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1 FACULDADE DE SÃO BENTO LICENCIATURA PLENA EM FILOSOFIA TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO GIOVANE RODRIGUES DOS SANTOS O CONCEITO DE AMOR NO CAPÍTULO VII DO SENTIMENTO TRÁGICO DA VIDA DE MIGUEL DE UNAMUNO. São Paulo 2015

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FACULDADE DE SÃO BENTO

LICENCIATURA PLENA EM FILOSOFIA

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

GIOVANE RODRIGUES DOS SANTOS

O CONCEITO DE AMOR NO CAPÍTULO VII DO

SENTIMENTO TRÁGICO DA VIDA DE MIGUEL DE

UNAMUNO.

São Paulo

2015

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GIOVANE RODRIGUES DOS SANTOS

O CONCEITO DE AMOR NO CAPÍTULO VII DO

SENTIMENTO TRÁGICO DA VIDA DE MIGUEL DE

UNAMUNO.

Monografia apresentada ao Curso de Licenciatura Plena em

Filosofia da Faculdade de São Bento, como requisito parcial

para obtenção do título de Licenciado em Filosofia.

Orientador: Prof. Dr. Jorge Luis Gutiérrez,

São Paulo

2015

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BANCA EXAMINARORA

São Paulo, 30 de Junho de 2015

____________________________________________________________

Prof. Dr. Jorge Luis Gutiérrez - Orientador

Faculdade de São Bento

__________________________________________________________

Prof. Drª. Maria Carolina Alves Santos - Examinadora

Faculdade de São Bento

_________________________________________________________

Prof. Dr. Franklin Leopoldo e Silva - Examinador

Faculdade de São Bento

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Dedico este Trabalho as Mulheres da minha Vida:

Eloiza Rodrigues dos Reis Santos,

Josiane Rodrigues dos Santos

Lourdes Rodrigues dos Santos

E a meu Grande Amigo:

Jaspio Alencar de Souza

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AGRADECIMENTOS

Agradecer é simplesmente reconhecer a presença significativa de pessoas que

imprimiram as suas marcas para a concretização deste trabalho, dentre elas e com elas

agradeço a Deus pelo dom inefável da minha existência humana e pelos momentos de

dificuldades e crise que me levaram a descobrir aquilo que realmente importa: amar.

Externo minha gratidão a minha Comunidade Religiosa Ordem dos Mínimos por

haver proporcionado esses anos de estudos. Em modo especial a meus Formadores

Padre Frei José Antonio de Lima, O.M e Padre Frei Leonardo Calazans, O.M, pelo zelo

e cuidado para com os formandos, e pelas mais variadas discussões.

Destaco e agradeço de maneira satisfatória a atuação do meu orientador Jorge

Luis Gutiérrez, este que se fez solícito em suas considerações e, a partir disso, soube

extrair do ordinário o extraordinário. A sua atenção, espontaneidade, competências

engenhosas fizeram com que os caminhos deste singelo trabalho fossem traçados e

delimitados. Deixo registrada a minha profunda e sincera gratidão, não somente por

aquilo que ele fez, mas por aquilo que ele é.

Agradeço a meus familiares por toda a paciência e carinho com que me

acompanharam nesta longa jornada, de modo especial minha mãe Eloiza, que sempre

esteve a meu lado nos momentos mais difíceis.

Aos meus amigos pela colaboração e apreço, em especial ao Frei Leandro de

Queiroz Albuquerque, O.M e Luiz Gustavo Xavier, por me suportarem e

insistentemente me incentivaram e fizeram com que me empenhasse e concluísse o

presente trabalho.

Também agradeço aos amigos de caminhada na Faculdade, em especial Irmã

Luciana Rodrigues, Rogério Santana e Andrea Martinez, pela companhia e longas

discussões filosóficas e existenciais, no período de faculdade.

Todo carinho a minha querida amiga Maria del Carmen, pelo seu carinho e

disponibilidade em me ajudar na redação e conferência do texto e pela sua bela

companhia.

Ao amigo Padre Luiz Carlos Pintenho, da Diocese de Umuarama, que com

generosidade e fé me cedeu um espaço em vossa casa para a elaboração deste trabalho.

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A grande Amiga Eliane Francisca, pelo carinho e apoio que tem me dado nesta

nova etapa de minha vida laical. Estendo meus Agradecimentos a minha Terapeuta Dra.

Maria Ondina, pelas longas conversar e partilha. E também a minha estimada Amiga

Alejandra que com todo seu carisma e paciência me ajudou neste trabalho, com as mais

variadas discussões e partilha de conhecimento.

E por fim, e não menos importante agradeço a meu amigo e Professor Lailson

Castanha, pela oportuna companhia durante os estágios, e pela partilha de

conhecimentos.

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DESMAYARSE

Desmayarse, atreverse, estar furioso,

áspero, tierno, liberal, esquivo,

alentado, mortal, difunto, vivo,

leal, traidor, cobarde y animoso;

no hallar fuera del bien centro y reposo,

mostrarse alegre, triste, humilde, altivo,

enojado, valiente, fugitivo,

satisfecho, ofendido, receloso;

huir el rostro al claro desengaño,

beber veneno por licor süave,

olvidar el provecho, amar el daño;

creer que un cielo en un infierno cabe,

dar la vida y el alma a un desengaño;

esto es amor, quien lo probó lo sabe.

Lope de Vega

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RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo adentrar no universo do pensamento de

Miguel de Unamuno, um filósofo espanhol, pré-existencialista que busca responder aos

inúmeros problemas existenciais de sua época.

Abordaremos o tema do amor contido no capítulo VII de sua obra filosófica “Do

sentimento trágico da vida nos homens e nos povos”. Obra a qual nos mostrará que o

amor é o mais belo e ao mesmo tempo o mais trágico dos sentimentos, e que só é

possível amar por meio do sofrimento.

Veremos também que o amor é porta de abertura para o outro, é um verdadeiro

ato de compadecimento e reconhecimento no outro, em meu próximo,aquilo que sou.

Afinal o amor é dor, angústia e compaixão.

E por fim nos leva a um caminho transcendente, de abertura para Deus que é

amor. E descobrimos a sua pedagogia: ”Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei”

( Jo. 13,34)

Palavras-chave: amor, dor, compaixão, outro, tragédia, homem.

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RESUMÉN

El presente estudio tiene por objetivo introducirnos al universo del pensamiento

de Miguel de Unamuno, un filósofo español, existencialista que busca contestar los

problemas de su tiempo.

Abordaremos sobre la temática del amor contenida em el capítulo VII de su obra

filosófica “Del sentimiento trágico de la vida en los hombres y en los pueblos”. Obra

que nos mostrará que el amor es el más bello y al mismo tiempo el más trágico de los

sentimientos, y que solo es posible amar por medio del sufrimiento.

También veremos que el amor es la puerta de abertura para el otro, porque es un

verdadero compadecimento, y reconocimiento del outro como mi prójimo Afinal el

amor es dolor, angustia y compasión.

Y por fin, el amor nos lleva a un camino transcendente, hacia Dios que es amor,

y a partir de esto descubrimos la pedagogia del amor:”Que os ameis unos a otros; como

yo os he amado” ( Juan 13,34)

Palabras Claves: Unamuno, amor, dolor, compasión, otro, tragédia, hombre

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO-------------------------------------------------------------------11

CAPITULO I

1. Uma introdução a filosofia de Miguel de Unamuno----------------- -14

1.1 Breve histórico-------------------------------------------------------------14

1.2 A filosofia de Dom Miguel-----------------------------------------------23

1.3 Unamuno novelistas-------------------------------------------------------26

1.4 Unamuno ensaísta---------------------------------------------------------32

1.5 Considerações-------------------------------------------------------------35

CAPITULO II

2. Unamuno e o conceito de amor no sentimento trágico da vida nos

homens e nos povos------------------------------------------------------37

2.1 Amor, desejo, dor e compaixão---------------------------------------37

2.2 Amor consciência: um Deus escondido-------------------------------46

2.3 Considerações------------------------------------------------------------56

CAPITULO II

3. Amor a pedagogia das relações------------------------------------------58

3.1 Amor: o Eu e o Tu---------------------------------------------------------58

3.2 O Tu eterno e absoluto----------------------------------------------------68

3.3 Pessoa: realidade ou ficção?---------------------------------------------71

3.4 Um caminho, um encontro: a pedagogia-----------------------------75

3.5 Considerações--------------------------------------------------------------79

CONCLUSÃO--------------------------------------------------------------------81

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS--------------------------------------83

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INTRODUÇÃO

“O amor é como a morte não tem hora para chegar, não anuncia [...] O amor

é esta surpresa que a existência nos revela. Então amamos quando nada

queremos; e quando já nem esperamos. Eis então que o amor aparece”

(TONNETTI, 2013 p. 68-69)

Desde os primórdios, a mais alta meta da indagação filosófica é o conhecimento

de si mesmo. Com Sócrates alcança grande potencialidade, e apesar das controvérsias

entre diferentes tendências dos pensadores, esse objetivo permanece invariável. O

imperativo do autoconhecimento também constitui o cerne da investigação de Miguel

de Unamuno.

Desde modo que Unamuno se preocupa há seu tempo em entender os estados

anímicos do ser humano. Em especial Unamuno verifica a causa do amor no homem, e

percebe que o mesmo é quem por sua vez dita às regras, a partir disto Unamuno atesta

que o amor é o sentimento dos sentimentos, aquele que é capaz de levar o homem, de

um estado estrondoso de alegria e júbilo a uma vasta e profunda angústia.

Por conseguinte, o amor trás arraigado em sua natureza, uma história que

perpassa o nosso tempo e muitas vezes nosso entendimento, tudo pelo fato de que o

amor é força que une e separa; que constrói e destrói; que acalma e avassala, pois sendo

como é pura vontade de ser.

Sem embargo sabemos que nós, seres humanos, fomos criados no amor e para o

amor. No entanto, não podemos esquecer que o amor é o único capaz de salvar e recriar

a cada instante a criação divina. Pois o amor é uma experiência compartilhada com o

outro em sua totalidade.

Não podendo ser de outra maneira este trabalho é fruto de minhas próprias crises

existências. Pois sempre cresci ouvindo que o amor é quem tudo cura, que tudo suporta,

e que seria ele um mar de rosas. No entanto com o andar da carruagem fui percebendo

que o amor não é toda essa beleza, pois trás em si também a tragédia.

Em razão disso e ao me deparar com a filosofia de Unamuno, pude melhor

compreender as outras facetas contidas no amor. Pois, o grande questionamento feito

por mim era por que somente eu devo amar? Por que não poderia ser eu também

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amado? Com Unamuno compreendi que o amor não é objeto de troca, mas sim

gratuidade e doação. É assim que procuraremos clarear essas novas e antigas visões,

buscando responder o que é em Unamuno o amor. E como os homens de nossos

tempos, homens de carne e osso lidam com tudo isso.

Para melhor compreensão, acompanharemos no primeiro capítulo um breve

relado da vida de D. Miguel de Unamuno, situando-o em seu tempo e verificando como

ele lidou com os problemas existenciais de sua época. Ele que fora novelista, ensaísta,

filósofo.

Também ainda neste capítulo, acompanharemos como Unamuno com audácia e

personalidade dá respostas ao povo e antes para si mesmo a respeito daquilo que era

sofrimento para o homem. Ademais, veremos que Unamuno renova a literatura de sua

época, criando um estilo próprio de escreve suas “nívolas”. E a partir daí emprega uma

nova filosofia. Uma filosofia do homem concreto e vivo. O homem de carne e osso.

Em continuidade, no segundo capítulo embarcaremos no coração do tema desta

monografia, que é acentuar o amor em D. Miguel. O que vale lembrar que, não

esgotaremos aqui o tema, mas apenas daremos uma visão panorâmica de tal assunto.

É aqui que começaremos a desconstruir o amor meigo, e frágil. Entendendo que

ele é o que há de mais trágico na vida dos homens e dos povos. Para isso Unamuno não

aliviará a barra, fará fortes afirmações, uma delas que para que haja amor, é necessário

sofrer. E quem sabe talvez você não saia como eu frustrado por saber que o amor é

também dor.

Consequentemente em primeira instância, teremos uma visão do amor como se

pensava os antigos, pois segundo Unamuno o amor é vontade de ser. Portanto é o amor

movimento em direção ao outro.

Ainda no mesmo capítulo veremos que o amor é capaz de revelar aquilo que está

no mais íntimo de nossa consciência, a saber, Deus. Pois é dele que provém todo amor

espalhado por nós homens.

Em sequência passaremos ao terceiro e último capítulo, onde adentraremos a um

novo mundo, o mundo do Outro. Pois, como vimos no segundo capítulo a revelação de

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Deus, agora, portanto, se fará necessário criar um caminho. Caminho o qual me faça

ampliar meus conhecimentos e me abrir para o Outro.

Tal abertura só será possível se eu me abandonar em mim mesmo, descobrindo

em mim aquilo que quero encontrar no outro. Portanto, esse capítulo demonstrará o

amor como uma pedagogia das relações, onde eu me relaciono comigo mesmo, com

Outro, com Deus e com a natureza.

Pois é como diz o velho jargão, para amar o outro, devo antes me amar. E de

fato é assim, pois o martírio, a dor e o sofrimento com razão são passos para amar o

outro. E Unamuno mostrará que no instante que este laço for sendo criado, e fortificado

no verdadeiro sentir aquela visão que o outro é para mim objeto acabará e, passaremos

percebê-lo como Pessoa.

Ainda neste terceiro capítulo discutiremos até que ponto a pessoa é real, ou seria

ela parte da minha ficção? E Unamuno mostrará que o real e fictício se unem e criam a

pessoa. Tudo porque, o Eu e o Outro caminhamos juntos, somos Um.

E por fim, a pedagogia, o modo com o qual o amor nos faz perceber não só a nós

mesmos, mas também ao mundo, e a pessoa que nos cercam. E deste modo nos

deixemos guiar pelo amor, que é lei e norma da vida.

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CAPÍTULO PRIMEIRO

Uma Introdução A Filosofia De Miguel De Unamuno

1.1 Breve histórico

Miguel de Unamuno Y Jugo, nasceu a 26 de setembro de 1864, na cidade de

Ronda Del Castro Viejo de Bilbao, Espanha. Foi escritor, poeta, romancista, ensaísta,

crítico, literário, filólogo espanhol; reitor, professor de grego, latim, psicologia e ética

na Universidade de Salamanca. Filho de Salomé Jugo e do comerciante indiano Félix de

Unamuno, teve cinco irmãos. Após a morte1 de seu pai em 1870, fica aos cuidados da

avó Benita Unamuno, de quem, como ele mesmo dizia, herdou a coragem para a vida

civil, e da mãe sua religiosidade.

No entanto com a morte de dom Félix, a situação econômica na família

Unamuno começou a se apurar, colocando toda a família em um ritmo de austeridade.

Mas antes mesmo de se estabelecerem em Bilbao de maneira definitiva, seu pai

teria imigrado para o México e desta forma ajuntado certa quantia em dinheiro, da qual

pudera desfrutar sua família2. Além disso, ao regressar do México Dom Félix seu pai

trouxe consigo uma pequena biblioteca, a qual tudo indica ter sido o primeiro contato de

Miguel de Unamuno com os livros, dentre os quais se encontrava de história, de direito,

de ciências, e filosofia.

Passou sua infância em Bilbao, sendo como tal a segunda cidade mais

importante para Unamuno, pois fora ali onde “nasceram as mais brilhantes ideias” 3 e

nesta mesma cidade cursou seus estudos do primeiro ciclo, no Colégio de São Nicolas.

No ano de 1874, aos 10 anos, estava pronto para ingressar no Instituto Vizcaino de

1A morte do pai de Unamuno se deu quando o mesmo tinha apenas seis anos. A morte foi para Unamuno

uma experiência vivenciada como uma descontinuidade abismal e definitiva, que serão retratadas em

poucas lembranças, que serão narradas e sua obra “Como Escrever um Romance”, que é por sua vez,

fruto de uma profunda crise espiritual vivida pelo jovem Unamuno.

2MARTÍNEZ,Izasku. Biografia de Unamuno. In: Seminário Grupo de Estudos Peirceanos (2004) na

Universidade de Navarra - http://www.unav.es/ acessado em 14/03/2015 ás 15:30

3 idem

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Bilbao, quando presenciou o assédio de sua cidade, durante a terceira guerra Carlista

(1873-1875), acontecimento que o inspirara depois, na criação da sua primeira novela:

“Paz e Guerra” (1897).

Miguel de Unamuno foi o que chamam os franceses de Cartel, uma pessoa de

personalidade forte e de presença marcante em toda Espanha. Deste modo, Unamuno

foi um homem singular em todos os sentidos da palavra. Teve uma presença

significativa em toda Europa e quem sabe, dentre os poucos filósofos espanhóis, junto

com Ortega seu filósofo de cabeceira, a quem mais tarde disse a respeito de Unamuno:

“Miguel de Unamuno um homem em luta, em luta consigo mesmo,

com seu povo e contra seu povo, homem hostil, homem de guerra civil,

tribuno sem partidários, homem solitário, desterrado, selvagem, pregador no

deserto, provocador, irreconciliável, inimigo do nada, aquém nada atrai e

devora desgarrado, entre a vida e a morte, morto e ressuscitado ao mesmo

tempo, invencível e sempre vencido.” 4

Unamuno teve uma dimensão pública favorecida por seu caráter e idiossincrasia

inconfundível. Foi um homem que viveu em constante oposição, chegando ao ponto de

ser exilado por atacar a monarquia espanhola e por encabeçar movimentos ao que se

pareciam subversivos. Um grande pensador, filósofo, um eterno apaixonado pelos

problemas de sua época. Unamuno é considerado um dos expoentes da geração 98, da

inteligência espanhola e considerado precursor do existencialismo em seu país.

Conhecia diversos idiomas, literaturas antigas e modernas e se interessava por

filologia. Seguiu para Salamanca onde morou, até falecer aos 31 de dezembro de 1936.

Recorda-nos Eduardo Portella, que esse aguçado interesse pelos estudos fez de

Unamuno para seu país, um escritor inegociável. Para muitos, Unamuno era

considerado um homem audaz, corajoso. Que lutava por aquilo que mais amava sua

Pátria. Em contrapartida muitos acreditavam que isso faria do mesmo um pensador

neutro, no entanto não era5.

4UNAMUNO, Miguel de. Como Escrever um Romance. São Paulo: É realizações Editora, 2011, p.45

5 PORTELLA, Eduardo. Miguel de Unamuno. In: Palestra proferida na ABL, em 7/11/2012, durante a

“Jornada Literária sobre D. Miguel Unamuno”, sob os auspícios da ABL e da Universidade de

Salamanca.

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Com o passar dos anos essa faceta unamuniana de escritor6, ela vai se pautando

num cenário público e social. Afinal de tudo Unamuno era muito ligado com a situação

real de seu povo, com sua história. Em outros relatos em sua passagem a Portugal as

pessoas o recordam como o “pai do povo”, pois Unamuno nunca se desligou da gente,

de sua realidade e contexto social.

Em 1885, aos 21 anos, já trabalhava como professor de latim e psicologia, em

Salamanca. Consequentemente, aos 22 anos obteve a cátedra de Língua e Literatura

Grega7 pela Universidade de Salamanca. Três anos depois, licenciou Psicologia, lógica

e ética no Instituto de Bilbao. Em Vizccaya discute com Sabino Araña e com poeta

Ressurreicción Maria de Azue. Polemizou com Araña, que iniciava sua atividade

nacionalista. Este o considerava um basco, porém “espanholista8, porque não o

considerava o bilinguismo possível”.

O ano de 1887 é para Unamuno um ano tomado e delineado como, ano da Crise.

Pois, é justamente neste período que Unamuno mergulha em uma profunda crise

religiosa e existencial. Precisamente tomado por essas inseguranças é que Unamuno se

agarra as mais variadas leituras religiosas, em busca de uma real resposta.

As mais variadas crises foram vivenciadas, compartilhadas e suas testemunhas

foram dentre muitas: Pedro Corominas e Leopoldo Alas. Com essas estupendas figuras

Unamuno trocou enumeras Cartas onde se narrava:

“En una de las cartas me explicó como una descarga fulminante que

hirió en una hermosa noche[...] al día siguiente [...] iba a recluirse en el

convento de los frailes dominico de Salamanca, donde estuvo tres días.” 9

6 MIGUEL, CIRILO FLORÉZ. Autobiografia, Filosofia y Escritura: El Caso Unamuno. In: Paidéia

Project on-line - http://www.unav.es

7Alguns comentadores como Eduardo Portella, em seu artigo Miguel de Unamuno, afirmar que a

literatura grega não era uma das especialidades de Dom Miguel, In: In: Palestra proferida na ABL, em

7/11/2012, durante a “Jornada Literária sobre D. Miguel Unamuno”, sob os auspícios da ABL e da

Universidade de Salamanca.

