Contratos existenciais: contextualização, conceito e interesses ...
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1
FACULDADE DE SÃO BENTO
LICENCIATURA PLENA EM FILOSOFIA
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
GIOVANE RODRIGUES DOS SANTOS
O CONCEITO DE AMOR NO CAPÍTULO VII DO
SENTIMENTO TRÁGICO DA VIDA DE MIGUEL DE
UNAMUNO.
São Paulo
2015
2
GIOVANE RODRIGUES DOS SANTOS
O CONCEITO DE AMOR NO CAPÍTULO VII DO
SENTIMENTO TRÁGICO DA VIDA DE MIGUEL DE
UNAMUNO.
Monografia apresentada ao Curso de Licenciatura Plena em
Filosofia da Faculdade de São Bento, como requisito parcial
para obtenção do título de Licenciado em Filosofia.
Orientador: Prof. Dr. Jorge Luis Gutiérrez,
São Paulo
2015
3
BANCA EXAMINARORA
São Paulo, 30 de Junho de 2015
____________________________________________________________
Prof. Dr. Jorge Luis Gutiérrez - Orientador
Faculdade de São Bento
__________________________________________________________
Prof. Drª. Maria Carolina Alves Santos - Examinadora
Faculdade de São Bento
_________________________________________________________
Prof. Dr. Franklin Leopoldo e Silva - Examinador
Faculdade de São Bento
4
Dedico este Trabalho as Mulheres da minha Vida:
Eloiza Rodrigues dos Reis Santos,
Josiane Rodrigues dos Santos
Lourdes Rodrigues dos Santos
E a meu Grande Amigo:
Jaspio Alencar de Souza
5
AGRADECIMENTOS
Agradecer é simplesmente reconhecer a presença significativa de pessoas que
imprimiram as suas marcas para a concretização deste trabalho, dentre elas e com elas
agradeço a Deus pelo dom inefável da minha existência humana e pelos momentos de
dificuldades e crise que me levaram a descobrir aquilo que realmente importa: amar.
Externo minha gratidão a minha Comunidade Religiosa Ordem dos Mínimos por
haver proporcionado esses anos de estudos. Em modo especial a meus Formadores
Padre Frei José Antonio de Lima, O.M e Padre Frei Leonardo Calazans, O.M, pelo zelo
e cuidado para com os formandos, e pelas mais variadas discussões.
Destaco e agradeço de maneira satisfatória a atuação do meu orientador Jorge
Luis Gutiérrez, este que se fez solícito em suas considerações e, a partir disso, soube
extrair do ordinário o extraordinário. A sua atenção, espontaneidade, competências
engenhosas fizeram com que os caminhos deste singelo trabalho fossem traçados e
delimitados. Deixo registrada a minha profunda e sincera gratidão, não somente por
aquilo que ele fez, mas por aquilo que ele é.
Agradeço a meus familiares por toda a paciência e carinho com que me
acompanharam nesta longa jornada, de modo especial minha mãe Eloiza, que sempre
esteve a meu lado nos momentos mais difíceis.
Aos meus amigos pela colaboração e apreço, em especial ao Frei Leandro de
Queiroz Albuquerque, O.M e Luiz Gustavo Xavier, por me suportarem e
insistentemente me incentivaram e fizeram com que me empenhasse e concluísse o
presente trabalho.
Também agradeço aos amigos de caminhada na Faculdade, em especial Irmã
Luciana Rodrigues, Rogério Santana e Andrea Martinez, pela companhia e longas
discussões filosóficas e existenciais, no período de faculdade.
Todo carinho a minha querida amiga Maria del Carmen, pelo seu carinho e
disponibilidade em me ajudar na redação e conferência do texto e pela sua bela
companhia.
Ao amigo Padre Luiz Carlos Pintenho, da Diocese de Umuarama, que com
generosidade e fé me cedeu um espaço em vossa casa para a elaboração deste trabalho.
6
A grande Amiga Eliane Francisca, pelo carinho e apoio que tem me dado nesta
nova etapa de minha vida laical. Estendo meus Agradecimentos a minha Terapeuta Dra.
Maria Ondina, pelas longas conversar e partilha. E também a minha estimada Amiga
Alejandra que com todo seu carisma e paciência me ajudou neste trabalho, com as mais
variadas discussões e partilha de conhecimento.
E por fim, e não menos importante agradeço a meu amigo e Professor Lailson
Castanha, pela oportuna companhia durante os estágios, e pela partilha de
conhecimentos.
7
DESMAYARSE
Desmayarse, atreverse, estar furioso,
áspero, tierno, liberal, esquivo,
alentado, mortal, difunto, vivo,
leal, traidor, cobarde y animoso;
no hallar fuera del bien centro y reposo,
mostrarse alegre, triste, humilde, altivo,
enojado, valiente, fugitivo,
satisfecho, ofendido, receloso;
huir el rostro al claro desengaño,
beber veneno por licor süave,
olvidar el provecho, amar el daño;
creer que un cielo en un infierno cabe,
dar la vida y el alma a un desengaño;
esto es amor, quien lo probó lo sabe.
Lope de Vega
8
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo adentrar no universo do pensamento de
Miguel de Unamuno, um filósofo espanhol, pré-existencialista que busca responder aos
inúmeros problemas existenciais de sua época.
Abordaremos o tema do amor contido no capítulo VII de sua obra filosófica “Do
sentimento trágico da vida nos homens e nos povos”. Obra a qual nos mostrará que o
amor é o mais belo e ao mesmo tempo o mais trágico dos sentimentos, e que só é
possível amar por meio do sofrimento.
Veremos também que o amor é porta de abertura para o outro, é um verdadeiro
ato de compadecimento e reconhecimento no outro, em meu próximo,aquilo que sou.
Afinal o amor é dor, angústia e compaixão.
E por fim nos leva a um caminho transcendente, de abertura para Deus que é
amor. E descobrimos a sua pedagogia: ”Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei”
( Jo. 13,34)
Palavras-chave: amor, dor, compaixão, outro, tragédia, homem.
9
RESUMÉN
El presente estudio tiene por objetivo introducirnos al universo del pensamiento
de Miguel de Unamuno, un filósofo español, existencialista que busca contestar los
problemas de su tiempo.
Abordaremos sobre la temática del amor contenida em el capítulo VII de su obra
filosófica “Del sentimiento trágico de la vida en los hombres y en los pueblos”. Obra
que nos mostrará que el amor es el más bello y al mismo tiempo el más trágico de los
sentimientos, y que solo es posible amar por medio del sufrimiento.
También veremos que el amor es la puerta de abertura para el otro, porque es un
verdadero compadecimento, y reconocimiento del outro como mi prójimo Afinal el
amor es dolor, angustia y compasión.
Y por fin, el amor nos lleva a un camino transcendente, hacia Dios que es amor,
y a partir de esto descubrimos la pedagogia del amor:”Que os ameis unos a otros; como
yo os he amado” ( Juan 13,34)
Palabras Claves: Unamuno, amor, dolor, compasión, otro, tragédia, hombre
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO-------------------------------------------------------------------11
CAPITULO I
1. Uma introdução a filosofia de Miguel de Unamuno----------------- -14
1.1 Breve histórico-------------------------------------------------------------14
1.2 A filosofia de Dom Miguel-----------------------------------------------23
1.3 Unamuno novelistas-------------------------------------------------------26
1.4 Unamuno ensaísta---------------------------------------------------------32
1.5 Considerações-------------------------------------------------------------35
CAPITULO II
2. Unamuno e o conceito de amor no sentimento trágico da vida nos
homens e nos povos------------------------------------------------------37
2.1 Amor, desejo, dor e compaixão---------------------------------------37
2.2 Amor consciência: um Deus escondido-------------------------------46
2.3 Considerações------------------------------------------------------------56
CAPITULO II
3. Amor a pedagogia das relações------------------------------------------58
3.1 Amor: o Eu e o Tu---------------------------------------------------------58
3.2 O Tu eterno e absoluto----------------------------------------------------68
3.3 Pessoa: realidade ou ficção?---------------------------------------------71
3.4 Um caminho, um encontro: a pedagogia-----------------------------75
3.5 Considerações--------------------------------------------------------------79
CONCLUSÃO--------------------------------------------------------------------81
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS--------------------------------------83
11
INTRODUÇÃO
“O amor é como a morte não tem hora para chegar, não anuncia [...] O amor
é esta surpresa que a existência nos revela. Então amamos quando nada
queremos; e quando já nem esperamos. Eis então que o amor aparece”
(TONNETTI, 2013 p. 68-69)
Desde os primórdios, a mais alta meta da indagação filosófica é o conhecimento
de si mesmo. Com Sócrates alcança grande potencialidade, e apesar das controvérsias
entre diferentes tendências dos pensadores, esse objetivo permanece invariável. O
imperativo do autoconhecimento também constitui o cerne da investigação de Miguel
de Unamuno.
