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ESTUDO DO ESCOAMENTO ATMOSFÉRICO DE UMA REGIÃO COM OROGRAFIA COMPLEXA VIA ANÁLISE CFD PARA IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROJETO EÓLICO Daniel Agnese Ramos Projeto de Graduação apresentado ao Curso de Engenharia Mecânica, da Escola Politécnica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção de título de Engenheiro. Orientador: Profº. Ph.D. Fernando Pereira Duda Rio de Janeiro Maio de 2016

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ESTUDO DO ESCOAMENTO ATMOSFÉRICO DE UMA REGIÃO COM

OROGRAFIA COMPLEXA VIA ANÁLISE CFD PARA IMPLEMENTAÇÃO DE

UM PROJETO EÓLICO

Daniel Agnese Ramos

Projeto de Graduação apresentado ao

Curso de Engenharia Mecânica, da Escola

Politécnica, Universidade Federal do Rio

de Janeiro, como parte dos requisitos

necessários à obtenção de título de

Engenheiro.

Orientador: Profº. Ph.D. Fernando Pereira

Duda

Rio de Janeiro

Maio de 2016

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ESTUDO DO ESCOAMENTO ATMOSFÉRICO DE UMA REGIÃO COM

OROGRAFIA COMPLEXA VIA ANÁLISE CFD PARA IMPLEMENTAÇÃO DE

UM PROJETO EÓLICO

Daniel Agnese Ramos

PROJETO DE GRADUAÇÃO SUBMETIDO AO CORPO DOCENTE DO CURSO

DE ENGENHARIA MECÂNICA DA ESCOLA POLITÉCNICA DA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO COMO PARTE DOS

REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO GRAU DE

ENGENHEIRO MECÂNICO

Aprovado por:

Prof. Fernando Pereira Duda, Ph.D. (Orientador)

Prof. Daniel Onofre de Almeida Cruz, Ph.D.

Prof. Flávio de Marco Filho, D.Sc.

Vanessa Gonçalves Guedes, D.Sc.

RIO DE JANEIRO, RJ - BRASIL

MAIO DE 2016

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RAMOS, Daniel Agnese.

Estudo do Escoamento Atmosférico de uma Região com Orografia

Complexa via Análise CFD para Implementação de um Projeto Eólico/

Daniel Agnese Ramos - Rio de Janeiro: UFRJ/ Escola Politécnica,

2016.

X 132 p.: il.; 29,7 cm.

Orientador: Fernando Pereira Duda

Projeto de Graduação - UFRJ/ Escola Politécnica/ Curso de

Engenharia Mecânica, 2016

Referências Bibliográficas: p. 113

1. Energia Eólica 2. Escoamento Atmosférico 3. CFD 4.

Otimização I. Fernando Pereira Duda II. Universidade Federal do Rio

de Janeiro, Escola Politécnica, Curso de Engenharia Mecânica III.

Estudo do Escoamento Atmosférico de uma Região com Orografia

Complexa via Análise CFD para Implementação de um Projeto Eólico

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“Este trabalho é dedicado à memória de

Maria da Gloria Cosenza Agnese”

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, por ter me dado saúde durante todo o período

de desenvolvimento desse trabalho.

Agradeço a toda a minha família. Em especial: aos meus pais, Maria Cristina

Cosenza Agnese e Fabio de Oliveira Ramos, que me ensinaram todos os meus valores,

demonstrando a prática do bem acima de qualquer outra questão; à Monica Ramos de

Macedo Soares, que sempre me lembrou da importância da família, mantendo a família

Ramos sempre unida e presente em sua morada; e à minha namorada Luiza Brener

Magalhães, por estar presente na minha vida e ser uma grande parceira nessa jornada.

Agradeço a todos os meus amigos, pois representam a extensão da minha

família. Em especial: aos amigos do surfe – esporte que pratico com todo o afinco e

dedicação –do posto 7 da Barra da Tijuca, por me socorrerem quando me acidentei na

Indonésia; aos amigos da faculdade, por transformarem a jornada da graduação na

Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro em uma tarefa mais

agradável; e aos outros amigos que tive o prazer de conhecer durante a vida, por

trazerem mais leveza ao enfrentamento dos desafios no cotidiano.

Agradeço a todas as pessoas que me ajudaram profissionalmente, cuja ajuda foi

diretamente responsável pelo trabalho desenvolvido. Em especial: ao meu orientador

Fernando Pereira Duda, que além de me orientar nesse projeto também foi meu

orientador acadêmico durante toda a jornada da graduação, auxiliando na tomada de

decisões importantes para o meu futuro profissional; aos pesquisadores do Cepel,

Vanessa Gonçalves Guedes e Sérgio Roberto Ferreira Cordeiro de Melo, que,

primeiramente, também estão inclusos no agradecimento aos amigos e que tiveram a

enorme solidariedade de me ajudar na execução desse trabalho; e a todos os professores

que tive a oportunidade de conhecer durante todo o período da graduação e do ensino

básico e médio.

Por fim, agradeço a todas as empresas que me ajudaram. Em especial: à Natural

Energia, por ter sido o meu primeiro emprego na área de energia eólica e me

proporcionar a oportunidade de conhecer um pouco desse setor fascinante; e ao Cepel,

por ter disponibilizado toda a infraestrutura necessária para a realização desse trabalho.

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Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/ UFRJ como parte

dos requisitos necessários para obtenção do grau de Engenheiro Mecânico.

Estudo do Escoamento Atmosférico de uma Região com Orografia Complexa via

Análise CFD para Implementação de um Projeto Eólico

Daniel Agnese Ramos

Maio de 2016

Orientador: Fernando Pereira Duda

Curso: Engenharia Mecânica

O desenvolvimento de um projeto eólico é uma tarefa multidisciplinar e, por esta razão,

necessita do conhecimento e da integração de várias áreas do saber. Dessa forma, o

trabalho foi idealizado com a intenção de realizar uma revisão bibliográfica da teoria

que embasa a avaliação do potencial eólico de uma região e da criação de uma

metodologia confiável para o desenvolvimento de um projeto eólico em condições de

terreno complexo, visto que essa situação traz uma série de desafios à modelagem.

Palavras-chave: Energia Eólica, Escoamento Atmosférico, CFD, Otimização.

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Abstract of Undergraduate Project presented to Poli/UFRJ as a partial fulfillment of the

requirements for the degree of Mechanical Engineering.

Simulation of Atmospheric Flow over Complex Terrain using CFD tools and

Development of an Eolic Project

Daniel Agnese Ramos

May of 2016

Advisor: Fernando Pereira Duda

Course: Mechanical Engineer

The development of an eolic project is a multidisciplinary task and demands the

knowledge of many fields of science. Thus, this work was idealized to review all the

theory behind the assessment of the wind resource and to create a reliable methodology

to deal with complex terrain situation while developing an eolic project.

Keywords: Eolic Energy, Atmospheric Flow, CFD, Optimization.

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ÍNDICE ANALÍTICO

CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO ...................................................................................... 1

I.1 MOTIVAÇÃO ............................................................................................................... 1

I.2 CONTEXTO ECONÔMICO ................................................................................................ 2

I.3 PRINCÍPIOS BÁSICOS DE AEROGERADORES ......................................................................... 4

I.3.1 História e Configuração Atual ......................................................................... 5

I.3.2 Energia e Potencia Extraída do Vento ............................................................. 8

I.3.3 Fator de Capacidade ..................................................................................... 12

I.4 ESCOLHA DA REGIÃO DE INTERESSE PARA O ESTUDO DE CASO ............................................... 12

CAPÍTULO II – CLIMATOLOGIA ................................................................................ 14

II.1 CIRCULAÇÃO GERAL DA ATMOSFERA .............................................................................. 15

II.1.1 Movimentos verticais ................................................................................... 16

II.1.2 Movimentos horizontais ............................................................................... 17

II.2 EFEITOS DE ESCALA SINÓTICA QUE AFETAM A REGIÃO DE INTERESSE ..................................... 18

II.2.1 Zona de Convergência Intertropical do Atlântico ........................................ 18

II.2.2 Vórtice Ciclônico de Altos Níveis .................................................................. 20

II.2.3 Linhas de Instabilidade ................................................................................. 21

II.2.4 Frentes Frias ................................................................................................. 22

II.2.5 Ondas de Leste ............................................................................................. 22

II.3 EFEITOS DE MESOESCALA QUE AFETAM A REGIÃO DE INTERESSE .......................................... 23

II.3.1 Brisas ............................................................................................................ 24

II.3.1.1 Brisa Marítima/Terrestre .................................................................................... 24

II.3.1.2 Brisa Vale/Montanha ......................................................................................... 25

II.3.2 Complexos Convectivos de Mesoescala ....................................................... 25

II.4 A INFLUÊNCIA DOS OCEANOS E ALGUNS FENÔMENOS ANÔMALOS ........................................ 26

II.4.1 Influência dos oceanos Atlântico e Pacífico na climatologia do NEB .......... 26

II.4.2 Anomalias nas temperaturas da superfície dos oceanos ............................. 26

II.4.2.1 El Niño ................................................................................................................ 27

II.4.2.2 La Niña ................................................................................................................ 28

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II.4.2.3 Dipolo do Atlântico ............................................................................................. 28

CAPÍTULO III – FUNDAMENTOS DA AVALIAÇÃO DO POTENCIAL EÓLICO .................. 29

III.1 TERRENO NO ESCOAMENTO ATMOSFÉRICO ................................................................... 29

III.1.1 Classificação, Obtenção e Tratamento de Dados ....................................... 29

III.1.1.1 Topografia ......................................................................................................... 30

III.1.1.2 Rugosidade do Terreno ..................................................................................... 32

III.1.1.3 Geoprocessamento de Dados ........................................................................... 35

III.1.2 Implicações do Terreno na Modelagem Física ............................................ 36

III.1.2.1 Camada Limite Atmosférica (CLA) ..................................................................... 36

III.1.2.1.1 Perfil Logarítmico ...................................................................................... 39

III.1.2.1.2 Perfil Exponencial ...................................................................................... 41

III.1.2.2 Obstáculos e Esteira .......................................................................................... 43

III.1.2.3 Estabilidade Atmosférica ................................................................................... 45

III.2 MEDIÇÃO E ANÁLISE ESTATÍSTICA DOS DADOS DE VENTO ................................................. 47

III.2.1 Tipos de Dados de Vento ............................................................................. 48

III.2.2 Sensores (Custo, Localização, Calibração e Tecnologias) ........................... 51

III.2.2.1 Localização ........................................................................................................ 51

III.2.2.2 Custos de Medição ............................................................................................ 52

III.2.2.3 Tipos de Sensores .............................................................................................. 52

III.2.2.3.1 Anemômetros ........................................................................................... 53

III.2.2.3.2 Birutas (“Wind Vanes”) ............................................................................. 55

III.2.2.3.3 Termo-higrômetros ................................................................................... 56

III.2.2.3.4 Barômetro ................................................................................................. 56

III.2.2.3.4 Piranômetro .............................................................................................. 57

III.2.2.4 Calibração e Montagem .................................................................................... 58

III.2.3 Análise Estatística dos Dados de Vento ...................................................... 60

III.2.3.1 Intensidade de Turbulência (IT) ......................................................................... 60

III.2.3.2 Distribuição de Weibull ..................................................................................... 61

III.2.3.4 Rosa Setorial de Frequência .............................................................................. 63

III.2.3.5 Correlação e Validação de Dados ...................................................................... 64

III.3 RESTRIÇÕES PARA A IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROJETO EÓLICO ......................................... 65

III.3.1 Restrições Técnicas ...................................................................................... 65

III.3.2 Restrições Ambientais ................................................................................. 68

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III.3.3 Restrições Burocráticas ............................................................................... 68

III.4 MODELAGENS PARA SIMULAÇÃO DO VENTO .................................................................. 68

III.4.1. Modelagem do Software de Simulação do Escoamento via CFD .............. 69

III.4.1.1 Embasamento Teórico ....................................................................................... 69

III.4.1.1.1 Equações Governantes .............................................................................. 70

III.4.1.1.2 Equação da Continuidade ......................................................................... 70

III.4.1.1.3 Equação de Navier-Stokes ......................................................................... 72

III.4.1.1.4 Reynolds Averaged Navier-Stokes Equations (RANS) ................................ 74

III.4.1.2 Modelo de Turbulência - (Parametrização do WindSim) ............................ 75

III.4.2 Modelo de Esteira ....................................................................................... 77

III.4.2.1 Modelo Comprimento de Mistura (AINSLIE, 1986) ........................................... 77

III.4.2.1.1 Modelagem Matemática ........................................................................... 78

III.4.2.1.2 Simplificações à Modelagem Matemática ................................................ 81

III.4.2.2 Metodologia Deep Array ................................................................................... 82

III.4.2.2.1 Aspectos Teóricos da Metodologia Deep Array ........................................ 82

III.4.2.2.2 Acoplamento da Metodologia Deep Array com o Modelo ‘Comprimento

de Mistura’ ................................................................................................................. 86

CAPÍTULO IV – ESTUDO DE CASO ............................................................................ 88

IV.1 MANIPULAÇÃO E OBTENÇÃO DE DADOS DE TERRENO ...................................................... 88

IV.2 OBTENÇÃO E CORRELAÇÃO DOS DADOS DE VENTO ......................................................... 89

IV.2.1 Correlação da Climatologia Local ............................................................... 90

IV.3 SIMULAÇÃO DO ESCOAMENTO ATMOSFÉRICO ................................................................ 92

IV.3.1 Simulação de “Larga Escala” ...................................................................... 92

IV.3.2 Metodologia Nesting .................................................................................. 97

IV.4 DEFINIÇÃO E OTIMIZAÇÃO DO LAYOUT DO PARQUE EÓLICO ............................................ 106

CAPÍTULO V – CONCLUSÃO ................................................................................... 112

CAPÍTULO VI – REFERÊNCIAS ................................................................................. 113

ANEXOS DOS RESULTADOS DO ESTUDO DE CASO ................................................. 115

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CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo a elaboração de uma metodologia

confiável para o estudo do escoamento atmosférico de regiões de terreno complexo e do

consequente desenvolvimento de um projeto eólico em uma cadeia de montanhas,

localizada no estado do Ceará.

Para isso, o trabalho foi realizado com a finalidade de revisar toda a bagagem

teórica referente à avaliação do potencial eólico de uma região e, posteriormente, aplicar

tais conceitos em um estudo de caso, elaborando uma metodologia que pode ser

aplicada na análise de qualquer projeto eólico em terreno complexo.

Em suma, a introdução do trabalho irá contextualizar o desafio apresentado com

o momento econômico atual – e com projeções para até 2040 realizadas pela

International Energy Agency (IEA) –, definir a escolha da área que será estudada e

apresentar os princípios básicos do mecanismo que possibilita a extração de energia do

escoamento dos ventos, o aerogerador.

I.1 Motivação

A crescente demanda por energia elétrica ainda é um problema muito presente

na atualidade e fonte de inspiração para inúmeras soluções de engenharia.

Nas últimas décadas, a exploração de recursos renováveis ou de fluxo foi

gradativamente viabilizada, tanto no que tange à sua geração quanto à sua inserção no

sistema elétrico, e recursos como a radiação solar e a energia dos ventos representam,

atualmente, uma parcela significativa da produção de energia de determinados países -

dentre os quais se destacam Portugal, Alemanha, Noruega e Dinamarca.

No cenário nacional a opção da exploração da energia proveniente dos ventos se

torna ainda mais interessante devido à sua complementaridade com a principal matriz

energética do Brasil, as hidroelétricas, e ao potencial promissor do recurso eólico em

determinadas regiões do país.

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Para usufruir de tal fonte é necessário se assegurar que a qualidade desse recurso

é realmente satisfatória na área a ser explorada, e para isso são necessárias campanhas

de medições de longa duração no local. Entretanto, assim como na exploração dos

recursos tradicionais, como o petróleo e outras commodities, o investimento para todo

esse processo de investigação e certificação da qualidade do prospecto é caro e

demorado, o que torna ainda mais importante escolher bem o lugar que se vai investir

tempo e capital para comprovar a qualidade do vento.

E é nessa conjuntura que estudos preliminares como a modelagem do

escoamento atmosférico utilizando como entrada séries históricas de longo prazo de

reanálise e dados de topografia e rugosidade disponíveis se tornam muito importantes,

uma vez que feita tal análise é possível estimar um provável fator de capacidade

característico da região e determinar se é válido ou não investir na área em questão –

sem a necessidade de investir a priori para determinar tal veredito.

I.2 Contexto Econômico

De acordo com o relatório do ano de 2009 da World Wind Energy Association

(WWEA), a energia eólica era um business com a considerável marca de 50 bilhões de

euros de receita e mais de 550.000 postos de trabalho gerados ao redor do mundo.

Naquele ano, 159,2 GW de potência instalada em parques eólicos estavam ligados na

rede elétrica.

Esse mesmo relatório também demonstrava outro fator interessante para aquela

época, o crescimento da taxa de ampliação da soma da potência instalada em parques

eólicos no mundo. O mercado eólico mundial, que havia crescido 21,3% no ano de

2004, cresceu 31,7% no ano do referido relatório, 2009.

Dessa forma, fica notório que o mercado eólico já era representativo no cenário

mundial – apesar de, se comparado à indústria do petróleo, ser muito menor em valores

absolutos de demanda mundial – daquela época. A situação do mercado de energia

eólica foi impulsionada, principalmente, pela necessidade de alguns países

implementarem um forma de geração de energia elétrica alternativa à baseada em fontes

fósseis, seja por metas de redução de emissão de carbono ou por questões estratégicas

de diversificação das fontes energéticas – vale ressaltar que uma das maiores barreiras

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para a ampliação do uso desse tipo de geração era o desafio de conectar e operar, de

forma à garantir a segurança energética de um sistema elétrico, uma forma de geração

intermitente de energia.

Outro relatório que também foi avaliado nesse trabalho foi o World Energy

Outlook (WEO) da IEA do ano de 2014, contendo previsões para o futuro do mercado

energético mundial – inclusive o mercado eólico. Nesse relatório foram avaliados três

cenários possíveis de incentivo à geração de fontes renováveis: o cenário New Policies,

que considerava medidas mitigadoras da emissão de carbono anunciadas mas ainda não

implementadas pelos países; o cenário Current Policies, que considerava apenas as

medidas mitigadoras da emissão de carbono existentes nos países; e o cenário 450, o

cenário menos realista, que considerava que todos os países adotariam medidas

necessárias para bater a meta mundial de controle do aumento temperatura do planeta.

De acordo com as projeções do WEO para 2040, fica constatado que, em todos

os cenários projetados, a inserção de energias renováveis no sistema – sobretudo a

energia eólica – aumenta em todos os países e blocos econômicos analisados pelo

estudo. A Figura 1 ilustra o investimento acumulado, projetado para o período de 2014

a 2040, dividido por fontes energéticas e expresso em bilhões de dólares de 2013.

Figura 1 - Investimento acumulado mundial no mercado energético (New Policies Scenario – WEO)

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Na Figura 1, é possível notar a significativa parcela de investimentos que é

projetada para energias renováveis nos próximos vinte e cinco anos. Nesse diagrama,

enquanto todas as fontes fósseis acumulam um investimento de 33.111 bilhões de

dólares de 2013, as fontes renováveis – sozinhas – acumulam a quantia de 7.377 bilhões

de dólares de 2013, o que significa que o investimento total projetado para as fontes

renováveis já representaria 23 % do investimento destinado para as fontes fósseis.

Por fim, a última projeção analisada no WEO de 2014 foi a projeção da potência

instalada da soma dos parques eólicos nos países, blocos econômicos e continentes para

o ano de 2040 (Figura 2) – os destaques dessa projeção seriam: a potência instalada na

China, que se aproximaria de 400 GW; e o percentual das eólicas na matriz energética

da União Europeia, que está projetada para representar 20 % da geração de energia.

Figura 2 – Potencia instalada de parques eólicos em 2040 (New Policies Scenario – WEO)

I.3 Princípios Básicos de Aerogeradores

A seguinte seção tem como finalidade apresentar conhecimentos teóricos básicos

em relação à extração da energia do deslocamento de massas de ar, definindo, também,

a configuração de aerogerador utilizada no estudo de caso do projeto – aerogeradores de

eixo horizontal – e o parâmetro mais utilizado para definir a eficiência de um projeto

eólico, o fator de capacidade.

