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  • 7/28/2019 consideraes sobre o governo representativo

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    J o h n StuartM lConsideraesSobre oGovernoRepresentativoPensamentoPoltico

    Traduo de Manoel Innocncio de LacerdaSantos Jr.

    o B I B L I O T E C A ! ?,> CENTRAL ^3,v -

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    Este livro ou parte deleno pode ser reproduzido sobnenhuma forma.por mimegrafo ou outro meio qualquer,sem autorizao por escrito do Editor.

    Impresso no BrasilEditora Universidade de Braslia

    Campus Universitrio Asa Norte70.910 Braslia Distrito Federal

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    Reviso:Carlos Roberto Mota PelegrinoReviso Grfica:

    Jorge Bruno de Arajoe Lgia do Amaral MadrugaCapa:

    Arnaldo Machado Camargo Filho

    UNIVCRSOAtDi. l , ' - : : .r*L

    U9.o?,SETORDE Ci&NCI,'.S JURDICAS

    Mill, John Stuart, 1806-1873.M645c O Governo representativo. Trad. de Manoel Innocncio de L.Santos Jr. Braslia, Editora Universidade de Braslia, 1981.

    192 p. (Coleo Pensamento Poltico, 19)Ttulo original: Considerationon representative government.1. Democracia Cincia poltica. 2. Regime parlamentar Cincia poltica I. Ttulo. II. Srie.

    CD U 3 2 1 . 7

    SUMRIO

    Prefcio 3

    1 - At que ponto as formas de governo so uma questo de escolha? 52 - Os critrios de uma boa forma de governo 133 - Que a forma de governo ideal o governo representativo 274 - Sob que condies sociais o governo representativo inaplicvel 395 - Das funes inerentes aos corpos representativos 476-Das enfermidades e perigos aosquais est sujeito ogoverno representativo 597 - Da verdadeira e da falsa democracia; a representao de todos, e a representao

    da maioria apenas ; 718 - Da extenso do sufrgio , 879 - Deveria haver dois estgios de eleio? 10 1

    I O - Da maneira de votar 107I 1 - D a durao do s parlamentos 11912 - Deveriam os membros do parlamento estar sujeitos ao mandato imperativo?. . . 12113 - De uma segunda Cmara 12 914 - Do poder executivo em um governo representativo 13 515 Dos corpos representativos locais 14 716 - Da nacionalidade, na sua relao com o governo representativo 15 717 Dos governos representativos federais - 16318 D o governoda s colniasde um Estado livre 17 1

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    CAPTULO IAT QUE PONTO AS FORMAS DE GOVERNO SO UM A QUESTO DE ESCOLHA?TODAS AS especulaes relativas sformas degoverno carregam a marca, mais ou menosexclusiva, de duas teorias conflitantes em matria de instituies polticas;ou, para falarcom mais propriedade, duas maneiras diferentes de conceber o que so as instituiespolticas.Para alguns, o governo estritamente uma arte poltica, que gera exclusivamentequestes de fim e de meios. As formas degoverno seriam apenas um dos expedientes paraa obteno dos objetivos humanos. So encaradas puramente como uma questo deinveno e combinao. Sendo feitas pelo homem, assume-se que o homem teria a escolhade faz-las ou no, ou de decidir como e segundo que padro elas seriam feitasUQquesto de negcios. O primeiro passo definir os propsitos a que os governos estodestmadoi O segundo averiguar que forma de governo mais adequada ao cumpri-mento desses propsitos. Estando acertados esses dois pontos, e estando identificada aforma de governo que associa o mximo de bem com o mnimo de mal, o que nos resta afazer obter, para a opinio que formamos sozinhos, p consentimento de nossos compa-triotas, ou daqueles a quem so destinadas as instituies. Encontrar a melhor forma degoverno, persuadir os outros de que a melhor; isto feito, incit-los a exigi-la. Essa aordem de ideias nas mentes dos que adotam esta viso de filosofia poltica. Eles encaramum a constituio da mesma maneira (a importncia respectiva das coisas parte) queencarariam uma charrua a vapor ou uma debulhadeira.A estes se opw uma outra espcie de pensadores polticos, que esto to longe deassemelhar uma forma de governo a uma mquina, que a consideram uma espcie deproduto espontneo, e consideram o governo um ramo, por assim .dizer, da histrianatural. Segundo eles, as formas de governo no so uma questo de escolha. Devemosempreg-las, na maioria dos casos, como as encontramos. Os governos no podem, serestabelecidos por um desgnio jpirerneditado. Eles "no so feiTos^M brotam". Nossoassunto com eles, assim como com os outros fatos da natureza, conhecer suas proprie-dades naturais e nos adaptannos a elas. Asinstituies polticas fundamentais de um povoso consideradas por essa escola uma espcie de produto orgnico da natureza e da vidadesse povo; um produto de seus hbitos, de seus instintos, de suas necessidades e de seus

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    desejos inconscientes, quase nunc a o fruto de seus prprios deliberados. A vontade dopovo no tem nenhuma participao na matria, a no ser por responder s necessidadesdo momento atravs de combinaes tambm de momento, combinaes essas que, emconformidade suficiente com o carter e os sentimentos nacionais, geralmente persistem;e que, por agregao sucessiva, constituem um governo adaptado ao povo que o possui,mas que seria intil impor a um povo cuja natureza e circunstncias no o teriam produ-zido espontaneamente. difcil decidir qual das duas teorias seria a mais absurda, se pudssemos supor um aou outra sustentada como teoria exclusiva. Mas os princpios que os homens professamsobre qualquer assunto discutido so um intrprete muito imperfeito das opinies queeles realmente defendem Ningum acredita que todas as pessoas sejam capazes de mane-jar todas as espcies de instituio. Pode-se levar a analogia das combinaes mecnicasat o ltimo extremo; um homem no escolhe um a simples ferramenta de madeira e deferro pela nica razo de ser ela o que h de melhor. Ele se questiona para saber se possuias condies que devem se juntar ao instrumento para tornar seu emprego vantajoso, eparticularmente se as pessoas que devem trabalhar com ele possuem o saber e habilidadenecessrios sua utilizao. Por outro lado, aqueles que falam das instituies polticascomo se fossem uma espcie de organismos vivos no so tambm realmente os fatalistaspolticos que se dizem ser. Eles no pretendem que a humanidade no tenha absoluta-mente nenhuma liberdade de escolher o governo sob o qual deve viver, ou que a consi-derao das consequncias que decorrem das diferentes formas de governo no tenhanenhum peso na determinao daquela que deve ser preferida. Mas embora ambas asescolas exagerem as suas teorias na sua oposio mtua, e embora ningum sustente essasteorias sem modificao, as duas doutrinas correspondem a uma diferena profunda entreas duas maneiras de pensar; e embora seja evidente que nenhuma delas esteja totalmentecerta, e igualmente evidente que nenhuma das duas esteja totalmente errada, devemos no sesforar para penetrar at as suas raze^,^noj>eiiejBdarmp^^existe em cada uma.Lembremo-nos, ento, em primeiro lugar, que as instituies polticas (no importa oquanto esta proposio possa ser ignorada s vezes) so obra dos homens, e que elesdevem sua origjn e toda a sua e jsJncia.l vontade hu Os homens no acordaramnuma manh de vero e as encontraram brotadas. Eles tambm no se assemelham srvores, que uma vez plantadas "crescem sempre", enquanto os homens "dormem".JjmcadajsJ&gjojiejiiUjajKisj^^^ slo pela afo voluntria do homem. Porconseguinte, como todas as coisas f eitas pelo homem, elas podem ser bem-feitas ou mal-feitas; bom sense e habilidade podem ter sido empregados na sua criao, ou no. E ainda,se um povo se omitiu, ou por uma presso externa se viu impedido de se proporcionaruma constituio pelo processo experimental de aplicar um corretivo a todos os males medida em que eles aparecem, ou medida em que aqueles que os sofrem ganham a forade resistir a eles, esse retardamento do processo poltico representa indubitavelmente umagrande desvantagem para o povo em questo; ma s isso no prova que aquilo que foiconsiderado bom para outros povos, teria tambm sido bom para eles, e continuar a nose-lo quando resolver adot-lo.

    ATQUEPONTO AS FORMAS.DE GOVERNO SO UMAQUESTO DE ESCOLHA?

    Por outro lado, preciso tambm ter em mente que o mecanismo poltico no agesozinha Exatamente como, na sua origem, ele foi feito pelos homens, deve tambm sermenejado por homens, at mesmo por homens comuns. Ele precisa, no de SI M simplesaquiescncia, mas de sua participao ativa, e deve estar ajustado s capacidades e quali-dades dos homens disponveis. Isto implica em trs condies: 1) O povo, ao qual sedestina a forma de governo, deve consentir em aceit-la, ou pelo menos no recus-la aoponto de opor ao seu estabelecimento um obstculo intransponvel; 2) Eles devem ter avontade e a capacidade de falar o necessrio para assegurar a sua existncia; e 3) Elesdevem ter a vontade e a capacidade de fazer aquilo que a forma de governo exige deles,sem o qual ele no poderia alcanar seu objetivo. A palavra,"fazer" significa tanto absten-es quanto aes. Esse povo deve ser capaz de preencher as condies de a^o e deconstrangimento moral, que so necessrias tanto para assegurar a existncia do governo,quanto para proporcionar-lhe os meios para alcanar seus fins; a aptido de um governonesse sentido constitui o seu mrito.A falta de uma dessas condies toma um a forma de governo inadequada ao casoparticular, no importa o quo promissora elapossa parecer.O primeiro obstculo, a repugnncia do povo por uma forma particular de governo,pede pouca ilustrao, porque nunca pode ser negligenciado em teoria. um caso que serepete todos os dias. Nada, a no ser a fora estrangeira, poderia levar uma tribo de ndiosnorte-americanos a se submeter s restries de um governo civil regular. O mesmo pode-ria ser dito, embora de maneira menos absoluta, dos brbaros que invadiram o ImprioRomano. Fo ram necessrios vrios sculos, e uma mudan a completa das circunstncias,para for-los obedincia a seus prprioschefes, fora do servio militar. Existem naesque no se submetem voluntariamente a u m governo que no seja o de certas famlias,que tenham tido desde tempos imemoriais o privilgio de fornecer-lhes chefes. Certasnaes no poderiam, exceto por conquista estrangeira, se acostumar a aturar umamonarquia. Outras so igualmente aversas a uma repblica. O obstculo frequentementese ergue, no presente, at a impraticabilidade.Mas existem casos em que, embora no aversos a uma forma do governo - talvez atdesejando-a um povo pode no ter a vontade ou ser incapaz de preencher suas condi-es. Ele pode ser incapaz de preencher at mesmo aquelas condies necessrias sim-ples existncia nom inal do governo. Desse m odo, um povo pode preferir um governo livre,mas por indolncia, por negligncia, por covardia ou por falta de esprito pblico, serincapaz de fazer os esforos necessrios sua conservao; se no quiser lutar por seugoverno quando este for atacado diretamente; se pode ser iludido pelos artifcios empre-gados para despoj-lo de seu governo; se por desencorajamento, ou pnico temporrio, oupor um acesso de entusiasmo por um indivduo, pode ser induzido a depositar suasliberdades aos ps de um grande homem, ou a confiar-lhe os poderes que o tornam capazde subverter suas instituies; em_todgs_esses casosj_essgj>oyo mais ou menos inapto^paj a^ yberdade; e muito embora possa lhe ter feito algum bem desfrutar dela mesmo porpouco tempo,demor ar muito para tirar disso algum proveito. Do mesmo modo, um povopode no querer ou no poder cum prir as obrigaes que lhe so impostas por uma formade governo. Um povo grosseiro, mesmo que sensvel aos benefcios de uma sociedade

