Depressão em Crianças Institucionalizadas: Análise da Produção Científica
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UNIVERSIDADE PAULISTA
RAFAELA ARDOINO ROBERTO DOS ANJOS
DEPRESSÃO EM CRIANÇAS INSTITUCIONALIZADAS: ANÁLISE DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA
SÃO PAULO
2015
RAFAELA ARDOINO ROBERTO DOS ANJOS
DEPRESSÃO EM CRIANÇAS INSTITUCIONALIZADAS: ANÁLISE DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA
Trabalho de conclusão de curso para obtenção do título de especialista em Saúde Mental para Equipes Multiprofissionais apresentado à Universidade Paulista - UNIP.
Orientadores:
Profa. Ana Carolina S. de Oliveira
Prof. Hewdy L. Ribeiro
SÃO PAULO
2015
Anjos, Rafaela Ardoino Roberto dosDepressão em crianças institucionalizadas: análise da produção científica / Rafaela Ardoino Roberto dos Anjos. – São Paulo, 2015.
23 f. + 1 CD
Trabalho de conclusão de curso (especialização) – apresentado à pós-graduação lato sensu da Universidade Paulista, São Paulo, 2015. Área de concentração: Saúde mental.
“Orientação: Profª. Ana Carolina Schmidt Oliveira”
“Orientação: Prof. Hewdy Lobo Ribeiro”
1. Crianças. 2. Depressão. 3. Institucionalização. I. Universidade Paulista - UNIP. II. Título. III. Anjos, Rafaela Ardoino Roberto dos.
RAFAELA ARDOINO ROBERTO DOS ANJOS
DEPRESSÃO EM CRIANÇAS INSTITUCIONALIZADAS: ANÁLISE DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA
Trabalho de conclusão de curso para obtenção do título de especialista em Saúde Mental para Equipes Multiprofissionais apresentado à Universidade Paulista - UNIP.
Orientadores:
Profa. Ana Carolina S. de Oliveira
Prof. Hewdy L. Ribeiro
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA
_______________________/__/___
Prof. Hewdy Lobo Ribeiro
Universidade Paulista – UNIP
_______________________/__/___
Profa. Ana Carolina S. Oliveira
Universidade Paulista – UNIP
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais José Roberto e Sílvia Cristina pelo
incentivo aos estudos, carinho, cuidados constantes, ensinamentos valiosos e
por serem grandes exemplos de vida. É uma honra tê-los como pais. Amo
vocês!
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus por me conceder vida e saúde para
concluir este projeto, sem ele nada disso seria possível.
Ao meu esposo Yuri pela parceria na vida e pela compreensão nos
momentos que estive ausente. Com você os meus dias são mais bonitos, és
muito importante pra mim.
A meu maninho Gustavo, pessoinha que amo demais, por sua amizade
e momentos felizes sempre compartilhados.
Aos meus avós Josefina e Alexandre que sempre me recebem com um
abraço pra lá de bom, que não dá vontade de largar! Amores da minha vida.
Aos demais familiares com os quais compartilho grandes alegrias.
A minha grande amiga Beatriz, feliz encontro na universidade que se
transformou em amizade sincera, verdadeira incentivadora, amiga presente e
exemplo de profissional. Admiro-te pela garra e pessoa maravilhosa que é.
A minha "fiel escudeira" Maria, amiga e companheira de curso, com a
qual tive o privilégio de trabalhar e dividir os dias de aula e ainda nos dias
atuais tenho a escuta carinhosa nas inquietações e alegrias.
A equipe do CREAS Brás Cubas em Mogi das Cruzes, em especial aos
"psis indelicados" - Bárbara, Érik, Vanessa, Roberto e Manoel com os quais
divido os meus dias de trabalho, compartilho experiências e aprendo a cada dia
a ser uma profissional melhor.
Aos professores Ana Carolina Schmidt Oliveira e Hewdy Lobo Ribeiro
pela paciência e dedicação na orientação deste trabalho e os valiosos
ensinamentos nas aulas ministradas durante o curso.
A todos aqueles que não foram diretamente citados, mas que
contribuíram para a realização deste trabalho, meus sinceros agradecimentos.
