Engels - O Papel Da Violência Na História

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MIA > Biblioteca > Marx/Engels > Novidades

O Papel da Violência naHistória [N203]

Fri edrich Engels

Março de 1888

Transcrição autorizada

Primeira Edição: Escrito por Engels entre fins de Dezembro de 1887 e Março de 1888.Publicado pela primeira vez na revista Die Neue Zeit, Bd. 1, n.os 22-26, 1895-1896.Publicado segundo o texto do manuscrito e, na parte em que este não se conservou,segundo o texto da re vista. Traduzido d o alemão..Fonte: Obras Escolhidas em três tomos, Editorial "Avante!" - Edição dirigida por umcolectivo composto por: José BARATA-MOURA, Eduardo CHITAS, Francisco MELO e ÁlvaroPINA, tomo III, pág: 422-477.Tradução: Eduardo CHITAS.Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo.Direitos de Reprodução: © Direitos de tradução em língua portuguesa reservados porEditorial "Avante!" - Edições Progresso Lisboa - Moscovo, 1982.

Apliquemos agora a nossa teoria à história alemã dehoje e à sua prática da violência pelo sangue e pelo ferro.Daí veremos com clareza por que teve que ter sucesso,temporariamente, a política de sangue e ferro e por quetem ela que fracassar no final.

O Congresso de Viena, em 1815[N204]

, tinha repartidoe vendido a Europa ao desbarato de u ma ta l maneira queficava clara perante o mundo inteiro a incapacidade totaldos potentados e homens de Estado. A guerra geral dospovos contra Napoleão foi a reacção do sentimento nacional espezinhadoem todos os povos por Napoleão. Em agradecimento por isso, os príncipes ediplomatas do Congresso de Viena espezinharam ainda com mais desprezoesse sentimento nacional. A mais pequena dinastia valia mais do que omaior povo. A Alemanha e a Itália foram de novo fragmentadas empequenos Estados, a Polónia foi dividida pela quarta vez, a Hungriapermaneceu subjugada. E não se pode dizer, sequer, que acontecia umainjustiça aos povos, pois por que se deixaram eles ficar e por que saudaram

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no tsar russo (1*) o seu libertador?

Mas isso não podia durar. Desde o fim da Idade Média, a historiatrabalha para a constituição da Europa a partir de grandes Estadosnacionais. Só tais Estados são a normal organização política da burguesiadominante europeia e são, do mesmo modo, condição prévia indispensável

para o estabelecimento da cooperação internacional harmoniosa dos povos,sem a qual não pode existir a dominação do proletariado. Para assegurar apaz internacional, têm primeiramente de ser afastadas todas as fricçõesnacionais evitáveis, tem cada povo de ser independente e senhor na suaprópria casa. Com o desenvolvimento do comércio, da agricultura, daindústria e, assim, com o poder social da burguesia, elevou-se por toda aparte o sentimento nacional, as nações fragmentadas e oprimidas exigiramautoridade e autonomia.

A revolução de 1848 estava, por isso, orientada em toda a parte,excepto na França, tanto para a satisfação das reivindicações nacionaiscomo das de liberdade. Mas, por detrás da burguesia, vitoriosa no seuprimeiro arranque, erguia-se já por toda a parte a figura ameaçadora doproletariado, que, na realidade, tinha conquistado a vitória e empurrado aburguesia para os braços dos adversários acabados de vencer — a reacçãomonárquica, burocrática, semifeudal e militar, à qual a revolução sucumbiuem 1849. Na Hungria, onde isto não foi o caso, entraram os russos e

esmagaram a revolução. Não contente com isso, o tsar russo(2*)

foi aVarsóvia e erigiu-se ali em árbitro da Europa. Nomeou Christian deGlücksburg, sua criatura dócil, sucessor ao trono da Dinamarca. Humilhou aPrússia como ela ainda nunca fora humilhada, ao proibir-lhe mesmo os maisfracos apetites de exploração dos esforços alemães para a unidade, aoforçá-la a restaurar o Parlamento Federal [Bundestag] [N205] e a submeter-se à Áustria. Todo o resultado da revolução parecia ser, assim, à primeiravista, o de que a Áustria e a Prússia eram governadas segundo formaconstitucional, mas no velho espírito, e que o tsar russo dominava a Europamais do que antes.

Mas, na realidade, a revolução tinha fortemente despertado a burguesiatambém nos países desmembrados, e designadamente a da Alemanha, davelha rotina hereditária. A burguesia tinha conseguido uma participação,embora modesta, no poder político; e cada sucesso político da burguesia éexplorado num avanço industrial. O «ano louco» [N206], que se tinhafelizmente deixado para trás, mostrou à burguesia que se tinha de pôr

termo agora, de uma vez por todas, à velha letargia e sonolência. Nasequência da chuva de ouro californiana e australiana [N207] e de outrascircunstâncias, deu-se uma extensão das ligações do mercado mundial e umavanço dos negócios como nunca antes acontecera; tratava-se de agarrar

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[a oportunidade] e de assegurar para si a sua quota-parte. Os começos dagrande indústria, que surgiram desde 1830 e nomeadamente desde 1840no Reno, na Saxónia, na Silésia, em Berlim e em cidades isoladas do Sul,eram agora rapidamente aperfeiçoados e alargados, a indústria domésticados distritos rurais estendia-se cada vez mais, era acelerada a construçãodos caminhos-de-ferro e, com tudo isso, o enorme crescimento da

emigração criou uma navegação a vapor transatlântica, alemã, que nãonecessitava de qualquer subvenção. Mais do que nunca anteriormente,negociantes alemães estabeleceram-se em todas as praças comerciaisultramarinas, tornaram-se intermediários de uma parte cada vez maior docomércio mundial e começaram pouco a pouco a ser intermediários navenda de produtos industriais, não só ingleses mas também alemães.

Contudo, o sistema alemão de pequenos Estados [deutscheKleinstaaterei], com as suas múltiplas legislações diversas do comércio e

dos ofícios, em breve se tinha de tornar numa insuportável grilheta paraesta indústria em poderoso incremento e para o comércio a ela ligado. Depoucas em poucas milhas um outro direito cambial, outras condições nodesempenho de um ofíc io, por toda a parte, mas por toda a parte mesmo,outras chicanas, armadilhas burocráticas e fiscais, tantas vezes aindabarreiras corporativas, contra as quais de nada valia nenhuma concessão!Além disso, as muitas e diversas legislações locais (3*) e as limitações deestada, que tornavam impossível aos capitalistas lançar as forças de

trabalho disponíveis, em número suficiente, nos pontos onde minério,carvão, força hidráulica e outros recursos naturais impunham oestabelecimento de empreendimentos industriais! A capacidade de explorarsem entraves a força de trabalho da pátria era a primeira condição dodesenvolvimento industrial; mas por toda a parte onde o fabricante patriotaconcentrava operários de todos os confins, a polícia e a assistência aospobres opunham-se ao estabelecimento dos recém-chegados. Um direito decidadania alemão e a plena liberdade de circulação para todos os cidadãosdo Império, uma legislação unificada do comércio e dos ofícios, já não eramfantasias patrióticas de estudantes exaltados, eram agora condiçõesnecessárias da vida da indústria.

Além disso, em cada Estado e Estadozinho, outro dinheiro, outros pesose medidas, bastantes vezes de dois e três géneros no mesmo Estado. E detodos estes inumeráveis géneros de moedas, medidas ou pesos, nem um sóera reconhecido no mercado mundial. Que admiração, pois, se negociantese fabricantes que estavam em relações com o mercado mundial ou tinham

de concorrer com artigos importados ainda tivessem de fazer uso de todasas moedas, medidas e pesos do estrangeiro, o fio de algodão dobado emlibras inglesas, os tecidos de seda fabricados ao metro, as contas para oestrangeiro postas em libras esterlinas, dólares, francos? E como se havia

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de conseguir grandes instituições de crédito nestes âmbitos monetárioslimitados, aqui com notas bancárias em Gulden (4*) , além em táleresprussianos, ao lado em táleres-ouro, táleres «Neue Zweidrittel»(5*) ,marcos-banco, marcos correntes, vinte e dois Gulden, vinte e quatroGulden, com intermináveis cálculos cambiais e flutuações cambiais?

E quando, finalmente, se conseguia vencer tudo isso, quanta força senão tinha gasto com todos estes atritos, quanto dinheiro e tempo se nãoperdiam! Começou-se a observar por fim, também na Alemanha, que hojeem dia tempo é dinheiro.

A jovem indústria alemã tinha de provar no mercado mundial que sópela exportação podia tornar-se grande. Para isso era preciso que elagozasse, no estrangeiro, da protecção do direito internacional. Ocomerciante inglês, francês, americano, podia sempre permitir-se algo maisno estrangeiro do que em casa. A sua legação intervinha por ele e, em casode necessidade, alguns navios de guerra também. Mas o alemão! NoLevante podia pelo menos o austríaco, em certa medida, confiar na sualegação, mesmo que não o ajudasse muito. Mas onde um negocianteprussiano, no estrangeiro, se queixasse ao legado [do seu país] sobrealguma injustiça, quase sempre lhe era dito:

«Isto acontece-lhe com toda a razão. Que tem V. a procurar aqui,por que não fica quietinho em casa?»

O cidadão de um pequeno Estado, por maioria de razão, estava por todaa parte completamente desprovido de direitos. Para onde quer que se fosse,os negociantes alemães ficavam sob protecção estrangeira, francesa,inglesa, americana, ou tinham de se naturalizar quanto antes na novapátria (6*) . E mesmo se os legados [do seu país] quisessem interessar-se poreles, de que serviria? Os legados alemães eram eles mesmos tratados noultramar como os engraxadores.

Por aqui se vê como a ânsia por uma «pátria» unificada tinha um fundomuito material. Já não era o ímpeto nebuloso de corporações de estudantes[Burschenschafter] nas festas de Wartburg [N208], «onde flamejavamcoragem e força nas almas alemãs» (7*) ; onde, a uma melodia francesa, se«arrastava o jovem, com sopro de tempestade, à luta e à morte pelapátria» (8*) para restaurar a romântica magnificência imperial da IdadeMédia; e onde o tempestuoso jovem se tornava por completo, na velhice,

um vulgar criado pietista e absolutista de príncipe. Também já não era oapelo à unidade, significativamente mais próximo da terra, por parte dosadvogados e outros ideólogos burgueses da festa de Hambach [N209], queacreditavam amar a liberdade e a unidade por elas mesmas e não

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reparavam que a helvetização da Alemanha numa república decantõezinhos, à qual ia parar o ideal dos menos confusos de entre eles, eratão impossível como o império hohenstaufeniano daqueles estudantes. Não,era o desejo impetuoso do comerciante e do industrial práticos, a partir danecessidade imediata de negócios, de varrer toda a velharia de pequenosEstados transmitida historicamente e que barrava o caminho à livre

expansão do comércio e indústria; de afastar toda a fricção superficial que onegociante alemão tinha primeiro de vencer no seu país se queria entrar nomercado mundial e a que eram poupados todos os seus concorrentes. Aunidade alemã tinha-se tornado uma necessidade económica. E a gente quea reclamava, agora, sabia o que queria. Tinha sido criada no comércio epara o comércio, entendia-se para comerciar e com ela podia-se tratar. Elasabia que se tem de exigir muito alto, mas que se tem também de baixarliberalmente. Ela cantava «a pátria alemã», incluindo a Estíria, o Tirol e «aÁustria rica de honras e vitórias», e:

Von der Maas bis an die Memel,von der Etsch bis an den Belt,Deutschíand, Deutschland über alies,über alies in der Welt (9*) —

mas estava pronta a conceder, desta pátria que tinha de ser sempremaior(10*) , um abatimento muito considerável — 25% a 30% — contra

pagamento a pronto. O seu plano de unidade estava feito e era praticávelde imediato.

A unidade alemã não era, porém, uma questão meramente alemã.Desde a guerra dos Trinta Anos[N210] já não havia um só assunto comumalemão que tivesse sido decidido sem a muito sensível ingerência doestrangeiro (11*) . Frederico II tinha conquistado a Silésia em 1740 com aajuda dos franceses. A França e a Rússia tinham literalmente ditado, em1803, a reorganização do Sacro Império Romano, por meio daReichsdeputationshauptschluss [N212]. Depois, Napoleão organizou aAlemanha segundo a sua conveniência. E finalmente, no Congresso deViena(12*) , ela foi de novo fragmentada, principalmente pela Rússia e, emsegunda linha, pela Inglaterra e pela França, em trinta e seis Estados, commais de duzentos farrapos de terra particulares, grandes e pequenos; e osdinastas alemães, tal qual como em 1802-1803 no Parlamento Imperial deRegensburg [N213], haviam sinceramente ajudado a isso e tornado ainda pior

a fragmentação. Além disto, foram entregues pedaços isolados da Alemanhaa príncipes estrangeiros. Assim estava a Alemanha, não só impotente edesamparada, consumida em zangas internas, política, militar e mesmoindustrialmente condenada à nulidade; mas, ainda mais grave, a França e a

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Rússia tinham adquirido, por uso repetido, um direito à fragmentação daAlemanha, assim como a França e a Áustria se arrogaram um direito dezelar por que a Itália permanecesse despedaçada. Foi este pretenso direitoque o tsar Nicolau tinha feito valer em 1850 quando, proibindo da maneiramais grosseira qualquer alteração da Constituição de própria iniciativa,forçou o restabelecimento do Parlamento Federal, essa expressão da

impotência da Alemanha.A unidade da Alemanha tinha pois de ser conquistada não só contra os

príncipes e outros inimigos internos, mas também contra o estrangeiro. Ecomo estavam, nessa altura, as coisas no estrangeiro?

Na França, tinha Luís Bonaparte utilizado a luta entre burguesia e classeoperária para se guindar à presidência com a ajuda dos camponeses, e aotrono imperial com a ajuda do exército. Mas um novo imperador Napoleão

feito pelo exército, dentro das fronteiras da França de 1815, era umabsurdo nado-morto. O império napoleónico renascido, isso queria dizer aextensão da França até ao Reno, a realização do sonho hereditário dochauvinismo francês. Mas, em primeiro lugar, Luís Bonaparte não tinha queter o Reno; qualquer tentativa nessa direcção teria tido como consequênciauma coligação europeia contra a França. Em contrapartida, oferecia-se umaocasião para elevar a posição de potência da França e proporcionar novoslouros ao exército, através de uma guerra dirigida, em acordo com quasetoda a Europa, contra a Rússia, que utilizara o período revolucionário naEuropa Ocidental para ocupar com toda a tranquilidade os principados doDanúbio e preparar uma nova guerra turca de conquista. A Inglaterraaliava-se com a França, a Áustria era favorável a ambas, só a heróicaPrússia beijava o chicote russo, que ainda na véspera a açoitava, epermanecia em neutralidade russófila. Mas nem a Inglaterra nem a Françaqueriam uma vitória séria sobre o adversário e assim a guerra terminounuma muito suave humilhação da Rússia e numa aliança russo-francesacontra a Áustria (13*) .

A guerra da Crimeia fez da França a potência dirigente da Europa e doaventureiro Luís Napoleão o maior homem do dia, o que, seguramente, nãoquer dizer muito. Mas a guerra da Crimeia não levou à França qualqueraumento territorial e trouxe no seio uma nova guerra, na qual LuísNapoleão devia cumprir a sua verdadeira vocação de «dilatador doImpério» (14*) . Esta nova guerra já tinha sido urdida durante a primeira, aoser permitido à Sardenha incluir-se na aliança das potências ocidentaiscomo satélite da França imperial, e especialmente como seu posto avançado— contra a Áustria. A guerra foi posteriormente preparada na conclusão dapaz, pelo acordo de Luís Napoleão com a Rússia[N214] 214, à qual nada eramais agradável do que um castigo da Áustria.

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Luís Napoleão era agora o ídolo da burguesia europeia. Não só porcausa da sua «salvação da sociedade» no 2 de Dezembro de 1851 [N95],onde certamente tinha aniquilado a dominação política da burguesia, maspara salvar a dominação social desta. Não só por ele ter mostrado comopode o sufrágio universal, em circunstâncias favoráveis, ser transformadonum instrumento para a opressão das massas; não só porque sob a

dominação dele a indústria e o comércio e, designadamente, a especulaçãoe a intrujice da Bolsa prosperavam de maneira nunca vista — mas, antes detudo, porque a burguesia reconhecia nele o primeiro «grande homem deEstado» que era carne da sua carne, sangue do seu sangue (15*) . Era umarrivista, como qualquer verdadeiro burguês. «Passado por todas aságuas», conspirador carbonário na Itália, oficial de artilharia na Suíça,distinto vagabundo endividado, polícia especial na Inglaterra [N215], massempre e por toda a parte pretendente, ele tinha-se preparado, por um

passado aventureiro e por comprometimentos morais em todos países daEuropa, para imperador dos franceses, dirigente dos destinos da Europa. Talcomo o burguês tipo, o americano, se prepara para milionário por uma sériede bancarrotas honradas e fraudulentas. Como imperador, não só colocou apolítica ao serviço do ganho capitalista e da intrujice da Bolsa, masempreendeu a própria política totalmente segundo os princípios da Bolsa devalores e especulou com o «princípio das nacionalidades». A fragmentaçãoda Alemanha e da Itália tinha sido até então, para a política francesa umdireito fundamental inalienável da França: Luís Napoleão dis-pôs-se logo adesfazer-se desse direito aos pedaços, a troco de pretensas compensações.Ele estava pronto a ajudar a Itália e a Alemanha a eliminar a suafragmentação, no pressuposto de que a Alemanha e a Itália lhe pagariamcada passo para a unificação nacional com uma cedência de território.Assim, não só foi satisfeito o chauvinismo francês, não só o império foigradualmente levado às suas fronteiras de 1801 [N216], como a França secolocou de novo enquanto potência especificamente esclarecida elibertadora dos povos, e Luís Napoleão como protector das nacionalidadesoprimidas. Então toda a burguesia esclarecida e entusiasta dasnacionalidades (porque vivamente interessada na remoção de todos osobstáculos aos negócios no mercado mundial) rejubilou unanimemente comestas Luzes libertadoras do mundo.

O começo foi feito na Itália(16*) . Desde 1849, a Áustria dominava aí ilimitadamente e a Áustria era então o bode expiatório geral da Europa. Amagreza dos resultados da guerra da Crimeia não foi imputada à indecisão

das potências ocidentais, que só tinham querido uma guerra de aparência,mas à posição indecisa da Áustria, da qual ninguém fora mais culpado queas próprias potências ocidentais. Mas a Rússia ficara tão ofendida com oavanço dos austríacos sobre o Prut — agradecimento da ajuda russa na

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Hungria em 1849 (embora este avanço tenha precisamente salvo a Rússia),que via com alegria qualquer ataque contra a Áustria. A Prússia já nãocontava, já era tratada en canaille(17*) no congresso da paz, de Paris [N217].E, assim, a guerra para a libertação da Itália «até ao Adriático» foi urdidacom a colaboração da Rússia, foi empreendida na Primavera de 1859 eterminada já no Verão, no Míncio. A Áustria não foi expulsa da Itália, a

Itália não ficou «livre até ao Adriático» e não foi unificada, a Sardenharecebera acréscimos; mas a França obtivera a Sabóia e Nice e tinha assim,do lado da Itália, as fronteiras de 1801 [N64].

Mas os italianos não estavam satisfeitos com isso. Na Itália era então amanufactura propriamente dita que predominava, a grande indústriaandava ainda de cueiros. A classe operária ainda não estava, nem de longe,completamente expropriada e proletarizada; nas cidades, possuía ainda osseus meios próprios de produção, no campo o trabalho industrial era umganho paralelo para pequenos camponeses possuidores de terras ou pararendeiros. Por conseguinte, a energia da burguesia ainda não estavaquebrada pela oposição face a um moderno proletariado com consciência declasse. E como só havia fragmentação na Itália pela dominação estrangeirada Áustria, sob cuja protecção os príncipes levavam ao extremo o seu maugoverno, a nobreza grande possuidora de terras e as massas populares dascidades estavam do lado da burguesia, enquanto campeã da independêncianacional. Mas, em 1859, sacudira-se a dominação estrangeira, excepto na

Venécia; a sua ingerência ulterior seria impossibilitada pela França e pelaRússia; já ninguém a receava. E a Itália possuía em Garibaldi um herói decarácter antigo, que podia fazer prodígios e os fez. Com mil voluntários[Freischärlern] derrubou todo o reino de Nápoles, unificou efectivamente aItália, rasgou o tecido artificial da política bonapartista. A Itália estava livree, em substância, estava unificada — não pelas intrigas de Luís Napoleão,mas pela revolução.

Desde a guerra italiana, a política externa do segundo Império francês já não era um segredo para ninguém. Os vencedores do grande Napoleãodeviam ser castigados — mas Vun après Vautre (18*) , um após outro. ARússia e a Áustria tinha recebido a sua parte, a próxima da série era aPrússia. E a Prússia era mais desprezada que nunca; a sua política durantea guerra italiana tinha sido cobarde e lastimosa, tal qual como no tempo dapaz de Basileia, em 1795 [N218]. Com a «política das mãos livres»[N219],chegou ela ao ponto de ficar inteiramente isolada na Europa, [ao ponto] detodos os seus vizinhos, grandes e pequenos, se regozijarem ante oespectáculo de como a Prússia foi batida, de as suas mãos só ficarem livrespara isto: ceder à França a margem esquerda do Reno.

De facto, nos primeiros anos após 1859, era convicção por toda a parte

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propalada e mais do que em parte nenhuma no próprio Reno, que amargem esquerda do Reno caberia irremediavelmente à França. Não eraprecisamente o que se desejava, mas via-se chegar isso como umafatalidade inevitável e — honra seja feita à verdade — também não sereceava muito isso. Entre os camponeses e pequenos burguesesredespertavam as velhas recordações do tempo dos franceses, que

realmente tinha trazido a liberdade; do lado da burguesia, estava já aaristocracia financeira, particularmente em Colónia, profundamenteimplicada nas intrujices do Crédit mobilier (19*) [N220] parisiense e noutrascompanhias de aldrabice bonapartistas, e clamava pela anexação (20*) .

Todavia, a perda da margem esquerda do Reno era o enfraquecimentonão só da Prússia, mas também da Alemanha. E a Alemanha estava maiscindida que nunca. A Áustria e a Prússia mais estranhas uma à outra quenunca por causa da neutralidade da Prússia na guerra italiana; a chusma depequenos príncipes, meio receosa de Luís Napoleão e meio desejosa dele,olhando-o como ao protector de uma renovada Confederação do Reno [N221]

— tal era a situação da Alemanha oficial. E isso num momento em que só asforças unidas da nação inteira eram capazes de evitar o perigo dodesmembramento.

