Dislexia, cognição e aprendizagem

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REVISTA DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOPEDAGOGIA • Nº 81 • 2009 • ISSN 0103-8486 VOLUME 26 EDITORIAL / EDITORIAL ............................................................................................................................ 337 ARTIGOS ESPECIAIS / SPECIAL ARTICLES • Dislexia, cognição e aprendizagem: uma abordagem neuropsicológica das dificuldades de aprendizagem da leitura ........................................................................................................................339 • Pedagogia da autoria: a construção do processo de autoria na formação de pedagogos................... 357 ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES • Protocolo de identificação precoce dos problemas de leitura: estudo preliminar com escolares de 1º ano escolar ................................................................................................................... 367 • A inclusão do aluno com perda auditiva na Rede Municipal de Ensino da cidade de Marília ............. 376 • Inventário das brincadeiras e jogos de crianças em diferentes municípios do Estado do Espírito Santo ..................................................................................................................................... 388 • Eficácia do programa de intervenção com a consciência fonológica em escolares com risco para a dislexia ................................................................................................................................396 • Avaliação assistida em crianças com hipotiroidismo congênito............................................................408 • Instituições privadas de ensino: considerações para o processo de inclusão ...................................... 415 RELATO DE EXPERIÊNCIA/EXPERIENCE REPORT • A escola contemporânea diante do fracasso escolar............................................................................. 425 PONTO DE VISTA / POINT OF VIEW • O laço social e a aprendizagem: algumas breves considerações .........................................................435 ARTIGOS DE REVISÃO / REVIEW ARTICLES • Aspectos psiquiátricos da criança escolar .............................................................................................. 441 • Estimulação do desenvolvimento de competências funcionais hemisféricas em escolares com dificuldades de atenção: uma perspectiva neuropsicopedagógica ..............................................458 • Conhecendo a dislexia e a importância da equipe interdisciplinar no processo de diagnóstico......... 470 • Dislexia e estresse: implicações neuropsicológicas e psicopedagógicas ............................................. 476 RESENHA / REVIEW • Compreensão de texto ...........................................................................................................................486 PSICOPEDAGOGIA 30 ANOS

Transcript of Dislexia, cognição e aprendizagem

REVISTA DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSICOPEDAGOGIA • Nº 81 • 2009 • ISSN 0103-8486

Volume

26

Editorial / Editorial ............................................................................................................................337

artigoS ESpEciaiS / SpEcial articlES

• Dislexia, cognição e aprendizagem: uma abordagem neuropsicológica das dificuldades de

aprendizagem da leitura ........................................................................................................................339

• Pedagogia da autoria: a construção do processo de autoria na formação de pedagogos...................357

artigoS origiNaiS / origiNal articlES

• Protocolo de identificação precoce dos problemas de leitura: estudo preliminar com

escolares de 1º ano escolar ...................................................................................................................367

• A inclusão do aluno com perda auditiva na Rede Municipal de Ensino da cidade de Marília .............376

• Inventário das brincadeiras e jogos de crianças em diferentes municípios do Estado

do Espírito Santo .....................................................................................................................................388

• Eficácia do programa de intervenção com a consciência fonológica em escolares com

risco para a dislexia ................................................................................................................................396

• Avaliação assistida em crianças com hipotiroidismo congênito ............................................................408

• Instituições privadas de ensino: considerações para o processo de inclusão ...................................... 415

rElato dE EXpEriÊNcia/EXpEriENcE rEport

• A escola contemporânea diante do fracasso escolar .............................................................................425

poNto dE ViSta / poiNt oF ViEW

• O laço social e a aprendizagem: algumas breves considerações .........................................................435

artigoS dE rEViSÃo / rEViEW articlES

• Aspectos psiquiátricos da criança escolar ..............................................................................................441

• Estimulação do desenvolvimento de competências funcionais hemisféricas em escolares

com dificuldades de atenção: uma perspectiva neuropsicopedagógica ..............................................458

• Conhecendo a dislexia e a importância da equipe interdisciplinar no processo de diagnóstico.........470

• Dislexia e estresse: implicações neuropsicológicas e psicopedagógicas .............................................476

rESENHa / rEViEW

• Compreensão de texto ...........................................................................................................................486

PsicoPedagogia

30ANOS

Conselho editorial internaCional

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Conselho exeCutivoMaria Irene Maluf SPQuézia Bombonatto SPCristina Valdoros Quilici SP

editora

Maria Irene Maluf SP

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2) Clase - Citas Latinoamericanas en Cien-cias Sociales y Humanidades. Universidad Nacional Autónoma de Mexico

3) Edubase - Faculdade de Educação, UNI-CAMP

4) Bibliografia Brasileira de Educação - BBE CIBEC / INEP / MEC

5) Latindex - Sistema Regional de Informa-ción en Línea para Revistas Científicas de América Latina, El Caribe, España y Portugal

6) Catálogo Coletivo Nacional – Instituto Brasileiro em Ciência e Tecnologia – IBICT

Psicopedagogia: Revista da Associação Brasileira de Psicopedagogia /Associação Brasileira de Psicopedagogia. - Vol. 10, nº 21 (1991). SãoPaulo: ABPp, 1991-

Quadrimestral

ISSN 0103-8486

C o n t i n u a ç ã o , a p a r t i r d e 1 9 9 1 , v o l . 1 0 , n º 2 1 d e B o l e t i m d aAssociação Brasileira de Psicopedagogia.

1. Psicopedagogia. I. Associação Brasileira de Psicopedagogia.

CDD 370.15

7) INDEX PSI – Periódicos – Conselho Federal de Psicologia

8) DBFCC – Descrição Bibliográfica Fundação Carlos Chagas

Editora Responsável: Maria Irene Maluf

Jornalista Responsável: Rose Batista – 28.268

Revisão e Assessoria Editorial:Rosângela Monteiro

Editoração Eletrônica: Sollo Comunicação

Impressão: Sollo Press

Tiragem: 3.000 exemplares

O conteúdo dos artigos aqui publicados é de inteira responsabilidade de seus autores, não expressando, necessariamente, o pensamento do corpo editorial.É expressamente proibida qualquer modali-dade de reprodução desta revista, seja total ou parcial, sob penas da lei.

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diretoria da assoCiaçãoBrasileira de PsiCoPedagogia2008/2010

Conselheiras eleitas (2008/2010)Carla Labaki SPCleomar Landim de Oliveira SPCristina Vandoros Quilici SPEdnalva de Azevedo Silva RNEloisa Quadros Fagali SPEvelise Maria Labatut Portilho PRGaleára Matos de França Silva CEHeloisa Beatriz Alice Rubman RJJanaina Carla R. dos Santos GOJozelia de Abreu Testagrossa BALuciana Barros de Almeida Silva GOMaria Auxiliadora de A. Rabello BAMaria Cristina Natel SP

Maria Helena Bartholo RJMaria José Weyne M. de Castro CEMarisa Irene Siqueira Castanho SPMarli Lourdes da Silva Campos DFMiriam do P.S.F. Vidigal Fonseca MGNadia Aparecida Bossa SPNeusa Kern Hickel RSQuézia Bombonatto SPRosa Maria J. Scicchitano PRSilvia Amaral de Mello Pinto SPSonia Maria Colli de Souza SPYara Prates SP

diretoria exeCutivaPresidenteQuézia [email protected] Valdoros [email protected] Cecília Castro [email protected]ária AdministrativaMaria Teresa Messeder [email protected] CientíficaNádia Aparecida [email protected]

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assessoriasAssessora de Divulgações CientíficasMaria Irene [email protected]

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Associação Brasileirade Psicopedagogia

Editorial / Editorial

•MariaIreneMaluf ................................................................................................................................................337

artigoS ESpEciaiS / SpEcial articlES

•Dislexia,cogniçãoeaprendizagem:umaabordagemneuropsicológicadasdificuldadesdeaprendizagem da leitura

Dyslexia, cognition and learning: a lurian neuropsychological approach to dyslexia Vitor da Fonseca ..............................................................................................................................339

•Pedagogiadaautoria:aconstruçãodoprocessodeautorianaformaçãodepedagogos

Pedagogy of authorship: the construction of the authorship process in teacher training Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini ......................................................................................357

artigoS origiNaiS / origiNal articlES

•Protocolo de identificação precoce dos problemas de leitura: estudo preliminar com escolares de 1º ano escolar

Early identification of reading problems: preliminary study with students of 1st grade Simone Aparecida Capellini; Maria Nobre Sampaio; Maryse Tomoko Matsuzawa Fukuda;

Adriana Marques de Oliveira; Cíntia Cristina Fadini; Maíra Anelli Martins ..............................367

•A inclusão do aluno com perda auditiva na Rede Municipal de Ensino da cidade de Marília

Inclusion of students with hearing loss in the Municipal Schools in the city of Marília Marília Piazzi Seno .........................................................................................................................376

•Inventário das brincadeiras e jogos de crianças em diferentes municípios do Estado do Espírito Santo

Inventory of plays and games of children in different districts of the State of Espirito Santo Claudia Broetto Rossetti; Taísa Rodrigues Smarssaro; Tatiana Lecco Pessotti ............................388

•Eficáciadoprogramadeintervençãocomaconsciênciafonológicaemescolarescomrisco para a dislexia

Efficacy of phonological awareness intervention in students at risk for dyslexia Regiane Kobal de Oliveira Alves Cardoso; Simone Aparecida Capellini ....................................396

•Avaliaçãoassistidaemcriançascomhipotiroidismocongênito

Assisted assessment in children with congenital hypothyroidism Anelise Caldonazzo; Paula Fernandes; Tatiana de Sá Riech; Carolina Santos; Maura Mikie Fukujima Goto; Maria Tereza Baptista; Gil Guerra Jr.; Sofia Lemos-Marini; Lília D’Souza-Li .408

sumário

•Instituições privadas de ensino: considerações para o processo de inclusão

Private school institutions: considerations regarding school inclusion processClaudia Gomes; Vera Lucia Trevisan de Souza .............................................................................415

rElato dE EXpEriÊNcia/EXpEriENcE rEport

•Aescolacontemporâneadiantedofracassoescolar The contemporary school concerning the school failure Marilene Gonzaga Gomes Travi; Lisiane Machado de Oliveira-Menegotto; Geraldine Alves dos Santos ..............................................................................................................................425

poNto dE ViSta / poiNt oF ViEW

•Olaçosocialeaaprendizagem:algumasbrevesconsiderações

The social bond and the learning: some brief thoughts Morgana Martins Grudzinski .........................................................................................................435

artigoS dE rEViSÃo / rEViEW articlES

•Aspectospsiquiátricosdacriançaescolar

Psychiatric aspects of the student child Francisco B. Assumpção Jr. ..............................................................................................................441

•Estimulaçãododesenvolvimentodecompetênciasfuncionaishemisféricasemescolares com dificuldades de atenção: uma perspectiva neuropsicopedagógica

Development stimulation of hemispherical functional skills in students with attention difficulties: a neuropsychopedagogic perspective Rosângela Rabello Carneiro; Fabrício Bruno Cardoso ...................................................................458

•Conhecendoadislexiaeaimportânciadaequipeinterdisciplinarnoprocessodediagnóstico

Exploring dyslexia and the importance of interdisciplinary team process diagnostic Sther Soares Lopes da Silva ............................................................................................................470

•Dislexia e estresse: implicações neuropsicológicas e psicopedagógicas Dyslexia and stress: neuropsychological and psychopedagogical implications Maria Arminda S. Tutti Cabussú .....................................................................................................476

rESENHa / rEViEW

•Compreensão de texto Text comprehension Geraldina Porto Witter .....................................................................................................................486

Rev. Psicopedagogia 2009; 26(81): 337-8

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No momento em que a Associação Brasileira de Psicopedagogia completa 30 anos de existência, temos a honra de trazer aos

associados e leitores um presente especial: nossa revista foi convidada para fazer parte da BVS-Psi, uma biblioteca virtual em Saúde e poderá muito em breve ser lida diretamente no endereço: http://www.bvs-psi.org.br/ .

Tal conquista nos dá imensa satisfação, por democratizar o acesso ao conhecimento de nossa área, tornar a revista Psicopedagogia mais interessante academicamente para publicações de autores ligados à academia e permitir que futuramente esteja em outras bases de dados que lhe conferirão cada vez maior visibilidade e credibilidade científica, bem como uma classificação mais expressiva no Qualis.

A inclusão da nossa revista na BVS-Psi, aliada à reformulação recém-concluída de nosso site, com certeza aumentará a visibilidade do conteúdo de excelência publicado em nossa revista e trará incremento à divulgação da produção intelectual da comunidade dos psicopedagogos e profissionais de áreas afins.

Esta 81ª edição conta com dois artigos especiais: ”Dislexia, cognição e aprendizagem: uma abordagem neuropsicológica às dificuldades de aprendizagem da leitura”, de Vitor da Fonseca, no qual o autor discorre sobre a dislexia sob o referencial da neurociência e, um segundo artigo, enviado pela psicopedagoga Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini, “Pedagogia da autoria: a construção do processo de autoria na formação de pedagogos”, que coloca o professor como um sujeito ativo-interativo na construção do conhecimento de seus alunos.

“Protocolo de identificação precoce dos problemas de leitura: estudo preliminar com escolares de 1º ano escolar”, escrito por Simone Aparecida Capellini, Maria Nobre Sampaio,

Maryse Tomoko Matsuzawa Fukuda, Adriana Marques de Oliveira, Cíntia Cristina Fadini e Maíra Anelli Martins, é um artigo de pesquisa sobre a elaboração e aplicação de um teste de identificação precoce dos problemas de leitura para caracterizar o desempenho dos escolares do 1º ano do Ensino Fundamental Municipal. O estudo comprova o que a maioria dos educadores sabe: infelizmente, muitos de nossos alunos dessa série não apresentam domínio de habilidades cognitivo-linguísticas necessárias para aprender o sistema de escrita do português brasileiro.

“A inclusão do aluno com perda auditiva na Rede Municipal de Ensino da cidade de Marília”, de Marília Piazzi Seno, é outro artigo que trata desse assunto muito debatido, mas que ainda não foi devidamente esclarecido em um de seus aspectos cruciais: a Inclusão sob o ponto de vista do docente.

É de Claudia Broetto Rossetti, Taísa Rodrigues Smarssaro e Tatiana Lecco Pessotti, a pesquisa “Inventário das brincadeiras e jogos de crianças em diferentes municípios do estado do Espírito Santo”, que nos esclarece que hoje há uma coexistência bastante frequente entre as brincadeiras e jogos tradicionais e diversas atividades lúdicas que envolvem o uso de novas tecnologias, como os computadores.

No artigo original “Eficácia do programa de intervenção com a consciência fonológica em escolares com risco para a dislexia”, Regiane Kobal de Oliveira Alves Cardoso e Simone Aparecida Capellini tiveram por objetivo verificar a eficácia de um programa de intervenção com a consciência fonológica em escolares com risco para a dislexia, demonstrando a eficácia desse programa de intervenção por meio da melhora das habilidades cognitivo-linguísticas em situação de pós-testagem em comparação à pré-testagem.

ABPP 30 Anos

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“Avaliação assis t ida em cr ianças com hipotiroidismo congênito”, de Anelise Caldonazzo, Paula Fernandes, Tatiana de Sá Riech, Carolina Santos, Maura Mikie Fukujima Goto, Maria Tereza Baptista, Gil Guerra Jr., Sofia Lemos-Marini e Lília D’Souza-Li, é um artigo de grande interesse e dificilmente tratado em publicações ligadas à aprendizagem. Seu objetivo foi avaliar o funcionamento executivo das crianças com diagnóstico de hipotiroidismo congênito por meio da avaliação dinâmica utilizando a resolução de problemas. Os autores concluíram que há necessidade de mudança na proposta escolar para que a criança com hipotiroidismo congênito tenha efetividade no rendimento acadêmico.

Um trabalho inédito de pesquisa de Claudia Gomes e Vera Lucia Trevisan, “Instituições privadas de ensino: considerações para o processo de inclusão”, nos mostra um outro aspecto importante desse assunto, que não pode mais ser esquecido: a proposta de inclusão exige mudanças na estruturação dos processos organizacionais, institucionais e pedagógicos nas escolas, e o envolvimento dos professores no desenvolvimento de uma construção de ações pedagógicas e relacionais, com enfoque na compreensão das diversidades e respeito de suas próprias diferenças e de seus alunos.

Um Relato de Experiência não pode faltar em nossa publicação, principalmente quando promove a reflexão do leitor sobre as transformações da sociedade e da escola contemporânea frente ao fracasso escolar, como é o caso do artigo “A escola contemporânea diante do fracasso escolar”, de Marilene Gonzaga Gomes Travi, Lisiane Machado de Oliveira-Menegotto e Geraldine Alves dos Santos.

“O laço social e a aprendizagem: algumas breves considerações” é um artigo de Morgana Martins Grudzinski, que tece proposições acerca da Psicanálise e da Educação, à luz de conceitos como laço social e laço parental e o papel do Outro de Lacan.

“Aspectos psiquiátricos da criança escolar”, de Francisco B. Assumpção Jr., é uma contribuição importante e esclarecedora para os profissionais que lidam com as dificuldades escolares de seus alunos, devido à riqueza de fatores que nela interferem.

“Es t imulação do desenvo lv imento de competências funcionais hemisféricas em escolares com dificuldades de atenção: uma perspectiva neuropsicopedagógica”, escrito por Rosângela Rabello Carneiro e Fabrício Bruno Cardoso, nos apresenta uma investigação dos comportamentos de atenção por meio de avaliação motora, cognitiva e da preferência hemisférica de escolares, entre 7 e 8 anos de idade, e conclui que a hemisfericidade não interfere apenas nos processos atencionais e de percepção, mas em todas as dimensões intelectuais e de personalidade, propondo ao final uma reflexão na condução do formato didático deste processo, em especial nos períodos iniciais de escolarização.

Um terceiro trabalho sobre esse tema – “Conhecendo a dislexia e a importância da equipe interdisciplinar no processo de diagnóstico” – nos é trazido por Sther Soares Lopes da Silva, que aponta que tanto o processo diagnóstico como a intervenção devem ser realizados por uma equipe interdisciplinar.

“Dislexia e estresse: implicações neuropsicológicas e psicopedagógicas”, de Maria Arminda S. Tutti Cabussú, relaciona a dislexia e o estresse que provoca na criança e suas implicações neuropsicológicas e psicopedagógicas.

Encerramos esta edição com “Compreensão de Texto”, a resenha apresentada por Geraldina Porto Witter sobre o livro Essential readings on comprehension, de Lapp D, Fisher D.

Aos nossos leitores, um abraço,

Maria Irene Maluf Editora

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Dislexia, cognição e aprenDizagem

Rev. Psicopedagogia 2009; 26(81): 339-56

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ARTIGO ESPECIAL

Dislexia, cognição e aprenDizagem: uma aborDagem neuropsicológica Das DificulDa-

Des De aprenDizagem Da leitura

Vitor da Fonseca –Professor catedrático da Faculdade

de Motricidade Humana da Universidade Técnica de

Lisboa, docente no Departamento de Educação Especial e

Reabilitação, Mestre em Dificuldades de Aprendizagem

pela Universidade de Northwestern (Evanston, Chicago,

EUA). Psicopedagogo e psicomotricista. Autor de várias

obras e artigos no domínio da psicomotricidade, da

antropologia, das perturbações do desenvolvimento,

das dificuldades de aprendizagem, da estimulação

precoce, da educação especial, da psicopedagogia, da

neuropsicologia, e da educação cognitiva.

Correspondência

Vitor da Fonseca

Rua Ernesto Veiga de Oliveira, 21, 2º A/B, Edifício

S. Julião - Oeiras, Portugal. - CEP 2880-052

E-mail: [email protected]

Vitor da Fonseca

RESUMO – O autor introduz a dislexia, definindo-a como dificuldade de aprendizagem específica, diferenciando-a, consequentemente, de uma dificuldade de aprendizagem global, partindo da noção que tal dificuldade invulgar revela uma discrepância do potencial intelectual, e não uma incapacidade, devendo ser definida com base num quociente intelectual, igual ou superior a 80, excluindo-a claramente, de qualquer categorização taxonômica do domínio da deficiência ou das dificuldades desenvolvimentais e intelectuais. A dificuldade de aprendizagem da leitura é apresentada como uma disontogênese do processo contínuo do desenvolvimento da linguagem, abarcando a duplicação das funções da linguagem falada (1º sistema simbólico) na linguagem escrita (2º sistema simbólico). Partindo de uma perspectiva de comorbidade, a dislexia é encarada como uma dificuldade que pode apresentar vários problemas de extração, captação e processamento de informação simbólica, subentendendo uma multiplicidade de competências cognitivas, que compreendem os sistemas funcionais propostos pelo neuropsicólogo russo A. R. Luria. Introduzindo os sistemas funcionais lurianos, a aprendizagem da leitura é equacionada como resultando do funcionamento sistêmico, ontogenético, concatenado e integrado das três unidades funcionais, a saber: a 1ª unidade de atenção e integração dos optemas; a 2ª unidade de processamento simultâneo e sucessivo ou sequencial e conversão dos optemas em fonemas e concomitantes redes semânticas e compreensíveis, e finalmente, a 3ª unidade de planificação, execução e de autorregulação, onde se opera a rechamada, o controle e a expressão dos articulemas. O autor sugere, com base no modelo de Luria, que a avaliação dinâmica do potencial de aprendizagem da criança seja equacionado a partir do perfil de áreas fortes e fracas revelado nas três unidades funcionais indicadas, perfil esse que deve ser tomado em linha de conta, para posteriormente desenvolver estratégias de intervenção psicopedagógicas individualizadas para cada caso.

UNITERMOS – Dislexia. Cognição. Aprendizagem.

fonseca V

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INTRODUÇÃO A dislexia tem sido basicamente considera-

da uma desordem da leitura e da linguagem, envolvendo, igualmente, dificuldades no di-tado e na redação1-6.

Trata-se de uma inesperada dificuldade de aprendizagem, e não incapacidade, e muito menos doença, considerando-se a inteligência média e superior do indivíduo e a oportuni-dade educacional em que ele se encontra integrado. O Quociente Intelectual (QI) a ser considerado como critério seletivo deverá ser igual ou superior a 80, mas a literatura especializada7-10 ilustra casos de dislexia com indivíduos portadores de QI > 115 ou superior. Quanto à oportunidade educacional, o critério seletivo deverá considerar o processo ensino-aprendizagem onde o indivíduo se encontra integrado com condições pedagógicas sufi-cientes. Tal processo deve ser considerado, portanto, adequado e eficaz para a maioria dos indivíduos, ou seja, não poderá ocorrer nele nenhum sinal de dispedagogia.

A dislexia não é, portanto, sinônimo de um QI baixo, pois pode ocorrer em todos os seus níveis, ou de disfunções visuais e auditivas detectadas por meios médicos convencionais. Também não deve ser considerada na sua definição a evidência manifesta de falta de motivação para aprender a ler, ou da presença de condições socioeconômicas desfavoráveis e desviantes.

Em termos gerais, a dislexia pode se ma-nifestar no indivíduo, ao longo da vida, inde-pendentemente de adequada oportunidade de aprendizagem, e da sua intrínseca integridade sensorial (input), mental (integração/elabora-ção), motora (output) e comportamental.

Por exclusão, a criança ou jovem disléxi-co não pode ser considerado em nenhuma categoria ou taxonomia defectológica, e ja-mais deverão ser confundidos com déficit ou disfunção mental. Por inclusão, as crianças e jovens disléxicos revelam perturbações e pro-blemas: subtis, invulgares, multicomplexos, por vezes, inexplicáveis, de processamento de

informação não simbólica e, sobretudo, simbó-lica, que poderão envolver dificuldades cogni-tivas de compreensão, análise e utilização dos sistemas e subsistemas da linguagem falada e escrita, isto é, podendo abarcar, isolada ou sistematicamente, componentes receptivos, integrativos, elaborativos e expressivos.

A dislexia pode ser superada em tempo útil com uma reeducação multiterapêutica, mas as suas causas mantêm-se inalteradas. Muitos sinais preditores podem ser identificados já na pré-escola, mas a dislexia inicia-se com a aprendizagem da leitura, onde se começa a detectar problemas de conscientização dos sons (fonemas), de reconhecimento de letras (optemas), de expressão verbal (articulemas), de cópia (grafemas), etc.

A aprendizagem da leitura no caso de uma criança disléxica é sempre lenta e muito laboriosa em termos de investimento emocio-nal. A equivalência auditivo-visual (fonema-optema), visuo-gráfica (optema-grafema) e auditivo-verbal (fonema-articulema) parece ser bloqueada por um déficit fonológico específico, que afeta o reconhecimento e a utilização rápida de palavras, assim como a sua decodificação e compreensão7.

Problemas em identificar segmentos de sons que constituem as palavras (lêem braco por barco, pato por prato, etc), e em repre-sentá-los graficamente, parecem dificultar o surgimento de automatismos de processamen-to de informação, tornando a aprendizagem inicial da leitura pouco fluente e pouco gra-tificante em termos emocionais. Segmentar e ordenar sons, soletrá-los, decompô-los, ou mesmo rechamá-los e articulá-los verbalmen-te de forma proficiente são aspectos dificil-mente identificáveis nas crianças disléxicas.

Aprender a ler é certamente a tarefa mais relevante da escola primária, e a porcentagem de indivíduos alfabetizados funcionalmente é um dos indicadores mais fidedignos de desenvolvimento cultural e de prosperidade econômica, só por esse fato se torna impor-tante estudar, pois cerca de 10% das crianças

Dislexia, cognição e aprenDizagem

Rev. Psicopedagogia 2009; 26(81): 339-56

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escolarizadas têm dificuldades específicas de aprendizagem da leitura.

A maioria das crianças aprende a ler sem dificuldades, outras não aprendem a ler por instrução suboptimal ou de muito baixa quali-dade, outras ainda não aprendem a ler devido a limitações cognitivas, enquanto as crianças disléxicas não aprendem a ler no tempo ade-quado ou esperado, independentemente da sua inteligência ser normal e das condições de ensino serem minimamente satisfatórias.

Não havendo ainda uma razão óbvia para o insucesso na aprendizagem ou uma única causa biossocial da dislexia, sabemos que ela coexiste com outros problemas, ela apresenta uma característica de comorbidade, cuja na-tureza do problema é complexa de identificar e de solucionar, onde de fato não cabe uma solução ou um tratamento milagroso.

A dislexia atinge um espectro muito amplo de expressões comportamentais; algumas crianças superam a dificuldade sem sequelas, enquanto outras não atingem a literacidade.

A leitura é um processo por meio do qual se extrai e se capta informações de textos (por exemplo, páginas impressas, imagens, diagramas, legendas, gráficos, ilustrações, etc). Não se trata de mera ou simples de-codificação de símbolos escritos em sons, nem tampouco de uma recepção passiva de uma imagem colhida em qualquer lugar no cérebro a partir da palavra escrita, com a qual pode ser associada. A leitura é um processo ativo, autodirigido pelo leitor em múltiplas formas e apresentando várias finalidades11.

Extrair e captar informações de textos pres-supõe que o leitor possa dispor da capacidade de processar, integrar e exprimir informação, isto é, de um ato ou processo de apropriação de conhecimento a que vulgarmente se chama cognição12.

Para ler e para que se processe a infor-mação, portanto, o leitor, inexperiente ou experiente, tem necessariamente que exibir um conjunto dinâmico, sistêmico, coeso e

Figura 1 – Processamento da leitura.

Seleção + sustentaçãoFiltragem + focagem

ATENÇÃO

Decodificação de optemas análise + síntese + memória

Associação optema-fonemaProcessamento simultâneo/sequencial

Fonema monemas(des)+(re) construção

Significação=compreensão

CODIFICAÇÃO

Codificação e recuperaçãoAssociação fonema-articulema

SequencializaçãoSérie de procedimentosSistemas de organização

Elaboração/regulaçãoControle/monitorização

Internalização verbalIntenção => açãoLinguagem oral

Retroação

PLANIFICAÇÃO

vf/1999

ES

TíM

UL

OS

RE

SP

OS

TA

S

fonseca V

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autorregulado de competências cognitivas, como atenção, percepção, memória, processa-mento simultâneo e sequencializado, simboli-zação, compreensão, inferência, planificação e produção de estratégias, conceptualização, resolução de problemas, rechamada e expres-são de informação, etc (Figura 1).

Ler não é apenas o resultado da coleção destes componentes cognitivos, mas o proces-so e o produto de um sistema complexo onde eles contribuem e cooperam de forma dinâmi-ca, envolvendo inúmeros sistemas funcionais neuropsicologicamente integrados.

Como se desenvolvem então esses sistemas funcionais na aprendizagem da leitura?

ABORDAGEM NEUROPSICOLÓGICA DA COGNIÇÃO: INTRODUÇÃO À NOÇÃO DE SISTEMAS FUNCIONAISPara Luria13-15, o cérebro humano é o pro-

duto filogenético e ontogenético de sistemas funcionais adquiridos em vários milhões de anos, ao longo do processo sócio-histórico (sociogenético) da espécie humana.

O mesmo autor define sistemas funcionais como a coordenação de áreas em interação no cérebro tendo em vista a produção de um dado comportamento ou conduta, consubstan-ciando qualquer processo de adaptação ou de aprendizagem, cujo produto final subentende um sistema cognitivo complexo como é o caso da aprendizagem da leitura.

A aprendizagem da leitura no modelo lu-riano resulta, portanto, da criação de conexões entre muitos grupos e redes de células que se encontram posicionadas em distantes áreas do cérebro.

Consequentemente, a aprendizagem da leitura, da escrita ou do cálculo, à luz desse modelo, implica que no cérebro da criança se opere um processo ativo conjuntural e reorga-nizador de sistemas funcionais múltiplos e de integração sensorial progressiva, envolvendo na sua superfície o sistema visual e o sistema auditivo, e na sua profundidade, o sistema

cognitivo complexo, já referido anteriormente.É dentro dessa ótica que a criança normal,

também segundo Piaget16,17 evolui de uma in-teligência sensorial a uma inteligência formal, passando pelas inteligências pré-operacional e operacional concreta. Neste aspecto, o modelo neuropsicológico de Luria equilibra dialeticamente o modelo cognitivo construti-vista de Piaget e o modelo co-construtivista de Vygotsky.

Para Luria18-20, a maturação cerebral efe-tua-se igualmente por meio da emergência de sistemas funcionais, pondo em jogo e em interação sistêmica vários conjuntos de cé-lulas e redes neuronais bem específicos. É, portanto, a instalação de conexões neuronais provocadas pela aprendizagem que sucessi-vamente vão permitir a integração complexa da informação multissensorial que ilustra a passagem da linguagem corporal à linguagem falada, e desta, à linguagem escrita9,21,22.

Segundo o pensamento luriano, a apren-dizagem da leitura resulta da sequência bem definida de estadios e da integração complexa de circuitos neuronais disponíveis, ilustrando uma reorganização cognitiva progressiva, onde cada área pode operar unicamente em conjugação com outras, a fim de produzir comportamentos, como, por exemplo, ler e escrever.

Nenhuma área do cérebro pode assumir responsabilidade exclusiva por qualquer com-portamento humano voluntário ou superior, como ler, exatamente porque o desempenho ou a realização de funções psíquicas supe-riores, como a aprendizagem da leitura, se fundamenta em uma interação dinâmica e sistêmica de muitas áreas do cérebro, isto é, uma espécie de equivalente funcional como sugerem os “equipotencialistas”, mas como os “localizacionistas”, Luria confere, igualmen-te, funções específicas a cada área do cérebro no processo da leitura.

Dessa forma, Luria coloca-se numa posição em claro desacordo com ambas as teorias. Por considerar que algumas áreas, e não

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todas, combinam-se e articulam-se para gerar comportamentos, Luria está em oposição aos localizacionistas. Paralelamente, porque o tecido cerebral é psicologica e fisiologicamen-te especializado, Luria está em contradição também com os equipotencialistas.

Para ler, escrever ou calcular, por exemplo, o cérebro põe em marcha, para cada um dos processos, um complexo sistema funcional, composto de vários subsistemas visuais, au-ditivos, tatil-cinestésicos e motores, subléxi-cos, léxicos, cognitivos e metacognitivos que interagem sequencialmente, melodicamente e sistemicamente.

Em síntese, a aprendizagem da leitura resulta do funcionamento de sistemas funcio-nais que integram várias áreas ou unidades de cérebro, mais do que resultados de áreas específicas bem determinadas. De acordo com esse axioma, uma dada aprendizagem pode ser afetada quando qualquer parte do sistema funcional por ele responsável estiver igualmente perturbada.

Com base nessa perspectiva, um indivíduo pode apresentar, por exemplo, sinais de dis-lexia, sem apresentar lesões no girus angular (denominado “centro de leitura” para os localizacionistas), pois é possível verificar-se disfunções em um ou mais componentes do sistema funcional da leitura.

O conceito de sistemas funcionais é para Luria, consequentemente, diferente dos con-ceitos inerentes à teoria da localização ou da equipotencialidade.

A teoria da localização, preconizada por frenologistas como Gall, citada por Luria23, sugere que todos os comportamentos resultam de áreas ou centros específicos do cérebro (por exemplo, “centro de leitura”, “centro da escrita”, ”centro do cálculo”, etc) e, conse-quentemente, indicia que todas as desordens ou lesões possam ser adstristas a áreas cere-brais circunscritas.

A teoria da equipotencialidade defendida por outros autores, nomeadamente Flourens, também citado de Luria, e essencialmente

Lashley24, em contrapartida, sugere que todos os comportamentos envolvem a participação equitativa de todas as áreas, ou seja, defende que nenhuma área pode conclusivamente es-pecificar uma aprendizagem particular.

Halstead25 e especialmente Galaburda & Hemper26, nas suas pesquisas com inúmeros casos portadores de lesões cerebrais e em casos de dislexia não conseguiram encontrar evidências que sustentassem os pressupostos desta doutrina de “ação em massa” do cére-bro, entendido aqui como órgão da aprendi-zagem da leitura.

A visão de Lúria, portanto, é inequivoca-mente diferente de ambas. Nenhuma área do cérebro por si só pode ser responsável por qualquer aprendizagem da leitura, ou por al-gum comportamento particular. Por analogia também, nem todas as áreas são consideradas igualmente contribuintes para a leitura e a escrita, o que pressupõe uma organização hierarquizada e desenvolvimental muito com-plexa e sistêmica.

A teoria luriana dos sistemas funcionais concebe que o cérebro opera apenas com um número limitado de áreas quando está en-volvido na produção de uma aprendizagem específica, cada uma delas jogando um papel peculiar dentro do sistema funcional, deno-minada pelo mesmo como uma constelação de trabalho.

A noção de sistema funcional tende a equa-cionar uma concatenação ou uma cadeia de transmissão onde cada ligação, elo ou zona de mediação, representa uma área particular. Cada elo é necessário para que a cadeia seja uma totalidade funcional, cada um partici-pando com uma função específica no conjunto global da cadeia funcional. A cadeia funcional que opera na leitura e na escrita, como já vi-mos, integra pelos menos os sistemas visual, auditivo, cognitivo e motor, oromotor para a leitura, e grafomotor para a escrita.

Daqui resulta a noção de que, se alguma parte do sistema funcional está disfuncional ou desagregada em termos sistêmicos, a

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aprendizagem representada pela cadeia fun-cional pode ficar obviamente afetada, como evidenciam inúmeros casos clínicos de inca-pacidade de aprendizagem (Luria15,27), como, por exemplo: de agnosia (disfunção grave de input), de afasia (disfunção grave de integra-ção e de elaboração da linguagem falada), de apraxia (disfunção grave de output), de alexia e agrafia (disfunção grave da leitura e da escrita, respectivamente).

No caso das dificuldades de aprendizagem, como por exemplo da disfasia, da disnomia, da disartria, da dislexia, da disortografia ou da discalculia (igualmente designada por dismatemática por alguns autores) também se podem identificar formas mais sutis e ligeiras (ditas “soft” na bibliografia anglo-saxônica) de disfunção ou de desagregação da cadeia funcional que ilustra qualquer aprendizagem da leitura ou da escrita, como atestam algumas das novas tecnologias, como a ressonância magnética, a emissão de pósitrons, a neuro-metria, a citoarquitetura neuronal, o mapa de atividade elétrica do cérebro – BEAM, e outras.

Para esclarecer essa questão, Luria propõe a noção de pluripotencialidade, reforçando a idéia que qualquer área específica do cé-rebro pode participar em inúmeros sistemas funcionais ao mesmo tempo, reforçando aqui a extraordinária plasticidade do órgão da aprendizagem.

Em consequência dessa propriedade neurofuncional, além de muitas outras21,28, se uma área do cérebro se encontra lesada, disfuncional ou imatura, então várias apren-dizagens podem estar comprometidas e não apenas um determinado tipo, dependendo do número de sistemas funcionais nos quais tal área participa, e tal é fundamental para compreender a dislexia.

Em síntese, as várias áreas do cérebro não trabalham isoladas, uma vez que uma dada aprendizagem só pode emergir quando resulta da cooperação sistêmica, melódica e sinergética das mesmas, assim é também no

surgimento das subcompetências e competên-cias simbólicas da leitura e da escrita.

Dentro do mesmo contexto, Luria refere-se ao conceito de sistemas funcionais alter-nativos, sugerindo que uma dada aprendi-zagem pode ser produzida por mais de um sistema funcional, evocando que o cérebro, como o órgão de incomensurável flexibili-dade, não se estrutura ou reorganizar com base em sistemas funcionais fixos, rígidos ou imutáveis.

Por este conceito se explica porque muitos indivíduos com lesões, disfunções ou trauma-tismos cerebrais não apresentam os déficits esperados, ou porque muitos deles recuperam espontaneamente algumas funções, indepen-dentemente da ocorrência de uma lesão.

Por analogia, quando identificamos vários sinais de dislexia (disfonética, diseidética ou mista) ou disortografia também não podemos tomá-los como indicadores fixos ou perpétuos do potencial de aprendizagem, razão pela qual em muitos desses casos clínicos uma prescrição psicoeducacional bem desenhada e implementada em tempo útil, a partir de um diagnóstico cognitivo dinâmico, pode superar e compensar a vulnerabilidade dos compo-nentes e subcomponentes que participam na cadeia funcional da leitura ou da escrita. A aprendizagem pode interferir, portanto, na criação de novos sistemas funcionais no cérebro.

Neste domínio, Luria15,20,29, Luria & Tsetko-va30 adiantam que a recuperação de funções após lesões talvez se verifique porque: 1. as competências decorrentes de níveis su-

periores de integração cerebral, em alguns casos, poderão compensar competências adstritas a níveis inferiores;

2. a recuperação de funções psíquicas supe-riores pode ser alcançada por reforço, au-tomatização ou enriquecimento de funções psíquicas básicas;

3. o papel de uma determinada área lesada pode ser assumido por outra área no cérebro. O cérebro sob condições normais é um

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órgão plástico e flexível, e é nessas condições que o processo normal de aprendizagem da leitura ou da escrita ocorre. Se efetivamente surge um problema ou uma dificuldade, por lesão, imaturidade ou por outra razão, não dizer que o sistema funcional esteja prospec-tivamente bloqueado ou desagregado. Pelo contrário, o que esta concepção sugere é algo muito diferente. Se existe alguma dificuldade, podemos mudar a natureza da tarefa (condi-ções externas), ou então, mudar a composição do sistema ou cadeia funcional, mudando a localização neurofuncional onde a informação é processada (condições internas), alterando a modalidade de input ou de output, adequando novas formas de processamento simultâneo ou sequencial da informação, modificando o conteúdo verbal para não-verbal, ajustando a estrutura mental de um componente para subcomponentes mais elementares, ou então, promover e automatizar as funções cognitivas de processamento de dados (input, elaboração e output) etc; adaptando a tarefa ao perfil cognitivo do indivíduo.

Apesar do pouco conhecimento de como o ser humano aprende e o seu cérebro funciona, e da análise cérebro-aprendizagem ser ain-da rudimentar, a teoria neuropsicológica de Luria apresenta uma arquitetura perceptível e coerente para compreender como a apren-dizagem da leitura e da escrita se estrutura, pois se suporta na grande quantidade de investigações neuropsicológicas realizadas sobre o problema31.

A organização funcional do cérebro pro-posta por Luria permite entender como os sistemas funcionais operam, quer seja nas praxias ou na linguagem falada e escrita.

A aprendizagem da leitura, da escrita e do cálculo, composta de componentes re-ceptivos (input), integrativos, elaborativos e expressivos (output), emerge, como já vimos, da cooperação de várias áreas ou zonas cor-ticais e subcorticais, e não como se pensava na teoria neurológica clássica, de uma só área específica.

Tal cooperação complexa joga com a par-ticipação particular de cada uma das áreas cerebrais relacionadas com um determinado sistema funcional, de tal modo que a sua des-truição, disfunção ou imaturidade, porque não causa e perda total da performance (afunção ou incapacidade), induz necessariamente a desintegração ou desconexão de algumas subfunções, enquanto outras podem se man-ter intactas, o que é promissor em termos de modificabilidade cognitiva para muitos casos clínicos.

A ORGANIZAÇÃO NEUROFUNCIONAL DO CÉREBRO NA APRENDIZAGEM DA LEITURA De acordo com Luria14,32, Geschwind33,34 e

Das35, a linguagem, quer falada ou escrita, integra também em termos funcionais a coo-peração de várias áreas.

No caso da linguagem falada, por exemplo, a recepção da fala ou a compreensão auditiva (input) envolve a sensação procedente dos ouvidos, que é recebida pelo córtex auditivo primário (captação de fonemas), sendo poste-riormente processada em morfemas com base semântica na área de Wernicke (2ª unidade funcional luriana), enquanto a sua expressão verbal (output) requer que as suas representa-ções sejam transferidas daquela mesma área, para a área de Broca (3ª unidade funcional luriana), através dos fascículos arqueados,

Nesta área pré-frontal, a fala envolve um detalhado plano oromotor de articulação (pro-dução de articulemas), onde participa o anel cortico-cerebral, por sua vez transmitido para a área motora primária para desencadear a execução sequencializada dos múltiplos mi-cromovimentos da laringe, faringe, língua e lábios que materializam a verbalização.

No caso da linguagem escrita receptiva-leitura, a recepção das letras (input) é feita no córtex visual primário (captação de optemas) por meio de complicados processos de fixação e focagem onde participam o sistema mag-nocelular, sendo posteriormente transmitida

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ao girus angular para associar e equivaler a logografia da palavra com o correspondente modelo auditivo (fonológico e morfológico) na área de Wernicke. No caso de uma leitura silenciosa, a compreensão opera-se neste sistema funcional (2ª unidade funcional), no caso de uma leitura oral, o processo é similar ao processo expressivo da linguagem falada, utilizando os mesmo substratos neurológicos acima descritos.

Em contrapartida, a linguagem escrita expressiva-escrita (output) envolve que as representações das letras (traços e linhas pormenorizadas e fonemas corresponden-tes) sejam transferidas do córtex associativo visuo-auditivo, em primeiro lugar para o córtex parietal associativo, a fim de formular visuo-espacialmente e tátil-cinestesicamente as formas das letras, e em segundo lugar, para a área de Exner (3ª unidade funcional), onde se opera um detalhado programa grafomotor (produção de grafemas), terminando na área motora primária a execução sequencial mi-cromotora dos gestos da escrita, pondo em movimento múltiplos músculos da coluna, do ombro, do braço, do antebraço, do pulso, da mão e dos dedos, onde de novo o anel cortico-cerebral tem um papel crucial.

Todos estes sistemas funcionais da lin-guagem corporal, falada e escrita, põem em jogo, como acabamos de ilustrar, uma melodia complexa de componentes de processamento de informação, que no fundo constituem o conjunto das funções cognitivas que suportam as aprendizagens simbólicas superiores23,27.

Em resumo, quando um dos componentes dos sistemas funcionais que acabamos de descrever se encontra lesado, disfuncional ou imaturo, a organização da linguagem pode ser comprometida, podemos gerar ora disfasias, disnomias, disastrias, no caso 1º sistema sim-bólico, ora dislexias (diseidéticas.disfonéticas ou mistas), disortografias e disgrafias, no caso do 2º sistema simbólico, podendo ocorrer entre ambos os sistemas uma cadeia ontogenética causal.

Por esta simples apresentação dos sistemas funcionais da linguagem falada e da escrita, podemos constatar que os problemas encon-trados em disléxicos, por exemplo, poderão ser atribuídos não só a déficits cerebrais7, que interferem com a atenção e com a produção rápida e fluente de processos automáticos sensório-motores básicos, como a déficits de processamento multissensorial, quer simultâ-neos e sequenciais, quer visuo-gráficos, quer fonológicos e semânticos.

Outro conceito fundamental de Luria para compreender a aprendizagem da leitura é o da falta unicidade ou de uniexclusividade dos sistemas funcionais, sugerindo que é a multiplicidade dos sistemas que surge como responsável por uma aprendizagem específica.

Com base nestas formulações funcionais, os efeitos de uma lesão ou disfunção cerebral numa criança tendem a ser substancialmente diferentes dos do adulto, na medida em que ambos dispõem de sistemas funcionais distin-tos em termos de organização neuropsicológi-ca, um ainda imaturo, e o outro eventualmente, maturo23,36,37.

De acordo com estes conceitos lurianos, não existe uma correspondência linear entre uma aprendizagem e uma zona específica do cérebro, levando-se em consideração a natu-reza sistêmica das funções cerebrais.

Luria23 adota, assim, uma metodologia de estudo do cérebro centrada mais em síndro-mes (padrões de sintomas) do que em sinto-mas isolados, quando o estuda funcionalmente a partir da análise dos seus distúrbios. A dis-função cerebral que resulte de uma estrutura ou de uma zona específica dentro do sistema total pode manifestar-se por diferentes déficits cognitivos, de acordo com o foco da lesão ou a distribuição da disfunção.

Por exemplo, no caso de uma dislexia, se a criança não pode ainda ler por razões de imaturidade neurológica, os sistemas funcio-nais responsáveis por tais funções cognitivas superiores, sejam corticais ou subcorticais, podem estar disfuncionais pelo menos num

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elo da sua cadeia ou, possivelmente, em mais do que um.

Esta perspectiva não se baseia, portanto, numa abordagem lesional fixa ou imutável do cérebro, mas sim em uma abordagem clínica dinâmica susceptível de modificabilidade neurofuncional sustentada por uma análise qualitativa da sua plasticidade e da sua reor-ganização hierárquica e sistêmica.

De acordo com Luria15, o cérebro opera como um organizador cognitivo complexo, sinergético e super-articulado em qualquer tipo de aprendizagem, tendo por fundamento o papel multicomponencial do processamen-to da informação, consistindo o seu trabalho em múltiplas interações neurofuncionais e sistêmica, abrangendo por essa qualidade funcional várias áreas do cérebro.

Esquematicamente Luria confere a tais áreas funções específicas, cada uma delas par-ticipando, como vimos, em diversos sistemas funcionais, dependendo da experiência de aprendizagem peculiar do indivíduo e do seu contexto sócio-histórico de mediatização21,22.

A INTEGRAÇÃO NEUROFUNCIONAL DA ATENÇÃO, DO PROCESSAMENTO E DA PLANIFICAÇÃO NA APRENDIZA-GEM DA LEITURA Luria apresenta o cérebro humano como o

resultado da integração sistêmica e progres-siva de três unidade funcionais básicas:• 1ªunidadedealertaedeatenção;• 2ªunidadederecepção,análise,integra-

ção, codificação e processamento sensorial sequencial e simultâneo;

• 3ªunidadedeexecuçãomotora,planifica-ção e autorregulação.Cada uma destas unidades está envolvida

em todos os tipos de aprendizagem, como na leitura e na escrita, sem exceção, todavia a re-latividade da contribuição de cada uma delas varia conforme o comportamento considerado, isto é, verbal ou não-verbal, simbólico ou não-simbólico, linguístico ou práxico, etc. A 2ª e a 3ª unidades são igualmente subdivididas em áreas distintas; primárias, secundárias e terciárias.

Vejamos de forma sintética as funções principais de cada uma das unidades:

Figura 2 – 1ª unidade: Alerta e Atenção

•Afunçãodealertaconsistenaatividadequeocorredentrodo cérebro e que é responsável pela manutenção de um estado de vigilância.

•Aatençãoestáinterligadacomohipotálamo,quemantémo nível ótimo do metabolismo fisiológico (por exemplo, bem estar, fadiga, motivação), componente crucial no desempe-nho de qualquer atividade.

•Amesmafunçãoestárelacionadacomoreflexodeorientaçãoque emerge no confronto com um novo estímulo (sistema de alarme).

•Afunçãodealertaestreitamenterelacionadacomaatençãogera o tônus postural e cortical, mas a atenção envolve a seletividade e a sustentação modulada das atividades cog-nitivas superiores.

•Alertaeatençãosãofuncionalmenteinterdependentes,selecionam,filtram,focalizam,alocamerefinamaintegração de estímulos.

•Asuadisfunçãopodegerarhiperatividade,implicandoproblemasdeprocessamento(percepção+memória)e de planificação... vf/1999

SUBSTRATO = SUBSTâNCIA RETICULA-DA E CEREBELO

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1ª Unidade de Alerta e de Atenção (Figura 2): localizada nas estruturas subcorticais e axiais do cérebro que suportam os dois hemis-férios, integra o sistema de ativação reticular ascendente e descendente (SARA e SARD) e um conjunto difuso e interligado de estru-turas reticulares, que são responsáveis pela modelação do alerta cortical, pelas funções de sobrevivência, pela vigilância tônico-postural, pela filtragem e integração dos inputs senso-riais e pela gestão emocional e motivacional das situações.

Esta unidade compreende a medula, o tronco cerebral, o cerebelo, o sistema límbico e o tálamo, sem ela o cérebro é incapaz de responder aos estímulos do mundo ao redor, pondo em risco não só a interação corpo-cére-bro (dita intrassomática), como igualmente a interação sensório-motora do organismo total do indivíduo com os seus ecossistemas (dita extrassomática). Sem esta unidade funcional, nenhuma aprendizagem simbólica é possível, nem o acesso a funções psíquicas superiores é viável.

As desordens desta unidade podem explicar vários casos de déficits de atenção, de hiperatividade e de hipoatividade em muitas crianças com dislexia.

Por estar implicada na filtragem e seleção sensorial, na integração sensório-tônica bá-sica e no controle postural e atencional, esta unidade impede que o cérebro seja inundado desnecessariamente com informação sensorial irrelevante que possa interferir negativa-mente com o processamento cognitivo mais elaborado, jogando dessa forma um papel fundamental no foco, na fixação e na susten-tação postural da atenção, na concentração, na integração experiencial e emocional e em outras funções automáticas similares.

2ª Unidade de Recepção, Análise, Integração, Codificação e Processamento Sensorial Sequencial e Simultâneo (Figura 3): trata-se da unidade que é responsável pela maioria das aprendizagens precoces, quer tônico-emocionais, quer posturo-motoras (quando envolvem as áreas primárias) e mais tarde pelas aprendizagens pré-escolares e escolares

Figura 3 – 2ª unidade: Codificação

SUBSTRATO = LOBOS OCCIPITAL, TEMPORAL E PARIETAL

•O termo codificação refere-se à análise, síntese, armazenamento e re-cuperação da informação, envolvendo a significação e a relação com a base de dados já integrada no cérebro.

•A informação é codificação de duas formas: simultânea e sucessiva(sequencial).

•Oprocessamentosimultâneoocorrequandoainformaçãoésintetiza-da, em unidades espaciais ou relacionais, por exemplo, quando todas as partes surgem ao mesmo tempo (por exemplo, figura/imagem). Em contrapartida, o processamento sucessivo ocorre quando a informação é fornecida em uma unidade de cada vez (por exemplo, número de telefone, ditado). Aqui o cérebro segura ativamente cada elemento, até que todos os outros sejam apresentados, no fim do qual emerge o seu significado.

•Ambososprocessosenvolvemcomplexasdesconstruçõesereconstruções,eambosestãoenvolvidosnasatividadescognitivas mais complexas (por exemplo, leitura).

•Oprocessamentodainformação,quernoseuconteúdo(verbal/não-verbal),nassuasmodalidades(V+A+TQ),quernos seus níveis (percepção + simbolização + + conceptualização), requer a combinação sistêmica dos dois tipos de processamento (Cognição = processamento simultâneo + processamento sucessivo)...

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(quando envolvem as áreas secundárias e terciárias), como na leitura e na escrita.

Ela é essencialmente constituída pelas zonas hemisféricas posteriores dos lobos occi-pitais (visão), temporais (audição) e parietais (tatil-cinestésico) e composta por: • áreasprimárias-áreas de recepção sen-

sorial e atencional que estão em estreita conexão com a periferia corporal e com os órgãos sensoriais (próprio e exterocep-tivos), predeterminadas geneticamente e sem diferenciação hemisférica, cuja disfunção provoca a cegueira ou a sur-dez cortical, dados que representam o início da integração cortical dos dados de informação;

• áreas secundárias - áreas de análise, de síntese, de retenção (memória e arma-zenamento) e integração da informação intrassensorial específica, recebida nas áreas primárias com base em processos perceptivos sequenciais já especializados hemisfericamente, onde se verifica a ocor-rência de múltiplos processos de discrimi-nação e identificação, de associação, de retenção e categorização de dados intra e interneurossensoriais para além de:vinúmeros subprocessamentos acústicos

do som (por exemplo, timbre, ritmo, in-tensidade, tolerância, etc.), de fonemas e de monemas, para o caso do sentido da audição;

vmúltiplos e diversificados subproces-samentos do espaço (por exemplo, locação, detecção, posição, orientação, lateralização, direção, navegação vir-tual, etc) que incluem os subsistemas magnocelular e parvocelular envol-vidos no rápido escrutínio de dados espaciais e envolvimentais, e também, a integração e interação visuo-motora, a discriminação e identificação da figura-fundo, da cor, da forma, da es-pessura, do tamanho, das letras, dos números, dos signos, etc. no caso do sentido da visão;

vcomplexos subprocessamentos somatog-nósicos das posturas e das praxias globais e finas, da analise, síntese e localização proprioceptiva, vestibular, táctil e cines-tésica do corpo e da sua integração emo-cional e experiencial de gestos e de ações espaço-temporalmente organizadas, no caso do sentido tátil-cinestésico28.

Tais funções tornam-se essenciais para fazer emergir a linguagem falada e, mais tarde, a escrita, onde os fonemas devem ser devidamente fragmentados (consciencializa-dos), sequencial e rapidamente articulados para que se formem palavras e frases nas áreas terciárias, ou fazer emergir a rápida categorização e nomeação optema-fonema e fonema-monema no caso da leitura, bem como a rápida rechamada dos grafemas, onde os traços, os ângulos, as figuras e as inferências picturais devem ser rapidamente manipulados para produzir a escola.

Nesta unidade, os optemas (visão), os fonemas (audição) os articulemas (fala-oromotricidade) e os grafemas (escrita-grafomotricidade) deverão produzir rápidas e automáticas equivalências interneurossensoriais (gnosias) para serem mobilizadas posteriormente pela 3ª unidade do lobo frontal, a fim de exprimirem posteriormente respostas adaptativas (praxias).

As lesões que se verificarem nestas regiões irão obviamente interferir com a natureza se-quencial da análise, daí resultando desordens de processamento ou de reconhecimento de informação, ora omitindo, invertendo e subs-tituindo dados, ora adicionando e distorcendo outros, desordens essas que apresentam um elevado grau de especialização intra e inter-hemisférica, e que em muitos casos caracte-rizam as dificuldades invulgares das crianças disléxicas.

O hemisfério esquerdo é mais vocacionado para o processamento e reconhecimento de informação verbal e simbólica, ou seja, mais analítico e espacialmente mais organizado,

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enquanto que o hemisfério direito é mais preferencialmente orientado para o processa-mento e reconhecimento da informação não-verbal e não-simbólica, espacial e musical, postural e facial, ou seja, é mais difusamente organizado, por subsistirem redes funcionais que apresentam distintos mediadores quími-cos em ambos os hemisférios.

Numa perspectiva evolutiva, o direito é mais precoce e holístico que o esquerdo na filogênese e ontogênese da aprendizagem, ponde em realce o papel dos dois hemisférios no seu desenvolvimento hierarquizado23,28.

Independentemente desta especialização hemisférica fundamental, que ocorre sensi-velmente por volta dos 7-8 anos de idade, período crucial da aprendizagem da leitura, os dois hemisférios devem atuar em perfeita harmonia e empatia funcional.

Em resumo, para se atingir eficácia na aprendizagem, o que se passa é mais uma

intrincada, coordenada e hierarquizada inte-ração inter-hemisférica, mediada pelo corpo caloso, do que uma mera divisão dicotômica e funcional entre os dois hemisférios, sugerindo que a aprendizagem da leitura deve ser ante-cedida de aprendizagem de proto-pré-leitura, de proto-pré-escrita. • áreas terciárias - áreas essencialmente

localizadas no lobo parietal de ambos os hemisférios e que são responsáveis pela síntese sensorial crosso-modal e intermo-dal em oposição à integração sequencial característica das áreas secundárias.Esta integração e interação simultânea

interneurossensorial (auditivo-visual ou visuo-auditiva, auditivo-tatil-cinestésica, visuo-tatil-cinestésica ou visuo-espacial) completa a análise sequencial e intraneuros-sensorial daquelas mesmas áreas, envolvendo processos cognitivos de decodificação-codifi-cação necessários para a leitura (integração

Figura 4 – 3ª unidade: Planificação

SUBSTRATO = LOBO FRONTAL

•Otermoplanificaçãoenvolveodesenvolvimentodeumasequência de ações ou uma série de manobras e procedi-mentos para atingir um fim (objetivo=>fim).

•Aplanificaçãopõeemmarchaumsistemadeorganização,que inclui estratégias, metaplanos e programas de ela-boração, regulação, execução, controle e monitorização de ações com validade ecológica, por exemplo, resolução de problemas com soluções adaptadas.

•Implicacincodimensões:1)identificaraaçãodesejada;2) sequencializar procedimentos; 3) recuperar dados rele-vantes; 4) alocar recursos cognitivos; 5) decidir e executar.

•Recorre a uma internalização verbal auto-controlada,uma atenção voluntária construída, testada e refinada.

•Trata-sedeumacogniçãodacognição(metacognição),pondo em jogo uma tomada de consciência...

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atividade cognitiva que antecede a produção de competências de aprendizagem.

Todas as áreas desta unidade frontal, inde-pendentemente de um processo neuroevolu-tivo idêntico às áreas da 2ª unidade, evoluem da maturação das áreas motoras primárias, passando sucessivamente às áreas secundá-rias e depois terciárias, operam também de forma interligada e sistêmica.

Para que a aprendizagem da leitura e da escrita ocorra de forma adequada e progres-siva, as três áreas contribuem de forma coesa e melódica para a sua expressão.

Nas áreas pré-frontais, também designadas psicomotoras, emergem as funções de planificação, de autorregulação, de suporte à decisão (decision making), de avaliação, de continuidade temporal, de controle emocional, de controle inibitório, de atraso e distância interiorizada, de gratificação adiada, de atenção voluntária, de criatividade, etc.

A função de planificação antecipada da performance, práxica ou linguística, é obvia-mente responsável pela evolução humana e pela evolução dos processos de aprendizagem.

Devido ao fato dos lobos frontais rece-berem informações das áreas secundárias e terciárias sensoriais da 2ª unidade funcional posterior do cérebro, assim como recebem informações do sistema límbico, do tronco cerebral e fundamentalmente do cerebelo da 1ª unidade funcional, os seus sistemas funcionais ao analisarem esta informação multifacetada dispõem das condições neces-sárias para planificar a resposta terminal, rá-pida e perfeitamente adequada às mudanças envolvimentais, às exigências da informação sensorial presente e às experiências passadas e acumuladas.

Sendo a unidade funcional que mais tarde é desenvolvida em termos neurológicos, ela integra por inerência a 2ª e a 1ª unidades, mais precocemente desenvolvidas. Conse-quentemente, ela guia e orienta hierarquica-mente as áreas subcorticais, permitindo a sua modelação consciente e atencional.

visuo-auditiva ou óptico-fonética) e a escrita (integração auditivo-tátil-cinestésica para o ditado).

A gramática, a abstração, a análise lógica, a compreensão das preposições, a rotação espacial, a determinação e projeção angular, as esterognosias, entre outras, são funções específicas das áreas terciárias funções es-sas, com algumas exceções, que constituem a maioria dos testes de inteligência, como o WISC39-41 daí que muitos disléxicos escapem ao seu escrutínio.

São, portanto, funções cognitivas com maior profundidade e poder de especialização hemisférica, cuja disfunção sugere a taxo-nomia das dificuldades de aprendizagem9,10 clinicamente subdividida em: disnomias, dis-fasias, disartrias no caso da linguagem falada; ou dislexias disortografias, disgrafias, e seus subtipos, no caso linguagem escrita.

3ª Unidade de Execução Motora, Planifi-cação e Autorregulação (Figura 4): compre-ende a unidade de output motor do cérebro, consistindo no lobo frontal, que representa também o seu nível mais elaborado de desen-volvimento, verdadeira central de comando das funções executivas de onde partem as vias motoras piramidais fugais descendentes que se dirigem à medula e aos grupos musculares específicos, para concretizarem, realizarem e executarem qualquer tipo de praxia, macro, micro, oro ou grafomotora.

