Cadeia Banana CE

107
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ - UFC PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PRODEMA – PROGRAMA REGIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente Área de Concentração: Economia dos Recursos Naturais e Política Ambiental JOSÉ ALESSANDRO CAMPOS DE ANDRADE ANÁLISE DA PRODUÇÃO DE BANANA ORGÂNICA NO MUNICÍPIO DE ITAPAJÉ – CEARÁ, BRASIL Fortaleza – Ceará 2005

description

producao de banana artesanal

Transcript of Cadeia Banana CE

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEAR - UFC PR-REITORIA DE PESQUISA E PS-GRADUAO

    PRODEMA PROGRAMA REGIONAL DE PS-GRADUAO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

    Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente rea de Concentrao: Economia dos Recursos Naturais e Poltica Ambiental

    JOS ALESSANDRO CAMPOS DE ANDRADE

    ANLISE DA PRODUO DE BANANA ORGNICA NO

    MUNICPIO DE ITAPAJ CEAR, BRASIL

    Fortaleza Cear 2005

  • ii

    JOS ALESSANDRO CAMPOS DE ANDRADE

    UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEAR UFC MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

    REA DE CONCENTRAO: ECONOMIA DOS RECURSOS NATURAIS E POLTICA AMBIENTAL

    ANLISE DA PRODUO DE BANANA ORGNICA NO MUNICPIO DE ITAPAJ CEAR, BRASIL

    Dissertao apresentada Coordenao do Curso de Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente, do Programa Regional de Ps-Graduao em Desenvolvimento e Meio Ambiente PRODEMA, da Universidade Federal do Cear UFC, como requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Orientador: Prof. Dr. Robrio Telmo Campos

    FORTALEZA 2005

  • iii

    A565a Andrade, Jos Alessandro Campos de.

    Anlise da produo de banana orgnica no Municpio de Itapaj Cear, Brasil / Jos Alessandro Campos de Andrade.

    103 f.: il., color. enc.

    Dissertao (mestrado) - Universidade Federal do Cear, Fortaleza, 2005.

    Orientador: Prof. Dr. Robrio Telmo Campos. rea de concentrao: Economia dos recursos naturais e poltica

    ambiental.

    l. Agricultura Orgnica 2. Banana Cear. I. Campos, Robrio Telmo II. Universidade Federal do Cear, Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente III. Ttulo.

    CDD 634.772

  • iv

    Dissertao submetida Coordenao do Curso de Mestrado em

    Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Cear UFC, como

    requisito parcial para obteno do ttulo de Mestre, outorgado pela referida

    instituio, encontrando-se disposio dos interessados na Biblioteca de Cincias

    e Tecnologia do Campus do Pici.

    A meno a qualquer parte desta dissertao permitida, desde que seja

    feita de acordo com as normas tcnicas de utilizao de fontes bibliogrficas da

    ABNT.

    Ttulo da Dissertao: Anlise da Produo de Banana Orgnica no Municpio de Itapaj Cear, Brasil.

    ________________________________________

    Jos Alessandro Campos de Andrade

    Dissertao aprovada em 29/08/2005

    Banca Examinadora

    _________________________________________

    Prof. Dr. Robrio Telmo Campos Orientador (UFC)

    _________________________________________

    Prof. Dr. Luiz Artur Clemente da Silva Membro (UFC)

    _________________________________________

    Prof. Dr. Roberto Csar Magalhes Mesquita Membro (EMBRAPA)

  • v

    Ao to esperado e realizado sonho,

    Sofia.

  • vi

    [...] j no se v mais aonde levam o crescimento econmico e o indefinido aumento do bem-estar entendido como riqueza, numa altura em que este processo de desenvolvimento comea atacar de forma preocupante os recursos vitais do planeta, o ar, a gua, as plantas, a vida animal e a vida humana (INDRIO, 1980, p. 7).

  • vii

    AGRADECIMENTOS

    Durante a elaborao deste trabalho, contou-se com a valiosa

    colaborao de pessoas e entidades relacionadas a seguir, a quem manifesto

    sinceros agradecimentos:

    Ao orientador, professor Dr. Robrio Telmo Campos, do Departamento de

    Economia Agrcola da Universidade Federal do Cear UFC, pela disposio e

    magnficas contribuies, apoio e pacincia ao longo do mestrado.

    Ao professor Dr. Luiz Artur Clemente da Silva, do Departamento de

    Economia Agrcola da Universidade Federal do Cear UFC, pelas colaboraes

    durante o exame de qualificao, pela disposio e sugestes.

    Ao professor Dr. Roberto Csar Magalhes Mesquita, da EMBRAPA, pela

    inestimvel disposio e contribuies.

    minha esposa, Giselia Campos de Andrade, pela dispendiosa

    compreenso.

    minha famlia, pais, irmos, cunhados e sobrinhos pelo apoio.

    A todos os agricultores que contriburam para a realizao desse

    trabalho, principalmente aos bananicultores de Itapaj CE,

    Associao dos Fruticultores do Municpio de Itapaj - AFMI, em

    especial ao senhor Arnbio de Castro Lima e sua me, senhora Amlcar de Castro

    Lima, pelas informaes cedidas, pelo tempo disponibilizado, por todo o apoio na

    aplicao dos questionrios e entrevistas.

    Ao meu cunhado Jos Aldair Gomes pelas orientaes.

    Ao bananicultor orgnico Sr. Francisco Chagas Braga Lima (Magal), pela

    inexprimvel contribuio e acolhimento durante a pesquisa de campo.

    Ao senhor Antonio Csar de Souza (Csar Silveira) pela preciosa ajuda e

    esclarecimentos nos tratos culturais da banana.

    A todos os meus colegas que contriburam nesse trabalho, especialmente

    Ernandy Luis Vasconcelos de Lima, pelo inestimvel apoio.

    E finalmente, ao Senhor Deus, que apesar de todas as dificuldades,

    esteve comigo, dando-me foras para prosseguir decididamente.

  • viii

    RESUMO

    A presente pesquisa tem como objetivo principal descrever o processo de

    bananicultura orgnica praticada em Itapaj - Cear, analisando os aspectos sociais,

    ambientais e econmicos dos produtores desta cultura. Alm disso, so objetivos

    especficos: analisar a produo de banana orgnica com o advento da criao da

    Associao dos Fruticultores do Municpio de Itapaj AFMI, efetuar as anlises

    tcnica, social e ambiental e sob a ptica de aceitao do consumidor de banana

    orgnica produzida em Itapaj, analisar a viabilidade econmica da atividade para os

    produtores associados AFMI e discutir alguns aspectos relacionados s vantagens

    e desvantagens da produo e mercado da banana orgnica. A rea de estudo est

    localizada em Itapaj, um dos maiores produtores de banana do Estado do Cear,

    caracterizado por uma intensa modificao no espao fsico em reas serranas. Fez-

    se uso de dados tanto primrios quanto secundrios. O presente estudo classifica-se

    como sendo de carter analtico-descritivo. Efetua-se tambm uma anlise da

    viabilidade econmica para os produtores ligados referida Associao. A anlise

    dos dados levantados foi efetuada utilizando-se tabelas, quadros e figuras, por meio

    dos instrumentos da estatstica descritiva. A agricultura orgnica nesse Municpio

    uma experincia inovadora, em que 16 produtores de banana orgnica, ligados

    AFMI, vm desenvolvendo esta atividade em meio a muitos problemas, tais como os

    de baixa infra-estrutura, principalmente, no que diz respeito precariedade das

    estradas, que prejudicam o escoamento da produo. Concluiu-se que alguns

    fatores so determinantes para a baixa produtividade dos bananeirais, podendo-se

    citar os tratos culturais deficitrios, a ausncia de irrigao, a incipiente reposio de

    nutrientes, a alta declividade do relevo, solos pedregosos, alm do fato do

    bananeiral j ser velho. Registrou-se que a adubao orgnica (compostagem)

    utilizada nas propriedades e que os bananicultores demonstraram ter uma profunda

    preocupao com a questo ambiental, buscando a preservao da biodiversidade

    local, mantendo em suas propriedades uma rea de, pelo menos, 20% de mata, ou

    seja, a chamada reserva legal. Por fim, quanto viabilidade, concluiu-se que a

    atividade da produo de banana orgnica em Itapaj rentvel economicamente.

    Palavras-chave: agricultura orgnica, bananicultura, Itapaj, sustentabilidade.

  • ix

    ABSTRACT

    The present research has as main objective to describe the process of organic

    bananicultura practiced in Itapaj - Cear, analyzing the aspects social,

    environmental and economical of this cultures production. Furthermore, the objective

    specific are: to analyze organic banana's production after the creation of the

    Associao dos Fruticultores do Municpio de Itapaj AFMI, to make the analyses

    technique, social and environmental and under the optical of organic banana's

    consumer's acceptance produced in Itapaj, to analyze the economical viability of the

    activity for the associated producers AFMI, to discuss some aspects related to the

    advantages and disadvantages of the production and the organic bananas market.

    The study area is located in Itapaj, one of the largest producing of banana of the

    State of Cear in Brazil. Itapaj is a city characterized by an intense modification in

    the physical space in mountainous areas. Primary and secondary datas were used to

    understand banana's organic production. The present study is classified as

    analytical-descriptive. Also, an analysis of the economical viability is elaborated for

    the Association's producers. The analysis of the data was studied through the

    descriptive statistics instruments and used tables, pictures and illustrations. The

    organic agriculture in Itapaj is an innovative experience. There are 16 sixteen

    organic bananas producers that are linked to AFMI. These producers are developing

    that activity with many problems, for intance, low infrastructure and precariousness of

    the roads that harm the productions drainage. In conclusion, some factors are

    decisive for the low productivity: the cultural treatments, no irrigation, incipient

    nutrientsreplacement, irregular relief, a stony soil and an old plant banana. It was

    registered the organic manuring (composting of organic matter). Also, it was

    registered that the organic banana's producers are concerned with the

    environmental, they preserve the local biodiversity and they preserve an area of, at

    least, 20% of forest, the call legal reservation, in organic banana's properties. Finally,

    this activity of organic banana's production in Itapaj is profitable economically.

    Keywords: organic agriculture, banana refinement, Itapaj, sustainability.

