Direitos Humanos e Currículo

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    MINISTRIO DA EDUCAOSECRETARIA DE EDUCAO CONTINUADA, ALFABETIZAO, DIVERSIDADE E INCLUSO

    INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAO, CINCIA E TECNOLOGIA DO PAR IFPACAMPUSBEL

    CURSO DE APERFEIOAMENTO EMEDUCAO EM DIREITOS

    HUMANOS

    NA MODALIDADE EDUCAO ADISTANCIA

    Abordagem em Direitos Humanos no

    currculo.

    BELM2013

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    INTRODUO ........................................................................................................................... 1

    1CURRCULO............................................................................................................................. 4

    1.1ORIGEM ................................................................................................................................ 4

    1.2TEORIAS BSICAS DO CURRCULO................................................................................................ 7

    2 CURRCULO PARA OS DIREITOS HUMANOS. ........................................................................ 15

    3 CATEGORIAS CENTRAIS PARA A EDUCAO EM DIREITOS HUMANOS: IDENTIDADE,

    ALTERIDADE, REPRESENTAO E MULTICULTURALISMO. ...................................................... 17

    CURRCULO FORMAL, CURRCULO EM AO E DIREITOS HUMANOS. .................................... 24

    4 LIMITES E POSSIBILIDADES DE PROPOSTAS EDUCATIVAS COM NFASE NOS DIREITOS

    HUMANOS.............................................................................................................................. 26

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    INTRODUO

    O meu nome RosineidePor sobrenome Lourinho,

    Filha de Antnia e Jos,

    Me de Sofia,

    Tenho trs irms e trs irmos

    Em 1 de setembro nascida,

    Dia de Nossa Senhora de Belm

    Minha terra queridaNeta de ndia com cearense

    Bisneta de negra com portugus

    Desde menina notei que,

    Entre ns, as mulheres eram

    maioria,

    Sustentado a si e as crias.

    Quanto nascia menino-macho era

    comemorao.

    Isso causou em mim uma estranha

    reao

    Por um nada desafiava meninos,

    meninas no

    Apanhei por provocar, apanhei por

    apanhar

    At descobrir os caminhos da

    imaginao

    Criava mundos no quintal, na escola

    Ou deitada na escurido,

    Depois de ser chamada de burra

    Por causa de uma reprovaoTomei uma deciso, tinha sete

    anos, ento.

    Eu no seria mais chamada de

    burra, Ah isso no!

    Leio e estudo desde ento.

    Virou uma obsesso,

    Passo por perodos de depresso.A idade me ensinou a contornar,

    Continuo a escrever, trabalhar, a

    estudar, desenhar.

    s vezes fico bem, s vezes no.

    No 1 grau em escola publica era

    aluna exemplar.

    Formei-me em tcnica na ETFPA,

    De l, para decepo familiar,

    fiz Artes Plsticas na UFPA,

    sempre gostei de desenhar,

    Depois, graas as voltas a vida d,

    Fiz mestrado em Educao

    Pesquisando currculo e

    profissionalizao,

    Pois, trabalho de 96 para c,

    formao de tcnicos

    no mesmo lugar que foi Escola

    Tcnica, e hoje IFPA.

    Por que comecei escrevendo brevemente minha vida? Por que nela est o

    meu currculo familiar, cultural, psicolgico, acadmico. E disso em diante destaco:

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    Esforo-me em todo o texto para seguir alguns princpios: no sou neutra, posso ser

    contraditria, tenho dificuldades e me esforo para tomar opes conscientes.

    Somos eu, voc, ele e elas formados seres humanos em mltiplas dimenses

    cambiantes metamorfoses ambulantes interagindo. A conscincia do eu, ajuda a

    reconhecer o tu e a considerao pelo ns. Se em mim h tantas faces, se eu posso

    ser to diferente de mim, se respeito isso em mim, respeitarei o que no outro for

    diferente. Mas quantas vezes ao me deparar com o diferente interna e externamente

    o rejeito por um padro no qual eu mesma no encaixo? Ou um padro em que

    partes minhas combinam e os meus resto eu varro para debaixo do tapete?

    Atualmente uma circulao de informaes e o contato, ainda que mediado

    pelos meios de comunicao, com uma profuso de possibilidades de viver, crer,

    criar que muitas vezes taxamos de exticos, estranhos, curiosos ou interessantes

    e, at rejeitamos essa possibilidade antes impensada, da qual vemos apenas um

    ponto. E, para mim, vem busca da inverso: o qu aqueles seres humanos

    pensariam de como vivo, do que como, creio ou como me comporto? Pessoalmente

    considero invivel perceber como aquele outro, com a exceo, novamente

    pessoal, mesmo que ainda restritiva, das suas expresses artsticas. Quais os

    limites do diferente longe?

    E como conviver com o diferente sentado ao lado? Ser que existe umigual? Ou s somos iguais negando as diferenas? Somos seres humanos, nisso

    somos iguais. Para mim se no, em todo resto, mas na maioria do que somos,

    somos diferentes. E como convivemos em nossas diferentes no que temos de

    iguais?

    Para a Educao em Direitos Humanos penso em sntese: como trabalhar a

    igualdade na diferena, e diferena com igualdade?

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    Essa perspectiva me remente a um conceito de Plato sobre composio

    (visual, musical, textual) que estudei em arte. Em que para a composio expressiva

    que necessrio que tenhamos unidade com diversidade e diversidade com

    unidade.

    A exclusiva/ predominncia da unidade gera o tdio, o inexpressivo, a obra

    montona, no atinge a possvel fruio do espectador. A exclusiva/ predominncia

    da diversidade, a disperso, confuso, a falta e sentido, que novamente

    impossibilita a fruio.

    O conhecimento dos estilos gerais, histricos ou do artista, elementos visuais,

    tcnicas, materiais e princpios podem favorecer a criao de uma composio

    expressiva, mas, no so garantia de uma obra harmnica, visto que a transgresso

    dos prprios princpios e regras uma constante da arte. Em que, mesmo que eu

    pense todos os aspectos do fazer/ exprimir/ conhecer da arte, ela s existir quando

    feita.

    Para mim o currculo tem paralelos com uma obra de arte: estilos, histrica,

    elementos, tcnicas que convergem para unidade/ diversidade e diversidade

    unidade, que no necessariamente seguem linearmente seus prprios princpios e

    regras e sua, realizao.

    Sem esquecer, claro, das opes/ percepes de quem compe e de seucarter de inacabado, pois, a interao dos espectadores muda/revela outras

    significaes a partir do que elege/ projeta sobre ele, que tantas vezes no eram

    evidentes para o artista. Assim h o artista que corporifica na obra contedos bvios

    e outras latentes e o espectador, tendo como linha condutora a obra, a reconfigura-

    se pelos bvios e por propor na obra seus contedos latentes. Um e outro agem/

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    reagem pela medio da obra. Como agimos/ reagimos, construmos/

    descontrumos, afirmamos/ negamos pela mediao do currculo.

