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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, com o devido acatamento, não se conformando com os termos da r. decisão de movimento 11.1 nos autos de Ação Civil Pública n. 1267-36.2014.8.16.0150, que move em face do Estado do Paraná, com fundamento no artigo 522, segunda parte, e seguintes do Código de Processo Civil, tempestivamente, vem interpor AGRAVO DE INSTRUMENTO com requerimento de concessão de EFEITO SUSPENSIVO ATIVO (artigo 558 do Código de Processo Civil - PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA) com o intuito de ver modificada a r. decisão do Juiz Singular da Vara Cível da Comarca de Santa Helena, que indeferiu pedido de antecipação de tutela quanto à designação de agentes penitenciários à carceragem da Delegacia de Polícia desta Comarca e à remoção dos presos condenados com sentença transitada em julgado ao sistema penitenciário, o que faz pelos fatos e fundamentos expostos nas razões anexas.

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  • EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO

    EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ

    O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, com o

    devido acatamento, não se conformando com os termos da r. decisão de

    movimento 11.1 nos autos de Ação Civil Pública n. 1267-36.2014.8.16.0150,

    que move em face do Estado do Paraná, com fundamento no artigo 522,

    segunda parte, e seguintes do Código de Processo Civil, tempestivamente,

    vem interpor

    AGRAVO DE INSTRUMENTO com requerimento de concessão

    de EFEITO SUSPENSIVO ATIVO (artigo 558 do Código de

    Processo Civil - PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA)

    com o intuito de ver modificada a r. decisão do Juiz

    Singular da Vara Cível da Comarca de Santa Helena, que indeferiu pedido

    de antecipação de tutela quanto à designação de agentes penitenciários

    à carceragem da Delegacia de Polícia desta Comarca e à remoção dos

    presos condenados com sentença transitada em julgado ao sistema

    penitenciário, o que faz pelos fatos e fundamentos expostos nas razões

    anexas.

  • Outrossim, preenchidos os requisitos dos artigos 524 e

    525 do Código de Processo Civil, requer-se seja recebido o presente,

    CONCEDENDO-SE LIMINARMENTE O EFEITO SUSPENSIVO ATIVO ORA

    PLEITEADO determinando-se, após, seu regular processamento.

    Termos em que pede e espera deferimento.

    Santa Helena, 17 de novembro de 2014.

    ANA CLAUDIA LUVIZOTTO BERGO

    Promotora de Justiça

  • RAZÕES DE AGRAVO DE INSTRUMENTO

    AUTOS DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA N. 1267-36.2014.8.16.0150

    ORIGEM: JUÍZO CÍVEL DA COMARCA DE SANTA HELENA

    AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ

    AGRAVADO: ESTADO DO PARANÁ

    EGRÉGIO TRIBUNAL

    COLENDA CÂMARA

    EMINENTES DESEMBARGADORES

    DOUTA PROCURADORIA DE JUSTIÇA

    Trata-se de Agravo de Instrumento movido pelo

    Ministério Público Estadual contra a decisão de movimento 11.1 (anexa),

    do Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da Vara Cível da Comarca

    de Santa Helena/PR, que indeferiu pedido de antecipação de tutela

    quanto à designação de agentes penitenciários à carceragem da

    Delegacia de Polícia desta Comarca e à remoção dos presos condenados

    com sentença transitada em julgado ao sistema penitenciário, pelos fatos

    e fundamentos a seguir expostos.

  • 1. RELATÓRIO

    Em 16 de julho de 2014, o Ministério Público do Estado

    do Paraná ingressou com Ação Civil Pública com Pedido de Antecipação

    de Tutela, com o fito de tutelar o direito difuso à segurança pública,

    almejando a adoção das providências necessárias para a designação e

    manutenção do quadro de efetivo da Polícia Civil em número suficiente

    para atender aos Municípios que integram esta Comarca de Santa

    Helena, bem como implementar estrutura adequada para o

    funcionamento da Cadeia Pública Local.

    Dentre as medidas ao final requeridas, em sede de

    tutela antecipada pugnou-se: (a) pela designação imediata de 01 (um)

    Delegado de Polícia titular exclusivamente para esta Comarca, mais 01

    (um) Investigador de Polícia ou Agente de Carceragem e 03 (três)

    Escrivães, para trabalhar na Delegacia de Polícia de Santa Helena,

    juntamente com os servidores já existentes – com a devida reposição de

    servidores durante o gozo de férias, afastamentos etc. –, fixando-se multa

    diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) para garantir-se o cumprimento da

    obrigação, na forma do art. 11, da Lei n.° 7.347/85, valor a ser destinado ao

    Conselho da Comunidade da Comarca de Santa Helena/PR; (b) e pela

    remoção imediata de todos os presos sentenciados e cumprindo pena na

    Delegacia de Polícia (regime fechado e semiaberto) para as

    Penitenciárias do Estado e/ou Colônia Penal, fixando-se multa diária no

    valor de R$ 1.000,00 (mil reais) por preso não transferido, para garantir o

    cumprimento da obrigação, na forma do art. 11, da Lei n.° 7.347/85, valor

  • a ser destinado ao Conselho da Comunidade da Comarca de Santa

    Helena/PR.

    Embasando o pleito, conjuntamente à inicial

    encontram-se encartados o Procedimento Preparatório deflagrado por

    este órgão para melhor apurar a calamitosa situação em que se encontra

    a carceragem da DEPOL local, bem como os Formulários de Avaliação da

    Cadeia Pública elaborados nas visitas mensais.

    À mov. 11.1, o douto magistrado a quo concedeu

    parcialmente o requerido na exordial. Foi deferida naquela oportunidade

    a antecipação de tutela quanto ao pleito de melhoramento da

    infraestrutura da cadeia pública de Santa Helena, obstando a entrada da

    água de chuva nas celas e melhorando a ventilação das mesmas.

    Entretanto, os pedidos de designação de 01 (um)

    Delegado de Polícia titular exclusivamente para esta Comarca, mais 01

    (um) Investigador de Polícia ou Agente de Carceragem e 03 (três)

    Escrivães, para trabalhar na Delegacia de Polícia de Santa Helena e a

    remoção imediata de todos os presos sentenciados e cumprindo pena na

    Delegacia de Polícia (regime fechado e semiaberto) para as

    Penitenciárias do Estado e/ou Colônia Penal foram indeferidos.

    Conforme certidão de mov. 34.1, acostada aos autos,

    na data de 14 de novembro de 2014 o Ministério Público tomou ciência da

    decisão quanto ao pedido de tutela antecipada.

