Especial Nordeste 2 - Carta Capital

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NORDESTE RELATÓRIOS ESPECIAIS 27 DE FEVEREIRO DE 2013 A renda do nordestino cresceu 40% nos últimos anos, promoveu o regresso de muita gente que abandonara a região e investimentos de 282 bilhões de reais Retirada. Para o Nordeste LEO CALDAS/PULSAR IMAGENS •EECapaOK_44.indd 1 20/02/13 20:40

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N O R D E S T E

R E L A T Ó R I O S E S P E C I A I S

2 7 D E F E V E R E I R O D E 2 0 1 3

A renda do nordestino cresceu 40% nos últimos anos, promoveu o regresso de muita gente que abandonara a região e investimentos de 282 bilhões de reais

Retirada. Para o Nordeste

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n o r d e s t e : Conjuntura

Pouca gente conhece me-lhor a cidade baiana de Luís Eduardo Magalhães, 950 quilômetros a oeste de Salvador, do que a famí-lia Lauck. Eles chegaram à Bahia, vindos do Paraná,

no começo da década de 1980, quando o local que hoje abriga o município não passava de um povoado minúsculo ape-lidado de Mimoso do Oeste. Era um lu-garejo sem nada. Tudo que oferecia era terra para plantar. Os Lauck mudaram--se para lá numa época em que o normal era fazer exatamente o contrário: dei-xar a miséria do Nordeste e seguir para o Sudeste próspero, em busca de opor-tunidades de trabalho. Porém, menos de 30 anos depois de instalados os primei-ros moradores, Luís Eduardo Magalhães hoje ostenta um símbolo dos ares muito diferentes que passaram a circular na re-gião na última década. A cidade é a 11ª do Brasil que mais recebeu imigrantes nos últimos anos. Pelo menos 35% da sua po-pulação (66 mil habitantes) não morava no município cinco anos atrás. “Vimos a cidade nascer, crescemos com ela e agora percebemos como tudo está mudando”, conta o produtor rural Fábio Lauck, que mora lá desde os 8 anos de idade.

O Nordeste ainda exporta gente, e muita ainda, para o Sudeste, mas os nú-meros do Instituto Brasileiro de Geogra-fia e Estatística (IBGE) mostram que o fluxo diminuiu consideravelmente na última década. Mais do que isso: além de reter nordestinos, a região também tem conseguido atrair de volta gente que um dia decidiu sair. Os estados do Nordeste estão entre os que apresentam os mais

altos índices de migração de retorno do País: 23% dos imigrantes de Pernambu-co, por exemplo, são pessoas no caminho de volta para o estado natal. E há bolsões de atração como Luís Eduardo Maga-lhães, onde o crescimento econômico ca-tapultado pelo agronegócio foi expressi-vo a ponto de ter feito sua população qua-se quadruplicar em menos de 15 anos.

“Estamos finalmente conseguindo livrar a região da imagem de saco de pobreza que ela tinha até bem pouco tempo atrás”, diz Tânia Barcelar, professora da Universidade Federal de Pernambuco e sócia da consul-toria Ceplan, especializada na Região Nor-

deste. “A orientação dos investimentos pú-blicos para a infraestrutura e as políticas de redistribuição de renda no Brasil teve o im-pacto potencializado no Nordeste.”

Não é difícil entender por quê. “Os trabalhadores que ganham salário mí-nimo formam um público enorme no Nordeste que, até dez anos atrás, não ti-nha poder de consumo nenhum”, afir-ma Saumíneo Nascimento, secretário de Desenvolvimento Econômico de Sergi-pe. De lá para cá, o mínimo teve um au-mento real, descontada a inflação do pe-ríodo, de nada menos que 70%. Seu valor atual é suficiente para comprar mais de duas cestas básicas, segundo as contas do Departamento Intersindical de Esta-tística e Estudos Socioeconômicos (Die-ese). É a melhor relação já registrada pe-lo órgão desde o fim dos anos 1970.

Esse movimento ajudou a renda dos nordestinos a crescer acima da média nacional. O rendimento da região au-mentou 40% desde 2004, 10 pontos mais que o crescimento da renda dos brasilei-ros em geral. Isso provocou uma mudan-ça de hábitos sem precedentes. “Quem usava ventilador, hoje luta contra o calor com ar-condicionado”, diz Nascimento. Quem se locomovia com os folclóricos je-gues consegue comprar uma motocicleta (a frota nordestina sobre duas rodas qua-druplicou desde 2002). Quem não tinha eletrodoméstico passou a ter – e o con-sumo de energia elétrica nas casas da re-gião disparou 84% em uma década, mais do que em qualquer outro lugar do Brasil.

