Comentários aos Julgados do TCU - nº 8

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Sessões de 30 de junho e 1º de julho de 2015 Ano I – nº 8 SERVIÇOS CONTINUADOS – PARÂMETRO DE PAGAMENTO – IN SLTI/MPOG Nº 02/2008 – OBRIGAÇÕES TRABALHISTAS – RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO – ENUNCIADO Nº 331 DO TST - ART. 71, §1º, DA LEI Nº 8.666/1993 “Nas contratações de serviços continuados, a previsão no edital de critério de remuneração por resultados, em contraposição ao pagamento por postos de trabalho, não exime a Administração de fixar no contrato que vier a ser firmado o quantitativo de postos de trabalho, de modo a viabilizar a fiscalização sobre o cumprimento das obrigações trabalhistas.” Fonte: Processo TC nº 010.139/2014-1. Acórdão nº 1.606/2015 — Plenário. Relator: Ministro Benjamin Zymler. Julgado em: 01.07.2015. A o contratar a execução de serviços, os órgãos ou en- tidades integrantes do Sistema de Serviços Gerais – SISG devem observar o disposto na Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamen- to, Orçamento e Gestão – SLTI/MPOG. Em relação aos serviços continuados, qual deve ser o parâmetro de pagamento à contratada? No que concerne à contratação de serviços continuados, o pagamento à contratada deve basear-se em unidade de medida que permita a mensuração dos resultados. 1 No caso de serviços de conservação e limpeza, por exem- plo, o art. 43 da IN define que o critério de aferição de resultados é a área física a ser limpa, “estabelecendo-se uma estimativa do custo por metro quadrado, observadas a peculiaridade, a produtividade, a periodicidade e a fre- quência de cada tipo de serviço e das condições do local objeto da contratação”. 1 Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamen- to, Orçamento e Gestão. “Art. 11. A contratação de serviços continu- ados deverá adotar unidade de medida que permita a mensuração dos resultados para o pagamento da contratada, e que elimine a possibili- dade de remunerar as empresas com base na quantidade de horas de serviço ou por postos de trabalho. [...]”. Em relação aos serviços continuados, a contratada pode ser remunerada com base na quantidade de horas de serviço ou nos postos de trabalho? Em regra, não. A IN veda que se utilize como base de pagamento a quantidade de horas de serviço ou o número de postos de trabalho para serviços continuados, abrindo- -se exceção apenas quando for inviável identificar o cri- tério de aferição dos resultados. 2 Obsta-se, inclusive, que a Administração fixe no instru- mento convocatório “o quantitativo de mão-de-obra a ser utilizado na prestação do serviço, devendo sempre adotar unidade de medida que permita a quantificação da mão de obra que será necessária à execução do serviço”. 3 A Administração Pública deve fiscalizar o cumpri- mento das obrigações trabalhistas pela contratada? Sim. Porque a Administração Pública direta e indireta pode responder subsidiariamente pelo inadimplemento 2 Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. “Art. 11. [...] § 1º Excepcionalmente poderá ser adotado critério de remuneração da contratada por postos de trabalho ou quantidade de horas de serviço quando houver inviabilidade da adoção do critério de aferição dos resultados. [...]”. 3 Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Art. 20, I. Comentários aos principais julgados doTribunal de Contas da União –TCU

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Oitava edição do informativo que contém comentários e análises sobre as principais novidades na jurisprudência do Tribunal de Contas da União - TCU.

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Sessões de 30 de junho e 1º de julho de 2015 Ano I – nº 8

SERVIÇOS CONTINUADOS – PARÂMETRO DE PAGAMENTO – IN SLTI/MPOG Nº 02/2008 – OBRIGAÇÕES TRABALHISTAS – RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO –

ENUNCIADO Nº 331 DO TST - ART. 71, §1º, DA LEI Nº 8.666/1993“Nas contratações de serviços continuados, a previsão no edital de critério de remuneração por resultados, em contraposição ao pagamento por postos de trabalho, não exime a Administração de fixar no contrato que vier a ser firmado o quantitativo de postos de trabalho, de modo a viabilizar a fiscalização sobre o cumprimento das obrigações trabalhistas.”Fonte: Processo TC nº 010.139/2014-1. Acórdão nº 1.606/2015 — Plenário. Relator: Ministro Benjamin Zymler. Julgado em: 01.07.2015.

Ao contratar a execução de serviços, os órgãos ou en-tidades integrantes do Sistema de Serviços Gerais –

SISG devem observar o disposto na Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamen-to, Orçamento e Gestão – SLTI/MPOG.

