EFEITOS OBJETIVOS DO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO · do Superior Tribunal de Justiça e do...

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// Revista da Faculdade de Direito // número 1 // primeiro semestre de 2014 222 EFEITOS OBJETIVOS DO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Fábio Victor Da Fonte Monnerat* *.Mestre em Direito Processual Civil pela PUC-SP. Especialista em Direito Proces- sual Civil pela PUC-SP. Professor de Direi- to Processual Civil da Universidade São Judas Tadeu – USJT. Procurador Federal, Diretor da Escola da Advocacia-Geral da União em São Paulo. Sumário INTRODUÇÃO. 1. O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA UNIFORMIZAÇÃO DA APLICAÇÃO DO DI- REITO. 2. O RECURSO EXTRAORDINÁRIO ENQUANTO RECURSO DE ESTRITO DIREITO. 3. ANÁLISE E RECO- NHECIMENTO DA REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 3. 1. REPERCUSSÃO GERAL: CONCEITO E CARACTERIZAÇÃO. 3.2. PROCEDIMENTO DE RECONHECIMENTO E DECLARAÇÃO DA PRESEN- ÇA DA REPERCUSSÃO GERAL NO ÂMBITO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 3.3. EFEITOS DA DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE A PRESENÇA DA REPERCUSSÃO GERAL. 4. ATUAL TENDÊNCIA DE OBJETIVAÇÃO DAS DECISÕES EM SEDE DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 5. MECANISMOS DE APLICA- ÇÃO DO ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ACERCA DA EXISTÊNCIA OU INEXISTÊNCIA DA REPERCUSSÃO GERAL AOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS QUE ENVOLVAM A MESMA QUESTÃO CONSTI- TUCIONAL. 5.1. ESPECIALMENTE SOBRE O PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DA REPERCUSSÃO GERAL NOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS REPETITIVOS (ART. 543-B DO CPC).

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EFEITOS OBJETIVOS DO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIOFábio Victor Da Fonte Monnerat*

*.Mestre em Direito Processual Civil pela PUC-SP. Especialista em Direito Proces-sual Civil pela PUC-SP. Professor de Direi-to Processual Civil da Universidade São Judas Tadeu – USJT. Procurador Federal, Diretor da Escola da Advocacia-Geral da União em São Paulo.

SumárioINTRODUÇÃO. 1. O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA UNIFORMIZAÇÃO DA APLICAÇÃO DO DI-

REITO. 2. O RECURSO EXTRAORDINÁRIO ENQUANTO RECURSO DE ESTRITO DIREITO. 3. ANÁLISE E RECO-

NHECIMENTO DA REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 3. 1. REPERCUSSÃO GERAL:

CONCEITO E CARACTERIZAÇÃO. 3.2. PROCEDIMENTO DE RECONHECIMENTO E DECLARAÇÃO DA PRESEN-

ÇA DA REPERCUSSÃO GERAL NO ÂMBITO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 3.3. EFEITOS DA DECISÃO

DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE A PRESENÇA DA REPERCUSSÃO GERAL. 4. ATUAL TENDÊNCIA

DE OBJETIVAÇÃO DAS DECISÕES EM SEDE DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 5. MECANISMOS DE APLICA-

ÇÃO DO ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ACERCA DA EXISTÊNCIA OU INEXISTÊNCIA DA

REPERCUSSÃO GERAL AOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS QUE ENVOLVAM A MESMA QUESTÃO CONSTI-

TUCIONAL. 5.1. ESPECIALMENTE SOBRE O PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DA REPERCUSSÃO GERAL NOS

RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS REPETITIVOS (ART. 543-B DO CPC).

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INTRODUÇÃO

Uma dificuldade constante e onipresente em todo

sistema jurídico consiste na potencial existência

de interpretações e aplicações conflitantes de

uma mesma norma jurídica pelos diversos órgãos do Po-

der Judiciário.

Trata-se de um problema que se coloca mesmo nos ordena-

mentos jurídicos mais simples e que, potencialmente, pode

ocorrer, por mais claro e preciso que seja o texto da normativo.

Entretanto, por mais que este fenômeno denominado “dis-

persão jurisprudencial” seja, em um primeiro momento,

previsível e até aceitável pelo Direito, dada as diferenças

culturais, sociais, políticas e até mesmo ideológicas exis-

tentes entre os membros do Poder Judiciário, responsáveis

por aplicar isonomicamente a norma ao caso concreto, fato

é que, o sistema jurídico deve estabelecer mecanismos,

isto é, técnicas processuais e órgãos competentes, para

combater ou evitar esta indesejável, ainda que a priori, pre-

visível, diversidade de entendimentos.

Muitos ordenamentos, entre os quais o brasileiro, procuram

combater esta divergência através do estabelecimento da

função nomofilácica de órgãos jurisdicionais de jurisdição

superior, no caso do Brasil, o Supremo Tribunal Federal, em

matéria constitucional e o Superior Tribunal de Justiça, no

caso de legislação infraconstitucional1.

O objetivo do presente trabalho é analisar a função nomofi-

lácica do Supremo Tribunal Federal, em especial a exercida

pela Corte Suprema no julgamento dos recursos extraordiná-

rios, uma, dentre outras técnicas processuais, aptas a viabili-

zar o exercício pelo STF de sua função constitucional2.

A par disso, tentará se demonstrar que, decorre das nor-

mas constitucionais que desenham esta função dos tribu-

nais superiores, a necessidade de respeito aos precedentes

formados nesta instância, devendo haver portanto, uma

necessária observância dos precedentes formados pelo

Supremo Tribunal Federal, ainda que em sede de recurso

extraordinário, mecanismo, típico do controle difuso de

constitucionalidade e por isso, a priori, voltado a surtir efei-

tos intra partes.

Assim, a partir da análise da missão constitucional do

Supremo Tribunal Federal e do recurso extraordinário,

procurar-se-á demonstrar a tendência de objetivação

deste mecanismo recursal, cujo julgamento é capaz de

gerar efeitos ‘pan-processuais’, para fora dos autos em

que eles se formaram, o que aproxima os efeitos do jul-

gamento do recurso extraordinário daqueles tipicamen-

te previstos para os pronunciamentos gerados pela via

da ação direta, que viabiliza o controle concentrado de

constitucionalidade.

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Neste contexto, uma das principais questões, que será en-

frentada adiante, é saber se o precedente formado pelo Su-

premo Tribunal Federal em sede de julgamento de recurso

extraordinário, possui efeitos erga omnes e vinculantes, tal

como expressamente previsto nas hipóteses de entendi-

mentos consagrados via ação direta de constitucionalidade

e súmula vinculante.

Conforme se verá adiante, autorizada doutrina, a partir de

uma interpretação sistemática, entende que o precedente

formado no julgamento do recurso extraordinário também

possui efeito vinculante, tendência igualmente sentida na

jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que faz expres-

sa referência aos efeitos objetivos do julgamento em sede

de controle difuso.

Entretanto, a mesma jurisprudência do Supremo Tribunal

Federal nega o cabimento da Reclamação, instrumento de

cassação tipificado para atacar uma decisão judicial que

contrarie entendimento proferido em sede de ação de con-

trole concentrado ou consagrado em súmula vinculante.

É de se ressaltar que o novo Código de Processo Civil

(PL nº 8.046/2010) prevê a superação desta questão, ao

dispor expressamente (art. 1.000, inc. IV c/c 522, inc. II)

que é cabível a reclamação contra decisão que contrarie

entendimento consagrado em sede de julgamento de re-

curso extraordinário o que aproximará, ainda mais, os efei-

tos deste julgamento dos institutos da súmula vinculante

e ações de controle concentrado de constitucionalidade

fato que, a partir de uma interpretação sistemática, que

leva em conta, especialmente, o papel do Supremo Tribu-

nal Federal e do recurso extraordinário, à luz da doutrina

e jurisprudência atuais, já pode ser constatado a teor da

legislação vigente.

1. O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NA

UNIFORMIZAÇÃO DA APLICAÇÃO DO DIREITO

Criado em 1828 como Supremo Tribunal de Justiça, o

Supremo Tribunal Federal é o órgão de cúpula do Poder

Judiciário, cabendo-lhe entre diversas competências ex-

pressamente previstas na Constituição Federal a guarda da

constituição, através do controle concentrado e difuso de

constitucionalidade, esse último, via recurso extraordinário

(art. 102, inc. III, da Constituição Federal).

Até o advento da Constituição de 1988 cabia ao Supremo

Tribunal Federal, via recurso extraordinário, uniformizar a

interpretação e aplicação de todo o direito federal, constitu-

cional e infraconstitucional

A partir da Constituição Federal de 1988, com a criação

do Superior Tribunal de Justiça e do recurso especial, o re-

curso extraordinário de competência do Supremo Tribunal

Federal passou a ser cabível apenas em matéria constitu-

cional, deixando portanto, o Supremo de ter competência

para dar a última palavra em matéria de direito federal infra-

constitucional.

Portanto, no atual sistema constitucional, cabe ao Supremo

Tribunal Federal, afora casos excepcionais de competência

originária e recursal ordinária expressa e exclusivamente

previstos na Constituição, decidir apenas questões consti-

tucionais, exercendo o controle de constitucionalidade das

leis e das decisões judiciais.

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A necessidade de controle de constitucionalidade das leis

e dos atos normativos infraconstitucionais decorre do fato

de, no Brasil, a Constituição possuir natureza rígida.

Por Constituição rígida, deve-se entender o sistema que se

caracteriza por uma supremacia das normas constitucionais

sobre as demais normas integrantes do direito positivo, que

só podem ser alteradas por um processo legislativo mais so-

lene e dificultoso do que o existente para edição das demais

espécies legislativas. Dada essa supremacia das normas

constitucionais, aquelas que a contrariem material ou formal-

mente não são tidas como aptas a integrar o direito positivo.

Desta feita, duas formas de inconstitucionalidade podem

ocorrer: a inconstitucionalidade formal, que se caracteriza

por ser um desrespeito ao processo legislativo estabelecido

pela Constituição; e a inconstitucionalidade material, que

ocorre nos casos em que o conteúdo do preceito legislativo

contraria um preceito ou um princípio da Constituição3.

Como o ordenamento jurídico impõe a necessidade de ob-

servância da Constituição Federal para validade das nor-

mas jurídicas infraconstitucionais editadas, faz-se necessá-

ria a existência de mecanismos aptos a realizar o controle

de constitucionalidade.

Tal controle, segundo a melhor doutrina4, pode ser: a) pre-

ventivo, ou seja, realizado antes da entrada da lei em vigor,

pelo Poder Executivo através do veto presidencial, e pelo

Poder legislativo, via Comissão de Constituição e Justi-

ça; e b) repressivo, sem dúvidas o predominante no direito

brasileiro, realizado pelo Poder Judiciário após a entrada

da lei em vigor.

O controle de constitucionalidade repressivo pode ser feito

de duas formas distintas: via controle difuso ou via controle

concentrado.

