BUKOWSKI, C. Ao Sul de Lugar Nenhum

203

Transcript of BUKOWSKI, C. Ao Sul de Lugar Nenhum

  • CHARLES BUKOWSKI(1920-1994)

    Charles Bukowski nasceu a 16 de agosto de 1920 em Andernach, Alemanha,filho de um soldado americano e de uma jovem alem. Aos trs anos de idade,foi levado aos Estados Unidos pelos pais. Criou-se em meio pobreza de LosAngeles, cidade onde morou por cinquenta anos, escrevendo e embriagando-se.Publicou seu primeiro conto em 1944, aos 24 anos de idade. S aos 35 anos que comeou a publicar poesias. Foi internado diversas vezes com crises dehemorragia e outras disfunes geradas pelo abuso do lcool e do cigarro.Durante a sua vida, ganhou certa notoriedade com contos publicados pelosjornais alternativos Open City e Nola Express, mas precisou buscar outrosmeios de sustento: trabalhou catorze anos nos Correios. Casou, teve uma filha ese separou. considerado o ltimo escritor maldito da literatura norte-americana, uma espcie de autor beat honorrio, embora nunca tenha seassociado com outros representantes beats, como Jack Kerouac e AllenGinsberg.

    Sua literatura de carter extremamente autobiogrfico, e nela abundamtemas e personagens marginais, como prostitutas, sexo, alcoolismo, ressacas,corridas de cavalos, pessoas miserveis e experincias escatolgicas. De estiloextremamente livre e imediatista, na obra de Bukowski no transparecemdemasiadas preocupaes estruturais. Dotado de um senso de humor ferino,auto-irnico e custico, ele foi comparado a Henry Miller, Louis-FerdinandCline e Ernest Hemingway.

    Ao longo de sua vida, publicou mais de 45 livros de poesia e prosa. So seisos seus romances: Cartas na rua (1971), Facttum (1975), Mulheres (1978),Misto-quente (1982), Hollywood (1989) e Pulp (1994). Bukowski publicou emvida oito livros de contos e histrias: Erees, ejaculaes e exibicionismos(1972), Ao sul de lugar nenhum: histrias da vida subterrnea (1973), Tales ofOrdinary Madness (1983), Hot Water Music (1983), Bring Me Your Love(1983), Numa fria (1983), Theres No Business (1984) e Septuagenarian Stew(1990). Seus livros de poesias so mais de trinta, entre os quais Flower, Fist andBestial Wail (1960), You Get So Alone at Times that It Just Makes Sense(1996), sendo que a maioria permanece indita no Brasil. Vrias antologias,alm de livros de poemas, cartas e histrias foram publicados postumamente.

  • Bukowski morreu de pneumonia, decorrente de um tratamento de leucemia,na cidade de San Pedro, Califrnia, no dia 9 de maro de 1994, aos 73 anos deidade, pouco depois de terminar Pulp.

  • para Ann Menebroker

  • Solido

    Edna estava caminhando pela rua com sua sacola de compras quandopassou pelo carro. Havia um cartaz na janela lateral:

    PROCURA-SE MULHER

    Ela parou. Havia um grande pedao de papelo grudado na janela comalguma substncia. A maior parte estava datilografada. De onde estava nacalada, Edna no conseguia ler o aviso. Podia apenas ver as letras gradas:

    PROCURA-SE MULHER

    Era um carro novo e caro. Edna deu um passo sobre a grama para ler aparte datilografada:

    Homem, 49 anos. Divorciado. Procura mulher para casamento.Deve ter entre 35 e 44 anos. Gosta de televiso e pelculascinematogrficas. Boa comida. Sou especialista em custos deproduo, com estabilidade no emprego. Dinheiro no banco. Gosto demulheres acima do peso.

    Edna tinha 37 anos e estava acima do peso. Havia um nmero de telefone.Tambm havia trs fotos do cavalheiro em busca de uma mulher. Ele pareciabem srio de terno e gravata. Tambm parecia estpido e um pouco cruel. Efeito de madeira, pensou Edna, feito de madeira.

    Edna se afastou, sorrindo um pouco. Sentia tambm uma espcie derepulsa. Ao chegar ao seu apartamento, ela o tinha esquecido. Apenas algumashoras depois, sentada na banheira, voltou a pensar nele e, dessa vez, pensou emcomo ele devia estar realmente sozinho para fazer tal coisa:

    PROCURA-SE MULHER

  • Imaginou-o chegando em casa, encontrando as contas de gs e telefone nacaixa de correio, despindo-se, tomando um banho, a televiso ligada. Ento leriao jornal da tarde. Depois iria para a cozinha preparar sua refeio. De p, decuecas, olhando para a frigideira. Pegando sua comida e caminhando para umamesa, comendo. Bebendo seu caf. Ento mais televiso. E talvez uma solitrialata de cerveja antes de se deitar. Havia milhes de homens como ele por toda aAmrica.

    Edna saiu da banheira, enrolou-se na toalha, vestiu-se e saiu doapartamento. O carro ainda estava l. Anotou o nome do homem, Joe Lighthill,e o nmero do telefone. Leu a parte datilografada novamente. Pelculascinematogrficas. Que termo estranho para se usar. Agora as pessoas dizemfilmes. PROCURA-SE MULHER. O aviso era muito ousado. Estava diante deum sujeito original.

    Quando Edna chegou em casa, tomou trs xcaras de caf antes de discar onmero. O telefone chamou quatro vezes.

    Al? ele respondeu. Sr. Lighthill? Sim? Vi seu anncio. Seu anncio no carro. Ah, sim. Meu nome Edna. Como vai, Edna? Ah, vou bem. Tem feito tanto calor. Esse tempo est demais. Sim, nada fcil. Bem, sr. Lighthill... Me chame apenas de Joe. Bem, Joe, r r r, me sinto to boba. Sabe por que estou telefonando? Voc viu meu aviso? Quero dizer, r r r, o que h de errado com voc? No consegue

    arranjar uma mulher? Acho que no, Edna. Me diga, onde elas esto? As mulheres? Sim. Ah, por toda parte, veja bem. Onde? Me diga. Onde? Bem, na igreja, veja bem. H mulheres na igreja.

  • No gosto de igrejas. Ah. Escute, porque voc no vem para c, Edna? Quer dizer para sua casa? Sim. Moro em um lugar legal. Podemos tomar um drinque, conversar.

    Sem presso. Est tarde. No est to tarde. Escute, voc viu meu aviso. Deve estar interessada. Bem... Voc est com medo, s isso. Est apenas com medo. No, no estou com medo. Ento venha pra c, Edna. Bem... Venha. Certo. Vejo voc em quinze minutos.

    O apartamento ficava no ltimo andar de um condomnio moderno.Nmero 17. A piscina abaixo refletia as luzes. Edna bateu. A porta se abriu e lestava o sr. Lighthill: entradas frontais, nariz aquilino com pelos que saam pelasnarinas, a camisa aberta na altura do pescoo.

    Entre, Edna...Entrou, e a porta se fechou atrs dela. Trazia seu vestido azul de seda.

    Estava sem meias, de sandlias, e fumando um cigarro. Sente-se, vou pegar uma bebida para voc.Era um lugar agradvel. Tudo nas cores azul e verde e muito limpo. Ela

    ouviu o sr. Lighthill cantarolar surdamente, enquanto preparava as bebidas,hmmmmmmm, hmmmmmmm, hmmmmmmm... Ele parecia tranquilo e isso aajudou a descontrair.

    O sr. Lighthill Joe voltou com as bebidas. Alcanou a Edna a sua eento sentou-se em uma cadeira do outro lado da sala.

    Sim ele disse , tem feito muito calor, um calor infernal. Mas tenho ar-condicionado.

    Notei. muito bom. Tome a sua bebida. Ah, claro.Edna tomou um gole. Era uma boa bebida, um pouco forte, mas com um

  • gosto agradvel. Observou Joe inclinar a cabea enquanto bebia. Ele parecia terrugas profundas em torno do pescoo. E suas calas estavam muito folgadas.Pareciam ser de uma numerao muito maior. Davam a suas pernas umaaparncia cmica.

    um belo vestido, Edna. Gosta? Oh, sim. Voc bem fornida. O vestido fica muito bem em voc, muito

    bem.Edna no disse nada. E Joe tambm no. Apenas permaneceram sentados,

    olhando um para o outro e bebericando suas bebidas.Por que ele no fala?, pensou Edna. ele quem tem de falar. Havia nele

    algo que lembrava madeira, sim. Ela terminou seu drinque. Deixe-me preparar outra bebida para voc disse Joe. No, realmente est na minha hora. Ora, vamos l ele disse , deixe-me preparar outra bebida. Precisamos

    de algo para relaxar. Tudo bem, mas depois vou embora.Joe foi at a cozinha com os copos. Ele no estava mais cantarolando.

    Voltou, alcanou a Edna um copo e sentou-se novamente em sua cadeira dooutro lado da sala, em frente cadeira dela. A bebida estava ainda mais forte.

    Sabe ele disse , me dou bem nesses testes sobre sexo das revistas.Edna tomou um gole de sua bebida e no respondeu. Como voc se sai nesses testes? Joe perguntou. Nunca fiz nenhum. Deveria, sabe, assim voc descobre quem e o que voc . Acha que esses testes funcionam? J vi nos jornais. Nunca fiz nenhum,

    mas j vi disse Edna. Claro que funcionam. Talvez eu no seja boa em sexo disse Edna , talvez seja por isso que

    estou sozinha.Ela bebeu um longo gole de seu copo. Cada um de ns est, no final, sozinho disse Joe. Como assim? Quero dizer, no importa quo bem a coisa esteja indo no sexo, no amor

    ou em ambos, chega um dia em que tudo acaba.

  • Isso triste disse Edna. Claro que . Ento chega o dia em que tudo acaba. Ou h uma separao

    ou a coisa toda se resolve em uma trgua: duas pessoas vivendo juntas semsentir nada. Acho que ficar sozinho melhor.

    Voc se divorciou da sua esposa, Joe? No. Ela se divorciou de mim. O que deu errado? Orgias sexuais. Orgias sexuais? Veja bem, uma orgia sexual o lugar mais solitrio do mundo. Essas

    orgias... fiquei com uma sensao de desespero... aqueles caralhos entrando esaindo... me desculpe...

    Tudo bem. Aqueles caralhos entrando e saindo, pernas enlaadas, dedos

    trabalhando, bocas, todo mundo se agarrando e suando e determinados a fazer acoisa toda... de alguma forma.

    No sei muito sobre essas coisas, Joe disse Edna. Acho que sem amor, sexo no nada. As coisas s podem representar

    alguma coisa quando existe algum sentimento entre os participantes. Quer dizer que as pessoas tm que gostar umas das outras? Ajuda. Imagine que eles se cansem uns dos outros? Imagine que tenham que

    continuar juntos? Por economia? Filhos? Essas coisas? Orgias no os mantero juntos. E o que manteria? Bem, no sei. Talvez o suingue. O suingue? Voc sabe, quando dois casais se conhecem muito bem e trocam

    parceiros. Os sentimentos tm, pelo menos, uma chance. Por exemplo, digamosque eu sempre tenha gostado da esposa de Mike. Gosto dela h meses. J aobservei caminhar pela sala. Gosto dos movimentos dela. Os movimentos medeixaram curioso. Imagino, voc sabe, o que vem depois desses movimentos. Ja vi braba, j a vi bbada, j a vi sbria. E ento, vem o suingue. Voc est noquarto com ela, finalmente voc a est conhecendo. H uma chance de algoreal. claro, Mike est com a sua esposa no outro quarto. Voc pensa: Boasorte, Mike, e espero que voc seja to bom amante quanto eu.

  • E isso d certo? Bem, no sei... Suingues podem causar dificuldades... mais tarde. Tudo

    tem que ser combinado... muito bem combinado, antecipadamente. E entopode ter pessoas que no se conheam bem o suficiente, no importa quantotenham conversado.

    Voc um desses, Joe? Bem, esse negcio de suingue pode ser bom para alguns... talvez seja

    bom para muitos. Acho que no daria certo para mim. Sou muito puritano.Joe terminou sua bebida. Edna bebeu o restante da sua e se levantou. Escute, Joe, tenho que ir...Joe caminhou atravs da sala na direo dela. Ele parecia um elefante

    naquelas calas. Ela viu suas orelhas grandes. Ento ele a agarrou e comeou abeij-la. Seu mau hlito vencia todas as bebidas. Ele tinha um cheiro muitoazedo. Parte de sua boca no estava fazendo contato. Era forte, mas sua forano era pura, sua fora claudicava. Ela afastou seu rosto para longe e mesmoassim ele a mantinha presa.