Esse círculo virtuoso pôs o Nordes-te em uma situação econômica privile-giada. “Assim como a Região Norte e a

Liquidez no SertãoDepois de décadas de miséria, a região começa a deixar de lado a imagem de recanto da pobreza brasileiraPOR MARIANA SEGALA

O nordestino trocou o jegue pela moto e o ventilador pelo ar-condicionado, diz Nascimento

Fluxo migratório. O agronegócio fez várias cidades nordestinas ficarem entre as mais procuradas no Brasil

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Centro-Oeste, estamos em uma frontei-ra de expansão cobiçada por empresas e investidores”, diz Paulo Ferraz Guima-rães, chefe do departamento nordestino do Banco Nacional de Desenvolvimen-to Econômico e Social (BNDES). Apesar dos efeitos da crise financeira de 2008, o Produto Interno Bruto (PIB) da região cresceu a uma média de 4,5% ao ano de 2002 para cá, com picos de 5,7% no Ma-ranhão e 5,4% no Piauí. Espera-se, no entanto, que no próximo par de anos o crescimento do Nordeste se distancie ainda mais da média brasileira, que foi de 4% no mesmo período.

“O conjunto de investimentos que exis-tem na região está maturando agora e promete mostrar a que veio em bre-ve”, destaca Guimarães. O crescimen-to econômico é a arma que pode aju-dar a região a superar os abismos his-tóricos de desenvolvimento econômico e social que ainda a separam das áreas mais avançadas do País. Um olhar rápi-do sobre as estatísticas educacionais do Nordeste indica o tamanho do desafio a enfrentar. O número de adultos anal-fabetos da região caiu 15%, mas lá ain-da está a taxa mais alta do País de pesso-as que não sabem ler um simples bilhe-te. Elas representam 16,9% da popula-ção de 15 anos ou mais. A renda dos nor-destinos aumentou, mas continua a ser a mais baixa do Brasil. A economia se di-namizou, mas ainda é desproporcional quando comparada com o tamanho de sua população – o PIB do Nordeste equi-vale a 13,5% do PIB do País, mas lá vivem quase 30% dos brasileiros. Não existe mágica para sair da lanterninha. •

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Formas de medir a riqueza nordestina

191,7 507,5

BahiaPernambucoCearáMaranhãoParaíbaRio Grande do NorteAlagoasSergipePiauí

154,3

95,2

77,9

45,3

31,9

32,3

23,9

22,1

60,7

35,3

28,9

15,5

12,4

12,2

9,8

9,5

7,4

24,6

Fonte: IBGE

Bahia Ceará Paraíba Alagoas Piauí BrasilPernambuco Maranhão Sergipe NordesteRio Gde

do Norte

PIB per capita em 2002 em milhares de reais(valores correntes)

PIB per capita em 2010 em milhares de reais(valores correntes)

4,6 4,4 3,8 2,7 3,5 4,3 3,4

7,9

11,6

7,19,6

19,8

5,12,6

3,9

8,511 10,8

9,26,9

8,510,2

Fonte: IBGE

5,7 5,4 4,8 4,7 4,6 4,4 4,2 3,8 3,4 4,5 4

Mar

anhã

o

Piau

í

Para

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Serg

ipe

Cear

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Bahi

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Pern

ambu

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Alag

oas

Rio

Gran

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do N

orte

Nor

dest

e

Bra

sil

Crescimento do PIB 2002-2010 (acumulado) - Em %

56 52,5 45,1 44,4 43,5 41,5 39,2 34,3 30,942,4 37,1

Fonte: IBGE

Crescimento do PIB 2002-2010 (média anual) - Em%

Indicadores sociais

Fonte: IBGE

BahiaPernambucoCearáMaranhãoParaíbaRio Grande do NorteAlagoasSergipePiauíNordesteBrasil

13.323.2128.084.6677.654.5355.803.2243.494.8932.852.7842.887.5351.846.0392.898.223

48.845.112174.632.960

14.021.4328.796.0328.448.0556.569.6833.766.8343.168.1333.120.9222.068.0313.119.015

53.078.137190.747.855

14.175.3418.931.0288.606.0056.714.3143.815.1713.228.1983.165.4722.110.8673.160.748

53.907.144193.946.886

População em 2002 População em 2010 População em 2012

Fonte: IBGE

Proporção da população por classe de rendimento - Em %

Fonte: Ceplan

2001 2009 2001 2009

AB C D E

3,3

4920,7

27 31,8 26,123,634,7 38,1 50,5

28,7 27,515,3

4,9 8,3 10,6

1.477,8 3.770,1

PIB em 2002 em bilhões de reais(valores correntes)

PIB em 2010 em bilhões de reais(valores correntes)

brasil

Número de analfabetos em

2001 em milhões de

pessoas(15 anos ou mais)

Número de analfabetos em

2011 em milhões de

pessoas(15 anos ou mais)

Taxa de analfabetismo

em 2011 em %

Taxa de analfabetismo

em 2001em %

Número médio de

anos de estudo em

2001(10 anos ou mais)

Número médio de

anos de estudo em

2011(10 anos ou mais)