Pelo primeiro, via recurso extraordinário, o Supremo Tribunal

Federal julga a constitucionalidade da decisão judicial, apre-

ciando a aplicação da lei ao caso concreto. Nessas hipóte-

ses, o julgamento do recurso pelo Supremo Tribunal Federal

também cumpre um importante papel na uniformização da

interpretação e aplicação das normas constitucionais.

O controle difuso nasceu da construção jurisprudencial

no direito norte-americano e foi incorporado no Brasil

pela Constituição de 1891, fortemente influenciada pelo

direito constitucional daquele país. Grosso modo, pode

ser caracterizada pela possibilidade de qualquer órgão

do Poder Judiciário poder declarar a incompatibilidade

de lei ou ato normativo infraconstitucional com a Consti-

tuição Federal.

Essa declaração de inconstitucionalidade no caso concre-

to pode ser realizada, em primeiro grau de jurisdição, por

qualquer juiz; e, em segundo grau, em virtude do art. 97 da

Constituição Federal, somente pode ser declarada pelo ple-

nário ou órgão especial do tribunal, sendo declarada pela

maioria dos desembargadores.

Caso a inconstitucionalidade tiver sido declarada pelo ple-

nário do supremo Tribunal Federal, via recurso extraordiná-

rio, e caso essa declaração tenha se dado pela maioria dos

seus membros, será dispensável a observância da regra de

reserva do plenário pelos tribunais de 2º grau de jurisdição,

podendo ser declarada pela câmara ou turma julgadora5,

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nos termos do art. 481, parágrafo único, do Código de Pro-

cesso Civil, acrescentado pela Lei 9.756/1998.

A declaração de inconstitucionalidade em sede de controle

difuso, em princípio, gera efeitos apenas no processo em

que foi proferida, ou seja, inter partes, existindo a possibili-

dade de ser estendida para todos por deliberação do Sena-

do Federal, o que, e a princípio, poderá ocorrer após o pro-

nunciamento do Supremo Tribunal Federal sobre a questão

a teor do que dispõe o art. 52, inc. X, da Constituição Fe-

deral. O pronunciamento do Senado, após a apreciação da

questão pelo Supremo Tribunal Federal, dar-se-á através de

uma resolução e terá efeitos ex nunc.

Entretanto, não pode ser desconsiderado o fato de que, jul-

gamentos reiterados em sede de recurso extraordinário dão

origem, informalmente, à denominada jurisprudência domi-

nante, que, mais adiante, pode vir a ser cristalizada em sú-

mulas, sendo certo que, em ambos os casos, a uniformiza-

ção, em determinado sentido, é técnica persuasiva, ou seja,

fator de convencimento, o que muitas vezes é admitido pela

lei como fator legitimador apto a influenciar os processos

que tenham por objeto questões jurídicas e constitucionais

semelhantes ou idênticas.

A par disso, a partir da entrada em vigor da Emenda Consti-

tucional n. 45, de 2004, o julgamento reiterado de recursos

extraordinários sobre a mesma matéria e no mesmo senti-

do passou a autorizar o Supremo Tribunal Federal a editar

súmula vinculante em relação aos demais órgãos do Poder

Judiciário e à administração pública, direta e indireta, nas

esferas federal, estadual e municipal, a teor do art. 103-A

da Constituição Federal6.

Ao contrário da jurisprudência dominante, que consiste

em uma mera constatação fática do posicionamento do

Tribunal sobre determinada matéria e das súmulas, ins-

trumentos formais de constatação e tradução dessa rea-

lidade, que são fatores meramente persuasivos e de ob-

servância não obrigatória, as súmulas vinculantes são de

forçosa observância pelos demais juízos e tribunais e pela

própria administração pública, sob pena de admissibilida-

de de Reclamação, ação de conhecimento de competên-

cia originária do Supremo Tribunal Federal, cujo objetivo é

única e exclusivamente, restabelecer o comando disposto

na súmula vinculante.

Ademais, a mesma Emenda Constitucional n. 45 de 2004,

introduziu, como requisito de admissibilidade do recurso

extraordinário, a necessidade de demonstração, pelo recor-

rente, da repercussão geral da tese jurídica veiculada, sen-

do o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal acerca

da existência ou inexistência do requisito, bem como, se

for o caso, o julgamento de mérito do recurso, aplicável a

todos os demais recursos extraordinários que veiculem a

mesma tese, nos termos do art. 543-A e 543-B do Código

de Processo Civil, que serão tratados nos itens 5 e 5.1 do

presente estudo.

Desta feita, independentemente da edição da súmula vin-

culante, os julgados do Supremo Tribunal Federal em sede

de recursos extraordinários com o reconhecimento de re-

percussão geral produzem um efeito objetivo, se não for-

malmente erga omnes e vinculante, com uma carga norma-

tiva muito próxima disso, uma vez que capaz de influenciar

os pronunciamentos dos demais órgãos jurisdicionais e do

próprio STF sobre a mesma matéria.

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Além do controle de constitucionalidade da lei e dos atos

normativos no caso concreto, via controle difuso de cons-

titucionalidade, o direito constitucional brasileiro admite

outra forma de controle de constitucionalidade, em sede

abstrata, em que o Supremo Tribunal Federal avalia a cons-

titucionalidade da lei em tese.

No controle concentrado de constitucionalidade, não há

conflito de interesses, pelo menos conflito de interesses no

sentido comumente utilizado no processo civil, dado que

não há direito subjetivo discutido no processo.

O Supremo Tribunal Federal, nesses casos, é provocado

por uma das vias elencadas na Constituição (Ação Direta de

Inconstitucionalidade, Ação Declaratória de Constituciona-

lidade, e Ação Declaratória de Descumprimento de Preceito

Fundamental), por um dos legitimados, para propor as refe-

ridas ações e se manifestar acerca da constitucionalidade

da lei em tese.

Portanto, as ações diretas de inconstitucionalidade pos-

suem natureza diversa das demais ações propostas com o

objetivo de se discutir direito subjetivo.

Isso porque, dentre outras coisas, o Supremo Tribunal Fe-

deral pode funcionar, inclusive, como legislador negativo,

caso declare a inconstitucionalidade formal ou material da

lei, ou seja, uma vez declarada em sede de controle abs-

trato a inconstitucionalidade da lei, a mesma é retirada do

mundo jurídico por essa decisão, independentemente da

realização de qualquer outro ato do Poder Judiciário ou dos

demais Poderes.

Em outras palavras, declarada a inconstitucionalidade da lei

ou ato normativo federal, a decisão terá efeito retroativo (ex

tunc) e para todos (erga omnes), desfazendo, desde a sua

origem, o ato declarado inconstitucional, juntamente com

todas as consequências dele derivadas.

No caso contrário, ou seja, caso o Supremo Tribunal Fede-

ral declare a norma compatível com a Constituição ou dê a

essa norma uma interpretação conforme a Constituição e,

portanto, excluindo as demais interpretações, essa decisão

possuirá efeito erga omnes, retroativo e vinculante em rela-

ção aos órgãos dos poderes Executivo e Judiciário.

Assim, o Supremo Tribunal Federal, pela via do controle

abstrato de constitucionalidade, também exerce o papel

uniformizador da interpretação e aplicação da Constituição

Federal, quer quando declara a inconstitucionalidade de

uma lei, dado que, nesse caso, o dispositivo legal é reti-

rado do universo do direito positivo; quer quando declara

constitucional determinada disposição normativa, consti-

tucionalidade essa que deixa de poder ser contestada ou

declarada pelos demais órgãos do Poder Judiciário; e quer,

ainda, quando dá uma interpretação conforme a Constitui-

ção, interpretação essa que, igualmente, vincula e deve ser

seguida pelos demais órgãos jurisdicionais do País.

A afronta a uma decisão do Supremo Tribunal Federal em

sede de controle abstrato também está sujeita a cassação

pela célere via da reclamação constitucional7-8, tal como a

decisão que afronta texto de súmula vinculante, e, a par dis-

so, autoriza outras técnicas de aceleração como a dispensa

de envio do processo ao plenário do tribunal, nos termos

do art. 97 da Constituição Federal, e a autorização de julga-

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mento monocrático pelo relator do recurso em casos seme-

lhantes, no próprio Supremo Tribunal Federal e nas demais

cortes superiores e de segundo grau.

Das três técnicas, suscintamente referidas neste item, a) ações

diretas de controle concentrado de constitucionalidade; b) sú-

mulas vinculantes, e; c) julgamento de recursos extraordinário

com reconhecimento de repercussão geral, todas capazes de,

em alguma medida, produzirem efeitos objetivos e pautarem

os pronunciamentos do próprio Supremo Tribunal Federal e

dos demais órgãos do Poder Judiciário, os itens subsequen-

tes do presente trabalho serão dedicados ao estudo dos efei-

tos do julgamento dos recursos extraordinários.

2. O RECURSO EXTRAORDINÁRIO ENQUANTO

RECURSO DE ESTRITO DIREITO

A Constituição e a lei regulam de modo diferente os diver-

sos tipos de recursos, o que enseja a possibilidade de vá-

rias formas de classificação. Uma delas é a classificação

dos recursos em ordinários e extraordinários (lato sensu),

ou excepcionais, utilizada por grande parte da doutrina9.

No primeiro grupo, estariam a apelação, o agravo, os embar-

gos infringentes, dentre outros, cuja competência, de regra,

é dos tribunais de 2o grau de jurisdição e se caracterizam,

grosso modo, por uma ampla devolutividade, inclusive no

que tange a questões de fato (reexame de provas), questões

de ordem pública, e questões não decididas anteriormente.

Já o grupo de recursos classificados como recursos de estri-

to direito, excepcionais ou extraordinários lato sensu é com-

posto do recurso especial e extraordinário stricto sensu.

São características comuns a esses recursos: a) exigem o

prévio esgotamento das instâncias ordinárias; b) não são

vocacionados à correção da injustiça do julgado recorri-

do; c) não servem para mera revisão de matéria de fato;

d) apresentam sistema de admissibilidade desdobrado ou

bipartido; e) têm os fundamentos específicos de sua admis-

sibilidade na CF, e não no CPC; f) é provisória a execução

que se faça em suas pendências10.

Apesar de a citada classificação ser largamente admitida11,

existem autorizadas vozes que a criticam, dentre os quais

se destaca José Carlos Barbosa Moreira12. Segundo o ilus-

tre processualista, “não existe entre nós uma classe de re-

curso a que se possa aplicar segundo critério preciso do

ponto de vista científico e útil do ângulo prático, a denomi-

nação genérica de extraordinário”.

Entretanto, não obstante criticar a referida classificação,

Barbosa Moreira, não nega a vocação uniformizadora juris-

prudencial do recurso extraordinário e do especial, na ex-

pressão do próprio, uma ramificação daquele, e arremata,

apoiado na lição de Pontes de Miranda, que a finalidade do

remédio era a de assegurar a inteireza positiva, a validade,

a autoridade e a uniformidade da interpretação da Consti-

tuição e das leis federais13.

