Direito a prestações materiais e a efetividade da tutela jurisdicional

51
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ FACULDADE DE DIREITO CURSO DE DOUTORADO DIREITO A PRESTAÇÕES MATERIAIS E A EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. Curso: Doutorado em Direito Constitucional Professor: LUIZ GUILHERME MARINONI Doutorando: JOÃO PEDRO GEBRAN NETO Janeiro de 2004

Transcript of Direito a prestações materiais e a efetividade da tutela jurisdicional

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE DOUTORADO

DIREITO A PRESTAÇÕES MATERIAIS

E A EFETIVIDADE

DA TUTELA JURISDICIONAL.

Curso: Doutorado em Direito Constitucional

Professor: LUIZ GUILHERME MARINONI

Doutorando: JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

Janeiro de 2004

1.- Estrutura sistêmica dos direitos fundamentais.

Direitos fundamentais, na sistematização proposta por

Robert Alexy1 podem ser compreendidos como direitos a algo, liberdades e

competências.

As liberdades são opções de conduta que podem ser

adotadas pelos indivíduos, não estando obrigado tampouco proibido a qualquer uma

das opções. As liberdades não asseguradas por meio de normas são ditas

liberdades não protegidas, ao passo que aquelas que se encontram normatizadas

são ditas liberdades protegidas. Embora possa ser suscitada dúvida acerca desta

categoria de normas, ante o conceito geral de liberdade que permite condutas

sempre que não haja leis que lhes proíbam ou determinem, a importância da

existência desta categoria jurídica do direito fundamental está na preservação

constitucional da liberdade, vedando a restrição da liberdade pelo legislador

ordinário. Diz-se que há liberdade fundamental quando o exercício desta opção

estiver protegido por norma constitucional, equivale dizer, dentro do texto

constitucional há previsão expressa que permite ao indivíduo adotar um ou outro

comportamento. Trata-se de liberdade protegida pelo próprio texto fundamental.

Exemplo disto é a liberdade associativa, prevista no art.

5o, XVII, da Carta Magna, interpretado em conjunto com a vedação constitucional de

obrigatoriedade de associação, do inciso XX, do mesmo preceito da Lei Maior.

A competência é a capacidade de o indivíduo, por meio de

uma ação, vir a modificar a posição jurídica de algo ou de alguém em relação àquela

em seu estado natural, pode se dar tanto no direito público como no privado, como o 1 - ALEXY, Robert., Teoria de los derechos fundamentales, p. 186.

casamento, testamento, ou ingresso no serviço público. O indivíduo, ao realizar um

dos dois atos, modifica sua posição jurídica e/ou a de terceiros. Tais modificações de

posições jurídicas podem ser feitas com amparo no art. 5o, XXII e XXX (direito de

propriedade e herança); art. 226 (relativo ao casamento) e art. 37, II, todos da

Constituição Federal.

Para caracterizar uma ação como exercício de

competência é preciso que se constitua uma ação institucional, ou seja, aquela que

pode ser realizada não só sobre a base de capacidades naturais, mas

principalmente sobre uma base de instituições jurídicas. Estas normas constitutivas

da base jurídica são chamadas de normas de competência. As normas de

competência criam a possibilidade de atos jurídicos e, com ele, a capacidade de

modificar posições jurídicas2. O descumprimento de uma norma de competência não

conduz a ilicitude, mas à nulidade do ato ou a sua deficiência, como, p.e., são

descumpridos regras e ritos relativos ao casamento. O mesmo ocorre em relação ao

testamento ou ao acesso ao cargo público.

As competências dos cidadãos que gozam de proteção

jusfundamental têm por núcleo central uma proibição dirigida ao legislador de não

eliminar ou modificar fundamentalmente determinadas instituições jurídicas de direito

privado. A garantia institucional é, pois, em primeira linha, uma proibição dirigida ao

legislador de não eliminar determinadas competências do cidadão.

De modo conciso é possível dizer que os direitos a algo

compreendem ações positivas e negativas por parte do Estado para a concretização

e respeito dos direitos fundamentais. Enquanto os direitos negativos dizem respeito

2- ALEXY, R., p. 232.

ao não impedimento, por parte do Estado, de ações dos particulares, não afetação

de propriedades e situações jurídicas e não eliminação de posições jurídicas, os

direitos positivos dividem-se em ações positivas fáticas e ações positivas

normativas. As ações positivas fáticas dizem respeito aos direitos prestacionais,

relativos às ações que o Estado deve adotar para atender o preceito fundamental.

As ações positivas normativas obrigam ao Estado a regular, por meio legislativo,

determinada garantia fundamental.

Os direitos prestacionais, que nos interessam mais de

perto neste trabalho, podem ser de três ordens: direitos de proteção; direitos a

organização e procedimento e prestações em sentido estrito3, como adiante será

abordado.

Os direitos prestacionais contemplam tanto as prestações

materiais propriamente ditas (aquelas em que há outorga de prestações materiais

fáticas por parte do Estado) quanto os direitos sociais. Estes consistem num leque

mais amplo de direitos porque compreendem não apenas as prestações fáticas, mas

também as prestações normativas e os direitos à organização e ao procedimento.

Por fim, as prestações destinadas a evitar a violação dos

direitos fundamentais estão ligadas aos direitos fundamentais prestacionais por se

tratarem de direito ao procedimento. Como salientado acima, embora pudesse ser

tratado como direito de proteção (dos direitos fundamentais) contra a intervenção de

terceiros, sua caracterização como direitos prestacional as torna com eficácia muito

mais ampla: primeiro porque o aspecto procedimento se sobressai ao aspecto

protecionista; segundo porque não busca apenas a proteção do direito fundamental

contra a intervenção de terceiros, mas, também, e talvez principalmente, a outorga 3- ALEXY, R., p. 427.

concreta e o desenvolvimento de alguns destes direitos fundamentais pelo legislador

ou pelo próprio juiz. Entram em jogo as ações de inconstitucionalidade por omissão,

que visa constituir em mora o legislador, para que este edite o comando normativo

faltante e as ações inibitórias contra ataques que os bens constitucionalmente

protegidos possam sofrer. Além desses, o direito a evitar a violação de direitos

fundamentais também podem ter por conteúdo a imposição do dever estatal de

outorgar direitos fundamentais aos cidadãos sempre que estiverem presentes os

pressupostos decorrentes do juízo de ponderação, de necessidade

(hipossuficiência) do indivíduo e defesa do mínimo vital.

A eficácia dos direitos fundamentais prestacionais e sua

justiciabilidade talvez seja o maior problema a ser resolvido pelos operadores do

direito. Isto porque as Cartas Constitucionais (especialmente a nossa) consagram

diversos direitos a serem outorgados pelo Estado aos indivíduos. Muitos deles sem

qualquer política pública para sua efetiva implementação, outros com implementação

precária e, por fim, alguns que já vem sendo prestados razoavelmente.

A chave do problema reside em indicar caminhos que

consigam harmonizar o princípio da separação dos poderes, a omissão dos poderes

legislativo e executivo com a efetiva entrega dos direitos fundamentais prestacionais.

Ainda, além de realizar esta concretização atendendo o princípio da separação dos

poderes, deve-se atentar para a liberdade política (e sua opções fáticas) quanto à

elaboração do orçamento. Também deve ser considerado o argumento da reserva

do possível porque, em sendo os recursos públicos finitos e escassos, a escolha de

políticas públicas em favor de determinados fins implicará necessariamente na

subtração de recursos para outros fins.

Estas considerações permitem chegar pelo menos a um

apontamento seguro. Dizer que os todos os direitos fundamentais previstos na

Constituição Federal, por força da irradiação do parágrafo primeiro, do artigo quinto,

têm aplicação imediata não significa dizer muito. Isto porque esta aplicação imediata

normativa não superará os problemas acima apontados nem do ponto de vista da

colisão de direitos constitucionais, nem do ponto de vista da realidade fática.

Por isso, razoável supor que a regra do art. 5o, § 1º, da

Constituição Federal, tem conteúdo diverso daquele que a maioria da doutrina

nacional procura lhe atribui4.

Esta conclusão implica em enfrentar a questão acerca da

acerca da justiciabilidade dos direitos fundamentais não-catalogados no rol do art.

5o, da Carta Magna, o que inclui os direitos prestacionais.

Importa reconhecer, desde logo, que todo direito

fundamental comporta tanto uma dimensão objetiva, quanto uma subjetiva,

compreendida aquela como tarefa e dever estatal de proteção dos próprios direitos

humanos; enquanto que a dimensão subjetiva implica no reconhecimento da

justiciabilidade do direito fundamental.

Um caminho inicial acerca da justiciabilidade dos direitos

fundamentais prestacionais pode ser trilhado a partir das posições de Claus-Wilhelm

Canaris5, Robert Alexy6 e J. J. Gomes Canotilho7, quanto ao regime jurídico e os

pressupostos para a aplicação mediata dos direitos fundamentais.

4 - Sobre o tema, ver Gebran Neto, João Pedro. “Aplicação imediata dos direitos e garantias individuais – a busca de uma exegese emancipatória”. RT, São Paulo, 2002. 5 - CANARIS, Claus-Wilhelm. Direitos fundamentais e direito privado. 6 - ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales.

2.- Canaris e o desenvolvimento dos direitos fundam entais de eficácia mediata.

