Batismo Infantil: Pais e filhos no pacto da graça
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Aluli da Silva Oliveira
Batismo Infantil: Pais e filhos no pacto da graa
Trabalho de Concluso de Cursoapresentado Escola de Superiorde Teologia da UniversidadePresbiteriana Mackenzie comorequisito parcial obteno do graude Bacharel em Teologia.
ORIENTADOR: Prof. Dr. Edson Lopes
So Paulo2007
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Agradecimentos
A minha esposa, Rachel Oliveira, por causa do amor que a cada dia me tem
dedicado, por seu companheirismo e por seu auxlio idneo. A Chel , em minha
vida, um instrumento de Deus para o meu crescimento como homem cristo e como
o cabea da minha casa. Ela, ainda que sem saber, me motivou a fazer este
trabalho. Minha esposa fez-me notar a importncia de saber o porqu de batizar as
crianas, sobretudo nossos filhos, e o que isso acarretaria para elas prprias e para
seus pais. De certa forma a Chel, minha esposa amada, co-autora desde trabalho.
A meus pais Ricardo e Cineide Coelho por estarem sempre presentes. Por
colocarem-se como instrumentos da providncia divina para o nosso bem estar
nesses quatro anos de estudos. Por estarem sempre a nossa retaguarda nos dando
segurana para alar vos mais altos e ousados. Pela ajuda financeira, fruto de seus
coraes generosos e desprendidos. Principalmente pelo amor de pai e me que
sempre nos dispensaram.
A minha famlia: Roberto, Alcebades e Wladilza, Fernando e urea, Silas e
Lilidia, e minhas sobrinhas. Pelo apoio em todas as reas, pelas oraes, por
serem de fato meus irmos. Porque cada um deles, em um determinado perodo da
minha vida, alm de irmos, foram pais e mes. Pela educao que me deram,
pelos valores que me transmitiram. Por me amarem.
Ao Pr. Franklin Dvila. Instrumento de Deus para minha formao como
cristo e uma referncia para o ministrio que almejo.
Aos nossos amigos Andr e Elaine. Companheiros de luta. Pelos bons
momentos que gozamos juntos. Pelas maratonas gastronmicas, pelo compartilhar
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das alegrias e das tristezas. Pela amizade to singela e sincera que o Senhor nos
concedeu ter.
Sobretudo a Deus, a quem dedico tudo o que tenho e o que sou. Pois, por
causa dele, todas as pessoas a quem dedico este trabalho existem e foram
colocadas na minha vida. Tambm dele vieram os meus dons, capacidades e as
Escrituras Sagradas, que so a base deste trabalho. Porque ele o Senhor da
minha casa. Porque ele prometeu ser o meu Deus e o Deus de meus filhos e porque
nele ns podemos esperar.
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Sumrio
INTRODUO 5
1 FUNDAMENTAO DOUTRINRIA 7
CONFISSO DE F DEWESTMINSTER(CFW) 7
2 O BATISMO NAS SAGRADAS ESCRITURAS 10
2.1 A ANTIGA DISPENSAO, O PACTO DA PROMESSA 11
2.1.1 CONCEITO DE ALIANA DIVINA 112.1.2 O PACTO DA PROMESSA 132.2 A ATUAL DISPENSAO, O PACTO DA GRAA 202.2.1 O BATISMO CRISTO 292.2.2 BATISMO DE PROSLITOS 302.2.3 O BATISMO DE JOO 322.2.4 O BATISMO DE JESUS 342.2.5 A TEOLOGIA DO BATISMO 352.3 EVIDNCIASBBLICAS 412.4 CONSIDERAES FINAIS 44
3 BATISMO INFANTIL: PAIS E FILHOS NO PACTO DA GRAA 46
3.1 F, REGENERAO E SALVAO DE CRIANAS 463.2 A IMPORTNCIA DA PALAVRA DEDEUS 503.3 TERCEIRIZAO DA EDUCAO 513.3.1 NA EDUCAO SECULAR 533.3.2 NA EDUCAO CRIST 543.4 OPRINCIPIO BBLICO DA EDUCAO 563.4.1 TREINA A CRIANA 583.4.2 COMO TREINAR A CRIANA? 61
CONCLUSO 68
OBATISMO DE CRIANAS BBLICO 68OS PAIS SO RESPONSVEIS POR SEUS FILHOS 69
BIBLIOGRAFIA 71
FONTESPRIMRIAS 71FONTESSECUNDRIAS 72
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Introduo
Este trabalho limita-se tratar da doutrina bblica do batismo somente noaspecto em os pequeninos so envolvidos, ou seja, o pedobatismo. No sero
abordadas nesta monografia questes como: forma de batismo, re-batismo ou outras
que no estejam diretamente ligadas ao batismo especfico de crianas. A
veracidade bblica da doutrina, seu valor teolgico e pactual, sua importncia e suas
implicaes para os pais e filhos envolvem o contedo deste trabalho.
Pela fora que a matria e pela necessidade que os dias atuais nos impem,
pretende-se tambm fazer uma reflexo sobre o papel dos pais na educao de
seus filhos. Esta reflexo ser feita sob a luz do que as Escrituras Sagradas nos
ensinam sobre o batismo como pacto da graa.
So dois os objetivos desta pesquisa. Primeiro, afirmar biblicamente a
doutrina do batismo de crianas. Embora seja um trabalho apologtico, o mesmo
no se interessa pela polmica. Por isso, no sero confrontadas posies
divergentes como uma forma de se chegar verdade. A proposta do autor que se
faa uma leitura bblico-teolgica do assunto e ao final se sustente a verdade
escriturstica como esta se apresenta.
O segundo objetivo trazer tona as implicaes do batismo de crianas
para os pais que se utilizam deste. Tem-se observado que, tanto na sociedade em
geral quanto na igreja, a famlia vive uma sria crise e comea a entrar em colapso.
Um dos principais motivos desta crise, apontam os especialistas, a negligencia dos
pais para com a educao dos filhos: permissividade, omisso, ausncia etc. Por
isso, sob a luz do pacto que o batismo representa e do compromisso que os pais
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cristos assumem quando batizam seus filhos pequenos, pretende-se demonstrar
que dos pais, principalmente, o compromisso de educar seus filhos.
Uma vez que se deseja, neste trabalho, mais que uma busca de textos provas
que evidenciem a prtica do batismo infantil nos tempos apostlicos, a metodologia
aplicada nele ser a da teologia bblica. Obviamente, tambm ser apoiado pela
teologia sistemtica, sobretudo a de Calvino, sem a qual o resultado final ficaria
prejudicado. Contudo, o interesse maior buscar nas Escrituras Sagradas a teologia
que est por trs do batismo e, assim, afirmar que o mesmo , no s convenientes crianas, mas tambm lhes necessrio.
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1 Fundamentao Doutrinria
Confisso de f de Westminster (CFW)
No s aqueles que realmente professam f em Cristo e obedincia a ele,
mas tambm as crianas, filhas de um ou de ambos os pais crentes, devem ser
batizadas (CFW, XXVIII, IV).
Este trabalho baseia-se no captulo XXVIII da Confisso de f de
Westminster, especificamente na seo IV transcrita acima. Esta afirma que crianas
cujos pais, ou pelo menos um deles, sejam crentes devem ser batizadas. Porm,
antes de tratarmos do batismo infantil propriamente dito, veremos como esta
confisso define o batismo em geral.
Segundo os telogos de Westminster, o batismo um sacramento do Novo
Testamento (NT), institudo por Jesus Cristo, no s para admisso solene do
batizando na igreja visvel, mas tambm para servi-lhe de sinal e selo do pacto da
graa, do seu enxerto em Cristo, da sua regenerao, ou remisso de pecados e de
sua total entrega a Deus atravs de Jesus Cristo, para andar em novidade de vida
(XXVIII, I). Desta forma, o batismo , primeiramente, um sacramento, ou seja: 1)
um santo sinal e selo do pacto da graa, institudo por Deus para representar
Cristo e seus benefcios, para confirmar o interesse do crente em Cristo, para fazer
diferena visvel entre os que pertencem igreja e o restante do mundo, para
solenemente comprometer os crentes no servio de Deus em Cristo (XXVII, I). 2) O
batismo possui duas partes: o sinal externo e sensvel e a graa interior e espiritual
representada por este sinal. O que percebemos, quanto ao sacramento e
conseqentemente quanto ao batismo, que dentre outras coisas este serve paraadmisso do batizando na igreja visvel e como sinal e selo do pacto da graa. So
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justamente estes dois aspectos do batismo que o tornam prprio aos infantes filhos
de pais1 crentes.
A CFW, sendo bblica, baseia suas afirmaes em vrios textos das
Escrituras Sagradas. No caso da seo em questo, vrias so as passagens, pelo
menos treze2, que servem de apoio para o que confessamos a respeito do batismo
de crianas. Porm, tais passagens no fazem, de forma alguma, aluso direta ao
pedobatismo. Da a polmica a respeito da administrao deste sacramento aos
pequeninos. Contudo, o fato de no estar explicita, nos textos prova ou em outraparte da Bblia, uma ordenana ou algo que justifique que crianas sejam batizadas,
no torna o batismo infantil uma doutrina extra-bblica, ou uma heresia, ou, como
diziam os anabatistas no passado e os opositores do presente, uma mera inveno
humana.
No livro batismo em diferentes vises, Cullmann (BARTH; CULLMANN,
2004) defende que mais correto se estudar o batismo infantil por uma definio
teolgica neotestamentria, ao invs de faz-lo buscando no NT a prtica deste ato.
A tese de Cullmann que no se deve querer ver o batismo infantil do ponto de vista
testemunhal, mas saber se ele compatvel com a concepo neo-testamentria de
batismo. Creio ser essa justamente a questo: qual o papel teolgico do batismo? A
carncia de uma definio teolgica a cerca do batismo nos d uma viso
empobrecida desde sacramento. A discusso fica, na maior parte das vezes, na
periferia do assunto se h ou no evidencias bblicas de que crianas foram
batizadas. O que gera as mais variadas exegeses moldadas segundo a tendncia
1Neste trabalho, a expresso pais crentes no exclui aquelas crianas das quais apenas um dospais cristo.2 Mc 16.15,16; At 8.37,38; Gn 17.7,9; Gl 3.9,14; Cl 2.11,12; At 2.38,39; Rm 4.11,12; 1Co 7.14; Mt28.19; Mc 10.13-19; Lc 18.15; 7.13; Ex 4.24-26.