8 6,824,2 16,9 4,7 6,2

15,1 12,9

12,4 8,6 6,1 7,3

Nordeste

Brasil

educ

ação

Nordeste Brasil

2.238.315 4.928.685 23.036.041 42.682.1112002 2012 2002 2012

Crescimento

Crescimento

Total

120% 85%

922.316 4.500.857 4.945.256 16.910.473388% 242%

4.079.993 11.939.732 35.523.633 76.137.191193%

Fonte: Denatran

Carro

Moto

frota

40,330,6

0

200

400

600

800

1000

2004 2005 2006 2007 2008 2009 2011

Crescimento

Em %

Fonte: IBGE

Nordeste

BrasilRendimento médio mensal real (10 anos ou mais) Em R$

114%

nordeste

(2004/2011)

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N o r d e s t e : Incentivos fiscais

A decisão sobre on-de aportar alguns mi-lhões de reais em in-vestimento fica mais fácil para uma empresa quando ela é recebida com tapete vermelho

como o que Pernambuco estendeu para a Nissin-Ajinomoto, fabricante de macar-rão instantâneo. Para convencer a japone-sa a levantar sua segunda fábrica brasilei-ra no distrito industrial de Glória do Goi-tá, uma das dez cidades mais pobres do estado, cravada na Mata Norte pernam-bucana, o governo fez de tudo um pouco. Vendeu a preço de banana o terreno para a construção, tão grande quanto 27 cam-pos de futebol como o Estádio do Mara-canã – cada metro quadrado foi avalia-do em menos de 1,30 real. Garantiu à em-presa, por pelo menos 12 anos, desconto de 85% no Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) inciden-te no preço dos produtos feitos no estado.

Para completar o pacote e assegurar que as caldeiras da fábrica pudessem fun-cionar, a Copergás, distribuidora de gás de Pernambuco, foi destacada para cons-truir 13 quilômetros de gasoduto até as portas da empresa. A planta foi inaugu-rada em 2012. “Quando uma cidade não tem empresa nenhuma, a inércia barra os primeiros investimentos. Nesses casos, somos realmente agressivos”, diz Márcio Stefanni Monteiro, secretário de Desen-volvimento Econômico de Pernambuco.

Conseguir pacotes de benefícios, como o obtido pelos japoneses, não é um privilé-gio de quem opta por investir em Pernam-buco. Em maior ou menor grau, o mes-mo expediente é usado por todos os esta-dos do Nordeste para atrair recursos que – os governos asseguram – se revertem

em crescimento econômico, empregos e, mais tarde, em nova arrecadação de im-postos. Os descontos de ICMS, que che-gam a superar 90%, são os mais comuns. Só em Pernambuco, que abate até 95% do imposto para atrair indústrias, o volume de incentivos relacionados ao ICMS con-cedidos no ano passado pode ter ultrapas-sado 1,4 bilhão de reais, pelas contas da Confederação Nacional dos Municípios.

É mais que o orçamento do estado com saneamento. O governo calcula, porém, que cada real dado em renúncia fiscal in-jete outros 3 na economia real.

“O Nordeste avançou muito nos últi-mos anos, mas ainda há diferenças tão brutais entre nós e o Sul e Sudeste que precisamos dar incentivos para com-pensá-las”, afirma James Silva Santos Correia, secretário de Indústria, Co-mércio e Mineração da Bahia. O estado, que tinha renúncias de ICMS de 2,5 bi-lhões previstas para o ano passado, foi um dos que tiveram mais investimentos anunciados nos últimos cinco anos.

Do ponto de vista dos investidores, os in-centivos negociados com os governos cos-tumam ser fatores decisivos para a escolha do Nordeste como a região onde se insta-lar. A opção por um ou outro estado, no en-tanto, leva em consideração mais fatores de atração. No Maranhão, o governo tem fei-to um esforço para qualificar a mão de obra necessária nas plantas industriais que es-tão sendo erguidas no estado. Em parce-ria com universidades e escolas técnicas, o plano é que 400 mil pessoas tenham trei-namento técnico até o ano que vem.

Outra frente atacada procura desburo-cratizar a concessão das licenças ambien-tais exigidas para a instalação de grandes empreendimentos. “Envolvemos os téc-nicos da Secretaria do Meio Ambiente no processo desde o momento em que as em-presas manifestam a intenção de vir pa-ra cá”, explica Maurício Macedo, secretá-rio de Desenvolvimento do estado. Todo o projeto da Refinaria Premium I, um in-vestimento de 37 bilhões de reais previsto pela Petrobras na cidade de Bacabeira, le-vou seis meses para ser licenciado, segun-do o secretário – um prazo considerado reduzido para obras de tamanho porte.

O governo de Pernambuco calcula que cada real dado em renúncia fiscal injete outros 3 na economia real

Uma colher de chá Estados que se fiam na isenção de impostos estendem a rede de benefícios para atrair investimentos

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tes fiscais do que de disposição para fa-cilitar a vida dos empreendedores. “To-dos oferecem incentivos de algum tipo”, afirma Sérgio Schelp, diretor da Bull Mo-tors, montadora de motocicletas paulista que escolheu a cidade de Nossa Senhora do Socorro, em Sergipe, para investir 10 milhões de reais na instalação de uma fá-brica. O menor estado do Brasil, segun-do o executivo, foi o que acolheu melhor

o projeto da empresa. “Nossas demandas têm acesso fácil ao governador. Percebe-mos que, embora estejamos fazendo um investimento pequeno, somos importan-tes para o estado.”

