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DÉCIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE APARECIDA DE GOIÂNIA-GO EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA DE FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DE APARECIDA DE GOIÂNIA, GOIÁS O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio dos Promotores de Justiça que esta subscreve, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, vem perante Vossa Excelência, com suporte nos artigos 129, inciso III e 37, caput e seu § 4.º, da Constituição Federal, nos artigos 117, inciso III, e 92, caput e seu § 4.º, da Constituição Estadual, no artigo 25, inciso IV, alíneas “a” e “b”, da Lei n.º 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, nas Leis 7.347, de 24 de julho de 1985 e 8.429, de 02 de junho de 1992, propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E DANO MORAL COLETIVO em desfavor de MARCOS VINÍCIUS ALVES, brasileiro, servidor público, inscrito no CPF/MF nº 949.954.191-87, portador da carteira de 1

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DÉCIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE APARECIDA DE GOIÂNIA-GO

EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA DE FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DE APARECIDA DE GOIÂNIA, GOIÁS

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por

intermédio dos Promotores de Justiça que esta subscreve, no exercício de suas

atribuições constitucionais e legais, vem perante Vossa Excelência, com suporte nos

artigos 129, inciso III e 37, caput e seu § 4.º, da Constituição Federal, nos artigos

117, inciso III, e 92, caput e seu § 4.º, da Constituição Estadual, no artigo 25, inciso

IV, alíneas “a” e “b”, da Lei n.º 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, nas Leis 7.347, de

24 de julho de 1985 e 8.429, de 02 de junho de 1992, propor

AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA E DANO MORAL COLETIVO

em desfavor de

MARCOS VINÍCIUS ALVES, brasileiro, servidor público,

inscrito no CPF/MF nº 949.954.191-87, portador da carteira de

1

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identidade 4143565 DGPC-GO, filho de José Alves Filho e Maria

Meuta Alves, residente e domiciliado na Rua SM 4, Jardim Santa

Maria, Goiânia – Goiás;

JOÃO CARVALHO COUTINHO JÚNIOR, brasileiro, servidor

público, inscrito no CPF/MF nº 796.177.271-53, portador da

carteira de identidade 3287490 SSP-GO, filho de João Carvalho

Coutinho e Joana Darc de Paula Coutinho, residente e domiciliado

na Avenida Padre Orlando de Moraes, Qd. 148, Lt. 01/03-23/25,

Apartamento 306, Residencial Viva Parque Cascavel, Torre Jatobá,

Parque Amazônia, Goiânia – Goiás;

I – DOS FATOS.

O inquérito civil público nº 037/2015 foi instaurado com a

finalidade de investigar a construção irregular de aproximadamente 112 barracões na

ala C, da Penitenciária Odenir Guimarães, situada nesta urbe.

De acordo com o Relatório de Inteligência nº 026/2015-

INTEL/SEAP/SSPAP/GO, elaborado pelo órgão de inteligência da Superintendência

Executiva de Administração Penitenciária (fls. 008/025), em diligência realizada, foi

identificada a construção de 112 barracões no pátio da ala “C”, da Penitenciária

Odenir Guimarães (POG).

No mencionado relatório, constavam informações de que o

responsável por financiar a obra seria um detento conhecido como “topete”,

chamado Thiago César de Sousa, preso por tráfico de drogas.

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Diante da constatação da construção irregular, a Coordenação de

Engenharia e Arquitetura da SEAP, instada, confirmou as irregularidades na

execução da obra, pois não teria sido apresentada nenhuma documentação para sua

execução, tampouco foi justificada a procedência dos recursos ali empregados.

Ainda, pelo que foi apurado, os próprios detentos foram os

responsáveis por construir a edificação, que teria como finalidade a acomodá-los

durante as visitas íntimas.

Frente a tamanhas irregularidades e a completa falta de

planejamento, não se vislumbrou outra alternativa senão a demolição de toda a

construção, conforme relatório fotográfico de fls. 19/20.

Sobre a obra e sua construção, cumpre transcrever trecho do

relatório de vistoria de obra nº 008/2015 (fls. 21/25), que apontou:

“ Não existe estrutura para suportar a edificação (edificação em alvenaria de canto virado); cobertura (telhas) assentadas diretamente sobre a alvenaria; aberturas de ventilação inexistentes e/ou insuficientes; corredores de acesso com dimensões insuficientes; telhado canalizando a água pluvial para um único ponto, podendo ocasionar alagamento dos espaços de visita intima; não identificamos execução de fundação nas edificações; ambientes são extremamente insalubres; instalações hidrossanitárias e elétrica improvisadas.(…)De acordo com a Resolução Nº 09, de 18 de Novembro de 2011, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCPC, a disponibilidade de espaços destinados a visitas intimas deverá “Os locais para visitas reservadas dos familiares e visitas intimas deverão constituir módulo próprio, isolado dos demais, com via de acesso disposta de modo a evitar contato dos visitantes com a população prisional em geral. Deverão ser formados por acomodações autônomas para visitas íntimas, pátios cobertos e descobertos, sanitários, revista, controle do agente, entre outros”.A construção na Ala “C” chega a 112 espaços edificados, criando um emaranhado de cubículos de difícil acesso e fiscalização pelos agentes penitenciários, sendo um fator de grande risco em momentos de crise ou motins .

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(…)Não foi possível falarmos com os supervisores administrativos e de manutenção da POG, sendo relatado pela equipe de plantão que os mesmos estavam ausentes naquele momento. Assim não conseguimos identificar a origem do material para a execução dessa edificação, ao questionarmos os membros da equipe todos alegaram que desconheciam por completo a origem do material ali empregado. Assim visando dirimir essa dúvida notificamos através do Memorando nº 123/2015-SEAP a unidade penal para prestar informações”.

Em sequência, concluiu o agente de segurança prisional Marcus

Patury:

“A obra encontra-se em andamento, os próprios custodiados estão executando as obras, os serviços executados até o momento apresentam baixa qualidade e falhas em sua execução, não foi possível identificar autorização de construção ou a existência de projetos de engenharia para essa edificação, não foi possível identificar a origem do material aplicado na edificação”.

Foi notificado a prestar esclarecimentos ao Ministério Público do

Estado de Goiás Marcus Rodrigo dos Santos, agente de segurança prisional, lotado

naquela unidade prisional que, conforme depoimento audiovisual de fl. 32, disse:

“(...) que quem trabalhou na obra foram os presos da Ala C; que quem administrou a obra foi o diretor, Marcos Vinicius, e Rubens; que quem administrava as obras, por parte dos presos, era Thiago Topete, Elizeu, (inaudível) Júnior; quem financiou a obra foram os próprios presos; que a receita da unidade é pequena e se estava errada a construção o dinheiro não veio da administração (...); que não houve a concordância da SEAP para construção; que haviam sido autorizados 10 ou 12 barracões (…) que o superintendente de segurança tinha meios de saber que a obra estava sendo executada, pois havia um pesado transito de veículos pesados; que estes caminhões passavam em frente à sala dele (…); que o superintendente, de nome João Júnior sabia da construção, bem como o gerente regional, Leandro Ezequiel, os supervisores da administração, o supervisor administrativo Rodolfo e próprio Rubens e as equipes da unidade sabiam (…); que ouviu de

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familiares de presos que haveria “cobrança” dos prejuízos sofridos; que alguns familiares afirmaram que “o marido teria gastado 40 mil, 50 mil, para construir aqueles barracões” (…); que os materiais eram adquiridos de uma só loja; que presenciou negociações de compra de materiais feitas por Marcos Vinicius (…); que não sabe se todos os pagamentos eram realizados no POG, mas que alguns pagamentos foram feitos naquele local, pois presenciou presos saindo da ala e, durante o procedimento de revista, era possível ver que os presos estavam portando volume de dinheiro; que logo após o preso subir, chegava o material de construção; que o pagamento era intermediado por Marcos Vinicius, que era “a ponte” com a rua dos detentos”.

