Cadernos FGV Projetos nº 4 - Agronegócios

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AGRONEGÓCIOS CADERNOS FGV PROJETOS | ANO 2 | Nº4 | ABRIL 2007 1 ENTREVISTA Dr. Silvio Crestana Diretor-Presidente da Embrapa ARTIGOS • Cenário • Ambiente Macroeconômico • Insumos • Agroenergia • Energias Renováveis • Empresa do Agronegócio Milho e Soja Pecuária Café Citricultura Perspectivas Gestão Negócios

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A edição do Cadernos FGV Projetos sobre agronegócios traz uma entrevista com o ex-presidente da Embrapa, Dr. Sílvio Crestana, e artigos assinados por especialistas e profissionais da FGV que abordam os temas Cenário do Agronegócio, Ambiente Macroeconômico, Agropecuária, Agroenergia, Energias Renováveis, Empresa do Agronegócio, Milho e Soja, Setor Pecuário, Café, Citricultura, Prespectivas, Gestão e Negócios.

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 1

AGRONEGÓCIOS CADERNOS FGV PROJETOS | ANO 2 | Nº4 | ABRIL 2007

1

ENTREVISTA

Dr. Silvio Crestana

Diretor-Presidente da Embrapa

ARTIGOS

• Cená r i o• Ambiente Macroeconômico• I n s u m o s• Agroene rg ia• Energias Renováveis• Empresa do Agronegócio

• Milho e Soja

• Pecuár ia

• Café

• Citr icu l tura

• Perspect ivas

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• Negóc io s

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 3

AGRONEGÓCIOS

EDITORIAL ........................................ 4

CENÁRIO ........................................... 5

AMBIENTE MACROECONÔMICO ..... 10

INSUMOS .......................................... 12

ENTREVISTA .................................... 14

AGROENERGIA ............................... 18

ENERGIAS RENOVÁVEIS ................. 21

EMPRESA DO AGRONEGÓCIO ........ 24

MILHO E SOJA ................................ 26

PECUÁRIA ....................................... 28

CAFÉ ............................................... 30

CITRICULTURA ................................. 34

PERSPECTIVAS ................................. 36

GESTÃO .......................................... 38

NEGÓCIOS ...................................... 40

Publicação periódica do Núcleo de Economia da FGV Projetos.Os artigos são de responsabilidade dos autores e não refletem, necessariamente,a opinião da FGV.

FGV Projetos

Diretor Executivo: Cesar Cunha CamposDiretor Técnico: Ricardo SimonsenDiretor de Controle: Antonio Carlos Kfouri Aidar

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criada em 20 de dezembro de 1944 como pessoa jurídica de direito

privado, tem por finalidade atuar no âmbito das Ciências Sociais,

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Vice-Presidentes: Francisco Oswaldo Neves Dornelles, Marcos Cintra Cavalcantede Albuquerque e Sérgio Franklin Quintella

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Suplentes: Alzira Alves de Abreu, Gilberto Duarte Prado, João Pedro GouveiaVieira Filho (Refinaria de Petróleo Ipiranga S.A), Luiz Roberto Nascimento Silva,Marcelo José Basílio de Souza Marinho (Brascan Brasil Ltda.), Ney Coe de Oliveira,Nilson Teixeira (Banco de Investimento Credit Suisse S.A), Patrick de LarragoitiLucas (Sul América Companhia Nacional de Seguros), Paulo Mário Freire (UniversalComércio e Empreendimentos Ltda.), Pedro Henrique Mariane Bittencourt (BancoBBM S.A), Rui Barreto (Café Solúvel Brasília S.A), Titto Botelho Martins (KMMineração e Metalurgia S.A)

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a hegemonia democrata hoje existen-te. Verifica-se, também, que a FarmBill 2007 proposta não é suficientepara alavancar ou mesmo dinamizaras negociações agrícolas da OMC.

TPA e o Futuro das NegociaçõesNo caso do Trade Promotion Authority,há uma situação interessante. Paraconseguir a prorrogação do mecanis-mo, o Executivo norte-americano deveconvencer o Legislativo de que as ne-gociações trarão ganhos efetivos parao país em termos de acesso a merca-dos. Ocorre que, para ter ganhos emacesso a mercados, os EUA terão defazer movimentos efetivos em apoiodoméstico (cortes e disciplinamentosadicionais). Isso porque, se a negocia-ção terminasse hoje com as propostasque estão sobre a mesa, ela levaria,ainda que timidamente e muito longedo esperado pelo Brasil, a algum cortetarifário, mas não implicaria nenhumaredução dos subsídios conferidos atu-almente pelos EUA.

Sem fazer movimentos adicionais, osEUA não levam o que querem, e semlevar o que querem encontrarão difi-culdades para renovar o TPA no casoda OMC.

Ao imobilismo dos EUA em apoio do-méstico, somam-se as seguintes posi-ções defensivas, para citar as principais:China, Tailândia, mas especialmente daÍndia em acesso a mercados agríco-las, Argentina e Venezuela em aces-so a mercados de bens industriais,

NAMA (sigla em inglês de acesso aomercado de produtos não-agrícolas)e União Européia em acesso a mer-cados agrícolas, embora o comissá-rio de comércio europeu, PeterMandelson, tenha mostrado dispo-sição em avançar neste sentido.

Sem fatos novos, não é possível fa-zer previsões sobre a conclusão dasnegociações, embora o dinamismodas conversas bi laterais em Gene-bra possa levar a algum avanço.

Neste cenário, o Brasil e o G-20 devemter clareza de onde estão os ganhosem cada pilar da negociação, dirigin-do os esforços para aquilo que real-mente interessa. Obter ganhos concre-tos em apoio interno é fundamental,já que deixaria a agenda bilateral ebirregional mais "limpa", e facilitaria aconclusão de negociações, como oacordo Mercosul-União Européia. Emacesso a mercados, o desafio será es-tabelecer critérios para o uso das sal-vaguardas especiais (mecanismo queconferirá proteção a determinado paíspara determinado produto agrícola emcaso de importações desses produtosacima de determinada quantidade ouabaixo de determinado valor) e dosprodutos especiais para países em de-senvolvimento (estarão sujeitos a cor-tes menores), de forma a evitar o mauuso de tais instrumentos. Nesse pilar,o tratamento dado pelos países de-senvolvidos para os produtos sensíveisdeve determinar a ambição da negoci-ação em acesso a mercados. É sempre

bom lembrar que a seleção pela UE deapenas 2% dos produtos agrícolascomo sensíveis (sujeitos a cortes me-nores) abarcaria grande parte das atu-ais exportações brasileiras para aquelemercado, já que o Bloco deve selecio-nar como sensíveis produtos, como car-nes e açúcar.

O Brasil continuará, de toda maneira,ocupando o centro das negociações.Além de estar preparado para enfren-tar o mercado agrícola internacional,são poucos os países que fizeram alição de casa como o Brasil, em pas-sado recente, com a abertura do seumercado agrícola, redução da inter-venção governamental e geração detecnologias adaptadas às novas fron-teiras agrícolas. Em estudo sobre apolítica agrícola brasileira, elabora-do em 2005 pela Organização paraCooperação e Desenvolvimento Eco-nômico (OCDE), o Brasil foi aponta-do como o segundo país menosinterven-cionista no mundo em agri-cultura, ficando atrás apenas da NovaZelândia e à frente da Austrália, paísnotoriamente liberal em sua políticaagrícola.

A despeito dos reconhecidos custos aosprodutores agrícolas no processo deajuste, as citadas abertura comercial eredução da intervenção governamentalgeraram um setor fortalecido que temrespaldado as fortes posições do go-verno brasileiro, dando consistência àliderança do País no processo negocia-dor da OMC.

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EDITORIAL

Interessa a muita gente, cujas ati-vidades, funções e a própria so-brevivência dependem do agrone-

gócio, e não tem noção disto. As pes-soas em geral acreditam que alimen-to é uma obviedade, uma coisa tãoessencial e básica que deve existir. Nãoimaginam o que está por trás da suaprodução.

O próprio conceito de agronegócio -indicado por Ray Goldemberg e suaequipe em Harvard, em 1957 - é pou-co conhecido no Brasil. Mesmo as idéi-as do grande Barbosa Lima Sobrinho,criador do Estatuto da LavouraCanavieira, nos anos 1940, em que jádefinia cadeia produtiva, são desco-nhecidas.

Agronegócio é a soma de todas ascadeias produtivas desde a produçãoe distribuição de insumos até acomercialização de alimentos, fibrase energia. Ou seja, é um conjunto deatividades que está intimamente liga-do a todos os setores da economia eda sociedade. No Brasil, é responsá-vel por 30% do PIB, 36% da pauta deexportações e 37% dos empregos.

Cadeia produtiva é aquela que come-ça na prancheta de um pesquisadorcientífico e termina na gôndola dosupermercado. O produto final deveter preço e qualidade competitivos emrelação a concorrentes do próprio Paísou estrangeiros, além de atender aopoder aquisitivo do consumidor. Eessa cadeia precisa ser sustentável,isto é, com processos de produção quepermitam a preservação dos recursosnaturais para as gerações futuras, aomesmo tempo em que promove con-dições de sobrevivência econômica atodos os atores envolvidos.

O que entra nesta cadeia?Em primeiro lugar, os fornecedores deinsumos e serviços indispensáveis

para a produção, o chamado "antesda porteira". Pertencem a esse está-gio o planejamento, o crédito, asmáquinas de preparo de solo, os cor-retivos, os fertilizantes, as sementes,os equipamentos de plantio, os de-fensivos agrícolas e pecuários, emsuma, tudo o que vem antes da por-teira. Apesar disso, deste universodependem, ainda, outros agenteseconômicos, como a própria siderur-gia, a indústria química, os bancos eas seguradoras; todos demandandoenergia, infra-estrutura e logística.

Em seguida, vêm as atividades de"dentro da porteira": as que envolvemdesde o plantio até a colheita; a ad-ministração de pessoas e de recursosfinanceiros; o uso de tecnologia; ocuidado com o meio ambiente; as re-lações trabalhistas; as gerências co-mercial, financeira e fiscal; a escolhados melhores juros e o pagamentode impostos justos. Esta gestão im-plica no controle de estoques; em es-tar em dia a respeito de preços deinsumos, produtos e serviços, mesmointernacionalmente; em ter boas in-formações meteorológicas; e em bomrelacionamento com cooperativas,associações, sindicatos e com a indús-tria a jusante.

Indústria esta que é o "depois da por-teira": transporte, armazenagem, indus-trialização, embalagem, distribuição ecomercialização interna ou externa.

Tudo isso envolve apenas alimentos?Não, envolve muito mais: madeira eseus derivados (papel e celulose), flo-res, fibras (algodão e sisal), energia(etanol e biodiesel), borracha, produ-tos de couro, perfumes, bebidas etantos outros.

E disto tudo dependem os fabrican-tes de fogões, microondas, geladei-ras, pratos, talheres, copos, mesas,

restaurantes etc., além dos profis-sionais de marketing e veículos decomunicação.

Na realidade, todo cidadão possui li-gações intensas com o agronegócio,embora não perceba. Seus própriosnetos terão suas vidas afetadas pelofuturo deste setor, uma vez que asatividades desempenhadas incidemsobre o meio ambiente, influencian-do as mudanças climáticas, o uso daágua, ou a forma como é produzida aenergia. Também se articula signifi-cativamente com questões sociais re-levantes, como a garantia alimentar,a qualidade dos alimentos e os em-pregos viabilizados ao longo das ca-deias. A saúde humana e animal,assim como o bem-estar geral depen-dem do agronegócio, em qualquerpaís do mundo.

Por reconhecer a dimensão estraté-gica do agronegócio brasi le i ro, aFGV Projetos pretende, por meiodeste periódico, seus artigos e en-trevista, fomentar o debate em tor-no de questões importantes para osetor e, desta forma, disseminar in-formações e opiniões que possamapoiar decisões e gerar o debatepermanente, fundamental para osurgimento de novas soluções, co-nhecimento e tecnologias.

A Fundação Getulio Vargas, por meiode sua unidade de consultoria, a FGVProjetos, e desta publicação, se colo-ca mais uma vez a serviço da socieda-de brasileira, cumprindo a cada dia amissão de contribuir para o desen-volvimento nacional por meio da dis-seminação do conhecimento geradoem suas Escolas, pesquisas e indica-dores de seus Institutos, e da aplica-ção das melhores práticas em organi-zações públicas e privadas do País.

Diretoria da FGV Projetos

O agronegócio no Brasil interessa a quem?

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US$ 0,7 bilhão em pagamentos dire-tos na caixa verde3. Essa migração (boxshifting) permitirá alguma melhora, ain-da que tímida, no perfil do gasto. Ain-da em relação à caixa amarela, verifica-se que na revisão do programa MarketLoan Assistance4 , o USDA propôs queo preço de referência do programa seja85% da média dos últimos cinco anos.Dessa maneira, se a regra para o preçode referência for seguida, o programapoderá tornar-se menos distorcivo doque o atual. Ocorre que, na prática, vêmsendo utilizados os preços máximospermitidos pela lei e, nesse caso, na pro-posta atual, a redução foi pequena paraum grupo de produtos, sendo que paraoutros, não houve redução, conformetabela ao lado.

Em relação aos pagamentos contra-cíclicos, pelos quais o governo ameri-cano completa a diferença entre o pre-ço alvo de um produto e a cotação domercado internacional, os mesmosdeixarão de ser baseados apenas nospreços dos produtos para serem atre-lados à renda dos produtores.

A estimativa de corte nos subsídiosem relação aos valores concedidospela Farm Bill 2002, cerca de US$ 10bilhões para os próximos 5 anos, se-gundo o comunicado de imprensado USDA, é tímida, ao pressupor amanutenção dos preços internacio-nais elevados.

Além disso, as indicações são de quea lei não cumpre as decisões docontencioso do algodão e apontapara reformas bem modestas nos re-gimes de açúcar e lácteos, com a ex-tensão do programa em vigor de su-porte de preço para os dois produtose com modesta redução nos paga-mentos sob o programa de perda derenda (Milk Income Loss ContractProgram - MILC) no caso dos lácteos.

A agroenergia foi outro setor ampla-mente abarcado na nova proposta,com previsão de gastos superiores aUS$ 1,6 bilhão em pesquisa etecnologia.

Como aspecto positivo, há uma im-portante modificação: só terão aces-so ao pagamento produtores com ren-

da líquida abaixo de US$ 200 mil aoano. Anteriormente, tinham acessoaos pagamentos os produtores comrenda líquida de até US$ 2,5 milhões.O USDA não informou a previsão daredução dos gastos com essa medi-da, mas esclareceu que em 2003 ha-via 71.800 produtores rurais com ren-da acima de US$ 200 mil. Os subsídiostambém foram limitados: os produ-tores que cumprirem com o critérioanterior terão direito a, no máximo,US$ 360 mil ao ano, contra osUS$ 1 milhão dados anteriormente.

De qualquer modo, os termos da novalei ainda não estão definidos até queela passe pelo Congresso. Teme-seque ocorra uma deterioração da já pe-quena ambição de redução dos sub-sídios dos termos da proposta, dada

1 Compreende as políticas de apoio interno capazes de distorcer o comércio agrícola internacional, sujeitas a limites de usoglobal de subsídios durante um período de tempo determinado, assim como a acordos de redução (são autorizadas a adotá-las somente as partes que se comprometerem a reduzí-las). São compostas por sistemas de sustentação de preço demercado e pagamentos diretos aos produtores. Fonte: Boletim Economia Política Internacional do Instituto de Economiada Unicamp.

2 Compreende formas de apoio interno capazes de distorcer o comércio internacional, isentas de compromissos multilateraispor estarem relacionadas a programas de limitação da produção interna, independentemente de serem consideradas pagamentodireto aos agricultores. Fonte: Boletim Economia Política Internacional do Instituto de Economia da Unicamp.

3 Utilizada para qualificar as medidas de apoio interno que não distorcem (ou distorcem minimamente) o comércio agrícola.Está isenta do compromisso de redução, mas não pode estar vinculada a nenhum tipo de garantia de preços aos produtores.São exemplos: assistências a desastres, programas governamentais de pesquisa, extensão rural, infra-estrutura e controle depestes e doenças. Fonte: Boletim Economia Política Internacional do Instituto de Economia da Unicamp.

4 Atualmente, garante aos produtores renda de 52 centavos de dólar por libra-peso da produção de algodão. Se os preçosficarem abaixo desse nível, o Governo norte-americano completa a diferença. É o mais importante subsídio doméstico concedidopelo Governo norte-americano ao algodão.

1O preço de referência atual é igual ao preço máximo previsto na Farm Bill 2002.

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CENÁRIO

Desafio ao campo

Roberto Rodrigues,Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV/EESP

Oagronegócio brasileiro passou porum conjunto inédito de dificulda-des a partir de 2004, sofrendo

uma perda de renda sem precedentes nahistória recente. As razões dessas dificul-dades foram: a) aumentos de custos deprodução (motivados pelo crescimento dademanda por insumos, pelos preços as-cendentes do petróleo e aço); b) dimi-nuição dos preços internos e externos(seja pela oferta ampliada, seja pela va-lorização do real frente ao dólar); c) que-bras de safra causadas por dois anos desecas impiedosas no sul do País e em ou-tras regiões, o surgimento da ferrugemda soja, as restrições às importações decarnes (por causa de novos focos deaftosa no MS e PR e também pelainfluenza aviária na Ásia e na Europa); d)o sucateamento da infra-estrutura detransportes; e) as questões macroeconô-micas recorrentes (juros altos, câmbiodesfavorável e tributação elevada). Essesforam fatores preponderantes para amaior crise do agronegócio em 40 anos.A incapacidade da Organização Mundialdo Comércio (OMC) em reduzir o prote-cionismo agrícola também contribuiupara a manutenção das dificuldades deacesso aos mercados dos países ricos.

O quadro favorável para o setor sucro-alcooleiro e a recuperação recente dealguns preços são insuficientes para tra-zer de volta o ânimo dos produtores ru-rais. Entretanto, é preciso perscrutar o fu-turo, analisar as grandes tendênciasmundiais do consumo de produtos agrí-colas e cuidar de estabelecer as mudançasinternas. As políticas públicas e a organi-zação privada devem ser capazes de ga-rantir o crescimento deste importante se-tor da economia brasileira.

Algumas tendências são visíveis e ou-tras, menos claras, são passíveis de in-ferir. Há uma crescente demanda, en-tre os consumidores mais abonadosdo mundo todo, por produtos de me-lhor qualidade. Preço, sabor e aparên-cia têm muito peso, mas também avan-ça a exigência de informações sobre aorigem dos produtos, como foramdesenvolvidos, a influência sobre omeio-ambiente e a saúde humana eanimal. Há nichos para produtos or-gânicos e alimentos processados.

Certamente, ocorrerá uma importan-te mudança de hábitos alimentares,bem como na procura de produtospara energia renovável, em função deuma série de variáveis, face a:

a) O comportamento do crescimentodemográfico. Dados das Nações Uni-das indicam que a população plane-tária, de 6,07 bilhões de pessoas em2000, será de 8,3 bilhões em 2030,um espetacular crescimento de quase35%, concentrado especialmente naÁsia, que terá quase 60% do totaldeste aumento (Quadro 1). Note-se,portanto, que serão mais de dois bi-lhões de novas bocas a alimentar. Essapopulação adicional, além disso, seráportadora de maior renda per capita,em decorrência do acelerado cresci-mento das economias asiáticas, o quedeve ampliar a demanda por proteí-na animal, frutas e energia.

Quadro 1 – Estimativa da população total e por região

Quadro 2 - Projeção da população Mundial, Rural e Urbana,de 2000 a 2030 (%)

Fonte: United Nations/AGE do MAPA

Fonte: Elaboração dos autores para esse estudo com dados de United Nations

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NEGÓCIOS

Avaliação das negociações noâmbito da OMC

Oano de 2007 iniciou-se comgrande expectativa doagronegócio brasi leiro sobre

as evoluções das negociações agrí-colas da Rodada Doha da Organiza-ção Mundial do Comércio (OMC). É na-tural que o maior produtor e exportadormundial de açúcar, café, suco de laran-ja, complexo soja, carne bovina, carnede frango, tabaco e etanol anseie porpolíticas agrícolas mais orientadas parao mercado e que, portanto, distorçammenos os preços agrícolas internacio-nais. No caso dos EUA, por exemplo,embora, como um todo, os subsídiospagos representem apenas 4% do va-lor da produção, esse índice chega a100% do valor da produção para al-guns produtos como algodão, arroz esoja, que concorrem diretamente como Brasil.

É natural, também, que o setor que res-ponde por 37% dos empregos, 36%das exportações e 29% do PIB, anseiepor uma maior abertura dos mercadosde países desenvolvidos e em desen-volvimento para seus produtos, uma vezque a agricultura é o setor mais prote-gido em todo o mundo, contando comelevada média tarifária aliada a escala-das e picos tarifários que prejudicamou mesmo impedem a agregação devalor dos produtos brasileiros, bemcomo a expansão das exportações emimportantes mercados.

E, finalmente, é natural que um paíscom 62 milhões de hectaresagricultados e, com pelo menos mais

Roberto Rodrigues,Coordenador do Centro de Agronegócio da EESP da Fundação Getulio Vargas.

Antonio Carlos Costa,Gerente do Departamento de Agronegócio da Fiesp.

90 milhões de hectares potencialmen-te agricultáveis (isso sem derrubaruma única árvore da floresta amazô-nica), queira mais mercados para osseus produtos.

Além disso, a falta de acordos bilate-rais e birregionais do Brasil com os prin-cipais importadores agrícolas mundi-ais (negociação frustrada na já quaseesquecida Alca e emperrada no casoda União Européia), somada à prolife-ração de acordos bilaterais entre ou-tros países, têm deslocado os produ-tos brasileiros desses mercados (comos EUA, por exemplo, o País tem perdi-do competitividade em favor do Cana-dá e México), e coloca todas as expec-tativas nas negociações da OMC.

Infelizmente, nesse sentido, não hou-ve nenhum avanço concreto desde aReunião Ministerial de Hong Kong, emdezembro de 2005, frustrando as ex-pectativas existentes. Na ocasião, fa-lou-se em uma boa "base de lançamen-to das negociações", já que algumganho foi obtido no texto da declara-ção Ministerial, que falou em "cortesefetivos" nas medidas de apoio domés-tico e colocou 2013 como data limitepara a eliminação dos subsídios às ex-portações, tratando-se, paralelamen-te, de questões como ajuda alimentar,crédito e empresa estatal decomercialização.

Em julho de 2006, as negociações fo-ram consideradas oficialmentesuspensas, sendo retomadas a partir

do final do ano em tratativas bilate-rais, com todos os membros observan-do com atenção a evolução de doistemas capazes de alterar a dinâmicadas negociações: a nova lei agrícolanorte-americana (Farm Bill 2007), jáapresentada pelo Executivo ao Con-gresso e a renovação ou não do TradePromotion Authority (TPA), mecanismoque dá liberdade para o Executivo dosEUA negociar acordos comerciais semter que solicitar autorizações doLegislativo ao longo do processo. As-sim, vale uma análise cuidadosa sobreesses temas:

Farm Bill 2007As propostas da Farm Bill 2007, elabo-radas pelo Departamento de Agricultu-ra dos Estados Unidos, USDA, foramdesenvolvidas com a realização de 52fóruns em todo o país, onde o secretá-rio Mike Johanns, colheu comentários edepoimentos para compor o documen-to de 183 páginas, que está em discus-são no Congresso. Contrariamente àFarm Bill 2002, a proposta de lei atualfoi elaborada em um cenário de preçosinternacionais elevados e de necessida-de de corte de gastos públicos nos EUA,gerando a expectativa de um texto mui-to mais favorável aos agricultores brasi-leiros do que o apresentado.

A proposta apresenta uma redução deUS$ 1,8 bilhão da caixa amarela1 (sub-sídios distorcivos) e aumento deUS$ 1,5 bilhão em caixa azul2 (ligeira-mente menos distorcivos) e

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b) A mudança no perfil da população.No ano 2000, 53% da população en-contravam-se na zona rural; em 2030projeta-se que serão apenas 39%. Éclaro que isto implica em mudançasde hábitos alimentares, dada a com-plexidade da vida urbana (Quadro 2).

c) A expectativa de vida é crescente nomundo todo. Havia, em 2000, 600milhões de pessoas com mais de 60anos no mundo; em 2030, estima-se que esse número será 1,4 bilhão,um aumento de 133%. Mais ainda:em 2030, seremos 1,39 milhão depessoas com mais de 100 anos!

d) Diferenças na distribuição das fai-xas de renda. Espera-se um cresci-mento econômico anual em todo omundo superior a 3%, nos próximosdez anos. Entretanto, os países de-senvolvidos crescerão 2,4%, enquan-to que os emergentes crescerão 4,6%,quase o dobro. Isso determina dife-renças nos fluxos do comércio de pro-dutos agrícolas. Só o Sudeste Asiáti-co crescerá mais que 5,5% ao ano!

e) Novos avanços tecnológicos. Abiotecnologia será aplicada na gera-ção de plantas resistentes a secas,geadas, pragas e doenças; serão pro-duzidos alimentos mais ricos e atécom poder medicinal. Já a nano-tecnologia permitirá a manipulaçãode genes. Esses dois elementos,somados ao seqüenciamento gené-tico de plantas, produzirão umarevolução na alimentação humana eanimal .

f) Preocupações com o meio-ambientee, especialmente, com a água. Terãopapel dominante na definição de sis-temas de produção, criando novosmecanismos financeiros para o usoadequado dos recursos naturais.

Todas essas tendências sinalizam au-mento do consumo de carnes, leite ederivados, verduras, frutas e menor cres-cimento do consumo de carboidratosoriundos diretamente dos grãos. É sem-pre pertinente lembrar que a elevaçãono consumo de proteína animal é acom-panhada por pressão sobre a produçãoagrícola de grãos, especialmente milhoe soja, posto que a produção de carnesuína e de aves é assentada sobre o

setor de rações. Mesmo o segmentobovino depende, em muitos países, dedietas fortemente apoiadas em cereaisde alto valor nutricional.

No tema das negociações internacio-nais, os movimentos ocorrerão nãopela benevolência dos países ricos, esim por suas necessidades. O grandedesafio da humanidade no século XXIé reduzir o abismo entre países ricose pobres, ou entre pessoas pobres ericas dentro de um mesmo país. Omundo todo está de acordo que épreciso melhorar a distribuição darenda para elevar a condição de vidadas populações de baixa renda e ga-rantir a defesa da democracia e dapaz universal. Para equacionar estaquestão, a abertura comercial agrí-cola é essencial. Afinal, os ricos pa-gam para seus agricultores não pro-duzirem, enquanto os emergentesproduzem para pagarem suas dívi-das, e é por isso que a Rodada deDoha chegará a algum tipo de acor-do mais favorável aos países em de-senvolvimento, como, aliás, já sinali-zam as vitórias brasileiras nos painéisdo açúcar (contra a UE) e algodão(contra os EUA).

O avanço nas negociações internaci-onais pode abrir caminhos relevantespara o Brasil. Hoje, o País já é o maiorexportador mundial de oito produtos(açúcar, café, suco de laranja, comple-xo soja, carne bovina, carne de fran-go, tabaco e etanol). O potencial de

crescimento nestas e em outras ca-deias é muito grande. Entretanto, tal-vez se encontre na agroenergia a maisimportante modificação do agrone-gócio mundial. Na verdade, um novoparadigma energético se desenha. Édifícil compreender como a humani-dade, em poucas décadas do séculoXX, construiu toda uma civilizaçãosobre os alicerces pantanosos do pe-tróleo, produto fóssil, finito, mal dis-tribuído entre os países e regiões, edominado por poucas empresas. É in-crível! Mas, de qualquer maneira, aalvorada do terceiro milênio mostraque o "império" do petróleo chega aoseu ocaso, nas próximas 4, 5 ou 6décadas.

Há 50 anos, o consumo mundial depetróleo era de 4 bilhões de barris porano, e a descoberta de novos poçosera de 30 bilhões de barris/ano. Hoje,o consumo anual é de 30 bilhões debarris por ano e as descobertas malarranham os 4 bilhões.

Acadêmicos do mundo inteiro se de-bruçam em busca de alternativasenergéticas, visto que o desenvolvi-mento da humanidade depende fun-damentalmente de novas fontes deenergia. Fala-se na nova célula de hi-drogênio, em energia solar e em mui-tos outros caminhos. Entretanto, aponte entre a civilização do petróleoe a que a sucederá em menos de umséculo terá de ser feita com combus-tíveis líquidos de origem agrícola.

Quadro 3 – Saldo da Balança Comercial Brasileira

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microeconômicos, inclusive decisões er-radas de investimento e comercializaçãode muitos produtores.

A questão das fontes de financiamentode capital de giro e de investimento con-tinuará ainda mais importante no futu-ro próximo, dada a ênfase na expansãoda agroenergia. Além da CPR (Cédula deProduto Rural), os novos títulos doagronegócio - CDCA (Certificado de Di-reitos Creditórios do Agronegócio), CDA/WA (Certificado de DepósitoAgropecuário/Warrant Agropecuário) eNCA (Nota Comercial do Agronegócio)podem representar alternativas de finan-ciamento para todos os elos das cadeiasprodutivas do agronegócio. Outra im-portante iniciativa para a gestão adequa-da do risco de crédito é a certificaçãopositiva, ou seja, a construção de umcadastro para positivar as empresas e osagricultores perante os seusfinanciadores, em contraposição à clás-sica negativação Serasa, SPC (Serviço deProteção ao Crédito) e outros.

O risco de preço é o maior pesadelo doagricultor. Os mercados agrícolas são ex-tremamente voláteis quando compara-dos aos produtos industriais. Além dis-so, as deficiências de infra-estruturafazem com que os agricultores sejam osmaiores tomadores de risco noagronegócio. O risco pode ser reduzidopor meio de duas vias: o apoio clássicodo governo e os mercados futuros. Em2005 e 2006, o governo alocou cerca deR$ 3,5 bilhões no programa de garantiade preços mínimos.

Os mercados futuros são os mecanismosmais adequados para o gerenciamentodo risco de preço no agronegócio. ABolsa de Mercadorias & Futuros nego-ciou 1,354 milhão de contratos em 2006(crescimento de 24%), com potencial decrescimento ainda maior para 2007. Masé fundamental a integração da políticagovernamental com os mecanismos pri-vados da BM&F.

Em setembro de 2006, o Conselho Mo-netário Nacional aprovou o financiamen-to das operações de hedge (proteção depreços) de produtores rurais e coopera-tivas nas bolsas nacionais, com recursosdo crédito rural, ou seja, à taxa de juro

de 8,75% ao ano. A BM&F firmou convê-nio com o Banco do Brasil e desenvolveiniciativas com outras instituições finan-ceiras, empresas, cooperativas e entida-des do agronegócio para a massificaçãodo uso do seguro de preço pelos produ-tores. Além dos derivativosagropecuários, existem os novos títulosdo agronegócio, especialmente o CDA(Certificado de Depósito Agropecuário)e o WA (Warrant Agropecuário) que sãoas "novas moedas" do agricultor, funcio-nando como uma espécie de EGF (Em-préstimo do Governo Federal) privado. OCDA e o WA poderão ser combinadoscom os mercados futuros, trazendo maisrecursos para o financiamento da

comercialização e o carregamento de es-toques.

É comum se dizer que a "agricultura nãoquebra, muda de dono". Independente-mente das crises de uma parte dos pro-dutores, a agricultura brasileira continu-ará sendo uma das mais competitivas domundo. As lições aprendidas indicam anecessidade de uma gestão articuladadas quatro dimensões do risco na agri-cultura e agronegócio. Mais do que nun-ca, a competitividade depende - comoensinou o professor Schultz - da atua-ção do capital humano, de pessoas qua-lificadas para gerenciar o complexo edesafiante mundo dos agronegócios.

Figura 1: Empréstimos e risco de crédito rural

Figura 2: Gerenciamento de risco no agronegócio

Fonte: MAPA/MDIC

Fonte: Banco Central

Contratos futuros, a termo, de opçõesCDA-WA, CPR, troca

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 7

O etanol e o biodiesel estão neste ca-minho, assim como a madeira, resídu-os de produção animal e vegetal,e abiomassa em geral. Tais combustíveis,renováveis, ambientalmente menosagressivos, mais democráticos (porquequalquer país pode produzí-los), cria-rão uma nova civilização, mais justa eequilibrada e, mesmo que os preçosdo petróleo voltem a cair, osbiocombustíveis são agora irreversíveis:da mesma forma que a segurança ali-mentar foi a grande prioridade na se-gunda metade do século passado,agora será preciso garantir a seguran-ça energética, e os biocombustíveis tor-nam-se estratégicos nesse cenário.

O agronegócio já é o maior setor daeconomia brasileira, representandoquase 30% do PIB nacional, gerando37% de todos os empregos e respon-dendo por 36% das exportações,sustentando nosso saldo comercial(o agronegócio responde por cerca de92% do resultado comercial brasi-leiro) (Quadro 3).

As relações comerciais do agronegóciobrasileiro são caracterizadas por suaabrangência internacional. União Eu-ropéia e Estados Unidos são nossosmaiores parceiros comerciais (quase50% do total), mas está crescendo aparticipação de novos países emergen-tes, como a China (8%), o Oriente Mé-dio (8%) e outros países asiáticos (11%)(Quadro 4).

Outra característica das exportaçõesbrasileiras é a diversidade de produ-tos. Há 50 anos, o café representava3/4 das nossas exportações, e, hoje,responde por menos de 7%, enquan-to a soja, que nem existia em 1950,hoje é responsável por mais de 18%das vendas externas. Carnes, couro eseus produtos já somam quase 25%, eessa transformação aconteceu em pou-co tempo (Quadro 5).

Como explicar este fenômeno?

O primeiro fator é a tecnologia: oBrasi l detém hoje a melhor tecno-logia tropical do planeta. Essa mo-derna tecnologia permit iu avançosexpressivos na produção e, especial-mente, na produtividade das diferen-tes cadeias do agronegócio brasileiro.

Quadro 4 - Exportações Brasileiras (em valor): Principais Mercados (2006)

Quadro 5 - Exportações Brasileiras (em valor): Principais Produtos (2006)

Quadro 6 - Produção de Grãos

GRÃOS: algodão, amendoim, arroz, aveia, centeio, cevada, feijão, girassol, mamona, milho, soja,sorgo, trigo e triticale

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GESTÃO

O capital humano, os riscos e a gestão doagronegócioIvan Wedekin,Membro do Conselho Editorial da Revista Agroanalysis da Fundação Getulio Vargas, Professor do programa de MBA emAgribusiness da Fundação Getulio Vargas, Diretor do Agronegócio e Energia da BM&F - Bolsa de Mercadorias & Futuros.

Theodore Schultz (1902-1998)foi o único economista a rece-ber o Prêmio Nobel de Economia

por seus estudos sobre as questões daeconomia da agricultura. Para ele, osagricultores são capitalistas, racionais,independentemente do tamanho dapropriedade, nível de educação, loca-lização ou atividade produtiva desen-volvida. Nos tempos atuais, pode-sedizer que os agricultores fazem partede um sistema de valor orientado parao consumidor final, participando dire-tamente de uma ou mais cadeias pro-dutivas do agronegócio.

Pioneiro, o professor Schultz ressaltava aimportância do capital educacional parao aumento da produtividade, a geraçãode riquezas e o desenvolvimento econô-mico. Nos tempos atuais, a capacitaçãona gestão comercial e financeira é tãoou mais importante quanto ogerenciamento técnico e produtivo nasatividades de plantar e criar, desenvolvi-das pelos produtores rurais.

Integrada aos mercados mundiais, aagricultura não é uma ilha, mas é cer-cada de riscos por todos os lados, oque leva à necessidade de umgerenciamento permanente do capi-tal empregado no setor.

O governo incentivou, nos últimos anos,a melhoria da competitividade da agri-cultura e do agronegócio, ampliando aoferta de crédito para investimentos nosprogramas de renovação de maquinárioe outros. De 2000 a 2006, R$ 35 bilhõesforam aplicados nos programas de in-vestimento do MAPA-BNDES e dos fun-dos constitucionais. Estes recursos, so-

mados aos investimentos com recur-sos próprios dos agricultores, permiti-ram o aumento de 38 milhões para 49milhões de hectares da área plantadade grãos.

Segundo o Banco Central, o saldo de-vedor dos produtores rurais registra-do no Sistema Nacional de CréditoRural (SNCR) perfazia cerca de R$ 78bilhões em dezembro de 2006(Figura 1). Adicionalmente, R$ 33 bi-lhões de dívida dos produtores foramtransferidos para o Tesouro Nacionalnos diversos programas dereestruturação de dívida realizadosnos anos 1990 (Pesa, Securitização,Recoop, entre outros). O montante dedívida, que supera R$ 110 bilhões,equivale a 70% do valor bruto da pro-dução anual da agropecuária.

Além da gestão da dívida, o mais im-portante são iniciativas para reduçãodo risco sistêmico ou estrutural doagronegócio brasileiro, que tem qua-tro dimensões, conforme mostra a Fi-gura 2.

O risco de produção deve ser reduzidopor meio da tecnologia, processos einformações cada vez mais aperfeiçoa-dos. Essa é a essência do trabalho dozoneamento agropecuário conduzidopelo Ministério da Agricultura, Pecuá-ria e Abastecimento, com a participa-ção de diversas entidades de pesqui-sa. O risco de produção também semitiga por meio do seguro agrícola. Ogoverno tem expandido a alocação derecursos subsidiados para cobrir partedas despesas de contratação do segu-ro agrícola pelos agricultores: aplicouR$ 33 milhões em 2006 e tem um or-çamento programado de R$ 100 mi-lhões para 2007.

A segunda dimensão é o risco dos con-tratos. A grande variação - para cimaou para baixo - dos preços agrícolas e,muitas vezes, a predominância de re-lações de conflito entre as partes oca-siona quebras freqüentes de contra-tos entre agricultores, agroindústriase exportadores. Além da boa intençãodas partes, é preciso um marco legalcada vez mais aperfeiçoado e a inclu-são de cláusulas contratuais estipulan-do a arbitragem como forma de solu-ção de controvérsias.

O risco de crédito aumenta nos períodosde crise agrícola, levando as instituiçõesfinanceiras e os fornecedores a deman-darem mais e mais garantias dos produ-tores. A Figura 1 mostra que, no períodocrítico de 1994 a 1999 (a primeira fasedo Plano Real, marcada por forte valori-zação da moeda nacional), a qualidadedo crédito rural era muito ruim, ou seja,o crédito considerado normal pelo Ban-co Central chegou a representar apenas70% do crédito total. Os programas dealongamento e as boas condições domercado agrícola após 2002 permitirama rápida melhoria da qualidade do cré-dito. No final de 2004, 94% do créditoera de risco normal.

Em 2005 e 2006, houve uma mudançaradical dos cenários da renda dos pro-dutores, puxada para baixo pela valori-zação do real e as quebras de safra, de-sencadeando uma crise de renda ediminuição da liquidez e da capacidadede pagamento da dívida pelos agricul-tores. Em conseqüência, a proporção docrédito avaliado como de risco normalcaiu para 86 em setembro de 2006. Abola de neve do endividamento agrícoladecorre de uma conjunção de fatoresmacroeconômicos, mercadológicos e

Fonte: MAPA

Fonte: MAPA

UE

Fonte: Conab/MAPA *Estimativa - 6º Levantamento (março)

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 20078

Não é à toa, por exemplo, que a área degrãos cultivada aumentou 25% nos úl-timos 15 anos, e a produção aumentou107%. O avanço da produção só nãofoi maior por conta de condições climá-ticas extremamente adversas nas duasúltimas safras (Quadro 6).

A produção de carne bovina cresceu71% em 12 anos, da carne suína 113%e a de frangos 170% (Quadro 7).

A dotação de recursos naturais constituiclara vantagem comparativa do País. Pos-suímos quase 20% da água doce do pla-neta, amplas áreas agrícolas e umabiodiversidade fecunda que possibilita ageração de novos produtos.

Entretanto, reside no capital humano aprincipal razão do sucesso da agriculturabrasileira. Produtores extremamente com-petitivos permitiram este crescimento es-pantoso no Brasil, nos últimos anos. Éclaro que políticas públicas foram rele-vantes, como os mecanismos de financia-mento para investimentos (como oModerfrota) e o alongamento das dívidas(Secutirização, Pesa e Recoop). Tambémos bons preços internacionais dos anos2002/2003 ajudaram, acoplados ao câm-bio favorável. Mas foi a enormecompetitividade de uma nova geração deprodutores rurais, capazes de incorporaras novas tecnologias e de aproveitar osbons ventos do mercado, com grande ca-pacidade gerencial (tanto financeira, quan-to comercial e de RH), o grande responsá-vel pelo boom do agronegócio nosprimeiros anos do século XXI.