    Para atuar no currculo precisamos tambm conhecer histria, seus

    elementos, seus mtodos e agir a partir dele e sobre ele mantendo em perspectiva

    que estamos fazendo escolhas que atingiram outros sujeitos e a ns. Que entre

    elas, esteja, a escolha da Educao em Direitos Humanos.

    1CURRCULO

    1.1 Origem

    Ao optar por comear pela origem da palavra currculo e sua histria

    pretendo que falemos a mesma lngua, pois, compartilho das reflexes de Ciavatta

    e Frigotto (2003) quanto no entendimento que o uso de determinados termos para

    nomear fatos, coisas e conceitos no inocente, mas carregado de interesses que

    tendenciam e desenvolvem significados sobre esses fatos e conceitos. A utilizao

    indiscriminada de termos, sem antes explicitar o que histria e significao geram o

    risco de superficializar e confundir a proposta de debate, des/construo desta

    disciplina.

    A explicitao remata ainda minhas escolhas, uma vez que, no h discurso

    neutro, assumir essas opes tambm acreditar que h outras escolhas, abrindo

    espao para o debate e o posicionamento consciente.

    Em geral o currculo considerado basicamente como coleo de disciplinas

    cujo objetivo transmitir o conhecimento institudo e imprescindvel para a formao

    intelectual do ser humano, que o torne apto na/para a sociedade. O currculo

    organizado por nveis que, de acordo, com seu desenvolvimento aprofundam sua

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    em complexidade. A cada nvel o ser humano testado, a fim de, de acordo com

    sua absoro do proposto no nvel anterior, poder acessar o prximo nvel.

    Essa concepo de currculo assemelha-o a uma corrida de obstculo o que

    se aproxima muito das etimologias encontradas para a palavra. Uma delas seria a

    palavra latinacurrere(VIEIRA & GOMES apud SANTRISTN, 2000) traduzida como

    a carreira, um percurso a ser atingido e a outra, mais difundida, seria na expresso

    latina curriculunentendida como pista ou circuito atltico e a carreira em si (VIEIRA

    & GOMES apud HAMILTON, 1992). Sob o aspecto de disciplina ou ordem estrutural

    o termo curriculun foi apropriado por Joo Calvino (1509-1564) para descrever a

    trajetria e a forma de vida que seus seguidores deveriam prosseguir.

    Hamilton (1991, apud N. SAVIAVI, 2005) cita o Oxford English Dictionaryde

    1663 como a pela primeira vez em que o que o termo currculo foi definido como

    curso com sequncia de estudos a serem seguidos ou concludos, referindo-se ao

    atestado de graduao outorgado de um mestre da Universidade de Glasgow,

    Esccia, ou seja, a primeira vez em que currculo fica evidentemente relacionado a

    conhecimento escolar.

    Ressalta-se que, desde essa primeira aplicao no campo da educao

    escolar traz imbudas as ideias de unidade, ordem, um grupo conhecimentos a

    serem ensinados/aprendidos predeterminado rigorosamente.Essa organizao implicava na exigncia de formalizao, que envolve plano,

    mtodo, controle, regularidade e centralidade convergindo com os sentidos de

    disciplina no sentido de regra de vida como elemento de coeso da escola. Do

    que advm disciplina e currculo serem indissociveis no contexto escolar.

    Currculo, at aqui, segundo N. Saviani (2005, p 12) invocava o ensino que

    obedeceria a um plano rgido, no qual estariam previstas as normasde conduta do estudante e as responsabilidades do professor, dentre

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    as quais a de avaliar os progressos de cada aluno nos estudos e ocumprimento das normas estabelecidas. Representando todo esseconjunto, o currculo seria o nome dado ao certificado de conclusodo curso, com o registro da avaliao de cada estudante.

    Esse todo se mescla com a organizao de alunos em classes observada por

    Mir em Paris em 1509 em que divises graduadas por nveis de complexidade so

    associados s idades e conhecimentos dos alunos (GOODSON, 1995).

    Hamilton e Gibbon (1980 apud GOODSON, 1995) destacam, ainda que, as

    palavras classe e currculo entram no vocabulrio educacional no mesmo perodo

    em que a escolarizao se transforma em atividade de massa.

    Goodson (1995) demonstrar que neste ponto se diferencia classe de sala

    de aula, ambas compartilham a ideia de grupo de crianas e jovens organizados e

    sob certa prescrio curricular. A questo que as diferencia : qual prescrio

    curricular?

    Essa diferenciao, concomitante aos estgios iniciais Revoluo Industrial,

    advm da passagem do ensino de habilidades ocupacionais das famlias de

    artesos do espao familiar para instituies estruturadas para corresponder s

    exigncias de habilidades tcnicas mais especificas. Da foi um pequeno passo para

    Tauton (1869 apud GOODSON, 1995) raciocinar que seria intil comear a ensinar

    matrias que exigiriam longo perodo de continuidade para alunos deixavam a

    escola aos 14 anos, orientando o currculo e trs graduaes que se aproximam,

    mas no so exatamente os nveis de escala social.

    Do currculo, e seus elementos indissociveis tais como disciplina e classe,

    subjaz, em sua origem, a conceituao de seleo, organizao e validao de uma

    cultuar a e conhecimentos determinados como contedos neutros e essenciais para

    a formao humana na educao institucionalizada dentro da sociedade em que

    este ser vive e na qual dever contribuir dentro dos limites anteriormente

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    aprendidos. Nessa perspectiva o saber escolar seria a transposio do

    conhecimento acadmico, valores e habilidades aceitos a priorie inquestionveis.

    Mas, sob essa face de neutralidade, mediante algumas questes o currculo

    revela-se artefato social e histrico, sujeito a mudanas e flutuaes.

    1.2 Teorias bsicas do currculo

    As primeiras conceituaes de currculo formuladas no incio do sculo XIX na

    Europa e transplantadas para colnias americanas, inclusive o Brasil, esto

    baseadas na idia rol de matrias e seus programas.

    Silva (2002 apud MACHADO & SILVA, 2011) nos afirma que foi no final do sculo

    XIX e inicio do sculo XX que o currculo comeou a ser estudo para alm de rol de

    disciplinas e contedos.

    Na escola, considerou-se o currculo como instrumento por excelncia docontrole social que se pretendia estabelecer. Coube, assim, escola,inculcar os valores, as condutas e os hbitos adequados. Nesse momentoa preocupao com a educao vocacional fez-se notar, evidenciando opropsito de ajustar a escola s novas necessidades da economia(MOREIRA & SILVA. 2002. p.10).