É também estruturada em áreas primárias, com as unidades motoras de output, onde a execução motora é desencadeada; em áreas secundárias, com centros de organização se-quencial e temporal de condutas dependentes de retro–informações e referências cinesté-sicas e proprioceptivas, de onde emanam os centros de planificação; e, finalmente, em áre-as terciárias, também designadas pré-frontais, com cetros de antecipação, de autorregulação, de extrapolação, de desprogramação-repro-gramação, de retrocontrole emocional, de superfocagem e sustentação da atenção, de flexibilidade e plasticidade, etc que refletem a

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Dotada desta arquitetura cibernética com-plexa, a 3ª unidade frontal avalia se a família de procedimentos de planificação-execução são consentâneos com objetivos de longo prazo e se a monitorização dos fins está ou não assegurada. Pôr em prática planos representa uma função crucial dos lobos frontais, tornando a ação (praxia e linguagem) vicária do pensamento, é disso que se trata quando a criança domina os mecanismos léxicos e simbólicos da aprendiza-gem da leitura e da escrita.

O cérebro, como órgão da civilização36,42,43 e como órgão da aprendizagem13, transforma pre-cocemente a ação em pensamento e, posterior-mente, o pensamento em ação, ambos mediados pela linguagem interiorizada. Tal circularidade e anel funcional garantiram à espécie humana um processo evolutivo e maturativo sem para-lelo na natureza, consubstanciando a função principal dos lobos frontais na produção de comportamentos ou condutas superiores.

Em síntese, para diferenciamos a maturi-dade da imaturidade dos lobos frontais, te-remos que equacionar não só a natureza dos déficits como a natureza da aprendizagem e da mediatização, pois só aguardando pela adolescência podemos inferir, ou esclarecer, o verdadeiro potencial de modificabilidade que se observa da infância.

Desta forma, o diagnóstico psicopedagógico ganha outra dimensão antropológica e educa-cional, pois não pode apenas apresentar indícios etários classificativos, mais tem de se centrar em dimensões dinâmicas mais prescritivas e pros-pectivas, mais tem de se centrar e dimensões dinâmicas mais prescritivas e prospectivas44,45.

Levando-se em consideração a arquitetura da organização funcional do cérebro, o desen-volvimento neuropsicológico em Luria parte da noção que, na criança (ser inexperiente), o processo maturacional é substancial e qua-litativamente diferente quando comparado

Figura 5 – Cognição

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ao adulto (ser experiente), onde neste todas estas unidades são supostas funcionarem integralmente.

Todo este processo de desenvolvimento, extremamente complexo e articulado entre as três unidades funcionais cerebrais, ocorre num tempo ontogenético e é necessariamente contextualizado num tempo social, dito so-ciogenético. A multiplicidade interativa dos ecossistemas sociais (micro-meso-exo-macro) que atuam sobre a criança, ora sequencial-mente ora simultaneamente, vão determinar a qualidade multiexperencial e multicontextual do seu desenvolvimento46.

O desenvolvimento neuropsicológico e concomitantes sistemas funcionais surgem só quando interagem com um envolvimento apropriado e com adequados requisitos de mediatização22. Se uma criança for criada com indivíduos que não falam, nem lêem e não a mediatizam cognitiva e simbolicamente, ela nunca aprenderá a falar, a ler ou a pensar criticamente com fluência, ilustrando assim o paradigma das crianças selvagens (por exem-plo, caso Genie)47.

O desenvolvimento neuropsicológico é o produto final de vários fatores: mielinização, crescimento axo-dendrítico, crescimento dos corpos celulares, sinaptogênese, estabeleci-mento de circuitos e redes interneuronais e muitos outros eventos bioquímicos, mas não explicam a complexidade dos processos de aprendizagem.

Os substratos neurológicos intactos e o envolvimento ecológico facilitador interagem reciprocamente para que as formas transien-tes ou sequenciais de aprendizagem possam surgir de acordo com uma hierarquia progres-sivamente e plasticamente integrada.

Sem experiências de aprendizagem me-diatizadas38,48-51, as habilidades cognitivas e simbólicas não emergem, pois não basta que a maturação neurológica ocorra de acordo com a lógica temporal, é crucial que se observe

um processo intencional de interação social e mediatizadora entre indivíduos experientes e inexperientes42.

A compreensão da organização neuropsico-lógica da cognição, com base em Luria, torna-se assim um paradigma fundamental da educação, da reabilitação, na medida em que ela permite operacionalizar o desenvolvimento da inteli-gência nas suas habilidades e sub-habilidades.

A leitura e a escrita, como funções psíquicas superiores que não, devem ser desenvolvidas com programas de enriquecimento linguístico adequados e com treino cognitivo de proces-sos: de atenção; de Informação sequencial e simultânea; de associação e generalização; de decodificação e codificação; de equivalência intermodal (optema-fonema-articulema-gra-fema); de análise e fragmentação fonológica; de memória visual e semântica; de autorre-gulação e de metacognição, etc (Figura 5)35.

De fato, a finalidade essencial da educação e da reeducação é acelerar o desenvolvimento cognitivo das crianças e dos jovens, com ele, a aprendizagem da leitura e da escrita são mais facilitadas.

Com a educação cognitiva, devemos visar à otimização máxima possível do potencial de aprendizagem de estudantes com rendimento normal ou superior. Com a reabilitação cog-nitiva, a finalidade da sua intervenção deve visar à compensação e o enriquecimento do potencial habilitativo de indivíduos portado-res de desigualdades sociais, dificuldades, perturbações, transtornos ou dificuldades de aprendizagem mais graves52.

Uma abordagem cognitiva à aprendizagem da leitura e da escrita constitui, portanto, um novo desafio aos sistemas de educação e de formação que têm a responsabilidade social de desenvolver, ao máximo possível, os recur-sos humanos de uma sociedade em qualquer idade, condição ou contexto.

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SUMMARYDyslexia, cognition and learning: a lurian neuropsychological approa-

ch to dyslexia

The author introduces dyslexia, defined as a specific learning difficulty differentiating the result, a global learning disability, based on the idea that this unusual difficulty, reveals a discrepancy of the intellectual potential, not a disability, that should be defined with on an intelligence quotient, equal to or greater than 80, excluding it clearly, from any categorization of the status field of disability or developmental difficulties and intellectuals. The difficulty of learning to read is presented as a dysontogenesis of the continuum of language development, covering the duplication of functions of spoken language (1st symbolic system) in written language (2nd symbolic system). Starting from the perspective of co-morbidity, dyslexia is seen as a problem that can present many problems of extraction, collection and processing of symbolic information, implying a range of cognitive skills, which include functional systems proposed by the Russian neuropsychologist A. R. Luria. Introducing Luria’s functional systems, learning to read is addressed as a result of a systemic, ontogenetic, concatenated and the integration functioning of the three functional units, namely: the 1st unit of attention and integration of optemes; the 2nd unit of simultaneous and successive processing in conversion of phonemes and concomitant semantic networks, and finally, the 3rd unit of planning, implementation and self-regulation, which operates the callback, control and expression of articulemes. The author suggests, based on the Luria model that the dynamic assessment of learning potential of children is equated from the profile of strengths and weaknesses revealed in the three functional units indicated profile that should be taken into account for further develop individualized intervention psychopedagogical strategies for each case.

KEY WORDS: Dyslexia. Cognition. Learning.

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fonseca V

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Trabalho realizado na Universidade Técnica de

Lisboa, Lisboa, Portugal.

Artigo recebido: 10/10/2009

Aprovado: 5/11/2009

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Pedagogia da autoria: a construção do Processo de autoria na formação de Pedagogos

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ARTIGO ESPECIAL

RESUMO – O objetivo desse trabalho é apresentar a importância do processo de autoria no curso de Pedagogia, por meio da criação de livros infanto-juvenis. Olhamos para o futuro professor como um sujeito ativo-interativo na construção do conhecimento. Vemos no processo da criação a possibilidade de despertar a necessidade de o futuro professor sair do lugar comum, para um fazer pedagógico reflexivo. Compreendemos, também, que, por meio da criatividade e da autoria, a construção dos processos de leitura e de escrita possa ser trabalhada de forma prazerosa e significativa junto ao aluno. Propomos uma pedagogia da autoria, no sentido de trabalhar a formação docente, de forma crítica e criativa, a fim de que os futuros docentes possam desenvolver a autonomia de pensamento e a autoria de seus futuros alunos.

UNITERMOS: Pedagogia. Psicopedagogia. Autoria e criatividade. Comunicação e expressão.

Pedagogia da autoria: a construção do Processo de autoria na formação de

Pedagogos

Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini

Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini – Mestre

em educação, Administração e Comunicação pela

Universidade São Marcos; Psicopedagoga Clínica

pela Universidade São Marcos; docente adjunta I

do curso de Pedagogia da Universidade Paulista

(UNIP); docente do curso de pós-graduação em

Psicopedagogia da Master School, SP.

Correspondência

Rossana Aparecida Vieira Maia Angelini

Alameda dos Maracatins, 1435, conj. 105 – São Paulo,

SP, Brasil - CEP 04089-004

E-mail: [email protected]

angelini raVm

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Escrever...

Inscrever-sena história.Escrever –

possibilidade de comunhão

Escrever o recôndito d’lma

Expressão dos sonhos...Escrever a marca

dum momentoduma eternidadeEscrever a vida...

Senti-laentre os dedos,entre os olhos...Escrever o doce

desejo, o vazio azuldo silênciobarulhento

Escreverbotar fora

Socializar os eusEscrever o não sentido

Escrever o não reveladoEscrever - tecer o fio

da existênciaEscrever os gestos,

os sons,os pensamentos...

Escrever a Vida...

Angelini, Rossana (2009)

HISTÓRICO DO MOVIMENTO DO PRO-CESSO DE AUTORIA, POR MEIO DA CRIAÇÃO DE LIVROSDurante muitos anos, atuamos no curso

Magistério, na rede pública, quando era mi-nistrada a disciplina de Literatura Infantil, por volta de 1986. Desde essa época, percebemos a necessidade de possibilitar ao futuro professor o desenvolvimento de seus processos de au-

toria, fundamentalmente, porque a educação tomava um novo rumo. Nasciam a criação e a construção de livros infanto-juvenis realizadas pelos futuros professores. As teorias de Piaget, Vygotsky, Wallon, Freud, Dolto, Emília Ferreiro e tantos outros autores importantes iluminavam nossa compreensão sobre o sujeito que aprende. Mais tarde, levamos a proposta de autoria e criatividade aos alunos do Ensino Fundamen-tal, aos alunos do Ensino Médio e a alunos com déficit intelectual. Todos tiveram oportunidade de viajar pelo universo da criação e, acima de tudo, desenvolver a autoria de pensamento, por meio da Literatura, da sensibilidade de escutar a palavra, de usar a palavra e tê-las nas mãos. Nasciam os novos autores de suas vidas, de suas vozes, de suas palavras.

A partir de 2005, iniciamos a proposta: au-toria e criatividade por meio da construção de livros no Terceiro Grau, no curso de Pedagogia. Nesse sentido, o movimento da autoria entrou novamente em cena e possibilitamos, também, aos professores e alunos do curso de Pedagogia de todos os campi da Universidade, a descoberta de seu universo crítico, criativo e, acima de tudo, o desafio do aluno construir seus processos de autoria, por meio de sua expressão.

Hoje, estamos em nossa quinta Exposição de Livros Infanto-Juvenis – Autoria e Criati-vidade – dos alunos do Curso de Pedagogia. Esse trabalho tomou uma dimensão enrique-cedora para cada aluno que desenvolveu seu livro e se posicionou como autor, por meio dos processos de ilustração, bem como de diagramação, paginação e capa. Tudo arran-jado artesanalmente, em que cada um, à sua maneira, de acordo com suas possibilidades, pôde vivenciar e mostrar sua criação e, es-sencialmente, interagir com as crianças, seus leitores, futuros autores.

Queremos compartilhar com todos os en-volvidos com a formação de professores uma proposta de trabalho que atua numa dimensão muito maior do que a própria confecção do livro, uma Pedagogia da Autoria. O professor pode ser criativo. De acordo com Miel1: “Quando

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um indivíduo procura fazer algo criativo como professor, qual é o produto? É claro o que não é o produto. Não é gente, pois professores não podem modelar gente como se fosse argila. O “produto” da criatividade do professor são oportunidades para que indivíduos e grupos experimentem e aprendam. (....) Desejamos propor que se chame criativo ao comportamento didático modelado em reação deliberada aos componentes de uma situação”.

Nossa intenção é criar na universidade um espaço que possibilite o escrever por meio da criação e, consequentemente, desenvolver a autonomia de pensamento. Acreditamos que o futuro professor precisa vencer o bloqueio frente à escrita, precisa resgatar o gosto por escrever, somente assim poderá semear uma escrita criativa. Dessa maneira, vivenciando o processo de autoria, poderá abrir espaços para a autonomia de pensamento de seus alu-nos. Dessa forma, a escrita fará sentido e será ressignificada pela criança. Concordamos com Fernández2 , quando aponta:

“Para que uma criança possa aprender a escrever são necessários, ainda que não sufi-cientes, os seguintes aspectos: a) Significação, a partir do professor, de um

aluno que possa ser diferente dele; b) Significação, a partir do professor, de um

aluno que possa pensar e enunciar uma opinião, um argumento que o torne original e questione a palavra do professor;

c) Uma escuta docente que outorgue sentido à expressão escrita e entenda o erro, não como falta, mas como etapa construtiva e necessária;

d) Uma leitura docente que espere e desfrute com a descoberta da diferença entre o enun-ciado do aluno e o que o professor esperava e desejava ler;

e) A criança poder escrever pelo prazer que encontra ao descobrir sua autoria;

f) A criança poder escrever pelo prazer que encontra ao poder estar presente em sua ausência. Por algum motivo Freud chamou a escrita “a linguagem do ausente.”

A autoria nos muda de “lugar”, possibilita-nos um movimento expressivo, criativo, um mo-vimento de liberdade que nos faz navegar pelo mundo da imaginação, pelas palavras, dando-lhe uma forma. Precisamos redimensionar a construção dos processos de leitura e escrita por meio de um caminho prazeroso e significativo à criança, para que possa se aventurar, movimen-to possível, desde que o professor encoraje seu aluno a questionar, a pensar com autonomia.

Por que desenvolver o processo de criação junto aos alunos do curso de Pedagogia – futuros professores? De acordo com Angelini3:

“O professor se sentindo capaz de criar e consciente da importância dos benefícios que o processo criador atribui à formação da crian-ça, do adolescente, terá condições de oferecer oportunidades para que o aluno dê asas à imaginação, desenvolvendo e despertando sua curiosidade para a realidade que o cerca.(...) Então, por que não oferecer ao aluno a possibi-lidade de se posicionar como autor – desenvol-ver seu livro, nele recriar sua realidade, seus anseios e através de sua linguagem, descobrir seu gosto estético?”

Portanto, cabe ao professor construir sua autoria e acreditar nas possibilidades da criança brincar com suas palavras, com sua expressão. Nossa busca é refletir sobre uma nova ação frente à construção dos processos de leitura e escrita, no novo paradigma que se constrói na Pós-Modernidade.

De nada adianta o discurso competente se a ação pedagógica é impermeável

à mudanças.(Freire,1999)4

A BUSCA DE UM NOVO PARADIGMA EM EDUCAÇÃONesse sentido, um novo paradigma entra

em cena. Passamos a perceber o mundo de maneira holística, em que todos estamos co-nectados em todos os aspectos: físico, químico,

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biológico, relacional, afetuoso, inconsciente... A física quântica pôde nos propiciar um novo conhecimento sobre o mundo e nossa relação com a vida em nossa casa: nosso planeta, nosso universo... Precisamos reaprender sobre as no-vas relações com a vida, com as pessoas, a partir dos novos conhecimentos: da teia de relações que nos conecta. Estamos buscando uma ação efetiva para um novo paradigma, o da Pós-Modernidade, em que o homem é visto como um sujeito sistêmico - interligado a uma rede de relações - que precisa se rever na totalidade e possibilitar as mudanças para a construção de um mundo melhor, que pulsa, que se renova e que se recria de forma interdependente. Com-preendemos, assim, que a dinâmica evolutiva básica da vida não é apenas a adaptação, é a criatividade. Força geradora da evolução e do progresso.

Recorremos a Moraes5 para compreender-mos o paradigma emergente:

“A educação precisa estar em consonância com essa nova visão do mundo, com a socie-dade, com a sociedade almejada no futuro, e, para tanto, é necessário criar ambientes educacionais que extrapolem as questões pedagógicas, que busquem o entendimento da condição humana, a preparação do cidadão para exercer sua cidadania, para uma partici-pação mais responsável na comunidade local e planetária, tendo como prioridade o cultivo de valores humanitários, ecológicos e espirituais. Isso requer novos métodos de ensino, novos currículos e novos valores, e novas práticas educacionais absolutamente diferentes das que estamos acostumados a encontrar em nossas escolas.”

Podemos compreender, então, a construção dos processos de leitura e escrita dentro de uma visão sistêmica. Ao invés de olharmos para esse processo de forma picotada (decodi-ficar), podemos olhar para esse processo como um sistema vivo, relacionado a um todo. Como podemos falar de construção de processos de leitura e escrita sem falar em letras, sons e sílabas? Para compreendermos esse processo

não é preciso separá-lo, é possível vê-lo no todo.Por exemplo, um pensador de sistemas vê as trocas entre a criança, as palavras e seu contexto. Vê o ciclo, as relações, a criança, o contexto e a escrita como uma construção de processos. Vê a criança como o mundo das palavras, do discurso, da autoria. Olha a criança e a construção dos processos de leitura e escrita como um sistema vivo maior: interdependente! Temos hoje a necessidade de construir uma pedagogia que possa desen-volver a autoria e a criatividade dos docentes e dos alunos.

“Como professor devo saber que sem a curiosidade que me move,

que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo nem ensino.

Exercer a minha curiosidade de forma cor-reta é um direito que tenho

como gente e a que corresponde o dever lutar por ele, o direito à curiosidade.”

(Freire, 1999)4

A IMAGINAÇÃO – O QUE NOS DIFERENCIASomos seres de imaginação, seres narra-

tivos, criaturas que buscam o sentido de sua condição. Nesse sentido, distinguimo-nos pela nossa capacidade de simbolização, de termos pensamentos que transcendem nossa experi-ência cotidiana, e a arte da palavra possibilita essa aventura.

Os homens de Neandertal, os habitantes do Paleolítico (c. 20.000 a 8 000 a. C.) nos deixaram a herança da criatividade por meio dos mitos, uma maneira que encontraram para dar conta de sua mortalidade, da dor de seu desamparo perante o universo. Não deixaram registro es-crito de seus mitos, contudo suas histórias foram tão cruciais à compreensão de sua condição que sobreviveram nas mitologias das culturas posteriores. De acordo com Armstrong6:

“Os seres humanos, por sua vez, facilmente se desesperam, e desde a origem mais remota inventamos histórias que permitem situar nos-sas vidas num cenário mais amplo e nos dão a

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sensação de que a vida, apesar de todas as pro-vas caóticas e arrasadoras em contrário, possui valor e significado.”

A Literatura é Arte e nos possibilita navegar pelo mundo dos sonhos. Podemos dizer que nossa primeira forma de arte foi a mitologia. O homem necessitou criar, inventar, imaginar... A criança também necessita das histórias, em primeiro lugar da sua história, da história de sua família para dar conta, de sua incompreensão frente ao mundo, tal qual o homem de Nean-dertal. Parece-nos um movimento do humano: a ontogênese repete a filogênese. A criança é um ser de narrativa, de história. Compreendemos esse movimento de acordo com Safra7:

“Considero as diversas formas de jogo da criança, assim como as histórias, não só como um modelo de encontrar expressão para desejos inconscientes, mas fundamentalmente como um modo de colocar seus conflitos subordinados à sua criatividade, ou seja, sob domínio do eu. Parece-me imprescindível tal forma de expres-são para o desenvolvimento cognitivo, ao lado do enriquecimento da percepção criativa, aqui definida como a capacidade da pessoa de apren-der a realidade segundo suas características pessoais. Isto significa estar pessoalmente pre-sente, sem estar submetido ao mundo externo e nem tampouco interpretá-lo de forma delirante, mas sim por meio de uma apreensão pessoal do mundo que a rodeia.”

Assim, cirandamos pelo universo criando e recriando nosso mundo. Daí a importância de levar a possibilidade da criação e de uma reflexão sobre a autoria ao futuro professor, para que ele possa redimensionar os processos de leitura e escrita na escola. Angelini3 nos convida a pensar:

“Criar é evoluir, é renovar o espírito, é o pra-zer que há em se superar; é o desafio de sair da condição passiva para a ativa, é poder modificar, é desenvolver técnicas, meios para alçar o des-conhecido, é abrir a mente para a reflexão...” .

Dessa forma, o aluno passa a ser visto como um ser capaz de criar, construir conhecimen-to, construir sua história, um sujeito que a todo

tempo aprende e interage com o universo. Um sujeito que precisa ser olhado holisticamente em seus processos de aprendizagem onde estão implicados cognição e afeto. Como Martinez8 aponta:

“Actividad creadora es la de um sujeto que, precisamente, em e lacto creador, expresa sus potencialidades de caráter cognitivo e afectivo em unidad indisoluble. Y esa unidad es condi-ción indispensable para el proceso creativo.(...) es el sujeto em su carácter activo quien actúa co sus capacidades em uma dirección y com um nível de implicación determinados, produciendo el resultado creativo ”.

A construção da autoria vem nos fazer alargar nossa visão sobre a aprendizagem e o “quem” aprende, ressaltando a importân-cia do vínculo entre o professor e o aluno. Atualmente, compreendemos que o sujeito da aprendizagem constrói conhecimento na interação com o mundo, um sujeito que tem corpo, organismo, cognição, afeto, emoção, relações, desejos, inconsciente... Um sujeito sistêmico que para aprender põe em jogo suas relações com a vida, com o mundo que o cerca. Um sujeito ativo-interativo que constrói conhecimento na relação com o outro, desde que é gerado.

Conteúdos cuja compreensão, tão clara e tão lúcida quanto possível,

deve ser elaborada na prática formadora. É preciso sobretudo e aí já vai um destes

saberes indispensáveis, que o formando, desde o princípio mes-

mo de sua experiência formadora, assumin-do-se como sujeito também da produção do

saber, se convença definitivamente de que ensinar

não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades

para a sua produção ou a sua construção. (Freire,1999)4

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A ATUAÇÃO DO PROFESSOR NO TER-CEIRO GRAUO professor que atua junto à formação de

futuros professores tem grande responsabilida-de no desenvolvimento de sua práxis. É preciso que, a cada aula, faça uma reflexão sobre a pre-paração dos novos docentes, principalmente, quanto aos futuros professores que trabalharão com a leitura e a escrita da criança.

Entendemos que a criação de livros por meio da Literatura Infanto-Juvenil pode ser o principal caminho para que o ler e o escrever sejam semeados. Para tanto, faz-se urgente capacitar o futuro professor de forma adequa-da em relação ao trabalho com a Literatura Infanto-Juvenil.

Para Zilberman9, ao falarmos em livros para crianças em sala de aula, o professor deve estar apto a:“a) à escolha de obras apropriadas ao leitor

infantil;b) ao emprego de recursos metodológicos efi-

cazes, que estimulem à leitura, suscitando a compreensão das obras e a verbalização, pelos alunos, do sentido apreendido.”

Ainda, a autora levanta aspectos fundamen-tais ao instrumental que deve ser oferecido ao professor:“a) o conhecimento de um acervo literário re-

presentativo;b) o domínio de critérios de julgamento estético,

que permitam a seleção de obras de valor;c) o conhecimento do conjunto literário destina-

do às crianças, considerando-se sua trajetória histórica (origem e evolução), assim como os autores atuais, nacionais e estrangeiros, mais representativos;

d) a manipulação de técnicas e métodos de ensino que socorram e auxiliem o mestre no processo de incremento e estímulo à leitura. Isto significa, por parte do professor, o reco-nhecimento de que a leitura é uma atividade decisiva na vida dos alunos, na medida em que, como se viu, permite a eles um discer-nimento do mundo e um posicionamento perante a realidade. Pela mesma razão,

invalidam-se a concepção e o emprego do livro como instrumento de transmissão de normas, sejam linguísticas ou comportamen-tais, ressaltando-se, em lugar disso, o seu destino inquiridor e cognitivo.” Sendo assim, o futuro professor necessita

compreender aspectos teóricos da Literatura Infanto-Juvenil e as estratégias adequadas a seu grupo, a fim de que a criança possa amar e desejar ler com prazer e satisfação. O sujeito que tem a possibilidade de ler, interpretar, redi-mensiona seu mundo interior e o mundo à sua volta, é capaz de reflexão e transformação sobre sua realidade. Portanto, a leitura e a escrita têm uma conotação política, inserem o sujeito no mundo enquanto cidadão capaz de participar de um contexto social, político, histórico, cultural com maior criticidade e criatividade.

Nesse sentido, o professor universitário deve estar capacitado, como aponta Masetto10:

“É fundamental que o docente perceba que o currículo de formação de um profissional abrange o desenvolvimento da área cognitiva quanto à aquisição, elaboração e organização de informações, ao acesso ao conhecimento, quanto à identificação de diferentes pontos de vista sobre o mesmo assunto, à imaginação, à criatividade, à solução de problemas...”

A Universidade é, sem dúvida, um espaço de formação de profissionais para diferentes áreas, os que vão fazer com que a sociedade caminhe qualitativamente, humanamente ou não. O pro-fessor consciente e politicamente responsável à formação dos novos cidadãos e profissionais precisa ter flexibilidade e estar aberto às mu-danças, às transformações sociais, políticas, históricas e, para isso, dominar e interagir com um conhecimento que possibilite a reflexão, a autonomia de pensamento, a criatividade.

Levantamos, ainda, alguns aspectos da teoria de Masetto10 fundamentais à competência do professor universitário:

“O papel do professor como apenas re-passador de informações atualizadas está no seu limite, uma vez que diariamente estamos sujeitos a ser surpreendidos com informações

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novas de que dispõem nossos alunos, as quais nem sempre temos oportunidade de ver nos inúmeros sites existentes na Internet. No âmbito do conhecimento, o ensino superior percebe a necessidade de se abrir para o diálogo com outras fontes de produção de conhecimento e de pesquisa, e os professores já se reconhecem como não mais os únicos detentores do saber a ser transmitido, mas como um dos parceiros a quem compete compartilhar seus conhecimen-tos com outros e mesmo aprender com outros, inclusive com seus próprios alunos.”

De acordo com as novas exigências desse século, o professor precisa se redescobrir, de-senvolver-se pessoalmente e profissionalmente, por meio da criatividade, da criticidade e da ética; aprender a aprender e, acima de tudo, aprender a interagir com seus alunos. Podemos pensar numa educação voltada para o desenvol-vimento da criatividade, como desenvolvimento da expressão.

RELATO DO TRABALHO DOS ALUNOS E SEUS DEPOIMENTOSTrabalhamos hoje numa nova ordem em que o

novo paradigma compreende o homem enquanto um sujeito ativo no processo de construção do co-nhecimento. Nesse sentido, procuramos despertar em nosso aluno o processo criador por meio do fazer literário, apontando-lhe caminhos para a autoria.

Nosso trabalho tem como essência o pro-cesso criador, assim lançamos um desafio aos alunos para que pudessem se libertar de uma passividade intelectual e produzissem um livro para crianças. Orientamos nossos alunos sobre a literatura e o desenvolvimento psicológico da criança, para poderem pensar no formato, no texto, nas imagens e na diagramação do livro. Fizeram pesquisas a respeito das obras infanto-juvenis, sobre os temas a serem abordados, visi-taram livrarias e bibliotecas para observarem a produção literária destinada às crianças.

Nossa preocupação é trabalhar o sujeito da criatividade e, para tanto, acionamos a moti-vação, para que o processo fosse instalado. O

argumento principal é o da necessidade de criar, de transformar, contrapondo à repetição, à pas-sividade, aos modelos prontos, estereotipados com que se trabalham os processos de leitura e de escrita na sala de aula.

A partir dessa proposta, criatividade tem como concepção o processo de produção da criação onde o subjetivo tem um importante papel, para que o sujeito da criatividade en-tre em ação, expressando suas possibilidades de caráter cognitivo e afetivo numa unidade indissolúvel. Instalado o processo criador e acionado o sujeito da criatividade, passamos para a intencionalidade do processo, o que o leva a pensar e como operar para se chegar ao produto criativo.

Para tanto, ativaremos nesse sujeito um pensar para que ele possa produzir a matéria da criação, ou seja, significar o que pretende produzir e a intenção de sua produção. Como Martínez (1995)8, acreditamos que o processo criador é um processo cognitivo que envolve também a subjetividade para a elaboração da matéria a ser desenvolvida.

Predispor o sujeito à criação é um processo que deve ser desenvolvido na educação, em especial, na formação de professores, na gra-duação de Pedagogia, o que propicia ao aluno acionar seus mecanismos cognitivos, afetivos, emocionais que se interligam, para que possa constituir um novo produto. Apontamos abaixo alguns depoimentos, reflexões dos alunos que vivenciaram o processo de criação de livros.

DEPOIMENTOS“Ser autor é participar de um processo

criativo que nos habilita a superar aquele que fomos ontem. Isto é, pensar, criar, transfor-mar, imprimir um novo olhar diante do que já existe, tudo isso nos transforma enquanto indivíduo. Experienciar a vida no papel de protagonista nos eleva a uma condição huma-namente mais consciente e responsável por nós mesmos e isso reflete na sociedade em que vivemos. (...) Portanto, valorizar o ser hu-mano aprendente e colocar-se também como

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tal favorece a educação como um fazer social, político e ético porque conscientiza, porque constrói em vez de humilhar, separar, alienar. Possibilitar desde o início diversos processos de autoria é um meio fértil de produzirmos uma realidade mais justa, pois, aquele que não pensa permite que o façam por ele.”

(Daniela Zellaui, 2009)

“A produção do livro foi de grande impor-tância para nós, estudantes de Pedagogia, pois desenvolvemos a criatividade, exploramos o programa Power Point, e o mais importante, tivemos que focar em uma faixa etária, preci-sando pesquisar a melhor forma de transmitir o conhecimento para a criança, assim como a escolha das palavras e figuras a serem utiliza-das. Não foi um trabalho fácil, pelo contrário, foi um trabalho de muito esforço e dedicação, mas que valeu a pena!”

(Laís Vanasco, 2009)

“Para mim, criar meu livro foi algo muito impor-tante. Importante porque me mostrou um mundo novo que antes eu desconhecia, algo que para mim não teria tanta importância. Quando somos leitores, não entendemos em nada como essa linguagem é produzida e não nos importamos em descobrir como é, e a partir de onde vêm essas obras mara-vilhosas da literatura. Fazer um livro infantil foi algo desafiador, contudo, muito bom de trabalhar. Desafiador por ter que construir algo com regras de linguagem, coisas que achamos desnecessárias, mas que para as crianças são fundamentais. É bom porque é divertido trabalhar com algo que, além de ensinar, vai fazer também a alegria das crianças, com todas as cores, bonecos, bichinhos e tudo mais que se pode imaginar. Construir esse livro sabendo da importância que seria para uma criança, me fez dedicar cada linha, cada parágrafo ainda mais, pois agora sei o intuito desse trabalho e porque devo usá-lo com sabedoria. Hoje posso passar para meus futuros leitores esse grande valor que o livro tem, pois por um momento fiz parte dele, desenvolvi minha autoria!”

(Josiliene Spigariol, 2009)

“Para mim, a oportunidade de poder criar um livro, desde a sua história até sua montagem e “publicação”, foi muito enriquecedora, ainda mais que eu sempre tive o desejo de escrever um livro. Foi trabalhoso, afinal criar uma histó-ria, imagens e uma narração propícia à criança é bem complicado, requer bastante experiência, mas o resultado foi surpreendente, é ‘super bacana’ ver no concreto tudo aquilo que ideali-zamos. Esse trabalho foi o que mais possibilitou nosso trabalho em equipe, o que foi muito útil e interessante à nossa formação. A meu ver esse trabalho foi ótimo em vários sentidos, devería-mos ter mais trabalhos assim...”

(Arlete Soares, 2009)

“A confecção do livro infantil foi uma tarefa árdua, mas muito prazerosa. Foi uma grande aprendizagem, pensar na elabo-ração de uma história com o objetivo de chamar a atenção da criança para a leitura, de fazer com que desperte seu interesse pela história e passar uma mensagem que a levasse a refletir sobre a história, foi muito importante para mim. Depois de elaborar a história, pensar na ilustração, que dese-nhos colocar? O que chamaria a atenção de uma criança na faixa etária dos seis aos oito anos? Que cores? Que textura utilizar? Pensar no tamanho da letra, na cor da letra, no papel, na impressão, na diagramação, enfim, pensar, imaginar, pesquisar, fazer, refazer, criar..., até conseguir elaborar um livro que apresente, ao mesmo tempo, uma história interessante, uma ilustração bonita, que prenda a atenção da criança, que tenha um objetivo, uma mensagem, que seja de fácil entendimento, mas que também seja uma leitura prazerosa para a criança. Então surgiu meu livro, praticamente, meu primei-ro livro, fiquei muito feliz como resultado, muito motivada e emocionada. Espero que tenha mais oportunidades para confeccionar muitos outros livros.”

(Elisângela T. Freitas, 2009)

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CONSIDERAÇõES FINAISA Educação tem voltado seu olhar já há al-

gumas décadas para a questão da Autoria e da Criatividade. A Universidade também está tra-balhando conteúdos em diferentes Graduações e disciplinas para o desenvolvimento do pensa-mento criativo, fundamentalmente na graduação de Pedagogia.

Esse trabalho tem o propósito de relatar uma experiência na Universidade junto aos alunos do curso de graduação em Pedagogia. A base desse projeto é o estudo e a pesquisa sobre a produção literária infanto-juvenil. O trabalho foi desenvolvido primeiramente com alunos do primeiro e segundo semestres, depois passamos a desenvolver livros em outras disciplinas, como em Ecopedagogia; Currículos e Programas; Co-municação e Expressão; Inclusão, Informática e Educação e outras. Os professores da graduação abraçaram esse projeto e o colocaram brilhante-mente em ação.

Ao trabalhar essa proposta, tivemos como meta o desenvolvimento da autoria, da criatividade junto aos futuros professores, por meio da escri-ta. Para o professor trabalhar com a autoria e a criatividade precisa construir sua própria autoria e criatividade, além de ler, analisar, criticar dife-rentes livros de literatura, bem como desenvolver um pensamento criativo para trabalhar com a literatura Infanto-juvenil, em sala de aula. Esse processo foi, então, finalizado com a criação de livros confeccionados pelos alunos da graduação de Pedagogia.

O professor que vivencia o processo de autoria tem possibilidade de sentir a importância desse processo e levá-lo aos seus alunos. Os alunos da graduação tiveram oportunidade de criar his-tórias, linguagem plástica, diagramação, até a conclusão final do livro.

Tenho desenvolvido o trabalho de Autoria e Criatividade há alguns anos com alunos da graduação de Pedagogia; crianças do Ensino Fundamental, com alunas do Curso Magistério e mesmo com jovens de uma escola especial. O tra-balho com a Autoria e Criatividade nasceu muito

cedo em meu movimento enquanto professora e psicopedagoga. Hoje, reavaliando todo o trabalho que tenho desenvolvido, vejo que a semente da autoria e da criatividade foi plantada muito cedo em minha vida: as narrativas de meus pais; as leituras na escola e a vontade de “brincar” com as palavras: o designer das palavras estava em meu mundo. Depois, descobri a paixão pelas artes em geral, pelo movimento do artista: o ousar, o inédito se desvelando de uma forma encantado-ra ou desencantadora em suas formas, em suas palavras-arte.

Na escola, nasceu a possibilidade da autoria, de uma autoria da vida, onde a palavra trançava e dançava em minhas mãos. Mais tarde, como professora de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira e Portuguesa, precisava compartilhar com meus alunos e colegas professores tamanha paixão e, desde então, o tema Autoria e Criativi-dade sempre esteve presente em minhas aulas, nas diferentes disciplinas que ministro.

Procuro entender hoje o nascimento desse movimento: o ato de criar e navegar por algumas ciências de forma interdisciplinar, para compre-ender a criatividade e a importância dela para o humano, o que lhe possibilita a liberdade de expressão. A partir dessa proposta, observamos a qualidade da criação dos alunos, o trabalho de pesquisa, o cuidado com a escrita, com a imagem, com a diagramação e com a montagem do livro. Alguns alunos estão escrevendo outras histórias, outros livros, alguns estão buscando editoras para publicar. Outros professores também abraçaram essa proposta e também estão criando livros com seus alunos, e ex-alunos, já professores, têm leva-do esse projeto de autoria e criatividade para suas escolas. Esse trabalho tomou uma nova dimensão e a criatividade e a autoria têm tomado conta de nosso curso, de nossa trajetória na universidade. A Pedagogia da Autoria tem aberto novos espaços de engajamento com o curso e com a educação.

Nesse sentido, fica nosso agradecimento a todos os professores, coordenadores que têm apoiado esse projeto por meio da exposição desse material e aos alunos e professores que têm inves-

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SUMMARYPedagogy of authorship: the construction of the authorship process in

teacher training

The objective of this paper is to present the importance of the authors in the Pedagogy course, through the creation of children’s books. We look to the future teacher as an active subject-interactive construction of knowledge. We see the process of creating the opportunity to awaken the need for future teachers out of the common place for a pedagogical reflective. We understand also that through creativity and authorship, the construction of the processes of reading and writing can be worked in a pleasant and meaningful with the student. We propose a pedagogy of authorship, to work on teacher training, critically and creatively, so that future teachers can develop the autonomy of thought and authorship of their future students.

KEY WORDS: Pedagogy. Psychoeducation. Authorship and creativity. Communication and expression.

REFERÊNCIAS 1. Mie A. Criatividade no ensino. São

Paulo:IBRASA;1972. 2. Fernández A. Autonomia de pensamento:

possibilidade de expressão. In: Grossi EP, Bordin J, organizadoras. Paixão de Apren-der. 12ª ed. Petrópolis:Vozes;2001. p.97.

3. Angelini RAVM. O processo criador em li-teratura infanto-juvenil. São Paulo:Letras e Letras;1991. p.13.

4. Freire P. Pedagogia da autonomia – sabe-res necessários à prática educativa. São Paulo:Paz e Terra;1999. p.11;24-5;95.

5. Moraes MC. O paradigma educacional

emergente. 13ª ed. São Paulo:Papirus;2007. p.112.

6. Armstrong K. A breve história do mito. São Paulo:Companhia das Letras;2005. p.8.

7. Safra G. Curando com histórias. São Paulo:Edições Sobornost;2005. p.23.

8. Martinez AM. Creatividad, personalidad y educación. Madrid:Editorial Pueblo y Edu-cación;1995. p.38.

9. Zilberman R. A literatura infantil na escola. 4ª ed. São Paulo:Global;1985. p.27.

10. Masetto MT. Competência pedagógica do professor universitário. São Paulo: Sum-mus;2003. p.14;19-20;28.

Trabalho realizado na Universidade Paulista (UNIP),

São Paulo, SP.

Artigo recebido: 7/10/2009

Aprovado: 27/11/2009

tido nessa proposta e procurado redimensioná-la. Atualmente, a Universidade conta com uma grande produção de livros criados e confeccio-nados por nossos alunos, futuros professores, que investem na autoria e numa ação mais reflexiva sobre sua práxis. Somente dessa forma

poderemos possibilitar o desenvolvimento de professores mais engajados, mais sensíveis e éticos, preocupados, de fato, com a qualidade e competência de nossas crianças na constru-ção dos processos de leitura e escrita, em todo nosso país.

IdentIfIcação precoce dos problemas de leItura

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Objetivos: Elaborar teste de identificação precoce dos problemas de leitura e caracterizar o desempenho dos escolares do 1º ano no procedimento elaborado. Método: Participaram deste estudo 83 alunos de 6 a 7 anos e 11 meses de idade do 1º ano do Ensino Fundamental Municipal na cidade de Marília-SP Foi elaborado Protocolo de identificação precoce dos problemas de leitura, composto por sete habilidades cognitivo-linguísticas: conhecimento do alfabeto; consciência fonológica; memória de trabalho; nomeação automática rápida; atenção visual; leitura de palavras e não palavras e compreensão de frases a partir de figuras. Resultados: Os resultados revelaram diferenças estatisticamente significantes, evidenciando que todos os escolares apresentaram desempenho obtido inferior ao desempenho esperado para as habilidades propostas no protocolo. Conclusão: Escolares do 1º ano do ensino fundamental avaliados neste estudo apresentaram desempenho inferior em habilidades que são consideradas na literatura nacional e internacional como preditoras para a alfabetização, o que demonstra que não apresentam domínio de habilidades cognitivo-linguísticas necessárias para aprender o sistema de escrita do português brasileiro.

UNITERMOS: Leitura. Avaliação. Aprendizagem.

protocolo de IdentIfIcação precoce dos problemas de leItura: estudo prelImInar

com escolares de 1º ano escolar

Simone Aparecida Capellini; Maria Nobre Sampaio; Maryse Tomoko Matsuzawa Fukuda; Adriana Marques de Oliveira; Cíntia Cristina Fadini; Maíra Anelli Martins

Simone Aparecida Capellini – Docente do Departamento de Fonoaudiologia e Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista –FFC/UNESP-Marília-SP. Maria Nobre Sampaio, Maryse Tomoko Matsuzawa Fukuda, Adriana Marques de Oliveira – Fonoaudiólogas Voluntárias do Departamento de Fonoaudiologia da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista – FFC/UNESP-Marília-SP. Cíntia Cristina Fadini, Maíra Anelli Martins – Discente do Curso de Fonoaudiologia da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista – FFC/UNESP-Marília-SP. Bolsistas de Iniciação Científica e Treinamento Técnico – CNPq.

Correspondência

Simone Ap. Capellini

Rua Hygino Muzzi Filho, 737 - Marília, SP, Brasil -

CEP: 17525-900

E-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃOA entrada na escola para o chamado pro-

cesso de escolarização requer uma série de habilidades e competências que se constituem como pré-requisitos para as aprendizagens que se processarão. Para ler, a criança deve adqui-rir certo número de habilidades cognitivas e perceptivo-linguísticas, que incluem habilidade de focalizar a atenção, a concentração e o segui-mento de instruções; habilidade para entender e interpretar a língua falada no cotidiano; me-mória auditiva e ordenação; memória visual e ordenação; habilidade no processamento das palavras; análise estrutural e contextual da língua; síntese lógica e interpretação da língua; desenvolvimento e expansão do vocabulário e fluência na leitura1,2.

Para a aquisição da leitura em uma língua cujo sistema de escrita é alfabético é necessário entender que as letras correspondem a segmen-tos sonoros menores, isto é, entender que as le-tras representam os fonemas, compreendendo, assim, o princípio alfabético da correspondência grafofonêmica3,4.

O sistema alfabético de escrita associa um componente auditivo fonêmico a um compo-nente visual gráfico (correspondência grafo-fonêmica), e para a compreensão do princípio alfabético são necessários três fatores: a cons-ciência de que é possível segmentar a língua falada em unidades distintas; o conhecimento de que essas unidades repetem-se em diferen-tes palavras faladas e a ciência das regras de correspondência entre grafemas e fonemas. Destacam-se que os dois primeiros fatores são aspectos da consciência fonológica, e isso a coloca como indispensável no desenvolvimento da leitura e da escrita3,5.

Pesquisadores identificaram cinco compo-nentes essenciais necessários para o sucesso da aprendizagem da leitura em crianças da pré-escola: a consciência fonológica, conhe-cimento dos fonemas, fluência, vocabulário e compreensão, sendo este o caminho para uma leitura fluente e para a compreensão de textos6.

Estudos internacionais7,8 ressaltaram que

o processamento fonológico é um elo funda-mental para a aquisição da leitura, visto que a consciência fonológica, ou seja, a habilidade de identificar e manipular mentalmente os sons constituintes da fala, é um importante preditor da capacidade de a criança pequena desenvol-ver a leitura na idade escolar.

Apesar de as literaturas nacional2-4,9 e in-ternacional6,10,11 apontarem a relação entre as habilidades fonológicas e a aquisição e de-senvolvimento da leitura, ainda são escassos na literatura nacional os estudos dedicados à verificação dessas habilidades por meio de protocolos ou avaliações formais na população de escolares em fase inicial de alfabetização.

Com base no exposto, esse estudo teve por objetivo a elaboração de um Protocolo de identificação precoce de problemas de leitura e caracterizar o desempenho dos escolares do 1º ano no procedimento elaborado.

MÉTODOO presente estudo foi realizado após aprova-

ção do Comitê de Ética em Pesquisa da Facul-dade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista – CEP/FFC/UNESP, sob o protocolo nº 3348/2008.

Participaram deste estudo 83 escolares do 1º ano do ensino fundamental do município de Marília-SP, de ambos os gêneros, sendo 51 (61,5%) do gênero masculino e 32 (38,5%) do gênero feminino, na faixa etária de 6 anos a 7 anos e 11 meses de idade.

Apenas participaram deste estudo os escola-res que não apresentavam em prontuário escolar anotações referentes à presença de deficiências auditiva, cognitiva, mental, visual ou física.

Para a realização deste estudo foram utiliza-dos os seguintes procedimentos:

a) Termo de Consentimento Pós-informado: conforme resolução do Conselho Nacional de Saúde CNS 196/96, anterior ao início das ava-liações, os pais ou responsáveis dos pacientes selecionados assinaram o termo de Consen-timento Pós-informado para autorização da realização do estudo;

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b) Elaboração do Protocolo de identificação precoce dos problemas de leitura: esse proto-colo é composto por sete habilidades cognitivo-linguísticas divididas em subtestes, descritos a seguir: 1. Conhecimento do alfabeto: foram apresenta-

das ao escolar as letras do alfabeto para que ele identificasse o nome da letra e o valor sonoro de cada letra apresentada;

2. Consciência fonológica: composta por sub-testes de produção de rima, identificação de rima, segmentação silábica, produção de palavras a partir do fonema dado, síntese fonêmica, análise fonêmica, identificação de som inicial.

2.1. Produção de rima: foram apresentadas ao escolar 20 palavras auditivamente e soli-citado que ele dissesse uma palavra que terminasse com o mesmo som.

2.2. Identificação de rima: foram apresentados ao escolar 20 grupos de três em três pa-lavras auditivamente e solicitado que ele identificasse as palavras que terminassem com o mesmo som.

2.3. Segmentação silábica: foram apresenta-das ao escolar 21 palavras auditivamente (dissílabas, trissílabas e quadrissílabas) e solicitado que ele separasse-as por sílabas.

2.4. Produção de palavras a partir do fonema dado: foram apresentados ao escolar os sons do alfabeto e solicitado que ele dis-sesse uma palavra que começasse com o mesmo som.

2.5. Síntese fonêmica: foram apresentadas ao escolar 21 palavras auditivamente separa-das por sons e solicitado que ele dissesse a palavra formada.

2.6. Análise fonêmica: foram apresentadas ao escolar 21 palavras auditivamente e solici-tado que ele dissesse os sons de cada letra das palavras apresentada.

2.7. Identificação de som inicial: foram apre-sentadas ao escolar 21 palavras auditiva-mente e solicitado que ele dissesse o som inicial da primeira letra de cada palavra apresentada.

3. Memória de trabalho: foram apresenta-das ao escolar 24 não palavras auditiva-mente e solicitado que ele as repetisse como havia entendido.

4. Velocidade de acesso à informação fo-nológica: foram apresentadas ao escolar sete sequências intercaladas de desenhos coloridos (carro, bola, pato, casa e chave) e solicitado que ele realizasse a nomeação rápida.

5. Atenção visual: foram apresentadas ao escolar 10 figuras coloridas e solicitado que ele identificasse, entre duas palavras, a que correspondia às figuras.

6. Leitura de palavras e não palavras: foram apresentadas ao escolar 40 palavras visu-almente (20 palavras e 20 não palavras) e solicitado que ele realizasse a leitura em voz alta.

7. Compreensão de frases a partir de figu-ras apresentadas: foram apresentadas ao escolar 20 frases incompletas com figuras ilustrativas e solicitado que ele observasse as figuras e completasse as frases.

O material linguístico utilizado para a ela-boração das provas foi extraído de um banco de palavras de livros didáticos de 1ª a 4ª sé-ries utilizados na rede municipal de ensino de Marília-SP. A partir desse banco de dados, as palavras utilizadas na elaboração das provas seguiram as regras de decodificação do portu-guês brasileiro descrito por Scliar-Cabral12 tan-to para palavras como para pseudo-palavras: a) regra de correspondência grafo-fonêmica independente do contexto e b) regra de cor-respondência grafo-fonêmica dependente do contexto.

O protocolo foi aplicado de forma individu-al, em apenas uma sessão e com duração de aproximadamente 50 minutos com cada escolar em período contrário ao de aula.

Os resultados foram analisados estatistica-mente utilizando o Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, com o intuito de verificarmos possíveis diferenças entre o escore obtido e

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Tabela 1 - Distribuição da média, desvio padrão, mínimo, máximo e p-valor do desempenho dosescolares em subtestes no Teste de Identificação Precoce dos Problemas de Leitura.

Par de Variáveis n Média Desvio-padrão Mínimo Máximo Mediana Significância (p)

CA _O 83 20,19 2,65 10,00 23,00 21,00< 0,001*

CA_E 83 23,00 0,00 23,00 23,00 23,00

PR_O 83 6,43 6,03 0,00 19,00 5,00< 0,001*

PR_E 83 20,00 0,00 20,00 20,00 20,00

IR_O 83 12,84 5,96 0,00 21,00 14,00< 0,001*

IR_E 83 20,00 0,00 20,00 20,00 20,00

SS_O 83 19,57 2,52 10,00 21,00 21,00< 0,001*

SS_E 83 21,00 0,00 21,00 21,00 21,00

PP_O 83 17,45 3,96 5,00 22,00 19,00< 0,001*

PP_E 83 21,33 0,47 21,00 22,00 21,00

SF_O 83 1,47 3,76 0,00 21,00 0,00< 0,001*

SF_E 83 21,00 0,00 21,00 21,00 21,00

AF_O 83 1,67 2,30 0,00 11,00 0,00< 0,001*

AF_E 83 21,00 0,00 21,00 21,00 21,00

ISI_O 83 7,31 7,89 0,00 21,00 5,00< 0,001*

ISI_E 83 21,00 0,00 21,00 21,00 21,00

MT_O 83 20,40 2,90 13,00 25,00 21,00< 0,001*

MT_E 83 24,00 0,00 24,00 24,00 24,00

AV_O 83 9,66 0,72 6,00 10,00 10,00< 0,001*

AV_E 83 10,00 0,00 10,00 10,00 10,00

L_O 83 27,88 12,79 0,00 40,00 33,00< 0,001*

L_E 83 40,00 0,00 40,00 40,00 40,00

CF_O 83 15,83 4,74 0,00 20,00 17,00< 0,001*

CF_E 83 20,00 0,00 20,00 20,00 20,00Legenda: CA= conhecimento do alfabeto; PR = produção de rima; IR = identificação de rima; SS = segmentação silábica; PP = produção de palavras a partir do fonema dado; SF = síntese fonêmica; AF= análise fonêmica; ISI = identificação do som inicial; MT = memória de trabalho; AV= atenção visual; L = leitura de palavras e não palavras; CF = compreensão de frase a partir de figura; O = obtido; E = esperado. Análise estatística: Teste de Wilcoxon.

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esperado em cada subteste do protocolo.Para a análise estatística foi adotado o nível

de significância de 5% (a = 0,050), marcada com asterisco. A análise dos dados foi realizada utilizando o programa SPSS (Statistical Packa-ge for Social Sciences), em sua versão 13.0.

RESULTADOSA Tabela 1 apresenta a distribuição da mé-

dia, desvio padrão e valor de p do desempenho dos escolares deste estudo em relação ao de-sempenho esperado e obtido de cada subteste do Teste de identificação precoce dos problemas de leitura.

Nessa tabela ainda é possível verificar os valores mínimos e máximos de cada prova, sendo que o valor mínimo é considerado como o efeito base e o valor máximo, como efeito teto para cada subteste realizado pelos escolares.

Com a aplicação do Teste dos Postos Sina-lizados de Wilcoxon, verificamos que ocorreu diferença estatisticamente significante para todos os subtestes, indicando que os escolares do 1º ano deste estudo obtiveram desempenho inferior do escore obtido em relação ao escore esperado em todos os subtestes do protocolo.

O resultado da aplicação do subteste de nomeação rápida de figuras revelou que os es-colares do 1º ano apresentaram média de 35,47 segundos para a realização do subteste, com desvio padrão de 7,14 e valor mínimo de 21,00 segundos e valor máximo de 71,00 segundos.

A Tabela 2 apresenta o coeficiente de corre-

lação entre os subtestes de memória de trabalho, leitura e nomeação rápida.

Com a aplicação da Análise de Correlação de Spearman, verificamos que o desempenho dos escolares desse estudo nos subtestes de memória de trabalho e leitura obteve um coeficiente de correlação positivo, ou seja, quanto maior o desempenho no subteste de memória de trabalho, maior o desempenho na prova de leitura de palavras e não pala-vras. No entanto, essas mesmas habilidades correlacionadas com o subteste de nomeação rápida obtiveram coeficiente de correlação negativo, apresentando comportamento contrário, isto é, quanto maior o desempenho no subteste de memória de trabalho, maior o desempenho na prova de leitura, em de-corrência de um tempo menor na prova de nomeação rápida de figuras.

DISCUSSÃOCom relação ao conhecimento do alfabeto,

os resultados deste estudo demonstram que os escolares do 1º ano apresentaram desempenho próximo ao esperado, entretanto tais escolares não apresentaram o conhecimento de todo o alfabeto. Esse resultado nos aponta para o fato de que em um sistema de escrita com base alfabética, como o do português brasileiro, é necessário que os escolares em fase inicial de al-fabetização dominem o alfabeto, pois conforme descrito na literatura10 o conhecimento de letras é relacionado com o desempenho em tarefas

Tabela 2 - Distribuição dos pares de variáveis, coeficiente de correlação e p-valor do desempenho dos escolares em subtestes no Teste de Identificação Precoce dos Problemas de Leitura.

Par de variáveis N Coeficiente de correlação Significância (p)

MT x L 83 +0,506 < 0,001

MT x NR 83 -0,271 0,013

L x NR 83 -0,339 0,002

Legenda: MT = memória de trabalho; L = leitura de palavras e não palavras; NR = nomeação rápida de figuras. Análise esta-tística: Teste de Correlação de Spearman.

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fonológicas, confirmando que o desenvolvimen-to dessas habilidades está correlacionado com o posterior bom desempenho em leitura, uma vez que o mecanismo de conversão letra-som é necessário de ser acionado para a leitura de palavras em um sistema de escrita com base alfabética.

Os resultados deste estudo revelaram que os escolares do 1º ano apresentaram desempenho superior nas tarefas silábicas em relação às tarefas fonêmicas. Tais resultados corroboram com a literatura4,9,13,15,16, que relata que a cons-ciência de sílabas é adquirida precocemente pelo fato da percepção de unidades maiores como as sílabas serem mais perceptíveis e, por isso, mais facilmente manipulada. As habili-dades de análise silábica e de outras unidades suprassegmentares se desenvolvem de forma mais natural, por prováveis fatores fono-articu-latórios, e são observadas com maior frequência em pré-escolares. Assim, espera-se que essas habilidades já estejam mais desenvolvidas na idade escolar3.

Na literatura9,17,18 está descrito que existe forte relação entre as habilidades de processa-mento fonológico, mais especificamente a cons-ciência fonológica e a habilidade de leitura de palavras, indicando o papel relevante da cons-ciência fonológica no desempenho da leitura, particularmente na decodificação de palavras.

Em estudo nacional18 foi descrito que as habilidades fonológicas são necessárias para leitura e escrita, na medida em que a consci-ência fonológica é um aspecto a ser integrado no reconhecimento de palavras. A percepção dos sons durante a produção da linguagem oral influencia diretamente o desenvolvimento da escrita.. Os resultados analisados desse estudo revelaram desempenho abaixo do esperado nas habilidades fonológicas (identificação e produção de rima, análise e síntese fonêmica e identificação de som inicial) como também visto na prova de leitura de palavras e não palavras, correlacionando, dessa forma, com o exposto pelos autores anteriormente citados, a não existência da relação do processamento

fonológico com a decodificação, prejudicando o desenvolvimento de uma leitura proficiente de palavras pelos escolares deste estudo.

Os dados analisados neste estudo mostraram desempenho inferior dos escolares de 1º ano obtido nas provas de consciência fonológica, o não uso da regra de conversão letra/som. Esse achado vai ao encontro de trabalhos da litera-tura9, que descreveram que nas séries iniciais pode haver maior dificuldade de decodificação ao ler palavras novas ou pouco frequentes, ex-tensas e com irregularidades ainda não apren-didas, pois a criança tem que utilizar regras de conversão entre grafemas e fonemas e/ou realizar uma pesquisa no léxico à procura da representação correspondente ao input visual, que ainda não está completamente formado. Isso pode justificar o desempenho dos escolares de 1º ano deste estudo na prova de leitura de palavras e não palavras.

Quanto à habilidade de leitura e à memória de trabalho, verificamos neste estudo que para tais habilidades ocorreu diferença estatistica-mente significante, corroborando estudo da lite-ratura nacional4, que a descreveu como uma das habilidades cognitivas envolvidas no processo de alfabetização e de aprendizagem da leitura.

Para alguns autores20,21, a nomeação rápida é uma habilidade do processamento fonológico, enquanto que para outros autores22 ela faz parte da velocidade do processamento da informação. Apesar dessa divergência, os pesquisadores en-volvidos nessas duas vertentes são unânimes em afirmar que a nomeação rápida possui relação com a leitura, principalmente em habilidades de decodificação, fluência e compreensão23. Essas afirmações vão ao encontro dos dados obtidos no presente estudo, no qual é possível observar relação das habilidades de memória de trabalho e leitura em uma relação inversamente propor-cional com a habilidade de nomeação rápida.

Os dados descritos neste estudo comprovam que quanto melhor o desempenho na prova de memória de trabalho, melhor será a leitura de palavras e não palavras em decorrência de um menor tempo na habilidade de acesso à

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informação fonológica, o que corrobora com os achados descritos na literatura24, evidenciando a relação entre velocidade e tempo de nome-ação em escolares, com e sem dificuldades de aprendizagem.

O resultado descrito neste estudo mostra o baixo desempenho obtido pelos escolares na prova de compreensão de frase a partir de figura, que, conforme estudo descrito na literatura25, a compreensão de leitura depende da ativação de relevantes conhecimentos que estão fortemente relacionados com o desenvolvimento do voca-bulário, da linguagem oral e da experiência de mundo de cada indivíduo, além do desenvolvi-mento da expressão clara e organizada de ideias, tanto na forma oral como na escrita, o que em indivíduo disléxico pode apresentar lentidão.

Os resultados descritos neste estudo apontam para a necessidade de refletirmos sobre as meto-dologias de ensino empregadas na alfabetização, pois a falta de instrução formal quanto ao uso do mecanismo de conversão letra-som em séries iniciais de alfabetização pode gerar problemas na aquisição do princípio alfabético da língua portuguesa. Dessa forma, seria necessário que, independentemente da metodologia de ensino utilizada pelos professores em situação de sala de aula, eles empregassem o uso de atividades de consciência fonológica, memória de trabalho fonológica, nomeação rápida e leitura em voz alta nos primeiros anos de escolarização, para que, assim, os escolares possam aprender a leitura e escrita por meio do uso dos mecanismos de con-versão grafofonêmico e fonografêmico.

A reflexão descrita está pautada em estudos internacionais11,16,19,26 desenvolvidos em países

que possuem, como na língua portuguesa, siste-ma de escrita com base alfabética. Tais estudos descreveram que, dentre as habilidades específi-cas, a consciência fonológica é uma competência fundamental para a formação de leitores profi-cientes no sistema alfabético, pois a habilidade de manipular fonemas não depende da maturidade psiconeurológica e só pode ser alcançada por meio de instrução explícita, ou seja, pelo ensino do princípio alfabético do sistema de escrita.

CONCLUSÃO Os resultados permitem concluir que os esco-

lares do 1º ano do ensino fundamental avaliados neste estudo apresentaram desempenho inferior em habilidades que são consideradas na literatura nacional e internacional como preditoras para a alfabetização, o que demonstra que os escolares de escola pública municipal deste estudo, em início de alfabetização, não apresentam domínio de habilidades cognitivo-linguísticas necessárias para aprender o princípio alfabético do sistema de escrita do português brasileiro.

Esses resultados apontam para a necessidade de continuidade do presente estudo, pois quanto menos conhecermos o perfil de escolares de séries iniciais de alfabetização quanto ao domínio de habilidades metafonológicas e leitura, menor será a condição do professor para realizar a detecção precoce do escolar de risco para o aprendizado da leitura e escrita.

AgRADECIMENTOSAo CNPq, pelo apoio científico em forma de

bolsa de produtividade em pesquisa concedida à primeira autora.

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SUMMARY Early identification of reading problems: preliminary study with stu-

dents of 1st grade

Purpose: To elaborate procedures for the early identification of problems in reading and to characterize the performance of the students from 1st grade in the test developed. Methods: Eighty–three students participated in this study, ranging from 6 to 7 years and 11 months of age from 1st grade of elementary school in Marília, São Paulo, both genders, middle-lower socio-economic level. The early identification of reading problems test was developed, composed by seven cognitive-language skills: knowledge of the alphabet, phonological awareness, working memory, rapid automatic naming, visual attention, reading of words and non-words, understanding of words and phrases from pictures. The results were statistically analyzed using the Wilcoxon-flagged posts test. Results: The results showed statistically significant differences, showing that all students had lower performance compared to the performance skills expected in the test. Conclusion: The results have enabled us to conclude that the students from 1st grade of elementary school evaluated in this study had lower performance on skills that are considered in national and international literature as predictors for literacy, which shows that students of municipal schools in this study beginning the literacy process do not present dominance of cognitive-linguistic skills necessary to learn the system of writing of Brazilian Portuguese.

