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Fúlvia Rosemberg é professora de Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, onde coordena o Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade (NEGRI), e Pesquisadora da Fundação Carlos Chagas, onde coordena o Programa Internacional de Bolsas de Pós-graduação da Fundação Ford. Autora de vários livros e artigos sobre infância, educação infantil, relações de gênero e raça. Dentre as últimas publicações destacam-se: Criança pequena e desigualdade social no Brasil (2006); A dívida latinoamericana para com a criança pequena (2008); Educação infantil e povos indígenas no Brasil: apontamentos para um debate (2006).

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Fúlvia Rosemberg é professora de Psicologia Social da Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, onde coordena o Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e

Idade (NEGRI), e Pesquisadora da Fundação Carlos Chagas, onde coordena o

Programa Internacional de Bolsas de Pós-graduação da Fundação Ford. Autora de

vários livros e artigos sobre infância, educação infantil, relações de gênero e raça.

Dentre as últimas publicações destacam-se: Criança pequena e desigualdade

social no Brasil (2006); A dívida latinoamericana para com a criança pequena

(2008); Educação infantil e povos indígenas no Brasil: apontamentos para um

debate (2006).

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Crianças e adolescentes na sociedade brasileira e a Constituição de 1988

Fúlvia Rosemberg

{A} infância é um fenômeno no qual a dupla hermenêutica das Ciências Sociais está

particularmente presente (...). Isto é, proclamar um novo paradigma da Sociologia da

Infância é também engajar-se e responder pelo processo de reconstrução da infância na

sociedade. (James e Prout, 2003, p. 8)

1. Preâmbulo

Ao receber o convite da ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências

Sociais) tomei duas decisões que me pareceram adequadas: focalizar o tema nos direitos da

infância e da adolescência (abandonando, portanto, a família e o idoso); iniciar pela prospecção

da literatura recente que trata da situação da infância e adolescência na sociedade brasileira nas

duas últimas décadas. Eu mesma havia elaborado balanço recente sobre a Criança pequena e

desigualdades sociais (Rosemberg, 2006) e que fora atualizado, sob o título Educação Infantil

Pós-Fundeb: avanços e tensões (Rosemberg, 2007), tendo sido apresentado no Congresso da

UNDIME (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação) após a aprovação da lei do

FUNDEB (Fundo de Manutenção de Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos

Profissionais da Educação) em 2006. Confrontei minhas análises com outros estudos que

focalizaram a década de 1990 e estes anos de 2000 (ANCED, 2004; IPEA, 2008; UNICEF, 2008)

e verifiquei que os indicadores macro analisados e as conclusões coincidiam.

Assim, conferidos os indicadores relacionados à distribuição de renda pelos grupos

etários, taxas de mortalidade infantil e na infância, condições de moradia, níveis de desnutrição,

índices de escolaridade e de aproveitamento escolar, indicadores da qualidade das escolas, nossas

conclusões têm sido idênticas. Observamos que ocorreu, sim, uma melhoria destes indicadores

durante as duas últimas décadas, mas que não conseguiu alterar, significativamente, a posição

brasileira no ranking mundial e regional ou o perfil de desigualdades nacionais. Com efeito, os

índices de pobreza continuam altos e mais intensos entre crianças e adolescentes do que entre

adultos e idosos; os indicadores decorrentes de políticas sociais (mortalidade, nutrição,

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saneamento básico, educação) mostram desigualdades entre as idades (quando menor a criança

pior o indicador), entre os diferentes estratos econômicos da família (quanto menor o rendimento

familiar, pior o indicador), entre população rural e urbana e pertença étnico-racial (piores

indicadores para população rural, negra e indígena). Dessas análises conclui-se que a dívida

brasileira para com crianças e adolescentes não decorre apenas da desigual distribuição de

rendimentos pelos segmentos sociais, mas também da desigual distribuição dos benefícios das

políticas sociais, desigualdades sustentadas por gastos per capita nitidamente inferiores para

crianças e adolescentes. “Considerando-se os gastos per capita, o governo federal gastou, durante

2003, R$ 7.916,00 com cada cidadão maior de 19 anos e R$ 376,00 com crianças e adolescentes

até 19 anos” (Rede de Monitoramento Amiga da Criança, 2006, p. 18).

Ao mesmo tempo em que tais constatações vêm sendo reafirmadas ano a ano pelas

análises dos Censos Demográficos, Escolares e das PNAD (Pesquisas Nacionais por Amostra de

Domicílios), como explicá-las diante dos preceitos constitucionais que reconhecem, no artigo

227, que “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com

absoluta prioridade”, direitos sociais, de proteção e de liberdade?

Nos balanços periódicos, especialmente os comemorativos de aniversário do Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA), tenho encontrado, com freqüência, respostas como “falta de

vontade política”, “ajustamento do Estado ao modelo neo-liberal” e que não me parecem

suficientes.

Propus-me, então, a revisitar este período da história da infância brasileira do qual tenho

participado como pesquisadora e ativista. Vasculhei lembranças e literatura1, orientada por um

quadro interpretativo que fui construindo ao longo desses anos, na busca de pistas para apreender

nossos caminhos e descaminhos na elaboração e implementação do que havia se configurado, em

1988, como os novos direitos da infância e adolescência.

O texto, que ainda se ressente de uma construção indutiva, contém quatro tópicos: ponto

de partida, ou meu enquadre; o cenário internacional; o cenário nacional; a implantação da

Constituição de 1988.

1 Para a revisão da literatura que sustenta este artigo recorri, especialmente, à base de dados sobre creche da Fundação Carlos Chagas. Agradeço a colaboração atenciosa de Maria José O. Souza, de Marcia Caxeta e à leitura de Livia M. Fraga Vieira.

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2. Enquadre

Entendo a delimitação das etapas da vida como uma construção social que, nas sociedades

ocidentais contemporâneas, hierarquiza as idades, posicionando o adulto como ápice desta

hierarquia. Neste sentido, ao lado das hierarquias de classe, gênero, raça-etnia e nação, as

categorias etárias também configuram relações de dominação. Porém, as relações de dominação

não atuam de forma sincrônica2, seja na trajetória social, seja na história individual. Isto significa,

por exemplo, que a busca de superação de relações de dominação de classe (ou gênero, ou raça-

etnia ou nação) pode gerar ou sustentar relações de dominação de idade. Por exemplo, teorias

feministas romperam com a máxima essencialista na compreensão das relações de gênero, mas

têm sustentado a naturalização da infância (Rosemberg, 1997; Alanen, 1994).

Tal perspectiva analítica se distancia de interpretações contemporâneas que anunciam “o

fim da infância” (Postman, 1999). Meu argumento chave é que, nas sociedades contemporâneas,

apesar de cada vez mais afastada da produção econômica, a infância produz recursos econômicos,

pois, pela demarcação de sua especificidade, dinamiza os mercados de trabalho e de consumo. Ao

se lhe reconhecerem necessidades específicas, geram-se novas profissões no mercado de trabalho

adulto que, por sua vez, gera, também, a produção de novas mercadorias e serviços, inclusive os

de natureza filantrópica, comunitária, ou solidária. Oldman (1994) assinala tal valor econômico

da infância a partir do que denomina “trabalho para criança” (childwork), “isto é, trabalho

realizado por adultos na organização e controle das atividades infantis” (p. 45). Mollo-Bouvier

(2005) também destaca que “cada atividade da criança cria instituições específicas (...) exigências

sociais que ajeitam a vida da criança em função da dos adultos e das necessidade do trabalho” e

completa, citando Chamboredon, que esta rede institucional que “enquadra” as crianças constitui

um mercado aberto à profissionalização (p. 392). Portanto, nossas sociedades sucumbiriam à não

demarcação da infância e de suas instituições específicas. Que se pense na hecatombe econômica

se a escola básica – instituição de massa para a infância e adolescência – desaparecesse.

Entre as dificuldades para se aceitar a configuração adultocêntrica das sociedades

contemporâneas, destaco o hábito de se pensar a infância preferencial ou exclusivamente em

contexto familiar. Assim, parece ocorrer um deslizamento de sentido de criança para filho. É

como se a generosidade de pais e mães pelo filho se expandisse “naturalmente” para todas as

crianças (Snyders, 1994). Por outro lado, ao subsumir a criança no filho, restringe-se a infância à

2 O conceito de não-sincronia ou de heterocronia, foi emprestado da teórica feminista Hicks (1981).

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esfera do privado, da família e da casa. A prática contemporânea de prover instituições

organizadas por classes de idade (creches e escolas) e de controlar o espaço da rua, reforça a

reduzida visibilidade pública de crianças, especialmente das menores, dos bebês. A infância e a

adolescência ascendem à visibilidade pública, como outras categorias sociais subordinadas,

quando associadas à excepcionalidade, ao “desvio”, ao drama, à violência (Hilgartner e Bosk,

1988; Ponte, 2002).