EPÍGRAFE
“É certamente por terem fama de faladoras que não se ouvem as
crianças. É certamente, também, por pensar por elas que não
entendem o que dizem”
(MOLLO)
RESUMO
Em crianças e adolescentes a depressão é caracterizada por sintomas
típicos como tristeza, baixa autoestima, fadiga e problemas do sono e da
alimentação, além dos atípicos, tais como irritabilidade, agressividade ou tédio.
A institucionalização como medida de proteção de crianças e adolescentes é
aplicada em casos em que há ameaça ou violação de direitos. Desta forma,
este estudo teve como objetivo analisar a produção científica sobre depressão
em crianças institucionalizadas. Concluiu-se que crianças institucionalizadas
apresentam maiores escores para depressão comparando-as com as que
vivem em suas famílias. Observou-se ainda que a ocorrência de eventos
estressores e um tempo de acolhimento superior a dois anos são indicativos
para um quadro depressivo.
Palavras- chave: Depressão, Criança, Institucionalização
ABSTRACT
In children and adolescents with depression is characterized by typical
symptoms such as sadness, low self-esteem, fatigue and problems of sleep and
food, in addition to the atypical, such as irritability, aggression or boredom. The
institutionalization as a measure of child and adolescent protection is applied in
cases where there is threat or violation of rights. Thus, this study aimed to
analyze the scientific literature on depression in institutionalized children. It was
concluded that institutionalized children have higher scores for depression
comparing them to those living in their families. It was also observed that the
occurrence of stressful events, and a host of time longer than two years are
indicative for depression.
Key-words: Children, depression, Institutionalization
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO......................................................................................... 09
1.1 Depressão Infantil .............................................................................. 091.2 Acolhimento Institucional ................................................................. 11
2 OBJETIVO............................................................................................... 13
3 METODOLOGIA...................................................................................... 14
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO...............................................................15
5 CONCLUSÕES........................................................................................ 21
REFERÊNCIAS.......................................................................................... 22
9
1 INTRODUÇÃO
1.1 Depressão Infantil
Já na década de 90 a Organização Mundial de Saúde apontava que a depressão
implica aspectos biológicos e psicológicos e que o prognóstico para esse quadro
pode ser bastante negativo em alguns casos. A estimativa para 2020, segundo a
OMS, é de que a depressão seja a maior causa de incapacidade humana, somente
sendo superada pelas doenças cardiovasculares (BONETTI et al., 2011)
Para Wathier e Dell’Aglio (2007) o termo depressão tem sido designado em
diferentes amplitudes, que podem caracterizar um estado afetivo normal, a
apresentação de um conjunto de sintomas ou até mesmo pode compreender uma
síndrome ou doença específica. Del Porto (1999) corrobora com a definição na
medida em que afirma que o termo depressão tem sido utilizado para indicar um
estado emocional, um sintoma, além de ser utilizado também para nomear uma
síndrome ou uma doença.
De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais -
DSM-5 os sintomas para diagnóstico de episódio depressivo maior são: humor
deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias, interesse ou prazer
acentuadamente diminuídos, perda ou ganho significativo de peso, diminuição ou
aumento de apetite, insônia ou hipersonia quase todos os dias, agitação ou retardo
psicomotor, fadiga ou perda de energia, sentimento de inutilidade ou culpa excessiva
ou inadequada, capacidade diminuída de pensar ou concentrar-se, ou indecisão,
pensamentos de morte recorrentes, ideação, tentativa ou plano suicida. Ainda em
concordância com o DSM-5 (p.161) “os sintomas causam sofrimento clinicamente
significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas
importantes da vida do indivíduo”.
Com o reconhecimento da depressão em crianças e adolescentes pelo Instituto
Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos em 1975, houve um avanço de
produções que focavam a avaliação e o diagnóstico dessa patologia na infância
(BALHS, 2002).
De acordo com Roberts et al. (1998, apud THIENGO et al., 2014) altas taxas de
prevalência de transtornos mentais são encontradas na infância e adolescência, em
10
uma revisão de literatura internacional, a média global da taxa de prevalência de
transtornos mentais nessa população foi de 15,8%, no Brasil, estudos apontaram
taxas de prevalência de 7 a 12,7%). Estimativas brasileiras apontam que 0,4% a 3%
das crianças apresentam quadros de depressão.