  • 2. DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

    O agravo de instrumento é o recurso interposto, em

    regra, contra decisões interlocutórias, cabível quando se tratar de decisão

    suscetível de causar à parte lesão de grave e de difícil reparação.

    Para admissibilidade e conhecimento do recurso,

    devem estar preenchidas as condições de admissibilidade de sua

    interposição e os seus pressupostos recursais, que, segundo ensinamentos

    de Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio

    Scarance Fernandes, assim se dispõem:

    Em síntese, a sistematização dos requisitos de admissibilidade

    do julgamento do mérito dos recursos, elaborada levando

    em conta a construção científica do processo, conduz a

    uma nova classificação, que é a seguinte:

    A) Condições de admissibilidade dos recursos: a)

    possibilidade jurídica (previsão no ordenamento); b)

    legitimação; c) interesse em recorrer (utilidade mais

    adequação).

    B) Pressupostos recursais para a constituição de uma fase

    procedimental válida: a) a investidura do juiz; b) a

    capacidade de quem formula o recurso; c) a regularidade

    formal da interposição deste recurso. E, numa visão mais

    abrangente: d) a inexistência de fatos impeditivos ou

    extintivos. (negritou-se)

    (GRINOVER, Ada Pelegrini; GOMES FILHO, Antônio

    Magalhães; FERNANDES, Antônio Scarance. Recursos no

    Processo Penal. 3a edição. São Paulo: RT, 2001, pag. 74/75)

    Desta forma, verifica-se que o recurso de Agravo de

    Instrumento interposto preenche as condições de admissibilidade recursal,

    vez que há possibilidade jurídica, ou seja, previsão no ordenamento

  • jurídico e o agravo de instrumento é o recurso cabível, segundo previsão

    do artigo 522 e seguintes do Código de Processo Civil.

    Além disso, o Ministério Público é parte legítima para

    interpor o presente recurso, vez que interessado em ver a decisão

    interlocutória que denegou os pedidos em sede de tutela antecipada

    reformada, e, diante da sucumbência, tem o Ministério Público interesse

    em recorrer.

    Por outro lado, também estão presentes os pressupostos

    recursais doutrinariamente elencados. O recurso interposto pelo recorrente

    foi dirigido ao órgão judicial competente, ou seja, foi interposto

    diretamente no tribunal, conforme preza o artigo 524 do CPC.

    O Ministério Público, interpondo-o como permite o

    Código de Processo Civil preenche o requisito de capacidade. O

    pressuposto de regularidade formal resta preenchido porque corretamente

    instrumentalizado o presente recurso, seguindo os trâmites legais, aí

    englobada a tempestividade do recurso, inerente à regularidade formal,

    eis que apresentado dentro do prazo legal, disposto no artigo 522 do

    Código de Processo Civil. Prazo computado em dobro para o Ministério

    Público, nos termos do artigo 188 do mesmo diploma legal

    Portanto, verificando-se o regular preenchimento de

    todas as condições de admissibilidade do recurso interposto e dos

    pressupostos recursais, o Ministério Público pugna pelo conhecimento do

    presente recurso de agravo de instrumento.

  • 3. FUNDAMENTAÇÃO

    3.1. Quanto à urgência e necessidade de ampliação

    do efetivo Policial

    Conforme exposto, requereu-se a designação imediata

    de 01 (um) Delegado de Polícia titular exclusivamente para esta Comarca,

    mais 01 (um) Investigador de Polícia ou Agente de Carceragem e 03 (três)

    Escrivães, para trabalhar na Delegacia de Polícia de Santa Helena,

    juntamente com os servidores já existentes.

    Quanto à necessidade de designação de 01 (um)

    Delegado de Polícia Titular, de fato, assiste razão ao julgador singular, vez

    que já foi designada a referida Autoridade Policial em caráter permanente

    a esta Comarca, restando sanado o problema.

    Entretanto, foi negada também a designação de 01

    (um) Investigador de Polícia ou Agente de Carceragem e 03 (três)

    Escrivães, sob a argumentação de que o parquet não teria feito prova

    cabal da necessidade, bem como o deferimento da medida poderia

    comprometer outra Comarca.

    Ocorre que a necessidade do pleito foi exaustivamente

    fundamentada com base nas peculiaridades fáticas desta Comarca.

    Vejamos:

  • Conforme já exposto, a Comarca de Santa Helena é

    formada também pelos Municípios de São José das Palmeiras e Diamante

    D’Oeste, com a seguinte população, segundo dados fornecidos pelo IBGE

    (censo de 2010) e disponibilizados na página da Subprocuradoria Geral de

    Justiça para Assuntos de Planejamento Institucional do Ministério Público

    do Estado do Paraná1:

    Santa Helena: 23.413 habitantes

    São José das Palmeiras: 3.830 habitantes

    Diamante D’Oeste: 5.027 habitantes

    Ao todo, a Comarca conta com 32.270 (trinta e dois mil

    duzentos e setenta) habitantes segundo dados do IBGE.

    Nos três Municípios que integram a Comarca são

    praticados todos os atos da vida comunitária, com exercício do comércio,

    estabelecimentos de ensino, instituições financeiras, trabalho urbano e

    rural, lazer e recreação.

    O Município de Santa Helena conta com um famoso

    balneário, que atrai inúmeras pessoas no verão, incluindo às más

    intencionadas.

    1http://www.planejamento.mppr.mp.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=21

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  • Ainda, trata-se de região de fronteira, na qual o

    crescimento dos índices de violência e criminalidade é fato público e

    notório.

    Frise-se que o índice de homicídios cometidos nesta

    região é altíssimo. Segundo o “Mapa da Violência”2, elaborado pelo

    Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americano, O MUNICÍPIO DE SANTA

    HELENA OCUPA A 125ª POSIÇÃO NO RANKING DE CIDADES COM MAIOR

    NÚMERO DE HOMICÍDIOS DO PAÍS, tendo sido registrados 15 crimes desta

    natureza no ano de 2012. Por este motivo, a população carcerária é maior

    do que o habitual em cidades com o mesmo número de habitantes.

    O Estado do Paraná tem descumprido

    deliberadamente a sua obrigação constitucional de prover a segurança

    pública aos cidadãos locais, especialmente no que tange à manutenção

    de um número mínimo de servidores da Polícia Civil na Delegacia local e

    ao cumprimento da legislação relativa à custódia de presos na cadeia

    pública.

    O Ministério Público já tomou todas as medidas possíveis

    em âmbito administrativo para que fossem implementadas mudanças na

    situação caótica em que se encontra a carceragem da Delegacia de

    Polícia de Santa Helena.

