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1 CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO N 0 16315-0900/07-9 ORIGEM: Conselho Superior do Ministério Público INVESTIGADO: MST – Levantamento de dados sobre suas atividades no Rio Grande do Sul CONSELHEIRO-RELATOR: Dr. Gilberto Thums Senhores Conselheiros: 1. Trata-se do procedimento administrativo instaurado a partir de determinação do Egrégio Conselho Superior do Ministério Público para realização de levantamento de dados sobre as atividades do MST (Movimento dos Sem Terra) no Estado a fim de adotar providências cabíveis na esfera de atuação do Ministério Público Estadual. Foram designados os Doutores Promotores de Justiça LUCIANO DE FARIA BRASIL e FÁBIO ROQUE SBARDELOTTO para o cumprimento do encargo, conforme Portarias de fls. 5 e 6. Doravante serão mencionados no presente relatório como Investigadores. O primeiro ato foi a edição de Portaria nº 01/2007, com o fim de instaurar o procedimento administrativo para dar legitimidade à atuação ministerial. Em face da dimensão do problema e para facilitar a sua compreensão INCORPORA-SE no presente relatório todo o relato feito pelos Investigadores. Assim os Investigadores tomaram as seguintes medidas: foram expedidos os seguintes ofícios, conforme determinação contida na Portaria de Instauração para: a) Registro de Imóveis de Carazinho (informar quem são os adquirentes lindeiros à Fazenda Coqueiros); b) b.1) Mozar Artur Dietrich –

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CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO N0 16315-0900/07-9 ORIGEM: Conselho Superior do Ministério Público INVESTIGADO: MST – Levantamento de dados sobre suas

atividades no Rio Grande do Sul CONSELHEIRO-RELATOR: Dr. Gilberto Thums Senhores Conselheiros: 1. Trata-se do procedimento administrativo instaurado a partir de

determinação do Egrégio Conselho Superior do Ministério Público para realização de levantamento de dados sobre as atividades do MST (Movimento dos Sem Terra) no Estado a fim de adotar providências cabíveis na esfera de atuação do Ministério Público Estadual.

Foram designados os Doutores Promotores de Justiça LUCIANO DE

FARIA BRASIL e FÁBIO ROQUE SBARDELOTTO para o cumprimento do encargo, conforme Portarias de fls. 5 e 6. Doravante serão mencionados no presente relatório como Investigadores. O primeiro ato foi a edição de Portaria nº 01/2007, com o fim de instaurar o procedimento administrativo para dar legitimidade à atuação ministerial. Em face da dimensão do problema e para facilitar a sua compreensão INCORPORA-SE no presente relatório todo o relato feito pelos Investigadores.

Assim os Investigadores tomaram as seguintes medidas: foram

expedidos os seguintes ofícios, conforme determinação contida na Portaria de Instauração para: a) Registro de Imóveis de Carazinho (informar quem são os adquirentes lindeiros à Fazenda Coqueiros); b) b.1) Mozar Artur Dietrich –

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INCRA; b.2) João Carlos Fagundes Machado – Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária e Agronegócio; b.3) Min. Mário Fortes de Almeida – Ministério das Cidades; b.4) Min. Guilherme Cassel – Ministério do Desenvolvimento Agrário (informar se existe cadastro dos componentes de cada acampamento do MST no Estado; se existe alguma fonte de financiamento ou auxílio aos participantes do MST no Estado; se há distribuição de bolsa-família, vale-gás, auxílio-refeição, bolsa-escola, etc aos participantes do Movimento dos Sem Terra no Estado); c) Cel. Nilson Nobre Bueno – Comandante Geral da Brigada Militar (informar se existe cadastro dos componentes de cada acampamento do MST no Estado); d) d.1) Sec. Fernando Schüler – Secretaria do Trabalho, Cidadania e Assistência Social; d.2) Min. Patrus Ananias – Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (informar se existe alguma fonte de financiamento ou auxílio aos participantes do MST no Estado; se há distribuição de bolsa-família, vale-gás, auxílio-refeição, bolsa-escola, etc aos participantes do Movimento dos Sem Terra no Estado); e) Min. Fernando Haddad – Ministério da Educação (se há distribuição de bolsa-família, vale-gás, auxílio-refeição, bolsa-escola, etc aos participantes do Movimento dos Sem Terra no Estado).

O primeiro depoimento foi de Ana Guerra, filha de Feliz Guerra,

acompanhado por seu procurador, Dr. Tailor Agostini, (fls. 84/87 dos autos principais), deste depoimento destaca-se:

“... O total de acampados é muito oscilante, pois há momentos em que reúnem-se em grande número, e outros em menor número. Em média, nos dois acampamentos lindeiros à Fazenda Coqueiros contam com aproximadamente 700 membros. Uma das áreas lindeiras, ocupada pelos Sem-Terras identificada pelo Acampamento Jandir, pertence a Jandir Viebrantz, que arrendou aos ocupantes. A outra área foi adquirida por uma pessoa que é um “laranja” dos acampados, cujo nome no momento não é lembrado pelos comparecentes. O Dr. Tailor Agostini informa que ajuizou Ação de Reintegração de Posse junto à 3ª Vara da Comarca de Carazinho, com liminar deferida e reintegrada a posse da área da Fazenda Coqueiros. Além disso, na mesma ação, houve um interdito proibitório e fixação de multa impedindo os acampados de ingressarem na Fazenda Coqueiros. Na atualidade, informa que há em torno de dez policiais permanentemente no local. Mesmo com as decisões judiciais e a presença da Brigada Militar no local, os delitos praticados pelos acampados prosseguem. É constante a ocorrência de invasões com abate de gado, queimada de lavoura, danos ambientais, ameaças aos empregados da Fazenda, disparos de armas de fogo. Informam os comparecentes que os acampados agem com táticas de guerrilha. Já entraram encapuzados na Fazenda e ameaçaram os empregados, fazem sabotagem para danificar as máquinas na época de colheita, efetuam permanente intimidação às pessoas. Em vista da atividade criminosa dos acampados, já em torno de cento e dez ocorrências policiais na Delegacia de Carazinho, apenas relacionadas à Fazenda Coqueiros. A Brigada Militar já efetuou um relatório informando toda a atividade dos acampados e sua estratégia de

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atuação, por meio do serviço de inteligência, já estando esse relato em poder do Ministério Público, por seu Procurador-Geral. Relatam os comparecentes que no final do Governo Rigotto estava programada uma atuação da polícia civil e militar no sentido de haver uma incursão junto aos acampados com a finalidade de prender foragidos, apreender armas e outras atividades necessárias. Houve uma programação sigilosa, com autorização judicial expedida pelo Dr. Orlando Fachini Neto. Porém, na última hora, foi abortada. Informam que nos acampamentos há estrangeiros comandando as atividades e dando treinamento. Referentemente ao financiamento dos acampados, informam os comparecentes que há auxílio do Governo Federal por meio da remessa de alimentos pela CONAB, fornecimento aos acampados de Bolsa-Família, Bolsa-Escola e o pagamento em dinheiro por dia. O INCRA fornece apoio logístico com lonas, caixas d’água e quem faz a distribuição é o INCRA. Informam que nos acampamentos há acampados que possuem telefone celular. Inclusive há um número de telefone que os acampados atendem e fornecem animais silvestres, ... Relatam os comparecentes que a população dos Municípios de Coqueiros do Sul e Carazinho não apóia a atividade dos acampados, pois aumentou intensamente a violência e criminalidade. Há um constante clima de tensão e medo na população desses Municípios. Com relação aos proprietários da Fazenda Coqueiros e empregados há um constante medo, haja vista ameaças intensas de agressões e morte. Foram queimadas todas as casas, a serraria, foi destruída a usina hidroelétrica Drastentes na Fazenda Coqueiros. No total houve oito grandes invasões, além das constantes entradas diárias de acampados na fazenda efetuando todo o tipo de danos e delitos.”.

Em 25.07.2007 foi solicitado o expediente n.º 00372-09.00/07-3

à Subprocuradoria-Geral para Assuntos Institucionais, que traz como anexo o resumo do relatório da Brigada Militar, elaborado pelo Comandante do CRPO Planalto, Cel. Waldir João Reis Cerutti (Anexo I). Pela relevância de seu conteúdo, transcrevem-se as partes principais:

1. A via Campesina – organização internacional com intensa atuação na região Norte, como de resto, em todo o Estado, vincula-se ao Movimento dos Sem Terra (MST), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB), dentre outros que se instalaram em torno da Fazenda Coqueiros, de propriedade de Félix Tubino Guerra, montando 04 (quatro) acampamentos, com cerca de 4.500 (quatro mil e quinhentos) acampados, ao todo.

2. Existem dois acampamentos na BR 386 e outros dois acampamentos em áreas contíguas à Fazenda Coqueiros; um deles últimos encontra-se em área arrendada denominado acampamento JANDIR – ocupada no ano de 2004 e o outro, recentemente adquirido por particular e cedido graciosamente ao MST, denominado acampamento SERRARIA (que tem demonstrado maior agressividade), encontra-se encravado em dita fazenda.

3. Todos acampamentos funcionam como vasos comunicantes, havendo intensa troca de acampados, de um para outro, além de receberem seguidamente novos militantes, recrutados entre a população menos favorecida das cidades maiores, bem como oriundos dos assentamentos da região. Acresço que essa movimentação visa dar condições estratégicas para as lideranças efetivarem a prática de ações delituosas em determinados pontos específicos, em verdadeiras ações para-militares, utilizando-se a estrutura destes acampamentos como base para suas incursões

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criminosas. 4. Cada acampamento possui sua liderança local, ligada às lideranças regionais,

que por sua vez se ligam às lideranças estaduais, tudo vinculado ao movimento internacional “Via Campesina”. As ações são todas coordenadas estrategicamente e normalmente tem cunha político, porém causam grande dano patrimonial e moral aos atingidos, suas famílias e funcionários, nas ações que desencadeiam na área.

5. Os Acampamentos estão sendo mantidos por diversas fontes, inclusive com verbas públicas do Governo Federal, através do INCRA-RS, com seguida remessa de toneladas de gêneros alimentícios provenientes de programas como o FOME-ZERO, adquiridos com recursos públicos da também estatal CONAB (Companhia Brasileira de Abastecimento), tudo comprovado com Nota Fiscal. Além disso, há fontes internacionais que também mantém o movimento e , segundo informações de inteligência, até as próprias FARC, que dominam parte do território colombiano.

6. Recentemente em ação do Ministério Público, durante investigações sobre as ações delituosas do movimento Via-Campesina, foi encontrado em um estabelecimento ligado a tal movimento, na cidade de Passo Fundo, grande quantidade de dinheiro, em moeda corrente de diversos países.

7. Comprovando o envolvimento internacional, temos também o registro de diversas visitas de estrangeiros aos acampamentos, bem como estrangeiros orientando as ações, como é caso do indivíduo conhecido como Hugo Castelhano.

8. As ações delituosas do movimento na região são facilmente observadas através dos diversos registros e prisões já homologados, caracterizando-se principalmente, por invasões, esbulhos, turbações, crimes ambientais, posse ilegal de armas, roubos, furtos e, supostamente, exploração de menores.

9. As maiores ações envolvem uma organização típica, a saber: são feitas em sigilo, da madrugada para o amanhecer, com atuação de um grupo precursor armado, com grande movimentação de pessoas e invejável estrutura, contando com lideranças estaduais de renome. Tais ações necessitam de grande aporte financeiro para sua execução.

10. Os setores de inteligência obtiveram informações da estratégia de atuação do movimento na região, que seria incentivada pelas FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), copiando o modelo adotado em tal país. Como é do conhecimento público, as FARC dominam grande parte daquele país e adotam o método de controle através do domínio territorial, começando suas ações pela guerrilha rural; nas regiões dominadas, o controle é total , as zonas são fechadas, pouco ou nada restando de autoridade aos governos central e local; em tais zonas o exército e a polícia não entram, tornando-se regiões fora da lei, onde a única lei é a ditada pelo crime organizado. Nestas regiões as FARC em como fonte de renda o tráfico de drogas e de armas, a venda de proteção a traficantes produtores de drogas, a empresários comerciantes e fazendeiros, tanto no campo como nas cidades existentes em sua “Zona de Domínio”. ...

11. Análises de nosso sistema de inteligência permitem supor que o MST esteja em plena fase executiva de um arrojado plano estratégico, formulado a partir de tal “convênio”, que inclui o domínio de um território em que o governo manda nada ou quase nada e o MST e Via Campesina, tudo ou quase tudo.

12. Na região do Estado do Rio Grande do Sul compreendida entre os municípios de Palmeira das Missões, Irai, Nonoai, Encruzilhada Natalino, Pontão e Passo Fundo, existem nada menos do que 31 (trinta e um) assentamentos do MST e diversas reservas indígenas;

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no vale do Rio Uruguai existem diversos aproveitamentos hidrelétricos (alguns prontos e outros ainda em execução), onde age um grupo denominado de MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), congênere do MST e que, igualmente, adotam métodos violentos de reivindicação como o movimento maior (o MST). Registram-se ações do MAB, entre outras, nas usinas hidrelétricas de Barra Grande, Machadinho e Itá.

13. Dentre os assentamentos referidos, destacam-se os dois maiores e mais conhecidos: os das Fazendas SARANDI e ANONI, nos municípios de SARANDI, RONDA ALTA e PONTÃO. Mais à OESTE da região mencionada, existe com número de assentamentos do MST, em municípios como BOA VISTA DO INCRA, CRUZ ALTA, JÓIA e TUPANCIRETÃ.

14. As informações acima prestadas permitem concluir que o arrojado plano estratégico do MST, sob orientação de operadores estrangeiros como as FARC, é adotar nesta rica produtiva região do nosso Estado, o método de controle territorial branco tão lucrativamente adotado pelas FARC na Colômbia. O fechamento do território consistiria em domínio de leste para oeste, a partir da linha norte-sul, representada no mapa em anexo pela rodovia RS-324, que vai de Passo Fundo a Nonoai e de lá até a ponte do Goio-En, que dá acesso ao município de Santa Catarina

15. Estima-se que a primeira etapa da ação visando obter pretendido domínio territorial branco seria tentar controlar o território entre as rodovias RS-324 (Passo Fundo, Pontão, Ronda Alta, Goio-En)e BR-386 (Carazinho, Sarandi e prolongamento por estrada estadual que também conduz à ponte do Rio GoioEn), estendendo com pontos até a fronteira com o Uruguai o que já lhes daria o controle sobre estas importantes rodovias norte-sul, de grande importância estratégica para fins de controle de área e liberdade de movimentos. Ressalte-se que já se verificou invasão às margens da BR-354. No município de Nonoai (dentro da área visada), na faixa de domínio da citada rodovia e na Fazenda de propriedade de Alberto Tagliari, ocorrendo o cumprimento de Ordem Judicial de reintegração de posse, no entanto os invasores retirados prometeram tornar a invadir a área e depredar a propriedade, pois é até assinalado como ponto indispensável de fixação.

16. Outro Componente que merece ser observado é a afirmação divulgada pela imprensa nacional, de João Pedro Stédille, Líder nacional do MST, no sentido de que o objetivo do MST não é mais somente a reforma agrária, justificando e enaltecendo as ações criminosas ocorridas contra a Aracruz Celulose e Monsanto, demostrando que as ações até então desenvolvidas serão intensificadas e potencializadas, com níveis cada vez maiores de danos.

17. Uma das maiores propriedades rurais existentes no trecho entre estas rodovias, objeto do plano estratégico referido, é a Fazenda Coqueiros, com cerca de 7.000 (sete mil) hectares, de forma aproximadamente triangular, sendo que seu ponto mais a leste fica a cerca de 13 (treze) quilômetros a oeste da Cidade de Pontão, onde existe acesso rodoviário ligando tal cidade ao Distrito de Xadrez, pertencente ao atual município de Coqueiros do Sul. O ponto mais ao Sul de tal fazenda fica a 06 Km da cidade de Carazinho, sendo que o acesso à Carazinho é por estrada municipal que liga tal município à Xadrez e, deste Distrito. Bifurca-se o ramal direito conduz a PONTÃO e o outro (na direção norte) conduz à sede do Município de COQUEIROS DO SUL e também dá acesso à FAZENDA ANONI (assentamento do MST) situada a aproximadamente 20 Km da divisa da Fazenda Coqueiros. O acesso rodoviário principal à sede do município de Coqueiros do Sul dista poucos quilômetros da divisa Norte da Fazenda Coqueiros (Rio Turvo), sendo que, em linha reta, a distancia é de 02 (dois) KM. Já, do lado OESTE, a fazenda Coqueiros não faz divisa com a

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BR-386, mas fica perto dela, havendo apenas uma estreita faixa de terra de alguns proprietários, que são, do Sul para o Norte: Família Bocorni, representado pela Sra. Genny Bocorni sucessores de Alfredo Bratz, representado pelo genro e administrador Dr. Reneu Ries e, ainda, a propriedade de 2.300 hectares, hoje denominada Sazão Agropecuária S.A, administrada pelo Sr. Antônio Chaves Barcellos, residente em Porto Alegre. Através de cada uma destas propriedades, em caminhadas com duração máxima de meia hora, a partir de qualquer ponto da BR-386, é possível atingir a divisa Oeste da Fazenda Coqueiros, bem como mobilizar assentados do norte do estado para participarem de ações e saírem do teatro de operações antes da chegada da polícia.

18. Para a execução da primeira parte do arrojado plano estratégico antes referido, é imprescindível a tomada, a qualquer preço, da Fazenda Coqueiros e outras propriedades situadas em seu caminho, por localizarem-se entre as duas rodovias asfaltadas mencionadas (RS-324 e BR-386), embora não divise com nenhuma delas.

19. O MST e seu afilhado o MPA, ambos integrantes da chamada Via Campesina, organismo internacional antes citado, instalam em torno da Fazenda Coqueiros nada menos do que 04 (quatro) acampamentos, ... onde mantêm cerca de 4.500 (quatro mil e quinhentas) pessoas, sendo que todo este efetivo é movimentado, constantemente, de um para outro acampamento, recebendo com grande freqüência novos ocupantes, vindos de outros municípios a até de outros estados e países. Dois deste acampamentos, denominados de ACAMPAMENTO DO JANDIR e ACAMPAMENTO SERRARIA estão contíguos às terras da fazenda, em áreas dela desmembradas. Sendo que o ACAMPAMENTO DO JANDIR foi localizado em terras de Jandir Viebrantz, aliado ao MST pelo diretor do movimento, SÍLVIO LUCIANO DOS SANTOS, desde a época da primeira invasão (ano de 2004) e deste acampamento saíram os grupos precursores para as segunda e terceira invasões, bem como inúmeras outras turbações de posse e toda sorte de ilícitos contra os proprietários e seus empregados.

20. ... 21. No acampamento designado como “Acampamento Do

Pedágio”, existem também acampados do MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores), movimento dos egressos do MST que já foram assentados, mas continuam agindo no movimento, integrante da internacional “Via Campesina”. Neste acampamento detectou-se indícios de treinamentos de guerrilha rural, com instrutores de fora do estado e do país.

22. ... 23. Também há informações que o movimento está negociando uma área,

próxima ao município de Pontão, contígua à Fazenda Coqueiros, para dar continuidade ao seu intento, cercando assim toda área. Além disso, repito, a localização geográfica da Fazenda Coqueiros – entre as BR-386, BR-285 e RS-324 – é fundamental para o movimento.

24. Verifica-se que os acampados são usados como massa de manobra, recebendo em troca alimentação, cestas básicas, e promessa de 15 (quinze)hectares de terra por família. Alguns acampados são foragidos da Justiça ou tem longa ficha criminal, para dar suporte as ações delituosas; além disso, recebem

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treinamento de operações em combate a Polícia com utilização de armas, em manejo de artefatos explosivos (coquetéis molotov) e em técnicas e táticas de fortificação das áreas invadidas, com utilização de estacas panjo e armadilhas, além de diversas outras táticas, com ensinamento inclusive para as crianças. As instalações que se verificam nas últimas invasões permitem bem demonstrar o uso de algumas técnicas de guerrilha.

Ademais, em vários momentos, neste ano, em que houve necessidade de emprego de efetivo da Brigada Militar para fazer cessar as atividades criminosas desenvolvidas pelos acampados, houve visível intenção destes de resistirem com uso de força, ocasião em que se apresentavam armados de armas brancas, coquetéis molotov e armas de fogo dissimuladas em suas vestes (mas perfeitamente perceptíveis por homens experimentados no combate ao crime); ressalta-se que, em tais ocasiões, muitos acampados apresentavam-se visivelmente embriagados e proferiam ameaças de morte e provocações aos agentes da lei, não ocorrendo um conflito sangrento em razão de, ainda, não ter ocorrido agressões físicas diretas de parte à parte, o que por certo, desencadearia o conflito que se quer evitar.

O depoimento de Félix Tubino Guerra, proprietário da fazenda Coqueiros, revela questões com semelhante significado ao que foi relatado pelo Coronel da Brigada Militar (fls. 125/131). Vejam-se algumas partes:

.... No ano de 2004, ocorreu a primeira invasão na propriedade do depoente.

Porém, já na década de 90, estiveram no Estado guerrilheiros das FARC, sendo recebidos pelo governo do estado por meio do Vice-Governador. Posteriormente, quando da realização dos sucessivos Fóruns Sociais Mundiais em Porto Alegre, novamente teria havido contatos dos guerrilheiros das FARC com pessoas nesta Estado. No dizer do depoente, por influência das FARC, os Sem Terra teriam montado uma estratégia de tomada de território, por meio da tomada de posição em determinada região e desenvolver um movimento socialista. Por isso, passaram a desenvolver ações em pontos estratégicos. No caso de Nova Santa Rita, trata-se de um local estratégico em virtude do Pólo Petroquímico e de uma ferrovia que por ela muitos produtos passam. Entre Rosário e Livramento colocaram um acampamento no entroncamento da estrada que vai a Bagé, pois aí podem fechar várias rotas de trânsito e “trancar o movimento econômico”. Na região de sua fazenda, as ocupações vão de Palmeira das Missões até perto de Passo Fundo, na Granja Brilhante. Essa é a estratégia dos líderes. Os demais participantes, querem é dinheiro fácil. Na fazenda do depoente, pretendem obter a reserva de madeira que o depoente plantou na década de 70, quando plantou 600 hectares de pinus, que sem haver uma perspectiva de tamanha rentabilidade do depoente, hoje é extremamente valorosa. Além disso, em sua propriedade há uma enorme reserva de araucárias. Mesmo que não cortem as araucárias, somente aquelas que morrem anualmente possuem um enorme valor. Com isso, o depoente conclui que houve uma alteração de estratégia do movimento, que agora adotaram a prática de tomada do poder em regiões para implantar o movimento socialista. Informa o depoente que a propriedade do depoente está no meio do caminho, por isso, é estratégica para o sucesso do movimento. Relata o declarante que a primeira invasão foi no dia 02 de abril de 2004, em um número estimado de 400 pessoas. Invadiram um mato nativo em uma baixada que fica ao lado da estrada

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municipal que lida a sede do Distrito de Xadrez com a sede do Município de Coqueiros do Sul, no local identificado por “Canhada Funda”. Na ocasião, o local escolhido pelos acampados não possuía água. Por isso, apelaram a um senhor identificado por Nelson Grasseli, ex-Prefeito de Pontão, que conseguiu por meio de um caminhão água. Entretanto, não era água potável e houve um problema de saúde entre os acampados. Por isso, segundo relatou ao depoente, o Prefeito de Coqueiros do Sul informou que a Doutora Clarissa, Promotora de Justiça, teria ela determinado que o Prefeito fornecesse água aos acampados. Na ocasião, houve duas audiências promovidas pelo Juiz no sentido de buscar a solução do problema, com a presença de órgãos do Governo Federal, invasores e o proprietário. Nas duas solenidades, o depoente pode depreender que havia uma acentuada afinidade ou cumplicidade entre os representantes do INCRA e os invasores. Foi concedida a reintegração, porém condicional, isto é, para que ocorresse a desocupação em 30 dias. Ao final do prazo, os invasores desocuparam a propriedade do depoente e se mudaram para uma propriedade lindeira de propriedade de Jandir Viebrantz de aproximadamente 8 hectares mediante arrendamento. Quem assinou o contrato pelo MST foi um elemento chamado Sílvio Luciano dos Santos, que hoje está foragido e com prisão preventiva decretada pela Comarca de Carazinho em virtude de crimes cometidos na invasão.... . Antes do decreto de prisão, Sílvio Luciano dos Santos concedeu entrevista ao Jornal Diário da Manhã afirmando que o objetivo era desestabilizar a Fazenda Coqueiros econômica, técnica e financeiramente. Durante o ano de 2004, os ataques continuaram. No final do mês de agosto de 2004, houve o anúncio público de uma nova invasão. Partiram pela BR-386 e pousaram nas proximidades do pedágio. No outro dia, dirigiram-se a Carazinho com um carro de som dirigido pelo Frei Sérgio, que se dizia o comandante da coluna de invasores. Com isso, o Coronel Cerutti percebeu o movimento e solicitou auxílio do BOE de Santa Maria. Quando o BOE chegou, houve uma barreira da Brigada Militar para impedir a invasão. Houve um enfrentamento com a Brigada e uma negociação muito tensa entre o Frei Sérgio, que era o comandante da invasão, e o comando da Brigada. Após negociações, retiraram-se sem conseguirem invadir. Ao início do mês de setembro de 2004, houve a segunda grande invasão. A mesma decisão judicial já adotada anteriormente foi revalidada, e os invasores do MST retirados da terra. Até o momento, desde então, houve um total de oito invasões coletivas na área do depoente. No ano de 2006 houve uma grande invasão. Porém, diariamente entram na Fazenda para causar danos e prejuízos. Praticam furto do que for possível. Furtam tudo o que for possível, milho, gado, ferro, madeira, etc. Já em 2004 o depoente recebeu a primeira ameaça de morte, quando estava com dois empregados fotografando uma invasão em uma mata. Depois disso, mais de uma vez recebeu ligações em sua residência, inclusive pelo celular, com insinuações do tipo “com o MST ninguém pode”. Mais recentemente, a residência do Dr. Tailor, que está recém construída, foi alvo de disparos de arma de fogo. O Dr. Alberi que era procurador do depoente também foi ameaçado. Informa que os membros do MST tem efetuado ameaças aos jornalistas do Jornal Diário da Manhã para não publicarem notícias contra os seus membros. Os acampados MST nas divisas da fazenda do depoente tem efetuado disparos de arma de fogo. Informa que possuem armas de

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vários tipos. Praticam diversos atos de terrorismo contra o depoente e seus empregados ou pessoas ligadas à sua pessoa. No ano de 2004, Angelo Menegat, que era assessor do Governador Olívio na Secretaria da Agricultura, assumiu o INCRA em Porto Alegre. Antes de assumir o INCRA, era membro do MDA. Em 28 de fevereiro de 2006, cerca de 2.000 invasores ocuparam a Fazenda do depoente, vindos de diversas áreas do Estado, todos chegando ao mesmo tempo. Estavam presentes, dentre os invasores, estrangeiros e pessoas com bandeira da Via Campesina e bandeira de Cuba. Havia, inclusive, uma componente de origem estrangeira que havia participado da invasão da ARACRUZ. Foi anotado seu passaporte e liberada pela Brigada, pois não estava ilegal. Foi na mesma época da invasão da propriedade da ARACRUZ em Barra do Ribeiro, no último dia do carnaval. Segundo a Brigada Militar, a estrutura era paramilitar muito bem organizada. No dia 3 de março o Superintendente do INCRA Angelo Menegat emitiu uma ordem de fiscalização cadastral à Fazenda Coqueiros para cumprimento no prazo de 30 dias. No momento, houve uma nova ação de reintegração de posse, julgada pelo Dr. Fachini que emitiu uma ordem muito importante determinando que aquela invasão fosse a última e a necessidade de desocupação. A desocupação ocorreu no dia 11.03.06. A ordem de desocupação foi rasgada em frente dos Oficiais de Justiça. Pelo que tomou conhecimento, foi ato de Ana Hanauer. ... No entender do depoente, Angelo Menegat participou do apoio logístico e do planejamento da invasão. Está fornecendo suporte logístico e financiamento da invasão. Em 17.4.06, Menegat passou a ser Assessor do Incra no RGS, passando a ser o Superintendente Mozart Dietrich, que continuou apoiando as invasões. Quando os invasores se retiraram da Fazenda em março de 2006, dia 11, passaram a ocupar outra área contígua à Fazenda. A área ocupada foi adquirida durante a invasão do proprietário Antônio Dalla Costa, ex-padre. Formalmente, esta área foi adquirida por Arno Maier, passando a ser ocupada até hoje pelos componentes do MST. Portanto, há dois acampamentos do MST contíguos à Fazenda do Depoente, um chamado de “Acampamento Serraria ou Maier” e “Acampamento Jandir”. Apesar da desocupação, continuaram invasões individuais constantes, sempre agressivas, com técnica de guerrilha. Cortam as cercas, matam gado simplesmente por matar, a tiros, facão, etc., mutilam o gado, cortando o tendão para fazer sofrer, cortam mata nativa, os pinus, furtam milho, colocam ferros no milho a ser colhido para quebrar as máquinas, cerraram a ponte para fazer cair as máquinas na água, colocam “miguelitos” na estrada para furar pneus, agrediram um funcionário que precisou ser medicado no hospital, incendiaram a cerraria em quatro ou cinco etapas utilizando coquetéis molotov com grande potencialidade, além de outras atitudes típicas de guerrilha. Em virtude disso, houve pedido judicial, por meio de advogado do depoente, para que a Juíza proibisse essas invasões e a desativação dos acampamentos. A Magistrada decidiu proibindo que houvesse qualquer invasão, individual ou coletiva, sob pena de multa de R$ 50.000,00. A Juíza determinou que fosse um carro de som para a leitura da sentença e anúncio da multa. Na noite seguida, os membros do MST foram até a Fazenda e cortaram seis quilômetros de cerca. A Magistrada oficiou ao Superintendente do INCRA solicitando que houvesse o reassentamento em outra área. O Superintendente respondeu que não era sua função, mas o que estavam fazendo era fornecer lona preta e suprimentos. Informou que o

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Ministério do Desenvolvimento Social é quem compra os suprimentos, por meio da CONAB, que repassa ao INCRA para fornecer aos integrantes do MST. O declarante informa que existem no Estado três locais onde estariam sendo ministradas lições de guerrilha rural pelos técnicos das FARC aos membros do MST. Esta informação o depoente obteve da Brigada Militar. Um deles chamado Centrão, em Palmeira das Missões, outro CETAP – Centro de Tecnologias Alternativas Populares Pontão. O terceiro em Veranópolis.

Declara o comparecente que, de parte do Estado do Rio Grande do Sul, houve um levantamento efetuado pelo ex-Vice Governador Antônio Hohlfeldt acerca dos órgãos estaduais que auxiliavam o MST e determinou a suspensão de todos os auxílios. No mês de junho do corrente ano, o Governo Federal suspendeu o auxílio e o Estado supriu as necessidades. Informa que o ex-Prefeito de Nova Santa Rita que hoje trabalha na Emater possui informações relevantes acerca da atividade dos integrantes do MST. Relata que nas proximidades do Seminário de Sarandi há um acampamento do MST. Há, também, um centro de pesquisa da aftosa. Os integrantes do MST estão utilizando uma tática de guerrilha, vendendo proteção em troca de dois animais carneados por mês. Relata que Nelson Grasselli, que era presidente do CORED e tinha contato com muitos Prefeitos, obteve a assinatura de em torno de vinte Prefeitos a favor da desapropriação. Nelson teria prometido aos Prefeitos a obtenção de verbas federais. Relata que a invasão do MST da Granja Nenê seguiu o mesmo método das invasões à Fazenda do depoente. Refere que a invasão da Granja Nenê é estratégica pois, o gasoduto que alimenta o Pólo Petroquímico por ela passa. Toda a tubulação de nafta e gás passa pela aludida fazenda.”.

O depoimento de Mozar Artur Dietrich, Superintendente

Regional do INCRA/RS, foi acompanhado de José Rui Cancian Tagliapietra,

Superintendente Regional Substituto do INCRA, (fls. 139/184), destacando-

se os seguinte:

“... inicialmente, houve o fornecimento de uma relação de acampamentos do MST no Estado, contendo também o número de famílias, de cestas básicas e lonas fornecidas. Esta relação está na primeira folha da documentação entregue. Quanto às cestas básicas, são originárias do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, em conjunto com o Programa de Aquisição de Alimentos do aludido Ministério e do Ministério do Desenvolvimento Agrário. A aquisição das cestas é feita pela CONAB por meio de leilão. .. . Os comparecentes também fornecem, neste momento, uma relação de acampamentos independentes, não ligados ao MST, sua localização, número de famílias, cestas fornecidas e lonas, objeto da segunda folha da relação. A terceira lista, é dos assentamentos do último ano. O Sr. Mozar informa que no total são 19

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grupos no Brasil que lutam pela terra. A Via Campesina possui outro papel, pois unifica lutas ligadas à reforma agrária e à agricultura familiar. É uma espécie de articulação política dos movimentos. O MPA é um movimento de pequenos agricultores não é ligado ao MST e à FETAG, mas integra a Via Campesina. São ligados à FETRAFSUL. Neste momento, também é feita a entrega de uma relação de controle de entrega de cestas de alimentos aos integrantes do MST e assentamentos feita no mês passado. O Sr. Mozar informa que há um cadastro de 2005 dos acampados. Não está atualizado, pois ao final de 2005 houve tentativa de recadastramento e os funcionários do INCRA foram hostilizados, com resistência dos acampados. No ano de 2006 não houve cadastramento. ... quanto mais o INCRA assenta, mais aumenta o número de acampados. No ano de 2006, foram assentadas 858 famílias. Porém, encerrou o ano com 2.750 famílias acampadas em dezembro. No início de 2006 eram menos de 2.000 famílias acampadas. O Sr. Mozar informa que o relacionamento com os atores envolvidos com o problema da reforma agrária é de “marisco”, isto é, a autarquia é cobrada por todos os envolvidos. Os focos de litígio atualmente existentes no Estado são a Fazenda Coqueiros, Nova Santa Rita, São Gabriel e Pedro Osório. Há também acampamentos grandes em Santana do Livramento e em Bossoroca. Quanto à Fazenda Coqueiros, há o encaminhamento de pedido de desapropriação por interesse social genérico pela Lei 4.132, que está sendo analisado pela Chefia da Casa Civil. . Em Pedro Osório, a proprietária da Fazenda da Palma foi notificada para avaliação do cumprimento da função social. Entretanto, houve ocupação do MST, o que levou à retirada do INCRA...

Em depoimento Eugênio Leonardo Vieira Grandó, Procurador do Município de Carazinho, esclarece que:

“Que as questões vinculadas ao MST estão ligadas ao Município de Coqueiros do Sul.

A principal repercussão no âmbito no Município de Carazinho diz respeito à área da saúde. Houve um aumento significativo no número de atendimentos, até porque o Município de Coqueiros do Sul não possui hospital. Sugere seja solicitado um relatório à Secretaria de Saúde do Município. Cerca de quatro ou cinco meses atrás, dois líderes do MST estiveram na Secretaria Municipal de Saúde e exigiram atendimento para os membros do Movimento. A liderança do MST solicitava remédios e atendimento no PSF, em quantidade e intensidade maior. Os líderes do MST ameaçaram a então Secretária de Saúde, Lúcia Schwember, dizendo que trariam um ônibus lotado de “sem-terras”, e acampariam na frente da Secretaria até serem fornecidos os atendimentos e medicamentos. Diz que a imprensa local noticia um incremento na criminalidade, especialmente crimes ambientais, mas que o depoente não dispõe de dados concretos com relação a isso. Afirma que a comunidade não aceita a presença dos “sem-terra”, destacando que o movimento “verde”, de defesa dos produtores, nasceu em Carazinho...”

O depoimento de Aderli Maximino Dal Bosco, Tenente Coronel

da Brigada Militar QOEM, Comandante do Batalhão de Carazinho (fls.