Agilidade, eficiência e bom trânsito entre os empreendedores tendem a se tornar ativos cada vez mais importantes para os estados atraírem investimentos, à medida que a discussão sobre a legali-dade dos incentivos fiscais se aprofun-da. Desde 2011, o Supremo Tribunal Fe-deral (STF) vem considerando inconsti-tucionais isenções de ICMS concedidas por diversos estados brasileiros que não foram aprovadas por unanimidade no Conselho Nacional de Política Fazendá-ria (Confaz), órgão que congrega os se-cretários de Fazenda dos estados.

Em 2012, a Corte ameaçou editar uma súmula vinculante sobre o assunto – o que obrigaria os governos a cobrar im-postos que tivessem deixado de ser re-colhidos. Em dezembro, o governo fede-ral apresentou uma proposta de unifica-ção gradual das alíquotas de ICMS entre os estados, mediante a criação de fundos destinados a promover o desenvolvimen-to das regiões menos favorecidas. “O im-portante é assegurar que as empresas que já receberam incentivos fiscais no passa-do não percam o benefício, nem tenham de recolher impostos retroativamente”, afirma Flávio Castelo Branco, gerente--executivo de política econômica da Con-federação Nacional da Indústria (CNI).

No Nordeste, no entanto, as opiniões são mais incisivas. Para James Correia, da Bahia, é importante manter nas mãos dos estados instrumentos claros de atração de investimento. “Aceitar a equiparação das alíquotas seria o suicídio do Nordeste.” •– POR MARIANA SEGALA

e

.

Investimentos anunciados no Nordesteentre 2008 e 2012 (em R$)

Obs.: Inclui apenas os investimentos feitos em um só estado

Bahia58.441.109.334

Sergipe15.040.028.773

Alagoas3.265.490.675

Pernambuco47.460.392.469

Paraíba2.366.246.046

TOTAl281.650.730.452

80.000

70.000

60.000

50.000

40.000

30.000

20.000

10.000

0

Fonte: Renai (MDIC)

No Rio Grande do Norte, o governo estadual tem apostado em outra frente. “Incentivamos o uso de gás na ativida-de industrial oferecendo tarifas de até 73 centavos por metro cúbico, diante de um preço médio perto de 1,10 real no merca-do nacional”, diz Rogério Marinho, se-cretário estadual de Desenvolvimento Econômico. Mas conquistar uma empre-sa pode depender menos de expedien-

Maranhão69.860.915.763

Piauí9.635.178.753

Ceará69.076.931.440

Rio Grande do Norte6.504.437.200

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N o r d e s t e : Finanças

Até não muito tempo atrás, instalar uma em-presa no Nordeste soa-va como uma ideia com tão poucas chances de sucesso quanto imagi-nar que, um dia, aquela

porção do Brasil pudesse se tornar um mercado cobiçado. O primeiro entrave é que à região faltavam fatores de atra-ção, qualidades que despertassem o in-teresse de potenciais investidores. O segundo é que, como havia pouca de-manda, também havia pouco dinheiro disponível para bancar empreendi-mentos lá. Dos anos 2000 para cá, a mão do Estado – e dos estados – conse-guiu amenizar o primeiro problema. Com o aumento da renda dos nordesti-nos e a melhora na infraestrutura da re-gião, o Nordeste começou a ser enxer-gado pelos empreendedores como um lugar onde é preciso estar. Cidades co-mo Recife, Salvador, Fortaleza e Natal figuram hoje na lista de lugares mais promissores para fazer investimentos. A solução do segundo problema veio na sequência. Quanto mais projetos (e projetos parrudos) entraram na fila em busca de financiamento, mais recursos brotaram para permitir que fossem le-vados a cabo. O sistema financeiro – em especial as instituições públicas, ainda as maiores financiadoras de grandes investimentos – ampliou a oferta de crédito para a região muito além dos ní-veis verificados em qualquer outra par-te do País. “Hoje já não dá para imagi-nar a região crescendo pouco porque faltou dinheiro”, avalia Henrique

Aguiar, diretor de gestão de fundos, in-centivos e atração de investimentos da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).

Nos últimos cinco anos, o Nordeste ajudou a puxar o grosso do crescimen-to das operações de crédito no País. O estoque de financiamentos feitos na re-gião, incluindo os voltados às pessoas físicas, cresceu 230% desde 2007. Che-gava perto de 300 bilhões de reais no fim do ano passado. Mais surpreen-dentes que a cifra total, no entanto, são os volumes de financiamentos conce-didos para as empresas – no fundo, o que realmente interessa para os empre-endedores. O crédito para as pessoas jurídicas, que financia desde os inves-timentos produtivos até o capital de gi-ro necessário para que toquem as ope-rações, aumentou 245% no período. Os saltos mais marcantes aconteceram em 2008 e 2009, justamente os anos em que mais investimentos de empresas foram anunciados na região. “Há uma carteira tão variada de projetos aconte-cendo no Nordeste que a minha pers-pectiva é de ver nossos números cres-cendo acima da média por um tempo”, diz Paulo Ferraz Guimarães, chefe do departamento nordestino do Banco Nacional de Desenvolvimento Econô-mico e Social (BNDES).