  • x

    LISTA DE FIGURAS

    1 Selo de qualidade, certificado orgnico IBD. 36

    2 Cultivo de banana orgnica numa propriedade em Itapaj - CE, em junho de 2005. 52

    3 Localizao do Municpio de Itapaj. 54

    4 Organograma da Associao dos Fruticultores do Municpio de Itapaj. 65

    5 cone da Associao dos Fruticultores Orgnicos de Itapaj - AFMI. 66

    6 Produo e produtividade de banana: Cear versus Itapaj. 69

    7 Produo Brasileira de Banana em 2002. 69

    8 Produo de Banana no Municpio de Itapaj. 70

    9 Espaamento de 3,0 x 3,0 metros entre as bananeiras, em junho de 2005. 75

    10 Tratos culturais de roo e desfolha do bananeiral (notar pontilhado, em vermelho), em junho de 2005. 76

    11 Lurdinha, aparelho utilizado para o desbaste da bananeira. Fonte: Adaptado de Padovani (1989). 77

    12 Transporte dos frutos, em junho de 2005. 78

    13 Local de residncia dos produtores de banana orgnica de Itapaj CE, em 2004 (2 semestre) 2005 (1 semestre). 80

    14 Composio familiar dos produtores orgnicos de Itapaj CE, em 2004 (2 semestre) 2005 (1 semestre). 80

    15 Aspectos ambientais da produo de banana orgnica de Itapaj CE, 2004 (2 semestre) 2005 (1 semestre). 81

    16 Percepo dos consumidores sobre os alimentos orgnicos nos supermercados de Fortaleza, em 2004 (2 semestre) 2005 (1 semestre).

    84

    17 Freqncia do consumo de alimentos orgnicos nos supermercados de Fortaleza, em 2004 (2 semestre) 2005 (1 semestre). 85

    18 Cadeia produtiva da bananicultura orgnica. Fonte: Adaptado de Custdio et al. (2001). 91

  • xi

    19 Centro de Abastecimento de Itapaj e feira livre semanal, em junho de 2005. 92

    20 Estrada municipal ligando o distrito de Soledade a Sede de Itapaj, em abril de 2005. 94

  • xii

    LISTA DE QUADROS

    p.

    1 Atuao dos rgos. 28

    2 Execuo dos Tratos Culturais Roo/Desfolha e Desbaste realizados anualmente pelos produtores de banana orgnica de Itapaj CE. 77

  • xiii

    LISTA DE TABELAS

    p.

    1 Produtividade mensal da AFMI versus permetros irrigados 73

    2 Custos e Receita da Banana Orgnica em Itapaj CE. 87

  • xiv

    LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

    AFMI Associao dos Fruticultores do Municpio de Itapaj

    APP rea de Proteo Permanente

    BNB Banco do Nordeste do Brasil

    CEASA Centrais de Abastecimento do Cear S.A.

    CODEVASF Companhia do Desenvolvimento do Vale do So Francisco

    CNPAT Centro Nacional de Pesquisa de Agroindstria Tropical

    CNPO Comit Nacional de Produtos Orgnicos

    CONAMA Conselho Nacional de Meio Ambiente

    DAR Deutscher Akkreditieungs Rat

    EMATERCE Empresa de Assistncia Tcnica e Extenso Rural do Cear

    EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria

    IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis

    IBD Instituto Biodinmico

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    INCRA Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria

    IOAS International Organic Accreditation Service

    IN Instruo Normativa

    JAS Japan Agriculture Standard

    NOP National Organic Program

    ONG Organizao No Governamental

    PPDU Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano

    SEBRAE Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas

    SEMACE Superintendncia Estadual do Meio Ambiente

    SUDENE Superintendncia de Desenvolvimento do Nordeste

    UFC Universidade Federal do Cear

    UECE Universidade Estadual do Cear

    USDA United States Department of Agriculture

    ZEE Zoneamento Ecolgico Econmico

  • xv

    SUMRIO

    p. 1 INTRODUO .............................................................................................. 14 1.1. O problema e sua importncia ............................................................... 14 1.2. Objetivos do trabalho .............................................................................. 17 1.2.1. Objetivo Geral ......................................................................................... 17 1.2.2. Objetivos especficos .............................................................................. 17 1.3. Estrutura do trabalho ............................................................................... 17

    2 REFERENCIAL TERICO ........................................................................... 19

    2.1 A sustentabilidade da agricultura orgnica ........................................... 19 2.1.1. A viso da economia ecolgica, do ecodesenvolvimento e do

    desenvolvimento sustentvel ................................................................ 19

    2.1.2. A agricultura orgnica sustentvel? ..................................................... 22 2.1.3. Construo de um modelo de agricultura orgnica ................................ 25 2.1.3.1. Contextualizao da agricultura orgnica ............................................ 26 2.1.3.2. A dimenso tica .................................................................................. 28 2.1.4. Abordagem conceitual da agricultura orgnica ....................................... 30 2.1.4.1. Economicamente vivel ....................................................................... 30 2.1.4.2. Ambientalmente sustentvel ................................................................ 31 2.1.4.3. Socialmente justa ................................................................................. 32 2.1.5. Certificao da agricultura orgnica ........................................................ 35 2.2. A fruticultura ............................................................................................. 40 2.2.1. Um pouco de histria: antecedentes da agricultura e da fruticultura

    cearense ............................................................................................... 40

    2.2.2. O crescimento da fruticultura cearense .................................................. 42 2.3. A bananicultura ........................................................................................ 43

    2.3.1. A bananicultura convencional ................................................................. 47

    2.3.2. Dimensionamento da bananicultura no Brasil e no mercado mundial .... 48 2.4. A bananicultura orgnica ........................................................................ 50

  • xvi

    3 METODOLOGIA ........................................................................................... 52 3.1. A rea de estudo ...................................................................................... 52 3.2. Fonte dos dados ...................................................................................... 56 3.3. Mtodos de anlise .................................................................................. 57 3.3.1. Anlise tabular e descritiva ..................................................................... 57 3.3.2. Anlise da viabilidade econmica ........................................................... 58 3.3.2.1. Receitas, custos e indicadores econmicos ........................................ 58

    4 RESULTADOS E DISCUSSO .................................................................... 64

    4.1. Produo de banana orgnica com o advento da criao da AFMI .... 64 4.1.1. Criao da Associao ........................................................................... 64 4.1.2. A produo de banana orgnica e a AFMI ............................................. 66 4.1.3. Mudanas aps a AFMI .......................................................................... 67 4.1.4. Produo de banana em Itapaj vis-a-vis o Estado ............................... 68 4.1.5. Dificuldades enfrentadas pela AFMI ....................................................... 71 4.1.6. Banana orgnica versus banana irrigada ............................................. 73 4.2. Anlise tcnica, social e ambiental da produo de banana orgnica de

    Itapaj ................................................................................................... 74

    4.2.1. Anlise tcnica: tratos culturais ............................................................... 74

    4.2.2. Anlise dos aspectos sociais .................................................................. 79

    4.2.3. Anlise dos aspectos ambientais ............................................................ 81 4.2.4. Uma ltima anlise: a viso do consumidor ............................................ 83

    4.3. Anlise econmica ................................................................................... 86 4.4. Aspectos relacionados s vantagens e desvantagens da produo e

    mercado da banana orgnica .............................................................. 90

    4.4.1. Vantagens ............................................................................................... 91 4.4.2. Desvantagens ......................................................................................... 93 5 CONCLUSO E SUGESTO ...................................................................... 95 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS................................................................ 98

  • 1 INTRODUO

    1.1. O problema e sua importncia

    Hoje com o advento dos produtos transgnicos, da produo agrcola em

    larga escala e o intenso consumo de alimentos enlatados, encontra-se, em debate, o

    uso de agentes qumicos no processo de produo e armazenamento desses

    produtos. A partir dessa constatao e oposto a esse movimento, percebe-se que

    crescente o nmero de pessoas que procuram ter uma alimentao mais saudvel e

    livre de agrotxicos.

    A agricultura brasileira depara-se diante do desafio de manter-se

    economicamente produtiva, tornar-se socialmente justa e adequar-se s exigncias

    da preservao ambiental. Com efeito, a agricultura orgnica assume hoje uma

    necessidade imposta, precisamente por uma sociedade que se torna cada vez mais

    exigente em consumir um alimento livre de produtos que possam prejudicar a sade.

    Indubitavelmente, desde o final da dcada de 1950, mudanas vm sendo

    efetuadas na agropecuria brasileira, precisamente no que tange agricultura.

    Neste contexto, os meios tcnicos e cientficos advindos durante e aps a Segunda

    Grande Guerra possibilitaram um avano significativo no campo da cincia,

    conseqentemente no da agricultura, que passou a se beneficiar de novas

    tecnologias de produo (tratores, irrigao, adubao qumica, previses

    meteorolgicas). Dessa forma, o conhecimento e a proviso de substncias

    qumicas impulsionaram vertiginosamente a comercializao dos agrotxicos e

    fertilizantes.

    Por conseguinte, transformaes importantes surgiram no espao

    agrcola: [...], de um lado, na composio tcnica do territrio pelos aportes macios

    de investimentos em infra-estruturas, e de outro lado, na composio orgnica do

    territrio [...]. Isso se d de forma paralela cientifizao do trabalho (SANTOS,

    1994, p.37). Com efeito, o aprimoramento e a conseqente facilidade dos produtores

    ao acesso destas tcnicas e ferramentas, tais como tratores, insumos modernos,

    implementos agrcolas, impulsionaram intensamente mecanizao da lavoura, no

    preparo do solo, colheita, armazenamento, transporte e beneficiamento de produtos

  • 18

    da agricultura. Ainda neste contexto, lado a lado ao avano da cincia, o

    aperfeioamento gentico das sementes e gros aprimorou tanto a conservao

    ps-colheita quanto o armazenamento dos produtos, contribuindo no avano

    cientfico e tecnolgico da produo agropecuria mundial, inclusive brasileira.

    De fato, a fruticultura cearense vem assumindo papel fundamental e

    essencial na agricultura, tanto para os grandes produtores quanto para os pequenos.

    As alteraes efetuadas ao longo dos ltimos anos possibilitaram um vertiginoso

    crescimento da fruticultura e das exportaes. No que tange comercializao de

    frutas, a taxa de exportao destes produtos cearenses atingiu o valor de US$ 24,8

    milhes para os pases da Europa (CEAR, 2005).

    luz disso, a bananicultura orgnica abriga uma excelente perspectiva de

    negcio para o Cear, visto que o mercado est cada vez mais exigente no que

    tange aos alimentos mais saudveis. A atividade da agricultura orgnica em Itapaj

    uma experincia inovadora, no obstante esta atividade j existir em outros

    municpios cearenses. So 16 produtores de banana orgnica que vm

    desenvolvendo esta atividade em meio a muitos problemas, tais como os de infra-

    estrutura, por exemplo, tanto no que diz respeito ao acesso s reas mais ngremes

    (rea serrana do Municpio) quanto precariedade das estradas, que prejudicam o

    escoamento da produo para os centros consumidores.