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I.3.1 História e Configuração Atual

O primeiro registro histórico da utilização da energia eólica se dá pela utilização

de cata-ventos, para realizar tarefas como bombeamento de água e moagem de grãos, na

Pérsia antiga, por volta de 200 A.C.. Esse tipo de moinho de eixo vertical veio a se

espalhar pelo mundo islâmico sendo utilizado por vários séculos. Acredita-se que antes

da invenção dos cata-ventos na Pérsia, a China – por volta de 2000 A.C. – e o Império

Babilônico – por volta de 1700 A.C. – também utilizavam cata-ventos rústicos para

irrigação (DUTRA, 2008). A imagem a seguir (Figura 3) ilustra um exemplo de cata-

vento antigo encontrado na província de Razavi Khorasan1 – na imagem ainda é

possível notar a dimensão considerável da máquina, por volta de 15 m, comparando-a

com o tamanho do indivíduo ao lado dela.

Figura 3 - Cata-Vento rústico encontrado no nordeste do Iran

1 Província localizada na região nordeste do Iran.

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Com o avanço da rede elétrica, foram feitas, no início do século XX, várias

pesquisas para o aproveitamento da energia eólica em geração de energia elétrica.

Enquanto os Estados Unidos estavam difundindo o uso de aerogeradores de pequeno

porte nas fazendas e residências rurais isoladas, a Rússia investia na conexão de

aerogeradores de médio e grande porte diretamente na rede.

A França também se empenhou nas pesquisas de aerogeradores conectados à

rede elétrica. Entre 1958 e 1966 foram construídos diversos aerogeradores de grande

porte – entre os principais estavam três aerogeradores de eixo horizontal e três pás, que

é a configuração utilizada comercialmente nos dias atuais. Um dos modelos apresentava

30 m de diâmetro de rotor com potência instalada de 800 kW (DUTRA, 2008).

Dessa forma, durante o período que compreende o século passado, houve uma

evolução significativa da tecnologia agregada à fabricação de aerogeradores de

pequeno, médio e grande porte. A Figura 4 demonstra a mudança da dimensão e da

potência instalada das máquinas de grande porte ao longo das últimas décadas do século

passado até o ano de 2005 – nesse estudo é interessante notar que as projeções para o

ano de 2010 foram alcançadas recentemente, como demonstra o aerogerador Enercon

E-126 do fabricante alemão Enercon (Figura 5), que possui 126 m de diâmetro de rotor

e uma potência instalada de 7,6 MW.

Figura 4 - Evolução dos aerogeradores (fonte: CRESESB)

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Figura 5 - Enercon E-126 (7,6 MW de potência instalada)

Atualmente, tem-se mais de uma solução possível para a configuração de um

aerogerador, mas apenas uma é amplamente utilizada comercialmente – e, por esta

razão, será a única configuração contemplada no trabalho em questão –, os

aerogeradores de eixo horizontal.

A disposição dos equipamentos de um aerogerador de eixo horizontal pode ser

feita de maneiras diferentes, porém as mais comuns são mostradas na figura 6. A

principal diferença entre elas é o tamanho e formato da nacele2, presença ou não de

caixa multiplicadora3 e o tipo de gerador utilizado, podendo esse ser convencional ou

multipolos – que é o caso do aerogerador da Enercon apresentado anteriormente.

2 Nacele é a carcaça montada sobre a torre, onde se situam o gerador, a caixa de engrenagens (quando

necessária), todo sistema de controle, medição do vento e motores para rotação do sistema para o melhor posicionamento em relação ao vento. 3 A caixa multiplicadora transmite a energia mecânica entregue pelo rotor para o gerador.

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Figura 6 - Diferentes tipos de arranjo em um aerogerador de eixo horizontal (fonte: CRESESB)

I.3.2 Energia e Potencia Extraída do Vento

A energia no vento é proveniente de seu movimento, logo, as pás da turbina

extraem parte da energia cinética ( ) presente na massa de ar que atravessa a turbina. A

energia cinética é dada pela equação abaixo (eq. 1.1).

(1.1)

onde: é a massa de ar que atravessa a turbina [kg]; e é a velocidade do vento [m/s].

Considerando a mesma massa de ar em movimento a uma velocidade ,

perpendicular a uma sessão transversal de um cilindro imaginário (Figura 7), pode-se

demonstrar que a potência disponível no vento ( ) que passa pela seção , transversal

ao fluxo de ar, é dada por:

(1.2)

onde: é a massa específica do ar [kg/m3]; e é a área da seção transversal [m

2].

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Figura 7 - Fluxo de vento através da turbina (fonte: CRESESB)

A potência disponível no vento não pode ser totalmente aproveitada pelo

aerogerador na conversão de energia elétrica. Para levar em conta esta característica

física, é introduzido um índice denominado coeficiente de potência , que pode ser

definido como a fração da potência eólica disponível que é extraída pelas pás do rotor.

Em cálculos feitos pelo físico alemão Albert Betz4, a seguinte equação (eq. 1.3) foi

obtida para o coeficiente de potência:

(1.3)

onde: representa a velocidade do vento na região anterior às pás [m/s]; a

velocidade do vento no nível das pás [m/s]; e a velocidade no vento após deixar as

pás [m/s] – que podem ser vistos esquematicamente na Figura 8.

4 Alber Betz (1885-1968), físico alemão. Foi um pioneiro no desenvolvimento do aerogerador moderno.

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Figura 8 - Perdas de velocidade do vento ao passar pelas pás da turbina (fonte: CRESESB)

É possível plotar a curva do coeficiente de potência em relação à razão de

velocidades

, esse gráfico pode ser visto na Figura 9.

Figura 9 - Distribuição do coeficiente de pressão (fonte: CRESESB)

É possível então achar um valor máximo para o coeficiente de pressão, chamado

de Coeficiente de Betz ( ), dado por (eq. 1.4):

(1.4)

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11

Também é preciso levar em conta a eficiência da máquina eólica, dada por ,

logo, a potência aproveitada do vento é dada por (eq. 1.5):

(1.5)

Dessa forma, uma conclusão pertinente na temática “energia e potência extraída

do vento”, é que a velocidade do vento é um parâmetro de alta sensibilidade da variável

potência do aerogerador – a potência varia com o cubo da velocidade do vento.

Por fim, é possível traçar curvas de potência teóricas para cada modelo de

aerogerador. Tais curvas dependem da configuração do gerador utilizado, dos

parâmetros de controle da máquina – velocidades de cut-in5 e cut-out

6 –, da eficiência

eletromecânica da turbina eólica e da velocidade do vento incidente e determinam a

potência despachada pelo aerogerador. A validação das curvas teóricas é realizada por

testes em campo, seguindo a norma IEC 61400-12. A Figura 10 demonstra uma curva

de potência de uma máquina com cut-in de 3,5 m/s e cut-out de 25 m/s.

Figura 10 - Curva de potência de um aerogerador convencional

5 Velocidade do vento incidente a partir da qual o aerogerador entra em operação.

6 Velocidade do vento incidente a partir da qual o aerogerador para sua operação.

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12

I.3.3 Fator de Capacidade

O fator de capacidade é uma taxa percentual que exprime a relação entre a

energia elétrica gerada e a sua capacidade nominal de produção. Considerando o

período de um ano padrão – 365 dias ou 8760 horas –, tem-se que a energia anual

gerada (EAG) em kWh é expressa pela fórmula a seguir (eq. 1.6):

(1.6)

onde: é a frequência percentual de ocorrência da velocidade do vento [%]; e

é a potência produzida pela turbina na velocidade do vento [kW].

Dessa forma, pode-se expressar o fator de capacidade ( ) de um modelo de

turbina eólico pela equação 1.7:

(1.7)

onde: é a potência nominal do vento [kW].

Por fim, também é válido resaltar que o fator de capacidade não é a eficiência da

máquina – apesar de ser um parâmetro muito utilizado para medir a eficiência de um

parque eólico – e, por conseguinte, não se limita a um coeficiente máximo teórico,

podendo registrar valores superiores ao coeficiente de Betz – o fator de capacidade

mede a eficiência de operação de uma turbina eólica em relação à máxima energia que

ela poderia gerar no período de um ano.

I.4 Escolha da região de interesse para o estudo de caso

A escolha da área de interesse é um tópico fundamental para a elaboração de

todo o trabalho que vem a seguir. Como já fora antecipado, existiam duas condições que

guiaram a definição dessa escolha: a condição de um terreno com orografia acidentada e

a localidade dessa região, que deveria ser dentro dos limites do estado do Ceará.

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13

A razão pela qual essas duas condições foram adotadas como referência é

devido, primeiramente, a desafiante tarefa de descrever o escoamento atmosférico sob

uma cadeia de montanhas e a condição climatológica do estado do Ceará – trabalhada

no capítulo II do presente trabalho – que é determinante na boa qualidade do vento da

região. Desse modo, foram mapeadas cadeias de montanhas no estado do Ceará com

potencial adequado para a realização do estudo, utilizando dados da base de

sensoriamento remoto disponível: o atlas eólico do estado do Ceará e o sistema de

informações georreferenciadas do setor elétrico (SIGEL).

Após essa etapa de determinação de hot spots7, foi escolhida a localidade final

do projeto (Figura 11) guiada pelos seguintes parâmetros limitantes: a oferta de dados

de vento observado próximos a região de interesse; a não existência de áreas de

influências de aeroportos e de projetos eólicos já outorgados; a existência de

propriedades privadas com regularização fundiária em dia; e a proximidade com linhas

de transmissão do sistema interligado nacional com capacidade de atender a demanda de

energia despachada pelo projeto – essa dinâmica será melhor descrita na seção do

capítulo III que trata do estudo das restrições.

Figura 11 - Área de interesse para o estudo do projeto (fonte: Google Earth Pro)

7 Hot spots são lugares associados a condições favoráveis dentro de um critério de avaliação.

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14

CAPÍTULO II – CLIMATOLOGIA

Os diferentes fenômenos meteorológicos que ocorrem na atmosfera do planeta

possuem dimensões espaço/temporais típicas. Tais fenômenos podem ser descritos por

quatro escalas espaço/temporais distintas: a microescala com dimensões espaciais

inferiores a 1 km e duração temporal inferior à uma hora; a mesoescala com dimensões

espaciais na faixa de 1 km a 100 km e duração temporal superior a uma hora e inferior a

um dia; a escala sinótica com dimensões espaciais na faixa de 100 km a 2000 km e

duração temporal da ordem de semanas ou até meses; e a escala global com dimensões

espaciais superiores a 2000 km e duração temporal da ordem de meses.

O impacto mais significativo que a análise das diferentes escalas atmosféricas

gera nos estudos climatológicos é a determinação da resolução espacial e temporal de

certa amostra de dados – sejam eles de pressão, temperatura ou qualquer outra grandeza

– necessária para o estudo de um determinado fenômeno meteorológico. A Figura 12

ilustra as diferentes dimensões das escalas citadas.

Figura 12 – Diferentes Escalas dos Fenômenos Atmosféricos.

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15

Para uma melhor compreensão do recurso eólico de uma determinada região é

necessário entender o clima local, tanto a influência de efeitos de escala sinótica quanto

os de microescala.

O clima é definido como a média das condições do tempo ao longo de um

período de algumas décadas e está diretamente relacionado com a dinâmica dos fluidos

presentes na atmosfera ˗ o ar e a água.

Por outro lado, as diferentes escalas dos fenômenos que influenciam na

climatologia tratam desde os efeitos locais que afetam o clima de uma região – micro e

mesoescala –, tais como a brisa marítima/terrestre e a brisa vale/montanha, até os

fenômenos globais que influenciam nesse clima – escalas sinótica e global –, tais como

ciclones, anticiclones e frentes frias.

A dinâmica dos fenômenos climatológicos será brevemente descrita neste

capítulo. Contudo, será empregado um foco especial para os efeitos que caracterizam o

clima e, por conseguinte, o recurso eólico da região estudada no projeto.

II.1 Circulação geral da atmosfera

O Sol não aquece o planeta de forma homogênea e proporciona a formação de

gradientes térmicos que impulsionam o deslocamento dos fluidos na atmosfera.

O aquecimento diferenciado da superfície terrestre ocorre pela inclinação dos

raios solares incidentes. Quanto mais próximos de uma incidência vertical, maior a taxa

de aquecimento da superfície. Devido à inclinação do eixo de rotação da Terra com

relação ao plano da órbita, os raios solares incidem, ao meio-dia, muito próximo da

vertical nas regiões tropicais e quase na tangente nas proximidades dos polos.

Quando o Sol está na vertical, os raios solares chegam perpendicularmente à

superfície que recebe a máxima quantidade de energia. Para outras inclinações a mesma

energia é repartida por uma área maior, resultando em um valor menor de energia

incidente por segundo por metro quadrado. A Figura 13 ilustra esse fenômeno.

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16

Figura 13 - Variação Angular da Incidência de Raios Solares. (Figura adaptada de Tempo e Clima

no Brasil/ Iracema F. A. Cavalcanti)

Dessa forma, a região tropical possui um excesso de energia, ao passo que as

regiões polares possuem um déficit de energia, e o deslocamento dos fluidos presentes

na atmosfera, previamente descrito nessa seção, atua no sentido de redistribuir o calor

das regiões com excesso de energia para as regiões com déficit.

A maneira como a atmosfera realiza essa redistribuição se dá por meio de

movimentos horizontais – os ventos geostróficos8 – e de movimentos verticais.

II.1.1 Movimentos verticais

O excesso de energia nos trópicos, especificamente nas regiões equatoriais, faz o

ar aquecido se elevar. O ar que sobe nas proximidades do equador desce nos

subtrópicos, por meio de uma célula de circulação denominada célula de Hadley. Nessas

regiões onde o ar desce – a aproximadamente 30 graus de latitude norte e sul –,

definem-se os sistemas de alta pressão subtropical.

Por outro lado, do encontro entre as massas frias e massas quentes, no cinturão

de baixas pressões – localizado a aproximadamente 60 graus de latitude norte e sul –,

ocorre o levantamento do ar que vai descer nos subtrópicos e polos. Dessa forma, ficam

definidas três células de circulação vertical, que recebem os nomes de célula de Hadley,

célula de Ferrell – ou célula de latitudes médias – e célula polar. Essa dinâmica é

ilustrada na figura abaixo (Figura 14).

8 Ventos geostróficos: vento horizontal, não acelerado que sopra ao longo de trajetórias retilíneas.

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Figura 14 - Esquema da Circulação Geral da Atmosfera (Figura adaptada de Tempo e Clima no

Brasil/ Iracema F. A. Cavalcanti)

II.1.2 Movimentos horizontais

Até o momento não foram considerados no estudo da circulação geral da

atmosfera os efeitos da rotação da Terra em torno de seu próprio eixo. Ao

acrescentarmos a influência dos movimentos do planeta nessa análise, viabilizamos a

existência de movimentos horizontais na dinâmica da circulação atmosférica.

O efeito mais importante na dinâmica dos movimentos horizontais é o Efeito

Coriolis9, que é a tendência que qualquer corpo em movimento sobre a superfície

terrestre tem de mudar sua trajetória devido à rotação da Terra. Tal tendência pode ser

modelada pela descrição de vetores velocidade e aceleração para um referencial não-

inercial em rotação, quando observados de um referencial inercial fixo.

Portanto, a massa de ar que caminha de uma zona de alta pressão para uma zona

de baixa pressão, nos níveis inferiores das células de recirculação vertical, não segue

9 Gaspard-Gustave Coriolis (1792-1843), matemático francês. É conhecido principalmente pelo teorema

da mecânica que leva seu nome e pela força inercial de Coriolis.

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uma trajetória retilínea na vertical. O que origina os ventos alísios de nordeste no

Hemisfério Norte e de sudeste no Hemisfério Sul, que convergem na Zona de

Convergência Inter Tropical (ZCIT). A Figura 15 ilustra a formação dos alísios devido

ao Efeito Coriolis e a formação da ZCIT.

Figura 15 - Efeito Coriolis (Figura adaptada de Tempo e Clima no Brasil/ Iracema F. A.

Cavalcanti)

II.2 Efeitos de escala sinótica que afetam a região de interesse

Assim como descrito na introdução do trabalho, a região de interesse para este

projeto é a região nordeste do Brasil (NE). Portanto, os sistemas meteorológicos que

serão brevemente abordados nessa seção estão diretamente relacionados com a

climatologia e o regime de ventos da região nordeste brasileira.

II.2.1 Zona de Convergência Intertropical do Atlântico

A Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) é considerada o sistema mais

importante gerador de precipitação sobre a região equatorial dos oceanos Atlântico,

Pacífico e Índico, assim como sobre áreas continentais adjacentes. Na escala planetária,

a ZCIT está localizada no ramo ascendente da célula de Hadley, atuando no sentido de

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transferir calor e umidade dos níveis inferiores da atmosfera das regiões tropicais para

os níveis superiores da troposfera e para médias e altas latitudes.

A ZCIT é formada principalmente pela confluência dos ventos alísios do

hemisfério norte com os ventos alísios do hemisfério sul - assim como já fora

demonstrado na seção anterior que tratava da circulação geral da atmosfera - nas

condições de: baixas pressões, altas temperaturas da superfície do mar e intensa

atividade convectiva. Esse sistema é visualizado em imagens de satélite como uma

banda de nuvens convectivas que se estende em uma faixa ao longo da região

equatorial, como ilustra a figura abaixo (Figura 16).

Figura 16 - Imagens do satélite GOES da Zona de Convergência Inter Tropical (ZCIT)

Considerando a região do Atlântico Equatorial, a ZCIT migra sazonalmente, em

anos considerados normais, de sua posição mais ao norte (em torno de 14ºN), durante

agosto-setembro, para sua posição mais ao sul (em torno de 2ºS), durante abril-março.

Essa migração sazonal da ZCIT tem papel importante na determinação da estação

chuvosa na região norte do NE.

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Imagens de satélite foram utilizadas por Citeau et al. (1985, 1988a, 1988b) e

Uvo (1989) para identificar a banda máxima de cobertura de nuvens como

representativa da ZCIT. Para tais autores, essa permanência por um período prolongado

da ZCIT em suas posições mais ao norte ou mais ao sul que determina a qualidade da

estação chuvosa de regiões como o Sahel10

, a costa noroeste da África e o norte do

Nordeste do Brasil (NEB). No norte do NE, se a ZCIT somente iniciar a sua migração

para o norte em fins de abril e início de maio, as chuvas provavelmente serão

abundantes.

II.2.2 Vórtice Ciclônico de Altos Níveis

Os Vórtices Ciclônicos de Altos Níveis (VCANs) são sistemas meteorológicos

caracterizados por centros de pressão relativamente baixos que se originam na alta

troposfera e se estendem até os níveis médios, dependendo da instabilidade atmosférica.

Eles se desprendem do escoamento atmosférico associado, são quase estacionários, mas

podem se deslocar lentamente tanto para leste quanto para oeste, e também se

caracterizam por um tempo de vida de vários dias.

Os VCANs que penetram na região Nordeste do Brasil formam-se no oceano

Atlântico, principalmente entre os meses de novembro e março, e sua trajetória

normalmente é de leste para oeste. O tempo de vida desses sistemas que atuam no NEB

varia em média, entre 4 a 11 dias. Os efeitos desse sistema sobre a precipitação no

Nordeste do Brasil são bastante evidentes, principalmente quando os VCANs se

originam no continente.

Na periferia dos VCANs há formação de nuvens causadoras de chuva e no

centro há movimentos de ar de cima para baixo (subsidência), aumentando a pressão e

inibindo a formação de nuvens. A Figura 17 ilustra essa dinâmica.

10

Sahel é uma faixa territorial de 500 km a 700 km de largura e 5.400 km de extensão, situada na África

Subsaariana.

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21

Figura 17 - Imagem do Satélite GOES-13 com formação do VCAN próximo ao Recôncavo Baiano

II.2.3 Linhas de Instabilidade

As Linhas de Instabilidade (LI) são bandas de nuvens causadoras de chuva

organizadas em forma de linha – essa é a razão pela qual são nomeadas Linhas de

Instabilidade. Sua formação se dá basicamente pelo fato de que com a grande

quantidade de radiação solar incidente sobre a região tropical ocorre o desenvolvimento

de nuvens com consequentes chuvas. Outro fator que contribui para o incremento das LI

é a proximidade com ZCIT.

Também é válido ressaltar que a convecção profunda nos trópicos tem um papel

fundamental na circulação global e energética da atmosfera tropical, por meio da

extração de calor da camada limite planetária – o conceito de camada limite será melhor

explicado no capítulo de avaliação do potencial eólico –, o qual é redistribuído na alta

troposfera. Assim, essas LIs constituem um dos sistemas mais importantes no transporte

de calor para a alta troposfera.