Concebo a agenda de políticas públicas também como uma construção social e política,

resultante do entrejogo de tensões e coalizões entre diversos atores sociais, nacionais e

internacionais, incluindo aqui as agências multilaterais e fundações. Neste sentido, os problemas

sociais que incitam a atenção pública podem também ser entendidos como socialmente

construídos (Lahire, 2002; Rosemberg e Andrade, 2007). Hierarquizamos necessidades sociais

conforme padrões éticos, políticos, concepções ideológicas, interesses pessoais ou corporativos.

A despeito de nossas motivações, a construção da agenda de problemas sociais, nas sociedades

contemporâneas, depende intensamente das mídias, que atuam tanto em seu próprio nome, quanto

como caixa de ressonância de outros atores sociais. A midiação das sociedades modernas, mais

enfaticamente das contemporâneas, penetra as diversas instituições, entre elas a política

(Thompson, 1995), o ativismo social e a academia (Sanchez-Jankowicz, 1997). Para o bem e para

o mal, vivemos uma era da política espetáculo (Lipowetsky, 1989) que atinge e, por vezes,

configura a agenda de políticas sociais.

Para incitar a atenção pública, nós, defensores de causas sociais, construímos um discurso

apoiado em retórica persuasiva, buscando convencer o público quanto à relevância das causas

que nos mobilizam. Alguns de nós privilegiam o drama (Hilgartner e Bosk, 1988; Lahire, 2002).

E a dramaticidade de uma necessidade humana é intensificada pelo uso retórico da criança,

especialmente quando associada à violência, como vítima ou algoz (Best, 2008).

Considero que nós - profissionais, políticos, ativistas e acadêmicos da causa da infância –,

com freqüência ultrapassamos o limite (que pode ser tênue) entre a publicização de uma

necessidade social intensa e a dramatização espetacular de um problema social. O risco, que

decorre desta passagem, é a canalização de recursos humanos e financeiros para o espetáculo, em

detrimento de outras urgências com menor apelo midiático.

Foi com este olhar que revisitei memórias e bibliografia, focalizando a construção da

agenda da infância na elaboração e implementação da Constituição de 1988. Atentei para atores

sociais envolvidos, seus discursos e retóricas, bem como para desdobramentos em políticas

sociais.

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De um modo geral, a literatura (Costa, 1989, por exemplo) destaca que a Constituição de

1988 teria consagrado, à criança e ao adolescente, três grandes princípios: proteção integral,

respeito à peculiar condição de pessoa em desenvolvimento e prioridade absoluta. A jurista

Martha de Toledo Machado (2003) inclui mais dois: princípio da igualdade de crianças e

adolescentes, isto é, que “todas as crianças e os adolescentes têm um mesmo status jurídico” (p.

42); princípio da participação na defesa dos direitos de crianças e adolescentes, na medida em

que “impôs também à Sociedade e à Família o asseguramento dos direitos fundamentais”

(Machado, 2003, p. 413-414). O direito à participação se estende a crianças e adolescentes como

extensão da liberdade.

Elegi para discutir particularmente duas novidades: o princípio da proteção integral (artigo

227); o reconhecimento de creches e pré-escolas como um direito da criança pequena à educação

(inciso IV, artigo 208). Neste sentido, a análise que aqui efetuo diverge, até certo ponto, das

referências mais tradicionais na área que se concentram no artigo 227 (Costa, 1990; Gohn, 1997;

Pinheiro, 2006).

O artigo 227 do Capítulo VII, Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso, é o que

define de forma mais abrangente os direitos da criança e do adolescente brasileiros, e o que tem

sido mais celebrado (Costa, 1989; Pinheiro, 2006) e que inclui, também, a aspiração à

participação da sociedade (§ 7º).

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com

absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à

profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar

e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, exploração,

violência, crueldade e opressão.

Do artigo 208, destaquei o inciso IV que, entre outros, estabelece que o

Dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de (...) atendimento

em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos.

Portanto, neste texto, focalizarei o direito a creches e pré-escolas da ótica dos direitos das

crianças pequenas, não entrando em discussões, importantes sem dúvida, sob o enfoque dos

direitos trabalhistas dos pais, especialmente os das mães, para os quais remeto ao texto de Bila

Sorj e colaboradoras (2007).

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Considerei pertinente, antes de focalizar os direitos da criança e do adolescente no Brasil,

deter-me na discussão em cenário internacional.

3. Cenário internacional

Longo foi o percurso histórico das instituições sociais, inclusive jurídicas e acadêmicas,

para que os adultos das sociedades ocidentais reconhecessem, à infância, o estatuto de sujeito e a

dignidade de pessoa.

Dentre os marcos fundantes desse reconhecimento destacam-se a Declaração Universal

dos Direitos da Criança promulgada pela ONU (Organização das Nações Unidas) em 1959 e a

publicação do livro de Philippe Ariès, em 1961, L’enfant et la vie familiale sous l’ancien régime.

Apesar de críticas que lhes foram feitas posteriormente, ambos textos instalaram discursos e

práticas sobre a infância e as crianças contemporâneas que repercutiram na Constituição

Brasileira de 1988.

Ariès (1961), ao inaugurar a “visão da infância como uma construção social, dependente

ao mesmo tempo do contexto social e do discurso intelectual” (Sirota, 2001, p. 10), lança as bases

para a mudança paradigmática proposta, nas décadas de 1980 e 1990, pelo Novos Estudos sobre a

Infância (na tradição anglosaxônica) ou Sociologia da Infância (na tradição francófona): alçar a

infância à condição de objeto legítimo das Ciências Sociais; tratar a infância como uma

construção social; romper com o modelo de interpretação de desenvolvimento humano da

Psicologia (por exemplo o piagetiano) “impelido para uma estrutura de racionalização adulta

permanentemente definida” (Jenks, 2002, p. 212); atacar o conceito de socialização da criança

predominante na Sociologia e na Psicologia; conceber a criança como ator social.

Esta nova perspectiva de compreensão da infância rompeu com três atributos até então

vigentes: racionalidade, universalização e naturalização. Tais atributos haviam configurado não

apenas a Psicologia, mas também a Sociologia e o contexto sócio-político de práticas destinadas à

infância e envolvendo crianças. Sua tradução, nas teorias estrutural-funcionalistas sobre a

socialização, configura-se como um tratamento à infância “como rato de laboratório”, passiva e

conformista e o adulto sendo-lhe o guia no labirinto social (apud James e Prout, 2003). A crítica

de James e Prout (2003), bem como a de Jenks (2002) ou Corsaro (1997), sobre o tratamento

dado à infância no arcabouço teórico funcionalista é contundente: teorias funcionalistas, às voltas

com a explicação da ordem social, adotam uma concepção de infância a seu serviço, passível

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apenas de explicar a reprodução social. Pouca atenção é dada à contradição e ao conflito: uma

criança ou se conforma ou é tida como desviante. Dessa perspectiva, as teorias não ofereceriam

um quadro interpretativo para compreender-se a infância, mas, ao contrário, adotariam uma

concepção de infância que permitisse manter arcabouço teórico assentado no pressuposto meta-

teórico do equilíbrio.

Esta nova produção teórica foi angariando adeptos, especialmente nos países do

hemisfério norte, tendo sido reconhecida como campo legítimo de produção acadêmica em 1990,

quando a International Sociological Association criou um grupo de trabalho sobre Sociologia da

Infância. Ela também informa, até certo ponto, as discussões sobre direitos da infância que

percorreram as décadas de 1970 e 1980.

Apesar de inspirar-me, venho problematizando tal enfoque teórico sob quatro

perspectivas: eventuais diferenças conceituais e políticas que o termo infância possa recobrir em

línguas que dispõem de dois termos diferentes para puer e filius (como o português) e para as que

dispõem de apenas um (inglês ou francês, por exemplo); qual a idade da criança na Sociologia da

Infância, frente à complexidade de enfrentarmos a alteridade do bebê (como concebê-lo como

ator social)?; qual o estatuto epistemológico do conceito infância, trata-se de categoria descritiva

ou analítica?; como integrar as relações de idade na compreensão de arranjos políticos nacionais

e supranacionais? Apesar de enfrentar inúmeras lacunas em minha argumentação, postulo que as

relações de idade (e não a infância) constituem categoria analítica útil para se compreender a

produção e sustentação de desigualdades sociais.

No Brasil, a despeito de alguns textos percussores na Educação (Cadernos de Pesquisa,

1979), na História (Mott, 1979), na Sociologia (Fernandes, 1979/1994) e na Psicologia

(Rosemberg, 1979), esta nova abordagem acadêmica é bem mais recente, datando especialmente

desta década e filiando-se mais particularmente aos campos da Educação e da História.3

O século XX também assistiu a uma formidável movimentação quanto aos direitos da

infância. A primeira Declaração dos Direitos da Criança, conhecida como Declaração de

Genebra, data de 1924, foi aprovada sob os auspícios da Sociedade das Nações. Orientada pelo

princípio “a criança em primeiro lugar”, sua ênfase recai na proteção e no auxílio à infância

(Soares, 1997, p. 79).