    PROCURA-SE MULHER

    Joe, me solta! Voc est indo muito rpido, Joe! Me solte! Para que voc veio aqui, sua puta?Ele tentou beij-la novamente e conseguiu. Era horrvel. Edna ergueu o

    joelho. Acertou-o em cheio. Ele se dobrou e caiu no tapete. Deus, deus... por que voc fez isso? Voc tentou me matar...Ele rolava no cho.Seu traseiro, ela pensou, ele tinha uma bunda to feia.Deixou-o rolando no tapete e desceu as escadas correndo. O ar estava

    limpo l fora. Ela ouviu pessoas conversando, ouviu seus aparelhos de televiso.No era uma caminhada muito longa at seu apartamento. Sentiu necessidadede outro banho, livrou-se do seu vestido de seda azul e se lavou. Ento saiu dabanheira, secou-se com a toalha e ajeitou os rolos em seus cabelos. Decidiu quenunca mais o veria.

  • Trepando com aquela cortina

    Falvamos sobre mulheres, espivamos suas pernas ao sarem dos carros eas olhvamos pelas janelas noite, na esperana de ver algum fodendo, masnunca vamos ningum. Uma vez chegamos a pegar um casal na cama e o caraestava malhando a mulher e pensamos que agora veramos algo, mas ela disse:

    No, no quero trepar essa noite!Ento voltou-se de costas para ele, enquanto ele acendia um cigarro e ns

    partamos em busca de outra janela. Filho da puta, nenhuma mulher viraria as costas para mim! Nem para mim. Que tipo de homem era aquele?ramos trs, eu, Baldy e Jimmy. Nosso grande dia era domingo. No

    domingo, nos encontrvamos na casa de Baldy e tomvamos um txi at a ruaprincipal. A tarifa era de sete centavos.

    Havia duas casas de variedades naquele tempo, a Follies e a Burbank.Estvamos apaixonados pelas strippers da Burbank e as piadas eram um poucomelhores, ento fomos para l. Havamos tentado a casa de filmes porns, masos filmes no eram realmente pesados e todos os enredos eram iguais. Umadupla de rapazes eventualmente embebedava alguma garota pequena e inocentee, antes que se recuperasse da ressaca, acordaria em uma casa de prostituiocom uma fila de marinheiros e corcundas batendo em sua porta. Alm disso,nesses lugares em que amos, os mendigos dormiam noite e dia, mijavam nocho, bebiam vinho e rolavam por cima uns dos outros. O fedor de mijo e vinhoe homicdio era insuportvel. Fomos para a Burbank.

    Vocs esto indo a um show de variedades hoje, rapazes? perguntava oav de Baldy.

    De jeito nenhum, senhor! Temos mais coisas para fazer.Fomos. amos todos os domingos. amos cedo pela manh, muito antes do

    show, e caminhvamos para cima e para baixo pela Main Street, olhando paradentro dos bares vazios onde as garotas sentavam perto da porta com suas saiaslevantadas, bailando seus ps sob a luz do sol que deslizava para dentro do barescuro. As garotas eram bonitas. Mas ns sabamos. Tnhamos ouvido. Um cara

  • entrava para tomar uma bebida, e cobravam o olho da cara, tanto pela bebidaquanto pelas garotas. Alm disso, as bebidas das garotas eram diludas em gua.Voc dava uma apalpada ou duas e era isso. Se voc mostrasse algum dinheiro,o balconista notaria e algum esquema seria armado e logo voc estaria fora dobar e sem dinheiro. Ns sabamos.

    Aps nossa caminhada pela Main Street, iramos at a banca de cachorros-quentes e comeramos nossos cachorros-quentes de oito centavos e nossagrande caneca de cerveja de um nquel. Levantvamos pesos e nossos msculosestavam salientes e usvamos as mangas bem enroladas e tnhamos, todos ns,um mao de cigarros em nossos bolsos do peito. Tnhamos tentado inclusive umcurso de Charles Atlas, Tenso Dinmica, mas levantar pesos parecia ser amaneira mais bvia e direta.

    Enquanto comamos nossos cachorros-quentes e bebamos nossa enormecaneca de cerveja, jogvamos pinball, um centavo por jogo. Acabamosconhecendo aquela mquina muito bem. Quando se fazia a pontuao mxima,ganhava-se um novo jogo. Tnhamos que fazer escores perfeitos, no tnhamosdinheiro para gastar naquilo.

    Franky Roosevelt estava l, as coisas estavam melhorando, mas aindavivamos a depresso e nenhum de nossos pais estava trabalhando. Ondearranjvamos nossa pequena poro de trocados era um mistrio, exceto pelofato de que tnhamos um olhar de guia para qualquer coisa que no estivessecimentada no cho. No roubvamos, compartilhvamos. E inventvamos.Tendo pouca ou nenhuma grana, inventvamos pequenos jogos para passar otempo... um deles era caminhar at a praia e voltar.

    Isso normalmente era feito em um dia de vero, e nossos pais nuncareclamavam quando chegvamos em casa tarde demais para a janta. Tambmno se preocupavam com as bolhas grandes e brilhantes na sola de nossos ps.Era quando notavam como havamos gastado as solas e os saltos de nossossapatos que comevamos a ouvir as reclamaes. Mandavam-nos para a lojaque vendia a um preo baixo saltos e solas e cola com pronta-entrega e a umpreo justo.

    Era a mesma coisa quando jogvamos futebol americano na rua. No havianenhuma verba pblica para parques. ramos to dures que jogvamos futebolnas ruas durante toda a temporada de futebol, e tambm durante a de basquete ede baseball, at a prxima temporada de futebol. Quando voc derrubado noasfalto, coisas acontecem. A pele se rasga, ossos se quebram, o sangue escorre,

  • mas voc se levanta como se nada tivesse acontecido.Nossos pais nunca se importavam com as feridas e com o sangue e os

    esfolados; o pecado terrvel e imperdovel era rasgar um furo nos joelhos denossas calas. S havia, ento, duas calas para cada garoto: a para usar todosos dias e a de domingo, e nunca podamos furar as calas, pois isso mostravaque voc era pobre e um idiota e que seus pais eram pobres e idiotas tambm.Ento voc aprendia a derrubar um adversrio sem cair de joelhos. E o cara queera derrubado aprendia a cair sem encostar os joelhos no cho.

    Quando brigvamos, brigvamos por horas e nenhum de nossos pais vinhanos salvar. Acho que era por fingirmos ser to dures e nunca pedirmosclemncia. Mas odivamos nossos pais, ento no podamos pedir ajuda, elesnos odiavam e quando saam pela varanda e olhavam-nos casualmente em umaterrvel e interminvel briga, apenas bocejavam, lanavam uma advertncia evoltavam para dentro.

    Lutei com um cara que, mais tarde, acabou com um posto muito alto naMarinha dos Estados Unidos. Briguei com ele, um dia, das oito e meia da manhat depois do pr do sol. Ningum nos interrompeu, embora estivssemos bemem frente ao jardim da casa dele, embaixo de duas enormes rvores com ospardais cagando na gente o dia inteiro.

    Foi uma briga dura, foi assim at o fim. Ele era maior, um pouco maisvelho e mais pesado, mas eu era mais louco. Paramos por acordo mtuo... Nosei como isso funciona, voc tem que passar por isso para entender, mas depoisque duas pessoas se batem, uma na outra, por oito ou nove horas, surge umaestranha forma de companheirismo.

    No dia seguinte, todo o meu corpo estava azul. No podia falar por causados meus lbios ou me mover sem sentir dor. Estava na cama espera da mortee minha me entrou com a camisa que eu havia vestido durante a luta. Ela asegurou na frente da minha cara, em cima da cama e disse:

    Olha! Tem manchas de sangue nesta camisa! De sangue! Desculpa! Nunca vou conseguir tirar estas manchas! Nunca!!! o sangue dele. No me interessa! sangue! E no sai!Domingo era o nosso dia, um dia ameno e tranquilo. amos Burbank.

    Sempre passavam um filme horrvel antes. Um filme muito velho, voc assistia e

  • esperava. Voc estava pensando em garotas. Os trs ou quatro caras no poo daorquestra tocavam alto, podiam no tocar muito bem, mas tocavam alto, eaquelas strippers finalmente apareciam e pegavam a cortina, a borda da cortina,e pegavam-na como se a cortina fosse, na verdade, um homem e balanavamseus corpos e trepavam com aquela cortina. Ento se balanavam e comeavama tirar a roupa. Se voc tivesse dinheiro suficiente, ganhava at mesmo um sacode pipoca; se no, para o inferno com a pipoca.

    Antes do prximo ato havia um intervalo. Um homenzinho se levantava edizia:

    Senhoras e senhores, se me derem um minuto de sua ateno...Ele vendia um pequeno culo com uma foto no fundo. Na extremidade de

    vidro de cada um, se voc olhasse contra a luz, havia uma imagem belssima.Isso ele prometia! Custava apenas cinquenta centavos a unidade, um bem para avida inteira por apenas cinquenta centavos, disponvel apenas para os clientesda Burbank e em nenhum outro lugar.

    Basta segur-lo contra a luz e vocs vero! E muito obrigado, senhoras esenhores, por sua gentil ateno. Agora os lanterninhas passaro peloscorredores prximos a vocs.

    Dois vagabundos p-rapados passavam pelos corredores entre as cadeiras,fedendo a moscatel, cada um carregando um saco com os dispositivos. Nunca vialgum compr-los. Imagino, entretanto, que, se voc olhasse contra a luz, afigura seria a de uma mulher nua.

    A banda recomeou e as cortinas se abriram e l estava a linha de coristas,a maioria delas antigas strippers envelhecidas, pesadamente maquiadas comrmel e ruge e batom, clios falsos. Faziam o que podiam para acompanhar amsica, mas sempre ficavam um pouco para trs. Mas continuavam. Eu asconsiderava muito corajosas.

    Ento vinha um cantor. Era muito mais difcil gostar dele. Cantava aosbrados sobre amores arruinados. No sabia cantar e, quando acabava, abria osbraos e curvava a cabea ao mnimo som de aplausos.

    Ento vinha o comediante. Ah, esse era bom! Aparecia com um sobretudovelho e marrom, o quepe puxado para baixo at os olhos, relaxado ecaminhando como um vagabundo, um vagabundo sem nada para fazer e sem terpara onde ir. Uma garota entraria no palco e seus olhos a seguiriam. Ento elevirava para o pblico e dizia com sua boca desdentada:

    Por Deus! No me castigue!

  • Outra garota entrava no palco, e ele ia at ela, colocava sua cara prxima dela e dizia:

    Sou um velho, passei dos 44, mas quando a cama quebra, termino oservio no cho.

    Isso era o suficiente. Como ramos! Os jovens e os velhos, como ramos. Etambm havia a rotina da mala. Ele est tentando ajudar alguma garota a fecharsua mala. As roupas ficam caindo para fora.

    No consigo colocar isso pra dentro! Assim, deixe eu ajudar! Escapou outra vez! Espere! Vou ficar em p aqui em cima! Como? Oh no, em p no!A coisa seguia por a. Ah, ele era engraado!Finalmente as primeiras trs ou quatro strippers voltavam. Cada um de ns

    tinha a sua preferida e estvamos todos apaixonados. Baldy tinha escolhido umagarota francesa magricela, com asma e olheiras muito escuras. Jimmy gostavada Mulher Tigre (a Tigresa, na verdade). Chamei a ateno de Jimmy para ofato de que a Mulher Tigre definitivamente tinha um peito maior do que o outro.A minha era Rosalie.

    Rosalie tinha uma bunda grande e a balanava sem parar, cantandomusiquinhas engraadas e, enquanto caminhava tirando a roupa, falava sobre simesma e ria. Era a nica que realmente gostava do que fazia. Eu estavaapaixonado por ela. Muitas vezes pensei em lhe escrever para dizer como elaera maravilhosa, mas, no sei por que, nunca escrevi.