199/200), apresenta idêntica versão acerca do MST e revela o custo da

segurança das propriedades:

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“Que assumiu o comando da Brigada Militar na região no mês de maio de 2004, porém já estava atuando no mês de abril do mesmo ano quando ocorreu a primeira invasão do MST na Fazenda Coqueiros. Desde então, a Brigada Militar vem mantendo um contingente de soldados no local bastante variado dependendo da necessidade. Houve a formação de um destacamento do Distrito de Xadrez com um contingente em torno de dez soldados. Esse destacamento foi instalado em razão do Movimento dos Sem-Terra estar instalado nas proximidades do local. Esses policiais recebem diárias no valor de, em torno, de R$ 40,00. Em 11 de abril do corrente ocorreu a última invasão, tendo sido mobilizados cerca de 490 policiais militares para a operação de retirada. Também neste caso houve pagamento de diárias pois houve necessidade de trazer policiais de outras cidades, inclusive do Batalhão de Operações Especiais. Com isso, a presença do MST naquela região está acarretando custos elevados ao Estado do Rio Grande do Sul. Além disso, o índice de criminalidade na região aumentou muito, elevando a atividade da Brigada Militar. Não apenas abigeatos, mas também outros delitos cresceram em número na região. Destaca também que, com a vinda de policiais militares de outras regiões, acentua-se a deficiência de efetivo na Brigada Militar que já é pequeno. Além das turbações que ocorrem com certa freqüência, o depoente informa terem havido cerca de sete invasões à Fazenda Coqueiros. Informa que a postura dos “sem-terra” é de hostilidade em relação á Brigada Militar, nas operações e no patrulhamento. Em várias oportunidades, viaturas foram apedrejadas, uma viatura foi retira em uma barreira e os Policiais Militares ficaram em cárcere privado por cerca de duas horas, sem falar no uso de armas de fogo. Já foram registrados disparos de armas de fogo por parte dos “sem-terra”. Informa que o MST utiliza estratégia de combate, sendo que na ocupação de uma serraria, o grupo precursor invadiu a propriedade com armas, para dominar a situação antes da chegada do contingente maior dos “sem-terra”. Nas operações de retirada por parte da Brigada Militar, as defesas dos acampamentos compõe-se de paliçadas, lanças, buracos no chão para que os cavalos tropecem, uso de Coquetéis Molotov. Além disso, o depoente tem notícia de que os “sem-terra” recebem treinamento especializado para essas atividades. ... O depoente considera bastante importante que seja realizada uma operação desse tipo, restabelecendo a presença do Estado do Rio Grande do Sul dentro dos acampamentos. Hoje a única presença é da União, fornecendo alimentos, inclusive cachaça. Informa que a Brigada Militar está como depositária de cerca de duas mil garrafas de cachaça que foram apreendidas em uma operação. Os alimentos apreendidos foram reclamados pelo INCRA.”.

O Ten-cel Aderli Maximino Dal Bosco, Comandante do Batalhão de Carazinho, apresentou documentos, tais como: termo de declaração de

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um ex-integrante de acampamento do MST e cópias de agendas de integrantes, e declarou que:

“... entregou ao Ministério Público dossiê envolvendo o Movimento dos Sem Terra, contendo cópia do termo de declaração de Nilton Antônio Damin, ex-integrante do MST e cópias de diversas agendas de integrantes do Movimento, além de cópia do Regimento Interno dos Acampamentos.

Diz Nilton Antônio Damin, em suas declarações: “que fazia parte do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra ... Que entende que o MST ilude as pessoas que buscam ter uma propriedade de área para desenvolver atividades agrícolas. Que as pessoas, após serem ludibriadas pelo MST, vendem suas pequenas casas na cidade ou abandonam área em que trabalhavam como arrendatários ou empregados, e juntam-se ao Movimento. Que pode afirmar que, se forem consultadas 100 pessoas sobre a permanência no MST, apenas 10 ficariam, mas que as outras 90 não têm como abandonar o Movimento porque não tem para onde ir. Que quando estavam acampados próximo ao pedágio, na BR-386, havia roubo de gado, de porcos e caixas de mel de abelha nas propriedades no encontro do acampamento. Que estes atos eram praticados por e a mando de CLAUDIOMORO ERD DE OLIVEIRA, de apelido GRINGO, que tem endereço na Rua Viana da Silva, 644, Vicentinos, Sarandi/RS. Que CLAUDIOMIRO pertencia pouco no acampamento, mas que tinha seus comparsas que ficavam no acampamento, cuidando as propriedades a serem atacadas. Que quando eram praticados os furtos, quem comandava e praticava era CLAUDIOMIRO. Que os produtos dos furtos (mel e carne) não ficavam no acampamento. Que o gado tinha a carne retirada e levada por um veículo Ford Pampa, placas LZI 3786, para as cidades de Rondinha e Sarandi, para ser revendida. Que além da Pampa, havia outros veículos que eram usados no transporte dos produtos de furto. Que em determinada data viu no barraco dos comparsas de CLAUDIOMIRO, que se encontravam acampados no acampamento próximo ao pedágio de Sarandi, uma grande quantidade de porcos, que acredita ter sido conseguido com assalto a um caminhão que os transportava. Que não viu o caminhão. Que os acampados, em sua maioria, não se beneficiam dos produtos de furto, sendo que apenas CLAUDIOMIRO e os seus comparsas tiram vantagens das ações criminosas. Que os alimentos encaminhados pelo INCRA também são revendidos pelos líderes do Movimento, restando muito pouco para ser distribuído aos integrantes que não fazem parte da direção do MST. Que além de CLAUDIOMIRO, também se apresenta como chefe do MST um homem de nome IVANIR LOUREIRO DE MELO e também um homem de apelido SECO. Que IVANIR é o responsável pela distribuição dos alimentos enviados pelo INCRA, ou seja, provavelmente é quem revende os alimentos recebidos. Que os alimentos recebidos do INCRA vêm em grande quantidade, “que vem comida para sobrar”, mas são distribuídos de forma racionada, de modo que há famílias mais numerosas que

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passam necessidades. Que é de conhecimento dos acampados que IVANIR está construindo um prédio de dois andares na cidade de Ronda Alta/RS. Que não sabe com que recursos está sendo efetuada a edificação, pois o IVANIR não tem renda. Que acredita que IVANIR obtém dinheiro da venda dos alimentos enviados pelo INCRA. Que todo mês vem um caminhão com alimentos do INCRA. Que a alimentação é só o IVANIR que comanda, é quem pede a quantia, e ninguém fica sabendo quanto exatamente é encaminhado pelo INCRA ao acampamento. Que há algum tempo, no acampamento ao lado da Fazenda Coqueiros (Acampamento dos Cabritos), ficou sabendo que. Que os integrantes do MST que houve um furto na mini-usina existente na propriedade de Félix Guerra, sendo que foram furtadas parte de turbinas por integrantes do MST. Que o furto na usina teria sido a mando de CLAUDIOMIRO e de IVANIR. Que o cobre proveniente dos produtos furtados foram vendidos na cidade de CARAZINHO... Que em Viamão/RS há um local chamado “Centrão” para onde são encaminhados integrantes do MST para serem “doutrinados” e posteriormente retornarem aos acampamentos para repassar os ensinamentos aos demais. Que quem contrata os ônibus e caminhões para transporte do MST são IVANIR e CLAUDIOMIRO (Gringo). Que não pretende voltar ao acampamento, e que sairá do MST, pois foi sorteado com um pedaço de terra e nada recebeu. Que acredita que o MST não repassou nada ao INCRA quanto aos sorteados, de modo que os integrantes sorteados nada recebessem e permanecessem no Movimento, aumentando o seu contingente. .. Que fica a disposição do Ministério Público para prestar maiores esclarecimentos, sendo que há muita coisa a ser revelada, não concordando com a atuação dos líderes do MST”.

As cópias das agendas, que possuem registros em forma de “diário”,

demonstram a capacidade de organização e funcionamento do Movimento. Há divisão de cada Grupo em setores, que se responsabilizam por uma determinada atividade.

... Chama atenção a questão da segurança. Existem guaritas e uma escala de “vigias” nos acampamentos. Além disso, há determinação para fazer revistas nos veículos que ingressam nos acampamentos.

Outra situação que igualmente causa espanto é que para sair do acampamento, é necessário pedir autorização. Os integrantes dizem quando vão, para onde vão e quando voltam, além de explicitar o motivo da saída em alguns casos. No registro do dia 02.04.07, no acampamento de Tupanciretã, consta o seguinte (dentre outras):

“Para liberação: A companheira Silvia precisa de 3 dias para pagar umas contas (NB 10). Liberada. Sai dia 03.04. Volta dia 05.04.07”.

“Desistentes: Quem desiste do acampamento não entra mais neste acampamento (a partir de hoje, dia 02.04.07). Quem desistir só vai acampar daqui a 6 meses em outros acampamentos”. Além disso, parece haver uma espécie de “documento” denominado de

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“liberação” para tais saídas, com punição para quem infringir as normas. Verifica-se na anotação feita em 1º/04/2007, no acampamento de Tupanciretã:

“O companheiro Alvos (ou Alves – letra não muito legível) falsificou uma liberação hoje, para sair. Encaminhar ao o DH.”

Na anotação do dia 24.03.07 (Tupanciretã) consta que há no acampamento “quatro tempos:

- Liberação em massa; - Tempo estudo; - Peleias.”. Não consta o quarto item. Outra situação no mínimo curiosa são as anotações feitas após cada “evento”

praticado pelo Movimento. Eles fazem avaliações acerca da atuação e dos resultados, ressaltando em que pontos precisam melhorar a atuação, o que foi considerado como “positivo” e as sugestões. Consta “arrumar mais foices”. Há uma preocupação com a participação das crianças do acampamento nos eventos do Movimento, demonstrando que elas devem participar de forma efetiva, fazer-se presentes.

Ainda nas anotações do acampamento de Tupanciretã, chama atenção a expressão “símbolo”, dentro de “estratégia”.

“Estratégia. Símbolos. Há três anos atrás, as ações sempre foram feitas na Guerra, ou seja, em áreas símbolos.

Função social da propriedade. As ações tinham que ser máxima, prolongada e de resistência. OBS.: O grande

inimigo nosso, são os grandes latifundiários, não os pequenos. Temos pior agora pois temos também as empresas.

Acampamento nosso, não pode mais ficar aqui.” Na anotação do dia 04.04.07 percebe-se um estudo sobre as possíveis áreas

para a mudança do acampamento, com ressalvas sobre a situação jurídica sobre determinados locais (propriedades).

Em outro “diário”, datado de 05.04.07, cujo acampamento não foi possível identificar, verifica-se a seguinte anotação:

“Coordenação. Conjuntura. A luta vai ser por terra. Em grandes latifundiários (em torno de áreas símbolos).

Estratégia. Luta tem que ser máxima, resistente. Estratégia. É o alvo onde nós queremos chegar. Tática. Como nós vamos

manter o alvo aceso (colo chegar lá na ocupação). Luta na região norte. Vai ser massiva. Todos os acampamentos da

região Norte (Bossoroca, Tupã, Coqueiro, etc). Temos o abril vermelho. Precisamos de 160 pessoas para luta. (Por enquanto, o

acampamento não vai mudar). OBS.: Temos necessidade de fazer luta, porque o INCRA diz que não tem

recursos para pagar as áreas, etc. Governo. (Todos estão brabos com a Governadora). Interno temos: - Acampamento fechado; - Foi feito a luta pela educação e terra; - Todo o acampamento pronto para luta.

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Como vamos fazer a luta. - Telefone - Fechado: Liberação (só por saúde e justiça) - Desistência: Quem desistiu, desistiu; quem não desistiu, não desiste

mais. - Sigilo - Tirar 50 pessoas para o DH - Um barracão para 45 pessoas; - 45 cozinha (pessoas por cozinha para comer) - 120 Infra – Produção, educação, saúde, comunicação.”. Também quanto à estratégia (anotação entre os dias 27 e 29 de março de

2007, em acampamento não identificado): “Ações em áreas grandes. Objetivo do alvo. Ocupação: o alvo mas com

sigilo. Luta Massiva e prolongada 3 mês. Luta com a resistência. Saber se eles vão bater, matando eles no cansaço.

Estratégia – eleger alvo símbolo. Sigilo e conhecer quem é quem. Cada um tem um problema.”. O sigilo, mascarado em mistério e segredos, privilégios de alguns, também se

verifica nas anotações. Ainda em Tupanciretã, no “diário” de 23.03.2007, percebe-se que há pessoa procurada pelo Judiciário:

“? companheiro (“?” para não citar nomes): O Zé Paulo falou em entregar o companheiro tal, quando a polícia vier procurar (diz que ele sabe quem é que a polícia vem procurar). Foi chamado no setor. Não sabe nada).

? companheiro: O Padilha que anda dando problema no acampamento. Chamar ele no setor de tarde para conversar.”.

O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

informou quanto aos benefícios assistenciais aos participantes do MST no Rio

Grande do Sul (fls. 222/224 dos autos principais).

O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

também informou quanto aos benefícios assistenciais aos participantes do

MST no Rio Grande do Sul (fls. 225/227 dos autos principais).

Quanto à atuação do MST em São Gabriel, foi ouvido Anibal

Menezes da Silveira, Capitão da BM (fls. 203/204 dos autos principais),

destacando-se:

“Que no ano de 2004 houve a primeira presença do MST em São Gabriel, ocasião em que se deu a chamada “Marcha do Abril Vermelho”. Na ocasião,

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inicialmente o movimento se estabeleceu em uma propriedade particular, na periferia da cidade, cedida por um simpatizante. Logo a seguir, passaram a ocupar uma área às margens da RS 630, lá permanecendo até o ano de 2006. ...O depoente estima que há um número em torno de 300 pessoas do MST acampadas neste local. ... Quando da movimentação do MST em 2004, o depoente informa que efetuaram uma revista nos seus membros e um dos participantes era foragido do presídio de Uruguaiana. Quando da manifestação ocorrido no último dia 18, houve uma revista nos participantes, sendo apreendidas várias foices, encontrado um coquetel Molotov, além de diversas estacas pontiagudas. Perguntado ao depoente se os membros do MST que se encontram em São Gabriel aparentam ter algum preparo para confronto físico ou armado, a exemplo de uma guerrilha, o depoente responde que por ocasião do dia 18 de abril do corrente ano, quando a Brigada Militar estava efetuando um cordão de isolamento para assegurar que os participantes do MST retornassem ao acampamento por decisão judicial, pôde perceber que ocorreu uma atitude premeditada de alguns participantes que enfrentaram o pelotão da cavalaria com uma técnica organizada e sem improviso...”.

O Ministério do Desenvolvimento Agrário – Instituto Nacional de

Colonização e Reforma Agrária – Superintendência Regional do Rio Grande do

Sul – SR/11 prestou informações (fls. 235/326), destacando-se:

‘Não existe nenhum subsídio, assistência social, ou repasse de verbas do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária aos participantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, individualmente ou em grupo. O que existe é a distribuição de cestas básicas de alimentos e rolos de lonas plásticas para os acampamentos, tanto para os integrantes do MST, quanto para os acampamentos ditos independentes, conforme documentos (relação de acampamentos com as respectivas entregas de cestas básicas e lonas) entregues pessoalmente por este Superintendente Regional a Vossas Excelências na audiência de 14 de agosto passado nas dependências da Promotoria de Justiça e Habitação e Defesa da Ordem Urbanística.” (...) “O INCRA é mero repassador das cestas básicas, que são adquiridas e distribuídas pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome/MDS e Companhia Nacional de Abastecimento/CONAB, por força do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional/Distribuição de Alimentos a Grupos Populacionais específicos e Programa de Aquisição de Alimentos daquele MDS.” (...) “Não existe mais a política de distribuição de vale-gás, auxílio-refeição, bolsa-escola, pois tudo foi condensado no Programa Bolsa Família do MDS. Contudo, o INCRA não participa nem colabora com esse Programa, que é executado pelas prefeituras municipais em parceria com o MDS.” (...) “o último cadastro realizado pelo INCRA nos acampamentos foi em 2004, totalizando 2.236 famílias, em 28 acampamentos, em 20 municípios. Contudo, a maior parte desses acampamentos nem existe mais, como é o exemplo dos acampados de Nonoai, Pantano Grande, Arroio dos Ratos, Júlio de Castilhos, ao passo que outros foram criados ou se criaram quase que espontaneamente.” (...) “Muitos surgem e desaparecem por força de

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políticas públicas, ou de sua ausência, de questões climáticas, de mão de obra (sic) em colheita sazonais, de fluxos migratórios tanto do campo para a cidade, quanto de retorno ao campo, ou como resultado de assentamentos que são realizados pelo INCRA e Governo do Estado.” Por fim, noticiam que no ano de 2005 “foi iniciada uma ação de atualização de cadastro de acampados, a qual foi interrompida pelo fato dos acampados impedirem essa ação do INCRA, inclusive tendo retido vários servidores e viaturas dentro desses acampamentos em dezembro daquele ano. Também por essas razões, muitas vezes os servidores do INCRA têm se negado a ir nesses acampamentos, mesmo para a simples ação de entrega de cestas básicas. Na verdade, a reação dos acampados contra o cadastro intentado pelo INCRA, na ocasião, se deu em razão de que nos meses de 2003 a 2005 foi ínfimo o número de famílias que conseguimos assentar , por várias razões.”.

O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome informou que é objetivamente impossível responder à demanda formulada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, na medida em que os registros do CadÚnico não contêm a informação a respeito da participação do cidadão inscrito no “Movimento dos Sem Terra”, ou em qualquer outro movimento social ou grupo político.”(fls. 327/337).

O Ministério das Cidades, respondeu ao questionamento feito por esta Instituição acerca da existência de cadastro dos componentes dos acampamentos do Movimento dos Sem Terra no Rio Grande do Sul (fls. 338/341), informando que há um distanciamento “entre o escopo de suas atribuição e a demanda solicitada” pois os dados solicitados “compete ao Ministério do Desenvolvimento Agrário”, a quem cabe a “reforma agrária e a promoção do desenvolvimento sustentável do segmento rural constituído elos agricultores familiares”.

Em 17.09.2007 Felix Guerra, informou aos Promotores de Justiça Luciano de Faria Brasil e Fábio Roque Sbardelotto (fls. 344) que: “Domingo dia 9 de setembro às 3:00 horas da madrugada ocorreu um fato gravíssimo, em que foram colocados explosivos em dois tratores que se encontravam na sede da Fazenda Coqueiros, os explosivos foram detonados e causaram grandes prejuízos nos tratores (ver matéria da Zero Hora, edição de segunda feira, página 28 Geral). Estamos seriamente preocupados pois todas os nossos alertas e previsões sobre os atos criminosos tem se concretizado sistematicamente. Infelizmente mais um grave atentado criminoso ocorreu causando sérios prejuízos ao proprietário. Os empregados da Fazenda estão cada vez mais atemorizados, pois notam o agravamento das ações cada vez mais ousadas e violentas, temem por suas vidas e de seus familiares. Fato foi comunicado à polícia civil, Brigada Militar, Exército, Polícia Federal e Ministério Público Federal, este último também está investigando as ações criminosas dos movimentos ditos sociais, no entorno da Fazenda Coqueiros, e comunicou ao Ministério MDA a existência dessa investigação. O local está isolado esperando a perícia técnica. Infelizmente Dr. Fábio os nossos alertas não tem funcionado, tudo o que vimos dizendo vem ocorrendo. Trata-se de uma sucessão de atos criminosos contra a

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propriedade, praticados pelos integrantes do MST e outros movimentos ditos “sociais”, visando a desestabilização técnica e econômica do empreendimento (Fazenda Coqueiros) e por esse meio torná-la improdutiva e anti econômica. O evento ocorrido no domingo se trata de crime federal, por utilização de explosivos e também por caracterizar crime de sabotagem que se trata de delito contra a segurança nacional. Pedimos a gentileza de comunicar mais essa ocorrência ao Dr. Mauro Rener, para que ele determine ao setor competente do MP, para que sejam adotadas as medidas já reiteradamente solicitadas pelo proprietário da Fazenda. Se não forem desativados os acampamentos não haverá solução, os crimes continuarão a BM, não tem condições da cumprir a ordem judicial e impedir as ações dos criminosos. Repetimos, mais dia ou menos dia ocorrerá um choque sangrento entre os insurgentes integrantes dos movimentos ditos “sociais” contra os agentes da lei que tem o compromisso de fazer cumprir ordem judicial”.

João Francisco Moares Cardoso, Presidente da COCEARGS, (Cooperativa Central de Assentamentos do Rio Grande do Sul (fls. 350/369) declarou que:

“que a COCEARGS presta auxílio para assentados, não para acampados. O auxílio se dá por meio de capacitação e assistência técnica para os assentados, viabilizando o repasse de recursos do INCRA e da EMATER, esta na qualidade de parceira, inclusive para implantação de habitação e saneamento básico. Apresenta exemplo de projetos desenvolvidos pela Cooperativa. A partir do assentamento, que pode ocorrer por diversos regimes jurídicos, conforme a época do assentamento, começa a atuação da Cooperativa para auxílio. A Cooperativa tem incentivado a implantação de bacias leiteiras entre os assentados, de forma a aproveitar o período intercalar entre as colheitas. Sobre a relação com o MST, informa que alguns dos assentados continuam a fazer parte do movimento, até por uma relação de solidariedade. Informa que em torno de 60% dos assentados do Estado do Rio Grande do Sul estão vinculados a COCEARGS, não podendo precisar o exato montante. Informa também que há uma ênfase cada vez maior em agricultura orgânica, com certificação internacional. Após o assentamento efetuado pelo Governo Federal, o assentado recebe um crédito de cerca de R$ 2.500,00 cada um, a título de subsídio, a fundo perdido, para satisfação de necessidades imediatas, como comprar alguns animais, fazer um galpão, etc. Dependendo do tipo, do local e das condições do assentamento, pode haver um segundo subsídio no mesmo valor. Após, o assentado ingressa no PRONAF-A, recebendo entre 16 e 17 mil reais, em 3 parcelas, com prestação de contas em cada etapa. O assentado deve ressarcir esses créditos, começando a fazê-lo, em regra, depois de 2 a 3 anos de carência, e mais 5 ou 6 anos para pagamento. Sobre recursos de origem internacional, informa que antes até obtinham alguma verba, especialmente da Igreja Católica e da organização Caritas. No entanto, faz muito tempo que não recebem recursos, especialmente desde a abertura do Leste Europeu.”.

O Ministério das Cidades informou que “não foram verificados repasses nos termos especificados” aos participantes do MST no Estado do Rio Grande do Sul (fls. 370/378). Sobre o mesmo assunto o Ministério do Desenvolvimento Social

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e Combate à Fome respondeu (fls. 379/384) que “a Ação de Distribuição de Alimentos a Grupos Populacionais Específicos – CONAB, atende acampados em situação de insegurança alimentar e nutricional que estão à espera da reforma agrária do Estado do Rio Grande do Sul; que a participação ou não dos acampados no Movimento Sem-Terra, ou qualquer outro movimento social, não é prerrogativa para que as famílias recebam as cestas de alimentos provenientes da ação supracitada; que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – por meio de sua Ouvidoria Agrária Nacional, é o órgão responsável pela indicação de atendimento às famílias acampadas que se encontram em situação de insegurança alimentar e nutricional para atender os acampados, comunidades quilombolas, comunidades de terreiros, comunidades indígenas e os atingidos por barragens, em todo o Brasil; que cada cesta de alimentos pesa 22 kg e é composta por: 10 kg de arroz, 3 kg de feijão, 1 kg de fubá, 2 kg de farinha de trigo, 2 litros de óleo de soja, 2 kg de açúcar, 1 kg de macarrão e 1 kg de leite em pó; que a previsão de entrega às famílias não é mensal, e sim de três vezes ao longo de um ano; que segue abaixo, quadro com o número de cestas distribuídas aos acampados do Estado do Rio Grande do Sul em 2005, 2006 e 2007 (até julho):

2005 2006 2007

N.º famílias atendidas 2.500 2.831 2.831 Quantidade cestas distribuídas 22.964 20.384 13.537

Quanto ao custeio de acampados do MST a Secretaria da Justiça e do Desenvolvimento Social do Rio Grande do Sul, respondeu (fls. 385/387) que “a informação deverá ser obtida junto às Prefeituras Municipais, onde existem os assentamentos. Os integrantes desse movimento que possuem renda percapita de até 1/2 salário mínimo deverão estar cadastrados no Cadastro Único dos programas sociais do Governo Federal e de acordo com os critérios do PBF para poder ser beneficiário. A inclusão de novas famílias do PBF é feita somente pelo Governo Federal de acordo com a Lei que instituiu o Programa e o Decreto nº 5209, de 17/09/2007 (Seção I – Da seleção de famílias beneficiárias).”.

O Comandante-Geral da Brigada Militar, Cel. Nilson Nobre Bueno,

prestou depoimento (fls. 396/397): “Pelo Comandante foi manifestada a preocupação da Brigada Militar com os

fatos que estão ocorrendo no Estado envolvendo o MST. Foi dito que está havendo uma grande movimentação do aludido Movimento de várias partes do Estado em direção à Fazenda Coqueiros em Carazinho, o que tem gerado a necessidade de muita atenção da Brigada Militar para evitar um conflito com os fazendeiros. Desde muito tempo tem sido enorme o investimento de recursos humanos e financeiros por parte da Brigada Militar para atender o Movimento dos Sem Terra. Em especial, no presente momento, está havendo necessidade de mobilização muito grande da Brigada Militar com o deslocamento de efetivo para acompanhar a movimentação do MST em direção à Fazenda Coqueiros e há uma grande preocupação, pois será necessário destino de um grande efetivo para eventualmente mediar o encontro do Movimento nas proximidades da Fazenda Coqueiros em breve. Esta movimentação da Brigada Militar está gerando grandes gastos financeiros para o Estado. O Comandante informa que em Pedro Osório, recentemente, houve um conflito do MST com os

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fazendeiros no qual houve a necessidade de intervenção da Brigada Militar. Na ocasião houve feridos por parte do MST, dos fazendeiros e da membros da Brigada Militar, sendo instaurado inquérito para apuração dos fatos. Pelo Comandante foi dito que até a próxima segunda-feira, 1º de outubro, enviará ao Ministério Público nas pessoas dos Promotores aqui presentes, o relatório de despesas da Brigada Militar para o atendimento da movimentação do MST. Na presente audiência houve o fornecimento de um relatório formatado em CD relativo ao MST no Estado, na atualidade”. Material constante no Anexo III – Reservado. O Ministério da Educação, acerca da distribuição ou não de benefícios sociais aos participantes do MST acampados no Estado do Rio Grande do Sul (fls. 413/415) respondeu que “nos termos da Lei n.º 10.836/2004, o Programa Nacional de Renda Mínima vinculado à Educação – Bolsa Escola, foi unificado ao Programa Bolsa Família, da alçada daquela Pasta”, referindo-se ao Ministério do Desenvolvimento Social.

É a síntese das diligências desenvolvidas pelos investigadores.

Ao analisar os dados coletados e cumprir a determinação do egrégio Conselho Superior do Ministério Público, os Investigadores enfocam as atividades de inteligência, destacando que ela é fundamental para a tomada de decisão e planejamento estratégico, assim, tudo foi realizado nos estritos termos legais.

Os Investigadores explicam a metodologia empregada, referindo os seguintes tópicos: 1. compreensão do fenômeno MST, 2. identificação de seus focos de atuação, 3. esclarecimento de seu modus operandi, 4. levantamento das conseqüências de sua atuação, fáticas e jurídicas, 5. propositura de linhas de enfrentamento do problema. Neste sentido, houve um uso intensivo das chamadas fontes abertas1.

Ao analisar o fenômeno MST, os Investigadores fizeram uma pesquisa da história e evolução dos movimentos agrários. Destaca-se como fundamental para a compreensão do problema que envolve o MST, as seguintes considerações:

Os movimentos de protesto no campo brasileiro principiam nos anos 1 As fontes de inteligência (Intelligence Sources) são pessoas, documentos, organizações ou equipamentos de onde se origina o dado de Inteligência. Quanto à sua natureza podem ser humanas, eletrônicas, de sinais e de imagens. Já as fontes abertas (Open Sources) consistem em dados e/ou informações de domínio público, ou seja, encontram-se disponíveis para qualquer pessoa, podendo ser legal e eticamente acessadas (http://www.abraic.org.br/v2/glossario.asp?letra=F).

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50, com a constituição e multiplicação de sindicatos de trabalhadores rurais, e, na seqüência, com a formação das chamadas Ligas Camponesas, notadamente no Nordeste. Com o crescimento daquelas organizações, outros atores, como o Estado, os partidos políticos e a Igreja Católica, entraram vigorosamente em cena, disputando o controle do processo de organização dos “pobres do campo” 2. No Rio Grande do Sul, esse processo de organização e protesto no campo adquiriu contornos radicais com a formação, em 1960, do MASTER (Movimento dos Agricultores Sem Terra), organizado para ser o instrumento de reforma agrária no Rio Grande do Sul. Suas principais lideranças fundadoras foram o ativista de esquerda Paulo Schilling, o deputado Ruy Ramos e Milton Seres Rodrigues, Prefeito de Encruzilhada do Sul. Na seqüência, Schilling foi convidado por Leonel Brizola, Governador do Rio Grande do Sul, para assumir a chefia do setor agrário em sua assessoria. A atmosfera de crescente radicalização ideológica manifestava-se em atos como o reconhecimento do MASTER como entidade de "utilidade pública", e o apoio do governo do Estado aos "acampamentos" de sem-terra exigindo a expropriação das fazendas ao lado das quais estavam posicionados. No Nordeste, na mesma época, Francisco Julião, líder das Ligas Camponesas, sublevava o campo e incentivava a violência contra os proprietários de terras, criando um clima de ‘guerra civil’. Como resultado dessa agressividade, a questão agrária acabou tornando-se um importante elemento detonador do movimento político-militar de 1964. A pacificação do campo foi promovida com a supressão dos movimentos organizados e com a introdução de legislação de teor reformista, como, v.g., o “Estatuto da Terra”3.

Os movimentos de protesto no meio rural começam a reviver no final da década de 70, por várias causas, entre elas a liberalização política do período e, da mesma forma, o processo sem precedentes de modernização e desenvolvimento na produção primária. O MST vem à luz no Rio Grande do Sul, atendendo à especificidade econômica e cultural da região. Sobre o tema, explica ZANDER NAVARRO 4:

Os determinantes principais que contribuíram para a emergência e o desenvolvimento desses novos movimentos sociais rurais, iniciando-se pelo Sul do Brasil (e no Rio Grande do Sul em particular), entre o final da década de 1970 e os anos posteriores, poderiam compor uma longa lista, incorporando desde aspectos

2 Conforme NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232. 3 Lei n. 4.504, de 30 de novembro de 1964. 4 ZANDER SOARES DE NAVARRO é Professor do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS e pesquisador visitante do Instituto de Estudos sobre Desenvolvimento, na Inglaterra. Doutorou-se em sociologia na Universidade de Sussex, Inglaterra, e fez pós-doutorado no Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos EUA.

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relacionados à história da participação política naquele estado, à existência de uma “cultura de organização” que as comunidades rurais tradicionalmente apresentam ou, ainda, elementos reativos como a oposição ao controle exercido pelas elites locais. Nesta seção se argumentará, contudo, que esses movimentos sociais na região citada resultaram principalmente de três fatores: a liberalização política do período, nos anos finais do ciclo militar; as mudanças estruturais na economia agrária dos estados que modernizaram sua agricultura (basicamente, o Centro-Sul do Brasil) e seus impactos sociais, além da ação de setores progressistas da Igreja Católica, inspirados inicialmente pela exacerbação dos conflitos no campo, que cresceram exponencialmente nos anos setenta e, posteriormente, já na década seguinte, emoldurados pelos aparatos discursivos propostos pela Teologia de Libertação, fatores esses que, como seria esperado, exerceram influência diferenciada no tempo e no espaço agrário (Navarro, 1996). A materialização dos efeitos combinados desses três fatores, particularmente nos estados sulistas, deve-se às características específicas da agricultura nesta região brasileira. São estados com forte presença de agricultores familiares e onde a Igreja Católica tem presença igualmente expressiva em termos de mediadores e estruturas físicas, provavelmente sem comparação com outros estados brasileiros (em vista da histórica presença da Igreja exatamente entre as comunidades rurais, aí recrutando filhos de agricultores para a carreira religiosa e, também, contando com o apoio material das famílias rurais para construir igrejas, casas paroquiais, seminários e, inclusive, a sua manutenção ao longo do tempo). O processo de modernização agrícola dos anos setenta integrou a maior parte dessas famílias rurais aos diferentes circuitos econômicos e financeiros e, quando esgotado, criou crescentes problemas de reprodução social, fazendo inevitável uma aliança entre o braço rural da Igreja Católica, representado pela Comissão Pastoral da Terra (com seus mediadores oriundos, precisamente, da agricultura familiar) e as nascentes organizações populares do período, como as entidades sindicais e os movimentos sociais, como o MST. Somente após a sua consolidação nos estados do Sul, durante a maior parte dos anos oitenta, é que foi possível, gradualmente, para estas novas organizações, ampliar seu raio de ação para os demais estados, o que ocorreu na segunda metade daquela década e, em especial, a partir dos anos noventa. 5

Agregadas certas condições objetivas (modernização

tecnológica da produção primária, liberalização política e atuação da Igreja Católica) às condições culturais específicas da Região Sul (a “cultura de organização” de que fala NAVARRO), delineava-se a possibilidade de eclosão de um movimento contestatório no campo brasileiro. O MST veio preencher esse espaço na cena política nacional, articulando um discurso de cariz fortemente anticapitalista e esquerdista. (grifou-se)

5 NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232.

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Pode-se dividir a história do MST em quatro momentos principais 6: a) o primeiro momento é o dos anos de formação, do início da década de 1980 até 1985, quando os primeiros grupos de sem-terra foram organizados, principalmente no Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Nesse período, o MST contou com a forte presença de mediadores religiosos ligados a grupos da Igreja Católica, inclusive como dirigentes do próprio movimento e, no geral, selecionou ações de pressão que não tinham caráter de enfrentamento, optando freqüentemente pela negociação e tendo como interlocutor principal os governos estaduais. b) a segunda etapa ocorreu entre os anos de 1986 e 1993. Neste período, as ações do Movimento gradualmente tornaram-se principalmente confrontacionais (simbolizado, inclusive na mudança do slogan principal, de “Terra para quem nela trabalha” para “Ocupar, resistir, produzir”), com vários episódios de enfrentamento com policiais, em virtude de uma nova orientação interna, que privilegiava esta tática de luta — particularmente, a partir da recusa dos sem-terra em submeter-se à direção assumida até então por mediadores da Igreja Católica. A partir desta fase, portanto, inverte-se a relação entre os mediadores religiosos, os quais, se antes definiam a orientação geral do movimento, passaram gradualmente a atuar como quadros auxiliares da organização, permanecendo na órbita do MST apenas os quadros mais radicalizados do clero católico. No Rio Grande do Sul, um episódio que bem ilustra esta fase foi o “conflito da Praça da Matriz”, ocorrido no centro de Porto Alegre, em agosto de 1990, quando os sem-terra enfrentaram a Brigada Militar e mataram um soldado7, em incidente cuja violência surpreendeu fortemente a opinião pública deste Estado. c) o terceiro momento engloba os anos mais recentes, iniciando-se em 1994, quando o MST viu-se envolvido em um conjunto novo de fatos políticos, como a nova realidade dos assentamentos, agora em grande número, que exigia respostas rápidas quanto à organização da produção e dos produtores nestas áreas. O fato marcante, no entanto, é que o MST, a partir daquele ano, estabeleceu-se definitivamente em São Paulo, o Estado mais influente da Federação, conseguindo consolidar-se e descobrindo um campo privilegiado de atuação, o Pontal do Paranapanema. Outra razão para a crescente força política e capacidade de pressão do MST derivou de alguns eventos trágicos de enfrentamento entre a força pública e os militantes do MST. O mais conhecido desses eventos foi o incidente de Eldorado dos Carajás, ocorrido em abril de 1996. Esses eventos trouxeram momentaneamente a opinião pública para o lado da organização dos sem-terra. Nesse contexto, o III Congresso Nacional do MST modificou novamente o seu slogan, agora para “Reforma agrária: uma luta de todos”.

6 Segue-se o modelo analítico de NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232. 7 http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/reforma_agraria/arquivo/150890.html.

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d) uma quarta fase, correspondente ao momento atual do MST, iniciada a partir de 1998, quando as dificuldades para a ação da organização ampliaram-se notavelmente. Há um crescente isolamento do MST, em relação às demais organizações populares do campo, e até mesmo em relação a algumas entidades urbanas antes aliadas, refletindo o extremismo do conjunto de recentes escolhas políticas da organização. (grifou-se)

Os outros movimentos de contestação no campo A disciplina estrita a que o MST submete sua militância8 haveria necessariamente de gerar dissidências. Segundo informações colhidas em revista de circulação nacional9, estima-se que cerca de setenta entidades participem de acampamentos e invasões de terra no país. Entre elas, há sindicatos e associações e, no mínimo, 27 movimentos autônomos10 inspirados no MST. A maioria dos movimentos tem atuação apenas local, mas alguns lograram alcançar projeção na mídia. Os movimentos mais importantes, além do MST, são os que seguem: 1. MLST (Movimento de Libertação dos Sem-Terra) – Criado em 1994, tem acampamentos em seis Estados - Maranhão, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Bahia, Minas Gerais e São Paulo. Formado por militantes de extrema esquerda, o movimento é ainda mais radical que o MST. Prega abertamente a tomada do poder pela força e defende a eclosão da revolução socialista a partir do campo. Apesar do radicalismo retórico, sua prática não difere muito da do MST. Alguns pesquisadores consideram o surgimento desse movimento como o produto de uma “guerra de egos” dentro do MST11. Além do criticismo existente entre as lideranças dos movimentos12, já houve inclusive confronto armado entre o MST e o MLST 13.