Mas como unir as forças da nação inteira? Três vias estavam abertas,após as tentativas fracassadas de 1848, quase sem excepção nebulosas,

mas que também por isso mesmo tinham dissipado muita névoa.A primeira via era a da unificação efectiva através da eliminação de

todos os Estados singulares, logo, a via abertamente revolucionária. Estavia tinha acabado de conduzir à meta na Itália; a dinastia de Sabóia tinha-se juntado à revolução e embolsado assim a coroa da Itália. Mas de tal feitoaudacioso eram absolutamente incapazes os nossos Sabóias alemães, osHohenzollern, e mesmo os seus Cavour mais temerários à la(21*) Bismarck.O povo teria mesmo tido de fazer tudo — e numa guerra pela margemesquerda do Reno ele teria sido bem capaz de fazer o necessário. A retiradainevitável dos prussianos sobre o Reno, a guerra estacionária nasfortificações renanas, a traição, então indubitável, dos príncipes daAlemanha do Sul, podiam conseguir desencadear um movimento nacionalface ao qual seria pulverizada a inteira governação dos dinastas. E entãoLuís Napoleão seria o primeiro a embainhar a espada. O segundo Império sópodia utilizar, como adversários, Estados reaccionários perante os quaisaparecesse como continuador da Revolução Francesa, como libertador dos

povos. Contra um povo ele próprio em revolução, aquele era impotente; arevolução alemã vitoriosa podia até dar o impulso para o derrubamento doImpério francês inteiro. Esse era o caso mais favorável; no maisdesfavorável, se os dinastas se tornassem senhores do movimento, perdia-

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se temporariamente a favor da França a margem esquerda do Reno, punha-se simplesmente perante todo o mundo a traição activa ou passiva dosdinastas, e criava-se uma situação forçada onde não restaria à Alemanhaoutra saída que a revolução, a expulsão de todos os príncipes, oestabelecimento da República alemã unificada.

Tal como estavam as coisas, esta via para a unificação da Alemanha sópodia ser percorrida se Luís Napoleão iniciasse a guerra pela fronteira doReno. Contudo, esta guerra não se fez — por razões a mencionar deseguida. Mas com isso a questão da unificação nacional deixou de ser umaquestão vital premente, que tivesse de ser resolvida de um dia para o outrosob pena de ruína. Provisoriamente, a nação podia esperar.

A segunda via era a unificação sob a predominância da Áustria. Em1815, a Áustria tinha mantido de bom grado a situação que lhe fora imposta

pelas guerras napoleónicas, a de um território nacional compacto,arredondado. Ela já não reivindicava as suas possessões na Alemanha doSul, que outrora tinham sido separadas dela; contentava-se com a junçãode antigas e novas regiões, que geográfica e estrategicamente se deixavamajustar ao núcleo ainda restante da monarquia. A separação da Áustriaalemã do resto da Alemanha, introduzida pelas barreiras alfandegárias deJosé II, agravada pela administração policial italiana de Francisco I, levadaao extremo pela dissolução do Império alemão e da Confederação do Reno,manteve-se factualmente em vigor mesmo depois de 1815. Metternichrodeou o seu Estado, do lado alemão, por uma muralha da China em forma.As alfândegas mantinham fora da Alemanha os produtos materiais, acensura os produtos espirituais; as mais inqualificáveis chicanas depassaportes limitavam o intercâmbio pessoal ao mínimo mais necessário.No plano interno, um arbitrário absolutista ali existente, único mesmo naAlemanha, prevenia contra todo o movimento político, mesmo o maissuave. Assim se mantivera a Áustria absolutamente afastada de todo omovimento burguês-liberal da Alemanha. Com 1848, caiu, pelo menos em

grande parte, o muro de separação espiritual; mas os acontecimentosdaquele ano e as suas consequências eram pouco apropriados paraaproximar a Áustria da restante Alemanha; pelo contrário, a Áustriavangloriava-se cada vez mais da sua posição independente de grandepotência. E assim aconteceu que, apesar de se gostar dos soldadosaustríacos nas fortificações federais [N222] , e de os soldados prussianosserem detestados e ridicularizados, apesar de a Áustria ser cada vez maispopular em todo o Sul e o Oeste predominantemente católicos, ninguém

pensava seriamente, porém, numa unificação da Alemanha sobpredominância austríaca, excepto alguns pequenos e médios príncipes deEstado alemães.

Não podia mesmo ser de outro modo. A própria Áustria não tinha

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querido outra coisa, embora alimentasse em sossego sonhos imperiaisromânticos. A fronteira alfandegária austríaca permanecera, com o tempo, oúnico muro de separação material ainda restante no interior da Alemanha, oque a tornou tanto mais agudamente sensível. A política independente degrande potência não tinha qualquer sentido se não significasse o abandonodos interesses alemães a favor dos interesses especificamente austríacos,

logo, italianos, húngaros, etc. Tal como antes, também depois da revoluçãoa Áustria permaneceu o Estado mais reaccionário da Alemanha, aquele quemais contrariado seguiu a corrente moderna e, além disso, a única grandepotência especificamente católica ainda restante. Quanto mais o governo doapós-Março [nachmärzliche] [N223] se esforçava por restabelecer a velhagovernação dos padres e jesuítas, mais se lhe tornava impossível ahegemonia sobre um país em dois termos protestante. E, finalmente, umaunificação da Alemanha sob a Áustria só era possível através dorebentamento da Prússia. Mas, por pouco que este significasse, em si, umadesgraça para a Alemanha, o rebentamento da Prússia pela Áustria ter-se-iatornado tão funesto como o seria o rebentamento da Áustria pela Prússiaantes da vitória iminente da revolução na Rússia (após a qual se tornasupérfluo aquele, porque a Áustria, então tornada supérflua, tem de cair porsi mesma).

Numa palavra, a unidade alemã sob a asa da Áustria era um sonhoromântico e mostrou-se como tal quando, em 1863, os pequenos e médios

príncipes alemães se reuniram em Frankfurt para proclamarem FranciscoJosé da Áustria como imperador alemão. O rei da Prússia (22*) estevesimplesmente ausente e a comédia imperial caiu miseravelmente à água.

Ficava a terceira via: a unificação sob chefia prussiana. E esta via,porque realmente seguida, reconduz-nos para baixo, do domínio daespeculação para o terreno mais sólido, se bem que assaz sujo, da políticaprática, da «política realista» [N224].

Desde Frederico II, a Prússia via na Alemanha, tal como na Polónia, ummero território de conquista do qual se toma o que se pode apanhar, masque também há que partilhar com outros, como se compreende. A partilhada Alemanha com o estrangeiro — com a França, antes de mais — era a«vocação alemã» da Prússia desde 1740. «Je vais, je crois, jouer votre jeu;si les as me viennent, nous partagerons» (23*) («Vou, creio eu, jogar o vosso

jogo; se me vierem os ases, partilharemos») — foram as palavras dedespedida de Frederico ao plenipotenciário francês (24*) quando moveu a suaprimeira guerra [N225]. Fiel a esta «vocação alemã», a Prússia traiu aAlemanha em 1795 na Paz de Basileia, consentiu antecipadamente (tratadode 5 de Agosto de 1796), contra garantia de aumento territorial, nacedência à França da margem esquerda do Reno, e também cobrou

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efectivamente, pela Reichsdeputationshauptschluss , ditada pela Rússia epela França, o preço da traição do Império. Em 1805 traiu ainda as suasconfederadas, a Rússia e a Áustria, logo que Napoleão lhe estendeu oHannover — o isco em que mordia de cada vez — mas embrulhou-se tantona sua esperteza boçal que chegou até à guerra com Napoleão e recebeuem Jena o castigo merecido [N226]. Ressentindo-se destes golpes, queria

Frederico-Guilherme III renunciar, mesmo depois das vitórias de 1813 e1814, a todos os postos exteriores [Aussenposten] alemães ocidentais,limitar-se à posse da Alemanha do Nordeste, retirar-se, à semelhança daÁustria, o mais possível da Alemanha — o que teria transformado aAlemanha Ocidental inteira numa nova Confederação do Reno sobdominação protectora russa ou francesa. O plano não resistiu; inteiramentecontra a vontade do rei, foram-lhe impostas a Vestefália e a província doReno, e com isso uma nova «vocação alemã».

Exceptuada a compra de minúsculos farrapos de terra isolados, estavampor enquanto acabadas as anexações. No plano interno, veio a reflorescer,pouco a pouco, a velha governação junker-buro crática; as promessas deConstituição, feitas na amarga necessidade ao povo, forampersistentemente quebradas. Mas apesar de tudo isso também na Prússia aburguesia se elevava cada vez mais, pois sem indústria e sem comércio,mesmo o arrogante Estado prussiano era agora uma nulidade. Lentamente,com renitência, em doses homeopáticas, tiveram de ser feitas concessões

económicas à burguesia. E, num aspecto, ofereciam estas concessões aperspectiva de apoiar a «vocação alemã» da Prússia: no de que, paraeliminar as fronteiras alfandegárias estrangeiras entre as suas duasmetades, a Prússia convidou para a unificação alfandegária os Estadosalemães limítrofes. Assim nasceu a União aduaneira [ Zollverein], votopiedoso até 1830 (só o Hessen-Darmstadt tinha aderido), mas que depois,com o andamento algo mais rápido do movimento político e económico, embreve anexou economicamente à Prússia a maior parte da Alemanhainterior. Os territórios costeiros não prussianos ainda permaneceram de forapara além de 1848.

A União aduaneira foi um grande sucesso da Prússia. Que significasseuma vitória sobre a influência austríaca ainda era o mínimo. O principal eraque colocava do lado da Prússia a burguesia inteira dos médios e pequenosEstados. Exceptuada a Saxónia, não havia Estado alemão cuja indústria setivesse desenvolvido em medida sequer aproximada da prussiana; e istonão era só devido a prévias condições naturais e históricas, mas também ao

maior território alfandegário e ao mercado interno. E quanto mais a Uniãoaduaneira se estendia e os pequenos Estados eram incluídos neste mercadointerno, mais se habituavam os burgueses principiantes destes Estados aolhar para a Prússia como a sua potência economicamente — e um dia

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também politicamente — preponderante. E conforme os burguesestocavam, assim dançavam os professores. Aquilo que em Berlim oshegelianos construíam filosoficamente — ser a Prússia chamada a pôr-se àcabeça da Alemanha — demonstravam-no historicamente em Heidelberg osdiscípulos de Schlosser , nomeadamente Häusser e Gervinus. Com isso eranaturalmente pressuposto que a Prússia alteraria o seu inteiro sistema

político, satisfaria as exigências dos ideólogos da burguesia (25*) .Mas tudo isso aconteceu, não por particular predilecção pelo Estado

prussiano, tal como, porventura, os burgueses italianos aceitaram oPiemonte como Estado dirigente depois de este se ter abertamente colocadoà cabeça do movimento nacional e constitucional. Não, isso aconteceu comrenitência, os burgueses tomaram a Prússia como o menor mal: porque aÁustria os excluía do seu mercado e porque a Prússia, comparada com aÁustria, sempre tinha um certo carácter burguês, quanto mais não fossepela sua sovinice financeira. Perante os outros grandes Estados, a Prússiatinha de antemão duas boas instituições: o serviço militar obrigatório e aescola obrigatória. Ela tinha-as introduzido em tempos de afliçãodesesperada e tinha-se contentado, em melhores dias, com despojá-las. poraplicação negligente e mutilação deliberada, do seu caráctercircunstancialmente perigoso. Mas elas subsistiam no papel e, assim, aPrússia mantinha a possibilidade de um dia desdobrar, num grau inatingívelem qualquer outra parte para igual número de população, a energia

potencial adormecida na massa do povo. A burguesia acomodava-se comestas duas instituições; por 1840, o serviço pessoal obrigatório dos quecumpriam um ano, portanto os filhos de burgueses, era fácil de levar, eficava bastante em conta por corrupção, tanto mais que se dava entãopouco valor, mesmo no exército, aos oficiais da Landwehr [N227] recrutadosnos círculos comerciais e industriais. E o grande número de gente aindarestante da escola obrigatória, com uma certa soma de conhecimentoselementares, que havia incontestavelmente na Prússia, era no mais altograu útil à burguesia; tornou-se até insuficiente, por fim, com o progressoda grande indústria (26*) . As queixas sobre os altos custos das duasinstituições(27*) , expressos em pesados impostos, faziam-se ouvirsobretudo na pequena burguesia; a burguesia ascendente calculava que oscustos, com certeza desagradáveis, mas inevitáveis, de futura grandepotência, seriam largamente compensados pelos lucros aumentados.

Numa palavra, os burgueses alemães não tinham quaisquer ilusõessobre a amabilidade prussiana. Se desde 1840 a hegemonia prussiana erabem vista entre eles, isso só acontecia porque e na medida em que aburguesia prussiana, na sequência do seu mais rápido desenvolvimentoeconómico, se punha económica e politicamente à cabeça da burguesiaalemã, porque e na medida em que os Rotteck e os Welcker do Sul velho-

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constitucionalista eram eclipsados pelos Camphausen , Hansemann e Mildedo Norte prussiano, os advogados e professores [eclipsados] pela gente docomércio e pelos fabricantes. E sentia-se de facto nos liberais prussianos,nomeadameadamente nos renanos dos últimos anos antes de 1848, umsopro revolucionário inteiramente diferente do que se sentia nos liberais decantõezinhos do Sul [N228]. Nasceram então os dois melhores cantos

populares políticos desde o século XVI, o canto do burgomestre Tschech e oda baronesa de Droste-Vischering, de cuja temeridade se horrorizam hoje,na velhice, os mesmos que em 1846, despreocupadamente, cantavam

juntos:

Hatte je ein Mensch so'n PechWie der Bürgermeister Tschech,Dass er diesen dicken Mann

Auf zwei Schritt nicht treffen kann!(28*)

Mas tudo isso devia alterar-se em breve. Veio a revolução de Fevereiroe vieram as jornadas de Março, de Viena, e veio a revolução de Berlim do18 de Março. A burguesia tinha vencido sem lutar seriamente, nem sequerquisera a luta a sério quando esta veio. Ela que ainda pouco antes tinhacoqueteado com o socialismo e o comunismo (nomeadamente no Reno),notava agora de repente que não tinha só criado operários isolados, masuma classe operária, um proletariado na verdade ainda semiconfundido no

sonho mas a despertar pouco a pouco, revolucionário segundo a sua maisíntima natureza. E este proletariado, que conquistara por toda a parte avitória para a burguesia, colocava já reivindicações, nomeadamente emFrança, que eram incompatíveis com a existência da ordem burguesainteira; em Paris ocorreu a primeira luta terrível entre ambas as classes, a23 de Junho de 1848; após uma batalha de quatro dias, o proletariado foiderrotado. A partir daí a massa da burguesia na Europa inteira pôs-se dolado da reacção, aliou-se com os burocratas, feudais e padres absolutistas,derrubados precisamente por ela, antes, com a ajuda dos operários —contra os inimigos da sociedade, precisamente os mesmos operários.

Na Prússia isso aconteceu sob a forma seguinte: a burguesia abandonouos seus próprios representantes eleitos e viu com alegria, dissimulada ouaberta, a sua dispersão pelo governo em Novembro de 1848 [N229]. Oministério junker-burocrático, que se pavoneava agora ao longo de dezanos na Prússia, na verdade teve de governar sob formas constitucionais,mas vingou-se disso através de um sistema de chicanas e vexames

mesquinhos, até aí inauditos mesmo na Prússia, sob o qual ninguém maisdo que a burguesia havia de sofrer. Mas esta, arrependida, voltava a si,apanhava humildemente pancada e pontapés que lhe choviam em cimacomo castigo pelos seus apetites revolucionários de outrora, e aprendia

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agora, pouco a pouco, a pensar o que mais tarde exprimiu: cães, é o quenós somos!

Veio a regência. Para provar a sua fidelidade ao rei, Manteuffel fizerarodear de espiões o herdeiro do trono, o imperador actual (29*) , assim comoagora Puttkamer a redacção do Sozialdemokrat [N230]. Quando o herdeiro do

trono se tornou regente, Manteuffel naturalmente recebeu logo um pontapéque o pôs de lado e a Nova Era[N231] começou. Foi só uma mudança decena. O príncipe regente dignou-se permitir aos burgueses que voltassem aser liberais. Os burgueses fizeram uso, com prazer, desta permissão,imaginando que tinham agora a faca e o queijo na mão, que o Estadoprussiano teria de dançar ao som da sua música. Mas isso não era de modonenhum o propósito «nos círculos competentes», como diz o estiloreptilário. A reorganização do exército devia ser o preço pelo qual os

burgueses liberais pagavam a Nova Era. O governo só exigia com isso aexecução do serviço militar obrigatório até ao ponto em que tinha sido usualpor 1816. Do ponto de vista da oposição liberal, absolutamente nada podiaser dito em contrário que as suas próprias frases sobre a posição depotência da Prússia e a vocação alemã não lhe atirassem também à cara.Mas a oposição liberal ligava o seu consentimento à condição de que otempo de serviço legal fosse de dois anos no máximo. Isto era, em si,inteiramente racional, a questão porém era se isso se podia extorquir, se aburguesia liberal do país estava pronta a responder até ao extremo, combens e sangue, por essa condição. O governo teimava em três anos deserviço, a câmara em dois; o conflito rebentou [N232]. E com o conflito naquestão militar, voltou a política externa a ser decisiva também para ainterna.

Vimos como a Prússia, pela sua atitude na guerra da Crimeia e naguerra italiana, tinha perdido os últimos restos de consideração. Estapolítica lastimosa encontrava parcialmente uma desculpa no mau estado do

exército. Dado que já antes de 1848 não se podiam aplicar novos impostosou contrair empréstimos sem consentimento dos estados [ständische], mastambém não se queria convocar para isso os estados [Stände], nunca haviadinheiro bastante para o exército e este decaía por completo sob a avarezasem limites. O espírito de parada e de fanatismo da disciplina introduzidosob Frederico-Guilherme III fez o resto. A que ponto este exército deparada se mostrou sem recursos, em 1848, nos campos de batalhadinamarqueses, é o que se pode reler no conde Waldersee . A mobilizaçãode 1850 foi um fiasco completo[N233]; faltava de tudo e o que havia nãoprestava, a maior parte das vezes. Remediou-se então isso porconsentimento de crédito por parte da câmara; o exército foi sacudido davelha praxe, o serviço de campo suplantou, pelo menos em grande parte, o

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serviço de parada. Mas os efectivos do exército continuavam os mesmosque por 1820, enquanto todas as outras grandes potências, nomeadamentea França, da qual precisamente agora o perigo ameaçava, tinhamaumentado significativamente o seu poderio militar. E contudo, subsistia naPrússia o serviço militar obrigatório; cada prussiano era soldado no papel,ao passo que a população tinha crescido de dez milhões e meio (1817) para

dezassete milhões e três quartos (1858) e os quadros do exército nãoconseguiam incorporar e formar mais do que um terço dos aptos para oserviço militar. O governo exigia agora um reforço do exército quecorrespondesse quase precisamente ao crescimento da população desde1817. Mas os mesmos deputados liberais que exigiam continuamente dogoverno que este se pusesse à cabeça da Alemanha, que defendesse aposição de potência da Alemanha para o exterior, que restabelecesse a suaconsideração entre as nações — essa mesma gente era avara, regateava enada queria consentir a não ser na base do tempo de serviço de dois anos.Tinham eles o poder de impor a sua vontade, na qual insistiam tãotenazmente? Estava o povo, ou mesmo só a burguesia, atrás deles, prontopara atacar?

Pelo contrário. A burguesia jubilava com as lutas oratórias daquelescontra Bismarck, mas na realidade organizava um movimento que, emborainconscientemente, era de facto dirigido contra a política da maioriaprussiana da câmara. As intrusões da Dinamarca na Constituição doHolstein, as violentas tentativas de danização [Dänisierung] no Schleswig,indignavam o burguês alemão. Ser vexado pelas grandes potências, a issoestava ele habituado; mas levar pontapés da pequena Dinamarca inflamavaa sua cólera. Foi formada a União Nacional [Nationalverein] [N234];precisamente a burguesia dos pequenos Estados formava os seus efectivos.E a União Nacional, por muito liberal que fosse, exigia antes de todas ascoisas a unificação nacional sob direcção da Prússia, de uma Prússia quantopossível liberal, de uma Prússia como a de sempre se necessário. Que enfimse andasse para diante, se acabasse com a posição miserável dos alemãescomo homens de segunda classe no mercado mundial, se castigasse aDinamarca, se mostrassem os dentes às grandes potências no Schleswig-Holstein, isso era o que, antes de tudo, reclamava a União Nacional. Eassim estava agora liberta a exigência da chefia prussiana de todas asobscuridades e divagações que se lhe tinham colado até 1850. Sabia-secom precisão que ela significava a rejeição da Áustria para fora daAlemanha e a eliminação efectiva da soberania dos pequenos Estados, eque não se podiam ter ambas as coisas sem a guerra civil e sem a divisão

da Alemanha. Mas já não se receava a guerra civil e a divisão apenas faziao balanço do bloqueio alfandegário austríaco. A indústria e o comércio daAlemanha tinham-se desenvolvido a uma altura tal, a rede das casascomerciais alemãs, que abrangia o mercado mundial, tinha-se tornado tão

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extensa e tão densa, que no país já não se suportava mais o sistema depequenos Estados e a ausência de direito e de protecção no estrangeiro. Eenquanto a mais forte organização política que a burguesia alemã algumavez possuíra dava de facto aos deputados de Berlim esse voto dedesconfiança, estes regateavam à volta do tempo de serviço!

Tal era a situação quando Bismarck se dispôs a intervir activamente napolítica externa.

Bismarck é Luís Napoleão traduzido do aventureiro francês, pretendenteà coroa, para fidalgote [Krautjunker] prussiano e para estudante alemão decorporação [Korpsbursche]. Tal qual como Luís Napoleão, é Bismarck umhomem de grande entendimento prático e de grande esperteza, um homemde negócios nato e sabido, que noutras circunstâncias teria disputado olugar aos Vanderbilt e Jay Gould na Bolsa de Nova Iorque, assim como

soube pôr a salvo o seu bonito pé-de-meia. A este entendimentodesenvolvido no domínio da vida prática está frequentemente ligada,porém, uma correspondente estreiteza de horizontes e nisso excedeBismarck o seu precursor francês. Pois este tinha conseguido elaborar assuas «ideias napoleónicas» [N235] durante o seu tempo de vagabundo — elaseram conformes a isso — enquanto Bismarck, como veremos, não só nãorealizou vestígio de uma ideia política própria, mas apenas combinou asideias prontas de outros. Mas esta tacanhez foi precisamente a sua sorte.Sem ela não teria conseguido representar-se a inteira história universal doponto de vista especificamente prussiano; tivesse esta visão do mundo,prussiana de gema, um buraco por onde penetrasse a luz do dia, e ele ter-se-ia extraviado de toda a sua missão, teria acabado a sua glória. É certoque quando cumpriu, à sua maneira, a sua particular missão, que lhe foiprescrita de fora, tinha também esgotado o seu latim; veremos a quefalhanços se viu forçado na sequência da sua absoluta falta de ideiasracionais e da sua incapacidade de compreender a situação histórica por elemesmo criada.

