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EDITORA

Conceição Bernardino

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Dedico este livro à minha querida mãe, que fez de mim a mulher que sou hoje. A uma menina muito especial que mora no meu coração, minha sobrinha Cátia. Aos meus queridos amigos e familiares.A um escritor de grande prestigio que sempre esteve a meu lado David Santos. Agradeço profundamente à minha melhor amiga Isabel Pereira pela coragem e determinação que sempre depositou em mim.

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Alma Poética Conceição Bernardino

Amor e Ódio

Odeio-te!Como te poderei odiarSe te amo tanto?!Odeio-te,Tu és o sol que se oculta nas nuvens da indiferençaE que provoca todo este dilúvio de sentimentosQue me fatiga e enlouquece

Odeio-te!Tu eras o sonho que se deitava comigo,Eras luz da esperançaQue entrava pelas janelas abertas da minha almaTodas as manhãs.

Odeio-te!Eras o sonho estéril e malditoAs marés encrespadas, o naufrágio,Do meu pobre barquito.Odeio-te!De tanto te amar...

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Crianças sem Rosto

Quantas crianças no mundo esperamPelo pão da esperança,Estendendo as mãosÀ desbasta miséria, esperandoApenas dela a sua sobrevivência.Quantas são aquelas, queMorrem sem conheceremOs horizontes ofuscantes da vida?Tristes daqueles que nascemDo ventre da desgraça queTanta pobreza lhes é oferecida.Que liberdade é a nossa?Que deixa a morte escreverNa miséria os nomes dos pobres.

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A Flor do Sonho

Quando o luar beijar a terra adormecidaE as guitarras do vento gemeram baixinhoTu virásComo sempreNa forma de um lírioBranco como a neveEnfeitar o meu sonho

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O teu Olhar Mãe

Esse olhar teu,Não sei que tem...Faz-me lembrarAquele olharDa Santa mãeQue está no céu

Tão meigo e triste,Faz-me cismar...Só lá no céuEncontro eu,Algo que existeNo teu olhar!

Olhar que encanta,Que cura a dorOh meu amor,És uma Santa!

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Rugas Famintas

As rugas silenciamO rosto,Naquele banco de jardimJogam-se cartas,Fumam-se mortalhasRecordam-se dias vividosDe uma mocidade já perdida.Sol sobre sol,A enxada era uma companhiaTalvez a melhor amigaSemeando o trigoEm troca de uma malga de sopaE um pedaço de pãoRugas que silenciam,A solidão a pobrezaDaqueles que,A humanidade abandonaQuando já não servemA nossa nação...

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Primoroso

Se eu pudesse,Pintar o mundo com as tuas cores preferidasLimpar essa cor negra que te envolve,O olhar...Faria com que todos reparassemQue ainda lá mora,Aquela menina,Que brincava na escola...A que chegava a casaSempre com um sorriso enorme,Só para não nos ver chorar...

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Perdição

Hoje não apetece dizer nada,E do nada fecho-me em tudo

Um tudo de não falar nada,Um tudo tão cheio de nadaJá nada me faz sentir

Já tudo invejo em redorJá não consigo dar nadaDe tudo que não tenho

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Quem...

Já não julgo quem me julga, quem me difama, Ou me censura.Quem já não foi censurado?Quem já não foi humilhado?Quem já não foi torturado ou até mesmo violado?Será que alguém me consegue responder...E quem me vai insultando!Eu carrego as palavras...Num livro multifacetado de sincera postura.

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Erudição Imperfeita

Passos que já ninguém escuta!Passos vazios recalcamO silêncio das pegadas,Que já não me acompanham mais.Sinto o fardo da tua mão,Entre os meus ombros caídos.A minha boca cala-se,Sufoca os gemidos!Já não consigo olhar para trásPerdi o meu pensamento.Vou, deambulando por aíComo quem anda perdida,Como quem perdeu a vida,Vou caminhando...Até que alguém me digaO que fazemos por aqui...