Desde modo que Unamuno se preocupa há seu tempo em entender os estados
anímicos do ser humano. Em especial Unamuno verifica a causa do amor no homem, e
percebe que o mesmo é quem por sua vez dita às regras, a partir disto Unamuno atesta
que o amor é o sentimento dos sentimentos, aquele que é capaz de levar o homem, de
um estado estrondoso de alegria e júbilo a uma vasta e profunda angústia.
Por conseguinte, o amor trás arraigado em sua natureza, uma história que
perpassa o nosso tempo e muitas vezes nosso entendimento, tudo pelo fato de que o
amor é força que une e separa; que constrói e destrói; que acalma e avassala, pois sendo
como é pura vontade de ser.
Sem embargo sabemos que nós, seres humanos, fomos criados no amor e para o
amor. No entanto, não podemos esquecer que o amor é o único capaz de salvar e recriar
a cada instante a criação divina. Pois o amor é uma experiência compartilhada com o
outro em sua totalidade.
Não podendo ser de outra maneira este trabalho é fruto de minhas próprias crises
existências. Pois sempre cresci ouvindo que o amor é quem tudo cura, que tudo suporta,
e que seria ele um mar de rosas. No entanto com o andar da carruagem fui percebendo
que o amor não é toda essa beleza, pois trás em si também a tragédia.
Em razão disso e ao me deparar com a filosofia de Unamuno, pude melhor
compreender as outras facetas contidas no amor. Pois, o grande questionamento feito
por mim era por que somente eu devo amar? Por que não poderia ser eu também
12
amado? Com Unamuno compreendi que o amor não é objeto de troca, mas sim
gratuidade e doação. É assim que procuraremos clarear essas novas e antigas visões,
buscando responder o que é em Unamuno o amor. E como os homens de nossos
tempos, homens de carne e osso lidam com tudo isso.
Para melhor compreensão, acompanharemos no primeiro capítulo um breve
relado da vida de D. Miguel de Unamuno, situando-o em seu tempo e verificando como
ele lidou com os problemas existenciais de sua época. Ele que fora novelista, ensaísta,
filósofo.
Também ainda neste capítulo, acompanharemos como Unamuno com audácia e
personalidade dá respostas ao povo e antes para si mesmo a respeito daquilo que era
sofrimento para o homem. Ademais, veremos que Unamuno renova a literatura de sua
época, criando um estilo próprio de escreve suas “nívolas”. E a partir daí emprega uma
nova filosofia. Uma filosofia do homem concreto e vivo. O homem de carne e osso.
Em continuidade, no segundo capítulo embarcaremos no coração do tema desta
monografia, que é acentuar o amor em D. Miguel. O que vale lembrar que, não
esgotaremos aqui o tema, mas apenas daremos uma visão panorâmica de tal assunto.
É aqui que começaremos a desconstruir o amor meigo, e frágil. Entendendo que
ele é o que há de mais trágico na vida dos homens e dos povos. Para isso Unamuno não
aliviará a barra, fará fortes afirmações, uma delas que para que haja amor, é necessário
sofrer. E quem sabe talvez você não saia como eu frustrado por saber que o amor é
também dor.
Consequentemente em primeira instância, teremos uma visão do amor como se
pensava os antigos, pois segundo Unamuno o amor é vontade de ser. Portanto é o amor
movimento em direção ao outro.
Ainda no mesmo capítulo veremos que o amor é capaz de revelar aquilo que está
no mais íntimo de nossa consciência, a saber, Deus. Pois é dele que provém todo amor
espalhado por nós homens.
Em sequência passaremos ao terceiro e último capítulo, onde adentraremos a um
novo mundo, o mundo do Outro. Pois, como vimos no segundo capítulo a revelação de
13
Deus, agora, portanto, se fará necessário criar um caminho. Caminho o qual me faça
ampliar meus conhecimentos e me abrir para o Outro.
Tal abertura só será possível se eu me abandonar em mim mesmo, descobrindo
em mim aquilo que quero encontrar no outro. Portanto, esse capítulo demonstrará o
amor como uma pedagogia das relações, onde eu me relaciono comigo mesmo, com
Outro, com Deus e com a natureza.
Pois é como diz o velho jargão, para amar o outro, devo antes me amar. E de
fato é assim, pois o martírio, a dor e o sofrimento com razão são passos para amar o
outro. E Unamuno mostrará que no instante que este laço for sendo criado, e fortificado
no verdadeiro sentir aquela visão que o outro é para mim objeto acabará e, passaremos
percebê-lo como Pessoa.
Ainda neste terceiro capítulo discutiremos até que ponto a pessoa é real, ou seria
ela parte da minha ficção? E Unamuno mostrará que o real e fictício se unem e criam a
pessoa. Tudo porque, o Eu e o Outro caminhamos juntos, somos Um.
E por fim, a pedagogia, o modo com o qual o amor nos faz perceber não só a nós
mesmos, mas também ao mundo, e a pessoa que nos cercam. E deste modo nos
deixemos guiar pelo amor, que é lei e norma da vida.
14
CAPÍTULO PRIMEIRO
Uma Introdução A Filosofia De Miguel De Unamuno
1.1 Breve histórico
Miguel de Unamuno Y Jugo, nasceu a 26 de setembro de 1864, na cidade de
Ronda Del Castro Viejo de Bilbao, Espanha. Foi escritor, poeta, romancista, ensaísta,
crítico, literário, filólogo espanhol; reitor, professor de grego, latim, psicologia e ética
na Universidade de Salamanca. Filho de Salomé Jugo e do comerciante indiano Félix de
Unamuno, teve cinco irmãos. Após a morte1 de seu pai em 1870, fica aos cuidados da
avó Benita Unamuno, de quem, como ele mesmo dizia, herdou a coragem para a vida
civil, e da mãe sua religiosidade.
No entanto com a morte de dom Félix, a situação econômica na família
Unamuno começou a se apurar, colocando toda a família em um ritmo de austeridade.
Mas antes mesmo de se estabelecerem em Bilbao de maneira definitiva, seu pai
teria imigrado para o México e desta forma ajuntado certa quantia em dinheiro, da qual
pudera desfrutar sua família2. Além disso, ao regressar do México Dom Félix seu pai
trouxe consigo uma pequena biblioteca, a qual tudo indica ter sido o primeiro contato de
Miguel de Unamuno com os livros, dentre os quais se encontrava de história, de direito,
de ciências, e filosofia.
Passou sua infância em Bilbao, sendo como tal a segunda cidade mais
importante para Unamuno, pois fora ali onde “nasceram as mais brilhantes ideias” 3 e
nesta mesma cidade cursou seus estudos do primeiro ciclo, no Colégio de São Nicolas.
No ano de 1874, aos 10 anos, estava pronto para ingressar no Instituto Vizcaino de
1A morte do pai de Unamuno se deu quando o mesmo tinha apenas seis anos. A morte foi para Unamuno
uma experiência vivenciada como uma descontinuidade abismal e definitiva, que serão retratadas em
poucas lembranças, que serão narradas e sua obra “Como Escrever um Romance”, que é por sua vez,
fruto de uma profunda crise espiritual vivida pelo jovem Unamuno.
2MARTÍNEZ,Izasku. Biografia de Unamuno. In: Seminário Grupo de Estudos Peirceanos (2004) na
Universidade de Navarra - http://www.unav.es/ acessado em 14/03/2015 ás 15:30
3 idem
15
Bilbao, quando presenciou o assédio de sua cidade, durante a terceira guerra Carlista
(1873-1875), acontecimento que o inspirara depois, na criação da sua primeira novela:
“Paz e Guerra” (1897).