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doutrinria do exegeta. Por isso que, para uns, todo sua casa 3 significa que as
crianas tambm foram batizadas e, para outros, a mesma expresso significa que
se tratava de uma casa onde s havia adultos. Esse tipo de polmica carece de
profundidade. Quando, porm, buscarmos nas Escrituras, no apenas no NT como
sugere Cullmann, uma definio teolgica para o batismo e para o que este
representa, uma vez que smbolo e sinal de uma realidade espiritual,
alcanaremos, ou ao menos estaremos mais prximos de alcanar, o seu centro, o
seu significado real. Desta forma, no nos interessar apenas a quem este
sacramento deve ser administrado, mas tambm quais suas causas e
conseqncias para o que o recebe.
A CFW, embora consciente do significado teolgico do batismo, por causa de
sua forma resumida, no o expe muito bem. Esta a razo da falta de clareza
quanto ao batismo de crianas. Prope-se que vamos a fonte da qual beberam os
telogos de Westminster: as Sagradas Escrituras. Desta forma poderemos
apreender qual a definio teolgica ou sentido escriturstico do batismo e o porqu
deste ser adequado e at mesmo necessrio s crianas cujos pais so cristos.
3 Aluso a Atos 16.15 e outros onde se diz que algum e todo sua casa foram batizados.
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2 O batismo nas Sagradas Escrituras
De uma maneira geral os telogos defendem que Jesus instituiu o Batismo:
como vemos, por exemplo, em Mt 28.19: Ide, portanto, fazei discpulos de todas as
naes, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Esprito Santo . Mas, na
verdade, os quatro evangelhos falam de batismo antes de Jesus t-lo ordenado aos
discpulos. Sabemos que Joo Batista, o precursor do Messias, j batiza e que o
prprio Senhor Jesus foi por ele batizado4. Este dado especialmente revelador
para que entendamos o sentido que as Escrituras e o Senhor Jesus do ao batismo.
Por que Joo batizava? Com base em que ele batizava? Por que, uma vez que o
batismo foi institudo por Jesus e, por isso mesmo, uma novidade, ele deu to
poucas explicaes aos seus discpulos sobre este sacramento? Diante destas
perguntas percebemos que h muito mais do que simplesmente saber a quem deve
ser ministrado o batismo: se aos adultos ou tambm s crianas. Olhando para o
Antigo Testamento (AT) onde a circunciso instituda por Deus como selo da sua
aliana com Abrao o Pacto da Graa, como o denomina Calvino (1999) e
atentando para a ntima ligao entre este selo e o batismo, podemos aferir quo
preciosa, solene, profunda e, principalmente, verdadeiramente bblica a doutrina
do batismo infantil.
4 Jo 1.24-34; Mt 3.13-17; Mc 1.4,5; 9-11; Lc 3.1-14; 21,22.
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2.1 A antiga dispensao, o pacto da promessa
2.1.1 CONCEITO DE ALIANA DIVINA
Para uma analise do Pacto da Graa5, precisamos antes entender qual o
conceito bblico de aliana ou pacto. Para tanto, recorreremos exposio que
Robertson (1997) faz sobre o assunto.
Tendo em vista a abrangncia do termo aliana e a dificuldade de defini-lo por
causa da freqncia em que aparece, nos mais variados contextos, nas Escrituras
Sagradas, Robertson (1997, p. 8), apoiado na integridade da histria bblica que
determinada pelas alianas divinas, afirma que aliana, em sua natureza, um
pacto de sangue soberanamente administrado. Desta maneira, todo pacto de Deus
com o homem , em primeiro lugar de sangue, quer dizer que implica vida e morte e,
em segundo lugar, administrado soberanamente por Deus, ou seja, a iniciativa e
as condies so divinas.
O sentido do termo hebraico (tyrIB.)6 para aliana no consenso entre os
estudiosos do AT. Mesmo assim, por causa do seu uso no contexto bblico, pode-se
considerar razoavelmente consistente o conceito de pacto ou relacionamento.
Robertson (1997, p. 9, grifo nosso), citando D. J. McCarthy, diz: Embora as alianas
divinas invariavelmente envolvam obrigaes, seu propsito ltimo vai alm da
quitao compreendida por um dever. Ao contrrio, a inter-relao pessoal de
Deus com seu povo que est no corao da aliana. De fato, com raras excees,
as alianas so feitas sempre entre pessoas. Assim afirmamos que quando Deus se
5 Termo usado por Calvino para se referir ao pacto que Deus faz Abrao. Maiores explicaes seroencontram-se na pgina 20 deste trabalho.6tyrIB. (ber-eeth'): Aliana, pacto.
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pe em aliana com algum, ele de fato est construindo um relacionamento com
esta pessoa.
Nesta afirmao de que aliana , em sua essncia, um pacto, devemos
considerar o seu elemento formalizador (ROBERTSON, 1997, p. 9). a declarao
verbal que formaliza a aliana. Deus fala graciosamente s suas criaturas
comprometendo-se com elas e lhes expondo as bases deste compromisso. Da a
importncia do juramento. Este pode ser verbalizado ou expresso por meio de
sinais
7
. O juramente faz com que pessoas se comprometam com pessoas.
Com relao presena de sinais nas alianas bblicas diz Robertson (1997
p. 11):
A presena de sinais em muitas das alianas bblicas tambm enfatiza que as
alianas divinas unem pessoas. O sinal do arco-ris, o selo da circunciso, o
sinal do Sbado estes sinais da aliana reforam, o carter de ligao da
aliana. Um compromisso interpessoal que pode ser garantido entra em vigor
por meio de um pacto com carter de aliana. [...] os sinais da aliana divina
simbolizam a permanncia do pacto entre Deus e o seu povo.
Este pacto qualificado como sendo de sangue. o que nos expe a Bblia
em Gn 158, quando Deus estabelece sua aliana com Abro. Os animais cortados
ao meio o derramamento de sangue representam a pena que cair sobre o que
violar a aliana. Deus no faz concertos informais com os seus, mas suas alianas
so srias e acarretam a morte da parte infiel. Este conceito, alm de estar presenteem todo AT, reafirmado no NT onde o escritor aos hebreus assevera que: Com
efeito, quase todas as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue; e, sem
7 Cf. Gen 15.10,18; 21.23-31; 26.28-30; Dt 7.8,12; Ex 24.8.8Gn 15:9-10; 17-18: Respondeu-lhe: Toma-me uma novilha, uma cabra e um cordeiro, cada qual de
trs anos, uma rola e um pombinho. Ele, tomando todos estes animais, partiu-os pelo meio e lhes psem ordem as metades, umas defronte das outras; e no partiu as aves.E sucedeu que, posto o sol, houve densas trevas; e eis um fogareiro fumegante e uma tocha de fogoque passou entre aqueles pedaos. Naquele mesmo dia, fez o SENHOR aliana com Abro.
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derramamento de sangue, no h remisso (Hb 9.22). Por isso dizer-se que aliana
divina um pacto de sangue.
Por fim, diferentemente dos acordos e contratos humanos, as alianas divinas
so soberanamente administradas. Elas so unilaterais. Como dito anteriormente, a
iniciativa do Senhor e as condies e promessas tambm so estabelecidas por
ele. Nada de barganha, troca ou contrato caracteriza as alianas divinas da
Escritura. O soberano Senhor do cu e da terra dita os termos da sua aliana
(ROBERTSON, 1997, 18).
Este entendimento do que uma aliana divina permiti-nos uma
compreenso melhor do significado do Pacto da promessa e conseqentemente do
batismo, sobretudo de infantes.
2.1.2 O PACTO DA PROMESSA9
A Bblia narra o pacto da promessa no livro de Gnesis nos captulos quinze e
dezessete. Naquele est o firmamento de uma aliana a respeito das promessas
que Senhor fizera a Abro quando do seu chamamento em Gn 12. O que acontece
no captulo dezessete a seladura do pacto feito dois captulos antes. Tanto em
Gneses quinze quanto em dezessete temos como pano de fundo as promessas
feitas por Deus ao patriarca: 1) posteridade numerosa e 2) uma terra por herana.
Contudo, as promessas no aparecem primeiramente no contexto da aliana,
na verdade, aquelas precedem a esta. Deus primeiro fez as promessas. A primeira
envolve uma numerosa posteridade. Como est escrito: de ti farei uma grande
nao, e te abenoarei, e te engrandecerei o nome. [...] em ti sero benditas todas
as famlias da terra (Gn 12. 2-3). E a segunda envolve a posse da terra de Cana, a9 Expresso usada por Robertson (1997) em referncia a aliana que Deus faz com Abrao descritaem Gn 15 e 17.
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cerca da qual disse o Senhor: Darei tua descendncia esta terra (Gn 12.7).
Quando Abro e L se separam, Deus reafirma a promessa feita no passado 10.
Novamente uma descendncia, to numerosa quando o p da terra ou as estrelas
do cu e a posse da terra. Contudo, o tempo vai passando. Abro est
envelhecendo e Sarai, sua esposa, estril. As possibilidades de que tais
promessas se cumpram se tornam cada vez mais remotas. Porm, mas uma vez
Deus fala a Abro, desta feita, por meio de uma viso. Suas palavras so: No
tenha medo, Abro! (Gn 15.1). O patriarca responde com um tom desanimado e
queixoso. Eis sua resposta: SENHOR Deus, que me havers de dar, se continuo
sem filhos e o herdeiro da minha casa o damasceno Elizer? [...] A mim no me
concedeste descendncia, e um servo nascido na minha casa ser o meu herdeiro
(Gn 15.2,3). Podemos notar o desnimo nas palavras de Abro. Afinal, quase dez
anos se passaram desde de que Deus lhe falou pela primeira vez. Agora, Abro tem
oitenta e cinco anos, sua mulher estril e sua nica esperana de posteridade
um servo damasceno chamado Elizer. Mas, Deus o anima. Ele o faz reiterando
suas promessas e as formalizando por meio de uma aliana.
Estudando o captulo quinze de Gnesis, notamos que de fato a aliana que
Deus faz com Abro um pacto de sangue soberanamente administrado
(ROBERTSON, 1997). Depois da reiterao das promessas, Abro pergunta: ,
Soberano Senhor, como posso saber que tomarei posse dela? (Gn 15.8). Como
resposta a esta pergunta, o Senhor formaliza uma aliana. Agora as promessas no
so apenas palavras, ainda que ditas por Deus, mas fazem parte de um pacto entre
Deus e Abro. Deus, como disse o patriarca, o Soberano Senhor, foi quem tomou a
iniciativa tanto de prometer como de comprometer-se, por meio de uma aliana, a
10 Gn 13.14-18
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cumprir o que havia prometido. Abro passivo. Ele apenas comunicado a
respeito do que Deus ir fazer nele, a favor dele e atravs dele. Mais do que isso, a
aliana no mera formalidade. Ela envolve a vida das partes que se
comprometeram. Os animais partidos ao meio e o derramamento de sangue so
smbolos do que deve acontecer quele que quebrar a aliana. O no cumprimento
do pacto acarretar a morte da parte infiel. Assim o pacto da promessa. Neste, o
Senhor, promete a Abro uma descendncia numerosa e conceder a ele e esta
descendncia a terra de Cana.