Assim, temos que, se é certo que o mote da parte que inter-

põe o recurso excepcional é a tutela de seu direito subjeti-

vo, o que não se discute; por outro lado, é necessário que

se tenha em mente que tal desiderato apenas será alcança-

do caso o recorrente demonstre que a apreciação do mérito

de seu recurso seja importante também para o sistema, isto

é, para a tutela do direito objetivo, elemento imediatamente

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tutelado pelos remédios excepcionais e que justifica a exis-

tência dos mesmos e das próprias cortes superiores que o

julgam, no sistema processual.

Esta vocação de recurso de estrito direito, permite ao Su-

premo Tribunal Federal, via recurso extraordinário, exer-

cer o controle difuso de constitucionalidade e nesta me-

dida, cumprir sua função nomofilácica, algo que ganhou

força a partir da introdução da sistemática de reconheci-

mento e aplicação do entendimento do Supremo Tribunal

Federal acerca da existência ou inexistência da repercus-

são geral aos recursos extraordinários que envolvam a

mesma questão constitucional, conforme se verá no item

seguinte.

3. ANÁLISE E RECONHECIMENTO DA REPERCUSSÃO

GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Requisito de admissibilidade específico e exclusivo do re-

curso extraordinário dirigido ao Supremo Tribunal Federal,

a necessidade de demonstração pelo recorrente da reper-

cussão geral para fins da admissibilidade do RE foi inserida

pela Emenda Constitucional n. 45/2004 e guarda semelhan-

ça com o instituto da arguição de relevância14 vigente no

sistema da Constituição de 1969.

A inserção desse filtro de acesso ao Supremo Tribunal Fe-

deral representa mais uma tentativa, no conjunto de medi-

das restritivas, voltada a resolver ou minimizar os efeitos

daquilo que se convencionou chamar de ‘crise do Supre-

mo’, assim entendida a quase inviabilidade das atividades

daquela corte constitucional por força do excesso de recur-

sos interpostos.

Nesse contexto, se insere a necessidade de a parte recorren-

te demonstrar, a par de todos os requisitos de admissibilida-

de comuns a todos os recursos e específicos dos recursos

excepcionais, “a repercussão geral das questões constitu-

cionais discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que

o Tribunal examine a admissão do recurso” (art. 102, §3º da

Constituição Federal com a redação dada pela EC 45/2004).

O mesmo dispositivo constitucional exige que a recusa da

existência da repercussão geral deve ser manifestada por

dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal, dei-

xando diversos aspectos inerentes ao instituto para o pla-

no infraconstitucional, que restou regulamentado pela Lei

11.418/2006, que inseriu os arts. 543-A e 543-B no Código

de Processo Civil, sendo certo que também se ocupam da

matéria os arts. 321 a 329 do Regimento Interno do Su-

premo Tribunal Federal, com a redação dada pela Emenda

Regimental n. 21/2007.

Rigorosamente, nem todos os aspectos da repercussão

geral guardam relação com o objeto deste trabalho, mas é

certo que decorre da natureza do instituto a aplicação uni-

forme do reconhecimento ou afastamento da existência de

repercussão geral para todos os processos que envolvam

a mesma questão de direito, gerando, desta feita, um efeito

objetivo do pronunciamento do Supremo Tribunal Federal.

3. 1. REPERCUSSÃO GERAL: CONCEITO E CARACTE-

RIZAÇÃO

Repercussão geral da questão constitucional encerra um

conceito jurídico indeterminado15, carregado intencional-

mente de vaguidade16, que carece de esclarecimento pela

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lei infraconstitucional, doutrina e, sobretudo, pela jurispru-

dência do Supremo Tribunal Federal.

O art. 543-A, § 1º do Código de Processo Civil define que a

existência de repercussão geral será considerada em fun-

ção da relevância da questão constitucional dos pontos

de vista econômico, político, social, ou jurídico que ultra-

passem os interesses subjetivos da causa, o que leva Luiz

Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero17 a concluírem que a

fórmula utilizada pelo legislador para definir a repercussão

geral conjuga os fatores relevância e transcendência.

Bruno Dantas Nascimento18, por sua vez, sob o argumento

de que a relevância e transcendência, apesar de referidas

pela lei, não são os melhores critérios para caracterizar a

presença da repercussão geral, busca para sua definição,

apoiado no que classifica como as duas dimensões do con-

ceito de repercussão geral.

Para o referido autor19, é necessário analisar a dimensão

subjetiva e objetiva da questão constitucional, para, assim,

decidir pela existência ou inexistência da repercussão geral.

A primeira impõe o exame do alcance do grupo social que

potencialmente será atingido pela decisão, não havendo

de ser, dessa perspectiva, necessariamente a totalidade da

população ou mesmo a maioria.

Isso porque, segundo o referido autor20, a expressão “geral”

do instituto não pode ser entendida como sinônimo de inte-

gral, total ou global, sendo suficiente que a decisão acerca

da questão constitucional atinja um grupo social relevante,

como portadores do vírus HIV, membros de determinada co-

munidade indígena, contribuintes de determinado tributo ou

servidores públicos integrantes de uma mesma categoria.

Definido o conceito de grupo relevante, a dimensão sub-

jetiva da repercussão geral passa a exigir a demonstração

da relação entre o recorrente e as razões recursais com ao

referido grupo21.

Pela dimensão objetiva, deve-se entender quais matérias,

“quando inseridas na fundamentação do recursos extraor-

dinário, são hábeis a causar impacto indireto em determi-

nados grupos sociais quando não na sociedade inteira”22.

Nessa dimensão, é possível definirem-se com razoável pre-

cisão alguns temas que objetivamente possuem repercus-

são geral do ponto de vista econômico, político, social, ou

jurídico, como os exemplificados por Teresa Arruda Alvim

Wambier23, que digam respeito a questões que envolvam

serviços públicos essenciais como saneamento básico, te-

lefonia, e nos quais podem ser acrescentadas normas de

direitos difusos e de direito do consumidor.

A referida autora24 aduz que há relevância jurídica “quan-

do esteja em jogo um conceito ou a noção de um instituto

básico de nosso Direito”, a exemplo do conceito de direito

adquirido. Relevância social, ainda segundo a autora25, “há

numa ação em que se discutem problemas relativos à es-

cola, à moradia, à saúde, ou mesmo à legitimidade do MP

para propositura de certas ações”.

Por fim, Teresa Arruda Alvim Wambier avalia e exemplifica,

com propriedade, os conceitos de relevância econômica e

política. A primeira se configura em ações em que se discu-

te, por exemplo, o sistema financeiro da habitação ou a pri-

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vatização de serviços públicos26, e a segunda pode emergir

de decisões capazes de influenciar relações entre Estados

estrangeiros27, podendo ser acrescentadas nesse mesmo

conjunto as decisões acerca de normas regulamentadoras

do processo político-eleitoral, como inelegibilidade, coliga-

ções e propaganda político-partidária, por exemplo.

Ademais, o §3º do art. 543-A do Código de Processo Civil

define que haverá repercussão geral sempre que a decisão

recorrida contrariar jurisprudência dominante ou sumulada

do próprio Supremo Tribunal Federal.

A razão de ser do dispositivo é justamente proteger a juris-

prudência da corte guardiã da Constituição Federal, impe-

dindo que uma decisão que consagra entendimento con-

trário ao do Supremo Tribunal Federal transite em julgado,

caso, eventualmente, o recurso extraordinário não venha a

ser conhecido.

3.2. PROCEDIMENTO DE RECONHECIMENTO E DE-

CLARAÇÃO DA PRESENÇA DA REPERCUSSÃO GERAL

NO ÂMBITO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

A análise e o reconhecimento da repercussão geral pelo

Supremo Tribunal Federal têm seu procedimento detalhado

pelo Código de Processo Civil, especialmente arts. 543-A e

543-B, introduzidos pela Lei 11.418/2906.

Cassio Scarpinella Bueno leciona que, rigorosamente, tra-

ta-se um “incidente processual” que deve guardar compa-

tibilidade com o modelo constitucional de processo, espe-

cialmente com o princípio do devido processo legal, e dada

a possibilidade de seu resultado refletir e influenciar outros

processos, devem ser maximizados a publicidade, a moti-

vação e, especialmente, o contraditório28.

Esse traço, aliás, é a principal característica que dis-

tingue o instituto da repercussão geral da arguição de

relevância, prevista no art. 119, §1º, da Constituição de

1969, que, àquela época, cumpria funções semelhantes,

sem que sua declaração fosse procedida de um proce-

dimento público e em contraditório e sem a necessidade

de que motivadas fossem as declarações de existência

ou inexistência do requisito de admissibilidade do recur-

so extraordinário.

Em suma, a deliberação sobre a presença da repercussão

geral deve ser precedida de um prévio procedimento, ob-

servadas as garantias e os princípios constitucionais de um

modo proporcional à potencialidade de seus efeitos.

Por observância proporcional, a potencialidade dos efeitos

deve ser entendida, sobretudo como: a) a potencialização

do contraditório, especialmente com a admissibilidade de

participação de terceiros na qualidade de amicus curiae,

conforme previsto no §6º do art. 543-A do CPC; b) motiva-

ção adequada, demonstrando e justificando a relevância e

transcendência da questão do ponto de vista político, eco-

nômico, jurídico ou social ou o porquê de sua inexistência; e

c) ampla publicidade, tanto da sessão deliberativa como do

resultado da deliberação, o que, aliás, se traduz na exigên-

cia do § 7º do citado dispositivo, que exige a publicação no

diário oficial do resultado do julgamento29.

A legislação infraconstitucional, além de regular com deta-

lhes o procedimento de análise e a declaração da presença

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da repercussão geral, estabelece mecanismos de aplicação

do referido entendimento aos demais recursos extraordiná-

rios que envolvam a mesma questão constitucional.

É interessante notar que, pela letra do referido dispositivo,

a apreciação da referida preliminar é de competência exclu-

siva do Supremo Tribunal Federal, aliás nos termos ditados

pela própria Constituição Federal (art. 102, §3º), o que leva

Bruno Dantas Nascimento a destacar que, apesar da natu-

reza de pressuposto específico de cabimento do recurso

extraordinário, ao contrário dos demais requisitos de ad-

missibilidade, uma limitação material à cognição imposta

pela norma constitucional impede que sua presença seja

analisada pelo Tribunal a quo, ou mesmo monocraticamen-

te pelos ministros do Supremo Tribunal Federal30.

Uma vez analisada e decretada a existência ou inexistên-

cia em relação a determinada questão constitucional, a

legislação infraconstitucional não apenas autoriza, como

determina que o entendimento seja reproduzido pelos de-

mais órgãos do Poder Judiciário e, internamente, pelos ór-

gãos fracionários do Supremo Tribunal Federal, em todas

as causas semelhantes pendentes de análise na esfera de

suas competências.

Nesse ponto, portanto, a lei faz clara distinção entre análise

e declaração da presença da repercussão geral, de compe-

tência exclusiva do Plenário do Supremo Tribunal Federal,

e aplicação do entendimento aos processos que envolvam

a mesma questão constitucional analisada pelo Supremo,

técnica, de reprodução da decisão consagrada, que, nessa

medida, acelera o procedimento recursal, nos termos a se-

guir tratados (item 5 e 5.1.).