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II.2.4 Frentes Frias

Outro importante mecanismo causador de chuva no NE está ligado à penetração

de frentes frias até as latitudes tropicais entre os meses de novembro a janeiro.

As frentes frias são bandas de nuvens organizadas que se formam na região de

confluência entre uma massa de ar frio, mais densa, com uma massa de ar quente menos

densa. A massa de ar frio penetra por baixo da massa de ar quente, como uma cunha, e

faz com que o ar quente e úmido suba, forme as nuvens e, consequentemente, as chuvas.

A imagem abaixo (Figura 18) ilustra essa dinâmica.

Figura 18 - Diagrama esquemático de formação de Frentes Frias

II.2.5 Ondas de Leste

As Ondas de Leste se formam no campo de pressão atmosférica, na faixa

tropical do globo terrestre, na área de influência dos ventos alísios, e se deslocam de

oeste para leste, ou seja, desde a costa oeste da África até o litoral leste do Brasil.

Este fenômeno provoca chuvas principalmente na Zona da Mata que se estende

desde o Recôncavo Baiano até o litoral do Rio Grande do Norte, mas, quando as

condições oceânicas e atmosféricas estão favoráveis, as ondas de Ondas de Leste

também provocam chuvas no estado do Ceará nos meses de junho a agosto,

principalmente na parte centro-norte do estado. A Figura 19 ilustra esse fenômeno.

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Figura 19 - Imagem do Satélite GOES-13 com formação das Ondas de Leste bem definida

II.3 Efeitos de mesoescala que afetam a região de interesse

Traçando um paralelo com a seção anterior, essa seção irá descrever brevemente

alguns fenômenos de mesoescala que afetam a climatologia e o regime de ventos do

NEB.

A escala dos fenômenos estudados nessa seção – a mesoescala – caracteriza

alguns efeitos locais que não encontram definição quando a escala utilizada é a escala

sinótica ou a escala global. Logo, fenômenos presentes na escala em questão são de

suma importância para a caracterização do microclima de um sistema e, por

conseguinte, fundamentais na análise de um terreno de orografia11

complexa.

11

A orografia é a parte da geografia física que se dedica à descrição de montanhas. Através das suas

representações cartográficas, é possível visualizar e estudar o relevo de uma região.

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II.3.1 Brisas

A proximidade com o mar e a altitude local são dois controladores muito

importantes do clima local denominados, respectivamente, brisa marítima/terrestre e

brisa vale/montanha.

II.3.1.1 Brisa Marítima/Terrestre

A brisa terrestre ocorre durante a noite, quando a terra se resfria mais

rapidamente do que o oceano. Este, por ter capacidade calorífica maior que a da terra

demora mais que a superfície terrestre tanto a se aquecer quanto a se resfriar. Dessa

forma, o gradiente de pressão formado pela diferença de temperatura do ar que está

sobre a terra e do ar que está sobre o mar gera um deslocamento da massa de ar da terra

para o mar.

Por outro lado, durante o período do dia observa-se exatamente o oposto, e a

brisa marítima sopra do mar para a terra. Tal dinâmica é demonstrada na Figura abaixo

(Figura 20).

Figura 20 - Diagrama esquemático da dinâmica da brisa marítima

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II.3.1.2 Brisa Vale/Montanha

Em regiões altas, durante a noite, o ar se resfria mais do que nos vales. O ar frio

é mais denso e flui para os vales formando a brisa de montanha, também conhecida

como fluxo catabático.

Assim como na brisa marítima/terrestre, ocorre uma inversão no período diurno

para a brisa vale/montanha. Durante o dia, o sol aquece as encostas com face para leste

antes de aquecer os vales, gerando a brisa de vale para montanha (Figura 21).

Figura 21 - Diagrama esquemático da dinâmica da brisa vale/montanha

II.3.2 Complexos Convectivos de Mesoescala

Os Complexos Convectivos de Mesoescala (CCMs) são aglomerados de nuvens

que se formam devido às condições locais favoráveis como temperatura, relevo,

pressão, etc., e provocam chuvas fortes e de curta duração, normalmente acompanhadas

de fortes rajadas de vento.

Normalmente chuvas associadas a esse fenômeno meteorológico ocorrem de

forma isolada. Os CCMs, na região subtropical, ocorrem preferencialmente durante os

meses de primavera e de verão do hemisfério sul, formando-se no período noturno com

um ciclo de vida entre 10 e 20 horas.

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II.4 A influência dos oceanos e alguns fenômenos anômalos

A última seção desse capítulo visa tanto descrever – novamente de forma breve

– fenômenos anômalos que interferem na climatologia do nordeste brasileiro (NEB),

quanto organizar o conceito da influência que os oceanos exercem no clima, uma vez

que vários fenômenos já descritos anteriormente – tanto de escala sinótica quanto de

mesoescala – possuíam relação direta ou indireta com os oceanos, principalmente com a

temperatura superficial média (TSM) dos oceanos.

II.4.1 Influência dos oceanos Atlântico e Pacífico na climatologia do NEB

Retomando um pouco do que já foi dito previamente nesse capítulo, a

temperatura superficial dos oceanos é de extrema importância para o comportamento da

maioria dos mecanismos meteorológicos já descritos até então.

O posicionamento da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) é influenciado

principalmente pelo perfil norte-sul da TSM no Atlântico Tropical e a região de máxima

cobertura de nuvens localiza-se sobre ou muito próxima à região de águas superficiais

mais quentes (et al. Pike 1971).

O trabalho de Hanstenrath (1978), além de associar alterações no período

chuvoso no estado do Ceará com variações nas TSM do Atlântico Sul e Norte, também

observou influências das variações na TSM do Pacífico Leste no referido clima.

II.4.2 Anomalias nas temperaturas da superfície dos oceanos

Assim como descrito na subseção anterior, os sistemas meteorológicos que

configuram a climatologia de uma determinada região – no caso o nordeste brasileiro –

sofrem forte influência da TSM dos oceanos próximos a eles.

Dessa forma, fica mais que demonstrado que alterações nos valores históricos da

temperatura média dos oceanos (TSM) podem afetar o período chuvoso e o regime de

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vento dessa tal região. A Figura 22 mostra a anomalia da TSM do Pacífico Tropical

para o período que vai de 13/10/2015 até 20/10/2015.

Figura 22 - TSM anômala do Pacífico Tropical (fonte: INPE)

Entretanto, mesmo possuindo esse caráter aleatório, tais anomalias possuem uma

certa repetibilidade na história. Fato que permitiu agrupar e classificar certas

ocorrências dessas anomalias e, por conseguinte, nomear tais fenômenos anômalos.

II.4.2.1 El Niño

El Niño é um fenômeno atmosférico-oceânico caracterizado por um

aquecimento anormal das águas superficiais no oceano Pacífico Tropical, e que pode

afetar o clima regional e global, mudando os padrões de vento a nível mundial, e

afetando assim, os regimes de chuva em regiões tropicais e de latitudes médias.

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II.4.2.2 La Niña

La Niña representa um fenômeno oceânico-atmosférico com características

opostas ao EL Niño, e que se caracteriza por um esfriamento anormal nas águas

superficiais do Oceano Pacífico Tropical. Alguns dos impactos do La Niña tendem a ser

opostos aos de El Niño, mas nem sempre uma região afetada pelo El Niño apresenta

impactos significativos no tempo e clima devido à La Niña.

II.4.2.3 Dipolo do Atlântico

O Dipolo do Atlântico também é um fenômeno oceânico-atmosférico e consiste

na diferença entre a anomalia da Temperatura da Superfície do Mar-TSM na Bacia do

Oceano Atlântico Norte e Oceano Atlântico Sul.

O dipolo positivo do Atlântico quando ocorre em conjunto com o fenômeno El

Niño, dependendo de sua intensidade, é responsável por anos considerados secos ou

muito secos na região do nordeste brasileiro (NEB). A tabela abaixo (Tabela 1) ilustra a

influência dessas três anomalias nos anos de 1995 a 2003 no clima do NEB.

Tabela 1 - Influencia dos fenômenos anômalos no clima do NEB

Ano El Niño La Niña Dipolo do Atlântico

Classificação Climática (ano foi considerado)

1995 Moderado - Negativo Chuvoso

1996 - Fraca Positivo Normal a Chuvoso

1997 Neutro Neutra Positivo Seco

1998 Forte - Positivo Muito Seco

1999 - Forte Negativo Normal

2000 - Moderada Negativo Normal

2001 - Moderada Neutro Normal a Seco

2002 Fraco - Negativo Normal

2003 Neutro Neutra Negativo Normal

Fonte: FUNCEME e INPE/CPTEC

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CAPÍTULO III – FUNDAMENTOS DA AVALIAÇÃO DO POTENCIAL

EÓLICO

Assim como tratado na introdução do trabalho, é de suma importância para o

desenvolvimento de um bom projeto eólico a avaliação correta do potencial da região de

interesse, não só do vento propriamente dito, mas de todas as variáveis que influenciam

no desenvolvimento de um projeto de geração eólica.

Dentre os principais parâmetros avaliados na análise do potencial eólico de uma

região, se destacam: a avaliação do terreno – mapeamento da topografia e da rugosidade

do local –, a campanha de medição do vento da região, o estudo de todas as restrições

do projeto e, por fim, a modelagem do escoamento atmosférico e estimativa da

produção energética do parque eólico.

III.1 Terreno no Escoamento Atmosférico

O relevo, sobre o qual um projeto eólico é desenvolvido, influi diretamente no

regime dos ventos atuante na região e, também, determina algumas restrições físicas

para o projeto – a inclinação do terreno pode ser responsável por inviabilizar a

instalação de um aerogerador em um determinado ponto.

Essa seção, do presente capítulo, tem como objetivo tratar, brevemente, todos os

aspectos abordados na análise de um terreno quando o projeto eólico está em fase de

desenvolvimento.

III.1.1 Classificação, Obtenção e Tratamento de Dados

Primeiramente, é fundamental definir os parâmetros necessários para o estudo do

terreno – classificando-os quanto a suas características básicas – e descrever as

ferramentas e metodologias utilizadas para o seu tratamento.

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Seguindo uma ordem lógica, essa subseção tratará os dois parâmetros

necessários para a avaliação do terreno – a topografia e a rugosidade – e descreverá uma

metodologia de tratamento desses dados utilizando ferramentas de geoprocessamento.

III.1.1.1 Topografia

A palavra "Topografia" deriva das palavras gregas "topos" (lugar) e "graphen"

(descrever), o que significa, a descrição exata e minuciosa de um lugar. Sua finalidade é

determinar o contorno, dimensão e posição relativa de uma porção limitada da

superfície terrestre, do fundo dos mares ou do interior de minas, desconsiderando a

curvatura resultante da esfericidade da Terra. Compete ainda à Topografia, a locação,

no terreno, de projetos elaborados de Engenharia. (DOMINGUES, 1979).

Assim como antecipa a definição acima, a topografia é um parâmetro que

precisa ser considerado em projetos de engenharia. No caso de um projeto eólico, dados

do terreno, referentes à topografia, são utilizados como condição de contorno para os

modelos que calculam o escoamento do vento para a região do projeto e, também,

determinam possíveis restrições para o posicionamento dos aerogeradores dentro do

projeto.

Dados topográficos podem ser matriciais (raster12

), triangulares (Triangulated

Irregular Networks13

- TIN) ou vetoriais (feição14

). Cada forma de representação citada

associa valores de altitude a uma coordenada do globo terrestre, usando técnicas

diferentes. As imagens a seguir ilustram as formas existentes de dados topográficos

(Figura 23) e sua visualização em três dimensões (Figura 24).

12

O formato matricial é baseado numa estrutura de grade de células (matriz). Pelo fato do valor ou código de uma célula representar todas as feições dentro de uma grade, este não mantém corretos o tamanho, a forma ou a localização, para feições individuais. 13

A grade triangular é uma estrutura topológica vetorial do tipo arco-nó formando recortes triangulares do espaço. A grade de um arquivo TIN é formada por conexão entre amostras do fenômeno, utilizando a triangulação de Delaunay. 14

Por definição, vetores são elementos de dados que permitem descrever posição e direção. Em SIG (Sistemas de Informações Geográficas), um vetor é a representação gráfica de feições como mapa, sem o efeito de generalização de uma grade matricial.

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31

Figura 23 – Tipos Existentes de Dados Topográficos para uma Mesma Área (gerados no ArcGIS)

Figura 24 - Visualização 3D dos Dados Topográficos (gerado no Global Mapper)

Na Figura 23 há quatro representações do mesmo terreno: representação do tipo

TIN (1); o raster da elevação (2); o mapa vetorial com as curvas de nível do terreno (3)

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e as quatro representações sobrepostas (4). Na Figura 24 verifica-se a visualização em

três dimensões dos dados topográficos da mesma região abordada na Figura 23,

evidenciando, apenas, a visualização do arquivo matricial (raster) sobreposto ao arquivo

vetorial (curvas de nível).

Por fim, quanto à forma de obtenção de dados topográficos, existem duas

vertentes possíveis, o sensoriamento remoto e as medições em campo. Ambas as

técnicas, apesar de distintas, podem atuar de forma complementar, isto é, pode-se usar o

sensoriamento remoto como forma de estudo prévio e as medições em campo como

uma maneira de detalhar os resultados e mitigar algumas incertezas do estudo do

projeto.

Uma forma viável de realizar as medições via sensoriamento remoto é pela

utilização de sistemas de satélite. As radiações do espectro visível e do infravermelho

podem ser registradas pelos sistemas passivos de sensoriamento remoto com métodos

fotográficos, de vídeo e de varredura (scanners). Esses sistemas registram a radiação

eletromagnética que é refletida ou emitida pelos alvos terrestres, mapeando os valores

de altimetria na resolução de medição do satélite.

A outra forma de levantamento de dados topográficos é a própria medição em

campo. Esta operação só pode ser realizada por um topógrafo qualificado de acordo

com a norma NBR 13133 da Associação Brasileira de Normas e Técnicas (ABNT).

III.1.1.2 Rugosidade do Terreno

A rugosidade descreve a força com que superfície atua como sumidouro de

momentum, absorvendo o impacto dos ventos. Dois parâmetros são utilizados para

descrever esse efeito: o comprimento da rugosidade (z0) – amplamente utilizado nos

estudos de potencial eólico – e o coeficiente de arrasto (CD). O parâmetro z0 é

independente da altura, enquanto CD é função da altura de referência (SHAW;

PEREIRA, 1982; WIERINGA, 1993).

Dos dois parâmetros citados acima, o que possui ampla utilização no estudo e no

desenvolvimento de projetos eólicos é o comprimento de rugosidade (z0).

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33

Algebricamente, z0 é apenas uma constante de integração do perfil vertical de

velocidade horizontal do vento (eq. 3.1) acima de uma superfície com obstáculos de

porte alto e sob condições adiabáticas (MONIN; YAGLOM, 1971). Assim z0 é a altura

na qual a velocidade horizontal do vento tende a zero, ou seja, é o limite inferior de

validade do perfil médio. A equação 3.1 correlaciona a velocidade horizontal média do

vento (Uz) à altura z com o comprimento de rugosidade (z0).

(3.1)

onde: k(=0,40) é a constante de von Kármán; é a velocidade de fricção [m/s] (eq.

3.2); é o limite superior da subcamada atmosférica rugosa (SCR) [m]; e d é o

deslocamento do plano zero [m] – d é um escalar empírico para compensar o

deslocamento vertical da dissipação de momentum pela superfície com obstáculos.

(3.2)

onde: é a tensão de cisalhamento na superfície do solo [N/m²]; é a massa

específica do ar [kg/m³].

Analogamente à topografia, os dados de rugosidade de um terreno também são

expressos em formatos específicos, podendo ser obtidos via sensoriamento remoto ou

medições em campo – as visitas em campo também são usadas para a validação de

dados de sensoriamento remoto.

Os dados de rugosidade são geralmente matriciais (raster), mas, em algumas

aplicações, também podem ser expressos como dados vetoriais (feições, polígonos de

rugosidade ou polylines). A imagem a seguir (Figura 25) ilustra um raster de

rugosidade da região nordeste do Brasil, obtido via processo de sensoriamento remoto

(fonte: European Space Agency – ESA) à uma resolução de 300 m.

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Figura 25 - Raster de Rugosidade do Nordeste Brasileiro (fonte: banco de dados do Meteodyn)

Assim como já fora citado, as técnicas de obtenção de dados de rugosidade são,

de certa forma, similares às técnicas de aquisição de dados topográficos, salvo algumas

particularidades.

Em relação à obtenção de dados via imagens de satélite, metodologia mais

comum no sensoriamento remoto, utiliza-se uma tabela de conversão que atribui um

valor de comprimento de rugosidade (z0) para cada padrão de cor, associado a um tipo

diferente de uso do solo, da imagem retirada por satélite – esse processo de classificação

é feito após o tratamento da imagem bruta retirada do satélite, isto é, é necessário

primeiro segmentar a imagem bruta em padrões de cor. A Tabela 2 demonstra uma

tabela de conversão de rugosidade possível, utilizada pela empresa AWS Truepower –

empresa desenvolvedora do software OpenWind, um dos aplicativos usados no estudo

de caso desse projeto.

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35

Tabela 2 - Faixa de Valores de Comprimento de Rugosidade (z0) por Tipos de Uso do Solo

Tipo de Uso do Solo Faixa de Valores de Z0 (m)

Água 0,001

Área Urbana 0,3 – 0,75

Floresta 0,9 – 1,125

Área Alagada 0,15 – 0,66

Mata Arbórea Arbustiva 0,1 – 0,2

Mata Antropizada 0,03 – 0,07

Fonte: AWS Truepower

Por fim, as visitas in loco – metodologia mais acurada de obtenção de dados de

rugosidade do terreno – devem ser realizadas por profissionais habilitados a classificar

os diferentes tipos de vegetação e uso do solo (engenheiros ambientais, geólogos e etc.).

Uma vez mapeados todos os diferentes tipos de uso do solo e vegetação da área

estudada, aplica-se uma tabela de conversão semelhante à mostrada acima para se obter

um arquivo matricial (ou vetorial) relacionando valores de comprimento de rugosidade

(z0) a uma coordenada específica do globo terrestre. As medições feitas pessoalmente na

área de estudo também são necessárias para validar os padrões definidos pela

metodologia de sensoriamento remoto que utiliza imagens de satélite.

III.1.1.3 Geoprocessamento de Dados

Geoprocessamento é um conjunto de técnicas computacionais que opera sobre

bases de dados – que são registros de ocorrência – georreferenciados, para transformá-

los em informação (XAVIER DA SILVA, 2001).

No caso do desenvolvimento de um projeto eólico, o geoprocessamento de

dados é fundamental para o tratamento de informações do terreno – rugosidade e

topografia – e continua presente em todas as outras etapas do desenvolvimento do

projeto, por exemplo, todas as simulações e otimizações que serão realizadas mais a

frente nos estudos do projeto são georreferenciadas.

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Dessa forma, fica evidente que o geoprocessamento no seu viés mais amplo é

parte integrante de todo o estudo de avaliação do potencial eólico de uma região. As

técnicas citadas anteriormente para a obtenção e o tratamento de informações de

topografia e rugosidade do terreno são implementadas, atualmente, por ferramentas GIS

(Geographic Information System) disponíveis no mercado, tais como o ArcGIS, o

Global Mapper – software que será utilizado no estudo de caso – entre outros mais.

III.1.2 Implicações do Terreno na Modelagem Física

Como elucidado no início desse capítulo, as informações de terreno definem

condições de contorno para as simulações do regime dos ventos de uma determinada

região. Do ponto de vista da modelagem física, as informações de comprimento de

rugosidade (z0) e de altitude realizam o acoplamento das equações de transporte, que

regem o comportamento do vento, com o terreno sob o qual o escoamento se

desenvolve – a formulação de teorias e equações empíricas que definem a influência do

terreno na forma como o vento se comporta serão abordadas nas subseções a seguir.

III.1.2.1 Camada Limite Atmosférica (CLA)

A superfície da Terra exerce importante influência sobre o escoamento

atmosférico na Troposfera15

. O escoamento do vento nessa camada da atmosfera é

fortemente influenciado pelas tensões cisalhantes e forças de empuxo térmico devido à

sua interação com a superfície terrestre, pela aceleração de Coriolis devido à rotação da

Terra e também pelos movimentos de grande escala na atmosfera – os ventos

geostróficos e térmicos.