Se Luís Napoleão se tinha habituado, pelo seu passado, a observarpoucos escrúpulos na escolha dos seus meios, Bismarck aprendeu dahistória da política prussiana, nomeadamente da do grande eleitor (30*) e deFrederico II, a proceder ainda menos escrupulosamente, no que podiaconservar a exaltante consciência de se manter assim fiel à tradição pátria.O seu entendimento dos negócios ensinou-lhe a reprimir a sua cobiça de

Junker, quando tinha de ser quando isso já não parecia necessário, elasobressaía outra vez de maneira crua; isso era certamente um sinal dedeclínio. O seu método político era o do estudante alemão de corporação; ainterpretação burlesca-literal do Bierkomment (31*) , pelo qual se sai deapuros em patuscada de estudantes, aplicava-a ele na câmara com inteiro

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desembaraço à Constituição prussiana; todas as inovações que introduziuna diplomacia são retiradas da estudantada das corporações. Mas se LuísNapoleão foi muitas vezes inseguro em momentos decisivos, como no golpede Estado de 1851, em que Morny teve positivamente de usar de violênciapara com ele para que prosseguisse o que estava começado, e como navéspera da guerra de 1870 em que a sua insegurança arruinou toda a sua

posição, tem de dizer-se de Bismarck que isso nunca lhe sucedeu. A suaforça de vontade nunca o abandonou; antes se mudava em brutalidadeaberta. E nisto reside, antes de tudo, o segredo dos seus sucessos. Emtodas as classes dominantes na Alemanha, nos Junker como nos burgueses,está a tal ponto perdido o último resto de energia, tornou-se a tal pontocostume, na Alemanha «culta», não ter vontade alguma, que o únicohomem entre eles que ainda tinha realmente vontade tornou-se o seu maiorhomem e tirano de todos eles, perante o qual, contra a própria consciência,como eles dizem, estavam prontos a «andar a toque de caixa» [über denStock springen]. Na Alemanha «inculta» ainda não se está certamente tãolonge; o povo operário tem mostrado que tem uma vontade da qual a fortevontade de Bismarck nada consegue.

Uma carreira brilhante estava à frente do nosso Junker da velha Marca[altmärkischer] se apenas tivesse coragem e entendimento para a agarrar.Não se tinha tornado Luís Napoleão o ídolo da burguesia, precisamente porter dispersado o seu Parlamento, mas elevado os seus lucros? E não tinhaBismarck os mesmos talentos para negócios que os burgueses tantoadmiravam no falso Bonaparte? Não era ele atraído para o seu Bleichrödercomo Luís Napoleão para o seu Fould? Não estava colocada em 1864, naAlemanha, uma contradição entre os deputados burgueses na câmara quequeriam regatear o tempo de serviço e, fora dela, os burgueses na UniãoNacional, que queriam a todo o custo actos nacionais, actos onde é precisoo militar? Contradição de todo semelhante à que havia na França, em 1851,entre os burgueses na câmara, que queriam refrear o poder do presidentee, fora dela, os burgueses que queriam calma e governo forte, calma a todoo custo — contradição que Luís Napoleão tinha resolvido ao dispersar oszaragateiros do Parlamento e ao dar calma à massa dos burgueses. Nãoestavam as coisas na Alemanha muito mais seguras ainda para um golpeaudacioso? Não tinha a burguesia fornecido o plano de reorganização,pronto e acabado, e não reclamava ela própria, em voz alta, um estadistaprussiano enérgico que havia de executar o plano dela, excluir a Áustria daAlemanha, unificar os pequenos Estados sob predominância da Prússia? Ese, com isso, se tivesse de tratar algo rudemente a Constituição prussiana,

afastar dentro e fora da câmara os ideólogos como mereciam, não sepoderia, tal como Luís Bonaparte, ter apoio no sufrágio universal? Quepodia ser mais democrático do que a introdução do sufrágio universal? Nãotinha Luís Napoleão demonstrado — por manejo judicioso — a inteira

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inocuidade daquele? E não oferecia precisamente esse sufrágio universal omeio de apelar para as grandes massas populares, de coquetear umpoucochinho com o movimento social nascente, se a burguesia semostrasse renitente?

Bismarck agarrou isso. Tratava-se de repetir o golpe de Estado de LuísNapoleão, de tornar claras e palpáveis, à burguesia alemã, as relações deforça reais, de dissipar à força os seus auto-enganos liberais, masexecutando as suas exigências nacionais coincidentes com os desejosprussianos. Primeiro foi o Schleswig-Holstein que ofereceu a ocasião paraagir. O terreno da política externa estava preparado. O tsar russo (32*)

estava ganho, graças ao serviço de carrasco prestado por Bismarck em1863 contra os polacos insurrectos [N236]; também Luís Napoleão tinha sidotrabalhado e podia, pelo seu querido «princípio das nacionalidades»,desculpar a sua neutralidade, senão o seu auxílio tácito, aos planos deBismarck; na Inglaterra, Palmerston era primeiro-ministro, mas ele sópusera o pequeno lorde John Russell nos Negócios Estrangeiros com o fimde ali se tornar ridículo. A Áustria, porém, era concorrente da Prússia pelapredominância na Alemanha e, precisamente neste assunto, ela devia tantomenos deixar a Prússia passar-lhe à frente quanto se tinha comportado, em1850 e 1851, como esbirro do tsar Nicolau no Schleswig-Holstein, de factomais baixamente ainda que a própria Prússia. A situação era, pois,extremamente favorável. Tanto quanto Bismarck odiava a Áustria, de tão

bom grado a Áustria teria descarregado na Prússia a sua cólera, mas com amorte de Frederico VII da Dinamarca só lhes restava intervir juntas contra aDinamarca — com tácita autorização russa e francesa. O êxito estavaantecipadamente assegurado enquanto a Europa permanecesse neutral; foiesse o caso, os ducados foram conquistados e cedidos na [conclusão da]paz[N237].

Com esta guerra a Prússia tivera a finalidade secundária deexperimentar perante o inimigo o seu exército, instruído desde 1850segundo novos princípios, reorganizado e reforçado em 1860. Eleconfirmara-se para além de toda a expectativa, e isso nas situações deguerra mais diversas. Que a espingarda de agulha era de longe superior àarma de carregar pela boca e que se compreendia como utilizá-lacorrectamente, provou-o o combate de Lyngby na Jutlântia, onde oitentaprussianos postados atrás de um bosque puseram em fuga, pelo seu fogorápido, o triplo dos dinamarqueses. Ao mesmo tempo, teve-se ocasião deobservar como os austríacos, da guerra italiana e da maneira de lutar dosfranceses, só tinham retirado a lição de que para nada serve atirar, overdadeiro soldado tem logo de carregar sobre o inimigo à baioneta; tomou-se boa nota disso, pois, à boca da arma de carregar pela culatra, não sepodia desejar táctica inimiga mais oportuna. E para pôr o mais rapidamente

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possível os austríacos em estado de se convencerem disso na prática, osducados foram entregues, em tempo de paz, à soberania comum da Áustriae da Prússia; criou-se assim uma situação puramente provisória que tinhade provocar conflito atrás de conflito e que pôs inteiramente nas mãos deBismarck a ocasião para quando quisesse utilizar tal conflito no seu grandegolpe contra a Áustria. Segundo o costume da política prussiana de

«explorar sem escrúpulos, até ao extremo» uma situação favorável, comodiz o Sr. von Sybel, era evidente que a pretexto da libertação de alemãesda opressão dinamarquesa fossem anexados à Alemanha duzentos mildinamarqueses do Schleswig do Norte. Mas quem saiu de mãos vazias foi ocandidato dos pequenos Estados e da burguesia alemã ao trono doSchleswig-Holstein, o duque de Augustenburg.

Assim fizera Bismarck, nos ducados, a vontade à burguesia alemãcontra a vontade da burguesia alemã. Expulsara os dinamarqueses,

desafiara o estrangeiro e o estrangeiro não se mexera. Porém, os ducados,logo que libertos, foram tratados como pais conquistado, não se lhesperguntou pela sua vontade, mas foram, sem rodeios, provisoriamentepartilhados entre a Áustria e a Prússia.

A Prússia tornou-se de novo uma grande potência, já não era a quintaroda no carro europeu; o cumprimento dos desejos nacionais da burguesiaestava no melhor caminho, mas a via escolhida não era a [via] liberal daburguesia. O conflito prussiano sobre o serviço militar perdurava, pois;tornava-se mesmo cada vez mais insolúvel. O segundo acto da acçãoprincipal(33*) de Bismarck tinha de ser iniciado.

A guerra dinamarquesa tinha cumprido uma parte dos desejosnacionais. O Schleswig-Holstein estava «liberto», o protocolo de Varsóvia ede Londres, em que as grandes potências tinham ratificado a humilhação daAlemanha face à Dinamarca [N238], era-lhes atirado aos pés, rasgado, e elasnão tinham bulido. A Áustria e a Prússia estavam de novo juntas, as tropas

de ambas tinham vencido lado a lado e já nenhum potentado pensava emviolar território alemão. Os apetites renanos de Luís Napoleão, até entãoempurrados para segundo plano por outros afazeres — a revolução italiana,o levantamento polaco, as complicações dinamarquesas, por último aexpedição do México[N239] —, já não tinham agora qualquer perspectiva.Para um homem de Estado conservador prussiano a situação mundialcorrespondia, pois, no exterior, inteiramente aos seus desejos. MasBismarck nunca foi conservador até 1871 — e nesta altura com maior razão

— e a burguesia alemã não estava de modo nenhum satisfeita.Antes como depois, a burguesia alemã movia-se na contradição

conhecida. Por um lado, exigia o poder político exclusivo para si, isto é, para

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um ministério escolhido entre a maioria liberal da câmara; e um talministério teria tido de conduzir uma luta de dez anos contra o velhosistema defendido pela coroa, até que a sua nova posição de poder fossedefinitivamente reconhecida; dez anos, portanto, de enfraquecimentointerno. Mas, por outro lado, ela reclamava uma transformaçãorevolucionária da Alemanha que só pela violência, logo por uma ditadura

efectiva, era exequível. E com isso, desde 1848, a burguesia tinha dadoprovas, vezes seguidas, em cada momento decisivo, de que não possuíavestígio da energia necessária para executar quer uma, quer outra coisa —muito menos as duas. Na política só há dois poderes decisivos: a violênciaorganizada do Estado, o exército, e a violência inorganizada, elementar, dasmassas populares. Apelar às massas, tinha-o a burguesia desaprendido em1848; isso receava-o ela mais ainda do que ao absolutismo. Mas o exércitonão estava de modo nenhum à sua disposição. Estava porém à disposiçãode Bismarck.

No conflito constitucional que ainda perdurava, Bismarck combatera atéao extremo as exigências parlamentares da burguesia, mas ardia de desejopor executar as exigências nacionais daquela; é que elas concordavam comos mais secretos votos cordiais da política prussiana. Se agora, mais umavez, ele fazia a vontade à burguesia contra a vontade da burguesia, setornava a unificação da Alemanha, tal como a burguesia a tinha formulado,uma verdade, então estava o conflito afastado por si mesmo e Bismarcktinha por isso mesmo de se tornar o ídolo dos burgueses, tal como LuísNapoleão, seu modelo.

A burguesia fornecia-lhe a meta, Luís Napoleão o caminho para a meta;só a execução permaneceu obra de Bismarck.

Para colocar a Prússia à cabeça da Alemanha, não só se tinha deempurrar, com violência, a Áustria para fora da Confederação Alemã [N240],mas também subjugar os pequenos Estados. Uma tal guerra fresca e

alegre [N241] de alemães contra alemães tinha sido desde sempre, na políticaprussiana, o meio principal do alargamento do território; nenhum bomprussiano receava algo de semelhante. Tão-pouco podia, de qualquer modo,suscitar escrúpulos o segundo meio principal: a aliança com o estrangeirocontra alemães. Tinha-se no bolso o sentimental Alexandre da Rússia. LuísNapoleão nunca desconhecera, na Alemanha, a vocação piemontesa daPrússia e estava inteiramente pronto a fazer um negociozinho comBismarck. Se pudesse obter por via pacífica aquilo de que precisava, naforma de compensações, ele preferiria. Também não precisava da margemesquerda do Reno inteira de uma só vez; se lhe fosse dada a retalho, umpedaço a cada novo progresso da Prússia, notar-se-ia menos e sempreconduziria à meta. Aos olhos do chauvinista francês uma milha quadrada no

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Reno valia bem a Sabóia e Nice inteiras. Tratou-se pois com Luís Napoleão eobteve-se a sua autorização para o aumento da Prússia e para umaConfederação da Alemanha do Norte [N242]. Está fora de dúvida (34*) que lhefoi oferecido, para isso, um pedaço de território alemão no Reno; nasnegociações com Govone, Bismarck falou da Baviera renana e do Hessenrenano. É certo que ele desmentiu isso depois. Mas um diplomata,

nomeadamente prussiano, tem o seu próprio parecer acerca dos limites nosquais se está legitimado ou mesmo obrigado a violentar suavemente averdade. A verdade é mulher, portanto tem de gostar particularmente disso,segundo a representação do Junker. Luís Napoleão não era tão tolo quepermitisse o aumento da Prússia sem que a Prússia lhe prometessecompensação; mais depressa teria Bleichröder emprestado dinheiro sem

juros. Mas ele não conhecia suficientemente os seus prussianos e foifinalmente intrujado. Numa palavra, quando se o teve seguro, houve aaliança com a Itália para o «golpe no coração».

O filisteu de diversos países indignou-se profundamente acerca destaexpressão. Inteiramente sem razão. À la guerre comme à la guerre (35*) . Aexpressão demonstra meramente que Bismarck reconhecia na guerra civilalemã de 1866 [N243] o que ela era, isto é, uma revolução, e que estavapronto a fazer prevalecer esta revolução com meios revolucionários. E foi oque fez. O seu procedimento face ao Parlamento Federal foi revolucionário.Em vez de se submeter à decisão constitucional das autoridades daConfederação, repreendeu-lhes a sua violação da Confederação — um puropretexto —, rompeu a Confederação, proclamou uma nova Constituição comum Parlamento Imperial eleito pelo sufrágio universal revolucionário eexpulsou finalmente de Frankfurt o Parlamento Federal [N244]. Na Alta Silésiaorganizou uma legião húngara sob o comando do general da revoluçãoKlapka e de outros oficiais da revolução, cujas tropas, compostas pordesertores e prisioneiros de guerra húngaros, deviam fazer a guerra contraos seus próprios chefes legítimos (36*) . Depois da conquista da Boémia,Bismarck dirigiu uma proclamação «aos habitantes do glorioso reino daBoémia» cujo conteúdo também era uma rude bofetada nas tradições dalegitimidade. Na paz, ele tomou para a Prússia as possessões inteiras detrês legítimos príncipes confederados alemães e de uma cidade livre (37*) ,sem que esta expulsão de príncipes, que não eram menos «de direitodivino» que o rei da Prússia, incomodasse de maneira alguma a suaconsciência cristã e legitimista. Numa palavra, foi uma revolução completa,executada com meios revolucionários. Naturalmente, somos os últimos a

reprovar-lhe isso. O que lhe reprovamos, pelo contrário, é ele não ter sidosuficientemente revolucionário, só ter sido revolucionário prussiano de cima,ter iniciado toda uma revolução numa posição em que só a podia executarpor metade e que, uma vez na via das anexações, se tenha contentado com

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quatro miseráveis pequenos Estados.

Mas agora, vinha atrás, a coxear, o Napoleão pequeno, e exigia a suapaga. Durante a guerra, ele tinha podido tomar no Reno o que lheaprouvesse; não só o país mas também as praças-fortes estavam adescoberto. Ele hesitou; esperava uma guerra demorada, queenfraquecesse ambas as partes — e vieram esses golpes rápidos, a derrotada Áustria em oito dias. Ele exigiu primeiro a Baviera renana e o Hessenrenano com Mainz — o que Bismarck designou ao general Govone comoterritório de indemnização possível. Mas agora já Bismarck não o podia dar,mesmo se quisesse. Os poderosos êxitos da guerra tinham-lhe impostonovas obrigações. No instante em que a Prússia se arvorava em protecção eabrigo da Alemanha, ela não podia desfazer-se, para o estrangeiro, deMainz, a chave do Reno central. Bismarck recusou. Luís Napoleão consentiuem negociar; só já reclamava o Luxemburgo, Landau, Saarlouis e o sector

carbonífero de Saarbruck. Mas também isto Bismarck já não podia ceder,tanto menos quanto também nisto era reivindicado território prussiano. Porque não lhes tinha mesmo Luís Napoleão deitado a mão em tempooportuno, quando os prussianos estavam retidos na Boémia? Enfim, nãohouve compensações para a França. Bismarck sabia que isso significavauma guerra ulterior com a França; mas era isso precisamente que lheconvinha.

Nas conclusões de paz, a Prússia não utilizou desta vez tão semescrúpulos a situação favorável, como antes era seu hábito em caso deêxito. E com boas razões. A Saxónia e o Hessen-Darmstadt foramintegrados na nova Confederação da Alemanha do Norte e já por isso forampoupados. A Baviera, Wurttemberg e Baden tinham de ser tratados combrandura, porque Bismarck tinha de concluir com eles as aliançasdefensivas e ofensivas secretas. E a Áustria — não lhe prestara Bismarckum serviço ao quebrar as complicações tradicionais que a amarravam àAlemanha e à Itália? Não lhe conseguira ele, agora, a posição de grande

potência independente a que há muito aspirava? Não soubera ele, de facto,melhor que a própria Áustria, o que servia a Áustria, ao vencê-la naBoémia? Não tinha a Áustria de perceber, manejando ajusta-damente, quea situação geográfica, a barreira recíproca dos dois países, fazia daAlemanha unificada à maneira prussiana a sua aliada necessária e natural?

Aconteceu assim que a Prússia, pela primeira vez na sua existência,podia rodear-se do brilho da generosidade — porque atirava com umasalsicha para [apanhar] um presunto (38*) .

Nem só a Áustria foi batida nos campos de batalha da Boémia —também o foi a burguesia alemã. Bismarck tinha-lhe demonstrado que sabiamelhor que ela mesma o que era proveitoso para ela. Do lado da câmara

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não era de pensar num prosseguimento do conflito. As reivindicaçõesliberais da burguesia estavam há muito tempo enterradas, mas as suasexigências nacionais mais se cumpriam dia após dia. Com uma rapidez euma precisão que a deixavam ela mesma admirada, Bismarck realizava oprograma nacional daquela. E depois de lhe ter provado de maneirapalpável, in corpore vili (39*) , no próprio corpo sórdido que era o dela, a sua

sonolência e falta de energia — e, com isso, a sua incapacidade total para aexecução do seu próprio programa — ele fez também de generoso peranteela e veio à câmara agora efectivamente desarmada, por motivo de umaindemnidade ao governo do conflito, contrário à Constituição. Comovida atéàs lágrimas, a câmara consentiu no avanço, de ora em dianteinofensivo[N245].

Apesar disso, foi lembrado à burguesia que também ela tinha sido

vencida em Königgrätz[N246]

. A Constituição da Confederação da Alemanhado Norte foi talhada segundo o padrão da Constituição prussiana [N247]

autenticamente interpretada pelo conflito. A recusa do imposto foi proibida.O chanceler federal e os seus ministros foram nomeados pelo rei da Prússia,independentemente de qualquer maioria parlamentar. A independência doexército para com o Parlamento, assegurada pelo conflito, foi tambémmantida face ao Parlamento Imperial. Mas, em contrapartida, os membrosdeste Parlamento Imperial tinham a elevada consciência de que erameleitos por sufrágio universal. Deste facto também eles eram lembrados ede maneira bem desagradável, à vista dos dois socialistas (41*) que tinhamassento entre eles. Pela primeira vez apareciam deputados socialistas,representantes do proletariado, num corpo parlamentar. Era um sinal demau presságio iminente.

Primeiramente, tudo isso não tinha significado. Tratava-se agora deacabar e explorar a nova unidade do império, pelo menos a do Norte, nointeresse da burguesia, e de atrair, também, através disso, os burgueses da

Alemanha do Sul para a nova Confederação. A Constituição daConfederação subtraía as relações economicamente mais importantes àlegislação de cada Estado singular e remetia a sua regulamentação para aConfederação: direito civil comum e livre circulação em todo o território daConfederação, direito de domicílio, legislação sobre ofícios, comércio,alfândegas, navegação, moedas, pesos e medidas, caminhos-de-ferro,canais, correios e telégrafos, patentes, bancos, toda a política externa,consulados, protecção ao comércio no estrangeiro, polícia médica, direitopenal, processo judicial, etc. A maioria destes objectos foi rapidamenteordenada por leis e, no conjunto, de modo liberal. E assim foram finalmenteeliminados — finalmente! — os piores abusos do sistema de pequenosEstados, que o mais das vezes obstruíam o caminho, por um lado, ao

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desenvolvimento capitalista, por outro, aos apetites prussianos dedominação. Mas isso não era conquista histórico-mundial nenhuma, como otrombeteava o burguês a tornar-se agora chauvinista; era antes uma muito,muito tardia e imperfeita imitação do que a Revolução Francesa já tinhafeito sessenta anos mais cedo e que há muito todos os Estados civilizadostinham adoptado. Em vez de vanglória, dever-se-ia ter tido vergonha de

que a Alemanha de «alta cultura» fosse a última a chegar lá.Durante todo este tempo da Confederação da Alemanha do Norte,

Bismarck veio de boa vontade ao encontro da burguesia no terrenoeconómico, e mostrou também, no tratamento de questões de poderparlamentar, punho de ferro, só que em luva de veludo. Foi o seu melhorperíodo; aqui e além pôde-se suspeitar da sua tacanhez especificamenteprussiana, da sua incapacidade de perceber que há na história mundialoutros e mais fortes poderes que exércitos e artimanhas de diplomatas

apoiadas em exércitos.Que a paz com a Áustria trazia no bojo a guerra com a França, não só

Bismarck o sabia como o queria também. Essa guerra devia oferecerprecisamente o meio para o completamento do império prusso-alemão (40*)

que a burguesia alemã lhe prescrevia. As tentativas para transformargradualmente o Parlamento Aduaneiro [N249] num Parlamento Imperial epara atrair, assim, pouco a pouco, os Estados do Sul à Confederação do

Norte, fracassaram ante os altos gritos dos deputados alemães do Sul:nenhum alargamento de competências! Não era mais favorável a disposiçãodos governos acabados de vencer no campo de batalha. Só uma novademonstração, palpável, de que a Prússia era poderosa de mais frente aeles, mas também bastante poderosa para os proteger — por conseguinteuma nova guerra, uma guerra alemã comum, podia trazer rapidamente omomento da capitulação. E depois a linha de separação do Meno [N250], queantes fora secretamente combinada entre Bismarck e Luís Napoleão, tinhacontudo sido aparentemente imposta por este à Prússia, após a vitória; aunificação com a Alemanha do Sul era, pois, violação do direito, reconhecidodesta vez formalmente, dos franceses à fragmentação da Alemanha, eracaso de guerra.