8 Existe um interessante estudo acadêmico acerca da marcha em direção a Brasília promovida pelo MST, em 1997. A autora relata o controle quase militarizado do evento, as fortes penalidades existentes e a condução do processo de forma inteiramente centralizada. Descrevendo o caso de expulsão de um integrante da marcha, por suposta transgressão das normas, a autora afirma: “(...) Há muitas formas de coibir a expressão, e distintos modos de controle social (...) o desacordo tendia a ser compreendido como indisciplina e, segundo a gravidade, podia redundar em expulsão (...) Esse temor tornou-se presente na Marcha Nacional; no entanto, é cotidiano nos acampamentos do MST: muitos sem-terra dispõem-se de tudo para neles garantir por um tempo a subsistência da família e a sobrevivência do sonho da terra (...) O poder silencioso do medo, que faz calar, tornar-se-ia ainda mais opressivo nos últimos dias da Marcha Nacional”. (CHAVES, Christine de Alencar. A marcha nacional dos sem-terra. Rio de Janeiro: Relume Dumará, UFRJ: Núcleo de Antropologia da Política, 2000, p. 217-218, grifou-se). 9 http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/reforma_agraria/personagens_movimentos.html. 10 Segundo informações do Superintendente Regional do INCRA, seriam 19 movimentos no país. 11 http://www.usp.br/agen/repgs/2003/pags/019.htm. 12 http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u79406.shtml.

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2. MLT (Movimento de Luta pela Terra) – Apareceu em 1994, no sul da Bahia, com o desemprego provocado pela crise das fazendas de cacau da região. Está organizado em quatro Estados: Minas Gerais, Bahia, Sergipe e Pará. Reúne 4.000 famílias, das quais 1.000 já foram assentadas. Adota as mesmas táticas do MST: invasões, acampamentos de beira de estrada e ocupações de prédios públicos. 3. MAST (Movimento dos Agricultores Sem-Terra) – Surgiu em 1998, na região do Pontal do Paranapanema, em São Paulo, e mais tarde se ampliou para o interior do Paraná. Foi fundado por militantes da Social Democracia Sindical, uma central sindical de direita, e por dissidentes do MST14. Hoje, representa 800 famílias. De todos, é o movimento de sem-terra mais moderado: opõe-se às ocupações de terra, não reclama da estrutura agrária do país e defende uma reforma negociada. 4. MTL (Movimento Terra, Trabalho e Liberdade) – Fundado em 2002, é um movimento com caráter político, pois apela aos estudantes e trabalhadores das cidades para que se unam a fim de implantar “um novo modelo econômico e social”. O MTL atua, basicamente, no Triângulo Mineiro e Sudoeste de Goiás. Sua base de apoio parece ser ligada a grupos de inspiração trotskista, como se pode perceber das lideranças que compareceram ao III Encontro Nacional do Movimento15. Nenhum desses movimentos, entretanto, tem a penetração territorial e o aparato de organização do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), que, por ser o maior e mais antigo, está presente em 23 Estados e tem dezenas de milhares de famílias acampadas em todo o país. A presença de tais movimentos deve ser referida com a a finalidade de proporcionar uma melhor percepção do mosaico de forças que compõem os movimentos em prol da reforma agrária no Brasil. (grifou-se)

Outro aspecto de relevância é a rede de apoio internacional, que

os investigadores assim delinearam:

É importante notar que o MST dispõe de ampla rede de apoio internacional, o que permite um fluxo permanente no levantamento de fundos, assim como a manutenção de um clima de solidariedade e simpatia para com o movimento. Não por acaso, o próprio movimento, para facilitar o acesso de estrangeiros dispõe de uma página na Internet totalmente em inglês (Brazil’s Landless Workers Movement16), demonstrando profissionalismo em gestão de informações e em relações públicas. Além disso, a rede de apoio também se apresenta organizada, 13 http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u79289.shtml. 14 http://www.biblioteca.unesp.br/bibliotecadigital/document/?did=4025. 15 http://www.mtl.org.br. 16 http://www.mstbrazil.org.

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mostrando ao público estrangeiro uma visão de Brasil frontalmente crítica à atuação do Poder Público e inteiramente de acordo com os objetivos estratégicos do MST. Refira-se, à guisa de exemplos, a atuação do “Comité de Apoyo de Madrid”17, e a campanha de levantamento de fundos feita nos Estados Unidos da América pela organização “Friends of the MST”, que dispõe de sete núcleos naquela nação (San Francisco, Seattle, Louisville, Chicago, Boston, New York e Washington)18. Além dos dois exemplos citados, existem dezenas de organizações de apoio ao redor do mundo, emprestando suporte ideológico e mesmo apoio material, quando necessário. Outro tipo de apoio é prestado pela organização La Via Campesina, que se define como um movimento internacional de camponeses, pequenos e médios proprietários, sem-terra, mulheres do campo, povos indígenas, jovens do campo e trabalhadores rurais19. Embora pretenda defender bandeiras como soberania alimentar e agricultura familiar, a Via Campesina tem atuado como um guarda-chuva debaixo do qual se abrigam movimentos agrários radicais em diversos países, constituindo uma organização-pólo – o MST é filiado a essa entidade. No Brasil, a Via Campesina foi responsável pelo recente episódio de vandalismo contra o viveiro da Aracruz Celulose S/A, ocasião em que foram destruídas cinco milhões de mudas20. (grifou-se)

17 http://www.mstmadrid.org. 18 Conforme notícia do jornal Zero Hora em 18 de julho de 2007, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) iniciou, no domingo, uma campanha de levantamento de fundos nos Estados Unidos. Um e-mail pedindo doações foi disseminado pelo país pelos sete núcleos do grupo - San Francisco, Seattle, Louisville, Chicago, Boston, Nova York e Washington - sob o selo do Friends of MST (Amigos do MST). De acordo com a solicitação, as doações podem ser feitas online, por cartão de crédito, cheque, dinheiro ou ordem postal, a serem enviados a uma caixa postal em Santa Cruz, na Califórnia. A quantia, diz o pedido, poderá ser descontada na declaração do imposto de renda nos EUA. O dinheiro deverá ser utilizado para bancar a Escola Nacional Florestan Fernandes, construída pelo grupo em Guararema (SP). “A Escola Nacional já está servindo ao seu propósito de promover o pensamento, o planejamento e a organização de ativistas do MST e seus líderes eleitos e de, ao mesmo tempo, desenvolver o seu treinamento político, técnico e ideológico” - diz o material que acompanha a solicitação. Em entrevista a O Globo, o norte-americano Miguel Carter, professor da American University e coordenador do grupo em Washington, afirmou que se trata da primeira universidade camponesa da América Latina: “Nossa perspectiva é a de levantar um bom volume de recursos, pois tanto os membros do ‘Amigos do MST’ quanto outras pessoas procuradas por nós apóiam a luta contra o apartheid social que existe no Brasil”. Os núcleos da Amigos do MST são formados por universitários, representantes de ONGs, pequenos empresários e profissionais brasileiros e norte-americanos. Anualmente eles costumam fazer marchas em Washington. O grupo sugere uma doação mínima de US$ 25 (cerca de R$ 50). “O MST está contando com a ajuda de seus amigos ao redor do mundo”, diz um trecho do material. O texto informa que, ao longo de cinco anos, 112 assentamentos e 230 acampamentos do MST em 20 dos 27 Estados brasileiros enviaram mais de 1,5 mil voluntários para construir a Escola Nacional Florestan Fernandes. A construção foi financiada com vendas do livro Terra, com texto do escritor português José Saramago, fotografias de Sebastião Salgado e um disco de Chico Buarque, além de contribuições do Exterior. 19 http://www.viacampesina.org.

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Os Investigadores analisam a situação no Rio Grande do Sul:

A situação no Rio Grande do Sul aponta para a predominância absoluta do MST nos acampamentos. Aos acampados, o INCRA fornece lona e efetua o repasse de cestas básicas originárias do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (“Fome Zero”). Confira-se o depoimento prestado ao Ministério Público pelo Superintendente Regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA no Rio Grande do Sul, MOZAR ARTUR DIETRICH, que compareceu acompanhado do Superintendente Regional Substituto, JOSÉ RUI CANCIAN TAGLIAPIETRA21:

Pelo Sr. Mozar, inicialmente, houve o fornecimento de uma relação de

acampamentos do MST no Estado, contendo também o número de famílias, de cestas básicas e lonas fornecidas. (...) O Sr. Mozar informa que no total são 19 grupos no Brasil que lutam pela terra. A Via Campesina possui outro papel, pois unifica lutas ligadas à reforma agrária e à agricultura familiar. É uma espécie de articulação política dos movimentos. O MPA é um movimento de pequenos agricultores não é ligado ao MST e à FETAG, mas integra a Via Campesina. São ligados à FETRAFSUL. Neste momento, também é feita a entrega de uma relação de controle de entrega de cestas de alimentos aos integrantes do MST e assentamentos feita no mês passado. O Sr. Mozar informa que há um cadastro de 2005 dos acampados. Não está atualizado, pois ao final de 2005 houve tentativa de recadastramento e os funcionários do INCRA foram hostilizados, com resistência dos acampados. No ano de 2006 não houve cadastramento. No presente ano deverá haver um novo recadastramento. Não há resistência do MST para este trabalho na atualidade. Os comparecentes informam que há um cadastro em poder do INCRA contendo 25.000 pessoas que se cadastraram pelo correio durante o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Informam que no último ano o INCRA retirou mais de 200 famílias acampadas nas proximidades da Fazenda Coqueiros. Porém, quanto mais o INCRA assenta, mais aumenta o número de acampados. No ano de 2006, foram assentadas 858 famílias. Porém, encerrou o ano com 2.750 famílias acampadas em dezembro. No início de 2006 eram menos de 2.000 famílias acampadas. O Sr. Mozar informa que o relacionamento com os atores envolvidos com o problema da reforma agrária é de “marisco”, isto é, a autarquia é cobrada por todos os envolvidos. Os focos de litígio atualmente existentes no Estado são a Fazenda Coqueiros, Nova Santa Rita, São Gabriel e Pedro Osório. Há também acampamentos grandes em Santana do Livramento e em Bossoroca. Quanto à Fazenda Coqueiros, há o encaminhamento de pedido de desapropriação por interesse social genérico pela Lei 4.132, que está sendo analisado pela Chefia da Casa Civil. Em São Gabriel, na área é identificada por Fazenda Soutal, há tentativa de desapropriação pelo INCRA por descumprimento da

20 http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI909064-EI306,00.html. 21 Autos principais, fls. 139/142.

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função social da propriedade, pois este deve preencher quatro requisitos, isto é, o cumprimento e observação da legislação ambiental, geração do bem estar social pelo proprietário e seus funcionários, a produção racional e adequada, que se confunde com produtividade, e o cumprimento das obrigações trabalhistas. Em Pedro Osório, a proprietária da Fazenda da Palma foi notificada para avaliação do cumprimento da função social. Entretanto, houve ocupação do MST, o que levou à retirada do INCRA. Em Nova Santa Rita, o proprietário ofertou a Fazenda ao INCRA para venda. Porém, o INCRA somente paga por meio de TDAs. Em virtude de invasão recente com depredação, houve um recuo no negócio. O INCRA está efetuando vistorias de cumprimento da função social em propriedades no Estado. Há quatro equipes para tanto. Nesta semana estão sendo notificadas mais de 10 propriedades. Há uma boa chance de as áreas não cumprirem a função social e, se isso se confirmar, serão encaminhadas para desapropriação sanção. O INCRA também está efetuando levantamento para fins de ação discriminatória em áreas devolutas ou federais ocupadas indevidamente. Houve, também, neste momento, a entrega de três listas de projetos de assentamentos realizados pelo INCRA, pelo Estado do Rio Grande do Sul e em conjunto INCRA-Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Informa o Sr. Mozar que há um enorme número de famílias que foram assentadas em conjunto entre o INCRA e o Estado do Rio Grande do Sul que ainda não conseguiu a sua infra-estrutura necessária e crédito, estando ainda pendentes de regularização em função de inadimplemento por parte do Estado de seus compromissos. O Estado do Rio Grande do Sul não está atuando em áreas de quilombos, sem-terra e índios. (...).

Verifica-se, assim, pelos dados complementares fornecidos pelo INCRA quando do comparecimento de seus representantes na sede do Ministério Público (tabelas que serão reproduzidas no tópico infra), que existem 2.262 famílias acampadas no Estado do Rio Grande do Sul, sendo que desse número, 2.170 famílias estão ligadas ao MST. Conforme consta das tabelas que serão reproduzidas mais adiante, existem 20 (vinte) acampamentos no Estado do Rio Grande do Sul, sendo que 13 controlados pelo MST e mais 7 (sete) acampamentos “independentes”, isto é, não ligados a nenhum dos grandes movimentos agrários.

Quanto à localização dos acampamentos:

Segue agora reprodução das tabelas entregues pelo Superintendente Regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA no Rio Grande do Sul dos acampamentos coordenados pelo MST:

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ACAMPAMENTOS LOCALIZAÇÃO N.º DE FAMÍLIAS

N.º DE CESTA

S

OBS

SARANDI BR 386 – KM 20 50 50 1 Rolo de Lona

COQUEIROS BR 386, ESTRADA VICINA, PRÓXIMO À VILA XADREZ

400 400 8 Rolos de Lona

TUPANCIRETÃ BR 158, KM 29 – PERTO DO FRIGORÍFICO DE TUPANCIRETÃ

190 190 3 Rolos de Lona

SÃO BORJA PRÓXIMAS À ÁREA MERCÊS E PALERMO

50 50 1 Rolo de Lona

BOSSOROCA RS 158, 6 KM DA CIDADE EM DIREÇÃO À SÃO TIAGO

180 180 3 Rolos de Lona

COQUEIROS/CABRITO

CARAZINHO – VIA VICINAL – PASSO DOS CABRITOS

160 160 2 Rolos de Lona

ARROIO DOS RATOS

BR 290, KM 149 50 50 1 Rolo de Lona

NOVA SANTA RITA BR 386, KM 431 – PRÓXIMO AO POSTO ESSO

420 420 6 Rolos de Lona

LIVRAMENTO BR 293 TREVO FAXINAL – NO PA FIDEL CASTRO

50 50

PEDRO OSÓRIO BR 116 KM 571 DIVISA PEDRO OSÓRIO ARROIO GRANDE

180 180 4 Rolos de Lona

SÃO GABRIEL RS – 530 PASSO DO PEDROSO, BALNEÁRIO ESTRADA VICINAL

300 300 5 Rolos de Lona

CHARQUEADAS VILA DOS PORTOS 515 PRÓXIMO GERDAL

50 50 1 Rolo de Lona

NOVA SANTA RITA GRANJA NENÊ 90 90 2 Rolos de Lona

TOTAL: 2.170 2.170

Segue agora a relação dos acampamentos “independentes”, ou seja, não vinculados ao MST, com discriminação dos mesmos dados apontados na tabela anterior:

ACAMPAMENTOS LOCALIZAÇÃO N.º DE FAMÍLIAS

N.º DE CESTAS

OBS

BOA VISTA DO INCRA I

BOA VISTA DO INCRA 10 10

BOA VISTA DO INCRA II

BOA VISTA DO INCRA 15 15

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BOA VISTA DO INCRA III

BOA VISTA DO INCRA 14 14

URUGUAIANA URUGUAIANA 14 14 Transportadora PELOTAS BR 116 KM 420 10 KM

ANTES DA CIDADE 01 01 Supervisor

CAPIVARI/FAZENDA GALINHA

BR 101 – 10KM ANTES DA CIDADE EM DIREÇÃO A

CAPIVARI DO SUL

10 10

NOSSA SENHORA DE LOURDES

SÃO LOURENÇO DAS MISSÕES – MUNICÍPIO DE

SÃO LUIZ GONZAGA

28 28 1 Rolo de Lona

TOTAL: 92 92

O aspecto mais preocupante e que interessa à compreensão do

MST no contexto da segurança nacional está na estratégia de atuação. Os

Investigadores observaram que:

A estratégia “confrontacional” adotada pelo MST reflete-se em seu modelo de organização e em sua estratégia prática de atuação. O movimento estrutura-se como um Estado paralelo, contando com “instituições internas” que regem todos os aspectos das vidas dos militantes que residem nos acampamentos. Para a elucidação do tema, é de suma valia o material apreendido pela Brigada Militar de Carazinho, e que compõe o Anexo II destes autos. Não se trata mais de estudo acadêmico ou de interpretações realizadas por terceiros acerca do assunto, o que constituiria fontes secundárias, mas de material que circula entre os acampados, verdadeira fonte primária. (grifou-se)

Alguns trechos do material merecem destaque:

- Nas fls. 09/14 encontra-se o regimento interno do acampamento, estabelecendo as quatro instâncias decisórias internas: coordenação, núcleos, direção e assembléia geral (fl. 09). - No capítulo II do regimento encontra-se o dever de todo acampado participar de todas as ações do acampamento. - A partir da fl. 27 está juntada cópia de agenda com anotações de lavra dos próprios sem-terra, documento único pela possibilidade

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que enseja de compreender a estratégia do movimento a partir da visão dos protagonistas, militantes do MST. - Na fl. 67, encontra-se uma avaliação de tópicos positivos e negativos na atuação do movimento. Entre os comportamentos avaliados positivamente, encontram-se itens como “as crianças resistiram” e “DH [sic] atirou bem”. Entre os itens tidos como negativos, aponta-se a “Brigada passando por dentro do ocupado nosso [sic]” e “pessoas com foices juntas nas horas das imagens”. - Na fl. 97 há anotações explícitas sobre estratégia. Os apontamentos relacionam Judiciário, latifúndio, Brigada Militar e meios de comunicação social. Fala-se em “luta massiva e prolongada”, “matando eles no cansaço”. - Na fl. 107 há uma apresentação do que é o MST, definido como um grupo que tem por objetivo “a construção de uma nova sociedade”. Na mesma página há a divisão de tarefas por setores: saúde, infra [sic], DH [sic], educação, secretaria, produção e finanças. - Na fl. 108 há uma lista de nomes, presumivelmente de figuras históricas importantes para o movimento. Na lista constam, entre outros, os seguintes nomes: Che Guevara, Paulo Freire, Rosa Luxemburgo, Sepé Tiarajú, José Martí, Chico Mendes, Olga Benario, Florestan Fernandes e Zumbi dos Palmares. - Nas fls. 121/122 existem letras de canções do movimento, com fraseologia de cunho revolucionário (“poder popular”, “sufocando com força nossos opressores”, “pátria livre, operária, camponesa”). - Nas fls. 154/155 encontra-se referência a uma obra de Anton Makarenko, pedagogo soviético, sendo que o exemplar pertence ao ITERRA (fl. 155). - Para sair do acampamento é necessária uma liberação. Na fl. 226 é narrado o caso de um acampado que falsificou essa liberação. - Na mesma linha, na fl. 228 fica definido que o acampado que desistir de pertencer ao acampamento não mais poderá a ele retornar, e que só poderá ingressar em outros acampamentos no prazo de seis meses. - Na fl. 232, novamente em tópico sobre estratégia, as ações do MST em relação à Fazenda Coqueiros (chamada no texto de Guerra) são definidas como ações sobre uma área símbolo. A expressão reaparece na fl. 247.

O material demonstra o caráter paramilitar do movimento, que dispõe:

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(1) de uma organização interna hierarquizada, que emula em alguns pontos a estrutura estatal; (2) de uma pauta de ações que privilegia o combate e a criação de espaços territoriais onde a força pública não possa ingressar; (3) de uma estratégia de atrito prolongado contra o Estado e os empreendedores privados (“matando eles no cansaço”); (4) de uma percepção de que as instituições públicas (Poder Judiciário, Brigada Militar) e os empreendedores privados (produtores rurais, meios de comunicação) são oponentes do movimento; (5) de um “panteão” de ícones inspiradores do movimento, a maior parte ligada a movimentos revolucionários ou de contestação aberta à ordem vigente; (6) de uma fraseologia agressiva, abertamente inspirada nos slogans dos países do antigo bloco soviético (“pátria livre, operária, camponesa”); (7) de um controle rígido sobre os acampados, não só na obrigatoriedade de tomar parte nas ações de confronto, como inclusive na liberdade de ir e vir.

A lista de características acima deduzida apenas vem certificar a assertiva de ZANDER NAVARRO, no sentido de que a direção nacional do MST aderiu a um “ideário leninista, ainda que simplificado”22. A concepção de partido exposta por Lênin no “Que Fazer?” propõe um modelo de organização formado por revolucionários profissionais, atuando simultaneamente na legalidade e na ilegalidade23 – exatamente como faz o MST. É nesse espírito leninista que deve ser compreendida a opção do MST pela extralegalidade, recusando inclusive a personalização jurídica, enquanto que, ao mesmo tempo, utiliza-se dos instrumentos legais para, e.g., promover o assentamento de seus militantes em áreas desapropriadas. (grifou-se)

Outro aspecto de extrema relevância para análise reside no

22 NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232, grifou-se. 23 Segundo Florestan Fernandes (que viria a emprestar seu nome para Escola Nacional do MST, ainda em fase de implementação), Lênin “propõe nada mais nada menos que a alternativa do anti-Estado, a organização de um Estado dentro de outro Estado, ou seja, a organização da revolução” (FERNANDES, Florestan. Apresentação. Apud LÊNIN, V.I. Que fazer? São Paulo: Hucitec, 1986, p. X, grifou-se).

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financiamento das atividades do MST, que os Investigadores assim

abordaram:

Um tema de abordagem tradicionalmente difícil e controversa tem sido o do financiamento das atividades do MST. De onde provém os recursos que sustentam o movimento? A resposta não é simples, mas a solução foi apontada em entrevista de página inteira concedida pelo Professor ZANDER NAVARRO ao jornal “O Estado de São Paulo” em 29 de abril de 2007. A matéria jornalística, sintomaticamente, intitula-se “Não existiria nenhum abril vermelho sem recursos públicos”. Cumpre, pois, reproduzir alguns trechos:

Muitas atividades do MST são financiadas com recursos públicos, por meio de convênios com entidades controladas para organização, como a Associação Nacional de Cooperativas Agrícolas. O senhor acha que esse dinheiro é bem empregado? A partir dos anos 90, o financiamento do MST oriundo das doações de igrejas européias começou a escassear, ao mesmo tempo em que se descobriu a porta das burras do Estado. São dois os estratagemas. Primeiramente, mantêm sob estrutura não formal o MST - que não é registrado, não tem estatuto, não tem processos públicos de escolha de sua direção e não presta contas de nada. Isso permite proteger suas lideranças em todo o País, ocorrendo alguma ilegalidade. Algo bizarro, porque o MST vive cobrando democracia e transparência no comportamento das demais organizações políticas do País. E o segundo estratagema? O outro caminho é registrar dezenas de organizações, sobre as quais ninguém ouviu falar (cooperativas, associações, organizações de técnicos). Essas últimas, por serem regulares, preparam projetos para obter fundos públicos. Como o MST tem milhares de simpatizantes dentro do Estado (o que é mérito político da organização), a aprovação sempre é facilitada. Como não há fiscalização, a criatividade, digamos assim, permite um uso bastante heterodoxo dos recursos. Inclusive o financiamento de ações como o “abril vermelho”? Sim. Sem esses fundos não existiria nenhum “abril vermelho”. Mas

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existem outras formas de acesso. Por exemplo, concentrar esforços para eleger representantes no Legislativo, que depois serão marionetes da cúpula do MST. Um deputado estadual sustenta pelo menos 10 militantes em tempo integral. Um deputado federal sustenta pelo menos o triplo. Militantes colocados em cargos públicos farão o mesmo, sempre que puderem. Se não ocorressem desvios e fosse uma organização realmente democrática e aberta, por que o MST resistiria a abrir suas contas?

Esse financiamento estatal do MST pode ser percebido na própria atuação do INCRA e na prestação de auxílio aos acampados. Há o fornecimento de lonas e de cestas básicas originárias do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Apenas em julho de 2007 foram 2.742 cestas básicas, se computados os acampamentos antes referidos e os assentamentos do último ano. Encaminhou-se também, por meio do Exmo. Sr. Procurador-Geral de Justiça, um questionamento ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, acerca da existência ou não de alguma fonte de financiamento ou ajuda, direta ou indireta, aos participantes do MST acampados no Rio Grande do Sul. A resposta do Ministério foi no seguinte sentido24: 1. a Ação de Distribuição de Alimentos a Grupos Populacionais Específicos – CONAB, atende acampados em situação de insegurança alimentar e nutricional que estão à espera da reforma agrária do Estado do Rio Grande do Sul; 2. que a participação ou não dos acampados no Movimento Sem-Terra, ou qualquer outro movimento social, não é prerrogativa para que as famílias recebam as cestas de alimentos provenientes da ação supracitada; 3. que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, por meio de sua Ouvidoria Agrária Nacional, é o órgão responsável pela indicação de atendimento às famílias acampadas que se encontram em situação de insegurança alimentar e nutricional, indicando também comunidades quilombolas, comunidades de terreiros, comunidades indígenas e os atingidos por barragens, em todo o Brasil; 4. que cada cesta de alimentos pesa 22 kg e é composta por: 10 kg de arroz, 3 kg de feijão, 1 kg de fubá, 2 kg de farinha de trigo, 2 litros de óleo de soja, 2 kg de açúcar, 1 kg de macarrão e 1 kg de leite em pó; que a previsão de entrega às famílias não é mensal, e sim de três vezes ao longo de um ano;

24 Autos principais, fls. 381/382.

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Segue abaixo quadro informativo com o número de cestas básicas distribuídas aos acampados do Rio Grande do Sul em 2005, 2006 e 2007 (até julho):

2005 2006 2007

Número de famílias atendidas 2.500 2.831 2.831

Quantidade de cestas distribuídas 22.964 20.384 13.537

Essa conexão entre MST e recursos públicos foi examinada pelo Congresso Nacional. A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito criada através do Requerimento n.º 13/2003, também chamada “CPMI da Terra”, teve por objetivo realizar amplo diagnóstico sobre a estrutura fundiária e o problema habitacional brasileiro, e investigar as crescentes ações de ocupações de áreas rurais e urbanas, registradas em todo o País, bem como os movimentos de resistência às ocupações. Uma das características mencionadas no relatório final da CPMI é que o MST é um grupo econômico e que embora apresente uma estrutura bem formada, a ausência de personalidade jurídica é proposital, para evitar que seu patrimônio seja atingido em ações judiciais. Os recursos financeiros, segundo levantamento feito pela CMPI, provêm da ANCA e da CONCRAB, referidos como “braços financeiros do MST”. Seguem algumas evidências analisadas pela Comissão:

a) A ANCA e a CONCRAB compartilham o mesmo endereço, que não por coincidência, vem a ser o mesmo endereço pelo MST no timbre do ofício enviado a esta CPMI; b) Quando o Governo Fernando Henrique Cardoso cortou recursos de convênios da CONCRAB, em 2000/2002, o MST e seus dirigentes afirmaram que se tratava de perseguição ao Movimento (informação obtida nos artigos disponíveis no site do MST); c) O MST recebe doações do exterior mediante transferências financeiras destinadas à ANCA e à CONCRAB (informação obtida nos sites de doadores estrangeiros e confirmada pelos dados do SISBACEN, que chegaram posteriormente à CPMI); d) Os depósitos referentes à aquisição de publicações e materiais diversos do MST são realizados na conta corrente 117.138-0, que a ANCA mantém junto ao Banco Bradesco, na agência 0136-8 (informação disponível no site do MST e confirmada, posteriormente, pelos dados bancários da entidade). e) O domínio do MST na Internet está registrado em nome da ANCA, ali constando seu CNPJ e endereço (informação disponível do site da FAPESP);

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f) O site na Internet da CONCRAB encontra-se dentro do domínio do MST, que, como já afirmado, pertence à ANCA (informação disponível no site da FAPESP); g) O MST reconhece, expressamente, a CONCRAB como seu braço operacional junto às diversas cooperativas agrárias (informação disponível no site do MST); e h) O logotipo da CONCRAB é análogo ao do MST (círculo contendo mapa do Brasil e casal de agricultores), diferenciando-se apenas pelas inscrições ao redor do círculo.

Além das evidências, apontaram-se os seguintes elementos probatórios:

i) Ao reivindicar recursos federais, ANCA e CONCRAB apresentam planos de trabalho em que descrevem como suas as instalações do MST nos assentamentos (escolas, professores, etc.); j) Ao prestar contas aos órgãos e entidades federais, ANCA e CONCRAB citam como seus eventos que foram organizados pelo MST; k) ANCA e CONCRAB têm uma estrutura física extremamente enxuta e recursos humanos escassos (uma sede em São Paulo, uma filial em Brasília, nove auxiliares administrativos e três faxineiras), o que não permitiria o recebimento de mais de R$ 30 milhões em convênios, a não ser que o executor fosse o próprio MST; l) Advogados do MST são pagos pela ANCA; m) Recursos de um convênio federal com a ANCA foram desviados para a organização da festa de comemoração dos 20 anos do MST; n) Dirigentes da ANCA e da CONCRAB ocupam postos de direção nacional no MST; e o) Funcionários da ANCA trabalham para a CONCRAB, inclusive movimentando recursos desta entidade – e vice-versa - funcionários da CONCRAB trabalham para a ANCA, realizando atividades financeiras.

Outros dados importantes foram constatados pela CPMI da Terra:

1) Além da ANCA, CONCRAB e suas filiais estaduais, municipais e locais (AESCA/AECA, CCA, cooperativas de produção e cooperativas de crédito, associações de assentados), outras entidades também integram a estrutura do MST, ligando-se direta ou indiretamente às “entidades-mães”; 2) As “escolas do MST”: verificou-se que o ITERRA, localizado

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em Veranópolis/RS, tem como sócios-fundadores a ANCA e a CONCRAB. O sigilo bancário dessa entidade foi transferido para a CPMI da Terra, e constatou-se que as irregularidades identificadas nas entidades paulistas se repetem com surpreendente freqüência e similaridade na escola gaúcha além de haver grande e suspeita circulação de recursos entre a escola e seus sócios. A Escola Florestan Fernandes é denominada de “Universidade do MST”. Analisando o CNPJ dessa escola verifica-se que se trata de uma filial do ITERRA, ou seja, a universidade do MST pertence, indiretamente, à ANCA e à CONCRAB, os sócios-fundadores da sede. Outras escolas de grande porte do MST não puderam ser investigadas com maior profundidade, mas é certo que existem ao menos uma dezena de instituições dessa natureza que foram direta ou indiretamente criadas pela ANCA e pela CONCRAB. 3) Gráficas e Editoras: em pelo menos um caso a ligação é notória: o Jornal Brasil de Fato, que publica, em nome do MST, o periódico de mesmo nome. Uma das pessoas que fazia o serviço bancário da ANCA e da CONCRAB é, na verdade, funcionário do Jornal Brasil de Fato. Esse “compartilhamento” de empregados só se admite como lícito se ANCA, CONCRAB e Brasil de Fato foram considerados um grupo econômico (CLT, art. 3.º). Gráfica e Editora Peres: benesses em subordinação da ANCA e da CONCRAB, em diversos convênios federais, levantavam forte suspeita de pertencer à estrutura do MST. Fato curioso para a Comissão: ao mesmo tempo que a Gráfica e Editora Peres recebeu benefícios da ANCA e da CONCRAB, políticos de esquerda receberam doações ou contrataram serviços dessa empresa durante o período eleitoral de 2002, conforme mostra o site do TSE, no sistema de prestação de contas eleitorais ali disponibilizado. O presente fato não pôde ser apurado, pois houve uma “blindagem” das entidades por membros da Comissão que temiam pelos avanços que a investigação poderia ter. Os responsáveis pela ANCA e pela Sociedade Editorial Brasil de Fato, empresa que edita a revista do MST, foram intimados pela CPI para justificar os elevados saques em dinheiro feitos em nome das pessoas jurídicas mencionadas, compareceram na data marcada, mas extrapolaram o uso do direito de permanecer em silêncio.

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Destacou a Comissão, ainda, que a regra n.º 73 das Normas Gerais do MST prevê que todos os bens coletivos, móveis e imóveis do Movimento deverão ser colocados em nome da Associação Nacional de Cooperação Agrícola. Isso afasta a simples parceira, consoante definido pelos dirigentes da MST.

A CPMI da Terra apontou também diversas outras irregularidades, onde o MST utilizou-se de patrimônio alheio e de dinheiro público para a prática de seus atos, inclusive por meio de convênios:

a) uso de tratores para invasões e apropriação de dinheiro que seria destinado à construção de casas; b) cobrança de pedágio sobre empréstimo e de comissões de venda sobre aquisições de insumos agrícolas e materiais de construção; c) apropriação de área destinada a assentamento de agricultores; d) Irregularidades em convênios apuradas através de auditorias.

Realizou-se também auditoria no Estado do Rio Grande do Sul 25:

A equipe de auditoria do Rio Grande do Sul examinou 27 convênios celebrados com o Iterra pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação (MEC), Ministério da Saúde (FNS), Ministério do Trabalho e Emprego (TEM), totalizando R$ 9.431.328,01.

... 8.6.2.4. Problemas no Incra Autos de Processo não são localizados pelo Incra O processo do convênio n.º 376.571 (R$ 610.985,00 para

a formação em nível de 2º grau, com habilitação administração de cooperativas) não foi localizado pelo INCRA, o que inviabilizou a análise dos pareceres técnicos, sobre o projeto/plano de trabalho, e jurídico, sobre as minutas do convênio e seus aditivos, bem como o cumprimento dos requisitos legais para celebração.

Atraso na Liberação de Verbas Verificou-se que, como regra, o Incra não cumpre os

cronogramas de desembolso, integrantes dos planos de trabalho dos convênios. Em média, há uma atraso de 2,5 meses para o repasse de cada parcela, tendo-se observado retardamentos de até 9 meses.

25 Transcreve parte do relatório da CPMI da Terra, material constante do Anexo VII.

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Para dar um falso amparo legal aos repasses atrasados, o Incra celebra, rotineiramente, aditivos para prorrogação de prazos de vigência de convênios. Mas os cronogramas físicos-financeiros são mantidos. Ou seja, o órgão “dá um jeito” de repassar ao Iterra os recursos previstos.

Mas, a lei estabelece que não se pode pagar por serviços já executados. Assim, o efeito do descompasso entre o programado e o executado é o impasse imposto ao beneficiário dos recursos em decidir pela restituição dos recursos, ou apresentação de uma execução financeira fictícia.

O Iterra não titubeou e optou pela apresentação de papéis que não comprovam, em absoluto, a aplicação dos recursos federais nos objetos dos respectivos convênios.

Na maioria das vezes, os falsos comprovantes de despesas apresentados consistiram em notas emitidas pelo próprio Iterra, ou em recibos dos alunos do Instituto, papéis que não comprovam, é claro, a contratação de serviços de terceiros ou a aquisição de materiais.

O relatório do TCU registra que “mesmo que os repasses fossem efetuados de forma tempestiva, o valor das despesas efetivamente realizadas com alimentação e hospedagem ficam bem aquém dos valores registrados nas notas fiscais emitidas pelo próprio Iterra.

Emissão de cheque único para pagamento a vários credores

Nas relações de pagamentos efetuados, insertas nas prestações de contas, observou-se pagamentos a vários credores com um mesmo cheque. Em geral, tais despesas correspondem a pagamentos de passagens usadas por alunos e por instrutores e de honorários destes. O INCRA/RS autorizou esta prática, tendo em vista os pequenos valores envolvidos, conforme ata de reunião realizada em 03/12/99.

Contudo, essa prática dificulta a demonstração do vínculo entre os recursos repassado e a despesa realizada. Esse tipo de falha ainda que possa ser considerada formal deve ser objeto de correção, pois dificulta a comprovação da aplicação dos recursos federais no objeto do convênio.

O art. 20 da IN STN 01/97 determina que somente são permitidos saques mediante cheque nominativo ao credor ou ordem bancária. A redação atual do dispositivo incluiu a possibilidade de saques mediante transferência eletrônica e destacou que no caso de pagamento seja identificado o credor.

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Notas fiscais emitidas pelo próprio convenente A comprovação da aplicação dos recursos ocorreu, em

sua maior parte, mediante notas fiscais de prestação de serviço emitidas pelo próprio Iterra, destinadas à comprovação de despesas com alimentação e hospedagem (diárias) de assessores/professores e alunos, além de pequenas despesas com fotocópias, material de consumo e expediente e locação de computadores.

Cada nota fiscal assim emitida corresponde a um cheque da conta específica, que recebeu R$ 3.717.495,50 da União entre 1999 e 2003, emitiu nesse período notas fiscais e recibos no total de R$ 2.284.662,65 (61%) para comprovar a aplicação dos recursos.

Esse tipo de comprovação vem sendo acolhida pelo INCRA, trazendo como resultado a aprovação sistemática de prestações de contas constituídas de documentos precários, com objetivo de dar aparência de legalidade à execução financeira.

O art. 30 da IN STN 01/97 determina que as despesas serão comprovadas mediante documentos fiscais emitidos em nome do convenente e não pelo próprio convenente.

O total das notas fiscais de prestação de serviço emitidas pelo próprio Iterra é de R$ 2.284.662,65.

Recibos assinados pelo próprios alunos Mais recentemente, em substituição ao procedimento

referido no item anterior, a comprovação das despesas com hospedagem/alimentação (diárias) passou a ser efetuada mediante recibos assinados pelo alunos e assessores/professores.

Em 2004 a entidade recebeu R$ 2.137.672,51 e já comprovou R$ 843.267,40 (40%) mediante recibos assinados pelos alunos/instrutores. A tendência desse percentual é de crescimento, com expectativa de que seja tingido o percentual de 60% que vem sendo praticado no período de 1999 a 2003.