    Alm disso, outros fatores a exemplo da ineficincia de tratos culturais,

    ausncia da irrigao, incipiente reposio de nutrientes, acidentalidade do relevo,

    existncia de solos pedregosos, alm da considerao sobre a vida til produtiva e

    econmica do bananeiral, so fatores que influenciam na produtividade. Analisar

    todos esses aspectos constitui um ponto deveras importante para o bom

    desempenho da atividade, levando em conta concorrncia dos permetros

    irrigados. Uma vez que tais permetros possuem um grau maior de investimentos em

    insumos (adubos, fertilizantes qumicos), infra-estrutura, equipamentos e assistncia

    tcnica.

    O sistema de produo de alimentos orgnicos se contrape aos desafios

    impostos pela cultura de massa (produo agrcola em larga escala) e por uma

    concorrncia dura imposta pela modernizao e mecanizao hoje to enraizadas

    na agricultura. Trata-se de um sistema que procura evitar a degradao dos

  • 19

    recursos naturais e os impactos negativos sade humana, precisamente no que

    diz respeito ao uso de produtos qumicos to presentes na agricultura convencional.

    O presente estudo pretende contribuir com a disseminao da idia de

    uma agricultura voltada no somente para o comrcio, mas tambm para a prtica

    de uma agricultura sustentvel. Entendida como sendo aquela que preconiza a

    manuteno e o aumento da produtividade biolgica do solo, alterando o enfoque

    produtivo ao passar da relao nutrio de plantas/pragas/doenas, e suas reaes

    s tcnicas empregadas.

    Dessa forma, a rea de estudo est inserida num desses espaos, neste

    caso, em um dos territrios rurais voltados para a produo de banana orgnica no

    Cear, mais precisamente no Municpio de Itapaj. Trata-se de um dos maiores

    produtores de banana do Estado, caracterizado por uma intensa modificao no

    espao fsico em reas serranas, pela qual vem se fundamentando as

    transformaes da paisagem local em funo da bananicultura, sendo esta de

    sequeiro, suscetvel a mais pragas e doenas e menos produtiva no que concerne

    aos poucos investimentos.

    Portanto, evidencia-se a necessidade de um conhecimento integrado para

    a caracterizao da cultura da banana orgnica, a partir da determinao das

    conexes entre os aspectos naturais (uso do solo e da gua) e sociais (produtores e

    conseqente mo-de-obra) que vm se desenvolvendo em Itapaj. Tais conexes

    esto intimamente relacionadas com a interao entre os processos fsicos e

    humanos, pelas quais ficam evidenciados os riscos que envolvem a

    operacionalizao de aes que possam ultrapassar os limites ambientais da

    expanso da bananicultura.

    Desta forma, o estudo pretende analisar e descrever os aspectos

    tcnicos, econmicos, sociais e de aceitao no mercado consumidor da banana

    orgnica produzida no Estado do Cear, na perspectiva de sustentabilidade e

    crescimento desse setor.

  • 20

    1.2. Objetivos do trabalho

    1.2.1. Objetivo geral

    Descrever o processo de bananicultura orgnica praticada em Itapaj -

    Cear, analisando os aspectos sociais, ambientais e econmicos dos produtores

    desta cultura.

    1.2.2. Objetivos especficos

    a) Analisar a produo de banana orgnica com o advento da criao da

    AFMI1;

    b) Efetuar as anlises tcnica, social e ambiental e sob a ptica de

    aceitao do consumidor de banana orgnica produzida em Itapaj;

    c) Analisar a viabilidade econmica da atividade para os produtores

    associados AFMI;

    d) Discutir alguns aspectos relacionados s vantagens e desvantagens da

    produo e mercado da banana orgnica.

    1.3. Estrutura do trabalho

    Alm desta introduo e da concluso, o trabalho est dividido em

    captulos, mediante descrio abaixo.

    No captulo intitulado Referencial Terico, descreve-se brevemente, os

    pressupostos e as concepes da sustentabilidade da agricultura orgnica,

    abordando-se os passos necessrios para a certificao do produto orgnico,

    precisamente no que se refere produo de banana orgnica.

    1 Associao dos Fruticultores do Municpio de Itapaj.

  • 21

    No captulo de Metodologia tratam-se concisamente, dos mtodos

    utilizados para atender os objetivos propostos.

    No captulo Resultados e Discusso, so enfocados os aspectos que

    dizem respeito s caractersticas de produo da bananicultura, na tentativa de

    reunir informaes possveis identificao da problemtica do avano da cultura da

    banana em Itapaj, pelo meio da verificao dos aspectos tcnicos, econmicos,

    sociais e ambientais.

  • 22

    2 REFERENCIAL TORICO

    2.1. A sustentabilidade da agricultura orgnica

    A abordagem cientfica priorizada neste estudo est fundamentada nos

    pressupostos defendidos pela economia ecolgica, cuja proposta est baseada no

    desenvolvimento de uma economia global que respeite os limites estabelecidos pela

    sustentabilidade. Trata-se, tambm de uma Idia defendida por May (1995), em seu

    livro Economia ecolgica, e nas idias de Sachs (1993), - dentre outros que

    trazem a viso da sustentabilidade como uma proposta vivel, a partir da

    compreenso de suas cinco dimenses: ecolgica, social, espacial, econmica e

    cultural.

    Neste intuito, objetivo deste captulo trabalhar brevemente os

    pressupostos e concepes da sustentabilidade da agricultura orgnica, enfocando

    o processo de certificao dos produtos orgnicos, precisamente no que se refere

    produo da banana orgnica em Itapaj CE. Partindo dessa perspectiva, torna-se

    inegvel resgatar a discusso epistemolgica no que diz respeito produo

    orgnica.

    2.1.1. A viso da economia ecolgica, do ecodesenvolvimento e do desenvolvimento

    sustentvel

    O termo economia ecolgica entendido como sendo aquela que possui

    a incumbncia de buscar uma economia de bem-estar global dentro dos limites

    impostos pela sustentabilidade, fundamentando-se, portanto, em uma tica.

    Neste sentido, a economia ecolgica ou ecologia econmica conforme

    May (1995), uma nova rea transdisciplinar que busca melhoria da qualidade de vida

    e eqidade das sociedades humanas, atravs da conservao do uso racional do

    ambiente. , ento, uma busca pelo desenvolvimento sustentvel. Abrange,

  • 23

    portanto, duas grandes reas: a economia do meio ambiente e a economia dos

    recursos naturais.

    A economia do meio ambiente busca mostrar as alteraes e impactos

    da economia no meio natural. Como a poluio gerada por determinada atividade

    econmica. J a economia dos recursos naturais apresenta, por sua vez, os efeitos

    do meio ambiente sobre a economia. Defende a utilizao dos recursos naturais,

    uma vez que o nvel de utilizao deste recurso seja menor que sua capacidade de

    renovao. No seria, como alguns pensam um elemento limitador ou proibitivo de

    seu uso. No se trata, portanto, de uma preservao, mas sim de uma conservao

    do patrimnio ambiental.

    A intensa busca pela melhoria das condies de bem-estar, no se

    baseia somente no progresso material. Ela estaria ligada, de uma forma ou de outra,

    a uma srie de valores. Dentre estes, a natureza que deve representar uma das

    maiores preocupaes para os estudiosos da cincia econmica como um todo.

    Cavalcanti (1998) contra essa viso, ora oposta ao bom senso das

    cincias da natureza, que Henri Kendall prmio Nobel de Fsica observou em

    julho de 1994, em que o homem pela sua nsia de crescimento econmico,

    encontra-se em rota de coliso com o mundo da natureza. A partir da, seria

    preciso rever a compreenso da cincia econmica e penetrar a fundo na questo

    da sustentabilidade.

    Pode-se, ento, concluir que a preocupao com o meio ambiente e a

    percepo de que o crescimento futuro depender das condies ecolgicas

    preservadas, fizeram com que as metas ambientais estivessem presentes nas

    agendas polticas de todos os pases. No entanto, atingir tais metas significa, por

    vezes, retirar no curto prazo recursos econmicos de investimentos produtivos ou

    aumentar custos de produo presentes. Trata-se, ento, da garantia de um meio

    ambiente saudvel que exige sacrifcios de curto prazo e gera custos polticos

    elevados devido ao fato de que as sociedades relutam dessa deciso intertemporal

    de sacrificar o presente em troca de um futuro mais sustentvel.

    Garantir a execuo prtica dessas idias e a difuso da agricultura

    orgnica trabalhar no sentido de manter a economia ecolgica como um novo

    modelo a ser posta em evidncia e no simplesmente o da economia de mercado,

    baseado na busca incessante do aumento da produtividade e, conseqentemente,

    do lucro.

  • 24

    No que se refere ao termo desenvolvimento sustentvel, a viso de

    ecodesenvolvimento de Sachs (1993) estabelece que todo planejamento de

    desenvolvimento precisa levar em conta, simultaneamente, cinco dimenses da

    sustentabilidade:

    i) a dimenso social, objetivando uma civilizao mais eqitativa na

    distribuio da renda e reduzindo o fosso entre ricos e pobres;

    ii) a dimenso econmica, alocao e gerenciamento mais eficientes dos

    recursos, alm de fluxos constantes de investimentos pblicos e privados;

    iii) a dimenso ecolgica, limitao e substituio do consumo de

    combustveis fsseis e recursos no renovveis; da reduo dos resduos da

    poluio (conservao/reciclagem); autolimitao no consumo; fomento pesquisa

    para a obteno de tecnologias eficientes no uso dos recursos e baixa gerao de

    resduos, voltadas para o desenvolvimento urbano, rural e industrial;

    iv) a dimenso espacial, voltada para a obteno de uma configurao

    rural e urbana mais equilibrada e melhor distribuio territorial dos assentamentos

    humanos e das atividades econmicas;

    v) a dimenso cultural, busca de razes endgenas de processos de

    modernizao e de sistemas agrcolas integrados, traduzindo o conceito do

    ecodesenvolvimento em um conjunto de solues especficas para o local, o

    ecossistema, a cultura e a rea.

    Ehlers (1996, p.105) definiu a agricultura e o desenvolvimento rural

    sustentvel como:

    o manejo e a conservao dos recursos naturais, e a orientao da mudana tecnolgica e institucional, de maneira a assegurar a obteno e a satisfao contnua das necessidades humanas para as geraes futuras. Tal desenvolvimento sustentvel resulta da conservao do solo, alm de no degradar o ambiente, ser tecnicamente vivel e socialmente aceitvel (sic).