8 MICAI, Barbara Aparecida Brosch. Fé e Razão, o conflito: a relação da esperança com a fé e a

caridade na filosofia de Miguel de Unamuno. São Paulo: Editorama, 2009.

9 SEGURA,José Antonio Serrano.Miguel de Unamuno.Sevilla,2001-In:http://jaserrano.nom.es/unamuno

Acessado em 10/03/2015 às 10:45.

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Há quem diga que foi após sua noite escura, de angústia e solidão que Unamuno

deu origem a sua mais bela, dramática e solitária novela “San Manuel Bueno, Mártír”;

um romance, uma história de amor que, por sua vez fracassada. Mas, ao fundo disto, é

esta novela uma expressão de desejo e vontade a dar uma resposta àquilo que ele

sempre incitou, a fome de imortalidade10

.

Sem embargo, essas crises ajudaram com que Unamuno ampliasse seus

conhecimentos e alargasse seu campo de escrita, pois a partir daqui Unamuno encerra

um capítulo de sua vida e concretiza desta maneira uma nova e definitiva visão de

pensar e escrever. Pois, o que antes parecia incerto, torna-se certeza, uma força que

movimenta busca. Quero dizer que Unamuno abandona seu estado de dúvida e se aferra

na verdade que é seu maior foco.

Em 1889, aos 25 anos preparava outras oposições, viajou para Suíça, Itália e

França, onde celebrava a exposição universal. Nesta época se festejava a inauguração da

torre Eiffel.

Anos antes em 1883 prestou exame para licenciatura e em 1884 termina seu

doutorado com a tese: “Crítica del problema sobre el orígen y prehistoria de la raza

vasca”.

Em 31 de janeiro de 1891 casou-se com Concepción Lizárraga, de quem estava

enamorado desde menino. Desse casamento procederam nove filhos: Fernando, Pablo,

Raimundo, Salomé, Felisa, José, Maria, Rafael e Ramón11

. Tamanha era alegria que

Unamuno encontrava em seu lar que chega a narrar Salcedo:

“Junto a sua família e a sua mulher encontrava algo de sussego.

Fora, na luta, a polêmica encarniçada da Universidade e outros ambientes da

vida local e nacional”12

Em 1894 abandona as ideias positivistas que cultivara e, em 11 de outubro desde

mesmo ano, ingressa no Partido Socialista Obrero Espanhol de Bilbao (PSOE). Em

10

DOS SANTOS, Milton Arcanjo. A fome de imortalidade na Obra de Miguel de Unamuno. In:

Monografia( Graduação Licenciatura em Filosofia) Faculdade de São Bento, São Paulo, 2009, p.12

11MARTÍNEZ,Izasku. Biografia de Unamuno. In: Seminário Grupo de Estudos Peirceanos (2004) na

Universidade de Navarra - http://www.unav.es/ acessado em 14/03/2015 ás 15:30

12E. Salcedo, Vida de Don Miguel. Unamuno en su tiempo, en su España, en su Salamanca,

Salamanca, Anaya, 1964, p.112-

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1897 se desencanta e abandona o partido socialista. Preocupa-se com o futuro da

Espanha. Após passar pelas crises religiosas e existenciais se dedica a questões como: a

morte e o nada. Analisando o sentido da vida e seu fim, preocupações que se tornam

angústias vitais do homem.

Anos antes em 1896, em sete de janeiro nasceu Raimundo13

o filho de Miguel de

Unamuno, que por saúde frágil, pois sofria o mesmo de meningite, que mais tarde lhe

gerara uma hidrocefalia, por esse motivo viveu apenas seis anos. Longos anos que

Unamuno sofreu e acompanhou de perto

Em 1900, é nomeado reitor da Universidade de Salamanca. Em 1908, com

44anos, passa suas férias de verão com a família em Espinho, onde conhece Manuel

Laranjeiras, prosador português que tem uma visão pessimista de Portugal. Neste

mesmo ano morre sua mãe Salomé; e em Lisboa são assassinados o rei de Portugal, D.

Carlos e seu filho Luiz Filipe.

Em 1912 ainda em continuidade laboral, lança um conjunto de ensaios os quais

se chamou de “Contra esto y aquello14

”. Um ano anterior em 1911 três grandiosas

obras: “Rosario de sonetos líricos, Por tierras de Portugal y España ySoliloquios y

conversaciones”. E para completar o ciclo no mesmo ano em Portugal é Fundada a

revista “Águia”15

, com a finalidade de fazer com que os Portugueses tomem consciência

de seus valores espirituais e sociais e lutem pelos mesmos. E Teixeira de Pascoaes foi

um dos célebres figuras desta revista.

Em 1913 escreve seu ensaio intitulado: “Dos Sentimentos Trágicos da Vida”.

Ademais a obra “Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos”, foi uma

notável e aplausível produção de Dom Miguel, uma das poucas obras a que Unamuno

escreveu de cunho filosófico. Em suas palavras Julián Marías, “ a temática de

Unamuno(...) é portanto, o homem em sua integridade, que vai de seu nascimento a sua

13

MARTÍNEZ,Izasku. Biografia de Unamuno. In: Seminário Grupo de Estudos Peirceanos (2004) na

Universidade de Navarra - http://www.unav.es/ Acessado em 14/03/2015 às 15:45

14idem

15 DOS SANTOS, Milton Arcanjo. A fome de imortalidade na Obra de Miguel de Unamuno. In:

Monografia ( Graduação Licenciatura em Filosofia) Faculdade de São Bento, São Paulo, 2009.

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19

morte, com sua carne, sua vida, sua personalidade e sobre tudo, sua preocupação em não

querer morrer”16

.

Neste mesmo período publicou outras três obras, sendo a primeira um conjunto

de contos intitulados “O espelho da Morte”. Em segunda ocasião escreve as mais

variadas obras teatrais: “La venda y La princesa dona Lambra”.

Já em 1914, aos 50 anos é destituído do Cargo de Reitor, destituição segundo

Ortega, foi por injusta causa17

·. Afinal no verão deste mesmo ano de 1914, nos recorda

Martínez que Unamuno e sua Família estão de viagem, onde passam suas férias em

Portugal18

, e foi durante essas suas férias que de maneira indireta soube de sua

destituição do reitorado de Salamanca.

“En la Plaza Mayor cuelgan los periódicos locales unas carteleras en

que dan avances de las noticias más salientes que van a publicar. Los titulares

de la guerra europea llenan las planas de todos los diarios y la gente tiene

avidez de noticias. Entre los telegramas de la guerra, la agencia de

información lanza una bomba auténtica: Bergamín ha destituido al rector. Y

Unamuno se entera bajo los soportales de la Plaza Mayor de Salamanca, en la

cartelera de un periódico”19

.

Ainda se tratando de sua retirada como reitor da Universidade de Salamanca,

acredita Martínez que tenha sido por desentendimento com as devidas autoridades

políticas, pois se tratava mais afundo de uma convalidação do título de Bacharel a um

aluno colombiano, pedido por Bergamín20

.

De uma maneira sucinta responde Unamuno ao senhor Bergamín – não

compartilhava por ele uma boa admiração. Daí por diante parece que tudo ficou sendo

remoído no mais profundo dos corações, resultando na retirada de Unamuno como

16

MARÍAS, Julián. Miguel de Unamuno. Madri, Espasa-Calpe, 1980, p.46

17PORTELLA, Eduardo. Miguel de Unamuno. In: Palestra proferida na ABL, em 7/11/2012, durante a

“Jornada Literária sobre D. Miguel Unamuno”, sob os auspícios da ABL e da Universidade de

Salamanca, p.18

18MARTÍNEZ,Izasku. Biografia de Unamuno. In: Seminário Grupo de Estudos Peirceanos (2004) na

Universidade de Navarra - http://www.unav.es/ Acessado em 14/03/2015 às 15:45

19E. Salcedo, Vida de Don Miguel. Unamuno en su tiempo, en su España, en su Salamanca,

Salamanca, Anaya, 1964,p185

20 MRTÍNEZ, op. cit.

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20

reitor. E Unamuno continua a afirmar desconhecer os motivos claros de sua destituição

do cargo21

, pois segundo o mesmo atuou de maneira correta, e que, portanto seria

injusto o presente fato.

Apesar das mais variadas opiniões, Ferreter Mora nos ajuda a interpretar o

motivo da destituição de Unamuno quando diz:

“Esta destitución tuvo lugar en 1914 (...) y el motivo de ella fue

precisamente la denuncia de la incompatibilidad entre la dedicación

pedagógica y la política. Denuncia curiosa en un país donde más que en una

gran mayoría de otros las fallas de la política son tan graves que es obra de

caridad repararlas por todos los medios que se pueda entre ellos, por la

pedagogía. Sobre todo cuando por "pedagogía" se entiende el trabajo a favor

de la regeneración material y moral del país, el esfuerzo denodado para que el

país se avive, labore, crea, sea”22

.

Um dos grandes erros de Unamuno, dirá Eduardo Portela, foi querer implantar

na política seu pensamento, pois o mesmo já dizia: “A política não pensa, reivindica” 23

.

Consequentemente estes desencontros com as autoridades fará de Unamuno mártir da

oposição24

.

Em 1920, é eleito “Decano da Faculdade de Filosofia e Letras. É condenado a

16 anos de prisão por injúrias ao rei Afonso XIII, porém a sentença não se cumpre. Em

1921 é nomeado vice-reitor, cargo o qual ocupará até 1923 na Universidade de

Salamanca. No mesmo ano faz ataques ao rei da Espanha, D. Afonso XIII e ao ditador

Primo Rivera, quando destituído do cargo novamente é condenado ao desterro no ano

de 1924. Em fevereiro deste mesmo ano, sofre exílio na Ilha de Fuenteventura, e em 19

de julho é indultado. Voluntariamente se exila em Paris, indo posteriormente para

Hendaya, país basco Frances até 1930. Nesta fase desenvolve intensa atividade criativa

e continua a se manifestar pelos jornais contra a ditadura. Com o fim da ditadura publica

21

ibidem

22 J. Ferrater Mora, Unamuno: Bosquejo de una filosofía, Buenos Aires, Editorial Sudamericana, 1957,

23PORTELLA, Eduardo. Miguel de Unamuno. In: Palestra proferida na ABL, em 7/11/2012, durante a

“Jornada Literária sobre D. Miguel Unamuno”, sob os auspícios da ABL e da Universidade de

Salamanca, p.18

24MICAI, op.cit.p.29

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21

a poesia: “Teresa”; retornando assim para a Espanha.Em visão de um Unamuno político

escreve Antonio Machado:

“Es Don Miguel de Unamuno la más alta figura de la política

española. Él ha iniciado la fecunda guerra civil de los espíritus; de la cual, la

ha de surgir – acaso surja una España nueva- Yo La llamaria el vitalizador,

mejor diré el humanizador de nuestra vida pública. El más personal de

nuestros políticos [...] Unamuno es antes todo persona, no en el sentido

etimológico de la palabra, porque es, acaso, el único político que no usa

máscaras. En esto mi juício, estriba su enorme fuerza. No será nunca un jefe

de partido o partida, no en caudillo de masas. Para Unamuno no hay partidos,

ni mucho menos mas, dóciles o rebeldes, en espera de cómitre o pastor.

Unamuno es un hombre orgullo de serlo, que habla a otros hombres, en

lenguajes esencialmente humanos. Se dirá que esto no es política. Yo creo

que es la más honda, la más original y de mayor fundamento. Porque ¿Puede

haber política fecunda sin amor al pueblo? ¿Y amor al pueblo sin amor al

hombre y, por ende, respeto a los valores del espíritu que son sus únicos

privilegiados?”25

Com o advento do governo republicano na Espanha, em 1931, quando já contava

seus 67 anos, retorna ao país, onde é recebido com grandiosa festa. Em 12 de abril de

1931 é eleito deputado pela conjunção republicano socialista.

Em 1933, com 69 anos decide não se reeleger-se ao cargo de Reitor de

Salamanca. Só então em 1934 é nomeado reitor honorário e vitalício da Universidade de

Salamanca. Sendo assim implantada a cátedra com o seu nome. Em 1934 já aos 70

anos, é nomeado doutor “Honoris Causa” pela Universidade de Oxford. Como sua vida

se encontra ameaçada, e os dois intelectuais são chamados a uma reunião, a qual

intenção é convencê-los a apoiarem os rebeldes, declarando que representam a defesa da

civilização ocidental e tradição cristã. No mesmo ano Azanã o destituiu do reitorado,

mas, no mês de setembro é novamente reconduzido ao cargo pelo general Cabanellas.

Em 22 de Outubro do mesmo ano é mais uma vez destituído do cargo pelo general

Franco e condenado a prisão domiciliar. E em 21 de novembro escreve a Lorenzo

Guisso, relatando que a Espanha vivia sobe regime do terror e que o ódio imperava,

tanto que os católicos como os nãos católicos, lutavam entre si. Isto o entristecia muito e

25

SEGURA,José Antonio Serrano.Miguel de Unamuno.Sevilla, 2001In:http://jaserrano.nom.es/unamuno

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22

o deixava desesperançado quanto ao futuro de seu país. No mesmo ano de 1934, vem a

falecer sua esposa Concepción de Lizarraga. E em homenagem a ela, Unamuno escreve:

“Foi-se minha mulher, que era meu hábito e minha alegria, e me

dava o que mais sempre me faltou: serenidade e alegria de viver. Nunca

acreditou na morte, como eu nunca acreditei na vida.”26

Em 31 de dezembro de 1936, na cidade de Salamanca, morre27

de forma

repentina, na companhia de dois amigos, conforme fez acreditar a imprensa da época.

Em seu funeral foi exaltado como herói falangista, embora não mais fizesse parte desse

movimento, fato que ficou registrado e comprovado na Festa da Razão. Foi justamente

nesta festa em meio à abertura dos cursos acadêmicos da Universidade de Salamanca;

Unamuno indignado pelo cenário de ódio e violência que tomava aquela gente, toma a

palavra e adverte todos ali presentes, dizendo: “Vencereis, mas não Convencereis”.

Vencereis, porque lhes resta força bruta para lutar. Mas, não convencereis, pois

convencer significa persuadir, e para persuadir necessitam de algo que a vocês lhes

faltam: razão e direito. Meio perdido e não sabendo como contestar a tamanhas palavras

o general que coordenava as tropas da infantaria José Millán tão só gritava: “Que Morra

a Inteligência”! Ao que contesta Unamuno: Este é o templo da Inteligência e sou Eu seu

supremo sacerdote. E vocês estão profanando sagrado recinto. Tomado por esse extinto

de morte, três dias antes de falecer Unamuno escreve:

“Morir soñando, si, mas si sueña morir,

La muerte ES um sueño: uma ventana

Hacia El vacío, no soñar; nirvana del tiempo

al fin de la eternidade se adueña.

Vivir El dia de hoy bajo la enseña del ayer deshaciéndose em

mañana

Vivir encaenado a desgana ES acaso vivir? Y esto que enseña?

¿Soñar la muerte no ES matar El sueño?

¿Vivir el sueñono no es matar la vida?

26

MICAI, op. Cit. P.30 27

Em sua morte Unamuno recebe reconhecimento de grandes amigos: “Antonio Machado” e “Ortega e

Gasset” que relatam o que significaria à Espanha a morte deste ilustre homem.

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23

¿a qué poner em ello al fin se olvida

Escudriñando el implacable ceño –

Celo desierto del eterno Dueño”28

Unamuno, podemos assim dizer foi uma espécie de existencialista. Uma corrente

a qual abarca Kierkegaard29

, que certamente nos pode levar a ilustres figuras como

Heidegger. Inúmeras foram suas obras e aplausíveis seus pensamentos, os quais sempre

estiveram voltados a questões humanamente existenciais do homem.

1.2 A filosofia de Dom Miguel

Como um bom existencialista, Unamuno entra em conflito com algumas

questões da própria existência humana, assim o filósofo tem por missão fazer com que

as pessoas se deparem com a realidade e busquem na mesma uma saída, se tornando

autônomas e não meros seres submissos a ordens.

Contudo a filosofia unamuniana busca como fim conciliar as necessidades

intelectuais com as emocionais, isto é, “cada homem é produto filosófico de um

homem” 30

. Em outras palavras Unamuno fundamenta sua filosofia na totalidade do

homem. Um homem que vive, com seus conflitos, com suas vontades, com seus vícios.

Concretamente se pode dizer que Unamuno foi uma espécie de existencialista,

ou quem sabe um radical em seu tempo. Títulos os quais não devam ter agradado ao

Dom Miguel, afinal, não existia nada que pudesse deixar Unamuno mais irritado que

títulos, algo que o mesmo rejeitava.

Como dissemos anteriormente, não sendo propriamente existencialista, o

enquadramos como tal. Mas, que espécie de existencialismo? Um existencialismo,

antropocêntrico, onde o homem é o centro, mas não o homem abstrato, e sim, o homem

28

SEGURA,José Antonio Serrano.Miguel de Unamuno.Sevilla,2001-In:http://jaserrano.nom.es/unamuno

29Para ler as obras de Kierkegaard, Miguel de Unamuno teve que aprender o Dinamarquês.

30HOLKE, Ryan.Filosofia de “carne e osso”: o sentido da filosofia em Miguel de Unamuno

no sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Artigo publicado em janeiro de 2010, 14 ̊Edição

da Revista eletrônica Pandora do Brasil - In:http://revistapandorabrasil.com/.

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24

de carne e osso31

, um homem que nasce; que sofre e morre. Sobre Tudo que morre32

.

Que joga; que pensa; que sente e que ama. Este é o homem unamuniano,esta é a

filosofia que permeia as veias de Miguel de Unamuno.

Unamuno foi por sua vez um prolífico escritor, onde na devassidão de seus

escritos nos deparamos com poesias, novelas, teatros e variados ensaios filosóficos.

Assim se tratando de suas obras foram as“Do Sentimento Trágico da vida e

Névoa”, as obras que impulsionaram a fama e o prestígio internacional de Miguel de

Unamuno.

A filosofia de Unamuno é uma filosofia polivalente. O que significa que

Unamuno em sua filosofia é capaz de percorrer os mais variados recintos, que vão desde

a criação do homem a questões éticas e políticas.

Sem embargo, como já havíamos relatado a Filosofia de Dom Miguel é a

Filosofia do Homem. Do Homem de carne e osso. De um homem que é capaz de viver

com intensidade a cada instante de sua vida. É a filosofia do homem que possui a

capacidade de se compreender, que possui formas, personalidade, caráter. Que possui

um rosto e não um homem abstrato e perdido nas sombras de seus contornos.

De algum modo é neste homem concreto que Unamuno tenta reafirmar aquilo

que ele é em si mesmo. “O Eu concreto, sou tudo para mim mesmo, ainda que não haja

interesse para o universo, pois o universo só tem sentido em função de mim mesmo. Os

sentidos de minha existência têm dito que sou Eu, em relação ao mundo, não está em

nenhum fim extrínseco, senão está realizado em minha vida. Desta maneira que tal

filosofia não possui nenhum outro objeto ou sujeito que não seja o homem concreto, o

sujeito de carne e osso, que é o sujeito e o supremo objeto desta filosofia” (Unamuno,

1996, p.2).

È justamente neste eixo que Unamuno, nos dirá Ryan, rompe em grande parte

com as grandes tradições filosóficas, pois já não se trata de algo abstrato, escondido.

Trata-se, portanto de uma filosofia do Homem, daquilo que pode ser palpado, que é não

apenas objeto, mas é também sujeito33

.

Em decorrência disto a essência de sua filosofia se dá no homem que vive e não

morre. Pois, é Unamuno o maior inimigo da Morte, e estreito amigo da Imortalidade.

31

UNAMUNO, Miguel de. Do Sentimento Trágico da Vida nos Homens e nos Povos; São Paulo:

Martins Fontes, 1996, p.1

32Ibidem,Idem

33HOLKE, Op.cit.

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25

Pois, ele acredita que o homem, no fim de sua vida é capaz de se agarrar em si e não

morrer. Delimitadamente essa questão do imortal está tratada em sua esponsal obra do

sentimento trágico da vida, onde o próprio Unamuno reivindica com toda sua força esse

pedido de imortalidade.

Em consonância a isto, nos dirá Gutiérrez que há em Unamuno esse desejo pelo

imortal. E que, portanto o mesmo crê na imortalidade e na substância da própria alma

em não querer morrer.34

Em suma, a finalidade de sua filosofia é eternizar-se, é viver e viver de modo

que possa ser eterno. Ora, o que o autor traz de radicalmente diferente da tradição

filosófica é que isso não é uma certeza. Com efeito, em nenhum lugar Unamuno afirma

que tal “eternizar-se” seja possível. Antes, é uma aposta, talvez a única resposta viável à

questão fundamental da morte e da existência humana.