Em relação aos serviços continuados, qual deve ser o parâmetro de pagamento à contratada?

No que concerne à contratação de serviços continuados, o pagamento à contratada deve basear-se em unidade de medida que permita a mensuração dos resultados.1

No caso de serviços de conservação e limpeza, por exem-plo, o art. 43 da IN define que o critério de aferição de resultados é a área física a ser limpa, “estabelecendo-se uma estimativa do custo por metro quadrado, observadas a peculiaridade, a produtividade, a periodicidade e a fre-quência de cada tipo de serviço e das condições do local objeto da contratação”.

1 Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamen-to, Orçamento e Gestão. “Art. 11. A contratação de serviços continu-ados deverá adotar unidade de medida que permita a mensuração dos resultados para o pagamento da contratada, e que elimine a possibili-dade de remunerar as empresas com base na quantidade de horas de serviço ou por postos de trabalho. [...]”.

Em relação aos serviços continuados, a contratada pode ser remunerada com base na quantidade de horas de serviço ou nos postos de trabalho?

Em regra, não. A IN veda que se utilize como base de pagamento a quantidade de horas de serviço ou o número de postos de trabalho para serviços continuados, abrindo--se exceção apenas quando for inviável identificar o cri-tério de aferição dos resultados.2

Obsta-se, inclusive, que a Administração fixe no instru-mento convocatório “o quantitativo de mão-de-obra a ser utilizado na prestação do serviço, devendo sempre adotar unidade de medida que permita a quantificação da mão de obra que será necessária à execução do serviço”.3

A Administração Pública deve fiscalizar o cumpri-mento das obrigações trabalhistas pela contratada?

Sim. Porque a Administração Pública direta e indireta pode responder subsidiariamente pelo inadimplemento 2 Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. “Art. 11. [...] § 1º Excepcionalmente poderá ser adotado critério de remuneração da contratada por postos de trabalho ou quantidade de horas de serviço quando houver inviabilidade da adoção do critério de aferição dos resultados. [...]”.3 Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Art. 20, I.

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expedienteComentários aos principais julgados do Tribunal

de Contas da União - TCU

Produção: Jorge Ulisses Jacoby FernandesCristiana Muraro TarsiaSofia Rodrigues Silvestre

Os artigos publicados neste informativo são de responsabilidade exclusiva de seus autores.

larmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

A redação anterior do Enunciado acima transcrito7 foi alterada após o julgamento de Ação Direta de Constitu-cionalidade que tinha por objeto o art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993:

Art. 71. O contratado é responsável pelos encar-gos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comer-ciais resultantes da execução do contrato.

§ 1º A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis. [...]

O Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucio-nalidade do supratranscrito dispositivo, conforme sinte-tiza a ementa a seguir transcrita:

RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. Subsidi-ária. Contrato com a administração pública. Inadim-plência negocial do outro contraente. Transferência consequente e automática dos seus encargos traba-lhistas, fiscais e comerciais, resultantes da execução do contrato, à administração. Impossibilidade jurídi-ca. Consequência proibida pelo art. 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666/93. Constitucionalidade reconheci-da dessa norma. Ação direta de constitucionalidade julgada, nesse sentido, procedente. Voto vencido. É constitucional a norma inscrita no art. 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995.8

7 Antiga redação do item IV do Enunciado nº 331/TST: “O inadim-plemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, im-plica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públi-cas e das sociedades de economia mista, desde que hajam partici-pado da relação processual e constem também do título executivo judicial.” (art. 71 da Lei nº 8.666/93)”.8 STF. ADC nº 16 — Plenário. Relator: Ministro Cezar Peluso. Jul-

das obrigações trabalhistas da contratada caso:

a) aja com culpa4 na fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas pela contratada;

b) participe da relação processual;5 e

c) conste do título executivo judicial.6

É o que se depreende dos termos dos itens IV e V do Enunciado nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho:

I - A contratação de trabalhadores por empresa in-terposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de traba-lho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II - A contratação irregular de trabalhador, median-te empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indi-reta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III - Não forma vínculo de emprego com o toma-dor a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obriga-ções da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmen-te na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obri-gações trabalhistas assumidas pela empresa regu-

4 Imprudência, negligência ou imperícia.5 Refere-se à ação movida pelo trabalhador.6 Refere-se à decisão transitada em julgado.