O capitulo dezessete a seladura do concerto o pacto da promessa. Nestes
versculos o Senhor esclarece os termos do pacto e aquilo que o simboliza a
circunciso. Nas outras vezes em que falara a Abro, Deus simplesmente pronuncia
suas promessas. Assim foi nos dois captulos j vistos. Desta vez, o Senhor se
apresenta como El-Shaddai11 o Deus todo poderoso e d a Abro o imperativo:
anda na minha presena e s perfeito (17.1).
No verso dois, Deus diz que estabelecer sua aliana12. Aps isto, Deus pe
os termos deste pacto. Quanto a mim13 (15. 4). A partir desta declarao o Senhor
impe a si mesmo deveres numa aliana criada e administrada soberanamente por
ele mesmo. O compromisso de El-Shaddai com, a partir de agora, Abrao que
aquele far este prolfero e que deste ser a terra de Cana. H ainda um elemento
novo. O Senhor diz no versculo sete Estabelecerei a minha aliana entre mim e ti e
a tua descendncia no decurso das suas geraes, aliana perptua, para ser o teu
Deus e da tua descendncia. Este pacto da promessa uma aliana perptua entre
11yD:v; lae-ynIa]12
tyrIB.: embora a etimologia seja incerta, a raiz usada no AT como um verbo. Sua ao descrevealiana, acordo. Sua traduo mais precisa cortar uma aliana. Este cortar uma aliana se d pormeio de sacrifcio cruento como parte do ritual da aliana (BIBLEWORKS, 2001).13ynIa]
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Deus, Abrao e seus descendentes. Deus, assim, se compromete no apenas com
o patriarca, mas tambm, com todas as geraes que descenderem dele. uma
aliana permanente.
Em contrapartida, a Abrao declarada sua parte no pacto. E tu14 (15.9).
Isto significa que Abrao tem sua parte para cumprir. Diz o Todo poderoso ao
patriarca: guarda a minha aliana. Tu e teus descendentes. So estes os termos da
aliana. a isto que as partes comprometidas por ela se obrigam. Da parte do
Senhor: fazer Abrao prolfero, conceder-lhe a terra de Cana e ser o seu Deus e oDeus de seus descendentes. Quanto a Abrao, espera-se que ele simplesmente
guarde a aliana. O smbolo e selo desta aliana a circunciso.
A circunciso no a parte que Abrao deve cumprir. Ela smbolo do pacto
firmado naquele momento. Assim como os anis que os noivos trocam no
casamento simbolizam a unio destes. Guardar a aliana, na verdade observar o
que est dito no verso um: anda na minha presena e s perfeito. o que Deus
pede a Abrao. Este o compromisso que o Todo Poderoso quer dele. disto que
a circunciso faz lembrar: que h um pacto e que neste compete ao homem andar
na presena de Deus e ser perfeito. Desta forma, Abro, seus contemporneos e
todos os seus descentes trariam, no prprio corpo, o selo do pacto feito com Deus.
Este o sentido da circunciso: a Deus aprouve se relacionar com Abrao e seus
descendentes e fez isso por meio de um pacto no qual promete ser o Deus dele e de
seus filhos. Em contrapartida, Abrao lhe seria obediente. A circunciso o selo do
pacto da promessa. Por isso, o seu carter obrigatrio. Negligenci-la mesmo que
negligenciar a prpria aliana e o relacionamento com Deus proposto nela. A
circunciso unia Abrao e seus descendentes ao Todo Poderoso Deus.
14hT'a;w>
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Na medida em que esses anncios escriturstico introduzem o seloda velha aliana, deve-se notar a solenidade da diretriz de Deus.Deus declarou que este sinal ser ministrado entre o seu povo.Tratar levianamente o sinal, ou ignorar as estipulaes associadascom ele, expor-se aos julgamentos do Deus da aliana(ROBERTSON, 1997, p. 135).
sabido, por meio dos historiadores, que a prtica da circunciso era comum
entre os grupos tnicos no Oriente Prximo, portanto no era uma peculiaridade de
Israel. No obstante a isso, o significado na circunciso para judeu era nico e
teolgico. Robertson (1997) esclarece o significado teolgico do selo nos seguintes
termos: 1) ela simbolizava a incluso na comunidade da aliana estabelecida pela
graa de Deus. Assim a pessoa era introduzida num relacionamento com o Deus da
aliana e com o povo da aliana. 2) A extirpao do prepcio um ato higinico de
purificao fsica. Desta maneira, a circunciso representa a impureza do homem e
sua necessidade de purificao, no somente o individuo, mas toda a raa humana.
A circunciso deveria ter humilhado o povo de Israel porque mostrava seu demrito
inato para ser o povo de Deus (ROBERTSON, 1997, p. 136). 3) A circunciso ainda
simboliza o processo real de purificao: ela tem o poder de limpar parcialmente,
mas tambm simboliza e sela realmente a purificao necessria participao da
aliana. H ainda uma peculiaridade digna de nota. Diferentemente dos outros
povos do Oriente Prximo, em Israel a circunciso era feita aos oito dias de vida.
Desta forma, ela no um rito de passagem para maior idade como o era nas
outras etnias mas servia para enfatizar o princpio de solidariedade entre pais e
filhos num relacionamento de aliana (ROBERTSON, 1997, p. 135).
Desde o princpio, na criao, Deus deixa claro que deseja se relacionar, no
apenas com indivduos, mas tambm com suas famlias. O Senhor pe um casal no
den. No dilvio, Deus poupa No e sua famlia (Gn 7.1). Da mesma maneira
acontece com Abrao. A aliana que o Senhor faz com ele envolve tambm sua
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famlia. Este o princpio da solidariedade familiar estabelecido nas Escrituras. Este
mesmo princpio est presente no ensino apostlico do NT: sers salvo tu e tua
casa15
. Robertson (1997) relaciona circunciso questo da propagao da raa.
Para ele um dos fatores que determina esta relao que a circunciso era para
Abrao e seus descentes, antes mesmo que estes tivessem nascido. Assim, todos
os descendes do patriarca, do menor ao maior, estavam obrigados com a aliana.
Esta solidariedade familiar do pacto da promessa traz duas implicaes para povo
de Israel. A primeira delas que, pelo fato da circunciso simbolizar a necessidade
de purificao e sendo ela mesma uma purificao parcial, a raa toda pecadora,
portanto precisa ser purificada. Nem mesmo os pequeninos fogem a esta regra. Eles
devem, j nos seus primeiros dias, receber o selo que os far lembrar de sua
impureza e da necessidade de purificao. O pecado no apenas assunto do
indivduo, mas tambm da raa. [...] a circunciso implica culpa da raa
(ROBERTSON, 1997, p. 137). A outra implicao que Deus quer tratar com
famlias. Como j exposto anteriormente, o Senhor tem como alvo de sua redeno
o indivduo e sua famlia.
Por outro lado, existe a argumentao de que a circunciso no passa de
mero smbolo de nacionalidade, a marca tnica de Israel. De fato, no se pode
olvidar o carter nacional desde smbolo. De certa forma, a circunciso simbolizava
a membresia na nao judaica. Mas, limitar a apenas este significado um
reducionismo. No se pode reduzir a aliana selada e simbolizada pela circunciso a
mero emblema nacional. Mesmo porque, como j exposto, este rito no era uma
exclusividade dos hebreus. Ainda que de maneira diversa da de Israel, outros povos
tambm utilizavam a circunciso. A um outro aspecto para este selo e que o faz
15oiko,j(oiks): intimidade da casa, pessoas que formam a famlia. Diferente de oivki,a (oikia) que serefere mais diretamente ao edifcio e/ou a todos que habitam na casa (BIBLEWORKS, 2001).
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peculiar entre os judeus: ele tambm pretendia representar o relacionamento do
homem com Deus por meio da aliana. A circunciso indicava o status de um
homem em relao a Deus tanto quanto seu status em relao nao de Israel
(ROBERTSON, 1997, p. 138). Este o significado teolgico da circunciso no AT:
Deus se pe num relacionamento com o homem por meio de um pacto de sangue
soberanamente administrado. Isto fica ainda mais claro porque o smbolo escolhido
como selo deste pacto a extrao do prepcio. Este procedimento que visava a
higienizao fsica serve para mostrar a necessidade de purificao daquele que se
coloca em uma relao pactual com o Todo Poderoso.
Por trs da circunciso h uma verdade inexorvel: todo homem impuro e
necessita de purificao. O pacto divino com Abrao no foi feito mediante uma
pureza pr-existente no patriarca. Ao contrrio, colocava Abrao e seus
descendentes, mesmo os de mais tenra idade, diante da realidade da natureza
humana decada e impura. At uma criana de oito dias necessita de purificao e,
por isso, recebia em sua carne o smbolo desta carncia. Este significado teolgico
amplamente exposto no AT. O homem, que na infncia recebera a purificao
parcial e fsica, deve buscar durante toda sua vida torn-la completa circuncidando
no apenas o pnis, mas o corao. Esta a exortao que Moiss e os profetas
fazem nao da aliana16. A circunciso do corao est na essncia da aliana
quando o Senhor declara a Abro anda na minha presena e s perfeito (Gn 17.1).
Portanto, a circunciso o selo e o smbolo da aliana divina soberanamente
administrada entre Deus e seu povo. Nesta, o Todo poderoso promete ser o Deus de
Abro e de todos os seus descendentes estabelecendo assim um princpio de
solidariedade familiar. Esta mesma aliana por meio de seu selo mostra a Abrao e
16 Dt 10.16; Jr 4.4.
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a sua descendncia que eles so impuros, mesmo os menores, e necessitam
purificar-se extraindo a impureza dos coraes assim como extraram a impureza
fsica quando extirparam seus prepcios. A circunciso servia para lembr-los disto.
Por fim, a aliana selada e simbolizada pela circunciso um pacto de
sangue que acarreta a morte da parte infiel. Aquele que negligenciasse o selo da
aliana, ou por no se circuncidar ou por no observar suas implicaes, quebrava a
aliana e era eliminado da comunidade do pacto.
2.2 A atual dispensao, o pacto da graa
Calvino (1999) refere-se ao pacto feito com Abrao como o pacto da graa.