Entretanto, Luís Napoleão tinha de ver se encontrava algures nafronteira alemã um farrapo de terra que embolsasse como compensação deSadowa. Na recente formação da Confederação da Alemanha do Norte, oLuxemburgo tinha sido excluído; era pois, agora, um Estado que se

encontrava em união pessoal com a Holanda, mas de resto um Estadointeiramente independente. Além disso, era aproximadamente tãoafrancesado como a Alsácia e tinha decididamente muito mais inclinaçãopela França do que pela Prússia, positivamento detestada.

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O Luxemburgo é um exemplo flagrante daquilo que a miséria políticaalemã fez, desde a Idade Média, das terras fronteiriças franco-alemãs, etanto mais flagrante quanto o Luxemburgo pertenceu nominalmente àAlemanha até 1866. Composto, até 1830, de uma metade francesa e deoutra alemã, já cedo a parte alemã sofria a influência da civilizaçãofrancesa, superior. Os imperadores alemães luxemburgueses (42*) eram

franceses pela língua e pela cultura. Desde a incorporação no paísborgonhês (1440), o Luxemburgo permaneceu, como os restantes PaísesBaixos, em associação apenas nominal com a Alemanha; a sua admissão naConfederação Alemã de 1815 nada alterou também. Depois de 1830, aparte francesa e ainda uma bonita fatia da parte alemã couberam à Bélgica.Mas no restante Luxemburgo alemão tudo ficou ao modo francês: ostribunais, os serviços públicos, a câmara, tudo tratava em francês; todos osdocumentos públicos e privados, todos os livros de comércio eram redigidosem francês, todas as escolas secundárias ensinavam em francês, a línguaculta era e permanecia o francês — um francês, naturalmente, que gemia earfava sob o fardo da alteração consonântica do alto-alemão. Em suma,eram faladas duas línguas no Luxemburgo: um dialecto popular renano-francónio e o francês, mas o alto-alemão permanecia uma línguaestrangeira. A guarnição prussiana da Capital tornava isto tudo antes piordo que melhor. É bastante vergonhoso para a Alemanha, mas é verdade. Eeste afrancesamento consentido do Luxemburgo coloca também a uma luzcorrecta o curso semelhante das coisas na Alsácia e na Lorena alemã.

O rei da Holanda(43*) , duque soberano de Luxemburgo, sabia muitobem servir-se de dinheiro a pronto e mostrava-se disposto a vender oducado a Luís Napoleão. Os luxemburgueses teriam aceitadoincondicionalmente a sua incorporação na França — como o prova a suaatitude na guerra de 1870. A Prússia nada podia objectar do ponto de vistado direito internacional [völkerrechtlich], porque ela própria tinha operado aexclusão do Luxemburgo da Alemanha. As suas tropas estacionavam nacapital como guarnição federal de uma praça-forte federal alemã; assim queo Luxemburgo deixou de ser praça-forte federal, elas já não tinhamqualquer razão de ali estar. Mas por que não regressaram a casa, por quenão podia Bismarck consentir na anexação?

Simplesmente porque as contradições em que ele se embrulharavinham agora à luz do dia. Antes de 1866 a Alemanha ainda era para aPrússia puro território de anexação, onde se tinha de repartir com oestrangeiro. Depois de 1866, a Alemanha tornara-se protectorado

prussiano, que tinha de ser defendido das garras estrangeiras. Certamenteque, por considerandos prussianos, se tinham excluído pedaços alemãesinteiros da chamada Alemanha recém-fundada. Mas o direito da naçãoalemã à integralidade do seu próprio território impunha agora à coroa da

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Prússia a obrigação de impedir a incorporação desses pedaços do antigoterritório federal em Estados estrangeiros, de deixar-lhes em aberto, para ofuturo, a integração [Anschluss] no novo Estado prusso-alemão. Por isso setinha feito parar a Itália na fronteira do Tirol [N251], por isso não podia agorao Luxemburgo passar para Luís Napoleão. Um governo realmenterevolucionário podia declarar isso abertamente. Não assim o revolucionário

[Revolutionär] regiamente prussiano, que finalmente acabara por conseguirtransformar a Alemanha num «conceito geográfico» [N252] metternichiano .Do ponto de vista do direito internacional, ele mesmo se colocara fora darazão e só podia socorrer-se do direito internacional por aplicação da suaamada interpretação de patuscada de estudantes.

Se com isso não se tornou francamente ridículo, foi apenas porque LuísNapoleão, na Primavera de 1867, ainda não estava de modo nenhumpreparado para uma grande guerra. Houve acordo na conferência deLondres. Os prussianos evacuaram o Luxemburgo; a praça-forte foidemolida, o ducado foi declarado neutral [N253]. A guerra foi adiada outravez.

Luís Napoleão não podia sossegar com isso. O aumento de poder daPrússia estava, para ele, inteiramente certo, desde que obtivesse no Renoas compensações correspondentes. Ele queria con-tentar-se com pouco;deste pouco ainda fizera um abatimento mas sem nada ter obtido, fora

completamente intrujado. Um império bonapartista em França, porém, sóera possível se empurrasse gradualmente a fronteira para o Reno e se aFrança — na realidade ou mesmo na imaginação — permanecesse árbitro daEuropa. A deslocação da fronteira falhara, a posição de arbitragem estava jáameaçada, a imprensa bonapartista gritava pela desforra de Sadowa; seLuís Napoleão queria manter o seu trono, tinha de permanecer fiel ao seupapel e de ir buscar pela violência o que não tinha obtido às boas, apesar detodos os serviços prestados.

De ambos os lados, pois, intensos preparativos de guerra, querdiplomáticos, quer militares. E ocorreu então o seguinte acontecimentodiplomático:

A Espanha procurava um candidato ao trono. Em Março [1869],Benedetti , plenipotenciário francês em Berlim, ouve rumores de umapretensão ao trono por parte do príncipe Leopoldo de Hohenzollern;[Benedetti ] recebe ordem de Paris para investigar a coisa. O subsecretáriode Estado von Thile garante sob palavra de honra que o governo prussianonada sabe acerca disso. Numa visita a Paris, Benedetti vem a conhecer aopinião do imperador:

«Esta candidatura é essencialmente antinacional, o país não a

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tolerará, tem de ser impedida.»

Diga-se de passagem que Luís Napoleão provava aqui que já tinhadescido muito baixo. De facto, podia lá haver mais bela «vingança deSadowa» do que o reinado de um príncipe prussiano em Espanha, osdissabores inevitavelmente daí decorrentes, o embaraço da Prússia nasrelações internas dos partidos espanhóis, talvez até uma guerra, umaderrota da minúscula frota prussiana, em todo o caso a Prússia levada,perante a Europa, a uma situação sumamente grotesca? Mas Luís Bonaparte

já não podia permitir-se esse espectáculo. O seu crédito estava tão abaladoque ele se mantinha ligado ao ponto de vista tradicional segundo o qual umpríncipe alemão no trono espanhol poria a França entre dois fogos, eportanto não era de tolerar — ponto de vista infantil desde 1830.

Benedetti procurou, pois, Bismarck, para obter mais esclarecimentos e

para lhe tornar claro o ponto de vista da França (11 de Maio de 1869). Elenão veio a conhecer de Bismarck nada de particularmente determinado. MasBismarck bem ficou a conhecer por ele o que queria saber: que aapresentação da candidatura de Leopoldo significava a guerra imediata coma França. Estava assim na mão de Bismarck fazer rebentar a guerra quandolhe aprouvesse.

De facto, a candidatura de Leopoldo surgiu outra vez em Julho de 1870e conduziu logo à guerra, por muito que se eriçasse Luís Napoleão contra

ela. Não viu só que tinha caído numa armadilha. Soube também que setratava do seu império; tinha pouca confiança na veracidade dos seusbandos de celerados [Schwefelbande] [N254] bonapartistas, que lhegarantiam estar tudo pronto até ao último botão de polaina, e menosconfiança ainda na sua habilidade militar e administrativa. Mas asconsequências lógicas do seu próprio passado empurravam-no para aperdição; mesmo a sua irresolução apressava a sua queda.

Em contrapartida, não só Bismarck estava inteiramente pronto para abatalha do ponto de vista militar, mas tinha de facto, desta vez, o povoatrás de si, [povo] que só via uma coisa, através de todas as mentirasdiplomáticas de ambos os lados: tratava-se aqui de uma guerra não só peloReno, mas pela existência nacional. Reservas e Landwehr — pela primeiravez desde 1813 — de novo acorriam prontamente às fileiras, desejosas deluta. Pouco importava como tudo isso acontecera, pouco importava quepedaço da herança nacional bimilenária Bismarck, por iniciativa própria,prometera ou não prometera a Luís Napoleão: tratava-se de ensinar umavez por todas ao estrangeiro que não tem que imiscuir-se nas coisasinternas alemãs e que a Alemanha não era chamada a amparar o tronovacilante de Luís Napoleão por cedência de território alemão. E perante estelevantamento nacional dissipavam-se todas as diferenças de classe,

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diluíam-se todos os apetites de Confederação renana das cortes daAlemanha do Sul, todas as tentativas de restauração de príncipes banidos.

Ambas as partes tinham solicitado alianças. Luís Napoleão tinha segurasa Áustria e a Dinamarca, bastante segura a Itália. Bismarck tinha a Rússia.Mas a Áustria, como sempre, não estava pronta, não pôde interviractivamente antes de 2 de Setembro — e a 2 de Setembro estava LuísNapoleão prisioneiro de guerra dos alemães, e a Rússia avisara a Áustria deque esta seria atacada assim que atacasse a Prússia. Mas na Itáliadesforrava-se a política pérfida de Luís Napoleão: ele pusera em marcha aunidade nacional, mas queria com isso proteger o papa dessa mesmaunidade nacional; ocupara Roma com tropas de que precisava agora no paíse que não podia retirar sem antes obrigar a Itália a respeitar Roma e o papacomo soberano; o que, por sua vez, impedia a Itália de lhe acudir. Porúltimo, a Dinamarca recebeu da Rússia a ordem de se manter quieta.

Mais decisivos, porém, do que todas as negociações diplomáticas,agiram na localização da guerra os golpes rápidos das armas alemãs, deSpichern e Wörth até Sedan [N255]. O exército de Luís Napoleão sucumbiaem cada combate e, finalmente, três quartas partes dele encaminharam-separa a Alemanha prisioneiras de guerra. Isso não foi culpa dos soldados,que se bateram bastante corajosamente, mas antes dos chefes e daadministração. Mas quando se conseguiu um império, como Luís Napoleão,com a ajuda de um bando de vagabundos, quando se manteve esse impériodurante dezoito anos só porque se entregou a França, para exploração, aesse mesmo bando, quando se ocuparam todos os postos decisivos doEstado com gente desse bando, precisamente, e todos os lugaressubalternos com os seus cúmplices, então não se deve empreendernenhuma luta de vida ou de morte, se não se quer ficar ao desamparo. Emmenos de cinco semanas desmoronou-se todo o edifício do Império, quedurante anos fora o espanto dos filisteus europeus; a revolução do 4 deSetembro [N67] só removeu os escombros; e Bismarck, que partira para aguerra para fundar um império pequeno-alemão [kleindeutschesKaiserreich], achou-se uma bela manhã fundador de uma repúblicafrancesa.

Segundo a própria proclamação de Bismarck, a guerra não foraconduzida contra o povo francês, mas contra Luís Napoleão. Com a quedadeste, desaparecia também todo o fundamento para a guerra. Isto tambémimaginava o governo do 4 de Setembro — não tão ingénuo, aliás — e ficoumuito surpreendido quando Bismarck bruscamente mostrou o seu avesso de

Junker prussiano.

Ninguém no mundo tem tamanho ódio aos franceses quanto o Junker prussiano. É que não só o Junker, até aí livre de impostos, tinha duramente

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sofrido durante o castigo infligido pelos franceses, de 1806 a 1813 —castigo que ele atraiu a si pela sua própria vaidade; pior ainda, os ímpiosfranceses tinham a tal ponto transviado as cabeças, com a sua revoluçãosacrílega, que o antigo esplendor junker fora na sua maior parte sepultado,mesmo na velha Prússia; que os pobres Junker tinham de conduzir umadura luta, ano após ano, pelos últimos restos deste esplendor, e que uma

grande parte de entre eles tinha já decaído até ao nível de uma pelintranobreza de parasitas. Tinha de ser tirada vingança da França por causadisso e os oficiais junker no exército cuidaram disso sob a direcção deBismarck. Tinham sido feitas listas das contribuições de guerra que osfranceses exigiram à Prússia e mediram-se a partir daí os impostos alevantar de cada cidade e departamento — mas, naturalmente, tomando emconsideração a riqueza muito maior da França. Requisitaram-se víveres,forragem, vestuário, calçado, etc, com brutalidade ostensiva. Umburgomestre, nas Ardenas, que declarou não poder fazer a entrega, recebeusem mais vinte e cinco bastonadas; o governo de Paris publicou a provaoficial disso. Os franco-atiradores [N256], que agiam tão precisamentesegundo as prescrições do regulamento prussiano de 1813 da milíciaterritorial [Landsturm] [N257] como se o tivessem expressamente estudado,foram fuzilados sem piedade onde foram apanhados. Também as históriasde relógios de pêndulo enviados para a Alemanha são verdadeiras, mesmoa Könische Zeitung noticiou isso. Só que, segundo conceitos prussianos,estes relógios de pêndulo não eram roubados, mas bens sem donoencontrados em casas de campo abandonadas dos arredores de Paris, eanexados para os entes queridos na pátria. E foi assim que os Junker , sob adirecção de Bismarck, tiveram o cuidado de conservar e de inculcar nosfranceses o carácter especificamente prussiano da guerra — apesar daatitude irrepreensível quer das tropas quer de uma grande parte dos oficiais— mas também o cuidado de que os franceses responsabilizassem oexército inteiro pela odiosidade mesquinha dos Junker.

E, porém, estava reservado a estes Junker prestar ao povo francês umahonra inigualada, até à data, em toda a história. Quando falharam todas astentativas para fazer levantar o cerco de Paris, repelidos todos os exércitosfranceses, falhada a última grande ofensiva de Bourbaki na linha decomunicação dos alemães, quando toda a diplomacia da Europa, sem mexerum só dedo, abandonou a França ao seu destino, finalmente, esfomeada,Paris teve de capitular. E o coração dos Junker bateu mais forte quandofinalmente puderam entrar, triunfantes, no ninho ímpio e tirar plenavingança dos inveterados rebeldes de Paris — a plena vingança que lhesfora interdita em 1814 por Alexandre da Rússia e em 1815 por Wellington;podiam agora castigar à vontade o foco e a pátria da revolução.

Paris capitulou; pagou 200 milhões como imposto de guerra; os fortes

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foram entregues aos prussianos; a guarnição depôs as armas perante osvencedores e entregou a sua artilharia de campanha; os canhões damuralha foram retirados das suas carretas; todos os meios de resistênciapertencentes ao Estado foram entregues peça a peça — mas não se tocounos defensores de Paris propriamente ditos, a guarda nacional, o povo deParis em armas, a quem ninguém pediu que entregasse as armas, nem

espingardas, nem canhões (44*) ; e assim foi conhecido de todo o mundo queo exército alemão vitorioso se deteve, respeitoso, perante o povo armadode Paris, os vencedores não entraram em Paris, mas tiveram de secontentar com a ocupação, durante três dias, dos Champs-Elysées (45*) —um jardim público! — guardados, vigiados e bloqueados ao redor pelassentinelas dos parisienses! Nenhum soldado alemão pôs os pés no Município[Stadthaus] de Paris, nenhum pisou as avenidas, e os poucos que foramadmitidos no Louvre para admirar os tesouros artísticos tiveram de pedir

autorização, era quebra da capitulação. A França estava abatida, Parisesfomeada, mas o povo parisiense, pelo seu passado glorioso, tinhaassegurado o respeito a tal ponto que nenhum vencedor ousava exigirdesarmá-lo, nenhum tinha a coragem de procurá-lo em casa e de profanarcom uma marcha triunfal essas ruas, campo de batalha de tantasrevoluções. Era como se o imperador alemão de fresca data (46*) tirasse ochapéu diante dos revolucionários de Paris vivos, como outrora o seuirmão(47*) diante dos combatentes de Março de Berlim mortos [N258], e

como se atrás dele estivesse e apresentasse armas o exército alemãointeiro.

Mas também foi o único sacrifício que Bismarck teve de impor-se. Sobpretexto de que não havia em França nenhum governo que com ele pudesseconcluir a paz — o que era exactamente tão verdadeiro e tão falso a 4 deSetembro como a 28 de Janeiro [N259] —, tinha aproveitado genuinamente, àprussiana, os seus êxitos até à última gota e só se declarara pronto para apaz depois do completo esmagamento da França. Mesmo na conclusão dapaz, foi outra vez «aproveitada sem escrúpulos a situação favorável», comose diz em bom prussiano antigo. Não só se extorquiu a soma inaudita decinco mil milhões de indemnização de guerra, mas também se arrancaramda França e se incorporaram na Alemanha duas províncias, a Alsácia e aLorena alemã, com Metz e Estrasburgo. Com esta anexação, Bismarckintervém pela primeira vez como político independente, que já não conduz àsua maneira um programa que lhe é prescrito do exterior, mas traduz emfactos os produtos do seu próprio cérebro; e com isso comete ele o seu

primeiro disparate colossal (48*) .A Alsácia foi conquistada pela França, quanto ao principal, na guerra

dos Trinta Anos. Com isso esquecera Richelieu o sólido princípio de

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Henrique IV:

«Que a língua espanhola seja para o espanhol, a alemã para oalemão; mas onde se fala francês, isso é comigo»;

ele [Richelieu] apoiou-se no princípio da fronteira natural do Reno, dafronteira histórica da Gália antiga. Isso era loucura; mas o Impérioalemão (49*) , que incluía os domínios linguísticos franceses da Lorena e daBélgica e até do Franche-Comté (50*) , não tinha o direito de reprovar àFrança a anexação de países de língua alemã. E se Luís XIV, em plena paz,se apoderou de Estrasburgo em 1681, com a ajuda de um partido deinspiração francesa na cidade [N260], ficava mal à Prússia indignar-se comisso, depois de ter violentado do mesmo modo, se bem que sem êxito, acidade imperial livre de Nuremberg, certamente sem ter sido chamada por

um partido prussiano(51*)

.A Lorena foi vendida ao desbarato pela Áustria à França em 1735,

quando da paz de Viena, e acabou por tornar-se possessão francesa em1766. Desde há séculos que ela só nominalmente pertencia ao Impérioalemão, os seus duques eram franceses sob todos os aspectos e quasesempre aliados da França.

Existiu nos Vosgos, até à Revolução Francesa, uma quantidade de

pequenos senhorios que se comportavam, face à Alemanha, como Estadosimediatos do Império [reichsunmittelbare Reichstände] mas, que, face àFrança, tinham reconhecido a sua suserania; eles tiravam vantagem destaposição híbrida e, se o Império alemão tolerava isso em vez de pedir contasaos senhores dinastas, não podia queixar-se quando a França, por força dasua suserania, tomava sob protecção os habitantes destes territórios contraos dinastas banidos.

No conjunto, este território alemão não foi quase nada afrancesado até

à Revolução. O alemão permaneceu língua escolar e administrativa nasrelações internas, pelo menos da Alsácia. O governo francês favoreceu asprovíncias alemãs, que conseguiam agora, após devastações de guerra delongos anos, já não ver nenhum inimigo no seu solo, desde o começo doséculo dezoito. Dilacerado por eternas guerras intestinas, o Império alemãonão era deveras feito para atrair os alsacianos a regressarem ao seiomaterno; pelo menos tinha-se sossego e paz, sabia-se em que ponto seestava e assim se conformava com o desígnio insondável de Deus o filistério[Philisterium] que dava o tom. Contudo, o destino dos alsacianos não erasem exemplo, pois também os habitantes do Holstein estavam sobdominação estrangeira dinamarquesa.

Veio a Revolução Francesa. O que a Alsácia e a Lorena nunca tinham

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ousado esperar da Alemanha foi-lhes oferecido pela França. As grilhetasfeudais foram quebradas. O camponês servo, sujeito à corveia, tornou-seum homem livre, em muitos casos proprietário livre da sua granja [Gehöft]e do seu campo. Nas cidades, a dominação dos patrícios e os privilégios dascorporações desapareceram. A nobreza foi banida. E nos territórios dospequenos príncipes e senhores os camponeses seguiram o exemplo dos

vizinhos, expulsaram os dinastas, as câmaras do governo e a nobreza edeclararam-se cidadãos franceses livres. Em parte nenhuma da França opovo abraçou com mais entusiasmo a Revolução do que, precisamente, nade fala alemã. E então quando o Império alemão declarou guerra àRevolução, quando os alemães, que não só ainda traziam obedientementeas suas próprias cadeias, se prestaram, para mais, a impor de novo aosfranceses a antiga servidão e aos camponeses alsacianos os senhoresfeudais que acabavam de ser banidos, acabou-se o carácter alemão[Deutschheit] dos alsacianos e lorenos, que aprenderam aí a detestar e adesprezar os alemães; em Estrasburgo foi então escrita, composta e pelaprimeira vez cantada por alsacianos a Marseillaise(52*) ; apesar da língua edo passado, abundaram os franceses-alemães em centenas de campos debatalha, na luta pela Revolução, conjuntamente num só povo com osfranceses de nacionalidade.