    As teorias curriculares iniciais afirmando esse novo papel do currculo foi

    paralelo as teorias de administrao cientfica dos processos industriais. Tais teorias em

    sntese tratava de sees e especializaes das etapas do trabalho diviso de tarefas e

    padronizao da produo sendo essas realizadas sob uma gerncia efetiva e umasuperviso rigorosa, conhecida como Tayorismo (PEDRA, 1993 apud MACHADO &

    SILVA, 2011).

    Shdmidtt (2003) nos apresenta que Jonh Dewey havia criado em 1896 a escola-

    laboratorio na Universidade de Chicago que tomava por princpio que a criana aprende

    melhor por meio de experincias significativas. Isso abriu caminho para o currculo

    experimental amplamente aceito no Brasil na dcada de 30 em que centrou-se no

    interesse do aluno.

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    Mas o primeiro livro a tratar diretamente de currculo foi o norte americano

    Franklin Bobbitt (1918), autor de The Curriculum. Esse autor, expoente da teoria

    tradicional do currculo, afirma que no livro citado que currculo aplicado a educao

    [...] aquela serie de coisas que as crianas e jovens tem que fazer e

    experimentar [...] para fazerem as coisas bem, para resolver os problemas da vida

    adulta (PACHECO, 2006 p 32).

    Experincias neste contexto eram teste direcionados, com resultado pr-

    determinado, o que divergisse desse resultado era tratado como erro, pois a influncia

    que das idias administrativas baseadas na eficincia e na padronizao no permitiam

    que houvesse divergncia na ao/consequncia j que, segundo Silva (2002 apud

    MACHADO & SILVA, 2011)

    Na perspectiva de Bobbitt a escola tinha a misso de conservar e restaurar os

    valores da cultura americana e o compromisso de formar pessoas atendendo exigncias

    do trabalho de empresas comerciais e industriais.

    De acordo com Pedra (1993 apud MACHADO & SILVA, 2011), Dewey prope o

    currculo influenciado pelas questo da experincia da cultura movimentos sociais do

    perodo, que abandonava o sistema rural e transformava-se em uma Amrica fabril

    e urbana (ideb p 30)

    Para Pedra (1993. p 31 apud MACHADO & SILVA, 2011, p 6) se Bobbitt

    entendia o currculo como um conjunto de estratgias para preparar o jovem para a vida

    adulta; Dewey o compreendia como o ambiente que era fornecido ao estudante para

    experienciar vida mesma.

    Sobre a linha tradicional da educao outro pensamento a se destacar o de

    tecnicismo estruturado sobre as sistematizaes sobre o currculo e educao de Ralfh

    Tyler apresentadas por volta da segunda metade do sculo XX.

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    Ralfh Tyler segue pressuposto de neutralidade cientfica e guiado pelos princpios

    da racionalidade e eficincia na produo, toma-se o processo educativo a fim de

    enfatizar a sua racionalizao e a tecnicizao das atividades criando critrios de

    medida de sucesso/fracasso para medir a qualidade da educao. A pea chave estava

    no planejamento burocratizado em formulrios, objetividade, produtividade e eficincia

    exclua qualquer subjetivao, mudanas durante o processo de execuo ou

    questionamento.

    Professores e alunos segundo plano, ou seja, esses so apenas peas guiadas

    por um planejamento (o currculo) coordenado e controlado por um especialista

    supostamente neutro, habilitado, objetivo e imparcial.

    A obra de referencia de Tyler Princpios bsicos do currculo e do ensino de

    1949 primorosa em seu modelo tcnico-linear e suas respostas as quatro questes

    bsicas: como selecionar objetivos, como selecionar experincias de aprendizagem,

    como organizar essas experincias e como avaliar sua eficincia teve influencia

    marcante no Brasil, que com raras excees, sempre se ajustou a esse pensamento

    curricular linear e modelar (SCHMIDT, 2003)

    Sobre a linha terica tradicional Machado e Santos 2011, p 7) destacam alguns

    aspectos fundamentais do currculo:

    1) foi uma tentativa de garantir o controle social ajustando o que seensina ao que se espera dos futuros trabalhadores, ou seja,

    inculcando conhecimentos e valores necessrios a garantir umaestrutura social ativa, mas submissa aos princpios dominantes;2) usaram de idias como neutralidade e objetividade a fim de

    legitimar a escola como em um ambiente neutro em relao aquestes sociais externas como, por exemplo, a desigualdade sociale a misria3) centravam-se em questes tcnicas garantindo eficincia no

    mundo do trabalho e da produo industrial.No entanto, podemos ponderar que o currculo serve comoinstrumento de poder, o ambiente escolar ao se preocupar comquestes econmicas e de produo acaba por demonstrar suaparcialidade, evidenciando que impossvel a neutralidade em

    questes que envolvam interesses humanos e de classe.

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    Durante a guerra fria, quando os soviticos saram a frente dos americanos na

    corrida espacial estudiosos americanos de vrias se voltam para o estudo do currculo

    a ser reproposto para favorecimento da formao de lderes e cientistas.

    Concomitantemente o mundo ocidental da dcada de 60 vivia uma crise

    novidades tecnolgicas e cientficas, filosofias existencialistas, movimentos sociais e

    questionamento moral e cultural da formao da civilizao. A escola contestada

    como estrutura institucional de educao num contexto de contracultura da

    liberdade sexual, uso indiscriminado de drogas lcitas e ilcitas, naturalismo, vida

    comunitria e denunciada como castradora, instrumento de elitizao e discrimao

    dos seres humanos.

    Schwab (1970, p 238 apud SCHMIDT, 2003) evidenciando o pessimismo da

    poca afirma o campo do currculo est moribundo. Ele incapaz, por sua presente

    metodologias e princpios, de continuar seu trabalho e contribuir significativamente

    para os avanos da educao.

    Tais crticas ganha corpo e presena acadmica nos Estados Unidos,

    Inglaterra e Frana, e nesse clima de conspirao que emerge uma sociologia do

    currculo, baseada em crticas e altercaes sobre a organizao curricular.

    Nesta perspectiva a pesquisa consistente no campo curricular que avana

    para a

    compreenso mediada pelo conceito e entendimento da questocultural, afirmava que assim como as partes da natureza no eramnecessariamente obstculo ao humana, mas sim produtos queos homens fizeram e que poderiam, portanto desfazer (Moreira eSilva, 2009), no caso do currculo a inteno central seria identificar eajudar a extinguir os aspectos que acabavam por contribuir de formaa limitar a liberdade do indivduo e dos mais diversos grupos sociais(MACHADO& SANTO, 2011,8 e 9)

    Como consequncias dessa apresentao do currculo como resultado da

    ao humana a partir de 1973 desenvolveram-se as correntes conhecidas

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    reconceitualistas, uma baseada no neomarxismo e na teoria crtica e outra

    baseada numa tradio humanista e hermenutica. As divergncias versavam sobre

    as posies que a neomarxista desconsiderava o ser humano suas especificidades

    a subornao pelos blocos estruturais de classes enquanto os humanistas focados

    no indivduo no o percebiam num estar numa base de sociedade com predomnios

    de classe.