Os direitos fundamentais comportam uma dimensão

subjetiva e outra objetiva. A primeira gera imediatamente um direito concreto e

subjetivo para o indivíduo, ao passo que a segunda gera apenas um dever estatal de

atendimento ao comando constitucional sem que isto, imediata e diretamente, gere

direito para todos os indivíduos. A distinção pode ser percebida quando se visualiza

o direito de proteção à saúde, que gera o direito material à prestação da saúde sem

que haja o correspondente direito material de atendimento a toda e qualquer

proteção estatal. De outro lado, o direito fundamental à liberdade de expressão

comporta não apenas o direito material à ação, mas também um direito subjetivo de

exercício imediato deste direito. Equivale dizer, a dimensão objetiva pode estar a

depender de uma intervenção estatal para sua efetiva entrega a todos os indivíduos.

Partindo da dimensão objetiva dos direitos fundamentais,

sustenta Canaris que o dever estatal está compreendido pelos princípios da

proibição de intervenção, proibição de excesso, proibição de insuficiência e do

imperativo da tutela.

Neste ponto cabe abrir um parêntesis para indicar que a

proposição de Canaris tem por objeto as disposições constitucionais alemã e a

conhecida discussão doutrinária sobre a eficácia horizontal dos direitos

fundamentais naquele país.

7 - CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição.

Diz Canaris que, para que se possa invocar o imperativo

de tutela, na defesa de um direito fundamental, preliminarmente deve haver o efetivo

direito fundamental material invocado pelo indivíduo. Assim, somente aquele que

efetivamente tenha sido ofendido em sua honra poderá invocar o imperativo de

tutela para buscar o direito de resposta. O mesmo se dá em relação aos direitos

prestacionais, como, por exemplo, direito à educação, direito à saúde, dentre outros.

Se não há violação do direito fundamental material invocado, não há que se cogitar

do imperativo de tutela; também, se o valor ou direito contraposto é superior ou

investe o outro indivíduo em posição jurídica mais forte, igualmente resta afastado

este princípio.

O objetivo principal da função de imperativo de tutela é o

de proteger os bens jurídico-fundamentais e assegurar sua efetiva capacidade

funcional.

Sustenta Canaris8 que há ofensa à proibição de

insuficiência quando a legislação infraconstitucional e a atividade administrativa não

atendem satisfatoriamente o direito constitucionalmente posto. Equivale dizer, há

omissão, total ou parcial, dos poderes legislativo ou executivo, quanto ao

desenvolvimento e outorga do direito material constitucionalmente assegurado.

A proibição de insuficiência conjugada com o imperativo

de tutela, segundo o raciocínio exposto pelo referido autor alemão, gera efeito

subjetivo em favor do indivíduo, por força da ilicitude da conduta ou mera ameaça de

outrem.

8 - CANARIS, op. cit., p. 107.

O pensamento desenvolvido por Canaris tem por pano de

fundo a discussão da doutrina alemã sobre a eficácia horizontal dos direitos

fundamentais, em face da problemática posição da maioria dos autores em negar a

vinculação imediata dos direitos fundamentais nas relações privadas. Porém,

transportadas para a realidade brasileira, as idéias por ele lançadas podem servir de

ponto de partida para a efetivação dos direitos fundamentais que não gozam de

aplicação imediata, consoante da distinção traçada a partir do art. 5o, § 1º, da

Constituição Federal.

Assim, a ausência de aplicação imediata dos direitos

fundamentais na relação horizontal de Canaris (aplicação mediata), ensejou a

criação de regime jurídico próprio que se identifica com o regime dos direitos sociais

da doutrina constitucional brasileira. Estes, embora gozem dos atributos de força

normativa e máxima efetividade das normas constitucionais, nem sempre possuem

densidade normativa ou concretização ao nível de legislação infraconstitucional que

permita sua imediata justiciabilidade.

A perspectiva de Canaris pode ser transportada para

justificar uma intervenção judicial por ocasião da colmatação de lacunas legislativas

e de políticas públicas em relação a direitos fundamentais que não gozam de

aplicação imediata. A inserção do indivíduo em posição subjetiva não decorre

apenas do direito fundamental que se possa invocar, mas também do próprio dever

de tutela dos direitos fundamentais reconhecidos objetivamente na Carta

Constitucional. A chamada “reserva de consistência”, referida por Sérgio Moro9, a

justificar a adoção judicial de políticas públicas, estará preenchida se houver

fundamentação razoável sobre o peso da intervenção e intensidade da ameaça

9 - MORO, Sérgio. Desenvolvimento e efetivação judicial das normas constitucionais. p. 109.

ao bem constitucionalmente tutelado , principalmente se referido bem se achar no

topo da hierarquização proposta por Canaris.

Tomando por exemplo o direito à vida e à saúde,

considerados sob a perspectiva do princípio da dignidade da pessoa humana e do

mínimo existencial (mínimo vital), pode-se, frente ao caso concreto e nos limites da

pretensão deduzida, justificar a determinação (intervenção) judicial acerca de

políticas (gerais ou individuais) públicas para atender direito fundamental. É o caso,

por exemplo, de determinar o fornecimento de medicamento ou intervenção

cirúrgica, custeados pelo SUS, para socorrer a vida de uma pessoa.

Um problema que deve ser considerado, quando ao direito

de outorga de prestações materiais diz respeito à medida daquilo que pode ser

exigido do Estado, pois os direitos não comportam exageros e absurdos.

O bem da vida pretendido deve ser aquele que qualquer

pessoa com razoáveis condições econômicas obteria com seus próprios recursos. A

outorga indiscriminada de bens pode criar uma subversão de prioridades públicas e

inviabilizar diversas outras políticas públicas – cuja eleição recai prioritariamente sob

os órgãos e pessoas politicamente investidas para tais funções.

Assim, para a imposição de obrigação estatal de cumprir

com o dever de tutela e superar a proibição de insuficiência, o Poder Judiciário pode,

agindo com prudência e sabedoria, atendendo a reserva de consistência, determinar

a prestação material, como, por exemplo, a realização de intervenção cirúrgica.

Entretanto, se a pretensão visa um tratamento no exterior,

para um único indivíduo, com elevados custos, então deve ser tomado em

consideração o fato de estes recursos deixarão de ser destinados para muitas outras

pessoas e/ou para políticas públicas igualmente prioritárias.

Alem disso, os limites do dever de tutela, segundo uma

aplicação dentro do quadro das possibilidades estatais e da realidade da média dos

indivíduos de determinado país, em determinada época, pode ensejar à conclusão

de que esse tratamento (no exterior) não está ordinariamente acessível a grande

maioria dos indivíduos, sequer à parte mais abastada da classe média.

A estes critérios agrega Canaris o peso da intervenção e

a intensidade da ameaça. Assim, o dever de proteção será tanto mais relevante

quanto mais grave for a intervenção que se ameaça e quanto maior for o perigo.

Relevante, neste particular, verificar a possibilidade de autoproteção do titular do

direito fundamental atingido, porque a justificação constitucional para uma atuação

protetora por parte da ordem jurídica deve ser relativizada quando cada um pode

ajudar a si mesmo10.

Com base nesses pressupostos, forma Canaris sua

conclusão final: “quanto maior o nível do direito fundamental afetado, quanto mais

severa a intervenção que se ameaça, quanto mais intenso o perigo, quanto menores

as possibilidades do seu titular para uma eficiente auto-proteção, e quanto menor o

peso dos direitos fundamentais e interesses contra-postos, tanto mais será de

reconhecer um dever jurídico-constitucional de proteção”11.

Com estas considerações reconhece Canaris a existência

de um direito de proteção. Cumpre descobrir como se dá esta proteção.

10- CANARIS, p. 114. 11 - CANARIS, idem.

Sustenta que há ampla liberdade de conformação do

legislador, a qual está adstrita pelos limites da proibição de excesso e proibição de

insuficiência na concretização de um dever de proteção.

Se a proibição de excesso está ligada ao desenvolvimento

do direito fundamental, a proibição de insuficiência passa pela verificação “se a

proteção satisfaz as exigências mínimas na sua eficiência e se bens jurídicos e

interesses contrapostos não esta sobre-avaliados”. Esta perspectiva não diz

respeito exclusivamente ao controle da omissão legislativa, mas também

corresponde aos problemas no quadro da aplicação e do desenvolvimento judiciais

do direito, pois o imperativo de tutela diz respeito não apenas ao legislador, mas

também à jurisprudência, porque não o fazendo se verifica um déficit de proteção e,

portanto, uma violação da proibição de insuficiência.

Sobre o dever de tutela, importa considerar que os direitos

fundamentais que contém reserva de lei não contém, por si só, uma mais fraca

função como imperativo de tutela do que os direitos sem reserva de intervenção

legislativa, pois a existência desta reserva não autoriza uma conclusão forçosa sobre

a posição hierárquica dos direitos fundamentais. As reservas e a proibição de

excesso apenas se tornam relevantes se o legislador (ou, em seu lugar, o juiz que

desenvolve e concretiza a lei) outorgar a uma parte mais proteção do que a exigida

pelos direitos fundamentais.

3.- Robert Alexy e a justiciabilidade dos direitos prestacionais.

Procurando formular uma teoria estrutural para os direitos

fundamentais, a partir da jurisprudência constitucional alemã, Robert Alexy trata dos

direitos fundamentais prestacionais asseverando que a Lei Fundamental de Bonn

estabelece expressamente, como direito subjetivo dos indivíduos, apenas o direito

de proteção à maternidade e o dever de assistência comunitária (art. 6o, par. 4o, da

LF). Outros direitos fundamentais prestacionais, na Alemanha, devem ser adscritos

de outras normas constitucionais, o que torna, nesse país, o problema muito mais

grave que frente ao Direito Constitucional brasileiro. Nossa Constituição, assim como

a de muitos outros países (como Portugal, Espanha, Índia, entre outros) trazem

diretamente normas que conferem direitos subjetivos prestacionais.

O problema dos direitos fundamentais prestacionais, na

concepção de ALEXY12 funda-se na questão do se e como se pode impor a

persecução de fins do Estado através dos direitos subjetivos fundamentais.