    Ainda segundo Ehlers (1996) a agricultura sustentvel :

    um sistema integrado de prticas de cultivo e de criao animal com aplicao local especfica que, no longo prazo, suprir as necessidades humanas de alimentos. Melhorar a qualidade do meio ambiente base dos recursos naturais da qual depende a economia agrcola. Far uso mais eficiente dos recursos no renovveis e integrar, quando apropriado, ciclos e controles biolgicos naturais. Sustentar ainda a viabilidade econmica

  • 25

    das exploraes agrcola e elevar a qualidade de vida dos agricultores e da sociedade como um todo (EHLERS, 1996. p.107)

    Essa idia elaborada pelo Departamento de Agricultura dos Estados

    Unidos, e aqui retratada, sintetiza a sustentabilidade econmica dessa atividade.

    Ademais, a vida do solo, o equilbrio de agroecossistemas, a diversidade

    e o uso intenso de matria orgnica so alguns dos aspectos que devem ser

    repensados em uma outra possibilidade de agricultura (DULLEY; CARMO, 1984

    apud CARMO; MAGALHES, 1999).

    Dessa forma, fazendo referncia ao termo agro-ecos-sistema,

    Ruscheinsky (2004, p.157) cita que:

    o conceito de agroecossistema visa estabelecer um elo entre biologia e antropologia, no qual contribuem ecologia, agronomia, sociologia e geografia. A separao dos termos agro eco sistemas no representa uma mera extravagncia lingstica, mas preconiza considerar tanto aspecto ligados cultura(agro), ao meio natural e biofsico(eco), como tambm s complexas interaes que se processam no tempo e no espao.

    2.1.2. Agricultura orgnica sustentvel?

    A idia de uma agricultura sustentvel ou orgnica como aquela que

    fosse capaz de garantir a melhoria da qualidade de vida, tanto da populao rural

    quanto da urbana, atravs da oferta de alimentos biologicamente sadios acessveis

    populao, isentos de agentes prejudiciais ao organismo humano, visando

    conservao do ambiente e o uso sustentvel dos recursos naturais hoje uma

    necessidade imposta no s pela sociedade mais consciente na conservao dos

    recursos naturais como igualmente exigente em consumir alimento livre de produtos

    que possam prejudicar a sade dos consumidores.

    A crise ambiental, mundialmente preocupante e difundida principalmente

    na conferncia no Rio de Janeiro (Conferncia das Naes Unidas sobre o Meio

    Ambiente e o Desenvolvimento UNCED) em 1992, especialmente a sua vertente

    paralela, o Frum Global, pela qual foram convocadas mais de 2.500 entidades

    ambientalistas de 150 pases, atraindo um pblico de aproximadamente 500 mil

  • 26

    pessoas e gerando 36 tratados ou compromissos de ao da sociedade civil

    planetria levou a um despertar profundo para a conscincia ecolgica, o que sem

    dvida nenhuma no deve e no pode mais ser desprezada.

    neste contexto que surge a preocupao de expor a idia de um

    desenvolvimento econmico que possa tambm garantir a manuteno da

    biodiversidade e do ambiente como um todo, garantindo as futuras geraes o

    acesso a esse precioso bem a vida. Rompe-se assim com a viso de um meio

    ambiente infinito e passa-se a estabelecer severos limites a um crescimento

    econmico contnuo pelo menos nos moldes em que este era (e ainda por

    muitos) trabalhado e que produziu um nmero incontvel de problemas ambientais:

    eroso do solo, poluio ambiental, efeito estufa, buraco na camada de oznio, uso

    indiscriminado de agrotxicos.

    A Lei n. 7.802, de 11 de julho de 1989, em seu artigo 2, define os

    agrotxicos como sendo:

    os produtos e os agentes de processos fsicos ou biolgicos, destinados ao uso nos setores de produo, no armazenamento e beneficiamento de produtos agrcolas, nas pastagens, na proteo de florestas, nativas ou implantadas, e de outros ecossistemas e tambm ambientes urbanos, hdricos e industriais, cuja finalidade seja alterar a composio da flora ou da fauna, afim de preserv-las da ao danosa de seres vivos considerados nocivos (BANCO DO NORDESTE, 1999, p. 9).

    A Lei n. 7.802 engloba, portanto, todos os produtos utilizados no combate

    as pragas e doenas das lavouras e animais denominando-os de defensivos, que

    sero chamados neste trabalho de agrotxicos. A referida Lei dispe sobre a

    pesquisa, experimentao, produo, embalagem, rotulagem, transporte,

    armazenamento, comercializao, propaganda comercial, utilizao, destinao final

    dos resduos e embalagens, registro, classificao, controle, inspeo e fiscalizao,

    importao, exportao e afins.

    Na prtica, no entanto, estes produtos so adquiridos com muita facilidade

    (sem receiturio agronmico), sendo largamente empregados, devido a sua

    aparente e rpida eficincia, o que tem levado ao seu uso indiscriminado,

    provocando at mesmo uma aplicao no rentvel do produto (superdosagem ou

    subdosagem), causando danos sade e ao meio natural.

  • 27

    Dessa forma, consoante Leis (1995), uma crise ecolgica global foi

    gerada, resultante da anarquia na explorao e gesto dos bens comuns da

    humanidade, por parte de atores polticos e econmicos orientados por uma

    racionalidade capitalista, individualista e instrumental. Neste sentido, essa

    chamada de discusso, para uma viso de bem comum, que provocou em Leis o

    questionamento de que o progresso do mercado no dever ser confundido com o

    progresso da humanidade. A partir dessa reflexo, pode-se perceber que a lgica de

    mercado dominante e presente em todos os setores da economia est igualmente

    presente no setor agrcola.

    O conceito de agronegcio caracteriza bem a tomada de direo seguida

    pela agricultura, o qual passou a ser visto como uma cadeia produtiva que envolve

    desde a fabricao de insumos, a produo nas fazendas, o beneficiamento e

    transformao dos produtos at o consumo.

    Essa complexa cadeia produtiva engloba desde a pesquisa e assistncia

    tcnica, crdito, produo, transporte, comercializao, exportao, industrializao,

    ou seja, todas as etapas do processo produtivo at chegar ao consumidor final,

    transformando a atividade em um elaborado sistema que leva a uma produo em

    grande escala, com o uso intenso de modernas tcnicas que favoream o

    incremento da produo e da produtividade. Prioriza-se assim, o mercado e no o

    consumidor.

    Dentro deste processo, tem-se o uso intensivo (para no se falar

    indiscriminado) de agrotxicos, com o objetivo de expandir a produtividade do setor,

    mas que levanta muita polmica pelos males que pode provocar no meio ambiente e

    ao homem, apontando como elemento preocupante o seu uso indiscriminado e

    excessivo, intoxicaes, contaminao do ar, solo e gua, leses qumicas, dentre

    outros. Ruegg conclui que:

    o homem do campo ficou completamente a margem do programa do desenvolvimento econmico; foi considerado apenas como uma pea mecnica, substituvel e de baixo custo. Este grave impacto social deve ser corrigido com a modificao das linhas de ao e com a conscientizao de toda a populao para os diversos problemas ligados aos agrotxicos (1986, p.8).

  • 28

    2.1.3. Construo de um modelo de agricultura orgnica

    A agricultura orgnica possui algumas particularidades em relao s

    demais propriedades agrcolas, por possuir basicamente o seguinte perfil: o tamanho

    da propriedade; a utilizao de mo-de-obra que basicamente em regime de

    economia familiar; a renda da famlia oriunda principalmente da propriedade; e,

    pelo fato desta residir na propriedade ou prxima dela. Este perfil, leva a uma

    confrontao com as caractersticas encontradas na chamada agricultura familiar,

    onde conforme o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura PRONAF,

    criado pelo governo em 1996 e citado por Gnoato (2000), so considerados

    agricultores familiares todos aqueles que exploram a terra na condio de

    proprietrios, assentados, posseiros, arrendatrios ou parceiros.

    De fato, a agricultura orgnica bem modesta, frente ao volume

    produzido pela agricultura familiar, pois em conformidade com o Instituto Brasileiro

    de Geografia e Estatstica - IBGE -, em seu Censo Agropecurio de 1985, citado por

    Silva (1998):

    os estabelecimentos de at 100 hectares, onde se presume estejam concentrados os estabelecimentos de agricultura familiar, as reas somadas correspondem na poca cerca de 21% do total e respondiam por uma parcela significativa da produo do Pas, ou seja, 87% da mandioca, 79% do feijo, 69% do milho, 66% do algodo, 46% da soja, e 37% do arroz produzido e 26% do rebanho bovino (SILVA, 1998, p.06)

    Pretende-se com isso, apresentar a terra frtil, que a agricultura

    orgnica tem para se desenvolver, tendo em vista que os agricultores familiares so

    potencialmente possveis e futuros agricultores e ou produtores orgnicos.

    A flexibilidade de adaptao a diferentes processos de produo e a

    variedade de fontes de renda (diversificao da propriedade e da renda) torna a

    agricultura familiar indispensvel na economia regional e nacional, desde que essas

    estejam consolidadas para isso.

    Com efeito, essa agricultura familiar apresenta a grande capacidade de

    absorver mo-de-obra e transform-la numa alternativa socialmente desejada,

    economicamente produtiva e politicamente correta para evitar grande parte dos

  • 29

    problemas sociais urbanos derivados do desemprego rural e da migrao

    descontrolada na direo campo-cidade (BRASIL, 1996). Esse outro ponto que

    vem ao encontro da agricultura orgnica.

    Neste contexto, a maioria dessas famlias carente financeiramente,

    tendendo a ser relativamente pobre, desnutrida, ou at subnutrida em parte do ano

    ou durante o ano todo. Entretanto, um ponto negativo o fato de que muitos desses

    trabalhadores e produtores rurais no se capacitam e assim no inovam na

    explorao de sua capacidade de trabalho, da terra e do prprio mercado carente

    por produtos mais confiveis e verdadeiramente mais saudveis.

    As dificuldades encontradas neste tipo de agricultura de pequena escala,

    podem ser atribudas em muitos pases em desenvolvimento, por exemplo, no Brasil,

    falta de agilidade no levantamento e aplicao de recursos financeiros pelos

    rgos de pesquisa, planejamento e de extenso, o que quase sempre no

    possibilita aquele sucesso to esperado pelo produtor, levando-o ao desestmulo e

    ao abandono da atividade, ou desenvolvendo uma produo rudimentar e sem

    criatividade.

    Neste sentido, para que o processo de desenvolvimento agrcola ocorra de

    forma satisfatria e efetiva, faz-se necessrio ter relaes interativas reais entre os

    produtores, os rgos de extenso rural, as organizaes no-governamentais, as

    firmas comerciais, alm de um envolvimento prioritrio entre entidades de pesquisa

    e de planejamento. A interao imprecisa e incompleta entre estes rgos prejudica

    o sucesso do desenvolvimento agrcola.

