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ESBOO DE UMA,DOGMATICAKARLBARTH2006..Capa:Eduardo de ProenaReviso:Alceu LourenoTraduo:Paulo ZacariasDiagramao:Z-PwblisJl!lJISBN: 85-86671-69-XTtuloOriginal: Esquisse d' Une Dogmatique - 1946Proibida a reproduototal ouparcial desta obra,de qualquer formaoumeioeletrnico e mecnico, inclusiveatravsdeprocessos xerogrficos,sempermisso expressa da editora.(Lei nO9.610 de19.02.1998)Todos os direitos reservadosFONTE EDITORIAL LTOA.Rua Baro de Itapetininga, 140 loja 401042-000 So Paulo - SPTe!.: 113214-0819/3214-3806www.fonreeditarial.com.bre-mail: [email protected]. Introduo: ATarefa da Dogmtica................................................. 7II. Crer Ter Confiana.............................................................................. 15III. Crer Significa Conhecer........................................................................ 25IV. Crer Confessar a SuaF..................................................................... 33V. Deus Nos Lugares Altssimo5.............................................................. 43VI. Deus, O Pai................................................................................................ 53VII. O Deus Todo-Poderoso........................................................................ 59VIII. O Deus Criador........................................................................................ 65IX. O Cu e a Terra........................................................................................ 79X. Jesus Cristo............................................................................................... 89XI. OSalvador e o Servo de Deus............................................................ 101XII. O Filho nico de Deus.......................................................................... 115XIII. Nosso Senhor 123XIV. O Mistrio e o Milagre do NataL....................................................... 133XV. Sofreu... 143XVI. Sob Pncio Pilatos.................................................................................. 153XVII. Foi Crucificado, Morto e Sepultado,Desceu ao Inferno.................................................................................. 161XVIII. Ao Terceiro Dia Ressurgiu dos Mortos............................................ 171XIX. Ascendeu aos Cus, e Est AssentadoDireita de Deus Pai Todo-Poderoso............................................. 177XX AVinda de Jesus Cristo, OJuiz.......................................................... 185XXI. Creio no Esprito Santo......................................................................... 197XXII. AIgreja, Sua Unidade, Santidade e Universalidade................... 203XXIII. O Perdo dos Pecados.......................................................................... 215XXIV. ARessurreio do Corpo e a VidaEterna....................................... 221Introduo:A Tarefa da DogmticaAdogmtica a cincia pela qual a Igreja, no nvel dos co-nhecimentos que possui, justifica para si mesma o contedode sua pregao.Trata-sedeumadisciplinacrtica, quer dizer, ins-taurada segundo a norma da Sagrada Escritura e segundoos fundamentosdas Confisses de F.Adogmtica uma cincia. Emtodas as pocas,tem se refletido, faladoe escrito interminavelmente sobreaquiloquesedeveentenderporcinciaenopodemosabordar esse problemacontentando-nos comumasim-ples aluso. Darei uma definio de cincia que certa-mente discutvel, mas que pode servir de ponto departida para nossa exposio. Entendemos por cinciaumensaio de compreenso e de representao, umabuscae umensinamentorelacionados aumobjetoe aumaatividadedeterminados. Nenhumesforodesseg-neropodeter apretensodeser algomaisdoqueumatentativa e, aodizermos issoacerca da prpriacincia,no fazemosnada mais que sublinhar sua dupla natureza:elaprovisriae limitada. Noscentros ondeacincia,de maneira precisa, encarada com a maior seriedade, nose crianenhumailusoacerca doqueo homem podefa-zer: ele no est envolvido em um projeto em que se com-8 - Esboo de lImJDogm;ricJbinama maisalta sabedoria e a maisrefinada arte, poisacincia cada do cu, a cincia absoluta, no existe.Adogmticacrist, tambmela, umensaio, umatentativa de compreensoe derepresentao; umatenta-tiva de ver, entender e fixar determinados fatos parareuni-los e organiz-los sob a forma de ensinamento.Emcadacinciaencontram-seassociadosoestudodoobjetoe suaaplicaoa umcampodeatividade, pois,nenhuma cincia se reduz teoria pura ou somente pr-tica; a teoria est sempre acompanhada da prtica quedela se origina. Tambm a dogmtica se oferecea ns emseu duplo movimento:ela pesquisa e ensinamento, liga-dos a um objeto e a uma atividade.Osujeito da dogmtica a Igreja crist. Osujeito deumacincianopodeseroutrosenoaquelequeman-tm, comoobjetoe a atividade considerados,relaesdepresenaedefamiliaridade. No, portanto, umaredu-olamentavelmentelimitativaqueimpomos dogm-tica enquantocinciaquandoafirmamos: osujeitodetalcincia a Igreja. AIgreja o lugar, a comunidade qualsoconfiadosoobjetoeaatividadeprpriosdadogm-tica, isto , a pregao do Evangelho. Quandodizemosque a Igreja o sujeitoda dogmtica, entendemos quedesdeoinstanteemquealgumseocupededogmtica,sejaparaaprend-la, sejaparaensin-la, essealgumseencontra dentro do ambiente da Igreja. Aquele que queirafazer dogmtica, colocando-se conscientemente fora daIgreja, deve esperar que o objeto da dogmtica lhe perma-neaestranho, edemaneiranenhumase surpreenderaoficar perdidologo nos primeiros passos, ou ao parecerum destruidor.Em dogmtica, como em outros assuntos, deve exis-tirfamiliaridadeentreosujeitodacincia eoobjetoqueeleestuda, eesseconhecimentontimotemaqui por ob-jetoavidadaIgreja. IssonosignificaqueadogmticaA Tarefa daDogmtica - 9possa se contentar em retomar e relacionar elementos de-finidospela autoridade eclesistica em tempos antigos ourecentes, desortequenoteramosquefazer nadamaisque repetir suas prescries. A prpria dogmtica catlicaconsidera sua tarefa diferentemente.Ao dizer que a Igreja o sujeito da dogmtica, insis-timos emapenas uma exigncia: aquele que se ocupedessa cincia, seja como mestre, seja como discpulo,deveaceitar aresponsabilidadedesesituarnoplanodaIgreja crist e da obra que ela desenvolve; uma condiosinequanonoMasquenohajamal-entendidos: trata-sedeumalivreparticipaonaobradaIgreja, deumares-ponsabilidade, assumidapelocristonessedomniopar-ticular.Acinciadogmticaummeiopeloqual aIgrejajustificaparasi mesmaocontedodesuapregao, nonvel dosconhecimentos que ela possui.Depois doque acabamosde dizer acerca da cincia,poder-se-iaobjetar queelavai porsi mesma. Masalgu-mas concepes relativas dogmtica me obrigam a repe-tirque, deformaalguma, ela umacincia cada docusobre a terra. Seria completamente maravilhoso,dir-se-,se existisse semelhante dogmtica, cada do cu, absoluta.Aissonosepoderesponderoutracoisaseno: sim, sefssemosanjos!Mas, porvontadedeDeus, ns nosomos anjos eassimbomque disponhamos de uma dogmticahu-manae terrestre. AIgrejacristnoestnocu, masnaterrae notempo; aindaquesejaumdomdeDeus, elaum dominseridonasrealidades humanase terrestrese oque se passa dentro da Igreja corresponde a essas realida-des.A Igreja crist vive na terra e na histria, guardi dobom depsito(2Tm1.14), que Deus lhe confiou. Gerenci-adoradesse bem precioso,ela segueseu caminhoatravs10 - Esboo deumaDogmricada histria, na forae na fraqueza, na fidelidadee infide-lidade, nainteligncia ou incompreenso doque lhe re-velado.A histria dessemunc:oseestabelece e se desenrolaem histriasrelativas natureza e cultura,aos hbitoses religies, s artes e s cincias, s sociedades e aos Esta-dos. Dentro dessarede, a Igreja tem tambm sua histria,uma histria humana e terrestre, e essa a razo pela qualnose podecontestar inteiramenteoqueGoethedisseaseurespeito: elafoi depoca empocauma confusodeerros e de violncias. Se formos sinceros, ns cristos, de-vemosconcordarqueahistriadaIgrejanotemcami-nhado diferentemente da histria do mundo. E dessamaneira nos dada aoportunidadedefalar modestaehumildemente da Igreja e da obra eclesistica que desen-volvemos aqui sob a forma de dogmtica.Adogmtica no podecumprir seu papel se nopermanecer ligada s atuais circunstncias da Igreja. AIgrejaestconscientedeseuslimites, jqueelasesaberesponsvel pelo depsito que deve administrar e conser-var, e que devedora emrelaoaonico bomDeus quelheconfiouessebem. Elanuncasercapazderealiz-laperfeitamente;aocontrrio,a dogmtica crist permane-cer sempre como um conjunto de reflexes, de pesquisase dedescriesrelativas, passveisdeerros. Ela tenderaumsaber melhor; outros viro depois de ns, e aquelequefiel noseutrabalhoesperaqueessespensemedi-gammelhor aquilo que ns tentamos pensar e dizer.Hoje, devemos fazer nosso trabalho com modstia e tran-qilidade, pondoemjogoosconhecimentosdequedis-pomos. Noserexigidodensmaisdoquerecebemos.Semelhantesaoservofiel nopouco(Mt 25.23), nonoslamentamos a respeito deste pouco. No nos exigidonada alm da nossa fidelidade.A T atera daDogmtica - 11A dogmtica como cincia chamada para justificarocontedodapregaodaIgrejacrist. Nohaveriane-nhumadogmtica, se atarefaprimordial da Igreja nofosse adeanunciar oEvangelho, dedar testemunhodaPalavra pronunciada por Deus. Esse dever sempre ur-gente, esseproblemacolocadoparaaIgreja desdeasori-gens - o problema do ensinamento, da doutrina, dotestemunho, dapregao- permanececomoaquesto,noparaotelogoouparaopastorapenas, masparaaIgrejatoda: oquerealmentetemos adizer ns, oscris-tos?Pois a Igreja, sem dvida nenhuma,deve ser um lu-gar onde ressoa uma palavra que se dirige ao mundo. As-sim, uma vez que a misso da Igreja anunciar a PalavrareveladaporDeus, missoque, aomesmotempo, umaobra humana, desde o comeo surge a necessidade deconstituir-se uma teologia, ou isso que denominamos,desde o sculo XVII, de dogmtica.Existe emteologia umproblema de fontes(deondevem a palavra?)e a disciplina chamada exegese que estencarregada de fornecer a resposta. Por outro lado, pre-ciso satisfazer-se questo como: estudar a forma e a con-duo dapregaoconfiadaIgreja; estamos agora noterrenodateologia prtica.Entre as duas, existe a dogm-ticaouteologiasistemtica. Adogmticanoperguntaarespeitodeondevemamensagemcrist, nemcomoseconcretiza, masapresenta uma questo: o que temosparameditar e para pensar?Essaquestosurgiu, fiquebementendido, tologoasEscriturasnosensinaramondeestafonte, eelavemacompanhada pela preocupao permanente denoficarnas declaraestericas, mas defazer ressoar concreta-mente essa mensagem no mundo. Falando precisamente apartir da dogmtica, deve ficar claro que a teologia no ,por umlado, ummerohistoricismo, mas umaHistria12 - Esboo delimaDogmticavlida, que penetra a realidade presente, aqui e agora. Poroutrolado, apregaonose deve degenerar emmeratcnica.De fato, em nossos dias, a questo de qual deve ser ocontedo da mensagemcrist mais premente do quenunca antes. Todavia, deve-se sublinhar bemque esseproblemanopodeser resolvidoporumrecursoexclu-sivodaexegeseoudateologiaprtica. necessrioquehajaumadogmtica. Quanto histriadaIgreja, quesepoderia cometer o errode desprezar, eudevoacrescentarquesuafuno enciclopdica: elatemahonradeserconstantemente requisitada eocupa umpostolegtimodentro do ensinamento cristo.Adogmtica umadisciplinacrtica. Nosetrata,pois, como se acreditou numa ou noutra poca, de seprender aquaisquer