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Meretriz

Soltas novamente,Os teus cabelos nas suas mãos,Sussurram-te palavras de prazer maldito,Fingis que ouves,Balanças-te no seu corpoEm sorrisos cálidos!Tentas enganar o teu corpoA tua indigência fala mais alto...Deixas-te cair mais uma vezNaquela cama nojenta,Feita de lençóis suadosViciados de orgasmos.A rotina já te cansaOs teus dias são o purgatório!Devaneias a miséria!Já sentes o frio...Quando ao fim te dão uns trocados.

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Esperança Muda

Às vezes apetece-me gritar!Nem sei bem porquê,Pelo elementar prazer de ser mulher,Pela pulcritude de sentir e viver,Por sentir a levezaDe um corpo confortávelDeitado sobre rosas perfumadasNum sítio qualquer,Onde alguém me quiser...Às vezes apetece-me fingir!Que sou a mais perfeita,Um cisne bem estruturadoCheio de vaidade, marcante,Bailando despido de ambiguidadeIgnorando um mundo pedanteÀs vezes apetece-me!Ter tudo ao mesmo tempoUm sopro do imaginário,Uma boneca de trapos colorido,Um sorriso desenhado,Nesse teu ser dolorido...

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Ajudem-me!

A semear a alegria, em campos abertosPor este mundo fora.A dar sorrisos aos molhos,Aos famintos que devoram a esperança.A exaltar o amor,Aos despidos da confiança.Ajudem-me...Por favor,Apagar essa dor que gagueja,Em lábios sedentos de vingança.Ajudem-me,Simplesmente a ajudar!

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Nas minhas Mãos...

Deslizo no teu corpo...As minhas mãos trémulas.Percorro as linhasDe uma escultura prefeita,E no suor da tua pelePerco o medo de sentir.Um momento únicoDe cada segundo que passa!Nos meus dedosLevo a inocência,De um amor banidoQue se oculta, Na textura do prazerO estado natural do inconsciente.Deslizo no teu corpo...As minhas mãos pertencentesDas sensações deslumbrantes,Que a minha boca calaNum beijo único.Dois corpos despidosQue se enaltecem de formosuraNas minhas mãos...

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Além de Mim

Choro, porque o meu olhar me obrigaA chorar a despedida, de quem já não choraPor quem já cambaleou e o desespero mendigaAs carícias que me roubaram, outrora

Choro, já nem sei bem o porquê, o motivoÀs lágrimas suplico uma réplica de gratidãoSó para me encontrar, mais uma vez contigoAqui ou em qualquer lugar, na imensidão

Já me caí do olhar azul o meu pranto,Uma vergonha insana de loucuraO desejo, desta forma de te querer tanto

Caí no meu rosto uma abusiva alacridadePor uns segundos parei, recordei, guardeiA mais bela história de toda a perpetuidade

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Acróstico de Amor

Beijo os teus lábios sublimes

Encarnados, selvagens como frutos silvestres

Renasço de novo no teu corpo suado

Navego em perpétuo pudor enamorado

Amando, destemidamente esse teu ser pervertido

Rasgas-me a roupa, desejas-me tua

Degenero-te como se fosse pura

Invejo-te, porque nunca fui de mais ninguém

Nasci da perdição sem preconceito

Oh meu amor cada vez te desejo mais em profundo pecado!

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Aprazimento

Quero partilhar contigo,Este corpo que um dia sucumbirá sem piedadeSobre as réstias de um jardim qualquer.Quero ter a certeza,Que voltarás a ser meu a qualquer momentoPara além de tudo que é vida, firmamentoQue nunca serás de mais ninguém.Quero-me deitar,Nos teus braços todas as noitesSer tua amante a tua melhor amiga,A tua rameira.Não importa!O que eu quero,É ser simplesmente tua...