Miguel de Unamuno foi o que chamam os franceses de Cartel, uma pessoa de
personalidade forte e de presença marcante em toda Espanha. Deste modo, Unamuno
foi um homem singular em todos os sentidos da palavra. Teve uma presença
significativa em toda Europa e quem sabe, dentre os poucos filósofos espanhóis, junto
com Ortega seu filósofo de cabeceira, a quem mais tarde disse a respeito de Unamuno:
“Miguel de Unamuno um homem em luta, em luta consigo mesmo,
com seu povo e contra seu povo, homem hostil, homem de guerra civil,
tribuno sem partidários, homem solitário, desterrado, selvagem, pregador no
deserto, provocador, irreconciliável, inimigo do nada, aquém nada atrai e
devora desgarrado, entre a vida e a morte, morto e ressuscitado ao mesmo
tempo, invencível e sempre vencido.” 4
Unamuno teve uma dimensão pública favorecida por seu caráter e idiossincrasia
inconfundível. Foi um homem que viveu em constante oposição, chegando ao ponto de
ser exilado por atacar a monarquia espanhola e por encabeçar movimentos ao que se
pareciam subversivos. Um grande pensador, filósofo, um eterno apaixonado pelos
problemas de sua época. Unamuno é considerado um dos expoentes da geração 98, da
inteligência espanhola e considerado precursor do existencialismo em seu país.
Conhecia diversos idiomas, literaturas antigas e modernas e se interessava por
filologia. Seguiu para Salamanca onde morou, até falecer aos 31 de dezembro de 1936.
Recorda-nos Eduardo Portella, que esse aguçado interesse pelos estudos fez de
Unamuno para seu país, um escritor inegociável. Para muitos, Unamuno era
considerado um homem audaz, corajoso. Que lutava por aquilo que mais amava sua
Pátria. Em contrapartida muitos acreditavam que isso faria do mesmo um pensador
neutro, no entanto não era5.
4UNAMUNO, Miguel de. Como Escrever um Romance. São Paulo: É realizações Editora, 2011, p.45
5 PORTELLA, Eduardo. Miguel de Unamuno. In: Palestra proferida na ABL, em 7/11/2012, durante a
“Jornada Literária sobre D. Miguel Unamuno”, sob os auspícios da ABL e da Universidade de
Salamanca.
16
Com o passar dos anos essa faceta unamuniana de escritor6, ela vai se pautando
num cenário público e social. Afinal de tudo Unamuno era muito ligado com a situação
real de seu povo, com sua história. Em outros relatos em sua passagem a Portugal as
pessoas o recordam como o “pai do povo”, pois Unamuno nunca se desligou da gente,
de sua realidade e contexto social.
Em 1885, aos 21 anos, já trabalhava como professor de latim e psicologia, em
Salamanca. Consequentemente, aos 22 anos obteve a cátedra de Língua e Literatura
Grega7 pela Universidade de Salamanca. Três anos depois, licenciou Psicologia, lógica
e ética no Instituto de Bilbao. Em Vizccaya discute com Sabino Araña e com poeta
Ressurreicción Maria de Azue. Polemizou com Araña, que iniciava sua atividade
nacionalista. Este o considerava um basco, porém “espanholista8, porque não o
considerava o bilinguismo possível”.
O ano de 1887 é para Unamuno um ano tomado e delineado como, ano da Crise.
Pois, é justamente neste período que Unamuno mergulha em uma profunda crise
religiosa e existencial. Precisamente tomado por essas inseguranças é que Unamuno se
agarra as mais variadas leituras religiosas, em busca de uma real resposta.
As mais variadas crises foram vivenciadas, compartilhadas e suas testemunhas
foram dentre muitas: Pedro Corominas e Leopoldo Alas. Com essas estupendas figuras
Unamuno trocou enumeras Cartas onde se narrava:
“En una de las cartas me explicó como una descarga fulminante que
hirió en una hermosa noche[...] al día siguiente [...] iba a recluirse en el
convento de los frailes dominico de Salamanca, donde estuvo tres días.” 9
6 MIGUEL, CIRILO FLORÉZ. Autobiografia, Filosofia y Escritura: El Caso Unamuno. In: Paidéia
Project on-line - http://www.unav.es
7Alguns comentadores como Eduardo Portella, em seu artigo Miguel de Unamuno, afirmar que a
literatura grega não era uma das especialidades de Dom Miguel, In: In: Palestra proferida na ABL, em
7/11/2012, durante a “Jornada Literária sobre D. Miguel Unamuno”, sob os auspícios da ABL e da
Universidade de Salamanca.
8 MICAI, Barbara Aparecida Brosch. Fé e Razão, o conflito: a relação da esperança com a fé e a
caridade na filosofia de Miguel de Unamuno. São Paulo: Editorama, 2009.
9 SEGURA,José Antonio Serrano.Miguel de Unamuno.Sevilla,2001-In:http://jaserrano.nom.es/unamuno
Acessado em 10/03/2015 às 10:45.
17
Há quem diga que foi após sua noite escura, de angústia e solidão que Unamuno
deu origem a sua mais bela, dramática e solitária novela “San Manuel Bueno, Mártír”;
um romance, uma história de amor que, por sua vez fracassada. Mas, ao fundo disto, é
esta novela uma expressão de desejo e vontade a dar uma resposta àquilo que ele
sempre incitou, a fome de imortalidade10
.
Sem embargo, essas crises ajudaram com que Unamuno ampliasse seus
conhecimentos e alargasse seu campo de escrita, pois a partir daqui Unamuno encerra
um capítulo de sua vida e concretiza desta maneira uma nova e definitiva visão de
pensar e escrever. Pois, o que antes parecia incerto, torna-se certeza, uma força que
movimenta busca. Quero dizer que Unamuno abandona seu estado de dúvida e se aferra
na verdade que é seu maior foco.
Em 1889, aos 25 anos preparava outras oposições, viajou para Suíça, Itália e
França, onde celebrava a exposição universal. Nesta época se festejava a inauguração da
torre Eiffel.
Anos antes em 1883 prestou exame para licenciatura e em 1884 termina seu
doutorado com a tese: “Crítica del problema sobre el orígen y prehistoria de la raza
vasca”.
Em 31 de janeiro de 1891 casou-se com Concepción Lizárraga, de quem estava
enamorado desde menino. Desse casamento procederam nove filhos: Fernando, Pablo,
Raimundo, Salomé, Felisa, José, Maria, Rafael e Ramón11
. Tamanha era alegria que
Unamuno encontrava em seu lar que chega a narrar Salcedo:
“Junto a sua família e a sua mulher encontrava algo de sussego.
Fora, na luta, a polêmica encarniçada da Universidade e outros ambientes da
vida local e nacional”12
Em 1894 abandona as ideias positivistas que cultivara e, em 11 de outubro desde
mesmo ano, ingressa no Partido Socialista Obrero Espanhol de Bilbao (PSOE). Em
10
DOS SANTOS, Milton Arcanjo. A fome de imortalidade na Obra de Miguel de Unamuno. In:
Monografia( Graduação Licenciatura em Filosofia) Faculdade de São Bento, São Paulo, 2009, p.12
11MARTÍNEZ,Izasku. Biografia de Unamuno. In: Seminário Grupo de Estudos Peirceanos (2004) na
Universidade de Navarra - http://www.unav.es/ acessado em 14/03/2015 ás 15:30
12E. Salcedo, Vida de Don Miguel. Unamuno en su tiempo, en su España, en su Salamanca,
Salamanca, Anaya, 1964, p.112-
18
1897 se desencanta e abandona o partido socialista. Preocupa-se com o futuro da
Espanha. Após passar pelas crises religiosas e existenciais se dedica a questões como: a
morte e o nada. Analisando o sentido da vida e seu fim, preocupações que se tornam
angústias vitais do homem.
Anos antes em 1896, em sete de janeiro nasceu Raimundo13
o filho de Miguel de
Unamuno, que por saúde frágil, pois sofria o mesmo de meningite, que mais tarde lhe
gerara uma hidrocefalia, por esse motivo viveu apenas seis anos. Longos anos que
Unamuno sofreu e acompanhou de perto
Em 1900, é nomeado reitor da Universidade de Salamanca. Em 1908, com
44anos, passa suas férias de verão com a família em Espinho, onde conhece Manuel
Laranjeiras, prosador português que tem uma visão pessimista de Portugal. Neste
mesmo ano morre sua mãe Salomé; e em Lisboa são assassinados o rei de Portugal, D.
Carlos e seu filho Luiz Filipe.
Em 1912 ainda em continuidade laboral, lança um conjunto de ensaios os quais
se chamou de “Contra esto y aquello14
”. Um ano anterior em 1911 três grandiosas
obras: “Rosario de sonetos líricos, Por tierras de Portugal y España ySoliloquios y
conversaciones”. E para completar o ciclo no mesmo ano em Portugal é Fundada a
revista “Águia”15
, com a finalidade de fazer com que os Portugueses tomem consciência
de seus valores espirituais e sociais e lutem pelos mesmos. E Teixeira de Pascoaes foi
um dos célebres figuras desta revista.
Em 1913 escreve seu ensaio intitulado: “Dos Sentimentos Trágicos da Vida”.
