Cavalheiro Respeitável

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8/20/2019 Cavalheiro Respeitável http://slidepdf.com/reader/full/cavalheiro-respeitavel 1/7  Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea II Docente: Professora Dra. Ana Isabel Vasconcelos Mestranda: Dina Carvalho Aparício 1 “Cavalheiro Respeitável”, de André Brun:  - a estética naturalista A obra sobre a qual nos propomos refletir data de 1914, elemento este que, de imediato, nos levantou uma questão que consideramos bastante pertinente e que, de certa forma, orientou todo o trabalho de leitura, pesquisa e reflexão que aqui se concretiza: - por que razão a peça “Cavalheiro Respeitável”, de André Brun, é considerada naturalista, em 1914, quando o realismo/naturalismo começou a ser divulgado e cultivado nas três últimas décadas do século XIX? A resposta, aparentemente obscura, foi-se-nos revelando nas primeiras leituras, pois, segundo Júlio Lourenço Pinto, a implantação do naturalismo no teatro foi mais difícil do que no romance ou na poesia, por isso, mais tardia, o que nos remete para a  “adaptabilidade” da nova fórmula à cena. A arte cénica não se desprend eu de imediato da exigência de «uma certa ilusão» que estava arreigada nos «hábitos e na educação do público» e esta nova estética, ao chegar ao teatro, já revela os frutos das sementes lançadas pela geração anterior, manifestando, através da sua aceitação pelo público, uma renovação e uma (re)educação intelectual veiculadas, sobretudo, pela divulgação e imposição do romance como género literário. 1  Ainda segundo este autor, a evolução naturalista vem libertar o teatro, banindo tudo o que era tradicional e que o estava a sufocar  não só os gostos duvidosos de um público que o frequentava não propriamente por amor à arte, mas mais por fatores de visibilidade social, mas também pela rigidez académica a que estava subjugado o teatro tradicional, desprovido de uma espontaneidade que a vida contemporânea exigia, pois é nela, na realidade ambiente que atua sobre nós, que põe em conflagração toda a nossa sensibilidade extrínseca e intrínseca, é nas sugestões dos modelos vivos, 1  PINTO, Lourenço Júlio – Estética Naturalista. Estudos Críticos, INCM (recurso disponibilizado na plataforma).

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 Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea II 

Docente: Professora Dra. Ana Isabel Vasconcelos

Mestranda: Dina Carvalho Aparício

“Cavalheiro Respeitável”, de André Brun: 

- a estética naturalista

A obra sobre a qual nos propomos refletir data de 1914, elemento este que, de

imediato, nos levantou uma questão que consideramos bastante pertinente e que, de

certa forma, orientou todo o trabalho de leitura, pesquisa e reflexão que aqui seconcretiza: - por que razão a peça “Cavalheiro Respeitável”, de André Brun, é

considerada naturalista, em 1914, quando o realismo/naturalismo começou a ser

divulgado e cultivado nas três últimas décadas do século XIX? A resposta,

aparentemente obscura, foi-se-nos revelando nas primeiras leituras, pois, segundo

Júlio Lourenço Pinto, a implantação do naturalismo no teatro foi mais difícil do que no

romance ou na poesia, por isso, mais tardia, o que nos remete para a

 “adaptabilidade” da nova fórmula à cena. A arte cénica não se desprendeu de

imediato da exigência de «uma certa ilusão» que estava arreigada nos «hábitos e na

educação do público» e esta nova estética, ao chegar ao teatro, já revela os frutos

das sementes lançadas pela geração anterior, manifestando, através da sua aceitação

pelo público, uma renovação e uma (re)educação intelectual veiculadas, sobretudo,

pela divulgação e imposição do romance como género literário.1 Ainda segundo este

autor, a evolução naturalista vem libertar o teatro, banindo tudo o que era tradicional

e que o estava a sufocar –  não só os gostos duvidosos de um público que o

frequentava não propriamente por amor à arte, mas mais por fatores de visibilidade