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Acróstico da minha Progenitora

Mãe, mulher entre as mulheresAbençoada sejas minha mãe!Robusto rosto, abençoadaInédita de coração robustoNascida de sabedoria inéditaAlvor da terra nascida.

Mãe, a mais perfeita Autónoma de sua mãeNatural, amiga, autónomaUniversal, empreendedora, naturalEspecial num mundo universalLeal, admirável, especialAmo-te minha mãe...

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Insanidade Perfeita

Sinto-me cansadaJá me faltam as palavras!As que saboreio entre dissaboresDa minha própria loucuraJá não sinto o meu corpoAs vogais consomem-noAdormece em brandas consoantesFicam tantas frases por dizerAquelas,Que já não consigo escrever,Falta-me a forçaA caneta começa a tremerSoluça.O meu olhar constróiO que meu pensamento rejeitaEsta sou, euA doce mulherA insana, poeta...

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Confissão Vedada

Luz,Tu que seduzes a escuridão Em qualquer madrugadaProvoca-me!Desafia os meus desejosCarnais e divinosIncendeia o meu amorDespe de mim esta negruraQue me amarraO sedento erotismoEu quero ser tuaDe qualquer forma de qualquer jeitoLuz!O ventre já debela a sede de te sentirNão me deixes aqui...Não partas sem mimEu quero sentir a todo o momentoQue a ti pertenço Luz,Que me cegaste por amorGuia-me!Nos braços de quem tanto me querNunca o poderei revelarMas também nunca o irei esconder

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Prioridade Solene

Não me peçam!Para fechar os olhos,Para silenciar,O que escrevo, o que sinto.Não me obriguem!A calar,Esta voz eloquenteQue denuncia a dor,De um corpo que não sabe falarDe um corpo que não se pode mexer.Deixem-me gritar!Foi este o estiloQue encontrei,Entre vegetar e viver...

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Vago Prematuro

Encanecida de belezas breves,Pedi ao tempo que se calasseQue fosse embora...que me deixasse,Um vago prematuro de rugas leves.

Afagos, recordei em lacunas débeis,Se outrora tivera quem me amasse!O corpo angélico não deixou...que voltasse,Aqueles momentos belos, férteis.

Choro a mocidade que não volta mais,Porque não espero de jamais voltarAgora que já não te servo...vais.

Queria ficar eternamente contigo! Mas tu foste passando despercebido,Traíste-me sem piedade… bandido.

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Outono

Já começam a cair as primeiras folhas,Sobre o meu corpo envolventeVestem a minha nudez, ardenteDe mil cores, o vento faz as escolhas.

Já sinto o orvalho com que me molhas A minha alma absorvente,Sento-me no teu colo reluzenteAconchegada, valiosamente nas tuas malhas!

Que eu vou tecendo em harmoniaAs vestes de um licor suave,Que eu bebo para brindar a alegria

De te voltar a ver, espirituosa De áurea... prata dourada,Sempre tão elegante, tão formosa!

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Desafortunada

O fogo arde imaturo... eu sei!Quanta lágrima, minha demência,Quis calar na tua ausênciaAs promessas que te furtei.

A cegueira traiu-me...quebreiAo julgar-te já indulgência,Da minha doce inocênciaDe um amor que enganei.

Perdoa-me se me entregueiA um inconstante delírio,Já te pertencia, arrisquei

Agora vagueio por aíNa quietude da inexistência,Procuro-te, mas nada sei te ti!

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Delírio

Tinha urgência em ser mulherUma vontade animalesca Que possuía o meu corpoNum fogo de prazer.O cio do venenoQue todos queriam ter.Já não sentia a diferençaSer deste, ou daqueleApenas queria ser mulherA mais amada...A mais impura...Aquela que se entregava ao amorSem nada receberEu era aquela,A que ansiava, ser apenasA tua mulher!