Isso porque a negativa de existência da repercussão geral por

dois terços dos ministros do Supremo Tribunal Federal autoriza

o indeferimento liminar dos recursos idênticos, nos termos do

§5º do art. 543-A, que remete ao Regimento Interno do STF.

A par disso, caso o recurso extraordinário seja enquadrado

como múltiplo nos termos do caput do art. 543-B do Có-

digo, dar-se-á um verdadeiro agrupamento de demandas

individuais que, em conjunto, se sujeitarão à não admissi-

bilidade “automática” nos termos do §2º do dispositivo, a

serem tratados a seguir.

Alinhado com o modelo constitucional de processo civil,

mais especificamente com a garantia do contraditório, a

sistemática procedimental de análise pelo Supremo Tribu-

nal Federal da repercussão geral da questão constitucio-

nal, por ter aptidão de ser reproduzida, e, nessa medida,

influenciar o destino de outros recursos não analisados in-

dividualmente pelo Supremo Tribunal Federal, no §6º do art.

543-A, permite que terceiros participem do procedimento

de análise da repercussão geral.

Esses terceiros, são aqueles que possuam interesse institucio-

nal e representatividade que lhes autorizam atuar como ami-

cus curiae, bem como os sujeitos que possuam recursos ex-

traordinários que contenha questão idêntica à analisada e que,

por esse motivo, terão o mesmo destino do recurso apreciado,

quer por força do art. 543-A, §5º, quer por força do regime

específico do art. 543-B do Código de Processo Civil.

O pedido de intervenção na qualidade de amicus curiae

deve ser apreciado, nos termos do §6º do art. 543-A do

CPC, pelo relator do recurso extraordinário.

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Entretanto, negado o pedido de intervenção pelo relator,

reza o art. 322, §2º, do Regimento Interno do Supremo Tri-

bunal Federal, que tal decisão é irrecorrível.

Não obstante a letra do referido dispositivo regimental,

Cassio Scarpinella Bueno31, por entendê-lo inconstitucio-

nal, defende ser a decisão do relator que não admite a in-

tervenção de terceiro recorrível.

Nessa hipótese, deve o recurso contra o indeferimento da

participação do terceiro ser dirigido ao colegiado compe-

tente para a análise da presença da repercussão geral, ou

seja, o plenário do Supremo Tribunal Federal.

Já a decisão do Supremo Tribunal Federal acerca da ine-

xistência da repercussão geral é irrecorrível, nos termos do

art. 326 do RISTF, assim sendo, especialmente, em função

de ter sido determinada por dois terços dos Ministros do

Supremo Tribunal Federal, não havendo instância superior

para reapreciar a referida decisão32.

Ainda assim, deve-se destacar que a decisão é passível de

impugnação via embargos de declaração, nos termos do art.

535 do Código de Processo Civil, desde que a parte alegue

omissão, contradição ou obscuridade da decisão que decla-

ra inexistir repercussão geral da matéria constitucional33.

3.3. EFEITOS DA DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FE-

DERAL SOBRE A PRESENÇA DA REPERCUSSÃO GERAL

Em função da já aludida vocação de influenciar os demais

processos que envolvam a mesma questão constitucional

claramente delineada pelos arts. 543-A, §5º e 543-B do

CPC, que consagram uma sistemática sem a qual o escopo

da introdução no ordenamento jurídico processual da reper-

cussão geral pela Emenda n. 45/2004 não seria atingido, é

possível extrair-se a conclusão no sentido de que a decla-

ração pelo Supremo Tribunal Federal acerca da presença

da repercussão geral possui efeito erga omnes e, se não

vinculante, com efeitos persuasivos bastante elevados.

É possível falar-se em efeito erga omnes dado que a de-

cisão do Supremo Tribunal Federal acerca de repercussão

geral de determinada questão constitucional será aplicada

a todos aqueles que se encontrarem na mesma situação

processual, isto é, que discutam em um determinado recur-

so extraordinário a mesma questão constitucional.

Em sentido semelhante, Luiz Guilherme Marinoni e Daniel

Mitidiero34 afirmam que “o não reconhecimento da reper-

cussão geral tem efeito pan-processual, no sentido que se

espraia para além do processo em que fora acertada a ine-

xistência de relevância e transcendência”.

Quanto ao efeito vinculante, se o mesmo não está previsto

na Constituição Federal nem na lei tal como os efeitos da

súmula vinculante, é certo que um efeito muito próximo dis-

so será alcançado na prática.

Isso porque, em princípio, nada justifica, e razões de ordem sis-

temática inclusive impedem, que qualquer outro órgão jurisdi-

cional reconheça repercussão geral de uma matéria analisada

e rechaçada pelo Supremo Tribunal Federal, e vice-versa, que

negue a existência de repercussão geral de questões tidas pelo

Supremo Tribunal Federal como representativas de tal requisito.

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Portanto, ainda que a legislação não se valha da expressão

‘efeito vinculante’, o precedente do Supremo Tribunal Fede-

ral que resolve a existência da repercussão geral de determi-

nada questão de direito é de obrigatória observância pelos

demais órgãos do Poder Judiciário que enfrentem a matéria.

Luiz Guilherme Marinoni35 assevera com precisão que

não há como conciliar a técnica de seleção de casos com

a ausência de efeito vinculante, já que isso seria o mesmo

que supor que a Suprema Corte se prestaria a selecionar

questões constitucionais caracterizadas pela relevância e

transcendência e, ainda assim, permitir que estas pudes-

sem ser tratadas de modo diferente pelos diversos juízos

inferiores.

O citado autor36 conclui que “a ausência do efeito vincu-

lante constituiria mais uma afronta à Constituição Federal,

desta vez à norma do art. 102, §3º, que deu ao Supremo

Tribunal Federal a incumbência de atribuir – a luz do insti-

tuto da repercussão geral – unidade do direito mediante a

afirmação da Constituição.”

Teresa Arruda Alvim Wambier37, por sua vez, afirma que

“a decisão do STF tem caráter absolutamente vinculante,

quando a inadmissibilidade do recurso em razão de ausên-

cia de repercussão geral”. E conclui: “deverá o órgão a quo,

assim, ater-se ao que tiver deliberado o STF a respeito38”.

4. ATUAL TENDÊNCIA DE OBJETIVAÇÃO DAS DECI-

SÕES EM SEDE DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Conforme já asseverado, a princípio, o controle difuso, que

caracteriza-se pela possibilidade de qualquer órgão do Po-

der Judiciário poder declarar a incompatibilidade de lei ou

ato normativo infraconstitucional com a Constituição Fe-

deral, no caso concreto, e com efeito apenas intra partes,

difere do controle concentrado de constitucionalidade, que

possui eficácia erga omnes e efeito vinculante para todos

os demais órgãos do Poder Judiciário.

Em primeiro grau de jurisdição, o controle difuso é realizado

singularmente pelo magistrado, que deve se posicionar fun-

damentadamente acerca da conformidade ou inconformida-

de com a Constituição Federal, das normas invocadas pelas

partes como aplicadas ao caso, devendo, nos casos de in-

constitucionalidade reconhecida, deixar de aplicar a norma.

Ademais, a inconstitucionalidade da norma aplicável ao

caso concreto pode ser declarada pelo juiz de primeiro grau,

ainda que nenhuma das partes tenha aventado a questão

em sua alegação, dada a garantia do livre convencimento

motivado (art. 131 do Código de Processo Civil).

Entretanto, a análise da constitucionalidade da lei ou ato

normativo pelo juízo singular do processo em primeiro grau

de jurisdição encontra limites, não estando, de uma manei-

ra absoluta, abarcada pela garantia do livre convencimento

motivado, ficando proibida, por exemplo, a decisão acerca

da compatibilidade de uma norma com a Constituição Fe-

deral, quando já analisada e decidida a questão pelo Supre-

mo Tribunal Federal.

Já, em segundo grau, a possibilidade de declaração de in-

constitucionalidade singularmente é vedada por força da

regra processual constante do art. 97, da Constituição Fe-

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deral, que determina a necessidade de remessa ao plenário

ou órgão especial do Tribunal, para que, nessa sede, seja

apreciada e declarada, pela maioria dos desembargadores,

a constitucionalidade ou inconstitucionalidade da norma.

Também, nesse caso, é preciso que se deixe claro que a

garantia do livre convencimento motivado dos desembar-

gadores do tribunal também não é ilimitada, devendo ser

sempre consentânea com os entendimentos pacificados no

Supremo Tribunal Federal acerca da (in)constitucionalidade

da norma, sendo, inclusive, a desconformidade de enten-

dimentos entre um tribunal e o Supremo Tribunal Federal

mais maléfica para o sistema do que a de um juiz singular

e os entendimentos superiores, dada a posição hierárquica

ocupada pelos primeiros.

Prova dessa valorização é a, já referida, dispensa da remes-

sa ao plenário do Tribunal da questão constitucional, quan-

do a matéria estiver pacificada pelo plenário do Supremo

Tribunal Federal (art. 482, parágrafo único, do CPC), valen-

do o destaque de que tal dispensa é autorizada quer o posi-

cionamento tenha sido firmado em sede de controle difuso,

quer em sede de controle concentrado, o que demonstra a

cada vez mais clara aproximação dos dois sistemas.

Em suma, a possibilidade de os magistrados de primeiro e se-

gundo graus verificarem a compatibilidade entre normas infra-

constitucionais e o texto da Constituição Federal, em princípio

abarcada pelo livre convencimento, não permite simplesmen-

te afastar, em sede de controle difuso, uma norma, por tê-la

como inconstitucional, quando já houver posicionamento em

sede do Supremo Tribunal Federal, mesmo que naquela sede.

É certo que a declaração do Supremo Tribunal Federal em

sede de controle difuso, para que tenha efeito erga omnes,

tem de ser chancelada pelo Senado Federal, nos termos do

art. 52, inc. X, da Constituição, o que poderia levar o intér-

prete a crer que, até então, restaria abarcada pela garantia

do livre convencimento motivado a possibilidade de o ma-

gistrado aplicar ou não a norma, mesmo em uma concep-

ção contrária à dos órgãos de jurisdição superior.

Entretanto, uma interpretação nesse sentido é prejudicial ao

sistema, por configurar uma potencial ofensa ao princípio

da igualdade, da legalidade, além de uma negação ao papel

primordial dos órgãos de jurisdição superior, que consiste,

justamente, em uniformizar o entendimento do Judiciário, o

que gera ineficiência processual e insegurança jurídica, va-

lores contrários ao sistema processual e ao próprio Estado

Democrático de Direito consagrado na Constituição Federal.

Em outras palavras, se é certo que o sistema prevê efei-

tos vinculantes a determinados comandos judiciais como

o controle concentrado de constitucionalidade, via ação

direta, súmula vinculante e resolução do Senado Federal,

também os precedentes fora desse conjunto, possuem seu

valor, devendo ser, mesmo sem possuírem expressa força

vinculante, observados pelos magistrados em primeiro e

segundo graus de jurisdição.