social, mas também pela rigidez académica a que estava subjugado o teatro

tradicional, desprovido de uma espontaneidade que a vida contemporânea exigia,

pois é nela,

na realidade ambiente que atua sobre nós, que põe em conflagração toda a

nossa sensibilidade extrínseca e intrínseca, é nas sugestões dos modelos vivos,

1 PINTO, Lourenço Júlio – Estética Naturalista. Estudos Críticos, INCM (recurso disponibilizado na plataforma).

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que se assimilam e transubstanciam, que se oferece um fundo inexaurível de

vitalidade e renovação artística. 2 

Desta forma, pôr em cena a realidade que o romance descreve torna-se um

desafio e exige adequações e modificações- nem sempre fáceis -, tendo em conta anatureza distinta das duas formas de arte. «A fórmula naturalista, no rigor com que

se ajusta ao romance tem de sofrer as modificações que são impostas pela natureza

especial do teatro», pois «o artifício e a convenção absoluto não podem ser banidos

do teatro, mas substituem-se quanto possível pela interpretação do real».3  Desta

forma, as principais transformações relativamente ao “academismo cénico” surgem

no cenário, nas decorações, no vestuário e na declamação, aproximando-os da

realidade do quotidiano. Como reforça Júlio L. Pinto, o artifício «tende a reduzir-se às

suas justas medidas, empregando-se só o quanto basta para ser um meio mais eficaz

de tornar mais completa a ilusão da realidade».4 Ao desligar-se das fórmulas rígidas

do convencionalismo teatral, a criação artística adquire uma nova tónica na

originalidade que exige, cada vez mais, do autor dramático, do cenógrafo e do ator, a

faculdade do “dom da interpretação” cuja ausência compromete a obra de arte.

A teoria pura do naturalismo teatral de Jean Jullien defende a naturalidade demovimentos e de discurso dos atores na cena,

como se estivessem em casa deles, sem nunca se reportarem ao público e

que, por conseguinte, o quadro da cena […] devia ser como uma quarta

parede, transparente para o público – que assim se encontrava na situação

de testemunha casual de um acontecimento, de uma tranche de vie – mas

opaca para os atores (MOLINARI, C., 2010: 327).

Por conseguinte, o encenador é entendido como aquele que sabe compreender

o significado profundo da obra para lá da própria consciência do seu autor e a

revelação psicológica da personagem vai surgir de todo um manancial de elementos

que contribuem para o “reviver” da realidade, aquilo que Anton Tchecov defende

como essencial para o «minucioso realismo cénico e cenográfico [que tem como fim]

a revelação psicológica da personagem» (ibid., 330) –  os acessórios, os sons, os

ruídos, o guarda-roupa… 

2 Ibid., p. 6

3 Ibid., p. 8

4 Ibid., p. 9

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Contudo, estes aspetos por nós referenciados constituiriam o ideal do

naturalismo no teatro. Na realidade – e, em particular, no caso do teatro português -

este ideal de espelhar fielmente a sociedade no palco não passou de uma «longínqua

aspiração» (REBELLO, L. F., 1978: 40). Os autores nacionais apostaram no episódio,na tranche de vie, e na renovação da forma, abolindo a artificialidade das falas dos

dramas habituais nos nossos palcos, substituindo-as por um diálogo caraterizado

«pela sua extrema simplicidade, pela sua aderência à vida quotidiana, pela sua

aproximação da linguagem falada pelo povo» (ibid., 63). Vemos, assim, surgir um

teatro naturalista “à portuguesa”, em que se destacam a sátira dos costumes e a

caricatura de uma pequena e média burguesia, caraterizada pela sua vacuidade e

ambição de conforto material. O público é o burguês citadino que, muitas vezes, é

alvo desta “crítica  de costumes” que pretende educar, formar, à luz dos  ideais

positivistas que sustentaram o naturalismo, mas também divertir.