Esse pessoal está na ativa, ainda bem maisequipado hoje, depois de sobreviver a estacrise avassaladora. Esta jovem geração demoças e moços do campo e doagronegócio está preparada para os avan-ços que as tendências já demonstradasoferecem aos produtos do Brasil.

Mas é preciso apoiá-los. A sociedade bra-sileira precisa compreender que um novociclo de progresso rural alavancará umsalto de desenvolvimento único para oPaís. Podemos liderar a criação de uma

Brasil só subsidia mais a produção ruraldo que a Nova Zelândia, serve para redu-zir a ofensiva primeiro-mundista contranós. Assim, enquanto o PSE (Estimativade Apoio do Produtor) do Japão é de 58%,da União Européia é de 34%, do Canadáé de 22%, dos Estados Unidos é de 17%,o PSE brasileiro (mecanismo de apoio aoprodutor) mal chega a 3% do PIB agrícolanacional (Quadro 8).

Quadro 8 - Estimativa de Apoio ao Produtor (PSE)Média (2002-2004)

É tudo, de fato, espetacular, inclusive obalanço social destes avançostecnológicos, por permitir a produçãode alimentos mais baratos para o povobrasileiro e maior competitividade exter-na para os produtores. Não se pode es-quecer que o conceito de agronegócioabrange todas as cadeias produtivas eseus diferentes agentes, sejam cientis-tas, produtores familiares (pequenos,médios e grandes), a indústria, o comér-cio, a armazenagem e a distribuição.

Temos, hoje, 62 milhões de hectaresagricultados (15 com culturas permanen-tes e 47 com culturas anuais). Além disso,o País apresenta mais de 200 milhões dehectares de pastagens, dos quais 90 mi-lhões são aptos para a agricultura. Nãohá nenhum continente, para não falarpaís, com este potencial de crescimentoespantoso, que não implica em derrubarflorestas e avançar sobre a Amazônia. Éclaro que essa capacidade de expansãoapavora nossos concorrentes, que, ob-servando nosso crescimento, tratam decriar todo tipo de barreira, e até de con-tra-propaganda, para estancar o avançobrasileiro. Nem o estudo da OCDE (Orga-nização para a Cooperação e Desenvolvi-mento Econômico), que provou que o

A despeito do grande diferencial desubsídio aos produtores, o agronegóciobrasileiro é capaz de crescer e de se ex-pandir internacionalmente. No caso doetanol, para o qual usamos três milhõesde hectares plantados com cana-de-açúcar, há espaço para multiplicar estaárea, além da capacidade de dobrar, emdez anos, a produção de etanol por hec-tare. O biodiesel, por sua vez, tem po-tencial quase ilimitado, dadas as diver-sas matérias-primas que o Brasil podeusar, em função das suas disparidadesregionais: mamona e pinhão manso nosemi-árido; óleo de palma, na Amazô-nia; e soja, girassol, amendoim, algo-dão, sebo bovino, entre outros, no Paísinteiro.

Quadro 7 - Produção de Carnes

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dos insumos e mais baixo o do pro-duto. O custo do frete reduz a mar-gem de rentabilidade e, assim, parauma mesma variação no preço do pro-duto ou dos insumos, o efeito sobre arentabilidade será tanto mais severoquanto pior for a logística da região.

3. Risco de variação da taxa de câmbioA partir do final de 1998, a taxa decâmbio brasileira passou a flutuar li-vremente. A abertura na conta de ca-pital, associada à alta liquidez nosmercados internacionais sugere que avolatilidade da taxa de câmbio será aregra na economia brasileira. Aintegração ao mercado internacionalpor parte da agricultura brasileira fazcom que todo sistema de preços noPaís tenha como referência básica a taxade câmbio. As mudanças na taxa decâmbio foram expressivas, explicandoboa parte da expansão e da crise naúltima década no País.

4. Risco sanitárioO aumento no tamanho do agrone-gócio brasileiro elevará o risco sanitá-

rio envolvido na produção. Além dis-so, a expansão do comércio inter-nac ional t raz cons igo o r i sco decontaminação com doenças ex i s -tentes no exterior. Em outras pala-vras, a probabil idade de problemassani tár ios e leva-se conforme au-menta a integração internacional .

O governo federa l está empenha-do em organizar a legislação e emconstruir uma estrutura para l idarcom os padrões de qual idade ex i -g idos pe las leg is lações sani tár iaspresentes nos parceiros comerciaisdo País. Entretanto, as restrições fi-nanceiras do governo parecem in-dicar que não haverá como acom-panhar a velocidade do movimentopr i vado.

As restrições f iscais impõem cortesno orçamento da vigi lância sanitá-ria do Ministério da Agricultura. Odéficit nominal do governo federalforça cortes nas despesas que segeneralizam por todo o governo fe-deral. Adicionalmente, é dif íc i l es-

tabe lecer pr ior idades entre os d i -ferentes ministérios. Por conta dis-so, apesar do forte crescimento nasexportações do agronegócio (e ,conseqüentemente, da necess ida-de de maior controle sanitár io) , ovolume de recursos a locados paraa segurança a l imentar ca i a cadaa n o .

As perspect ivas do agronegóciobras i le i ro dependerão fortementedo desenvolv imento de fer ramen-tas f inanceiras para mitigar os r is-cos inerentes ao setor agr ícola. Ofuturo reserva ao Pa ís pos ição dedestaque no cenário internacional;d iversas oportunidades de merca-do surgem a todo o momento, as-segurando uma t ra jetór ia de ex-pansão potenc ia l de grandemagnitude. Entretanto, a velocida-de do crescimento do agronegóciobrasi leiro dependerá, fundamental-mente, da capac idade do s i s temaprodutivo para l idar com os r iscosinerentes aos c ic los econômicos eagr íco las .

Fontes: CNA, ABEF e ABIECS. * Estimativa

Fonte: OCDE - * Média 2002-2003

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 9

nova civilização por meio da agroenergia,sem que isto signifique destruir nossosrecursos naturais. Ao contrário: os nú-meros da produção de grãos mostramisso. Se não tivéssemos evoluídotecnológica e gerencialmente nos últi-mos cinco anos, a terra necessária paraa produção de grãos deste ano seriabem maior. Portanto, nosso padrãotecnológico é eminentemente preser-vador, além de conservacionista!

Portanto, o apoio ao produtor deve virda pressão da sociedade urbana, comojá se dá em países desenvolvidos hádécadas. Não existe mais o 'jeca-tatu'ou o 'coronel dos grotões'. Nossoagropecuarista é eficiente, capaz ecompetitivo, o que dá à própria refor-ma agrária um conceito diferente de50 anos atrás, quando, de fato, nossaagricultura ainda tinha núcleos degrande incompetência.

Quais as questões mais importantes aserem tratadas? Já existe um diagnósti-co perfeito a esse respeito. O Ministérioda Agricultura tem clareza do que deveser feito e trabalha em busca do con-senso dentro do governo como umtodo para implantar medidas de mo-dernização e fortalecimento do campo.

O principal item é uma política de ren-da para o setor. O seguro rural é umagrande necessidade. Ainda pequeno,mas já criado por lei e também regula-mentado, esse instrumento será, den-tro de alguns anos, como já é nos paí-ses desenvolvidos, o grande elementoque evitará a recorrente obrigação desucessivos governos em prorrogar dívi-das de produtores quando as crises seavolumam. Obrigação que permanece-rá, enquanto não se consolidar e secompletar o projeto do seguro ruralcom: a) criação do Fundo de Catástrofe;b) redução do custo do prêmio de se-guro. Um avanço positivo no tema foi aabertura do monopólio do resseguro peloInstituto de Resseguros do Brasil (IRB). Éurgente equacionar os estoques da dívidarural, fator que desestabiliza todo o setor eque é, inclusive, responsável pela reduçãoda área plantada com grãos em quase5% para a safra 2006/07.

Por outro lado, devemos buscar novosmecanismos de crédito rural, inclusivehabilitando os bancos privados a tra-

balhar com a Caderneta de PoupançaRural, a operar com recursos do CréditoRural Equalizáveis pelo Tesouro, e a re-passar recursos dos Fundos Constitucio-nais (FCO, FNE). Os bancos cooperativosdevem ser cada vez mais apoiados, re-cebendo autorização para operar dire-tamente com recursos do FAT (Fundode Amparo ao Trabalhador) e com re-passes de bancos cooperativos interna-cionais, como o Crédit Agricole, oDesjardin, o DG Bank e outros.

Devem ser ampliados os mercados fu-turos, sobretudo desburocratizando osnovos títulos criados pelo governo(CDA/WA - Certificado de DepósitoAgropecuário / Warrant Agropecuário,NCA – Nota Comercial do Agrone-gócio, CPR – Cédula de Produto Rural),estimulando operações de hedge, oque reduziria a demanda de ações daPolítica de Preços Mínimos para sus-tentar os preços agrícolas, aliviando oTesouro, e redirecionando seus recur-sos para políticas de renda mais liga-das ao mercado.

É fundamental o vigoroso investimen-to em infra-estrutura e logística, paraviabilizar a atividade rural em áreas maisdistantes e garantir condições compe-titivas aos produtores tradicionais. Es-pera-se que as PPPs ajudem neste ca-minho.

O progresso tecnológico é um fatordinâmico, de modo que, embora te-nhamos a melhor tecnologia tropicaldo planeta, a escassez de recursospode nos levar a perder competi-tividade. A Embrapa trabalha na idéiada Sociedade de Propósito Específi-co, em que o setor privado - principalbeneficiário dos resultados da pesqui-sa - passará a apropriar-se tambémda parte dos royalties. O setor deagroenergia poderia ser a primeiraboa experiência para um projeto destanatureza, dado seu bom momento.

Ainda na área tecnológica, embora emoutro ponto, a defesa sanitária mereceespecial atenção. As perdas recentescom a aftosa são exemplos, mostrandoao governo e ao setor privado a neces-sidade de andarem juntos nessa ques-tão. A rastreabilidade e a certificação seacoplam à questão sanitária, emboranão façam parte dela. Consumidores

do mundo inteiro estão cada vez maisexigentes quanto à origem e ao modode produção do que compram. E, é cla-ro, também no agronegócio a primaziaé do consumidor; ele determina as açõesdo produtor.

Do lado privado, além das parcerias járeferidas, é imperiosa uma melhor arti-culação dos diferentes elos de cada ca-deia produtiva, em benefício da sua pró-pria sustentabilidade. O conceito decadeia produtiva está bem estabeleci-do, mas a prática ainda não, especial-mente onde ela é mais poderosa, ouseja, na industrialização e na distribui-ção. Sem a aplicação do conceito, tere-mos um desastre setorial se repetindoao longo do tempo.

Nesse sentido, o cooperativismo temum papel cada vez mais importante,porque as cooperativas são atores daintegração produtiva, da agregação devalor e da própria organização da ca-deia. Mas também elas devem dar aten-ção à intercooperação e às modernastécnicas de administração.

E, para a melhor articulação entre osagentes econômicos das cadeias pro-dutivas, não é mais possível tolerar odesrespeito a contratos. Nos últimosanos, a falta de respeito a contratos -inclusive ao direito de propriedade - temsido um fator inibidor de novos investi-mentos no campo, sejam eles nacio-nais ou internacionais.

O conceito de sustentabilidade - neleincorporado o tema ambiental e os di-reitos dos trabalhadores rurais - deveser rigorosamente assumido pelos pro-dutores, pois aí residirá um fatorlimitante de acesso aos mercados.

Finalmente, é preciso voltar a atençãopara temas repetidos e aceitos, mas nãoadequadamente implementados. A ve-lha tese de que uma andorinha só nãofaz verão nunca foi tão verdadeira: ar-ticulação, integração, organização, enten-dimento, harmonização, regramento,eis os temas fundamentais, estruturais.

Se todos estes pontos, já conhecidos erepetidos, forem adequadamente tra-tados, o céu é o limite para o agrone-gócio brasileiro.

Quem viver, verá!

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PERSPECTIVAS

Luiz Antonio Pinazza,Consultor da FGV Projetos e Coordenador do Núcleo de Comunicação do Centro de Agronegócio da EESP-FGV.

Riscos e oportunidades no agronegóciobrasileiro

Alexandre Lahóz Mendonça de Barros,Professor da EESP e Coordenador do Núcleo de Pesquisas do Centro de Agronegócio da FGV / EESP.

Orelatório sobre as perspecti-vas agrícolas mundiais para operíodo de 2005 a 2015, ela-

borado conjuntamente, pela primei-ra vez, pela Organização de Coope-ração e Desenvolvimento Econômico(OCDE) e pela Organização das Na-ções Unidas para a Agricultura e Ali-mentação (FAO), traz informações in-dispensáveis para a análise doagronegócio brasileiro e mundial.

O estudo mostra a influência do Bra-si l e de outros países fortes noagronegócio, na evolução dasagroexportações. Um tênue choquena demanda de alimentos na Chinae Índia provocará ajustes externosnão negligenciáveis. A produçãoagrícola global deverá crescer, no ce-nário 2010, o equivalente a uma sa-fra brasileira de grãos, e, no cenário2015, a duas safras. Nas carnes, con-siderando estes mesmos cenários,crescer respectivamente uma e duasvezes, o volume da produção corren-te nacional.

O trabalho aponta o Brasil como omaior ganhador entre as nações agrí-colas exportadoras nos próximos dezanos, deixando para trás, por exem-plo, os Estados Unidos, no comérciomundial de oleaginosas, e a Austrá-lia, no comércio de carne bovina.

No mundo globalizado e competiti-vo, o Brasil precisa fortalecer as es-tratégias para a inserção comercial

do seu agronegócio. Os ganhos deprodutividade proporcionados pelasatividades das suas várias cadeias pro-dutivas não podem ser dissipados porineficiências na logística de armazena-gem, transporte e portos. Há grandesentraves nas distribuições interna eexterna da produção primária, sendoestas um calcanhar-de-aquiles. Se exis-tem as potencialidades e capacidadepara o Brasil alavancar de forma signi-ficativa a sua produção agropecuáriano cenário de médio prazo, é necessá-rio conceber as estratégias pós-portei-ra das fazendas, para dar suporte a essecrescimento, na apresentação de posi-ções, análises e tendências sobre ques-tões cruciais para o desenvolvimentodo agronegócio.

O diferencial de custos mais baixos daagricultura nacional é reconhecido nãoapenas no Brasil, mas também no mer-cado externo. Porém, a atividade sofreuma combinação perversa de pelo me-nos quatro diferentes fontes de riscoque torna preocupante o futuro doagronegócio brasileiro:

1. Risco de produtividadeO risco de redução de produtividadepor razões climáticas ou biológicas éintrínseco à produção agrícola. Por essarazão, diversos países, inclusive o Bra-sil, procuraram desenvolver sistemasde seguro que permitam manter a es-tabilidade do setor produtivo ao asse-gurar uma proteção à quebra de safra.As experiências internacionais sugeremque a participação do setor público no

mercado de seguro agrícola é quaseindispensável. O governo brasileiroaprovou a lei que permite a atuaçãode resseguradoras nacionais e estran-geiras no País. Outro passo importan-te será a regulamentação do Fundo deCatástrofe.

2. Risco de variação nos preços dos pro-dutos e dos insumosA volatilidade nos preços dos produ-tos agrícolas, bem como dos princi-pais insumos consumidos pelo setor,é uma realidade no setor agropecuário.A forma de defesa dessa volatilidadeencontra-se tradicionalmente associa-da às operações de mercado futuro ede opções.

Fora das economias agrícolas desen-volvidas, como há falta de políticas degarantia de renda ao produtor, as os-cilações na oferta internacional dequalquer produto são corrigidas namargem pelo produtor nacional (re-dução de renda seguida de diminui-ção de área plantada). Os ajustes naestrutura produtiva são muito maisseveros.

Sobra ao agricultor a estratégia de di-versificação de cultura, mas esse ca-minho, dependendo do tamanho dapropriedade em questão, pode limi-tar os ganhos em escala decorrentesda especialização. O risco de variaçãonos preços do produto e dos insumosé especialmente relevante nas regi-ões de pior logística. Quanto mais dis-tante dos portos, mais alto é o preço

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200710

Oambiente macroeconômico bra-sileiro deverá ser permeado,ao longo de 2007 (e nos pró-

ximos anos), por um ciclo de relativamanutenção dos principais eixos dapolítica econômica praticada ao lon-go do primeiro mandato do presi-dente Lula. Nesse contexto, não seesperam mudanças radicais no âm-bito da condução da economia bra-si leira. Um aspecto ressaltado, emcerto sentido à exaustão, pela equi-pe econômica do governo, e san-cionado no plano político pelo pró-prio Presidente da República.

Isso não significa, no entanto, quemudanças nessa área, ainda que mar-ginais, devam ser completamentedescartadas. De fato, o governo deuclaras mostras de preocupação coma questão do crescimento brasileiro,cuja média do primeiro mandato pou-co diferiu da registrada pelo seuantecessor. Adicionalmente, o cres-cimento econômico do País tem sesituado abaixo do mundial há váriosanos.

Os sinais dessa preocupação foramexplicitados durante a campanha elei-toral de 2006 e expressos de formamais contundente no início do novomandato, com a edição do Programade Aceleração do Crescimento (PAC),no começo de 2007. Adicionalmen-te, as movimentações internas dopróprio governo apontam para umarediscussão da orientação econômi-ca no âmbito do Executivo, denotan-do um crescente foco na questão docrescimento econômico.

Em razão disso, é razoável imaginarque os próximos anos, em termos de

política econômica, devem ser mar-cados pela manutenção dos parâ-metros da ortodoxia econômica ob-servada entre 2003 e 2006. Noentanto, também é lícito supor quealgumas mudanças de dosagem e,marginalmente, de foco, surjam nocontexto da condução da economiapor parte do governo em 2007 e nospróximos anos.

Essa dimensão, do ponto de vista do-méstico, também deve levar em contaa configuração do ambiente econô-mico externo, que tem se mostradoextremamente favorável nos últimosanos. De fato, a economia global vematravessando uma fase excepcionalem termos de desempenho, o que temcondicionado um cenário internacio-nal propício às economias emergen-tes. Essa dinâmica, conjugada a umquadro de extrema abundância deliquidez de recursos externos,condicionou uma evolução econômi-ca internacional livre de crises nos úl-timos anos (diferente da que se ob-servou na segunda metade dos anos1990 e início da década atual). Dessaforma, as economias emergentes seviram firmemente favorecidas por esseciclo, o que lhes proporcionou umaabundância de recursos como hámuito não se via. Ao mesmo tempo, oelevado crescimento global tambémcondicionou o comportamento dospreços de vários produtos, em parti-cular das commodities. Esse movimen-to também favoreceu as economiasprodutoras desses produtos nos últi-mos anos, reforçando a perspectivade um ambiente favorável.

As perspectivas adiante no front ex-terno, no entanto, sinalizam para al-

gum grau de desaceleração do cresci-mento econômico global. Em parti-cular, espera-se que a economia nor-te-americana apresente certo graude desaceleração nos próximosanos, sendo válido o mesmo para aeconomia chinesa. Nesse contexto,é possível que o pico dos preços in-ternacionais de várias commodit iestenha ficado para trás, o que, semdúvida, afetará, em alguma medi-da, as economias dos países ex-portadores dessas commodit ies(onde o Brasi l tem lugar de desta-que). Adic ionalmente, a esperadadesaceleração do crescimento glo-bal deverá ser acompanhada poralguma reversão dos fluxos de capi-tais externos, com potenciais impac-tos sobre as economias emergen-tes.

Tendo por base esses elementos,podem ser traçados três cenários al-ternativos para 2007 e para os pró-ximos anos, com diferentes desdo-bramentos para o agronegócio:

Cenário Otimista (25%)Neste cenário, as principais diretri-zes de pol ít ica econômica sãomantidas, com retomada gradual docrescimento econômico, sem a ge-ração de pressões inflacionárias sig-nif icativas. O governo é bem-suce-dido na sua agenda de transitar paraum regime de maior crescimentoeconômico sem comprometer ospr incipais fundamentos da econo-mia brasi le i ra. Ao mesmo tempo,tem êxito no plano de restabeleceruma agenda de reformas estrutu-rais, com modernização progressivada estrutura econômica do País.

AMBIENTE MACROECONÔMICO

Rogério Mori,Professor e Coordenador do Centro de Macroeconomia Aplicada (CEMAP) da FGV-EESP

Cenários macroeconômicos

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São Paulo e Flórida: produção de laranja (milhões de caixas)

da Lei de Defesa da Concorrência,que passou a proibir a cessação deconduta em casos de infrações à or-dem econômica relacionadas à acu-sação de cartelização (Lei n° 10149de 21 de dezembro de 2000).

A Faesp deverá ser o órgão gestordesse recurso. A maior parte do va-lor da indenização deverá ser envia-da para a parte eventualmente "pre-judicada", os produtores. Muitosdeles optaram pela renegociação in-dividual com a indústria porque nãoacreditam que possa ocorrer umaformalização do reajuste coletivo.

Do ponto de vista da formação de pre-ços, a negociação contribui em trêsaspectos:1.Diminui a diferença entre o valor

mínimo e o máximo nos contra-tos, com a política de piso mínimoa US$ 4,00 a caixa;

2. Introduz uma fórmula baseada naBolsa de Nova York para medir aparticipação dos produtores nosganhos do mercado internacionalde suco;

3.Cria um novo meio de negociaçãoe fixação dos preços ao produtorcom base nos preços externos.

Cenário melhor para 2007Os prejuízos provocados pelos fura-cões em 2004 e 2005, na Flórida,reduziram a colheita de laranja e aoferta de sucos dos Estados Unidosem 2006. O alastramento de doen-ças, como o cancro cítrico, a tristezados citros e o greening , junto com aurbanização, torna mais dramático oquadro de diminuição da áreacitrícola na região.

O estoque de passagem de suco delaranja concentrado e congelado(Frozen Concentrated Orange Juice -FCOJ ) na safra 2005/06 foi de 125mil toneladas na Flórida. Esse volu-me é 38% inferior ao registrado natemporada anterior, de acordo como relatório da Flórida Citrus Mutual(Associação dos Processadores deCitros da Flórida).

Desde o início do censo realizado peloUSDA, em 1967, a área atual supera

apenas a de 1986, de 188,77 mil hec-tares. Embora o adensamento de plan-tio compense parte da redução daárea, a redução no plantio de árvoresé uma realidade na Flórida.

Com estoques reduzidos e previsãode oferta limitada de suco, os preçosdevem se sustentar em patamares aci-ma de US$ 2 mil a tonelada. Caso aprodutividade dos pomares se recu-pere em 2008 e 2009, os preços nomercado poderão sofrer reversão aci-ma dos níveis de 2004 e 2005. A par-tir de abril de 2006, a cotação supe-rou a barreira de US$ 2 mil a toneladae bateu recordes históricos. Conside-rando que seu consumo anual de sucoé de aproximadamente 200 milhõesde caixas, os Estados Unidos devemcontinuar importando o produto doBrasil e de outras origens nos próxi-mos anos, embora com taxaçãoelevadíssima.

A Hora é EstaA cadeia de suco de laranja, assim comoa de várias outras commodities, mudoumuito nos últimos anos. A base técnicaé outra, o investimento e a produtivida-de por área dobraram e a apreciação doreal fez o resto. Lá se vão os anos de 4caixas por pé e preço de 3 dólares porcaixa, que fizeram a felicidade de algu-mas regiões e famílias do interiorpaulista. Também já existiram, no pas-sado, contratos com participação empreço, base bolsa de Nova York.

Neste momento, há boas perspectivasde grandes melhorias. A montagem deum modelo para estabelecer o preço parao pagamento da indústria de suco aocitricultor não é uma idéia nova, mas umaestratégia importante para a harmoniada cadeia produtiva. Discutir se o preçoserá estabelecido em caixa ou brix, a par-tir da cotação no mercado internacionalé fundamental, assim como a defini-

Com uma produção de 1,3 mi lhãode toneladas na safra 2005/06, se-gundo o USDA, o Brasi l se destacacomo o maior produtor e exporta-dor de suco de laranja do mundo.As exportações bras i le i rascorrespondem a 80% do vo lumetotal exportado no mundo e a pro-dução a 58%. Em relação à produ-ção de laranja, a produção brasilei-ra nessa mesma safra fo i de 39milhões de toneladas, 39% do vo-lume mundia l produzido .

ção dos fatores de cálculo em funçãodo rendimento industrial. O estabe-lecimento de um Consecitrus em mol-des similares ao do Consecana trazunião e aumenta a força competitivado setor. O pagamento da laranja porqualidade é uma modernização ne-cessária. É neste momento de preçosmelhores que o elo mais forte, a in-dústria, aceitaria negociar. Cabe aosprodutores manter a união e um diá-logo objetivo para tentar conseguir oequilíbrio da cadeia a longo prazo.

Fonte: Departamento de Agricultura dos EUA (USDA)

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 11

A taxa de investimentos atinge pa-tamar superior a 20% do PIB de for-ma sistemática, proporcionando umambiente favorável ao crescimentoeconômico. Neste cenário, as taxas dejuros seguem caindo, atingindo pa-tamares significativamente mais bai-xos em termos reais, em alguns anos.

Do ponto de vista externo, o cenáriocontempla uma desaceleração gradu-al da economia global (soft landing),sem maiores turbulências nos merca-dos internacionais e sem reversõesbruscas de fluxos de recursos inter-nacionais para as economias emer-gentes.

Esse cenário se mostra favorável aoagronegócio, dada a perspectiva docrescimento balanceado da economiabrasileira. Ao mesmo tempo, a quedada taxa de juros e a manutenção dataxa de câmbio estável em termos re-ais favorecerão o setor. Por fim, ante aperspectiva de desaceleração gradualda economia internacional, os preçosdas commodities devem apresentar al-guma acomodação.

Cenário Básico (65%)Neste cenário, a perspectiva é de quea economia brasileira apresente umdesempenho marginalmente superiorao observado nos últimos anos.

Nesse contexto, a ênfase do governono crescimento econômico esbarranos entraves políticos e de maior arti-culação junto à sociedade. Dessa for-ma, o governo enfrenta dificuldadesem implementar um projeto de mu-danças e reformas mais amplo,focando-se no limite do possível anteas condições impostas pelos ambien-tes político e econômico. Nesse cená-rio, as taxas de juros seguem caindo,mas a um ritmo mais lento do que oprevisto no cenário otimista, uma vezque os limites impostos pelos baixosníveis de investimento sugerem ris-cos inflacionários latentes, em face deuma maior aceleração do crescimen-to econômico.

Espera-se ainda que a desaceleraçãodo crescimento global mais adianteseja suave (soft landing), mas a persis-tência de incertezas levará a períodosde turbulências temporárias, com efei-tos maiores sobre as economias emer-gentes e suas respectivas taxas decâmbio.

Do ponto de vista do agronegócio, ocenário também se mostra favorável,mas com perspectiva de desempenhomais moderado, diante de um con-texto de crescimento doméstico maislento e de potenciais turbulências in-ternacionais.

Cenário Pessimista (10%)Neste cenário, o governo não tem su-cesso algum em implementar sua agen-da de crescimento econômico ou derealizar reformas estruturais essenci-ais à economia brasileira. Ante maio-res riscos de pressões inflacionárias,as taxas de juros permanecem em pa-tamar elevado, o que afeta diretamen-te o setor agrícola.

Ao mesmo tempo, é possível preverum quadro de brusca desaceleraçãodo crescimento econômico global (hardlanding) e fortes turbulências nos mer-cados financeiros internacionais. Tal fe-nômeno tem impacto direto sobre aseconomias emergentes, provocandoelevada volatilidade de suas moedas.

Do ponto de vista do agronegócio, estecenário embute dificuldades tanto pelaperspectiva de menor crescimento do-méstico quanto pelas dificuldades anteum cenário externo conturbado.

Em suma, as perspectivas de médio elongo prazo para o agronegócio, anteos cenários delineados se mostramrelativamente favoráveis para ospróximos anos. Ainda assim, nãodevem ser desconsiderados inteira-mente alguns riscos possíveis associa-dos à evolução das principais variáveismacroeconômicas.

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CITRICULTURA

Montagem do Consecitrus

Luiz Antonio Pinazza,Consultor da FGV Projetos e Coordenador do Núcleo de Comunicação do Centro de Agronegócio da EESP-FGV.

Em 2006, representantes doscitricultores da indústria paulista desuco e do governo realizaram diver-

sas rodadas de negociação, em busca desoluções para o impasse em torno dospreços da fruta entregue às fábricas. Omotivo foi a valorização do preço do sucono mercado internacional e a queda dodólar, que, segundo os contratos estabe-lecidos entre 2004 e 2005, colocaram osprodutores em condições desfavoráveis.Com a lentidão nas negociações e adificuldade em se obter consenso parasolucionar a questão, os produtoresbuscavam renegociar seus contratos in-dividualmente. O intervalo de preçosda caixa de 40,8 quilos nas negocia-ções realizadas em 2005 foi deUS$ 2,80 a US$ 3,80, para a fruta en-tregue no portão da indústria. Com onovo cenário, principalmente em fun-ção do real valorizado, estes valoresficaram menores.

Quando algumas processadoras desuco iniciaram a moagem no início dejunho, o acordo entre indústrias ecitricultores a respeito da renegociaçãodos contratos continuava em aberto.Em 31 de maio, as indústrias oferece-ram um reajuste por caixa de US$ 0,60para os negócios fechados em anosanteriores. A Associação Brasi le i rados Citr icultores (Associtrus) nãoconcordou com a proposta e a Fe-deração da Agricultura do Estado deSão Paulo (Faesp) sugeriu um bô-nus superior a US$ 1,00 por caixa.Antes desta reunião, representan-tes dos produtores re iv indicavamum adicional de US$ 3,40 à caixa.Em 4 de agosto, após meses de nego-ciação, representantes dos citricultorese da indústria fecharam um acordosobre o reajuste do valor dos contra-tos de fornecimento de matéria-prima

fechados até dezembro de 2005, váli-dos para a safra 2006/07.

O bônus é válido somente para essatemporada e será obtido por meiode uma fórmula que leva em conta ovalor do preço do suco na bolsa deNova York, taxa de câmbio e o rendi-mento da fruta (240 caixas por tone-lada de suco). Independentementedo valor obtido pela fórmula, todosos contratos já firmados serão rea-justados para esta temporada a umvalor mínimo de US$ 4,00 por caixade 40,8 quilos.

O bônus será calculado por meio dadiferença entre o preço médio dosuco na Bolsa de Mercadorias deNova York (Nybot), de julho de 2006a junho de 2007, e o valor de 138centavos de dólar por l ibra-peso.Para converter esse diferencial emtoneladas de suco, multiplica-se pelofator 14,55. O resultado em dólarespor caixa de laranja (US$/cx) é obtidopela divisão por 240 (caixas por to-nelada de suco). Cinqüenta por cen-to desse valor será repassado para oprodutor.

Os citricultores com contratos de par-ticipação no mercado internacionalreceberão o valor estipulado no con-trato firmado com a indústria anteri-ormente, somado a um bônus quedeverá ser pago da seguinte forma:50% de imediato, em função da esti-mativa da safra 2006/07 e os 50%restantes à medida que a fruta forcolhida e entregue.

Entre as empresas que participaramda negociação de reajuste de preçosnos contratos, a Sucocítrico Cutraleassinou um acordo de bonificação

no final de dezembro e o grupo LouisDreyfus em fevereiro. As demaisprocessadoras renegociam isolada-mente com seus fornecedores. O va-lor da caixa dos contratos negocia-dos na safra 2006/07 vai de US$ 4,00a US$ 6,05.

A fórmula de bonificação ainda teráque ser avaliada pelo Conselho Ad-ministrativo de Defesa Econômica(Cade) e pelas indústrias não associ-adas da Associação Brasileira dos Ex-portadores de Cítricos (Abecitrus).

O setor citrícola também aguarda odesfecho da apuração de existência decartel das indústrias investigadas peloCade, que não aceitou a proposta dasindústrias para pagar uma indeniza-ção de R$ 100 milhões e colocar umfim ao processo de investigação decartel. A indenização equivale, em va-lores atuais, a 3% da receita com asexportações do setor em 1999(US$ 1,5 bilhão, valores reais FOB de2006, incluindo o suco e subprodutos),segundo dados da Secex (Secretaria deComércio Exterior do Ministério doDesenvolvimento, Indústria e Comér-cio Exterior). Se o processo for levadoadiante, a multa poderá chegar a 30%do faturamento das empresas de suco,além do julgamento se arrastar poranos.

O fechamento vai depender da apro-vação dos conselheiros do Cade, quejá receberam um relatório das apu-rações feitas pela Secretaria de Direi-to Econômico (SDE). As duas entida-des integram o Sistema Brasileiro deDefesa da Concorrência (SBDC). Adúvida é se um acordo será possível,pois a acusação de cartel é de 1999.A partir de 2000, houve uma revisão

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200712

Após três décadas de mudanças, háevidências de que a agricultura bra-sileira começa a delinear um pa-

drão agrícola único no mundo: moderno,de larga escala, intensivo em tecnologia eessencialmente tropical. Não é fácil antevertodos os aspectos desse modelo, que ain-da se encontra em construção, mas é pos-sível levantar suas principais característi-cas, bem como delinear alguns desafios aserem superados a fim de que o processode expansão do agronegócio brasileiro sejasustentável no tempo. Em especial, mere-cem destaque os setores produtores deinsumos, que se mostraram capazes degerar tecnologias adaptadas ao sistemaagropecuário brasileiro. O objetivo do pre-sente artigo consiste em dar uma perspec-tiva histórica ao desenvolvimentotecnológico no País, associando-o aos se-tores produtores de insumos.

O agronegócio brasileiro é um sistemacomplexo. O País apresenta diversas ca-deias completas de produção. Todosegmento de insumos (máquinas agrí-colas e tratores, fertilizantes, defensi-vos, sementes etc.), de produção agrí-cola (que contempla as principaisculturas e animais produzidos no mun-do) e toda a cadeia processadora dedistribuição e informática associada aoagronegócio constituem um amplo sis-tema produtivo.

Ao comparar a agricultura brasileiracom os maiores sistemas produtivosdos países desenvolvidos, é possívelfazer duas afirmações sobre o sistemabrasileiro: (i) a moderna agricultura bra-sileira é um sistema relativamente novodo ponto de vista histórico e (ii) não háoutra grande agricultura tropical de lar-ga escala no mundo. A observação

comparativa torna evidente que o siste-ma brasileiro exigiu desenvolvimentotecnológico específico e que ele foi es-sencialmente construído no decorrerdos últimos 30 anos. Ademais, pode-se afirmar que as novas tecnologias per-mitiram assegurar ao País elevado graude competitividade frente às principaisagriculturas do mundo.

O evento tecnológico mais relevanteocorrido na agricultura brasileira nosúltimos 30 anos foi sem dúvida o Siste-ma de Plantio Direto. Essa técnica foidecisiva para viabilizar o desenvolvimen-to da agricultura nas áreas de cerrado.Clima tropical requer proteção do solo.O sistema de cultivo tradicional, bemcomo o modelo de mecanização a eleatrelado, mostrou-se inadequado a esseregime climático. Plantio direto, junta-mente com nutrição de plantas e de-senvolvimento genético, garantiram ex-pressivo aumento da produtividade daagricultura na região central do País.Foi necessário o desenvolvimento deconhecimento nas áreas de manejo deplantas, máquinas e equipamentos, no-vos defensivos e dessecantes, nutriçãode plantas e de manejo de solo paraque o plantio direto se viabilizasse noBrasil.

O domínio tecnológico da agriculturaem ambiente tropical permitiu que anatural abundância de solo, lumino-sidade, temperatura e água pudessemser utilizadas a fim de elevar a produti-vidade da agricultura. Em poucas pala-vras, o desenvolvimento tecnológico

permitiu fazer uso de suas vantagenscomparativas na agricultura.

A possibilidade de produzir duas safrasem um único ano tornou-se maior gra-ças ao desenvolvimento do sistema deplantio direto. A realização de duas sa-fras por ano é hoje usual no Mato Gros-so, em Goiás e no Paraná, embora nes-se último estado, em decorrência daelevada precipitação por quase todo oano, o sistema de safra de verão e deinverno já fosse utilizado, no passado,com maior freqüência1. A técnica deplantio direto reduz o tempo despen-dido com mecanização, permitindo aexecução de duas safras com menor ris-co climático.

O Brasil possui um volume expressivode área potencialmente agricultável.Existem diferentes estudos referentes àdisponibilidade de terra que, em geral,tendem a convergir para uma área po-tencial superior a 100 milhões de hec-tares na região do cerrado. Existe, ain-da, uma enorme área de pastagemcaracterizada por baixa produtividadedas forragens e que, atualmente, co-meça a ser integrada ao sistema degrãos, configurando um inovador sis-tema de rotação. Em trabalho recente,Brandão et alli (2005)2 concluem quecerca de 80% do aumento da área culti-vada com lavouras nos últimos dez anosno Brasil deu-se em antigas áreas depasto. A área total de pastagem no Paíssitua-se ao redor de 170 a 180 milhõesde hectares. A área agrícola atualmentecultivada no Brasil encontra-se em um

INSUMOS

Alexandre Lahóz Mendonça de Barros,Professor da EESP e Coordenador do Núcleo de Pesquisas do Centro de Agronegócio da FGV/ EESP

A importância dos setores produtores no desenvolvimentotecnológico da agropecuária brasileira

1 O sistema de plantio direto foi inicialmente desenvolvido por agricultores paranaenses emmeados dos anos 1970. Após essas experiências iniciais, a tecnologia de plantio direto foisendo desenvolvida, disseminada e adotada na região do cerrado.

2 Brandão et alii (2005) Crescimento agrícola no período 1999-2004, explosão da área plantadacom soja e meio-ambiente no Brasil. Texto para discussão 1062, IPEA/DIMAC.

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mais xícaras de café por dia, e o con-sumo fora do lar (no trabalho, nascafeterias, nos restaurantes) aumen-tou, entre 2004 e 2006, de 4,5 para5,5 milhões de sacas de 60 quilos. Apesquisa mostra, também, mais in-teresse em adquirir novas cafeteiraspara uso doméstico e maior aumen-to no consumo nas classes A/B, emconseqüência da demanda por cafésmais elaborados, de melhor qualida-de, certificados e com sabor e aromamarcantes, fatores determinantes doconsumo.

O ano de 2006 marcou a entrada nomercado brasileiro de novas cadeiasde casas de café estrangeiras e oanúncio de investimentos de empre-sas européias. Tudo isso confirma ointeresse despertado pelo tamanho ematuridade do mercado brasileiropara assimilar inovações e novos pro-dutos.

Mesmo em menor parcela, a oferta decafés de má qualidade é um grandeperigo para os objetivos de amplia-ção do consumo. O setor reivindicajunto ao MAPA uma atualização daslegislações para o café em grão cru eindustrializado. É necessário coibir acomercialização de matérias-primascom qualidade inferior e de volumescom excesso de grãos defeituosos,bem como a oferta, aos consumido-res, de produtos com qualidade nãorecomendável.

Os governos da Bahia, do Espírito San-to e de Minas Gerais, em 2006, cria-ram, por decreto dos governadores,regras para a adoção de critérios dequalidade mínima nas aquisições e li-citações de café para o consumo dosseus organismos públicos. Com tan-

tas novidades, o consumo nacional decafé aumenta. O consumo per capitaanual passou de 5,14 quilos para 5,28quilos por ano. Uma alta de quase 3%,o dobro da média mundial.

Por trás desse crescimento, também es-tão os programas de certificação daqualidade. O principal deles é o Progra-ma Permanente de Controle da Purezade Café criado pela própria ABIC, maisconhecido como Selo de Pureza.

No ano da criação do selo, em 1989, oconsumo de café estava em declínio.Mais de 30% das marcas analisadas bur-lavam a legislação, com mistura de ou-tras substâncias ou grau de impurezasacima do limite permitido. Apenas 463marcas faziam parte do programa eeram responsáveis pela industrializaçãode 330 mil sacas por mês.

Hoje, 70% do café produzido no Brasiltem o selo e menos de 5% das marcassão consideradas impuras ou adultera-das. O programa conta com mil marcasprocessando 480 mil sacas por mês.

Todos estes dados, referendados pelasegunda Conferência Mundial de Café,realizada em Salvador, em setembro de2005, indicam uma melhor condiçãono futuro para a cafeicultura brasilei-ra, frente à violenta crise dos anos an-teriores.

A política anticíclica para 2007 será con-templada com cerca de R$ 2 bilhões doFuncafé, R$ 500 milhões do MCR 6.2 eR$ 235 milhões do OOC, recursos sufi-cientes para atenuar os efeitos negati-vos da bianualidade. Para otimizar a efi-cácia dessas políticas, é imprescindívelque sejam incorporados mecanismosque sinalizem claramente a evoluçãodos preços futuros como, por exemplo:Prêmio de Risco de Operações Privadas(PROP), Prêmio de Equalização de Preçoao Produtor (PEPRO) e Prêmio deEqualização de Preço Pago à Agroin-dústria (PEP). Com essas medidas, o se-tor produtor poderá efetuar um hedge,amenizando substancialmente o riscoda estocagem e garantindo dinamis-mo na comercialização, com maior ren-da para o setor.