Frente à morte e em resposta a ela temos a imortalidade, em que acredita

Unamuno que não deva tão só ser buscada pela fé, mas também pelo próprio desejo de

se eternizar, de ser imortal35

. “Afinal não quero morrer”! Afirma Ele. E se acaso ocorra,

que morra o Eu com toda minha personalidade, meus desejos, meus vícios.

No entanto, acredita Unamuno, que o homem, é produto de uma filosofia, e que

só filosofa pela necessidade que o mesmo possui mediante ao conflito que ele mesmo

tende em buscar e dar respostas a tensões e dramas entre o individual e o coletivo, entre

o espírito e o intelecto, entre a razão e a emoção.Presenteia todas essas questões que

busca responder sua filosofia, Unamuno elabora um extraordinário e poderoso império e

vitalismo que é capaz de antecipar o próprio existencialismo.

Evidente que para Unamuno, a matéria prima com a qual primeiro se depara o

filósofo, é Ele mesmo. Pois, na medida em que este passa compreender e avançar na

compreensão de si, poderá compreender o Outro em sua totalidade. Sendo assim é por

esta razão que sobre a influência de Kierkegaard e de Schopenhauer que Unamuno

abandona o realismo. Afinal de contas nos dirá Jean Cassou em seu texto: Retrato de

34

GUTIÉRREZ, Jorge Luis. A filosofia de Unamuno como reação ao mistério da realidade e da vida

humana e seu destino. Artigo publicado em janeiro de 2010,14 ̊Edição da revista eletrônica Pandora do

Brasil – In:http://revistapandorabrasil.com/ 35

É mediante essa análise e permanente sublimação que Unamuno ele se aferra a ideia de ser imortal. Ao

ponto Maximo em sua obra Dom Quixote, exclamar: “ Eu não quero Morrer”!

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26

Unamuno: “Unamuno não possui ideias, é Ele mesmo as ideias”36

. Por aqui já

podemos denotar a força da filosofia de Unamuno e seus argumentos.

Unamuno não foi literalmente um homem moderno. Pois, manifestava sua

carência e sensibilidade para os valores exclusivamente formais, e jamais optou por uma

compreensiva postura mediante os movimentos Literários de sua época.

Consequentemente, muitos autores por constatarem esse seu lado bronco e rude

chegam a identificá-lo com Nietzsche e sua “filosofia do Martelo”. Não é por nada que

Unamuno possui múltiplas facetas em seus escritos. Pois, Ele é capaz de saltar de um

quadro poético, que é percebida na forte necessidade de Unamuno ao narrar sua história,

sua infância, recorrendo à forma lírica; ainda mesmos que a rejeitasse, à uma forte e

construtiva forma de pensar como sua própria filosofia.

No entanto, para que realmente se compreenda a filosofia de Unamuno, se fazem

urgente e necessário, que nos afastemos de tudo aquilo que não é Unamuno. Ao

fazermos isso chegaremos àquilo que é ele mesmo, conheceremos a seu íntimo,

adentraremos ao vazio de sua existência e compreenderemos o homem em sua

totalidade, criando assim um “niilismo espanhol”.37

Entretanto, vastas são as obras e as formas as quais Unamuno se vale para

escreve e conceituar sua filosofia. Mas nos valerá aqui ressaltar dois importantes lados

de Unamuno: O novelista e o ensaísta.

1.3 Unamuno Novelista

As novelas de Unamuno são a projeção literária de suas crises e desejos

pessoais. Cada um de seus personagens é a encarnação de suas férteis ideias. Sem que

nos prescindamos das mais ilustres novelas “Paz na Guerra” e “São Manuel Bueno,

Mártir”, mas a que lhe deu fama internacional foi mesmo sua grande novela “Névoa”,

ou como ele mesmo a chamava: “Nívola”. Todas as novelas, Unamunianas possuem um

caráter melodramático, marcados por seus medos e angústias. Uma vez que a sua forma

poética desprezava a comunicação direta com o leitor38

, aqui em suas novelas Unamuno

elimina toda e qualquer ilusão, ambiente e circunstâncias que possam rodear o homem

36

UNAMUNO, 2011,P.46 37

ibid, p.50 38

Uma afirmação que muitas vezes possa parecer contraditória, pois em sua Novela “Névoa” Unamuno, busca manter um diálogo direto com os leitores, o que soaria contraditória com o escrito acima, mas é de Unamuno percorrer a contradição, para buscar um equilíbrio entre razão e sentimento. E essa evidência de contradição é perceptível pela forte capacidade de Unamuno em tornar-se um com seus leitores.

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27

em agonia. Neste sentido a novela de D. Miguel contrasta com as novelas costumeiras,

onde o ambiente das mesmas é o todo. Agora não podemos nos esquecer que as novelas

de Unamuno, foram as primeiras a romper com o realismo Espanhol.

Para Unamuno a pessoa humana não é algo estático, e sim algo dinâmico, em

constante movimento, um puro devir. Por esta razão, que suas novelas nos apresentam

um drama, uma tensão sociológica vivenciadas por seus personagens, que nos

demonstram como a vida vai acontecendo ao longo da imensa estrada.

Evidente que para Unamuno, o personagem não é mera ilusão, ou mera

personagem, mas, é este que possui tanta vida, o tal qual possui o homem de carne e

osso. Dentro desta visão, o personagem de ficção que é por sua vez, sonhado e criado

pelo próprio autor, no entanto, o grande autor que é Deus.

Por conseguinte toda a força que possui o homem de carne e osso também

possuirá o personagem mediante o Deus, autor ao qual ninguém pode se rebelar.

Em sua imensurável e magnífica Novela “Névoa”, por exemplo, o protagonista

se revolta, entra em conflito com o próprio criador, D. Miguel, resistindo morrer, como

é ordenado pelo próprio Unamuno.

“_Penso logo existo, [...] todo aquele que pensa existe, e todo que existe

pensa. Sim, todo aquele que existe, pensa. Existo, logo penso.

[...] Mas logo Pensou: Não, não! Eu não posso morrer! Só morre quem está

vivo, aquele que existe, e eu, como não existo, não posso morrer...sou

imortal! Não existe imortalidade como a daquele que, como eu, nunca nasceu

e não existe. Um ser de ficção é uma ideia, e como uma ideia sou sempre

imortal...

_Sou Imortal! Sou Imortal! – gritou Augusto.” 39

Com isto, podemos nos perguntar: tudo quanto sonhamos é real? Tudo aquilo

que me circunda seja realidade ou ficção fará parte de mim?

É claro o paradoxo aqui presente. Sonhamos o que vivemos, Deus sonha a cada

um de nós, e nós sonhamos nosso próximo, criamos nossos próprios personagens que

são produtos de nossa imaginação. Afinal de contas a vida é um eterno teatro que não

nos permite ensaios e quem sabe, não seja o teatro a própria vida, onde se contenha mais

realidade que a própria vida. O homem se aterroriza em saber que irá morre, portanto,

não quer morrer. Almeja, sonha com ser imortal, imortalidade a qual só se é possível

criando.

39

UNAMUNO, Miguel de. Névoa. Tradução de José Antônio Ceschin – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989, p.174

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28

“_Bem o senhor de Unamuno também é coisa de livros... Todos nós

somos... E ele vai morrer, sim morrerá também, mesmo que não queira...

Morrerá! E será essa minha vingança. Não me quer deixar viver? Pois

morrerá, morrerá, morrerá! [...]

_Dormir... dormir...sonhar..

_Morrer... dormir..dormir...sonhar...qualquer coisa!

_Penso logo existo. Existo, logo penso... Não existo não!Não

existo... minha mãe! Eugenia... Rosário... “Unamuno...” 40

O que Unamuno ressalta em tudo isso é que a cada passo que se escreve, e que

lemos tais escritos, convidamos a outros a participar de nossos sonhos, de nossa vida, de

nossa eternidade, daquilo que para nós é real. È como nos diz o poema:

“Com lembranças de esperanças

e esperanças de lembranças

vamos matando a vida

e dando vida ao eterno

descuido que do cuidado

do morrer nos esqueçamos...

Foi já outra vez o futuro,

será o passado de novo,

amanhã e ontem mexidos

no hoje ficam-se mortos.

Acordei e estava sonhando,

sonhei que estava desperto,

sonhei que o sonho era vida,

sonhei que a vida era sonho.

Senti que estava pensando,

pensei que sentia, e logo

vi reduzir-se a cinzas

meus pensamentos de fogo.

Se há quem não sente a brasa

embaixo destes conceitos,

é que em sua vida pensou

com seu próprio sentimento;

é que em sua vida sentiu

dentro de sim ao pensamento

. Flores dá o amor ao homem,

40

Ibidem, p.178

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29

flores entre folhas ao vento,

mas também lhe dá diamantes

duros, cortantes e concretos.

Não só o vapor esquenta;

não chameis frio ao seco;

a carne com freqüência esfria

e costuma queimar os ossos.” 41

.

E são justamente estes nos pequenos momentos que fazem de nós e de nossos

escritos eternos, a ponto de ultrapassar gerações. Convencido disto certa vez, Jean

Cassou disse que as obras de Unamuno e toda sua filosofia nunca empalidecem. E

Concordando ressalta Unamuno: “um livro só permanece vivo, quando as pessoas

encontram vida nele, portanto o livro é algo para comê-lo, e aquele que come se ainda

estiver vivo, reviverá ao comê-lo42

”.

Paz e guerra (1987)

“Paz e Guerra” é um plano, um rascunho daquela que seria a real novela. É

também essa novela um relato vivo da guerra carlista que são emaranhados,

resquícios de suas lembranças de infância. Uma novela que conta a vida comum e

individual vividas em Bilbao.

Névoa

Novela a qual o próprio autor chamou de “Nívola”, numa tentativa de renovar as

técnicas da narrativa. A mesma, não se trata de uma novela no sentido estrito e oficial.

Por esta razão que Unamuno a intitulou de Nívola.“Inventei um gênero, que não é

simplesmente dar a este um nome novo, mas dou-lhe também a elas formas, regras as

quais me comprazem”.

Tal gênero pode ser acompanhado naquilo que vemos no capítulo XVII de sua

novela Névoa. Acompanhemos:

“-A novela não tem um argumento. Ou melhor, vai ser aquele que for se

desenrolando. O argumento se fará sozinho.

- Isso é novidade para mim...

41

GUTIÉRREZ, Jorge Luis. A filosofia de Unamuno como reação ao mistério da realidade e da vida

humana e seu destino. Artigo publicado em janeiro de 2010,14 ̊Edição da revista eletrônica Pandora do

Brasil – In:http://revistapandorabrasil.com/

42Cf. UNAMUNO, 2011, p. 54

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-Pois veja, um dia destes, quando não sabia bem o que fazer mas tinha

vontade de alcançar alguma realização, uma coisa dentro de mim me levou a

pensar em escrever uma novela. Mas me decidi escrevê-la da forma como se

vive, sem saber o que iria acontecer no final. Então me sentei, apanhei papel

e comecei a rascunhar as primeiras ideias que me vieram à cabeça, sem saber

o que viria depois, sem um plano preestabelecido. Meus personagens vão agir

conforme fazem na vida real, e dirão as palavras que disserem. Seu caráter

vai formando-se pouco a pouco, e às vezes seu caráter será o de não tê-lo.

-sim, como o meu.

-Não sei. Isso irá aparecendo por si mesmo, eu me deixo levar.

-E há alguma psicologia? Você descreve os personagens?

-Bem você começa acreditando que leva os personagens do jeito que quer, e

no fim é fácil se convencer de que eles são quem levam. È muito freqüente

um autor acabar se tornando um brinquedo de suas próprias ficções.

-Talvez sim. Mas o caso é que nessa novela penso colocar tudo que me

acontecer, seja como for.

-Pois então acabará não sendo uma novela.

-Não, será...será..uma Nívola.

-Nívola? Que diabos é isso?

-è que certa vez, Manuel Machado, o poeta, irmão de Antonio contou que

levou um soneto para ler para Dom Eduardo Benot. O soneto estava em

alexandrinos, ou sei lá que outra forma heterodoxa. Ele leu e D. Eduardo

disse: “Mas isso não é uma soneto!”... Machado respondeu: “Não é um

soneto. É um sonite”. E assim como minha novela não será uma novela, vou

chamá-la de... Como foi mesmo que eu disse? Navilo... Nebulo... Não.

Nívola! Isso mesmo Nívola! Assim ninguém se achará no direito de dizer que

minha obra não respeita as leis de seu gênero [“...] e posso dar-lhe as leis que

eu bem entender.” 43

Nesta sua nova técnica D. Miguel busca enfatizar o diálogo, mas antes de tudo a

liberdade do autor em criar, em abusar de sua criatividade. Também se torna esta

maneira de escrever algo de individual e original dado por Unamuno.

Unamuno se torna reconhecido em meio às grandes personalidades por essa

ousadia contidas em todas suas novelas, ou melhor, nívolas, é o que nos relata Maria

43

UNAMUNO, Miguel de. Névoa. Tradução de José Antonio Ceschin. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989, p.99-100.

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Isabel Toro, e acrescenta que toda a energia de Unamuno está voltada a seu ideal e

preocupações sociais44

.

A este respeito Unamuno relata na “empírica fábula e mítica realidade, a

propósito da relação entre sujeito e objeto, leitor e autor, novela e nívola, tudo constado

em seu ensaio Névoa (Niebla).

Deste modo, D. Quixote45

não é mais real que qualquer outro heroi, pois ambos

se fazem presentes, existem de fato na consciência coletiva. Portanto, crer, é querer crer,

querer que o objeto, o personagem de fato exista.

O paradoxo ser é querer ser, crer é querer crer, é muito forte na novela

Unamuniana Névoa. Não obstante, tal novela quer que Unamuno acredite nos

personagens, que dê a eles vida, e que os mesmos sejam independentes do próprio autor.

Torna-se aqui um “realismo criativo”. O que significa que a realidade poética e criativa

de um homem ou do personagem, consiste no grau e na intensidade que há neste

homem e querer ser. O real é, portanto, um simbólico personagem, que está incluída no

palco da vida. Afinal a realidade é o puro querer ser ou não quer ser do personagem, é

como nos diria Charbonneau:

“(...) a existência é causa da existência, na medida em que podem assentar

sobre a fundação do existente, onde os seres tomam corpo, vida, e se

cristalizam no substancial”.46

Tudo para nos reforçar a ideia de que o é sua própria ideia de ser. E de ser cada

vez mais.

Contudo em Névoa, Unamuno constitui a Liberdade que o indivíduo possui

frente ao seu criador, podendo eliminá-lo quando, onde e como quiser. Por exemplo, em

Névoa, o personagem protagonista Augusto Perez, é o homem que não chega a querer

ser, portanto, não é. Tornando-se ele uma mera e simples aparência, uma ficção. Sendo

assim Augusto é a existência aparente, fictícia, ser sem rosto, sem finalidade, pois entre

ele e o autor não existe nada.

Em relevância a isto vale recordar que, denotada obra é de extrema significação

para o espírito de toda uma geração, a geração de 98.

Nesta altura, de sua narrativa, chegamos ao cerne da obra Névoa: o encontro da

consciência e do homem que resiste ao nada, mas é em meio da perda da consciência

44

PASCUA,Maria Isabel Toro.Miguel de Unamuno: relato de uma obra Universal. Tradução de Hernán

Gomez – In: Palestra proferida na ABL em 07/11/2012, durante a “Jornada Literária sobre D. Miguel de

Unamuno”; sob auspícios da ABL e da Universidade de Salamanca.

45 Um personagem da ilustre literatura de Miguel de Cervantes – Dom Quixote de la Mancha.

46CHARBONNEAU, Paul-Eugéne. O Homem a procura de Deus. São Paulo: EPU, 1981.

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que o homem se sente abandonado, totalmente solitário. Aqui a perda da consciência

implica no próprio limite da consciência, pois é por meio do abandono, do vazio, da dor

propriamente dito que se alcança novamente a consciência que fora perdida.

Ao fim e a cabo, a consciência num todo só se revela na dor, na dor da perda, na

dor do limite, como diz o velho ditado: “só valorizamos quando perdemos”. Tal

sensação é alcançada na compaixão e no amor.

É justamente em meio a decepção amorosa, isto é, em meio a dor que Augusto

chega ao seu íntimo, ao mais rebuscado e profundo daquele que é. Descobrindo assim,

toda sua consciência, seus limites, seu caráter e personalidade. Aqui Chegamos ao

ápice, ao clímax, de Névoa onde Augusto na angústia, tomado pelo desejo de se matar

encontra-se com seu Criador, Miguel de Unamuno.

Unamuno, por sua vez, o proíbe se suicidar, mas o obriga a morrer. É um dos

mais belos momentos da novela, o forte conflito entre Unamuno e o personagem

Augusto que anseia viver.

Sendo assim é Névoa uma das mais brilhantes, talvez a melhor novela já escrita

por Unamuno e que nos permite perguntar: Entre realidade e ficção, há separação? È

este paradoxo que faz com que Névoa seja um de seus escritos que possui maior número

de traduções.

1.4 Unamuno Ensaísta

Em consonância a José Ortega e Gasset (1883-1955), Xavier Zubiri (1898-1983)

é Unamuno um dos filósofos mais importantes da Espanha no século XX. Como temos

visto, Unamuno não faz distinção entre ontologia e teologia. A final para ser verdadeiro

deve ser eterno, imortal. Pois toda a garantia que temos da eternidade e do imortal nos é

dado pela fé ou pelas fictícias criações de nossa imaginação.

Acredita D. Miguel que o homem só se imortaliza por meio de suas criações,

pois ao criá-las o autor dá a elas vida, corpo, lhes dá forma.

Para Unamuno é inconcebível, incompatível consolo dado pela religião, e a

verdade oferecida pelo mundo da racionalidade. Para Ele, o homem se vê enredado no

profundo dilema entre obedecer, a razão e responder aos sentimentos.

Pensando nisso, Unamuno presenteia a seus leitores com um do mais

extraordinário de seus ensaios de cunho filosófico e teológico, a saber: “Do sentimento

trágico da vida” que traz á tona o conflito entre razão e emoção.

Nela somos levados a crer que tudo é felicidade, que o verdadeiro amor, a

socialização entre os homens é possível na medida em que há um esvaziamento de si, e

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no mais íntimo, no âmago de seu ser; você se depara com seu verdadeiro e mais puro

Eu.

Do Sentimento Trágico da vida nos homens e nos povos

Um ensaio desordenado, encantador, cativador e decepcionante ao mesmo

tempo. Pois, leva ao leitor na angústia planejar um desigual valor entre amar e sofrer,

entre viver e morrer. E não nos dá respostas claras, mas nos deixa uma certeza: a de não

querer morrer.

Entendida como uma literária produção filosófica é esta, segundo estudiosos sua

principal e fundamental obra de filosofia.

Tem como centro a questão da imortalidade, que, pois desejo tomado pela

vaidade. Do homem que se perde da sabedoria, e a este afastamento que Unamuno

chama de “tragédia”. Vemos, portanto, a fragilidade do homem frente a criação de

Deus. Fomos criados, nascemos, vivemos, e logo morremos. Frente a tais eventos que

nos angustiamos e sofremos.

Unamuno nos deixa evidenciar um homem que é perecível. Pode ser, mas

pereçamos resistindo; e se é o nada que nos está reservado, não façamos com que isto

seja uma justiça47

.

Também está contida nesta mesma obra, a batalha travada entre fé e razão. Vida

e lógica. Vontade e sentimento, tornando-se assim as maiores angústia do homem

moderno.

É justamente este impasse, essa imensa dificuldade de conciliar os extremos que

torna o sentimento trágico da vida nos homens e nos povos um marco de distinção entre

espanhóis e europeus.

Ainda que haja esse distanciamento entre fé e razão, que são atrozmente

inimigos, nem uma nem a outra sobrevive sem apoio alheio.

“Não me submeto à razão, revolto-me contra ela e aspiro a criar, à força de

fé, meu Deus imortalizador e a modificar, com minha vontade, o curso dos

astros, porque, se tivéssemos fé como um grão de mostarda, continua

47

UNAMUNO, Miguel de. Do Sentimento Trágico da Vida nos Homens e nos Povos; São Paulo:

Martins Fontes, 1996, p.252.

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Unamuno, diríamos ao monte: “Passa daqui para acolá", ele passaria e

nada nos seria impossí¬vel (Mat, 17, 20).” 48

Em geral esta obra nos explica que os desejos desesperados de imortalidade

individual além de gerar conflito, geram por sua vez uma nova teoria do conhecimento,

uma doutrina de Deus, uma ética, e uma estética, uma história do homem universal.

E nos reforça, o que define o homem é o permanente estado de conflito entre

sentimentos e razão. Deste ponto a diante percebemos que o homem refinado, de alma

polida é aquele que se compadece, aquele que toma consciência do sofrimento do outro,

e reconhece no outro a si mesmo.