É neste contexto que surge André Brun (1881-1926), autor de obras que se

destacaram pelo pendor humorístico, abrindo caminho para a comédia de costumes.

Legou-nos uma extensa obra teatral e com «notável sentido burlesco e, no que ao

teatro respeita, uma técnica segura, caricaturou a pequena e média burguesialisboeta da I República» (REBELLO, L. F., 2007: 273).  “Cavalheiro Respeitável”, texto

dramático de um ato com cinco cenas, é um exemplo desta nova forma de arte

teatral. Das quatro personagens em palco, podemos perceber que o Sr. Salazar e a

D. Isaura adquirem maior relevo pela caraterização pormenorizada que deles é feita.

Ele, homem de 50 anos, gordo e bem tratado, «usa anéis e colete branco», é descrito

como um burguês que «após anos de bom comércio, lhe chegou a hora de gozar a

vida sem sobressaltos» (BRUN, A., 2007: 275). Ela, cinco anos mais nova («45 anosarrebicados» - id.) é caraterizada como uma «dona de casa de hóspedes, que na sua

mocidade deve ter sido uma pândega de estalo» (id.). Estas indicações alertam-nos,

de imediato para o espaço social em foco –  a pequena e a média burguesia-, que

assume preponderância em relação às outras duas personagens – Albertina e Alfredo

–  secundarizadas pela sumária caraterização, indicadora da sua posição social. O

cenário transporta-nos para a tranche de vie ao consistir na «saleta em casa de D.

Isaura», em que existem todos os «apetrechos de uma casa burguesa», desde os

paninhos de crochet , ao canário na gaiola, as oleografias nas paredes, um exemplar

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dum Diário de Notícias (cuja finalidade percebemos com o desenrolar do enredo) e,

curiosamente, um relógio parado que nos faz refletir sobre a sua (não) utilidade e

sobre as caraterísticas psicológicas da dona da casa –  o relógio serve apenas para

enfeitar, provavelmente por ser considerado bonito, segundo o gosto pequeno-burguês, ou por se tratar de uma peça de “estimação”(id.)

Sobe o pano e D. Isaura surge «com um roupão de andar por casa todo

enfeitado de laçarotes» (id.), exemplificativo do guarda-roupa das peças naturalistas,

que pretende dar-nos a ilusão de “episódio do quotidiano”, ao mesmo tempo que põe

em evidência as caraterísticas da personagem: - pequeno-burguesa, mas que gosta

de impressionar com um certo coquetismo, ou seja, mesmo em casa, nos hábitos

mais comuns, gosta de transmitir o seu bom gosto, a sua “posição”. A sua

superioridade social e relevância na ação em relação a Adelaide são acentuadas pelo

facto de D. Isaura estar «sentada no sofá» e Albertina «de pé junto dela» (id.). A

distinção que D. Isaura pretende transmitir é arruinada logo na sua primeira fala, ao

falar como uma mulher do povo («Credo, filha!...»), pronunciando erradamente a

palavra “frenesim” («farnesim») (ibid., 276). Dada a crendices e dar ouvidos a falares

alheios, deita as cartas a Albertina, fazendo-lhe uma leitura direcionada para aquiloque ela julga mais conveniente. Compreendemos o enredo: - Albertina tinha namoro

com Alberto que, segundo as más-línguas, andaria a traí-la com uma corista.