3 Para uma revisão da produção acadêmica francófona e anglófona ver Sirota (2001) e Montandon (2001). Para a produção brasileira recente, reportar-se aos periódicos Educação e Pesquisa (2000); Cadernos CEDES (2002); Educação e Sociedade (2005); Cadernos PAGU (2006), e as coletâneas organizadas por Priore (1999) e Freitas (1997).

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A Declaração dos Direitos Humanos de 1948 instituiu a “proteção especial” para a

maternidade e a infância (Renaut, 2002, p. 379), o que foi retomada pela Declaração Universal

dos Direitos da Criança de 1959, fonte inspiradora do artigo 227 da Constituição Federal de 1988,

e que se baseia na doutrina de proteção integral. A Declaração de 1959 ampliou o número de

princípios (de cinco para dez), manteve a ênfase na “proteção especial”, e prenunciou algumas

novidades no que diz respeito aos direitos de liberdade. Seu preâmbulo, ao lado da ênfase na

proteção e bem-estar da criança, afirma que “a criança beneficia (...) de direitos e liberdades aqui

enunciados”. Porém, “os direitos proclamados no corpo da Declaração são ainda apenas “direitos

a ...” e não “direitos de ...” (Renaut, 2002, p. 388).

Intensa inovação na representação dos direitos da criança foi introduzida pela Convenção

Internacional dos Direitos da Criança de 1989, ratificada pelo Brasil em 1990, porém que já havia

inspirado o artigo 227 da Constituição e a elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente ao

integrarem os direitos de liberdade. A elaboração da Convenção de 1989 se iniciou em 1978, a

partir de proposta do governo polonês para homenagear o centenário do nascimento de Janusz

Korczak, médico, pedagogo polonês, assassinado pelo terror nazista em Treblinka em 1942.

Korczak dirigiu um orfanato, foi escritor de ficção infantil e pedagogo de escol. Suas obras,

originalmente publicadas entre 1920 e 1930, foram redescobertas na Europa nos anos 1970 e

traduzidas no Brasil nos anos 1980.Sua obra de fôlego - Como amar uma criança - contém um

apêndice – O direito da criança ao respeito – no qual critica a Declaração de Genebra (1924) por

não reconhecer à infância direitos de liberdade: “O primeiro e indiscutível direito da criança é o

que lhe permite exprimir livremente suas idéias e de ter participação ativa no debate que

concerne a apreciação de sua conduta e punição” (Korczak, 1929/1983). Antes desta declaração,

em 1915, Korczak já havia incitado a criação da Magna Charta Libertatis da criança (Renaut,

2002).

Assim, sob o patronato de Korczak, a Convenção de 1989 inovou não só por sua extensão

(59 artigos), mas porque reconhece à infância (da concepção até os 18 anos) todos os direitos e

todas as liberdades inscritas na Declaração dos Direitos Humanos. Ou seja, pela primeira vez se

autorgam às crianças (da concepção aos 18 anos) direitos de liberdade, até então reservados aos

adultos. Porém, a Convenção de 1989 reconhece, também, a especificidade da infância,

concepção próxima à do preâmbulo da Declaração de 1959: “a criança, em razão de sua falta de

maturidade física e intelectual, precisa de uma proteção especial e de cuidados especiais,

especialmente de proteção jurídica apropriada antes e depois do nascimento”.

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Analistas da Convenção de 1989 discutem-na especialmente sob duas perspectivas: sua

pretensão universal, mas seu viés ocidentalista captado via ênfase nos direitos individuais

(Boyden, 1997); sua tensão intrínseca, e que complexifica sua compreensão e implementação,

decorrente da promulgação simultânea de direitos à proteção, à provisão e de direitos de

liberdade, expressão e participação, estes últimos até então reservados aos adultos (Soares, 1997;

Renaut, 2002).

O mesmo menor cuja maturidade física e intelectual baseia a proteção à qual tem direito,

parece agora poder ser considerado suficientemente maduro para beneficiar-se das

liberdades de opinião, de pensamento, de consciência ou de associação. Situação estranha,

concordar-se-à, pela confusão e, ao mesmo tempo, pelo sério problema de coerência que

cria na representação de criança que a Convenção subentende (Renaut, 2002, p. 294).

A tensão entre concepções de direitos para a infância observada na Convenção de 1989

tem provocado instigante debate entre filósofos, juristas e sociólogos, especialmente europeus

(Arendt, 1991; Finkielkraut, 1991; O’Neill, 1988; Renaut, 2002; Soares 1997). Deste debate

emergem duas posições: “por um lado, um compromisso entre uma tradição de proteção, fundada

na idéia de educação e de instrução, a única que pode tirar a criança de sua vulnerabilidade para

que tenha acesso à autonomia; por outro, uma corrente defendida pelos ‘artesãos da

autodeterminação’ que pedem uma mobilização em torno dos direitos do homem na criança”

(Théry, 1998, apud Sirota, 2001, p. 20). Ou denominadas mais simplesmente de posições

filosófico-políticas “protecionista” e “liberacionista”. 4

Na Crise da Cultura, por exemplo, Arendt (1991, p. 223-252) considera que o papel da

educação é, simultaneamente, introduzir a criança no mundo, de modo ordenado e progressivo, e

de proteger a criança das vicissitudes do mundo para preservar seu poder de inovar o mundo. “A

linha que separa as crianças dos adultos deveria significar que não se pode nem educar os adultos,

nem tratar as crianças como adultos”. Por seu lado, Finkielkraut (1991) evoca o direito das

crianças à irresponsabilidade.

Reconheço a tensão posta pela Convenção e contribuo neste debate focalizando,

inicialmente, as crianças pequenas, para as quais a configuração dos direitos de liberdade, de

4 A bibliografia em língua inglesa e francesa sobre o debate em torno dos direitos da infância é volumosa, complexa e instigante. Da França, um texto síntese contemporâneo é o livro do filósofo do Direito Alan Renaut (2002) La libération de l’enfant, o qual foi traduzido em Portugal. Da Inglaterra, os dois volumes da coletânea Childrens Rights, editada por Michael Freeman (2004). Em Portugal, uma síntese do debate internacional foi elaborada por Natália F. Soares (1997).

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participação podem assumir contornos surreais nas sociedades contemporâneas. Portanto,

problematizo a unicidade da categoria infância, tendo em vista a desigual visibilidade pública e

distribuição de recursos sociais, econômicos e humanos, para os diferentes sub-grupos etários que

compõem a infância e a adolescência. Percebo os direitos de liberdade como um ideal regulador

das relações adulto-criança no espaço público e na família, que deve ser interpretado à luz da

posição estrutural de subordinação das infâncias, e, portanto, de sua vulnerabilidade nas

sociedades contemporâneas. Em acordo com Soares (2002), diferencio entre vulnerabilidade

inerente a esta etapa da vida da vulnerabilidade estrutural, decorrente da posição socialmente

subordinada da infância, produzida por seu afastamento do poder político, econômico e de

direitos civis. Neste sentido, os direitos de liberdade da infância se vêem também restringidos

pelos riscos reais derivados de nós adultos e das instituições que criamos ao autorgarmos, à

infância, uma posição de subordinação. Porém, reconheço, também, que minhas respostas são

fortemente orientadas por um pragmatismo e que as tensões permanecem. Foram debates como

estes que levaram alguns países, como a França, a retardarem a ratificação da Convenção de

1989.

4. Cenário brasileiro

O Brasil ratificou a Convenção de 1989, rapidamente incorporando seu paradigma no

ECA (Lei Complementar nº 8069/90), primeira lei infraconstitucional aprovada após a

Constituição de 19885. Porém, entre nós, o debate sobre os direitos da criança e do adolescente

(especialmente os subsumidos no artigo 227) não ocorreu entre as posições liberacionista e

protecionista, mas entre as doutrinas da proteção integral (proposta pela Constituição de 1988) e

da situação irregular que orientava o Código de Menores (de 1979), como veremos adiante.

Portanto, no Brasil, quase não se debateu tal tensão: identifiquei apenas na tese de Pinheiro

5 Segundo Bazílio (2003, p. 23), além da Constituição de 1988, o ECA inspirou-se em vários documentos internacionais, a saber: a Declaração dos Direitos da Criança de 1959; as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e da Juventude, Regras de Beijing; Diretrizes da Nações Unidas para a Prevenção da Delinqüência Juvenil; Regras Mínimas das Nações Unidas para Proteção de Jovens Privados de Liberdade, Diretrizes de Riad; Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Crianças. Costa (1990, p. 17 e 18) informa que entidades e movimentos sociais dispunham de informações sobre a Convenção e que se empenharam em introduzir seu enfoque na Constituição de 1988.