Diagramação e layout: Alveni Lisboa

Dúvidas, críticas ou sugestões:http://www.jacoby.pro.br [email protected]

(61) 3366-1206Coordenação: Álvaro Luiz da Costa Júnior

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Nesse sentido, a própria IN SLTI/MPOG nº 02/2008 estabelece regras de fiscalização a serem cumpridas pelos órgãos ou entidades integrantes do SISG no to-cante às obrigações trabalhistas da contratada, em es-pecial no art. 34, §§ 4º e 5º e no art. 35.9

gado em: 24.11.2010. DJe: 09.09.2011.9 IN SLTI/MPOG nº 02/2008 “Art. 34. A execução dos contratos deverá ser acompanhada e fiscalizada por meio de instrumentos de controle, que compreendam a mensuração dos seguintes aspectos, quando for o caso: [...] § 4º O descumprimento total ou parcial das responsabilidades assumidas pela contratada, sobretudo quanto às obrigações e encargos sociais e trabalhistas, ensejará a aplicação de sanções administrativas, previstas no instrumento convocatório e na legislação vigente, podendo culminar em rescisão contratual, conforme disposto nos artigos 77 e 87 da Lei nº 8.666, de 1993. § 5º Na fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas e sociais nas contratações continuadas com dedicação exclusiva dos trabalhadores da contratada, exigir-se-á, dentre outras, as seguintes comprovações: I - no caso de empresas regidas pela Consolida-ção das Leis Trabalhistas: a) recolhimento da contribuição previ-denciária estabelecida para o empregador e de seus empregados, conforme dispõe o artigo 195, § 3º da Constituição federal, sob pena de rescisão contratual; b) recolhimento do FGTS, referente ao mês anterior; c) pagamento de salários no prazo previsto em Lei, referente ao mês anterior; d) fornecimento de vale transporte e auxílio alimentação quando cabível; e) pagamento do 13º salário; f) concessão de férias e correspondente pagamento do adicional de férias, na forma da Lei; g) realização de exames admissionais e demissionais e periódicos, quando for o caso; h) eventuais cursos de treinamento e reciclagem; i) encaminhamento das informações trabalhistas exigidas pela legislação, tais como: a RAIS e a CA-GED; j) cumprimento das obrigações contidas em convenção co-letiva, acordo coletivo ou sentença normativa em dissídio coletivo de trabalho; e k) cumprimento das demais obrigações dispostas na CLT em relação aos empregados vinculados ao contrato. II - No caso de cooperativas: a) recolhimento da contribuição previ-denciária do INSS em relação à parcela de responsabilidade do cooperado; b) recolhimento da contribuição previdenciária em relação à parcela de responsabilidade da Cooperativa; c) compro-vante de distribuição de sobras e produção; d) comprovante da aplicação do FATES – Fundo Assistência Técnica Educacional e Social; e) comprovante da aplicação em Fundo de reserva; f) comprovação de criação do fundo para pagamento do 13º salário e férias; e g) eventuais obrigações decorrentes da legislação que rege as sociedades cooperativas. III - No caso de sociedades diver-sas, tais como as Organizações Sociais Civis de Interesse Público – OSCIP’s e as Organizações Sociais, será exigida a comprovação de atendimento a eventuais obrigações decorrentes da legislação que rege as respectivas organizações. Art. 35. Quando da rescisão contratual nas contratações de que trata o artigo anterior, o fiscal deve verificar o pagamento pela contratada das verbas rescisórias ou a comprovação de que os empregados serão realocados em ou-

O caso concreto analisado pelo TCU

No caso analisado pelo TCU, envolvendo pregão eletrô-nico para contratação de serviços de limpeza, discutiu--se, entre outras questões, a responsabilidade dos ges-tores públicos acerca da contratação de empresa com critério de remuneração por postos de serviço, em vez de área física a ser limpa.

O Ministro Relator sustentou que, de fato, o art. 11 da IN obsta a contratação de serviços de limpeza por postos de trabalho, impedindo-se que o quantitativo corresponden-te conste do edital.

Afirmou, todavia, que os postos de trabalho devem estar fixados no contrato, no intuito de permitir que a Admi-nistração Pública fiscalize a observância das obrigações trabalhistas pela contratada. Dessa forma, evita-se a res-ponsabilização subsidiária da Administração assentada no Enunciado nº 331 do TST.

Indo além, afirmou que, para a proteção da Administra-ção Pública, é insuficiente a ciência acerca do número de trabalhadores, sendo necessário também saber sua iden-tificação e horário de trabalho, por exemplo.