No que pertine ao superintendente de segurança, o réu JOÃO

CARVALHO COUTINHO JÚNIOR, o agente de segurança, em depoimento

gravado em mídia digital acostado aos autos físicos, afirmou (3m30s/4m06s):

“(...) tinha que saber, se autorizou ou não aí já não tem como, mas pelo menos saber tinha como, tinha que saber. Porque o trânsito de veículos pesados lá é muito, passa em frente à sala dele, e uma obra desse tamanho naquela unidade, não um coisinha, um reformazinha, foi uma construção de mais ou menos 50x50, um espaço considerável em que foram construídas essas casas (...)”

Os materiais utilizados na construção foram adquiridos da empresa

Tocantins Max, Rede da Construção, localizada da Rua J-2, Mansões Paraíso,

Aparecida de Goiânia, por intermédio dos vendedores Henrique e entregues pelo

motorista Daniel.

Henrique foi notificado para prestar esclarecimentos e afirmou (fls.

44/46):

“(…) que no ano de 2014 realizou a venda de materiais à POG para construção do alojamento dos agentes prisionais daquela unidade, no valor aproximado de R$ 23.000,00, pagos com cheque do Conselho da Comunidade Goiana; que soube que os referidos materiais de construção se destinavam à construção dos alojamentos, em razão do auxílio que prestou para a construção dos mesmos; que já vendeu telhas para o telhado da enfermaria da

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POG, não se recordando da forma como foi realizado o pagamento; que há aproximadamente três ou quatro meses atrás vendeu diversos materiais de construção que foram pagos em dinheiro; que foram vendidos tubos, telhas, cimento, conexões diversas, 12 lavatórios para banheiro, 12 vasos sanitários, 12 caixas de descarga, areia e ferro; que foram várias compras efetuados no período de dois ou três meses; que recebeu o valor total aproximado de R$ 11.000,00; que vendeu aproximadamente quatro mil tijolos e soube que Marcos Vinicius adquiriu outros tijolos diretamente de outros fornecedor; que posteriormente ficou sabendo pela mídia e por amigos que os referidos materiais de construção estavam sendo utilizados para construir barracões dentro da penitenciária; que soube também que o diretor Marcos Vinicius foi afastado da direção do presídio em razão dos fatos; que não sabe dizer a origem do dinheiro; que recebeu o dinheiro das mãos de Marcos Vinícius e Lindorval (…); que ouviu por boatos e pela mídia que o dinheiro utilizado para adquirir os materiais de construção pertencia aos presos mas não sabe de a informação procede (…); que o declarante ou o motorista da loja, chamado Daniel, efetuavam a entrega do material de construção na penitenciária e recebiam o correspondente pagamento na sala da administração; que por mais de quatro vezes o declarante e Daniel fizeram entregas nos últimos quatro meses, ocasião em que falaram diretamente com Marcos Vinícius (…); que soube que a obra para a qual o material era destinado estava sendo executada com a mão de obra dos presos, porque Marcos Vinícius, todas as vezes que pedia a mercadoria, mencionava que a entrega não podia atrasar porque havia mais de duzentos homens trabalhando na obra e eles não podiam ficar parados (…) que segundo informações de Daniel, motorista terceirizado da loja, o material de construção era recebido por Marcos Vinícius.”

O Superintendente Executivo de Administração Penitenciária do

Estado de Goiás, Cel. Edson Costa Araújo, mediante ofício (fls. 49/50), prestou

esclarecimentos sobre os fatos e informou que foi o responsável pela determinação

da demolição dos barrocões construídos na Ala “C” da POG, pois conforme relatório

de vistoria de obras, as edificações não apresentavam quaisquer condições de

segurança e regularidade, bem como foi construída sem autorização.

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Este superintendente informou que Marcos Vinícius Alves foi

exonerado do cargo, no dia 20/11/2015 (fl. 56).

Conforme o Memorando nº 194/2015 – SEAP (fl. 58), o setor de

engenharia da Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária vem

orientando os gestores das unidades prisionais, desde 2011, sobre o dever comunicar

àquele setor qualquer modificação, adaptação ou intervenção nas edificações

prisionais ou administrativas, para análise e elaboração de estudos sobre sua

viabilidade.

Todavia, MARCOS VINÍCIUS ALVES, na condição de

gerente/diretor da POG não adotou tal providência, ignorou todas os procedimentos

necessários para construir naquela penitenciária e, por conta própria, mediante a

utilização de recursos públicos e doações para a POG, adquiriu materiais de

construção e autorizou que detentos construíssem, dentro da Penitenciária Odenir

Guimarães, alojamentos para visitas íntimas, agindo de maneira ilegal e colocando

em risco a população carcerária, os visitantes da unidade prisional e a integridade

física dos próprios agentes prisionais, tudo isso sub oculis do Superintendente de

Segurança Penitenciária JOÃO CARVALHO COUTINHO JÚNIOR.

Não restam dúvidas de que MARCOS VINÍCIUS ALVES foi o

responsável pela obra em questão, conforme afirmou, também, Rubens Teles

Barbosa, nos autos da Sindicância Nº 304/2015 (fls. 074/77), conforme segue:

“(...) que está em sua atribuição promover a manutenção da unidade, a limpeza e pequenos reparos; que no início do ano em curso recebeu naquela Unidade Prisional 01 (um) caminhão de areia, 01 (um) caminhão de brita, 50 (cinquenta) sacos de cimento, 10 (dez) vasos, 01 (um) caminhão de tijolos e 10 (dez) lavatórios, material este referentes à nota de empenho do processo nº 201200037002187, destinado à construção de 10 (dez) salas íntimas na Ala C da POG (…); Que no dia 04, ao chegar de férias deparou com a construção de uma galeria com várias salas, com as paredes erguidas e parcialmente coberto com telha Eternit (…); que logo após alguns dias recebeu determinação do diretor da

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unidade para que recebesse um caminhão carregado com telhas Eternit, mais ou menos 200 (duzentas) peças (…); que em um dos dias de seu trabalho, logo pela manhã, foi comunicado pelo chefe da equipe Wildes dos Santos, via rádio, que havia um caminhão carregado com tijolos para ser descarregado; que certificou-se com o motorista daquele caminhão o destino da carga, sendo que no pedido apresentado pelo motorista não havia nenhuma informação do destino da carga; que solicitou ao chefe de equipe que aguardasse o diretor da Unidade Marcos Vinicius chegar para resolver a situação (…) que escutou via rádio a informação de que o diretor da unidade Marcos Vinicius havia autorizado a entrada do caminhão para ser descarregado; que vários outros caminhões com materiais de construção foram descarregados naquela obra sem o conhecimento e/ou participação do depoente (…) que a referida obra estava sendo tocada por Marcos Vinicius (…) que achou o comportamento de Marcos Vinícius muito natural, no que se refere a construção em questão, tendo entendido que aquela obra estava devidamente autorizada pelos chefes superiores (…); que os caminhões com materiais de construção chegarem até o pátio e irem até a Ala C passaram de frente à Seção Administrativa da Superintendência de Segurança e da 1ª Regional”.

Nestes mesmo autos de sindicância, João Carvalho Coutinho Júnior,

Superintendente de Segurança Penitenciária, afirmou (fls. 121/123):

“(...) que no ano de dois mil e doze foi procurado pelo Diretor da POG Marcus Vinicius, tendo o mesmo lhe dito que queria construir algumas celas para visitas íntimas na Ala C da POG (…); que orientou Marcus a fazer a obra dentro dos padrões de segurança e de arquitetura (…); que tomou conhecimento que o Diretor Marcus Vinícius foi quem administrativo a obra (…).”

Cumpre mencionar que, por intermédio da Portaria Nº 490/2015 –

ACD/SEAP, de 17 de dezembro de 2015 (fls. 148/152), foi instaurado procedimento

administrativo disciplinar em desfavor de MARCOS VINÍCIUS ALVES.