Não podemos nos esquecer que para Unamuno, é Deus e em Deus que tudo se

personaliza, se personifica e ganha forma, isto é, consciência. Afinal o Todo é

personalizado para que o homem fuja do desespero do nada. E mais, é o Homem nada

antes de sua concepção, e para esse mesmo nada ele retorna, isto é, como está escrito:

“tu és pó, e ao pó hás de voltar” (cf. Gn 3,19)

É justamente no se deparar com o nada, com seu vazio existencial que o homem

se compadece, e ama o outro num doloso deleite livre que ele é.

Por outro lado, o autor do Sentimento Trágico percebe que é somente o amor-

compaixão que é capaz de unificar os homens. Pois, o amor faz com que este mesmo

homem, que muitas vezes é tomado pela cegueira do egoísmo, é capaz de se desnudar

para o outro e em função do outro.

Mas, também nos recorda que este outro só é revelado na medida mesma que me

faço desvelar no outro, é dizer, que eu reconheça nele aquilo que sou, fazendo

transparecer aquilo que antes parecia perdido e obscuro, é trazer a figura de Deus

revelado pela consciência. E a partir de então compreenderemos o que é o amor.

48

GUTIÉRREZ, Jorge Luis. A filosofia de Unamuno como reação ao mistério da realidade e da vida

humana e seu destino. Artigo publicado em janeiro de 2010,14 ̊Edição da revista eletrônica Pandora do

Brasil – In:http://revistapandorabrasil.com/

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1.5 Considerações

Ao longo do percurso tivemos o prazer de acompanhar a inconfundível figura de

Miguel de Unamuno. Um verdadeiro homem de “carne e osso”. De vontade e

limitações, mas que com sua bravura luta pelo gosto de viver.

Unamuno se confirmou na história por sua ousadia e coragem de fazer com que

compreendêssemos que a vida está muito mais além da morte, que existe dentro de cada

um de nós uma resposta eloquentemente viva e que luta diariamente por viver e se

tornar imortal.

Uma filosofia do martelo, como alguns pensadores ousam dizer, Unamuno nos

convidou, convocou a percorrer por um mundo que antes era só dele, e trouxe até nós a

perspicácia de nos fazer novos.

Além de um genial escritor e filósofo, foi Unamuno fecundo e profundo

pensador, em outras palavras, ele mesmo. Um unamuniano irrevogável, onde em todas

suas obras Unamuno deixa transparecer o que nele há de mais íntimo, seu amor familiar

e religioso, deixou também transluzir seus medos e angústias, sua fome por

imortalidade, fazendo dos leitores seus participes do seu próprio Eu.

Unamuno foi há seu tempo um homem de luta. Que lutou por causas humanas

que caminhou junto a um povo e que transformou toda uma nação, a nação dos

intelectuais. Demonstrou-nos que para vencer a ignorância é necessário muito mais que

argumentos. É necessário a razão.

Contudo na sua relutância contra a “vida”, e pelo anseio de não querer morrer.

Não significa antecipar a morte ou diminuir a vida. Mas, que a vida está além da morte,

reafirmando o que professam os católicos “creio na vida eterna”.

Sem embargo, Unamuno nos leva numa viagem em busca daquilo que para a

filosofia seria um problema, religar o sentimental com o racional. Com isso gera em

Unamuno o que poderia haver de mais trágico nos homens: morrer. No entanto ele diz

que a única maneira de escaparmos da morte é Amar.

Pois o amor diante amor, como força e movimento, luta perante a morte, o vazio

e o nada. Neste ímpeto Unamuno quer nos dizer que o amor em sua origem possui uma

dimensão ética e moral, não se tratando o mesmo como um simples amor sentimental e

apaixonado, mas sim de um amor sem limites, que aceita a dor como caminho e

necessária para que realmente nos tornemos verdadeiros homens de carne e osso.

Assim, que a filosofia Unamuniana, ela não busca dar respostas prontas e

imediatistas. Mas, compreende que para chegar a uma conclusão se faz necessário

morrer. Mais que morrer para o mundo é morrer para si, é se encontrar com omais

escuro Eu que há em você. Deste modo se quereis saber como Unamuno desenvolve seu

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pensar sobre o amor e como se dá este caminho devereis ler o próximo capítulo, onde

trataremos de desvendar o Amor em Miguel de Unamuno.

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CAPÍTULO SEGUNDO

Unamuno e o conceito de Amor no sentimento trágico da vida dos

homens e dos povos.

2.1 – Amor, desejo, dor e compaixão.

Ainda que Unamuno seja existencialista. Podemos sentir em sua filosofia um algo

do platonismo. Vimos que a angústia unamuniana está no ato de “não querer morrer!” Na

beleza que nos é ofertada pela vida. Mas, no entanto, somos tomados pelo forte desejo de

possuir, de obter aquilo que ainda nos falta.

Pautado nisso, Unamuno afirma que a “única e eficaz arma capaz de combater a

morte é o amor, pois o amor é a chave para que vivamos bem. Pois, quando amamos,

nosso olhar se transforma, e em tudo que vemos contemplamos beleza” 49

.

Por conseguinte é no amor onde encontramos a esperança, a força e alegria. Pois,

por meio do amor é que sabemos que a vida não termina com a morte, mas transcende a

própria existência do homem. E isso reconheceu Unamuno quando diz:

“A sede de eternidade é o que se chama amor entre os homens e quem ama

outrem, é porque se eterniza nele. Portanto, o que não é eterno não é real” 50

.

Aqui Unamuno deixa evidenciar que o amor, ele é força movedora, e que por esta

razão possui a capacidade de ser além daquilo que ele é. Não obstante, o autor nos

recorda que o amor só é eternizante, isto é, eterno, na medida mesma que se solidifica, ou

seja, quando se personaliza em outro.

“O amor personaliza tudo o que ama. Só é possível apaixonar-nos por uma

ideia, ou alguém personalizando-a. E quando o amor é tão grande, tão forte, tão

vivo e transbordante que tudo que ama personaliza. E assim descobre o todo, o

universal, a pessoa”51

.

49

ARCANJO DOS SANTOS, Milton. A fome de imortalidade na obra de Miguel de Unamuno. In:

Monografia (Graduação Licenciatura em Filosofia) Faculdade de São Bento - São Paulo: 2009, p.62.

50 UNAMUNO, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo: Martins

Fontes, 1996, p.39.

51 Ibidem, P.134

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Neste ritmo perceberemos que “Amar não é mais que desejar uma coisa por si

mesma. Pois, amor é desejo” 52

. Sendo assim, todo desejo nos encaminha àquilo que nos

falta53

. Consecutivamente o amor é completude na incompletude. Afinal:

“Não é bom que o homem esteja só. Vou fazer-lhe uma auxiliar que lhe

corresponda (Gn 2, 18)”.

Não muito distante, porém compartilhando da mesma linha de raciocínio nos

afirma Miguel de Unamuno:

“O amor busca com fúria, através do amado, algo que está além deste (...) por

tanto, não é o amor outra coisa que nem ideia, nem volição, são antes de tudo

desejo” 54

.

Unamuno nos demonstra que o desejo está acima da própria vontade do homem.

Seria, pois este um desejo divino, contido no coração de Deus.

“Então o Senhor Deus fez o homem cair em um profundo sono e, enquanto

dormia, tomou-lhe uma de suas costelas e fez crescer carne em seu lugar.

Depois, da costela que tirara do homem, Iahweh Deus modelou uma mulher e

a trouxe ao homem. Então o homem exclamou: Esta sim é osso de meus

ossos e carne de minha carne! (Gn 2, 21-23)”.

Mediante esta magnífica passagem do livro do Gênesis encontramos o primado

da filosofia unamuniana, a figura do homem concreto, vivo. O homem de carne e osso.

Da mesma forma com a que Adão buscou sua metade. É também o amor55

busca

por aquilo que nele está em falta, e não pelo que já possui56

. Que por ele é desejado com

52

ARENDT, Hannnah. O Conceito de Amor em Santo Agostinho. Lisboa, Instituto Piaget; p.17

53 Diferente de Platão, Agostinho. Espinosa entende o Amor já não mais como falta e sim como potência;

no sentido ultimo de vir a ser.

54 UNAMUNO, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo:

Martins Fontes, 1996,p.127

55 Aqui podemos entender o amor como o entendeu Platão. O amor é movimento (dunamis) em direção

ao outro, seria, portanto aqui um amor carnal, sexual o amor primeiro, do desejo, o amor Eros. O que,

temos de obter clareza é que o Amor em Platão percorre um caminho de ascensão, quero dizer que para o

mesmo este amor é “Belo Amor”, onde devo caminhar em direção ao mesmo seguindo passos claros, ou

seja, de um amor que vai do belos corpos ao belo em si, uma ideia que está por sua vez ligado a Ideia do

Bem e da Verdade em Platão. Assim Portanto, a Ascensão dialética é entendida como a escala ascendente

de Eros toda essa ascensão serve para nos mostrar que Eros possui um movimento próprio e inteligente.

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fúria, que a ele satisfaça por inteiro, pois o amor não é estático, está sempre em direção

ao outro.

Neste sentido mesmo, de busca e movimento, o amor para Unamuno só pode ser

entendido como liberdade concreta. Liberdade que por sua vez já fora dada pelo criador

quando ordena ao homem: “Sede fecundos, multiplicai-vos e enchei a terra (Gn 1,28)”.

Tal máxima nos indica que o homem imagem e semelhança de Deus57

, e por meio

dele fora feito para amar e ser amado. Pois, Deus é Amor58

.

Mas antes de chegarmos neste grau de transcendência do amor. Vejamos que

aquilo que antes era mero desejo individual, torna-se agora carnal, comum. Carnal na

medida em que os “amantes59

não chegam a se amar com entrega de si, com verdadeira

fusão de suas almas” 60

. Somos levados a crer que o amor por sua finalidade última

desemboca na máxima da vida, a saber: a procriação.

“o amor carnal; O amor entre homem e mulher é para perpetuar a linhagem

humana sobre a terra”61

.

Portanto:

“todo ato de geração é um deixar-se de ser total ou parcialmente, um partir-se,

um morrer parcial. Uma vez que viver é dar-se, perpetuar-se, e perpetuar-se é

dar-se é morrer” 62

.

Contudo, o movimento de ascensão dialética é o processo natural qual o Amado sai em direção ao que

ama (isto é, ao Belo em si) Um caminho segundo o Filósofo devem seguir quatro importantes degraus:

1.o plano do corpo, 2. O plano da alma, 3. O plano do conhecimento e da ciência , e 4. O plano das Ideias.

Assim que amar em Platão é constantemente buscar pelo Belo, o Bem que há no outro que em mim falta.

56 COMTE SPONVILLE, André. O amor. Tradução de Eduardo Brandão. – São Paulo: Martins Fontes,

2011.

57 Cf. Gn, 1,27

58 Cf. 1 Jo 4,8

59 Aqui nos recordamos de uma intrigante indagação deixada por Platão em seu diálogo o Banquete 189 c,

que o mesmo diz ser o amado mais importante que o amante.

60 UNAMUNO, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo:

Martins Fontes, 1996, p.129

61 Ibidem, p. 128.

62 UNAMUNO, Op. cit. p.128

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O que Unamuno nos reitera aqui é que todo ato de amor por mais livre e

despojado que possa vir á ser, é um ato de rompimento. O que não significa gerar um

amor egoísta, e bem um amor que seja capaz de morrer a cada dia um em favor daquele

que se ama. Mas sem perder sua essência. Assim percebemos: “O amor materno, que é

senão compaixão pelo frágil, pelo desvalido, pelo pobre filho inerme que necessita do

leite e do regaço acolhedor de sua mãe” (UNAMUNO, 1996, p.131)

Unamuno quer que vejamos que todo amor é gratuito na medida em que se é

retribuído. Mas ao mesmo tempo é ele renúncia e morte, sofrimento e dor. E nos alerta

Unamuno que aquilo que antes parecia ser harmonioso, um mar de rosas, perfeito, trás a

superfície aquilo que antes estava escondido, no mais íntimo do seu Eu, o grande abismo:

a dor. Afinal: “O amor é irmão, filho e, ao mesmo tempo pai da morte, que é sua irmã,

sua mãe e sua filha (UNAMUNO, 1996, p.129)”.

Deparamo-nos aqui com a crise gerenciada pela falta, pelo desejo que nos leva a

uma incansável busca, e que não nos permite progredir. Em todo caso nos afirma D.

Miguel, que o amor por sua potencialidade de ser, implica no mais individual do homem

isto é, suas escolhas63

, que são por sua vez todas e indubitavelmente pessoais,

característica do próprio homem.

São firmadas nas escolhas e decisões que reconhecemos que o amor-desejo é de

um todo carnal e instintivo, o que nos faz pensar que há nele pura volição, vontade, ou

como diriam os psicanalistas: pura libido.

No entanto, é de fundamental participação para nosso crescimento. E isto faz do

amor peça inerente em função de seu próprio desejo. Contudo, nos lembra Unamuno,

ainda que seja o amor força, pulsividade, é também ele processo doloroso. Um processo

lento do apaixonar-se, que não é outra coisa como já dissemos admirar e contemplar no

outro aquilo que está em falta. Um triturar-se e adaptar-se as novas do outro.

Sendo assim tal como é, em seu sofrimento fecundo, na mescla de dor e alegria, é

o amor um sentimento insaciável e solitário, sempre inquieto com o que ama, sempre

63

A este respeito convido a você caro leitor a ler outro artigo meu intitulado: O amor na perspectiva da

sexualidade e da espiritualidade - In: Revista Pandora do Brasil, Edição 14 – Janeiro de 2010 – “Miguel

de Unamuno”/ Disponível em www.Revistapandoradobrasil.com.br - Ed. Unamuno.

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41

carecendo de seu objeto, ele é verdadeira paixão, que enlouquece e dilacera, a que

esfomeia, que tortura, que exalta e aprisiona.

Sob tais argumentações, amar de forma limpa e verdadeira para Unamuno é sair

de nossa redoma de vidro, é quebrar a casca do ovo e ir em direção a nossas próprias

misérias. É termos a coragem de reconhecer no outro o que nós somos de fato. Em outras

palavras, para que eu ame de verdade eu devo me apaixonar, interagir com o outro a tal

ponto de encontrar no mesmo aquilo que me completa.

Pois, sem ser radical apaixonar-se é amar o outro para seu próprio bem, o que não

faria do amor possessivo, egoísta e sim passional e relacional.

No entanto não nos deixemos enganar, não exageremos, não enfeitemos a paixão,

não a confundamos com melancólicos momentos de romances, pois uma dose desregrada

da paixão pode gerar mais dor e mesmo a morte.

O que Unamuno quer que compreendamos é que a paixão é necessária para o

crescimento e avanço para o verdadeiro amor. Não obstante a paixão é efêmera, ilusória.

Afinal amor não é apego, ou um troféu a ser exposto aos amigos. Mas, é o amor um

desprender da carência, da falta e mergulhar na profundidade daquilo que se é amar.

“Pois, só se ama deveras se o coração do amante que se misturou, em almofariz de

angústia e dor ao do coração do amado” 64

.

Sem embargo, o processo de se apaixonar é um tanto quanto melancólico,

doloroso. Uma fase que nos pode levar a compreender e a desvendar tudo àquilo que de

fato é o amor em sua primeira instância, dor e sofrimento. Como resultado, temos a fala

de Sponville quando diz que só ama, de verdade aquele que um dia sofreu.

Em decorrência disto nos dirá Unamuno: “O mistério do amor, é o mistério da

dor” 65

.

Ainda que seja um doloroso processo é o amor transcendência. Tudo porque o

mesmo está sempre visionando o “porvir”, que possa trazer satisfação, preenchimento.

Não querendo aqui, transformar o mais belo dos sentimentos em monstro, esta faceta do

64

UNAMUNO, Miguel de. Uma História de Amor - In: Revista Pandora do Brasil, Edição 14 – janeiro de 2010 – “Miguel de Unamuno”/ Disponível em http:// revistapandoradobrasil.com 65

UNAMUNO, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo:

Martins Fontes, 1996,p.190.

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amor que nasce pela dor, me faz recordar a D. Miguel quando diz: “O amor é senão, fruto

da dor universal” 66

.

Tal dor é aquela que une os homens em momentos mais difíceis. Isto é um amor

livre que age, que doa, que se esvazia de si para tomar as dores do próximo que está a

sofrer.

Em contra partida a um amor devassador, voraz. Deparamo-nos com um amor que

mesmo na dor é paciente e sabe esperar. E toda essa espera já nos ensina São Paulo:

“O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria,

não se orgulha.Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente,

não guarda rancor.O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a

verdade.Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”67

Contudo toda essa espera é refletida no cotidiano. Na vida comum, pois “quem

não sofre não ama, não vive”68

.

O que Unamuno quer deixar claro é que sem sofrimento, dor, renúncia não existe

verdadeiro amor. Afinal, já viram rosas sem espinhos? Portanto acredita Unamuno que

sem dor é impossível se falar de amor.

Muitos são aqueles que sofreram por amor, Tristão e Isolda, Romeu e Julieta,

Ricardo e Ludovina, até mesmo o próprio Deus sofreu por amor ao entregar ao mundo

seu filho único - “Deus amou o mundo de tal maneira que entregou seu filho

Unigênito”69

.

Tudo isso é para nos mostra que toda abnegação possui seu lado positivo.

Todavia, para que se possa haver uma evolução da alma, da personalidade e até mesmo

da pessoa se faz necessário um abandono mais amplo e profundo. Um abandono que seja

capaz de ver ao outro sem suas armaduras, vê-lo em sua nudez.

O que Unamuno está tentado deixar claro é que esta nudez é uma ação de

liberdade tomada por esse imponente homem que está dominado pelo terreno da angústia

66

Idem,Ibidem

67 Cf. 1 Cor. 4,4-7

68 UNAMUNO, Op.Cit. p198

69 Cf. Jo 3, 16.

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e do medo, frutos de seu interior. Em decorrência disto, assente que não há verdadeiro

amor sem sofrimento e dor, sem martírio.

Em conseqüência disso aquele que não sofre é porque não vive e não aceita a dor

como substância da vida70

e raiz da personalidade, pois é sofrendo que se torna pessoa.

Em resumo amor e dor são indelevelmente inseparáveis, e desta união se pode

construir uma nova e límpida forma de amar, a saber: a compaixão (caridade).

Desta maneira, o amor passa a se tornar aqui um ato e não mais falta. Um

encontro mais íntimo e pessoal do homem que se debruça sobre si mesmo, criando

capacidades de fazer daquilo que o movimenta, isto é, o amor superabundar e extravasar,

explodir em direção ao outro.

No entanto, ainda que nos pareça bizarro devemos, com reverência, agradecer

estes nossos momentos de crise e dor, os quais muitas das vezes cravejam o coração do

homem. Assim a frustração, a decepção e a dor, gerenciadas por esse processo nos

ajudam a compreendermos que “Eu sou Eu e não o Outro”71

.

Diferente do amor desejo, carnal. A compaixão permite que aquele que ama

ultrapasse seu egoísmo, e passe a se entregar ao outro com tudo que ele é: liberdade,

vontade, sentido, desejo. E ao percebê-lo descobre que é homem capaz de sentir, amar,

doar e ver aquilo que antes estava oculto os seus olhos e passa a aceitar que ele é um ser

feito o qual Deus criou para amar.

Aqui uma vez mais de forma sutil, reaparece a figura desse homem vivo, de carne

e osso, que antes estava aprisionado e se encontra em liberdade de tal modo que,

abrandado pelo amor este homem perceba e tome ciência de que possui, a capacidade de

sair de seu mundinho e amar o todo e o universal, deixando-se descobrir pelo novo e

desconhecido que é o Outro.

Como já nos dissera Theodor Adorno em um de seus escritos “serás amado

quando puderes mostrar sua fraqueza, sem que o outro se sirva dela para afirmar sua

força”. Em outras palavras Adorno quer que compreendamos que a compaixão é uma

70

Idem, Ibidem 71

MICAI, Barbara Aparecida Brosch. Fé e razão, o conflito: a relação da esperança com a fé e a caridade na filosofia de Miguel de Unamuno. – São Paulo: Editorama, 2009 p.58

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maneira de amar gratuita, que nos faz viver menos para que o Outro viva mais. Portanto,

é amar sem esperar nada em troca. É doação pura e total. É consentimento de vida.

Aqui nos faz resgatar o que já dissera Simone Weil desta nova forma de amar. O

amor caridade (charitas) é um amor de desprovimento. Um amor universal, ou seja, não

é um amor-amizade (philia) que faz escolhas. Este é um amor que não faz distinção, não

tem preferência. È este fruto da compaixão. Um amor sem limites, sem justificativas tolas

e egoístas. É por fim, a caridade ligada a compaixão uma maneira transcendente do amor

humano.