Segundo Cohen e Marcelli (2009, apud BARROS; SCHMITZ, 2011), a criança
diagnosticada com depressão infantil apresenta características como: desaceleração
psicomotora e inibição motriz; rosto com pouca expressão, pouca mobilidade e
apresenta-se pouco sorridente. Algumas crianças podem apresentar-se
comportadas demais, chegando até a manifestar tendência à submissão. Na mesma
linha Abaid et al. (2009) colocam que em crianças e adolescentes a depressão é
caracterizada por sintomas típicos como tristeza, baixa autoestima, fadiga e
problemas do sono e da alimentação, além dos atípicos, tais como irritabilidade,
agressividade ou tédio.
Crianças deprimidas com maior frequência se zangam, choram ou se queixam
comparada às crianças que não tem depressão. Comportamentos como brincar,
estudar e se relacionar com amigos são inferiores a média do esperado para a faixa
etária (MÉNDEZ et al., 2005 apud ÁLVARES; LOBATO, 2013).
Lima (2004) aponta que o conceito de depressão na infância ainda é muito
controverso e que não pode ser confundido com o sentimento de tristeza, já que
este faz parte da experiência normal do sujeito.
Diversos estudos apontam para fatores de risco para a depressão em crianças e
adolescentes entre eles Balhs (2002) afirma que a existência de histórico de
familiares com depressão aumenta em três vezes o risco em crianças e
adolescentes, seguidos por estressores ambientais, como casos de abuso físico e
sexual e perda de um dos pais, irmão ou amigo íntimo. Na mesma direção Dell’Aglio
e Wathier (2007) colocam que eventos estressantes, tais como separação dos pais,
família numerosa, história de criminalidade em um dos pais, doença mental dos
genitores e baixa renda, são citados como fatores de risco para depressão e Lima
(2004) elenca o abuso físico e sexual, problemas acadêmicos, separação ou
divórcio dos pais como importantes fatores de risco.
Em pesquisa realizada por Rohde, Lewinsohn e Seeley (1994, apud BAHLS,
2002), constatou-se que após a recuperação da depressão nessa faixa etária,
costuma-se ficar algum grau de prejuízo psicossocial e quanto mais cedo aparecer a
patologia, o prejuízo tende a ser maior. Wathier et al. (2008) salientam a
11
importância de uma detecção precoce de sintomas depressivos em crianças e
adolescentes, pois com essa verificação, pode-se evitar que se desenvolvam
quadros graves, com prejuízos no convívio social e também nos ambientes escolar e
familiar.
1.2 O acolhimento institucional
A institucionalização de crianças e adolescentes perpassa a realidade de muitas
famílias brasileiras. De acordo com o Levantamento Nacional das Crianças e
Adolescentes em Serviços de Acolhimento (2011) realizado pelo Ministério do
Desenvolvimento Social em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz em 2010,
existiam naquela data, 36.929 crianças e adolescente sob a medida do acolhimento
distribuídas em 2624 serviços em todo o Brasil, a maior parte dos acolhimentos
(21.730) estava concentrado na região Sudeste do país e os principais motivos de
acolhimento são negligencia na família (37,6%), pais ou responsáveis dependentes
químicos (20,1%), abandono (11,9%) e violência doméstica (10,8%).
Uma das mais duradouras instituições de assistência à infância, vinculada à
Igreja, foi a roda dos expostos, prática que tinha como objetivo recolher crianças
abandonadas anonimamente. Criada no período do Brasil Colônia, a roda dos
expostos atravessou e multiplicou-se no período imperial, conseguindo manter-se
durante a República e só foi extinta definitivamente em 1950. Durante mais de um
século, a roda de expostos foi praticamente a única instituição de assistência à
criança abandonada em todo o Brasil. Algumas vezes, famílias substitutas acolhiam
estes bebês, movidas pelo espírito de caridade, ou ainda com objetivos de
transformá-los em mão-de-obra familiar fiel, reconhecida e gratuita, na juventude e
vida adulta. (MARCILIO,1997 apud SIQUEIRA; DELL’AGLIO, 2006).
Com a regulamentação do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA através
da lei 8.990 de 1990 as crianças e adolescentes passaram a ser vistos como
sujeitos de direitos e algumas garantias foram afiançadas a estes indivíduos. Em seu
Título II o ECA apresenta as medidas de proteção aplicadas em casos em que há
violação ou ameaça dos direitos das crianças e adolescentes, dentre elas o
acolhimento institucional. A existência de violência física, psicológica, sexual, a
negligência, o abandono e outros eventos na dinâmica familiar podem levar ao
acolhimento da criança ou adolescente, esta medida segundo a lei tem caráter
12
excepcional e provisório até que melhores condições possam ser ofertadas as
crianças e adolescentes pela própria família de origem, pela família extensa e na
impossibilidade destas por outras famílias através do processo de adoção.