Dessa interação do escoamento atmosférico com o terreno, observou-se que o

atrito das correntes de ar com a superfície terrestre produz, devido a efeitos viscosos,

uma força horizontal contrária ao fluxo incidente e decrescente com a altura, até um

ponto chamado de camada limite planetária ou atmosférica, além do qual chamamos de

atmosfera livre – região onde o vento circula ao longo de linhas da mesma pressão,

15

A Troposfera corresponde à camada atmosférica mais próxima do solo. Tal camada estende-se do nível

do solo até aproximadamente 12 km acima dele.

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chamadas de isóbaras16

. Na atmosfera livre, devido às forças barométricas, que também

dependem da altura, os ventos crescem linearmente até atingirem a tropopausa, de onde

voltam a cair de valor.

A altura da camada limite atmosférica não é constante, variando com o tempo e

a localização geográfica. Ela é influenciada por diversos fatores, como a aceleração de

Coriolis, a velocidade do vento, a rugosidade da superfície e processos de troca de calor.

Dependendo da hora do dia e das condições atmosféricas, a faixa em que a velocidade

do vento é não perturbada está entre 600 e 2000 m.

Portanto, alterações no tipo do uso do solo e/ou da vegetação do terreno influem

diretamente na intensidade da média do vento local. A Figura 26 ilustra essa dinâmica.

Nessa ilustração esquemática são apresentados três perfis de velocidade para três

terrenos diferentes, considerando o mesmo vento geostróficos de 4,5 m/s e as mesmas

condições atmosféricas – a modelagem desse tipo de análise será explicada na próxima

subseção que trata dos perfis verticais de velocidade do vento horizontal.

Figura 26 – Perfis de velocidade em diferentes terrenos (figura de Renewable Energy/ Kaltschimitt)

16

Isóbaras é um termo meteorológico que representa linhas de um mapa que ligam pontos de igual pressão atmosférica, medido em bares. Além da pressão, o mapa de isóbaras também pode dar informações sobre a intensidade da média do vento e de sua direção, em uma determinada região.

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A área da camada limite próxima ao solo é chamada de camada de Prandtl17

. As

condições de fluxo nessa área são dominadas pelo atrito do fluxo do ar contra a

superfície terrestre. A altura da camada de Prandtl varia com as condições

meteorológicas. Durante a noite, ela tem somente 10 a 50 m de espessura, ao passo que

durante o dia a extensão vertical está entre 50 e 150 m. Investigações mostram que o

rotor de um aerogerador a 60 m de altura tem somente cerca de 30% das horas anuais

dentro da camada de Prandtl. A Figura 27 apresenta de forma esquemática a porção da

CLA correspondente a Camada de Prandtl e a compara com a dimensão média de um

aerogerador padrão de grande porte disponível no mercado – para aplicações onshore a

altura de uma turbina eólica de grande porte está na faixa de 86 a 120 m.

Figura 27 - Camada Limite Atmosférica (Figura de Fundamentos de Energia Eólica/ Milton Pinto)

17

Ludwig Prandtl (1875-1953), físico alemão. Foi um dos pioneiros da aerodinâmica, tendo desenvolvido a base matemática para os princípios fundamentais da aerodinâmica subsônica na década de 1920. Entre seus estudos mais importantes estão a camada limite, os aerofólios finos e a teoria da linha de sustentação.

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39

III.1.2.1.1 Perfil Logarítmico

Assim como descrito anteriormente na formulação do comprimento de

rugosidade (z0), existe uma lei empírica (eq. 3.1) que descreve como a média da

velocidade horizontal do vento varia com a altura para um determinado valor de z0. O

perfil vertical resultante dessa equação empírica também é conhecido como perfil

logarítmico e descreve de forma satisfatória os efeitos formulados na teoria de camada

limite – para alturas inferiores a 50 m aproximadamente – essa altura varia durante o dia

devido à estabilidade atmosférica –, onde há uma predominância dos efeitos do terreno

no desenvolvimento vertical do escoamento atmosférico.

Considerando o comportamento logarítmico da velocidade do vento, é possível

estimar a média de velocidade horizontal do escoamento numa determinada altura com

a informação da média de velocidade horizontal em outra altura, conforme equação 3.3

– descrita para dois referenciais distintos de altura para o mesmo perfil vertical.

(3.3)

onde: é a altura acima do solo no referencial 1 [m]; é a altura acima do solo do

referencial 2 [m]; é a velocidade horizontal do vento no referencial 1 [m/s]; e é a

velocidade horizontal do vento no referencial 2 [m/s].

Para alturas superiores à, aproximadamente, 50 m, o comportamento logarítmico

do vento sofre alguns desvios. A influência da rugosidade do terreno sobre o

escoamento diminui e o efeito do empuxo térmico passa a ser mais atuante.

Para alturas de interesse que excedem esse limite aproximado de 50 m, o

escoamento quente da superfície adquire grande importância, fazendo com que o perfil

de velocidade passe a se comportar conforme descrito na equação mais genérica abaixo

(eq. 3.4).

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(3.4)

onde: é o fator empírico de correção do perfil atmosférico devido à influência

do fluxo de calor no solo [adimensional] – a função faz a correlação da influência do

fluxo de calor do solo no comportamento da camada limite e é fortemente dependente

de estratificação atmosférica18

.

Para condições estáveis, temos a equação 3.5:

(3.5)

Para condições instáveis, temos a equação 3.6:

(3.6)

onde: é o comprimento de estabilidade de Monin-Obukov [m].

Uma interpretação física, pertinente ao viés de análise de potencial eólico, do

comprimento de Monin-Obukov seria a altura em relação a superfície terrestre em que

as forças de empuxo passam a exercer domínio em relação ao efeito viscoso na

produção de turbulência (STULL, 1988). Esse parâmetro pode ser determinado pela

equação abaixo (eq. 3.7):

(3.7)

onde: é a temperatura absoluta da superfície [K]; é o calor específico do ar à

pressão constante [J/(kg.K)]; é a aceleração da gravidade [m/s²]; e é o fluxo de

calor na superfície [J/s].

18

A estratificação da atmosfera é a sua segmentação em regiões características. A estratificação que afeta o potencial eólico se da na Troposfera, região na qual cada estrato, camada, apresenta um comportamento diferente quanto à variação de temperatura e pressão em relação à altura.

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41

III.1.2.1.2 Perfil Exponencial

Outra forma de determinação da velocidade do vento em alturas diferentes é

através do perfil exponencial, também conhecido como lei de potência (Power Law),

dado pela equação 3.8.

(3.8)

onde: é o coeficiente de atrito [adimensional].

A tabela abaixo (tabela 3) expressa alguns valores típicos do coeficiente de atrito

para determinadas características do terreno.

Tabela 3 - Coeficiente de Atrito para vários tipos de terreno

Características do Terreno Coeficiente de Atrito ( )

Calma superfície aquática ou solo suave 0,10

Grama alta ao nível do solo 0,15

Arbustos e cercas 0,20

Áreas rurais com muitas árvores 0,25

Pequenas cidades com árvores e arbustos 0,30

Grandes cidades com prédios elevados 0,40

Fonte: Rohatgi, 1994 (adaptado)

Trabalhos mais recentes também estudam a influência da estabilidade da

atmosfera no parâmetro , considerando condições distintas da atmosfera de uma região

atuando no mesmo tipo de terreno (KALTSCHIMITT, 2007). A tabela a seguir (Tabela

4) demonstra a influência da estabilidade atmosférica na magnitude do coeficiente .

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Tabela 4 - Coeficiente de Atrito para vários tipos de terreno em diferentes condições atmosféricas

Estabilidade Superfície Aquática Aberta Superfície Plana Vilarejos e Cidades

Instável 0,06 0,11 0,27

Neutra 0,10 0,16 0,34

Estável 0,27 0,40 0,60

Fonte: Kaltschimitt, 2007

Também é possível observar que as variáveis da equação 3.3 são praticamente as

mesmas da equação 3.8, com exceção do z0 e do coeficiente de atrito – variável que

engloba os efeitos da superfície e da estabilidade atmosférica, dentre outras influências,

no escoamento local. A magnitude do pode variar de 0,06 em locais lisos com

condições atmosféricas instáveis até 0,6 em locais com alta rugosidade e com condições

atmosféricas estáveis (Tabela 4).

Todavia, tanto a formulação exponencial em (eq. 3.8) quanto a logarítmica em

(eq. 3.3) são aproximações que somente oferecem um valor inicial da variação da

velocidade do vento com a altura. Na realidade, nada é melhor do que as medidas de

campo. A correlação entre o coeficiente de atrito , também conhecido como

expoente de Hellman, e a forma logarítmica pode ser mensurada na seguinte

aproximação (eq. 3.9).

(3.9)

onde: H é a altura de referência [m] – o valor padrão de 1/7 para (também chamado

de expoente de cisalhamento do vento) provém de assumir uma altura de 10 m para um

comprimento de rugosidade de 0,01 m.

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43

III.1.2.2 Obstáculos e Esteira

Outro conceito importante na temática “influência do terreno no

desenvolvimento do escoamento dos ventos”, que será tratado na presente seção do

trabalho, é o estudo dos obstáculos. Qualquer forma de barreira física – árvores,

edificações, formações rochosas, dunas, aerogeradores, entre outras formas possíveis –

atua como um obstáculo ao interagir com o deslocamento de uma massa de ar passante,

causando perturbações ao escoamento que, posteriormente, se dissipam ao longo de

uma determinada extensão territorial, devido a efeitos, principalmente difusivos, de

amortecimento de tais perturbações.

O fenômeno que mais interessa ao estudo de desenvolvimento de um projeto

eólico, relacionado às perturbações que um obstáculo provoca no escoamento, é o efeito

esteira. O termo esteira é, geralmente, aplicado à região do escoamento de um fluido de

vorticidade19

não nula a jusante20

de um obstáculo (BATCHELOR, 1967). A Figura 28

a seguir ilustra a dinâmica da formação da esteira atrás de um obstáculo.

Figura 28 – Esteira formada atrás de um obstáculo (Figura adaptada de Fundamentos de Energia

Eólica/ Milton Pinto)

19

Vorticidade é um conceito matemático utilizado em mecânica dos fluídos. Ela pode ser entendida como a quantidade de circulação ou rotação de um fluido por unidade de área de um ponto no campo de escoamento. 20

Jusante, em hidráulica, é a região do escoamento entre o observador e a foz do curso de um rio. O emprego desse termo na temática “escoamento atmosférico” faz referencia a região do escoamento posterior a um objeto, considerando o vento incidente como anterior a esse objeto.

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A região de esteira é caracterizada por um déficit de velocidade e incremento da

intensidade de turbulência e, por esta razão, é um fator importante na definição do

layout de um projeto eólico, visto que a configuração ideal de um parque eólico deve

atender a condição de mínima influência da esteira de aerogeradores à montante21

em

aerogeradores à jusante – a modelagem matemática desse fenômeno será apresentada

mais a diante nesse capítulo. A Figura 29 ilustra a influência da formação de esteira de

um aerogerador à montante num outro à jusante – nessa imagem o gradiente de cor

indica a variação da média de velocidade horizontal do vento, onde vermelho seria a

média mais intensa e azul a média menos intensa.

Figura 29 – Influência da esteira de aerogeradores dentro do mesmo parque

Por fim, a última consideração qualitativa, acerca da dinâmica “obstáculos e

formação de esteiras” seria a distinção entre duas situações: o relevo e a vegetação

atuando ora como uma rugosidade no solo, ora como obstáculo. Este efeito dual do

terreno em análises de recurso eólico é devido ao referencial principal do estudo: o

aerogerador. Dependendo da altura de um objeto e da sua distância em relação ao

parque eólico, a esteira formada por esse objeto – árvore, edificação e etc. - pode ser

percebida ou não na região do parque. Dessa forma, um vilarejo, uma floresta ou uma

cidade – entre outras várias formas possíveis de obstáculo – só devem ser encaradas

como um obstáculo para o projeto se estiverem até uma determinada distância do

mesmo.

21

Montante, em hidráulica, é a região do escoamento entre a nascente do curso de um rio e o observador. O emprego desse termo na temática “escoamento atmosférico” faz referencia a região do escoamento anterior a um objeto, considerando o vento incidente como anterior a esse objeto.

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III.1.2.3 Estabilidade Atmosférica

A estabilidade da atmosfera é um dos fatores fundamentais para o estudo dos

fenômenos de dispersão de efluentes e poluentes (SEINFIELD; PANDIS, 2000). Essa

afirmação foi retirada de um artigo da revista brasileira de meteorologia e faz referência

à aplicação mais usual do conceito de estabilidade atmosférica. Entretanto, também

seria correto afirmar que a estabilidade da atmosfera local é um fator de considerável

relevância para a avaliação do potencial eólico de uma região.

Como antecipado na subseção que tratava dos perfis verticais das médias de

velocidade horizontal do vento, variações nas condições de estabilidade da atmosfera

local são capazes de causar impactantes alterações na forma como essas médias de

velocidade variam com a altura, isto é, a estabilidade atmosférica afeta o movimento

vertical do ar – a convecção e a turbulência são aumentadas quando a atmosfera está na

condição instável e inibidas quando a condição é estável.

Dessa forma, faz-se necessário o conhecimento de metodologias capazes de

determinar a estabilidade atmosférica de uma região, dado um determinado intervalo

temporal – a estabilidade da atmosfera varia consideravelmente durante o dia –, para

uma avaliação mais detalhada do potencial eólico.

Uma boa solução para o problema de determinação da condição atmosférica foi

desenvolvida pelo meteorologista inglês Frank Pasquill. O sistema de classificação de

Pasquill (PASQUILL, 1961) é provavelmente a metodologia mais usada para classificar

a estabilidade atmosférica baseando-se em condições meteorológicas observacionais –

metodologia empírica. Estas classes dependem da velocidade do vento, juntamente com

a radiação solar durante o dia ou a fração de cobertura de nuvens durante a noite

(Tabelas 5 e 6).

Tabela 5 - Classes da Tabela de Pasquill

A – extremamente instável C – levemente instável E – levemente estável

B – moderadamente instável D - neutra F – moderadamente estável

Fonte: Pasquill, 1961

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Tabela 6 - Tabela de Classificação da Estabilidade Atmosférica

Vento Superficial Insolação durante o dia Nebulosidade durante a noite

(Medido a 10 m) [m/s] Forte Moderado Leve >4/8 <3/8

< 2 A A – B B - -

2 – 3 A - B B C E F

3 - 5 B B - C C D E

5 – 6 C C – D D D D

> 6 C D D D D

Fonte: Pasquill,1961

Alternativamente à metodologia observacional de Pasquill, também é possível

calcular a condição de estabilidade atmosférica de forma algébrica. Um método

algébrico possível consiste no cálculo do fluxo turbulento vertical de empuxo – a média

do produto das flutuações de velocidade vertical e temperatura potencial – para a

determinação da condição de estabilidade.

Se o fluxo turbulento vertical de empuxo é positivo, a atmosfera é considerada

estar em condições instáveis, devido à instabilidade experimentada por uma parcela de

ar que se move verticalmente e adiabaticamente sob tais condições. Quando o fluxo é

negativo, a parcela de ar é inibida de movimento turbulento vertical e assim a atmosfera

é caracterizada como estável. Se o fluxo é igual a zero, a atmosfera é dita estar em

condições neutras.

Entretanto, a utilização desse método para aplicações práticas é inibido pela

grande dificuldade de realizar medições de temperatura potencial em campo. A

temperatura potencial é definida na equação abaixo (eq. 3.10).

(3.10)

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onde: corresponde à razão e é o calor específico a volume constante por

unidade de massa de ar [adimensional]; é a pressão atmosférica na altura de referência

[KPa]; é a pressão ao nível do solo [KPa]; e é a temperatura absoluta na altura de

referencia [K].

III.2 Medição e Análise Estatística dos Dados de Vento

Para qualquer empreendimento eólico desenvolvido em território brasileiro, é

exigido, pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), um certo número de medições –

esse número varia com a área do projeto e com a complexidade do terreno – com um

intervalo mínimo de três anos de duração para a validação do projeto do parque eólico.

A importância de uma boa campanha de medição, comprovada pela exigência

das agências reguladoras, está relacionada à mitigação de incertezas da variável mais

significativa da avaliação do potencial eólico de uma região, o vento – isto é, o campo

de médias de velocidade do vento.

Como será elucidado mais adiante nesse capítulo, os dados de vento são

utilizados como entrada para qualquer ferramenta computacional de simulação do

regime de ventos. Logo, o fornecimento de dados problemáticos, isto é, com alguma

espécie de erro de calibragem, de medição, ou de qualquer outra origem, é capaz de

gerar um campo de médias de velocidade do vento com um erro considerável e com

nenhuma representatividade com o escoamento real – devido à natureza fortemente não-

linear dos fenômenos descritos pela modelagem utilizada em tais simulações.

Em suma, esta subseção irá descrever brevemente os tipos de dados de vento,

questões práticas de uma campanha de medição de vento – sensores, estratégias de

posicionamento, calibração e custos de medição –, a avaliação estatística dos dados de

vento e algumas técnicas de correlação e validação desses dados.

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III.2.1 Tipos de Dados de Vento

Uma premissa muito importante para todo o conteúdo dessa seção, referente à

medição e análise do vento, é a discretização dos principais tipos de dados de vento.

Uma segmentação tradicional desse tipo de dados distingue-os quanto a sua

natureza. Portanto, tem-se dois grupos bem característicos de dados de vento possíveis:

os dados observados, isto é, medidos em campo, e as séries de reanálise.

O primeiro grupo, os dados observados (medidos), como o nome já adianta, é

obtido pela medição direta em campo. Sua medição é feita tradicionalmente por

sensores instalados em torres treliçadas – solução convencional para se medir dados na

altura de interesse – conectados a um datalogger que armazena e envia tais

informações. A imagem a seguir (Figura 30) ilustra uma configuração padrão de uma

torre treliçada com sensores de aquisição de dados de vento – essa solução também é

conhecida como Torre Anemométrica ou Meteorological Tower.

Figura 30 – Esquema representativo de uma torre anemométrica

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Atualmente, existem duas alternativas de sensores, em oposição à solução

clássica da torre anemométrica, que medem informações do vento de alturas

consideráveis – de 25 m até 1500 m – sem a necessidade de estarem fisicamente

alocados em tais alturas, ou seja, tais sensores são capazes de realizar medições de

ventos em alturas superiores a 100 m estando posicionados ao nível do solo. Esses

sensores são de dois tipos distintos: Light Detection And Ranging (LIDAR) – utiliza a

emissão e recepção de sinais de laser para a medição das variáveis de interesse – e Sonic

Detection And Ranging (SODAR) – utiliza a emissão e recepção de sinais sonoros para

a medição das variáveis de interesse. A imagem a seguir (Figura 31) ilustra a utilização

dessas duas novas tecnologias de medição de dados de vento em projetos eólicos.

Figura 31 - Tecnologias modernas de obtenção de dados de vento (SODAR e LIDAR)

Por fim, o segundo tipo possível de dados de vento é formado pelas séries de

reanálise. As séries de reanálise de dados de vento são desenvolvidas através de

modelos numéricos de previsão do tempo com base na manipulação de dados de

variáveis físicas coletados em diversas fontes – estações sinóticas, radiossondas,

satélites, boias oceânicas, dentre outras – para a geração de séries históricas em cada um

dos pontos de uma malha global atrelada a cada tipo de série de reanálise. A Figura 32

ilustra a malha, referente a uma pequena porção do globo terrestre, de uma série de

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reanálise muito utilizada para a avaliação de potencial eólico, a série Modern-Era

Retrospective analysis for Research and Applications (MERRA).

Figura 32 - Malha da série de reanálise MERRA para uma reião do leste canadense

Diferentemente dos dados observados, os dados advindos de séries de reanálise

não foram medidos por sensores posicionados na localidade de suas coordenadas. Esse

fato adiciona uma considerável incerteza a esse tipo de dado de vento.

Por esta razão, a utilização desse tipo de dado é mais usual em estudos

preliminares da avaliação do potencial eólico, quando, por alguma razão, não há

disponibilidade de dados observados no local avaliado e/ou o intervalo de tempo

medido é inferior ao mínimo necessário para a avaliação do prospecto de vento.

Das séries de reanálise existentes na atualidade, três são usadas com mais

frequência para fins de estimativa do recurso do vento para o desenvolvimento de

projetos eólicos: a série Modern-Era Retrospective analysis for Research and

Applications (MERRA) – fornecida pela National Aeronautics and Space

Administration (NASA), a série ERA-Interim – fornecida pelo European Centre for

Medium-Range Weather Forecasts (ECMWF) e a série Climate Forecast System

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Reanalysis (CFSR) – fornecida pelo National Centers for Environmental Prediction

(NCEP).