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    civilizada, pode ser incapaz de praticar as abstenes que ele exige; suas paixes podem serviolentas demais, ou seu orgulho pessoal tirnico demais para renunciar s lutas parti-culares, e para abandomar s leis e vingana de suas ofensas reais ou supostas. Em casosemelhante, um governo civilizado, para ser realmente vantajoso, deveria possuir um grauconsidervel de despotismo, no permitir que o povo exera sobre elenenhuma espcie decontrole e impor ao povo umagrande quantidade de constrangimento legalDa mesma maneira, deve ser considerado despreparado para algo mais do que umaliberdade limitada e qualificada o povo que no estiver disposto a cooperar ativamentecom a lei e com as autoridades pblicas na represso aos malfeitores. Um povo que estmais disposto a esconder um criminoso do que a prend-lo; um povo que, como oshindus, comete perjrio para salvar o homem que o roubou, ao invs de se dar ao trabalhode depor contra ele e da extrair sua vingana; um povo que, a exemplo de algumas naesda Europa at recentemente, quando v um homem apunhalaroutro em plena rua, passapara o outro lado, porque cuidar do assunto tarefa da polcia, e porque mais segurono interferir em assuntos que no lhe dizem respeito; um povo, enfim, que se revolta poruma execuo, mas que no se choca por um assassinato esse povo precisa de autori-dades agressivas, melhor armadas do que quaisquer outras, uma vez que as primeiras eindispensveis condies para uma vida civilizada no possuem outras garantias. Esse

    estado deplorvel de sentimentos, em um povo que deixou para trs a vida selvagem, ,sem dvida nenhuma, o resultado natural de um mau governo anterior, que o ensinou aencarar a lei como feita para outro fim que no oseuprprio bem, e seus intrpretes comoinimigos piores do que aqueles que a violam abertamente. Masmesmo no sendo merece-dores de culpa aqueles em cujo seio brotaram essas maneiras de pensar, e muito emboraelas possam ser eliminadas posteriormente por um governo melhor, enquanto persistirem,um tal povo no pode ser governado com a mesma pouca intensidade de restries queum povo cujas simpatias esto do lado da lei e que est disposto a prestar ativa assistncia execuo desta lei. De mesmo, as instituies representativas so de pouco valor, epodem ser mero instrumento da tirania ou da intriga, quando a generalidade dos eleitoresno est suficientemente interessada em setv prprio governo para.dar-lhe seu voto, ouquando a maioria dos eleitores, quando votam, noo fazem segundo os interesses-do bempblico, mas o fazem por dinheiro ou por jndgo ^ iSteente,que por razesparticulares pretendem favorecer. A eleio popular praticada dessa maneira, ao invs deser um a garantia contra o mau governo, representa um a engrenagem adicional no seumecanismo.Alm desses obstculos morais, as dificuldades materiais so frequentemente umimpedimento insupervel para as formas de governa No mundo antigo, embora possa tere realmente tenha havido umagrande independncia individuale local, no poderia nuncaexistir um governo popular regular fora dos muros da cidade; porque no havia condiesfsicas para a formao e propagao de uma opinio pblica, a no ser entre aqueles quepodiam ser reunidos para discutir os assuntos pblicos em um a mesmaagora. Acredita-segeralmente que esse obstculo desapareceu depois da adoo do sistema representativo.M ai para transp-lo completamente, faltou a imprensa, mesmo a imprensa jornalstica, oequivalente real, embora inadequad~5rguns aspectos, Tnyx^e do Frum.' Houve

    AT QUE PONTO AS FORMAS DE GOVERNO SO UMA QUESTO DE ESCOLHA? 9

    estados de sociedade em que mesmo um a monarquia de grande extenso territorial nopde subsistir, e se fragmentou inevitavelmente em pequenos principados, respec--tiyamente independentes ou unidos por laos frgeis como o feudalismo; isso porque omecanismo da autoridade no foi perfeito o suficiente para fazer obedecidas as ordens agrandes distancias da pessoa do governante, A nica garantia de obedincia ao governante,mesmo por parte de seu exrcito, era a fidelidade voluntria, alm de no existir um meiode fazer o povo pagar um a soma de impostos suficiente para manter a fora necessriapara impor a obedincia por todo um vasto territrio. Nesse e em todos os casos seme-lhantes, deve ser entendido que a fora da obedincia pode ser maior ou menor. Pode serto grande a ponto de fazer a forma de governo trabalhar muito mal, sem impedirabsolutamente sua existncia, ou sem impedi-la de ser prefervel na prtica a qualqueroutra. Essa ltima questo repousa principalmente sobre uma considerao qual aindano chegamos - a tendncia das diferentes formas degoverno a favorecer o progresso.Acabamos agora de examinar as trs condies fundamentais, pelas quais as formasde governo se adaptam a um povo. Se os defensores daquela que pode ser chamada deteoria naturalstica da poltica, pretendem apenas insistir na necessidade dessas trs condi-es; se eles pretendem apenas que nenhum governo possa existir sem preencher as duasprimeiras condies, nem mesmo em grande parte a terceira; sua doutrina, assim limitada, incontestvel Pretender o que quer que seja alm disso, me parece inadmissvel. Tudoaquilo que nos dizem sobre a necessidade de uma base histrica para as instituies, e deestarem em harmonia com o carter e os costumes nacionais, ou significa isso, ou nosignifica nada. Em frases semelhantes, alm do sentido racional que elas contm, existeuma grande quantidade de puro sentimentalismo. Mas, do ponto de vista prtico, essaspretensas. qu alidades indispensveis das instituies polticas so apenas facilidades para arealizao das trs condies^ Quando uma instituio ou um conjunto de instituies-tmos seus caminhos prepafSos por ocasies, gostos e hbitos do povo, no apenas essepovoser levado mais facilmente a aceit-la, mas, desde o comeo, ele aprender mais facil-mente e estar mais disposto a fazer o que lhe exigido, tanto para a preserv dasinstituies quanto pra seu desenvolvimento e fecundidade mais vantajosos. Seria umgrande erro por parte de um legislador no moldar suas medidas de modo a tomar partido,quando possvel, de tais hbitos e sentimentos preexistentes. Por outro lado, exagerotranformar em condies necessrias essas coisas que so meros auxlios e facilidades. Aspessoas so mais facilmente induzidas a fazer, e fazem mais facilmente, aquilo a que jesto acostumadas. Mas um povo tambm aprende a fazer coisas que lhe so novas. Afamiliaridade uma grande ajuda; ma s estender-se longamente sobre um a ideia podetorn-la familiar, mesmo se estranha a princpio. Existem exemplos abundantes de povosinteiros ardentemente vidos por coisas novas. A dose de aptido que um povo possuipara coisas novas, a de se adaptar a novas circunstncias, em si um dos elementos daquesto. uma qualidade na qual naes diversas, e distintos estgios de civilizao,diferem muito de um para o outra A capacidade de um povo determinado de preencheras condies de uma forma de governo determinada no pode ser estabelecida por umaregra absoluta. O grau de cultura do povo em questo, o seu nvel de julgamento esagacidade prtica devem ser os guias.

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    10 O GOVERNO REPRESENTATIVO AT QUE PONTO AS FORMAS DE GOVERNO SO UMAQUESTO DE ESCOLHA? 11

    EbUse^Jambm,_umaqutrjLpn^erajo que nlo se deve perder de vista. Um povopode no estar preparado para boas instituies; mas acender nele o desejo de tais insti-tuies uma parte necessria da operao. Recomendar e defender uma instituio ouform~d~gverno especfica, nh"d" e~ m evidncia suas vantagens, uma das maneiras,frequentemente a nica maneira possvel de educar oespritonacional queaprende assimno apenas a aceitar e a reivindicar, ma s tambm a manejar a instituio. Qu e meiostiveramos patriotas italianos, durante a gerao atua! e aprecedente, de preparar o povoitaliano para a liberdade pela unio, se no por incit-lo a essa exigncia? Aqueles,contudo, que empreendem tal tarefa, devem estar fortemente compenetrados, no apenasdos benefcios da instituio ou poltica que recomendam, mas tambm das capacidadesmorais, intelectuais e ativas necessrias sua prtica, a fim de evitar, dentrodopossvel,acender num povo um desejo por demais superior sua capacidade.O resultado do que foi dito que, dentro dos limites impostos pelas trs condiesto frequentemente aludidos, as instituies e as formas de governo so uma questo deescolha. Pesquisar em tese geral (como chamada) qual a melhor forma de governo, no uma quimera, mas sim um emprego altamente prtico da inteligncia cientfica; intro-duzir em um pas as melhores instituies que possam, noestadoatual dopas, preenchertoleravelmente as trs condies, constitui um dos fins mais racionais aos quais se podedirigir qualquer esforo prtico. Tudo o que se pode dizer para depreciar a eficcia davontade e dos propsitos humanos em matria de governo, pode tambm ser dito paraqualquer outra aplicao dessa mesma vontade e desses mesmos propsitos. Em todas ascoisas, o poder humano estritamente limitado. Ele s pode agir manejando uma ou maisdas foras da natureza. Foras aplicveis ao uso desejado devem, portanto, existir; massagiro de acordo com suas prprias leis. N o podemos fazer um rio correr no sentidocontrrio; mas no podemos por isso dizer que os moinhos de gua ''no so feitos,brotam". Na poltica, como na mecnica, deve-se procurar fora do mecanismo a fora quefaz funcionar o motor; e se no for possvel encontr-la, ou se for insuficiente paratranspor os obstculos que podem ser racionalmente esperados, a inveno falhar. Istono uma peculiaridade da arte poltica; serve-apenas para mostrar que ela est sujeita smesmas limitaes e condies dasoutras artes.