A decisão pelo afastamento do convívio familiar é extremamente séria e terá
profundas implicações, tanto para a criança quanto para a família, portanto, deve ser
aplicada apenas quando representar o melhor interesse da criança ou do
adolescente e o menor prejuízo ao seu processo de desenvolvimento (PLANO
NACIONAL DE PROMOÇÃO, PROTEÇÃO E DEFESA DO DIREITO À
CONVIVÊNCIA E COMUNITÁRIA, 2006).
Em muitos casos a experiência da criança é conflituosa com relação à
institucionalização, percebendo-a como positiva por receber os recursos materiais
necessários para sua sobrevivência, mas, ao mesmo tempo, afastando-as daquilo
que consideram mais valioso, ou seja, a vida em convívio familiar para onde
desejavam voltar (ZEM-MASCARENHAS; DUPAS, 2001).
Diante do exposto, é de se esperar que as crianças institucionalizadas
apresentem um maior comprometimento emocional do que as crianças que vivem no
contexto familiar. Para verificar esta hipótese, o presente estudo teve como objetivo
principal realizar uma análise da produção científica reunindo estudos que traziam
como tema a depressão em crianças em medida de proteção de acolhimento
institucional.
13
2 OBJETIVOS
O presente trabalho teve como objetivo principal realizar uma análise da
produção científica reunindo estudos que traziam como tema a depressão em
crianças institucionalizadas e verificar dentro deste tema os fatores que estão
relacionados à sintomatologia depressiva e ainda se estas crianças apresentam
maiores índices de depressão comparadas as que vivem no grupo familiar.
14
3 METODOLOGIA
O presente estudo foi realizado a partir de uma revisão bibliográfica nas bases
Lilacs, e busca ampla no Google Acadêmico. Foram utilizados como descritores
“Crianças and Depressão and Acolhimento and Abrigo and Institucionalização”; os
filtros utilizados foram “textos completos”, em “português”, “crianças”, não houve
delimitação do ano da pesquisa.
Foram excluídos artigos que abordassem outras faixas etárias, e outros tipos de
transtornos mentais em crianças. A seleção foi feita a partir da leitura dos títulos,
depois dos resumos e só então da leitura dos textos completos.
15
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Através de busca realizada na base de dados consultada, foram
encontrados 143 artigos (artigos de pesquisa, artigos teóricos e/ou de
revisão, resenhas/comentários e teses/dissertações). Após, este
primeiro filtro, passou-se a excluir os artigos pela leitura dos títulos e
alguns pelos resumos que não tivessem foco no assunto que se
pretendia abordar. Sendo assim, utilizou-se para esta pesquisa 3 artigos
que serão apresentados a seguir:
Tabela 1: Resumo do Artigo “Depressão e desempenho escolar
em crianças e adolescentes institucionalizados”.
Autor/Ano Dell’Aglio e Hutz, 2004
Título
Depressão e desempenho escolar em crianças e
adolescentes institucionalizados
Método
Participaram do estudo 215 crianças e
adolescentes de ambos os sexos, sendo estas
105 crianças institucionalizadas e 110 que viviam
com suas famílias. Utilizou-se como instrumento
para avaliar o desempenho escolar a Escala de
Avaliação e para verificar os sintomas
depressivos a Children’s Depression Inventory (CDI).
Resultados Quanto ao desempenho escolar, foi encontrada
diferença entre o grupo institucionalizado e o grupo que
mora com a família apenas entre as crianças, sendo
que o grupo institucionalizado apresentou médias mais
baixas. Do total da amostra 6% apresentaram escores
significativos para a depressão, também foi observada
diferença nos escores do CDI, entre o grupo
institucionalizado e o grupo que mora com a família.
apontando uma maior depressão entre as crianças e
adolescentes institucionalizados.
Conclusão Os autores concluíram que há uma maior depressão
entre as crianças e adolescentes institucionalizados e
que estas também tem um desempenho inferior
16
àquelas.
Na Tabela 1 é apresentado o resumo do artigo de Dell’Aglio
e Hutz (2004) que concluíram que há maior depressão entre
crianças e adolescentes que vivem em instituições de
acolhimento. Em concordância com estes autores Custódio et al.