III.2.2 Sensores (Custo, Localização, Calibração e Tecnologias)

Quando consideramos questões práticas de uma campanha de medição de vento,

é necessário, primeiro, estabelecer a localização da campanha de medição –

coordenadas e alturas –, o tipo de informação que será requisitada, os tipos de sensores

que serão utilizados nessa campanha, e, por fim, realizar a montagem, calibração e

monitoramento dos dados coletados.

III.2.2.1 Localização

A localização da coleta dos dados de uma campanha de medição de vento, para

fins de aproveitamento do recurso eólico, deve ser tal que a região onde a medição está

localizada seja representativa quanto ao comportamento global da área estudada. Em

outras palavras, dentro de uma região de interesse, para uma campanha de medição,

existem inúmeras situações que provocam particularidades no escoamento atmosférico

– formações abruptas do relevo, regiões com elevado comprimento de rugosidade, entre

outras – que, se escolhidas como sede de tais campanhas, iriam produzir resultados, nas

simulações, incompatíveis com a realidade, uma vez que tais simulações utilizariam

essas situações particulares como referência para todo o restante da área estudada.

Dessa forma, é de bom tom que se conheça a área que será avaliada previamente

ao início de qualquer campanha de medição. Existem opções de avaliação do

posicionamento ideal das medições de vento em algumas das ferramentas

computacionais de avaliação de potencial eólico, mas é sempre recomendável a visita in

loco para ajustes mínimos do posicionamento final de tais medições.

Ainda referente a representatividade dos dados de uma campanha de medição,

existem normas e recomendações da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) quanto ao

número mínimo de medições em relação a área que necessita ser validada. Essa norma

varia de acordo com a qualidade do terreno e determina que, para um relevo complexo –

foco do estudo de caso desse trabalho –, o raio de influência de uma local de medição,

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para fins de validação, tem o valor máximo de 2 km, sendo necessária a instalação de

outra coleta de dados fora dessa região de influência para áreas do projeto que não

forem englobadas por tal circunferência de 2 km de raio, centrada no local da medição

realizada.

III.2.2.2 Custos de Medição

Na determinação das médias de velocidade horizontal do vento, obtém-se

incertezas consideráveis no cálculo da produção energética. Os custos envolvidos na

medição do vento giram em torno de 0,1 % do custo total do parque eólico, valores bem

menores se comparados com a redução do risco do investimento.

Os custos das campanhas medição são devidos: ao transporte, instalação e

montagem da estrutura necessária para a coleta dos dados, à compra e instalação

(comissionamento) dos sensores e do datalogger, à manutenção preventiva, geralmente

mensal, da estrutura – uma campanha de medição não pode possuir um intervalo maior

que quinze dias sem medição, sob pena da invalidação de toda a campanha de medição

já realizada – e ao monitoramento e tratamento das informações medidas – essas duas

últimas formas de custo perduram durante todo o período de medição.

Por fim, o montante de todos os custos discriminados anteriormente pode variar

de trezentos mil reais – projetos tradicionais com sensores alocados em torres

anemométricas – até valores acima um milhão de reais – campanhas de medição usando

um LIDAR ou um SODAR – (dados de 2015), dependendo da tecnologia utilizada.

III.2.2.3 Tipos de Sensores

Assim como descrito anteriormente, a escolha do sensor de uma campanha de

medição está diretamente relacionada com a definição de quais variáveis interessam

para o estudo. No estudo de avaliação do potencial eólico de uma região, as variáveis de

interesse são: a média e a direção da velocidade horizontal do vento, a pressão, a

temperatura absoluta, a umidade relativa do ar e, em alguns casos, a velocidade vertical

e a radiação global.

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Dessa forma, os sensores que serão abordados a seguir, nessa subseção, medem

as variáveis descritas anteriormente. Todavia, para cada variável – como será tratado na

subseção “Análise Estatística dos Dados de Vento” do presente capítulo – existem

parâmetros estatísticos específicos que devem ser medidos, visto que para algumas

dessas variáveis a medição de todos as grandezas estatísticas não agregaria informações

relevantes na análise do potencial eólico. A Tabela 7 abaixo demonstra os parâmetros

estatísticos de interesse para cada variável medida numa campanha de medição –

convencionais e não convencionais.

Tabela 7 - Parâmetros estatísticos de interesse associados às variáveis físicas medidas

Variáveis Físicas Parâmetros Estatísticos de Interesse

Velocidade Horizontal [m/s] Média, Desvio Padrão, Máx./Mín.

Direção do Vento [graus] Média, Desvio Padrão, Máx. na direção da rajada

Temperatura Absoluta [oC] Média, Máx./Mín.

Radiação Solar [W/m2] Média, Máx./Mín.

Velocidade Vertical [m/s] Média, Desvio Padrão, Máx./Mín.

Pressão [kPa] Média, Máx./Mín.

Umidade Relativa [%] Média, Máx./Mín.

Fonte: AWS Truepower

III.2.2.3.1 Anemômetros

A velocidade do vento é medida por um instrumento chamado anemômetro (do

grego anemus que significa vento). Há, atualmente, uma gama de tipos desse sensor

disponíveis no mercado: rotacionais, de pressão, termoelétricos, a laser e sônico ou de

fase – além do tipo de tecnologia empregada, os tipos possíveis de anemômetros

também se subdividem em sensores que medem a velocidade horizontal do vento e

sensores que medem a velocidade vertical do vento.

Dos tipos possíveis de anemômetros disponíveis comercialmente, o que tem

ampla utilização em campanhas tradicionais de medição de vento é o anemômetro de

copo – da classe de sensores rotacionais, que medem a velocidade horizontal. Essa

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configuração foi inventada por John Thomas Rommey Robinson22

em 1846 e

aperfeiçoada por J. Patterson23

em 1926.

O anemômetro rotacional de copo é um mecanismo de arrasto, em outras

palavras, ele é movimentado pela interação com vento incidente, predominantemente,

por forças de arrasto e mede a sua velocidade de forma indireta convertendo a

informação de intensidade de rotação do sensor. A Figura 33 ilustra um modelo de

anemômetro de copo muito usado em campanhas de medição de vento: o sensor Thies

First Class Advanced Anemometer.

Figura 33 - Thies First Class Advanced Anemometer

22

John Thomas Rommey Robinson (1792-1882), astrônomo e físico irlandês. É conhecido entre os meteorologistas como o inventor do anemômetro de copos. 23

John Patterson (1872-1956), meteorologista e físico canadense. Responsável pelo desenvolvimento da configuração atual de anemômetro de copo, que possui um erro inferior a 3% quando submetido a velocidades inferiores a 60 mph.

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III.2.2.3.2 Birutas (“Wind Vanes”)

A medição de dados referentes à direção do vento horizontal é necessária para a

modelagem espacial da distribuição do recurso eólico de uma área de interesse.

Para a realização desse tipo de medição utiliza-se um sensor chamado wind

vane. A configuração mais usual desse tipo de sensor utiliza uma haste vertical acoplada

a uma cauda horizontal que gira solidária a direção do vento. A imagem a seguir (Figura

34) ilustra um modelo de wind vane da empresa Renewable NRG Systems, opção de

ampla utilização em projetos eólicos.

Figura 34 – RNRG 200P Wind Vane

Em relação a questões práticas de instalação desse tipo de sensor, é

recomendável que, para a mesma torre anemométrica, sejam instalados dois wind vanes

em hastes diferentes e/ou alturas diferentes. Essa técnica de instalação e montagem atua

no sentido de garantir a validade do resultado final da direção do vento medido.

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III.2.2.3.3 Termo-higrômetros

Outro sensor de ampla utilização em campanhas de medição é o termo-

higrômetro. Este mecanismo é capaz de auferir medições de temperatura absoluta e

umidade relativa do ar – variáveis físicas usadas na estimativa da massa específica do ar

da região do projeto, que, por sua vez, é utilizada para estimativas de produção

energética do parque eólico.

A Figura 35 ilustra um modelo de termo-higrômetro comum em campanhas de

medição com torres anemométricas – na imagem o sensor está encapsulado dentro de

um suporte branco que protege o sensor contra o aquecimento devido à radiação direta

do sol, impedindo que a exposição a esse tipo de radiação interfira na medição.

Figura 35 - Exemplo de termo-higrômetro usado em torres anemométricas

III.2.2.3.4 Barômetro

A tomada de dados relativos à pressão do ar, assim como a coleta de informação

de umidade e temperatura, também é guiada pela necessidade de estimar com maior

precisão a massa específica do ar da região do projeto. Esse tipo de medição é realizada

tradicionalmente por barômetros (Figura 36).

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57

Figura 36 - Barômetro desenvolvido pela empresa Vaisala

Entretanto, devido à dificuldade de medir de forma acurada a pressão do ar em

ambientes sujeitos à significativa atividade de ventos – a pressão induzida pela interação

da massa de ar em movimento com o sensor pode acrescentar erros em relação a

resposta final de pressão desse sensor – e a baixa sensibilidade da variável física alvo, a

massa específica do ar, em relação a pressão do ar, é comum não incluir medições desse

tipo em campanhas de medição , utilizando, por conseguinte, dados de pressão de

estações meteorológicas próximas à área do projeto como fonte de dados para as

análises do projeto.

III.2.2.3.4 Piranômetro

Dados de radiação são geralmente associados a projetos de geração solar, seja

ela fotovoltaica, solar térmica ou qualquer outra tecnologia. Todavia, há também uma

considerável relevância desse tipo de informação em projetos de geração eólica. Esse

tipo de dado, quando associado com informações de médias de velocidade do vento,

pode ser usado para o cálculo da estabilidade atmosférica, que, como já fora

apresentado, é muito influente na forma como o vento se comporta.

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O equipamento mais usado para a aquisição desse tipo de informação é o

Piranômetro. Esse sensor é utilizado para medir a radiação solar horizontal global, que é

a combinação das radiações direta e difusa projetada no plano horizontal. A imagem a

seguir (Figura 37) ilustra um modelo de piranômetro possível.

Figura 37 - Piranômetro

III.2.2.4 Calibração e Montagem

O último aspecto prático, de uma campanha de medição de vento, que será

abordado na presente seção é a calibração e montagem dos principais sensores. As

temáticas ‘calibração’ e ‘montagem’ são fundamentais para a compreensão dos aspectos

práticos de uma boa campanha de medição de dados. Entretanto, a presente subseção

não irá se aprofundar no referido tema, mas sim apontar algumas normas e

procedimentos mandatórios para uma coleta de dados de vento tradicional.

Quanto à calibração, o aspecto mais importante na instalação dos sensores é a

definição do norte verdadeiro24

. Saber a direção do norte verdadeiro é essencial para a

interpretação correta de dados de direção e, também, fundamental para a definição do

layout da montagem dos equipamentos na torre de medição. A importância da

24

O Norte verdadeiro é a direção tomada à superfície da Terra que aponta para o Polo Norte geográfico.

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determinação do norte verdadeiro em campo é justificada pela geração de layouts de

parques eólicos ineficientes devido à entrada de dados desalinhados nas otimizações de

definição de posição dos aerogeradores. Uma fonte de erro frequente, quando se realiza

esse tipo de calibração em campo, é a escolha do norte magnético25

como sendo o norte

verdadeiro. Atualmente, a forma mais confiável definição da direção do norte

verdadeiro é realizada por um aparelho Global Positioning System (GPS) – esse tipo de

aparelho é capaz de determinar diretamente a posição do norte verdadeiro, excluindo a

necessidade de medir o norte magnético para determinar a correlação com o norte

verdadeiro pelo cálculo da declividade magnética da região.

Em relação à montagem dos sensores, considerando, ainda, uma campanha de

medição tradicional realizada em torres de medição, é sempre necessário avaliar que a

posição do suporte dos sensores pode interferir em suas respectivas medições – esse

efeito indesejado é muito mais significativo nos aparelhos de medição de velocidade do

vento: os anemômetros. Em relação a esse tipo de sensor, a recomendação é posicionar

o suporte do sensor baseado na direção predominante do vento, de modo a evitar que o

sensor fique alocado na frente da torre de medição, tendo como referência a direção

mais frequente do vento local. A imagem a seguir (Figura 38) ilustra essa dinâmica.

Figura 38 - Esquema de montagem de anemômetros em torres de medição (imagem adaptada de

Wind resource Assessment/ Michael C. Brower)

25

Uma agulha imantada aponta sempre para o norte magnético e, de modo aproximado, para o norte verdadeiro. O ângulo entre o norte magnético e o verdadeiro reflete a declinação magnética do lugar e varia geralmente de 20 a 30 graus.

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III.2.3 Análise Estatística dos Dados de Vento

Assim como explicado na subseção anterior, as informações do vento coletadas

em campanhas de medição – dados observados – e /ou modeladas em séries de reanálise

são expressas sempre como medidas estatísticas: médias, desvios padrões, máximos e

mínimos. Para cada medida estatística de dado de vento é gerada uma série temporal –

séries de dados observados, geralmente, possuem um intervalo de dez minutos entre

cada tomada de dados, ao passo que séries de reanálise costumam possuir intervalos

(steps) diários ou horários. A frequência de aquisição de dados observados é, por

norma, equivalente a 1 Hz. A Figura 39 ilustra a série temporal das médias de

velocidade horizontal de um dado da série de reanálise MERRA usado no estudo de

caso do projeto.

Figura 39 – Série temporal da média de velocidade horizontal (fonte: MERRA)

A partir da obtenção de uma série histórica das medidas estatísticas básicas, são

calculados outros parâmetros estatísticos: distribuições probabilísticas, intensidade de

turbulência, rosa setorial de frequência das medidas entre outras.

III.2.3.1 Intensidade de Turbulência (IT)

A intensidade de turbulência (eq. 3.11) é um parâmetro importante para a

escolha da classe do aerogerador que será utilizado no projeto e é, por definição, a razão

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entre o desvio padrão da flutuação da velocidade horizontal do vento ( ) e a média de

velocidade horizontal do vento ( ).

(3.11)

em que é dado por 3.12:

(3.12)

onde: é o período do tempo cuja referência é [s]; é a velocidade do vento

horizontal instantânea [m/s]; é a média de velocidade horizontal do vento.

A Intensidade de Turbulência (IT) varia com a velocidade média do vento, com

a rugosidade do solo, com a estabilidade atmosférica e com a topografia do terreno. Os

menores valores de IT são medidos sobre o mar aberto, apresentando valores próximos

a 5%, ao passo que os maiores índices – 20% em média – são medidos sob terrenos com

alto valor de comprimento de rugosidade (z0).

III.2.3.2 Distribuição de Weibull

Quando um dado evento ocorre de modo aleatório, ele é tido como estocástico26

.

O vento tem características estocásticas e sua velocidade é uma variável aleatória

contínua. Logo, para facilitar a análise do vento, é necessário discretizar os dados na

forma de histogramas e, por conseguinte, funções de densidade de probabilidade.

26

Existe uma sutil diferença entre aleatoriedade e estocacidade. Apesar de improvável, é possível que sete lançamentos, consecutivos, de dados resultem numa sequência de sete números iguais, logo, a sequência é não aleatória, mas o lançamento de dados é.

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A função de densidade que mais se ajusta a distribuição do vento é a distribuição

de Weibull27

(eq. 3.13).

(3.13)

onde: k é o fator de forma [m/s]; e c é o fator de escala [adimensional].

A imagem a seguir (Figura 40) ilustra o histograma da série temporal – das

médias de velocidade horizontal – extraída da série de reanálise MERRA (Figura 39) e a

função de Weibull que realizou o melhor ajuste para essa distribuição de médias de

vento horizontal.

Figura 40 - Histograma e melhor ajuste da função de Weibull para uma distribuição de médias de

velocidade horizontal do vento (fonte: MERRA)

27

Ernest Hjalmar Wallodi Weibull (1887-1979), físico suéco. Apresentou, em 1939, o modelo de planejamento estatístico sobre a fadiga de um material. É reconhecido, na estatística, pelos seus estudos sobre a distribuição de Weibull.

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III.2.3.4 Rosa Setorial de Frequência

A rosa de frequência de dados de vento é uma distribuição probabilística muito

usada para a análise de variáveis vetoriais, como a direção do vento horizontal –

também, apesar de não muito usual, pode ser aplicada à grandezas escalares, como a

média de velocidade. Essa forma de representação de uma série histórica se dá pela

discretização da frequência de um tipo de medida estatística primária – média, desvio

padrão e etc. - em cada um de n setores, que sempre totalizam 360o, de um domínio

polar28

.

A Figura 41 ilustra a rosa de frequência da direção do vento horizontal da

mesma série de reanálise do MERRA, usada posteriormente no estudo de caso, que vem

sendo usada como referência dessa subseção de análise estatística dos dados de vento.

Figura 41 - Rosa de frequência da direção do vento discretizada em 16 setores (fonte: MERRA)

28

Em matemática, um sistema de coordenas polares é um sistema de coordenadas bidimensional, no qual cada ponto de um plano é determinado pela sua distância em relação a um ponto fixo e do ângulo em relação a uma direção fixa.

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III.2.3.5 Correlação e Validação de Dados

O último tópico, referente à análise estatística dos dados de vento, é a validação

e correlação das informações coletadas. Antes dos procedimentos estatísticos realizados

com as séries temporais, descrito anteriormente, existe uma etapa muito importante que

consiste na validação dos dados brutos extraídos das medições – esse procedimento só é

necessário em dados observados – para a posterior análise de tais séries temporais.

Quando se trabalha com dados brutos de medição de vento, é comum se deparar

com erros de medição, tais como: medidas de direção sem nenhuma variação em um

longo intervalo de tempo devido ao travamento do wind vane, medidas de velocidade

absurdas – valores irreais de 400 m/s, por exemplo – devido a alguma falha de

processamento do anemômetro e/ou data logger e outras formas de falha possíveis.

Desse modo, a validação de dados brutos, extraídos em campanhas de medição,

atua no sentido de identificar e remover – esse procedimento é usualmente chamado de

flag – tais ocorrências das séries temporais brutas.

Para a realização dessa operação, existem duas técnicas principais: o uso de

filtros lógicos que podem ser empregados nas séries temporais – exemplo: “para >

400 m/s, marque o dado e o exclua” – e a própria inspeção visual dos dados expressos

graficamente.

Por fim, o último processo realizado na análise estatística do vento, deve ser a

correlação entre dados de vento de regiões próximas. Esse processo tem duas

finalidades principais: a primeira é determinar se é possível usar dados de uma série

temporal para completar alguns ‘buracos’ – pontos sem medição ou com dados

excluídos no processo de filtragem para validação – de outra série e /ou extrapolar um

período curto de dados observados – um a três anos de duração – para um intervalo de

longo prazo – dez a trinta anos ou mais de duração –; e a segunda seria determinar se

ambas as séries se encontram no mesmo regime climático.

Para a realização desse procedimento de verificação da correlação, é necessário

ajustar as séries estudadas para o mesmo step – intervalo temporal entre cada dado da

série. Após o ajuste das duas séries com mesmo step, realiza-se a escolha do período de

interesse que será avaliado.

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Geralmente, têm-se séries de durações diferentes nesse tipo de análise, onde o

intervalo de medição de um dado contém o intervalo do outro, logo, o período escolhido

para a análise corresponde ao período da série de menor duração – considerando um

cenário onde se deseja correlacionar uma série com intervalo de duração que vai de

1999 até 2015 com outra série com intervalo de duração correspondente ao ano de 2013,

escolhe-se o ano de 2013 como referência para o estudo de correlação.

Feita a escolha das séries e do período de interesse, realiza-se a discretização das

diferenças do valor dos dados das séries, para cada intervalo temporal desse período de

interesse, na forma de um gráfico de dispersão. Para esse gráfico de dispersão, realiza-se

um ajuste da melhor reta – existem algumas técnicas possíveis para esse ajuste, mas a

mais usual é a técnica dos mínimos quadrados – e calcula-se o coeficiente angular da

reta gerada, que, por sua vez, é nomeado como fator de correlação (R2). Para a

confirmação da correlação satisfatória dos dados, espera-se encontrar valores de R2

superiores a 0,8 em séries de médias de velocidade com step temporal equivalente a um

mês.

III.3 Restrições para a Implementação de um Projeto Eólico

Outra análise mandatória para a implementação de um projeto eólico é o estudo

das restrições. Esse estudo lida, em grande parte, com as questões burocráticas do

desenvolvimento de um empreendimento eólico, sendo, por muitas vezes, um divisor de

águas entre a idealização do projeto e a concretização do mesmo.