Não realizou a grande Revolução o mesmo prodígio com os flamengosde Dunquerque, com os celtas da Bretanha, com os italianos da Córsega? E

quando nos queixamos de que isso tenha também acontecido com alemães,esquecemos então toda a nossa história, que o tornou possível? Teremosesquecido que toda a margem esquerda do Reno, que só passivamenteparticipou na Revolução, tinha sentimentos franceses quando os alemães aliregressaram em 1814 e de sentimentos franceses ficou até 1848, quando aRevolução reabilitou os alemães aos olhos dos renanos? Que o entusiasmode Heine pelos franceses, e mesmo o seu bonapartismo (53*) , não eramoutra coisa do que o eco da disposição geral do povo da margem esquerdado Reno?

Quando da entrada dos aliados, em 1814, foi precisamente na Alsácia ena Lorena alemã que eles encontraram a inimizade mais decidida, aresistência mais rude no povo mesmo; porque se sentia, aqui, o perigo deter de voltar a ser alemão. E, contudo, ali ainda só quase se falava alemãonesse tempo. Mas quando passou o perigo de serem extorquidas à França,quando acabou o apetite de anexação dos chauvinistas alemães-românticos,perceberam a necessidade de se integrarem cada vez mais na França, do

ponto de vista linguístico também; e desde então introduziu-se o mesmoafrancesamento das escolas que os luxemburgueses tinham de livrevontade adoptado entre eles. No entanto, o processo de transformaçãoandou muito lentamente; só a presente geração da burguesia é realmente

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afrancesada, ao passo que camponeses e operários falam alemão. Está-semais ou menos como no Luxemburgo: o alemão literário é suplantado pelofrancês (excepto, parcialmente, no púlpito), mas o dialecto popular alemãosó perdeu terreno na fronteira linguística e é muito mais empregue comolíngua corrente do que na maior parte das regiões da Alemanha.

É este o país que Bismarck e os Junker prussianos, apoiados, ao queparece, pela reanimação de um romantismo chauvinista inseparável detodas as questões alemãs, empreenderam tornar alemão outra vez. Querertornar alemã a pátria da Marselhesa, Estrasburgo, era um contra-senso, talqual como querer tornar francesa a pátria de Garibaldi, Nice. Contudo, emNice, manteve Luís Napoleão a decência, fez votar a anexação — e amanobra resultou. Abstraindo de que os prussianos detestavam, por muitoboas razões, tais medidas revolucionárias — ainda nunca aconteceu, ondequer que seja, que a massa do povo aspirasse à anexação pela Prússia —

sabia-se muito bem que, precisamente aqui (54*) , a população pendia maisunanimemente para a França do que os próprios franceses denacionalidade. E executou-se assim o golpe de força simplesmente pelaviolência. Foi um pedaço da vingança contra a Revolução Francesa;extorquia-se um dos pedaços que se tinham fundido com a Françaprecisamente com a Revolução.

Militarmente, a anexação tinha com certeza uma finalidade. Através deMetz e Estrasburgo, a Alemanha obtinha uma frente de defesa de enormeforça. Enquanto a Bélgica e a Suíça permanecerem neutrais, um ataquemaciço francês não pode incidir em nenhuma outra parte que não seja oestreito território entre Metz e os Vosgos; e, para isso, Coblença, Metz,Estrasburgo e Mainz formam o mais forte e o maior quadrilátero de praças-fortes do mundo. Mas este quadrilátero de praças-fortes, tal como oaustríaco na Lombardia (55*) , também tem metade em terra inimiga e formaali cidadelas para a repressão da população. Mais: para o completar, tevede se usurpar fora do território de língua alemã, teve de se anexar umquarto de milhão de franceses de nacionalidade.

A grande vantagem estratégica é, pois, o único ponto que podedesculpar a anexação. Mas está este ganho em qualquer proporção com odano que com ele se faz?

Quanto ao grande inconveniente moral em que se pôs o jovem Impérioalemão ao declarar a violência brutal, abertamente e sem disfarce, comoseu princípio fundamental — para isso não tem olhos o Junker prussiano.Pelo contrário, para ele são uma necessidade súbditos recalcitrantes,mantidos com violência de rédea apertada; eles são demonstrações dopoder prussiano acrescido; e, no fundo, nunca teve outros. Mas aquilo paraque era obrigado a ter olhos era para as consequências políticas da

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anexação. E elas estavam claramente à luz do dia. Ainda antes de aanexação ter tido força de lei, Marx gritava ao mundo aquelas[consequências] numa circular da Internacional: «A anexação da Alsácia eda Lorena faz da Rússia o árbitro da Europa.»(56*) E os sociais-democratasrepetiram-no muitas vezes da tribuna do Parlamento Imperial, até que averdade desta proclamação foi finalmente reconhecida pelo próprio

Bismarck, no seu discurso do Parlamento Imperial, de 6 de Fevereiro de1888, no seu gemer perante o tsar todo-poderoso, senhor da guerra e dapaz.

Isso, contudo, era claro como a luz do dia. Ao arrancarem-se à Françaduas das suas províncias mais fanaticamente patrióticas empurrava-seaquela para os braços de quem lhe oferecesse a perspectiva de restituiçãodessas províncias, fazia-se da França um inimigo eterno. Com certezaBismarck — que a este respeito representa digna e conscienciosamente osfilisteus alemães — reclama dos franceses que renunciem à Alsácia-Lorenanão só do ponto de vista do direito público mas também moralmente, queainda se alegrem devidamente por estes dois pedaços da Françarevolucionária «serem reentregues à antiga mãe pátria», coisa de que elesrotundamente não querem ouvir falar. Infelizmente, porém, os francesesfazem-no tão pouco quanto os alemães, durante as guerras napoleónicas,renunciaram moralmente à margem esquerda do Reno, embora esta demodo nenhum tivesse, nesse tempo, saudades deles. Enquanto os

alsacianos e os lorenos reclamarem regressar à França, tem e terá a Françade esforçar-se pela sua recuperação e procurar os meios para tal, logo,entre outras coisas, procurar aliados. E o aliado natural contra a Alemanhaé a Rússia.

Se as duas maiores e mais fortes nações da parte ocidental docontinente se neutralizam mutuamente pela sua hostilidade, se até mesmohá entre elas um eterno pomo de discórdia que as excita à luta uma contraa outra, então, nisso só tem vantagem a Rússia, cujas mãos ficam assimtanto mais livres; a Rússia, que será tanto menos estorvada pela Alemanhanos seus apetites de conquista quanto mais puder esperar apoioincondicional da França. E não acabou Bismarck por deixar a França nasituação de mendigar aliança à Rússia, de ter de abandonar de bom gradoConstantinopla à Rússia, desde que a Rússia apenas lhe prometesse asprovíncias perdidas? E se, não obstante, a paz foi mantida dezassete anos,donde vem isso senão do facto de o sistema de milícia introduzido naFrança e na Rússia necessitar pelo menos de dezasseis anos até mesmo

vinte e cinco anos, depois dos recentes melhoramentos alemães — parafornecer o número completo de contingentes exercitados? E a anexação,após já ter sido durante dezassete anos o facto predominante em toda apolítica da Europa, não é neste instante a causa fundamental de toda a crise

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que ameaça com a guerra esta parte do mundo? Retire-se este único factoe a paz fica assegurada!

Com o seu francês de sotaque alto-alemão [oberdeutsch], o burguêsalsaciano, esse janota atravessado que se dá ares de francês como qualquerfrancês de cepa, que olha Goethe de alto e se entusiasma por Racine, quenão se livra com isso da má consciência do seu secreto carácter alemão e,por isso mesmo, tem de fanfarronar desdenhando de tudo o que é alemão,de tal modo que nem sequer presta para medianeiro entre a Alemanha e aFrança — este burguês alsaciano é certamente um sujeito desprezível, sejaele fabricante em Mulhouse ou jornalista em Paris. Mas quem fez dele o queé senão a história alemã dos últimos trezentos anos? E, até há muito poucotempo, não eram quase todos os alemães no estrangeiro, nomeadamenteos comerciantes, autênticos alsacianos, que renegavam a sua qualidade dealemães [Deutschtum], que, com uma verdadeira autocrueldade para com

animais, faziam a si próprios crueldades pela nacionalidade estrangeira dasua nova pátria, e se tornavam assim, de livre vontade, no mínimo tãoridículos como os alsacianos — que, contudo, eram mais ou menos forçadosa isso pelas circunstâncias? Na Inglaterra, por exemplo, toda a comunidadede comerciantes [Kaufmannschaft] alemães imigrados de 1815 a 1840estava quase sem excepção anglicizada, quase só falava inglês entre si, epela Bolsa de Manchester, por exemplo, ainda hoje perambulam diversosvelhos filisteus alemães que dariam metade da sua fortuna para poderempassar por perfeitos ingleses. Só desde 1848 é que alguma mudança foiintroduzida nisto e, desde 1870, mesmo quando o tenente de reserva vem aInglaterra e Berlim envia aqui o seu contingente, o rastejamento de outroraé suplantado por uma arrogância prussiana que não nos torna menosridículos no estrangeiro.

E foi nalguma coisa acomodada ao. gosto dos alsacianos a união com aAlemanha, desde 1871? Pelo contrário. Foram colocados sob ditadura,enquanto ao lado, na França, a república dominava. Intro-duziu-se entre

eles a pedante e importuna administração prussiana do conselho regional[Landratswirtschaft] frente à qual é de ouro a ingerência — estritamenteregida pela lei — da mal afamada administração francesa dos prefeitos.Deu-se um fim rápido aos últimos restos de liberdade de imprensa, dedireito de reunião e de associação, foram dissolvidos os municípiosrecalcitrantes e instalados burocratas alemães como burgomestres. Emcontrapartida, porém, foram lisonjeados os «notáveis», isto é, os nobres eburgueses completamente afráncesados, e foram protegidos no seuespremer dos camponeses e operários, que, se não eram de sentimentosalemães, eram contudo de fala alemã — e formavam o único elemento como qual se podia entabular uma tentativa de reconciliação. E que se obtevedaí? Que em Fevereiro de 1887, quando a Alemanha inteira se deixouintimidar e enviou para o Parlamento Imperial a maioria do cartel de

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Bismarck[N262], a Alsácia-Lorena só elegeu então franceses decididos erejeitou todo aquele que era suspeito das mais leves simpatias alemãs.

Se agora os alsacianos são como são, temos nós direito de nos irritarcom isso? De modo nenhum. A sua antipatia pela anexação é um factohistórico que exige, não ser demolido, mas esclarecido. E aí, temos de nos

perguntar: quantos e quão colossais erros históricos não teve a Alemanhade cometer até se ter tornado possível esta disposição de espírito naAlsácia? E como terá de apresentar-se, visto do exterior, o nosso novoImpério alemão se. após dezassete anos de tentativa de re-alemanização,os alsacianos nos gritam unanimemente: poupem-nos isso! Temos nós odireito de imaginar que duas campanhas bem sucedidas e dezassete anosde ditadura bis-marckiana bastam para apagar os efeitos todos de umavergonhosa história de trezentos anos?

Bismarck atingia a meta.[ retornar à nota 48* ]O seu novo Impérioprusso-alemão fora publicamente proclamado em Versalhes, na sala decerimónias de Luís XIV[N263]. A França, desarmada, estava aos seus pés;Paris rebelde, na qual mesmo ele não ousara tocar, fora provocada porThiers para a insurreição da Comuna e fora deitada por terra, depois, pelossoldados do exército ex-imperial que regressavam do cativeiro de guerra. Oconjunto dos filisteus europeus pasmava com Bismarck, tal como pasmaranos anos cinquenta com Luís Bonaparte, modelo daquele. A Alemanha, com

ajuda russa, tinha-se tornado a primeira potência na Europa, e toda apotência da Alemanha estava nas mãos do ditador Bismarck. Tratava-seagora do que ele soubesse começar a fazer com esta potência. Se até entãoele tinha executado os planos de unidade da burguesia, se bem que nãocom os meios da burguesia mas com meios bonapartistas, este tema estavaagora quase esgotado, o que importava agora era fazer planos próprios,mostrar que ideias era capaz de produzir a sua própria cabeça. E isso tinhade se tornar manifesto no acabamento interno do novo Império.

A sociedade alemã compõe-se de grandes possuidores fundiários,camponeses, burgueses, pequenos burgueses e operários, que se agrupampor sua vez em três classes principais.

A posse fundiária maior está nas mãos de alguns poucos magnates(nomeadamente na Silésia) e de um grande número de médiosproprietários fundiários situados com mais elevada densidade nas provínciasprussianas antigas, a leste do Elba. São também estes Junker prussianosque mais ou menos dominam a classe inteira. Eles mesmos sãoagricultores, na medida em que fazem cultivar os seus bens em grandeparte por administradores [Inspektoren] e, ao lado disso, são muitofrequentemente possuidores de destilarias de aguardente e de fábricas deaçúcar de beterraba. A sua posse fundiária, onde foi esse o caso, está

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assente na família, como morgadio. Os filhos mais novos entram para oexército ou para o serviço civil do Estado e, assim, desta pequena nobrezafundiária depende uma ainda mais pequena nobreza de oficiais efuncionários que, além disso, ainda recebe incremento pela intensafabricação de nobres entre oficiais e funcionários superiores, burgueses. Nolimite inferior de toda esta súcia nobre forma-se, naturalmente, uma

numerosa nobreza de parasitas, um lumpenproletariado nobre que vive dedívidas, de jogo duvidoso, de indiscrição, de mendicidade e de espionagempolítica. O conjunto desta sociedade forma a Junkertum (57*) prussiana e éum dos suportes principais do antigo Estado prussiano. Mas o núcleopossidente fundiário desta Junkertum assenta mesmo sobre uma basefrágil. A obrigação de viverem em conformidade com a sua posição torna-sedia a dia mais dispendiosa; o sustento dos filhos mais novos até ao posto detenente e de assessor, a colocação das filhas em estado de casamento, tudoisso custa dinheiro; e como tudo isso são obrigações diante de cujocumprimento todas as outras considerações têm de se calar, não admiraque os rendimentos não cheguem, que sejam assinadas letras e até feitashipotecas. Numa palavra, toda a comunidade junker [Junkerschaft] estáconstantemente à beira do abismo; qualquer desastre, seja guerra, mácolheita ou crise comercial, ameaça precipitá-la nele; e assim não é deadmirar que desde há uns bons cem anos ela só se tenha salvo da ruína portoda a espécie de ajudas do Estado e que, na realidade, só subsista porajudas do Estado. Só artificialmente mantida, esta classe está votada àruína; não há ajudas do Estado que a possam manter em vida por muitotempo. Mas com ela desaparece também o velho Estado prussiano.

O camponês é politicamente um elemento pouco activo. Enquantoproprietário ele mesmo, arruína-se cada vez mais pelas condições deprodução desfavoráveis do camponês de parcelas esbulhado da antigamarca comum [gemeine Mark] ou pastagem comum, sem a qual nenhumgado é possível para ele. Enquanto rendeiro, para ele é ainda pior. Aexploração pequeno-camponesa pressupõe preponderantemente aeconomia natural, na economia monetária afunda-se. Donde:endividamento crescente, expropriação maciça pelos credores hipotecários,refúgio na indústria doméstica, só para não se ser expulso por completo dagleba. Politicamente, o campesinato é a maior parte das vezes indiferenteou reaccionário: ultramontano no Reno por ódio antigo à Prússia,particularista ou protestante conservador noutras regiões. O sentimentoreligioso, nesta classe, serve ainda como expressão de interesses sociais oupolíticos.

Da burguesia, já tratámos. Desde 1848, ela foi apanhada numcrescimento económico inaudito. A Alemanha tinha tomado parte crescentena expansão colossal da indústria depois da crise comercial de 1847,

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[expansão] determinada [bedingt] pelo estabelecimento, ocorrido nesteperíodo, de uma linha de navegação a vapor transoceânica, pela enormeexpansão dos caminhos-de-ferro e pelas minas de ouro da Califórnia e daAustrália. O que tinha posto em movimento a revolução de Bismarck foraprecisamente o ímpeto da burguesia pela eliminação dos entravescomerciais dos pequenos Estados e por igual posição, no mercado mundial,

ao lado dos seus concorrentes estrangeiros. Agora que os milhares demilhões franceses inundavam a Alemanha, inaugurava-se para a burguesiaum novo período de actividade profissional febril, no qual ela secomprovava pela primeira vez como grande nação industrial através de umcraque alemão nacional [N46]. Ela já era então a classe economicamentemais poderosa da população; o Estado tinha de obedecer aos seusinteresses económicos; a revolução de 1848 tinha conduzido o Estado àforma constitucional exterior na qual ela podia dominar tambémpoliticamente e formar-se [ausbilden] na sua dominação. Contudo, elaainda estava muito longe da dominação política efectiva. No conflito [N232b],ela não tinha sido vitoriosa contra Bismarck; a eliminação do conflito pelorevolucionamento da Alemanha, de cima, tinha-lhe ensinado ainda que opoder executivo, provisoriamente, dependia dela quando muito de maneiramuito indirecta, que ela não podia destituir nem impor ministros, nemdispor do exército. Assim, frente a um poder executivo enérgico, ela eracobarde e frouxa, mas também os Junker o eram e ela tinha mais desculpaque estes, pela oposição económica directa dela à classe operária Industrialrevolucionária. Mas era seguro que ela tinha de aniquilar gradualmente a

Junkertum do ponto de vista económico, que ela era a única de todas asclasses possidentes que ainda tinha a perspectiva de um futuro.

A pequena burguesia consistia, em primeiro lugar, de restos doartesanato medieval, que estavam mais maciçamente representados naAlemanha por muito tempo retardatária do que na restante EuropaOcidental; consistia, em segundo lugar, de burgueses arruinados; emterceiro lugar, de elementos da população não possidente que se tinhamelevado até ao pequeno comércio. Com a expansão da grande indústria, aexistência da pequena burguesia inteira perdeu os últimos restos deestabilidade; mudança de ganha-pão e bancarrota periódica tornaram-seregra. Esta classe antes tão estável, que fora a tropa de elite do filistérioalemão, caiu do sossego, domesticação, servilidade, devoção ehonorabilidade anteriores em desolada confusão e desgosto com a sorte quelhe foi destinada por Deus. Os restos do artesanato gritavam pelorestabelecimento dos privilégios de corporação; dos outros, uma partetornou-se brandamente demo-crática-progressista [N264], outra aproximou-se até da social-democracia e juntou-se directamente, aqui e além, aomovimento operário.

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Finalmente, os operários. Dos operários do campo, pelo menos os doLeste continuavam a viver numa semi-servidão e não tinham atingido amaioridade. Em contrapartida, entre os operários das cidades a social-democracia fizera progressos rápidos e crescia na medida em que a grandeindústria proletarizava as massas populares e levava ao extremo a oposiçãode classe entre capitalistas e operários. Se os operários sociais-democratas

ainda estavam cindidos em dois partidos que se combatiam [N3], contudo,desde o aparecimento do Capital de Marx, a oposição de princípio entreambos a bem dizer desaparecera. O lassallianismo de estrita observância,com a exclusiva reclamação de «cooperativas de produção com ajudas doEstado», adormecia gradualmente e mostrava-se cada vez maisinapropriado para vir a dar o núcleo de um partido operário bonapartis-ta-socialista de Estado. Aquilo que de mal a este respeito tinham cometidochefes isolados foi reparado pelo bom senso das massas. A unificação dasduas orientações sociais-democratas, que só quase por questões de pessoasestava retardada, era segura num futuro próximo. Mas já durante a cisão, eapesar da cisão, o movimento era bastante poderoso para inspirar terror àburguesia industrial e para a paralisar na sua luta contra o governo aindanão dependente dela; de tal modo, pois, a burguesia alemã em geral, desde1848, mais uma vez não se via livre do espectro vermelho.

Esta articulação das classes estava na base da articulação dos partidosno Parlamento e nas Dietas [Landtagen]. A grande posse fundiária e uma

parte do campesinato formavam a massa dos conservadores; a burguesiaindustrial fornecia a ala direita do liberalismo burguês: os nacionais-liberais;enquanto a ala esquerda — o enfraquecido Partido Democrático ou ochamado Partido do Progresso — era abastecida pelos pequenos burgueses,apoiados tanto numa parte da burguesia como dos operários. Na social-democracia os operários tinham finalmente o seu partido autónomo, ao qualpertenciam também pequenos burgueses.

Um homem na posição de Bismarck e com o passado de Bismarck tinhade dizer para si, com alguma inteligência do estado de coisas, que os

Junker, tais como eram, não formavam uma classe capaz de viver, que detodas as classes possidentes só a burguesia podia pretender a um futuro eque, por conseguinte (abstraindo da classe operária, cuja missão históricanão queremos exigir dele que a compreenda), o seu novo Império prometiauma existência tanto mais segura quanto mais ele lhe preparasse,gradualmente, a transição para um Estado burguês moderno. Não lheexijamos o que, nas circunstâncias, lhe era impossível. Uma tão pronta

transição para o governo parlamentar, com o poder decisivo no ParlamentoImperial (como na Câmara Baixa inglesa) não era possível nem mesmoaconselhável momentaneamente; a ditadura de Bismarck em formasparlamentares tinha de aparecer-lhe a ele mesmo como inicialmente ainda

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necessária; de modo nenhum lhe levamos a mal que ele a tenha mantidoinicialmente, perguntamos meramente para que ia ela servir. E aí dificilmente pode haver dúvida de que o encaminhamento para um estadode coisas correspondente ao da Constituição inglesa era a única via em quese dava a perspectiva de assegurar ao novo Império uma base sólida e umdesenvolvimento interno tranquilo. Ao abandonar-se a maior parte da

comunidade junker, aliás sem salvação, ao declínio iminente, ainda pareciapossível organizar, com o resto e com novos elementos, uma classe degrandes possuidores fundiários independentes, que era só a frenteornamental da burguesia; uma classe à qual a burguesia, mesmo no plenogozo do seu poder, tinha de abandonar a representação estatal e, com isso,os postos mais chorudos e uma influência muito grande. Ao fazerem-se àburguesia as concessões políticas de que ela, com o tempo, não podia aliásser privada (assim havia que julgar, pelo menos do ponto de vista dasclasses possidentes) — concessões estas a fazerem-se gradualmente emesmo em pequenas e raras doses — estava-se pelo menos a dirigir o novoImpério no caminho em que ele podia seguir os restantes Estados daEuropa Ocidental, politicamente muito mais adiantados que ele; caminhoem que ele sacudiria os últimos restos do feudalismo assim como datradição filisteia que ainda predominava pesadamente na burocracia e emque se tornaria capaz, antes de tudo, de se ter nos próprios pés no dia emque os seus fundadores, nada jovens, deixassem este mundo.