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(2006, p. 99) uma breve discussão sobre o tema mediada pelo conceito de cidadania atribuído à

criança e ao adolescente, a partir dos debates que envolveram a Constituição de 1988.6

Com certeza, as condições econômica, sociais e políticas que nos diferenciam do

hemisfério norte, especialmente em decorrência da crise econômica e das políticas de ajuste na

década de 1980 e suas graves implicações na vida de crianças e adolescentes pobres (Chahad e

Cervini, 1988), podem explicar as particularidades dos debates sobre infância brasileira e seus

direitos. De fato, expressivo percentual das crianças brasileira viveram, e ainda vivem, abaixo da

linha da pobreza (Ribeiro e Saboia, 1993; Brasil/IPEA, 2007). Porém, tenho enfatizado a

midiação espetacular da pobreza da infância brasileira (para uso interno e internacional) e que

conduz ao equívoco de ser tratada por metáforas associadas ao abandono familiar e à

delinqüência, atual ou projetada para o futuro, cuja figura privilegiada como emblema, sem ser

problematizada, tem sido o “menino de rua”.

O esforço de sensibilizar a opinião pública quanto à violência a que estão expostas

crianças e adolescentes, principalmente dos países subdesenvolvidos, gerou uma retórica

específica, que vem percorrendo o mundo, e que, no seu esforço de convencimento,

muitas vezes inverossímeis, distantes da realidade, estigmatizadores de famílias, crianças

e adolescentes pobres e inadequadas enquanto balizas para a ação (...) A imagem de

adolescentes pobres que tem alimentado nosso imaginário vem associando os homens à

violência, criminalidade, dependência de drogas e abuso sexual; as mulheres à

promiscuidade sexual, prostituição e abandono de filhos” (Rosemberg, 1994, p. 135 e

151).

Tenho interpretado esta retórica como produção ideológica e estratégia de persuasão na

construção de problemas sociais relacionados à infância pobre para que incitem a atenção pública

nos embates da definição das agendas de políticas sociais (Rosemberg e Andrade, 2007). Tal

retórica, deletéria a meu ver, tem penetrado os movimentos sociais, a mídia, o governo e a

própria academia7. Apreendo esta concepção de infância pobre também na produção em Ciências

Sociais desde a década de 1970, mas culminando na década de 1980, (ab)usando da figura

6 A discussão de Pinheiro (2006, p. 99) recorre ao conceito de cidadania, a partir de Jelin (1994) e Bevenides (1994) e também à curta menção de Zaluar (1994), em Cidadãos não vão ao paraíso, de que o conceito de cidadania não deve ser quando associado à infância e adolescência em decorrência do fato de estarem em socialização, o que lhes retira direitos e responsabilidades. 7 No contexto do NEGRI temos realizado várias pesquisas que focalizam discursos proferidos por adultos sobre temas relacionados à infância pobre, na mídia (Andrade, 2004; Freitas, 2004; Andrade, 2005; Nazareth, 2004; Bizzo, 2008) e na academia (Calazans, 2000).

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metafórica da categoria “meninos de rua”8, e que penetrou os debates na Constituinte. Metáforas

podem orientar práticas sociais, reificar categorias imaginárias, hierarquizar prioridades em

políticas sociais e obter acordos, mesmo que superficiais e temporários.

O processo Constituinte ocupa um lugar especial na memória de várias gerações: “tempos

heróicos” é um dos qualificativos usados para dar conta da vigília cívica e mobilização social,

apesar da composição política do parlamento, de decisões contraditórias, das manobras para

angariar consenso, da conciliação parcial entre agendas díspares. E isto aconteceu nas propostas e

debates em torno dos direitos da infância e da adolescência, apesar de terem sido aprovados sem

emenda e com “absoluta prioridade”.

As plataformas dos partidos políticos compondo a Constituinte, com exceção do PTB

(Partido Trabalhista Brasileiro) e do PDT (Partido Democrático Trabalhista), não mencionaram

cláusulas relacionadas à infância e adolescência (Pinheiro, 2006). Portanto, não é de se estranhar

a similaridade entre as falas sobre a criança abandonada proferidas por parlamentares de

diferentes partidos nos debates constituintes (transcrições extraídas de Pinheiro, 2006, p. 290 e

293).

Valmir Campelo (PFL). Dever sagrado para nós, que somos portadores do mandato

popular, consiste em assumirmos o compromisso de lutar para resolver situação tão

dolorosa, que vai se constituindo em perigo para a sociedade maior. Nossos presídios

estão abarrotados. (...) É até uma vergonha, para nós, pensarmos que as coisas podiam ser

diferentes se tivéssemos no Brasil uma estrutura social mais humana e a criança tivesse o

devido amparo desde a sua mais tenra infância.

Benedita da Silva (PT). É impossível, para nós, nos mantermos calados no exato momento

em que reconhecemos que os chamados pivetes nada mais são do que aquelas crianças

que são filhas de trabalhadores, de trabalhadores que têm contribuído para este País e que

não têm tido, a nível de sua estrutura familiar, uma assistência necessária.

8 Particularmente notável foi o “estudo sociológico sobre a marginalidade e a reintegração social do menor na cidade de São Paulo”, realizado pelo CEBRAP (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), publicado em 1972, cujo título é A criança, o adolescente, a cidade e que tratou de ”menores” institucionalizados, isto é, internados. Também vale destacar o estado das artes de Alvim e Valladares (1988), publicado no BIB (Boletim Informativo das Ciências Sociais) que, ao mesmo tempo em que questiona a produção que usou a categoria “menor”, exclui referências bibliográficas do período que não provinham de mesma matriz discursiva.

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Mauro Sampaio (PMDB). O menor abandonado de hoje será, sem dúvida, o maior

abandonado de amanhã, entregue à marginalidade, de difícil retorno à sociedade.

Precisamos preservar nossas crianças.

A causa da infância entrou na agenda da Constituinte particularmente via movimentos

sociais, entidades de assistência, igrejas, organizações de classe, técnicos e profissionais do setor

público e privado, além do UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância). A mobilização

social organizou-se em torno de duas grandes campanhas de extração diversa – Criança

Prioridade Nacional e Criança e Constituinte –, que deram origem a duas emendas populares,

posteriormente integradas para serem apresentadas ao Congresso Constituinte. Ambas

empregaram o termo cidadania ou cidadão associado às suas propostas para demarcar o novo

lugar político reivindicado para crianças e adolescentes.

A mobilização Criança e Constituinte está na origem da extensão às crianças com menos

de 7 anos do direito à educação, aspecto geralmente omitido nas análises de autores que

focalizam o artigo 227. Identifico sua formulação a partir da segunda metade dos anos 1970,

quando foi se articulando, no país, uma crítica e implantando novas propostas de atendimento à

criança pequena em creche. Remonta ao movimento de mulheres, que se organizava no Brasil a

partir da declaração pela ONU de 1975 como o Ano Internacional da Mulher, e dos movimentos

de luta contra a carestia, que se articularam nos bairros, especialmente da cidade de São Paulo.

Nos bairros, diversas organizações de mulheres se mobilizaram e construíram creches em sistema

de mutirão, recebendo recursos da Prefeitura de São Paulo.9 Iniciou-se, a partir de São Paulo,

uma articulação entre movimento de mulheres/feministas e movimento dos bairros, dando origem

ao Movimento de Luta por Creches, oficialmente criado em 1979, como resolução do Primeiro

Congresso da Mulher Paulista (Rosemberg, 1989). Uma particularidade notável da época, no

movimento de São Paulo, foi a reivindicação por creches públicas, isto é, mantidas e geridas pelo

Estado. A crítica que se fazia era contra o conveniamento do Estado com entidades filantrópicas e

assistenciais, muitas de natureza religiosa. De fato, no Brasil, os programas sociais destinados à

9 Uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a discriminação contra a mulher foi instaurada em 1977, na qual Maria Malta Campos (1977) depôs sobre a situação das creches no país. Trata-se de uma das primeiras manifestações públicas, de caráter nacional, sobre o tema. Apesar de focalizar as mobilizações em São Paulo, o movimento ocorreu em várias cidades do país, como em Belo Horizonte.

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infância e adolescência pobres, muito antes da onda neo-liberal da década de 1990, apoiavam-se

na “participação da comunidade” (Rosemberg, 1997).

O embate do Movimento de Luta por Creches em São Paulo ocorreu com a Prefeitura e

sua reivindicação foi por creches públicas, “diretas”, zelando, também, por sua qualidade,

exigindo padrões na construção, participação na seleção de funcionários, inclusive das diretoras,

um atendimento que não fosse custodial, mas educacional (Rosemberg, 1984, p. 98). Ameaças à

rede de creches públicas que vinha sendo implantada na cidade provocaram a instalação, na

Câmara Municipal de São Paulo, de uma Comissão Especial de Inquérito sobre Creche (CEI) em

1983. Do relatório final da CEI de creches, datado de julho de 1985, que ouviu diversos setores

da sociedade, consta uma proposta para a Constituinte, “a creche como um direito da criança à

educação”.