Nesta subseção do capítulo de avaliação do potencial eólico, serão avaliadas

todas as restrições possíveis para um projeto eólico no Brasil, que, visando uma melhor

compreensão, foram subdivididas nas seguintes categorias: restrições técnicas,

restrições ambientais e restrições burocráticas.

III.3.1 Restrições Técnicas

O conjunto de restrições definido como pertencente à categoria técnica abrange

o conjunto de normas, leis e situações técnicas específicas que, por si só, seriam capazes

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de impedir o posicionamento de um aerogerador em uma posição específica ou a

própria existência do empreendimento eólico em uma determinada região.

Primeiramente, é necessário analisar as restrições técnicas capazes de

inviabilizar a existência de um projeto numa determinada localidade. Os principais

eventos técnicos que podem ser considerados proibitivos ao projeto são: o prospecto de

vento do local; a existência de projetos eólicos já outorgados a jusante; a área de

influência de aeroportos; a logística de transporte dos aerogeradores para a região do

projeto; e a proximidade com uma infraestrutura de subestações de elevação de carga

capaz de absorver a demanda do projeto – no caso de projetos que serão ligados ao

Sistema Interligado Nacional (SIN)29

, caso o projeto atenda um geração distribuída, a

existência dessa infraestrutura não é necessária.

Em relação ao prospecto de vento da região, a confirmação da qualidade do

vento só ocorre depois da certificação – realizada por uma empresa autorizada – do fator

de capacidade (eq. 1.7) do parque calculado no desenvolvimento do projeto, cabe ao

desenvolvedor escolher a região certa para realizar toda a análise da avaliação do

potencial eólico – que vem sendo descrita nesse capítulo.

Os parâmetros para a escolha dessa área, considerando apenas a oferta de vento

e desconsiderando as outras restrições, são disponibilizados em bases GIS de

sensoriamento remoto, com as informações de climatologia do local, do atlas de

potencial eólico do país, de dados de vento de reanálise e de indícios de bons prospectos

de vento percebidos em visitas in loco na região escolhida – esses indícios podem ser

obtidos através da observação direta de indicadores biológicos, como árvores e arbustos

deformados pela ação contínua dos ventos, ou de censos realizados com a população

local.

A imagem a seguir (Figura 42) ilustra o atlas de potencial eólico do Brasil – a

uma altura de 50 m – cuja elaboração foi coordenada pelo Centro de Pesquisas de

Energia Elétrica (Cepel) no ano 2001.

29

Com tamanho e características que permitem considerá-lo único em âmbito mundial, o sistema de produção e transmissão de energia elétrica do Brasil é um sistema hidrotérmico de grande porte, com forte predominância de usinas hidrelétricas e com múltiplos proprietários. O Sistema Interligado Nacional é formado pelas empresas das regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste e parte da região Norte. Apenas 1,7% da energia requerida pelo país encontram-se fora do SIN, em pequenos sistemas isolados localizados principalmente na região amazônica.

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Figura 42 - Atlas eólico brasileiro (fonte: Cepel, 2001)

Por fim, no que tange o estudo de restrições técnicas, restaram apenas as

restrições que são proibitivas à locação de turbinas eólicas em uma determinada

posição, que, por sua vez, se subdividem em dois grupos principais: áreas de servidão –

nascentes, rios, estradas, benfeitorias e edificações – e restrições do terreno, isto é, a

inclinação do terreno. Um exemplo de análise desse tipo de restrição está presente na

otimização do layout final do parque eólico desenvolvido no estudo de caso do corrente

projeto.

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III.3.2 Restrições Ambientais

Outra forma de restrição ao desenvolvimento de um projeto eólico são as

restrições ambientais. Elas podem estar relacionadas a áreas de proteção ambiental, que

por si só impedem a realização de um projeto, ou a parâmetros que devem ser mitigados

no desenvolvimento de um bom projeto eólico, dentre eles se destacam: o impacto

sonoro e visual do parque e a rota de migração dos pássaros.

III.3.3 Restrições Burocráticas

A última forma de restrição que será abordada nesse projeto é referente a

questões burocráticas que, no Brasil, seriam capazes de inviabilizar um empreendimento

eólico. Essa forma de restrição se faz presente em toda a questão fundiária que deve ser

resolvida para o desenvolvimento do empreendimento.

A magnitude dessa questão, no desenvolvimento de um projeto de grande e

médio porte – com potência instalada superior a 30 MW –, é de ordem elevada devido à

grande demanda por terras para o posicionamento das turbinas eólicas dentro do projeto.

Dessa forma, o desenvolvedor de um projeto eólico deve avaliar se há terras

regularizadas na área de interesse e/ou checar o trabalho que deverá ser realizado para

regularizar as terras ainda não regularizadas nessa área.

III.4 Modelagens para Simulação do Vento

Ao longo do desenvolvimento do capítulo em questão, foram citados inúmeros

fenômenos físicos do escoamento atmosférico. A compreensão da modelagem de tais

fenômenos é de suma importância para a análise dos resultados que as ferramentas

computacionais de recurso eólico fornecem.

Esta seção irá tratar, especificamente, de toda a modelagem de turbulência do

software de simulação do escoamento atmosférico via Computational Fluid Dynamics

(CFD) usado no estudo de caso, o software norueguês WindSim, e da modelagem de

esteira usado no software de otimização de parques eólicos Open Wind.

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III.4.1. Modelagem do Software de Simulação do Escoamento via CFD

O software WindSim é uma interface para a aplicação do código de resolução via

análise CFD chamado Phoenics – desenvolvido por Cham (UK). O WindSim é

desenvolvido para o cálculo do escoamento do vento para aplicações específicas de

análise para aproveitamento em projetos eólicos.

As subseções a seguir, tem como finalidade contextualizar, de forma sucinta, os

aspectos fundamentais da modelagem da simulação do regime dos ventos.

III.4.1.1 Embasamento Teórico

Os estados de equilíbrio da matéria são caracterizados pela distribuição espacial

uniforme de cada uma de suas várias propriedades, com cada elemento da referida

matéria estando em balanço mecânico e térmico com os elementos vizinhos. Caso

algumas propriedades da matéria não estejam, inicialmente, uniformes, observa-se a

ocorrência da troca de propriedades térmicas e mecânicas entre os elementos adjacentes,

sempre no sentido de levar a matéria a seu estado de equilíbrio.

Um importante – e comum – resultado da troca entre dois elementos – com

propriedades diferentes – da matéria, é que o montante de algumas grandezas,

satisfazendo uma lei de conservação, associadas a um elemento diminui e o montante

associado ao outro elemento aumenta. O grupo que engloba todas essas trocas constitui

o que se intitula como ‘fenômenos de transporte’. Três tipos básicos de fenômeno de

transporte são o transporte de massa, energia e momentum (BATCHELOR, 1967).

Assim é descrito no trabalho de G.K.Batchelor, o comportamento da matéria é

regido pelos fenômenos de transporte. A modelagem que vem a seguir, nessa subseção,

atua no sentindo de estudar formas resolver o transporte de momentum no escoamento

de um fluido, com a finalidade de resolver os campos de velocidade e pressão do

escoamento atmosférico.

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III.4.1.1.1 Equações Governantes

As principais equações governantes do escoamento, desprezando efeitos

moleculares, magnéticos e etc., são as equações de conservação de massa e energia e a

equação de transporte de momentum, também conhecida como equação de Navier-

Stokes.

Nesta subseção serão abordadas apenas as equações de transporte de momentum

e de conservação de massa – também conhecida como equação da continuidade –, visto

que são responsáveis pela base teórica da modelagem do software WindSim.

III.4.1.1.2 Equação da Continuidade

O primeiro assunto que deve ser abordado, no que tange a modelagem de todas

as equações que serão abordadas daqui para a frente, é a forma de descrição do espaço.

Para a descrição dos fenômenos de interesse desse trabalho, será utilizada a descrição

euleriana do movimento. Essa descrição se assemelha a descrição do campo magnético

em que grandezas do escoamento são definidas como função da posição do espaço (x) e

tempo (t).

O espaço descrito da forma euleriana pode ser pensado como o resultado de uma

foto da distribuição espacial das grandezas do fluido – velocidade, massa específica,

pressão e etc. – a cada instante de tempo (BATCHELOR, 1967).

Definida a forma de descrição do espaço sendo a forma euleriana, é necessário

descrever a aceleração de um elemento do fluido em (x, t). Todavia, derivada

não representa essa aceleração, uma vez que um elemento do fluido se encontra na

posição x apenas no instante t. Portanto, a expressão correta da aceleração de um

elemento do fluido necessita da compreensão de que um elemento na posição x no

tempo t estará na posição no instante , e que a alteração da velocidade no

intervalo infinitesimal de tempo é . A equação 3.14

aproxima a variação da velocidade em para uma ordem de erro de (O( )).

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(3.14)

Logo, determina-se que a aceleração de um elemento no fluido, descrita no

espaço euleriano, é expressa pela equação 3.15.

(3.15)

onde: é definido, por convenção, como a derivada material.

Determinada a derivada material em função da aceleração do elemento de um

fluido, aplica-se essa definição à formulação integral da conservação da massa para um

cubo finito, descrito em coordenadas cartesianas, onde e são porções

infinitesimais de volume área superficial, é a massa específica e é o vetor unitário

normal à superfície (eq. 3.16). A Figura 43 ilustra o volume de controle definido

como um cubo finito de dimensões x, e .

Figura 43 - Volume de Controle (Figura de Introdução à Mecânica dos Fluidos/ Fox)

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(3.16)

Considerando que o volume é fixo no espaço, pode-se reescrever 3.16 como a

equação a seguir (eq. 3.17).

(3.17)

onde: I é a matriz identidade.

Dessa forma, obtém-se que para um fluido incompressível, isto é, com derivada

material da massa específica nula, que o divergente da velocidade deve ser nulo. Logo,

a equação da continuidade para um fluido dito incompressível é representada pela

equação 3.18.

(3.18)

onde: u, v, e w são as componentes cartesianas da velocidade [m/s].

III.4.1.1.3 Equação de Navier-Stokes

Como antecipado anteriormente, a equação de Navier-Stokes é uma formulação

do fenômeno de transporte de momentum no meio fluido. Essa formulação utiliza a

hipótese do continuo, a segunda lei de Newton e a hipótese de fluido newtoniano para

descrever tal fenômeno.

A presente subseção descreverá de forma breve a formulação dessa equação tão

importante para a compreensão do escoamento atmosférico. A dedução completa da

equação de Navier-Stokes é feita nas referências [1] e [4] do presente trabalho.

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Primeiro, ainda utilizando uma representação cartesiana do volume de controle,

descreve-se todas as tensões empregadas à superfície de um cubo finito. A ilustração a

seguir (Figura 44) ilustra a descrição de todas as tensões atuantes na direção x.

Figura 44 - Balanço de tensões na direção x de um volume de controle cartesiano (Figura de

Introdução à Mecânica dos Fluidos/ Fox)

Considerando a hipótese de fluido newtoniano, tais tensões podem ser expressas

como gradientes das propriedades do fluido, tais como a velocidade (u), a pressão ( ) e

viscosidade dinâmica ( ) [N.s/m2] – consultar referência [1]. As equações 3.19 e 3.20

explicitam a formulação das tensões axiais ( ) e cisalhantes (

) atuantes na

superfície do volume de controle.

(3.19)

(3.20)

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O balanço dessas tensões e a aplicação da segunda lei de Newton resultam na

formulação cartesiana das equações de Navier-Stokes, representada pela equação a

seguir (eq. 3.21).

(3.21)

onde: é a aceleração da gravidade na direção i [m/s2]

Sob a condição da incompressibilidade do escoamento, a equação de Navier-

Stokes se reduz a equação vetorial 3.22.

(3.22)

III.4.1.1.4 Reynolds Averaged Navier-Stokes Equations (RANS)

Os escoamentos encontrados em situações de engenharia, como o caso do

escoamento atmosférico modelado para fins de estudo do potencial eólico, são

turbulentos.

Desse modo, uma forma de lidar com a turbulência, inerente ao escoamento de

um fluido, é a tomada da média das equações de transporte que modelam tal

escoamento. Portanto, define-se as grandezas do escoamento como a soma de médias e

flutuações e realiza-se a média da equação incompressível de transporte de momentum e

de conservação de massa.

O procedimento descrito acima é mostrado em detalhes na referência [2] e tem

como resultado a equação 3.23, também conhecida como Reynolds Averaged Navier-

Stokes Equations (RANS), que é sujeita a equação média da continuidade (eq. 3.24).

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(3.23)

(3.24)

onde: é a média da velocidade do escoamento na direção i [m/s]; é a flutuação da

velocidade do escoamento na direção i [m/s]; é viscosidade cinemática do escoamento

[m2/s]; é a média das forças de campo na direção i [N]; e

é a média do produto

das flutuações da velocidade nas direções i e j.

A RANS é sujeita, também, à condição de não penetrabilidade e da lei da parede

– velocidade horizontal nula em qualquer superfície sólida.

III.4.1.2 Modelo de Turbulência - (Parametrização do WindSim)

A grande questão a se resolver quando se trabalha com as equações médias de

Navier-Stokes é a modelagem do termo proveniente da média do produto das flutuações

da velocidade (

). Para esse termo atribui-se o conceito de uma viscosidade

turbulenta ( ), descrito na equação a seguir (eq. 3.25).

(3.25)

onde: é o delta de Kronecker; e é a energia cinética turbulenta [m2/s

2], definida na

equação a seguir (eq. 3.26).

(3.26)

Dessa forma, existem modelagens de turbulência única e exclusivamente para

formular um fechamento para as equações médias de Navier-Stokes, também conhecida

como equações de Reynolds, modelando a viscosidade turbulenta ( ) – deve-se levar

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em conta que a viscosidade turbulenta é uma propriedade do escoamento e não do

fluido.

Por sua vez, o software WindSim utiliza a modelagem de turbulência - para

realizar o fechamento da RANS. Essa modelagem possui esse nome porque expressa a

viscosidade turbulenta em função de duas equações de transporte criadas para grandezas

que satisfazem a dimensão da viscosidade turbulenta, a energia cinética turbulenta (k) e

a dissipação ( ). As equações a seguir (3.27 a 3.29) são o fechamento do problema da

modelagem da viscosidade turbulenta proposta por esse modelo de turbulência – a

dedução das equações de transporte se encontra na referência [2].

(3.27)

(3.28)

(3.29)

onde: é o termo de produção de energia cinética turbulenta, expresso pela equação

3.30; e , , , , são constantes determinadas pelas parametrizações do

software e expressas na tabela 8 – o WindSim dá a opção de duas parametrizações

diferentes: a tradicional parametrização do modelo - , denominada como standard k-

epsilon model constants; e a parametrização particular do programa, denominada como

modified k-epsilon model constants.

(3.30)

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Tabela 8 - Parametrizações do Modelo de Turbulência no Software WindSim

Parametrização

Standard 0.09 1.0 1.3 1.44 1.92

Modified 0.324 1.0 1.85 1.44 1.92

Fonte: WindSim Validation

III.4.2 Modelo de Esteira

Ao agruparmos turbinas em parques eólicos ocorrem efeitos de interação entre

elas devido à operação de turbinas localizadas na esteira de outras turbinas. Como

consequência, temos uma ligeira queda de produção de energia e um aumento nas

cargas de fadiga aplicadas sobre as pás das turbinas.

Ao projetar um parque eólico, devem-se levar em conta todos estes efeitos, de

modo a conseguir uma operação que produza energia suficiente e para que as pás

possam resistir aos efeitos de fadiga causados pelas tensões turbulentas de Reynolds. É

necessário também atentar ao projeto da localização do parque em si.

Nessa subseção serão analisadas as duas técnicas, referentes à perda por efeito

esteira na geração energética do parque, que foram utilizadas no estudo de caso: a

modelagem de esteira “comprimento de mistura” e a metodologia Deep Array.

III.4.2.1 Modelo Comprimento de Mistura (AINSLIE, 1986)

Ao modelar a esteira através de um comprimento de mistura, Ainslie tinha em

mente entender a física do problema de esteira, uma vez que os modelos existentes até o

momento da publicação de seu artigo não conseguiam explicitar fisicamente todos os

problemas. O modelo de comprimento de mistura tem dois benefícios ao problema de

esteira: descrição dos efeitos turbulentos na mistura do escoamento na camada limite da

esteira e descrição do efeito da turbulência ambiental na esteira.

Segundo Ainslie, estudos feitos em esteiras de turbinas indicam a existência de

uma região complexa próximo à esteira que se estende sobre aproximadamente 2 a 4

diâmetros de turbina a jusante do escoamento. Nesta região há uma relaxação dos

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gradientes de pressão axial e radial, que são causados pela extração de energia do

escoamento principal no rotor da turbina. Esta extração causa redução na velocidade e

um aumento na espessura da esteira conforme o ar continua o seu movimento natural. A

velocidade mínima irá ocorrer entre 1 e 2 diâmetros após a turbina, onde a velocidade

começa a aumentar novamente. Os vórtices de ponta do rotor da turbina começam a cair

dentro de 2 a 3 diâmetros devido à turbulência do ambiente.

A taxa de recuperação da esteira após passar por esta complexa região é

determinada pela turbulência gerada na camada limite da esteira e do nível de

turbulência ambiental, que é função do lugar onde é situado o parque eólico, da altura

das turbinas – quanto menores, ou seja, quanto mais próximas do solo, maior é a

turbulência ambiental – e da estabilidade da atmosfera.

III.4.2.1.1 Modelagem Matemática

No modelo de comprimento de mistura, o escoamento na esteira será

considerado axissimétrico, completamente turbulento, sem velocidade circunferencial –

irrotacional – e o campo de escoamento será considerado estacionário no tempo. Os

gradientes de pressão fora da região de esteira serão considerados desprezíveis. Os

gradientes na direção radial serão considerados muito maiores do que os gradientes na

direção axial. Assim, as equações de Navier-Stokes podem ser aproximadas pela teoria

de camada limite, desprezando os termos viscosos (eq. 3.31).

(3.31)

temos também a equação da continuidade (eq. 3.32):

(3.32)

onde: é a velocidade axial [m/s]; é a velocidade radial [m/s]; é a distância axial

medida em relação à turbina eólica [m]; é a distância radial medida a partir da linha de

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centro da esteira [m]; e é a Tensão de Reynolds [m2/s

2] – definido como o produto

entre as flutuações das velocidades.

O conceito de viscosidade turbulenta será usado para descrever o termo da

tensão de cisalhamento através de um comprimento de mistura, definida como (eq.

3.33):

(3.33)

em que:

(3.34)

onde: é a escala de comprimento [m]; é a escala de velocidade que descrevem a

camada limite da esteira [m/s]; e é a contribuição da turbulência ambiente para o

comprimento de mistura [m2/s].

As escalas de comprimento e de velocidade são tomadas de forma a serem

proporcionais à largura da esteira e à diferença de velocidade através da camada limite

da esteira.

Para distâncias à turbina menores do que cinco diâmetros de rotor, é necessário

alguma correção na relação para o comprimento de mistura. A correção é feita com a

inserção de um fator F para filtrar a equação os valores da turbulência. O fator é

definido como (eq. 3.35 e 3.36):

; para x < 5,5

(3.35)

; para x ≥ 5,5

(3.36)

assim:

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(3.37)

(3.38)

onde: é uma constante adimensional dada por 0,015; é a constante de Von Kármán;

é o nível de turbulência ambiental [%]; é a velocidade da linha central [m/s]; é

a velocidade do escoamento [m/s]; e é a medida da largura da esteira [m].

Todas as distâncias devem ser normalizadas com respeito ao diâmetro do rotor.

Baseado em dados experimentais, Ainslie concluiu que o perfil inicial da esteira é

Gaussiano e da forma descrita pela equação 3.39 abaixo:

(3.39)

Através da equação de conservação de quantidade de movimento é possível

relacionar o déficit da linha de centro da esteira ( ) com o coeficiente de impulsão do

rotor ( ) e assim chegar a uma expressão (eq. 3.40) para a largura inicial da esteira:

(3.40)

De dados experimentais, Ainslie chegou a uma relação empírica que relaciona o

déficit inicial da esteira ao coeficiente de impulsão do rotor e à intensidade de

turbulência ambiente (eq. 3.41):

(3.41)

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Agora é possível resolver para a velocidade atrás de uma turbina eólica. A

solução requer um esquema de integração numérica. Usando o método de Crank-

Nicholson, incondicionalmente estável, baseado em diferenças centradas no espaço e

uma regra trapezoidal no tempo, dando um método de segunda ordem no tempo. A

solução deste problema é bem demorada, por isso, foi desenvolvido um método mais

simples para conseguir abordar este problema.