Atualmente, o BNDES é uma das fontes mais relevantes de financia-mento para as obras no Nordeste. Os valores despejados pelo banco na re-gião entre 2009 e 2012 beiraram 80 bi-lhões de reais, mais que o dobro do vo-

lume de operações realizadas nos sete anos anteriores. Atualmente, 13% do orçamento do banco desemboca na região – era 8% apenas cinco anos atrás. E não se cogita um revés nessa trajetória. O crédito concedido a enor-mes projetos estruturantes marcou uma mudança de patamar nos desem-bolsos do BNDES para a região. A dire-ção que o banco adotaria ficou mais clara a partir de 2009. Naquele ano, quase 10 bilhões de reais – então o maior financiamento de sua história – foram destinados à construção da Refi-naria Abreu e Lima, uma obra de quase 35 bilhões de reais que está sendo er-guida pela Petrobras e a PDVSA, esta-tal venezuelana de petróleo, em Per-nambuco. A partir daí, o que se viu foi uma espécie de piso informal de de-sembolsos para a região, que nos últi-mos quatro anos rondou a faixa dos 20 bilhões de reais anuais. Em 2012, foram

Não vai faltar crédito A disponibilidade de recursos para viabilizar projetos na região triplicou nos últimos cinco anos

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21 bilhões. “Conseguimos elevar o cré-dito para o Nordeste até esse nível por-que a região agora conta com projetos de grande porte”, diz Guimarães. “Final-mente, o peso do Nordeste nas opera-ções do banco aproxima-se dos 13% que a região representa para o PIB do País.”

Projetos grandes que consigam amar-rar firmemente todas as pontas – em outras palavras, que embutam poten-cial de ganhos elevados, tenham sus-tentabilidade financeira e apresentem impactos econômicos em cadeia – são os preferidos dos maiores financiado-res do País. Para levantar uma fábrica que deve produzir 250 mil carros por ano a partir de 2014, a Fiat vai investir 4,5 bilhões de reais, mas quase tudo se-rá bancado com recursos do BNDES, do Banco do Nordeste do Brasil (BNB) e do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE), abastecido por re-

cursos do Tesouro Nacional. “As con-dições para investir no Nordeste estão realmente muito interessantes. O ano passado terminou com crescimento na demanda por recursos e 2013 já come-çou do mesmo jeito”, avalia Ary Joel de Abreu Lanzarin, presidente do BNB. Em 2012, o banco desembolsou quase 23 bilhões de reais para a economia nordestina, o equivalente ao PIB do Piauí. Desse volume, 12,5 bilhões de re-ais foram voltados especificamente pa-ra financiamentos de longo prazo, co-mo o de quase 900 milhões de reais que a Fiat tomou. A origem prioritária desses recursos é de repasses da arre-cadação de tributos federais como o Imposto de Renda e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) que incide sobre produtos importados. Neste ano, o banco estima que o volu-me de crédito para investimentos atin-ja a cifra histórica de 13,8 bilhões de

reais, emprestados a juros baixíssimos para os padrões brasileiros – é possível tomar dinheiro pagando taxas de até 3% ao ano. “Temos feito todo o possível para atender a todas as demandas”, diz Lanzarin. Não é à toa que um dos slo-gans populares do banco para seu pro-grama de financiamento é: “Pode in-vestir. Crédito não vai faltar”.

Uma filosofia semelhante vem sendo aventada na Sudene, recriada durante o governo Lula, depois de ter sido extinta em 2001. A autarquia administra o FDNE, que tem um orçamento já apro-vado para este ano de 2 bilhões de reais voltados para o financiamento de in-vestimentos na região. O valor é o mes-mo destinado para o fundo em 2013, mas, na Sudene, há esforços para que ele seja elevado durante o ano. “A de-manda por crédito cresceu tanto no fim do ano passado que acreditamos que os nossos recursos possam ser totalmente

Guimarães, do BNDES, e Ary Lanzarin, do BNB, registram expansão nos empréstimos

Combustível. A Refinaria Abreu e Lima demandará investimento de 35 bilhões de reais

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N o r d e s t e : Finanças

de retorno dos investimentos no Nor-deste é tão boa que mesmo bancos e or-ganizações de fomento estrangeiras es-tão tratando de fincar bandeira por lá, atraindo os empreendedores com ou-tras armas. “O Nordeste não é exata-mente o lugar mais fácil do mundo pa-ra fazer negócios”, diz Loy Pires, ge-rente no Brasil da International Finan-ce Corporation (IFC), braço do Banco Mundial que financia projetos priva-dos em países em desenvolvimento.

consumidos até abril”, afirma Aguiar, da Sudene. No último mês e meio de 2012, depois de uma mudança nas re-gras do FDNE que era aguardada há anos, empreendedores interessados em investir no Nordeste correram para ca-dastrar novos projetos de investimento na superintendência. O resultado foi a formação de uma carteira de pedidos de crédito que ultrapassou 6 bilhões de reais – desde que foi criado, o FDNE de-sembolsou pouco menos de 4 bilhões para financiar projetos como o da cons-trução da ferrovia Transnordestina, que vai ligar o interior pernambucano e piauiense aos portos de Suape, também em Pernambuco, e de Pecém, no Ceará. “Certamente, teremos um problema positivo, que vamos procurar resolver costurando com o governo a liberação de mais recursos”, diz Aguiar.