Aliás, a constante valorização dos precedentes formados

pelo Supremo Tribunal Federal, ainda que em sede de con-

trole difuso de constitucionalidade, vem sendo considerada

pela doutrina, com claros reflexos na jurisprudência e na

própria legislação, como uma tendência de objetivação do

recurso extraordinário e, conforme os já citados entendi-

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mentos da autorizada doutrina de Luiz Guilherme Marino-

ni39 e Teresa Arruda Alvim Wambier40, com efeitos vinculan-

tes aos demais órgãos do Poder Judiciário ainda que isso

não decorra expressamente do texto normativo.

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Ferreira

Mendes, em sede doutrinária41, vem destacando que:

se ao Supremo Tribunal Federal compete, precipuamente, a

guarda da Constituição Federal, é certo que a interpretação

do texto constitucional por ele fixada deve ser acompanha-

da pelos demais Tribunais, em decorrência do efeito defini-

tivo outorgado à sua decisão do Tribunal de origem ter sido

proferido antes daquele do Supremo Tribunal Federal no

leading case, pois, inexistindo o trânsito em julgamento e

estando a controvérsia constitucional submetida à analise

deste Tribunal, não há qualquer óbice para aplicação do

entendimento fixado pelo órgão responsável pela guarda

da Constituição da República.

O Ministro42, após fazer uma análise da evolução da juris-

prudência sobre o tema, citando, dentre outros julgados,

os acórdãos proferidos nos julgamentos do RE 120.728,

que dispensava o encaminhamento do tema constitucional

ao Plenário, desde que o Supremo Tribunal Federal já hou-

vesse se posicionado sobre o assunto, o que foi reiterado

nos recursos extraordinários n. 150.755-PE e 150.764-PE,

e AgRgAI 168.149, conclui que:

Esse entendimento marca evolução no sistema de contro-

le de constitucionalidade brasileiro, que passa a equipa-

rar, praticamente, os efeitos das decisões preferidas nos

processos de controle abstrato e concreto. A decisão do

Supremo Tribunal Federal, tal como colocada, antecipa o

efeito vinculante de seus julgados em matérias de controle

de constitucionalidade incidental, permitindo que o órgão

fracionário se desvincule do dever de observância da de-

cisão do Pleno ou do Órgão do Especial do Tribunal a que

se encontra vinculado. Decide-se autonomamente, como

fundamento na declaração de inconstitucionalidade (ou de

constitucionalidade) do Supremo Tribunal Federal, proferi-

da incidenter tantum.

Em sua atuação no Supremo Tribunal Federal, o Minis-

tro Gilmar Mendes vem consagrando esse entendimento

desde o julgamento do RE n. 376.852, no que vem sendo

acompanhado por seus pares, conforme se depreende do

acórdão da lavra do ministro Eros Grau, in verbis:

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRA-

ORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL. ALTERAÇÃO.

BASE DE CÁLCULO. LEI N. 9.718/98. VIOLAÇÃO DO AR-

TIGO 239 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. O Supremo

Tribunal Federal tem entendido, a respeito da tendência

de não-estrita subjetivação ou de maior objetivação do re-

curso extraordinário, que ele deixa de ter caráter marcada-

mente subjetivo ou de defesa de interesse das partes, para

assumir, de forma decisiva, a função de defesa da ordem

constitucional objetiva. Precedentes. Agravo regimental a

que se nega provimento43.

No plano doutrinário, o referido fenômeno é destacado por

Rodolfo de Camargo Mancuso44, para quem, por não haver

diferença substancial entre os modelos de controles difu-

so e concentrado de constitucionalidade, pode o Supremo

Tribunal Federal imprimir eficácia expansiva extra-autos à

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decisão, no bojo do recurso extraordinário, que reconhece

a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, no que vem

sendo chamado de objetivação do recurso extraordinário.

Considerando as diversas mudanças constitucionais e le-

gislativas voltadas a valorizar a jurisprudência do Supremo

Tribunal Federal, em especial a súmula vinculante e a reper-

cussão geral, Fredie Didier Jr.45, com apoio em farta juris-

prudência do Supremo Tribunal Federal, afirma, em artigo

específico sobre o tema, que o recurso extraordinário, “em-

bora instrumento de controle difuso de constitucionalidade

das leis, tem servido, também, ao controle abstrato”.

Teresa Arruda Alvim Wambier, da mesma forma, identifica

essa tendência de atribuição às decisões do Supremo Tri-

bunal Federal acerca da inconstitucionalidade da lei, toma-

das pelo seu plenário, efeito vinculante.

Mais adiante, conclui a autora que: “de acordo com essa ten-

dência, os demais órgãos do Poder Judiciário e a Adminis-

tração Pública devem respeitar as decisões do STF tomadas

nessas condições, como se fossem fruto de ações declara-

tórias de inconstitucionalidade, i.e., controle concentrado”.

Portanto, fato é que, em função das recentes modificações

constitucionais e legais no plano processual, especialmente

com o advento da súmula vinculante e repercussão geral,

mas também em função de outros mecanismos que igual-

mente valorizam a jurisprudência, sobretudo aquela forma-

da pelo Supremo Tribunal Federal no exercício do controle

difuso, é visível uma aproximação com o sistema de con-

trole concentrado, em princípio, o único apto a gerar efeitos

vinculantes e obrigatória observância de seus julgados.

Contudo, alguns desdobramentos decorrentes do efeito

vinculante e da eficácia erga omnes expressamente previs-

tos para as decisões de controle concentrado ou súmula

vinculante, especialmente o cabimento da Reclamação de

competência originária do Supremo Tribunal Federal, não

são possíveis de ser extraídos do simples julgamento reite-

rado de recursos extraordinários.

A jurisprudência formada pelo Supremo Tribunal Federal pela

via do controle difuso deve, por razões de ordem sistemática,

ser seguida, valorizada e prestigiada pelos demais órgãos do

Poder Judiciário, sem, contudo, poder ser, impugnável pela

via da Reclamação a decisão este precedente46.

Não cabe ao intérprete, especialmente por tratar-se de ação

competência originária do Supremo Tribunal Federal, com hi-

póteses de cabimento taxativamente estabelecidas no texto

constitucional, ampliar o rol de situações em que a decisão

pode ser cassada pela via excepcional da reclamação.

Assim vem decidindo o Supremo Tribunal Federal, confor-

me se depreende os acórdãos, relatados pelos Ministros

Luiz Fux e Teori Zavaski, verbis:

Ementa: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. ALE-

GAÇÃO DE DESRESPEITO AO DECIDIDO NO RE 579.648/

MG (COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA). FAL-

TA DE SIMILITUDE FÁTICA E DE ESTRITA ADERÊNCIA DE

CONTEÚDO ENTRE O ATO ATACADO E O PRECEDENTE

DO STF. ACÓRDÃO DA CORTE QUE, NÃO OBSTANTE

PROFERIDO NO ÂMBITO DA SISTEMÁTICA DA REPER-

CUSSÃO GERAL, NÃO VINCULA O JUÍZO DE PRIMEIRO

GRAU. RECLAMAÇÃO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. 1.

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Falta, no caso, similitude fática e estrita aderência entre o

conteúdo do ato reclamado e o julgado da Corte apontado

como desrespeitado (RE 579.648/MG). 2. Os precedentes

do STF, proferidos no âmbito da sistemática de repercus-

são geral (art. 543-B do CPC), ainda que descumpridos,

não propiciam o ajuizamento de reclamação, mormente

quando o alegado descumprimento ocorrer perante juízo

de primeiro grau. 3. Impossibilidade de utilização de recla-

mação como sucedâneo de recurso e ação rescisória. 4.

Agravo regimental não provido47. (grifo nosso)

Ementa: RECLAMAÇÃO. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO

SOCIAL. ART. 25 DA LEI Nº 8.212/91. ART. 25 DA LEI

Nº 8.870/94. INCONSTITUCIONALIDADE DO TRIBUTO.

COMPENSAÇÃO. ALEGAÇÃO DE OFENSA À AUTORIDA-

DE DAS DECISÕES PROFERIDAS NOS RECURSOS EX-

TRAORDINÁRIOS NºS 363.852/MG E 596.177/RS. TESE

APRECIADA POR ESTA CORTE APENAS EM SEDE DE

CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE. INE-

XISTÊNCIA DE PRECEDENTE EM CONTROLE ABSTRATO.

IMPOSSIBILIDADE DE MANEJO DE RECLAMAÇÃO COMO

SUCEDÂNEO DE RECURSO DE ÍNDOLE ORDINÁRIA OU

EXTRAORDINÁRIA. APLICAÇÃO DA ORIENTAÇÃO FIRMA-

DA NO JULGAMENTO DA RECLAMAÇÃO Nº 10.793/SP,

REL. MIN. ELLEN GRACIE, AUTORIZANDO O JULGAMEN-

TO MONOCRÁTICO. RECLAMAÇÃO NÃO CONHECIDA. 1.

A reclamação é inadmissível pelo só descumprimento de

tese fixada em repercussão geral assentada no julgamen-

to de recurso extraordinário, por isso que o instituto não é

servil à substituição dos recursos cabíveis in itinere contra

as decisões judiciais, porquanto raciocínio inverso consa-

graria pleito per saltum com indevida supressão de instân-

cia (Reclamação nº 10.793/SP, Rel. Min. Ellen Gracie, j. em

13 de abril de 2011, acórdão pendente de publicação). 2.

Reclamação ajuizada contra decisão de segundo grau que,

em sede de apelação, declarou a inconstitucionalidade da

contribuição social prevista no arts. 25 da Lei nº 8.212/91

e 25 da Lei nº 8.870/94, ressaltando, porém, que o crédito

do contribuinte deveria sofrer “compensação com contri-

buições sobre folha de salários prevista no art. 22, incisos

I e II, da Lei nº 8.212/91”. 3. Alegação de descumprimento

da autoridade dos precedentes proferidos por este Supre-

mo Tribunal Federal no julgamento dos Recursos Extraor-

dinários nºs 363.852/MG e 596.177/RS, oportunidade nas

quais restou rejeitado o pleito de modulação da declaração

de inconstitucionalidade das normas tributárias em jogo.

4. Inexistindo, in casu, precedente fruto de exercício da

fiscalização abstrata de constitucionalidade, a reclamação

constitucional não pode ser admitida, sob pena de frustrar

a teleologia indispensável para a subsistência do sistema

recursal pelo manejo indevido da medida como sucedâneo

de recurso de índole ordinária ou extraordinária. 5. Recla-

mação não conhecida.48 (grifo nosso)

Tais entendimentos, pelo menos no que tange ao cabimen-

to o da Reclamação, distanciam os pronunciamentos pro-

feridos em sede de controle concentrado e os editados em

súmula vinculantes daqueles proferidos em sede de recurso

extraordinário, algo um tanto quanto assistemático, sobre-

tudo, a partir da introdução da sistemática de reconheci-

mento da repercussão geral e à luz da já referida tendência

de objetivação do recurso extraordinário.