frmulas teolgicas, antigas ouno-vas, edesecrerquetudoestfeito. Pois, seexisteumadisciplinacrticaquesedevaremetersemcessaraopro-psito desua obra,essa justamente a dogmtica,exteri-ormente determinada pelo fato de que a pregao daIgrejaestsempreameaadaporerros. Adogmticaaverificaoda doutrinae dapregaodaIgreja;longedeconstituir umexamearbitrrio, fundadosobreumcrit-rioescolhidolivremente, Igrejaqueelavai perguntarsobqual pontodevist-anormativoeladeversecolocar.Praticamente, pela escala daSagrada Escritura, Antigo eNovoTestamentos, quea dogmticaavaliaa pregaodaIgreja. ASagradaEscrituraodocumentode basequetangeaomaisntimodavidadaIgreja, odocumentodaEpifaniada Palavrade Deus napessoade Jesus Cristo.Fora desse documento, ns no temos nada e, onde aIgreja est viva, ela deve sempre de novo se deixar julgar asi prpria segundoesse critrio. No sepodetratar dedogmtica semque esse critrio permanea presente edeve-se, semcessar, voltarquestodotestemunho. NoA Tarefa da Dogmtica - 13aquele do meu esprito e do meu corao, mas aquele dosapstolos e dos profetas enquanto testemunho do prprioDeus. Umadogmticaqueabandonasseessecritrionoseria uma dogmtica objetiva.Nsindicamosnatesequeabreocaptulo: segundoos fundamentosde suas Confisses de F. A Sagrada Escri-turaeas Confissesdef noestoemumplanoidn-tico. Reservamos Bblia uma estima e um amor que notemos, nomesmograu, pelatradio, nemmesmopelosmaisvaliososdeseuselementos. NenhumaConfissodeF datando da Reforma ou da poca atual pode, damesmamaneiraqueas Escrituras, elevar-se pretensode solicitar orespeito da Igreja.MasissonoretiranadadofatodequeaIgrejaes-cutaeapreciaotestemunhodeseusPais. Ento, mesmoquens noencontremos neleaPalavradeDeuscomoemJeremias ouemPaulo, eletemparans umsignifi-cado elevado. Obedecendoao mandamento"honrateupaie tuame", nsnonosrecusaremosarespeitar, sejanapregao, sejanaelaboraocientficadadogmtica,as afirmaes de nossos Pais. Diferentemente das Escritu-ras, as Confisses notmautoridadequeobrigue, masdevemos, todavia, lev-lasseriamente emconsideraoelhes atribuir uma autoridade relativa.Munidadessecritrio, a dogmticase lanadema-neiracrtica suatarefaque justificar ocontedodapregao crist e da ligao subsistente entre a mensagemque a Igreja deveria publicar e aquela que ela transmite defato. Odogma para ns a reproduo, a restituio, pelaIgreja, da Palavra de Deus que lhe foi anunciada.AIgrejadeveseinterrogarincessantementeacercado grau de correlao, de correspondncia, entre odogma e a mensagemque ela proclama. Oobjetivo ,pois, muitosimples: trata-se de sempre elaborar melhor apregao da Igreja. O aperfeioamento, a preciso, o- ~ - - J -, ,J14- Esboo dellmaDogm;ticaaprofundamentodoqueensinadonanossaIgreja, soobras prprias de Deus, mas que requerem um esforo dohomem. Uma parte desse esforo representada peladogmtica.Falaremos de dogmtica de umaforma elementar,obrigados quesomos, nocursodestebrevesemestredevero, anoscontentarcomumesboo. Dessemodo, to-maremos comofiocondutor umtexto clssico,o Smbolodos Apstolos.1Noexistemtodoobrigatrioquesejaimpostodeantemo dogmtica crist. Cada um livre, no mo-mentoemquevai abordar essesassuntos, paraescolhersegundoseusaberesuaconscinciaoencaminhamentoquelheparecer bom. verdadequenodecorrerdoss-culosfoi engendradoumprocedimentoquesetornaria,dealgummodo, usual; ele consiste emretomar emgran-des linhas o plano do pensamento cristo: Deus Pai, Filhoe Esprito Santo.Isso deu lugar a desenvolvimentos extre-mamente variados que no cessam de se entrecruzar.Aqui, ainda, ns temos a escolha. Indopelo maissimples, nosdeteremosnaConfissodefquetodosvo-cs conhecem, que repetida no culto todo domingo.Deixaremos de ladoos problemas histricos. Vocs sa-bemqueotermoapostlicodeveserpostoentreaspas:esse texto nofoi redigidopelos apstolos; noseuteoratual, ele remonta ao sculo III e tem sua origem em umafrmula conhecida e reconhecida pela comunidade deRoma. Emseguida, foi divulgadodentrodaIgreja, queotomou por umadeclaraofundamental. Portanto, nosem razo que ns o consideramos um clssico.I. N. DoEd.:Asconfissese credoshistricosdocristianismosocomu-mentedenominados Smbolos def; oautor constantementefarrefe-rncia ao Credo Apostlico apenas como o smbolo.Crer Ter ConfianaAConfissocomeaporessasduaspalavrascarre-gadasde significao:"eu creio':Tudo o que ns teramosa dizerpara justificar atarefaquenosaguarda coman-dadopor esse prembulo. Comearemos por trs teses,que se aplicam essncia da f.A fcrist o domdoencontro que tornaos homens livrespara escutar a Palavrada graa, pronun-ciada por Deus em JesusCristo, demaneiratal que eles se atm s promessas e aosmandamentos dessa Palavra, apesar detudo,deumavez por todas, exclusiva e totalmente.Vimos que a fcrist,a mensagem da Igreja, consti-tui o fundamentoe o objeto da dogmtica.Mas de quesetrata? Daquiloemque cremos cristos e da maneiracomo eles crem. Na prtica, no se pode separar a formasubjetivadaf,fides quacreditur, dapregao, poisessapregao implica necessariamente na presena de ho-mens queescutaramereceberamoEvangelho; homensque, juntos, foramevangelizados. Mas o fato de acreditar-mos podeser desdelogoconsideradocomosecundrio16 -Esboo deumaDogmticaemrelaoaoqueexiste demaior e deautnticona pre-gao, aoquecr ocristo, isto,o contedode sua f; eao que devemos anunciar, isto , o objeto da Confisso deF: creio em Deus, o Pai, o Filho e o Esprito Santo.AlinguagempopulardenominaaConfissodeFde "Credo" e essa expresso deve ao menos nos fazercompreenderoquensacreditamos. Dentrodafcristtrata-se, de uma maneira decisiva, de um encontro.Creio"em..."dizaConfisso. Tudodependedesse"em...", desseobjetodefonde vivenossafsubjetiva. notvel que, partedestaintroduo"creio...", oCredono diz nada do aspecto subjetivo da f. No foi bomquandoos cristos inverteram esta relao, falando muitosobre suas aes e sobre a emoo de experimentar aquiloque ocorre no interior dohomem, enquantopermane-ciam mudos sobre o que devemos crer.Aosilenciarsobreoladosubjetivodafparafalarde seu aspecto objetivo, o Credo se concentra naquilo queparans essencial, noquedevemos ser, fazer eviver.Aqui igualmente vlida a palavra: "aquele que quisersalvar sua vida, perd-Ia-, mas aquele que tiver perdido asua vida por minhacausa, salva-Ia-"(Mt 16.25). Aquelequequisersalvareconservarasubjetividadeperd-Ia-,masaquelequea abandonar pela preocupao com a ob-jetividade, reencontra-Ia-. Eucreio: efetivamentemi-nha experincia, uma experincia humana e umfato,uma formadenossa existncia de homens.Masesse"creio"serealiza em umencontrocomal-gum que no um ser humano, mas Deus, o Pai, o Filhoe o Esprito Santo.E no instante em que creio eu me sintocompletamentepreenchidoe tomadopeloobjetodemi-nha f; oquemeinteressano mais"eu com minhaf",mas aquele em que eu creio. Quando eu penso nele e olhoCrer Tcr Confiana -17para ele, ento sinto que tudo vai melhor para mim."Creio em...", credo in... , significa: no estou mais s.Ns, os homens, em nosso esplendor e nossa misria, noestamosmaisss. Deus vem ao nosso encontroe ele vema ns como nosso Senhor e nosso Mestre. Nos bons e nosmaus dias, emnosso desregramento ou nossa honesti-dade, vivemos, agimose sofremosnessa posio dereen-contro. Eunoestou s. Deus vemaomeuencontro. Emtodas as circunstncias, eu estou com ele. Eis o que signi-ficacreio em Deus, o Pai, o Filho e o Esprito Santo.Esse encontro com Deus o encontro com a palavradagraa queDeus pronunciouemJesusCristo. Affalade Deus Pai, Filho eEsprito Santo como daquele quevemao nosso encontro, como objeto de nossa f. Elaafirma esse Deus que Unoemsi, que foi para ns oDeusnicoe que foi denovoparaa eternidadenostem-pos emqueserealizousuavontadedeamor, seuamorgratuitoeincondicional pelohomem, por todos os ho-mens, conforme a sua graa.ConfessaroPai, oFilhoeoEspritoSanto, dizerque Deus o Deus da graa. Isso implica em quens nopodemosprovocara comunhocomele: nsnoacria-mos enocriaremosjamais. Assimcomons nofize-mos por merecer que ele seja nosso Deus, no temosnenhumapretensodefazervalernenhumdireitosobreele. ele, em sua bondade totalmente gratuita, em sua li-berdade soberana, que desejou ser o Deus do homem,nossoDeus. Eissoelenosdiz. QuandoDeusdiz: minhagraa est sobre vs, eis a Palavra de Deus, o conceitocentral de todoo pensamentocristo. APalavra deDeus a Palavra de sua graa.18 - Esboo de limaDogm,icaEse vocsperguntarem:ondeescutamosessaPala-vra de Deus? Eu no posso fazer outra coisa senomand-los de volta ao prprio Deus que nos deu a ouvir asua Palavra. Refiro-me ao corao da Confisso deF,aosegundoartigodoSmbolo2:aPalavradagraa, naqualDeusnosencontra, JesusCristo, verdadeiroDeuse ver-dadeiro homem, Emanuel, Deus conosco.A f crist o encontro com esse "Emanuel", com Je-sus Cristoe, nele, comaPalavravivadeDeus. Quandochamamosa Sagrada Escritura de Palavra de Deus(nsanomeamosassimporque bemoqueela), pensamosnaEscrituracomotestemunhodadopelosprofetasepe-los apstolos nica Palavra de Deus, pensamos no judeuJesus, que oCristodeDeus3,nossoSenhore nossoReipara sempre.Quandoconfessamos isso, ao ousarmos chamar apregaodaIgrejadePalavradeDeus, issodeveseren-tendidocomooannciode Jesus Cristo, daquelequeverdadeiroDeus everdadeirohomemparanossasalva-o. nele que Deus vem aonossoencontro. Quandodi-zemos: creioemDeus, significaconcretamente: creionoSenhor Jesus Cristo.Eufalei desseencontrocomodeumdom. oen-contropelo qual os homenssetornamlivres para escutaraPalavradeDeus. Odomealibertaosoumaseamesma coisa. O dom o domde uma liberdade, dagrandeliberdadenaqual estocompreendidas todas asoutras liberdades. Partindo desse ponto, desejo chegar, nodecorrer destecurso, afazer comquevocsexperimen-temde novo essa palavra de liberdade, que temsido2. Vide nota n" XXX.:). N. do T.: Cristo em grego significa"ungido",logo: o Ungido de Deus.Crer Ter Confiana - 19usadademaneira toabusiva e que permanece,contudo,como a maisnobre das palavras.A liberdade o grande domdeDeus,o domdoen-controcomele. Por qu umdom? Epor qu, precisa-mente,o domda liberdade? que o encontro de quefalao Credono se produz por coisa alguma. Ele no repousaem uma possibilidade ou uma iniciativa humana, em umacapacidade que ns, os homens, teramos de encontrarDeus, deouvirsuaPalavra. Casoquisssemosexaminardoquequesomoscapazes, ns nosesforaramosemvopor encontrar qualquer coisa quepudesse ser nome-ada como uma disposio para ouvir a Palavra de Deus.oimenso poder de Deusque entra em jogo, semquensobuscssemosporcoisaalguma, equetornapossvel oque para ns impossvel. um dom de Deus, livrementeconcedidoesemqualquerpreparaodenossaparte, seencontramosaDeuse emnossoencontrocomeleouvi-mos sua Palavra.A Confisso doPai, do Filho e do Esprito Santo falaemseus trsartigos4de uma realidade e de uma obra ab-solutamentenovas, inacessveise incompreensveisansoutros, homens. Ecomo essa realidade e essa obra deDeusPai, Filhoe EspritoSantosoparansumagraade Deus, ainda uma nova graa que nossos olhos e ouvi-dos estejamabertos paraele. Aqui aConfissoest fa-lando do mistrio de Deus e ns ficamos exatamentedentro desse mistrio no momento em que ele se iluminaparans, nomomentoemquenostornamoslivresparareconhec-loeparaviver nele. "Eucreio", disse Lutero,"queno nem por minharazonempor minhasforasque eu posso crer em Jesus Cristo e chegar a ele".Eucreio,aexpressodeumconhecimentopelaf, pormeiodatJ. Vide nota n" XXX.20- Esboo deLImaDogmticaqualeusei queDeus nosedeixa