Recorrer aos cofres das instituições públicas brasileiras – como o BNDES, o BNB e a Sudene – para financiar inves-timentos no Nordeste é muito vantajo-so por causa dos custos. Na Sudene, por exemplo, é possível conseguir crédito com prazo de 20 anos e juros de até 5% anuais. Em geral, as taxas são tão mais baixas quanto mais carente de infraes-trutura for a região onde o projeto será instalado, ou quanto maior for a reper-cussão socioeconômica que tiver po-tencial para gerar. Mas a expectativa

“Mas é um país por si só. Como a região cresce mais que o Brasil, nossas apos-tas lá tendem a ser mais lucrativas.” Em vez dos juros, o chamariz de que a ins-tituição se vale é a consultoria de técni-cos dedicados a acompanhar cada pas-so dos projetos, do início ao fim.

Entre investimentos diretos em em-preendimentos e concessões de crédito, o IFC promete injetar pelo menos 1,6 bi-lhão de reais no Nordeste este ano, um volume que equivale a 40% de todos os recursos aplicados no Brasil. Entram na carteira projetos de todos os tipos. A ex-pansão do Tecon Salvador, o terminal de contêineres do porto da capital baiana, por exemplo, recebeu financiamento de 160 milhões de reais da IFC. “A região é uma prioridade para a instituição e, den-tro dela, os projetos de infraestrutura ganham atenção especial porque são os que provocam impactos de mais longo prazo”, afirma Pires. Enquanto a IFC se ocupa dos projetos privados, o Banco Mundial tem recursos destinados a fi-nanciar obras e investimentos dos go-vernos estaduais e municipais do Nor-deste. Para este ano, os desembolsos pre-vistos são da ordem de 3 bilhões de reais.

Até bancos de fomento de outros paí-ses emergentes, como os chineses, têm voltado seus recursos para o Nordeste brasileiro. Um parque de geração de energia eólica construído pela Desen-vix e inaugurado em janeiro em Sergi-pe recebeu o equivalente a 112 milhões de reais em financiamento do Banco de Desenvolvimento da China (CDB, em inglês) no ano passado. “Bancos eu-ropeus e asiáticos estão encharcados de dinheiro em busca de bons projetos para financiar”, diz Humberto Gar-giulo, diretor da Upside, consultoria que assessorou a Desenvix na opera-ção. Sem restrições de recursos para aplicar – a carteira de créditos conce-didos pelo CDB ultrapassa 1,7 trilhão de reais, quatro vezes maior que a do BNDES –, o montante do projeto financiado pelo banco chegou a 80%. Em troca, parte dos equipamentos usados na obra foi comprada de empre-sas da China. “Mas a disponibilidade de recursos que uma instituição como essa proporciona compensa”, afirma Gargiulo. E, cada vez mais, compensa buscar formas de viabilizar investi-mentos no Nordeste. – POR MARIANA SEGALA

A ferrovia Transnordestina vai cruzar o interior e ligar o Porto de Suape ao de Pecém

Na mesma trilha. Pedidos de crédito na Sudene superam 6 bilhões de reais

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Luiz gonzaga, o compositor pernambucano que ficou conhecido Brasil afora co-mo o Rei do Baião, foi quem melhor retratou em músi-ca as agruras de nascer nor-destino no século XX. Na le-

tra de Sertão Sofredor, canção gravada na década de 1950 em que descrevia seu “sertãozinho desprezado como o quê”, Gonzagão questionava: “Cadê as fábri-cas? Cadê as indústrias? Cadê as coisas boas anunciadas para o Nordeste?” Sen-do rico em matérias-primas e em gente para trabalhar, faltava para a região, na opinião do músico, “uma ajuda leal do grande chefe: o governo federal”. Déca-das depois de feito, o clamor de Gonza-gão parece começar a ser atendido.

As iniciativas de distribuição de renda e os investimentos que vêm sen-do promovidos e estimulados nas es-feras federal e estadual estão ajudan-do a transformar a região em um po-lo de interesse para as fábricas e as in-dústrias que o músico insistia em que-rer ver instaladas no Sertão. Nos últi-mos cinco anos, empresas anunciaram investimentos de, no mínimo, 282 bi-lhões de reais nos estados nordesti-nos, segundo o Ministério do Desen-volvimento – é o equivalente ao PIB de Bahia e Pernambuco, as maiores economias da região, somado ao do Rio Grande do Norte.