    Com efeito, foi instaurado o Procedimento Preparatório

    de nº MPPR-0127.14.000067-1, que acompanha esta manifestação. No

    2 http://www.mapadaviolencia.org.br/

  • referido procedimento, encontram-se diversos ofícios para as autoridades

    responsáveis pela solução dos problemas ora expostos, sem, contudo, que

    houvesse solução satisfatória.

    Os Municípios de São José das Palmeiras e Diamante

    D’Oeste não contam com estruturas físicas de Delegacia de Polícia,

    Delegados, Investigadores, Escrivães ou Auxiliares de Carceragem, apesar

    de possuírem pequenas carceragens instaladas próximas aos postos da

    Polícia Militar.

    A carceragem de Diamante D’Oeste, em tempos

    remotos, quando o município ainda pertencia à comarca de Matelândia,

    já abrigou até mesmo um escrivão de polícia. Atualmente, porém, ambas

    encontram-se desativadas por falta de efetivo policial.

    Embora tais carceragens estejam instaladas próximas à

    estrutura da Polícia Militar nestes municípios, não é possível que oficiais

    desta responsabilizem-se por pessoas lá detidas e atuem como polícia

    judiciária, eis que tal situação configuraria flagrante desrespeito à decisão

    do Supremo Tribunal Federal, que já declarou:

    EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DECRETO N.

    1.557/2003 DO ESTADO DO PARANÁ, QUE ATRIBUI A

    SUBTENENTES OU SARGENTOS COMBATENTES O ATENDIMENTO

    NAS DELEGACIAS DE POLÍCIA, NOS MUNICÍPIOS QUE NÃO

    DISPÕEM DE SERVIDOR DE CARREIRA PARA O DESEMPENHO

    DAS FUNÇÕES DE DELEGADO DE POLÍCIA. DESVIO DE

    FUNÇÃO. OFENSA AO ART. 144, CAPUT, INC. IV E V E §§ 4º E 5º,

    DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AÇÃO DIRETA JULGADA

    PROCEDENTE.

  • (ADI 3614, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Relator(a) p/

    Acórdão: Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em

    20/09/2007, DJe-147 DIVULG 22-11-2007 PUBLIC 23-11-2007 DJ

    23-11-2007 PP-00020 EMENT VOL-02300-02 PP-00229 RTJ VOL-

    00204-02 PP-00682)

    Assim, por não existir ninguém para fazer a guarda e

    custódia dos presos e detentos destas cidades nas pequenas carceragens

    lá existentes, todas as pessoas detidas nos três municípios são trazidas para

    a cadeia pública da Delegacia de Polícia de Santa Helena, onde

    concentra-se todo o trabalho de polícia judiciária da região.

    Todavia, o quadro de pessoal na Delegacia de Polícia

    de Santa Helena, a qual acumula o atendimento da população da

    Comarca toda, é insuficiente.

    Embora tenha sido recentemente designado um

    Delegado de Polícia titular a esta Comarca, os servidores da Polícia Civil

    lotados na Delegacia local são: 01 (um) delegado, 05 (cinco)

    Investigadores de Polícia e 01 (um) escrivão, que são responsáveis pelo

    atendimento ao público, confecção de boletins de ocorrências,

    investigações, serviço de inteligência e cuidados dos detentos, além dos

    plantões. Assinale-se também que o já exíguo contingente é

    constantemente diminuído quando qualquer dos servidores entra em

    férias, não havendo qualquer designação para suprir a falta.

    Importante destacar que, ao ser designado um

    Delegado de Polícia para a Comarca, foram removidos 02 (dois)

    investigadores, acabando por reduzir ainda mais o contingente policial!

  • O pequeno efetivo policial, somado à necessidade do

    exercício das funções de agentes carcerários, torna deveras difícil a

    realização de investigações adequadas, implicando em prejuízo à

    propositura da ação penal e, consequentemente, à prestação da tutela

    jurisdicional, eis que é quase impossível a observância daquelas diligências

    previstas no art. 6º do Código de Processo Penal, como colheita de

    vestígios do crime, realização de exames periciais, elaboração de laudos e

    oitiva de testemunhas.

    Por não existir alternativa, os Investigadores de Polícia,

    em reprovável desvio de função, exercem atos de custódia e vigilância de

    presos, sem que tenham sido contratados e preparados para tanto.

    E, pior, são obrigados a permanecer no interior da

    unidade policial prestando assistência aos detentos, providenciando sua

    alimentação, locomoção ao banho de sol e ao Fórum para participação

    em audiências, perdendo, enfim, capacidade operacional significativa no

    que diz respeito ao desempenho de suas funções básicas de polícia

    judiciária e investigação de delitos.

    No período noturno e nos finais de semana, os

    investigadores também são obrigados a se revezarem para dar

    atendimento aos presos e segurança à unidade policial.

    Tal situação causa graves consequências também ao

    desempenho das atividades dos policiais civis, que são obrigados a

  • trabalhar em ambiente tenso, sem condições mínimas adequadas, sempre

    apreensivos e temendo rebeliões, motins e tentativas de fuga.

    Essa situação é corriqueira no Estado do Paraná, onde

    os Investigadores de Polícia são também responsáveis pela guarda de

    presos provisórios, o que caracteriza atividade ininterrupta. Confira-se o art.

    6º, VII, da Lei Complementar Estadual nº 96/2002:

    Art. 6º - Aos Investigadores de Polícia compete:

    (...)

    VII – zelar pela integridade física e moral, e guarda de presos

    provisórios, recolhidos nos setores de carceragem das

    unidades policiais civis, enquanto interessarem à

    investigação policial;

    Isto significa que é preciso haver ao menos um

    Investigador de Polícia, de forma permanente, na Delegacia, a fim de

    atender eventualidades dentro da cadeia pública. Equipara-se, assim, ao

    cargo de Agente Penitenciário, para o qual é estabelecido o Regime de

    Trabalho em Turnos – RTT.

    Com efeito, para atividades ininterruptas, o Decreto

    Estadual nº 2.471/2004 estabeleceu o Regime de Trabalho em Turnos – RTT:

    Art. 4°. Fica regulamentado o Regime de Trabalho em Turnos

    – RTT, para as atividades com atuação ininterrupta de 24

    horas de serviço, para o servidor ocupante de cargo/função

    com carga horária prevista no artigo 4° da Lei n° 13.666/02,

    da seguinte forma:

    I - 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso, com duas

    folgas mensais, para aquele servidor com jornada de oito

    horas diárias; ou

    II - Omissis

  • III - Omissis

    § 1°. O regime de trabalho para os ocupantes do cargo de

    Agente Penitenciário será o previsto no inciso I, deste artigo.