conhecer a noser porele mesmo.Esepossorepetiristocomf, issosignificaqueeulouvoe agradeopelofatode que DeusoPai,oFilhoe oEsprito Santo o que e faz que ele faz,e revelou-se paramim, destinou-separamimemedestinouparaele. Eudougraaspor tersidochamadoe escolhido, por ter umSenhor que me libertou para ele. da que parte a minhaf. Oque quer que eu faa, no momento em que eu creio,notemamenor importncia. Mas, oessencial saberparaoqueeufui convidado, e emvistadoquefui liber-tadoporaquelequepoderealizarissoqueeunopossoneminiciar enemterminar. Estoufazendousododomatravsdoqual oprprioDeussedeuamim. Respiro; edoravanterespirofelize livredentroda liberdadequeeunemconquistei, nemprocurei, nemencontrei dentrodemim, mas quemefoi dadapor Deusquandoeleveioamim. Trata-seda liberdadedeescutaraPalavradagraade maneira tal que o homem possa se ater a essa Palavra eque a considere como digna de f.O mundo de hoje est repleto de palavras e sabemoso que significa uma inflao de palavras, quando elas per-demo seu '-alor e cessamde ser reconhecidas. Masquando se cr no Evangelho, a Palavra reencontra seucrditoe sefazouvir detal maneira queaquelequeaes-cutar nomaislhe possa escapar. PeloEvangelho, aPala-vra recebe seu sentido e se impe como Palavra. EssaPalavra maravilhosa, na qual cr a f, a Palavra de Deus,JesusCristo, emquemDeusanunciouaoshomensasuaPalavra, de uma vez por todas. assim que crer significa ter confiana. A confiana o,atopelo qual um homem se abandona fidelidadedeumoutro, de quemconhece a aquiescncia e do qualaceita as exigncias. "Eu creio" significa "tenho confi-Crer Ter Confiana - 21ana". No mais em mim mesmo que devo ter confiana;nonecessitomaisdemejustificar, demedesculpar, deme salvar,de preservar a mimmesmo. Esse esforo terr-veldohomemparase manterasi mesmoe paraseatri-buir uma razo a si mesmo, esse esforo se torna umesforo sem sentido. Eu creio, no em mim, mas em DeusPai, Filhoe Esprito Santo. Torna-se suprfluae caducaaconfiana que se atribua s instituies que se acreditavaseremdignas, quelaspretensasncorassquaiserane-cessrio se agarrar. Suprflua e caduca igualmente setornaa confiana atribudaacertasdivindadeserguidas,honradas e invocadas pelos homens em todos os tempos.Qualquer quesejaonomequeselhesd, Idias ouPotncias doDestino, elas continuam sendoasinstnciass quais nos entregamos. A fnos libera da confiana queatribumosa taisdivindadese dotemor queelasnosins-piram, eelimina. asdecepesdasquaiselassoafonte.Devemos ser livres para ter confiana naquele que merecenossaconfiana; ser livres parapermanecermos ligadosquele que fiel e que assim permanece, contrariamente atodasasoutrasinstncias. Denossaparte, nsnosere-mos jamais fiis. Nossa rota est semeada por nossas infi-delidades ao prximo e ocorre o mesmo com asdivindades destemundo. Elas nomantmas suaspro-messas; assim, nunca h nelas a verdadeira paz e luz.Noexistefidelidade anoser emDeus. Af aconfiana que permite que nos mantenhamos nele, nassuaspromessasenos seusmandamentos. Manter-seemDeus abandonar-seaessacertezaeviv-la: Deus estaqui para mim.Tal a promessa que Deusnosfaz: eu es-tou aqui, para ti.Mas essa promessa est acompanhada por um man-damento. Euno mais me deixarei conduzir por meusprprios pensamentos ou segundo meu bel-prazer; eu re-cebi de Deus uma ordem pela qual devo me conduzir du-22- Eshoo de umaDogmticarantetodaminhaexistnciaterrestre. OCredosempreEvangelho, aBoaNovadeDeus paraoshomens, desseEmanuel, Deus conosco, Deusvindons; simultanea-menteenecessariamente, uma lei. OEvangelhoeaLeino devem ser separados, constituem uma nica entidadenointeriordaqual oEvangelhoacoisaprimordial eaLei permanececontidanaBoaNova. VistoqueDeus para ns, nos permitidoser paraele. Vistoqueeleseoferece a ns, ns devemos, por reconhecimento, dar aele o pouco que temos para dar.Agarrar-sea Deus, portanto,sempre significa: rece-bertudodeDeuse pr tudoaseuservio. Eisso, ades-peito de tudo, de uma vez por todas, exclusivamente etotalmente.emrelaoaessasdeterminaesqueafcomoconfiana deveser aindacaracterizada. E deve-seestabe-lecerquenafissose tratadeuma possibilidade, nodeuma obrigao, pois desde o instante em que se idealiza af, subestima-se a sua grandeza.Essa grandeza noresidenofatodequesejamoschamadosa cumpriralgodeex-traordinrio, que ultrapassaria as nossas foras. A f , so-bretudo, umaliberdade, umapermisso. AquelequecrnaPalavradeDeusdevepodernelaseagarrarapesardetudoaquiloqueseopeaessaPalavra. Nosecr"porcausade"ou"baseadoem", masse despertadoparaafa despeitodetudo.Pensem nos homens da Bblia. Eles no se tornaramcrentes por causa de uma demonstrao qualquer, de umaprova; masumbelodiaelesse viramcolocadosemumasituaoquelhes permitia crer e que lhes obrigava a crer,adespeito de tudo. Forade sua Palavra, Deus nos estoculto, mas ele se revela em Jesus Cristo. Se ns passamosemfrente aelesemover, nodevemos nosadmirar deno encontrar a Deus, de ir dos erros s decepes, de vero mundorepleto detrevas. Se acreditamos, devemos crer,Crer Ter Confiana - 23apesardetudo, noDeusocultoe, nofatodequeeleestoculto,est oapelonecessrio para nos lembrar denossalimitao humana. Ns no acreditamos apoiados emnossa razo ou emnossos prpriosrecursos. Todocrenteautntico sabe disso bem.Omaiorobstculofsimplesmenteessaeternapresuno e tambmessa angstia que subsistemnonosso corao. Ns no amamos viver pela graa; h sem-pre emns alguma coisa que se insurgeviolentamentecontra a graa. Ns no amamos receber a graa, nsamaramos, nomximo, atribu-laansmesmos. Avidahumana feita desse vai-e-vem entre o orgulho e o deses-pero, que apenas a f podeeliminar. Se contar consigomesmo, o homem no pode chegar a ela, uma vez que nopodemos, nsmesmos, noslibertardoorgulhoe daan-gstia. Se formos libertos graas a uma ao que no de-pende de ns.Quandosetentacondensartudooque representaessa fora de oposioe de contradio, tem-se uma vagaidiadoque aBbliaquer dizer quandofala do Diabo."Deusodisseverdadeiramente?"(Gn3.1). APalavradeDeus verdadeira?Quandosecr, despreza-seesseDi-abo. Mascrerno umatodeheroismo. Guardemo-nosdefazerdeLutero umheri. Lutero jamais se consideroucomo tal, mas ele sabia de uma coisa: se devemoscomba-ter, afrontar oinimigo, justamente a ttulode uma pos-sibilidade atribuda, de uma permisso, de uma liberdaderecebida na mais profunda humildade.Estar naf: trata-sede uma deciso tomadadeumavez por todas. A fno uma opinio quese poderia tro-car por umaoutra. Aquele que cr apenas durante umtemponosabeoque a f, poiscrersupe umarelaodefinitivamente estvel. Estarnaf: trata-sedeDeus e doqueelefezpornsdeuma vez portodas. Issonoevita,por certo, que ocorramenfraquecimentos da f. Mas,24- Esboo de umaDogm,ticaconsiderada em relao ao seu objeto, a f uma coisa de-finitiva. Aquelequeacreditouumavez, crparasempre.Nose assustemcomoquedigoaqui, maso consideremcomoumconvite. Porcerto, podem-secometerenganosou duvidar, mas quem acreditou uma vez, de alguma ma-neira, portaumcharacter indelebilis: pode assegurar-seempensamentoqueestsalvo. precisoaconselharaosque devemcombater a incredulidade que no levemmuitoa srioessa mesma incredulidade. Nada alm dafdeveser levadoasrioesetemos umaf semelhanteaum grode mostarda (Mt13.31) o suficiente para que oDiabo tenha perdido a partida.Emterceiro lugar5, f est relacionada a ns nosagarrarmos exclusivamenteaDeus. Exclusivamentepor-queDeusAquelequefiel. Existetambmumafideli-dadehumanaquetemsuaorigememDeus eque deveincessantementenosalegrarenosfortalecer. Masofun-damentodessafidelidade sempreafidelidadedeDeus.Af aliberdadedeseconfiar totalmenteapenas nele,solagratiaet sola fide. Issonoimplica, demaneirane-nhuma, um empobrecimento da vida humana;ao contr-rio, todas as riquezas deDeus assim nos so atribudas.Para terminar, devemos nos agarrar totalmente Pa-lavra de Deus. A f no concerne a um setor particular davidadenominadoreligioso, elaseaplicaexistnciaemsua totalidade, exterior como interior, corporalcomo espiritual, szonassombriascomosclaras. De-vemosnos confiar a Deus, seja em relaoa ns mesmos,sejaemnossocomportamentonointeressedooutro, dahumanidade inteira; emrelao ao todo da vida e damorte. Serlivreparaumaconfianaassimdefinida terf.5. N. do Ed.: A primeira e a segunda consideraes, (1) CI despeilo de ludo,e (2)de uma vez por lodos, foramexpostas nos pargrafos anteriores.Crer Significa ConhecerA fcrist a iluminaodarazoque permite aos ho-mens a liberdade de viver na verdade deJesusCristoe, por esse mesmocaminho, de conhecer, semrisco deerrar,o sentido de suavida, bem como a causae o fimdetudoo que existe.Pode ser que vocs fiquemsurpresos em ver a razointervir aqui. de maneira intencional que faouso desseconceito. Vale a pena lembrar que o famoso conselho:"desprezaarazoeacincia, essasupremaalavancadohomem", no vem de um profeta, mas do Mefisto de Goe-the. Cristos e telogos tm sido sempre muito mal inspi-rados quando, por entusiasmo ou emnome de suasconcepesparticulares, acreditaramquedeviamseali-nhardentrodocampodos adversriosdarazo. AcimadaIgrejacrist, resumindoarevelaoea obra deDeus,encontra-seaPalavra.6"APalavrasefezcarne". Ologos(querdizeroverbo, arazo, apalavra) sefezhomem. ApregaodaIgreja umdiscursoque, muitolongedeser6. Em grego, o logos, que significa tambm a razo. (N.do T.da ed.francesa).2(, -Esboo deumaDogm,ricaacidental, arbitrrio,catico ou ininteligvel, pretende serverdadeiro e procura se impor como tal contra a falsi-dade. No aceitemos abandonar essa posio perfeita-menteclara! ApalavraqueaIgrejatemavocaoparapregar no a verdade em um sentidoprovisrio,secun-drio' masnosentidoprimeiroe fortedotermo;trata-sedologos que se manifesta e se revela na razo do homem,noseuentendimento, comtodaasuasignificaoeemtoda a sua verdade. A pregao crist est ligada aologos,ratio, razo, fontedarevelao na qualo homem comsuasfaculdades racionaispode, emseguida, sereencon-trar. Pregaoeteologianadatma ver coma verborra-gia, o falar emlnguas ou a propaganda, incapaz desustentar suas asseveraes. Ns conhecemos bemessegnero de discursos edificantes, proferidos commuitaeloquncia e nfase,mas que - muito claro! - noresis-temsimplesquestonotocanteverdadedoqueafir-mam. OCredocristoassenta-seemumconhecimento.Por toda a parte ondeele pronunciadoe confessado,elenofazmais que criar esse conhecimento.Afcrist no, demaneiranenhuma, irracional, anti-racional ousu-pra-racional. Bem entendida, ela , ao contrrio, racional.AIgreja querecita o Credoe que se apresenta coma pre-tensoinauditadepregar, deanunciara boanova, podefaz-loporqueelaentendeu, compreendeu algumacoisa?e porque ela deseja simplesmente que isso seja compreen-dido, percebido por outros. No se pode considerar comofelizesas pocas em que, na histria da Igreja, a teologia eadogmticapensarampoder separara gnosisdapistis, oconhecimentodaf. Afbemcompreendidaconheci-7. Em alemoVernunfi (razo)vemde uernehmen(compreender,entender, perceber),assimcomo entendimento, emfrancs,vemde entender.