Maranhão, Ceará, Bahia e Pernambu-co estão entre os destinos mais pro-curados para os novos empreendimen-tos industriais e comerciais que seguem para a região. Muitos deles já foram le-vados a cabo, enquanto outros não saí-ram – e, talvez, nunca saiam – do papel. Mas o fato é que, neste exato momento,

cerca de 246 bilhões de reais em obras e projetos estão em andamento na região.

Na invejável situação de ser o ponto de convergência de diversos elementos que interessam a diferentes perfis de empresas, o Nordeste é uma das úni-cas regiões do Brasil que conseguem agradar a gregos e troianos. Compa-nhias exportadoras têm na região um campo fértil de negócios, assim como as indústrias que abastecem o merca-do interno com produtos de consumo – ou as duas coisas ao mesmo tempo.

“Instalados em Pernambuco, fica-mos próximos de seis capitais nordesti-nas e, ao mesmo tempo, na extremidade oriental da América do Sul”, diz Cledor-vino Belini, presidente da Fiat Chrysler na América Latina. A montadora, que está construindo uma fábrica na cidade de Goiana, na Zona da Mata pernambu-cana, se posicionou no centro de uma região cuja frota de automóveis cresceu 120% nos últimos dez anos.

O mercado nacional avançou 85%. Ho-je, há um carro para cada 11 nordestinos – é uma taxa muito melhor que a do iní-cio da década passada, de um para ca-da 22, mas ainda longe da média nacio-nal, de um para cinco. Um olho da Fiat está nesses consumidores, ávidos pe-lo conforto de um automóvel. O outro, nas suas exportações pelo Porto de Sua-pe, a potência pernambucana que liga-rá a empresa a pelo menos 160 pontos da África, Europa e América do Norte.

O mercado consumidor nordestino é um chamariz também para indústrias que produzem bens de valor agregado bem menor do que o de um automóvel. “Assim como os chineses, a população do Nordeste também se alimenta me-lhor hoje do que há algumas décadas ”,

Versos de Gonzagão tornaram-se vaticínio da realidade atual da região

Cifras industriais. As fábricas que o músico pedia na década de 1950 chegaram

Um pacote de R$ 282 bilhõesOs investimentos anunciados para os estados da região nos últimos cinco anos somam o equivalente ao PIB de Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Norte juntos

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C o m m o d i t i e s : Reportagem

Freitas e Hiltner destacam as vantagens logísticas e climáticas da região

Infraestrutura. A Vale reserva 12,5 bilhões de reais para duplicar a Estrada de Ferro Carajás

ao Porto de Itaqui, em São Luís – ou se-ja, é bom lugar também para os expor-tadores. A infraestrutura tende a ficar ainda melhor em alguns anos. Só a mi-neradora Vale está investindo 12,5 bi-lhões de reais para duplicar a Estrada de Ferro Carajás, que serve ao escoa-mento do minério que explora. “As van-tagens logísticas do Nordeste, em com-paração com outras regiões, são um di-ferencial que já foi aprendido pelos in-vestidores”, afirma Ricardo Belo, di-retor de consultoria da Ernst & Young Terco na região. Não é à toa que o Ma-ranhão foi o estado do Nordeste que te-ve mais investimentos anunciados nos últimos cinco anos, totalizando quase 70 bilhões de reais, à frente de líderes históricos como Bahia e Pernambuco.

Há ainda casos de empresas que, por características específicas do Nordes-te, não poderiam se instalar em qual-quer outro lugar que não na região. “Pe-las condições de luz e clima, Alagoas é o melhor local para fazer os cruzamen-tos de cana-de-açúcar que geram a es-pécie de que precisamos, com baixo te-or de açúcar e alta concentração de fi-bras”, justifica Alan Hiltner, vice-pre-sidente da GraalBio, fabricante de eta-nol do Grupo Graal, pertencente à fa-mília Gradin. O grupo, que está in-vestindo 350 milhões de reais para le-vantar uma planta em São Miguel dos Campos, cidade de 56 mil habitantes no leste alagoano, será o primeiro no Hemisfério Sul a produzir etanol celu-lósico, que usa a palha e o bagaço da ca-na como matéria-prima.

Da mesma forma, a Vale e seus só-cios coreanos da Dongkuk Steel e da Posco avaliaram que o Ceará – mais especificamente São Gonçalo do Ama-rante, na região metropolitana de For-taleza – era o lugar do Brasil mais ade-quado para instalar a sua Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP). A side-rúrgica, que terá capacidade de pro-duzir 3 milhões de toneladas por ano de aço quando estiver pronta, está sen-do erguida a 8 quilômetros do Porto de Pecém. “A produção de aço é tão mais competitiva quanto mais próxima es-tiver das matérias-primas, que são o carvão e o minério de ferro”, explica Marcos Chiorboli, presidente da CSP. “Se essas duas coisas andam de navio e o aço é exportado pelo mesmo meio, só

diz Leonardo Freitas, diretor-supe-rintendente da Algar Agro, beneficia-dora de soja. Há seis anos, a empre-sa instalou uma unidade de processa-mento em Porto Franco, no sul do Ma-ranhão, que no ano passado ganhou também uma refinaria de óleo. Cer-ca de 220 milhões de reais em investi-mentos depois, a fábrica maranhense já representa mais da metade das ven-das da Algar Agro, sediada em Uber-lândia, no Triângulo Mineiro.