Razões do crescimento do mercado interno de café

� Melhoria contínua da qualidade do café oferecido aos consumidores. O Programa de

Qualidade do Café (PQC) certifica mais de 160 marcas em todo o Brasil;

� Consolidação do mercado de cafés tipo Gourmet ou Especiais, diferenciados e de alta

qualidade;

� Maior percepção do café quanto aos aspectos dos benefícios para a saúde, como

resultado dos grandes investimentos no Programa Café e Saúde.

� Investimentos em promoção e marketing. Em 2006, foram aplicados com recursos do

Funcafé (Fundo de Defesa da Economia Cafeeira), R$ 5 milhões, por meio do

Programa Integrado de Marketing (PIM-2006), coordenado pelo Departamento do Café

(Decaf), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. A esses recursos,

somaram-se as contrapartidas privadas neste programa, em valor superior a

R$ 2 milhões e o Fundo Especial de Marketing da ABIC, no valor de R$ 655 mil,

constituído por contribuições extraordinárias dos seus associados torrefadores.

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 13

patamar de 60 milhões de hectares, oque permite dimensionar o enorme po-tencial produtivo brasileiro.

Ao longo da última década, iniciou-seum sistema de produção que procurainteragir as culturas anuais (grãos e al-godão) com a pecuária bovina. Este sis-tema passou a ser conhecido comointegração lavoura-pecuária. Existe umleque de variações dos tipos deintegração, mas o princípio geral é arotação de pastagem com grão, entreanos ou em um único ano (inverno everão). O sistema de plantio direto re-quer palhada para proteger o solo. Aofinal do período de chuvas, é usual ocultivo de alguma lavoura para garantira proteção do solo com palha para oplantio da safra em setembro/novem-bro. O pasto pode perfeitamente serutilizado para esse propósito, conferin-do excelente proteção ao solo. Alémdisso, a rotação com lavoura resulta emmelhoria da fertilidade do solo, elevan-do a produtividade das pastagens. Arotação com pasto permite, por sua vez,reduzir a infestação de doenças, o quereduz as pulverizações necessárias às la-vouras anuais. O sistema de integraçãolavoura-pecuária é uma novidade quenão é freqüente em nenhuma outragrande agricultura do mundo. Esse sis-tema traz vantagens agronômicasdecorrentes da rotação, reduzindo a in-cidência de pragas e doenças, especial-mente na lavoura de soja. Entretanto, éimportante ressaltar que esses sistemasde produção inovadores requerem per-manente desenvolvimento tecnológico,em especial dos setores produtores deinsumos agrícolas.

A presença da agricultura nas regiõestradicionais de pecuária permite ampli-ar a qualidade da nutrição dos bovinos.O processamento da safra colhida aca-ba por gerar subprodutos que podemser utilizados em rações de confi-namento, semicon-finamento ou suple-mentação a pasto a um custo reduzido,o que amplia consideravelmente a pro-dutividade da pecuária. É interessantenotar a presença de estruturas deconfinamento disseminadas por todoo País, até em regiões do cerrado quenunca fizeram uso dessa tecnologia porrazões de custos de produção. Alémdisso, a presença de uma dieta de me-

lhor qualidade amplia consideravelmen-te o benefício advindo do melhoramen-to genético, estimulando a adoção des-sa tecnologia. É notório que, ao longodos últimos anos, o uso de técnicas demelhoramento genético (touros prova-dos, inseminação artificial, transferên-cia de embrião, fertilização in vitro) cres-ceu muito no Brasil.

Nota-se, portanto, que há forte sinergiaentre a produção de grãos e a pecuáriabovina. Foram citadas acima as vanta-gens tecnológicas, mas além dessas,pode-se também afirmar que a diluiçãode risco decorrente da diversificaçãoconfigura outro ganho do sistema deintegração.

A agropecuária nacional dependeu econtinuará dependendo pesadamentedo sistema de pesquisa no Brasil. Esteúltimo é liderado, em âmbito federal,pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pes-quisa Agropecuária) que desenvolvepesquisas em todo o País, englobandodiferentes condições edafoclimáticas edistintos produtos. Existe, ainda, umconjunto de centros de pesquisa esta-duais, notadamente no Estado de SãoPaulo, que desenvolvem tecnologiaadaptada às condições locais. Além dis-so, diversas associações privadas de pes-quisa foram criadas por produtores ru-rais com a finalidade de desenvolverpesquisa nas áreas de nutrição e de me-lhoramento genético de plantas. Existeum amplo número de empresas priva-das que adaptam e desenvolvem mate-rial genético, novos equipamentos e téc-nicas de pulverização e mecanização,nutrição de plantas etc. A maior partedas empresas multinacionais produto-ras de insumos possui longa tradiçãono Brasil.

No decorrer das últimas décadas, diver-sas escolas de Engenharia Agronômicae Florestal, Medicina Veterinária,Zootecnia e Biologia foram criadas, mul-tiplicando consideravelmente o núme-ro de profissionais em ciências agrári-as. Número igualmente significativo deprogramas de pós-graduação foi cria-do, elevando a qualidade dos profissi-onais que atuam na área. Atualmente,o Ministério da Educação exige que asuniversidades mantenham em seusquadros professores e pesquisadores

com um padrão mínimo de formação.A maior parte das universidades públi-cas e parcela crescente das privadasapresentam quadros compostos porprofissionais com mestrado e doutora-do. Parte desses profissionais obtevepós-graduação em instituições interna-cionais, elevando o padrão de conheci-mento brasileiro.

Os profissionais de Ciências Agráriasatuam em empresas privadas deinsumos, nos centros de pesquisa pú-blicos e privados, nas empresas agríco-las, nas cooperativas, em empresas deconsultoria etc. É interessante notar queas propriedades agropecuárias maismodernas contam com consultoria es-pecializada nas diversas etapas do pro-cesso produtivo: nutrição, pulverização,mecanização; caracterizando forte es-pecialização do conhecimento e eleva-ção da produtividade do sistema. To-das as empresas de insumos possuemem seus quadros um corpo de profissi-onais para aplicar e disseminartecnologia. No passado, esse processofoi essencialmente feito pelo Estado,mas em decorrência tanto do crescimen-to do setor quanto da crise fiscal dosanos 1980 e 1990, as empresas priva-das assumiram a liderança na dissemi-nação do conhecimento como uma es-tratégia de marketing. Atualmente,muitos encontros tecnológicos são or-ganizados pelas empresas privadas ecooperativas.

A inovação é o elemento central doagronegócio brasileiro. Dadas as especi-ficidades do meio-ambiente, não hácomo garantir a continuidade do de-senvolvimento do agronegócio sem umfluxo permanente de inovação. É ne-cessário, portanto, assegurar um mar-co institucional que garanta e estimuleo processo de geração e incorporaçãode novas tecnologias e que permita queas empresas produtoras de insumosagropecuários possam seguir expandin-do, ganhando dimensão e escala inter-nacional. É fundamental que o País seconsolide como grande exportador detecnologia agropecuária, o que incluitodos os segmentos produtores de insu-mos: biotecnologia, agroquímica, máqui-nas e equipamentos, equipamentos in-dustriais, genética animal e de plantas.

32

Mesmo assim, o volume de exporta-ções se manteve estável, embora avalores mais elevados.

A Organização Mundial do Café pre-vê um déficit de 11 milhões de sacasna safra 2007/2008, fundamental-mente por causa da bianualidade dassafras.

Os mercados consumidores tradicio-nais, formados por Estados Unidos,Europa Ocidental e Japão, responsá-veis prat icamente pela metade doconsumo mundial , tendem a cres-cer dentro da média mundial. Já ospaíses produtores, com um quartoda demanda mundial, e mais os pa-íses emergentes, crescerão acima damédia .

Índia, México e Indonésia, com pro-gramas para aumento do consumointerno de café, podem ampliar ademanda em 5 milhões de sacas. Amesma tendência cabe para o LesteEuropeu, a Rússia e a China, sob oefeito do aumento da renda e a as-piração por um est i lo de v ida oci-dental .

Em 2006, foi registrada a maior ven-da da história do Brasil em termos devalor (3,3 bilhões de dólares) e a se-gunda em quantidade, depois de2002. Há um cenário externo de opor-tunidades para consolidar e ampliaresta posição.

A exportação de café torrado e moí-do também apresentou um excelen-te desempenho, conforme acompa-nhamento feito pelo PSI (ProgramaSetorial Integrado) realizado pelaABIC em convênio com a Agência dePromoção de Exportações e Investi-mentos (APEX Brasi l). Os produtosbrasi leiros conseguem maior suces-so em mercados e segmentos quedemandam cafés de alta qualidade epagam maior valor unitário.

Para 2007, a previsão é que as expor-tações de café torrado e moído con-tinuem a crescer. Os EUA figuramcomo o maior mercado comprador eo Mercosul surge como boa opçãode negócios (5% das vendas).

Também vem crescendo o consumo interno. No Brasil, o café é uma bebi-da consumida por 94% da população pesquisada e é a segunda coloca-da no rank ing de preferênc ia , segundo pesquisa rea l izada pe la ABIC,entre homens e mulheres maiores de 15 anos. Perde apenas para a água.Mesmo com a retração das vendas ocorrida no varejo, principalmente noprimeiro semestre de 2006, e o fraco desempenho da economia naqueleper íodo, o consumo de café vo l tou a crescer no mercado interno.

Desde 2003, o consumo de café no Brasil evoluiu 19,2%, de 13,7 milhõespara 16,33 milhões de sacas. O mercado brasileiro representa 14% da deman-da mundial e mais de 50% do consumo interno de todos os 57 países produ-tores de café, estimado pela OIC em 31 milhões de sacas por ano. No mundo,segundo dados da Organização Internacional do Café (OIC), o crescimentonesse período ficou em 1,5% ao ano, na média.

Pesquisa anual realizada pela Interscience, mostra que se manteve, em 2006, a tendênciade crescimento do consumo em todas as classes sociais e faixas etárias, com certaestabilidade apenas no segmento mais jovem (15 a 19 anos). As pessoas consomem

Brasil Exportação de café torrado e moído

Ano Valor Quantidade Preço médio

2007*

2006

2005

2004

US$ 32,00 milhões

US$ 24,47 milhões

US$ 16,69 milhões

US$ 8,45 milhões

6.955 toneladas

5.400 toneladas

4.165 toneladas

2.696 toneladas

Us$ 4,60/kg

US$ 4,55/kg

US$ 4,00/kg

US$ 3,13/kg

Brasil: Consumo de café

Período Quantidade

Novembro de 2005 a Outubro de 2006 16,33 milhões de sacas

Novembro de 2004 a Outubro de 2005 15,53 milhões de sacas.

Fonte: Área de Pesquisa da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic)

Fonte: MDIC (*) PREVISÃO

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200714

ENTREVISTA

1. No século XX, a Embrapa contri-buiu para a expansão da agriculturabrasi le ira ao desenvolver umatecnologia tropical que permitiu a con-quista dos cerrados. Qual será o gran-de salto tecnológico no século XXI?

Nas três primeiras décadas do séculoXXI, provavelmente, o grande saltotecnológico será o de consolidar o Bra-sil como o maior produtor mundial deenergias renováveis a partir da biomassa.Obviamente, será alcançada a liderançana agricultura de fibras e alimentos, oque significa se consolidar como potên-cia mundial nas três agriculturas: alimen-tos, fibras e madeira e energia. Para queisto possa ocorrer, a Embrapa, com as ins-tituições de pesquisa e desenvolvimentonacionais, deverá dedicar parte substan-cial de seus esforços, investimentos e re-cursos humanos no desenvolvimento desistemas produtivos mais eficientes doponto de vista energético, com balançospositivos que permitam uma reduçãosubstancial do uso de insumos externose o aproveitamento total da biomassaproduzida. Isso significa gerar tecnologiade primeira e de segunda geração, indoda produção até o processo agroindustrialdas conversões.

2. Parcerias entre entidades públicasde pesquisa, como a Embrapa, e asgrandes empresas de biotecnologia,principalmente em áreas estratégicas,como a biotecnologia, são cada vezmais constantes. Como está o temadas Empresas de Propósito Específico(EPE)?

Avançamos muito nos últ imos me-ses sobre a questão da Empresa dePropósito Específico. No mês de ja-neiro, a proposta foi aceita pelo

Conselho Superior do Agronegócioda Federação das Indústrias do Esta-do de São Paulo (Fiesp). A Embrapapropôs a criação de uma EPE com focoem agroenergia.

A dificuldade que temos encontradoé a ausência de regulamentação maisclara e definida na esfera da inova-ção. Além da questão jurídica,estamos trabalhando outros três as-pectos: o plano de negócios; o valorda marca e da tecnologia da marca; ea gestão do negócio propriamentedito. Vale dizer que o principal ativoda Embrapa e das instituições de ci-ência e tecnologia é o conhecimento.No entanto, há pouca expertise nomundo e praticamente nada no Brasilque permita valorar conhecimento etecnologias expressas, por exemplo,em um banco de germoplasma, ouum conjunto de talentos e competên-cias. Portanto, um caminho a ser tri-lhado quase a partir do marco zero. Opróximo passo é iniciar a etapa deação, de colocar a empresa em funci-onamento. Com a força-tarefa cons-tituída entre a Embrapa e a Fiesp, acre-ditamos que, ainda neste semestre, aEPE em agroenergia possa estar fun-cionando.

Uma vez constituída uma primeiraEPE, com a segurança de que os ato-res públicos e privados poderão serbeneficiados mutuamente, será bemmais fácil implementar outras EPEs,considerando-se a competência daEmbrapa em P&D (Pesquisa e Desen-volvimento) e em Transferência deTecnologia, incluindo os diferentestemas como a biotecnologia, o me-lhoramento genético animal e vege-tal, a fertilidade e o manejo sustentá-vel de recursos naturais, entre outros.

Incluem-se aqui investimentos em re-cursos humanos e infra-estrutura quevêm sendo feitos em tecnologias por-tadoras de futuro, como é o caso dananotecnologia.

3. A Política de Desenvolvimento deBiotecnologia, lançada recentementepelo governo, pretende, em 15 anos,colocar o Brasil entre os cinco princi-pais países na pesquisa e geração deserviços e produtos biotecnológicos.Qual será o papel da Embrapa nesteprograma?

A participação de cientistas daEmbrapa foi fundamental na formu-lação do programa lançado pelo Go-verno Federal. Esta iniciativa deixa cla-ro que não haverá como se atingir ospatamares de produção e de qualida-de sustentáveis necessários aos inte-resses da agricultura nacional semque, nos próximos quinze anos, o Brasilpossa ser um líder, no mínimo domundo tropical, no desenvolvimentode tecnologias biotecnológicas, bemcomo um cliente destacado destastécnicas, a exemplo da clonagem ani-mal, da genômica, da caracterizaçãomolecular, da manipulação nano-mé-trica, da transformação genética, dosprocessos fermentativos e do melho-ramento genético. A Embrapa, sendoresponsável pela guarda do patri-mônio genético vegetal e animal doPaís, detendo um conjunto de unida-des em quase todos os estados dafederação, portadora de uma infra-estrutura de laboratórios com ativi-dades biotecnológicas e com o con-junto de pesquisadores espe-cializados de que dispõe, tem a res-ponsabilidade e a capacidade de li-derar as pesquisas em biotecnologiaaplicadas à agricultura, pecuária,

Dr. Silvio Crestana, Diretor-Presidente da Embrapa1

Bruno Blecher

1 Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. (N.R.)

31

Os aspectos conjunturais foram tra-tados via prorrogação das dívidas elançamento de contratos de opçõesde venda públicas e privadas de café.O Conselho Monetário Nacional au-torizou a repactuação de parte dosdébitos do setor em até 18 meses. Aintrodução do café na Política de Ga-rantia de Preços Mínimos permitiuque a cafeicultura tivesse acesso àslinhas de financiamento do MCR-6.2(Manual de Crédito Rural), para cus-teio e comercialização (neste últimocaso por meio dos Empréstimos doGoverno Federal - EGF e da Linha Especi-al de Crédito - LEC). O acesso aos recur-sos do Orçamento Oficial de Crédito -OOC , por outro lado, permitiu o lança-mento das opções públicas e privadascom equalização das taxas de juros e dospreços. Cerca de 3 milhões de sacas fo-ram colocadas nos leilões de opções.

Todas estas medidas permitiram o inícioda recuperação dos preços.

A questão estrutural foi tratada pelo CDPCcom o objetivo de "gerar renda e desen-volvimento harmônico em todos os elosda cadeia agroindustrial do café, promo-vendo a geração de divisas, de emprego,a inserção social e a sustentabilidadeambiental, em benefício da sociedadebrasileira".

Algumas ações foram desenvolvidas nes-ta tentativa:

I - Programa Nacional de Pesquisa eDesenvolvimento do Café - PNP&D/CAFÉ - Voltou a ser considerado es-tratégico, com a alocação crescentede recursos. Foi concluído omapeamento do Genoma Café e, apartir de 2007, será dada ênfase natransferência e difusão de tecnologia,com acesso de milhares de produto-res aos resultados das pesquisas.

I I - Projeto de AperfeiçoamentoMetodológico do Sistema de Previsãode Safras, denominado Geosafra - ACONAB - Companhia Nacional de Abas-tecimento - mapeou a área física ocu-pada pelos cafezais e está desenvol-

vendo metodologias para definição daprodutividade, o que contribuirá paraa consolidação do Sistema.

III - Levantamento dos estoques pú-blicos e privados - Os estoques, emabril de cada ano, são levantados edivulgados pela CONAB em proces-sos que vêm sendo aperfeiçoados econtribuindo para a transparência domercado.

IV - Programa Integrado de Marketingdos Cafés do Brasil - PIM/CAFÉ -Viabilizou um trabalho abrangente depromoção, envolvendo feiras,simpósios, concursos de qualidade,Café & Saúde e campanhas promo-

cionais veiculadas na mídia televisa-da, contando com representantes dacadeia cafeeira, no Grupo Gestor deMarketing - GGM, e do CDPC.

Boa parte destes programas foi exe-cutada com recursos do FUNCAFÉ,redirecionados e reorientados paraatender a toda a cadeia produtiva.

Foi, sem dúvida, um grande cresci-mento, consolidando ações, que, as-sociadas às perspectivas de mercado- produção mundial crescendo me-nos que o consumo - permitiu umamelhora na renda do setor, só nãomais efet iva em função do câmbiodesfavorável para as exportações.

Elaboração: MAPA/SPAE/DCAF

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 15

bioenergia e florestas para a produ-ção de alimentos, fibras, madeiras esubprodutos, de forma que o negó-cio da agricultura continue sendouma força singular na produção dealimentos, matérias-primas industri-ais, derivados e biocombustíveis.

4. Além do Brasil, onde a tecnologiatropical criada pela Embrapa está sen-do utilizada? Há acordos com outrospaíses?

A Embrapa possui acordos de coopera-ção bilateral, trilateral e multilateral. Amaior parte são acordos de cooperaçãobilateral, num total de 69, envolvendo 38países (América Latina e Caribe - 14;América do Norte e Europa - 9; África -9; Ásia e Oceania - 6) e 64 instituições.Esses acordos se expressam mediante oaporte de experiência científ ica,tecnológica e de inovação por instituiçõesde países parceiros como os Estados Uni-dos, Alemanha, França, Reino Unido,Holanda, Suíça, Japão, entre outros.

Para otimizar estas relações, a Embrapacr iou o Labex/EUA (em Beltsv i l le,Maryland, parceria USDA-ARS1), o LabexEuropa - França (Montpellier, parceriaAgropolis) e o Labex Europa - Holanda(Wageningen, parceria Universidade deWageningen). O objetivo dos Labex é re-alizar prospecção de oportunidades eparcerias para implementar projetos dedesenvolvimento científico, high-tech,intercâmbio de experiência científica,busca e intercâmbio na área de inova-ção, ou mesmo estabelecer e avaliar ce-nários tecnológicos.

Atualmente, temos dois acordos decooperação trilateral: com o Japão(JICA2), para treinamento de técnicos dospaíses africanos de língua portuguesae do Timor-Leste; e com o Fundo IBAS(Índia - Brasil - África do Sul), para trans-ferência de tecnologia e treinamentode técnicos da Guiné-Bissau. Estão vi-gentes, também, 20 acordos de coope-

ração multilateral com organismos in-ternacionais.

Além destes acordos, instalamos o Es-critório da Embrapa na África, em Gana.A Embrapa África tem o objetivo decompartilhar conhecimentos científicose tecnológicos para todo o continente,e assim contribuir com seu desenvolvi-mento sustentável, social e econômico,para a segurança alimentar e o comba-te à fome em toda a região. As ativida-des serão concentradas na transferên-cia de tecnologia, enfatizando asdemandas específicas de cada país,compatibilizadas em projetos de desen-volvimento agrícola. Além disso, aEmbrapa África vai desenvolver açõesde assistência técnica, treinamento edesenvolvimento de recursos humanos,bem como a prospecção de oportuni-dades para o agronegócio brasileiro,acreditando que será possívelimplementar duas agendas estratégi-cas para o Brasil: uma de caráter huma-nitário e outra de caráter empresarial.

5. Como estão as pesquisas na área daagroenergia? O novo Centro está funcio-nando?

A matriz energética mundial está emmudança. Ela está centrada em reser-vas fósseis. Do ponto de vista estraté-gico, reservas fósseis constituem-se emum recurso finito. A grandepotencialidade do mundo moderno ébuscar energias renováveis, dentre asquais, a energia de biomassa. Esse re-curso tem um forte propósito em fun-ção das grandes regiões tropicais domundo inteiro, que convertem ener-gia radiante do sol em energia debiomassa para fins de biocombustíveis,de eletricidade e outros fins agrega-dos. Nesse contexto, a Embrapa temum papel fundamental, levando-se emconta sua exitosa experiência de 34anos na agricultura de alimentos e porser uma instituição de excelência empesquisa, desenvolvimento e inovação(P&DI) em áreas tropicais. A Embrapa

pode também se constituir em umagrande contribuidora para o Brasil eparceira na agricultura de energias. Di-ante desse cenário, surge a EmbrapaAgroenergia, que está em funciona-mento desde o final do ano passado.Sua missão é coordenar e executar açõesde pesquisa nas quatro grandes plata-formas da agroenergia: etanol,biodiesel, florestas energéticas e resí-duos. Seguindo essa linha, estamos de-senvolvendo programas de P&DI para oetanol, especialmente de cana;biodiesel, nas culturas tradicionais deprodução de óleos vegetais (soja,mamona, dendê etc.); e naquelas ou-tras espécies vegetais potenciais comopinhão manso, algodão, macaúba, den-tre outras. Também na parte de flores-tas energéticas, estamos reestudandoos programas em andamento, reforçan-do os pontos focais para finsenergéticos, visando promover a tran-sição da idéia de aplicação e usos dabiomassa tradicional para a biomassamoderna. Em resíduos, o grande apeloé a oportunidade dos co-produtos e dasua utilidade para fins diversos. Essasquatro prioridades estratégicas se en-contram em pleno funcionamento, eestão sendo ampliadas na medida emque reforçamos a nossa equipe técni-co-científica.

Em relação a essa nova unidade deP&DI, estamos priorizando sua implan-tação. Para isso, toda estrutura e com-petência da Embrapa e das UnidadesDescentralizadas localizadas em dife-rentes regiões do Brasil e exterior es-tão sendo aproveitadas. Isto implicano fortalecimento de redes regionaisde pesquisa com o objetivo de con-centrar esforços para resolver as ques-tões regionalizadas. Estas parcerias in-ternas e externas constam de umametodologia própria e adequada àexperiência da Embrapa. A constitui-ção de redes regionalizadas de P&DI,ora em implementação, tem uma es-tratégia e um propósito definidos evai, por certo, encurtar caminhos, pou-par tempo e esforços e, é claro, econo-mizar energia.

1 US Department of Agriculture – Agricultural Research Service. (N.R.)2 Japan International Cooperation Agency. (N.R.)

30

CAFÉ

Roberto Rodrigues,Coordenador do Centro de Agronegócio da EESP da Fundação Getulio Vargas.

O caminho para a diferenciação

Acafeicultura amargou umacrise aguda entre 1997 e2002, refletindo a conjuntu-

ra de produção global superior aoconsumo. No período, os preços mé-dios de exportação brasileira do caféverde declinaram de US$ 189,60/saca de 60kg para US$ 46,23/sacade 60kg. Em 2002, embora o Brasiltenha exportado 28 milhões de sa-cas, o ano ficará na história como oápice de uma crise que destruiu arenda do setor, provocando umendividamento crescente dos cafei-cultores.

Ficou evidente, no início de 2003, anecessidade de adoção de medidasconjunturais que assegurassem nocurto prazo a sobrevivência da cafei-cultura, ao mesmo tempo em que seestruturasse um sistema de melhorordenamento das safras, com umadistribuição equil ibrada do café aolongo dos 24 meses seguintes.

Sempre que uma crise afeta um se-tor, a cadeia produtiva se desarticulaem busca do "salve-se quem puder".Assim estava a cafeicultura no come-ço de 2003. Mas graças à moderni-zação das lideranças, a cadeia se or-ganizou positivamente por meio doCDPC (Conselho Deliberativo da Po-lítica Cafeeira) - com representantesdo governo e dos diferentes elos daárea privada - em busca de duas ques-tões centrais:- conjuntural: o equacionamento do

endividamento do setor;- estrutural: a criação de polít icas

contracíclicas.

Luiz Antonio Pinazza,Consultor da FGV Projetos e Coordenador do Núcleo de Comunicação do Centro de Agronegócio da EESP-FGV.

Fonte: NYBOT - Valores: US$ Cents/libra

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6. As projeções para 2020 indicamcrescimento de 55% da demanda poralimentos no mundo. Ao mesmo tem-po, o relatório da ONU sobre mudan-ças climáticas alerta para os impac-tos ambientais de várias atividadeseconômicas, inclusive a agricultura.Como resolver esta equação?

Estima-se que a agricultura seja res-ponsável por 20% do efeito estufano planeta. Esta contribuição variamuito com relação às fontes predo-minantes de emissão de gases nosdiferentes países. Cada um possuiuma realidade específica e um histó-rico diferente de contribuição para oefeito estufa, fato este que pesa noestabelecimento de metas de redu-ção de gases entre os países.

No Brasil, o desmatamento e a queimade florestas representam a maior fon-te de emissão de gases (CO

2, CH

4, N

2O,

NOx) à atmosfera. A agricultura temum papel importante nesse contexto,se a mesma propiciar desmatamentonas práticas de plantio e pastoreio emáreas ainda não exploradas ou degra-dar áreas já ocupadas.

Além da necessidade de um bomzoneamento ecológico-econômico,é preciso uma maior difusão de co-nhecimento sobre os potenciais im-pactos da at iv idade agrícola e daspráticas mitigadoras nos diferentesbiomas. Também há que se consi-derar os efeitos potenciais da mu-dança do clima na agricultura, e osmeios para a sua adaptação, que dealguma forma se ref let irão nas fu-turas prát icas de manejo. Há umconjunto de at iv idades agrícolasque podem contribuir para a redu-ção das emissões de gases de efeitoestufa e que tendem a ser cada vezmais adotadas, à medida que hajauma maior conscientização sobre oproblema do aquecimento global eum acesso maior à informação pe-los agricultores e pela sociedade deum modo geral.

O plantio direto é uma técnica de pre-paro do solo que, se bem conduzida,contribui para a estabilização do es-toque de carbono nos solos. Este tipode manejo está atualmente presenteem mais de 20 milhões de hectaresno País, com perspectivas de cresci-mento. Outro sistema altamente pro-missor é a integração lavoura-pecuá-ria-floresta, que começa a ganhar forçaprincipalmente na recuperação depastagens pouco produtivas.

Pastagens bem manejadas fazem omesmo papel, a lém de melhorar aprodutiv idade animal, gerando al i-mento de maior qualidade.

A recuperação de áreas degradadas ede áreas de preservação permanente,além de ter um efeito ambiental de gran-de valor, inclusive na biodiversidade,propicia o seqüestro de carbono pelabiomassa vegetal (parte aérea, raízes esolos), funcionando como um impor-tante sumidouro de carbono.

O Mecanismo de Desenvolvimento Lim-po (MDL) e outros instrumentos do Pro-tocolo de Kyoto vêm sendo explora-dos cada vez mais, inclusive com aintrodução de metodologias de linhade base para projetos de florestamentoe reflorestamento (projetos de uso daterra). Desta forma, países como o Bra-sil podem contribuir muito para a re-dução de gases, por meio de projetosde MDL, ou vis-a-vis com uma fortepolítica de incentivos a agricultores eprodutores, em geral.

Novas dietas nutricionais para rumi-nantes estão sendo estudadas comvistas à redução de metano (CH

4) no

processo de fermentação entérica. Oideal é alcançar uma relação menorpossível em termos de kg de metano/kgde produto (carne, leite). Entretanto,há muito a se estudar nesse sentidoe o assunto ainda se reveste de mui-tos desaf ios.

O uso de biodigestores para o tra-tamento de dejetos animais propi-

c ia a redução de gás metano, 21vezes mais potente do que o CO

2

para o aquecimento global, ao mes-mo tempo em que contribui com aenergia alternativa (biogás) para usonas propriedades agrícolas, comconseqüentes benef íc ios econômi-cos e ambientais. Existem, hoje, deze-nas de projetos de MDL com base nouso de biodigestores em criações de su-ínos em vários países.

A crescente demanda por combustíveisalternativos encontra na agricultura umafonte substancial de matéria-prima, comgrande expectat iva para novastecnologias de geração de combustível.Ainda mais, lembrando que em paísestropicais como o Brasil, a atividadefotossintética elevada nos coloca em po-sição privilegiada.

Mas é importante que se tenha em vistafuturos impactos ambientais, econômicose sociais que poderão advir com a expan-são de áreas agrícolas voltadas à produçãode biocombustíveis. Daí a importância dese desenvolver projeções (cenários) para ouso dessas alternativas, bem como estimaras emissões de gases de efeito estufa rela-cionadas a essas atividades ao longo do tem-po, para se saber se a atividade realmentecontribuirá não só para a economia dospaíses, como também para o combate aoaquecimento global. Com isso, ostomadores de decisão poderão planejar ati-vidades antrópicas de acordo com cenáriossustentáveis no tempo e no espaço.

Finalmente, há que se ressaltar a im-portância da pesquisa agropecuáriana busca de conhecimento sobre opotencial de emissão de gases ge-rados por diferentes sistemas agrí-colas, pecuários, f lorestais eenergéticos, bem como os efeitosde diferentes manejos na reduçãode gases. O projeto Rede Agrogasesda Embrapa, criado em 2003, e emandamento, envolve o estudo devários sistemas de produção agríco-la, animal e agroflorestal, no senti-do de conhecer os fatores que le-

29

poderia sinalizar uma tendência demudança no ciclo. No entanto, é ra-zoável esperar que o número total defêmeas abatidas aumente em ummundo de crescimento de produtivi-dade. Além disso, houve uma redu-ção no abate informal no País, de acor-do com as estatísticas do número decabeças abatidas e do número de pe-ças de couro levantados pelo IBGE. Ouseja, como no mercado informal aba-tem-se proporcionalmente mais fême-as do que machos, a redução nainformalidade levaria naturalmente aum aumento nas estatísticas de aba-te de fêmeas. É possível notar, por-tanto, que os dados relativos ao aba-te de fêmeas podem não ser umprevisor do comportamento do reba-nho em um cenário de transforma-ções tecnológicas e mudanças da baseestatística.

Em decorrência das dúvidas expostasacima, torna-se fundamental o acom-panhamento dos preços do bezerropara ajudar na análise do comporta-mento futuro do rebanho brasileiro.Os últimos meses sinalizaram, em al-gumas praças, uma reversão nos pre-ços do bezerro com relação ao boigordo, após um período de sucessi-vas quedas. É possível, embora sejacedo para afirmar, que esteja ocorren-do um relativo encurtamento da ofer-ta. Caso essa trajetória de oferta seconsolide, pode-se esperar para o pró-ximo ano alguma melhora nos preçosinternos. Em outubro de 2006, com-pletou-se um ano desde o surgimentodo primeiro foco de aftosa no País.Em tese, os mercados europeu e chi-leno devem voltar a se abrir para oPaís, salvo se algum novo problemasanitário surgir nos próximos meses.Dado o já alto crescimento das expor-tações, a liberação desses mercadosconsiste em elemento relevante aoaumento da demanda pela carne ver-melha brasileira. A cada dia que pas-sa, o Brasil se consolida como grandeexportador de carnes. Esse é um ca-minho sem volta. É preciso, entretan-to, seguir o caminho da qualidade,da segurança do alimento, pois essaé a única forma de se aumentar o va-lor agregado de um produto que acada dia ganha melhor reputação nomundo todo.

Mapa: Número de cabeças por ha de município no Brasil em 2004

Mapa: Número de cabeças por ha de município no Brasil em 1990

Fonte: Dados originais IBGE

Fonte: Dados originais IBGE

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 17

vam à maior ou menor emissão degases, de forma a contribuir para es-tratégias de mitigação. Os cenáriosde emissões são também importan-tes instrumentos orientadores parapolíticas ligadas à questão do clima.

7. Técnicas como o plantio direto e aintegração lavoura-pecuária podem con-tribuir para se evitar o desmatamento?

Existem muitas áreas, principalmen-te na região do cerrado, que já foramabertas, ou seja, desmatadas. Grandeparte delas é ocupada por pastagensde baixa produtividade e baixos índi-ces zootécnicos. Tecnologias desen-volvidas pela pesquisa agropecuáriabrasileira possibilitam que elas sejammelhor aproveitadas dentro do con-texto da integração lavoura-pecuária-floresta e do plantio direto, com me-nor impacto social, econômico eambiental. Destas áreas, algo como40 a 45 milhões de hectares podemser utilizados com estes sistemas quedão mais sustentabilidade para oagronegócio. Contribuindo para amitigação do desmatamento, estastecnologias que foram desenvolvidaspela Embrapa e instituições estaduaisde pesquisa e ensino, nos últimosanos, possibilitam a utilização maisracional destas áreas já abertas. Coma utilização destas tecnologias, pode-se obter índices mais elevados de pro-dutividade tanto na parte animal,quanto na produção de grãos ou fi-bras e mesmo agroenergia. Destamaneira, o Brasil não necessitariadesmatar novas áreas para atender àcrescente demanda por aumento daprodução agrícola, podendo a pro-dução ser realizada em áreas já con-solidadas.

8. Na sua opinião, qual é o grande pro-blema tecnológico a ser enfrentadopelo agronegócio brasileiro?

Abstraindo-se dos problemas de ges-tão, infra-estrutura, logística e sani-dade que ainda nos afligem e que pre-cisam e podem ser melhorequacionados e resolvidos, talvez hajapouca dúvida de que o grande pro-

blema a ser enfrentado peloagronegócio nacional seja o decompatibilizar o crescimento na pro-dução com sustentabilidadeambiental e eqüidade social. Avan-ços significativos foram observados naredução de insumos externos nos sis-temas produtivos dos grãos, a exem-plo do uso intensivo de fixadoressimbióticos de Nitrogênio, da utiliza-ção massiva do plantio direto, do de-senvolvimento de cultivares adapta-das a solos com elevados teores dealumínio e baixo pH. Atualmente, ou-tros desafios se colocam à frente, aexemplo da necessidade por sistemasde produção menos dependentes deágua, cultivares mais adaptadas aestresses hídricos e a temperaturaselevadas, tolerantes às pragas e do-enças, modelos de convivência comas pragas e doenças que utilizem in-tensamente o controle biológico e umsistema mais eficiente de monito-ramento das trocas e estoques de ga-ses de efeito estufa.

Nunca o homem esteve tão convenci-do da necessidade de, além do ime-diato, pensar em médio e longo pra-zos, utilizando-se de tecnologiasmenos agressivas ao meio ambientena produção dos bens necessários àsua sobrevivência, preservando o Pla-neta Terra como habitat desta diversi-dade construída ao longo de milhõesde anos e imprescindível à existênciada espécie humana, que no conjuntonão passa de uma pequena parte nes-te complexo jogo da evolução da na-tureza.

A dimensão social da susten-tabilidade também é um grande de-safio que tem viés tecnológico e de-pende de conhecimento, na medidaem que a convivência harmônica queviabilize a eficiência dos sistemas deprodução dependerá da eqüidade deoportunidades a todos os produto-res: pequenos, médios e grandes. Aintegração entre eles em arranjosassociativos convenientes tambémserá necessária. O desenvolvimentoagrícola nacional, do ponto de vistada sua competitividade, sustenta-

bilidade e eqüidade também precisa-rá levar em conta as grandes diferen-ças regionais, buscando diminuí-las,assim como ampliar nossa capacida-de como nação e global player em in-fluir cada vez mais fortemente no ce-nário mundial das três agriculturas:alimentos, fibras e madeiras e ener-gia. Não acreditamos em nenhumasolução plausível para tais desafios,se não continuarmos a desenvolver eaplicar com radicalidade máxima todoo arsenal de conhecimentos etecnologias que o País for capaz deempreender.

9. E a agricultura familiar, está sendocontemplada?

A Embrapa tem produzido informa-ção e tecnologias mais baratas paraatender ao agricultor familiar, levan-do-o a se tornar mais competitivo.Uma das principais exigências do mer-cado internacional é em relação à sa-nidade. Neste ponto, temos traba-lhado com o Programa AlimentosSeguros (PAS) com o agricultor famili-ar, como no caso da Castanha-do-Bra-sil, do leite, do café e da uva.

A Embrapa vem desenvolvendo, tam-bém, novas variedades que devemapresentar superioridade com relaçãoa características como produtividade,resistência a pragas e doenças, adap-tação a condições específicas deestresse abiótico, ou outras caracte-rísticas importantes para os agricul-tores e para o mercado. Com isso, oganho para agricultura familiar foibastante significativo. Do ponto devista da organização e disponibi-lização da informação, lançamos emmarço deste ano o livro "AgriculturaFamiliar na Dinâmica da PesquisaAgropecuária" reunindo, pela primei-ra vez, todo o acervo de tecnologiasgeradas pela Embrapa, em conjuntocom o Sistema Nacional de PesquisaAgropecuária (SNPA), considerando asecorregiões brasileiras assim comoprocessos, produtos e técnicas trans-versais, na medida em que se aplicama múltiplos ecossistemas. Essa publi-cação retrata bem o que tem sido fei-to no campo da tecnologia e da pes-quisa em agricultura familiar.

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PECUÁRIA

Perspectivas do mercado de carne vermelha no Brasil

Alexandre Lahóz Mendonça de Barros,Professor da EESP e Coordenador do Núcleo de Pesquisas do Centro de Agronegócio da FGV / EESP.

Aeconomia da carne vermelhano Brasil segue misteriosa. Édifícil entender em profundi-

dade as transformações por que pas-sa o setor pecuário no País. O fatomais curioso do ano de 2006 diz res-peito ao mercado internacional e aovolume de abates. No final do anopassado, em conseqüência aosurgimento do foco de aftosa noMato Grosso do Sul, esperava-se umano de exportações mais fracas e, por-tanto, haveria pressão para redução novolume de abates. Entretanto, ocorreuo oposto: o volume de abate cresceuem 2006 e as exportações aumenta-ram 13,8% em volume e surpreenden-tes 26,3% em valor. A despeito disso,os preços recebidos pelos produtorescaíram em algumas praças, ou se esta-bilizaram em outras.

A pergunta fundamental a ser respon-dida é: por que há tanta diferença en-tre o comportamento dos preços nomercado internacional e no mercadointerno? Em algum momento, no fu-turo próximo, pode-se esperar umaaproximação entre esses mercados,como ocorre com a soja, por exemplo?

A resposta mais fácil para essaassimetria de preços é a taxa de câm-bio. A forte apreciação do real ocorri-da nos últimos três anos fez com queos preços internacionais traduzidos emreais se reduzissem fortemente. As co-tações no início de 2003 baseavam-seem patamares de R$3,50 por dólar, aopasso que, hoje, o câmbio situa-se aoredor de R$2,15. É uma perda de valorconsiderável. Não sabemos ao certo oefeito total dos preços internacionaisno processo de formação dos preçosinternos no Brasil, mas é certo que acrescente participação das exportações

na produção doméstica (hoje cerca de25%) está alterando o funcionamentodo mercado brasileiro em direção atorná-lo cada vez mais conectado aomercado mundial.

Entretanto, a taxa de câmbio não ex-plica tudo. É crescente a percepção deque os ganhos na cadeia da carne ver-melha estão concentrados no setor daindústria voltada à exportação, poisestão se beneficiando de um preço daarroba baixo no Brasil e um preço dacarne alto no mundo. O mesmo nãopode ser dito daquelas indústrias vol-tadas para o mercado doméstico, queestão trabalhando com margens mui-to baixas ou negativas.