    Neste ponto nos deparamos com uma outra objeo, ou com a mesma objeo sobuma outra forma. Argumenta-se, segundo ela, que as foras de que dependem os maioresfenmenos polticos no se submetem direo dos homens de estado ou dos filsofos,Em substncia, o governo de um pas fixado a priori pelo estado do pas, no querespeita distribuio dos elementos do poder social poder mais forte da sociedade,qualquer que seja, receber a autoridade governante, e uma mudana na constituiopoltica no poder ser durvel se no for precedida ou acompanhada de uma novadistribuio do poder na prpria sociedade. Uma nao, portanto, nopode.escolher suaforma de governo. Os meros detalhes, e a organizao prtica, ela pode escolher. Mas aessncia do todo, o assento do poder supremo, so determinados pelas circunstnciassociais.Reconheo de imediato que existe uma poro de verdade nessa doutrina; ma s paratirar-se dela qualquer proveito, ela deve ser reduzida a uma expresso distinta e a limites

    adequados. Quando se diz que o poder mais forte na sociedade ser o poder mais forte nogoverno, o que se quer dizer por "poder"? No o poder dos nervos e dos msculos dessa forma a democracia pura seria o nico governo possvel. mera fora fsica,acrescentamos dois elementos, a propriedade e a inteligncia, e estaremos mais perto daverdade, mas longe ainda de t-la alcanado. No apenas uma maioria frequentementedominada por uma minoria, mas tambm uma maioria com uma- preponderncia empropriedade e individualmente em inteligncia pode vir a ser dominada por uma minoriamais fraca em ambos os aspectos. Para que esses vrios elementos de poder possam serpoliticamente eficazes, eles precisam ser organizados; e a vantagem da organizaoest necessariamente com os que esto de posse do governo. Um grupo muito mais fraco,em termos de todos os outros elementos do poder, pode vir a ter uma prepondernciamuito grande quando os poderes do governo so jogados na balana, e pode, causa disso,manter sua preponderncia durante muito tempo; muito embora, sem dvida, um gover-no assim disposto esteja na condio chamada em mecnica de equilbrio instvel, comoalgo equilibrado sobre sua extremidade menor, e que, se perturbado, tende a se afastarcada vez mais do seu estado original, ao invs de a ele voltar.Mas existem ainda objees mais fortes ainda a essa teoria de governo, nos termos emque normalmente apresentada. Todo o poder numa sociedade, que tende a transfor-mar-se em poder poltico, no poder aquiescente, nem meramente passivo, mas sim poderativo; em outras palavras, poder realmente exercido, isto , uma parte muito pequena dopoder existente. Politicamente falando, uma grande parte do poder consiste na vontade.Como ser possvel, eSacV^fflpTitaT-t>s~e^tirmos da computao tudo aquilo que age baseado na verdade? Pensar que, s porqueaqueles que detm o poder na sociedade acabam detendo o poder governamental, seriaintil procurar influenciar a constituio do governo agindo na opinio, esquecer que aopinio em si uma das maiores foras sociais ativas. Um a pessoa com uma crenapoltica um poder social igual a noventa e nove outras^ssMS"que pofsum apenasinteresses. Aqueles que conseguirem criar uma persuaso geral de que uma certa forma degoverno, ou um fato social de qualquer espcie, merece ser preferido, tero dado o passomais importante que pode ser dado para arregimentar a seu lado os poderes da sociedade.No dia em que o protomrt i r foi apedrejado at a morte em Jerusalm, enquanto aqueleque mais tarde veio a ser chamado de Apstolo dos Pagos ficou de lado "concordandocom sua morte", quem poderia supor que os seguidores daquele h omem apedrejado eramento o poder mais forte na sociedade? E o acontecimento no provou que eles o eram?Isto decorrncia do fato de que a crena deles era a mais forte de todas as crenasexistentes. Esse mesmo elemento fez um monge de Wittenberg, na reunio da Dieta deWorms, uma fora social mais poderosa do que o Imperador Carlos V e todos os prn-cipes ali reunidos. Ma s deve ser dito que esses casos so aqueles em que a religio estavaenvolvida, e as convices religiosas so de certa maneira peculiares em sua fora. Tome-mos ento um caso puramente poltico, em que a religio, quando envolvida, estavaprincipalmente no lado perdedor. Se algum precisa ser convencido de que o raciocnioespeculativo um dos principais elementos do poder social, essa pessoa deve se lembrar dapoca em que praticamente no houve um trono na Europa que no estivesse ocupado

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    por um rei liberal e reformador, um imperador liberal e reformador, ou, o mais estranhode todos, um papa liberal e reformador; a poca deFrederico, o Grande, Catarina II, JosII, Pedro Leopoldo, Benedito XIV, Ganganelli, Pombal e Aranda; quando os prpriosBourbons de Npoles eram liberais e todas as mentes ativas da nobreza francesa estavamcheias de ideias que lhes custariam tanto um pouco mais tarde. Este certamente umexemplo conclusivo de como o poder meramente fsico e econmico est longe de ser otodo do poder socialNo foi por nenhuma mudana na distribuio dos interesses materiais, mas sim pelapropagao de convices morais, que a escravatura dos negros terminou no ImprioBritnico e em outros lugares. Os servos da Rssia devem sua emancipao, seno a umsentimento do dever, pelo menos-ao crescimento de uma opinio mais esclarecida comrespeito ao verdadeiro interesse do Estado. o que os homens pensam que determina suamaneira de agir; e embora as persuases e convices dos homens comuns sejam deter-minadas num grau muito maior por sua posio pessoal do que pela razo, muito poder exercido sobre eles pelas persuases e convices de pessoas de classes diferentes e, ainda,pela autoridade unnime das pessoas instrudas, guando, portanto, a maioria daspessoasinstrudas puder ser levada _ a rwc^rcerjajniQ^slujtaiJuma^tui~pltica, e uma outra como prejudicial; uma como desejvel, outra como con-denvel; muito ter sido feito para proporcionar a uma, e negar outra, ajjrepondernciada fora social que a faz viver. a mxima de que governode um pas aquilo que asforas sociais o obrigam a ser, verdadeira apenas enquanto favorecem, ao invs dedesencorajar, a tentativa de exercer, entre todas as formas de governo praticveis nacondio existente da sociedade, uma escolha racional.

    CAPTULO II

    OS CRITRIOS DE UM A BOA FORMA DE GOVERNOSENDO A forma de governo de um determinado pas (dentro dos limites de certascondies definidas) uma questo de escolha, devemos agora averiguar de que maneiraessa escolha deve ser feita; quais so as caractersticas distintivas da forma de governomelhor adequada a promover os interesses de uma sociedade determinada.Antes de passar a essa averiguao, talvez seja necessrio decidir quais so as funesinerentes ao governo; de vez que, o governo sendo pura e simplesmente um meio, aelegibilidade dos meios deve depender de sua adaptao ao fira Mas essa maneira decolocar o problema no facilita a investigao, tanto quanto poderamos supor, e nemmesmo traz luz o todo da questo. Porque, em primeiro lugar, as funes inerentes aogoverno no so uma coisa invarivel, mas sim diferentes nos diferentes estgios da socie-dade; muito mais numerosas num povo atrasado do que num povo avanado. E, emsegundo lugar, o carter de um governo ou de um conjunto de instituies polticas nopoder ser suficientemente avaliado enquanto concentrarmos nossas atenes na esferalegtima das funes governamentais. Porque, embora as benfeitorias de um governoestajam necessariamente inscritas nessa esfera, o mesmo no acontece infelizmente com osseus maus feitos. Os males, de todas as espcies e graus, de que so suscetveis aoshomens, lhes podem ser inflingidos por seu prprio governo; e os homens no podem tirarda existncia social nenhuma das vantagens que ela comporta, se o governo no o consen-tir. Sem falar nos efeitos indiretos, a interveno direta das autoridades pblicas nopossui limites, a no ser os da existncia humana; e a influncia do governo no bem-estarda sociedade pode ser considerada ou estimada com relao nada menos do que com otodo dos interesses da humanidade.Estando assim obrigados a colocar nossa frente como teste do bom ou mau gover-no, um assunto to complexo como os interesses agregados da sociedade, deveramosvoluntariamente tentar alguma espcie de classificao desses interesses, a qual, separan-do-os em nossa mente em grupos definidos, poderia dar alguma indicao das qualidadesque permitiriam a uma forma de governo atender a cada um desses vrios interesses. Seriauma grande facilidade se pudssemos dizer que o bem de uma sociedade consiste de tais etais elementos; cada um desses elementos exige certas condies; o governo, ento, quereunir o maior nmero dessas condies deve ser o melhor. A teoria do governo seria

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    construda assim com os teoremas distintosdoselementos quecompem umbomestado dasociedade.Infelizmente, no uma tarefa simples enumerar e classificar os elementos .do bem-estar social, de modo a admitir a formao de tais teoremas. Muitos daqueles que, nagerao atual ou na precedente, estudaram a filosofia poltica comvises um pouco maisabrangentes, sentiram a importncia de tal classificao; mas todas as tentativas feitas selimitaram, at onde me foi dado saber, ao primeiro passo. A classificao comea etermina com uma diviso das exigncias da sociedade entre as duas categorias de ordemeprogresso (na fraseologia dos pensadores francews), oi^wjancfl t progresso,segun-do Coleridge. Esta diviso plausvel e sedutora, pelo contraste aparente entre seus doismembros e pela diferena notvel entre os sentimentos que eles inspirar Mas receio que(embora admissvel em conversa) a distino entre ordem, ou permanncia,e progresso,empregada para definir as qualidades necessrias em um governo, seja incorreta e poucocientfica.Ora, em primeiro lugar, o que so ordem e progresso! No que respeita ao progresso,no h nenhuma dificuldade, ou pelo menos nenhuma aparente primeira vista. Quandoas pessoas se referem ao progresso como um dos desejos da sociedade humana, pode-sesupor que ele queira dizer aperfeioamento. Esta uma ideia toleravelmente distinta.Maso que a ordem! s vezes quer dizer menos, s vezes mais, mas nunca o todo dasnecessidades da humanidade, exceo do aperfeioamento.No^seu sentida mais estreito, orgm sigrjifca-gfegdtencfa. Diz-se de um governo queele mantm a ordem quando consegue se fazer obedecido. Mas existem graus diferentes deobedincia, e nem todo grau 6 recomendvel. Apenasum despotismo puro pode exigir doscidados individuais a obedincia sem reservas a todas asdiretrizes daspessoas que detmo poder. Devemos pelo menos limitar nossa definio s diretrizes gerais e apresentadassob forma de lei A ordem, assim entendida, exprime indubitavelmente um atributoindispensvel do governo. So incapazes de governar aqueles que no conseguem se fazerobedecer Este, embora seja uma condio necessria,noro objetivo da governo. O fatode o governo ter que se fazer obedecer um requisito, de modo a que possa cumprir umJiulro propsito. Resta-nos ainda descobrir, separadamente da ideia de aperfeioamento,qual este outro propsito, o qual deve ser cumprido em todas as sociedades, sejam elasestacionrias ou progressivas.Nu m sentido abrangente, ordem significa a preservao da paz pela cessao daviolncia privada. Diz-se que a ordem existe naqueles pases cujos habitantes cessaram deresolver.suas querelas mo armada, e adquiriram o hbito de confiar ao governo adeciso de suas disputas e a reparao de seus prejuzos. Mas, tanto nessa viso maisabrangente como na precedente, mais estreita, ordem significa muito mais uma dascondies do governo, do que seu propsito ou um dos critrios de sua excelncia. Istoporque, no importando quo enraizado possa estar o hbito de se submeter ao governoadeciso de todas asdisputas, a maneira pela qual o governo trata desses assuntos, ou todosos outros com os quais se preocupa, pode variar entre o que h de melhor e o que h depior no mundo.Se pretendemos entender pela ideia de ordem tudo aquilo que a sociedade exige d*

    seu governoque no estiver includo na ideia de progresso,_deyemos definir ordem como apreservao de todo o bem que j existe, e progresso como o aumento desse bem Estadistino realmente compreende em um ou outro setor tudo aquilo que se pode exigir deum governo. Mas, assim entendida, ela no serve de base para um a filosofia de governo.No podemos dizer que, ao constituir poltica, certas providncias devero ser tomadaspara a ordem e outras para o progresso, porque as condies da ordem, no sentido agoraempregado, no so diferentes daquelas do progresso. As diligncias que tendem a preser-var o bem social j existente so exatamente as mesmas qu e promovem o aumento dessebem, e vce-versa, com a nica diferena de que as diligncias necessrias para este ltimoprecisam ser mais potentes que as do primeiro.