    Certa tarde, estvamos esperando pelo txi depois de um espetculo, e lestava a Mulher Tigre esperando por um tambm. Usava um vestido verde justoe ns ficamos ali parados, olhando para ela.

    a sua garota, Jimmy, a Mulher Tigre. Cara, como gostosa! Olha s! Vou falar com ela disse Baldy. a garota do Jimmy. No quero falar com ela disse Jimmy. Vou falar com ela disse Baldy. Ps um cigarro na boca, acendeu e

    caminhou at ela. E a, gata! sorriu maliciosamente para ela.A Mulher Tigre no respondeu. Continuou olhando bem em frente,

  • esperando pelo carro. Sei quem voc . Vi seu show hoje. Voc muito linda, gata, muito

    mesmo!Ela no respondeu. Voc rebola bem, meu Deus, voc realmente sabe rebolar.Ela continuou olhando diretamente em frente. Baldy estava ali sorrindo

    para ela feito um idiota. Quero meter em voc. Quero trepar com voc, gata!Fomos at l e tiramos Baldy de perto dela. Caminhamos com ele at o fim

    da quadra. Seu idiota, voc no tem o direito de falar assim com ela! Bem, ela se levanta e rebola, ela fica em p na frente dos homens e

    rebola! Ela est apenas tentando ganhar uma grana. Ela gostosa, muito gostosa, est querendo! Voc est louco.Caminhamos com ele rua abaixo.

    Pouco depois disso, comecei a perder o interesse naqueles domingos naMain Street. Suponho que a Follies e a Burbank ainda estejam l. Claro, aMulher Tigre e a stripper com asma e Rosalie, minha Rosalie, j se foram hmuito tempo. Provavelmente mortas. A enorme e balanante bunda de Rosalieest provavelmente morta. E, quando estou na minha vizinhana, passodirigindo em frente casa em que vivia e vejo estranhos morando l. Aindaassim, aqueles domingos eram bons, a maioria dos domingos eram bons, umapequena luz na escurido dos dias da depresso, quando nossos pais saam pelasvarandas, desempregados e impotentes, e olhavam-nos enquanto espancvamosuns aos outros pra valer e ento voltavam para dentro e ficavam encarando asparedes, com medo de ligar o rdio por causa da conta de luz.

  • Voc e a sua cerveja e o quo maravilhosovoc

    Jack entrou e encontrou o mao de cigarros junto lareira. Ann estava nosof lendo um exemplar da Cosmopolitan. Jack acendeu um cigarro e sentou-se.Faltavam dez minutos para a meia-noite.

    Charley disse para voc no fumar disse Ann, levantando os olhos darevista.

    Mereo um cigarro. Esta noite foi dura. Ganhou? No foi unnime, mas ganhei. Benson era um cara duro, muita coragem.

    Charley disse que Parvinelli o prximo. Ganhando do Parvinelli, ganhamos ocampeonato.

    Jack se levantou, foi at a cozinha, voltou com uma garrafa de cerveja. Charley me disse pra manter voc longe da cerveja disse Ann enquanto

    baixava a revista. Charley disse isso, Charley disse aquilo... Estou cansado disso. Ganhei a

    luta. Ganhei dezesseis seguidas, tenho direito a um cigarro e a uma cerveja. Tem de manter a forma. No importa. Surro qualquer um deles. Voc to bom... Quando voc se embebeda, tenho que ficar ouvindo

    como voc bom. de dar nos nervos. Eu sou bom. Dezesseis seguidas, quinze nocautes. Quem melhor?Ann no respondeu. Jack levou sua garrafa de cerveja e seu cigarro para o

    banheiro. Voc nem me deu um beijo ao chegar. A primeira coisa que voc fez foi

    pegar a sua garrafa de cerveja. To bom, certo. Um bom bebedor de cerveja.Jack no respondeu. Cinco minutos mais tarde, apareceu em p na porta do

    banheiro, com as calas e os cales pelos tornozelos. Pelo amor de Deus, Ann, no d pra deixar nem um rolo de papel

    higinico aqui?

  • Desculpa.Foi at o armrio e levou um rolo para ele. Jack terminou o servio e saiu.

    Ento terminou sua cerveja e pegou outra. Aqui est voc, vivendo com o melhor peso mdio do mundo e tudo que

    faz reclamar. Um monte de garotas gostaria de estar aqui comigo, e tudo quevoc faz ficar sentada e reclamar.

    Sei que voc bom, Jack, talvez at seja o melhor, mas voc no fazideia de como entediante ficar sentada e ouvir voc dizer mais e mais uma vezo quo maravilhoso voc .

    Oh, ento voc est entediada, isso? Sim, porra, voc e a sua cerveja e o quo maravilhoso voc . Diga o nome de um peso mdio que seja melhor. Voc nem mesmo vai s

    minhas lutas. Existem outras coisas alm de lutar, Jack. Como o qu? Passar o dia com essa bunda no sof lendo Cosmopolitan? Gosto de exercitar a mente. E deveria. Tem muito ainda pra progredir nesse terreno. Estou dizendo que existem outras coisas alm de lutar. Como o qu, por exemplo? Bem, arte, msica, pintura, coisas desse tipo. E voc sabe fazer alguma delas? No, mas aprecio. Merda, prefiro ser o melhor no que estou fazendo. Bom, melhor, o nico... Deus, voc no consegue apreciar as pessoas

    pelo que elas so? Pelo que elas so? O que a maioria delas ? Lesmas, sanguessugas,

    dndis, dedos-duros, cafetes, empregados... Voc est sempre rebaixando os outros. Nenhum dos seus amigos bom

    o suficiente. Voc o fodo! Isso mesmo, boneca.Jack foi at a cozinha e voltou com outra cerveja. Voc e a sua maldita cerveja! um direito meu. Eles vendem. Eu compro. Charley disse... Quero que Charley se foda! Voc o melhor!

  • Isso mesmo. Pelo menos Pattie sabia disso. Ela admitia e se orgulhava.Sabia o que isso custava. Tudo que voc faz reclamar.

    Bem, por que voc no volta pra ela? O que est fazendo aqui comigo? Era bem nisso que estava pensando. Bem, no somos casados, posso ir embora a qualquer hora. Isso o que est nos fodendo. Merda, chego aqui morto de cansado

    depois de uma luta dura de dez assaltos, e voc nem mesmo fica feliz por eu tervencido. Tudo que voc faz reclamar de mim.

    Escute, Jack, existe mais na vida alm de lutar. Quando o conheci,admirei-o pelo que voc era.

    Eu era um lutador. No existe nenhuma outra coisa alm de lutar. Isso o que sou: um lutador. Essa a minha vida e sou bom nisso. O melhor. Noto quevoc sempre simpatiza com os lutadores de segunda classe... como TobyJorgenson.

    Toby muito engraado. Tem um senso de humor, um senso de humor deverdade. Gosto do Toby.

    Sua marca so nove vitrias, apenas cinco por nocaute e uma derrota.Dou uma surra nele mesmo podre de bbado.

    E Deus sabe que voc fica podre de bbado frequentemente. Como vocacha que me sinto nas festas quando voc est caindo de bbado, rolando nocho, quando no est se gabando pela sala, dizendo pra todo mundo SOU OMELHOR, O MELHOR, O MELHOR DE TODOS!? No acha que isso fazcom que eu me sinta um cu?

    Talvez voc seja um cu mesmo. Se gosta tanto do Toby, por que no vaificar com ele?

    Ah, s disse que gostava dele, achei ele engraado, isso no quer dizerque quero ir para a cama com ele.

    Bem, voc vai pra cama comigo e diz que sou entediante. No sei o quediabos voc quer.

    Ann no respondeu. Jack se levantou, caminhou at o sof, ergueu acabea de Ann e beijou-a, retornou ao seu lugar e se sentou.

    Escute, deixe-me contar sobre essa luta com o Benson. At voc teriaficado orgulhosa de mim. Ele me derruba no primeiro assalto, uma direitaperigosa. Levanto e o seguro o resto do assalto. Caio outra vez no segundoassalto e quase no consigo me levantar quando a contagem j estava em oito.Seguro ele outra vez. Uso alguns dos assaltos seguintes para recuperar minhas

  • pernas. Ganho o sexto, o stimo e o oitavo assaltos, derrubo ele uma vez nonono e duas vezes no dcimo. No acho que era luta para decidir nos pontos.Mas os juzes acharam que era. Venci, mas no foi unnime. Bem, so 45 mil,entende, garota? Quarenta e cinco mil. Sou timo. No d pra negar. Sou muitobom. D pra negar?

    Ann no respondeu. Vamos, diz que eu sou o melhor. Est bem, voc o melhor. Bem, comeamos a nos entender.Jack caminhou at ela e a beijou novamente. Sinto que sou to bom. Boxe uma obra de arte, realmente . preciso

    ter coragem para ser um grande artista e preciso ter coragem pra ser um bomlutador.

    Tudo bem, Jack. Tudo bem, Jack? tudo que voc tem a dizer? Pattie costumava ficar

    feliz quando eu ganhava. Ficvamos ambos felizes a noite inteira. Voc nopode compartilhar algo de bom que eu fiz? Porra, voc est apaixonada por mimou est apaixonada pelos perdedores, aqueles merdas? Acho que voc seriamais feliz se eu chegasse aqui como perdedor.

    Quero que voc vena, Jack, s que voc pe muita nfase no que faz... Porra, o meu sustento, minha vida. Me orgulho de ser o melhor. como

    voar, como sair voando pelo cu espancando o sol. O que voc vai fazer quando no puder mais lutar? Porra, vamos ter bastante dinheiro para fazer o que quisermos. Menos nos dar bem, talvez. Talvez eu possa aprender a ler Cosmopolitan, melhorar minha mente. Bem, h espao para melhorias. Vai se foder! Qu? Vai se foder! Bem, algo que voc no faz j h algum tempo. Alguns caras gostam de foder mulheres que no param de reclamar, eu

    no gosto. Imagino que Pattie no reclamava? Todas reclamam, mas voc a campe.

  • Bem, por que no volta para Pattie? Voc est aqui agora. S posso hospedar uma puta de cada vez. Puta? Puta.Ann se levantou e foi at o armrio, pegou sua mala e comeou a guardar

    suas roupas ali. Jack foi at a cozinha e pegou outra garrafa de cerveja. Annestava chorando, tomada de fria. Jack sentou com a cerveja e tomou um bomgole. Precisava de um usque, precisava de uma garrafa de usque. E de um bomcharuto.

    Posso vir pegar o resto das minhas coisas quando voc no estiver poraqui.

    No se preocupe. Mando pra voc.Ela parou junto porta. Bem, imagino que seja o fim ela disse. Creio que sim respondeu Jack.Ela fechou a porta e se foi. Procedimento padro. Jack terminou sua

    cerveja e foi at o telefone. Discou o nmero de Pattie. Ela atendeu. Pattie? Oi, Jack, como tem passado? Ganhei uma grande essa noite. No foi unnime. Tudo que tenho que

    fazer passar por cima do Parvinelli e levo o campeonato. Vai acabar com a raa deles, Jack. Sei que voc consegue. O que vai fazer essa noite, Pattie? uma da manh, Jack. Andou bebendo? Um pouco. Estou comemorando. E Ann? Brigamos. S ando com uma mulher por vez, voc sabe disso, Pattie. Jack... Qu? Estou com um cara. Um cara? Toby Jorgenson. Ele est no banheiro... Oh, sinto muito. Tambm sinto muito, Jack. Eu amava voc... talvez ainda ame. Merda, vocs mulheres gostam mesmo de jogar essa palavra por a... Sinto muito, Jack.

  • Tudo bem.Ele desligou. Ento foi at o armrio pegar seu casaco. Vestiu, terminou a

    cerveja, desceu o elevador e foi at o carro. Dirigiu pela Normandie a cemquilmetros por hora, parou na loja de bebidas na Hollywood Boulevard. Saiudo carro e entrou na loja. Comprou um pacote de cerveja de seis garrafasMichelob, uma caixa de Alka-Seltzer. Ento, no caixa, pediu ao funcionrio poruma garrafa de Jack Daniels. Enquanto o funcionrio estava somando ascompras, um bbado entrou com dois pacotes de seis cervejas Coors.