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Diferenças sem Esperança

Se a humanidade esquecesse as diferençasAs raças se juntassem,O mar era só um e o céu seria de todosDeus, seriamos nós,

Um só gesto, uma só vozUma lágrima esquecida,Em cada rosto sofrido, angustiadoUm retracto penduradoNa parede do passado

O mundo seria de todosA verdade só, umaUma rosa perfumadaEm cada janela aberta.

Como é bom sonhar, Com um mundo realQue vive apertado,Dentro do meu peitoHá espera de ser libertado

Nós fazemos a diferença,Quando deixamos de ver,Somente com o olharSe soubermos escutar,Sem nada dizer, Palavras para quê?

A humanidade seria bem melhorSe ouvisse melhor,Aquilo que não consegue ver.

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Úrano e Plutão

Foste feito para mim Meu doce veneno!Transformaste as ruínasDa minha triste vidaNum belo casteloEsse teu veneno De sabor a melQue morde mas não mataEnche-me de luzCobre-me de prata.

O mar abriu-seNas dunas de um desertoE tu a minha sedeDe viver cada momentoDeste-me esse doce venenoEspelhado num escorpiãoSempre tão forte Eu entreguei-te o meu amorNo reflexo da tua fragilidadeCruzaram-se as sombrasEntregaram-se os corpos Dentro dum aquário de paixãoEu, Úrano e tu, PlutãoNum imenso céu só nosso

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Guerra dos Sentidos

O mundo traiu-me Numa destemida encruzilhadaAs torres surgiram lá do céu Fiquei presa entre pedras aos montesEntre a sujidade e a lamaNesta incógnita Chamada raça humana

O mundo tornou-seNum jogo de xadrezMexem-se os peõesO cavalo defende a rainha Xeque-mateVencida a altivezA vergonha defende-seEsconde-se na pequenezDos indefesos

O mundo castigou-mePrendeu-me à TerraNesta imensa guerraDos sentidosJá não sei o que sentirQuando já nada faz sentidoAinda sou uma vencedoraNo meio de uma raça já vencida

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Moldura sem Corpo

Sou prisioneira Nas grades de um corpoAlgemado às vontadesDe uma vida que não é minha

Fechada numa molduraPresa a um espelhoMarcada por númerosCondenada à argúcia

Sou prisioneiraDe um relógio de pontoDe um calendário De páginas envelhecidasAs horas de rotinaSepultada nas obrigaçõesNos deveres cívicos

Sou prisioneira de mimDentro da liberdadeDa minha almaDa minha menteOnde não existe passadoFuturo nem presenteApenas liberdadeDe ser eu mesma

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Deslumbramento

Chove torrencialmente Eu caminho numa praia desertaDescalça abraçando a chuvaDanço ao som do marEntrego-me aos céusAs estrelasEmbalam-me na belezaQue deslumbramentoQuanta luz aqueceO meu corpo frio de alegriaA chuva cobre-meVai matando a minha Sede de viverCaio na exaustão Da liberdadeComo estas pequenas coisasMe enchem de paixãoA simplicidade da chuvaDe uma noite inesquecívelCobrem a minha vidaCom tanta energiaSustentam os meus sonhosMais reais

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Sonho Cristalino

Quando fecho os olhosSinto o silêncio da tua alma no meu corpoE a brisa fresca da noite gela-me os sentidosPerco a noção da vida, esqueço-me de viver.A madrugada leva-me longe,Longe do mundo e da saudade,Dos gritos frios da monotonia.Quanta calma, quanta pazAbraça o meu cansaçoE despe de mim as roupas da nostalgiaLá longe não sei aonde, aonde tudo é cristalinoComo as águas que nascem no horizonte.Os desejos são eternos e as vontades mendigamSão como a luz de quem não vê e os olhosQue tudo invejamQuando fecho os olhos, não durmo, viajoPara lá da eternidade...

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Espelho de Palidez

És o auge da minha timidezA sombra do meu pecado,Raiz da minha sementeFruto áspero e amargo.