    Quais, por exemplo, so as qualidades individuais do s cidados que ajudam melhor amanter elevados os nveis de boa conduta, bo a administrao, de sucesso e prosperidade,que j existem na sociedade? Todos concordaro que essas qualidades so o trabalho, aintegridade, a justia e a prudncia Mas, de todas as qualidades,no so exatamente estasas que melhor levam ao aperfeioamento? E no em si o crescimento dessas virtudes nacomunidade o melhor dos aperfeioamentos? Sendo assim, quaisquer qualidades do go-verno qu e promovam o trabalho, a integridade, a justia e a prudncia, conduzem igual-mente permannciae progresso; apenas ser necessria um a dose mais forte dessasqualidades para fazer um a sociedade progressivaao invs de meramente permanente.Quais, ainda, so os atributos particulares do s seres humanos que parecem ter umareferncia especial ao progresso, e no sugerem to diretamente as ideias de ordem epreservao? So sobretudo a atividade mental, esprito empreendedor e coragem. M asno so todas essas qualidades to necessrias preservao do bem existente quanto aoseu crescimento? Se existe algo de certo nos assuntos humanos, o fato de que nossasaquisies mais valiosas s podero ser mantidas pela continuao das mesmas energiasque as conquistaram. Coisas abandonadas a si mesmas inevitavelmente deterioram. Aque-les que so levados pelo sucesso a relaxar seus hbitos de cuidado e previdncia e suadisposio para enfrentar os reveses, raramente conseguem se manter por muito tempo notopo. O atributo menta que parece exclusivamente dedicado ao progresso, e que con-centra no mais alto nvel todas as tendncias progressivas, a originalidade, ou inveno.Ela , contudo, no menos necessria permanncia, uma vez que nas inevitveis mudan-as do s assuntos humanos, novas inconvenincias e perigos aparecem constantemente, edevem ser enfrentados co m novos recursos e novas artimanhas, de modo a permitir que ascoisas continuem pelo menos to bem quanto estavam. Quaisquer qualidade, portanto,qu e tendam a encorajar a atividade mental, a energia, a coragem e a originalidade, sorequisitos tanto da permanncia quanto do progresso; apenas uma dose menor dessasqualidades dever ser suficiente para atender ao primeiro propsito.

    Se passarmos agora dos requisitos intelectuais para os requisitos materiais da socie-dade, veremos- que impossvel encontrar uma combinao poltica ou uma arrumaodas questes sociais que conduza ordem somente ou ao progresso somente; o que quej .que tenda para um dos dois favorece a ambos. Tomemos, por exemplo, a instituiocomum de um a polcia. A ordem o objetivo qu e parece mais imediatamente interessado -na eficincia deste ramo da organizao social Contudo, se ela for eficaz em promover a

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    ordem, isto , se reprimir o crime de modo a permitir que cada um sinta suapessoa e suapropriedade em segurana, poderia existir uma outra coisa que levasse mais diretamenteao progresso? A segurana maior da propriedade uma das condies e causas principaisde uma maior produo, que o aspecto mais vulgar e mais familiar do progresso. represso mais severa do crime reprime as disposies que levam ao mal, e isto progressoem um sentido mais elevado. O indivduo, liberado dos cuidados e ansiedades de umestado de proteo imperfeita, esta livre para empregar suas faculdades em qualquer novoesforo para melhorar sua prpria condio e a dos outros; enquanto a mesma causa, aolig-lo existncia social, e impedindo-o de ver seu prximo como um inimigo real oupotencial, desenvolve .todos esses sentimentos de bondade e camaradagem, e interesse nobem-estar geral da comunidade, que so partes to importantes do progresso social.Tomemos, ainda, um caso to familiar quanto o de um bom sistema de impostos efinanas. Um tal sistema seria normalmente classificado na categoria de Ordem. No entan-to, que outra coisa poderia ser mais favorvel ao progresso? Um sistema de finanas queleve a um, levar ao outro exatamente pelas mesmas qualidades. A economia, por exem-plo, no apenas preserva o estoque existente de riqueza nacional mas tambm favorece oseu crescimento. Uma justa distribuio dos encargos, oferecendo a todo cidado umexemplo de moralidade e conscincia aplicadas a ajustamentos difceis, e uma prova daimportncia que dada a essas qualidades pelas altas autoridades, tende primordialmentea educar os sentimentos morais da comunidade, sob o duplo aspecto da fora e dodiscernimento. Uma maneira de aumentar os impostos que no impede o trabalho docidado, ou que no interfere desnecessariamente com a liberdade do cidado, promoveno apenas a preservao mas tambm o aumento da riqueza nacional, e encoraja umautilizao mais ativa das faculdades individuais. E vice-versa: todos os erros em finanaseimpostos que impedem o aperfeioamento material e moral do povo tendem tambm, seem nmero suficientemente grave, a empobrec-lo e a desmoraliz-lo. Em suma, o queisto representa que, de maneira geral, quando Ordem e Progresso soentendidos em seusentido mais amplo, pela estabilidade das vantagens existentes, os requisitos do Progressono so outros que os da Ordem em escala maior; oS da Permanncia someramente os doProgresso em escala algo menor.Para reforar este princpio de que a Ordem intrinsecamente diferente do Progresso,e que a preservao dosbens existentes e a aquisio de bens adicionais so suficien-temente distintas para proporcionar abase de uma classificao fundamental, deveramostalvez ter em mente que o Progresso pode ser feito s custas da Ordem; que, enquantoestamos adquirindo, ou esforando-nos para adquirir bens de um certo tipo, estamosperdendo terreno no que respeita a outros bens: assim, pode haver progresso na riqueza,enquanto a virtude se deteriora. Ao admitirmos isto, no estamos sustentando que oProgresso coisa genericamente diferente de Permanncia, mas sim que a riqueza coisadiferente da virtude. Progresso Permanncia e algo mais; e no responde a isso dizer queProgresso em uma coisa no implica Permanncia em todas as outras. Da mesma forma, oProgresso em uma coisa tambm no implica Progresso em todas as outras. O Progressoem um campo determinado envolve a Permanncia nesse mesmo campo: todas asvezesque a Permanncia for sacrificada em favor de um tipo especfico de Progresso, outros

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    tipos de Progresso sero ainda mais sacrificados; e seeste sacrifcio no valer a pena, nSoapenas o interesse da permanncia ter sido negligenciado, mas tambm o interesse geraldo progresso ter sido prejudicado.Se, para darmos um primeiro comeo de preciso cientfica noo de um bomgoverno, tivermos que empregar estas ideias indevidamentecontrastadas, seria mais filoso-ficamente correio deixar de lado a definio da palavra Ordem, e dizer que o melhorgoverno aquele com maior tendncia para o Progresso; Porque o Progresso implicaOrdem, e a Ordem implica Progresso. O Progresso um grau maior daquilo de que aOrdem um grau menoj^A-Qrdfirjnijjrn qualquer sentido, representa apenas urna p,aVtedos pr-requisitos do bom governo, e no sua del essncia. Ordem encontraria umlugar mais adequado entre, as condiesi doi Progressc ide^vez iqne7sl"qulsnnos aumentarnossa soma de bens, nada mais indispensvel do que tomarmos devido cuidado com aquiloque j possumos. Se estivermos procura de mais riquezas, nossa primeira regra deverser a de no desperdiar inutilmente nossos meios existentes. A Ordem, assim consi-derada, no um fim adicional a ser conciliado ao Progresso, mas apenas uma parte e uminstrumento do prprio Progresso. Se um ganho numa rea se dever a uma perda-mais doque equivalente nesta mesma ou numa outra rea, no h Progresso. A tendncia para oProgresso, assim entendido, constitui todo o mrito de um governo.Mas, embora metafisicamente defensvel, esta definio do critrio de um bom gover-no no apropriada porque, mesmo contendo toda a verdade, revela apenas uma partedela. O termo Progresso sugere uma ideia de avano, ao passo que, da maneira como empregado aqui, pode muito bem querer dizer mero empecilho ao recuo. As mesmascausas sociais as mesmas crenas, os mesmos sentimentos, as mesmas instituies e asmesmas prticas so to necessrias para impedir a sociedade de regredir, quanto paraproduzir um novo avano. Mesmo que no houvesse nenhuma esperana de melhoria, avida no deixaria de ser uma luta incessante contra as causas da deteriorao; assim comoela hoje mesmo o . A poltica, tal como foi concebida pelos antigos, consistia unica-mente nisto: a tendncia natural dos homens e suas obras a de degenerar; mas possvelneutralizar essa tendncia por tempo indeterminado por meio de boas instituies virtuo-samente administradas. Embora no sejamos mais dessa opinio; embora a maioria daspessoasatualmente professem uma doutrina contrria, acreditando que no todo a ten-dncia das coisas para o Progresso; no devemos esquecer que todas as loucuras, todosos vcios, todas as negligncias, toda a indolncia, todo o desleixo da humanidade consti-tuem uma fora que sem cessar arrasta para o mal todos os assuntos humanos; e que essafora s controlada, e impedida de arrastar tudo sua frente, por uma classe de homenscujos esforos (constantemente em alguns, de tempos em tempos em outros) tendem paraum fim til e elevado. Supor que o nico valor desses esforos consiste da dose real demelhoria que eles operam, e que a nica consequncia de sua cessao seria nossa per-manncia em nosso estado atual, ter uma ideia muito imperfeita da importncia dosesforos cujo objetivo melhorar. Uma diminuio muito pequena nesses esforos nffoapenas poria um fim ao aperfeioamento, mas tambm faria que todas as coisas tendessempara a deteriorao;, a qual, uma vezcomeada, progrediria comrapidez cada vez maior,ficaria cada vez mais difcil de controlar, at que chegasse a um estgio frequentemente