    Os questionamentos e estudos desta fase acabam por favorecer uma

    concepo de currculo como uma construo social, a compreenso das complexas

    conexes entre currculo, cultura e poder na sociedade capitalista do sculo XX.

    A Sociologia, consolidada como disciplina universitria, abre espao

    Sociologia da Educao. Que focava seus estudos em pesquisas das micro

    estruturas - estabelecimento escolar, as salas de aula e seus atores.

    Schmid ( 2003) chama ateno que o currculo tambm se torna neste perodo

    objeto da psicologia pelos estudos de Piaget e Vygotsky que fazem o eixo curricular

    ir do que se considerava lgico para o psicolgico reorganizando-o pela

    aprendizagem coordenada com as etapas de desenvolvimento cognitivo e

    experincias de interao entre o individio e o objeto ou meio. Vygotsky e os outros

    tericos russos enfatizam o papel dos determinantes scio-culturais na formao

    das estruturas comportamentais e cognitivas.A sociologia focava seus estudos em pesquisas das micro estruturas -

    estabelecimento escolar, as salas de aula e seus atores.do conhecimento pelos

    saberes cotidianos e sobre aqueles que os promovem revelam como so relativos e

    socialmente construdos, as significaes produzidas e compartilhadas e

    comunidade subsidiar a experincia individual e participara da construo sua

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    identidade, mas este ser no passivo por sua prpria percepo e eleio pelo seu

    aparato cognitivo/ psicolgico.

    A questo do conhecimento e do poder como controle social, se desnaturaliza

    pela uma teoria do valor crtico dos contedos cognitivos e culturais da educao

    quando essa aplicar mensuraes alheias aos comportamentos individuais

    buscando subordinar estas variaes a uma unidade de conhecimentos/

    comportamentos selecionados e transmitidos que, por negar ou desqualificar as

    variaes divergentes (FORQUIN, 1993. p.82/83 apud MACHADO & SANTOS,

    2011).

    Para a teoria do currculo a Nova Sociologia da Educao argumenta que a

    maneira como uma sociedade classifica, seleciona, distribui, transmite e avalia os

    conhecimentos histricos, sociais, culturais e cientficos arbitrariamente para o

    ensino que reflete a distribuio de poder e assegura o controle social dos

    comportamentos individuais subordinando estes comportamentos e tornando-os

    reprodutores de sua prpria subordinao.

    Para os reprodutivistas as desigualdades sociais persistem e so perpetuadas

    por complexas relaes de dominao entre vrios grupos sociais. Para Bourdieu

    (1998) a reproduo cultural transmite dentro do grupo familiar por certo capital

    cultural e um sistema de valores implcitos e profundamente interiorizados, quecontribui para definir, entre outras coisas, as atitudes face ao capital cultural e a

    instituio escolar (NOGUEIRA e CATONI. 1998. p. 43 apud MACHADO &

    SANTOS, 2011)

    O acmulo cultural de cada famlia seria, portanto, o primeiro contato do

    indivduo com a cultura. Com esse depositrio cultural familiar de informaes/

    conhecimentos, posturas, tica e principalmente vises de mundo, confrontando/

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    comparado com o currculo d escola. Dependendo da proximidade entre a cultura

    familiar e a que ser apresentada na escola haver o fracasso ou sucesso escolar.

    Bourdieu (1998 apud MACHADO & SANTOS, 2011) deduz que a valorizao

    e transmisso da cultura dominante nas escolas garantem sua hegemonia e

    continuidade em um crculo vicioso, pois, as crianas de classe baixa, que

    absorveram, de acordo com suas culturas familiares, formas de agir e de conversar

    em desarmonia das que imperam nas escolas.

    Paira a impresso de que, se as regras sociais dominantes, legitimadas na

    escola, menosprezam e desqualificao as outras possibilidades, como as culturas

    familiares e de outros grupos que dela se afastarem, como se fosse possvel

    simplesmente exclui-los, e no como estivessem mesclados no tecido social.

    Louis Althusser introduz nas dcadas de 60 e 70 do sculo passado, pela

    base da teoria marxista, ao questionar as condies sociais de produo se

    reproduzem na sociedade capitalista, o conceito de aparelhos ideolgicos do estado

    (AIE), que seriam instituies sociais que usam a ideologia e o convencimento na

    sociedade a favor da ideologia da classe dominante e reproduzida por estas

    instituies (escola, famlia, igreja, meios de comunicao...).

    Althusser (1985) v a educao como era um dos fundamentais aparelhos de

    transmisso de ideias dominantes os saberes contidos na ideologia dominante, oclculo, a histria natural, as cincias ou simplesmente ideologia dominante em

    estado puro moral, educao cvica e filosofia. (ALTHUSSER, 1985 p.79 apud

    MACHADO & SANTOS, 2011) em seu currculo.

    As teorias crticas tambm nomeiam o currculo oculto. Neste currculo esto

    os saberes, valores e representaes sociais implcitos na escola, mas que no

    figuram nos programas. Esses currculos pode ser a radicalizao da ideologia

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    dominante, ou ao contrario ser o que escapa dela e fica fora do controle institucional

    (FORQUIN. 1993, apud MACHADO & SANTOS, 2011 p.23)

    1) o, quando trazemos essas discusses para o campo docurrculo vemos que elas nos ajudaram a criar uma nova forma de

    pensar a educao, suas possibilidades e suas implicaes sociais,

    2) a percepo de que as idias contidas no currculo no

    so neutras e desinteressadas, e que devem ser mostradas e

    reveladas

    3) estudo que valorizem o cotidiano e a vida real na escola,

    nos revela que devemos valorizar as contradies sociais e entender

    que os sujeitos so atores e no simplesmente produtos do meiosocial onde vivem,

    4 relao direta histrica e cultural entre o conhecimento e o

    controle das camadas subalternas sendo legitimada pela escola e

    pelos conhecimentos transmitidos

    5 a noo de ideologias transmitidas no currculo como

    instrumento de poder social, cultural e historicamente construdo em

    uma luta constante entre sujeitos a fim de manterem o poder

    institudo.

    Quando do currculo retirada a fachada de neutralidade e derrubado da

    posio de transmissor de conhecimentos acima dos conflitos sociais, so

    questionadas juntamente, s noes de razo e racionalidade, de padro

    socialmente vlido. Duvida-se da ideia de progresso/ avano tecnolgico/acmulo de

    conhecimento, at ento visto como algo desejvel, necessrio e benigno. Critica-se

    o sujeito racional, livre, autnomo, centrado e soberano.