Ademais a obra “Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos”, foi uma
notável e aplausível produção de Dom Miguel, uma das poucas obras a que Unamuno
escreveu de cunho filosófico. Em suas palavras Julián Marías, “ a temática de
Unamuno(...) é portanto, o homem em sua integridade, que vai de seu nascimento a sua
13
MARTÍNEZ,Izasku. Biografia de Unamuno. In: Seminário Grupo de Estudos Peirceanos (2004) na
Universidade de Navarra - http://www.unav.es/ Acessado em 14/03/2015 às 15:45
14idem
15 DOS SANTOS, Milton Arcanjo. A fome de imortalidade na Obra de Miguel de Unamuno. In:
Monografia ( Graduação Licenciatura em Filosofia) Faculdade de São Bento, São Paulo, 2009.
19
morte, com sua carne, sua vida, sua personalidade e sobre tudo, sua preocupação em não
querer morrer”16
.
Neste mesmo período publicou outras três obras, sendo a primeira um conjunto
de contos intitulados “O espelho da Morte”. Em segunda ocasião escreve as mais
variadas obras teatrais: “La venda y La princesa dona Lambra”.
Já em 1914, aos 50 anos é destituído do Cargo de Reitor, destituição segundo
Ortega, foi por injusta causa17
·. Afinal no verão deste mesmo ano de 1914, nos recorda
Martínez que Unamuno e sua Família estão de viagem, onde passam suas férias em
Portugal18
, e foi durante essas suas férias que de maneira indireta soube de sua
destituição do reitorado de Salamanca.
“En la Plaza Mayor cuelgan los periódicos locales unas carteleras en
que dan avances de las noticias más salientes que van a publicar. Los titulares
de la guerra europea llenan las planas de todos los diarios y la gente tiene
avidez de noticias. Entre los telegramas de la guerra, la agencia de
información lanza una bomba auténtica: Bergamín ha destituido al rector. Y
Unamuno se entera bajo los soportales de la Plaza Mayor de Salamanca, en la
cartelera de un periódico”19
.
Ainda se tratando de sua retirada como reitor da Universidade de Salamanca,
acredita Martínez que tenha sido por desentendimento com as devidas autoridades
políticas, pois se tratava mais afundo de uma convalidação do título de Bacharel a um
aluno colombiano, pedido por Bergamín20
.
De uma maneira sucinta responde Unamuno ao senhor Bergamín – não
compartilhava por ele uma boa admiração. Daí por diante parece que tudo ficou sendo
remoído no mais profundo dos corações, resultando na retirada de Unamuno como
16
MARÍAS, Julián. Miguel de Unamuno. Madri, Espasa-Calpe, 1980, p.46
17PORTELLA, Eduardo. Miguel de Unamuno. In: Palestra proferida na ABL, em 7/11/2012, durante a
“Jornada Literária sobre D. Miguel Unamuno”, sob os auspícios da ABL e da Universidade de
Salamanca, p.18
18MARTÍNEZ,Izasku. Biografia de Unamuno. In: Seminário Grupo de Estudos Peirceanos (2004) na
Universidade de Navarra - http://www.unav.es/ Acessado em 14/03/2015 às 15:45
19E. Salcedo, Vida de Don Miguel. Unamuno en su tiempo, en su España, en su Salamanca,
Salamanca, Anaya, 1964,p185
20 MRTÍNEZ, op. cit.
20
reitor. E Unamuno continua a afirmar desconhecer os motivos claros de sua destituição
do cargo21
, pois segundo o mesmo atuou de maneira correta, e que, portanto seria
injusto o presente fato.
Apesar das mais variadas opiniões, Ferreter Mora nos ajuda a interpretar o
motivo da destituição de Unamuno quando diz:
“Esta destitución tuvo lugar en 1914 (...) y el motivo de ella fue
precisamente la denuncia de la incompatibilidad entre la dedicación
pedagógica y la política. Denuncia curiosa en un país donde más que en una
gran mayoría de otros las fallas de la política son tan graves que es obra de
caridad repararlas por todos los medios que se pueda entre ellos, por la
pedagogía. Sobre todo cuando por "pedagogía" se entiende el trabajo a favor
de la regeneración material y moral del país, el esfuerzo denodado para que el
país se avive, labore, crea, sea”22
.
Um dos grandes erros de Unamuno, dirá Eduardo Portela, foi querer implantar
na política seu pensamento, pois o mesmo já dizia: “A política não pensa, reivindica” 23
.
Consequentemente estes desencontros com as autoridades fará de Unamuno mártir da
oposição24
.
Em 1920, é eleito “Decano da Faculdade de Filosofia e Letras. É condenado a
16 anos de prisão por injúrias ao rei Afonso XIII, porém a sentença não se cumpre. Em
1921 é nomeado vice-reitor, cargo o qual ocupará até 1923 na Universidade de
Salamanca. No mesmo ano faz ataques ao rei da Espanha, D. Afonso XIII e ao ditador
Primo Rivera, quando destituído do cargo novamente é condenado ao desterro no ano
de 1924. Em fevereiro deste mesmo ano, sofre exílio na Ilha de Fuenteventura, e em 19
de julho é indultado. Voluntariamente se exila em Paris, indo posteriormente para
Hendaya, país basco Frances até 1930. Nesta fase desenvolve intensa atividade criativa
e continua a se manifestar pelos jornais contra a ditadura. Com o fim da ditadura publica
21
ibidem
22 J. Ferrater Mora, Unamuno: Bosquejo de una filosofía, Buenos Aires, Editorial Sudamericana, 1957,
23PORTELLA, Eduardo. Miguel de Unamuno. In: Palestra proferida na ABL, em 7/11/2012, durante a
“Jornada Literária sobre D. Miguel Unamuno”, sob os auspícios da ABL e da Universidade de
Salamanca, p.18
24MICAI, op.cit.p.29
21
a poesia: “Teresa”; retornando assim para a Espanha.Em visão de um Unamuno político
escreve Antonio Machado:
“Es Don Miguel de Unamuno la más alta figura de la política
española. Él ha iniciado la fecunda guerra civil de los espíritus; de la cual, la
ha de surgir – acaso surja una España nueva- Yo La llamaria el vitalizador,
mejor diré el humanizador de nuestra vida pública. El más personal de
nuestros políticos [...] Unamuno es antes todo persona, no en el sentido
etimológico de la palabra, porque es, acaso, el único político que no usa
máscaras. En esto mi juício, estriba su enorme fuerza. No será nunca un jefe
de partido o partida, no en caudillo de masas. Para Unamuno no hay partidos,
ni mucho menos mas, dóciles o rebeldes, en espera de cómitre o pastor.
Unamuno es un hombre orgullo de serlo, que habla a otros hombres, en
lenguajes esencialmente humanos. Se dirá que esto no es política. Yo creo
que es la más honda, la más original y de mayor fundamento. Porque ¿Puede
haber política fecunda sin amor al pueblo? ¿Y amor al pueblo sin amor al
hombre y, por ende, respeto a los valores del espíritu que son sus únicos
privilegiados?”25
Com o advento do governo republicano na Espanha, em 1931, quando já contava
seus 67 anos, retorna ao país, onde é recebido com grandiosa festa. Em 12 de abril de
1931 é eleito deputado pela conjunção republicano socialista.
Em 1933, com 69 anos decide não se reeleger-se ao cargo de Reitor de
Salamanca. Só então em 1934 é nomeado reitor honorário e vitalício da Universidade de
Salamanca. Sendo assim implantada a cátedra com o seu nome. Em 1934 já aos 70
anos, é nomeado doutor “Honoris Causa” pela Universidade de Oxford. Como sua vida
se encontra ameaçada, e os dois intelectuais são chamados a uma reunião, a qual
intenção é convencê-los a apoiarem os rebeldes, declarando que representam a defesa da
civilização ocidental e tradição cristã. No mesmo ano Azanã o destituiu do reitorado,
mas, no mês de setembro é novamente reconduzido ao cargo pelo general Cabanellas.
Em 22 de Outubro do mesmo ano é mais uma vez destituído do cargo pelo general
Franco e condenado a prisão domiciliar. E em 21 de novembro escreve a Lorenzo
Guisso, relatando que a Espanha vivia sobe regime do terror e que o ódio imperava,
tanto que os católicos como os nãos católicos, lutavam entre si. Isto o entristecia muito e
25
SEGURA,José Antonio Serrano.Miguel de Unamuno.Sevilla, 2001In:http://jaserrano.nom.es/unamuno
22
o deixava desesperançado quanto ao futuro de seu país. No mesmo ano de 1934, vem a
falecer sua esposa Concepción de Lizarraga. E em homenagem a ela, Unamuno escreve:
“Foi-se minha mulher, que era meu hábito e minha alegria, e me
dava o que mais sempre me faltou: serenidade e alegria de viver. Nunca
acreditou na morte, como eu nunca acreditei na vida.”26
Em 31 de dezembro de 1936, na cidade de Salamanca, morre27
de forma
repentina, na companhia de dois amigos, conforme fez acreditar a imprensa da época.