Contudo, a CFW, posteriormente ao telogo, denomina pacto da graa aquele
realizado na eternidade entre o Deus Pai e o Deus Filho com respeito redeno
dos eleitos17. No h, pois, dois pactos da graa de substncia diferenciada, mais
um s e o mesmo sob vrias dispensaes (CFW, VII, VI). Nesta nomenclatura
dada por Calvino, possivelmente, reside uma confuso quanto natureza teolgica
da circunciso e, por conseguinte, do batismo. importante salientar que esta
confuso no do prprio Calvino, mas daqueles que posteriormente o
interpretaram. No que se refere ao batismo de infantes, o telogo de Genebra
chama de pacto da graa a aliana entre Deus e Abro ou, como referido aqui, pactoda promessa.
Entretanto, Calvino no erra em usar o termo pacto da graa com relao ao
da promessa. Sabemos que todo movimento de Deus em direo ao homem
mediado pela graa, pois no somos merecedores da sua propiciao seno por
causa da sua livre graa. Da mesma forma, as alianas divinas so pactos
17 Catecismo Maior de Westminster, pergunta trinta e um.
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soberanamente administrados cuja iniciativa do Senhor e cujas condies so por
ele estabelecidas. Sendo assim, o pacto da promessa pode ser chamado de pacto
da graa sem prejuzo do entendimento teolgico do mesmo. Para o reformador, a
promessa que o Senhor faz a Abrao de ser o Deus dele e de seus filhos mostra
a inteno do Criador em separar para si um povo por meio de uma linhagem santa.
Com este povo e por iniciativa prpria, o Todo Poderoso entra em aliana da qual o
selo a circunciso. As Escrituras nos mostram que Abrao no era diferente dos
outros homens. Sabemos que Abrao foi tirado de uma famlia idlatra que morava
numa terra igualmente idlatra18. O fato de Deus entrar em aliana com o patriarca
no se baseia em mritos humanos, porm na graa divina. Por isso, muito prprio
que Calvino chame a aliana de Deus com Abrao de pacto da graa.
Uma vez que esclarecemos o que Calvino quer dizer com pacto da graa no
tocante a este assunto, podemos nos desvencilhar de alguns equvocos
relacionados circunciso e ao batismo. No que se refere a este, pacto da graa
aquele que foi feito entre Deus e Abrao em favor de Israel. O pacto a que o
reformador francs refere-se como da graa no aquele feito na eternidade entre
o Deus Pai e o Deus Filho em favor dos eleitos, tambm chamado de pacto da
redeno. Contudo, temos que ter em mente que o pacto com Abrao tipifica aquele
feito com Cristo. Sendo tipo, a expresso material e imperfeita do que mais tarde
se revelar como espiritual e perfeito. Ento, o pacto da graa a que Calvino se
refere o tipo e no a realidade espiritual.
Deste equvoco decorre outro: pensar que os bens eternos garantidos no
pacto arqutipo so conferidos aos que fazem parte apenas do pacto tipo. Ou seja, a
exciso da acropstia ligava o circuncidado ao Deus e ao povo da aliana e o
18 Js 24.1-4.
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separava dos outros povos. Por isso, Israel ser chamado de linhagem santa19.
Entretanto, aquele que fazia parte do povo do pacto e que gozava dos privilgios
que Deus, por sua graa, havia concedido a este de forma alguma teria a redeno
de sua alma garantida com base em um rito. A circunciso apontava para a
impureza inerente a raa humana que atinge desgraadamente o ser humano j
na sua concepo, como declara o salmista20 e para a necessidade de purificao.
Por isso, a verdadeira circunciso deve ser a do corao. Desta maneira, o que se
esperava daquele que foi circuncidado que ele cumpra o [m;v'21. O que se torna
possvel por causa da operao graciosa do Senhor nos coraes do seu povo 22.
Uma vez que esta expectativa no fosse alcanada o pacto estava descumprido e a
parte infiel deveria morrer. Estes eram os termos. Da, vermos no AT, a separao
do reino de Israel, os cercos nao judaica e os cativeiros e, no NT, como exposto
pelo apstolo Paulo, que o prprio Israel foi parcialmente rejeitado e aguarda sua
restaurao23.
Uma vez estabelecidos os limites do que Calvino chama de pacto da graa,
podemos observar como o telogo o relaciona com o batismo infantil.
Assevera-se que o pacto feito com Abrao to pertinente aos cristos hoje
quanto o foi no passado aos judeus. De fato, muitas so as evidncias bblicas de
que circunciso e batismo so as duas formas de um mesmo pacto: aquela na
antiga dispensao e este na atual. No difcil de notar os pontos de contato entre
os dois sacramentos. Os filhos dos judeus foram chamados de linhagem santa e
19 Ez 9.2.20 Sl 51.21 [m;v': (shma) trad.: Ouvir. Confisso de f judaica baseada em Dt 6.4ss. uma exortao a que
se tenha em mente que Wnyhel{a/ hw"hy> o nico Deus. Por isso deve ser amado com totalidade do sere seus mandamentos e estatutos devem ser obedecidos.22 Dt 30.6.23 Rm 11.1-11.
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distintos dos filhos dos outros povos por que eram herdeiros do pacto. Da mesma
forma, os filhos dos cristos so chamados santos, mesmo que s um dos pais seja
cristo24
.
O batismo deriva da circunciso. De fato, podemos encar-lo como uma
atualizao que Cristo fez daquilo que j era prtica no AT, a circunciso.
Observando Gn 17.7-10, onde Deus estabelece sua aliana com Abrao e a sela por
meio da circunciso, Calvino (1999) afirma que tanto para o batismo quanto para
circunciso as promessas, as figuras e os fundamentos so os mesmos.
H uma promessa de vida eterna em ambos que est presente na aliana que
Deus fez com Abrao. Prova-se isto na declarao de Jesus em Lc 20.38: Ele no
Deus de mortos, mas de vivos, pois para ele todos vivem . Paulo diz que os gentios
incircuncisos, que antes estavam sem Cristo, estavam tambm fora da comunidade
de Israel, logo, alheios s promessas feitas a Abrao25. O primeiro passo para nos
aproximarmos de Deus e termos a vida eterna passar pela remisso do pecado.
Tal promessa segue-se tambm ao batismo que o smbolo de nossa purificao e
lavagem (CALVINO, 1999, p. 1045, traduo nossa). Para Calvino, o batismo a
marca de nosso cristianismo e o sinal pelo qual somos recebidos na sociedade da
igreja. Da mesma forma, a circunciso colocava o individuo em relao com o Deus
e com o povo da aliana. O batismo simboliza a remisso dos pecados operada em
e por Cristo na sua morte e ressurreio26. O selo da antiga aliana tambm indicava
a necessidade de purificao e o desejo de Deus de remir um povo para ser-lhe
santo. Convm ainda salientar que como na dispensao passada o pacto era
cruento porque exigiu derramamento sangue, na de agora se d da mesma forma. A
24 Ed 9.2 e 1Co 7.14.25 Ef 2.1226 Rm 6.
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nova aliana estabelecida na morte Cristo seu sacrifcio substitutivo o sangue
de Cristo derramado na cruz o da nova aliana27.
Da mesma forma, batismo e circunciso representam e, at mesmo, exigem a
mortificao da carne ou santidade. O Senhor diz a Abro que este ande em sua
presena em integridade de corao. Da mesma forma, Moiss exorta ao povo que
circuncide seus coraes28. No ficam dvidas que a circunciso tem a ver com a
mortificao da carne. A circunciso da carne apenas smbolo do que deve
acontecer no interior
29
. Em outras palavras, o ato externo deve seguir-se de umaatitude de santidade, pureza e devoo que so o cumprimento da aliana
estabelecida por Deus e outrora selada pela circunciso. Moiss ensina que tal
circunciso obra da graa de Deus (Dt 30.6)30.
Percebemos, ento, que a circunciso precede ao testemunho. Como smbolo
da aliana de Deus com seu povo, a circunciso significa o ato de Deus separar para
si uma nao31. Por isso no s os pequeninos, mas tambm, todos os homens que
fossem inseridos na nao judaica (Gn 17.12, 13) estrangeiros e escravos
deveriam ser circuncidados. Isto no fazia destes homens pessoas redimidas de
seus pecados, mas os identificava como participantes do povo de Israel. O mesmo
se aplica aos meninos nativos. Conforme assevera Robertson (1997, p. 135), a
circunciso simbolizava a incluso na comunidade da aliana estabelecida pela
graa de Deus. Era sinal da aliana. Como tal, introduzia o povo em relacionamento
27 Gn 15; Mt 26.28; Mc 14.24; Lc 22.20; 1Co 11.25; Hb 9.15; 12.24.28 Dt 10.16.29 A circunciso indica a necessidade de purificao. O ato higinico da remoo do prepciosimboliza a purificao necessria para o estabelecimento de uma relao de aliana entre um Deussanto e um povo profano (ROBERTSON, 1997, p. 136).30O SENHOR, teu Deus, circuncidar o teu corao e o corao de tua descendncia, para amareso SENHOR, teu Deus, de todo o corao e de toda a tua alma, para que vivas.31 Quando tratamos Israel como povo de Deus ou nao separada, queremos deixar bem claro o fatode que, no AT, Israel era o reino visvel de Deus, como hoje o a igreja, e no a totalidade do Reinode Deus em todas as sua instncias.
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com o Deus da aliana, e em solidariedade com o povo da aliana . Este o reino
visvel de Deus, Israel. Contudo, o que tinha a marca da circunciso deveria ser
instrudo a viver em amor e temor a Deus e obedincia aos seus mandamentos.
Assim a circunciso sairia da esfera simblica e se juntaria verdade espiritual que
representa. Desta maneira, a circunciso no era apenas para os que tinham
condio de testemunhar, mas tambm, para aqueles que, mesmo sem
entendimento do smbolo, ingressavam no povo da aliana.
O menino circuncidado aos oito dias de vida no estava livre do seu pecadoou isento de qualquer juzo divino caso se desviasse quando adulto. Na verdade, a
circunciso permitia-lhe o ingresso no povo de Deus, naquele que era o reino visvel
do Senhor aqui na terra, Israel. Todos que quisessem participar deste privilgio
deveriam circuncidar-se e tambm seus filhos. Contudo, privilgios trazem consigo
responsabilidades. O circunciso deveria extrapolar o ato externo e circuncidar o
prprio corao (Dt 10.16). O menino que teve seu prepcio extrado deveria mais
tarde viver de maneira coerente com o sinal exterior que lhe foi dado. Isto a
circunciso do corao da qual Moiss fala. Voltando a Gn 17, o que Deus pede a
Abrao que este ande em sua presena e seja integro de corao (v. 1). E no
somente Abrao, mas tambm, os seus futuros descendentes (v. 9).