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    visto na histria, e no qual grandes pores da humanidade ainda rastejam; quando quasenada a no ser uma fora sobre-humana parece capaz de virar a mar e dar um novo incioao progresso.Estas razes fazem a palavra Progresso to inadequada quanto os termos Ordem ePermanncia para ser a base de uma classificao dos requisitos de uma forma de governo.A anttese fundamental que essas palavras expressam no est tanto nas coisas elas mes-mas, mas muito mais nos tipos de carter humano que a elas correspondera Existem, nssabemos, m^jes nas j uais-. a jaudncia que-predomina, e outras nasquais predomina aousadia: para alguns, o desejo de evitar pr em perigo aquilo que j possudo umsentimento mais forte do que o que leva a procurar novas vantagens e melhorar as antigas;enquanto existem outros que se inclinam para o lado oposto, e que so mais desejosos debens futuros do que zelosos dos atuais. O caminho para os objetivos de ambos o mesmo;mas os homens esto sujeitos a se afastarem dele em direes opostas. Essaxonsiderao jmportante para a composio do pessoal de um corpo poltico;pessoas dos dois tiposdevem ser includas nele, de modo que as tendncias opostas possam ser* equilibradas,naquilo em que so excessivas, por uma proporo adequada de uma e de outra. Nenhumaprecauo expressa necessria para .assegurar este objetivo; basta que se tome cuidadopara n o permitir que nada lhe faa obstculo. mistura natural e espontnea ao velho edo novo, daqueles cuja fortuna e reputao j esto feitas, e daqueles que ainda as tm

    para fazer, dever ser suficiente para atender ao propsito, se apenas este equilbrionatural no for perturbado por regulamentos artificiais.Um a vez que a distino mais comumente adotada para a classificao das exignciassociais no possui propriedades necessrias para esse fim, cabe a ns procurar um a outradistino primria melhor adaptada a nosso propsito. Tal distino dever ser indicadapelas consideraes que farei a seguir.o que causa e condiciona o bom governo em todos os seus-jjQS-pfir^unlarmos o que causa esentidos, do mais humilde ao mais exaltado, vamos encontrar em primeira Unha as quali-dades dosseres hum anos quecompem a sociedade sobre a qual governo exercido.Podemos tomar, como primeiro exemplo, a administrao da justia; o mais ade-quado, uma vez que no existe outro ramo dos negcios pblicos em que o mero meca-nismo, as regras e combinaes para conduzir os detalhes da operao, sejam de impor-tncia to vital Contudo, o que importa ainda mais so as qualidades dosagentes huma-nos envolvidos. De que servem as regras de procedimento como garantia de justia, se acondio moral do povo tal que as testemunhas geralmente mentem, e os juizes e seussubordinados so corruptos? Igualmente, como podem asinstituies propiciar uma boaadministrao municipal, se existe tal ind iferena ao assunto que as pessoas que poderiamadministrar, honesta e eficientemente, no podem ser induzidas a servir, e as tarefas sodeixadas para aqueles que as empreendem porque possuem algum interesse particular apromover? De que utilidade o sistema representativo mais amplamente popular, se oseleitores no se preocupam em escolher o melhor membro do Parlamento, mas simescolhem aquele que gasta mais dinheiro para ser eleito? Como pode um a assembleiarepresentativa trabalhar para o bem se os seus membros podem ser comprados, ou se asua excttabUidade de temperamento, no controlada pela disciplina pblica ou por auto-

    controle individual, os torna incapazes de uma deliberao calma, os leva s vias de fatoou a trocar tiftjs-ne prprio recinto da Cmara? Como pode, ainda, o Governo, ouqualquer outro empreendimento comum, ser conduzido de maneira tolervel por umpovo to invejoso que toda vez que um homem est a pont o de conseguir alguma coisa, osque deveriam cooperar com ele se entendem tacitamente para derrub-lo? Sempre que adisposio geral do povo for tal que cada indivduo atente apenas para aqueles de seusinteresses que so egostas, e~quenlo.se preocupe com3 sua parte dos interesses gerais,em tal estado de coisas o bom governo impossvel. influncia de falta de intelignciatia obstruo de todos os elementos do bom governo no carece de ilustrao. O governoconsiste de. atos execu tados por seres human os; e se os agentes, ou aqueles que escolhemos agentes, ou aqueles perante os quais os agentes so responsveis*, ou os espectadorescuja opinio deveria influenciar todos esses, no passam de massas de ignorncia, estu-pidez e preconceito maldoso, toda operao do governo ser virada para o mal; enquantoque, medida que os homens forem se elevando acima desse nvel, o governo tambmmelhorar de qualidad e; at o po nto de excelncia, atingvel mas ainda no atingi do, emque os funcionrios do governo, eles m esmos dotados de virtude e inteligncia superiores,respiraro um a atmosfera de uma opinio pblica virtuosa e esclarecida.Sendo o primeiro elemento de um bom governo, portanto, a virtud e e a intelignciados seres humanos que compem a comunidade, p mais importante mrito que podepossuir uma forma de governo o de p romover a virtude e a inteligncia do prprio povo. /A primeira questo a respeito de qualquer instituio poltica saber at que ponto elatende a desenvolver nos membros de comunidade as vrias desejveis qualidades morais eintelectuais; ou melhor (seguindo a classificao mais completa de Bentham), morais,intelectuais e ativas. O governo que melhor fizer isto ter toda a probabilidade de ser o.melhor em todos os sentidos, uma vez que dessas q ualidades, na proporo em que elasexistem no povo, que depende todo o bem que pode ser feito pelo governo em suasoperaes prticas.Podemos considerar, ento, como um critrio de aferio da qualidade de um gover-no, o grau em que ele tende a aumentar a soma de boas qualidades dos governados,coletiva e individualmente; visto que, alm do fato de que seu bem-estar o nicoobjetivo do governo, suas boas qualidades fornecem a fora motriz que fez mover amquina. Isto faz da qualidade da prpria mquina o outro elemento constitutivo domrito de um bom governo; isto , o grau em que ele est adaptado a usufruir das boasqualidades existentes e fazer delas instrumento para fins teis. Tom emos mais uma vez oexemplo da judicatura._Dado q sistema judicial, o mrito da adm inistrao da justia estdiretamente relacionado com o valor dos homens que compem os tribunais, e com ovalor da opinio pblica que os influencia e controla. M as toda a diferena entre um bome um mau sistemas de judicatura repousa nos dispositivos adotados para levar tudo o queexiste de valor moral e intelectual na comunidade a pesar sobre a administrao da justia,de modo a torn-la devidamente eficaz nos seus resultado^ As disposies feitas para aescolha dos/juizes com vistas a obter a mais alta mdia de virtude e inteligncia; as formassalutares de procedimento; a publicidade que permite a observao e crtica de todo oabuso^ajibeidade de discutir e censurar j>pr meio da imprensa; a maneira de recolher as

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    20 O GOVERNO REPRESENTATIVO lprovas, escolhendo aquela mais adequada e elucidar a verdade; as facilidadesde todos ostipos para obter acesso aos tribunais; os meios adotados para descobrir os crimes eprender os malfeitores odas essas coisas no so o poder, mas sim o mecanismo quepe o poder em contato com o obstculo; e o mecanismo no tem nenhuma a"o prpria,mas sem ele o poder, no importa quo grande possa ser, estaria desarmado e intil.Um a distino similar existe com respeito constituio dos departamentos execu-tivos da administrao. O mecanismo bom quando as qualidades exigidas dos candidatosso submetidas aos exames adequados, e quando so estabelecidas as regras adequadaspara a promoo dos funcionrios; quando as tarefas so convenientemente distribudasentre aqueles que devem execut-las, quando elas so executatas dentro de uma ordemmetdica e conveniente, e quando um registro correto e inteligvel feito depois de suar""sahil' atfts1 " responsabilidadesv -

    so conhecidas pelos ou rqs|quando, em qualquer dos atosda administrao, as melhoresprecaues s" tomadas rontraji negligncia, "oTavritismo ou a malversao. Mas os" agir s^nKs,~tnto qunl"um arreio no pode dirigir umcavalo sem um cavaleiro. Se os funcTTi^^TSTscSG^lTrern to comyjtosjou toegTigenes_quant_aguees que etes" devem fiscalizar, ou seTfpubTico, a mola-mestra detodo o mecanismo de fiscaUza^ for ignorante dmS,~pssiv demais, ou cuidadoso einafnto demais para cumprir sua parte, pouco benefcio poder ser extrado do melhoraparato administrativo. Ainda assim um bom aparato prefervel a um mau aparato. El epermite extrair o mximo da pouca fora motriz, ou repressora do mal, existente; e, semele, nenhuma fora motriz ou repressora seria suficiente. A publicidade, por exemplo, noconstituir nem um impedimento ao mal, nem um estmulo ao bem, se o pblico noquiser ver o que est acontecendo; mas sem a publicidade, como poderia o pblicorefrear ou encorajar aquilo que no lhe foi permitido ver?-A oastiujcjgjdeal-de umafuno pblica aquela_em,que_oJntefesse4e-umfuncionrio,cctacide mtedrame_ntej?om-o seir dever. Nenhum sistema isolado nos levar a isso, mas nunca o conseguiremos semum sistema habilmente preparado para esse fim.O que dissemos sobre os detalhes da administrao do governo tambm pode ser ditocom ainda mais exatido sobre a sua constituio geral. Todo o governoque visa ser bom uma organizao de parte das boas qualidades existentes nos indivduos membros dacomunidade para a conduo de seus assuntos. Uma constituio representativa ummeio de levar o nvel geral de inteligncia e honestidade na comunidade, e a inteligncia evirtude individuais de seus membros mais sbios, a pesar mais diretamente sobre o gover-no, investindo-os de maior influncia sobre ele, muito mais do que geralmente teriam sobqualquer outro tipo de organizao; na verdade, essa influncia, qualquer que seja aorganizao, a fonte de todo e bem existente no governo, e o obstculo a todo o malque lhe estranho. Quanto maior o nmero de boas qualidades que as instituies de umpas conseguirem organizar, e quanto melhor o tipo de organizao, melhor ser o governo.Chegamos ento a um ponto de vista de onde podemos divisar o duplo mrito de que suscetvel.todo o conjunto de instituies polticas. Ele consiste em parte do grau emque elas promovem o avano mental geral da comunidade, no que tange inteligncia, virtude, atividade prtica e eficincia; e consiste tambm do grau de perfeio com que