Sob outro ângulo, ponderou que, na contratação de ser-viços de limpeza e conservação, a própria IN aborda o número máximo de postos de trabalho do futuro con-trato, ao determinar que o conteúdo do projeto básico deve incluir a “produtividade mínima a ser considerada para cada categoria profissional envolvida, expressa em termos de área física por jornada de trabalho ou relação serventes por encarregado”.10

Com esteio nesses argumentos, afastou a aplicação de multa aos gestores, em voto aprovado à unanimidade pelo Plenário.

tra atividade de prestação de serviços, sem que ocorra a interrupção do contrato de trabalho. Parágrafo único. Até que a contratada com-prove o disposto no caput, o órgão ou entidade contratante deverá reter a garantia prestada”.10 Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de 2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamen-to, Orçamento e Gestão. Art. 42, inc. II.

Autora do texto:• Sofia Rodrigues Silvestre Guedes

Acórdãos/Decisões referidos:• STF. ADC 16, Relator(a): Min. Cezar Peluso,

Tribunal Pleno, julgado em 24/11/2010, DJe-173 Divulgado em: 08-09-2011 e Publicado em: 09-

09-2011

• Enunciado nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho.

Normas Referidas:• Instrução Normativa nº 02, de 30 de abril de

2008, da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento,

Orçamento e Gestão.

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PROJETO BÁSICO – MODIFICAÇÃO OU OMISSÃO – NÃO CONFIGURAÇÃO DE DEFICIÊNCIA - ART. 6º, INCISO IX,

DA LEI 8.666/1993.“Não é qualquer omissão ou modificação de itens contratuais que conduz à conclusão de que o projeto

básico foi deficiente. A grave violação ao art. 6º, inciso IX, da Lei 8.666/93, necessária à aplicação da multa do art. 58, inciso II, da Lei 8.443/92, requer evidenciação de materialidade, impacto e aderência das modificações à concepção inicial do projeto como um todo, caracterizando transfiguração do objeto.”Fonte: Acórdão 1608/2015-Plenário, TC 015.696/2011-1, relator Ministro Benjamin Zymler, 1.7.2015

O projeto básico é, sem dúvidas, a peça mais impor-tante para a boa condução da licitação e condição

sine qua non para a validade do certamente que verse sobre obras e serviços de engenharia. Se ele não for bem feito, pode gerar graves problemas na execução das obras.

Dada a sua importância, a própria Lei de Licitações cui-dou de conceituá-lo e elencar os elementos que deverão estar nele contidos. Leia-se art. 6º, inciso IX:

Art. 6º Para os fins desta Lei, considera-se:

[...]

IX - Projeto Básico - conjunto de elementos neces-sários e suficientes, com nível de precisão adequa-do, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou serviços objeto da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos pre-liminares, que assegurem a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do em-preendimento, e que possibilite a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução, devendo conter os seguintes elementos:

a) desenvolvimento da solução escolhida de forma a fornecer visão global da obra e identificar todos os seus elementos constitutivos com clareza;

b) soluções técnicas globais e localizadas, suficientemente detalhadas, de forma a minimizar a necessidade de reformulação ou de variantes durante as fases de elaboração do projeto executivo e de realização das obras e montagem;

c) identificação dos tipos de serviços a executar e de materiais e equipamentos a incorporar à obra, bem como suas especificações que assegurem os melhores resultados para o empreendimento, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;

d) informações que possibilitem o estudo e a dedução de métodos construtivos, instalações provisórias e condições organizacionais para a obra, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;

e) subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra, compreendendo a sua programa-ção, a estratégia de suprimentos, as normas de fis-calização e outros dados necessários em cada caso;

f) orçamento detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados;

Existem diversas controvérsias, todavia, a respeito do nível de precisão adequado que a lei quis impor a esse projeto.

Qual nível de precisão deve apresentar o projeto básico?

O tema ainda não é pacificado e depende muito do por-te, tipo e condições do objeto licitado. Podem-se encon-trar parâmetros em normas complementares, como a Resolução nº 361/1991 do CONFEA, a qual estabelece como característica de um projeto básico a definição de quantidades e dos custos de serviços e fornecimentos de acordo com o tipo e porte da obra, de modo a permitir a determinação do custo global com precisão de cerca de 15%.

Somente com o projeto executivo é que se conhecerão maiores detalhes do serviço a ser executado. Principal-mente quando se trata de obras de grande extensão ou profundidades, cujos estudos detalhados e testes de solo/materiais se tornem demasiadamente caros ou demo-

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rados, de forma que a exigência de detalhamento com grande precisão tornaria inviável o próprio procedimen-to licitatório.