V – O Direito à Creche

Acreditamos que a creche é um direito da criança, uma extensão do direito universal à

educação, um direito dos pais e um dever da sociedade.

- Propomos que seja definido na Constituição Federal o papel do Estado com relação às

crianças menores de 7 anos, reconhecendo a creche e a pré-escola como fazendo parte

do direito universal à educação (Câmara Municipal de São Paulo, CEI de Creches,

1985, p. 2).

A proposta de vincular as creches à educação decorreu da apreensão do caráter instável da

oferta quando associada ao “alívio” da pobreza ou ao trabalho materno, da ausência de

fiscalização e controle, da baixa qualidade. A área da educação significava um contraponto de

estabilidade, de controle por parte do Estado, bem como de insumos para a criança além de

comer, dormir, tomar banho que marcava o cotidiano das creches custodiais.

Esta proposta foi encampada pelo recém criado CNDM (Conselho Nacional dos Direitos

da Mulher) que endossara, também, a Carta das Mulheres à Assembléia Constituinte, que havia

incluído os chamados temas polêmicos relacionados à vida sexual e reprodutiva. Nesta arena, o

maior embate se deu com a “Igreja Católica contrária ao planejamento familiar e ao aborto, que

pretendia incluir [na Constituição] a proteção à vida desde a concepção” (Leocádio, 2006, p. 85).

Ao participar da rede Criança e Constituinte, o CNDM sustentou a proposta da creche

e pré-escola não só como direito da mãe trabalhadora, mas também da criança à educação. Além

do CNDM, participaram desta rede representantes de sete ministérios, incluindo o Ministério da

Educação (MEC), organizações e entidades da sociedade civil que atuavam na área da infância e

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que organizaram encontros regionais para debater a proposta da emenda popular que adotava a

perspectiva de direitos da Declaração da ONU (Didonet, 1986).

Apesar de contar com a participação de pesquisadoras e ativistas da Educação, a proposta

da creche não era reivindicação prioritária do campo. Ao contrário, desde os anos 1980, os

debates teórico e político de alas progressistas na Educação, especialmente os alinhados à crítica

às teorias reprodutivistas e compensatórias, viam na pré-escola, ao lado de outros programas de

compensação, uma estratégia para “contornar o problema [da democratização] em lugar de atacá-

lo de frente” (Saviani, 1982, apud Campos e Haddad, 1992, p. 16).

Nas mobilizações que ocorreram antes e durante o processo Constituinte, a proposta de

inclusão de creches e pré-escolas no capítulo da Educação também recebeu apoio de várias

entidades advindas do campo da Educação e não suscitou polêmicas na Constituinte. Com efeito,

a Subcomissão da Educação esteve intensamente envolvida com os embates ensino público x

privado, a destinação de recursos públicos e laicidade da educação, o que polarizou constituintes

progressistas e de esquerda versus constituintes do centro e da direita com protagonismo, nas

mobilizações populares, da Igreja Católica (Pinheiro, 1991).

Porém, análise de documentos primários da Constituinte permite apreender que a proposta

de inclusão da creche na Educação, como direito da criança e dever do Estado, não angariava

unanimidade, nem de setores populares que se manifestaram em foruns regionais Criança e

Constituinte, ocorrendo, por exemplo, propostas de extensão da licença maternidade ou

ampliação do salário do pai para que a mãe cuidasse dos filhos (Rosemberg, 1985), nem da

ANPEd (Campos, 1986), refratária à inclusão da creche, mas adepta da inclusão da pré-escola no

sistema de ensino.

Analisei, para este trabalho, o tratamento dado à creche nas emendas propostas por

parlamentares10 constituintes e nas emendas populares propostas por entidades do campo da

Educação. No primeiro caso, notei que a maioria das emendas dos parlamentares focalizara

especialmente a creche como direito associado ao trabalho de mães e pais, poucas se atendo à

creche como direito à educação da criança. No caso das emendas populares vindas da Educação,

pude notar que algumas entidades, especialmente provenientes do setor privado, omitiam a

creche, postulavam a obrigatoriedade de o Estado prover a pré-escola, não como um direito da

criança à educação, mas como medida preventiva ao fracasso escolar: “escolaridade obrigatória a

partir dos três anos principalmente para os carentes e para evitar a vergonhosa repetência na 1ª

10 Os registros de debates e emendas na Constituinte podem ser acionados em Anais e Diários das Assembléias Constituintes pelo site www2.camara.gov.br/publicações

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série do 1º grau” (Federação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino, apud Pinheiro, 1991,

anexo).

Portanto, a aprovação do artigo 208 estava longe de refletir um consenso real. Um

exemplo remarcável é referido por Pinheiro (2006), em excertos das audiências públicas na

Constituinte. De um lado, o depoimento do padre Afonso Pastore (Pastoral do Menor da

Arquidiocese de Vitória), “que tentou deixar claro porque considera que ‘as creches são um mal’”

(p. 332).

A creche de que falamos, no grande Brasil, é uma massificação imensa, é uma massa de

crianças, que vão sendo tiradas das mães subnutridas, dos bóias-frias, desse imenso povão

que está abandonado. Aí está a creche que não tem sentido e é o motivo de as crianças se

tornarem menores abandonados (Brasil, 26.06.87d: 120-1, apud Pinheiro, 2006, p. 332).

De outro, o depoimento de Ana Maria Wilheim, então defendendo a proposta do CNDM

(apud Pinheiro, 2006, p. 334).

O que desejamos ver incorporado nesta Constituição é o direito à creche como um direito

da criança a um atendimento de guarda e educação, necessários na faixa etária em questão.

O deslocamento da ótica aqui proposto se reflete em todo o trabalho que se desenvolve em

prol do desenvolvimento infantil. Entender a creche como um equipamento de guarda e de

educação significa profissionalizar o trabalhador da creche, destinar recursos, investir na

educação, metodologias e no trabalho com a criança.

Assim, muito longe estávamos de ter consenso quanto à universalidade do status jurídico

da infância e adolescência: uma hierarquização por idade e por estrato econômico esteve sempre

presente nos debates.

Bastante diversa foi a composição da outra rede que se mobilizou pela emenda popular

Criança Prioridade Nacional: ela foi articulada por setores sociais que vinham se opondo ao

Código de Menores (de 1979) e à Política de Bem-estar do Menor da FUNABEM (Fundação

Nacional do Bem-estar do Menor). Sua origem remonta à Comissão Parlamentar de Inquérito

(CPI) instituída em 1976 para apurar violência contra o “menor”. A partir do núcleo de críticas da

CPI, o governo militar elaborou, em 1979, um novo Código de Menores (que substituiu o de

1924), celebrando o Ano Internacional da Criança (Custódio, 2008). É o Código de Menores, e

não as Constituições anteriores, o principal antagonista da sociedade civil e de parlamentares que

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se pronunciaram nas propostas e nos debates relacionados ao artigo 227 da nova Constituição.

Isto porque setores considerados progressistas pretendiam, com a nova Constituição, alterar a

doutrina de “situação irregular” que orientava o Código de Menores, para a doutrina de proteção

integral.11 A CPI, cujos resultados foram divulgados no livro A Realidade Brasileira do menor,

adotara o conceito de “abandonado”, “que incluia a extensa categoria daqueles cujos pais não

possuem condições para atender às suas necessidades básicas”, portanto integrando a pobreza.

É sobretudo em torno desta agenda, o combate ao Código de Menores de 1979 e à

concepção de “situação irregular”, que vão sendo criadas organizações da sociedade civil (como

o Movimento em Defesa do Menor, em São Paulo, 1979), bem como a partir da Igreja Católica,

por exemplo, a República do Pequeno Vendedor (em Belém) e a Pastoral do Menor (em 1979).

Em cenário internacional, nota-se intensa mobilização, especialmente pela infância pobre

dos países em desenvolvimento, em decorrência de 1979 ter sido declarado ano Internacional da

Criança. O Papa João Paulo II pronunciara um discurso sobre o tema para o Comitê Europeu de

Jornalistas defensores dos Direitos da Criança, onde exorta a “proteção à vida desde a

concepção” (entenda-se, não à discriminalização do aborto) e a indissolubilidade do vínculo

matrimonial (Vaticano, João Paulo II, 1979).

Também na rasteira do Ano Internacional da Criança, organizações internacionais,

especialmente o UNICEF, focalizaram a atenção nos “meninos de rua”, particularmente no

Brasil. Um grupo de técnicos do UNICEF, da FUNABEM e da SAS (Secretaria de Ação Social),

do então Ministério de Previdência e Assistência Social, iniciaram, em 1982, o projeto

Alternativas de Atendimento a Meninos de Rua, com a participação da FLACSO (Faculdade

Latino-Americana de Ciências Sociais – Brasil). O projeto objetivou identificar, registrar e

divulgar “experiências bem sucedidas de atendimento a meninos e meninas que estavam nas ruas

ou nas comunidades pobres” (Costa, Kayayan, Fausto, 1992, p. 10, grifos meus).