Divide Alexy os direitos prestacionais em direito em sentido

estrito e direito em sentido amplo. Os primeiros têm por objeto as prestações fáticas;

ao passo que a segunda categoria compreende, além das prestações em sentido

estrito, também dos direitos à proteção e o direito às organizações e procedimentos.

Somente haverá direito à prestação fática se este direito puder

ser considerado como ensejador de direito subjetivo e estiver adscrito a uma norma

constitucional. Aqueles direitos constitucionais (adscritos na Constituição alemã e

expressos na Constituição brasileira - embora aqui também seja possível a

adscrição de novos direitos fundamentais), que não puderem ser classificados como

direito subjetivo, podem ser compreendidos como direito objetivo.

12 - ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. p. 430.

Enquanto direitos subjetivos, todos os direitos à prestação são

relações trivalentes entre um titular de direito fundamental, o Estado e uma ação

positiva por parte deste. Se o titular de um direito fundamental tem frente ao Estado

um direito a que seja realizada uma ação positiva, então o Estado tem frente ao

indivíduo o dever de prestar a ação referida. Cada vez que uma relação deste tipo

está caracterizada, então o titular do direito tem competência para exigir do Estado a

prestação. Esta fórmula de compreensão dos direitos fundamentais prestacionais

indica, apenas, a existência de um direito fundamental prima facie o qual deve ser

ponderado com os direitos que lhe são opostos para configurar uma razão definitiva.

Alexy traz como idéia retora dos direitos fundamentais

prestacionais o ponto de vista de que estes possuem tão elevada importância no

direito constitucional que sua outorga, ou não, não pode restar livremente à

disposição do legislador13.

Cumpre analisar, na posição do referido autor alemão, os

direitos prestacionais nas suas três perspectivas: direito de proteção; organização e

procedimento e direito à prestação fática.

a) competências de direito privado – relativas ao dever estatal de estruturar

juridicamente as relações privadas, mediante o estabelecimento de regramento

próprio para diferentes institutos como propriedade, casamento, testamento, modo

de aquisição da propriedade, contrato, etc;

b) procedimentos judiciais e administrativos – visam à proteção de posições jurídicas

existentes frente ao Estado e frente a terceiros. Embora fosse possível configurar

este direito dentro do marco dos direitos à proteção, sua inserção como direito à

organização e ao procedimento é preferível porque o aspecto procedimental neles é,

13 - ALEXY, R., p. 435.

do ponto de vista da teoria dos direitos fundamentais, mais interessantes que o da

proteção.

c) organização em sentido estrito – relativo à instituição de regras próprias para

regular os diferentes tipos de organização constitucionalmente previstos, que

regulam a cooperação de numerosas pessoas orientadas para um fim, como as

sociedades e cooperativas (art. 5o, XVIII, Constituição Federal), sindicatos (art. 8o,

Constituição Federal), partidos políticos (art. 17 da Carta Política).

d) formação da vontade estatal – este último direito prestacional à organização e ao

procedimento diz respeito ao direito de participação popular na vontade estatal,

mediante o estabelecimento de diversos mecanismos, seja o voto (art. 14, da Lei

Maior) ou iniciativa legislativa popular (art. 61 e § 2º, da Constituição Federal).

Quanto aos direitos prestacionais em sentido estrito, objetivam

a entrega de prestação material por parte do Estado para atender aos fins

constitucionalmente previstos, destacadamente aqueles fins que buscam erradicar

as desigualdades sociais mediante a outorga de direitos relacionados, pelo menos,

ao mínimo vital.

i- O direito de proteção deve ser compreendido como obrigação

estatal na proteção do indivíduo frente à intervenção de terceiros na esfera de seu

direito fundamental, a qual pode se dar de forma variada, por meio de normas de

direito penal, processual, ações administrativas e proteções fáticas, p.e.

A subjetivação deste direito de proteção decorre da própria

essência do Estado, por força da renúncia de parte do direito de autodeterminação

dos cidadãos para que o Estado promova a tutela. Se esta tutela fosse meramente

objetiva, então deveria o indivíduo realizar por conta própria a defesa de seus

direitos fundamentais, como a vida. Isso equivaleria à própria negação da

necessidade do Estado. Por isso, justifica-se a subjetivação do direito à proteção,

sem que se faça confusão com os direitos de defesa. Esses dizem respeito a uma

ação negativa por parte do Estado. Aqueles uma ação positiva para que veda a

intervenção de terceiros, mas a prestação adequada desse dever estatal pode se

dar por diferentes formas, as quais devem ser eleitas pelo legislador; mas se há

apenas um meio efeito para o atendimento deste direito fundamental, então este

meio é obrigatório e deve ser utilizado.

A liberdade de eleição dos meios para a proteção de determinado

direito ou bem (p.e, vida) pode, em casos especiais, reduzir-se à eleição de um

determinado meio se, de outra maneira, não pode lograr-se uma proteção efetiva

do direito ou bem (vida)14.

Mas o problema da outorga, ou não, do direito prestacional

pelo órgão legislativo ou judicial, reside na fundamentação da resposta ao problema

segundo um juízo de ponderação entre o respectivo princípio jusfundamental

material afetado e o princípio formal da competência de decisão do legislador

democraticamente legitimado15.

Tomemos como exemplo o direito à saúde. Na perspectiva de

direito constitucional à prestação positiva prestacional, este direito assegura a

intervenção estatal contra a intervenção de outrem no exercício deste direito. Não

basta aqui a omissão do Estado em malferir a saúde de seus súditos. Deve também

atuar positivamente de modo a impedir a ação de terceiros. Este dever estatal está

representado pela edição de normas penais relativas à saúde (existentes no Código

14 - ALEXY, R., p. 448. 15 - ALEXY, R., p. 454.

Penal e em diplomas extravagantes); em legislação relativa à fiscalização e

regulamentação da venda de remédios; no impedimento de atividades nocivas à

saúde (sejam elas poluentes ou danosas ao meio ambiente hígido); na atuação

administrativa de fiscalizar e impedir a ação danosa à saúde individual e coletiva,

inclusive impondo sanções.

Este direito à proteção deve ser reconhecimento como direito

subjetivo do cidadão, que pode exigir jurisdicionalmente a atuação Estatal. Se, no

campo normativo penal, em face do princípio constitucional da legalidade, não se

pode exigir que o Poder Judiciário emita o comando penal faltante, no campo da

atuação administrativa, pode o indivíduo exigir conduta estatal para reprimir conduta

lesiva de outrem.

Surge aqui, como instrumento de fundamental importância

procedimental, a regra dos arts. 461 e 461, do Código de Processo Civil, bem como

o art. 84 do Código de Defesa do Consumidor, que autorizam a imposição de multa

para que se consiga o atendimento da obrigação de fazer. Aliás, o direito

fundamental a tutela jurisdicional idônea e eficaz impõe que esta tutela não seja

meramente formal, mas também com eficácia material. Por isso, deve o Poder

Judiciário utilizar-se de todos os meios necessários para alcançar o efetivo

cumprimento da obrigação que lhe constitucionalmente imposta16.

ii- Ao tratar dos direitos fundamentais prestacionais na

perspectiva dos direitos à organização e ao procedimento, Alexy assevera que:

16 - Sobre o tema específico da prestação da tutela jurisdicional, ver excelente artigo “O direito à efetividade da tutela jurisdicional na perspectiva da teoria dos direitos fundamentais”, de autoria Luiz Guilherme Marinoni, in Revista de Direito Processual Civil n.º 28, abril-junho de 2003, ed. Gênesis, p. 298/338.

“ Os procedimentos são sistemas de regras e/ou princípios para

a obtenção de um resultado. Se o resultado é obtido respeitando as

regras e/ou princípios, então, desde o aspecto procedimental apresenta

uma característica positiva. Se não é obtido desta maneira, então é

defeituoso desde o ponto de vista procedimental e, por isto, tem uma

característica negativa. Este conceito amplo de procedimento abarca tudo

o que cai sob a fórmula ‘realização e asseguramento dos direitos

fundamentais através da organização e o procedimento’”17.

Noticia Alexy que, de acordo com a jurisprudência do TCF, a

todo direito fundamental material estão adscritos direitos procedimentais. Porém, se

os direitos materiais são direitos subjetivos, então os direitos procedimentais

também o devem ser assim considerados.

Dentro do marco de uma teoria estrutural geral, é possível a

classificação em quatro tipos de direitos de organização e procedimento:

a) competências de direito privado;

b) procedimentos judiciais e administrativos;

c) organização em sentido estrito;

d) formação da vontade estatal.

a) Competências de direito privado.

17 - Idem, p. 458.

São direitos frente ao Estado para que este formule normas

que são constitutivas para as ações jurídicas de direito privado e, com isto, para a

criação, modificação e eliminação de posições jurídicas de direito privado18,

referindo-se que estas normas tenham vigência quanto conteúdo definido. Exemplo

disto é o Código Civil e seus diversos institutos, especificamente aqueles

decorrentes da Constituição, como matrimônio, propriedade, entre outros.

A conexão entre institutos jurídicos de direito privado e a idéia

de procedimento reside no fato de que os institutos jurídicos de direito privado

consistem essencialmente em competências que, enquanto tais, não delimitam em

seu conteúdo as esferas jurídicas dos sujeitos de direito privado, sim que,

fundamentam a possibilidade de levar a fim uma tal delimitação. São procedimentos

para a criação de direitos que, em última análise, partem de um modelo básico, qual

seja, o modelo de contrato.

Mais difícil é responder a questão se existe direito subjetivo a

existência de institutos jurídicos de direito privado ou se estes estão somente

objetivamente protegidos.