    2.1.3.1. Contextualizao da agricultura orgnica

    Este trabalho est fundamentado tambm na preocupao com a questo

    ambiental e com o avano significativo sobre as reas ainda verdes, alm do

    estabelecimento de novos padres alimentares que condicionaram mudanas nos

    sistemas de produo da agricultura e da sociedade dita moderna, que passou a

  • 30

    consumir uma gama infindvel de produtos com um total desconhecimento de sua

    procedncia. Preocupa-se tambm com as importantes transformaes das

    estruturas socioeconmicas do meio rural cearense, precisamente em Itapaj.

    Com a misso de elaborar normas para a agricultura orgnica no Brasil,

    foi criado o Comit Nacional de Produtos Orgnicos (CNPO), em 1995, com uma

    composio paritria formada por representantes do Governo (Ministrio da

    Agricultura, do Ministrio do Meio Ambiente, da Empresa Brasileira de Pesquisa

    Agropecuria EMBRAPA), de ONGs das cinco regies do Pas que trabalham com

    agricultura orgnica e de universidades.

    A partir desse estudo, foi publicado a Instruo Normativa (IN) n. 07/99,

    estabelecendo normas de produo, tipificao, processamento, envase,

    distribuio, identificao e certificao de qualidade para os produtos orgnicos de

    origem animal e vegetal. Estabelece ainda os critrios de utilizao de mquinas e

    equipamentos, manejo de pragas, doenas e plantas invasoras, critrios para

    adubao do solo, atravs da orientao e do fornecimento de uma lista com os

    adubos e condicionantes do solo permitidos; lista ainda os insumos que podem ser

    adquiridos fora da propriedade, alm do estabelecimento de regras para a

    converso do sistema convencional ou tradicional para o orgnico. Refere-se

    tambm aos aditivos e outros produtos permitidos para o beneficiamento de

    orgnicos, s normas para armazenamento e transporte e quela relativa

    rotulagem e identificao do produto.

    Dessa forma, ainda conforme a IN n. 07/99, o controle e a qualidade dos

    produtos orgnicos de competncia e responsabilidade das instituies

    certificadoras, as quais devem ser certificadas, reconhecidas como pessoa jurdica,

    sem fins lucrativos e com sede no territrio nacional, (SOUSA, 2003).

    Conforme o Quadro 1, no que tange competncia e atuao dos rgos

    colegiados, a respeito das esferas de poder (estadual e federal), em que se ficam

    definidos, atravs da IN n. 07/99, a anlise, normatizao, disciplinamento e o

    credenciamento de uma instituio certificadora, tem-se:

  • 31

    Quadro 1 Atuao dos rgos

    Colegiado Composio Competncia

    Nacional

    paritria, com cinco membros

    (titulares e suplentes), de organizaes

    governamentais e, cinco membros

    (titulares e suplentes) de organizaes

    no-governamentais, representando as

    cinco regies do pas.

    1. Fiscalizar os Colegiados Estaduais

    e do Distrito Federal;

    2. Realizar o credenciamento das

    agncias certificadoras que podero

    atuar no pas;

    3. Zelar pelo cumprimento das normas

    para agricultura orgnica

    estabelecidas pela IN 07/99.

    Estadual e do Distrito

    Federal

    paritria, com cinco membros

    (titulares e suplentes), de organizaes

    governamentais e, cinco membros

    (titulares e suplentes) de organizaes

    no-governamentais, com atuao

    reconhecida pela sociedade.

    1. Fiscalizar as certificadoras locais;

    2. Fazer encaminhamento dos

    pedidos de registro das certificadoras

    ao Colegiado Nacional.

    Fonte: Brasil, 1999.

    Foi a Instruo Normativa n. 06/02, publicada em janeiro de 2002, que

    aprovou os glossrios de termos empregados no credenciamento, certificao e

    inspeo da produo orgnica, determinando tambm os critrios de

    credenciamento de entidades certificadoras de produtos orgnicos no Pas, alm

    dos procedimentos para inspeo e certificao (BRASIL, 2002).

    2.1.3.2. A dimenso tica

    O Brasil, historicamente conhecido como o pas dos latifndios (PIFFER,

    2001), tem igualmente demonstrado na prtica uma tendncia clara e notria no que

    diz respeito aos apoios inegveis para os grandes empreendimentos, no s na

  • 32

    atividade secundria, mas igualmente no setor primrio: desde a pecuria, o

    extrativismo e, em especial, a agricultura. Assim:

    [...] o desenvolvimento crescente das foras produtivas capitalistas, responsveis pelas grandes produes agrcolas, tem determinado a transformao de grandes latifndios tradicionais em modernas empresas capitalistas e, no que diz respeito pequena produo familiar, tem definido duas categorias distintas: a produo familiar tecnificante e a produo familiar marginalizada (CHANG MAN YU, 1988, p.37 apud RIBEIRO, 1993).

    O processo vivido por estas grandes propriedades rurais de monoculturas,

    exportadoras e hoje, na grande maioria, mecanizadas (tecnificadas), impossibilitou

    uma absoro da fora de trabalho ociosa que foi expulsa ou engolida por estes

    grandes empreendimentos, auxiliando na segregao de muitas propriedades

    familiares e de seus donos, tornando-os proletarizados ou simplesmente excludos e

    expulsos do campo. O processo clssico de diferenciao, citado por Lnin (1979),

    defende que um reduzido e insignificante nmero de pequenos produtores

    enriquecem, enquanto a imensa maioria se arruna completamente, transformando-

    se em trabalhadores assalariados ou pauprrimos e passa a viver eternamente no

    limite na condio de proletrios. Tudo leva a pensar que de l para c, talvez pouco

    se tenha feito para mudar esse quadro.

    Desta forma, o produtor que no dispuser de meios para aumentar sua

    produtividade de trabalho, ser marginalizado e entrar em processo de decadncia

    at a extino social, enquanto produtor autnomo, uma vez que este se torna um

    simples vendedor de sua fora de trabalho. Com efeito, a reverso deste quadro

    est baseada na assistncia destinada aos pequenos agricultores no sentido de

    melhorar seu padro de vida, buscando no somente o benefcio a sua famlia, mas

    o conseqente benefcio sociedade como um todo.

    O aumento gradual da populao tem igualmente levado a um aumento

    (explorao) do uso inconseqente das propriedades agrcolas, tornado-as

    insustentveis e ambientalmente degradadas (por exemplo, fadiga do solo e falta de

    nutrientes). Essa ao nociva e predatria poder por em risco a segurana

    alimentar e/ou a inviabilidade econmica futura, da recuperao posterior dessas

    reas. Mesmo tendo j identificado o problema, devido s circunstncias mais

    urgentes, de produzir o bsico para sobreviver, os agricultores so forados pela

  • 33

    lgica do mercado a abandonar as medidas que garantiriam a sustentabilidade em

    longo prazo. Deve-se considerar ainda a qualidade inferior dos solos da maioria

    destes sistemas e sua maior vulnerabilidade degradao.

    De fato, o conjunto de tcnicas utilizadas pelos pequenos agricultores

    (como o consrcio de cultura, utilizado primeiramente por necessidade e que

    comprovou ser altamente sustentvel) dos pases em desenvolvimento, e o seu

    distanciamento da presso mercadolgica possibilitam a minimizao dos riscos.

    Isto se deve ao fato de que suas unidades no so somente de produo, mas

    tambm so de consumo. H, portanto, uma cumplicidade, uma espcie de

    parceria, um casamento tico de quem est produzindo com aquele que o

    grande motivador da construo desse processo o consumidor. Ambos, produtor e

    consumidor, esto presentes na busca pela qualidade do que est sendo produzido.

    2.1.4. Abordagem conceitual da agricultura orgnica

    2.1.4.1. Economicamente vivel

    A agricultura sustentvel traz, em si, um conjunto de objetivos que

    alcanar um sistema produtivo de alimentos e fibras, garantindo aos agricultores um

    grande desenvolvimento agrcola, meta de qualquer pequeno, mdio ou grande

    produtor. Desta forma, o objetivo da agricultura sustentvel chegar a uma

    produtividade agrcola, com o mnimo de impactos ambientais e com retornos

    econmicos adequados, sem perder de vista os seus princpios.

    Com relao ao exposto, o modelo da agricultura orgnica aclamado

    como economicamente vivel, pois alm de minimizar os danos ambientais e

    aumentar a produtividade, possibilita um rendimento extra pelo valor que hoje so

    pagos em relao ao produto convencional. No obstante essas consideraes,

    sabe-se que o sistema de produo orgnico dificilmente atinge a mesma

    produtividade do sistema convencional. Em conseqncia, tem-se, por exemplo, os

  • 34

    pequenos produtores que acabam lanando mo deste modelo de agricultura em

    funo dos custos e de um retorno a longo prazo no que concerne rentabilidade.

    Paradoxalmente, o processo de transformao do espao rural est sendo

    caracterizado por melhoria da eficincia tcnico-econmico, que leva a uma melhor

    utilizao da capacidade produtiva da terra a um menor custo de produo; pelo

    emprego de tecnologias limpas, com uma dependncia menor de agrotxicos,

    levando a um aprimoramento da qualidade dos produtos e ainda pelo aumento da

    renda rural atravs da agregao de valor a seu produto final.

    2.1.4.2. Ambientalmente sustentvel

    A agricultura orgnica, at a dcada de 1970, era tida como primitiva,

    retrograda, improdutiva e sem valor cientfico, o que fica evidente nesta frase do

    secretrio da agricultura dos Estados Unidos da Amrica, Earl Buts (1971), citado

    por Ehlers (1996 p.107):

    [...] se necessrio, podemos retroceder para a agricultura orgnica neste pas, pois sabemos como pratic-la. No entanto, antes de ir nesta direo, algum precisa decidir quais sero os cinqenta milhes de norte-americanos que morrero de fome.

    Entretanto, os Estados Unidos chegaram na dcada de 1980 colocando

    como prioridades em sua agricultura o trip: produo, conservao ambiental e

    viabilidade econmica. No obstante, isto na prtica ter sido pouco efetivamente

    implantado.

    A partir da, surgiram novas tcnicas, novos modelos de produo

    baseados no pressuposto da sustentabilidade (tanto econmica quanto ambiental),

    palavra esta que at ento tinha pouco significado. Essa mudana provocada pela

    noo de sustentabilidade repercutiu tambm na poltica agrcola norte-americana.