É este um amor sem preconceito. Que ama sem olhar a quem. Este por sua vez faz

valer o que nos diz Cristo: “Orem por seus amigos e amem seus inimigos” 72

. Tomados

por nossas fraquezas humanas, tais palavras acabam se tornando uma afronta a ponto de

nos questionarmos: Como poderei eu amar meu inimigo? Como amar aquele que me fere

até mesmo me odeia?

Tais palavras de Jesus ainda que duras a nós reles mortais, servem para confirmar

que o homem que se deixa embriagar pelo amor caridade e se guiar pela compaixão

cresce como homem. Tudo porque esse amor transfigura e faz com que todo o individual

e narcísico, torne-se universal e livre.

Não podemos tapar o sol com a peneira. Tamanho é o desafio lançado por Cristo e

se amplia a cada vez mais, na medida em que encarnamos que somos a imagem e

semelhança de Deus, e fomos criados para amar, pois em outra de sua fala Jesus diz: “

Amai vosso próximo como a si mesmo”73

. Para tudo! Como amar meu próximo como a

mim mesmo?

Desafiadora é esta máxima deixada por Jesus. Mas Simone Weil nos ajuda a

entender, pois tal compreensão se da na inversão desta máxima: “ame a si mesmo como

ama a um estranho (próximo)” 74

.

Se minuciosamente analisarmos, perceberemos que a fórmula evangélica “amai ao

próximo como a si mesmo”, nos estaria sendo dito: “ame ao próximo (qualquer pessoa)

72

Cf Mt. 5,44

73 Cf. Mt 22,37

74 COMTE SPONVILLE, André. Pequeno Tratado das Grandes Virtudes. Tradução de Eduardo

Brandão. – São Paulo: Editora Positivo, 2009- p.307

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da mesma maneira que você se ama, isto é, com todo seu narcisismo, com seu

egocentrismo e amor cego e passional, tudo não passaria de loucura, afinal como posso

amar a outro na mesma medida com que me amo, uma vez que sou único e exclusivo?

Tais indagações, e discussões só servem para que entendamos de uma vez por

todas o que vem a ser esse amor compadecido. E acolher com gratuidade nossas misérias

e fraquezas. Para isso nos auxilia Unamuno ao dizer: “o homem anseia ser amado, ou

ainda anseia ser compadecido” 75

.

Entenda-se que ser compadecido para Unamuno é ser reconhecido e se

reconhecer, acolher e ser acolhido buscando compreender o homem concreto em sua

totalidade, com seus vícios e virtudes.

Ainda acrescenta Unamuno:

“Compadecemo-nos do semelhante a nós, e tanto mais nos

compadecemos quanto mais e melhor sentimos sua semelhança para

conosco”76

Agora não podemos esquecer que esse ideal de amor não é alcançado por todos. E

menos ainda se sabe amar, ou lidar com a dor que o amor causa a um. Tanto é que para

muitos de nossa atualidade, amar pode ser doloso demais a tal ponto, de se criar meios de

se amenizar, ou até mesmo para não amar.

Isso já ocorre segundo a revista época, onde em alguns estados europeus já se

vendem a pílula do desamor. Tudo para afastar daquilo que é essência do amor. A dor é

filtro para o crescimento humano e reconhecimento do outro.

Sem embargo, ainda que a caridade não seja compatível com este amor a si

mesmo, pois ela é fonte do verdadeiro amor que se emana em direção ao próximo, pois se

compreende que é a partir de mim, do meu egoísta amor ,que serei capaz de reconhecer

no outro minhas misérias e distribuir e compartilhar com o outro um estreito laço de

verdadeiro amor. Dirá Unamuno: “A Caridade é, pois, impulso de me libertar, de libertar

todos os meus próximos da dor, de libertar Deus, impulso que abarca a todos nós” 77.

75

UNAMUNO, Op.cit p.130

76 Ibidem, p.135

77 Idem, Ibidem, p.202

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E mais:

“A Caridade é o transbordar da compaixão, é o impulso que liberta-

nos da dor e do sofrimento. È a verdade e ação do amor [...] é a caridade a mais

viva expressão do amor, e movida por ela, eterniza aquele que ama e

impulsiona-o a amar e a descobrir a Deus nele e no próximo” 78

.

Contudo quando o amor é espontâneo e pessoal, pois o mesmo não pode ser

comandado. O amor em minha liberdade me permite encontrar com a riqueza que há

além fronteira, fora de mim.

Entretanto devemos deixar aqui esclarecido, o amor em sua forma é desejo, júbilo,

mas também caridade, abertura para o desconhecido, que juntas podem formar o homem

concreto.

Sem mais é a caridade por meio da compaixão sua principal veia condutora, que

nos permite sem medo de errar, amar a todos os homens, nos libertando de tudo que nos

aprisiona, nos sufoca. Tornando-nos amados e amantes.

E seria este o único e eficaz amor, desprendido, livre que nos pode levar a uma

profunda e verdadeira aproximação com o Outro interno e externo. Que nos aproxima de

Deus e homem.

Afinal como diria santo Agostinho: “a única forma de amar, é amar sem

medidas”. Portanto amemos e nos deixemos amar. Porém para que amemos de verdade é

necessário que voltemos ao primeiro motor, ao principio do Amor.

2.2 - Amor Consciência: um Deus escondido.

“Quem não conhece o Filho jamais conhecerá o Pai, e o Pai só se

conhece pelo filho; quem não conhecer o Filho do homem, que sofre angústias

de sangue e dilaceramentos do coração, que vive com a alma triste até a morte,

que sofre uma dor que mata e ressuscita, não conhecerá o Pai e nem saberá do

Deus paciente e escondido” 79

.

78

MICAI, Barbara Aparecida Brosch. Fé e razão, o conflito: a relação da esperança com a fé e a

caridade na filosofia de Miguel de Unamuno. – São Paulo: Editorama, 2009 p.81

79 Unamuno, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo: Martins

Fontes, 1996, p.196

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Até aqui temos percebido que o amor é algo individual, no entanto que está em

processo de expansão em direção ao outro, deixando, portanto esse seu lado único e

passando a ser universal, isto é, em direção ao que antes não era enxergado.

Sem embargo nos ficou claro que o amor para Unamuno é um processo lento,

solitário e dolorido. Mas é ele porta de sensibilidade no homem, pois faz com que ele se

compadeça por outrem que não ele mesmo.

Assim a compaixão é responsável por outro processo, que é gerado pelo amor, o

reconhecimento do outro, da pessoa exterior a ele, e este reconhecimento do outro

chamamos de consciência.

Para Unamuno a consciência, ela é o conhecimento participado <<quem não

conhece o filho jamais conhecerá o pai>>, é consentimento, é compaixão80

. Além de

tudo esse reconhecer, trazer o que antes estava escondido, ou seja, a consciência sofre,

compadece. E este processo de sofrimento e compaixão faz com que o escondido se

desvele no amor, pois como ele, a consciência personaliza tudo que ama, é o que

chamamos de Deus. Afinal “Deus é a personalização de tudo, é a consciência eterna e

infinita do Universo” 81

.

Em Unidade a este movimento de dentro para fora que gera a compaixão nos

dirá Charbonneau:

“[...] Uma vez desprendida da massa cósmica da inconsciência... a

consciência floresceria rapidamente e se tornaria um conhecimento superior e

especificamente humano que seria o conhecimento de si [...] e tal movimento

seria passando de uma análise exterior a uma análise interior, nisso o homem

amadureceria e conheceria a si próprio”82

.

Deste modo a consciência em Unamuno é “tida como um tesouro da vida

humana” 83

, pois o mesmo teve, que nele mesmo formular as questões existenciais,

como a vida do homem depois da morte. No entanto sabemos, quando<<o Filho do

80

Ibidem, p.134.

81 Ibidem, Idem

82 CHARBONNEAU, Paul-Eugéne. O homem à procura de Deus. – São Paulo: EPU, 1981- p.436.

83 SILAR, Mario. "Don Miguel y el Dios escondido. La tensión entre cordialidad y racionalidad en el

pensamiento religioso de Unamuno"In: http://www.unav.es – Artículos On-line, 2008, p.41

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Homem for levantado, atrairá todos para vós (Jo 12,32)>> e mais << se com Cristo

morremos, com ele ressuscitaremos ( Rm 6,8)>>.

O que nos deve ficar claro, é que essa busca incansável por Deus já nos é dado

desde nossa criação, pois ninguém se esquece do seio que veio. Assim, portanto, só

posso falar de Deus, pelo fato mesmo que o já tenha saboreado, sentido a este Deus.

E é pautado nesta certeza de que ao sermos criados por Deus, e que esta busca já

está fundida na alma do homem buscar a Deus, que São Francisco Sales se firma para

escrever sua primordial obra: Tratado do Amor de Deus. A este respeito concorda

Unamuno ao dizer: “Esse conceito de Deus brota do eterno sentimento deste Deus

gravado no homem” 84

.

Circunstancialmente é nesse desejo, vontade de conhecer aquilo que está

implantada a consciência, que antes mesmo de conhecer pela razão, toca e sente aquilo

que é seu objeto de busca.

Diferentes de nós homens. Deus a Consciência Suprema como costuma chamar

Unamuno, ele não pensa, Ele cria. E se cria não existe é Eterno dirá Kierkegaard; o que

demonstra que Deus antes mesmo de Ser no homem, Ele é.

E é deste Deus que É, que nasce o desejo de buscar aquilo que está fora de nós; a

saber, a consciência.

“Ora, a serpente era mais astuta que todas as alimárias do campo que o

SENHOR Deus tinha feito. E esta disse à mulher: É assim que Deus disse:

Não comereis de toda a árvore do jardim? E disse a mulher à serpente: Do

fruto das árvores do jardim comeremos, Mas do fruto da árvore que está no

meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem nele tocareis para que

não morrais. Então a serpente disse à mulher: Certamente não morrereis.

Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se abrirão os vossos

olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal. E viu a mulher que aquela

árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para

dar entendimento; tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido,

e ele comeu com ela. Então foram abertos os olhos de ambos, e conheceram

que estavam nus; e coseram folhas de figueira, e fizeram para si aventais. E

ouviram a voz do Senhor Deus, que passeava no jardim pela viração do dia; e

esconderam-se Adão e sua mulher da presença do Senhor Deus, entre as

84

UNAMUNO, Op.cit. p.138

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árvores do jardim. E chamou o Senhor Deus a Adão, e disse-lhe: Onde estás?

E ele disse: Ouvi a tua voz soar no jardim, e temi, porque estava nu, e

escondi-me. E Deus disse: Quem te mostrou que estavas nu? Comeste tu da

árvore de que te ordenei que não comesses?” (Gn 3,1-11)

Aplausívelmente nos é dado a saber que tudo adquirimos de Deus, exceto a

consciência, a qual só nos será dada no ato de comermos do fruto da árvore do

conhecimento, que caímos em nós e percebemos que estávamos nus, e que tínhamos

medo, vergonha daquele que nos criou, pois é aqui que tomamos a consciência de que

nos falta algo, de que temos uma ligação com o criador.

Mas não querendo nos ampliar, nosso foco aqui é demonstrar que este Deus que

é no homem, ele é desvelado, ou melhor, revelado ao homem na consciência, na medida

mesmo que eu me descubra no outro e em suas misérias. Afinal já nos dizia são João:

Deus é Amor! E é esta crença que se torna o centro da existência do homem, pois é

nesse amor dado em Deus e por Deus que nos reconhecemos e conhecemos85

o outro,

isto é aquele, que está fora e ao mesmo tempo imerso em nós.

Uma vez mais colidimos com a questão da incompletude onde já dizia um amigo

em certa discussão: “A incompletude da condição humana é o que faz o ser humano se

abrir para o outro, em busca de um complemento. Assim sendo, é a nossa deficiência

quem nos enriquece. Afinal se bastássemos a nós mesmos, não provaríamos jamais da

riqueza que o outro tem a nos oferecer; os novos sabores que ainda não conhecemos.

Portanto, a vida humana é paradoxal – nossa pobreza, nossa deficiência, ou seja, o fato

de não nos bastarmos a nós mesmos, é motivo, e enfim, nossa maior riqueza”. E

completa Sponville quando diz: “Amar é encontrar a riqueza fora de nós [...], pois, o

amor é pobre86

, e, portanto a única riqueza” 87

.

Expressamente vemos aqui viabilizados a figura de um ser superior que nos é

dado pela experiência no outro, no reconhecer nossas próprias misérias. Assim, pois, é

no ato de compadecer que reconhecemos o “Não-Eu”, isto é, aquele que está fora de

85

Cf. Bento XVI, Carta Encíclica Deus Caritas Est.

86 Platão já nos dizia: “O amor é filho da pobreza e do recurso. In: Coleção os pensadores - Diálogo o

Banquete, §203 b

87 SPONVILLE, André Comte. Pequeno tratado das grandes virtudes. Tradução de Eduardo Brandão –

São Paulo: Editora Martins Fontes, 2009, p.310.

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mim. E nesse processo o qual conhecemos a necessidade de Amar e sermos amados88

, o

que, no entanto não nos é suficiente para que sejamos felizes.

Deste modo Deus é a causa primária de nossa existência. Pois já nos alertava

Deuteronômio quando diz: “Escuta, ó Israel! O Senhor, nosso Deus, é o único Senhor!

Amará ao Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas

as tuas forças » (Dt 6, 4-5).

Por outro lado ao fazermos uma minuciosa análise perceberemos que o Amor

torna-se uma Ordem: “Amarás, o Senhor teu Deus”, Mas poderá o Amor ser

comandado?

Dirá Sponville: “O amor não pode ser comandado, pois o mesmo comanda,

rege” 89

. Neste sentido concorda Bento XVI quando declara: “o amor só se torna

possível porque não é mera exigência: o amor pode ser « mandado », porque antes nos é

dado” 90

. Neste sentido mesmo o amor é um dom, é graça de Deus, pois Ele sendo tal

quem é: Amor, ele não poderia ser uma ordem e mais bem gratuidade, e isto reconhece

Jung quando relata e afirma que o “amor é como Deus: ambos só se oferecem a seus

serviçais mais corajosos.” 91

Em conformidade a tal pensar nos dirá Muller: “O amor dos homens em direção

a Deus têm sua origem, seu progresso e aperfeiçoamento no amor eterno de Deus em

direção a este homem, pois o amor é fundamento do mundo” 92

, fundamento este que já

estava disposto nos planos de Deus, quando por boca de Jesus exprime: “Amarás ao

Senhor teu Deus, de todo seu coração, de toda sua alma, e com toda as suas forças e

de todo o teu entendimento, e a seu próximo como a ti mesmo(Lc 10,27)”.

88

SPONVILLE, André Comte. O Amor. Tradução de Eduardo Brandão – São Paulo: Editora Martins

Fontes, 2011, p.40.

89 SPONVILLE, op. cit., 2009 – p.308

90 Cf. Deus Caritas Est. – In: www.vatican.va

91 JUNG, Carl Gustav.Sobre o amor.Tradução de Inês Antonia Lohbauer – Aparecida/São Paulo: Ideias

&Letras,2005 p. 24

92 MULLER, Michael.La Alegría en el Amor de Dios. Bamberg, 1933 - In: http://www.opuslibros.org/

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Em suma o “amor era nele tão abundante que Ele não exigia de nós, tampouco

exigia de nós ser, pois Ele é aquele que é, portanto não exige amor, mas dá que é

todo amor” 93

. Afinal senão há Deus não há amor, dirá Lacan.

Em vista disto nos é atestado que por Deus fomos criados para amar e ser

amados, a sua imagem e semelhança fomos criados. Imagem e semelhança que são

nossa identidade e marco deste Deus que é Amor. E quando usa a palavra semelhança

nos recordará Tomás de Aquino é para deixar mais que evidenciado a precisão do amor

de Deus rumo a este homem, obras de suas mãos.

E consequentemente sendo o homem criação de Deus, é por estado de lógica o

homem ser criação do Amor, que faz com que o homem obedeça a tamanho imperativo

que agite seu coração, e tome um caminho de retorno a Deus. Algo que já nos dizia

Dostoievski: “... se amas já és de Deus”. E tamanho é o amor de Deus em direção ao

homem que o mesmo que é capaz de sentir ciúmes94

.

Neste sentido à medida que vou conhecendo aquele que é e buscando os

caminhos do mesmo, o amor vai se tornando centro de tudo aquilo que constitui a

consciência95

até a criação divina. Como já dizia um teólogo, de Deus só podemos saber

e dizer aquilo que ele não é. Pois Deus é o ser por excelência, por isso não podemos

prová-lo e menos ainda demonstrá-lo. Pois, já nos dizia Jaspers: “Deus existe e isso

basta”.

Mas o homem que é dotado de inteligência, vontades e desejos ele sempre estará

em busca de mais, não para demonstrar e firmar tal existência, mas bem para se

debruçar junto aquilo que realmente dá sentido em sua vida, isto é, voltar as fontes

primeiras, buscar as origens.

Ainda que nos valhamos da consciência como meio para conhecer aquilo que

está “escondido”. Nos é claro que é somente na existência que podemos conhecê-lo,

fixá-lo; afinal “O verbo se fez carne e habitou entre nós96

”.

93

Charbonneau, op.cit., p.462

94 Ibidem- p.461.

95 Idem

96 Cf. Jo 1,14

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É a partir daqui que o que antes era oculto se faz presente, pois na medida em

que ele tenha revelado seu misterioso nome “Eu sou aquele que é”. Tal nome traz

consigo uma força na qual demonstra o quanto ele está infinitamente acima de tudo, o

quanto podemos dizer ou compreender, pois ele é o Deus Escondido97

.

Parece-nos absurdo, pois, nossa razão não consegue racionalizar a figura deste

que É. Mas o simples fato Dele nos revelar, nos fazer conscientes de seu nome, ele

também deixa evidenciar sua fidelidade, sua aliança e o mais importante o que nos faz

melhor se aproximar dele, seu amor. E nos diz Unamuno:

“O conhecimento de Deus procede do amor a Deus, e é um

conhecimento que pouco ou nada tem de racional. Porque Deus é indefinível.

Querer definir Deus é limitá-lo [...] Deus é, portanto, Amor, Pai do amor, é

Filho do Amor em nós98

”.

Para todos os efeitos Deus em sua natureza é o terno “conhece a ti mesmo”. O

que queremos afirmar é que, Deus não é uma essência a qual se deixa captar por uma

redutiva definição.

Já nos dizia Bento XVI:

“Ninguém jamais viu a Deus tal como Ele é em Si mesmo. E, contudo, Deus

não nos é totalmente invisível, não se deixou ficar pura e simplesmente

inacessível a nós.” 99

Deus, portanto, ele è supremo conhecimento, é essencialmente fonte, motor

primeiro capaz de unificar em sua criação a sua essência. Liberdade Radical100

de

escolhas como nos diria São Paulo. Afinal foi para que já não houvesse mais judeus

nem gregos, nem escravos nem livres, nem homem nem mulher, pois sois agora livres

em Cristo101

.

97

Catecismo da Igreja Católica,§§ 207-208

98 UNAMUNO, op. cit. 1996, pp. 162-163

99 Deus Cáritas Est, §17

100 Cf. Rm 8,21

101 Cf. Gl 3,28

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Ao fim e a cabo este Deus é o Deus da libertação, do amor. Da mesma maneira

que o amor não impõe, da mesma forma Deus. Neste perfilar de pensamento nos

deparamos uma vez mais com São Paulo quando diz: O amor cresce através do amor. O

amor é “divino”, porque vem de Deus e nos une a Deus, e, através deste processo

unificador, transforma-nos em um Nós, que supera as nossas divisões e nos faz ser um

só, até que, no fim, Deus seja « tudo em todos » (1 Cor 15, 28).

E se tratando ainda desse reconhecer a Deus acrescenta Bento XVI:

“O reconhecimento do Deus vivo é um caminho para o amor, e o sim da

nossa vontade à d'Ele une intelecto, vontade e sentimento no ato globalizante

do amor. Mas isto é um processo que permanece continuamente em caminho:

o amor nunca está « concluído » e completado; transforma-se ao longo da

vida, amadurece e, por isso mesmo, permanece fiel a si próprio.” 102

É dizer, o amor é aquilo que o homem busca desde sua criação. Desde o instante

que fora separados, divididos. A saber, o homem está sempre em busca daquilo que o

complete e dê sentido a sua existência.

O amor é, portanto, o eixo constitutivo, a chave que nos levará ao universo da

consciência, fazendo-nos encontrar com a Suprema Consciência (Deus). Pois já escrevia

Carlos Vogt: “Deus é uma barreira em móvel que, localizada nos últimos limites do

saber humano e acompanhada de uma grande questão X, retrocede sem cessar perante

os progressos da ciência. E eu acrescento: da barreira aqui, tudo se explica sem Deus, da

barreira em diante, nem com Deus, nem sem Deus, por tanto resta Deus.” 103

Com isso nos dirá Unamuno que este Deus cordial, dos sentimentos é o dos

vivos, é a Consciência do Universo. E na medida mesma nos homens criação, do Deus-

Amor, iremos aos poucos reconhecendo em nós e nos outros que este “Deus dos vivos,

teu Deus, nosso Deus, está em mim, está em ti, vive em nós, e nós vivemos, nos

movemos e somos Nele.”104

102

Cf. Deus Cáritas Est.