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    T v 'elas organizam o valor moral, intelectual e ativo j existente, de moda a operar com maiorefeito sobre os assuntos pblicos. Um governo deve ser julgado poOuhomens, e por sua atuao sobre coisas; por aquilo que faz doscidadovt, , ,* ,,.,faz com eles; por sua tendncia a melhorar ou deteriorar o prprio povo, e pelo mrito ouvcio do trabalho que faz por ele, ou por meio dele. O governo ao mesmo tempo umagrande influncia sobre a mente'humana e um conjunto de disposies organizadas paraos assuntos pblicos. No primeiro caso, sua atuao beneficente eminentemente indi-reta, mas no por isso menos vital, enquanto sua atuao nociva pode ser direta.A diferena entre essas duas funes do governo no , como aquela entre Ordem eProgresso, uma diferena meramente no grau, mas tambm no gnero. No podemos,contudo, supor que elas no possuem uma ntima relao uma com a outra. As insti-tuies que asseguram a melhor gerncia dos assuntos pblicos, compatvel com o estgiode desenvolvimento da comunidade em um determinado momento, tendem, por* issomesmo, ao aperfeioamento deste estgio. O povo que tiver as leis mais justas, a judi-catura mais honesta e eficiente, a administrao mais esclarecida, e o mais equitativo emenos oneroso sistema de finanas, compatveis com o estgio de desenvolvimento morale intelectual que tiver alcanado, estar prestes a alcanar rapidamente um estgio supe-rior. E, tambm, no existe nenhuma outra maneira de as instituies contriburem maiseficientemente para a melhoria do povo, a no ser por se concentrarem em desempenharbem suas tarefas mais diretas. Se, ao contrrio, o seu mecanismo to mal concebido aponto de que elas executem mal suas tarefas, os efeitos se fazem sentir de mil maneiras,abaixando a moralidade e entravando a inteligncia e atividade do povo. Mas a distino, apesar de tudo, real, porque esta circunstncia de um mecanismo bom ou mau apenasum dos meios atravs dos quais as instituies melhoram ou deterioram o esprito huma-no, e as causas e os tipos dessa influncia benfica ou prejudicial sobre os governospermanecem objeto de um estudo distinto e muito mais profundo.Da s duas maneiras de operao pelas quais uma forma de governo, ou um conjun-to de instituies polticas, afeta o bem-estar da comunidade a saber, sua operaocomo um agente de educao nacional, e os seus mecanismos para conduzir os assuntoscoletivos da comunidade no estgio em que ele se encontra evidente que esta segundamaneira varia muito menos do que a primeira, de acordo com as diferenas entre os pasese entre os graus de civilizao. E ela tambm tem muito pouco a ver com a constituio

    fundamental do gcnrema_Ajmelhor maneira de conduzir a tarefa prtica de um governosob uma constituio liberal, tambm ser a melhor sob uma monarquia absoluta;apenas, pouco provvel que uma monarquia a empregu>As leis da propriedade, por exemplo;os princpios da prova e do procedimento judicial; o sistema de taxao e administraofinanceira; nenhum deles precisa ser diferente em diferentes formas de governo. Cada umdesses assuntos possui princpios e regras prprios, que so objetos de estudos separados.Jurisprudncia geral, legislao civil e penal, poltica comercial e financeira, socincias em si mesmas, ou melhor, membros individuais da cincia (ou arte) abrangenteqve o governo; e as teorias mais esclarecidas sobre todos esses temas seriam geralmenteteis sob todas as formas de governo, se todos fossem capazes de as entender e de sesujeitar a elas, o que no parece muito provvel bem verdade que essas doutrinas nommm v JiByOTECA D E CINCIAS JURDICAS

    s?g9ornomoo

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    poderiam ser aplicadas sem algumas modificaes, a todos os estgios da sociedade e damente humana; contudo, a grande maioria delas necessitaria apenas de modificaes emalguns detalhes, para serem adaptadas a qualquer sociedade suficientemente avanada parapossuir governantes capazes de entend-las. Um governo ao qual elas sejam totalmenteinaplicveis deve ser um governo to mau em si, ou to diametralmente oposto ao senti-mento pblico, de modo a ser incapaz de se manter por meios honestos.O inverso acontece com aquela outra poro dos interesses da comunidade, relacio-nada com a melhor ou pior educao do prprio povo. Consideradas instrumentos paraeste fim, as instituies devem ser radicalmente diferentes, de acordo com o grau deprogresso j alcanado. O reconhecimento desta verdade, embora mais emprica do quefilosfica, pode ser encarado como o grande trao da superioridade das teorias polticasdo presente sobre as do passado, quando era constume reclamar, para a Frana ou aInglaterra, a democracia representativa utilizando argumentos que mostravam como anica forma de governo adequada para bedunos ou malaios. O estgio das diferentescomun idades, em termos de cultura e desenvolvimento, desce at a uma condio poucosuperior dos animais mais inteligentes. O movimento na outra direo tambm consi-dervel, e a possibilidade de melhora futura muito maior. Uma comunidade s podepassar de um desses estgios para um outro mais elevado em virtude de certas influncias,dentre as quais a mais importante a do governo ao qual est sujeita. Em todos osestgios de aperfeioamento humano j alcanados, a natureza e o grau de autoridadeexecida^pbre-os^m divduoT,~-e~S condies de coman do e obedincia, so as maispoderosas das influncias, a exceo da crena religiosa, que fazem dos homens o que soe que os tomam capazes de se tornarem aquilo que podem ser. Um governo que se adaptemal ao grau de civilizao alcanado por um povo determinado pode interromper oprogresso desse povo. O nico m rito indispensvel a um gov erno, e em virtude do qua lpodem ser perdoados todos os desmritos compatveis com o progresso, o de que suaoperao seja favorvel, e no desfavorvel, ao prximo passo que deve ser dado pelopovo de modo a subir para um estgio mais alto.Assim (para repetir um exemplo anterior), um povo em um estgio de independnciaselvagem, no qual cada indivduo viva por si, isento na maior parte do tempo de qualquercontrole externo, praticamente incapaz de fazer qualquer progresso em termos decivilizao, a no ser que aprenda a obedecer. Portanto, a virtude indispensvel a umgoverno que vier a se estabelecer sobre um povo dessa espcie a de saber se fazerobedecida Para chegar a tanto, a constituio deste governo deve ser quase, ou total-mente, desptica. Um a constituio com um grau qualquer de popularidade, dependentedo abandono voluntrio por parte dos membros da comunidade de sua liberdade indi-vidual de ao, seria incapaz de impor a seus adeptos o primeiro princpio necessrio aesta fase de seu progresso. Por conseguinte, a civilizao de tais tribos, quando no oresultado da justaposio com outras tribos j civilizadas, quase sempre o trabalho deum governante absoluto, que tira seu poder de proezas religiosas ou militares; muitofrequentemente de conquista estrangeira.Igualmente, as raas no-civilizadas, e sobretudo as mais corajosas e as mais enrgicas,so avessas a um trabalho contnuo e montono. Contudo, toda civilizao real se faz a

    OS CRITRIOS DE UMA BOA FORMA DE GOVERNO 23esse preo; sem esse trabalho, no se pode nem preparar o esprito para os hbitos queexige a sociedade civilizada, nem preparar o mundo material para receb-la. O que necessrio nesses casos uma concorrncia rara de circunstncias, e por essa razo fre-quentemente um lapso de tempo considervel, para reconciliar um tal povo com o traba-lho, a no ser que ele seja durante algum tempo constrangido a isso. Da por que a prpriaescravido, dando um comeo vida de trabalho, e impondo-a como a ocupao exclu-siva da poro mais numerosa da comunidade, pode acelerar a transio para uma liber-dade melhor do que aquela das lutas e das pilhagens. quase intil dizer que estadesculpa para a escravido s se aplica a um estgio m uito atrasado da sociedade. Umpovo civilizado possui muitos outros meios de inculcar a civilizao aos povos sobre osquais exerce influncia; e a escravido repugna de tal maneira, em todos os seus detalhes,a esse governo de direito que a base da vida moderna, e uma fonte de corrupo topotente para a classe dominante, uma vez que esta ltima chega civilizao, que a suaadoo, no importa sob que circunstncias, por uma sociedade moderna representa umarecada para algo pior que a barbrie.Em um perodo qualquer de sua histria, contudo, quase todos os povos agoracivilizados consistiram, na maioria, de escravos. Um povo nessas condies necessita deuma poltica bem diferente daque la de um povo d e selvagens. Se for um povo en rgico pornatureza, e especialmente se estiver associada a ela na mesma comunidade um a classelaboriosa que no seja composta nem de escravos nem de donos de escravos (comoocorreu na Grcia), ele precisar, para se garantir seu desenvolvimento, provavelmenteno mais do que ser libertado; quando libertados, eles estaro frequentemente aptos,como os romanos libertados, a assumirem de imediato todos os direitos da cidadania. Isto,contudo, no a condio normal da escravido, e constitui geralmente um sinal de queela est se tornando obsoleta. Um escravo, propriamente dito, que ainda no aprendeu ase cuidar sozinho. Ele est, sem dvida, um passo frente do selvagem: j no precisa maisaprender a primeira lio da sociedade poltica, j apren deu a ob edecer. Ma s ele sobedece a ordens diretas. uma caracterstica dos escravos natos o fato de seremincapazes de adaptarem seu comportamento a regras ou leis. S podem fazer aquilo queso mandados fazer, e apenas quando os mandam faz-lo. Se um homem temido por elesest perto deles e os ameaa com punies, eles obedecem; mas quan do vira as costas, elesparam de trabalhar. O impulso que recebem no age sobre seus interesses, mas sim sobre

    seus instintos; esperana imediata ou terror imediato. Um despotismo capaz de domar osselvagens no far mais (enquanto despotismo) que confirmar os escravos em suas incapa-cidades. Contudo, eles ainda seriam incapazes de se auto-governar. Seu desenvolvimentono pode partir deles mesmos, mas deve ser introduzido no exterior. O nico caminhoque eles tm para o progresso passar de um governo arbitrrio para um governo dedireito. Eles devem aprender a ser donos de si mesmos, e isto, no seu estgio inicial, nadamais do que a capacidade de agir segundo instrues gerais. O governo que necessitamno um governo de fora, mas sim um que os guie. Estando, contudo, em um estgiopor demais atrasado para ceder orientao de pessoas a quem no considerem comodetentores do poder, o governo que m ais lhes convm um que possua a fora, mas queraramente a use; um a aristocracia ou despotismo paternal, semelhante forma Saint-"

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    24 O GOVERNO REPRESENTATIVO Simoniana de socialismo; um poder que presida de cima a todas as operaes da socie-dade, de modo a que cada um sinta a presena de uma fora capaz de obrig-lo a obedecers leis mas que, ncapaz de descer ao ponto de regular todas as mincias da vida e dotrabalho, deixaria e induziria_necessariamene_gs indivduos a agirem sozinhos. Este, quepoderia ser chamado d governo de pupilagemj parece ser a forma mais adequada paralevar um povo dessa espcie a dar ^pfXflfi passo necessrio no caminho do progressosocial Esta parece ter sido a ideia dos Inas do Peru; e assim procederam osJesutas noParaguai No me necessrio ressaltar que a pupilagem apenas admissvel como ummeio de gradualmente treinar o povo a marchar sozinho.