Isto nem sequer era difícil. Nem Junker nem burgueses tinham energia,por medíocre que fosse. Os Junker mostravam-no desde há sessenta anos,em que o Estado fazia por eles o seu melhor, contra a oposição destes D.Quixotes. A burguesia, também tornada dócil através de uma longa históriaanterior, ainda se ressentia duramente do conflito [N232c]; desde então, osêxitos de Bismarck quebraram ainda mais a sua força de resistência, e omedo diante do movimento operário, a crescer de maneira ameaçadora, fezo resto. Em tais circunstâncias, não podia ser difícil, ao homem que haviarealizado os desejos nacionais da burguesia, manter qualquer andamentopor ele preferido na realização dos desejos políticos dela, ao todo já muitomodestos. Só tinha que ver claramente a meta.

Do ponto de vista das classes possidentes, isso era a única coisaracional. Do ponto de vista da classe operária, porém, mostra-secertamente que já era tarde de mais para o estabelecimento de umadominação burguesa duradoura. A grande indústria, e com ela burguesia eproletariado, formou-se na Alemanha num tempo em que, quase

simultaneamente com a burguesia, o proletariado podia entrar na cenapolítica de maneira autónoma, num tempo em que, por conseguinte, jácomeça a luta das duas classes antes de a burguesia ter conquistadoexclusiva ou preponderantemente o poder político. Mas, se bem que na

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Alemanha seja tarde de mais para uma tranquila e solidamentefundamentada dominação da burguesia, no ano de 1870, contudo, a melhorpolítica no interesse das classes possidentes em geral ainda era a de rumarpara esta dominação burguesa. Porque só assim era possível eliminar assobrevivências maciças do tempo do feudalismo apodrecido, queproliferavam na legislação e na administração; só assim era possível

aclimatar gradualmente na Alemanha o conjunto dos resultados da grandeRevolução Francesa, numa palavra, cortar a enorme e velha trança deperuca à Alemanha, e dirigi-la consciente e definitivamente pelo caminho dodesenvolvimento moderno, adaptar as suas condições políticas às suascondições industriais. Se, finalmente, chegava a luta inevitável entreburguesia e proletariado, ela cumpria-se, assim, pelo menos emcircunstâncias normais, em que cada qual podia ver do que se tratava, enão na confusão, obscuridade, encruzilhada de interesses e perplexidadetais como as vimos, em 1848, na Alemanha. Só com a diferença que, destavez, a perplexidade estará exclusivamente do lado dos possidentes; a classeoperária sabe o que quer.

Tal como estavam as coisas em 1871, na Alemanha, um homem comoBismarck era de facto indicado para uma política oscilante entre as diversasclasses. E nessa medida, nada há a reprovar--lhe. A questão é só a de quepara que meta estava orientada esta política. Se ela marchava fosse comque andamento fosse, mas consciente e resolutamente para a dominaçãofinal da burguesia, estava de acordo com o desenvolvimento histórico, tantoquanto em geral o podia estar do ponto de vista das classes possidentes. Semarchava para a manutenção do velho Estado prussiano, para aprussianização gradual da Alemanha, então era reaccionária e estavacondenada ao fracasso final. Se marchava para a mera manutenção dadominação de Bismarck, então era bonapartista e tinha de acabar comotodo o bonapartismo.

A tarefa seguinte era a Constituição do Império. Como material,

apresentavam-se, por um lado, a Constituição da Confederação daAlemanha do Norte, por outro os tratados com os Estados da Alemanha doSul[N265]. Os factores com a ajuda dos quais Bismarck tinha de chamar àvida a Constituição do Império eram, por um lado, as dinastiasrepresentadas no Conselho Federal [Bundesrat], por outro o povorepresentado no Parlamento Imperial. As reivindicações das dinastias eraposto um limite na Constituição da Alemanha do Norte e nos tratados. Opovo, em contrapartida, tinha direito a que a sua quota-parte no poder

político fosse significativamente aumentada. Ele conquistara no campo debatalha a independência para com a ingerência estrangeira e a unificação —tanto quanto podia ser esse o caso; também ele era chamado em primeiralinha a decidir para que devia ser utilizada esta independência, como devia

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esta unificação, no pormenor, ser executada e aproveitada. E mesmo se opovo reconhecia o terreno jurídico existente na Constituição da Alemanhado Norte e nos tratados, isso de modo nenhum impedia, contudo, que eleobtivesse na nova Constituição uma maior quota-parte de poder do que nasde até ao presente. O Parlamento Imperial era o único corpo querepresentava a nova «unidade» na realidade. Quanto mais peso tinha a voz

do Parlamento Imperial, quanto mais livre era a Constituição do Impérioface às Constituições de país [Landesverfassungen] tanto mais firmementetinha de se consolidar o novo Império, tanto mais tinham o bávaro, o saxão,o prussiano, de se fundir no alemão.

Isso tinha de ser claro para quem quer que visse mais longe que aponta do seu nariz. Mas de modo nenhum era a opinião de Bismarck. Pelocontrário, ele utilizou o delírio patriótico propagado depois da guerra paratrazer a maioria do Parlamento Imperial a renunciar não só a qualquer

extensão mas mesmo a qualquer verificação clara dos direitos do povo, e alimitar-se, depois, a reproduzir simplesmente na Constituição do Império oterreno jurídico existente na Constituição da Alemanha do Norte e nostratados. Todas as tentativas dos pequenos partidos para darem expressãoaos direitos da liberdade do povo foram rejeitadas, mesmo a proposta doCentro católico de inclusão dos artigos constitucionais prussianos quecontinham as garantias da liberdade de imprensa, de associação e dereunião, assim como da autonomia da Igreja. A Constituição prussiana,cerceada duas e três vezes como estava, permanecia, pois, ainda maisliberal que a Constituição do Império. Os impostos não foram votadosanualmente mas de uma vez por todas, «por lei», de modo que estavaexcluída a rejeição dos impostos pelo Parlamento Imperial. Era assimaplicada à Alemanha a doutrina prussiana, inconcebível para o mundoconstitucional extra-alemão, doutrina segundo a qual a representação dopovo só tem o direito de rejeitar no papel as despesas, enquanto o governomete no saco as receitas em metal sonante. Mas enquanto o ParlamentoImperial é, assim, despojado dos melhores meios do poder e rebaixado àmodesta posição da câmara prussiana, quebrada pelas revisões de 1849 e1850, pela gente de Manteuffel, pelo conflito e por Sadowa, goza oConselho Federal, no essencial, de todos os plenos poderes que o antigoParlamento Federal possuía nominalmente e goza deles, na realidade,porque está liberto das grilhetas que paralisavam o Parlamento Federal. OConselho Federal tem não só uma voz decisiva na legislação, ao lado doParlamento Imperial, como também é a mais alta instância administrativa— na medida em que promulga as regulamentações das leis do Império — e

decide, além disso, «sobre insuficiências que na execução das leis doImpério... se manifestam», isto é, sobre insuficiências que noutros paísescivilizados só uma nova lei pode remediar (art. 7, al. 3, que é muitosemelhante a um caso de conflito jurídico (58*) ).

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Por conseguinte, Bismarck não procurou os seus apoios principais noParlamento Imperial, que representava a unidade nacional, mas noConselho Federal, que representava a fragmentação particularista. Ele nãotinha a coragem — ele, que se arvorava em representante do pensamentonacional — de se pôr ou de pôr os seus representantes realmente à frenteda nação; a democracia devia servi-lo, mas não ele a ela; em vez de se fiar

no povo, fiava-se em caminhos tortuosos atrás dos bastidores, nacapacidade de se bandear no Conselho Federal por meios diplomáticos, pão-doce e chicote com uma maioria, ainda que recalcitrante. A pequenês daconcepção, a baixeza do ponto de vista, que aqui se manifestam,correspondem inteiramente ao carácter do homem que aprendemos aconhecer até agora. Entretanto, podemos admirar-nos de que os seusgrandes êxitos nem ao menos por um instante lhe tenham permitido elevar-se acima de si próprio.

O caso estava, porém, como quer que fosse, em dar um único eixofirme à Constituição do Império, ou seja, o chanceler do Império. OConselho Federal tinha de obter uma posição que tornasse impossível outroexecutivo responsável que não o chanceler do Império e excluísse, assim, aeventualidade de ministros do Império, responsáveis. De facto, qualquertentativa de ordenar a administração do Império, por instituição de umministério responsável, esbarrou com invencível resistência, como intrusãonos direitos do Conselho Federal. A Constituição, como depressa sedescobriu, estava «talhada ao corpo» de Bismarck. Era um passo em frentena via da sua dominação pessoal exclusiva, graças ao balancear dospartidos no Parlamento Imperial, dos Estados particulares no ConselhoFederal — um passo em frente na via do bonapartismo.

Quanto ao resto não se pode dizer — abstraindo de concessões isoladasà Baviera e ao Württemberg — que a nova Constituição do Império seja umpasso atrás directo. Mas é também o melhor que dela se pode dizer. Asnecessidades económicas da burguesia estavam no essencial satisfeitas;

diante das suas reivindicações políticas — tanto quanto ainda as fazia —estendia-se o mesmo obstáculo que no tempo do conflito [N232d].

Tanto quanto ainda fazia reivindicações políticas. Porque é inegável queestas reivindicações, nas mãos dos nacionais-liberais, estavam reduzidas auma muito modesta medida e diariamente ainda mais se encolhiam. Ossenhores, muito longe de pretenderem que Bismarck lhes concedessefacilidades na cooperação com ele, antes se esforçavam por lhe fazer avontade onde isso convinha, e muitas vezes também onde não convinha ounão deveria convir. Que Bismarck os desprezasse, ninguém lhe pode levar amal — mas eram os seus Junker melhores e mais homens num só cabelo?

O domínio seguinte em que a unidade do Império estava por fazer, as

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finanças [Geldwesen], foi regulado pelas leis de 1873 a 1875 sobre a moedae a banca. A introdução do padrão-ouro foi um progresso significativo; massó de maneira hesitante e indecisa foi introduzido e ainda hoje não está depés inteiramente firmes. O sistema monetário [Geldsystem] adoptado — oterço de táler [Dritteltaler], sob o nome de marco, como unidade, comdivisão decimal — foi o proposto por Soetbeer no fim dos anos trinta; a

unidade monetária efectiva eram os vinte marcos-ouro. Com uma alteraçãode valor quase imperceptível, ela podia ser absolutamente equivalente querao sovereign (59*) inglês, quer aos vinte e cinco francos-ouro, quer aos cincodólares-ouro americanos, e ganhar assim uma integração num dos trêsgrandes sistemas de moeda [Munzsystem] do mercado mundial. Preferiu-secriar um sistema de moeda à parte e, assim, dificultar desnecessariamenteo comércio e os cálculos das cotações. As leis sobre papel-moeda doImpério e sobre bancos limitaram a intrujice com papéis por parte dospequenos Estados e dos bancos dos pequenos Estados e observaram,tomando em consideração o craque entretanto acontecido, uma certatimidez, como convinha a uma Alemanha ainda inexperiente neste domínio.Também aqui os interesses económicos da burguesia foram, ao todo,adequadamente salvaguardados.

Finalmente, vinha ainda a compatibilização de leis de justiça unificadas.Foi superada a resistência dos Estados médios contra a extensão dacompetência do Império também ao direito civil material; mas o código civil

ainda está em devir, ao passo que a lei penal, o processo penal e civil, odireito comercial, a regulação de falências e a organização judicial estãoreguladas de maneira unificada. A eliminação das normas de direito formaise materiais, desencontradas, dos pequenos Estados, já era em si umanecessidade premente do progressivo desenvolvimento burguês, e nestaeliminação reside também o mérito principal das novas leis — muito maisque no seu conteúdo.

O jurista inglês baseia-se numa história do direito que salvou, para alémda Idade Média, um bom pedaço da antiga liberdade germânica, que nãoconhece o Estado policial, sufocado em germe nas duas revoluções doséculo XVII, e culminou em dois séculos de contínuo desenvolvimento daliberdade burguesa. O jurista francês baseia-se na grande Revolução que —após aniquilamento total do feudalismo e do arbítrio policial absolutista —traduziu as condições económicas de vida da recém-fundada sociedademoderna na linguagem das normas do direito, no seu código clássicoproclamado por Napoleão. Em contrapartida, que é a base histórica dos

nossos juristas alemães? Não é outra coisa do que o processo dedecomposição secular, passivo, dos restos da Idade Média, impulsionado amaior parte das vezes por golpes do exterior e até hoje ainda inacabado;uma sociedade economicamente atrasada, onde o Junker feudal e o mestre

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de corporação volteiam como fantasmas e buscairi um novo corpo; umasituação jurídica em que o arbítrio policial — embora desaparecida em 1848a justiça de gabinete dos príncipes — ainda abre diariamente brecha atrásde brecha. Destas escolas, piores entre as piores, saíram os pais dos novoscódigos de leis do Império e o trabalho está em conformidade. Abstraindodo lado puramente jurídico, a liberdade política sai bastante mal destes

códigos de leis. Se os tribunais de assessores [N266] põem nas mãos daburguesia e da pequena burguesia um meio de cooperarem na opressão daclasse operária, o Estado cobre-se, contudo, o mais possível, contra operigo de uma oposição burguesa renovada, pela limitação dos tribunais de

jurados. Os parágrafos políticos do código penal são, com bastantefrequência, de uma indeterminação e elasticidade como se fossem talhadospelo tribunal imperial de agora, e este por aqueles. Não é preciso dizer queos novos códigos são um progresso face ao direito comum [Landrecht]prussiano —hoje em dia já nem mesmo Stoecker consegue fazer algo de tãohorroroso como esse código [prussiano], mesmo se também ele se fizessecircuncidar. Mas as províncias que até à data tiveram o direito francês atésentem de mais a diferença entre a cópia atamancada e o original clássico.Foi o abandono pelos nacionais-liberais, do seu programa, que tornoupossível este reforço da violência do Estado à custa da liberdade civil, esteprimeiro positivo passo atrás.

É ainda de mencionar a lei de imprensa do Império. O código penal já

tinha regulado no essencial o direito material que aqui vem ao caso; oestabelecimento de iguais determinações formais para todo o Império e aeliminação das cauções e selos, ainda subsistentes aqui e além,constituíram, pois, o conteúdo principal desta lei e ao mesmo tempo o únicoprogresso por aí efectuado.

Para que a Prússia se comprovasse outra vez como Estado modelo, foiali introduzida a chamada auto-administração. Tratava-se de eliminar osrestos mais chocantes do feudalismo e todavia, quanto ao fundo, deixandoo mais possível tudo como antigamente. Para isso serviu o ordenamento porcírculos [Kreisordnung] [N267]. O poder(60*) de polícia dos senhores Junker nos seus domínios tornara-se um anacronismo. Quanto ao nome — comprivilégio feudal — foi suprimido e, quanto ao fundo, foi restaurado aocriarem-se distritos dominiais [Gutsbezirke] autónomos, no interior dosquais ou o possuidor de domínios [Gutsbesitzer] é ele mesmo regedordominial [Gutsvorsteher] com as competências de um regedor de comunarural [ländlicher Gemeindevorsteher] ou então nomeia este regedor

dominial; e [foi restaurado], além disso, ao transferir-se o poder de políciatodo e a jurisdição policial de um distrito administrativo para um regedoradministrativo [Amtsvorsteher] que, no campo, naturalmente, era quasesem excepção um grande possuidor fundiário e, assim, ficava também com

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as comunas rurais sob a sua férula. A prerrogativa feudal do [indivíduo]singular foi retirada, mas com isso foram dados à classe inteira os plenospoderes ligados àquela. Por um processo de escamoteamento semelhante,os grandes possuidores fundiários ingleses transformaram-se em juízes depaz e em senhores da administração rural, da polícia e da jurisdição inferiore, assim, asseguraram-se sob título novo, modernizado, da continuação do

uso de todos os postos de poder essenciais mas já não conserváveis naforma feudal antiga. Mas esta também é a única semelhança entre a «auto-administração» inglesa e a alemã. Eu gostaria de ver o ministro inglês quese atrevesse a propor no Parlamento a ratificação dos funcionárioscomunais eleitos e a substituição [deles], em caso de voto renitente, porsuplentes impostos pelo Estado; a propor a introdução de funcionários doEstado com as competências dos conselhos regionais, dos governos dedistrito e dos primeiros presidentes [Oberpräsidenten] prussianos; a propora ingerência da administração do Estado, reservada ao ordenamento porcírculos, nos assuntos internos das comunas, das circunscriçõesadministrativas e dos círculos; e a propor mesmo o corte, inaudito empaíses de língua inglesa e de direito inglês, do direito de recurso aostribunais, tal como se encontra quase a cada página do ordenamento porcírculos. E ao passo que, tanto as assembleias de círculos como asassembleias provinciais continuam a ser compostas, à maneira feudalantiga, por representantes dos três estados [Stände]: grandes possuidoresfundiários, cidades e comunas rurais — na Inglaterra, mesmo um ministério

altamente conservador apresenta um projecto de lei [Bill] que transferetoda a administração dos condados para autoridades eleitas por sufrágioquase universal [N268].

A proposta de ordenamento por círculos para as seis províncias orientais(1871) foi o primeiro sinal de que Bismarck não pensava fazer absorver aPrússia pela Alemanha, mas consolidar mais, pelo contrário, a sólidacidadela do velho prussianismo, precisamente essas seis provínciasorientais. Os Junker conservaram, sob nome alterado, todas as posições depoder essenciais; os operários rurais daquelas regiões — criados e

jornaleiros — permaneceram os hilotas da Alemanha, na sua servidãoefectiva de até àquela data, só admitidos em duas funções públicas:tornarem-se soldados e servir os Junker como gado de votar nas eleiçõespara o Parlamento Imperial. O serviço que Bismarck prestou, por aí, aopartido socialista revolucionário, é indescritível e merece todo oagradecimento.

Mas que dizer da estupidez dos senhores Junker , que estrebuchavamcom pés e mãos, como crianças mimadas, contra esse ordenamento porcírculos elaborado unicamente no seu interesse, no interesse da mais longamanutenção dos seus privilégios feudais, apenas com nome algo

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modernizado? A Câmara prussiana dos Senhores [Herrenhaus], ou antes, aCâmara dos Junker, rejeitou primeiro a proposta, que se arrastou por umano completo, e só a aceitou depois de ter resultado uma fornada de Pares[Pairsschub] de vinte e quatro novos «senhores». Os Junker prussianosmostravam-se assim, outra vez, como reaccionários mesquinhos, teimosos,sem salvação, incapazes de formar o núcleo de um grande partido

autónomo com vocação histórica na vida da nação, como fazem, narealidade, os grandes possuidores fundiários ingleses. Tinham afirmado comisso a sua total falta de entendimento; Bismarck só tinha ainda de tornarclara perante todo o mundo a não menos total falta de carácter da partedeles, e um pouco de pressão aplicada com medida transformou-os numpartido Bismarck sans phrase (61*) .

Para isso devia servir a Kulturkampf [N13].

A execução do plano prusso-alemão do imperador tinha de ter porcontragolpe a reunião, num só partido, de todos os elementosantiprussianos que se baseavam em desenvolvimento separado anterior.Estes elementos multicores encontraram no ultramontanismo [N269] umabandeira comum. A rebelião do bom senso humano, mesmo entre inúmeroscatólicos ortodoxos, contra o novo dogma da infalibilidade papal por umlado, por outro o aniquilamento do Estado da Igreja e o chamado cativeirodo papa em Roma [N270], obrigaram a uma fusão mais estreita de todas asforças militantes do catolicismo. Assim se formou na Dieta prussiana, jádurante a guerra — no Outono de 1870 — o Partido do Centro,especificamente católico; ele entrou no primeiro Parlamento Imperialalemão de 1871 só com 57 homens, mas reforçou-se em cada nova eleiçãoaté chegar acima de 100. Era composto por elementos muito diversos. NaPrússia, as suas forças principais estavam nos pequenos camponesesrenanos, que ainda se consideravam como «prussianos à força»; depois,nos grandes possuidores fundiários e camponeses, católicos, das dioceses

vestefalianas de Münster e Paderborn e na Silésia católica. O segundogrande contingente era fornecido pelos católicos da Alemanha do Sul,nomeadamente os bávaros. Mas a força do Centro estava muito menos nareligião católica do que no facto de que ele representava as antipatias dasmassas populares contra o prussianismo específico, que pretendia agora àdominação sobre a Alemanha. Estas antipatias eram particularmente vivasnas regiões católicas; além disso, corriam simpatias para com a Áustria,agora rejeitada para fora da Alemanha. Em uníssono com estas duascorrentes populares, o Centro era decididamente particularista e federalista.