(f\J. cio T da cd. francesa).Crer Significa Conhecer - 27mento, O ato pelo qual se cr tambm um ato de conhe-cimento. Crer significa conhecer.Ditas essas coisas, podemos estabelecer que a fcrist comporta uma iluminao da razo.Afcrist temumobjetoprecisodoqual falaoCredo: Deus, oPai, oFilho e o Esprito Santo.A particularidade desse objeto,aparticularidade deDeus, oPai, oFilhoe oEsprito Santo, seguramente, a de permanecer imperceptvel ao ho-mementregueaseus prprios meios de conhecimento.Para permitir que o homemo perceba, necessrionadamenos que aintervenodoprprioDeus agindocomplenaliberdadee decidindosoberanamente. Entreguessuas prprias foras, ohomempoder, nomximo, se-gundo o grau de suas faculdadesnaturais, de seu entendi-mentoedesuaintuio, reconhecer aexistnciadeumser supremo,absoluto, de uma potncia superior, deumaentidade que domina toda a realidade. Mas tal descobertano temnenhuma relao como prprio Deus. Ela frutodasintuiese daspossibilidades- limitesdopen-samentoe doesforo do homem, que pode, comcerteza,imaginar umser supremosemque, apesar disso, tenhaencontrado Deus. Descobre-se e conhece-se Deusquandoele se da conhecer a si mesmo, dentroda sua in-teiraliberdade. Chegaremosmais tardeafalar deDeus,deseu ser e desuanatureza, masdesde j devemosespe-cificar bemqueelepermanecesendosempreaquelequese d a conhecer em sua livre revelao e no um ser ima-ginadopelohomemeaoqual esteltimocolaumaeti-queta "Deus".A linha divisria entre o verdadeiro Deus eos falsos deuses se estabelecejclaramente apartir doproblema do conhecimento. Conhecer Deus no se incluinoquadrodas possibilidadesdiscutveis. Deus ocon-tedo e a soma de toda a realidade tal como esta se revelapara ns. Oconhecimento de Deus ocorre desdeque efe-28- Esboo de limaDogmricativamenteelefale, desdequeeleseapresenteaohomemde tal forma queohomemnopossadeixar dev-loeouvi -lo, desde que, numa situao emque no possuimaisocontrolee naqualelese torna umenigma parasimesmo, ohomemse vcolocadodiantedofatoquevivecom Deuse Deus com ele, porque Deus se agradou disto.ParaqueeletenhaconhecimentodeDeus, necessrioque tenharevelao divina, sendo o homem ensinado, es-clarecido e persuadido pela interveno do prprioDeus.Comeamospor dizer queaf cristnasceudeumen-contro. Podemos precisar a coisa dizendo que a fcrist eo conhecimento que se possa ter existem desde que a Ra-zodivina, oLogosdeDeus, dirigesualeiaoseiodara-zohumana, sendoesta, segundosuanatureza, obrigadaa se conformar a essa lei. dentro desse evento que o homem chega ao verda-deiroconhecimento, pois, apartir dofato de que Deusocupa seu pensamento, seussentimentose seussentidos,o homem e sua razo so revelados a si mesmos. A revela-odeDeus ao homem , pois, aomesmo tempo umare-velao da verdadeira natureza do homem, quepermaneceincapaz de provocar o evento queoiluminaedoqual apenas Deus o autor. Pode Deus ser conhecido?Sim, Deuspodeser conhecidoporqueeleseda conhe-cere nopodeser conhecidosenoporele mesmo. Esseevento confere ao homem a liberdade, a capacidade, o po-derdeconhecer Deus- acoisa permanecendoemsiummistrio. OconhecimentodeDeus umconhecimentoabsolutamente determinadoe criado peloseu objeto, isto, pelo prprioDeus.Mas isso precisamente o que umconhecimentoautnticoe, nosentidomaisprofundodapalavra, umconhecimentolivre. Certamenteeleperma-nece um conhecimentorelativo, encerrado nos limites dacriatura.E para seu sujeito que ele se satisfaz muito par-I ICrer Significa Conhecer - 29ticularmentedefalar dotesouroquecarregamosdentrodosvasos debarro(2Co4.7). Nossos conceitos soim-prprios paraconter essetesouro. impossvel noverque nesse clima toda forma de orgulho est excludadesdelogo. Ohomempermanecesendooque, impo-tente, sua razo estando submissa aos limites do estado dacriatura. Mas nesse quadro que convma Deus sereve-lar. E acontece queaqui, igualmente, estando louco queohomemsetornasbio, sendopequenoquesetornagrande, e queDeusserevelaeficaz ondeo homemsere-velaimpotente(ICo1.25; 3.18). "Minhagraatebasta!Pois aminhapotnciaserealizanatuafraqueza" (2Co.12.9). Estapalavra seaplicatambmaoproblemadoco-nhecimento.Segundo a tese formulada no comeo deste captulo,afcrist a iluminao darazo quenos d a liberdadede vverdentro daverdade de Jesus Cristo. essencialpara a inteligncia da f crist compreender que a verdadedeJesusCristoe o conhecimentodessa verdadereferem-sevida. Assim, issonosignificaque, por essarazo,deva-se abandonar a idia de que a f um conhecimentoparaconsider-lacomoumconhecimentoobscuro, umaexperincia ou uma intuio irracional. A f verdadeira-mente um conhecimento, ela est ligada aologos de Deuse, porconseguinte, constitui algointeiramentelgico. Averdade de Jesus Cristo , no sentido mais rigoroso da pa-lavra, umaverdadeobjetiva. Seu pontodepartida, ares-surreio de Jesus , segundo os dados do NovoTestamento, umfatoqueseproduziunotempoenoes-pao. Os apstolos no secontentaramemdescrever edefender umaexperinciapuramenteinterior. Eles fala-ramdoqueviramcomseusolhos, doqueouviramcomseusouvidosedoquetocaramcomsuas mos. AssimaverdadedeJesusCristo entranoquadrodeumareflexo.)0 . Esboo de limaDogmticahumana absolutamenteclara,lgicae livre, precisamenteporque ligadaa seuobjeto. Mas- no separemosas duascoisas - essaverdadedizrespeitovida. Aquiloque sechama cincia, o saber, no saberia o suficiente em si paradescreveressaverdade. Parapodercompreenderaoqueisso remete, necessriovoltar principalmente noode sabedoria prpria doAntigoTestamento, sophiadosgregos, sapientiadoslatinos. Sapientiasedistinguedescientia, sabedoria decincia, noqueelaimplicaemumsaber eminentemente prtico que engloba a totalidade daexistncia humana. A sabedoria o saber que nos permiteviver defatoemumasituaoqueanossa; elauneaprticaeateoria. Osegredodasuaeficciaqueelaaplicvel de imediato e governa nossa existncia comoumaluzsobreonossocaminho (SI 119.105). Noumaluz qualquer, oferecidapara nossa estupefao ouparanossasreflexes, nouma luz queofereaaocasioparafazerfogosde artifcio- mesmo quandose trate das maissbiasreflexesfilosficas! -, masaluzque, muitosim-plesmente, ilumina nosso caminho, nossas palavras enossos atos, que brilha sobre nossos dias de sade e sobrenossos diasdedoena, sobre nossa pobreza e sobre nossariqueza; que nos acompanha quando acreditamos vercomclareza, bemcomoquandonosdesencaminhamos.Essa luz que no cessa de estar aqui quando tudo se extin-gue e a morte nos sobrevm.ConhecimentocristosignificavivernaverdadedeJesusCristo. nele que temos a vida, o movimento e o ser(At 17.28),a fimde que possamos ser nele, por elee paraele(Rm11.36). Esseconhecimentocoincide, pois, abso-lutamente com o que denominamos a confiana em DeuseemsuaPalavra. Nonosdeixemosimobilizar quandonos proposto distinguir, separar, nessa matria. Noexiste confiana real, slida, autntica, vitoriosa emDeusCrer Significa Conhecer - 31e emsua Palavra que no seja baseada na verdade deDeus e de sua Palavra, como no existe conhecimentocristo, deteologia, deconfissodef emesmodever-dadebblica queno porteaomesmotempoocarter deverdade viva e real. preciso que uma e outra, confianaeconhecimento, vidaef, sejamincessantementeverifi-cadas, controladas e confirmadas uma pela outra.E precisamente porque nos dado viver comocristos na verdade de Jesus Cristo, luz do conheci-mentode Deus que iluminanossarazo, que podemosconhecer comconvicooverdadeirosentidode nossavida, assim como a razo de ser e o objetivo de tudo o queexiste. Daoalargamentoprodigioso denossohorizonte:compreender dentro de sua verdade o objeto da f, nemmais nemmenos, tornar-secapazdeconhecer todas ascoisas, quer dizer, a si mesmo, o homem, o mundo e a to-talidade do cosmos. A verdade de Jesus Cristo no umaverdade entre outras, pois ela a verdade de Deus, aprimaveritas, e aomesmotempoaultimaveritas. NocriouDeus todasascoisas emJesusCristoCCI 1.16), nsmesmos a compreendidos? No existimos seno nele,quer osaibamosouno, eouniversointeironoexisteseno nele, sustentado pela sua Palavra potente. O conhe-cer conhecer todasascoisas. Ser tocadoe tomadopeloseuEspritoser conduzidoparadentrode todaaver-dade(Jo16.13). CreremDeuseconhec-lotorna, pois,impossvel a questo do sentido da vida. Ao crer eu vejo osentidodaminha vida, osentidodomeuestadodecria-tura, da minha individualidade com seus limites e seu ca-rter falvel, tributrio a cada instante do pecado, mastambm doauxlioque Deus me concede ao intervir semcessaremmeufavor, apesarde mime semn e n h ~ ' m m-rito de minha parte.Em tudo isso eu conheo e identificoa tarefa que me atribuda, a esperana que a acompanha32 - Esboo de limaDogm,ticaemrazoda graa naqual vivo, a realidade da glria queme est prometida e na qual eu j estou secretamente en-volvidoaquie agora, com toda a fraquezada minha con-diopresente. Crerreconhecer quetal precisamenteo sentido de minha vida.OCredoafirmaqueDeus a razodesere oobje-tivo de tudo que existe. A razo de ser e o objetivo do uni-verso JesusCristo. Eis o inaudito em todo esse assunto:afcrist, queimplicaessaconfianatotal emDeuseemsuaPalavra, esse conhecimento ntimoe profundo dara-zodeser edoobjetivodetodas as coisas; assimoho-memvive, a despeito de tudo que possa ser dito aocontrrio, nessapazquesuperatodoentendimento (Fp4.7)e que, nisso mesmo, a luz que ilumina nosso enten-dimento.I ICrer Confessar a Sua FA fcrist a decisoque daos homens a liberdade de de-clarar publicamente sua confiananaPalavra deDeus e seu conhecimentode JesusCristo, tantona linguagemdaIgreja,comonalinguagemdomundo, e sobretudo pelas aese atitudes subseqentes.Af cristumadeciso, esseonossopontodepartida neste quarto captulo. Certamente a f um acon-tecimentodentrodomistriodarelaoentreDeuseohomem, acontecimento que manifesta a liberdade da qualDeus faz uso em direo ao homem, ao mesmo tempo emquelheofereceessamesmaliberdade. Mas issonoex-c1ui, bemaocontrrio, que a fse traduza por uma hist-ria, quer dizer, queohomemquecrsejalevadoaagiratravs dotempo.Af omistriode Deus queirrompe emnossomundo: elamanifestaaliberdadedeDeusealiberdadedohomememao. Seelanosetraduzirpornenhumfato- visvel e audvel- no f. Aofalar deDeus, oPai,oFilhoeoEspritoSanto, oCredoquersignificarqueoprprio Deus em sua essncia, em sua vida profunda, no umDeuspassivo, inativo, umDeusmorto, mas queele34 - Esboo de umaDogmticaexiste em uma relaointerna, em um movimento quesepode, comfundamento, descrever como uma histria,umdevir.Deus no est acima da histria. Ele prprio a his-tria. Portodaaeternidade, concebeuemsi mesmoumpropsito do qual a Confisso de F exprime linhas geraisequenossos paissdenominaramdecretodacriao, daalianaedasalvao. EssepropsitoDeus executou, deuma vez por todas,sobre o plano da histria na obra e namensagem de Jesus Cristo, as quais testemunha concreta-menteo quartoartigo doSmbol09: "padeceu sobPncioPilatos, foi crucificado, morto e sepultado...".Af oquecorresponde, por partedohomem, aessaexistnciaeaessaaodeDeus. SeuobjetoesseDeushistricoemsuaessnciae seu propsitovisa, peemmovimentoerealizaahistria. Umafquenosejaela mesma histria no mais a f crist, perdeu o seu ob-jeto.Aautntica f crist determina sempre umfen-meno histrico: a apario, entre os homens de umamesma pocaedetodasaspocas, deumacomunidade,de uma reunio, de uma comunho. Mas ao mesmotempoela suscita no prprio seio dessa comunidade umapregao, uma mensagem dirigida ao exterior, em direoao mundo de fora. Uma luz se acende e "ela ilumina a to-dos os que esto dentro da casa"(Mt 5.15). Em suma:a fd nascimento e vida a uma comunidade cuja vocao adeestarnoe paraomundo;e Israel quesurgenomeiodos povos, e a Igreja que se rene, a comunho dos san-tos, todososqueconstituemocorpodeCristo. NoqueS. N. do Ed.:As primeiras geraes dos Reformadores,que sistematizaramestas doutrinas.9. Videnotan I.I ICrer f, Confessar a Sua F - 35Israel eaIgrejasejamumfimemsi