Entendemos que os preços recebidospelos pecuaristas seguem baixos porum conjunto de razões. Do ponto devista da oferta, parece claro que a car-ne de frango vem estabelecendo umlimite de alta no preço da carne verme-lha no Brasil. A despeito do reconheci-do desejo de consumo dos brasileirospela carne bovina, as restrições de ren-da do consumidor associadas à ofertacrescente de frango restringem forte-mente o poder de alta da carne verme-lha. Esse fato ficou claro no evento dosurgimento da Gripe Aviária na Euro-pa. A queda do consumo de frango,naquele continente, e a súbita eleva-ção dos estoques europeus forçarama forte redução nas importações decarne brasileira de frango, o que, porsua vez, acabou por inundar o merca-do interno, pressionando as cotaçõesde todas as carnes para baixo. A que-da de margem da indústria domésticafoi instantânea.

Outra razão relevante para a determi-nação dos baixos preços do boi gordoestá relacionada com a grande oferta

de animais no Brasil. De acordo comos dados do IBGE, o rebanho brasilei-ro vem crescendo sistematicamente,em particular nas regiões Norte e Cen-tro-Oeste. Além disso, fica evidente quea produtividade do rebanho brasileirotambém cresce sistematicamente.Melhoria nutricional decorrente depreços baixos dos insumos advindosda agricultura, melhoria nas pasta-gens, uso crescente de melhoramen-to genético, avanço nas técnicas demanejo, integração entre lavoura epecuária etc., constituem a realidadeda pecuária de corte no País. Os ma-pas apresentados a seguir indicam adensidade do rebanho brasileiro emcada município do Brasil nos anos de1990 e 2004. Para elaborar os ma-pas, dividimos o número de cabeçasdo município por sua respectiva área.Sabemos que o ideal seria dividir orebanho pela área de pastagens, mas,infelizmente, essa informação nãoexiste para os referidos anos. Acredi-tamos, entretanto, que a divisão pelaárea do município constitui uma boaaproximação para se analisar o au-mento da produtividade. É nítido quehouve intensificação da produçãoem todo o País (cores mais escurasindicam maior relação de cabeças/hectare).

Até quando esse aumento de ofertase dará? Os baixos preços não estari-am estimulando a redução no reba-nho brasi leiro? É difíci l encontraruma resposta para essa questão, poisas estatísticas brasileiras relativas àpecuária de corte são precárias. Oparâmetro de dimensionamento docomportamento do rebanho futurotem sido, usualmente, a evolução doabate de fêmeas. Observa-se, nos úl-timos anos, respeitável aumento nonúmero de fêmeas abatidas, o que

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200718

Da mesma forma que a segu-rança alimentar foi um temadominante nas discussões do

pós-guerra, contribuindo para a for-mação da Comunidade EconômicaEuropéia e para o lançamento da Po-lítica Agrícola Comunitária, atualmen-te ganha destaque estratégico emtodo o planeta a questão da segu-rança energética. Não se obterá de-senvolvimento sem energia.

E, no caso das diferentes alternativaspara combustíveis, cresce a atençãointernacional para aqueles de origemagrícola, como o etanol e o biodiesel.O Brasil tem uma liderança notável noassunto, dada a experiência de 30anos do uso do etanol, desde oProálcool, criado em 1975 como res-posta aos choques do petróleo.

O tema apresenta uma dimensão mui-to maior do que se tem escrito e discu-tido: trata-se de uma mudança na civi-lização. É interessante, a propósito, queem poucas décadas do século XX, te-nha sido constituída toda uma civiliza-ção energética sobre um produtofinito, fóssil, mal distribuído entre ospaíses e manejado por poucas empre-sas: o petróleo. É verdade que isto tudose deu graças a preços muito baixosdos seus derivados e ao fato de, na-quele tempo, a questão ambiental nãoser considerada relevante.

De qualquer maneira, hoje está evi-dente que esta era vai chegando aoocaso. E que a biomassa é a grande

saída, no propósito da construção deoutra civilização, muito mais demo-crática (porque qualquer país podeproduzir seu próprio combustívelrenovável) e ambientalmente mais cor-reta. Na matriz energética brasileira, abiomassa já representa 29%, enquan-to que na mundial apenas 11%.

A nossa área agricultada é hoje de 62milhões de hectares; perto de 6 mi-lhões são cultivados com cana-de-açú-car, dos quais 50% vão para a produ-ção de etanol e os outros 50% para aprodução de açúcar. Com isso, pro-duzimos mais de 16 bilhões de litrosde etanol, dos quais consumimos 14e exportamos o resto. Temos um po-tencial de mais 22 milhões de hecta-res aptos para a cana-de-açúcar, o quesupera de longe qualquer país ou atécontinente do planeta inteiro. Comotemos mais 90 milhões de hectarescultiváveis (dos atuais 200 milhões de

hectares de pastagens, portanto sementrar em ecossistemas como a Ama-zônia), o aumento da área da cananão irá prejudicar a produção de ali-mentos ou fibras. Prova disso é que,nos últimos 15 anos, a área plantadacom grãos cresceu 23%, enquanto aprodução cresceu mais de 110%. Tam-bém as carnes cresceram na mesmaproporção. Há, portanto, espaço paraaumentar a produção de etanol - e oBrasil é de longe o país com os meno-res custos de produção - sem que istointerfira no crescimento, em iguaiscondições, da oferta alimentar.

Aliás, é possível dobrar, em 15 anos,a produção de álcool por hectare, comnovas tecnologias já em avaliação eestudo. Hoje, produzimos 7.000 litrosde álcool por hectare.

O carro flex fuel, marca registrada bra-sileira e que começa a ser copiado no

Roberto Rodrigues,Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV/ EESP

Luiz Antonio Pinazza,Consultor da FGV Projetos e Coordenador do Núcleo de Comunicação do Centro de Agronegócio da FGV/EESP

AGROENERGIA

Um novo paradigma agrícola

Quadro 1 - Produção, Consumo e Exportação de Etanol

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A alta nos preços dos grãos afetadiretamente essas cadeias, amplian-do as possibilidades de exportação,tanto de milho quanto de soja. O Bra-sil se caracterizou, nos últimos anos,como um exportador eventual de mi-lho: dependendo das condiçõesconjunturais do câmbio, dos preçosinternacionais e da demanda domés-tica, nossas exportações saltaram dacasa de 1 milhão de toneladas para oscerca de 4 milhões em 2006, por exem-plo. Entretanto, com a mudança estru-tural no mercado de milho nos EUA,abre-se a oportunidade de o Brasil con-solidar-se como um exportador estru-tural de milho. Essa situação alterará opadrão da produção no sul do País,que é a região verdadeiramentevocacionada para exportar milho, emvirtude da excelente logística da região.

A alta no preço do milho no merca-do internacional tem como conse-qüência, ainda, a elevação dos cus-tos de produção de carnes,especialmente no mundo desenvol-vido, que é totalmente dependentede ração. Temos assistido, recente-mente, a sucessivas manifestaçõesde executivos dos principais gruposnorte-americanos de produção dealimentos alegando que está se tor-nando inviável produzir carne (es-pecialmente de frango e suína) comos custos atuais da ração.

Ora, esse fato tende a est imular aprodução brasileira não somente degrãos, mas também de proteína ani-mal (carne bovina, suína, de frangoe leite). Os EUA respondem por par-cela relevante das exportaçõesmundiais de carne de frango, suína ebovina. Com a perda de com-petitividade dessas exportações de-correntes da alta do preço da ração,abre-se oportunidade para o incre-mento da produção do setor pecuá-rio brasileiro. O País encontrará ple-nas condições de ampliar suasexportações de frango, de carnesbovina e suína e, até, de leite.

Como compat ib i l i zar exportaçãomaior de milho e simultaneamentede carnes? É poss íve l aumentar apart ic ipação em todos esses mer-cados? Entendemos que s im. Em-bora a área cultivada com grãos te-nha l imitações de expansão naRegião Sul, o mesmo não pode serdito da Região Centro-Oeste. Comocomentado em outros art igos des-se periódico, o potencial produtivodo cerrado é considerável. Além denovas áreas a serem ocupadas, háa possibilidade de se produzir duassafras em um único ano. Atualmen-te, muitas vezes os agricultores nãofazem a segunda safra por total au-sência do est ímulo de preços. En-tretanto, com a crescente deman-da de mi lho para exportação naRegião Sul, as empresas de aves ede suínos acelerarão seu processode expansão para o cerrado, embusca de matéria-prima mais bara-

ta. O surgimento da demanda fa-vorecerá os preços dos grãos nocerrado, est imulando a produçãoda safrinha. Uma vez que o merca-do internacional estará demandan-do so ja (posto que a produçãoamer icana deve se reduz i r ou, nomáximo, se manter nos padrõesatuais ) , a produção dessa legumi-nosa deverá segui r t ra jetór ia deexpansão no cerrado, o que refor-ça a área potencial de aumento dasafrinha, gerando portanto, um ci-c lo v i r tuoso de cresc imento tantoda agricultura, quanto do segmen-to pecuário brasi le i ro.

Pode-se ver, portanto, que a entradado mundo desenvolvido e subdesen-volvido na produção e consumo deagroenergia abre enormes possibili-dades para diversos segmentos daagropecuária brasileira, em especialo de grãos e o de carnes.

Figura 1: Área agrícola disponível e ocupada em países selecionados(1.000 hectares)

Fonte: Estimativas da AGE/MAPA Fonte: FAO/2005

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exterior, vai exigir, nos próximos 10anos, um aumento de 12 bilhões delitros, só para o consumo interno. Paraisso, já estão em construção 43 novasdestilarias no País, e uma centena deoutras estão sendo projetadas.

É importante citar que o álcool é com-petitivo com o barril de petróleo aci-ma de US$ 37 (com o dólar equiva-lente a R$ 2,13).

Já a Assessoria de Gestão Estratégica(AGE), do Ministério da Agricultura,tem uma visão ainda mais audaciosa(Quadro 1).

As projeções da produção, consumo eexportação do etanol refletem grandedinamismo desse produto, devido aocrescimento tanto do consumo internoquanto das exportações. Projetada para2017, a produção é de aproximada-mente 38,6 bilhões de litros, mais queo dobro da produção de 2006. O con-sumo interno para 2017 está projeta-do em cerca de 28,4 bilhões de litros eas exportações em aproximadamente10,3 bilhões. A Secretaria de Produçãoe Agroenergia do MAPA projeta, para2010, vendas de um milhão de auto-móveis Flex, mais que o dobro do volu-me de automóveis a gasolina, cujas ven-das projetadas são de 467 milunidades.

Há ainda outras matérias-primas de-rivadas da biomassa, como a celulo-se, avançando muito nos Estados Uni-dos ao lado do etanol de milho.

O que falar do biodiesel? É outro temaem que não nos faltam matérias-pri-mas: mamona, dendê, pinhão manso,algodão, girassol, amendoim, sebo bo-vino, resíduos agrícolas em geral, en-fim, não há limite para nossas condi-ções de produção, que incorporam todotipo de agricultores, desde o familiaraté o grande empresário integrado everticalizado, além das cooperativas.

Internamente, esta importante evolu-ção representa mais de 1 milhão de

novos empregos diretos e indiretos,num modelo de desenvolvimento quese adequa às regiões mais pobres doPaís. Vamos exportar os biocom-bustíveis, bem como os equipamentose a tecnologia que dominamos. Istoquer dizer mais renda e mais empregopara o Brasil.

Mas, dentro da grande ambição, o querealmente faz diferença é a chance deliderarmos a criação de uma civilizaçãomais equilibrada.

Para isto, algumas coisas são funda-mentais:

- coordenação: há pelo menos sete mi-nistérios interessados no assunto, alémde uma dezena de instituições gover-namentais. É fundamental um grandeentendimento público, para que a es-tratégia seja unificada.

- ação privada: precisamos transfor-mar o etanol e o biodiesel emcommodities. Para tanto, é mister es-timular a produção em outros países,estabelecer padrões e parâmetros in-ternacionais (antes que outros o fa-çam) e, sobretudo, "vender a idéia"para potenciais grandes consumido-res, como países asiáticos.

- tecnologia: embora detenhamoshoje a melhor tecnologia mundial noassunto, este é um processo dinâmi-co e, se não investirmos vigoro-samente, outros países nos tirarão ocomando dos processos. Investimen-tos em desenvolvimento e pesquisasprecisam ser feitos também pelo se-tor privado, já que o Estado não dis-põe de recursos suficientes.

- recursos humanos: dados a amplia-ção espetacular da área com cana e onúmero crescente de unidades indus-triais, será necessária a formação de re-cursos humanos altamente capacitadospara desenvolver o setor.

- seriedade: há muita liquidez internacio-nal e muita gente quer investir no setor

brasileiro. Precisamos tratar estes recur-sos com muita seriedade, para não colo-carmos a perder uma chance única que ahistória nos oferece de mudar o mundo.

Enquanto isso, como ficam os EstadosUnidos? Funcionaria um acordo do Bra-sil com os EUA para a promoção doetanol tanto na questão hemisféricaquanto mundial?

Em seu discurso no Congresso dos Es-tados Unidos (EUA), em janeiro de 2007,o presidente George W. Bush voltou acriticar a dependência americana de pe-tróleo e a necessidade de aumentarsubstancialmente o consumo de com-bustíveis como o etanol. A declaraçãoalimenta a esperança dos usineiros na-cionais, pois as vendas para o mercadonorte-americano cresceram de maneiraformidável nos últimos anos.

A meta estabelecida pelo presidente éelevar a produção de 28,4 bilhões para132,5 bilhões de litros entre 2012 e2017, para reduzir o consumo de gaso-lina em 20%. Esse volume será quatrovezes superior à produção brasileiraprevista para o período. O consumo atu-al é de 18,9 bilhões de litros.

Com 110 usinas em operação e outras73 em construção, a produção deetanol conta com medidas protecio-nistas. O etanol importado recebe umatarifa de US$ 0,14 por litro. Essa políti-ca acaba de ser renovada pelo Con-gresso americano e permanecerá emvigor pelo menos até o final de 2008.Os subsídios federais de US$0,14 porlitro, recebidos pelas destilarias paramisturar 10% de etanol na gasolina,têm prazo até 2010.

Nos EUA, a matéria-prima para a pro-dução de etanol é o milho. Muitas usi-nas são controladas pelos fazendeiros.O lobby do Meio-Oeste, região produ-tora de grãos, é centenário e tem sen-tido nacionalista. O governo em Wa-shington conhece esse poder e aseleições presidenciais de 2008 come-çam a pesar nas tomadas de decisão.

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MILHO E SOJA

Os efeitos da agroenergia na produçãobrasileira de milho e soja

Alexandre Lahóz Mendonça de Barros,Professor da EESP e Coordenador do Núcleo de Pesquisas do Centro de Agronegócio da FGV / EESP.

Em setembro de 2006, os mercadosinternacionais de grãos sofreram sú-bita e surpreendente reversão

altista. A principal razão para tão agres-siva mudança foi a percepção, por partedos mercados no mundo todo, de quehavia algo de novo no mundo agrícola: ademanda por produtos para a geraçãode energia. Ora, essa mudança não énada trivial. Na verdade, se trata de umatransformação estrutural na economiaagrícola internacional. É claramente umamudança produtiva de paradigma.

Como toda mudança estrutural, é muitodifícil antever todas as transformações naprodução agropecuária no mundo e noBrasil. É possível, entretanto, vislumbraralgumas conseqüências dessa transforma-ção para o mundo agrícola. Para tanto,vale a pena analisar o que vem ocorren-do com a produção norte-americana deetanol.

Os Estados Unidos da América res-pondem por mais de 40% da ofertade milho do mundo, atingindo pro-duções que oscilam entre 280 e 300milhões de toneladas. Para se ter umaidéia da distância da produção nor-te-americana sobre os demais paí-ses, basta olhar para a China e o Bra-si l : a produção chinesa de milhositua-se entre 130 e 140 milhões detoneladas; a brasileira, ao redor de40 e 45 milhões. Os EUA são tam-bém os maiores exportadores de mi-lho do mundo, com volumes da or-dem de 55 milhões de toneladas.Essa imensa produção sempre foidestinada ao consumo humano di-

reto e, especialmente, ao consumoanimal, segmento que responde porcerca de 155 milhões de toneladas.Entretanto, nos últimos dois anos, ademanda de milho para produção deetanol aumentou consideravelmente:de acordo com dados do USDA1, o con-sumo de milho para etanol atingiu, em2005, cerca de 44 milhões de tonela-das. Projeta-se que, já em 2007, serãoabsorvidas algo entre 55 e 60 milhõesde toneladas de milho para a produ-ção de álcool. Diversos estudos norte-americanos indicam que em um hori-zonte de 3 a 5 anos, o consumo demilho para etanol superará 100 mi-lhões de toneladas, o que correspondea 1/3 da produção atual.

A demanda criada pela produção debiocombustível elevou consideravel-mente o preço do milho no mercadointernacional. As cotações saltaramem curto espaço de tempo do inter-valo de US$ 2,3 por bushel2, para maisde US$ 4,2 por bushel (mercado fu-turo). Esse movimento deve-se a umasérie de fatores. Primeiramente, osanalistas e investidores de mercadoperceberam, após diversas manifes-tações do setor público dos EUA, quea agroenergia chegou para ficar e setornou um elemento estratégico detodos os países desenvolvidos. Assim,essa nova demanda seguirá pressio-nando os mercados internacionais.Em segundo lugar, é certo que a áreacultivada nos EUA, Europa, China e

Índia não tem como aumentar, postoque já se ocupa quase a totalidade daárea agrícola potencial desses países.

Como conseqüência desse fato, apressão de demanda no curto prazoconverteu-se em alta do preço domilho e, junto com ele, das demaisculturas anuais (especialmente osgrãos). Os mercados, como sempre,anteciparam os movimentos futuros.Como o preço do milho subiu muito,é de se esperar que a área de milhocresça em detrimento da área de ou-tras lavouras anuais, com destaquepara a soja. Com isso, projeta-se re-dução na oferta futura desses ou-tros grãos, forçando os preços paracima, e arbitrando os mercados dosdiferentes produtos agrícolas. A con-seqüência no curto prazo é que to-das as lavouras anuais entraram emum processo de recuperação de pre-ços e rentabilidade. No médio prazo,entretanto, é possível antever umaresposta nas regiões com potencialde expansão de área cultivada.

E é aqui que entra o Brasi l. Comopode ser visto na Figura 1, o País cons-titui uma das últimas fronteiras agrí-colas do mundo. A única outra re-gião com potencial de expansão é aÁfrica, em que pesem as dificulda-des geopolít icas e a ausência deinfra-estrutura da região. Como con-seqüência, um novo ciclo de expan-são produtiva se abre ao Brasil.

1 United States Department of Agriculture (N.R.)2Medida equivalente a 27,215kg. (N.R.)

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200720

Na balança dos prós e contras, umaação estratégica entre Brasil e EUA afavor do etanol parece ser viável. Ogoverno nacional já entregou um me-morando ao Departamento de Estadodos EUA com manifestação dessa in-tenção. O irmão do Presidente Bush,Jeb Bush, governador da Flórida, já seposicionou favoravelmente.

O subsecretário de Estado america-no para Assuntos Políticos, NicholasBurns, em visita este ano ao Brasil,manifestou a intenção de um acor-do dos EUA com o Brasi l sobrebiocombustíveis, baseado em trêsvertentes:

1. Como responsáveis por 70% daprodução mundial de etanol, éestratégica uma cooperaçãomaior entre o governo e o setorprivado dos dois países;

2. Est ímulo ao envolv imento deoutros países, para o desenvol-

v imento e formação de merca-dos para os biocombustíveis;

3. Ampliação do mercado globalpara os biocombustíveis, princi-palmente o etanol, para torná-lo uma commodity global.

A idéia inicial é a escolha de um paísda América Centra l para o desen-vo lv imento de um pro jeto p i loto.Os setores pr ivados dos dois pa í -ses já possuem uma parceira em ElSa lvador. A ARFS (Amer icanRenewable Fuel Supliers) é uma usi-na des idratadora de á lcool loca l i -

zada em Donsonate, com capital deempresas bras i le i ras, americanas esalvadorenhas.

Os americanos estão conscientes deque necessitam do produto impor-tado. Os efeitos da febre por etanolaquecem os preços dos grãos. Omilho ganha uma demanda alterna-tiva e a soja e os outros grãos per-dem área para o cereal. Os custosde produção aumentam para os cri-adores e para a indústria de alimentos.Muitos grupos de interesse são afetadose resta aguardar como reagirão.

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da das empresas, os relatórios tra-zem valiosas informações inéditas, eàs vezes surpreendentes, sobre suascontribuições econômicas. Vejamosalgumas conclusões desses estudos.

No caso da Aracruz, o estudo estimouque a empresa foi responsável pelageração de R$ 3,397 bilhões de ren-da na economia brasileira em 2003,o que correspondeu a 0,24% do PIBbrasileiro. O seu valor adicionado res-pondeu por quase 5% do PIB do Es-pírito Santo. Considerando os em-pregos diretos e indiretos, asatividades da Aracruz sustentaram95,8 mil empregos naquele ano. Em2005, as exportações da Aracruz pro-duziram US$ 1,005 bilhão de divi-sas, o que representou aproximada-mente 0,9% de todas as exportações

brasileiras. Esse montante seria sufi-ciente para pagar todas as importa-ções de trigo, farinha de trigo, leite,laticínios, carnes e livros.

O estudo da Veracel revelou outrastantas informações desconhecidassobre as atividades da empresa. Em2006, a contribuição da Veracel paraa economia brasileira atingiu R$ 516milhões e suas atividades sustenta-ram 30,4 mil empregos. Nesse mes-mo ano, as atividades florestais daempresa responderam por 1,4% detodo o valor da produção agrope-cuária baiana, enquanto que a partici-pação das atividades industriais no PIBda indústria estadual atingiu 1,2%. En-tre 2003 e 2006, a implantação da fá-brica e a expansão das atividades flo-restais da Veracel contribuíram com

60% de todo o crescimento econômi-co observado nos municípios do ex-tremo sul da Bahia. A Veracel tam-bém foi responsável diretamente por19,2% dos novos postos de trabalhogerados neste período. De tudo quea cadeia produtiva da Veracel adicio-na de valor à economia brasileira, maisde 32% retornam para a sociedadedurante o período de produção. Fo-ram R$ 313 milhões, em 2006.

No caso dessas duas empresas, asanálises da FGV Projetos geraram in-formações novas que surpreenderampositivamente inclusive algumas daspessoas diretamente envolvidas comessa atividade. Criaram, enfim, osubstrato necessário para mostrar àsociedade qual o valor dessasempresas.

Fonte: Embrapa e Universidade da Califórnia

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ENERGIAS RENOVÁVEIS

Virgílio Gibbon,Doutor em Economia pela Fundação Getulio Vargas e Consultor da FGV Projetos.

Os ganhos ambientais como instrumento definanciamento de energias renováveis

OMecanismo de Desenvolvi-mento Limpo (MDL) foi, semdúvida, o mecanismo de flexi-

bilidade do Protocolo de Kyoto quemais virtudes encerrava em sua concep-ção. Além de permitir o comércio dasReduções Certificadas de Emissões, vi-sava, também, atrair fluxos de investi-mento dos países desenvolvidos (Ane-xo I) para os países em desenvolvimento.Tais investimentos, além de trazeremembutida uma tecnologia menos emis-sora de gases do efeito estufa, deveri-am promover o desenvolvimento den-tro dos princípios de sustentabilidadeambiental, social e econômica.

O MDL vem se desenvolvendo a umataxa substancial. Porém, raros são osprojetos que apresentam aporte ex-pressivo de capital estrangeiro. Portan-to, se por um lado o Mecanismo vemcumprindo a contento sua função deflexibilizar os custos para os países doAnexo I, por outro, tem deixado a de-sejar como instrumento capaz de atra-ir investimentos daqueles países paraas economias em desenvolvimento.Esta fraca performance na capacidadede canalizar poupanças externas pare-ce, entretanto, ser determinada pelaprópria natureza do Mecanismo.

Com efeito, o MDL é multisetorial. Por-tanto, as decisões de investimento seoriginam em um amplo espectro deinteresses e motivações. A convergên-cia dessas motivações com as oportu-nidades, quando as primeiras residemno Hemisfério Norte e as segundas noHemisfério Sul, é naturalmente difícil.

Como diriam os economistas, esse en-contro possui um elevado custo de in-formação e de transação, além de umapreciável componente de risco.

É, portanto, de se esperar que, quantoa esse aspecto - a atração de investi-mentos externos - o MDL deva se de-senvolver lentamente, seguindo a cro-nologia própria dos negócios complexos.

Porém, o Protocolo de Kyoto trouxeembutido, em sua gênese, um pode-roso instrumento: o "Princípio das Res-ponsabilidades Comuns, porém Dife-renciadas". A conseqüência práticadesse Princípio foi o estabelecimentode metas de redução de emissão, sobpena de multa, para os países desen-volvidos, considerados os maiores res-ponsáveis pelo estoque acumulado degases do efeito estufa na atmosfera.

Esse Princípio, ao gerar um custo paraos países do Anexo I, deflagrou umamudança no comportamento dasempresas e governos, que resultouno surgimento de um mercado glo-bal de Reduções de Emissões e incu-tiu, nas políticas públicas, a consci-ência quanto à gravidade doproblema da mudança climática.

Portanto, o significativo movimentoque temos presenciado no sentido dasubstituição dos combustíveis fósseispor aqueles de natureza renovável étambém uma conseqüência da obri-gação de redução de emissão preconi-zada pelo Protocolo de Kyoto, uma vezque os países desenvolvidos, ao subs-tituírem suas fontes de energia, atin-

gem mais facilmente as metas que lhesforam impostas.

Porém, o Protocolo de Kyoto não pre-vê nenhum mecanismo por meio doqual os países em desenvolvimentopossam se beneficiar ao exportarembiocombustíveis para os países desen-volvidos.

As metas de redução de emissão e asmultas - impostas aos países do Ane-xo I - transformam a importação debiocombustíveis, por aqueles países,em um negócio com duplo potencialde margem de ganho: o primeiro, ex-presso pelo próprio diferen-cial de preço entre os dois combustí-veis e o segundo, pelo ganhoambiental que também possui signi-ficativo valor econômico e será apro-priado pelos países desenvolvidos emtermos de redução de emissão de ga-ses do efeito estufa.

Esse ganho, que a princípio pode pa-recer de difícil apropriação por partedos países em desenvolvimento, poisnão se enquadra dentro do Mecanis-mo de Desenvolvimento Limpo, pode,entretanto, viabilizar um novo merca-do de capitais capaz de canalizar umsubstancial volume de recursos paraas economias em fase de expansão,por meio de investimentos concen-trados no setor de biocombustíveis.Essa possibilidade tem potencial parase transformar em um instrumentocapaz de satisfazer o segundo objeti-vo que motivou a criação do MDL: ode promover o desenvolvimento sus-tentável dos países Não Anexo I.

24

EMPRESA DO AGRONEGÓCIO

Fernando Garcia,Professor da EESP-FGV e Consultor da FGV Projetos.

O valor da empresa do agronegócio

Qual o valor de uma empresa?Para o acionista, a resposta équase imediata, pois há uma

série de metodologias de avaliação euma infinidade de informaçõescontábeis da empresa de fácil acessoe, hoje, praticamente instantâneas.Sejam os majoritários, sejam os acio-nistas pulverizados no mercado, asinformações financeiras e de produ-ção da empresa de que eles necessi-tam são bastante acessíveis e trans-parentes, na maioria das empresasde grande porte.

Não obstante, responder quanto vale umaempresa para a sociedade é tarefa bemmais complexa. E essa é uma perguntaque tem ganhado expressão entre seto-res sociais organizados que, de formacrescente, interferem na opinião públicae interagem com as grandes corporações.No caso do agronegócio, essa é uma ten-dência no País, aos moldes do que ocor-re no mundo. O agronegócio, por envol-ver questões ambientais, fundiáriase sociais reúne empresas que, usual-mente, estão no foco de debatesamplos com a sociedade. Exemplosdisso são as empresas do segmentode fumo e bebida, imersas em ques-tões relativas à saúde; as de defensi-vos, sempre presentes nas discussõesambientais; e as de pecuária de cor-te, em aspectos relacionados a ques-tões fundiárias.

Os setores da sociedade que pressi-onam essas empresas, na maior par-te das vezes de forma válida, centramsua atenção em questões específicas,

Ana Maria Castelo,Consultora da FGV Projetos e Professora do MBA de Construção da EESP-FGV.

desconsiderando o todo que umaempresa representa para uma regiãoou para a economia nacional. Revelarà sociedade esse outro lado da em-presa, ou seja, sua importância regio-nal e para a economia nacional, assimcomo suas ações de sustentabilidade,é uma estratégia com efeitos positi-vos sobre a imagem da empresa, eque funciona como um importantebalizador de políticas. Trata-se de uminstrumento de transparência que for-nece elementos novos ao diálogo coma sociedade.

Recentemente, a FGV Projetos desenvol-veu vários estudos nesse campo, os quaismedem e avaliam a contribuição econô-mica e social de grandes empreendimen-tos do agronegócio para o desenvolvi-mento regional e do País. Foram os casos,por exemplo, dos estudos realizados so-bre a Souza Cruz, no mercado de fumo,e a Aracruz e a Veracel na área de celulo-se. Também o setor de bebidas quentes -destilados e vinhos - recebeu tratamentono que diz respeito à sua contribuiçãoeconômica.

Baseados numa metodologia origi-nalmente desenvolvida pela FGV Pro-jetos para a vice-presidência de as-suntos governamentais do McDonald'sem Chicago, esses estudos mostramde que forma as atividades de umaempresa contribuem para o desen-volvimento econômico e social dasregiões em que ela atua e para a eco-nomia como um todo. Os estudossão fundamentados em uma análiserigorosa - que segue os protocolos

científicos - das informações quanti-tativas e qualitativas das empresas ede seus fornecedores. Eles iniciam peladescrição dos elos da cadeia produtivada empresa para, na seqüência,quantificar seu potencial de geraçãode riqueza para a sociedade. Tambémsão avaliadas questões relativas àsustentabilidade dos negócios, umaanálise alicerçada na avaliação das ati-vidades que garantem o contínuo au-mento da produtividade, a inserçãonas comunidades e a geração de opor-tunidades regionais.

As informações dos balanços das em-presas, e aquelas levantadas pela FGVProjetos especialmente para os estu-dos, são avaliadas tendo por referên-cia as estatísticas oficiais das ContasNacionais e Regionais do País e de ou-tras pesquisas de fontes oficiais. Ametodologia adapta as informaçõescontábeis e financeiras das empresas,ou do setor de atividade, para inserí-las no modelo de contabilidade soci-al do País. Construída com base nateoria de Leontief, a metodologiatambém permite medir os efeitosmultiplicadores das atividades dasempresas, indo além da métrica res-trita às operações visíveis das mesmas.

Os estudos na área de celulose

Os estudos realizados em 2006 e em2007 para a Aracruz e a Veracel sãoexemplos do potencial de geração deinformações dessa metodologia.Além de servirem como uma radio-grafia econômica da geração de ren-

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200722

De fato, os países com potencial cli-mático e territorial, capazes deviabilizar uma expansão da produçãode biocombustíveis compatível com oaumento previsto da demanda, são,geralmente, países em fase de desen-volvimento, carentes de capital e commecanismos de financiamento de lon-go prazo que, quando existentes, cos-tumam se caracterizar por taxas de ju-ros elevadas ou por uma exigênciaexcessiva de garantias.

Assim sendo, torna-se extremamenteoportuno o surgimento de um ganhoambiental passível de ser utilizadocomo indutor de investimentos inter-nacionais. Restaria criar um modelo definanciamento para os novos projetosque, por meio de recursos externos,permitisse a participação majoritária doempresariado doméstico, concomi-tantemente a um mecanismo pelo qualo ganho ambiental fosse tambémapropriado pelos países em desenvol-vimento, permitindo que o “Princípiodas Responsabilidades Comuns, po-rém Diferenciadas” continuasse a serimplementado.

O objetivo deste artigo é estabelecer asbases para a criação de referido mode-lo, bem como do mecanismo para autilização dos ganhos ambientais comoredutor do custo de capital.

O MODELO PARA O FINANCIAMENTO

DOS NOVOS PROJETOS

A substituição de combustíveis fósseispor combustíveis de origem renovável,ao significar uma profunda mudançana matriz energética mundial, requerestabilidade no suprimento dos novoscombustíveis, o que, geralmente, é ob-tido por meio da celebração de contra-tos de fornecimento de longo prazo.

Esses contratos, para apresentarem acredibilidade necessária à decisão demudança da política energética de umpaís, deverão ser celebrados entre em-presas de grande porte, como tradingsinternacionais ou empresas de ener-gia. Por esse motivo, os contratos deexportação de biocombustíveis podemse transformar em ativos que se carac-terizam por apresentar um fluxo de re-cebimentos futuros assegurados por

empresas com investment grade , oque os torna passíveis de serem des-contados e, conseqüentemente, dese constituírem no lastro principal deproject finances voltados para o fi-nanciamento de empreendimentospara suprir a oferta adicional de com-bustíveis renováveis.

A celebração de contratos de exporta-ção de longo prazo, portanto, permitea criação de instrumentos de captaçãode recursos em que os investidorespodem ser os próprios países impor-tadores de biocombustíveis - países de-senvolvidos -, pois estarão descontan-do um fluxo de recebíveis que elespróprios pagarão, o que, por si só, járepresenta uma considerável reduçãodos riscos de crédito.

Os Fundos de Investimento em Direi-tos Creditórios (FIDC), lastreados emcontratos de exportação de biocom-bustíveis, parecem ser o instrumentoideal para o financiamento dos novosempreendimentos a serem implanta-dos nos países em desenvolvimento,pois, além do reduzido risco de crédi-to supracitado, podem, também, apre-sentar baixo risco de desempenho e,com algum aperfeiçoamento insti-tucional, baixo risco cambial.

De fato, no que diz respeito ao riscode performance, a subscrição gradualdas cotas dos FIDCs permite obterratings elevados para este instrumen-to de captação de recursos, segundo ocronograma físico-financeiro dos in-vestimentos dos novos projetos e apossibilidade de se contratarem segu-ros de entrega dos equipamentos eseguros de performance na constru-ção das plantas.

Do ponto de vista do risco cambial,seria possível, também, fazer com queparte dos recebíveis de exportação (de-nominados em moeda forte) fluísse di-retamente para uma conta do fundo aser mantida no exterior, sem necessi-dade de internalização dos recursos, oque reduziria, além do risco cambial, orisco soberano do país exportador.

No caso brasileiro, essa possibilidaderequereria alguma alteração na legis-

lação vigente. Porém, tal modificaçãoé perfeitamente justificável em termoseconômicos, pois sua conseqüênciaprática seria apenas a redução do riscodo investimento - e, conseqüentemen-te, da taxa de juros -, uma vez que, emtermos de divisas, haveria antecipaçãode parte das receitas de exportação, queingressariam previamente no país parafinanciar os investimentos, ao passoque o volume de pagamentos que flui-ria diretamente para a conta do fundo,no exterior, representaria um percentualreduzido do volume de divisas a sergerado pelo aumento das exportações.

Com efeito, pelo fato dos contratos deexportação de biocombustíveis seremde longo prazo, apenas 20%, aproxi-madamente, do fluxo de receitas pre-cisaria ser descontado para asseguraro montante de recursos necessários aofinanciamento dos novos empreendi-mentos.

O risco de performance poderia, ain-da, ser mitigado por uma adequadaestruturação societária das novas em-presas de bioenergia que, permitindoa participação acionária do capital es-trangeiro, poderia, finalmente, promo-ver a integração das empresas do He-misfério Norte com os empreendedoresdo Hemisfério Sul, tal como idealizadopelo Protocolo de Kyoto.

Um modelo para a expansão da pro-dução de biocombustíveis voltada parao mercado externo, com essas caracte-rísticas, teria, ainda, como principalvantagem, abrir a porta à captação derecursos externos para todo o setoragroindustrial do país exportador, semprecisar aportar garantias e sem a ne-cessidade prévia de capitalização, poiso lastro da operação seria constituídopelos recebíveis oriundos dos própri-os contratos de exportação.

Assim sendo, o modelo permitiria as-segurar uma participação majoritá-ria do empresariado nacional nestesnovos empreendimentos, o que re-duziria, inclusive, o risco de desa-bastecimento interno dos países ex-portadores, o qual poderia resultarde um processo de aquisição pura esimples das usinas existentes pelocapital estrangeiro.

23

1 Fonte: Artigo intitulado "Balanço das Emissões de Gases de Efeito Estufa na Produção e no Usodo Etanol no Brasil", do Governo do Estado de São Paulo.

OS GANHOS AMBIENTAIS E O CUSTO

DE CAPITAL

Finalmente, caberia sugerir o meca-nismo segundo o qual o ganhoambiental, decorrente da substituiçãodos combustíveis fósseis por combus-tíveis renováveis - que seria auferidopelos países desenvolvidos - poderiabeneficiar também os países em de-senvolvimento.

A forma ideal para uma redistribuiçãoglobal desses ganhos estaria na redu-ção da taxa de juros a ser paga pelosrecursos provenientes dos países de-senvolvidos e que seriam investidos nodesconto do fluxo de recebíveis dos con-tratos de exportação.

Uma metodologia simples permitevisualizar o potencial deste mecanis-mo: consideremos, por exemplo, a im-plantação de uma usina de etanolcom capacidade de produção de 160milhões de litros por ano. Suponha-mos que esse volume de combustívelseja integralmente exportado por 20anos e que sua utilização acarrete, parao país importador, a substituição domesmo volume de combustível fóssil.Podemos afirmar que o ganhoambiental, em valor presente, é dadopela expressão:

uma taxa de desconto de 5%, o valorpresente do ganho ambientalauferido pelo país importador doetanol produzido e exportado pornossa usina hipotética é da ordem deUS$ 121,7 milhões.

O montante de recursos necessáriosà implantação de uma usina com essacapacidade, incluindo a implantaçãoda lavoura de cana-de-açúcar é de,aproximadamente, US$ 175 milhões.

Como o desconto de um fluxo derecebíveis equivale a um financiamen-to pelo prazo do contrato de exporta-ção, podemos calcular qual seria o va-lor anual dos pagamentos que uminvestidor (país importador) recebe-ria, caso pretendesse obter uma ren-tabilidade de 8% ao ano. Esse valorseria de US$ 17,82 milhões por ano,durante 20 anos.

Reduzindo essa taxa de juros para 2%ao ano, por exemplo, o valor dos pa-gamentos anuais cairia para US$ 10,7milhões.

Portanto, reduzindo a taxa de juros co-brada pelos investidores em cotas doFIDC de 8% para 2% ao ano, o investi-dor teria uma diminuição de recebi-

Com base no exercício acima, pode-mos concluir que, mesmo com umaredução dramática nas taxas de juros,os países importadores poderiam fi-nanciar a expansão da produção debiocombustíveis nos países em desen-volvimento e, mesmo assim, obteremsubstanciais ganhos ambientais.

Se considerarmos cenários mais rea-listas para o comportamento futurodos preços da tonelada de carbono,o custo do financiamento poderia serpraticamente nulo e ainda assim ge-rar ganhos ambientais substanciaispara os países importadores.

O deslocamento da demanda globalpor combustíveis renováveis, sobretu-do por etanol, abre uma grande opor-tunidade de concretizar um dos prin-cipais objetivos do Protocolo de Kyoto,que é o de promover o Desenvolvimen-to Sustentável por meio do aporte derecursos dos países desenvolvidos paraos países em desenvolvimento.

Em função das características de lon-go prazo dos contratos de exporta-ção, é possível desenvolver um mo-delo de financiamento para os novosprojetos, pelo desconto de um fluxode recebíveis, que apresenta baixo ris-co de crédito e que pode apresentarbaixo risco, tanto de performance,quanto cambial.

Os ganhos ambientais auferidos pe-los países desenvolvidos com a im-portação de biocombustíveis podemser repassados aos países em desen-volvimento mediante redução subs-tancial da taxa de juros à qual o fluxode recebíveis será descontado.

O modelo de financiamento propos-to, bem como o mecanismo de redis-tribuição dos ganhos ambientais, tan-to podem ser implementadosbilateralmente, como podem, tam-bém, constituir uma nova etapa denegociações no âmbito da Conven-ção Quadro das Nações Unidas paraMudanças do Clima, pois elesviabilizam os princípios e objetivosque nortearam a institucionalizaçãodo Protocolo de Kyoto.

