Braquetes autoligáveis futuro da Ortodontia

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R Detal Press Ortodo Ortop Facial 17 Marig, . 13, . 6, p. 17-19, o./de. 2008 Braquetes autoligáveis - futuro da Ortodontia? Marcos A. Lenza* O interesse em se corrigir uma má posição dentária esteve presente mesmo antes da era An- gle. Este interesse veio sempre associado a novas invenções tecnológicas. Kingsley (1825-1896) de- senvolveu a tração occipital e o plano inclinado. Farrar (1839-1913) já desenvolvia um interesse mais aguçado pela biologia da movimentação den- tária e pelo estudo da mecânica dos movimentos. Da mesma orma, desenvolveu dispositivos para a correção de rotações dentárias e expansão da ma- xila com parauso expansor. Angle (1855-1930) não só contribuiu para a Ortodontia como ciência, mas patenteou inúmeros aparelhos ortodônticos (Fig. 1), a iniciar pelo arco-E (1900), depois pelo aparelho pino e tubo (1910), arco de cinta (1916) e culminando com o modelo nal do aparelho Edgewise, em 1926 1 . Desta orma, a Ortodontia como especialidade evoluiu muito, cienticamen- te, e esteve sempre associada a uma constante procura por inovações tecnológicas que viessem a viabilizar o avanço da ciência. Com os anos, o empirismo inicial oi sendo substituído por u nda- mentos que hoje se diundem em nossos conheci- mentos sobre a Ortodontia. Nestes últimos 10 anos, pode-se observar uma prolieração de aparelhos pré-ajustados com tec- nologia de dispositivos autoligáveis. Segundo os seus idealizadores, quando associados ao uso de os superelásticos com ormato mais expansivo, permitem ao prossional a obtenção de excelentes resultados, sem a necessidade de extração de pré- molares, além de propiciarem uma orça “siológi- ca” leve e contínua para movimentação dentária, gerando baixo nível de atrito e resultando em um tratamento nalizado em um menor período de tempo. Apesar do seu us o ser relativamente rece nte, o s braquetes autoligáveis não são novidade na Orto- dontia, tendo sido descrito pela primeira vez por Stolzenberg, em 1935 11 . Hoje, ganharam enorme popularidade em todo o mundo, pois, na era di- gital, as “novidades” são transmitidas muito mais rapidamente 12 . * Chefe do departamento de Crescimento e Desenvolvimento (Ortodontia e Odontopediatria) e coordenador do programa de pós-graduação em Ortodontia (mestrado e doutorado) da Faculdade de Odontologia da Universidade de Nebraska. O q u e  h á  d e  nOvO  n a O dOntOlOgia FIGURA 1 - Arco-E de Agle (apresetado em 1900 e pateteado em 1901) j propagaa a idéia da expasão com o objetio de se obter espaços o arco para todos os detes.

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Marig, . 13, . 6, p. 17-19, o./de. 2008

Braquetes autoligáveis - futuro da Ortodontia?

Marcos A. Lenza*

O interesse em se corrigir uma má posiçãodentária esteve presente mesmo antes da era An-gle. Este interesse veio sempre associado a novasinvenções tecnológicas. Kingsley (1825-1896) de-senvolveu a tração occipital e o plano inclinado.Farrar (1839-1913) já desenvolvia um interessemais aguçado pela biologia da movimentação den-

tária e pelo estudo da mecânica dos movimentos.Da mesma orma, desenvolveu dispositivos para acorreção de rotações dentárias e expansão da ma-xila com parauso expansor. Angle (1855-1930)não só contribuiu para a Ortodontia como ciência,mas patenteou inúmeros aparelhos ortodônticos(Fig. 1), a iniciar pelo arco-E (1900), depois peloaparelho pino e tubo (1910), arco de cinta (1916)e culminando com o modelo nal do aparelhoEdgewise, em 19261. Desta orma, a Ortodontiacomo especialidade evoluiu muito, cienticamen-

te, e esteve sempre associada a uma constanteprocura por inovações tecnológicas que viessema viabilizar o avanço da ciência. Com os anos, oempirismo inicial oi sendo substituído por unda-mentos que hoje se diundem em nossos conheci-mentos sobre a Ortodontia.