    Foca-se tambm a diferena e converso do saber cientfico em saber escolar

    em que documento currculo e o currculo processo so analisados nas

    convergncias e divergncias, rematando como as mesmas indicaes curriculares

    podem ser abordadas de formas diferentes (GOODSON, 1995).Para o ps-modernismo, o sujeito no o centro da ao social. Eleno pensa, fala e produz: ele pensado, falado e produzido. As

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    ideias de mudana de paradigmas ganham espao nos debatesacadmicos, busca-se romper a lgica positivista, tecnocrtica eracionalista, linear, na tentativa de dar voz aos subalternos eexcludos de um sistema totalizante e padronizado (SANTOS &MACHADO, p17).

    A partir as teorias educacionais ps-crticas destaca-se a argumentao sobre

    o multiculturalismo- movimento terico-politico que busca encaminhar as

    pluralidades culturais de dos seres humanos criadores/criados nestas culturas que

    converge para o direito a diferena. Candau (2008 SANTOS & MACHADO)

    argumenta que a problemtica multicultural em que sujeitos histricos negados no,

    afirmam suas identidades escamoteadas e lutam por seus direitos de cidadania

    plena na nossa sociedade, dando visibilidade aos subterfgios que pretendem

    legitimar a subordinao, excluso ou favorecimentos de classe ou por

    caractersticas individuais de fundamentados em padres dominantes. Segundo a

    autora o multiculturalismo no simplesmente como um dado da realidade ele

    mais uma maneira de atuar, intervir e transformar a dinmica social (CANDAU e

    MOREIRA, 2011. p.20). neste ponto que ganha relevncia no currculo.

    2 Currculo para os Direitos Humanos.

    A necessidade dos Direitos Humanos atravessarem a construo curricular

    busca desenvolver no indivduo e na sociedade em geral um compromisso com a

    cultura de promoo, proteo, defesa e reparao desses direitos individuais e

    coletivos.

    Pelo direito a diferena e noo de que possvel promover modificaes

    sociais, contanto que os sujeitos tenham conscincia de si e da impossibilidade de

    neutralidade, o currculo se reposiciona como um dos meios de superao da falciada monocultura no destaque aos direitos humanos.

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    Para mim na arte e currculo formam e transformam os seres humanos. Da,

    ao tratarmos o currculo para Direitos Humanos, precisarmos partir de indagaes:

    Como est pensada a formao humana no que compe o currculo? Que

    pensarmos para esse ser humano nos conhecimentos priorizados ou descartados do

    currculo deslocado de um tempo e lugar? Que cultura est sendo legitimada nos

    contedos e em sua abordagem? Quem escolheu essa disciplina, aquele contedo,

    nessa abordagem? Em que lugar (es) e tempo (s) o currculo est? Em que lugares

    e sob que lente esse ser humano se encontra no que lhe for exposto? Como

    conviver e tratar aos outros seres e o mundo ao seu redor? Como agir a partir do

    aprendido e do que no foi apresentado? Enfim que ser humano emergir dessas

    escolhas? E onde eu estou, o que opto, o que pretendo, como interajo e porque

    neste currculo?

    O currculo sob, esse prisma [...] um artefato histrico-social, alm de conter

    a noo de controle do processo, tecido de conflitos, interpretaes e gradaes

    de rejeio/aceitao de propostas novas confrontadas com tradies cristalizadas,

    perceptveis nas disciplinas, sua distribuio pelos nveis escolares, carga horria e

    programas, planejamento, prescries oficiais e orientaes a partir de projetos do

    que deve ou se quer realar ou omitir e m termos de conhecimento e formao

    para/do indivduo ou grupo (SAVIANI, 2006).A seleo dos elementos que sero evidenciados no currculo intracultural

    de uma cultura, ou seja, escolhas e priorizaes dentro das vrias possveis dentro

    de um espao scio histrico. As inclinaes por conhecimentos formais/ contedos

    distribudos nas disciplinas, em sries/ nveis de aprofundamento, a carga horria

    atribuda para cumprir esse programa/disciplina, a indicao de mtodos e materiais

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    (N.SAVIANI, 2005) ocorre em trajetrias sinuosas e tumultuadas, num processos

    conflituosos em diversas dimenses.

    Em sua elaborao convivem lado a lado fatores lgicos, epistemolgicos e

    intelectuais (GOODSON, 1995, p 8) com interesses de relaes polticas, de poder,

    de persuaso, de presso de legitimao e controle do que se consolidar como

    conhecimento cientfico, crena, expectativas e vises sociais.

    Os contornos do currculo se desenham em decises negociadas, implcitas

    ou explicitamente, entre partes que proclamam e defendem interesses diversos e

    muitas vezes antagnicos.

    Consequentemente o espao do currculo a escola- e os sujeitos que

    agem/reagem nele e partir dele autores, gestores escolares, professores,

    profissionais da escola e alunos so lugar e sujeitos inseridos e participantes

    saibam ou no, queiram ou no do processo da construo curricular e de seus

    efeitos sobre o ser humano e a sociabilidade.

    3 Categorias centrais para a educao em Direitos Humanos:identidade, alteridade, representao e multiculturalismo.

    Um marco da educao em Direitos Humanos a pesquisa promovida no

    continente latino-americano pelo Instituto Interamericano de Direitos Humanos (IIDH)

    da Costa Rica, no perodo de1999-2000 e coordenada pelo professor chileno

    Abraham Magendzo (Cuellar, 2000) que faz um balano crtico da educao em

    Direitos Humanos nos anos 90 na Amrica Latina.

    A temtica de educao em Direitos Humanos nos anos 80 envolveu-se com

    o fortalecimento da democracia, em processos de transio de ditaduras para

    democracias como o Brasil.

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    O estudo apontou que a educao em Direitos Humanos estava mais no

    mbito das organizaes no governamentais e raramente em administraes

    pblicas localizadas.

    J dcada de 90 foi pela macia do governo em realizaes de planos e

    promulgao de leis que envolviam os Direitos Humanos.

    No entanto, o alargamento ou confinamento do termo para campos como a

    educao para o transito, os direitos do consumidor, questes de gnero, tnicas, do

    meio-ambiente leva ao risco que a educao em Direitos Humanos perca

    especificidade (CANDAU, ? p 3).

    Candau (?, p 3) adverte queEm relao polissemia da expresso educao em DireitosHumanos, os pesquisadores [do estudo citado] afirmaram aimportncia de no se deixar que esta expresso seja substituda poroutras consideradas mais fceis de serem assumidas por um pblicoamplo, como educao cvica ou educao democrtica, ou querestrinjam a educao em Direitos Humanos a uma educao emvalores, inibindo seu carter poltico.

    Na sntese dos debates do seminrio promovido pelo IIDH em Lima, 1999,

    refora trs componentes articulados da gnese histrica conceitual da Educao

    em Direitos na Amrica- Latina: formar sujeitos de direito, favorecer processos de

    empoderamento e educar para o nunca mais.