Igualmente, não restam dúvidas de que recursos públicos foram

empregados naquela obra, conforme aponta nota de empenho de fls. 080/081, no

valor de R$ 11.480,00 (onze mil quatrocentos e oitenta reais). Tal dispêndio foi

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realizado por solicitação do próprio MARCOS VINÍCIUS ALVES, conforme

demonstram os documentos de fls. 91/93.

Mas a obra, como já dito, não contou apenas com recursos públicos,

tendo sido utilizados materiais doados por pessoa físicas e jurídicas àquela unidade

prisional, conforme demonstram as fls. 094/099, os quais, para todos os efeitos,

devem ser considerados para a composição do dano erário, haja vista que o Estado

de Goiás poderia se valer destas doações na construção dos alojamentos para visitas

íntimas.

Diante desses fatos, inequívoco que as ações de MARCOS

VINICIUS ALVES e a omissão de JOAO CARVALHO COUTINHO JÚNIOR

configuram ato de improbidade administrativa, conforme se passa a expor.

II – DO DIREITO

II.a – Da Configuração de Improbidade Administrativa

A Lei nº 8.429/92 cuidou de especificar três categorias de atos de

improbidade administrativa, quais sejam, os que importam enriquecimento ilícito, os

que causam prejuízo ao erário e aqueles que atentam contra os princípios da

Administração Pública.

Sobre cada uma das hipóteses de ato ímprobo, dispõem os artigos

10, e 11, do referido Diploma Legal:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (…)

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XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, (...)

Quanto às sanções cabíveis, a Lei nº 8.429/92 assim dispõe:

Art. 12. Independente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações: (…)

II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

II.a.1 – Da violação aos princípios da Administração Pública

Nos termos do artigo 37, caput, da Constituição Federal de 1998, in

verbis:

Art. 37. A Administração Pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

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Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, também, ao seguinte:

Sobre o princípio da legalidade, como norma de observância

permanente no âmbito da Administração Pública, de acordo com Helly Lopes

Meirelles, “significa que o administrador público está, em toda a sua atividade

funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e dele

não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a

responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso1”.

A complementar a definição suso transcrita, insta colacionar o

seguinte ensinamento:

“O administrador deve obediência à norma: o legislador, ao elaborar a norma, deve obediência à Constituição; e o juiz deve zelar pelo respeito à Constituição, o que inclui os princípios e regras que dela defluem, os quais a todos obrigam: Executivo, Legislativo e Judiciário.Desta forma, a ilegalidade ou a inconstitucionalidade do ato apresenta-se como relevante indício de consubstanciação da improbidade, já que o agente não observou o principal substrato legitimador de sua existência e norteador da atividade estatal.2”.

Já no que pertine ao princípio da moralidade, em síntese, este

deve ser entendido como o dever de agir com ética, probidade, honestidade,

razoabilidade e justiça.

O preceito em tela tem como corolário os princípios da

proporcionalidade e da razoabilidade. Estes, por sua vez, se desenvolveram ligados à

ideia de desvio de poder e denotam a hipótese em que o administrador público

utiliza de meios inadequados para atingir finalidades metajurídicas irregulares.

Consoante a administrativista Odete MEDAUAR3:1 Meirelles, Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 19ª Edição. Editora Parma. São Paulo. pg. 82.2 Garcia, Emerson e Alves Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 3ª Edição. Editora Lumen Juris.

São Paulo. pg. 68.3 Direito administrativo moderno. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, pp. 148-149.

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“O princípio da moralidade administrativa é de difícil expressão verbal. A doutrina busca apreendê-lo, ligando-o a termos e noções que propiciem seu entendimento e aplicação”.

Na doutrina pátria, Manoel de Oliveira Franco Sobrinho, que

dedicou obra específica à moralidade administrativa, tece as seguintes

considerações: “Muito embora não se cometam faltas legais, a ordem jurídica não

justifica no excesso, no desvio, no arbítrio, motivações outras que não

encontram garantia no interesse geral, público e necessário [...] o que se quer

defender é a lisura ou a exação nas práticas administrativas [...] a presunção de

fim legal equivale à presunção de moralidade” (O controle da moralidade

administrativa, 1974, p. 18, 19, 22, 186).

Vê-se, então, que o referido autor ligou moralidade administrativa à

exação, lisura e fins de interesse público. Hely Lopes Meirelles, que sempre incluiu

a moralidade entre os princípios da Administração, afirma que “ao legal deve se

juntar o honesto e o conveniente aos interesses gerais”; e vincula a moralidade

administrativa ao conceito de “bom administrador” (op. cit., p. 79 e 80).

Por sua vez, José Afonso da Silva parece aceitar a concepção de

Hauriou que vê a moralidade como o conjunto de regras de conduta extraídas da

disciplina geral da Administração; menciona, como exemplo, o cumprimento imoral

da lei, no caso de ser executada com intuito de prejudicar ou favorecer

deliberadamente alguém (op. cit., p. 571).

O doutrinador Gilmar Ferreira MENDES4, sobre o tema do desvio

de poder como faceta do princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade,

assevera que:

42 Controle de Constitucionalidade. São Paulo : Saraiva. 1990, pp. 39-42.

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O excesso de poder como manifestação de inconstitucionalidade configura afirmação da censura judicial no âmbito da discricionariedade legislativa ou, como assente na doutrina alemã, na esfera da liberdade de conformação do legislador (gesetzgeberische Gestaltungsfreiheit), permitindo aferir a compatibilidade das opções políticas com os princípios consagrados na Constituição. Nega-se, assim, à providência legislativa o atributo de um ato livre no fim, consagrando-se a vinculação do ato legislativo a uma finalidade.[...]Importa assinalar, todavia, que o vício de excesso de poder legislativo, externado sob a forma de desvio de poder, há de ser aferido com base em critérios jurídicos. Não se trata de perquirir sobre a conveniência e oportunidade da lei, mas de precisar a congruência entre os fins constitucionalmente estabelecidos e o ato legislativo destinado a prossecução dessa finalidade.A doutrina identifica como típica manifestação do excesso de poder legislativo a violação ao princípio da proporcionalidade ou da proibição de excesso (Verhältnismässigkeitsprinzip; Übermassverbt), que se revela mediante contrariedade, incongruência e irrazoabilidade ou inadequação entre meios e fins. 1 Direito administrativo moderno. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001, pp. 148-149.

Dessarte, os princípios da administração pública constituem

fundamentos da ação administrativa, verdadeiros sustentáculos da atividade pública,

devendo nortear o administrador para a boa guarda do interesse da coletividade, de

forma a evitar a malversação do dinheiro público.

Já o princípio da eficiência, como norma de observância obrigatória

por todo gestor público, se consubstancia no “dever de eficiência (...) que se impõe a

todo agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e

rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já

não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados

positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da

comunidade e de seus membros. Esse dever de eficiência, bem lembrado por

Carvalho Simas, corresponde ao dever de ‘boa administração’ da doutrina italiana, o

que já se acha consagrado, entre nós, pela Reforma Administrativa Federal do Dec.-

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Lei 200/67, quando submete toda atividade do Executivo ao controle de resultado

(arts. 13 e 25,V), fortalece o sistema de mérito (art. 25, VIII), sujeita a

Administração indireta a supervisão ministerial quanto à eficiência administrativa

(art. 26, III) e recomenda a demissão ou dispensa do servidor comprovadamente

ineficiente ou desidioso (art. 100)5”

Maria Sylvia Zanella Di Pietro, por sua vez, demonstra duas faces

do princípio da eficiência:

“ (…) o princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público”6.

Sandra Pires Barbosa entende que o princípio da eficiência possui

uma estreita relação com a moralidade administrativa, conforme segue:

“Convém ressaltar, finalmente, que o princípio da eficiência, além de extremamente vinculado ao princípio da legalidade, como destacado, está intrínsecamente relacionado também aos princípios da razoabilidade e da moralidade. Ao da razoabilidade porque o administrador deverá adotar critérios razoáveis por ocasião de sua atividade discricionária, evitando, dessa forma, cometer abusos; ao da moralidade porque a imoralidade administrativa é, em si, um ato que representa ineficiência grosseira.7(grifei)”

Pois bem. MARCOS VÍNICIUS ALVES e JOÃO CARVALHO

COUTINHO JÚNIOR, nas condições de gerente/diretor da Penitenciária Coronel

Odenir Guimarães e Superintendente de Segurança Penitenciária, respectivamente,

deviam obediência a todos estes princípios supra elencados.