    Assim, buscou-se reduzir a quantidade de agrotxicos, o desmatamento

    descontrolado, as queimadas, a salinizao dos solos, a poluio das guas, a

    diminuio da biodiversidade e, finalmente, a contaminao dos homens, do solo,

    plantas e animais. Todos estes elementos, importantes para garantir a

  • 35

    sustentabilidade dos recursos naturais to importantes ao homem, passaram a ser

    perseguidos por muitos produtores. No obstante toda a evoluo cientfica e

    tecnolgica pela qual passou a agricultura, esta ainda continua dependendo dos

    recursos naturais.

    Segundo Altiere (2001), um agroecossistema considerado

    insustentvel quando causa: reduo da capacidade produtiva provocada por

    eroso ou contaminao dos solos por agrotxicos; reduo da capacidade

    hemeosttica, tanto nos mecanismos de controle de pragas como nos processo de

    reciclagem de nutrientes; reduo na capacidade evolutiva do sistema, e funo da

    eroso gentica ou da homogeneizao gentica provocada pelas monoculturas;

    reduo da disponibilidade e qualidade de recursos que atendam s necessidades

    bsicas (acesso a terra, gua, etc); reduo da capacidade de utilizao adequada

    dos recursos disponveis, principalmente no que se refere ao emprego de

    tecnologias temporrias.

    2.1.4.3. Socialmente justa

    A visualizao de uma atividade econmica, como a agricultura orgnica,

    s poder se perceber sustentvel, se incorporar em seus conceitos e valores o

    desejo da extino da misria na agricultura. Neste contexto, so muitos os fatores

    sociais que precisam ser, verdadeiramente, analisados.

    Segundo Magnant (1999), alm dos aspectos da mo-de-obra poderiam

    ser citados: valorizao monetria que os produtos recebem por terem sido

    beneficiados, levando ao aumento de renda dessas famlias; contribuio para a

    fixao das famlias no meio rural, livrando-as do caos e dos graves problemas

    sociais urbanos; as melhorias das condies de infra-estrutura no meio rural que so

    necessrias para o escoamento e beneficiamento da produo (estradas, energia

    eltrica e outros), que garantem uma qualidade de vida melhor para essa populao

    rural; melhoria da formao profissional dos agricultores para enfrentar os desafios

    de produo e beneficiamento dos produtos, possibilitando uma mo-de-obra

    qualificada e com possibilidade de melhores ganhos e de maiores inovaes na

    agricultura por eles praticada; fornece uma entrada monetria constante durante

  • 36

    todo o ano, equilibrando a renda dos agricultores; descentraliza a

    agroindustrializao, permitindo a participao ativa dos agricultores e a

    consolidao de estruturas democrticas e participativas no meio rural.

    Tm-se ainda as seguintes perspectivas de ganhos sociais no

    desenvolvimento dessas atividades: a segurana alimentar que deve ser parte

    integrante de um modelo socialmente justo, pois torna efetivo um direito elementar

    de toda pessoa humana: o direito a alimentao; persegue-se ainda o da

    alimentao saudvel, direito sagrado do consumidor; o decrscimo no nmero

    absoluto de pobres vivendo na zona rural o que no deve esconder o fato de que os

    mais elevados ndices de pobreza localizam-se ainda nas reas rurais, notadamente,

    na regio Nordeste; o desenvolvimento de uma famlia saudvel e bem alimentada;

    a diminuio do xodo rural, tendo em vista que, em funo da agricultura familiar,

    visivelmente, ocorre uma tmida fixao do homem no campo, opondo-se ao fluxo

    migratrio vigente, em que grande parcela da populao rural pobre vem migrando

    para as grandes cidades e metrpoles.

    Constituindo um fator que, segundo Maluf (1999), trata-se da

    urbanizao da pobreza, isto , a populao pobre passou a concentrar-se, em

    nmero cada vez maior, nas reas urbanas, em decorrncia do elevado xodo rural

    e o grau de urbanizao que caracterizam os centros urbanos brasileiros.

    Valendo-se da definio constante do documento brasileiro Cpula

    Mundial de Alimentao, citado por Maluf (1999, p.04), entende que,

    segurana alimentar significa garantir, a todos, condies de aceso a alimentos bsicos de qualidade, em quantidade suficiente, de modo permanente e sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, com base em prticas alimentares saudveis, contribuindo, assim, para uma existncia digna, em um contexto de desenvolvimento integral da pessoa humana.

    Pode-se afirmar que os elevados ndices de pobreza e as situaes

    agudas de insegurana alimentar presentes no mundo rural brasileiro devem-se, em

    larga medida, s precrias condies de reproduo da agricultura de base familiar e

    insuficincia da renda auferida pelas famlias rurais nas diferentes fontes de que

    podem dispor (trabalho agrcola e no agrcola, os rendimentos previdencirios, etc).

    H, portanto, um entrelaamento entre o campo e a cidade. Um elo de fortes

    ligaes gera a possibilidade de que uma ao errnea em um, leve conseqncias

  • 37

    srias no s para si, mas tambm ao outro. Assim, como a recproca tambm seria

    verdadeira.

    Hennrich (2000, p. 97) conclui que:

    papel das administraes municipais, individualmente ou em conjunto, das organizaes governamentais e no governamentais que atuem de forma local ou regional, exera um papel ativo na promoo do desenvolvimento do prprio municpio e da regio em que esto inseridos, considerando principalmente as atividades desenvolvidas pela agricultura familiar, com intuito de assegurar a qualidade de vida rural e urbana dos municpios, regies e conseqentemente do Pas.

    O fortalecimento da agricultura orgnica passa a ser um projeto de vida

    para o agricultor, uma nova forma de busca de identidade social e de viabilizao de

    empregos e renda para permanncia de jovens no campo, contribuindo para a

    reduo do xodo rural e, conseqentemente, do caos urbano.

    O trabalho associativo ou em cooperativas de produtores tem-se

    mostrado eficaz na organizao da agricultura familiar. O desenvolvimento da

    agricultura sustentvel, em especial a consolidao da agricultura orgnica, atravs

    da sua produo, comercializao pelos agricultores familiares um dos elementos

    chaves que as organizaes dos agricultores familiares devem absorver em sua

    prtica cotidiana para a construo de uma nova proposta de desenvolvimento

    sustentvel.

    Referindo a agricultura familiar, Castilhos e Coletti (1999, p.27) destacam

    que: [...] a unificao destas entidades viabilizaria um projeto de desenvolvimento

    da agricultura familiar, pois nenhuma organizao sozinha conseguir efetivar tal

    proposta.

    As aes a favor dos agricultores familiares devem ser concretas, a partir

    de planos de ao de desenvolvimento sustentvel nas microrregies e municpios.

    Referindo-se a organizao dos agricultores do sul do Brasil, Castilhos e

    Coletti (1999) destacam ainda que, para que ocorra uma nova organizao da

    agricultura, deve-se construir uma representao que: i) estimule a organizao da

    base; ii) crie e promova a identidade dos agricultores; iii) concentre foras na luta

    contra o neoliberalismo; iv) crie oportunidades concretas, como novos projetos

    voltados para o desenvolvimento rural.

    As idias de Castilho e Coletti (1999) podem muito bem ser aplicadas aos

    agricultores que lidam com a agricultura orgnica e em qualquer regio do Brasil,

  • 38

    pois se trata da necessidade que qualquer pequeno produtor possui que estar

    unido a uma entidade forte e organizada.

    2.1.5. Certificao da agricultura orgnica

    A definio legal de produto orgnico um requisito para que os produtos orgnicos ocupem o setor formal de distribuio de alimentos, particularmente por agregar confiabilidade e permitir o enquadramento na legislao de proteo do consumidor. A certificao da produo orgnica, a exemplo da de sementes, visa a garantir a qualidade do produto, dentro dos critrios estabelecidos em lei (KHATOUNIAN, 2001, p.46).

    A certificao um processo em que fica asseverado que o

    produto/alimento cumpriu as exigncias. A certificao de produto orgnico, atravs

    do selo, garante ao consumidor que o alimento foi produzido, inegavelmente, base

    de uma agricultura sem contaminantes qumicos, pautado numa atividade agrcola

    sustentvel.

    Registra-se, na dcada de 1980, a primeira certificao de produtos

    orgnicos no Brasil, no obstante presena da cooperativa COOLMIA, em 1978,

    na organizao de parmetros que seriam adotados posteriormente por outras

    instituies como: Associao de Agricultores Biolgicos AABIO no Rio de janeiro

    em 1984; Associao de Agricultura Orgnica AAO em 1996, So Paulo;

    Associao de Agricultura Natural de Campinas e Regio ANC, a Associao dos

    Produtores de Agricultura Natural APAN e a Fundao Mokiti Okada MOA.

    Em 17 de maio de 1999, a Instruo Normativa n. 007/99, entra em vigor

    a respeito da certificao da produo orgnica, objetivando estabelecer as normas

    disciplinadoras de produo, tipificao, processamento, envase, distribuio,

    identificao e certificao de qualidade para produtos orgnicos de origem, tanto

    animal quanto vegetal.

    Mesmo assim, adicionalmente, os padres de certificao orgnica devem

    sempre estar em concordncia com as normas que so estabelecidas pela

    International Federation of Organic Agriculture Movements IFOAM, o rgo que

    credencia internacionalmente as certificadoras. Criado em 1972, trata-se de uma

    federao internacional que congrega os diversos movimentos relacionados com a

    agricultura orgnica.

  • 39

    Estabelecido em 1990, dentre as instituies certificadoras, o Instituto

    Biodinmico - IBD a nica certificadora totalmente brasileira. Com sede em

    Botucatu SP, a mais antiga instituio certificadora de orgnicos do Brasil

    monitorada por quatro organizaes internacionais: IOAS International Organic

    Accreditation Service (IFOAM Acccreditation); DAR Deutscher Akkreditieungs Rat

    (EM 45011/ISO 65); USDA United States Department of Agriculture (NOP

    National Organic Program), e DEMETER INTERNATIONAL.

    O IBD tem um grupo tcnico, formado por inspetores (com representantes

    em quase todos os estados do Brasil), ministrando cursos internos a cada seis

    meses, com palestras de especialistas e com os contedos tcnicos de auditoria, o

    que confere aos inspetores do IBD um nvel tcnico superior.

    De modo geral, trata-se de uma instituio sem fins lucrativos, em que os

    resultados alcanados pela instituio so reinvestidos no setor orgnico atravs de

    pesquisas nesta rea, divulgao e crescimento da atividade no Brasil e no exterior.

    Desta forma, garante ao consumidor, atravs dos selos IBD Orgnico (Figura 1) e

    DEMETER a certeza de estar consumindo um produto saudvel e livre de agentes

    contaminantes e prejudiciais a sade e ao meio ambiente. Permite que os pequenos

    produtores possuam maior organizao, desenvolvimento na atividade e

    comercializao de sua produo.