KEY WORDS: Reading. Evaluation. Learning.

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Trabalho realizado na Faculdade de Filosofia e

Ciências da Universidade Estadual Paulista – FFC/

UNESP-Marília-SP, Marília, SP.

Artigo recebido: 02/11/2009

Aprovado: 20/11/2009

Seno MP

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Introdução: Atualmente a inclusão é um assunto bastante debatido e controverso. Ao mesmo tempo em que é imposta pelo sistema educacional, este não oferece a mínima estrutura para que esse processo seja realmente efetivo. Vivenciando esse desencontro estão os educadores e os alunos com necessidades educacionais especiais. Estes sendo atendidos improvisadamente e aqueles precisando buscar por si só resoluções para as dificuldades encontradas durante o percurso. Método: O objetivo deste trabalho foi pesquisar o conhecimento de 34 professores da Rede Municipal de Ensino do Município de Marília que lecionam para alunos com perda auditiva, por meio da aplicação de questionário que pesquisou dados como os sentimentos do docente ao receber a notícia que terá um aluno deficiente auditivo / surdo incluído, informações prévias que retêm sobre a deficiência, o desenvolvimento individual da criança, os recursos tecnológicos disponíveis, o domínio da Língua Brasileira de Sinais e a importância de obter informações sobre as questões específicas inerentes à perda de audição. Resultados: Após a análise dos dados foi possível comprovarmos a necessidade e a importância do apoio especializado para a atuação do professor, que na maioria das vezes desconhece informações básicas que podem ser consideradas fundamentais para o bom desenvolvimento do aluno.

UNITERMOS: Perda auditiva. Surdez. Educação especial. Educação.

Marília Piazzi Seno – Fonoaudióloga e Psicopedagoga,

Coordenadora do Centro de Atendimento

Multidisciplinar - CAM da Secretaria Municipal da

Educação de Marília.

Correspondência

Marília Piazzi Seno

Rua José Freire Sobrinho, 610 – Jd. Europa – Marília,

SP, Brasil – CEP 17514-014

E-mail: [email protected]

A incluSão do Aluno coM PerdA AuditivA nA rede MuniciPAl de enSino dA cidAde de

MAríliA

Marília Piazzi Seno

incluSão do deficiente Auditivo

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INTRODUÇÃOA inclusão tem sido um assunto bastante

debatido, principalmente pelos profissionais da área da educação, que expressam opiniões diferentes, gerando polêmicas e debates sobre seus reais benefícios para o progresso do aluno deficiente.

O Ministério da Educação e do Desporto (1998) define a Educação Especial, em seu ca-pítulo V, art. 58, como modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para educandos portadores de necessidades especiais.

A educação inclusiva nasceu e vem se for-talecendo dentro de um ensino regular sedento pela melhoria da qualidade da escolarização no mundo. Os especialistas inclusivos partem da idéia de que uma educação com qualidade teria como consequência a presença de todos os tipos de crianças dentro da escola regular1; porém, em algumas situações, a experiência escolar é referida como inclusiva em função da presença de algum aluno deficiente em classe comum, ainda que este realize solitariamente alguma atividade diferenciada do resto da classe2.

Ao mesmo tempo em que o sistema “impõe” o processo da inclusão, não oferece condições para que a mesma seja efetiva. O aluno deficien-te dentro de uma sala de aula, que não esteja integrado aos demais, acaba tendo suas limita-ções destacadas de forma que suas diferenças parecem acentuar-se ainda mais representando um prejuízo para todos.

O sucesso do processo da inclusão está dire-tamente ligado à possibilidade de reconhecer as diferenças e aceitá-las. Isso não significa ig-norá-las, isso não significa colocar crianças com necessidades educacionais especiais na sala de aula regular e esperar que elas aprendam pela proximidade com seus colegas da mesma idade. Respeitar as diferenças é oportunizar os recur-sos necessários para que a criança aprenda. É fundamental que haja especialistas nessa equi-pe de apoio para que o professor não tenha que se tornar um super-herói conhecedor de todas as deficiências e de seus recursos de auxílio3.

A maioria das escolas não está preparada para receber um aluno com necessidades edu-cacionais especiais. As barreiras arquitetônicas, o despreparo dos professores, a falta de uma equipe de apoio com profissionais especializa-dos e a resistência dos educadores em modificar as suas práticas são evidentes nesse processo e dificultam ainda mais a acolhida a esses indiví-duos. Oferecer alternativas que contemplem as diferenças, além de recursos de ensino e equi-pamentos especializados que atendam a todas as necessidades educacionais dos alunos, com e sem deficiências, mas sem discriminações, é indispensável4.

Não são as particularidades individuais que determinam se um aluno possui ou não dificul-dade escolar que exija ações educativas dife-renciadas, mas sim quando este aluno se depara às ações da escola, que está, na maioria das vezes, voltada para atendimento educacional a um grupo de referência, ou seja, a instituição espera que o aluno se “encaixe” na forma do processo educativo que ela oferece. As mudan-ças de atitudes e paradigmas são fundamentais para a construção de uma escola inclusiva, que não faça distinções entre deficientes e normais, que apresente uma proposta educacional que garanta e favoreça condições de aprendiza-gem a todos num só contexto, proporcionando uma educação diferenciada e dando respostas educativas ao aluno durante todo o processo de escolarização, se isto se fizer necessário, ou seja, oferecer uma educação permanente que atenda às peculiaridades de cada aluno5.

A experiência em muitos países demonstra que a integração das crianças e jovens com necessidades educacionais especiais é me-lhor atingida dentro de escolas inclusivas que atendem todas as crianças na comunidade. A inclusão social é um processo que contribui para a construção de um novo tipo de sociedade por meio das transformações, pequenas e grandes, nos ambientes físicos e na mentalidade de todas as pessoas6.

Mas será que as crianças estão realmente melhor acolhidas em escolas regulares,

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independentemente de sua necessidade especial?

A partir do momento em que os ajustes não estejam sendo realizados para oferecer ao indi-víduo deficiente todas as possibilidades para o seu progresso, da mesma maneira que acontece com os demais, não podemos dizer que está havendo inclusão.

Para a concretização de uma pedagogia que realmente privilegie a diversidade, não é suficiente colocar as crianças juntas a fim de desencadear-se imitação e interação entre elas7. Apenas inserir o aluno deficiente na classe comum não garante que ele se integre de fato ao grupo que pode sofrer exclusão tanto no interior da classe, quanto na comunidade a qual pertence8.

Para a aceitação das diferenças não basta que os currículos sejam adaptados, os pro-fessores capacitados ou que haja uma equipe de especialistas na unidade escolar; antes de qualquer coisa é necessária uma mudança interna e individual. É preciso que as pessoas aceitem a diversidade naturalmente, para que suas atitudes e paradigmas sejam modificados da mesma forma.

O maior obstáculo para a mudança é interno, está dentro de cada um, envolvendo atitudes e medos. Há uma tendência para serem subes-timadas as pessoas com deficiência e para ser superestimado o defeito, as dificuldades que podemos enfrentar e os desapontamentos que podem ocorrer se “falharem”9.

As adaptações previstas nos documentos oficiais Parâmetros Curriculares Nacionais de 1998 estão embasadas na premissa de que cada aluno tem peculiaridades específicas e especiais e para atendê-las são necessários ajustes e adaptações nos currículos regularmente propos-tos para os diferentes níveis de escolaridade, de forma a garantir as condições (respostas educa-cionais) que lhe são necessárias para acessar o conhecimento disponível10.

Não é tarefa simples planejar atividades diferenciadas e adequá-las às necessidades de cada aluno com necessidades educacionais

especiais; além disso, nem sempre a quantidade de alunos em sala de aula favorece essa prática ao educador.

Um dos desafios que os professores enfren-tam em uma turma heterogenia é determinar adaptações curriculares e modificações didáti-cas importantes que permitam aos alunos com necessidades expressivas serem membros ativos da rotina diária da turma11.

Sabemos que, muitas vezes, o educador não está emocionalmente preparado para lidar com esse tipo de situação. A ansiedade e a rejeição que muitos professores manifestam diante da integração, em aulas de alunos com necessida-des educacionais especiais, estão estreitamente relacionadas, na maioria das vezes, com a falta de preparo e informação e com a inexistência da experiência12.

Diante de um aluno com deficiência na classe regular uma das reações comuns da parte do professor é afirmar que não está preparado para trabalhar com ele ou com outros educandos que apresentam uma necessidade educativa espe-cial. De igual modo, ainda persistem algumas atitudes que expressam medo, pois o aluno dife-rente representa ameaça, o que conduz, muitas vezes, à fuga do problema, por meio de alguns mecanismos de defesa, tais como o abandono (através do não investimento do tempo, atenção, cuidado, dedicação a esse aluno no ambiente escolar, seja nas atividades pedagógicas, cultu-rais, de lazer, de recreação, entre outras, embora lhe seja garantida a matrícula por força da lei, no ambiente escolar regular); a superproteção (que impede o aluno de crescer, de avançar na sua aprendizagem e socialização) e a negação, que se expressa por meio da atenuação, com-pensação e simulação13.

A atuação consciente e compromissada do educador é determinante no desenvolvimento dos alunos. A rotulação causa impactos, dimi-nuindo as expectativas frente aos alunos e limi-tando as suas oportunidades de aprendizagem14. Em todo processo educativo, a competência pro-fissional dos professores, sua capacidade para planejar situações de aprendizagem, realizar

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processos de adaptação do currículo, elaborar pautas de trabalho em equipe, etc., adquire uma grande relevância, que nos parece decisiva para o êxito ou para o fracasso de tal processo12.

O profissional da educação que atende um aluno com necessidades educacionais especiais deve evitar colocar a deficiência como foco das suas atenções para que não limite suas opor-tunidades de ação, ao mesmo tempo, precisa levá-las em consideração na hora de planejar suas atividades.

De acordo com o Referencial Curricular Na-cional para a Educação Infantil (1998) é compe-tência do professor a tarefa de individualização das situações de aprendizagem oferecidas às crianças, considerando as suas capacidades afetivas, emocionais, sociais e cognitivas. Nessa perspectiva, não se deve estigmatizar as crian-ças pelo que diferem, mas levar em conside-ração as suas singularidades, respeitando-as e valorizando-as como fator de enriquecimento pessoal e cultural.

A formação continuada possibilita diminui-ção da ansiedade e da insegurança nos profes-sores e gestores educacionais, uma vez que se tornam potenciais multiplicadores, formando e informando os demais alunos, pais e/ou respon-sáveis, bem como toda a comunidade escolar15.

Ações independentes dificilmente vão pos-sibilitar a inclusão efetiva do aluno com neces-sidades educacionais especiais, mas, com toda certeza, contribuíram para sua acolhida e aos poucos modificarão as atitudes dos educadores.

A inclusão no ensino regular do aluno defi-ciente auditivo, que pertence às classes média e alta da sociedade, vem ocorrendo com maior frequência, mesmo em um período que ante-cedeu a todas essas discussões. É provável que isso ocorra devido às condições às quais esse aluno deficiente auditivo foi exposto, durante seu desenvolvimento, com maior acesso a um dispositivo de amplificação sonora adequado às características da perda auditiva e ao trabalho conjunto entre especialistas, familiares e educa-dores, que são fundamentais para o sucesso do seu desenvolvimento e aprendizagem16.

As consequências que as limitações biológi-cas do indivíduo podem acarretar dependerão da idade em que a deficiência foi detectada, do tipo e grau da perda auditiva, do tempo de uso do recurso tecnológico, da reabilitação, do desenvolvimento linguístico, do empenho e participação familiar nesse processo, entre vários outros.

As crianças com perda de audição natural-mente não têm a mesma estimulação auditiva que aquelas ouvintes. O vocabulário se apre-sentará reduzido e seu próprio conhecimento do mundo pode ser limitado. Ao chegar à escola não terá vivenciado as mesmas situações que os demais colegas podendo se evidenciar um comprometimento linguístico e cognitivo.

Durante a comunicação com a criança defi-ciente auditiva é fundamental permanecer no seu campo visual e lembrar que as mensagens faciais e corporais estão sendo captadas constantemente. A receptividade – expressa pela atenção, sorriso, carinho e brincadeiras que os pais fazem com seus filhos – é que transmitem as primeiras impressões de sua importância. É o grau de receptividade demonstrado que irá traçar para ela o caminho para uma auto-estima elevada17.

Numa entrevista, realizada com uma profes-sora de alunos surdos, formada em educação especial, na área de deficiência auditiva, em relação à abordagem de problemas na atuação com esses alunos, ela referiu-se a uma diver-sidade de temas: limitação de sua própria for-mação profissional, obstáculos para integração do surdo na sociedade, falta de colaboração da família no processo escolar e condições institu-cionais para o trabalho pedagógico (recursos materiais insuficientes, instabilidade na atribui-ção de classes, tempo reduzido de aulas, etc.)18.

O professor deve ser orientado que, devido às barreiras de acesso aos estímulos sonoros, a criança deficiente auditiva é extremamente prejudicada, em especial, nos processos de aquisição e desenvolvimento da linguagem e, em consequência no processo de construção de conhecimento, por apresentar dificuldades cognitivas que estão diretamente relacionadas

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ao desenvolvimento da linguagem, e não a de-ficiência auditiva, a qual não acarreta qualquer déficit cognitivo10.

Quando estamos diante de um aluno com deficiência auditiva na sala de aula, podemos lançar mão de algumas estratégias como:• sentá-lopróximoaoprofessor;• nãoposicioná-lodefrenteparaajanelapara

que a leitura orofacial não seja dificultada pela claridade;

• oprofessordeverepetirasinformaçõesqueo aluno não conseguiu captar e individual-mente, se preciso for;

• nãoexigirdoalunoqueexecuteatividadesalgumas vezes fora do seu alcance, como um ditado de palavras isoladas19. Além dos efeitos prejudiciais dos ruídos –

principalmente quando o recurso tecnológico utilizado for o aparelho de amplificação sonora individual –, o número de alunos em sala de aula, a competição sonora, a distância do in-terlocutor e o desconhecimento, por parte do professor, de qual o nível da linguagem oral que este aluno domina também irão interferir no seu processo de aprendizagem.

As pessoas com déficits auditivos enfrentam inúmeros entraves para participar da educa-ção escolar, decorrentes da perda da audição e da forma como se estruturam as propostas educacionais das escolas. Muitos alunos com deficiência auditiva / surdez podem ser prejudi-cados pela falta de estímulos adequados ao seu potencial cognitivo, sócio-afetivo, linguístico e político-cultural e ter perdas consideráveis no desenvolvimento da aprendizagem20.

MÉTODOParticiparam desse estudo 34 professores da

Rede Municipal de Ensino que lecionam para alunos deficientes auditivos matriculados desde o maternal até a Educação de Jovens e Adultos - EJA, com idades entre 21 e 60 anos, sendo um do sexo masculino e 33 do sexo feminino.

Os questionários foram aplicados no Centro de Apoio Psicopedagógico da Secretaria Mu-nicipal da Educação de Marília, no início de

2007 e de 2008, anteriormente à realização de palestras anuais, organizadas pela profissional do setor de Fonoaudiologia, que tinham por finalidade discutir aspectos específicos sobre a deficiência auditiva.

A base metodológica adotada utilizou a técnica de pesquisa qualitativa de caráter ex-ploratório: “... uma atividade que coloca o ob-servador no mundo. Consiste em um conjunto de práticas interpretativas que tornam o mundo visível e o representam através de entrevistas, conversas, fotografias e recordações, envolven-do uma abordagem interpretativa e naturalista do mesmo”21.

Tendo em vista que o método qualitativo exploratório não deve ser completamente desestruturado, devendo conter questões que levem a um objetivo específico, o levantamento de dados foi realizado por meio da aplicação de questionário, com perguntas dirigidas. É um procedimento útil para pesquisas exploratórias e tem como vantagens o conhecimento direto da realidade, quantificação, economia e rapidez22.

O questionário continha três questões de múltipla escolha e nove com opções de sim ou não, sendo duas dessas acompanhadas de respostas dissertativas (Quadro 1). As mesmas foram elaboradas a partir da análise teórica de aspectos pertinentes à inclusão do aluno com perda auditiva.

O protocolo foi entregue a cada um dos parti-cipantes, aos quais foi solicitado que respondes-sem fidedignamente. Não houve delimitação de tempo para devolução. A pesquisadora manteve-se na sala durante todo o processo, para garantir a individualidade das respostas.

RESULTADOS E DISCUSSÃOEntre os 34 participantes deste estudo, 23

não têm habilitação alguma. Dentre os habilita-dos, encontramos as seguintes áreas: supervisão escolar (1); deficiência auditiva (4); deficiência mental (3); administração (1); educação infantil (1) e deficiência auditiva e educação infantil (1).

Catorze desses professores nunca tiveram alunos incluídos, 13 deles já tinham lecionado

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Quadro 1 – Questionário aplicado nos professores

1. O que você sentiu ao saber que lecionaria para um deficiente auditivo?

o medo de não saber como lidar com o aluno.

o animado (a) com o novo desafio.

o preocupado (a) em como passar o pedagógico.

o não tive nenhuma sensação diferente.

2. Você tem algum conhecimento sobre Deficiência Auditiva?

o não.

o Sim, aprendi na habilitação.

o Sim, ao me deparar com essa nova situação eu mesma busquei mais informações.

o Sim, fui orientada por uma fonoaudióloga.

3. Como o (a) seu (sua) aluno (a) é em sala de aula?

o Corresponde às atividades propostas.

o Apresenta alguma dificuldade, mas acompanha a classe.

o Não consegue acompanhar a classe.

o Apesar de não acompanhar a classe tem apresentado progressos desde o início do ano.

4. Você sabe manusear um Aparelho Auditivo?

o Sim o Não

5. Você sabe a diferença entre Implante Coclear e Aparelho Auditivo? Se sim, qual é?

o Sim o Não

6. Seu (sua) aluno (a) usa Libras?

o Sim o Não

7. Você sabe Libras?

o Sim o Não

8. Seu (sua) aluno (a) frequenta sala de recursos?

o Sim o Não

9. Você tem contato com as professoras que o atendem na sala de recursos?

o Sim o Não

10. Já tinha tido contato com algum deficiente auditivo?

o Sim o Não

11. Você acha que esses encontros para capacitação de professores são importantes?

o Sim o Não Por que?

12. Teria interesse em participar de um segundo encontro (no 2º semestre) onde o tema seria mais aprofundado?

o Sim o Não

Seno MP

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para deficientes auditivos e 7, para alunos com outros tipos de deficiência.

Quando questionados sobre o que sentiram ao saber que teriam um aluno deficiente audi-tivo na sala de aula:• 54% caracterizaram-se preocupados em

atuar profissionalmente com esse aluno;• 28%referiramsentirem-seanimadoscomo

novo desafio;• 15% assinalaram que não sentiram nada

diferente;• 3% responderam preocupados em atuar

profissionalmente com esse aluno, porém animados com o novo desafio.Pudemos observar que a maioria dos par-

ticipantes demonstrou preocupação em atuar com esse aluno. O despreparo do professor ao receber uma criança com deficiência é um dos fatores mais relevantes na inclusão.

O medo, a insegurança, a ansiedade e a angústia são sentimentos naturais que geral-mente acompanham o docente quando precisa se adaptar a essa nova situação, pois os profes-sores, em sua grande maioria, não tiveram em sua formação acadêmica preparo suficiente para atuar e avaliar o desempenho acadêmico de seu aluno deficiente auditivo.

A questão da formação ou do acompanha-mento do professor que trabalha com alunos com necessidades educacionais especiais tem se revelado pertinente e atual. Um aspecto a ser destacado é a possibilidade das dúvidas e “mitos” relacionados à perda de audição criarem resistência e insegurança destes pro-fessores que não se sentem preparados para estabelecerem uma relação, muitas vezes de comunicação, que permeia o processo de en-sino e da aprendizagem23.

Em relação ao conhecimento anterior sobre deficiência auditiva:• 45%assinalaramnãoterconhecimentoalgum;• 26% relataram ter ido buscar informações

diante da nova situação;• 12%disseramjáostrazerdahabilitação;• 12%referiramjáteremrecebidoorientações

de uma fonoaudióloga;

• 6% assinalaram trazê-los da habilitação etê-los recebido de uma fonoaudióloga.Diante das respostas acima é possível confir-

marmos a falta de conhecimento específico do docente para lidar com alunos que apresentam necessidades educacionais especiais, em con-trapartida, a Lei de Diretrizes e Bases da Edu-cação Nacional (1996) afirma que os sistemas de ensino devem assegurar a estes alunos cur-rículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específica para atender às suas necessidades (art. 59, inciso I).

Como é possível pregarmos a inclusão se o sistema não oferece o apoio mínimo para que ela seja efetivada? Além de tudo, o professor acaba sendo responsabilizado pelo fracasso do aluno e se culpa pela falta de preparo.

É fundamental sentir se há disponibilidade da escola e principalmente do professor para receber a criança deficiente auditiva e trabalhar de forma necessária e adequada seu problema, procurando proporcionar seu desenvolvimento. O professor deve estar ciente de que a obtenção de sucesso na educação especial depende, em grande parte, da compreensão que tenha do significado de sua atuação19.

Sobre o desenvolvimento do aluno em sala de aula:• 41%disseramqueestesapresentamalguma

dificuldade, porém acompanham a classe;• 24%relataramqueosalunosdeficientesau-

ditivos incluídos correspondem às atividades propostas;

• 21%assinalaramque,apesardenãoteremacompanhado a classe, apresentaram pro-gressos desde o início do ano;

• 15% afirmaram que os alunos incluídos não acompanham os demais.Observamos que, segundo as professoras,

mais de 50% dos alunos com perda auditivaincluídos apresentam algum tipo de dificuldade para acompanhar os colegas de sala de aula.

As crianças que escutam normalmente ini-ciam o aprendizado da escrita de forma natural, já que têm bem desenvolvido o código oral. Desde o seu nascimento, conversas, diálogos,

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piadas e histórias fizeram parte do seu cotidiano e, consequentemente, ocorre o desenvolvimento da fala e da linguagem com a incorporação de novas palavras ao seu vocabulário, compre-ensão de fatos que a cercam, interpretação de palavras com duplo sentido, etc. As pessoas com perdas auditivas estão privadas dessas situações e obviamente a falta de domínio do código oral irá interferir significativamente na aquisição da escrita.

É importante que o docente tenha conhe-cimento das estratégias que pode lançar mão para facilitar o desenvolvimento e progresso do aluno com perda auditiva. A partir do momento que compreende as necessidades específicas que os indivíduos apresentam, dependendo do grau do seu comprometimento, poderá aplicar recursos específicos para cada situação. Sua atuação correta é essencial nesse contexto, pois influenciará o ambiente e adequará as situações visando aproveitar ao máximo o potencial da criança incluída.

Ao serem questionados sobre o manuseio do aparelho de amplificação sonora individual – AASI:• 80%responderamnãosabermanuseá-lo;• 20%consideram-seaptosamanuseá-lo.

É extremamente importante que o professor conheça os mecanismos gerais, tanto do apare-lho de amplificação sonora individual – AASI como do implante coclear – IC, para que saiba como agir em determinadas situações.

Algumas intercorrências, como, por exem-plo, a retroalimentação acústica dos AASIs, podem ser minimizadas pela simples inserção correta do molde no ouvido, aspecto que pode ser monitorado com facilidade por qualquer adulto24.

Quanto às diferenças entre o implante coclear e o aparelho de amplificação sonora individual:• 71%referiramdesconhecê-las;• 29%disseramteressainformação,descre-

vendo dados como a diferente localização do implante coclear ou do aparelho de am-plificação sonora individual, o ato cirúrgico

do implante coclear e a possibilidade do desenvolvimento da comunicação oral com o implante coclear.A diversificação dos momentos e das estra-

tégias de ensino-aprendizagem para o mesmo conteúdo e na mesma sala de aula, de maneira oportuna e adequada é essencial para o sucesso da aprendizagem dos alunos25.

Quando não entende os mecanismos da am-plificação sonora do aparelho de amplificação sonora individual e do implante coclear fica difícil modificar a atuação ou incluir estratégias diferenciadas que auxiliem a comunicação e facilitem o processo ensino-aprendizagem.

A postura do professor em sala de aula e a forma como lida com as dificuldades apresen-tadas pelos alunos tanto pode auxiliá-los como pode desmotivá-los. No caso dos alunos com perdas auditivas, quanto mais o professor inse-rir o aprendiz na situação em que se enquadra a atividade proposta, quanto mais contextos linguísticos e situações extralinguísticas forem ao aprendiz apresentados, melhor será o re-sultado26.

Com relação à Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, dentre os professores entrevistados:• 18%referiramqueseusalunosfazemusoda

LIBRASe82%onegaram;• 9%disseramconhecê-lacontraoutros91%

que não sabem usá-la.Desses18%dealunosqueusamLIBRAS,

apenas2%têmprofessorasqueentendemessaLíngua; mas a maioria deles utiliza também a oralidade como forma de comunicação.

Notamos que nem todos os professores que lecionam para alunos com perda auditiva que se comunicam por meio da LIBRAS sabem utilizá-la. A dificuldade de comunicação in-terfere diretamente no aprendizado e priva o aluno de informações importantes para o seu desenvolvimento e aprendizagem.

No processo da inclusão é previsto que a escola ofereça as mesmas condições de desen-volvimento para todos os alunos, independente-mente das necessidades educacionais especiais que apresentem.

Seno MP

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A metodologia de alfabetização precisa estar de acordo com as características linguísticas da criança. Assim, se o aluno utiliza a língua oral de forma satisfatória, dominando a narrativa, a consciência fonológica tem vocabulário e conhecimento de mundo compatíveis com a idade, poderá ser exposto a metodologias de alfabetização utilizadas para crianças ouvintes falantes do mesmo idioma. Se, além de utilizar a língua oral, a criança for falante de língua de sinais, poderão ser acrescidas estratégias dessa língua para facilitar o processo de alfabetização. Se a criança se comunicar apenas por LIBRAS, a metodologia utilizada será, necessariamente, bastante diferente daquela utilizada com crian-ças ouvintes: as aulas deverão ser, obviamente, ministradas na língua que a criança domina e as estratégias para a criança compreender (leitura) e, posteriormente, produzir (escrita) a língua escrita precisam ser conhecidas e dominadas por seus professores27.

Com referência à sala de recursos:• 50% responderam que seus alunos a fre-

quentamcomoapoioescolar.Destes,23%relataram que mantém contato sistemático com os professores dessas salas;

• 50%assinalaramqueseusalunosnãoafre-quentam. Há um tempo não muito distante, os alunos

com perdas auditivas eram matriculados nas salas de aula especiais onde se aglomeravam crianças de diferentes idades que permaneciam ali durante anos, convivendo com os mesmos colegas, enquanto o sistema acreditava que essa era a melhor oportunidade que podiam promover para o seu progresso.

Com a chegada do processo de inclusão, as salas de recurso passaram a funcionar como um apoio a esses alunos que apresentam dificul-dades para acompanhar a sala de aula regular devido às suas limitações, no caso, uma altera-ção sensorial.

Numa pesquisa realizada com profissionais que desenvolviam, em sua maioria, ativida-de docente verificou-se que os participantes acreditam que a partir do momento que há um

trabalho pedagógico sério e integrado, realizado por profissionais comprometidos com uma edu-cação de qualidade para todos, haverá também a preocupação com: a adaptação curricular com base nas especificidades dos alunos; a valori-zação de suas potencialidades; o estímulo a valores como a cooperação e o respeito às dife-renças, considerados fundamentais no processo de ensino-aprendizagem28. A parceria entre escola, família e profissionais especializados é indispensável para que, em conjunto, haja um trabalho reflexivo que proporcione desenvolvi-mento satisfatório ao indivíduo.

Entreosparticipantes,68%játinhamtidoalgum tipo de contato com pessoas deficientes auditivase32%nuncaotinhamtidoanterior-mente.

As estratégias facilitadoras para a comuni-cação com um deficiente auditivo / surdo são recursos importantes no momento da interação.

Ao pesquisar o número de professores que já tinha tido algum contato com um deficiente auditivo, objetivávamos ter conhecimento de quantos deles já tinham vivenciado essa di-ficuldade de ser compreendido e de se fazer entender. Como observamos, a maioria referiu já ter passado por essa situação.

A distância e a posição que o professor fica em relação ao aluno interferem de forma sig-nificativa na sua compreensão. A pista visual é muito importante e auxilia a criança a entender o conteúdo que está sendo trabalhado. Nos usuários de aparelho de amplificação sonora individual, da mesma forma que os sons da fala são amplificados, o ruído também é; portanto, ações como colocação de feltros nos pés das mesas e cadeiras, presença de vasos e varais dentro da classe auxiliam na sua diminuição, reduzindo a reverberação.

Na sala de aula, conforme a posição em que o professor permanece em relação ao aluno deficiente auditivo, este poderá estar ouvindo apenas ruídos ambientais, isto é, se entre esse aluno e o professor se interpuserem outros alu-nos conversando, carteira sendo arrastada ou papel sendo amassado, esses sons chegarão ao

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ouvido do aluno surdo, mascarando a voz do professor.

Quando questionados sobre seu interesse em participarem de outras palestras como a que se-ria realizada pela fonoaudióloga posteriormente àentregadosquestionários,94%responderamafirmativamentee6%apontaramdesinteresse.

As respostas afirmativas estavam relacio-nadas às necessidades de um trabalho em equipe, trocas de experiência, sugestões de procedimentos e metodologias e obtenção de informações específicas para serem utilizadas na prática pedagógica.

Observamos que a maioria dos participantes responde afirmativamente a reuniões que pro-piciem discussões, nas quais possam sanar suas dúvidas, diminuir suas angústias, apresentarem casos e receberem orientações de profissionais habilitados.

CONCLUSÃOO despreparo da maioria dos professores em

receber um aluno deficiente é evidente. A situ-ação provoca reações diversas que questionam tanto a disponibilidade física (estrutural e am-biental) e educacional (curricular e humana) da escola em atendê-los como os próprios valores pessoais e individuais dos educadores, que leva o indivíduo a perceber por si só que não está preparado para enfrentar esse tipo de condição.

O aluno com perda auditiva, assim como os demais que apresentam necessidades educa-cionais especiais, sentem na pele as falhas do sistema. Na escola são depositados e com muita sorte podem encontrar um docente sensibiliza-do, responsável e comprometido que busque por ele mesmo preencher as lacunas apresentadas por esse processo – que ocorrem desde o mo-mento de sua formação acadêmica.

A partir do momento em que os educadores têm consciência da sua importância no processo da inclusão e como algumas atitudes simples podem auxiliar o desenvolvimento desse aluno, passam a agir como agentes multiplicadores, repassando informações, buscando apoio e intervindo com maior propriedade.

O trabalho de formação continuada possibi-lita diminuição da ansiedade e da insegurança dos professores e gestores educacionais no que tange à inclusão dos alunos surdos/ deficientes auditivos, uma vez que esses se tornam poten-ciais multiplicadores, formando e informando os demais alunos, pais e/ou responsáveis, bem como toda a comunidade escolar15.

Com base nos resultados desse estudo, concluímos que a maioria dos professores des-conhece informações básicas que podem ser fundamentais para o bom desenvolvimento do aluno com perda auditiva incluído na sala de aula regular.

Seno MP

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SUMMARYInclusion of students with hearing loss in the Municipal Schools in

the city of Marília

Introduction: Currently, integration is a subject frequently discussed and controversial. While that is imposed by the educational system, this doesn’t provide the minimum structure for this process to be truly effec-tive. Experiencing this mismatch, are teachers and students with special educational needs. These, off handing being served and those needing to get itself resolutions to the difficulties encountered during the journey. Methods: The goal of this study was to investigate the knowledge of 34 teachers of municipal schools in the city of Marilia who teach students with hearing loss through self-administered questionnaire that surveyed data and the feelings of teachers to receive the news that will have a disabled child hearing/deaf included, information they already have about disability, the child’s individual development, the technological resources available, the field of Brazilian Sign Language and the importance of getting information about the specific issues arising from the hearing loss. Results: After data analysis was possible to prove the necessity and importance of specialist support for the performance of teachers, who mostly know basic information that can be considered essential for the proper development of the student.

KEY WORDS: Hearing loss. Impairment. Deafness. Education, special. Education.

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Trabalho realizado na Secretaria Municipal da

Educação de Marília, Marília, SP.

Artigo recebido: 12/9/2009

Aprovado: 21/11/2009

Rossetti CB et al.

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Introdução: Legítimos depositários da cultura de transmissão oral infantil, as brincadeiras e os jogos têm despertado o interesse de muitos pesquisadores no Brasil e no mundo. Assim, objetiva-se investigar o panorama atual da prática de jogos e brincadeiras em diferentes municípios do estado do Espírito Santo. Método: Foram realizadas 205 observações de atividades lúdicas de crianças com idades aproximadas entre sete e 12 anos, sendo 105 no interior do estado e 100 na Grande Vitória. Além disso, uma parte dessas mesmas crianças respondeu a uma entrevista sobre preferências e práticas lúdicas, perfazendo um total de 20 entrevistas na Grande Vitória e 31 no interior do estado. Os participantes foram observados e entrevistados enquanto brincavam e jogam em locais como ruas, escolas, praças públicas, parques, praias e casas. As brincadeiras e os jogos foram fotografados com o fim de registro dos mesmos. Resultados: Os jogos e brincadeiras mais observados tanto na Grande Vitória quanto no interior foram as modalidades de futebol. Do total de participantes das entrevistas, 27 eram meninos e 24, meninas. O futebol aparece como atividade lúdica preferida de 66,7% dos meninos, enquanto a boneca foi mencionada por 25% das meninas. O pique foi preferido como brincadeira de ambos os sexos. Conclusão: Observou-se uma coexistência bastante frequente entre as brincadeiras e jogos tradicionais e diversas atividades lúdicas que envolvem o uso de novas tecnologias, como os computadores, o que parece contribuir para desmistificar a ideia vigente de que as crianças de hoje não praticam mais brincadeiras e jogos tradicionais como as de antigamente.

UNITERMOS: Jogos e brinquedos. Recreação. Criança. Desenvolvimento infantil.

inventáRio das BRinCadeiRas e jogos de CRianças em difeRentes muniCípios do estado

do espíRito santo

Claudia Broetto Rossetti; Taísa Rodrigues Smarssaro; Tatiana Lecco Pessotti

Claudia Broetto Rossetti – Professora Adjunta do

Departamento de Psicologia Social e do Desenvolvimento

e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da

Universidade Federal do Espírito Santo.

Taísa Rodrigues Smarssaro & Tatiana Lecco Pessotti –

Alunas do curso de Psicologia da Universidade Federal do

Espírito Santo. Bolsistas de Iniciação Científica da Fundação

de Apoio à Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (FAPES).

Correspondência

Claudia Broetto Rossetti

Universidade Federal do Espírito Santo

Programa de Pós-Graduação em Psicologia

Av. Fernando Ferrari, 514 – CEMUNI VI – Goiabeiras

– Vitória, ES, Brasil – CEP 29075-910

E-mail: [email protected]

inventáRio das BRinCadeiRas e jogos de CRianças

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INTRODUÇÃOEstudar as brincadeiras e os jogos, tradicio-

nais ou não, que continuam sendo praticados ainda hoje por crianças do estado do Espírito Santo parece relevante de pelo menos duas maneiras. Primeiro, pela possibilidade de en-tender o passado, tendo em vista tratar-se de um estado cuja história registra um forte fluxo migratório, com grande influência das culturas indígena, e, principalmente, de imigrantes de diversas partes do mundo que, junto com suas tradições culturais, trouxeram também uma maneira específica de brincar e jogar.

Em segundo lugar, há a possibilidade de planejar o futuro, sobretudo em termos de inter-venções no nível da cultura e da educação, que garantam que, a despeito do advento de toda tecnologia e modernidade, as crianças capixa-bas possam conhecer e praticar os mais diversos jogos e brincadeiras de ontem e de hoje.

Legítimos depositários da cultura de trans-missão oral infantil, as brincadeiras e os jogos tradicionais têm atravessado os séculos, sobre-vivendo a todas as mudanças econômicas e sociais ocorridas ao longo do tempo. De fato, várias pesquisas no mundo1-4 têm demonstrado a importância de jogar e brincar para o desen-volvimento de aspectos afetivos, cognitivos, sociomotores e culturais de crianças e adoles-centes.

Atualmente, no Brasil, há várias pesquisas que registram o brincar e o jogar de crianças e adolescentes nos mais diversos cantos do país5,6. Os referidos autores destacam que um aspecto fundamental nos estudos da área é a compreensão de que o brinquedo é um objeto que possui, além de sua função utilitária nas brincadeiras, um aspecto simbólico carregado de significações específicas. Essas significa-ções remetem a traços sociais que adquirem expressividade dentro do seu universo cultu-ral. Cada sociedade produz um conjunto de significados que não constitui apenas uma replicação de objetos, mas uma expressão de imagens dotadas de significados que traduzem traços culturais peculiares a uma

sociedade. No entanto, diferentes culturas produzem distintos brinquedos e jogos que, ao serem passados de geração a geração, levam consigo seus valores culturais7.

É interessante notar que o grupo de companheiros de brinquedo e jogo é uma microsociedade, na qual se constituem redes de relações, cujos papéis são atribuídos di-namicamente no desenrolar das interações, e conhecimentos, regras e procedimentos são continuamente trocados, reformulados, criados e repassados.

Dessa maneira, o estudo das brincadeiras e dos jogos é importante não só para compreen-der as interações infantis, mas também como uma estratégia de investigação sobre o com-portamento dos adultos de uma sociedade. De fato, estudos acerca das questões de gênero (tipificação, segregação, estereotipia) em brin-cadeiras e jogos infantis mostram que, desde muito pequenas, as crianças estão atentas ao fato de que homens e mulheres desempenham papéis diferentes na sociedade e manifestam o entendimento que possuem sobre eles em suas atividades lúdicas8-10.

Outro fato interessante é que a organização familiar, as condições de vida e os meios de subsistência influenciam diretamente as ativi-dades lúdicas das crianças. Assim, é possível chamar de “zona lúdica” o espaço em que ocorre o brincar e o jogar, constituído pelos seguintes elementos: o espaço físico propria-mente dito, com suas dimensões e conteúdo, o espaço temporal, com o tempo dedicado à brincadeira, bem como experiências, recursos, motivações, pressões e condições sociais que cercam esse espaço11.

Além disso, é necessário ressaltar que apesar de serem encontradas várias pesquisas brasileiras recentes sobre aspectos diversos relacionados à prática de brincadeiras e jo-gos11-19, no Espírito Santo, até onde foi pos-sível levantar, não há registros de pesquisas em tais moldes na área, o que aponta para a originalidade e a relevância da proposta do presente estudo.

Rossetti CB et al.

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MÉTODO

ParticipantesForam realizadas 205 observações de ati-

vidades lúdicas de crianças com idades apro-ximadas entre sete e 12 anos, sendo 105 no interior do estado e 100 na Região Metropoli-tana da Grande Vitória (RMGV). Além disso, uma parte dessas mesmas crianças respondeu a uma entrevista sobre preferências e práticas lúdicas, perfazendo um total de 20 entrevistas na Grande Vitória e 31 no interior do estado, conforme apresentado na Tabela 1.

Instrumentos e procedimentosForam utilizados dois diferentes instrumen-

tos de coletas de dados. No caso das observa-ções realizadas, foi empregado um protocolo de observação do brincar e do jogar, onde eram registrados todos os dados possíveis sobre os participantes, o local e a atividade lúdica obser-vada. No caso das entrevistas, foi utilizado um roteiro de entrevista semi-estruturado sobre as preferências e práticas lúdicas dos participan-tes, contendo 10 questões abertas e fechadas.

Os participantes foram observados e entrevis-tados enquanto brincavam e jogavam em locais

como ruas, escolas, praças públicas, parques, praias, casas e igrejas. As brincadeiras e os jogos foram fotografados com a finalidade de registro dos mesmos. As entrevistas foram gravadas para facilitar a posterior transcrição das mesmas.

RESULTADOS E DISCUSSÃOÉ importante ressaltar que muitas das ativi-

dades lúdicas observadas envolveram a parti-cipação de duas ou mais crianças, de maneira que o total de crianças observadas brincando e jogando foi de aproximadamente 447 no interior do estado, sendo 264 meninos e 183 meninas. Destas, 91 possuíam adultos (geralmente a mãe ou a avó) observando-as e 356 não possuíam. Já na Grande Vitória, 298 crianças foram observa-das, sendo 155 meninos e 143 meninas. Destas, 222 possuíam adultos observando-as e somente 76 não possuíam.

A discrepância entre o número de crianças que foram observadas brincando sozinhas na Grande Vitória e no interior do estado provavel-mente se deve ao fato de que, principalmente na capital, as crianças não têm mais o costume de brincar na rua. De fato, brincadeiras e jogos passaram a ocorrer preferencialmente em par-ques da cidade, em praças e em clubes ou play-grounds dos prédios em que vivem. No interior, pelo fato das ruas serem menos movimentadas, as crianças têm mais liberdade para brincar, por encontrarem menos riscos a sua volta. Assim, provavelmente não precisam de tanta atenção dos adultos para levá-las a lugares específicos para brincar ou jogar. Entretanto, as pesquisa-doras puderam presenciar, no caso do interior do estado, alguns momentos em que houve perigo real para as crianças durante as atividades lúdi-cas e não havia adultos para alertá-las quanto a isso, como, por exemplo, soltar pipa perto de fiação elétrica e utilização de facas de verdade para fazer “comidinha”.

ObservaçõesFoi possível observar 62 jogos e brincadeiras

diferentes no Espírito Santo, sendo 44 delas no

Tabela 1 – Resumo das observações e entrevistas realizadas.

Município Observações Entrevistas

Grande Vitória 100 20

Alfredo Chaves 21 6

Aracruz 17 __

Cachoeiro de Itapemirim

7 7

Castelo 20 8

Conceição da Barra

18 __

São Mateus 22 10

Total 205 51

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interior do estado e 42 na Grande Vitória. As atividades lúdicas mais presentes no interior do estado foram modalidades diversas de fute-bol (travinha, futebol clássico, driblinho, etc), andar de bicicleta, brincar de carrinho, soltar pipa, pique-pega e modalidades de vôlei (vôlei clássico, três toques, corte, etc), como pode ser observado na Tabela 2.

Por outro lado, as atividades lúdicas mais presentes na Região Metropolitana da Grande Vitória são diferentes modalidades de futebol, balançar em balanços de parquinhos, pique-pega, brincar com areia na praia e modalidades de vôlei (Tabela 3).

É interessante notar que, tanto na Região Metropolitana da Grande Vitória como no in-terior, as modalidades de futebol se mostraram mais presentes. Entretanto, muitas foram as brincadeiras observadas no interior que não apareceram na capital, como basquete, bola de gude, brincadeiras de mão, brincadeiras com água, elefante colorido, jogo da velha, patinete, patins, queimada, varetas, dentre outras. Da mesma maneira, algumas brincadeiras só fo-ram observadas na capital, como, por exemplo, amarelinha, gaiola, passar anel, roda-roda, tirar foto, trepa-trepa e brincar com areia na praia.

Tabela 2 – Brincadeiras observadas no interior do estado do Espírito Santo.

Brincadeiras Frequência

Modalidades de futebol 14

Piques 13

Bicicleta 6

Carrinho 6

Barbie e bonecas 5

Pipa 5

Modalidades de vôlei 5

Outros 51

Total 105

Tabela 3 – Brincadeiras observadas na Região Metropolitana da Grande Vitória.

Brincadeiras Frequência

Modalidades de futebol 15

Balanço 12

Piques 11

Brincar com areia na praia

5

Modalidades de vôlei 5

Modalidades de surf 4

Gangorra 4

Trepa-trepa 4

Outros 40

Total 100

As brincadeiras e jogos observados com maior frequência foram agrupados segundo a classificação proposta por Piaget1 em ativida-des com predomínio de estruturas de exercício (entre o nascimento e aproximadamente dois anos), de símbolos (entre aproximadamente dois e sete anos) e de regras (a partir de, apro-ximadamente, sete anos), conforme pode ser observado na Tabela 4.

Assim, constata-se que a maior parte das atividades observadas foram classificadas como jogos de regras. Considerando o nível de desenvolvimento cognitivo estimado para a faixa etária dos participantes, os dados vão ao encontro do que propõe Piaget1, ou seja, que haja um predomínio da prática de jogos de regras a partir do estágio de desenvolvimento operatório concreto.

Muitos fatos interessantes foram registrados durante a primeira etapa da coleta de dados, como os diferentes materiais empregados na confecção de brinquedos e os diversos usos de objetos para facilitar brincadeiras e jogos. Não foi incomum a utilização de garrafas PET como bola no jogo de futebol, assim como para

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a produção de panelinhas para brincar de “comidinha”. Objetos lúdicos também foram usados para outros fins, como bolas de futebol utilizadas para jogar vôlei.

Outro fato interessante foram os relatos das crianças sobre as melhores épocas e horários para determinadas brincadeiras acontecerem. Por exemplo, costuma-se brincar de pique-esconde durante o período noturno, pois a escuridão difi-culta encontrar as pessoas escondidas, tornando a brincadeira mais emocionante e prazerosa. Além disso, foram encontradas diversas variações para nomes de brincadeiras, como boleba (referente à bola de gude), pique-gelo (pique-cola) e alerta colorido (elefante colorido), dentre outras.

EntrevistasObjetivando melhor compreensão das pre-

ferências lúdicas dos participantes, além das observações, foram realizadas entrevistas com crianças entre sete e 12 anos. Assim, realizaram-se 51 entrevistas, sendo 20 na Região Metropo-litana da Grande Vitória, e 31 nos municípios do

interior (Cachoeiro do Itapemirim, Castelo, São Mateus e Alfredo Chaves), perfazendo 25,5% do total de observações.

Dentre as 51 crianças entrevistadas, 27 eram meninos e 24, meninas. As entrevistas ocorre-ram nos espaços lúdicos usuais das crianças, em sua maioria em parques municipais e dos bairros, e em ruas.

Perguntou-se às crianças qual era sua brin-cadeira/jogo preferido, e 66,7% dos meninos en-trevistados afirmaram ser o futebol, confirman-do assim que, tanto na Região Metropolitana da Grande Vitória quanto no interior do Espírito Santo, o futebol é a brincadeira mais popular entre os meninos. Outros jogos/brincadeiras indicados apenas por meninos foram carrinho, basquete e faz de conta de Super Herói, com uma citação cada.

No caso das meninas, a atividade lúdica preferida é brincadeira com boneca (25,0%), seguida pela queimada (20,8%), pular corda e fazer comidinha, cada uma com uma citação. Por fim, 16 jogos/brincadeiras foram mencio-nados como prediletos por crianças de ambos os sexos: piques (12 citações), bicicleta e video-game (duas citações cada), sendo que os piques foram mais lembrados pelos participantes do interior do Estado.

Perguntou-se também aos participantes so-bre quais outros jogos e brincadeiras, além dos seus preferidos, eles costumavam jogar/brincar. Assim, outras atividades lúdicas citadas pelas crianças foram piques dos mais variados, boleba (bolinha de gude), pular corda, ver TV, andar de bicicleta, ficar no computador, amarelinha, vôlei, balançar, futsal, queimada, futebol, pipa, carrinho, guerrinha, cabaninha, boneca, comi-dinha, patins, videogame, parquinho, basquete, piscina, capoeira, bola, caça-fantasma, subir em árvore, escolinha, bambolê, brincadeira da cadeira, brincadeira de roda, cobra-cega, figuras de ação, karatê, elefante-colorido, ma-tar besouro, tiro ao alvo, menina pega menino, corrida, bobinho, dono da rua, handebol, parque de diversões, sete pecados, fazer bijuterias, mês-castigo, desenhar, entre outras.

Tabela 4 – Classificação das brincadeiras e jogos mais observados.

Exercício Símbolo Regra

Balanço (12) Barbie e bonecas (5)

Modalidades de futebol

(29)

Bicicleta (6) Carrinho (6) Piques (24)

Brincar com areia (5)

Modalidades de vôlei (10)

Gangorra (4)

Modalidades de surf (4)

Pipa (5)

Trepa-trepa (4)

Total 40 Total 11 Total 63

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Quando questionados se seu jogo/brincadei-ra predileto seria exclusivamente masculino/feminino ou para ambos os sexos, nove meni-nos disseram ser exclusivos de meninos, sete meninas afirmaram ser exclusivos de meninas e 35 participantes (ou seja, 68,63% do total de entrevistados) disseram ser para os dois igual. É interessante notar que os jogos/brincadeiras realizados em grupo, como os piques e até mesmo o futebol, foram os que tiveram menos separações de gênero.

Em seguida, solicitou-se a cada uma das crianças que explicasse como se jogava/brin-cava o seu jogo/brincadeira predileto. Todos os participantes, independente do sexo, deram explicações detalhadas e interessantes sobre cada uma das atividades lúdicas preferidas, o que parece indicar um bom conhecimento das mesmas. Quando perguntados sobre se seria possível mudar as regras do seu jogo/brinca-deira preferido, a grande maioria dos meninos e meninas (72,4% do total de participantes) disse que não. Nesse caso, o nível de desen-volvimento cognitivo e moral estimado parece ter sido mais importante do que as questões relacionadas ao gênero dos participantes.

Dentre as 51 crianças, 35,3% aprenderam a sua brincadeira predileta com algum de seus familiares (pai, mãe, irmão ou primo), 21,6% aprenderam com amigos, 35,3% aprenderam sozinhos, apenas observando, e 7,8% apren-deram na escola.

Os participantes informaram ainda que utilizam suas casas (quintal, laje, varanda, playground) para brincar/jogar (32 referências), sendo 12 na Região Metropolitana da Grande Vitória e 20 no interior. Houve ainda três refe-rências à escola como espaço lúdico no interior do estado, e 15 referências, sendo oito da Região Metropolitana da Grande Vitória e sete do Inte-rior, a espaços como campos de futebol, ginásios e parquinhos. É importante salientar que, uma mesma criança pode ter indicado mais de um lugar como espaço lúdico.

A respeito de com quem costumam brincar/jogar, os amigos foram citados 38 vezes e os

primos ou irmãos 28 vezes. Os pais foram citados apenas quatro vezes e apenas duas crianças afirmaram brincarem sozinhas. Chama muito a atenção o fato de que os pais são lembrados poucas vezes como companheiros de jogo/brin-cadeira e os professores não foram lembrados uma única vez.

Por fim, foi perguntado aos participantes onde e com quem eles costumavam brincar/jogar. Assim, foi possível inferir que enquanto os meninos brincam/jogam mais com amigos em espaços fora de casa, as meninas brincam/jogam mais em casa, com irmãos ou amigos.

De uma maneira geral, foi possível concluir que há um enfraquecimento da estereotipia sexual, sobretudo na hora da escolha do jogo/brincadeira preferido e que a grande maioria das atividades lúdicas aparece como sendo pra-ticada pelos companheiros presentes, meninas e meninos, nos diferentes espaços disponíveis para os jogos/brincadeiras. No entanto, uma diferença significativa ainda aparece, sobre-tudo nos municípios do interior do estado, no que diz respeito às meninas brincarem/joga-rem mais em casa. Chama atenção também o fato de que mesmo quando brincam/jogam em espaços públicos, as meninas apareceram sempre mais acompanhadas por adultos (em geral, mãe, avós, tias ou irmãs mais velhas) do que os meninos.

Assim, os espaços permitidos para as meni-nas, bem como as maneiras de utilização des-ses espaços para brincar/jogar, ainda parecem bem diferentes, o que, muito provavelmente, tem grande influência em como essas meninas experienciam suas atividades lúdicas.

CONSIDERAÇÕES FINAISDurante os quase 12 meses de coleta de dados

da presente pesquisa, realizou-se uma imersão no universo das práticas lúdicas atuais no estado do Espírito Santo. Pelo menos para o universo de crianças observadas, foi possível constatar que as brincadeiras e jogos estão muito presentes no cotidiano, mesmo quando há algum tipo de restri-ção dos espaços direcionados para tais atividades.

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Entre os muitos aspectos interessantes en-contrados, fica o registro da coexistência bas-tante frequente entre as brincadeiras e jogos tradicionais e diversas atividades lúdicas que envolvem o uso de novas tecnologias, como os computadores, o que parece contribuir para desmistificar a ideia vigente de que as crian-ças de hoje não praticam mais brincadeiras e jogos tradicionais como as de antigamente. Observou-se também predomínio de uso de materiais alternativos (em geral, reciclados) nas mais diversas atividades lúdicas, princi-palmente no interior do estado e nas locali-dades com nível socioeconômico mais baixo.

Por fim, o conjunto das respostas das crian-ças possibilitou inferir que estas têm brincado/jogado muito pouco com os pais e nunca com os professores. Tal constatação deve levar a um necessário questionamento sobre como as famílias e as escolas têm encarado o valor e a relevância da prática de jogos e de brincadeiras para o desenrolar de um processo de desenvol-vimento pleno e integral na infância.

AGRADECIMENTOSÀ Fundação de Apoio à Ciência e Tecnologia

do Espírito Santo (FAPES), pelo financiamento desta pesquisa.

SUMMARYInventory of plays and games of children in different districts of the

State of Espirito Santo

Introduction: The true custodians of the culture of oral transmission of child, play and games have attracted the interest of many researchers in Brazil and around the world. Thus, the goal of this study is to investigate the actual situation of the practice of play and games in different cities in the state of Espirito Santo. Methods: Were carried out 205 observations of play activities of children between seven to 12 years old, 105 in districts of the state and 100 in the capital. In addition, some of these same children answered a survey about play preferences and practices, making a total of 20 interviews in the capital and 31 in the districts. Participants were interviewed and observed while playing in places such as streets, schools, public squares, parks, beaches and homes. Toys and games were photographed in order to record them. Results: The games / plays more observed both in the capital and the interior were soccer. Of all participants of the interviews, 27 were boys and 24, girls. Football appears as favorite recreational activity of 66.7% of boys, while the doll was mentioned by 25% of girls. Pike was preferred as a game of both genders. Conclusion: There was a very frequent coexistence between traditional play and games and various recreational activities that involve the use of new technologies such as computers, which seems to help to demystify the prevailing idea that children today do not practice more traditional games as some decades before.

KEY WORDS: Play and playthings. Recreation. Child. Child development.

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Trabalho realizado na Universidade Federal do

Espírito Santo - Programa de Pós-Graduação em

Psicologia, Vitória, ES. Apoio financeiro: Fundação

de Apoio à Ciência e Tecnologia do Espírito Santo

(FAPES).

Artigo recebido: 25/7/2009

Aprovado: 13/10/2009

Cardoso rKoa & Capellini sa

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Objetivo: Este estudo teve por objetivo verificar a eficácia de um programa de intervenção com a consciência fonológica em escolares com risco para a dislexia. Método: Participaram deste estudo 27 escolares de 1ª série do ensino público municipal da cidade de Marília-SP, de ambos os gêneros, na faixa etária de 7 anos a 7 anos e 11 meses. Em situação de pré e pós-testagem, todos os escolares foram submetidos ao Teste de identificação precoce dos problemas de leitura. Os escolares que apresentaram desempenho inferior a 51% no Teste de identificação precoce dos problemas de leitura foram submetidos à intervenção na consciência fonológica com base nas provas do CONFIAS. Dessa forma, os escolares foram divididos em: GI: composto por 17 escolares não submetidos ao programa de intervenção e GII: composto por 10 escolares submetidos ao programa de intervenção. Resultados: O GI apresentou diferença estatisticamente significante nos subtestes de produção de rima, segmentação fonêmica e leitura de palavras, enquanto o GII apresentou diferença estatisticamente significante nos subtestes de produção de rima, segmentação fonêmica e leitura de palavras. Conclusão: O Teste de identificação precoce dos problemas de leitura elaborado para este estudo demonstrou-se efetivo para a verificação dos sinais da dislexia em escolares, e a realização do programa de intervenção na consciência fonológica foi eficaz para os escolares com sinais da dislexia. Isso se comprovou pela melhora das habilidades cognitivo-linguísticas em situação de pós-testagem em comparação à pré-testagem.

UNITERMOS: Avaliação. Leitura. Dislexia.

efiCáCia do programa de intervenção Com a ConsCiênCia fonológiCa em esColares Com

risCo para a dislexia

Regiane Kobal de Oliveira Alves Cardoso

– Discente do Curso de Fonoaudiologia da

Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade

Estadual Paulista – FFC/UNESP-Marília-SP.

Bolsista do Núcleo de Ensino da FFC/UNESP.

Simone Aparecida Capellini – Fonoaudióloga.

Doutora e Pós-Doutora em Ciências Médicas pela

Faculdade de Ciências Médicas da Universidade

Estadual de Campinas, FCM/UNICAMP-Campinas

– SP. Docente do Departamento de Fonoaudiologia

e Programa de Pós-Graduação em Educação da

Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade

Estadual Paulista –FFC/UNESP-Marília-SP.

Correspondência

Simone Ap. Capellini

Rua Bartolomeu de Gusmão, 10-84 – Jardim

América – Bauru, SP – CEP: 17017-336

E-mail: [email protected]

Regiane Kobal de Oliveira Alves Cardoso; Simone Aparecida Capellini

identifiCação dos sinais de dislexia

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INTRODUÇÃOA dislexia é um distúrbio específico de

aprendizagem de origem neurológica, caracteri-zada pela dificuldade com a fluência correta na leitura e dificuldade na habilidade de decodifi-cação e soletração, resultantes de um déficit no componente fonológico da linguagem1.

Os principais sinais da dislexia podem ser evi-denciados durante o desenvolvimento da crian-ça. Esses sinais se referem: à fala ininteligível; à imaturidade fonológica; à redução de léxico; à dificuldade em aprender o nome das letras ou os sons do alfabeto; à dificuldade para entender instruções, compreender a fala ou material lido; à dificuldade para lembrar números, letras em sequência, questões e direções; à dificuldade para lembrar sentenças ou estórias; ao atraso de fala; à confusão direita-esquerda, embaixo, em cima, frente-atrás (palavras-conceitos); e à dificuldade em processar os sons das palavras2.

Estudos recentes apontam para a necessida-de de realizar intervenção em crianças de séries iniciais de alfabetização que apresentam os sinais descritos3-5. O objetivo desta intervenção é verificar se, após a realização de programas específicos com as habilidades cognitivo-lin-guísticas alteradas, as crianças com sinais de dislexia apresentam melhora na aprendizagem da leitura ou se permanecem com as habili-dades cognitivo-linguísticas alteradas, o que significaria que estas apresentam realmente uma defasagem e que por isso deveriam ser submetidas a avaliações interdisciplinares para a investigação do quadro de dislexia, uma vez que a falta de resposta à intervenção pode ser considerada um critério para este diagnóstico6,7.

Na literatura8, há descrição de estudos que referiram a importância da realização de interven-ções nos primeiros anos escolares em crianças com dificuldades de aprendizagem, pois há evidências de que os problemas iniciais com a fonologia, sinta-xe e semântica não desaparecem completamente depois dos primeiros anos escolares, sem que a criança seja submetida a um programa de interven-ção com enfoque em habilidades de linguagem9.

Apesar de na literatura internacional existi-

rem estudos4-7,10 que descrevam o uso de pro-gramas de remediação fonológica com escolares que apresentam sinais de dislexia, no Brasil, os mesmos ainda são restritos, evidenciando a ne-cessidade de pesquisas que realizem a detecção e a identificação precoce dos sinais de dislexia em fase inicial de alfabetização.

Em decorrência do exposto, o objetivo deste estudo foi verificar a eficácia do programa de intervenção com a consciência fonológica em escolares de risco para a dislexia.

MÉTODOEste trabalho foi submetido ao Comitê de

Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista – CEP/FFC/UNESP/Marília – SP, sob o protocolo número 3349/2008.

Participam deste estudo 27 escolares de 1a série do ensino fundamental municipal, de ambos os gêneros e na faixa etária de 7 anos a 7 anos e 11 meses. Inicialmente, todos os es-colares da 1ª série foram submetidos à mesma metodologia de avaliação, para que, a partir do desempenho intragrupo, os escolares que apre-sentaram desempenho inferior no teste para identificação precoce dos problemas de leitura fossem submetidos ao programa de intervenção com a consciência fonológica. Desta forma, estes escolares foram considerados de risco para a dislexia e distribuídos em pequenos grupos de, no mínimo, 5 e, no máximo, 10 escolares para aplicação dos programas em período contrário ao horário escolar.

