Comentário Sobre o Método Cartesiano, Para Alunos de Filosofia Do Ensino Médio

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 O bom senso é a coisa do mundo melhor partilhada, pois cada qual pensa estar tão bem provido dele, que mesmo os que são mais difíceis de contentar em qualquer outra coisa não costumam desejar tê-lo mais do que o têm. E não é verossímil que todos se enganem a tal respeito mas isso antes testemunha que o poder de bem julgar e distinguir o verdadeiro do falso, que é  propriamente o que se denomina o bom senso ou a ra!ão, é naturalmente igual em todos os homens e, destarte, que a diversidade de nossas opini"es não provém do fato de serem uns mais racionais do que outros, mas somente de condu!irmos nossos pensamentos por vias diversas e não considerarmos as mesmas coisas. #ois não é suficiente ter o espírito bom, o principal é aplic$- lo bem. %s maiores almas são capa!es dos maiores vícios, tanto quanto das maiores virtudes, e os que s& andam muito lentamente podem avan'ar muito mais, se seguirem sempre o caminho reto, do que aqueles que correm e dele se distanciam. Descartes, René. (iscurso do )étodo. Primeira Parte. São Paulo: Nova Cultural, 1987. (Os Pensaores!. "ste trec#o nos $arece interessante $ara o tra%al#o na escola. Poe ser relacionao & iscussão so%re sa%er, sa%eoria, senso'comum, ue )oi esenvolvia anteriormente. Descartes o)erece uma e)ini*ão e %om senso ou ra+ão como $oer e %em ul-ar e istin-uir o veraeiro o )also e a)irma ser essa ca$aciae a mais %em istri%ua entre os #omens. / i)eren*a entre as almas ca$a+es e vcios e virtues não est0 na $osse a ra+ão, ue toos $ossuem, mas na a$lica*ão ela. $reciso a$rener a a$licar o %om senso, o $oer e ul-ar. "ssa istin*ão entre $ossuir a ca$aciae racional e a$lic0'la %em é im$ortante, $ois e2$lica a varia*ão as o$ini3es e as conutas #umanas. "sse é tam%ém o $rimeiro $asso a ar-umenta*ão ue Descartes constroi $ara usti)icar sua ieia e métoo. ...como um homem que caminha s& e nas trevas, resolvi ir tão lentamente, e usar de tanta circunspec'ão em todas as coisas, que, mesmo se avan'asse muito pouco, evitaria pelo menos cair. *ão quis de modo algum come'ar rejeitando inteiramente qualquer das opini"es que  porventura se insinuaram outrora em minha conf ian'a, sem que aí fossem in trodu!idas pela ra!ão, antes de despender bastante tempo em elaborar o projeto da obra que ia empreender, e em procurar o verdadeiro método para chegar ao conhecimento de todas as coisas de que meu espírito fosse capa!. Eu estudara um pouco, sendo mais jovem, entre as partes da +ilosofia, a &gica, e, entre as )atem$ticas, a %n$lise dos gemetras e a lgebra, três artes ou ciências que pareciam dever contribuir com algo para o meu desígnio. )as, e/aminando-as, notei que, quanto 0 &gica, os seus silogismos e a maior parte de seu outros preceitos servem mais para e/plicar a outrem as coisas que j$ se sabem, ou mesmo, como a arte de 1lio, para falar, sem julgamento, daquelas que se ignoram, do que para aprendê-las. 2...3 %ssim, em ve! desse grande n1mero de preceitos de que se comp"e a &gica, julguei que me bastariam os quatro seguintes, desde que tomasse a firme e constante resolu'ão de não dei/ar uma s& ve! de observ$-los. O primeiro era jamais acolher alguma coisa como verdadeira que eu não conhecesse evidentemente como tal isto é, de evitar cuidadosamente a precipita'ão e a preven'ão, e de nada incluir em meus juí!os que não se apresentasse tão clara e tão distintamente a meu espírito, que eu não tivesse nenhuma ocasião de p-lo em d1vida. O segundo, o de dividir cada uma das dificuldades que eu e/aminasse em tantas parcelas quantas  possíveis e quantas necess$rias fossem para melhor resolvê-las. O terceiro, o de condu!ir por ordem meus pensamentos, come'ando pelos objetos mais simples e mais f$ceis de conhecer, para subir, pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros. E o 1ltimo, o de fa!er em toda parte enumera'"es tão completas e revis"es tão gerais, que eu