O eu do meu ser caladoA rigidez do meu corpo erguido,A calúnia do meu erro cometido.Célula do meu sangue envenenado.

És ser do destino falsificadoIlusão, de todo meu passadoBrilho no meu cabelo molhadoPedra que no meu sapato entrouQue me atormentas no caminho.

Sorriso no rosto meu desenhadoEspelho de palidezSuado de imaginação,Gasto e tão usado.

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A Estrada da tua Luz

Hoje meu paiTe trago no sonhoNo pensamento e no brilho do meu amorNa estrada infinita da minha alma

Hoje meu paiAs saudades batem-me à portaVejo-te chegarAs portas do céuRenascem do teu olhar

Quando essa porta fechaBrilho teu, no meu destinoAmor sagrado e divinoNos ergue de mãos dadasNas dimensões do nosso caminho

Não há paredesNem fronteirasQue nos façam separarApenas luz da luz sagradaQue nos une em amar

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Inexplicável Voz

Quero ver e sentirA rigidez,Desse teu sonhoNavegar pelas ruasDespidas e sósOuvir o grito da tua voz.

Quero, quero admirarA força da tua sombraNo silêncio julgadoDa muda mentira.

Quero ser,Um pouco do teu brilho no arA razão do teu velho caminharSer uma pedraDo teu alicerce nascido.

Quero sentir,Sentir o meu fruto floridoNos galhos da tua solidãoQuero de, ti vidaSer julgada e ouvidaPela abstracta razãoDe viver.

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Caminho Descalço

Fui eu que caminhei descalçaPor entre espinhosE roseiraisFui eu que caminheiPor ruelas e pinheiraisSem nunca me magoarMas tanto sangrar.

Fui eu que caminhei descalça,Sobre vidros e punhaisEntre guerras,Lágrimas fatais

Sou eu, a lutaQue ao mundo chegou descalçaEntre o frio e a fomeSou eu,A descalçaQue vivo entreAs almas imortais

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Meu Irmão

Meu irmãoNa leveza do teu serFeliz o dia que gritasteNa liberdade de nascer

Transformas-teO sonho estérilNa flor da realidadeNo florir do teu amor

Meu irmãoFoste tu essa luzVinda do céuQue iluminouO ventre da solidão

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Licor Amargo

Desenhei a morteNum jardim,De rosas,Perfumei-aNum penumbrosoLicor amargo,De espinhos suculentosQue me sufocavam,Na sede de viver.

Desenhei-a,Despida e sombria,Tépida,Aspa e dorida.A morteQue todos fogem.A morte findaO corpoSe faz em pó.Morte, vida,De quem nunca viveu.

Ao nascer tememosO tristeEspelho da morteNas ruínasDe um sentimentoEm folhas secas de sorte.

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Fatiga

Cansei,O meu cansaço na saudade,Nas folhas secas do chão.Cansei, a esperançaNa triste pedraNo túmulo da desilusão.

Cansei!No meu cansaço as PrimaverasDe uma melancólica infância.No nevoeiro da fantasia,Chorei numa criança,Um desprezo de alegria.

Cansei,No meu cansaço a liberdadeDe um sonho adormecido,Nas grades da independênciaDe um falso rumo prometido.

Cansei,No meu cansaço, cansei!Essa tristonha menina,Com rosto sofrido de mulher.

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Noite Oculta

Esta noite, meu amor

Em que o luar nos oculta,

Tu virás te deitar

No meu sonho

Enfeitado de luz

Que te espera no mistério

No auge do reino do prazer

Tu serás o meu império

Eu, uma escrava,

Servindo os desejos

Do teu cálido ser.

Enfeitando-te de jóias

De tesouros e fantasias

Dando-te a luz, um sol

Um novo dia.

Esta noite, meu amor

Em que as vertigens

Gritaram lá do alto,

Eu subo ao céu

Leve como um pardalinho

Procurando o teu corpo de Primavera.