103SILAR, Op.cit

104 UNAMUNO, op. cit. 1996, p.171

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Em outras palavras diz Arendt pelo desejo que temos de Deus, chegamos a este

que é Deus, da mesma forma é o amor.105

Concorda Charbonneau quando diz que

somos humanos, porque sabemos que Deus é Amor.106

Neste sentido Deus quis se

encarnar na pessoa de Cristo e desta forma se inserir por meio do amor na história deste

homem que é de carne e osso.

Para todos os efeitos somos direcionados a amar, e amar a partir daquele que nos

criou. E tudo porque este Homem já experimentou do amor de Deus, pois nos seria

contraditório falar de amor de Deus, ou até mesmo Dele, sem nunca mesmo haver

experimentado, não em sentido empírico, mas emocional, em espírito.

Experiência que fará com que o homem, com o homem, seja ousado se

abandone, e faça aquilo que deve ser feito, e diga sem esmorecer de que não há nada

mais que o amor de Deus.107

Assim mesmo dirá Francisco Sales Deus mesmo, na pessoa do Homem-Deus, se

uniu a criatura fazendo com que isso determine a posição de Deus mediante ao homem,

conjunto da criação, pois Amando a Deus sobre todas as coisas, nos tornamos em Deus

mais que criaturas, passamos a ser Filhos.

Portanto amar a Deus é também perceber no outro a figura de Deus, é acolher

assim as nossas misérias e suas misérias, pois é, no outro que reconheço a Deus e toda a

sua grandeza, pois tudo o que ele fez é bom. Deus é diferente de nós não é meramente

um ser pensante, um pequeno mortal, mas Ele é aquele que existe, Aquele que é Amor.

Neste sentido o homem torna-se realmente ele mesmo, quando corpo e alma se

encontram em íntima unidade; e aspira a ser somente espírito e quer rejeitar a carne,

pois quando dominado, isto é, envolvido pelo amor o homem sente que é infinito e

imortal, afinal isso nos promete o amor, duração e infinitude, no sentido ultimo de não

105

ARENDT, Hanna. O conceito de amor em Santo Agostinho – Porto Alegre: Instituto Piaget, p. 68

106 CHARBONNEAU, op. cit. p,461.

107 Ibidem,Idem p.474

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morrer. Afinal é o Amor que nos revela o eterno, e o amor de Deus é que nos faz crer

que venceremos o tempo108

.

Assim que pelo amor a mim mesmo, e ao próximo posso compreender de um

todo aquilo que esta fora de mim. Sem embargo Unamuno sempre pregou um amor

desapegado e livre de todo e qualquer preconceito, mas nos faz pensar que de tudo

dependemos de Deus, pois somente Ele nos pode direcionar para o Amor.

Em contrapartida reafirma Bento XVI que é pelo amor que compreendemos a

totalidade de toda a existência. Pois Deus é para o homem quanto o homem é para

Deus109

, uma vez mesma que o Homem é fruto da ideia de Deus. Por tanto amem,

amem e façam o que desejam, pois amar nos permite pela consciência conhecermos a

Deus.

108

Unamuno, p 196 109

Idem,Ibid p.199

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2.3 Considerações Finais

Ao logo da evolução humana se percebeu que muitas foram às formas dadas ao

amor, no entanto se tornou intacto a maneira a qual se alcança o verdadeiro amor.

Percorremos ao longo deste caminho, um percurso que nos levou de maneira

sutil a compreender e a desvendarmos como o amor é compreendido em Unamuno.

Amar é sofrer, quem nunca sofreu não pode afirmar que amou verdadeiramente,

e isso defende Unamuno, afinal ainda que pareça algo belo, tão fantasioso, o amor assim

com uma rosa possui também seus espinhos. E para que se possa dizer “Eu te amo”, é

necessário renunciar.

Unamuno nos demonstrou também que o amor é puro desejo. O amor é desejar

aquilo que me falta, no sentido de buscar aquilo que um dia perdi no tempo, aquilo que

me completa. Domado pela falta, somos convocados a nos abrir a novas experiências,

isto é, nos abrir aos que nos cercam buscando compreender no outro aquele que sou por

natureza.

Chegamos aqui à compaixão, esta nos permite sair do narcisismo e refletir no

outro, aquele que está fora de mim. Este seja talvez o amor pregado por Jesus durante

toda sua vida terrena - “Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os

doentes.” (Mt 9,12).

Em consequência disto percebemos que Amor é dom, é gratuidade. A partir

daqui somos levamos a nos perguntar quem é Deus? De onde que nos vem esse amor

como dom?

Parece óbvio, se o amor é dom, só poderia ser nos oferecido por Deus. Mas não

é assim, pois para que afirmemos que Deus é Deus, nos Faz necessário antes de tudo

buscar um caminho inverso, não cartesiano, mas bem unamuniano, ou quiçá freudiano,

pois partimos do filho para que conheçamos a Deus.

Vimos também que em resposta a sua criação e superabundância, Deus nos

permite não só sermos imagem e semelhança vossa como também nos permite Amar e

sermos amados, mesmo que ainda sejamos limitados em nosso corpo e mente.

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Nesta nova batalha descobrimos que podemos chamar Deus de Deus, porque

algum dia nos foi revelado, - “Deus tanto amou o mundo que nos deu seu único filho”.

A partir daqui percebemos que já não somos meros mortais, mas que somos homens

criados no amor e para o amor, e que, portanto, temos o dever de propagá-lo por toda a

terra.

Aquele que antes somente Era, torna-se também amor. Afinal Deus é Amor. Mas

não um amor egoísta, que se restringe só tão somente só nele mesmo, mas que se abre

ao novo, ao homem que é capaz a ele responder da melhor forma possível.

Desta maneira, nos é permitido viver a loucura de esperar e buscar com ânsia

aquilo que nos completa, pois ainda que sejamos imagem e semelhança do Criador,

somos limitados para reconhecer em nós de maneira comunitária a grandeza de Deus.

Pois assim, toda a história do homem se deixa engendrar pela manifestação consciente

de Deus.

Diante deste movimento, nos é pedido que saiamos de nossos redis e nos

abramos a novas experiências, afinal não fomos criados para vivermos sozinhos,

isolados, pelo contrário fomos criados para experimentarmos ainda que seja necessária a

dor real e vital dose do amor.

Deus é, portanto, o artista que absolutamente poderá ser pensado, mas bem

sentido, na generosidade do outro em se abrir e se deixar amar. Já nos dizia Dostoievski

“em nossos sofrimentos ressuscitaremos para a alegria, na qual o homem não pode viver

nem Deus existir, pois é Ele quem nos dá o grande privilegio” o de amar.

Deus é, portanto o fundamento de nossa existência em sua origem como é

também em seu fim, pois Deus é Amor.

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Capítulo III

Amor: a pedagogia das relações

Até aqui vimos que o amor é por natureza puro desejo, vontade de ser. Mas é

também dom, graça de Deus. É entrega e abertura ao Outro. A partir dessa certeza e

com mais claridade nos tocará aqui minuciosamente verificar como nós homens do

século XXI lidamos como o amor, e de que maneira este sentimento é sentido por nós.

Para isso faremos um percurso que a meu ver se faz necessário para tal

compreensão, e seria este o caminho: analisar o amor numa relação do Eu - Tu, e de que

forma esse amor se desenvolve como uma pedagogia, isto é, maneira de sentir e

compartilhar com o outro tal sentimento que não é individual, é aberto e circular.

3.1 Amor: o Eu e o Tu

“[...] ter aquilo que se quer ter nem sempre é sinônimo de amor

verdadeiro ou de um sentimento profundo [...] nem objeto, nem

personalidade: amor é ausência na ausência do outro. O amor se faz ao

contrário. É de dentro de si mesmo que o amor floresce e não de fora. O outro

é o sol, mas que deve habitar apenas dentro daquele que ama.” 110

Em direção ao presente pensar está Unamuno quando nos diz “Sou homem e a

nenhum homem eu considero estranho” 111

, pois como nos lembrará Mounier, “só sou

para o outro na medida mesma que o outro é para mim”. O que nos indica que meu

relacionamento com o outro me é dado no instante que me permito pelo outro

conhecido.

Ser pessoa para Unamuno é ser o homem concreto de carne e osso, que carrega

consigo sete virtudes e ao mesmo os sete vícios capitais112

, o que não nos impediria de

continuar a descobrir no outro o que é nosso.

110

Flávio Tonnetti; Arthur Meucci. Amor, existência e morte. – Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2013

– Coleção Miniensaios de Filosofia.

111 UNAMUNO, M. Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Tradução de Eduardo

Brandão. – São Paulo: Martins Fontes, 1996 p. 1

112 CUESTA, Manuel Sánchez. El personalismo unamuniano: la relación Yo-Outro. In revista

Acontecimiento: disponível em http://www.mounier.es/ Acessado em 20/04/15 às 14:40

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De alguma maneira aqui passamos com mais intimidade a olhar para nós mesmo

para nossas fraquezas, pois se entendermos e verificarmos bem, o Outro é aquilo que

fora retirado de nós, é a outra metade da laranja, a tampa da panela. Pois tal separação

nos explica, o mito que se deu por certa forma pelo medo que os deuses sentiram dos

homens, assim Zeus decide: “vou cortar cada um deles em dois; serão ao mesmo tempo,

mais fracos e mais proveitosos” 113

. Assim, portanto, mediante a tal signo da separação

surge à falta e a carência114

, a partir daqui o homem passa incansavelmente a buscar o

outro na tentativa de voltar a ser um. Uma virtuosa realidade, a qual será possível ao

homem por meio do Amor.

Afinal é o amor o responsável pela unificação dos corações. No entanto, se pode

perder quando entra em um velho conflito, sentimento e razão, pois o homem quando

ama ele sente com o coração e afirma ou nega com a razão, temos aqui o velho dizer de

Pascal “o coração possui razão que até a própria razão desconhece”. E tudo porque o

homem é dotado de amor, um amor que ultrapassa sua razão. É a consciência que nos

faz enxergar no Outro e o Outro com um olhar diferenciado, e pela compaixão que nos

debruçamos sobre aquilo que somos em nossa natureza: Amor.

E tudo isso nos fica claro quando aos nossos ouvidos ressoa:

“Com voz de ressonância

nos níveis do ar

voz de calma e de arrulho

voz de brisa

entre as folhas das árvores

voz de sussurro

no vácuo da espera

voz de confissão e de prece

voz de água

contra as rochas da beira

113

NEUMANN,Patrícia. O mito do andrógeno contado por Aristófanes no banquete: homossexual,

heterossexual e amor. In: Anais da XII Semana de Filosofia e III Semana PET Filosofia – UNICENTRO

– Guarapuava, Paraná nos dias 07 a 11 de Outubro de 2013

114 DROZ, Geneviéve. Aristófanes e o Mito do “Andrógino”. Os Mitos Platônicos. – Brasília: Unb, 1997

pp. 27-91.

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com voz de grito de liberdade

no exílio da palavra

e com silêncio

de encadeada amante

a quem te ama,”115

Fica aqui exprimido a importância que há tanto para Mounier, quanto para

Buber, grandes figuras do personalismos que essa proximidade do Eu e Tu nos é dada

por intermédio da comunicação, pois somos pessoas criadas para a comunicação, tanto

emocional, quanto social, uma comunicação que aqui para nós é dada por meio da

compaixão, afinal como vimos é nela que contemplamos a beleza, que esta contida no

Outro. Para maior compreensão, vejamos:

“O Tu, vem antes do Eu. Pois a criança ela reconhece antes dela

mesma o Tu, no entanto para que ela possa se descobrir em sua

plenitude se faz necessário mergulhar no mistério que é o Tu.” 116

Consequentemente:

“A relação com o Tu é uma relação direta. Entre o Eu e o Tu não se

interpõe nenhum sistema de ideias, nenhuma espécie de esquema ou

imagem previa [...] entre o Eu e o Tu não se interpõe um fim, nem,

prazer ou prejulgamentos, pois o desejo se transforma em presença,

isto é em pessoa.” 117

É justamente esse jogo relacional que muitas das vezes não compreendemos e

acabamos nos enredando em sistemas aos quais não conseguimos nos encontrar e mais,

é um problema que acaba sendo estendido aos sentimentos, pois só nos reconhecemos

pessoas na medida mesma em que há uma relação com outra pessoa, uma troca de

energia, de prazer, de gostos.

115

IBÁÑEZ, Guillermo Juan. Poemas de Amor. In: Revista Pandora do Brasil, Edição Nº 39 - Fevereiro

de 2012 - "Poetas Poesia II"/ Disponível em http://revistapandorabrasil.com/ Acessado em 18/04/2015 ás

15:45

116 DÍAZ. Carlos. Introducción al piensamiento de Martin Buber. Instituto Emmanuel Mounier.

Disponível em www.Mounier.es

117 Ibidem.Idem

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No entanto, o erro mais cometido é o esquecimento. Esquecemos que os

sentimentos são estados anímicos e que, portanto, devem ser compreendido como tal

em sua particularidade, pois em cada pessoa reaciona de maneira diferente.

Assim, portanto, o amor é responsabilidade. É compatibilidade. É um mundo no

qual somos submergidos a uma sensação de prazer, de vontades e desejos, um

envolvimento mágico que nos Leva a perguntar: porque amamos? Porque somos

amados?

Talvez, tal pergunta nos direcione aquilo que antes havíamos denotado, amamos

porque nos falta, e só numa relação com o Outro é que me descubro, pois o “amor é

uma alegria acompanhada por uma ideia ou causa exterior118

”, e como senão bastasse o

amor é conhecer o Outro, criar um grau de intimidade experiência a qual nenhum outro

sentimento nos permitirá.119

Compreendendo isso nos dirá Buber: “Só posso amar o ideal e não posso

conceber o ideal em nenhuma outra forma senão amando-o” 120

. E em concordância diz

Unamuno: Só amo o outro personalizando-o.

Como isso, percebemos que o Tu é o marco da existência humana desde sua

criação, - “Depois das costelas que tirara do homem, o Senhor Deus modelou uma

mulher” (Gn 2, 22). O amor por sua vez também é força, é dinâmica que está sempre

em direção do outro: “E o amor? Ah! Amor, esse, não havia de vir, chega sem querer,

pois quando se ama- o amor dele necessita” 121

, sempre aparece.

É também sem dúvidas o amor que se agarra, se prende, ao mais íntimo de

nossas almas de maneira mais profunda de nossa própria inteligência, pois o amor,

seduz, nos alucina e nos completa. O amor por sua vez serve da inteligência para que

possa ir mais no fundo e longínquo conhecimento da pessoa amada.

118

SPONVILLE, Andre Comte. Amor. Tradução de Eduardo Brandão. – São Paulo: Martins Fontes,

2011 p.78.

119 Ibidem,Idem p.88

120 DÍAS, Carlos. Introducción al pensamiento de Martin Bubber. – Clasicos Basicos del

Pensamiento; Disponível em www.mounier.es.

121 Unamuno, Miguel de. Uma História de amor. In: Revista Pandora do Brasil, Edição Nº 14 – Janeiro

de 2010 - "Miguel de Unamuno"/ Disponível em http://revistapandorabrasil.com/ Acessado em

28/04/2015 às 14:29

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Como diria May, o amor sempre chama um amor, é ele sempre um grito por

outro amor122

.

Aqui se faz claro e evidente o que já nos dizia Marcel “a pessoa se realiza mais

que em atos pelo qual tende a se encarnar( em uma obra, em uma ação, em um conjunto

de uma vida) mas se realiza como pessoa na encarnação particular(...) pois, é no ser

pessoa que se participa da inesgotável plenitude de onde brota a pessoa”.123

Em contra partida o amor em sentido mais amplo e concreto, só se faz

verdadeiro se for amor de um ser, para outro ser124

, isto é se houver uma relação entre

um Eu e um Tu, o que nos deixa claro que o amor ele transcende a oposição do si

mesmo e do outro na medida mesmo que reconhece o outro.

O que nos leva a pensar que o amado, isto é, o outro passa a ser percebido, pois,

passa o amante a chamá-lo pelo nome, fazendo com o que antes era desejo, passe a ser

compartilhamento, isto é, já não é um amor egoísta e sim um amor complementar,

deixando de ser busca e passando a ser plenitude.

Tudo nos leva a declarar:

“El ser a quien amo no es de ninguna manera um tercero para mi...El

a cada vez más en el circulo con relación al cual-exteriormente al cual –se

dan los terceros que son los otros. Expresaria esto diciendo que no comunico

efectivamente conmigo mismo, sino el medida en que comunico com el

outro, es decir, en que el outro se convierte en Tú para mi”.125

E mais amado e amante tornam-se um, não havendo mais diferença entre ambos:

“Amo tanto más aunténticamente cuanto menos amo por mi, es

decir, por lo que puedo esperar del outro, y más por él mismo (...) la

respuesta residiria más bien em la comunidad cada vez más invisible en el

seno en el cual Yo y el Outro nos fundimos más perfectamente”. 126

122

MAY, ROLLO. Eros e repreensão: o amor e a vontade. Tradução de Áurea Brito Weissenberg. -

Petrópolis, vozes, 1973.

123 PERÉZ, José Seco. Introducción al Pensamiento de Gabriel Marcel. Instituto Emannuel Mounier –

Coleção Clasicos Basicos del Personalismo; p29. –Disponível em www.mounier.es – acessado em

28/04/2015 ás 15:00.

124 Ibidem, p.36

125 Ibidem, p.38

126 PÉREZ, op.cit. p.38-39

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O que devemos compreender que, é no outro e com o outro que me fortaleço,

que construo aquilo que em mim estava em falta. É contemplar o que nos recorda

Agostinho: “o amor torna fácil o que é difícil e leve o que é pesado, pois dois amores

construíram duas cidades, o Amor a si mesmo até o desprezo de Deus, o amor de Deus

até o desprezo de si mesmo”.127

Assim, portanto, o amar o outro é a ele dar créditos, é considerá-lo em sua

totalidade e não pelo que ele haverá de ser, pois o mistério do amor se concretiza no

intimo conhecimento do outro.

Nisso vemos com clareza, quando vemos narrado o amor que Jonatas sente por

David.

“Aconteceu que, terminando ele de falar com Saul, a alma de

Jônatas se ligou com a alma de Davi; e Jônatas começou a amá-lo como a si

mesmo. E Jônatas fez um pacto com David; porque Jônatas o amava como à

si mesmo. E Jônatas se despojou da capa que trazia sobre si, e a deu a Davi,

como também as suas vestes, até a sua espada, e o seu arco, e o seu cinto”.128

Notoriamente fica evidenciado que o ser humano, como já se sabe, é um ser de

relação e isso implica dizer que possui a capacidade de estabelecer vínculo com o seu

próximo e, a partir disso, ressalta-se uma categoria considerada primordial para Buber,

isto é, o “entre”, “lugar em que se torna possível a aceitação e a confirmação ontológica

dos dois pólos envolvidos no evento da relação” (ZUBEN in BUBER, 1979, p.XLVIII).

Ou seja:

“Compreenderíamos o homem se o compreendêssemos como um ser

cuja dialógica estar-dois- em –recíproca presença que se realiza e reconhece

cada vez no encontro do um com o Outro”. 129

Afinal:

“O ser humano vai muito mais além da simpatia... e o cara a cara

recíproco do dialógico”. 130

127

GONZÁLES OSA, Paulino Sahelices. O amor, fio condutor. In: Cadernos de espiritualidade

agostiniana, vol 2, - FABRA (Federação Agostiniana Brasileira), Petrópolis, RJ. 2011

128 Cf. 1 Sm 18, 1. 3-4

129 DÍAS, Carlos. Introducción al pensamiento de Martin Bubber. – Clasicos Basicos del

Pensamiento; p.24 - Disponível em www.mounier.es – Acessado em 28/04/2015 às 16:00.

130 Ibidem,Idem

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Sem embargo, nos fica atestado que o Outro sem sombra de dúvidas é de

extrema importância para nós, pois é no outro e com o outro que nos fazemos pessoas e

nos reconhecemos como seres amados, e criados para amar.

Neste mesmo sentido de Buber, se encontra Unamuno pois a relação do homem

com o Outro é uma busca não daquele que está fora, mas é um recorrido uma forte

busca de si mesmo131

. Consequentemente forte e egoísta, o Eu se converte num amplo

Nós. O que significa que o Eu sai de si e vai em direção do outro, o que é para

Unamuno o grande ato da Compaixão.