    Ei, cara! ele disse a Jack. Voc no Jack Backenweld, o lutador? Sou respondeu Jack. Cara, vi a sua luta essa noite, Jack, voc tem colhes. Voc realmente

    bom! Obrigado, cara respondeu ao bbado e ento pegou sua sacola de

    compras e caminhou para o carro. Sentou l, abriu a tampa do Daniels e tomouum bom trago. Ento voltou, dirigiu em alta velocidade no sentido oeste, devolta pela Hollywood, dobrou a esquerda na Normandie e notou uma garotanova e benfeita de corpo cambaleando pela rua. Parou o carro, pegou a garrafade usque e mostrou a ela.

    Quer uma carona?Jack ficou surpreso quando ela entrou. Vou ajudar voc a beber isso, senhor, mas nada alm disso. Claro que no disse Jack.Desceu a Normandie a sessenta quilmetros por hora, um respeitado

    cidado, o terceiro melhor peso mdio no ranking mundial. Por um momentosentiu vontade de contar para ela com quem estava andando, mas mudou deideia e estendeu a mo para apalpar um dos joelhos dela.

    Voc tem um cigarro, senhor? ela perguntou.Ele ofereceu rapidamente um cigarro com a mo, acionou o isqueiro do

    painel, que saltou para fora, e ento acendeu o fogo para ela.

  • Nenhum caminho para o paraso

    Eu estava sentado em um bar na avenida Western. Era perto da meia-noitee estava metido em uma das minhas habituais confuses. Quero dizer, vocsabe, nada d certo: as mulheres, os trabalhos, a falta de trabalhos, o tempo, osces. Por fim, voc simplesmente senta em uma espcie de estado de transe eespera como se estivesse no banco da parada de nibus aguardando a morte.

    Bem, estava sentado l e ento chega essa mulher com cabelo preto elongo, bom corpo, olhos castanhos e tristes. No me virei para olh-la. Ignorei-a,mesmo ela tendo sentado no banco ao lado do meu, quando havia uma dzia deoutros lugares vagos. Na verdade, ramos os nicos no bar, exceto pelobalconista. Ela pediu um vinho seco. Depois me perguntou o que eu estavabebendo.

    Scotch com gua. D-lhe um scotch com gua ela disse ao balconista.Bem, isso era incomum.Abriu a bolsa, removeu uma pequena gaiola de arame e tirou algumas

    pessoas pequenas e as colocou no balco. Tinham todos aproximadamente dezcentmetros de altura e estavam vivos e bem vestidos. Havia quatro deles, doishomens e duas mulheres.

    Fazem desses agora ela disse. So muito caros. Custaram quase doismil dlares cada um quando comprei. Agora j esto chegando aos 2.400dlares. No sei como so feitos, mas provavelmente coisa fora da lei.

    As pessoas em miniatura estavam caminhando por cima do balco.Repentinamente um dos pequenos homens deu um tapa na cara de uma daspequenas mulheres.

    Sua vagabunda ele disse , j chega! No, George, voc no pode ela gritou , eu te amo! Vou me matar!

    Tenho que ter voc! No me importo! disse o pequeno sujeito e puxou um cigarrinho e o

    acendeu. Tenho o direito de viver. Se voc no a quer disse o outro sujeitinho , fico com ela, eu a amo.

  • Mas no quero voc, Marty. Estou apaixonada pelo George. Mas ele um idiota, Anna, um idiota completo! Eu sei, mas o amo de qualquer forma.O idiotinha caminhou pelo balco e beijou a outra mulherzinha. Estou com um tringulo amoroso em andamento disse a mulher que

    havia me pagado uma bebida. Esses so Marty e George e Anna e Ruthie.George vai se dar mal, muito mal. Marty meio quadrado.

    No triste ver tudo isso? Errr, qual o seu nome? Dawn[1]. um nome terrvel. Mas o que as mes fazem com suas

    crianas s vezes. O meu Hank. Mas no triste... No, no triste observar isso tudo. No tive muita sorte com os meus

    prprios amores, pssima sorte, alis... Passa o mesmo com todos ns. Parece que sim. De qualquer forma, comprei essas pessoinhas e agora

    fico olhando pra elas. E como ter e no ter esses problemas. Mas fico muitoexcitada quando comeam a fazer amor. a que fica difcil.

    So excitantes? Muito, muito excitantes. Meu Deus, me deixam louca! Por que voc no os obriga a fazer sexo? Quero dizer agora. Ficaremos

    olhando juntos. No se pode for-los. Tm de fazer por conta prpria. Com que frequncia acontece? Oh, eles so bem bons. Quatro ou cinco vezes por semana.Estavam caminhando pelo balco. Escute disse Marty , me d uma chance. Apenas uma chance, Anna. No disse Anna. Meu corao pertence ao George. No pode ser de

    nenhuma outra maneira.George estava beijando Ruthie, apalpando seus peitos. Ruthie estava

    ficando excitada. Ruthie est ficando excitada eu disse a Dawn. Est, est mesmo.Eu tambm estava ficando. Agarrei Dawn e a beijei. Escute ela disse. No gosto que eles faam sexo em pblico. Vou

    lev-los para casa e coloc-los para transar. Mas a no poderei olhar.

  • Bem, ter que vir comigo. Tudo bem respondi. Vamos l.Acabei minha bebida e samos juntos. Ela carregava as criaturas em uma

    pequena gaiola de arame. Entramos no carro dela e colocamos o pessoal entrens, no banco da frente. Olhei para Dawn. Era realmente jovem e bonita.Parecia ser boa tambm por dentro. Como podia ter fracassado com os homens?H tantas maneiras de as coisas sarem erradas. Os quatro pequenos custaram-na oito mil. Tudo isso para se afastar de relacionamentos e na verdade no seafastar de relacionamentos.

    A casa era perto dos morros, um lugar com uma aparncia agradvel.Descemos do carro e caminhamos at a porta. Segurei a gaiola com os pequenosenquanto ela abria a porta.

    Ouvi Randy Newman semana passada no The Troubador. Ele no timo? perguntou.

    Sim, timo.Entramos na sala, e Dawn tirou os pequenos da gaiola e os colocou em uma

    mesinha. Ento caminhou at a cozinha, abriu o refrigerador e pegou umagarrafa de vinho. Trouxe dois copos.

    Perdo ela disse. Mas voc parece um pouco louco. O que voc faz? Sou escritor. E ir escrever sobre isso? Ningum jamais acreditar, mas vou. Olha disse Dawn. George tirou as calcinhas de Ruthie. Ele est

    enfiando os dedos nela. Gelo? Sim, est fazendo isso. No, sem gelo. Puro est timo. No sei o que acontece disse Dawn , mas fico realmente excitada

    quando os observo. Talvez seja porque so to pequenos. Realmente me excita. Entendo o que quer dizer. Olhe, o George est chupando ela. mesmo. Olhe pra eles! Deus do cu!Agarrei Dawn. Ficamos ali em p nos beijando. Enquanto isso, seus olhos

    iam dos meus para eles e novamente para os meus.O pequeno Marty e a pequena Anna tambm estavam olhando.

  • Olhe disse Marty , eles vo trepar. Ns bem que podamos trepartambm. At os grandes vo transar. Olhe pra eles!

    Voc ouviu isso? perguntei a Dawn. Eles disseram que ns vamostrepar. verdade?

    Espero que sim disse Dawn.Levei-a para o sof e levantei o vestido acima da cintura. Beijei seu

    pescoo. Eu te amo eu disse. Mesmo? Ama? Sim, de alguma forma, sim... Tudo bem disse a pequena Anna ao pequeno Marty. Tambm

    podemos trepar, mesmo que eu no ame voc.Eles se abraaram no meio da mesinha. Eu j tinha tirado as calcinhas de

    Dawn. Ela gemia. Ruthie gemia. Marty se aproximava de Anna. Estavaacontecendo por toda parte. Tive a ideia de que todas as pessoas no mundoestavam trepando. Ento esqueci do resto do mundo. De alguma forma fomospara o quarto. Ento penetrei Dawn para a longa e lenta cavalgada.

    Quando ela saiu do banheiro, eu estava lendo uma histria muito idiota naPlayboy.

    Foi to bom ela disse. O prazer foi meu respondi.Ela voltou para a cama. Pus a revista de lado. Acha que daremos certo juntos? perguntou. O que quer dizer? Acha que vamos conseguir ficar juntos por algum tempo? No sei. Coisas acontecem. O comeo sempre mais fcil.Ento ouvimos um grito vindo da sala. Ai, ai ela disse.Saltou da cama e correu para a sala. Segui logo atrs. Quando cheguei l,

    ela estava segurando George nas mos. Oh, meu Deus! O que aconteceu? Foi a Anna! O que tem a Anna? Cortou fora as bolas dele! George um eunuco!

  • Uau! Pegue papel higinico, rpido! Ele pode sangrar at morrer! Esse filho da puta disse Anna da mesinha , se no posso ter o George,

    ningum mais ter. Agora vocs duas so minhas! disse Marty. No, agora voc tem que escolher uma de ns disse Anna. Ento, com qual vai ficar? perguntou Ruthie. Amo as duas disse Marty. Parou de sangrar disse Dawn. Ele est frio.Ela embrulhou George em um leno e colocou sobre a borda da lareira. Quero dizer seguiu Dawn que se voc acha que no daremos certo,

    no vou insistir. Acho que amo voc, Dawn. Olhe ela disse. Marty est abraando Ruthie! Vo trepar? No sei. Parecem excitados.Dawn pegou Anna e a colorou na gaiola de arame. Deixe-me sair daqui! Vou matar os dois! Deixe-me sair daqui!George gemeu de dentro do leno sobre a borda. Marty j tirara as

    calcinhas de Ruthie. Puxei Dawn para perto de mim. Era bonita e jovem e boapor dentro. Eu podia estar apaixonado novamente. Era possvel, nos beijamos.Mergulhei fundo em seus olhos. Ento emergi e comecei a correr. Eu sabia ondeestava. Uma barata e uma guia faziam amor. O tempo era um idiota com umbanjo na mo. Continuei correndo. Seu cabelo longo caa sobre meu rosto.

    Vou matar todo mundo! gritava a pequena Anna. Agitava-se na gaiolade arame s trs horas da manh.

  • Poltica

    No City College de Los Angeles, logo antes da Segunda Guerra Mundial,eu me fazia de nazista. Mal sabia distinguir Hitler de Hrcules, mas no meimportava nem um pouco. O negcio que ficar sentado na sala de aulaouvindo todos aqueles patriotas discursando sobre como deveramos atravessaro oceano e acabar com tudo aquilo me entediava profundamente. Decidi fazeroposio. No me dava sequer o trabalho de ler sobre Adolf, simplesmentevomitava qualquer coisa que me parecia malfica ou insana.

    A verdade que, de fato, eu no tinha nenhuma crena poltica. Eraapenas uma maneira de me libertar daquilo tudo.

    Voc sabe, algumas vezes, se um homem no acredita no que est fazendo,ele pode fazer um trabalho muito mais interessante, porque ele no estemocionalmente envolvido em sua Causa. No demorou muito at que todos osgarotos altos e loiros formassem A Brigada Abraham Lincoln para manter ashordas do fascismo fora da Espanha. E ento levaram chumbo das tropastreinadas. Alguns fizeram isso pela aventura e pela viagem at a Espanha, masmesmo assim levaram chumbo na bunda. No havia em mim nenhuma parte queme atrasse muito, mas gostava da minha bunda e do meu caralho e no queriaperder nenhuma parte do corpo nessa confuso.

    Eu levantava durante a aula e gritava qualquer coisa que me viesse cabea. Normalmente tinha alguma relao com a Raa Superior, o que meparecia ser bem engraado. No falava diretamente dos Negros e dos Judeus,porque via que eles eram to pobres e perdidos quanto eu era. Mas mandeialguns discursos selvagens dentro e fora da sala de aula, e a garrafa de vinhoque eu mantinha no meu armrio me ajudava. Ficava surpreso ao perceber aquantidade de pessoas que me ouviam e quo poucas entre elas, se quealguma, ao menos questionava minhas afirmaes.

    Apenas derramava palavras boca afora e me deliciava ao ver que divertidopodia ser o City College de Los Angeles.

    Voc vai concorrer a presidente do corpo estudantil, Chinaski? No, porra.

  • No queria fazer coisa nenhuma. Eu no ia nem mesmo academia. Naverdade, a ltima coisa que eu queria fazer era ir academia e suar e usarsunguinha e comparar os tamanhos dos paus. Sabia que eu tinha um pau detamanho mdio. No precisava ir academia para descobrir isso.