Neste aspecto é preciso fazer referência ao projeto de novo

Código de Processo Civil (PL nº 8.046/2010), atualmente

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em fase de revisão no Senado Federal que, se aprovado,

superará a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal su-

pra referida, e aproximará os mecanismos de controle difu-

so e concentrado também no que tange ao cabimento da

Reclamação.

Isso porque, o art. 1000, inc. IV, do projeto prevê o cabimen-

to de Reclamação para garantir a observância de súmula

vinculante e de acórdão ou precedente proferido em julga-

mento de casos repetitivos, assim entendidos, nos termos

do art. 522, inc. II, entre outros, o julgamento de recurso

extraordinário repetitivo.

Por outro lado mesmo sem a aprovação do projeto de novo

CPC, à luz da doutrina, jurisprudência e legislação vigente

é possível, sustentar a tese de que o precedente formado

pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de controle difuso,

deve ser observado pelos demais órgão do Poder Judiciário

conforme determinado pelos arts. 543-A e 543-B do Código

de Processo Civil vigente, a seguir tratados.

5. MECANISMOS DE APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO

DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL ACERCA DA EXIS-

TÊNCIA OU INEXISTÊNCIA DA REPERCUSSÃO GERAL

AOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS QUE ENVOLVAM

A MESMA QUESTÃO CONSTITUCIONAL

A par de regulamentar o procedimento de verificação pelo

Supremo Tribunal Federal da presença da repercussão ge-

ral, nos termos acima tratados, os arts. 543-A e 543-B do

Código de Processo Civil detalham o procedimento de apli-

cação do entendimento consagrado pelo Supremo Tribunal

Federal aos demais recursos extraordinários que envolvam

a mesma questão constitucional.

Tais dispositivos, além de determinarem a aplicação uni-

forme, estabelecem técnicas voltadas a viabilizar uma apli-

cação acelerada do entendimento, evitando etapas proce-

dimentais consideradas pela lei desnecessárias, uma vez

resolvida a questão pelo Supremo Tribunal Federal.

A forma de aplicação varia de acordo com o estágio proce-

dimental dos recursos extraordinários de fundamento idên-

tico, conforme será analisado no presente item.

Além disso, é possível distinguir dois regimes procedimen-

tais para a aplicação do reconhecimento ou declaração de

inexistência da repercussão geral, um genérico e comum a

todos os recursos extraordinários, e outro específico, pre-

visto para aqueles que, de antemão, o Tribunal a quo ou

o próprio Supremo Tribunal Federal classificam o recurso

extraordinário como repetitivo, por retratar uma “demanda

múltipla com idêntica questão de direito” veiculada em ou-

tros recursos ‘idênticos’.

O procedimento comum encontra-se precipuamente regu-

lado no art. 543-A do Código de Processo Civil, ao passo

que o procedimento específico para o reconhecimento de

decretação de existência ou inexistência de repercussão

geral para os recursos extraordinários repetitivos encontra-

-se regulamentado especialmente no art. 543-B do Código.

É importante ressaltar, todavia, que mesmo aqueles recur-

sos não enquadrados e processados como “recursos ex-

traordinários repetitivos”, nos termos do art. 543-B do CPC,

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terão tratamento uniforme nos termos do § 5º do art. 543-A

do Código.

Em outras palavras, a aplicação uniforme do entendimento

do Supremo Tribunal Federal em relação à presença da re-

percussão geral é comum a todos os recursos extraordiná-

rios que envolvam a mesma questão, sendo certo que, caso

essa semelhança seja notada de antemão e represente o

que a lei denomina “multiplicidade de recursos”, o trata-

mento procedimental é ainda mais específico nos termos a

seguir tratados.

Dispõe o § 5º do art. 543-A do Código de Processo Civil que

“negada a existência da repercussão geral a decisão valerá

para todos os recursos sobre a matéria idêntica, que serão

indeferidos liminarmente, salvo revisão de tese, tudo nos ter-

mos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal”.

Portanto, uma vez declarada a inexistência da repercussão

geral, resta dispensada a remessa para o plenário do Su-

premo Tribunal Federal para a análise da mesma questão

constitucional.

Teresa Arruda Alvim Wambier49, com propriedade, aduz que

“não fosse assim, a reforma constitucional ficaria sem sen-

tido, já que cada recurso extraordinário, para ser rejeitado

em razão da ausência de repercussão geral, dependeria

sempre de reunião do Pleno do STF, o que conduziria a um

resultado contraproducente”.

A lei não precisa qual órgão é competente para a deno-

minada rejeição liminar e remete ao Regimento Interno do

Supremo Tribunal Federal.

O referido diploma, por sua vez, dispõe em seu art. 13, inc.

V, ‘c’ que compete ao Presidente do Supremo Tribunal Fe-

deral despachar

como relator (a), nos termos do arts. 544, §3º, e 557 do Có-

digo de Processo Civil, até eventual distribuição, os agra-

vos de instrumentos e petições ineptos ou doutro modo

manifestamente inadmissíveis, bem como os recursos que

não apresentam preliminar formal e fundamentada de re-

percussão geral, ou cuja matéria seja destituída de reper-

cussão geral, conforme jurisprudência do Tribunal.

Bruno Dantas50 salienta que a referida atuação do Presiden-

te do Supremo Tribunal Federal “como relator” é anterior à

própria distribuição do recurso extraordinário e volta-se a

reduzir a distribuição de feitos aos ministros da corte me-

diante delegação de poderes ao presidente.

A solução, embora estabelecida em norma regimental, é

compatível com o modelo constitucional e legal da reper-

cussão geral, dada a expressa autorização do art. 543-A, §

5º, parte final, do CPC e do alinhamento de tal prática com

a finalidade da norma constitucional, que visa a prestigiar a

jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Ademais, considerando os efeitos da decisão acerca da

repercussão geral, outro resultado não poderia ser atin-

gido pela deliberação de outro Ministro designado como

relator, o que demonstra a desnecessidade da atividade

processual de distribuição.

O art. 327 do RISTF, inserido pela Emenda Regimental

27/2007, além de em seu caput reproduzir a norma do citado

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art. 13, inc. V, ‘c’, estende, em seu §1º, os mesmos poderes

ao relator do recurso extraordinário nas hipóteses em que a

recusa não seja, quando cabível, realizada pela Presidência.

Assim, uma vez declarada a inexistência da repercussão

geral de determinada questão constitucional, sua mera

reprodução, assim entendida a aplicação da decisão aos

demais recursos extraordinários que veiculem a mesma

controvérsia, é atividade a ser exercida pelo presidente do

Supremo Tribunal Federal antes da distribuição do RE, ou

pelo relator, após a distribuição do mesmo, que devem, mo-

nocraticamente, proceder ao juízo negativo de admissibili-

dade do recurso.

Tal decisão monocrática, contudo, não obstante ser de

declaração de inexistência de repercussão geral, não atrai

a incidência do art. 326, que estabelece ser irrecorrível a

“toda a decisão de inexistência de repercussão geral”.

Isso porque, tal dispositivo, já comentado, possui aplicabi-

lidade nos casos em que a “decisão de inexistência de re-

percussão geral” for tomada por dois terços dos ministros,

não sendo aplicável às hipóteses de reprodução do enten-

dimento nos demais recursos tidos por idênticos51.

A decisão, nos termos do art. 327, §2º, do RISTF, desafia

o recurso de agravo interno, para o plenário, se interposto

contra a decisão do presidente, ou para turma, se contrário

à decisão do relator.

Também é compatível com a sistemática da repercussão

geral a negativa de seguimento do recurso extraordinário

na origem, isto é, pelo presidente ou vice-presidente do tri-

bunal a quo, da mesma forma que esses estão autorizados

a negar seguimento pela falta de qualquer outros requisitos

de admissibilidade.

Isso porque, conforme já afirmado, a competência “exclusi-

va” do Supremo Tribunal Federal é referente a deliberação e

decisão acerca de existência da repercussão geral, e não a

sua mera aplicação a cada um dos processos.

Dada a possibilidade de alguma singularidade distinguir um

determinado recurso extraordinário daqueles que levaram a

formação de precedentes, da negativa de admissibilidade

pelo tribunal a quo, é cabível o agravo nos autos do proces-

so previsto no art. 544 do CPC52.

5.1. ESPECIALMENTE SOBRE O PROCEDIMENTO DE

ANÁLISE DA REPERCUSSÃO GERAL NOS RECURSOS

EXTRAORDINÁRIOS REPETITIVOS (ART. 543-B DO

CPC)

Conforme já mencionado nos itens precedentes, um pro-

cedimento especialíssimo de tratamento conjunto dos re-

cursos extraordinários múltiplos ou repetitivos, assim en-

tendidos aqueles que em grande número versem sobre a

mesma questão constitucional, é traçado pelo art. 543-B do

Código de Processo Civil, no que é complementado pelos

arts. 328 e 328-A do Regimento Interno do Supremo Tribu-

nal Federal.

Em linhas gerais, esse procedimento se caracteriza por,

uma vez identificada a multiplicidade de recursos extraordi-

nários ‘idênticos’, pelo tribunal a quo ou pelo próprio Supre-

mo Tribunal Federal, dever ser realizada uma seleção por

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amostragem de recursos que representem a controvérsia,

sobrestando-se os demais recursos similares, até que seja

decidida a questão da presença da repercussão geral.

Uma vez decidida pelo Supremo Tribunal Federal a ques-

tão, o mesmo art. 543-B estabelece um procedimento

acelerado de aplicação não só do decidido pelo Supremo

Tribunal Federal acerca da presença da repercussão geral,

como também do próprio julgamento de mérito do recurso

paradigma, pela própria corte, e até pelo tribunal prolator da

decisão recorrida.

Sobre as peculiaridades desse procedimento de julga-

mento dos recursos extraordinários repetitivos será dedi-

cado este item.

Reza o art. 543-B caput e §1ºdo CPC que, quando houver

multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica

controvérsia, deve o Tribunal de origem (de acordo com seu

regimento interno) selecionar um ou mais “recursos repre-

sentativos da controvérsia” e encaminhá-los para o Supre-

mo Tribunal Federal.

Nada impede que a multiplicidade seja sentida no próprio

Supremo Tribunal Federal, estando, nesse caso, tanto o

presidente do Tribunal quanto o ministro relator do recurso

extraordinário, autorizados, nos termos do art. 328, pará-

grafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Fe-

deral, a dar início ao procedimento.

Nessa hipótese, deverão ser devolvidos para os órgãos ju-

risdicionais inferiores os demais recursos para fins de apli-

cação do 543-B do CPC, assim entendido o sobrestamento

e processamento após decisão do Supremo Tribunal Fede-

ral acerca do recurso paradigma.

Um primeiro ponto não esclarecido pela lei e debatido pela

doutrina está no critério que deve ser levado em conside-

ração para escolha dos recursos paradigmas, sendo certo

que a representatividade deve retratar quantas perspecti-

vas argumentativas forem possíveis53, o que é requisito es-

sencial para a legitimidade do procedimento.

Gláucia Mara Coelho54 argumenta que não deve ser anali-

sada apenas a peça recursal em si, mas também outras pe-

ças importantes tais como a sentença, o acórdão recorrido

e as contrarrazões apresentadas pela parte contrária.