O argumento decisivo para a subjetivização resulta da idéia de

procedimento. Ao garantir os direitos fundamentais institutos jurídicos de direito

privado, garantem procedimentos para a configuração autônoma-privada de

relações jurídicas em situações de igual hierarquia.

18 - Idem.

Tratando do direito de propriedade na LF, assevera que exigem

não só que goze de plena proteção jusfundamental não só das posições de direito

privado já existentes, senão também a possibilidade jurídica de adquirir posições de

direito privado.

Disto decorre que não existem: primeiro, garantias

institucionais objetivas que, através do asseguramento de um conjunto básico de

normas sirvam para o asseguramento de direitos fundamentais e; segundo, direitos

fundamentais como direitos subjetivos à vigência de normas de direito privado que

são necessárias para que seja possível aquilo que garanta o direitos fundamental.

Desta maneira, as garantias fundamentais resultam ser, do ponto de vista

dogmático, construções supérfluas.

Isto não significa que não exista uma garantia jusfundamental

dos institutos jurídicos de direito privado. O Estado está obrigado frente às pessoas

que valham as normas relativas aos institutos jurídicos. A concepção exposta agrega

subjetivização ao mero asseguramento objetivo. Este agregado é indispensável se

os direitos fundamentais são tomados à sério como direitos individuais.

b) Procedimentos judiciais e administrativos (procedimentos em sentido estrito).

Os direitos a procedimentos judiciais e administrativos são

essencialmente direitos a uma proteção jurídica efetiva. Condição de uma efetiva

proteção jurídica é que o resultado do procedimento garanta os direitos materiais do

respectivo titular de direito.

O TCF descreve a tarefa do direito processual como: O direito

processual serve para a produção de decisões conforme a lei e, desde este ponto de

vista, corretas, porém, ademais, dentro do marco desta correção, justa”19.

O fato de que no âmbito dos direitos fundamentais as normas

procedimentais não podem proporcionar tudo não significa que devam ser

subestimadas. Ali onde as normas procedimentais podem aumentar a proteção dos

direitos fundamentais, estão exigidas prima facie por princípios jusfundamentais. Se

não primam princípios opostos, existe um direito definitivo a sua vigência. Por tanto,

no que respeita a relação entre direitos fundamentais e procedimentos jurídicos, o

aspecto procedimental e o material tem que ser reunidos em um modelo dual que

garanta o primado do aspecto material20.

Os direitos a procedimentos em sentido estrito serve, em

primeiro lugar, para a proteção de posições jurídicas existentes frente ao Estado e

frente a terceiros. Por isto, é possível tratar a estes últimos também dentro do marco

dos direitos à proteção. O fato de que eles sejam tratados aqui se justifica porque o

aspecto procedimental neles é, do ponto de vista da teoria dos direitos

fundamentais, mais interessante que o da proteção.

c) Organização em sentido estrito.

19 - Idem, p. 472. 20 - Idem, p. 474.

O terceiro grupo é o da organização em sentido estrito

abrangendo diferentes tipos de organização, que regulam a cooperação de

numerosas pessoas orientadas para um fim.

A questão é saber até que ponto a organização jusfundamental

devida está exigida por normas que conferem direitos subjetivos e até que ponto por

normas que só fundamentam deveres objetivos?

Após analisar as diferentes posições e a jurisprudência do TCF,

Alexy afirma que “Tomar a sério os direitos fundamentais como direitos dos

indivíduos exclui toda argumentação com totalidade. O argumento da totalidade não

pode, pois, afetar a tese segundo a qual o indivíduo, se está jusfundamentalmente

protegido, o está por princípio não só através de normas objetivas, mas também de

direito subjetivo21.

d) formação da vontade estatal.

O quarto grupo está constituído por direitos frente ao Estado a

que este, através da legislação ordinária, facilite procedimentos que possibilitem a

participação na formação da vontade estatal. O exemplo mais claro é a competência

para votar.

Em virtude da competência para votar, quem detém esta

competência participa, ainda que não seja diretamente, na legislação. Ademais, os

direitos fundamentais fixam restrições a competência do legislador.

21 - ALEXY, p. 481.

Isto já mostra que os direitos fundamentais, ao assegurar o

procedimento democrático, expressa sua confiança na democracia, porém, existe

uma conexão interna e uma relação de tensão entre os direitos fundamentais e o

princípio da democracia.

iii- Os direitos a prestação em sentido estrito são direitos do

indivíduo frente ao Estado a algo que – se o indivíduo possuísse meios financeiros

suficientes e encontrasse no mercado uma oferta suficiente – poderia obter de

particulares.

Esses direitos à prestação em sentido estrito (direitos sociais)

podem estar expressamente estatuídos ou resultarem de adscrições interpretativas.

Do ponto de vista teórico eles podem ser divididos com três critérios: a) normas que

conferem direitos subjetivos ou normas que obrigam ao Estado objetivamente; b)

vinculantes, se sua lesão pode ser constatada pelo TCF, e não-vinculante, quando

seu enunciado for programático; c) direitos e deveres definitivos ou direitos e

deveres prima facie.

A proteção mais forte outorga normas vinculantes que

garantem direitos subjetivos definitivos e a mais fraca, direitos não-vinculantes que

fundamentam um mero dever objetivo do Estado prima facie.

A estas diferentes estruturas se agregam outras de conteúdo,

sendo especialmente importante a que se refere a um conteúdo mínimo e outro

máximo. Um programa minimalista aponta assegurar ao indivíduo o domínio de um

espaço vital e um status social mínimo (direitos mínimos); num conteúdo maximalista

se fala em realização plena dos direitos fundamentais.

A esboçada variedade sugere a suposição de que o problema

dos direitos fundamentais sociais não pode tratar-se de uma questão de tudo-ou-

nada. Com o apoio da teoria dos princípios aqui esboçada, e orientado pela idéia

retora formal já apresentada, se passará a aduzir os argumentos pró e contra os

direitos sociais.

O argumento em favor dos direitos fundamentais sociais é um

argumento da liberdade, sustentado por duas teses:

a) a liberdade jurídica para fazer ou omitir algo sem a liberdade fática (real), é dizer,

a possibilidade fática de eleger entre o permitido, carece de todo valor.

b) sob as condições da moderna sociedade industrial, a liberdade fática de um

grande número de titulares de direitos fundamentais não encontra substrato material

em um âmbito vital dominado por isto, senão que depende essencialmente de

atividade estatal.

Alexy, frente aos direitos fundamentais alemão, preocupa-se

com a adscrição da liberdade fática às normas constitucionais, trazendo dois

argumentos:

I – o primeiro aponta para a importância da liberdade fática para o indivíduo,

porquanto despido de algumas deles – como a habitação, o trabalho ou saúde – não

poderá fruir de outras liberdades jusfundamentais, como o voto.

II – o segundo, que se vincula a isto, a liberdade fática é jusfundamentalmente

relevante não só sob o aspecto formal de assegurar as coisas essencialmente

importantes, mas também sob o aspecto material – O TCF tem reconhecido os

direitos fundamentais como um sistema de valores, o que, à luz da teoria dos

princípios, exige que os indivíduos possam desenvolver-se livre e dignamente na

comunidade social, o que pressupõe, uma certa medida de liberdade fática.

Esta preocupação, frente ao direito brasileiro, está diminuída

em face da existência de elevado número de direitos sociais plasmados na Carta e

outros direitos fundamentais relativos ao trabalho, à ordem econômica, etc.

Sugere Alexy a adoção de modelo firmado segundo a idéia

retora formal apresentada acima, segundo a qual os direitos fundamentais são

posições tão importantes que não podem cair livres à simples maioria parlamentar.

De acordo com esta fórmula, a questão a acerca de quais são

os direitos fundamentais sociais que o indivíduo possui definitivamente é uma

questão da ponderação entre os princípios. Por outro lado se encontra, sobretudo, o

princípio da liberdade fática. Por outro lado, se encontram os princípios formais de

competência de decisão do legislador democraticamente legitimado e o princípio da

divisão de poderes, como assim também princípios materiais que, sobretudo, se

referem à liberdade jurídica de outros, porém, também a outros direitos

fundamentais sociais e bens coletivos.

Com base neste conceito, cujo detalhamento acerca dos

direitos sociais definitivos é tarefa da dogmática, é possível verificar se uma posição

de prestação jurídica está definitivamente garantida jusfundamentalmente se:

a) é exigência do princípio da liberdade fática;

b) bem como é exigência do princípio da divisão dos poderes e o da democracia

(que inclui a competência pressuposta do parlamento); e,

c) princípios materiais opostos (especialmente aqueles que aponta a liberdade

jurídico de outros) são afetados em uma medida relativamente reduzida através

da garantia jusfundamental da posição de prestação jurídica e das decisões do

Tribunal Constitucional que a tomam em conta.

Em todo caso, estas condições estão satisfeitas no caso

dos direitos mínimos, é dizer, por exemplo, um mínimo vital , a uma moradia

simples, à educação escolar, à formação profissiona l e a um nível standard

mínimo de assistência médica 22.

