Canastra real

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102 REVISTAGOL REVISTAGOL 103 Descoberta serra Da canastra por natália Martino fotos ValDeMir cunha Canastra real RoteiRo pelas montanhas de minas GeRais Revela o saboR único do queijo GuaRdado entRe paisaGens exubeRantes e ainda pouco exploRadas Peças de queijo canastra permanecem nas prateleiras da fazenda nova califórnia em processo de maturação

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Canastra real

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102 REVISTAGOL REVISTAGOL 103

Descoberta serra Da canastra

por natália Martino fotos ValDeMir cunha

Canastra realRoteiRo pelas montanhas de minas GeRais Revela o saboR único do queijo

GuaRdado entRe paisaGens exubeRantes e ainda pouco exploRadasPeças de queijo canastra permanecem nas prateleiras da fazenda nova califórnia em processo de maturação

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na fazenda nova califórnia, em sacramento, é possível colocar a mão na massa e aprender a receita deste queijo especial. a partir do alto, verificação do ponto certo do leite; separação do soro; queijo enformado; retirada do que sobrou de soro; hora de lixar o queijo

em sentido horário, a partir do alto, à esq.: turista relaxa na cachoeira lava Pés; romilda Faria mostrando o verdadeiro canastrão; e igreja de um dos povoados da região

Canastrão. nenhuma outra palavra combina mais com José Filho de Faria, 42 anos, do que essa. Parte da culpa é da sua esposa, romilda aparecida Faria, 35 anos. todos os dias eles acordam com os primeiros raios de sol para produzir um enorme queijo que se destaca entre outros menores nas prateleiras da fazenda agroserra, em são roque de Minas. há 200 anos a iguaria que pode atingir 7 quilos era um desejado presente oferecido para autoridades, um rito que combina com o nome oficial do produto, canastra real. o nome foi popularizado e, para alegria geral, seu consumo também. a fazenda ganhou destaque como ponto turístico mesmo com a concorrência da surpreendente paisagem que a cerca.

localizada na região da serra da canastra, a fazenda é apenas uma de centenas de outras propriedades rurais que se espalham por ali e ajudam a manter a popularidade do queijo mineiro brasil afora. o produto é assunto tão sério que ganhou, em 2008, o título de patrimônio cultural e imaterial do país, concedido pelo instituto do Patrimônio histórico e artístico nacional (iphan). a agroserra é o ponto final de um roteiro em busca desse tesouro que é marca da serra da canastra desde o século 19, quando os mora-dores locais adaptaram a receita trazida pelos colonos portugueses. a partir do início do percurso, na cidade de sacramento, redescobrimos parte da história do brasil nos casarões antigos da cidade, que foi um importante polo produtor de café.

de pai para filhohoje, no lugar do café, é o queijo que oferece renda para 2.200 famílias da região da canastra. a primeira parada desse roteiro gastronômico é a fazenda nova califórnia, que produz em média 60 queijos diários. ravana ariel leite, 18 anos, perpetua, ao lado dos pais e dos irmãos, uma tradição transmitida através das gerações. Quem chega por ali durante o horário de trabalho é convidado a, literalmente, colocar a mão na massa. Munidos de avental, toca e botas, seguimos as instruções da jovem sorridente. aperta, espreme, enforma, escorre. o processo só termina no dia seguinte, quando ravana vai lixar e preencher os buracos da superfície em um trabalho cuidadoso no qual ela parece acariciar o queijo. “É para ficar mais bonito”, explica, enquanto dá o acabamento em sua obra de arte.

se ela tem medo de roubarem sua receita? não há motivo: os queijos da serra da canastra não podem ser produzidos em outro lugar. Peculiaridades do relevo, do solo, do clima, da água e da pastagem é que dão sabor e aroma especiais ao leite produzido pelo gado local. a comprovação chega logo, com um belo café com queijo depois do trabalho. na estrada, diferentes tons de verde se revezam até Desemboque. o pequeno povoado que hoje abriga 60 habitantes já foi uma das vilas mais importantes da região, servindo como entreposto comercial para tropeiros. Da igreja do século 18 às casas coloniais que resistiram ao tempo, o povoado oferece a oportunidade de fazer um mergulho na história.

