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Meu nome é Chiquinho
Meu pai é alto e magro e se chama Chico.Meu avô é baixo e gordo e se chama Francis-co. Eu me chamo Chiquinho e ainda não seicomo sou.
Já andei pensando nisso e acho que essa his-tória de eu não saber como sou deve ser porcausa da minha idade, pois o pessoal aqui de ca-sa já tem opinião formada a meu respeito.
Minha avó, por exemplo, que é a mais velhade todos, acha que sou um palito de fósforo epronto. Isso porque sou magrela e pouco faná-tico por comida, principalmente pela sopa queminha mãe faz e sempre tem gosto de coisa deque não gosto. Por isso todos deram de mechamar palito de fósforo.
Principalmente aquela chata da minha ir-mã, que, não sei por quê, acha uma graça dana-
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da quando me chama de palito de fósforo e ride um jeito tão irritante que me deixa louco davida, com vontade de inventar apelidos horri-pilantes para ela.
Mas, para falar a verdade, acho uma perdade tempo ficar inventando apelidos para os ou-tros e sei que, se fosse para eu querer ser algumacoisa, é lógico que não seria um palito de fós-foro. Preferiria, por exemplo, ser um pé de mesa,um pé de mesa bailarino. Para começar a dançarbem na hora da comida, quando todos estives-sem na mesa. Já imaginou os pratos, os copos, ostalheres… todos pulando? E a cara das pessoas?
Eu morreria de tanto rir, e ninguém des-confiaria de nada, porque não dá para ouvirum pé de mesa, mesmo quando ele está se ma-tando de dar risada.
Também não gosto do meu nome. Eu mechamo, na verdade, Francisco Ferreira Neto.Para mim, parece nome de outra pessoa. Com-bina mais com o meu avô do que comigo. Eleé que é o verdadeiro Francisco Ferreira.
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Um dia desses passou pela minha cabeçaprocurar alguém que tivesse cara de FranciscoFerreira Neto e gostasse do nome. Eu dariatranqüilamente o meu nome de presente paraele e arranjaria outro para mim, mas pensei emvários nomes e não achei nenhum que combi-nasse comigo.
Então peguei uma folha de papel enorme erabisquei uma assinatura bem caprichada, quenão dava para ler de jeito nenhum. Além de mui-to bonita e toda cheia de curvas, ela poderia re-presentar qualquer nome. Quer dizer, eu pode-ria dar a ela o nome que quisesse, trocar de nometodos os dias ou até várias vezes ao dia.
Ainda não achei nenhum nome para a mi-nha assinatura, mas isso não tem nenhumaimportância.
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Domingo vira quinta-feira
Acordei logo de manhã sem saber o que fa-zer. Não que eu não tivesse nada. Havia as li-ções da escola e tudo o mais, mas ninguém acor-da num domingo de manhã louco para fazerlição de casa. Se é para falar a verdade, acho es-sas lições muito chatas e também acho o do-mingo chato. Acho o domingo sem passeio odia mais chato de todos.
É aquele dia em que, se minha mãe e meupai não programaram nenhum passeio, a gen-te fica trancado dentro de casa, andando deum lado para o outro, não fazendo nada e secansando de não fazer nada. E eles falam quequerem descansar. Com toda a razão, pois tra-balharam a semana inteira.
Mas, para que a gente não fique rondan-do, incomodando, perturbando o repouso
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deles, mandam a gente fazer coisas o tempotodo. Então é um tal de faça isso, faça aquilo…“Por que não estuda, não faz a lição, não lêum livro, não arruma suas coisas e a bagunçado seu quarto?”
Dá para agüentar?Por isso decidi que o meu domingo não se-
ria mais um domingo. Poderia ser qualqueroutro dia, menos um domingo. Poderia seruma quinta-feira, por exemplo.
Pronto! Decidi que o domingo não seriamais domingo, mas quinta-feira.
E, quando meu pai entrou no quarto paraavisar que meus avós vinham almoçar em casa,foi como se nada tivesse acontecido. Quer dizer,se o domingo não era domingo, mas quinta-feira, naquela hora eu não estava no meu quarto— estava na escola — e meu pai não estava naminha frente — estava no trabalho.
Então eu, que não estava, não respondinada. E meu pai, que também não estava, saiusem perceber nada.
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Tinha dado tudo certo. Cheguei até a pen-sar que todos os outros domingos também po-deriam ser quintas-feiras.
Mas bastou meu pai sair do quarto para euficar todo atrapalhado. Quer dizer, se o do-mingo não era domingo, mas quinta-feira, e senaquela hora eu estava na escola, quem estavano meu quarto não era eu.
E, se não era eu, quem era, então?
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