Para me espreguiçar

Na tua doce manhã,

Perfumada de juventude.

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Esta noite, meu amorTu virás...Como sempreNo brilho de uma estrelaLá longe, do universo,Tu virásAdormecer em minha almaPara iluminar o meu sonho.

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Sentido Calado

Sinto,Sinto que nada mais sinto euPara além,Da leveza do tempoDesse tempo que se escoaEntre as minhas palmas das mãos,Entre as pedras caladas da rua,As noites escuras,Onde o mistério se oculta, nosOlhos belos da lua.Sinto, sintoQue nada mais eu sintoDiante destes gritos ávidos,A loucura separa-nosNo reino dos sentidos.Que me importa ouvir asSinfonias melódicas de um bastoAmor platónico,Se fizeram surdos os meus ouvidos.Sinto,Fiz-me sentir também,Mas todos me fizeram sentir porémUm mero serDo nada de ninguém...

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Revelação

Tu estás aliNa voz triste do marNo colear das ondasNa brancura luminosa da espumaTu estás aliOnde tudo é azul e severoNo esplendor do falecer da tardeTu estás aliGritante e belaEntre o céu e o mar

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Mundos Opostos

Vivo em mundos diferentesMundos que se repelemMundos que não se enquadram.Que se afastem as palavrasDe quem apenas usa a falaQue se afastem os olharesOs quais tudo olham e nada sentemFaz-se silêncio!E tudo em meu redor choraPorque nestas palavras moraA alma de um corpo falecido.Quanta indiferença Existe do outro lado da rua.Tanta gente passaNinguém reparaQue a Terra está a ficar nua.

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Danúbio

Quanta raiva, quanta misériaTudo isto me enfurece Tudo em mim desvaneceEntre as ruínas da mágoaDeixei fugir o meu serQue fui eu fazer?Se não espelhar o meu amor no teuLevaste o que eu tinha de mais beloAquela menina cheia de alvores.Que dançava entre as nascentesE as marés!Que fui eu fazer?Se não naufragar a teus pés

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Puberdade

Aqui jaz uma meninaQue adormeceu pela madrugada foraSem dizer adeusQue seguiu a luzA que os olhos não alcançamEntregando o seu amor a DeusAqui jaz quem jamais se esqueceráDaqueles que ama

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Obsessão

Voltem o rosto!Olhem para o horizonteNascem rebentos aos molhosSafiras incandesceramA puberdade é cristalinaE os amores inocentes

Voltem o rosto!Olhem os campos verdesSem fim.Olhem nos meus olhos,Quanta saudade mora em mim...

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Desespero

Eu queria ter os DeusesE a Terra...As palavras soltas na boca,O riso preso no rosto.Queria ser a mais belaA desejada, aquela que passaSem ter que fugir...A sedutora das luasNovas do céu, a que,Caminha nua cobertaPor um véu...Eu queria ter os olhosVerdes do mar para,Poder chorar lágrimasDe espuma branca Na despedida...Eu queria ser a noivaDe um sol perdido,Para me deitar na alvorada.Eu queria ter asas e voarPara poder fugir com aMadrugada...

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O Império da Pobreza

Rezem às almasDaqueles que criaram o impérioDos que descobriram a liberdadeO rumo da pouca sorteOs que navegaram os oceanosE encontraram a morte.Rezem ó vozes da pátriaE encontrem os caminhosDaqueles que naufragaramSem destino, em busca da glóriaDos que saíram do caísEm pequenas caravelas,Dos que partiram para láDos céus.

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Dormente Eco

Há em mim um espaço fundo de serAlgo que não existe, algo irrealAlgo escondido no oculto no anormalQue me espera quando eu não partoQue me seduz, quando eu não queroHá algo em mim que eu escutoQuando melancólica estouNão sei o que ouço, não sei paraOnde saio para onde vouHá algo em mim que se manifestaQuando calma sou, talvez porque nãoEstou ausente, talvez porque nuncaCá estive presente.

