Estudo de caso - Dilema ético 12.05.2012

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Rio Verde-Go, 12 de Maio de 2012 Pós-graduação em Gestão de Pessoas Aluno (a): ______________________________________________________________ Estudo de caso Dilema ético na demissão de um vendedor RESUMO Um jovem e ambicioso gerente de vendas recebe uma nova área de atuação e, com ela, alguns novos problemas, tal como um vendedor que parece enfrentar mais dificuldades do que apenas um colapso em suas vendas. Este caso coloca em confronto o caráter pessoal e profissional, leva-nos a refletir sobre como, em nossas vidas, enfrentamos situações que, apesar de nossas expectativas, jamais estaremos plenamente preparados para encarar. APRESENTAÇÃO Jonas Pereira era um jovem profissional, com sólida formação acadêmica, que já havia passado pelos cargos de vendedor e de supervisor de vendas em um grande grupo nacional de produtos de consumo comercializados através de supermercados, atacadistas e distribuidores em todo o país. Como vendedor, Pereira foi responsável pelo atendimento a vários clientes e seus resultados considerados excepcionais, tendo contribuído para o desenvolvimento das marcas da empresa e para a melhoria do relacionamento com clientes. Além de prêmios recebidos pelo desempenho, a promoção à supervisão comercial foi uma espécie de degrau para que ele pudesse exercitar sua capacidade de liderança com os demais membros da equipe. Durante o período em que atuou como supervisor, sua equipe demonstrou elevado grau de profissionalismo, atingindo altos índices de efetividade e satisfação, tanto da equipe de vendas quanto dos clientes. Por conseguinte, a ninguém causou surpresa que a promoção ao cargo de Gerente de Vendas tenha vindo em tão curto espaço de tempo: com menos de um ano na função, Pereira recebeu nova promoção. Como Gerente de Vendas, Pereira ficou responsável, por dois anos, pelas vendas no Rio Grande do Sul, obtendo, novamente, robustos resultados de crescimento em todas as categorias de produtos. O convite para um novo desafio, gerenciar os estados do Paraná e Santa Catarina, substituindo Inácio Filho que estava se aposentando, foi recebido como mais um passo na caminhada para um futuro brilhante e representava, além de um excelente “upgrade” profissional, uma ótima oportunidade para resolução de um dos maiores problemas de Pereira no estabelecimento de uma política de preços que reduzisse o nível de stress oriundo dos diversos conflitos entre os atacadistas/distribuidores localizados nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Atacadistas e distribuidores dos três estados do sul travavam uma verdadeira “guerra” no mercado, ofertando os mesmos produtos com preços diversos, o que fazia parte da política do fornecedor, o qual procurava assegurar livre concorrência e não se intrometer na formação dos preços de seus parceiros. Pereira tinha a intenção de erradicar essa disputa por duas razões básicas: A primeira é que acreditava na necessidade de gestão de preços como estratégia de produto a ser gerenciado pelo fabricante, não pelo atacadista/distribuidor. Ele entendia que, no composto de marketing mix, o preço representava o coroamento da proposta de valor e que este precisava estar adequado ao valor percebido pelo público-alvo. Caso os atacadistas vendessem com margens inferiores, a percepção do preço, muito abaixo do esperado pelos consumidores, poderia abalar o entendimento do valor entregue, destruindo a imagem da marca junto ao seu mercado. A segunda, advinda da corrosão das margens de lucro por preços deprimidos, em situações extremas, poderia provocar abalo em sua capacidade de pagamentos dos clientes, por conseguinte redução de capacidade de compras e vendas. Esta situação prejudicaria o grau de atratividade dos produtos da indústria, que tinham ótima aceitação e giro nas gôndolas dos varejistas. ________________________________________________________________________________________________ Prof. Me. Carlos Antonio Cardoso Sobrinho Teoria das Organizações [email protected]

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Rio Verde-Go, 12 de Maio de 2012

Pós-graduação em Gestão de Pessoas

Aluno (a): ______________________________________________________________

Estudo de caso

Dilema ético na demissão de um vendedor

RESUMO

Um jovem e ambicioso gerente de vendas recebe uma nova área de atuação e, com ela, alguns novos problemas, tal

como um vendedor que parece enfrentar mais dificuldades do que apenas um colapso em suas vendas. Este caso coloca

em confronto o caráter pessoal e profissional, leva-nos a refletir sobre como, em nossas vidas, enfrentamos situações

que, apesar de nossas expectativas, jamais estaremos plenamente preparados para encarar.