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7/18/2019 Comentário Sobre o Método Cartesiano, Para Alunos de Filosofia Do Ensino Médio

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O bom senso é a coisa do mundo melhor partilhada, pois cada qual pensa estar tão bem providodele, que mesmo os que são mais difíceis de contentar em qualquer outra coisa não costumamdesejar tê-lo mais do que o têm. E não é verossímil que todos se enganem a tal respeito masisso antes testemunha que o poder de bem julgar e distinguir o verdadeiro do falso, que é

 propriamente o que se denomina o bom senso ou a ra!ão, é naturalmente igual em todos oshomens e, destarte, que a diversidade de nossas opini"es não provém do fato de serem uns maisracionais do que outros, mas somente de condu!irmos nossos pensamentos por vias diversas e

não considerarmos as mesmas coisas. #ois não é suficiente ter o espírito bom, o principal é aplic$-lo bem. %s maiores almas são capa!es dos maiores vícios, tanto quanto das maiores virtudes, e osque s& andam muito lentamente podem avan'ar muito mais, se seguirem sempre o caminho reto,do que aqueles que correm e dele se distanciam.

Descartes, René. (iscurso do )étodo. Primeira Parte. São Paulo: Nova Cultural, 1987. (OsPensaores!."ste trec#o nos $arece interessante $ara o tra%al#o na escola. Poe ser relacionao & iscussãoso%re sa%er, sa%eoria, senso'comum, ue )oi esenvolvia anteriormente.

Descartes o)erece uma e)ini*ão e %om senso ou ra+ão como $oer e %em ul-ar e istin-uir overaeiro o )also e a)irma ser essa ca$aciae a mais %em istri%ua entre os #omens.

/ i)eren*a entre as almas ca$a+es e vcios e virtues não est0 na $osse a ra+ão, ue toos$ossuem, mas na a$lica*ão ela. $reciso a$rener a a$licar o %om senso, o $oer e ul-ar."ssa istin*ão entre $ossuir a ca$aciae racional e a$lic0'la %em é im$ortante, $ois e2$lica avaria*ão as o$ini3es e as conutas #umanas.

"sse é tam%ém o $rimeiro $asso a ar-umenta*ão ue Descartes constroi $ara usti)icar sua ieiae métoo....como um homem que caminha s& e nas trevas, resolvi ir tão lentamente, e usar de tantacircunspec'ão em todas as coisas, que, mesmo se avan'asse muito pouco, evitaria pelo menoscair. *ão quis de modo algum come'ar rejeitando inteiramente qualquer das opini"es que

 porventura se insinuaram outrora em minha confian'a, sem que aí fossem introdu!idas pelara!ão, antes de despender bastante tempo em elaborar o projeto da obra que ia empreender, e

em procurar o verdadeiro método para chegar ao conhecimento de todas as coisas de que meuespírito fosse capa!.

Eu estudara um pouco, sendo mais jovem, entre as partes da +ilosofia, a &gica, e, entre as)atem$ticas, a %n$lise dos gemetras e a lgebra, três artes ou ciências que pareciam devercontribuir com algo para o meu desígnio. )as, e/aminando-as, notei que, quanto 0 &gica, osseus silogismos e a maior parte de seu outros preceitos servem mais para e/plicar a outrem ascoisas que j$ se sabem, ou mesmo, como a arte de 1lio, para falar, sem julgamento, daquelasque se ignoram, do que para aprendê-las. 2...3 %ssim, em ve! desse grande n1mero de preceitosde que se comp"e a &gica, julguei que me bastariam os quatro seguintes, desde que tomasse afirme e constante resolu'ão de não dei/ar uma s& ve! de observ$-los.