“Com a fábrica lá, conseguimos abastecer o mercado nordestino com um custo muito competitivo”, diz o executivo. O Maranhão, em especial, reserva vantagens logísticas dificil-mente encontradas em outros lugares. É cortado por rodovias importantes e ferrovias que ligam o interior do estado

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poderíamos nos instalar em um porto bem estruturado como Pecém.” Puxa-dos pelo Complexo Industrial do Porto de Pecém, os investimentos anuncia-dos no Ceará ultrapassaram 69 bilhões de reais nos últimos cinco anos.

A tentativa de levar para o Nordeste empresas capazes de gerar não apenas emprego, mas também um grande im-pacto de desenvolvimento econômico e social, não é nova no País. Leis federais que isentavam de Imposto de Renda os projetos realizados na região datam já da década de 1960 – atualmente, no-vos empreendimentos conseguem ob-ter um desconto de 75% no IR duran-te dez anos. A questão é que foi nos úl-timos anos que o conjunto formado pe-los incentivos, as melhorias de infra-estrutura e o mercado consumidor em expansão maturou. “Os empresários já não precisam compensar com a produ-tividade os custos com logística e ou-tras falhas do Nordeste, como antes”, diz José Sergio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras e atual secretário de Pla-nejamento da Bahia.

Os efeitos de ver instalada na região uma indústria de grande porte podem alcançar níveis tão elevados a ponto de mudar completamente a realidade lo-cal. Para conseguir bons trabalhadores para a fábrica de papel e celulose que es-tá construindo na maranhense Impera-triz, a Suzano reservou 10 milhões de reais dos 5,8 bilhões de reais que está investindo na cidade para treinar gente.

Mais de 7 mil pessoas já passaram pelo programa de treinamento da empresa. “Talvez essas pessoas nem sequer che-guem a trabalhar para nós, mas estão voltando para casa com formação de pe-dreiro, de carpinteiro. São profissionais prontos para trabalhar em obras”, diz Adriano Canela, diretor do projeto da Suzano no estado – uma herança e tan-to para o estado, um dos poucos onde o número absoluto de adultos analfabetos aumentou nos últimos dez anos.

Outras indústrias são tão inovadoras para determinados locais ainda ermos do Nordeste que acabam por exigir no-

vos investimentos que retroalimentam uma cadeia de alto impacto nas ativida-des diárias da população local. É o ca-so da geração de energia eólica. De 2009 para cá, depois dos leilões de compra de energia pelo governo que priorizaram fontes renováveis, estados como Bahia, Ceará e Rio Grande do Norte se torna-ram celeiros de implantação de parques eólicos. Atualmente, há mais de cem de-les em construção, segundo a Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), e as obras de outra centena devem come-çar nos próximos anos – um investimen-to que totaliza mais de 16 bilhões de reais.

A Renova Energia resolveu instalar seus parques nos arredores da cida-de de Caetité, a quase 800 quilômetros de Salvador. Lá, os ventos são melho-res nas áreas montanhosas. “Um dos nossos maiores desafios foi fazer che-gar os equipamentos até esses lugares”, diz Mathias Becker, presidente da em-presa. Cada pá do cata-vento que faz uma turbina eólica funcionar mede 40 metros, em média. Não havia no ser-tão baiano estradas ou pontes que su-portassem uma estrutura tão grande. Por isso, empresa e governo tiveram de abrir os cofres e se debruçar sobre as pranchetas para reforçar a estrutu-ra rodoviária da rota que os caminhões com os equipamentos seguiriam.

“Já investimos 20 milhões de reais e temos mais 140 milhões de reais para concretar estradas, melhorar pontes e abrir acessos e desvios para a indústria eólica”, afirma James Silva Santos Cor-reia, secretário da Indústria, Comér-cio e Mineração da Bahia. Foi na pri-meira leva de investimentos que se tor-nou possível chegar de carro à casa de Rita Maria da Silva, baiana de 58 anos. Ela e os vizinhos moravam, como cos-tuma dizer, isolados no meio do mato. “Para chegar em casa, só de cavalo por um caminhozinho que levava até a es-trada mais próxima”, conta. Mas, como o lugarejo estava no roteiro da Renova, Rita ganhou um acesso até a porta da sala – e, de quebra, emprego na empre-sa para um dos filhos e um dos genros. Em meio às cifras bilionárias dos inves-timentos no Nordeste, a estradinha que conduz à casa de Rita parece singela demais para ser levada em conta. Mas Rita garante que não é. •– POR MARIANA SEGALA

A casa de Rita, antes isolada no mato, agora tem acesso à estrada por causa de uma usina eólica

Menos falhas. Os custos que afugentavam os empresários diminuíram, diz Gabrielli

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