APRESENTAÇÃO

Jonas Pereira era um jovem profissional, com sólida formação acadêmica, que já havia passado pelos cargos de

vendedor e de supervisor de vendas em um grande grupo nacional de produtos de consumo comercializados através de

supermercados, atacadistas e distribuidores em todo o país.

Como vendedor, Pereira foi responsável pelo atendimento a vários clientes e seus resultados considerados

excepcionais, tendo contribuído para o desenvolvimento das marcas da empresa e para a melhoria do relacionamento

com clientes. Além de prêmios recebidos pelo desempenho, a promoção à supervisão comercial foi uma espécie de

degrau para que ele pudesse exercitar sua capacidade de liderança com os demais membros da equipe.

Durante o período em que atuou como supervisor, sua equipe demonstrou elevado grau de profissionalismo,

atingindo altos índices de efetividade e satisfação, tanto da equipe de vendas quanto dos clientes. Por conseguinte, a

ninguém causou surpresa que a promoção ao cargo de Gerente de Vendas tenha vindo em tão curto espaço de tempo:

com menos de um ano na função, Pereira recebeu nova promoção.

Como Gerente de Vendas, Pereira ficou responsável, por dois anos, pelas vendas no Rio Grande do Sul,

obtendo, novamente, robustos resultados de crescimento em todas as categorias de produtos.

O convite para um novo desafio, gerenciar os estados do Paraná e Santa Catarina, substituindo Inácio Filho que

estava se aposentando, foi recebido como mais um passo na caminhada para um futuro brilhante e representava, além de

um excelente “upgrade” profissional, uma ótima oportunidade para resolução de um dos maiores problemas de Pereira

no estabelecimento de uma política de preços que reduzisse o nível de stress oriundo dos diversos conflitos entre os

atacadistas/distribuidores localizados nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.

Atacadistas e distribuidores dos três estados do sul travavam uma verdadeira “guerra” no mercado, ofertando

os mesmos produtos com preços diversos, o que fazia parte da política do fornecedor, o qual procurava assegurar livre

concorrência e não se intrometer na formação dos preços de seus parceiros. Pereira tinha a intenção de erradicar essa

disputa por duas razões básicas:

A primeira é que acreditava na necessidade de gestão de preços como estratégia de produto a ser gerenciado

pelo fabricante, não pelo atacadista/distribuidor. Ele entendia que, no composto de marketing mix, o preço representava

o coroamento da proposta de valor e que este precisava estar adequado ao valor percebido pelo público-alvo. Caso os

atacadistas vendessem com margens inferiores, a percepção do preço, muito abaixo do esperado pelos consumidores,

poderia abalar o entendimento do valor entregue, destruindo a imagem da marca junto ao seu mercado.

A segunda, advinda da corrosão das margens de lucro por preços deprimidos, em situações extremas, poderia

provocar abalo em sua capacidade de pagamentos dos clientes, por conseguinte redução de capacidade de compras e

vendas. Esta situação prejudicaria o grau de atratividade dos produtos da indústria, que tinham ótima aceitação e giro

nas gôndolas dos varejistas.

________________________________________________________________________________________________

Prof. Me. Carlos Antonio Cardoso Sobrinho Teoria das Organizações [email protected]

Pereira entendeu que o convite lhe possibilitaria controlar as políticas e negociações praticadas em outras

regiões que antes prejudicavam as operações de vendas no Rio Grande do Sul, pois passaria a ser o gestor responsável

pelos negócios nessas áreas. O convite foi aceito imediatamente, e Pereira partiu para uma reunião na sede de sua

empresa, localizada na cidade de São Paulo, onde se encontraria com o Diretor Comercial para receber as orientações e

informações sobre a nova área pela qual esse se responsabilizaria.

Pereira não imaginava o dilema que estava prestes a encarar e que exigiria uma difícil decisão gerencial ligada

ao desempenho de um antigo vendedor dessa região que ora assumia.

A NOVA EQUIPE

Carlos Santos era o dedicado Diretor Comercial da empresa que foi seu primeiro e único emprego. Formado

em química, ingressou na área de produção como estagiário havia 20 anos. Com sólida formação acadêmica,

complementada por curso de gestão na Universidade de Lausanne na Suíça, era conhecido por conduzir de forma

centralizadora e detalhista suas ações.