    Figura 1 - Selo de qualidade, certificado orgnico - IBD. Fonte: Instituto Biodinmico, 2005.

    Neste sentido, a prtica da agricultura orgnica exige a no utilizao de

    adubos solveis e de agrotxicos nos ltimos trs anos, alm da existncia de

    barreiras vegetais quando h vizinhos que praticam a agricultura convencional, bem

  • 40

    como a qualidade da gua a ser utilizada na irrigao e na lavagem dos produtos; as

    condies de trabalho e de vida dos trabalhadores; o cumprimento da legislao

    sanitria, ambiental e trabalhista; a no existncia de lixo espalhado pelo

    estabelecimento e o tratamento no cruel para com os animais de criao.

    O processo de certificao deste instituto, a saber: 1 Etapa, compe-se

    de uma matrcula, junto empresa e da assinatura do contato de inspeo com o

    IBD; 2 Etapa, quando ocorrem as visitas dos inspetores, que tm a funo de

    orientar e fiscalizar todo o processo de produo, bem como realizar as coletas de

    material para anlises (solos, vegetais e da gua); e a 3 Etapa, aps o trmino da

    inspeo produzido um relatrio, onde so registrados todos os dados da rea, do

    produto e at do agricultor e ou produtor.

    Dentro desse processo, o IBD inspeciona, praticamente, todos os

    produtores na primeira certificao da rea e, ainda, reinspeciona os produtores que

    apresentam alguma deficincia a ser sanada, dentro dos critrios para produo

    orgnica.

    Aps observar estes procedimentos metodolgicos, o IBD motiva dentro

    do grupo de produtores um controle interno que orienta os produtores na soluo

    dos problemas levantados durante a inspeo. Pode ser formado por integrantes do

    grupo ou ser terceirizado. Tambm so checados os parmetros sociais, tais como:

    renda familiar, condio de habitao, acesso educao. Assim, o processo de

    converso do sistema convencional para o sistema orgnico leva normalmente cerca

    de dois anos para ser completamente concludo. Estando tudo em conformidade,

    recebe certificao de produto orgnico, passando a exibir o selo do IBD.

    Um fato relevante a ser considerado neste processo so os custos de

    certificao, segundo informaes IBD (2004), compreende uma mdia de R$

    100,00 / produtor / ano, somando-se todos os custos com 100% de visitas (o que

    compreende a primeira inspeo realizada para se visitar todos os produtores do

    grupo), e de R$ 30,00 / produtor / ano, quando so realizadas visitas por

    amostragem.

    Os custos do processo de certificao esto dispostos dentro de quatro

    tipos (matrcula, inspeo, anlise e certificao) variando de acordo com o tipo de

    procedimento, podendo ser: padro quando formado por um projeto individual; e,

  • 41

    o da agricultura familiar quando congrega um grupo de pequenos produtores, o

    que barateia muito os custos. Esta queda no custo deve-se a misso do IBD que a

    de fomentar a agricultura familiar orgnica. Os custos elencados e fixados pelo

    mencionado instituto so necessrios para o processo de certificao, obedecendo

    ao longo da safra anual o tipo (matrcula, inspeo, anlises e a emisso do

    certificado orgnico), a taxa e a freqncia.

    O custo de inspeo envolve todas as despesas de viagem (transporte,

    hotel e refeies) do inspetor. Da o seu carter varivel, pois depende da distncia

    entre o inspetor e o projeto a ser analisado e do tempo de sua permanncia no local.

    Para tanto, o IBD possui inspetores desde o Rio Grande do Norte at o Rio Grande

    do Sul. Estas despesas podero ser excludas do oramento se a companhia

    garantir providenciar estes itens. Neste clculo entra tambm o valor da diria do

    inspetor: de R$ 650,00 (para projetos de exportao) e de R$ 400, 00 (para projetos

    do mercado interno), alm de um valor extra (meia diria) para a emisso do

    relatrio final. H um custo extra neste processo que o da inspeo surpresa,

    calculado em 50% do valor normal. realizada uma vez por ano, em caso de

    olericultura e na produo de leite ou solicitada pelo produtor (IBD, 2004).

    Outro parmetro a ser observado o custo laboratorial, para a realizao

    das anlises de amostras de solo, da gua utilizada e at de vegetais. Este

    procedimento utilizado antes da liberao da rea para o plantio de orgnicos, com

    o objetivo de confirmar a ausncia de resduos txicos. Os custos dessas anlises

    podem ser previamente obtidos pelo agricultor junto ao IBD.

    E, finalmente, tem-se o custo para a emisso do certificado orgnico, entre

    0,5% a 1% do valor faturado e dever ser pago sempre que o embarque exigir

    certificao. Trata-se do documento que acompanha o embarque de cada produto

    (em caso de exportao). Descreve o peso, o volume e tipo de produto, bem como

    as demais informaes tcnicas.

    Dentro do mercado interno, o valor calculado com base no total de

    produto certificado vendido pela empresa, no possuindo a necessidade de emitir

    certificados especficos para cada embarque. O comprador recebe o certificado

    (anual) de produto orgnico. Esta taxa pode ser reembolsada caso o produto

    exportado sofra avarias durante o transporte e o produtor no receba o que foi

    acertado ou ainda se houver uma quebra entre o valor acertado e o da quantidade

  • 42

    produzida naquela safra. O valor cobrado, para a referida taxa de matrcula,

    acompanha o faturamento anual da empresa ou o grupo de produtores (caso de

    uma associao) estando os referidos valores dispostos da seguinte forma, segundo

    dados disponibilizados pelo IBD (2004).

    Como se trata de uma entidade sem fins lucrativos, o IBD apia entidades

    que no possuem condies financeiras para atuar na rea de produo orgnica e

    desejam iniciar o processo de certificao. Ademais, o incentivo dado a partir de um

    repasse mensal Associao de Agricultura Biodinmica, passa (dentro de sua

    disponibilidade) a disponibilizar consultores para auxiliar de forma gratuita ou a baixo

    custo os produtores que esto enquadrados no prazo de certificao compreendido

    entre um a dois anos. Dentro desse perodo traado um cronograma de reembolso

    do valor que deveria ter sido pago pelo produtor. Este valor, em seguida

    reinvestido em outras instituies com os mesmos problemas financeiros. H

    tambm a possibilidade do IBD dividir o custo total do processo de certificao, em

    doze parcelas fixas mensais, para facilitar o pagamento.

    O IBD certifica atualmente dentro do territrio brasileiro, os seguintes

    produtos: acar, algodo, cacau, caf, castanha de caju, cereais, farinha, arroz,

    trigo, ch, cogumelo, erva mate, extratos fitoterpicos, ervas medicinais, fcula de

    mandioca, feijo, abacaxi, acerola, banana, citrus, coco, goiaba, kiwi, manga,

    maracuj, melo, morango, uva, frutas desidratadas, gado de corte, gado de leite e

    laticnios, gelias, gengibre, guaran, horticultura, mel, leo de babau, leo de

    girassol, leos essenciais, palma de dend, palmito, polpa de frutas, sementes para

    horticultura, soja e urucum.

    Em seu processo de certificao, o referido instituto trabalha com o que

    chama de grupo de produtores homogneos. Compe-se de um grupo constitudo

    por produtores com o mesmo perfil (frutas e gros). Trata-se de um trabalho

    direcionado, basicamente, a pequenos produtores, os quais devem estar

    organizados e representados por alguma entidade, seja associao, cooperativa,

    organizao nogovernamental, dentre outras.

  • 43

    2.2. A fruticultura

    De modo geral, alm das consideraes acerca da agricultura orgnica,

    parece oportuno tratar brevemente sobre a expanso da fruticultura cearense para

    se entender os processos que norteiam a produo da bananicultura em Itapaj.

    Antes de entrar na abordagem da produo de banana orgnica, faz-se

    necessrio por em discusso alguns dos aspectos da fruticultura, uma vez que: as

    fruteiras ocupam reas poucos expressivas, mas tm grande importncia porque

    tanto fornecem o alimento ao agricultor como bons preos nas feiras [...]

    (ANDRADE, 1988, p. 53).

    2.2.1. Um pouco de histria: antecedentes da agricultura e da fruticultura cearense

    A colonizao portuguesa, ocupando as terras brasileiras, apropriou-se

    tanto do solo, quanto das benesses que este providenciava aos portugueses.

    Grandes lotes de terra brasileira, as sesmarias, foram distribudos aos colonos mais

    influentes:

    [...] a ocupao do territrio e o sistema de propriedade criado com as sesmarias, provocaram a existncia de uma dualidade no setor agrcola, entre o latifndio, reconhecido jurdica e socialmente, e o roado, com presena permanente mas sem proteo legal (ANDRADE, 1998, p.11).

    Neste contexto, as plebes rurais, sem o devido reconhecimento legal

    sobre a propriedade, foram formadas pelos pequenos proprietrios, produtores, ex-

    escravos, arrendatrios; tais plebes, uma vez aliadas aos latifndios, constituram

    uma dicotomia entre a grande e a pequena explorao agrcola (ANDRADE 1988).

    Assim, de acordo com Szmrecsnyl (1990), basicamente, so trs os elementos

    representativos do Brasil, enquanto colnia: a propriedade fundiria, a monocultura

    de exportao e o trabalhador escravo.

    Diante do exposto, no que concerne s mudanas efetuadas no espao

    agrcola, desde o final da dcada de 1950, o termo meio tcnico-cientfico-

  • 44

    informacional explica o impacto do processo de globalizao, referindo-se ao

    perodo que comea praticamente aps a Segunda Guerra Mundial, em que a unio

    entre as tcnicas e a cincia se d, sob a gide do mercado capitalista (SANTOS,

    1996). Adicionalmente, aps a mencionada guerra, tcnicas, produtos, processos e

    meios foram progressivamente sendo incorporados na agricultura, visto que isto

    objetivava o controle de insetos, pragas, doenas e o desenvolvimento de adubos

    concentrados e agrotxicos.

    Desta forma, imperioso citar que tais avanos ficaram conhecidos, a

    partir da referida dcada, como revoluo verde, uma vez que estes

    caracterizam as tcnicas e os insumos agrcolas que viabilizaram crescimento da

    produtividade. Baseado nessas mudanas, o governo brasileiro programou a

    revoluo verde no Brasil, com vistas no aumento da produtividade agrcola.

    Desta maneira, houve um aumento vertiginoso do uso de adubos qumicos e

    agrotxicos no Pas, os quais contaminaram o solo, rios e reservatrios de gua,

    lenol fretico e degradou reas cultivadas, exercendo um efeito devers danoso

    sade.