Em seu funeral foi exaltado como herói falangista, embora não mais fizesse parte desse
movimento, fato que ficou registrado e comprovado na Festa da Razão. Foi justamente
nesta festa em meio à abertura dos cursos acadêmicos da Universidade de Salamanca;
Unamuno indignado pelo cenário de ódio e violência que tomava aquela gente, toma a
palavra e adverte todos ali presentes, dizendo: “Vencereis, mas não Convencereis”.
Vencereis, porque lhes resta força bruta para lutar. Mas, não convencereis, pois
convencer significa persuadir, e para persuadir necessitam de algo que a vocês lhes
faltam: razão e direito. Meio perdido e não sabendo como contestar a tamanhas palavras
o general que coordenava as tropas da infantaria José Millán tão só gritava: “Que Morra
a Inteligência”! Ao que contesta Unamuno: Este é o templo da Inteligência e sou Eu seu
supremo sacerdote. E vocês estão profanando sagrado recinto. Tomado por esse extinto
de morte, três dias antes de falecer Unamuno escreve:
“Morir soñando, si, mas si sueña morir,
La muerte ES um sueño: uma ventana
Hacia El vacío, no soñar; nirvana del tiempo
al fin de la eternidade se adueña.
Vivir El dia de hoy bajo la enseña del ayer deshaciéndose em
mañana
Vivir encaenado a desgana ES acaso vivir? Y esto que enseña?
¿Soñar la muerte no ES matar El sueño?
¿Vivir el sueñono no es matar la vida?
26
MICAI, op. Cit. P.30 27
Em sua morte Unamuno recebe reconhecimento de grandes amigos: “Antonio Machado” e “Ortega e
Gasset” que relatam o que significaria à Espanha a morte deste ilustre homem.
23
¿a qué poner em ello al fin se olvida
Escudriñando el implacable ceño –
Celo desierto del eterno Dueño”28
Unamuno, podemos assim dizer foi uma espécie de existencialista. Uma corrente
a qual abarca Kierkegaard29
, que certamente nos pode levar a ilustres figuras como
Heidegger. Inúmeras foram suas obras e aplausíveis seus pensamentos, os quais sempre
estiveram voltados a questões humanamente existenciais do homem.
1.2 A filosofia de Dom Miguel
Como um bom existencialista, Unamuno entra em conflito com algumas
questões da própria existência humana, assim o filósofo tem por missão fazer com que
as pessoas se deparem com a realidade e busquem na mesma uma saída, se tornando
autônomas e não meros seres submissos a ordens.
Contudo a filosofia unamuniana busca como fim conciliar as necessidades
intelectuais com as emocionais, isto é, “cada homem é produto filosófico de um
homem” 30
. Em outras palavras Unamuno fundamenta sua filosofia na totalidade do
homem. Um homem que vive, com seus conflitos, com suas vontades, com seus vícios.
Concretamente se pode dizer que Unamuno foi uma espécie de existencialista,
ou quem sabe um radical em seu tempo. Títulos os quais não devam ter agradado ao
Dom Miguel, afinal, não existia nada que pudesse deixar Unamuno mais irritado que
títulos, algo que o mesmo rejeitava.
Como dissemos anteriormente, não sendo propriamente existencialista, o
enquadramos como tal. Mas, que espécie de existencialismo? Um existencialismo,
antropocêntrico, onde o homem é o centro, mas não o homem abstrato, e sim, o homem
28
SEGURA,José Antonio Serrano.Miguel de Unamuno.Sevilla,2001-In:http://jaserrano.nom.es/unamuno
29Para ler as obras de Kierkegaard, Miguel de Unamuno teve que aprender o Dinamarquês.
30HOLKE, Ryan.Filosofia de “carne e osso”: o sentido da filosofia em Miguel de Unamuno
no sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Artigo publicado em janeiro de 2010, 14 ̊Edição
da Revista eletrônica Pandora do Brasil - In:http://revistapandorabrasil.com/.
24
de carne e osso31
, um homem que nasce; que sofre e morre. Sobre Tudo que morre32
.
Que joga; que pensa; que sente e que ama. Este é o homem unamuniano,esta é a
filosofia que permeia as veias de Miguel de Unamuno.
Unamuno foi por sua vez um prolífico escritor, onde na devassidão de seus
escritos nos deparamos com poesias, novelas, teatros e variados ensaios filosóficos.
Assim se tratando de suas obras foram as“Do Sentimento Trágico da vida e
Névoa”, as obras que impulsionaram a fama e o prestígio internacional de Miguel de
Unamuno.
A filosofia de Unamuno é uma filosofia polivalente. O que significa que
Unamuno em sua filosofia é capaz de percorrer os mais variados recintos, que vão desde
a criação do homem a questões éticas e políticas.
Sem embargo, como já havíamos relatado a Filosofia de Dom Miguel é a
Filosofia do Homem. Do Homem de carne e osso. De um homem que é capaz de viver
com intensidade a cada instante de sua vida. É a filosofia do homem que possui a
capacidade de se compreender, que possui formas, personalidade, caráter. Que possui
um rosto e não um homem abstrato e perdido nas sombras de seus contornos.
De algum modo é neste homem concreto que Unamuno tenta reafirmar aquilo
que ele é em si mesmo. “O Eu concreto, sou tudo para mim mesmo, ainda que não haja
interesse para o universo, pois o universo só tem sentido em função de mim mesmo. Os
sentidos de minha existência têm dito que sou Eu, em relação ao mundo, não está em
nenhum fim extrínseco, senão está realizado em minha vida. Desta maneira que tal
filosofia não possui nenhum outro objeto ou sujeito que não seja o homem concreto, o
sujeito de carne e osso, que é o sujeito e o supremo objeto desta filosofia” (Unamuno,
1996, p.2).
È justamente neste eixo que Unamuno, nos dirá Ryan, rompe em grande parte
com as grandes tradições filosóficas, pois já não se trata de algo abstrato, escondido.
Trata-se, portanto de uma filosofia do Homem, daquilo que pode ser palpado, que é não
apenas objeto, mas é também sujeito33
.
Em decorrência disto a essência de sua filosofia se dá no homem que vive e não
morre. Pois, é Unamuno o maior inimigo da Morte, e estreito amigo da Imortalidade.
31
UNAMUNO, Miguel de. Do Sentimento Trágico da Vida nos Homens e nos Povos; São Paulo:
Martins Fontes, 1996, p.1
32Ibidem,Idem
33HOLKE, Op.cit.
25
Pois, ele acredita que o homem, no fim de sua vida é capaz de se agarrar em si e não
morrer. Delimitadamente essa questão do imortal está tratada em sua esponsal obra do
sentimento trágico da vida, onde o próprio Unamuno reivindica com toda sua força esse
pedido de imortalidade.
Em consonância a isto, nos dirá Gutiérrez que há em Unamuno esse desejo pelo
imortal. E que, portanto o mesmo crê na imortalidade e na substância da própria alma
em não querer morrer.34
Em suma, a finalidade de sua filosofia é eternizar-se, é viver e viver de modo
que possa ser eterno. Ora, o que o autor traz de radicalmente diferente da tradição
filosófica é que isso não é uma certeza. Com efeito, em nenhum lugar Unamuno afirma
que tal “eternizar-se” seja possível. Antes, é uma aposta, talvez a única resposta viável à
questão fundamental da morte e da existência humana.
Frente à morte e em resposta a ela temos a imortalidade, em que acredita
Unamuno que não deva tão só ser buscada pela fé, mas também pelo próprio desejo de
se eternizar, de ser imortal35
. “Afinal não quero morrer”! Afirma Ele. E se acaso ocorra,
que morra o Eu com toda minha personalidade, meus desejos, meus vícios.
No entanto, acredita Unamuno, que o homem, é produto de uma filosofia, e que
só filosofa pela necessidade que o mesmo possui mediante ao conflito que ele mesmo
tende em buscar e dar respostas a tensões e dramas entre o individual e o coletivo, entre
o espírito e o intelecto, entre a razão e a emoção.Presenteia todas essas questões que
busca responder sua filosofia, Unamuno elabora um extraordinário e poderoso império e
vitalismo que é capaz de antecipar o próprio existencialismo.