Embora alterada a sistemática de comprovação, não houve alteração significativa na situação fática.

O relatório aduz que cada conjunto de recibos referentes a diárias de uma etapa de convênio corresponde a um cheque da conta específica do convênio que é sacado pela própria entidade.

Ou seja, simula-se que o Iterra sacou o dinheiro no caixa e o distribuiu entre alunos e distribuidores. O problema é que o saque ocorre depois dos cursos e, durante os cursos, eles recebem hospedagem e alimentação fornecida pelo próprio Itetrra.

O que era de se esperar era o Iterra apresentar, por exemplo, notas fiscais referentes a compras de supermercado

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destinadas à preparação de comida para os hóspedes. O relatório concluiu que não é admissível a

comprovação de despesas com diárias mediantes recibos emitidos pelo alunos e instrutores, pois eles foram, na verdade, meros beneficiários de alimentação/hospedagem fornecida pelo convenente, sem receber qualquer dinheiro sacado pelo Iterra das contas de convênio.

Em outras palavras, os recibos de alunos e instrutores são falsos.

Como no caso anterior, o acolhimento dessa modalidade de comprovação traz como resultado a aprovação sistemática de prestações de contas constituídas de documentos precários, com o objetivo de dar aparência de legalidade à execução financiera.

Vale registrar também que, quanto à qualidade dos serviços oferecidos, houve críticas dos participantes: “Aparentemente a Escola não estava devidamente preparada para o curso”; “Faltou qualidade nutricional e criatividade no cardápio”.

Superfaturamente de diárias, alimentação e estadia A equipe de auditoria do TCU verificou, mediante dados

extraídos dos registros contábeis da entidade, considerando todas as contas passíveis de registrar despesas relacionadas a diárias, alimentação e estadia, que os cursos efetivamente incorridos pelo Iterra são significativamente inferiores aos valores apresentados pelo Instituto nas prestações de contas.

... Superfaturamento das diárias: R$ 1.741.468,94 Superfaturamento com alimentação e estadia R$

438154,39, em 2002. Nesse ponto, a equipe do TCU conclui pelo que já se

suspeitava na CPMI da Terra em relação aos convênios federais firmados com as entidades ligadas ao MST: “Na prática, verifica-se que o Iterra vem sendo financiado com recursos públicos federais oriundos de convênios. O superávit em favor do Iterra resulta na realização de despesas não relacionados ao objeto dos convênios e que não correspondem a benefícios para os alunos com alimentação e instalações compatíveis com os valores de diárias atestados pelo Iterra.

Liberação irregular de parcela No convênio nº 488.326 (R$ 795.8000,00 para

Especialização em educação do campo e desenvolvimento) ocorreu a liberação da 2ª parcela de recursos sem a aprovação de prestação de contas parcial relativa à primeira etapa.

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O convênio foi assinado pelo Presidente do INCRA e previa a liberação de recursos em três parcelas. A primeira (R$ 170.430,00) foi creditada na conta bancária do Iterra em 30/12/03. A prestação de contas referente a primeira parcela foi apresentada em 18/02/04.

Essa prestação de contas não foi analisada, estando registrada no SIAFI, em 27/07/05, na situação “A APROVAR”.

O art. 51 do Decreto 93.872/86 determina que a entrega dos recursos destinados ao cumprimento do objetivo do convênio devem ter por base o cronograma de execução, condicionando-se as entregas subseqüentes ao regular emprego da parcela anteriormente liberada.

Duas versões de comprovantes de pagamentos A facilidade que o Iterra tem para produzir falsos

comprovantes de despesas chega ao ponto de se verificar que, no convênio n.º 488.326, o Iterra apresentou duas versões de relações de pagamentos, indicando comprovantes de despesas para três cheques.

... A equipe do TCU entende que as despesas indicadas na

Tabela 6 devem ser impugnadas, “pois não é admissível que a prestação de contas seja construída, ora com uns, ora com outros documentos, ao alvedrio do convenente, a fim de adequar as supostas despesas à movimentação da conta específica.

Falhas na utilização da conta-corrente de convênio Diante das grosseiras irregularidades detectadas pela

Cecex/RS, outras parecem pouco significar. Uma irregularidade que seria greve, se não houvesse o

absurdo descrito anteriormente, é o fato de o Iterra haver uma única conta-corrente para dois convênios. O convênio n.º 424.906 teve seus recursos movimentados na conta específica do Banco do Brasil, agência 604-1, conta 7257-5 até 21/03/2005. Contudo, em 23/12/2004, foi firmado novo convênio (nº 516.927), informando a mesma conta-corrente. No extrato bancário do primeiro convênio, consta o crédito da parcela de R$ 75.000,00 do segundo convênio.

Assim como nos convênios da OCB, o convenente Iterra se absteve de aplicar os recursos de convênios em caderneta de poupança, acarretando perda de rendimentos financeiros.

Conclusão dos Analistas do TCU

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A equipe de auditoria concluiu que o processo de fiscalização deve ser convertido em tomada de contas especial, para que, no prazo de quinze dias, o Iterra apresente sua defesa ou recolha aos cofres públicos a importância de R$ 3.144.920,05, mais atualização monetária e juros de mora.

A equipe propõe, também, a audiência do Presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Sr. Rolf Hackbart, para que justifique sua autorização para transferência da 2ª parcela do convênio nº 488.326, sem que tenha sido aprovada a prestação de contas parcial referente à 1ª parcela do acordo.

Se não for devidamente justificada a liberação de recursos, o responsável poderá ser multado pelo TCU.

... Os benefícios esperados da auditoria são, de acordo

com os analistas do TCU, os seguintes:

a) obrigação de ressarcimento de R$ 3.144.920,02 (valor histórico), referentes aos convênio examinados; b) ressarcimento de valores da ordem de R$ 295.500,00 (valor histórico) referente à impugnação de despesas nas próximas prestações de contas; c) economia de R$ 1.430.370,00, em caso de denúncia dos convênios vigentes; d) melhores controles referentes às prestações de contas dos convênios, e; e) aperfeiçoamento de procedimentos do PRONERA.

O TCU procedeu à auditoria em diversos Estados e

constatou que ANCA e CONCRAB atuam como agentes financeiros do MST (fl. 231) tendo em vista o desvio de recursos que eram destinados à reforma agrária, educação, saúde, pesquisa.

A equipe de auditoria listou algumas propostas para

tentar punir e solucionar as irregularidades praticadas pelo MST em razão de desvio de verbas, principalmente em decorrência do mau uso de convênios (fl. 238/239). Há, ainda, uma conclusão sobre indícios de formação de quadrilha (fl. 239), suspeita de desvio de recursos para o “Abril Vermelho” (fl. 240), além de despesas absurdas pagas pela União que chocaram a equipe de auditoria, e os analistas, que com cuidado, narraram alguns fatos que impressionaram (fl. 237):

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De modo semelhante, ninguém se deu ao trabalho de

avaliar a tiragem de 20.000 exemplares de cada um dos cadernos de educação, denominados Alfabetização de Jovens e adultos – Matemática, Alfabetização de Jovens e Adultos – Didática da Linguagem e Como fazer a escola que queremos – Planejamento. Ora, se o MST afirma contar com 4.000 educadores, qual a justificativa para a impressão de 20 mil exemplares de material para formação pedagógica? O caderno Alfabetização de Jovens e Adultos – Didática da Linguagem encontra-se a venda na loja do MST pelo preço de R$ 4,00 (informação disponível no site www.mst.org.br).

Note-se que o preço informado no fim do parágrafo não

guarda relação direta com a falta de análise técnica da proposta. É possível que a equipe tenha desconfiado que o excesso de cadernos impressos seja vendido na Internet. Dessa forma, a equipe insinua, entrelinhas, a apropriação indébita de R$ 64 mil (16 mil cadernos), já que apenas 4 mil seriam aproveitados pelos educadores do MST.

Resumindo, a equipe de auditoria do TCU identificou

diversas irregularidades na execução dos convênios firmados pela administração federal com as entidades ligadas ao MST, principalmente, as maiores delas: Anca, Concrab e Iterra (fl. 243):

a) danos aos cofres públicos; b) irregularidades nos convênios de assistência jurídica e assentados; c) indícios de favorecimento na celebração de convênios da Anca e da Concrab; d) A Anca e a Concrab atuam como agentes financeiros do MST; e) Desvio de finalidade na celebração de convênios; f) Suspeitas de desvio de recursos para o “Abril Vermelho”.

Verifica-se, pois, que seja pelas maneiras de malversação de verbas públicas apontadas nas conclusões da CPMI da Terra, seja pelo repasse de dinheiro público efetuado diretamente pelo INCRA na forma de distribuição de lonas, cestas básicas e outros auxílios, o financiamento estatal das atividades do MST fica claro.

Assim como fica evidente o financiamento público das

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atividades do MST, também fica evidente o financiamento de entidades

estrangeiras ao movimento, conforme apontam os Investigadores:

Além da proveniência pública de boa parte dos recursos utilizados

pelo MST, não se pode olvidar aquela que foi a sua fonte inicial de renda: a doação de recursos por entidades estrangeiras, notadamente organizações não-governamentais ligadas a instituições religiosas, como a organização Caritas, mantida pela Igreja Católica na Alemanha. No ano de 2003 o jornalista Ricardo Westin, da “Folha de São Paulo”, publicou uma reportagem com o título “ONGs estrangeiras financiam parte das atividades do MST”. Pela relevância do tema, transcreve-se a matéria 26:

02/11/2003 - 08h00 ONGs estrangeiras financiam parte das atividades do MST RICARDO WESTIN da Folha de S.Paulo O cofre administrado pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) recebe doações vindas do exterior que, a cada ano, somam o equivalente a pelo menos R$ 752 mil. O MST mantém suas fontes de renda em segredo, mas um levantamento feito pela Folha mostra que no mínimo oito ONGs e agências de cooperação internacional ajudam a financiar o principal movimento social do país. Entre elas, estão a alemã Caritas (doa o equivalente a R$ 396 mil por ano), a canadense Développement et Paix (R$ 162 mil), a britânica Christian Aid (R$ 143 mil) e a americana Grassroots International (R$ 51 mil) --as duas primeiras são ligadas à Igreja Católica; a terceira, a igrejas protestantes. Outras organizações ajudam a engrossar a lista de "patrocinadores", mas a Folha não teve acesso a informações sobre as cifras. São a FMST (Friends of the MST), dos EUA, a Frövännerna, da Suécia, o Conselho Mundial de Igrejas, com sede na Suíça, e a Mani Tese, da Itália. Os dirigentes, além de não revelar os nomes das entidades estrangeiras, tratam de minimizar o peso do apoio internacional em seu orçamento. "Não temos cifra exata, mas, nos últimos anos, a média [de doações vindas do exterior] não representa mais que 5% do financiamento do MST", afirma Geraldo Fontes, diretor do setor de Relações Internacionais do MST. Esse dinheiro, no entanto, não é destinado apenas aos trabalhadores rurais que vivem em assentamentos e acampamentos. Parte desses milhares de reais também sustenta outra face do movimento,

26 http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u54996.shtml, grifou-se.

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menos conhecida. Ajuda a manter uma complexa hierarquia burocrática de coordenações, direções e secretarias (nacionais, estaduais e regionais), que, com tentáculos em quase todo o país, só não alcança quatro Estados (Amazonas, Roraima, Acre e Amapá). Nos primeiros momentos do MST, nos anos 80, o principal mediador dos recursos vindos de fora eram igrejas, por meio de organizações como a Cese (Coordenadoria Ecumênica de Serviço), da Bahia. Hoje o movimento já é suficientemente conhecido no exterior para manter relações diretas com seus "parceiros". O setor de Relações Internacionais do MST foi criado em 1989 e, segundo Geraldo Pontes, conta com o trabalho de 53 militantes. O dinheiro estrangeiro pode chegar ao MST nacional ou diretamente aos Estados. A Grassroots, por exemplo, lida diretamente com os sem-terra do Maranhão e de Pernambuco. A ONG americana destina à secretaria estadual de Pernambuco, em Caruaru, cerca de R$ 28 mil por ano. A verba garante a contratação de um advogado para cuidar dos interesses dos sem-terra na Justiça e dois "cursos de formação" anuais para líderes pernambucanos a respeito de direitos humanos. "Esse dinheiro faria muita falta. Garante toda a assessoria jurídica do MST em Pernambuco", conta Severino Ramos, da coordenação estadual do movimento. Prestação de contas Em todos os casos, o MST é obrigado a fazer periodicamente uma prestação de contas. "Nunca tivemos problemas com isso", diz Wolfgang Hees, da Caritas, que frequentemente vem ao Brasil. Os R$ 400 mil que a ONG alemã destina aos sem-terra são depositados num fundo, que é administrado em conjunto pelo MST, pela CPT (Comissão Pastoral da Terra) e pela Caritas brasileira. Fora essas doações que são depositadas regularmente no caixa dos sem-terra, neste momento o MST conta com uma ajuda milionária vinda da parceria entre a Caritas, a francesa Frères des Hommes e até a União Européia para levantar seu centro de formação política e técnica de militantes em Guararema (SP). A futura Escola Nacional Florestan Fernandes deverá consumir até a inauguração, prevista para o ano que vem, o equivalente a mais de R$ 7,3 milhões. Do total, cerca de R$ 2,5 milhões são bancados pelo próprio MST. Se as doações externas representam cerca de 5% do caixa do movimento, chega-se a uma receita de no mínimo R$ 15 milhões por ano. Também procurando relativizar a importância desse orçamento, Mário Lill, da coordenação do Rio Grande do Sul, diz que o MST não é rico. "Às vezes, cria-se uma paranóia a respeito do dinheiro. Fazemos um trabalho pobre e sofrido. O que nos move é mais a dignidade que o dinheiro".

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Com essas informações, pode-se compor, de forma aproximada, o mosaico das fontes de financiamento do MST: 1. financiamento estatal direto, com distribuição de cestas básicas, lonas e auxílio logístico. 2. financiamento estatal indireto, com repasse de verbas por meio de convênios entre órgãos públicos e entidades ligadas ao MST. 3 financiamento privado internacional, com verbas oriundas de ONGs estrangeiras ligadas a instituições religiosas e de agências de cooperação internacional.

Os Investigadores abordam outra questão de extrema gravidade

na estruturação ideológica do MST, que são as escolas de formação de

ativistas.

Outra temática não menos polêmica é a das escolas mantidas pelo MST. No tópico sobre financiamento foram apontadas as circunstâncias ligadas ao custeio das atividades do ITERRA e da Escola Nacional Florestan Fernandes, inclusive as irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas da União. Além disso, o INCRA mantém um programa específico de educação para os assentados, conforme depoimento do Superintendente Regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária27:

O INCRA possui um programa chamado PRONERA, decorrente de uma Conferência realizada em 1998. Este programa é executado pelo INCRA, tendo como objetivo a escolarização de nível médio, alfabetização, curso de segundo grau regular, supletivo de 1º grau, curso superior, especialização e pós-graduação de assentados. Este programa já formou mais de 300.000 pessoas no Brasil inteiro. Todos os cursos são aprovados pela Secretaria Estadual, Conselho Estadual de Educação e Ministério da Educação. Em Veranópolis há uma Escola chamada Antônio de Castro, mantida pelo ITERRA, contendo ensino técnico e médio regular. A Escola é aprovada pelo Conselho Estadual de Educação. Os assentados interessados dirigem-se às instituições de ensino e com ela apresentam um projeto à Comissão Pedagógica do PRONERA. Se aprovado, o projeto é encaminhado ao INCRA que efetua um convênio com a instituição. O encargo de escolher corpo docente é da instituição conveniada. O INCRA libera um valor de R$ 15,00 reais de diária por aluno para a permanência em turno integral na Escola em Veranópolis.

Resta, pois, o tema do conteúdo pedagógico das escolas mantidas e/ou gerenciadas pelo MST, seja em assentamentos controlados pelo movimento, seja em acampamentos. Na já referida entrevista concedida por ZANDER NAVARRO ao jornal “O Estado de São Paulo” em 29 de abril de 2007, a questão foi abordada:

27 Autos principais, fls. 141.

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O MST diz que investe na emancipação política e intelectual do homem do campo. Um dos orgulhos do movimento são suas escolas, os centros de formação de professores, os currículos especiais, os convênios com universidades. Seria preciso existir possibilidade de visitas e acompanhamento sem controle prévio às escolas dos assentamentos - o que o MST jamais permitiria, porque levaria à desmoralização dessas atividades. Há exceções, notáveis, mas na maior parte dos casos é um exercício primaríssimo de doutrinação da meninada. É um absurdo chamar de educação o que está sendo feito nos assentamentos rurais quando prevalece o tom monocórdio da cartilha única. Pedagogia sem desenvolver o pensamento crítico e sem apresentar diversas leituras sobre o mundo pode ser chamada de educação?

A temática provocou tanta polêmica que já foi objeto de reportagem especial em revista de circulação nacional. Com efeito, a revista “Veja”, na edição n.º 1870, de 8 de setembro de 2004, publicou matéria intitulada “Madraçais do MST” – alusão à formação dogmática que existe em tais escolas, de rigidez comparável, segundo a reportagem, às escolas de doutrinação dos fundamentalistas islâmicos. Segue o texto da reportagem (grifou-se):

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) criou sua própria versão das madraçais – os internatos religiosos muçulmanos em que crianças aprendem a recitar o Corão e dar a vida em nome do Islã. Nas 1.800 escolas instaladas em acampamentos e assentamentos do MST, crianças entre 7 e 14 anos de idade aprendem a defender o socialismo, a "desenvolver a consciência revolucionária" e a cultuar personalidades do comunismo como Karl Marx, Ho Chi Minh e Che Guevara. "Sem-terrinha em ação, pra fazer a revolução!", gritam os alunos, de mãos dadas, ao final de eventos e apresentações. Pelo menos 1.000 dessas escolas são reconhecidas pelos conselhos estaduais de educação – o que significa que têm status idêntico a qualquer outro estabelecimento de ensino da rede pública e que seus professores são pagos com dinheiro do contribuinte. Elas nasceram informais, fruto da necessidade de alfabetizar e educar os filhos de militantes do movimento – que chegam a ficar durante anos acampados nas fazendas que invadem, à espera da desapropriação. No fim dos anos 80, atendendo a uma reivindicação do MST, o governo passou a integrar essas escolas

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improvisadas à rede pública. Parte delas funciona nas antigas sedes das fazendas invadidas, parte foi construída pelos Estados e municípios. Ao todo, as escolas do MST abrigam 160.000 alunos e empregam 4.000 professores.

A reportagem de VEJA visitou duas delas, ambas no Rio Grande do Sul. Tanto a escola Nova Sociedade, em Nova Santa Rita, quanto a Chico Mendes, em Hulha Negra, exibem, nas classes e no pátio, a bandeira do MST; no currículo, abordagens ausentes da cartilha do Ministério da Educação e que transmitem a ideologia sem-terra. Os professores utilizam, por exemplo, uma espécie de calendário alternativo que inclui a celebração da revolução chinesa, a morte de Che Guevara e o nascimento de Karl Marx. O Sete de Setembro virou o "Dia dos Excluídos", e a Independência do Brasil é grafada entre aspas. "Continuamos dependentes dos países ricos", justifica o professor de história da escola Nova Sociedade, Cícero Marcolin. No ano passado, seus alunos aproveitaram o Dia da Independência, ou "independência", para sair em passeata pelas ruas da cidade carregando faixas com críticas à Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Na escola Chico Mendes, professores exibem vídeos que atacam as grandes propriedades e enaltecem as virtudes da agricultura familiar, modelo que o MST gostaria de ver esparramado no território nacional: "A pequena propriedade é oprimida pelos grandes latifúndios, que só fazem roubar emprego do povo", diz um dos filmes. A mesma fita é usada para ensinar aos alunos que os produtos transgênicos "contêm veneno". A reportagem de VEJA assistiu a uma dessas aulas. No fim da exibição do filme, o professor pergunta quem da classe come margarina. A maioria das crianças levanta o braço. Tem início o sermão: "Margarina é à base de soja, que pode ser transgênica e, por isso, ter ve-ne-no!" A atividade seguinte foi uma encenação teatral. No pátio, carregando bandeiras do MST, crianças entoaram uma música que dizia: "Traga a bandeira de luta / Deixe a bandeira passar / Essa é a nossa conduta / Deixe fluir para mudar". Para encerrar, deram o grito de guerra conclamando para a revolução.

O MST implementou um sistema de ensino paralelo, sobre o qual o poder público não exerce quase nenhum controle. O Ministério da Educação desconhece até mesmo quantas são e onde estão exatamente as escolas públicas com a grife do movimento.

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E as secretarias estaduais e municipais de ensino, embora sustentem as escolas, enfrentam dificuldades até para fazer com que professores não ligados aos sem-terra sejam aceitos nas salas de aula. "O MST torna a vida do educador que vem de fora um inferno", diz Gislaine do Amaral Ribeiro, coordenadora estadual das escolas de assentamentos na região de Bagé, Rio Grande do Sul. Nos assentamentos, pelo menos a metade do corpo docente vem do MST. Já nos acampamentos, todos os professores pertencem ao movimento. Muitos não têm o curso de magistério completo – pré-requisito básico para a contratação na rede pública –, e alguns não chegaram sequer a terminar o ensino fundamental. "A realidade é que há pessoas atuando como profissionais da educação nessas escolas sem o mínimo de preparo para exercer a função", reconhece o secretário estadual de Educação do Rio Grande do Sul, José Fortunati. O governo gaúcho diz que está de mãos atadas diante da situação, porque herdou um grande número de professores contratados pelo governo anterior, do PT. Pela proximidade com o MST, a antiga gestão teria sido mais complacente na contratação do corpo docente. A secretaria diz estar pleiteando junto ao MEC verbas para implantar um programa para dar a esses professores o nível básico de estudo para que possam lecionar. Em seu Caderno de Educação de número 8, o MST deixa claro que a educação que pretende dar a seus alunos deve ter "o compromisso em desenvolver a consciência de classe e a consciência revolucionária". A rigor, nada impede que uma organização como o MST queira propagar sua ideologia para crianças que mal aprenderam a escrever o próprio nome. O problema é fazer isso dentro do sistema de ensino público e com dinheiro do contribuinte. A legislação brasileira preserva a autonomia das escolas, desde que cumpram o currículo exigido pelos Estados e estejam em consonância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, que prega o "pluralismo de idéias" e o "apreço à tolerância" – elementos básicos para que as crianças desenvolvam o raciocínio e o espírito crítico. Não são os critérios adotados no território dos sem-terra. "Essas escolas estão aprisionando as crianças num modelo único de pensamento", observa a pedagoga Sílvia Gasparian Colello, da Universidade de São Paulo.

Um modelo, acrescente-se, falido do ponto de vista histórico e equivocado do ponto de vista filosófico. Está-se falando, evidentemente, do marxismo. Falido porque levou à instauração de

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regimes totalitários que implodiram social, política e economicamente. Equivocado porque, embora se apresente como ciência e ponto final da filosofia, nada mais é do que messianismo. De fato, o marxismo não passa de uma religião que, como todas as outras, manipula os dados da realidade a partir de pressupostos não verificáveis empiricamente. E, assim também como as religiões, rejeita violentamente a diferença. "Burgueses não pegam na enxada / Burgueses não plantam feijão / E nem se preocupam com nada / Arrasam aos poucos a nação", diz a letra de uma das canções ensinadas aos "sem-terrinha". Da mesma forma que os internos das madraçais, as crianças do MST são treinadas para aprender aquilo que os adultos que as cercam praticam: a intolerância.

Em um enfoque mais acadêmico, pondera ZANDER NAVARRO:

São inúmeras as evidências comprobatórias do limitado foco educacional das escolas de formação política do Movimento. Claramente, sob os vários mecanismos doutrinários utilizados, a ênfase não era (e não tem sido) na formação política universalista dos jovens sem-terra participantes mas, pelo contrário, reforçar a “mística” do MST, criando uma geração de militantes cegamente voluntaristas. Não surpreende, assim, que as camadas intermediárias do Movimento, em sua ação política, ajam de forma rigidamente dogmática e uniforme, presas a um conjunto de preceitos políticos mínimo, do qual não podem abrir mão, pois se enfraqueceriam na interlocução e nas disputas políticas, pela falta de capacidade política mais abrangente. Também sem surpresa, resultante de uma formação política tão limitada, a diversidade desaparece nos esquemas de interpretação utilizados pelos quadros da organização, pois tal complexidade seria incompatível com a extrema simplicidade da formação política dos militantes sem-terra.

28

Prossegue o Professor ZANDER NAVARRO, no mesmo texto:

O objetivo da formação política de jovens agricultores sem-terra nas escolas do Movimento situa-se, como antes referido, em campo inteiramente distinto — em resumo, pretende-se tão somente produzir a adesão a uma compreensão “total” e fechada da política que, de fato, sequer procura situar-se concretamente em relação ao desenvolvimento político brasileiro recente, pois volta-se inteiramente “para dentro”, já que é destinada precipuamente a manter a disciplina, a motivação e a coesão entre seus

28 Conforme NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232, nota n. 11, grifou-se.

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militantes intermediários. Algumas vezes, a mistificação ideológica pode atingir o patético, na tentativa de reforçar a perspectiva polarizada do mundo e o maniqueísmo das interpretações políticas. O jornal do Movimento, por exemplo, é talvez o melhor espelho das mudanças operadas. Até 1986 uma publicação plural, naquele ano sofreu a intervenção da direção nacional e foi transformado em “instrumento de agitação de massas”, no melhor estilo do receituário leninista. Seus jornalistas, por desconfiança, foram afastados e substituídos por “repórteres populares”, tal reorientação passando a refletir-se nas páginas da publicação. Como ilustração da nova opção ideológica, cite-se, por exemplo, entre dezenas de possibilidades de distorção deliberada dos fatos, a maneira como o jornal, em sua seção de “fatos diversos”, tratou a prisão do lutador norte-americano Mike Tyson, em 1991, acusado (e posteriormente condenado, inclusive com sua confissão) de estupro. Na perspectiva “política” do jornal, tal fato simplesmente não ocorreu e a prisão de Tyson ocorreu, isto sim, em face da histórica discriminação racial existente naquele país, razão que teria sido a única para ser preso e condenado, segundo o que o periódico, na ocasião, publicou, provavelmente para surpresa de seus leitores mais informados. Neste caso, como na maior parte da agenda política organizada pela direção do Movimento, igualmente fruto de um discurso inspirado pelos setores ligados à Comissão Pastoral da Terra, que lhe serve como suporte de legitimação religioso, o recurso é à polarização extremada entre o “bem” e o “mal”. Curiosamente, mesmo em meio à crescente complexidade social e cultural do país, bem como à ampliação do arco político e ideológico, vencido o ciclo militar do passado, os instrumentos mobilizadores do MST jamais conseguiram ultrapassar os estreitos limites de uma perspectiva marcada por pólos antípodas que opõe o virtuoso e o maléfico, distantes por certo de qualquer correspondência real. Preso a esta armadura de visível simplificação ideológica, que tem fins meramente instrumentais, não surpreende que a organização raramente tenha conseguido estabelecer alianças ou agendas comuns sequer com as demais organizações populares do campo brasileiro.29

Concluem os Investigadores:

29 NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232.

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Examinando-se o quadro à luz das informações acima reproduzidas, resta evidente que são necessárias medidas urgentes para colocar as crianças e adolescentes que residem nos acampamentos a salvo da ideologização agressiva. Da mesma forma, necessita o Estado brasileiro retomar o controle sobre o conteúdo pedagógico e sobre a organização real das escolas do MST, resgatando uma premissa fundamental para a construção de uma vida democrática em comunidade: o pluralismo cultural, sem o qual não é possível aprender a viver em comunidade no Estado Democrático de Direito. (grifou-se)

A atuação do MST no recentes conflitos agrários demonstra

nitidamente a idéia de tomada de território estratégico e não com o objetivo

de assentar seus companheiros. Neste sentido os Investigadores observam:

O MST tem seus marcos históricos em locais como Fazenda Annoni e Encruzilhada Natalino. Hoje, entretanto, outros são os focos de conflito. Conforme depoimento prestado ao Ministério Público pelo Superintendente Regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, MOZAR ARTUR DIETRICH, os focos de conflito encontram-se atualmente nas cidades de Pedro Osório, Coqueiros do Sul, São Gabriel e Nova Santa Rita:

Os focos de litígio atualmente existentes no Estado são a Fazenda Coqueiros, Nova Santa Rita, São Gabriel e Pedro Osório. Há também acampamentos grandes em Santana do Livramento e em Bossoroca.30

Como o problema em Coqueiros do Sul será tratado em tópico separado, cumpre destacar o atual estado da questão nas outras três localidades: Pedro Osório, Nova Santa Rita e São Gabriel. Da mesma forma, cabe destacar o levantamento feito pelo Centro de Apoio da Ordem Urbanística e Questões Fundiárias – CAOUrb, a pedido da Subprocuradoria-Geral de Justiça para assuntos Institucionais, no sentido de verificar-se a repercussão judicial das movimentações do MST no Rio Grande do Sul.

Em Pedro Osório, militantes do MST estão acampados ao lado de uma fazenda que foi invadida em abril deste ano naquele município. No local, há cerca de 200 famílias, segundo o próprio movimento. Em 9 de agosto deste ano, uma audiência pública com integrantes do MST e produtores rurais terminou em

30 Autos principais, fls. 140.

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confronto entre os dois grupos. Seis membros do MST foram presos e liberados mais tarde, e quatro policiais e 22 sem-terra ficaram levemente feridos e foram encaminhados para a Santa Casa do município. Conforme notícia publicada na imprensa31, a audiência, que seria realizada em um salão paroquial na cidade, iria discutir os conflitos agrários na localidade. Segundo a Brigada Militar, os sem-terra tentaram impedir a entrada de produtores rurais na sala onde ocorreria o evento. Houve empurra-empurra e agressões entre os dois grupos, de acordo com a Brigada, e os policiais intervieram. Segundo os policiais, havia cerca de 150 sem-terra e outros 150 produtores rurais no local. Em razão do confronto, a audiência acabou cancelada. Segundo a Brigada Militar, 70 policiais atuaram na ação. Enquanto isso, a atmosfera de tensão prossegue.

Em Nova Santa Rita, na região metropolitana de Porto Alegre, vários são os problemas. No dia 06 de setembro deste ano, cerca de 150 assentados ligados ao MST cercaram a prefeitura de Nova Santa Rita para exigir melhorias nos acessos rodoviários aos seus lotes de terra e obras de saneamento para as comunidades rurais. Um grupo com 30 pessoas entrou no prédio e lotou a sala da secretaria de governo ameaçando permanecer no local se não fosse recebido pelo chefe do Executivo32. Mais tarde, em 10 de setembro, integrantes do MST e um grupo de moradores de Nova Santa Rita bloquearam o trânsito da BR-386, das 7h às 8h30, protestando contra a instalação de um aterro sanitário nas margens da rodovia, liberada pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente na semana passada. O horário do bloqueio, de grande movimento na região, causou congestionamentos de 5 km em direção a Porto Alegre e de 7 km em direção a Nova Santa Rita, segundo a Polícia Rodoviária Federal33. Em São Gabriel, antigo foco de agitação, a situação encontra-se momentaneamente calma. Após o fracasso do cerco inicial do MST à Fazenda Southall, há cerca de três anos, em situação fática muito parecida com a da Fazenda Coqueiros, os esforços do movimento na região parecem ter sido mitigados. Confira-se o depoimento prestado ao Ministério Público por BALTAZAR BALBO GARAGORRI TEIXEIRA, Prefeito Municipal de São Gabriel:

... Já no atual mandato do depoente, o MST retornou à cidade. Na oportunidade, houve um apelo no sentido de que o Prefeito fosse à estrada para bloquear a passagem do MST, tendo o depoente ponderado que isso era atribuição da polícia. Em São Gabriel o MST

31 http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u318999.shtml. 32 http://noticias.uol.com.br/ultnot/agencia/2007/09/06/ult4469u10851.jhtm. 33 http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u327316.shtml.

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ocupou uma área pública, tendo o Município ajuizado, por seu Procurador, Dr. Renato da Costa Figueira, uma ação de reintegração de posse com pedido de liminar. A Justiça concedeu o mandado de liminar de reintegração de posse, tendo determinado prazo para desocupação da área, prazo este que foi cumprido voluntariamente pelos integrantes do MST, “no último minuto”. Após esses fatos, o depoente recebeu, sucessivamente, delegações dos produtores rurais e do MST. A todos, o depoente pediu que se mantivessem dentro da legalidade, o que tem ocorrido até o presente momento. A liderança do MST solicitou ao depoente que disponibilizasse estrutura de atendimento médico específico para o acampamento, tendo o depoente ponderado que já existem postos de saúde que atendem as demandas dos bairros, e que os acampados deveriam se dirigir a esses postos. A informação de que o depoente dispõe é a de que a Brigada Militar reforçou seu efetivo. Consigne-se quando dos primeiros incidentes envolvendo o MST e a Fazenda Southall, o Prefeito Municipal era Rossano Gonçalves. 34

É interessante perceber o custo indireto acarretado pela presença dos militantes no MST na localidade, custo este de difícil contabilização. É o caso dos custos de prestação dos serviços de saúde, na medida em que o sistema de atendimento municipal recebe uma sobrecarga com os novos “habitantes” da municipalidade.

Outro aspecto que chamou a atenção dos Investigadores foi a

reduzida intervenção do Ministério Público nas questões dos conflitos

agrários.

A repercussão judicial do MST no Rio Grande do Sul

Neste tópico, trata-se evidentemente apenas das ações judiciais que sejam protagonizadas pelo Ministério Público ou que recebam intervenção ministerial, na forma do art. 82, inciso III, do Código de Processo Civil. Assim, foi acostado aos autos o Memo n.º 49/2007 referente às repostas das Promotorias de Justiça sobre a existência de ações civis públicas, ou outras ações com intervenção do Ministério Público, em tramitação no que tange ao MST 35. Seguem as Comarcas com resultado positivo:

34 Autos principais, fls. 201/202. 35 Autos principais, fls. 391/395.

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Ações cíveis com intervenção do MP (art. 82, III, CPC): - Caçapava do Sul (processo baixado); - Canguçu (reintegração de posse); - Carazinho; - Pinheiro Machado (reintegração de posse); - Sarandi (reintegração de posse); - Viamão (reintegração de posse). Ação civil pública:

- Carazinho.

Como se constata, é baixo o número de processos em que o Ministério Público tem a oportunidade de abordar a questão da violência no campo. É importante mudar essa realidade, garantindo um engajamento mais ativo do Parquet na pacificação das relações agrárias e no controle dos atos praticados pelo MST.

Quanto à Fazenda Coqueiros, os Investigadores perceberam que

se trata de uma questão fundamental para os objetivos do MST:

Antecedentes

A Região Noroeste do Rio Grande do Sul, historicamente, serviu de base territorial para a instalação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra – MST em nosso Estado. Nela é que, por primeiro, ocorreram manifestações do aludido movimento, ainda embrionário no Estado.

A aludida Região é marco histórico e geográfico do nascedouro do próprio MST, a partir de manifestações passadas nos municípios de Nonoai, Sarandi e Ronda Alta, em nosso Estado, no final da década de 1970. Naquele período, é perfeitamente factível apontar a ocorrência de fatos históricos que geraram a semente do nascimento do Movimento dos Sem Terra.

Um retrospecto histórico nos reporta ao ano de 1978, quando índios Kaingang da reserva no município de Nonoai expulsaram mais de mil famílias de posseiros que lá viviam desde 1968, arrendando suas terras por intermédio da FUNAI. Sem terem destino definido, parte das famílias expulsas pelos índios ocuparam a Fazenda Macali, mas, logo em seguida, também de lá foram expulsas. Em setembro de 1979, a Fazenda Macali foi novamente ocupada juntamente com outra área vizinha, a Fazenda Brilhante, ambas no município de Ronda Alta/RS. Diante dessa realidade, João Pedro Stedile, então funcionário da Secretaria da Agricultura do Rio Grande do Sul, e o pároco de Ronda Alta começaram a organização das famílias de posseiros expulsos da reserva Nonoai. Outro grupo de famílias, na mesma época, ocupou a Fazenda Anoni, no município de Sarandi/RS, e logo foi despejado. Em conseqüência, tais famílias deram início ao chamado

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acampamento de “Encruzilhada Natalino”. No local, situado no encontro das estradas que levam a Passo Fundo, Ronda Alta e Sarandi (daí a denominação “encruzilhada), o primeiro acampado a erguer uma barraca chamava-se Natalino (por isso o nome Encruzilhada Natalino). Ao início, no ano de 1981, o acampamento tinha em torno de 600 famílias, situando-se em área de servidão pública, entra a cerca e o leito da estrada. Aos aludidos movimentos, já no ano de 1984, seguiu-se o nascimento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST, decorrente do I Encontro Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, ocorrido em Cascavel/PR em 1984. Este encontro, aliás, tornou-se o marco oficial do surgimento do MST, janeiro de 1984. No ano de 1985, em suma, o MST, após promover a ocupação, consegui a desapropriação da Fazenda Anoni. Nela foram assentadas mais de 300 famílias. A relação entre os fatos narrados e a realidade vivida na Fazenda Coqueiros, no Município de Coqueiros do Sul, é umbilical e indissociável. Na atualidade, entre os municípios gaúchos de Palmeira das Missões, Iraí, Nonoai, Encruzilhada Natalino, Pontão, Carazinho e Passo Fundo, notadamente, há uma grande quantidade de acampamentos do MST. Em especial, percebe-se que o assentamento ocorrido na Fazenda Anoni situa-se geograficamente muito próximo da Fazenda Coqueiros, em Coqueiros do Sul, ambas com grande extensão territorial. (grifou-se) Nesse contexto, diante dos fatos que vêm ocorrendo, com a mobilização de diversas frentes do MST existentes no Estado em direção à Fazenda Coqueiros, percebe-se nitidamente uma estratégia de ocupação territorial da Região Noroeste do Estado, sendo a aludida área de terras no município de Coqueiros do Sul aparentemente estratégica para a consolidação de tal desiderato, certamente não apenas pela sua extensão territorial de 7,1 mil hectares (conforme folder fornecido pelo proprietário, fl. 131 dos autos principais).