    Este Decreto é aplicável aos servidores da Polícia Civil

    do Paraná, por força do art. 1º, § 3º, do Decreto 4.345/2005:

    Art. 1º. O servidor público civil do Estado do Paraná, da

    Administração Direta e Autárquica, deverá laborar em

    jornada pela carga horária de seu cargo adotando-se, nos

    casos específicos, o regime de turno de trabalho conforme

    estabelece a legislação estadual, para atendimento integral

    do serviço.

    § 1º. Entende-se por carga horária a quantidade de horas

    semanais a que deve se submeter a atividade laborativa do

    cargo público, que é de 40 (quarenta) horas.

    § 2º. Entende-se por jornada a quantidade de horas diárias

    de atividade laborativa a que um servidor deve se submeter,

    de acordo com a carga horária de seu cargo.

    § 3º. O regime de turno de trabalho deverá obedecer ao que

    dispõe o Decreto nº 2.471, de 14 de janeiro de 2004,

    estendendo-se as disposições daquele Decreto aos demais

    órgãos da Administração Direta e Autárquica do Poder

    Executivo.

    Assim, apenas para realizar a guarda dos presos

    provisórios, é necessário que 4 (quatro) dos Investigadores de Polícia hoje

    lotados na Delegacia de Santa Helena dediquem-se EXCLUSIVAMENTE a

    estas atividades, a fim de que se revezem, em jornada de 12 horas de

    trabalho por 36 horas de descanso.

    Ademais, ao menos um desses Investigadores de Polícia

    deve ser do sexo feminino, a fim de possibilitar diligências imprescindíveis,

    especialmente no que tange às visitas aos presos. Caso haja falha na

    fiscalização do ingresso de mulheres nas dependências da Delegacia de

  • Polícia, algumas das deletérias consequências são o ingresso de aparelhos

    de telefonia celular, drogas e armas e utensílios para tentativas de fuga.

    Obviamente, além da guarda de presos provisórios, os

    Investigadores de Polícia possuem outras atribuições – mais condizentes

    com o seu cargo, diga-se – que consubstanciam atividades externas. Ou

    seja, enquanto 4 (quatro) Investigadores dedicam-se exclusivamente para

    a guarda dos presos provisórios, os outros três restantes realizam todo o

    trabalho efetivo de polícia judiciária, ou seja, a análise de cenas de crimes,

    a colheita de provas, o cumprimento de mandados de prisão, busca e

    apreensão, etc. Frise-se que a Comarca de Santa Helena conta com

    altíssima ocorrência de homicídios, crime que, por certo, demanda

    investigações mais aprofundadas. Apenas a título de exemplo, confira-se

    novamente o art. 6º, da Lei Complementar n. 96/2002:

    Art. 6º - Aos Investigadores de Polícia compete:

    (...)

    V - prender ou fazer prender delinquentes contra os quais

    houver mandado de prisão ou em flagrante delito,

    providenciando, neste caso, o acompanhamento de

    testemunhas;

    (...)

    XI - cooperar, demonstrando espírito de colaboração, com

    as autoridades policiais e seus agentes auxiliares, em todas

    as investigações para a descoberta de crimes e seus

    autores, empenhando o máximo esforço para o completo

    êxito das diligências;

    Importa ressaltar que os Investigadores devem ser

    formados na Escola da Polícia Civil. Caso contrário, somente podem

    realizar atividades administrativas, o que exclui a guarda de presos e a

    realização de diligências externas.

  • Os Escrivães de Polícia, por sua vez, também se fazem

    necessários 24 horas por dia. As suas atribuições, no Estado do Paraná,

    estão fixadas no art. 7º do Anexo I do Decreto Estadual nº 4884, de 24 de

    abril de 1.9783.

    Os autos de prisão em flagrante (atribuição do

    Escrivão, prevista no inciso VII do mencionado art. 7º), por exemplo, devem

    ser elaborados imediatamente, independentemente da hora em que

    ocorre a prisão em flagrante, conforme se infere do art. 306 do Código de

    Processo Penal:

    Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se

    encontre serão comunicados imediatamente ao juiz

    competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à

    pessoa por ele indicada. (Redação dada pela Lei nº 12.403,

    de 2011).

    § 1º Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da

    prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de

    prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome

    de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

    (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

    Ademais, é atribuição do Escrivão encaminhar a vítima

    para exame pericial (inciso XIX do mencionado dispositivo legal). Em

    crimes sexuais, por exemplo, é imperativo que alguns exames se deem nas

    primeiras horas que sucedem o fato, sob pena de se perder a prova do

    crime.

    3 Disponível em

    http://www.policiacivil.pr.gov.br/arquivos/File/CONCURSOS/2010/edital_01_2009.pdf

    Anexo I do Edital de abertura do concurso da Polícia Civil de 2010, pp. 17/20. Acesso em

    31.10.13

    http://www.policiacivil.pr.gov.br/arquivos/File/CONCURSOS/2010/edital_01_2009.pdf

  • Isto significa que é preciso haver ao menos um Escrivão

    de Polícia, de forma permanente, na Delegacia. Destarte, são necessários

    ao menos 4 (QUATRO) Escrivães de Polícia, permanentemente, para se

    revezarem em jornada de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso.

    Do exposto, verifica-se que para a manutenção de um

    regime de plantão na Delegacia de Santa Helena, são necessários ao

    menos 8 Investigadores (ou 4 investigadores e 4 agentes de carceragem) e

    4 Escrivães, totalizando 12 (doze) servidores da Polícia Civil do Paraná.

    Ressalte-se que não estamos tratando, aqui, do número

    adequado de servidores da Polícia Civil na Delegacia de Santa Helena,

    mas do número mínimo para o desenvolvimento das atividades de polícia

    judiciária de forma ininterrupta, conforme o art. 144, § 4º da CF.