5 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. 22 ed. São Paulo: Malheiros, 1997. P. 90.6 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 13 ed. São Paulo: Atlas. 2001. P. 83.7 BARBOSA, Sandra Pires. Impacto da globalização sobre o princípio da eficiência. Revista de direito

administrativo n. 244 – abril/junho. Rio de Janeiro: Editora Renovar. 2001. P. 206/207.

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É inegável que tais princípios não foram observados pelos réus

quando o primeiro teve a iniciativa de construir barracões do pátio da Ala “C” da

POG e o segundo por nada ter feito diante de uma construção completamente

irregular que colocava em risco a segurança da penitenciária..

Conforme já salientado, a Secretaria de Administração Penitenciária

vem orientando os responsáveis pelas unidades prisionais sobre os critérios a serem

observados em obras nestes locais.

Inobstante, o réu MARCOS não empreendeu nenhum tipo de

cautela preliminar para construção dos barracões naquele local.

Não foi observado a adequação daquela obra à luz das normas de

segurança e prevenção de ilícitos naquela edificação, bem como não foram

observadas as diretrizes traçadas pelo Conselho Nacional de Política Criminal e

Penitenciária na Resolução Nº 09, de 18 de novembro de 2011, e seus anexos.

Deixou o gestor da unidade de realizar qualquer estudo sobre a obra, o qual a ergueu

de inopino, assumindo, de sobremaneira a responsabilidade por seus atos.

Vale mencionar, ainda, o risco a que o réu MARCOS submeteu o

erário ao utilizar-se de mão de obra carcerária para a execução da obra, pois não se

tem notícia de terem sido utilizados EPI's ou mesmo que os detentos tivessem

qualificação para aquele serviço.

Igualmente reprovável é a ação, ou melhor, a omissão de JOÃO

CARVALHO COUTINHO JÚNIOR diante de tão afrontosa situação,

principalmente do ponto de vista da segurança penitenciária.

Ainda, após concluída, é nítido o risco a que os detentos e agentes

penitenciários seriam expostos pela inadequação da obra a seu propósito, situação

para a qual pouco se importaram os réus, ignorando as atribuições dos respectivos

cargos.

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Indene de dúvidas, pois, que os réus agiram em violação aos

princípios da legalidade, eficiência e moralidade.

No mais, os réus não adotaram nenhum tipo de consulta pública e

não discutiram com o Conselho da Comunidade a obra em questão, conforme

determina o art. 8º, da Lei Estadual Nº 14.132/2002.

Dessa forma, como o réu MARCOS agiu de maneira livre e

consciente na condução da obra que restou demolida, por ser completamente

inadequada e inaproveitável, ocasionou prejuízos ao erário estadual.

Já JOÃO CARVALHO COUTINHO JÚNIOR não exerceu

nenhuma das atribuições inerentes ao cargo de superintendente de segurança

penitenciária, deixando de praticar ato que lhe incumbia, na defesa da segurança

penitenciária.

Assim, os atos praticados pelos réus consubstanciam-se em atos de

improbidade administrativa previstos no artigo 11, caput, I e II, da Lei nº 8.429/92:

“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições, e notadamente:I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;”

II.a.2 – Do Prejuízo ao Erário

Conforme foi devidamente comprovado nos autos do inquérito civil

público anexo, que MARCOS VINICIUS ALVES foi o responsável por gerir e

executar a obra referente aos barracões da Ala “C” da Penitenciária Coronel Odenir

Guimarães.

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Não é necessário ser um expert em engenharia para se concluir que

em construções dentro de uma instalação que abriga criminosos de alta

periculosidade devem ser observadas regras de segurança visando minorar os riscos

inerentes a tais tipos de estabelecimentos.

A Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária do

Estado de Goiás, atenta a tal preceito, desde 2011, vem orientando os gestores das

unidades prisionais para observarem as diretriz de construção em unidades

prisionais, o que foi completamente ignorado pelo réu.

Inicialmente, não houve a elaboração de, no mínimo, o projeto

básico de engenharia e arquitetônico referente à construção dos barracões, muito

menos foi elaborado a planilha orçamentária para estimar o montante de materiais

necessários, bem como os custos da obra.

Igualmente, não foi elaborado qualquer estudo sobre a viabilidade

da obra sob o aspecto de segurança da unidade prisional e de todos que por ali

estejam.

Muito menos foram observados os requisitos mínimos dos módulos

de visita íntima, a fim de garantir o mínimo de conforto e privacidade aos seus

usuários detentos.

Assim, aquela obra, no pátio de uma unidade prisional de regime

fechado, acabava por apresentar risco iminente, bem como favorecia o tráfico de

produtos para dentro da unidade prisional.

Frente a estas irremediáveis irregularidades, a única alternativa foi

proceder com a demolição daquela obra, o que, indubitavelmente, acarretou prejuízo

ao erário.

No que pertine ao valor do prejuízo, foi verificado que o Estado de

Goiás, por intermédio da Secretaria de Administração Penitenciária, liberou a

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quantia de R$ 11.480,00 (onze mil quatrocentos e oitenta reais) para a construção

dos alojamentos destinados às visitas íntimas, utilizados na obra (fls. 80/81).

Todavia, a POG foi agraciada com doação de particulares para a

realização da obra, conforme apontou o próprio réu em seu depoimento, conforme

segue (fls. 84/88):

“(...) que recebeu doação da empresa Assisco Máquinas e Equipamentos (Francisco de Assis Silva, CNPJ 05699415/0801-19), através da irmã de Eduardo, 4.000 (quatro mil) tijolos, 5 (cinco) metros e areia grossa e 5 (cinco) metros de brita 3/8; Que recebeu ainda de Isaac Martins, CPF 775134101-78, a doação de um caminhão de areia, 5 (cinco) sacos de cimento e algumas ferramentas pequenas, também através de Eduardo e sua irmã; Que recebeu de Benedito Lopes da Silva, RG 293114, um metro e mio de brita, dois metros e meio de areia, 4300 (quatro mil e trezentos) tijolos e 13 (treze) sacos de cimento, também através de Eduardo e sua irmã; Que recebeu através de Lívia Aparecida Fernandes de Oliveira, CPF 789641211-04, 03 (três) metros de brita, 2 (dois) metros de areia e cerca de 1.700 (mil e setecentos tijolos) além de pequenas ferramentas, também através de Eduardo e sua irmã. Que recebeu de Cleide Fernandes de Oliveira 20 (vinte) latas de brita, 12 (doze) latas de areia, cerca de 1.100 (mil e cem) tijolos e 04 (quatro) tábuas, também através de Eduardo e sua irmã; Que recebeu de Divina Cecília Alves, CPF 09044441-80, um metro e meio de brita, um metro e meio de areia e 800 tijolos; Que todo material acima relacionado foi levado para a POG em 2 ou 3 viagens de caminhão; Que a irmã de Eduardo foi quem fez os contatos com os doadores, não sabendo informar onde o material foi adquirido (...)”

Desta forma, resta claro que a POG foi destinatária de doações de

particulares, para fins de construção naquela unidade prisional, conforme

demonstram os termos de fls. 094/099.

Sobre o instituto da doação, o artigo 538, do Código Civil,

considera como doação “o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere

do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.

Já o artigo 541, da Lei Civil, estabelece que:

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“Art. 541. A doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular.Parágrafo único. A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição.”

Dessa forma, verifica-se que no caso, estamos, juridicamente, diante

de uma doação por instrumento particular de pessoa plenamente capaz à

Administração Pública.