Evolução dos acontecimentos

A cronologia dos fatos envolvendo o Movimento dos Sem Terra e a Fazenda Coqueiros iniciou no dia 02 de abril de 2004, data em que ocorreu a primeira invasão. Naquela data, aproximadamente 400 integrantes do MST chegaram ao local, invadindo o imóvel. Já no dia 15 de abril de 2004, novo grupo de membros do MST aportou ao local, passando a arrendar uma propriedade de Jandir Wiebrans, situada ao lado da Fazenda Coqueiros, montando um acampamento no local e lá permanecendo até o momento. Aliás, na atualidade, nas cercanias da Fazenda Coqueiros, o MST montou três acampamentos. No município de Sarandi, o acampamento às margens da BR-386, no município de Coqueiros do Sul, fazendo divisa com a Fazenda Coqueiros, o acampamento em área pertencente a Jandir

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Wiebrans, antes referido, e o acampamento identificado por Sepé Tiarajú, também conhecido por acampamento “Serraria” ou Passo Cabrito”, em área arrendada pelo MST. Para melhor detalhar as atividades desenvolvidas pelo MST a fim de obter a desapropriação da Fazenda Coqueiros, importante relatório foi efetivado pela Brigada Militar do Estado, sendo encaminhado ao Ministério Público com a identificação amiúde das ações praticadas pelo aludido Movimento. Além da perspectiva cronológica dos fatos relativos às invasões, há informações sobre o proceder dos membros do MST para atingiram seu objetivo (fls. 02v./17 do Anexo III). Destacam-se os seguintes eventos:

1) 02 DE ABRIL DE 2004 – Ocorre a 1ª invasão na Fazenda Coqueiros. A propriedade é comumente conhecida por FAZENDA GUERRA ou FAZENDA COQUEIROS e foi invadida pela primeira vez no dia 02 de abril de 2004, por aproximadamente 600 (seiscentos) sem terra que chegaram ao local em 13em 13 (treze) ônibus, 07 (sete) caminhões, 15 (quinze) veículos tipo passeio e 02 (duas) motocicletas, oriundos dos acampamentos de Julio de Castilhos e Palmeira das Missões. Durante o deslocamento, foram abordados no Município de Sarandi, onde informaram a Polícia Rodoviária Federal que deslocariam para colheita da maça no município de Vacaria. Em seguida abandonaram a rodovia principal e deslocando por uma estrada de chão batido, chegaram até as terras da fazenda onde concretizaram a invasão.

A Fazenda Guerra possui sete mil hectares e está situado no Distrito de Xadrez, município de Coqueiro do Sul, que fica distante cerca de 15 Km da cidade de Carazinho. A área invadida está subdividida em propriedades pertencentes aos irmãos FÉLIX TUBINO GUERRA e VERA GUERRA e do marido desta, CARLOS BARCELOS. Segundo dados dos meios de comunicação está dividida em 1,3 mil de mata nativa, 2 mil em lavoura de soja e restante em lavoura de milho e criação de gado.

O advogado da família, tão logo tenha se concretizado a invasão, reuniu a documentação necessária com vistas a entrar com o pedido de reintegração de posse.

2) 15 DE ABRIL DE 2004 – Nesta data, um outro grupo de Sem Terras que estavam em marcha pela BR-386 em direção a Carazinho, arrendaram a propriedade de JANDIR WIEBRANS, ex-vereador de Coqueiros do Sul, propriedade esta, situada ao lado da Fazenda Coqueiros, tendo como objetivo montar um acampamento no local, ficando assim, próximos aos demais Sem Terra que haviam invadido a fazenda no dia 02 de abril de 2004.

3) 11 a 13 DE MAIO DE 2004 - A Brigada Militar passou a reunir efetivo e meios necessários para realizar a desocupação na Fazenda Coqueiros, cumprindo determinação judicial, uma vez que fora expedido

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Mandado de Reintegração de posse. Entretanto, no dia 12 de maio de 2004, deputados estaduais gaúchos simpatizantes do movimento, reuniram-se com o juiz da 1ª Vara da Comarca de Carazinho, para pedir a prorrogação do prazo da desocupação da Fazenda Guerra. Esta solicitação acabou motivando a realização de uma audiência pública no dia 17 de maio de 2004, a fim de formalizar o acordo que possibilitou a saída dos invasores, sem que houvesse a necessidade da ação policial. O governo federal propôs liberar R$ 50 milhões para assentamentos dos sem terra. Logo depois da audiência a Via Campesina realizou ato público no centro de Carazinho afirmando que não faria novas invasões nos próximos 30 dias, período em que parte da verba deveria ser liberada. Os Invasores concordaram em deixar a propriedade, tendo o INCRA indicado local para assentamento das famílias.

4) 26 DE JULHO DE 2004 – Passados aproximadamente dois meses da primeira invasão, ocorre a 2ª invasão na Fazenda Coqueiros, onde aproximadamente trezentos (300) manifestantes, acampados em uma área arrendada pelo MST, lindeira a Fazenda e pertencente a JANDIR CELSO WIEBRANTZ, acabaram por invadi-la novamente. Eles transpuseram a cerca que separa as duas propriedades, onde utilizando três (03) tratores e três juntas de bois passaram a lavrar a terra para o plantio de milho. Esta invasão tinha como objetivo pressionar o Governo Federal a adquirir terras para novos assentamentos, conforme havia sido prometido em maio de 2004. A Brigada Militar montou barreiras junto às entradas que levavam à área invadida, evitando desta forma que novos integrantes pudessem se juntar aos primeiros, aumentando o contingente, o que poderia ser um agravante em caso de necessidade de ação policial para a retirada dos invasores.

No julgamento do agravo de instrumento impetrado pelo proprietário FELIX TUBINO GUERRA e outros ao Tribunal de Justiça do Estado, foi concedida a liminar, fixando o prazo de dez (10) dias para a desocupação da área invadida, sob pena de reintegração compulsória.

Ao tomarem conhecimento da decisão judicial, os sem terra derrubaram a cerca divisória entre as duas propriedades e ampliaram a ocupação da área. Os invasores na época manifestavam a intenção de resistir, montando barricadas e armadilhas, a exemplo do que fizeram quando da invasão anterior.

5) 04 DE AGOSTO DE 2004 - Os integrantes da Via Campesina desocuparam a Fazenda Guerra sem necessidade de atuação da Brigada Militar.

Nas fotos a seguir, é possível perceber de que forma os invasores articulam-se de forma a resistir a uma possível ação por parte da tropa da Brigada Militar. Salienta-se que tais técnicas são ensinadas como táticas de guerrilha.

6) 02 DE DEZEMBRO DE 2004 - Como forma de manter constante pressão sobre os proprietários da fazenda, os sem terras

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incendiaram pequenas faixas de terra, da Fazenda Coqueiros, queimando parte da colheita.

7) 03 DE JANEIRO DE 2005 – Os Sem terra divididos em dois grupos realizaram a colheita nas terras da Fazenda Coqueiros. Enquanto um grupo procedia à colheita, outro montava guarda e em caso do comparecimento de efetivo policial escondiam-se no mato próximo ao acampamento, onde estavam concentrados cerca de 400 (quatrocentos) sem terra portando foices e facões.

8) 04 DE FEVEREIRO DE 2005 – Nesta data, por volta das 0800 horas, sob a proteção da Brigada Militar, com um efetivo de cerca de 350 Policiais Militares mobilizados no Comando Regional de Polícia Ostensiva do Planalto (CRPO/Planalto), Batalhão de Operações Especiais de Santa Maria (BOE/SM) e Batalhão de Operações Especiais de Porto Alegre (BOE/PA), 03 (três) colheitadeiras deram início a colheita da roça de milho de 54 hectares. Os acampados observavam o fato e gritavam palavras de ordem e comentavam que as máquinas iriam parar. Durante a colheita 02 (duas) colheitadeiras quebraram, tendo sido encontradas no seu interior espigas de milho recheadas com ferro, tipo o utilizado em obra da construção civil. No mesmo dia às 1000 horas, os manifestantes entraram na roça de milho e foram até as lonas pretas que estavam no chão e onde estava o milho debulhado e pisotearam em cima, jogaram o milho para o alto e fizeram gestos provocando a tropa que permanecia em linha protegendo o trabalho das colheitadeiras. No período da tarde, as colheitadeiras começaram a trabalhar na roça, junto ao mato nativo próximo ao acampamento, tendo sido apedrejadas. Novamente foi acionado o efetivo da Brigada e com a proteção dada, a colheita transcorreu normalmente o resto da tarde.

09) 08 DE JANEIRO DE 2006 - O ano de 2006 iniciou com os sem terra colocando fogo em torno das 1800 horas, na área que fica lindeira ao acampamento. O efetivo da Brigada Militar que se encontrava na localidade de Xadrez foi acionado, juntamente com os Bombeiros, e conseguiram apagar o fogo por volta das 2115 horas do mesmo dia. Foram queimados aproximadamente 20 hectares de área, sendo 10 hectares cultivados com soja e outros 10 hectares com capoeira (mata rasteira).

10) 25 DE JANEIRO DE 2006 - Além das queimadas, as ações de furto de produtos cultivados na propriedade também continuaram acontecendo, tanto que em 25 de janeiro de 2006, por volta das 1700 horas, o capataz da Fazenda Guerra, comunicou à Guarnição da Brigada Militar em Xadrez que aproximadamente 30 (trinta) integrantes do MST, acampados em área vizinha à Fazenda, entraram àquela propriedade e colheram parte do milho plantado, nas proximidades da cerca que divide a área. A Guarnição da Brigada Militar de Xadrez compareceu ao local para averiguar a denúncia, constatando a veracidade das informações, momento em que os sem terra fugiram para o mato localizado na área arrendada pelo MST tendo sido escutado um disparo de arma de fogo do seu interior. Neste dia o acampamento do MST contava com aproximadamente 200 (duzentas) pessoas, tendo os demais deslocado para reforçar uma invasão praticada por

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integrantes do MST na faixa de domínio da RS 406 em Nonoai. 11) 28 DE FEVEREIRO DE 2006 - O MST, com apoio do

Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), invadiu pela terceira vez a Fazenda Guerra, sendo esta uma das maiores invasões dos últimos anos, envolvendo mais de mil (1000) pessoas de vários acampamentos do interior do Estado.

Nesta invasão houve ações taticamente organizadas, como se fosse uma operação paramilitar. O evento criminoso ocorreu às 0500h, contando com aproximadamente mil (1000) pessoas, integrantes do MST e do MPA oriundos dos acampamentos montados em Sarandi, Pontão, Não-Me-Toque e Nonoai, sendo a maior parte das pessoas do antigo acampamento de Nonoai. Os infratores não se preocuparam com a existência de benfeitorias e com a família de um funcionário residente no local, cuja residência foi invadida por grupo que demonstrou ter treinamento especializado neste tipo de ação. Este grupo se apoderou de uma espingarda calibre 12. O funcionário e seus familiares foram liberados para saírem do local. A ação preparada pelo MST utilizou para chegar até a Fazenda Coqueiros, aproximadamente 60 (sessenta) ônibus, 01 (uma) carreta, 35 (trinta e cinco) caminhões e 20 (vinte) veículos de passeio, sendo que os veículos de carga efetuaram transporte de material de logística (barracas, colchões, caixas d’água, alimentos, etc). Após a invasão continuaram as ações de hostilidade contra os funcionários e policiais militares que patrulhavam nas imediações.

Depois de instalados os invasores tomaram posse das madeiras (tábuas) da serraria existente no local, passando a utilizá-las para a construção de barracos. Constatou-se também a chegada de grande quantidade de mantimentos, através da carreta Volvo N10, placas IGE 9381 (Palmeira das Missões). Além disso, efetuaram ligação clandestina de luz (gato) para utilização de energia elétrica da rede que cruza pelo local invadido.

Após a invasão de 28 de Fevereiro de 2006 o MST desencadeou uma série de ações, como se pode ver a seguir:

- UTILIZAÇÃO DE CRIANÇAS - Uma das medidas mais comuns utilizadas pelos integrantes do MST é a colocação de crianças e mulheres como escudos humanos à frente das manifestações. Esta atitude visa minar a ação das forças de segurança pública que tentam fazer cumprir as ordens manifestamente legais. Fatos anteriores já mostravam esta intenção do MST, pois no dia 11 de maio de 2004, o MST rejeitou a notificação sobre proteção das crianças durante as ações do Movimento. Quando acampados na Fazenda Coqueiros, negaram-se a assinar notificação do Conselho Tutelar que recomendava que as crianças presentes na Fazenda fossem protegidas, caso a Brigada Militar usasse a força para desocupar a área invadida. O mandado orientava os pais a preservarem integridade física dos filhos na ação de despejo sob pena de responsabilização criminal. Os líderes do acampamento do MST receberam a notificação, mas não quiseram assiná-la.

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- AGRESSÕES A POLICIAIS MILITARES No dia 28 de fevereiro de 2006, por volta das 0430 horas, pouco

antes da invasão da fazenda, a Guarnição da Viatura prefixo 3253 (do OPM de Coqueiros do Sul), composta pelos Sgt CRUZ e Sgt FRANÇA, efetuava o policiamento ostensivo e ao perceber a movimentação de veículos iniciou acompanhamento.

Próximo da encruzilhada que liga o Distrito de Xadrez aos Municípios de Coqueiros do Sul e Pontão, saiu do interior de uma mata, aproximadamente 60 (sessenta) integrantes do MST e MPA, que cercaram a guarnição, e de posse de foices cortaram os pneus, arrancaram a tampa de combustível, a antena do rádio VHF, riscaram na lataria as letras “MST”, levaram o microfone do rádio transceptor VHF e duas baterias de celular dos Policiais. Após arrastaram a Viatura para uma vala, encostando-a em um barranco, onde permaneceram junto à mesma até a passagem do comboio formado por ônibus, caminhões e veículos leves.

Em 28 de Fevereiro de 2006 houve um registro de duas ocorrências na Delegacia de Polícia de Carazinho por parte do proprietário e três funcionários da Madeireira Cagliari instalada dentro da Fazenda Coqueiros em Coqueiros do Sul - As ocorrências de nº 1107 (Outros crimes contra a liberdade individual) e 1108/2006 informando sobre apropriação de armas de fogo (roubo/furto): A primeira – 01 Espingarda marca Boito, Pump, 01 cano, Cal 12, nº E3839903; A segunda – Esp marca Boito, Cal 28, 02 canos, nº 22997, e 01 revólver marca Taurus, Cal 38, nº 0, infratambor K830 e com referência aos danos na Vtr BM 3253 (Fiat Palio), foi confeccionado COP nº 624649 e BA-BM nº 2937298.

As vítimas relataram que durante a madrugada foram surpreendidos por grupo de 10 (dez) pessoas (sem terras invasores da Fazenda Coqueiros) armadas, ameaçaram e trancaram as vítimas em uma peça da madeireira onde permaneceram até de manhã, quando saíram para registrar a ocorrência. Os sem terras furtaram vários objetos, equipamentos agrícolas e as referidas armas citadas acima.

12) 02 DE MARÇO DE 2006 – por volta das 1000 horas, os invasores interromperam o fornecimento de energia elétrica da usina existente na sede da fazenda visando prejudicar os funcionários e os policiais militares. Mas, também houve prejuízos a aproximadamente 1.500 (mil e quinhentas) pessoas do próprio movimento. Destas 400 (quatrocentas) eram crianças, sendo 250 (duzentas e cinqüenta) em idade escolar e 150 (cento e cinqüenta) com menos de 6 (seis) anos de idade

13) 04 DE MARÇO DE 2006 – Nesta data, mais uma vez foi possível constatar que tanto o MPA quanto o MST não têm a preocupação em cumprir as ordens judiciais, pois acreditam na intervenção política de parlamentares solidários a seu Movimento. Isto ficou evidente quando deixaram de cumprir a Determinação Judicial expedida pelo Dr. ORLANDO FACCINI NETO, Juiz de Direito da Comarca de Carazinho, o qual determinou prazo de 24 horas para a desocupação da área invadida. Ao tomarem conhecimento da ordem judicial os representantes do MST rasgaram o documento, havendo um principio de tumulto e revolta, o que foi logo controlado pelo efetivo Policial Militar.

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14) 06 DE MARÇO DE 2006 - Ao longo dos anos, tem-se visto que é comum a participação de autoridades públicas junto aos movimentos sociais, inclusive se dirigindo diretamente as áreas invadidas. Neste sentido, em 06 de março de 2006 chegou à sede da BM, na Fazenda Guerra, o Deputado Estadual FREI SÉRGIO, acompanhado pelos Prefeitos de Pontão e de Coqueiros do Sul a fim de participar de reunião com o Comando da Operação Policial, que já preparava algumas medidas para o cumprimento do Mandado de Reintegração de Posse.

Ao término da reunião o Comandante da Operação informou aos presentes que iria revistar os caminhões, ônibus e pessoas a fim de verificar se não estava saindo material pertencente à fazenda, momento em que o FREI SÉRGIO e o Prefeito de Coqueiros do Sul deslocaram até o interior do acampamento para dar conhecimento das exigências às lideranças dos invasores.

15) 11 DE MARÇO DE 2006 - Os líderes do MST cientes das providências que a Brigada Militar adotaria, orientaram os invasores a fugirem para uma área de terra de 05 hectares localizada a poucos metros de onde estavam acampados. Na fuga os manifestantes entraram em uma área errada, a Chácara do Sr MOACIR CAVAL, situada também ao lado da Fazenda Guerra.

Diante disto os Sem Terra foram intimados pelo Comandante da Operação Policial Militar para retornarem a Fazenda Guerra, a fim de serem revistados, o que não foi acatado. Os integrantes do MST permaneceram reunidos na área da chácara, onde haviam entrado por engano. Após os Sem Terra conseguiram deslocar para o local certo, a área lindeira da Chácara de MOACIR CAVAL. A nova área foi comprada previamente pelo movimento, pois sua posição estratégica era importante, uma vez que se avizinhava a desocupação da Fazenda e eles precisariam se manter próximos ao alvo. A compra foi realizada pelo Sr. ARNO MAIER, que a cedeu aos manifestantes, diferentemente da arrendada do Sr. JANDIR CELSO WIEBRANTZ, anteriormente citada.

Os invasores abandonaram na Fazenda Coqueiros vários utensílios, alguns casebres e lonas pretas. As guarnições da Brigada Militar realizaram as vistorias no acampamento abandonado encontrando em uma das casas antes ocupada pelos invasores, aproximadamente mil e quinhentas (1.500) garrafas de cachaça, e alimentos variados estocados tais como: arroz, feijão e farinha de trigo, os quais foram apreendidos para serem entregues ao Poder Judiciário local.

Os mais de 1500 Sem Terra instalaram-se na área de 5 hectares que receberem em situação de cedência por parte do Sr. MAIER, onde permaneceram precariamente acampados pois não havia material suficiente para acomodarem-se, inclusive com pouca água e a alimentação.

O filho de ARNO MAIER, VLADIMIR MAIER, 41 anos, apoiador do movimento, estava acampado em Coqueiros do Sul, com o

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grupo responsável pela invasão da Fazenda Guerra. Após a desocupação do local, ele se mudou para o sítio comprado pelo pai.

- PESSOAS PRESAS Durante a operação de desocupação da Fazenda Guerra 03 (três)

pessoas, (dois homens e uma mulher) que não conseguiram fugir do acampamento foram presas pela Brigada Militar e conduzidas para a Delegacia de Polícia. Segundo o Comandante da Operação os motivos das prisões se deram pela a prática do delito de furto de objetos, danos ao patrimônio público causado pela depredação de uma viatura e de cárcere privado de dois policiais no dia da ocupação da área, embora a coordenadora do MST, ANA SOARES, negasse todas as acusações.

16) 14 DE MARÇO DE 2006 – Por volta das 1923h, houve o comunicado de que uma criança, que estava no acampamento do MST havia morrido. A criança de cinco meses morreu no Hospital de Caridade de Carazinho. A menina estava no acampamento do Movimento do (MST) em Coqueiros do Sul e apresentava sinais de desidratação, diarréia e vômito.

Também foi verificado na época que outras três crianças estavam internadas com os mesmos sintomas. O hospital encaminhou relatório ao Conselho Tutelar de Coqueiros do Sul para que o caso fosse remetido à Justiça. As crianças permaneceram internadas até o dia 15 de março de 2006, no Hospital de Carazinho. O que mais preocupou as autoridades, sociedade e meios de comunicação em geral foram às informações repassadas pela mãe da menina. Ela informou que a demora em levar o bebê ocorreu porque os coordenadores do acampamento não autorizaram a saída dos integrantes. Um dos médicos plantonistas do hospital disse que os pacientes internados não corriam risco de morte.

Dia 16 de março de 2006, por volta das 1945h, houve o pronunciamento da equipe médica do Hospital de carazinho. A médica responsável pelo atendimento, disse que a morte de bebê poderia ter sido evitada. A certidão de óbito confirma que a morte foi causada por insuficiência respiratória aguda. A médica ressaltou que cuidados simples como o respeito da mãe ao período de amamentação evitaria a morte.

- PRESENÇA DE ESTRANGEIROS NOS ACAMPAMENTO

No dia 17 de março de 2006, foi percebido que os homens responsáveis pela segurança do MST recebiam as instruções dentro de um dos acampamentos por parte de estrangeiros. O depoimento à Polícia Civil de um comerciante que teve contato com os sem terras no início de março reforçou a suspeita da presença de estrangeiros no grupo que invadiu a Fazenda Guerra. Os indícios da presença de estrangeiros junto ao MST em Coqueiros aumentaram depois que um familiar do dono da propriedade, que fica ao lado do acampamento, declarou que teve contato com dois homens com sotaque estrangeiro.

Os guardas do acampamento tinham uma equipe com cerca de 30 (trinta) homens armados com foices e facões liderados por HUGO

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CASTELHANO, sendo este um dos líderes do MST no acampamento. De nacionalidade colombiana, ele seria o encarregado das escalas nas guaritas e o mentor das estratégias de resistência do grupo em caso de retirada compulsória pela polícia. O outro estrangeiro não foi identificado. Também foi observado que no interior do acampamento, havia 03 (três) mulheres com sotaque estrangeiro, e segundo comentários seriam Suecas pertencentes a uma ONG de movimento social europeu e estariam no Estado em um grupo de 15 (quinze) pessoas entre Suecos, Franceses e Americanos. A intenção deste grupo seria a produção de um documentário. As demais pessoas estariam espalhadas nos diversos acampamentos do Estado.

17) 21 DE MARÇO DE 2006 - O Delegado da Polícia Civil de Carazinho, DANILO FLORES, anunciou que indiciaria 800 (oitocentos) integrantes do MST, que participaram na invasão da Fazenda Guerra, em pelo menos oito delitos. Foi instaurado Inquérito Policial para a apuração dos delitos cometidos pelos sem terra desde o dia 28 de fevereiro, quando a área sofreu a terceira invasão. Para a Polícia Civil, os sem serra foram responsáveis por furtos, roubos, esbulho possessório, cárcere privado, formação de quadrilha, danos contra o patrimônio privado e crimes ambientais. Na investigação consta os fatos envolvendo a Fazenda e os estragos feitos em um sítio ao lado da área onde acampara o MST.

Alguns dos delitos praticados pelos integrantes do MST e MPA ocorreram enquanto estavam acampados em área cedida e lindeira a Fazenda Guerra. Armados com foices e facões, com o corpo pintado e alguns usando toucas ninjas, cortaram aproximadamente 140 (cento e quarenta) árvores da Fazenda e bloquearam a estrada vicinal que liga o município de Coqueiros do Sul ao de Carazinho, próximo a Base da Brigada Militar do Distrito de Xadrez.

Simultaneamente um grupo do MST tentou junto à sede da Fazenda, derrubar uma torre de madeira construída por eles mesmos durante a invasão do local, e era utilizada como ponto de observação pela Brigada Militar. O efetivo policial do local apoiado pelo BOE/PF controlou a situação e os manifestantes retornaram para o acampamento na área cedida.

18) 02 DE ABRIL DE 2006 - Às 1430h na lavoura de plantação de soja pronta para a colheita da Fazenda Guerra, localizada atrás do acampamento do MST, ocorreram vários focos de incêndio que atingiram de 130 a 150 hectares, aproximadamente. Foram acionados os Bombeiros de Carazinho que controlaram e apagaram o fogo.

19) 17 DE ABRIL DE 2006 – Integrantes do movimento entraram na serraria da Fazenda Coqueiros, onde se apossaram de madeiras lá existentes e construíram dezenove barracos ornamentados com cruzes, próximo a cerca que faz divisa com a área do acampamento. Para a realização deste ato, os acampados derrubaram a cerca de arame que havia sido colocada após a sua retirada pela BM quando da última invasão (11 de Março de 2006), bem como, derrubaram uma araucária.

20) 18 DE ABRIL DE 2006 - Os Sem terras haviam construíram 19 barracos dentro das terras da Fazenda, para lembrar o massacre

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em Eldorado dos Carajás no Pará. Durante à tarde os sem terras pegaram madeiras da serraria que fica dentro da Fazenda e fizeram fogueiras. Um veículo Kombi com compras foi revistado pela BM, que encontro além de alimentos e pregos, 180 garrafas de cachaça, como foi apresentada nota fiscal das mercadorias os produtos foram liberados pelos PM.

21) 19 DE ABRIL DE 2006 pela parte da tarde, uma Tropa do BOE de Passo Fundo, deslocou até a Fazenda Coqueiros, no Município de Coqueiros do Sul a fim de dar condições de segurança para que os funcionários da Fazenda pudessem desmanchar os dezenove barracos.

Com a chegada do efetivo no local, houve resistência, sendo necessário a tropa posicionar-se em linha e avançar em direção aos manifestantes com o objetivo de forçá-los a sair da fazenda em direção a área de onde estão acampados, momento em que os integrantes do MST reagiram arremessando pedaços de madeira contra a tropa e “Coquetel Molotov”, gerando vários focos de incêndio nas madeiras e casas que serviam de depósito da serraria.

22) 14 DE JULHO DE 2006 – durante a madrugada, integrantes do MST, do Acampamento JANDIR, ao lado da Fazenda Guerra, cortaram aproximadamente 6 Km de cerca e às 1000h, cerca de 100 (cem) pessoas invadiram a lavoura da fazenda, montaram 02 (duas) barracas de lona preta, com o propósito de plantarem 30 (trinta) hectares de milho. A divulgação para a imprensa da ação nas terras da Fazenda Guerra por parte de integrantes do MST, foi feita por VANDERLAN FAGUNDES, um dos líderes regionais do Movimento dos Sem Terra.

23) 18 DE JULHO DE 2006 – aproximadamente 50 (cinqüenta) integrantes do MST, por volta de 0730h, entre homens e mulheres, oriundos do acampamento Jandir, cortaram a cerca lindeira ao arrendamento e entraram na lavoura da Fazenda, onde iniciaram plantação de milho com o uso de máquinas manuais. Também, no local iniciaram a construção de barracos.

Durante o dia utilizaram a estratégia de passar para as terras da Fazenda, sempre que o policiamento se afastava, de onde saíam quando o policiamento se aproximava. Às 1730h, os invasores da lavoura deixaram o local sem a necessidade de intervenção de Força Policial. Retornaram para o local onde mantém um acampamento por mais de três anos.

24) 20 DE JULHO DE 2006 - por volta das 0630h, um efetivo de cerca de 80 policiais militares integrantes do BOE, POE e OPM de Passo Fundo, chegaram na Fazenda Coqueiros, para apoiar a retirada de barracas montadas na lavoura, em razão de interdito proibitório concedido quando da invasão propriedade.

Quando da chegada do efetivo, foi constatada a presença de dois integrantes do MST vigiando o local de cima da torre de madeira, MIGUEL RODRIGUES (25/09/1967) e NADIR PINTO DA SILVA (26/03/1957), que estavam armados de foice e facão.

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Foram desarmados, presos e posteriormente conduzidos até a Delegacia de Polícia de Carazinho.

Ao iniciar a operação, foram arremessadas pedras e bolinhas de gude do acampamento, sendo necessário o uso de bombas de gás por parte da tropa. Os objetos lançados pelos integrantes do MST atingiram viaturas e até o equipamento de filmagem de um repórter que estava no local. Uma bola de gude arremessada por estilingue atingiu o Cap Martinelli, provocando lesões leves.

No local de interdito proibitório, funcionários da Fazenda Guerra, utilizando uma máquina retroescavadeira desmontaram 10 (dez) barracas desabitadas e uma torre de madeira.

Após a conclusão da Operação, por volta das 1000h, o efetivo que deixava o local foi alvo de pedras arremessadas por integrantes do MST. A Vtr 136 foi atingida por uma pedra quebrando um dos vidros. Estiveram presentes durante a operação, repórteres da RBS, Correio do Povo e Rede Pampa. Foi também realizado levantamento de degradação ambiental pelo efetivo do 3º BABM.

25) 25 DE JULHO DE 2006 - aproximadamente às 0500h da manhã, integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), acampados no acampamento JANDIR, cortaram aproximadamente 5 Km de cerca. A cerca está localizada junto à estrada de acesso ao município de Coqueiros do Sul.

26) 14 DE AGOSTO DE 2006 - Por volta das 1530h, quando em patrulhamento pela estrada principal de acesso a Coqueiros do Sul, próximo ao acampamento do JANDIR, uma patrulha da Brigada Militar formada Por 10 Policiais Militares em 03 viaturas, comandados pelo 1º Ten QTPM DAVID GOTS DA ROCHA, foram cercados por aproximadamente 60 (sessenta) integrantes do MST, as quais jogaram pedras na guarnição. A fim de controlar a situação e salvaguardar a integridade física dos Policiais Militares, bem como, proteger o patrimônio do Estado (viaturas), foi necessária a utilização de munição antimotim.

Ao comandar manobras evasivas a fim de garantir o retorno das viaturas a Base da Brigada Militar no distrito de Xadrez, o Oficial PM foi atingido com uma pedrada no rosto causando-lhe lesão superficial e a viatura Prefixo 1123 teve seu pára-brisa traseiro quebrado por uma pedra.

Após estes fatos a Guarnição retornou a localidade de Xadrez, não sendo possível identificar quem atingiu o Tenente e a viatura. Ninguém foi preso. O oficial ferido foi submetido a exame médico e liberado. Foi efetuado registro da ocorrência na Polícia Civil de Carazinho sob nº 4740/06 e BA 095602.

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27) 22 DE AGOSTO DE 2006 - por volta das 0930h, aproximadamente 200 (duzentos) integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), acampados no Jandir, ultrapassaram a divisa da Fazenda, ocupando aproximadamente 02 hectares da referida propriedade.

Os sem terras estavam divididos em três grupos dentro da área, bem como, dispunham de material de uso pessoal, (mochilas, colchões e cobertores), porém não apresentavam disponibilidade de logística para maiores construções (barracas).

Na mesma data, aproximadamente às 1510h, os integrantes do MST entraram a área da serraria da fazenda e atearam fogo em 01 (uma) casa e nos escombros de outras três abandonadas no local, queimadas anteriormente pelo mesmo movimento, sendo 01 (uma) grande e 03 (três) pequenas. O fogo espalhou-se também pelas matas vizinhas. Foram acionados os bombeiros da cidade de Carazinho, que ao chegaram no local nada puderam fazer, haja vista que as chamas já tinham consumido totalmente as residências.

Após o incêndio, aproximadamente 180 (cento e oitenta) pessoas montaram cerca de 12 (doze) barracas, a 500 metros dentro da fazenda na lavoura da Fazenda Coqueiros. Outras 50 (cinqüenta) pessoas ficaram acampadas na área da serraria da fazenda.

28) 23 DE AGOSTO DE 2006 - a Brigada Militar mobilizou aproximadamente 160 (cento e sessenta) Policiais Militares da região de Passo Fundo e Santa Maria, a fim de ser realizado ação de Reintegração de Posse, face Interdito Proibitório para o local invadido.

Ao chegarem no local foi constatado que a maioria dos invasores havia deixado o local na noite do dia 22 para 23 de agosto de 2006, restando apenas 100 (cem) pessoas dentro da lavoura e 04 (quatro) pessoas na torre de observação construída pelos mesmos durante a invasão do dia 22 de agosto de 2006.

No meio do dia os sem terra que estavam na lavoura, atearam fogo em algumas barracas construídas pelos mesmos e após deslocaram até o acampamento do movimento.

O fogo ateado pelos integrantes do MST nas barracas, espalhou-se pela palha de milho seca atingindo aproximadamente 5 hectares. Não foi necessária a presença dos bombeiros, pois o fogo extinguiu-se naturalmente.

Aproximadamente às 1835h, o Comando deu por término a Operação na Fazenda Coqueiros, sendo dispensados os efetivos que deslocaram em apoio ao CRPO/Planalto. Ficaram no local apenas o efetivo orgânico de Xadrez, 17 Policiais Militares.

29) 20 DE OUTUBRO DE 2006 - aproximadamente às 1530h, integrantes do MST acampados próximo ao córrego do cabrito, “antiga

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serraria da Fazenda Guerra”, entraram em área da Fazenda Coqueiros com uma junta de bois e araram aproximadamente 1.000 (mil) metros de terra, também construíram no local 02 (duas) barracas.

O proprietário da fazenda registrou o fato na Delegacia de Polícia de Carazinho, sendo confeccionado BA Nº 3818489.

Dois dias após, em 22 de outubro de 2006, aproximadamente às 1930h, o capataz da Fazenda Coqueiros, DÁRIO CAGLIARI, comunicou a integrantes da Brigada Militar de Xadrez, que havia vários focos de incêndio em uma plantação de milho com cobertura de aveia, próximo ao acampamento do MST (acampamento JANDIR). Foi deslocada para o local uma guarnição da Brigada Militar, a qual tentou controlar os focos de incêndio, mas em virtude do fogo ter se alastrado por uma grande área, foi solicitado apoio do Corpo de Bombeiros de Carazinho, os quais extinguiram por completo o incêndio. Os bombeiros estimaram em aproximadamente 25 hectares o total de área queimada.

Esteve no local o capataz da Fazenda Coqueiros, o qual não soube precisar a extensão dos danos causado na lavoura de milho, optando por efetuar o registro na DP de Carazinho na manhã de 23 de outubro.

A lavoura destruída pelo incêndio está localizada aproximadamente 1.000 (mil), metros do acampamento do MST.

30) 27 DE OUTUBRO DE 2006 - foi reiniciado o plantio, e aproximadamente às 0930h, cerca de 100 integrantes do MST, saíram do acampamento JANDIR, armados com foices, facões e porretes, investiram contra os funcionários da Fazenda, os quais estavam iniciando o plantio a cerca de 300 metros do acampamento. Em conseqüência da eminente agressão, fugiram do local abandonando os caminhões carregados de sementes de soja e insumos.

Em ato continuo os integrantes do MST atearam fogo nos caminhões, sendo que um deles foi totalmente queimado incidindo em perda total do veículo e da carga, o montante de 3.200 Kg de semente de soja. No outro veículo a carga não foi danificada, todavia o caminhão foi totalmente incendiado acarretando a perda total do mesmo.

O Comando do CRPO/PLANALTO determinou o deslocamento para a Base de Xadrez, de um efetivo composto por 10 (dez) integrantes do BOE-PF, 07 (Sete), integrantes do 13º BPM e 10 (Dez), integrantes 3º RPMon, em apoio ao efetivo de 11 (onze), na Base de Xadrez.

Por volta de 1400h, a Polícia Civil de Carazinho, com o apoio da Brigada Militar, compareceu no local do crime. A perícia foi solicitada ao Instituto Geral de Perícias (IGP).

31) 15 DE NOVEMBRO DE 2006 – A Brigada Militar, de Xadrez, tomou conhecimento que uma lavoura da Fazenda Guerra localizada próximo ao acampamento JANDIR, havia sido queimada, totalizando uma área de aproximadamente 01 hectare. O local da queimada é próximo de onde integrantes do MST haviam queimado dois caminhões de propriedade da Fazenda Guerra. Quando Policiais Militares chegaram ao local do incêndio foram avistados entre 50 (cinqüenta) a 60 (sessenta)

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pessoas, as quais observavam as chamas do interior do acampamento JANDIR. Com a chegada da Brigada Militar foram ouvidos alguns silvos de apitos, em tese, de algum coordenador do acampamento, o que fez com que os acampados se recolhessem aos barracos, não sendo mais vistos.