    Sobre a necessidade de se manter serviço policial

    ininterrupto, confira-se a seguinte decisão do E. TJ-PR:

    REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL

    PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER EM DEFESA DA

    SEGURANÇA PÚBLICA. INSUFICIÊNCIA DE EFETIVO HUMANO

    NA POLÍCIA CIVIL NO ÂMBITO DOS MUNICÍPIOS DE

    MANGUEIRINHA E HONÓRIO SERPA, QUE CONTA APENAS

    COM UM ESCRIVÃO DE POLÍCIA. PRETENSÃO DE

    CONDENAÇÃO DO ESTADO NA OBRIGAÇÃO DE FAZER

    CONSISTENTE EM ASSEGURAR A ADOÇÃO DAS PROVIDÊNCIAS

    LEGAIS E ADMINISTRATIVAS NECESSÁRIAS PARA

    PREENCHIMENTO DE UM QUADRO MÍNIMO DE SERVIDORES DA

    POLÍCIA CIVIL EM TAIS MUNICÍPIOS. SENTENÇA DE PARCIAL

    PROCEDÊNCIA. RECURSO DO ESTADO DO PARANÁ.

    SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, QUE DETERMINA AO

  • ESTADO DO PARANÁ QUE, NO PRAZO DE SEIS MESES, DESIGNE

    PARA A DELEGACIA DE MANGUEIRINHA NÚMERO SUFICIENTE

    DE DELEGADOS, ESCRIVÃES E INVESTIGADORES DE POLÍCIA

    PARA O CUMPRIMENTO DA ESCALA DE PLANTÃO E DEMAIS

    ATIVIDADES, SOB PENA DE MULTA PESSOAL AO SECRETÁRIO DE

    SEGURANÇA. (...) SITUAÇÃO OBJETO DA LIDE QUE REVELA

    DESCUMPRIMENTO A PRECEITO CONSTITUCIONAL RELATIVO À

    SEGURANÇA PÚBLICA. PRESENÇA DE APENAS UM SERVIDOR

    (ESCRIVÃO) NO MUNICÍPIO (E DE UM DELEGADO

    DESIGNADO, QUE ATENDE OUTRAS CINCO DELEGACIAS) QUE

    INFRINGE A PREVISÃO CONSTITUCIONAL, POIS IMPOSSIBILITA A

    CONSECUÇÃO DE TODOS OS ATOS E MEDIDAS NECESSÁRIAS

    NA ÁREA DE SEGURANÇA PÚBLICA PREVISTAS EM LEI,

    DEIXANDO A POPULAÇÃO EM EVIDENTE CARÊNCIA. A

    IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA EXISTENTE NÃO TRATA

    DE ATO DISCRICIONÁRIO, MAS VINCULATIVO, PELO QUE,

    HAVENDO OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NESTE

    SENTIDO, É POSSÍVEL A INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO, PARA

    FAZER VALER A LETRA CONSTITUCIONAL. INOCORRÊNCIA DE

    OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES IN CASU.

    CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER DETERMINADA

    PELA SENTENÇA QUE DEVE SER MANTIDA. (...)

    (TJPR - 4ª C.Cível - AC - 730910-4 - Mangueirinha - Rel.: Maria

    Aparecida Blanco de Lima - Unânime - - J. 23.08.2011)

    Caso não se adote o Regime de Trabalho por Turno –

    RTT, deve-se observar que a carga horária dos servidores da Polícia Civil do

    Paraná é de 40 horas semanais (conforme disposto no já transcrito art. 1º, §

    3º, do Decreto Estadual nº 4.345/2005), e a própria Constituição Federal

    limita a jornada diária a 8 horas diárias (art. 39, § 3º, c.c. art. 7º XIII, ambos

    da CF).

    A semana possui 168 horas. Assim, se houvesse 4

    Escrivães de Polícia na Delegacia de Santa Helena, por exemplo, cada um

    precisaria trabalhar 42 horas semanais para manter a atividade de forma

    ininterrupta, extrapolando o limite legal.

  • Confira-se a seguinte decisão do TJ-PR sobre o regime

    de trabalho dos policiais civis do Paraná:

    MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. SINDICATO -

    LEGITIMIDADE - REQUISITOS - LEI Nº 9.494/97 (REDAÇÃO DA

    MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.180-35) - JORNADA DE TRABALHO

    DOS POLICIAIS CIVIS - SUJEIÇÃO AO REGIME DE TEMPO

    INTEGRAL E DEDICAÇÃO EXCLUSIVA - DIREITO À

    CONTRAPRESTAÇÃO PELO LABOR EXTRAORDINÁRIO -

    INVIABILIDADE - AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQÜIDO E CERTO À

    CONVOCAÇÃO FORMAL PARA OPERAÇÕES ESPECIAIS. (...)

    Pela natureza jurídica dos serviços públicos, especialmente

    os relativos à polícia civil, pode a forma de cumprimento da

    jornada de trabalho, especialmente a escala de plantão, ser

    determinada por lei, que, no caso, não desrespeita o limite

    máximo de 40 horas semanais, assegurada a compensação

    das horas extraordinárias, sem a necessidade de efetivação

    de acordo ou convenção coletiva de trabalho, nos termos

    permitidos pelo art. 39, § 3º da Constituição Federal." (Juiz

    Péricles Bellusci de Batista Pereira, Mand. Seg. nº 141.742-1).

    2. Em razão da natureza especial de suas funções, os

    policiais civis não têm direito líqüido e certo de serem

    convocados formalmente (por escrito), para participação

    de operações especiais. Conquanto os atos administrativos

    em geral sejam via de regra solenes, é perfeitamente

    possível a sua exteriorização pela forma verbal, em se

    tratando de determinações de polícia em casos

    especialíssimos e de urgência, como nas convocações para

    batidas, "blitz", rondas e arrastões.

    (TJPR - IV Grupo de Câmaras Cíveis - MS - 142168-9 - Curitiba

    - Rel.: Ivan Bortoleto - Unânime - - J. 11.12.2003)

    Como se vê, é mais vantajoso para o Estado do Paraná

    adotar o Regime de Trabalho em Turnos – eis que precisará lotar menos

    servidores da Polícia Civil – do que se cumprir a legislação relativa à

    jornada de trabalho de 40 horas semanais dos referidos funcionários

    públicos.

  • O que não se admite é que apenas 01 Delegado, 01

    Escrivão de Polícia e 05 Investigadores de Polícia realizem toda a atividade

    policial de três municípios, estando 24 horas por dia e 7 dias por semana à

    disposição do serviço público por força da omissão do Estado do Paraná

    em prover adequadamente o serviço de segurança pública.

    Diante deste quadro, não é preciso grande esforço

    para perceber que é impossível sequer o adequado atendimento àquelas

    pessoas vitimadas por uma infração penal. Ainda, o que não dizer acerca

    da necessária investigação dos delitos praticados. A situação é tão

    precária que os inquéritos concluídos mensalmente são ínfimos, fazendo

    com que apenas chegue às mãos desta Promotoria de Justiça os

    inquéritos policiais de réus presos. Raros são os casos de conclusão de

    inquéritos policiais de réus soltos.