Os clientes tinham a tranquilidade de que as políticas da empresa não oscilavam conforme os humores do

mercado e de que eram baseadas em uma estratégia estruturada e ponderada, que considerava uma série de fatores tais

como: gestão do relacionamento com os parceiros, identificação das atividades dos concorrentes em cada região,

presteza do atendimento e profissionalismo da equipe, entre outros.

Com o passar do tempo, os clientes passaram a ser “educados” a fazer negócios com a empresa, mantendo-se

alinhados ao novo estilo e à velocidade que eram impressos pela gestão de Carlos e que permeavam sua equipe de

trabalho. Dessa forma, todos os gestores regionais comungavam deste mesmo estilo e estavam muito próximos de ter

uma conduta similar à da direção comercial, mesmo que, na maioria das vezes, tomassem as decisões de forma isolada,

o faziam dentro dos parâmetros impostos pela direção comercial. Não eram toleradas indisciplinas e condutas não

apropriadas.

Carlos conhecia um a um, cada membro da equipe, e as peculiaridades de cada região, seus principais clientes

e concorrentes, as estratégias utilizadas e o histórico das ocorrências desses mercados e clientes. Isso só era possível

devido ao processo de comunicação adotado pela empresa, e ao perfil do próprio Carlos, que era conhecido como um

exímio “esgrimista” na arte da sondagem e formulação de perguntas.

As reuniões de vendas eram realizadas conforme o calendário abaixo:

Mensais – o corpo nacional de gerentes participava da reunião de staff com avaliação de vendas, projetos e

relatórios de status de mercado. Após essa reunião cada gestor retornava à sua sede onde se encontrava com seu time,

atualizando os status dos projetos, incentivando e cobrando os resultados de cada setor de vendas.

Trimestrais – as equipes de vendas reuniam-se em suas regiões. Membros da matriz da empresa participavam

como multiplicadores, para lançamentos de campanhas de vendas, divulgação de resultados e acompanhamento de

performance das áreas. Bons resultados eram comemorados através de jantares informais.

Comunicação Formal – mensalmente, relatórios de desempenho, contendo indicadores de vendas e market

share (pesquisas AC Nielsen) eram divulgados juntamente com o Relatório de Política Comercial, enviado pela

administração de vendas aos gerentes regionais.

A preferência de comunicação entre os gerentes e Carlos era o email e o telefone. Diariamente, Carlos

contatava pessoalmente cada um, propondo ações, ouvindo relatos e discutindo o andamento dos projetos, propostas e

negociações com clientes.

Para Pereira, ouvir de Carlos um relato sobre a região que assumiria, no mês seguinte, não significava apenas

uma boa oportunidade de conhecer os números do setor, já que muitos deles eram de seu conhecimento, mas

significava, principalmente, uma oportunidade de conhecer a percepção do diretor sobre os membros da nova equipe

que Pereira viria a gerenciar, além de discutir a gestão estratégica de preços para a região sul.

Durante a conversa com Carlos, Pereira repassou os temas de seu interesse e recebeu as Pastas de

Acompanhamento dos Vendedores, deixados pelo antigo gerente. Essas pastas continham os relatórios de avaliação

profissional dos funcionários e memorandos de contatos de treinamento, correspondências trocadas entre o gerente e os

funcionários, sobre pontos fortes e oportunidades de melhoria de performance que eram levantadas pelo gerente e/ou

supervisor, durante o trabalho de campo realizado com os vendedores.

Gerentes e supervisores devem, obrigatoriamente, passar ao menos dois dias a cada trimestre em trabalho

conjunto com seus vendedores. Efetuam visitas, em conjunto, aos clientes e aos pontos de vendas, acompanhando e

avaliando o trabalho, bem como identificando pontos a serem enfocados em futuros treinamentos.

Após o período de trabalho em conjunto, é fornecido um feedback ao vendedor, através de uma discussão entre

o gerente\supervisor e o vendedor. Há um formulário específico que deve ser assinado por ambos, como compromisso

acordado nos pontos a melhorar por parte do vendedor e que servirá para follow-up (acompanhamento futuro). Uma

cópia do formulário fica com o vendedor para seu acompanhamento e execução; outra, com o gerente, para sua

administração e acompanhamento, e a última cópia segue para a diretoria comercial, como forma de monitoramento do

trabalho de toda a equipe.