O Corpo de Bombeiros do Distrito de Xadrez foi acionado, compareceu no local e apagou o incêndio, evitando que as chamas se espalhassem por outras áreas da lavoura.

32) 29 DE NOVEMBRODE 2006 - por volta das 0800h, aproximadamente 100 (cem) integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do Acampamento do JANDIR, entraram na fazenda e capinaram uma lavoura plantada com soja. Às 0930h, construíram no local 03 barracas de lona preta, mas não chegaram a utiliza-las. Às 1200h os invasores abandonaram a lavoura e deslocaram para o acampamento JANDIR.

33) 30 DE NOVEMBRO DE 2006 - às 1400h, comandados pelo Comandante do CRPO/PLANALTO, cerca de 70 Policiais Militares do BOE/PF, cercaram a área onde se encontravam apenas barracas montadas pelos sem terras. Uma retroescavadeira e um trator removeram as barracas deixadas pelos integrantes do MST junto à serraria e a lavoura dentro da propriedade pertencente à Fazenda Coqueiros. Os funcionários da Fazenda refizeram a cerca que divide o acampamento das terras da Fazenda Coqueiros, pois havia sido derrubada pelos sem terras.

34) 12 DE FEVEREIRO DE 2007 - O proprietário da FAZENDA COQUEIROS em Coqueiros do Sul, Sr FÉLIX GUERRA, solicitou apoio à Brigada Militar, para realizar a pulverização com defensivos agrícola na lavoura localizada próxima ao acampamento JANDIR.

As 0800h, um efetivo PM de 51 homens, devidamente comandados inicialmente pelo Comandante do 38º Batalhão de Polícia Militar, iniciaram o isolamento da área não tendo êxito, devido a reação dos acampados os quais encontravam-se em torno de 90 pessoas entre homens, mulheres e crianças e faziam o uso de estilingues para o arremesso de pedras contra a guarnição e funcionários da fazenda obrigando-os a recuar. Por volta de 1030h chegou no local o Cmt BOE-PF o qual passou a comandar a operação, inicialmente tentando dialogar com os acampados para o cumprimento da missão sem que fosse preciso recorrer ao uso da força, porém não foi obtido êxito na negociação, tendo os acampados do interior de um mato existente nas proximidades, onde seria passado o veneno, usando estilingues, jogando pedras contra os tratores, funcionários da Fazenda e a tropa BM, tendo um dos PM do Pelotão Hipo, sido atingido por uma pedra. Para contê-los foi usado meios não letais (75 disparos cal.12 munição anti-motim, lançamento de 12 granadas de efeito moral e gás lacrimogêneo) no intuito de dispersar os agressores. Com a ação da BM, os sem terras permaneceram no acampamento, tendo desta forma sido realizada a operação com 04 (quatro) tratores para aplicação de defensivos agrícolas na lavoura, a qual foi encerrada por volta de 1400h.

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35) 16 DE FEVEREIRO DE 2007 – Nesta data, por volta de 1600h, no acampamento do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), na BR 386, KM 162 (Próximo ao Pedágio da COVIPLAN em Almirante Tamandaré do Sul), foi queimado pelos acampados, o que restou das barracas e lonas, sendo que no local estavam no máximo 10 pessoas.

Os acampamentos de Almirante Tamandaré do Sul e Sarandi migraram para os Acampamentos em Coqueiros do Sul, junto à área de 08 ha arrendadas de JANDIR e o acampamento de Sepé Tiarajú, próximo a Serraria da Fazenda Guerra, e iniciaram a montagem de barracas nas áreas arrendadas, sendo que na área do JANDIR estavam presentes em torno de 400 pessoas e no Sepé Tiarajú, aproximadamente 100 pessoas. Os líderes do movimento continuaram a arregimentar pessoas para engrossar o número de manifestantes. Instalaram duas barreiras na área onde os fatos se deram, próximas a base da BM nos acessos á fazenda.

36) 04 DE ABRIL DE 2007 – 40 (quarenta) integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do Acampamento JANDIR, entraram na plantação de soja da Fazenda Guerra, lindeira ao acampamento (foto abaixo) e com foices cortaram em torno de 02 hectares de soja, não sendo possível precisar a quantidade de soja colhida.

A ação dos sem-terras perdurou por aproximadamente 40 minutos, não havendo confronto com os Policiais Militares.

37) 07 DE ABRIL DE 2007 – pela segunda vez na semana, aproximadamente 40 (quarenta) integrantes do MST do Acampamento do JANDIR, entraram na plantação de soja da Fazenda Coqueiros, lindeira ao acampamento e colheram certa quantidade de soja, não sendo possível precisar a área que foi cortada. Por volta das 1200h, houve pausa para o almoço e às 1500h reiniciaram a colheita, com o aumento de integrantes, sendo entre homens e mulheres em torno de 100 (cem) pessoas. A soja cortada foi deixada sob o solo. Às 1630h, os sem terras retornaram para o acampamento JANDIR.

38) 11 DE ABRIL DE 2007 – 150 sem terras em três caminhões, invadiram pela 4ª vez a sede da Fazenda Guerra. Divididos em três grupamentos invadiram simultaneamente a residência onde se encontrava instalado o efetivo da Brigada Militar, o galpão utilizado para deposito de sementes, oficina e estacionamento do maquinário agrícola, e o terceiro grupamento invadiu a residência de um empregado da fazenda. A ação foi dotada de uso de força, sendo arrombadas portas e janelas, e utilizados artefatos explosivos de fabricação caseira. Instantes após a invasão da propriedade, um comboio formado por seis ônibus vindos de Coqueiros do Sul e Carazinho, deixaram no local em torno de 300 (trezentas) sem-terras (homens mulheres e crianças). Um grupo composto por 150 (cento e cinqüenta) sem-terras (homens, mulheres e crianças), que estavam instalados no acampamento Sepé Tiarajú localizado próximo da antiga serraria deslocaram a pé, se juntando aos demais. Os sem-terras eram oriundos dos Acampamentos JANDIR, SEPÉ TIARAJÚ, BEIRA CAMPO

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(BR 386), apoiados por assentados da área 9 da FAZENDA ANONNI. Durante a invasão os sem terras apossaram-se dos materiais da fazenda deixados pelos Policiais Militares que estavam no local. 400 Policiais foram mobilizados para o local para realizar a reintegração de posse, o que motivou os invasores a deixarem o local no mesmo dia da invasão.

39) 12 DE ABRIL DE 2007 – Em 12 de abril de 2007, houve confronto entre sem terras e um efetivo da BM, 04 (quatro) Policiais Militares que permaneceram no distrito de Xadrez. Atendendo solicitação de FELIX TUBINO GUERRA, o efetivo da BM acompanhou funcionários da Fazenda Coqueiros, até a lavoura próxima do Acampamento Osiel Alves (JANDIR), onde iriam retirar um caminhão da propriedade que fora queimado durante uma das investidas já mencionadas anteriormente. Ao chegarem no local, foram cercados por cerca de 300 (trezentos) acampados que se postaram em linha de frente para os Policiais Militares a uma distancia de aproximadamente trezentos metros, momento que foram efetuados disparos de arma de fogo do interior do mato em direção a guarnição, que revidaram com 06 (seis) disparos de espingarda calibre 12. Logo após saiu do acampamento o veiculo VW gol de cor vermelha placas IGH 4020, em alta velocidade. O veiculo foi acompanhado e abordado próximo a Base da BM no distrito de Xadrez, onde foram identificados: IVAN EDENILTON MARROZO DE OLIVEIRA, RG 6028661608, EVANDRO PACHECO, DANIEL SIDINEI MAFALDA, RG 1051396057, este com um ferimento proveniente de arma de fogo na nádega, a principio sem gravidade tendo sido conduzido ao Hospital de Carazinho. Os ocupantes do veiculo eram oriundos do município de São Jose das Missões. Foram conduzidos a DP de Carazinho. Daniel Mafalda alegou que estava com problemas para caminhar, foi trazido para o Hospital Cristo Redentor em POA, onde ficou internado, sendo liberado mais tarde e retornado para Coqueiros do Sul. O referido simulava problema para caminhar para culpar a BM no incidente por ocasião do confronto em Coqueiros do Sul.

40) 1º DE MAIO DE 2007 – Em 01 e 03 de Maio de 2007, foi constatado abigeato nas terras da Fazenda Guerra, onde foi localizado pelo administrador da Fazenda, no município de Coqueiros do Sul, nas proximidades do Acampamento OSIEL ALVES (JANDIR), 03 (três) cabeças de gado abatidas (carcaças) e 02 (dois) animais feridos por arma branca. Na mesma data, pela parte da manhã, o Administrador encontrou mais 02 (duas) reses abatidas com duas perfurações similares a arma de fogo na região da cabeça. Foi confeccionado registro na DP de Carazinho. Não foram identificados os autores do fato.

41) 11 DE MAIO DE 2007 – foram constatadas novas ocorrências de abigeato na Fazenda Guerra onde a Brigada Militar tomou conhecimento que foi localizado pelo administrador da Fazenda Guerra, (03) três cabeças de gado feridas por arma branca e com perfurações similares a arma de fogo, sendo que uma delas estava morta e outra foi sacrificada devido aos ferimentos, sendo que mais tarde, funcionários da Fazenda Guerra

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localizaram outras 03 (três) reses feridas por arma de fogo e da mesma forma que as encontradas anteriormente. Enquanto os funcionários faziam esta conferência, foram realizados contra eles aproximadamente 10 (dez) disparos de arma de fogo, não tendo sido atingido nenhuma pessoa. Não foi possível visualizar os autores dos disparos. O fato foi registrado na DP de Carazinho.

42) 16 DE SETEMBRO DE 2007 – Em 16 de setembro de 2007, por volta das 0030h, o Srº Wagner e Ari funcionários que residem na sede da Fazenda Coqueiros, notaram que os cachorros estavam inquietos. Entraram em contato com o efetivo da Brigada em Xadrez, que compareceram ao local efetuando, mas nada de anormal foi constatado.

Por volta das 0300h, houve duas explosões, onde dois tratores que estavam estacionados atrás do galpão principal, tiveram danos provocados por explosivos.

A Brigada Militar isolou o local, e permaneceu aguardando a chegada da perícia para o levantamento.

A sede fica localizada a 300 metros do Acampamento Sepé Tiaraju (lado da antiga Serralharia da Fazenda Coqueiros).

No pátio onde ocorreu o fato, havia 07 tratores, duas plantadeiras e 01 colheitadeira. O Advogado do Srº Felix Tubino Guerra, deslocou a Delegacia de Policia da Cidade de Carazinho, onde confeccionou o registro de Nº 6897/2007, a Brigada Militar confeccionou BA BM nº 2567964.

43) 19 DE SETEMBRO DE 2007 –

No município de Sarandi: ACAMPAMENTO BR-386 KM-139 (BEIRA CAMPO)

a. Número de barracas: 40 b. Número de homens: 35 c. Número de mulheres: 25 d. Número de crianças: 20

Total = 70 adultos

No município de Coqueiros do Sul: ACAMPAMENTO OZIEL ALVES: área pertencente a JANDIR, arrendada pelo MST.

a. Número de barracas: 180 b. Número de homens: 190 c. Número de mulheres: 130 d. Número de crianças: 100

Total = 320 Adultos

No município de Coqueiros do Sul: ACAMPAMENTO SEPÉ TIARAJU: (também conhecido como acampamento da “serraria” ou “Passo Cabrito”); área arrendada pelo MST, junto a Fazenda Coqueiros, município de Coqueiros do Sul:

a. Número de barracas: 50 b. Número de homens: 80

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c. Número de mulheres: 60 d. Número de crianças: 35

Total = 140 adultos Percebe-se, a partir dos relatos detalhados efetuados pela Brigada Militar, que a partir da primeira invasão ocorrida no ano de 2004, sucederam-se diversos outros atos dessa mesma natureza, de grandes ou menores proporções. Há, nitidamente, motivação intransigente do MST no sentido de compelir os órgãos públicos a desapropriar a Fazenda Coqueiros. Veja-se que, para tanto, a organização não mede esforços, fazendo uso de métodos nada convencionais de pressão. Diversamente do que se vê em outros movimentos sociais, com resultados positivos na maior parte dos casos (ver o caso da luta dos afrodescendentes que obtiveram, após muitas reivindicações pacíficas, o direito às cotas em universidades públicas), o MST elegeu a via supralegal ou extralegal para desenvolver suas postulações. Isso ocorre desde sua organização informal, passando pelo desrespeito a decisões judiciais, métodos de intimidação, enfrentamento com o sistema de segurança por meio de algumas táticas de guerrilha e uma estratégia de atuação devidamente coordenada (veja-se menção no relatório ao comando da guarda do acampamento sob a liderança de um elemento de nacionalidade colombiana identificado por Hugo Castelhano) 36. As atividades desenvolvidas pelo MST no sentido da obtenção da desapropriação da Fazenda Coqueiros, conforme se observa do relatório da Brigada Militar37, tem gerado a necessidade de intensa demanda na área da segurança pública da região, ocorrendo 06 (seis) boletins de atendimento no ano de 2004, 27 (vinte e sete) no ano de 2005, 29 (vinte e nove) no ano de 2006 e 35 (trinta e cinco) no ano de 2007. Afigura-se importante, também, em complemento, conferir destaque à manifestação do Comandante-Geral da Brigada Militar, Coronel Nilson Nobre Bueno, prestada no dia 26 de setembro do corrente ano aos signatário, quando apontou sua preocupação com o rumo que as atividades do MST tem tomado, além da necessidade de grandes investimentos de recursos humanos e financeiros por parte do Estado, que já está com seus cofres combalidos (fls. 396/397 dos autos principais):

Pelo Comandante foi manifestada a preocupação da Brigada Militar com os fatos que estão ocorrendo no Estado envolvendo o MST. Foi dito que está havendo uma grande movimentação do aludido Movimento de várias partes do Estado em direção à Fazenda Coqueiros em Carazinho, o que tem gerado a necessidade de muita atenção da Brigada Militar para evitar um conflito com os fazendeiros. Desde muito tempo tem sido enorme o investimento de recursos humanos e financeiros por parte da Brigada Militar para atender o Movimento dos Sem Terra. Em especial, no presente momento, está havendo necessidade de mobilização

36 Anexo III, fl. 07v. 37 Conforme material acostado no Anexo III.

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muito grande da Brigada Militar com o deslocamento de efetivo para acompanhar a movimentação do MST em direção à Fazenda Coqueiros e há uma grande preocupação, pois será necessário destino de um grande efetivo para eventualmente mediar o encontro do Movimento nas proximidades da Fazenda Coqueiros em breve. Esta movimentação da Brigada Militar está gerando grandes gastos financeiros para o Estado. O Comandante informa que em Pedro Osório, recentemente, houve um conflito do MST com os fazendeiros no qual houve a necessidade de intervenção da Brigada Militar. Na ocasião houve feridos por parte do MST, dos fazendeiros e da membros da Brigada Militar, sendo instaurado inquérito para apuração dos fatos38.

Em complemento e na mesma linha de entendimento do Comandante Geral da Brigada Militar, ressalte-se a preocupação do Comandante do Batalhão da Brigada Militar de Carazinho com os fatos envolvendo o MST na região. Referiu Aderli Maximino Dal Bosco, Tenente Coronel da Brigada Militar QOEM:

Que assumiu o comando da Brigada Militar na região no mês de maio de 2004, porém já estava atuando no mês de abril do mesmo ano quando ocorreu a primeira invasão do MST na Fazenda Coqueiros. Desde então, a Brigada Militar vem mantendo um contingente de soldados no local bastante variado dependendo da necessidade. Houve a formação de um destacamento do Distrito de Xadrez com um contingente em torno de dez soldados. Esse destacamento foi instalado em razão do Movimento dos Sem-Terra estar instalado nas proximidades do local. Esses policiais recebem diárias no valor de, em torno, de R$ 40,00. Em 11 de abril do corrente ocorreu a última invasão, tendo sido mobilizados cerca de 490 policiais militares para a operação de retirada. Também neste caso houve pagamento de diárias pois houve necessidade de trazer policiais de outras cidades, inclusive do Batalhão de Operações Especiais. Com isso, a presença do MST naquela região está acarretando custos elevados ao Estado do Rio Grande do Sul. Além disso, o índice de criminalidade na região aumentou muito, elevando a atividade da Brigada Militar. Não apenas abigeatos, mas também outros delitos cresceram em número na região. Destaca também que, com a vinda de policiais militares de outras regiões, acentua-se a deficiência de efetivo na Brigada Militar que já é pequeno. Além das turbações que ocorrem com certa freqüência, o depoente informa terem havido cerca de sete invasões à Fazenda Coqueiros. Informa que a postura dos “sem-terra” é de hostilidade em relação á Brigada Militar, nas operações e no patrulhamento. Em várias oportunidades, viaturas foram apedrejadas, uma viatura foi retira em uma barreira e os Policiais Militares ficaram em cárcere privado por cerca de duas horas, sem falar no uso de armas de fogo. Já foram registrados disparos de armas de fogo por parte dos “sem-terra”. Informa que o MST utiliza estratégia de combate, sendo que na ocupação de uma serraria, o grupo precursor invadiu a propriedade com armas, para dominar a situação antes da chegada do contingente maior dos “sem-terra”. Nas operações de retirada por parte da Brigada Militar, as defesas dos acampamentos compõe-se de paliçadas, lanças, buracos no chão para que os cavalos tropecem, uso de Coquetéis Molotov. Além disso, o depoente tem notícia de que os “sem-terra” recebem treinamento especializado para essas atividades. Destaca que, se a Brigada Militar quisesse ingressar nos acampamentos, necessitaria de um contingente muito maior, treinado para a tarefa. Informa que, no ano passado, o juiz de direito da Comarca de Carazinho autorizou uma operação de busca e apreensão no acampamento “Jandir”, mas quando a operação encontrava-se na fase final do planejamento chegou uma contra-ordem da Secretaria de

38 Autos principais, fls. 199/200.

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Segurança. O depoente considera bastante importante que seja realizada uma operação desse tipo, restabelecendo a presença do Estado do Rio Grande do Sul dentro dos acampamentos. Hoje a única presença é da União, fornecendo alimentos, inclusive cachaça. Informa que a Brigada Militar está como depositária de cerca de duas mil garrafas de cachaça que foram apreendidas em uma operação. Os alimentos apreendidos foram reclamados pelo INCRA.

Do depoimento do Tenente Coronel Dal Bosco, Comandante do Batalhão da Brigada Militar de Carazinho, é relevante destacar a mantença de contingente de policiais com atuação exclusiva na região ocupada pelo MST nos limites da Fazenda Coqueiros, o que enfraquece o efetivo já carente para a realização do policiamento nas demais localidades de abrangência do Batalhão. Em épocas de conflito, há o deslocamento de policiais de outras regiões do Estado, com o incremento das despesas, notadamente por meio de diárias, deslocamento, etc. Informou que há uma postura de hostilidade dos “sem-terra” com relação à Brigada Militar. Este fato foi constatado em virtude do apedrejamento em várias oportunidades das viaturas, inclusive sendo retida uma viatura em uma barreira e os Policiais Militares mantidos em cárcere privado por cerca de duas horas, além da utilização de armas de fogo pelos integrantes do MST.

Preocupante, sobremaneira, a informação do aludido Tenente no sentido de que o MST utiliza estratégia de combate, sendo que na ocupação de uma serraria, o grupo precursor invadiu a propriedade com armas, para dominar a situação antes da chegada do contingente maior dos “sem-terra”. Nas operações de retirada por parte da Brigada Militar, as defesas dos acampamentos compõe-se de paliçadas, lanças, buracos no chão para que os cavalos tropecem, uso de Coquetéis Molotov. Além disso, o depoente tem notícia de que os “sem-terra” recebem treinamento especializado para essas atividades.39

Por derradeiro, é fundamental apontar as informações prestadas pelo Capitão Anibal Menezes da Silveira, Comandante do Batalhão da Brigada Militar de São Gabriel, onde também há acampamento do MST reivindicando a desapropriação da Fazenda Southal. Não é diversa a preocupação deste integrante da Brigada Militar:

Que no ano de 2004 houve a primeira presença do MST em São Gabriel, ocasião em que se deu a chamada “Marcha do Abril Vermelho”. Na ocasião, inicialmente o movimento se estabeleceu em uma propriedade particular, na periferia da cidade, cedida por um simpatizante. Logo a seguir, passaram a ocupar uma área às margens da RS 630, lá permanecendo até o ano de 2006. Não tem lembrança precisa mas acredita que por volta da metade do ano de 2006 os acampados do MST saíram do município de São Gabriel. No presente ano, no mês de abril, novamente retornaram, saindo de Santana do Livramento em uma marcha e

39 Autos principais, fl. 200.

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acampando em uma propriedade particular próxima à Fazenda Southal. O depoente estima que há um número em torno de 300 pessoas do MST acampadas neste local. No dia 18 de abril do corrente ano, houve um incidente entre o MST e a Brigada Militar quando o Movimento efetuou uma manifestação comemorativa ao Massacre em Eldorado dos Carajás e, após, pretendia-se dirigir em direção à Fazenda Southal, contrariando decisão judicial no sentido de que deveriam retornar ao acampamento de origem. Na ocasião houve um embate físico com o Movimento dos Sem Terra, ocorrendo lesões em policiais e um participante do Movimento. O policiamento em São Gabriel é feito com o efetivo do esquadrão. Quando há ações do MST, e se faz necessário, ocorre um reforço no policiamento provindo do Comando Regional e do BOE de Santa Maria. Nessas ocasiões, há despesas para o Estado, tais como diárias e alimentação. Quando da movimentação do MST em 2004, o depoente informa que efetuaram uma revista nos seus membros e um dos participantes era foragido do presídio de Uruguaiana. Quando da manifestação ocorrido no último dia 18, houve uma revista nos participantes, sendo apreendidas várias foices, encontrado um coquetel Molotov, além de diversas estacas pontiagudas. Perguntado ao depoente se os membros do MST que se encontram em São Gabriel aparentam ter algum preparo para confronto físico ou armado, a exemplo de uma guerrilha, o depoente responde que por ocasião do dia 18 de abril do corrente ano, quando a Brigada Militar estava efetuando um cordão de isolamento para assegurar que os participantes do MST retornassem ao acampamento por decisão judicial, pôde perceber que ocorreu uma atitude premeditada de alguns participantes que enfrentaram o pelotão da cavalaria com uma técnica organizada e sem improviso. Em determinado momento, alguns dos participantes levantaram duas taquaras com uma lona preta em frente à cavalaria fazendo com que os cavalos se assustassem e, com isso, passaram a enfrentar os policiais que estavam na retaguarda. Em virtude da crise que este fato gerou e do perigo de um embate físico com proporções muito graves, o depoente determinou que o policiamento recuasse. Com isso, os membros do MST também recuaram. O declarante informa que mantém um patrulhamento constante no local, inclusive de inteligência, mas não há um efetivo fixo.40

Mais uma vez, além dos aspectos já levantados, destaca-se a ratificação da notícia do uso de técnicas de guerrilha por parte de integrantes do MST.

Ora, ditas informações, constatadas oficialmente, por si só, são extremamente relevantes e devem conduzir a uma reflexão acerca dos rumos a serem seguidos no enfrentamento da questão.

A posição do INCRA

O órgão do governo federal diretamente incumbido de viabilizar solução para as reivindicações do Movimento dos Sem Terra é o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, que possui uma Superintendência no Estado do Rio Grande do Sul gerenciada por Mozar Artur Dietrich. Este Superintendente, no

40 Autos principais, fl. 203/204.

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dia 14 de agosto de 2007, compareceu ao Ministério Público acompanhado por José Rui Cancian Tagliapietra, Superintendente Regional Substituto, e prestou depoimento aos signatários, tendo manifestado esclarecedoras informações (fls. 139/142 dos autos principais). Veja-se:

Pelo Sr. Mozar, inicialmente, houve o fornecimento de uma ralação de acampamentos do MST no Estado, contendo também o número de famílias, de cestas básicas e lonas fornecidas. Esta relação está na primeira folha da documentação entregue. Quanto às cestas básicas, são originárias do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, em conjunto com o Programa de Aquisição de Alimentos do aludido Ministério e do Ministério do Desenvolvimento Agrário. A aquisição das cestas é feita pela CONAB por meio de leilão. Com relação às lonas, são adquiridas com verbas do Departamento de Ouvidoria Agrária Nacional do Ministério do Desenvolvimento Agrário. O pedido de lona é efetuado conforme a necessidade. A informação acerca da quantidade de lona necessária é feita por meio da supervisão do INCRA que acompanha essencialmente os assentamentos. Além disso, há informações do MST, de Prefeitos e Vereadores quanto à necessidade. O INCRA também fornece lonas aos assentados, pois até que construam suas casas por vezes é demorado. Os comparecentes também fornecem, neste momento, uma relação de acampamentos independentes, não ligados ao MST, sua localização, número de famílias, cestas fornecidas e lonas, objeto da segunda folha da relação. A terceira lista, é dos assentamentos do último ano. O Sr. Mozar informa que no total são 19 grupos no Brasil que lutam pela terra. A Via Campesina possui outro papel, pois unifica lutas ligadas à reforma agrária e à agricultura familiar. É uma espécie de articulação política dos movimentos. O MPA é um movimento de pequenos agricultores não é ligado ao MST e à FETAG, mas integra a Via Campesina. São ligados à FETRAFSUL. Neste momento, também é feita a entrega de uma relação de controle de entrega de cestas de alimentos aos integrantes do MST e assentamentos feita no mês passado. O Sr. Mozar informa que há um cadastro de 2005 dos acampados. Não está atualizado, pois ao final de 2005 houve tentativa de recadastramento e os funcionários do INCRA foram hostilizados, com resistência dos acampados. No ano de 2006 não houve cadastramento. No presente ano deverá haver um novo recadastramento. Não há resistência do MST para este trabalho na atualidade. Os comparecentes informam que há um cadastro em poder do INCRA contendo 25.000 pessoas que se cadastraram pelo correio durante o governo do Presidente Fernande Henrique Cardoso. Informam que no último ano o INCRA retirou mais de 200 famílias acampadas nas proximidades da Fazenda Coqueiros. Porém, quanto mais o INCRA assenta, mais aumenta o número de acampados. No ano de 2006, foram assentadas 858 famílias. Porém, encerrou o ano com 2.750 famílias acampadas em dezembro. No início de 2006 eram menos de 2.000 famílias acampadas. O Sr. Mozar informa que o relacionamento com os atores envolvidos com o problema da reforma agrária é de “marisco”, isto é, a autarquia é cobrada por todos os envolvidos. Os focos de litígio atualmente existentes no Estado são a Fazenda Coqueiros, Nova Santa Rita, São Gabriel e Pedro Osório. Há também acampamentos grandes em Santana do Livramento e em Bossoroca. Quanto à Fazenda Coqueiros, há o encaminhamento de pedido de desapropriação por interesse social genérico pela Lei 4.132, que está sendo analisado pela Chefia da Casa Civil. Em São Gabriel, na área é identificada por Fazenda Soutal, há tentativa de desapropriação pelo INCRA por descumprimento da função social da propriedade, pois este deve preencher quatro requisitos, isto é, o cumprimento e observação da legislação ambiental, geração do bem estar social pelo proprietário

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e seus funcionários, a produção racional e adequada, que se confunde com produtividade, e o cumprimento das obrigações trabalhistas. Em Pedro Osório, a proprietária da Fazenda da Palma foi notificada para avaliação do cumprimento da função social. Entretanto, houve ocupação do MST, o que levou à retirada do INCRA. Em Nova Santa Rita, o proprietário ofertou a Fazenda ao INCRA para venda. Porém, o INCRA somente paga por meio de TDAs. Em virtude de invasão recente com depredação, houve um recuo no negócio. O INCRA está efetuando vistorias de cumpirmento da função social em propriedades no Estado. Há quatro equipes para tanto. Nesta semana estão sendo notificadas mais de 10 propriedades. Há uma boa chance de as áreas não cumprirem a função social e, se isso se confirmar, serão encaminhadas para desapropriação sanção. O INCRA também está efetuando levantamento para fins de ação discriminatória em áreas devolutas ou federais ocupadas indevidamente. Houve, também, neste momento, a entrega de três listas de projetos de assentamentos realizados pelo INCRA, pelo Estado do Rio Grande do Sul e em conjunto INCRA-Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Informa o Sr. Mozar que há um enorme número de famílias que foram assentadas em conjunto entre o INCRA e o Estado do Rio Grande do Sul que ainda não conseguiu a sua infra-estrutura necessária e crédito, estando ainda pendentes de regularização em função de inadimplemento por parte do Estado de seus compromissos. O Estado do Rio Grande do Sul não está atuando em áreas de quilombos, sem-terra e índios. O INCRA possui um programa chamado PRONERA, decorrente de uma Conferência realizada em 1998. Este programa é executado pelo INCRA, tendo como objetivo a escolarização de nível médio, alfabetização, curso de segundo grau regular, supletivo de 1º grau, curso superior, especialização e pós-graduação de assentados. Este programa já formou mais de 300.000 pessoas no Brasil inteiro. Todos os cursos são aprovados pela Secretaria Estadual, Conselho Estadual de Educação e Ministério da Educação. Em Veranópolis há uma Escola chamada Antônio de Castro, mantida pelo ITERRA, contendo ensino técnico e médio regular. A Escola é aprovada pelo Conselho Estadual de Educação. Os assentados interessados dirigem-se às instituições de ensino e com ela apresentam um projeto à Comissão Pedagógica do PRONERA. Se aprovado, o projeto é encaminhado ao INCRA que efetua um convênio com a instituição. O encargo de escolher corpo docente é da instituição conveniada. O INCRA libera um valor de R$ 15,00 reais de diária por aluno para a permanência em turno integral na Escola em Veranópolis. Os comparecentes indicam a COCEARGS, de telefone 32219022 e 99891820, para contato com o movimento dos sem terra, situada na Travessa Leonardo Truda, 4º Andar.

Da explanação vertida a partir do depoimento do Superintendente Regional do INCRA, vê-se que o governo federal se faz presente intensamente na assistência aos membros dos acampamentos do MST no Estado. Há o fornecimento de cestas básicas, adquiridas pela CONAB, originárias do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, em conjunto com o Programa de Aquisição de Alimentos do mesmo Ministério e do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Por parte do INCRA, diretamente, ocorre o fornecimento de lonas para os acampamentos. Esses dados são confirmados por meio de correspondência oficial expedida ao Gabinete do Procurador-Geral de Justiça, Dr. Mauro Henrique Renner (fl. 380 dos autos principais), contendo, inclusive, relação de cestas básicas fornecidas (fls. 382 dos

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autos principais). Referentemente ao controle sobre o número de acampados participantes do MST no Estado, informou que há um cadastro de 2005, não atualizado em virtude de hostilização aos funcionários do INCRA pelos integrantes do citado movimento. Ponderou que no ano de 2006 não houve recadastramento, o que também inocorreu até o momento, havendo indicativo de que deverá haver novo senso até o final do ano. Entretanto, noticiou a existência de um cadastro efetuado pelo correio durante o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso contendo 25.000 pessoas. Neste particular, considerando o grau de conflituosidade que a reivindicação do MST atingiu no Estado, sem que se pretenda efetuar juízo meritório acurado, parece-nos relevante a necessidade de se manter um cadastro atualizado dos ocupantes dos acampamentos do MST, notadamente aqueles nos quais se está verificando riscos de conflitos e intensa atividade reivindicatória. Isso se faz necessário, inclusive, para a hipótese de ocorrer desapropriação pelo governo e futuro destino de lotes a famílias que, realmente, preencham o perfil necessário para ocupar a terra e fazê-la produtiva. Ademais, para evitar a possibilidade de infiltração de pessoas que nenhuma ou pouca relação tenham com a questão agrária, afastando-os desde logo do movimento e reduzindo o nível de tensão verificado. Não bastasse, considerando a informação do Superintendente do INCRA no sentido de que o número de acampados é sempre crescente, apesar de ocorrerem assentamentos periódicos, com mais razão afigura-se imprescindível a atividade cadastral por parte do Instituto ou outro órgão da Administração Pública. Há necessidade de se ter dados precisos sobre a identidade dos acampados, sua origem, estrutura familiar, etc. A atividade cadastral é relevante, inclusive, para conferir legitimidade às reivindicações do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Não pode o Estado prestigiar a clandestinidade, em especial diante da relevância que o tema tem assumido no contexto social deste País. Não se quer crer, também, que um movimento com a envergadura do MST pretenda desenvolver demandas pela terra sem permitir que o Estado conheça quem são seus integrantes e a eles destine glebas para serem tornadas produtivas. Aliás, nos parece absolutamente lídimo concluir que deveria haver o maior interesse do MST na identificação de seus membros, em absoluto entrosamento com os órgãos estatais neste particular, para garantir apenas a quem legitimamente tem direito o acesso à terra. Por derradeiro, a partir das informações do Superintendente Mozar, percebe-se que a atividade estatal do governo federal destinada ao assentamento de agricultores sem terra no ano de 2006 foi insuficiente para atender à demanda. Conforme referiu, no ano de 2006, foram assentadas 858 famílias. Porém, encerrou o ano com 2.750 famílias acampadas em dezembro. No início de 2006 eram menos de 2.000 famílias acampadas (fl. 140 dos autos principais). Vê-se, por amostragem, que o número de assentados (858 famílias) foi infinitamente menor ao montante de acampados (2.000 famílias) no ano de 2006. Com esse índice de efetividade estatal,

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o déficit sempre crescerá, podendo acentuar o conflito hoje já em níveis preocupantes.

Os Investigadores identificaram nos últimos desdobramentos que

envolvem a Fazenda Coqueiros fatos de extrema gravidade, atentatórios ao

Estado Democrático de Direito, neste sentido referem atuação do Ministério

Público de inibir os movimentos de invasão que podem gerar conflitos

graves.

Na atualidade, a questão envolvendo a Fazenda Coqueiros assumiu contornos ainda mais preocupantes. Não bastassem as invasões já realizadas ao longo do tempo desde 2004, tem-se verificado o desenvolvimento de nova movimentação de participantes do MST com destino à aludida Fazenda. Informações obtidas pela imprensa reiteradas vezes, bem como por meio do relatório da Brigada Militar (Anexo III) e, ainda, do Ouvidor-Geral da Segurança Pública do Rio Grande do Sul Adão Paiani e do Ouvidor Agrário e Presidente da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo Gercino José da Silva Filho, dão conta que há o desenvolvimento de uma marcha, em três frentes, contendo grande número de pessoas, com destino à Fazenda Coqueiros, com intenção explícita de invadi-la novamente caso não haja uma solução do Governo Federal no sentido de desapropriá-la e implementar assentamento no local. Em contrapartida, há também uma marcha de ruralistas com itinerário dirigido à Fazenda Coqueiros com vistas a impedir a invasão dos membros do MST. A partir dessa realidade, há perspectiva de que haja um conflito em breve envolvendo os integrantes do MST e ruralistas de conseqüências imprevisíveis. Por isso, vê-se manifestação dos Ouvidores Adão Paiani e Gercino José da Silva Filho, quando em visita ao Procurador-Geral de Justiça de nosso Estado, no dia 26.09.07, no sentido de solicitarem o apoio da Instituição nas tentativas de mediação entre os integrantes do MST e ruralistas, em virtude do conflito iminente (fls. 388/389 dos autos principais). Prontamente, o Ministério Público adotou medida judicial com o desiderato de evitar o confronto que se vislumbrava, agindo de maneira salutar e adequada. Na Comarca de Carazinho, o Promotor de Justiça Doutor Denilson Belegante ajuizou Ação Civil Pública Inibitória com pedido de adiantamento de tutela contra os sem-terras e demais intergantes de movimentos sociais representados pelo MST, e contra os ruralistas e demais produtores rurais representados pela Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul –

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FARSUL (fls. 122/126v, do Anexo VI), com pedido para que os aludidos movimentos se abstenham de se dirigir a Coqueiros do Sul, bem como para que a Brigada Militar atue no sentido de impedir a movimentação dos referidos grupos de se dirigirem a Coqueiros do Sul, estancando a movimentação, se necessário, na entrada da Comarca de Carazinho. Houve pleno acatamento do pleito ministerial pela Juíza da Comarca de Carazinho, Dra. Marlene Marlei de Souza, sendo deferida liminar nos termos da pretensão deduzida (fls. 127/131 do Anexo VI). Vê-se, pois, que a ação do Ministério Público foi destinada a evitar o conflito que se avizinhava, com prognóstico de riscos aos interesses sociais da comunidade da Comarca de Carazinho, integrantes do MST e ruralistas. Reafirmou-se, com isso, a necessidade do zelo pelo cumprimento da ordem legal e constitucional, o que não inviabiliza o desenvolvimento de atividades de cunho reivindicatório pelo direito à terra ou mesmo de proteção da propriedade. Incumbido da defesa da ordem jurídica e do regime democrático, o Ministério Público agiu prontamente e obteve a necessária sensibilidade jurisdicional para que o mister do fomento à ordem legal e constitucional fosse exercitado. Essa atuação, sem sombra de dúvida, é paradigmática e de efeitos práticos de extrema importância, podendo ser o embrião para outras providências no sentido de ser mantida a ordem legal e constitucional. Aliás, todas as reivindicações sociais devem estar lastreadas no eixo da legalidade-constitucionalidade, sob pena de autorizar a atuação do Ministério Público, que se mostrará incansável no cumprimento de suas funções.