    Ressalte-se que, apenas neste ano de 2014, ocorreu

    uma fuga em massa bem sucedida em janeiro (documento de fls. 08) e

    uma tentativa de fuga em março (fls. 10/12), além da evasão de dois

    presos (fls. 30). Além disso, deu-se também o suicídio de um detento no

    mês de março (fls. 07).

    Destaca-se que o Ministério Público já tomou todas as

    medidas possíveis para que fossem implementadas mudanças na situação

    caótica que encontra-se a Delegacia de Polícia de Santa Helena perante

    a Secretaria Estadual de Segurança Pública e a Secretaria Estadual de

    Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, porém, não foram obtidas respostas

    e providências satisfatórias.

  • Enfim, de concreto, nada mudou e dificilmente irá

    mudar sem uma intervenção firme do Poder Judiciário.

    3.1. Quanto à urgência e necessidade de remoção dos

    presos sentenciados

    Ao lado do deficitário quadro de pessoal, as condições

    físicas da Cadeia Pública local são péssimas.

    Esclareça-se que existe adequada estrutura na

    Delegacia de Polícia, com amplos gabinetes e locais propícios ao

    atendimento ao público, porém, o mesmo não pode ser dito em relação à

    carceragem.

    Conforme se observa dos inclusos relatórios de visitas

    mensais desta agente ministerial, a população carcerária gira em torno de

    45 (quarenta e cinco) presos, enquanto a capacidade máxima de lotação

    é de 22 detentos!

    Segundo relatórios anexos emitidos pelo Conselho da

    Comunidade local, não há espaço físico para a quantidade de pessoas lá

    existentes, tampouco condições mínimas de vida digna.

    Destaque-se que o município de Santa Helena registrou

    as temperaturas mais altas do Estado no último verão (aproximadamente

  • 42ºC) e que tem sido relatado constantemente pelo Conselho da

    Comunidade a ausência de ventilação adequada nas celas.

    Outrossim, não há espaço adequado para a detenção

    de mulheres, adolescentes e presos civis.

    Quando se faz necessária a prisão de mulheres é

    adaptado um pequeno espaço para sua permanência, sem qualquer tipo

    de ventilação.

    Em relação aos adolescentes, da mesma forma, não

    há espaço apropriado para a permanência destes nos casos de

    apreensão em flagrante de atos infracionais graves. Nestas circunstâncias,

    devendo prevalecer os princípios e o regramento próprio do Estatuto da

    Criança e do Adolescente, tem sido comum o aguardo de vagas para

    internação em liberdade.

    Igualmente, não existe espaço para presos civis. Nestas

    hipóteses, da mesma forma como é feito quando apreende-se

    adolescente em flagrante de ato extremamente grave, é necessário um

    remanejamento de presos, destinando-se uma das celas para tais

    situações.

    Existem 15 presos já condenados (eram 08 à época da

    propositura da demanda), aguardando transferência para o sistema

    penitenciário. Em resposta à requisição de transferência feita pelo

    Ministério Público, no entanto, o Comitê de Transferência de Presos –

  • COTRANSP informou inexistirem vagas nas Unidades Penais localizadas em

    Foz do Iguaçu para atendimento do pleito (documento de fls. 36/43).

    A Lei de Execução Penal (Lei n.º 7.210/84) é muito clara

    ao tratar dos estabelecimentos penais: a penitenciária destina-se ao

    condenado à pena de reclusão, em regime fechado (art. 87).

    A Cadeia Pública, por sua vez, destina-se ao

    recolhimento de presos provisórios, a fim de resguardar o interesse da

    administração da justiça criminal, e permanência do preso em local

    próximo ao seu meio social e familiar. Confira-se:

    Da Cadeia Pública

    Art. 102. A cadeia pública destina-se ao recolhimento de

    presos provisórios.

    Art. 103. Cada comarca terá, pelo menos 1 (uma) cadeia

    pública a fim de resguardar o interesse da Administração da

    Justiça Criminal e a permanência do preso em local próximo

    ao seu meio social e familiar.

    Tal conclusão se infere, também, da análise do já

    transcrito art. 6º, VII, da Lei Complementar nº 96/2002, que prevê como

    atribuição do Investigador da Polícia Civil do Paraná a guarda dos presos

    provisórios, apenas enquanto interessem à investigação.

    Segundo Julio Fabbrini Mirabete, “a finalidade da

    prisão provisória é apenas a custódia daquele a quem se imputa a prática

    do crime a fim de que fique à disposição da autoridade judicial durante o

    inquérito ou a ação penal e não para o cumprimento da pena, que não

    foi imposta ou que não é definitiva.” (Execução Penal, Comentários à Lei

  • 7.210, de 11-7-1984, 11ª edição, revista e atualizada até 31 de março de

    2004, Editora Atlas S. A., São Paulo, 2004, pág. 285-286)

    O STF já teve oportunidade de se manifestar com

    relação à impossibilidade de cumprimento de pena em cadeia pública:

    HABEAS CORPUS. Estabelecimento penal. Réu recolhido em

    Cadeia Pública, onde já cumpriu mais da metade da pena

    imposta por sentença definitiva. Remoção para

    estabelecimento penal adequado. Não sendo a Cadeia

    Pública - lugar de recolhimento de presos provisórios - o

    estabelecimento penal adequado para se cumprir decisão

    condenatória, defere-se a ordem de "habeas corpus" para

    garantir a transferência do paciente para outro tipo de

    estabelecimento penal, onde devera ser aferida, pelo Juiz

    competente para execução da pena, sua situação pessoal

    e eventuais direitos dela decorrentes. "Habeas corpus"

    deferido, em parte.

    (HC 68963, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Primeira Turma,

    julgado em 05/11/1991, DJ 29-11-1991 PP-17328 EMENT VOL-

    01644-02 PP-00255)

    Também o STJ já afirmou a inadequação do

    cumprimento de pena em cadeias públicas:

    HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO.

    CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. REGIME

    FECHADO. PRESÍDIO. TRANSFERÊNCIA À CADEIA PÚBLICA.

    ALEGAÇÃO DA INCLUSÃO FAMILIAR. INADEQUAÇÃO DO

    ESTABELECIMENTO PRISIONAL. ORDEM DENEGADA.

    O cumprimento da pena privativa de liberdade demanda

    uma série de cuidados indispensáveis à ressocialização do

    apenado, dentre os quais se destaca a proximidade com os

    entes familiares.