Três são as objeções possíveis a este modelo:

a) Também os direitos fundamentais sociais mínimos têm consideráveis efeitos

financeiros, quando são muitos que lhe exigem. Isto, por si só, não é

impedimento, porquanto a competência pressuposta do legislador não é um

princípio absoluto e ilimitado. Direitos individuais podem ter mais peso que as

razões de política financeira.

b) O grau de exercício dos direitos fundamentais sociais aumenta em tempos de

crise econômica, aumentando consideravelmente as dificuldades para atender

aos reclamos, face haver pouco para distribuir. Cabe considerar, primeiro, que

aquilo que é imediatamente exigível deve estar sob a condição do mínimo vital ;

em segundo lugar, a ponderação necessária do modelo aqui pressuposto pode,

sob as circunstâncias diferentes, conduzir a diferentes direitos definitivos e; em

22 - ALEXY, p. 495.

terceiro lugar, justamente nos tempos de crise, parece indispensável uma

proteção jusfundamental das posições sociais, por mínima que seja.

c) Pode-se, ainda, objetar com a justiciabilidade deficiente para fazer valer esses

direitos. Primeiro deve se considerar que este problema, frente aos direitos

sociais, não é diferente do que ocorre com os direitos fundamentais tradicionais;

segundo, a existência de um direito não pode depender da sua justiciabilidade,

até porque, quando existe um direito, ele é justiciável; terceiro, de modo algum

um Tribunal é impotente frente a um legislador inoperante. O espectro de suas

possibilidades processuais-constitucionais se esten de, desde a mera

constatação de uma violação da Constituição, atravé s da fixação de um

prazo dentro do qual deve levar-se a cabo uma legis lação de acordo com a

Constituição, até a formulação judicial direta do o rdenado pela

Constituição 23.

O modelo apresentado é um modelo de ponderação, sendo

característica deste tipo de modelo que o devido prima facie é mais que o

definitivamente devido.

Este caráter prima facie é corretamente expressado quando se

diz que este direito pertence a seu titular em si e que é limitável. Que o direito,

enquanto direito prima facie, é um direito vinculante e não tem, por exemplo, só um

caráter programático se percebe claramente quando se diz que o direito não pode

depender em sua validade normativa do menor ou maior grau de suas possibilidade

de realização. Porém, a propriedade de direito vinculante prima facie significa que a

cláusula restritiva deste direito, a reserva do possível no sentido que o indivíduo

23 - Idem. Idem, p. 496/497.

pode razoavelmente exigir da sociedade, não tem como conseqüência a ineficácia

do direito. Esta cláusula expressa simplesmente a necessidade de ponderação

deste direito.

Finalmente poderia objetar-se o modelo apresentado como um

modelo que prioriza o direito subjetivo em detrimento do objetivo, sendo que, por

vezes, sequer direito subjetivo decorre o dever estatal. Nesse sentido são as críticas

de Häberle. Sem embargo, para o modelo proposto não vale a objeção de que não

teria em conta a importância do objetivo. Pelo contrário, oferece uma base para a

versão mais exata do conteúdo correto da primazia do objetivo. A chave é a teoria

dos princípios.

De acordo com o modelo, o indivíduo tem um direito definitivo à

prestação quando o princípio da liberdade fática tem um peso maior que os

princípios formais e materiais opostos tomados em seu conjunto. Este é o caso dos

direitos mínimos. A este tipo de direitos mínimos definitivos se faz possivelmente

referência quando direitos a prestações públicas subjetivos e justiciáveis são

contrapostos a um conteúdo objetivo excessivo. Frente a direitos definitivos que são

o resultado de uma ponderação, os direitos prima facie que correspondem aos

princípios para os quais o direito em si a ser admitido em um estúdio universitário é

um exemplo, tem que sempre algo excessivo. O conceito de excessivo não está,

pois ligado a dicotomia subjetivo/objetivo 24.

Este modelo também corresponde ao nível objetivo porque aos

direitos prima facie correspondem deveres prima facie do Estado de procurar que as

24 - ALEXY, R., p. 590.

liberdades jurídicas dos titulares de direitos fundamentais correspondam liberdades

fáticas.

O problema dos limites de atuação do TCF deve ser entendido

na transformação dos deveres prima facie em deveres definitivos, que se dará se, se

a luz de princípios opostos, o dever prima facie tenha sido satisfeito em medida

suficiente.

A competência do Tribunal termina nos limites do

definitivamente devido, porém, também mais além destes limites, os princípios

contém exigências normativas ao legislador.

3.- Vieira de Andrade e os direitos fundamentais pr estacionais 25.

Sustenta Vieira de Andrade que os direitos fundamentais

sociais, apesar de estarem sujeitos a um regime constitucional diferente, não

constituem uma categoria radicalmente autônoma dos direitos, liberdades e

garantias.

O regime diferenciado a que alude o professor lusitano decorre

da aplicação imediata que a Carta Política de Portugal confere aos direitos,

liberdades e garantias.

Mas a disposição constitucional que amplia e confirma a

aplicação imediata destes não permite concluir que os demais direitos fundamentais

25 - ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976.

estejam despidos da mesma eficácia. É que esta já não decorrerá mais do

imperativo constitucional, mas sim da sua própria possibilidade de, segundo sua

força normativa, fazer seus preceitos valerem.

Os princípios constitucionais da preservação do núcleo

essencial de cada comando normativo, acrescido do princípio da dignidade da

pessoa humana irradiam força jurídica suficiente para se extrair, de todo o catálogo

dos direitos fundamentais, posições subjetivas.

De logo acentua Vieira de Andrade que as normas que

prevêem direitos sociais, na constituição portuguesa, tem conteúdo impositivo ao

legislador, que tem o dever de dar-lhe o contorno infraconstitucional.

Esta dimensão objetiva, entretanto, ao impor tarefas com certa

finalidade, fornece critérios para determinação do conteúdo mínimo dos interesses

dos beneficiários, os quais, sendo individualizáveis, podem constituir também a

dimensão subjetiva. Para que se tornem direitos objetivos certos é necessário, em

regra, a atuação legislativa que defina o conteúdo concreto, segundo um quadro

político de prioridades, considerando a escassez de recursos. A omissão legislativa

para completar este conteúdo fragiliza a posição subjetiva, mas não a invalida de

todo, porque em primeira linha estabelecem garantias institucionais.

Além disso, a força jurídica dos preceitos relativos aos direitos

sociais implica no reconhecimento de que o conteúdo mínimo de cada um desses

direitos já está delineado na própria carta política.

Esses dados normativos implicam no reconhecimento dos

seguintes aspectos:

a) imposição legislativa concreta das medidas necessárias para tornar exeqüíveis os

preceitos constitucionais;

b) conteúdo mínimo constitucionalmente conferido, que permite o controle judicial

das leis que completem o conteúdo das normas e o fator interpretativo que este

conteúdo desempenha no sistema jurídico;

c) fundamento constitucional de limitação de outros direitos fundamentais que

podem ser-lhes contrapostos;

d) força irradiante, conferindo uma certa capacidade de resistência às mudanças

normativas que impliquem numa diminuição do grau de realização dos direitos

(vedação de retrocesso).

Assinalando que o dever de legislar pode por vezes se revelar

insuficiente, assinala Vieira de Andrade que, em regra, administração e poder

judiciário não poderão atuar. Entretanto, “em casos excepcionais, pode pensar-se

em retirar diretamente da Constituição um direito a determinada prestação social:

julgamos que isso será admissível quando esteja em causa o conteúdo mínimo dos

preceitos constitucionais, nomeadamente em situações de necessidade e injustiça

extremas”26.

Ao lado do dever de legislar, os preceitos fundamentais sociais

possuem o efeito de servir de padrão positivo de controle da constitucionalidade das

leis, tomando-se em conta os conteúdos constitucionalmente determinados. Em

regra a conformação desses conteúdos fica ao arbítrio do legislador, mas nalguns

casos deve ser feito este controle tanto para invalidar as normas que lhe sejam

26 - ANDRADE, J. C. V. op. cit., p. 384.

contrárias como também para declarar a insuficiência de colmatações que não

atendam ao conteúdo mínimo27.

Outra manifestação da força jurídica dos direitos fundamentais

sócias reside na possibilidade deles servirem de restrições legítimas ou limitações

aos direitos, liberdades e garantias.

Estas considerações levaram o referido autor a concluir que,

sendo juridicamente vinculantes, os direitos sociais produzem efeitos, ainda que de

reduzida densidade normativa. Esta tende a aumentar quando associada a valores

básicos de sobrevivência digna, equiparando-se assim aos direitos, liberdades e

garantias.

“É precisamente por isso que a Constituição de 1976 lhes não

confere, em geral, a qualidade de direito imediatamente aplicável, mas sem excluir

essa possibilidade, que deve considerar-se até imposta em certos aspectos, se tal

resultar inequivocamente dos respectivos modos de positivação”, na expressão de

Vieira de Andrade28-29.

27 - O legislador estabeleceu, no Brasil, os requisitos mínimos para a concessão do benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência hipossuficientes, em atendimento ao comando constitucional inserto no art. 195. Dentre os requisitos previu uma renda familiar per capita não superior a um quarto do salário mínimo. Em linha de princípio esta eleição legislativa deve ser prestigiada, na medida em que decorreu do sopesamento político das possibilidades orçamentárias, o número de eventuais beneficiários, etc. Tal requisito legal vem sendo, por vezes, questionado perante o Poder Judiciário para que novo parâmetro seja fixado. Da simples comparação entre o texto constitucional e a legislação que o complementou não é possível, a priori, estabelecer infração aos termos da Constituição. Entretanto, comparando-se outros critérios legais para estabelecer os requisitos para qualificar os hipossuficientes, é possível concluir que o legislador ordinário não completou suficientemente o comando constitucional, na medida em que os critérios adotados violaram o princípio da vedação de insuficiência. 28 - ANDRADE, J. C. V., op. cit., p. 395. 29 - Esta afirmação de Vieira de Andrade vem a coincidir com a opinião por mim externada desde a edição da obra “Aplicação imediata dos direitos e garantias individuais” onde sustento a idéia de diferente regime jurídico para os direitos insertos no art. 5o, da Constituição Federal, sem prejuízo de compreender-se que os demais direitos fundamentais podem ter eficácia imediata, mas que esta não decorre aplicação do parágrafo primeiro do referido artigo, mas sim da forma de positivação, agregada aos postulados, na dicção de Humberto Ávila, da força normativa da Constituição e da máxima efetividade das normas constitucionais.