Evidente que para Unamuno, a matéria prima com a qual primeiro se depara o
filósofo, é Ele mesmo. Pois, na medida em que este passa compreender e avançar na
compreensão de si, poderá compreender o Outro em sua totalidade. Sendo assim é por
esta razão que sobre a influência de Kierkegaard e de Schopenhauer que Unamuno
abandona o realismo. Afinal de contas nos dirá Jean Cassou em seu texto: Retrato de
34
GUTIÉRREZ, Jorge Luis. A filosofia de Unamuno como reação ao mistério da realidade e da vida
humana e seu destino. Artigo publicado em janeiro de 2010,14 ̊Edição da revista eletrônica Pandora do
Brasil – In:http://revistapandorabrasil.com/ 35
É mediante essa análise e permanente sublimação que Unamuno ele se aferra a ideia de ser imortal. Ao
ponto Maximo em sua obra Dom Quixote, exclamar: “ Eu não quero Morrer”!
26
Unamuno: “Unamuno não possui ideias, é Ele mesmo as ideias”36
. Por aqui já
podemos denotar a força da filosofia de Unamuno e seus argumentos.
Unamuno não foi literalmente um homem moderno. Pois, manifestava sua
carência e sensibilidade para os valores exclusivamente formais, e jamais optou por uma
compreensiva postura mediante os movimentos Literários de sua época.
Consequentemente, muitos autores por constatarem esse seu lado bronco e rude
chegam a identificá-lo com Nietzsche e sua “filosofia do Martelo”. Não é por nada que
Unamuno possui múltiplas facetas em seus escritos. Pois, Ele é capaz de saltar de um
quadro poético, que é percebida na forte necessidade de Unamuno ao narrar sua história,
sua infância, recorrendo à forma lírica; ainda mesmos que a rejeitasse, à uma forte e
construtiva forma de pensar como sua própria filosofia.
No entanto, para que realmente se compreenda a filosofia de Unamuno, se fazem
urgente e necessário, que nos afastemos de tudo aquilo que não é Unamuno. Ao
fazermos isso chegaremos àquilo que é ele mesmo, conheceremos a seu íntimo,
adentraremos ao vazio de sua existência e compreenderemos o homem em sua
totalidade, criando assim um “niilismo espanhol”.37
Entretanto, vastas são as obras e as formas as quais Unamuno se vale para
escreve e conceituar sua filosofia. Mas nos valerá aqui ressaltar dois importantes lados
de Unamuno: O novelista e o ensaísta.
1.3 Unamuno Novelista
As novelas de Unamuno são a projeção literária de suas crises e desejos
pessoais. Cada um de seus personagens é a encarnação de suas férteis ideias. Sem que
nos prescindamos das mais ilustres novelas “Paz na Guerra” e “São Manuel Bueno,
Mártir”, mas a que lhe deu fama internacional foi mesmo sua grande novela “Névoa”,
ou como ele mesmo a chamava: “Nívola”. Todas as novelas, Unamunianas possuem um
caráter melodramático, marcados por seus medos e angústias. Uma vez que a sua forma
poética desprezava a comunicação direta com o leitor38
, aqui em suas novelas Unamuno
elimina toda e qualquer ilusão, ambiente e circunstâncias que possam rodear o homem
36
UNAMUNO, 2011,P.46 37
ibid, p.50 38
Uma afirmação que muitas vezes possa parecer contraditória, pois em sua Novela “Névoa” Unamuno, busca manter um diálogo direto com os leitores, o que soaria contraditória com o escrito acima, mas é de Unamuno percorrer a contradição, para buscar um equilíbrio entre razão e sentimento. E essa evidência de contradição é perceptível pela forte capacidade de Unamuno em tornar-se um com seus leitores.
27
em agonia. Neste sentido a novela de D. Miguel contrasta com as novelas costumeiras,
onde o ambiente das mesmas é o todo. Agora não podemos nos esquecer que as novelas
de Unamuno, foram as primeiras a romper com o realismo Espanhol.
Para Unamuno a pessoa humana não é algo estático, e sim algo dinâmico, em
constante movimento, um puro devir. Por esta razão, que suas novelas nos apresentam
um drama, uma tensão sociológica vivenciadas por seus personagens, que nos
demonstram como a vida vai acontecendo ao longo da imensa estrada.
Evidente que para Unamuno, o personagem não é mera ilusão, ou mera
personagem, mas, é este que possui tanta vida, o tal qual possui o homem de carne e
osso. Dentro desta visão, o personagem de ficção que é por sua vez, sonhado e criado
pelo próprio autor, no entanto, o grande autor que é Deus.
Por conseguinte toda a força que possui o homem de carne e osso também
possuirá o personagem mediante o Deus, autor ao qual ninguém pode se rebelar.
Em sua imensurável e magnífica Novela “Névoa”, por exemplo, o protagonista
se revolta, entra em conflito com o próprio criador, D. Miguel, resistindo morrer, como
é ordenado pelo próprio Unamuno.
“_Penso logo existo, [...] todo aquele que pensa existe, e todo que existe
pensa. Sim, todo aquele que existe, pensa. Existo, logo penso.
[...] Mas logo Pensou: Não, não! Eu não posso morrer! Só morre quem está
vivo, aquele que existe, e eu, como não existo, não posso morrer...sou
imortal! Não existe imortalidade como a daquele que, como eu, nunca nasceu
e não existe. Um ser de ficção é uma ideia, e como uma ideia sou sempre
imortal...
_Sou Imortal! Sou Imortal! – gritou Augusto.” 39
Com isto, podemos nos perguntar: tudo quanto sonhamos é real? Tudo aquilo
que me circunda seja realidade ou ficção fará parte de mim?
É claro o paradoxo aqui presente. Sonhamos o que vivemos, Deus sonha a cada
um de nós, e nós sonhamos nosso próximo, criamos nossos próprios personagens que
são produtos de nossa imaginação. Afinal de contas a vida é um eterno teatro que não
nos permite ensaios e quem sabe, não seja o teatro a própria vida, onde se contenha mais
realidade que a própria vida. O homem se aterroriza em saber que irá morre, portanto,
não quer morrer. Almeja, sonha com ser imortal, imortalidade a qual só se é possível
criando.
39
UNAMUNO, Miguel de. Névoa. Tradução de José Antônio Ceschin – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989, p.174
28
“_Bem o senhor de Unamuno também é coisa de livros... Todos nós
somos... E ele vai morrer, sim morrerá também, mesmo que não queira...
Morrerá! E será essa minha vingança. Não me quer deixar viver? Pois
morrerá, morrerá, morrerá! [...]
_Dormir... dormir...sonhar..
_Morrer... dormir..dormir...sonhar...qualquer coisa!
_Penso logo existo. Existo, logo penso... Não existo não!Não
existo... minha mãe! Eugenia... Rosário... “Unamuno...” 40
O que Unamuno ressalta em tudo isso é que a cada passo que se escreve, e que
lemos tais escritos, convidamos a outros a participar de nossos sonhos, de nossa vida, de
nossa eternidade, daquilo que para nós é real. È como nos diz o poema:
“Com lembranças de esperanças
e esperanças de lembranças
vamos matando a vida
e dando vida ao eterno
descuido que do cuidado
do morrer nos esqueçamos...
Foi já outra vez o futuro,
será o passado de novo,
amanhã e ontem mexidos
no hoje ficam-se mortos.
Acordei e estava sonhando,
sonhei que estava desperto,
sonhei que o sonho era vida,
sonhei que a vida era sonho.
Senti que estava pensando,
pensei que sentia, e logo
vi reduzir-se a cinzas
meus pensamentos de fogo.
Se há quem não sente a brasa
embaixo destes conceitos,
é que em sua vida pensou
com seu próprio sentimento;
é que em sua vida sentiu
dentro de sim ao pensamento
. Flores dá o amor ao homem,
40
Ibidem, p.178
29
flores entre folhas ao vento,
mas também lhe dá diamantes
duros, cortantes e concretos.
Não só o vapor esquenta;
não chameis frio ao seco;
a carne com freqüência esfria
e costuma queimar os ossos.” 41
.
E são justamente estes nos pequenos momentos que fazem de nós e de nossos
escritos eternos, a ponto de ultrapassar gerações. Convencido disto certa vez, Jean
Cassou disse que as obras de Unamuno e toda sua filosofia nunca empalidecem. E
Concordando ressalta Unamuno: “um livro só permanece vivo, quando as pessoas
encontram vida nele, portanto o livro é algo para comê-lo, e aquele que come se ainda
estiver vivo, reviverá ao comê-lo42
”.