    A primeira diz respeito formao de sujeitos de direito objetiva estabelecer

    fortalecer nos latino-americanos a conscincia de que so sujeitos de direito a nvel

    pessoal e coletivo, pois culturalmente com considerarem com favor o

    cumprimento de seus direitos pelo governo, em outras instncias ou instituies do

    cotidiano.

    Os processos de educao em Direitos Humanos devem comearpor favorecer processos de formao de sujeitos de direito, que

    articulem as dimenses tica, poltico-social e as prticas cotidianase concretas (CANDAU, ?, 4).

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    Outro elemento considerado fundamental na educao em Direitos Humanos

    favorecer o processo de O "empoderamento" (empowerment), principalmente

    orientado aos atores sociais que historicamente tiveram menos poder na sociedade,

    isto , poucas possibilidades de influir nas decises e nos processos coletivos

    (CANDAU,? p 4). O empoderamento tambm considerado essencial na educao

    em Direitos Humanos ao fazer o sujeito reconhecer-se e agir como sujeito de sua

    vida e ator social.

    O sob o ngulo coletivo o empoderamento encaminha a valorizao dos

    grupos scio-culturais excludos e discriminados, a fim promover sua organizao e

    participao ativa na sociedade civil.

    O terceiro elemento trata dos processos de transformao necessrio para a

    construo de sociedades verdadeiramente democrtica e humana (CANDAU,?, 5)

    pela cultura de educar para nunca mais pelo resgate da memria social encoberta,

    a ruptura do silncio social e no aceitao da impunidade em momentos histricos

    como o vivido pela ditadura no Brasil.

    Perpassam as dimenses destacadas para a Educao em Direitos humanos

    os princpios de identidade, alteridade, representao e multiculturalismo.

    No se pode deixar que tais conceitos so interligados e interferente e

    sobrem interferncias.Escolho comear por identidade. A identidade traz em partes contedos que o

    ser humano afirma, opta e outros preexistentes, que so marcas que adquirir de

    seu lugar, tempo, fatores fsicos, raciais. Apesar dos riscos, exemplifico: bissexual

    masculino.

    As opes no so inocentes, os indicadores da identidade afirmada esto

    saturados de valores histricos, sociais, psicolgicos. Tais valores, por sua vez, no

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    so isentos, e, mesmo me esforando pra no dicotominazar, uns reforam, outros

    enfraquecem o prprio sujeito.

    A identidade evidencia o que sou/ escolho e tambm o que recuso. As

    incluses e excluses da identidade do ser trazem tona as representaes

    simblicas do indivduo para si para os outros.

    Cabe destacar que a identidade cultural ao mesmo tempo produto/

    produtora do ser. E, como a cultura mutvel graas influencias das mudanas de

    pensamento religioso, cientfico, poltico, etc, a identidade cultural tambm muda.

    Muganda (?) tendo em vista que a construo social da identidade se produz

    em relaes de fora distingui trs formas para sua origem:

    A identidade legitimadora, que elaborada pelas instituiesdominantes da sociedade, a fim de estender e racionalizar suadominao sobre os atores sociais;

    A identidade de resistncia, que produzida pelos atores sociaisque se encontram em posio ou condies desvalorizadas ouestigmatizadas pela lgica dominante.[...]

    A identidade-projeto: quando os atores sociais, com base nomaterial cultural a sua disposio, constroem uma nova identidadeque redefine sua posio na sociedade e, consequentemente sepropem em transformar o conjunto daestrutura social (MUGANDA, ?, p 3).

    A identidade, o eu, tambm gera o outro. As identidades (biolgicas, culturais,

    sexuais, religiosas, etc) aproximam por um lado para os outros em que tenha algo

    em comum e distancia de outro onde houver disparidade. Portanto,

    identidade/alteridade so co-dependentes.

    A identidade individual e coletiva muitas vezes busca se afirmar pela negao

    da legitimidade da diferena do outro. A identidade passa a ser o estereotipo, as

    caractersticas dessa identidade podem considerar-se superiores dos princpios

    fundamentais da alteridade que o h na sua vertente social tem uma relao de

    interao e dependncia com o outro. Por esse motivo, o "eu" na sua forma

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    individual s pode existir atravs de um contato com o "outro". A interao

    identidade/ alteridade nesse contexto de antagonismo.

    Pessoalmente defendo que, inclusive para defender os Direitos Humanos, h

    posies com as quais sou antagnica, por exemplo: um homem que em sua

    identidade de gnero considera natural agredir fisicamente uma mulher. Esse

    antagonismo consciente no aleatrio, e no generalizante: nenhum homem

    presta ou veste em toda mulher as roupas de coitadinhas e submissas.

    A questo quando a alteridade negada por projeo do aparente contraste

    com a identidade individual/coletiva antes de conhec-la. Ou o pre conceito, ideiais

    firmadas que generalizam aspectos do outro, concebidas a distncia, com bases

    poucos confiveis, descontextualizadas e que se autointitulam imparciais.

    Na modernidade as identidades culturais eram mais claras. Mas atualmente

    nesse perodo povoado pelas tecnologias da informao, pelacompresso das distncias - seja por via virtual como pela

    velocidade dos meios de transporte [...] caem por terra as fronteirasnacionais e no qual os produtos (comida, bebida, vesturio, lngua,crena, msica, moda, valores, entre tantos outros) das maisdiversas culturas, dos mais diversos pases, invadem sem pedirlicena, sem permisso, fiscalizao ou visto os territrios de outrasnaes, pases, povos e comunidades mais distantes, a identidadecultural se configura enquanto resultado desse contexto muitomenos fechada, muito menos estvel e esttica (PACHECO, Joice,?, p 5)

    Os outros e o eu culturais, perto ou distantes, falam e escutam novos

    discursos, novas formas de os representar e de serem presentados. Essa

    representao tem dois sentidos. O primeiro a representao simblica que pode

    ser concreta (o tipo de roupas, a comidas preferidas) e abstrata (implcito nas

    palavras, gestos e posturas).

    O segundo sentido de representao envolve aos sujeitos identificados em

    um conjunto de pessoas.

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    Neste sentido a representatividade evoca as noes de defesa de direitos e

    participao de minorias culturais ou excludas pelos padres da homogeneizao

    cultural.

    Do reconhecimento conceitos de identidade (s), alteridade(s) e representao

    (es) em conjunto indissociveis e conflituosos chegamos ao multiculturalismo.

    Para Muganda (?) o multiculturalismo implica nas peculiaridades do eu, tu,

    ele(s), ela (s), ns de e seus problemas e experincias sociais dos diversos grupos

    sociais: tnicos, de gneros, de raa, etc em que se preze convivncia harmoniosa,

    que no evite a divergncia, o respeito e a aceitao e aprendizagens entre os

    sujeitos e grupos especficos. Multiculturalismo no evitar divergncias, ou

    aceitao de tudo, mas debate, posicionamento, e defesa consciente e

    fundamentada falada e escutada do indivduo, do outro e de ns em que das

    influencias mltiplas h a apreenso da humanidade.