(2010) concluíram em sua pesquisa que as crianças institucionalizadas
podem apresentar maior agressividade, sentimento de hostilidade e de
inadequação, falta de contato social, ansiedade, timidez, tristeza,
impulsividade e instabilidade emocional e confirmaram a hipótese inicial
de que crianças institucionalizadas apresentam mais problemas
emocionais do que as crianças não institucionalizadas.
Conforme Runyon et al. (2002, apud SCHWAN; RAMIRES, 2011)
crianças que tenham experimentado a falta de apoio familiar ou o
rompimento dos vínculos afetivos demonstram maiores chances de
desenvolver o distúrbio depressivo.
Em relação ao primeiro ano de vida Spitz (2004) coloca que a
privação de relações objetais é um fator muito prejudicial para crianças
que a vivenciam, levando a sérios distúrbios emocionais, quando isso
ocorre, as crianças apresentam um quadro clínico espantoso, parecendo
ter sido privadas de algum elemento vital a sobrevivência. Na mesma
linha Bowlby (2006) afirma que a privação prolongada dos cuidados
maternos pode ter efeitos graves e de longo alcance sobre a
personalidade de uma criança pequena e, consequentemente, sobre
toda sua vida futura. O mesmo autor diz ainda que qualquer que seja a
situação da criança dentro de sua família, sua separação desta pode
desencadear uma série de acontecimentos que afetarão em maior ou
em menor grau toda sua vida futura.
Milavic (apud, BONETTI et al., 2011) afirma que os sintomas
depressivos que configuram um quadro clínico, no desenrolar dos
primeiros anos de vida, estão amplamente ligados com os transtornos
do vínculo mãe/filho, o abandono infantil, a privação materna e a
psicopatologia dos pais.
17
Tabela 2: Resumo do Artigo “Sintomas depressivos e eventos
estressores em crianças e adolescentes no contexto de
institucionalização”.
Autor/Ano Wathier e Dell’Aglio, 2007
Título Sintomas depressivos e eventos estressores em crianças e
adolescentes no contexto de institucionalização.
Metodologia Participaram 257 jovens de 7 a 16 anos, de ambos os
sexos, sendo que 130 residiam em acolhimentos e 127
moravam com suas famílias na região metropolitana de
Porto Alegre e todos freqüentavam da 1ª à 8ª série do
ensino fundamental de escolas públicas. Para verificar
sintomas depressivos foi utilizado o Children’s Depression
Inventory e para mensurar eventos estressores o Inventário
de Eventos Estressores na Infância e Adolescência.
Resultados Meninas institucionalizadas tiveram escores mais altos do
que as que moram com a família Em relação à frequência
de eventos, foi encontrada diferença significativa entre as
médias dos grupos, sendo que os jovens institucionalizados
apresentaram um número maior de eventos do que os que
moravam com a família.
Conclusões O estudo demonstrou a associação entre a ocorrência de
eventos estressores e a manifestação de sintomas
depressivos entre crianças e adolescentes. Além disso,
evidenciou quantitativamente que as crianças que estão
afastadas de suas famílias biológicas, por medidas de
proteção, apresentaram maiores escores de sintomas
depressivos.
A tabela 2 traz o resumo do artigo de Wathier e Dell'Aglio (2007) no
qual os autores investigaram a prevalência de depressão em crianças e
adolescentes institucionalizados e concluíram que essa população reúne
diversas características que corroboram a presença desse problema,
uma vez que sofreram rompimentos de vínculos por terem sido
negligenciadas ou vitimadas por violência física e psicológica. Assim,
18
segundo as autoras, os índices de depressão em crianças em
instituições de abrigo são significativos, e em meninas esse número é
ainda maior.
O processo de institucionalização surge na vida das crianças e
adolescentes como consequência de eventos estressores, que
geralmente envolvem abandono, negligência e abusos. Possivelmente
esses fatores sejam as causas principais de um elevado índice de
depressão em crianças e adolescentes observadas em situação de
acolhimento institucional em alguns estudos (DELL’AGLIO, 2000).
Em suas pesquisas Bowlby (2006) identificou três tipos de grupos de
crianças que por viverem longe de suas famílias de origem necessitam
de assistência psiquiátrica entre estas estão aquelas cujos distúrbios
resultaram de experiências desagradáveis em seus próprios lares, que
foram causa da sua necessidade do acolhimento institucional, como por
exemplo, a negligência de sua família.