( )( )∑

= +=

20

1

6

1

10*160*00282,0

tt

t

i

PCVPGA

Na qual:VPGA = valor presente do ganho ambientalPCt = preço da tonelada de carbono no período t0,00282 = fator de conversão para cada litro de combustível fóssil (gasolina)substituído por etanol, em toneladas de CO

2 equivalente1 .

i = taxa de desconto

Considerando uma hipótese extrema-mente conservadora de que o preçoda tonelada de CO

2 se mantenha cons-

tante ao longo de 20 anos e igual àmédia das cotações das allowancesnegociadas na European CarbonExchange para o período de 2008 a2012 - US$ 21,65 - e considerando

mento de US$ 7,1 milhões por ano,durante os 20 anos do financiamento.

O valor presente desse fluxo de redu-ção de receita, descontado a 5% ao anoé de US$ 88,7 milhões, o que represen-ta apenas 72% do ganho ambientalauferido pelo país importador.

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200722

De fato, os países com potencial cli-mático e territorial, capazes deviabilizar uma expansão da produçãode biocombustíveis compatível com oaumento previsto da demanda, são,geralmente, países em fase de desen-volvimento, carentes de capital e commecanismos de financiamento de lon-go prazo que, quando existentes, cos-tumam se caracterizar por taxas de ju-ros elevadas ou por uma exigênciaexcessiva de garantias.

Assim sendo, torna-se extremamenteoportuno o surgimento de um ganhoambiental passível de ser utilizadocomo indutor de investimentos inter-nacionais. Restaria criar um modelo definanciamento para os novos projetosque, por meio de recursos externos,permitisse a participação majoritária doempresariado doméstico, concomi-tantemente a um mecanismo pelo qualo ganho ambiental fosse tambémapropriado pelos países em desenvol-vimento, permitindo que o “Princípiodas Responsabilidades Comuns, po-rém Diferenciadas” continuasse a serimplementado.

O objetivo deste artigo é estabelecer asbases para a criação de referido mode-lo, bem como do mecanismo para autilização dos ganhos ambientais comoredutor do custo de capital.

O MODELO PARA O FINANCIAMENTO

DOS NOVOS PROJETOS

A substituição de combustíveis fósseispor combustíveis de origem renovável,ao significar uma profunda mudançana matriz energética mundial, requerestabilidade no suprimento dos novoscombustíveis, o que, geralmente, é ob-tido por meio da celebração de contra-tos de fornecimento de longo prazo.

Esses contratos, para apresentarem acredibilidade necessária à decisão demudança da política energética de umpaís, deverão ser celebrados entre em-presas de grande porte, como tradingsinternacionais ou empresas de ener-gia. Por esse motivo, os contratos deexportação de biocombustíveis podemse transformar em ativos que se carac-terizam por apresentar um fluxo de re-cebimentos futuros assegurados por

empresas com investment grade , oque os torna passíveis de serem des-contados e, conseqüentemente, dese constituírem no lastro principal deproject finances voltados para o fi-nanciamento de empreendimentospara suprir a oferta adicional de com-bustíveis renováveis.

A celebração de contratos de exporta-ção de longo prazo, portanto, permitea criação de instrumentos de captaçãode recursos em que os investidorespodem ser os próprios países impor-tadores de biocombustíveis - países de-senvolvidos -, pois estarão descontan-do um fluxo de recebíveis que elespróprios pagarão, o que, por si só, járepresenta uma considerável reduçãodos riscos de crédito.

Os Fundos de Investimento em Direi-tos Creditórios (FIDC), lastreados emcontratos de exportação de biocom-bustíveis, parecem ser o instrumentoideal para o financiamento dos novosempreendimentos a serem implanta-dos nos países em desenvolvimento,pois, além do reduzido risco de crédi-to supracitado, podem, também, apre-sentar baixo risco de desempenho e,com algum aperfeiçoamento insti-tucional, baixo risco cambial.

De fato, no que diz respeito ao riscode performance, a subscrição gradualdas cotas dos FIDCs permite obterratings elevados para este instrumen-to de captação de recursos, segundo ocronograma físico-financeiro dos in-vestimentos dos novos projetos e apossibilidade de se contratarem segu-ros de entrega dos equipamentos eseguros de performance na constru-ção das plantas.

Do ponto de vista do risco cambial,seria possível, também, fazer com queparte dos recebíveis de exportação (de-nominados em moeda forte) fluísse di-retamente para uma conta do fundo aser mantida no exterior, sem necessi-dade de internalização dos recursos, oque reduziria, além do risco cambial, orisco soberano do país exportador.

No caso brasileiro, essa possibilidaderequereria alguma alteração na legis-

lação vigente. Porém, tal modificaçãoé perfeitamente justificável em termoseconômicos, pois sua conseqüênciaprática seria apenas a redução do riscodo investimento - e, conseqüentemen-te, da taxa de juros -, uma vez que, emtermos de divisas, haveria antecipaçãode parte das receitas de exportação, queingressariam previamente no país parafinanciar os investimentos, ao passoque o volume de pagamentos que flui-ria diretamente para a conta do fundo,no exterior, representaria um percentualreduzido do volume de divisas a sergerado pelo aumento das exportações.

Com efeito, pelo fato dos contratos deexportação de biocombustíveis seremde longo prazo, apenas 20%, aproxi-madamente, do fluxo de receitas pre-cisaria ser descontado para asseguraro montante de recursos necessários aofinanciamento dos novos empreendi-mentos.

O risco de performance poderia, ain-da, ser mitigado por uma adequadaestruturação societária das novas em-presas de bioenergia que, permitindoa participação acionária do capital es-trangeiro, poderia, finalmente, promo-ver a integração das empresas do He-misfério Norte com os empreendedoresdo Hemisfério Sul, tal como idealizadopelo Protocolo de Kyoto.

Um modelo para a expansão da pro-dução de biocombustíveis voltada parao mercado externo, com essas caracte-rísticas, teria, ainda, como principalvantagem, abrir a porta à captação derecursos externos para todo o setoragroindustrial do país exportador, semprecisar aportar garantias e sem a ne-cessidade prévia de capitalização, poiso lastro da operação seria constituídopelos recebíveis oriundos dos própri-os contratos de exportação.

Assim sendo, o modelo permitiria as-segurar uma participação majoritá-ria do empresariado nacional nestesnovos empreendimentos, o que re-duziria, inclusive, o risco de desa-bastecimento interno dos países ex-portadores, o qual poderia resultarde um processo de aquisição pura esimples das usinas existentes pelocapital estrangeiro.

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1 Fonte: Artigo intitulado "Balanço das Emissões de Gases de Efeito Estufa na Produção e no Usodo Etanol no Brasil", do Governo do Estado de São Paulo.

OS GANHOS AMBIENTAIS E O CUSTO

DE CAPITAL

Finalmente, caberia sugerir o meca-nismo segundo o qual o ganhoambiental, decorrente da substituiçãodos combustíveis fósseis por combus-tíveis renováveis - que seria auferidopelos países desenvolvidos - poderiabeneficiar também os países em de-senvolvimento.

A forma ideal para uma redistribuiçãoglobal desses ganhos estaria na redu-ção da taxa de juros a ser paga pelosrecursos provenientes dos países de-senvolvidos e que seriam investidos nodesconto do fluxo de recebíveis dos con-tratos de exportação.

Uma metodologia simples permitevisualizar o potencial deste mecanis-mo: consideremos, por exemplo, a im-plantação de uma usina de etanolcom capacidade de produção de 160milhões de litros por ano. Suponha-mos que esse volume de combustívelseja integralmente exportado por 20anos e que sua utilização acarrete, parao país importador, a substituição domesmo volume de combustível fóssil.Podemos afirmar que o ganhoambiental, em valor presente, é dadopela expressão:

uma taxa de desconto de 5%, o valorpresente do ganho ambientalauferido pelo país importador doetanol produzido e exportado pornossa usina hipotética é da ordem deUS$ 121,7 milhões.

O montante de recursos necessáriosà implantação de uma usina com essacapacidade, incluindo a implantaçãoda lavoura de cana-de-açúcar é de,aproximadamente, US$ 175 milhões.

Como o desconto de um fluxo derecebíveis equivale a um financiamen-to pelo prazo do contrato de exporta-ção, podemos calcular qual seria o va-lor anual dos pagamentos que uminvestidor (país importador) recebe-ria, caso pretendesse obter uma ren-tabilidade de 8% ao ano. Esse valorseria de US$ 17,82 milhões por ano,durante 20 anos.

Reduzindo essa taxa de juros para 2%ao ano, por exemplo, o valor dos pa-gamentos anuais cairia para US$ 10,7milhões.

Portanto, reduzindo a taxa de juros co-brada pelos investidores em cotas doFIDC de 8% para 2% ao ano, o investi-dor teria uma diminuição de recebi-

Com base no exercício acima, pode-mos concluir que, mesmo com umaredução dramática nas taxas de juros,os países importadores poderiam fi-nanciar a expansão da produção debiocombustíveis nos países em desen-volvimento e, mesmo assim, obteremsubstanciais ganhos ambientais.

Se considerarmos cenários mais rea-listas para o comportamento futurodos preços da tonelada de carbono,o custo do financiamento poderia serpraticamente nulo e ainda assim ge-rar ganhos ambientais substanciaispara os países importadores.

O deslocamento da demanda globalpor combustíveis renováveis, sobretu-do por etanol, abre uma grande opor-tunidade de concretizar um dos prin-cipais objetivos do Protocolo de Kyoto,que é o de promover o Desenvolvimen-to Sustentável por meio do aporte derecursos dos países desenvolvidos paraos países em desenvolvimento.

Em função das características de lon-go prazo dos contratos de exporta-ção, é possível desenvolver um mo-delo de financiamento para os novosprojetos, pelo desconto de um fluxode recebíveis, que apresenta baixo ris-co de crédito e que pode apresentarbaixo risco, tanto de performance,quanto cambial.

Os ganhos ambientais auferidos pe-los países desenvolvidos com a im-portação de biocombustíveis podemser repassados aos países em desen-volvimento mediante redução subs-tancial da taxa de juros à qual o fluxode recebíveis será descontado.

O modelo de financiamento propos-to, bem como o mecanismo de redis-tribuição dos ganhos ambientais, tan-to podem ser implementadosbilateralmente, como podem, tam-bém, constituir uma nova etapa denegociações no âmbito da Conven-ção Quadro das Nações Unidas paraMudanças do Clima, pois elesviabilizam os princípios e objetivosque nortearam a institucionalizaçãodo Protocolo de Kyoto.

( )( )∑

= +=

20

1

6

1

10*160*00282,0

tt

t

i

PCVPGA

Na qual:VPGA = valor presente do ganho ambientalPCt = preço da tonelada de carbono no período t0,00282 = fator de conversão para cada litro de combustível fóssil (gasolina)substituído por etanol, em toneladas de CO

2 equivalente1 .

i = taxa de desconto

Considerando uma hipótese extrema-mente conservadora de que o preçoda tonelada de CO

2 se mantenha cons-

tante ao longo de 20 anos e igual àmédia das cotações das allowancesnegociadas na European CarbonExchange para o período de 2008 a2012 - US$ 21,65 - e considerando

mento de US$ 7,1 milhões por ano,durante os 20 anos do financiamento.

O valor presente desse fluxo de redu-ção de receita, descontado a 5% ao anoé de US$ 88,7 milhões, o que represen-ta apenas 72% do ganho ambientalauferido pelo país importador.

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 21

ENERGIAS RENOVÁVEIS

Virgílio Gibbon,Doutor em Economia pela Fundação Getulio Vargas e Consultor da FGV Projetos.

Os ganhos ambientais como instrumento definanciamento de energias renováveis

OMecanismo de Desenvolvi-mento Limpo (MDL) foi, semdúvida, o mecanismo de flexi-

bilidade do Protocolo de Kyoto quemais virtudes encerrava em sua concep-ção. Além de permitir o comércio dasReduções Certificadas de Emissões, vi-sava, também, atrair fluxos de investi-mento dos países desenvolvidos (Ane-xo I) para os países em desenvolvimento.Tais investimentos, além de trazeremembutida uma tecnologia menos emis-sora de gases do efeito estufa, deveri-am promover o desenvolvimento den-tro dos princípios de sustentabilidadeambiental, social e econômica.

O MDL vem se desenvolvendo a umataxa substancial. Porém, raros são osprojetos que apresentam aporte ex-pressivo de capital estrangeiro. Portan-to, se por um lado o Mecanismo vemcumprindo a contento sua função deflexibilizar os custos para os países doAnexo I, por outro, tem deixado a de-sejar como instrumento capaz de atra-ir investimentos daqueles países paraas economias em desenvolvimento.Esta fraca performance na capacidadede canalizar poupanças externas pare-ce, entretanto, ser determinada pelaprópria natureza do Mecanismo.

Com efeito, o MDL é multisetorial. Por-tanto, as decisões de investimento seoriginam em um amplo espectro deinteresses e motivações. A convergên-cia dessas motivações com as oportu-nidades, quando as primeiras residemno Hemisfério Norte e as segundas noHemisfério Sul, é naturalmente difícil.

Como diriam os economistas, esse en-contro possui um elevado custo de in-formação e de transação, além de umapreciável componente de risco.

É, portanto, de se esperar que, quantoa esse aspecto - a atração de investi-mentos externos - o MDL deva se de-senvolver lentamente, seguindo a cro-nologia própria dos negócios complexos.

Porém, o Protocolo de Kyoto trouxeembutido, em sua gênese, um pode-roso instrumento: o "Princípio das Res-ponsabilidades Comuns, porém Dife-renciadas". A conseqüência práticadesse Princípio foi o estabelecimentode metas de redução de emissão, sobpena de multa, para os países desen-volvidos, considerados os maiores res-ponsáveis pelo estoque acumulado degases do efeito estufa na atmosfera.

Esse Princípio, ao gerar um custo paraos países do Anexo I, deflagrou umamudança no comportamento dasempresas e governos, que resultouno surgimento de um mercado glo-bal de Reduções de Emissões e incu-tiu, nas políticas públicas, a consci-ência quanto à gravidade doproblema da mudança climática.

Portanto, o significativo movimentoque temos presenciado no sentido dasubstituição dos combustíveis fósseispor aqueles de natureza renovável étambém uma conseqüência da obri-gação de redução de emissão preconi-zada pelo Protocolo de Kyoto, uma vezque os países desenvolvidos, ao subs-tituírem suas fontes de energia, atin-

gem mais facilmente as metas que lhesforam impostas.

Porém, o Protocolo de Kyoto não pre-vê nenhum mecanismo por meio doqual os países em desenvolvimentopossam se beneficiar ao exportarembiocombustíveis para os países desen-volvidos.

As metas de redução de emissão e asmultas - impostas aos países do Ane-xo I - transformam a importação debiocombustíveis, por aqueles países,em um negócio com duplo potencialde margem de ganho: o primeiro, ex-presso pelo próprio diferen-cial de preço entre os dois combustí-veis e o segundo, pelo ganhoambiental que também possui signi-ficativo valor econômico e será apro-priado pelos países desenvolvidos emtermos de redução de emissão de ga-ses do efeito estufa.

Esse ganho, que a princípio pode pa-recer de difícil apropriação por partedos países em desenvolvimento, poisnão se enquadra dentro do Mecanis-mo de Desenvolvimento Limpo, pode,entretanto, viabilizar um novo merca-do de capitais capaz de canalizar umsubstancial volume de recursos paraas economias em fase de expansão,por meio de investimentos concen-trados no setor de biocombustíveis.Essa possibilidade tem potencial parase transformar em um instrumentocapaz de satisfazer o segundo objeti-vo que motivou a criação do MDL: ode promover o desenvolvimento sus-tentável dos países Não Anexo I.

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EMPRESA DO AGRONEGÓCIO

Fernando Garcia,Professor da EESP-FGV e Consultor da FGV Projetos.

O valor da empresa do agronegócio

Qual o valor de uma empresa?Para o acionista, a resposta équase imediata, pois há uma

série de metodologias de avaliação euma infinidade de informaçõescontábeis da empresa de fácil acessoe, hoje, praticamente instantâneas.Sejam os majoritários, sejam os acio-nistas pulverizados no mercado, asinformações financeiras e de produ-ção da empresa de que eles necessi-tam são bastante acessíveis e trans-parentes, na maioria das empresasde grande porte.

Não obstante, responder quanto vale umaempresa para a sociedade é tarefa bemmais complexa. E essa é uma perguntaque tem ganhado expressão entre seto-res sociais organizados que, de formacrescente, interferem na opinião públicae interagem com as grandes corporações.No caso do agronegócio, essa é uma ten-dência no País, aos moldes do que ocor-re no mundo. O agronegócio, por envol-ver questões ambientais, fundiáriase sociais reúne empresas que, usual-mente, estão no foco de debatesamplos com a sociedade. Exemplosdisso são as empresas do segmentode fumo e bebida, imersas em ques-tões relativas à saúde; as de defensi-vos, sempre presentes nas discussõesambientais; e as de pecuária de cor-te, em aspectos relacionados a ques-tões fundiárias.

Os setores da sociedade que pressi-onam essas empresas, na maior par-te das vezes de forma válida, centramsua atenção em questões específicas,

Ana Maria Castelo,Consultora da FGV Projetos e Professora do MBA de Construção da EESP-FGV.

desconsiderando o todo que umaempresa representa para uma regiãoou para a economia nacional. Revelarà sociedade esse outro lado da em-presa, ou seja, sua importância regio-nal e para a economia nacional, assimcomo suas ações de sustentabilidade,é uma estratégia com efeitos positi-vos sobre a imagem da empresa, eque funciona como um importantebalizador de políticas. Trata-se de uminstrumento de transparência que for-nece elementos novos ao diálogo coma sociedade.

Recentemente, a FGV Projetos desenvol-veu vários estudos nesse campo, os quaismedem e avaliam a contribuição econô-mica e social de grandes empreendimen-tos do agronegócio para o desenvolvi-mento regional e do País. Foram os casos,por exemplo, dos estudos realizados so-bre a Souza Cruz, no mercado de fumo,e a Aracruz e a Veracel na área de celulo-se. Também o setor de bebidas quentes -destilados e vinhos - recebeu tratamentono que diz respeito à sua contribuiçãoeconômica.

Baseados numa metodologia origi-nalmente desenvolvida pela FGV Pro-jetos para a vice-presidência de as-suntos governamentais do McDonald'sem Chicago, esses estudos mostramde que forma as atividades de umaempresa contribuem para o desen-volvimento econômico e social dasregiões em que ela atua e para a eco-nomia como um todo. Os estudossão fundamentados em uma análiserigorosa - que segue os protocolos

científicos - das informações quanti-tativas e qualitativas das empresas ede seus fornecedores. Eles iniciam peladescrição dos elos da cadeia produtivada empresa para, na seqüência,quantificar seu potencial de geraçãode riqueza para a sociedade. Tambémsão avaliadas questões relativas àsustentabilidade dos negócios, umaanálise alicerçada na avaliação das ati-vidades que garantem o contínuo au-mento da produtividade, a inserçãonas comunidades e a geração de opor-tunidades regionais.

As informações dos balanços das em-presas, e aquelas levantadas pela FGVProjetos especialmente para os estu-dos, são avaliadas tendo por referên-cia as estatísticas oficiais das ContasNacionais e Regionais do País e de ou-tras pesquisas de fontes oficiais. Ametodologia adapta as informaçõescontábeis e financeiras das empresas,ou do setor de atividade, para inserí-las no modelo de contabilidade soci-al do País. Construída com base nateoria de Leontief, a metodologiatambém permite medir os efeitosmultiplicadores das atividades dasempresas, indo além da métrica res-trita às operações visíveis das mesmas.

Os estudos na área de celulose

Os estudos realizados em 2006 e em2007 para a Aracruz e a Veracel sãoexemplos do potencial de geração deinformações dessa metodologia.Além de servirem como uma radio-grafia econômica da geração de ren-

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200720

Na balança dos prós e contras, umaação estratégica entre Brasil e EUA afavor do etanol parece ser viável. Ogoverno nacional já entregou um me-morando ao Departamento de Estadodos EUA com manifestação dessa in-tenção. O irmão do Presidente Bush,Jeb Bush, governador da Flórida, já seposicionou favoravelmente.

O subsecretário de Estado america-no para Assuntos Políticos, NicholasBurns, em visita este ano ao Brasil,manifestou a intenção de um acor-do dos EUA com o Brasi l sobrebiocombustíveis, baseado em trêsvertentes:

1. Como responsáveis por 70% daprodução mundial de etanol, éestratégica uma cooperaçãomaior entre o governo e o setorprivado dos dois países;

2. Est ímulo ao envolv imento deoutros países, para o desenvol-

v imento e formação de merca-dos para os biocombustíveis;

3. Ampliação do mercado globalpara os biocombustíveis, princi-palmente o etanol, para torná-lo uma commodity global.

A idéia inicial é a escolha de um paísda América Centra l para o desen-vo lv imento de um pro jeto p i loto.Os setores pr ivados dos dois pa í -ses já possuem uma parceira em ElSa lvador. A ARFS (Amer icanRenewable Fuel Supliers) é uma usi-na des idratadora de á lcool loca l i -

zada em Donsonate, com capital deempresas bras i le i ras, americanas esalvadorenhas.

Os americanos estão conscientes deque necessitam do produto impor-tado. Os efeitos da febre por etanolaquecem os preços dos grãos. Omilho ganha uma demanda alterna-tiva e a soja e os outros grãos per-dem área para o cereal. Os custosde produção aumentam para os cri-adores e para a indústria de alimentos.Muitos grupos de interesse são afetadose resta aguardar como reagirão.

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da das empresas, os relatórios tra-zem valiosas informações inéditas, eàs vezes surpreendentes, sobre suascontribuições econômicas. Vejamosalgumas conclusões desses estudos.

No caso da Aracruz, o estudo estimouque a empresa foi responsável pelageração de R$ 3,397 bilhões de ren-da na economia brasileira em 2003,o que correspondeu a 0,24% do PIBbrasileiro. O seu valor adicionado res-pondeu por quase 5% do PIB do Es-pírito Santo. Considerando os em-pregos diretos e indiretos, asatividades da Aracruz sustentaram95,8 mil empregos naquele ano. Em2005, as exportações da Aracruz pro-duziram US$ 1,005 bilhão de divi-sas, o que representou aproximada-mente 0,9% de todas as exportações

brasileiras. Esse montante seria sufi-ciente para pagar todas as importa-ções de trigo, farinha de trigo, leite,laticínios, carnes e livros.

O estudo da Veracel revelou outrastantas informações desconhecidassobre as atividades da empresa. Em2006, a contribuição da Veracel paraa economia brasileira atingiu R$ 516milhões e suas atividades sustenta-ram 30,4 mil empregos. Nesse mes-mo ano, as atividades florestais daempresa responderam por 1,4% detodo o valor da produção agrope-cuária baiana, enquanto que a partici-pação das atividades industriais no PIBda indústria estadual atingiu 1,2%. En-tre 2003 e 2006, a implantação da fá-brica e a expansão das atividades flo-restais da Veracel contribuíram com

60% de todo o crescimento econômi-co observado nos municípios do ex-tremo sul da Bahia. A Veracel tam-bém foi responsável diretamente por19,2% dos novos postos de trabalhogerados neste período. De tudo quea cadeia produtiva da Veracel adicio-na de valor à economia brasileira, maisde 32% retornam para a sociedadedurante o período de produção. Fo-ram R$ 313 milhões, em 2006.

No caso dessas duas empresas, asanálises da FGV Projetos geraram in-formações novas que surpreenderampositivamente inclusive algumas daspessoas diretamente envolvidas comessa atividade. Criaram, enfim, osubstrato necessário para mostrar àsociedade qual o valor dessasempresas.

Fonte: Embrapa e Universidade da Califórnia

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 19

exterior, vai exigir, nos próximos 10anos, um aumento de 12 bilhões delitros, só para o consumo interno. Paraisso, já estão em construção 43 novasdestilarias no País, e uma centena deoutras estão sendo projetadas.

É importante citar que o álcool é com-petitivo com o barril de petróleo aci-ma de US$ 37 (com o dólar equiva-lente a R$ 2,13).

Já a Assessoria de Gestão Estratégica(AGE), do Ministério da Agricultura,tem uma visão ainda mais audaciosa(Quadro 1).

As projeções da produção, consumo eexportação do etanol refletem grandedinamismo desse produto, devido aocrescimento tanto do consumo internoquanto das exportações. Projetada para2017, a produção é de aproximada-mente 38,6 bilhões de litros, mais queo dobro da produção de 2006. O con-sumo interno para 2017 está projeta-do em cerca de 28,4 bilhões de litros eas exportações em aproximadamente10,3 bilhões. A Secretaria de Produçãoe Agroenergia do MAPA projeta, para2010, vendas de um milhão de auto-móveis Flex, mais que o dobro do volu-me de automóveis a gasolina, cujas ven-das projetadas são de 467 milunidades.

Há ainda outras matérias-primas de-rivadas da biomassa, como a celulo-se, avançando muito nos Estados Uni-dos ao lado do etanol de milho.

O que falar do biodiesel? É outro temaem que não nos faltam matérias-pri-mas: mamona, dendê, pinhão manso,algodão, girassol, amendoim, sebo bo-vino, resíduos agrícolas em geral, en-fim, não há limite para nossas condi-ções de produção, que incorporam todotipo de agricultores, desde o familiaraté o grande empresário integrado everticalizado, além das cooperativas.

Internamente, esta importante evolu-ção representa mais de 1 milhão de

novos empregos diretos e indiretos,num modelo de desenvolvimento quese adequa às regiões mais pobres doPaís. Vamos exportar os biocom-bustíveis, bem como os equipamentose a tecnologia que dominamos. Istoquer dizer mais renda e mais empregopara o Brasil.

Mas, dentro da grande ambição, o querealmente faz diferença é a chance deliderarmos a criação de uma civilizaçãomais equilibrada.

Para isto, algumas coisas são funda-mentais:

- coordenação: há pelo menos sete mi-nistérios interessados no assunto, alémde uma dezena de instituições gover-namentais. É fundamental um grandeentendimento público, para que a es-tratégia seja unificada.

- ação privada: precisamos transfor-mar o etanol e o biodiesel emcommodities. Para tanto, é mister es-timular a produção em outros países,estabelecer padrões e parâmetros in-ternacionais (antes que outros o fa-çam) e, sobretudo, "vender a idéia"para potenciais grandes consumido-res, como países asiáticos.

- tecnologia: embora detenhamoshoje a melhor tecnologia mundial noassunto, este é um processo dinâmi-co e, se não investirmos vigoro-samente, outros países nos tirarão ocomando dos processos. Investimen-tos em desenvolvimento e pesquisasprecisam ser feitos também pelo se-tor privado, já que o Estado não dis-põe de recursos suficientes.

- recursos humanos: dados a amplia-ção espetacular da área com cana e onúmero crescente de unidades indus-triais, será necessária a formação de re-cursos humanos altamente capacitadospara desenvolver o setor.

- seriedade: há muita liquidez internacio-nal e muita gente quer investir no setor

brasileiro. Precisamos tratar estes recur-sos com muita seriedade, para não colo-carmos a perder uma chance única que ahistória nos oferece de mudar o mundo.

Enquanto isso, como ficam os EstadosUnidos? Funcionaria um acordo do Bra-sil com os EUA para a promoção doetanol tanto na questão hemisféricaquanto mundial?

Em seu discurso no Congresso dos Es-tados Unidos (EUA), em janeiro de 2007,o presidente George W. Bush voltou acriticar a dependência americana de pe-tróleo e a necessidade de aumentarsubstancialmente o consumo de com-bustíveis como o etanol. A declaraçãoalimenta a esperança dos usineiros na-cionais, pois as vendas para o mercadonorte-americano cresceram de maneiraformidável nos últimos anos.

A meta estabelecida pelo presidente éelevar a produção de 28,4 bilhões para132,5 bilhões de litros entre 2012 e2017, para reduzir o consumo de gaso-lina em 20%. Esse volume será quatrovezes superior à produção brasileiraprevista para o período. O consumo atu-al é de 18,9 bilhões de litros.

Com 110 usinas em operação e outras73 em construção, a produção deetanol conta com medidas protecio-nistas. O etanol importado recebe umatarifa de US$ 0,14 por litro. Essa políti-ca acaba de ser renovada pelo Con-gresso americano e permanecerá emvigor pelo menos até o final de 2008.Os subsídios federais de US$0,14 porlitro, recebidos pelas destilarias paramisturar 10% de etanol na gasolina,têm prazo até 2010.

Nos EUA, a matéria-prima para a pro-dução de etanol é o milho. Muitas usi-nas são controladas pelos fazendeiros.O lobby do Meio-Oeste, região produ-tora de grãos, é centenário e tem sen-tido nacionalista. O governo em Wa-shington conhece esse poder e aseleições presidenciais de 2008 come-çam a pesar nas tomadas de decisão.

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MILHO E SOJA

Os efeitos da agroenergia na produçãobrasileira de milho e soja

Alexandre Lahóz Mendonça de Barros,Professor da EESP e Coordenador do Núcleo de Pesquisas do Centro de Agronegócio da FGV / EESP.

Em setembro de 2006, os mercadosinternacionais de grãos sofreram sú-bita e surpreendente reversão

altista. A principal razão para tão agres-siva mudança foi a percepção, por partedos mercados no mundo todo, de quehavia algo de novo no mundo agrícola: ademanda por produtos para a geraçãode energia. Ora, essa mudança não énada trivial. Na verdade, se trata de umatransformação estrutural na economiaagrícola internacional. É claramente umamudança produtiva de paradigma.

Como toda mudança estrutural, é muitodifícil antever todas as transformações naprodução agropecuária no mundo e noBrasil. É possível, entretanto, vislumbraralgumas conseqüências dessa transforma-ção para o mundo agrícola. Para tanto,vale a pena analisar o que vem ocorren-do com a produção norte-americana deetanol.

Os Estados Unidos da América res-pondem por mais de 40% da ofertade milho do mundo, atingindo pro-duções que oscilam entre 280 e 300milhões de toneladas. Para se ter umaidéia da distância da produção nor-te-americana sobre os demais paí-ses, basta olhar para a China e o Bra-si l : a produção chinesa de milhositua-se entre 130 e 140 milhões detoneladas; a brasileira, ao redor de40 e 45 milhões. Os EUA são tam-bém os maiores exportadores de mi-lho do mundo, com volumes da or-dem de 55 milhões de toneladas.Essa imensa produção sempre foidestinada ao consumo humano di-

reto e, especialmente, ao consumoanimal, segmento que responde porcerca de 155 milhões de toneladas.Entretanto, nos últimos dois anos, ademanda de milho para produção deetanol aumentou consideravelmente:de acordo com dados do USDA1, o con-sumo de milho para etanol atingiu, em2005, cerca de 44 milhões de tonela-das. Projeta-se que, já em 2007, serãoabsorvidas algo entre 55 e 60 milhõesde toneladas de milho para a produ-ção de álcool. Diversos estudos norte-americanos indicam que em um hori-zonte de 3 a 5 anos, o consumo demilho para etanol superará 100 mi-lhões de toneladas, o que correspondea 1/3 da produção atual.

A demanda criada pela produção debiocombustível elevou consideravel-mente o preço do milho no mercadointernacional. As cotações saltaramem curto espaço de tempo do inter-valo de US$ 2,3 por bushel2, para maisde US$ 4,2 por bushel (mercado fu-turo). Esse movimento deve-se a umasérie de fatores. Primeiramente, osanalistas e investidores de mercadoperceberam, após diversas manifes-tações do setor público dos EUA, quea agroenergia chegou para ficar e setornou um elemento estratégico detodos os países desenvolvidos. Assim,essa nova demanda seguirá pressio-nando os mercados internacionais.Em segundo lugar, é certo que a áreacultivada nos EUA, Europa, China e

Índia não tem como aumentar, postoque já se ocupa quase a totalidade daárea agrícola potencial desses países.

Como conseqüência desse fato, apressão de demanda no curto prazoconverteu-se em alta do preço domilho e, junto com ele, das demaisculturas anuais (especialmente osgrãos). Os mercados, como sempre,anteciparam os movimentos futuros.Como o preço do milho subiu muito,é de se esperar que a área de milhocresça em detrimento da área de ou-tras lavouras anuais, com destaquepara a soja. Com isso, projeta-se re-dução na oferta futura desses ou-tros grãos, forçando os preços paracima, e arbitrando os mercados dosdiferentes produtos agrícolas. A con-seqüência no curto prazo é que to-das as lavouras anuais entraram emum processo de recuperação de pre-ços e rentabilidade. No médio prazo,entretanto, é possível antever umaresposta nas regiões com potencialde expansão de área cultivada.

E é aqui que entra o Brasi l. Comopode ser visto na Figura 1, o País cons-titui uma das últimas fronteiras agrí-colas do mundo. A única outra re-gião com potencial de expansão é aÁfrica, em que pesem as dificulda-des geopolít icas e a ausência deinfra-estrutura da região. Como con-seqüência, um novo ciclo de expan-são produtiva se abre ao Brasil.

1 United States Department of Agriculture (N.R.)2Medida equivalente a 27,215kg. (N.R.)

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200718

Da mesma forma que a segu-rança alimentar foi um temadominante nas discussões do

pós-guerra, contribuindo para a for-mação da Comunidade EconômicaEuropéia e para o lançamento da Po-lítica Agrícola Comunitária, atualmen-te ganha destaque estratégico emtodo o planeta a questão da segu-rança energética. Não se obterá de-senvolvimento sem energia.

E, no caso das diferentes alternativaspara combustíveis, cresce a atençãointernacional para aqueles de origemagrícola, como o etanol e o biodiesel.O Brasil tem uma liderança notável noassunto, dada a experiência de 30anos do uso do etanol, desde oProálcool, criado em 1975 como res-posta aos choques do petróleo.

O tema apresenta uma dimensão mui-to maior do que se tem escrito e discu-tido: trata-se de uma mudança na civi-lização. É interessante, a propósito, queem poucas décadas do século XX, te-nha sido constituída toda uma civiliza-ção energética sobre um produtofinito, fóssil, mal distribuído entre ospaíses e manejado por poucas empre-sas: o petróleo. É verdade que isto tudose deu graças a preços muito baixosdos seus derivados e ao fato de, na-quele tempo, a questão ambiental nãoser considerada relevante.

De qualquer maneira, hoje está evi-dente que esta era vai chegando aoocaso. E que a biomassa é a grande

saída, no propósito da construção deoutra civilização, muito mais demo-crática (porque qualquer país podeproduzir seu próprio combustívelrenovável) e ambientalmente mais cor-reta. Na matriz energética brasileira, abiomassa já representa 29%, enquan-to que na mundial apenas 11%.

A nossa área agricultada é hoje de 62milhões de hectares; perto de 6 mi-lhões são cultivados com cana-de-açú-car, dos quais 50% vão para a produ-ção de etanol e os outros 50% para aprodução de açúcar. Com isso, pro-duzimos mais de 16 bilhões de litrosde etanol, dos quais consumimos 14e exportamos o resto. Temos um po-tencial de mais 22 milhões de hecta-res aptos para a cana-de-açúcar, o quesupera de longe qualquer país ou atécontinente do planeta inteiro. Comotemos mais 90 milhões de hectarescultiváveis (dos atuais 200 milhões de

hectares de pastagens, portanto sementrar em ecossistemas como a Ama-zônia), o aumento da área da cananão irá prejudicar a produção de ali-mentos ou fibras. Prova disso é que,nos últimos 15 anos, a área plantadacom grãos cresceu 23%, enquanto aprodução cresceu mais de 110%. Tam-bém as carnes cresceram na mesmaproporção. Há, portanto, espaço paraaumentar a produção de etanol - e oBrasil é de longe o país com os meno-res custos de produção - sem que istointerfira no crescimento, em iguaiscondições, da oferta alimentar.

Aliás, é possível dobrar, em 15 anos,a produção de álcool por hectare, comnovas tecnologias já em avaliação eestudo. Hoje, produzimos 7.000 litrosde álcool por hectare.

O carro flex fuel, marca registrada bra-sileira e que começa a ser copiado no

Roberto Rodrigues,Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV/ EESP

Luiz Antonio Pinazza,Consultor da FGV Projetos e Coordenador do Núcleo de Comunicação do Centro de Agronegócio da FGV/EESP

AGROENERGIA

Um novo paradigma agrícola

Quadro 1 - Produção, Consumo e Exportação de Etanol

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A alta nos preços dos grãos afetadiretamente essas cadeias, amplian-do as possibilidades de exportação,tanto de milho quanto de soja. O Bra-sil se caracterizou, nos últimos anos,como um exportador eventual de mi-lho: dependendo das condiçõesconjunturais do câmbio, dos preçosinternacionais e da demanda domés-tica, nossas exportações saltaram dacasa de 1 milhão de toneladas para oscerca de 4 milhões em 2006, por exem-plo. Entretanto, com a mudança estru-tural no mercado de milho nos EUA,abre-se a oportunidade de o Brasil con-solidar-se como um exportador estru-tural de milho. Essa situação alterará opadrão da produção no sul do País,que é a região verdadeiramentevocacionada para exportar milho, emvirtude da excelente logística da região.

A alta no preço do milho no merca-do internacional tem como conse-qüência, ainda, a elevação dos cus-tos de produção de carnes,especialmente no mundo desenvol-vido, que é totalmente dependentede ração. Temos assistido, recente-mente, a sucessivas manifestaçõesde executivos dos principais gruposnorte-americanos de produção dealimentos alegando que está se tor-nando inviável produzir carne (es-pecialmente de frango e suína) comos custos atuais da ração.

Ora, esse fato tende a est imular aprodução brasileira não somente degrãos, mas também de proteína ani-mal (carne bovina, suína, de frangoe leite). Os EUA respondem por par-cela relevante das exportaçõesmundiais de carne de frango, suína ebovina. Com a perda de com-petitividade dessas exportações de-correntes da alta do preço da ração,abre-se oportunidade para o incre-mento da produção do setor pecuá-rio brasileiro. O País encontrará ple-nas condições de ampliar suasexportações de frango, de carnesbovina e suína e, até, de leite.

Como compat ib i l i zar exportaçãomaior de milho e simultaneamentede carnes? É poss íve l aumentar apart ic ipação em todos esses mer-cados? Entendemos que s im. Em-bora a área cultivada com grãos te-nha l imitações de expansão naRegião Sul, o mesmo não pode serdito da Região Centro-Oeste. Comocomentado em outros art igos des-se periódico, o potencial produtivodo cerrado é considerável. Além denovas áreas a serem ocupadas, háa possibilidade de se produzir duassafras em um único ano. Atualmen-te, muitas vezes os agricultores nãofazem a segunda safra por total au-sência do est ímulo de preços. En-tretanto, com a crescente deman-da de mi lho para exportação naRegião Sul, as empresas de aves ede suínos acelerarão seu processode expansão para o cerrado, embusca de matéria-prima mais bara-

ta. O surgimento da demanda fa-vorecerá os preços dos grãos nocerrado, est imulando a produçãoda safrinha. Uma vez que o merca-do internacional estará demandan-do so ja (posto que a produçãoamer icana deve se reduz i r ou, nomáximo, se manter nos padrõesatuais ) , a produção dessa legumi-nosa deverá segui r t ra jetór ia deexpansão no cerrado, o que refor-ça a área potencial de aumento dasafrinha, gerando portanto, um ci-c lo v i r tuoso de cresc imento tantoda agricultura, quanto do segmen-to pecuário brasi le i ro.

Pode-se ver, portanto, que a entradado mundo desenvolvido e subdesen-volvido na produção e consumo deagroenergia abre enormes possibili-dades para diversos segmentos daagropecuária brasileira, em especialo de grãos e o de carnes.

Figura 1: Área agrícola disponível e ocupada em países selecionados(1.000 hectares)

Fonte: Estimativas da AGE/MAPA Fonte: FAO/2005

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vam à maior ou menor emissão degases, de forma a contribuir para es-tratégias de mitigação. Os cenáriosde emissões são também importan-tes instrumentos orientadores parapolíticas ligadas à questão do clima.

7. Técnicas como o plantio direto e aintegração lavoura-pecuária podem con-tribuir para se evitar o desmatamento?

Existem muitas áreas, principalmen-te na região do cerrado, que já foramabertas, ou seja, desmatadas. Grandeparte delas é ocupada por pastagensde baixa produtividade e baixos índi-ces zootécnicos. Tecnologias desen-volvidas pela pesquisa agropecuáriabrasileira possibilitam que elas sejammelhor aproveitadas dentro do con-texto da integração lavoura-pecuária-floresta e do plantio direto, com me-nor impacto social, econômico eambiental. Destas áreas, algo como40 a 45 milhões de hectares podemser utilizados com estes sistemas quedão mais sustentabilidade para oagronegócio. Contribuindo para amitigação do desmatamento, estastecnologias que foram desenvolvidaspela Embrapa e instituições estaduaisde pesquisa e ensino, nos últimosanos, possibilitam a utilização maisracional destas áreas já abertas. Coma utilização destas tecnologias, pode-se obter índices mais elevados de pro-dutividade tanto na parte animal,quanto na produção de grãos ou fi-bras e mesmo agroenergia. Destamaneira, o Brasil não necessitariadesmatar novas áreas para atender àcrescente demanda por aumento daprodução agrícola, podendo a pro-dução ser realizada em áreas já con-solidadas.

