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APOSTILA DIREITO TRIBUTÁRIO I Professor Carlos Jorge Sampaio Costa

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APOSTILA

DIREITO TRIBUTÁRIO I

Professor Carlos Jorge Sampaio Costa

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BIBLIOGRAFIA

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AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2000.  

BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.  

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria do Direito Tributário. São Paulo. Saraiva. BORGES, José Souto Maior. Isenções Tributárias. 2ª ed. São Paulo, Sugestões Literárias, 1980.  CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999  ......................Teoria da Norma Jurídica Tributária. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais.  CARRAZZA, Roque Antônio Curso de Direito Constitucional Tributário 11ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999.COELHO, Sacha Calmon. Curso de Direito Tributário Brasileiro. Rio de PIRES, Adilson Rodrigues. Manual do Direito Tributário. 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.  DANARI, Zelmo. Curso de Direito Tributário. 8. ed. São Paulo: AtlasDE SOUSA, Rubens Gomes. Compêndio de Legislação Tributária. Edição Póstuma. São Paulo. Editora Resenha tributária Ltda.  FALCÃO, Amílcar de Araújo, NOVELLI, Flávio Bower, ATALIBA, Geraldo. Fato Gerador da Obrigação Tributária e Financeira. Rio de Janeiro: Forense 1997  FONROUGE, Carlos Giuliani. Conceitos de Direito Tributário. São Paulo: Lael.MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito tributário. 32ª edição. São Paulo. Malheiros Editores Ltda.  MORAES, Bernardo Ribeiro – Compêndio de Direito Tributário. Rio de Janeiro – Forense.NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. 14ª edição. São Paulo, Saraiva, 1965. RUSCHMANN, Cristiano Frederico. Direito Tributário. 3ª edição reformulada. São Paulo, Saraiva, 2009.SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 2ª ed. Belo Horizonte. Saraiva, 2010.TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário 11ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002. 

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Material de ClasseConstituição Federal AtualizadaCódigo Tributário Nacional (Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966, atualizada).

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Direito Tributário I

I. O Estado e a Competência TributáriaA. As finanças do Estado.

1. O surgimento do Estado. O ser humano, um animal racional, para sobreviver tornou-se um animal social. A vida em sociedade exigiu a formação do Estado, que dirige uma ou várias nações em determinado território. Este domínio, denominado por alguns domínio eminente, por outros soberania, também pode em alguns casos ser chamado de jurisdição.

2. Nação. Nação é a comunidade de pessoas unidas por identidade de origem, língua, costumes, religião etc.. O povo de uma nação pode estar disperso no mundo em diversos estados.

3. Objetivo do Estado. Para evitar a luta fratricida entre os homens e, portanto, impedir que a justiça seja feita individualmente, mediante a vingança pessoal, surgiu o Estado com o monopólio do uso da força dentro de determinado território, visando inicialmente à manutenção da ordem e a distribuição da justiça. O objetivo do Estado no mundo contemporâneo, segundo a maioria dos estudiosos da Teoria do Estado, é o bem comum de todos os que habitam dentro do território onde o poder estatal exerce a sua soberania.

4. Moral e Direito. Cada nação tem seus princípios morais, que são normas de conduta cuja violação é punida com a reprovação social. O Estado, com base nesses princípios morais, cria o Direito Positivo, que é um conjunto de normas cuja desobediência provoca uma sanção do Estado. Nem toda norma jurídica é baseada na moral. Há normas que são úteis, mas moralmente neutras, como as que se integram no Código Nacional de Trânsito.

5. Necessidade do Estado de arrecadar fundos financeiros. Para a consecução de seus objetivos, tais como o de manter a ordem, distribuir justiça, prover educação básica, saúde etc., o Estado necessita arrecadar fundos financeiros.

6. Estado unitário ou federal. O Estado pode ser unitário ou federal. O Estado unitário tem um governo centralizado. O Estado federal está dividido em unidades autônomas, muitas vezes chamadas províncias (Argentina, Canadá) ou estados (Brasil, Estados Unidos da América).

7. República Federativa do Brasil. O Brasil era um estado unitário durante o período imperial (1822-1889). Hoje é um Estado Federal, mas com muitas características de Estado Unitário. O poder de tributar está bastante concentrado no Governo Federal que é quem dita as principais normas de Direito Tributário.

8. Tributos. Para exercer suas atividades, o Estado, com base em sua soberania, impõe aos seus cidadãos o dever de contribuir financeiramente para seus cofres. Tais contribuições são denominadas tributos.

9. Livre iniciativa e papel do Estado. A Constituição Federal consagra no Brasil o princípio da livre iniciativa em seu artigo 1º, inciso IV. Isto significa que as atividades civis e econômicas dos particulares são os principais motores da vida social do país. O Estado brasileiro, por outro lado, objetivando o bem comum, para além de regular a atividade econômica, por intermédio de agências reguladoras visando a estimular a livre concorrência, intervém no domínio econômico com empresas públicas (aquelas nas quais participa com a integralidade do capital) ou através de sociedades de economia mistas (nas quais participa somente com parcelas do capital social).

10. Receitas públicas originárias e derivadas. O Estado, como já foi mencionado, necessita de recursos financeiros para o exercício de suas atividades, com o objeto de promover o bem comum. Os recursos adquiridos pelo Estado podem ser classificados genericamente como

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receitas originárias (advindas de operações com bens pertencentes ao Estado, por exemplo, alugueis provenientes de um imóvel do Estado) ou receitas derivadas (provenientes de bens do patrimônio dos particulares, verbi gratia, imposto predial e territorial urbano - IPTU).

11. Classificação das Receitas Públicas. A classificação clássica das receitas públicas foi exposta pelo economista americano SELIGMAN1, autor citado por RUBENS GOMES DE SOUSA2. SELIGMAN, em seu clássico livro Essays in Taxation classifica as receitas públicas da seguinte maneira:

(a) Preços quase privados. São cobranças efetuadas pelo Estado em atividades puramente privadas, que não são consideradas privadas apenas porque é o Estado o credor da obrigação. É o caso de o Estado possuir um hotel e cobrar pela hospedagem ou explorar uma livraria e cobrar pelos livros vendidos.

(b) Preços públicos. São cobranças por atividades monopolistas do Estado, atividades essas que poderiam ser exercidas por particulares, mas que, por força de lei são atividades exclusivamente estatais. É o caso, por exemplo dos preços cobrados pelos Correios.

(c) Tributos. O conceito de tributo está definido pelo artigo 3º do Código Tributário Nacional (CTN) da seguinte maneira: “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.” Os tributos podem ser:

(i) Impostos: O conceito de imposto também está definido pelo CTN, no seu artigo 16, que dispõe: “Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.” Em outras palavras, explica HUGO DE BRITO MACHADO: “Diz-se, por isto, que o imposto é uma exação3 não vinculada, isto é, independente de atividade estatal específica. A expressão “não vinculada”, com que se qualifica o imposto, nada tem a ver com a qualificação da atividade administrativa vinculada, na definição legal de tributo. Quando se diz que o imposto é uma exação não vinculada, o que se está afirmando é que o fato gerador do imposto não se liga à atividade estatal específica relativa ao contribuinte. Quando se fala de atividade administrativa vinculada, no artigo 3º do CTN, o que se quer dizer é que a atividade administrativa tributária é sempre vinculada à lei, não se admitindo discricionarismo da autoridade administrativa na cobrança de tributos. Os impostos se distinguem entre si pelos respectivos fatos geradores e com base nessa distinção, nos países de organização federativa, como o nosso, são atribuídos às diversas entidades entre as quais se

1 Edwin Robert Anderson Seligman, (1861-1939), economista e educador americano, especializado em tributação.2 Rubens Gomes de Souza: advogado, professor e ilustre tributarista, co-autor do projeto do Código Tributário Nacional. A citação mencionada encontra-se em seu clássico Compêndio de Legislação Tributária, Editora Resenha Tributária Ltda. São Paulo. Edição póstuma. 1975, páginas 36 e 37.

3 Segundo o Dicionário de Antônio Houaiss, exação assim se define:

substantivo femininoUso: formal.1ato ou efeito de exigir2 Rubrica: termo jurídico.em direito administrativo, atividade de arrecadar ou receber impostos, taxas, emolumentos etc.; exigência,

cobrança de rendas públicas3 ato ou efeito de (alguém) exigir mais do que lhe é devido

Ex.: o deputado desmascarou as e. dos credores internacionais 4 realização de algo com perfeição, capricho ou pontualidade

Ex.: completar um trabalho com e. 4.1 Rubrica: termo jurídico.

exatidão, correção, pontualidade no exercício de um múnus, cargo ou função5 reclamação de uma dívida ou promessa

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divide o poder político.4 Também RUBENS GOMES DE SOUSA esclareceu o significado de imposto da seguinte maneira: “Impostos, finalmente, são as receitas que o Estado cobra tendo em vista exclusivamente o interesse público da atividade desempenhada pelo governo, sem levar em conta as vantagens que possam decorrer dessa atividade para os particulares ou mesmo a ausência de tais vantagens sob o ponto de vista individual. É o que ocorre quando todas as atividades inerentes à própria existência, organização e funcionamento do governo (administração pública, órgãos políticos, funcionalismo, defesa nacional), que representem um interesse público geral não suscetível de ser relacionado direta ou indiretamente a um determinado indivíduo.”5 São impostos, entre outros: o imposto sobre a renda (IR), o imposto predial territorial urbano (IPTU) e o imposto sobre a circulação de mercadorias e prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS).

(ii) Taxas. EDUARDO SABBAG assim define taxa: “taxa é um tributo imediatamente vinculado à ação estatal, atrelando-se à atividade pública, e não à ação particular. 6 A Constituição Federal (CF) em seu artigo 145 II faculta à União, aos Estados e aos Municípios a instituição de taxas em razão de seu poder de polícia e o artigo 77 do CTN dispõe: “As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.” São taxas, entre outras: a taxa judiciária, a taxa de alvará ou de funcionamento e a taxa de fiscalização de anúncios.

(iii) Contribuição de Melhoria. A contribuição de melhoria está assim definida pelo CTN, em seu artigo 81: “A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.” A contribuição de melhoria é um tributo de difícil cálculo e, consequentemente, de difícil cobrança e, por isso, encontra-se em desuso na maior parte das unidades da Federação.

(iv) Empréstimo compulsório. O empréstimo compulsório é um tributo pelo qual a União obriga o contribuinte a conceder-lhe um empréstimo, nos termos do artigo 148 da CF, que dispõe: “A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, "b". Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição.”7

(v) Contribuições. São tributos cobrados pelo fisco federal, estadual ou municipal, sendo o produto de suas arrecadações carreado para financiar certas ações do poder público, consideradas relevantes e que beneficiam certos grupos e direta ou indiretamente o contribuinte.

B. A competência para tributar.

4 Cf. Autor citado, Curso de Direito Tributário, Malheiros Editores, São Paulo, SP. 32ª edição, páginas 64 e 65.5 Cf. Obra citada, página 38.6 Cf. Autor citado, Manual de Direito Tributário, Edição Atualizada, Editora Saraiva, São Paulo, SP, página 405.7 A controvérsia sobre a natureza jurídica do empréstimo é analisada

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12. O poder soberano na tributação. A soberania estatal implica o poder de tributar. Como diz HUGO DE BRITO MACHADO: “Caracteriza-se a soberania como a vontade superior às vontades individuais, como um poder que não reconhece superior”8. A relação de soberania implicava uma dependência do súdito para com soberano, do escravo para com senhor. Entretanto, nos países onde predomina o Estado de Direito, a relação entre o Estado e o contribuinte é uma relação jurídica e não uma relação de poder. O Estado somente pode tributar se autorizado pelo parlamento, que representa os contribuintes. É o princípio do “no taxation without representation.” Este princípio se originou de uma palavra de ordem revolucionária, originada da principal queixa das famosas treze colônias britânicas na América (futuros Estados Unidos) durante meados do século XVIII. Com efeito, o governo britânico cobrava impostos dos seus cidadãos residentes nas Américas, sem que estes tivessem representação no Parlamento Britânico, o que seria inconstitucional. Em realidade, desde a assinatura da Carta Magna pelo rei JOÃO SEM TERRA (1215) que vinha sendo estabelecido no direito inglês o princípio de que o soberano não poderia cobrar impostos sem o consentimento de seus súditos. Assim, a Revolução Americana buscou suas raízes em um dos momentos mais cruciais da cultura dos povos de língua inglesa, qual seja o da promulgação da Carta Magna, ainda na Idade Média.

13. Poder de tributar e competência tributária. Como bem observa o Professor HUGO DE BRITO MACHADO, o conceito de “poder de tributar” difere da expressão “competência tributária”.9 Poder de tributar é conceito da seara política. O Estado tem o poder de tributar porque tem o monopólio da força e pode coagir o cidadão a pagar o tributo que estabelecer. Já o conceito de competência tributária implica uma relação jurídica. O Estado é competente para tributar quando o faz de acordo com a lei preestabelecida. “Tem competência”, escreveu o Professor HUGO MACHADO, “quem recebe atribuição outorgada pelo Direito.” A competência é do mundo das normas, não existe fora do sistema jurídico.10

14. O Estado de Direito e a competência tributária. O moderno Estado de Direito é instituído por uma constituição política que estabelece a competência tributária. Nos estados federais, como o Brasil, a competência para tributar é distribuída entre a União, os estados-membros, o Distrito Federal e os municípios. Em nosso país, as competências tributárias dos governos federal, estadual, distrital e municipal estão delineadas na Constituição da República de maneira mais ou menos pormenorizada em seus artigos 153 a 156.

15. Princípios jurídicos da tributação ou limitações constitucionais ao poder de tributar. São normas constitucionais que restringem o poder do Estado de tributar. A Constituição Federal (CF) limita o poder do Estado em matéria fiscal principalmente com, entre outros, os seguintes princípios:

(a) Legalidade. Nenhum tributo pode ser criado ou aumentado a não se mediante lei (art. 150 I da CF;

(b) Irretroatividade. Veda a cobrança de tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado (art. 150 III “a” da CF).

(c) Anterioridade. Veda a cobrança de tributos no mesmo exercício financeiro em que tenha sido publicada a lei que os criou ou aumentou e proíbe a cobrança de tributos antes de decorridos 90

8 Cf. Obra citada, página 27.9 Ver autor e obra citada, página 28.10 Idem.

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dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou (art. 150, III, “b” e “c” da CF);

(d) Igualdade ou isonomia. Todos são iguais perante a lei (art. 5º e art. 150 II da CF);(e) Competência. Princípio pelo qual a autoridade tributária deve restringir seu poder de tributar à

matéria que lhe cabe dentro das normas constitucionais;(f) Capacidade contributiva. Princípio pelo qual os impostos são graduados de acordo com a

capacidade financeira do contribuinte (art. 145 § 1º da CF);(g) Vedação ao confisco. Princípio pelo qual o ente governamental com poder de tributar não pode

utilizar tributo com efeito de confisco (art. 150, IV da CF);(h) Liberdade de tráfego. Princípio que veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos

Municípios o estabelecimento de limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos, ressalvada a cobrança de pedágio (art. 150 V da CF);

(i) Uniformidade Geográfica. Princípio que veda à União instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional (art. 151, I da CF);

16. Exceções aos princípios. Há exceções aos princípios (ou limitações) indicados acima. As limitações constitucionais ao poder de tributar e suas exceções serão estudados mais pormenorizadamente adiante e se incluem entre as questões mais significativas do Direito Tributário.

II. As Limitações Constitucionais do Poder de TributarA. Introdução

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1. Princípios constitucionais de competência tributária. No sistema tributário nacional (artigos 145 a 162 da Constituição da República) as limitações constitucionais ao poder de tributar estão estabelecidas principalmente nos artigos 150, 151 e 152 de nosso maior diploma legal. São os princípios que foram indicados no final do capítulo anterior desta apostila. Tais princípios são próprios do Estado de Direito e garantem ao contribuinte maior segurança jurídica na administração de seus negócios. Outros princípios podem ser depreendidos da Constituição Federal mediante uma interpretação sistemática. São disposições que também inibem o Estado em seu poder de tributar. Entre eles destacam-se as normas de imunidade tributária e as de proibição de privilégios e de discriminações fiscais. As limitações constitucionais ao poder de tributar, de acordo com a jurisprudência firmada do Supremo Tribunal Federal são consideradas cláusulas pétreas11 da Constituição da República.12

2. Poder de tributar é poder de direito. Como ensina Eduardo Sabbag, “o poder de tributar é, em verdade um poder de direito, lastreado no consentimento dos cidadãos, destinatários da invasão patrimonial, tendente à percepção do tributo. Se há em seu emprego uma parcela de força, ela se mostra institucionalizada, dotada de juridicidade. No estudo da soberania estatal, diz-se que o Estado surgido com a função precípua de promover necessidades coletivas, há de estar ele munido do poder de exigir dos governados uma participação nos encargos públicos.”13. O poder de tributar não é absoluto, mas tem de se conformar aos ditames dos preceitos constitucionais que impedem os governos de cobrar impostos, taxas e contribuições ao seu bel-prazer.

3. O Código Tributário Nacional regula as limitações constitucionais ao poder de tributar. Embora os princípios que limitam o poder de tributar estão todos na Constituição Federal, cabe à lei complementar, no caso o Código Tributário Nacional (CTN), regular as limitações constitucionais ao poder de tributar (Artigo 146 II da Constituição Federal).14

B. Princípio da Legalidade

11 Cláusulas pétreas da Constituição da República são dispositivos constitucionais imutáveis, que, portanto, não poderão ser objeto de deliberação de proposta de emenda. De acordo com o artigo 60, § 4º, da Constituição Federal, "não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais".12 Eduardo Sabbag, obra citada, página 56.13 Idem, página 53 e 54.

14 Art. 146 da Constituição Federal estabelece: Cabe à lei complementar:

I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;

III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;

c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.

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4. História do princípio da legalidade. O princípio da legalidade remonta à Idade Média e à Magna Carta. Como sabemos, a “Magna Carta” ou "Grande Carta" (“Great Charter em inglês) foi redigida em latim bárbaro e é um diploma legal de 1215 (ainda em vigor no Reino Unido), que restringiu o poder dos reis da Inglaterra, especialmente o do Rei João Sem Terra (John Lackland), que a assinou. Com a Magna Carta, começa na nossa civilização ocidental judaico-cristã o movimento em direção à democracia, que somente veio a se realizar mais plenamente, porém ainda com limitações, a partir das revoluções liberais (principalmente a revolução americana de 1776 e a francesa de 1789). A Carta Magna impedia o exercício do poder absoluto. Resultou de desentendimentos entre o rei João e os barões ingleses acerca das prerrogativas do soberano. Segundo os termos da Magna Carta, João deveria renunciar a certos direitos e respeitar determinados procedimentos legais, bem como reconhecer que a vontade do rei estaria sujeita à lei. Daí resultou, entre outros o instituto do habeas corpus e o princípio de que o rei somente poderia cobrar tributos com a autorização do parlamento. Este princípio na revolução americana ficou consagrado pela palavra de ordem no taxation without representation (nenhum imposto sem representação popular).

5. O princípio da legalidade tributária no Estado de Direito. A questão tributária sempre esteve no centro das revoluções ao ponto de Dino Jarach dizer que “ foi por razões tributárias que nasceu o Estado moderno de Direito”.15Assim, está assentado em todos os Estados que adotam o Estado de Direito que nenhum tributo pode ser estabelecido sem que seja criado por lei. Ademais, somente mediante lei pode o tributo ser aumentado. Já o artigo 5º da Constituição Federal, onde estão os direitos fundamentais da pessoa humana dispõe em seu inciso II: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.”

6. O princípio da legalidade tributária no Brasil. O princípio da legalidade tributária está expresso claramente no inciso I do artigo 150 da Constituição da República que prescreve: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos

d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

Parágrafo único. A lei complementar de que trata o inciso III, d, também poderá instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, observado que: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

I - será opcional para o contribuinte; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

II - poderão ser estabelecidas condições de enquadramento diferenciadas por Estado; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

III - o recolhimento será unificado e centralizado e a distribuição da parcela de recursos pertencentes aos respectivos entes federados será imediata, vedada qualquer retenção ou condicionamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

IV - a arrecadação, a fiscalização e a cobrança poderão ser compartilhadas pelos entes federados, adotado cadastro nacional único de contribuintes. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

15 Cf. Jarach, Dino. Curso Superior de Derecho Tributario. Buenos Aires: Nueva, 1969, página.24, apud Sabbag, Eduardo, obra citada, página 57.

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Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;...” É o princípio em latim nullum tributum sine lege, semelhante ao princípio basilar do Direito Penal nullum crimen, nula poena sine lege. É portanto necessário que seja sancionada uma lei para que se possa criar, aumentar, extinguir ou diminuir tributos. No Brasil, normalmente, os tributos tem de estar anunciados na Constituição Federal, definidos em lei complementar e criados por lei ordinária. Com efeito, o inciso III artigo 146 da Constituição da República determina que cabe à lei complementar (CTN, geralmente): “estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.”