Incentivada por D. Isaura, Albertina põe um anúncio no Diário de Notícias  para

encontrar um “cavalheiro respeitável” que seria, segundo a lógica de D. Isaura, o

oposto de Alberto, um jovem «sempre sem vintém» ( ibid., 277)… Durante a primeira

cena, D. Isaura argumenta com Albertina, revelando-se uma mulher prática, pouco

dada a sentimentalismos («Chorar não adianta nada.» - ibid., 278), muito maisinteressada no conforto material do que em sentimentos verdadeiros («O que tu

precisas, rapariga, é de uma pessoa tua amiga, que seja de uma certa idade e com

assento, que te garanta um bom futuro…»  - id.), reconhecendo que, em nova, fora

ingénua e cedera ao amor por Vitorino, «um sargento de lanceiros», o que se revelou

um “prejuízo” no futuro («Se não fosse ele, podia hoje estar muito bem a rir-me de

quem se ri de mim, em vez de andar a aturar hóspedes…»  - id.). Temos, assim, um

retrato fiel desta camada da sociedade da época, da sua falta de valores, reforçado

pela crítica implícita à importância dada aos jornais que, na peça como no quotidiano,

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eram vistos como uma forma de atingir determinados fins, em vez de veículos de

informação e cultura («Se os jornais não servissem para isso, para que haviam eles

de servir? E quase sempre dá excelentes resultados. […] Conheci uma amiga minha

que não tinha onde cair morta e hoje até já tem jazigo…» - id.). Perante a hesitaçãode Albertina, revela-se todo o poder de persuasão de D. Isaura, toda a sua astúcia,

caraterísticas evidentes nas suas falas, sugerindo uma dualidade que se vai confirmar

com o aparecimento do Sr. Salazar que, afinal, lhe interessa mais a ela do que a

Albertina, o que nos faz pôr em causa o próprio sentimento de amizade que diz nutrir

pela rapariga.

Na segunda cena, com o aparecimento do Sr. Salazar, D. Isaura revela-se

educadíssima, cheia de mesuras, embora reconhecendo que o prédio onde recebe os

hóspedes podia estar em melhores condições («A escada é um bocado escura e às

vezes os gatos…»  - ibid., 280), uma forma de introduzir no diálogo aquilo que, no

romance naturalista, pertenceria ao domínio da descrição. Na conversa com o Sr.

Salazar, a astúcia de D. Isaura floresce ao ponto de, depois de perceber que o

cavalheiro estava realmente bem posicionado na vida e disposto a fruir e usufruir de

uma vida sem preocupações, procurar agradar-lhe em todos os pormenores, dando-lhe a entender que, mesmo não sendo tão nova como Albertina, tem outras

qualidades que só se adquirem com a maturidade e que são essenciais para o tipo de

relacionamento que ele procura. Divertida e bem realista é a forma como o Sr.

Salazar se refere à falecida mulher que lhe atormentou a vida e arruinou a felicidade

enquanto foi viva, mas a quem ele se refere como «a minha santa mulher, que Deus

haja» (ibid., 282 )… Com cumplicidade, trocam impressões –  realistas –  sobre o

casamento, sobre o relacionamento homem/mulher, sobre a necessidade de viver adois placidamente, sem sobressaltos, sem grandes emoções, mas com carinho e

respeito mútuos. Era o ideal de casamento burguês. Neste diálogo, confirma-se a

dualidade – ou vacuidade – do caráter de D. Isaura que, agora, se confessa «pessoa

de sentimentos», nada superficial, que não cede aos apelos do status. A vacuidade de

sentimentos do Sr. Salazar é confirmada e reforçada no momento em que confessa

ter respondido ao anúncio por acreditar que nos jornais se arranjam “umas

pechinchas em segunda mão muito boas e em conta”  (ibid., 285), referindo que um

amigo seu comprara «uma caixa de música das grandes por três mil e quinhentos,

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que até toca a Traviata  e tem corda para doze peças» (id.). Ficamos, então, a

conhecer, através deste diálogo tão aparentemente quotidiano, as prendas que uma

mulher deve reunir para “prender” um homem: - a esposa ideal deve ser prendada

para a cozinha, para os arranjos do lar, deve ser carinhosa, submissa5.

Na cena III, Albertina entra abruptamente e refere-se ao Sr. Salazar como «o

homenzinho» (ibid., 287), revelando a sua baixa condição social e falta de educação.