O apstolo Paulo faz essa relao entre circunciso e batismo. De maneira
especial, em Romanos, o escritor faz sua anlise entre batismo e circunciso. Em
primeiro lugar, no captulo dois, ele diz que a circunciso no tem valor algum se
acompanhada de desobedincia. Paulo diz: a circunciso tem valor se voc
obedece Lei; mas, se voc desobedece Lei, a sua circunciso j se tornou
incircunciso. Sendo assim, circunciso aquele que obedece aos mandamentos doSenhor. No mesmo captulo dito: No judeu quem o apenas exteriormente,
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nem circunciso a que meramente exterior e fsica. No! Judeu quem o
interiormente, e circunciso a operada no corao, pelo Esprito, e no pela Lei
escrita. Isto confirma, o que j foi exposto por Moiss em Deuteronmio: a
circunciso deve ser seguida de uma vida santa.
No obstante s advertncias quanto circunciso meramente fsica e
exterior, Paulo, no captulo seguinte, respondendo a pergunta retrica sobre qual a
vantagem de ser judeu e sobre a utilidade da circunciso, afirma: Muita, sob todos
os aspectos. Principalmente porque aos judeus foram confiados os orculos deDeus. Tambm no captulo nove, ainda que com tristeza ele afirma: pertence-lhes
a adoo e a glria, as alianas, a legislao, o culto e as promessas; deles so os
patriarcas, e tambm deles descende o Cristo, segundo a carne (Rm 9.4, 5).
Vemos, ento, que no coisa de somenos pertencer comunidade de Israel. Este
era um povo especial para Deus, chamado de nao santa32. Era um privilgio fazer
parte deste povo e ser cidado do reino visvel de Deus. Foi aos judeus que
primeiramente o Senhor se revelou e lhes confiou sua vontade, promessas e
tambm juzos. Israel era o povo da aliana, a comunidade da graa. A circunciso
era o smbolo de pertencimento a este povo e permitia o acesso do circunciso aos
privilgios do relacionamento entre Deus a comunidade judaica. O mesmo acontece
com a igreja na atual dispensao.
H os que objetam afirmao de que Israel tipificava a igreja. Afirmam que
so dispensaes diferentes com nada em comum entre si. Entretanto, negar a
relao tipolgica entre Israel e a Igreja o mesmo que negar a relao entre Antigo
e Novo Testamentos. Parafraseando Loyd-Jones, afirmamos que a igreja latente
em Israel e Israel e patente na igreja. Assim nos afirmam as Escrituras em vrias
32 Ex 19.5, 6.
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partes. Encontramos, por exemplo, na carta aos Efsios a expresso de tal verdade
clara e indubitavelmente. Paulo, nesta carta, aponta para a consumao do plano
eterno de Deus cujo propsito era fazer convergir todas as coisas em Cristo. O
apstolo continua sua exposio sobre o propsito divino falando do poder de Deus
que ressuscitou Jesus dentre os mortos e o exaltou fazendo-o sentar a sua direita
em lugares celestiais. Esta exaltao evolve tambm a sujeio de todas as coisas
ao senhorio de Jesus e para isso o deu igreja33.
A partir da igreja Jesus domina sobre tudo e todos. O Senhor Jesus no apenas o cabea da igreja, mas o Senhor de tudo comeando pela igreja. Em
outras palavras, a igreja o reino visvel de Cristo assim como fora Israel no
passado. Ainda vemos o apstolo Pedro que se refere a igreja da mesma forma que
Deus se referia a Israel: Vs, porm, sois raa eleita, sacerdcio real, nao santa,
povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele
que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz (1Pe 2.9). Contudo, a
expresso maior da unidade entre Israel e a igreja se encontra em Ef 2.19, 20:
Assim, j no sois estrangeiros e peregrinos, mas concidados dos santos, e sois
da famlia de Deus, edificados sobre o fundamento dos apstolos e profetas, sendo
ele mesmo, Cristo Jesus, a pedra angular. Em Cristo o velho e o novo testamentos
se encontram. Jesus a pedra angular que liga os dois fundamento do povo de
Deus: profetas e apstolos. Em Cristo, a igreja Israel e vice-versa. Desta forma,
dizemos que a igreja uma comunidade privilegiada. Ela de fato a comunidade da
graa. onde Deus se revela de forma especial, uma vez que a esta foi confiado o
evangelho. Pois e por ela que Deus torna conhecida sua multiforme sabedoria (Ef
3.10). A igreja tem os mesmos privilgios e responsabilidades que tinha Israel. Ns,
33 Ef 1.22ss.
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os da atual dispensao, fomos feitos co-participantes das promessas por meio de
Jesus Cristo34. A igreja sem dvida o novo Israel.
No que se refere ao batismo e circunciso, como j exposto, a nica
mudana se d na forma de administr-los. No mais so iguais: tm o mesmo
significado, representam as mesmas coisas, so estabelecidos em Cristo trazem
consigo as mesmas promessas e juzos.
O apostolo Paulo, j no captulo seis, fala a respeito do batismo com base na
morte de Cristo e cujo fim que o batizado viva uma nova vida longe do pecado
que vem a ser a mesma exigncia da circunciso. O batismo fundamenta-se na
morte de Cristo. A gua figura do sangue35 que o sangue da nova aliana
derramado no Calvrio. Este o batismo real, realizado em favor dos eleitos, do qual
a cerimnia batismal mero smbolo. O batizado deve unir-se a Cristo em sua morte
e, tambm, unir-se a ele em sua ressurreio para uma vida nova. o que o escritor
aos romanos afirma:
[...] Ns, os mortos para o pecado, como podemos continuar vivendonele? Ou vocs no sabem que todos ns, que fomos batizados emCristo Jesus, fomos batizados em sua morte? Portanto, fomossepultados com ele na morte por meio do batismo, a fim de que,assim como Cristo foi ressuscitado dos mortos mediante a glria doPai, tambm ns vivamos uma vida nova (Rm 6.2-4).
Conclui-se que as promessas espirituais dadas na circunciso so asmesmas concedidas a ns no batismo e o propsito de ambos que vivamos em
justia. Segundo Calvino (1999), a terceira caracterstica comum circunciso e ao
batismo o fato de que o fundamento de ambos est em Cristo. Cristo o
fundamento tanto do batismo como da circunciso porque ele foi prometido a Abrao
para beno de todas as gentes (Gn 12.3). O selo de tal promessa foi a circunciso.
34 Ef 3.6.35 Cf. 1Pe; Lc 22.20; Hb 9.11-28.
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Em Atos 2.2536, vemos que em Cristo, descendente de Abrao, Deus abenoou
todas as famlias da terra. Reportando-nos ao captulo seis de Romanos, afirmamos
que o fundamento do batismo cristo est na morte e ressurreio do Senhor Jesus
Cristo37.
Por isso, afirmarmos que o batismo e a circunciso so diferentes smbolos
das mesmas promessas, fica claro que da mesma forma como a circunciso era
ministradas aos infantes tambm o deve ser o batismo.
Tanto a circunciso quanto o batismo tm uma aliana correspondente: uma
em Abro e outra em Cristo respectivamente. Estas, na verdade, no so duas, mas
apenas uma, o Pacto da Graa. Portanto, circunciso e batismo, em suas
respectivas pocas, servem de smbolo e selo da aliana que Deus faz com seu
povo. Falando acerca da cessao do rito formal da circunciso por causa da sua
realizao em Cristo e sua evidncia da ao purificadora do Esprito Santo na vida
do crente da nova aliana, diz Robertson: Entretanto, a realidade simbolizada no
rito formal da circunciso tem certamente significao para o crente da nova aliana.
A purificao da impureza e a incorporao na comunidade da aliana mantm vital
significado para o cristo (1997, p. 144).
2.2.1 O BATISMO CRISTO
Com base no que j foi exposto podemos agora, com maior clareza tratar a
instituio do batismo cristo, seu significado teolgico e suas implicaes para o
povo de Deus hoje.
36 Vs sois os filhos dos profetas e da aliana que Deus estabeleceu com vossos pais, dizendo aAbrao: Na tua descendncia, sero abenoadas todas as naes da terra. 37 Ver tambm Cl 2. 9-12.
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2.2.2 BATISMO DE PROSLITOS
A prtica do batismo aparece no NT, pela primeira vez, nos Evangelhos.
Nestes, sempre Joo Batista que est batizando as pessoas38. A exceo o
quarto evangelho onde os discpulos de Jesus tambm batizam39. Percebemos
tambm que, nas narrativas relacionadas ao batismo de Joo, tal batismo goza de
grande popularidade inclusive entre os judeus40. Contudo, a Bblia no nos d
nenhuma indicao a respeito do porqu de Joo batizar, pelas Escrituras no
temos nenhuma pista de como surgiu a prtica do batismo. A profecia que fala deJoo Batista a voz do clama no deserto o trata como um anunciador do reino de
Cristo, um pregador do arrependimento como preparao para este reino, porm de
maneira nenhuma o liga prtica do batismo. importante salientar que no AT no
h meno de batismo. Ento, por que Joo batizava? De onde vem a idia de
batismo?
Conforme os escritos rabnicos o rito de recepo de proslitos41 possua trs
partes: circunciso, batismo e um sacrifcio oferecido no templo. Testemunhos
antigos indicam que a circunciso e o batismo faziam parte do rito de admisso na
membresia da religio judaica. A cerimnia tinha algumas caractersticas essenciais:
tinha que ser feita na presena de trs testemunhas pais de batismo que
deveriam instruir o proslito na Torah e deveria ser realizada de dia, o que lhe d um
carter pblico. Aps sua admisso o proslito era considerado como um recm-
38 Mt 3.1-17 e seus correspondentes nos sinpticos e Jo 1.39 Jo 3.22, 26; 4.1, 2.40 Mt 3.5-7; Mc 4.5; Lc 3.7.41 Gentil convertido ao judasmo.
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nascido, ou seja, sua vida antes da converso era esquecida e o que importa agora
a sua nova vida como judeu. Este o conceito judaico do novo nascimento42.
O batismo de proslitos desenvolvido nos tempos pr-cristianismo foi um rito
para receber aqueles no nascidos em santidade (LOGOS, 1999). Por isso, ele era
aplicado s crianas j nascidas bem como aos seus pais. H, no entanto, uma
curiosidade. Filhos nascidos aps o batismo de seus pais no precisariam ser
batizados, pois j nasciam em santidade. Por exemplo, se uma mulher fosse
batizada estando grvida, o feto como parte do seu corpo no necessitaria serbatizado depois de nascer. Ele era participante do batismo da me. Estes filhos de
novos convertidos ao judasmo, batizados na infncia, eram chamados de proslitos
convertidos abaixo de trs anos e um dia. L-se no Talmude que crianas muito
pequenas menores que trs anos e um dia deveriam ser batizadas com seus
pais se este fosse convertido ou, segundo o julgamento da corte, sozinhas se no
tivessem pais.