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Fúria

O silêncio do teu corpoCala na minha alma a sensatezDe um prazer adormecidoSolta ao meu olhar,Uma nostálgica liberdadeDe viverDando mais e maisSentido há razão inefávelDe te entregar todo o meu ser

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Lúcida Vontade

A brisa do marAdormeceu em minhas pálpebras O meu olhar tornou-se longínquo, perdidoQuerendo calar a saudadeQue se atravessava diante de mimAo sentir-te tão perto mas distante,Distante do meu desejoQue ali se fazia prisioneiro,Esperando pela tua liberdadeCalou-se-me a vozGelavam-se-me os sentidosA branca espuma do marLevava-me ao teu encontroDeslumbrou-se o meu olharAo ver-teOlhei-te, senti-te,Amor,Foi então que te encontreiNas lágrimas amadasQue me corriam pelo rosto

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Pedras Adormecidas

Pedras só pedras se levantamPor esse mundo fora,Por esses jardins em que o silêncio ocultaA indefinida palavra,Que voz nenhuma tão alto alcança A dimensão da obscuridade permaneceEm sigilo profundoQue ser algum se não o rei do mundoComanda as portas largas apodrecidas Que tantas vezes se abrem.E cá ao olhar tantas pedras adormecidasPerguntas se fazem sôfregas de curiosidadeBem lá às profundezas dos céus.De um corpo sólido erguidoLarga-se, se não só em poeira esquecidoDe quem a alma se soltaDe quem a alma partePedras e só pedras se levantamSempre que alguém tem fomeSempre que alguém tem medoSempre que se ouve um gritoSempre que a morte chama...

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Silêncio Profanado

Silêncio que o mundo ignoraA mudez de uma delinquênciaMal definida, amargaDe se beber azeda para se ingerir

Quando se calam os olhosA boca se fechaDesdita a palavraQue nunca se falaSilêncio

Esta palavra maldita, Que corrói as feridasDe um corpo mal cicatrizadoCalam-se os ouvidosJá não consigo ouvir mais nadaO silêncio levou-me tudoEm troca do nada

Quem entenderá isto?Sem saber que as palavrasPor vezes não dizem nadaQuanto falo eu,E agora, Alguém me ouviu?Alguém me entendeu?

O silêncio já não me deixaFalar, tanto que eu faleiMas ninguém percebeuQue ouvir,Vale mais que uma única palavra

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Receita Conceituada

Junte 300 gramas de sinceridade, com engenho q.b.Adicione meia dúzia de sinónimos e vá mexendo lentamenteAté formar uma massa consistente de palavreadoEspalhe uma arroba de folhas recicladas sob um tabuleiroE deixe cozer em lume brando por vinte minutosDepois salpique com eufemismos e metáforasEnfeite Use a imaginaçãoCom uma crónica, poema, piada ou indignaçãoObterá um pouco de escritaSe a confecção lhe correr mal não desespereVá lá, não desistaVolte ao início e repita

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Recolher Obrigatório!

Já não consigo ouvir aquelas malditas sirenesQue sangram nos meus ouvidos o ruído da morteA correria daqueles gritos que dizimam os meus sentidos,Os horrores das mãos carregadas de granadasAs rajadas dos morteiros amaldiçoadosQue disparam a toda a hora a nociva matançaDe uma pronunciada guerra.Malditas, malditas!Sejam as atrocidades que se cometemPor falsas razões e verdadesDe povos que se distinguem apenasPor meras fronteiras e crençasNa diferença das igualdadesO Líbano disputa o sangue que Israel amordaçaNo maldito ódioQue fomenta a desgraça.Ouçam de uma vez por todas!Os gritos que desvanecem em ogivasQuantos daqueles padecemEm prol das nossas guerrasMata-se sem medidaComo se fosse uma praga, uma pesteDe insectos que desbastam campos de trigo.