    Todavia, não há falar de participação familiar sem antes

    idealizar o estabelecimento prisional adequado à situação

    do comando do título executivo, porquanto o cumprimento

    da pena em estabelecimento destinado à conservação dos

  • presos provisórios esvaziaria o esforço do sistema na

    recondução futura do convívio social, além, naturalmente,

    de conspirar contra as disposições legais.

    Ordem denegada.

    (HC 30.106/GO, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA,

    QUINTA TURMA, julgado em 23/09/2003, DJ 28/10/2003, p.

    326)

    Ora, a Lei de Execuções Penais não é um diploma

    meramente ornamental, a ser contemplado como norma programática.

    Ao contrário, estabelece requisitos muito claros a serem observados pelo

    Estado.

    Embora o Estado do Paraná esteja tomando medidas

    para tentar amenizar o gravíssimo problema das cadeias públicas das

    delegacias de polícia, a Comarca de Santa Helena foi excluída das

    políticas públicas em andamento.

    Com efeito, o Governador editou o Decreto Estadual nº

    4.199/2012, que prevê um plano de transição da gestão dos presos do

    Estado do Paraná, que passariam da responsabilidade da Secretaria de

    Segurança Pública para a Secretaria de Justiça, até o ano de 2014.

    Todavia, este plano não faz qualquer menção à comarca de Santa Helena.

    Resta claro, assim, o interesse de agir deste órgão

    ministerial, a fim de garantir patamar mínimo de segurança e dignidade

    aos cidadãos, que não possuem qualquer perspectiva de melhora.

    A situação dos presos é preocupante. Ante o quadro

    deficitário de funcionários e a utilização da área do solarium para

  • abrigamento de determinados detentos, os demais não estão tendo

    banho de sol com regularidade e existem alguns já com a saúde

    debilitada.

    Não há separação entre presos provisórios e

    condenados que aguardam transferência para o sistema penitenciário.

    Não há separação entre presos primários e reincidentes.

    Em todas as operações ‘bate-grade’ realizadas este

    ano, foram encontrados aparelhos celulares e instrumentos utilizados para

    possibilitar fugas.

    Todas estas situações evidenciam o total descaso do

    Poder Público com o sistema prisional desta cidade e colocam em risco a

    segurança pública desta cidade e região.

    Tal situação é verificada em decorrência do fato de

    que a Cadeia Pública de Santa Helena – como tantas outras cadeias

    públicas do Paraná – está com a população carcerária acima da sua

    capacidade.

    Ou seja, haverá superlotação carcerária, seja na

    cadeia pública de Santa Helena – local inadequado para a manutenção

    de presos condenados – ou nos presídios estaduais. Isto esvazia qualquer

    argumento, por parte do Estado do Paraná, de ausência de vagas no

    sistema penitenciário estadual. Ora, se não há vagas para presos

  • condenados de forma definitiva nas penitenciárias, também não há vagas

    na carceragem da Delegacia de Polícia local!

    Se a remoção de presos somente transfere o problema

    da cadeia pública para a penitenciária, ao menos os presos estarão em

    estabelecimento adequado ao cumprimento da pena privativa de

    liberdade. Ademais, com a remoção, permite-se que os Investigadores de

    Polícia se dediquem mais às atividades realmente típicas de Polícia

    Judiciária.

    Confira-se, a propósito, precedentes do E. TJ-SP

    favoráveis a Ações Civis Públicas que objetivam a transferência de presos

    de cadeias públicas para penitenciárias:

    0010761-82.2011.8.26.0268 - Apelação

    Relator(a): Paulo Galizia

    Comarca: Itapecerica da Serra

    Órgão julgador: 10ª Câmara de Direito Público

    Data do julgamento: 12/08/2013

    Data de registro: 14/08/2013

    Ementa: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER DE

    NÃO FAZER. Cadeia pública com população carcerária

    além dos limites legais. Regularização da ocupação pela

    remoção de condenados definitivos e proibição do ingresso

    de presos além da capacidade máxima. Sentença que

    julgou improcedentes os pedidos. Reforma. Necessidade.

    Discricionariedade da Administração que deve ser exercida

    nos termos da lei. Inobservância do princípio da dignidade

    da pessoa humana e do direito constitucional à segurança

    pública (art. 1º, inciso III, e art. 6º, da CF). Constatação.

    Situações que autorizam a atuação do Poder Judiciário.

    Desrespeito ao princípio da separação dos Poderes.

    Inocorrência. Aplicação de multa em caso de

    descumprimento da obrigação. Admissibilidade. Pedido

    parcialmente procedente. Recurso parcialmente provido

  • Ação Civil Pública - Preliminares afastadas -Superpopulação

    carcerária - Pretensão de remoção de presos com

    condenações definitivas, transitadas em julgado, das

    Cadeias Públicas dos Distritos Policiais e das Delegacias de

    Polícia Especializadas, para estabelecimentos prisionais

    adequados - Possibilidade - Conselho Nacional de Justiça -

    "Meta Zero" - Política Pública - Ativismo judicial - Direitos

    fundamentais do preso - Princípio da dignidade da pessoa

    humana - Inteligência dos arts. 5º, XLIX e LXIII, da

    Constituição Federal e arts. 40, 41, 42 e 43, da Lei de

    Execução Penal - Precedentes do Tribunal de Justiça do

    Estado de São Paulo -Sentença reformada - Recursos oficial

    e voluntário do Ministério Público providos.

    (TJ-SP - APL: 9092747452002826 SP 9092747-45.2002.8.26.0000,

    Relator: Marrey Uint, Data de Julgamento: 05/04/2011, 3ª

    Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 12/04/2011)

    Ressalte-se que todos os presos atualmente existentes

    na cadeia pública de Santa Helena respondem a processos graves

    (homicídios, roubos e estupros) e, em sua maioria, são reincidentes, não

    sendo possível a colocação destes em liberdade, ainda que cumulada a

    medidas cautelares diversas da prisão.

    As perspectivas não são animadoras, eis que o número

    de presos vem aumentando de forma gradativa e já foi ultrapassado o

    limite do suportável. Registre-se que o problema não se restringe a esta

    Comarca, sendo comum a todas as Comarcas da região. Recentemente,

    houve interdição da cadeia pública da Comarca de Marechal Cândido

    Rondon.

    Enfim, a Comarca de Santa Helena não dispõe de

    prédio com estrutura adequada à manutenção de detentos, e a

    superpopulação carcerária acarreta insegurança social, descrença com a

  • segurança pública e irreparáveis danos de ordem física, moral e psíquica

    aos presos em face das desumanas condições a qual são submetidos.