Dentre os 27 (100%) escolares submetidos à avaliação para verificação dos sinais de dislexia, 10 (37%) apresentaram desempenho inferior na avaliação, ou seja, apresentaram menos de 51% das respostas no teste para a identificação pre-coce dos problemas de leitura, sendo, portanto, considerados de risco para dislexia. A partir do desempenho nesta avaliação, os escolares foram distribuídos em dois grupos (Tabela 1): • Grupo I (GI): 17escolaresda1ª sérienão

submetidos ao programa de treinamento fonológico;

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• GrupoII(GII):10escolaresda1ªsériesub-metidos ao programa de treinamento fono-lógico.Os escolares que participaram deste estudo

não apresentaram anotações referentes à defi-ciência mental, física, sensorial ou múltipla em prontuário escolar.

uma palavra que terminasse com o mesmo som;

2.2 Identificação de rima: foram apre-sentados ao escolar 20 grupos de três palavras auditivamente e soli-citado que identificasse as palavras que terminassem com o mesmo som;

2.3 Segmentação silábica: foram apre-sentadas ao escolar 21 palavras au-ditivamente (dissílabas, trissílabas e quadrissílabas) e solicitado que as separassem por sílabas;

2.4 Produção de palavras a partir do fonema dado: foram apresentados ao escolar os sons do alfabeto e so-licitado que dissesse uma palavra que começasse com o mesmo som;

2.5 Síntese fonêmica: foram apre-sentadas ao escolar 21 palavras auditivamente separadas por sons e solicitado que dissesse a palavra formada;

2.6 Análise fonêmica: foram apresen-tadas ao escolar 21 palavras audi-tivamente e solicitado que dissesse os sons de cada letra das palavras apresentadas;

2.7 Identificação de som inicial: foram apresentadas ao escolar 21 palavras auditivamente e solicitado que dis-sesse o som inicial da primeira letra de cada palavra apresentada;

3. Memória de trabalho: foram apresentadas ao escolar 24 não-palavras auditivamente e solicitado que repetisse como havia enten-dido;

4. Velocidade de acesso à informação fono-lógica: foram apresentadas ao escolar 7 se-quências intercaladas de desenhos coloridos (carro, bola, pato, casa e chave) e solicitado que realizasse a nomeação rápida;

5. Atenção visual: foram apresentadas ao es-colar 10 figuras coloridas e solicitado que identificasse entre duas palavras a que cor-respondia às figuras;

6. Leitura de palavras e não-palavras: foram

Tabela 1 – Distribuição dos escolares de 1ª série sub-metidos à avaliação para verificação dos sinais

da dislexia, segundo gênero

Grupos Masculino

N (%)

Feminino

N (%)

I 4 (23,5%) 13 (76,5%)

II 3 (36,0%) 7 (64,0%)

Além disso, os escolares foram submetidos aos seguintes procedimentos:•Termo de Consentimento Pós-Informado:

conforme resolução do Conselho Nacional de Saúde CNS 196/96, anteriormente ao início das avaliações, os pais ou responsáveis dos escolares selecionados assinaram o termo de Consentimento Pós-Informado para a autori-zação da realização do estudo;

•Testedeidentificaçãoprecocedosproblemasde leitura: este teste foi elaborado com base em estudo descrito na literatura11 e composto por 7 subtestes, a saber:

1. Conhecimento do alfabeto: foi apresentado ao escolar o alfabeto para que este identi-ficasse o nome da letra e o valor sonoro de cada letra apresentada;

2. Consciência fonológica: composta por sub-testes de produção de rima, identificação de rima, segmentação silábica, produção de palavras a partir do fonema dado, síntese fonêmica, análise fonêmica, identificação de som inicial; 2.1 Produção de rima: foram apresen-

tadas ao escolar 20 palavras auditi-vamente e solicitado que dissesse

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apresentadas ao escolar 40 palavras visu-almente (20 palavras e 20 não-palavras) e solicitado que realizasse a leitura em voz alta;

7. Compreensão de frases a partir das figuras apresentadas: foram apresentadas ao escolar 20 frases incompletas com figuras ilustrati-vas e solicitado que observasse as figuras e completasse as frases.

PROGRAMA DE INTERVENÇÃO COM A CONSCIÊNCIA FONOLÓGICAO programa de intervenção na consciência

fonológica foi realizado na própria escola durante o período de aula. O instrumento de avaliação CONFIAS12 foi adaptado para a intervenção fonológica. Esta foi composta por 12 sessões se-manais de 50 minutos, que abrangessem todos os níveis de consciência fonológica e silábica, apresentada de forma cumulativa. O programa foi dividido em duas etapas: na primeira foi rea-lizada a intervenção nas habilidades referentes à consciência da sílaba (identificação de sílaba ini-cial, identificação de rima, produção de palavra com sílaba dada, identificação de sílaba medial, produção de rima, segmentação e transposição) e na segunda, foi realizada a intervenção nas habilidades referentes à consciência do fonema (produção de palavra que inicia com som dado, identificação de fonema inicial, identificação de fonema final, exclusão, síntese, segmentação e transposição). As palavras de estímulos utilizadas no programa de intervenção foram extraídas de listas de palavras e pseudopalavras. O progra-ma de intervenção elaborado para este estudo encontra-se descrito a seguir:

a) Consciência de sílaba1. Identificação da sílaba inicial: foi apresen-

tado um desenho e solicitado aos escolares a nomeação deste. Em seguida, foram apresentadas 4 palavras auditivamente e solicitado que os escolares dissessem qual palavra iniciava-se com a mesma sílaba da palavra representada pelo desenho apre-sentado. Em cada sessão foram fornecidas 12 palavras e 4 desenhos.

2. Identificação da rima: foi apresentado um desenho e solicitado aos escolares a nomea-ção deste. Em seguida, foram apresentadas 4 palavras auditivamente e solicitado que os escolares dissessem qual palavra ter-minava (ou rimava) com o mesmo som da palavra representada pelo desenho apre-sentado. Em cada sessão foram fornecidas 12 palavras e 4 desenhos.

3. Produção de palavra com sílaba dada: foi apresentada auditivamente uma sílaba e solicitado aos escolares que dissessem uma palavra que iniciasse com esta mesma sílaba. Caso os escolares não conseguissem evocar a sílaba medial, eram fornecidos exemplos. Em cada sessão foram fornecidas 3 sílabas.

4. Identificação de sílaba medial: foi apre-sentado um desenho e solicitado aos es-colares a nomeação deste. Em seguida, era solicitada a identificação da sílaba medial da palavra. Depois da evocação da sílaba pelos escolares, eram apresentadas 4 palavras auditivamente e solicitado que os escolares dissessem qual palavra apre-sentava a mesma sílaba medial da palavra representada pelo desenho apresentado. Caso os escolares não conseguissem evocar a sílaba medial, eram fornecidos exemplos. Em cada sessão foram fornecidas 12 pala-vras e 4 desenhos.

5. Produção de rima: foi apresentado um desenho e solicitado aos escolares a nome-ação deste. Em seguida, foi solicitado que os escolares dissessem outra palavra que rimasse com a palavra representada pelo desenho. Depois da produção da rima, eram apresentadas 4 palavras auditivamente, uma por vez, e solicitado aos escolares que dissessem uma palavra que rimasse com a palavra fornecida. Caso os escolares não conseguissem evocar a sílaba medial, eram fornecidos exemplos. Em cada sessão foram fornecidas 12 palavras e 4 desenhos.

6. Exclusão: foram apresentadas auditiva-mente uma palavra e fichas em papel car-

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tão correspondentes ao número de sílabas desta palavra e solicitado aos escolares que dissessem qual palavra resultaria da retirada da sílaba inicial, medial ou final da palavra apresentada. Em cada sessão foram fornecidas 4 palavras.

7. Transposição: foi solicitado aos escolares que falassem as palavras em ordem inversa da palavra apresentada pela pesquisadora. Para auxiliar na compreensão da tarefa, foram fornecidas fichas correspondentes ao número de sílabas de cada palavra. Em cada sessão foram fornecidas 4 palavras.

b) Consciência de fonemas1. Produção de palavra que se inicia com o

som dado: foi apresentado auditivamente um fonema e solicitado que os escolares mencionassem uma palavra que começasse com este som. Caso os escolares não conse-guissem evocar uma palavra que iniciasse com o fonema solicitado, eram fornecidos exemplos. Em cada sessão foram fornecidos 3 fonemas.

2. Identificação de fonema inicial: foi apre-sentado um desenho e solicitado aos es-colares a nomeação deste. Em seguida, foram apresentadas oralmente 3 palavras e questionado qual delas começava com o mesmo som da palavra representada no desenho. Em cada sessão foram fornecidas 12 palavras e 4 desenhos.

3. Identificação de fonema final: foi apre-sentado um desenho e solicitado aos es-colares a nomeação deste. Em seguida, foram apresentadas oralmente 3 palavras e questionado qual delas começava com o mesmo som da palavra representada no desenho. Em cada sessão foram fornecidas 12 palavras e 4 desenhos.

4. Exclusão: foi solicitado aos escolares que dissessem qual palavra resultaria da reti-rada do fonema inicial, medial ou final da palavra apresentada. Em cada sessão foram fornecidas 3 palavras.

5. Síntese: foi apresentada 1 palavra auditi-vamente separada por sons e os escolares deveriam reconhecer esta palavra. Em cada sessão foram fornecidas 4 palavras.

6. Segmentação: foi apresentada aos esco-lares 1 palavra oralmente e solicitado que dissessem todos os fonemas desta. Nesta fase do programa foram utilizadas fichas coloridas para auxiliar os escolares a seg-mentar os sons das palavras auditivamente apresentadas. Em cada sessão foram forne-cidas 4 palavras.

7. Transposição: foi apresentada aos escolares 1 palavra oralmente com os fonemas na ordem inversa e solicitado que invertes-sem (com a ajuda das fichas) os fonemas e dissessem a palavra-alvo. Em cada sessão foram fornecidas 4 palavras.

Após a realização do programa de interven-ção na consciência fonológica, todos os escolares foram submetidos novamente à aplicação do Teste para identificação precoce dos problemas de leitura.

O material linguístico utilizado para a adap-tação do procedimento de testagem e interven-ção foi retirado de um banco de palavras de livros didáticos de 1ª a 4ª séries utilizados na rede municipal de ensino de Marília-SP. As pa-lavras utilizadas para a elaboração das provas seguem as regras de decodificação do portu-guês brasileiro13, tanto para palavras como para pseudopalavras: a) regra de correspondência grafofonêmica independente do contexto e b) regra de correspondência grafofonêmica dependente do contexto.

Os resultados foram analisados por meio do Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, com o intuito de verificar possíveis diferenças entre o escore esperado e obtido em cada subteste e para comparar o desempenho dos escolares em situação de pré e pós-testagem.

Para a análise estatística foi adotado o nível de significância de 5% (a = 0,050 — significân-cia adotada). A análise dos dados foi realizada utilizando o programa SPSS (Statistical Packa-ge for Social Sciences), em sua versão 13.0.

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RESULTADOSA Tabela 2 apresenta a distribuição da mé-

dia, desvio padrão e valor de p do desempenho dos escolares de 1ª série deste estudo em rela-ção ao desempenho esperado e obtido de cada subteste do Teste para identificação precoce dos problemas de leitura.

Nesta tabela ainda é possível verificar os valores mínimos e máximos de cada prova, sendo que o valor mínimo é considerado como o efeito base e o valor máximo, como efeito teto para cada subteste realizado pelos escolares.

Com a aplicação do Teste dos Postos Sina-lizados de Wilcoxon, verificou-se que ocorreu diferença estatisticamente significante entre o escore obtido e esperado para todos os subtes-tes, indicando que os escolares da 1ª série não obtiveram a pontuação máxima de acerto para estes subtestes.

O resultado da aplicação do subteste de nomeação rápida de figuras revelou que os escolares da 1ª série apresentaram média de 44,81 segundos para a realização do subteste, com desvio padrão de 13,49, valor mínimo de 27 segundos e valor máximo de 80 segundos.

Na Tabela 3, pode-se verificar a distribuição da média, desvio padrão, valor mínimo, valor máximo e valor de p do desempenho dos es-colares do GI em relação ao desempenho nos subtestes do Teste de identificação precoce dos problemas de leitura em situação de pré e pós-testagem. Com a aplicação do Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, verificou-se que ocorreu diferença estatisticamente signifi-cante nos subtestes de produção de rima (PR), segmentação fonêmica (SF) e leitura de palavras (LP). Considerando que este grupo não foi sub-metido à intervenção, pode-se considerar que o conteúdo oferecido pelo professor em sala de aula favoreceu a melhora do desempenho destes escolares nestes subtestes.

A Tabela 4 apresenta a distribuição da mé-dia, desvio padrão, valor mínimo, valor máximo e valor de p do desempenho dos escolares do GII em relação ao desempenho nos subtestes do Teste de identificação precoce dos problemas de

leitura em situação de pré e pós-testagem. Com a aplicação do Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, verificou-se que ocorreu diferença estatisticamente significante nos subtestes de produção de rima (PR), identificação de rima (IR), segmentação fonêmica (SF), análise fonê-mica (AF) e identificação de sílaba inicial (ISI), evidenciando que o programa de intervenção com a consciência fonológica proporcionou melhora em habilidades de percepção de sons, entretanto não houve diferença estatisticamente significante para tarefas de leitura de palavras.

DISCUSSÃOOs resultados evidenciaram que as habili-

dades consideradas preditoras14,15 para o de-senvolvimento da leitura e escrita não estavam sendo enfocadas no processo de alfabetização dos escolares de 1ª série, o que explicaria a diferença estatisticamente significante entre o escore esperado e obtido no Teste de identifica-ção precoce dos problemas de leitura elaborado para este estudo.

Assim, deve-se considerar que a criança, ao ingressar na escola, possui o domínio do sistema linguístico em sua modalidade oral. Entretanto, não há a percepção, neste momento, de que os aspectos fonológicos relacionados à linguagem oral são necessários para o desenvolvimento da leitura. Dessa forma, deve-se compreender que existe uma relação entre as letras e os sons da fala necessária para ensinar aos escolares em fase inicial de alfabetização, pois, segundo a literatura, este é o modelo ideal do sistema alfabético14-18.

Neste estudo, verificou-se que apenas 10 (37%) escolares apresentaram desempenho inferior a 51% do Teste de identificação preco-ce dos problemas de leitura, sendo, portanto, considerados de risco para a dislexia. Porém, após a intervenção na consciência fonológica, apenas 2 escolares do GII não responderam à intervenção. Conforme descrito na literatura6,7, a falta de resposta à intervenção fonológica é indicativa do quadro de dislexia, sendo neces-sária a realização de avaliação interdisciplinar

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Tabela 2 – Distribuição da média, desvio padrão, valor mínimo, valor máximo e valor de p do desempenho obtido e esperado dos escolares da 1ª série em cada subteste do Teste para identificação precoce dos problemas de leitura

Par de Variáveis MédiaDesvioPadrão

Mínimo Máximo Mediana Valor de p

CA_O 20,33 2,29 15,00 23,00 21,00< 0,001*

CA_E 23,00 __ 23,00 23,00 23,00

PR_O 8,33 5,74 __ 18,00 9,00< 0,001*

PR_E 20,00 __ 20,00 20,00 20,00

IR_O 13,48 4,80 2,00 20,00 14,00< 0,001*

IR_E 20,00 __ 20,00 20,00 20,00

SS_O 19,33 2,84 10,00 21,00 21,000,003*

SS_E 21,00 __ 21,00 21,00 21,00

PP_O 19,48 1,97 15,00 22,00 20,00< 0,001*

PP_E 22,00 __ 22,00 22,00 22,00

SF_O 2,07 3,17 __ 11,00 __< 0,001*

SF_E 21,00 __ 21,00 21,00 21,00

AF_O 1,48 2,17 __ 8,00 __< 0,001*

AF_E 21,00 __ 21,00 21,00 21,00

ISI_O 12,30 6,23 __ 20,00 14,00< 0,001*

ISI_E 21,00 __ 21,00 21,00 21,00

MT_O 21,30 1,86 18,00 24,00 21,00< 0,001*

MT_E 24,00 __ 24,00 24,00 24,00

NR_O 33,70 1,51 29,00 35,00 34,00< 0,001*

NR_E 35,00 __ 35,00 35,00 35,00

AV_O 9,67 0,88 6,00 10,00 10,000,039*

AV_E 10,00 __ 10,00 10,00 10,00

LP_O 33,30 8,15 1,00 40,00 36,00< 0,001*

LP_E 40,00 __ 40,00 40,00 40,00

CF_O 14,56 3,67 5,00 20,00 16,00< 0,001*

CF_E 20,00 __ 20,00 20,00 20,00Legenda: C.A.: conhecimento do alfabeto; P.R.: produção de rima; I.R.: identificação de rima; S.S. segmentação silábica; P.P.: pro-dução de palavras a partir do fonema dado; S.F. síntese fonêmica; A.F.: análise fonêmica; I.S.I.: identificação de som inicial; M.T.: memória de trabalho; A.V: atenção visual; L.: leitura; C.F.: compreensão de frases a partir de figuras, produção de palavras a partir do fonema dado; O: Obtido; E: Esperado.

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Tabela 3 – Distribuição da média, desvio padrão, valor mínimo, valor máximo e valor de p do desempenho dos escolares do GI em situação de pré e pós-testagem

Par de Variáveis MédiaDesvioPadrão

Mínimo Máximo Mediana Valor de p

CApré 20,94 1,47 18,00 23,00 21,000,085

CApós 21,67 1,71 16,00 23,00 22,00

PRpré 8,61 6,25 __ 18,00 9,000,014*

PRpós 11,06 4,70 __ 18,00 11,00

IRpré 13,83 5,19 2,00 20,00 15,500,104

IRpós 14,61 4,55 2,00 20,00 15,50

SSpré 19,39 2,75 10,00 21,00 21,000,056

SSpós 20,22 1,35 16,00 21,00 21,00

PPpré 19,83 1,86 15,00 22,00 20,000,705

PPpós 19,61 2,48 13,00 22,00 20,00

SFpré 2,94 3,57 __ 11,00 2,000,014*

SFpós 4,67 3,50 __ 11,00 4,50

AFpré 2,11 2,40 __ 8,00 2,000,084

AFpós 2,72 2,76 __ 9,00 2,00

ISIpré 15,56 4,08 8,00 20,00 17,000,748

ISIpós 15,67 4,60 5,00 21,00 17,50

MTpré 21,78 1,93 18,00 24,00 21,500,914

MTpós 21,61 2,59 14,00 24,00 22,00

NRpré 33,83 1,76 29,00 35,00 34,500,234

NRpós 34,06 1,55 30,00 35,00 34,50

AVpré 9,78 0,55 8,00 10,00 10,000,577

AVpós 9,89 0,47 8,00 10,00 10,00

LPpré 35,78 3,51 27,00 40,00 36,500,048*

LPpós 35,44 9,49 __ 40,00 39,00

CFpré 15,89 2,68 9,00 20,00 16,000,364

CFpós 15,39 4,69 __ 20,00 16,00

Legenda: C.A.: conhecimento do alfabeto; P.R.: produção de rima; I.R.: identificação de rima; S.S. segmentação silábica; P.P.: produção de palavras a partir do fonema dado; S.F. síntese fonêmica; A.F.: análise fonêmica; I.S.I.: identificação de som ini-cial; M.T.: memória de trabalho; A.V: atenção visual; L.: leitura; C.F.: compreensão de frases a partir de figuras, produção de palavras a partir do fonema dado; Pré: pré-testagem; Pós: pós-testagem.

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Tabela 4 – Distribuição da média, desvio padrão, valor mínimo, valor máximo e valor de p do desempenho dos escolares do GII em situação de pré e pós-testagem

Par de Variáveis MédiaDesviopadrão

Mínimo Máximo Mediana Valor de p

CApré 19,08 2,91 15,00 23,00 20,000,196

CApós 20,08 1,93 16,00 23,00 20,00

PRpré 6,17 5,11 __ 14,00 6,000,013*

PRpós 10,33 4,96 __ 18,00 11,50

IRpré 11,83 4,67 2,00 18,00 12,500,033*

IRpós 14,00 4,92 2,00 18,00 17,00

SSpré 19,67 2,84 12,00 21,00 21,000,785

SSpós 19,58 2,31 14,00 21,00 21,00

PPpré 18,50 1,98 16,00 22,00 19,000,414

PPpós 18,08 2,47 13,00 22,00 18,50

SFpré 0,50 0,80 __ 2,00 __0,011*

SFpós 3,58 2,91 __ 8,00 4,00

AFpré 0,17 0,58 __ 2,00 __0,007*

AFpós 3,00 1,86 __ 6,00 3,00

ISIpré 5,83 3,81 __ 14,00 5,000,008*

ISIpós 9,75 2,99 4,00 16,00 10,00

MTpré 20,25 1,36 19,00 22,00 20,000,492

MTpós 20,25 2,26 14,00 22,00 20,00

NRpré 33,42 0,90 32,00 34,00 34,000,157

NRpós 33,75 0,75 32,00 35,00 34,00

AVpré 9,25 1,54 6,00 10,00 10,000,269

AVpós 9,83 0,58 8,00 10,00 10,00

LPpré 26,75 13,41 1,00 40,00 29,000,160

LPpós 27,08 12,40 __ 40,00 31,00

CFpré 12,33 3,68 5,00 17,00 13,000,235

CFpós 12,33 4,44 __ 17,00 13,50

Legenda: C.A.: conhecimento do alfabeto; P.R.: produção de rima; I.R.: identificação de rima; S.S. segmentação silábica; P.P.: pro-dução de palavras a partir do fonema dado; S.F. síntese fonêmica; A.F.: análise fonêmica; I.S.I.: identificação de som inicial; M.T.: memória de trabalho; A.V: atenção visual; L.: leitura; C.F.: compreensão de frases a partir de figuras, produção de palavras a partir do fonema dado; Pré: pré-testagem; Pós: pós-testagem.

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para confirmação ou não do diagnóstico. Entretanto, destaca-se outro ponto impor-tante deste estudo: os escolares do GII apresentaram melhora em situação de pós-testagem nas habilidades de produção de rima, identificação de rima, segmentação fonêmica, análise fonêmica e identificação de sílaba inicial.

Assim, pode-se considerar que o progra-ma de intervenção utilizado neste estudo aborda atenção, discriminação e memória auditiva de forma direta, em todas as ses-sões, devido às especificidades das tarefas, o que favoreceu o desenvolvimento da atenção à fonologia da língua portuguesa, conforme descrito em estudos internacio-nais19-21 e nacionais22-24.

Porém, destaca-se que os escolares do GI não submetidos à intervenção apresen-taram melhora quanto à produção de rima, segmentação fonêmica e leitura de palavras, evidenciando que essas habilidades podem ser desenvolvidas de forma aleatória a partir do conteúdo ministrado pelo professor em sala de aula. Isso pode não ocorrer com todos os escolares, o que gera dificuldades cognitivo-linguísticas que podem parecer com a manifes-tação da dislexia, mas na verdade é uma falha no processo de ensino-aprendizagem. Isso já está descrito na literatura25 e remete à reflexão de que, qualquer que seja a metodologia de al-fabetização utilizada pelo professor em sala de aula, é necessário que as habilidades de aten-ção, discriminação e percepção dos sons sejam trabalhadas, pois os escolares em fase inicial de alfabetização poderiam ser beneficiados por um ensino voltado para a percepção fonológica do sistema de escrita do português brasileiro, melhorando o desempenho na decodificação, aumentando o vocabulário auditivo-visual e a compreensão da leitura26,27.

Apesar de a literatura internacional3-8 estar repleta de estudos sobre a identificação preco-ce dos sinais da dislexia, no Brasil, esta temá-tica é pouco explorada. Assim, os resultados apresentados neste estudo podem contribuir

para o repensar da atuação fonoaudiológica, pedagógica e psicopedagógica, pois somente a atuação destes profissionais na perspecti-va da promoção e da prevenção na área de leitura e escrita pode realmente modificar o olhar sobre o escolares que apresentam risco para a dislexia.

Consoante à literatura28,29, há a necessi-dade de desenvolvimento de ações de inves-tigação que permitam conhecer a realidade da escola, do professor e do escolar, para realizar o levantamento dos problemas de leitura e escrita, bem como identificar quais as habilidades metalinguísticas e metacogni-tivas que são preditoras ou facilitadoras para a aprendizagem da leitura e escrita em um sistema de escrita alfabético como o do por-tuguês brasileiro. Com base nisso, devem-se realizar propostas de ações educativas que permitam atender às necessidades previa-mente identificadas pelos fonoaudiólogos, psicopedagogos e professores, e, assim, poder contribuir efetivamente para o entendimento de que os métodos de alfabetização utilizados pelos professores nas escolas são ferramentas de apropriação de um sistema de escrita com base alfabética, o que minimizaria a presença de sinais da dislexia em escolares em fase inicial de alfabetização.

CONCLUSÃOCom base nos resultados deste estudo,

conclui-se que:•OTestedeidentificaçãoprecocedosproble-

mas de leitura elaborado para este estudo mostrou-se efetivo para a verificação dos sinais da dislexia em escolares, pois identi-ficou as habilidades cognitivo-linguísticas em defasagem nos escolares deste estudo;

•Arealizaçãodoprogramadeintervençãona consciência fonológica foi eficaz para os escolares com sinais de dislexia. Isso se comprovou com a melhora das habili-dades cognitivo-linguísticas em situação de pós-testagem em comparação com a pré-testagem.

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SUMMARYEfficacy of phonological awareness intervention in students at risk for

dyslexia

Purpose: This study aimed to verify the effectiveness of an intervention program on phonological awareness of students at risk for dyslexia. Method: The study included 27 students from 1st grade of municipal schools in the city of Marília-SP, of both genders, aged from 7 years to 7 years and 11 months old. In case of pre-and post-testing, all students were subject to testing for early identification of reading problems. The students who performed below 51% in the early identification of problems in reading test were subject to intervention in phonological awareness based on the evidence of CONFIAS. Thus, the students were divided into: GI: composed of 17 students not subject to the intervention program and GII: composed of 10 students submitted to the plan of action. Results: Results showed statistically significant difference between the expected and obtained scores for all subtests of the Test. The GI showed statistically significant differences in subtests of producing rhyme, phonemic segmentation and reading of words, while the GII showed statistically significant differences in subtests of producing rhyme, phonemic segmentation and reading of words. Conclusion: The test for early identification of problems of reading prepared for this study was effective for the verification of the signs of dyslexia in school, and completion of the intervention program was effective in phonological awareness for children with signs of dyslexia. This is evidenced by the improvement of cognitive-linguistic skills at post-test compared to pre-testing.

KEY WORDS: Evaluation. Reading. Dyslexia.

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Trabalho realizado na Faculdade de Filosofia e

Ciências da Universidade Estadual Paulista –FFC/

UNESP, Marília, SP. Fonte de auxílio: Núcleo de

Ensino – FFC/UNESP – Marília, SP.

Artigo recebido: 22/10/2009

Aprovado: 5/12/2009

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – O objetivo deste estudo foi avaliar o funcionamento executivo das crianças com diagnóstico de hipotiroidismo congênito por meio da avaliação dinâmica utilizando a resolução de problemas. Os resultados revelaram dificuldade em integrar, categorizar e estabelecer a representação das relações entre os elementos do problema. Os dados foram coletados por meio de avaliação assistida. Dessa forma, conclui-se que há necessidade de mudança na proposta escolar para que a criança com hipotiroidismo congênito tenha efetividade no rendimento acadêmico.

UNITERMOS: Resolução de problemas. Hipotireoidismo congênito. Avaliação educacional. Cognição.

avaliação assistida em Crianças Com hipotiroidismo Congênito

Anelise Caldonazzo - Farmacêutica; Bioquímica;

Pedagoga; Neuropsicopedagoga; Mestre em Saúde

da Criança e do Adolescente.

Correspondência

Anelise Caldonazzo

Rua Piauí, 95 – sala 23 – Poços de

Caldas, MG – CEP 37701-024

E-mail: [email protected]

Anelise Caldonazzo; Paula Fernandes; Tatiana de Sá Riech; Carolina Santos; Maura Mikie Fukujima Goto; Maria Tereza Baptista; Gil Guerra Jr.; Sofia Lemos-Marini; Lília D’Souza-Li

INTRODUÇÃOA capacidade de pensar, raciocinar, formular

hipóteses, representar mentalmente situações e operar sobre uma situação inicial visa à so-lução de problemas1. Para isso, combinamos elementos do conhecimento, usando técnicas e conceitos adquiridos para organizar a solução para uma situação nova. Nem toda situação desafiadora caracteriza-se como uma situação problema. Quando nos encontramos diante de um problema e conhecemos os elementos necessários para sua resolução, seguimos auto-maticamente um roteiro de ação e assim agimos mecanicamente2.

A forma como entendemos a tarefa, proces-samos a informação e as relações mentais que

construímos são condicionadas pelas atividades propostas e, por isso, influenciam e estruturam a capacidade de pensamento e de raciocínio e, em última análise, a aprendizagem da matemática3.

Ao resolver situações-problema, o sujeito in-venta a matemática e desenvolve a capacidade de formalizar e organizar o pensamento. Assim, aos poucos, faz a conexão da percepção da situação real e dos conceitos matemáticos, es-tabelecendo uma base adequada para a apren-dizagem das operações formais, conseguindo aplicabilidade na vida real3. Utiliza as funções executivas relacionadas ao córtex pré-frontal, caracterizadas basicamente pela capacidade de controlar, direcionar, gerenciar e integrar as fun-ções cognitivas, emocionais e comportamentais

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na execução voluntária e consciente das ações necessárias para administrar contingência, em função de um objetivo4-7.

O hipotireoidismo congênito caracteriza-se por alterações na função da glândula tireóide ao nascimento, com consequente alteração das concentrações dos hormônios tireoideanos. O diagnóstico de hipotireoidismo congênito pode ser confirmado após triagem neonatal, com as dosagens séricas de TSH de 5,2 µU/mL e T4 livre normal ou < 0,7 ng/dL. O hipotireoidismo congênito tem prevalência de aproximadamen-te 1:3.500 e pode causar retardo mental se a re-posição hormonal com hormônios tireoideanos não se fizer logo após o nascimento8.

A falta de hormônios tireoideanos resulta em disfunção em áreas específicas do cérebro, afetando a região parietal posterior, responsável pela localização espacial; os lobos temporais inferiores, responsáveis pela identificação dos objetos; o núcleo caudado, relacionado com a atenção; o hipocampo, associado à memória, e pode resultar também em perda auditiva. Avaliações de pacientes com hipotireoidismo congênito, mesmo identificados e tratados precocemente por meio de triagem neonatal, demonstram que a inteligência alcança pontu-ações dentro da normalidade. Entretanto, esses pacientes apresentam transtornos menores na atenção, memória, percepção visuoespacial e linguagem9,10.

A modalidade de avaliação assistida é uti-lizada para obter informações sobre processos cognitivos funcionais, disfuncionais e em vias de desenvolvimento, bem como favorece a quantidade e o tipo de intervenção necessária para produzir mudança no processo cognitivo11.

A avaliação assistida pode ser definida como um processo interativo de avaliação baseada no funcionamento cognitivo e que procura avaliar o pensamento, a percepção e a aprendizagem numa proposta de resolução de problemas. Diferente do teste convencional, a avaliação assistida fica centrada nos processos, nos instru-mentos, na situação de avaliação e na interpre-tação dos resultados11. O conceito de avaliação

assistida é amplo, pois inclui várias teorias, metodologias, funções e objetivos relaciona-dos com as novas concepções de inteligência e com as várias propostas de avaliação, tais como a avaliação psicopedagógica dinâmica12 e a avaliação do processamento cognitivo com resolução de problemas13.

Por meio da representação mental, o cérebro humano representa a realidade e as experi-ências, organizando a simbolização. Com isso ocorre a elaboração do conceito e a abstração da forma como é exigida para a resolução de problemas13.

No processo de integração das informações, para a resolução de um problema mais comple-xo, ocorrem sucessivas mudanças na represen-tação inicial. Essas mudanças representacionais podem ocorrer em três instâncias: codificação, combinação e comparação seletiva13. A informa-ção real que os sujeitos percebem de objetos, ideias e eventos são facilmente verbalizáveis, quando tentam resolver situações problema, por meio da linguagem oral2.

Esta forma de avaliação pode ser utilizada como uma abordagem complementar à avalia-ção padronizada, normativa, de modo a retratar um quadro global e acurado do funcionamento cognitivo, uma vez que cada abordagem res-ponde a questões diferentes e complementa-res11.

Essas concepções teóricas baseadas na plasti-cidade cerebral da cognição humana facilitam as novas medidas para avaliar as crianças diferen-temente dos testes convencionais. Dessa forma, o conceito de inteligência deixa de ser entendido como uma habilidade inata e facilita a compreen-são das diferenças individuais no pensamento, na percepção, na aprendizagem, na solução de pro-blemas e na interação social. Todas as alternativas de resposta devem ser consideradas para verificar o real desempenho em resolução de problemas, antes de inferir que são decorrentes de uma incapa-cidade para aprender. Baseado nesta proposta esse estudo procurou avaliar o funcionamento executivo em crianças com diagnóstico de hipotiroidismo congênito na resolução de problemas.

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MÉTODOFoi utilizada a proposta de avaliação dinâmi-

ca assistida, utilizando um roteiro de observação clínica comportamental da criança e um proto-colo de resolução de problemas. O Roteiro de Observação Clínica Comportamental da Crian-ça Orientada para a Aprendizagem, baseado em Medeiros et al.14, envolveu a observação da criança com hipotireoidismo congênito frente a uma situação orientada para aprendizagem. Foram avaliadas as formas de reação diante da diversidade dos materiais lúdicos e pedagógi-cos. Os aspectos analisados foram:• Produção: conjunto de atividades verbais e

motoras executadas pela criança, conside-rando o nível de adequação e elaboração das tarefas;

• Desempenho Específico: conteúdo predomi-nante de interesse do indivíduo por meio do interesse pelas tarefas acadêmicas, objetos escolares, brinquedos e objetos relacionados a situações do cotidiano. Foi observada a for-ma como a criança comunicou o que realiza-va e como ocorreu a integração e adequação desta frente à atividade e à examinadora;

• Desempenho Geral: recursos utilizados pela criança com hipotireoidismo congênito, as manifestações afetivas e a autorregulação. Nos recursos utilizados foram avaliados organização, planejamento e atenção. Nas manifestações afetivas foi observado o jul-gamento, a iniciativa, a capacidade de tomar decisão e a ansiedade.

O Protocolo de Resolução de Problemas, baseado em Vieira15, utilizou os parâmetros de mudança representacional propostos por Sternberg16 para verificar as etapas de codi-ficação, de elaboração e de execução frente à situação-problema. Nas tarefas, verificou-se o conhecimento informal da composição aditiva que, para serem solucionadas, exigiam o uso de uma operação de soma ou subtração ou, ainda, a combinação das duas17. A solução de proble-mas não exigia apenas a aplicação das técnicas com símbolos e fórmulas convencionais. Isto

favorecia um nível de exigência cognitiva mais elevado, favorecendo a avaliação dos três está-gios da atividade mental avaliados:• Codificação: avaliou a recepção da infor-

mação, a ação exploratória e o domínio de conceitos básicos considerados dentro dos critérios de conhecimentos linguísticos, numéricos e figurativos. A observação da representação inicial e das estratégias de seleção de informação considerou a habi-lidade do indivíduo com hipotireoidismo congênito para formalizar a percepção do material matemático e para compreender a estrutura formal do problema;

• Elaboração: verificou a memória de traba-lho relacionada com recuperação, seleção e organização dos dados codificados e o estabelecimento das relações para formular a busca das soluções. Observou a utilização dos recursos externos e manipulativos;

• Execução: verificou os processos cognitivos que efetivamente permitiram a solução do problema.

PacientesForam avaliadas 42 crianças com hipoti-

reoidismo congênito em acompanhamento na Unidade de Endocrinologia Pediátrica do Hos-pital de Clínicas da UNICAMP. As crianças que apresentavam problemas psiquiátricos, neuroló-gicos ou síndromes genéticas foram excluídas.

O projeto foi aprovado pela Comissão de Ética da Faculdade de Ciências Médicas, UNI-CAMP (CEP 740/2005). Os pais assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, autorizando a participação das crianças.

RESULTADOS Foram avaliadas 42 crianças com hipoti-

reoidismo congênito, com idades entre 5 e 15 anos. Todas estavam matriculadas em escolas públicas do ensino regular, sendo que a maioria cursava o ensino fundamental.

Muitas crianças não estavam habituadas a resolver a tarefa do modo como esta foi apre-sentada no Roteiro de Observação Clínica

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Orientado para Aprendizagem e foram neces-sárias várias estimulações. Após a compreensão da solicitação, houve adequada interação da criança e a resolução ocorreu de modo tranquilo.

Durante a realização das atividades, as crian-ças procuraram conversar com a examinadora ou brincar com o material. Os temas de inte-resse discutidos foram programas de televisão, heróis preferidos e assuntos religiosos. Nessas ocasiões, as crianças conseguiram expressar-se de maneira clara e precisa na comunicação oral. Não foram observadas alterações nos processos de planejamento e organização. As crianças demonstraram confiança em relação ao julgamento sobre o próprio desempenho. Mostraram-se decididas e com capacidade de iniciativa, porém demonstraram ansiedade, pois interrompiam os assuntos ou as atividades iniciadas, tentando falar sobre o que realizavam. A maioria das crianças não teve eficiência na produção final desta tarefa.

Na resolução de problemas, apesar de possuírem domínio dos conceitos necessários para operar e resolver a situação e terem ade-quada recepção e ação exploratória, a maior parte das crianças não conseguiu selecionar as informações necessárias para a realização da atividade. Quando as crianças compararam e encontraram diferença entre a resposta da solução do problema encontrada no relato oral e a obtida no registro escrito, demonstraram ansiedade e desinteresse pela continuidade na execução da tarefa. Essa situação provocou insegurança nos participantes, pois embora dominassem os conceitos pedagógicos exigidos para a execução da tarefa, eles realizaram ações corretivas tentando corrigir a resposta emitida. A maioria das crianças mostrou baixo nível de eficiência, não acertando os cálculos efetuados. Demonstraram desempenho inadequado na recepção da informação, na ação exploratória e na representação inicial.

Houve dificuldade em integrar, categorizar e estabelecer a representação das relações en-tre os elementos do problema. Os dados foram coletados de forma assistemática, saltando a

lógica que organiza e leva diretamente para uma resposta adequada.

Os indivíduos com hipotireoidismo congênito realizaram constantemente uso de recursos ma-nipulativos para certificar a solução encontrada. Não fizeram uso de estratégias para garantir a coerência das informações e isso interferiu nos processos cognitivos que processaram uma quantidade limitada de informações dentre o grande montante de elementos disponíveis, comprometendo a execução final da tarefa.

Em cada uma destas etapas, as crianças com hipotireoidismo congênito foram capazes de autorregular suas ações cognitivas, embora na resolução final da situação-problema não con-seguissem acessar as informações codificadas. Ficou evidenciado o comprometimento efetivo na execução final da tarefa proposta.

DISCUSSÃO A linguagem matemática consiste em sím-

bolos que se relacionam com palavras e en-contram significado em contextos particulares relacionados a procedimentos para resolver situações-problemas18.

A capacidade que um indivíduo tem de uti-lizar a matemática para resolver uma situação desafiadora envolve pensamento, raciocínio, comunicação, resolução de problemas, repre-sentação e uso dos símbolos matemáticos. Esses procedimentos são fundamentais para que o indivíduo possa introduzir o registro e conseguir bom desempenho nas atividades de resolução de problemas18.

As tarefas com aplicação das técnicas, que utilizam símbolos matemáticos e fórmulas convencionais memorizadas, reduzem o pensa-mento do aluno a um único tipo de raciocínio. De modo oposto, tarefas baseadas numa apren-dizagem conceitual conduzem os indivíduos à conexão e à reflexão e oferecem diferentes formas de organização do pensamento18. A decomposição nestas tarefas em etapas mais específicas facilita a percepção e a avaliação das habilidades cognitivas.

Embora haja estudos demonstrando que

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os pacientes com hipotireoidismo congênito apresentam transtornos na linguagem19, neste estudo, as crianças apresentaram adequada interação e comunicação oral na realização das atividades.

A atenção é a função que organiza a dire-ção e a seleção das informações codificadas, permitindo manipular a constante entrada de informação para o processamento em paralelo da atividade mental. Os lobos frontais consti-tuem um sistema de supervisão que modula a atividade mental, sustenta a atenção e mantém a concentração, coordenando as capacidades cognitivas, permitindo o planejamento das ações durante a elaboração das antecipações sobre a solicitação desafiadora.

Quando há alteração da atenção concentrada ocorre interferência no processo cognitivo20. As alterações e omissões na representação dos da-dos selecionados pelas crianças em nosso estudo estão associadas ao fato da atenção delas passar rapidamente de uma informação para outra. Ou-tros estudos com crianças com hipotireoidismo congênito verificaram que a atenção foi ativada de forma adequada, mas oscilou permanente-mente durante a realização da tarefa2.

As crianças não conseguiam adequar a repre-sentação inicial com a execução final da atividade, por não realizarem uma representação mental adequada para ativarem as operações mentais.

Os erros cometidos nos registros escritos, quando exigiam o uso dos símbolos matemáticos estabelecidos pela escola para a realização das operações matemáticas, foram de acordo com a literatura. Esses demonstram que as dificul-dades em lidar com a estruturação do sistema de numeração decimal e com a identificação e resolução das operações matemáticas interfere nas interpretações desses princípios lógico-matemáticos e são de difícil compreensão para o encaminhamento do raciocínio13.

Buscavam rapidamente uma operação arit-mética qualquer, dedicando pouco tempo ao raciocínio e à recuperação dos conhecimentos armazenados na memória operacional. Não conseguiram aprimorar seu plano de ação

e tiveram dificuldades em considerar dois ou mais dados nos problemas e integrar as diferentes fontes de informações. Pensavam rapidamente na resposta e não elaboravam com clareza a relação exata existente nos dados do problema.

À medida que havia discrepância entre o registro escrito e o relato oral, as crianças demonstravam desinteresse em resolver as atividades. Não tinham clara a relação exata dos dados do problema; não se sentiam desa-fiadas para resolver a atividade proposta, mes-mo com conhecimento pedagógico suficiente. Falhavam nas respostas às perguntas, porque utilizam um processo de raciocínio inade-quado. Os estudos confirmam que, quando o aluno concebe o problema matemático como sendo muito difícil de solucionar, pode ocorrer desinteresse e, consequentemente, falta de atenção na tarefa2.

As estratégias de representação inicial do problema são abandonadas com o avanço da escolarização, em função das crianças começarem a usar a recordação do conteúdo aprendido na escola. A disponibilidade pro-longada de material manipulativo permite a representação direta dos elementos do proble-ma e tende a inibir o uso de estratégias mais sofisticadas quando as crianças dominam as operações aritméticas usadas na escola e que são necessárias para a resolução da tarefa20.

A adequada autorregulação favoreceu a manifestação das capacidades de planejamento e organização durante a realização da situa-ção desafiadora, pois sem essa integração não ocorre a síntese dos dados21,22. A autorregulação refere-se à habilidade de inibir respostas com-petitivas que frequentemente prejudicam os indivíduos quanto a saber como, quando e que tipo de conhecimento devem usar para resolver um problema matemático23.

A maneira como as informações são integra-das e manipuladas por meio da representação mental influencia na eficiência da execução da tarefa. Os indivíduos com hipotireoidismo congênito não conseguiram uma representação

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gráfica inicial adequada, o que ficou evidencia-do com o baixo desempenho da produção e da execução do grupo avaliado.

CONCLUSÃONesta avaliação, as crianças com hipotireoi-

dismo congênito apresentaram alterações nos processos executivos, demonstrando dificul-dades de processamento de informação. Esse

SUMMARYAssisted assessment in children with congenital hypothyroidism

The objective of this study was to evaluate the executive functioning of children diagnosed with congenital hypothyroidism through dynamic evaluation using the resolution of problems. The results revealed difficulties in integrating, categorize and establish the representation of relations between the elements of the problem. Data were collected unsystematically, skipping the logic that organizes and leads directly to an appropriate response. Thus, it appears that there is need for change in the proposed school for children with HC has effectiveness in academic performance.

KEY WORDS: Problem solving. Congenital hypothyroidism. Educational measurement. Cognition.

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Rev. Psicopedagogia 2009; 26(81): 408-14

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Artigo recebido: 1/11/2009

Aprovado: 16/12/2009

Trabalho realizado na Unidade de Endocrinologia

Pediátrica, Departamento de Pediatria, Centro de

Investigação em Pediatria, Faculdade de Ciências

Médicas, Universidade Estadual de Campinas

(UNICAMP), Campinas, SP.

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InstItuIções prIvadas de ensIno: consIderações para o processo de Inclusão

Rev. Psicopedagogia 2009; 26(81): 415-24

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ARTIGO ORIGINAL

RESUMO – Introdução: O acesso de todos à Educação é um dos processos efetivos para o amplo movimento de inclusão social, no entanto, a contradição decorrente do embate entre o legalmente imposto e divulgado e o realmente possível delimita e amordaça as propostas de inclusão escolar. Método: Assim, com o objetivo de explorar os aspectos organizacionais, institucionais e relacionais que sustentam as dinâmicas escolares inclusivas dentro de uma escola particular, este estudo delineado por um paradigma qualitativo de pesquisa contou com a participação de três professoras, sendo uma delas regente do ciclo de Educação Infantil, e duas docentes na 2ª série do Ensino Fundamental, de uma instituição particular da região do ABCD/SP. Como recursos priorizaram-se as observações e os sistemas conversacionais realizados e mantidos na instituição durante os sete meses de acompanhamento diário da pesquisadora à instituição. Resultados: As informações obtidas e analisadas qualitativamente puderam ser organizadas nos núcleos intitulados: 1) distanciamento de quem pensa e quem executa as ações pedagógicas; 2) realidades vividas em sala de aula. Conclusão: Com as discussões dos indicadores construídos e sintetizados pelos núcleos de análise, pôde-se concluir que a proposta de inclusão exige mudanças na estruturação dos processos organizacionais, institucionais e pedagógicos nas escolas, indicando que o sucesso do processo de inclusão escolar depende do desenvolvimento de uma nova cultura organizacional, que possibilite espaços democráticos e criativos aos professores, na construção de ações pedagógicas e relacionais com enfoque na compreensão das diversidades e respeito de suas próprias diferenças e de seus alunos.

UNITERMOS: Inclusão. Instituições acadêmicas. Criança excepcional.

InstItuIções prIvadas de ensIno: consIdera-ções para o processo de Inclusão

Claudia Gomes; Vera Lucia Trevisan de Souza

Claudia Gomes – Mestre em Psicologia Escolar e

Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em

Psicologia como Profissão e Ciência da Pontifícia

Universidade Católica de Campinas - PUCCAMP.

Vera Lucia Trevisan de Souza – Professora Doutora

do Programa de Pós-Graduação em Psicologia

como Profissão e Ciência da Pontifícia Universidade

Católica de Campinas – PUCCAMP.

Correspondência

Claudia Gomes

Rua Coronel Francisco Amaro, 258 – Centro – Santo

André, SP – CEP: 09020-250

E-mail: [email protected]

Gomes c & souza vlt

Rev. Psicopedagogia 2009; 26(81): 415-24

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INTRODUÇÃOComo se sabe, no âmbito nacional, a polêmi-

ca discussão da proposta educacional inclusiva se deu pela aprovação, em 1993, e pela promul-gação, em 1996, da Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação1, que em seus artigos firma a necessidade de equidade ao atendimento educacional no ensino regular a todos os edu-candos. Deixa claro, em seu Art. 3º (inciso I, II e IV), que os princípios de igualdade de condi-ções de acesso e permanência, com respeito à liberdade e apreço à tolerância, deverão ser as bases e princípios da Educação. Vale ressaltar que, mais recentemente, esses mesmos princí-pios foram novamente evidenciados com a im-plementação das Novas Diretrizes Curriculares para a Educação Especial no país2, assim como pelas atuais discussões lançadas pelo Decreto n. 6.571 (09/2008), que regulamenta a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva Inclusiva.

Entretanto, mesmos as discussões ligadas à inclusão escolar ganhando cada vez mais destaque por seus diferentes documentos, o que ainda vem se percebendo é um distancia-mento entre os propósitos lançados e a reali-dade vivida em nossas instituições escolares. O panorama da inclusão escolar na maioria das escolas parece piorar ao se levar em conta seu quadro de profissionais e sua capacitação e a falta ou inexistência de materiais ou re-cursos3-5. Desta forma, o embate decorrente entre o legalmente imposto e divulgado (pelas legislações e regulamentos educacionais) e o realmente possível (estrutura física, organi-zacional e humana das instituições escolares) delimita e amordaça as propostas de inclusão escolar, ao empregar ações cada vez mais descomprometidas, distantes das realidades sociais, pedagógicas e relacionais dos alunos em processo de inclusão6,7.

De maneira geral, as pesquisas que tratam das políticas educacionais refletem, explicita-mente, o discurso da educação como instru-mento para o enfretamento do processo de exclusão social, acrescido da possibilidade de

justiça social da escola para todos, inclusive, para as pessoas com necessidades especiais. Estas mesmas políticas abordam e divulgam, em suas diretrizes, a importância do processo de sociabilização em detrimento de currículos conteudistas, em respeito ao ritmo de cada criança. Porém, Souza6 conclui que, embora esses princípios sejam, em tese, democráticos, na verdade existe um hiato entre a intenção e a realidade vivida em nossas escolas. Dimen-sionar a compreensão da exclusão escolar de alunos que não se adaptam aos modelos rígidos de currículos e avaliações, que lhe são impostos ao longo de suas curtas vidas acadêmicas equi-vale a ser favorável à inclusão escolar8.

Na escola, crianças são excluídas ressaltan-do-se suas condições, e assim, o cotidiano de muitas escolas constitui-se em cenários explí-citos de exclusão, justificados por uma relação perversa de inclusão, que se dá pela margi-nalização dos educandos. A exclusão dentro da escola vem sendo concebida e reafirmada por práticas autoritárias, que não propiciam o avanço no desenvolvimento e aprendizagem dos alunos6.

Pensar no processo de inclusão escolar como uma possibilidade de transformação social, com a instrumentalização de ações mais apropria-das a todos, indistintamente, parece ser um dos maiores impasses. A concepção restrita da ação de inclusão de alunos com necessidades especiais impede a abordagem da magnitude das mudanças que devem ser promovidas na instituição escolar, para que sejam satisfeitas as necessidades educacionais dos mais diversos grupos de alunos. É este enfoque simplificador da proposta inclusiva que parece vir dificultan-do a adoção de estratégias e ações inovadoras exigidas pela inclusão escolar9.

No entanto, o que parece também defla-grado pelos estudos desenvolvidos é que a responsabilização do êxito ou não da inclusão é direcionada para professores. O que se per-cebe, no entanto, é que os professores, quando indicam suas dificuldades e necessidades, po-dem também estar chamando a atenção para

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a sua condição de isolamento profissional. A democratização da gestão e a educação inclu-siva se relacionam diretamente, e uma escola inclusiva deve ser, antes de tudo, uma escola democrática6.

A qualificação educacional para a inclusão deve provocar mudanças nas concepções e organização da instituição, transformando-se em um espaço de formação docente, dentro de um ambiente coletivo de trabalho, que venha a propiciar a possibilidade da discussão do ato educativo e de suas relações. Os autores com-plementam que o professor tem sim a respon-sabilidade de gerir sua sala de aula, no entanto deve, antes disso, ser membro de uma equipe de trabalho10.

Um novo patamar educacional só será alcançado quando revistos os valores implí-citos na instituição, seu clima organizacional, as resistências apresentadas pelos agentes humanos envolvidos, assim como um espaço de articulação profissional propício para o de-senvolvimento dos docentes como agentes de transformação, que discutam, inclusive, o papel da escola na sociedade8,11,12.

Pesquisas e ações que se direcionem à efe-tivação da proposta inclusiva devem ter como base a análise da democratização da gestão escolar e os valores organizacionais que a man-têm13,14. Para que as escolas se tornem inclusivas é necessário que novas práticas, novos valores e novos conhecimentos sejam instaurados, e para tanto, alguns fatores de acordo com Ainscow15 devem ser preconizados, dentre eles: liderança eficaz; envolvimento da equipe de trabalho; atividades colaborativas, política de valorização profissional e a abertura à comunidade para a discussão.

Assim, interessado nos desafios, embates e dificuldades vivenciadas por professores, este trabalho lançou como objetivo explorar os aspectos organizacionais, institucionais e rela-cionais que sustentam as dinâmicas escolares dentro de uma escola particular na compre-ensão das propostas inclusivas de alunos com necessidades especiais.

MÉTODO

ParticipantesForam convidadas a participar do estudo

três professoras, sendo duas docentes da 2ª série do Ensino Fundamental, e uma profes-sora regente do Ciclo de Educação Infantil, de uma escola particular da região do Grande ABCD/SP. Ressalta-se que as três docentes participantes atuavam no processo de inclu-são escolar de dois alunos com necessidades especiais, sendo um deles pré-diagnosticado com Distúrbio Global do Desenvolvimento, e a outra aluna, com necessidades físicas, com comprometimento dos dois membros superiores.

RecursosSistemas Conversacionais – o diálogo foi

considerado fonte essencial e elemento im-prescindível para a qualidade da informação produzida pela pesquisa16, evidenciando uma real construção dinâmica do pesquisador com os participantes, com a amplitude dos relatos. Para tanto, tornou-se imprescindível a utiliza-ção da modalidade metodológica de um diário de pesquisa, que não representa apenas uma finalidade de transcrição de informações, mas é fundamental para a reflexão sobre o proces-so de pesquisa.

ProcedimentosOs sistemas conversacionais foram firma-

dos entre a pesquisadora e os participantes, direcionados com a devida exploração e o aprofundamento nos níveis de discursos ou narrativas construídas, durante sete meses, no período de maio/2007 a dezembro/2007, obtidas nas visitas diárias realizadas pela pes-quisadora, no período das 13:00h às 17:00h.

Vale ressaltar, que foi, previamente, firma-do um contato com a direção da escola a fim da obtenção da autorização, foram entregues a todos os participantes Termo de Consenti-mento Livre e Esclarecido quanto às questões éticas da pesquisa.

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Plano de Análise das InformaçõesAs informações obtidas por meio dos sis-

temas conversacionais foram, primeiramente, contextualizadas, e posteriormente, organiza-das em categorias de indicadores, no entanto, relatos que exemplifiquem a construção dos indicadores apontados serão apresentados na discussão dos resultados sob a indicação da legenda “transcrição de relato”.

RESULTADOS E DISCUSSÃOA análise das informações construídas ao

longo do estudo proporcionou a organização de dois núcleos (Quadro 1): o primeiro denomi-nado “Distanciamento de quem pensa e quem executa as ações pedagógicas”, que agrupou indicadores relacionados aos embates vividos frente à estrutura e organização institucional, e o segundo núcleo “Realidades vividas em sala de aula”, que aponta indicadores relacionados às dinâmicas em sala de aula, que permeiam a discussão e a compreensão do processo de inclu-são assumido pelos professores na elaboração de suas atividades pedagógicas.

Pôde ser evidenciado, já nos primeiros con-tatos e relatos, que um dos focos que influem na concepção da proposta de inclusão escolar é gerado pelo conflito constante frente às exigên-cias pedagógicas instauradas pela instituição escolar, que parecem paralisar seus profissio-nais na busca de ações mais críticas e autô-nomas, gerando descontentamento de modo

geral entre as participantes: o que gera grande descontentamento às professoras. Relatos como: “Eu mesma não concordo”, “são exigências que não contribuem para o desenvolvimento dos alunos”, “acho importante oferecer novos caminhos aos alunos, mas aqui não podemos” (transcrição de relato), foram expressões cons-tantemente verbalizadas para exemplificação dos conflitos das professoras quanto à neces-sidade de atividades diversificadas versus o cumprimento das tarefas programadas.

O que se pode constatar é que mesmo demonstrando descontentamento quanto às representações instauradas pela instituição, as professoras na maior parte do tempo atuam em consonância às exigências que lhe são impostas, mesmo que não concordem: “eles dizem, eles fa-zem, a gente acompanha”; “já tenho muito chão de estrada, depois de um tempo você percebe que não adianta, não concorda, mas também não vai conseguir mudar nada”; “já passei por muita coisa, estou cansada, querem mudar, que mude, eu cumpro e pronto, não estou aqui para discutir (transcrição de relato).

Pensar o professor, atualmente, nos remete a repensar as formas de gestão institucional. As práticas de gestão democráticas e emanci-patórias são propícias para o desenvolvimento humano dos educadores como agentes de posi-cionamento e transformação10. No entanto, esta ação envolve situar a organização escolar em um contexto social mais amplo, dentro de uma

Quadro 1 – Núcleos de indicadores.

Distanciamento de quem pensa e quem executa as ações pedagógicas

Realidades vividas em sala de aula

Conflito no desenvolvimento de atividades diversificadas x exigências metodológicas

Inclusão escolar é possibilitar o acompanhamento dos alunos com necessidades especiais nas atividades

Contrapontos das necessidades observadas x cumprimento das tarefas programadas

Dinâmica pedagógica deve ser embasada nos mecanismos de repetição e memorização do conteúdo

Avaliação formativa x avaliação somativa Interações restritas ao ensino do conteúdo acadêmico

Inclusão escolar deve ser uma proposta político-pedagógica da instituição

Insucesso das estratégias de inclusão e o aniquilamento e sofrimento profissional

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concepção mais realista, que considere os valo-res, os significados, as interpretações pessoais de cada membro da equipe, para a instauração de fato de uma comunidade da aprendizagem, que se contraponha às organizações lineares que separam “quem pensa e quem executa as ações pedagógicas”.

Desta forma, o que parece dificultar a apro-priação por parte dos profissionais quanto ao ideal de superação e acolhimento implícito a todas as diretrizes da escola é o distanciamento existente entre as esferas de trabalho, o que revela a dicotomia entre “aqueles que pensam as propostas” (inclusive as propostas de di-vulgação e propaganda da escola) e “aqueles que cotidianamente vivenciam as ações” (ou buscam traduzir as propostas apresentadas em ações práticas de trabalho), como constatado nas observações e adequações necessárias do trabalho docente: “materiais apostilados, ava-liações quantitativas, projetos isolados de cada professor, responsabilização isolada de cada professor, competição, ameaça e redução de horário de trabalho, entre outros”.

Ainda em relação ao conflito institucional vivido pelas professoras, pode ser constatado que, mesmo que a instituição se autodenomi-ne atuante nas causas e propostas inclusivas, cotidianamente, a tradução desses princípios é visualizada pela responsabilização das profes-soras no insucesso dessas mesmas ações: “não posso ir todo dia na sala da coordenadora, ela deixa bem claro quais são as minhas respon-sabilidades, e eu já tenho tempo para saber”; fiquei com receio de que quando estourasse o problema falassem que eu não avisei, fiquei tentando resolver sozinha, tentei até onde con-segui, mas a aluna é da escola, acho que todos devem discutir isso”.

Com essas considerações um foco de análise se abre frente às informações obtidas. De modo geral, a dinâmica institucional da escola não fa-vorece discussões profissionais que contemplem novas estratégias de ensino, o processo de in-clusão parece atrelado às competências de cada professor isoladamente em sua sala de aula,

indicando a compreensão de que o processo de inclusão é uma tarefa do professor. O problema é que o professor se apropria desta atribuição e toma para si a responsabilidade pela inclusão.

Repensar ações consoantes e comprometidas com uma ação pedagógica mais crítica e cons-trutiva exige trabalho em equipe, com base em ações de cooperação, que favoreçam a convi-vência e possibilitem encarar as transformações necessárias com uma ação oposta àquela do trabalho isolado, no qual o professor deve resol-ver tudo sozinho. A ação humana dos docentes deve, acima de tudo, ser entendida por seu fa-zer profissional, baseada no sistema de valores que inspiram suas ações e seus pensamentos, e que os posicionem ativamente frente às reais dificuldades, ao invés de sentirem-se isolados e acuados em suas salas de aula17.

O que se pode perceber é que as ações isoladas da professora são a base de algumas das relações pessoais e sociais vivenciadas na instituição, em que a competitividade parece transformar-se em dificuldade para compre-ender e desenvolver a proposta de inclusão escolar, como um processo efetivo de toda a instituição, como pode ser descrito no relato de observação a seguir: “há uma distinção de dois grupos que dominam a reflexão – “os profissionais da casa” e os “novatos”, e assim novamente o espaço grupal instaura uma lógica de hierarquização fechada ao debate sadio” (transcrição de relato).

São ainda essas mesmas relações de compe-titividade que estremecem as possibilidades de instauração de relações sociais e pessoais que recuperem os sujeitos envolvidos, apresentan-do-lhes novas formas de convívio profissional, não apenas focados em instabilidades e amea-ças. Ressalta-se, ainda, que o apoio institucional e organizacional em relação à estruturação das práticas pedagógicas parece inexistente. Assim, as ações no processo de inclusão escolar de um aluno com necessidades especiais, se apresen-tam como estratégias isoladas e acabam geran-do a exclusão. Segundo uma das professoras: “nunca trabalhei com inclusão, daí chego aqui

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e sozinha vou descobrindo tudo, ou melhor, só vou descobrindo porque ainda não sei o que vou fazer com ele” (transcrição de relato).

Aparentemente, sem orientações precisas da coordenação (justificadas pela política de auto-nomia do professor), a professora utiliza-se de estratégias que se limitam à convivência social de seus alunos: “eles querem que o aluno fique aqui, então vou tentando um pouco de tudo, deixo sozinho, coloco junto, separo, faço o que querem para manter ele aqui, mas dizer que ele está se desenvolvendo, daí não sei” (transcri-ção de relato). A fala da professora revela que, em nome da autonomia, as escolas praticam o abandono. Também não se pode deixar de con-siderar a importância da formação dos docentes no que se refere à preparação para o trabalho com a inclusão de alunos com necessidades especiais, enfatizando que essa formação não deve se resumir à apropriação de dinâmicas e práticas pedagógicas a serem implementadas em sala de aula, mas impulsionar um processo de construção e reconstrução cotidiana das relações pedagógicas e interações humanas.

Entender a prática profissional dos profes-sores nos patamares mais profundos, com a consideração de sua cidadania em sua ação humana, é condição central para a compre-ensão da proposta escolar inclusiva17, é uma ação de reconstrução, que possibilita a reflexão constante com o compromisso no tratamento da diversidade humana.

Assim, discutir o processo de inclusão é ain-da dimensionar o compromisso dos professores e demais profissionais para ações mais compro-metidas e projetos pedagógicos que ultrapas-sem as paredes da sala de aula, e se efetivem em ações pensadas e organizadas coletivamente, e que se contraponham à compreensão de que o processo de inclusão escolar é uma responsabi-lidade única e exclusiva de cada professor em sala de aula, compreensão essa que permeia as relações profissionais e acarretam entraves que sustentam e dificultam as relações pedagógicas em sala de aula.