7. A criação do tributo no direito Brasileiro. Os tributos são criados normalmente por meio de lei ordinária16 seja federal, no caso dos tributos de competência do Governo Federal, estadual, nos casos dos tributos de competência dos Estados e do Distrito Federal, e municipal, no caso dos tributos de competência dos municípios e do Distrito Federal.17 Estas competências estão delineadas na Constituição da República nos artigos 153, 154, 155 e 156. Vêm definidas em Lei Complementar (CTN). Está implícito na filosofia política na qual se baseia a democracia representativa que ao ser criado o tributo por lei, ele passa a existir no mundo político como um encargo consentido pelo contribuinte. A criação do tributo implica estabelecer todos os elementos necessários para que se estabeleça a relação jurídica tributária entre o fisco e o contribuinte. Como explica HUGO DE BRITO MACHADO: “Assim, a lei instituidora do tributo há de conter: (a) a descrição do fato tributável18; (b) a definição da base de caculo e da alíquota ou do critério a ser utilizado para o estabelecimento do valor do tributo; (c) o critério a identificação do sujeito passivo da obrigação tributária; (d) o sujeito ativo da relação tributária, se for diverso da pessoa jurídica da qual a lei seja expressão da vontade.

8. Exceções do princípio da legalidade em relação ao aumento do tributo. A criação do tributo deve no Brasil ser estabelecida por lei; em hipótese alguma por diploma legal de hierarquia inferior. Entenda-se que a medida provisória, que tem força de lei, é uma lei em sentido amplo, ainda que não aprovada pelo parlamento.19 A medida provisória pode, portanto, criar tributo e aumentá-lo dentro dos limites previstos no parágrafo 2° do artigo 62 da Constituição Federal.20 Sem embargo, para o aumento dos tributos, há exceções na própria constituição que permitem o incremento da carga tributária mediante legislação infra legal. Com efeito, todos os tributos estão sujeitos à legalidade tributária, mas em alguns, o princípio da legalidade está mitigado com relação às alíquotas. Nesses casos excepcionais, o Poder Executivo pode alterar as alíquotas de alguns tributos. Assim, o parágrafo 1º do artigo 153 da Constituição

16 No Brasil, o tributo pode ser criado por lei ordinária, lei delegada ou medida provisória. Esta tem força de lei, embora inicialmente não seja aprovada pelo Parlamento. 17 O Distrito Federal, que é uma autarquia territorial autônoma da União. Apresenta particularidades sui generis tendo características tanto de Estado como de Município. Cobra tributos de competência estadual e municipal. 18 A descrição do fato tributário, ou seja, o fato gerador ou a hipótese de incidência do tributo.19 A medida provisória depois de aprovada pelo parlamento passa a ser uma lei comum.20 O parágrafo 2º do artigo 62 da Constituição da República dispõe: “Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos artigos 153, I, II, IV, V e 154, II, só produzirá efeitos no exercício seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.” As exceções de que trata o artigo 153, I, II, IV, V e o artigo 154 II referem-se ao imposto de importação, ao imposto de exportação, ao imposto sobre produtos industrializados ao imposto sobre operações financeiras e o imposto extraordinário em caso de guerra externa.

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da República dispõe que é facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos de importação, de exportação, dos produtos industrializados e sobre operações financeiras. Essas exceções referem-se maiormente aos chamados tributos extra fiscais ou flexíveis, que são aqueles nos quais o interesse do Estado é mais o de regular os mercados e menos o de arrecadar numerário para os seus cofres. A partir da Emenda Constitucional nº 33/2001 há mais dois casos de exceção ao princípio da legalidade tributária: o do CIDE-Combustível (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico)21 e o ICMS-Combustível22.

C. Princípio da Irretroatividade

9. A constitucionalizarão do princípio da irretroatividade. No Brasil, o princípio da irretroatividade está consagrado na Constituição da República23. Em muitos países esse preceito está contemplado na lei ordinária. No Brasil, o conceito está expressamente plasmado no artigo 5º, XXXVI de nossa Carta Magna, que dispõe: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:...XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;...” Assim, nenhuma lei (não somente a lei tributária), poderá atingir o direito adquirido (por exemplo, uma aposentadoria concedida conforme lei promulgada anteriormente) o ato jurídico perfeito (por exemplo, um contrato de empréstimo devidamente formalizado) ou a coisa julgada (por exemplo um acórdão transitado em julgado.)

10. A irretroatividade no Direito Tributário. O assunto, no sistema tributário nacional, está regulado também mais especificamente no artigo 150, III (a) da constituição Federal, nos seguintes termos: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:.. III - cobrar tributos: a) em relação a fatos geradores24 ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;...” Assim, a retroatividade da lei tributária que venha a prejudicar o contribuinte está proibida no Brasil, ou seja, a lei tributária somente pode tratar sobre fatos geradores que lhe sejam posteriores. Não pode criar tributos nem aumentá-los com relação a fatos que sejam anteriores a sua vigência. Sem embargo, conforme exposto mais adiante, à semelhança do que ocorre no Direito Penal, a lei tributária que seja mais benigna para o contribuinte pode retroagir.

11. A irretroatividade no Código Tributário Nacional. Com relação à aplicação das leis no tempo, dispõe o artigo 106 do CTN: “Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito: I - em qualquer caso, quando seja expressamente interpretativa, excluída a aplicação de penalidade à infração dos dispositivos interpretados; II - tratando-se de ato não definitivamente julgado: a) quando deixe de defini-lo como infração; b) quando deixe de tratá-lo como contrário a qualquer exigência de ação ou omissão, desde que não tenha sido fraudulento e não tenha implicado em falta de pagamento de tributo; c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática.” Antes de mais nada, é importante concordar com Eduardo Sabbag que afirma que não existem exceções ao princípio da irretroatividade tributária. Não há tributo que não se submeta a tal regra. 25 Na realidade, a retroatividade é permitida quando a nova lei beneficia o contribuinte e quando seja um diploma legal meramente

21 O CIDE-Combustível é um tributo federal criado pela Lei 10.336. O Poder Executivo poderá reduzir e restabelecer as alíquotas do tributo.22 O ICMS-Combustível é um tipo de ICMS. Os Estados poderão reduzir e restabelecer as respectivas alíquotas.23 A irretroatividade da lei tributária está consagrada em poucas constituições políticas, entre elas, além da brasileira, a constituição dos EUA, a mexicana e a norueguesa. 24 Fato gerador, como veremos adiante, é o fato jurídico (como a morte de alguém) ou o ato jurídico (como o contrato de compra e venda de um imóvel) que gera, ou seja, faz nascer a obrigação tributária do contribuinte em relação ao fisco. A morte pode gerar o imposto de transmissão causa mortis e o contrato de compra e venda de imóvel gera o imposto de transmissão intervivos.25 Cf. Autor e obra citados, página 186.

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interpretativo. Se, entretanto a suposta lei interpretativa criar um princípio novo que prejudique o contribuinte não será considerada interpretativa. Ao contrário, será inconstitucional, como explicita o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, cuja ementa se transcreve a seguir:

“EMENTA: TRIBUTÁRIO. SISTEMA INTEGRADO DE PAGAMENTO DE IMPOSTOS E CONTRIBUIÇÕES (SIMPLES). APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO. 1. A lei tributária mais benéfica e aquelas meramente interpretativas retroagem, a teor do disposto nos incisos I e II, do art. 106, do CTN. 2. O § 4º introduzido pela Lei nº 9.528/97 no artigo 9º, da Lei nº 9.317/96, ao explicitar em que consiste “a atividade de construção de imóveis”, veicula norma restritiva do direito do contribuinte cuja retroatividade é vedada. (...) (REsp nº 440.994, Rel. Min. Luiz Fux, j.25-02-2003)”

12.Podemos então concluir, que só é retroativa a lei que é verdadeiramente interpretativa. Mesmo que se diga retroativa, se na realidade for modificativa, ela não retroagirá, mas valerá do momento de sua vigência em diante.

D. Princípio da Anterioridade

13. Anterioridade anual e anterioridade nonagesimal. O artigo 150 da Constituição Federal dispõe: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: ...III - cobrar tributos: a) ...; b) no mesmo exercício financeiro26 em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; ...” No Brasil, portanto, (a) salvo as exceções explicadas mais adiante, não pode o fisco também cobrar tributos no mesmo exercício financeiro em que a lei que criou ou aumentou o tributo haja sido publicada (o princípio da anterioridade anual, de exercício ou da anterioridade comum); (c) salvo as exceções abaixo indicadas, não pode ainda o fisco cobrar tributos quando não se passaram 90 dias de publicação da lei que criou ou aumentou tais tributos (princípio da anterioridade nonagesimal, qualificada ou anterioridade privilegiada). Há, portanto, um período de tempo de espera entre a data da lei instituidora do tributo ou que o majore e a data de sua cobrança.

14. Anterioridade anual. O exercício financeiro no Brasil vai de 1º de janeiro a 31 de dezembro de cada ano. Portanto, de acordo com o princípio da anterioridade anual, um imposto criado por uma lei publicada em 20 de janeiro de 2012 somente poderá ser cobrado pela autoridade fiscal a partir de 1º de janeiro 2013 e com relação a fatos geradores ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2013. Situação jurídica similar ocorre no caso de uma majoração de tributo que ocorra por força de uma lei publicada em de 20 de janeiro de 2012; o respectivo tributo majorado somente poderá ser cobrado a partir de 1º de janeiro de 2013 também com relação a fatos geradores ocorridos de 1º de janeiro de 2013 em diante.

15. Anterioridade nonagesimal. A alínea (c) do inciso III do artigo 150 da Constituição da República foi acrescentada pela Emenda Constitucional nº 42 para evitar que alguns tributos criados ou aumentados por leis publicadas no final de dezembro de um determinado ano fossem cobrados já no mês de janeiro do ano seguinte, ou seja, em prazos muitas vezes menores do que 30 dias.

16. Aplicação da anterioridade nonagesimal. Portanto, de acordo com o princípio da anterioridade nonagesimal, a criação (ou majoração) de um tributo determinada por uma lei publicada em 20 de

26 Exercício financeiro é um intervalo de tempo durante os quais são consolidadas certas operações contábeis. No Brasil, o exercício financeiro coincide com o ano civil, isto é, os exercícios financeiros começam em 1º de janeiro e terminam em 31 de dezembro de cada ano. Como exercício financeiro dura um ano criou-se a expressão “ano fiscal (fiscal year em inglês) para contrapor-se ao ano civil (denominado ano calendário por aoguns).

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dezembro de 2012, somente poderá ser efetivada 90 dias após a publicação, isto é, o imposto criado ou majorado por tal lei somente poderá ser cobrado passados 90 dias de 20 de dezembro de 2012.

17. Súmula 669. O Supremo Tribunal Federal (STF) emitiu a súmula (não vinculante) nº 669 que dispõe que: “ (A) norma legal que altera o prazo do recolhimento da obrigação tributária não se sujeita ao princípio da anterioridade.” A partir da edição dessa súmula que ficou claro que o fisco pode modificar o prazo dos vencimentos das obrigações tributárias sem respeitar os princípios da anterioridade anual ou nonagesimal.

18. O princípio da anterioridade e o Código tributário Nacional (CTN). Já o Código Tributário Nacional, sancionado muito antes da Constituição de 1988, consagra o princípio da anterioridade anual com relação aos impostos sobre o patrimônio ou a renda em seu artigo 104.27

19. As isenções e o princípio da anterioridade. As isenções podem ser revogadas ou modificadas por lei a qualquer tempo salvo aquelas outorgadas por prazo determinado. É o que dispõe o artigo 178 do Código Tributário Nacional que estipula: Art. 178 - A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104.28 O artigo 104 do CTN, entretanto, obriga que a revogação da isenção de imposto sobre o patrimônio ou a renda, quando prejudica o contribuinte, respeite o princípio da anterioridade nos seguintes termos: Art. 104. Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua publicação os dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio ou a renda: I - ...; II - ...- que extinguem ou reduzem isenções, salvo se a lei dispuser de maneira mais favorável ao contribuinte, e observado o disposto no artigo 178.

20. Exceções aos princípios da anterioridade anual e nonagesimal. As principais exceções aos princípios da anterioridade normalmente se referem a tributos, quase sempre impostos, chamados extra fiscais, ou seja, tributos cujo objetivo de sua criação é mais o de regular o mercado do que arrecadar numerário para o fisco. É o caso, por exemplo, do imposto de importação e o imposto sobre operações financeiras. Também o caráter de emergência na cobrança de alguns impostos, como, por exemplo o imposto extraordinário de guerra ou o empréstimo compulsório, justificam a exceção aos princípios da anterioridade. Por outo lado é evidente o caráter emergencial do imposto extraordinário de guerra e os empréstimos compulsórios. As exceções mais importantes ao princípio da anterioridade anual e o da anterioridade nonagesimal estão indicadas no parágrafo primeiro do artigo 150 da Constituição da República que reza: “§ 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos artigos. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I.” 29Assim, o princípio da anterioridade anual não se aplica aos empréstimos compulsórios previstos no inciso I do art. 148 da CF, ao imposto de importação (II), ao imposto de exportação (IE), ao imposto sobre produtos industrializados (IPI), ao imposto sobre operações financeiras (IOF) e ao imposto extraordinário de guerra (IEG). Já o princípio da anterioridade nonagesimal não se aplica aos empréstimos compulsórios previstos no inciso I do art. 148 da CF, o imposto de importação (II), ao imposto de exportação (IE), ao imposto sobre a renda (IR), ao imposto sobre operações financeiras (IOF) e ao imposto extraordinário de guerra (IEG).

27 O artigo 104 do CTN dispõe: Art. 104. Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua publicação os

dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio ou a renda: I - que instituem ou majoram tais impostos; II - que definem novas hipóteses de incidência; III - que extinguem ou reduzem isenções, salvo se a lei dispuser de maneira mais favorável ao contribuinte, e observado o disposto no artigo 178.

28 Redação promulgada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003

29 Redação promulgada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003

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21. O CIDE-COMBUSTÍVEL e o ICMS-COMBUSTÍVEL. A Emenda Constitucional nº 33 criou mais duas exceções ao princípio da anterioridade anual, relacionada com os seguintes tributos: a CIDE-COMBUSTÍVEL, ou seja, a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, criada pela lei 10.336/2001, incidente sobre a importação e a comercialização de gasolina, diesel, querosene etc., assim como o ICMS-COMBUSTÍVEL, que é o imposto estadual, ICMS, que se aplica aos combustíveis. Com efeito, de acordo com o que dispõe os artigos da Constituição Federal, 149 § 2º, II e 177, § 4º, I, b, parte final, o Poder executivo Federal poderá reduzir e reestabelecer as alíquotas por meio de decreto presidencial, não se aplicando portanto o princípio da anterioridade anual.30 Semelhantemente, o parágrafo 4º, inciso IV do artigo 155 da Constituição da República excluiu o ICMS-Combustível do princípio da anterioridade anual. Diz o referido parágrafo 4º: “§ 4º Na hipótese do inciso XII, h, observar-se-á o seguinte: ...IV - as alíquotas do imposto serão definidas mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, nos termos do § 2º, XII, g, observando-se o seguinte...c) poderão ser reduzidas e restabelecidas, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III,b.”

22. Tabela. Para facilitar o estudo da anterioridade tanto anual como nonagesimal, transcreve-se a seguinte tabela:

TABELA DAS EXCEÇÕES AOS PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE ANUAL E NONAGESIMAL

ANTERIORIDADE ANUAL ANTERIORIDADE NONAGESIMAL

II IIIE IEIPI IRIOF IOF

IEG31 IEGEC.GECP32 EC.GECP

CIDE COMBUSTÍVEIS33 BASE DE CÁLCULO IPTUICMS COMBUSTÍVEIS34 BASE DE CÁLCULO IPVA

30 O § 4º do artigo 177 da Constituição da República dispõe: “§ 4º A lei que instituir contribuição de intervenção no domínio econômico

relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível deverá atender aos seguintes requisitos: I - a alíquota da contribuição poderá ser: ...b)reduzida e restabelecida por ato do Poder Executivo, não se lhe aplicando o disposto no art. 150,III, b...”

31 Imposto extraordinário por motivo de guerra externa.32 Empréstimo compusório por motivo de guerra externa ou de calamidade pública.33 Para o reestabelecimento de alíquotas.34 Para o reestabelecimento de alíquotas.

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E. Princípio da Igualdade ou Isonomia

23. A isonomia jurídica. O princípio da isonomia jurídica, um dos mais importantes, senão o mais importante direito fundamental35, está plasmado, entre outras normas constitucionais, no caput do artigo 5° e no seu inciso I da Constituição da República, nos seguintes termos: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição...” A regra da igualdade é, por assim dizer, a regra mestra da República que jogou para trás, no lixo da história, os privilégios da nobreza, de raças, de crentes em determinada religião, de pessoas que exercem ou exerceram certas posições etc. A partir da Revolução Francesa e da Revolução Americana, passou a dominar, entre os países que adotaram o Estado de Direito, o governo das leis e não dos homens; o rule of law. O direito evoluiu do status para o contrato. No ancien régime, ou seja, no período que antecedeu a Revolução Francesa, o que valia era o status das pessoas (se eram nobres e do alto clero ou cidadãos comuns). Após a revolução francesa, no Estado de Direito, passou a valer o contrato assinado entre iguais. A própria Constituição Política passou a ser considerada um contrato, o contrato social. Passou a proibir-se o arbítrio.

24. Projeção do princípio da isonomia na área tributária. Como explica HUGO DE BRITO MACHADO, o princípio de igualdade no direito fiscal é uma projeção, na área tributária, do princípio geral da isonomia jurídica.36 O princípio da isonomia tributária está disposto expressamente no artigo 150, II da Constituição Federal assim: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:...II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;...” Consagra nosso sistema tributário o princípio de igualdade exposto por Rui Barbosa em sua famosa oração aos moços. A isonomia consistiria em aquinhoar igualmente aos iguais e desigualmente aos desiguais, na medida que se desigualam.37 Portanto, o imposto progressivo (aqueles com maior capacidade contributiva pagam mais imposto em percentagens maiores), como o imposto de renda, não viola o princípio da igualdade por isto que trata desigualmente pessoas desiguais.

25. O princípio da isonomia tributária e sua aplicação prática. A rigor, ocorrido o fato gerador, deve incidir o imposto, não importando a pessoa do contribuinte. Entretanto, a própria Constituição da República oferece exceções a essa regra ao proibir o fisco de instituir impostos sobre templos de qualquer culto.38

26. A isonomia e as isenções. Muitas vezes parece ao intérprete que as isenções ferem o princípio da isonomia e, realmente às vezes o fazem. Nestes casos são nulas por isto que ferem um princípio maior da Constituição Federal. Há casos fáceis de verificação. Por exemplo, uma lei que isentasse de imposto de renda as pessoas de determinada raça, religião ou partido político seria discriminatória e portanto inconstitucional. Já uma lei que isente de IPI objetos fabricados no Nordeste do Brasil seria constitucional já que se estaria tratando desiguais de maneira desigual, o que é correto. A igualdade de que trata o princípio da isonomia é a igualdade na lei, ou a igualdade por intermédio da lei. Os iguais

35 O princípio da isonomia é considerado sobreprincípio para Paulo de Barros Carvalho, em comparação com outros princípios constitucionais. (Carvalho, Paulo de Barros. O Princípio da anterioridade em matéria tributária. Revista de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, nº 63, página 104. Apud Sabbag, obra citada, página 130.)36 Cf. Autor e obra citados, página 37.37 Cf. Barbosa, Rui, Oração aos Moços. São Paulo, Acádia, 1944, páginas 10 e 11. Apud Sabbag, obra citada, página 129.38 O artigo 150, inciso VI (b) da Constituição federal veda ao fisco instituir impostos sobre templos de qualquer culto.

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deverão ser igualmente tratados, enquanto os desiguais, na medida de suas dessemelhanças deverão diferentemente sê-lo.39

F. Princípio da Competência

27. O sistema tributário nacional é rígido. A rigidez do sistema tributário nacional é inconteste. Tanto a União, quanto os Estados ou os municípios somente podem criar tributos dentro dos limites de competência expressos na Constituição. Assim, o Estado de São Paulo não pode cobrar imposto sobre a renda, à semelhança do que fazem muitos Estados dos Estados Unidos da América, por isto que os impostos que os Estados da Federação Brasileira podem cobrar estão indicados em lista exaustiva no art. 155 da Constituição da República.

G. Princípio da Capacidade Contributiva

28. A capacidade contributiva na Constituição da República. A questão da capacidade contributiva do contribuinte está expresso na Constituição Federal em termos ambíguos. Diz o artigo 145 § 1º de nossa Carta Magna: “Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I - impostos; II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas. § 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte 2º - As taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos. (Os grifos não constam do original).