    Como exemplo dessa combinao vou contar uma atividade que costumo

    fazer em sala, antes de trabalhar com interpretao de obra de arte, em que

    comum perguntarem o qu o artista quis dizer na obra, como sendo essa a

    resposta certa ou a posio de que cada um tem uma interpretao da obra e

    ponto, todos esto certos.

    Procedo assim: pego um objeto tridimensional como uma cadeira e ponho em

    cima da mesa;

    peo para que diversos alunos descreverem o que veem; um

    pode falar sobre um parafuso, que o outro no v;

    pergunto: o fato desse ltimo no ver o parafuso prova que ele

    no existe?

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    posso mudar a cadeira de posio ou pedir para os alunos

    mudarem de lugar e retorno as perguntas.

    Encerro perguntando aos os alunos que sentidos identificam na brincadeira,

    as falas giram em torno de: O que eu vejo depende de onde estou. O que eu vejo

    pode no ser visto pelo outro. Se o outro enxerga algo que eu no, no quer dizer

    que no existe. Ao descrever o que vemos do nosso ngulo e combinarmos com a

    descrio do outro, complemento como vejo a cadeira. Quando a posio da cabeira

    muda, muda o que vejo dela. Quando mudo de posio vejo outras coisas da

    cabeira. Cada um v a mesma cadeira, mas de forma diferente dependendo de onde

    est.

    Repassando para identidade, alteridade, representao e multiculturalismo:

    do meu lugar eu vejo/ leio/ idntico/ concebo o que est proposto; o outro, de seu

    lugar v/ l/ identifica/ concebe o mesmo proposto em outro ngulo; as diferenas

    entre o que vemos no se excluem, mas se complementam; mudando o que est

    proposto temos que rever o que concebamos de nossas posies, indo para o lugar

    do outro vejo o proposto de forma diferente, cada um de seu ponto de vista tem uma

    viso diferente do proposto, e, finalmente falar sobre o meu ponto de vista e ouvir o

    das outras pessoas formar um conjunto complexo de similares e dispares.

    Figuro o exposto por meio deuma obra de Veri Apriyatno,artista com forte influncia deoutra artista, Escher.

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    3 Currculo formal, currculo em ao e direitos humanos.

    Apesar da carga histria e conceitual presentes na palavra currculo

    empregada em diversos discursos nas mais diferentes situaes. Sendo comumente

    usado como sinnimo de grade ou matriz curricular, atividades curriculares, matrias

    de estudo ou matrias de ensino, disciplinas escolares, componentes curriculares,

    programas ou contedos das componentes curriculares.

    O currculo para N. Saviani (2008) envolve uma multiplicidade de relaes

    que vo do aparato legal de suas prescries ao que acontece em sala de aula e

    uma

    viso dinmica de organizao curricular supe conceber-se ocurrculo como processo, em diversos mbitos de decises erealizaes: a) o currculoprescrito e regulamentado o mbito dasdecises polticas e administrativas; b) o currculo planejado o

    mbito das prticas de desenvolvimento, modelos em materiais,guias; c) o currculo organizado no contexto de uma escola ombito das prticas organizativas; d) ocurrculona ao o mbitoda reelaborao na prtica, em que se operam transformaes noplano dos professores/as e nas tarefas escolares; e) o currculoavaliado o mbito das prticas de controle internas e externas. (Cf.SACRISTN, 1998, p.139 apud N. SAVIANI, 2008, p 2).

    O que inferimos como currculo formal compreende o currculo prescrito e o

    currculo planejado, j o currculo em ao o organizado na escola e o currculo emsala de aula

    O currculo formal fundamenta-se prescries e modificaes em lei do que o

    currculo deve conter e orientaes para sua implementao. As prescries devem

    ser obedecidas, as orientaes so relativizadas como facilitadoras do cumprimento

    das prescries. Ambas so emanadas do Estado e constam em documentos da

    legislao pblica, basicamente, as prescries esto em leis e decretos e as

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    orientaes em pareceres e documentos contendo subsdios. Podem, entre outras

    modificaes, incluir/ excluir disciplinas e contedos, reconfigurar disciplinas,

    ampliar/ diminuir o tempo escolar em seus nveis ou disciplinas. As modificaes no

    currculo formal podem ou no ser respostas a reinvindicaes da sociedade para a

    educao,

    O currculo formal prximo da definio de Jackson (1968 apud GOODSON,

    1995) da fase pr-ativa do currculo, como estrutura com selees de

    conhecimentos externa aos seus sujeitos ou o currculo de fato de Young (1977

    apud GOODSON, 1995, p18) visto como algo que possui vida prpria.

    O currculo em ao, por sua, tem aspectos em comum com a fase interativa

    do currculo de Jackson (1968 apud GOODSON, 1995) quando o conhecimento

    deve ser dominado pelo sujeito e ao currculo na prtica de Young (1977 apud

    GOODSON, 1995, p18) que trata das interaes objetivas e subjetivas de

    professores e alunos na sala de aula.

    O currculo em ao se desenrola dentro do espao escolar indo de aes

    administrativas e pedaggicas que atingem desde organizao de turmas,

    viabilizao de tempo e do espao na matriz at a solicitao de material didticos

    adequados e realizaes de planejamento pedaggico e formao docente.

    Neste momento os sujeitos do currculo podem compreend-lo, elabor-lo eimplement-lo embasados em reflexes relacionadas aos objetivos do ensino;

    valores, atitudes implicados e quais os interesses e interessados e na absoro

    desses conhecimentos. Tomam as decises de definio e controle do que xito e

    do que fracasso no ensino; questionamento das formas dominantes de avaliao

    do processo de ensino e mudana das prticas escolares questionadas. Esse

    espao precisa estar aberto s negociaes.

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    Para N, Saviani (2008, p 4)

    a principal negociao [...] se d no momento da realizao docurrculo. Na relao pedaggica propriamente dita, entre

    professores/as e alunos/as. Por mais que a proposta curricularvenha bem atraente, organizada, no que diz respeito satividades a serem desenvolvidas, ainda que o/a professor/aencampe essas propostas e [...] tenha participado de suaelaborao, na hora de trabalh-las em situaes de sala deaula e outras a ela relacionadas, as alteraes so inevitveis:os alunos reagem, aceitando-as ou rejeitando-as. O aceitar /rejeitar no significa simplesmente dizer quero ou no quero,fazer ou deixar de fazer; aprender ou no aprender, ter estaou aquela dificuldade... Isto vai exigindo que os professoresfaam alteraes.

    Currculo formal e currculo em ao no devem estar distanciados.

    O currculo formal tem importncia no em ao porque tambm tem

    importncia fora da escola e ambos devem ser refletidos como construes sociais.