Paz e guerra (1987)
“Paz e Guerra” é um plano, um rascunho daquela que seria a real novela. É
também essa novela um relato vivo da guerra carlista que são emaranhados,
resquícios de suas lembranças de infância. Uma novela que conta a vida comum e
individual vividas em Bilbao.
Névoa
Novela a qual o próprio autor chamou de “Nívola”, numa tentativa de renovar as
técnicas da narrativa. A mesma, não se trata de uma novela no sentido estrito e oficial.
Por esta razão que Unamuno a intitulou de Nívola.“Inventei um gênero, que não é
simplesmente dar a este um nome novo, mas dou-lhe também a elas formas, regras as
quais me comprazem”.
Tal gênero pode ser acompanhado naquilo que vemos no capítulo XVII de sua
novela Névoa. Acompanhemos:
“-A novela não tem um argumento. Ou melhor, vai ser aquele que for se
desenrolando. O argumento se fará sozinho.
- Isso é novidade para mim...
41
GUTIÉRREZ, Jorge Luis. A filosofia de Unamuno como reação ao mistério da realidade e da vida
humana e seu destino. Artigo publicado em janeiro de 2010,14 ̊Edição da revista eletrônica Pandora do
Brasil – In:http://revistapandorabrasil.com/
42Cf. UNAMUNO, 2011, p. 54
30
-Pois veja, um dia destes, quando não sabia bem o que fazer mas tinha
vontade de alcançar alguma realização, uma coisa dentro de mim me levou a
pensar em escrever uma novela. Mas me decidi escrevê-la da forma como se
vive, sem saber o que iria acontecer no final. Então me sentei, apanhei papel
e comecei a rascunhar as primeiras ideias que me vieram à cabeça, sem saber
o que viria depois, sem um plano preestabelecido. Meus personagens vão agir
conforme fazem na vida real, e dirão as palavras que disserem. Seu caráter
vai formando-se pouco a pouco, e às vezes seu caráter será o de não tê-lo.
-sim, como o meu.
-Não sei. Isso irá aparecendo por si mesmo, eu me deixo levar.
-E há alguma psicologia? Você descreve os personagens?
-Bem você começa acreditando que leva os personagens do jeito que quer, e
no fim é fácil se convencer de que eles são quem levam. È muito freqüente
um autor acabar se tornando um brinquedo de suas próprias ficções.
-Talvez sim. Mas o caso é que nessa novela penso colocar tudo que me
acontecer, seja como for.
-Pois então acabará não sendo uma novela.
-Não, será...será..uma Nívola.
-Nívola? Que diabos é isso?
-è que certa vez, Manuel Machado, o poeta, irmão de Antonio contou que
levou um soneto para ler para Dom Eduardo Benot. O soneto estava em
alexandrinos, ou sei lá que outra forma heterodoxa. Ele leu e D. Eduardo
disse: “Mas isso não é uma soneto!”... Machado respondeu: “Não é um
soneto. É um sonite”. E assim como minha novela não será uma novela, vou
chamá-la de... Como foi mesmo que eu disse? Navilo... Nebulo... Não.
Nívola! Isso mesmo Nívola! Assim ninguém se achará no direito de dizer que
minha obra não respeita as leis de seu gênero [“...] e posso dar-lhe as leis que
eu bem entender.” 43
Nesta sua nova técnica D. Miguel busca enfatizar o diálogo, mas antes de tudo a
liberdade do autor em criar, em abusar de sua criatividade. Também se torna esta
maneira de escrever algo de individual e original dado por Unamuno.
Unamuno se torna reconhecido em meio às grandes personalidades por essa
ousadia contidas em todas suas novelas, ou melhor, nívolas, é o que nos relata Maria
43
UNAMUNO, Miguel de. Névoa. Tradução de José Antonio Ceschin. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989, p.99-100.
31
Isabel Toro, e acrescenta que toda a energia de Unamuno está voltada a seu ideal e
preocupações sociais44
.
A este respeito Unamuno relata na “empírica fábula e mítica realidade, a
propósito da relação entre sujeito e objeto, leitor e autor, novela e nívola, tudo constado
em seu ensaio Névoa (Niebla).
Deste modo, D. Quixote45
não é mais real que qualquer outro heroi, pois ambos
se fazem presentes, existem de fato na consciência coletiva. Portanto, crer, é querer crer,
querer que o objeto, o personagem de fato exista.
O paradoxo ser é querer ser, crer é querer crer, é muito forte na novela
Unamuniana Névoa. Não obstante, tal novela quer que Unamuno acredite nos
personagens, que dê a eles vida, e que os mesmos sejam independentes do próprio autor.
Torna-se aqui um “realismo criativo”. O que significa que a realidade poética e criativa
de um homem ou do personagem, consiste no grau e na intensidade que há neste
homem e querer ser. O real é, portanto, um simbólico personagem, que está incluída no
palco da vida. Afinal a realidade é o puro querer ser ou não quer ser do personagem, é
como nos diria Charbonneau:
“(...) a existência é causa da existência, na medida em que podem assentar
sobre a fundação do existente, onde os seres tomam corpo, vida, e se
cristalizam no substancial”.46
Tudo para nos reforçar a ideia de que o é sua própria ideia de ser. E de ser cada
vez mais.
Contudo em Névoa, Unamuno constitui a Liberdade que o indivíduo possui
frente ao seu criador, podendo eliminá-lo quando, onde e como quiser. Por exemplo, em
Névoa, o personagem protagonista Augusto Perez, é o homem que não chega a querer
ser, portanto, não é. Tornando-se ele uma mera e simples aparência, uma ficção. Sendo
assim Augusto é a existência aparente, fictícia, ser sem rosto, sem finalidade, pois entre
ele e o autor não existe nada.
Em relevância a isto vale recordar que, denotada obra é de extrema significação
para o espírito de toda uma geração, a geração de 98.
Nesta altura, de sua narrativa, chegamos ao cerne da obra Névoa: o encontro da
consciência e do homem que resiste ao nada, mas é em meio da perda da consciência
44
PASCUA,Maria Isabel Toro.Miguel de Unamuno: relato de uma obra Universal. Tradução de Hernán
Gomez – In: Palestra proferida na ABL em 07/11/2012, durante a “Jornada Literária sobre D. Miguel de
Unamuno”; sob auspícios da ABL e da Universidade de Salamanca.
45 Um personagem da ilustre literatura de Miguel de Cervantes – Dom Quixote de la Mancha.
46CHARBONNEAU, Paul-Eugéne. O Homem a procura de Deus. São Paulo: EPU, 1981.
32
que o homem se sente abandonado, totalmente solitário. Aqui a perda da consciência
implica no próprio limite da consciência, pois é por meio do abandono, do vazio, da dor
propriamente dito que se alcança novamente a consciência que fora perdida.
Ao fim e a cabo, a consciência num todo só se revela na dor, na dor da perda, na
dor do limite, como diz o velho ditado: “só valorizamos quando perdemos”. Tal
sensação é alcançada na compaixão e no amor.
É justamente em meio a decepção amorosa, isto é, em meio a dor que Augusto
chega ao seu íntimo, ao mais rebuscado e profundo daquele que é. Descobrindo assim,
toda sua consciência, seus limites, seu caráter e personalidade. Aqui Chegamos ao
ápice, ao clímax, de Névoa onde Augusto na angústia, tomado pelo desejo de se matar
encontra-se com seu Criador, Miguel de Unamuno.
Unamuno, por sua vez, o proíbe se suicidar, mas o obriga a morrer. É um dos
mais belos momentos da novela, o forte conflito entre Unamuno e o personagem
Augusto que anseia viver.
Sendo assim é Névoa uma das mais brilhantes, talvez a melhor novela já escrita
por Unamuno e que nos permite perguntar: Entre realidade e ficção, há separação? È
este paradoxo que faz com que Névoa seja um de seus escritos que possui maior número
de traduções.
1.4 Unamuno Ensaísta
Em consonância a José Ortega e Gasset (1883-1955), Xavier Zubiri (1898-1983)
é Unamuno um dos filósofos mais importantes da Espanha no século XX. Como temos
visto, Unamuno não faz distinção entre ontologia e teologia. A final para ser verdadeiro
deve ser eterno, imortal. Pois toda a garantia que temos da eternidade e do imortal nos é
dado pela fé ou pelas fictícias criações de nossa imaginação.
Acredita D. Miguel que o homem só se imortaliza por meio de suas criações,
pois ao criá-las o autor dá a elas vida, corpo, lhes dá forma.