29. Alcance do dispositivo Constitucional. Ressalta HUGO DE BRITO MACHADO que o dispositivo suscita duas questões importantes: a primeira seria se o princípio aplicar-se-ia somente aos impostos, conforme uma interpretação literal. A segunda seria compreender exatamente o que significaria a expressão “sempre que possível”.40Com relação ao primeiro ponto parece que não há dúvida que a Constituição se refere a tributos em geral tendo sido a expressão “impostos” inserida no parágrafo acima transcrito por equívoco do constituinte. Com efeito, não teria sentido (contraria o senso comum) deixar que os demais tributos que não são impostos não fiquem sujeitos ao limite da capacidade contributiva do constituinte. E assim tem sido a prática do legislador. Por exemplo, estão isentos de pagar a taxa judiciária (que é um tributo mas não é um imposto) os pobres, que se beneficiam da justiça gratuita. Já a expressão “sempre que possível,” dá a impressão que o constituinte quis dar ao legislador o poder discricionário de não aplicar o princípio

39 Cf. Sabbag, Eduardo, obra citada, página 131.40 Cf. Autor e obra citada, página 39.

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da capacidade contributiva quando encontrasse que não fosse possível evitar a cobrança do imposto. Data vênia, o que parece sempre impossível é cobrar tributos que estejam acima da capacidade contributiva do contribuinte. Assim, parece-me que o conceito “sempre que possível”refere-se exclusivamente ao caráter pessoal que os tributos devem ter. Esta é a interpretação, entre outros de Américo Lacombe.41 Trata-se de uma infelicidade de redação do constituinte que o intérprete deve corrigir.

H. Princípio de Vedação ao Confisco

30. Dispositivo constitucional. A vedação ao confisco está estabelecida no inciso IV da Constituição da República, nos seguintes termos: “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:...IV- utilizar tributo com efeito de confisco.” A doutrina tem considerado o entendimento desse dispositivo problemático. É vago, ficando ao critério do Poder Judiciário a determinação do que seja um tributo confiscatório. O princípio existe para proteger a propriedade privada, direito garantido pela Constituição Federal. É de se destacar que conforme jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a identificação do efeito confiscatório deve ser feita em função da totalidade da carga tributária, mediante verificação da capacidade de que dispõe o contribuinte.42

I. Princípio da Liberdade de Tráfego

31. Dispositivo constitucional. O artigo 150, V da Constituição da República estabelece: “Art. 150 da CF: Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao DF e aos municípios: (...) V – Estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público.”

32. O princípio federativo da liberdade de locomoção. Com efeito, há constitucionalmente plena liberdade de ir e vir dentro do território nacional, tanto de pessoas quanto de bens. É o que estabelece o inciso XV do art. 5º da Constituição Federal nos seguintes termos: “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens.

33. Transposição de limites entre municípios e entre divisas estaduais. O fato gerador de qualquer tributo não pode ser nem a transposição entre limites municipais ou a transposição de divisas entre Estados membros.

34. Imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS). A ilimitabilidade ao tráfego de pessoas e

41 Para Américo Lacombe, "a primeira observação é que a expressão sempre que possível só pode se referir ao caráter pessoal dos impostos. Não é de ser conectada com a expressão seguinte, vale dizer, graduação segundo a capacidade econômica do contribuinte. Isto porque a graduação dos impostos segundo a capacidade econômica é um corolário lógico do princípio da igualdade, e, assim sendo, a sua referência expressa é totalmente despicienda. A conclusão, portanto, é que os impostos deverão ser graduados conforme a capacidade econômica do contribuinte"; ('Igualdade e Capacidade Contributiva' - "V Congresso Brasileiro de Direito Tributário", São Paulo, Separata da Revista de Direito Tributário, 1991, pág. 157. Apud artigo de Carlos Alberto del Papa Rossi no site http://www.fiscosoft.com.br/a/2hhz/a-emenda-constitucional-n-292000-e-a-progressividade-do-iptu-carlos-alberto-del-papa-rossi .

42 Cf. STF. ADIMC 2010/DF, Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, j. 30-09-1999)

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bens não impede a exigência de impostos sobre a circulação de bens em operações interestaduais ou intermunicipais. De certa maneira, além do pedágio, o ICMS faz uma exceção ao princípio da liberdade de locomoção. Na realidade, é o fato gerador de qualquer imposto que não pode ser a transposição das fronteiras dos Estados e dos Municípios. Os fatos geradores do ICMS são: a circulação de mercadorias, a prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal e a prestação de serviço de comunicação.43 De qualquer maneira, pode-se dizer que o princípio de ir e vir e permanecer comporta duas atenuações: o pedágio e o ICMS.

35. A cobrança do pedágio como exceção ao princípio de liberdade de tráfego. O inciso V do artigo 150, como indicado acima, ressalva expressamente a cobrança de pedágio como exceção ao princípio da liberdade de ir e vir.

36. Natureza jurídica do pedágio. Existe também a controvérsia doutrinária quanto à natureza jurídica do pedágio. Seria uma taxa, uma tarifa, um preço público? Se fosse tributo, teria que obedecer aos princípios constitucionais da legalidade, anterioridade, isonomia, vedação ao confisco etc.. Se for entendido como exação44 não tributária não estará sujeito a esses princípios, não respeitando, portanto, o princípio da legalidade. Assim, há um consenso de que o pedágio não é um tributo.

J. Princípio da uniformidade Geográfica

37. Os tributos federais devem ser instituídos de modo uniforme em todo o Brasil. Realmente, a União, em homenagem ao princípio da isonomia deve instituir tributos federais de modo uniforme em todo o território nacional, como determina o inciso I do artigo 151 da Constituição da República que dispõe: “Art. 151. É vedado à União: I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do País;...” Assim, o tributo federal deve ter a mesma alíquota em todo o país.

43 O ICMS e seus fatos geradores serão exaustivamente estudados em Direito Tributário II.44 O vocábulo exação está assim definido no Dicionário de Antônio Houaiss:1 ato ou efeito de exigir2 Rubrica: termo jurídico.em direito administrativo, atividade de arrecadar ou receber impostos, taxas, emolumentos etc.; exigência, cobrança de rendas públicas3 ato ou efeito de (alguém) exigir mais do que lhe é devidoEx.: o deputado desmascarou as e. dos credores internacionais 4 realização de algo com perfeição, capricho ou pontualidadeEx.: completar um trabalho com e. 4.1 Rubrica: termo jurídico.exatidão, correção, pontualidade no exercício de um múnus, cargo ou função5 reclamação de uma dívida ou promessa

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III. A Natureza do Direito Tributário

A. Definição de Direito Tributário

1. Conceito de Direito Tributário. Segundo uma definição preliminar de RUBENS GOMES DE SOUSA, o Direito Tributário ou Fiscal “é o direito que regula a cobrança e a fiscalização dos tributos.”45 Com efeito, o Direito Tributário é o conjunto de normas jurídicas que rege as relações entre o Fisco, ou seja, o Estado e o cidadão contribuinte. Por intermédio dessas relações, o contribuinte se obriga a pagar ao Fisco quantias em dinheiro que servirão para o Estado cumprir seus objetivos de alcançar o bem comum dentro do território em que o referido Estado é soberano. A obrigação tributária tem origem na lei (ex lege). Não é uma obrigação contratual. Geralmente não se origina em um negócio jurídico entre o fisco e o contribuinte. HUGO DE BRITO MACHADO define magistralmente o Direito Tributário da seguinte maneira: “é o ramo do Direito que se ocupa das relações entre o Fisco e as pessoas sujeitas a imposições tributárias de qualquer espécie, limitando o poder de tributar e protegendo o cidadão contra os abusos desse poder.” 46 Também PAULO DE BARROS CARVALHO conceitua o Direito Tributário em termos precisos: “o Direito Tributário é o ramo didaticamente autônomo do Direito, integrado pelo conjunto de proposições jurídico normativas, que correspondam, direta ou indiretamente à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos”.47 Finalmente, vale a pena transcrever a definição de nossa disciplina de autoria de EDUARDO SABBAG que nos lembra que o Direito Tributário é parte do Direito Público. Assim conceituou o Direito Tributário o Professor SABAG: “Direito Tributário é ramificação autônoma da Ciência Jurídica, atrelada ao Direito Público, concentrando o plexo de relações jurídicas que imantam o elo Estado versus contribuinte,” na atividade financeira do Estado, quanto à instituição, fiscalização e

45 Autor e obra citados, página 30.46 Autor e obra citada, página 50.47 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, 16ª edição, página 15. Apud SABBAG, Eduardo, obra citada, página 40.

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arrecadação de tributos.”48 Assim, o Direito Tributário é parte do Direito Público já que a pessoa titular do direito, ou seja, a pessoa a quem aproveita o Direito Tributário é o Estado. Também a natureza do interesse protegido é público e não privado. Ademais, as obrigações tributárias são compulsórias. Nelas não atua o princípio da autonomia da vontade, princípio basilar do direito entre particulares. Sem dúvida, o Direito Tributário é obrigacional pois trata das obrigações dos contribuintes em relação com o Fisco.

2. Autonomia do Direito Tributário. A autonomia das disciplinas do Direito é meramente didática já que o Direito forma um conjunto de normas unificado. É conveniente, entretanto que estudemos as matérias separadamente para facilitar nosso estudo. Hoje em dia, diante da importância do Direito Tributário, sendo o Sistema Tributário Nacional todo um capítulo da Constituição da República,49 não há dúvida que o Direito Tributário é uma disciplina autônoma da chamada ciência jurídica. Tem princípios que lhe são próprios e deve ser analisado independentemente do Direito Financeiro de que é teoricamente parte.

3. O Direito Tributário como parte do Direito Financeiro e do Direito Administrativo. O Direito Financeiro, como bem o definiu o professor napolitano MANLIO INGROSSO é a disciplina que estuda o ordenamento jurídico das finanças do Estado e as relações jurídicas por ele criadas no desempenho da sua atividade financeira.50 O Direito Financeiro é o conjunto de normas jurídicas que regula todas as atividades financeiras do Estado. Incluiria, portanto, a tributação. Entretanto, inclui principalmente atividades que não dizem respeito à tributação como as receitas não tributárias do Estado, o orçamento, o crédito público e a despesa pública. Assim sendo, desde um ponto de vista da teoria do direito, o Direito Tributário é teoricamente parte do Direito Financeiro. Este, por sua vez, é, também em teoria, parte do Direito Administrativo que, na singela e precisa definição de Celso Antônio Bandeira de Mello, é o ramo do Direito Público que disciplina o exercício da função administrativa.51 Obviamente a tributação é uma atividade da administração e portanto se enquadra no Direito Administrativo latu sensu.52 É claro que os manuais de Direito Administrativo, assim como de Direito Financeiro não mais incluem matérias próprias do Direito Tributário já que este possui normas específicas em grande número que garantem a necessidade de ser estudado separadamente. Daí ser notória a autonomia do Direito Tributário no Direito contemporâneo.53

4. Direito Tributário e Ciências das Finanças Públicas. É importante não confundir Direito Financeiro e Direito Tributário com Ciência das Finanças Públicas ou com

48 Autor e obra citada, página 41.49 Capítulo I, Do Sistema Tributário Nacional, do Título IV, Da Tributação e do Orçamento, da Constituição da República.50 Cf. INGROSSO, Manlio, Instituzioni di Diritto Finanziario, Nápoles, 1937. Apud DE SOUSA, Rubens Gomes, obra citada, página 34.51 Cf. DE MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de direito Administrativo, 29ª edição. Malheiros. São Paulo. Página 13. 52 Outra definição tradicional de Direito Administrativo se encontra no clássico Direito Administrativo Brasileiro de Hely Lopes Meirelles, nos seguintes termos: Direito Administrativo é o conjunto harmônico de princípios que regem os órgãos, os agentes, as atividades públicas tendentes a realizar, concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo Estado. (Cf. Autor e obra citados, 38ª edição, Malheiros, São Paulo, página 32.53 Na prática, no estudo do Direito Administrativo exclui-se todo o relacionado ao Direito financeiro e Direito Tributário. Também na prática, a disciplina Direito Financeiro exclui tudo o que se relaciona com as normas tributárias.

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política tributária (taxation em inglês). A Ciência das Finanças estuda a despesa, a receita, o orçamento e o crédito público. Seu objeto não são normas jurídicas, mas os fatos financeiros que envolvem as atividades do Estado. É através do exame das finanças públicas que se estabelece as políticas financeiras e tributárias, ou seja, a Ciência das Finanças informa o legislador sobre a situação financeira do Estado e com base nela, o político elabora as normas que irão constituir o Direito Financeiro e o Direito Tributário. Como explica HUGO DE BRITO MACHADO: “A ciência das finanças públicas está para o direito tributário (e financeiro) tal como a ciência da administração está para o Direito administrativo; a ciência econômica, ou Economia está para o Direito Econômico; a Criminologia está para o Direito Penal; e assim por diante.”54 Em suma, o Direito Tributário é o conjunto de normas que regulam as obrigações tributárias dos contribuintes, ou seja, as obrigações que constrangem os cidadãos a pagar tributos ao Estado. Já o Direito Financeiro é na prática o conjunto de normas que regulam toda a atividade financeira do Estado, excluída a tributação. A ciência das finanças públicas é uma ciência social, parte da economia, que estuda a atividade financeira do Estado do ponto de vista fático, ou melhor, é a disciplina que, pela investigação dos fatos, explica os fenômenos da arrecadação e despesa do Estado e suas autarquias do ponto de vista econômico.

B. Definição de Tributo

5. Conceito de tributo. O conceito de tributo está claramente definido no artigo 3º do Código Tributário Nacional (CTN), nos seguintes termos: Art. 3º. Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada. Está claro, portanto que o tributo é uma prestação pecuniária a ser paga em moeda, ou seja em dinheiro, aceitando-se excepcionalmente o pagamento in natura, com imóveis, por força do novo inciso XI do artigo 156 do CTN, acrescentado pela Lei Complementar nº 104 de 2001. Esse inciso permite a extinção do crédito tributário mediante a dação em pagamento em bens imóveis na forma e condições estabelecidas em lei. É o tributo uma prestação compulsória, isto é, obrigatória, não podendo o contribuinte deixar de pagá-la, sob pena de sofrer diversas sanções e ver seus bens retirados judicialmente de seu patrimônio para a satisfação da obrigação não satisfeita. O tributo não é sanção de ato ilícito. Ao contrário, a quase totalidade dos fatos geradores dos tributos são atos lícitos. Embora, excepcionalmente possa o fato gerador ser ato ilícito (por exemplo a renda auferida pelo banqueiro do jogo do bicho), não é de sua essência a ilicitude. (O fato gerador do imposto sobre a renda é o rendimento anual independentemente de que tal rendimento seja auferido licita ou ilicitamente.) Ademais, todo tributo tem de ser criado por lei, como já vimos acima. O princípio da legalidade, que não admite exceções no Direito Brasileiro, assegura que o tributo, qualquer que seja, somente pode surgir no mundo jurídico mediante lei (nullum tributum sine lege). Finalmente diz a definição do art. 3º do CTN acima transcrito que o tributo somente pode ser

54 Ver autor e obra citada, página 54.

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cobrado através de atividade administrativa plenamente vinculada. Com efeito, as atividades administrativas podem ser vinculadas (obrigatórias e com rito próprio) e discricionárias quando o funcionário pode fazer ou não fazer alguma coisa dentro de critérios de conveniência e oportunidade. A cobrança do tributo é um ato vinculado. O funcionário não pode deixar de lançar o tributo ao saber da ocorrência do fato gerador e não pode deixar de cobrá-lo em sua totalidade de acordo com as formalidades prescritas em lei.

C. Classificação dos tributos

6. Espécies de tributos. O artigo 5º do CTN apresenta como tributos os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria. A Constituição da República elenca as mesmas espécies de tributo em seu artigo 145. Entretanto a Lei Maior, de certa maneira, assemelhou aos tributos tanto o empréstimo compulsório como as contribuições sociais, que passaram a ser estudados com tributos latu sensu.

7. Imposto. Imposto, conforme o art. 16 do CTN, “é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.” Também, como explicou RUBENS GOMES DE SOUSA, o imposto “tem como característica a de ser o tributo que se destina a cobrir as necessidades públicas gerais, isto é, todas aquelas que interessam os cidadãos indistintamente, sem que se possa determinar o grau de interesse que cada um tenha individualmente na existência do serviço ou atividade pública de que se trate.”55 PAULO DE BARROS CARVALHO define imposto “como o tributo que tem por hipótese de incidência (fato gerador) um fato alheio a qualquer atuação do poder público.”56 Por exemplo o imposto sobre a propriedade territorial rural (tributo federal) incide sobre a propriedade privada (domínio útil ou posse) de imóvel localizado fora da zona urbana de um município. Tal fato gerador é um fato jurídico privado, totalmente alheio ‘a atuação do Poder Público, seja federal, estadual ou municipal.

8. Taxa. As taxas estão definidas no art. 77 do CTN nos seguintes termos: “Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. Parágrafo único. A taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em função do capital das empresas.” A taxa, portanto, ao contrário do imposto, é um tributo profundamente amarrado à atividade estatal. Com efeito, as taxas relacionam-se a uma prestação direta, um serviço do Estado. A taxa é uma contraprestação de um serviço oferecido pelo Estado, como por exemplo, é a taxa judiciária. Ademais, a taxa pode ser cobrada também como contraprestação da utilização efetiva ou potencial de serviços públicos específicos e divisíveis prestados ao contribuinte ou postos a sua

55 Cf. Autor e obra citada, página 164.56 Autor e obra citada, página 36. Apud SABBAG, obra citada, pagina 396.

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disposição. Exemplos de taxas: taxa de alvará ou funcionamento; taxa de fiscalização de anúncios; taxa de controle e fiscalização ambiental etc..

9. Taxa, preço público e tarifa. Taxa difere de preço público e de tarifa. A questão é tormentosa na doutrina, havendo várias opiniões divergentes, principalmente em relação à natureza do pedágio. Esboço aqui algumas considerações. A tarifa é sempre cobrada por uma empresa concessionária de serviço público, muitas vezes privada. Por exemplo, uma companhia de água e esgoto concessionária de serviços municipais cobra tarifa. Se o Estado explorar diretamente o serviço, poderá cobrar um preço público. Ou seja, se o município resolver prestar diretamente os serviços de água e esgoto, poderá cobrar um preço público, que é uma espécie de tarifa cobrada pelo Estado. Tarifa não é um tributo. Tampouco é tributo o preço público. Ambos não estão sujeitos às limitações constitucionais ao poder de tributar. O advogado RODRIGO ROCHA BARBOSA conclui seu interessante trabalho sobre o tema da seguinte maneira: “Logo, quando for serviço público específico e divisível indelegável em face de sua natureza, o regime deve ser exclusivamente tributário. Se for serviço público divisível e específico não essencial ou delegável, caso seja prestado pelo Estado, este poderá, por conveniência ou interesse público, adotar o regime tributário ou contratual de direito público, utilizando a taxa ou preço público. Finalmente, se o serviço público divisível e específico for delegado a terceiro, o regime será contratual de direito público, utilizando-se a tarifa, que é receita do próprio particular.57

10. Contribuição de melhoria. A contribuição de melhoria é tratada no Código Tributário Nacional nos artigos 81 e 82. O artigo 81 assim define esse tributo: “Art. 81. A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.” A contribuição de melhoria difere da taxa porque está relacionada diretamente à obra pública e à valorização de imóvel do contribuinte. Seu fato gerador somente ocorre uma vez com relação a uma obra. É a valorização de uma obra pública. Se não ocorrer valorização não ocorrerá a hipótese de incidência e, consequentemente, não haverá a possibilidade de cobrança do tributo.

11. O empréstimo compulsório. A natureza jurídica do empréstimo é controversa. O Supremo Tribunal Federal entendeu inicialmente que não se tratava de um tributo e sim de um empréstimo público. Chegou até a publicar a Súmula 418 que dizia: “O empréstimo compulsório não é tributo, e sua arrecadação não está sujeita à exigência constitucional da prévia autorização orçamentária. Esta súmula foi revogada pelo Recurso Extraordinário 111954-RTJ 126/330-1º/6/1988 e pelos artigos 18, § 3º e 21, § 2º, II da Constituição Federal de 1967 com a redação que lhe foi dada pela Emenda Constitucional nº 1 de 1969. O tema da súmula era relacionado ao princípio da anterioridade que está hoje em dia totalmente resolvido na Constituição

57 Cfr. Autor citado em http://www.juspodivm.com.br/i/a/%7BA359D605-2221-45F9-A18E-B6DB73DE6B68%7D_7.pdf . Zelmo Denari,

citado no artigo, entretanto, entende que quando o Estado presta serviço público diretamente só poderá instituir taxa. (Cf. DANARI, Zelmo . Curso de Direito Tributário. 8. ed. São Paulo : Atlas. 2002. Páginas 103 a 108).

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de 1988, como veremos adiante. Nem o princípio da anterioridade anual nem o da anterioridade nonagesimal aplicam-se aos empréstimos compulsórios para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência.