mesmos, poisestoaqui unicamenteparasignificara vindadoservidorqueDeus suscitou para todos.H a histria, portanto, e aqui o lugar de falardessacorrespondnciaentreaaodohomemeaobraque Deus realizouna livre deciso da sua graa. Essa his-tria possvel desde que o homem responda, quer dizer,obedea.Afobedinciaenoadesopassiva. Obedecerescolher. Escolher af enoaincredulidade, decidir-sepelaconfianacontraadvida, peloconhecimentocon-traaignorncia. Crerfazer umaescolhaentreafeoque no ela, o erro e a superstio. A f o ato de obedi-ncia e de deciso pelo qual o homem se apresenta a DeuscomoDeusoexige. Esseatoimplicaquesedeixedeserneutro face a face com Deus, que se abandone essa atitudede indiferenaedeirresponsabilidadequeimpedetodadecisoverdadeira;quesedeixe, enfim, seuprpriouni-versopara ousar escolher e se ligar abertamente, publica-mente. Umafquepermaneaalgoprivado, quenosemanifesteparaoexterior, nosermaisdoqueumain-credulidade escondida, uma falsa f, uma superstio.Poisa fque tem por objeto Deus, o Pai,o Filho e o Esp-rito Santo no pode no se manifestar publicamente.Dissemos que "a fcrist a deciso que d aos ho-mens a liberdade dedeclarar publicamente sua confianana Palavra de Deus". Aresponsabilidade pblica que ocristoassumeimplicaqueelerecebeuodireito, aper-misso; quer dizer queeleconheceumaevidente liber-dade. liberdadedecreredeconhecer, soma-seaquelade se engajar. Impossvel separar uma da outra. Uma con-fiana emDeus quepretendaviver semconhecimento,noseria verdadeira. E o homem transbordante de confi-anaedeconhecimentoquenosesintalivreparade-.)6. E s b o ~ ' o deumaDognlCricaclar-los publicamente, merece que dele se diga "suaconfianaeseuconhecimentonovalemnada!" Opr-prioDeus, tal comoo confessa a Igreja, no aqueleque,longe de permanecer oculto ede querer existir para simesmo, saiudoseumistrioedasuamajestade divinaparadesceresemanifestar dentrodasuacriao?Noaquele que se desvela,que se mostra?Quandose cr nele, nosepodeter escondidos agraa, oamor, aconsolaoealuzquevmdele, nemguardar para si a confiana quese pe na suaPalavrae oconhecimento que se tem dele. impossvel que as palavras e os atos do crente per-maneampalavras neutras, atos que nosecomprome-tam. Desde que exista a f, a glria de Deus(doxa, gloria)devenecessariamente brilhar sobrea terra. Sea glriadeDeus no se manifesta de uma maneira ou de outra, se elapode ser obscurecida oudeformada por nossa prpria sa-bedoria oupornossafraqueza, deve-seconcluirqueafest ausentee que a consolaoe a luz queDeusconcedenoforamrecebidas defato. AglriadeDeusentranocosmos eseunomesantificadosobreaterratodavezque aos seres humanos dado crer, toda vez quese renee se pe em marcha o povo, a comunidade de Deus.A f d ao homem, tal como ele , com todos os seuslimitese sua impotncia, em toda a sua perdioe todaasua loucura, a liberdade real para fazer resplandecer aglria e a honra deDeus, derefletir sua luz incomparvelsobre a terra. No nos exigido mais do que isso, mas issonos exigido. Essa liberdade de testemunhar publica-mente sobre a nossa confiana na Palavra de Deus e sobrenosso conhecimento da verdade que est em Jesus Cristo,issoOquenostermosdaIgrejasechamaconfessarsuaf.I ICrer Confessar a SuaF - 37Confessar sua f declarar publicamente na lingua-gem da Igreja, mas tambm testemunharatravsdede-cises profanas e, sobretudo, pelas aes e atitudesconseqentes. Temosaqui, parece-me, astrsformasab-solutamenteinseparveis- impossveisdeseoporumass outras e que devem ser vistas sempre ao mesmo tempo- do testemunho cristo, que em si mesmo uma das ma-nifestaes essenciais da f. As explicaes que se seguemformam, portanto, um todo indivisvel.1. Afnosdaliberdadedeafirmarpublicamentenossa confiana e nosso conhecimento, na linguagem pr-priadaIgreja. Oquequeremosdizer comisso?Aigrejateveetemsualinguagemparaelaemtodasaspocas. assim. Nodesenvolvimentohistrico, elapossui suahis-triaparticular, suaprpria via. Aoconfessarsuaf, nopodeabstrairessahistria. Ela viveemumcontextohis-tricoabsolutamenteprecisoquenocessardelheim-por uma determinada linguagem. Assim, afcrist- e otestemunho pblico dessa f -necessariamente extrairseu mododeexpresso daBblia, das lnguasdaBblia, ogrego e o hebraico, e das tradues que tm sido feitas,as-simcomo da tradio da Igreja, das formas de pensa-mento, conceitos e idias que a Igreja utilizou no decorrerdossculos para formular, adquirir, defender e desenvol-ver seus conhecimentos. Existe umalinguagemprpriadaIgreja. normal. Ousemoscham-la porseunome: o"dialeto de Cana". Nenhum cristo, chamadoa confessara f, quer dizer, chamado para fazer brilhar externamentea luz queestacesanele, poder faz-losemutilizaressalinguagem, que asua. Vejamosascoisascomoelasso:desdequesetornenecessrioexprimircomprecisoascoisasdaf, desdequesedevafalar denossaconfianaemDeus, em sua Palavra noque ela tem, por assim dizer,3B-Esboo delimaDogmticade especfico- e nsdevemosbemreconhecer que issoterrivelmente necessrio para que os problemas se tornemclaros - devemos desadafalar odialetodeCana! Te-nhamosessacoragem! Poiscertasdirees, certos conse-lhose certasexortaesnopodemser comunicadosaosoutros seno nesse "dialeto". No necessrio ser delicadodemais nesse assunto, nem medir excessivamente as pala-vras. "Eucreio", dizemosfreqentemente, "masminhaf algo to ntimo e pessoal que estipulei para mim mesmoumaregradeevitar citar a mnimapalavrabblica, e quesinto umforte embarao ao pronunciar at mesmo onomedeDeus, issosemfalarde JesusCristo, deseusan-gueoudoEspritoSanto ..."Eurespondo: "Caroamigo,admitoque possa terumafprofunda, cuide somentedetornar-secapaz de declar-la publicamente! Casocontr-rio, esse pudor de sentimentos que reclama poderiamuitobemnosermaisdoqueomedodissimuladodeter desair deseu estadodeneutralidadeinterior. Pense!"Sem dvida, uma vez que a Igrejanoousa confessar suafnalinguagemqueasua, elaadquireohbitodenoconfessarcoisanenhuma! Torna-se, ento, umacomuni-dadesilenciosa, senomuda. Af, desdequeexiste, le-vanta imediatamente aquesto: nosedeve, alegrementee semtemor, falar a linguagemda Bblia, exprimir-secomo fez a Igreja no passado ecomodeve fazer hoje?Fortepelaliberdadeeseguranaquesosuas, af nodeixadesuscitar, portodaaparteesempre, semelhantelinguagem para o louvor e a glria de Deus.2.Masissoaindanopodeconstituirtodooteste-munhodaIgreja. Confessar significaaindamais. Guar-demo-nosdepensarqueaconfissodefno maisdoque uma coisa espiritual, reservada exclusivamente aodomnio da Igreja e consistindo simplesmente emdarCrerf: Confessar a Sua F - 39umacertaextensosuamensagem. A verdadeiramol-duradaIgrejaomundo, comosepodenotarjpri-meira vistaa partirdofatoque, dentrode umaaldeia oudentrodeumacidade, otemploocupaseu lugaraoladoda escola, do cinemaeda estao. Alinguagemfaladapela Igrejanopoderia ter um propsito emsimesma. necessrio perceber que a Igreja est verdadeiramenteaqui paraomundo; precisoquealuzbrilhenastrevas00 1.5). AssimcomoCristonoveio paraser servido,masparaservir, noconvenientequeoscristosexis-tam simplesmente para eles mesmos. Quer dizer que a f,que se manifestaexteriormente comouma confiana ecomo umconhecimento, determina certas decises nosculo e que, por constituir um testemunho claro e autn-tico, eladevapodersetraduzirperfeitamentenalingua-gemdoSenhorTodo-Mundo, dohomemdarua, enfim,na lngua daqueles que no tm nem o hbitode ler a B-blianemodecantaroscnticos, e dequemosmeiosdeexpressoe oscentrosdeinteressesoabsolutamente di-ferentes. para o mundo que Cristo enviou seus discpu-los e nomundo que ns vivemos. Nenhumde ns apenas cristo; todos somos aomesmotempocidadosdesse mundo. Omesmo vale para nossas decises crists,paraa traduodenossotestemunhonalnguadequal-querum. A confissodef, comefeito, pretendeseapli-car vida tal qual ela , s circunstncias de nossaexistnciaquotidianacomtodas as questes tericas ouprticas queelanos prope. Senossaf real, eladevenecessariamenteentrarnanossa vida. Emsua formapu-ramente eclesistica, o testemunho cristo corre sempre oriscode fazercrer que o crente considere seu credo comoalgopessoal eprivadoeque, nomundotal como, sooutras as verdades que tmvalor. Omundovive sobreesse mal-entendido e considera o cristianismo como uma40-Esboo delimaDogrn,iricaagradvel "magia" pertencente ao "domnio religioso",certamente respeitvel, mas que no convmmexer etudoest d i t o ~ Masessemal-entendidopodemuitobemexistir entreosprprioscristosdispostosde bomgradoafazer dafseuobjetivo, comacondiodenomexercomela jamais. No de ontem que se tenta apresentar oproblema dasrelaes entre a Igreja e o mundo como umproblema de boa vizinhana, cada umpermanecendoprudentemente nas posies cuidadosamente preparadas,a despeito de algumas escaramuas que possam acontecernospostosavanados. AIgrejanopodeconsideraresse"acordo de cavalheiros" como definitivo. De seu ponto devistaumascoisaconta: queseutestemunhopossares-soarigualmentenoseiodasociedadequeacerca, dessaveznonodialetodeCana, masna linguagemmaiss-bria e menos eclesistica que o mundo costuma falar.Trata-se, paraaIgreja, detraduzirsuamensagemnoes-tilodos jornais, por exemplo. Trata-se derepetir, deumamaneiraprofana, oquedizemoscomaspalavrasealin-guagemdaIgreja. Ocristonodevertemer, portanto,usardeumafalapouco"edificante". Se elesesentir inca-paz, queseperguntese oquese dizdentroda Igrejasempreedificante! Ns conhecemos bemesse jargo pas-toral e clerical que para as pessoas de fora, produz o efeitodochins! Tomemoscuidadodenonosisolarmosedeno recearmos falar claro ao mundo. Umexemplo: em1933, numerososforamaqueles quena Alemanha soube-ramconfessare viversuafdeumamaneiraprofundaeautntica, enslouvamosaDeusporisso; infelizmente,essestestemunhosforamdealgumamaneirabloqueadospela linguagem que servia para formul-los.No se soubetraduzir, ento, emdecisespolticas, oqueestavaexce-lentemente expresso na lngua da Igreja; caso contrrio, aIgreja evanglica desse pas veria claramente que ela deve-Crer Confessar a SuaF - 41riadizer noaonacional-socialismoeissodesde oco-meo. Efoi assim, ento, que no houve, sob a formainteiramente profana, a verdadeira confisso de f. Imagi-nemos oqueteriaacontecidose aIgrejativesse sabidoformular em termospolticos suas convices espirituais!Elanofoicapaz e asconseqncias estodiante denos-sosolhos. Umsegundoexemplo: hoje, igualmente, exis-temmanifestaes de f crist sria, autntica. Estoupersuadido de que os acontecimentos atuais elevaramtanto a fome e a sede da Palavra de Deus, que a Igreja esta pontode viver um momento importante.Mas no su-ficientequeelaselimitea secorrigir, a se consolidara siprpria e que os cristos permaneam uma vez mais entreeles. Em verdade, hoje indispensvel fazerteologia comuma consagrao muito maior. Mas, oxal possamos ver ecompreendermelhordoquehpoucotempoanecessi-dadedesetraduziremdecises eemtomadas deposi-es polticas o que se passa no seio da Igreja!Uma Igrejaevanglicaquepretendahojepermanecermudasobreaquestoda culpabilidade que os acontecimentosqueaca-bamos de viver levantam, ouque simplesmente acredi-tasse poder negligenci-la, quando esta exige umaresposta em razo mesmo do futuro, se condenaria, desdeoprincpio, esterilidade. Damesmaforma, umaIgrejaquenocompreendasuavocaoemrelaospessoasemaflio, e paraa qualo ensinamentoe a pregaonocorrespondamaos problemas levantados pela situaoatual, umaIgrejaquenoseponhainteiramentenotra-balhoderesponder