III.4.2.1.2 Simplificações à Modelagem Matemática

O perfil Gaussiano da esteira é preservado em todas as regiões após a turbina, de

tal maneira que apenas sua largura e sua profundidade sofrem alguma alteração. Já que

a largura da esteira está relacionada ao déficit através da conservação de quantidade de

movimento, sobra apenas o déficit da linha de centro da esteira para resolver.

(3.42)

Substituindo a equação (3.42) e a equação da continuidade (3.32) na equação de

conservação da quantidade de movimento, temos a equação 3.43:

(3.43)

onde:

(3.44)

A equação obtida acima (eq. BB) é uma equação diferencial de primeira ordem,

de forma que pode ser resolvida de maneira rápida e eficiente usando um esquema de

integração numérica simples.

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III.4.2.2 Metodologia Deep Array

Os modelos de esteira para turbinas que existiam antes da proposição desta

teoria não levavam em consideração as perdas da esteira em projetos grandes com

muitas linhas de turbinas. Estes modelos ignoravam a interação entre as turbinas e a

atmosfera. Quando as turbinas retiram energia do vento através de seu rotor isso cria

uma zona onde a velocidade é reduzida a jusante. A montante e fora desta zona de

influência, o vento natural não é afetado pela presença das turbinas.

Teoria e experimentos demonstram que para grandes números de turbinas isto

não é válido, ou seja, a presença das turbinas irá reduzir a quantidade de energia

disponível para cada turbina retirar do vento que corre naturalmente no local de

instalação do parque eólico.

Novos modelos que envolvem o "deep-array" são necessários para simular

corretamente este efeito de perda de carga devido à presença de muitas turbinas na

região. Este problema de predição das perdas de carga envolve a dinâmica do problema,

interações entre as turbinas e algumas propriedades da atmosfera, como gradientes de

temperatura, pressão, velocidade e também a turbulência. Para a resolução de problemas

deste tipo é necessário um maquinário computacional muito forte, porém é de se esperar

que algumas simplificações funcionem bem para o projeto e estimativa da energia de

produção na próxima geração de projetos de energia eólica.

O modelo de Deep Array é um recurso do programa Open Wind para permitir

melhores cálculos que envolvam as perdas induzidas pela presença de turbinas no

caminho do escoamento natural de ar na região de localização do parque eólico – para o

estudo de caso, o cálculo das perdas por efeito esteira foi realizado com o auxílio do

modelo de comprimento de mistura atualizado pela metodologia deep array.

III.4.2.2.1 Aspectos Teóricos da Metodologia Deep Array

A aproximação usada no método de Deep Array empregada no Open Wind é

baseado em uma teoria de Sten Frandsen, onde um arranjo infinito de turbinas eólicas é

representado como uma região com alta rugosidade superficial. Esta rugosidade irá

gerar arrasto na atmosfera, causando uma redução na velocidade de escoamento do

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vento na altura do cubo de geração da turbina. De acordo com a teoria, formulou-se uma

rugosidade equivalente para o parque eólico, que é escrita de acordo com a relação

abaixo (eq. 3.45):

(3.45)

onde: é a altura do cubo da turbina [m]; é a constante de Von Kármán, é a

rugosidade ambiental entre as turbinas [m]; e é o coeficiente de impulsão distribuído

(Thrust Coefficient) [adimensional] – pode ser encontrado de acordo com uma relação

entre o coeficiente de impulsão da turbina e os espaçamentos entre os cubos em duas

direções medidos em função do diâmetro do rotor (eq. 3.46):

(3.46)

A Figura 45 ilustra um gráfico onde é possível ver como a rugosidade

equivalente do parque eólico é profundamente dependente do espaçamento entre as

turbinas e nem tão dependente assim da rugosidade ambiental - no gráfico foi assumido

que a rugosidade para instalações offshore vale 0,001m e para instalações onshore vale

0,03m.

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Figura 45 - Rugosidade equivalente (fonte: AWS True Power)

O gráfico mostrado acima usou um espaçamento médio (RD), calculado como a

média geométrica do espaçamento na direção do escoamento (sd) e o espaçamento na

direção transversal ao escoamento (sc).

É possível enxergar que para maiores espaçamentos entre as turbinas, a

rugosidade equivalente tem seu valor diminuído, concluindo que uma turbina exerce

pouca influência na perda de potencial das outras turbinas.

Uma vez que a rugosidade equivalente está definida, podemos obter uma relação

entre a verdadeira velocidade do vento na altura do cubo da turbina e a velocidade do

vento natural, longe da região afetada pelo posicionamento do parque eólico, de maneira

que o vento contém toda a energia possível para ele naquela região de acordo com

características da atmosfera. Considerando uma velocidade constante para o vento e um

perfil logarítmico através da camada limite planetária, temos o seguinte resultado para

comparar as duas velocidades citadas anteriormente no texto (eq. 3.47):

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(3.47)

A Figura 46 ilustra a visualização gráfica desta relação.

Figura 46 - Perfil logarítmico através da camada limite planetária (fonte: AWS True Power)

Quanto menor a distância entre as turbinas, menor a velocidade disponível para a

altura do cubo de produção do rotor das turbinas, uma vez que um número maior de

turbinas dentro de uma mesma área causa maior turbulência na esteira, diminuindo a

energia do vento que está escoando naquele local.

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Figura 47 - Aumento da distância entra as turbinas

A imagem acima (Figua 47) mostra o porquê de ao aumentarmos a distância

entre as turbinas o valor da velocidade disponível para elas na altura do cubo da turbina

aumenta. À medida que afastamos as turbinas estamos permitindo que o déficit de

velocidade causado pela retirada de energia em uma turbina é compensado pelo

escoamento natural que retorna ao seu valor original, permitindo que as turbinas

encontrem um valor mais alto de energia disponível para elas poderem transformar em

energia eólica.

III.4.2.2.2 Acoplamento da Metodologia Deep Array com o Modelo

‘Comprimento de Mistura’

O acoplamento entre os modelos é implementado no programa Open Wind e usa

equações que descrevem os efeitos à jusante das mudanças causadas pela rugosidade na

velocidade do vento do escoamento.

Em termos de modelagem, o acoplamento entre as duas técnicas se dá de uma

forma bem simples no software: as equações das camadas limites internas modificam a

velocidade de corrente do vento que é usada para colocar nas equações de comprimento

de mistura desenvolvidas por Ainslie.

Neste método, cada turbina ocupa uma área discreta com uma determinada

rugosidade equivalente de superfície. Ao chegar à turbina, o vento cria uma camada

limite interna, causada pela rugosidade da superfície. Após passar pela turbina, o vento

cria uma segunda camada limite para poder retornar às condições ambientais do seu

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próprio escoamento. As duas camadas limites crescem com a distância à jusante, e são

geradas para cada uma das turbinas que apareçam no caminho do escoamento.

Considerando o primeiro par de camadas limites internas, podemos escrever a

equação abaixo (eq. 3.48) para o ajuste da velocidade disponível na altura do cubo da

turbina:

(3.48)

onde: e são as alturas da primeira e da segunda camada limite interna e e

são as rugosidades da turbina e a rugosidade ambiental respectivamente – após alguns

experimentos, chegou-se à conclusão de que a altura 1, da primeira camada limite

interna é a altura da parte de cima do rotor da turbina enquanto a altura 2, da segunda

camada limite interna é a altura da parte inferior do rotor da turbina.

Em suma, a metodologia Deep Array é uma ferramenta que melhora os métodos

já existentes, ao levar em conta a interação entre as turbinas ao diminuir a velocidade

disponível na altura do cubo de geração de energia elétrica de cada uma delas. Assim,

ele deve ser combinado com os métodos existentes para gerar resultados mais

realísticos. Ele também faz com que a relação entre a turbina e o ambiente ao seu redor

seja uma relação de duas vias, diferentemente do que os métodos originais levavam em

conta, acreditando que as turbinas não modificavam o escoamento do ambiente ao seu

redor. Esta ferramenta permite a otimização dos projetos, uma vez que está levando em

conta as perdas causadas pela colocação de turbinas nos locais de produção de energia.

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CAPÍTULO IV – ESTUDO DE CASO

O estudo de caso, do projeto em questão, consiste no desenvolvimento de um

projeto eólico em terreno complexo e com a análise do escoamento realizada em

ferramenta CFD. Para a realização da meta ambiciosa descrita acima, foi necessário

concluir quatro etapas bem definidas e necessárias: a manipulação e obtenção dos dados

do terreno; a obtenção e a correlação dos dados de vento; a simulação do escoamento

atmosférico; e a definição e otimização do layout do parque eólico. As seções a seguir

descrevem em detalhes cada etapa do estudo de caso.

IV.1 Manipulação e Obtenção de dados de Terreno

Primeiramente, foi realizada a obtenção dos dados de topografia no banco de

dados do software Meteodyn WT – dados com uma resolução de 92,2m

aproximadamente (base SRTM) – e de rugosidade fornecido pelo INPE (Instituto

Nacional de Pesquisas Espaciais) – dados com resolução de 500m. A imagem a seguir

(Figura 48) ilustra a visualização dos dados de topografia e rugosidade do estado do

Ceará no Global Mapper.

Figura 48 - Topografia (esquerda) e Rugosidade (direita) do Ceará

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Após a importação dos dados de terreno no software Global Mapper, foi criado

um arquivo da extensão .gws com os dados de rugosidade e topografia a uma resolução

de 92m. Nessa operação foi necessário realizar um 'sample30

' nos dados para uma

resolução única de 92m – correspondente à resolução do dado mais refinado, o dado de

topografia.

Por fim, foi criado um novo projeto na ferramenta WindSim com o arquivo .gws

gerado anteriormente e rodado o módulo (Terrain) do software para a criação de um

arquivo de terreno 3D. A imagem a seguir (Figura 49) ilustra a visualização do arquivo

3D de terreno no software WindSim.

Figura 49 - Arquivo 3D de terreno gerado no WindSim

IV.2 Obtenção e Correlação dos Dados de Vento

Para a realização desse estudo de caso, foram utilizados três dados observados

para uma região próxima à região do projeto – Embuaca, Icaraí I e Icaraí. Todavia,

como os dados observados disponíveis estavam à uma distância considerável da área do

30

A operação sample é amplamente utilizada em ambientes de geoprocessamento. Esta operação se dá pela modificação da resolução de um raster ou uma matriz para uma resolução objetivo.

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90

projeto, foram baixados seis dados da série de reanálise MERRA para preencher o

domínio da simulação do vento – em anexo ao corrente trabalho encontram-se os

histogramas e rosas de frequência do vento de todos os dados utilizados nesse estudo de

caso, contemplando dados observados, de reanálise e as informações de vento sintéticas,

isto é, geradas no software de simulação do escoamento atmosférico, como será descrito

na próxima subseção desse capítulo.

IV.2.1 Correlação da Climatologia Local

Para utilização dos dados de reanálise do MERRA avaliou-se a correlação com

dados anemométricos de torres de medição próximas. Segundo Gardner (2007) o

coeficiente de Pearson (R2) para correlação mensal em todas as direções deve ser acima

de 0,8 para que seja uma boa correlação. Observa-se que, apesar das distâncias (entre 24

e 115 km) a maioria dos coeficientes encontra-se acima de 0,8.

As tabelas a seguir (Tabelas 9 a 11) mostram todos os resultados do estudo de

correlação. Foram utilizadas todas as técnicas de cálculo de R2, disponíveis no software

de análise estatística do vento WindoGrapher (Tabela 12), para avaliar a correlação de

todos os dados observados com todos os dados de reanálise. O único dado de reanálise

que apresentou valores de R2

abaixo do critério foi o dado nomeado como ‘Bs’ quando

correlacionado com o dado observado de Embuaca – esse dado, ponto ‘Bs’, obteve um

coeficiente de Pearson acima de 0,8 quando comparado com os outros dois dados

observados e valores muito próximos de 0,8 quando comparados com ‘Embuaca’, logo,

também foi considerado como tendo um coeficiente de correlação acima do critério.

Tabela 9 - Resultados do estudo de correlação (referência Embuaca)

MERRA DISTÂNCIA R2 (LLS) R

2 (TLS) R2 (VR) R

2 (WBL) R2 (SS)

A 80.9 km ENE 0.893 0.890 0.890 0.893 0.861

As 78 km ESE 0.860 0.854 0.855 0.855 0.841

B 31.6 km N 0.861 0.856 0.856 0.854 0.854

Bs 24 km S 0.780 0.763 0.767 0.761 0.780

C 115 km NE 0.903 0.900 0.900 0.902 0.877

D 87.2 km N 0.883 0.880 0.879 0.879 0.868

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Tabela 10 - Resultados do estudo de correlação (referência Icaraí)

MERRA DISTÂNCIA R2 (LLS) R

2 (LTS) R2 (VR) R

2 (WBL) R2 (SS)

A 67.2 km NE 0.923 0.922 0.921 0.923 0.902

As 42.2 km E 0.915 0.914 0.913 0.914 0.902

B 61 km NNW 0.924 0.923 0.923 0.922 0.920

Bs 32 km W 0.875 0.871 0.871 0.868 0.875

C 116 km NNE 0.925 0.925 0.924 0.925 0.911

D 113 km NNW 0.934 0.934 0.933 0.934 0.925

Tabela 11 - Resultados do estudo de correlação (referência Icaraí I)

MERRA DISTÂNCIA R2 (LLS) R

2 (LTS) R2 (VR) R

2 (WBL) R2 (SS)

A 66 km NE 0.917 0.915 0.915 0.917 0.885

As 46.4 km E 0.896 0.893 0.893 0.893 0.875

B 55.4 km NNW 0.899 0.897 0.893 0.895 0.891

Bs 29.5 km WSW 0.832 0.824 0.825 0.820 0.832

C 113 km NNE 0.922 0.921 0.921 0.922 0.897

D 107 km NNW 0.915 0.914 0.914 0.914 0.900

Todos os dados de reanálise utilizados no estudo apresentaram correlação

mensal acima do critério de validação quando comparados com todos os dados

observados de vento do projeto – Embuaca, Icaraí e Icaraí I. Em suma, todos os seis

dados de reanálise, baixados do MERRA, serão utilizados nas simulações.

Tabela 12 - Ajustes possíveis para cálculo do coeficiente de correlação R2

LLS LTS VR WBL SS

Técnica Mínimos

Quadrados (Linear)

Mínimos Quadrados

(Total)

Raio de Variância

Weibull Fit

SpeedSort

Fonte: WindoGrapher

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IV.3 Simulação do Escoamento Atmosférico

Após o tratamento dos dados do vento local, das informações orográficas e a

geração do arquivo 3D do terreno, referente à região a ser estudada, no software de

simulação WindSim, realizou-se o cálculo do escoamento e da produção energética do

parque eólico definido. Foram realizadas simulações setoriais – 16 setores

uniformemente espaçados – do escoamento da região de interesse. A etapa CFD

(Computational Fluid Dynamics), da metodologia aplicada pelo WindSim, usa como

dado de entrada os ventos geostróficos – ventos de 10m/s a uma altura de 500m.

IV.3.1 Simulação de “Larga Escala”

Foi realizada uma primeira etapa de simulações, denominadas como “larga

escala” devido à extensão da área a ser processada (aproximadamente 15.927 km2) e da

consequente baixa resolução utilizada para a geração da malha (aproximadamente 2 km)

devido a limitações do hardware.

A magnitude da área a ser processada deveu-se à necessidade de estudar o

comportamento do escoamento a jusante e a montante da região montanhosa, que

compreende o projeto eólico, mitigando, dessa forma, o impacto da imprecisão gerada

na fronteira da área estudada na região onde o projeto estará localizado – oeste da

cadeia de montanhas. Para esta etapa a metodologia utilizada aplica a lei logarítmica nas

fronteiras da região estudada como condição de contorno. As imagens a seguir (Figuras

50, 51 e 52) ilustram a convergência dos parâmetros de velocidade (U1, V1, W1),

energia cinética turbulenta (KE) e dissipação (EP) para os setores mais frequentes do

vento da região – 67, 90 e 112 graus – na simulação via CFD.

Para garantir a validade dos resultados gerados nessa etapa, a simulação setorial

via CFD, é necessário averiguar a convergência de todos os setores. Os gráficos que

comprovam a convergência dos demais setores dessa simulação se encontram em anexo

no final do trabalho. Nesse anexo é possível comprovar a convergência de todos os

setores simulados.

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Figura 50 - Convergência Setorial 67o (Larga Escala)

Figura 51 - Convergência Setorial 90o (Larga Escala)

Figura 52 - Convergência Setorial 112o (Larga Escala)

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Após a etapa CFD setorial do WindSim, foram inseridos os dados de vento na

simulação – tanto os dados de séries de reanálise quanto os dados observados da região.

A Figura 53 ilustra a localização desses dados de vento – a posição dos dados

observados, isto é, medidos, é simbolizada pelo marcador amarelo e a localização dos

dados sintéticos pelo marcador vermelho – e a Figura 54 apresenta a análise estatística

de um dos dados observados – dado observado de Embuaca.

Figura 53 - Localização dos dados de vento do conjunto de simulações de Larga Escala

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Figura 54 - Relatório da análise estatística do dado observado de Embuaca

O software de simulação usado também é capaz de gerar dados sintéticos de

vento usando como referência dados já inseridos na simulação. Foram gerados oito

dados sintéticos de vento usando a metodologia descrita acima, um para validação e sete

para o uso posterior na segunda rodada de simulações do estudo.

A validação se deu pela comparação dos parâmetros estatísticos do dado

observado da região de Embuaca com os parâmetros estatísticos de um ponto gerado na

mesma localização desse dado observado, mas com referência de um outro dado

fornecido ao programa (Tabela 13) – O ponto ‘B’ da malha do MERRA (Modern Era

Retrospective-Analysis). A Figura 55 ilustra a localização dos dados gerados pelo

programa.

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Figura 55 - Localização dos dados sintéticos de vento (gerados pelo WindSim)

Tabela 13 - Validação dos dados sintéticos

Dado Parâmetro A Parâmetro K Altura [m]

Observado 9,42 4,02 78

Sintético 9,26 4,31 78

Realizada a etapa de inserção dos dados na simulação de larga escala, foi gerado

o Wind Resource Grid (WRG), que contém informações do campo de velocidades da

região estudada para as alturas de 120m e 110 m – alturas de interesse para a posterior

otimização do layout do parque, por serem as maiores alturas de hub disponíveis para os

aerogeradores que serão avaliados nessa etapa de definição do layout do parque eólico.

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O resultado obtido levou em conta o resultado das simulações de todos os

setores e informa a média do vetor de velocidade horizontal para cada ponto da malha

da simulação. A Figura 56 ilustra o WRG à 120 m obtido na simulação de larga escala e

a localização de todos os dados de vento utilizados e gerados durante o processo.

Figura 56 - WRG de Larga Escala @ 120 m

IV.3.2 Metodologia Nesting

Após o primeiro ciclo de simulações, iniciou-se o cálculo mais refinado do

escoamento, apenas da região montanhosa que engloba a área do projeto, com uma

resolução de 276m. As figuras a seguir (Figura 57 e 58) ilustram o modelo 3D de

terreno refinado para a área de processamento dessa segunda etapa de simulações.

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Figura 57 - Modelo 3D de terreno com malha refinada

Figura 58 - malha do modelo 3D de terreno com malha refinada

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A metodologia dessa segunda etapa de simulações é bastante semelhante à

primeira, todavia a condição de contorno nas fronteiras da simulação não utiliza a

simplificação da lei logarítmica, mas sim os dados calculados na simulação de larga

escala, realizando o acoplamento com o ciclo de simulações anterior.

Para compatibilizar as duas etapas de cálculo – ‘malha refinada’ e ‘larga escala’

–, a simulação de malha refinada também foi dividida em 16 setores uniformemente

espaçados e usou como entrada a condição de ventos geostróficos – para uma espessura

de camada limite atmosférica de 500m e com intensidade de 10m/s. A Figura 59 ilustra

a convergência dos parâmetros de velocidade (U1,V1,W1), energia cinética turbulenta

(KE) e dissipação (EP) para o setor predominante do vento da região – 90 graus. A

convergência dos demais setores está como anexo no final do trabalho.

Figura 59 - Convergência setorial 90o (Malha Refinada)

Analogamente ao primeiro ciclo de simulações, foram inseridos os dados de

vento na simulação com malha refinada após a simulação da etapa CFD do escoamento,

usando como entrada ventos geostróficos.