Foi difícil para Pereira entender os problemas relatados por Carlos quando foi analisado o perfil do vendedor

Inácio, com sede em Itajaí – SC, região que abrange o litoral norte catarinense, compreendida entre o município de São

José, município vizinho a Florianópolis, até a fronteira com o estado do Paraná, passando pelas cidades de Blumenau,

Joinville e Brusque. Santa Catarina estava dividida em três áreas: a) Litoral sul, com sede em Florianópolis; b) Oeste,

com sede em Chapecó; c) Litoral norte, com sede em Itajaí.

Para cada área a empresa mantém um vendedor, além da estrutura de pós-vendas formada por promotores de

vendas que visitam as lojas de varejo para efetuar atividades de merchandising nestes pontos e auxiliar os clientes em

técnicas de exposição e reposição de produtos.

A análise de potencial de mercado para os produtos da empresa indicavam que a região do litoral norte, onde

estava sediado Inácio, deveria responder por 40% das vendas do Estado, mas havia se estabilizado em menos de 30%.

Segundo os relatórios apresentados na pasta de Inácio, ele enfrentava um problema de “importação” de atacadistas e

isso vinha impossibilitando que seus clientes atingissem um volume de compras compatível, já que os preços praticados

pelos atacadistas/distribuidores de outras áreas, notadamente do Paraná, reduziam a competitividade dos clientes locais.

Pereira imaginou que o setor precisasse de um “choque comercial”, com ações promocionais que

possibilitassem aos atacadistas locais tornarem-se competitivos contra os concorrentes de outras regiões. Este choque

mudaria o estado anímico de Inácio e das equipes de vendas dos atacadistas locais, que já saíam derrotadas de casa para

atender seus clientes; além disso, um maior regramento sobre os preços e políticas comerciais dos

atacados/distribuidores dos estados do sul do Brasil poderia beneficiar toda a região ao focalizar a atuação dos

vendedores do canal indireto ao disputar contra os concorrentes da indústria, não entre si.

Entretanto, antes que Pereira pudesse apresentar seus planos futuros para a região de Inácio, Carlos tomou a

palavra e esclareceu que a performance de Inácio vinha se mantendo excessivamente baixa por um período muito acima

do aceitável. Silas, o gerente anterior, que se aposentara, defendia Inácio, apresentando argumentos que, na maioria das

vezes, Carlos não julgava pertinentes. Pereira entendeu que um dos motivos pelos quais a aposentadoria de Silas

ocorresse de forma tão repentina, deveu-se às diferenças existentes entre ele e Carlos.

Segue um resumo da conversa mantida entre Carlos e Pereira sobre o vendedor Inácio:

— O Inácio está muito abaixo das metas da região, ele “puxa” os números para baixo, numa região importante

para o estado. O Silas sempre apresentava uma justificativa para defendê-lo, mas minha paciência acabou – reclamou

Carlos.

— Mas qual o teu diagnóstico sobre o que está ocorrendo na região? – perguntou Pereira.

— Não sei. O Silas sempre alegava que a culpa era da força do atacado paranaense na região, mas para mim,

tem alguma coisa errada, os outros vendedores têm o mesmo problema, mas ainda assim chegam às metas. Claro que às

vezes um problema ou outro acontece, mas na área de Itajaí é sempre a mesma coisa. Não posso manter alguém assim

no meio da equipe, ele é uma “pedra no sapato” e desmotiva os demais vendedores; por isso pedi para o Silas demiti-lo

e colocar alguém novo no lugar dele, mas não deu tempo para isso. Acho que o melhor é que tu liquides este assunto e

vamos começar a região do zero com outra pessoa na área, o que tu achas?

— Entendo, Carlos. Acho que realmente deve haver alguma coisa errada com o Inácio, mas não é possível ele

ter esquecido tudo o que sabia. Eu o conheço das reuniões de vendas e creio que seja alguém que pode ser recuperado.

Outro ponto a considerar é que, para aquela região e para o perfil dos clientes, precisamos alguém muito próximo do

seu estilo pessoal. Pelo que soube ele se relaciona muito bem com os clientes e “fala” a mesma língua do pessoal de lá,

porque é natural da região. Outro aspecto importante a ser considerado é que não posso entrar em uma nova área e,

antes mesmo de trabalhar com o vendedor, demiti-lo. Como isso seria visto pelos demais membros da equipe? Que eu

não dei uma chance para o colega deles? Não sei se estou certo ou errado, mas gostaria de ter um período para analisar

com prioridade a região e, depois de nosso primeiro contato de campo, te passarei um relatório sobre o que analisei e

minha decisão. Pode ser assim?