No caso das criancinhas, a questo da deciso pessoal era tratada nos
seguintes termos uma vantagem pode ser concedida a um homem sem seu
conhecimento43 (LOGOS, 1999, traduo nossa), palavras do rabino Huna (?-297).
A deciso segue-se posteriormente. Outro rabino, chamado Jos (?-333), disse:
uma vez que [as crianas] tenham idade podem levantar uma objeo e voltar ao
paganismo44 (LOGOS, 1999, traduo nossa). Contudo, esta objeo s seria
valida quando a maior idade fosse atingida. Assim, o judasmo como uma religio
missionria praticava o pedobatismo.
42 Por isso Jesus estranhar que Nicodemos, mestre da lei, no entendesse o significado de nascer
de novo (Jo 3.1-4, 10).43an advantage may be conferred on a man without his knowledge.44Once of age, they can raise an objection (and return to paganism without being punished or treatedas apostate Jews, Rashi).
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O batismo de Joo e tambm o cristo tm sua origem no batismo de
proslitos praticado pelos judeus. Por meio deste, eles faziam discpulos e recebiam
os novos convertidos; neste o novo convertido deveria mostrar-se arrependido e
ento seriam circuncidados e batizados ele e seus filhos. O fato que [os judeus]
recebiam sses (sic!) proslitos juntamente com seus filhos, circuncidando-os,
batizando-os e recebendo deles uma oferta pacfica (LANDES, 1979, p. 53). Ainda
segundo Landes, os judeus no batizavam seus prprios filhos porque entendiam
que toda nao judaica j havia passado pelo batismo por Moiss como se l em Ex
19.10: Disse tambm o SENHOR a Moiss: Vai ao povo e purifica-o hoje e amanh.
Lavem eles as suas vestes. Vemos, ento, que segundo o texto, o batismo para os
judeus tinha a mesma conotao que a circunciso, a saber, purificao e admisso
na comunidade da aliana.
2.2.3 O BATISMO DE JOO
Oscar Cullmann (2004, p. 60) tambm relaciona o batismo de Joo com o de
proslitos. Diz ele: o judasmo no ignorava a prtica do batismo, j que submetia
os pagos a ele. Joo Batista, pondo os judeus no mesmo nvel dos proslitos,
chamava-os ao batismo de arrependimento. Cullmann ainda assevera que no NT
no h nenhuma indicao de que adultos cujos pais fossem cristos tenham sido
batizados. Tal prtica j seria possvel por volta do ano 50 d.C., portanto, antes que
a maior parte dos livros neotestamentrios fossem escritos. A nica coisa dita sobre
filhos de crentes est em 1Co 7.14: Porque o marido incrdulo santificado no
convvio da esposa, e a esposa incrdula santificada no convvio do marido crente.
Doutra sorte, os vossos filhos seriam impuros; porm, agora, so santos. Paulo
confirma o que era a prtica no batismo de proslitos. Cullmann (BARTH;
CULLMANN, 2004, p. 110) citando Grossmann diz: o Novo Testamento deveria
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conter uma proibio explcita ao batismo de crianas, se a igreja crist no o
houvesse praticado, pois que esta maneira de atuar era corrente na comunidade
judaica.
Joo tomou apenas a segunda parte do batismo de proslitos (judaico): o
banho de purificao. O diferencial que Joo encerrou judeus e pagos no mesmo
lugar, pois ambos precisavam ser purificados como preparao para o reino de Deus
e a ira vindoura. Uma vez que o batismo de Joo era, principalmente, dirigido aos
judeus que se arrogavam santos por serem descendncia de Abrao, simbolizadapela circunciso tal batismo tomava o sentido da circunciso de ser smbolo de
agregao ao Reino de Deus (BARTH; CULLMANN, 2004).
Portanto, o batismo de arrependimento praticado por Joo, embora tivesse
caractersticas novas, tinhas suas bases no batismo judaico para admisso de
proslitos. Ambos marcavam o abandono do passado pecaminoso para uma nova
vida. Os dois serviam como cerimnia de admisso o de Joo, no reino
messinico; o judaico, na comunidade da aliana. Tanto um como outro exigiam
arrependimento e um novo viver tico e ambos tinham implicaes escatolgicas.
Podemos dizer, ento, que Joo ampliou o significado e as implicaes do batismo
judaico ao mesmo tempo que preparava as pessoas para uma novo batismo do qual
o seu era mera representao. Ele mesmo dizia: Eu vos batizo com gua, para
arrependimento; mas aquele que vem depois de mim mais poderoso do que eu,
cujas sandlias no sou digno de levar. Ele vos batizar com o Esprito Santo e com
fogo (Mt 3.11).
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2.2.4 O BATISMO DE JESUS
Chegamos ento ao batismo cristo propriamente dito. Este foi institudo por
Jesus quando aparece ressurrecto os seus discpulos e lhes d a seguinte ordem:
Ide, portanto, fazei discpulos de todas as naes, batizando-os em nome do Pai, e
do Filho, e do Esprito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho
ordenado (Mt 28.19, 20).
Como Joo, o Senhor Jesus utiliza algo j estabelecido para comunicar novas
realidades. O batismo de Jesus a realizao plena do que anunciava o batismo de
arrependimento realizado por Joo. Contudo, em sua forma cerimonial ele
continuava o mesmo. Jesus no deu nenhuma instruo a respeito de como os
discpulos deveriam batizar. H uma nica instruo quanto frmula batismal que
deveria ser em nome do Pai, do Filho e do Esprito Santo. Porm, alm disso, nada
foi acrescido ou subtrado.
Como j vimos, o batismo no era uma novidade. To pouco foi uma
inveno de Joo ou do Senhor Jesus. A prtica vem de tempos anteriores era
crist e era a forma como os judeus recebiam os novos convertidos na comunidade
de Israel. Significa que a cerimnia batismal era conhecida dos discpulos, pois era
uma prtica comum no tempo deles. A prtica no s era familiar aos onze, mas
tambm a todos que habitavam na Palestina por aqueles dias. importante e
revelador o fato de Jesus no ter dado nenhuma orientao aos onze, seno aquela
quanto frmula batismal. Por exemplo, uma vez que os judeus batizavam os filhos
pequenos dos proslitos, deveria haver por parte do Mestre uma proibio explicita
quanto a esta prtica se, de fato, o batismo cristo no fosse conveniente aos
pequeninos. Ou seja, Jesus no estabelece nenhuma restrio ao batismo dos
pequeninos. Desta forma, a prtica continuva a mesma. O batismo seria ministrado
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pelos discpulos da forma como era comum fazer em seus dias. Esta uma das
evidncias mais importantes de que o batismo era ministrado aos infantes filhos de
pais cristos j nos tempos da igreja primitiva.
2.2.5 A TEOLOGIA DO BATISMO
fundamental, para o correto entendimento do batismo e a sua convenincia
s crianas, que observemos o seu valor teolgico e no apenas cerimonial. At
aqui vimos que, assim como a circunciso, o batismo tem dois significados
principais: a) a admisso na comunidade pactual antes, Israel; agora, a Igreja e
b) a necessidade de purificao. O que nos interessa agora sabermos qual o
significado teolgico que o NT, sobretudo nos ensinos do Mestre e do apstolo
Paulo, confere a este sacramento.
Jesus refere-se ao seu batismo como representao de sua prpria morte. Os
evangelhos sinpticos relatam este fato claramente. Em Lucas, o Senhor fala da
angstia com que aguarda o batismo no qual ser batizado (Lc 12.50). Quando
colocamos estas palavras de Cristo em paralelo ao que ele fala em Mateus e
Marcos45 fica claro que o Mestre considera a sua morte na cruz o batismo pelo qual
deveria passar. Jesus estabelece assim o alicerce do batismo cristo, qual seja: a
sua prpria morte, o sacrifcio cruento de si mesmo. A exemplo do que aconteceu
com Abrao, Jesus tornou-se o cabea pactual da nova aliana. Esta se estabelece
por meio do sangue de Cristo sua morte vicria que ele mesmo considera como
um batismo. Pode-se concluir, ento, que o batismo cristo smbolo e selo da
morte do Senhor Jesus e de suas implicaes para Igreja.
45 Mc 10.38 (cf. Mt 20.22): os versculos encontram-se no contexto em que Jesus e os doze esto deretorno a Jerusalm onde Jesus seria preso e condenado morte na cruz. Este fato predito peloprprio Cristo.
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O apstolo Paulo na carta aos Romanos esclarece o que anteriormente o
Senhor Jesus afirmara sobre o batismo. O captulo seis desta carta onde Paulo
expe o valor teolgico deste sacramento. No captulo cinco de Romanos, o
apstolo trata da justia proveniente da f em Cristo por causa da morte de Jesus
todo que cr justificado. O escritor sagrado, fazendo o contraste entre Ado e
Jesus, mostra como a justia que pela graa chegou at os crentes. Tal justia no
alcanada pelas obras da Lei, mas o segunda a graa. A lei, segundo o apstolo,
serviu para avultar a ofensa (5.20), portanto, ningum pode ser justificado por ela.
Logo a lei condena todos os homens morte. Mas, na segunda parte do v. 20, Paulo
em uma nica frase restabelece a esperana de redeno. Diz ele: mas onde
abundou o pecado, superabundou a graa (5.20b). No h justia ou justificao
que se possa alcanar por obras humanas. Como afirma o profeta Isaas: todos ns
somos como o imundo, e todas as nossas justias, como trapo da imundcia (Is
64.6a). Desta forma, a Lei nos mostra quem somos de fato: impuros, injustos. A
circunciso exercia este papel. Como visto anteriormente, a extirpao do prepcio
era uma medida higinica que simboliza a necessidade que todo homem tem de se
purificar, mesmo os de mais tenra idade. O prprio Paulo em captulos anteriores ao
quinto afirma que a circunciso verdadeira a interior e no a meramente exterior.
Diferentemente da Lei, a graa elimina a culpa e cobre as transgresses. Quantomaior a culpa ainda maior a graa. Esta graa reina pela justia que imputada ao
homem mediante a obra redentora do Jesus Cristo (5.21). Assim, somos livres da
culpa do pecado pela justia que nos imputada pela graa mediante a f em Jesus
Cristo, nosso Senhor.
O captulo seis trata de um outro aspecto da morte de Cristo: a santificao.