urgnciadessatarefaesmagadora,celebrar o seu prprio funeral. Oxal cada cristo indivi-dualmente possa ver claramente o que suafimplica:en-quanto ela no passa de uma espcie de agradvel torre demarfimqueodispensadepensaremoutrem, enquantoela lhe oferece um tipode libi fcile fazdele um ser du-42- Esboo deLImaDogmticapIo, elanoautntica. Por outrolado, nosepodedemaneiranenhuma viverdentrodeumatorredemarfim!Ohomem um todoe nopode verdadeiramente existirseno como um todo.3-Recordemos enfima ltima frase de nossa teseinicial: pelasaese atitudessubseqentes. intencional-mente que falo numterceiro ponto, distinto do prece-dente. Dequeserviriaa um homemfalare confessar suaf na linguagemmais forte que pudesse existir, se nohouvesse a caridade? Confessar sua f, testemunhar, umatoestreitamente ligadovida. Crer serchamadoparaarriscar-se. Tudo depende disso.Deus Nos LugaresAltssimosSegundoa Sagrada Escritura, Deus aquele que estpresente, vive, age e se da conhecer paranspela obra que ele determinoue realizou emJesusCristona liberdade de seu amor, ele onico.oSmbolodosApstolos, quenos servedepontode partida, abre-se comas seguintes palavras: creio emDeus.Ns pronunciamos assim o conceito maior, o termodecisivodoqualoCredocristono maisdoquea ex-plicao e o desenvolvimento. Deus o objeto da f de quefalamos nas nossas ltimas aulas. , sumariamente fa-lando, o contedo da pregao da Igreja. Contudo, ocorrequeDeuspareceser, deumamaneiraoudeoutra, umarealidadefamiliaratodasasreligieseatodasasfiloso-fias.Antes de prosseguir, necessrio, pois, determo-nosuminstante paraperguntar ans mesmos: que relaoexisteentreapalavra"Deus", nosentidoemqueaem-prega a fcrist,e naquele que esse nome encobre em to-das as religies e filosofias de todos os povos e de todas aspocas?Vamos esclarecer a significao habitual desse voc-buloforadafcrist. Quandoo homem faladeDeus, da44-Esboo deLImaDogmticanatureza ou da essncia divina, pretende traduzir o senti-mento de nostalgia e de desorientao que ele experi-mentacomtodos os seus semelhantes equeoempurraparaprocurar umaunidadeentreosseres, umarazodeser parasua existnciae umsentidoparaouniverso. Elepensa na existncia e na natureza de um ser em umarela-o mais oumenos coerentecomaestonteantediversi-dade de fenmenos e que deveria considerar como aessnciasupremaqueregulaedominatodaarealidade.E,se lanamos agora umolhar sobre esse vasto campo depesquisas, onde se d livre curso nostalgia e s hipteseshumanas,nossa primeira impresso a de uma faculdadede inveno infinitamente diversa, que se conjuga comtodas as arbitrariedades e todas as fantasias.Defato, encontramo-nosdiantedeumamontanhade incertezas e de contradies. Quando, pois, falamosdeDeusna moldura dafcrist, devemoster emmente quensnoestamosacrescentandomaisumanooatodasaquelas que j existem no inventrio religioso da humani-dade. Deus, segundo a f crist, no mais um Deus entreos outros. Ele nopertence aopanteodapiedadehu-mana e da engenhosidade religiosa.Portanto, no umaquestodese postularnoseiodanaturezahumanaaexistnciadeumatendnciauni-versal e inata ao divino, de um conceito geral de Deus queenglobaria, numdadomomento, oquecremoseconfes-samosquandofalamosdeDeusenquantocristos, detalsorte quenossa f seria umafentre outras, um caso par-ticular dentrodeumaregrageral. UmPai daIgrejadissecomrazo: Deusnonestin genere- Deusnopertenceanenhum gnero!Quando falamos de "Deus", ns, cristos, podemos edevemosclaramentenosdarcontaqueessetermosigni-ficadeimediatoo "totalmente Outro"e que estamos ver-DeusNosLugaresAltssimos - 45dadeiramente libertosda pesada moldura das buscas, dashipteses, das imaginaes, das iluses e das especulaeshumanas. No questo, no mais, de se pensar que o ho-mem em busca do divino poderia, enfim, depois de muitosofrimento, alcanar um degrau de conhecimento tal quecoincidisse praticamente com o contedo da fcrist.ODeus que a fcrist confessa no , maneira dosdeuses deste mundo, umser que seencontraouse in-venta, umadivindadequeseoferece aohomemaotr-minodeseusesforos; elenoocoroamento, sejaeleomais perfeito, de umaprocura que pudssemos iniciarsem mais nada e alcanar por ns mesmos. o Deus que, ao contrrio, ocupa j e sem retorno olugar de tudoaquiloque os homens costumavam chamar"Deus" e, que, excluindo de imediato todas as demais pre-senas, exceto a sua, reivindica o privilgio de ser dele so-mente a verdade. Senose compreende isso, permanece-se incapaz de entender aquilo que a Igreja quer dizerquando confessa:creio em Deus.Trata-se aqui de um en-controdohomemcomarealidadeaqual elepermanecepara sempre incapaz de buscar e encontrar por si mesmo."Oqueoolhonoviu, oqueoouvidonoescutoueoquenosubiuaocorao do homem, Deusorevelouaosque o amam" (lCo 2.9). Assimse exprime o apstoloPauloa respeito dessa realidade. E nose pode falardife-rentemente.Deus, nosentidoda f crist, temumaexistnciaabsolutamente diferente daquilo que habitualmente sechamao divino. Suanatureza, portanto, totalmentedis-tinta daquela dos seres que se chamavam "deuses". Ns re-sumimostudooque sepodedizer a respeitode Deus,segundoa fcrist, na expresso: Deusnos lugaresaltssi-46 - Esboo de umaDogm;ticamos. Elaseencontra, comovocssabem, nas narrativasdo Natal (Lc 2.14). esta pequena frase "nos lugares alts-simos", in excelsis, que eu quero tentar explicar agora."Nos lugaresaltssimos" significa simplesmente, de-poisdoqueacabamosdedizer: Deusestacimadens,acima de todas as nossas intuies, de todos os nossos es-foros, de todos os nossos sentimentos, sejam eles os maissublimes, acimadetodososprodutosdenossoesprito,sejameles os mais admirveis. Eisso significa, emse-guida, comojvimos, queDeus nodeposita coisa al-gumadesuarazodeseremnsmesmosequeelenocorrespondeanenhumadisposiooupossibilidadedenossanatureza, masqueelenoexisteenemtemreali-dade, senoemsi mesmo. Comotal, elenoserevelaansatravsdenossa procura, nossasdescobertas, nossossentimentos enossos pensamentos, mas exclusivamentepor ele mesmo. precisamente esse Deus que est sentado nos luga-resaltssimos quese tornoutal para o homem, se deu, sefezconhecerasi. Deusnoslugaresaltssimosnosigni-fica, portanto, que ele no tem nada a ver conosco, que elenonosconcerne,queele permanece eternamenteestra-nho, mas, segundoafcrist, issoquerdizer, aocontr-rio, queeleveio, desceuatns, queelesetornounossoDeus. o Deus que afirma e prova sua autenticidade,aquele que nossa mo nopode conter e que, precisa-menteporessarazo, tomou-nos pelamo; aqueleque,numapalavra, onicoquemereceonomedeDeus, diferena de toda as divindades inventadas e que, radical-mente distinto de tudo o que existe, est contudo ligado ans. Quando dizemos como Smbolo dos Apstolos:Creio em Deus, esse Deus que ns estamos confessando.Tentaremos agora formular de umamaneira maisprecisa oque acaba de ser dito. Segundo a SagradaEscri-Deus NosLugares Altssimos - 47tura, Deus um ser presente, vivo, atuante e que se faz co-nhecer. Por essa definio, as coisas se tornammuitodiferentes do que seriamse eu tentasse simplesmenteapresentar a vocs alguns conceitos relativos a um ser su-premoe infinito. Nesse caso euestaria fazendoespecula-o. Mais eu no convido vocs a fazer especulao, pois ummtodovicioso, umavez que, longe deconduzir aDeus, essemtodonopodesenonoslevar adesignarsob esse nomeuma realidade que no ele. Deus estpresente no Antigo e no Novo Testamento que falamdele.E a definio crist de Deus consiste simplesmente em di-zer:esses livros falamdele, portanto escutemos o que elesestonos dizendo. Aquilo que se pode ver e entender nasEscrituras Deus.Observemos bem: a Bblia, Antigo e Novo Testa-mentos, nocontmjamaisamenortentativadeprovarDeus. Semelhantestentativas noexistemsenoforadaBblia e por toda parte onde se esquece com quemse estlidandoquandosefaladeDeus. Elassofamiliaresparavocs: consistemem postular a existncia deum serper-feitoapartirdoprpriofatodequetudooqueexisteimperfeito;afirmar que a ordemgeral do mundopressu-peumapotncia ordenadora; partir denossaconscin-ciamoral paraafirmar aexistnciadeumser supremo,etc. Notenhoaintenodesair em guerracontraessasdiversas"provas" daexistncia de Deus. Noseise vocsse do conta de imediato do que elas tm, ao mesmotempo, de frgil e detrgico. Aplicando-seaosdeusesfa-miliares a esse mundo, elas so perfeitamente aceitveis e,se eu tivesse de entret-los com essas divindades, no dei-xaria de recorrer s cinco famosas provas da existncia deDeus. A Bblia no conhece esse gnero de demonstrao:48- EsboodeumaDogm;iticaparaela, Deusnotemnecessidadedeser provado. Elequem, de uma extremidade a outra, prova-se por simesmo: eis-me, dizele, eapartir dofatoqueeuexisto,vivo e ajo, torna-se intil provar aminha existncia. comrelao a essa demonstrao que Deus d de simesmoquefalamosprofetaseosapstolos. Impossvelfalar de Deus de maneira diferente dentro da Igreja. Deusnotemnenhumanecessidadedenossasprovas. AquelequesechamaDeus, naSagradaEscriturainsondvel, oquequerdizerqueelenopodeserdescobertopornin-gum. Quandose trata dele na Bblia e ele referido comumagrandefamiliaridade, maisprximodensdoquens mesmosjamais seremos emais real quetodaoutrarealidade, issonoocorreporserdadoacertoshomensparticularmentereligiosos apossibilidadedealcan-lo,mas porque ele se revelou, ele, o Deus oculto.Dissoresulta que no apenas nsno podemos des-cobrireprovar Deus, masaindaqueelenospermaneceincompreensvel. ABblianuncabuscadefinir Deus, valedizer, fazer comqueeleseencaixeemnossos conceitos;mas, quandoela pronunciaseunome, afirmasemcessarumsujeitoquevive, queage, quesefazconhecerporsimesmo, aocontrriodaentidadedefinida pelosfilsofoscomo um ser supremo, infinito, longnquoe pairando so-bre ouniverso. A Bblia conta Deus, relata o que ele fez, ahistria muito precisa realizada neste mundo entre os ho-mens por aquele que se assenta nos lugares altssimos. Elaassinala a significao e o alcance dessa ao, dessa hist-riaeassimqueprovaaexistnciadeDeus edescrevesuanatureza. ConhecimentodeDeus, segundoaBblia esegundoa confisso defda Igreja , pois, conhecimentoda sua presena, de sua vida, de sua ao, de sua revelaoi IDeusNosLugares Airssimos - 49na obra que ele realizou. Assim, a Bblia no um livro defilosofia, masumlivrodehistria, olivrodospoderososatos de Deus, no qual Deus se faz conhecido dens.I.AEscritura descreve uma obra:a obra dacriao.Deusfazsurgir aoseuladoumarealidade outra, distintadele, "a criatura", semnecessidade, naliberdade de seupoder absoluto e na superabundncia de seu amor.2. Uma aliana se estabeleceu entre ele e uma desuascriaturas, entre Deuse o homem. Existe aqui,ainda,uma coisa incompreensvel: por que essa aliana entreDeus e o homem, esse homem de quem a Bblia afirma deuma ponta a outra que um ingrato, umrebelde, umpe-cador?Apesardisso, semquererlevarissoemcontaeseabstendodeendireitara situao, Deus se da si mesmosua criatura. Eofaz, tornando-se o Deus de umpe-queno povo desprezado do Oriente Mdio, Israel. Fazisso, tornando-se um membrodesse povo, uma criana e,finalmente, morrendo.3.Enfim - mastudoissono maisque umanicae mesma obra -, existe a redeno, a revelao da intenodeDeusqueamanaliberdade, noqueconcerneaoho-meme aomundo, o aniquilamentode tudoaquiloqueseopeaessainteno, amanifestaodenovoscusedanova terra. Tudoisso, umnome o significa e exprime,Je-susCristo, o homem em quem o prprio Deus se fez vis-vel e tornou-seao sobre a terra; JesusCristo,o objetivoda histria de Israel, em