    Estvamos com sorte. O colgio decidiu cobrar uma taxa de dois dlarespara a matrcula. Decidimos uns poucos de ns decidiram, para variar queisso era inconstitucional, ento recusamos. E nos mantivemos firmes contra acoisa toda. Permitiram que a gente assistisse s aulas, mas alguns de nossosprivilgios foram cortados, entre eles o uso da academia.

    Quando chegava a hora da aula de ginstica, ficvamos com roupas civis.O treinador havia recebido ordens de nos fazer caminhar para cima e para baixopelo campo em uma formao fechada. Essa era a vingana deles. Umamaravilha. Eu no precisava correr ao redor da pista suando a bunda nem ficartentando arremessar uma bola estpida de basquete por uma cesta ainda maisestpida.

    Marchvamos para l e para c, jovens, os sacos cheios, cheios de loucura,excitados, sem buceta, beira da guerra. Quanto menos se acreditava na vida,menos se tinha a perder. Eu no tinha muito a perder, eu e o meu caralhomediano.

    Marchvamos e compnhamos msicas obscenas, e os bons garotosamericanos do time de futebol ameaavam nos dar uma surra, mas de algumaforma nunca o faziam. Provavelmente porque ramos maiores e mais malvados.Para mim, era maravilhoso fingir-me de nazista e em seguida proclamar quemeus direitos constitucionais estavam sendo violados.

    s vezes eu me emocionava. Lembro que uma vez, durante a aula, depoisde me passar no vinho, os olhos rasos dgua, eu disse:

    Prometo a vocs que essa dificilmente ser a ltima guerra. To logo uminimigo caia, de alguma forma outro surgir. No h fim nem sentido nisso tudo.No existe essa coisa de guerra boa ou m.

    Em outra ocasio, havia um comunista falando em um palanque erguidoem uma rea verde ao sul do campus. Era um garoto muito srio com culossem armao, espinhas, vestindo um suter preto com furos nos cotovelos.Fiquei ouvindo o que ele dizia e tinha comigo alguns de meus seguidores. Umdeles era um Russo Branco, Zircoff, seu pai ou seu av foram mortos pelosVermelhos na Revoluo Russa. Ele me mostrou um saco de tomates podres.

    Quando voc der a ordem ele me disse , comearemos a atirar.

  • Percebi ento que meus seguidores no estavam ouvindo o discurso, ouque, mesmo que estivessem ouvindo, nada do que ele dissesse importaria. Suasmentes estavam decididas. A maioria do mundo estava assim. De repente, terum pau mediano no parecia ser o pior pecado do mundo.

    Zircoff eu disse , deixe os tomates de lado. Porra ele disse. Queria que fossem granadas.Perdi o controle dos meus homens naquele dia e fui embora caminhando

    assim que eles comearam a arremessar seus tomates podres.

    Fui informado de que um novo partido de vanguarda estava para se formar.Recebi um endereo em Glendale e fui at l naquela noite. Sentamo-nos noporo de uma casa grande com nossas garrafas de vinho e nossos caralhos detamanhos variados.

    Havia um palanque e uma mesa com uma bandeira americana bem grandedesfraldada na parede de trs. Um garoto americano de aspecto saudvelcaminhou at o palanque e sugeriu que comessemos saudando a bandeira,jurando-lhe lealdade.

    Nunca gostei de jurar lealdade bandeira. Era aborrecido e idiota demais.Sempre me senti mais confortvel jurando lealdade a mim mesmo, mas lestvamos, e nos levantamos e fizemos a coisa toda. Ento, depois, houve umapequena pausa, e todos se sentaram como que se sentindo levementemolestados.

    O americano saudvel comeou a falar. Reconheci-o como um gordo quesentava na primeira fila na aula de escrita teatral. Nunca confiei nesses tipos.Idiotas. Estritamente idiotas. Ele comeou:

    A ameaa comunista deve ser contida. Estamos aqui reunidos para tomarmedidas que levem a isso. Daremos passos legais e talvez ilegais para atingirmosnossa meta...

    No me lembro muito do resto. No me importava muito com a ameaacomunista ou com a ameaa nazista. Queria me embebedar, foder, queria umaboa refeio, cantar diante de um copo de cerveja em um bar sujo e fumar umcigarro. Eu no estava conscientizado. Eu era um tolo, uma pea naengrenagem.

    Mais tarde, Zircoff, eu e um ex-seguidor fomos at Westlake Park ealugamos um barco e tentamos pegar um pato para o jantar. Arranjamos umjeito de ficar muito bbados e no pegamos um pato e descobrimos que no

  • tnhamos dinheiro suficiente com a gente para pagar o aluguel do barco.Ficamos flutuando pelo lago raso e jogamos roleta russa com a arma de

    Zircoff e tivemos sorte. Ento Zircoff se levantou na bebedeira da madrugada eatirou no fundo do barco. A gua comeou a entrar e nos apressamos paratentar chegar margem. A um tero do caminho, o barco afundou e tivemos quesair e molhar nossos rabos para alcanar terra firme. No fim a noite acabou beme no se poderia dizer que foi perdida.

    Banquei o nazista por mais um tempo ainda, sem dar realmente bola paraos nazistas, muito menos para os comunistas ou para os americanos. Mas estavaperdendo o interesse. Na verdade, desisti pouco antes de Pearl Harbour. Adiverso tinha acabado. Sentia que a guerra aconteceria e eu no tinha muitavontade de ser um combatente e tambm no queria ser um oposicionistaconscientizado. Tudo isso era uma merda. Eu era intil. Eu e meu pau medianoestvamos em apuros.

    Sentei na sala de aula sem falar, esperando. Os alunos e os instrutores mealfinetavam. Tinha perdido minha motivao, meu gs, meu combustvel. Sentique a coisa toda fugira do meu controle. A coisa aconteceria. Todos os caralhosestavam em apuros.

    Minha professora de ingls, uma senhora muito agradvel com belaspernas, me pediu, certa vez, para ficar depois da aula.

    O que est acontecendo, Chinaski? ela perguntou. Desisti eu disse. Refere-se poltica? perguntou. Sim respondi. Voc daria um bom marinheiro ela disse.Sa caminhando...

    Eu estava sentado com o meu melhor amigo, um fuzileiro naval, em um barno centro bebendo cerveja quando aconteceu. Um aparelho de rdio estavatocando msica, houve uma pausa. Disseram-nos que Pearl Harbour tinha sidobombardeada. Foi anunciado que todos os militares deviam voltar a suas bases.Meu amigo pediu que eu tomasse o nibus para San Diego com ele, sugerindoque poderia ser a ltima vez que o veria. Ele estava certo.

  • Amor por $17,50

    O primeiro desejo de Robert quando comeou a pensar nessas coisas foi esgueirar-se, em uma noite qualquer, para dentro do Museu de Cera e fazeramor com as mulheres de cera. Isso pareceu, entretanto, muito perigoso.Limitou-se a fazer amor com esttuas e manequins em suas fantasias sexuais eviver em seu mundo de fantasia.

    Um dia, enquanto esperava no sinal vermelho, olhou a entrada de uma loja.Era uma dessas lojas que vendem de tudo: discos, sofs, livros, trivialidades,lixo. Foi l que a viu, parada, com um longo vestido vermelho. Usava uns culossem armao, tinha boa forma; digna e sexy como costumavam ser. Uma gata declasse. Ento o sinal mudou para o verde e ele teve que arrancar.

    Robert estacionou um quarteiro adiante e voltou caminhando at a loja.Permaneceu do lado de fora, perto da banca de jornais, e a fitou. At os olhospareciam reais e a boca era muito impulsiva, s um pouquinho saliente.

    Robert entrou na loja e olhou o mostrurio de discos. Estava, ento,prximo a ela e a olhava de modo furtivo. No, no as faziam mais dessa forma.Usava at mesmo sapatos de salto alto.

    A garota na loja veio at ele. Posso ajudar, senhor? Estou apenas olhando, moa. Se houver algo que queira, pode me chamar. Certamente.Robert foi at o manequim. No havia uma etiqueta de preo. Imaginou se

    estaria venda. Caminhou novamente at o mostrurio de discos, escolheu umbarato e o comprou da garota.

    Na vez seguinte em que visitou a loja, o manequim ainda estava l. Robertcaminhou pela loja, comprou um cinzeiro que era moldado de forma a imitaruma cobra enrolada e depois saiu.

    Na terceira vez em que esteve l, perguntou garota: O manequim est venda?

  • O manequim? Sim, o manequim. Quer compr-lo? Sim, voc vende coisas, no? O manequim est venda? S um momento, senhor.A garota foi at o fundo da loja. Uma cortina se abriu e um velho judeu

    apareceu. Os dois botes de baixo de sua camisa estavam faltando e era possvelver sua barriga peluda. O sujeito parecia suficientemente amigvel.

    Voc quer comprar o manequim, senhor? Sim, est a venda? Bem, na verdade no. Sabe, uma espcie de pea de vitrine, feita de

    brincadeira. Quero compr-la. Bem, vejamos...O velho judeu foi at o manequim e comeou a toc-lo, o vestido, os

    braos. Vejamos... Acho que posso vender essa... coisa... por $17,50. Vou levar.Robert puxou uma nota de vinte. O vendedor contou o troco. Vou sentir falta dela ele disse. s vezes parece ser quase real. Devo

    embrulh-la? No, vou lev-la como est.Robert pegou o manequim e carregou-o at o carro. Deitou-a no banco

    traseiro. Ento entrou e dirigiu at sua casa. Quando chegou l, por sorte, noparecia haver ningum por perto e a fez passar pela porta sem ser visto.Colocou-a no centro da sala e a olhou.

    Stella ele disse. Stella, sua cadela!Caminhou at ela e deu-lhe um tapa na cara. Ento agarrou sua cabea e a

    beijou. Foi um bom beijo. Seu pnis comeava a endurecer quando o telefonetocou.

    Al? Robert? Sim. o Harry. Como vai, Harry? Bem. O que voc est fazendo?

  • Nada. Pensei em dar uma chegada a. Levar algumas cervejas. Ok.Robert desligou o telefone, pegou o manequim e carregou-o at o armrio.

    Empurrou-o para um canto e fechou a porta.Harry realmente no tinha muito a dizer. Ficava l sentado com sua lata de

    cerveja. Como est a Laura? perguntou. Ah disse Robert , est tudo acabado entre mim e Laura. O que aconteceu? A eterna mordida da vampira. Sempre em cena. Era implacvel.

    Procurava homens em toda a parte: na loja de convenincia, na rua, em cafs,em qualquer lugar e dava para qualquer um. No importava quem fosse, desdeque fosse homem. Flertou at mesmo com um cara que discou o nmero errado.No aguentei mais.

    Est sozinho agora? No, estou com outra. Brenda. Voc j a conheceu. Ah, claro. Brenda. Ela legal.Harry ficou ali bebendo cerveja. Harry nunca teve uma mulher, mas estava

    sempre falando sobre elas. Havia algo doentio nele. Robert no encorajou aconversa, e Harry logo partiu. Robert foi at o armrio e tirou Stella de l.

    Sua puta de merda! disse. Andou me traindo, no mesmo?Stella no respondeu. Ficou ali em p parecendo tranquila e fria. Deu-lhe

    uma tremenda bofetada. Ainda est pra nascer o dia em que uma mulher traiaBob Wilkenson e fique impune. Deu outro bofeto.

    Sua piranha! Foderia um garoto de quatro anos se ele conseguisse ficarde pau duro, no mesmo?

    Deu outro tapa, ento a agarrou e a beijou. Beijou-a mais e mais. Entosuas mos entraram por baixo do vestido. Tinha boas formas, muito boas. Stellao lembrava de uma professora de lgebra do ensino mdio. Stella estava semcalcinhas.

    Vagabunda! disse. Quem levou suas calcinhas?Ento seu pnis foi pressionado contra a parte frontal dela. No havia

    abertura. Mas Robert estava tomado de paixo. Enfiou o pau por entre as coxas.Era liso e apertado. Deu um jeito e seguiu adiante. Por um momento apenas,

  • sentiu-se extremamente tolo, ento sua paixo voltou novamente e ele comeoua beijar-lhe o pescoo enquanto fazia o servio.

    Robert lavou Stella com um pano de pratos, colocou-a no armrio atrs deum sobretudo, fechou a porta e ainda deu um jeito de assistir pela televiso oltimo tempo de Detroit Lions contra Los Angeles Rams.