Paulo, antecipando-se a um possvel mau entendimento do que foi exposto no
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captulo anterior, inicia este captulo com a pergunta retrica: Que diremos, pois?
Permaneceremos no pecado, para que seja a graa ma is abundante? (v.1). Sua
resposta categrica e inquestionvel: De modo nenhum! Como viveremos ainda
no pecado, ns os que para ele morremos? (v.2). A graa de Deus revelada em
Cristo no de forma alguma uma permisso para pecar e muito menos um
incentivo a isto. Significa que uma vez em Cristo, o homem morre para o pecado e
deve viver em santidade.
Para deixar bem claro o seu ensino sobre a morte para o pecado, Paulo fazlembrar aos romanos o significa e as implicaes do batismo que receberam.
Primeiro, o verdadeiro batismo acontece na morte de Cristo (v.3). O ato
batismal real do qual o sacramento do batismo smbolo a morte de Jesus. Paulo
afirma que todos os que foram batizados em Cristo o foram em sua morte. A o
sacrifcio de Jesus sua morte cruenta na cruz o batismo real. Significa dizer
que uma vez batizados em Cristo nos unimos a ele em sua morte.
Se o batismo expressa a unio com Cristo, deve apontar para aunio com Ele em tudo quanto Ele em todas as fases de sua obracomo Mediador. Cristo Jesus no pode ser contemplado parte desua obra, nem sua obra parte dEle mesmo. Tampouco uma fase desua realizao redentora pode ser divorciada de outra fase qualquer.Por conseguinte, a unio com Cristo, significada pelo batismo,expressa unio com Ele em sua morte (MURRAY, 2003, p. 240).
Segundo, como expresso por Murrey (2003) no se pode apartar Cristo e sua
obra um do outro. Menos ainda, podem-se contemplar parcialmente as fases da obra
redentora de Jesus. Por exemplo, no se pode olhar para a justificao e ao mesmo
tempo negligenciar a santificao. Desta forma, a unio com Cristo em sua morte
deve ser uma unio com todas as implicaes oriundas dela. Por isso, unidos a
Cristo pelo batismo em sua morte o crente na nova aliana est livre da culpa do
pecado pela justificao e tambm a corrupo deste pela santificao.
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Paulo para mostrar quo completa a unio do crente com Cristo assevera:
Fomos, pois, sepultados com ele na morte pelo batismo; para que, como Cristo foi
ressuscitado dentre os mortos pela glria do Pai, assim tambm andemos ns em
novidade de vida (v.4). Champlin (1986) divide as conseqncias da unio com
Cristo em positivas e negativas. O lado negativo refere-se morte para o pecado e o
sepultamento como evidncia dessa morte. Ambos, morte e sepultamento, esto
ligados ao batismo. O lado positivo trata da ressurreio. Uma vez que Cristo
ressuscitou o crente tambm ressuscitar. Conforme o prprio apstolo afirma, esta
ressurreio no para uma mera existncia, mas para a novidade de vida livre do
pecado.
Ora, isso exige e garante a vitria sobre o pecado, at mesmo nestavida presente, porquanto essa vida agora consiste do andar de Cristono crente, conforme tambm aprendemos naquela declaraopaulina que diz: ... para mim o viver Cristo... (CHAMPLIN, 1986,p. 668).
Assim, conforme a exposio de Paulo da unio do crente com Cristo pelo
batismo, entendemos que o significado teolgico do sacramento do batismo para
igreja crist a unio espiritual entre Cristo e seu povo a igreja e suas
conseqncias: morte para o pecado e nova vida em santidade46. Percebemos
tambm que esta era a mesma proposta da circunciso: separar um povo para
Deus, pois em ltima instncia a circunciso exigia santidade o mesmo que exigido
no batismo. Champlin (1986, p. 669) relaciona os dois desta maneira:
A lei mosaica consistia apenas em um documento escrito, que ensinaexcelentes princpios morais; mas no representava uma fora viva.O Esprito de Deus no crente, que produz a unio com Cristo, em suamorte e ressurreio, uma fora viva, e isso garante a vida desantidade. Porm, se no existe vida santa para o crente, temos o
46sabendo isto: que foi crucificado com ele o nosso velho homem, para que o corpo do pecado seja
destrudo, e no sirvamos o pecado como escravos (Rm 6.6).sabedores de que, havendo Cristo ressuscitado dentre os mortos, j no morre; a morte j no temdomnio sobre ele. Pois, quanto a ter morrido, de uma vez para sempre morreu para o pecado; mas,quanto a viver, vive para Deus (Rm 6.9,10).
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direito de duvidar da existncia de qualquer fora viva atuante nocrente, pelo menos no que se aplica pessoa que permanece nopecado.
Este pensamento concorda com aquilo que est foi dito por Paulo em Cl 2.11,
12:
Nele [Cristo], tambm fostes circuncidados, no por intermdio demos, mas no despojamento do corpo da carne, que a circuncisode Cristo,tendo sido sepultados, juntamente com ele, no batismo, noqual igualmente fostes ressuscitados mediante a f no poder deDeus que o ressuscitou dentre os mortos.
A circunciso de Cristo no uma mera exciso prepucial, mas o despojar-
se da carne a natureza carnal. Isto s possvel por causa do batismo de Cristo
sua morte sacrificial. E o crente se mostra participante desta por meio do
sacramento do batismo.
Assim como a circunciso era mero sinal da necessidade de purificao e no
a purificao em si. Da mesma forma o sacramento batismal representao da
graa revelada na obra redentora de Cristo e no a graa em si. Segundo o que
crem as igrejas reformadas:
A graa que comunicada nos sacramentos, ou por meio deles,devidamente usados, no conferida por qualquer poder nelesexistente; nem a eficcia de um sacramento depende da piedade einteno daquele que o administra, mas da operao do EspritoSanto e da palavra da instituio, a qual, juntamente com o preceitoque autoriza o uso dele, contm uma promessa de benefcio aos quedignamente o recebem (CFW, XXVII, III, grifo nosso).
Por isso, condenvel o pensamento sacramentalista que confere aos
sacramentos um poder mgico. Poder este inerente ao prprio sacramento e que, no
caso do batismo, poderia causar a regenerao e a redeno daquele que o recebe.
Calvino e a teologia Reformada partiam da pressuposio de que o batismo foi
institudo para os crentes, e no produz, mas fortalece a nova vida (BERKHOF,
1990, p. 579).
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Por isso, o apstolo Paulo exorta aos irmos de Roma a no mais andarem
segundo o velho homem, mas em novidade de vida47. Uma vez que o batismo indica
essa necessidade de purificao, necessrio que o batizado busque santificar-se.
O mesmo se d com a circunciso quando Moiss ordena que o povo circuncide o
corao. O que torna o sacramento eficaz no o que acontece antes, mas
principalmente o que acontece depois de o crente o receber. Da mesma forma, a
CFW fala da eficincia dos sacramentos somente no caso de serem recebidos
dignamente. Desta maneira ela concorda com que o apstolo Paulo na carta aos
romanos.
Conclui-se que o valor teolgico do batismo est no fato de que ele
representa a morte de Cristo cabea pactual do novo Israel que a Igreja.
Portanto, segundo o modelo do AT, onde os que eram circuncidados repetiam o
compromisso de Abrao o cabea pactual do antigo Israel de andar na presena
de Deus em perfeio. Da mesma forma os que hoje so batizados repetem o
compromisso de Cristo de morrer para o mundo e viver para Deus. Ainda, como a
circunciso apontava para a impureza inerente a todo homem desde o seu
nascimento, tambm o batismo aponta para a necessidade de santificao, uma vez
que todos os homens, inclusive as crianas, sofrem com a corrupo do pecado.
Uma vez que batismo e circunciso tm o mesmo valor teolgico, apontam
para mesma necessidade de santificao, que so baseados nas mesmas
promessas e que tm como alicerce o prprio Senhor Jesus, sendo ambos smbolos
de admisso na comunidade pactual, afirmamos que batismo e circunciso so um
s sacramento que se diferenciam apenas na forma em que so administrados em
suas respectivas pocas. Sendo assim, o batismo cristo em sua forma cerimonial
47 Rm 6.11-13; 19-23.
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administrado por meio do lavar com gua e no da extirpao do prepcio; feito
em nome do Pai, do Filho e Esprito Santo e conveniente a todos que fazem parte
da comunidade pactual a igreja visvel sejam adultos ou crianas.
2.3 Evidncias Bblicas
No a proposta deste trabalho afirmar a biblicidade do batismo infantil
atravs de fatos histricos narrados nas Escrituras Sagradas que provem que
crianas foram batizadas, uma vez que no existem narrativas bblicas que mostrem
explicitamente que isto aconteceu. Deve-se considerar que nas condies da igreja
primitiva missionria, em fase de constituio o batismos de infantes no se dava
na mesma proporo que numa igreja j formada (BARTH; CULLMANN, 2004). H
no texto santo, entretanto, narrativas de pessoas que foram batizadas e junto com
elas todos de sua casa, porm estas narrativas no so na opinio de alguns
conclusivas para questo do pedobatismo. Contudo, servem para mostrar o carter
pactual do sacramento.
O batismo judaico j contemplava as mulheres (BARTH; CULLMANN, 2004).
A igreja primitiva tambm inclua as mulheres no batismo: Quando, porm, deram
crdito a Filipe, que os evangelizava a respeito do reino de Deus e do nome de
Jesus Cristo, iam sendo batizados, assim homens como mulheres (At 8.12).Notamos que nenhuma orientao foi dada por Cristo quanto ao batismo de
mulheres, mas os da igreja primitiva agiram conforme o modelo de batismo que
conheciam a batismo de proslitos praticado pelos judeus. Como sabemos, na
sociedade judaica as mulheres eram consideradas inferiores aos homens, muitas
vezes consideradas como mera propriedade masculina. A participao delas na
comunidade do pacto se dava atravs ou do pai ou do marido, uma vez que eles
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que recebiam a circunciso. O fato de a igreja primitiva batizar mulheres seria, para
aquele momento histrico, uma subverso que necessitaria de orientaes mais
claras por parte de quem instituiu o batismo cristo, o Senhor Jesus. Contudo, esta
orientao seria desnecessria se j houvesse um modelo de batismo em que as
mulheres fossem includas. Este o caso do batismo judaico.