Neste sentido a compaixão deixa de ser plural e passa a ser singular, sendo capaz

de transformar o Outro em irmão132

, fazendo com o Eu individual e narcísico se abra a

uma conectividade com o Outro, com aquele que é seu próximo.

Sem embargo, entramos aqui ao que muito pouco se é dito em Unamuno que é,

pois, a questão da alteridade, que não passa desta relação que há entre o Outro e Eu,

dada por meio da simpatia dolorosa culminada pela caridade e compaixão.

“O amor e a dor se geram mutuamente, o amor caridade e a

compaixão, e o amor que não é caritativo não é tal amor. O amor é por fim

desespero resignado”.133

Em outras palavras amar é simplesmente dar-se. Pois neste jogo Tu e Eu amar ao

próximo sem resignação é amá-lo na mesma medida com a que nos amamos.

Amar ao outro significa a ele dizer: “Tu não morreras”, o que da margem a

entender que amo algo, ao qual me permite selar o abismo, ao qual chamamos de morte,

pois contrario dela o “amor quer sempre o que é eterno”.

Isso já clamava D. Miguel: “Dá-me mais um instante de vida”!134

, tudo nos leva

a pensar que todos morrerão; O porquê de tudo? Simples cada um de nós está morrendo

a cada passo, uma vez mesmo que a morte se torna um forte mistério enigmático para

131

DÍAZ-PETERSON, R., Unamuno: el personaje en la busca de sí mismo,Playor, Madrid, 1975.

132 CUESTA, Manuel Sánchez. El personalismo unamuniano: la relación Yo-Outro. In revista

Acontecimiento: disponível em http://www.mounier.es/

133 UNAMUNO, M. Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Tradução de Eduardo

Brandão. – São Paulo: Martins Fontes, 1996, p.198

134 ARCANJO DOS SANTOS, Milton. A fome de imortalidade na obra de Miguel de Unamuno.

In:Monografia (Graduação Licenciatura em Filosofia) Faculdade de São Bento, São Paulo 2009, p.31

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nós meros humano. Pois, acrescenta Unamuno; “o pensamento que tenho de morrer e o

enigma do que haverá depois é o próprio latejar de minha consciência” 135

. Assim por

tanto, tornaria o amor, ou até mesmo o ato de amar um morrer lentamente.

No entanto a grande batalha travada por Unamuno e justamente essa, não morrer

e sim viver, e viver sempre pela eternidade. E isso não é egoísmo, e sim amor em

Unamuno, um amor pela vida, pelo próximo e por si mesmo.

E acrescentamos:

“O amor é aquilo pelo que os mortais embora nunca sendo iguais,

tendem a conservar e a participar, a imortalidade [...] afinal o amor é a

própria vida, vida que amam e buscam a imortalidade”.136

Contrário a este pensamento ainda Sponville em sua obra “ O Amor” afirma que

o fato de dizer ao outro que o amamos, isto é, o velho jargão “Te amo”, é demonstrar ao

outro que ele é efêmero ao que realmente sinto, pois ao pronunciar ao outro Te amo137

, é

o mesmo que dizer: caso você me abandone não sofrerei, pois creio, tenho a certeza que

ao final da fila há outro há minha espera. Tudo porque nós ainda não aprendemos amar

de uma maneira desnudada, livre, sempre queremos algo em troca, ainda que seja um

“Eu também te amo”.

Ora, se o simples fato de afirmar com palavras ao outro meus sentimentos da

margem a tal pensar, significa que somos muitos mais que uma dependência do outro,

somos puros devir, somos amor em nossa natureza.

Tudo nos faz recordar que o homem não se aproxima do mundo tão somente

pela experiência, mas “o experimentador não participa do mundo: a experiência se

realiza ‘nele’ e não entre ele e o mundo”.138

Destarte sendo o homem um ser de relação. Portanto estabelece vínculos. Ao

que nos implica afirmar que o mesmo possui a grande capacidade de estabelecer um

135

ARCANJO, Op. Cit. p. 32

136 COMTE-SPONVILLE, André. Pequeno tratado das grandes virtudes, Tradução de Eduardo

Brandão. - 2ª edição – São Paulo, Martins Fontes, 2009 – p.255

137 COMTE-SPONVILLE, André. O Amor, Tradução de Eduardo Brandão – São Paulo, Martins Fontes,

2011 – pp. 76-77

138 ZUBEN, Newton Aquiles Von. Martin Buber: Cumplicidade e Diálogo. Bauru: EDUSC, 2003.

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vínculo com aquele que está próximo dele. E mais, em relação com o fato a cima o que

estabelece este vínculo é o lugar no qual está inserido139

este homem, fazendo com que

seja possível a aceitação e confirmação dos eventos envolvidos, a saber, o homem e o

homem, em outras palavras o Outro.

É, por meio desta atitude, que o ser de relação desvenda os segredos da natureza

sob a sua ação e o seu protagonismo; porém torna-se um mal através do momento em

que o homem converge os seus valores, unicamente, a este modo de existência o qual

favorece a indisponibilidade e a irresponsabilidade para com o outro, com o mundo e

com Deus.

É-nos esclarecido que para que eu possa distinguir de fato aquilo que sou, do que

não sou é necessário aceitar a existência do Outro, como diria Aristóteles “o homem é

por natureza social”. Sendo assim, “para que eu possa ter consciência de mim mesmo,

preciso diferenciar-me do outro. Só quando existe essa diferenciação que pode haver

relacionamento” 140

, e, por conseguinte verdadeiro Amor, pois “uma pessoa só alguma

coisa em relação a outro indivíduo”.141

E finalmente nos é esclarecido que o Amor só é gerado por uma estrita e

confidencial relação entre o Eu e o Tu, o nosso fim é envolver-nos, entregar-nos ao

Outro, tornando-nos um com ele, pois dirá Buber:

“O amor é uma força cósmica. Aquele que habita e contempla no amor, os

homens se desligam do seu emaranhado confuso próprio das coisas; bons e

maus, sábios e tolos, belos e feios, uns após outros, tornam-se para ele atuais,

tornam-se TU, isto é, seres desprendidos, livres, únicos, ele os encontra cada

um face-a-face. [...] O Amor é responsabilidade de um EU para com um TU:

nisto consiste a igualdade daqueles que amam, igualdade que não pode

consistir em um sentimento qualquer, igualdade que vai do menor, ao maior

do mais feliz e seguro, daquele cuja vida está encerrada na vida de um ser

amado, até aquele crucificado durante sua vida na cruz do mundo por ter

podido e ousado algo inacreditável: amar os homens”142

E completa Unamuno:

139

Aqui nos remetemos Vygotsky quando em seus estudos retrata as maneiras de aprendizagens, pois o

homem afirma, ele; só reconhece o outro no momento em que sai de sua zona de conforto e passa a zona

de proximidade.

140 JUNG, Carl Gustav. Sobre o Amor, - Tradução de Inês Antonia Lohbauer; - Aparecida, São Paulo:

Ideias & Letras, 2005.

141 Ibid, idem, p. 87.

142 ZUBEN, Newton Aquiles Von. Martin Buber: Cumplicidade e Diálogo. Bauru: EDUSC, 2003 –

p.17

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67

“O amor é o rumor das águas profundas que se funde ao ruído das folhas

secas e vem numa altura em que a terra ressequida se escancara – e, à

superfície dela irrompem, como um manancial, as águas adormecidas isso é o

amor, [...] amor encarnado e humanizado, que exige que a ele pertençamos,

inteiramente – e só a ele”. 143

E por fim;

“O amor supõe que Eu ame alguém (Outro), e que este alguém seja amado

com o mesmo amor. Desta forma nos deparamos com esta tríplice realidade:

o que ama (Eu), o que é amado (Outro) e o próprio amor (Deus). O que é

portanto o amor, senão uma certa vida que enlaça dois seres, ou tenta enlaçar,

a saber, o que ama e o que é amado”? 144

Assim é o amor pura relação, comunicação entre mim e o outro. È uma busca

incansável por uma completude que se perdeu no tempo. Sem embargo o amor é força,

movimento o qual me impulsiona na barreira da vida buscar o outro, me fazendo

abandonar o narcísico e egoísta, e me abrindo para um amor que é cumplicidade é

compartilhamento.

Ao fim e a cabo na medida em que a pessoa se relaciona com seu próximo e

descobre nela seu amor, a ponto de poder dizer como Deus disse a Jesus “Este é meu

bem amado e nele eu me comprazo”, seremos pessoas mais felizes e realizadas – “A

partir do momento em que o amor se faz feliz, se satisfaz, se realiza, já não mais deseja,

mas ama.” 145

O que realmente temos que entender é que o amor ele só se concretiza, se realiza

quando há uma resposta comprometida do outro, e com isso, ter presente que o Amor é

um presente e constante relacionamento entre Eu-Tu.

Neste sentido quando se há uma doação mútua, uma afinada aceitação entre

ambos, o Tu nos dá uma abertura, a eternidade. O que nos da margem a um novo e

eterno Tu. Pois, é mediante a relação entre os homens que nascem uma profunda relação

Deus-Homem.

143

UNAMUNO, Miguel de. Uma História de amor. In: Revista Pandora do Brasil, Edição Nº 14 –

Janeiro de 2010 - "Miguel de Unamuno"/ Disponível em http://revistapandorabrasil.com/

144 GONZÁLES OSA, Paulino Sahelices. O amor, fio condutor. In: Cadernos de espiritualidade

agostiniana, vol 2, - FABRA (Federação Agostiniana Brasileira), Petrópolis, RJ. 2011

145 UNAMUNO, M. Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Tradução de Eduardo

Brandão. – São Paulo: Martins Fontes, 1996, p 196

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68

Ao final nascemos e fomos criados por Deus e em Deus. Assim sobre tudo ao

falar do Outro em nossa relação, estamos englobando uma íntima relação com Deus que

nos permite amar e sermos amados.

3.2 O Tu eterno e absoluto.

“O Deus sentido, a divindade sentida como pessoa e consciência única fora

de nós, embora envolvendo-nos e submetendo-nos, converteu-se na idéia de

Deus [...], portanto dizer que Deus existe, sem dizer o que Deus é e como é,

equivale a não dizer nada”.146

Unamuno sempre fora muito religioso, pois adotara esta virtude de sua amada

vó. No entanto, com o passar dos anos o jovem Miguel deixa de certa maneira sua fé

adormecer, o que produz mais tarde uma imensa crise. Mas a personalidade e ideia de

Deus sempre pulsaram em seu interior.

É em virtude a esta inquietude que Unamuno começa a investigar a esse Deus e

sua influência na vida dos Homens. Vimos que por natureza os homens são seres de

relações com o outro, com o Universo e mesmo com Deus (o grande Tu).

Não obstante ainda que nos relacionemos com as demais pessoas, sempre

estamos com uma mera sensação de vazio, como se tal relação não se bastasse por si

mesmo. O que nos levaria a buscar um novo Outro, aquele que pudera ser eterno e me

eternizasse nele.

Por essa razão que Unamuno mergulha no mistério do Tu eterno. O que talvez

viesse a ser seu trampolim para a questão da imortalidade. Do querer ser eterno, pois

existirá sempre em nós o desejo daquele que É.

Sem dúvidas que as relações humanas imprimem o desejo de uma participação

total com o ser do outro e com o Tu eterno (Outro). Com tudo nossa tarefa é fazer

possível o diálogo do homem com Deus, de recuperar a relação entre os homens, o

mundo e Deus, pois, segundo ele, é isso que interessa ao homem e lhe é significativo e

profundo a sua relação com o Tu eterno.

Neste sentido já nos alertava Martin Buber:

146

Ibidem, pp. 154-155

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69

“La vida humana toca con el absoluto gracias a su carácter

dialógico,pues, a despecho de su sigularidad, nunca el hombre, aunque se

sumerja em próprio fondo, puede encontrar um ser que descanse del todo em

si mismo, de este modo, Le haria rozar com el Absoluto; el hombre no puede

hacerse enteremente hombre mediante su relación consigo mismo, sino

gracias a su relación con Otro mismo”.147

Ora, o que Buber quer resgatar é que por sermos pessoas sociáveis

necessitamos de total relacionamento. No entanto Unamuno parece inverter esse quadro

quando nos diz que não chegamos ao Tu por meio da razão, mas sim pelo meio do

amor. Afinal de contas o Deus é um mistério.

Por outro lado, o Deus unamuniano não passa de uma mera projeção humana,

sinalizada pelo profundo desejo que se há no homem que existia um ser supremo, o que

me permitiria concebê-lo com um ser Absoluto e realmente eterno. Talvez por isso fosse

à divindade de Deus substituída por uma necessidade.

Declara Unamuno:

“É na necessidade de Deus parece sua vontade livre, isto é sua

personalidade consciente. Pois o Deus que ansiamos, o Deus que salvará

nossa alma do nada, o Deus imortalizador, tem que ser um Deus

arbitrário”.148

Embora nos pareça apresentado a uma figura de um Deus ideal, isto é, criado

pela ideia e necessidade do homem; o Deus de Unamuno é por sua vez um Deus Vivo e

presente que está sempre próximo dos seus, o mesmo Deus dos cristãos – Um deus que

pensa, age e cria, ou seja, é Um Deus Ativo149

.

O homem que busca a Deus e com ele deseja manter uma relação se inclina bom

e terno caminho – “Eu sou o caminho a verdade e a vida” 150

. Afinal, os homens ao

buscar encontram a Deus e nele se abandonam, apostam. Pois, seguramente quem

encontra seu Tu, a outra metade da laranja, implica neste Tu ser de um todo inteiro, pois

se há encontrado com aquele que não pode ser buscado.

147

DÍAS, Carlos. Introducción al pensamiento de Martin Bubber. – Clasicos Basicos del Pensamiento;

p.27 - Disponível em www.mounier.es – Acessado em 07/05/2015 às 15:00

148 UNAMUNO, M. Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Tradução de Eduardo

Brandão. – São Paulo: Martins Fontes, 1996, p 158

149 Ibidem, Idem, p.158

150 Cf Jo 14,6

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Com isso nos recorda Unamuno, só nos conhecemos conhecendo ao Outro151

.

Não obstante o homem, para se relacionar com o divino, necessita, então, em primeiro

lugar manter a relação com o próximo, pois é este evento que garante o cultivo e o

constante desejo de uma relação perfeita, em que “o meu tu engloba o meu si - mesmo,

sem, no entanto, ser o si - mesmo; o meu reconhecimento limitado se expande na

possibilidade ilimitada de ser reconhecido” 152

, pois a sua imagem e semelhança o

homem fora feito, portanto nada mais justo esta incontrolável vontade de se aproximar e

manter contato com este que é eterno.

Tudo ocorre nos diz Dias, porque existe uma simetria153

entre o Eu e o Tu eterno

absoluto, e todo esse jogo simétrico ocorrer porque entre o Eu e o Tu há um

reconhecimento mútuo.

Agora não nos esqueçamos que cada e particular Tu, abre uma perspectiva ao

que diz respeito ao Tu eterno, ou seja, a cada Tu singular e particular a palavra primeira

se dirige ao Tu eterno.

É por essas e outras razões que devemos nos cuidar para que Outro enquanto

pessoa não seja tratada como um megafone amplificador, mas que seja cúmplice na

busca daquilo que o Outro é para nós.

Sem embargo, todo nosso acesso a esse Outro eterno nos é dado pelo amor,

antes a mim mesmo e ao meu próximo. Pois, somente assim é que o Tu (Deus) pode

chegar a uma realidade real e sentida.

Portanto, o caminho não é amar-nos a nós mesmo, tornando-nos prisioneiros

narcísicos e individualistas, mas amá-lo. Ao fim e a cabo “Deus é Amor, Pai do Amor e

filho Amor em nós” (UNAMUNO,1996 p.162).

Deste modo “todo conhecimento de Deus procede do amor a Deus, e é

conhecimento que pouco ou nada tem de racional. Tudo porque Deus nada tem de

indefinível” (UNAMUNO, 1996 p.162).

151

UNAMUNO, Miguel de. Abel Sánchez una historia de pasión. Versão digitalizada disponível em

http://www.gutenberg.org/ acessado em 07/05/2015 Acessado às 15:45

152 LORENZ, Fernando. A NOÇÃO DE PESSOA EM EMMANUEL MOUNIER. In: Monografia

apresentada à Universidade Católica Dom Bosco – Campo Grande Minas Gerais, 2008.

153 DIAS, José Francisco de Assis. Direitos Humanos: fundamentação onto-teológica dos diretos

humanos. - Maringá, Pr: Unicorpore, 2005 p.387

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E por tanto nos amar “Deus em sua infinita bondade e infinita sabedoria, quis

revelar-se a si mesmo seu mistério e sua vontade e [...] Deus, invisível,, se revela por

causa do seu muito amor”.154

Afinal, dizia Mounier:

“La relación del yo con el tú es el amor, por el que mi persona se descentra

de alguna manera y vive en el otro aunque poseyéndose e y poseyendo su

amor. El amor es la unidad de La comunidad como la vocación es la unidad

de las personas”.155

3.3 Pessoa: Realidade ou Ficcção?

Frente a tudo nos resta tão só uma única questão: “Que é o homem Senhor para

vós? Exclama o salmista, para dele assim vos lembrardes e o tratardes com tanto

carinho? Pouco abaixo de Deus o fizestes, coroando-o de glória e esplendor” (Sl 8, 5-6)

Essa é uma pergunta que fundamentaliza toda a filosofia de Unamuno, e a ela o

mesmo responde “Todo homem, toda mulher é um ser que está em busca de si

mesma”.156

Unamuno define, portanto como pessoa, o homem. Aquele que é de

carne e osso. Sendo assim a pessoa unamuniana é aquela que desempenha um papel

tragicômica da história, é, pois, o personagem que o homem representa em sua vida real.

Não obstante a ideia de pessoa, no pensar unamuniano, explica Moelleda se

refere ao conteúdo espiritual do indivíduo. No entanto em Unamuno é estritamente

difícil fazer a separação do homem real, do homem personagem. Para tal confirmação

temos Augusto Pérez, que é, pois, segundo estudiosos um retrato, uma personagem da

vida interior (sentimental/intelectual) de Miguel de Unamuno.

É neste cenário que encontramos dúvidas, dificuldades em distinguir o homem

real de carne e osso, da vida interior de um personagem que se torna tão real quanto seu

criador.

154

Cf. CONCÍLIO VATICANO II, Constituição Dogmática sobre a revelação, n° 2

155RUIZ, Antonio. Emannuel Mounier. In: Instituto Emannuel Mounier – Coleção Clasicos Basicos del

Personalismo; n° 3 p39. –Disponível em www.mounier.es – acessado em 08/05/2015 ás 15:50.

156 CUESTA, Manuel Sánchez. El personalismo unamuniano: la relación Yo-Outro. In revista

Acontecimiento: disponível em http://www.mounier.es/

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Para que compreendamos melhor, vejamos o que nos diz Unamuno:

“- [...] é preciso confundir o sono com o despertar, a ficção com a realidade, o

verdadeiro com o falso, confundir tudo numa única névoa... a criança ri na

tragédia e o velho chora na comédia.

- É a comedia, Augusto, a comédia que representamos perante nós mesmos,

no que se chama foro íntimo, no tablado da consciência, nos fazendo ao

mesmo tempo cômicos e espectadores. E na cena da dor representamos a dor,

e nos parece um contra-senso que então tenhamos vontade de ri.

- Então, o que é real, o verdadeiro, o sentido?

- E quem disse que a comédia não é real, verdadeira e sentida?

- Ora, tudo é uma coisa, é a mesma coisa. É preciso confundir, meu caro

Augusto, confundir. Aquele que não confunde, confunde-se.

- [...] Ora, você já esta se sentindo como um personagem de drama ou de

novela, homem! Devemos nos concentrar em ser personagens de nívolas!”157

É justamente este jogo de real e irreal que faz de Augusto Pérez um personagem

estático, e inseparável, fazendo com que ele possua as mesmas características de seu

criador D. Miguel – “Volto 158

a insinuar a ideia de que o senhor quem não existe fora

de mim e dos personagens que acredita ter inventado”.

Assim que ao evoluir neste contexto de unicidade, seu Augusto tão certo de sua

existência, pouco a pouco toma para si as crises existenciais de Unamuno159

.

Por outro lado, perceberemos que esta pessoa que cria Unamuno também

vontade160

. Vontade de ser, existir, se movimentar. Pois, onde há vontade há

manifestação de uma personalidade.

Frente a isso declara Unamuno:

“Eu sou o centro do meu Universo, o centro do universo, e em minhas

angústias supremas grito como Michelet: Meu eu, estão arrebatando meu eu!

De que serve ao homem ganhar ao mundo todo, se perde sua alma? (Mt 16,

26)”.161

157

UNAMUNO, Miguel de. Névoa. Tradução de José Antonio Ceschin. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira,

1989 p 160-162

158 UNAMUNO, Op. Cit. p.168

159 A este respeito peço aos caros leitores que leiam do capitulo XXXI da Novela a Névoa de Miguel de

Unamuno.