quem a Igreja comea e termina,chave da revelao, da redeno e da nova criao. Toda aobradeDeusestcontidanessanicaemesmapessoa.Falar de Deus, segundo a Sagrada Escritura, necessaria-mente falar de Jesus Cristo.dentrodessaobradacriao, daalianaedare-denoqueDeusestpresente, vive, ageesefazconhe-50- Esboo de umaDogmticacer. No permitido fazer-se abstrao dessa obraquandosequersaberalgodaexistnciae daessnciadeDeus. Deus em pessoa est presentenessa obra e preci-samenteosujeitodela. Eleagena liberdadedeseuamor.Certamente a palavra liberdade e a palavra amor so con-venientes quandose trata de caracterizar o que ele faze oqueele. Masdeve-se tomar cuidado para nose cair denovodoconcretonoabstrato, dahistrianas idias. Euteria medodedizer: Deusliberdade ou Deus amor, sebemqueesta segunda frmulaseja bblica(lJo4.8). Nsignoramosoque seja o amor, ns ignoramos oqueseja aliberdade, masDeus amor, Deus liberdade. delequetemos que aprender sobre uma e sobre outro.Ele aqueleque ama naliberdade. comotal que se manifesta naobra da criao, da aliana e da redeno. E aqui que ve-mosemqueconsisteoamor: essanecessidadedooutrocomotal, oDeusnicodeixandodesersparaseunirtotalmentepessoadooutro. Tal oamor, olivreamorde Deus.Mesmo sem a criao, Deusnoest s. Ele none-cessita delae contudoelea ama. Esseamornopode serconcebidosenodentrodoabsolutodaliberdadedivina.O amor de Deusconsiste nisso: que Deus oPai ama oFi-lho que , ele mesmo, Deus. Sua obra no mais doque amanifestaodomistriodoseuserntimoondetudoamor e liberdade.Quemsabeagorapossamoscompreender melhorosentidodo nosso ttulo: Deus nos lugares altssimos. porqueDeusoPai, oFilhoeoEspritoSantonaobraque ele realizou emJesus Cristo, que ele est precisa-mente nos lugares altssimos. Ele, cujanaturezaconsisteI IDeusNosLugares Alrssimos -51emseabaixar; ele, cujaexistncia semanifesta noatodedesceraofundodoabismo; ele, omisericordiosoquesedsuacriaturaapontodepartilhar asuadecadnciamais profunda, ele o Deus altssimo. Ele o, noapesardisso, emvirtude de umparadoxosurpreendente, masdevidoao fatomesmo de que ele se abaixe assim. nesselivreamorqueeleestacimadetudo. Ver emDeusumaoutragrandezanotercompreendidoqueele"total-menteOutro", , comoospagos, buscar Deusnainfini-dade. Maselediferetotalmentedaidiaquefazemos denossos"deuses" humanos. Ele chama Abrao, conduz umpovo miservel atravs do deserto,recusa, por sculos in-teiros' deixar-sedesconcertarpela infidelidadee desobe-dinciadessepovo, aceitasetornarumhumilderecm-nascidonoestbulo deBelm e morrer noGlgota. Eleo Senhor teu Deus. Vocs compreendem o que significa omonotesmoparaafcrist?Deusnoquersabernadadessa mania de unidade!Deixemos de lado essa mania donmeroumecompreendamos queDeus osujeitoaomesmotemponicoeabsolutamentedistintodetudooqueexiste, radicalmentediferentedasdivindadesridcu-las imaginadas pelos homens. Quando se compreendeisso, nose podedeixar derirdeles, comoofazaBblia.Aqui ondeo verdadeiroDeus reconhecido, osdolossedesmancham na poeira e s ele permanece. "Eu sou oSe-nhor teu Deus ... tu noters outros deuses diante da mi-nhaface" (Ex20.2-3). Issoquer dizer: tunopodes teroutrosdeuses. Tudooquesechama "deus"aoladodeleno maisque oreflexo da nostalgia doentia que est in-cubadanocoraodohomem com desastrosasconseq-ncias. Nessa perspectiva, o segundo mandamento se52-Esboo deurnaDogmticatorna muitoclarotambm: "tunofars imagementa-lhada, nemnenhumarepresentao... tunoteprostra-rs diante deles e tu no os servirs!". Tambm completamente falsopostular aqui um conceitofilosficosobre a invisibilidade de Deus, assim como ver a uma ex-presso tpica da mentalidade israelita.Oprprio Deus jfez tudopara se apresentar ele mesmo a ns. Comoo ho-mempoderia quererrepresent-lo?Dizemosapropsitodissoquea artecrist certamente movidapelasmelho-resintenesdomundo, masimpotente, porqueDeus jnos deu a sua imagem. Quando se compreende verdadei-ramente que Deus est nos lugares altssimos, no se podemais querer represent-lo quer seja por pensamentos,quer seja por imagens.I IDeus O Paio nico Deus verdadeiro por natureza e pela eternidade oPai, origemdeseu Filhoe, unido a ele, origemdoEspritoSanto. Emvirtude dessamaneirade ser, ele, pela graa, o Paidetodos os homens, que ele chama em seu Filhoe pelo Esprito Santo para serem seus filhos.oDeus nico, oAltssimo, umPai. Desde quepronunciamos essapalavra, desde que, comoprimeiroartigo do Smbolo, ns dizemos Deus, o Pai, devemoslogonos lembrar dosegundoartigo: Deus oFilho, e doterceiro: ele o EspritoSanto. Os trs artigos doSmbolonos falamacadavezdomesmoDeus. Noexistemaquitrsdivindades, noh emDeusdiviso, ruptura. Longede afirmar trstiposde"Deus", aTrindadefala, pelo con-trrio, estritamente de umnicoe mesmoDeus. assimqueaIgrejateminterpretadosempreeaprpriaEscri-turanonosdiznadadediferente. ATrindadecessadeser uma construo terica desde que se queira no sepa-rar os trs artigosdo Credo e reconhecer que o tema nes-ses trs artigos tratadomesmoDeuscriandoomundo,intervindo com JesusCristo e agindopelo Esprito Santo,e no de trs departamentos divinos que tm cada um seu54-Esboo de limaDogndrica"diretor"! Ns tratamos comuma s e mesma obra donico e mesmo Deus, mas esta obra , ela mesma, um mo-vimento. Pois o Deus emquemacreditamos no umDeusmorto, nemumDeussolitrio, mas, sendointeira-mente o nico, ele no fica, contudo, s em si mesmo,re-colhidoemsuamajestadedivina: aobraqueelerealiza,naqual elenosencontrae quenospermite conhec-lo, umaaodinmicaeviva, pornaturezaeparaaeterni-dade; e para ns que vivemos no tempo da sua graa, ele o Deusnico emsuastrsmaneiras deser. AIgreja antigaafirma: Deus um s em trs pessoas. Se tem-se em contaasignificaoqueesseltimoconceitorecobria paraela,a Igreja antiga forneceu aqui uma definio inatacvel.Comefeito, em latim e em grego, "pessoa" quer dizer exa-tamente aquilo que tentei indicar pela expresso "maneiradeser". Hoje, otermopessoaevocaparans, quasequeirresistivelmente, a idia de uma individualidade.E, nessaacepo, elano muitoconveniente para exprimir oserdeDeusPai, oFilhoe oEspritoSanto. Calvinodisseemalgumlugar, nosemironia, quenoerapermitidore-presentar o Deus trinitrio maneira da maioria dos pin-tores que se contentamemmostrar sobre a tela trs"figurasestranhas". IssonotemnadaavercomaTrin-dade. QuandoaIgreja cristfaladoDeustrinitrio, pre-tendedizer queeleaomesmotempoetambmoPaiqueoFilhoeoEspritoSanto. Trata-se, portanto, portrsvezesdonicoe mesmoDeus, desuastrsmaneirasde ser, de sua Trindade de Pai, de Filho e de EspritoSanto; talele nos lugares altssimos e tal ele em sua re-velao.necessrio, pois, desde o comeo precisar que,afirmando que Deus, o Pai, "nosso Pai", estamos di-zendo uma coisa vlida e justa, correspondendo sua na-turezamaisprofunda, eternamente verdadeira. DeusoI IDeus OPai - 55Pai. Domesmomodocomoquandofalamos doFilhoedoEspritoSanto. EssenomedePai, dadoaDeus, noacidental, umttuloprovisrioquensatribumosaelepensando: "porquenssabemos por experinciaoqueumpai humano, bemnatural quenstenhamos apli-cadoaDeusessaidia; masficabementendidoqueelanotemnenhumaligaocomareal naturezadeDeus,queinteiramenteoutra. DizerqueDeusumPai, notem portanto valor exceto pela ligao com sua revelao,pela ligao conosco. O que Deus por si mesmo, na eter-nidade, ignoramos. Todavia, agrada-lhe deixar seu mist-rio e assim que, para ns, ele o Pai". Falar desse modo nover finalmenteoqueesse nomenostraz de verdade.Quando as Escrituras e a Confisso deF chamam dePaia Deus, elas queremdizer que assimantes de tudo,desdeoprincpio. oPai emsi mesmo, por naturezaepelaeternidadee, emseguida, a partirda, eleonossoPai, oPai de suas criaturas. Noh, pois, quecomearuma paternidade humana e, emseguida, por analogia,uma pretensa paternidade divina. Ocontrrio que correto: a verdadeira paternidade, a paternidade autnticae primeira, est em Deus e ela que funda todas as nossaspaternidades humanas. A paternidade divina aquela daqual procedem todas as outras. A epstola aos Efsios diz:" dele que tira seu nome toda famlia - em grego patri -nocue sobrea terra"(Ef3.14-15). Estamos bem dentrodaverdade, averdade primeiraefundamental quando,nessa perspectiva radical, reconhecemos Deus comonosso Pai e nos chamamos de seus filhos. Falando deDeus, oPai, ns exprimimos umaprimeiramaneiradeser de Deus, que condiciona uma segunda,diferente, masquelhecontudoaplicvel, j que lhepertencepropria-mente.Deus Deus sendo um Pai,o Pai deseuFilho, emquemeleestabeleceedefinedenovo, porsimesmo, sua56- Esboo ueumaDogm,ricaqualidade de Deus. Dizemos bem que ele estabelece e de-fine, noquea criou- oFilhofoi engendradoe nocri-ado!Todavia,essa relao entre o Pai e o Filho no esgotaainda omistriode Deus, suanaturezaprofunda, almde, por outrolado, noameaar a unidadedivina. Acon-tecequeoconjuntoPai eFilhoafirmaumaterceiravezessaunidadenapresenadoEspritoSanto. DeDeus oPai edeDeusoFilho, procedeoEspritoSanto. Spiritusque procedit a Patre Filioque. isso que jamais compreen-deram completamente os infelizes representantes daIgreja doOriente: o Paie oFilho selandosua unidadenoEsprito Santo que a realiza. OEsprito Santo foi cha-mado, svezes, devnculodacaridade, vinculumcarita-tis. No apesar de, mas por causadapresena emDeusdoPai edoFilhoqueexisteunidade. DeusDeusaoseestabelecer emsimesmoe porsimesmocomoDeus, aomesmo tempodiferente e idnticoa si mesmo em sua di-vindade. Eassimqueelenoestsemsimesmo. Emsi, porque oDeustrinitrio, existindoa vida em todaasuariqueza, aaoeacomunhoemtodaasuapleni-tude. Ele o movimentoe o repouso. Ns podemos com-preender assim tudo o que ele por ns:o Criador que sed a ns emJesus Cristoenos une a elepeloEspritoSanto; aobradesualivregraa, asuperabundnciadesua plenitude. Superabundncia misericordiosa e gra-tuita!Deus no quer permanecer o que ele em si mesmoe porsi mesmo; aquelecujapresenapreencheaeterni-dade quer ser para ns. Que Deus, na plenitude de sua pa-ternidadeeternal, por puragraa, - nopor que seu"ofcio" - queira tambm ser nosso Pai, uma verdade so-brea qualnotemosnenhuma influncia. Porqueele oPai eterno, todasuaobranopodedeixar delevar suamarca. Se ele cria, se ele faz nascer seres que, ao contrriodeseuFilho, sodistintos dele, seeleaceitaexistirparaI IDeus OPai - 57eles, isso no pode significar outra coisa que: ele quer nosfazerparticipardesua vida, "afimdequenostornemosparticipantesdanaturezadivina" (2Pe 1.4). Aochamar-mosDeusdenossoPai, nsnodizemosoutracoisa. Ans permitido dar-lheo nomequeele se d a si mesmoemseuFilho. Emsi mesmo, ohomemnoumfilho,mas uma criatura deDeus,jactus et non genitus! Essa cri-atura, ohomem, estsobtodos os aspectos emrevoltaaberta contra ele, umsem-Deus e, contudo, Deus ochamadeseufilho. Sepodemos, ns mesmos, noscha-mar deseusfilhos, unicamente por causa doatodesualivre graa, por causa de seu aviltamentoe desua miseri-crdia, apesar dens, por que ele o Pai e nos d o poderdeparticipardesuavida. Nssomosseusfilhos emseuFilhoepeloEspritoSantoe, portanto, noporquehajaumarelaodiretaentreDeus ens, mas porqueDeusnosfazparticipar, a partir deseuprpriomovimento, desua natureza,de sua vida e de seuser. assim que o bomgradoe a vontadedeDeus, o prpriomistriodasuaes-snciadivina, omistriodasuarelaocomseuFilho,contm, de fato, achave da sua relao conosco; equenele, seuFilho, podemosnos chamar seusfilhospeloEs-pritoSanto, querdizer, pelomesmovnculodecaridadeque une o Pai e o Filho. nessa terceira maneira de ser deDeus, o Esprito Santo, que se acha contida nossa vocaosegundo a mesma e eternal deciso do Pai. O que Deus efazemseuFilho, concernediretamentea voc, valeparavoc e lhe beneficia. O que verdadeiro na eternidade, noprprio Deus, torna-se verdadeiro aqui e agora no tempo.De que se trata? Nem mais nem menos que de uma repeti-oda vidadivina, repetioquensnopodemosnemprovocar, nemsuprimir, queoprprioDeus suscitanomundoqueelecriou, valedizer, foradele. Glriaa Deusnos lugares altssimos! isso que estamos dizendo58- Esboo de umaDogm,ticaquando chamamos Deus de nosso Pai. Mas porque elenooPai somente, mastambmoFilho- valedizer,Deusconosco-, devemosacrescentartambm: "pazso-bre a terra entre os homens que ele quer bem".o Deus Todo-Poderosoo que distingue a potnciade Deus da fraqueza, o que aeleva acimadetodos os outros poderes e o quea ope vitoriosamente "fora em si", que ela a potnciadodireitodecorrente do amor que ele fezbrilharem JesusCristo. Emconseqncia, a potnciade Deus contm, qualifica e delimitatodoo domniodopossvel e dominaabsolutamente o conjuntodoreal.Pelo adjetivo "Todo-poderoso", o Smbolo10enunciaumaqualidadedeDeus, umaperfeiodaquelequeeledenominaDeus, oPai. anica que ele menciona. Maistarde, quandose tentoufalar de Deus deumamaneirasistemticaedescreveroseuserhouvemenosconciso.Falou-se de sua asseidade(isto ,de seu ser enquantode-pendentedenadaalmdesi mesmo), desuainfinitudeno tempo e no espao, de sua eternidade. Acrescentou-se,emseguida, suasantidadee sua justia, sua misericrdiaesuapacincia. precisoprestarmuitaatenoquandoseaplicamassimaDeusosconceitoshumanos: elesnopodemserjustificveis, excetoattuloindicativo, sema10. VidenotanO. 