    No que concerne implementao de inovaes cientficas e

    tecnolgicas, ocorreu uma maior concentrao dessas transformaes nas

    regies Sul e Sudeste. Os pequenos e os agricultores menos favorecidos

    socioeconomicamente no foram incorporados aos modelos de implementao

    produo agrcola, ficando sem o acesso s revolues e mudanas tcnicas e

    cientficas na atividade, precisamente no Nordeste.

    A criao da Superintendncia de Desenvolvimento do Nordeste

    SUDENE, no incio da dcada de 1960, como agncia de planejamento e

    coordenao do desenvolvimento regional, foi inegvel para superar, dentre

    outras coisas, a estagnao econmica da Regio. Objetivava tambm superar os

  • 45

    problemas de desemprego, o arcasmo da estrutura fundiria e baixa

    produtividade da agricultura e indstria. No obstante implantao dessa

    instituio, os problemas regionais no foram resolvidos.

    Em meados do final da dcada de 1980, algumas reas do Nordeste

    comearam a se expandir, participando dos circuitos espaciais de modernizao

    agrcola (ELIAS, 2002), tanto pela produtividade de gros quanto de frutas.

    2.2.2. O crescimento da fruticultura cearense

    As caractersticas do Nordeste do Brasil de uma alta luminosidade, baixa

    umidade relativa do ar, aliadas implantao de sistemas de irrigao favoreceram

    a proviso da produo da fruticultura nordestina. Neste sentido, o Cear vem

    acompanhando esse panorama: ampliou os cultivos, melhorou a produtividade e a

    qualidade dos produtos agrcolas e reduziu a infestao de pragas e a infeco de

    doenas.

    Nesse intuito, a fruticultura cearense vem assumindo papel fundamental e

    essencial na agricultura do Estado, tanto para os grandes produtores quanto para os

    pequenos. As mudanas efetuadas ao longo dos ltimos anos possibilitaram um

    vertiginoso crescimento no nmero das exportaes.

    Essa implementao da irrigao mecanizada no Estado, com vastas

    reas irrigadas, associada s condies edafoclimticas possibilitaram a produo

    de frutas tropicais em qualquer poca do ano, tanto no perodo de estiagem quanto

    no chuvoso (da os permetros irrigados, tais como Jaguaribe Apodi, Curu-

    Paraipaba). Neste sentido, isto vem viabilizando os altos ndices de produtividade de

    frutas cultivadas no Cear, j a partir da dcada de 1990.

    Com respeito ao exposto, no que se refere s condies de viabilizao

    ao aumento da produo da fruticultura no Estado, trata-se tambm de um discurso

    que veementemente usado pelo mercado capitalista e pelo governo: tal tese

    defendida por setores empresariais e da administrao pblica, que vem nas altas

    temperaturas, na luminosidade e na baixa umidade relativa do ar grandes

    potencialidades de utilizao produtiva do semi-rido (ELIAS, 1999).

  • 46

    Por volta do perodo entre as dcadas de 1980 e 1990, tm-se as

    proliferaes tanto da fruticultura quanto do consumo de frutas: desidratadas, sucos

    e in natura. Adicionalmente, no que tange fruticultura tropical no Nordeste e no

    Cear, houve um expressivo e inegvel crescimento do mercado consumidor interno

    e externo.

    Paradoxalmente, frente ao exposto, ocorre tambm uma vasta

    concentrao de terra por parte desses permetros irrigados, o que contraria aos

    anseios de uma factvel

    [...] reforma agrria, mesmo da monetarizada com a cdula da terra. A compra de terras por parte de grandes empresas nacionais e multinacionais no Estado j uma realidade, pois somente a Del Monte [...] adquiriu mais de mil hectares na regio do Baixo Jaguaribe. A maior concentrao de terras remete ao problema da expulso do campo de pequenos arrendatrios, parceiros, meeiros, pequenos produtores de base familiar e posseiros, culminando na expropriao destes trabalhadores. Acirrar-se-, assim, a transformao das relaes sociais de produo, aumentando o nmero de trabalhadores agrcolas assalariados temporrios, fazendo crescer o subemprego, e o desemprego no campo (ELIAS, 2002, p. 31).

    2.3. A bananicultura

    A bananeira uma planta de fcil cultivo que bastante encontrada em

    diversas regies do planeta, cuja expanso se deu pela ndia, frica, Europa e

    Oceania.

    As primeiras mudas de bananeira foram trazidas para o Brasil pelos

    fencios e malsios. Sendo uma planta tropical, hoje , praticamente, um consenso

    que tenha vindo da sia (mais precisamente Malsia), de onde passou para

    Madagascar, por volta do sculo V, vindo em seguida para a frica, sendo

    encontrada pelos portugueses no sculo XV, segundo relatos de Samson (1986)

    apud Pino (2000).

    Neste contexto, consoante Moreira (1987), a bananeira j era encontrada

    no Brasil por volta do descobrimento. No obstante um relato questionado por

    autores como Medina (1985). No entanto, pelo fato de ser comestvel, popular e de

    ser acessvel a todas as classes sociais, trata-se de um fato de relevncia neste

  • 47

    trabalho no que tange s opes de produo da banana no Brasil e, de modo

    particular, produo orgnica.

    As bananeiras podem ser plantadas em todos os estados brasileiros

    porque se adaptam, facilmente, a reas com atitudes variando entre 0 e 1.000

    metros. Com efeito, outros fatores de influncia so a altitude e a latitude, que

    quanto maiores, aumentam os ciclos de produo, principalmente para os cultivares

    nanica e nanico (RANGEL et al., 2002, p.04).

    Morfologicamente, a bananeira considerada uma erva gigante, monocotilednea. Ela no tem caule, sendo que a parte area que se assemelha ao tronco da bananeira nada mais que um amontoado de folhas, justapostas e imbricadas umas nas outras, de forma compacta e consistente. Seu caule [...] subterrneo. Ele chamado tambm de rizoma e consiste, a bem dizer, num verdadeiro centro vital da bananeira [...]. atravs deste rizoma, o caule subterrneo, que as bananeiras se reproduzem, pelo sistema da reproduo vegetativa, no apresentando sementes frteis e nem mtodos sexuados de reproduo (PADOVANI, 1989, p.15).

    As bananas comestveis pertencem famlia Musceae, subfamlia

    Musoideae, gnero Musa. Uma nica banana, por exemplo, o cultivar prata

    principal variedade produzida em Itapaj - CE, contm: gua (73,79 %), glicose

    (15,04%), potssio (41,31 %), alm de sdio, magnsio, clcio, amido, ferro,

    vitaminas B e C (RANGEL et al., op.cit.).

    Os produtos oriundos do beneficiamento tanto da banana quanto da

    bananeira so diversos: cerveja, papel, sorvetes, essncias aromatizantes, rao,

    palmito, compota, borracha, vinagre, suco, pasta de banana, cosmticos, artesanato,

    banana passa, farinha, xarope, suco, licor, banana chipe, gelia e doces variados.

    As variedades da banana mais encontradas no territrio brasileiro so:

    banana-da-terra, banana-nanica, grand-naime, nanico, ma, prata, pacov e ouro.

    As bananas comestveis so classificadas como Musa cavendishii (tipos

    nanica, nanico e congo, entre outras), Musa sapientum (tipos so Tom, santa

    catarina, ouro, prata, branca, ma, marmelo, entre outras), Musa paradisaca (tipos:

    banana da terra, maranh, e an) e Musa corniculata (banana pacov) (PADOVANI,

    op. cit.).

  • 48

    Dentre as variedades da banana, a prata a mais evidenciada no Brasil,

    precisamente no Nordeste. Contm casca com colorao amarelo-ouro e sua polpa

    tem colorao rsea. O pseudocaule desta pode medir em torno de 4,5 a 6 metros

    de comprimento com cerca de 25 a 35 cm de dimetro, formando grandes touceiras.

    Esse tipo de banana bastante suscetvel ao mal do panam.

    O mal - do - Panam causado por Fusarium oxysporum f. sp. cubense (E.F. Smith) Snyder e Hansen. As principais formas de disseminao da doena so o contato dos sistemas radiculares de plantas sadias com esporos liberados por plantas doentes e, em muitas reas, o uso de material de plantio contaminado. O fungo tambm disseminado por gua de irrigao, de drenagem, de inundao, assim como pelo homem, por animais e equipamentos (BORGES, 2003, p.03).

    A banana nanica a variao mais cultivada em So Paulo (PLANO...,

    2001). denominada de banana da casca verde ou banana dgua no Cear. Sua

    estatura baixa e por isso, recebe menos influncia dos impactos dos ventos. Os

    cachos podem ser prejudicados com temperaturas muito baixas. No obstante a

    banana nanica ser resistente ao mal-do-panam, ela pode ser facilmente vitimada

    pelo mal-de-sigatoka.

    O mal-de-sigatoka apresenta duas variedades: o mal-de-sigatoka amarela

    (Mycosphaerella musicola fase perfeita; Cercospora musae, fase imperfeita); e a

    sigatoka negra, causada por um fungo ascomiceto conhecido como Mycosphaerella

    fijiensis Morelet (fase sexuada)/ Paracercospora fijiensis (Morelet) Deighton (forma

    imperfeita ou assexuada) (Borges, 2003, p.03). Sendo esta devers agressiva do

    que a amarela. Segundo Rangel et al. (2002, p.28), trata-se de [...] uma doena que

    destri as folhas da bananeira, impedindo a planta de respirar e elaborar

    fotoassimilados para o seu sustento, levando-a morte antes mesmo de o cacho da

    bananeira estar pronto para ser colhido.

    Banana mysore, sendo denominada de banana ma-da-ndia, uma

    fruta macia com sabor suave, doce e que lembra o sabor da ma. Contm casca

    fina, cor amarelada, sensvel, e sua polpa tem colorao branca. muito suscetvel

    ao mal-do-panam.

  • 49

    Conhecida por ter sido a primeira a ser cultivada no Brasil, a banana-terra,

    ora amadurecida, tem casca amarelada e uma polpa rosada. Contm um

    desenvolvimento vigoroso, chegando a alcanar cerca de 6 metros de altura.

    tambm resistente ao mal-de-sigatoka e ao mal-do-panam, entretanto pode ser

    atacada pela broca-da-bananeira.

    O moleque ou broca-da-bananeira, Cosmopolites sordidus, um besouro

    preto, ora inseto adulto, [...] de hbito noturno; suas larvas so responsveis pelas

    perfuraes que aparecem no rizoma, destruindo internamente o tecido da planta,

    prejudicando o seu desenvolvimento. As folhas amarelecem, os cachos ficam

    pequenos e as plantas sujeitas ao tombamento (RANGEL et al., 2002, p.23). A larva

    causa diversos danos: com uma baixa produtividade, plantas ficam defic