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Amar-te-ei...

Corre-me nas veias,Confesso!Esta forma subtilEste desejoEsta vontade.Contesto!Essa necessidadeQue a minha nudez, anseia Na sombra do teu rosto.Arremesso!Os gemidos de prazerQue calo em mim,Através do teu beijo.O beijo que adulteraQue me engana...Menosprezo!Qualquer tormentoVem! Procura, Esta impudica Que te chama...

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Indolência

O sentimento é o reversoAo que se dissertaEm palavras estéreis, ocasJulga-las por demaisSenti-las jamaisNão passam,De uma dor loucaQue a imposturaVai saciandoDevorando de qualquer formaA alma de quem sente

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Um Grito de Ódio

Humilhaste o meu corpo despidoEstropiaste o meu ventre Roubaste-me a inocênciaImpiedoso violadorQue te escondes na fraca doença Usaste-me como se eu fosse um trapoDespedaçando aos poucosO meu sonho de criançaAgora olhas-me nos olhosComo quem olha um jogueteJá não sou o teu preferidoAmadureci repleta de nojoAmparada pela vingançaJá não sou maisAquela menina indefesaQue te condenouEm liberdade condicionalAgora passei a ser No teu dia-a-diaO teu pesadeloA tua sombraO teu rótuloSujo de pedofilia

Este poema é dedicado a todas as crianças, que foram vítimas de pedofilia germes.

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Inocência

Carreguei-a nos braços!Tremula, desfalecida,Apertei-a contra mimMas ela não resistiu...Morreu,Partiu.Prematura, descalça,A fome levou-aAinda menina,Ainda criança...

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Reflexos

Se pensas que consegues ver, entãoApaga a luz...Os olhos perdem-se na escuridão,Porque a verdadeira luz está naNossa mente,Procura-a...

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Mulher

Quando me olho ao espelhoVejo o meu corpo de mulher,Tão frágil e subtilDispo-me da belezaCobro-me de inocência,Quero voltar a nascerQuero sentir de novo a fecundaçãoIgnorar o preconceito,Voltar a ser um pouco de vidaNo teu ventre de mulherGanhar a mesma formaDelicada, ternurentaDo teu seio que me amamentaNa forma mais sedentaO meu corpo é o teu corpoAquele que quis terOrgulhosamente Nasci mulher!

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Índice

Amor e ÓdioCrianças sem RostoA Flor do SonhoO teu Olhar MãeRugas FamintasPrimorosoPerdiçãoQuem…Erudição ImperfeitaMeretrizEsperança MudaAjudem-me!Nas minhas Mãos…Além de MimAcrósticos de AmorAprazimentoAcróstico da minha ProgenitoraInsanidade PerfeitaConfissão VedadaPrioridade SoleneVago PrematuroOutonoDesafortunadaDelírioDiferenças sem EsperançaÚrano e PlutãoGuerra dos SentidosMoldura sem CorpoDeslumbramento

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Sonho Cristalino

Espelho da Palidez

A Estrada da tua Luz

Inexplicável Voz

Caminho Descalço

Meu Irmão

Licor Amargo

Fatiga

Noite Oculta

Sentido Calado

Revelação

Mundos Opostos

Danúbio

Puberdade

Obsessão

Desespero

O Império da Pobreza

Dormente Eco

Fúria

Lúcida Vontade

Pedras Adormecidas

Silêncio Profanado

Receita Conceituada

Recolher Obrigatório!

Amar-te-ei…

Indolência

Um Grito de Ódio

Inocência

Reflexos

Mulher

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Alma Poética

Conceição Bernardino

Ex-Ricardo dePinho Teixeira

Paulo Cruz

Cromotema

978-

Março de 2007

989-617-

Título:

Autora:

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Impressão:

ISBN:

Depósito Legal:

1ª Edição:

www.corposeditora.com

Colecção Segundas Salivas

EDITORA

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