Portanto, há casos em que o projeto básico é feito com base em amostragens, o que não pode garantir níveis de precisão elevados na fase preliminar, conhecendo-se as condições reais de trabalho apenas no desenvolver da obra.

Por esse motivo, na fase de execução é que os problemas vêm à tona. A prática tem mostrado que, na grande maio-ria das vezes, é necessário promover alterações nas pre-missas entabuladas no projeto básico a fim de viabilizar ou adequar a execução da obra, pois é raríssimo haver 100% de assertividade de projeto básico.

Nesse sentido, a fiscalização de obras e apreciação do seu projeto básico exigem que os fatos sejam analisa-dos à luz das informações disponíveis à época da sua ocorrência e de acordo com as circunstâncias daquele momento, não se podendo demandar do administrador público, nas palavras de Marçal Justen Filho, “o dom sobre-humano do conhecimento futuro”1.

Neste aspecto, a doutrina2 admite que tanto os fatos im-previsíveis quanto os imprevistos, mesmo que pré-exis-tentes, podem implicar em alterações de projeto, com os correspondentes ajustes contratuais.

Leiam-se comentários da doutrina especializada que en-dossam o acima aludido:

[A] elaboração do projeto básico dá-se a partir de estimativas feitas pela Administração Pública. Tal documento, pois, não consubstancia modelo pronto e acabado, a ser meramente reproduzido pelo con-tratado durante a execução dos serviços. Pelo con-trário, é frequente que o projeto básico não resista a um exame de compatibilidade com as condições reais de campo, somente capazes de ser aferidas precisamente por ocasião da realização concreta dos trabalhos. 3

1 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contra-tos Administrativos. São Paulo: Dialética, 2010. p. 672 Vide: SUNDFELD, Carlos Ari. CAMPOS, Rodrigo Pinto de. Contratos administrativos de obras e o problema de sua alteração. In. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, ano 8, nº 28. Belo Horizonte: Fórum, jan/mar. 2010, p. 130; MARQUES NETO, Flori-ano de Azevedo. Contrato administrativo: Superveniência de fatores técnicos dificultadores da execução da obra – Inaplicação dos limites de 25% de acréscimos. In. Boletim de Licitações e Contratos, Fev./2001, p. 96 e 98; JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 13ª ed. São Paulo: Dialética, 2009, p. 752.3 SUNDFELD, Carlos Ari. CAMPOS, Rodrigo Pinto de. Contratos

Significa dizer que, ainda que o projeto básico siga os requisitos legais e seja pautado em estudos consistentes, não se pode exigir que um documento desse porte pre-veja absolutamente todos os entraves com os quais se poderá deparar, devendo sua avaliação ser pautada nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

TCU já se posicionou sobre o assunto

Nesse passo, vale rememorar julgado do TCU, no qual os estudos realizados previamente à conclusão do proje-to não puderam antever tudo o que sucedeu na execução da obra, acarretando alterações contratuais. Todavia, a Corte de Contas reconheceu a impossibilidade de apena-ção ao projetista, pois, ainda que a metodologia, naquele caso, fosse parte do projeto, não se pôde exigir que os estudos prévios mapeassem exaustivamente toda a reali-dade a ser enfrentada. Em textual:

Acórdão nº 1.762/2013 – TCU – Plenário

[...] No que atine à atualização do projeto duran-te a execução da obra [...] A alegação da unidade técnica de que a abertura de poços de inspeção nas ombreiras - providência não realizada à épo-ca - poderia ter identificado o fraturamento geo-lógico, é apenas uma suposição, que poderia não ter se concretizado. Ou seja, mesmo com a reali-zação da abertura dos poços, a fratura poderia não ter sido localizada, o que ocasionaria, fatalmen-te, a reformulação do projeto na fase de obras. Aduzo, além do já exposto, que não constam infor-mações nestes autos dando notícia de outras irre-gularidades imputáveis ao responsável, tais como desvio de recursos, superfaturamento, locupleta-mento ou má-fé, razões que se somam ao já avalia-do acima para me levar a concluir que a aplicação da multa propugnada seria de excessivo rigor, se consideradas, por si só, as ocorrências que motiva-ram a audiência de que se defendeu o ex-secretário.4

O TCU teve nova oportunidade de enfrentar o tema, cujo teor da decisão foi publicado no informativo em comento.