    Para a Educao em Direitos Humanos preciso que, estando no currculo

    formal, possa promover a reflexo e ao a partir deste onde a Educao em

    Direitos Humanos ainda no est pela via do currculo em ao, ao mesmo tempo

    esse em que o currculo em ao que j est em pratica pode assegurar-se pelo

    currculo formal.

    4 Limites e possibilidades de propostas educativas com nfase nosdireitos humanos.

    Um tpico que defendo como que a Educao em Direitos Humanos no seja uma

    a citao dos Direitos Humanos, ou o contedo Direitos Humanos entre os demais

    contedos, mas, que os Direitos Humanos perpassem todo o currculo na analise de suas

    entrelinhas, gestos, imagens do que est impregnado pela cultura da homogeneidade ou

    disfarado no discurso da neutralidade. Lembrando neste processo h choques e

    necessidade de negociaes.

    Outra questo perceber a relevncia na atualidade das discurses e defesas dos

    Direitos Humanos pela prpria globalizao, infiltraes e contatos com diversidades da

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    cultura a nvel mundial, que geraram conflitos e interferncias negativas se tomarmos nosso

    ponto de vista como padro do correto.

    preciso conhecer o que nos diferencia e de ir, alm dos que nos diferencia para o

    que nos aproxima.

    Candau (2008) nomeia essa situao tenso e entre o particular e universal.

    Insisto em dois pontos para proposta de Educao em Direitos: assumir que que no

    h neutralidade, que cada um e todos trazemos conceitos e preconceitos, dos quais estar

    conscientes fundamental e que as situaes individuais e sociais podem ser mudadas por

    novamente cada um e todos sermos atores neste contexto que no mas est, ou seja,

    o que esta construdo no definitivo pode ser reformado. Advertindo que Educao em

    Direitos Humanos no o remdio de todos os males um processo conflituoso no

    esttico ou com guia de passos, mas h direes priorizadas em documentos que

    destacam as mais recorrentes e perigosas violaes dos Direitos Humanos.

    A Educao em Direitos Humanos em seu principio de identidade e diferena no os

    contrape, mas h dimenses da identidade e diferena que negam os direitos humanos,

    dependendo da abordagem esse aspecto delicado pode recrudescer o conflito.

    Canem (in LOPES & MACEDO, 2005) apresente alguns riscos na abordagem do

    multiculturalismo, que em vez de superar os preconceitos diferenas levem a sua

    perpetuao. Os ricos so:

    Quando o multiculturalismo adquiri um carter reparador, reduzindo-se a aes de

    supostas correes e reparaes a injustias passadas p 181, em que os critrios

    adotados, com falhas do margem as dvidas de sua utilizao e so manipulveis, casos

    em que marcar a raa negra em formulrio, sem outras comprovaes d o direito a estar

    nas cotas de concurso pblico. A reduo da no discriminao a esse aspecto podem

    resultar em mais discriminao.

    Tratar o multiculturalismo como folclorismo exclusivamento e, momentos escolares

    com feira da cultura, dia do ndio ou da conscincia negra entre outros, apresentados em

    seu exotismo e distante dos sujeitos que falam, como falar do ndio esquecendo de

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    identificar sua presena entre os ancestrais e familiares ou nos traos fsicos e gostos dos

    sujeitos.

    No reducionismo identitrio o reconhecimento da diversidade no percebe o que

    Souza Santos (2001, apud CANEN in LOPES & MACEDO, 2005) apregoa: diferenas

    dentro das diferenas. A partir disso se reconhece a construo da identidade como hbrida

    e provisria, e se foca apenas um marcador de identidade que identifica o sujeito em um

    grupo, se vincula e cristaliza o sujeito neste marcador, com apontamentos como mulher

    loira tem restries em sua capacidade cognitiva.

    A guetizao cultural ocorre quando, curricularmente, um grupo opta ou levado a

    optar pelo estudo se no exclusivo, mas prioritrio, das especificidades de sua identidade e

    cultura dificultando intercmbios culturais. A guetizao tem como argumento base que a

    necessidade de currculos diferenciados compostos em marcos culturais advm da

    negao no currculo no abordar ou abordar esparsa ou equivocadamente sua

    cultura.

    A Educao em Direitos Humanos no constituda est constituda em solo

    firme precisa da atuao pautadas nas advertncias de Santos (2006 p. 445-447

    apud CANDAU, 2008) nesta longa citao que me levou a desrespeitar a regra de

    recuo a esquerda:

    1 A superao do debate entre o universalismo e o relativismo cultural. [...] todas as culturasou grupos culturais tm valores e ideias, elementos fundamentais que aspiram a comunicar

    a outros e universalizar, mas o universalismo incorreto, enquanto uma nica culturapredomine e queira se impor a todos (mas, possvel que alguns de seus elementos sejamuniversais). [...] o relativismo cultural, afirma que todas as culturas so relativas, nenhuma absoluta, nenhuma completa, mas necessrio propor dilogos interculturais sobrepreocupaes convergentes, ainda que expressas a partir de diversos universos culturais.Somente assim seremos capazes de construir algo juntos, um projeto comum. necessrionegar tanto o universalismo quanto o relativismo absolutos.2. Todas as culturas possuem concepes da dignidade humana. Nem todos os gruposculturais conhecem ou usam a expresso direitos humanos, mas isso no quer dizer queno tenham uma idia de dignidade humana, de vida digna, de querer uma vida melhor paraos seus habitantes ou para seus integrantes. Temos de ter sensibilidade para descobrir emcada universo sociocultural essa idia de dignidade humana que traduzimos como direitos

    humanos.3. Todas as culturas so incompletas e problemticas nas suas concepes de dignidadehumana e (no do conta da totalidade do humano). Afirmar que nenhuma cultura

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    completa, [...] desenvolver a sensibilidade para com a idia da [...] da necessidade dainterao entre elas.4. Nenhuma cultura monoltica. Todas as culturas comportam verses diferentes dadignidade humana [...]. Os grupos culturais no so homogneos e padronizados. [...] necessrio identificar e potencializar aquelas verses mais abertas, amplas e queapresentam um crculo de reciprocidade mais amplo, que favoream o dilogo com outrasculturas.5. Todas as culturas tendem a distribuir as pessoas e os grupos sociais entre dois princpioscompetitivos de pertena hierrquica: princpio da igualdade e princpio da diferena. Estaltima premissa situa-nos no mago da questo da ressignificao dos direitos humanos [...]No se trata de, para afirmar a igualdade, negar diferena, nem de uma viso diferencialistaabsoluta, que relativize a igualdade. A questo est em como trabalhar a igualdade nadiferena.

    Nas polticas e Educao em Direitos Humanos:

    temos o direito a sermos iguais, sempre que a diferena nosinferioriza; temos o direito de ser diferentes sempre que a igualdadenos descaracteriza (SANTOS, p. 462 apud CANDAU, 2008).

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