O que se pode evidenciar é que no âmbito

das relações em sala de aula, reflexos das di-nâmicas de isolamento profissional, que firmam as relações na escola, são firmadas também as relações pedagógicas nas dinâmicas de ensino-aprendizagem relacional. Pôde-se observar uma tendência dos docentes em isolar-se também dentro de suas disciplinas, ou seja, não só dei-xam de realizar atividades conjuntas, como em suas aulas limitam-se aos seus próprios progra-mas e conteúdos. De modo geral, as professoras possuem e utilizam um livro base no qual são descritas e rigorosamente desenvolvidas as ati-vidades em aulas, fato que pode ser constatado no seguinte relato de uma das professoras: “Eu nem me atrevo a participar dessas atividades, essa coisa de temas transversais, puxar um conteúdo de outra matéria e desenvolver, já fiz muito, agora deixo para lá, sei o que tenho que desenvolver, os outros são conteúdos dos outros” (transcrição de relato).

Com base nessa rotina de trabalho, há outra consideração a ser feita: as observações de sua aula revelam ainda que, dentro de uma atuação conteúdista fragmentada, o papel do professor passe a ser concebido pelas professoras como limitado à transmissão do conhecimento aos alu-nos, como evidenciado no relato: “50 minutos de aula, é chegar, abordar o conteúdo, questioná-los se pegaram ou não, e finalizar a aula, é isso!”; “Ao início de cada aula, retomamos tudo que vimos na última lição, senão muitos esquecem e não conseguem dar continuidade às atividades, não esquecem, ficam repetindo e não esquecem mais”, “tenho o conteúdo a ser desenvolvido, tenho o material apostilado, é abordar, explicar e pronto” (transcrição de relato).

Assim como as atribuições limitadas à transmissão do conhecimento, a concepção de avaliação dos alunos também é fragmentada, segundo uma das professoras: “a avaliação deve indicar o que os alunos sabem ou não sabem” (transcrição de relato), compreensão que reflete uma visão apenas quantitativa do processo, e que não se compromete realizar o acompanha-mento dos progressos dos alunos, que somada à compreensão estática de avaliação e às dinâ-

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micas em sala de aula focadas em estratégias reprodutivas de ensino impulsiona os alunos a repetirem os conteúdos ministrados, sem ater-se à concretude do processo de desenvolvimento e construção do conhecimento.

O que se pôde perceber no acompanha-mento da instituição escolar é que, com as relações sociais reduzidas à sala de aula, torna-se comum que as ações pedagógicas passem a se concretizar em processos avaliativos que desconsideram as potencialidades dos alunos, focando apenas suas necessidades. Ações essas que são ainda impulsionadas e justificadas pela adequação aos recursos e procedimentos peda-gógicos, como por exemplo: “adoção de livros didáticos, sistemas de avaliação burocráticos que impõem a todos os alunos e professores que ensinem e aprendam da mesma forma” (transcrição de relato), aniquilando qualquer forma subversiva de desenvolvimento, e que, portanto, parece contrapor-se à efetividade da ação escolar inclusiva.

É dentro da sala de aula que novas possibi-lidades de interações podem ser estabelecidas e confirmar a constituição do desenvolvimento humano em sua complexidade, mas, para tanto, exige a construção e reconstrução do professor como um ser social, que participa na interlocução ativa18. Fato esse que não é considerado pelos docentes, que parecem paralisados frente às possíveis mudanças, não se assumindo como su-jeito ativo em construções sociais e profissionais.

Sem condições para propor atividades di-recionadas, que atendam às peculiaridades do aluno, as professoras revelam “perdição” em relação ao processo de desenvolvimento e aprendizagem: “não dá nem para avaliá-lo, eu acho que tem dias que está melhor, mas como vou avaliar isso?” (transcrição de relato).

As observações quanto às dinâmicas em sala de aula, e procedimentos de avaliação dos pro-fessores, denotam que vivenciam sentimentos de impotência, culpa, frustração, pânico, revolta e isolamento. que a levam ao desânimo e à de-sistência de investir nos alunos, em práticas efe-tivas: “Hoje vou mudar, você me desculpe, pode

não concordar, mas estou cansada, todos acham que eu não dou conta, do jeito normal, você viu, não dou mesmo” (transcrição de relato).

O que não se pode deixar de considerar é que parte da cultura organizacional da instituição é composta por elementos que demarcam isolada-mente ações pedagógicas dos professores que, impulsionados por uma relação competitiva em que se valorizam aqueles que correspondam às suas exigências, penalizam individualmente os insucessos, como se a política organizacional da escola não configurasse padrões a serem estabelecidos, e mais, reproduzidos inclusive nas relações pedagógicas ditas inclusivas. Ou seja, a escola exclui os professores, justamente aqueles que esperam que incluam os alunos.

São inúmeros os estudos que apontam para as consequências da exigência do processo de inclusão escolar, nos quais os professores são obrigados a incluir, sem que sejam considera-das suas próprias necessidades e limites6,19. No entanto, o que ainda parece não discutido são as consequências desse processo no cotidiano de professores de escolas particulares.

Pôde ser constatado que, ainda que as condi-ções físicas e estruturais sejam adequadas, po-dem se transformar em um grande peso ao pro-fissional, que deve não só incluir esses alunos, mas, principalmente, manter sua permanência satisfatoriamente, sob o risco de ser penalizado por possíveis evasões (com processos contínuos de transferências entre as escolas particulares, a qualquer momento do ano letivo), como pode ser evidenciado nos relatos da professora: “Ela me falou: são só cinco alunos em sala, se você não dá conta de ficar com ele, é incompetência sua” (transcrição de relato).

São as reações a ameaças e sufocamento, que quando somadas às exigências das propos-tas inclusivas parecem paralisar a compreensão da instituição escolar sobre as mudanças de concepção, necessárias para se efetivar a inclu-são, e assim continuam propagando a adoção de estratégias que não impulsionam o processo inclusivo.

Porém, o que fica evidenciado é que essa

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compreensão atrelada à proposta de inclusão escolar só se dará de fato quando a instituição avançar para uma discussão organizacional, pois, como já apresentado e discutido, o distan-ciamento existente entre as esferas que com-põem a instituição escolar cria um abismo entre os profissionais, que interfere efetivamente no processo de inclusão em todas as suas esferas (sociais, pedagógicas, acadêmicas, familiares).

CONSIDERAÇÕES FINAISO que se pode perceber no processo de

pesquisa é que algumas deficiências arquite-tônicas e instrumentais passam a se constituir em barreiras secundárias, ao se considerar o distanciamento existente entre a legalidade e objetividade das políticas educacionais inclusi-vas e a realidade vivida nas ações educacionais reais que a escola desenvolve.

A análise dos fatores relacionados à estrutura-ção e à organização da instituição escolar neces-sária ao processo de inclusão denotou que, se de um lado a instituição pode possuir uma avaliação satisfatória quanto a seus aspectos físicos, por outro a organização pedagógica burocratizada parece privar seus profissionais da elaboração das ações a serem construídas, distanciando as esferas de “quem pensa as propostas e de quem as instrumentaliza cotidianamente”.

Já no que se refere aos aspectos que in-fluenciam o processo de inclusão, enfocando as

atividades em sala de aula, puderam ser obtidos entraves pedagógicos, como procedimentos focados ainda na reprodução do conhecimen-to, ou ainda esferas de avaliação com base na competitividade dos alunos que, somados a uma prática profissional de isolamento de cada professor em sua sala de aula, estremecem de modo geral as relações sociais instauradas com a “desconsideração das potencialidades dos alunos/professores”.

Além destas questões, o que já ficou evi-dente no estudo é a interferência de muitos outros aspectos, a depender do contexto que se propõe a implementar a inclusão escolar. No caso da escola particular, por exemplo, a questão socioeconômica do público, assim como a econômico-financeira da instituição, parece ser determinante da forma como os processos inclusivos se desenvolvem no interior da escola. Assim, pode-se concluir que efetivar o processo de inclusão escolar exige o desenvolvimento de uma nova cultural organizacional que pos-sibilite aos próprios professores a criação de espaços profissionais focados na valorização e autonomia, que sustentem a construção de ações pedagógicas com o enfoque às diversi-dades e respeito às diferenças de seus alunos.

AGRADECIMENTOS Ao CNPq, pelo apoio financeiro para a reali-

zação do estudo.

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SUMMARYPrivate school institutions: considerations regarding school inclusion

process

Introduction: The access of all to the Education is one of the effective processes for the ample movement of social inclusion, however, the decurrent contradiction of the shock between legally imposed and divulged and the really possible one it delimits and it gags the proposals of school inclusion. Methods: Thus, on the objective to explore the factors contextual that influence in the process of school inclusion, this study delineated for a qualitative paradigm of research it counted on the participation of three teachers of 1st cycle of Regular Educations of the Regular Net of Private Education of the region of the ABCD/SP. As resources had been prioritized the comments and conversational systems achieved and kept in dill event moments of school activities during the seven months of daily accompaniment of researcher to the institution. Results: The gotten information had been organized and categorized in nucleus of discussion: distance of who thinks and who executes the pedagogical actions; 2) realities lived in classroom. Conclusion: It can be concluded that the success of the process of school inclusion depends primarily on the development of a new organizational culture that makes possible democratic and creative spaces of teachers and pupils in the construction of pedagogical and relational actions with the approach to the understanding of the diversities and respect to the differences.

KEY WORDS: Inclusion. Schools. Child, exceptional.

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Texto produzido a partir dos resultados da tese de

doutorado realizada no Programa de Pós-graduação

em Psicologia como Profissão e Ciência da Pontifícia

Universidade Católica de Campinas, Campinas, SP.

Artigo recebido: 11/10/2009

Aprovado: 12/11/2009

A escolA contemporâneA diAnte do frAcAsso escolAr

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RELATO DE EXPERIÊNCIA

Resumo – A escola contemporânea encontra-se diante de transformações constantes da sociedade. Esta situação obriga que a escola se posicione no sentido de modificar os paradigmas das concepções de ensino-aprendizagem, uma vez que o fracasso escolar se impõe de maneira acentuada na atualidade. O presente artigo objetivou discutir os desafios da escola contemporânea diante dos problemas de aprendizagem e da inclusão, utilizando-se de uma vinheta de caso clínico de um adolescente com representativos problemas de aprendizagem. O caso ilustra o fracasso escolar como produto de uma complexidade de fatores, exigindo um olhar amplo e integrado, a partir de uma interface entre o trabalho clínico, educacional e a família. Retrata uma experiência de inclusão exitosa, a partir de um trabalho de cunho interdisciplinar entre a Psicopedagogia, a Psicanálise e a Pedagogia. A escola como possível (re)produtora do fracasso escolar é objeto de discussão no presente artigo.

uniteRmos: Instituições acadêmicas. Transtornos de aprendizagem. Psicologia. Psicopedagogia.

A escolA contemporâneA diAnte do frAcAsso escolAr

Marilene Gonzaga Gomes Travi – Psicopedagoga,

Especialista em Educação Inclusiva, mestranda em

Inclusão Social e Acessibilidade da Feevale.

Lisiane Machado de Oliveira – Menegotto-Psicóloga.

Mestre e doutora em Psicologia do Desenvolvimento

(UFRGS), docente, pesquisadora e extensionista da

Feevale.

Geraldine Alves dos Santos – Psicóloga. Mestre

em Psicologia Clínica, Doutora em Psicologia,

Pós-doutorado na Faculdade de Serviço Social da

PUCRS. Professora titular e Pesquisadora do Curso

de Psicologia e do Curso de Mestrado em Inclusão

Social e Acessibilidade da Feevale.

Correspondência

Marilene Gonzaga Gomes Travi

Rua João Pedro Schmitt, 750 - Bairro Rondônia -Novo Hamburgo, RS - CEP: 93415-640

E-mail: [email protected]

Marilene Gonzaga Gomes Travi; Lisiane Machado de Oliveira-Menegotto; Geraldine Alves dos Santos

trAvi mGG et Al.

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intRoduçãoA escola contemporânea se vê diante das

transformações da sociedade, obrigando-a a buscar novos posicionamentos. Tais posicio-namentos referem-se a uma mudança de para-digma nas concepções de escola e de ensino-aprendizagem, uma vez que o fracasso escolar se impõe de maneira acentuada na atualidade.

O fracasso escolar nos remete a pensar em problemas de aprendizagem. Para Fernández1, os problemas de aprendizagem são basicamen-te de dois tipos: reativo e sintoma. O problema de aprendizagem como sintoma é aquele que necessita tratamento clínico. Por outro lado, o problema de aprendizagem reativo surge em reação às modalidades de ensino.

O presente artigo objetivou discutir os desa-fios da escola contemporânea diante dos proble-mas de aprendizagem e da inclusão. Para tanto, utilizou-se de uma vinheta de caso clínico de um adolescente com representativos problemas de aprendizagem. Realizou-se uma triangulação analítica entre família, escola e profissionais para identificar respostas que viabilizem a efeti-va inclusão social. Na análise dos dados clínicos também se buscou refletir a articulação entre a Psicopedagogia e a Psicanálise e os importantes diálogos com a Pedagogia.

os desafios e peRspectivas da es-cola contempoRânea A escola atual não está conseguindo cor-

responder às demandas da sociedade. As exigências do mundo atual apontam para uma educação diferenciada2, exigindo quali-ficação mais esmerada e constante formação e informação dos educadores, uma vez que o mundo globalizado aponta para incessante transformação.

Esse desencontro entre escola e sociedade pode gerar e/ou fortalecer os processos de exclusão, sobretudo, considerando uma socie-dade cujo conhecimento é distribuído de forma desigual. Esse aspecto social se apresenta como um expressivo desafio da escola nos dias atuais, na medida em que algumas pessoas

são privilegiadas e outras não conseguem ter acesso ao conhecimento. Nessa mesma perspectiva, Bossa3 afirma que: “Vivemos em um país em que a distribuição do conhecimento como fonte de poder social é feita privilegian-do alguns e discriminando outros. Precisamos buscar soluções para que a escola seja eficaz no sentido de promover o conhecimento e, assim, vencer problemas cruciais e crônicos de nosso sistema educacional: evasão escolar, aumento crescente de alunos com problemas de aprendizagem, formação precaríssima dos que conseguem concluir o ensino fundamental, desinteresse geral pelo trabalho escolar.”

Nesse sentido, “a escola torna-se cada vez mais o palco de fracassos e de formação pre-cária”3. Isso porque as frágeis condições tanto estruturais quanto funcionais de muitas escolas contribuem em grande parte para o fracasso escolar. Tais escolas, na maioria das vezes, não conseguem lidar com as responsabilidades que lhes são delegadas. Nesse contexto, os professo-res, não raras vezes, se vêem oprimidos, angus-tiados e com inúmeras incertezas, fato esse que, em geral, se reflete na relação com os alunos.

Devem-se reconhecer as tentativas de reor-ganização da escola no sentido de prevenir e solucionar o fracasso escolar. Entretanto, a busca de respostas para o grande número de crianças e jovens com dificuldades de aprendizagem exige da escola um repensar em relação aos seus pro-cessos. Nesse sentido, reconhecemos em Paín4 um indicativo para esse repensar, pois, para a autora, a educação pode ser alienante ou liber-tadora, dependendo de como ela é instrumen-talizada. É tomando a preocupação de Paín que pensamos na escola como possível (re)produtora de problemas de aprendizagem.

Paín4 ainda ressalta que o maior problema, na esfera da aprendizagem, é quando a escola “[...] constitui a oligotimia social, que produz sujeitos cuja atividade cognitiva pobre, mecânica e passiva, se desenvolve muito aquém daquilo que lhe é estruturalmente possível”. A autora utiliza a expressão oligotimia, no sentido de um sujeito que se vê impossibilitado de utilizar o

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seu potencial cognitivo. Por oligotimia social, a autora propõe-se a pensar no social como uma forma de impedimento do desenvolvimento cog-nitivo, manifestando-se sob a forma de prejuízos na autonomia do pensamento.

Fernández1, na mesma lógica de Paín4, faz referências a “[...] uma sociedade enferma e causadora de enfermidades, que provoca oligo-timia social e grande parte dos transtornos de ‘aprendizagem reativos’[...]”. Estes elementos permitem considerar que no social e, especial-mente em nossas escolas, a (re)produção do fracasso escolar torna-se cada vez mais respon-sável pela exclusão de muitas crianças e jovens. Sendo assim, o espaço escolar que deveria ser de formação de indivíduos críticos e capazes de transformar a realidade pode tornar-se um ambiente que contribui para o aprisionamento da inteligência e, portanto, a exclusão.

Dolto5 refere que as causas para o fracasso escolar situam-se em “três ordens: sociológica, psicológica e pedagógica”. Esses fatores se con-jugam e são interdependentes. A autora ainda aponta a necessidade de se apropriar da intera-ção desses fatores e compreender seus elementos intercambiáveis para, então, entender seus efei-tos no fracasso escolar. Para tanto, é necessário que haja um olhar mais amplo para as questões do fracasso escolar. Olhar que se volte para o entendimento do sistema escolar atual e para a compreensão dos processos de aprendizagem, o que aponta para a importância de um trabalho articulado e interdisciplinar, no espaço escolar ou não escolar, buscando conceber sujeito e ins-tituição na sua integralidade, sem desconsiderar as suas singularidades.

De acordo com Costa6, a escola do século XXI é alvo de discussões e reflexões entre os docentes, intelectuais e pesquisadores. Por meio de diferentes olhares, esses profissionais tentam encontrar caminhos para uma escola que asse-gure uma formação cultural e científica para toda a vida do sujeito. Costa ilustra o momento atual da educação contemporânea salientando que:“[...] parece que a escola do século XXI ainda se mantém como uma instituição central na vida

das sociedades e das pessoas. Ela não carece de vitalidade. Seu propalado anacronismo parece ser seu catalisador, como uma Fênix que renasce das próprias cinzas. Se a escola da modernidade não se sustenta mais, ela se transmuta, se hi-bridiza em múltiplos cruzamentos e se reproduz nos infinitos discursos que sobre ela enunciam. Ela certamente não é de um único jeito, não toma uma só forma. Ela própria já começa a se reconhecer como território de diversidade, contorcionista da incerteza, prisioneira dos po-deres que a dobram. Mas uma escola que fala a língua do seu tempoespaço poderia continuar fazendo diferença no processo de socialização e educação dos humanos.”

Sem dúvida, a escola ainda ocupa um lugar central na vida das pessoas. É nela que são depositadas inúmeras expectativas em relação ao futuro do sujeito e da sociedade. É também o espaço por excelência onde o sujeito estabelece laços sociais para além da família.

Cabe salientar que a escola sofre os impactos das transformações sociais. Dentre tais trans-formações destacam-se as novas configurações da família. Atualmente, estamos diante de um declínio do exercício das funções parentais. O que vemos é, muitas vezes, a família delegando à escola responsabilidades que outrora eram culturalmente suas. O declínio do exercício das funções parentais gera impasses na constituição subjetiva, fazendo com que as crianças cheguem às escolas com fraturas significativas no desejo de aprender. Muitas delas apresentam proble-mas de aprendizagem como sintoma4, o que exige da escola um redimencionamento de suas práticas e processos. Paralelamente, a escola, na atualidade, está diante do imperativo que reza que ela deve ser para todos.

Em relação a isso, Beyer7 afirma que “uma escola para todos nunca existiu” e que a escola sempre foi imposta como uma fonte de poder social, em que somente os mais abastados eram os mais privilegiados. Ele evidencia que:“[...] na história da educação formal ou escolar, nunca houve uma escola que recebesse todas as crianças, sem exceção alguma. As escolas sempre

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se serviram de algum tipo de seleção. Todas elas foram, cada uma à sua maneira, escolas espe-ciais, isto é, escolas para crianças selecionadas. As escolas de filosofia da Antiguidade, os mos-teiros da Idade Média, as escolas de filosofia da Renascença - todas foram escolas especiais para crianças especiais, selecionadas. Neste sentido, também hoje as melhores escolas particulares em nosso país são escolas especiais, que acolhem não todas as crianças, porém, apenas algumas delas (obviamente, aquelas cujas famílias têm condição financeira privilegiada para bancar seus estudos).“

Embora a escola nunca tenha sido para to-dos, é fato que a Declaração de Salamanca da UNESCO8 teve um impacto social, cobrando da escola e da sociedade uma abertura para as dife-renças. A proposta da Educação Inclusiva remete a uma ressignificação das práticas pedagógicas, respaldando-se no paradigma do respeito às di-ferenças. Exige uma nova organização da escola, sendo esta pautada por processos que assegurem o acesso, a permanência e a aprendizagem de todos os alunos. As transformações pautadas nas novas configurações familiares, bem como o imperativo trazido pelo movimento da educação inclusiva, sem dúvida tiveram um impacto na escola, gerando inquietações, angústias, incer-tezas e inseguranças.

O professor, diante disso, é quem tem ma-nifestado maior sofrimento, uma vez que tais transformações exigem dele um reposiciona-mento, pautando sua função para o olhar para diferentes processos de ensino e aprendizagem. Isso porque o professor está frente a alunos que, muitas vezes, apresentam impasses no que se refere à aprendizagem e ao relacionamento interpessoal, sendo frequente o sentimento de incapacidade e até mesmo a recusa em trabalhar com eles. Por isso, é preemente que o professor seja acompanhado nesse processo.

Pensar na escola e no educador em meio a este panorama social em plenas transformações aponta para a necessidade de criação de parcerias que possam trabalhar de forma articulada. Nesse sentido, a articulação da Pedagogia, Psicanálise e

Psicopedagogia traz subsídios importantes para a implantação de uma escola verdadeiramente inclusiva e, sobretudo, uma escola que busque a não (re)produção do fracasso escolar.

Estamos propondo uma articulação inter-disciplinar que possibilite apoio ao professor que, diante da diferença, se vê desamparado e impotente. Entendemos por diferença o aluno que deflagra angústia no professor, por um dis-tanciamento significativo em relação aquilo que ele espera. Nesse sentido, alunos com necessi-dades especiais, bem como alunos com proble-mas de aprendizagem, podem representar para esse professor a diferença. O aluno diferente, não raramente, remete o professor a um estado de não saber o que fazer. Nessa perspectiva, a Psicanálise, a Psicopedagogia e a Pedagogia, de forma interdisciplinar, podem auxiliar o pro-fessor a retomar a sua função como educador. A Psicanálise trabalha no campo da subjetividade e dos modos de subjetivação e de relação com o outro. A Pedagogia trabalha no campo do currículo, do método e da avaliação. A Psicope-dagogia se insere no campo da aprendizagem humana, tendo como foco de estudo o aprender e o não aprender, ressignificando as relações do sujeito com as mais diversas aprendizagens. Trata-se de saberes que ao serem articulados podem trazer importantes benefícios à escola e ao social, como um todo.

a tRaJetÓRia de um adolescente no pRocesso de inclusão escolaR: uma vinHeta de caso clÍnicoPartiremos de uma vinheta de caso clínico para

discutir as questões relativas ao fracasso escolar na sociedade contemporânea. Trata-se de um adoles-cente com significativos problemas de aprendiza-gem, enfrentando dilemas referentes ao processo de inclusão social. Nossa discussão será pautada na defesa de um trabalho de cunho interdisciplinar entre a Psicopedagogia, a Psicanálise e a Pedago-gia, contando com todo o respaldo necessário da escola em que o rapaz estava estudando.

Estaremos referindo o adolescente em ques-tão pelo nome fictício de Carlos, no sentido de

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preservar sua identidade. Trata-se de um rapaz, que na época dos atendimentos tinha 15 anos de idade. Estava cursando o primeiro ano do ensino médio numa escola da rede particular de ensino.

Chamava a atenção o seu aspecto sindrômi-co, caracterizado por olhos puxados e um corpo hipotônico, que lhe concedia um ar desajeitado. Além disso, apresentava uma expressão apática, como se nada lhe despertasse interesse. Embora sua aparência indicasse uma alteração genética, os pais se recusaram a realizar uma investigação com tal especialista.

A queixa da escola era que Carlos apre-sentava uma desorganização que o impedia de aprender e realizar as atividades escolares. Aprender não parecia fazer algum sentido na vida dele. Sua apatia também se apresentava na relação com os pares, sendo, por conta disso, segregado pelos colegas.

A avaliação médica, realizada no período da sua infância, acusava uma significativa defici-ência auditiva, apresentando 100% de perda auditiva no ouvido direito. Também apresen-tava dificuldade visual, que fora diagnosticada apenas na adolescência. Sua problemática, no entanto, não era apenas de caráter orgânico-funcional, atingindo também a esfera psíquica, sociocultural e familiar.

Os pais relatavam uma gravidez não planeja-da e muito sofrida para a mãe, devido a um qua-dro de depressão e de inúmeras hospitalizações. O parto foi induzido e muito difícil, com muito sofrimento para a mãe e para o bebê. Segundo ela, o menino nasceu “roxinho”, remetendo-nos a pensar num quadro de cianose, precisando da intervenção imediata do pediatra. Era um bebê descrito pelos pais como “bonzinho”, pois quase não chorava.

A história escolar de Carlos foi de muito sofrimento, caracterizada por uma sucessão de reprovações, sendo também marcada por muitos fracassos na leitura e escrita. Chegou ao ensino médio com lacunas significativas na construção do seu conhecimento formal. Foi somente no ensino médio, quando Carlos passou a estudar numa nova escola, que foi en-

caminhado para uma avaliação psicopedagógi-ca. Avaliação que confirmou a preocupação da escola quanto ao problema de aprendizagem. Carlos também foi encaminhado para uma avaliação psíquica, havendo a necessidade de indicação de um tratamento nessa área, realizado paralelamente ao acompanhamento psicopedagógico, que já se efetuava.

O acompanhamento psicopedagógico e psíquico, na realidade, não se propunham a trabalhar somente com os comprometimentos de Carlos no âmbito clínico. O trabalho estava calcado numa proposta de articulação interdis-ciplinar, considerando os saberes da Pedagogia, Psicopedagogia e Psicanálise, no sentido de fazer valer o processo de educação inclusiva de Carlos. Afinal, havia a necessidade de prepará-lo para os três anos do ensino médio e para a sua inclusão social em outras dimensões, como por exemplo, trabalho e esporte.

O trabalho interdisciplinar ocorreu a partir de reuniões com a equipe pedagógica, que se encarregava de repassar nossas discussões para os professores. Em determinadas situações, en-tretanto, se fez necessário o contato com todos os professores para conversarmos sobre os avanços terapêuticos de Carlos e sobre questionamentos e orientações quanto ao desenvolvimento do trabalho em sala de aula. Tais espaços foram pautados, especialmente, por reflexões acerca da necessidade de flexibilização curricular, já que Carlos apresentava significativas lacunas relati-vas à aprendizagem formal. A principal queixa da escola era de que Carlos revelava precárias condições para a interpretação e compreensão de textos, além de ter dificuldades em estabelecer relações entre os conhecimentos já adquiridos e os novos. Para os professores, era sempre um recomeço com o aluno nas atividades em sala de aula. Do ponto de vista psicopedagógico, a avaliação demonstrou que Carlos apresentava uma total rejeição aos objetos de aprendizagem escolar e um déficit lúdico, demonstrando em-pobrecimento quanto à capacidade de antecipar, coordenar e classificar. Também apresentava acentuada dificuldade para criar e recriar o

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conhecimento. Quanto às questões psíquicas, a avaliação evidenciou que Carlos apresentava comprometimentos psíquicos, sendo estes porta-vozes da dinâmica de funcionamento familiar. Como já dizia Dolto9, o trabalho psicanalítico com crianças e adolescentes situa-se nos laços familiares, uma vez que a criança e o adolescente são porta-vozes de seus pais. Desta forma, a apa-tia de Carlos, desde bebê, revelava, entre outros aspectos, o quanto seus pais pouco lhe deman-davam, produto de fraturas no desejo parental. Afinal, o discurso dos pais sinalizava que eles pouco esperavam de Carlos, sendo sua apatia uma espécie de laço estabelecido entre eles.

Eram inegáveis os comprometimentos de ordem orgânica, sendo diagnosticados déficits de visão e audição e levantada uma suspeita de alteração genética, em função de sinais ca-racterísticos de síndromes genéticas. Embora se apresentasse este quadro orgânico, o que evidenciamos, a partir dos acompanhamentos psicopedagógico e psíquico, era que Carlos apresentava impasses na sua constituição como sujeito. Tais impasses tiveram repercussões nas questões relativas à aprendizagem, denuncian-do, portanto, problemas de aprendizagem como sintoma1. Sintoma que mostrava o narcisismo ferido dessa família, pela vinda de uma crian-ça não desejada e incompatível com os ideais parentais. Uma criança que, desde a gestação, esteve à mercê de um entorno frágil e que pouco conseguiu estabelecer os contornos do corpo de Carlos. A hipotonia, possivelmente, pelo menos em parte, denunciava problemas na estrutura-ção de um corpo que pudesse fazer frente às demandas do outro.

Como os acompanhamentos foram buscados quando Carlos já era adolescente, não tínhamos dados precisos acerca dos primórdios de sua constituição subjetiva. Os dados que tínhamos acessos referiam-se aos relatos de seus pais, bem como, aquilo que se apresentava enquanto dificuldades na vida atual de Carlos. O relato dos pais e as dificuldades de Carlos nos remetiam a pensar em fraturas significativas na constituição do laço de filiação, sendo este o fundamento da

estruturação de um corpo marcado por signi-ficantes, de acordo com a Psicanálise10-16. Tais fraturas nos indicam duas questões principais: o relato de depressão materna e o fato de os aspectos sindrômicos estarem marcando um distanciamento em relação ao bebê, em geral, sonhado pelos pais. Nesse sentido, além da vulnerabilidade psíquica materna, a marca da diferença estampada no rosto de Carlos possivel-mente estaria sinalizando para uma fragilidade na constituição do laço de filiação.

Quando a constituição do laço de filiação é comprometida, muitas vezes, observamos repercussões psíquicas e psicopedagógicas muito semelhantes àquelas apresentadas por Carlos. Entendemos que a deficiência auditiva e visual pode ter um impacto na aprendizagem, mas acreditamos que, nesse caso, os aspectos relativos à constituição de sujeito se fizeram marcantes no desenvolvimento dos problemas de aprendizagem.

Tendo em vista tais questões, o percurso terapêutico teve como norte alcançar o estatuto de sujeito de desejo, que para a Psicanálise é o que possibilita a aprendizagem. Tomamos sujeito do desejo no sentido lacaniano. O sujeito, para Lacan17, se constitui no campo do Outro, estan-do inicialmente alienado ao desejo do Outro e, portanto, numa posição de objeto, para então, a partir da separação, operação dada pela castra-ção, constituir-se como sujeito do desejo. Sendo assim, constituir-se como sujeito do desejo abri-ria, para Carlos, possibilidades para ele desejar a aprender e, dessa forma, a escola ter um sentido para a sua vida. Isso nos possibilitou trabalhar uma das facetas da inclusão, qual seja, a da constituição do sujeito, que se instaura a partir de um trabalho clínico, no sentido de propiciar o movimento da filiação para a inclusão. A filiação aponta para um lugar simbólico, de pertenci-mento na família. Poderíamos dizer que a filiação é a nossa primeira experiência de inclusão e que, portanto, a forma como ela foi constituída terá efeitos na inclusão em outros âmbitos da vida, tais como: escola, trabalho, sociedade15.

Além do trabalho desenvolvido com Carlos,

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foi essencial o empenho com os pais no sentido de resgatar os seus lugares nas relações fami-liares e, sobretudo, o lugar de sujeito de Carlos. Isso envolveu percorrer os desejos de cada um em relação ao filho, o que nos possibilitou es-tabelecer os contornos entre as limitações e as potencialidades de Carlos, para que esses pais pudessem, a partir de então, permitir que ele conquistasse um lugar nessa família, marcado por satisfações, por alegrias e não mais somente por decepções e frustrações. O trabalho também possibilitou o resgate da curiosidade, do prazer da descoberta e do aprender, da autonomia e da autoria de pensamento, pois o lugar destinado pela família ao aluno era “o lugar do que não pode aprender”1. Para eles, Carlos não sabia, não podia e não devia fazer nada. Como já foi sinali-zado anteriormente, os pais de Carlos ocupavam lugares de poucos desejos em relação ao filho.

O trabalho clínico era guiado por esses pres-supostos, porém o caso apontava para o fracasso escolar como produto de uma complexidade de fatores. Nesse sentido, não apontava somente para as questões subjetivas de Carlos, mas também a uma idéia de possíveis fracassos no processo de inclusão. Embora as dificuldades de Carlos apontassem para problemas de aprendi-zagem como sintoma, não poderíamos descon-siderar a presença de impasses institucionais, de modo que Carlos também poderia estar apre-sentando problemas de aprendizagem reativos1. Nesse sentido, o fato de apresentar problemas de aprendizagem como sintoma não invalida de se pensar nos obstáculos institucionais. Isso porque o aluno que apresenta significativos problemas de aprendizagem, não raras vezes, desestabiliza o professor, fazendo-o perder suas referências em relação a sua atuação docente. Assim sen-do, era fundamental que o trabalho clínico não permanecesse reduzido aos aspectos subjetivos de Carlos, e sim que propusesse uma articulação interdisciplinar com a Pedagogia, baseado na premissa de que a escola era um espaço vital para ele, assim como é para todas as crianças e jovens. Um espaço de estabelecimento de laços sociais para além da família.

Para Carlos, entretanto, a escola era um espaço que o remetia a frustrações e fracassos. Nesse sentido, havia a necessidade de ressig-nificação desse lugar e da relação entre Carlos e a escola. Isso deflagrou um repensar sobre as práticas escolares, que fora fundamental para o processo de ressignificação da escola. A proposta era promover o máximo de autono-mia e autovalorização do aluno, respeitando as diferenças, as limitações e, principalmente, acreditando no potencial e nas possibilidades de sua aprendizagem. Isso exigiu que a escola saísse da lógica curricular como algo engessado e previsto, para entrar na lógica da primazia do sujeito. Sendo assim, não falamos mais de integração e sim de inclusão. A diferença en-tre integração e inclusão é que na primeira os alunos devem se adaptar ao que está posto no currículo, sendo ele ainda a referência das rela-ções de ensino e aprendizagem; na segunda, há uma abertura, por parte da escola, às diferenças e, nesse sentido, a aprendizagem se dá por meio de adaptações curriculares, considerando os diferentes modos de subjetivação e de aprender.

Esta vinheta de caso clínico nos remete a pensar em problemas de aprendizagem que conjuguem os aspectos de ordem sintomática e os aspectos institucionais. Incluímos aqui os aspectos institucionais, pois se tratava de uma escola que, não muito diferente das demais, se confrontava com muitas dificuldades para tra-balhar com a inclusão. Não contava com uma proposta efetivamente inclusiva em seu Projeto Político-Pedagógico e, ademais, seu corpo do-cente não se sentia capaz para agir de acordo com os pressupostos da educação inclusiva. Nesse sentido, a experiência com Carlos foi fun-damental, pois o trabalho foi se dando a partir da prática diária. Para tanto, foram necessários encontros sistemáticos com a equipe pedagógica da escola. Afinal, essa equipe era responsável pela gestão pedagógica da escola. O trabalho se inscreveu numa proposta interdisciplinar, por meio do estabelecimento de uma relação de parceria entre a clínica e a escola. Também foi necessário realizar encontros com os professores,

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para que eles pudessem encontrar ali um espaço de fala, de escuta, enfim, de trocas. O trabalho sempre se deu no sentido de refletir sobre o fra-casso escolar como não sendo apenas produto de funções parentais fragilizadas e de problemas de constituição subjetiva, mas também produto institucional, pensando aqui as relações esta-belecidas na escola, pois elas facilmente podem reproduzir a questão sintomática, aprisionando-se nas limitações do aluno, sem conseguir, portanto, investir nas suas reais capacidades e potencialidades. É nesse sentido que aqui postu-lamos que a escola pode se colocar num lugar de (re)produção do fracasso.

Defendemos no presente artigo a importância de um trabalho clínico articulado com o trabalho educacional. Afinal, de nada adianta trabalhar as questões sintomáticas se, no âmbito da escola, não há um trabalho efetivamente inclusivo, que acolha as diferenças, as limitações e aposte nas potencialidades do aluno. Ao longo dos encon-tros com a escola, fomos percebendo os avanços de todos: dos trabalhos clínicos, da escola, da família e, sobretudo, de Carlos. Isso porque os diferentes saberes articularam-se e tornaram possível uma visão mais global e integrada de Carlos. Os avanços, nesse sentido, foram visí-veis a partir do momento em que, efetivamente, criou-se um espaço interdisciplinar. Podería-mos dizer que tal espaço também operou em caráter preventivo, uma vez que conseguimos evitar maiores riscos inerentes ao processo de subjetivação e aprendizagem em casos como o de Carlos. Um dos maiores produtos de nosso trabalho em parceria foi reconhecer as potencia-lidades de Carlos e seu ritmo de aprendizagem singular, por parte da escola e da família. Cabe salientar que tanto a escola como a família conseguiram bravamente enfrentar os desafios da inclusão. Do ponto de vista da escola, os professores mantiveram-se abertos e desejosos em relação ao processo de aprendizagem de Carlos. A coordenação pedagógica da escola, no decorrer dos três anos do ensino médio, ficou em contato frequente com a psicóloga e psicopedagoga clínica permitindo, assim,

uma avaliação constante quanto ao processo inclusivo. Os pais, por sua vez, permaneceram atrelados ao processo de inclusão de seu filho, acompanhando-o na escola e nos atendimentos.

Apesar das dificuldades encontradas por Carlos em sua trajetória, poderíamos definir tal experiência de inclusão como exitosa. Carlos terminou o terceiro ano do ensino médio com perspectivas de fazer um curso técnico na área da informática pelo qual estava mais identifi-cado. No entanto, o mais importante é que no transcorrer do trabalho, Carlos conseguiu esta-belecer os contornos entre seus limites e suas potencialidades.

Diante da complexidade das relações sociais, acreditamos que a escola contemporânea não tem mais como fugir da perspectiva interdisci-plinar. Isso porque tal complexidade requer a interface de diferentes saberes, na medida em que um só não dá conta de suas vicissitudes. Nesse sentido, articular os saberes da educação e da saúde é de fundamental importância, no sentido de promover reflexões e ações de forma mais integrada e global.

consideRações finaisO presente artigo se propôs a discutir os

desafios da escola contemporânea diante dos problemas de aprendizagem e da inclusão. Vi-mos que a escola contemporânea está diante da complexidade das relações sociais, necessitando rever seus paradigmas, na medida em que ainda ocupa um lugar central e de referência na vida das pessoas. Um dos maiores desafios enfren-tados pela escola contemporânea refere-se aos impactos gerados pela educação inclusiva, o que a coloca diante da diferença, seja nos aspectos de constituição subjetiva ou de aprendizagem. Sendo assim, a escola precisa repensar sua identidade para não somente acolher a diferen-ça, mas também assegurar a permanência e a aprendizagem de crianças e adolescentes com problemas de aprendizagem.

Quando a escola não se flexibiliza, mantendo-se num sistema rígido e engessado, facilmente pode produzir ou reproduzir o fracasso escolar. A

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reprodução do fracasso escolar, em geral, ocorre quando a escola se identifica com a família, não apostando nas reais possibilidades e capacidades de cada sujeito e, portanto, não respeitando a sua singularidade no processo de aprendizagem.

A partir do relato da vinheta de caso clínico e das intervenções da Psicopedagogia e da Psicologia foi possível compreender a importância de um trabalho interdisciplinar, que possibilite a comunhão destes diferentes saberes, compondo uma visão integrada do sujeito, de modo que sejam respeitadas suas diferenças e peculiaridades. Percebemos também que a escola, frente à diferença, se vê, muitas vezes, numa condição de desamparo, necessitando de

um espaço de escuta e discussão sobre questões de aprendizagem e comportamento, no sentido de restabelecer o saber do professor, para que ele possa também apostar nas potencialidades do aluno.

Embora o artigo tenha apresentado somente uma vinheta de um caso clínico, sendo, portanto, impossível realizar generalizações, nosso intuito foi trazer a contribuição de uma experiência exitosa de inclusão, apontando que o diálogo interdisciplinar é fundamental em casos como o de Carlos. Isso porque o fracasso escolar é fruto de uma complexidade de fatores, exigindo um olhar amplo e integrado dos diferentes saberes envolvidos com a saúde e a educação.

summaRyThe contemporary school concerning the school failure

The contemporary school is faced with constant changes of society. This requires the school to be positioned to change the teaching and learning conception paradigms, since school failure is remarkable today. This article aimed to discuss the challenges of contemporary school face the problems of learning and inclusion, using a clinical case vignette of an adolescent with representative learning disabilities. The case illustrates the failure of school as a product of a complex of factors, requiring a comprehensive, integrated look, from an interface between the clinical and educational works and family. It portrays an experience of successful inclusion, from an interdisciplinary work between the Psychopedagogy, Psychoanalysis and Pedagogy. The school as possible (re) production of school failure is the subject of discussion in this article.

Key woRds: Schools. Learning disorders. Psychology. Psychopedagogy.

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Trabalho realizado na Feevale, Novo Hamburgo, RS. Artigo recebido: 05/7/2009

Aprovado: 30/10/2009

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O laçO sOcial e a aprendizagem

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PONTO DE VISTA

RESUMO – Este artigo visa algumas proposições acerca da Psicanálise e da Educação, a luz de conceitos como laço social e laço parental e o papel do Outro de Lacan, que constituem a base da subjetivação do indivíduo. A estrutura social da escola promove o conhecimento, mas a família é a responsável pela consolidação dos laços que possibilitam à criança se tornar desejante do saber e do conhecimento. As funções materna e paterna, ligadas à importância do Outro na constituição do sujeito, mostram àqueles educadores interessados na fundamentação psicanalítica um estudo de caso em que sujeito e desejo estão em embaraço, causando o não aprender nas séries iniciais da alfabetização.

UNITERMOS: Aprendizagem. Relações familiares. Relações interpessoais. Meio social. Psicologia social.

O laçO sOcial e a aprendizagem: algumas breves cOnsiderações

Morgana Martins Grudzinski

Morgana Martins Grudzinski – Pedagoga e Psicopedagoga Clínica, Especialista em Diagnóstico e Tratamento dos Transtornos do Desenvolvimento na Infância e Adolescência - no Centro de Estudos Dr. Paulo César Brandão - Centro Lydia Coriat de Porto Alegre. Atua como Professora de Educação Infantil desde 1999 e em Clínica Psicopedagógica com Crianças e Adolescentes desde 2003.

Correspondência Morgana Martins Grudzinski Rua Felipe Néri, 320, conjs. 203 e 204 - Bairro Auxiliadora - Porto Alegre, RS - CEP 90440-150E-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃOConceber a Psicanálise como ligada à Edu-

cação nos remete aos escritos de Freud, que embora não tenha ligado diretamente as duas áreas, deu vazão a interlocuções possíveis.

Sigmund Freud (1913) cita o interesse cien-tífico de outras áreas com relação à Psicanálise, quando afirma que a Educação “psicanalitica-mente esclarecida” é entendida como importante na profilaxia das neuroses, tendo em vista que “quando os educadores se familiarizarem com as descobertas da Psicanálise, será mais fácil se re-conciliarem com certas fases do desenvolvimento infantil e, entre outras coisas, não correrão o risco de superestimar a importância dos impulsos instintivos socialmente imprestáveis ou perversos que surgem nas crianças”1.

Creio que Freud1,2 se refere mais à educa-ção de casa, onde os pais são responsáveis por “humanizar” as crianças, tornando-as pessoas inseridas na sociedade, com laços sociais conso-lidados. A instituição escola é o segundo lugar de acolhimento das crianças, é lá onde a socializa-ção, a linguagem, os hábitos de vida e a apren-dizagem aparecem de forma plena, entendendo que o comportamento do indivíduo mostrará como realmente ele é, onde professores com uma escuta sensível podem detectar possíveis fraturas na estruturação psíquica dos alunos.

Alguns autores mais contemporâneos têm dado contribuições interessantes acerca do pen-sar educação escolar e psicanálise.

Margareth Shäffer3 realiza uma análise da relação entre a Epistemologia Genética, tão amplamente usada nas escolas que se propõe a uma ação educativa construtivista, e a Psi-canálise. Jean Piaget não considerou o sujeito inconsciente de Freud, em razão disso, muitos educadores buscam na Psicanálise o entendi-mento do não-aprender, expressão usada tanto no meio educacional quanto psicológico. A auto-ra não vê a possibilidade concreta de intersecção entre Psicanálise e Psicologia Genética, entre sujeito de desejo e sujeito da Cognição “...des-sas duas posições, apesar de suas divergências internas, só poderá advir um não-método. Da

Psicologia Genética, porque ela se fundamenta na espontaneidade de construções dos sujeitos; e da Psicanálise, porque lida com o inconscien-te, que escapa a qualquer tentativa de domínio, de aprisionamento que permita determinar os meios a empregar para atingir determinado ob-jetivo – processo que se faz necessário quando se trabalha com a Educação. “Como nos coloca Millot, mesmo que as teorizações psicanalíticas forneçam subsídios para esclarecer os meca-nismos psíquicos em que se funda o processo educacional da relação professor-aluno e da aprendizagem, tal esclarecimento não aumenta o domínio sobre esse processo. Assim, as esperan-ças de se aliarem tais abordagens, com a finali-dade de unir uma metodologia construtivista de trabalho com uma pedagogia analítica de base psicanalítica frente ao educando, parecem estar fadadas ao fracasso. É como nos diz Millot: “não existe pedagogia analítica no sentido de que o educador poderia adotar uma posição analítica frente ao educando, de tal sorte que isto poderia evitar o recalque ou permitir sua suspensão”. Assim, a antinomia “entre processo psicanalítico e educação tem como corolário a impossibilidade de ocupar, frente à mesma pessoa, o lugar de educador e de analista” (Millot apud Schäffer3)”.

O objetivo desse artigo não é se deter na aná-lise teórica da relação entre as duas vertentes, mas sim propor reflexões acerca da subjetivação promovida pelos pais, em relação à inserção social-educativa dos filhos e seu não aprender. Subjetividade e cognição estão em pauta nesse processo e podem, ao meu ver, serem alicerces para compreensão dos profissionais que se comprometem com ações concretas para um aprender saudável.

Lacan entende que a subjetividade de um indivíduo está ligada às figuras parentais que cumprem funções diferentes dentro da vida infantil. A criança se relaciona à mãe como um espelhamento, pois seu desejo é o desejo daquela que deseja por ela, num primeiro mo-mento. A subjetivação perpassa questões intra e inter-relacionais. O ser humano adulto pode fazer surgir ou não o sujeito desejante naquele

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ser que nasce dependente do adulto. O desejo, cujo efeito principal é a possibilidade de indi-viduação, aparece intensamente por meio da criação dos filhos. A mãe, exercendo sua função materna, pode subjetivar de um jeito ou de outro sua criança.

O primeiro momento psíquico do bebê é o espaço materno. É a mãe que proporciona para o bebê a quietude, o prazer ao adormecer e ma-mar. O bebê estabelecerá com a mãe uma relação de fusão. A mãe estruturará a vida psíquica no bebê, que nos primeiros meses depende dela para sobreviver.

A função paterna, exercida por aquele sujeito que se mostra um terceiro na relação entre a mãe e a criança, delimita uma lei, uma regra social que se encarrega dos valores culturais da sociedade em questão. A dependência da mãe, de seus cuidados maternais e acolhedores, cede espaço às proibições, o que se pode e não pode, os interditos são postos por essa figura que tem um papel também fundamental na estruturação do sujeito.

O desejo de incesto, tão apregoado pela Psi-canálise, encontra neste terceiro uma interdição necessária que proporcionará a subjetivação ne-cessária para a aprendizagem acontecer. Desde as brincadeiras de Fort-dá, que Freud descreve em “Além do princípio do prazer”, torna o in-divíduo um ser que joga. E espera o retorno da mãe, que deixou a lacuna da falta como marca subjetiva importante a esse sujeito.

Neste contexto, cabe indagar quem é o Outro de Lacan?

O Outro, segundo Chemama4,5, “...funda-mentalmente constitui aquilo a partir do qual é ordenada a vida psíquica, isto é, o lugar onde insiste um discurso que é articulado, mesmo que nem sempre seja articulável”.

O outro é visto também como a ordem da linguagem, e sabemos que em Psicanálise a linguagem é fundante do psiquismo do sujeito.

Um artigo extraído da Internet foi escla-recedor com relação ao conceito de Outro no Seminário XVI de Lacan (De um outro ao Ou-tro). O autor, Luiz Eduardo Prado de Oliveira6,

nos diz que, em 1966, Lacan definiu o Outro como sendo para o sujeito “...o lugar de onde pode ser colocado, para ele, a questão de sua existência”, isto é: de sua sexualidade e de seu desejo, de sua procriação e de sua filiação, de sua existência e de sua morte, do destino que terá sido o seu, enfim. Outro, portanto: um lugar de questionamento do sujeito. Poderia ser uma versão lacaniana do conceito de Inconsciente. Outro é um lugar, um espaço, topológico, decerto. Intrapsíquico... Bastaria que deste lugar viesse o questionamento de cada um quanto à sua existência e seus principais eixos para que ele (o lugar) se constitua como o Outro. Logo poderá ser também: um Outro idioma, um Outro país, uma Outra prática social, sob a forma banal de uma Outra sociedade transformada pela revolução. Provavelmente, uma Outra pessoa. Em outro lu-gar, onde trata da Subversão do sujeito e dialética do desejo no Inconsciente freudiano, Lacan muda de registro: “Do qual se deduz que este Outro não é nada além do puro sujeito da moderna estratégia dos jogos, como tal perfeitamente acessível ao cálculo da conjectura, porquanto o sujeito real, para pautar o que lhe é devido, não se dará conta, aí, de nenhuma alienação dita sub-jetiva ao senso comum, quer dizer, psicológica, mas somente da inscrição de uma combinatória cuja exaustão é possível. Lacan passa, então, ao domínio do cálculo das probabilidades, à lógica das combinatórias”6.

O Outro passou de um lugar de questiona-mento para um lugar da inscrição da combi-natória. Lacan articula o inconsciente com a lógica matemática das combinatórias: “A análise combinatória é um elemento da teoria dos con-juntos que trata da organização dos grupos de elementos ou da organização de uma série de números cujo último depende do primeiro. Ela desempenha um papel determinante na teoria dos jogos e da circulação da informação. De ma-neira surpreendente, no meio do mesmo artigo, Lacan dará um salto da matemática à linguísti-ca. Escreverá, então, que o Outro é “o lugar do tesouro do significante, o que não quer dizer do código”6. Portanto, o que isso não quer dizer? Que

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o Outro não seja o lugar do desdobramento de uma correspondência unívoca entre um signifi-cante e qualquer coisa, que o Outro não pode ser assimilado ao código de trânsito, ao código de boas maneiras, ao código telegráfico, ao código Morse, e que dele não emanará nenhum SOS, como também nenhum imperativo, nenhuma lei. E o que é “o lugar do tesouro do significante”? É “o lugar do ajuntamento sincrônico e enume-rável, onde nenhum (significante) se sustenta senão pelo princípio de sua oposição a cada um dos outros.” O significante é entendido, portanto, aqui, em termos de linguística”6.

É a relação com esse Outro e mesmo com as funções parentais, que muitas vezes falham na estruturação do sujeito, muito nos interessa ao pensarmos na criança que não aprende, na criança em que o desejo está remetido a outra ordem que não a das letras e dos números.

O laço social, onde a escola está inserida, sur-ge a partir do laço parental. Mas como entender melhor esses 2 laços?

Molina7 explica que o laço parental é “o ve-ículo da transmissão dos traços identificatórios aportados pela função materna e pela função paterna. A estruturação psíquica através destas operações possibilita a função perceptiva regis-trar o mundo, simultaneamente, desde a pers-pectiva de si e do outro, gerando as condições necessárias para nutrir a palavra da sua função evocativa, significante”7.

O laço social, por sua vez, é uma atadura humana “que vai sendo montada pela via do significante investido afetivamente e que se constitui por traços identificatórios, ordenados por um código moral, ético e estético”8.

A Psicopedagogia nessa concepção é vista como atravessada pelo saber da Psicanálise, que sugere ao psicanalista e – acrescento também àquele profissional atravessado pela Psicanáli-se – que o espaço da dúvida pode dar lugar ao surgimento do saber do mundo.

RELATO DE CASOCito a seguir o caso de K, 9 anos, que chega

encaminhado pela Psicóloga do Posto e pela es-cola para uma avaliação na área da Psicopedago-gia com queixas de problemas na Alfabetização. Vem oriundo de uma família em que a mãe mora em outra cidade e o visita eventualmente, em datas especiais ou em feriados prolongados, o pai numa terceira cidade, sem manter contatos com a mãe e sem visitas a ele. K. é cuidado e educado por uma tia que muitas vezes se refere como mãe e que o cria com ameaças de “voltar para a mãe - quando não se comporta bem e quando não estuda direito”.

As funções materna e paterna, neste caso, são exercidas por outras pessoas, os cuidadores, a quem K. respeita como adultos que cuidam dele, mas que não são seus genitores.

CONSIDERAÇÕES ACERCA DO CASO K.Temos claro que os pais são protagonistas nas

inscrições inconscientes fundantes nos filhos, muito embora outras pessoas possam exercer funções complementares, como coadjuvantes à estruturação psíquica do sujeito.

K. sofreu abandono por parte da mãe, que o deixou aos cuidados da irmã mais velha, que da forma que consegue vem educando o menino. Com relação ao saber escolar, essa cuidadora procura significar conhecimento com vistas à aprendizagem, muito embora ela mesma não detenha os conhecimentos escolares. Os signi-ficantes para que ocorra o desejo por aprender já foram estruturados de forma desarmônica.

K. teve um saber lhe foi abstraído, que é o saber de si, de sua filiação, de quem o fez e que não o quer por perto.

Saber de si pode estruturar o saber do mundo, não querer saber do mundo pode ser um jeito de não pensar em sua problemática de filiação.

De acordo com Silvia Molina7, “Tudo o que não é colocado em palavras exerce um efeito inibidor, obstáculo para a ampliação da função simbólica”.

Significantes que giram em torno do sentir-se abandonado podem interferir na não aprendi-zagem de K., que mostra em sintomas visíveis,

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como agitação, como não se interessar por leitura e escrita e não se inserir no mundo simbólico dos letrados.

O laço parental e social tem se constituído de forma a levar esse menino a resistir à aprendi-zagem do mundo. Aprender significa crescer, se independizar no mundo e isso pode ser perigoso num ambiente sentido como hostil e de tênues referências parentais.

A escola é uma das manifestações do Outro, promotora de linguagem e também de subjetiva-ção. Adaptar-se ao meio social da escola é difícil, o menino sempre reclama de professoras ruins e que não gostam dele. Pequenas rupturas se dão por um sentimento de não pertencer a essa parcela da sociedade que tem como objetivo ensinar a aprender saberes de livros e de vida, ou seja, a comunidade escolar.

Saber da vida para K. talvez seja saber de um passado de abandono e de miséria de significan-tes de carinho, de aconchego e de amor.

O laço parental desde a tenra infância foi constituído de não aceitação, o que leva a um funcionamento de desprezo de si próprio, de quem não sabe, não faz nada direito. Dentro da escola essa postura leva a um não produzir, não se apropriar do que a escola tem de melhor, ou seja, a cultura, a escrita e a leitura de um mundo feito por outras pessoas, melhor inseridas no social.

Chemama5,6 fala da ruptura do laço social e analisa alguns sujeitos que, por meio de seu comportamento, não firmam parceiro que de-manda do sujeito relacionamentos reais.

A escola, ao meu ver, impõe ao sujeito um relacionamento sólido com a instituição, a fim de se consolidar a aprendizagem. Estar com os laços com o mundo tênues ou até rompidos promove uma relação confusa e insuficiente, não atingindo assim o aprender.

As causas do não aprender podem se dar por razões das mais variadas, mas creio que entender como se dá o laço social do sujeito com o mundo pela via da Psicanálise pode ajudar os educado-res e enxergarem mais o sujeito de desejo, neste caso impossibilitado de aprender e não somente como um aluno que faz parte de um sistema de imperativos educativos que se deve seguir à risca.

A pedagogia na maioria das vezes responde ao sujeito de forma uniforme e espera dele que se comporte e que se interesse pelos saberes arbitra-riamente ensinados.

Freud cita de forma muito bonita que “somente aqueles que puderem sondar as mentes das crian-ças serão capazes de educá-las”1.

Creio que somente querendo muito promover o desejo de aprender, promovendo-o por meio de relações sólidas e permanentes com essas crianças, os educadores poderão ser esses “sondadores de mentes”, conforme diz Freud1. Sondar suas pró-prias mentes por meio de seus processos de análise também são formas de adentrar no mundo de de-sejo infantil. O educador que se deixa atravessar por saberes da Psicanálise, em função de sua tarefa de educar, tem a coragem de permitir lembranças e vivências de sua infância, a fim poder promover um Outro que traga felicidade aos alunos.

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Trabalho realizado na Disciplina “Seminário em Lacan – de um Outro ao outro” do Programa de Pós Graduação em Educação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS.

Artigo recebido: 11/8/2009 Aprovado: 15/10/2009

SUMMARYThe social bond and the learning: some brief thoughts

This article aims some propositions about Psychoanalysis and Education, under the light of concepts such as social bond and parental bond and the role of Another of Lacan, which form the basis of subjectivity of the individual. The social structure of the school promotes the knowledge, but the family is the responsible for strengthening the bonds that enable the child become desirous of learning and knowledge. The maternal and paternal functions, related to the importance of the Other in the constitution of the subject, show those educators interested in the grounds of a psychoanalytic one study case in which subject and desire are in embarrassment, causing not learn in initial series of literacy.

KEY WORDS: Learning. Family relations. Interpersonal relations. Social environment. Psychology, social.

REFERÊNCIAS 1. Freud S. Totem e tabu e outros trabalhos. In: Obras

Psicológicas Completas de Sigmund Freud Volume XIII. Rio de Janeiro:Imago;1996.

2. Freud S. Além do princípio do prazer. In: Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud Volume XIII. Rio de Janeiro:Imago;1996.

3. Shäffer M. A educação e a falta: algumas questões sobre psicanálise, epistemologia e psicologia genéti-ca. Revista APPOA 1999;16:102-15. Disponível em: www.appoa.com.br

4. Chemama R. Dicionário de psicanálise. Porto

Alegre:Artmed;1995. 5. Chemama R. Clínica e ruptura do laço social. Polí-

grafo Digitado. 6. Oliveira LEP. O conceito de outro e a abordagem

das psicoses. Controvérsias Psicanálise. 1999;1. Disponível em: http://www.pradodeoliveira.com/br/outro.html

7. Molina S. A intervenção psicanalítica em crianças adotivas. Revista APPOA 2001;21:102-15.

8. Molina S. Formações clínicas neuróticas em posi-ção tangencial ao laço social. Polígrafo digitado 2. Porto Alegre:Centro Lydia Coriat.

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ARTIGO DE REVISÃO

RESUMO – Realizar revisão da literatura acerca da Psicopatologia na infância e na adolescência, visando à apresentação da relação com as dificuldades escolares e os diferentes fatores que nela interferem. São necessários outros estudos para que se busquem estratégias adequadas.

UNITERMOS: Transtornos do comportamento infantil. Transtornos de aprendizagem. Transtornos globais do desenvolvimento infantil.

Francisco B. Assumpção Jr. – Professor Livre Docente

do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de

Medicina da Universidade de São Paulo; Professor

Associado do Instituto de Psicologia da USP.

Correspondência

Francisco B. Assumpção Jr.

Rua Otonis, 697 – Vila Clementino – São Paulo, SP

– CEP 04025-002

E-mail: [email protected]

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Francisco B. Assumpção Jr.

INTRODUÇÃOA Psiquiatria Infantil é uma especialidade

bastante recente, tendo conseguido seu status acadêmico somente em 1938, com a primeira cátedra sendo criada na Universidade de Pa-ris, pelo Prof. Georges Heuyer. Em seu bojo, engloba uma série de fenômenos com caracte-rísticas biológicas, psicológicas e sociais1, todas imbricadas de uma tal maneira que se torna muitas vezes difícil a linearidade direta e a compreensibilidade linear de todos os quadros por ela estudados.

Sob o ponto de vista metodológico, assume características ligadas ao modelo proveniente das Ciências Naturais, onde o pensamento causal, de base analítico-dedutiva, é o ponto básico e central. Assim, todo o conhecimento fornecido através das neurociências, com o conhecimento cada vez maior dos mecanismos de neurotransmissão e das estruturas cere-brais, faz com que se consiga compreender cada vez melhor as doenças psiquiátricas na

infância e na adolescência, em que pesem os riscos de uma neurologização excessiva que a descaracteriza.

Por outro lado, dadas as influências oriundas da Psicanálise e da Psicologia do Desenvolvimen-to, passa a se valer também de um pensamento analógico, no qual, conforme refere Marchais2, a dedução e a indução intervêm secundariamente, submetendo-se aos imperativos dominantes da analogia. Dessa maneira, juntamente com todos os modelos psicoterápicos de base compreensiva, somam-se os modelos pedagógicos e educacio-nais, que se mostram com um valor cada vez maior dentro desse contexto.

Finalmente, considerando-se também a ques-tão social, o estudo das famílias e suas influências fundamentais no desenvolvimento e no cresci-mento da criança, outros fatores se sobrepõem, passando a se valorizar as inter-relações vividas, apoiados metodologicamente no processo analó-gico. Isso porque esse conhecimento envolverá a formação da própria matriz de identidade social,

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sem a qual se torna impossível o trabalho com um ser heterônomo e dependente, como o é a criança em seu processo de desenvolvimento.