8. Na sua opinião, qual é o grande pro-blema tecnológico a ser enfrentadopelo agronegócio brasileiro?

Abstraindo-se dos problemas de ges-tão, infra-estrutura, logística e sani-dade que ainda nos afligem e que pre-cisam e podem ser melhorequacionados e resolvidos, talvez hajapouca dúvida de que o grande pro-

blema a ser enfrentado peloagronegócio nacional seja o decompatibilizar o crescimento na pro-dução com sustentabilidadeambiental e eqüidade social. Avan-ços significativos foram observados naredução de insumos externos nos sis-temas produtivos dos grãos, a exem-plo do uso intensivo de fixadoressimbióticos de Nitrogênio, da utiliza-ção massiva do plantio direto, do de-senvolvimento de cultivares adapta-das a solos com elevados teores dealumínio e baixo pH. Atualmente, ou-tros desafios se colocam à frente, aexemplo da necessidade por sistemasde produção menos dependentes deágua, cultivares mais adaptadas aestresses hídricos e a temperaturaselevadas, tolerantes às pragas e do-enças, modelos de convivência comas pragas e doenças que utilizem in-tensamente o controle biológico e umsistema mais eficiente de monito-ramento das trocas e estoques de ga-ses de efeito estufa.

Nunca o homem esteve tão convenci-do da necessidade de, além do ime-diato, pensar em médio e longo pra-zos, utilizando-se de tecnologiasmenos agressivas ao meio ambientena produção dos bens necessários àsua sobrevivência, preservando o Pla-neta Terra como habitat desta diversi-dade construída ao longo de milhõesde anos e imprescindível à existênciada espécie humana, que no conjuntonão passa de uma pequena parte nes-te complexo jogo da evolução da na-tureza.

A dimensão social da susten-tabilidade também é um grande de-safio que tem viés tecnológico e de-pende de conhecimento, na medidaem que a convivência harmônica queviabilize a eficiência dos sistemas deprodução dependerá da eqüidade deoportunidades a todos os produto-res: pequenos, médios e grandes. Aintegração entre eles em arranjosassociativos convenientes tambémserá necessária. O desenvolvimentoagrícola nacional, do ponto de vistada sua competitividade, sustenta-

bilidade e eqüidade também precisa-rá levar em conta as grandes diferen-ças regionais, buscando diminuí-las,assim como ampliar nossa capacida-de como nação e global player em in-fluir cada vez mais fortemente no ce-nário mundial das três agriculturas:alimentos, fibras e madeiras e ener-gia. Não acreditamos em nenhumasolução plausível para tais desafios,se não continuarmos a desenvolver eaplicar com radicalidade máxima todoo arsenal de conhecimentos etecnologias que o País for capaz deempreender.

9. E a agricultura familiar, está sendocontemplada?

A Embrapa tem produzido informa-ção e tecnologias mais baratas paraatender ao agricultor familiar, levan-do-o a se tornar mais competitivo.Uma das principais exigências do mer-cado internacional é em relação à sa-nidade. Neste ponto, temos traba-lhado com o Programa AlimentosSeguros (PAS) com o agricultor famili-ar, como no caso da Castanha-do-Bra-sil, do leite, do café e da uva.

A Embrapa vem desenvolvendo, tam-bém, novas variedades que devemapresentar superioridade com relaçãoa características como produtividade,resistência a pragas e doenças, adap-tação a condições específicas deestresse abiótico, ou outras caracte-rísticas importantes para os agricul-tores e para o mercado. Com isso, oganho para agricultura familiar foibastante significativo. Do ponto devista da organização e disponibi-lização da informação, lançamos emmarço deste ano o livro "AgriculturaFamiliar na Dinâmica da PesquisaAgropecuária" reunindo, pela primei-ra vez, todo o acervo de tecnologiasgeradas pela Embrapa, em conjuntocom o Sistema Nacional de PesquisaAgropecuária (SNPA), considerando asecorregiões brasileiras assim comoprocessos, produtos e técnicas trans-versais, na medida em que se aplicama múltiplos ecossistemas. Essa publi-cação retrata bem o que tem sido fei-to no campo da tecnologia e da pes-quisa em agricultura familiar.

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PECUÁRIA

Perspectivas do mercado de carne vermelha no Brasil

Alexandre Lahóz Mendonça de Barros,Professor da EESP e Coordenador do Núcleo de Pesquisas do Centro de Agronegócio da FGV / EESP.

Aeconomia da carne vermelhano Brasil segue misteriosa. Édifícil entender em profundi-

dade as transformações por que pas-sa o setor pecuário no País. O fatomais curioso do ano de 2006 diz res-peito ao mercado internacional e aovolume de abates. No final do anopassado, em conseqüência aosurgimento do foco de aftosa noMato Grosso do Sul, esperava-se umano de exportações mais fracas e, por-tanto, haveria pressão para redução novolume de abates. Entretanto, ocorreuo oposto: o volume de abate cresceuem 2006 e as exportações aumenta-ram 13,8% em volume e surpreenden-tes 26,3% em valor. A despeito disso,os preços recebidos pelos produtorescaíram em algumas praças, ou se esta-bilizaram em outras.

A pergunta fundamental a ser respon-dida é: por que há tanta diferença en-tre o comportamento dos preços nomercado internacional e no mercadointerno? Em algum momento, no fu-turo próximo, pode-se esperar umaaproximação entre esses mercados,como ocorre com a soja, por exemplo?

A resposta mais fácil para essaassimetria de preços é a taxa de câm-bio. A forte apreciação do real ocorri-da nos últimos três anos fez com queos preços internacionais traduzidos emreais se reduzissem fortemente. As co-tações no início de 2003 baseavam-seem patamares de R$3,50 por dólar, aopasso que, hoje, o câmbio situa-se aoredor de R$2,15. É uma perda de valorconsiderável. Não sabemos ao certo oefeito total dos preços internacionaisno processo de formação dos preçosinternos no Brasil, mas é certo que acrescente participação das exportações

na produção doméstica (hoje cerca de25%) está alterando o funcionamentodo mercado brasileiro em direção atorná-lo cada vez mais conectado aomercado mundial.

Entretanto, a taxa de câmbio não ex-plica tudo. É crescente a percepção deque os ganhos na cadeia da carne ver-melha estão concentrados no setor daindústria voltada à exportação, poisestão se beneficiando de um preço daarroba baixo no Brasil e um preço dacarne alto no mundo. O mesmo nãopode ser dito daquelas indústrias vol-tadas para o mercado doméstico, queestão trabalhando com margens mui-to baixas ou negativas.

Entendemos que os preços recebidospelos pecuaristas seguem baixos porum conjunto de razões. Do ponto devista da oferta, parece claro que a car-ne de frango vem estabelecendo umlimite de alta no preço da carne verme-lha no Brasil. A despeito do reconheci-do desejo de consumo dos brasileirospela carne bovina, as restrições de ren-da do consumidor associadas à ofertacrescente de frango restringem forte-mente o poder de alta da carne verme-lha. Esse fato ficou claro no evento dosurgimento da Gripe Aviária na Euro-pa. A queda do consumo de frango,naquele continente, e a súbita eleva-ção dos estoques europeus forçarama forte redução nas importações decarne brasileira de frango, o que, porsua vez, acabou por inundar o merca-do interno, pressionando as cotaçõesde todas as carnes para baixo. A que-da de margem da indústria domésticafoi instantânea.

Outra razão relevante para a determi-nação dos baixos preços do boi gordoestá relacionada com a grande oferta

de animais no Brasil. De acordo comos dados do IBGE, o rebanho brasilei-ro vem crescendo sistematicamente,em particular nas regiões Norte e Cen-tro-Oeste. Além disso, fica evidente quea produtividade do rebanho brasileirotambém cresce sistematicamente.Melhoria nutricional decorrente depreços baixos dos insumos advindosda agricultura, melhoria nas pasta-gens, uso crescente de melhoramen-to genético, avanço nas técnicas demanejo, integração entre lavoura epecuária etc., constituem a realidadeda pecuária de corte no País. Os ma-pas apresentados a seguir indicam adensidade do rebanho brasileiro emcada município do Brasil nos anos de1990 e 2004. Para elaborar os ma-pas, dividimos o número de cabeçasdo município por sua respectiva área.Sabemos que o ideal seria dividir orebanho pela área de pastagens, mas,infelizmente, essa informação nãoexiste para os referidos anos. Acredi-tamos, entretanto, que a divisão pelaárea do município constitui uma boaaproximação para se analisar o au-mento da produtividade. É nítido quehouve intensificação da produçãoem todo o País (cores mais escurasindicam maior relação de cabeças/hectare).

Até quando esse aumento de ofertase dará? Os baixos preços não estari-am estimulando a redução no reba-nho brasi leiro? É difíci l encontraruma resposta para essa questão, poisas estatísticas brasileiras relativas àpecuária de corte são precárias. Oparâmetro de dimensionamento docomportamento do rebanho futurotem sido, usualmente, a evolução doabate de fêmeas. Observa-se, nos úl-timos anos, respeitável aumento nonúmero de fêmeas abatidas, o que

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6. As projeções para 2020 indicamcrescimento de 55% da demanda poralimentos no mundo. Ao mesmo tem-po, o relatório da ONU sobre mudan-ças climáticas alerta para os impac-tos ambientais de várias atividadeseconômicas, inclusive a agricultura.Como resolver esta equação?

Estima-se que a agricultura seja res-ponsável por 20% do efeito estufano planeta. Esta contribuição variamuito com relação às fontes predo-minantes de emissão de gases nosdiferentes países. Cada um possuiuma realidade específica e um histó-rico diferente de contribuição para oefeito estufa, fato este que pesa noestabelecimento de metas de redu-ção de gases entre os países.

No Brasil, o desmatamento e a queimade florestas representam a maior fon-te de emissão de gases (CO

2, CH

4, N

2O,

NOx) à atmosfera. A agricultura temum papel importante nesse contexto,se a mesma propiciar desmatamentonas práticas de plantio e pastoreio emáreas ainda não exploradas ou degra-dar áreas já ocupadas.

Além da necessidade de um bomzoneamento ecológico-econômico,é preciso uma maior difusão de co-nhecimento sobre os potenciais im-pactos da at iv idade agrícola e daspráticas mitigadoras nos diferentesbiomas. Também há que se consi-derar os efeitos potenciais da mu-dança do clima na agricultura, e osmeios para a sua adaptação, que dealguma forma se ref let irão nas fu-turas prát icas de manejo. Há umconjunto de at iv idades agrícolasque podem contribuir para a redu-ção das emissões de gases de efeitoestufa e que tendem a ser cada vezmais adotadas, à medida que hajauma maior conscientização sobre oproblema do aquecimento global eum acesso maior à informação pe-los agricultores e pela sociedade deum modo geral.

O plantio direto é uma técnica de pre-paro do solo que, se bem conduzida,contribui para a estabilização do es-toque de carbono nos solos. Este tipode manejo está atualmente presenteem mais de 20 milhões de hectaresno País, com perspectivas de cresci-mento. Outro sistema altamente pro-missor é a integração lavoura-pecuá-ria-floresta, que começa a ganhar forçaprincipalmente na recuperação depastagens pouco produtivas.

Pastagens bem manejadas fazem omesmo papel, a lém de melhorar aprodutiv idade animal, gerando al i-mento de maior qualidade.

A recuperação de áreas degradadas ede áreas de preservação permanente,além de ter um efeito ambiental de gran-de valor, inclusive na biodiversidade,propicia o seqüestro de carbono pelabiomassa vegetal (parte aérea, raízes esolos), funcionando como um impor-tante sumidouro de carbono.

O Mecanismo de Desenvolvimento Lim-po (MDL) e outros instrumentos do Pro-tocolo de Kyoto vêm sendo explora-dos cada vez mais, inclusive com aintrodução de metodologias de linhade base para projetos de florestamentoe reflorestamento (projetos de uso daterra). Desta forma, países como o Bra-sil podem contribuir muito para a re-dução de gases, por meio de projetosde MDL, ou vis-a-vis com uma fortepolítica de incentivos a agricultores eprodutores, em geral.

Novas dietas nutricionais para rumi-nantes estão sendo estudadas comvistas à redução de metano (CH

4) no

processo de fermentação entérica. Oideal é alcançar uma relação menorpossível em termos de kg de metano/kgde produto (carne, leite). Entretanto,há muito a se estudar nesse sentidoe o assunto ainda se reveste de mui-tos desaf ios.

O uso de biodigestores para o tra-tamento de dejetos animais propi-

c ia a redução de gás metano, 21vezes mais potente do que o CO

2

para o aquecimento global, ao mes-mo tempo em que contribui com aenergia alternativa (biogás) para usonas propriedades agrícolas, comconseqüentes benef íc ios econômi-cos e ambientais. Existem, hoje, deze-nas de projetos de MDL com base nouso de biodigestores em criações de su-ínos em vários países.

A crescente demanda por combustíveisalternativos encontra na agricultura umafonte substancial de matéria-prima, comgrande expectat iva para novastecnologias de geração de combustível.Ainda mais, lembrando que em paísestropicais como o Brasil, a atividadefotossintética elevada nos coloca em po-sição privilegiada.

Mas é importante que se tenha em vistafuturos impactos ambientais, econômicose sociais que poderão advir com a expan-são de áreas agrícolas voltadas à produçãode biocombustíveis. Daí a importância dese desenvolver projeções (cenários) para ouso dessas alternativas, bem como estimaras emissões de gases de efeito estufa rela-cionadas a essas atividades ao longo do tem-po, para se saber se a atividade realmentecontribuirá não só para a economia dospaíses, como também para o combate aoaquecimento global. Com isso, ostomadores de decisão poderão planejar ati-vidades antrópicas de acordo com cenáriossustentáveis no tempo e no espaço.

Finalmente, há que se ressaltar a im-portância da pesquisa agropecuáriana busca de conhecimento sobre opotencial de emissão de gases ge-rados por diferentes sistemas agrí-colas, pecuários, f lorestais eenergéticos, bem como os efeitosde diferentes manejos na reduçãode gases. O projeto Rede Agrogasesda Embrapa, criado em 2003, e emandamento, envolve o estudo devários sistemas de produção agríco-la, animal e agroflorestal, no senti-do de conhecer os fatores que le-

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poderia sinalizar uma tendência demudança no ciclo. No entanto, é ra-zoável esperar que o número total defêmeas abatidas aumente em ummundo de crescimento de produtivi-dade. Além disso, houve uma redu-ção no abate informal no País, de acor-do com as estatísticas do número decabeças abatidas e do número de pe-ças de couro levantados pelo IBGE. Ouseja, como no mercado informal aba-tem-se proporcionalmente mais fême-as do que machos, a redução nainformalidade levaria naturalmente aum aumento nas estatísticas de aba-te de fêmeas. É possível notar, por-tanto, que os dados relativos ao aba-te de fêmeas podem não ser umprevisor do comportamento do reba-nho em um cenário de transforma-ções tecnológicas e mudanças da baseestatística.

Em decorrência das dúvidas expostasacima, torna-se fundamental o acom-panhamento dos preços do bezerropara ajudar na análise do comporta-mento futuro do rebanho brasileiro.Os últimos meses sinalizaram, em al-gumas praças, uma reversão nos pre-ços do bezerro com relação ao boigordo, após um período de sucessi-vas quedas. É possível, embora sejacedo para afirmar, que esteja ocorren-do um relativo encurtamento da ofer-ta. Caso essa trajetória de oferta seconsolide, pode-se esperar para o pró-ximo ano alguma melhora nos preçosinternos. Em outubro de 2006, com-pletou-se um ano desde o surgimentodo primeiro foco de aftosa no País.Em tese, os mercados europeu e chi-leno devem voltar a se abrir para oPaís, salvo se algum novo problemasanitário surgir nos próximos meses.Dado o já alto crescimento das expor-tações, a liberação desses mercadosconsiste em elemento relevante aoaumento da demanda pela carne ver-melha brasileira. A cada dia que pas-sa, o Brasil se consolida como grandeexportador de carnes. Esse é um ca-minho sem volta. É preciso, entretan-to, seguir o caminho da qualidade,da segurança do alimento, pois essaé a única forma de se aumentar o va-lor agregado de um produto que acada dia ganha melhor reputação nomundo todo.

Mapa: Número de cabeças por ha de município no Brasil em 2004

Mapa: Número de cabeças por ha de município no Brasil em 1990

Fonte: Dados originais IBGE

Fonte: Dados originais IBGE

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bioenergia e florestas para a produ-ção de alimentos, fibras, madeiras esubprodutos, de forma que o negó-cio da agricultura continue sendouma força singular na produção dealimentos, matérias-primas industri-ais, derivados e biocombustíveis.

4. Além do Brasil, onde a tecnologiatropical criada pela Embrapa está sen-do utilizada? Há acordos com outrospaíses?

A Embrapa possui acordos de coopera-ção bilateral, trilateral e multilateral. Amaior parte são acordos de cooperaçãobilateral, num total de 69, envolvendo 38países (América Latina e Caribe - 14;América do Norte e Europa - 9; África -9; Ásia e Oceania - 6) e 64 instituições.Esses acordos se expressam mediante oaporte de experiência científ ica,tecnológica e de inovação por instituiçõesde países parceiros como os Estados Uni-dos, Alemanha, França, Reino Unido,Holanda, Suíça, Japão, entre outros.

Para otimizar estas relações, a Embrapacr iou o Labex/EUA (em Beltsv i l le,Maryland, parceria USDA-ARS1), o LabexEuropa - França (Montpellier, parceriaAgropolis) e o Labex Europa - Holanda(Wageningen, parceria Universidade deWageningen). O objetivo dos Labex é re-alizar prospecção de oportunidades eparcerias para implementar projetos dedesenvolvimento científico, high-tech,intercâmbio de experiência científica,busca e intercâmbio na área de inova-ção, ou mesmo estabelecer e avaliar ce-nários tecnológicos.

Atualmente, temos dois acordos decooperação trilateral: com o Japão(JICA2), para treinamento de técnicos dospaíses africanos de língua portuguesae do Timor-Leste; e com o Fundo IBAS(Índia - Brasil - África do Sul), para trans-ferência de tecnologia e treinamentode técnicos da Guiné-Bissau. Estão vi-gentes, também, 20 acordos de coope-

ração multilateral com organismos in-ternacionais.

Além destes acordos, instalamos o Es-critório da Embrapa na África, em Gana.A Embrapa África tem o objetivo decompartilhar conhecimentos científicose tecnológicos para todo o continente,e assim contribuir com seu desenvolvi-mento sustentável, social e econômico,para a segurança alimentar e o comba-te à fome em toda a região. As ativida-des serão concentradas na transferên-cia de tecnologia, enfatizando asdemandas específicas de cada país,compatibilizadas em projetos de desen-volvimento agrícola. Além disso, aEmbrapa África vai desenvolver açõesde assistência técnica, treinamento edesenvolvimento de recursos humanos,bem como a prospecção de oportuni-dades para o agronegócio brasileiro,acreditando que será possívelimplementar duas agendas estratégi-cas para o Brasil: uma de caráter huma-nitário e outra de caráter empresarial.

5. Como estão as pesquisas na área daagroenergia? O novo Centro está funcio-nando?

A matriz energética mundial está emmudança. Ela está centrada em reser-vas fósseis. Do ponto de vista estraté-gico, reservas fósseis constituem-se emum recurso finito. A grandepotencialidade do mundo moderno ébuscar energias renováveis, dentre asquais, a energia de biomassa. Esse re-curso tem um forte propósito em fun-ção das grandes regiões tropicais domundo inteiro, que convertem ener-gia radiante do sol em energia debiomassa para fins de biocombustíveis,de eletricidade e outros fins agrega-dos. Nesse contexto, a Embrapa temum papel fundamental, levando-se emconta sua exitosa experiência de 34anos na agricultura de alimentos e porser uma instituição de excelência empesquisa, desenvolvimento e inovação(P&DI) em áreas tropicais. A Embrapa

pode também se constituir em umagrande contribuidora para o Brasil eparceira na agricultura de energias. Di-ante desse cenário, surge a EmbrapaAgroenergia, que está em funciona-mento desde o final do ano passado.Sua missão é coordenar e executar açõesde pesquisa nas quatro grandes plata-formas da agroenergia: etanol,biodiesel, florestas energéticas e resí-duos. Seguindo essa linha, estamos de-senvolvendo programas de P&DI para oetanol, especialmente de cana;biodiesel, nas culturas tradicionais deprodução de óleos vegetais (soja,mamona, dendê etc.); e naquelas ou-tras espécies vegetais potenciais comopinhão manso, algodão, macaúba, den-tre outras. Também na parte de flores-tas energéticas, estamos reestudandoos programas em andamento, reforçan-do os pontos focais para finsenergéticos, visando promover a tran-sição da idéia de aplicação e usos dabiomassa tradicional para a biomassamoderna. Em resíduos, o grande apeloé a oportunidade dos co-produtos e dasua utilidade para fins diversos. Essasquatro prioridades estratégicas se en-contram em pleno funcionamento, eestão sendo ampliadas na medida emque reforçamos a nossa equipe técni-co-científica.

Em relação a essa nova unidade deP&DI, estamos priorizando sua implan-tação. Para isso, toda estrutura e com-petência da Embrapa e das UnidadesDescentralizadas localizadas em dife-rentes regiões do Brasil e exterior es-tão sendo aproveitadas. Isto implicano fortalecimento de redes regionaisde pesquisa com o objetivo de con-centrar esforços para resolver as ques-tões regionalizadas. Estas parcerias in-ternas e externas constam de umametodologia própria e adequada àexperiência da Embrapa. A constitui-ção de redes regionalizadas de P&DI,ora em implementação, tem uma es-tratégia e um propósito definidos evai, por certo, encurtar caminhos, pou-par tempo e esforços e, é claro, econo-mizar energia.

1 US Department of Agriculture – Agricultural Research Service. (N.R.)2 Japan International Cooperation Agency. (N.R.)

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CAFÉ

Roberto Rodrigues,Coordenador do Centro de Agronegócio da EESP da Fundação Getulio Vargas.

O caminho para a diferenciação

Acafeicultura amargou umacrise aguda entre 1997 e2002, refletindo a conjuntu-

ra de produção global superior aoconsumo. No período, os preços mé-dios de exportação brasileira do caféverde declinaram de US$ 189,60/saca de 60kg para US$ 46,23/sacade 60kg. Em 2002, embora o Brasiltenha exportado 28 milhões de sa-cas, o ano ficará na história como oápice de uma crise que destruiu arenda do setor, provocando umendividamento crescente dos cafei-cultores.

Ficou evidente, no início de 2003, anecessidade de adoção de medidasconjunturais que assegurassem nocurto prazo a sobrevivência da cafei-cultura, ao mesmo tempo em que seestruturasse um sistema de melhorordenamento das safras, com umadistribuição equil ibrada do café aolongo dos 24 meses seguintes.

Sempre que uma crise afeta um se-tor, a cadeia produtiva se desarticulaem busca do "salve-se quem puder".Assim estava a cafeicultura no come-ço de 2003. Mas graças à moderni-zação das lideranças, a cadeia se or-ganizou positivamente por meio doCDPC (Conselho Deliberativo da Po-lítica Cafeeira) - com representantesdo governo e dos diferentes elos daárea privada - em busca de duas ques-tões centrais:- conjuntural: o equacionamento do

endividamento do setor;- estrutural: a criação de polít icas

contracíclicas.

Luiz Antonio Pinazza,Consultor da FGV Projetos e Coordenador do Núcleo de Comunicação do Centro de Agronegócio da EESP-FGV.

Fonte: NYBOT - Valores: US$ Cents/libra

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ENTREVISTA

1. No século XX, a Embrapa contri-buiu para a expansão da agriculturabrasi le ira ao desenvolver umatecnologia tropical que permitiu a con-quista dos cerrados. Qual será o gran-de salto tecnológico no século XXI?

Nas três primeiras décadas do séculoXXI, provavelmente, o grande saltotecnológico será o de consolidar o Bra-sil como o maior produtor mundial deenergias renováveis a partir da biomassa.Obviamente, será alcançada a liderançana agricultura de fibras e alimentos, oque significa se consolidar como potên-cia mundial nas três agriculturas: alimen-tos, fibras e madeira e energia. Para queisto possa ocorrer, a Embrapa, com as ins-tituições de pesquisa e desenvolvimentonacionais, deverá dedicar parte substan-cial de seus esforços, investimentos e re-cursos humanos no desenvolvimento desistemas produtivos mais eficientes doponto de vista energético, com balançospositivos que permitam uma reduçãosubstancial do uso de insumos externose o aproveitamento total da biomassaproduzida. Isso significa gerar tecnologiade primeira e de segunda geração, indoda produção até o processo agroindustrialdas conversões.

2. Parcerias entre entidades públicasde pesquisa, como a Embrapa, e asgrandes empresas de biotecnologia,principalmente em áreas estratégicas,como a biotecnologia, são cada vezmais constantes. Como está o temadas Empresas de Propósito Específico(EPE)?

Avançamos muito nos últ imos me-ses sobre a questão da Empresa dePropósito Específico. No mês de ja-neiro, a proposta foi aceita pelo

Conselho Superior do Agronegócioda Federação das Indústrias do Esta-do de São Paulo (Fiesp). A Embrapapropôs a criação de uma EPE com focoem agroenergia.

A dificuldade que temos encontradoé a ausência de regulamentação maisclara e definida na esfera da inova-ção. Além da questão jurídica,estamos trabalhando outros três as-pectos: o plano de negócios; o valorda marca e da tecnologia da marca; ea gestão do negócio propriamentedito. Vale dizer que o principal ativoda Embrapa e das instituições de ci-ência e tecnologia é o conhecimento.No entanto, há pouca expertise nomundo e praticamente nada no Brasilque permita valorar conhecimento etecnologias expressas, por exemplo,em um banco de germoplasma, ouum conjunto de talentos e competên-cias. Portanto, um caminho a ser tri-lhado quase a partir do marco zero. Opróximo passo é iniciar a etapa deação, de colocar a empresa em funci-onamento. Com a força-tarefa cons-tituída entre a Embrapa e a Fiesp, acre-ditamos que, ainda neste semestre, aEPE em agroenergia possa estar fun-cionando.

Uma vez constituída uma primeiraEPE, com a segurança de que os ato-res públicos e privados poderão serbeneficiados mutuamente, será bemmais fácil implementar outras EPEs,considerando-se a competência daEmbrapa em P&D (Pesquisa e Desen-volvimento) e em Transferência deTecnologia, incluindo os diferentestemas como a biotecnologia, o me-lhoramento genético animal e vege-tal, a fertilidade e o manejo sustentá-vel de recursos naturais, entre outros.

Incluem-se aqui investimentos em re-cursos humanos e infra-estrutura quevêm sendo feitos em tecnologias por-tadoras de futuro, como é o caso dananotecnologia.

3. A Política de Desenvolvimento deBiotecnologia, lançada recentementepelo governo, pretende, em 15 anos,colocar o Brasil entre os cinco princi-pais países na pesquisa e geração deserviços e produtos biotecnológicos.Qual será o papel da Embrapa nesteprograma?

A participação de cientistas daEmbrapa foi fundamental na formu-lação do programa lançado pelo Go-verno Federal. Esta iniciativa deixa cla-ro que não haverá como se atingir ospatamares de produção e de qualida-de sustentáveis necessários aos inte-resses da agricultura nacional semque, nos próximos quinze anos, o Brasilpossa ser um líder, no mínimo domundo tropical, no desenvolvimentode tecnologias biotecnológicas, bemcomo um cliente destacado destastécnicas, a exemplo da clonagem ani-mal, da genômica, da caracterizaçãomolecular, da manipulação nano-mé-trica, da transformação genética, dosprocessos fermentativos e do melho-ramento genético. A Embrapa, sendoresponsável pela guarda do patri-mônio genético vegetal e animal doPaís, detendo um conjunto de unida-des em quase todos os estados dafederação, portadora de uma infra-estrutura de laboratórios com ativi-dades biotecnológicas e com o con-junto de pesquisadores espe-cializados de que dispõe, tem a res-ponsabilidade e a capacidade de li-derar as pesquisas em biotecnologiaaplicadas à agricultura, pecuária,

Dr. Silvio Crestana, Diretor-Presidente da Embrapa1

Bruno Blecher

1 Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. (N.R.)

31

Os aspectos conjunturais foram tra-tados via prorrogação das dívidas elançamento de contratos de opçõesde venda públicas e privadas de café.O Conselho Monetário Nacional au-torizou a repactuação de parte dosdébitos do setor em até 18 meses. Aintrodução do café na Política de Ga-rantia de Preços Mínimos permitiuque a cafeicultura tivesse acesso àslinhas de financiamento do MCR-6.2(Manual de Crédito Rural), para cus-teio e comercialização (neste últimocaso por meio dos Empréstimos doGoverno Federal - EGF e da Linha Especi-al de Crédito - LEC). O acesso aos recur-sos do Orçamento Oficial de Crédito -OOC , por outro lado, permitiu o lança-mento das opções públicas e privadascom equalização das taxas de juros e dospreços. Cerca de 3 milhões de sacas fo-ram colocadas nos leilões de opções.

Todas estas medidas permitiram o inícioda recuperação dos preços.

A questão estrutural foi tratada pelo CDPCcom o objetivo de "gerar renda e desen-volvimento harmônico em todos os elosda cadeia agroindustrial do café, promo-vendo a geração de divisas, de emprego,a inserção social e a sustentabilidadeambiental, em benefício da sociedadebrasileira".

Algumas ações foram desenvolvidas nes-ta tentativa:

I - Programa Nacional de Pesquisa eDesenvolvimento do Café - PNP&D/CAFÉ - Voltou a ser considerado es-tratégico, com a alocação crescentede recursos. Foi concluído omapeamento do Genoma Café e, apartir de 2007, será dada ênfase natransferência e difusão de tecnologia,com acesso de milhares de produto-res aos resultados das pesquisas.

I I - Projeto de AperfeiçoamentoMetodológico do Sistema de Previsãode Safras, denominado Geosafra - ACONAB - Companhia Nacional de Abas-tecimento - mapeou a área física ocu-pada pelos cafezais e está desenvol-

vendo metodologias para definição daprodutividade, o que contribuirá paraa consolidação do Sistema.

III - Levantamento dos estoques pú-blicos e privados - Os estoques, emabril de cada ano, são levantados edivulgados pela CONAB em proces-sos que vêm sendo aperfeiçoados econtribuindo para a transparência domercado.

IV - Programa Integrado de Marketingdos Cafés do Brasil - PIM/CAFÉ -Viabilizou um trabalho abrangente depromoção, envolvendo feiras,simpósios, concursos de qualidade,Café & Saúde e campanhas promo-

cionais veiculadas na mídia televisa-da, contando com representantes dacadeia cafeeira, no Grupo Gestor deMarketing - GGM, e do CDPC.

Boa parte destes programas foi exe-cutada com recursos do FUNCAFÉ,redirecionados e reorientados paraatender a toda a cadeia produtiva.

Foi, sem dúvida, um grande cresci-mento, consolidando ações, que, as-sociadas às perspectivas de mercado- produção mundial crescendo me-nos que o consumo - permitiu umamelhora na renda do setor, só nãomais efet iva em função do câmbiodesfavorável para as exportações.

Elaboração: MAPA/SPAE/DCAF

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patamar de 60 milhões de hectares, oque permite dimensionar o enorme po-tencial produtivo brasileiro.

Ao longo da última década, iniciou-seum sistema de produção que procurainteragir as culturas anuais (grãos e al-godão) com a pecuária bovina. Este sis-tema passou a ser conhecido comointegração lavoura-pecuária. Existe umleque de variações dos tipos deintegração, mas o princípio geral é arotação de pastagem com grão, entreanos ou em um único ano (inverno everão). O sistema de plantio direto re-quer palhada para proteger o solo. Aofinal do período de chuvas, é usual ocultivo de alguma lavoura para garantira proteção do solo com palha para oplantio da safra em setembro/novem-bro. O pasto pode perfeitamente serutilizado para esse propósito, conferin-do excelente proteção ao solo. Alémdisso, a rotação com lavoura resulta emmelhoria da fertilidade do solo, elevan-do a produtividade das pastagens. Arotação com pasto permite, por sua vez,reduzir a infestação de doenças, o quereduz as pulverizações necessárias às la-vouras anuais. O sistema de integraçãolavoura-pecuária é uma novidade quenão é freqüente em nenhuma outragrande agricultura do mundo. Esse sis-tema traz vantagens agronômicasdecorrentes da rotação, reduzindo a in-cidência de pragas e doenças, especial-mente na lavoura de soja. Entretanto, éimportante ressaltar que esses sistemasde produção inovadores requerem per-manente desenvolvimento tecnológico,em especial dos setores produtores deinsumos agrícolas.

A presença da agricultura nas regiõestradicionais de pecuária permite ampli-ar a qualidade da nutrição dos bovinos.O processamento da safra colhida aca-ba por gerar subprodutos que podemser utilizados em rações de confi-namento, semicon-finamento ou suple-mentação a pasto a um custo reduzido,o que amplia consideravelmente a pro-dutividade da pecuária. É interessantenotar a presença de estruturas deconfinamento disseminadas por todoo País, até em regiões do cerrado quenunca fizeram uso dessa tecnologia porrazões de custos de produção. Alémdisso, a presença de uma dieta de me-

lhor qualidade amplia consideravelmen-te o benefício advindo do melhoramen-to genético, estimulando a adoção des-sa tecnologia. É notório que, ao longodos últimos anos, o uso de técnicas demelhoramento genético (touros prova-dos, inseminação artificial, transferên-cia de embrião, fertilização in vitro) cres-ceu muito no Brasil.

Nota-se, portanto, que há forte sinergiaentre a produção de grãos e a pecuáriabovina. Foram citadas acima as vanta-gens tecnológicas, mas além dessas,pode-se também afirmar que a diluiçãode risco decorrente da diversificaçãoconfigura outro ganho do sistema deintegração.

A agropecuária nacional dependeu econtinuará dependendo pesadamentedo sistema de pesquisa no Brasil. Esteúltimo é liderado, em âmbito federal,pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pes-quisa Agropecuária) que desenvolvepesquisas em todo o País, englobandodiferentes condições edafoclimáticas edistintos produtos. Existe, ainda, umconjunto de centros de pesquisa esta-duais, notadamente no Estado de SãoPaulo, que desenvolvem tecnologiaadaptada às condições locais. Além dis-so, diversas associações privadas de pes-quisa foram criadas por produtores ru-rais com a finalidade de desenvolverpesquisa nas áreas de nutrição e de me-lhoramento genético de plantas. Existeum amplo número de empresas priva-das que adaptam e desenvolvem mate-rial genético, novos equipamentos e téc-nicas de pulverização e mecanização,nutrição de plantas etc. A maior partedas empresas multinacionais produto-ras de insumos possui longa tradiçãono Brasil.

No decorrer das últimas décadas, diver-sas escolas de Engenharia Agronômicae Florestal, Medicina Veterinária,Zootecnia e Biologia foram criadas, mul-tiplicando consideravelmente o núme-ro de profissionais em ciências agrári-as. Número igualmente significativo deprogramas de pós-graduação foi cria-do, elevando a qualidade dos profissi-onais que atuam na área. Atualmente,o Ministério da Educação exige que asuniversidades mantenham em seusquadros professores e pesquisadores

com um padrão mínimo de formação.A maior parte das universidades públi-cas e parcela crescente das privadasapresentam quadros compostos porprofissionais com mestrado e doutora-do. Parte desses profissionais obtevepós-graduação em instituições interna-cionais, elevando o padrão de conheci-mento brasileiro.

Os profissionais de Ciências Agráriasatuam em empresas privadas deinsumos, nos centros de pesquisa pú-blicos e privados, nas empresas agríco-las, nas cooperativas, em empresas deconsultoria etc. É interessante notar queas propriedades agropecuárias maismodernas contam com consultoria es-pecializada nas diversas etapas do pro-cesso produtivo: nutrição, pulverização,mecanização; caracterizando forte es-pecialização do conhecimento e eleva-ção da produtividade do sistema. To-das as empresas de insumos possuemem seus quadros um corpo de profissi-onais para aplicar e disseminartecnologia. No passado, esse processofoi essencialmente feito pelo Estado,mas em decorrência tanto do crescimen-to do setor quanto da crise fiscal dosanos 1980 e 1990, as empresas priva-das assumiram a liderança na dissemi-nação do conhecimento como uma es-tratégia de marketing. Atualmente,muitos encontros tecnológicos são or-ganizados pelas empresas privadas ecooperativas.

A inovação é o elemento central doagronegócio brasileiro. Dadas as especi-ficidades do meio-ambiente, não hácomo garantir a continuidade do de-senvolvimento do agronegócio sem umfluxo permanente de inovação. É ne-cessário, portanto, assegurar um mar-co institucional que garanta e estimuleo processo de geração e incorporaçãode novas tecnologias e que permita queas empresas produtoras de insumosagropecuários possam seguir expandin-do, ganhando dimensão e escala inter-nacional. É fundamental que o País seconsolide como grande exportador detecnologia agropecuária, o que incluitodos os segmentos produtores de insu-mos: biotecnologia, agroquímica, máqui-nas e equipamentos, equipamentos in-dustriais, genética animal e de plantas.

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Mesmo assim, o volume de exporta-ções se manteve estável, embora avalores mais elevados.

A Organização Mundial do Café pre-vê um déficit de 11 milhões de sacasna safra 2007/2008, fundamental-mente por causa da bianualidade dassafras.

Os mercados consumidores tradicio-nais, formados por Estados Unidos,Europa Ocidental e Japão, responsá-veis prat icamente pela metade doconsumo mundial , tendem a cres-cer dentro da média mundial. Já ospaíses produtores, com um quartoda demanda mundial, e mais os pa-íses emergentes, crescerão acima damédia .

Índia, México e Indonésia, com pro-gramas para aumento do consumointerno de café, podem ampliar ademanda em 5 milhões de sacas. Amesma tendência cabe para o LesteEuropeu, a Rússia e a China, sob oefeito do aumento da renda e a as-piração por um est i lo de v ida oci-dental .

Em 2006, foi registrada a maior ven-da da história do Brasil em termos devalor (3,3 bilhões de dólares) e a se-gunda em quantidade, depois de2002. Há um cenário externo de opor-tunidades para consolidar e ampliaresta posição.

A exportação de café torrado e moí-do também apresentou um excelen-te desempenho, conforme acompa-nhamento feito pelo PSI (ProgramaSetorial Integrado) realizado pelaABIC em convênio com a Agência dePromoção de Exportações e Investi-mentos (APEX Brasi l). Os produtosbrasi leiros conseguem maior suces-so em mercados e segmentos quedemandam cafés de alta qualidade epagam maior valor unitário.

Para 2007, a previsão é que as expor-tações de café torrado e moído con-tinuem a crescer. Os EUA figuramcomo o maior mercado comprador eo Mercosul surge como boa opçãode negócios (5% das vendas).

Também vem crescendo o consumo interno. No Brasil, o café é uma bebi-da consumida por 94% da população pesquisada e é a segunda coloca-da no rank ing de preferênc ia , segundo pesquisa rea l izada pe la ABIC,entre homens e mulheres maiores de 15 anos. Perde apenas para a água.Mesmo com a retração das vendas ocorrida no varejo, principalmente noprimeiro semestre de 2006, e o fraco desempenho da economia naqueleper íodo, o consumo de café vo l tou a crescer no mercado interno.

Desde 2003, o consumo de café no Brasil evoluiu 19,2%, de 13,7 milhõespara 16,33 milhões de sacas. O mercado brasileiro representa 14% da deman-da mundial e mais de 50% do consumo interno de todos os 57 países produ-tores de café, estimado pela OIC em 31 milhões de sacas por ano. No mundo,segundo dados da Organização Internacional do Café (OIC), o crescimentonesse período ficou em 1,5% ao ano, na média.

Pesquisa anual realizada pela Interscience, mostra que se manteve, em 2006, a tendênciade crescimento do consumo em todas as classes sociais e faixas etárias, com certaestabilidade apenas no segmento mais jovem (15 a 19 anos). As pessoas consomem

Brasil Exportação de café torrado e moído

Ano Valor Quantidade Preço médio

2007*

2006

2005

2004

US$ 32,00 milhões

US$ 24,47 milhões

US$ 16,69 milhões

US$ 8,45 milhões

6.955 toneladas

5.400 toneladas

4.165 toneladas

2.696 toneladas

Us$ 4,60/kg

US$ 4,55/kg

US$ 4,00/kg

US$ 3,13/kg

Brasil: Consumo de café

Período Quantidade

Novembro de 2005 a Outubro de 2006 16,33 milhões de sacas

Novembro de 2004 a Outubro de 2005 15,53 milhões de sacas.