    O tempo passava e tudo corria bem para Robert. Providenciou algumasmelhorias. Comprou para Stella vrias calcinhas, uma cinta-liga, meias longas efinas, um adereo de tornozelo.

    Tambm comprou brincos e ficou um tanto chocado ao descobrir que seuamor no possua orelhas. Sob todo aquele cabelo, no havia orelhas. Mesmoassim, prendeu os brincos com fita adesiva. Mas havia vantagens: no tinha delev-la para jantar, a festas, a filmes idiotas; todas essas coisas mundanas quesignificavam tanto para a mulher comum. E havia discusses. Sempre havia,mesmo com um manequim. Ela no era muito falante, mas ele estava certo deque ela, uma vez, lhe disse: Voc o melhor amante de todos. Aquele velhojudeu era um amante fraco. Voc ama com a alma, Robert.

    Sim, havia vantagens. Ela no era como todas as outras mulheres que eleconhecera. Ela no queria fazer amor em momentos inconvenientes. Ele podiaescolher a hora certa. E ela no menstruava. E ele a chupava. Ele cortou umpouco do cabelo da cabea dela e o colou entre as coxas do manequim.

    O relacionamento no comeo era sexual, mas gradualmente ele estava seapaixonando por ela, podia sentir que estava acontecendo. Considerou ahiptese de ir a um psiquiatra, ento decidiu que no. Afinal de contas, eranecessrio amar um ser humano real? Nunca durava muito. Havia muitasdiferenas entre os sexos, e o que comeava como amor, geralmente acabavacomo guerra.

    E tambm no era preciso deitar na cama com Stella e ouvi-la falar sobretodos os seus antigos amantes. Como Karl tinha um troo to grande, mas Karlno caa de boca. E como Louie danava bem, Louie poderia ter feito a vida noballet em vez de vender seguros. E como Marty beijava bem. Ele tinha umamaneira de tocar com a lngua. E assim por diante. Que merda. claro, Stellamencionou o velho judeu. Mas s uma vez.

    Robert j estava com Stella h duas semanas quando Brenda ligou. Sim, Brenda? respondeu.

  • Robert, voc no tem me ligado. Ando terrivelmente ocupado, Brenda. Fui promovido a gerente distrital e

    tive de reorganizar as coisas no escritrio. mesmo? Sim. Robert, algo est errado... O que voc quer dizer? D pra notar pela sua voz. Algo est errado. Que diabos est errado,

    Robert? H outra mulher? No exatamente. O que significa isso, no exatamente? Oh, Cristo! O que ? O que ? Robert, algo est errado. Vou passar a pra ver voc. No h nada errado, Brenda. Seu filho da puta, voc no quer me contar! Algo est acontecendo. Irei

    at a! Agora!Brenda desligou, e Robert apanhou Stella e a colocou no armrio, bem no

    fundo, no canto. Pegou o sobretudo do cabide e pendurou sobre Stella. Entovoltou, sentou-se e esperou.

    Brenda abriu a porta e entrou correndo. Muito bem, o que raios est acontecendo? O que ? Escute, garota ele disse , est tudo bem. Acalme-se.Brenda era boa de corpo. Seus peitos eram um pouco cados, mas tinha

    belas pernas e uma bunda bonita. Seus olhos sempre tinham um aspectodesvairado e perdido. Ele jamais poderia remediar aquele olhar. s vezes,depois de fazer amor, uma calma temporria enchia seus olhos, mas nuncadurava.

    Voc ainda nem me beijou!Robert levantou-se de sua cadeira e beijou Brenda. Jesus, isso no foi um beijo! O que est acontecendo? ela perguntou.

    O que est errado? Nada, nada mesmo. Se voc no me contar, eu vou gritar! Estou dizendo, no h nada.Brenda gritou. Caminhou at a janela e gritou. Podia-se ouvi-la por toda a

    vizinhana. Ento ela parou.

  • Deus, Brenda, no faa mais isso! Por favor, por favor! Vou fazer outra vez! Vou fazer outra vez! Conte o que h de errado,

    Robert, ou gritarei outra vez! Tudo bem ele disse. Espere.Robert foi at o armrio, tirou o sobretudo de cima de Stella e a trouxe

    para fora. O que isso? perguntou Brenda. O que isso? Um manequim. Um manequim? Voc quer dizer que... Quero dizer que estou apaixonado por ela. Oh, meu Deus! Srio? Por essa coisa? Esse negcio? Sim. Voc ama mais essa coisa do que a mim? Esse pedao de celulide, ou

    seja l do que for feita essa merda? Quer dizer que voc ama essa coisa mais doque a mim?

    Sim. Suponho que a leve pra cama com voc? Suponho que faa... com isso? Sim. Ah...Ento Brenda realmente gritou. Ficou ali em p e gritou. Robert pensou

    que ela jamais pararia. Ento ela pulou no manequim e comeou a bater earranh-lo. O manequim caiu contra a parede. Brenda correu pela porta, entrouno seu carro e arrancou selvagemente. Bateu na lateral de um carroestacionado, balanou e seguiu dirigindo.

    Robert caminhou at Stella. A cabea quebrara e rolara para baixo de umacadeira. Havia pedaos de material gredoso no cho. Um brao pendiafrouxamente, quebrado, dois fios para fora. Robert sentou-se em uma cadeira.Apenas sentou-se ali. Ento se levantou e foi at o banheiro, ficou ali umminuto e voltou. Ficou em p no corredor e podia ver a cabea embaixo dacadeira. Comeou a soluar. Era terrvel. No sabia o que fazer. Lembrou-se decomo tinha enterrado seu pai e sua me. Mas aquilo era diferente. Isso eradiferente. Apenas ficou no corredor, chorando e esperando. Os dois olhos deStella estavam abertos e frios e bonitos. Encaravam-no.

  • Um par de bbados

    Eu estava na casa dos vinte anos e, embora estivesse bebendo muito e semcomer, ainda era forte. Quero dizer, fisicamente, e isso uma sorte quando todoo resto no est indo bem. Minha mente estava amotinada contra o meu destinoe a minha vida, e a nica maneira de acalm-la era beber e beber e beber.Estava caminhando pela estrada, empoeirada e suja e quente, e creio que era oestado da Califrnia, mas no tenho mais certeza. Era uma regio desrtica.Estava caminhando ao longo da estrada, minhas meias duras e apodrecidas efedorentas, os pregos estavam atravessando a sola dos meus sapatos e paradentro dos meus ps e eu colocava papelo nos sapatos: papelo, jornal,qualquer coisa que encontrasse. Os pregos passavam mesmo assim e, ou vocarranjava mais papel, ou virava a coisa do outro lado, ou de cabea para baixo,ou mudava o seu formato.

    Um caminho parou ao meu lado. Ignorei-o e continuei caminhando. Ocaminho arrancou e novamente o sujeito dirigia ao meu lado.

    Garoto o sujeito disse , voc quer um emprego? Quem tenho que matar? perguntei. Ningum disse o sujeito , venha, entre.Dei a volta at o outro lado e quando cheguei l a porta estava aberta. Pisei

    no estribo, entrei, fechei a porta e me recostei no assento de couro. Estava forado sol.

    Quer me chupar? o sujeito disse. Ganha cinco pratas.Dei-lhe um golpe com a direita no estmago, a esquerda em algum lugar

    entre a orelha e o pescoo, soltei mais uma de direita em direo boca, e ocaminho saiu da estrada. Agarrei o volante e o coloquei de volta na pista.Ento desliguei o motor e freei. Desci e continuei a caminhar pela estrada.Aproximadamente cinco minutos depois o caminho estava novamente ao meulado.

    Garoto disse o sujeito , me desculpe. No quis dizer isso. No quisdizer que voc veado. Quero dizer, embora voc meio que parea um. H algoerrado em ser gay?

  • Acho que se voc um, no h problema. Venha disse o sujeito , entre. Tenho um emprego realmente honesto

    para voc. Pode conseguir algum dinheiro, mudar de vida.Subi novamente. Partimos. Me desculpe ele disse , voc tem cara de duro, mas olhe as suas

    mos. Mos de moa. No se preocupe com as minhas mos eu disse. Bem, um trabalho duro. Carregando vigas. J carregou vigas? No. um trabalho duro. J peguei vrios desses na vida. Ok disse o sujeito. Ok.Seguimos dirigindo sem conversar, o caminho balanava pra l e pra c.

    No havia nada alm de poeira, poeira e deserto. O sujeito no tinha muitacabea, no tinha muito de nada. Mas s vezes pessoas insignificantes quepermaneciam no mesmo lugar por um longo tempo conseguiam um pequenoprestgio e poder. Ele tinha o caminho e estava contratando. s vezes precisoaguentar essas coisas.

    Seguimos andando e havia um velho caminhando pela estrada. Devia estarj nos quarenta anos. J era velho demais para andar na estrada. Esse sr.Burkhart, ele me disse seu nome, diminuiu a velocidade do caminho eperguntou ao velho.

    Ei, amigo, quer ganhar alguns trocados? Oh, sim, senhor! disse o velho. Mexa-se. Deixe-o entrar disse o sr. Burkhart.O velho entrou e ele realmente fedia: de bebida e suor e agonia e morte.

    Seguimos at que chegamos a um pequeno grupo de prdios. Samos comBurkhart e caminhamos at uma loja. Havia um sujeito usando uma viseiraverde com um monte de borrachas ao redor do pulso esquerdo. Era careca, masseus braos estavam cobertos com pelos loiros, longos e finos.

    Ol, sr. Burkhart ele disse , vejo que o senhor encontrou mais um parde bbados.

    Aqui est a lista, Jesse disse o sr. Burkhart, e Jesse caminhou pela lojapegando os produtos. Demorou algum tempo. Ento ele juntou o pedido.

    Mais alguma coisa, sr. Burkhart? Duas garrafas de vinho barato? Nada de vinho para mim eu disse.

  • Ok disse o velho , ficarei com as duas. Sair do seu pagamento Burkhart disse ao velho. No importa respondeu , desconte do salrio. Tem certeza que no quer uma garrafa? Burkhart me perguntou. Tudo bem eu disse , levarei uma.

    Tnhamos uma barraca e naquela noite bebemos o vinho e o velho mecontou seus problemas. Tinha perdido a esposa. Ainda a amava. Pensava nela otempo todo. Uma grande mulher. Ele ensinava matemtica. Mas perdeu suaesposa. Nunca uma mulher como ela. Bl, bl, bl.

    Cristo, quando acordamos o velho estava doente e eu no me sentia muitomelhor. O sol estava alto e fomos fazer o nosso trabalho: empilhar dormentes detrilho. Tnhamos que empilh-los em montes. Os de baixo eram fceis. Mas, medida que aumentava, tnhamos que contar. Um, dois, trs e os atirvamos.

    O velho tinha uma bandana amarrada na cabea, e o resultado dabebedeira destilava de sua cabea para a bandana, que se encharcava eescurecia. De vez em quando, uma lasca de um dos dormentes cortava a luvaapodrecida e perfurava minha mo. Normalmente a dor seria insuportvel e euteria desistido, mas o cansao anestesiava os sentidos, realmente os anestesiava.Eu ficava apenas brabo quando acontecia: como se quisesse matar algum, mas,quando olhava ao redor, havia apenas areia e penhascos e o sol forte, amarelo,brilhante, seco e nenhum lugar para ir.

    De vez em quando, a empresa ferroviria trocava os dormentes. Deixavamos velhos do lado dos trilhos. No havia nada de muito errado com os velhos,mas a ferrovia os deixava por ali e Burkhart tinha sujeitos como ns paraempilh-los em montes que ele levava no caminho e vendia. Imagino quetenham muita utilidade. Em alguns ranchos se podia v-los fincados no cho,servindo como moures para as cercas de arame farpado. Suponho que haviaoutros usos tambm. No estava muito interessado.

    Era como qualquer outro trabalho impossvel, voc se cansava e queriapedir demisso e ento ficava mais cansado e esquecia de se demitir e osminutos no avanavam, vivia-se para sempre dentro de um minuto, semesperana, sem sada, preso, muito entorpecido para se demitir e sem nenhumlugar para ir caso se demitisse.

    Garoto, perdi minha esposa. Ela era a mulher mais maravilhosa domundo. Fico pensando nela. Uma boa mulher a melhor coisa do planeta.