Dessa forma, ela é uma especialidade com características muito particulares, pois temos que considerar que a criança não corresponde a um ser passível de generalização e, muito menos, de estudos transversais encarados de forma abso-luta, uma vez que ela é, antes de mais nada, um ser em desenvolvimento, no qual as alterações, sejam de base biológica ou ambiental, interferem de maneira intensa, pois alteram sua curva de desenvolvimento.

É importante, portanto, compreender como as forças maturacionais de origem biológica, no seu inevitável contato com a experiência, produzem comportamentos, habilidades e motivações.

Embora não acredite que devamos pensar a Psiquiatria da Infância e da Adolescência como uma Psiquiatria do Desenvolvimento, uma vez que isso talvez pudesse se apresentar de maneira reducionista, é indiscutível que temos obrigatoriamente que pensá-la como uma Psiquiatria durante o processo de desen-volvimento, pois somente dessa forma temos as condições necessárias para compreendermos esse indivíduo com suas características par-ticulares, que fazem com que a expressão de sua doença tenha características peculiares, algumas delas encontradas somente durante determinados períodos do desenvolvimento. O contrário disso reduz a criança a um adulto mi-niaturizado, de forma similar ao que se fazia em Pediatria há alguns séculos. Assim, devemos procurar “ver” a criança como um indivíduo único e irreprodutível, que caminha de maneira própria e constante para sua autonomia.

A QUESTÃO DO DIAGNÓSTICO E DO ENCAMINHAMENTOA criança costuma chegar ao médico a partir

de um encaminhamento escolar ou familiar, com duas queixas primordiais: déficit no aprendizado ou transtorno de conduta.

Entretanto, nenhum dos dois motivos signifi-ca, obrigatoriamente, presença de psicopatologia

infantil, o que nos leva a pensar em um primeiro passo, visando à operacionalização do encami-nhamento clínico (Figura 1).

Cabe lembrar que famílias disfuncionais, quer sejam decorrentes de separação, ritmo de tra-balho, valores diversos, carências afetivas, edu-cacionais ou maus-tratos e negligência, devem ser encaminhadas diretamente aos Conselhos Tutelares responsáveis, da mesma forma que a suspeita de negligência e maus-tratos deve ser resolvida judicialmente.

Após essas providências é que o pensar-se em uma Psicopatologia específica faz-se necessário, embora inicialmente deva-se procurar ter uma preocupação com o bem estar mais do que com o desempenho (escolar no caso) da criança, procurando-se observar (e compreender) as maneiras pelas quais ela reage a essas pressões (associadamente ou não a processos psicopatológicos). Isso por-que, mais que a mera ausência de doença, a saúde comporta um estado de bem estar biopsicossocial, para onde confluem ele-mentos físicos, familiares, sociais, pessoais, administrativos, escolares e outros, todos de-sembocando, de maneira geral, naquilo que, de maneira simplista, poderíamos agrupar sob a denominação genérica de qualidade de vida da criança.

Figura 1 - Transtorno de aprendizado ou trans-torno de conduta

Transtorno de Aprendizado ou Transtorno de Conduta

Problema da Criança

Problema da Família

Problema da Escola

T. desenvolvimento Retardo Mental T. Específicos TDAH Pers. Border T. AfetivosEsquizofrenia T. Ansiosos T. Conduta T. Sensoriais Outras condições

Disfuncionais verificar:

separação trabalho valores

afeto educação

negligência maus-tratos

tipo de programas adequação de serviços presença de educador

recursos materiais

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Nesse processo, quanto menor é a criança, mais dependente é do grupo familiar que, principalmente a mãe, torna-se habitualmente aquela que percebe todo e qualquer desvio nesse estado de bem estar. Conforme a crian-ça se desenvolve, a escola passa também a desempenhar esse papel, constituindo-se, juntamente com a família, no universo infantil.

Assim sendo, ambos os ambientes devem ter em mente que:• existe para a criança a possibilidade de ado-

ecer mentalmente;• esse adoecer pode, inclusive, envolver algu-

ma gravidade;• existem benefícios na prevenção e no trata-

mento precoce dessas ocorrências;• devem existir recursos na comunidade que

possam ser acessados quando necessários.Dessa forma, a doença mental na infância e

na adolescência deve ser visualizada a partir de diferentes tipos de fatores envolvidos que, por sua complexidade, ao serem avaliados devem ser considerados de maneiras diferentes. Temos então, a serem considerados:a) Fatores predisponentes: caracterizados pela

vulnerabilidade biológica, características de personalidade, primeiras experiências, respostas ao estresse e influências sociocul-turais. Estes fatores são os mais difíceis de serem avaliados em ambiente escolar, uma vez que dependem do próprio crescimento e desenvolvimento anterior da criança;

b) Fatores precipitantes: corresponde aos acontecimentos estressantes e aos estímulos que ocasionam respostas emocionais des-prazeirosas. Nesse âmbito, a escola, por sua importância no universo infantil, já passa a ter um papel fundamental na detecção e na manipulação desses eventos;

c) Fatores perpetuadores: são os estressores permanentes, elementos temperamentais ligados a ansiedade, estímulos reforçadores de condutas inadequadas e influências fa-miliares. Nesta esfera, a escola tem um pa-pel que pode ser considerado fundamental;

d) Fatores protetores: correspondendo aos

atributos temperamentais de adaptabilidade, relações intrafamiliares adequadas, rede de irmãos e suporte comunitário positivo. Aqui, a escola pode (e deve) fornecer parte desse suporte comunitário, constituindo-se assim em, mais do que uma simples fornecedora de informações, um ambiente favorecedor do crescimento e desenvolvimento da criança e do adolescente.Dessa maneira, considerando-se as neces-

sidades da criança e do adolescente, pode-se pensar a atenção a sua saúde mental da seguinte maneira:

Escutar a criança e a família sobre o compor-tamento apresentado, contextualizando-o;

Evitar ver todas as manifestações como de-correntes da hereditariedade ou da carga bioló-gica, da mesma forma que evitar desmerecê-las através da célebre frase “não é nada” ou que “é normal”;

Não dramatizar as situações quando os sin-tomas apresentam recorrência;

Procurar resolvê-los primeiramente no pró-prio ambiente da criança antes de recorrer-se a programas de atenção secundária ou terciários;

Evitar as ameaças ou os julgamentos depre-ciativos para a criança, animando-o a falar sobre seus comportamentos.

Uma vez estabelecidos esses cuidados e não se minorando a sintomatologia, procurar aventar a suspeita de processos psicopatoló-gicos envolvidos, bem como a gravidade dos mesmos e as alterações na dinâmica familiar decorrentes ou envolvidas nos mesmos e, uma vez realizado esse passo, estabelecer o encami-nhamento a profissionais adequados, visando a intervenções terapêuticas especializadas. Essas, conforme orientação da própria OMS (2003), podem ser visualizadas no Quadro 1.

PRINCIPAIS QUADROS CLÍNICOS E SUA ABORDAGEMAssim, visando instrumentalizar a identifica-

ção de eventual psicopatologia, apresentaremos, a seguir, os principais quadros clínicos, bem como as possibilidades de atuação e seguimento.

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1 Transtornos do Desenvolvimento1.1 Retardo Mental F70-79

ConceitoO Retardo Mental pode ser considerado, se-

gundo a Associação Americana de Deficiência Mental, como “o funcionamento intelectual geral abaixo da média, que se origina durante o período de desenvolvimento e está associado a prejuízo no comportamento adaptativo” (OMS, 1985).

Observamos nele, além das perturbações or-gânicas, dificuldades na realização de atividades esperadas socialmente, bem como as consequen-tes alterações no relacionamento com o mundo. Não corresponde, portanto, a uma moléstia úni-ca, mas a um complexo de síndromes que têm como única característica comum a insuficiência intelectual. Assim, o indivíduo por ela afetado é incapaz de competir, em termos de igualdade, com os companheiros normais, dentro de seu grupamento social.

Ao DSM IV3 é definido como um funciona-mento mental significativamente inferior a média, acompanhado de limitações significativas no funcionamento adaptativo em pelo menos duas das seguintes áreas: comunicação, autocuidados, vida doméstica, habilidades sociais/interpessoais, uso de recursos comunitários, autosuficiência, habilidades acadêmicas, trabalhos, lazer, saúde, segurança; com início antes dos 18 anos de ida-de, podendo ser visualizada como uma via final

comum de diferentes processos patológicos que afetam o funcionamento cognitivo.

O funcionamento intelectual abaixo da média vai ser considerado a partir de um QI padrão de 70/75, avaliado a partir de provas padronizadas, levando-se em consideração a diversidade cul-tural e lingüística, bem como outros fatores de comportamento definidos pelo ambiente onde se encontra o indivíduo.

Diagnóstico Para seu diagnóstico deve-se utilizar uma

bateria de avaliações que possibilite o esclareci-mento da provável etiologia do quadro. Assim, ao exame físico, cabe a tentativa de caracterização de três ou mais sinais físicos que, são significati-vamente comuns em indivíduos com deficiência mental, assim como malformações primárias do sistema nervoso central, segundo Newell (1987). Também a pesquisa de infecções congênitas é de fundamental importância, uma vez que, segundo o mesmo autor, cerca de 2% dos casos são por elas causadas (Newell,1987).

Segundo a AAMR (1992), o diagnóstico deve ser formulado em três passos, sendo a dimen-são 1 referente ao funcionamento intelectual e aos padrões adaptativos, avaliados a partir de instrumentos padronizados que permitam veri-ficar esse funcionamento abaixo de 70/75, com incapacidades em diferentes áreas adaptativas, ocorrendo em idade inferior a 18 anos. A dimen-

Quadro 1 - Intervenções terapêuticas prioritárias em saúde mental da infância e da adolescência (OMS, 2003)

Psico-tera-pia

Terapiascogniti-

vas

Psicofarma-coterapia

Terapiafami-liar

Interven-ção

escolar

Aconse-lhamento

Interven-ções

especiaisOutros

T. aprendi-zado

TDAH (*)

Tiques

Depressão (*)

Psicoses

Esquizofrenia(*) Esses tratamentos dependem da idade da criança.

TranstornoTratamento

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são 2 verifica e identifica aspectos psicológicos e emocionais, bem como etiologia e déficits físicos associados com o ambiente onde esse indivíduo situa-se. Finalmente, a dimensão 3 estabelece os suportes necessários para que esse indivíduo possa ter minorada sua incapacidade e maximi-zado seu desempenho adaptativo.

ClassificaçãoCorresponde a um “continuum” que se es-

tende do próximo ao normal ao francamente anormal, de acordo com o potencial adaptativo do indivíduo em questão, potencial este repre-sentado pela sua capacidade intelectual.

Considerando-se seu desenvolvimento, bem como os déficits dessa população, temos também as seguintes características (OMS - 1985):• Deficientes Mentais Profundos (20>QI),

correspondendo a uma idade de desenvolvi-mento abaixo de 2 anos, frequentemente com déficits motores acentuados - F73;

• Deficientes Mentais Importantes e Mode-rados (20<QI<36; 36<QI<50), com nível de independência nas atividades cotidianas dependendo de treinamento e com padrão de desempenho a nível de pensamento pré-operatório – F72 e F71;

• Deficientes Mentais Leves (50<QI<70) também depende dos processos de treinamento e de ade-quação e seu padrão de pensamento permanece a nível de operações concretas – F70.

O processo de habilitaçãoO processo de habilitação define as neces-

sidades básicas para os serviços necessários para a implantação do atendimento, que vai determinar de certa forma o prognóstico da população envolvida. Esses serviços podem ser esquematizados da seguinte maneira, de acordo com diversos autores (Comissão Conjunta em Aspectos Internacionais da Deficiência Men-tal,1981; Krynski,1985; OMS,1985):• Atenção Primária

¾ A.1. Medidas Pré-Natais (planejamento familiar, aconselhamento genético, pré-natal, diagnóstico pré-natal);

¾ A.2. Medidas Peri-Natais (atendimento ao parto e ao recém-nato, “screening” neonatal, diagnóstico precoce);

¾ A.3. Medidas Pós-Natais (serviços de pue-ricultura, diagnóstico precoce, estimulação sensório-motora).

• Atenção Secundária (diagnóstico, tratamen-to biomédico e cirúrgico, apoio às famílias, estimulação).

• Atenção Terciária (diagnóstico, tratamento biomédico e cirúrgico, suporte educacional e profissionalizante, programas residenciais).Esse processo, portanto, envolve uma gama

de complexos educacionais, de estimulação para bebês e de profissionalização.

TerapêuticaSua abordagem terapêutica é predominan-

temente pedagógica, comportamental e, espo-radicamente, psicofarmacológica. O Quadro 2 apresenta os modelos de terapêutica comporta-mental passíveis de serem utilizados.

1.2 Transtornos Globais do Desenvolvi-mento – F84

ConceitoO relato Kanner (1943)4 ainda edifica a

caracterização e o diagnóstico de autismo,

Quadro 2 - Modelos de terapêutica comportamental passíveis de serem utilizados (adaptado de Benson;

1999)

Reforço Punição

Controle de estímulo e generali-

zação

Modela-gem

Parea-mento de estímulos

“Time out” (-) (-)

Reforço diferen-cial

Supercorreção (-) (-)

ExtinçãoEstimulação aversiva à resposta

(-) (-)

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destacando-se a combinação de três padrões de comportamento alterados no autista: a inabilida-de no relacionamento interpessoal, o uso peculiar da linguagem e a tendência à mesmice.

Estudos posteriores ressaltaram a contribui-ção importante de fatores biológicos em asso-ciação com o autismo uma vez que eles exibem com maior frequência anormalidades físicas e/ou neurológicas leves (soft signs), alterações eletroencefalográficas5 e uma maior tendência ao desenvolvimento de transtornos convulsivos6, além de ser detectado com maior frequência em associação com algumas condições clínicas (fe-nilcetonúria não tratada, rubéola congênita, es-clerose tuberosa, etc.). Também tem sido descrita a presença de fatores de risco pré e peri-natais como marcos de história pregressa dos afetados (Tsai apud Lewis, 19955), havendo, inclusive, maior frequência de distúrbios cognitivos e de linguagem entre os familiares destas crianças, sugerindo a existência de um “continuum” de sintomas associado ao vínculo genético7. Após o desenvolvimento de novas técnicas de cultura de células para métodos citogenéticos8, na década de 70, a detecção e o estudo da síndrome do X frágil geraram grande impacto, resultando em diversas pesquisas que ressaltaram a importân-cia dos fatores genéticos em associação com o autismo9-11.

PrevalênciaEstima-se atualmente que a prevalência de

autismo seja da ordem de 2 a 5 indivíduos por 10.000, com a possibilidade de aumentar para 10 a 20 por 10.000, caso se utilizem critérios mais amplos11,12.

Quadro ClínicoO autismo é hoje considerado uma síndrome

comportamental, com etiologias múltiplas e curso de um transtorno de desenvolvimento13, caracterizado por um déficit social, apreensível pela inabilidade em se relacionar com o outro, geralmente combinado com déficits de lingua-gem e distúrbios motores. Segundo o DSM-IV4, o quadro deve se iniciar antes dos 36 meses de

idade. Crianças autistas se apresentam, quanto à inteligência, tanto como superdotados quanto como deficientes profundos, sendo que apenas um terço dos afetados trabalham na faixa inte-lectual média ou superior.

Algumas outras condições, reunidas dentro do conceito de Transtornos Globais do Desen-volvimento, merecem uma descrição sucinta:A) Síndrome de Asperger (F84.5): descrita pri-

mariamente por Asperger, em 1944, sob o nome de psicopatia autística, é um quadro caracterizado por déficit social, interesses circunscritos, alterações de linguagem e de comunicação14,15. Sua relação com o autismo é discutível, com a possibilidade de enquadrá-la dentro do espectro autístico descrito por Wing (1988)16.

B) Transtornos Desintegrativos (F84.3): inclui condições nas quais ocorre um desenvolvi-mento normal (ou próximo ao normal) nos primeiros anos de vida, seguido por piora dos padrões sociais e de linguagem, conjun-tamente com alterações nas emoções e no relacionamento interpessoal17, acompanha-da, após um breve intervalo, por estereoti-pias e hiperatividade. O comprometimento intelectual pode surgir, mas não é obrigatório.

C) Síndrome de Rett (F84.2): associada ao retar-do mental profundo, afeta especificamente o sexo feminino, com o desenvolvimento de múltiplos déficits específicos, também após um período de desempenho normal durante os primeiros anos de vida. Surgem associadas estereotipias gestuais características, redução progressiva do desenvolvimento do perímetro cefálico e convulsões6.

Abordagem Terapêutica Concebido o autismo como multifatorial

quanto à sua etiologia e ainda sem tratamento específico, a abordagem do paciente abrange um programa de tratamento que deve interferir nas diferentes áreas afetadas: comportamento, aprendizado, relacionamento familiar, etc., sen-do o tratamento farmacológico apenas parte de um esquema amplo a ser proposto ao paciente e

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família18. Com o intuito de controle de sintomas-alvo (hiperatividade, convulsões, auto-agressivi-dade, estereotipias, etc.), praticamente todas as classes de psicotrópicos, anticonvulsivantes e vitaminas já foram utilizadas nesta população, com resultados nada homogêneos.

1.3 Transtornos Específicos do Desenvolvi-mento - F80-83

ConceitoAntes da década de 40, crianças com dificul-

dades acadêmicas eram consideradas mental-mente retardadas, emocionalmente perturbadas, ou social e culturalmente negligenciadas19. Na década de 40, surge uma quarta possibilidade: razões neurológicas como causa dos problemas acadêmicos. Por um lado, desenvolveu-se uma linha de pesquisa em torno do que se passou a denominar lesão cerebral mínima20, refletindo lesões cerebrais cuja detecção não seria clini-camente possível. Outro grupo denominou esta condição de disfunção cerebral mínima21, cogi-tando um funcionamento cerebral diferente do usual, sem necessariamente corresponder a uma sequela decorrente de lesão cerebral.

Inicialmente, denominava-se a dificuldade acadêmica pela habilidade primariamente pre-judicada, e assim surgiram a dislexia (distúrbio da leitura), a disgrafia (distúrbio da escrita) e a discalculia (distúrbio das habilidades aritméti-cas). Por fim, cunhou-se o termo transtorno do aprendizado, abrangendo todas estas condições, e o DSM-IV3 assim os classifica:

Transtornos do Desenvolvimento do Apren-dizado (APA, 1995)3

1. Transtornos do Aprendizadoa. Transtorno da leitura – F81.0b. Transtorno da Matemática – F81.2c. Transtorno da expressão escrita

2. Transtornos das Habilidades Motorasa. Transtorno do desenvolvimento da coor-denação

3. Transtornos da Comunicaçãoa. Transtorno da linguagem expressiva – F80.1b. Transtorno misto da linguagem receptivo-expressivac. Transtorno fonológico d. Tartamudez (gagueira)

PrevalênciaA real prevalência dos transtornos do apren-

dizado é ignorada, visto que em função das di-ferentes definições que foram criadas ao longo das últimas décadas, a consistência dos dados obtidos em estudos de prevalência não pôde ser sustentada. No entanto, estima-se que 5 a 10% seriam uma estimativa razoável19.

Quadro ClínicoAs avaliações psicológicas e pedagógicas

(também denominadas como abordagem psicoe-ducacional) envolvendo os transtornos de apren-dizado utilizam-se do modelo cibernético ou de processamento de informações a nível cerebral. O primeiro passo é receber e assimilar a informação (input). Uma vez gravada, esta informação deve ser manipulada de modo a ser compreendida (integração). O terceiro passo é o armazenamento e recuperação (memória). Por fim, a informação deve ser comunicada pelo sistema (output). Desnecessário lembrar que alterações mais gros-seiras, perceptivo-motoras (como, por exemplo, deficiências visuais, auditivas e motoras) devem ser avaliadas conjuntamente.

No entanto, é frequente que a demanda de atendimento desta população seja por problemas de comportamento, e o profissional envolvido nesta avaliação deve, ao abordar uma criança ou adolescente portador de dificuldades emo-cionais, sociais, familiares, mais as dificuldades acadêmicas, ser capaz de diferenciar entre causa e sintoma19. O clínico deve inquirir sobre o his-tórico acadêmico e desempenho em cada área de habilidade22, retardo de desenvolvimento psicomotor, retardo de aquisição de linguagem, problemas da fala e prejuízo das habilidades cog-nitivas (refletido inclusive a partir do nível que

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sua capacidade de brincar atingiu frente à sua idade cronológica). Os resultados da abordagem psicoeducacional devem estabelecer a presença ou ausência de um transtorno de aprendizagem.

Abordagem TerapêuticaO tratamento de escolha é a educação, com

abordagens específicas para cada distúrbio. Condições clínicas psiquiátricas outras, que surjam como co-morbidades, ou problemas emocionais, sociais e/ou familiares devem ser detectados e adequadamente conduzidos, quer do ponto de vista medicamentoso, psicoterápico ou educacional.

1.4 Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) – F90

ConceitoDescrito há 100 anos, atualmente acredita-

se que não há uma única condição clínica, mas diversas subsíndromes que se interseccionam. Enquanto diagnóstico, apesar de ser nomeado a partir da disfunção atencional, é necessário que estejam presentes também impulsividade e hiperatividade, e em mais de um ambiente; a necessidade de dados fornecidos por pais e pro-fessores dificulta sua avaliação imparcial. Parte da controvérsia sobre esta síndrome foi gerada pelas muitas mudanças na terminologia deste transtorno, influenciada pelas tendências histó-ricas na conceitualização das várias etiologias ou aspectos fundamentais da síndrome23.

PrevalênciaEm um estudo abrangente da prevalência do

TDAH, o Estudo de Saúde Infantil de Ontário (Canadá), por Offord et al.15, são resumidos 11 outros estudos, demonstrando que idade, tipo e tamanho da amostra, método de diagnóstico, razão entre os sexos, vida rural versus urbana e classe econômica podem afetar a prevalência. Offord et al. detectaram um pico de 8% entre os 6 e 9 anos, com cifras menores para pré-escolares e adolescentes, sendo que a prevalência diferen-cial entre os sexos (9% para meninos e 3,3% para

meninas) foi menor que a habitualmente descrita em outros estudos. O tamanho da amostra e a ampla faixa etária englobada, a multiplicidade de fontes de informação utilizadas para se es-tabelecer o diagnóstico e a inclusão de dados socioeconômicos, além de vida rural ou urbana, tornam este estudo um marco na pesquisa do TDAH23.

Quadro ClínicoSão pacientes que, desde idades precoces,

mostram-se mais irritadiços, com choro fácil, sono agitado e vários despertares noturnos. A partir do primeiro ano de idade, apresentam agitação psicomotora, necessitam vigilância constante, quebrando objetos com frequência e se desinteressando rapidamente de brinquedos ou situações. Os meninos, principalmente, apre-sentam prejuízos no desenvolvimento da fala, de aquisição mais lenta e presença de trocas, omissões e distorções fonêmicas, além de um ritmo mais acelerado (taquilalia). Esta condição, inclusive, propicia maiores dificuldades e altera-ções no processo de alfabetização da criança, se não ocorrer a intervenção precoce24.

São características importantes a descoordena-ção motora e o retardo na aquisição de automa-tismos mais tardios (como amarrar um sapato ou utilizar um lápis), que se refletem numa dispraxia em relação a crianças sadias de mesma faixa etária. O desenvolvimento da noção têmporo-espacial também é prejudicado, resultando em dificuldades com o desenho e incapacidade de diferenciar símbolos gráficos semelhantes, que se diferenciem apenas por sua disposição espacial (como as letras b e d). A co-existência de outros transtornos associados, decorrentes ou concomi-tantes (transtorno de conduta, depressão, abuso e dependência de psicotrópicos, etc.) deve ser adequadamente detectada, para que a abordagem seja a mais eficiente25.

Abordagem TerapêuticaBradley, em 1937, foi o primeiro a descrever

o dramático efeito do estimulante benzedrina (uma mistura de dextro e levoanfetamina) em um

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grupo de crianças hospitalizadas e perturbadas, incluindo algumas que apresentavam a síndrome hiperativa23. Todos os três estimulantes em uso atualmente – metilfenidato, dextroanfetamina e pemolina (as duas últimas não são disponíveis em nosso meio) – comprovadamente normalizam a criança hiperativa. Nestas últimas décadas, numerosos estudos medicamentosos bem plane-jados e controlados por placebos estabeleceram a sua eficácia (Gittelman-Klein, 1987). Também são utilizados os antidepressivos tricíclicos e o haloperidol, mas seus efeitos colaterais (cardio-toxicidade e discinesia tardia, respectivamente), considerados mais deletérios, limitam seu uso.

Entretanto, o tratamento não se deve res-tringir apenas ao uso de medicamentos, mesmo porque a maioria destes pacientes apresenta, como já comentado, um comprometimento mais extenso do que uma alteração da atenção ou a hiperatividade. Deste modo, dependendo das manifestações clínicas, podem se fazer necessárias terapias fonoaudiológica, corporal, ludoterapia, ou abordagens psicopedagógicas para aprimorar seu desempenho e conduta25.

2 Transtornos Afetivos – F30-39

ConceitoA depressão e a mania têm sido descritas em

crianças e adolescentes há anos26. Kraepelin27 achava que a mania era rara em crianças, mas que a incidência aumentava na adolescência. Kanner28 duvidava da sua existência. Lamenta-velmente, persiste a indefinição de critérios para esta faixa etária, sendo que os critérios diagnós-ticos em uso atualmente, como, por exemplo, o DSM-IV, não trazem uma classificação específica para os transtornos afetivos na infância e adoles-cência, com a ressalva de que deve ser levada em conta a faixa etária29.

PrevalênciaTaxas de prevalência variadas têm sido des-

critas para a depressão, diferenças estas que podem ser atribuídas a diferenças nas popula-ções amostradas – pacientes da comunidade,

ambulatoriais psiquiátricos, ambulatoriais pedi-átricos, internados (psiquiátricos e pediátricos). O aprimoramento de instrumentos diagnósticos também tornou mais precisa sua avaliação26. Estudos epidemiológicos realizados nos EUA relataram a incidência de depressão como sen-do de 0,9% em pré-escolares, 1,9% em crianças escolares e 4,7% em adolescentes30.

Carlson e Kashani31 estudaram uma amostra comunitária de 150 adolescentes de 14 a 16 anos em Columbia, Missouri (EUA), detectando 0,6% de quadros maníacos, caso a gravidade e duração dos sintomas fosse levada em con-sideração. Inexistem, até o momento, estudos epidemiológicos publicados sobre mania em crianças pré-púberes.

Quadro Clínico

DepressãoNa fase pré-verbal, deve-se atentar para

manifestações como a inquietação, retraimento, choro frequente, recusa alimentar, distúrbios do sono, apatia e piora da resposta aos estímulos vi-suais e auditivos. Crianças pré-escolares com fre-quência apresentam sintomas somáticos (dores abdominais, etc.), prejuízo no desenvolvimento pôndero-estatural, fácies tristonha, irritabilidade, anorexia, hiperatividade, transtornos de sono, além de auto- e hetero-agressividade. Escolares também podem apresentar lentificação, dis-torções cognitivas de cunho autodepreciativo, pensamentos de morte ou suicidas e o descensu acadêmico é frequente, além da irritabilidade, sintomas ansiosos e transtornos de conduta (I, 1996). Na adolescência, as manifestações de-pressivas se assemelham muito ao quadro no adulto, mas é frequente a co-morbidade com uso de psicotrópicos, o que pode vir a prejudicar sua detecção32.

Mania – F30-31Na fase pré-escolar, podem surgir a irrita-

bilidade, auto- e hetero-agressão, fala rápida e incompreensível, pouco sono e apetite, além da

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hiperatividade. O humor é instável, com pensa-mentos fantasiosos de grandeza (poderes mági-cos, etc.). Na fase escolar, além da instabilidade do humor, irritabilidade e hiperatividade, podem surgir associados sintomas delirantes e alucina-ções, e o diagnóstico diferencial com o TDAH se faz mister. Os adolescentes em mania começam a ter manifestação clínica similar à dos adultos33.

Infelizmente, não temos questionários padro-nizados no Brasil referentes ao diagnóstico de quadros maníacos na criança.

Abordagem TerapêuticaAs evidências disponíveis até o momento

sugerem que os antidepressivos tricíclicos (ADT), como grupo, não têm utilidade clínica no tratamento do transtorno depressivo maior do adolescente, havendo vários estudos em que algumas drogas deste grupo não demonstraram eficácia superior ao placebo34. Os poucos estudos disponíveis envolvendo inibidores irreversíveis da monoamino-oxidase (IMAO-I) não consoli-dam sua eficácia como antidepressivo de escolha para adolescentes, principalmente frente aos riscos que a conhecida “bizarrice” dietética desta faixa etária pode desencadear em usuários de IMAO-I neste grupo35.

Atualmente, a maior evidência de eficácia e tolerabilidade de antidepressivos na adolescên-cia envolve os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), com estudos abertos siste-maticamente conduzidos, com respostas mos-trando 60% a 75% dos pacientes desenvolvendo bons resultados36-46, seja em primeiro episódio ou em depressões resistentes a tratamento.

Psicoterapias de linha cognitiva, treino de ha-bilidades sociais ou interpessoais podem ser úteis ao adolescente deprimido, mas alguns estudos não demonstraram eficácia significativamente maior do que simples intervenções de suporte, nem maior eficácia que placebo. No entanto, é opinião compartilhada pela maioria dos profissio-nais de saúde mental infantil que a psicoterapia em adolescentes deprimidos é insuficiente, mas necessária como componente do tratamento35.

Existem poucos estudos com amostras peque-

nas em desenhos “cross-over”47,48, com resposta ao lítio superior ao placebo, além de estudos abertos com amostras maiores sugerindo sua eficácia em crianças e adolescentes49. Um estu-do de evolução natural demonstrou alta taxa de recaída com a suspensão de litioterapia de ma-nutenção50. Ainda não há estudos confirmando a eficácia dos anticonvulsivantes como estabili-zadores do humor (carbamazepina e valproato) no tratamento do transtorno bipolar da infância e adolescência51.

3 Transtornos Ansiosos – F40-48

ConceitoA ansiedade é um fenômeno universal na vida

diária e apresenta diversos aspectos adaptativos importantes à necessidade de pronta resposta, suscitada pelas exigências do cotidiano52. Na prática, devemos avaliar com uma visão abran-gente o complexo de relações que está envolvido nas transformações de um elemento normal do desenvolvimento em um sintoma (ou síndrome) que requeira uma intervenção de cunho tera-pêutico53.

PrevalênciaTranstornos ansiosos são certamente comuns

entre crianças e adolescentes, mas é difícil obtermos a real prevalência na população. As taxas podem variar de 5 a 50%54, e não há dados suficientes sobre as diferenças transculturais envolvendo síndromes ou medos e ansiedades específicas. A distribuição segundo o sexo tam-bém é limitada e pode simplesmente refletir morbidade referida, e não prevalência real. A fobia social seria mais frequente em meninos, en-quanto a fobia simples, transtorno de evitação e agorafobia seriam mais prevalentes nas meninas. Transtorno de ansiedade de separação, trans-torno de excesso de ansiedade, transtorno de pânico sem agorafobia e transtorno de ansiedade generalizada seriam igualmente prevalentes em ambos os sexos55.

Alguns estudos estimam entre 0,2 e 1,2% a prevalência de transtorno obsessivo compulsivo

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na infância56, mas é conhecida a subnotificação desta condição na infância e adolescência, dado que suas manifestações com frequência não são relatadas ao responsável ou médico que assiste o menor, e a vivência de “loucura” é um fator que muitas vezes impede a criança de buscar auxílio, se não chegar a causar prejuízos no contexto familiar, grande fator de encaminhamento nesta faixa etária.

Quadro ClínicoEstudos clínicos sugerem a existência de

uma continuidade entre as formas da infância/ adolescência e adultas56. Atualmente, enquanto grupo nosológico, os transtornos ansiosos na infância guardam semelhança quanto ao seu diagnóstico aos critérios utilizados no adulto, para agorafobia com ou sem ataques de pânico, transtorno de pânico, fobias simples e social, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno de estresse pós-traumático3. No atendimento a crianças torna-se, muitas vezes, impossível a obtenção de uma verbalização clara das sensações psíquicas e cognições associadas, mas por meio da observa-ção de seu comportamento e do relato (por parte de seus cuidadores) de suas reações, pode-se inferir que a criança está ansiosa53.

Há, no entanto, quadros descritos especifica-mente na faixa etária pediátrica, identificados como “habitualmente evidentes pela primeira vez na infância ou adolescência”: transtorno re-ativo de vinculação, transtorno de ansiedade de separação, transtorno de excesso de ansiedade e transtorno de evitação3.

Abordagem TerapêuticaHá tentativas de grupos isolados na abordagem

dos transtornos ansiosos em geral, envolvendo antidepressivos tricíclicos, benzodiazepínicos e terapia de orientação cognitivo-comportamental, mas ainda não se obteve número de pacientes suficiente nem experiências consistentes no sen-tido de se estabelecer uma conduta terapêutica consagrada nesta faixa etária.

Quanto ao transtorno obsessivo-compulsivo,

há mais estudos envolvendo os inibidores seletivos da recaptação da serotonina, mas até o momento estas medicações não foram aprova-das para uso na faixa etária pediátrica com este fim56. Não há estudos disponíveis envolvendo abordagens cognitivo-comportamentais nesta faixa etária.

4 Transtornos Psicóticos: Esquizofrenia –

F20-29

ConceitoNo final do século XIX, Kraepelin (1919)57 dá

o nome de dementia praecox (a atualmente de-nominada esquizofrenia) a um transtorno grave de comportamento, de início ao fim da adoles-cência e início da idade adulta, de características peculiares. Também observa que alguns casos aparentam ter seu início na infância. No início do século, Sancte de Sanctis (1906) propõe o termo dementia praecossima para crianças que desenvolveram sintomas na infância. Potter58 tenta definir a esquizofrenia infantil com base em critérios específicos, como perda de interesse no ambiente circunjacente, distúrbios de pensa-mento e afeto e alterações de comportamento. Em 1943, Kanner4 considerava o autismo como uma doença pertencente ao grupo das psicoses infantis, embora com aspectos específicos. Na década de 70, Kolvin59 sugeria que a diferencia-ção entre as duas condições poderia ser realizada a partir da idade de início, história familiar, ca-racterísticas clínicas e evidências de distúrbios a nível de sistema nervoso central.

O conceito de psicose, quando se considera a criança, é problemático em vários aspectos, visto que os conceitos de realidade da criança vão se alterando durante o processo de desenvolvimento, conforme descreve tão minuciosamente Piaget60. A capacidade de desenvolver o pensamento formal, correspondente ao do adulto, só é adquirido plena-mente na adolescência. Assim, crenças fantasiosas fazem parte do universo da criança normal e não necessariamente constituem um delírio. Também o discurso e comportamento desorganizado não são necessariamente alterações sugestivas de esqui-

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zofrenia, quando se considera o desenvolvimento infantil. Além disso, a utilização dos critérios vigentes para o diagnóstico de esquizofrenia no adulto (DSM-IV e CID-10) não discrimina aspec-tos referentes às manifestações desta condição quando de seu início na infância, o que dificulta sua utilização no campo da Psiquiatria Infantil.

PrevalênciaDada a grande variação de critérios diagnós-

ticos que cercaram a constituição do conceito de esquizofrenia na infância ao longo das décadas, não é de se admirar que não haja uma definição de prevalência desta condição na população, apesar de ser consenso considerá-la mais rara que o au-tismo na faixa etária pediátrica, existindo estudos que consideram o autismo 1,4 vezes mais frequente que a esquizofrenia na infância59. Também não há consenso quanto à incidência entre os sexos, sendo que tanto uma preponderância do sexo masculino (1,5 a 2 homens para 1 mulher) quanto distribuição equalitária entre os sexos são descritas60.

Quadro ClínicoO tipo de início mais frequentemente encon-

trado é o insidioso, principalmente nos casos de esquizofrenia de início muito precoce (VEOS – very early onset schizophrenia, com início ante-rior aos 13 anos de idade), existindo controvérsia quanto ao tipo mais frequente na esquizofrenia de início precoce (EOS - early onset schizophre-nia, com início anterior aos 18 anos), se o agudo (definido como inferior a um ano) ou o insidioso61.

A grande maioria das crianças apresenta alucinações auditivas (80%), sendo que, metade destas, concomitante a alucinações corporais ou visuais. Prejuízo na associação de idéias, blo-queio de pensamento e delírio surgem em 60% dos casos, sendo mais frequente o delírio de tipo persecutório; 66% apresentam embotamento afetivo e ambitendência, e a perplexidade é a alteração de humor mais encontrada62. Associa-se ao quadro um menor rendimento intelectual63.

Poucos estudos foram realizados sobre o prog-nóstico destes quadros, admitindo uma maior cro-nificação para os casos de VEOS, mas não neces-

sariamente de pior prognóstico, se comparados aos esquizofrênicos adultos cujo início foi insidioso64. Os quadros de melhor prognóstico seriam os de início agudo, em idade mais tardia, com boa adaptação pré-mórbida e sintomatologia bem diferenciada63.

Abordagem TerapêuticaComo os outros aspectos desta enfermidade,

os estudos envolvendo terapêutica são poucos e limitados. Os neurolépticos, enquanto grupo, aparentam apresentar utilidade no controle dos sintomas ditos positivos (alucinações e delírios), mas os possíveis efeitos colaterais (como a disci-nesia tardia) exigem a utilização consentida pelos responsáveis65. Os neurolépticos ditos “atípicos” (como a clozapina) são uma opção nos indivíduos que não se beneficiem dos esquemas clássicos, mas há poucos estudos envolvendo amostras significativas na faixa etária pediátrica65, visto que os estudos se concentram em adultos não-respondedores aos esquemas habituais.

Os poucos estudos envolvendo as abordagens psicoterápicas nesta faixa etária são de difícil interpretação, uma vez que os critérios diagnós-ticos variáveis e as amostras heterogêneas dão margem a muita variabilidade evolutiva, mas há consenso quanto à necessidade de psicoterapia de suporte nesta condição. Os problemas de desenvolvimento e aprendizado que frequente-mente se associam à esquizofrenia de início nesta idade devem receber as abordagens pertinentes.

5 Transtornos de Conduta – F91-94

ConceitoTranstorno de conduta é um termo que congre-

ga crianças cujos sinais, sintomas e comportamen-tos mais afligem aos demais que o cercam (pais, parentes, professores, companheiros de mesma idade) que a si próprios. Apesar de extremamente semelhante, nas suas manifestações, ao quadro denominado de transtorno de personalidade anti-social apresentado por adultos, há uma predileção dos pesquisadores em mantê-lo numa categoria separada, em virtude da crença de maior potencial de mudança nesta população jovem5.

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PrevalênciaTorna-se impossível determinar a prevalência

desta condição, dadas as amplas variações dos critérios diagnósticos em cada época e contexto cultural de cada grupo social, e dadas as va-riações que suas manifestações apresentam ao longo do desenvolvimento infantil. O DSM-IV3 estima uma prevalência de 6 a 10% em meninos, e 2 a 9% em meninas.

Quadro ClínicoO DSM-IV descreve o transtorno de conduta

como sendo “...um padrão repetitivo e persis-tente de comportamento no qual são violados os direitos básicos dos outros ou normas e regras sociais importantes apropriadas à idade...”3. No entanto, é essencial um diagnóstico diferencial com outras condições neuropsiquiátricas que podem se manifestar como comportamento dis-ruptivo e/ ou coexistir (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, transtornos do apren-dizado, transtornos afetivos, esquizofrenia, etc.).

Abordagem TerapêuticaEm uma revisão sobre o tema, Kazdin66

afirma que “... a diversidade de procedimentos desenvolvidos sugere que nenhuma abordagem em particular demonstrou melhorar o com-portamento anti-social...”. De fato, nenhuma modalidade terapêutica isolada conseguiu com-provar sua eficácia, mas se torna evidente que as melhores respostas envolvem intervenções já na faixa etária pré-escolar67. Assim, é mister que a partir de uma abordagem multiprofissio-nal se individualize o esquema terapêutico, a fim de obter o máximo de rendimento de cada abordagem frente ao paciente, sob risco de que esse descuido não impeça uma evolução na ida-de adulta dentro de um histórico de violência, infrações e prejuízo social.

6 TRANSTORNO DE ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO NA INFÂNCIA – F43

EpidemiologiaEstudos populacionais demonstram os

distúrbios de ansiedade classificados entre os Distúrbios Emocionais (ou Distúrbios Neuróticos), com índices de prevalência entre 2 e 15% dos casos na população geral52,54,62. Alguns estudos referem índices de 10% para transtornos ansiosos, 2% de quadros de pânico em crianças entre 1 e 5 anos de idade, 4% em crianças entre 6 e 10 anos, 11% em adolescentes entre 11 e 15 e 13% entre adolescentes entre 15 e 20 anos de idade, 1% em fobia social e 0,35% de transtornos obsessivo-compulsivos.

Quadro ClínicoO estado de ansiedade caracteriza-se por

sensações psíquicas e orgânicas.Do ponto de vista psíquico, a principal

manifestação é uma sensação inespecífica e vaga, da existência de algum tipo de amea-ça ao bem-estar enquanto uma inquietante sensação de que “algo está para acontecer”, sem nenhuma causa objetiva aparente.

Sensações físicas acompanham essa sen-sação psíquica, a saber, palidez, palpitações, falta de ar, boca seca, olhos arregalados, tremores e sudorese nas mãos e pés, “frio na espinha”, formigamentos, mal estar ab-dominal, com todos os sistemas do nosso corpo reagindo e se manifestando, de modo genérico.

Ao DSM IV3, a característica fundamental da reação de stress pós-traumático é o desen-volvimento dos sintomas característicos após a exposição ao estressor. Na criança, esse estressor pode envolver experiências sexuais inadequadas, mesmo que não haja dano físi-co. Ela pode ser aguda quando os sintomas são inferiores a três meses em sua duração, ou crônica, quando eles duram mais tempo.

A susceptibilidade da criança aos distúr-bios emocionais e ao estresse é bem docu-mentada, com efeitos a longo prazo sendo mais difíceis de serem determinados em função de diagnosticados na idade adulta.

TerapêuticaPode ser realizada sob a forma de Orientação

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(Orientação aos familiares - pais, irmãos, avós; Orientação a professores, conselheiros, amigos; Criação de redes de suporte social), Psicoterapia (1. terapia baseada em avaliação cuidadosa dos mecanismos psicológicos subjacentes ao problema; 2. situação psicoterápica estruturada de forma a facilitar a comunicação para expressão de sentimentos e crenças da criança; 3. o terapeuta deve comunicar à criança sua compreensão e sua disponibilidade para ajudá-la; 4. o terapeuta e a criança devem definir os propósitos e os objetivos de seus encontros; 5. terapeuta deve deixar claro o que é ineficaz ou inapropriado; 6. quando lidando com comportamentos que dependem de interação social, o terapeuta pode modificá-lo, focalizando diretamente nas interações nas quais tais comportamentos têm lugar) e Psicoterapia.

CONCLUSÕESA Psicopatologia da infância reúne em seu

seio uma série de fenômenos que englobam des-de quadros biológicos e orgânicos até alterações psíquicas heterogêneas e problemas individuais ou coletivos de saúde mental1. Pela extrema abrangência de seu campo, cada vez torna-se mais importante a colaboração entre diferentes áreas do conhecimento. O professor é um dos mais importantes elementos na identificação e no encaminhamento precoce de um grande número de problemas de saúde mental, cabendo-lhe as-sim, orientá-los.

Este trabalho tem como finalidade, unicamen-te, orientar para que sua atividade seja mais eficaz nesse campo e que, assim, possa resolver uma par-cela significativa dos problemas que a ele chegam sem que precise recorrer a recursos, na maioria das vezes, inexistentes em nosso ambiente.

SUMMARYPsychiatric aspects of the student child

Carry out a bibliographical review about the child and adolescent psychopathology, to presents the relationship to academic difficulties and the several factors associated. Futures studies on this theme will be necessary to look for strategies.

KEY WORDS: Child behavior disorders. Learning disorders. Child development disorders, pervasive.

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Trabalho realizado no Instituto de Psicologia da

Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.

Artigo recebido: 5/11/2009

Aprovado: 18/12/2009

Carneiro rr & Cardoso FB

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aRtigo de Revisão

RESUMO – Objetivo: O objetivo deste estudo foi investigar comportamentos de atenção por meio de avaliação motora, cognitiva e da preferência hemisférica de 10 escolares, entre 7 e 8 anos de idade, e possíveis modificações em comportamento de atenção no desempenho motriz e cognitivo, por meio de atividades lúdicas, estimulando o desenvolvimento das competências funcionais cerebrais, considerando a dinâmica da hemisfericidade. Método: Para a consecução de tal objetivo, utilizou-se como estratégia metodológica entrevistas com os alunos, responsáveis e profissionais da escola, uma avaliação psicomotora (conduta e comportamento motor), cognitiva (Teste de Prontidão para Leitura TPL – CEPA), Teste de CLEM e Coleta de registro de ondas cerebrais da linha de base EEG (pontos C3 e C4), e sessões de intervenção neuropsicopedagógica. Resultados: Constatou-se que algumas características marcantes referentes à hemisfericidade interferem diretamente, em diversas formas, no processo de aprendizagem. Como os dois hemisférios são especializados em diferentes modos de pensamento, presume-se aqui que esta utilização diferenciada reflete um “estilo cognitivo”, com preferências pessoais na solução de problemas. Conclusão: Visto que a hemisfericidade não interfere apenas nos processos atencionais e de percepção, mas em todas as dimensões intelectuais e de personalidade, se propõe, então, uma reflexão na condução do formato didático deste processo, em especial nos períodos iniciais de escolarização.

UNITERMOS: Atenção. Cérebro. Aprendizagem.

estimulação do desenvolvimento de CompetênCias FunCionais hemisFériCas em esColares Com diFiCuldades de atenção: uma perspeCtiva neuropsiCopedagógiCa

Rosângela Rabello Carneiro – Psicóloga; Pós-

graduação em Psicopedagogia Clínico - Institucional;

Psicologia Médica e Psicossomática, Mestre em

Ciência da Motricidade Humana; Psicóloga e

Psicopedagoga no colégio Brigadeiro Newton Braga.

Fabrício Bruno Cardoso – Graduado em Educação

Física; Mestre em Ciência da Motricidade Humana;

Professor assistente do Curso de Especialização em

Educação Física Escolar da UERJ; Pesquisador do

LABFILC e do LANEU II.

Correspondência

Rosângela Rabello Carneiro

Rua Babaçu, 90, apto 201, - Jardim Guanabara - Ilha do

Governador - Rio de Janeiro, RJ - CEP 21931-230

E-mail: [email protected] - [email protected]

Rosângela Rabello Carneiro; Fabrício Bruno Cardoso

uma perspeCtiva neuropsiCopedagógiCa

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INTRODUÇÃOO objetivo deste estudo foi investigar comporta-

mentos de atenção, por meio de avaliação motora, cognitiva e da preferência hemisférica dos escola-res, e possíveis modificações em comportamento de atenção no desempenho motriz e cognitivo, por meio de atividades lúdicas, estimulando o desen-volvimento das competências funcionais cerebrais, considerando a dinâmica da hemisfericidade. Isto foi feito através do pensamento de alguns autores da psicologia do desenvolvimento1 e de outros pertencentes à área do conhecimento específico2-4. Para tal, tomou-se como base, identificar as difi-culdades de diferentes naturezas, priorizando as de características fenomênicas. Estas dificuldades foram estratificadas em dificuldades biofísicas, biopsíquicas ou bioemocionais, biomorais (ética e bioética) ou humanas e biossociais ou históricas. A identificação de tais dificuldades tem como propó-sito iluminar a dificuldade principal dos referidos escolares, isto é, a dificuldade de atenção.

Neurocientistas3-8 vêm se dedicando a estu-dar as diferenças funcionais entre os hemisférios cerebrais, suas relações de aprendizagem com a preferência hemisférica e processamento das informações. Estes estudos têm sido de grande importância, e sua aplicação se dá também na área psicopedagógica, onde um dos objetivos é compreender e qualificar o indivíduo para a aprendizagem. As pesquisas em neurociência apresentam estudos que nos levam à reflexão sobre a elaboração de atividades específicas de facilitação de aprendizagem, favorecendo um estado de homeostase do cérebro. Sendo assim, no presente estudo, faz-se o seguinte questio-namento: a preferência hemisférica poderá in-terferir no processo atencional de escolares com dificuldades na aprendizagem e em especial da linguagem escrita?

MÉTODOUtilizou-se a estratégia metodológica de uma

pesquisa bibliográfica e experimental, conside-rando-se a faixa etária dos escolares, de 7 e 8 anos de idade; o período do desenvolvimento em que se encontravam, em particular o neuropsico-

lógico. Optou-se por uma avaliação/intervenção psicopedagógica e neuropsicológica, direcionadas principalmente para o aluno, entretanto também foi assistido o corpo docente da escola, com orien-tações na área da psicopedagogia, neuropsico-logia, neurociência e palestra informativa sobre hemisfericidade.

As dificuldades no processo ensino-aprendi-zagem da linguagem escrita nas séries iniciais do Ensino Fundamental passam pela vivência do aluno; pela linguagem veiculada pela escola; pela conscientização e conhecimento do professor, inclusive do seu aluno, e pela função que esta aprendizagem terá na vida de cada um9.

Os educadores se questionam como solucio-nar as dificuldades no processo ensino-aprendi-zagem da linguagem escrita e como despertar o interesse dos alunos em prestar atenção nas atividades. Cabe ressaltar que o fracasso de alguns alunos, em particular na aquisição da linguagem escrita e leitura, em sua maioria, não é de ordem disléxica e sim tipicamente de um analfabetismo funcional10.

Pesquisa bibliográficaConhecer um pouco sobre o aluno e as carac-

terísticas próprias de uma faixa etária nos permite, a partir de um caráter exploratório, perceber e reconhecer as individualidades, o que poderá nos tornar mais aptos para a observação e interpreta-ção de determinados comportamentos1. O escopo desse trabalho tem como perspectiva teórica o estudo do desenvolvimento do ser humano, consi-derando-se os aspectos do desenvolvimento físico, cognitivo e psicossocial. Para efeito deste estudo, será dada ênfase ao aspecto biofísico, abordando questões referentes ao cérebro, com prioridade ao funcionamento dos hemisférios cerebrais. Houve um grande avanço no conhecimento da relação entre o cérebro e as funções mentais, devido ao desenvolvimento das técnicas de neuroimagem e do refinamento da avaliação neuropsicológica11. Essas técnicas exigem condições experimentais específicas para serem aplicadas em crianças, pois são técnicas que requerem cooperação e envolvem imobilização física, desta forma, grande parte dos

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estudos é feita com adultos. Assim, os conheci-mentos em neuropsicologia do desenvolvimento infantil ainda estão, em grande parte, relaciona-dos às avaliações qualitativas, como entrevistas, avaliações psicológicas, neuropsicológicas, ques-tionários de psicodiagnóstico e, principalmente, de relatos e trocas entre profissionais que atuam em conjunto, como professores, pedagogos, psi-cólogos, médicos, fonoaudiólogos, etc., conforme a área de intervenção, considerando também as variáveis dos fatores sociais e culturais.

Desenvolvimento maturacionalA formação e a elaboração das várias funções

cognitivas passam por um processo de ontogênese que atravessa vários estágios. A esses estágios pode-se atribuir uma correlação significativa com as fases do desenvolvimento cerebral. A partir dos 6-7 anos, a criança tem maior desenvolvimento das noções de lateralidade, orientação direita e esquerda, sendo capaz de reproduzir movimentos alternados e simultâneos. Há um grande desen-volvimento das áreas associativas específicas e das conexões inter-hemisféricas do córtex motor e sensorial11.

MielinizaçãoObservam-se diferenças sexuais na crono-

logia da mielinização, mais precoce nas meni-nas em áreas relacionadas com a linguagem, hemisfério esquerdo. Para os meninos, o ciclo maturacional do hemisfério direito parece ser mais prolongado, o que poderia justificar a maior habilidade em tarefas que envolvem o processamento viso-espacial11.

Lateralidade das funçõesA noção de lateralização ou simetria funcio-

nal da linguagem e outras funções cognitivas, iniciou-se em 1861, com o neurologista Pierre Paul Broca. Observa-se que cada hemisfério utiliza estratégias de processamentos diferentes e complementares, um de base verbal-analítica, hemisfério esquerdo (como a linguagem) e o outro visuo-espacial, hemisfério direito (por meio de imagens)11.

Hemisfério esquerdoO hemisfério esquerdo (HE) parece ter o subs-

trato neural para a expressão, análise e compre-ensão da linguagem, que compreendem sistemas para a percepção e classificações de materiais que são codificados linguisticamente; também é associado à organização temporal e sequencial da informação das funções de raciocínio abstrato, matemático e analítico, formação de conceitos verbais e distinção de sons e outras características articulatórias.

Hemisfério direitoO hemisfério direito (HD) parece ser predomi-

nantemente não linguístico, emocional e responsá-vel pela integração sensorial de variáveis internas e externas, isto é, orientação espacial, percepção de estímulos, análise e posição do corpo no espa-ço, com a imagem corporal, percepção do todo de um estímulo, relações visuo-espaciais, bem como participa da mediação da expressão emocional.

Com o desenvolvimento da especialização hemisférica, observa-se que a lateralidade de função no cérebro se desenvolve com o tempo e parece ser totalmente estabelecida na ado-lescência. Observa-se que lesões ocorridas no hemisfério esquerdo, ocorrendo entre o início da fase da fala e adolescência, associam-se a distúrbios de linguagem. Desta forma, prova-velmente a lateralidade, na utilização de estra-tégias de processamentos, tem sua emergência também na época da aquisição da linguagem. Algumas diferenças no processamento hemisfé-rico já estão presentes desde o nascimento, mas são susceptíveis à modulação e à modificação mediante experiência11.

PlasticidadeVerifica-se que os sistemas neurais que mediam

a linguagem têm um prognóstico para a sua recu-peração, de algum prejuízo, aproximadamente até aos 12 anos de idade. Numa perspectiva evolutiva maturacional, lesões e disfunções caracterizam-se de acordo com as fases do crescimento neuronal, mielinização e maturação sequencial das várias regiões cerebrais:

uma perspeCtiva neuropsiCopedagógiCa

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[...] os determinantes de disfunção neuropsico-lógica na infância sofrem influência de fatores genéticos e estruturais (relacionados com a topografia das lesões), especificidade das áre-as cerebrais envolvidas com o comportamento (relacionadas a áreas eloquentes da linguagem e memória), a extensão das disfunções, fatores de neuroplasticidade e os relacionados ao pa-radigma da especialização hemisférica, isto é, estilo cognitivo holístico do hemisfério direito ou analítico do hemisfério esquerdo11.

O desenvolvimento psicológico se dá por meio de uma interação dinâmica e contínua das experi-ências sociais e ambientais e por isso é necessário, não só identificar os fatores que interferem nesse processo, mas também sua influência. Padrões ru-dimentares de atividade neural fornecerão a base do desenvolvimento psicológico da criança11.

Fatores ambientaisOs fatores ambientais estão diretamente rela-

cionados às condições nutricionais, quantidade e qualidade de estimulação, cuidados físicos, tanto da criança quanto da mãe, ocupação dos pais, es-colaridade e estilos de interação familiar e social.

Fatores culturaisCultura refere-se ao comportamento aprendi-

do e aos traços que são atribuíveis às experiências socializadas de um particular sistema ou insti-tuição de uma sociedade, diferentes ambientes culturais levam ao desenvolvimento de diferentes padrões e habilidades, incluindo também as ha-bilidades cognitivas. Os fatores culturais também alteram diferente e dinamicamente o desenvolvi-mento do cérebro:

[...] o cérebro não funciona como variável inde-pendente que dita ou controla o comportamento, mas que atua como uma variável dependente que reflete e é influenciada pelos fatores ambientais. O desenvolvimento e a plasticidade sináptica das funções cognitivas chamadas “superiores” são ati-vados no processo do contato social da criança e não somente determinados por fatores estruturais e de

mielinização das regiões corticais. (grifo da autora da pesquisa)11.

A totalidade das idéias, habilidades e costu-mes a qual cada criança nasce e cresce estariam envolvidas no seu desenvolvimento e no perfil de habilidades cognitivas.

Função atencionalA função atencional está relacionada tanto

à entrada de informação, como na execução de tarefas complexas, onde a pessoa adquire infor-mação sobre si própria, sobre o seu meio e, com isso, afeta o seu comportamento12. De todas as funções cognitivas, a atenção é provavelmente aquela que mais frequentemente se torna compro-metida quando se consideram as lesões cerebrais como um todo, independente de sua localização. Os déficits atentivos podem se manifestar em diferentes quadros clínicos13. A partir dos cinco anos, a atenção da criança fica sob o controle de processos lógicos internos como, por exemplo, as estratégias de procura seletiva, onde ela tem dificuldades em ignorar distrações e discriminar estímulos que são ou não relevantes para uma tarefa14. Prestar atenção é focalizar a consciên-cia, concentrando os processos mentais em uma única tarefa principal e colocando as demais em segundo plano. A atenção apresenta-se sob dois aspectos: a criação de um estado geral de sensi-bilização - estado de alerta e a focalização desse estado de sensibilização sobre certos processos mentais e neurobiológicos. Podemos focalizar a atenção em estímulos sensoriais (som, cheiro), e em processos mentais (cálculo matemático, pensa-mento, lembrança). A atenção mental é chamada de cognição seletiva e a atenção sensorial, de percepção seletiva6. O controle da atenção refere-se ao esforço, por parte do sujeito, para manter a atenção, é determinado por fatores externos e internos. Os externos referem-se às características dos estímulos, como tamanho, posição, cor, inten-sidade, movimento, complexidade, relevância e novidade. Os fatores internos são aqueles que se relacionam diretamente com o estado do orga-nismo, como fadiga, estresse, interesse, uso de

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medicamentos e, provavelmente, a preferência de processamento hemisférico14.

Bases neurais da atençãoO córtex frontal e o temporal são as estruturas

corticais envolvidas na atenção, uma rede aten-cional composta de áreas frontais que mobilizam seletivamente o córtex parietal (atenção viso-es-pacial) e o córtex temporal (atenção linguística)14. Para se verificar quais regiões corticais estariam envolvidas na atividade de atenção, utilizaram-se técnicas de imagem por ressonância magnética funcional (IRMf) e tomografia por emissão de pósitrons (PET), as quais nos capacitam a ver as alterações na atividade encefálica humana.

Pode-se considerar que a atenção está rela-cionada com o processamento preferencial de informação sensorial. O cérebro não consegue processar toda a informação sensorial que entra simultaneamente. A atividade cerebral muda quando a atenção é dirigida para um estímulo específico: visual, auditivo. Os dois hemisférios cerebrais são especializados nos mecanismos atencionais por diferentes caminhos. Um sistema de ativação, responsável pela produção de res-postas motoras, está localizado no lado esquerdo do cérebro, enquanto que o sistema de alerta (provocativo), responsável pela resposta fásica aos estímulos externos, encontra-se lateralizado para o lado direito do cérebro. Geralmente a duração de um determinado foco de atenção é breve14.

HemisfericidadeA idéia de que os dois hemisférios são especia-

lizados em diferentes modos de pensamento levou ao conceito de hemisfericidade. A hemisfericidade é uma forte tendência para a predominância de um dos hemisférios ou de um modo de proces-samento, independentemente do tipo de tarefa. Apesar dos hemisférios parecerem semelhantes, eles têm particularidades diferentes e fazem a diferença entre os indivíduos de acordo com a sua preferência de processamento e capacidade de balanceamento entre eles4. Presume-se que esta utilização diferencial se reflete no “estilo cognitivo” do indivíduo, as preferências pessoais

e a abordagem na solução de problemas. A he-misfericidade não se estende apenas à percepção, mas a todos os tipos de dimensões intelectuais e de personalidade5.

Hemisfericidade e uso da linguagem verbal e não verbal

Conforme dito anteriormente, o hemisfério direito processa a informação não-verbal, é holís-tico, tem capacidade de reconhecer faces, formas e propriedades geométricas, realizar transforma-ções espaciais e transposições, colocar forma nos moldes, copiar desenhos, discriminar e lembrar formas visuais e uma pequena capacidade de pro-cessar habilidade verbal. O hemisfério esquerdo processa informações analíticas, é verbal, controla também a sequência de movimentos dos membros superiores e inferiores, sistema de produção da fala, melhor habilidade para reconhecimento da fala humana.

Especialização hemisféricaNa dimensão neuropsicológica, a linguagem

verbal, que define a preferência funcional do he-misfério esquerdo, é antecedida pela linguagem não-verbal, que pertence ao hemisfério cerebral direito. Pode-se dizer que: “a especialização hemisférica requer que, evolutivamente, o hemis-fério direito assuma a liderança das atividades não-verbais, como os gestos, a postura, as brincadeiras, as imitações, a integração motora. Gradativamente, ao longo do desenvolvimento humano, o hemisfério esquerdo transcende esta dimensão, a fim de se pro-jetar e disponibilizar para as atividades linguísticas verbais e cognitivas mais complexas17.

2. Pesquisa teórico-experimental• Amostra:10alunos,ambosossexos,de7e8

anos de idade, primeiro ciclo, de uma Escola Pública Municipal da zona norte da cidade do Rio de |Janeiro, com dificuldades de atenção (queixa do professor: atenção difusa, baixa con-centração e rendimento escolar: insuficiente);

• Local:varioudeacordocomogrupoeaativi-dade (sala de aula, quadra de esporte, pátio recreativo, cantina, sala de leitura, sala da

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direção e sala dos professores); • Tempodeduração:umsemestre,umavez

por semana, após o intervalo da recreação, 30 minutos, grupo de quatro alunos. Com os professores, antes ou após as atividades do dia e entre a execução de alguma avaliação ou ta-refa escolar. Com os responsáveis, na reunião bimestral agendada pela direção/coordenação escolar.Oportunizou-se uma intervenção neuropsico-

pedagógica, após a coleta de dados, por meio de atividades lúdicas, com o objetivo específico de estimular a atenção, o desenvolvimento de mo-tivação para novas tarefas, um comportamento ativo, favorecer o desenvolvimento da abstração, desenvolver a percepção e a interpretação da re-alidade, estimulando o desenvolvimento de com-petências funcionais hemisféricas nos escolares com dificuldades de atenção.