12. O empréstimo compulsório e o princípio da anterioridade na Constituição de 1988. O empréstimo compulsório está inserido no sistema tributário nacional pela Constituição de 1988, no artigo 148, nos seguintes termos: Art. 148. A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios: I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência; II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, "b". Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição. É importante observar que o empréstimo compulsório somente pode ser introduzido no direito positivo brasileiro por intermédio de lei complementar. Há, ademais, duas espécies de empréstimo compulsório: aquele para atender despesas decorrentes de calamidade pública e guerra externa e aquele relacionado ao investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional. Os princípios da anterioridade anual e nonagesimal devem ser respeitados apenas no caso do inciso II do artigo 148 da Constituição da República. Quando o empréstimo compulsório for implantado por causa de calamidade pública, guerra externa ou sua eminência, o princípio da anterioridade não se aplica. É o que estipula o parágrafo 1º do art. 150 da Constituição Federal. Uma leitura apressada do artigo 148, II da Constituição da República poderá nos induzir ao erro de concluir que somente seria aplicado o princípio da anterioridade anual aos empréstimos compulsórios instituídos no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional. Isto porque o referido inciso apenas se remete à observância do artigo 150, III (b) da Constituição Federal, omitindo por completo a letra (c) do inciso III do mesmo artigo 150. Isto ocorre porque quando da redação do artigo 148 da Constituição da República, ou seja, em 1988, já que a redação do referido artigo nunca foi modificada, não existia o princípio da anuidade nonagesimal, que somente foi introduzida na Carta Magna mediante a emenda nº 42 de 2003. Ocorre que a própria Emenda 42 ao redigir o parágrafo 1º do artigo 150 da Constituição Federal, claramente excluiu a aplicação dos dois princípios da anterioridade ao empréstimo compulsório previsto no inciso I do artigo 148 da Lei Maior, mas não excluiu os empréstimos compulsórios previstos no inciso II do aludido artigo 148 da aplicação dos princípios da anterioridade, nem da anterioridade anual nem da nonagesimal. Por isto, a melhor doutrina58 considera que o princípio da anterioridade, tanto anual como nonagesimal se aplica aos empréstimos compulsórios previstos no inciso II do artigo 148 da Constituição Federal. Para evitar a aparente contradição, a Emenda 42 deveria ter alterado a redação do artigo 148, II, para incluir também a observância do disposto na letra (c) do artigo 150, III, o que infelizmente não o fez.

58 Cfr. Eduardo Sabbag, obra citada, página 475 e 476.

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13. A Natureza jurídica do empréstimo compulsório. O empréstimo compulsório é um tributo e assim é tratado pela maior parte dos juristas nacionais. Há entretanto que reconhecer que existem duas teorias sobre a natureza do empréstimo compulsório. Uma delas define o empréstimo compulsório como uma categoria jurídica autônoma. Sua natureza jurídica seria específica. Não seria uma espécie de tributo, mas um contrato de mútuo coativo, um empréstimo público. É esta a doutrina de HUGO DE BRITO MACHADO. Sem embargo, AMILCAR FALCÃO, ALFREDO AUGUSTO BECKER, PONTES DE MIRANDA, ALIOMAR BALEEIRO, GERALDO ATALIBA, RUBENS GOMES DE SOUSA, RUY BARBOSA NOGUEIRA, entre outros grandes nomes do Direito Tributário pátrio esposaram a doutrina de que o empréstimo compulsório é uma espécie de tributo. É esta a doutrina também de EDUARDO SABBAG. Com efeito, o instituto enquadra-se perfeitamente da definição do artigo 3º do CTN que não distingue entre as prestações tributárias, aquelas que devam ser restituídas ou não.

14. Contribuições sociais. Os artigos 149 e 195 da Constituição da República dispõem: Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos artigos. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.... ......................................................................................................................................................................Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b) a receita ou o faturamento; c) o lucro; II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; III - sobre a receita de concursos de prognósticos. IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar. § 1º - As receitas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios destinadas à seguridade social constarão dos respectivos orçamentos, não integrando o orçamento da União. § 2º - A proposta de orçamento da seguridade social será elaborada de forma integrada pelos órgãos responsáveis pela saúde, previdência social e assistência social, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias, assegurada a cada área a gestão de seus recursos 3º - A pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. § 4º - A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I. § 5º - Nenhum benefício ou serviço da

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seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total. §6º - As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no art. 150, III, "b". § 7º - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei. § 8º O produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais e o pescador artesanal, bem como os respectivos cônjuges, que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, contribuirão para a seguridade social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção e farão jus aos benefícios nos termos da lei. § 9º As contribuições sociais previstas no inciso I do caput deste artigo poderão ter alíquotas ou bases de cálculo diferenciadas, em razão da atividade econômica, da utilização intensiva de mão de obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mercado de trabalho. § 10. A lei definirá os critérios de transferência de recursos para o sistema único de saúde e ações de assistência social da União para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, e dos Estados para os Municípios, observada a respectiva contrapartida de recursos. § 11. É vedada a concessão de remissão ou anistia das contribuições sociais de que tratam os incisos I, a, e II deste artigo, para débitos em montante superior ao fixado em lei complementar. § 12. A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b; e IV do caput, serão não cumulativas. § 13. Aplica-se o disposto no § 12 inclusive na hipótese de substituição gradual, total ou parcial, da contribuição incidente na forma do inciso I, a, pela incidente sobre a receita ou o faturamento.

15. Espécies de contribuição social. As três espécies de contribuições sociais são, portanto: contribuições de intervenção no domínio econômico (art. 149 da CF); contribuições de interesse de categorias profissionais (art. 149 da CF); e contribuições de seguridade social (art. 195 da CF). Por outro lado, da análise do artigo 149 da CF, depreende-se que as contribuições são federais, de competência exclusiva da União (ver art. 149, caput da CF); estaduais e municipais, de competência tanto dos Estados, como do Distrito Federal e dos Municípios (art. 149, §1º da CF); e municipais, de competência dos Municípios e Distrito Federal (art. 194-A da CF).

16. Contribuições sociais não são nem impostos nem taxas. A contribuição social nada tem que ver com imposto já que este tem origem no poder de império do Estado, sucessor do príncipe soberano. A contribuição social apoia-se na solidariedade em relação aos integrantes de um grupo social ou econômico, na busca de uma finalidade, como bem observa EDUARDO SABBAG.59 Com relação à distinção entre contribuição social e taxa, observa ainda o Professor Sabbag: “Da mesma forma, a contribuição não pode ser considerada taxa, por não remunerar serviços cobrados ou disponibilizar aos contribuintes. De fato, havendo referibilidade direta entre a atividade estatal e o sujeito passivo, ter-se-á taxa; se a referibilidade for indireta, sendo desenvolvida para o atendimento do interesse geral, porém

59 Autor e obra citados, página 488.

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deflagrando um especial benefício a uma pessoa ou grupo de pessoas, ter-se-á contribuição.60

17. Classificação dos tributos. HUGO DE BRITO MACHADO assim classifica os tributos:61 (a) quanto à espécie, como foi explicado acima, os tributos são ou impostos ou taxas, ou contribuições de melhoria ou contribuições sociais. Nós e a maior parte da doutrina incluiríamos nessa lista os empréstimos compulsórios. Entretanto, como sabemos, o professor da Universidade do Ceará não considera o empréstimo compulsório tributo; (b) quanto ao órgão que impõe e cobra o tributo, União, Estados e Municípios, os tributos podem ser federais, estaduais ou municipais; (c) quanto à vinculação à atividade do Estado, os tributos são vinculados (taxas, contribuições de melhoria, contribuições sociais) e não vinculados (impostos); (d) quanto à natureza econômica, os tributos são: (i) sobre o comércio exterior, (ii) sobre o patrimônio e a renda; (iii) sobre a produção e a circulação de mercadorias; e (iv) impostos especiais; (e) quanto à função, os tributos podem fiscais, extra fiscais e parafiscais. São fiscais quando seu objetivo é arrecadar recursos financeiros para o Estado. São extra fiscais quando seu objetivo é intervir nos mercados, regulando-os. É o caso, por exemplo do IOF e dos impostos alfandegários. São parafiscais, segundo HUGO DE BRITO MACHADO, quando seu objetivo é o custeio de uma atividade não necessariamente pública. São geralmente cobradas por autarquia, como por exemplo as contribuições ao CREA cobradas dos engenheiros e arquitetos. Data venia, não considero o chamado tributo parafiscal tributo por isto que não estão sujeitos ao princípio da legalidade.

IV. Fontes do Direito TributárioA. Introdução

1. Fontes materiais e fontes formais. O vocábulo fonte significa originalmente nascente de água. Em sentido figurado, como está no Aurélio, quer dizer procedência, proveniência, origem. Ao estudarmos as fontes do Direito Tributário, deparamo-nos com duas possibilidades de aproximação da matéria: as chamadas fontes materiais e as fontes formais.

2. As fontes materiais do Direito. As fontes materiais do direito, estudadas principalmente pela filosofia do Direito ou pelas ciências sociais, são as origens mediatas do fenômeno jurídico, visto como um acontecimento social. Assim, pode-se estudar as fontes do Direito de um ponto de vista histórico, por exemplo, o Direito brasileiro provem principalmente do Direito português, este do Direito romano, mas ambos recebem forte influência atualmente do Direito anglo-saxônico. Dentre as fontes materiais do Direito Positivo estão também as chamadas fontes sociológicas, isto é, as circunstâncias econômico-sociais que fazem aparecer a norma. Também se pode estudar as fontes instrumentais, ou seja, examinar os documentos nos quais foram escritas as regras do Direito. Pode-se estudar ainda as fontes orgânicas das normas: Congresso Nacional, Ditador Militar, Ditador Civil etc.

60 Idem, página 489.61 Autor e obra citados, página 67.

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3. As fontes reais do Direito Tributário. As fontes reais do Direito Tributário são os fatos que fazem surgir a obrigação tributária. RUY BARBOSA NOGUEIRA os define como os suporte fácticos das imposições tributárias (riquezas, bens, transferência de riquezas etc.). Ou seja para o grande tributarista, o fato gerador seria uma fonte real do Direito Tributária. Com a devida venia, parece-me que o fato gerador ou a hipótese de incidência do tributo é fonte da obrigação tributária, mas não é fonte da norma, nem material nem formal e muito menos real.

4. As fontes formais do Direito Tributário. As fontes formais do Direito são as normas propriamente ditas. São as fontes imediatas do jus, ou seja, a Constituição, as leis, os decretos etc.. No caso do Direito Tributário, é sua fonte formal a legislação tributária.

5. Definição de legislação tributária. O artigo 96 do Código Tributário Nacional assim define legislação tributária: “Art. 96. A expressão "legislação tributária" compreende as leis, os tratados e as convenções internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.” Depreende-se claramente deste artigo que há uma profunda diferença entre a expressão legislação tributária e lei tributária. Sabemos que a expressão legislação nos dicionários mais comuns da língua portuguesa quer dizer conjunto de leis acerca de determinada matéria. Esta é pelo menos a definição do Aurélio. Entretanto, em Direito em geral, e em Direito Tributário em particular, legislação é um todo do qual a lei stricto sensu é uma parte. A palavra legislação tributária engloba as leis fiscais, leis delegadas em matéria fiscal, medidas provisórias, os tratados e convenções internacionais que tratam de tributos, os decretos e normas complementares fiscais, como instruções normativas, portarias, resoluções da Fazenda etc. Na minha opinião, as normas constitucionais que tratam de temas tributários incluem-se na legislação tributária, embora o CTN seja silente quanto ao assunto. Também hoje há que acrescentar entre as normas constitucionais e legais as decisões erga omnes do STF: (a) as súmulas vinculantes; (b) as decisões definitivas de mérito nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade (art. 102 § 2º da CF); e (c) as decisões em arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente da CF. É que estas decisões têm força de lei já que obrigam a todos os poderes da República: o Judiciário, o Legislativo e o Executivo a cumpri-las como se leis fossem.

6. Fontes formais primárias e secundárias ou complementares. Do artigo 96 do CTN depreende-se que há fontes formais do Direito Tributário que são mais importantes que outras. São as fontes primárias as normas mais importantes, isto é, aquelas que, sem elas não poderia haver Direito Tributário. São a Constituição Federal e suas emendas, as leis complementares, as constituições estaduais, as leis ordinárias, as leis delegadas, os tratados e convenções internacionais, as medidas provisórias que têm força de lei, decretos legislativos, as resoluções do Congresso Nacional ou de uma das casas do Congresso, e os decretos. As fontes complementares ou secundárias do Direito Tributário estão definidas no artigo 100 do CTN assim: “Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e dos decretos: I - os atos normativos expedidos pelas

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autoridades administrativas; II - as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa; III - as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas; IV - os convênios que entre si celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Parágrafo único. A observância das normas referidas neste artigo exclui a imposição de penalidades, a cobrança de juros de mora e a atualização do valor monetário da base de cálculo do tributo.”

B. As fontes formais do Direito Tributário.

7. A Constituição da República. A Constituição Federal é a lei das leis. Todas as normas jurídicas estão a elas subordinadas. A atual Constituição de 1988 é da maior importância para o direito Tributário. Ela delineia o Sistema Tributário Nacional (artigos 145 a 162), É na Constituição da República que estão explícitas as limitações constitucionais ao poder de tributar (art. 150 a 152) e que estão demarcadas as competências impositivas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, assim como a repartição das receitas tributárias.

8. Emenda à Constituição Federal. As emendas à Constituição, como é óbvio, têm o mesmo nível hierárquico da Constituição original. O procedimento legislativo para a aprovação de emenda está contemplado no artigo 60 da Lei Maior, sendo vedada emenda que tenda a abolir a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos poderes; e os direitos e garantias individuais. As limitações constitucionais ao poder de tributar são direitos e garantias individuais dos cidadãos e portanto são cláusulas pétreas que não podem ser objeto de emenda que prejudique os direitos já outorgados ao Contribuinte pela Constituição vigente.

9. A lei complementar. No direito positivo brasileiro, ao contrário de outros sistemas estrangeiros, existem a lei complementar e a lei ordinária. Segundo alguns juristas importantes do Direito Tributário pátrio, só é lei complementar aquela que se ocupa de matéria que a Constituição reservou para essa espécie de diploma legal, não havendo consequentemente hierarquia entre a lei complementar e a lei ordinária. Entretanto, parece-me que assiste razão a HUGO DE BRITO MACHADO quando ensina: “Aqui podemos dizer, em síntese, que lei ordinária e lei complementar são duas espécies normativas distintas, sendo a última hierarquicamente superior à primeira. E que as leis editadas antes do advento da atual Constituição Federal tratando de matérias que esta reservou à lei complementar continuam válidas e ganharam o status de leis complementares, e só por lei complementar, portanto, podem ser alteradas ou revogadas. É o que aconteceu com o Código Tributário Nacional. Afastando definitivamente a tese segundo a qual a lei complementar identifica-se pelo conteúdo, o artigo 146 – A da CF62, inserido pela Emenda 42, de

62 O artigo 146-A da Constituição Federal dispõe o seguinte: “Art. 146-A. Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de

tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo.”

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19.12.2003, estabeleceu situação na qual é impossível a distinção entre lei ordinária e lei complementar pelo critério de conteúdo. Na verdade, a lei complementar identifica-se pelos elementos formais, de sorte que é lei complementar aquela como tal aprovada pelo Congresso Nacional, seja qual for a matéria da qual se ocupe.63

10. A lei ordinária. A lei ordinária é a fonte mais visível do Direito Tributário. Quando na Constituição da República aparece a expressão lei, ou na forma da lei, sem qualificação, a Carta Magna refere-se à lei ordinária seja federal, estadual ou municipal. A lei ordinária no Direito Tributário está profundamente vinculada ao princípio da legalidade que permeia todos os meandros de nossa disciplina. De acordo com o artigo 97 do Código Tributário Nacional, somente ela pode estabelecer: “I - a instituição de tributos, ou a sua extinção; II - a majoração de tributos, ou sua redução, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65; III - a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo; IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65; V - a cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas; VI - as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades. § 1º Equipara-se à majoração do tributo a modificação da sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso. § 2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo.” EDUARDO SABBAG explica que é a Constituição Federal, que define as competências tributárias e é a Lei Complementar que suplementa a Constituição, mas é a lei ordinária que institui os tributos, que cria os tributos in abstractu.64 Há, entretanto, casos extraordinários de instituição de tributos por lei complementar.65 É o caso do imposto sobre grandes fortunas, até hoje não criado (art. 153, VII da CF); dos empréstimos compulsórios (art. 148 da CF); dos impostos residuais (art. 154, I) e das contribuições sociais residuais (art.195, § 4º).

11. Princípio da tipicidade. Convém lembrar que o princípio da estrita legalidade estabelecido no artigo 97 do CTN transcrito acima coloca a lei ordinária no centro do Direito Tributário assim como está também no centro do Direito Penal. É o também chamado princípio da tipicidade que o grande tributarista português ALBERTO XAVIER considera a expressão mesma do princípio da legalidade.66 O conjunto de normas que cria o Direito Tributário se consubstancia como uma tipologia fechada e exauriente, ou seja, que se exaure, que se esgota. Assim, a lei ordinária deve fixar claramente o fato gerador, a alíquota, a base de cálculo, o sujeito passivo do tributo e a multa.

12. Majoração do tributo. O princípio da legalidade aplica-se à majoração do tributo ressalvada a possibilidade de aumento ou redução de alíquotas nos casos de imposto de importação (II), imposto de exportação (IE), imposto sobre produtos

63 Autor e obra citada, página 79.64 Ou seja, de forma abstrata. O tributo passa a existir in concreto, isto é, concretamente, quando se realiza o fato gerador.65 Eduardo Sabbag, obra citada, página 579.66 Alberto Xavier, Os Princípios da Legalidade e da Tipicidade da Tributação, São Paulo: RT, 1978, páginas 69 e 70. Apud Eduardo Sabbag, obra citada, página 579.

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industrializados (IPI), imposto sobre operações financeiras (IOF), CIDE-Combustível e ICMS-Combustível. É importante ressaltar que a atualização do valor monetário da base de cálculo não constitui majoração. No Brasil, acostumado a altos índices de inflação, considera-se que a não atualização monetária do valor do débito implica enriquecimento sem causa do devedor.

13. Multas. A multa e outras penalidades no Direito Tributário, como sabemos, não se confunde com o tributo. É o que claramente está disposto no artigo 3º do CTN. Entretanto somente pode ser estabelecida por lei.

14. Tratados e convenções internacionais. Os tratados e convenções internacionais são normalmente expressões sinônimas. Com exceção dos tratados e convenções sobre direitos humanos67, que ficam no mesmo nível hierárquico da Constituição, os tratados equivalem-se a leis ordinárias e têm de se submeter às normas constitucionais federais (cfr. Art. 102, III (b) da Constituição da República.) O Código Tributário Nacional, porém, esposando uma posição internacionalista dispõe em seu artigo 98 que os tratados e convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna e serão observados pela que lhes sobrevenha. No Direito Tributário os tratados são importantes, principalmente com relação a tributos relacionados com o comércio exterior e aqueles que incidem sobre a renda. Muitas convenções internacionais têm sido celebradas, principalmente para evitar a bitributação, que é o fenômeno pelo qual um mesmo fato gerador dá origem a tributos em países diferentes.68 No conflito entre o tratado e a lei interna, não há dúvida que o artigo 98 acima mencionado do CTN assegura o primado dos tratados internacionais sobre a lei interna. É o que estabelece a Constituição Francesa de 1958. Sem embargo, há resistências no direito pátrio à aplicação pura e simples do indigitado artigo 98. A tendência da doutrina e jurisprudência brasileiras é a de aplicar o chamado monismo nacionalista moderado. Por este princípio doutrinário, lei e tratado se equivalem. O tratado depois de formalizado tem força de lei, mas perde a eficácia se lei posterior é sancionada e é com ele incompatível. Aplicar-se-á, de acordo com esta doutrina o princípio lex posterior derogat priori (a lei posterior revoga a anterior.) Em 1977 o Supremo Tribunal Federal decidiu em matéria cambial (nota promissória) que o tratado internacional não se sobrepõe a lei interna do país. 69 Entretanto esta foi uma decisão de 1977, no auge da Ditadura Militar e que não tratava de matéria tributária. Ademais estávamos sob a vigência de outra constituição. Sobre o assunto, ensina HUGO DE BRITO MACHADO com cuja doutrina nos identificamos: “O plenário do STF já decidiu, por maioria de votos pela prevalência de lei ordinária posterior ao tratado (RTJ 83/809)70. Tal entendimento fundou-se na ausência, na Constituição Federal, de norma garantidora da supremacia dos tratados em relação à lei ordinária. Em matéria tributária, porém, mesmo em face de

67 O parágrafo 3º do inciso LXXXVIII do artigo 5º da Constituição da República, introduzido pela Emenda constitucional nº 45, elevou os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos ao nível de emendas à própria Constituição Federal, desde que sejam aprovadas em dois turnos, por três quintos dos respectivos membros de cada casa do Congresso Nacional.68 O procedimento de celebração de tratados é matéria de Direito Internacional Público, mas está bem explicada por Eduardo Sabbag na obra citada, na páginas 573 e 574.69 Cfr. RE 80.004 de 29-12-1977. Relator para o acórdão, Ministro Cunha Peixoto.70 Trata-se da transcrição na Revista Trimestral de Jurisprudência número 83, na página 809, do inteiro teor do acórdão referido na tota 65 anterior.