Para Barnett (1997, apud MAIA; WILLIANS, 2005) nenhum outro
fator de risco tem uma associação mais forte com a psicopatologia do
desenvolvimento do que uma criança maltratada, ou seja, o abuso e a
negligência causam efeitos profundamente negativos no curso de vida
da criança. Segundo este autor, as sequelas do abuso e da negligência
abrangem grande variedade de domínios do desenvolvimento, incluindo
as áreas da cognição, linguagem, desempenho acadêmico e
desenvolvimento sócio emocional.
Sternberg et al. (2006, apud WATHIER; DELL'AGLIO, 2007)
confirmaram, em um estudo longitudinal, que crianças que sofreram
algum tipo de violência intrafamiliar apresentaram mais problemas de
comportamento ou sintomas depressivos na adolescência do que as que
não foram vítimas.
Tabela 3: Resumo do Artigo “Um Estudo Exploratório da Incidência de
Sintomas Depressivos em Crianças e Adolescentes em Acolhimento
Institucional”
Autor/Ano Álvares e Lobato, 2013.
Título Um Estudo Exploratório da Incidência de Sintomas
19
Depressivos em Crianças e Adolescentes em Acolhimento
Institucional
Metologia Participaram da pesquisa 23 crianças e adolescentes em
medida de acolhimento com idade entre 7 e 16 anos, de
ambos os sexos. Para coleta dos dados foi utilizado um
questionário de autoria das autoras e a Children’s
Depression Inventory.
Resultados Os resultados apontaram que 35% da amostra obtiveram
percentil acima de 85, que sob o ponto de vista
epidemiológico, devem ser considerados como clinicamente
significativos, havendo, portanto incidência de sintomas
depressivos.
Conclusão Os resultados da pesquisa sugeriram o seguinte perfil de
criança/ adolescente com sintomas depressivos: ter um
tempo de acolhimento superior a 2 anos, ter histórico de
acolhimento, não ter padrinhos, não possuir irmãos na
instituição e ser acolhida depois dos 7 anos de idade.
A Tabela 3 apresenta o resumo da pesquisa realizada por Álvares e
Lobato (2013), nesta os autores observaram correlação entre tempo e
histórico de acolhimento anterior e a presença de sintomas depressivos.
Da amostra pesquisada pelos autores 52% estavam de 1 a 5 anos
acolhidas, 9% estavam de 6 a 10 anos acolhidas e 4% estavam há mais
de 11 anos na instituição de acolhimento. Corroborando com estes
dados Abaid et al. (2009) verificaram na amostra pesquisada que
médias altas de tempo de institucionalização e o número elevado de
irmãos podem ser compreendidos como fatores de risco para
depressão.
Segundo o ECA o acolhimento institucional é medida provisória e
excepcional e que a permanência da criança e do adolescente em
programa de acolhimento não se prolongará por mais de 2 (dois) anos,
salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse,
devidamente fundamentada pela autoridade judiciária. Siqueira e
20
Dell’Aglio (2006) ressaltam a importância da criação de mecanismos
sociais que promovam a brevidade dessa medida de proteção, a partir
de ações conjuntas entre as instituições e as famílias, para que um
planejamento seja traçado com vistas ao retorno familiar, de forma que
os efeitos de um período prolongado numa instituição sejam diminuídos. Ainda de acordo com os autores (p. 71) “os efeitos de um período de
institucionalização prolongado têm sido apontados na literatura, por
interferirem na sociabilidade e na manutenção de vínculos afetivos na
vida adulta”.
Para Carvalho (2002, apud SIQUEIRA; DELL’AGLIO, 2006), o
ambiente institucional não se constitui no melhor ambiente de
desenvolvimento, pois o atendimento padronizado, o alto índice de
criança por cuidador, a falta de atividades planejadas e a fragilidade das
redes de apoio social e afetivo são alguns dos aspectos relacionados
aos prejuízos que a vivência institucional pode operar no indivíduo.
Ainda em relação as instituições de acolhimento Siqueira e Dell’Aglio
(2006) ressaltam que a relação estabelecida com os monitores
desempenha papel central na vida das crianças e dos adolescentes
abrigados, à medida que serão estes adultos que assumirão o papel de
orientá-los e protegê-los, constituindo, neste momento, os seus modelos
identificatórios.