Entrevistas• Comosalunos: local: saladeaula,pátioe

cantina da escola. De forma coletiva, os alunos eram divididos em grupos, com o objetivo de coletar dados e informações quanto à auto-percepção de cada aluno com relação a sua compreensão e sentimentos sobre o espaço/escola e dificuldades escolares;

• Comosprofessores: local: saladeaula,deforma individual, com o objetivo de coleta de informações sobre os alunos, avaliação esco-lar, comportamento, participação familiar na escola e nos trabalhos escolares; Com os responsáveis: local: sala de aula, de

forma coletiva, com o objetivo de coleta de infor-mações sobre o aluno, com o preenchimento de questionário psicopedagógico, acompanhados de orientação.

Avaliação psicomotora (avaliação de con-duta e comportamento motor: observação de atividade recreativa de iniciação esportiva para o basquetebol)

Utilizaram-se jogos pré-desportivos visando à avaliação da combinação de habilidades motoras, desenvolvimento físico, técnico, tático, psicológi-

co, moral e social18. Aplicação coletiva. Utilizou-se o tempo-aula de Educação Física. Local: quadra de esporte da escola. Material: garrafão de bas-quetebol padrão, de parede. Bola não oficial, com tamanho, peso e flexibilidade adequados para a atividade. Objetivo: acertar a bola dentro da cesta. Era observada principalmente a atenção para a instrução, movimento e mudança de com-portamento após verificar o resultado do primeiro arremesso. Categorizava-se cada conduta motora.

Teste de Prontidão para Leitura (TPL – CEPA)Utilizou-se o tempo-aula de leitura. Local:

sala de leitura. Aplicação coletiva. Material: lápis preto, marcador de papel e um exemplar do teste. Tempo de aplicação: aproximadamente quando 80% das crianças tivessem terminado cada etapa. A aplicação em duas partes e as tarefas apresen-tadas como um exercício. Objetivo: verificar se a criança estava apta para entrar no período inicial de instrução regular em leitura19.

Teste de CLEM (teste de conjugação lateral dos movimentos dos olhos)

Utilizaram-se tempos-aula. Local: sala de lei-tura. Aplicação individual. Protocolo com cinco perguntas de conteúdo analítico e cinco perguntas de conteúdo espacial. Objetivo: detectar tendên-cias de dominância cerebral em processamentos mentais, avaliação da hemisfericidade4,5.

Coleta de registro de ondas cerebrais da linha de base EEG (pontos C3 e C4)

Utilizou-se tempo-aula. Local: sala de leitura. Foram realizadas as coletas da linha de base ele-troencefalográfico de forma individual. EEG com neurofeedback, usando aparelho eletrônico com-putadorizado denominado ProComp+, BioGraph na versão 2.1., com um programa que captura os dados advindos do aparelho de eletroencefalogra-ma, ou seja, nos permite analisar e comparar o fun-cionamento cerebral. A onda cerebral priorizada foi a onda alfa (7 a 14 Hz) como uma linha de base, ideal para a aprendizagem3,4,8, com os escolares em repouso e com os olhos abertos, por três minutos e dez segundos, nas regiões C3 (Hemisfério Es-

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querdo) e C4 (Hemisfério Direito), ponto central, de maior abrangência (para cada hemisfério cere-bral), de acordo com as normas internacionais de eletroencefalografia. Demonstrando predomínio de atividade do HD.

Intervenção neuropsicopedagógicaUtilizaram-se atividades lúdicas, modalidade

não verbal, equivalente às atividades escolares, com objetivo geral de facilitar o funcionamento dos pro-cessos, habilidades e estratégias de pensamento, em particular a atenção, por meio de: jogos de dominó, absurdo, de erros, onde está (retirado de jornais, e revista Coquetel Picolé), contribuindo para o desen-volvimento cognitivo e motor. Buscou-se favorecer uma mudança de atitude e desempenho em diferen-tes situações escolares e da vida às quais os alunos estivessem expostos. Estas atividades apresentavam como objetivos específicos, respectivamente: estimu-lar a atenção e a necessidade de utilização de regras para qualquer atividade individual, de grupo e da vida; propiciar o desenvolvimento da motivação para novas tarefas e comportamento ativo, desenvolver a percepção e a interpretação da realidade; requerer a atenção nas tarefas de encontrar semelhanças e diferenças por meio da comparação dos objetos; e, principalmente, estimular a percepção analítica por meio da divisão do todo em partes (desenvolvendo o pensamento divergente) e estimular e mediar a integração das partes em um todo (desenvolvendo o pensamento convergente).

RESULTADOSConsiderando a natureza de cada teste, os

instrumentos estatísticos utilizados foram:

Referente às coletas de dados da captação de ondas cerebrais e os testes de avaliação mo-tora e cognitiva: discutidos sob forma de análise qualitativa, 2) os dados referentes ao teste de CLEM: tratados com referência à ficha de Borg, ao analisar os movimentos conjugados laterais dos olhos, este é registrado em um modelo de sistema numérico “face dos relógios”, para cada pergunta feita, sendo detectada tendências a hemisfericidade dos escolares. Por meio de um

acompanhamento neuropsicopedagógico sis-tematizado de entrevistas e intercalado pelas avaliações e intervenções, procurou-se identificar as dificuldades de diferentes naturezas:

a) Dificuldades de natureza biofísica:• Necessidadededesenvolvimentodenovo

plano no mapeamento de áreas cerebrais: dificuldade na passagem das operações mais concretas e primitivas, do período anterior, pré-operatório, segundo Piaget, para o uso mais aperfeiçoado da lógica, aquisição da capacidade de leitura, escrita, cálculos e in-teração social;

• Provávellentidãonodesenvolvimentoestru-tural das organizações do cérebro interferindo no aperfeiçoamento da mielinização dos cir-cuitos elaborados intra-hemisféricos quanto ao aumento de vocabulário, aquisição da leitura e da escrita;

• Poucaestimulaçãoparafacilitaraespecializa-ção do hemisfério esquerdo para funções mais complexas e abstratas da linguagem;

• Dificuldadeemperceberarealidade:atençãodifusa, pouca orientação no tempo e espaço, percepção corpórea prejudicada inclusive de reconhecimento e definição de lateralidade;

• Dificuldadedecoordenaçãomotorageraleviso-motora;

• Provávelimaturidadenoplanodaconectivi-dade neuronal hemisférica impedindo e/ou dificultando os escolares de compreenderem e realizarem as atividades necessárias na fase de alfabetização.b) Dificuldades de natureza biopsíquica ou

emocional:• Sentimentode inferioridadepornãoconse-

guirem aprender habilidades específicas da escolaridade, como escrever, ler e calcular;

• Dificuldadeemselecionarestímuloscompa-tíveis com a escolarização, não conseguindo manter a atenção concentrada para atividades escolares, como apresentação das letras e nú-meros.

• Lentidãoe faltade interesseematividadesrelacionadas com a linguagem escrita.

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c) Dificuldades de natureza biomoral ou hu-mana:• Buscamcompanheirosqueproporcionemo

respeito mútuo frente às dificuldades, geral-mente aos pares, em papéis que expressam as dificuldades das outras;

• Indisciplina,comportamentoinadequadoemsala de aula, andar, correr e sair da sala sem autorização.d) Dificuldades de natureza biossocial ou

histórica:• Autoconceitoprejudicadodevidoàpercepção

e à conscientização de suas dificuldades e limitações frente aos conteúdos escolares;

• Comportamentoinadequado,demonstrandoagressividade e baixa tolerânci;

• Auto-estimaeautoconfiançaprejudicadas.As dificuldades relatadas anteriormente, em

suas respectivas estratificações, têm o propósito de adequar ou ordenar as mesmas, facilitando e ampliando o conhecimento destes escolares do primeiro ciclo.

Resultados do desempenho motorPara efeito deste trabalho optou-se pelo

jogo de basquetebol por ser uma modalidade de iniciação esportiva não utilizada na escola e também porque nenhum aluno a executava em outro espaço (clube, praça, casa), eliminando-se a possibilidade de experiência e manejo dos movimentos específicos para o basquetebol. Buscou-se observar, em um primeiro momento, a atenção do aluno em relação à orientação (técnica) para a execução de cada movimento e para a sequência dos movimentos (quicar a bola parado, quicar a bola andando, parar em

frente à marca para o arremesso e arremessar a bola em direção à cesta). Em seguida, também se observou a atenção do aluno em relação ao seu sucesso quanto ao objetivo de acertar a cesta e dependendo do resultado, se ele manteve o mesmo movimento (comportamento) ou se ele mudava de atitude frente ao insucesso (conduta), dando mais força ou menos força ao movimento. Totalizando um escore de 10 pontos (Figura 1).

Resultados do desempenho cognitivo: Teste de Prontidão para Leitura

O TPL mediu o desenvolvimento dos esco-lares nas habilidades que são requeridas no período inicial da leitura. Houve pouca variação de criança para criança, em relação ao número e à natureza das experiências que lhes foram proporcionadas, a intensidade do exercício, a direção dos interesses, a capacidade de atenção e a energia volitiva (vontade). Todos os alunos apresentaram escore acima da média para pron-tidão para leitura19 (Figura 2).

Resultados do teste de preferência de proces-samento hemisférico

Os indivíduos foram avaliados por meio de procedimentos de CLEM20. Encontrou-se 6 alunos hemisféricos esquerdos (HE) e 4 alunos hemisfé-ricos direitos (HD), conforme Tabela 1.

Coleta de linha de base do EEG: pontos C3 (HE) E C4 (HD)

A análise dos dados coletados nos dois hemis-férios com olhos abertos, sendo C3 representante do hemisfério esquerdo e C4, representante do hemisfério direito, para fins de comparação entre os hemisférios cerebrais (Figura 3).

Tabela 1 - Preferência hemisférica dos alunos com dificuldade de atenção.

Indivíduos 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

Movimento ocular (no de vezes)

He 10 9 2 7 9 8 7 3 4 3

Hd 0 1 8 3 1 2 3 7 6 7No de itens avaliados: 10. He = Hemisfério esquerdo; Hd = Hemisfério direito.

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DISCUSSÃO Atividade motora: oportunizou aos alunos

autoconhecimento de sua capacidade motora, de maneira recreativa. O jogo de basquetebol apresentado como uma atividade lúdica, adap-tada, foi utilizado como facilitador do processo ensino-aprendizagem, pois possibilitou adequar as atividades do jogo à vivência motora dos alu-nos, respeitando a faixa etária, proporcionando uma maior motivação para a prática e facilitando a “resignificação” do aprender em outro contex-to, além do espaço sala de aula. Esta atividade motora utilizada como estratégia neuropsicope-dagógica demonstrou que, além de servir como estímulo na construção de processos atencionais, auxiliando o desenvolvimento das funções cogni-tivas superiores, também favoreceu a promoção do basquedesenvolvimento da confiança de cada aluno em si mesmo, responsabilidade para cumprir a tarefa, sociabilidade entre os demais colegas e cooperação.

Atividade cognitiva: Houve pouca variação entre os escolares. Todos os alunos apresenta-ram escore acima da média para prontidão para leitura19.

Convém lembrar que o hemisfério esquerdo processa informações analíticas e sequenciais; e que, o hemisfério direito processa informações espaciais e conceituais. Quando os alunos são submetidos a uma situação estressante (processo de aprendizagem), entram em resposta de luta e fuga, e, normalmente, durante esta resposta, o hemisfério direito “fecha-se ou se desmobiliza”, apresentando uma imagem do traçado cortical bem desbalanceada3, tornando o aprendizado ainda mais difícil, pois afeta a capacidade de aprender. Observou-se que o grupo de alunos em que predomina a preferência de funciona-mento do hemisfério direito, a cada nova etapa do processo de alfabetização em que eles não conseguiam acompanhar, desenvolviam um processo de ansiedade, sendo reativado a cada nova tarefa relacionada com a linguagem es-crita e prejudicando seu interesse e atenção. O hemisfério direito é o responsável por processar todas as informações novas para depois enviar

Figura 2 - Representação da probabilidade de alfabetização de alunos com dificuldades de atenção.

Figura 1 - Representação gráfica da atividade lúdica de iniciação esportiva para o basquetebol.

Figura 3 - Representação gráfica da amplitudedas ondas alfa C3-He e C4-Hd.

Crianças com dificuldade de atenção

Am

plitu

de (

V)

Indivíduos

HE HD

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para o hemisfério de competência3,4; para uma determinada atividade, podendo ser no próprio hemisfério direito ou no hemisfério esquerdo; e o hemisfério esquerdo, associado a uma tarefa de rotina. Este fato, provavelmente, pode ter sido o principal fator relacionado a estes resultados em função do método utilizado pela professora, isto é, a questão do hemisfério direito ser o responsável pelo processamento de atividades novas (ativi-dades pedagógicas relacionadas à alfabetização: nova letra, nova palavra, nova frase), onde após identificada, será enviada para o hemisfério de sua competência, o esquerdo, que também está relacionado ao processamento de atividades ro-tineiras, e a linguagem escrita. Verifica-se que alunos predominantes de processamento hemis-férico direito, por ter esta característica própria, necessitam de um tempo maior para estabelecer um novo padrão de homeostase cerebral e reiniciar ou dar continuidade ao processo de alfabetização.

CONCLUSÃOA criança, uma vez ingressada no ciclo inicial,

terá um caminho contínuo de desequilíbrios, equilí-brios e desequilíbrios a percorrer. Desta forma, por meio de um acompanhamento neuropsicopedagó-gico sistematizado, intercalado pelas avaliações, procurou-se identificar, as dificuldades de diferen-tes naturezas, considerando-se como referência as dificuldades biofísicas, provavelmente consequen-tes a preferências de funcionamento hemisférico, em escolares com dificuldades de atenção.

Embora se considere um conjunto de fatores, como a motivação e auto-estima do aluno e o envolvimento dos pais, será a diversidade do ensino, ministrado pelo professor, que fará a diferença, considerando-se o estilo cognitivo dos alunos. O estado da mente suporta ambos os tipos de processamento, mental, sequencial/analítico (hemisfério esquerdo), como também espacial/conceitual (hemisfério direito). Em outras palavras, “aprendizagem do cérebro por inteiro”3. Na maioria das pessoas, na região frontal, no lobo direito, ocorrem os comandos para lidar com as situações novas de aprendizagem; o hemisfério es-querdo trabalha com as situações cotidianas, embora haja um ciclo contínuo de informações que partem do

hemisfério direito para o hemisfério esquerdo4,7. Ao entrar na escola a criança já é um sujeito que efetivou inúmeras aquisições no que se refere ao conheci-mento. O aluno é alguém que já apresenta um estilo cognitivo na aquisição destes conhecimentos, que resultam de suas experiências cotidianas. Na prática, as diversas abordagens do ensino defrontam-se com estilos cognitivos diversos utilizados pelos escolares, colocando a questão da (in)coerência entre diferentes abordagens e os seus efeitos na alfabetização21, a cada ano do ciclo. Os escolares que adotam o processo simultâneo em detrimento do sequencial (hemis-fério direito) podem apresentar dificuldades para segmentar as palavras em sílabas e decodificá-las, seguir sequências, orientações, encontrar sequên- cias dos acontecimentos em um relato (Tabela 1). Os escolares que adotam o processo sequencial sem utilizar o processo simultâneo (HE), podem apre-sentar dificuldades para reconhecer globalmente uma palavra, fazer ligações lógicas considerando o contexto, extrair a idéia principal de um texto e fazer um resumo (Tabela 1). Estas dificuldades pontuam à falta de correspondência entre a abordagem utilizada pelo professor no ensino (sequencial ou simultâneo) e o modo pelo quais os escolares tratam as informações (estilo cognitivo de funcionamento cerebral: preferên-cia hemisférica), podendo gerar dificuldade.

As reflexões sobre as diferenças de desempe-nho na alfabetização, à luz da preferência hemisfé-rica, dos diversos enfoques dados à alfabetização, sugerem indagações sobre a interferência da abordagem predominante no ensino e a produção das diferenças dos desempenhos dos escolares.

Verificou-se que a utilização diferenciada de “estilo cognitivo” de escolares poderá levar a preferências pessoais, e provavelmente a necessi-dades diferenciadas no processo de alfabetização e, consequentemente, uma intervenção com abor-dagens diferenciadas, na busca de amenizar e/ou solucionar alguns problemas de aprendizagem. Pode-se dizer que, no caso específico deste estudo, a dificuldade de atenção (abordagem geral) quei-xa principal do professor, provavelmente é uma dificuldade, temporária, consequente da falta de correspondência entre a abordagem pedagógica, no processo de ensino no período de alfabetização,

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utilizada pelo professor (processo sequencial) e o modo pelo qual os alunos recebiam e tratavam as informações (estilo cognitivo). O grupo dos alunos com dificuldade de atenção, em que predominava o funcionamento do hemisfério esquerdo conseguiu ultrapassar as dificuldades iniciais, entretanto os he-misfério direito observou-se a continuação das difi-culdades no processo de alfabetização, mesmo após a intervenção neuropsicopedagógica, necessitando provavelmente de maior tempo de estimulação com atividades voltadas para o desenvolvimento das funções atencionais do hemisfério esquerdo. Desta forma, em uma perspectiva neuropsicope-dagógica (abordagem específica), pode-se dizer que a dificuldade de atenção dos escolares são desordens de natureza orgânica, neurológica, fun-cional, temporária, que interferem na recepção do estímulom caracterizando-se por uma discrepância

entre o potencial funcional do aluno (preferência hemisférica) e a estratégia pedagógica do professor (sequencial ou simultâneo) para a alfabetização.

Considerando-se a questão da hemisfericidade, como fator relevante no processo de aprendiza-gem, propõe-se que programas educacionais com intervenções neuropsicopedagógicas sejam dire-cionados ao atendimento de todos os alunos, isto é, os alunos com predominância de funcionamento tanto para o hemisférico direito quanto esquerdo, independente da sua modalidade de aprender. E que outros estudos sejam realizados no campo da educação, pois se considera esta proposta de intervenção, precursora, necessitando de mais estudos correlacionando as preferências hemis-féricas e os processos atencionais interferindo na aprendizagem, inclusive a preferência hemisférica da professora, isto é, sua modalidade de ensinar.

SUMMARYDevelopment stimulation of hemispherical functional skills in students

with attention difficulties: a neuropsychopedagogic perspective

Purpose: The objective of this study was to investigate attention behaviors through motor and cognitive evaluation and hemispherical preference of 10 students between 7 and 8 years old and possible attention behaviors modifications on motor and cognitive performance, using playful activities, stimulating brain functional skills, considering the dynamic of hemisphericity. Methods: To reach this objective it was applied as methodological strategy interviews with students, students parents and school professionals; psychomotor evaluation (motor conduct and behavior); cognitive evaluation (Test of Reading Readiness – CEPA); CLEM Test; collection of brain-wave recording of electroencephalogram base line (C3 e C4 points) and neuropsychopedagogic intervention sessions. Results: It was observed that some remarkable characteristics referring to hemisphericity directly interfere, in various ways, in the learning process. As both hemispheres are specialized in different ways of thinking, it is presumed here that this distinguished use reflects a “cognitive style” with personal preferences in solving problems. Conclusion: As far as hemisphericity does not interfere solely on attention and perceptional processes, but all over intellectual and personality dimensions, it is proposed, though, a reflection on the conduction of the didactical shape of this process, mainly in the early stages on the teaching of read and write.

KEY WORDS: Attention. Cerebrum. Learning.

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Artigo recebido: 3/7/2009 Aprovado: 12/12/2009

Trabalho realizado no Laboratório de Neuromotri-

cidade II da Universidade Castelo Branco, Rio de

Janeiro, RJ.

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Silva SSl

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ARTIGO de RevIsãO

RESUMO – Dislexia é uma dificuldade de aprendizagem caracterizada por problema na linguagem receptiva e expressiva, oral ou escrita. Os fonoaudiólogos, por seus conhecimentos e sua formação sobre linguagem e distúrbios de linguagem, estão cada vez mais envolvidos na identificação, na avaliação e no tratamento de indivíduos com distúrbios de leitura. O objetivo deste estudo consiste em descrever a dislexia e suas manifestações para o correto tratamento, minimizando, assim, os impactos emocionais e comportamentais para a criança. Com a realização desta pesquisa, verificou-se que existe a necessidade de mais pesquisas sobre o assunto e, principalmente, que os profissionais tanto da educação quanto da área da saúde entendam que o processo diagnóstico e intervenção é realizado por uma equipe interdisciplinar, dentre eles o fonoaudiólogo, por seu conhecimento na área de linguagem oral, leitura/escrita.

UnitERMOS: Dislexia. Equipe interdisciplinar. Aprendizagem.

ConheCendo a diSlexia e a importânCia da equipe interdiSCiplinar no proCeSSo de

diagnóStiCo

sther soares Lopes da silva

Sther Soares Lopes da Silva – Fonoaudióloga.

Formada pelas Faculdades Unidas do Norte de Minas

– FUNORTE/MG.

Correspondência

Sther Soares Lopes da Silva

Rua Goiania, 551- Jd. das Palmeiras - Montes Claros,

MG. CEP 39402-204

E-mail: [email protected]

diSlexia e a importânCia da equipe interdiSCiplinar no diagnóStiCo

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intRODUÇÃODislexia é uma dificuldade de aprendizagem

caracterizada por problema na linguagem recep-tiva e expressiva, oral ou escrita. As dificuldades podem aparecer na leitura e na escrita, soletração e ortografia, fala e compreensão e em matemá-tica. Problemas no processamento visual e audi-tivo podem aparecer, distinguindo os disléxicos como um grupo que apresenta dificuldade no processamento de linguagem. Isso significa que pessoas disléxicas têm dificuldade em traduzir a linguagem ouvida ou lida para o pensamento, ou o pensamento para a linguagem falada ou escrita. Dislexia não está associada a uma baixa de inteligência. Na verdade, há uma lacuna ines-perada entre a habilidade de aprendizagem e o sucesso escolar. As alterações comportamentais e emocionais são consequências do problema, pois a dislexia não é uma doença e sim um funciona-mento peculiar do cérebro para o processamento da linguagem¹.

Os fonoaudiólogos, por seus conhecimentos e sua formação sobre linguagem e distúrbios de linguagem, estão cada vez mais envolvidos na identificação, na avaliação e no tratamento de indivíduos com distúrbios de leitura. Além disso, sua contribuição ao atender esses indi-víduos está sendo pouco a pouco reconhecida por professores, pedagogos e psicólogos, sendo este um esforço de colaboração entre todos os profissionais envolvidos com distúrbios de linguagem².

O diagnóstico nem sempre é realizado corretamente, devido à falta da equipe in-terdisciplinar, com esta incerteza estes não serão devidamente orientados. Observa-se a falta de informações dos profissionais das áreas de educação e saúde, a não identifica-ção precoce e o devido encaminhamento, que implicam em frustração e evasão escolar. O correto diagnóstico de que a criança é por-tadora de dislexia provoca aflição tanto na família quanto na escola e nos profissionais de educação, devido às limitações existentes na colaboração familiar e às difíceis adequa-ções escolares. Em relação à criança, obser-

va-se um alívio por definir a causa das suas dificuldades, pois pelo menos ela não ficará exposta ao rótulo de preguiçosa, desatenta e bagunceira.

Tendo em vista a importância do diag-nóstico para o tratamento de crianças com dislexia e da equipe multidisciplinar/inter-disciplinar, o objetivo deste estudo consiste em descrever a dislexia, suas manifestações para o correto tratamento, minimizando, assim, os impactos emocionais e comporta-mentais para a criança.

MÉtODOPara a elaboração deste estudo utilizaram-se

diferentes bases de dados como SciELO, Revis-tas on-line como CEFAC, Sociedade Brasileira de Pediatria, entre outras. Nesta pesquisa bi-bliográfica, optou-se por utilizar artigos atuais publicados nos últimos dez anos, exceto nos casos em que os trabalhos mais antigos apresen-taram-se como indispensáveis para este estudo.

Utilizou-se para pesquisas além de artigos disponíveis na Internet, livros necessários para a elaboração desse trabalho.

Na citação dos autores consultados optou-se por referenciá-los de acordo com a ordenação do raciocínio clínico necessário para escrever cada um dos tópicos deste estudo e não pela ordem cronológica.

RESULtADOS E DiSCUSSÃO

Definição “A dislexia consiste em alterações resul-

tantes de limitações sensoriais discretas ou de anomalias na organização dinâmica dos circui-tos cerebrais responsáveis pela coordenação vísuo-audio-motora. Os indivíduos acometidos são portadores de diferenças de aprendizagem específicas, não se tratando portanto de uma doença e sim de um modo diferente de pensar, não uma incapacidade3.”

As crianças, quando iniciam a alfabetização, já dominam a linguagem oral, sendo capazes de iniciar o aprendizado da escrita. Entretanto,

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sabe-se que existem regras mais específicas e próprias da escrita, havendo, então, maiores dificuldades no seu aprendizado4.

É importante ressaltar que existe uma combi-nação dos fenômenos biológicos e ambientais no aprendizado da linguagem escrita, envolvendo a integridade motora, sensório-perceptual e a socio-emocional. Além disso, o domínio da linguagem e a capacidade de simbolização também são princípios importantes no desenvolvimento do aprendizado da leitura e da escrita5,6.

Observou-se que a dislexia, por ser uma altera-ção específica de leitura e de escrita, requer estudos mais aprofundados, por se tratar de um tema com-plexo. O aprendizado da leitura e da escrita é um marco na vida das crianças, entretanto, muitas des-tas apresentam dificuldades neste processamento e requerem que os profissionais aprimorem-se sobre este assunto, para que a intervenção seja realizada precocemente.

EtiologiaA dislexia trata-se de um distúrbio de origem

neurológica, congênito e hereditário, sendo co-mum apresentar-se em parentes próximos. As alterações no processamento cerebral têm sido pesquisadas pela Neuropsicologia e Neuroquí-mica. Estudos recentes realizados pela equipe do Dr. Fagerheim, da Noruega, descobriram que o gene DYX3 do cromossomo 2 estaria relacionado aos distúrbios de leitura e de escrita3.

Classificação da DislexiaAs classificações da dislexia são7,8:

• DislexiaDisfonéticaouFonológica:caracte-rizada por uma dificuldade na leitura oral de palavras pouco familiares, que se encontra na conversão letra-som e é, normalmente, associada a uma disfunção do lóbulo tem-poral.

• DislexiaDiseidéticaouSuperficial: caracte-rizada por uma dificuldade na leitura rela-cionada a um problema visual, cujo processo é deficiente. O leitor lê por um processo extremamente elaborado de análise e sín-tese fonética. Esse subtipo de dislexia está

associado às disfunções do lóbulo occipital.• DislexiaMista:caracterizadaporleitoresque

apresentam problemas dos dois subtipos: disfonéticos e diseidéticos, os quais estão associados às disfunções dos lóbulos pré-frontal, frontal, occipital e temporal.

Manifestações Encontradas na DislexiaDesordens no processamento fonológico da

informação, decorrentes de disfunções neuro-psicológicas, estão presentes no distúrbio espe-cífico de leitura, ocasionando transtornos para execução de atividades intraneurosensoriais (atividades que exigem o uso de um proces-samento apenas visual ou auditivo, como em atividades de repetição de palavras e cópia), e/ou atividades interneurosensoriais (que exigem o uso de dois ou mais processamentos, como o auditivo-visual, auditivo-visual e tátil, como em atividades de leitura oral ou escrita sob ditado)9.

As primeiras manifestações das dificulda-des encontradas em crianças com dislexia do desenvolvimento aparecem na decodificação fonografêmica, quando a criança precisa en-tender e utilizar a associação dos sinais gráficos com as sequências fonológicas das palavras no início da alfabetização10.

As crianças com distúrbio específico de leitura apresentam dificuldades na habilidade narrativa, que são detectadas, primeiramente, pelos professores em situação de sala de aula, e se manifestam quanto à capacidade de desen-volver a temática textual, manter a coerência em suas narrativas e utilizar as ligações coesivas para estabelecer conexões entre as frases que, geralmente, influenciam a contagem, a recon-tagem e a compreensão de estórias11.

Tendo em vista a importância do processa-mento fonológico e visual para aquisição da leitura e escrita e o déficit destes encontrado em crianças com dislexia, torna-se relevante entender seu funcionamento, este será descrito no capítulo a seguir.

Processamento FonológicoPara chegar à descoberta do fonema o

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aprendiz necessita adquirir e desenvolver a consciência fonológica, uma competência me-talinguística que possibilita o acesso consciente ao nível fonológico da fala e à manipulação cognitiva das representações neste nível, que é tanto necessária para a aprendizagem da leitura e da escrita como dela consequente12.

Para ler eficazmente a criança precisa prestar atenção a todas as letras de uma palavra, a fim de conectá-las aos sons que ouve quando esta é pronunciada, e assim, decodificá-la13,14.

A criança que começa a ler deve desenvolver a consciência fonológica para aprender o início alfabético, ou seja, a correspondência grafema-fonema. A aprendizagem das regras de correspon-dência grafema-fonema é considerada a habilida-de básica para processar os sons das palavras15.

O termo consciência fonológica envolve várias unidades linguísticas e se refere a di-ferentes níveis de processamento. Podemos segmentar as sentenças em palavras ( ex: O – menino – chutou – a – bola), palavras em ataque e rima (ex: pr – ato ou v – ela) ou em sílabas (ex: pra – to ou ga – to), sílabas em fonemas (ex: /v/ - /a/ - /z/ - /o/. Além disso, há também um contínuo de complexidade de processamento, dependendo da tarefa solicitada. São exemplos de tarefas que avaliam essas competências me-talinguísticas: segmentação, exclusão e adição, substituição ou inversão de sílabas ou fonemas em uma determinada palavra2.

As autoras ainda relatam que a alteração do processamento fonológico manifesta-se em diversas competências linguísticas, como dificuldade de consciência fonológica, memó-ria fonológica, discriminação, nomeação e até mesmo na articulação de palavras. Os distúrbios de leitura e de escrita envolvem, então, um dé-ficit no processamento fonológico, acarretando dificuldades no estabelecimento da consciência fonológica que, por usa vez, é determinante do sucesso do aprendizado da leitura escrita2.

Processamento VisualA leitura envolve uma tarefa de processa-

mento visual dinâmica que requer a análise e a

integração de informações de padrões visuais, por meio de sequências de movimentos ocu-lares sacádicos e de fixação, além de todas as informações que acontecem entre uma fixação e a outra seguinte2.

intervenção e DiagnósticoA aquisição da leitura e escrita é um código e

como tal resultante da interação complexa entre as capacidades biológicas inatas e a estimulação ambiental e evolui de acordo com a progressão do desenvolvimento neuropsicomotor. Deve-se entender que, para o correto desenvolvimento da leitura e da escrita, a criança deve ter um bom desenvolvimento da linguagem oral, pois ambos estão associados.

Observa-se que as crianças com dislexia apresentam alterações no processamento fo-nológico, falha nas habilidades semânticas, sintática e pragmática. Em relação ao diagnós-tico encontrou-se na literatura que este não é dado por um único profissional, e sim por uma equipe interdisciplinar e, consequentemente, o tratamento. As crianças no início da alfabe-tização, quando começam a apresentar atraso na aquisição da leitura e da escrita, muitas são rotuladas como desatentas e preguiçosas, mas é preciso que a escola e a família saibam inter-vir adequadamente e precocemente para que isto não gere na criança frustração e abandono escolar.

Quando a dislexia é diagnóstica e tratada precocemente, os impactos emocionais e com-portamentais são evitados e a criança consegue suprir suas dificuldades e prosseguir no proces-so de alfabetização.

No diagnóstico devem-se utilizar procedi-mentos que possibilitem determinar o nível funcional da leitura, seu potencial e capaci-dade, a extensão da deficiência, as deficiên-cias específicas na capacidade de leitura, a disfunção neuropsicológica, os fatores asso-ciados e as estratégias de desenvolvimento e recuperação para a melhoria do processa-mento neuropsicológico e para a integração das capacidades perceptivo-linguísticas. O

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fonoaudiólogo deve conhecer as dificulda-des apresentadas pela criança no processo diagnóstico, com o objetivo de orientar-se e aos professores para o tratamento adequado, visando ao desenvolvimento de estratégias que possibilitem a melhora no uso das habi-lidades e funções da linguagem e no desem-penho dessa criança nas tarefas escolares que exigem leitura e escrita. A partir do reconhe-cimento do problema, o diagnóstico fonoau-diológico deve ser realizado basicamente pela análise da linguagem nos níveis fonológico, morfológico, sintático e semântico16.

No tratamento fonoaudiológico é impor-tante conhecer a criança, seus interesses, suas vivências, suas dificuldades, seus erros e acer-tos. É necessário adaptar métodos e técnicas à individualidade de cada caso, respeitando-se a personalidade do paciente e tratando-o como um todo, dentro do contexto social e familiar17.

Uma intervenção bem sucedida depende de uma avaliação criteriosa e multidisciplinar ou interdisciplinar (neurologia, otorrinolaringolo-

gia, fonoaudiologia, psicologia, psicopedagogia ou psicopedagogia clínica)18.

COnSiDERAÇÕES FinAiSCom a realização deste estudo, verificou-se a

importância de conhecer a dislexia, suas mani-festações e o correto tratamento e intervenção, que são realizados pela equipe interdisciplinar, da qual faz parte o fonoaudiólogo, pelo seu co-nhecimento na área de linguagem oral, leitura/escrita. Encontrou-se que existe a necessidade de mais pesquisas sobre o assunto e, principal-mente, que os profissionais, tanto da educação quanto da área da saúde, entendam que o pro-cesso diagnóstico e intervenção é realizado por uma equipe interdisciplinar.

Para que a criança disléxica seja atendida precocemente e que os impactos emocionais e comportamentais sejam evitados é de compe-tência de todos conhecer os distúrbios de leitura e da escrita, lembrando-se sempre que a criança em questão, no momento, é um ser único e como tal deverá ser tratada.

SUMMARyExploring dyslexia and the importance of interdisciplinary team pro-

cess diagnostic

Dyslexia is a difficulty in learning problem characterized by the receptive and expressive language, oral or written. The speech therapists for their knowledge and their training on language and disorders of language are increasingly involved in identifying, in assessment and treatment of individuals with disorders of reading. The aim of this study is to describe the dyslexia and its manifestations for the correct treatment thereby minimizing the emotional and behavioral impacts to the child. With the completion of this research, we found that there is a need for more research on the subject and especially the professionals from both educations about health care, understand that the diagnosis and intervention is carried out by an interdisciplinary team, including the speech therapist is on his knowledge in the area of oral language, reading / writing.

kEy wORDS: Dyslexia. Interdisciplinary team. Learning.

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Trabalho realizado no consultório da autora, Montes

Claros, MG.

Artigo recebido: 7/6/2009

Aprovado: 20/9/2009

Cabussú MasT

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ARTIGO DE REVISÃO

Resumo – Este artigo tem como objetivo principal relacionar dislexia e estresse e suas implicações neuropsicológicas e psicopedagógicas. Para tanto, será realizada uma revisão bibliográfica nos conceitos de dislexia, estresse, neuropsicologia e psicopedagogia. Em seguida, far-se-á uma discussão dos temas, buscando um novo olhar sobre o tratamento das crianças com dislexia, ressaltando como fatores estressantes e emocionais interferem nos tratamentos realizados e no processo acadêmico.

uNITeRmos: Dislexia. Estresse psicológico. Neuropsicologia. Psicopedagogia.

Dislexia e esTresse: iMpliCações neuropsiCológiCas e psiCopeDagógiCas

Maria Arminda S. Tutti Cabussú

Maria Arminda S. Tutti Cabussú - Psicóloga,

Especia l i s ta em Ps icoterapia Junguiana,

Psicopedagogia e Neuropsicologia. Docência

e Coordenação em Curso de Psicopedagogia

Junguiana.

Correspondência

Maria Arminda Seixas Cabussú

Av. Paulo VI, 2331 apto 212 – Condomínio

Pedras do Nascente – Pituba – Salvador,

BA, Brasil – CEP 41810-000

E-mail: [email protected] ; tutticabussu@

gmail.com

Dislexia e estresse

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INTRoDuÇÃoA proposta deste artigo é relacionar o

transtorno de aprendizagem classificado como dislexia com situações de estresse, e suas impli-cações neuropsicológicas e psicopedagógicas.

A dislexia é um transtorno neurológico crôni-co, que afeta cerca de 15% da população, tendo o disléxico que conviver com os sintomas para o resto de sua vida. Muitas situações estressantes interferem na sua vida, influenciando no seu desempenho e futuro acadêmico e social.

Na primeira parte do artigo, será apresentada uma conceituação dos subtemas dislexia, estres-se, neuropsicologia e psicopedagogia por meio de uma revisão bibliográfica. Na segunda parte, serão discutidas as implicações neuropsicológi-cas e psicopedagógicas do estresse no decorrer do tratamento de crianças disléxicas.

Este artigo se propõe a ajudar os profis-sionais que lidam com crianças disléxicas, levantando situações que interferem no pro-cesso de aprendizagem, buscando um novo entendimento no tratamento dessas crianças.

DIsLeXIAA dislexia é um distúrbio específico de

aprendizagem que se caracteriza por uma demora na aquisição da leitura e da escrita. Segundo Ianhez e Nico1, é um distúrbio de ori-gem neurológica, congênito e hereditário, sendo comum apresentar-se em parentes próximos, com maior incidência no sexo masculino, atin-gindo cerca de 15% da população. Não é uma doença e por isso não se pode falar em cura, seus sintomas são persistentes e acompanham o sujeito ao longo de sua vida, entretanto, com apoio e tratamento adequado, as dificuldades poderão ser contornadas.

A nova definição adotada pela Associação Brasileira de Dislexia2 (ABD) foi elaborada em 2003 pela International Dyslexia Association: “Dislexia é uma dificuldade de aprendizagem de origem neurológica. É caracterizada pela dificuldade com a fluência correta na leitura e por dificuldade na habilidade de decodificação e soletração. Essas dificuldades resultam tipi-

camente do déficit no componente fonológico da linguagem que é inesperado em relação a outras habilidades cognitivas consideradas na faixa etária”.

A maioria dos especialistas na área concor-da com a hipótese de que ocorre um déficit no processamento fonológico. Existem evidências também de problemas na memória verbal de curto prazo e algumas linhas de pesquisa atu-ais apontam para fatores visuais envolvidos na dislexia3.

Os sintomas mais frequentes da dislexia, de acordo com Ianhez & Nico1, Jardini4 e Frank5 são:• Dificuldade e demora na aquisição da leitura

e da escrita;• Discrepância entre as realizações acadêmi-

cas e seu potencial cognitivo;• Dificuldade com os sons das palavras,

principalmente com rimas, aliterações e soletração;

• Confusão entre letras, sílabas ou palavras com diferenças sutis de grafia, ou grafias similares;

• Inversões parciais ou totais de sílabas ou palavras;

• Substituições de palavras por outras de es-trutura mais ou menos similar ou criação de palavras, porém com diferente significado;

• Dificuldade na identificação e conversão fonema-grafema;

• Dificuldade na escrita, com trocas, omissões, junções e aglutinações de fonemas;

• Lentidão nas tarefas de leitura e escrita, mas não nas orais;

• Dificuldade na organização sequencial, temporal e espacial;

• Dificuldade na orientação direita-esquerda;• Dificuldade para nomear objetos, memorizar

números, palavras e endereços;• Dificuldade com cálculos matemáticos;• Resistência ou relutância para escrever ou

tomar notas;• Persistência nos erros, apesar da ajuda

profissional;• Dificuldade com línguas estrangeiras;• Baixa auto-estima afetiva e intelectual;

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ReLuTâNcIA pARA IR à escoLAGeralmente o professor percebe a dificulda-

de de leitura e escrita e faz o encaminhamento para o especialista. É necessário fazer avaliação com uma equipe multidisciplinar. Começa então uma peregrinação entre diversos profissionais, como médico, psicólogo, fonoaudiólogo e psico-pedagogo, até que se chegue ao diagnóstico. O tratamento deverá ser sistemático e cumulativo, de preferência com a utilização de métodos multissensoriais.

A aquisição da leitura e da escrita de disléxi-cos não será feita na forma convencional como é feita nas escolas, o que provocará frustrações para o disléxico, pois sua aprendizagem não corresponderá às suas expectativas, nem de sua família. O fator emocional deverá ser conside-rado durante o tratamento, pois o processo é geralmente longo e demorado, com sentimentos de insegurança e ansiedade1.

Várias reações emocionais podem ocorrer nos disléxicos. Alguns têm atitudes depressivas diante de suas dificuldades de aprendizagem, recusando situações que exijam rendimento sis-temático e ativo por temor de viver situações de fracasso. Outros apresentam atitude agressiva diante de seus superiores e iguais, com com-portamento de hostilidade para com seus pro-fessores e colegas adiantados na escola. Podem também evitar e rejeitar qualquer situação que envolva leitura, retirando-se da aprendizagem e de competições, o que leva a uma diminuição da sua auto-estima.

A maioria dos disléxicos após técnicas tera-pêuticas chega a dominar as habilidades da lei-tura e escrita, sempre com um nível de esforço. Dificilmente eles serão leitores interessados em material de leitura recreativa. Suas habilidades de leitura geralmente têm fins práticos, mas po-derão ler eventualmente assuntos de interesse como uma forma de lazer. Eles provavelmente terão dificuldade em dominar com eficácia a leitura e ortografia de uma segunda língua.

Segundo Frank5, a criança com dislexia geral-mente vivencia uma “vida secreta”, pois perce-be que não é como as outras crianças e prefere

manter segredo sobre seu transtorno. Isso acarreta enorme pressão sobre a criança, que vive secre-tamente com medo de ser descoberta e de não se adaptar às situações. “Acaba evitando situações desconfortáveis nas quais seu segredo” possa ser revelado. Esse sentimento de medo causa um estresse ao longo do tratamento, que interfere na aprendizagem, causando enorme sofrimento emocional.

Os disléxicos que não conseguem fazer tra-tamentos especializados bem sucedidos podem aumentar as fileiras dos analfabetos, ou podem ficar excluídos das profissões que requerem rendimento acadêmico.

esTResseSegundo Guimarães apud Lipp6, “o estresse

é uma consequência inevitável do processo de viver, sem o qual não haveria a própria vida”. Qualquer mudança ou situação na vida poderá provocar estresse, que é uma reação física e emocional às demandas adversas impostas a um organismo em condições difíceis. O que causa estresse a uma pessoa é a forma como ela reage às situações na vida.

Lipp6 chama de estresse “a um estado de ten-são que causa uma ruptura no equilíbrio interno do organismo” causando um desequilíbrio, no qual automaticamente faz-se um esforço para restabelecer a homeostase interior. Quando se conseguem estratégias para enfrentar o que causou esse desequilíbrio, o estresse é elimi-nado e volta-se ao normal. Porém, em muitas situações, essa fonte de estresse pode ser gran-de e permanente, causando tensão emocional e problemas no corpo e na mente do sujeito. O que gera estresse é chamado de estressor, que poderá ter sua origem em fontes externas e internas. As fontes externas se referem a tudo que ocorre na vida e vem de fora do organismo. As fontes internas estão relacionadas a crenças, valores e modos de agir.

De acordo com Savoia7, qualquer mudança na vida gera certo nível de estresse, que poderá ser positivo ou negativo. O estresse positivo aumenta o desempenho e é chamado de “eutress”. Já o

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estresse que ameaça a capacidade do sujeito é chamado de “distress”. As pessoas têm níveis diferentes de tolerância a situações estressantes, entretanto, segundo McLean apud Savoia7, pe-quenos eventos do dia-a-dia podem agir de ma-neira cumulativa e transformarem-se em grandes fontes de estresse. Segundo Savoia7, chama-se coping às estratégias de enfrentamento desen-volvidas para dominar e se adaptar às situações de estresse, isto é, uma resposta ao estresse (comportamental ou cognitiva) com a finalida-de de reduzir as suas qualidades aversivas: “A forma pela qual uma pessoa usa o coping está determinada, em parte, por seus recursos, os quais incluem saúde e energia, crenças exis-tenciais, habilidades de solução de problemas, habilidades sociais, suporte social e recursos materiais. O coping é também determinado por variáveis que diminuem o uso dos recursos pes-soais. Podem ser de natureza pessoal, incluindo valores e crenças culturais que prescrevem certas formas de déficits de comportamentos. Podem ser ambientais, incluindo demandas que competem com os recursos pessoais e/ou agências como instituições que impedem os esforços de coping”.

Para Biaggio apud Lipp6, o estresse está rela-cionado a estados de ansiedade e medo, sendo a ansiedade um sentimento difuso de medo diante de algo que não sabemos exatamente o que é, cuja percepção é de uma ameaça. Ge-ralmente está relacionada a uma expectativa de que algo ruim pode acontecer. O medo é específico a alguma coisa real com tendência a fuga ou evitação de confronto. Todo ser hu-mano, inclusive as crianças, desenvolve ansie-dade e estresse devido a fatores ambientais e predisposição genética. A ansiedade e o medo são reações fisiológicas que fazem o indivíduo fugir ou lutar diante de situações adversas. Ou seja, o estresse surge a partir de uma fonte estressora, que geralmente é uma situação na vida que ultrapassa a capacidade de adaptação do indivíduo ou da criança.

Segundo Bignotto apud Lipp6, o estresse pode ser criado pela própria criança, de acor-

do com sua maneira de perceber a si mesma e ao mundo a sua volta. Sua aprendizagem social e características pessoais são formadas por meio de ensinamentos recebidos direta ou indiretamente pelos adultos significativos com quem se relaciona (pais, professores, fa-miliares, amigos, etc.). Pais excessivamente exigentes e/ou superprotetores podem gerar filhos perfeccionistas, ansiosos, inseguros e, consequentemente, estressados. Os sintomas físicos de estresse infantis mais frequentes nas crianças são: náuseas, dores de cabeça e barri-ga, diarréia, agitação motora, tensão muscular, gagueira, enurese noturna, ranger dentes e tique nervoso. Os sintomas psicológicos mais frequentes são: agressividade, medo e choro excessivos, pesadelos, ansiedade, insegurança, dificuldade de relacionamento, distúrbios de atenção e concentração, desobediência, irrita-bilidade, impaciência, mudanças constantes de humor, desânimo, terror noturno, impaciência, dificuldades escolares, dentre outros.

Nos adultos, o estresse pode causar doenças físicas, como úlcera e gastrite, hipertensão, crises de pânico, doenças dermatológicas, distúrbios do sono, depressão e ansiedade, dentre outros, com risco dos problemas se tornarem graves a ponto de desencadear infartos, derrames, etc6.

Em uma família em que um dos membros tem uma doença crônica, esta afeta a todos. Se a família souber lidar com o problema, reduzin-do as situações de tensão emocional, o estresse diminui. No entanto, se os membros da família também forem ansiosos, o estresse será sentindo por todos. Segundo Lipp6, a família estressada necessita de cuidados especiais para poder sobreviver como uma unidade funcional, onde seus membros possam se adaptar aos estresso-res presentes. Um transtorno como a dislexia acaba causando estresse não só ao indivíduo, mas a toda sua família. No tratamento psico-pedagógico de crianças/adolescentes, deve-se levar em consideração que o estresse interfere no processo terapêutico.

Para se tratar o estresse é necessário identifi-car os estressores internos e externos. As fontes

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de estresse externas são mais fáceis de identifi-car do que as internas, pois estas muitas vezes não são percebidas claramente pelo indivíduo, e envolvem crenças e valores. As estratégias de enfrentamento das situações que causam o estresse determinaram sua evolução positiva ou negativa.

Lipp6 propõe um tratamento para controle do estresse baseado em quatro pilares: (1) alimen-tação, para repor os nutrientes perdidos no perí-odo de estresse; (2) relaxamento, para diminuir a tensão mental e física; (3) exercícios físicos, para eliminar a prontidão gerada pelo estresse; e (4) reestruturação dos aspectos emocionais, para mudar o modo de pensar, sentir e agir.

psIcopeDAGoGIAA Psicopedagogia surgiu da necessidade

de atendimento às crianças com problemas de aprendizagem, numa fronteira entre a psi-cologia e a pedagogia. A maioria dos autores concorda que é uma área que estuda a apren-dizagem humana, numa abordagem preventiva e curativa.

Para Scoz apud Bossa8, “a Psicopedagogia estuda o processo de aprendizagem e suas dificuldades, e numa ação profissional deve englobar vários campos do conhecimento, integrando-os e sintetizando-os”. Segundo Kiguel apud Bossa8, “o objeto central da Psico-pedagogia está se estruturando em torno do pro-cesso de aprendizagem humana: seus padrões evolutivos normais e patológicos – bem como a influência do meio (família, escola, sociedade) no seu desenvolvimento”.

A Psicopedagogia engloba conhecimentos específicos de diversas áreas, sendo as princi-pais as seguintes8: psicanálise, psicologia social, psicologia genética, linguística, pedagogia e neuropsicologia.

A prática psicopedagógica ocorre num âm-bito clínico ou institucional. Na prática clínica, o psicopedagogo busca o sentido particular da dificuldade de aprendizagem do sujeito ou do grupo, identificando as causas e os elementos que dificultam ou facilitam o processo de apren-

dizagem, observando e analisando o contexto da situação, numa atitude de investigação e intervenção. Na psicopedagogia institucional, o sujeito é a própria instituição, com sua rede de relações, sua filosofia, valores e ideologia. Segundo Fogali apud Bossa8, a Psicopedagogia institucional pode trabalhar no contexto escolar, empresarial, hospitalar e familiar, entre outros. Outro campo de atuação da psicopedagogia visa à criação de um corpo teórico por meio de estudos das questões educacionais e da saúde no que concerne ao processo de aprendizagem.

Um dos campos da Psicopedagogia, citado anteriormente, acontece no consultório clínico onde se fazem diagnósticos e intervenções em sujeitos com dificuldades de aprendizagem.

Dentre os distúrbios de aprendizagem, a dislexia ocupa um espaço particular, em função de sua complexidade, pois, em muitos casos, seu diagnóstico é tardio, e o impacto na vida do sujeito e de sua família é enorme, uma vez que não é doença, por isso não tem cura. A dislexia é uma dificuldade, não impossibilidade, mas pode causar profundos efeitos negativos ou positivos na personalidade do disléxico, que tem que aprender a conviver com esse problema para o resto de sua vida1.

O tratamento do disléxico geralmente envolve dois métodos de alfabetização, se-gundo a maioria dos especialistas: o método multissensorial e o método fônico. O método multissensorial envolve diferentes modalidades sensoriais, como aspectos visuais, auditivos e sinestésicos. Segundo Capovilla9, o método fônico desenvolve habilidades metafonológicas e ensina as correspondências grafo-fonêmicas. Vários profissionais podem tratar a dislexia, porém, segundo Garcia apud Jardini4, os pro-fissionais mais habilitados na intervenção são os fonoaudiólogos e os psicopedagogos, pois possuem formação mais específica em relação à fundamentação teórica das dificuldades de aprendizagem.

Segundo Jardini4, normalmente a criança disléxica inicia o tratamento entre 7 e 10 anos, sendo a primeira etapa da intervenção a recons-

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tituição do processo de leitura e escrita, o que corresponde à fase de 1ª à 4ª série do ensino fundamental. Na segunda fase da reabilitação, a criança encontra-se na fase da pré-adolescên-cia, frequentando da 5ª à 8ª série, e a interven-ção visa estruturar a linguagem escrita em todos os seus aspectos morfo-sintáticos e semânticos, propiciando ao disléxico uma produção de tex-tos de boa qualidade, utilizando–se de todos os recursos disponíveis na língua portuguesa. A intervenção continua dando atenção à interpre-tação de textos, questões, linguagem figurativa, gráficos e outras formas de linguagem. Nos adultos, a reabilitação visa ao restabelecimen-to da autoconfiança em suas potencialidades e inteligência, sua auto-aceitação como ser pensante, pois geralmente envolve histórias de fracassos escolares e frustrações quanto ao seu desempenho. No entanto, o disléxico adulto também revela uma série de soluções desenvol-vidas criativamente por ele próprio para vencer suas dificuldades de leitura e escrita.

Percebe-se que a intervenção psicopedagó-gica de um disléxico acaba se tornando um pro-cesso prolongado, muitas vezes durando anos. O sucesso do tratamento depende da atuação do profissional, da escola, da família e do próprio disléxico. Devido à sua complexidade faz-se necessário buscar referenciais de outras áreas para melhor compreensão, abordagem e trata-mento. Dentre essas áreas, os conhecimentos da neuropsicologia têm uma importância especial, em função dos estudos e avanços mais recentes.

NeuRopsIcoLoGIAA neuropsicologia é um campo específico

das neurociências que estuda as relações entre o cérebro e o comportamento (Bertolucci apud Andrade et al.10). Sua fundamentação teórica foi construída a partir da convergência de vá-rias ciências, entre elas a medicina, fisiologia e psicologia, sofrendo influência da escola russa por meio de Vygotsky e Luria, que ressaltaram a importância dos fatores socioculturais na evo-lução do ser humano10.

De acordo com Luria11, os processos mentais

humanos são sistemas funcionais complexos que ocorrem por meio da participação de grupos de estruturas cerebrais operando em concerto. Ele definiu três unidades cerebrais funcionais, necessárias para qualquer tipo de atividade humana: a primeira unidade funcional regula o tono e a vigília, a segunda recebe, processa e armazena as informações que chegam do mundo exterior e a terceira programa, regula e verifica a atividade mental. Além disso, cada unidade básica possui uma estrutura hierar-quizada que consiste em pelo menos três áreas corticais construídas uma sobre as outras, as áreas primárias (de projeção), as secundárias (projeção e associação) e as terciárias (zonas de superposição). Para Luria11, as zonas terciárias são estruturas especificamente humanas, sendo a terceira unidade funcional representada pelo córtex pré-frontal, que desempenha um papel essencial na regulação de estados de atividade que constituem o pano de fundo do compor-tamento humano. Ou seja, os lobos frontais participam de todas as formas de atividade consciente: “Cada forma de atividade conscien-te é sempre um sistema funcional complexo e ocorre por meio do funcionamento combinado de todas as três unidades cerebrais, cada uma das quais oferece a sua contribuição própria”11.

Segundo Fonseca12, essa complexa atividade cortical atua nos movimentos voluntários, isto é, em funções psíquicas superiores e em processos mentais humanos, que são formados, elabora-dos e materializados com base na atividade da linguagem: “No início do desenvolvimento, a atividade da criança é regulada pela linguagem exterior do adulto; mais tarde, é a própria lin-guagem interiorizada que guia e organiza a sua atividade psíquica superior, isto é, a atividade do seu próprio cérebro”.

Portanto, o ser humano nasce com um cé-rebro imaturo, e essa maturação depende da influência do meio envolvente, pois a criança só desenvolve as funções superiores por meio da mediação da linguagem.

No ser humano, a linguagem parte da ação, passa por ela, mas progressivamente vai se

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distanciando dela, passando da linguagem gestual para a linguagem falada e posterior-mente para a linguagem escrita. Em função desse desenvolvimento social ocorre uma orga-nização funcional do cérebro, onde “o cérebro humano transformou-se no próprio órgão da civilização”12.

De acordo com Tabaquim apud Ciasca13, dis-funções em alguma das unidades cerebrais du-rante o desenvolvimento acarretam alterações percepto-motoras, que resultam em compro-metimento da linguagem e da aprendizagem.

Segundo Ohlweiler et al.14, as unidades funcionais de Luria11 se referem às funções cognitivas, não se podendo esquecer da afe-tividade, que poderia ser incorporada a uma quarta unidade funcional, localizada no sis-tema límbico para selecionar os estímulos e a porção orbitária do lobo frontal, para planificar a conduta no aspecto afetivo.

O sistema límbico está implicado no contro-le dos processos emocionais e motivacionais, da memória e da aprendizagem, e ainda no controle do meio interno. Neste sistema estão incluídos o hipocampo (importante para a fixação da memória declarativa), a amígdala cerebral (responsável pelas emoções princi-palmente de ansiedade e medo) e o giro do cíngulo (envolvido nos processos da atenção, memória, motivação, emoção e função visce-ral). Segundo Cosenza apud Andrade et al.10, “em situações ameaçadoras, a amígdala é importante para o processamento do estado do medo, estando implicada tanto no desencadea-mento de respostas viscerais e endócrinas como na aprendizagem e memória, que levem a uma melhor adaptação às situações semelhantes, eventualmente encontradas no futuro”.

Para Servan-Schreiber15, o sistema límbico forma um cérebro emocional que permanece constantemente em guarda, e aciona um alar-me quando percebe algum perigo ou ameaça. Já o cérebro cognitivo, formado pelo neocór-tex, tem a habilidade de controlar as reações emocionais.

De acordo com Goleman16, a amígdala pode

ser um repositório de impressões emocionais, podendo acionar uma resposta emocional em situações de emergência, que dispara a se-creção de hormônios para lutar ou fugir, antes mesmo que o neocórtex processe a informação e emita uma resposta. Por isso, muitas vezes, a emoção pode esmagar a racionalidade. O hipocampo seria responsável por lembrar os fatos puros, enquanto a amígdala grava na me-mória a intensidade emocional do estímulo. A amígdala examina a experiência, comparando com alguma situação vivida no passado, por meio de associações com eventos anteriores, muitas vezes com vagas semelhanças. Essas reações foram importantes para a sobrevivência da espécie humana, em função da rapidez para fugir de situações de perigo. Entretanto, na vida emocional atual dos seres humanos, muitas vezes causam consequências desastrosas nas relações sociais.

As reações de sobrevivência acontecem cada vez que estamos em alguma situação de possível ameaça e são desencadeadas dentro do cérebro, como foi citado anteriormente. Isso provoca sen-timentos de medo e ansiedade (sistema límbico), que deflagram o estresse. Então, o estresse é uma reação que começa no cérebro e se espalha por todo o organismo, causando reações emocionais, fisiológicas e comportamentais.

DIscussÃoA dislexia, por ser um transtorno de origem

neurológica, acompanha o sujeito ao longo de sua vida. Os sintomas geralmente aparecem na fase de alfabetização ou nos primeiros anos do ensino fundamental, quando a criança não acompanha o ritmo da sala, com dificuldades para aprender a ler e a escrever. A partir da indicação da escola, a família procura por aten-dimento especializado. Após muitas consultas com vários profissionais, o aluno inicia um acompanhamento psicopedagógico. A família e a criança passam por situações de estresse ao longo desse processo. Esses estressores têm origens internas e externas. Dentre os estresso-res de fontes externas pode-se citar o ambiente

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familiar, escolar, social e os atendimentos espe-cializados. Em relação ao estressores internos podem-se citar ansiedades, medos, expectati-vas, as crenças em relação à própria dislexia, e valores da família e da criança.

A família da criança com dislexia vivencia uma série de emoções ao perceber que seu filho não é da forma como eles idealizaram. Os pais poderão até viver um processo de luto, como é descrito por Elisabeth Kubler-Ross apud Frank5,envolvendo os cinco estágios: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação.

O ambiente escolar é um dos maiores estres-sores externos da criança disléxica, uma vez que ela se depara com outras crianças que não apresentam dificuldades na leitura e na escrita como ela. Segundo Frank5, a criança com disle-xia muitas vezes decide manter segredo sobre seu problema porque se sente envergonhada, embaraçada ou “anormal”. Isso acaba provo-cando uma pressão interna sobre a criança, que passa então a evitar situações nas quais ela possa ser “descoberta”, gerando muitos medos, que podem não ser identificados pelos adultos. Além do medo, a criança disléxica vivencia sentimentos de frustração, por não conseguir realizar as tarefas escolares da mesma forma que as outras crianças. O aluno disléxico sente também medo, insegurança e ansiedade cada vez que muda de professor ou de escola, pois ele terá que enfrentar várias situações novas, que causarão sempre um impacto emocional no seu dia-a-dia.

Nos ambientes sociais, muitas vezes, a criança disléxica se depara com outras crian-ças e adultos que propõem brincadeiras que envolvem leitura ou escrita, o que também causa estresse. A criança disléxica então poderá desenvolver vários tipos de sentimentos, como raiva, inferioridade, inveja, vergonha e solidão5.

Uma criança disléxica geralmente passa por vários profissionais durante o processo de avaliação e tratamento de sua dificuldade, tais como médicos de várias especialidades, psi-cólogo, fonoaudiólogo e psicopedagogo. Isso acarreta vários sentimentos de medo, ansiedade

e insegurança, pois ela percebe que tem alguma coisa diferente dos outros ao precisar consultar tantos profissionais diferentes. Cada profissional que a família consulta gera uma esperança de que a dificuldade vai ser superada, causando frustração quando percebe que não há uma solução mágica.

Esses vários contextos estressores (internos e externos) acabam muitas vezes comprometendo de forma negativa o desempenho escolar do disléxico, causando o estresse negativo cha-mado distresse.

Segundo a International Dyslexia Society apud Ohlweiler et al.14, na dislexia deve-se sempre observar “que as diferenças são pesso-ais, o diagnóstico é clínico, o entendimento é científico e o tratamento é educacional”.

O diagnóstico é clínico porque busca identifi-car o problema a partir de seus sinais, sintomas ou evidências através de uma equipe profissio-nal, com uso de instrumentos específicos para esse fim13.