    Seria suprfluo levar mais adiante esta ilustrao. Tentar investigar qual seria a formade governo mais adequada para cada estgio conhecido da sociedade seria compor%umtratado, no sobre o governo representativo, mas simsobre cincia poltica emgeral. Paranosso propsito mais limitado extramos da filosofia poltica apenas os seus princpiosgerais. Para determinar a forma de governo melhor adequada a um povo determinado,devemos ser capazes de, dentre os vcios e lacunas desse povo, distinguir aquele queconstitui o impedimento mais imediato ao progresso; descobrir o que lhe barra o cami-nho, por assim dizer. O melhor governo para esspovo o _que mais tende a propiciar-lheaquilo-cujilal ta.o impede de avanar, ou que o faz avanar de uma maneira desajeitada eincompleta. No podeijs^c^ todas as coisasque,possuem como objeto o desenvolvimento, if Progresso: ao procurar o bemneces-srio, nenhum dano, ou o mnimo dano possvel, deve ser feito ao bem j conquistado. Aum povo de selvagens deveria ser ensinada a obedincia, mas no de maneira a torn-losum povo de escravos. E (para dar observao um carter mais geral) a forma de governoque for mais eficaz em conduzir o povo para o estgio seguinte de progresso ainda assimpode vir a ser por demais prejudicial a esse povo, se o fizer de maneira a impedir, oudespreparar totalmente o povo para qualquer avano posterior. Tais casos so frequenteseesto includos entre os fatos mais melanclicos da histria. A hierarquia egpcia, o des-potismo paternal da China, foram bem adequadas para trazer aquelas naes ao seu grauatual de civilizao. Mas tendo alcanado.esse rJonto, elas foram obrigadas a interromperdefinitivamente seu avano, p or falta de liberdade mental e individualidade jL_as_isti-tuies, que vinham conduzindo essas naes, tomaram-nas.tQtalnie.nte..incapazes deadquirir dois requisitos do desenvolvimento: como as instituies no se desmoronarampara ceder seu lugar a outras, o desenvolvimento parou.Em contraste com essas naes, consideremos o exemplo totalmente oposto que nosproporciona um outro povo oriental comparativamente insignificante ->os-ju.deus. Elestambm, tiveram uma monarquia absoluta, e suas instituies eram de origem tVsacer-dotal quanto as dos hindus. Essas instituies fizeram por eles o que as instituiesfizeram p or outras raas orientais nduziram-nos ao trabalho e ordem, e deram-lhesvida nacional Mas nem os seus reis nem os seus sacerdotes conseguiram, como ocorreunos outros pases, o molde exclusivo de seu carter. Sua religio, que permitia que pessoasbrilhantes e de grande piedade religiosa fossem encaradas e encarassem a si mesmas comoinspirados divinos, deu existncia a uma instituio no-organizada de um valor inesti-mvel a Ordem (se que pode ser assim chamada) dos Profetas. Sob a proteo, embora

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    nem sempre afetiva, do carter religioso, os Profetas eram um poder dentro da nao, umpoder frequentemente maior do que o dos reis e dos sacerdotes, e que manteve aceso,naquele canto do mundo, o antagonismo de influncias que a nica segurana real deprogresso contnuo. A religio, naquele pas, no exerceu o mesmo papel que teve emoutros lugares a consagrao de tudo que j havia sido estabelecido, e uma barreiracontra qualquer desenvolvimento futuro. O comentrio de um judeu ilustre, M. Salvador,de que os Profetas foram, na Igreja e no Estado, o equivalente moderna liberdade deimprensa, d uma ideia justa mas no adequada do papel cumprido na histria nacional euniversal por este grande elemento da vida judia: por meio do qual, sendo inesgotvel afonte de inspirao, as pessoas mais dotadas em termos de gnio e sentimento moralpodiam no apenas denunciar e reprovar, com a autoridade direta do Todo-Poderoso,tudo aquilo que lhes parecesse merecedor de tal tratamento,mas tambm dar melhores emais elevadas interpretaes religio nacional, as quais se tornavam da em diante partedesta religio. Assim, aquele que puder deixar de lado o hbito de ler a Bblia como sefosse um nico livro (hbito at recentemente to enraizado entre os Cristos quantoentre os incrdulos), ver com admirao o vasto intervalo entre a moralidade e religiodo Pentateuco, ou mesmo dos livros histricos (obra evidente dos conservadores hebreusda ordem sacerdotal), e a moralidade e religio das Profecias: uma distncia to grandequanto aquela entre estas ltimas e os Evangelhos. Condies mais favorveis ao Progressono poderiam facilmente existir; por conseguinte, os judeus, ao invs de permaneceremestacionrios como os outros asiticos, foram, ao lado dos gregos, o povo mais progres-sista da antiguidade, e tm sido, juntamente com eles, o ponto de partida e a grandeinfluncia impulsionadora da cultura moderna.

    No , portanto, possvel entender a questo da adaptao das diversas formas degoverno aos estgios da sociedade sem levar em considerao no apenas o passo seguinte,mas sim todos os passos que a sociedade deve ainda dar; tanto os que podem ser previstosquanto os que, de nmero infinitamente maior, escapam no momento a qualquer pre-viso. Por conseguinte, para julgar dos mritos das formas de governo, deve-se construir umideal tendo por base a forma de governo mais desejvel, ou seja, a que promoveria noapenas um aperfeioamento, mas tambm todas as formas e graus de desenvolvimento, seexistissem as condies necessrias para dar efeito s suas tendncias benficas. Isto feito,devemos examinar quais so as diferentes condies mentais necessrias a que esse gover-no possa realizar suas tendncias e, portanto, quais so os vrios defeitos que tornam umpovo incapaz de colher seus benefcios. Seria ento possvel elaborar um teorema dascircunstncias nas quais aquela forma de governo poderia ser sabiamente introduzida; etambm julgar, nos casos em que seria melhor no introduzi-la, que formas inferiores degoverno conduziriam melhor essas comunidades atravs dos estgios intermedirios queprecisam atravessar antes de se tornarem adequadas para a melhor forma de governo.

    Destas questes, a ltima no de interesse para ns aqui. Mas a primeira parteessencial -de nosso assunto; podemos, desde j, enunciar semtemeridadeuma proposio,cujas provas e exemplos se apresentaro nas pginas seguintes: que a forma ideal degoverno'se encontra em qualquer uma das variedades do sistema representativo.

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    C A P T U L O mQUEAFORMA DEGOVERNO IDEAL O GOVERNOREPRESENTATIVO

    D U R A N T E M U I T O tempo (talvez durante toda a durao da Uberdade inglesa) fo i ditoque se um bom dspota pudesse ser encontrado, a monarquia desptica seria a melhorforma de governo. BScar isso corno um a concepo radicalmente falsa e extremamenteperniciosa do que seria um bom gdverno; e at q ue consigamos nos livrar dele,1"fatalmentedeturpar todas as nossas especulaes sobre o governo.A suposio d e que o poder absoluto, na s mos de um indivduo em inente, poderiauegurar o cumprimento virtuoso e inteligente de todos os deveres do governo. Boas leisteriam estabelecidas e impostas, leis m s seriam refeitas; os melhores homens preenche-riam todos os cargos de confiana; a justia seria to bem administrada, os encargospblicos seriam to leves e to judiciosamente impostos, todos os ramos da administraoeriam t puramente e to inteligentemente conduzidos, quanto o permitissem as cir-cunstncias do pas e o seu grau de cultivo moral e intelectual Estou disposto, pelo be mda discusso, a conceder tudo isso; ma s devo precisar exatamente quo grande essaconcesso; e tambm, o que mais preciso se r acrescentado simples expresso, um bomdspota, para produzir uma mera aproximao desses resultados. Sua realizao implica,na verdade, no apenas um bom monarca, mas tambm um que seja onisciente. Ele deveeitar sempre corretamente informado, e e m grande detalhe, da conduta e do desempenhode todos os ramos da administrao, em todos os distritos do pas; e deve ser capaz, nasvinte e quatro horas que so tudo o que se concede tanto para um rei quanto para o maishumilde trabalhador, de dar suficiente ateno e superviso a todas as partes deste vastocampo; ou ento ele deveria ao menos ser capaz de distinguir e escolher, dentre a grandemassa de sditos, no apenas um a grande quantidade de homens honestos e capazes,prprios para dirigir todos os ramos da administrao pblica sob superviso, mas tamb maquele pequeno n mero de homens de em inentes virtudes e talentos, que no s pudes-sem ser dispensados desta superviso, mas que tambm pudessem exerc-la sobre osoutros. So to extraordinrias as faculdades e energias necessrias para executar estatarefa de uma maneira pelo menos tolervel, que o bom dspota qu e estamos imaginandodificilmente a empreenderia, a no ser para evitar m ales intolerveis, ou como preparaotransitria para algo diferente. Mas a discusso pode dispensar este argumento. Supo-

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    28 O GOVERNO REPRESENTATIVO QU E A FORMA DE GOVERNO IDEAL O GOVERNO REPRESENTATIVO 29

    nhamos que desaparea a dificuldade. O que teramos ento? Um nico homem desuper-humana atividade mental dirigindo todos os assuntos de um povo mentalmentepassivo. Sua passividade est implcita na prpria ideia de poder absoluto. A nao comoum todo, e todos os indivduos que a compem, no tm nenhumavozsobre seu destino.No exercitam nenhuma vontade com respeito a seus interesses coletivos. Tudo deci-dido em seu lugar por uma vontade que no a sua, cuja obedincia constitui legalmenteum crime. _ _ ~,Que espcie..de seres'humano& pode ser formada sob tal regime? Quedesen-volvimento podem as suas faculdades de raciocnio ou de ao obter nessas condies?Sobre questes de pura teoria talvez lhes fosse permitido especular, na medida em queno se aproximassem da poltica, ou que suas especulaes no tivessem a menor relaocom sua prtica Sobre assuntos prticos lhes seria quando muito permitido sugerir; emesmo sob o mais moderado dos dspotas, s aqueles homens de superioridade j reco-nhecida poderiam esperar que suas sugestes, se no fossem levadasem considerao, pelomenos chegassem ao conhecimento dos que dirigem os negcios. Umhomem teria de terum gosto extremamente incomum pelo esforo intelectual em si e por si, para se dar aotrabalho de pensai, mesmo na certeza de que no produzir nenhum efeito exterior, oupara se qualificar para funes que sabe no ter nenhuma chance de poder exercer. Onico estmulo real ao esforo intelectual (exceo feita a um pequeno numere de men-tes), aperspectiva de colheita de frutos prticos.

    A nao no ficar, contudo, totalmente desprovida de poder intelectual. As tarefasordinrias da vida diria, que devem necessariamente ser cumpridas por cada indivduo oucada famlia, exigiro certa dose de inteligncia e habilidade prtica, dentro de umaordem estreita de ideias. Pode haver uma classe seleta de sbios, que cultivem a cincia emvista de suas aplicaes fsicas, ou pelo amor pesquisa. Haver uma burocracia, e aspessoas treinadas para a burocracia aprendero pelo menos algumas mximas empricassobre o governo e a administrao pblica. Poder existir, e tem frequentemente existido,uma organizao sistemtica da melhor fora mental no pas em um sentido especial(geralmente militar) para promover a grandeza do dspota. Mas o grande pblico conti:nuar sem informao e sem interesse por todos os grandes assuntos da poltica prtica;ou, se chegar a ter algum conhecimento dela, ser apenas um conhecimento de diletante,como aquele das pessoas, que nunca empunharam um a ferramenta, sobre as artes mec-nicas.M as tambm no apenas a inteligncia dos homens que sofre sob este regime; suascapacidades morais tambm so atingidas. Sempre que a esfera de ao dos seres humanos artificialmente circunscrita, seus sentimentos so estreitados e diminudos na mesmaproporo. O alimento do sentimento a ao; mesmo a afeio domstica vive de bonsofcios voluntrios.^ixjs que^uma jssoa_no faa nada jjpr jeu.j)as,e_.ela_jnfo_seinteressar por ele. J se disse outras vezes que com o despotismo no existe mais do queum patriota, o prprio dspota; o ditado se baseia numa apreciao exata dos efeitos dasujeio absoluta, mesmo que seja a um bom e sbio mestre. Resta a religio: i e aqui,finalmente podemos crer que existe uma influncia capaz de elevar os olhos e as mentesdos homens acima da poeira que est a seus ps. Mas a religio, mesmo supondo que no