Este carácter essencialmente antiprussiano do Centro foi logoreconhecido pelas restantes pequenas fracções do Parlamento Imperial queeram antiprussianas por razões locais — não por razões nacionais e gerais,

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como os sociais-democratas. Não só os polacos e alsacianos católicos, masmesmo os guelfos [Welfe] protestantes [N271] se juntaram estreitamente,como aliados, ao Centro. E apesar de nunca ter ficado claro para as fracçõesburguesas-liberais o carácter real dos chamados ultramontanos, elasrevelaram contudo um pressentimento do correcto estado de coisas aoterem intitulado o Centro de «sem pátria», de «inimigo do Império»... (62*)

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Notas de rodapé:

(1*) Alexandre I. (retornar ao texto )

(2*) Nicolau I. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(3*) As legislações locais (Heimatgesetzgebungen) garantiam o direito do cidadão à

residência fixa, bem como o direito de protecção, pela comuna (Gemeinde) de origem, àsfamílias sem recursos. Ver MEW, Bd. 21, S. 601, n. 371. (Nota da edição portuguesa.)(retornar ao texto )

(4*) Outro nome alemão do florim. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto )

(5*) Literalmente: táleres «dois terços novos». Para as principais características eequivalências das unidades monetárias alemãs referidas no texto, ver MEW, Bd- 21, S.601-602, n. 372. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto )

(6*) Nota de Engels à margem, a lápis: « Weerth». (Poeta revolucionário e Publicista,Georg Weerth, amigo de Marx e Engels, tinha sido viajante de comércio. — Nota da edição

portuguesa.) (retornar ao texto )

(7*) Citações da canção de E. Hinkel, « Jugend-Muth und -Kraft » , Deutsche Volkslieder [«Coragem e força juvenis», Cantos Populares Alemães], Mainz 1849. (Nota da ediçãoportuguesa.) ( retornar ao texto )

(8*) Citações da canção de E. Hinkel, « Jugend-Muth und -Kraft», Deutsche Volkslieder[«Coragem e força juvenis», Cantos Populares Alemães], Mainz 1849. (Nota da ediçãoportuguesa.) ( retornar ao texto )

(9*) Do Mosa até ao Memel, do Ádige até ao Báltico, Alemanha, Alemanha, acima de tudo,acima de tudo no mundo. Estrofe do Lied der Deutschen (Canto dos Alemães), compostoem 1841 por Hoffmann von Fallersleben, preocupado com a desunião alemã. Mais tarde foiabusivamente utilizado como hino chauvinista, na Alemanha. Ver MEW, Bd. 21, S. 602, n.377. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(10*) Engels parafraseia ironicamente o refrão de um poema composto em 1813 Por ErnstMoritz Arndt. Ver MEW, Bd. 21, S 602, n. 378. (Nota da edição Portuguesa.) ( retornar aotexto)

(11*) Nota de Engels à margem, a lápis: «Paz de Veste[fália] e paz de Tesch[en].» [N211]

(retornar ao texto )(12*) Nota de Engels no manuscrito entre linhas, a lápis: «Alemanha — Polónia». ( retornarao texto )

(13*) A guerra da Crimeia foi uma colossal comédia de enganos única, onde se pergunta, a

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cada nova entrada em cena: quem deve ser aqui ludibriado? Mas a comédia custoutesouros incalculáveis, e largamente um milhão de vidas humanas. Mal tinha começado aluta, a Áustria marchou sobre os principados do Danúbio; os russos retiraram-se peranteela. Por isso, enquanto a Áustria permaneceu neutral, foi impossível uma guerra contra aTurquia nas fronteiras territoriais russas. Mas era de ter a Áustria como aliada nessasfronteiras, pressupondo-se que a guerra seria conduzida seriamente, para a restauração daPolónia e o recuo duradouro das fronteiras russas ocidentais. Então teria sido coagidatambém a Prússia, por onde a Rússia recebe, ainda agora, todo o seu abastecimento; aRússia teria sido bloqueada por terra como por mar e teria de sucumbir rapidamente. Mastal não era a intenção dos aliados. Pelo contrário, ficaram satisfeitos por estar agoraafastado todo o perigo de uma guerra séria. Palmerston propôs que se transportasse paraa Crimeia o teatro da guerra — o que a Rússia desejava — e Luís-Napoleão aceitou issomais do que de bom grado. Ali, a guerra só podia permanecer ainda uma guerra deaparência, e assim ficavam satisfeitos todos os protagonistas. Mas ao imperador Nicolaumeteu-se-lhe na cabeça conduzir ali uma guerra a sério e esqueceu-se de que o que eraum terreno favorável para uma guerra de aparência, era desfavorável para uma guerra asério. A força da Rússia na defensiva — a extensão enorme do seu território poucopovoado, impraticável e pobre de recursos — vira-se contra a própria Rússia em qualquer

guerra ofensiva russa e, mais do que em parte nenhuma, na direcção da Crimeia. Asestepes russas do Sul, que teriam de se tornar a sepultura dos agressores, tornaram-se asepultura dos exércitos russos, que Nicolau, com inconsideração estúpida e brutal,empurrou uns após outros — por último no meio do Inverno — para Sebastopol. E quandoa última coluna, reunida à pressa, mal equipada, miseravelmente mantida, perdeu emmarcha dois terços do seu efectivo (batalhões inteiros pereceram na tempestade de neve)e o resto já não estava em condições de expulsar do solo russo os inimigos, então ocabeça oca arrogante, Nicolau, abateu-se lastimosamente e ao mesmo tempo envenenou-se. Desde aí, a guerra voltou a ser guerra de aparência e em breve conduziu à conclusãoda paz. (Nota de Engels.) ( retornar ao texto )

(14*) Engels utiliza aqui a expressão: « Mehrer des Reichs», do título oficial dos operadoresdo Sacro Império Romano na Idade Média. (retornar ao texto )

(15*) Literalmente: Fleisch von ihrem Fleisch, Bein von ihrem Bein, isto é, carne da suacarne, osso do seu osso. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(16*) Nota de Engels à margem, a lápis: «Orsini». ( retornar ao texto )

(17*) Em francês no texto: como canalha, como gente desprezível. (Nota da ediçãoportuguesa.) ( retornar ao texto )

(18*) Em francês no texto. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto )(19*) Em francês no texto: Crédito mobiliário. (Nota da edição portuguesa.) (retornar aotexto)

(20*) Que nessa altura fosse esse o sentimento geral no Reno, disso nos convencemosMarx e eu, bastantes vezes, no próprio local. Industriais da margem esquerda do Renoperguntavam-me, entre outras coisas, como ficaria a sua indústria sob a tarifaalfandegária francesa. (Nota de Engels.) ( retornar ao texto )

(21*) Em francês no texto: à, à maneira de. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao

texto)(22*) Guilherme I. (retornar ao texto )

(23*) Em francês no texto. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

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(24*) Beauvau. ( retornar ao texto )

(25*) A Rheinische Zeitung[N47] de 1842 discutiu, deste ponto de vista, sobre a questão dahegemonia prussiana. Gervinus dizia-me já, no Verão de 1843, em Ostende: a Prússia temde se pôr à cabeça da Alemanha; para isso três coisas são necessárias: a Prússia tem dedar uma Constituição, tem de dar liberdade de imprensa e tem de adoptar uma políticaexterna que se veja. (Nota de Engels.) ( retornar ao texto )

(26*) Ainda ao tempo da Kulturkampf [N13], fabricantes renanos queixavam-se-me por nãopoderem promover operários, aliás excelentes, a capatazes, por falta de conhecimentosescolares suficientes. Era particularmente o caso nas regiões católicas. (Nota de Engels.)(retornar ao texto )

(27*) Nota de Engels à margem: «Escolas secundárias para a burguesia.» ( retornar aotexto)

(28*) Nunca um homem teve tanto azar/ Como o burgomestre Tschech,/ E que naquelegordo/ Nem a dois passos acertou!A canção surgiu em 1844. Tschech, burgomestre de Storkow até 1841, tinha disparado,sem êxito, dois tiros contra Frederico-Guilherme IV da Prússia, em 26 de Julho de 1844.Ver MEW, Bd. 21, S. 606, n. 404. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(29*) Guilherme I. (retornar ao texto )

(30*) Frederico-Guilherme. ( retornar ao texto )

(31*) Literalmente: ritual da cerveja. Antiga praxe estudantil alemã. (Nota ediçãoportuguesa.) ( retornar ao texto )

(32*) Alexandre II. (retornar ao texto )

(33*) No original: Haupt- und Staatsaktion . Sobre os dois sentidos principais destaopressão, ver o tomo I da presente edição, p. 235. (Nota da edição portuguesa.) ( retornarao texto )

(34*) Engels escreveu aqui à margem, a lápis: «Partilha — linha do Meno» ver o prexentetomo, p. 451 ( retornar ao texto )

(35*) Em francês no texto: guerra é guerra. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar aotexto)

(36*) Engels escreveu aqui à margem, a lápis: «juramento!». ( retornar ao texto )

(37*) O reino do Hannover, o grande-eleitorado de Hessen-Cassel, o ducado de assau e acidade livre de Frankfurt am Main. (retornar ao texto )

(38*) Utilizando uma imagem de jogo tradicional de feira, Engels pretende dizer que aPrússia visava grandes interesses com pequenos custos. (Nota da edição Portuguesa.)(retornar ao texto )

(39*) Em latim no texto. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(40*) August Bebel e Wilhelm Liebknecht. (retornar ao texto )

(41*) Interpelado já antes da guerra austríaca por um ministro de um Estado médio, porcausa da sua política alemã demagógica, Bismarck respondeu-lhe que, não obstante todasas frases, poria a Áustria fora da Alemanha e romperia a Confederação. — «E os Estadosmédios, acredita V. que eles assistirão a isso impassíveis?» — «Vós, Estados médios, não

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fareis nada.» — «E que será dos alemães?» — «Depois levo-os a Paris e lá faço-osunirem-se.» (Contado em Paris antes da guerra austríaca pelo referido político daqueleEstado médio [Mittelstaatsmann] e publicado, durante essa guerra, no Manchester Guardian[N248] pela sua correspondente em Paris, Sr.ª Crawford.) (Nota de Engels.)(retornar ao texto )

(42*) Engels refere aqui os imperadores da dinastia Luxemburgo, que ocuparam o trono doSacro Império Romano-Germânico, com interrupções, de 1308 a 1437. A dinastia reinoutambém na Boémia e na Hungria durante uma parte dos séculos XIV E XV. (Nota da edição

portuguesa.) (retornar ao texto )

(43*) Guilherme III. ( retornar ao texto )

(44*) Foram estes canhões da guarda nacional, não pertencentes ao Estado e por issomesmo não entregues aos prussianos, que Thiers deu ordem de roubar aos Parisienses em18 de Março de 1871, e ocasionou assim a insurreição de que saiu a Comuna. (Nota deEngels.) (retornar ao texto )

(45*) Em francês no texto: Campos Elíseos. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar aotexto)(46*) Guilherme I. (retornar ao texto )

(47*) Frederico-Guilherme IV. (retornar ao texto )

(48*) Desde aqui até às palavras: « Bismarck atingia a meta» ( ver o presente tomo, p.464) faltam as páginas correspondentes do manuscrito de Engels. O texto respectivo éconforme ao que foi publicado em Die Neue Zeit, N. 25, Bd. 1, 1895-1896, S. 772-776.(retornar ao texto )

(49*) Isto é, o Sacro Império Romano-Germânico. (Nota da edição portuguesa.) ( retornarao texto )

(50*) Em francês no texto: Franco-Condado. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar aotexto)

(51*) Reprova-se a Luís XIV o ter soltado as suas câmaras de reunião [N261], na paz maiscompleta, em território alemão que não lhe pertencia. Mesmo a inveja mais malévola nãopode repetir tal coisa acerca dos prussianos. Pelo contrário. Depois de terem feito, em1795, paz separada com a França, em quebra directa da Constituição imperial, e de teremreunido à sua volta os seus pequenos vizinhos, também rebeldes, atrás da primeira linhade demarcação para a primeira Confederação da Alemanha do Norte, utilizaram, paratentativas de anexação na Francónia, a situação aflitiva dos Estados do Império[Reichsstände] da Alemanha do Sul, que prosseguiam agora, sozinhos, a guerra em uniãocom a Áustria. Estabeleceram em Ansbach e Bayreuth (que então eram prussianas)câmaras de reunião segundo o modelo das de Luís [XIV], levantaram uma série dereivindicações de territórios vizinhos, frente às quais os pretextos jurídicos de Luís [XIV]eram luminosamente convincentes; e quando os alemães, batidos, recuaram, e osfranceses entraram na Francónia, os salvadores prussianos ocuparam então o território deNuremberg, incluindo os subúrbios, até à muralha da cidade, e apanharam dos pequenosburgueses [Spiessburger] de Nuremberg, que tremiam de susto, um tratado (2 de

Setembro de 1796) pelo qual a cidade se submetia à dominação prussiana — sob acondição de que nunca deviam ser admitidos judeus nos seus muros. Mas logo a seguir oarquiduque Carlos voltou a avançar, bateu os franceses perto de Wurzburg em 3 e 4 deSetembro de 1796 e assim se desfez em fumo essa tentativa de inculcar nosnurembergueses a missão alemã da Prússia. (Nota de Engels.) (retornar ao texto )

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(52*) Em francês no texto: Marselhesa. {Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(53*) Aqui no sentido de: sentimentos ou ideias favoráveis a Napoleão Bonaparte , não aLuís Napoleão. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(54*) Isto é, na Alsácia e na Lorena. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(55*) Trata-se das praças-fortes do Norte da Itália: Verona, Legnago, Mântua e Peschiera.(retornar ao texto )

(56*) Ver a presente edição, t. II, 1983, pp. 212-219 . (Nota da edição portuguesa.)(retornar ao texto )

(57*) Latifundiários aristocratas da antiga Prússia Oriental. (Nota da edição portuguesa.)(retornar ao texto )

(58*) Engels cita aqui a Constituição do Império alemão, de 16 de Abril de 1871, publicadana Reichsgesetzblatt 1871 (Folha Oficial do Império, 1871) Berlin, N. 16, S. 68. (Nota daedição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(59*) Em inglês no texto: soberano, moeda de ouro inglesa. (Nota da edição portuguesa.)(retornar ao texto )

(60*) Dos pontos de vista económico, social e político, o vocábulo Gewalt , aqui utilizadopor Engels, supõe: emprego da força, poder exercido e, por conseguinte, violênciaorganizada. Se nem sempre é possível traduzir directamente aquele vocábulo por«violência», este sentido, todavia, está pelo menos sempre implícito no presente escrito deEngels. (Nota da edição portuguesa.) ( retornar ao texto )

(61*) Em francês no texto. Literalmente: sem frase, isto é, simplesmente. (Nota da ediçãoportuguesa.) ( retornar ao texto )

(62*) O manuscrito interrompe-se aqui. ( retornar ao texto )

Notas de fim de tomo:

[N3] No Congresso de Gotha , que se reuniu entre 22 e 27 de Maio de 1875, uniram-se asduas correntes do movimento operário alemão — o Sozialdemokratische Arbeiterpartei (Partido Operário Social-Democrata, eisenachianos ), dirigido por August Bebel e WilhelmLiebknecht, e a Allgemeiner Deutscher Arbeiterverein (União Geral Operária Alemã,lassalliana). O partido unificado adoptou o nome de Sozialistischen Arbeiterpartei Deutschlands (Partido Operário Socialista da Alemanha). Isto pôs fim à divisão nas fileirasda classe operária alemã. O projecto de programa do partido unificado, que Marx e Engelssubmeteram a uma aguda crítica, foi no entanto aprovado pelo Congresso, apenas comcorrecções insignificantes. ( retornar ao texto )

[N13] Kulturkampf (Luta pela Cultura): designação dada pelos liberais burgueses a umsistema de medidas legislativas adoptado nos anos 70 do século XIX pelo governo deBismarck, sob a bandeira de uma campanha pela cultura laica. Nos anos 80, contudo, a fimde consolidar as forças reaccionárias, Bismarck revogou a maior parte dessas medidas.(retornar ao texto ) (retornar à nota 26 )

[N46] Trata-se da crise económica mundial de 1873. Na Alemanha a crise começou com o«grande craque» em Maio de 1873, prelúdio da crise que durou até fins dos anos 70.(retornar ao texto )

[N47] Rheinische Zeitung fur Politik, Handel und Gewerbe (Gazeta Renana para Política,Comércio e Ofícios): diário publicado em Colónia de 1 de Janeiro de 1842 a 31 de Março de

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1843. Em Abril de 1842 Marx começou a colaborar nele, e em Outubro desse mesmo anopassou a ser um dos seus redactores; Engels colaborava também no jornal. ( retornar aotexto)

[N64] Guerra italiana: guerra da França e do Piemonte contra a Áustria, desencadeada porNapoleão III com o falso pretexto da libertação da Itália, quando de facto o que elepretendia era conquistar novos territórios e consolidar o regime bonapartista em França.No entanto, assustado pela grande envergadura do movimento de libertação nacional em

Itália e empenhado em manter o fraccionamento político desta, Napoleão III estabeleceuuma paz separada com a Áustria. Em resultado da guerra a França obteve a Sabóia e Nice.A Lombardia foi integrada na Sardenha e a Venécia continuou sob o domínio da Áustria.(retornar ao texto )

[N67] A 4 de Setembro de 1870 verificou-se um levantamento revolucionário das massaspopulares que conduziu à queda do regime do Segundo Império, à proclamação daRepública e à formação do Governo Provisório, em cuja composição entraram republicanosmoderados e monárquicos. Este governo, dirigido por Trochu, governador militar de Paris,e Thiers, seu autêntico inspirador, seguiu o caminho da traição nacional e do conluio com oinimigo externo. (retornar ao texto )

[N95] Trata-se do golpe de Estado realizado por Luís Bonaparte a 2 de Dezembro de 1851,que deu início ao regime bonapartista do Segundo Império. ( retornar ao texto )

[N203] A presente obra constitui o quarto capítulo da brochura concebida mas nãoterminada por Engels intitulada Die Rolle der Gewalt in der Geschichte (O Papel daViolência na História). Os três primeiros capítulos do trabalho deviam ser constituídos,depois de revistos, pelos capítulos da segunda secção do Anti-Dühring, unidos sob o títulocomum Gewaltstheorie (Teoria da Violência ). Engels tencionava submeter na brochura auma análise crítica toda a política de Bismarck e mostrar, com o exemplo da história daAlemanha após 1848, a justeza das conclusões teóricas extraídas no Anti-Dühring sobre arelação mútua entre a economia e a política. O capítulo não foi concluído. Nele analisa-se odesenvolvimento da Alemanha até 1888.Na obra O Papel da Violência na HistóriaEngels dá uma clara definição das possíveis viasde unificação da Alemanha, explicando as causas que determinaram a sua unificação «apartir de cima», sob a hegemonia da Prússia. Ao assinalar o carácter progressista dopróprio facto da unificação, apesar de se ter operado por esta via, Engels põe a nu, aomesmo tempo, a limitação histórica e o carácter bonapartista da política de Bismarck, quelevou, em última análise, à formação na Alemanha de um Estado policial, à prepotênciados Junker, ao crescimento do militarismo. Engels desmascara a ambiguidade e a cobardiada burguesia prussiana, incapaz de defender até ao fim os seus próprios interesses econseguir a liquidação completa das sobrevivências feudais. Engels critica acerbamente apolítica militar belicista das classes dominantes da Alemanha, que encontrou a suaexpressão mais clara na pilhagem da França em 1871 e na anexação da Alsácia e daLorena. Ao analisar o estado interno do Império alemão e a distribuição das forças declasse nele, pondo a nu as contradições internas que lhe eram inerentes a partir do própriomomento da sua fundação, as suas aspirações militaristas e agressivas, Engels chega àconclusão da inevitabilidade da sua bancarrota. Do trabalho de Engels deduz-se com toda aevidência que na Alemanha só uma classe, o proletariado, pode assumir o papel de porta-voz dos interesses de todo o povo. ( retornar ao texto )

[N204] No Congresso de Viena (1814-1815), a Áustria, a Inglaterra e a Rússia, depois daderrota da França, refizeram o mapa da Europa com o objectivo de restaurar asmonarquias «legítimas» contra os interesses da reunificação nacional e da independênciados povos. ( retornar ao texto )

[N205] Bundestag (Parlamento , ou Dieta, Federal): órgão central da Confederação Alemã

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(criada na base da decisão do Congresso de Viena de 8 de Junho de 1815; era uma uniãode Estados feudais absolutistas alemães); reunia-se em Frankfurt a. M. e era uminstrumento da política reaccionária dos governos alemães. Em 1848-1849 suspendeu a suaactividade devido ao desmoronamento da Confederação, retomando-a em 1850, quando aConfederação Alemã foi restaurada. Esta deixou de existir definitivamente durante a guerraaustro-prussiana de 1866. ( retornar ao texto ) (retornar à nota 244 )

[N206] Ano louco (tolle Jahr): assim designavam alguns literatos e historiadores

reaccionários alemães o ano de 1848. A expressão pertence ao escritor Ludwig Bechstein,que publicou em 1833 um romance com este título dedicado aos distúrbios em Erfurt em1509. ( retornar ao texto )

[N207] Trata-se da influência que exerceu no desenvolvimento do comércio internacional adescoberta de novos jazigos de ouro na Califórnia em 1848 e na Austrália em 1851.(retornar ao texto )

[N208] As festas de Wartburg foram realizadas pelas organizações estudantis alemãs (osBurschenschafts) a 18 de Outubro de 1817 em relação com o 300.° aniversário da Reformae o 4.° aniversário da batalha de Leipzig. A festa transformou-se numa manifestação dosestudantes de tendências oposicionistas contra o regime reaccionário de Metternich e pelaunidade da Alemanha. ( retornar ao texto )

[N209] Festa de Hambach: manifestação política de 27 de Maio de 1832 perto do castelo deHambach no Palatinado bávaro, organizada pelos representantes da burguesia liberal eradical alemã. Os participantes na festa apelavam para a unidade de todos os alemãescontra os príncipes alemães em nome da luta pelas liberdades burguesas e portransformações constitucionais. ( retornar ao texto )

[N210] Guerra dos Trinta Anos (1618-1648): guerra europeia provocada pela luta entre osprotestantes e os católicos. A Alemanha foi o teatro principal desta luta, objecto de saquemilitar e de pretensões anexionistas dos participantes na guerra. Esta terminou em 1648com a paz de Vestefália, que consagrou o fraccionamento político da Alemanha. ( retornarao texto )

[N211] Paz de Teschen: tratado de paz entre a Áustria, por um lado, e a Prússia e aSaxónia, por outro, assinado em Teschen a 24 de Maio de 1779, que pôs fim à guerra dasucessão bávara (1778-1779). De acordo com esse tratado, a Prússia e a Áustriareceberam porções do território bávaro, e a Saxónia uma compensação em dinheiro. ARússia interveio como intermediária na conclusão do tratado, sendo, juntamente com aFrança, garante do mesmo. ( retornar ao texto )

[N212] Reichsdeputationshauptschluss (literalmente: Resolução principal da deputacão doImpério): comissão de representantes do Império alemão, eleita pelo Reichstag emOutubro de 1801. Depois de prolongadas discussões e sob a pressão dos representantes daFrança e da Rússia (que concluíram em Outubro de 1801 um convénio secreto sobre aregulação das questões territoriais na Alemanha renana a favor da França napoleónica),adoptou a 25 de Fevereiro de 1803 a decisão de suprimir 112 Estados alemães e deentregar uma parte considerável dos seus domínios à Baviera, Württemberg, Baden ePrússia. ( retornar ao texto )

[N213] Engels referé-se à discussão e aprovação pelo Reichstag, órgão do Sacro Império

Romano-Germânico, composto por representantes dos Estados alemães, da decisãoimposta pela França e Rússia sobre a regulação das questões territoriais na Alemanha ( vernota 212 ). Desde 1663, o Reichstag reunia-se em Regensburg. ( retornar ao texto )

[N214] Trata-se da conclusão em Paris, a 3 de Março (19 de Fevereiro) de 1859, de um

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tratado secreto entre a Rússia e a França, em virtude da qual a Rússia prometia ocupar aposição de neutralidade favorável no caso de guerra entre a França e a Sardenha, por umlado, e a Áustria, por outro. Por seu turno, a França prometeu colocar a questão da revisãodos artigos do tratado de paz de Paris de 1856, que limitavam a soberania da Rússia nomar Negro. ( retornar ao texto )

[N215] Engels refere-se aos seguintes factos da biografia de Louis Bonaparte: desejandoconquistar popularidade, ele tentava granjear a confiança de diversos partidos da oposição,

em particular dos carbonários italianos; em 1832 adoptou a cidadania suíça no cantão deTurgau; a 30 de Outubro de 1836, com a ajuda de dois regimentos de artilharia, tentoulevantar um motim em Estrasburgo; em 1848, durante a sua estada na Inglaterra, alistou-se como voluntário no corpo de constables especiais (na Inglaterra, reserva da políciaconstituída por civis), que participaram na dispersão da manifestação dos cartistas de 10de Abril de 1848. (retornar ao texto )

[N216] Trata-se das fronteiras da França estabelecidas pela paz de Lunéville, assinadaentre a França e a Áustria a 9 de Fevereiro de 1801. O tratado de paz ratificou oalargamento das fronteiras da França em resultado das guerras contra a primeira e asegunda coligações e, em particular, a anexação da margem esquerda do Reno, da Bélgicae do Luxemburgo. (retornar ao texto )

[N217] Trata-se do congresso de representantes da França, da Inglaterra, da Áustria, daRússia, da Sardenha, da Prússia e da Turquia em Paris, que teve como resultado aassinatura, a 30 de Março de 1856, do tratado de paz de Paris, que pôs fim à guerra daCrimeia de 1853-1856. ( retornar ao texto )

[N218] A paz de Basileia de 1795 foi estabelecida com a República Francesa em separado,a 5 de Abril, pela Prússia, que traiu assim os seus aliados da primeira coligaçãoantifrancesa. ( retornar ao texto )

[N219] Com estas palavras, von Schleinitz, ministro dos Negócios Estrangeiros da Prússia,caracterizou em 1859 a política externa da Prússia no período da guerra da França e doPiemonte contra a Áustria. Esta política consistia em não aderir a nenhuma das partesbeligerantes, mas sem declarar a neutralidade. ( retornar ao texto )

[N220] Trata-se da Societé Générale du Crédit Mobilier, grande banco por acções francêscriado em 1852. A fonte principal dos rendimentos do banco foi a especulação com títulos.O Crédit Mobilier estava estreitamente ligado aos círculos governamentais do SegundoImpério. Em 1867 faliu e em 1871 foi encerrado. ( retornar ao texto )

[N221] Confederação do Reno: união dos Estados da Alemanha do Sul e do Oeste, fundadasob o protectorado de Napoleão em Julho de 1806. A Confederação agrupava mais de 20Estados que se tornaram, de facto, vassalos da França. A Confederação desagregou-se em1813 em consequência da derrota do exército de Napoleão.