Não há direitos subjetivos plenos, com um conteúdo

determinado ou determinável que permita aos seus titulares a exigência direta do

respectivo cumprimento por via judicial.

O recurso direto individual à administração é admissível,

quando haja lesão direta de bens pessoais constitucionalmente protegidos

associados a direitos econômicos, sociais e culturais, mas isto será viável apenas

para assegurar o cumprimento de prestações estaduais mínimas, nomeadamente

quando esteja em causa a sobrevivência das pessoas30.

4.- Canotilho e os direitos sociais, econômicos e c ulturas na Constituição

Portuguesa.

Em capítulo específico sobre os direitos sociais, econômicos e

culturais, J. J. Gomes Canotilho31 assevera que esses direitos fundamentais, para a

sua proteção, devem ser considerados segundo aquilo que a moderna doutrina

chama de pressupostos de direitos fundamentais. Estes devem ser

compreendidos como o conjunto de fatores (tais como capacidade econômica do

Estado, distribuição de bens, níveis de ensino e desenvolvimento, estágio cultural,

30 - Acerca da posição de Vieira de Andrade, cumpre salientar que embora a Constituição Portuguesa de 1976 confira uma elevada gama de direitos sociais, referido autor não logra obter em seu discurso densidade normativa tão extensa quanto aquelas trazidas por Alexy ou Canaris. Estes em suas teorias conferem uma maior subjetivação aos direitos de aplicação mediata, segundo normas adscritas à Carta alemã, que o autor português logra conseguir em normas constitucionais expressas. Embora faca referência ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao mínimo vital, esta argumentação é deduzida apenas de modo lateral, centrando-se mais sua preocupação no dever do legislador e na impossibilidade de sua reivindicação direta pelos cidadãos, ou ainda mediante a atuação dos direitos por meio do Poder Judiciário. 31 - CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição.

convenções sociais, convicções filosóficas, estilo de vida, etc.) que condicionam, de

forma positiva e negativa, a existência e proteção desses direitos sociais.

Estes chamados pressupostos de direitos fundamentais têm

total pertinência para exame da matéria, principalmente quando se busca fundar

uma técnica de aplicação e concretização das normas constitucionais a partir de

lições da doutrina alienígena. O transporte puro e simples de conceitos e valores

estrangeiros, para serem inseridos em realidade tão diferente como a nossa, pode

causar perplexidade e confusão. O nível de exigência que se pode realizar frente

aos Estados alemão ou norte-americano é bem diverso daquele que pode ser

deduzido frente ao Estado brasileiro, mexicano, argentino ou qualquer outro que

esteja em estágio de desenvolvimento diverso.

Isto implica em tomar-se em consideração as realidades locais,

como saber que a exigência de efetividade de direito à moradia (art. 6o, da nossa

Carta Política) possui baixíssima densidade normativa – na perspectiva prestacional

- quando notoriamente é sabido que sequer deveres estatais primários como o

direito de proteção à saúde ou mesmo prestação de serviços médicos não são

satisfatoriamente atendidos.

Ao lado dos pressupostos, que não fazem parte do regime

jurídico, existem os elementos estruturais que integram o âmbito normativo e o

regime jurídico, como o princípio da dignidade da pessoa humana, o do livre

desenvolvimento da personalidade.

Estes direitos fundamentais sociais podem possuir tanto uma

dimensão objetiva quanto uma subjetiva. Considerado na perspectiva de direito de

proteção esses direitos fundamentais possuem a mesma dignidade dos direitos,

liberdades e garantias, porque nem o Estado nem terceiros podem agredir posições

jurídicas reconhecidas constitucionalmente, como o direito à saúde, por exemplo.

Isto confere aos indivíduos um direito subjetivo quanto à proteção destes direitos.

Mas há, também, a dimensão objetiva que se opera de duas

formas: a) dever de legislar imposto aos órgãos constitucionalmente competentes,

para que criem as condições materiais e jurídicas para o exercício desses direitos; b)

fornecimento de prestações materiais por parte do Estado aos cidadãos.

Estes direitos diretamente estatuídos na constituição são

chamados por Canotilho de direitos a prestações originários, os quais, para além do

dever de legislar, trazem consigo o problema da sua efetivação.

Mas há também dos direitos a prestações derivados, que

decorrem do desenvolvimento infraconstitucional dos mesmos, que impõem sua

concretização mediante a sua prestação para todos quanto deles necessitem,

conectando-o ao princípio da isonomia (igual acesso à saúde, às escolas, igualdade

na distribuição dos benefícios estatais, etc.). Estes direitos derivados é que fazem

surgir a cláusula de vedação ao retrocesso, porque já positivados, impedem o grau

de concretização já obtido pela sociedade seja eliminado, sob pena de violação do

núcleo essencial deste direito já conquistado.

O cerne do regime jurídico dos direitos sociais, culturais e

econômicos reside na sua ligação com o princípio da liberdade igual, como

paradigma estruturante da ordem constitucional portuguesa. A liberdade igual

aponta para a igualdade real, de modo que todos tenham acesso não apenas aos

direitos de proteção, mas também de igual oportunidade para obtenção dos direitos

sociais, como moradia, saúde, informação, pleno emprego, como dimensão social de

bens jurídicos, como inviolabilidade do domicílio, integridade física, liberdade de

expressão e liberdade laborativa.

A liberdade igual impõe a tarefa de distribuição dos bens

sociais entre as diferentes classes sociais, entre nações e gerações.

Mas a outorga de tais direitos não pode restar confinada a

argumentos como reserva do possível, que acaba por reduzir sua eficácia a zero.

Assim impõe-se a adoção do conceito de garantia do mínimo social. Segundo alguns

autores este mínimo social resulta diretamente do dever de garantir a dignidade da

pessoa humana e não de qualquer densificação jurídico-constitucional dos direitos

sociais.

Para refutar objeções acerca da reserva do possível, traz

Canotilho a lição do Tribunal Constitucional português que reconheceu a existência

dos direitos sociais, fixando alguns traços constitutivos destas normas:

- vinculatividades normativo-constitucional (e não meros programas);

- servem de parâmetros para o controle judicial das normas infraconstitucionais;

- imposição legisferante;

- tarefas impostas ao Estado para concretização destes direitos mediante a adoção

de medidas concretas e determinadas;

- a produção destas medidas não está à disposição do legislador, embora este

possua liberdade de conformação.

5.- Da doutrina nacional acerca da justiciabilidade dos direitos sociais.

Este amplo leque de posições da doutrina estrangeira sobre a

justiciabilidade dos direitos fundamentais produziu reflexos em solo nacional.

A classificação bipartite das normas constitucionais, de origem

norte-americana, liderada por Cooley, foi introduzidas em solo brasileiro pelas mãos

de Ruy Barbosa, que distinguia as normas em auto-executáveis e não auto-

executáveis. Aquelas produziam desde logo todos os seus efeitos enquanto que

estas ficam na pendência de integração legislativa, porque revelavam apenas um

caminho ou programa a ser desenvolvido pelo legislador ordinário.

Posteriormente, fundado na doutrina italiana de Vezio Crisafulli,

José Afonso da Silva elaborou a sua clássica divisão tripartite das normas

constitucionais, em normas de eficácia plena, eficácia contida e eficácia limitada.

Com algumas nuances, esta divisão vem sendo acolhida pela

maioria da doutrina nacional, mas os contornos das chamadas normas de aplicação

mediata e eficácia limitada passaram a ser redefinidos.

É que nesta categoria se encontrava a grande maioria dos

direitos sociais os quais, sob a perspectiva mais antiga, teriam seu conteúdo e

desenvolvimento às mãos do legislador, não conferindo direito subjetivo aos

indivíduos.

Ao tratar das chamadas normas programáticas, Regina M. M.

Nery Ferrari32 atribui-lhes a mesma natureza das demais normas constitucionais,

como imperatividade e igualdade de hierarquia, entre outros atributos.

32 - FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Normas Constitucionais programáticas.

Para fundamentar sua posição acerca dessa igual natureza das

normas programáticas e demais normas, Regina FERRARI serve-se do pensamento

de Konrad Hesse acerca da força normativa das normas constitucionais33,

justificando assim sua conclusão de que, “se as normas programáticas tratam de

direitos sociais e econômicos, face a sua imperatividade superior, é irrecusável ao

cidadão a possibilidade de postular, perante o Judiciário, o respeito aos direitos que

daí decorrem, de modo a garantir o seu exercício, a utilidade concreta a ser satisfeita

pela prestação de outrem e a vedação de comportamentos em desconformidade

com os vetores constitucionais”34.

Na mesma linha segue Luis Roberto Barroso35 que,

reconhecendo a aplicação imediata das normas programáticas, assinala os atributos

de: a) revogar as leis anteriores com elas incompatíveis; b) vincular o legislador; c)

condicionar a atuação da administração pública; d) informar a interpretação e a

aplicação da lei pelo Poder Judiciário36.

Em monografia específica sobre a eficácia dos direitos

fundamentais, Ingo W. Sarlet37 sustenta que o preceito constitucional que confere

aplicação imediata aos direitos fundamentais irradia sua força por todo o texto.

Porém, muitas das vezes referidos preceitos não geram posições subjetivas aos

indivíduos ante a necessidade de concretização infraconstitucional. Assim, assume

33 - FERRARI, R. M. M. N. op. cit., p. 183. 34 - FERRARI. Idem, p. 249. 35 - BARROSO, Luis Roberto. O Direito constitucional e a efetividade de suas normas. 36 - BARROSO, L. R. op. cit., p. 156. 37 - SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais.

especial relevo a perspectiva jurídico-objetiva, outorgando-lhe um caráter normativo

diferenciado38.