De fato, a doação recebida pela POG, foi ato de inegável

liberalidade dos doadores e procedida de aceitação pelo donatário, pelo que não se

vislumbra qualquer nulidade em tal ato.

Conclui-se, assim, que aqueles materiais foram incorporados ao

patrimônio estadual, para que este pudesse deles dispôr da forma como melhor lhe

aprouvesse.

Como tal doação não foi destinada a pessoa de MARCOS

VINICIUS ALVES mas, sim, à unidade prisional, na utilização deste materiais

deveria ter sido obedecidas as regras e princípios que norteiam a Administração

Pública.

Ao dispor destes materiais de maneira irregular, inegável que

MARCOS VINICIUS ALVES acarretou prejuízo ao erário pois, uma vez que o

Estado dispunha de tais bens, sua malversação acarretará novo dispêndio à

Administração Pública Estadual.

Portanto, a malversação destes recursos deve ser considerada para

fins de composição do dano ocasionado pelo réu, cujos valores deverão ser objeto de

dilação probatória.

Com base nos elementos contidos nos autos foi possível calcular o

valor dos materiais doados à POG, com exceção da brita, que corresponde à quantia

de R$ 6.423,36 (seis mil quatrocentos e vinte e três reais e trinta e seis centavos).

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Assim ao todo, o valor do prejuízo apurado, considerando tão

somente as informações contidas nos presentes autos, foi de R$ 17.903,36 (dezessete

mil novecentos e três reais e trinta e seis centavos).

II.b – Da Conclusão Sobre a Conduta do Réu

Diante dos fatos, verifica-se que o réu MARCOS praticou os atos de

improbidade administrativa previstos nos artigos 10, caput, X; e 11, caput, da Lei

8.429/92, razão pela qual deve ser condenado às penas previstas no artigo 12, incisos

II e III, do referido Diploma Legal, no que couber.

III – DA TUTELA DE URGÊNCIA

As tutelas cautelares visam eliminar ou ao menos minorar os males

do tempo necessário para que o processo cumpra seu desiderato, assegurando a

utilidade e eficácia do provimento jurisdicional final. Com o advento do Novo

Código de Processo Civil, foram os institutos anteriores alterados, agora passando a

se chamarem tutela de urgência (cautelares) e tutela de evidência (antecipação da

tutela).

Lado outro, a Lei de Improbidade Administrativa (LIA), em seu

artigo 7, estabelece:

“Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.”

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Dessa forma, evidente que o artigo 7º, da LIA, é medida de cautelar,

que visa assegurar o necessário ressarcimento ao erário (resultado útil do processo)

por aqueles que a ele tenham causado prejuízo ou enriquecido ilicitamente.

O artigo 300, da novel Lei Adjetiva, estabelece:

“Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”

Sobre as medidas passíveis de serem adotadas pelos juízo, o artigo

301, do mesmo diploma legal, prescreve:

“Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito.”

Pois bem. Inobstante esta alteração provida pelo novo codex

processual, em termos gerais, não houve alteração no que tange aos preceitos que

envolvem a concessão de tutela de urgência em ações civis públicas por ato de

improbidade administrativa.

Isso porque, conforme disposição expressa contida no artigo 12, da

Lei 7.347/85 (Lei de Ação Civil Pública – Lei Especial), há possibilidade de

concessão de medida liminar em sede de ação civil pública, com ou sem justificação

prévia, para evitar dano irreparável ou de difícil reparação, desde que presentes os

requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora.

Assim, conjugando os dispositivos envolvidos, temos como possível

a tomada de medidas cautelares por parte do juízo, a fim de assegurar a efetividade

da prestação jurisdicional.

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Logo, evidente que a legislação pátria contempla as hipóteses de

decisão liminar e tutela de urgência e de evidência em sede de ação civil pública,

consagrando, inclusive, a fungibilidade entre ambas.

Ao dispor sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos autores

de atos de improbidade administrativa e pessoas que dele se beneficiem, a Lei de

Improbidade Administrativa dispõe o seguinte:

“Quando o ato de improbidade administrativa causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá à autoridade responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado. (Lei nº 8.429/1.992, artigo 7º, caput)”.

Ainda que assim não fosse, o Novo Código de Processo Civil

contempla a determinação judicial de diversas medidas cautelares, nominadas ou

não, permitindo-se, pois, que se confira atuação concreta à previsão constitucional

de indisponibilidade de bens.

Por outro lado, o artigo 942, do Código Civil, determina que os bens

dos responsáveis pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à

reparação do dano causado.

Com relação ao requisitos para a concessão de medidas liminares foi

e continua sendo necessária a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora,

de modo que o primeiro requisito consiste na plausibilidade da argumentação

jurídica, enquanto o segundo consubstancia-se no risco de dano em caso de demora

do provimento jurisdicional final.

No caso em tela estão presentes tais requisitos.

O fumus boni iuris exsurge na farta argumentação fática e jurídica

ora deduzida e comprovada, sobretudo na flagrante ilegalidade na construção levada

a efeito pelo réu MARCOS, com a omissão do réu JOÃO.

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Isso porque, conforme narrado, o prejuízo ao erário é constatado

ante a demolição dos barracões inadequadamente construídos pelo primeiro réu, com

a conivência do segundo.

O periculum in mora em ações que versem sobre ato de

improbidade administrativa, como é sabido, prescinde de demonstração concreta de

perigo, sendo que tal elemento decorre da própria natureza da demanda e o interesse

público a que ela se destina reguardar.

Nesse sentido, segue aresto aclaratório:

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DECRETAÇÃO DE INDISPONIBILIDADE PATRIMONIAL. POSSIBILIDADE. ÍNDICIOS DE PRÁTICA LESIVA. 1. Agravo de instrumento no qual se busca reforma de decisão singular que deferiu liminar, em ação civil pública de improbidade administrativa, no sentido de determinar a indisponibilidade patrimonial do réu até o limite dos recursos malversados. 2. Nas ações civis públicas de improbidade administrativa, a decretação de indisponibilidade patrimonial prescinde da demonstração do "periculum in mora" concreto, ou seja, de que o réu estaria dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, exigindo-se apenas a demonstração de "fumus boni iuris", baseado em fundados indícios da prática de atos de improbidade. É o caso. Precedentes do STJ e deste Regional. 3. Agravo de instrumento improvido. (TRF-5 - AG: 111577120124050000, Relator: Desembargador Federal Marcelo Navarro, Data de Julgamento: 01/08/2013, Terceira Turma, Data de Publicação: 07/08/2013)

O periculum in mora in re ipsa em ações que visem o ressarcimento

ao erário por ato de improbidade administrativa já se encontra pacificado no âmbito

do Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, conforme julgado

que segue:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. APLICAÇÃO DO PROCEDIMENTO PREVISTO NO ART. 543-C DO CPC. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CAUTELAR DE INDISPONIBILIDADE DOS