Nestes últimos 10 anos, pode-se observar umaprolieração de aparelhos pré-ajustados com tec-nologia de dispositivos autoligáveis. Segundo osseus idealizadores, quando associados ao uso deos superelásticos com ormato mais expansivo,permitem ao prossional a obtenção de excelentesresultados, sem a necessidade de extração de pré-molares, além de propiciarem uma orça “siológi-ca” leve e contínua para movimentação dentária,gerando baixo nível de atrito e resultando em um

tratamento nalizado em um menor período detempo.

Apesar do seu uso ser relativamente recente, osbraquetes autoligáveis não são novidade na Orto-dontia, tendo sido descrito pela primeira vez porStolzenberg, em 193511. Hoje, ganharam enormepopularidade em todo o mundo, pois, na era di-gital, as “novidades” são transmitidas muito maisrapidamente12.

* Chefe do departamento de Crescimento e Desenvolvimento (Ortodontia e Odontopediatria) e coordenador do programa de pós-graduação emOrtodontia (mestrado e doutorado) da Faculdade de Odontologia da Universidade de Nebraska.

O q u e   h á   d e   n O v O   n a O d O n t O l O g i a

FIGURA 1 - Arco-E de Agle (apresetado em 1900 e pateteado em 1901) jpropagaa a idéia da expasão com o objetio de se obter espaços o arcopara todos os detes.

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O qUE há DE nOvO

Toda uma losoa de tratamento em Odonto-logia deveria estar alicerçada em evidências cientí-cas, como vem acontecendo desde os primórdiosda Ortodontia6. Entretanto, atualmente, por orçade uma campanha de marketing agressiva por par-te dos abricantes, tem-se observado a indicaçãode um novo tipo de braquete – autoligáveis, asso-ciados a os ortodônticos de ormato mais expan-sivo – para todos os indivíduos, independente dopadrão acial ou tipo de má oclusão2,4,5. Em api-nhamentos severos, por exemplo, a sua indicaçãoiria resultar na expansão dos arcos, no aumentoda inclinação vestibular dos incisivos, de orma a

alinhar e nivelar todos os dentes no arco, em detri-mento de um diagnóstico e plano de tratamentoadequados, e, certamente, num prognóstico de es-tabilidade duvidoso.

Por este motivo, não se pode condenar a to-tal utilização dos braquetes autoligáveis comarcos expansivos. Nos tradicionais estudos sobreestabilidade do tratamento ortodôntico realiza-dos na Universidade de Washington, Little8 nãoencontraram dierenças signicativas no grau derecidiva com ou sem a extração de pré-molares.

Inicialmente, a ênase do tratamento ortodônticoestava apenas nos componentes dentários e es-queléticos da má oclusão. Hoje, tem-se uma pre-ocupação muito maior com a estética acial doindivíduo, o que está refetindo numa tendênciaa uma losoa de tratamento mais expansionistae sem extração. Por este motivo, a utilização debraquetes autoligáveis associados a os supere-lásticos expansivos de alta tecnologia tem ganhogrande popularidade7.

Entretanto, não podemos generalizar o seu uso

para todos os pacientes, independente do grau deapinhamento, em detrimento da estabilidade pós-ortodôntica. A quantidade de expansão transversalque pode ocorrer nestes casos tem levantado al-gumas dúvidas, devido ao risco de induzir danosiatrogênicos aos tecidos periodontais na orma derecessões gengivais e deiscências na cortical ósseaque poderiam, em longo prazo, comprometer o

prognóstico do tratamento9,10. Na cavidade bucal,os dentes se encontram em um estado de equilíbrio.Embora o ortodontista promova alterações nas po-sições dentárias durante o tratamento, o problemaé estimar que quantidade de alteração permanece-rá estável por um longo período de tempo13.

Um estudo clínico prospectivo randomizadoem adolescentes com grau de apinhamento mode-rado oi realizado na Universidade de Aarhus, naDinamarca, por Carlsson e Thorgeirsson3, com oobjetivo de avaliar o grau de movimentação trans-versal dos dentes superiores, as alterações na incli-nação dentária e a quantidade de tecido ósseo nos

segmentos laterais após o tratamento com um sis-tema de braquetes autoligáveis passivo e ativo. Odesenvolvimento da tomograa computadorizada

FIGURA 2 - Estudo de Carlsso e Torgeirsso3 com o objetio de aaliar auatidade de osso cortical remaescete após a utiliação dos brauetesautoligeis e fos expasios.