  • . Se ao menos tivssemos um pouco de vinho. No temos nada de vinho. Temos que esperar at a noite. Ser que algum entende os bbados? S os outros bbados. Voc acha que essas lascas nas nossas mos iro para o corao? Sem chance. Nunca teremos essa sorte.Dois ndios vieram e nos observaram. Ficaram nos observando por um

    longo tempo. Quando o velho e eu nos sentamos em um dormente para fumarum cigarro, um dos ndios veio at ns.

    Vocs esto fazendo tudo errado ele disse. Como assim? perguntei. Esto trabalhando no horrio mais quente do deserto. O que devem fazer

    acordar cedo pela manh e trabalhar enquanto ainda est fresco. Voc est certo eu disse. Obrigado.O ndio estava certo. Decidi que levantaramos cedo. Mas nunca

    conseguamos. O velho estava sempre enjoado da bebedeira da noite, e eu noconseguia faz-lo levantar a tempo.

    Mais cinco minutos ele dizia. Mais cinco minutos.Finalmente, um dia, o velho desistiu. No podia levantar outro dormente.

    Ficava se desculpando por isso. Est tudo bem, velho.Voltamos para a barraca e esperamos pela noite. O velho falava deitado.

    Ficava falando de sua ex-esposa. Ouvi-o falar de sua ex-esposa por todo o dia enoite adentro. Ento Burkhart chegou.

    Jesus Cristo, vocs no fizeram muito hoje. Esto pensando em viver doque a terra d?

    Acabou, Burkhart eu disse , estamos esperando pelo dinheiro. Acho que o melhor no pag-los. Se voc sabe o que o melhor eu disse , ento vai pagar. Por favor, sr. Burkhart disse o velho , por favor, por favor,

    trabalhamos muito duro, trabalhamos honestamente. Burkhart sabe o que fizemos eu disse. Ele fez a contagem das pilhas e

    eu tambm. Setenta e duas pilhas disse Burkhart. Noventa pilhas eu disse.

  • Setenta e seis pilhas disse Burkhart. Noventa pilhas eu disse. Oitenta pilhas disse Burkhart. Vendido eu disse.Burkhart tirou seu lpis e papel e nos cobrou pelo vinho, pela comida, pelo

    transporte e pelo alojamento. O velho e eu ganhamos, cada um, dezoito prataspor cinco dias de trabalho. Pegamos a grana. E ganhamos uma carona de graapara a cidade. De graa? Burkhart fodera com a gente direitinho. Mas nopodamos chamar a lei, porque, quando voc no tem dinheiro, a lei deixa defuncionar.

    Por Deus disse o velho , vou ficar realmente bbado. Vou ficar bem ebbado. Voc no, garoto?

    Acho que no.

    Entramos no nico bar na cidade e nos sentamos. O velho pediu um vinho,e eu, uma cerveja. Ele comeou a ladainha de sua ex-esposa novamente e eu fuipara a outra ponta do bar. Uma garota mexicana desceu pelas escadas e sentou-se ao meu lado. Por que sempre desciam pelas escadas desse jeito, como nosfilmes? Eu mesmo me senti como se estivesse em um filme. Paguei-lhe umacerveja. Ela disse:

    Meu nome Sherri.E eu disse: Esse nome no mexicano. No precisa ser. Est certo.No andar de cima, tudo me custou cinco dlares, e ela me lavou antes e

    depois. Lavou-me em uma bacia pequena e branca na qual se via pintinhospintados perseguindo uns aos outros ao redor da bacia. Ela, em dez minutos,ganhou o mesmo que eu tinha ganhado em um dia e mais algumas horas. Emtermos monetrios, parecia mais do que certo que era melhor ter uma buceta doque um caralho.

    Quando desci a escada, o velho j estava com a cabea cada no bar. Jestava bbado. No tnhamos comido o dia inteiro e ele no tinha nenhumaresistncia. Havia um dlar e algumas moedas perto de sua cabea. Por ummomento pensei em lev-lo comigo, mas eu no conseguia nem mesmo tomarconta de mim. Sa. Estava fresco l fora e eu caminhei para o norte.

  • Senti-me mal por deixar o velho l para os pequenos abutres da cidade.Ento imaginei se a esposa do velho pensava nele de vez em quando. Decidi queno ou que, se pensava, provavelmente no era da mesma maneira que elepensava nela. Por toda a terra rastejavam pessoas tristes e machucadas, comoele. Precisava de um lugar para dormir. A cama em que estive com a garotamexicana fora a primeira cama que vi nas ltimas trs semanas.

    Algumas noites atrs, eu tinha descoberto que, quando esfria, as farpas emminhas mos latejam. Podia sentir onde cada uma estava. Comeou a esfriar.No posso dizer que odeie o mundo dos homens e das mulheres, mas eu sentiaum certo nojo que me separava dos artesos e dos comerciantes, dos mentirosose dos amantes, e agora, dcadas mais tarde, sinto esse mesmo nojo. claro, essa apenas a histria de um homem ou a viso de um homem da realidade. Sevoc continuar lendo, talvez a prxima histria seja mais alegre. Espero que sim.

  • Maja Thurup

    Houve ampla cobertura da imprensa e da televiso, e a senhora estava paraescrever um livro sobre tudo isso. O nome da senhora era Hester Adams, duasvezes divorciada, dois filhos. Tinha 35 anos, e algum poderia imaginar que essaseria sua ltima jogada. As rugas estavam aparecendo, os peitos estavam caindoj h algum tempo, os tornozelos e as panturrilhas estavam engrossando, jhavia sinais de uma barriga. A Amrica aprendeu que a beleza reside apenas najuventude, especialmente para a mulher. Mas Hester Adams tinha a sombriabeleza da frustrao e da perda vindoura; era algo que rastejava por cima dela, aperda vindoura, e dava-lhe alguma coisa sexualmente atrativa, como umamulher desesperada para quem o tempo est passando enquanto ela continuasentada em um bar cheio de homens. Hester tinha olhado ao redor, visto poucossinais de ajuda vindos dos homens americanos e entrou em um avio para aAmrica do Sul. Entrou na selva com sua cmera, sua mquina de escreverporttil, seus tornozelos que esto engrossando, sua pele branca e arranjou parasi um canibal, um canibal negro: Maja Thurup. Maja Thurup tinha uma cara comum bom aspecto. Seu rosto parecia estar marcado por mil ressacas e miltragdias. E era verdade: passara por mil ressacas, mas todas as tragdias tinhama mesma origem: Maja Thurup tinha o pau maior do que a mdia, muito maiordo que a mdia. Nenhuma garota na aldeia o aceitava. Tinha provocado a mortede duas garotas com seu instrumento. Uma tinha sido penetrada pela frente e aoutra por trs. No fazia diferena.

    Maja era um homem solitrio que bebia e pensava em sua solido at queHester Adams chegou com um guia e sua pele branca e uma cmera. Depois dasapresentaes formais e algumas bebidas perto do fogo, Hester tinha entrado nacabana de Maja e aguentado tudo o que Maja Thurup podia meter e ainda pediupor mais. Era um milagre para ambos, e os dois se casaram em uma cerimniatribal de trs dias, durante a qual homens capturados de tribos inimigas eramassados e comidos em meio a danas, encantamentos e embriaguez. Foi depoisda cerimnia, depois que as ressacas passaram, que os problemas comearam. O

  • paj, notando que Hester no partilhara da carne assada do homem da triboinimiga (decorada com abacaxi, azeitona e nozes), anunciou para todos que nose tratava de uma deusa branca, mas uma das filhas de um deus mau chamadoRitikan. (Sculos atrs, Ritikan tinha sido expulso do cu tribal por se recusar acomer qualquer coisa alm de vegetais, frutas e nozes.) O anncio causoudissenso na tribo, e dois amigos de Maja Thurup foram imediatamenteassassinados por terem sugerido que a habilidade de Hester de lidar com todo otamanho do pau de Maja era em si um milagre e o fato de que ela no ingeriaoutras formas de carne humana poderia ser perdoado, pelo menostemporariamente.

    Hester e Maja fugiram para a Amrica, para North Hollywood para sermais preciso, onde Hester deu incio aos procedimentos para tornar MajaThurup um cidado americano. Sendo uma antiga professora de colgio, Hestercomeou a instruir Maja no uso de roupas e da lngua inglesa, a beber cervejas evinhos da Califrnia, a assistir televiso e a se alimentar de comidascompradas no Safety Market mais prximo. Maja no apenas via televiso, mastambm aparecia nela com Hester, e eles declararam seu amor publicamente.Ento voltaram para seu apartamento em North Hollywood e fizeram amor.Depois Maja sentou no meio do tapete com seus livros de gramtica inglesa,bebendo cerveja e vinho e cantando cantos nativos e tocando bong. Hestertrabalhava em seu livro sobre Maja e Hester. Uma grande editora estavaesperando. Tudo que Hester precisava fazer era escrever.

    Certa manh, eu estava na cama l pelas oito horas. No dia anterior euperdera quarenta dlares em Santa Anita, minhas economias na conta doCalifornia Federal estavam se tornando perigosamente baixas e eu no tinhaescrito uma histria decente em um ms. O telefone tocou. Levantei, pigarreei,tossi e atendi ao telefone.

    Chinaski? Sim? Aqui Dan Hudson.Dan dirigia a revista Flare de Chicago. Ele pagava bem. Era o editor e o

    diretor. Ol, Dan, nossa. Olha, tenho algo para voc. Claro, Dan. O que ?

  • Quero que voc entreviste uma puta que casou com um canibal. Torne osexo GRANDE. Misture amor com horror, sabe?

    Sei. Tenho feito isso minha vida toda. Pago quinhentos dlares se conseguir entregar antes do prazo final, que

    27 de maro. Dan, por quinhentos dlares consigo fazer do Burt Reynolds uma lsbica.Dan me passou o endereo e um nmero de telefone. Levantei, joguei gua

    na cara, tomei dois Alka-Seltezrs, abri uma garrafa de cerveja e telefonei paraHester Adams. Contei-lhe que queria dar publicidade a sua relao com MajaThurup como uma das maiores histrias de amor do sculo XX. Para os leitoresda revista Flare. Afirmei-lhe que isso ajudaria Maja a obter sua cidadaniaamericana. Ela concordou com a entrevista, e marcamos para a primeira hora datarde.

    Era um apartamento no terceiro andar de um prdio sem elevador. Elaabriu a porta. Maja estava sentado no cho, com seu bong, bebendo umagarrafa de um vinho do Porto direto do gargalo. Estava descalo, vestia calasjeans apertadas e uma camiseta branca com listras pretas, zebrada. Hesterestava vestindo uma roupa idntica. Trouxe-me uma garrafa de cerveja, pegueium cigarro do mao na mesa de caf e comecei a entrevista.

    Quando voc viu Maja pela primeira vez?Hester me deu uma data. Tambm disse a hora com exatido e o lugar. Quando voc comeou a perceber os primeiros sentimentos de amor por

    Maja? Quais foram exatamente as circunstncias que desencadearam a relao? Bem disse Hester , foi quando... Ela me ama quando eu meto o troo nela disse Maja do tapete. Ele aprendeu ingls muito rapidamente, no mesmo? Sim, ele brilhante.Maja pegou a garrafa e tomou um bom gole. Meto o troo nela, ela dizer Oh meu deus oh meu deus oh meu deus!

    R, r, r, r! Maja tem um corpo fantstico ela disse. Ela engole tambm disse Maja , ela engole bem. Garganta profunda,

    r, r, r! Amei Maja desde o comeo disse Hester. Foram seus olhos, seu

    rosto... to trgico. E o jeito que ele caminhava. Ele caminha, bem, ele caminha

  • meio que como um tigre. Porra disse Maja , trepamos e esporreamos, porra, foda, porra. Estou

    ficando cansado.Maja bebeu mais um pouco. Ele me olhou. Voc fode ela. Eu cansei. Ela grande tnel faminto. Maja tem um senso de humor muito peculiar disse Hester. Isso foi

    outra coisa que me fez am-lo ainda mais. A nica coisa que voc gosta em mim disse Maja o meu caralho

    poste telefnico. Maja est bebendo desde a manh disse Hester , voc ter de perdo-

    lo. Talvez seja mais adequado que eu volte quando ele estiver melhor. Acho que sim.Hester marcou um novo horrio comigo, duas da tarde do dia seguinte.