    3.3. Quanto à possibilidade/necessidade de

    antecipação dos efeitos da tutela

    Pelos argumentos de fato e de direito acima

    apresentados, denota-se que incorreu em erro o julgador a quo ao proferir

    a decisão de mov. 11.1, ao entender não haver urgência nas medidas

    requeridas, sendo perfeitamente cabíveis os pedidos efetuados em sede

    de antecipação de tutela.

    Consoante o artigo 273, inciso I, do Código de Processo

    Civil, o juiz pode antecipar os efeitos da tutela quando presentes a prova

    inequívoca que o convença da verossimilhança das alegações e haja

    fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

    A prova inequívoca consubstancia-se nos documentos

    juntados com a inicial, que comprovam as péssimas condições da

    carceragem da Delegacia de Polícia local, assim como o déficit de efetivo

    destinado às atividades de polícia judiciária da Comarca.

    A verossimilhança das alegações expostas decorre do

    direito fundamental à segurança pública assegurado constitucionalmente

    e da normativa que garante condições mínimas aos privados de

    liberdade.

  • Já quanto ao receio de dano irreparável, tem-se que a

    segurança pública possui caráter essencial, sendo inadmissível exigir-se da

    população que se aguarde a obtenção de tal prestação. Da mesma

    forma, como demonstrado, a atual situação impede a efetiva garantia da

    segurança, inexistindo servidores em número suficiente que investiguem,

    colham provas e realizem a guarda e custódia dos presos, enfim que

    exerçam de forma eficiente as atividades de polícia judiciária.

    Ora, como a criminalidade não se reduz, pelo

    contrário, só viceja diante da inércia estatal, inegável o justo receio de

    lesão grave e irreparável aos membros desta comunidade.

    Da mesma forma, a população resta insegura diante

    da probabilidade concreta de fugas e rebeliões e os presos são

    submetidos a danos irreparáveis de ordem física, moral e psíquica frente às

    condições desumanas a que são submetidos, possibilitando homicídios,

    lesões corporais e tráfico de drogas no interior das celas, casos de

    contaminação por doenças infecciosas, destruição do patrimônio público

    e assim por diante.

    Demonstrada, pois, a presença do periculum in mora

    da efetivação da tutela pleiteada.

    Assim, mister a concessão de medida antecipatória,

    determinando-se: (a) a designação imediata de 03 (três) Investigadores de

    Polícia ou Agentes de Carceragem e 03 (três) Escrivães (eis que houve

    redução do efetivo existente à época da propositura da demanda), para

  • trabalhar na Delegacia de Polícia de Santa Helena, juntamente com os

    servidores já existentes – com a devida reposição de servidores durante o

    gozo de férias, afastamentos etc. –, fixando-se multa diária no valor de R$

    1.000,00 (mil reais) para garantir-se o cumprimento da obrigação, na forma

    do art. 11, da Lei n.° 7.347/85, valor a ser destinado ao Conselho da

    Comunidade da Comarca de Santa Helena/PR; com a expressa

    advertência de que não servirá como cumprimento da determinação

    judicial eventual remanejo de servidores que respondam sindicâncias,

    procedimentos administrativos, inquéritos policiais, ações penais por

    quaisquer tipos de crimes e ações civis de responsabilidade por

    improbidade administrativa. Ainda, o réu deve ser advertido acerca da

    impossibilidade de redução do referido número de servidores, bem como

    do atual número de servidores lotados, por se tratar do mínimo para o

    funcionamento do regime de plantão das atividades da Polícia Civil em

    Santa Helena; (b) a remoção imediata de todos os presos sentenciados e

    cumprindo pena na Delegacia de Polícia (regime fechado e semiaberto)

    para as Penitenciárias do Estado e/ou Colônia Penal, fixando-se multa

    diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) por preso não transferido, para

    garantir o cumprimento da obrigação, na forma do art. 11, da Lei n.°

    7.347/85, valor a ser destinado ao Conselho da Comunidade da Comarca

    de Santa Helena/PR;

    4. DO PEDIDO

    A vista do exposto, requer-se o recebimento do

    presente Agravo de Instrumento, e, por conseguinte, a ponderação dos

    fatos apresentados para que haja a reconsideração da r. decisão de

  • movimento 11.1, nos termos no art. 523, § 2º, do CPP, posto que os

    requerimentos efetuados em sede de antecipação de tutela atendem aos

    ditames da lei e da justiça para o caso em comento.

    Contudo, em não havendo juízo de retratação, requer-

    se seja o recurso recebido e julgado procedente, a fim de se acolher o

    pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, com fundamento

    nos art. 527, III, 2ª parte, do CPC, para:

    (a) a designação imediata de 03 (três) Investigadores

    de Polícia ou Agentes de Carceragem e 03 (três)

    Escrivães, para trabalhar na Delegacia de Polícia de

    Santa Helena, juntamente com os servidores já

    existentes – com a devida reposição de servidores

    durante o gozo de férias, afastamentos etc. –, fixando-

    se multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) para

    garantir-se o cumprimento da obrigação, na forma do

    art. 11, da Lei n.° 7.347/85, valor a ser destinado ao

    Conselho da Comunidade da Comarca de Santa

    Helena/PR; com a expressa advertência de que não

    servirá como cumprimento da determinação judicial

    eventual remanejo de servidores que respondam

    sindicâncias, procedimentos administrativos, inquéritos

    policiais, ações penais por quaisquer tipos de crimes e

    ações civis de responsabilidade por improbidade

    administrativa. Ainda, o réu deve ser advertido acerca

    da impossibilidade de redução do referido número de

  • servidores, bem como do atual número de servidores

    lotados, por se tratar do mínimo para o funcionamento

    do regime de plantão das atividades da Polícia Civil em

    Santa Helena;

    (b) a remoção imediata de todos os presos

    sentenciados e cumprindo pena na Delegacia de

    Polícia (regime fechado e semiaberto) para as

    Penitenciárias do Estado e/ou Colônia Penal, fixando-se

    multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) por preso

    não transferido, para garantir o cumprimento da

    obrigação, na forma do art. 11, da Lei n.° 7.347/85,

    valor a ser destinado ao Conselho da Comunidade da

    Comarca de Santa Helena/PR;

    Nestes termos, pede e aguarda deferimento.

    Santa Helena, 17 de novembro de 2014.

    ANA CLAUDIA LUVIZOTTO BERGO

    Promotora de Justiça