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orientação jurisprudencial da Corte Maior, tem-se de considerar o disposto no art. 98 do CTN, de sorte que a lei posterior ao tratado, para prevalecer sobre ele, em matéria tributária, terá de ser uma lei complementar...Assim, temos fortalecido o nosso entendimento, no sentido de que os tratados internacionais não podem ser revogados por lei interna. Tanto no plano da ciência do Direito, como no plano ético.”71

15. A lei delegada. As leis delegadas estão descritas no artigo 68 da Constituição Federal. São atos normativos, com força de lei, elaborados pelo Poder Executivo, que para tanto tem de haver recebido poderes especiais do Poder Legislativo. Dispõe o caput do artigo 68 da Constituição Federal: “Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.” A lei delegada está em desuso tendo em vista que o Poder Executivo, nos casos de relevância e urgência, tem preferido utilizar a medida provisória. Por outro lado, é muito difícil que o Congresso Nacional delegue ao Executivo suas faculdades de legislar. A delegação ao Presidente da República terá a forma de resolução do Congresso Nacional conforme estabelece o parágrafo 2º do mencionado artigo 68. A lei delegada goza da mesma hierarquia da lei ordinária.

16. Medida provisória. As medidas provisórias estão disciplinadas no artigo 62 da Constituição Federal que dispõe: Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. §1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I - relativa a: a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; II - que vise a detenção ou sequestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III - reservada a lei complementar; IV - já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República. § 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada. § 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes. § 4º O prazo a que se refere o § 3º contar-se-á da publicação da medida provisória, suspendendo-se durante os períodos de recesso do Congresso Nacional. § 5º A deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos constitucionais.§ 6º Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma

71 Ver autor e obra citados, páginas 84 e 85.

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das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando. § 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional. § 8º As medidas provisórias terão sua votação iniciada na Câmara dos Deputados. § 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional. § 10. É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo. § 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas. § 12. Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto.

17. Princípio da anterioridade e a medida provisória. De acordo com o parágrafo 2º do artigo 62 acima transcrito, as medidas provisórias não podem instituir ou aumentar impostos salvo os excluídos do princípio da anterioridade tributária. Portanto, somente instituem os tributos não mencionados no parágrafo 2º referido, ou os aumentam após se transformarem em lei. Assim, os impostos sujeitos ao princípio da anterioridade anual só podem ser cobrados a partir do exercício seguinte àquele em que ocorrer a publicação da lei que os instituiu ou aumentou. Apesar de a Constituição falar de impostos, HUGO DE BRITO MACHADO aplica o mesmo princípio a qualquer tributo por considerar a norma do artigo 62 parágrafo 2º meramente interpretativa. Da mesma maneira o ilustre magistrado cearense considera que a anterioridade nonagesimal, a que se sujeitam as contribuições sociais (cfr. art. 195, § 6º da CF) seria contada a partir da publicação da lei que tenha convertido a medida provisória.72 Data venia, considero que a medida provisória pode instituir e majorar tributos que não sejam impostos antes mesmo de se tornar lei ordinária, respeitado o princípio da anterioridade, seja anual ou nonagesimal, isto tendo em vista o princípio interpretativo que estabelece que não se distingue onde a lei distingue e vice-versa (Ubi lex non distinguit nec nos distinguire debemus, ou seja onde a lei não distingue nós não devemos distinguir.) Ora, no caso, a Constituição fala de impostos e não de tributos. Finalmente, cabe ressaltar que a medida provisória não pode tratar de matéria reservada à lei complementar. Não pode, portanto, alterar o Código Tributário Nacional.

18. Resolução. Eduardo Sabbag assim define resolução: “resolução é o ato legislativo emanado do Congresso Nacional (ou de uma de suas Casas), em decorrência do exercício da sua competência, não estando sujeita à sanção do Presidente da República, o que leva alguns estudiosos a intitulá-la, ao lado dos decretos legislativos, de lei sem sanção.” A Resolução tem força de lei. É, portanto, fonte formal principal do Direito Tributário. É o que dispõe o artigo 59, VII, da

72 Cfr. autor e obra citada, página 83.

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Constituição da República que estipula: “Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de: I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções. Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis.” São as resoluções do Congresso Nacional que delegam ao Presidente da República a faculdade de elaborar uma lei delegada; e rejeitam medidas provisórias. Entretanto, no Direito Tributário, são as resoluções do Senado Federal que mais interessam. São as resoluções relacionadas com impostos estaduais. As alíquotas de três impostos estaduais podem ter seus limites máximos e mínimos estipulados por resoluções do Senado Federal. São as do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação), as do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) e as do IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores).

19. O Decreto. O artigo 99 do CTN assim dispõe: “Art. 99. O conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais sejam expedidos, determinados com observância das regras de interpretação estabelecidas nesta Lei.” No Direito Tributário há muitos decretos e regulamentos aprovados por decretos do Poder Executivo, seja Federal, Estadual ou Municipal. O decreto obviamente é norma infra legal, não podendo alterar a lei nem tratar de matéria reservada à lei. Como acentua HUGO DE BRITO MACHADO, o decreto tem grande importância. Ele se presta para a consolidação de um texto único que explicita várias leis esparsas. É o caso de grandes regulamentos, como o RIR (Regulamento do Imposto de Renda) ou o RIPI (Regulamento do Imposto sobre Produtos Industrializados).73 O decreto, além de explicitar textos legais, estabelece meios e formas para o cumprimento das leis.

20. Normas complementares. As normas complementares são fonte formais secundárias do Direito Tributário e estão definidas no CTN, em seu artigo 100, assim: “ Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e dos decretos: I - os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas; II - as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa, a que a lei atribua eficácia normativa; III - as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas; IV - os convênios que entre si celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Parágrafo único. A observância das normas referidas neste artigo exclui a imposição de penalidades, a cobrança de juros de mora e a atualização do valor monetário da base de cálculo do tributo.” As normas complementares não podem inovar nem em relação à lei nem em relação ao decreto.

73 Cfr. autor e obra citada, página 86

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V. A VIGÊNCIA DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA

1. Conceito de vigência. Norma vigente é aquela que, quando eficaz, é aplicada validamente pelo Estado sempre que a hipótese de incidência nela prevista se concretiza. Para que a norma seja válida e portanto o Estado possa aplicá-la, é necessário que seja emitida pelo poder competente de acordo com o rito correto e que tenha obedecido os pressupostos formais e materiais na sua edição. Por exemplo, a lei que não foi publicada não está ainda vigente, por não ter cumprido um pressuposto formal. Uma medida provisória que procura revogar o Código Tributário Nacional, é uma medida não vigente já que, de acordo com a Constituição da República, é proibida a edição de medida provisória para regrar matéria reservada a lei complementar (Art. 62, § 1º, III da Constituição Federal).

2. Vigência no tempo. O artigo 101 inserido no Capítulo II do Título I do Código Tributário Nacional dispõe: “Art. 101- A vigência no espaço e no tempo da legislação tributária rege-se pelas disposições legais aplicáveis às normas jurídicas em geral, ressalvado o previsto neste capítulo.” Neste diapasão, no caso de que a lei tributária não indique o início de sua vigência, esta começa, conforme estabelece o art. 1º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (Decreto-lei 4.657 de 1942). O referido artigo dispõe: “salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada. É importante entretanto observar que esta regra tem exceções e, neste caso, as exceções são mais numerosas do que a regra. Quase sempre, no Brasil, por disposição expressa de cada lei, esta entra em vigor na data de sua publicação. Se, entretanto, a lei não dispuser quando entra em vigor, vigorará no 45º dia de sua publicação. Durante os 45 dias em que, apesar de válida, a lei ainda não está vigente, ocorre o que se chama vacatio legis (vacância de lei).

3. Recomendações de lei complementar ao legislador. A Lei Complementar 95/1998, que trata da elaboração das leis, indica que a vigência de cada uma delas deve ser estabelecida expressamente em cada diploma legal. O início da vigência de qualquer lei, portanto, deve estar demarcado sempre74, segundo a referida Lei Complementar, em cada diploma legal, obedecendo o princípio de dar a todos um prazo razoável para que se possa conhecer amplamente o conteúdo das novas normas que passarão a vigorar. Trata-se, como é óbvio, de um preceito que mais se dirige ao legislador do que ao cidadão comum.

4. Contagem do prazo do início da vigência. A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral. (cfr. § 1º

74 Caso não esteja demarcado por descuido do legislador, aplica-se o art. 1º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro supra transcrito.

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do art. 8º da Lei Complementar 95/1998, com a redação que lhe deu a Lei Complementar 107/2001).

5. Vigência e eficácia. Não confundamos vigência com eficácia. A lei pode estar vigente, mas não ser eficaz. A lei somente pode ser aplicada se além de vigente, possuir eficácia. Por exemplo, uma lei que aumente o ISS, publicada em 15 de fevereiro de 2011 e que expressamente diga que entra em vigor no dia de sua publicação, apesar de vigente em 15 de fevereiro de 2011, somente será eficaz em 1º de janeiro de 2012 por força do princípio constitucional da anterioridade anual, já explicado nesta apostila. O mesmo ocorre com as leis que necessitam de regulamentação, ou seja, não são autoaplicáveis. A respeito trata a seguinte ementa do Superior Tribunal de Justiça (STJ):

“EMENTA: TRIBUTÁRIO E CIVIL (...) 4. Distinção entre eficácia e vigência. No caso de leis que necessitam de regulamentação, sua eficácia opera-se após a entrada em vigor do respectivo decreto ou regulamento. O regulamento transforma a estática da lei em condição dinâmica. É lícito ao regulamento, sem alterar o mandamento legal, estabelecer o termo a quo de incidência da novel norma tributária. Uma vez prometido pela lei um termo inicial, ele não pode ser interpretado de forma a surpreender o contribuinte, nem o fisco, posto que a isto corresponde violar a ratio essendi do princípio da anterioridade e da própria legalidade. (...)(Resp. 408.621/RS, 1ª Turma, Relator: Ministro Luiz Fux) Publicado em 08-10-2002)75

6. Vigência da norma complementar. A vigência das normas complementares do Direito Tributário, definidas no artigo 100 do Código Tributário Nacional (CTN), também denominadas de fontes formais secundárias do Direito Tributário, está regulada no artigo 103 do mesmo CTN, que estabelece: “Art. 103. Salvo disposição em contrário, entram em vigor: I - os atos administrativos a que se refere o inciso I do artigo 100, na data da sua publicação; II - as decisões a que se refere o inciso II do artigo 100, quanto a seus efeitos normativos, 30 (trinta) dias após a data da sua publicação; III - os convênios a que se refere o inciso IV do artigo 100, na data neles prevista.”

7. Interpretação do Art. 104 do CTN. Estabelece o artigo 104 do CTN: “Art. 104. Entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a sua publicação os dispositivos de lei, referentes a impostos sobre o patrimônio ou a renda: I - que instituem ou majoram tais impostos; II - que definem novas hipóteses de incidência; III - que extinguem ou reduzem isenções, salvo se a lei dispuser de maneira mais favorável ao contribuinte, e observado o disposto no artigo 178.” Segundo EDUARDO SABBAG, este dispositivo não se afastaria do disposto na Constituição da República já que trata de vigência e não de eficácia. O artigo 104 do CTN regularia regra especial de vigência de algumas leis tributárias.76 Entretanto, para HUGO DE BRITO MACHADO e LEANDRO V. PAULSEN, os incisos I e II do artigo 104 do CTN estão revogados por isto que o artigo 150 da Constituição Federal, quando trata do princípio da anterioridade, aplica o referido princípio aos tributos em geral e não somente aos impostos sobre o patrimônio e a renda.77 A Constituição da República teria tratado a matéria de maneira diferente. Lembra EDUARDO SABBAG que em concursos públicos, o artigo vem sendo considerado em vigor. Com relação ao inciso III do artigo 104 do CTN, sem dúvida há uma regra especial de vigência que protege o contribuinte. Refere-se o mencionado inciso ao Artigo 178 do CTN, o qual dispõe: “Art. 176. A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer

75 Apud, Eduardo Sabbag, obra citada, página 634.76Cfr. Autor e obra citados, página 640.77 Cfr. Leandro V. Paulsen, Direito Tributário: Constituição e Código Tributário Nacional à luz da doutrina e da jurisprudência , 9ª edição. Porto Alegre, Livraria do Advogado, página 856 e Hugo de Brito Machado, obra citada, página 95. Apud Eduardo Sabbag, obra citada, página 640.

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tempo, observado o disposto no inciso III do artigo 104.” Assim, resumindo, a melhor doutrina considera os inciso I e II do artigo 104 do CTN revogados pelo artigo 150 da Constituição Federal. Entretanto, na esteira de EDUARDO SABBAG, em concursos públicos, considera-se que ambos os incisos ainda estão vigentes. Já com relação ao inciso III do aludido artigo 104 do CTN, há consenso de que se encontra vigente e seu dispositivo está atrelado ao artigo 176 do mesmo CTN. Conclui-se então que, com relação a impostos que incidam sobre o patrimônio e à renda, as leis que extinguem ou reduzem isenções, salvo se forem mais favoráveis ao contribuinte, somente entram em vigor no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que ocorra a publicação de ditas leis, sendo certo que se a isenção for concedida por prazo certo e em função de determinadas condições não pode ser revogada.

8. A vigência da legislação tributária no espaço. A questão da vigência da lei tributária no espaço está regulada pelo artigo 102 do Código Tributário Nacional que estipula: “Art. 102. A legislação tributária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios vigora, no País, fora dos respectivos territórios, nos limites em que lhe reconheçam extraterritorialidade os convênios de que participem, ou do que disponham esta ou outras leis de normas gerais expedidas pela União.” Normalmente, a lei tributária, como quaisquer outras leis, vigoram somente dentro do território do Estado que as emitiu. Excepcionalmente, pode a norma jurídica vigorar para além dos territórios dos Estados que em que foram editadas. É o caso de normas sujeitas a convênios entre diversos Estados, o Distrito Federal e os Municípios.

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VI. A INTERPRETAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA

1. Conceito de interpretação. Como observa HUGO DE BRITO MACHADO, o vocábulo interpretação tem pelo menos duas acepções. Tanto significa a atividade do intérprete como o resultado desta.78 O que cabe tratar aqui é a interpretação da norma jurídica (hermenêutica jurídica), mais especificamente da norma jurídica tributária.

2. Diferença entre interpretação e integração. Segundo o dicionário de Antônio Houaiss, interpretar significa “determinar o significado preciso de (texto, lei etc.)” Assim, interpretar uma norma é dizer o que ela significa. Já integrar, de acordo com o mesmo dicionário, quer dizer, incluir(se) (um elemento) num conjunto, formando um todo coerente; incorporar(-se), integralizar(-se).” Portanto, integrar uma norma jurídica ao sistema é incorporar uma nova norma que não está presente na legislação. A integração ocorre quando há uma lacuna na lei, ou seja quando não existe uma norma jurídica que regule uma dada situação.

3. Integração no Direito Comum. A integração faz-se necessária porque o juiz não pode se eximir de decidir nenhum caso alegando obscuridade ou lacuna na lei. É o que determina o art. 126 do Código de Processo Civil. Por isso, o artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do do Direito Brasileiro (Decreto-lei nº 4.707 de 1942) dispõe que: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.” Esta regra foi ligeiramente modificada no caso do Direito Tributário.

4. Integração no Direito Tributário. No Direito Tributário a integração é tratada no artigo 108 do Código Tributário Nacional assim: “Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada: I - a analogia; II - os princípios gerais de direito tributário; III - os princípios gerais de direito público; IV - a equidade. § 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei. § 2º O emprego da equidade não poderá resultar na dispensa do pagamento de tributo devido.”

78 Cfr. Autor e obra citada, página 102.

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5. Analogia. Analogia é a aplicação, na falta de uma norma expressa para um caso específico, de uma regra que normalmente se enquadra em casos semelhantes ou análogos. A analogia no Direito Tributário não pode ser empregada para exigir tributo. Isso em homenagem ao princípio da legalidade. Não pode tampouco ser utilizada para introduzir penalidades que não estão previstas na lei tendo em vista que o princípio do Direito Penal nulla poena sine lege aplica-se ao Direito Tributário por força, entre outras normas79, do inciso V do artigo 97 do Código Tributário Nacional.

6. Princípios gerais de Direito Tributário. Assim EDUARDO SABBAG define os princípios gerais do Direito Tributário: “ (são aqueles) primados que, explícita ou implicitamente se irradiam pelo subsistema das normas tributárias, penetrando-as e ativando-as em certa direção.”80 Muitos desses princípios estão na Constituição Federal, como o da legalidade, o da anterioridade tributária, o da irretroatividade tributária, da isonomia, da liberdade de tráfego de pessoas e bens, o da proibição do confisco etc.

7. Princípios gerais de Direito Público. São preceitos que estão plasmados na Constituição Federal ou que se depreendem do nosso direito positivo. Entre outros, destaca EDUARDO SABBAG: (a) quem pode mais, pode menos; (b) o todo explica as partes; (c) as exceções são restritas; (d) princípio de ampla defesa e do contraditório; (e) princípio da moralidade administrativa; (f) princípio da presunção da inocência; etc.

8. A equidade. A equidade é a suavização da pena para que haja justiça. Quando a pena é exagerada no caso concreto, quando há lacuna da lei, falhando a analogia, não havendo princípios gerais, já seja de Direito Tributário ou de Direito Público a serem aplicados, pode o intérprete recorrer à equidade sempre que não resulte na dispensa do pagamento do tributo devido, isso por causa do princípio da estrita legalidade, que dispõe que somente a lei pode criar e dispensar o pagamento de tributos.

9. Classificação da interpretação segundo a fonte de onde provém. A interpretação da norma jurídica pode ser autêntica, jurisprudencial ou doutrinária, conforme seja a identidade do intérprete. Diz-se que a interpretação é autêntica quando realizada pelo mesmo órgão que criou a norma. Assim a interpretação autêntica de uma lei emana do Poder Legislativo através de uma outra lei. Muitas vezes a nova lei que se autodenomina interpretativa, na realidade cria novas normas e, por esse motivo, deixa de ser considerada interpretativa pelos tribunais e pela doutrina. A interpretação é jurisprudencial quando realizada pelo Poder Judiciário, o poder político que aliás tem como principal função interpretar o direito positivo e aplicá-lo aos casos concretos. A interpretação é doutrinária quando realizada por juristas, isto é, estudiosos do Direito. Muitas vezes a interpretação jurisprudencial se baseia na doutrinária e vice-versa.

10. Métodos de interpretação. Há muitos métodos de interpretação e nenhum deles é perfeito. Hoje em dia há um consenso que o intérprete deve utilizar vários métodos de interpretação para alcançar o significado da norma e aplicá-la aos casos concretos. Também, como observa HUGO DE BRITO MACHADO: “a interpretação jurídica é o conhecimento da norma, impregnado de inevitável conteúdo axiológico. Com efeito, a cada dia que passa, os tribunais interpretam as leis com fulcro nos valores democráticos do Estado de Direito que estão inseridos na Constituição Federal.

79 O inciso XXXIX da Constituição da República dispõe que “não há crime sem lei anterior que o defina nem pena sem prévia cominação legal.”Assim, mesmo que o CTN fosse silente sobre o assunto, não poderia haver pena na área tributária que não estivesse prevista em lei.80 Autor e obra citados, página 670.

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11. Interpretação gramatical, lógico gramatical, filológica ou léxica. A hermenêutica jurídica, entre os métodos de interpretação, destaca a exegese gramatical como a primeira que ocorre ao intérprete. É a interpretação conforme o texto. Vale o que está escrito. Utiliza regras de linguística, analisa a pontuação, a etimologia das palavras para entender o conteúdo da norma. É um método limitado porque pode levar a conclusões fora do contexto, chegando a verdadeiros absurdos.

12. Interpretação lógica. É a interpretação da norma dentro do contexto. Procura descobrir o que o legislador quis dizer e não necessariamente o que disse, utilizando as regras da lógica, que são estudadas principalmente em filosofia e matemática.

13. Interpretação histórica. É o estudo das origens da norma. Porque nasceu, como foi discutida, como foi aprovada. Os debates entre os parlamentares que elaboraram a norma são de fundamental importância na utilização do método de interpretação histórica.

14. Interpretação teleológica. Busca o objetivo da norma, o porquê foi criada. Muitas vezes a interpretação teleológica corrige a percepção literal da norma. É quando se descobre que a leitura exclusivamente literal da lei leva a um resultado diferente daquele querido pelo legislador.