Entenda o caso

O Tribunal de Contas da União realizou auditoria com o objetivo de avaliar a conformidade dos contratos de re-passe relativos a obras em unidades prisionais no Estado do Maranhão.

administrativos de obras e o problema de sua alteração. In. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, ano 8, nº 28. Belo Horizonte: Fórum, jan/mar. 2010, p. 130.4 TC nº 037.494/2011-2. Ministro Relator VALMIR CAMPELO.

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Entre outras ocorrências, foi apontada a execução de contratos com base em projetos básicos deficientes ou desatualizados, motivo pelo qual a unidade técnica pro-pôs a rejeição das justificativas apresentadas pelos ges-tores, com a consequente aplicação de multa aos respon-sáveis.

Suas conclusões foram pautadas na ausência de previsão de diversos itens que caracterizariam a obra, bem como na necessidade de realização de modificações nos con-tratos logo após a sua assinatura, “ocasionadas por fatos já existentes à época da elaboração dos projetos arquite-tônicos, mas que não foram considerados”, em razão da deficiência dos projetos básicos.

O Ministro Relator, contudo, dissentiu da proposta da unidade técnica, entendendo que as evidencias colhidas pela fiscalização não eram suficientes para caracterizar grande distanciamento do projeto básico dos parâmetros de legalidade impostos pela Lei nº 8.666/1993.

Ademais, entendeu o Ministro não ter sido comprovado se as modificações realizadas geraram grandes impactos financeiros ou alteraram substancialmente o objeto pro-jetado. São essas as palavras constantes do voto condu-tor do julgamento:

Acórdão nº 1.608/2015 – TCU – Plenário

25. Acerca da realização da Concorrência 05/2008-CPL, com base em projeto básico deficiente, [...], entendo que as evidências colhidas pela unidade técnica não são suficientes para configurar um gra-ve distanciamento do parâmetro de legalidade es-perado, segundo os contornos da Lei 8.666/1993, analisada em sua inteireza.

26. No caso, verifico que a Secex/MA relacio-

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nou várias falhas nos projetos que deram causa à celebração de aditivos, mas não perquiriu se as modificações eram financeiramente relevan-tes, se transfiguraram o objeto e se constituíram ou não mera adequação técnica aos objetivos do projeto. Ademais, compreendo que não foi bem evidenciado se as alterações decorreram de circunstâncias que poderiam ser racionalmen-te previstas ou de fatos que surgiram posterior-mente e, ainda, se constituíram mero aperfeiçoa-mento do projeto que não necessariamente era falho. 27. Sobre o assunto, penso que não é qualquer omissão ou modificação de itens contratuais que conduz à conclusão de que o projeto foi deficiente. A uma porque a própria Lei 8.666/1993 admite al-teração contratual para melhor adequação técnica aos seus objetivos e para modificar quantitativa-mente o seu objeto, desde que seja atendido o limi-te fixado em seu art. 65; e a duas porque os projetos de engenharia possuem uma imprecisão intrínseca, de modo que é impossível a exata identificação de todos os seus elementos constitutivos.

28. Dessa forma, não tendo a unidade técnica se desincumbido de evidenciar suficientemente a materialidade, o impacto e a aderência ou não das modificações ocorridas à concepção inicial dos projetos como um todo, isto é, se houve transfigu-ração do objeto, reputo não comprovada a grave violação ao art. 6º, inciso IX, da Lei 8.666/1993, circunstância necessária à aplicação da multa do art. 58, inciso II, da Lei 8.443/1992. Por essa ra-zão, entendo inadequada a aplicação de sanção aos responsáveis, sendo de bom direito o acatamento parcial das razões de justificativas [...]

Note-se que o Ministro admitiu uma imprecisão intrín-seca aos projetos de engenharia, sendo impossível a in-dicação exata de todos os seus elementos.

Nesse sentido, precisa foi a sua análise de que não é qualquer omissão ou modificação de itens contratu-ais que conduz à conclusão de que o projeto foi defi-

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REEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO – REVISÃO DE PREÇOS – TEORIA DA IMPREVISÃO - ART. 65, INCISO II,

ALÍNEA ‘D’ DA LEI 8.666/1993.“Não há óbice à concessão de reequilíbrio econômico-financeiro visando à revisão (ou recomposição)

de preços de itens isolados, com fundamento no art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei 8.666/1993, desde que estejam presentes a imprevisibilidade ou a previsibilidade de efeitos incalculáveis e o impacto acentuado na relação contratual (teoria da imprevisão); e que haja análise demonstrativa acerca do comportamento dos demais insumos relevantes que possam impactar o valor do contrato”Fonte: Acórdão 1604/2015-Plenário, TC 007.615/2015-9, relator Ministro Augusto Nardes, 1.7.2015.

ciente. Ainda mais escorreito foi o embasamento de sua posição técnica à luz da possibilidade, prevista na Lei 8.666/1993, de alteração contratual para ade-quação técnica e, inclusive, quantitativa, desde que preservados os limites legais e os objetivos da obra. Atenção!