21
5 CONCLUSÕES
A institucionalização durante a infância e adolescência tem sido
apontada como um evento de vida estressante e, portanto, como fator
de risco para o desenvolvimento que pode ter como efeito a depressão.
O presente trabalho teve como objetivo principal realizar uma análise
da produção científica relacionada ao tema depressão em crianças em
medida protetiva de acolhimento institucional. Na pesquisa realizada na
base de dados observou-se uma quantidade escassa de literatura
abordando a temática sendo encontrados apenas três artigos com os
descritores pesquisados. Destes, um aborda a depressão e o
desempenho escolar em crianças e adolescentes
institucionalizados, o segundo apresenta sintomas depressivos e
eventos estressores em crianças e adolescentes no contexto de
institucionalização e por fim o terceiro artigo traz um estudo exploratório
da incidência de sintomas depressivos em crianças e adolescentes em
acolhimento institucional.
Quanto aos fatores relacionados à depressão em crianças acolhidas
estão questões como as condições que antecedem o acolhimento tais
como situações de negligência, abandono e violências (física,
psicológica e sexual) e também a ruptura com o vínculo familiar.
Nos artigos encontrados foi possível constatar que a depressão tem
grande incidência em crianças acolhidas e comparando estas com
crianças que vivem no grupo familiar há maior porcentagem de sintomas
depressivos na primeira variável.
Pontua-se a necessidade de atenção pela rede de atendimento
destas crianças, inclusive por profissionais da saúde, para o diagnóstico
22
precoce e o tratamento adequado, considerando que em cumprimento
de medida de proteção estas crianças encontram-se, em muitos casos,
desprotegidas e invisíveis diante das burocracias de um acolhimento.
Finalizando aponta-se que o presente estudo apresenta limitações
considerando o pequeno número de artigos revisados e a necessidade
de mais pesquisas nesta área considerando a escassez de publicações
encontradas sobre o tema e a relevância da temática para a sociedade.
REFERÊNCIAS
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ÁLVARES, A. M; LOBATO, G. R. Um Estudo Exploratório da Incidência de Sintomas Depressivos em Crianças e Adolescentes em Acolhimento Institucional. Temas em Psicologia, 21 (1), 151 – 164. 2013.
BAHLS. S. Aspectos Clínicos da Depressão em Crianças e Adolescentes. Jornal de Pediatria, 78 (5). 2002.
BOLWBY, J. Cuidados Maternos e Saúde Mental. São Paulo: Martins Fontes. 2006.
BONETTI, R. A. ET AL. A depressão infantil e suas formas de manifestação. Psicologia Argumentos, 64 (29),11-22. 2011.
BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente: Lei federal nº 8069. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial. 2002.
Brasil. Levantamento Nacional das Crianças e Adolescentes em Serviços de Acolhimento. Brasília: MDS. 2011.
Brasil. Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária. Brasília: Conanda, 2006.
CORDIOLI, A. V. et al. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM – V. Porto Alegre: Artmed. 2014.
CUSTÓDIO, E. M. et al. Características emocionais e traços de personalidade em crianças institucionalizadas e não institucionalizadas. Boletim de Psicologia,133, 139-152. 2010.
23
DELL’AGLIO, D. D. O processo de coping, institucionalização e eventos de vida em crianças e adolescentes. 2000. (Tese de doutorado - Programa de Pós-Graduação em Psicologia) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2000.
DELL’AGLIO, D.D; HUTZ, C.S. Depressão e desempenho escolar em crianças e adolescentes institucionalizados. Psicologia: Reflexão e Crítica, 17 (3), 341-350. 2004.
DEL PORTO, J. A. Conceito e diagnóstico. Revista Brasileira de Psiquiatria, 21 (Supl. 1) 06-11. 1999.
LIMA, D. Depressão e doença bipolar na infância e adolescência. Jornal de Pediatria, 80(2), 11-20. 2004.
MAIA, J. M. D; WILLIANS, L. C. A. Fatores de risco e fatores de proteção ao desenvolvimento infantil: uma revisão da área. Temas em Psicologia, 13 (2), 91-103. 2005. SCHWAN, S; RAMIRES, V.R.R. Depressão em crianças: Uma breve revisão de literatura. Psicologia Argumentos, 29 (67) 457-468. 2011.
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