15. Interpretação sistemática. Por este método, insere-se a norma no conjunto das outras normas vigentes, ou seja ao sistema jurídico existente para que a eles harmonicamente se ajustem. Como ensinou RUY BARBOSA NOGUEIRA: “o direito não é escrito apenas por meios de textos, mas também de contextos ou textos interligados, compondo uma estrutura ou sistema de normas gerais especiais e específicas.”81

16. Interpretação evolutiva. É método que se aplica mais a novas leituras da Constituição. É no dizer de Luís Roberto Barroso: a atribuição de novos conteúdos à norma constitucional sem modificação de seu teor literal, em razão de mudanças históricas ou de fatores políticos e sociais que não estavam presentes nas mentes dos constituintes.”82

17. Interpretação econômica. Por este método hermenêutico, o intérprete deve considerar acima de tudo os efeitos econômicos da norma. O parágrafo único do artigo 116 do CTN (denominada de norma geral anti elisão, ou norma antielisiva83) introduzido pela lei complementar 104 de de 2001 parece valorizar a interpretação econômica. Dispõe: “Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.”

18. Interpretação quanto aos resultados. Quanto ao resultado, a interpretação pode ser declarativa, extensiva ou restritiva. É declarativa quando busca meramente declarar o que o legislador quis dizer. É extensiva ou ampliativa quando amplia o alcance do texto para abranger situações semelhantes àquela expressa na norma. É restritiva, quando, ao contrário, não se amplia o alcance da exegese, que, ao contrário, restringe-se praticamente a uma percepção literal da norma.

19. A interpretação da norma tributária de acordo com o Código Tributário Nacional. O CTN trata da interpretação da legislação tributária nos artigos 107 e de 109 a 112 nos

81 Idem, página 655.82 Ibidem, página 656.83 O parágrafo obriga o intérprete a optar pela percepção substancial em detrimento da formal.

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seguintes termos: “Art. 107. A legislação tributária será interpretada conforme o disposto neste Capítulo. Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários. Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre: I - suspensão ou exclusão do crédito tributário; II - outorga de isenção; III - dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias. Art. 112. A lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades, interpreta-se da maneira mais favorável ao acusado, em caso de dúvida quanto: I - à capitulação legal do fato; II - à natureza ou às circunstâncias materiais do fato, ou à natureza ou extensão dos seus efeitos; III - à autoria, imputabilidade, ou punibilidade; IV - à natureza da penalidade aplicável, ou à sua graduação.” O alcance dos artigos 109 e 110 é que, se determinado conceito legal de Direito Privado não for adequado aos fins do Direito Tributário, o legislador pode adaptá-lo. Entretanto, se a Constituição Federal, as Constituições Estaduais ou as leis orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios referirem-se a institutos, conceitos ou formas de Direito Privado para definir ou limitar competências tributárias, esses institutos, conceitos ou formas não podem ser modificados pela legislação tributária porque as modificações contrariariam normas hierarquicamente superiores. O artigo 111 impõe a exegese literal da norma tributária que disponha sobre a suspensão do crédito tributário, a concessão de isenção e a dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias por isto que tais benesses são exceções às normas impositivas. Finalmente, na esteira do Direito Penal, o artigo 112 oferece ao acusado de infrações tributárias o privilégio de que lhe seja aplicado o princípio in dúbio pro reo.

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VII. A RELAÇÃO JURÍDICO TRIBUTÁRIA

1. A relação jurídica tributária. Dá-se uma relação jurídico tributária quando ocorre um fato gerador (fato ou ato jurídico) definido na hipótese de incidência descrito em lei. Surge então uma obrigação tributária e, consequentemente, um crédito tributário.84

2. A hipótese de incidência. A hipótese de incidência é a descrição abstrata na lei de um fato jurídico, de um ato jurídico ou de um negócio jurídico, que ao concretizar-se no mundo dos fenômenos, constitui-se no fato gerador de um tributo. A hipótese de incidência não se confunde com o fato gerador. A hipótese de incidência é uma mera conjectura, está no mundo das coisas abstratas. Já o fato gerador é um fato concreto, que realmente ocorreu no mundo das coisas concretas.

3. Fato gerador ou fato imponível. O fato gerador da obrigação tributária principal assim está definido no art. 114 do Código Tributário Nacional: “Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.” Já o fato gerador da obrigação acessória assim está definido no artigo 115 do CTN: Fato gerador da obrigação acessória é qualquer situação que, na forma da legislação aplicável, impõe a prática ou a abstenção de ato que não configure obrigação principal.” Fato gerador ou fato imponível é, portanto, a hipótese de incidência materializada, concretizada. É através da subsunção 85 que se percebe o fato gerador como o fato descrito no paradigma legal, ou seja na hipótese de incidência. Ressalte-se que a natureza jurídica do tributo é determinada pelo fato gerador sendo irrelevante para qualificá-la tanto a denominação e demais características formais adotadas pela lei quanto a destinação legal do produto de sua arrecadação (art. 4º do CTN).

4. Incidência sobre atos ilícitos. O tributo pode incidir sobre atividades lícitas, ilícitas ou imorais. É o chamado princípio do non olet (não tem cheiro)86. De fato, como observa Eduardo Sabbag, o

84 Com se verá no capítulo seguinte, o crédito tributário formaliza-se apenas após o lançamento, sendo portanto a obrigação tributária conceitualmente diferente do crédito tributário, apesar de o CTN em seu art. 139 afirmar que têm a mesma natureza.85 Ocorre a subsunção quando se concebe um indivíduo fazendo parte de uma espécie, quando se reconhece que ocorreu um fato descrito na lei. 86 Sobre a expressão non olet, esclarece Átila Da Rold Roesler: “É princípio consagrado em Direito Tributário que o tributo deve incidir sobre as atividades lícitas e, da mesma forma, sobre aquelas consideradas ilícitas ou imorais. Isso ocorre de acordo com o princípio pecúnia non olet, segundo o qual, para o Estado, o dinheiro não tem cheiro que se traduz na conhecida expressão pecunia non olet. Aliomar Baleeiro lembra que a cláusula surgiu a partir do diálogo ocorrido entre o Imperador Vespasiano e seu filho Tito, quando este se pôs a indagar o pai sobre a razão pela

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Direito Tributário preocupa-se tão-somente sobre a relação econômica relativa a um determinado negócio jurídico87, o que claramente está contemplado no art. 118 do CTN nestes termos: “Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se: I - da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos; II - dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos.” Assim, são tributáveis fatos geradores que correspondam a atos nulos, anuláveis, ilícitos. Há que se fazer uma interpretação objetiva do fato gerador. Assim, o tributo pode ser cobrado com base em atos realizados por pessoas absolutamente incapazes ou empresas irregulares. A jurisprudência consagra esse entendimento, como se observa em leading case do STJ, que concluiu: “...a situação irregular da empresa no DF não afasta a obrigação de recolher o tributo, pois a capacidade tributária de uma empresa independe da constatação da regularidade de sua formação” (CC-conflito de Competência 37.768/SP, rel. Ministro Gilson Dipp, 3ª T., j. 11-06-2003).88

5. Quando ocorre o fato gerador? Dispõem os artigos 116, 117 e 118 do Código Tributário Nacional: “Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que o se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios; II - tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável. Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001). Art. 117. Para os efeitos do inciso II do artigo anterior e salvo disposição de lei em contrário, os atos ou negócios jurídicos condicionais reputam-se perfeitos e acabados: I - sendo suspensiva a condição, desde o momento de seu implemento; II - sendo resolutória a condição, desde o momento da prática do ato ou da celebração do negócio. Art. 118. A definição legal do fato gerador é interpretada abstraindo-se: I - da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da

qual se decidiu tributar os usuários de banheiros públicos na Roma Antiga. Assim, o Imperador justificou a incidência do tributo respondendo que o dinheiro não tem cheiro, não importando para o Estado a fonte de que provenha ( Direito tributário brasileiro. Atualizado por Misabel Abreu Machado Derzi, 11ª. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 714). Em outras palavras, pouco importa para o Fisco, desde tempos antigos, se a atividade praticada pelo contribuinte é "limpa" ou "suja". (cfr. site http://jus.com.br/revista/texto/13631/a-clausula-pecunia-non-olet-em-direito-tributario ) Leia mais em: http://jus.com.br/revista/texto/13631/a-clausula-pecunia-non-olet-em-direito-tributario#ixzz1wNp5viSq87 Ver Eduardo Sabbag, obra citada, página 653.88

O inteiro teor da ementa deste acórdão é o seguinte: “EMENTACRIMINAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. SONEGAÇÃO DE ICMS.EMPRESA SEDIADA EM BRASÍLIA. MERCADORIAS ADQUIRIDAS EM SÃO PAULOE VENDIDAS PARA PREFEITURA DESSE MESMO ESTADO. CIRCULAÇÃO FÍSICASOMENTE EM SÃO PAULO. IRRELEVÂNCIA. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA.CIRCULAÇÃO ECONÔMICA OU JURÍDICA. IRREGULARIDADE DA EMPRESA.CAPACIDADE TRIBUTÁRIA INDEPENDENTE. CIRCULAÇÃO JURÍDICACARACTERIZADA, EM FUNÇÃO DA MODIFICAÇÃO DA TITULARIDADE DOSBENS. CONFLITO CONHECIDO.I – Tratando-se de Empresa com sede no Distrito Federal e sem filiais em outras unidades da Federação, torna-se irrelevante o fato de a compra e venda de mercadorias ter ocorrido em São Paulo, sem a entrada física dos bens no Distrito Federal.II – O fato gerador do ICMS é a circulação de mercadorias e a hipótese de incidência ocorre não só quando da circulação física dos bens, mas, também, quando há circulação econômica ou jurídica.III - A situação irregular da Empresa no Distrito Federal não afasta a obrigação de recolher o tributo, pois a capacidade tributária de uma empresa independe da constatação da regularidade de sua formação.IV - Caracterizada, em princípio, a circulação jurídica das mercadorias, que deveria constar nos documentos contábeis da empresa, devido à modificação da titularidade dos bens.V - Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 4ª Vara Criminal de Brasília – DF, o Suscitado.”

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natureza do seu objeto ou dos seus efeitos; II - dos efeitos dos fatos efetivamente ocorridos .” Assim, quando há uma condição suspensiva em um negócio jurídico que seja um fato gerador, somente se considera que ocorreu a hipótese de incidência quando aconteça o fato correspondente à condição. Quando a condição for resolutória, considera-se que ocorreu o fato gerador quando o negócio foi celebrado. Também, para evitar a evasão, quando o contribuinte simular um ato para evitar a ocorrência do fato gerador, pode a autoridade tributária lançar o tributo como se o ato não fora simulado, ou seja, o lançamento se faz como se o ato esperado para a consecução do objetivo querido pelo contribuinte tivesse sido realizado normalmente. É o caso de doação disfarçada de mútuo (empréstimo) para evitar o imposto de transmissão inter-vivos. A evasão legal ocorre quando o contribuinte escolhe praticar um ato, sem que ocorra a simulação, que não configura o fato gerador previsto na lei como hipótese de incidência.

6. Fatos geradores instantâneos, periódicos ou complexos e continuados. Diz-se que um fato gerador é instantâneo ou simples quando ocorre em um momento, mediante o acontecimento do fato gerador em uma pequena fração de tempo (em um instante, por exemplo: nos fatos que causam a incidência do ICMS, do IPI, do ITBI do ITCMD etc.). O fato gerador é periódico ou complexo quando sua realização se concretiza em um longo período de tempo. É o caso típico do imposto sobre a renda que incide sobre os rendimentos de um indivíduo ou de uma empresa no período de um ano. Os fatos geradores continuados se consubstanciam de forma duradoura e estável no tempo. É o caso da propriedade de um imóvel, fato gerador do IPTU ou de um veículo automotor, fato gerador de IPVA. Esses tributos no Brasil são cobrados geralmente de forma anual e há um dia de corte temporal quando o imposto é devido.

7. A obrigação tributária. É o fruto do fato gerador. Ocorrido o fato gerador, surge no mundo jurídico uma relação tributária, ou mais precisamente uma obrigação na qual o sujeito ativo é o fisco, o sujeito passivo é o contribuinte, o objeto é a prestação prevista em lei sendo esta a verdadeira causa da obrigação.

8. Sujeito ativo. Estabelece o art. 119 do CTN: “art. 119 – Sujeito ativo da obrigação é a pessoa jurídica de direito público titular da competência para exigir o seu cumprimento.” O sujeito ativo da obrigação tributária pode ser tanto a União, como os Estados e os Municípios. Segundo EDUARDO SABBAG, olvidou-se o legislador de incluir como possíveis sujeitos ativos da obrigação tributária as entidades parafiscais como o CREA, o CRM, o CRC etc.89

9. Sujeito passivo. O sujeito passivo da obrigação tributária é o contribuinte ou o responsável pelo cumprimento da obrigação. Assim dispõem os artigos 121 e 122 do CTN: “Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se: I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; II - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei. Art. 122. Sujeito passivo da obrigação acessória é a pessoa obrigada às prestações que constituam o seu objeto.” Assim, há dois tipos de sujeito passivo, o contribuinte ou o responsável pela obrigação de acordo com a lei. As convenções particulares, ou seja, contratos privados não podem alterar quem seja o sujeito passivo determinado por lei (ver art. 123 do CTN). Esses contratos podem ser feitos e valem entre as partes, mas não contra o fisco. Exemplo típico é o do pagamento do IPTU pelos locatários conforme convenção entre senhorio e aqueles que pagam aluguéis. A Prefeitura ignora os contratos de locação e cobra o

89 Cfr. Eduardo Sabbag, obra citada, página 686.

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imposto sempre do proprietário, embora este possa em ação cível solicitar que o locatário pague o imposto.

10. Sujeito passivo direto e indireto. Sujeito passivo direto é o contribuinte. Aquele que tem uma relação imediata com o fato gerador. Por exemplo o proprietário de um imóvel é o contribuinte direto do respectivo IPTU. O sujeito passivo indireto é o responsável pelo pagamento do tributo em conformidade com a lei (não de acordo com contratos entre particulares). É o caso dos pais de menor proprietário de imóvel. São responsáveis pelo pagamento do IPTU pertinente. É o caso também do sócio administrador da empresa com relação às dívidas da sociedade (ver artigos 134, III e 135, III do CTN).

11. Solidariedade. A solidariedade assim está definida no Código Civil de 2002, no art. 264, que dispõe: art. 264 - Há solidariedade quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado à dívida toda.” Já o Código Civil português em seu artigo 512, assim define a solidariedade: “artigo 512- A obrigação é solidária, quando cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos libera, ou quando cada um dos credores tem a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral e esta libera o devedor para com todos eles.” Assim, há solidariedade ativa quando há vários credores da mesma obrigação, mas o pagamento pelo devedor ou devedores da dívida a qualquer credor desonera completamente o devedor ou devedores da obrigação como um todo. Há solidariedade passiva quando, ao contrário, há vários devedores de uma mesma obrigação e o credor (ou credores) pode cobrar o total da dívida a apenas um dos devedores. É o caso do emitente de uma nota promissória e seus avalistas que também subscreveram o título.

12. Solidariedade ativa no Direito Tributário. Não existe solidariedade ativa no Direito Tributário. O contribuinte ou responsável devem pagar o tributo a apenas uma pessoa de direito público interno. A mesma que seja competente para exigir o tributo, de acordo com a Constituição Federal e o Código Tributário.

13. Solidariedade passiva no Direito Tributário. A solidariedade passiva no Direito Tributário Brasileiro está regulada nos artigos 124 e 125 do Código Tributário Nacional que dispõem: “Art. 124. São solidariamente obrigadas: I - as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal; II - as pessoas expressamente designadas por lei. Parágrafo único. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem. Art. 125. Salvo disposição de lei em contrário, são os seguintes os efeitos da solidariedade: I - o pagamento efetuado por um dos obrigados aproveita aos demais; II - a isenção ou remissão de crédito exonera todos os obrigados, salvo se outorgada pessoalmente a um deles, subsistindo, nesse caso, a solidariedade quanto aos demais pelo saldo; III - a interrupção da prescrição, em favor ou contra um dos obrigados, favorece ou prejudica aos demais.” Assim, a solidariedade pode ser natural ou legal. É natural quando os contribuintes tenham interesse comum no fato gerador. É o caso de vários compradores de um imóvel. Todos são solidários no pagamento do ITBI. Há solidariedade legal quando determinada por lei. É o caso, por exemplo do disposto no artigo 134 VII do CTN que dispõe: “Art. 134. Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:... VII - os sócios, no caso de liquidação de sociedade de pessoas.”

14. Interesse comum, pessoas jurídicas de um mesmo grupo econômico. A solidariedade dos membros de um mesmo grupo econômico está condicionada a que fique devidamente comprovado: a) o interesse imediato e comum de seus membros nos resultados decorrentes do

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fato gerador; e/ou b) fraude ou conluio entre os componentes do grupo. Há interesse comum imediato em decorrência do resultado do fato gerador quando duas ou mais pessoas se beneficiam diretamente com sua ocorrência. Por exemplo, a afixação de cartazes de propaganda de empresa distribuidora de derivados de petróleo em postos de gasolina é, geralmente, um fato gerador de taxa municipal cuja ocorrência interessa não somente à empresa distribuidora, beneficiária direta da propaganda, como também ao posto de gasolina, que é solidário com aquela no pagamento da taxa. Na fraude ou conluio, o interesse comum se evidencia pelo próprio ajuste entre as partes, almejando a sonegação. A solidariedade passiva no pagamento de tributos por aqueles que agiram fraudulentamente é pacífica. Aliás, no caso de fraude, pagam até os representantes pelos representados’.90

15. Pessoas designadas solidárias por lei. São solidárias em direito tributário as pessoas como tal designadas por lei. Neste caso pode não haver interesse comum na situação que constitui o fato gerador.

16. Benefício de ordem. Assim HUGO DE BRITO MACHADO explica o benefício de ordem: “É o direito à observância de uma ordem ou sequência preestabelecida para a execução, operando-se esta primeiramente contra um, e só depois contra o outro. Isto é o que se conclui do estabelecido pelo Código Civil, segundo o qual “o fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam executados os bens do devedor”. Neste caso nomeará bens do devedor situados no mesmo Município, livres e desembaraçados, quantos bastem para solver o débito.”91 E interessante notar que nem a doutrina nem o Código Civil, ao tratar de solidariedade cuidam de benefício de ordem que é um instituto próprio da fiança. Afirma HUGO DE BRITO MACHADO que o CTN poderia ter silenciado sobre o benefício de ordem, mas que o parágrafo único do art. 124 do CTN tem função esclarecedora que afasta controvérsias.92 Parece-me entretanto que não andou bem o Código Tributário. É uma menção desnecessária e inapropriada. O benefício de ordem não tem nada que ver com a solidariedade.

17. Aspectos do fato gerador. A doutrina considera que são aspectos do fato gerador: (a) o aspecto material ou nuclear; (b) a base de cálculo; e (c) a alíquota.

18. O aspecto material ou nuclear do fato gerador. É a situação de fato indicada na lei que cria o tributo. É o fato que concretiza a hipótese de incidência na lei pertinente. No caso do IPTU, por exemplo, é a propriedade do imóvel.

19. Base de cálculo. Na definição de HUGO DE BRITO MACHADO, é a expressão econômica do fato gerador do tributo.93 A base de cálculo é, portanto, a soma econômica sobre a qual se aplica a alíquota para calcular a quantia a pagar. Assim, na venda de um imóvel, a base de cálculo do respectivo ITBI (Imposto sobre a transmissão inter-vivos de bens imóveis) é, em princípio, o valor da compra do bem.

20. Alíquota. Alíquota é o percentual ou valor fixo que é aplicado sobre a base de cálculo. A alíquota é um percentual quando a base de cálculo for um valor econômico (alíquota ad valorem). É o caso mais comum. Entretanto, quando a base de cálculo é uma unidade não monetária a alíquota é um valor. É a chamada alíquota específica. As alíquotas em percentual são mais comuns em impostos e as alíquotas em valor ocorrem mais em tributos como o empréstimo compulsório, as taxas e as contribuição de melhoria. HUGO DE BRITO MACHADO dá o seguinte exemplo de alíquota específica: o IPI cobrado sobre cervejas e refrigerantes. O imposto é calculado em função das unidades do tributo e não do preço de venda.

90 Ver Carlos Jorge Sampaio Costa: “Solidariedade passiva e o interesse comum no fato gerador, Revista de Direito Tributário, Ano II, nº 4. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1978, p. 304.91 Autor e obra citados, página 147.92 Idem.93 Ibidem, página 135.

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21. Alíquotas fixas ou variáveis. A alíquota fixa é sempre a mesma para qualquer base de cálculo. Já a alíquota variável se altera de acordo com o montante da base de cálculo. Por exemplo as alíquotas do imposto de renda de pessoas físicas é variável. Conforme os rendimentos dos indivíduos ela pode ser de 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%.

22. Alíquotas progressivas ou regressivas. As alíquotas variáveis são progressivas quando aumentam na medida que aumenta a base de cálculo. É o caso das alíquotas de imposto de renda acima indicadas. Já as alíquotas regressivas diminuem na medida que aumentam a base de cálculo.

23.