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na fazenda nova califórnia, em sacramento, é possível colocar a mão na massa e aprender a receita deste queijo especial. a partir do alto, verificação do ponto certo do leite; separação do soro; queijo enformado; retirada do que sobrou de soro; hora de lixar o queijo

em sentido horário, a partir do alto, à esq.: turista relaxa na cachoeira lava Pés; romilda Faria mostrando o verdadeiro canastrão; e igreja de um dos povoados da região

Canastrão. nenhuma outra palavra combina mais com José Filho de Faria, 42 anos, do que essa. Parte da culpa é da sua esposa, romilda aparecida Faria, 35 anos. todos os dias eles acordam com os primeiros raios de sol para produzir um enorme queijo que se destaca entre outros menores nas prateleiras da fazenda agroserra, em são roque de Minas. há 200 anos a iguaria que pode atingir 7 quilos era um desejado presente oferecido para autoridades, um rito que combina com o nome oficial do produto, canastra real. o nome foi popularizado e, para alegria geral, seu consumo também. a fazenda ganhou destaque como ponto turístico mesmo com a concorrência da surpreendente paisagem que a cerca.

localizada na região da serra da canastra, a fazenda é apenas uma de centenas de outras propriedades rurais que se espalham por ali e ajudam a manter a popularidade do queijo mineiro brasil afora. o produto é assunto tão sério que ganhou, em 2008, o título de patrimônio cultural e imaterial do país, concedido pelo instituto do Patrimônio histórico e artístico nacional (iphan). a agroserra é o ponto final de um roteiro em busca desse tesouro que é marca da serra da canastra desde o século 19, quando os mora-dores locais adaptaram a receita trazida pelos colonos portugueses. a partir do início do percurso, na cidade de sacramento, redescobrimos parte da história do brasil nos casarões antigos da cidade, que foi um importante polo produtor de café.

de pai para filhohoje, no lugar do café, é o queijo que oferece renda para 2.200 famílias da região da canastra. a primeira parada desse roteiro gastronômico é a fazenda nova califórnia, que produz em média 60 queijos diários. ravana ariel leite, 18 anos, perpetua, ao lado dos pais e dos irmãos, uma tradição transmitida através das gerações. Quem chega por ali durante o horário de trabalho é convidado a, literalmente, colocar a mão na massa. Munidos de avental, toca e botas, seguimos as instruções da jovem sorridente. aperta, espreme, enforma, escorre. o processo só termina no dia seguinte, quando ravana vai lixar e preencher os buracos da superfície em um trabalho cuidadoso no qual ela parece acariciar o queijo. “É para ficar mais bonito”, explica, enquanto dá o acabamento em sua obra de arte.

se ela tem medo de roubarem sua receita? não há motivo: os queijos da serra da canastra não podem ser produzidos em outro lugar. Peculiaridades do relevo, do solo, do clima, da água e da pastagem é que dão sabor e aroma especiais ao leite produzido pelo gado local. a comprovação chega logo, com um belo café com queijo depois do trabalho. na estrada, diferentes tons de verde se revezam até Desemboque. o pequeno povoado que hoje abriga 60 habitantes já foi uma das vilas mais importantes da região, servindo como entreposto comercial para tropeiros. Da igreja do século 18 às casas coloniais que resistiram ao tempo, o povoado oferece a oportunidade de fazer um mergulho na história.

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acima, turistas usam binóculos para observar a fauna local; ao lado, ivone Devós preparando uma de suas especialidades, a goiabada

Quanto mais tempo o queijo permanecer nas prateleiras das fazendas da serra da canastra antes de ser consumido, mais vai se diferenciar do tipo frescal e ter seu sabor único acentuado. ao longo dos dias, à medida que os microrganismos presentes no ambiente e no leite agem, ele vai ficando mais amarelo e consis-tente. e, claro, gostoso. É o chamado queijo curado.

em algumas fazendas, o queijo canastra ganha temperos espe-ciais. É o caso da produção do casal álvaro Guaritá, 56, e nancy bavaresco, 53. Paulistas instalados na região, eles aprenderam a receita local e hoje servem para quem visita sua pousada, a Portal da canastra, um queijo curado produzido com um toque de pimenta. Difícil dizer o que faz mais sucesso, se o queijo ou a vista privilegiada da imensidão da serra que se tem dali. as acomoda-ções estão a poucos minutos da entrada do Parque nacional da serra da canastra, um dos mais bonitos do brasil.

BiChos e Quedas-d’ÁGuaos caminhos de terra podem levar tanto a paradas obrigatórias, como a casca D’anta, a mais famosa queda-d’água da região, com quase 190 metros, ou a cachoeiras menos conhecidas como a lava Pés. entre uma parada e outra, aparições de aves, como carcarás e pica-paus, e de muitos outros animais, como emas e veados, fazem o passeio ainda mais interessante. binóculos e câmeras fotográficas são bastante úteis para curtir e registrar cores, comportamentos e sons.

ao atravessar parte do parque e sair por uma de suas portarias, chega-se ao povoado de são João batista da serra da canastra. na simplicidade aconchegante de lugares como o bar e restaurante do Vicente, turistas se reúnem para ouvir histórias dos moradores locais. o maior contador de “causos” do povoado é o próprio dono

café cOmpLetO

Para ProVar Doces caseiros e o reQueiJão Mineiro, Passe na iVone

ele é produzido com leite de vaca e é presença garantida na casa de todo mineiro. É redondo, amarelado e saboroso. Mas não é queijo, é re-que ijão. Diferentemente dos produtos indus tria-lizados, o requeijão mineiro tem o formato de um queijo e consistência pastosa. na ser ra da canastra, um dos melhores lugares para expe rimentá-lo é o restaurante recanto dos Periquitos. É ali que mora ivone Devós, 52 anos. ani mada, ela recebe os visitantes com a alegria de quem reencontra amigos que vêm de loge. a mesa vai sendo arrumada com pamonhas, doces, pães caseiros, sucos naturais e, claro, requeijão. o café da dona ivone inclui uma variedade de doces inconfundíveis, que podem ser de acerola, mamão, goiaba ou de qualquer outra fruta que ela cultiva no seu pomar. e vem acompanhado também de uma boa prosa.