1.60 -Esboo de umaDogmricapretenso de compreender o ser do prprioDeus. PorqueDeus incompreensvel. No se trata, por conseguinte, dedefinir, por exemplo, sua santidade ou sua bondade a par-tirdasidiasquetemosdesantidadeoudebondade; es-ses dois atributos nopodemser definidos a noser apartir doprprioDeus, daquiloque ele . Ele oSenhor,ele a verdade. indireta e secundariamente que sua pa-lavrapodeserretomadaporlbioshumanos. Nolugarenaposiode todasasqualificaesque podem serutili-zadasparadescrever anaturezadeDeus, oSmbolodosApstolos no usa mais que uma nica palavra: o adjetivoTodo-poderoso, servindo como qualificativo para o subs-tantivo"Pai". Essas duas palavras devem ser interpretadasumapelaoutra: oPai oTodo-Poderoso, oTodo-Pode-roso o Pai.Deus Todo-poderoso. Issosignifica, a prinCIpIO:ele potncia. Potncia quer dizer poder, recurso, virtua-lidadeemrelaoaumadadarealidade. Todarealidadedada, determinada e subsistente pressupe umpoderfundador. ArespeitodeDeusnosditoqueele temessepoder de criar, dedeterminar, demanter; mais, que eletemonipotncia, isto, queeletemtudoemsuamoeconstitui a medida do conjunto doreal e do possvel. Noexisterealidadedaqual elenosejaaomesmotempoapossibilidade. Nadadepossibilidade, nadadepodersus-cetvel de limitar ou de impedir sua ao. Ele pode tudo oquequer. Poder-se-ia, ento, tambmdescreverapotn-ciadeDeus comoaexpressode sualiberdade. Deus absolutamentelivre. Issoimplicaaeternidade, aubiqi-dade e a infinitude.Ele tem a potncia sobre toda a cadeiadepossveiscontedosnotempoe noespaoe dosquaiseleofundamentoeamedida. Elesemlimites. Tudoissoafilosofiapressentecorretamente, masnsestamosaindamuitolonge darealidadequeimplica esse conceitoI IoDeLIs Todo-Poderoso - 61de onipotncia divina. Existemmuitos fenmenos aosquais facilmenteseprestamosatributosdapotnciaouda onipotncia divina eque notmnenhumaligaocom a onipotncia de Deus. Conservaremos, ento, as de-finiesgerais.Nossa tese inicial indicatrs graus: apotncia deDeus se distingue da fraqueza, ela ultrapassa todos os ou-tros poderes e ela se ope, vitoriosamente, "fora em si".ApotnciadeDeussedistinguedetodasas formasde fraqueza. Afraquezapode, comefeito, dispordeumacertapotnciaeoimpossvel deumacertamargemdepossibilidade. Mas Deus no de nenhuma maneira fraconessesentido, suapotnciareal, efetiva. Elenopodeser aqueleque nada poderia nemaquele queno poderiatudo, mas ele se distingue detodas as outras potnciasporqueele podetudoo queelequer. Falar deimpotnciadeDeusmuitosimplesmenteteresquecidoquesefaladele. Representar-seDeuscomoumpersonagemlongn-quo, fora domundo, com certeza ter mudado de objeto, imaginar umser qualquer, fracoe impotente. Deusnotem nada de uma sombra, de um fantasmainofensivo; ele o contrrio da impotncia.Essa potncia de Deusultrapassatodososoutros po-deres. Esses outros poderes oupotncias exercemsobrensumapressoaparentementemuitomaisfortedoqueoprprioDeus. Eles parecemser as nicas coisas reais.Contudo, Deusnofazparte das potnciasdeste mundo,ele nem mesmo a mais alta, mas ele as ultrapassa infini-tamente,ele oRei dosreis, o Senhor dossenhores, cujopoder nada limita nem condiciona. De sorte que todas es-sasoutraspotncias, quecomotais existemcertamente,encontram-sepordefiniosobseusps. Elasnosabe-riam lhe fazer concorrncia.G2- Esboo de umaDogm,ticaE eisoltimoponto, que omaisimportantepor-queomaissuscetvelde dar lugara todasorte deconfu-ses: Deus no a 'fora em si". muito sedutor imaginarDeus como a soma de todas as potncias reunidas, defaz-lo, no sentido neutro e abstrato, um sinnimo do ser,da liberdade, do poder, da fora em si. Seria Deus, dentrodessa perspectiva, a "condensao" daquilo que os latinoschamavampotentia? Constatamos que se tem faladodessa maneira commuita freqncia e que extrema-mentetentadorparaoespritoconsiderara potnciaemsi comoumdomniosagrado, comoa verdadeltimae achavedomistriodoser. QuemnoselembradeHitlerfalando de Deus e chamando-o de "Todo-Poderoso"?Ora, o"Todo-Poderoso"no Deuse no ocasodesepartir daidia deonipotncia para se definirDeus. Falarde"Todo-Poderoso" expor-seaoterrvel perigodepas-saraolargodeDeus. Invocarao"Todo-Poderoso"ou"apotncia emsi" abrir o abismo, liberar o caos, chamar odiabo. Nohprecisamentemelhor definiododiabodoquea queconsiste em imaginar um poder emsi, neu-tro, independente, soberano. isso que a Bblia chama decaos, o tohuwabohu11que Deus abandonou e rejeitouquandocriouoscuse aterra. AanttesedeDeus, ope-rigo que no cessa de ameaar sua criao, precisamenteesseataque, essaofensivaimpossvel dolivre-arbtrio, dapotnciaemsi, buscandoseimpore dominarcomotal.Desdequeapotnciaemsi reivindiqueahonraeores-peito, desdequeelaentendaserautoridadeeditarodi-reito, estamos emface da "revoluo do niilismo". AII. N.do T.: Emhebraico no original. Tohuwabohu a expresso que se en-contranosegundoversculodoGnesiserefere-sesituaodaterranoprincpiodasuacriao, podendoser traduzidaporvaziaevaga,conforme aBbliadeJerusalm, ou mesmopor o desertoeovazionumatraduomais literal.oDeus Todo-Poderoso - 63potnciaemsi no outracoisasenoonadaequandoelase desencadeia e busca se impor a revoluoe noaordemqueelatraz. Apotnciaemsi omal, ofimdetudo. Ela tem contra si a potncia deDeus, a nicaqueverdadeira. A potncia de Deus no somente a ultrapassa,masaindacontraela. Deusdiznorevoluodonii-lismo. Mas umnovitorioso, ouseja, aintervenodeDeus provoca omesmofenmenoque osol dissipandoabruma: apotnciaemsi perdetodooseupoderetodasuarealidade. Desdeoinstanteemqueeladesmasca-rada emtodooseuhorror, ela privadadorespeitoquese lhe manifestou. Os demnios fogem. Deus e a potnciaem si se excluem mutuamente. Deus significa o possvel, apotncia em si, o impossvel.Mas em que medida Deus se ope foraemsi, emquemedidaultrapassatodosos outros poderese em quemedida se distingue de todas as formasda impotncia? ASagrada Escritura nunca fala da potncia de Deus, de suasmanifestaesedesuasvitrias, separando-adodireito.A potncia de Deus , de um ponto a outro, uma potnciade direito. Ela , no potentia, mas potestas, vale dizer, po-tncia legtima, fundada no direito.Masoque odireito?Retomandooque j foi dito,podemosafirmarqueapotnciadeDeusadodireitoporque ela a onipotncia de Deus, o Pai. Vamos lembraraqui comofalamos dovnculoqueuneoPai eoFilho,dessa vida de Deus que, longe de ser solido, ao contr-rio, movimento,mudana, comunho ntima. Portanto, aonipotncia de Deus , conforme o direito, a potncia da-queleque, emsimesmo, o amor. Tudooqueameaaoamor - asolidoeaafirmaodesi mesmo- constituiumainjustia epermanecesempoder real. Deus o re-nega. Oqueeleaprovaaordemconformeaquereinanele mesmoentre oPai,o Filhoe o Esprito Santo.A po-64-EsboodeumaDogll1,iticatnciadeDeusumapotnciadeordem. ApotnciadeDeus boa, santa, justa, misericordiosa, paciente. Porfim, oque distinguea potncia deDeusdaimpotnciaque aquela a do Deustrinitrio.Essa potncia a doamor que foiiluminadoe reve-ladolivrementeemJesusCristo. , pois, aindaaobradeDeus que nos vai servir de critrio do possvel e doreal. Ocontedodetodopoder, detoda virtualidade, de toda li-berdade' coincideexatamentecomoqueDeusefaz. ApotnciadeDeus noumapotncianeutra, annima;pedir a ele, por exemplo, que faacom que dois e doisse-jamcinco infantil e sempropsito, porque atrs dequestes desse gnero se esconde precisamente uma idiaabstratado"poder". E umapotnciasuscetveldementircessariade ser real. Elanoseriamais que impotncia,potncia de negao, pretendendo dispor de tudo se-gundoasuavontade. Elanotemnadaa vercomDeus,vale dizer, com a potncia real. A potncia de Deus umapotnciaautntica; comotal, elaestacimadetudo. "Eusou o Deus Todo-poderoso, anda em minha presena e sntegro"(Gn17.1). esse"Eu"quedefineoDeusTodo-poderoso e, portanto, a prpria onipotncia. "Todo poderme foidadonocu e sobre a terra"(Mt 28.18). a ele, Je-susCristo, que todoo poder foi dado. portantona obradeseuFilhoquea onipotncia deDeussetornavisvel eviva, enquanto potncia salutar e boa. E dessemodo queDeusocontedo, adefinioealimitaodetodosospossveis; transcendente nosentidoemque eledominaabsolutamenteoconjuntodoreal; imanentenosentidoemque ele habita toda forma do real - ele, o Sujeitoeternoquepronuncia suaPalavrae realiza asuaobrase-gundoseu desejo de amor e para o nosso bem.o Deus Criadorb'm se fazendohomem, Deus manifestou e atestou que eleno quer existir unicamente para si nem ficarsolitrio, Para o mundo distintodele, eleconcede propriamente a realidade, aliberdade e umamaneira deser.SuaPalavra a foraque animatodoente criado. Deus suscita, mantme dirigetodacriatura para que elamanifeste sua glria,daqual o homem chamado a ser a testemunhaativapela sua posio no centro dacriao.Creio emDeus, o Pai Todo-poderoso, criador docu e da terra. Quando ns abordamos esse ponto deCredo cristo, ns nosaberamos suficientemente nosdar conta dequenosencontramosaqui, igualmente, faceaomistrioda f, que implica na interveno darevelaodivinacomonicagarantiadenossosconhecimentos. OprimeiroartigodoSmbolo, noumaespciedetriodos gentios, um tipo de rea de entendimento preliminar,ondecristos, judeus e pagos, crentese no-crentes, pu-dessemseencontrare reconhecer comumacerta unani-midadeaexistnciadeumDeuscriador. Asignificaodessaltimaexpresso, como, poroutrolado, aquelada66 - Esboo deumaDogm;ticaprpriacriao, permanecetomisteriosaparans, ho-mens, quantotodas as outrasafirmaesdoCredo. Nonos muitomaisfcil crernoDeuscriadordoquecrerna concepode Jesus Cristo pelo Esprito Santo e nonascimentovirginal. falsopretender queadeclaraorelativaaDeuscriadornosseria porassimdizer, direta-menteacessvel e queapenasocontedodosegundoar-tigonecessitaria de umarevelaoespecial. Encontramo-nos, ao contrrio, nos dois casos, colocados diante domistr