Esse projeto realizou, em 1984, o I Seminário Latinoamericano de Alternativas

Comunitárias de Atendimento a Meninos e Meninas de Rua, ao final do qual organizações da

sociedade civil que desenvolviam tais experiências, em busca de autonomia, criaram, em 1985, o

Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR).12 Também, em 1985, foi criada

a Frente Nacional de Defesa dos Direitos da Criança (FNDC), integrando “setores municipalistas

11 É importante notar que a partir de 1934, as Constituições brasileiras se referem à proteção da criança, especialmente, associada à proteção materna (1934), a filhos de famílias numerosas (1946), à idade limite para atividade laboral (1946 e 1967-1969) e à obrigatoriedade escolar (1967/1969) (Coelho, 1998). 12 Rosa Maria Ferreira, publicou, em 1979, o livro Meninos da rua: valores e expectativas de menores marginalizados em São Paulo, primeira publicação nacional a utilizar a expressão “meninos de rua”.

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progressistas” e articuladora da emenda popular Criança Prioridade Nacional e que, em agosto

de 1986, conclama direitos de cidadania às crianças e aos adolescentes brasileiros.

Com o recuo dos anos, e ao rever a literatura produzida no período e posteriormente,

reconheço nesta rede que sustentou a emenda popular Criança Prioridade Nacional, não só o que

Costa (2005, p. 2) identificou como “um grupo verdadeiramente muito eclético”, mas também

subagendas variadas, convergindo na defesa da infância pobre “abandonada” contra o Estado

totalitário e, diferentemente da proposta do CNDM que reivindicava creches como um dever do

Estado, uma aspiração à participação da comunidade (ver também Pinheiro, 2006).

Quatro emendas populares reafirmam o tema dos direitos da criança e do adolescente não

só no Plenário, mas nas ruas, com a cata de assinaturas em sua defesa onde se destaca o

papel da Igreja Católica, tanto da linha mais tradicional como a Mitra do Rio (emenda PE

007) como da CNBB (emenda PE 0011), mas com o mesmo conteúdo, com ênfase na

defesa da vida contra o aborto” (Faleiros, 1995, p. 85).

De fato, em 1987, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) colocou nas

ruas a Campanha da Fraternidade “Quem acolhe o menor, a mim acolhe” que recebeu mensagem

do Papa João Paulo II (4 de março 1987) conclamando, entre outras, “a solicitude pelo menor –

pela criança, ainda antes do nascimento, desde a concepção”.

O clima de celebração da aprovação da Constituição de 1988 obnubilou a atenção mais

cuidadosa a tensões e conflitos subjacentes à unanimidade das votações. Talvez, ingenuamente,

acreditássemos que teria ocorrido um consenso da sociedade brasileira relativo aos direitos da

criança e do adolescente. Que nossas concepções de infância, de direitos eram compartilhadas.

Porém, os conflitos ali se manifestavam. Com efeito, Ângela Pinheiro (2004, 2006), atenta ao

distanciamento entre “os direitos legais e os direitos efetivos da criança e do adolescente no

Brasil” (p. 27), revisitou, entre outros, os discursos sobre infância que circularam na e durante a

Assembléia Nacional Constituinte à luz da teoria de representação social.

Ao analisar os discursos dos parlamentares, Pinheiro (2006) observou que os

“pronunciamentos dos constituintes não necessariamente expressam concepções ‘oficiais’ de seus

partidos sobre a criança e o adolescente, revelando mediações oriundas do seu lugar social, ou de

vinculações com a militância em defesa aos direitos da criança e do adolescente” (p. 347). Para

Pinheiro (2006), o tema mereceu atenção secundária entre os constituintes, o que teria levado

seus defensores a utilizar “argumentos tentando contribuir para que a questão recebesse (...)

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atenção diferenciada” (p. 348), o que surtiu efeito, pois a proteção integral à criança e ao

adolescente foi o único artigo que recebeu o qualificativo de absoluta prioridade. Os discursos

predominantes, que sustentaram argumentos dos parlamentares, “apontam para duas recorrentes

configurações da proteção em articulação com o controle e disciplinamento: proteger a criança e

o adolescente para, no futuro, contribuírem na construção da nação; e para evitar que,

futuramente, incorram na delinqüência” (p. 349). Observou, também, um uso recorrente de

referências a crianças pequenas associadas à desproteção.

Do lado dos discursos proferidos no contexto das emendas populares, Pinheiro (2006)

identifica predominância da representação “criança e adolescente como sujeitos de direitos”, por

vezes associada, também, à representação de proteção. Para a autora, este foi o discurso

prevalente durante a Constituinte – crianças e adolescentes como receptáculos de proteção –

apesar de o texto ter consagrado o paradigma da criança e do adolescente como sujeito de direitos

universais e que respeitem sua peculiar condição de pessoa em desenvolvimento, acolhendo,

então, a tensão entre direitos de proteção e direitos de liberdade da Convenção de 1989.

Como implantar na prática, e com sucesso, uma doutrina de proteção integral de direitos

universais à infância e adolescência, uma ética que reconhece crianças e adolescentes como

atores sociais contando com representantes dos partidos políticos, das comunidades, das igrejas

expressando concepções tão diversas, sustentadas por agendas, por vezes, antagônicas? Penso

que a implementação da Constituição responde, em parte, à questão.

4. A implementação da Constituição 1988

A regulamentação da Constituição de 1988 em leis ordinárias, e assim viabilizar a

implementação de políticas sociais em consonância com os novos direitos da criança e do

adolescente, seguiu caminhos diferentes no que diz respeito ao inciso IV do artigo 208 e do artigo

227: os embates da educação infantil ocorreram em torno das instâncias educacionais e

organizações multilaterais; a operacionalização do artigo 227 redundou na elaboração e

aprovação do ECA e sua implementação.

Logo após a aprovação da Constituição, participei de uma equipe, na Fundação Carlos

Chagas que elaborou o documento Aspectos sócio-educativos e sugestões para uma política de

educação da criança de zero a seis anos no Brasil (Campos, Rosemberg, Ferreira, 1989). Ali

levantávamos as tensões que iríamos enfrentar na implantação dessa política desdobrada a partir

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da Constituição de 1988. Entre outros, destacávamos o embate qualidade x extensão do

atendimento, a questão dos recursos e a oposição de setores da educação hostis à inclusão das

creches no sistema educacional. Tais previsões se confirmaram acrescida de outra: o modelo neo-

liberal de política macroeconômica com seu impacto na estratégia de focalização das políticas

sociais iniciado pelo governo Collor de Mello. Recuperando memória e revendo textos, resumo

minha visão do período.

No campo da educação infantil, a COEDI (Coordenação da Educação Infantil), do MEC,

iniciou, desde o governo Itamar Franco, uma série de iniciativas, com apoio de técnicos e

representantes da sociedade civil, visando a integração da EI ou das creches no sistema

educacional. A cada etapa da implementação do plano, o consenso constitucional se desfazia e

enfrentávamos dissensos, defesas corporativas, concepções naturalizadas sobre criança pequena e

sua educação. No plano administrativo, tudo estava por ser feito e foi sendo paulatinamente

realizado: definição de uma política nacional para a educação infantil (MEC, 1993); inclusão de

creches e pré-escolas nos sistemas nacionais de estatística (o que ocorreu no IBGE a partir de

1995); definição de critérios básicos de qualidade para funcionamento de creches e pré-escolas;

formação de pessoal para trabalhar nas creches, entre outros. Na implantação dessas medidas,

ocorreram tensões, inicialmente, entre as instâncias administrativas da educação e da assistência

social que, com a inclusão de creches e pré-escolas no sistema educacional, “temiam perder” um

filão importante de sua ação. Tensão corporativista que atingia não só os profissionais, mas

também o executivo (a Legião Brasileira de Assistência era importante instância na política

conveniada de creche) e as entidades conveniadas que permaneciam sob a responsabilidade

administrativa da assistência. Os embates entre educação e assistência permaneceram até a

extinção da LBA (1995) e a aprovação da LDB (1996).

Ocorreu, também, durante os anos 1990, uma alteração dos atores sociais envolvidos:

retração do movimento de mulheres/feminista, agora mais envolvido com uma agenda identitária

(Rosemberg, 2003); fortalecimento do debate no campo da Educação, agora às voltas com a

elaboração da LDB (aprovada apenas em 1996) e com o “pacote” de medidas neo-liberais

decorrentes do Consenso de Washington; o fortalecimento das instituições multilaterais,

UNICEF, UNESCO e Banco Mundial, que, na área da educação, priorizaram o ensino

fundamental, preconizando para a creche modelos a baixo custo, de educação das mães, ao invés

da expansão de vagas.