Mesmo assim, impressiona-o e, num à parte bastante cómico, avalia-a fisicamente

como se avaliasse uma caçarola («É uma caçarola, tipo 3, dezassete marcos a dúzia,

de se lhe tirar o chapéu» - ibid., 288), o que revela a concupiscência do seu caráter.

Muito mais se poderia dizer sobre o enredo e o que as falas das personagens

evidenciam. Contudo, não podemos deixar de referir a naturalidade com que se

processa a conversa entre Alberto e Albertina, uma conversa despretensiosa,

reveladora de sentimentos puros de quem não valoriza aquilo que não tem e com que

não conta ter. Alfredo revela a sua pureza de intenções e sentimentos ao tratá-la,

carinhosamente, por «carocho» e ao mostrar-se incrédulo com a confissão de

Albertina relativa ao anúncio e a outros “ideais de vida”, fruto da (má) influência de

D. Isaura… 

Esta peça torna-se tão especial e divertida por estar impregnada de

caraterísticas naturalistas: - desde o cenário, às didascálias6, às falas das

personagens, criteriosamente adaptadas a cada uma delas, ao teu temperamento e

condição, às subtilezas da natureza humana, ao enredo simples, mas ilustrativo da

mentalidade burguesa da época, aos pormenores que percebemos serem

estrategicamente referidos. Além disso, não podemos deixar de rever aqui laivos do

teatro vicentino e de relembrar o seu princípio: “ridendo castigat mores” . O que se

pretende com uma peça naturalista como esta é mesmo mostrar a sociedade à

sociedade, tal como ela é, para a poder educar, formar, através da reflexão. Por isso,

encontramos aqui um profuso recurso aos cómicos de caráter, de linguagem e de

situação. D. Isaura lembra-nos a Alcoviteira, hipócrita, dual, um bom exemplo de

cómico de caráter. A forma como o Sr. Salazar compara Albertina a uma caçarola é,

sem dúvida, um dos muitos exemplos de cómico de linguagem (e de caráter) que nos

5 Característica habilmente transmitida pela última didascália da cena II, referente a D. Isaura («de olhos baixos» - id., 287)

6 Curtas, muitas vezes resumindo-se a um simples adjetivo («servil » - id., 289)

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fazem sorrir e rir ao longo de toda a peça… Cómico de situação encontramo-lo, por

exemplo, na aldrabada leitura das cartas. O autor recorre aos três tipos de cómico na

última cena, em que se instala a confusão originada pelo ciúme de Alfredo que, com

toda a sua impulsividade genuína de homem, apaixonado e povo, acusa D. Isaura deser a «abelha-mestra cá do cortiço» que, indignada, ferida na sua distinção de

burguesa consciente do seu estatuto, o alerta para a forma como fala… Sem dramas

nem tragédias, esta peça humorística mostra-nos a sociedade da época, fá-la rir-se

de si própria, incisivamente, mas com uma leveza subtil que, no fim, nos faz pensar

em Shakespeare: “tudo está bem, quando acaba bem” .

BIBLIOGRAFIA:

BRUN, André (2007) –  “Cavalheiro Respeitável”, in Teatro Português em Um Acto

81900-1945), [organização, seleção e notas de Luiz Francisco Rebello],Lisboa, INCM, pp.273-295.

MOLINARI, Cesare (2010) – História do Teatro, Lisboa, Edições 70.

PINTO, Júlio Lourenço –  Estética Naturalista. Estudos Críticos, INCM (recurso

disponibilizado na plataforma).

REBELLO, Luiz Francisco (1978) –  O Teatro Naturalista e Neo-Romântico (1870-

1910), Lisboa, ICP.

REBELLO, Luiz Francisco (1988) – História do Teatro Português, 4ª ed., Mem Martins,

Publicações Europa-América. 

SENA, Jorge de (1988) – Do Teatro em Portugal. Obras de Jorge de Sena, Lisboa,

Edições 70.