Uma dessas mulheres batizadas era Ldia48. Diz-se desta mulher que ela era
temente a Deus e que este lhe abriu o corao para atender s coisas que Paulo
dizia (At 16.14). Contam-nos tambm as Escrituras que Ldia foi batizada e juntamente com ela todo sua casa49 (oi=koj). No mesmo captulo dezesseis, est
contada a histria do carcereiro da priso em que Paulo e Silas estavam detidos50. O
guarda do crcere faz a seguinte pergunta: Senhores, que devo fazer para que seja
salvo?A resposta de Paulo e Silas : Cr no Senhor Jesus e sers salvo, tu e tua
casa [oi=koj] (At 16.30, 31). O texto segue nos dizendo que tanto o carcereiro,
quanto todos os seus foram batizados51. H ainda outros casos narrados na Bblia
de pessoas que foram batizadas juntamente com toda sua casa (oi=koj). Embora
nenhuma delas mostre claramente que havia crianas naquelas famlias52, podemos
extrair delas um princpio e um padro a respeito do batismo cristo praticado pela
igreja primitiva.
48 At 16.11-15.49 wj de evbaptisqh kai. o oikoj authj( pareka,lesen le,gousa( Eiv kekri,kate, me pisth.n tw/|kuri,w| ei=nai( eivselqo,ntej eivj to.n oi=ko,n mou me,nete\ kai. parebia,sato hma/j (GNT, At 16.15,grifo nosso).50 At 16.25-34.51kai. paralabw.n auvtou.j evn evkei,nh| th/| w[ra| th/j nukto.j e;lousen avpo. tw/n plhgw/n( kai.ebaptisqh auto.j kai oi autou pantej paracrhma(GNT, At 16.33, grifo nosso).52 Em Jo 4.46-53 que termina com declarao que tanto o oficial do rei quanto toda sua casa creram,faz-se necessrio notar que o filho(v. 49) do oficial era uma criana pequena como descrito pelasubstantivo grego paidi,on. Esta uma evidncia de que crianas eram contadas entre os da casa dealgum.
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O princpio o da solidariedade familiar. Uma vez que um dos chefes da
famlia seja homem ou mulher cresse, no s esta pessoa, mas tambm toda
sua famlia (oi=koj) eram batizadas, como aconteceu com Ldia e com carcereiro.
importante notarmos que a palavra usada para casa nestes textos, e tambm em
todos outros que tratam de batismo ou crena de famlias inteiras53, oi=koj. H, no
grego, duas palavras para casa: oi=koje oivki,a. O termo oi=koj, na tradio helnica
e principalmente no NT, mais usado para se referir famlia e no s propriedades
de algum. Relaciona-se, portanto, esposa e filhos e eventualmente a parentesque habitassem juntos na mesma casa. Segundo Kittel, a expresso casa de,
usada no NT, tem sua origem no AT. de l que os escritores neotestamentrios
freqentemente extraem o valor semntico de oi=koj54. Expresses do tipo: casa de
Israel, casa de Davi, casa de Jac e casa de Jud e outras fazem-nos lembrar
da idia bsica do NT: A nao, gerao ou famlia tem um ancestral ou lder de
quem todo grupo recebe seu nome. Originalmente o nome prprio est no genitivo e
colocado depois de oi=kojtornando-se assim o nome do grupo55 (Kittel inLOGOS,
1999). Exemplo disto so: oi=kon Dauid (casa de Davi) ouStefana/ oi=kon (casa de
Estfanas). O que se pretende demonstrar aqui que, a exemplo do que acontecia
com a circunciso, quando o lder de uma famlia se convertia ao cristianismo e era
batizado toda sua famlia indistintamente era batizada com ele. Isto no os tornava
salvos pois o batismo smbolo da graa da redeno e no a graa em si mas
os admitia da comunidade do pacto a igreja visvel. Assim como na circunciso
observa-se tambm no batismo o mesmo princpio da solidariedade familiar.
53 Ver tambm: Cornlio (At 10.23-48); Crispo (At 18.8); Estfanas (1Co 1.16).54
traduo da LXX para o substantivo hebraico tyIB; (casa).55The natio, gens, or familiahas an ancestor or leader from whom the whole group receives its nameand after whom it calls itself. Originally the proper name is a gen. behind oi=koj, but it then becomesthe name of the group as such (LOGOS, 1999).
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Inferimos, das narrativas sobre famlias inteiras sendo batizadas, o padro
deixado pelos apstolos: eles batizavam os lideres que se tornavam crentes e todos
que estivessem debaixo de sua tutela. Supondo-se que no houvesse crianas em
todas as famlias batizadas e cujas histrias esto registradas nas Escrituras
Sagradas, ainda assim no podemos negar que era uma prtica na igreja primitiva
batizar famlias inteiras desde que pelo menos um de seus lderes se tornasse
crente. Este padro nos deixado por herana atravs do registro bblico.
2.4 Consideraes finais
At aqui observamos como circunciso e batismo so smbolos diferentes,
mas com o mesmo significado teolgico-pactual: necessidade de purificao e
admisso no reino visvel de Deus outrora Israel e hoje a Igreja. Assim o batismo
conveniente aos pequeninos porque no apenas os admite na mesma comunidade
pactual de seus pais, mas tambm porque indica que mesmo o menor dos seres
humanos est sujeito corrupo do pecado e, por isso mesmo, necessita de
purificao por meio do sangue de Cristo.
Demonstramos ainda que, em sua forma ritual, o batismo cristo deriva do
batismo judaico de proslitos. Padro repetido por Joo e pelo prprio Senhor Jesus
quando instituiu o batismo cristo sem qualquer ressalva, seno que fosse realizadoem nome do Pai, do Filho e do Esprito Santo. Desta maneira, assim como os judeus
batizavam os proslitos e os filhos destes para admiti-los no judasmo e como
smbolo de uma nova vida novo nascimento os cristos devem batizar seus filhos
pequenos, uma vez que no h nenhuma restrio bblica a este respeito.
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Por fim, vimos que o batismo traz consigo o mesmo princpio de solidariedade
familiar que havia na circunciso. Por isso os apstolos batizavam o chefe da famlia
e toda sua casa. Este um padro indubitvel das Escrituras Sagradas.
Partiremos agora para as implicaes prticas do batismo infantil para os pais
e seus filhos.
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Diante do significado pactual do batismo semelhante ao da circunciso
percebemos como este sacramento no s prprio para as crianas, mas tambm
necessrio a elas por causa de suas implicaes. Tais implicaes so o alvo deste
captulo.
Contudo, antes de adentrarmos na questo proposta necessrio que
esclareamos algumas questes sobre o batismo de infantes. Estas questesprecisam ser elucidadas para que no pairem dvidas em nossas mentes quanto ao
verdadeiro significado do batismo para os filhos dos crentes.
3.1 F, regenerao e salvao de crianas
Uma das maiores objees ao batismo de crianas questo da f. Os
batistas56 negam aos pequenos este sacramento porque alegam que bebs no
podem confessar a sua f. Usam como base para esse posicionamento casos como
o do Eunuco57. Neste, Filipe coloca como condio para o batismo a existncia de
uma f verdadeira. O texto segue nos dizendo que aps confessar sua f em Cristo
o eunuco desce s guas com Filipe e batizado por este (v. 37, 38). A primeira
vista, podemos mesmo afirmar que a condio essencial para o batismo que obatizando, antes, tenha confessado sua f em Cristo. Doutra sorte, podemos deduzir
do texto, ele no pode nem deve ser batizado. A questo : seria isto verdade
tambm para os bebs?
56 No uma referncia especfica denominao, mas batistas serve para identificar o grupoantagnico aos pedobatistas.57 At 8.36-38.
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E quanto s palavras do Senhor Jesus quando da grande comisso (Mc
16.15, 16)? Argumentam os batistas que na ordem de Jesus aos seus discpulos a f
ativa a condio fundamental para o batismo. Este e muitos outros textos do NT
apresentam a f como uma condio para o batismo de adultos. Mas, embora a
Bblia indique claramente que somente os adultos que criam eram batizados, em
parte nenhuma firma a regra de que uma f ativa absolutamente essencial para
receber-se o batismo (BERKHOF, 1990, p. 588). importante salientarmos que no
caso de adultos que queiram ser batizados, espera-se que estes faam a confisso
e a demonstrao de uma f verdadeira. o caso da grande comisso. Temos que
ter em mente que, naquela ocasio, Cristo tem em vista a obra missionria da igreja.
Implica que o alvo so os adultos. Eles que seriam evangelizados. f de fato
um pr-requisito para que adultos sejam batizados, mas o mesmo no se aplica s
crianas. Em momento algum, este pode ser um argumento contra o batismo infantil.
Outro argumento usado pelos batistas, ainda sobre a questo da f nos
infantes, tem base em Rm 10.17 (NVI): [...] a f vem por se ouvir a mensagem, e a
mensagem ouvida mediante da palavra de Cristo. Uma vez que as crianas,
supostamente, no podem compreender a pregao, tambm no podem chegar
f e, por isso, no podem ser batizadas. Novamente afirmamos que no h duvidas
de que o texto assevera justamente que a f s possvel por meio do ouvir a
pregao do evangelho. A mensagem de boas novas foi o meio ordinrio
providenciado por Deus para que pessoas pudessem crer em seu Filho. Ento, fica a
pergunta: isto se aplica tambm s crianas?
Se respondermos positivamente a pergunta acima, entraremos numa questo
muito mais profunda do que a convenincia de se batizar ou no bebs. O sim aesta pergunta nos levar a realidade inexorvel de que aqueles que morrem na
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8/14/2019 Batismo Infantil: Pais e filhos no pacto da graa
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Batismo Infantil
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infncia esto condenados ao inferno, pois sua condio infantil no permite que
exeram f. Seria este o caso, ento? Podemos afirmar que todas as crianas que
morrem vo para o inferno? Cremos que no! Como temerrio afirmar que todas
as crianas ao morrerem so salvas, tambm leviano dizer que todas sero
condenadas caso morram na infncia. Berkhof (1990, p. 589) expe da seguinte
maneira a questo: o batista que for coerente ver-se- sob o peso do seguinte
silogismo: A f a conditio sine qua non (condio indispensvel) da salvao. As
crianas ainda no podem exercer f. Logo, as crianas no podem ser salvas. A
afirmao que todas as crianas que morrem esto condenadas no verdadeira
inclusive para os batistas. Landes (1979, p. 29) expe assim a questo:
[...] tanto batistas como os pedobatistas admitem que as crianasque morrem na infncia so salvas sem f. E para serem salvasprecisam ser regeneradas pelo Esprito Santo, porque ningum entrano Reino dos Cus sem ter nascido de novo. E se a criana pode serregenerada, tambm pode receber o sinal visvel da suaregenerao. As crianas so salvas por Jesus, que pelo Esprito lheaplica as bnos da redeno. Desde que nasceram no pecado,necessitam da purificao pelo sangue de Cristo para entrarem noseu reino.
A condio espir