VIII. O CRÉDITO TRIBUTÁRIO E O LANÇAMENTO

1. Crédito tributário. O Código Tributário Nacional faz uma diferença entre obrigação tributária e crédito tributário. Com efeito, dispõe o artigo 139 do CTN: “Art.139 – O crédito tributário decorre da obrigação principal e tem a mesma natureza desta.”Aqui há uma imprecisão do Código, pois se têm a mesma natureza, de um ponto de vista ontológico, deveriam ser exatamente a mesma coisa. Entretanto, não são. Realmente, como está exposto no capítulo anterior, uma vez ocorrido o fato gerador descrito na lei, nasce a obrigação tributária. Sem embargo, a simples ocorrência do fato gerador não formaliza, por si só, o crédito tributário, que apenas é devido após o lançamento. Para que o crédito surja no mundo jurídico e possa ser cobrado, é preciso que a administração faça tácita ou expressamente um lançamento. Somente com o lançamento nasce o crédito tributário.

2. Definição de crédito tributário. HUGO DE BRITO MACHADO assim define crédito tributário: é o vínculo jurídico, de natureza obrigacional, por força do qual o Estado (sujeito ativo) pode exigir do particular, o contribuinte ou responsável (sujeito passivo), o pagamento do tributo ou penalidade pecuniária (objeto da relação obrigacional).94 O crédito tributário, entretanto, nasce com o lançamento.

3. Definição de lançamento. O lançamento está definido no artigo 142 do CTN nos seguintes termos: “Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.” O lançamento, portanto, traz certeza e liquidez à obrigação tributária. É pelo lançamento que o fisco verifica a ocorrência do fato gerador, determina a matéria tributária, calcula o montante do tributo devido, identifica o sujeito passivo e/ou o responsável e propõe, se for o caso, a aplicação da penalidade cabível.95 HUGO DE BRITO MACHADO define com precisão lançamento assim: “Lançamento tributário

94 Cfr. Autor e obra citados, página 173.95 Cfr. Eduardo Sabbag, obra citada, páginas 738 e 739.

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é o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, identificar o seu sujeito passivo, determinar a matéria tributável e calcular ou por outra forma definir o montante do crédito tributário, aplicando, se for o caso, a penalidade cabível.”96

4. Características do lançamento. O lançamento é um procedimento de exclusiva competência do fisco e é um conjunto de atos administrativos. Há doutrinadores que acreditam que o lançamento é apenas um ato administrativo e não um conjunto deles. Entretanto, o Código considera o lançamento um procedimento e, portanto, um complexo de atos administrativos. Com efeito, o lançamento afere uma série de fatos e fatores para concluir e fazer líquida uma obrigação tributária. É portanto um procedimento. É também o lançamento é uma atividade meramente declaratória e não constitutiva. O que constitui a obrigação tributária é o fato gerador. O lançamento apenas declara, revela, expõe o quantum a pagar, ou seja, torna certo e líquido o crédito tributário. O lançamento é ademais um conjunto de atos administrativos vinculados e não discricionários. Assim dispõe o art. 142 do Código que expressa ser o lançamento atividade administrativa vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.

5. Taxa de câmbio. Quando o valor relacionado com o fato gerador estiver expresso em moeda estrangeira, no lançamento,” far-se-á sua conversão em moeda nacional ao câmbio do dia da ocorrência do fato gerador” (cfr. CTN, art. 143). Assim, no caso de importação de mercadoria, nenhuma diferença de ICMS pode ser exigida em razão da variação cambial encontrada entre a data do desembaraço aduaneiro e da efetiva liquidação do contrato de câmbio.

6. Revisão do lançamento. De acordo com o artigo 145 do CTN, o lançamento notificado ao contribuinte somente pode ser alterado em virtude de impugnação do sujeito passivo, recurso de ofício ou iniciativa de ofício da autoridade administrativa, nos casos previstos no artigo 149 do mesmo diploma legal. Assim, a autoridade administrativa pode, antes de notificado o contribuinte alterar o lançamento, se assim considerar necessário, não depois, com exceção dos casos claramente estipulados no Código. Recurso de ofício, em latim ex-officio, ocorre quando após a impugnação, a autoridade administrativa julgadora retifica o lançamento em favor do contribuinte e é obrigado a recorrer, ela mesmo, à autoridade superior que pode ser um órgão colegiado, como o Conselho de Contribuintes. Já o artigo 149 do CTN estipula: “Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: I - quando a lei assim o determine; II - quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária; III - quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade; IV - quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória; V - quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte; VI - quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária; VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação; VIII - quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior; IX - quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou

96 Cfr. autor e obra citados, página 174.

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falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial. Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.” É importante notar que, de acordo com o art. 146 do CTN, a mudança de critério jurídico adotado pelo fisco não autoriza a revisão do lançamento. Já preconizava a súmula 227 do extinto Tribunal Federal de Recursos, até hoje confirmada pela jurisprudência: “A mudança de critério jurídico adotado pelo fisco não autoriza a revisão de lançamento.” A jurisprudência de diversos tribunais, inclusive do STF, confirmando a súmula do antigo TFR, tem sido pacífica no sentido de que novos critérios adotados pela autoridade tributária somente podem ser aplicados em relação a um mesmo sujeito passivo, quando o fato gerador ocorrer posteriormente à sua introdução.

7. Tipos ou modalidades de lançamento. De acordo com o Código Tributário Nacional, há três modalidades de lançamento: o lançamento de ofício (art. 149, I), o lançamento por declaração (art. 147) e por homologação (autolançamento, art. 150). Ocorre o lançamento de ofício quando realizado por iniciativa da autoridade administrativa. Sucede quando a lei assim o determine. O IPTU, o IPVA e o ITR são, via de regra, lançados ex-officio. Pode acontecer que haja lançamento de ofício com relação a tributos que geralmente são lançados mediante declaração ou autolançamento. Isto ocorre quando o contribuinte se omite no cumprimento de seus deveres. Os autos de infração são sempre lançamentos de ofício. O lançamento por declaração (também chamado misto) ocorre nos casos em que a legislação determina que o contribuinte deve oferecer à autoridade administrativa correspondente, através de uma declaração, informações quanto ao fato gerador e as circunstâncias que determinem qual seria o valor do tributo. São informações necessárias à feitura do lançamento que deverá ser formalizado pela autoridade administrativa. Os impostos de exportação, de importação e o ITBI são típicos tributos normalmente lançados por declaração. Finalmente, o lançamento por homologação ou autolançamento é aquele que ocorre com relação aos tributos que a legislação obriga o contribuinte ou responsável a averiguar, ele mesmo, o valor do tributo e pagá-lo, antes de qualquer manifestação da autoridade fiscal. São lançados por homologação o IPI, o ICMS e o IR.

8. Suspensão do crédito tributário. As causas de suspensão do crédito tributário assim estão indicadas no art. 151 do CTN: “Art. 151 - Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: I - moratória; II - o depósito do seu montante integral; III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo; IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança. V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial; VI – o parcelamento. Parágrafo único. O disposto neste artigo não dispensa o cumprimento das obrigações assessórias dependentes da obrigação principal cujo crédito seja suspenso, ou dela consequentes.” Obviamente, a suspensão é sempre temporária. Como observa HUGO DE BRITO MACHADO, a suspensão pode ser prévia, operando-se antes do de que a exigibilidade exista, ou seja, antes do lançamento, ou posterior, isto é, quando ocorre após o crédito tributário está constituído e já está exigível (depois do lançamento).97

9. A moratória. A moratória é uma das causas da suspensão do crédito tributário. Consiste na prorrogação concedida pelo credor do prazo para o pagamento da dívida assim para o pagamento à vista em data posterior ao vencimento, como para o pagamento parcelado. A concessão da moratória depende de lei, em conformidade com o que dispõe o art. 97, VI do CTN. 98 Via de

97 Autor e obra citados, página 186. 98 O art. 97 VI do CTN estabelece: “Art. 97 – somente a lei pode estabelcer: ...(VI) as hipóteses de exclusão, suspensão e extinsão de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.”

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regra a moratória é concedida pela pessoa jurídica de direito público que tem competência para instituir o tributo, conforme prevê o art. 152 do CTN. Entretanto, a União Federal, de acordo com o mesmo artigo, pode outorgar moratória quanto a tributos de competência dos Estados, Distrito Federal e Municípios sempre e quando simultaneamente conceder o mesmo benefício com relação aos tributos de competência federal e às obrigações de direito privado. A moratória pode ser concedida em caráter geral (a todos os contribuintes) e em caráter individual. A concessão de moratória em caráter individual é outorgada pela autoridade administrativa indicada em lei. A lei que conceder a moratória pode circunscrever sua aplicabilidade à determinada região do território jurisdicionado pela pessoa de direito público interno competente para cobrar o tributo. Pode também compreender somente determinada classe ou categoria de sujeitos passivos (ver § único do art. 152 do CTN). O parcelamento de que trata o inciso VI do artigo 151 do CTN, é, obviamente, uma das espécies de moratória.

10. O depósito. O depósito do montante integral do tributo, que suspende o crédito tributário, é um ato voluntário do contribuinte. Mediante o depósito, o sujeito passivo da obrigação tributária evita a correção monetária da quantia devida. É notório entre os operadores do direito que o depósito não pode ser exigido pelo fisco como condição para o conhecimento de recursos administrativos, vedada também sua exigência para a interposição de ações judiciais, seja ação declaratória, anulatória ou madado de segurança.

11. A extinção do crédito tributário. Em conformidade com o artigo 156 do Código Tributário Nacional, o crédito tributário se extingue pelo pagamento, pela compensação, pela transação, pela remissão, pela prescrição ou decadência, pela conversão do depósito em renda, pelo pagamento antecipado e a homologação do lançamento, pela consignação em pagamento, pela decisão administrativa irreformável, pela decisão judicial passada em julgado e pela dação em pagamento em bens imóveis.

12. O pagamento. Como é óbvio, o pagamento é a forma mais usual para que se extinga o crédito tributário. Consiste usualmente na entrega pelo contribuinte ou responsável de dinheiro, cheque ou vale postal, ou ainda em estampilha ou papel selado99 ao fisco de acordo com a soma que consta no respectivo lançamento. As normas relacionadas com o pagamento do crédito tributário estão estipuladas nos artigos 157 e seguintes do Código Tributário Nacional. O artigo 161 do mesmo código estabelece que a caracterização da mora com relação ao crédito tributário é automático, independente de interpelação ou notificação do sujeito passivo. De acordo com o § 2º do artigo 162 do CTN, não há mora na pendência de consulta formulada pelo devedor dentro do prazo legal para o pagamento do crédito. O § 1º do artigo 161 do mesmo Código estipula que a taxa de juros de mora é de 1% ao mês, salvo se a lei dispuser em contrário. Com efeito, hoje, a taxa SELIC deveria ser utilizada para o cálculo dos juros de mora. É o que dispõe o inciso I do artigo 84 da Lei 8.981, de 1995. Entretanto, o § 3º do mesmo artigo determina que em nenhuma hipótese os juros de mora em comento poderão ser inferiores à taxa de juros estipulada no CTN, no artigo 59 da Lei 8.383/1991 e no artigo 3º da Lei nº 8.620/1993.

13. Pagamento antecipado e homologação do lançamento. O art. 156 do CTN, que elenca os modos de extinção do crédito tributário, contempla em seu inciso VII, o pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos termos do art. 150 e seus parágrafos 1º e 4º, como uma das maneiras de extinguir o crédito tributário. Com efeito, no lançamento por homologação o

99 Ver artigo 162 do CTN

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pagamento antecipado efetuado pelo contribuinte seguido da homologação expressa ou tácita da Fazenda Pública (condição resolutória) extingue o crédito tributário.

14. Pagamento indevido e restituição. Dispõe o art. 165 do CTN: que o sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento nos casos de cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior do que o devido; ou erro na identificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou ainda na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento. A restituição pelo fisco do pagamento indevido do tributo (também denominado repetição do indébito100) encontra dificuldades quando se trata de devolução de tributos indiretos101. Sobre a questão estipula o Código Tributário Nacional em seu artigo 166 assim: “Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la." Sobre este artigo, escreveu HUGO DE BRITO MACHADO: “O Código Tributário Nacional estipulou que a restituição de tributos que comportem por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la (art. 166). Assim, nas restituições de tributos indevidamente pagos se há de examinar se o tributo, no caso, teve ou não encargo financeiro transferido a terceiro. O sujeito passivo terá direito à restituição se provar que assumiu o encargo financeiro, ou no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la (CTN, art. 166). O terceiro, que tinha suportado o encargo financeiro do tributo indevidamente pago, não é parte legítima para pedir a restituição. Ao nosso ver, tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro são somente aqueles tributos em relação aos quais a própria lei estabeleça dita transferência. Somente em casos assim aplica-se a regra do art. 166 do CTN, pois a natureza a que se reporta tal dispositivo legal só pode ser a natureza jurídica, que é determinada pela lei correspondente, e não por meras circunstâncias econômicas que podem estar, ou não, presentes, sem que se disponha de um critério seguro para saber quando se deu, e quando não se deu, tal transferência. Para saber quando a transferência do ônus do tributo ocorre por força da norma jurídica basta imaginar uma situação na qual as partes na relação onde incide o tributo tenham acertado o preço do bem, ou do serviço, sem fazer qualquer referência ao tributo. E, depois de acertado o preço, seja colocada a questão de saber se o obrigado, perante o Fisco, ao pagamento do tributo vai transferir o ônus respectivo. A não ser assim, ter-se-á de concluir pela inconstitucionalidade do art. 166 por ser este um óbice intransponível ao exercício do direito à restituição do indébito.”102 Realmente, qualquer interpretação que negue o exercício do direito à restituição do indébito é inconstitucional. Entretanto, em minha modesta opinião, tem direito à restituição o contribuinte de facto que sempre que comprove que assumiu o encargo de pagar o tributo. No caso do contribuinte de direito, somente teria a prerrogativa da restituição quando fosse autorizado pelo contribuinte de

100 Repetição do indébito é a ação pela qual alguém demanda a devolução de uma quantia paga desnecessariamente, sem motivo legal para fazê-lo. 101 Recordando: o imposto direto é pago pelo contribuinte diretamente ao fisco. Por exemplo, o imposto de renda é pago diretamente pelo sujeito passivo da obrigação à Fazenda Nacional. Uma única pessoa é ao mesmo tempo contribuinte de direito e de fato. Já o imposto indireto é pago pelo contribuinte de direito que o repassa imediatamente ao comprador do bem onerado pelo tributo (contribuinte de fato). É o caso do ICM que o comerciante paga ao fisco estadual e o repassa ao consumidor (contribuinte de fato).102 Ver autor e obra citada, página 208. As ênfases constam do original.

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facto a requerer a repetição do indébito. As questões suscitadas pela leitura do art. 166 do CTN têm sido tormentosas. A Súmula nº 71 do Supremo Tribunal Federal, equivocada ao nosso ver, dispõe: “Embora pago indevidamente, não cabe restituição de tributo indireto.” O próprio Ministro Aliomar Baleeiro considerava que esta súmula deveria ser aplicada com cautela, tendo em vista que não há na doutrina critérios seguros para distinguir os impostos diretos dos indiretos. A Súmula 546, abrandando a Súmula 71, dispõe que “cabe restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão, que o contribuinte de jure não recuperou do contribuinte de facto o quantum respectivo. EDSON TEIXEIRA DE MELO entende que o art. 166 do CTN não é congruente com a Constituição Federal de 1988 e, portanto, não foi por ela recepcionado. A restituição do indébito está ligada ao princípio da legalidade. Somente em virtude de lei o contribuinte sujeita-se ao pagamento de tributos.103

15. A extinção do direito à restituição. O art. 168 do CTN dispõe que a restituição do pagamento indevido extingue-se em 5 anos contados da extinção do crédito tributário. Nos casos de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória, o referido prazo prescricional104 começa a contar da data em que a aludida decisão administrativa torna-se definitiva ou a decisão judicial transita em julgado. Quando há pagamentos antecipados, que ocorrem nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, (como é o caso do IR) o que extingue o pagamento é a homologação. Destarte, estava claro, até o advento da Lei Complementar 118 de 2005, que, desde que o prazo prescricional para pleitear a restituição é de cinco anos contados da data da extinção do crédito tributário, quando o lançamento era por homologação, o prazo prescricional começava quando da homologação expressa ou tácita, esta cinco anos após à data de quando era devido o pagamento. Era a chamada teoria dos cinco mais cinco. Entretanto o art. 3º da Lei Complementar nº 118 de 2005, com ares de lei interpretativa, dispôs: “Art. 3º - Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado da que trata o § 1º do art. 150 da referida lei ”. Assim, conforme atesta EDUARDO SABBAG, o legislador quis que a extinção do crédito tributário, nos lançamentos por homologação ocorresse antes da homologação, isto é, na própria data do pagamento antecipado105. Entretanto, a doutrina e a jurisprudência recusou o caráter interpretativo do art. 3º da Lei Complementar nº 118/2005. Destarte, o disposto no artigo 3º da Lei Complementar em comento somente pode vigorar a partir da sua vigência, não tendo efeito retroativo. Este é o entendimento do STJ, conforme se observa da leitura da seguinte ementa: EMENTA:(...) 1. A 1ª Seção do STJ, no julgamento do ERESP 435.835/SC, Relator para o acórdão Min. José Delgado, sessão de 24.03.2004, consagrou o entendimento segundo qual o prazo prescricional para pleitear a restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação é de cinco anos, contados da data da homologação do lançamento, que, se for tácita, ocorre após cinco anos da realização do fato gerador — sendo irrelevante, para fins de cômputo do prazo prescricional a causa do indébito. Adota-se o entendimento firmado pela Seção, com ressalva do ponto de vista pessoal, no sentido da subordinação do termo a quo do prazo ao universal princípio actio nata (voto-vista proferido nos autos do ERESP 423.994/SC, 1ª. Seção, Min. Peçanha Martins, sessão de 08-10-2003). 2. O art. 3º da LC 118/2005, a pretexto de

103 Ver: EDSON TEIXEIRA DE MELO, Artigo 166 do Código Tribut´pario Nacional: Transferência de Encargo. Em

http://jusvi.com/pecas/26175 .104 A doutrina tem debatido se este tipo de prazo é de decadência ou de prescrição, inclinando-se mais no sentido da prescrição.105 Ver autor e obra citados, páginas 845 e 846.

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interpretar os arts. 150, § 1º, 160, I do CTN, conferiu-lhes, na verdade, um sentido e um alcance diferente daquele dado pelo Judiciário. Ainda que defensável a “interpretação” dada, não há como negar que a Lei inovou no plano normativo, pois retirou das disposições interpretadas um dos seus sentidos possíveis, justamente aquele tido como correto pelo STJ, intérprete e guardião da legislação federal. Portanto, o art. 3º da LC 118/2005 só pode ter eficácia prospectiva, incidindo apenas sobre situações que venham ocorrer a partir da sua vigência. 3. O art. 4º, segunda parte, da LC 118/2005, que determina a aplicação retroativa do seu art. 3º, para alcançar inclusive fatos passados, ofende o princípio constitucional da autonomia e independência dos poderes (C.F., art. 2º) e o da garantia do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (C.F. art. 5º XXXVI). Ressalva, no particular, do ponto de vista pessoal do relator, no sentido de que cumpre ao órgão fracionário do STJ suscitar o incidente de inconstitucionalidade perante a Corte Especial, nos termos do art. 97 da C.F. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AG 633.462/SP, 1ª T, rel. Min. Teori Albino Zavascki, j.17-03-2005).106

16. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirma a inconstitucionalidade do art. 4 da Lei Complementar 118/2005, in fine. Com efeito, o art. 4º da Lei Complementar 118/205, tentando confirmar o caráter interpretativo do art. 3º do mesmo diploma legal dispõe: Art. 4º - esta lei entra em vigor 120 dias após a sua publicação, observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – CTN. O STJ, em 29 de setembro de 2007, enterrou definitivamente o caráter interpretativo da Lei Complementar nº 118/2005, por intermédio do acórdão no Resp nº 644.763/PE), ao considerá-lo inconstitucional e a partir de então ficou estabelecido, de acordo com o consenso da doutrina e da jurisprudência atestado por EDUARDO SABBAG o seguinte: 1. Pagamento de tributo efetuado a partir da vigência (09-06-2005). Com fato gerador ocorrido após esta dada, o prazo é de 5 anos a contar da data de pagamento; 2. Pagamento de tributo efetuado antes da vigência (09-06-2005), com fato gerador ocorrido antes desta data, vale a regra de prescrição do regime anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei; 3. Pagamento de tributo efetuado após a vigência (09-06-2005), com fato gerador ocorrido antes desta data, vale a regra de prescrição do regime anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei.

17. Prescrição da ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição. O art. 169 do CTN é claro ao dispor que: Prescreve em dois anos ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição.