[N222] Trata-se das fortalezas da Confederação Alemã ( ver nota 240 ), situadasprincipalmente ao longo da fronteira francesa; as guarnições destas fortalezas eramrecrutadas entre as forças armadas dos Estados mais importantes da Confederação, eeram compostas sobretudo de tropas austríacas e prussianas. ( retornar ao texto )

[N223] Trata-se do governo reaccionário do príncipe Schwarzenberg, formado em

Novembro de 1848 após a derrota da revolução democrática burguesa, que começou com asublevação popular de 13 de Março de 1848 em Viena. ( retornar ao texto )

[N224] A expressão «política realista» [Realpolitik] era utilizada para designar a política deBismarck, que os contemporâneos consideravam baseada no cálculo. ( retornar ao texto )

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[N225] Trata-se do ataque de Frederico II à Silésia, que pertencia à Áustria, em Dezembrode 1740. ( retornar ao texto )

[N226] A 14 de Outubro de 1806, em duas batalhas simultâneas, Jena e Auerstedt , oexército prussiano foi aniquilado pelas tropas francesas, e o Estado prussiano viu-secompletamente derrotado. ( retornar ao texto )

[N227] Landwehr: parte integrante das forças militares prussianas de terra; surgiu na

Prússia em 1813 como milícia popular na luta contra as tropas napoleónicas, era utilizada,segundo a idade dos seus camponentes, para engrossar o exército activo ou para realizarserviço de guarnição. ( retornar ao texto )

[N228] Engels chama ironicamente liberais de cantõezinhos aos liberais partidários datransformação da Alemanha num Estado federal, à semelhança da Suíça, dividida emcantões autónomos. ( retornar ao texto )

[N229] Trata-se do golpe de Estado na Prússia em Novembro-Dezembro de 1848 e doperíodo de reacção que se lhe seguiu. ( retornar ao texto )

[N230] Der Sozialdemokrat (O Social-Democrata): semanário alemão, órgão central doPartido Social-Democrata alemão; publicou-se de Setembro de 1879 a Setembro de 1888em Zurique e de Outubro de 1888 a 27 de Setembro de 1890 em Londres. Marx e Engels,que colaboraram no semanário durante todo o período da sua publicação, ajudavamactivamente a redacção do jornal a aplicar a linha proletária do partido, criticavam ecorrigiam os diferentes erros e vacilações da publicação. ( retornar ao texto )

[N231] Em 1858,o príncipe regente Guilherme destituiu o ministério de Manteuffel echamou ao poder os liberais moderados; na imprensa burguesa esta orientação recebeu opomposo título de «Nova Era»; mas, na realidade, a política de Guilherme tinha comoúnico objectivo o fortalecimento das posições da monarquia prussiana e dos Junker. A

«Nova Era» preparou, de facto, a ditadura de Bismarck, que subiu ao poder em Setembrode 1862. ( retornar ao texto )

[N232] O chamado conflito constitucional entre o governo prussiano e a maioria liberalburguesa do Landtag surgiu em Fevereiro de 1860, quando esta se recusou a aprovar oprojecto de reorganização do exército, apresentado pelo ministro da Guerra von Roon. EmMarço de 1862, a maioria liberal recusou-se outra vez a aprovar as despesas de guerra,após o que o governo dissolveu o Landtag e convocou novas eleições. Em fins de Setembrode 1862 constituiu-se o ministério contra-revolucionário de Bismarck, que em Outubro domesmo ano voltou a dissolver o Landtag e começou a aplicar a reforma militar, gastandomeios sem a ratificação do Landtag. O conflito só se resolveu em 1866, quando, após avitória da Prússia sobre a Áustria, a burguesia prussiana capitulou perante Bismarck.(retornar ao texto ) (retornar ao texto- nota b ) (retornar ao texto - nota c ) (retornar aotexto - nota d ) (retornar à nota 245 )

[N233] Em resposta à entrada das tropas austro-bávaras em Kurhessen, o governoprussiano declarou, no começo de Novembro de 1850, a mobilização e enviou para ali assuas tropas. A 8 de Novembro teve lugar uma escaramuça insignificante entre osdestacamentos de vanguarda austro-bavaros e prussianos em Bronzell, que revelou sériasdeficiências do sistema militar e o carácter envelhecido do armamento do exércitoprussiano. Isto fez com que a Prússia renunciasse às operações militares e capitulasse

perante a Áustria. ( retornar ao texto )[N234] A União Nacional foi fundada a 15 e 16 de Setembro de 1859 no congresso dosliberais burgueses em Frankfurt a. M. Os organizadores da União colocavam-se comoobjectivo unificar toda a Alemanha, com excepção da Áustria, sob a soberania da Prússia.

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Depois da formação da Confederação da Alemanha do Norte, a União Nacional declarou asua própria dissolução. ( retornar ao texto )

[N235] Trata-se do livro de Luís Bonaparte Ideias Napoleónicas, publicado em Paris em1839 (Napoléon-Louis Bonaparte, Des idées napoléoniennes). (retornar ao texto )

[N236] A 8 de Fevereiro de 1863, durante a sublevação de libertação nacional da Polónia, aRússia e a Prússia assinaram um convénio prevendo acções conjuntas das tropas dos dois

Estados contra os rebeldes. Mesmo antes da assinatura do convénio, as tropas prussianasreforçaram a protecção das fronteiras com o objectivo de evitar a passagem dossublevados para o território da Prússia. ( retornar ao texto )

[N237] Depois da morte do rei dinamarquês Frederico VII, a Áustria e a Prússiaapresentaram, a 16 de Janeiro de 1864, um ultimato ao governo da Dinamarca exigindo aabolição da Constituição de 1863, que proclamava a completa integração do Schleswig naDinamarca. Esta recusou-se a aceitar o ultimato, razão pela qual a Áustria e a Prússiacomeçaram as hostilidades. Em Julho de 1864, as tropas dinamarquesas foram derrotadas.Durante toda a guerra, a França e a Rússia mantiveram uma neutralidade amistosarelativamente à Áustria e à Prússia. De acordo com o tratado de paz assinado em Viena a30 de Outubro de 1864, o território dos ducados de Schleswig e Holstein, incluindo asregiões onde predominava a população alemã, foi declarado condomínio da Áustria e daPrússia, passando a pertencer integralmente à Prússia depois da guerra austro-prussianade 1866. ( retornar ao texto )

[N238] De acordo com o protocolo de Varsóvia de 5 de Junho (24 de Maio) de 1851,assinado pelos representantes da Rússia e da Dinamarca, assim como com o protocolo deLondres, de 8 de Maio de 1852, assinado pela Rússia, a Áustria, a França, a Prússia e aSuécia juntamente com os representantes da Dinamarca, era estabelecido o princípio daindivisibilidade dos domínios da Coroa dinamarquesa, incluindo-os ducados de Schleswig eHolstein. (retornar ao texto )

[N239] Expedição do México: intervenção militar da França empreendida em 1862-1867,inicialmente em conjunto com a Grã-Bretanha e a Espanha; tinha como objectivo esmagara revolução mexicana e transformar o México numa colónia dos Estados europeus. Emresultado da heróica luta de libertação do povo mexicano, os invasores franceses foramderrotados e viram-se forçados a evacuar do México as suas tropas em 1867. ( retornar aotexto)

[N240] Confederação Alemã: criada a 8 de Junho de 1815 pelo Congresso de Viena, era umagrupamento de Estados absolutistas feudais alemães e consagrava a divisão política e

económica da Alemanha. A Confederação deixou definitivamente de existir durante aguerra austro-prussiana de 1866 e foi substituída pela Confederação da Alemanha doNorte. (retornar ao texto ) (retornar à nota 222 )

[N241] A expressão «uma guerra fresca e alegre» foi empregada pela primeira vez pelohistoriador e publicista reaccionário Heinrich Leo em 1853 e foi utilizada também nos anosposteriores com espírito militarista e chauvinista. ( retornar ao texto )

[N242] A Confederação da Alemanha do Norte, que compreendia 19 Estados e 3 cidadeslivres da Alemanha do Norte e do Centro, foi formada em 1867 por proposta de Bismarck.A formação da Confederação foi uma das etapas decisivas da reunificação da Alemanha

sob a hegemonia da Prússia. Em Janeiro de 1871 a Confederação deixou de existir devido àformação do Império alemão. ( retornar ao texto )

[N243] Trata-se da guerra austro-prussiana de 1866, na qual, ao lado da Áustria, lutaram aSaxónia, Hannover, Baviera, Baden, Württemberg, o Kurhessen, Hessen-Darmstadt e

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outros membros da Confederação Alemã, e, ao lado da Prússia, Mecklenburg, Oldenburg eoutros Estados do Norte da Alemanha, assim como três cidades livres. ( retornar ao texto )

[N244] Na Primavera de 1866, a Áustria dirigiu-se à Bundestag (ver nota 205 ) queixando-se de que a Prússia tinha violado o convénio sobre a administração conjunta dos ducadosde Schleswig e Holstein; Bismarck recusou-se a acatar a decisão da Dieta, a qual, porproposta da Áustria, declarou guerra à Prússia. No decurso da guerra, dados os êxitos dastropas prussianas, a Dieta Federal viu-se obrigada a transferir-se de Frankfurt a. M. para

Augsburg, onde, a 24 de Agosto de 1866, declarou terminada a sua actividade. ( retornar aotexto)

[N245] Em Setembro de 1866, a Câmara de Representantes da Prússia aprovou o projectode lei apresentado por Bismarck eximindo o governo da responsabilidade pelo gasto derecursos não ratificado legislativamente no período do conflito constitucional ( ver a nota232). (retornar ao texto )

[N246] Trata-se do combate decisivo da guerra austro-prussiana nas imediações da cidadede Königgrätz (actualmente Hradec-Králové, na Boémia), perto da aldeia de Sadowa, a 3de Julho de 1866. A batalha de Sadowa terminou com uma grande derrota das tropasaustríacas. ( retornar ao texto )[N247] A Constituição da Confederação da Alemanha do Norte foi ratificada a 17 de Abrilde 1867 pelo Reichstag Constituinte da Confederação e consagrava o domínio efectivo daPrússia na Confederação. O rei da Prússia foi declarado presidente da Confederação ecomandante-chefe das forças armadas federais, delegando-se nele a direcção da políticaexterna. Os poderes legislativos do Reichstag da Confederação, eleito por sufrágiouniversal, eram muito limitados; as leis aprovadas por ele entravam em vigor depois deserem ratificadas pelo Conselho Federal, de composição reaccionária, e ratificadas pelopresidente. A Constituição da Confederação tornou-se depois base dà Constituição doImpério alemão. Segundo a Constituição de 1850, na Prússia conservava-se a câmara alta,composta preferentemente por representantes da nobreza feudal («câmara dossenhores»), os poderes do Landtag eram muito limitados, vendo-se este privado deiniciativa legislativa. Os ministros eram nomeados pelo rei e eram responsáveis apenasperante ele, o governo tinha o direito de criar tribunais especiais para julgar os casos dealta traição. A Constituição de 1850 manteve-se em vigor na Prússia mesmo depois daformação do Império alemão em 1871. ( retornar ao texto )

[N248] The Manchester Guardian (O Guardião de Manchester): jornal burguês, órgão dospartidários do livre-câmbio (free-trade), mais tarde partido liberal; fundado em Manchesterem 1821. ( retornar ao texto )

[N249] Zollparlament (Parlamento aduaneiro): órgão dirigente da Zollverein(UniãoAduaneira) reorganizada depois da guerra de 1866 e da assinatura, a 8 de Julho de 1867,do tratado da Prússia com os Estados alemães meridionais, de acordo com o qual seestipulava a criação deste órgão. O parlamento compunha-se de membros do Reichstag daConfederação da Alemanha do Norte e de deputados especialmente eleitos dos Estadosalemães meridionais (Baviera, Baden, Württemberg e Hessen). Devia dedicar-seexclusivamente às questões de comércio e política aduaneira; a aspiração de Bismarck deampliar pouco a pouco as suas competências, alargando-as a questões de outro tipo,políticas, chocou com uma resistência encarniçada por parte dos representantes daAlemanha do Sul. (retornar ao texto )

[N250] O rio Meno formava a fronteira entre a Confederação da Alemanha do Norte e osEstados do Sul da Alemanha. (retornar ao texto )

[N251] De acordo com o tratado com a Áustria, concluído a 3 de Outubro de 1866 em

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Viena, à Itália, que participara na guerra austro-prussiana ao lado da Prússia, foi devolvidaa Venécia, mas as suas pretensões relativas ao Tirol meridional e a Trieste não foramsatisfeitas. ( retornar ao texto )

[N252] Trata-se da expressão do chanceler austríaco Metternich «a Itália é um conceitogeográfico», utilizada num despacho para o conde de Apponyi, embaixador em Paris, de 6de Agosto de 1847. Utilizava-a também posteriormente referindo-se à Alemanha. ( retornarao texto )

[N253] A Conferência de Londres em torno da questão do Luxemburgo, na qualparticiparam representantes diplomáticos da Áustria, da Rússia, da Prússia, da França, daItália, dos Países Baixos e do Luxemburgo, realizou-se de 7 a 11 de Maio de 1867. Segundoo tratado assinado a 11 de Maio, o ducado do Luxemburgo (o título de duque era mantidopelo rei dos Países Baixos) foi declarado Estado neutral. A Prússia comprometia-se aretirar imediatamente a sua guarnição da fortaleza do Luxemburgo, e Napoleão III deviarenunciar às suas pretensões de anexação do Luxemburgo à França. ( retornar ao texto )

[N254] Sjchwefelbande (literalmente, Bandos do enxofre): inicialmente nome de umagrupamento de estudantes da Universidade de Jena na década de 70 do século XVIII, quegozava de má fama devido aos escândalos provocados pelos seus membros; mais tarde aexpressão «bando do enxofre» tornou-se sinónimo de qualquer grupo de criminosos eelementos suspeitos. ( retornar ao texto )

[N255] Nas batalhas de Spichern (Lorena) e Wörth (Alsácia), as tropas prussianasderrotaram a 6 de Agosto de 1870 as unidades francesas. Na zona de Sedan teve lugaruma das maiores batalhas da guerra franco-prussiana, que teve como resultado acapitulação do exército francês a 2 de Setembro de 1870. ( retornar ao texto )

[N256] Franco-atiradores (francs-tireurs): guerrilheiros franceses que participavamactivamente na luta contra os prussianos durante a guerra franco-prussiana de 1870-1871.(retornar ao texto )

[N257] Trata-se da lei aprovada na Prússia a 21 de Abril de 1813 que estipulava a criaçãode guerrilhas de voluntários (franco-atiradores) na retaguarda e nos flancos do exército deNapoleão. (retornar ao texto )

[N258] A 19 de Março, o povo sublevado de Berlim obrigou o rei da Prússia FredericoGuilherme IV a vir à varanda do palácio e a descobrir-se perante os cadáveres dos mortosdurante a rebelião popular de 18 de Março de 1848. ( retornar ao texto )

[N259] A 28 de Janeiro de 1871, o governo francês de «defesa nacional» formado emresultado da revolução de 4 de Setembro de 1870 assinou com Bismarck o convénio sobreo armistício e a capitulação de Paris. O tratado de paz foi definitivamente subscrito a 10 deMaio de 1871 em Frankfurt a. M. (retornar ao texto )

[N260] Por ordem de Luís XIV, a 30 de Setembro de 1681, a cidade de Estrasburgo, quefazia parte do Império alemão, foi ocupada pelas tropas francesas. O partido católico dacidade, chefiado pelo bispo Fürstenberg, saudou a integração na França e contribuiu paraque não fosse oferecida resistência aos franceses. ( retornar ao texto )

[N261] As câmaras de reunião (chambres de réunion) criadas por Luís XIV em 1679-1680tinham a missão de fundamentar e justificar com razões jurídicas e históricas aspretensões relativamente a uma ou outra parte dos Estados vizinhos, que depois eraocupada pelas tropas francesas. ( retornar ao texto )

[N262] Cartel de Bismarck: bloco dos dois partidos conservadores («conservadores» e«conservadores livres») e dos nacionais-íiberais, bloco que apoiava o governo de

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Bismarck. Foi formado depois da dissolução do Reichstag por Bismarck em Janeiro de1887. O cartel conseguiu a vitória nas eleições de Fevereiro de 1887, alcançando umasituação dominante no Reichstag (220 lugares). Apoiando-se neste bloco, Bismarck fez comque fossem aceites uma série de leis reaccionárias em benefício dos Junker e da grandeburguesia. A agudização das contradições entre os partidos do cartel e a sua derrota naseleições de 1890 (recebeu apenas 132 mandatos) levaram à sua decomposição. ( retornarao texto )

[N263] Engels refere-se à proclamação do rei da Prússia Guilherme I, imperador daAlemanha, que se verificou a 18 de Janeiro de 1871 no Palácio de Versalhes. ( retornar aotexto)

[N264] Referências aos representantes do partido progressista, partido burguês prussianoformado em Junho de 1861, que exigia a unificação da Alemanha sob a hegemonia daPrússia, a convocação de um parlamento de toda a Alemanha e a criação de um ministérioliberal responsável perante a câmara dos deputados. ( retornar ao texto )

[N265] Trata-se dos direitos especiais da Baviera e do Württemberg consagrados nostratados da sua entrada (Novembro de 1870) na Confederação da Alemanha do Norte e naConstituição do Império alemão. A Baviera e o Württemberg conservaram, em particular,um imposto especial sobre a aguardente e a cerveja, a administração própria dos correiose telégrafos. Os representantes da Baviera e do Württemberg, assim como da Saxónia,formaram no Conselho Federal uma comissão especial, de política externa, dotada dodireito de veto. ( retornar ao texto )

[N266] Tribunais de Schöffen (assessores): tribunais de primeira instância no Impérioalemão instaurados numa série de Estados alemães depois da revolução de 1848, e emtoda a Alemanha a partir de 1871. Eram então compostos por um juiz da coroa e por doisassessores (Schöffen) que, ao contrário dos jurados, não só estabeleciam a culpa doacusado como, juntamente com o juiz, determinavam a medida do castigo; para ocumprimento das funções de Schöffen exigia-se a residência permanente e uma situaçãoabastada. ( retornar ao texto )

[N267] Trata-se da reforma administrativa de 1872 na Prússia , de acordo com a qual eraabolido o poder feudal hereditário dos latifundiários no campo e introduzidos elementos deadministração autónoma local; na prática, os latifundiários Junker conservaram o poderlocal, pois ocupavam pessoalmente ou por meio dos seus testas-de-ferro a maioria doscargos electivos ou designados. ( retornar ao texto )

[N268] Trata-se da reforma da administração local na Inglaterra aprovada em 1888. De

acordo com esta reforma, a função do sheriff foi transferida para conselhos eleitos noscondados, que se ocupavam da recolha de impostos, dos orçamentos locais, etc.Participavam na eleição dos conselhos todos os que tinham direito de voto para oParlamento, bem como as mulheres com mais de trinta anos. ( retornar ao texto )

[N269] Ultramontanismo: corrente extremamente reaccionária do catolicismo, que reclamaa influência ilimitada do papa nos assuntos religiosos e laicos de qualquer Estado. Emresultado da vitória do ultramontanismo, o Concílio do Vaticano aprovou em 1870 o dogmada «infalibilidade» do papa. (retornar ao texto )

[N270] Em 1870, em resultado do plebiscito de 2 de Outubro no território papal, este foi

integrado no Reino da Itália. Com isso terminou a unificação política do país. O podertemporal do papa foi anulado; manteve-se apenas nos palácios do Vaticano e de Latrão ena residência suburbana. Em resposta, o papa declarou-se «prisioneiro do Vaticano». Oconflito, que durou muitos anos, entre o papa e o governo italiano, apenas foi resolvidooficialmente em 1929. ( retornar ao texto )

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Inclusão 08/10/2011

[N271] Guelfos: partido do Hannover formado em 1866 depois da integração deste naPrússia (o nome procede da antiga linhagem principesca dos Guelfos). O partido propunha-se restabelecer os direitos da casa real do Hannover e a autonomia do Hannover noImpério alemão. Aderia ao Centro principalmente por motivos particularistas eantiprussianos. ( retornar ao texto )