Muitas vezes, a própria qualidade da parte e natureza da

ação, sobretudo se coletiva, devem ser levadas em consi-

deração para a eleição do recurso paradigma.

Definidos os “recursos representativos da controvérsia”, fi-

cam os demais sobrestados até a apreciação da questão

pelo plenário do Supremo Tribunal Federal.

Outro ponto não tratado pela lei é a possibilidade de recur-

so contra o sobrestamento, tendo a doutrina majoritária e

acertadamente defendido a recorribilidade da decisão pela

via do agravo, nos moldes previstos para atacar a decisão

de retenção indevida do recurso extraordinário55.

É certo, todavia, que o sucesso desse agravo não está atre-

lado ao direito da parte de ver o seu recurso escolhido, dado

que “inexiste direito da parte à escolha de seu recurso para

remessa ao Supremo Tribunal Federal para aferição, a partir

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dele, da existência ou inexistência de repercussão geral56”.

O referido recurso deve ser manejado pela parte nas hipóte-

ses em que o sobrestamento não se justifique por ausência

de identidade entre o recurso sobrestado e a questão leva-

da pelos “recursos representativos da controvérsia”, haja

vista alguma singularidade ou peculiaridade do caso, ou

qualquer espécie de erro judiciário na definição do recurso

extraordinário como integrante daquele conjunto.

Resolvida a questão da existência ou inexistência da re-

percussão geral e, se tido por presente esse requisito de

admissibilidade, julgado o mérito do recurso extraordinário,

formam-se as seguintes possibilidades: a) negada a exis-

tência de repercussão geral, aplica-se o §2º do art. 543-B

do CPC, que considera automaticamente não admitidos os

recursos ‘idênticos’; b) reconhecida a existência da reper-

cussão geral e julgado o mérito do recurso extraordinário

paradigma, fica autorizado o órgão prolator da decisão a

retratar-se, adaptando a decisão recorrida à decisão firma-

da pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do recurso

paradigma, nos termos do art. 543-B, §3º, do Código; ou

c) reconhecida a existência da repercussão geral e mantida

a decisão recorrida em termos contrários ao entendimento

do Supremo Tribunal Federal, hipótese em que o recurso

extraordinário deve ser encaminhado ao Supremo Tribunal

Federal e, naquela sede, cassado ou reformado “liminar-

mente” (art. 543-B, §4º, do CPC).

A seguir, serão analisados os desdobramentos de cada

uma das situações possíveis.

Nos casos em que não for reconhecida a repercussão geral (letra

‘a’ supra), os recursos extraordinários são tidos pelo art. 543-B,

§2º, do CPC como “automaticamente não admitidos”.

Nesses casos, portanto, cabe ao órgão a quo “noticiar nos

autos de cada recurso o julgamento do Supremo Tribunal

Federal, declarando-os não admitidos” conforme asseve-

ram Daniel Mitidiero e Luiz Guilherme Marinoni57.

Os autores citados58, com razão, concluem que não é dado

ao órgão a quo remeter o recurso com controvérsia já de-

cidida pelo Supremo como não representativa de repercus-

são geral, estando esses vinculados verticalmente à deci-

são do Supremo Tribunal Federal59.

Talvez o ponto mais delicado seja exatamente o juízo de

retratação ou o “julgamento do mérito do recurso extraordi-

nário” pelo órgão prolator da decisão autorizado pelo 543-

B, §3º, do Código de Processo Civil, nas hipóteses em que

for reconhecida a existência da repercussão geral e julgado

o mérito do recurso paradigma (hipótese exposta na letra

‘b’, acima).

Isso porque é possível sustentar, em tese, ofensa ao princí-

pio do juiz natural, bem como a própria regra constitucional

que estabelece a competência do Supremo Tribunal Fede-

ral para apreciar o recurso extraordinário (art. 102, III, da

Constituição Federal).

Cassio Scarpinella Bueno60, por exemplo, aduz que:

os 3º e 4º do art. 543-B, disciplinados pelo art. 328-A do

RISTF incluído pela Emanada Regimental n. 23/20087, pre-

cisam ser compreendidos em conformidade com o mode-

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lo constitucional de processo civil. Não pode a lei – como

parecem pretender os dispositivos destacados – autorizar

que os demais Tribunais julguem os recursos extraordinários

mesmo que esse julgamento se limite a aplicar a orientação

fixada pelo Supremo Tribunal Federal ao caso concreto.

Isso porque, ainda segundo o citado autor61, essa tarefa é

privativa do Supremo Tribunal Federal, não sendo possível

sua delegação ser realizada por lei, mas apenas por Emen-

da constitucional, o que, ainda segundo C.S. Bueno, “não

foi feito pela Emenda Constitucional n. 45/2004”

Entretanto, outra forma teórica de enfrentar o problema,

com os mesmos efeitos práticos, sem, contudo, se deparar

com a delicada questão do “julgamento de mérito do recur-

so extraordinário pelo tribunal a quo” é oferecida por Gláu-

cia Mara Coelho62 para quem, nessas hipóteses, o tribunal

prolator da decisão está legalmente autorizado a exercer

juízo de retratação acerca da decisão recorrida, em uma

hipótese de exceção à regra da irretratabilidade prevista no

art. 463 do CPC.

Ademais, a aplicação, assim entendido o enquadramento

consequente de reprodução do entendimento consagrado

pelos Ministros, se realizado exclusivamente pelo próprio

Supremo Tribunal Federal, retira praticamente toda a razão

de ser do instituto e o impede de, na prática, alcançar sua

finalidade, qual seja, a diminuição do número de recursos

pendentes de processamento e julgamento no âmbito do

Supremo Tribunal Federal.

A solução proposta pela lei, portanto, é coerente com a sis-

temática da repercussão geral, se analisada à luz dos efei-

tos das decisões do Supremo Tribunal Federal acerca do

requisito de admissibilidade e, em um contexto maior, den-

tro do próprio espírito da Emenda Constitucional 45/2004,

que a consagra, voltada a dar maior estabilidade e impri-

mir maior respeito à jurisprudência da Corte Constitucio-

nal, aproximando, com isso, em muito, o controle difuso do

controle concentrado de constitucionalidade63.

Ademais, corrobora com a legitimidade de aplicação pelos

tribunais de origem do entendimento firmado pelo Supremo

Tribunal Federal, não apenas em relação à repercussão ge-

ral, como também se tida por presente, do próprio mérito

da questão constitucional, a recorribilidade da decisão pela

via do agravo nos autos do processo previsto no art. 544.

Obviamente, o recurso não teria por objeto, pura e simples-

mente, rediscutir a tese recém firmada, hipótese em que po-

deria inclusive ser considerado manifestamente improceden-

te por contrariar jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Essa via recursal, destarte, fica aberta para que a parte possa

demonstrar que seu recurso, por qualquer motivo, distingue-

-se da matéria debatida no recurso paradigma e que, por

esse motivo, não merece a mesma resposta jurisdicional64.

Com a negativa em função da aplicação do não reconhe-

cimento da repercussão geral da questão constitucional

isso não é diferente, sendo certo que, na hipótese, pode-

-se dizer, inclusive, que a garantia, de certa forma, é mais

bem observada, considerando que a atividade do tribunal a

quo limita-se a enquadrar a situação do caso concreto ao

entendimento do Supremo e, uma vez feito isso, reproduzir

seus termos, não havendo, dessa feita, a possibilidade de

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D

nenhum outro tribunal analisar a existência da repercussão

geral da questão constitucional, sendo tal tema exatamente

o ponto central da repercussão geral, reservada exclusiva-

mente ao juízo natural do recurso extraordinário.

Em caso de manutenção da decisão pelo Tribunal a quo,

em sentido contrário ao posicionamento firmado pelo Su-

premo Tribunal Federal no julgamento do mérito do recurso

paradigma (letra ‘c’ supra), o que, repita-se, não é correto

nem desejado pelo sistema, o art. 543-B, §4º, do CPC de-

termina a subida do recurso e a cassação ou reforma “limi-

nar” do acórdão contrário a orientação do Supremo Tribunal

Federal, nos termo do seu Regimento Interno.

Por cassação ou reforma “liminar” do acórdão deve ser en-

tendida a autorização de atuação monocrática do relator

ao qual tenha sido distribuído o recurso extraordinário que

consagra a tese proclamada pelo Supremo Tribunal Federal.

Por tratar-se de atuação monocrática do relator, contra a

decisão cabe agravo interno para o colegiado, em que po-

derá ser demonstrado pelo recorrente o desacerto da repro-

dução do entendimento firmado no julgamento do recurso

paradigma, dada a singularidade de seu caso.

Notas

1. Sobre um estudo comparativo entre as funções nomofilácicas dos Tribunais Superiores no Brasil e na Itália, nosso: Função Nomofilácica dos Tribunais Superiores no Brasil e na Itália e a necessidade de respeito aos seus precedentes, in Publicações Específicas da AGU, vol. 21, Brasília, 2012, p. 79 à 103.

2. A referida função nomofilácica, também é exercida pelo Supremo Tribunal Federal nas ações de controle concentrado de constitucionalidade, bem como através da edição de súmulas vinculantes, procedimentos que, todavia, não constituem o objeto central deste trabalho, que se limitará aos efeitos do julgamento do recurso extraordinário.

3. José Afonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, 21. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 47.

4. José Afonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, cit., p. 49.

5. Nesse sentido: RE 440458 AgR/RS Ag. REg. No Recurso Extraordinário. RE. Min. Sepúlvida Pertence, j. 19/04/2005, DJ 06/05/2005, p. 25: “EMENTA: 1. Controle de constitucionalidade; reserva de plenário (CF, art. 97): aplicabilidade, no caso, da exceção prevista no art. 481, parágrafo único, do C. Pr. Civil (red. da L. 9.756/98), que dispensa a submissão ao plenário, ou ao órgão especial, da arguição de inconstitucionalidade, quando já houver pronun-ciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão. 2. Fazenda Pública: execução não embargada: honorários de advogado: MPr 2.180/2001: constitucionalidade declarada pelo STF, com interpretação conforme ao art. 1º-D da L. 9.494/97, na redação que lhe foi dada pela MPr 2.180-35/2001, de modo a reduzir-lhe a aplicação à hipótese de execução por quantia certa contra a Fazenda Pública (C. Pr. Civil, art. 730), excluídos os casos de pagamento de obrigações definidos em lei como de pequeno valor (CF/88, art. 100, § 3º) (RE 420.816, Plenário, 29.9.2004, red. p/acórdão Pertence, Inf./STF 363). No caso, contudo, tratando-se de litisconsórcio, não há nos autos elementos que permitam concluir, com segurança, pela inci-dência do § 3º do art. 100 da Constituição com relação a todos os litisconsortes. RE provido para, ressalvada a incidência do procedimento relativo às obrigações definidas em lei como de pequeno valor, afastar a condenação da Fazenda Pública ao pagamento da verba honorária”.