O entendimento científico é fundamental, pois as dificuldades de leitura e de escrita das crian-ças com dislexia envolvem um funcionamento cerebral diferente, que precisa ser compreendido a partir de um enfoque neuropsicológico. Na dislexia precisa-se entender o funcionamento cerebral da criança, particularmente as áreas envolvidas na linguagem, como as áreas de Wer-nicke, Broca, e temporal esquerda, entre outras.

O tratamento é educacional, pois envolve uma equipe de apoio, que inclui família, escola, professores particulares e acompanhamento psicopedagógico. A dislexia, por ser um trans-torno de aprendizagem complexo, exige todo esse suporte técnico ao redor do disléxico para que ele aprenda a lidar com sua dificuldade e receba o apoio específico para suas necessida-des. O disléxico terá que aprender a conviver num ambiente social letrado, sabendo que não domina totalmente os instrumentos necessários (leitura e escrita) para ser bem sucedido nessa sociedade moderna.

No entanto, apesar de toda essa rede de apoio, existem diferenças pessoais significativas

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em relação às estratégias de enfrentamento desenvolvidas pelo disléxico, para se adaptar às situações difíceis ao longo de sua vida. A depender de como ele reaja às suas dificuldades de aprendizagem, seu estresse pode se tornar “eutress” ou “distress”. Por isso, é fundamental levar em consideração o estado emocional do disléxico durante o tratamento psicopedagógico e sua inclusão no ambiente escolar.

coNcLusÃoA dislexia é um distúrbio de linguagem de

origem neurológica e crônica, tendo o disléxico que aprender a conviver com os sintomas para o resto da vida. No entanto, para que possa se adaptar em uma sociedade letrada, que exige níveis de escolaridade cada vez mais altos, deverá aprender a lidar com suas dificuldades de leitura e escrita. Para melhorar seu desem-penho faz-se necessária uma rede de apoio nos diversos ambientes onde circula.

A síndrome disléxica precisa ser compre-endida sob a ótica de vários conhecimentos, entre eles o conhecimento da neuropsicologia, pois na dislexia há um funcionamento cerebral

summARyDyslexia and stress: neuropsychological and psychopedagogical im-

plications

The main goal of this article is to relate dislexia and stress, and its neuropsychological and psychopedagogical implications. In order to do that, a bibliographical revision in the dislexia, stress, neuropsychology and psychopedagogy concepts will be carried through. Following that, a discussion among the subjects will take place, searching for a new look upon the treatment of the children with dislexia, pointing out how stressing and emotional factors intervene with the treatments carried out and the academic process.

Key WoRDs: Dyslexia. Stress, psychological. Neuropsychology. Psychopedagogy.

diferente no hemisfério esquerdo na área da

linguagem. Por se tratar de uma dificuldade

contínua, necessita também de acompanha-

mento psicopedagógico e desenvolvimento de

estratégias educacionais nos ambientes familiar,

escolar e social, para favorecerem sua adapta-

ção nesses contextos.

Na prática o tratamento é prolongado, mui-

tas vezes estressante, causando “distresse” e

desconforto emocional cada vez que o disléxico

se depara com uma situação nova que envolva

atividades de leitura e escrita, como mudança

de escola, de professor, de curso, atividades

sociais e mesmo nos relacionamentos interpes-

soais. Devem-se tratar enfaticamente aspectos

psicológicos para que os demais tratamentos

possam ser bem sucedidos.

Existem muitos estudos relativos à dislexia que

tratam de aspectos neurológicos e educacionais,

no entanto pouco se investiga sobre os aspectos

emocionais e estressantes vividos nos diversos

ambientes por onde os disléxicos circulam, e como

isso influencia nos tratamentos realizados.

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ReFeRÊNcIAs 1. Inhaez ME, Nico MA. Nem sempre é o que

parece: como enfrentar a dislexia e os fra-cassos escolares. 8ª reimpressão.Rio de Janeiro:Elsevier;2002.

2. Nico MA, Souza JC. Tradução do artigo nova definição da dislexia Annals of Dys-lexia an Interdisciplinary J Int Dyslexia Assoc. 2003. Disponível em: http://www.dislexia.org.br Acesso em: 23 de outubro de 2006.

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6. Lipp MEN. O stress está dentro de você. 6ª ed. São Paulo:Contexto;2004.

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São Paulo:EDUSP;1981. 12. Fonseca V. Manual de observação psico-

motora: significação psiconeurológica dos fatores psicomotores. Porto Alegre:Artes Médicas;1995.

13. Ciasca SM. Distúrbios de aprendizagem: proposta de avaliação interdisciplinar. São Paulo:Casa do Psicólogo;2003.

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15. Servan-Schreiber D. Curar o stress, a ansie-dade e a depressão sem medicamento nem psicanálise. São Paulo:Sá Editora;2004.

16. Goleman D. Inteligência emocional. 18ª ed. Rio de Janeiro:Ed. Objetiva;1995.

Trabalho realizado para obtenção do título de

Especialista em Neuropsicologia, pelo IBPEX -

Instituto Brasileiro de Pós-Graduação e Extensão /

FACINTER – Faculdade Internacional de Curitiba,

Salvador, BA.

Artigo recebido: 13/6/2009

Aprovado: 3/10/2009

Witter GP

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RESENHA

ComPreensão de texto

Resenha: Geraldina Porto Witter

Resenha do livro: Lapp D, Fisher D. Essential readings on comprehension. Newark:IRA;2009.

Geraldina Porto Witter – Doutora em Ciências,

Livre-docente em Psicologia Escolar; Professora

Emérita da UFPa, do UNIPE e da UNICASTELO,

Coordenadora Geral da Pós-Graduação Stricto Sensu

da UNICASTELO e Membro da Academia Paulista

de Psicologia.

Correspondência

Geraldina Porto Witter

Av. Pedroso de Moraes, 144, apto 302 – Pinheiros –

São Paulo, SP, Brasil – CEP 05420-000

E- mail: [email protected]

Sem compreensão não se pode dizer que ocorreu a leitura. Nestas circunstâncias não é de estranhar que ela seja o tema central de muitos trabalhos na área e a meta de muitas tecnologias e estratégias voltadas para aquisição, desen-volvimento e manutenção do comportamento dos leitores.

Face à variedade de materiais disponíveis, Diane Lapp e Douglas Fisher fizeram uma seleção de textos que consideram essenciais para os preocupados com a matéria. Com eles estruturaram o livro aqui resenhado. Ela é doutora em educação e leciona na San Diego State University (Califórnia, USA). Ele é doutor em filosofia e leciona na mesma universidade.

O livro compreende Introdução, 15 textos e Apêndice. A Introdução foi redigida pelos organizadores que começam por lembrar que, embora no final dos anos setenta já houvesse dados mostrando que os professores não ensi-nam compreensão, o que foi reiterado com vee-mência na última década do século passado, há muito por mudar nesse cenário. Procedimentos estratégicos e tecnologias disponíveis existem, mas parece que carecem de maior divulgação e uso no cotidiano das escolas. O problema é ain-da mais grave em países carentes de pesquisa e com formação limitada e restrita dos docentes. Com o livro esperam colaborar para acelerar as

mudanças neste setor da educação, reeditando artigos pertinentes, os quais são sucintamente enfocados a seguir.

Raphael Av (2005) enfoca em um artigo pu-blicado em The Reading Teacher a ampliação da compreensão por meio da avaliação ao longo dos anos acadêmicos usando o procedimento QAR (Question Answer Relationship), ou seja, Relação entre Pergunta e Resposta, usado não apenas para avaliar, mas também para desen-volver a linguagem e preparar a organização da compreensão. Com estas mudanças tecnológi-cas pode ser promovido o pensar sobre o texto em níveis crescentes de complexidade, melho-rar as relações entre perguntar e responder, trazendo benefícios para escolas, professores e alunos em pouco tempo e com baixo custo.

O texto seguinte trata de outros procedi-mentos utilizáveis para desenvolver a compre-ensão e que se baseiam no uso de questões, mudanças e repetições em torno de perguntas, fornecimento de pistas, como fazer anotações e manter os traços afetivos relativos ao prazer de ler e aprender. Trata-se de um artigo de Manzo, publicado no Journal of Reading (1985).

O uso de figuras para o desenvolvimento da compreensão é o tema de Hibbing e Rankin-Erickson, especialmente quando se trabalha com leitores problemáticos ou relutantes. A ên-

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fase não é na ilustração, mas no ensinar a criar imagem mental do texto, imagem televisiva do material lido, produzir desenhos representando o texto e procedimentos similares. Trata-se de artigo publicado em 2003, na The Reading Te-acher. As estratégias são de baixo custo e alta produtividade.

Walmsley (2006) trata, na The Reading Tea-cher, de um tema que tem sido negligenciado no ensino de compreensão da leitura, ou seja, ter criticidade para compreendendo o texto ir além dele, detectar a grande ideia, ou a ideia principal subjacente em um livro, um artigo, uma argumentação ou filme. Trata-se de um comportamento que se espera que o professor saiba ensinar aos alunos. Para tanto, o profes-sor precisa saber como fazê-lo, para o que nem sempre parece competente.

Outra estratégia importante na área de leitura é saber resumir o material lido, o que é particularmente importante nas várias áreas de conteúdo. O ensino-aprendizagem do resumir está também relacionado com a retenção da informação e a manutenção do conhecimento. O aluno precisa aprender técnicas eficientes de resumir, saber detectar as pistas do texto e as sequências produtivas para chegar a um bom resumo, como destaca Friend (2000/2001) em artigo publicado no Journal of Adolescent & Adult Literacy.

A consciência da estrutura textual de textos expositivos precisa ser cuidadosamente traba-lhada e ensinada pelo professor, com o lembra Dymock (2005), no The Reading Teacher, pois compreender este tipo de discurso traz dificul-dade para os alunos e requer instrução direta inclusive sobre os seus vários níveis de elabo-ração. A autora apresenta várias matrizes de dificuldades.

Muito da compreensão do texto depende do autor e do leitor conhecerem e saberem usar os organizadores gráficos. Esse aspecto começou a ser pesquisado nos anos sessenta do século passado e teve seu estudo intensificado na úl-tima década. Merkley e Jefferies (2000/2001) publicaram na The Reading Teacher um artigo

em que apresentam diretrizes e sugestões prá-ticas decorrentes de pesquisas para se trabalhar com os alunos.

Fisher, Frey e Lapp publicaram, em 2008, na The Reading Teacher, um artigo em que com base em vários dados mostram que para melhorar a competência em leitura é necessário modelar a compreensão, trabalhar o vocabu-lário, estudar a estrutura textual e, no caso de leitores mais velhos, outros aspectos precisam ser incluídos. Complementam bem os artigos anteriores com a pesquisa que relatam.

O artigo seguinte é da responsabilidade de Lapp, Fisher e Grant, tendo sido publicado em 2008 no Journal of Adolescent & Adult Literacy e diz respeito ao ensino interativo da compre-ensão, cabendo ao professor estimular e ensinar como ler compreensivamente, mostrando como chegar ao cerne do texto, saber destacar o que é novo, como fazer previsões. Retomam a relevân-cia de enfocar interativamente o vocabulário, as estratégias de compreensão, a estrutura textual e as pistas textuais para superar as lacunas de realização.

O ensino interativo pode ser usado para promover a aprendizagem independente, capa-citando o estudante a ler e buscar significado, como descrevem Palincsar & Brown em artigo publicado no The Reading Teacher (1986). Esses autores defendem o emprego de estratégias de ensino recíproco para que o aluno melhore sua aprendizagem a partir do texto, equilibrando o uso de modelagem, prática dirigida, explicação e instrução diretiva.

É inegável a relação entre leitura e escrita e há dados que mostram a possibilidade de usar a escrita para ampliar a aprendizagem das várias áreas de conteúdo. Esta é a temática do texto de Cudd e Roberto, publicado em 1989, no The Reading Teacher. Os autores começam por in-dicar algumas variáveis que levam os alunos a terem dificuldades com os textos lidos. Sugerem o uso de algumas técnicas que recorrendo à escrita favorecem a solução dessas dificulda-des. Entre elas lembram a técnica cloze, o uso de exemplos como ponto de partida, acréscimo

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gradual de estruturas, enumeração das mesmas, orientação em busca de reações favoráveis, uso de comparações e contrastes, etc.

De Jacobs (2008) é o texto selecionado do Journal of Adolescent & Adult Literacy, em que a autora parte da premissa de que aprendemos o que fazemos (DAE), destaca a importância da prática de escrever para desenvolvimento deste repertório. A autora usa a técnica denominada Mensagem Instantânea (IM) pelo celular ou Mensagem de Texto (SMS) como uma maneira de trabalhar a escrita, mas sem descuidar da escrita formal. O procedimento tem muito em comum com a comunicação mediada pelo com-putador. São respostas sociais que atendem às demandas feitas pelos avanços tecnológicos, mas que não dispensam o cuidado com a com-petência em leitura e escrita de textos formais dos vários tipos de gênero.

Em trabalho publicado em 2006, no Journal of Adolescent & Adult Literacy, Grisham e Wol-sey consideram a sala de aula uma comunidade de aprendizagem da qual destacam os alunos, a leitura e a tecnologia utilizada. O conceito de comunidade é para os autores a alma da aprendizagem. Para que ela se institua todos os discursos devem estar conectados ao estudante e isto nem sempre ocorre. Analisam as possibili-dades do uso dos recursos tecnológicos e do ci-berespaço para criar esta comunidade. Relatam pesquisa em que fizeram da aprendizagem pelo aluno o centro do planejamento, recorrendo a várias tecnologias, como grupos de discussão, jogos, ciclos literários, etc, associadas ao uso da Internet, obtendo bons resultados.

O texto seguinte é da autoria de Gambel e

dá continuidade à discussão das mudanças que o uso da tecnologia, especialmente a Internet, vem introduzindo na cultura da leitura. Seu artigo foi publicado em 2005, no The Reading Teacher, e discute as alterações decorrentes dos novos tempos e textos, concluindo que não há risco de ter perdas na leitura convencional, ela continuará a ser valorizada na cultura.

Em 2007, Spector e Jones publicaram, no Journal of Adolescent & Adult Literacy, uma vivência usando o Diário de Anne Frank para trabalhar a leitura crítica, tendo por foco ques-tões sobre leitores, autores, texto e contexto constituído por outros textos da época e de comentaristas. Concluem que o envolvimento com um enfoque de leitura crítica das represen-tações de diferenças socioculturais cria força no trabalho do aluno, tanto para se reconstruir o passado como para rever seu mundo atual.

Como são artigos publicados em periódicos estrangeiros especializados da área, é possível que o leitor que atua com leitura já os tenha lido em suas bases originais. Mas, mesmo já conhecendo os textos é interessante enfocar a aglutinação feita pelos organizadores da obra. A seleção foi nitidamente de estratégias que não requerem qualquer novo material, mas apenas uso de tecnologias de baixo custo, de reorgani-zação da relação professor-texto-aluno usando procedimentos diversos, até o uso da Internet de forma produtiva, sem que seja exclusiva para assegurar a boa formação de leitores. Ter estes textos em um só documento pode facilitar o trabalho tanto de pesquisadores como de pro-fessores e equipe técnica nas escolas.

Resenha realizada na Universidade Camilo Castelo

Branco – UNICASTELO, São Paulo, SP.

Artigo recebido: 7/8/2009

Aprovado: 1/9/2009

La Revista Psicopedagogía, órgano decomunicación de la Asociación Brasileña dePsicopedagogía (Associação Brasileira de Psicope-dagogia) és indexada en: LILACS (Literatura Latino- Americana e do Caribe em Ciências da Saúde),Bibliografia Brasileira de Educação (BBE), Latindex(Sistema Regional de Información en Línea paraRevistas Científicas de América Latina, el Caribe,España y Portugal), CLASE (Citas Latinoamericanasem Ciencias Sociales y Humanidades), EDUBASE(Faculdade de Educação, Universidade deCampinas), INDEX PSI (Conselho Federal dePsicologia), Catálogo Coletivo Nacional (InstitutoBrasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia)y Descrição Bibliográfica da Fundação CarlosChagas (DBFCC). Tiene por objetivo publicarartículos en la área de psicopedagogía, en especial:resultados de investigación de carácter teórico /empírico; revisiones críticas de la literatura deinvestigación educacional temática o metodológicay reflexiones críticas respecto a experienciaspedagógicas que amplíen el conocimiento en el áreay que no tengan sido publicados en otros periódicos.La Revista Psicopedagogía emplea las normasVancouver (Uniform Requirements for ManuscriptSubmitted to Biomedical Journals, organizadas porel International Committee of Medical JournalsEditors, disponible en http://www.icmje.org) y aceptapara publicación lãs siguientes colaboraciones:

1. Artículo Original: relato completo de investi-gación. Limitado a 20 páginas, su estructura debecontener: introducción, métodos (procedimientosbásicos), resultados, discusión y conclusión. Debecontener aun: sumario y summary, palabras llave ykey words.

2. Artículo de Revisión: revisión crítica de la litera-tura abordando conocimientos respecto a determinadotema de manera a abarcar, por medio de consulta,análisis e interpretación de la bibliografía pertinente.Limite: 20 páginas y debe incluir sumario, summary,palabras llave y key words.

3. Relato de Investigación o experiencia: análisisde implicaciones conceptuales/investigación ydescripción de experimentos originales. Limite: 20páginas y debe contener: sumario y summary,palabras llave y key words.

4. Disertación, Tesis y Monografia: Límite: 20páginas y debe contener: sumario, summary, palabrasllave y key words.

5. Reseña de Libros: abordaje de obra recién-publicada. Límite: 4 páginas. No requieren sumario,summary, palabras llave y key words.

6. Punto de Vista: temas relevantes para elconocimiento científico y universitario presentados enla forma de comentarios que favorezcan nuevas ideas operspectivas para el asunto. Limite: 4 páginas. Norequiere: sumario, summary, palabras llave y key words.

7. Artículo especial: textos elaborados, ainvitación del editor, de gran importância para laespecialidad, no classificados en las categorias deartículos mencionados anteriormente. Debe contener:sumario y summary, palabras llave y key words.

8. Entrevista: con los psicopedagogos y estudiososde áreas semejantes y / o testimonios de los

profesionales que actúan en el ámbito de laPsicopedagogía.

INFORMACIONES GENERALESLos artículos y correspondencias deberán ser

enviados para: Revista da Associação Brasileira dePsicopedagogia

Rua Teodoro Sampaio, 417 - Cj. 1105405-000 - São Paulo - SP - Brasil

Cada original tiene que venir seguido de dos copias,inclusive con CD en sistema PC, fotografías, gráficos,etc. El contenido del material enviado para publicaciónen la Revista Psicopedagogía no puede Haber sidopublicado anteriormente, ni sometido para publicaciónen otros medios de comunicación. La Revista Psico-pedagogía posee los derechos de autoría de todos losartículos en ella publicados. La reproducción total delos artículos en otras publicaciones requiereautorización por escrito del Editor. Todos los artículospublicados son revisados por miembros Del ConsejoEditorial, y la decisión respecto a la aceptación delartículo para publicación ocurrirá, siempre queposible, en el plazo de tres meses a partir de la fecha desu recibimiento. En la selección de los artículos parapublicación, se evalúan la originalidad, la relevanciadel tema y la calidad de la metodología científicautilizada, además de la adecuación a las normaseditoriales adoptadas por el periódico. Artículosrecusados no serán devueltos al autor. El ConsejoEditorial se reserva el derecho de realizar pequeñasmodificaciones en el texto de los autores, para agilizarel proceso de sumisión o publicación. Cuando de lapublicación, pruebas impresas serán enviadas a losautores, debiendo ser revisadas y devueltos en el plazode cinco días. En el caso que los autores no lasdevuelvan indicando posibles correcciones, el trabajoserá publicado de acuerdo con la prueba.

PREPARACIÓN DE LOS TRABAJOSLos artículos pueden ser escritos en portugués o

español, y debem encuadrarse en una de las diferentessecciones de la revista. El trabajo deberá ser redactadoen cuerpo 12 (Times New Roman), en una sola faz(anverso) del papel, en el máximo de 20 páginas con30 líneas cada, espacio 1,5 línea, con margen de 3cmde cada lado, en el alto y al pie de cada página. Losmanuscritos deben ser presentados en esta secuencia:página título, sumarios en portugués y inglés(summary), key words, palabras llave, textos,referencias, tablas y/o ilustraciones.

PÁGINA TÍTULODeberá contener:A) título del trabajo en portugués y inglésB) nombre, apelido de lo(s) autor (es) y institución

a que pertenece(n);C) título resumido (no exceder quatro palabras);D) Carta de presentación, conteniendo firma de todos

los autores, haciendose responsables por el contenidodel trabajo, concordando con las normas de publicacióny cediendo el derecho de publicación a la Revista Psicope-dagogía, pero solamente uno de ellos debe ser indicadocomo responsable por la troca de correspondencia. Debecontener teléfono, fax y dirección para contacto.

NORMAS PARA PUBLICACIÓN

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E) Aspectos éticos – Carta de los autores revelandoeventuales conflictos (profesionales, financieros ybeneficios directos o indirectos) que puedan influenciarlos resultados de la investigación. En la carta deberáconstar aun la fecha de aprobación del trabajo por elComité de Ética en Investigaciones de la instituciónla cual se encuentran vinculados los autores.

ESTRUCTURA DEL TEXTOLos Artículos Originales deben contener,

obligatoriamente:A) Introducción: Debe indicar el objetivo del

trabajo y la hipótesis formulada;B) Métodos (Procedimientos Básicos): Breves

descripciones de los procedimientos empleados;C) Resultados: Síntesis de los dos hallazgos,

pudiendo ser presentados con figuras o tablas queilustren puntos importantes;

D) Discusión: Incluye el hallazgo, la validez y elsignificado del trabajo;

E) Conclusión: consideraciones finales.Referencias de “resultados no publicados” y

“comunicación personal” deben aparecer, entreparéntesis, siguiendo lo(s) nombre (s) individual (es)en el texto. Ejemplo: Oliveira AC, Silva PA y GardenLC (resultados no publicados). El autor debe obtenerpermisión para usar “comunicación personal”.

SUMARIO y SUMMARYSon obligatorios para los Artículos Especiales,

Artículos Originales, de Revisión, Relato deExperiencia o Investigación, Disertación, Tesis yMonografía, debendo contener en el máximo 250palabras. Tras el sumario deberán ser indicados en elmáximo seis palabras llave (se recomienda elvocabulario controlado del “Decs-Descriptores enCiencias de la Salud”, publicación de la Bireme(www.bireme.br/terminologiaemsaude). El Summary(traducción del sumario para el inglés) debeacompañar el mismo modelo del sumario y serseguido de key words (traducción de las palabras llavepara el inglés).

AGRADECIMIENTOSSolamente a quien colabore de manera signifi-

cativa en la realización del trabajo. Deben venir antesde las Referencias Bibliográficas.

REFERENCIASLas referencias deben ser dispuestas por orden de

entrada en el texto y numeradas consecutivamente demanera sobrescrita, siendo obligatoria su citación.Ejemplo: como ya manifestaran diversos autores6,9,15.Deben ser citados todos los autores del trabajo si sunúmero no es superior a seis; cuando superan estenúmero, se citan los seis primeiros seguidos de et al.El nombre de la revista debe ser abreviado según elCummulated Index Medicus o, si ello no fuere posible,según la Associação Brasileira de Normas Técnicas(ABNT). Ejemplos de tipos de referencias:

1. Estándar ( Solamente un autor)Noffs NA. A formação de educadores para uma

escola inclusiva. Rev Psicopedagogia 2002;19:41-4.

2. Estándar (Entre dos y seis autores)Wippel MLM, Goulart DF, Moreira ALGB, Bozza

MGG. Capacidade para a prática interdisciplinar:um relato de experiência. Rev Psicopedagogia2002;19: 66-73.

3. Estándar (Más de seis autores)Araújo VJF, De Carlucci Jr D, Sasaki SU, Montag

E, Azato FN, Cordeiro NC, et al. Perfil da incidênciade câncer em hospital geral em São Paulo. Rev HospClin Fac Med Univ São Paulo 1998;53:110-3.

4. Ausencia de autorCancer in South Africa [editorial]. S Afr Med J

1994;84:15.5. Organización como autorSociedade Brasileira de Cardiologia. III

Diretrizes Brasileiras sobre dislipidemias. Arq BrasCardiol 2001;77:1-48.

6. Libros y otras obras monográficas - Autor(es)personal(es)

Gasparian MC. A Psicopedagogia institucionalsistêmica. São Paulo:Abril Cultural;1997.

7. Capítulo en un libroPiaget, J. Problemas de epistemologia genética.

In: Piaget J. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural;1978. p. 211-71.

8. Disertación/TesisMendes MH. Psicopedagogia: uma identidade em

construção [Dissertação/Tese]. São Paulo:Univer-sidade São Marcos;1998.

9. Referencia en formato electrónicoFundação Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística - IBGE. Censo Demográfico e Estimativas,1996. Disponível no URL: http://www.ibge.gov.br

Los editores se dan el derecho de excluir referenciasno indicadas en el texto o elaboradas erróneamente.

FIGURAS, TABLAS Y GRÁFICOSSerán aceptas el máximo de seis ilustraciones por

artículo, las cuales comprenden: figuras, tablas,gráficos, diagramas, fotografías y diseños esquemá-ticos. En el caso de empleo de fotografías o figuras, sesolicita el envío de los originales o copias digitalizadasen formato .TIF, con resolución mínima de 300 dpi.El aprovechamiento quedará condicionado a lacualidad del material enviado y deben ser presentadosen negro y blanco, en hojas separadas y seguidos deleyenda que permita entender el significado de losdatos reunidos. Señalar, en el texto, por su número deorden, los sitios en que los cuadros y tablas deben serintercalados. Cuando extraídos de otros trabajospreviamente publicados, deben venir seguidos depermisión, por escrito, para su reproducción.

ABREVIAMIENTOS / NOMENCLATURA/NOTAS DE RODAPIÉ

El uso de abreviamientos debe ser mínimo. Cuandoexpresiones extensas deben ser repetidas, se recomiendaque sus iniciales las reemplacen tras la primeramención. Esta debe ser seguida de las iniciales entreparêntesis. Notas de rodapié solamente se estrictamentenecesario. Deben ser señaladas em el texto y presentadasem hojas separadas, o trás las referencias, com subtítulonota de rodapié.

Revista de Psicopedagogia is a communication organ from Associação Brasileira de Psicopedagogia indexed in LILACS ( Latin Literature – American and Caribbean in Health Science, Brazilian Education Bibliography (BBE), Latindex (Sistema Regional de Información en Línea para Revistas Científicas de América Latina, el Caribe, España y Portugual), CLA-SE (Citas Lationoamericanas em Ciencias Sociales y Humanidades), EDUBASE (Education College, Campinas University), INDEX PSI (Psychology Fe-deral Council) Catálogo Coletivo Nacional (Brazilian Information Institute in Science and Technology) and Carlos Chagas´ Bibliographic Description Foundation (DBFCC). It aims to publish unpublished articles on psychopedagogy, mainly: research results with practical/empirical character; critical review on educational researches literature or critical re-flections on pedagogical experiences that somehow can expand or deepen the knowledge of the area and those which have not been published before. Revista Psicopedagogia uses the standards from Vancouver (Uniform Requirements for Manuscript Submitted to Biomedical Journals, organized by International Committee of Medical Journals Editors, available at http://www.icmje.org) and is accepted for publication the following collaborations:

1. Original Articles: complete report of an in-vestigation. Up to 20 lauds. The manuscript must be arranged in the following order: introduction, methods (basic procedures), results, discussion and conclusion. It is also needed: abstract and summary, descriptors and keywords.

2. Review Articles: critical review of literature towards the knowledge on a specific topic, under conference, analysis and interpretation of a relevant bibliography. Up to 20 lauds and it must be included abstract, summary, descriptors and keywords.

3. Case Study: analysis of some investigation/conceptual implications and description of original researches. Up to 20 lauds. Abstract, summary, des-criptors and keywords must be included.

4. Dissertation, Thesis and Monograph: Up to 20 lauds and it is necessary: abstract, summary, descriptors and keywords.

5. Books Reviews: approach of a newly publi-shed publication. Up to 4 lauds. Abstract, summary, descriptors and keywords are no needed.

6. Point of View: relevant topics for the scientific area or for students, presented as a point of view which has the intention of discussing new ideas or perspectives on the issue. Up to 4 lauds. Abstract, summary and keywords are no needed.

7. Special Articles: manuscripts written under the editor ’s invitation. With a great relevance for the topic in discussion. It is not classified into the categories of the previous listed ones. It must have: abstract, summary, descriptors and keywords.

8. Interview: accountants from people directly involved in the areas: researchers, professionals or psychopedagogue.

GeneRAl InfORMATIOnThe manuscripts must be sent to: Revista da Associação Brasileira de Psicopeda-

gogiaRua Teodoro Sampaio, 417 – Cj. 1105405-000 – São Paulo – SP – Brasil

Which original must be followed by 2 printed version and CD (for PC users), pictures, graphics, etc. The whole material sent to Revista Psicopeda-gogia must not be previous published in any other means of communication. The author(s) transfer(s) the article copyright to Revista de Psicopedagogia The reproduction of the articles in any other publi-cation requires the editor ’s authorization. All the articles are revised by the members of the Editorial Council, and the response of the manuscripts ac-ceptance will be available, as much as possible, in three months (from the arrival date). Besides the journal publication requirements adequacy, topic relevance, originality, quality of the scientific me-thods are evaluated in the articles for publication. Refused articles will not be sent to the author(s). The Editorial Council holds the right to make few changes in the articles in order to adequate and speed up the publication process. When the printed versions were sent to the author(s) for revisions, they must return in 5 days, if the manuscripts were not sent back with the modifications, the work will be published according to the first version.

MAnuSCRIPT PRePARATIOnThe articles must be written in Portuguese or

Spanish, and must be suitable for one of the sections of the journal. The work must be typed in Times New Roman 12, in one face of the sheet in 20 lauds of 30 lines each (1,5 spaced-lines). The margins must have 3 cm in each part (laterals, top and bottom). The manuscripts must be presented as the following sequence: title page, abstracts (Portuguese) and summary (English), keywords, descriptors, text, references, tables or/and illustrations.

TITle PAGeIt must be followed by:A) The manuscript name (in Portuguese and

English)B) First and last name of each author C) Name and address of the department (s) and

institution (s) to which the work should be attribute

D) A short title (up to 4 words)E) A letter of introduction. Each author must

sign the text taking the responsibility for the manuscript and in accordance with the RE-VISTA PSICOPEDAGOGICA publication re-quirements and also giving up the copyright for publication in the journal. Only one author should be elected to be in charge of exchan-ging mails ( Be sure to include the person’s

PuBlICATIOn RequIReMenTS

name, address, phone, FAX and e-mail)F) Ethical Aspects: A letter from the authors

revealing the conflicts of interests (financial professionals and direct or indirect benefits) that may influence the research results. An authorization from the Committee of Ethical Research of the institution or department where the author(s) is (are) linked must also be included.

TexT STRuCTuReThe original Articles must be followed by:A) Introduction: The objective of the work and

the hypothesis.B) Methodology: A short descriptions of the

procedures. C) Results: A summary of the findings (pictures,

tables can be used to illustrated the main points).

D) Discussion: The meaning, the relevance and the validity from the finding

E) Conclusion: Final considerationsReferences like “unpublished results” and

“personal communication” must appear between parentheses, followed by the individual name(s) in the text. Example: Oliveira AC, and Garden LC (un-published results). The author must obtain the sui-table permission to use “personal communication”

ABSTRACT AnD SuMMARYIt is needed for the Special Articles, Original

Articles, Review, Accountants of Experience or Research, Dissertation, Theses and Monograph. It must have up to 250 words. Be sure to indicate six descriptors (it is recommended from “Decs-Descritores em Ciência da Saúde”, BIREME, www.bireme.br/terminologiaemsaude). The summary needs to be similar to the abstract model and also with keywords.

ACKnOWleDGMenTSExclusively for those who collaborated in the

research. It must be posted in the bibliographical references.

BIBlIOGRAPhICAl RefeRenCeSThe references must be presented in the same

text order and consecutively numbered in the overwrite type. It is needed the appropriate citation. Example: As many authors have already demons-trated 6,9,15. All authors must be listed until 6; above this number, it is used to list the first 6 ones followed by et al. The name must be abbreviated according to Cummulated Index Medicus or, in case of impossibility, to Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Examples of References:

1. Standard (one author)Noffs NA. A formação de educadores para uma

escola inclusiva. Rev Psicopedagogia 2002;19:41-42. Standard (2-6 authors)Wippel MLM, Goulart DF, Moreira ALGB, Bozza

MGG. Capacidade para a prática interdisciplinar:

um relato de experiência. Rev Psicopedagogia 2002;19:66-73

3. Standard (more than 6 authors)Araújo VJF, De Carlucci Jr D, Sasaki SU, Montag

E, Azato FN, Cordeiro NC, et al. Perfil da incidência de câncer em hospital geral de São Paulo. Rev Hosp Clin Fac Univ São Paulo 1998;53:110-3.

4. Lack of authorshipCancer in South Africa [editorial]. S Afr Med J

1994;84:155. Organizations as authorsSociedade Brasileira de Cardiologia. III Diretri-

zes Brasileiras sobre dislipidemias. Arq Bras Cardiol 2001: 77:1-48

6. Books and other monographic work – Personal Author(s)

Gasparian MC. A Psicopedagogia institucional sistêmica. São Paulo: Abril Cultural; 1997.

7. In booksPiaget, J. Problemas de espitemologia genéti-

ca. In: Piaget J. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural;1978.p.221-71.

8. Dissertations and ThesisMendes MH. Psicopedagogia: uma identi-

dade em construção [Dissertation/These]. São Paulo:Universidade São Marcos;1998.

9. In eletronic formatFundação Instituto Brasileiro de Geografia e Es-

tatística – IBGE. Censo Demográfico e Estimativas, 1996. Avaliable from: http://www.ibge.gov.br

The editors hold the right to exclude references that are not listed in the text or inappropriate men-tioned.

PICTuReS, TABleS AnD GRAPhICSIllustrations should be limited in 6 per article,

among pictures, tables, diagram, graphics and sche-matic drawings. In case of using pictures or drawing, it is necessary to send the original ones or digitalized copies in TIF format, with the minimum of 300dpi resolution. The will be used in the text if the quality of the materials were appropriate. The material should be send in black and write, in separated sheets and followed by a legend that allows the meaning com-prehension of the data. Make sure to signalize in the text, by using numbers, the correct place where the illustrations must be included. If the illustrations had been published before, a written authorization must follow them.

ABReVIATIOnS/ nOMenClATuReS /fOOT-nOTeS

The use of abbreviations must be minimum. When long expressions are repeated, it is recommended that the initials replace after its mention. These must be followed by their initials in parentheses. Footnote only when it is really needed. They must be marked in the text and presented in a separated sheet, or right after the bibliographical references marked as footnote

A Revista Psicopedagogia, órgão de comunicaçãoda Associação Brasileira de Psicopedagogia, éindexada em: LILACS (Literatura Latino - Americanae do Caribe em Ciências da Saúde), BibliografiaBrasileira de Educação (BBE), Latindex (SistemaRegional de Información en Línea para RevistasCientíficas de América Latina, el Caribe, España yPortugal), CLASE (Citas Latinoamericanas emCiencias Sociales y Humanidades), EDUBASE(Faculdade de Educação, Universidade de Campinas),INDEX PSI (Conselho Federal de Psicologia),Catálogo Coletivo Nacional (Instituto Brasileiro deInformação em Ciência e Tecnologia) e DescriçãoBibliográfica da Fundação Carlos Chagas (DBFCC).Tem por objetivo publicar artigos inéditos na área depsicopedagogia, em especial: resultados de pesquisade caráter teórico/empírico; revisões críticas daliteratura de pesquisa educacional temática oumetodológica e reflexões críticas sobre experiênciaspedagógicas que ampliem e aprofundem oconhecimento na área e que não tenham sidopublicados em outros periódicos. A RevistaPsicopedagogia utiliza as normas Vancouver(Uniform Requirements for Manuscript Submitted toBiomedical Journals, organizadas pelo InternationalCommittee of Medical Journals Editors, disponíveisem http://www.icmje.org) e aceita para publicação asseguintes colaborações:

1. Artigo Original: relato completo de inves-tigação. Limitado a 20 laudas, sua estrutura deveconter: introdução, métodos (procedimentos básicos),resultados, discussão e conclusão. Deve conter ainda:resumo e summary, unitermos e key words.

2. Artigo de Revisão: revisão crítica da literaturaabordando conhecimentos sobre determinado temade forma abrangente, mediante consulta, análise einterpretação da bibliografia pertinente. Limite:20 laudas e deve incluir resumo, summary, unitermose key words.

3. Relato de Pesquisa ou Experiência: análise deimplicações conceituais/investigação e descrição depesquisas originais. Limite: 20 laudas e deve conter:resumo e summary, unitermos e key words.

4. Dissertação, Tese e Monografia: Limite:20 laudas e deve conter: resumo, summary, unitermose key words.

5. Resenha de Livros: abordagem de obra recém-publicada. Limite: 4 laudas. Dispensam resumo,summary, unitermos e key words.

6. Ponto de Vista: temas de relevância para oconhecimento científico e universitário apresentadosna forma de comentário que favoreçam novas idéiasou perspectivas para o assunto. Limite: 4 laudas.Dispensa resumo, summary, unitermos e key words.

7. Artigo Especial: textos elaborados a convite doeditor responsável, de grande relevância para aespecialidade, não classificáveis nas categorias deartigos listados anteriormente. Deve conter: resumo,summary, unitermos e key words.

8. Entrevista: com psicopedagogos ou estudiososde área correlata e/ou depoimentos de profissionaisque atuem no campo da Psicopedagogia.

INFORMAÇÕES GERAISOs artigos e correspondências deverão ser

enviados à:Revista da Associação Brasileira de Psicope-dagogiaRua Teodoro Sampaio, 417 - Cj. 1105405-000 - São Paulo - SP

Cada original deverá vir acompanhado de duasvias impressas e CD em sistema PC, fotografias,gráficos, etc. O conteúdo do material enviado parapublicação na Revista Psicopedagogia não pode tersido publicado anteriormente, nem submetido parapublicação em outros veículos. A Revista Psicope-dagogia possui os direitos autorais de todos os artigospor ela publicados. A reprodução total dos artigos emoutras publicações requer autorização por escrito doEditor. Todos os artigos publicados são revisados pormembros do Conselho Editorial, e a decisão sobre aaceitação do artigo para publicação ocorrerá, sempreque possível, no prazo de três meses a partir da data deseu recebimento. Na seleção dos artigos parapublicação, são avaliados a originalidade, a relevânciado tema e a qualidade da metodologia científicautilizada, além da adequação às normas editoriaisadotadas pela revista. Artigos recusados não serãodevolvidos ao autor. O Conselho Editorial reserva-se odireito de fazer pequenas modificações no texto dosautores para agilizar seu processo de submissão oupublicação. Quando da publicação, provas impressasserão enviadas aos autores, devendo ser revisadas edevolvidas no prazo de cinco dias. Caso os autores nãoas devolvam, indicando possíveis correções, o trabalhoserá publicado conforme a prova.

PREPARAÇÃO DOS TRABALHOSOs artigos podem ser escritos em português ou

espanhol, e devem se enquadrar em uma das diferentesseções da revista. O trabalho deverá ser redigido emcorpo 12 (Times New Roman), numa só face do papel,no máximo em 20 laudas de 30 linhas cada, espaço 1,5linha, com margem de 3cm de cada lado, no topo e nopé de cada página. Os manuscritos devem ser apre-sentados nesta seqüência: página título, resumos emportuguês e inglês (summary), key words, unitermos,texto, referências, tabelas e/ou ilustrações.

PÁGINA TÍTULODeverá conter:A) título do trabalho em português e inglêsB) nome, sobrenome do (s) autor (es) e instituição

pertencente (s);C) nome e endereço da instituição onde o trabalho

foi realizado;D) título resumido (não exceder quatro palavras);E) Carta de apresentação, contendo assinatura de

todos os autores, responsabilizando-se pelo conteúdodo trabalho, concordando com as normas depublicação e cedendo o direito de publicação à RevistaPsicopedagogia, porém apenas um deve ser indicadocomo responsável pela troca de correspondência. Deveconter telefone, fax e endereço para contato.

NORMAS PARA PUBLICAÇÃO

492

F) Aspectos éticos – Carta dos autores revelandoeventuais conflitos de interesse (profissionais,financeiros e benefícios diretos ou indiretos) quepossam influenciar os resultados da pesquisa. Na cartadeve constar ainda a data da aprovação do trabalhopelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição àqual estão vinculados os autores.

ESTRUTURA DO TEXTOOs Artigos Originais devem conter, obrigato-

riamente:A) Introdução: Deve indicar o objetivo de

trabalho e a hipótese formulada;B) Métodos (Procedimentos Básicos): Breves

descrições dos procedimentos utilizados;C) Resultados: Síntese dos achados, podendo

ser apresentados com figuras ou tabelas queilustrem pontos importantes;

D) Discussão: Inclui o achado, a validade e osignificado do trabalho;

E) Conclusão: considerações finais.Referências a “ resultados não publicados” e

“comunicação pessoal” devem aparecer, entreparênteses, seguindo o(s) nome (s) individual (is) notexto. Exemplo: Oliveira AC, Silva PA e Garden LC(resultados não publicados). O autor deve obterpermissão para usar “comunicação pessoal”.

RESUMO e SUMMARYSão obrigatórios para os Artigos Especiais,

Artigos Originais, de Revisão, Relato de Experiênciaou Pesquisa, Dissertação, Tese e Monografia,devendo conter no máximo 250 palavras. Após oresumo deverão ser indicados no máximo seisUnitermos (recomenda-se o vocabulário controladodo “Decs-Descritores em Ciências da Saúde”,publicação da Bireme (www.bireme.br/terminologiaemsaude). O Summary (tradução doresumo para o inglês) deve acompanhar o mesmomodelo do resumo e ser seguido de Key words(tradução dos Unitermos para o inglês).

AGRADECIMENTOSApenas a quem colabore de modo significativo na

realização do trabalho. Devem vir antes dasReferências Bibliográficas.

REFERÊNCIASAs referências devem ser dispostas por ordem de

entrada no texto e numeradas consecutivamente deforma sobrescrita, sendo obrigatória sua citação.Exemplo: como já demonstraram diversos autores6,9,15.Devem ser citados todos os autores do trabalho,quando até seis; acima deste número, citam-se osseis primeiros seguidos de et al. O periódico deveráter seu nome abreviado segundo o Cummulated IndexMedicus ou, se não for possível, a AssociaçãoBrasileira de Normas Técnicas (ABNT). Exemplosde tipos de referências:

1. Padrão ( Só um autor)Noffs NA. A formação de educadores para uma

escola inclusiva. Rev Psicopedagogia 2002; 19: 41-4.2. Padrão (Entre dois e seis autores) Wippel MLM, Goulart DF, Moreira ALGB, Bozza

MGG. Capacidade para a prática interdisciplinar:um relato de experiência. Rev Psicopedagogia 2002;19: 66-73.

3. Padrão (Mais de seis autores)Araújo VJF, De Carlucci Jr D, Sasaki SU, Montag

E, Azato FN, Cordeiro NC, et al. Perfil da incidênciade câncer em hospital geral em São Paulo. Rev HospClin Fac Med Univ São Paulo 1998;53:110-3.

4. Ausência de autorCancer in South Africa [editorial]. S Afr Med J

1994;84:15.5. Organização como autorSociedade Brasileira de Cardiologia. III

Diretrizes Brasileiras sobre dislipidemias. Arq BrasCardiol 2001;77:1-48.

6. Livros e outras obras monográficas - Autor(es)pessoal(is)

Gasparian MC. A Psicopedagogia institucionalsistêmica. São Paulo:Abril Cultural;1997.

7. Capítulo em um livroPiaget, J. Problemas de epistemologia genética.

In: Piaget J. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural;1978. p. 211-71.

8. Dissertação/TeseMendes MH. Psicopedagogia: uma identidade em

construção [Dissertação/Tese]. São Paulo:Univer-sidade São Marcos;1998.

9. Referência em formato eletrônicoFundação Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística – IBGE. Censo Demográfico e Estimativas,1996. Disponível no URL: http://www.ibge.gov.br

Os editores se dão ao direito de excluir refe-rências não indicadas no texto ou elaboradaserroneamente.

FIGURAS, TABELAS E GRÁFICOSSerão aceitas no máximo seis ilustrações por

artigo, as quais compreendem: figuras, tabelas,gráficos, diagramas, fotografias e desenhosesquemáticos. No caso de utilização de fotografiasou figuras, solicita-se o envio dos originais ou cópiasdigitalizadas em formato .TIF, com resolução mínimade 300 dpi. O aproveitamento ficará condicionado àqualidade do material enviado e devem serapresentados em preto e branco, em folhas separadase acompanhados de legenda que permita compreendero significado dos dados reunidos. Assinalar, no texto,pelo seu número de ordem, os locais em que os quadrose tabelas devem ser intercalados. Quando extraídosde outros trabalhos previamente publicados, devemvir acompanhados da permissão, por escrito, para asua reprodução.

ABREVIAÇÕES / NOMENCLATURA / NOTASDE RODAPÉ

O uso de abreviações deve ser mínimo. Quandoexpressões extensas devem ser repetidas, recomenda-se que suas iniciais as substituam após a primeiramenção. Esta deve ser seguida das iniciais entreparênteses. Notas de rodapé somente se estritamentenecessárias. Devem ser assinaladas no texto eapresentadas em folha separada, ou após asreferências, com subtítulo nota de rodapé.

ASSOCIADOS TITULARES PARA REVISTA 81 - 2009

ALAGOAS

Maceió

ELIANE CALHEIROS CANSANÇÃO

[email protected] (82) 3223-4258 – Farol

BAHIA

Feira de Santana

LOURDES MARIA DA SILVA

TEIXEIRA

[email protected](75) 3221-3456 – Mangabeira

Itabuna

GENIGLEIDE SANTOS DA HORA

[email protected](71) 9112-9765 - São Caetano

Salvador

ARLENE NASCIMENTO PESSOA

[email protected](71) 9983-0470 – Caminho das Árvores

DEBORA SILVA DE CASTRO

PEREIRA

[email protected] (71) 3341-2708 - Candeal

IARA FERNANDES PEREIRA LIMA

[email protected](71) 9119-9208 - Brotas

JOZELIA DE ABREU TESTAGROSSA

[email protected](71) 3341-2708 - Caminho das Árvores

KARENINA AZEVEDO

[email protected](71) 3345-3535 - Pituba

MARIA ANGELICA MOREIRA

ROCHA

[email protected](71) 3345-1111- Pituba

MÁRCIA GONÇALVES NUNES

[email protected]

(71) 9973-4777 - Federação-Garibaldi

SANDRA MARIA FURTADO

ANDRADE

[email protected](71) 3351-9973 - Itaigara

CEARÁ

Fortaleza

ANDRÉA AIRES COSTA DE

OLIVEIRA

[email protected](85) 3261-0064 - Aldeota

ELIANE CÁSSIA ROCHA BLANES

[email protected](85) 3244-2820 – Dionísio Torres

GALEÁRA MATOS DE FRANÇA

SILVA

[email protected](85) 3264-0322 - Aldeota

MARIA JOSÉ WEYNE MELO DE

CASTRO

[email protected](85) 3261-0064 – Parque Manibura

OTILIA DAMARIS QUEIROZ

[email protected](85) 3246-7000 – Dionísio Torres

DISTRITO FEDERAL

Brasília

ELINE LIMA M. DE AZEVEDO

[email protected](61)3901-7583 – Vila Tecnológica

ESPÍRITO SANTO

Vitória

MARIA DA GRAÇA VON KRUGER

PIMENTEL

[email protected]

(27) 3225-9978 – Praia do Canto

GOIÁS

Goiânia

CARLA BARBOSA DE ANDRADE

JAYME

[email protected](62) 3225-9805 - Setor Oeste

LUCIANA BARROS DE ALMEIDA

SILVA

[email protected](62) 3293-3067 – Setor Marista

MARISTELA NUNES PINHEIRO

[email protected](62) 3259-0247 – Nova Suiça

MINAS GERAIS

Campanha

RAMONA CARVALHO FERNANDEZ

NOGUEIRA

[email protected](35) 3261-2119 - Centro

Pouso Alegre

SÔNIA REGINA BELLARDI

TAVARES

[email protected](35) 3425-3456 – Santa Filomena

Uberlândia

SANDRA MEIRE DE OLIVEIRA R.

ARANTES

[email protected](34) 3224-3687 - Lidice

Varginha

JÚLIA EUGÊNIA GONÇALVES

[email protected](35) 3222-1214 - Centro

MARIA CLARA R. R. FORESTI

[email protected](35) 3212-3496 - Centro

MARIA ISABEL SILVA PINTO

REZENDE

[email protected] (35) 3212-9120 – Jardim Andere

REGINA CLÁUDIA A. S. FERRAZ

[email protected](35) 3214-5660 – Jardim Andere

PARÁ

Belém

CARMEM CYLBELLE PEREIRA

ALVES VIÉGAS

[email protected](91) 3259-3531 – São Braz

ELIANE SOUZA DE DEUS NETO

ALMEIDA

[email protected](91) 3259-3531 – Cidade Velha

MARIA DE NAZARÉ DO VALE

SOARES

[email protected](91) 9981-2076 – São Braz

PARANÁ

Curitiba

ARLETE ZAGONEL SERAFINI

[email protected](41) 3363-1500 - Santa Candida

CINTIA BENTO M. VEIGA

[email protected](41) 3332-2156 - Rebouças

FABIANE CASAGRANDE C. O.

MELLO

[email protected](41) 3022-4041- Batel

EVELISE M. LABATUT PORTILHO

[email protected](41) 3271-1655 – Prado Velho

ISABEL CRISTINA HIERRO

PAROLIN

[email protected](41) 3264-8061 – Alto da XV

ISABELA CRISTINA DA SILVA

[email protected](41)3026-2865 – Cabral

LAURA MONTE SERRAT BARBOSA

[email protected](41) 3363-1500 – Alto da Glória

MARIA LUIZA Q. SOARES DA SILVA

[email protected](41) 3264-9101- Alto da Glória

REGINA BONAT PIANOVSKI

[email protected](41) 3345-8798 - Portão

SONIA MARIA GOMES DE SÁ

KUSTER

[email protected](41) 3264-8061 - Centro

Foz do Iguaçu

ANA ZANIN ROVANI

[email protected](45) 3025-6103 - Centro

Guarapuava

ADRIANA CRISTINE LUCCHIN

[email protected](42) 3622-4022 - Trianon

Londrina

ROSA MARIA JUNQUEIRA

SCICCHITANO

[email protected](43) 3342-7308 – Jardim Caiçaras

Maringá

GEIVA CAROLINA CALSA

[email protected](44) 3261-4127 - Vila Morangueira

IVONILCE FÁTIMA RIGOLIN

GALLO

[email protected](44) 3224-7752 – Zona 4

NERLI NONATO RIBEIRO MORI

[email protected](44) 262-1161- Campus Universitário

São José dos Pinhais

LORIANE DE FÁTIMA FERREIRA

[email protected]

(41) 3282-9357 - Centro

PERNAMBUCO

Recife

IRANY BARBOSA DINIZ

[email protected]

(81) 3339-2057 - Estãncia

PIAUÍ

Teresina

AMÉLIA CUNHA RIO LIMA

COSTA

amé[email protected]

(86) 3233-2878 - Fátima

RIO GRANDE DO NORTE

Natal

EDNALVA DE AZEVEDO

SILVA

[email protected]

(84) 221-6573 – Lagoa Seca

SONIA APARECIDA MONÇÃO

GONÇALVES

[email protected](84) 3211-4220 - Ribeira

RIO GRANDE DO SUL

Porto Alegre

CLARA GENI BERLIM

[email protected]

(51) 3221-1740 – Santana

SANDRA MARIA CORDEIRO

SCHRÖEDER

[email protected]

(51) 3328-3872 – Chácara das

Pedras

SONIA MARIA PALLAORO

MOOJEN

[email protected]

(51) 3333-8300 - Petrópolis

RIO DE JANEIRO

Ilha do Governador

DULCE CONSUELO RIBEIRO

SOARES

[email protected](21) 3366-2468 – Freguesia

Niterói

FÁTIMA GALVÃO PALMA

[email protected](21) 2710-5577 - Icaraí

Rio de Janeiro

ANA MARIA ZENICOLA

[email protected](21) 2556-3767 - Flamengo

ANA PAULA LOUREIRO E COSTA

[email protected](21) 2436-1803 - Jacarepaguá

CLYTIA SIANO FREIRE DE CASTRO

[email protected](21) 2247-3185 - Ipanema

DIRCE MARIA MORRISSY

MACHADO

[email protected] (21) 2236-2012 – Copacabana

HELOISA BEATRIZ ALICE

RUBMAN

[email protected](21) 2259-9959 – Jardim Botânico

LUCIA HELENA MACHADO

SAAVEDRA

[email protected](21) 2239-5878 - Gávea

MARIA HELENA C. LISBOA

BARTHOLO

[email protected](21) 2266-0818 - Humaitá

MARIA KATIANA VELUK

GUTIERREZ

[email protected](21) 2527-1933 – São Conrado

MARIA LÚCIA DE OLIVEIRA

FIGUEIREDO

[email protected](21) 2289-4932 - Humaitá

MARTHA IZAURA DO

NASCIMENTO TABOADA

[email protected] (21) 2570-0065 – Barra da Tijuca

MARLENE DIAS PEREIRA PINTO

[email protected] (21) 9739-5332 - Leblon

SANTA CATARINA

Florianópolis

ALBERTINA C. MATTOS CHRAIM

[email protected](48) 3244-5984 - Estreito

ANA CRISTINA BARBOSA ROCHA

[email protected](48) 3223-0641 - Centro

ELZA ADELE GUERRA GOBBI

[email protected](48) 3232-0011 - Centro

JANICE MARIA BETAVE

[email protected](48) 8453-7791 - Ingleses

MARIA LÚCIA ALMADA

FERNANDES

[email protected](48) 3331-1952 - Trindade

SÃO PAULO

Araraquara

ALINE RECK PADILHA ABRANTES

[email protected](11) 3331-3377 - Centro

Cotia

MARIA CECILIA CASTRO

GASPARIAN

[email protected](11) 4702-2192- Granja Viana

Jacareí

ANA MARIA LUKASCHEK

BRISOLA

[email protected](12) 3951-7929

Ribeirão Preto

ANA LUCIA DE ABREU BRAGA

[email protected](16) 3021-5490 – Jardim Sumaré

Santos

ANGELA COTROFE RODRIGUES

[email protected](13) 3232-5020 - Boqueirão

São Bernardo do Campo

BEATRIZ PICCOLO GIMENES

[email protected] (11) 4368-0013 – Rudge Ramos

São Paulo

ADA MARIA GOMES

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[email protected](11) 2261-2377 - Santana

ANA LISETE P. RODRIGUES

[email protected](11) 3885-7200 – Jardim Paulista

BEATRIZ JUDITH LIMA SCOZ

[email protected](11) 3651-9914 – Alto de Pinheiros

CARLA LABAKI

[email protected](11) 3815-5774 – Vila Madalena

CLEOMAR LANDIM DE OLIVEIRA

[email protected](11) 9302-5501 – Moema

ELOISA QUADROS FAGALI

[email protected](11) 3864-2869 - Perdizes

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HERVAL G. FLORES

[email protected](11) 3257-5106 - Higienópolis

LEDA MARIA CODEÇO BARONE

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Núcleo Espírito SantoCoordenadora: Maria da Graça Von Kruger Pimentel

R. Elesbão Linhares, 420/601 – Canto da PraiaVitória – ES – CEP 29057-220(027) 3225-9978 [email protected]

Núcleo Sul MineiroCoordenadora: Júlia Eugênia Gonçalves

R. Deputado Ribeiro de Rezende, 494 - CentroVarginha – MG – CEP 37002-100(035) [email protected]

Seção BahiaDiretora Geral: Débora Silva de Castro Pereira

Av. Tancredo Neves, 3343 – Ed. Cempre – Sala 1103 –Torre B – Caminho das ÁrvoresSalvador – BA – CEP 41820-021(071) [email protected]

Seção BrasíliaDiretora Geral: Marli Lourdes da Silva Campos

SCLN Quadra 102 – Bloco D – sala 110Brasília – DF – CEP 70722-540(061) [email protected]

Seção CearáDiretora Geral: Galeára Matos de França Silva

R. Assis Chateaubriand, 362 A – Dionízio TorresFortaleza – CE – CEP 60135-200(085) 3261-0064 – [email protected]

Seção GoiásDiretora Geral: Luciana Barros de Almeida

Av. 85, 684 sala 207 – Ed. Eldorado Center – Setor OesteGoiânia – GO – CEP 74120-090(062) [email protected]

Seção Minas GeraisDiretora Geral: Regina Rosa dos Santos Leal

R. Grão Mogol, 502 / 305 – Carmo SionBelo Horizonte – MG – CEP 30310-010(031) [email protected]

Seção ParáDiretora Geral: Maria Nazaré do Vale Soares

Trav. 3 de Maio, 1218/ sl 105 – São BrazBelém – PA – CEP 66060-600(094) [email protected]

Seção Paraná NorteDiretora Geral: Geiva Carolina Calsa

R. Montevidéu, 206Maringá - PR - CEP 87030-470(044) [email protected]

Seção Paraná SulDiretora Geral: Sonia Maria Gomes de Sá Kuster

R. Fernando Amaro, 431 – Alto da XVCuritiba – PR – CEP 80050-020(041) [email protected]

Seção PernambucoDiretora Geral: Maria das Graças Sobral Griz

R. das Pernambucanas, 277 – GraçasRecife – PE – CEP 52011-010(081) 3222-4375 – [email protected]

Seção PiauíDiretora Geral: Amélia Cunha Rio Lima Costa

R. Eletricista Guilherme, 815 – IningaTeresina – PI – CEP 64049-530(086) 3233-2878 [email protected]

Seção Rio de JaneiroDiretora Geral: Ana Paula Loureiro e Costa

Av. N. Sra. de Copacabana, 861 sala 302Rio de Janeiro – RJ – CEP 22060-000(021) 2236-2012 / Fax: (021) [email protected]

Seção Rio Grande do NorteDiretora Geral: Ednalva de Azevedo Silva

R. São João, 1392 – Lagoa SêcaNatal – RN – CEP 59022-390(084) [email protected]

Seção Rio Grande do SulDiretora Geral: Fabiani Ortiz Portella

Av. Venâncio Aires, 1119/ sala 9Porto Alegre – RS – CEP 90520-000(051) [email protected]

Seção Santa CatarinaDiretora Geral: Albertina Celina de Mattos Chraim

R. Eurico Gaspar Dutra, 445, sl 101- EstreitoFlorianópolis – SC – CEP 88075-100(048) [email protected]

Seção São PauloDiretora Geral: Sônia Maria Colli

R. Carlos Sampaio, 304 – cj. 51- sl 03São Paulo – SP – CEP 01333-020(011) [email protected]

Seção SergipeDiretora Geral: Auredite Cardoso Costa

Av. Ivo Prado, 312 – CentroAracaju – SE – CEP 49010-050(079) 3211-8668/ [email protected]

Sede: Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000 - São Paulo - SPPabx: (11) 3085-2716 - 3085-7567 - www.abpp.com.br - [email protected]

Associação Brasileirade Psicopedagogia

NúClEoS E SEçõES da aBPp

(dezembro de 2009)

Rua Teodoro Sampaio, 417 - Conj. 11 - Cep: 05405-000 São Paulo - SP - Pabx: (11) 3085-2716 - 3085-7567

www.abpp.com.br - [email protected]

A Associação Brasileira de Psicopedagogia (ABPp) éuma entidade de caráter científico-cultural, sem finslucrativos, que congrega profissionais militantes na área da Psicopedagogia.

Em 12 de novembro de 1980, um grupo de profissionais jáenvolvidas e atuantes nas questões relativas aos problemas da aprendizagem fundou a Associação Estadual dePsicopedagogos do Estado de São Paulo, a AEP.Devido ao grande interesse em torno dessa Associação, a sua expansão a nível Nacional surgiu como necessidade imperiosa.Em 1986, a AEP transformou-se na ABPp e gradativamente foram sendo criados os seus escritórios de representação por todo o Brasil, denominados de Núcleos e Seções.

Durante estes anos, a ABPp vem cuidando de questões referentes à formação, ao perfil, à difusão e ao reconhecimento da Psicopedagogia no Brasil, já tendo alcançado muitas vitórias na luta pela sua regulamentação. Atualmente, conta com 16 Seções e 2 Núcleos, espalhados pelo Brasil, para melhor divulgar a Psicopedagogia e aproximar os profissionais em torno de seus objetivos comuns.

A ABPp promove conferências, cursos, palestras, jornadas,congressos, bem como a divulgação de trabalhos sobre suaárea de atuação, por meio da revista científicaPsicopedagogia, do informativo DiálogoPsicopedagógico e do site www.abpp.com.br. Oferece, ainda, descontos tanto nos eventos queorganiza quanto em eventos de terceiros, que são parceiros einteressados nos assuntos desta área.

Preocupada com as questões sociais, a atual diretoria da ABPp Nacional organizou um novo trabalho de cunhosociocientífico, que visa não só ao atendimento da população carente, promovendo a inserção social e a divulgação da importância da prática psicopedagógica, como também à implantação de um novo modelo de estudo e pesquisa nesse campo. Dele poderão participar todos osassociados interessados em prestar um trabalho social.

Podem associar-se à ABPp todas as pessoas interessadas nessa área de atuação, tendo ou não concluído a sua especialização em Psicopedagogia.

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ANOS