Também foi objeto de análise dos Investigadores o aspecto da

legalidade e as ações do MST.

Em ponto anterior, versando sobre a estratégia do MST, destacou-se a relação ambígua que o movimento tem com o tema da legalidade. Naquela oportunidade, foi ressaltada a filiação ideológica da direção do movimento a um ideário leninista, concepção que supõe um modelo de organização formado por revolucionários profissionais, atuando simultaneamente na legalidade e na ilegalidade. É nessa “opção leninista” que deve ser compreendida a opção do MST pela extralegalidade, inclusive com a recusa de registro ou de formalização da personalidade jurídica, ao mesmo tempo em que não desdenha da utilização dos instrumentos legais quando necessário.

Assim como o tráfico de drogas em várias regiões do país

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conseguiu instalar território considerado Estado-paralelo, onde as leis do

pais não valem, o objetivo do MST segue a mesma linha, pois visa à

ocupação territorial e não o loteamento da terra para assentamentos. Os

Investigadores apontam para o risco à democracia.

O problema que a adesão a um tal ideário gera é justamente o da falta de compromisso com a democracia, vista como “burguesa” e insuficiente. O não-reconhecimento da democracia como um valor universal de organização social, somado ao controle autoritário e por vezes violento que o MST tem sobre seus militantes, enseja necessária preocupação quanto aos riscos à democracia advindos da atuação do movimento. Como assinalado pelo pesquisador, o MST repete a história das chamadas “Ligas Camponesas” em seu processo de radicalização:

Ironicamente, a história recente do MST repete, sob diversos ângulos, a história das ligas camponesas, em seus anos imediatamente anteriores à ruptura institucional de 1964, comprovando assim a natureza cíclica dos processos sociais. Desde a exacerbação da retórica política às formas extremadas de luta social, passando pelo ataque ao Estado e, até mesmo, à pueril adoção de “esquemas militares”, as lições da história passada parecem ter sido esquecidas pelos dirigentes da organização. Nos últimos três anos, o Movimento tem optado por um processo de radicalização política cuja rationale parece avessa a qualquer esquema interpretativo. Preferindo invadir, por exemplo, prédios públicos, ocupar algumas propriedades notoriamente produtivas (que não podem ser desapropriadas, segundo a lei), invadir navios para denunciar a existência de carga de “grãos transgênicos”, afrontar diretamente as demais organizações populares do campo, realizar atos de pressão política sobre temas recentíssimos e ainda muito controvertidos, na esfera dos debates públicos (como os tratados de livre comércio ora propostos, ou o tema dos organismos geneticamente modificados), além da repetição exaustiva de um discurso anti-Estado, são iniciativas que têm contribuído para afastar o Movimento de suas áreas anteriores de adesão política, estreitando seu campo de ação. Talvez o sinal mais significativo desta nova fase, se concretizada, seja exatamente a reticência da cúpula da Igreja Católica em aliar-se, quase incondicionalmente (como no passado), com a organização dos sem-terra, crescentemente desconfiada de suas formas de ação e opções políticas, embora a agência de mediação da instituição, a Comissão Pastoral da Terra, há

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anos venha atuando como linha auxiliar do Movimento (a mais rigorosa análise sobre a ação e a história recente da CPT sendo encontrada em Martins, 2000: 11-71 e 133-153). O tempo, contudo, é que indicará se tais rupturas irão concretizar-se mais amplamente ou se, caso contrário, o MST poderá reorganizar-se politicamente e melhor interpretar suas alternativas e possibilidades, à luz das mudanças operadas no Brasil, no período recente.41

Ora, se as instituições democráticas não são tão frágeis quanto no período pré-1964, também é necessário dizer que devem ser constantemente protegidas. O ethos democrático alimenta-se da confiança dos cidadãos e na adesão irrestrita à legitimidade das instituições públicas. Um movimento que aposte na ruptura institucional, na técnica de confronto e no discurso anti-Estado como elementos de sua estratégia de atuação terá necessariamente uma prática hostil à legalidade democrática. O Ministério Público, como defensor do regime democrático, conforme preceito do art. 127 da Carta Constitucional, pode e deve manifestar sua preocupação com o tema.

Uma forte evidência desse desprezo pelas instituições pode ser encontrada no famoso discurso de JOÃO PEDRO STÉDILE, liderança nacional do MST, em evento da EMATER, atacando o Poder Judiciário e o Ministério Público:

“(...) o terceiro aspecto na ação do governo é a legislação, é o poder judiciário. Muita gente tem dito em palestras que, ‘ah, o problema do Brasil é que o poder judiciário vai ser um problema’ [para a implantação da reforma agrária]. Vocês sabem melhor do eu (...) o poder judiciário no Brasil é um capacho do poder executivo, é uma tropa de puxa-saco, não existe nenhuma independência do poder judiciário com o poder executivo, a começar pelo Supremo Tribunal Federal (...) se os caras são indicados pelo presidente da república, algum deles vai criticar o presidente? (...) Então, um judiciário que começa desde o Supremo com essas características, o juizinho lá nós compramos ele com um churrasco, né, o preço

41 NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232.

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vem baixando, promotor de justiça então, deus o livre (...)”42

Assim, discursos como os de STÉDILE só podem ser vistos no contexto de uma lógica de deslegitimação do Estado e de destruição das instituições públicas. A adesão ao regime democrático é conditio sine qua non para a participação na vida pública, cumprindo ao Ministério Público fiscalizar o efetivo respeito à Constituição por parte dos atores da cena política e social brasileira, como é o caso do MST.

Tendo em vista a ausência de políticas públicas para os

assentamentos e a mantença de uma legião cada vez maior de acampados,

chamou a atenção dos Investigadores o custo que representa ao povo

brasileiro manter acampamentos de pessoas que servem de massa de

manobra a interesses de grupos que querem provocar uma ‘revolução’ no

país. Assim, perguntam os Investigadores: quanto custa um sem-terra?

Diante de todas as informações reunidas pelos signatários, dando conta do auxílio prestado pelo Poder Público aos acampados, à repercussão geral da atuação do MST e dos esforços na área da segurança pública para conter ou minimizar os efeitos deletérios das marchas e invasões, uma pergunta se mostrava inexorável: qual o custo de toda essa situação para a sociedade brasileira? Seria possível contabilizar os prejuízos? Para responder a essa questão, os signatários solicitaram a realização de uma perícia por parte da DAT – Divisão de Assessoramento Técnico da Procuradoria-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul. A perícia teve por objetivo apurar o custo suportado pelo Poder Público (estadual e federal) no tocante ao fornecimento de víveres para os sem-terra, tendo como base os dados fornecidos pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, e sua relação com os gastos realizados com a segurança pública, com base nas informações fornecidas pela Brigada Militar.

42 Conforme manifestação de JOÃO PEDRO STÉDILE (maio de 1994), em exposição pública realizada no “II Encontro Estadual da Equipe de Reforma Agrária da Emater/RS”, evento realizado na cidade gaúcha de Veranópolis, promovido pela referida empresa pública de extensão rural do Rio Grande do Sul (transcrição ad litteram retirada da gravação da palestra). Apud NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232, grifou-se.

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Destaca-se também que, embora a perícia refira-se à “Fazenda Coqueiros”, os valores fornecidos à Divisão de Assessoramento Técnico têm caráter parcialmente genérico, aplicando-se em parte a todo o Rio Grande do Sul. O número de cestas básicas, por exemplo, diz respeito ao total de famílias acampadas no Estado. Já os polpudos valores desembolsados pela Brigada Militar dizem respeito apenas às operações relativas à “Fazenda Coqueiros”43. Poderiam ser muito maiores, portanto, se contabilizadas as despesas atinentes a outras operações policiais de contenção das atividades do MST.

Em suma, das informações prestadas, a conclusão foi a seguinte44:

Do Gastos com alimentação

Dados de fornecimento informados pela Ação de Distribuição de Alimentos a Grupos Populacionais Específicos efetuados pela SESAN-MDS e CONAB. Média de famílias atendidas = (2.500+2831+2831) divididos por 3 = 2.721 utilizamos a média como forma calcular o gasto por família e ainda por pessoas atendidas considerando-se cada família composta pela média de 04 pessoas.

Quadro resumo do total

Consideramos os valores já atualizados até agosto/2007 para a cesta básica.

Isso posto, elaboramos as planilhas com os valores dos gastos efetuados

com as invasões ocorridas na Fazenda Coqueiros do Sul.

O montante dos gastos totais no período de 01/01/2005 a 31/07/2007, - 31 meses – foi de R$ 3.251.493,92.

43 Exceção feitas à horas de vôo de avião e de helicóptero, essas sim de caráter global (autos principais, fl. 424). 44 Autos principais, fls. 425/429.

Exercíci

Gastos diretos

com MST

Brigada Militar

do R G S

Total dos

Gastos

Famílias

Atendidas

Custo Médio

por Família

Valor Total Valor Total Total Gastos

2005 1.081.374,76 148.702,00 1.230.076,76 2500

2006 959.882,56 301.965,48 1.261.848,04 2831Até jul

2007 637.457,33 122.111,79 759.569,12 2831

Totais 2.678.714,65 572.779,27 3.251.493,92 2.721 1.195,11

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Temos um gasto médio mensal de R$ 104.886,90.

Considerando-se uma média de 2.721 famílias, tem-se uma média de R$ 1.195,11 por família.

Assim, estima-se o valor médio mensal gasto pelo Poder Público com os acampados existentes no Rio Grande do Sul como sendo de R$ 1.195,11 por família. Ressalta-se que esse valor tem caráter meramente indicativo, pois contabiliza apenas despesas com alimentação fornecida pela União e despesas com atividades de segurança e manutenção da ordem efetuada pela força pública estadual quanto à “Fazenda Coqueiros”.

Não estão contabilizados outros gastos, de natureza oculta, com o impacto nos serviços de saúde das localidades atingidas, ou os prejuízos ao comércio resultante das paralisações de trânsito feitas pelo MST. Da mesma forma, não foi contabilizado o prejuízo decorrente da desorganização da cadeia produtiva do campo, afetada pelas invasões e outros atos de vandalismo. Esses impactos devem, se possível, ser objeto de um estudo mais aprofundado com o fim de apurar a dimensão econômica das ações do MST. Não foram contabilizados, por fim, os gastos relativos ao total das operações da Brigada Militar nos últimos anos, o que faria – com toda certeza – elevar os valores informados.

Uma das constatações mais importantes dos Investigadores é a necessidade de medidas urgentes em relação aos acampados e principalmente com a organização ilegal denominada MST e os gastos do poder público com movimentos sociais de intolerância que abjetivam

Fazenda Coqueiros

Gastos diretos com MST

Alimentos - MST

exercícioQuant.Cest. Vlr. Unit Valor Total

2005 22.964,00 47,09 1.081.374,76 2500

2006 20.384,00 47,09 959.882,56 2831Até jul

2007 13.537,00 47,09 637.457,33 2831

Totais 56.885,00 47,08 2.678.714,65

Famílias

Atendidas

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unicamente atentar contra a democracia. É importante destacar esses dados porque, mesmo com o conteúdo

parcial e incompleto dos dados, foi possível estimar um gasto mensal médio de R$ 1.195,11 por família de sem-terra acampada no Rio Grande do Sul. O debate acerca da aplicação do dinheiro público é urgente, pois, apesar das considerações de ordem humanitária freqüentemente invocadas, não se pode aceitar que o Estado brasileiro, com tantas tarefas a cumprir em um país subdesenvolvido, possa despender enormes quantias subvencionando ou tolerando um movimento que recusa a legitimidade das instituições democráticas.

Embora não fosse objeto do levantamento de dados, os

Investigadores não puderam deixar de observar que o objetivo do MST em

relação à reforma agrária é algo que deve ser motivo de medidas urgentes.

Não se pretende discutir a reforma agrária no bojo deste relatório, pois o tema desborda do objeto do levantamento de dados. Entretanto, é necessário examinar, ainda que superficialmente, em que medida o MST ainda pretende uma reforma agrária. O tema foi dissecado mais uma vez por ZANDER NAVARRO na “Folha de São Paulo” em 22 de abril de 2007, sob o título “Comédia Agrária” (grifou-se):

Perdendo sua razão de ser, o MST tem sido forçado a apelar para "novos temas"; desde então, são patéticas suas ações e demandas NA FAMOSA frase, Hegel escreveu que "a coruja de Minerva só levanta vôo com o cair do crepúsculo", a metáfora alertando que a sabedoria da filosofia somente interpreta a realidade após os fatos ocorridos, pois não pode prescrever como o mundo deveria ser. Três décadas depois de sua formação pela Comissão Pastoral da Terra, o MST promove mais um "abril vermelho". Assusta uns e enfeitiça outros tantos, encantados com a mobilização supostamente voluntária dos pobres do campo. A maioria, contudo, recebe com enfado o que ocorre, pois a política não sobrevive à banalização da incessante repetição. Anos depois, a organização permanece sob relativo mistério, e muitos ainda se surpreendem de que mantenham tal ativismo. Os principais mitos precisam ser desvendados, para que a interpretação oriente-se pela história real. Aos fatos. Reformas têm o seu tempo histórico, e a agrária surgiu nos anos

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50, quando foi entendida como necessária para constituir o mercado interno que desenvolveria o país. Mas não ocorreu, pois após o "milagre brasileiro" o Brasil ressurgiu mais urbano, com sua economia prescindindo da reforma agrária. Mas não apenas isto. No mesmo período, o mundo rural se tornou mais heterogêneo e a produção de alimentos e matérias-primas, ainda nos anos 80, encontrou-se com a demanda. Assim, reforma agrária para garantir oferta de produtos e uma política que precisasse ser uniforme em todo o país também sumiram do mapa dos argumentos. Restaria a justificativa política, a democratização no campo, ainda uma exigência em algumas regiões, mas cada vez menos, em face da difusão de informações e do aperfeiçoamento democrático. A conclusão inevitável é que hoje inexistem razões, sob qualquer ângulo, para a realização desta reforma em todo o Brasil. Nem mesmo existe uma demanda social digna do nome, cada vez mais raquítica. Quando muito, a reforma agrária concentrada exclusivamente no chamado "polígono das secas" ainda seria justificável, pois reduziria a incidência da pobreza rural. Perdendo a sua razão de ser, o MST tem sido forçado a apelar para "novos temas" para se autojustificar e, desde então, são patéticas suas ações e demandas. Sempre procurando polaridades que facilitam o jogo político, a tentativa, por exemplo, de transformar o chamado "agronegócio" em alvo é apenas um desses equívocos. Não apenas porque todos os agricultores fazem negócios, inclusive os assentados, mas porque a maioria dos brasileiros se perguntaria: podemos abrir mão desse setor produtivo? O erro estratégico é pedestre, mas os líderes dos sem-terra preferem a miopia do obscurantismo ideológico ao exame da realidade. Se assim não fosse, o MST atacaria a agricultura de grande porte valendo-se dos fatos. Ou seja, os abusos sistemáticos realizados pela maior parte daqueles proprietários em relação aos direitos trabalhistas e, em particular, a espantosa depredação ambiental em áreas rurais, comprometendo as regiões de produção. Mas alguém, em sã consciência, poderia antever um futuro rural sem a agricultura de grande escala no Brasil? Haveria alguma chance, pequena que fosse, de atrair novamente massas de moradores urbanos para o campo, inspirando-se quem sabe na tragédia da experiência do

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Khmer Rouge? Mas a comédia de erros pode se estender a perder de vista. Desde o embuste de apresentar-se como um "movimento social", quando é uma organização não democrática do sistema político (o que permite esconder líderes, que escapam do debate), até os aspectos de sua estruturação interna, quase todos ignorados pelo público. Este desconhece, por exemplo, a verdadeira aberração que são suas iniciativas em "educação", passando pelo controle autoritário, freqüentemente violento, sobre os assentados, em um mundo rural onde o Estado não comparece e as práticas democráticas são rarefeitas. Por fim, o coroamento dessa seqüência de absurdos. O "abril vermelho" é ostensivamente pago com recursos públicos, sem transparência ou prestação de contas. Isso o torna mais acintoso, pois finge atacar a política federal e o Estado, quando são os recursos estatais que financiam a montagem deste tragicômico teatro. Até quando o governo federal sustentará esse embate leviano e a irracionalidade de um programa que, sob a forma atual, não muda nada, não democratiza a propriedade rural, não atende aos pobres do campo, mantendo apenas a retórica dos jogos de cena da política e os atuais interesses dos principais atores, o MST inclusive?

Os movimentos sociais são importantes para o regime democrático, na medida em que vêm preencher o gap muitas vezes existente entre o Estado e a sociedade, sendo os partidos políticos em certas ocasiões insuficientes para uma mediação plena dos interesses. No entanto, quando esses movimentos sociais perdem a espontaneidade e se transformam em organizações burocráticas, é necessário estar alerta. A situação se torna mais preocupante ainda quando a motivação inicial (como, no caso, a reforma agrária) se torna um pretexto para atuação, e o movimento excede o limite da legalidade em suas ações – não ocasionalmente, mas como estratégia de ação. Quando se chega a esse ponto, a questão deve merecer atenção de todos e, principalmente, a vigilância do Ministério Público, que tem a missão constitucional de proteger a ordem pública e o regime democrático.

As conclusões a que chegaram os Investigadores são

preocupantes e mostram a necessidade de medidas das Instituições que

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devem garantir a democracia.

Em face das informações colhidas na tarefa para qual o Egrégio Conselho Superior do Ministério Público designou os órgãos signatários, qual seja, a atividade de levantamento de dados acerca da situação dos acampamentos do Movimento dos Sem-Terra no Estado do Rio Grande do Sul, verificou-se a contrariedade à lei de algumas formas de atuação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, bem como o risco ao Estado Democrático de Direito que decorre de um tratamento permissivo ou inadequado dos referidos comportamentos.

No curso do levantamento de dados, constatou-se também que algumas medidas são possíveis para o enfrentamento do problema. Destarte, os órgãos signatários lançam as seguintes sugestões de atuação por parte do Ministério Público:

1. Sugere-se sejam tomadas medidas para, se necessário, ocorrer o ajuizamento de ações civis públicas com vista à desconstituição dos acampamentos que estejam sendo utilizados como “base de operações” para invasões de propriedades. Tal medida tem como fundamento, entre outros motivos que possam ser destacados nos casos concretos, a proteção da ordem pública, que é um direito difuso de toda a coletividade. Além disso, entende-se possível invocar o art. 1.277 do Código Civil, o qual trata do uso anormal ou nocivo da propriedade, como argumento de apoio em prol da desconstituição dos acampamentos.

2. Sugere-se sejam tomadas medidas para, se necessário, ocorrer o ajuizamento de ações civis públicas com vista à suspensão das marchas, colunas ou outros deslocamentos em massa de sem-terras. Como destacado pelo Promotor de Justiça DENÍLSON BELEGANTE, com atuação na Promotoria de Justiça de Carazinho, semelhantes medidas podem impedir o confronto entre sem-terras e as forças de segurança, ou entre sem-terras e os produtores rurais45. Trata-se, mais uma vez, de atuação preventiva em prol da proteção da ordem pública.

3. Tendo em vista que parte das ações de mobilização do MST tem origem em

45 http://www.mp.rs.gov.br/imprensa/noticias/id12173.htm.

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assentamentos (não mais acampamentos) controlados pelo movimento, em função do controle social que o MST exerce sobre os assentados46 e em total desvio da finalidade de reforma agrária prevista na Constituição Federal, que visa a uma melhor produtividade no campo, sugere-se sejam investigados os assentamentos promovidos pelo INCRA ou pelo Estado do Rio Grande do Sul, de forma a verificar se a propriedade rural, nessas áreas, cumpre sua função social. Com essas medidas, buscar-se-á assegurar o tratamento isonômico da propriedade rural no Brasil, implementado paridade na avaliação da produtividade dos assentados e dos demais proprietários rurais, assim como na avaliação dos demais requisitos da função social da propriedade. Salienta-se, outrossim, a recente iniciativa do Ministério Público Federal, que ingressou com ação civil pública no Juízo Federal de Santarém, no Pará, para anular todas as portarias de criação de assentamentos emitidas no oeste daquele Estado pelo INCRA entre os anos de 2005 e 2007, pois criados sem licença ambiental47.

4. Sugere-se também sejam tomadas medidas para investigar os integrantes de acampamentos e a direção do MST pela prática de crime organizado, pois ficou constatado que o movimento e seus militantes têm a prática de atos criminosos, com a invasão e depredação de propriedades privadas e de prédios públicos, como táticas regulares de atuação.

5. Sugere-se sejam tomadas medidas para, se necessário, ocorrer o ajuizamento de ações civis públicas com vista à proteção da infância e juventude em relação às bases pedagógicas veiculadas nas escolas mantidas ou geridas pelo MST, nitidamente contrárias aos princípios contidos na Constituição Federal e que embasam o Estado Democrático de Direito. Da mesma forma, sugere-se a tomada de medidas judiciais, se necessário, para impedir a presença de crianças e adolescentes em acampamentos, assim como em marchas, colunas ou outros deslocamentos em massa de sem-terras, tendo em vista serem ambientes notoriamente inadequados para pessoas em processo de desenvolvimento.

6. Sugere-se também sejam tomadas medidas para investigar os integrantes de

46 NAVARRO, Zander. O MST e a canonização da ação coletiva (comentário ao artigo de Horácio Martins Carvalho). Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 261-282. 47 Processo n.º 2007.39.02.000887-7 – Vara Federal de Santarém, Pará.

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acampamentos e a direção do MST no que toca ao uso de verbas públicas e de subvenções oficiais, tanto no plano criminal quanto na esfera da improbidade administrativa. Não se pode aceitar que o Estado brasileiro, com tantas tarefas a cumprir em um país subdesenvolvido, possa despender enormes quantias na subvenção de um movimento que recusa a legitimidade das instituições democráticas.

7. Sugere-se sejam expedidas recomendações aos órgãos públicos estaduais relacionados à problemática da reforma agrária, com controle do Ministério Público quanto ao efetivo cumprimento das medidas recomendadas, para que atuem de forma integrada no controle e fiscalização das atividades do MST, especialmente na identificação e cadastramento dos acampados.

8. Sugere-se seja comunicado o Ministério Público Federal do teor das conclusões contidas neste relatório.

9. Sugere-se a realização de uma investigação sobre a estrutura interna de organização do MST, com vista a elucidar a existência de eventual “braço” paramilitar do movimento. Se eventualmente constatada a existência de aparato organizado para o enfrentamento armado com o Estado ou com particulares, sugere-se atuação no sentido da dissolução do movimento, em face do que preceitua o art. 5º, XVII, da Constituição Federal48.

10. Sugere-se também a realização de investigação eleitoral nas localidades em que se situam os acampamentos controlados pelo MST, examinando-se a existência de condutas tendentes ao desequilíbrio deliberado da situação eleitoral local. Constatada eventual irregularidade, sugere-se atuação para que ocorra o cancelamento do alistamento eleitoral, à semelhança das medidas tomadas pelo Promotor de Justiça DENÍLSON BELEGANTE, com atuação na Promotoria de Justiça de Carazinho 49.

11. Sugere-se, por derradeiro, a formulação de uma política oficial do Ministério

48 Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; (...). 49 http://www.mp.rs.gov.br/imprensa/noticias/id12173.htm.

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Público, com discriminação de tarefas concretas, com a finalidade da proteção da legalidade no campo. O problema é sério e merece ser enfrentado de imediato, sob pena de agravamento. Entende-se que o MST deva ser monitorado em caráter permanente, sendo importante que exista no mínimo um órgão do Ministério Público especialmente destacado para a atividade, seja na assessoria do Procurador-Geral de Justiça, seja com a implementação de Promotoria de Justiça Especializada em Conflitos Agrários.

Com as 11 sugestões acima, corretamente identificadas, os

Investigadores concluíram seu trabalho para o fim a que foram designados.

É o relatório.

2. VOTO

Registro, inicialmente, um voto de louvor pelo trabalho executado

pelos doutores Promotores de Justiça LUCIANO DE FARIA BRASIL e

FÁBIO ROQUE SBARDELOTTO, da Promotoria de Justiça de Habitação e

Defesa da Ordem Urbanística, que, com imparcialidade e profissionalismo,

revelaram um quadro obscuro da questão agrária no Rio Grande do Sul. Com

os seus subsídios é possível ao Ministério Público tomar uma posição

institucional de atuação segundo os parâmetros que lhe foram conferidos

pela Constituição Federal de 1988.

A questão dos conflitos agrários e dos movimentos que se

consolidaram com o objetivo de lutar por reforma agrária está claramente

delineada na presente investigação.

Registro, inicialmente, que se trata de um momento histórico do

Ministério Público na sua atribuição constitucional em defesa do Estado

Democrático de Direito. A omissão no enfrentamento das questões que

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constam deste expediente pode representar a negligência com a mais

importante função conferida ao Ministério Público pela Carta de 1988. Trata-

se de lançar mão de instrumentos para a defesa da democracia brasileira.

A primeira constatação é inarredável. É preciso desmascarar

o MST como movimento que luta pela reforma agrária. A forma como agem

os integrante do MST é clara no sentido de tratar-se de uma organização

criminosa, à semelhança de outras que existem no mundo, e que

objetiva conquistas territoriais para a instalação de um ‘Estado-

paralelo’, com nítida inspiração leninista, e não um movimento que

luta pela terra em prol de seus filiados. O MST hoje é uma

organização criminosa que utiliza táticas de ‘guerrilha rural’ para

tomada de território estrategicamente escolhidos por seus líderes.

Nos recentes episódios ocorridos na região norte do Rio Grande do

Sul pode-se observar que não se trata de mera invasão com o fim de esbulho

possessório para assentamento de sem-terras. O MST age por orientação de

um organismo maior, que lhe fornecesse dinheiro e ideologia. A propósito,

cabe observar reportagem da revista VEJA, de 7.11.2007, p. 126 e 127,

acerca de episódio ocorrido no Pará, que pode ser comparado às investidas

do MST na Fazenda Coqueiros:

Justiça Faroeste no Pará Sem-terra e bandoleiros saqueiam e destroem fazendas no sul

do estado e a governadora Ana Júlia Carepa nada faz para impedi-los, por Leonardo Coutinho, de Santa Maria das Barreiras:

“Os frigoríficos descobriram o sul do Pará há dez anos. O baixo custo da terra atraiu os gigantes Bertin, Minerva e aventureiros que se embrenharam no setor, como o banqueiro Daniel Dantas. Hoje, a área, equivalente à do estado do Rio de Janeiro, abriga um dos maiores rebanhos do país. A economia floresceu, os investimentos chegaram e o preço do hectare dobrou desde 2004. Agora, uma onda de conflitos

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agrários e um surto de banditismo ameaçam interromper o desenvolvimento. Vinte e cinco fazendas já foram invadidas. Vinte delas ainda estão ocupadas e oito foram destruídas. A Justiça concedeu mandados de reintegração de posse a nove fazendeiros. Nenhum deles foi cumprido, porque a governadora Ana Júlia Carepa, do PT, editou uma portaria proibindo a polícia de interferir nos conflitos agrários. Pasme, mas é isso mesmo. A medida define esses casos como "conflitos sociais" e estabelece que eles devem ser dirimidos exclusivamente por uma delegacia de assuntos fundiários, que funciona a 350 quilômetros da área convulsionada, uma distância maior do que a que separa Salvador de Aracaju. A decisão da governadora beneficiou não só os sem-terra como também três quadrilhas de malfeitores que aterrorizam o sul do estado. Esses bandos invadem fazendas e cobram resgate dos seus proprietários. Quando não recebem o dinheiro, matam animais, queimam pastos e arruinam edificações. Em dezembro do ano passado, uma das gangues incendiou os currais e a sede da Fazenda Rodeio, em Bannach. O prejuízo ultrapassou 1 milhão de reais. Em setembro, outros bandidos tomaram a Fazenda Mirim, em Redenção, e exigiram 50.000 reais do empresário Darci Capeleto para desocupá-la. Se ele não pagasse, sua fazenda seria entregue aos sem-terra. Há duas semanas, três policiais fugiram de uma estrada tomada por um dos bandos de pistoleiros. Deveriam ter voltado com reforços. Não o fizeram por causa da portaria da governadora. Casos como esse levaram o promotor Daniel Barros advertir Ana Júlia, por meio de ofício, de que a afirmar que, no Pará, "está se confundindo reforma agrária com crimes de extorsão, dano ao patrimônio, ameaças, lesões corporais e mortes". Em meio à impunidade, uma recém-criada organização de sem-terra começou a aterrorizar a região: a Liga dos Camponeses Pobres, que mantém relações com remanescentes do Sendero Luminoso, o grupo terrorista de orientação maoísta que matou 30.000 pessoas no Peru nas décadas de 80 e 90. Os integrantes da liga andam encapuzados e armados. Dois deles contaram que a organização funciona com o dinheiro que cobra de pessoas interessadas em ganhar lotes da reforma agrária. Quem paga 10 reais por mês pode manter uma barraca nas áreas ocupadas. No mês passado, quarenta integrantes da liga invadiram a Fazenda Forkilha, em Santa Maria das Barreiras. Os proprietários foram feitos reféns por doze

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horas antes de ser liberados. Atualmente, a Forkilha está tomada por 1.000 pessoas acampadas, algumas das quais têm casa própria em cidades da região. Os métodos desses marginais são tão violentos que assustam até as outras organizações de sem-terra que atuam na região. "São bandidos. Quem age mascarado e com arma na mão não é de movimento social", diz Pedro Alcântara de Sousa, da Federação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Familiar. Os crimes dos bandoleiros e dos sem-terra, combinados com a impunidade assegurada pelo governo do PT, levaram fazendeiros a contratar empresas de segurança. Graças a isso, a Fazenda Mirim, de Darci Capeleto, escapou de ser invadida pela segunda vez no mês passado. Outros proprietários decidiram se cotizar em um fundo para contratar um serviço coletivo de vigilância. "É a única alternativa que temos, porque o pouco de presença de estado que existia aqui desapareceu", afirma a presidente do Sindicato Rural de Redenção, Rosangela Hanemann. O Pará da governadora Ana Júlia Carepa é uma terra sem lei. A Fazenda Vitória Régia (acima, à esq.) foi incendiada por sem-terra. Acima, integrantes armados e encapuzados da Liga dos Camponeses Pobres ocupam a Fazenda Forkilha. Ao lado, a Fazenda Rodeio, depredada por bandidos” .

O fato acima narrado é o prólogo de um imenso mar de conflitos

agrários que se avizinham em face da complacência do pode público,

notadamente dos governos de esquerda, com a questão agrária e o

tratamento dispensado aos sedizentes ‘sem-terra’. No caso, o governo federal

tem-se mostrado completamente omisso para solucionar o problema,

limitando-se a fornecer cestas básicas, lonas para as barracas, cachaça,

treinamento em escolas para conhecer a cartilha de Lenin, etc., menos a

identificação de terras não produtivas e que poderiam ser destinadas para a

reforma agrária.

Uma pergunta que não quer calar: por que se invade um fazenda-

empresa, que é altamente produtiva? O que representaria para a economia

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do país destruir fazendas produtivas e entregá-las a vagabundos que jamais

trabalham em terras e sequer conhecem manejo de plantações???

O quadro que se vislumbra numa invasão a uma fazenda é de

causar escarnecimento a qualquer pessoa que não tem a mínima noção de

produção de alimentos. O que invasores movidos a cachaça, utilizados como

massa de manobra do MST, vão fazer numa fazenda mecanizada que é

produtiva (tem reserva natural, rio, usina de energia, imensa área de cultivo

e se situa numa posição geográfica estratégica)?

O MST é uma organização estruturada e despersonalizada

juridicamente, tal qual as FARCs colombianas, pois assim não pode ser

responsabilizado pelos seus atos contra bens jurídicos individuais ou

coletivos. Todavia, recebe auxílios financeiros do Poder Público e de

entidades estrangeiras, tudo de forma mascarada, utilizando-se de

instituições aparentemente legais. O MST negocia com órgãos

governamentais e indicam quem serão os beneficiários do lotes para

assentamento. O ‘abril vermelho’, as ‘escolas de treinamento’ de jovens e a

forma como são distribuídos nos acampamentos, a logística empregada em

seus deslocamentos, a manutenção dos acampados, tudo revela um quadro

de emprego gigantesco de dinheiro público, sem qualquer controle. Quem

decide é uma entidade despersonalizada juridicamente.

O Ministério Público sempre fiscalizou de perto o destino de

recursos públicos, promovendo ações penais e de improbidade contra

agentes públicos que fazem mau uso do dinheiro do povo. E o MST, a Via

Campesina? Foi identificado pelos Investigadores o financiamento público do

MST:

... a equipe de auditoria do TCU identificou diversas irregularidades

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na execução dos convênios firmados pela administração federal com as entidades ligadas ao MST, principalmente, as maiores delas: Anca, Concrab e Iterra (fl. 243): ... g) danos aos cofres públicos; h) irregularidades nos convênios de assistência jurídica e assentados; i) indícios de favorecimento na celebração de convênios da Anca e da Concrab; j) A Anca e a Concrab atuam como agentes financeiros do MST; k) Desvio de finalidade na celebração de convênios; l) Suspeitas de desvio de recursos para o “Abril Vermelho”.

Verifica-se, pois, que seja pelas maneiras de malversação de verbas públicas apontadas nas conclusões da CPMI da Terra, seja pelo repasse de dinheiro público efetuado diretamente pelo INCRA na forma de distribuição de lonas, cestas básicas e outros auxílios, o financiamento estatal das atividades do MST fica claro.

Não há nenhuma dúvida que o MST é financiado pelo Poder

Público Federal, porém não tem personalidade jurídica. Não presta constas do

emprego da verba e gasta como bem entende. Apenas sob este aspecto há

um MAR DE ILEGALIDADES que levaria todos os envolvidos à cadeia, se

fossem integrantes de instituições legalizadas.

Porém o que mais preocupa é a ideologia que atualmente move o

MST, caracterizando-se como movimento revolucionário, com objetivo de

tomada de poder, iniciando-se pelo espaço territorial.

As declarações do Comandante do CRPO Planalto, Cel. Waldir

João Reis Cerutti são fundamentais para a compreensão do MST:

A via Campesina – organização internacional com intensa atuação na

região Norte, como de resto, em todo o Estado, vincula-se ao Movimento dos Sem Terra (MST), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB), dentre outros que se instalaram em torno da Fazenda Coqueiros, de propriedade de Félix Tubino Guerra, montando 04

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(quatro) acampamentos, com cerca de 4.500 (quatro mil e quinhentos) acampados, ao todo.

Existem dois acampamentos na BR 386 e outros dois acampamentos em áreas contíguas à Fazenda Coqueiros; um deles últimos encontra-se em área arrendada denominado acampamento JANDIR – ocupada no ano de 2004 e o outro, recentemente adquirido por particular e cedido graciosamente ao MST, denominado acampamento SERRARIA (que tem demonstrado maior agressividade), encontra-se encravado em dita fazenda.

Todos acampamentos funcionam como vasos comunicantes, havendo intensa troca de acampados, de um para outro, além de receberem seguidamente novos militantes, recrutados entre a população menos favorecida das cidades maiores, bem como oriundos dos assentamentos da região. Acresço que essa movimentação visa dar condições estratégicas para as lideranças efetivarem a prática de ações delituosas em determinados pontos específicos, em verdadeiras ações para-militares, utilizando-se a estrutura destes acampamentos como base para suas incursões criminosas.

Cada acampamento possui sua liderança local, ligada às lideranças regionais, que por sua vez se ligam às lideranças estaduais, tudo vinculado ao movimento internacional “Via Campesina”. As ações são todas coordenadas estrategicamente e normalmente tem cunha político, porém causam grande dano patrimonial e moral aos atingidos, suas famílias e funcionários, nas ações que desencadeiam na área.

25. Os Acampamentos estão sendo mantidos por diversas fontes, inclusive com verbas públicas do Governo Federal, através do INCRA-RS, com seguida remessa de toneladas de gêneros alimentícios provenientes de programas como o FOME-ZERO, adquiridos com recursos públicos da também estatal CONAB (Companhia Brasileira de Abastecimento), tudo comprovado com Nota Fiscal. Além disso, há fontes internacionais que também mantém o movimento e , segundo informações de inteligência, até as próprias FARC, que dominam parte do território colombiano.

Recentemente em ação do Ministério Público, durante investigações sobre as ações delituosas do movimento Via-Campesina, foi encontrado em um estabelecimento ligado a tal movimento, na cidade de Passo Fundo, grande quantidade de dinheiro, em moeda corrente de diversos países.

Comprovando o envolvimento internacional, temos também o registro de diversas visitas de estrangeiros aos acampamentos, bem como estrangeiros orientando as ações, como é caso do indivíduo conhecido como Hugo Castelhano.