— Ok, se tu achas melhor assim, tudo bem. Só quero que resolvas logo a região, que é importante para os

negócios em SC. – finalizou o diretor.

Saindo da reunião, Pereira refletiu sobre o que estaria acontecendo na região de Inácio e sobre a conversa que

tivera com Carlos. Ficou feliz por ter tomado a decisão que acreditava a mais correta, afinal não podia gerenciar uma

região pela cabeça de outras pessoas. Se tivesse aceitado a determinação de Carlos em demitir Inácio, sem sequer ter

uma oportunidade de conversar e entender o que ocorria, carregaria para toda a vida o peso dessa decisão.

A primeira visita de trabalho a ser realizada com a nova equipe foi agendada, obviamente, com Inácio. Pereira

estava ansioso por entender o que acontecia e mostrar ao Diretor Comercial como poderia “salvar” um profissional que

estava se perdendo. Ele acreditava no potencial do ser humano e que cada um tem uma capacidade que pode ser

melhorada com vontade e competência e estava disposto a fazer sua parte.

Os dois se encontraram no hotel pela manhã, após uma rápida conversa e um café, seguiram na sistemática de

atendimento do vendedor, visitando pontos de vendas e alguns clientes atacadistas e supermercadistas. Já nas primeiras

visitas não foi difícil para Pereira identificar o que vinha acontecendo, identificou a ausência de foco nos atendimentos

aos clientes, falhas no gerenciamento dos espaços no ponto de vendas, no acompanhamento das variáveis de loja e no

trabalho da equipe de merchandising (promotores de vendas), erros de planejamento de trabalho, ausência de uma

rotina correta de visitas e, até mesmo, falta de material de trabalho para essas. Todas, certamente, atividades que

Inácio dominava, mas que não praticava mais.

Ao final do dia, Pereira convocou Inácio para uma reunião de avaliação. Reuniram-se na cafeteria do hotel:

— Tenho uma boa impressão de ti, Inácio, decorrente de todas as reuniões e contatos que tivemos. Tu sempre

foste muito atencioso e me pareceu um profissional de capacidade e, como qualquer um de nós, com pontos a melhorar,

mas vamos chegar a esses logo mais.

— O que me preocupa hoje é que tua região é de grande potencial, o maior do estado, mas os resultados estão

abaixo do que a empresa espera. No trabalho de hoje, pude identificar que estamos com muitas oportunidades em

relação aos clientes. Em vários pontos de vendas, como conversamos hoje, temos um share de prateleira inferior aos

nossos concorrentes, além de estarmos fora de pricing em três lojas. Em uma das visitas de hoje, estava sem a Ficha de

Cliente, que traz todas as informações para que possas realizar uma proposta interessante de vendas. Quero que me

esclareças o que está acontecendo com teu trabalho. Existe alguma situação que esteja te impedindo de ser o grande

Inácio que eu conheço?

— Desculpe, Pereira, o Silas estava sabendo de tudo, e eu deveria ter te contado já no momento em que

assumistes o Estado. Não tenho conseguido ser um bom profissional, porque estou enfrentando problemas de saúde na

família. Meu filho de 10 anos sofre de fibrose cística, uma doença degenerativa dos órgãos respiratórios. Esta é uma

luta já de meses. Minha família, na verdade, espera o pior. A doença não tem cura e sua progressão leva a pessoa ao

óbito.

Pereira ficou chocado. Imaginou o quanto seria difícil enfrentar esta situação, pois também tinha filhos.

Perguntou pela criança, pela esposa, como estavam sendo atendidos em termos de acompanhamento médico. Inácio

informou que todo o acompanhamento possível estava sendo dado à família. O menino estava, naquele mesmo dia, em

Campinas no Hospital da Unicamp, para onde viajava frequentemente para receber tratamento. Lá, os mais modernos

recursos estavam sendo utilizados na busca da melhoria de qualidade de vida. Quem sabe aconteceria algum milagre.

Toda essa situação deixava Inácio completamente sem ação no campo profissional.