O nível de precisão e assertividade do projeto básico é analisado caso a caso. Existem inúmeros julgados do TCU que condenam gestores ao pagamento de multa e ressarcimento de danos causados em razão da elabora-ção de projetos básicos deficientes e em desacordo com

os requisitos legais.

Os responsáveis devem se atentar para que o projeto seja elaborado de forma criteriosa e por profissionais com-petentes a fim de preservar o interesse público e evitar futuros aditivos ou, até mesmo, a inviabilização da con-clusão de obra ou serviços de engenharia que, em decor-rência de tamanhas alterações, exorbitem o orçamento disponível para a sua finalização e entrega.

Autores do texto:• Jorge Ulisses Jacoby Fernandes

• Cristiana Muraro Tarsia

Acórdãos/Decisões referidos:• TCU. Acórdão nº 1.762/2013 – Plenário.

• TCU. Acórdão nº 1.608/2015 – Plenário.

Normas Referidas:• Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.

• Resolução CONFEA nº 361, de 10 de dezembro de 1991.

Conforme já visto nos comentários do Informativo nº 241, a Lei nº 8.666/1993 estabelece em seu art. 65 as

hipóteses de alteração dos contratos por ela regidos. Isso porque o contrato administrativo tem uma mutabilidade decorrente:

a) das cláusulas exorbitantes em favor da Adminis-tração e do caráter dinâmico do interesse público – alteração unilateral; e

b) dos percalços enfrentados durante a execução do contrato – por acordo entre as partes.

As dificuldades enfrentadas pelo contratado no curso da vigência contratual podem prejudicar o atingimento do interesse da coletividade, razão pela qual há uma divisão dos riscos de forma que o Estado, além dos fatos a si imputáveis, também assume os ônus por aqueles impre-visíveis que não poderiam ser imputados a nenhuma das partes.

Nesse sentido, aos contratos administrativos aplica-se a “Teoria da Imprevisão” que tem como seu principal vetor a proteção da equação econômico-financeira da avença. É dizer que, seja por ação ou omissão do Esta-do — material ou jurídica — ou por fatos imprevisíveis

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em geral, se essa estrutura econômica inicial da relação contratual for alterada, deve-se procurar restabelecê-la, seja em favor do particular ou da própria Administração.

O reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos é nor-ma constitucional, inafastável por vontade das partes, nos termos do art. 37, inc. XXI, da Constituição Federal, do art. 478 do Código Civil e do art. 65, inc. II, da Lei de Licitações.

O não reestabelecimento da equação econômico-finan-ceira pode caracterizar o enriquecimento ilícito de uma das partes e ensejar a rescisão contratual.

Da álea ordinária

Note-se, porém, que a álea ordinária ou empresarial, ine-rente a qualquer tipo de negócio, não pode ser abarcada pela Administração. Significa dizer que circunstâncias previsíveis; imprevisíveis, mas de resultados contorná-veis; ou de pequenos reflexos econômicos não autorizam modificações contratuais.

Na esteira desse raciocínio, se o licitante tiver ofertado preço que não seja suficiente para cobrir os custos da execução da avença, não há o que se falar em reequilí-brio de contrato que já nasceu com equação econômica desequilibrada.

Da álea extraordinária

Apenas a chamada álea extraordinária autoriza o ree-quilíbrio contratual, seja ela oriunda da Administração – alteração unilateral ou fato da Administração –, ou econômica – proveniente de circunstâncias externas ao contrato e às partes. Veja-se:

a) álea administrativa:

a.1 – alteração unilateral do contrato: mo-dificação qualitativa ou quantitativa do objeto, observados os limites percentuais impostos nos §§ 1º e 2º do art. 65, inc. I, da Lei de Licitações – ex.: alteração de projeto;

a.2 – fato da administração: ação ou omis-são ilegítima da Administração contratante que atinge diretamente a relação contratual – ex.: não entrega do local da obra;

a.3 – fato do príncipe: determinação geral e imprevisível da Administração contratante que de forma reflexa afeta o equilíbrio econômico--financeiro do contrato – ex.: superveniência de nova lei ou alteração tributária;