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6. A natureza, os efeitos e o procedimento de edição, revisão e cancelamento da súmula vinculante escapam ao objeto central deste trabalho que se volta ao estudo dos efeitos, ou mais amplamente, da influência dos entendimentos consagrados pelo Supremo Tribunal Federal em julgamentos de recursos extraordinários não formalizados pela edição de súmulas vinculantes.

7. Sobre o ponto já nos manifestamos em trabalho publicado na Revista de processo (Reclamação. STF. Legitimação ativa. Atingidos por ADIN, in Revista de Processo, v. 142, p. 185-205. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006), em que afirmamos que: “A decisão do STF em sede de controle concentrado atinge a todos independentemente de terem figurado ou não no processo em que a declaração foi proferida e vincula os demais órgãos jurisdicionais e administrativos. Caso estes órgãos vinculados a decisão do STF atuem de maneira contrária ao decidido por aquela corte, quer entendendo constitu-cional uma lei declarada pelo Supremo em sede de controle concentrado inconstitucional, quer considerando inconstitucional uma norma tida pelo STF por constitucional ou ainda quando qualquer órgão dos poderes Executivos e Judiciários der a norma interpretação diversa da dada pelo STF como a interpretação compatível com a Constituição (interpretação conforme a Constituição), estarão estes órgãos afrontando uma decisão daquela Corte. Como essa decisão possui efeito erga omnes qualquer interessado que tiver seu direito subjetivo lesado por um pronunciamento contrário possui a via da Reclamação a ser ajuizada diretamente no STF com o fito de fazer valer o declarado pelo STF em sede de controle concentrado e portanto, invalidar o ato oposto. Inicialmente a Reclamação, nesses casos, não era admitida pelo Supremo Tribunal Federal, ou seja, terceiros lesados pela não observância do decidido pelo STF em controle abstrato não poderiam valer-se da mesma. A Reclamação, nestas hipóteses, só era admitida se proposta por quem houvesse sido parte na ação direta, conforme se depreende da decisão a seguir transcrita: “hoje, a jurisprudência desse Tribunal tem se orientado no sentido de só admitir reclamação com fundamento em desrespeito à autoridade das suas decisões tomadas em ação direta nos casos em que é reque-rida por quem foi parte na respectiva ação direta e que tenha o mesmo objeto. Tal entendimento, data máxima vênia, não deveria prevalecer dado que desta forma estar-se-ia esvaziando, pelo menos em parte, o efeito erga omnes da decisão do Supremo, bem como enfraquecendo o efeito vinculante da decisão proferida em ação direta. Isso porque, a parte lesada, pelo só fato de não ter participado do processo de controle concentrado, que de rigor, sequer possuía legitimidade, mas que não obstante, aproveita a decisão, não possuiria mecanismo para fazer valer a decisão do STF. Além disso, restringir a legitimidade da Reclamação apenas para os legitimados para propor a ação direta contraria frontalmente a norma constitucional que prevê a Reclamação (art. 102, I, L, CF). A partir do julgamento da questão de ordem na Reclamação n. 1.880 que ora se comenta, o STF mudou, por maioria de votos, seu posicionamento passando a considerar, conforme sustentado no presente trabalho, legitimados para propor Reclamação todos aqueles que forem atingidos por decisões contrárias ao entendimento firmado pela Suprema Corte no julgamento proferido em sede de ação direta de constitu-cionalidade. Esse entendimento consagra em primeiro lugar a função constitucional da Reclamação e, além disso, robustece a eficácia erga omnes e o efeito vinculante sobre os demais órgãos dos Poderes Executivo e Judiciário que possuem as decisões proferidas em sede de controle concentrado de constitucionalidade”.

8. No mesmo sentido: STF. AgReg. na Reclamação n. 1.880-6 SÃO PAULO. Rel. Min. Maurício Corrêa, j. 07/11/2002, DJU: 19/03/2004, verbis: “EMENTA: QUESTÃO DE ORDEM. AÇÃO DIRETA DE INCOSNTITUCIONALIDADE. JULGAMENTO DE MÉRITO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 28 DA LEI 9.868/99: CONSTITUCIONALIDADE. EFICÁCIA VINCULANTE DA DECISÃO. REFLEXOS. RECLAMAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA. 1. É constitucional a lei ordinária que define como de eficácia vinculante os julgamentos definitivos de mérito proferidos pelo Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucio-nalidade (Lei 9.868/99, artigo 28, parágrafo único).2. Para efeito de controle abstrato de constitucionalidade de lei ou ato normativo, há similitude substancial de objetos nas ações declaratórias de cons-titucionalidade e direta de inconstitucionalidade. Enquanto a primeira destina-se à aferição positiva de constitucionalidade a segunda traz pretensão negativa. Espécies de fiscalização objetiva que, em ambas, traduzem manifestação definitiva do Tribunal quanto a conformação da norma com a Consti-tuição Federal. 3. A eficácia vinculante da ação declaratória de inconstitucionalidade, fixada pelo § 2º do art. 102 da Carta da República, não se distingue, em essência, dos efeitos das decisões de mérito proferidas nas ações diretas de inconstitucionalidade. 4. Reclamação. Reconhecimento de legitimidade ativa ad causam de todos que comprovem prejuízo oriundo de decisões dos órgãos do Poder Judiciário, bem como da Administração Publica de to-dos os níveis, contrárias ao julgado do Tribunal. Ampliação do conceito de parte interessada (Lei 8.038/90, artigo 13). Reflexos processuais da eficácia vinculante do acórdão a ser preservado. 5. Apreciado o mérito da ADI 1662-SP (DJ 30/08/2001), está o Município legitimado a propor a Reclamação”.

9. Por todos, Nelson Nery Jr., Teoria Geral dos Recursos, Recursos no processo civil – 1, 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 285.

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10. Rodolfo de Camargo Mancuso, Recurso extraordinário e recurso especial, Recursos no processo civil – 3. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 103.

11. Entre outros: José Miguel Garcia Medina. O prequestionamento nos recursos extraordinário e especial, Recursos no processo civil – 6, 4ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 98-99; e Nelson Nery Jr., Teoria geral dos recursos, cit., p. 285.

12. Comentários ao código de processo civil, 13ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 2006, v. 5, p. 255

13. Op. e loc. cit.

14. Arruda Alvim, A EC n. 45 e o instituto da repercussão geral, In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et ali (coord.). Reforma do judiciário: primeiras reflexões sobre a emenda constitucional n. 45/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 67.

15. Nesse sentido, Bruno Dantas Nascimento (Repercussão geral: perspectivas histórica, dogmática e de direito comparado; questões processuais. Recursos no processo civil - 18, 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 237) aduz que “o constituinte derivado se valeu de linguagem par-cialmente descritiva” não encerrando, portanto, um conceito insuscetível de valoração, mas que, por outro lado, limita o preenchimento valorativo lhe dando menor margem de ação.

16. Arruda Alvim, A EC n. 45 e o instituto da repercussão geral, cit., p. 73.

17. Repercussão geral no recurso extraordinário, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 33.

18. Repercussão geral, cit., p. 250.

19. Op. cit. p. 240.

20. Op. cit. p. 241.

21. Bruno Dantas, op. e loc. cit.

22. Bruno Dantas, op. e loc. cit.

23. Recurso especial, recurso extraordinário e ação rescisória, 2. ed.

24. Recurso especial, recurso extraordinário e ação rescisória, cit., p. 298.

25. Op. e loc. cit.

26. Op. cit. p. 298.

27. Op. cit. p. 298.

28. Curso sistematizado de direito processual civil, vol. 5, São Paulo: Saraiva, 2008, cit., p. 261.

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29. Maximizando ainda mais a publicidade das decisões sobre repercussão geral, o art. 329 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal deter-mina a formação e a atualização de bancos de dados sobre as questões constitucionais analisadas.

30. Repercussão geral, cit., p. 216 a 219.

31. Curso sistematizado de direito processual civil, vol.5, cit., p. 262.

32. O mesmo não se pode dizer da decisão de outros órgãos jurisdicionais que aplicam (reproduzem) a declaração de inexistência de repercussão ge-ral do plenário do STF a outros recursos extraordinários qualificados por estes órgãos como veiculadores de “idêntica controvérsia” conforme se verá adiante.

33. Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, Repercussão geral no recurso extraordinário, cit., p. 53. E Cassio Scarpinella Bueno, Curso sistematizado de processo civil, vol. 5, cit., p. 264.

34. Repercussão geral no recurso extraordinário, cit., p. 52.

35. Precedentes obrigatórios, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 472.

36. Op. e loc. cit.

37. Recurso especial, recurso extraordinário e ação rescisória, cit., p. 305.

38. Op. cit. p. 306.

39. Precedentes obrigatórios, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 472.

40. Recurso especial, recurso extraordinário e ação rescisória, cit., p. 305.

41. Curso de Direito Constitucional, cit., p. 1123

42. Op. cit. p. 1133.

43. RE 475812 AgR, Relator(a):  Min. Eros Grau, 2º Turma, J. 13.06.2006, DJ 04.08.2006.

44. Divergência jurisprudencial e súmula vinculante, 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 116.

45. Transformações do recurso extraordinário. In: Nelson Nery Jr.; Teresa Arruda Alvim Wambier (coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, v. 10, p. 105.

46. Contra, defendendo o cabimento da Reclamação nesses casos: Fredie Didier Jr., (op. cit., p. 111-112) que após considerar as diversas alterações constitucionais e legais sobre a valorização da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, assevera que “tudo isso nos leva a admitir a ampliação do cabimento da reclamação constitucional, para abranger os casos de desobediência a decisões tomadas pelo Pleno do STF em controle difuso de cons-titucionalidade, independentemente da existência de enunciado sumular de eficácia vinculante.”

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47. Rcl 16551 AgR, Relator(a):  Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 27/02/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-056 DIVULG 20-03-2014 PUBLIC 21-03-2014

48. Rcl 12692 AgR, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 27/02/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-056 DIVULG 20-03-2014 PUBLIC 21-03-2014

49. Op. cit. p. 302.

50. Op. cit. p. 282.

51. Nesse sentido, Bruno Dantas, Repercussão geral, cit., p. 282; e, Cassio Scarpinella Bueno, Curso sistematizado de direito processual civil, vol. 5, cit., p. 264.

52. Gláucia Mara Coelho, Repercussão Geral: da questão constitucional no processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2009, p. 133, e Bruno Dantas, op. cit. p. 334.

53. Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, Repercussão geral no recurso extraordinário, cit., p. 59-60.

54. Repercussão Geral, cit., p. 141.

55. Bruno Dantas Nascimento, Repercussão Geral, cit., p. 330.

56. Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, Repercussão geral no recurso extraordinário, cit., p. 61.

57. Op. cit. p. 61.

58. Op. e loc. cit.

59. Op. cit. p. 71.

60. Curso sistematizado de direito processual civil, vol. 5, cit., p. 265.

61. Op. e loc. cit.

62. Repercussão geral, cit., p. 142.

63. No mesmo sentido: Gláucia Mara Coelho, op. cit. p. 138.

64. Bruno Dantas, Repercussão geral, cit., p. 334.