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Descoberta ibitiPoca

oriGeM saíDa cheGaDa

brasília (bsb)** 20h44 23h40

são paulo (cGh) 18h27 19h50

VOOs para UberLândia — GOL*

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do bar, Vicente Paula aguiar, 69 anos, que arranca gargalhadas de todos enquanto a esposa, elza Maria aguiar, 53 anos, pre-para uma deliciosa comida mineira. “Depois que conhecemos esse povoado, nunca mais nos hospedamos em outro lugar da serra da canastra”, diz Graziella calcagno, 27 anos, que visita a região com frequência.

nas fazendas é possível notar diferenças fundamentais nos processos de higiene. Para garantir a segurança daqueles que consomem a maior iguaria local, o instituto Mineiro de agropecuária criou o selo de certificação para os queijos arte-sanais, que exige adaptações nas estruturas das fazendas para seguir certas normas sanitárias. com cerca de 20 propriedades certificadas, segundo a associação dos Produtores de Queijo canastra (aprocan), a demanda da região acaba consumindo todos os queijos produzidos dentro dessas normas. sendo assim, aos interessados em experimentar o queijo canastra da melhor qualidade, resta a opção de visitar a canastra.

no fim da viagem, retorna-se à fazenda agroserra, templo do canastrão. o desafio agora é só controlar o impulso de levar um grande queijo — é possível que quem tenha achado o canastrão um enorme exagero no início, a essa altura já quei-ra voltar para casa com 7 quilos a mais na bagagem.

acima, a cachoeira do Jota. ao lado, Graziella calcagno no bar e restaurante do Vicente, em são João batista da serra da canastra

GUia serra da canastra

sacRamentoOnde ficar • Hotel fazenda portal da canastra estrada ecológica da serra da canastra, a 3 km da portaria iii do Parque nacional da serra da canastra. tel.: (34) 3661-4808. www.fazendaportaldacanastra.com.br. Diária para casal r$ 260, com pensão completa. parque náutico de Jaguara rod. MG-428, km 102. tel.: (34) 3351-9150. www.parquenauticodejaguara.com.br. Diária para casal r$ 188, com café da manhã.Hotel palace Pça. Getúlio Vargas, 180, centro. tel.: (34) 3351-1522. www.sacramentopalacehotel.com.br. Diária para casal r$ 120, com café da manhã.Onde cOmer • restaurante traíra e cia av. hugo rodri-gues da cunha, s/n, Parque de exposição. tel.: (34) 3351-3820. traíra, arroz e salada para três pessoas r$ 60.Onde cOmprar qUeiJO • fazenda nova califórnia es-trada ecológica entre as cidades de sacramento e Delfi-nópolis. recomenda-se a companhia de um guia local. o queijo de 600 gramas a 800 gramas sai por r$ 10.

são joão batista da seRRa da canastRaOnde ficar • casa da serra r. João Mamede, 74. tel.: (34) 3669-7044/9108-7902. aluguel de casa com duas suítes r$ 70, com café da manhã.chalé refúgio da serra r. João Mamede, 257. tel.: (34) 3664-7566/9981-7765. Quarto para casal r$ 90, com café da manhã.Onde cOmer• bar e restaurante do Vicente Pça. cris-tino José Ferreira, 676. tel.: (34) 9957-4863/3433-1014. Faça reserva. comida mineira à vontade r$ 15.

são Roque de minasOnde ficar • chapadão da canastra r. beijamin cons-tant, 10. tel.: (37) 3433-1267/3433-1440. www.chapadao-dacanastra.com.br. Diária para casal r$ 120.Onde cOmer • recanto dos periquitos Pça. José afonso sobrinho, 66, santo antônio. café completo r$ 12.restaurante da dona inês r. Vicente Piccardi, 341. self-service r$ 12.Onde cOmprar qUeiJO • fazenda agroserra r. XV de novembro, 31. De 600 gramas a 800 gramas, r$ 16; ca-nastrão de 5 a 7 quilos r$ 150. qUem LeVa • maritaca turismo av. capitão borges, 301, sacramento (MG). tel.: (34) 3351-5059. www.maritacatu-rismo.com.br.

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