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RefeRências

1. ANGLE, E. H. Th trtmnt of mloluon of th tth. 7thed. Philadelphia: SS White, 1907.

2. BURROW, S. To extract or not to extract: a diagnostic decision,not a marketing decision. am. J. Orthod. Dntofl Orthop.,St. Louis, v. 133, no. 3, p. 341-342, 2008.

3. CARLSSON, K. H.; THORGEIRSSON, T.atv nd pvlf-lgtng ytm: evaluation of transversal expansion,bucco-lingual tooth inclination and buccal bone quality. 2007.(Thesis)-University of Aarhus, Dennmark, 2007.

4. DAMON, D. H. Dmon ytm: the workbook. Glendora:Ormco.

5. DAMON, D. H. The rationale, evolution and clinical applicationof the self-ligating bracket. cln. Orthod. R., Copenhagen,v. 1, no. 1, p. 52-61, Aug. 1998.

6. GRABER, T. M.; VANARSDALL, R. L.; VIG, K. W. L. Orthodont:current principles and techniques. 4th ed. St. Louis: Elsevier-Mosby, 2005.

7. HARRADINE, N. W. T. Self-ligating brackets: where are we now?J. Orthod., London, v. 30, no. 3, p. 262-273, Sept. 2003.

8. LITTLE, R. M. Stability and relapse of mandibular anterioralignment: University of Washington studies. smn. Orthod.,Philadelphia, v. 5, no. 3, p. 191-204, Sept. 1999.

9. PECK, S. So what’s new? Arch expansion, again. angl Orthod.,Appleton, v. 78, no. 3, p. 574-575, May 2008.

10. RINCHUSE, D. J.; MILES, P. G. Self-ligating brackets: presentand future. am. J. Orthod. Dntofl Orthop., St. Louis,v. 132, no. 2, p. 216-222, Aug. 2007.

endrço pr orrpondênMarcos A. LenzaUniversity of Nebraska Medical Center College of DentistryDepartment of Growth and Development40th & HoldregeLincoln – Nebraska – USA 68583E-mail: [email protected]

de eixe cônico (CBCT) aplicada a estes casos per-mite obter a análise tridimensional das alteraçõesdo osso alveolar em uma amostra relativamentegrande, o que seria impensável anteriormente, porrazoes éticas (Fig. 2).

Os resultados demonstram haver redução naquantidade de osso alveolar por vestibular após otratamento, embora em nenhum caso tenham sidoobservadas deiscências ósseas. A quantidade deexpansão mais acentuada oi detectada na regiãode pré-molares, seguida por caninos e em menormagnitude nos molares. Embora estes resultadospareçam promissores quanto ao uso do sistema

de braquetes autoligáveis, ressalta-se que oramtratados apenas adolescentes com má oclusão deClasse I e II, com moderado grau de apinhamento.

A estabilidade destes casos será objetivo de pes-quisa utura.

Há necessidade de novos estudos para avaliar oeeito desta expansão promovida pela técnica dosbraquetes autoligáveis com arcos expansivos14. Aalta de mais evidências cientícas não nos per-mite apenas contemplar os resultados estéticos. AOrtodontia como ciência tem a sua história. Nãose pode permitir que haja a substituição dos prin-cípios undamentais que são inerentes a esta his-tória pelo modismo atual de uma nova técnica. Épreciso se preocupar...

agRaDecimenTOsDr. Hideo Mitani e Kim Carlsson por teremcedidos as guras 1 e 2, respectivamente.

11. STOLZENBERG, J. The Russell attachment and its improvedadvantages. int. J. Orthod. Dnt. chld., [s.l.], v. 21, p. 837-840,1935.

12. ZACHRISSON, B. U. Global trends and paradigm shifts in clinicalOrthodontics. World J. Orthod., Carol Stream, v. 6, no. 1, p.3-7, 2005. Supplement.

13. ZACHRISSON, B. U. Use of self-ligating brackets, superelasticwires, expansion/proclination and permanent retention: a wordof caution. World J. Orthod., Carol Stream, v. 7, no. 2,p. 198-206, Summer 2006.

14. ZACHRISSON, B. U. Proper quality Orthodontics vs the newmechanical “systems”. World J. Orthod., Carol Stream, v. 8,no. 4, p. 412-419, Winter 2007.

LEnzA, M. A.