18. Compensação. Ocorre compensação quando alguém é ao mesmo tempo devedor e credor de outrem. Neste caso, ao invés de cada um pagar as suas dívidas, compensa-se um crédito com o outro. O artigo 170 do CTN assim dispõe sobre a compensação no Direito Tributário: “Art. 170. A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública.” Assim, leis federais, estaduais ou municipais podem prever e regulamentar a compensação na área tributária.

19. A compensação no âmbito federal. Na área federal, a autorização para que se efetue a compensação entre débitos e créditos do contribuinte encontra-se na Lei Federal nº 8.383 de 1991 cujo artigo 66 dispõe: Art. 66. Nos casos de pagamento indevido ou a maior de tributos,

106 Apud EDUARDO SABBAG, OBRA CITADA, PÁGINAS 848 E 849.

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contribuições federais, inclusive previdenciárias, e receitas patrimoniais, mesmo quando resultante de reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória, o contribuinte poderá efetuar a compensação desse valor no recolhimento de importância correspondente a período subsequente. § 1º A compensação só poderá ser efetuada entre tributos, contribuições e receitas da mesma espécie. § 2º É facultado ao contribuinte optar pelo pedido de restituição. § 3º A compensação ou restituição será efetuada pelo valor do tributo ou contribuição ou receita corrigido monetariamente com base na variação da UFIR § 4º As Secretarias da Receita Federal e do Patrimônio da União e o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS expedirão as instruções necessárias ao cumprimento do disposto neste artigo. Também a Lei Federal nº 9.430 de 1996, em seu art. 74 determina: “Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão. § 1o A compensação de que trata o caput será efetuada mediante a entrega, pelo sujeito passivo, de declaração na qual constarão informações relativas aos créditos utilizados e aos respectivos débitos compensados. § 2o A compensação declarada à Secretaria da Receita Federal extingue o crédito tributário, sob condição resolutória de sua ulterior homologação. § 3o Além das hipóteses previstas nas leis específicas de cada tributo ou contribuição, não poderão ser objeto de compensação mediante entrega, pelo sujeito passivo, da declaração referida no § 1o: I - o saldo a restituir apurado na Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda da Pessoa Física; II - os débitos relativos a tributos e contribuições devidos no registro da Declaração de Importação. III - os débitos relativos a tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal que já tenham sido encaminhados à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional para inscrição em Dívida Ativa da União; IV - o débito consolidado em qualquer modalidade de parcelamento concedido pela Secretaria da Receita Federal - SRF; V - o débito que já tenha sido objeto de compensação não homologada, ainda que a compensação se encontre pendente de decisão definitiva na esfera administrativa; e VI - o valor objeto de pedido de restituição ou de ressarcimento já indeferido pela autoridade competente da Secretaria da Receita Federal - SRF, ainda que o pedido se encontre pendente de decisão definitiva na esfera administrativa. § 4o Os pedidos de compensação pendentes de apreciação pela autoridade administrativa serão considerados declaração de compensação, desde o seu protocolo, para os efeitos previstos neste artigo. § 5o O prazo para homologação da compensação declarada pelo sujeito passivo será de 5 (cinco) anos, contado da data da entrega da declaração de compensação. § 6o A declaração de compensação constitui confissão de dívida e instrumento hábil e suficiente para a exigência dos débitos indevidamente compensados. § 7o Não homologada a compensação, a autoridade administrativa deverá cientificar o sujeito passivo e intimá-lo a efetuar, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da ciência do ato que não a homologou, o pagamento dos débitos indevidamente compensados. § 8o Não efetuado o pagamento no prazo previsto no § 7o, o débito será encaminhado à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional para inscrição em Dívida Ativa da União, ressalvado o disposto no § 9o. § 9o É facultado ao sujeito passivo, no prazo referido no § 7o, apresentar manifestação de inconformidade contra a não-homologação da compensação. § 10. Da decisão que julgar improcedente a manifestação de inconformidade caberá recurso ao Conselho de Contribuintes. § 11. A manifestação de inconformidade e o recurso de que tratam os §§ 9o e 10 obedecerão ao rito processual do Decreto n o 70.235, de 6 de março de 1972 , e

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enquadram-se no disposto no inciso III do art. 151 da Lei n o 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, relativamente ao débito objeto da compensação. § 12. Será considerada não declarada a compensação nas hipóteses: I - previstas no § 3o deste artigo; II - em que o crédito a) seja de terceiros; b) refira-se a "crédito-prêmio" instituído pelo art. 1 o do Decreto-Lei n o 491, de 5 de março de 1969 ; (Incluída pela Lei nº 11.051, de 2004); c) refira-se a título público; d) seja decorrente de decisão judicial não transitada em julgado; ou e) não se refira a tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal - SRFf) tiver como fundamento a alegação de inconstitucionalidade de lei, exceto nos casos em que a lei: 1 – tenha sido declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade ou em ação declaratória de constitucionalidade 2 – tenha tido sua execução suspensa pelo Senado Federal; 3 – tenha sido julgada inconstitucional em sentença judicial transitada em julgado a favor do contribuinte; ou 4 – seja objeto de súmula vinculante aprovada pelo Supremo Tribunal Federal nos termos do art. 103-A da Constituição Federal. § 13. O disposto nos §§ 2o e 5o a 11 deste artigo não se aplica às hipóteses previstas no § 12 deste artigo§ 14. A Secretaria da Receita Federal - SRF disciplinará o disposto neste artigo, inclusive quanto à fixação de critérios de prioridade para apreciação de processos de restituição, de ressarcimento e de compensação. § 15. Será aplicada multa isolada de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do crédito objeto de pedido de ressarcimento indeferido ou indevido. § 16. O percentual da multa de que trata o § 15 será de 100% (cem por cento) na hipótese de ressarcimento obtido com falsidade no pedido apresentado pelo sujeito passivo.§ 17. Aplica-se a multa prevista no § 15, também, sobre o valor do crédito objeto de declaração de compensação não homologada, salvo no caso de falsidade da declaração apresentada pelo sujeito passivo. Assim, fica claro que cabe ao contribuinte tomar a iniciativa de compensar o tributo devido com seus créditos para esperar pela homologação de tal ato pelo fisco que terá cinco anos para fazê-lo. Não o fazendo expressamente, a omissão equivalerá por uma homologação tácita.

20. Transação. A palavra transação é sinônima de ajuste, acordo. O artigo 840 do Código Civil assim dispõe sobre a transação: “É lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas.” Já o Código Tributário Nacional dispõe: “A lei pode facultar, nas condições que estabeleça, aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária celebrar transação que, mediante concessões mútuas, importe em terminação de litígio e consequente extinção do crédito tributário.” Assim, a diferença entre o disposto no Código Civil e no CTN, é que a norma de direito civil é uma norma de direito privado, ou seja, reina a autonomia da vontade, ou seja, o arbítrio das partes. Já no Direito Tributário, a transação tem de ser autorizada por lei. Não podendo nenhuma autoridade fiscal, por mais importante que seja, transigir com os créditos tributários a não ser que seja autorizado por lei.

21. Remissão. Os dicionários definem a remissão como perdão, misericórdia. O Código Tributário só admite a remissão, ou seja o perdão da dívida do contribuinte pelo fisco, quando tal remissão for autorizada por lei. Estabelece o artigo 172 do CTN: “art. 172 – A lei pode autorizar a autoridade administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total ou parcial do crédito tributário, atendendo: I – à situação econômica do sujeito passivo; II – ao erro ou ignorância escusáveis do sujeito passivo quanto a matéria de fato; à diminuta importância do crédito tributário; IV – a considerações de equidade em relação com as características pessoais ou materiais do caso; a condições peculiares a determinada região do território da entidade tributante.” Nem sempre a remissão é outorgada por despacho da autoridade administrativa. Na

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realidade, a lei pode, obviamente, expressa e diretamente conceder remissão a certa categoria de pessoas ou a certas situações. A remissão difere da anistia. Esta extingue o crédito, aquela o extingue. A anistia está ligada à isenção que também é outra causa de exclusão do crédito tributário. Na anistia é como se o crédito nunca tivesse existido. Na remissão á um perdão pelo não pagamento da dívida.

22. Decadência e prescrição. As questões jurídicas sobre prescrição e decadência são motivo de discussões complexas no âmbito assim do direito privado como do direito público. Em geral diz-se que quando ocorre a decadência, desaparece o direito em si, enquanto na prescrição o que se perde é o direito à ação. O prazo para efetuar o lançamento tributário é um prazo decadencial. Já o prazo para cobrar um tributo depois do lançamento é um prazo prescricional.

23. Decadência. A Fazenda Pública deve efetuar o lançamento do crédito tributário em cinco anos (prazo decadencial) a partir de diferentes momentos dependendo do imposto que se trate. Diz o artigo 173 do CTN: “art. 173 – O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos contados: I - do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado; II – da data em que se tronar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado. § único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.” Quando o lançamento for por homologação (a maioria dos casos), o prazo decadencial de cinco anos começa no momento em que acontece o fato gerador, a não ser que a lei fixe prazo diverso para a homologação e exceto nos casos de dolo, fraude ou simulação. É que o § 4º do artigo 150 do CTN dispõe: “§ 4º. Se a lei não fixar prazo para a homologação, será ele de 5 (cinco) anos, a contar da ocorrência do fato gerador, expirado esse prazo, sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.” É importante salientar a declaração de inconstitucionalidade do art. 45, I da Lei Federal nº 8.212 de 1991, que estipulava o prazo decadencial de 10 anos para o lançamento tributário de contribuições sociais destinadas à seguridade social, prazo que seria contado do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o crédito poderia ter sido constituído. A inconstitucionalidade foi plasmada pela edição da Súmula Vinculante do STF nº 8 que diz: “São inconstitucionais o parágrafos único do artigo 5º do Decreto-lei 1.569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário”. O STF baseou-se no artigo 146, III, b da Constituição da República que reserva à lei complementar, no caso, ao CTN, a regulação de prescrição e decadência em matéria tributária e a lei 8.212/91 não é lei complementar. Não podia, portanto, tratar da matéria.

24. Prescrição. A prescrição é a perda do direito de ação. Ocorre no Direito Tributário quando o credor, ou seja, a Fazenda Pública, não exerce o seu direito de acionar, ou seja, cobrar o devedor após um lapso de tempo, denominado prazo prescricional. O art. 174 do CTN dispõe que “a ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data de sua constituição definitiva.” Quando ocorre a prescrição, extingue-se o crédito tributário (art. 156, V do CTN). O prazo prescricional pode ser objeto de suspensão ou interrupção. Terminada a suspensão, o prazo prescricional volta a correr normalmente. Após a interrupção, o prazo volta a correr recomeçando desde a interrupção. Como explica HUGO DE BRITO MACHADO: “Interromper a prescrição significa apagar o prazo já decorrido, o qual recomeçará seu curso.

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Assim, constituído definitivamente um crédito tributário, daí começa o curso da prescrição. Se depois de algum tempo, antes de completar-se o quinquênio, ocorre uma das hipóteses de interrupção acima indicadas, o prazo já decorrido fica sem efeito e a contagem dos cinco anos volta a ser iniciada. Suspender a prescrição é outra coisa. Significa paralisar o seu curso enquanto perdurar a suspensão. O prazo já decorrido perdura, e uma vez desaparecida a causa da suspensão o prazo continua em curso.”

25. Prescrição das contribuições previdenciárias. A súmula vinculante nº 8 do Supremo Tribunal Federal dispõe que: “são inconstitucionais o § único do art. 5º do Decreto-lei 1.569/1977 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/1991, que tratam de prescrição e decadência do crédito tributário.” Assim, o prazo prescricional das contribuições previdenciárias é também de cinco anos e não de dez como prescrevia o art. 46 da Lei 8.212/1991.

26. Suspensão da prescrição. A inscrição da dívida do contribuinte na Dívida Ativa da Fazenda Pública suspende o prazo prescricional por 180 dias (art. 2º, § 3º da Lei 6.830/1980).

27. Interrupção da prescrição. O art. 174 do CTN dispõe que a prescrição se interrompe: (a) com o despacho do juiz ordenando a citação do devedor; (b) pelo protesto judicial; (c) com qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor (interpelação, notificação ou intimação judiciais); e (d) por qualquer ato inequívoco, ainda que extra judicial, que importe em reconhecimento da dívida pelo devedor. Na prática somente a propositura de execução judicial tem sido utilizado pela Fazenda Pública para interromper a prescrição.

28. Conversão de depósito em renda. O art. 156 do CTN, em seu inciso VI contempla a conversão de depósito em renda como uma das causas da extinção do crédito Tributário. Com efeito, como explica HUGO DE BRITO MACHADO: “A conversão do depósito em renda extingue o crédito tributário, e pressupõe, portanto, a existência deste. É possível, porém, o depósito, mesmo sem que exista ainda o crédito tributário, quando se trate de tributos sujeitos a lançamento por homologação. Neste caso o depósito suspende a exigência do dever de antecipar o pagamento, e a este equivale para fins de lançamento. Feito o depósito, se a Fazenda Pública concorda, expressa ou tacitamente, com o seu montante, considera-se feito o lançamento e portanto existente o crédito tributário.” Por outro lado, continua o Professor cearense, “A sentença que resolve o litígio afirmando ser devido o tributo e, por isto mesmo, subsistente o crédito tributário respectivo, opera a transferência do depósito do patrimônio do contribuinte para o patrimônio da Fazenda Pública, e assim extingue o crédito tributário, mesmo que não o diga expressamente.”107

29. Pagamento antecipado e homologação do pagamento. O pagamento antecipado ocorre quando há lançamento por homologação, como por exemplo no lançamento do imposto sobre a renda. O pagamento antecipado pelo contribuinte extingue o crédito tributário somente se houver e quando houver a homologação do Fisco expressa ou tácita do referido lançamento. Assim a homologação do fisco é uma resolutória necessária para que se concretize a extinção do crédito.

30. A consignação em pagamento. O artigo 164 do Código Tributário Nacional contempla a possibilidade de que o contribuinte consigne em judicialmente o valor do crédito tributário nos seguintes termos:

“Art. 164. A importância de crédito tributário pode ser consignada judicialmente pelo sujeito passivo, nos casos:

107 Autor e obra citados, página 225.

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I - de recusa de recebimento, ou subordinação deste ao pagamento de outro tributo ou de penalidade, ou ao cumprimento de obrigação acessória;II - de subordinação do recebimento ao cumprimento de exigências administrativas sem fundamento legal;III - de exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador.§ 1º A consignação só pode versar sobre o crédito que o consignante se propõe pagar.§ 2º Julgada procedente a consignação, o pagamento se reputa efetuado e a importância consignada é convertida em renda; julgada improcedente a consignação no todo ou em parte, cobra-se o crédito acrescido de juros de mora, sem prejuízo das penalidades cabíveis.”

31. A ação judicial de consignação em pagamento. O artigo 164 do Código Tributário Nacional, portanto consagra, portanto, o direito de o sujeito passivo mover uma ação de consignação no foro competente, nos termos acima indicados. Ou seja, cabe a ação de consignação em pagamento quando o contribuinte estiver em dúvida assim de qual o sujeito ativo deva receber o pagamento do tributo como quando o sujeito passivo competente para receber o valor do tributo se recusar a fazê-lo.

32. Extinção do crédito tributário somente quando a ação de consignação é considerada procedente. Como é óbvio, somente quando transitada em julgada a sentença que decide pela procedência da ação de consignação em pagamento contra a Fazenda Pública é que se extingue o crédito tributário nos termos do art. 164, § 2º, 1ª parte, combinado com o art. 156, VIII do CTN. Julgada improcedente a consignação (no todo ou em parte), fica o contribuinte sujeito ao pagamento do principal, juros de mora, correção monetária e às penalidades que o caso vier a requerer.

33. Extinção do crédito tributário mediante decisão administrativa irrecorrível. Obviamente o crédito tributário estará extinto quando a própria administração diante de uma impugnação ou outro recurso do contribuinte, em processo administrativo, reconhece ser equivocado o lançamento. Neste caso, é como se o lançamento não tivesse existido. Para que a decisão administrativa tenha o condão de extinguir o crédito tributário, é necessário que a mesma seja irreformável. Aliás, a irrecorribilidade das decisões administrativas definitivas sofreu um revés a partir da Portaria nº 820/2004 do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, de legalidade controversa, que concebeu a possibilidade de a Fazenda Pública ingressar com ações anulatórias perante o Poder Judiciário contra decisões definitivas proferidas pela Administração Fazendária, quando favoráveis ao contribuinte, no caso em que tais decisões neguem a aplicabilidade de leis ou decretos e possam acarretar grave lesão ao patrimônio público. A partir dessa portaria, alguns autores, como CRISTIANO FREDERICO RUSCHMANN, passaram a considerar que “a decisão final irrecorrível na esfera administrativa faz coisa julgada apenas em relação ao Fisco (hipótese de extinção do crédito tributário, indicada no art. 156, IX, do CTN), mas não quanto ao sujeito passivo que se encontra sempre possibilitado de recorrer ao Poder Judiciário para buscar proteção dos seus direitos, reabrindo até mesmo, toda a discussão de fato e de direito porventura desenvolvida no curso do processo fiscal.”108

34. Extinção do crédito tributário mediante decisão judicial transitada em julgado. A decisão judicial que demarca a invalidade do lançamento, como é óbvio, extingue o crédito tributário. Considera-se que uma decisão judicial transita em julgado quando não é mais possível nenhum recurso contra a mesma. Como explica HUGO DE BRITO MACHADO, a decisão judicial, assim como a administrativa, anula o lançamento. Na realidade, quando um lançamento é anulado, já seja por decisão administrativa ou por decisão judicial, o que deixa de existir é o crédito tributário como realidade formal, já que a obrigação tributária, reconhecidamente pela decisão pertinente, nunca existiu. Não é o caso do pagamento que extingue a obrigação que existia e o consequente crédito tributário.109

108 Cfr. Autor Citado, Direito Tributário, Coleção Curso Concurso. Editora Saraiva, 3ª ed. Reformulada. 2009, página 163.109 Cfr. Autor e obra citados, página 228.

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35. Dação em pagamento de bem imóvel. A dação em pagamento de bem imóvel na forma e condições estabelecidas em lei (inciso XI do art. 156 do CTN) foi incluído no Código Tributário Nacional pela Lei Complementar nº 104 de 2, como uma das causas da extinção do crédito fiscal. Não há lei federal regulando a matéria. Tanto a União, como os Estados, o Distrito Federal e os Municípios estão autorizados a editar leis que permitam o pagamento de seus tributos através da dação em pagamento de bens imóveis. Como observa RUSCHMANN, “Neste contexto, é importante notar que, de acordo com o § 1º do art. 164 do CTN, a consignação só pode versar sobre o crédito tributário que o sujeito passivo se propõe pagar. Caso exista alguma incerteza sobre a exigibilidade do crédito, o sujeito passivo deverá fazer uso de outras medidas judiciais ‘a sua disposição (dependendo das circunstâncias do caso concreto: ação declaratória, ação anulatória ou mandado de segurança).110

IX. Conflitos da Lei Tributária no Tempo

1. A bitributação. Ocorre a bitributação quando duas ou mais entidades fiscais (por exemplo o Estado e o Município) definem o mesmo fato gerador com o objetivo de cobrar tributos diferentes. A bitributação é proibida no Direito Brasileiro, mas é possível em outras jurisdições. Por exemplo, o Estado de Nova Iorque assim como o município de Nova Iorque cobram de seus residentes imposto sobre a renda. Este imposto também é cobrado pelo Governo Federal americano. Assim, nos EUA o mesmo fato gerador pode gerar três impostos, um federal, outro estadual e ainda um outro municipal. No Brasil, somente a União pode instituir imposto sobre a renda de qualquer natureza por isto que a bitributação é vedada em nosso direito positivo.

2. Exceção à vedação à bitributação. Uma leitura do art. 154 da Constituição Federal poderá implicar uma exceção ao princípio do Direito Brasileiro de vedação à bitributação. Dispõe o art. 154 da Carta Magna: “Art. 154. A União poderá instituir: I - mediante lei complementar, impostos não previstos no artigo anterior, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição; II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.” Observe-se que o inciso I trata da instituição de imposto residual111 em tempo de paz. Está, em tempo de paz, portanto, proibida a instituição de imposto residual que tenha o mesmo fato gerador ou base de cálculo definidos na Constituição Federal para outro imposto. Entretanto, o inciso II, que trata da criação de imposto residual no caso de guerra externa, não interdita que o novo imposto tenha o mesmo fato gerador de outro imposto já existente. Existe, portanto, uma exceção à regra de vedação à bitributação nos casos de iminência ou existência de guerra externa.

3. Bitributação internacional. Embora seja vedada a bitributação dentro do território brasileiro, é claro que a mesma não pode ser evitada no plano internacional. Neste diapasão, o Direito Tributário Internacional estuda a aplicação de instrumentos jurídicos de validade extraterritorial (como por exemplo os tratados internacionais), com o objetivo de impedir ou diminuir os efeitos maléficos da dupla tributação para o desenvolvimento do comércio exterior.

110 Autor e obra citados, pagina 150.111 Diz-se residual o imposto que venha a ser instituído pela União e que não está previsto na Constituição da República.

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