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BENS DO PROMOVIDO. DECRETAÇÃO. REQUISITOS. EXEGESE DO ART. 7º DA LEI N. 8.429/1992, QUANTO AO PERICULUM IN MORA PRESUMIDO. MATÉRIA PACIFICADA PELA COLENDA PRIMEIRA SEÇÃO.1. Tratam os autos de ação civil pública promovida pelo Ministério Público Federal contra o ora recorrido, em virtude de imputação de atos de improbidade administrativa (Lei n. 8.429/1992).2. Em questão está a exegese do art. 7º da Lei n. 8.429/1992 e a possibilidade de o juízo decretar, cautelarmente, a indisponibilidade de bens do demandado quando presentes fortes indícios de responsabilidade pela prática de ato ímprobo que cause dano ao Erário.3. A respeito do tema, a Colenda Primeira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial 1.319.515/ES, de relatoria do em. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Relator para acórdão Ministro Mauro Campbell Marques (DJe 21/9/2012), reafirmou o entendimento consagrado em diversos precedentes (Recurso Especial 1.256.232/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 19/9/2013, DJe 26/9/2013; Recurso Especial 1.343.371/AM, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 18/4/2013, DJe 10/5/2013; Agravo Regimental no Agravo no Recurso Especial 197.901/DF, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 28/8/2012, DJe 6/9/2012; Agravo Regimental no Agravo no Recurso Especial 20.853/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 21/6/2012, DJe 29/6/2012; e Recurso Especial 1.190.846/PI, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 16/12/2010, DJe 10/2/2011) de que, "(...) no comando do art. 7º da Lei 8.429/1992, verifica-se que a indisponibilidade dos bens é cabível quando o julgador entender presentes fortes indícios de responsabilidade na prática de ato de improbidade que cause dano ao Erário, estando o periculum in mora implícito no referido dispositivo, atendendo determinação contida no art. 37, § 4º, da Constituição, segundo a qual 'os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível'. O periculum in mora, em verdade, milita em favor da sociedade, representada pelo requerente da medida de bloqueio de bens, porquanto esta Corte Superior já apontou pelo entendimento segundo o qual, em casos de indisponibilidade patrimonial por imputação de conduta ímproba lesiva ao erário, esse requisito é implícito ao comando normativo do art. 7º da Lei n. 8.429/92. Assim, a Lei de Improbidade Administrativa, diante dos velozes tráfegos, ocultamento ou dilapidação patrimoniais, possibilitados por

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instrumentos tecnológicos de comunicação de dados que tornaria irreversível o ressarcimento ao erário e devolução do produto do enriquecimento ilícito por prática de ato ímprobo, buscou dar efetividade à norma afastando o requisito da demonstração do periculum in mora (art. 823 do CPC), este, intrínseco a toda medida cautelar sumária (art. 789 do CPC), admitindo que tal requisito seja presumido à preambular garantia de recuperação do patrimônio do público, da coletividade, bem assim do acréscimo patrimonial ilegalmente auferido". 4. Note-se que a compreensão acima foi confirmada pela referida Seção, por ocasião do julgamento do Agravo Regimental nos Embargos de Divergência no Recurso Especial 1.315.092/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 7/6/2013. 5. Portanto, a medida cautelar em exame, própria das ações regidas pela Lei de Improbidade Administrativa, não está condicionada à comprovação de que o réu esteja dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, tendo em vista que o periculum in mora encontra-se implícito no comando legal que rege, de forma peculiar, o sistema de cautelaridade na ação de improbidade administrativa, sendo possível ao juízo que preside a referida ação, fundamentadamente, decretar a indisponibilidade de bens do demandado, quando presentes fortes indícios da prática de atos de improbidade administrativa. 6. Recursos especiais providos, a que restabelecida a decisão de primeiro grau, que determinou a indisponibilidade dos bens dos promovidos. 7. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e do art. 8º da Resolução n. 8/2008/STJ. (REsp 1366721/BA, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro OG FERNANDES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/02/2014, DJe 19/09/2014)

A liminar determinando o bloqueio dos bens dos réus é totalmente

adequada, necessária e útil para garantia do patrimônio público.

O pedido é juridicamente possível, inexistindo qualquer óbice legal

ao reclamo ministerial, com expressa disposição legal permissiva.

O artigo 4º, da Lei 8.429/92, é claro ao estabelecer que “os agentes

públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita

observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e

publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos”, o que não foi observado por

nenhum dos réus.

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Os fatos narrados são graves e o dano é de difícil reparação, por sua

dimensão econômica.

Há a presença de fundamentos fáticos e jurídicos da prática de

improbidade administrativa e do risco de dano irreparável ou de difícil reparação.

Logo, deve ser evitada a concretização e perpetuação da lesão

patrimonial.

Os indícios de improbidade administrativa estão deveras

demonstrados.

Permitir que os réus tenham livre disposição de seu patrimônio

certamente tornará inócuo todo o esforço do Ministério Público e da própria Justiça

para a reprovação de atos ímprobos e proteção do patrimônio público lesado por

ação do réu, que descumpriu deveres básicos dos agentes públicos, em situação

ilegal e afrontosa aos princípios da boa, adequada e razoável administração.

O valor total correspondente ao prejuízo até o momento apurado, a

ser objeto de bloqueio, deverá ser acrescido do valor correspondente à possível pena

de multa aplicável aos réus, em seu patamar máximo, com a finalidade de garantir a

aplicação das sanções pelo cometimento de ato de improbidade administrativa.

Tal providência está em consonância com o entendimento do

Superior Tribunal de Justiça, conforme aresto que segue:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. POSSIBILIDADE. DILAPIDAÇÃO PATRIMONIAL. PERICULUM IN MORA PRESUMIDO NO ART. 7º DA LEI N. 8.429/92. INDIVIDUALIZAÇÃO DE BENS. DESNECESSIDADE. 1. O art. 7º da Lei n. 8.429/92 estabelece que "quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado. Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo

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patrimonial resultante do enriquecimento ilícito". 2. Uma interpretação literal deste dispositivo poderia induzir ao entendimento de que não seria possível a decretação de indisponibilidade dos bens quando o ato de improbidade administrativa decorresse de violação dos princípios da administração pública. 3. Observa-se, contudo, que o art. 12, III, da Lei n. 8.429/92 estabelece, entre as sanções para o ato de improbidade que viole os princípios da administração pública, o ressarcimento integral do dano - caso exista -, e o pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente. 4. Esta Corte Superior tem entendimento pacífico no sentido de que a indisponibilidade de bens deve recair sobre o patrimônio dos réus em ação de improbidade administrativa, de modo suficiente a garantir o integral ressarcimento de eventual prejuízo ao erário, levando-se em consideração, ainda, o valor de possível multa civil como sanção autônoma. 5. Portanto, em que pese o silêncio do art. 7º da Lei n. 8.429/92, uma interpretação sistemática que leva em consideração o poder geral de cautela do magistrado induz a concluir que a medida cautelar de indisponibilidade dos bens também pode ser aplicada aos atos de improbidade administrativa que impliquem violação dos princípios da administração pública, mormente para assegurar o integral ressarcimento de eventual prejuízo ao erário, se houver, e ainda a multa civil prevista no art. 12, III, da Lei n. 8.429/92. 6. Em relação aos requisitos para a decretação da medida cautelar, é pacífico nesta Corte Superior o entendimento segundo o qual o periculum in mora, em casos de indisponibilidade patrimonial por imputação ato de improbidade administrativa, é implícito ao comando normativo do art. 7º da Lei n. 8.429/92, ficando limitado o deferimento desta medida acautelatória à verificação da verossimilhança das alegações formuladas na inicial. Agravo regimental improvido.

Assim, considerando o valor do prejuízo até o momento apurado, no

valor de R$ 17.903,36 (dezessete mil novecentos e três reais e trinta e seis centavos),

e o patamar máximo fixado na Lei de Improbidade Administrativa, em seu art. 12,

III, para fins de fixação da pena de multa, que é de até 100 vezes o valor da

remuneração do agente (R$ 19.041,42), temos que deverá ser declarada a

indisponibilidade de bens do réu MARCOS VINÍCIUS ALVES, no importe total de

R$ 1.904.142 (um milhão, novecentos e quatro mil e cento de quarenta e dois reais).

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No que pertine ao réu JOÃO CARVALHO COUTINHO JÚNIOR,

deverá ser declarada a indisponibilidade de bens no montante de cem vezes o valor

da remuneração na época dos fatos (R$ 14.920,71), correspondente a R$

1.492.071,00 (um milhão, quatrocentos e noventa e dois mil e setenta e um reais).

IV – DO DANO MORAL COLETIVO

A previsão de responsabilização por danos morais coletivos

encontra guarida, dentre outros diplomas legais, na Lei 7.347/85, in verbis:

“Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: (…) IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.”

“Art. 3º A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.”

Além da expressa previsão legal, a doutrina advoga que “os valores

da coletividade não se confundem com os valores de cada um dos indivíduos que a

compõem, admitindo-se, assim, que um determinado fato possa abalar a imagem e a

moral coletivas, independentemente dos danos individualmente suportados”8.