b) álea econômica:

b.1 – Teoria da Imprevisão: todo aconteci-mento externo ao contrato, estranho à vontade das partes, imprevisível e inevitável, que causa desequilíbrio considerável e torna a execução demasiadamente onerosa ao contratado. Cha-mada de cláusula rebus sic standibus, determina que, por um lado, a ocorrência de circunstâncias excepcionais não pode afastar as obrigações do contratado, e, por outro, não seria justo que ele respondesse sozinho pelos prejuízos ocorridos para que um contrato de interesse de toda cole-tividade seja executado. Dessa forma, o Estado assume as consequências do imprevisível;

b.2 – fatos imprevistos: são fatos materiais ou incidentes técnicos já existentes no momento da contratação, mas desconhecidos – ex.: uma rocha insuspeita encontrada após início das es-cavações.

Para a aplicação da Teoria da Imprevisão aos contratos administrativos é necessário que os fatos sejam: 1) im-previsíveis, ou previsíveis, mas de consequências incal-culáveis; 2) estranhos à vontade das partes; 3) inevitá-veis; e 4) causadores de significativo desequilíbrio do contrato.

Diante das áleas acima descritas, preferencialmente, deve-se manter a equação econômico-financeira do con-trato, porém, caso não seja possível, pode-se rescindi-lo, conforme hipótese descrita no art. 78, inc. XVII, da Lei nº 8.666/1993.

Entenda o caso

Trata-se representação formulada pela SeinfraRodovias questionando a legalidade da Instrução de Serviço DG nº 02, de 23 de maio de 2015, expedida pelo Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte – DNIT, que “es-tabelece os critérios para o reequilíbrio econômico-finan-

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Autores do texto:• Jorge Ulisses Jacoby Fernandes

• Cristiana Muraro Tarsia

Acórdãos/Decisões referidos:• TCU. Acórdão nº 1.604/2015 – Plenário.

Normas Referidas:• Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.

• Constituição Federal da República Federativa do Brasil, de 1988.

• Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.• Instrução de Serviço DG nº02, de 23 de maio

de 2015.

ceiro de contratos administrativos decorrente do acrésci-mo dos custos de aquisição de materiais betuminosos”.

O DNIT expediu a referida norma em decorrência do anuncio realizado pela Petrobras no final do ano de 2014 sobre a alta nos preços do insumos asfálticos.

A unidade técnica entendeu que não se poderia promover o reequilíbrio econômico-financeiro apenas por meio da análise de preço de apenas um insumo em separado, pois esta particularidade não encontraria lastro legal.

O ministro Relator, todavia, entendeu que o fato de a Petrobras, como reguladora dos preços de mercado dos insumos asfálticos, ter promovido a elevação dos preços de forma imprevisível e anormal, chegando a mais de 30% de acréscimo sobre os patamares anteriores, confi-guraria os requisitos do art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei nº 8.666/1993 ensejadores do reequilíbrio dos con-tratos administrativos nos quais esses insumos tivessem impacto significativo.

Ressaltou o Relator que não se trata de autorização am-pla e irrestrita de revisão dos contratos em favor da au-tarquia, mas a possibilidade de reequilíbrio para aqueles casos em se demonstrassem alterações de preços signifi-

cativas e imprevisíveis ou previsíveis, porém de conse-quências incalculáveis, capazes de justificar a aplicação da teoria da imprevisão.

Nesse contexto, concluiu o relator que:

a) não há óbice à concessão de reequilíbrio eco-nômico-financeiro de contrato administrativo, vi-sando à revisão (ou recomposição) de preços de itens isolados, com fundamento no art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei 8.666/1993, desde que:a.1) estejam presentes os requisitos enunciados pela teoria da imprevisão, que são a imprevisibilidade (ou previsibilidade de efeitos incalculáveis) e o impacto acentuado na relação contratual; a.2) haja análise demonstrativa acerca do comportamento dos demais insumos do contrato, ao menos os mais importantes em aspecto de materialidade, com a fi-nalidade de identificar outras oscilações de preços enquadráveis na teoria da imprevisão que possam, de igual maneira, impactar significativamente o va-lor ponderado do contrato.

Isto está a evidenciar o reconhecimento da Corte de Contas de que a alteração de preços unitários de forma abrupta, imprevisível e que gere significativos impactos financeiros ao contratado poderá ensejar o reequilíbrio econômico-financeiro previsto na Lei de Licitações e garantido pela Constituição Federal.

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