As ações delituosas do movimento na região são facilmente observadas através dos diversos registros e prisões já homologados, caracterizando-se principalmente, por invasões, esbulhos, turbações, crimes ambientais, posse ilegal de armas, roubos, furtos e, supostamente, exploração de menores.

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As maiores ações envolvem uma organização típica, a saber: são feitas em sigilo, da madrugada para o amanhecer, com atuação de um grupo precursor armado, com grande movimentação de pessoas e invejável estrutura, contando com lideranças estaduais de renome. Tais ações necessitam de grande aporte financeiro para sua execução.

Os setores de inteligência obtiveram informações da estratégia de atuação do movimento na região, que seria incentivada pelas FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), copiando o modelo adotado em tal país. Como é do conhecimento público, as FARC dominam grande parte daquele país e adotam o método de controle através do domínio territorial, começando suas ações pela guerrilha rural; nas regiões dominadas, o controle é total , as zonas são fechadas, pouco ou nada restando de autoridade aos governos central e local; em tais zonas o exército e a polícia não entram, tornando-se regiões fora da lei, onde a única lei é a ditada pelo crime organizado. Nestas regiões as FARC em como fonte de renda o tráfico de drogas e de armas, a venda de proteção a traficantes produtores de drogas, a empresários comerciantes e fazendeiros, tanto no campo como nas cidades existentes em sua “Zona de Domínio”. ...

Análises de nosso sistema de inteligência permitem supor que o MST esteja em plena fase executiva de um arrojado plano estratégico, formulado a partir de tal “convênio”, que inclui o domínio de um território em que o governo manda nada ou quase nada e o MST e Via Campesina, tudo ou quase tudo.

Na região do Estado do Rio Grande do Sul compreendida entre os municípios de Palmeira das Missões, Irai, Nonoai, Encruzilhada Natalino, Pontão e Passo Fundo, existem nada menos do que 31 (trinta e um) assentamentos do MST e diversas reservas indígenas; no vale do Rio Uruguai existem diversos aproveitamentos hidrelétricos (alguns prontos e outros ainda em execução), onde age um grupo denominado de MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), congênere do MST e que, igualmente, adotam métodos violentos de reivindicação como o movimento maior (o MST). Registram-se ações do MAB, entre outras, nas usinas hidrelétricas de Barra Grande, Machadinho e Itá.

Dentre os assentamentos referidos, destacam-se os dois maiores e mais conhecidos: os das Fazendas SARANDI e ANONI, nos municípios de SARANDI, RONDA ALTA e PONTÃO. Mais à OESTE da região mencionada, existe com número de assentamentos do MST, em municípios como BOA VISTA DO INCRA, CRUZ ALTA, JÓIA e TUPANCIRETÃ.

As informações acima prestadas permitem concluir que o arrojado plano estratégico do MST, sob orientação

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de operadores estrangeiros como as FARC, é adotar nesta rica produtiva região do nosso Estado, o método de controle territorial branco tão lucrativamente adotado pelas FARC na Colômbia. O fechamento do território consistiria em domínio de leste para oeste, a partir da linha norte-sul, representada no mapa em anexo pela rodovia RS-324, que vai de Passo Fundo a Nonoai e de lá até a ponte do Goio-En, que dá acesso ao município de Santa Catarina

Estima-se que a primeira etapa da ação visando obter pretendido domínio

territorial branco seria tentar controlar o território entre as rodovias RS-324 (Passo Fundo, Pontão, Ronda Alta, Goio-En)e BR-386 (Carazinho, Sarandi e prolongamento por estrada estadual que também conduz à ponte do Rio GoioEn), estendendo com pontos até a fronteira com o Uruguai o que já lhes daria o controle sobre estas importantes rodovias norte-sul, de grande importância estratégica para fins de controle de área e liberdade de movimentos. Ressalte-se que já se verificou invasão às margens da BR-354. No município de Nonoai (dentro da área visada), na faixa de domínio da citada rodovia e na Fazenda de propriedade de Alberto Tagliari, ocorrendo o cumprimento de Ordem Judicial de reintegração de posse, no entanto os invasores retirados prometeram tornar a invadir a área e depredar a propriedade, pois é até assinalado como ponto indispensável de fixação.

Outro Componente que merece ser observado é a afirmação divulgada pela imprensa nacional, de João Pedro Stédille, Líder nacional do MST, no sentido de que o objetivo do MST não é mais somente a reforma agrária, justificando e enaltecendo as ações criminosas ocorridas contra a Aracruz Celulose e Monsanto, demostrando que as ações até então desenvolvidas serão intensificadas e potencializadas, com níveis cada vez maiores de danos.

Uma das maiores propriedades rurais existentes no trecho entre estas rodovias, objeto do plano estratégico referido, é a Fazenda Coqueiros, com cerca de 7.000 (sete mil) hectares, de forma aproximadamente triangular, sendo que seu ponto mais a leste fica a cerca de 13 (treze) quilômetros a oeste da Cidade de Pontão, onde existe acesso rodoviário ligando tal cidade ao Distrito de Xadrez, pertencente ao atual município de Coqueiros do Sul. O ponto mais ao Sul de tal fazenda fica a 06 Km da cidade de Carazinho, sendo que o acesso à Carazinho é por estrada municipal que liga tal município à Xadrez e, deste Distrito. Bifurca-se o ramal direito conduz a PONTÃO e o outro (na direção norte) conduz à sede do Município de COQUEIROS DO SUL e também dá acesso à FAZENDA ANONI (assentamento do MST) situada a aproximadamente 20 Km da divisa da Fazenda Coqueiros. O acesso rodoviário principal à sede do município de Coqueiros do Sul dista poucos quilômetros da divisa Norte da Fazenda Coqueiros (Rio Turvo), sendo que, em linha reta, a distancia é de 02 (dois) KM. Já, do lado OESTE, a fazenda Coqueiros não faz divisa com a BR-386,

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mas fica perto dela, havendo apenas uma estreita faixa de terra de alguns proprietários, que são, do Sul para o Norte: Família Bocorni, representado pela Sra. Genny Bocorni sucessores de Alfredo Bratz, representado pelo genro e administrador Dr. Reneu Ries e, ainda, a propriedade de 2.300 hectares, hoje denominada Sazão Agropecuária S.A, administrada pelo Sr. Antônio Chaves Barcellos, residente em Porto Alegre. Através de cada uma destas propriedades, em caminhadas com duração máxima de meia hora, a partir de qualquer ponto da BR-386, é possível atingir a divisa Oeste da Fazenda Coqueiros, bem como mobilizar assentados do norte do estado para participarem de ações e saírem do teatro de operações antes da chegada da polícia.

Para a execução da primeira parte do arrojado plano estratégico antes referido, é imprescindível a tomada, a qualquer preço, da Fazenda Coqueiros e outras propriedades situadas em seu caminho, por localizarem-se entre as duas rodovias asfaltadas mencionadas (RS-324 e BR-386), embora não divise com nenhuma delas.

O MST e seu afilhado o MPA, ambos integrantes da chamada Via Campesina, organismo internacional antes citado, instalam em torno da Fazenda Coqueiros nada menos do que 04 (quatro) acampamentos, ... onde mantêm cerca de 4.500 (quatro mil e quinhentas) pessoas, sendo que todo este efetivo é movimentado, constantemente, de um para outro acampamento, recebendo com grande freqüência novos ocupantes, vindos de outros municípios a até de outros estados e países. Dois deste acampamentos, denominados de ACAMPAMENTO DO JANDIR e ACAMPAMENTO SERRARIA estão contíguos às terras da fazenda, em áreas dela desmembradas. Sendo que o ACAMPAMENTO DO JANDIR foi localizado em terras de Jandir Viebrantz, aliado ao MST pelo diretor do movimento, SÍLVIO LUCIANO DOS SANTOS, desde a época da primeira invasão (ano de 2004) e deste acampamento saíram os grupos precursores para as segunda e terceira invasões, bem como inúmeras outras turbações de posse e toda sorte de ilícitos contra os proprietários e seus empregados.

No acampamento designado como “Acampamento Do

Pedágio”, existem também acampados do MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores), movimento dos egressos do MST que já foram assentados, mas continuam agindo no movimento, integrante da internacional “Via Campesina”. Neste acampamento detectou-se indícios de treinamentos de guerrilha rural, com instrutores de fora do estado e do país.

Também há informações que o movimento está negociando uma área,

próxima ao município de Pontão, contígua à Fazenda Coqueiros, para dar continuidade ao seu intento, cercando assim toda área. Além disso, repito, a localização geográfica da Fazenda Coqueiros – entre as BR-386, BR-285 e RS-324 – é fundamental para o movimento.

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Verifica-se que os acampados são usados como massa de manobra, recebendo em troca alimentação, cestas básicas, e promessa de 15 (quinze)hectares de terra por família. Alguns acampados são foragidos da Justiça ou tem longa ficha criminal, para dar suporte as ações delituosas; além disso, recebem treinamento de operações em combate a Polícia com utilização de armas, em manejo de artefatos explosivos (coquetéis molotov) e em técnicas e táticas de fortificação das áreas invadidas, com utilização de estacas panjo e armadilhas, além de diversas outras táticas, com ensinamento inclusive para as crianças. As instalações que se verificam nas últimas invasões permitem bem demonstrar o uso de algumas técnicas de guerrilha.

Não se trata de declarações infundadas ou viciadas

ideologicamente, mas são informações de autoridade ligada diretamente ao

controle de algumas atividades do MST. Os Investigadores coletaram outros

dados que dão suporte às declarações do comandante da Unidade Militar. Há

uma clareza acerca dos objetivos pretendidos pelo MST na atual política dita

como ‘reforma agrária’.

O MST não permite mais a realização de cadastro de acampados e

o próprio INCRA-RS não tem o menor interesse em fazê-lo, pois é

administrado por simpatizantes do próprio movimento. Há uma conivência,

para não dizer promiscuidade entre órgãos governamentais e os líderes do

MST. Como poderia o poder público fornecer cachaça (mais de 2 mil

garrafas) a um só acampamento?

Apenas para exemplificar a estratégia de atuação do MST, cita-se

o ocorrido na primeira das oito invasões realizadas na Fazenda Coqueiros,

quando um dos líderes do movimento SÍLVIO LUCIANO DOS SANTOS, hoje

foragido da Justiça, eis que tem prisão preventiva decretada, concedeu

entrevista do jornal local Diário da manhã afirmando que o objetivo era

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desestabilizar a Fazenda Coqueiros econômica, técnica e

financeiramente.

O MST não está em busca de terras para assentar ‘colonos’, mas

quer conquistar territórios pagos com o dinheiro do povo brasileiro. Estes

territórios passarão a ser controlados pelos seus líderes e servirão para

instalar um ‘estado-paralelo’, porque se trata de áreas localizadas em espaço

estratégico, servido por usinas de energia, acesso por rodovias, e controle

absoluto do território.

Neste sentido pode-se observar nas declarações de Aderli

Maximino Dal Bosco, Comandante do Batalhão de Carazinho:

Informa que a postura dos “sem-terra” é de hostilidade em relação á Brigada Militar, nas operações e no patrulhamento. Em várias oportunidades, viaturas foram apedrejadas, uma viatura foi retira em uma barreira e os Policiais Militares ficaram em cárcere privado por cerca de duas horas, sem falar no uso de armas de fogo. Já foram registrados disparos de armas de fogo por parte dos “sem-terra”. Informa que o MST utiliza estratégia de combate, sendo que na ocupação de uma serraria, o grupo precursor invadiu a propriedade com armas, para dominar a situação antes da chegada do contingente maior dos “sem-terra”. Nas operações de retirada por parte da Brigada Militar, as defesas dos acampamentos compõe-se de paliçadas, lanças, buracos no chão para que os cavalos tropecem, uso de Coquetéis Molotov. Além disso, o depoente tem notícia de que os “sem-terra” recebem treinamento especializado para essas atividades. ... O depoente considera bastante importante que seja realizada uma operação desse tipo, restabelecendo a presença do Estado do Rio Grande do Sul dentro dos acampamentos. Hoje a única presença é da União, fornecendo alimentos, inclusive cachaça. Informa que a Brigada Militar está como depositária de cerca de duas mil garrafas de cachaça que foram apreendidas em uma operação. Os alimentos apreendidos foram reclamados pelo INCRA.”.

Há uma evidência gigantesca, de clareza solar, que o MST está

desvirtuado de sua função original de luta pela terra aos seus filiados. Só

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faltam armas em grandes quantidades, que poderão ser alcançadas a

qualquer momento por organização internacional e o MST se tornará uma

‘FARB’.

Todas as semanas há notícias no país sobre a atuação violenta do

MST na prática de crimes. A questão é objeto de análise por Denis Lerrer

Rosenfield, professor de filosofia da UFRGS, em livro recém lançado e

recebeu destaque na Revista VEJA de 21.11.2007. o Título do livro é

Reflexões sobre o direito à propriedade. O autor faz uma rigorosa

defesa do direito à propriedade, afirmando que “... se o direito à

propriedade é relativizado, todos os valores do estado de direito

podem ruir. Restrições à propriedade com base em uma vaga

‘função social’ só alimentam a sanha predatória de organizações

como o Movimento dos Sem-Terra. ...” O autor conclui que a invasão

de terras promovida pelo MST são UM ATAQUE AO ESTADO DE

DIREITO.

Rosenfield afirma que “A subversão da democracia se faz hoje por meios democráticos’. É o processo em curso na Venezuela de Hugo Chaves.

É preciso adotar medidas para neutralizar o MST no Rio Grande do

Sul, desconstituindo-o como uma ‘movimento legítimo de reivindicação’. A

medida é a mesma adotada para a torcida organizada Mancha Verde em São

Paulo, que trazia a violência aos campos de futebol. Pois bem, chegou a

hora do BASTA. O MST deve ser extinto como organismo aceito pelo Estado

ou tolerado pelo Estado nas questões agrárias. É um absurdo que o INCRA

não possa proceder ao recadastramento dos acampados porque os líderes

do MST não permitem. É um absurdo que o governo negocie com líderes de

um movimento ilegal. É um absurdo que o MST indique quem deve receber

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terra e que escolha qual a terra será objeto de expropriação. Os absurdos são

infinitos...

O ataque sistemático e reiterado a grandes fazendas produtivas

(empresas rurais) com o objetivo de tomada violenta do território,

descaracterizam o MST como movimento social que luta pela terra para seus

filiados. O MST não quer a ‘reforma agrária’, mas sim a tomada de territórios

estratégicos, onde a ‘massa humana’ serve de manobra política para o

assistencialismo estatal, com o fornecimento de alimentos, dinheiro para

construir casas, adquirir implementos agrícolas, insumos para cultivo, sem

necessidade de qualquer retorno desse dinheiro público, até que o território

tenha condições de auto-sustentabilidade e se torne independente, alijando a

presença do Estado oficial nestes locais. Estará tudo pronto para a luta

armada contra o próprio Estado que lhes deu a estrutura.

O Ministério Público, como instituição encarregada pelo

Constituinte de 1988 a ser o defensor do Estado Democrático de Direito tem

um papel fundamental para a preservação da Democracia no Brasil. As ações

predatórias do MST, não só às propriedades, mas representando uma gama

de crimes, sustentado com dinheiro do povo, que traduzem à evidência uma

organização criminosa, estão a exigir uma imediata e vigorosa ação

representada por um conjunto de providências que levem à

neutralização de suas atividades e declaração de ilegalidade do

movimento.

O MST é um organismo sem existência legal, mas

faticamente existente e com apoio governamental. É atrás deste

organismo que ocorrem as ações violentas e ilegais. Se comparadas

às ações de pessoas individuais, o Ministério Público já teria requerido a

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prisão preventiva e tomado uma série de providências para a aplicação da lei

penal e de restabelecimento da ordem jurídica. Assim, tirando-se o véu ou a

carapaça de proteção do MST, tem-se um grupo de pessoas mal

intencionadas, que dirigem um organismo, recrutam ou aliciam pessoas com

promessas de acesso à terra, e praticam um série de crimes violentos,

impunemente, causando um custo elevadíssimo ao Estado com segurança

dos locais dos conflitos, além de serem destinatários de verbas públicas sem

comprovação de seu emprego. É uma afronta à Democracia. O Ministério

Público não pode ficar omisso diante deste quadro de gravidade extrema.

Neutralizando o MST e declarando-se ilegal sua existência, quebra-

se o vínculo com a Via Campesina e sua legitimidade de negociação com o

poder público.

Via Campesina tem atuado como um guarda-chuva debaixo do qual se abrigam movimentos agrários radicais em diversos países, constituindo uma organização-pólo – o MST é filiado a essa entidade. No Brasil, a Via Campesina foi responsável pelo recente episódio de vandalismo contra o viveiro da Aracruz Celulose S/A, ocasião em que foram destruídas cinco milhões de mudas50.

A questão vai mais longe, porque o MST tem quase o monopólio

das famílias acampadas:

Verifica-se, assim, pelos dados complementares fornecidos pelo INCRA quando do comparecimento de seus representantes na sede do Ministério Público, que existem 2.262 famílias acampadas no Estado do Rio Grande do Sul, sendo que desse número, 2.170 famílias estão ligadas ao MST. Existem 20 (vinte) acampamentos no Estado do Rio Grande do Sul, sendo que 13 controlados pelo MST e mais 7 (sete) acampamentos “independentes”, isto é, não ligados a nenhum dos grandes movimentos agrários.

50 http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI909064-EI306,00.html.

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Cabe ao Ministério Público agir AGORA. ‘Quebrar a espinha dorsal

do MST’. O momento é histórico no país e se constitui no maior desafio já

apresentado à Instituição pós 1988: A DEFESA DA DEMOCRACIA. Não

importa o desgaste eventual das medidas aos simpatizantes do movimento. O

que importa é a razão de ser das medidas a serem tomadas. O Ministério

Público não é uma instituição governamental, porque se fosse, ficaria

assistindo passivamente ao avanço de um movimento cujo objetivo é a

subversão da democracia, eis que se trata de organização paramilitar, vedada

pela Constituição Federal de 1988.

Essa é a primeira constatação e as necessárias providências.

Assim, voto no sentido de designar uma equipe de Promotores de

Justiça para promover ação civil pública com vistas à dissolução do

MST e a declaração de sua ilegalidade. Não havendo necessidade de

maior investigação sobre o que já foi apurado, em face do que

preceitua o art. 5º, XVII, da Constituição Federal51.

Neste item, voto ainda no sentido de que sejam tomadas as

seguintes medidas cabíveis

I -“com vista à suspensão das marchas, colunas ou outros deslocamentos em massa de sem-terras. Como destacado pelo Promotor de Justiça DENÍLSON BELEGANTE, com atuação na Promotoria de Justiça de Carazinho, semelhantes medidas podem impedir o confronto entre sem-terras e as forças de segurança, ou entre sem-terras e os produtores rurais52. Trata-se, mais uma vez, de atuação preventiva em prol da proteção da ordem pública.”

II -“para investigar os integrantes de acampamentos e a direção do MST pela prática de crime organizado, pois ficou constatado que o movimento

51 Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; (...). 52 http://www.mp.rs.gov.br/imprensa/noticias/id12173.htm.

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e seus militantes têm a prática de atos criminosos, com a invasão e depredação de propriedades privadas e de prédios públicos, como táticas regulares de atuação.

III – “para investigar os integrantes de acampamentos e a direção do MST no que toca ao uso de verbas públicas e de subvenções oficiais, tanto no plano criminal quanto na esfera da improbidade administrativa. Não se pode aceitar que o Estado brasileiro, com tantas tarefas a cumprir em um país subdesenvolvido, possa despender enormes quantias na subvenção de um movimento que recusa a legitimidade das instituições democráticas.

A segunda constatação reside nos campos de treinamento de

seus integrantes para formar uma legião de seguidores e aliciadores do

movimento. Existem no Estado três locais onde estariam sendo ministradas

lições de guerrilha rural pelos técnicos das FARCs aos membros do MST. Esta

informação vem da Brigada Militar. Um deles chamado Centrão, em Palmeira

das Missões, outro CETAP – Centro de Tecnologias Alternativas Populares em

Pontão e o terceiro em Veranópolis.

Conforme depoimento do Superintendente Regional do Instituto

Nacional de Colonização e Reforma Agrária:

O INCRA possui um programa chamado PRONERA, decorrente de uma Conferência realizada em 1998. Este programa é executado pelo INCRA, tendo como objetivo a escolarização de nível médio, alfabetização, curso de segundo grau regular, supletivo de 1º grau, curso superior, especialização e pós-graduação de assentados. Este programa já formou mais de 300.000 pessoas no Brasil inteiro. Todos os cursos são aprovados pela Secretaria Estadual, Conselho Estadual de Educação e Ministério da Educação. Em Veranópolis há uma Escola chamada Antônio de Castro, mantida pelo ITERRA, contendo ensino técnico e médio regular. A Escola é aprovada pelo Conselho Estadual de Educação. Os assentados interessados dirigem-se às instituições de ensino e com ela apresentam um projeto à Comissão Pedagógica do PRONERA. Se aprovado, o projeto é encaminhado ao INCRA que efetua um convênio com a instituição. O encargo de escolher corpo docente é da instituição conveniada. O INCRA libera um valor de R$ 15,00 reais de diária por aluno para a permanência em turno integral na Escola em Veranópolis.

A entrevista concedida por ZANDER NAVARRO ao jornal “O Estado de São Paulo” em 29 de abril de 2007 é esclarecedora: “O MST diz

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que investe na emancipação política e intelectual do homem do campo. Um dos orgulhos do movimento são suas escolas, os centros de formação de professores, os currículos especiais, os convênios com universidades. ... É um absurdo chamar de educação o que está sendo feito nos assentamentos rurais quando prevalece o tom monocórdio da cartilha única. Pedagogia sem desenvolver o pensamento crítico e sem apresentar diversas leituras sobre o mundo pode ser chamada de educação? A mesma constatação foi feita pela a revista “Veja”, na edição n.º 1870, de 8 de setembro de 2004, publicou matéria intitulada “Madraçais do MST” – alusão à formação dogmática que existe em tais escolas, de rigidez comparável, segundo a reportagem, às escolas de doutrinação dos fundamentalistas islâmicos. Destaca-se:

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) criou sua própria versão das madraçais – os internatos religiosos muçulmanos em que crianças aprendem a recitar o Corão e dar a vida em nome do Islã. Nas 1.800 escolas instaladas em acampamentos e assentamentos do MST, crianças entre 7 e 14 anos de idade aprendem a defender o socialismo, a "desenvolver a consciência revolucionária" e a cultuar personalidades do comunismo como Karl Marx, Ho Chi Minh e Che Guevara. "Sem-terrinha em ação, pra fazer a revolução!", gritam os alunos, de mãos dadas, ao final de eventos e apresentações. Pelo menos 1.000 dessas escolas são reconhecidas pelos conselhos estaduais de educação – o que significa que têm status idêntico a qualquer outro estabelecimento de ensino da rede pública e que seus professores são pagos com dinheiro do contribuinte. Elas nasceram informais, fruto da necessidade de alfabetizar e educar os filhos de militantes do movimento – que chegam a ficar durante anos acampados nas fazendas que invadem, à espera da desapropriação. No fim dos anos 80, atendendo a uma reivindicação do MST, o governo passou a integrar essas escolas improvisadas à rede pública. Parte delas funciona nas antigas sedes das fazendas invadidas, parte foi construída pelos Estados e municípios. Ao todo, as escolas do MST abrigam 160.000 alunos e empregam 4.000 professores.

A reportagem de VEJA visitou duas delas, ambas no Rio Grande do Sul. Tanto a escola Nova Sociedade, em Nova Santa Rita, quanto a Chico Mendes, em Hulha Negra, exibem, nas classes e no pátio, a bandeira do MST; no currículo, abordagens ausentes da cartilha do

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Ministério da Educação e que transmitem a ideologia sem-terra. Os professores utilizam, por exemplo, uma espécie de calendário alternativo que inclui a celebração da revolução chinesa, a morte de Che Guevara e o nascimento de Karl Marx. O Sete de Setembro virou o "Dia dos Excluídos", e a Independência do Brasil é grafada entre aspas. "Continuamos dependentes dos países ricos", justifica o professor de história da escola Nova Sociedade, Cícero Marcolin. No ano passado, seus alunos aproveitaram o Dia da Independência, ou "independência", para sair em passeata pelas ruas da cidade carregando faixas com críticas à Área de Livre Comércio das Américas (Alca). Na escola Chico Mendes, professores exibem vídeos que atacam as grandes propriedades e enaltecem as virtudes da agricultura familiar, modelo que o MST gostaria de ver esparramado no território nacional: "A pequena propriedade é oprimida pelos grandes latifúndios, que só fazem roubar emprego do povo", diz um dos filmes. A mesma fita é usada para ensinar aos alunos que os produtos transgênicos "contêm veneno". A reportagem de VEJA assistiu a uma dessas aulas. No fim da exibição do filme, o professor pergunta quem da classe come margarina. A maioria das crianças levanta o braço. Tem início o sermão: "Margarina é à base de soja, que pode ser transgênica e, por isso, ter ve-ne-no!" A atividade seguinte foi uma encenação teatral. No pátio, carregando bandeiras do MST, crianças entoaram uma música que dizia: "Traga a bandeira de luta / Deixe a bandeira passar / Essa é a nossa conduta / Deixe fluir para mudar". Para encerrar, deram o grito de guerra conclamando para a revolução.

O MST implementou um sistema de ensino paralelo, sobre o qual o poder público não exerce quase nenhum controle. O Ministério da Educação desconhece até mesmo quantas são e onde estão exatamente as escolas públicas com a grife do movimento. E as secretarias estaduais e municipais de ensino, embora sustentem as escolas, enfrentam dificuldades até para fazer com que professores não ligados aos sem-terra sejam aceitos nas salas de aula. "O MST torna a vida do educador que vem de fora um inferno", diz Gislaine do Amaral Ribeiro, coordenadora estadual das escolas de assentamentos na região de Bagé, Rio Grande do Sul. Nos assentamentos, pelo menos a metade do corpo docente vem do MST. Já nos acampamentos, todos os professores pertencem ao movimento. Muitos não têm o curso de magistério completo – pré-requisito básico para a contratação na rede pública –, e alguns não chegaram

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sequer a terminar o ensino fundamental. "A realidade é que há pessoas atuando como profissionais da educação nessas escolas sem o mínimo de preparo para exercer a função", reconhece o secretário estadual de Educação do Rio Grande do Sul, José Fortunati. O governo gaúcho diz que está de mãos atadas diante da situação, porque herdou um grande número de professores contratados pelo governo anterior, do PT. Pela proximidade com o MST, a antiga gestão teria sido mais complacente na contratação do corpo docente. A secretaria diz estar pleiteando junto ao MEC verbas para implantar um programa para dar a esses professores o nível básico de estudo para que possam lecionar. Em seu Caderno de Educação de número 8, o MST deixa claro que a educação que pretende dar a seus alunos deve ter "o compromisso em desenvolver a consciência de classe e a consciência revolucionária". A rigor, nada impede que uma organização como o MST queira propagar sua ideologia para crianças que mal aprenderam a escrever o próprio nome. O problema é fazer isso dentro do sistema de ensino público e com dinheiro do contribuinte. A legislação brasileira preserva a autonomia das escolas, desde que cumpram o currículo exigido pelos Estados e estejam em consonância com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, que prega o "pluralismo de idéias" e o "apreço à tolerância" – elementos básicos para que as crianças desenvolvam o raciocínio e o espírito crítico. Não são os critérios adotados no território dos sem-terra. "Essas escolas estão aprisionando as crianças num modelo único de pensamento", observa a pedagoga Sílvia Gasparian Colello, da Universidade de São Paulo.

Um modelo, acrescente-se, falido do ponto de vista histórico e equivocado do ponto de vista filosófico. Está-se falando, evidentemente, do marxismo. Falido porque levou à instauração de regimes totalitários que implodiram social, política e economicamente. Equivocado porque, embora se apresente como ciência e ponto final da filosofia, nada mais é do que messianismo. De fato, o marxismo não passa de uma religião que, como todas as outras, manipula os dados da realidade a partir de pressupostos não verificáveis empiricamente. E, assim também como as religiões, rejeita violentamente a diferença. "Burgueses não pegam na enxada / Burgueses não plantam feijão / E nem se preocupam com nada / Arrasam aos poucos a nação", diz a letra de uma das canções ensinadas aos "sem-terrinha". Da mesma forma que os

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internos das madraçais, as crianças do MST são treinadas para aprender aquilo que os adultos que as cercam praticam: a intolerância.

O professor ZANDER NAVARRO observa que a formação das

‘escolas’ do MST consiste em ‘reforçar a “mística” do MST, criando uma

geração de militantes cegamente voluntaristas.53

Não há como não concordar com a conclusão dos Investigadores:

(... resta evidente que são necessárias medidas urgentes para colocar as crianças e adolescentes que residem nos acampamentos a salvo da ideologização agressiva. Da mesma forma, necessita o Estado brasileiro retomar o controle sobre o conteúdo pedagógico e sobre a organização real das escolas do MST, resgatando uma premissa fundamental para a construção de uma vida democrática em comunidade: o pluralismo cultural, sem o qual não é possível aprender a viver em comunidade no Estado Democrático de Direito.

Portanto percebe-se a necessidade de intervenção estatal nos

referidos ‘educandários’, que recebem verbas públicas e são mantidos pelo

poder público.

Neste sentido o voto é pela intervenção do Ministério

Público nas três ‘escolas’ referidas a fim de tomar todas as medidas

que serão necessárias para a readequação à legalidade, tanto no

aspecto pedagógico quanto na estrutura de influência externa do

MST. Exatamente como apontaram os Investigadores:

Sugere-se sejam tomadas medidas para, se necessário, ocorrer o ajuizamento de ações civis públicas com vista à proteção da infância e juventude em relação às bases pedagógicas veiculadas nas escolas

53 Conforme NAVARRO, Zander. “Mobilização sem emancipação” — as lutas sociais dos sem-terra no Brasil. Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 189-232, nota n. 11, grifou-se.

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mantidas ou geridas pelo MST, nitidamente contrárias aos princípios contidos na Constituição Federal e que embasam o Estado Democrático de Direito. Da mesma forma, sugere-se a tomada de medidas judiciais, se necessário, para impedir a presença de crianças e adolescentes em acampamentos, assim como em marchas, colunas ou outros deslocamentos em massa de sem-terras, tendo em vista serem ambientes notoriamente inadequados para pessoas em processo de desenvolvimento.

A terceira constatação consiste na necessidade de desativação

e remoção dos acampamentos situados nas regiões de conflitos

permanentes, onde o MST escolheu determinado território para ocupação.

Entre os locais que podem ser referidos, e de maior

conflituosidade, situam-se os acampamentos próximos à Fazenda Coqueiros,

que é uma empresa rural e não uma área improdutiva, conforme

demonstram à evidência fotografias aéreas do local e toda a infra-estrutura

de que é dotada.

Atualmente, entre os municípios de Palmeira das Missões, Iraí,

Nonoai, Encruzilhada Natalino, Pontão, Carazinho e Passo Fundo, há uma

grande quantidade de acampamentos do MST. Em especial, percebe-se que

o assentamento ocorrido na Fazenda Anoni situa-se geograficamente muito

próximo da Fazenda Coqueiros, em Coqueiros do Sul, ambas com grande

extensão territorial. Nesse contexto, diante dos fatos que vêm ocorrendo,

com a mobilização de diversas frentes do MST existentes no Estado em

direção à Fazenda Coqueiros, percebe-se nitidamente uma estratégia de

ocupação territorial da Região Noroeste do Estado, sendo a aludida

área de terras no município de Coqueiros do Sul aparentemente

estratégica para a consolidação de tal desiderato, certamente não

apenas pela sua extensão territorial de 7,1 mil hectares para possíveis

assentamentos.

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Os Investigadores identificaram nos últimos desdobramentos que

envolvem a Fazenda Coqueiros fatos de extrema gravidade, atentatórios ao

Estado Democrático de Direito, neste sentido referem atuação do Ministério

Público de inibir os movimentos de invasão que podem gerar conflitos

graves.

O objetivo é tomar a fazenda Coqueiros a qualquer custo. Tanto

os relatórios da Bragada Militar, quanto o do Ouvidor-Geral da Segurança

Pública do Rio Grande do Sul, quanto o do Ouvidor Agrário e Presidente da

Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo Gercino, dão conta

que há o desenvolvimento de uma marcha, em três frentes,

contendo grande número de pessoas, com destino à Fazenda

Coqueiros, com intenção explícita de invadi-la novamente caso não

haja uma solução do Governo Federal no sentido de desapropriá-la

e implementar assentamento no local. Em contrapartida, há também

uma marcha de ruralistas com itinerário dirigido à Fazenda Coqueiros com

vistas a impedir a invasão dos membros do MST.

Os Investigadores concluíram que a partir dessa realidade, há

perspectiva de que haja um conflito em breve envolvendo os integrantes do

MST e ruralistas de conseqüências imprevisíveis.

Portanto, há necessidade de desativação dos acampamentos

situados nas proximidades da Fazenda Coqueiros, com a remoção dos

acampados para locais a serem identificados e onde poderão permanecer

mantidos pelo poder público. Pouco importa o local, desde que diminua a

possibilidade de conflitos violentos, já que custo mensal seria diminuído

(atualmente é de R$ 1.200,00 mensais o custo estatal por família) se reduzir

o risco de invasão às propriedades produtivas. É impossível manter pessoas

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acampadas em local de intenso conflito permanente, quando o objetivo é a

prática de atos ilícitos. E constitui uma afronta à democracia o sustento

público desses acampamentos que acolhem criminosos.

Neste sentido, voto pela necessidade de desativação dos

acampamentos situados nas proximidades da Fazenda Coqueiros,

onde a possibilidade de conflitos é mais evidente, bem como de

todos os acampamentos que estejam sendo utilizados como ‘base

de operações’ para invasão de propriedades. O fundamento é o uso

nocivo da propriedade, vedado pela ordem jurídica brasileira.

A quarta constatação consiste na necessidade de intervenção do

Ministério Público nas relações entre INCRA-RS e a organização dos

acampados, com o fim de promover um recadastramento com

identificação de todos os que já receberam lotes do governo e se ainda

continuam na terra, bem como os que ainda pretendem permanecer

acampados, aguardando o seu assentamento, identificando quem realmente

tem origem rural e quem é recrutado como desempregado urbano, apenas

para engrossar as fileiras do MST. Quais os assentamentos que são

produtivos, o que produzem, e como funcionam esses assentamentos

Assim, voto no sentido de acolher a sugestão dos Investigadores

de nos seus exatos termos:

“Tendo em vista que parte das ações de mobilização do MST tem origem em assentamentos (não mais acampamentos) controlados pelo movimento, em função do controle social que o MST exerce sobre os assentados54 e em total desvio da finalidade de reforma agrária prevista na Constituição Federal, que visa a uma melhor produtividade no campo,

54 NAVARRO, Zander. O MST e a canonização da ação coletiva (comentário ao artigo de Horácio Martins Carvalho). Publicado em SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Produzir para viver. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, p. 261-282.

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sugere-se sejam investigados os assentamentos promovidos pelo INCRA ou pelo Estado do Rio Grande do Sul, de forma a verificar se a propriedade rural, nessas áreas, cumpre sua função social. Com essas medidas, buscar-se-á assegurar o tratamento isonômico da propriedade rural no Brasil, implementado paridade na avaliação da produtividade dos assentados e dos demais proprietários rurais, assim como na avaliação dos demais requisitos da função social da propriedade. Salienta-se, outrossim, a recente iniciativa do Ministério Público Federal, que ingressou com ação civil pública no Juízo Federal de Santarém, no Pará, para anular todas as portarias de criação de assentamentos emitidas no oeste daquele Estado pelo INCRA entre os anos de 2005 e 2007, pois criados sem licença ambiental55.

A quinta constatação diz respeito à intensa migração de sem-terras entre acampamentos, o que poderá provocar, em tese, desequilíbrio de eleitores locais. Neste sentido, voto pelo acolhimento da sugestão dos Investigadores no sentido da

“realização de investigação eleitoral nas localidades em que se situam os acampamentos controlados pelo MST, examinando-se a existência de condutas tendentes ao desequilíbrio deliberado da situação eleitoral local. Constatada eventual irregularidade, sugere-se atuação para que ocorra o cancelamento do alistamento eleitoral, à semelhança das medidas tomadas pelo Promotor de Justiça DENÍLSON BELEGANTE, com atuação na Promotoria de Justiça de Carazinho 56.

Finalizando, voto pelo acolhimento da sugestão dos

Investigadores no sentido de efetivar a

“formulação de uma política oficial do Ministério Público, com discriminação de tarefas concretas, com a finalidade de proteção da legalidade no campo. Este órgão do Ministério Público deve ser especialmente destacado para a atividade, seja na Assessoria do Procurador-Geral de Justiça, seja com a implementação de Promotoria de Justiça Especializada em Conflitos Agrários.

55 Processo n.º 2007.39.02.000887-7 – Vara Federal de Santarém, Pará. 56 http://www.mp.rs.gov.br/imprensa/noticias/id12173.htm.

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Para encerrar, voto ainda pela comunicação ao Ministério Público

Federal do teor das conclusões do presente expediente.

GILBERTO THUMS

Conselheiro-Relator