As ações capitaneadas pelo MEC também fortaleceram técnicos, especialistas e

pesquisadores (em sua maioria mulheres), em sua maioria provenientes do campo da Educação,

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que encontraram na ANPEd (Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação)

um espaço de organização, em torno do Grupo de Trabalho “Educação da Criança de 0 a 6 anos”.

O campo se expandiu, o número de pesquisas, estudos, palestras, assessorias aumentou, se

legitimou e institucionalizou. Novas disputas e tensões foram se configurando, a partir de

divergências teóricas e político-partidárias. Ao final dos anos 1990, foi formalizado o Movimento

Interforuns de Educação Infantil (MIEIB), que teve atuação notável no plano da mobilização

social, para que a Lei do FUNDEB (2006) incluísse as creches, contrariamente à proposta do

Governo Federal (administração Luiz Inácio Lula da Silva) e dos governos estaduais.

Participei ativamente de cada uma dessas etapas, em governos diferentes, com

interlocutores diferentes, enfrentando, constantemente, resistências à incorporação das creches no

sistema educacional, que excluiam as crianças pequenas do direito à educação, privilegiavam

propostas familiaristas incompletas a baixo investimento do Estado em seu custeio, refratárias à

melhoria de sua qualidade, da formação de seu pessoal. Recorri ao mito de Sísifo, como

metáfora, para caracterizar este período de implementação de uma política nacional do direito à

educação de crianças pequenas no Brasil (Rosemberg, 2005).

De forma recorrente, instâncias do governo federal, nas duas últimas administrações

(FHC e Lula), elaboraram propostas que excluíram a creche do sistema educacional, voltando à

antiga concepção assistencialista (combate à pobreza), por vezes acoplada a um enfoque

familiarista, recomendando que a educação e o cuidado da criança pequena ficasse sob a

responsabilidade da “família” (isto é, mães), investindo na educação dos “pais” (isto é, mães)

com recursos do orçamento da educação infantil. Nesta empreitada, as propostas federais foram

geralmente subsidiadas pelo UNICEF e Banco Mundial. Isto ocorreu com a proposta da Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), isto aconteceu com proposta de Emenda

Constitucional – PEC nº 233-A/95 que instituiu o FUNDEF (Fundo de Manutenção e

Desenvolvimento do Ensino Fundamental), com o Plano Nacional de Educação (aprovado em

2001), com a proposta do Plano Plurianual do primeiro governo Luiz Inácio Lula da Silva

(2003), com a proposta da lei do FUNDEB (aprovada em 2006).

Por exemplo, destaco a PEC nº 233-A/95 (governo Fernando Henrique Cardoso), pacote

encaminhado pelo Governo Federal ao Congresso Nacional para emendar a Constituição na área

da Educação e que incluiu a criação do FUNDEF. Tal proposta previa progressiva

universalização dos ensinos médio e pré-escolar gratuitos e retomava a idéia de “oferta gratuita

de creche a crianças de zero a três anos, com prioridade para população de menor renda”. Jogo de

sedução ao oferecer gratuidade condicionada à focalização em segmentos sociais de menor renda.

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Ainda na administração FHC, o Plano Nacional de Educação aprovado em 2001, além de separar

as metas para creches e pré-escolas, novamente descaracterizava as creches como instância

educacional para todos, definindo seus objetivos “para atender famílias que não possuem

condições de fornecer cuidados necessários às crianças...” (PNE, p. 15, apud Rosemberg, s/d). O

Plano Plurianual do primeiro governo Lula, previa o fornecimento de “bolsas pré-escola” para

que mães permanecessem em casa com suas crianças pequenas oferecendo-lhes estimulação.13

Vale destacar o papel dos governos federal e estaduais no emperramento para a inclusão das

creches no FUNDEB, durante suas discussões entre 2005 e 2006. Conforme relatório da Rede de

Monitoramento Amiga da Criança (2006),

O executivo não priorizou a discussão e aprovação dessa emenda constitucional nas suas

articulações com o Parlamento fazendo com que o processo avançasse muito lentamente

(...) Faltou, por parte do governo federal, empenho na proposta original do FUNDEB,

especialmente no que diz respeito à consideração das crianças de 0 a 3 anos de idade (...)

Houve intensa resistência dos governos estaduais à inclusão das creches no Fundo, sob a

alegação de não aumentar o montante de recursos que este ente federado seria obrigado a

redistribuírem com os municípios. Persistiram, no governo central, teses que defendem a

focalização das políticas sociais, refletindo no modelo de atendimento das creches (p. 42).

Finalmente, com pressão da sociedade, as creches foram incluídas no FUNDEB, porém os

fatores de ponderação para distribuição dos recursos e os valores previstos per capita variam

conforme o nível de ensino, tanto mais alto quanto mais velho o aluno.

Assim, o relatório final de avaliação da educação infantil brasileira, efetuado pela

UNESCO em colaboração com a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento

Econômico) e aprovado pelo MEC (UNESCO/OECD, 2005), em consonância com estudos

nacionais, aponta as debilidades na implementação da política de educação infantil. A despeito do

intenso progresso no plano legal e administrativo, as debilidades se traduzem na lenta progressão

da expansão para crianças de 0 a 3 anos, sua intensa iniqüidade que penaliza as crianças de

famílias com rendimento per capita inferior, padrões de qualidade insuficientes, problemas

decorrentes, em boa parte, da insuficiência e descontinuidade de recursos federais e estaduais e

da diversidade da gestão municipal na medida em que o município é o ente federado diretamente

responsabilizado pela oferta e regulamentação da educação infantil.

13 Este modelo foi proposto pelo então ministro Cristovan Buarque.

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Quanto a artigo 227, logo após a promulgação da Constituição, os grupos permaneceram

mobilizados para a elaboração da legislação infraconstitucional que o regulamentasse. Em meio a

debates, envolvendo, agora, mais intensamente juristas, foi elaborado e aprovado o ECA,

sancionado por Collor de Mello que, em seu discursos, encaminhou a criação do Ministério da

Criança.

Talvez, não se disponha, no Brasil, de lei mais decantada que o ECA: “moderno”,

“revolucionário”, “progressista”, “um baluarte na defesa da igualdade e universalidade de

direitos”, “modelo para o mundo” são algumas expressões que vêm sendo usadas nas celebrações

anuais de seu aniversário. Foi divulgado para crianças e adolescentes usando personagens

populares de história em quadrinhos, cantado em samba enredo, será disciplina obrigatória no

ensino fundamental. Porém, é atacado pela direita a cada vez que a mídia noticia crimes

praticados por adolescentes. Tenho encontrado poucos estudos analíticos que refletem sobre suas

tensões intrínsecas. As dificuldades detectadas em sua implementação de fato, dificuldades

atestadas pelos indicadores desfavoráveis relacionados à condição de vida de crianças e

adolescentes, são geralmente atribuídas à retração econômica instaurada com o governo Collor.

Porém, alguns autores (Adorno, 1993; Bazílio, 2003) tratam, sem paixão, de suas fragilidades

intrínsecas.

Sergio Adorno (1993) aponta que

O Estatuto se revela mais preocupado em proteger os adolescentes autores de infração à

lei penal do que as crianças e adolescentes em situação de risco. Neste particular, o texto

legal limita-se a reafirmar os princípios constitucionais que lhes conferem direitos à vida,

à saúde, á alimentação, à educação, ao lazer ... (p. 110).

Bazílio (2003) destaca as conseqüências do embate para sua formulação ter se dado no

confronto com o Código de Menores de 1979 e o Judiciário. “No bojo da crítica às instituições de

atendimento, o Judiciário e o Ministério Público não foram poupados” durante as discussões que

conduziram à formulação do ECA, em decorrência da participação de alguns de seus membros na

elaboração do satanizado Código de Menores. Assim, a antiga “lei e seu principal guardião

(Judiciário)” foram tratados como vilões e a palavra de ordem “do grupo hegemônico” de

sustentação da nova lei foi desjudicializar (Bazílio, 2003, p. 36 e 37).Tal desjudicialização

acabou gestando uma complexa estrutura para implementação do Sistema de Garantias de

Direitos da criança e do adolescente: em nível federal e estadual, o Conselho de Direito da

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Criança e do Adolescente; e em nível municipal, além deste, o Conselho Tutelar, “nova figura

desta política setorial” e principal responsável pelas medidas preventivas (...) que “seriam

determinadas não na esfera dos tribunais, mas nos bairros, próximos à população, sob

responsabilidade de cidadãos que desempenharam esta função social relevante” (Bazílio, 2003, p.