Após análise de diversas posições da jurisprudência e doutrina,

conclui Ingo W. Sarlet que “à vista do exposto, percebe-se também que – na esfera

dos direitos a prestações – se impõe uma relativização da noção de direito subjetivo.

Mesmo em se mantendo a estrutura de uma relação trilateral estabelecida entre o

titular, o objeto e o destinatário, constata-se – em virtude das peculiaridades dos

direitos a prestações – uma inevitável diferenciação no que tange à força jurídica

das diversas posições jurídico-prestacionais fundamentais em sua dimensão

subjetiva, a exemplo, aliás, do que ocorre na esfera jurídico-objetiva. Por outro lado,

não há como desconsiderar a natureza excepcional dos direitos fundamentais

originários a prestações sob o aspecto de direitos subjetivos definitivos, isto é,

dotados de plena vinculatividade e que implicam a possibilidade de impor ao Estado,

inclusive mediante o recurso à via judicial, a realização de determinada prestação

assegurada por norma de direito fundamental, sem que com isto se esteja colocando

em cheque a fundamentalidade formal e material dos direitos sociais de cunho

prestacional”39.

Paulo Gilberto Cogo Leivas, em recente monografia

apresentada como dissertação de mestrado na Universidade Federal do Rio Grande

do Sul, sob o tema “A estrutura normativa dos direitos fundamentais sociais” traz seu

conceito material de direitos fundamentais sociais, calcado na lição de Robert Alexy,

como sendo “em sentido material, direitos a ações positivas fáticas que, se o

indivíduo tivesse condições financeiras e encontrasse no mercado oferta suficiente,

poderia obtê-las de particulares, porém, na ausência destas condições e

38 - SARLET, I. W. op. cit., p. 270. 39 - SARLET, I. W. op. cit., p. 320.

considerando a importância destas prestações, cuja outorga ou não-outorga não

pode permanecer nas mãos da maioria parlamentar, podem ser dirigidas contra o

Estado por força de disposição constitucional”40.

Assim, resta claro que a doutrina nacional também advoga a

aplicação imediata das normas programáticas, por decorrência da força normativa

da Constituição. O que importa considerar é como devem ser colmatadas as

omissões legislativas e os comandos constitucionais de conteúdo vago, para fins de

reconhecer a justiciabilidade dos direitos prestacionais. Em suma, duas perguntas

devem ser respondidas: como e em que medida pode o Poder Judiciário promover a

integração e desenvolvimento dessas normas.

6.- Conclusão pessoal acerca da justiciabilidade do s direitos sociais.

Sobreleva destacar a lição de José Eduardo Faria41, sobre os

direitos sociais, para quem estes não estão ligados ao princípio da igualdade, mas

fundamentalmente na superação das desigualdades sociais. Visam os direitos

sociais criar preferências e tratamento discriminatório por meio de políticas

compensatórias, para promoção de ampla inclusão social.

Os direitos sociais, portanto, representam a fundamentalidade

das promessas do constituinte em criar um Estado que se proponha, em primeiro

lugar, cumprir o disposto no art. 3o, da Carta Política: construir uma sociedade livre,

justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a

40 - LEIVAS, Paulo Cogo. “A estrutura normativa dos direitos fundamentais sociais”. Dissertação apresentada e defendida para obtenção do título de Mestre em Direito, junto a Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. 2003. 41 - FARIA, José Eduardo. Direitos Humanos, Direitos Sociais e Justiça. p. 105.

marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de

todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas

de discriminação.

É a Constituição quem aponta o caminho a ser seguido,

consoante escolha da própria sociedade, para atender a estes objetivos estatais. E

este caminho reside principalmente na outorga dos direitos sociais. Por isso que não

podem as políticas públicas necessárias à consecução destes objetivos ficar à

mercê dos eventuais mandatários de cargos políticos; não está, o atendimento

destas políticas públicas, à disposição dos políticos; são imperativos fundamentais

que devem ser perseguidos e cumpridos, segundo as possibilidades da nação.

Em sendo possível configurar um dever estatal de direito

prestacional (segundo uma adscrição, na concepção da constituição alemã, e

diretamente, ou mesmo mediante adscrição, no ordenamento constitucional

brasileiro) esse dever se configura num direito objetivo, cuja outorga aos indivíduos

não se acha ao livre arbítrio do legislador ou do poder executivo.

Mas isto, na expressão de Robert Alexy, pode configurar no

máximo um direito prestacional prima facie, o qual é muito menos que o direito

definitivo.

O direito definitivo restará representado a partir do resultado

decorrente dos diferentes métodos de concretização dos direitos constitucionais,

destacadamente o juízo de proporcionalidade e de ponderação das diferentes

normas (princípios e regras) que lhe são contrapostas.

O preenchimento dos comandos constitucionais que

asseguram direitos prestacionais deve ser feito, preferencialmente, pelos poderes

políticos incumbidos do atendimento das tarefas do Estado, seja pela conformação

do direito constitucional pelo legislador ordinário, seja pela adoção de políticas

públicas pela Administração. Mas, diante da omissão destes órgãos, por força do

imperativo de tutela dos direitos fundamentais, cuja argumentação acha-se bem

desenvolvida e defendida na exposição de Canaris, é possível reconhecer a

justiciabilidade dos direitos sociais prestacionais.

O controle judicial das atividades estatais, positivas ou

negativas, se dará por meio dos postulados de vedação de excesso e proibição de

insuficiência, cotejados com o postulado da reserva de consistência e o princípio da

dignidade da pessoa humana.

Isto não que dizer que todo direitos prestacional inserto na

Constituição possa, desde logo, implicar na existência de direito subjetivo para os

indivíduos, mas apenas que a adoção de políticas públicas pode ser ordenada

quando o imperativo de tutela indicar, mediante justificação consistente que a

intensidade da ameaça ao bem constitucionalmente tu telado é tamanha que

justifica sua outorga pelo Poder Judiciário. A este argumento adicione-se a

consideração acerca do mínimo vital, desenvolvida por Robert Alexy quanto à

extensão que se pode dar ao direito prestacional em sentido estrito, de modo a

reconhecer que a atuação Estatal (e o suprimento de sua omissão pelo Poder

Judiciário) somente será obrigatória quando estiver presente o argumento da

liberdade fática, compreendida esta como a possibilidade de o indivíduo realizar, ou

não, determinada faculdade se reunisse condições materiais para tanto.

Para o asseguramento deste direito, além da exigência da

liberdade fática, devem ser considerados os princípios da separação dos poderes e

o da democracia, como também os princípios que lhe são opostos, destacadamente

a liberdade jurídica dos outros que serão afetados pela medida.

É evidente que o aplicador do direito fundamental deverá

considerar os efeitos financeiros da medida, considerada esta não apenas

individualmente, mas também segundo uma probabilidade de outorga da mesma

prestação a todos aqueles que se achem em condições equivalentes42.

Nem sempre a prestação será direta e imediata, mas poderá,

determinada política pública mais ampla, ser determinada mediante a imposição de

prazos e condições viáveis de realização.

Por fim, e talvez o ponto essencial para o conhecimento de

uma limitada outorga de direitos prestacionais, é que somente deve ser prestado

aquilo que possa ser razoavelmente exigido da sociedade. O objeto da tutela que se

prestará, para suprir omissão estatal e justificar o ordenamento judicial de política

social, deverá atender ao mínimo vital.

Por mínimo vital deve ser compreendida a prestação social que

seja necessária e indispensável, para acolher o direito fundamental, prestada esta

42 - Sobre o tema, a Corte Constitucional Federal da Alemanha proclamou, em caso paradigmático referido por Alexy, que a prestação a ser outorgada pelo Estado deve corresponder ao que o indivíduo pode razoavelmente exigir da sociedade, de tal sorte que, mesmo havendo recursos disponíveis, não haverá obrigação de prestar se a pretensão de apresentada fora dos limites do razoável.

não na sua condição máxima e exigida pelo beneficiário, mas sim de acordo com as

possibilidades reais e fáticas do próprio Estado.

Pode ser adotado, como paradigma, a prestação que

ordinariamente qualquer pessoa obteria se tivesse condições materiais razoáveis

para atender à necessidade. No campo do direito à saúde, por exemplo, não é

exigível toda e qualquer prestação material, mas apenas aquelas que comumente

qualquer pessoa tem acesso quando possui condições econômicas. Assim, não há

que se pretender a prestação de uma tutela máxima, segundo os interesses e

conveniências do beneficiário, mas apenas aquilo que ordinariamente está acessível

àqueles que não seja hipossuficientes.

Considerando que a prestação acabará por limitar os escassos

recursos orçamentários, é evidente que não há direito a tratamentos extraordinários

e acessíveis a poucos, como é o caso daqueles prestados no exterior, ainda que

este se mostre vital. Isto porque o aporte de recursos desta magnitude extrapola o

direito ao mínimo vital, porque este tipo de tratamento está fora do alcance de quase

a totalidade dos indivíduos.

Entretanto, não pode o Estado negar-se a prestar tutelas

mínimas, que habitualmente são colocadas, pelo mercado, à disposição de todos

quanto necessitados. É o caso do paradigmático julgamento do Supremo Tribunal

Federal sobre o dever estatal de fornecimento de medicamentos para os portadores

do vírus HIV. Os portadores com razoáveis condições podiam obter junto às

farmácias de modo a obstaculizar ou dificultar o avanço da doença, ao passo que

isto não estava acessível a elevada parcela de portadores do mal em decorrência

das suas dificuldades econômicas. Por isso o acolhimento da pretensão de obrigar o

SUS a fornecer o medicamento gratuitamente.