Fonte: Área de Pesquisa da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic)

Fonte: MDIC (*) PREVISÃO

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200712

Após três décadas de mudanças, háevidências de que a agricultura bra-sileira começa a delinear um pa-

drão agrícola único no mundo: moderno,de larga escala, intensivo em tecnologia eessencialmente tropical. Não é fácil antevertodos os aspectos desse modelo, que ain-da se encontra em construção, mas é pos-sível levantar suas principais característi-cas, bem como delinear alguns desafios aserem superados a fim de que o processode expansão do agronegócio brasileiro sejasustentável no tempo. Em especial, mere-cem destaque os setores produtores deinsumos, que se mostraram capazes degerar tecnologias adaptadas ao sistemaagropecuário brasileiro. O objetivo do pre-sente artigo consiste em dar uma perspec-tiva histórica ao desenvolvimentotecnológico no País, associando-o aos se-tores produtores de insumos.

O agronegócio brasileiro é um sistemacomplexo. O País apresenta diversas ca-deias completas de produção. Todosegmento de insumos (máquinas agrí-colas e tratores, fertilizantes, defensi-vos, sementes etc.), de produção agrí-cola (que contempla as principaisculturas e animais produzidos no mun-do) e toda a cadeia processadora dedistribuição e informática associada aoagronegócio constituem um amplo sis-tema produtivo.

Ao comparar a agricultura brasileiracom os maiores sistemas produtivosdos países desenvolvidos, é possívelfazer duas afirmações sobre o sistemabrasileiro: (i) a moderna agricultura bra-sileira é um sistema relativamente novodo ponto de vista histórico e (ii) não háoutra grande agricultura tropical de lar-ga escala no mundo. A observação

comparativa torna evidente que o siste-ma brasileiro exigiu desenvolvimentotecnológico específico e que ele foi es-sencialmente construído no decorrerdos últimos 30 anos. Ademais, pode-se afirmar que as novas tecnologias per-mitiram assegurar ao País elevado graude competitividade frente às principaisagriculturas do mundo.

O evento tecnológico mais relevanteocorrido na agricultura brasileira nosúltimos 30 anos foi sem dúvida o Siste-ma de Plantio Direto. Essa técnica foidecisiva para viabilizar o desenvolvimen-to da agricultura nas áreas de cerrado.Clima tropical requer proteção do solo.O sistema de cultivo tradicional, bemcomo o modelo de mecanização a eleatrelado, mostrou-se inadequado a esseregime climático. Plantio direto, junta-mente com nutrição de plantas e de-senvolvimento genético, garantiram ex-pressivo aumento da produtividade daagricultura na região central do País.Foi necessário o desenvolvimento deconhecimento nas áreas de manejo deplantas, máquinas e equipamentos, no-vos defensivos e dessecantes, nutriçãode plantas e de manejo de solo paraque o plantio direto se viabilizasse noBrasil.

O domínio tecnológico da agriculturaem ambiente tropical permitiu que anatural abundância de solo, lumino-sidade, temperatura e água pudessemser utilizadas a fim de elevar a produti-vidade da agricultura. Em poucas pala-vras, o desenvolvimento tecnológico

permitiu fazer uso de suas vantagenscomparativas na agricultura.

A possibilidade de produzir duas safrasem um único ano tornou-se maior gra-ças ao desenvolvimento do sistema deplantio direto. A realização de duas sa-fras por ano é hoje usual no Mato Gros-so, em Goiás e no Paraná, embora nes-se último estado, em decorrência daelevada precipitação por quase todo oano, o sistema de safra de verão e deinverno já fosse utilizado, no passado,com maior freqüência1. A técnica deplantio direto reduz o tempo despen-dido com mecanização, permitindo aexecução de duas safras com menor ris-co climático.

O Brasil possui um volume expressivode área potencialmente agricultável.Existem diferentes estudos referentes àdisponibilidade de terra que, em geral,tendem a convergir para uma área po-tencial superior a 100 milhões de hec-tares na região do cerrado. Existe, ain-da, uma enorme área de pastagemcaracterizada por baixa produtividadedas forragens e que, atualmente, co-meça a ser integrada ao sistema degrãos, configurando um inovador sis-tema de rotação. Em trabalho recente,Brandão et alli (2005)2 concluem quecerca de 80% do aumento da área culti-vada com lavouras nos últimos dez anosno Brasil deu-se em antigas áreas depasto. A área total de pastagem no Paíssitua-se ao redor de 170 a 180 milhõesde hectares. A área agrícola atualmentecultivada no Brasil encontra-se em um

INSUMOS

Alexandre Lahóz Mendonça de Barros,Professor da EESP e Coordenador do Núcleo de Pesquisas do Centro de Agronegócio da FGV/ EESP

A importância dos setores produtores no desenvolvimentotecnológico da agropecuária brasileira

1 O sistema de plantio direto foi inicialmente desenvolvido por agricultores paranaenses emmeados dos anos 1970. Após essas experiências iniciais, a tecnologia de plantio direto foisendo desenvolvida, disseminada e adotada na região do cerrado.

2 Brandão et alii (2005) Crescimento agrícola no período 1999-2004, explosão da área plantadacom soja e meio-ambiente no Brasil. Texto para discussão 1062, IPEA/DIMAC.

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mais xícaras de café por dia, e o con-sumo fora do lar (no trabalho, nascafeterias, nos restaurantes) aumen-tou, entre 2004 e 2006, de 4,5 para5,5 milhões de sacas de 60 quilos. Apesquisa mostra, também, mais in-teresse em adquirir novas cafeteiraspara uso doméstico e maior aumen-to no consumo nas classes A/B, emconseqüência da demanda por cafésmais elaborados, de melhor qualida-de, certificados e com sabor e aromamarcantes, fatores determinantes doconsumo.

O ano de 2006 marcou a entrada nomercado brasileiro de novas cadeiasde casas de café estrangeiras e oanúncio de investimentos de empre-sas européias. Tudo isso confirma ointeresse despertado pelo tamanho ematuridade do mercado brasileiropara assimilar inovações e novos pro-dutos.

Mesmo em menor parcela, a oferta decafés de má qualidade é um grandeperigo para os objetivos de amplia-ção do consumo. O setor reivindicajunto ao MAPA uma atualização daslegislações para o café em grão cru eindustrializado. É necessário coibir acomercialização de matérias-primascom qualidade inferior e de volumescom excesso de grãos defeituosos,bem como a oferta, aos consumido-res, de produtos com qualidade nãorecomendável.

Os governos da Bahia, do Espírito San-to e de Minas Gerais, em 2006, cria-ram, por decreto dos governadores,regras para a adoção de critérios dequalidade mínima nas aquisições e li-citações de café para o consumo dosseus organismos públicos. Com tan-

tas novidades, o consumo nacional decafé aumenta. O consumo per capitaanual passou de 5,14 quilos para 5,28quilos por ano. Uma alta de quase 3%,o dobro da média mundial.

Por trás desse crescimento, também es-tão os programas de certificação daqualidade. O principal deles é o Progra-ma Permanente de Controle da Purezade Café criado pela própria ABIC, maisconhecido como Selo de Pureza.

No ano da criação do selo, em 1989, oconsumo de café estava em declínio.Mais de 30% das marcas analisadas bur-lavam a legislação, com mistura de ou-tras substâncias ou grau de impurezasacima do limite permitido. Apenas 463marcas faziam parte do programa eeram responsáveis pela industrializaçãode 330 mil sacas por mês.

Hoje, 70% do café produzido no Brasiltem o selo e menos de 5% das marcassão consideradas impuras ou adultera-das. O programa conta com mil marcasprocessando 480 mil sacas por mês.

Todos estes dados, referendados pelasegunda Conferência Mundial de Café,realizada em Salvador, em setembro de2005, indicam uma melhor condiçãono futuro para a cafeicultura brasilei-ra, frente à violenta crise dos anos an-teriores.

A política anticíclica para 2007 será con-templada com cerca de R$ 2 bilhões doFuncafé, R$ 500 milhões do MCR 6.2 eR$ 235 milhões do OOC, recursos sufi-cientes para atenuar os efeitos negati-vos da bianualidade. Para otimizar a efi-cácia dessas políticas, é imprescindívelque sejam incorporados mecanismosque sinalizem claramente a evoluçãodos preços futuros como, por exemplo:Prêmio de Risco de Operações Privadas(PROP), Prêmio de Equalização de Preçoao Produtor (PEPRO) e Prêmio deEqualização de Preço Pago à Agroin-dústria (PEP). Com essas medidas, o se-tor produtor poderá efetuar um hedge,amenizando substancialmente o riscoda estocagem e garantindo dinamis-mo na comercialização, com maior ren-da para o setor.

Razões do crescimento do mercado interno de café

� Melhoria contínua da qualidade do café oferecido aos consumidores. O Programa de

Qualidade do Café (PQC) certifica mais de 160 marcas em todo o Brasil;

� Consolidação do mercado de cafés tipo Gourmet ou Especiais, diferenciados e de alta

qualidade;

� Maior percepção do café quanto aos aspectos dos benefícios para a saúde, como

resultado dos grandes investimentos no Programa Café e Saúde.

� Investimentos em promoção e marketing. Em 2006, foram aplicados com recursos do

Funcafé (Fundo de Defesa da Economia Cafeeira), R$ 5 milhões, por meio do

Programa Integrado de Marketing (PIM-2006), coordenado pelo Departamento do Café

(Decaf), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. A esses recursos,

somaram-se as contrapartidas privadas neste programa, em valor superior a

R$ 2 milhões e o Fundo Especial de Marketing da ABIC, no valor de R$ 655 mil,

constituído por contribuições extraordinárias dos seus associados torrefadores.

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 11

A taxa de investimentos atinge pa-tamar superior a 20% do PIB de for-ma sistemática, proporcionando umambiente favorável ao crescimentoeconômico. Neste cenário, as taxas dejuros seguem caindo, atingindo pa-tamares significativamente mais bai-xos em termos reais, em alguns anos.

Do ponto de vista externo, o cenáriocontempla uma desaceleração gradu-al da economia global (soft landing),sem maiores turbulências nos merca-dos internacionais e sem reversõesbruscas de fluxos de recursos inter-nacionais para as economias emer-gentes.

Esse cenário se mostra favorável aoagronegócio, dada a perspectiva docrescimento balanceado da economiabrasileira. Ao mesmo tempo, a quedada taxa de juros e a manutenção dataxa de câmbio estável em termos re-ais favorecerão o setor. Por fim, ante aperspectiva de desaceleração gradualda economia internacional, os preçosdas commodities devem apresentar al-guma acomodação.

Cenário Básico (65%)Neste cenário, a perspectiva é de quea economia brasileira apresente umdesempenho marginalmente superiorao observado nos últimos anos.

Nesse contexto, a ênfase do governono crescimento econômico esbarranos entraves políticos e de maior arti-culação junto à sociedade. Dessa for-ma, o governo enfrenta dificuldadesem implementar um projeto de mu-danças e reformas mais amplo,focando-se no limite do possível anteas condições impostas pelos ambien-tes político e econômico. Nesse cená-rio, as taxas de juros seguem caindo,mas a um ritmo mais lento do que oprevisto no cenário otimista, uma vezque os limites impostos pelos baixosníveis de investimento sugerem ris-cos inflacionários latentes, em face deuma maior aceleração do crescimen-to econômico.

Espera-se ainda que a desaceleraçãodo crescimento global mais adianteseja suave (soft landing), mas a persis-tência de incertezas levará a períodosde turbulências temporárias, com efei-tos maiores sobre as economias emer-gentes e suas respectivas taxas decâmbio.

Do ponto de vista do agronegócio, ocenário também se mostra favorável,mas com perspectiva de desempenhomais moderado, diante de um con-texto de crescimento doméstico maislento e de potenciais turbulências in-ternacionais.

Cenário Pessimista (10%)Neste cenário, o governo não tem su-cesso algum em implementar sua agen-da de crescimento econômico ou derealizar reformas estruturais essenci-ais à economia brasileira. Ante maio-res riscos de pressões inflacionárias,as taxas de juros permanecem em pa-tamar elevado, o que afeta diretamen-te o setor agrícola.

Ao mesmo tempo, é possível preverum quadro de brusca desaceleraçãodo crescimento econômico global (hardlanding) e fortes turbulências nos mer-cados financeiros internacionais. Tal fe-nômeno tem impacto direto sobre aseconomias emergentes, provocandoelevada volatilidade de suas moedas.

Do ponto de vista do agronegócio, estecenário embute dificuldades tanto pelaperspectiva de menor crescimento do-méstico quanto pelas dificuldades anteum cenário externo conturbado.

Em suma, as perspectivas de médio elongo prazo para o agronegócio, anteos cenários delineados se mostramrelativamente favoráveis para ospróximos anos. Ainda assim, nãodevem ser desconsiderados inteira-mente alguns riscos possíveis associa-dos à evolução das principais variáveismacroeconômicas.

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CITRICULTURA

Montagem do Consecitrus

Luiz Antonio Pinazza,Consultor da FGV Projetos e Coordenador do Núcleo de Comunicação do Centro de Agronegócio da EESP-FGV.

Em 2006, representantes doscitricultores da indústria paulista desuco e do governo realizaram diver-

sas rodadas de negociação, em busca desoluções para o impasse em torno dospreços da fruta entregue às fábricas. Omotivo foi a valorização do preço do sucono mercado internacional e a queda dodólar, que, segundo os contratos estabe-lecidos entre 2004 e 2005, colocaram osprodutores em condições desfavoráveis.Com a lentidão nas negociações e adificuldade em se obter consenso parasolucionar a questão, os produtoresbuscavam renegociar seus contratos in-dividualmente. O intervalo de preçosda caixa de 40,8 quilos nas negocia-ções realizadas em 2005 foi deUS$ 2,80 a US$ 3,80, para a fruta en-tregue no portão da indústria. Com onovo cenário, principalmente em fun-ção do real valorizado, estes valoresficaram menores.

Quando algumas processadoras desuco iniciaram a moagem no início dejunho, o acordo entre indústrias ecitricultores a respeito da renegociaçãodos contratos continuava em aberto.Em 31 de maio, as indústrias oferece-ram um reajuste por caixa de US$ 0,60para os negócios fechados em anosanteriores. A Associação Brasi le i rados Citr icultores (Associtrus) nãoconcordou com a proposta e a Fe-deração da Agricultura do Estado deSão Paulo (Faesp) sugeriu um bô-nus superior a US$ 1,00 por caixa.Antes desta reunião, representan-tes dos produtores re iv indicavamum adicional de US$ 3,40 à caixa.Em 4 de agosto, após meses de nego-ciação, representantes dos citricultorese da indústria fecharam um acordosobre o reajuste do valor dos contra-tos de fornecimento de matéria-prima

fechados até dezembro de 2005, váli-dos para a safra 2006/07.

O bônus é válido somente para essatemporada e será obtido por meiode uma fórmula que leva em conta ovalor do preço do suco na bolsa deNova York, taxa de câmbio e o rendi-mento da fruta (240 caixas por tone-lada de suco). Independentementedo valor obtido pela fórmula, todosos contratos já firmados serão rea-justados para esta temporada a umvalor mínimo de US$ 4,00 por caixade 40,8 quilos.

O bônus será calculado por meio dadiferença entre o preço médio dosuco na Bolsa de Mercadorias deNova York (Nybot), de julho de 2006a junho de 2007, e o valor de 138centavos de dólar por l ibra-peso.Para converter esse diferencial emtoneladas de suco, multiplica-se pelofator 14,55. O resultado em dólarespor caixa de laranja (US$/cx) é obtidopela divisão por 240 (caixas por to-nelada de suco). Cinqüenta por cen-to desse valor será repassado para oprodutor.

Os citricultores com contratos de par-ticipação no mercado internacionalreceberão o valor estipulado no con-trato firmado com a indústria anteri-ormente, somado a um bônus quedeverá ser pago da seguinte forma:50% de imediato, em função da esti-mativa da safra 2006/07 e os 50%restantes à medida que a fruta forcolhida e entregue.

Entre as empresas que participaramda negociação de reajuste de preçosnos contratos, a Sucocítrico Cutraleassinou um acordo de bonificação

no final de dezembro e o grupo LouisDreyfus em fevereiro. As demaisprocessadoras renegociam isolada-mente com seus fornecedores. O va-lor da caixa dos contratos negocia-dos na safra 2006/07 vai de US$ 4,00a US$ 6,05.

A fórmula de bonificação ainda teráque ser avaliada pelo Conselho Ad-ministrativo de Defesa Econômica(Cade) e pelas indústrias não associ-adas da Associação Brasileira dos Ex-portadores de Cítricos (Abecitrus).

O setor citrícola também aguarda odesfecho da apuração de existência decartel das indústrias investigadas peloCade, que não aceitou a proposta dasindústrias para pagar uma indeniza-ção de R$ 100 milhões e colocar umfim ao processo de investigação decartel. A indenização equivale, em va-lores atuais, a 3% da receita com asexportações do setor em 1999(US$ 1,5 bilhão, valores reais FOB de2006, incluindo o suco e subprodutos),segundo dados da Secex (Secretaria deComércio Exterior do Ministério doDesenvolvimento, Indústria e Comér-cio Exterior). Se o processo for levadoadiante, a multa poderá chegar a 30%do faturamento das empresas de suco,além do julgamento se arrastar poranos.

O fechamento vai depender da apro-vação dos conselheiros do Cade, quejá receberam um relatório das apu-rações feitas pela Secretaria de Direi-to Econômico (SDE). As duas entida-des integram o Sistema Brasileiro deDefesa da Concorrência (SBDC). Adúvida é se um acordo será possível,pois a acusação de cartel é de 1999.A partir de 2000, houve uma revisão

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 200710

Oambiente macroeconômico bra-sileiro deverá ser permeado,ao longo de 2007 (e nos pró-

ximos anos), por um ciclo de relativamanutenção dos principais eixos dapolítica econômica praticada ao lon-go do primeiro mandato do presi-dente Lula. Nesse contexto, não seesperam mudanças radicais no âm-bito da condução da economia bra-si leira. Um aspecto ressaltado, emcerto sentido à exaustão, pela equi-pe econômica do governo, e san-cionado no plano político pelo pró-prio Presidente da República.

Isso não significa, no entanto, quemudanças nessa área, ainda que mar-ginais, devam ser completamentedescartadas. De fato, o governo deuclaras mostras de preocupação coma questão do crescimento brasileiro,cuja média do primeiro mandato pou-co diferiu da registrada pelo seuantecessor. Adicionalmente, o cres-cimento econômico do País tem sesituado abaixo do mundial há váriosanos.

Os sinais dessa preocupação foramexplicitados durante a campanha elei-toral de 2006 e expressos de formamais contundente no início do novomandato, com a edição do Programade Aceleração do Crescimento (PAC),no começo de 2007. Adicionalmen-te, as movimentações internas dopróprio governo apontam para umarediscussão da orientação econômi-ca no âmbito do Executivo, denotan-do um crescente foco na questão docrescimento econômico.

Em razão disso, é razoável imaginarque os próximos anos, em termos de

política econômica, devem ser mar-cados pela manutenção dos parâ-metros da ortodoxia econômica ob-servada entre 2003 e 2006. Noentanto, também é lícito supor quealgumas mudanças de dosagem e,marginalmente, de foco, surjam nocontexto da condução da economiapor parte do governo em 2007 e nospróximos anos.

Essa dimensão, do ponto de vista do-méstico, também deve levar em contaa configuração do ambiente econô-mico externo, que tem se mostradoextremamente favorável nos últimosanos. De fato, a economia global vematravessando uma fase excepcionalem termos de desempenho, o que temcondicionado um cenário internacio-nal propício às economias emergen-tes. Essa dinâmica, conjugada a umquadro de extrema abundância deliquidez de recursos externos,condicionou uma evolução econômi-ca internacional livre de crises nos úl-timos anos (diferente da que se ob-servou na segunda metade dos anos1990 e início da década atual). Dessaforma, as economias emergentes seviram firmemente favorecidas por esseciclo, o que lhes proporcionou umaabundância de recursos como hámuito não se via. Ao mesmo tempo, oelevado crescimento global tambémcondicionou o comportamento dospreços de vários produtos, em parti-cular das commodities. Esse movimen-to também favoreceu as economiasprodutoras desses produtos nos últi-mos anos, reforçando a perspectivade um ambiente favorável.

As perspectivas adiante no front ex-terno, no entanto, sinalizam para al-

gum grau de desaceleração do cresci-mento econômico global. Em parti-cular, espera-se que a economia nor-te-americana apresente certo graude desaceleração nos próximosanos, sendo válido o mesmo para aeconomia chinesa. Nesse contexto,é possível que o pico dos preços in-ternacionais de várias commodit iestenha ficado para trás, o que, semdúvida, afetará, em alguma medi-da, as economias dos países ex-portadores dessas commodit ies(onde o Brasi l tem lugar de desta-que). Adic ionalmente, a esperadadesaceleração do crescimento glo-bal deverá ser acompanhada poralguma reversão dos fluxos de capi-tais externos, com potenciais impac-tos sobre as economias emergen-tes.

Tendo por base esses elementos,podem ser traçados três cenários al-ternativos para 2007 e para os pró-ximos anos, com diferentes desdo-bramentos para o agronegócio:

Cenário Otimista (25%)Neste cenário, as principais diretri-zes de pol ít ica econômica sãomantidas, com retomada gradual docrescimento econômico, sem a ge-ração de pressões inflacionárias sig-nif icativas. O governo é bem-suce-dido na sua agenda de transitar paraum regime de maior crescimentoeconômico sem comprometer ospr incipais fundamentos da econo-mia brasi le i ra. Ao mesmo tempo,tem êxito no plano de restabeleceruma agenda de reformas estrutu-rais, com modernização progressivada estrutura econômica do País.

AMBIENTE MACROECONÔMICO

Rogério Mori,Professor e Coordenador do Centro de Macroeconomia Aplicada (CEMAP) da FGV-EESP

Cenários macroeconômicos

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São Paulo e Flórida: produção de laranja (milhões de caixas)

da Lei de Defesa da Concorrência,que passou a proibir a cessação deconduta em casos de infrações à or-dem econômica relacionadas à acu-sação de cartelização (Lei n° 10149de 21 de dezembro de 2000).

A Faesp deverá ser o órgão gestordesse recurso. A maior parte do va-lor da indenização deverá ser envia-da para a parte eventualmente "pre-judicada", os produtores. Muitosdeles optaram pela renegociação in-dividual com a indústria porque nãoacreditam que possa ocorrer umaformalização do reajuste coletivo.

Do ponto de vista da formação de pre-ços, a negociação contribui em trêsaspectos:1.Diminui a diferença entre o valor

mínimo e o máximo nos contra-tos, com a política de piso mínimoa US$ 4,00 a caixa;

2. Introduz uma fórmula baseada naBolsa de Nova York para medir aparticipação dos produtores nosganhos do mercado internacionalde suco;

3.Cria um novo meio de negociaçãoe fixação dos preços ao produtorcom base nos preços externos.

Cenário melhor para 2007Os prejuízos provocados pelos fura-cões em 2004 e 2005, na Flórida,reduziram a colheita de laranja e aoferta de sucos dos Estados Unidosem 2006. O alastramento de doen-ças, como o cancro cítrico, a tristezados citros e o greening , junto com aurbanização, torna mais dramático oquadro de diminuição da áreacitrícola na região.

O estoque de passagem de suco delaranja concentrado e congelado(Frozen Concentrated Orange Juice -FCOJ ) na safra 2005/06 foi de 125mil toneladas na Flórida. Esse volu-me é 38% inferior ao registrado natemporada anterior, de acordo como relatório da Flórida Citrus Mutual(Associação dos Processadores deCitros da Flórida).

Desde o início do censo realizado peloUSDA, em 1967, a área atual supera

apenas a de 1986, de 188,77 mil hec-tares. Embora o adensamento de plan-tio compense parte da redução daárea, a redução no plantio de árvoresé uma realidade na Flórida.

Com estoques reduzidos e previsãode oferta limitada de suco, os preçosdevem se sustentar em patamares aci-ma de US$ 2 mil a tonelada. Caso aprodutividade dos pomares se recu-pere em 2008 e 2009, os preços nomercado poderão sofrer reversão aci-ma dos níveis de 2004 e 2005. A par-tir de abril de 2006, a cotação supe-rou a barreira de US$ 2 mil a toneladae bateu recordes históricos. Conside-rando que seu consumo anual de sucoé de aproximadamente 200 milhõesde caixas, os Estados Unidos devemcontinuar importando o produto doBrasil e de outras origens nos próxi-mos anos, embora com taxaçãoelevadíssima.

A Hora é EstaA cadeia de suco de laranja, assim comoa de várias outras commodities, mudoumuito nos últimos anos. A base técnicaé outra, o investimento e a produtivida-de por área dobraram e a apreciação doreal fez o resto. Lá se vão os anos de 4caixas por pé e preço de 3 dólares porcaixa, que fizeram a felicidade de algu-mas regiões e famílias do interiorpaulista. Também já existiram, no pas-sado, contratos com participação empreço, base bolsa de Nova York.

Neste momento, há boas perspectivasde grandes melhorias. A montagem deum modelo para estabelecer o preço parao pagamento da indústria de suco aocitricultor não é uma idéia nova, mas umaestratégia importante para a harmoniada cadeia produtiva. Discutir se o preçoserá estabelecido em caixa ou brix, a par-tir da cotação no mercado internacionalé fundamental, assim como a defini-

Com uma produção de 1,3 mi lhãode toneladas na safra 2005/06, se-gundo o USDA, o Brasi l se destacacomo o maior produtor e exporta-dor de suco de laranja do mundo.As exportações bras i le i rascorrespondem a 80% do vo lumetotal exportado no mundo e a pro-dução a 58%. Em relação à produ-ção de laranja, a produção brasilei-ra nessa mesma safra fo i de 39milhões de toneladas, 39% do vo-lume mundia l produzido .

ção dos fatores de cálculo em funçãodo rendimento industrial. O estabe-lecimento de um Consecitrus em mol-des similares ao do Consecana trazunião e aumenta a força competitivado setor. O pagamento da laranja porqualidade é uma modernização ne-cessária. É neste momento de preçosmelhores que o elo mais forte, a in-dústria, aceitaria negociar. Cabe aosprodutores manter a união e um diá-logo objetivo para tentar conseguir oequilíbrio da cadeia a longo prazo.

Fonte: Departamento de Agricultura dos EUA (USDA)

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 9

nova civilização por meio da agroenergia,sem que isto signifique destruir nossosrecursos naturais. Ao contrário: os nú-meros da produção de grãos mostramisso. Se não tivéssemos evoluídotecnológica e gerencialmente nos últi-mos cinco anos, a terra necessária paraa produção de grãos deste ano seriabem maior. Portanto, nosso padrãotecnológico é eminentemente preser-vador, além de conservacionista!

Portanto, o apoio ao produtor deve virda pressão da sociedade urbana, comojá se dá em países desenvolvidos hádécadas. Não existe mais o 'jeca-tatu'ou o 'coronel dos grotões'. Nossoagropecuarista é eficiente, capaz ecompetitivo, o que dá à própria refor-ma agrária um conceito diferente de50 anos atrás, quando, de fato, nossaagricultura ainda tinha núcleos degrande incompetência.

Quais as questões mais importantes aserem tratadas? Já existe um diagnósti-co perfeito a esse respeito. O Ministérioda Agricultura tem clareza do que deveser feito e trabalha em busca do con-senso dentro do governo como umtodo para implantar medidas de mo-dernização e fortalecimento do campo.

O principal item é uma política de ren-da para o setor. O seguro rural é umagrande necessidade. Ainda pequeno,mas já criado por lei e também regula-mentado, esse instrumento será, den-tro de alguns anos, como já é nos paí-ses desenvolvidos, o grande elementoque evitará a recorrente obrigação desucessivos governos em prorrogar dívi-das de produtores quando as crises seavolumam. Obrigação que permanece-rá, enquanto não se consolidar e secompletar o projeto do seguro ruralcom: a) criação do Fundo de Catástrofe;b) redução do custo do prêmio de se-guro. Um avanço positivo no tema foi aabertura do monopólio do resseguro peloInstituto de Resseguros do Brasil (IRB). Éurgente equacionar os estoques da dívidarural, fator que desestabiliza todo o setor eque é, inclusive, responsável pela reduçãoda área plantada com grãos em quase5% para a safra 2006/07.

Por outro lado, devemos buscar novosmecanismos de crédito rural, inclusivehabilitando os bancos privados a tra-

balhar com a Caderneta de PoupançaRural, a operar com recursos do CréditoRural Equalizáveis pelo Tesouro, e a re-passar recursos dos Fundos Constitucio-nais (FCO, FNE). Os bancos cooperativosdevem ser cada vez mais apoiados, re-cebendo autorização para operar dire-tamente com recursos do FAT (Fundode Amparo ao Trabalhador) e com re-passes de bancos cooperativos interna-cionais, como o Crédit Agricole, oDesjardin, o DG Bank e outros.

Devem ser ampliados os mercados fu-turos, sobretudo desburocratizando osnovos títulos criados pelo governo(CDA/WA - Certificado de DepósitoAgropecuário / Warrant Agropecuário,NCA – Nota Comercial do Agrone-gócio, CPR – Cédula de Produto Rural),estimulando operações de hedge, oque reduziria a demanda de ações daPolítica de Preços Mínimos para sus-tentar os preços agrícolas, aliviando oTesouro, e redirecionando seus recur-sos para políticas de renda mais liga-das ao mercado.

É fundamental o vigoroso investimen-to em infra-estrutura e logística, paraviabilizar a atividade rural em áreas maisdistantes e garantir condições compe-titivas aos produtores tradicionais. Es-pera-se que as PPPs ajudem neste ca-minho.

O progresso tecnológico é um fatordinâmico, de modo que, embora te-nhamos a melhor tecnologia tropicaldo planeta, a escassez de recursospode nos levar a perder competi-tividade. A Embrapa trabalha na idéiada Sociedade de Propósito Específi-co, em que o setor privado - principalbeneficiário dos resultados da pesqui-sa - passará a apropriar-se tambémda parte dos royalties. O setor deagroenergia poderia ser a primeiraboa experiência para um projeto destanatureza, dado seu bom momento.

Ainda na área tecnológica, embora emoutro ponto, a defesa sanitária mereceespecial atenção. As perdas recentescom a aftosa são exemplos, mostrandoao governo e ao setor privado a neces-sidade de andarem juntos nessa ques-tão. A rastreabilidade e a certificação seacoplam à questão sanitária, emboranão façam parte dela. Consumidores

do mundo inteiro estão cada vez maisexigentes quanto à origem e ao modode produção do que compram. E, é cla-ro, também no agronegócio a primaziaé do consumidor; ele determina as açõesdo produtor.

Do lado privado, além das parcerias járeferidas, é imperiosa uma melhor arti-culação dos diferentes elos de cada ca-deia produtiva, em benefício da sua pró-pria sustentabilidade. O conceito decadeia produtiva está bem estabeleci-do, mas a prática ainda não, especial-mente onde ela é mais poderosa, ouseja, na industrialização e na distribui-ção. Sem a aplicação do conceito, tere-mos um desastre setorial se repetindoao longo do tempo.

Nesse sentido, o cooperativismo temum papel cada vez mais importante,porque as cooperativas são atores daintegração produtiva, da agregação devalor e da própria organização da ca-deia. Mas também elas devem dar aten-ção à intercooperação e às modernastécnicas de administração.

E, para a melhor articulação entre osagentes econômicos das cadeias pro-dutivas, não é mais possível tolerar odesrespeito a contratos. Nos últimosanos, a falta de respeito a contratos -inclusive ao direito de propriedade - temsido um fator inibidor de novos investi-mentos no campo, sejam eles nacio-nais ou internacionais.

O conceito de sustentabilidade - neleincorporado o tema ambiental e os di-reitos dos trabalhadores rurais - deveser rigorosamente assumido pelos pro-dutores, pois aí residirá um fatorlimitante de acesso aos mercados.

Finalmente, é preciso voltar a atençãopara temas repetidos e aceitos, mas nãoadequadamente implementados. A ve-lha tese de que uma andorinha só nãofaz verão nunca foi tão verdadeira: ar-ticulação, integração, organização, enten-dimento, harmonização, regramento,eis os temas fundamentais, estruturais.

Se todos estes pontos, já conhecidos erepetidos, forem adequadamente tra-tados, o céu é o limite para o agrone-gócio brasileiro.

Quem viver, verá!

36

PERSPECTIVAS

Luiz Antonio Pinazza,Consultor da FGV Projetos e Coordenador do Núcleo de Comunicação do Centro de Agronegócio da EESP-FGV.

Riscos e oportunidades no agronegóciobrasileiro

Alexandre Lahóz Mendonça de Barros,Professor da EESP e Coordenador do Núcleo de Pesquisas do Centro de Agronegócio da FGV / EESP.

Orelatório sobre as perspecti-vas agrícolas mundiais para operíodo de 2005 a 2015, ela-

borado conjuntamente, pela primei-ra vez, pela Organização de Coope-ração e Desenvolvimento Econômico(OCDE) e pela Organização das Na-ções Unidas para a Agricultura e Ali-mentação (FAO), traz informações in-dispensáveis para a análise doagronegócio brasileiro e mundial.

O estudo mostra a influência do Bra-si l e de outros países fortes noagronegócio, na evolução dasagroexportações. Um tênue choquena demanda de alimentos na Chinae Índia provocará ajustes externosnão negligenciáveis. A produçãoagrícola global deverá crescer, no ce-nário 2010, o equivalente a uma sa-fra brasileira de grãos, e, no cenário2015, a duas safras. Nas carnes, con-siderando estes mesmos cenários,crescer respectivamente uma e duasvezes, o volume da produção corren-te nacional.

O trabalho aponta o Brasil como omaior ganhador entre as nações agrí-colas exportadoras nos próximos dezanos, deixando para trás, por exem-plo, os Estados Unidos, no comérciomundial de oleaginosas, e a Austrá-lia, no comércio de carne bovina.

No mundo globalizado e competiti-vo, o Brasil precisa fortalecer as es-tratégias para a inserção comercial

do seu agronegócio. Os ganhos deprodutividade proporcionados pelasatividades das suas várias cadeias pro-dutivas não podem ser dissipados porineficiências na logística de armazena-gem, transporte e portos. Há grandesentraves nas distribuições interna eexterna da produção primária, sendoestas um calcanhar-de-aquiles. Se exis-tem as potencialidades e capacidadepara o Brasil alavancar de forma signi-ficativa a sua produção agropecuáriano cenário de médio prazo, é necessá-rio conceber as estratégias pós-portei-ra das fazendas, para dar suporte a essecrescimento, na apresentação de posi-ções, análises e tendências sobre ques-tões cruciais para o desenvolvimentodo agronegócio.

O diferencial de custos mais baixos daagricultura nacional é reconhecido nãoapenas no Brasil, mas também no mer-cado externo. Porém, a atividade sofreuma combinação perversa de pelo me-nos quatro diferentes fontes de riscoque torna preocupante o futuro doagronegócio brasileiro:

1. Risco de produtividadeO risco de redução de produtividadepor razões climáticas ou biológicas éintrínseco à produção agrícola. Por essarazão, diversos países, inclusive o Bra-sil, procuraram desenvolver sistemasde seguro que permitam manter a es-tabilidade do setor produtivo ao asse-gurar uma proteção à quebra de safra.As experiências internacionais sugeremque a participação do setor público no

mercado de seguro agrícola é quaseindispensável. O governo brasileiroaprovou a lei que permite a atuaçãode resseguradoras nacionais e estran-geiras no País. Outro passo importan-te será a regulamentação do Fundo deCatástrofe.

2. Risco de variação nos preços dos pro-dutos e dos insumosA volatilidade nos preços dos produ-tos agrícolas, bem como dos princi-pais insumos consumidos pelo setor,é uma realidade no setor agropecuário.A forma de defesa dessa volatilidadeencontra-se tradicionalmente associa-da às operações de mercado futuro ede opções.

Fora das economias agrícolas desen-volvidas, como há falta de políticas degarantia de renda ao produtor, as os-cilações na oferta internacional dequalquer produto são corrigidas namargem pelo produtor nacional (re-dução de renda seguida de diminui-ção de área plantada). Os ajustes naestrutura produtiva são muito maisseveros.

Sobra ao agricultor a estratégia de di-versificação de cultura, mas esse ca-minho, dependendo do tamanho dapropriedade em questão, pode limi-tar os ganhos em escala decorrentesda especialização. O risco de variaçãonos preços do produto e dos insumosé especialmente relevante nas regi-ões de pior logística. Quanto mais dis-tante dos portos, mais alto é o preço

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 20078

Não é à toa, por exemplo, que a área degrãos cultivada aumentou 25% nos úl-timos 15 anos, e a produção aumentou107%. O avanço da produção só nãofoi maior por conta de condições climá-ticas extremamente adversas nas duasúltimas safras (Quadro 6).

A produção de carne bovina cresceu71% em 12 anos, da carne suína 113%e a de frangos 170% (Quadro 7).

A dotação de recursos naturais constituiclara vantagem comparativa do País. Pos-suímos quase 20% da água doce do pla-neta, amplas áreas agrícolas e umabiodiversidade fecunda que possibilita ageração de novos produtos.

Entretanto, reside no capital humano aprincipal razão do sucesso da agriculturabrasileira. Produtores extremamente com-petitivos permitiram este crescimento es-pantoso no Brasil, nos últimos anos. Éclaro que políticas públicas foram rele-vantes, como os mecanismos de financia-mento para investimentos (como oModerfrota) e o alongamento das dívidas(Secutirização, Pesa e Recoop). Tambémos bons preços internacionais dos anos2002/2003 ajudaram, acoplados ao câm-bio favorável. Mas foi a enormecompetitividade de uma nova geração deprodutores rurais, capazes de incorporaras novas tecnologias e de aproveitar osbons ventos do mercado, com grande ca-pacidade gerencial (tanto financeira, quan-to comercial e de RH), o grande responsá-vel pelo boom do agronegócio nosprimeiros anos do século XXI.

Esse pessoal está na ativa, ainda bem maisequipado hoje, depois de sobreviver a estacrise avassaladora. Esta jovem geração demoças e moços do campo e doagronegócio está preparada para os avan-ços que as tendências já demonstradasoferecem aos produtos do Brasil.

Mas é preciso apoiá-los. A sociedade bra-sileira precisa compreender que um novociclo de progresso rural alavancará umsalto de desenvolvimento único para oPaís. Podemos liderar a criação de uma

Brasil só subsidia mais a produção ruraldo que a Nova Zelândia, serve para redu-zir a ofensiva primeiro-mundista contranós. Assim, enquanto o PSE (Estimativade Apoio do Produtor) do Japão é de 58%,da União Européia é de 34%, do Canadáé de 22%, dos Estados Unidos é de 17%,o PSE brasileiro (mecanismo de apoio aoprodutor) mal chega a 3% do PIB agrícolanacional (Quadro 8).

Quadro 8 - Estimativa de Apoio ao Produtor (PSE)Média (2002-2004)

É tudo, de fato, espetacular, inclusive obalanço social destes avançostecnológicos, por permitir a produçãode alimentos mais baratos para o povobrasileiro e maior competitividade exter-na para os produtores. Não se pode es-quecer que o conceito de agronegócioabrange todas as cadeias produtivas eseus diferentes agentes, sejam cientis-tas, produtores familiares (pequenos,médios e grandes), a indústria, o comér-cio, a armazenagem e a distribuição.

Temos, hoje, 62 milhões de hectaresagricultados (15 com culturas permanen-tes e 47 com culturas anuais). Além disso,o País apresenta mais de 200 milhões dehectares de pastagens, dos quais 90 mi-lhões são aptos para a agricultura. Nãohá nenhum continente, para não falarpaís, com este potencial de crescimentoespantoso, que não implica em derrubarflorestas e avançar sobre a Amazônia. Éclaro que essa capacidade de expansãoapavora nossos concorrentes, que, ob-servando nosso crescimento, tratam decriar todo tipo de barreira, e até de con-tra-propaganda, para estancar o avançobrasileiro. Nem o estudo da OCDE (Orga-nização para a Cooperação e Desenvolvi-mento Econômico), que provou que o

A despeito do grande diferencial desubsídio aos produtores, o agronegóciobrasileiro é capaz de crescer e de se ex-pandir internacionalmente. No caso doetanol, para o qual usamos três milhõesde hectares plantados com cana-de-açúcar, há espaço para multiplicar estaárea, além da capacidade de dobrar, emdez anos, a produção de etanol por hec-tare. O biodiesel, por sua vez, tem po-tencial quase ilimitado, dadas as diver-sas matérias-primas que o Brasil podeusar, em função das suas disparidadesregionais: mamona e pinhão manso nosemi-árido; óleo de palma, na Amazô-nia; e soja, girassol, amendoim, algo-dão, sebo bovino, entre outros, no Paísinteiro.