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Os dados de vento inseridos neste ciclo de simulações foram gerados no ciclo

anterior (Larga Escala) e suas posições foram definidas de modo a respeitar a

recomendação da IEA (International Energy Agency) de 2 km de raio de espaçamento

entre as torres de medição – recomendação referente à certificação de projetos eólicos

situados em terreno complexo. A Figura 60 ilustra o raio de espaçamento dos dados e a

área definida como a área utilizável do projeto – critérios para a definição dessa área

serão descritos posteriormente no trabalho. A área utilizável do projeto encontra-se

simbolizada por dois padrões: pontos azuis para propriedades regularizadas e cor

vermelha para propriedades sem regularização fundiária pronta (banco de dados do

INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

Figura 60 - Espaçamento dos dados de vento sintéticos

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Uma vez definidos os dados de vento dentro das simulações de malha refinada,

foi calculada uma série de parâmetros para cada ponto da malha (Intensidade de

Turbulência, Inflow (β) – ângulo de ataque do escoamento incidente (eq. 4.1) –, Shear –

coeficiente de atrito ( ) –, Pressão, Direção e Média do Vento Horizontal) para as duas

alturas de interesse (120 m e 110 m). As imagens a seguir (Figuras 61 a 66) ilustram os

resultados a 120 m para o setor predominante do vento da região – 90 graus.

(4.1)

onde: é a componente da velocidade no eixo ‘z’ [m/s]; é a componente da

velocidade no eixo ‘x’ [m/s]; e é a componente da velocidade no eixo ‘y’ [m/s].

Figura 61 - Vetor velocidade horizontal (Malha Refinada) @ 120m/ 90o

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Figura 62 - Inflow (Malha Refinada) @ 120m/ 90o

Figura 63 - Shear (Malha Refinada) @ 120m/ 90o

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Figura 64 - Pressão (Malha Refinada) @ 120m/ 90o

Figura 65 - Direção do vetor velocidade horizontal (Malha Refinada) @ 120m/ 90o

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Figura 66 - Média de velocidade (Malha Refinada) @ 120m/ 90o

Por fim, o resultado das simulações de malha refinada é um WRG (Wind

Resource Grid) com a média ponderada dos resultados dos 16 setores. A Figura 68

ilustra o resultado final do estudo do escoamento atmosférico da região do projeto, um

WRG de escala refinada da região montanhosa, e a Figura 67 mostra os dois WRGs

calculados, lado a lado, mostrando o impacto da metodologia Nesting.

Figura 67 - Comparação dos WRGs (esquerda ‘larga escala’; direita ‘nesting’)

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Figura 68 - WRG de Malha Refinada

Ao compararmos os resultados das simulações com refinamentos de malha

diferentes, fica evidente que o simples fato de aumentar a resolução da malha pode

mudar drasticamente os resultados.

Basta realizar uma simples análise do range31

de médias de velocidade de ambos

os WRGs para verificar a veracidade da afirmação acima. Enquanto o WRG com malha

refinada ofereceu range de 2,168 a 12,507 m/s o WRG da simulação com malha menos

refinada ofereceu um range de 6,142 a 10,434 m/s.

31

Quando se fala no “range” dos resultados de uma simulação faz se referência a diferença entre o valor máximo e o valor mínimo de tais resultados

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Essa necessidade de refinar a malha é ainda mais marcante em terrenos

montanhosos – como o caso do projeto em questão. No caso da impactante diferença

dos resultados apresentados acima, o range dos resultados advindos da malha menos

refinada foi bem menor que o range dos resultados do WRB de malha refinada devido à

incapacidade da simulação que utilizou a malha menos refinada de descrever

corretamente o escoamento do vento por entre os vales e montanhas da área estudada no

projeto.

Em suma, ao reduzir a resolução das informações do terreno e da malha, a

simulação deixou de enxergar diversas regiões de separação e recirculação do

escoamento devido ao relevo acidentado, oferecendo resultados com pouca

representatividade com a realidade.

IV.4 Definição e Otimização do Layout do Parque Eólico

Após a obtenção e o tratamento das informações de terreno e dos dados de vento

e o cálculo do Wind Resource Grid (WRG) em malha refinada, faltava apenas a

definição de dois parâmetros – as restrições de posicionamento dos aerogeradores e o

modelo da turbina eólica – e a otimização do parque eólico para a conclusão do projeto,

isto é, a definição do layout final dos aerogeradores e a estimativa de produção

energética à uma probabilidade de excedência P90.

Primeiramente, foi realizado um estudo das restrições do projeto. A primeira

restrição definida nessa análise foi a escolha da área do empreendimento. Acessando o

banco de dados do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária),

foram mapeadas as propriedades com regularização fundiária pronta na cadeia de

montanhas da região de interesse – problemas relacionados à regularização fundiária

dos imóveis arrendados podem inviabilizar um projeto eólico.

Dessa forma, foi definida a área do empreendimento contendo duas grandes

propriedades em situação regular e uma área contendo imóveis sem regularização

fundiária pronta – região vizinha às duas propriedades onde a simulação do escoamento

apontava um bom recurso de vento. A imagem a seguir (Figura 69) ilustra a poligonal

da área do empreendimento eólico dividida em terras regularizadas – caracterizada pelo

padrão de pontos azuis – e terras não regularizadas – caracterizada pela cor vermelha.

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Figura 69 - Poligonal da área do empreendimento eólico

A anexação de terras ainda sem regularização fundiária pronta na área do

empreendimento do projeto eólico foi uma alternativa de considerar possíveis expansões

para o projeto. Considerando o ótimo prospecto de vento dessa área e a sua localização

– vizinha às duas propriedades regularizadas –, pode ser razoável, para o empreendedor

do projeto, realizar a regularização fundiária dessas terras, visando à expansão do

projeto eólico.

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Definida a área do empreendimento, foram mapeadas as restrições físicas e

legais do projeto. Considerando a baixíssima frequência de algumas restrições físicas –

rios, açudes, edificações, estradas e rodovias – na área de interesse, a única restrição

considerada foi a restrição de inclinação do terreno, visto que para um terreno

complexo, como o do projeto em questão, a inclinação do terreno atinge frequentemente

valores que impedem a instalação de aerogeradores.

Por fim, foi considerada a norma da EPE (Empresa de Pesquisa Energética) que

define um buffer negativo de 200m em relação à borda de empreendimentos eólicos.

Dessa forma, foi gerado um raster da área utilizável do projeto em questão, com

uma resolução de 10 m, considerando todas as restrições mencionadas anteriormente. A

Figura 70 mostra a visualização do software de otimização de parques eólicos –

OpenWind – da área utilizável do empreendimento (“Buildable Area”).

Figura 70 - Raster da Buildable Area do empreendimento eólico (gerado no OpenWind)

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Após o estudo e definição das restrições do projeto, o único parâmetro que ainda

falta ser definido é o modelo e o fabricante do aerogerador que será utilizado no parque.

Para tal análise, foram selecionados três aerogeradores diferentes: a máquina

Gamesa 2.1k 114RD do fabricante Gamesa; a máquina Alstom ECO 2.7k 122RD do

fabricante Alstom e a máquina SWT 2.3k 120RD do fabricante Siemens. A razão pela

qual tais modelos de máquina foram alvo do estudo em questão é devido: a sua

disponibilidade no mercado brasileiro; a dimensões das máquinas – como a altura de

Hub [120 m para a Alstom e a Gamesa e 110 m para a Siemens] e o diâmetro de rotor

que tais modelos oferecem; e a características das suas respectivas curvas de potência.

Para cada modelo de aerogerador selecionado, foi realizada uma otimização com

Layout expansivo a fim de determinar a capacidade máxima de aerogeradores, fixando

parâmetros como a máxima perda por efeito esteira permitida (10%) e o mínimo fator

de capacidade bruto à P50 (45%). A tabela a seguir (Tabela 14) reporta o resultado das

otimizações, demonstrando os valores de fator de capacidade e de geração de energia

líquida no P90, isto é, considerando as perdas e incertezas do projeto que devem ser

consideradas na hora de entrar em leilões de energia coordenados pela EPE.

Tabela 14 - Resultado das Otimizações

Turbina (Potência Nominal em MW)

Número de

Turbinas

Potência Instalada (MW)

FC @P50 Bruto (%)

FC @P90 (%)

Produção Líquida @P90

(GWh/ano)

GAMESA (2.1) 122 256.2 46.34 34.3 769.618

ALSTOM ECO (2.7) 94 253.8 45.16 33.4 743.600

SIEMENS SWT (2.3) 116 266.8 47.05 34.8 814.266

Para os cálculos do fator de capacidade líquido à P50 e, posteriormente, o

cálculo da produção energética do parque à P90, foram consideradas perdas elétricas e

mecânicas e incertezas de medição e modelagem – valores baseados em recomendações

do DEWI (Deutsches Windenergie Institut). As tabelas a seguir (Tabelas 15 e 16)

reportam as perdas e incertezas consideradas no estudo.

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Tabela 15 - Perdas Consideradas para Cálculo de P50 Líquido

Perdas

Paradas Forçadas 3,00 %

Manutenção Programada 1,00 %

Degradação da Pá do Aerogerador 0,50 %

Elétrica – Grid Interna e Interconexão 2,00 %

Elétrica – Perdas de Transmissão 2,50 %

Fonte: DEWI

Tabela 16 - Incertezas Consideradas para Cálculo de P90 Líquido

Incertezas

Medição do Vento 9,00 %

Extrapolação Horizontal 3,00 %

Incerteza Climatológica 8,00 %

Curva de Potência 10,00 %

Eficiência do Parque Eólico 1,0 %

Incerteza Total Acumulada 14,8 %

Fonte: DEWI

A partir da análise crítica dos resultados das otimizações, foi determinado que a

máquina da Siemens apresentou os melhores resultados nos quesitos técnicos, obtendo

os maiores valores de energia líquida e fator de capacidade no P90 - é interessante uma

posterior análise financeira para comprovar a escolha dessa opção de turbina eólica. A

imagem a seguir (Figura 71) ilustra a posição dos aerogeradores do Layout otimizado

com a máquina da Siemens em relação ao WRG de malha refinada e a área utilizável do

projeto.

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Figura 71 - Layout final do projeto

Por fim, na representação do Layout final do parque mostrada acima, cada

aerogerador está representado por um ponto inserido em uma elipse, que é, justamente,

o espaçamento mínimo que uma máquina pode se posicionar em relação à outra devido

à influência da esteira de aerogeradores a montante no desempenho de aerogeradores a

jusante – as dimensões da elipse são em função do diâmetro do rotor da turbina eólica e

é certificada pelo fabricante da máquina (5 diâmetros de rotor na direção predominante

e 2,5 na direção secundária).

A razão pela qual o espaçamento entre aerogeradores desse projeto teve esse

formato elíptico foi devido a uma característica muito importante do vento da região: o

comportamento monótono da rosa de frequência de todos os dados de ventos da região.

Dessa forma foi possível ajustar uma elipse na direção predominante do vento da região

– 90o (Leste).

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CAPÍTULO V – CONCLUSÃO

O trabalho que fora apresentado foi capaz de suprir o objetivo principal do

projeto: a elaboração de uma metodologia confiável para o estudo do escoamento

atmosférico de uma região de orografia complexa – uma metodologia nova,

inteiramente desenvolvida pelo autor (Daniel Agnese Ramos), que será implementada

no Cepel e publicada no congresso Brazil WindPower de 2016; e do desenvolvimento

de um projeto eólico em tais condições de terreno – avaliando todos os quesitos que um

desenvolvedor de projetos eólico deve considerar.

Em relação ao estudo de caso desenvolvido no projeto, é válido analisar que a

configuração final do projeto demonstrou-se viável em relação a todos os parâmetros

técnicos que avaliam o potencial eólico de uma região – esse trabalho não abordou duas

análises necessárias, a posteriori da análise de potencial eólico, para a implementação

de um projeto eólico: a análise financeira; e o estudo de conexão ao sistema elétrico

brasileiro, visto que não estava no escopo do trabalho – e que seu resultado final de

fator de capacidade, à uma probabilidade de excedência P90 – exigida pela EPE quando

se deseja entrar em leilões de energia – foi superior à média mundial e muito próximo

da média nacional (Tabela 17).

Tabela 17 - Médias de fatores de capacidade nos países

Países Brasil EUA China Austrália Espanha

Fator de Capacidade 36% 32% 24% 33% 27%

Fonte: Ministério de Minas e Energia, 2016

Um fato que penalizou bastante o valor desse parâmetro foi a modelagem de

incerteza para P90. Logo, como uma recomendação para a oferta desse projeto em

leilões de energia, seria interessante a realização de investimentos como campanhas de

medição na área do projeto e tomada de dados do terreno por topógrafos em campo, à

uma resolução mais detalhada, visto que tais medidas diminuiriam algumas dessas

incertezas modeladas e tornariam o projeto ainda mais competitivo no mercado

nacional.

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CAPÍTULO VI – REFERÊNCIAS

[1] Batchelor, G. K., AN INTRODUCTION TO FLUID DYNAMICS.

Cambrigde: Cambrigde University Press, 1967.

[2] Freire, A. P. S., Menut, P. P. M., Su, J., TURBULÊNCIA. Rio de Janeiro:

ABCM, 2002.

[3] Lange, M., Focken, U., PHYSICAL APPROACH TO SHORT-TERM

WIND POWER PREDICTION. Netherlands: Springer, 2005.

[4] Stull, R. B., AN INTRODUCTION TO BOUNDARY LAYER

METEOROLOGY. USA: Springer, 1988.

[5] Fox, R. W., Pritchard, P. J., McDonald, A. T., INTRODUÇÃO À

MECÂNICA DOS FLUIDOS. Rio de Janeiro: LTC, 2014.

[6] Kaltschmitt, M., Streicher, W., Wiese, A., RENEWABLE ENERGY –

TECHNOLOGY, ECONOMICS AND ENVIROMENT. Berlin: Springer, 2007.

[7] Brower, M. C., WIND RESOURCE ASSESSMENT: A Pratical Guide to

Developing a Wind Project. New Jersey: Wiley, 2012.

[8] Jain, P., WIND ENERGY ENGINEERING. USA: McGraw-Hill, 2011.

[9] Burton, T., David, S., Jenkins, N., Bossanyi, E., WIND ENERGY

HANDBOOK. UK: John Wiley & Sons, Ltd, 2001.

[10] Pinto, M., FUNDAMENTOS DE ENERGIA EÓLICA. Rio de Janeiro:

LTC, 2013.

[11] Custódio, R. S., ENERGIA EÓLICA – PARA PRODUÇÃO DE ENERGIA

ELÉTRICA. Rio de Janeiro: Centrais Elétricas Brasileiras S.A., 2007.

[12] Cavalcanti, I. F. A., Ferreira, N. J., da Silva, M. G. A. J., Dias, M. A. F. S.,

TEMPO E CLIMA NO BRASIL. São Paulo: Oficina de Textos, 2009.

[13] Montgomery, D. C., Runger, G. C., APPLIED STATISTICS AND

PROBABILITY FOR ENGINEERS. USA: John Wiley & Sons, Ltd, pp 97-135, 2003.

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[14] Olauson, J. e Bergkvist, M., MODELLING THE SWEDISH WIND

POWER PRODUCTION USING MERRA REANALYSIS DATA RENEWABLE

ENERGY, Vol. 76, pp. 717-725, 2005.

[15] Gardner, P., Garrad, A., Hansen, L.F., Jamieson, P., Morgan, C., Murray.

F., Tindal, A., Cruz, J.I., Arribas, L., Fichaux, N., 2007, Wind Energy – The Facts –

Part I – Technology.

[16] Lyra, G. B., PARÂMETROS DE RUGOSIDADE AERODINÂMICA

SOBRE VEGETAÇÃO ESPARSA. Tese (Doutorado em Agronomia) – Escola

Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” – Universidade de São Paulo, Piracicaba,

2005.

[17] Zanardi, R. P., GERAÇÃO DE MODELO DIGITAL DE TERRENO A

PARTIR DE PAR ESTEREOSCÓPICO DO SENSOR CCD DO SATÉLITE CBERS-2

E CONTROLE DE QUALIDADE DAS INFORMAÇÕES ALTIMÉTRICAS.

Dissertação (Mestrado em Sensoriamento Remoto) – Programa de Pós-Graduação em

Sensoriamento Remoto – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,

2006.

[18] Assireu, A. T., Pereira, R. R., Souza, V. C. O., Souza, A. F., Franchito, S.

H. APLICAÇÃO DO OPERADOR DE FRAGMENTAÇÃO ASSIMÉTRICA (FA)

PARA ESTIMATIVAS DA RUGOSIDADE SUPERFICIAL A PARTIR DE MAPAS

DIGITAIS DE ELEVAÇÃO: Universidade Federal de Itajubá, Instituto Nacional de

Pesquisas Espaciais, 2013 (Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto).

[19] Copque, A. C. S. M., Negrão, J. R. P., Ribeiro, V. R. USO DO

GEOPROCESSAMENTO EM ESTUDOS DE VIABILIDADE DE PROJETOS DE

PARQUES EÓLICOS NO ESTADO DA BAHIA: Universidade Católica do Salvador,

2013 (Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto).

[20] Ferreira, A. G., Mello, N. G. S. PRINCIPAIS SISTEMAS

ATMOSFÉRICOS ATUANTES SOBRE A REGIÃO NORDESTE DO BRASIL E A

INFLUENCIA DOS OCEANOS PACÍFICO E ATLÂNTICO NO CLIMA DA

REGIÃO: Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos, 2004 (Simpósio

Brasileiro de Climatologia).

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ANEXOS DOS RESULTADOS DO ESTUDO DE CASO

A seguir os gráficos de convergência de todos os setores das simulações de larga

escala e malha refinada.

Figura 72 - Convergência Setorial 0o (Larga Escala)

Figura 73 - Convergência Setorial 22o (Larga Escala)

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Figura 74 - Convergência Setorial 45o (Larga Escala)

Figura 75 - Convergência Setorial 67o (Larga Escala)

Figura 76 - Convergência Setorial 90o (Larga Escala)

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Figura 77 - Convergência Setorial 112o (Larga Escala)

Figura 78 - Convergência Setorial 135o (Larga Escala)

Figura 79 - Convergência Setorial 157o (Larga Escala)

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Figura 80 - Convergência Setorial 180o (Larga Escala)

Figura 81 - Convergência Setorial 202o (Larga Escala)

Figura 82 - Convergência Setorial 225o (Larga Escala)

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Figura 83 - Convergência Setorial 247o (Larga Escala)

Figura 84 - Convergência Setorial 270o (Larga Escala)

Figura 85 - Convergência Setorial 292o (Larga Escala)

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Figura 86 - Convergência Setorial 215o (Larga Escala)

Figura 87 - Convergência Setorial 337o (Larga Escala)

Figura 88 - Convergência Setorial 0o (Malha Refinada)

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Figura 89 - Convergência Setorial 22o (Malha Refinada)

Figura 90 - Convergência Setorial 45o (Malha Refinada)

Figura 91 - Convergência Setorial 67o (Malha Refinada)

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Figura 92 - Convergência Setorial 90o (Malha Refinada)

Figura 93 - Convergência Setorial 112o (Malha Refinada)

Figura 94 - Convergência Setorial 135o (Malha Refinada)

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Figura 95 - Convergência Setorial 157o (Malha Refinada)

Figura 96 - Convergência Setorial 180o (Malha Refinada)

Figura 97 - Convergência Setorial 202o (Malha Refinada)

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Figura 98 - Convergência Setorial 225o (Malha Refinada)

Figura 99 - Convergência Setorial 247o (Malha Refinada)

Figura 100 - Convergência Setorial 270o (Malha Refinada)

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Figura 101 - Convergência Setorial 292o (Malha Refinada)

Figura 102 - Convergência Setorial 315o (Malha Refinada)

Figura 103 - Convergência Setorial 337o (Malha Refinada)

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As imagens a seguir são referentes ao histograma da velocidade e a rosa de

frequência da direção de todos os dados de vento usados e gerados no estudo de caso.

Figura 104 – Dados do ponto do MERRA nomeado como ‘A’

Figura 105 - Dados do ponto do MERRA nomeado como ‘As’

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Figura 106 – Dados do ponto do MERRA nomeado como ‘B’

Figura 107 – Dados do ponto do MERRA nomeado como ‘Bs’

Figura 108 - Dados do ponto do MERRA nomeado como ‘C’

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Figura 109 - Dados do ponto do MERRA nomeado como ‘D’

Figura 110 – Dados gerados no WindSim

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Figura 111 – Dados gerados no WindSim

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Figura 112 – Dados observados de Embuaca

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Figura 113 - Dados observados de Icaraí

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Figura 114 - Dados observados de Icaraí I