    tenha sido pervertida pelo despotismo em seu prprio benefcio, deixa nessas condies deser um a questo social, e se reduz a uma questo pessoal entre o indivduo e seu Criador,em que pesa a prpria salvao. Sob esse aspecto, a religio bem compatvel com o maisestreito e pessoal egosmo, e, tanto quanto a prpria volpia, impede que o devoto seidentifique em sentimentos com seus semelhantes.Um bom despotismo significa um governo em que, no que depender do dspota, noexista nenhuma opresso positiva por parte dos funcionrios pblicos, mas no qual o povono cuide de seus prprios interesses coletivos, no conceba nenhum pensamento relativoa seus interesses, e a s mentes do povo sejam anuentes ou condicionadas poresta abdicaode suas prprias energias. Deixar as coisas para o governo, como deix-las ao acaso, sinnimo de no se preocupar com elas, e d e aceitar os resultados, quando desagradveis,como caprichos da natureza. exceo, portanto, de um pequeno nmero de estudiososque tomam um interesse intelectual pela meditao em si, a inteligncia e o s sentimentosdo povo inteiro so abandonados em favor dos interesses materiais e, quando estes soatendidos, em favor da diverso e da ornamentao da vida privada. Mas dizer isto omesmo que dizer que, se o testemunho da histria for de algum valor, chegou a hora dodeclnio desta nao: isto , se esta nao tiver algumavezchegado a uma altura de ondepossa cair. Se nunca houver ultrapassado a condio de uma nao oriental, nessa con-dio permanecer estagnada. M as se, como em Grcia e Roma, tiver realizado algo maiselevado, atravs da energia, do patriotismo e da abertura da mente, que como qualidadesnacionais so frutos unicamente da liberdade, ela retornar em poucas geraes ao nveldos orientais. E esta condio no significa um a tranquilidade estpida, a salvo de mudan-as para pior; ela significa frequentemente a possibilidade de a nao ser invadida,conquistada e reduzida escravido, tanto por um dspota mais poderoso, quanto por umpovo brbaro limtrofe que tenha mantido com sua rudeza selvagem todo o vigor de suaUberdade.Tais no so apenas as tendncias naturais, mas tambm as necessidades inerentes dogoverno desptico, para as quais no h alternativa, a no ser na medida em que odespotismo aceite no ser desptico; na medida em que o suposto bom dspota se abstiverde exercitar seu poder, e, pelo fato de mante-lo em reserva, permita que os assuntos geraisdo governo sejam conduzidos como se o povo estivesse realmente se autogovernando. Pormais improvvel -que possa ser, podemos imaginar um dspota observando a maioria dasregras e restries do governo constitucional. Ele poderia permitir suficiente liberdade deimprensa e discusso, de maneira a propiciar a formao e a manifestao de uma opiniopblica sobre os temas nacionais. Ele poderia delegar s localidades a direo dos interes-ses locais, sem interveno da autoridade. Poderia at se cercar de um ou vrios conselhosde governo, escolhidos livremente pelo todo ou por parte da nao, mas mantendo emsuas mos o direito de taxar, bem como o poder supremo legislativoe executivo. Se agissedessa maneira, e portanto desistisse de ser um dspota, evitaria parte considervel dascaractersticasms do despotismo. A atividade poltica e a capacidade para os negcios p-blicos no*seriam mais impedidas de florescer no corpo da nao; e s e formariaum a opiniopblica que no seria mero eco do governo. M as tais melhorias seriam apenas o comeo denovas dificuldades. Esta opinio pblica, independente da influncia do monarca, s

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    30 O GOVERNO REPRESENTATIVO QUE A FORMA DE GOVERNO IDEAL O GOVERNO REPRESENTATIVO 31poder estar com ele ou contra ele; ou um , ou outro. Todos os governos acabam pordescontentar muitas pessoas - ora, estas tendo agora rgos regulares e podendo expres-sar seus sentimentos, externariam com frequncia opinies contrrias s medidas do go-verno. O que dever fazer o monarca quando essas opinies desfavorveis constiturem amaioria? Dever mudar de rumo? Dever acatar os desejos da nao? Se assim fizer,deixar de ser dspota para se tomar um rei constitucional; um rgo,um primeiro-'ministro da nao, diferente apenas por ser insubstituvel. Seno o fizer, dever derrubara oposio atravs de seu poder desptico, caso contrrio surgirum antagonismo perma-nente entre o povo e um homem, situao para a qual sh um fim possvel Nemmesmoum princpio religioso de obedincia passiva e de "direito divino" poderia retardar pormuito tempo as consequncias naturais de tal situao. O monarca dever sucumbir eceder s condies da realeza constitucional, ou ento dar seu lugar a algum que o faa.O despotismo, sendo assim to puramente nominal, teria poucas das vantagens que se su-pe pertencer monarquia absoluta; ao mesmo tempo em que teria em um grau muito m-perfeito as de um governo livre, uma vez que, por maior que seja a liberdade que os cida-dos possam realmente gozar, jamais esqueceriam o fato de t-la obtido por tolerncia, epor uma concesso que, sob a constituio existente do Estado, pode ser revogadaa qual-quer momento; e nunca esqueceriam o fato de que so legalmente escravos, embora deamo prudente, ou indulgente.

    No constitui surpresa o fato de que alguns reformadores impacientes ou desapon-tados, ao se depararem com a ignorncia, a indiferena, a indocilidade, a obstinaoperversa de um povo, e as combinaes corruptas de interesses privados egostas, impedi-mentos que se opem s mais salutares melhorias pblicas, clamem s vezes por uma moforte que derrube estes obstculos, e que imponha a um povo recalcitrante um governomelhor. Mas (deixando de lado o fato de que para cada dspota que vez por outra corrijaabusos, existem noventa e nove outros que no fazem outra coisa a no ser cri-los)aqueles que depositam esperana em um tal remdio, deixem de fora da ideia de bomgoverno seu principal elemento, a melhoria do prprio povo. Um dps benefcios daliberdade que o governante no pode deixar, de lado as mentes dos indivduos, e nopode aperfeioar por lesreus assufttosrsem aperfeioar a eles prprios. Sefosse possvelpara o povo ser bem governado sem sua participao, seu bom governo no duraria maisdo que a liberdade de um povo que tivesse sido liberado por armas estrangeiras sem a suacooperao. verdade que um dspota pode educar um povo; e se realmente o fizesse,esta seria a melhor desculpa por seu despotismo. Ma s toda a educao que vis^ fazer oshomens se tornarem mquinas acaba, a longo prazo, fazendo que eles clamem pelo con-trole de suas prprias aes. Os lderes da filosofia francesa do sculo XVIII tinham sidoec^os""pelbs jesutas. Mesmo a educao jesuta, d que parece, foi suficiente parade|pertar~q apetite pela liberdade. Tudo aquilo que fortalece, por pouco que seja, asfaculdades, cria um desejo cada vez maior de exerc-lasmais livremente; e uma educaopopular ser falha se preparar o povo para qualquer outro estado que no aquele que oinduz a desejar,e muito provavelmentea reivindicar.Longe de mim querer condenar, em caso de extrema necessidade, o recurso ao poderabsoluto na forma de uma ditadura temporria. Em outras eras, naes livres concederam,

    de livre escolha, este poder a indivduos, como um remdio necessrio para os males docorpo poltico que no poderiam ser eliminados por meios menos violentos. Mas suaaceitao, mesmo por um tempo estritamente limitado, s poder ser justificada se, comoSlon ou Ptaco, o ditador empregar todo o poder que lhe for confiado na remoo dosobstculos que impedem a nao de encontrar a liberdade. Um bom despotismo umideal totalmente falso, que praticamente (exceto como meio pra alcanar algum objetivotemporrio) se torna a mais insensvel e perigosa das quimeras. De qualquer maneira, umbom despotismo, em um pas com algum avano em termos de civilizao, melhor doque um mau despotismo; de vez que ele muito mais relaxante e enervante para ospensamentos, sentimentos e faculdades do povo. O despotismo de Augusto preparou osromanos para Tibrio. Se o tom geral de seu carter nohouvesse sido abaixado por quaseduas geraes daquela escravido temperada, talvez tivessem ainda energia suficiente parase rebelarem contra a escravido mais odiosa.N o h nenhuma dificuldade em demonstrar que a forma ideal de governo aquelaem que a soberania, o poder supremo de controle em ltima instncia, pertence, massa

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    32 O GOVERNO REPRESENTATIVO

    dependendo daquilo que eles mesmos podem fazer, separadamente ou em conjunto,muito mais do que daquilo que os outros podem fazer por eles.A primeira proposio a de que cada um o nico guardio seguro de seus prpriosdireitos e interesses e uma das mximaselementares da prudncia, na qual toda pessoa capaz de conduzir seus prprios assuntos, se baseia implicitamente toda a vez que elamesma a interessada.Muitos,na verdade, tomam por ela grande antipatia como doutrina

    poltica, e sentem prazer em difam-la, como urna doutrina de egosmo universal Aosquais respondemos que, no momento em que os homens cessarem de, via de regra, sepreferirem, aos outros, e os mais prximos, aos mais remotos, o Comunismo ser noapenas praticvel, mas tambm a nica forma sustentvel de sociedade; e ser, quandoesse momento chegar, seguramente levado a efeito.De minha parte, no acreditando em egosmo universal, no tenho nenhuma dificul-dade em admitir que o Comunismo seja mesmo agora praticvel para a elite da humanida-de, e que possa vir a s-lopara o resto. Mas como esta opinio no absolutamente popu-

    , lar entre os defensores das instituies atuais, que criticam a doutrina da predominncia\ldo egosmo, estou inclinado a pensar que eles naverdade acreditam que oshomens

    consideram mais a si mesmos do que aos outros. N o , contudo, necessrio afirmar tudoisto para apoiar o direito de todos de participarem do poder soberano. No precisamossupor que quando o poder reside exclusivamente em uma classe, estaclasse dever cons-ciente e deliberadamente sacrificar em favor de si mesma as outras classes; basta saber quena ausncia de seus defensores naturais os interesses dos excludos estaro sempre emperigo de serem negligenciados; e que, quando forem considerados, o sero com olhosbem diferentes dos das pessoas a quem concernem diretamente.

    Neste pas, por exemplo, as chamadas classes trabalhadoras podem ser consideradascomo excludas de toda a participao direta ao governo. N o acredito que as classes que. participam dele tenham qualquer inteno de sacrificar as classes trabalhadoras em seufavor. J a tiveram uma vez: prova disso so as tentativas perseverantes de reduzir por leios salrios. Mas no presente sua disposio habitual bem diferente elas fazem de bomgrado sacrifcios considerveis, sobretudo no que tange ao seu interesse pecunirio, epecam muito mais pelos benefcios demasiado prdigos e indiscriminados; e tambm noacredito ter havido governantes inspirados por um desejo mais sincero de cumprir seusdeveres com relao aos mais humildes de seus compatriotas. Contudo, o Parlamento, ouqualquer um de seus membros, alguma vez j examinou uma questo qualquer com osQffirjfm trabffiadoj2_Quandoiim assunto de interesse para os ditos trabalhadores

    \ levantado, ele