Diferente seria, por exemplo, se um portador de moléstia grave

pretendesse que lhe fosse custeado o tratamento, no estrangeiro ou especial equipe

médica nacional, de mal raro. Embora as peculiaridades do caso possam impor o

reconhecimento de situação dramática (como ocorre em muitas outras para as

quais a medicina ainda não encontrou tratamento ou cura) o fornecimento daquilo

que é extraordinário, envolvendo elevados recursos orçamentários não está

necessariamente obrigado ao Estado. Embora o aspecto vital esteja presente, a

situação pode exceder ao direito mínimo que constitucionalmente se impõe ao

Estado.

7.- A questão do orçamento e da reserva do possível diante das necessidades

de realização dos direitos sociais e proteção dos d ireitos fundamentais

invioláveis.

Daquilo que restou amplamente sublinhado nos tópicos

antecedentes verifica-se que a questão orçamentária funciona apenas como um dos

argumentos que podem ser contrapostos - e entram no jogo da ponderação dos

diferentes interesses em colisão – para a solução da questão acerca justiciabilidade

dos direitos fundamentais prestacionais.

Fundamentos outros podem – e devem – ser deduzidos

para justificar a existência de direitos fundamentais na sua dimensão subjetiva, bem

como a preponderância deste sobre as dificuldades orçamentárias para o seu

deferimento.

A dedução de objeção quanto à ausência de previsão

orçamentária, separação dos poderes e reserva do possível não são obstáculos

absolutos ao deferimento de direitos prestacionais.

Embora devam ser satisfeitas as prioridades

administrativas estabelecidas pelos órgãos democraticamente legitimados para

tanto, é possível que o Poder Judiciário – na omissão estatal – estabeleça

obrigações para atender direitos fundamentais e até mesmo impor políticas públicas.

O princípio da separação de poderes, se considerado

segundo apreciação rígida e ortodoxa, impede que o Poder Judiciário venha a

alterar aquilo que, democraticamente, havia sido previsto pelos poderes Legislativo e

Executivo. Porém, esta rígida consideração do princípio da separação de poderes já

não encontra espaço entre nós. As políticas públicas, embora devam ser eleitas e

priorizadas segundo as legítimas escolhas políticas, não se encontram ao livre

arbítrio do Poder Executivo. Legislativo e Judiciário igualmente integram o Estado,

possuindo ambos o poder-dever de fixar diretrizes e fiscalizar seu cumprimento. Isto

se dá essencialmente pelo cumprimento das metas e promessas constitucionais. Se

é dado ao Poder Executivo como alcançar tais metas, quais devem ser objeto de

maior investimento, não lhe é dado negar o fornecimento de alguns direitos

fundamentais ligados os mínimo vital. Isto passa por uma nova compreensão do

papel que o princípio da separação dos poderes desempenha na sociedade, como

assinalado por Andréas J. Krell43. “Em outras palavras: não se atribui ao Poder

43 - KRELL, Andréas Joachim. Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha. Os (des)caminhos de um direito constitucional ‘comparado’.Sérgio Antonio Fabris Editor.

Judiciário o poder de criar políticas públicas, mas tão-só de impor a execução

daquelas já estabelecidas nas leis constitucional e ordinárias. As sentenças obtidas

podem constituir importantes veículos para canalizar em direção aos poderes

políticos as necessidades da agenda pública através de uma ‘semântica’ dos direitos

sociais, e não meramente através das atividades de lobby ou demandas político-

partidárias”44 (...) “exige-se um Judiciário intervencionista que realmente ousa

controlar a falta de qualidade das prestações dos serviços básicos e exigir a

implementação de políticas sociais eficientes, não podendo as decisões da

Administração Pública se distanciar da ‘programaticidade princípiológica’ da

constituição45.

Presentes circunstâncias fáticas a justificar a defesa de

direito fundamental de elevada parcela da população, sem que com isso houvesse a

eliminação de outro direito fundamental contraposto, devido o controle judicial da

omissão inconstitucional.

Aliás, não há mais espaço para falsos dogmas como a

impossibilidade de o Poder Judiciário atuar como legislador positivo ou de ampla

discricionariedade administrativa. É necessário que os julgadores reconheçam o

papel político que devem desempenhar na sociedade, determinando a efetivação

das promessas constitucionais. Também é indispensável que os demais

operadores46 do direito participem deste processo de construção de um novo

paradigma de atuação judicial, provocando a tutela jurisdicional.

44- KRELL, Andréas J., cit., p. 94. 45 - KRELL, A. J., p. 97. 46 - Papel importante vem sendo desempenhado pelas ações civis públicas propostas pelo Ministério Público e entidades civis na defesa de direitos difusos ligados à implementação dos direitos sociais do Estado, destacadamente na defesa do direito à saúde e educação. Argumentos como a reserva do possível, violação do princípio da separação dos poderes, e o papel do Poder Judiciário vem sendo enfrentados e superados, na busca da efetividade destes direitos.

O império do direito impõe a realização dos fins

plasmados na Constituição, a concretização dos direitos fundamentais, uma

administração pública que cumpra, prioritariamente, o princípio da moralidade

administrativa que implica na escolha de políticas públicas que atenda aos elevados

interesses sociais e não apenas os interesses paroquiais daqueles que,

temporariamente, acham-se no exercício da administração.

A análise dos orçamentos públicos47 exerce importante

papel para exame das possibilidades estatais para o cumprimento das tarefas que

lhe foram constitucionalmente destinadas. Não se pode ignorar aquilo que Canotilho

chamou de ‘pressupostos dos direitos fundamentais’, pois a realidade,

especialmente em países em desenvolvimento, apresenta multiplicidade das

carências e recursos escassos. Por isso mesmo, a boa utilização destes recursos é

medida que se exige com maior vigor.

Exemplo ilustrativo é a sentença proferida pelo Juiz de

Direito da Comarca de Joinville, no Estado de Santa Catarina48 que, julgando

procedente ação civil pública proposta pelo Ministério Público Estadual, impondo

política pública para diminuir o déficit de 2948 vagas escolares no ensino

fundamental. Partindo do dever constitucional dos municípios atuarem no ensino

fundamental e na educação infantil (art. 211, § 2o, da Constituição Federal) e da

ausência de vagas, entendeu o magistrado que estava a municipalidade obrigada a

atuar de modo buscar políticas públicas aptas a atender à demanda. Isto porque a

47 - É sabido que as leis orçamentárias não possuem caráter impositivo aos administrativos, mas meramente autorizativos o que permite a apresentação de proposta orçamentária indicativa de preocupação com os direitos humanos, mas com realidade diversa quando se observa o que foi executado efetivamente, consoante salientado por Ricardo Lobo Torres, na obra Teoria dos Direitos Fundamentais, p. 278s. 48 - Autos de processo n.º 038.03.008229-0, da Comarca de Joinville, proferida em 12 de maio de 2003, pelo Juiz de Direito Alexandre Morais da Rosa.

liberdade de condução da municipalidade está adstrita ao cumprimento primeiro das

prioridades absolutas previstas no ECA e na CF, para depois poder atuar com

discricionariedade. Confrontando o orçamento municipal com as necessidades,

constatou a existência de verbas destinadas a programas especiais, incluindo a

construção de estádio de futebol, ao passo que a imperiosa necessidade de novas

salas de aula não se achava contemplada. O programa municipal de alargamento do

número de vagas era de tal modo tímido (incremento de 2,4% ao ano, em relação a

crianças de 0 a 3 anos, 5% ao ano, em relação às crianças na idade de 3 e 6 anos)

que “a grande maioria das atualmente discriminadas e negligenciadas crianças – em

evidente situação de risco por omissão da Administração Pública Municipal de

Joinville – jamais terão garantidas o acesso à educação infantil, posto que atingirão

a idade de 7 anos antes que se disponha de vagas suficientes para acolhê-las pela

rede existente”.

BIBLIOGRAFIA:

ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Centro de Estudios Constitucionales, Madrid, 1997. ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. 2a. ed. Coimbra: Almedina, 2001. AVILA, Humbert. Teoria dos princípios – da definição à aplicação dos princípios jurídicos, 2a. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. BARROSO, Luis Roberto. O Direito constitucional e a efetividade de suas normas. 7a. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. CANARIS, Claus-Wilhelm. Direitos Fundamentais e Direito Privado. Almedina. Trad. Ingo Wolfgang Sarlet e Paulo Mota Pinto. Almedina: Coimbra, 2003. CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1998. FARIA, José Eduardo. “O Judiciário e os Direitos Humanos e Sociais: notas para uma avaliação da justiça brasileira”, in Direitos Humanos, Direitos Sociais e Justiça. São Paulo: Malheiros, 1994. FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Normas Constitucionais programáticas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. GEBRAN NETO, João Pedro. Aplicação imediata dos direitos e garantias individuais – a busca de uma exegese emancipatória. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. KRELL, Andréas Joachim. Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha. Os (des)caminhos de um direito constitucional ‘comparado’. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2002. LEIVAS, Paulo Cogo. “A estrutura normativa dos direitos fundamentais sociais”. Dissertação apresentada e defendida para obtenção do título de Mestre em Direito, junto a Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. 2003. MARINONI, Luiz Guilherme. O direito à efetividade da tutela jurisdicional na perspectiva da teoria dos direitos fundamentais. in Revista de Direito Processual Civil n.º 28, abril-junho de 2003, ed. Gênesis, p. 298/338.

MORO, Sérgio. Desenvolvimento e efetivação judicial das normas constitucionais. São Paulo: Max Limonad, 2000. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 1998. TORRES, Ricardo Lobo. “A cidadania multidimensional na era dos direitos”, in: o mesmo (org.), Teoria dos Direitos Fundamentais, 1999.