Quadro 7 - Produção de Carnes

37

dos insumos e mais baixo o do pro-duto. O custo do frete reduz a mar-gem de rentabilidade e, assim, parauma mesma variação no preço do pro-duto ou dos insumos, o efeito sobre arentabilidade será tanto mais severoquanto pior for a logística da região.

3. Risco de variação da taxa de câmbioA partir do final de 1998, a taxa decâmbio brasileira passou a flutuar li-vremente. A abertura na conta de ca-pital, associada à alta liquidez nosmercados internacionais sugere que avolatilidade da taxa de câmbio será aregra na economia brasileira. Aintegração ao mercado internacionalpor parte da agricultura brasileira fazcom que todo sistema de preços noPaís tenha como referência básica a taxade câmbio. As mudanças na taxa decâmbio foram expressivas, explicandoboa parte da expansão e da crise naúltima década no País.

4. Risco sanitárioO aumento no tamanho do agrone-gócio brasileiro elevará o risco sanitá-

rio envolvido na produção. Além dis-so, a expansão do comércio inter-nac ional t raz cons igo o r i sco decontaminação com doenças ex i s -tentes no exterior. Em outras pala-vras, a probabil idade de problemassani tár ios e leva-se conforme au-menta a integração internacional .

O governo federa l está empenha-do em organizar a legislação e emconstruir uma estrutura para l idarcom os padrões de qual idade ex i -g idos pe las leg is lações sani tár iaspresentes nos parceiros comerciaisdo País. Entretanto, as restrições fi-nanceiras do governo parecem in-dicar que não haverá como acom-panhar a velocidade do movimentopr i vado.

As restrições f iscais impõem cortesno orçamento da vigi lância sanitá-ria do Ministério da Agricultura. Odéficit nominal do governo federalforça cortes nas despesas que segeneralizam por todo o governo fe-deral. Adicionalmente, é dif íc i l es-

tabe lecer pr ior idades entre os d i -ferentes ministérios. Por conta dis-so, apesar do forte crescimento nasexportações do agronegócio (e ,conseqüentemente, da necess ida-de de maior controle sanitár io) , ovolume de recursos a locados paraa segurança a l imentar ca i a cadaa n o .

As perspect ivas do agronegóciobras i le i ro dependerão fortementedo desenvolv imento de fer ramen-tas f inanceiras para mitigar os r is-cos inerentes ao setor agr ícola. Ofuturo reserva ao Pa ís pos ição dedestaque no cenário internacional;d iversas oportunidades de merca-do surgem a todo o momento, as-segurando uma t ra jetór ia de ex-pansão potenc ia l de grandemagnitude. Entretanto, a velocida-de do crescimento do agronegóciobrasi leiro dependerá, fundamental-mente, da capac idade do s i s temaprodutivo para l idar com os r iscosinerentes aos c ic los econômicos eagr íco las .

Fontes: CNA, ABEF e ABIECS. * Estimativa

Fonte: OCDE - * Média 2002-2003

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 7

O etanol e o biodiesel estão neste ca-minho, assim como a madeira, resídu-os de produção animal e vegetal,e abiomassa em geral. Tais combustíveis,renováveis, ambientalmente menosagressivos, mais democráticos (porquequalquer país pode produzí-los), cria-rão uma nova civilização, mais justa eequilibrada e, mesmo que os preçosdo petróleo voltem a cair, osbiocombustíveis são agora irreversíveis:da mesma forma que a segurança ali-mentar foi a grande prioridade na se-gunda metade do século passado,agora será preciso garantir a seguran-ça energética, e os biocombustíveis tor-nam-se estratégicos nesse cenário.

O agronegócio já é o maior setor daeconomia brasileira, representandoquase 30% do PIB nacional, gerando37% de todos os empregos e respon-dendo por 36% das exportações,sustentando nosso saldo comercial(o agronegócio responde por cerca de92% do resultado comercial brasi-leiro) (Quadro 3).

As relações comerciais do agronegóciobrasileiro são caracterizadas por suaabrangência internacional. União Eu-ropéia e Estados Unidos são nossosmaiores parceiros comerciais (quase50% do total), mas está crescendo aparticipação de novos países emergen-tes, como a China (8%), o Oriente Mé-dio (8%) e outros países asiáticos (11%)(Quadro 4).

Outra característica das exportaçõesbrasileiras é a diversidade de produ-tos. Há 50 anos, o café representava3/4 das nossas exportações, e, hoje,responde por menos de 7%, enquan-to a soja, que nem existia em 1950,hoje é responsável por mais de 18%das vendas externas. Carnes, couro eseus produtos já somam quase 25%, eessa transformação aconteceu em pou-co tempo (Quadro 5).

Como explicar este fenômeno?

O primeiro fator é a tecnologia: oBrasi l detém hoje a melhor tecno-logia tropical do planeta. Essa mo-derna tecnologia permit iu avançosexpressivos na produção e, especial-mente, na produtividade das diferen-tes cadeias do agronegócio brasileiro.

Quadro 4 - Exportações Brasileiras (em valor): Principais Mercados (2006)

Quadro 5 - Exportações Brasileiras (em valor): Principais Produtos (2006)

Quadro 6 - Produção de Grãos

GRÃOS: algodão, amendoim, arroz, aveia, centeio, cevada, feijão, girassol, mamona, milho, soja,sorgo, trigo e triticale

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GESTÃO

O capital humano, os riscos e a gestão doagronegócioIvan Wedekin,Membro do Conselho Editorial da Revista Agroanalysis da Fundação Getulio Vargas, Professor do programa de MBA emAgribusiness da Fundação Getulio Vargas, Diretor do Agronegócio e Energia da BM&F - Bolsa de Mercadorias & Futuros.

Theodore Schultz (1902-1998)foi o único economista a rece-ber o Prêmio Nobel de Economia

por seus estudos sobre as questões daeconomia da agricultura. Para ele, osagricultores são capitalistas, racionais,independentemente do tamanho dapropriedade, nível de educação, loca-lização ou atividade produtiva desen-volvida. Nos tempos atuais, pode-sedizer que os agricultores fazem partede um sistema de valor orientado parao consumidor final, participando dire-tamente de uma ou mais cadeias pro-dutivas do agronegócio.

Pioneiro, o professor Schultz ressaltava aimportância do capital educacional parao aumento da produtividade, a geraçãode riquezas e o desenvolvimento econô-mico. Nos tempos atuais, a capacitaçãona gestão comercial e financeira é tãoou mais importante quanto ogerenciamento técnico e produtivo nasatividades de plantar e criar, desenvolvi-das pelos produtores rurais.

Integrada aos mercados mundiais, aagricultura não é uma ilha, mas é cer-cada de riscos por todos os lados, oque leva à necessidade de umgerenciamento permanente do capi-tal empregado no setor.

O governo incentivou, nos últimos anos,a melhoria da competitividade da agri-cultura e do agronegócio, ampliando aoferta de crédito para investimentos nosprogramas de renovação de maquinárioe outros. De 2000 a 2006, R$ 35 bilhõesforam aplicados nos programas de in-vestimento do MAPA-BNDES e dos fun-dos constitucionais. Estes recursos, so-

mados aos investimentos com recur-sos próprios dos agricultores, permiti-ram o aumento de 38 milhões para 49milhões de hectares da área plantadade grãos.

Segundo o Banco Central, o saldo de-vedor dos produtores rurais registra-do no Sistema Nacional de CréditoRural (SNCR) perfazia cerca de R$ 78bilhões em dezembro de 2006(Figura 1). Adicionalmente, R$ 33 bi-lhões de dívida dos produtores foramtransferidos para o Tesouro Nacionalnos diversos programas dereestruturação de dívida realizadosnos anos 1990 (Pesa, Securitização,Recoop, entre outros). O montante dedívida, que supera R$ 110 bilhões,equivale a 70% do valor bruto da pro-dução anual da agropecuária.

Além da gestão da dívida, o mais im-portante são iniciativas para reduçãodo risco sistêmico ou estrutural doagronegócio brasileiro, que tem qua-tro dimensões, conforme mostra a Fi-gura 2.

O risco de produção deve ser reduzidopor meio da tecnologia, processos einformações cada vez mais aperfeiçoa-dos. Essa é a essência do trabalho dozoneamento agropecuário conduzidopelo Ministério da Agricultura, Pecuá-ria e Abastecimento, com a participa-ção de diversas entidades de pesqui-sa. O risco de produção também semitiga por meio do seguro agrícola. Ogoverno tem expandido a alocação derecursos subsidiados para cobrir partedas despesas de contratação do segu-ro agrícola pelos agricultores: aplicouR$ 33 milhões em 2006 e tem um or-çamento programado de R$ 100 mi-lhões para 2007.

A segunda dimensão é o risco dos con-tratos. A grande variação - para cimaou para baixo - dos preços agrícolas e,muitas vezes, a predominância de re-lações de conflito entre as partes oca-siona quebras freqüentes de contra-tos entre agricultores, agroindústriase exportadores. Além da boa intençãodas partes, é preciso um marco legalcada vez mais aperfeiçoado e a inclu-são de cláusulas contratuais estipulan-do a arbitragem como forma de solu-ção de controvérsias.

O risco de crédito aumenta nos períodosde crise agrícola, levando as instituiçõesfinanceiras e os fornecedores a deman-darem mais e mais garantias dos produ-tores. A Figura 1 mostra que, no períodocrítico de 1994 a 1999 (a primeira fasedo Plano Real, marcada por forte valori-zação da moeda nacional), a qualidadedo crédito rural era muito ruim, ou seja,o crédito considerado normal pelo Ban-co Central chegou a representar apenas70% do crédito total. Os programas dealongamento e as boas condições domercado agrícola após 2002 permitirama rápida melhoria da qualidade do cré-dito. No final de 2004, 94% do créditoera de risco normal.

Em 2005 e 2006, houve uma mudançaradical dos cenários da renda dos pro-dutores, puxada para baixo pela valori-zação do real e as quebras de safra, de-sencadeando uma crise de renda ediminuição da liquidez e da capacidadede pagamento da dívida pelos agricul-tores. Em conseqüência, a proporção docrédito avaliado como de risco normalcaiu para 86 em setembro de 2006. Abola de neve do endividamento agrícoladecorre de uma conjunção de fatoresmacroeconômicos, mercadológicos e

Fonte: MAPA

Fonte: MAPA

UE

Fonte: Conab/MAPA *Estimativa - 6º Levantamento (março)

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 20076

b) A mudança no perfil da população.No ano 2000, 53% da população en-contravam-se na zona rural; em 2030projeta-se que serão apenas 39%. Éclaro que isto implica em mudançasde hábitos alimentares, dada a com-plexidade da vida urbana (Quadro 2).

c) A expectativa de vida é crescente nomundo todo. Havia, em 2000, 600milhões de pessoas com mais de 60anos no mundo; em 2030, estima-se que esse número será 1,4 bilhão,um aumento de 133%. Mais ainda:em 2030, seremos 1,39 milhão depessoas com mais de 100 anos!

d) Diferenças na distribuição das fai-xas de renda. Espera-se um cresci-mento econômico anual em todo omundo superior a 3%, nos próximosdez anos. Entretanto, os países de-senvolvidos crescerão 2,4%, enquan-to que os emergentes crescerão 4,6%,quase o dobro. Isso determina dife-renças nos fluxos do comércio de pro-dutos agrícolas. Só o Sudeste Asiáti-co crescerá mais que 5,5% ao ano!

e) Novos avanços tecnológicos. Abiotecnologia será aplicada na gera-ção de plantas resistentes a secas,geadas, pragas e doenças; serão pro-duzidos alimentos mais ricos e atécom poder medicinal. Já a nano-tecnologia permitirá a manipulaçãode genes. Esses dois elementos,somados ao seqüenciamento gené-tico de plantas, produzirão umarevolução na alimentação humana eanimal .

f) Preocupações com o meio-ambientee, especialmente, com a água. Terãopapel dominante na definição de sis-temas de produção, criando novosmecanismos financeiros para o usoadequado dos recursos naturais.

Todas essas tendências sinalizam au-mento do consumo de carnes, leite ederivados, verduras, frutas e menor cres-cimento do consumo de carboidratosoriundos diretamente dos grãos. É sem-pre pertinente lembrar que a elevaçãono consumo de proteína animal é acom-panhada por pressão sobre a produçãoagrícola de grãos, especialmente milhoe soja, posto que a produção de carnesuína e de aves é assentada sobre o

setor de rações. Mesmo o segmentobovino depende, em muitos países, dedietas fortemente apoiadas em cereaisde alto valor nutricional.

No tema das negociações internacio-nais, os movimentos ocorrerão nãopela benevolência dos países ricos, esim por suas necessidades. O grandedesafio da humanidade no século XXIé reduzir o abismo entre países ricose pobres, ou entre pessoas pobres ericas dentro de um mesmo país. Omundo todo está de acordo que épreciso melhorar a distribuição darenda para elevar a condição de vidadas populações de baixa renda e ga-rantir a defesa da democracia e dapaz universal. Para equacionar estaquestão, a abertura comercial agrí-cola é essencial. Afinal, os ricos pa-gam para seus agricultores não pro-duzirem, enquanto os emergentesproduzem para pagarem suas dívi-das, e é por isso que a Rodada deDoha chegará a algum tipo de acor-do mais favorável aos países em de-senvolvimento, como, aliás, já sinali-zam as vitórias brasileiras nos painéisdo açúcar (contra a UE) e algodão(contra os EUA).

O avanço nas negociações internaci-onais pode abrir caminhos relevantespara o Brasil. Hoje, o País já é o maiorexportador mundial de oito produtos(açúcar, café, suco de laranja, comple-xo soja, carne bovina, carne de fran-go, tabaco e etanol). O potencial de

crescimento nestas e em outras ca-deias é muito grande. Entretanto, tal-vez se encontre na agroenergia a maisimportante modificação do agrone-gócio mundial. Na verdade, um novoparadigma energético se desenha. Édifícil compreender como a humani-dade, em poucas décadas do séculoXX, construiu toda uma civilizaçãosobre os alicerces pantanosos do pe-tróleo, produto fóssil, finito, mal dis-tribuído entre os países e regiões, edominado por poucas empresas. É in-crível! Mas, de qualquer maneira, aalvorada do terceiro milênio mostraque o "império" do petróleo chega aoseu ocaso, nas próximas 4, 5 ou 6décadas.

Há 50 anos, o consumo mundial depetróleo era de 4 bilhões de barris porano, e a descoberta de novos poçosera de 30 bilhões de barris/ano. Hoje,o consumo anual é de 30 bilhões debarris por ano e as descobertas malarranham os 4 bilhões.

Acadêmicos do mundo inteiro se de-bruçam em busca de alternativasenergéticas, visto que o desenvolvi-mento da humanidade depende fun-damentalmente de novas fontes deenergia. Fala-se na nova célula de hi-drogênio, em energia solar e em mui-tos outros caminhos. Entretanto, aponte entre a civilização do petróleoe a que a sucederá em menos de umséculo terá de ser feita com combus-tíveis líquidos de origem agrícola.

Quadro 3 – Saldo da Balança Comercial Brasileira

39

microeconômicos, inclusive decisões er-radas de investimento e comercializaçãode muitos produtores.

A questão das fontes de financiamentode capital de giro e de investimento con-tinuará ainda mais importante no futu-ro próximo, dada a ênfase na expansãoda agroenergia. Além da CPR (Cédula deProduto Rural), os novos títulos doagronegócio - CDCA (Certificado de Di-reitos Creditórios do Agronegócio), CDA/WA (Certificado de DepósitoAgropecuário/Warrant Agropecuário) eNCA (Nota Comercial do Agronegócio)podem representar alternativas de finan-ciamento para todos os elos das cadeiasprodutivas do agronegócio. Outra im-portante iniciativa para a gestão adequa-da do risco de crédito é a certificaçãopositiva, ou seja, a construção de umcadastro para positivar as empresas e osagricultores perante os seusfinanciadores, em contraposição à clás-sica negativação Serasa, SPC (Serviço deProteção ao Crédito) e outros.

O risco de preço é o maior pesadelo doagricultor. Os mercados agrícolas são ex-tremamente voláteis quando compara-dos aos produtos industriais. Além dis-so, as deficiências de infra-estruturafazem com que os agricultores sejam osmaiores tomadores de risco noagronegócio. O risco pode ser reduzidopor meio de duas vias: o apoio clássicodo governo e os mercados futuros. Em2005 e 2006, o governo alocou cerca deR$ 3,5 bilhões no programa de garantiade preços mínimos.

Os mercados futuros são os mecanismosmais adequados para o gerenciamentodo risco de preço no agronegócio. ABolsa de Mercadorias & Futuros nego-ciou 1,354 milhão de contratos em 2006(crescimento de 24%), com potencial decrescimento ainda maior para 2007. Masé fundamental a integração da políticagovernamental com os mecanismos pri-vados da BM&F.

Em setembro de 2006, o Conselho Mo-netário Nacional aprovou o financiamen-to das operações de hedge (proteção depreços) de produtores rurais e coopera-tivas nas bolsas nacionais, com recursosdo crédito rural, ou seja, à taxa de juro

de 8,75% ao ano. A BM&F firmou convê-nio com o Banco do Brasil e desenvolveiniciativas com outras instituições finan-ceiras, empresas, cooperativas e entida-des do agronegócio para a massificaçãodo uso do seguro de preço pelos produ-tores. Além dos derivativosagropecuários, existem os novos títulosdo agronegócio, especialmente o CDA(Certificado de Depósito Agropecuário)e o WA (Warrant Agropecuário) que sãoas "novas moedas" do agricultor, funcio-nando como uma espécie de EGF (Em-préstimo do Governo Federal) privado. OCDA e o WA poderão ser combinadoscom os mercados futuros, trazendo maisrecursos para o financiamento da

comercialização e o carregamento de es-toques.

É comum se dizer que a "agricultura nãoquebra, muda de dono". Independente-mente das crises de uma parte dos pro-dutores, a agricultura brasileira continu-ará sendo uma das mais competitivas domundo. As lições aprendidas indicam anecessidade de uma gestão articuladadas quatro dimensões do risco na agri-cultura e agronegócio. Mais do que nun-ca, a competitividade depende - comoensinou o professor Schultz - da atua-ção do capital humano, de pessoas qua-lificadas para gerenciar o complexo edesafiante mundo dos agronegócios.

Figura 1: Empréstimos e risco de crédito rural

Figura 2: Gerenciamento de risco no agronegócio

Fonte: MAPA/MDIC

Fonte: Banco Central

Contratos futuros, a termo, de opçõesCDA-WA, CPR, troca

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 5

CENÁRIO

Desafio ao campo

Roberto Rodrigues,Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV/EESP

Oagronegócio brasileiro passou porum conjunto inédito de dificulda-des a partir de 2004, sofrendo

uma perda de renda sem precedentes nahistória recente. As razões dessas dificul-dades foram: a) aumentos de custos deprodução (motivados pelo crescimento dademanda por insumos, pelos preços as-cendentes do petróleo e aço); b) dimi-nuição dos preços internos e externos(seja pela oferta ampliada, seja pela va-lorização do real frente ao dólar); c) que-bras de safra causadas por dois anos desecas impiedosas no sul do País e em ou-tras regiões, o surgimento da ferrugemda soja, as restrições às importações decarnes (por causa de novos focos deaftosa no MS e PR e também pelainfluenza aviária na Ásia e na Europa); d)o sucateamento da infra-estrutura detransportes; e) as questões macroeconô-micas recorrentes (juros altos, câmbiodesfavorável e tributação elevada). Essesforam fatores preponderantes para amaior crise do agronegócio em 40 anos.A incapacidade da Organização Mundialdo Comércio (OMC) em reduzir o prote-cionismo agrícola também contribuiupara a manutenção das dificuldades deacesso aos mercados dos países ricos.

O quadro favorável para o setor sucro-alcooleiro e a recuperação recente dealguns preços são insuficientes para tra-zer de volta o ânimo dos produtores ru-rais. Entretanto, é preciso perscrutar o fu-turo, analisar as grandes tendênciasmundiais do consumo de produtos agrí-colas e cuidar de estabelecer as mudançasinternas. As políticas públicas e a organi-zação privada devem ser capazes de ga-rantir o crescimento deste importante se-tor da economia brasileira.

Algumas tendências são visíveis e ou-tras, menos claras, são passíveis de in-ferir. Há uma crescente demanda, en-tre os consumidores mais abonadosdo mundo todo, por produtos de me-lhor qualidade. Preço, sabor e aparên-cia têm muito peso, mas também avan-ça a exigência de informações sobre aorigem dos produtos, como foramdesenvolvidos, a influência sobre omeio-ambiente e a saúde humana eanimal. Há nichos para produtos or-gânicos e alimentos processados.

Certamente, ocorrerá uma importan-te mudança de hábitos alimentares,bem como na procura de produtospara energia renovável, em função deuma série de variáveis, face a:

a) O comportamento do crescimentodemográfico. Dados das Nações Uni-das indicam que a população plane-tária, de 6,07 bilhões de pessoas em2000, será de 8,3 bilhões em 2030,um espetacular crescimento de quase35%, concentrado especialmente naÁsia, que terá quase 60% do totaldeste aumento (Quadro 1). Note-se,portanto, que serão mais de dois bi-lhões de novas bocas a alimentar. Essapopulação adicional, além disso, seráportadora de maior renda per capita,em decorrência do acelerado cresci-mento das economias asiáticas, o quedeve ampliar a demanda por proteí-na animal, frutas e energia.

Quadro 1 – Estimativa da população total e por região

Quadro 2 - Projeção da população Mundial, Rural e Urbana,de 2000 a 2030 (%)

Fonte: United Nations/AGE do MAPA

Fonte: Elaboração dos autores para esse estudo com dados de United Nations

40

NEGÓCIOS

Avaliação das negociações noâmbito da OMC

Oano de 2007 iniciou-se comgrande expectativa doagronegócio brasi leiro sobre

as evoluções das negociações agrí-colas da Rodada Doha da Organiza-ção Mundial do Comércio (OMC). É na-tural que o maior produtor e exportadormundial de açúcar, café, suco de laran-ja, complexo soja, carne bovina, carnede frango, tabaco e etanol anseie porpolíticas agrícolas mais orientadas parao mercado e que, portanto, distorçammenos os preços agrícolas internacio-nais. No caso dos EUA, por exemplo,embora, como um todo, os subsídiospagos representem apenas 4% do va-lor da produção, esse índice chega a100% do valor da produção para al-guns produtos como algodão, arroz esoja, que concorrem diretamente como Brasil.

É natural, também, que o setor que res-ponde por 37% dos empregos, 36%das exportações e 29% do PIB, anseiepor uma maior abertura dos mercadosde países desenvolvidos e em desen-volvimento para seus produtos, uma vezque a agricultura é o setor mais prote-gido em todo o mundo, contando comelevada média tarifária aliada a escala-das e picos tarifários que prejudicamou mesmo impedem a agregação devalor dos produtos brasileiros, bemcomo a expansão das exportações emimportantes mercados.

E, finalmente, é natural que um paíscom 62 milhões de hectaresagricultados e, com pelo menos mais

Roberto Rodrigues,Coordenador do Centro de Agronegócio da EESP da Fundação Getulio Vargas.

Antonio Carlos Costa,Gerente do Departamento de Agronegócio da Fiesp.

90 milhões de hectares potencialmen-te agricultáveis (isso sem derrubaruma única árvore da floresta amazô-nica), queira mais mercados para osseus produtos.

Além disso, a falta de acordos bilate-rais e birregionais do Brasil com os prin-cipais importadores agrícolas mundi-ais (negociação frustrada na já quaseesquecida Alca e emperrada no casoda União Européia), somada à prolife-ração de acordos bilaterais entre ou-tros países, têm deslocado os produ-tos brasileiros desses mercados (comos EUA, por exemplo, o País tem perdi-do competitividade em favor do Cana-dá e México), e coloca todas as expec-tativas nas negociações da OMC.

Infelizmente, nesse sentido, não hou-ve nenhum avanço concreto desde aReunião Ministerial de Hong Kong, emdezembro de 2005, frustrando as ex-pectativas existentes. Na ocasião, fa-lou-se em uma boa "base de lançamen-to das negociações", já que algumganho foi obtido no texto da declara-ção Ministerial, que falou em "cortesefetivos" nas medidas de apoio domés-tico e colocou 2013 como data limitepara a eliminação dos subsídios às ex-portações, tratando-se, paralelamen-te, de questões como ajuda alimentar,crédito e empresa estatal decomercialização.

Em julho de 2006, as negociações fo-ram consideradas oficialmentesuspensas, sendo retomadas a partir

do final do ano em tratativas bilate-rais, com todos os membros observan-do com atenção a evolução de doistemas capazes de alterar a dinâmicadas negociações: a nova lei agrícolanorte-americana (Farm Bill 2007), jáapresentada pelo Executivo ao Con-gresso e a renovação ou não do TradePromotion Authority (TPA), mecanismoque dá liberdade para o Executivo dosEUA negociar acordos comerciais semter que solicitar autorizações doLegislativo ao longo do processo. As-sim, vale uma análise cuidadosa sobreesses temas:

Farm Bill 2007As propostas da Farm Bill 2007, elabo-radas pelo Departamento de Agricultu-ra dos Estados Unidos, USDA, foramdesenvolvidas com a realização de 52fóruns em todo o país, onde o secretá-rio Mike Johanns, colheu comentários edepoimentos para compor o documen-to de 183 páginas, que está em discus-são no Congresso. Contrariamente àFarm Bill 2002, a proposta de lei atualfoi elaborada em um cenário de preçosinternacionais elevados e de necessida-de de corte de gastos públicos nos EUA,gerando a expectativa de um texto mui-to mais favorável aos agricultores brasi-leiros do que o apresentado.

A proposta apresenta uma redução deUS$ 1,8 bilhão da caixa amarela1 (sub-sídios distorcivos) e aumento deUS$ 1,5 bilhão em caixa azul2 (ligeira-mente menos distorcivos) e

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 20074

EDITORIAL

Interessa a muita gente, cujas ati-vidades, funções e a própria so-brevivência dependem do agrone-

gócio, e não tem noção disto. As pes-soas em geral acreditam que alimen-to é uma obviedade, uma coisa tãoessencial e básica que deve existir. Nãoimaginam o que está por trás da suaprodução.

O próprio conceito de agronegócio -indicado por Ray Goldemberg e suaequipe em Harvard, em 1957 - é pou-co conhecido no Brasil. Mesmo as idéi-as do grande Barbosa Lima Sobrinho,criador do Estatuto da LavouraCanavieira, nos anos 1940, em que jádefinia cadeia produtiva, são desco-nhecidas.

Agronegócio é a soma de todas ascadeias produtivas desde a produçãoe distribuição de insumos até acomercialização de alimentos, fibrase energia. Ou seja, é um conjunto deatividades que está intimamente liga-do a todos os setores da economia eda sociedade. No Brasil, é responsá-vel por 30% do PIB, 36% da pauta deexportações e 37% dos empregos.

Cadeia produtiva é aquela que come-ça na prancheta de um pesquisadorcientífico e termina na gôndola dosupermercado. O produto final deveter preço e qualidade competitivos emrelação a concorrentes do próprio Paísou estrangeiros, além de atender aopoder aquisitivo do consumidor. Eessa cadeia precisa ser sustentável,isto é, com processos de produção quepermitam a preservação dos recursosnaturais para as gerações futuras, aomesmo tempo em que promove con-dições de sobrevivência econômica atodos os atores envolvidos.

O que entra nesta cadeia?Em primeiro lugar, os fornecedores deinsumos e serviços indispensáveis

para a produção, o chamado "antesda porteira". Pertencem a esse está-gio o planejamento, o crédito, asmáquinas de preparo de solo, os cor-retivos, os fertilizantes, as sementes,os equipamentos de plantio, os de-fensivos agrícolas e pecuários, emsuma, tudo o que vem antes da por-teira. Apesar disso, deste universodependem, ainda, outros agenteseconômicos, como a própria siderur-gia, a indústria química, os bancos eas seguradoras; todos demandandoenergia, infra-estrutura e logística.

Em seguida, vêm as atividades de"dentro da porteira": as que envolvemdesde o plantio até a colheita; a ad-ministração de pessoas e de recursosfinanceiros; o uso de tecnologia; ocuidado com o meio ambiente; as re-lações trabalhistas; as gerências co-mercial, financeira e fiscal; a escolhados melhores juros e o pagamentode impostos justos. Esta gestão im-plica no controle de estoques; em es-tar em dia a respeito de preços deinsumos, produtos e serviços, mesmointernacionalmente; em ter boas in-formações meteorológicas; e em bomrelacionamento com cooperativas,associações, sindicatos e com a indús-tria a jusante.

Indústria esta que é o "depois da por-teira": transporte, armazenagem, indus-trialização, embalagem, distribuição ecomercialização interna ou externa.

Tudo isso envolve apenas alimentos?Não, envolve muito mais: madeira eseus derivados (papel e celulose), flo-res, fibras (algodão e sisal), energia(etanol e biodiesel), borracha, produ-tos de couro, perfumes, bebidas etantos outros.

E disto tudo dependem os fabrican-tes de fogões, microondas, geladei-ras, pratos, talheres, copos, mesas,

restaurantes etc., além dos profis-sionais de marketing e veículos decomunicação.

Na realidade, todo cidadão possui li-gações intensas com o agronegócio,embora não perceba. Seus própriosnetos terão suas vidas afetadas pelofuturo deste setor, uma vez que asatividades desempenhadas incidemsobre o meio ambiente, influencian-do as mudanças climáticas, o uso daágua, ou a forma como é produzida aenergia. Também se articula signifi-cativamente com questões sociais re-levantes, como a garantia alimentar,a qualidade dos alimentos e os em-pregos viabilizados ao longo das ca-deias. A saúde humana e animal,assim como o bem-estar geral depen-dem do agronegócio, em qualquerpaís do mundo.

Por reconhecer a dimensão estraté-gica do agronegócio brasi le i ro, aFGV Projetos pretende, por meiodeste periódico, seus artigos e en-trevista, fomentar o debate em tor-no de questões importantes para osetor e, desta forma, disseminar in-formações e opiniões que possamapoiar decisões e gerar o debatepermanente, fundamental para osurgimento de novas soluções, co-nhecimento e tecnologias.

A Fundação Getulio Vargas, por meiode sua unidade de consultoria, a FGVProjetos, e desta publicação, se colo-ca mais uma vez a serviço da socieda-de brasileira, cumprindo a cada dia amissão de contribuir para o desen-volvimento nacional por meio da dis-seminação do conhecimento geradoem suas Escolas, pesquisas e indica-dores de seus Institutos, e da aplica-ção das melhores práticas em organi-zações públicas e privadas do País.

Diretoria da FGV Projetos

O agronegócio no Brasil interessa a quem?

41

US$ 0,7 bilhão em pagamentos dire-tos na caixa verde3. Essa migração (boxshifting) permitirá alguma melhora, ain-da que tímida, no perfil do gasto. Ain-da em relação à caixa amarela, verifica-se que na revisão do programa MarketLoan Assistance4 , o USDA propôs queo preço de referência do programa seja85% da média dos últimos cinco anos.Dessa maneira, se a regra para o preçode referência for seguida, o programapoderá tornar-se menos distorcivo doque o atual. Ocorre que, na prática, vêmsendo utilizados os preços máximospermitidos pela lei e, nesse caso, na pro-posta atual, a redução foi pequena paraum grupo de produtos, sendo que paraoutros, não houve redução, conformetabela ao lado.

Em relação aos pagamentos contra-cíclicos, pelos quais o governo ameri-cano completa a diferença entre o pre-ço alvo de um produto e a cotação domercado internacional, os mesmosdeixarão de ser baseados apenas nospreços dos produtos para serem atre-lados à renda dos produtores.

A estimativa de corte nos subsídiosem relação aos valores concedidospela Farm Bill 2002, cerca de US$ 10bilhões para os próximos 5 anos, se-gundo o comunicado de imprensado USDA, é tímida, ao pressupor amanutenção dos preços internacio-nais elevados.

Além disso, as indicações são de quea lei não cumpre as decisões docontencioso do algodão e apontapara reformas bem modestas nos re-gimes de açúcar e lácteos, com a ex-tensão do programa em vigor de su-porte de preço para os dois produtose com modesta redução nos paga-mentos sob o programa de perda derenda (Milk Income Loss ContractProgram - MILC) no caso dos lácteos.

A agroenergia foi outro setor ampla-mente abarcado na nova proposta,com previsão de gastos superiores aUS$ 1,6 bilhão em pesquisa etecnologia.

Como aspecto positivo, há uma im-portante modificação: só terão aces-so ao pagamento produtores com ren-

da líquida abaixo de US$ 200 mil aoano. Anteriormente, tinham acessoaos pagamentos os produtores comrenda líquida de até US$ 2,5 milhões.O USDA não informou a previsão daredução dos gastos com essa medi-da, mas esclareceu que em 2003 ha-via 71.800 produtores rurais com ren-da acima de US$ 200 mil. Os subsídiostambém foram limitados: os produ-tores que cumprirem com o critérioanterior terão direito a, no máximo,US$ 360 mil ao ano, contra osUS$ 1 milhão dados anteriormente.

De qualquer modo, os termos da novalei ainda não estão definidos até queela passe pelo Congresso. Teme-seque ocorra uma deterioração da já pe-quena ambição de redução dos sub-sídios dos termos da proposta, dada

1 Compreende as políticas de apoio interno capazes de distorcer o comércio agrícola internacional, sujeitas a limites de usoglobal de subsídios durante um período de tempo determinado, assim como a acordos de redução (são autorizadas a adotá-las somente as partes que se comprometerem a reduzí-las). São compostas por sistemas de sustentação de preço demercado e pagamentos diretos aos produtores. Fonte: Boletim Economia Política Internacional do Instituto de Economiada Unicamp.

2 Compreende formas de apoio interno capazes de distorcer o comércio internacional, isentas de compromissos multilateraispor estarem relacionadas a programas de limitação da produção interna, independentemente de serem consideradas pagamentodireto aos agricultores. Fonte: Boletim Economia Política Internacional do Instituto de Economia da Unicamp.

3 Utilizada para qualificar as medidas de apoio interno que não distorcem (ou distorcem minimamente) o comércio agrícola.Está isenta do compromisso de redução, mas não pode estar vinculada a nenhum tipo de garantia de preços aos produtores.São exemplos: assistências a desastres, programas governamentais de pesquisa, extensão rural, infra-estrutura e controle depestes e doenças. Fonte: Boletim Economia Política Internacional do Instituto de Economia da Unicamp.

4 Atualmente, garante aos produtores renda de 52 centavos de dólar por libra-peso da produção de algodão. Se os preçosficarem abaixo desse nível, o Governo norte-americano completa a diferença. É o mais importante subsídio doméstico concedidopelo Governo norte-americano ao algodão.

1O preço de referência atual é igual ao preço máximo previsto na Farm Bill 2002.

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AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007AGRONEGÓCIOS ABRIL 2007 3

AGRONEGÓCIOS

EDITORIAL ........................................ 4

CENÁRIO ........................................... 5

AMBIENTE MACROECONÔMICO ..... 10

INSUMOS .......................................... 12

ENTREVISTA .................................... 14

AGROENERGIA ............................... 18

ENERGIAS RENOVÁVEIS ................. 21

EMPRESA DO AGRONEGÓCIO ........ 24

MILHO E SOJA ................................ 26

PECUÁRIA ....................................... 28

CAFÉ ............................................... 30

CITRICULTURA ................................. 34

PERSPECTIVAS ................................. 36

GESTÃO .......................................... 38

NEGÓCIOS ...................................... 40

Publicação periódica do Núcleo de Economia da FGV Projetos.Os artigos são de responsabilidade dos autores e não refletem, necessariamente,a opinião da FGV.

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Instituição de caráter técnico-científico, educativo e filantrópico,

criada em 20 de dezembro de 1944 como pessoa jurídica de direito

privado, tem por finalidade atuar no âmbito das Ciências Sociais,

particularmente Economia e Administração, bem como contribuir

para a proteção ambiental e o desenvolvimento sustentável.

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Primeiro Presidente Fundador: Luiz Simões Lopes

Presidente: Carlos Ivan Simonsen Leal

Vice-Presidentes: Francisco Oswaldo Neves Dornelles, Marcos Cintra Cavalcantede Albuquerque e Sérgio Franklin Quintella

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42

a hegemonia democrata hoje existen-te. Verifica-se, também, que a FarmBill 2007 proposta não é suficientepara alavancar ou mesmo dinamizaras negociações agrícolas da OMC.

TPA e o Futuro das NegociaçõesNo caso do Trade Promotion Authority,há uma situação interessante. Paraconseguir a prorrogação do mecanis-mo, o Executivo norte-americano deveconvencer o Legislativo de que as ne-gociações trarão ganhos efetivos parao país em termos de acesso a merca-dos. Ocorre que, para ter ganhos emacesso a mercados, os EUA terão defazer movimentos efetivos em apoiodoméstico (cortes e disciplinamentosadicionais). Isso porque, se a negocia-ção terminasse hoje com as propostasque estão sobre a mesa, ela levaria,ainda que timidamente e muito longedo esperado pelo Brasil, a algum cortetarifário, mas não implicaria nenhumaredução dos subsídios conferidos atu-almente pelos EUA.

Sem fazer movimentos adicionais, osEUA não levam o que querem, e semlevar o que querem encontrarão difi-culdades para renovar o TPA no casoda OMC.

Ao imobilismo dos EUA em apoio do-méstico, somam-se as seguintes posi-ções defensivas, para citar as principais:China, Tailândia, mas especialmente daÍndia em acesso a mercados agríco-las, Argentina e Venezuela em aces-so a mercados de bens industriais,

NAMA (sigla em inglês de acesso aomercado de produtos não-agrícolas)e União Européia em acesso a mer-cados agrícolas, embora o comissá-rio de comércio europeu, PeterMandelson, tenha mostrado dispo-sição em avançar neste sentido.

Sem fatos novos, não é possível fa-zer previsões sobre a conclusão dasnegociações, embora o dinamismodas conversas bi laterais em Gene-bra possa levar a algum avanço.

Neste cenário, o Brasil e o G-20 devemter clareza de onde estão os ganhosem cada pilar da negociação, dirigin-do os esforços para aquilo que real-mente interessa. Obter ganhos concre-tos em apoio interno é fundamental,já que deixaria a agenda bilateral ebirregional mais "limpa", e facilitaria aconclusão de negociações, como oacordo Mercosul-União Européia. Emacesso a mercados, o desafio será es-tabelecer critérios para o uso das sal-vaguardas especiais (mecanismo queconferirá proteção a determinado paíspara determinado produto agrícola emcaso de importações desses produtosacima de determinada quantidade ouabaixo de determinado valor) e dosprodutos especiais para países em de-senvolvimento (estarão sujeitos a cor-tes menores), de forma a evitar o mauuso de tais instrumentos. Nesse pilar,o tratamento dado pelos países de-senvolvidos para os produtos sensíveisdeve determinar a ambição da negoci-ação em acesso a mercados. É sempre

bom lembrar que a seleção pela UE deapenas 2% dos produtos agrícolascomo sensíveis (sujeitos a cortes me-nores) abarcaria grande parte das atu-ais exportações brasileiras para aquelemercado, já que o Bloco deve selecio-nar como sensíveis produtos, como car-nes e açúcar.

O Brasil continuará, de toda maneira,ocupando o centro das negociações.Além de estar preparado para enfren-tar o mercado agrícola internacional,são poucos os países que fizeram alição de casa como o Brasil, em pas-sado recente, com a abertura do seumercado agrícola, redução da inter-venção governamental e geração detecnologias adaptadas às novas fron-teiras agrícolas. Em estudo sobre apolítica agrícola brasileira, elabora-do em 2005 pela Organização paraCooperação e Desenvolvimento Eco-nômico (OCDE), o Brasil foi aponta-do como o segundo país menosinterven-cionista no mundo em agri-cultura, ficando atrás apenas da NovaZelândia e à frente da Austrália, paísnotoriamente liberal em sua políticaagrícola.

A despeito dos reconhecidos custos aosprodutores agrícolas no processo deajuste, as citadas abertura comercial eredução da intervenção governamentalgeraram um setor fortalecido que temrespaldado as fortes posições do go-verno brasileiro, dando consistência àliderança do País no processo negocia-dor da OMC.

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Page 44: Cadernos FGV Projetos nº 4 - Agronegócios

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AGRONEGÓCIOS CADERNOS FGV PROJETOS | ANO 2 | Nº4 | ABRIL 2007

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ENTREVISTA

Dr. Silvio Crestana

Diretor-Presidente da Embrapa

ARTIGOS

• Cená r i o• Ambiente Macroeconômico• I n s u m o s• Agroene rg ia• Energias Renováveis• Empresa do Agronegócio

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• Perspect ivas

• Ges t ão

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