Ademais, “o dano moral (lesão a direito personalíssimo) não se

confunde com a dor, com o abalo psicológico, com o sofrimento da vítima, sendo

estes apenas os efeitos da ofensa. Por isso é perfeitamente possível entender a

proteção dos direitos da personalidade para os direitos difusos e coletivos, a exemplo

8 ANDRADE, Adriano; MASSON, Cleber; ANDRADE, Landolfo. Interesses Difusos e Coletivos Esquematizado. 3ª ed., São Paulo: Método, 2013, p. 435.

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do que já é feito em relação às pessoas jurídicas, passíveis de sofrerem dano

moral”.2

Com apoio nesse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça, por

meio da 2ª Turma (direito público) e da 3ª Turma (direito privado) tem admitido

sistematicamente a possibilidade de responsabilização por dano moral coletivo, sua

função punitiva e a legitimidade do Ministério Público para pleiteá-la em sede de

ação civil pública. Confiram-se alguns precedentes:

ADMINISTRATIVO - TRANSPORTE - PASSE LIVRE - IDOSOS - DANO MORAL COLETIVO - DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA DOR E DE SOFRIMENTO - APLICAÇÃO EXCLUSIVA AO DANO MORAL INDIVIDUAL - CADASTRAMENTO DE IDOSOS PARA USUFRUTO DE DIREITO - ILEGALIDADE DA EXIGÊNCIA PELA EMPRESA DE TRANSPORTE - ART. 39, § 1º DO ESTATUTO DO IDOSO - LEI 10741/2003 VIAÇÃO NÃO PREQUESTIONADO.1. O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação jurídica-base.2. O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos.3. Na espécie, o dano coletivo apontado foi a submissão dos idosos a procedimento de cadastramento para o gozo do benefício do passe livre, cujo deslocamento foi custeado pelos interessados, quando o Estatuto do Idoso, art. 39, § 1º exige apenas a apresentação de documento de identidade.4. Conduta da empresa de viação injurídica se considerado o sistema normativo.5. Afastada a sanção pecuniária pelo Tribunal que considerou as circunstancias fáticas e probatória e restando sem prequestionamento o Estatuto do Idoso, mantém-se a decisão.6. Recurso especial parcialmente provido.(REsp 1057274/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/12/2009, DJe 26/02/2010)

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RECURSO ESPECIAL - DANO MORAL COLETIVO - CABIMENTO - ARTIGO 6º, VI, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - REQUISITOS - RAZOÁVEL SIGNIFICÂNCIA E REPULSA SOCIAL - OCORRÊNCIA, NA ESPÉCIE - CONSUMIDORES COM DIFICULDADE DE LOCOMOÇÃO - EXIGÊNCIA DE SUBIR LANCES DE ESCADAS PARA ATENDIMENTO - MEDIDA DESPROPORCIONAL E DESGASTANTE - INDENIZAÇÃO - FIXAÇÃO PROPORCIONAL - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO - RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.I - A dicção do artigo 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor é clara ao possibilitar o cabimento de indenização por danos morais aos consumidores, tanto de ordem individual quanto coletivamente.II - Todavia, não é qualquer atentado aos interesses dos consumidores que pode acarretar dano moral difuso. É preciso que o fato transgressor seja de razoável significância e desborde os limites da tolerabilidade. Ele deve ser grave o suficiente para produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social e alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva. Ocorrência, na espécie.III - Não é razoável submeter aqueles que já possuem dificuldades de locomoção, seja pela idade, seja por deficiência física, ou por causa transitória, à situação desgastante de subir lances de escadas, exatos 23 degraus, em agência bancária que possui plena capacidade e condições de propiciar melhor forma de atendimento a tais consumidores.IV - Indenização moral coletiva fixada de forma proporcional e razoável ao dano, no importe de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais).V - Impõe-se reconhecer que não se admite recurso especial pela alínea "c" quando ausente a demonstração, pelo recorrente, das circunstâncias que identifiquem os casos confrontados.VI - Recurso especial improvido.(REsp 1221756/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/02/2012, DJe 10/02/2012)

Apesar de possuir alguns julgados em sentido contrário, a 1ª Turma

do STJ possui importante precedente sobre o cabimento da reparação por dano

moral coletivo e a legitimidade do Parquet para pleiteá-la:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. COMPETÊNCIA PARA O PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA

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AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL OBJETIVANDO INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COLETIVOS EM DECORRÊNCIA DE FRAUDES EM LICITAÇÕES PARA A AQUISIÇÃO DE MEDICAMENTOS PELO ESTADO MEDIANTE A UTILIZAÇÃO DE RECURSOS FEDERAIS. EMISSÃO DE DECLARAÇÕES FALSAS DE EXCLUSIVIDADE DE DISTRIBUIÇÃO DE MEDICAMENTOS. ART. 535 DO CPC NÃO VIOLADO. UNIÃO FEDERAL ADMITIDA COMO ASSISTENTE. SÚMULA 150 DO STJ. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ART. 109, I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS À PROPOSITURA DA AÇÃO RECHAÇADA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7 DO STJ.1. Constatado que a Corte regional empregou fundamentação adequada e suficiente para dirimir a controvérsia, dispensando, portanto, qualquer integração à compreensão do que fora por ela decidido, é de se afastar a alegada violação do art. 535 do CPC.2. À luz dos artigos 127 e 129, III, da CF/88, o Ministério Público Federal tem legitimidade para o ajuizamento de ação civil pública objetivando indenização por danos morais coletivos em decorrência de emissões de declarações falsas de exclusividade de distribuição de medicamentos usadas para burlar procedimentos licitatórios de compra de medicamentos pelo Estado da Paraíba mediante a utilização de recursos federais.3. A presença da União Federal como assistente simples (art. 50 do CPC), por si só, impõe a competência Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal. Incidência da Súmula 150 do STJ: "Compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença da União, no processo, da União, suas Autarquias ou Empresas Públicas".4. Se as instâncias ordinárias decidiram por bem manter a ora agravante na lide diante do acervo fático-probatório já produzido, não é dado a esta Corte rever os elementos que levaram à tal convicção.5. É defeso ao Superior Tribunal de Justiça apreciar a alegação de ausência de documentos indispensáveis à propositura da ação, rechaçada pelas instâncias ordinárias. Incidência da Sumula 7 do STJ.6. Agravo regimental não provido.(AgRg no REsp 1003126/PB, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 01/03/2011, DJe 10/05/2011)

Na esteira do entendimento ora defendido, a Escola Nacional de

Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM, sob a batuta da então

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Ministra do STJ Eliana Calmon, editou os seguintes enunciados sobre improbidade

administrativa e dano moral coletivo:

Enunciado n.º 16 (TJPB/ESMA – agosto de 2013): “O ato de improbidade pode gerar dano moral coletivo quando configurada a razoável significância a produzir sentimento de intranquilidade e repúdio social, os quais ultrapassam a mera insatisfação com a atividade administrativa.”

Enunciado n.º 8 (TJBA/Unicorp, Ilhéus – setembro de 2013): “É cabível a condenação em dano moral coletivo, ainda que não exista pedido expresso na inicial, desde que exposto como causa de pedir, face a mitigação do princípio da adstrição nas ações de improbidade administrativa.”

Enunciado n.º 5 (TJBA/Unicorp, Juazeiro – setembro de 2013): “O ato de improbidade pode gerar dano moral coletivo cujo valor deverá ser estimado e acrescido ao valor do ressarcimento do dano material, se houver.”

Enunciado n.º 16 (TRF1/Esmaf – novembro de 2013): “A compensação pelo dano moral coletivo não integra a sanção de ressarcimento integral prevista no art. 12 da Lei 8429/92. Pode, contudo, haver cumulação dos pedidos típicos da ação de improbidade administrativa com o pedido de compensação pelo dano moral coletivo, cujo valor será destinado ao fundo previsto na Lei 7347/85.”