O primeiro era jamais acolher alguma coisa como verdadeira que eu não conhecesseevidentemente como tal isto é, de evitar cuidadosamente a precipita'ão e a preven'ão, e denada incluir em meus juí!os que não se apresentasse tão clara e tão distintamente a meu espírito,que eu não tivesse nenhuma ocasião de p-lo em d1vida.

O segundo, o de dividir cada uma das dificuldades que eu e/aminasse em tantas parcelas quantas possíveis e quantas necess$rias fossem para melhor resolvê-las.

O terceiro, o de condu!ir por ordem meus pensamentos, come'ando pelos objetos mais simples emais f$ceis de conhecer, para subir, pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dosmais compostos, e supondo mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente unsaos outros.

E o 1ltimo, o de fa!er em toda parte enumera'"es tão completas e revis"es tão gerais, que eu

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tivesse a certe!a de nada omitir.

Essas longas cadeias de ra!"es, todas simples e f$ceis, de que os gemetras costumam servir-se para chegar 0s suas mais difíceis demonstra'"es, haviam-me dado ocasião de imaginar que todasas coisas possíveis de cair sob o conhecimento dos homens seguem-se umas 0s outras da mesmamaneira e que, contanto que nos abstenhamos somente de aceitar por verdadeira qualquer que

não o seja, e que guardemos sempre a ordem necess$ria para dedu!i-las umas das outras, não pode haver quaisquer tão afastadas a que não se chegue por fim, nem tão ocultas que não sedescubram.Descartes, René. (iscurso do )étodo. Primeira Parte. São Paulo: Nova Cultural, 1987. (OsPensaores!.Nesse trec#o, Descartes torna eviente ue $rocura re-ras e $ensamento istintas auelas uecaracteri+avam a l4-ica anti-a, voltaa $ara as eu*3es, e ue, $ortanto, )a+ia erivar e$ro$osi*3es mais -erais outras $ro$osi*3es menos -erais, não $rou+ino novo con#ecimento,mas a$enas e2$licitano al-o ue 0 estava contio nas $ro$osi*3es mais -erais.

50 necessiae, a-ora, e $rou+ir um outro ti$o e métoo, ue $ermita reali+ar esco%ertas,am$liar o con#ecimento so%re o muno, ue não a$enas orene as $ro$osi*3es em um sistema esirva & a$ar6ncia e con#ecimento, ao iscurso va+io.

O métoo $ro$osto $or Descartes tem, claramente, uma ins$ira*ão no métoo os -emetras,inicano a im$ortncia o esenvolvimento a matem0tica $ara a ci6ncia moerna.

Como veremos aiante, Descartes esenvolve uma conce$*ão meta)sica a matéria comoe2tensão ue usti)ica o uso o métoo matem0tico na investi-a*ão a nature+a.

Parece'nos, entretanto, ue, antes e iscutirmos os $ressu$ostos meta)sicos o métoo, é$ossvel $ro$or aos estuantes a e2$eri6ncia e tentar a$licar esse métoo, )ormulao aui emuatro re-ras -erais, a al-um $ro%lema atual, ue os $r4$rios estuantes everão )ormular.

ual ser0 o resultao esse e2erccio Não sa%emos, é uma ativiae a%erta, e convite aosestuantes $ara utili+arem um recurso a$resentao em um te2to )ilos4)ico, e vermos oneconse-uimos c#e-ar com ele."2erccio $ro$osto...;entar utili+ar as re-ras o métoo, $ro$ostas $or Descartes, em seu Discurso o <étoo, nasolu*ão e $ro%lemas atuais = seam $ro%lemas as isci$linas escolares, seam $ro%lemas)ormulaos $elos alunos so%re suas vias, sua e2$eri6ncia, a via #umana, etc.

/valia*ão o resultao a e2$eri6ncia...i. Ser0 ue as re-ras e Descartes se a$licam tão universalmente uanto $areciam $rometer

i. Ser0 ue elas são su)icientes $ara resolver uaisuer $ro%lemas

i. /l-uém conse-uiria )ormular outras re-ras e métoo, mais e)etivas ue as e Descartes

Fonte: Curso de Filosofia da FGV Online.

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