Pereira, mesmo sentindo-se péssimo por isso, lembrou a Inácio que muito da assistência médica que seu filho

recebia, só era possível graças à possibilidade que a empresa lhe permitia através do plano assistencial e que, caso

necessitasse de auxílio adicional, ele próprio envidaria esforços com o setor de Recursos Humanos, para atender seu

pleito. De qualquer forma, o fato de que seu filho estava doente deveria ser enfrentado com atitude e esperança.

Assim como em sua vida profissional, de nada adiantaria ele se deixar desestruturar emocionalmente, pois o

que seu filho precisava nesse momento, bem como sua família, era que ele continuasse sendo aquele pai, seguro,

confiante e firme em suas atitudes.

— Tu precisas estar com seu filho 100% , quando estiver com ele, assim como a empresa precisa de ti 100%

durante o trabalho. Sei que é difícil, mas tu precisas ter atitude correta e estar sempre envolvido com o que está fazendo.

No que precisares de mim, sempre estarei a tua disposição; quero que me mantenhas informado, mas preciso de teu

comprometimento quanto aos resultados da empresa.

— Precisamos garantir que as metas da companhia sejam atingidas nesta região, pois sabes como este setor é

importante para nossa equipe. Tu te comprometes comigo neste aspecto? É claro que sempre que precisares te ausentar

para dar assistência ao seu filho e à sua família estarei à disposição.

Inclusive garantindo atendimento aos clientes através de teus colegas, mas preciso de teu compromisso com os

resultados e foco também nos negócios da empresa, porque nós contamos contigo, Inácio.

— Ok, Pereira, obrigado, sei que a empresa tem me ajudado muito e sei que tenho errado com ela, mas estou

certo de que conseguirei mudar, eu só preciso de teu apoio. – asseverou o vendedor.

— Ok, Inácio, vamos fazer um planejamento para os próximos três meses e buscar uma recuperação na área.

Assim fizeram. Dedicaram o dia seguinte ao planejamento de ações agressivas e campanhas para os clientes. A

preocupação de Pereira era que Inácio tivesse reais condições de chegar aos objetivos de forma consistente e que isso

lhe possibilitasse flexibilidade de tempo, para que ele pudesse atender eventuais necessidades com sua família.

Passados dois meses, no entanto, mesmo com o acompanhamento à distância de Pereira, que conversava com

Inácio frequentemente sobre os negócios e propostas e, é claro, sobre a saúde do filho, os resultados ficaram abaixo do

previsto. Inácio acabou sendo demitido por Pereira, já que este não notou nenhuma melhora nas atitudes de funcionário

em relação ao trabalho e compromisso que haviam firmado.

O filho de Inácio faleceu seis meses após a demissão, sempre assistido pelo plano assistencial da empresa

(Pereira conseguiu que ele mantivesse o plano pelo período em que a criança necessitasse).

Passados dois anos, Pereira e Inácio se encontraram em uma visita desse à região. Durante a conversa, Inácio

agradeceu pela decisão de Pereira, pois ele pôde acompanhar os últimos meses de vida de seu filho estando sempre

presente. Pereira, sensibilizado, agradeceu as palavras de Inácio que lhe tiraram um pouco do peso da decisão mais

difícil que ele havia tomado em sua vida profissional.

QUESTÕES PARA DISCUSSÃO

1. Discuta a responsabilidade de Carlos ao repassar a decisão de análise de um vendedor com problema para uma nova

gerência que começava a atuar na região;

2. Se você estivesse no lugar de Pereira, como teria agido em relação à proposta inicial de Carlos de demitir

imediatamente o vendedor? Não teria Pereira errado ao assumir para si o risco dessa decisão, podendo alegar que a

escolha era de Carlos e que não cabia a ele discutir?

3. Qual seria sua decisão em relação ao vendedor Inácio?

4. Discuta o papel da empresa em relação ao caso apresentado: que ações poderiam ser adotadas?

5. Em relação aos métodos de acompanhamento de vendedores, adotados pela empresa e seu sistema de avaliação de

performance, você acredita que ele foi insuficiente para possibilitar um acompanhamento mais adequado do vendedor e

dos gestores? Que alterações tu proporias?

6. Analise a situação de Inácio em relação à empresa e à forma como ele conduziu este caso.

7. Discuta a atuação de Silas que omitiu em seus relatórios a situação do vendedor Inácio.

Fonte: http://www.espm.br/Publicacoes/CentralDeCases/Documents/DILEMAETICONADEMISSAODEUMVENDEDOR.pdf