Importante frisar que há forte tendência no STJ e na doutrina em

eleger dois requisitos para a configuração do dano moral coletivo: a) razoável

significância do fato transgressor e b) repulsa social.1 In casu, esses requisitos estão

presentes, senão veja-se.

Tecidas estas breves considerações jurídicas sobre a possibilidade

de condenação de agentes público por dano moral coletivo, passo a tecer as

seguintes observações sobre o fato.

Pois bem. A mixórdia levada a efeito pelos réus, não fosse

prontamente demolida, colocaria em risco toda a coletividade que eventualmente

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estivesse na POG, além de favorecer estupros, tráfico de drogas, linchamentos,

execuções e outros ilícitos, o que é deveras previsível dadas as razões pelas quais os

indivíduos ali se encontram.

É inadmissível, desde sempre, que, em havendo um indivíduo bem

remunerado, com vencimento de R$ 14.920,21 (quatorze mil novecentos e vinte

reais e vinte e um centavos), com seus pagamentos em dia, designado

especificamente para cuidar da segurança penitenciária estadual, nada tenha visto ou

feito em relação a tão grave situação.

O primeiro réu, com argumento de pretender garantir um local para

que os detentos satisfizessem sua lascívia, sem qualquer pudor ocasionou prejuízos

ao erário e violou os princípios da administração pública, além de ter manchado a

imagem das Instituições de Segurança Pública do Estado de Goiás.

O segundo, com o mesmo despudor, não fez em relação às

irregularidades.

Outrossim, a já caótica POG, graças aos réus, não fosse a atuação

pública, teria sido “beneficiada” com a instalação de empreendimento assemelhado a

um lupanar, um covil ou um habitat púnico para o cometimento de toda ordem de

ilícitos, inclusive contra à administração e segurança penitenciária.

As fatos ocorridos sob o olhar dos réus foram, inclusive, motivo de

chacota em todo o território nacional, alegou-se que teria sido erguido um motel

dentro do POG, financiado por um indivíduo condenado por tráfico de drogas,

denegrindo a imagem e credibilidade de nossas instituições públicas.

Os fatos aqui versados nos remetem a um fato histórico, que foi

motivo de humilhação e vergonha de nossa vizinha Colômbia.

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Naquele país, um traficante de drogas internacional foi o

responsável por construir a própria cadeia que o iria abrigar, conhecida como “La

Catedral”, fato tido como absurdo, inclusive no Brasil.

Não obstante, passados mais de 20 (vinte) anos, na Penitenciária

Odenir Guimarães, situada neste Estado, foi erigida obra dentro de uma penitenciária

ao alvedrio dos detentos, para que estes pudessem praticar os atos que bem

entendessem, sem qualquer possibilidade de vigilância por parte dos agentes

prisionais, inobservando os elementos que devem nortear o encarceramento de

indivíduos.

Ocorre que, na Colômbia os recursos para construção da “La

Catedral” foram arcados pelo próprio traficante, já em Goiás, os recursos foram

pagos pelos contribuintes.

Assim, é notório que os réus da presente demanda, com suas ações e

omissões, indiscutivelmente, vilaram direitos difusos da população goiana, inclusive

da carcerária, a qual deverá aguardar mais um bom tempo para que possam usufruir

de acomodações adequadas para visitas intimas, pelo que devem, cada um dos réus,

serem condenados ao pagamento de valor correspondente a dez vezes o do prejuízo

apurado, o que corresponde à quantia de R$ 179.033,60 (cento e setenta e nove mil e

trinta e três reais e sessenta centavos) a título de danos morais coletivos

V – DOS PEDIDOS

Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE

GOIÁS requer:

a) seja a presente ação recebida, autuada e processada na forma e no rito previstos

na Lei nº 7.347/85;

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b) a concessão de MEDIDA LIMINAR, inaudita altera pars, para evitar a

dilapidação de patrimônio, decretando-se a indisponibilidade dos bens dos réus:

b.1) MARCOS VINÍCIUS ALVES, até o importe total de R$ 1.922.045,36 (um

milhão novecentos e vinte e dois mil e quarenta e cinco reais e trinta e seis

centavos);

b.2) JOÃO CARVALHO COUTINHO JÚNIOR, até o importe total de R$

1.492.071,00 (um milhão, quatrocentos e noventa e dois mil e setenta e um reais);

b.3) Para a efetividade da indisponibilidade de bens postulada, requer:

b.1) seja oficiado à Central Nacional de Indisponibilidade de Bens,

na forma que prescreve o Provimento 39/2014, do CNJ,

comunicando a indisponibilidade dos bens imóveis dos réus,

procedendo às averbações necessárias;

b.2) o bloqueio de veículos em nome dos réus, via RENAJUD,

oficiando-se ao Departamento Estadual de Trânsito do Estado de

Goiás, a fim de impedir a transferência destes;

b.3) o bloqueio dos valores existentes em conta correntes,

poupanças e aplicações financeiras em nome dos réus, utilizando-se

para tanto o BACENJUD;

b.4) sejam expedidos ofícios aos Cartórios de Registros Imobiliários

de Goiânia, Aparecida de Goiânia e Inhumas, para que procedam

com a averbação de indisponibilidade nos registros de imóveis em

nome dos réus;

c) a intimação dos réus para, querendo, oferecer manifestação escrita, nos termos do

artigo 17, §7º, da Lei 8.429/92;

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d) a citação pessoal dos réus MARCOS VÍNICIUS ALVES e JOÃO

CARVALHO COUTINHO JÚNIOR para, querendo, oferecerem contestação, sob

pena de revelia, garantido-se ao Sr. Oficial de Justiça, os permissivos do artigo 172,

§2º, do Código de Processo Civil, após recebimento da petição inicial, § 8º do artigo

17 da Lei 8.429/92;

e) seja a ação julgada procedente para:

e.1) condenar o réu MARCOS VINÍCIUS ALVES pela prática dos atos de

improbidade administrativa descritos nos artigos 10 e 11, da Lei 8.429/92,

aplicando-se-lhes as sanções previstas no artigo 12, inciso II e III, da Lei 8.429/92,

notadamente a multa a que aludi o incíso III, inclusive a obrigação de reparar o dano

ao erário, no importe total de R$ 17.903,36 (dezessete mil novecentos e três reais e

trinta e seis centavos) devidamente corrigido, acrescido dos valores referentes ao

materiais doados à POG que eventualmente surjam durante o trâmite processual, sob

pena de multa diária;

e.2) condenar o réu JOÃO CARVALHO COUTINHO JÚNIOR pela prática dos

atos de improbidade administrativa descritos nos artigos 11, caput e II, da Lei

8.429/92, aplicando-se-lhes as sanções previstas no artigo 12, inciso III, da Lei

8.429/92, notadamente a multa a que, inclusive a obrigação solidária de reparar o

dano ao erário, no importe total de R$ 17.903,36 (dezessete mil novecentos e três

reais e trinta e seis centavos) devidamente corrigido, acrescido dos valores referentes

ao materiais doados à POG que eventualmente surjam durante o trâmite processual,

sob pena de multa diária;

e.2) condenar cada um dos réus ao pagamento de valor corresponde a dez vezes o

valor do prejuízo apurado, a título de dano moral coletivo, o que corresponde à

quantia de R$ 179.033,60 (cento e setenta e nove mil e trinta e três reais e sessenta

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centavos) a ser destinado ao fundo de que trata o art. 13, a Lei de Ação Civil

Pública;

f) a declaração expressa, por ocasião da sentença, de afronta ao artigo 37, caput, da

Constituição Federal, para efeito de prequestionamento, bem como artigos 10 e 11,

da Lei 8.429/92;

g) a condenação do réu nos ônus sucumbenciais.

Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito

admitidos.

Dá-se à causa o valor de R$ 196.936,96 (cento e noventa e seis mil

novecentos e trinta e seis reais e noventa e seis centavos).

Aparecida de Goiânia, 13 de fevereiro de 2017.

FERNANDO AURVALLE DA SILVA KREBSPromotor de Justiça em Substituição

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