    Tudo corria bem. Eu precisava de fotografias. Conhecia um fotgrafototalmente arruinado, um tal de Sam Jacoby que era bom e cobraria barato.Levei-o at l comigo. Era uma tarde ensolarada com apenas uma fina camadade poluio no ar. Subimos e toquei a campainha. No houve resposta. Toquei acampainha mais uma vez. Maja abriu a porta.

    Hester no est ele disse. Foi loja de convenincias. Tnhamos hora marcada para as duas da tarde em ponto. Gostaria de

    entrar e esperar.Entramos e sentamos. Mim tocar tambor para voc disse Maja.Ele tocou o tambor e cantou alguns cantos da floresta. Ele era muito bom.

    Estava bebendo outra garrafa de vinho do Porto. Ainda estava vestindo suacamiseta listrada ao estilo zebra e seus jeans.

    Foder, foder, foder ele disse. s o que ela quer. Ela me deixa louco. Sente falta da floresta, Maja? Voc no caga contra a corrente, paizinho. Mas ela ama voc, Maja. R, r, r!Maja fez outro solo no tambor. Mesmo bbado ele era bom.Quando Maja acabou, Sam me perguntou: Voc acha que ela pode ter uma cerveja na geladeira?

  • Pode ser. Minha cabea no est boa. Preciso de uma cerveja. Vai l. Traga duas. Depois compro mais para ela. Eu devia ter trazido

    algumas.Sam levantou-se e foi at a cozinha. Ouvi a porta da geladeira se abrindo. Estou escrevendo um artigo sobre voc e Hester disse para Maja. Mulher buraco. Nunca enche. Como um vulco.Ouvi Sam vomitando na cozinha. Ele bebia muito. Sabia que estava de

    ressaca. Mas ainda assim era um dos melhores fotgrafos em atividade. Entotudo ficou quieto. Sam voltou caminhando. Sentou-se. No trouxe a cerveja.

    Eu tocar tambor mais uma vez disse Maja.Ele tocou novamente. Ainda estava tocando bem. Embora no to bem

    como da outra vez. O vinho estava pegando. Vamos sair daqui Sam me disse. Tenho que esperar por Hester respondi. Cara, vamos embora disse Sam. Vocs querem um pouco de vinho? Maja ofereceu.Levantei e fui at a cozinha buscar uma cerveja. Sam me seguiu. Fui em

    direo geladeira. Por favor, no abra essa porta! ele disse.Sam caminhou at a pia e vomitou mais uma vez. Olhei para a porta da

    geladeira. No a abri. Quando Sam acabou, eu disse: Tudo bem. Vamos embora.Caminhamos at a sala da frente, onde Maja ainda estava sentado tocando

    seu bong. Eu tocar tambor mais uma vez ele disse. No, obrigado, Maja.Samos e descemos a escada e ganhamos a rua. Entramos no meu carro.

    Dei a partida e arranquei. No sabia o que dizer. Sam no disse nada. Estvamosno bairro comercial. Dirigi at um posto de gasolina e disse ao frentista paraencher o tanque com gasolina comum. Sam saiu do carro e foi at um telefonepblico para ligar para a polcia. Vi Sam sair da cabine telefnica. Paguei pelagasolina. No consegui minha entrevista. Fiquei sem os meus quinhentosdlares. Esperei enquanto Sam voltava para o carro.

  • Os assassinos

    Harry acabara de sair da estiva e estava descendo a alameda em direo aoPedros para tomar uma xcara de caf de um nquel. Era muito cedo na manh,mas lembrou que costumavam abrir s cinco. No Pedros era possvel ficarsentado por algumas horas pagando apenas alguns centavos. Dava para pensarum pouco. Lembrar-se dos erros e dos acertos da vida.

    Estavam abertos. A garota mexicana que lhe deu o caf olhou-o como seele fosse um ser humano. A pobrezinha conhecia a vida. Uma boa garota. Bem,uma garota suficientemente boa. Todas significavam problemas. Tudo era sinalde problemas. Lembrou-se de uma afirmao que tinha ouvido em algum lugar:Viver um problema.

    Harry sentou-se em uma das velhas mesas. O caf estava bom. Trinta e oitoanos de idade e ele estava acabado. Bebeu o caf e lembrou onde tinha errado...ou acertado. Simplesmente se cansara... do jogo das seguradoras, dos pequenosescritrios e altas divisrias de vidro, dos clientes, simplesmente cansara de trairsua mulher, de se esfregar com secretrias no elevador e nos corredores, cansaradas festas de Natal e das festas de Ano-Novo e dos aniversrios, pagamentos decarros novos, mveis, luz, gs, gua... todo o complexo sistema de necessidades.

    Cansou-se e se demitiu, isso era tudo. O divrcio veio logo e tambm abebida e subitamente estava fora de tudo aquilo. No tinha nada e descobriuque no ter nada tambm era difcil. Era um outro tipo de fardo. Se ao menosexistisse algum caminho mais suave entre esses dois. Parecia que um homemtinha apenas duas escolhas: acotovelar-se no jogo da ambio ou ser ummendigo.

    Harry levantou os olhos e viu um homem que tambm tinha uma xcara decaf de um nquel sentando sua frente. Parecia recm-entrado nos quarenta.Estava mal vestido como Harry. Puxou um cigarro e olhou para Harry enquantoo acendia.

    Como vo as coisas? uma boa pergunta disse Harry. ... acho que sim.

  • Ficaram sentados bebendo o caf. de se perguntar como um homem vem parar num buraco destes. ... disse Harry. Por sinal, se interessar, meu nome William. Eu me chamo Harry. Voc pode me chamar de Bill. Obrigado. Voc tem a expresso de algum que chegou ao fim de alguma coisa. Estou apenas cansado desta vida de mendigo, cansado at os ossos. Quer voltar para a sociedade, Harry? No, isso no. Quero apenas sair dessa situao. H o suicdio. Eu sei. Escute disse Bill , o que precisamos de um pouco de dinheiro fcil

    para retomarmos o flego. Claro, mas como? Bem, um pouco arriscado. Quo arriscado? Eu costumava roubar casas. No ruim. Seria legal ter um bom parceiro. Ok. Estou pronto para tentar qualquer coisa. Estou enjoado de feijo

    aguado, de rosquinhas da semana passada, dos missionrios, as palestras sobreDeus, os roncos...

    Nosso problema como chegar at um lugar em que possamos operar disse Bill.

    Tenho alguns dlares. Tudo bem, me encontre perto da meia-noite. Tem um lpis? No. Espere. Vou pedir um emprestado.Bill voltou com o toco de um lpis. Pegou um guardanapo e escreveu. Tome o nibus Beverly Hills e pea ao motorista para descer aqui. Ento

    caminhe dois quarteires na direo norte. Estarei esperando l. Vai conseguir? Estarei l. Voc tem esposa? Bill perguntou. Tinha Harry respondeu.

    Fazia frio naquela noite. Harry desceu do nibus e caminhou dois

  • quarteires para o norte. Estava escuro, muito escuro. Bill estava em pfumando um cigarro de palha. Ele no estava parado no meio da calada, masencostado contra um grande arbusto.

    Ol, Bill. Ol, Harry. Est pronto para comear sua nova e lucrativa carreira? Estou. Muito bem. Tenho explorado esta regio. Acho que escolhi uma casa boa

    pra gente. Isolada. Fede a dinheiro. Est com medo? No, no estou com medo. Isso bom. Fique tranquilo e me siga.Harry seguiu Bill pela calada por um quarteiro e meio, ento Bill atalhou

    por entre dois arbustos e por um grande gramado. Caminharam at os fundos dacasa, uma manso espetacular com dois andares. Bill parou diante da janela dosfundos. Cortou a tela com sua faca, depois ficou imvel, a escutar. Tudo estavaquieto como um cemitrio. Bill ergueu a tela e a afastou. Ficou ali trabalhandona janela. Bill embromou por algum tempo, e ento Harry comeou a pensar:Jesus. Estou com um amador, com algum tipo de louco. Ento a janela abriu eBill entrou por ela. Harry podia ver sua bunda balanando enquanto se debatiapara passar. Isso ridculo, pensou. Homens fazem esse tipo de coisa?

    Venha Bill sussurrou do lado de dentro.Harry passou pela janela. Realmente a casa fedia a dinheiro e a lustra-

    mveis. Jesus. Bill. Agora estou com medo. Isso no faz nenhum sentido. No fale to alto. Voc quer ou no quer se livrar daquele feijo aguado? Sim. Ento seja homem.Harry ficou parado em p, enquanto Bill lentamente abria gavetas e

    colocava coisas em seus bolsos. Pareciam estar em uma sala de jantar. Billestava colocando colheres e facas e garfos em seus bolsos. Como vamosconseguir algum dinheiro por isso?, pensou Harry.

    Bill continuava a socar a prataria nos bolsos de seu casaco e entoderrubou uma faca. O cho era duro, sem carpete, e o som foi alto e claro.

    Quem est a?Bill e Harry no responderam. Quem est a? O que , Seymour? disse a voz de uma garota.

  • Acho que ouvi algo. Alguma coisa me acordou. Ah, volte a dormir. Srio. Ouvi algo.Harry ouviu um som de cama se mexendo e ento o som de um homem

    caminhando. O homem passou pela porta e logo estava na sala de jantar com osdois. Ele usava pijamas, era um jovem de 26 ou 27 anos com um cavanhaque ecabelos longos.

    Muito bem, seus escrotos, o que esto fazendo na minha casa?Bill virou-se para Harry. Entre no quarto. Pode ter um telefone l. No deixe a garota us-lo. Vou

    tomar conta desse daqui.Harry caminhou em direo ao quarto, achou a porta, entrou, viu uma loira

    jovem perto dos 23 anos, cabelos longos, vestindo uma camisola sensual, osseios soltos. Havia um telefone no criado mudo e ela no o estava usando. Desbito, ela levou o dorso da mo boca. Estava sentada na cama.

    No grite disse Harry ou eu mato voc.Permaneceu ali, olhando-a, pensando em sua prpria esposa, mas nunca

    uma esposa como aquela. Harry comeou a suar, sentiu-se tonto e encararamum ao outro.

    Harry sentou na cama. Deixe minha esposa em paz ou eu mato voc! disse o jovem.Bill acabara de traz-lo para o quarto. Segurava-o com uma chave de brao

    e mantinha sua faca espetando as costas do sujeito. Ningum ir machucar sua esposa, cara. Apenas nos conte onde est a

    porra da grana e iremos embora. J disse. Tudo o que eu tenho est na minha carteira.Bill apertou a chave de brao e forou um pouco mais a faca. O sujeito

    tremeu. As joias disse Bill. Me mostre as joias. Esto l em cima... Muito bem. Me leve at l.Harry observou Bill lev-lo para fora do quarto. Harry continuou

    encarando a garota e ela devolvia o mesmo olhar. Olhos azuis, e as pupilasestavam dilatadas de medo.

    No grite ele lhe disse ou mato voc, ento melhor voc me ajudar!Os lbios dela comearam a tremer. Estavam no tom mais plido que o rosa

  • pode assumir, e ento os lbios dos dois estavam colados. Ele estava malbarbeado e sujo, ranoso, e ela era branca, um branco liso, delicado, tremendo.Ele segurou a cabea da jovem nas mos. Afastou-a e olhou-a nos olhos.

    Sua puta ele disse. Sua puta de merda!Beijou-a novamente, com fora. Caram juntos na cama. Ele estava tirando

    os sapatos, segurando-a. Ento foi tirando as calas e durante todo o tempo nodeixou de segur-la e beij-la.

    Sua puta, sua puta de merda... Oh no! Jesus Cristo! No! A minha esposa no, seus crpulas!Harry no os ouvira entrar. O jovem soltou um berro. Ento Harry ouviu

    um murmrio. Levantou-se um pouco e olhou ao redor. O sujeito estava nocho com sua garganta cortada, o sangue esguichava de modo ritmado pelocho.

    Voc o matou! disse Harry. Ele estava gritando. No precisava mat-lo. Voc no precisava estuprar a mulher. No a estuprei, e voc o matou.Ento ela comeou a gritar. Harry colocou a mo sobre sua boca. O que vamos fazer? perguntou. Vamos mat-la tambm. Ela uma testemunha. No posso mat-la disse Harry. Eu mato diss