160 MARTÍN, Jaime Vilarroig. El concepto de persona en “Del sentimiento trágico de la vida” de

Miguel de Unamuno, p. 286 In: http://dialnet.unirioja.es Acessado em 11/05/2015 às 15:00

161 UNAMUNO, 1996 P.44

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Neste percurso, fica firmado que para Unamuno “cada homem vale mais que

uma humanidade inteira e que, portanto, não sacrificar cada um a todos, afirma

Gutierrez, a não ser que todos se sacrifiquem por um”.162

O que nos faz recordar que a existência da pessoa em Unamuno se dá na

comunidade, é comunhão163

, e deste modo a cada relacionamento a pessoa acaba por si

tornando-se sujeito, pois como dirá Unamuno onde há subjetividade há também

personalidade164

.

Neste sentido mesmo que Unamuno está sempre utilizando o jogo de vocábulos,

pois, tudo indica que aquele que de fato possui personalidade é capaz de “personificar”.

Portanto, o ato de Personalizar tudo é dado à pessoa, que assim como “Deus o amor

personaliza tudo que ama, e por outro lado Deus é a personalização do Todo é a

Consciência infinita”.165

È justamente neste ponto que o real e o fictício se misturam, afinal “todo real é

racional, e todo racional é real”.166

Tamanha é a mistura entre real e personagem que

tudo se confunde se perde no tempo.

Portanto o que antes era tão só uma personagem ganha vida; dando a ela espaço

e personalidade. O Eu vivo é, pois a pessoa, designando em Unamuno o abstrato e o

real. Tamanha é a selagem que chegamos a nos perguntar se realmente estamos vivos?

Neste caso vemos a Augusto, indagar:

“– Augusto terminou em meio a uma calma terrível [...] queria acabar

consigo mesmo [...] mas antes de levar a cabo sua intenção, como o náufrago

que se agarra s uma pequena tábua, ocorreu-lhe conversar comigo, autor

deste relato.

[...] – Em seguida começou a me contar de sua vida e suas infelicidades.

Interrompi-o dizendo que não precisava contar-me tudo aquilo das suas

vicissitudes da sua vida eu sabia tanto quanto ele. E demonstrei, citando os

mais íntimos pormenores e até aqueles que ele acreditava serem os mais

secretos.

162

GUTIERREZ, Jorge Luis. A “fome de imortalidade” no pensamento de Miguel de Unamuno.

Artigo em pdf disponível em www.mackenzie.br - acessado em 09/05/2015 ás 14:40.

163 MARTÍN, op. Cit. p.288.

164 Ibidem, p287.

165 UNAMUNO, 1996 p. 134

166 PELENCIA, Oscar González. El tema de la personalidad en la obra narrativa de Miguel de

Unamuno.Un estado de la cuestión. In: Boletín de la Real Academia de Buenas Letras de

Barcelona,2002 vol. 48 – Disponível em http://www.raco.cat/ ; Acessado em 11/05/2015 ás 14:20

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74

[...] – Não se mexa! – Ordenei.

_É que você não pode se suicidar, mesmo que o pretenda.

_ Como?

_ Para se matar é necessário que esteja vivo!

_É claro?

_ E você não está vivo!

_ Como? Não estou vivo? Por acaso morri?

_ Não homem, não! – respondi – Antes disse que você não estava acordado

nem dormindo, e agora digo que não está nem morto nem vivo

- A verdade, querido Augusto – é que você não pode se matar porque não

está vivo, e não está vivo e muito menos morto, porque não existe.

_ Você só existe como uma ficção. Você pobre Augusto, nada mais é que

produto de minha fantasia e das fantasias dos meus leitores que lerem o relato

de suas fingidas venturas e desventuras que eu escrevi. Você nada mais é que

um personagem de novela, ou de nívola... ”167

Assim que drama e personagem, novela e homem168

, todos se tornam um;

dificultando-nos a identificação de quem é autor (pessoa) e quem é personagem. E que

por fim o personagem não passa de tão só parte de uma leitura.

Deste modo que o autor possui a força, a capacidade de criar seus personagens.

É também o amor capaz de criar vínculos com as pessoas, ou até mesmo de destruir

com tudo que a mesma conquistou.

Tão evidente que o papel do autor permite que o leitor saiba que Unamuno é real

e que existe seja aparte ou envolvido bem adentro de sua novela. Sua existência é um

tema de muitas de suas novelas. E tamanho é o envolvimento de Unamuno nas novelas

que acaba não fazendo distinção daquilo que é Unamuno, seus afetos, seus medos. Do

que venha a ser o personagem, que é capaz de sentir e vivenciar as dores e amores do

próprio autor, possuindo assim suas mesmas características e assumindo sua

personalidade.

O que Unamuno nos tenta deixar claro, é que tudo em nós faz parte do Outro, até

mesmo nossa maneira simples e singela de amar. Basta que nos deixemos mergulhar em

nosso mundo.

Por outro lado, nos alerta que não é possível colocar todas as culpas e forças no

personagem, pois o mesmo é reflexo daquilo que sou. Portanto, na medida em que eu

me aproximo de mim mesmo, serei capaz de me abrir e me aproximar de outrem que se

167

NÉVOA, op. Cit. p.167-168

168 UNAMUNO, 1989 p.162

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75

assemelha ou aproxima de mim. Podendo assim amá-lo, senti-lo, pois este é a

verdadeira pessoa; aquela que se realiza de um todo no amor e para o Amor.

3.4 Um caminho, um encontro: a pedagogia.

“Filosofar consiste en llevar a cabo una hermenéutica de la vida y los afectos,

tematizar las inquietudes más profundas del ser humano y ponerlas de

manifiesto, expresarlas para que cada individuo pueda identificarse con ellas

y entienda que son algo compartido con todos los demás. Cada ser humano

emprende una búsqueda para «encontrarse a sí mismo y para encontrar, con

él, a todos los seres humanos que a su vera sufren y gozan» (Ferrater Mora,

1985, 36).”

Assim como o ato de filosofar, é o amor. Pois é ele, uma hermenêutica, uma

elucubração da vida. È por meio da pedagogia do amor que Unamuno encontra uma

válvula de escape, um meio pelo qual os homens pudessem não só se encontrar consigo

mesmo, com o universo, mas também com todos que estão a seu redor buscando em

particular manter um vinculo de proximidade.

Para isso que ao longo de sua caminhada e com tais preocupações que Unamuno

em 1902 escreve sua segunda novela Amor e pedagogia. Uma estupenda novela a qual

perceberemos com clareza que o amor triunfará, pois para Unamuno é o amor o meio

mais seguro e amplo para se alcançar a felicidade ainda que custe muito.

Deste modo, a psicologia a ser usada nesta novela, afirma Julia Barella é que a

“vida é superior ao homem e suas políticas e que o amor como sentimento dos

sentimentos é superior a lógica” 169

, Neste sentido somos sempre indagados pela

questão: O que é o amor do qual fala tanto os poetas? Para isso nos diz Unamuno “a

poesia é a virtude, o amor, a piedade, o afeto, o amor à pátria, o infortúnio, é você, é

seu amor”... (UNAMUNO, 2011 p. 108). São eles os poetas que possuem a capacidade

de transmitir com emoção e verdade o mais puro e verdadeiro sentimento do homem.

Ao mesmo tempo declama o Poeta:

O amo é uma planta e das mais preciosas virtudes,

Pesado parecia, quando só nos céus existia.

Até que na terra se derramou.

169

BARELLA, Julia.Miguel de Unamuno: Amor y Pedagogia. Alianza editorial: Madri, 2000

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76

Como espírito leve como pena,

Desde que carne e sangue se revestiu.

Ligeiro e penetrante como ponta de agulha. 170

A esta altura, tamanha é a preocupação de Unamuno com a educação e com o

homem em suas relações, que parte de seu pensamento da maturidade, está imbuído de

reflexões que nos permitem adentrar na intimidade do homem.

Sem embargo a “existência não nos pertence, mas sim a vida. Do mesmo modo,

o amor não pertence a mim, mas ao homem” ( TONETTI, 2013 p. 28). O que nos

revela Unamuno neste trajeto é que não vivemos sozinhos. A figura do outro é de

extrema importância, pois só existimos sob o olhar daquele que nos amam.

Em outras palavras, o amor como pedagogia de encontro e esmero é expressão

em seu sentido de força, e luta contra a morte, contra o nada. O amor é o caminho que

nos faz perceber que para existir é necessário amar, e para amar é indispensável morrer.

Sem muitos rodeios, o amor é o caminho pedagógico que leva o homem a

desfrutar e conhecer aquele que sou no mais íntimo de mim. Pois, para Unamuno todo

aprendizado nasce de uma amarra entre a vida e os sentimentos. A essas alturas nos

deparamos com o pensamento de Gaona que diz:

“Puede uno tener un gran talento […] y ser un estúpido del sentimiento y

hasta um imbécil moral» (Unamuno, 2005, 115). No basta con acumular

conocimientos, sino que el pensamiento debe ocuparse primordialmente de la

vida en su especificidad y tomar en consideración todas las dimensiones

afectivas que han sido olvidadas por los discursos científicos y filosóficos

tradicionales. «La razón es enemiga de la vida» (Marías, 1968, 14) porque

«la inteligencia, al intentar pensar la vida, la mata y sólo conoce su cadáver

inerte» (Marías, 1968, 15)”.171

Assim, portanto, fica declarado que todo conhecimento sem fundamentos sólidos

não possuem valor. Da mesma maneira o amor, quando não está apoiado em si mesmo e

no outro não há possibilidades de sobrevivência. A este respeito concordava Mazzini ao

dizer:

170

LEWIS, C.S. Alegoria do Amor: um estudo da tradição medieval. Tradução de Gabriele

Greggersen – São Paulo: È realizações editora, 2012

171 María Ángeles Goicoechea Gaona ; Olaya Fernández Guerrero. Filosofía Y Educación Afectiva En

Amor Y Pedagogía, De Unamuno. In: Revista Inter-Universitária, Vol. 26 n° 1. Disponível em

http://revistas.usal.es/ acessado em 11/05/2015 às 14h00min.

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77

“Embaixo de meu coração encontro cinza e um lar apagado. O vulcão

completou seu incêndio e dele só restam o calor e a lava que se agitam na

superfície, e quando tudo estiver gelado e as coisas tenham se cumprido não

restará nada – uma lembrança dos meios que deveriam ter sido utilizados

para a felicidade e que ficaram perdidos na inércia dos desejos titânicos

rechaçados desde o intimo, sem que nem ao menos pudessem se derramar

para fora, que minaram a alma de esperanças, de ansiedades, de votos sem

frutos... e depois sem nada”. 172

Em tempos modernos como o nosso, tudo tem perdido seu sentido, pois já não

mais valorizamos o que somos e sentimos e, mais bem aquilo que possuímos. Mas

Unamuno nos mostra que amar está acima de qualquer outra coisa, é como afirma

Brosch “quem ama tem olhos para o outro, importa-se, interessa-se, percebe sua

existência, tem a capacidade de sentir o que está oculto, se condói com que está além

do seu próprio eu”.173

e mais, é a partir do amar e ser amado que “o homem que sentir é

ver no outro suas limitações, suas forças e ao mesmo tempo um ato de conhecimento

próprio”174

.

Assim que:

“El amor precede al conocimiento,y éste mata aquél» (Unamuno, 2001, 39).

El amor se aleja de la razón y se acerca a la vida en toda su intensidad y

dramatismo, pues «lo que perpetúan los amantes sobre La tierra es la carne

del dolor, es el dolor, es la muerte» (Unamuno, 2005, 275). El amor más

intenso es el que surge de compartir el dolor, se llega a amar verdaderamente

a otra persona cuando se pone en juego esa empatía que permite ver al otro

como alguien que es semejante a mí, que sufre igual que yo”.175

E acrescenta Unamuno:

“[...] el amor abre el camino hacia un nuevo modo de conocimiento del

mundo que ya no se basa en la pedagogía sino en los afectos: «Para amarlo

todo, para compadecerlo todo, humano y extrahumano, viviente y no

172

UNAMUNO, Miguel de. Como escrever um romance. –Tradução de Antonio Fernando Borges. São

Paulo: É Realizações editora, 2011 p.86

173 MICAI, Barbara Aparecida Brosch. Fé e razão, o conflito: a relação da esperança com a fé e a

caridade na filosofia de Miguel de Unamuno. São Paulo: Editorama, 2009 p.58

174Ibidem, Idem

175 María Ángeles Goicoechea Gaona ; Olaya Fernández Guerrero. Filosofía Y Educación Afectiva En

Amor Y Pedagogía, De Unamuno. In: Revista Inter-Universitária, Vol. 26 n° 1. Disponível em

http://revistas.usal.es/ acessado em 11/05/2015 às 14h00min.

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viviente, es menester que sientas tododentro de ti mismo, que lo personalices

todo.” 176

Fica-nos, pois, evidenciado que o amor é o único caminho para um

autoconhecimento. No entanto é necessário que o homem mergulhe naquilo que há de

mais íntimo, e valioso que é o vosso coração, e se abra para novos mundos, para um

mundo do amor e do encontro. Ao fim, quem ama personifica aquilo que ama e busca

no outro sua razão de viver.

176

Ibidem

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3.5 Considerações Finais

“Só o amor conhece o caminho da verdade, da felicidade, da

beleza... Deus. A eles só se chega pelo amor”.177

Assim como em Santo Agostinho; vimos também, muito bem estampado na

filosofia concreta de Miguel de Unamuno que o amor como virtude e força é o caminho

que leva aos homens ao conhecimento de si mesmo em relação ao outro.

Para isso, se faz necessário um ardo caminho. Caminho este que muitas vezes

está repleto de espinho, mas já afirmara Unamuno só se pode amar sofrendo. Sem

embargo, a relação entre eu e o Tu se faz precisa na medida mesma que me relaciono e

coloco no outro aquilo que sou. Não se trata de projeção, mas de contemplação, de

completude naquilo que o outro pode me oferecer.

Consequentemente essa relação entre mim e Tu quando tratada de maneira

correta, perpassa todos os obstáculos, me levando assim a um amor transcendente a um

Tu que é capaz de se eternizar no tempo. É justamente este tu que me permitirá lutar e

com o último fôlego da vida exclamar: “Não quero Morrer!” quero viver, me eternizar

no tempo. Ser imortal.

O amor para Unamuno se torna, portanto, o meio mais viável e humano para a

integração do homem. Deste homem de carne e osso.

Não obstante o amor é fio de ligação para uma profunda e duradoura relação

entre o Eu, o Outro, a natureza e Deus. È, pois, o amor a força motora de unicidade e

comunhão entre os povos. O que faz enfim do amor o mais trágico na vida dos homens

é sua vontade de ser.

A saber; o amor possui o fundante missão de equilibrar o sentimento e a razão.

Pois só ele, o amor, pode evocar e fazer visíveis a força que se faz marcada em nossa

alma.

O que Unamuno aqui nos mostrou que todos nós, independente da raça ou credo,

não podemos viver sozinhos. Somos seres sociáveis e que precisamos do outro. Mas, no

entanto essa ligação só nos é dada pelo mais puro e brando sentimento.

177

GONZÁLES OSA, Paulino Sahelices. O amor, fio condutor. In: Cadernos de espiritualidade

agostiniana, vol 2, - FABRA (Federação Agostiniana Brasileira), Petrópolis, RJ. 2011 p. 11

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Talvez seja justamente, devido essa capacidade de ser que o amor carrega, como

marca, que faça dele o que há de mais trágico na vida dos homens.

Como fio condutor, o amor tem o dever de ligar e unir o terreno com o divino.

Para isso o caminho percorrido que o torna pedagógico e caritativo, e aberto para

aqueles que necessitam de um pouco mais de amor.

Domado por sua fome de imortalidade, Unamuno se agarra no homem e em suas

virtudes. Pois quando amamos somos capazes de afugentar de nós todo o mal. E é pelo

amor que o homem personaliza tudo que ama.

Ao nosso tempo, banalizado, o amor é a única ferramenta de acalmar os

corações e fazer com que os homens se redescubram como pessoas, e abandonem a

caricatura de ser apenas um personagem e se tornem protagonistas de suas próprias

vidas e vontades, nem que para isso deva morrer.

O Amor Unamuniano é amor puro, desnudo livre, assim como diz o poeta

Gutiérrez:

Nua...

somente vestida

com a eternidade.

[...] nua existência.

E teu corpo nu

Se expandiu por minha carne

Como um cândido rio

de felicidade de nua

Nua

sem fronteiras

Nua

Eras bela nua

Airosa nua

Formosa nua

Verdadeiramente nua

Eu te amo nua.178

Amar é, portanto, caros leitores, se perder nas estradas mais longínquas do

conhecimento humano. É se perder na beleza nua do Outro. É olhar com os olhos livres

e limpos. Compreendendo o outro em sua totalidade, em sua natureza.

178

Para ler o poema completo acessar http://revistapandorabrasil.com/pagina literaria

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CONCLUSÃO

Longe de esgotar o tema do amor, nossa missão aqui fora demonstrar como o

amor é compreendido por Unamuno. Contudo mergulhamos em um mundo que

perpassa a nossa realidade. Unamuno nos mostrou que o amor é como uma música que

nos leva a uma viagem muitas vezes sem volta. No entanto a cada viagem descobrimos

que ama é se redescobrir a cada instante é se fortalecer no caminho que nos é dado

gratuitamente.

Afinal, frutos da criação divina que total e puro amor. Somos também nós

convocado a amar sem medidas, a nos lançar no mar da vida acreditando que tudo se é

possível quando se ama.

Unamuno também nos ensina que o amor não é tão só um sentimento, mas sim

uma abertura, um se despojar do narcísico que há dentro de cada um de nós e mergulhar

na bela que há no outro, pois a medida que eu amar a mim mesmo como a um estranho,

saberei como me abrir e amar aquele que de fato é meu próximo.

Portanto, toda a filosofia unamuniana está embasada no homem. O que significa,

na vida ainda que o mesmo a detestasse, pois viver desembocaria em morrer. E seu

esforço estava todo voltado pelo não querer morrer.

Sem embargo, envolvido por um apaixonado pela vida, e pela beleza que nela

contém. Pois fomos criados por Deus para amar e sermos amados.

Contudo Unamuno nos dirá que o verdadeiro amor consiste na admiração, na

contemplação da pessoa amada, deste modo antes de amar deve se passar pelo

sofrimento, mas também um sofrimento que o leve a pensar e a amar a si mesmo, pois o

amor, dentre os muitos sentimentos, é um dos poucos que não envelhece, e está sempre

em movimento, e mais: é o sentimento que almeja o longe, e traz consigo o eterno.

Em detrimento disso, em geral o amor implica e abarca em si múltiplas escolhas,

as quais indubitavelmente são individuais, refletidas no outro, que nos permite olhar o

outro como nosso bem, e ponte para que nos reconheçamos em nosso mais profundo Eu.

Para esse novo mar de abertura rumo ao outro se faz mais que urgente olhar para

dentro de nós mesmos e nos perguntar: Eu me amo?

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Se formos capazes de com firmeza atestar isso, poderemos dizer que somos aptos

para amar. Afinal amar é atirar as cegas, e se lançar no abismo e esperar pela queda.

Amar é entrega, é doação.

Também nos mostrou Unamuno que o amor é transcendente a tudo aquilo que

para nós se parece sem sentido. O amor assim, como as rosas carregam seus espinhos.

Espinhos os quais vão sendo abandonados pelas estradas na medida em que com ele vou

tornando-me um.

Em meio a tantas dores e medos, Unamuno trás algo de inovador a sua filosofia, a

figura do homem que é capaz de decidir pela própria razão aquilo que é de melhor para

si. Ensina-nos que sim é possível o homem concreto ser de carne e osso e ao mesmo

tempo fruto de sua ficção, de seus sonhos, afinal sonhar também é amar.

Agora nos resta a nós amigos leitores, traçar nosso próprio caminho. Nenhum

filósofo esgotará ou sanará as nossas dores existências, mas podem eles nos ajudar a

compreender o mistério da vida, indicando-nos meios para que superemos os nossos

medos.

Consequentemente para Unamuno o amor é aquele que engloba o universo,

aquele que busca uma felicidade além do mundo sensível, um sentimento capaz de

ultrapassar as barreiras humanas. Sendo o amor o sentimento mais trágico de nossas

vidas, pois o homem busca na totalidade amar e ser amado, onde o mesmo se submete a

imensuradas torturas para que se alcance tal sentimento. E assim termino dizendo que o

amor é o que há de mais radical neste planeta, pois, o mesmo é capaz de gerar desde

uma perpétua e dócil felicidade, a uma destruição total. Pois o preço do Amor é amar

sem medidas.

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