37). Além disso, a extinção da FUNABEM e seu sucessor, o CBIA (Centro Brasileiro da Infância

e Adolescência), não foi compensada por uma instância no executivo capaz de articular a

implantação de políticas integradas para a infância e adolescência. O Conselho Nacional dos

Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), de configuração paritária (Estado e

sociedade civil), não seria suficiente para orquestrar, no plano do executivo, uma política

nacional para a infância (Bazílio, 2003). Para o autor, os Conselhos Tutelares foram implantados

sem que tivesse ocorrido um amadurecimento das reflexões e práticas que os sustentassem.

Para se formar uma idéia mais concreta sobre os conselhos é necessário descrever, mesmo

que brevemente, como foi prevista a operacionalização da doutrina de proteção integral à criança

e ao adolescente. Tal doutrina é materializada no Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do

Adolescente, que, por sua vez, prevê uma política de atendimento que articule ações

governamentais e não-governamentais nas três esferas de governo. São três os eixos do Sistema

de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente: a promoção, o controle social e a defesa dos

direitos. Para articular estes eixos foram previstos dois tipos de conselho: os Conselhos de Direito

da Criança e do Adolescente (federal, estadual e municipal), que fazem parte do executivo, são

compostos por representantes do governo e da sociedade civil e atuam nos três eixos, sendo,

portanto, responsáveis pela formulação de políticas, monitoramento do atendimento e controle

das operações de um fundo; o Conselho Tutelar, órgão permanente e autônomo, é circunscrito

aos municípios, seus membros são eleitos, tendo por função zelar pelos direitos da criança e do

adolescente.

A cada ano do ECA, as avaliações disponíveis referem-se ao lento processo de

implantação dos conselhos que, conforme a lei, deveriam ser instalados em todos os municípios.

A última informação de que dispus, arrolava sua presença em todos os estados, no distrito federal

e em 90% dos municípios. Peça chave na implementação dos direitos da infância e adolescência,

os conselhos, especialmente os municipais, têm sido objeto de vários estudos locais (Baccini,

2000; Bazílio, 2003; Souza, 2005; Mello, 1999, entre outros) e uma importante pesquisa

nacional.

Inicio por avaliações locais: sobre o Rio de Janeiro, Bazílio (2003) efetuou uma síntese

das dificuldades enfrentadas pelos Conselhor Tutelares a partir de pesquisa realizada no Rio de

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Janeiro em 2001: falta de estrutura física, material e de apoio “para atender à real demandas das

violações dos direitos”; “ausência de capacitação e/ou qualidade dos treinamentos oferecidos”;

“questões relativas à representação política do conselheiro” em decorrência da “baixa

participação da população”; “falta de retaguarda ou estrutura de apoio”; “excesso de solicitações

de demanda direta”, “de balcão” que prejudicam a fiscalização das entidades responsáveis pelo

atendimento direto.

De fato, em decorrência do modelo descentralizado com participação da sociedade,

defendido na Constituinte e incorporado pelo ECA, o papel do Estado na oferta de serviços

diretos à população foi redimensionado, repassando às entidades sociais, agora denominadas

ONGs, tal atribuição. “Acompanha-se o novo direcionamento internacional para as políticas

sociais com redução no investimento estatal e ampliação na participação filantrópica da

sociedade com apoio nas iniciativas empresariais” (Passetti, 2004, p. 367).

Para Bazílio (2003, p. 41), a escassez de recursos centrais acabou tornando a “rede de

proteção” obra de ficção e mais, gera competição e disputas entre entidades da sociedade civil,

antes congregadas por cultura de solidariedade.

Em plano nacional vale destacar a recente pesquisa Conhecendo a realidade realizada

pelo Centro de Empreendedorismo Social e Administração em Terceiro Setor da Fundação

Instituto de Administração (CEATS), em parceria com a Secretaria Especial dos Direitos

Humanos do Ministério da Justiça e o CONANDA entre fevereiro e setembro de 2006. Os

resultados da pesquisa referem-se a um questionário respondido por 96% dos Conselhos

Estaduais, 71% dos Conselhos Tutelares e 49% dos Conselhos Municipais. Seus resultados são

interessantíssimos e mostram a complexidade de seu funcionamento e aprimoramento. Destacarei

parte da síntese.

“De acordo com o levantamento, os conselheiros julgam-se pouco eficientes em funções

estratégicas como elaborar diagnósticos” (CEATS, 2006, p. 7-8). Notaram: uma minoria de

diagnósticos locais precisos referentes à situação da população infanto-juvenil; diagnósticos que

podem estar comprometidos com as tendências político-partidárias de grupos no poder;

servidores públicos participando dos conselhos como se fossem representantes da sociedade civil;

"mobilização dos cidadãos menos intensa e espontânea do que se pressupunha quando de sua

concepção” (p. 380); apenas um pouco mais da metade dos Conselhos Estaduais elaborou política

estadual de defesa dos direitos da criança e do adolescente; a média mensal de dedicação dos

conselheiros municipais é de cinco horas; apesar de um sofisticado sistema de informação ter

sido elaborado (SIPIA), ele foi instalado em dois quintos dos municípios mas opera apenas em

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um quinto deles; número insuficiente de entidades para dar conta das demandas locais;

dificuldade de captação e gestão dos Fundos, entre outros.

Em suma, um sistema operando com dificuldade. Porém, dentre as informações da

pesquisa, a que maior impacto me causou, foi a intensa concordância, tanto nos Conselhos de

Direito (índice 0,74), quanto nos Conselhos Tutelares (0,8%?) que as transgressões mais

freqüentes aos direitos de crianças e adolescentes são o uso de álcool, droga e a gravidez

adolescente. Ou seja, os problemas relacionados às políticas setoriais – educação, saúde, lazer etc

-, e que deveriam ser centrais em uma política pública de direitos da criança e do adolescente são

suplantados pela dupla sexo e droga. Sem descartar a possível seriedade destes problemas,

destaco suas particularidades relacionadas, historicamente, ao campo do “desvio” de

comportamento de adolescentes, indicando, a meu ver, um olhar mais atento a uma faixa etária

(adolescentes) cuja visibilidade pública é dada pela preocupação com a “moral e os bons

costumes”.

Os debates em torno dos novos direitos da criança e do adolescente, cristalizados, no

Brasil, no processo Constituinte, posteriormente pelos debates sobre o ECA e sobre a Convenção

de 1989, colocaram na roda velhos e novos discursos sobre a infância e ampliaram sua adesão.

Dificilmente, hoje, no Brasil, alguém sustentaria uma posição contrária ao reconhecimento da

proteção a crianças e adolescentes. Empresto de Moraes e Carvalho (s/d, p. 6) uma reflexão que

efetuaram a partir de entrevistas com informantes privilegiados cariocas na área de

implementação do ECA:

Os sentimentos que têm fornecido a base de sustentação social e jurídica do ECA são

solidários e altruístas, atravessam todo o campo de atendimento e têm sido, de maneira

genérica, representados pela idéia de que “todos precisam fazer algo pelas nossas crianças

e jovens” (...) Os ideais de luta pela garantia de direitos de cidadania da criança e do

adolescente muitas vezes se configuram ou se confundem com idealizações evocadoras,

tais como aquelas que se referem aos objetivos de “imunização do sofrimento” e de

“salvação de crianças e jovens para um futuro digno” (grifo no original).

Identifico a popularização deste discurso na sociedade brasileira atual, em forma de

sensibilidade epidérmica, orquestrada pela mídia, indústria do espetáculo, agências multilaterais,

novas organizações da sociedade civil, fundações, acadêmicos e governos. Assistimos ao que

Pereira (2005) intitula “a criança como o centro do espetáculo da compaixão” (p. 56), que deglute

discursos e práticas em defesa da infância e adolescência. Aqui desfilam os mais de 20 anos do

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Criança Esperança (Rede Globo em parceria inicial com UNICEF e posteriormente com

UNESCO), o marketing social em novelas (a adoção de um menino negro e “abandonado” por

um par de lésbicas), a criação de fundações e ONGs por celebridades para atender as crianças

pobres, a concessão de prêmios, selos e outros distintivos para a empresa, o jornalista, o prefeito,

o presidente, todos amigos da criança. A infância pobre dos países pobres apela benevolência

(“faça feliz uma criança brasileira por U$ X”), empresta glamour a celebridades (Freitas, 2004): a

princesa Diane visita “os meninos de rua” da Praça da Sé em São Paulo (Andrade, 2005). A

mídia noticia relatórios do UNICEF sobre mortalidade infantil no Brasil, publica fotos de

governantes carregando crianças, e nós todos clamamos por justiça diante de uma criança morta.

Mas poucos de nós sabemos e nos indignamos, inclusive conselheiros tutelares e dos direitos da

criança e do adolescente, com o fato de que, depois de quase 20 anos da promulgação da

Constituição, o congresso brasileiro finalmente estipulou que uma criança na creche vale, em

tempo integral por ano, no máximo R$ 2.830,00 e no mínimo R$ 1.251,03.

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