Para Unamuno é inconcebível, incompatível consolo dado pela religião, e a
verdade oferecida pelo mundo da racionalidade. Para Ele, o homem se vê enredado no
profundo dilema entre obedecer, a razão e responder aos sentimentos.
Pensando nisso, Unamuno presenteia a seus leitores com um do mais
extraordinário de seus ensaios de cunho filosófico e teológico, a saber: “Do sentimento
trágico da vida” que traz á tona o conflito entre razão e emoção.
Nela somos levados a crer que tudo é felicidade, que o verdadeiro amor, a
socialização entre os homens é possível na medida em que há um esvaziamento de si, e
33
no mais íntimo, no âmago de seu ser; você se depara com seu verdadeiro e mais puro
Eu.
Do Sentimento Trágico da vida nos homens e nos povos
Um ensaio desordenado, encantador, cativador e decepcionante ao mesmo
tempo. Pois, leva ao leitor na angústia planejar um desigual valor entre amar e sofrer,
entre viver e morrer. E não nos dá respostas claras, mas nos deixa uma certeza: a de não
querer morrer.
Entendida como uma literária produção filosófica é esta, segundo estudiosos sua
principal e fundamental obra de filosofia.
Tem como centro a questão da imortalidade, que, pois desejo tomado pela
vaidade. Do homem que se perde da sabedoria, e a este afastamento que Unamuno
chama de “tragédia”. Vemos, portanto, a fragilidade do homem frente a criação de
Deus. Fomos criados, nascemos, vivemos, e logo morremos. Frente a tais eventos que
nos angustiamos e sofremos.
Unamuno nos deixa evidenciar um homem que é perecível. Pode ser, mas
pereçamos resistindo; e se é o nada que nos está reservado, não façamos com que isto
seja uma justiça47
.
Também está contida nesta mesma obra, a batalha travada entre fé e razão. Vida
e lógica. Vontade e sentimento, tornando-se assim as maiores angústia do homem
moderno.
É justamente este impasse, essa imensa dificuldade de conciliar os extremos que
torna o sentimento trágico da vida nos homens e nos povos um marco de distinção entre
espanhóis e europeus.
Ainda que haja esse distanciamento entre fé e razão, que são atrozmente
inimigos, nem uma nem a outra sobrevive sem apoio alheio.
“Não me submeto à razão, revolto-me contra ela e aspiro a criar, à força de
fé, meu Deus imortalizador e a modificar, com minha vontade, o curso dos
astros, porque, se tivéssemos fé como um grão de mostarda, continua
47
UNAMUNO, Miguel de. Do Sentimento Trágico da Vida nos Homens e nos Povos; São Paulo:
Martins Fontes, 1996, p.252.
34
Unamuno, diríamos ao monte: “Passa daqui para acolá", ele passaria e
nada nos seria impossí¬vel (Mat, 17, 20).” 48
Em geral esta obra nos explica que os desejos desesperados de imortalidade
individual além de gerar conflito, geram por sua vez uma nova teoria do conhecimento,
uma doutrina de Deus, uma ética, e uma estética, uma história do homem universal.
E nos reforça, o que define o homem é o permanente estado de conflito entre
sentimentos e razão. Deste ponto a diante percebemos que o homem refinado, de alma
polida é aquele que se compadece, aquele que toma consciência do sofrimento do outro,
e reconhece no outro a si mesmo.
Não podemos nos esquecer que para Unamuno, é Deus e em Deus que tudo se
personaliza, se personifica e ganha forma, isto é, consciência. Afinal o Todo é
personalizado para que o homem fuja do desespero do nada. E mais, é o Homem nada
antes de sua concepção, e para esse mesmo nada ele retorna, isto é, como está escrito:
“tu és pó, e ao pó hás de voltar” (cf. Gn 3,19)
É justamente no se deparar com o nada, com seu vazio existencial que o homem
se compadece, e ama o outro num doloso deleite livre que ele é.
Por outro lado, o autor do Sentimento Trágico percebe que é somente o amor-
compaixão que é capaz de unificar os homens. Pois, o amor faz com que este mesmo
homem, que muitas vezes é tomado pela cegueira do egoísmo, é capaz de se desnudar
para o outro e em função do outro.
Mas, também nos recorda que este outro só é revelado na medida mesma que me
faço desvelar no outro, é dizer, que eu reconheça nele aquilo que sou, fazendo
transparecer aquilo que antes parecia perdido e obscuro, é trazer a figura de Deus
revelado pela consciência. E a partir de então compreenderemos o que é o amor.
48
GUTIÉRREZ, Jorge Luis. A filosofia de Unamuno como reação ao mistério da realidade e da vida
humana e seu destino. Artigo publicado em janeiro de 2010,14 ̊Edição da revista eletrônica Pandora do
Brasil – In:http://revistapandorabrasil.com/
35
1.5 Considerações
Ao longo do percurso tivemos o prazer de acompanhar a inconfundível figura de
Miguel de Unamuno. Um verdadeiro homem de “carne e osso”. De vontade e
limitações, mas que com sua bravura luta pelo gosto de viver.
Unamuno se confirmou na história por sua ousadia e coragem de fazer com que
compreendêssemos que a vida está muito mais além da morte, que existe dentro de cada
um de nós uma resposta eloquentemente viva e que luta diariamente por viver e se
tornar imortal.
Uma filosofia do martelo, como alguns pensadores ousam dizer, Unamuno nos
convidou, convocou a percorrer por um mundo que antes era só dele, e trouxe até nós a
perspicácia de nos fazer novos.
Além de um genial escritor e filósofo, foi Unamuno fecundo e profundo
pensador, em outras palavras, ele mesmo. Um unamuniano irrevogável, onde em todas
suas obras Unamuno deixa transparecer o que nele há de mais íntimo, seu amor familiar
e religioso, deixou também transluzir seus medos e angústias, sua fome por
imortalidade, fazendo dos leitores seus participes do seu próprio Eu.
Unamuno foi há seu tempo um homem de luta. Que lutou por causas humanas
que caminhou junto a um povo e que transformou toda uma nação, a nação dos
intelectuais. Demonstrou-nos que para vencer a ignorância é necessário muito mais que
argumentos. É necessário a razão.
Contudo na sua relutância contra a “vida”, e pelo anseio de não querer morrer.
Não significa antecipar a morte ou diminuir a vida. Mas, que a vida está além da morte,
reafirmando o que professam os católicos “creio na vida eterna”.
Sem embargo, Unamuno nos leva numa viagem em busca daquilo que para a
filosofia seria um problema, religar o sentimental com o racional. Com isso gera em
Unamuno o que poderia haver de mais trágico nos homens: morrer. No entanto ele diz
que a única maneira de escaparmos da morte é Amar.
Pois o amor diante amor, como força e movimento, luta perante a morte, o vazio
e o nada. Neste ímpeto Unamuno quer nos dizer que o amor em sua origem possui uma
dimensão ética e moral, não se tratando o mesmo como um simples amor sentimental e
apaixonado, mas sim de um amor sem limites, que aceita a dor como caminho e
necessária para que realmente nos tornemos verdadeiros homens de carne e osso.
Assim, que a filosofia Unamuniana, ela não busca dar respostas prontas e
imediatistas. Mas, compreende que para chegar a uma conclusão se faz necessário
morrer. Mais que morrer para o mundo é morrer para si, é se encontrar com omais
escuro Eu que há em você. Deste modo se quereis saber como Unamuno desenvolve seu
36
pensar sobre o amor e como se dá este caminho devereis ler o próximo capítulo, onde
trataremos de desvendar o Amor em Miguel de Unamuno.
37
CAPÍTULO SEGUNDO
Unamuno e o conceito de Amor no sentimento trágico da vida dos
homens e dos povos.
2.1 – Amor, desejo, dor e compaixão.
Ainda que Unamuno seja existencialista. Podemos sentir em sua filosofia um algo
do platonismo. Vimos que a angústia unamuniana está no ato de “não querer morrer!” Na
beleza que nos é ofertada pela vida. Mas, no entanto, somos tomados pelo forte desejo de
possuir, de obter aquilo que ainda nos falta.
Pautado nisso, Unamuno afirma que a “única e eficaz arma capaz de combater a
morte é o amor, pois o amor é a chave para que vivamos bem. Pois, quando amamos,
nosso olhar se transforma, e em tudo que vemos contemplamos beleza” 49
.
Por conseguinte é no amor onde encontramos a esperança, a força e alegria. Pois,
por meio do amor é que sabemos que a vida não termina com a morte, mas transcende a
própria existência do homem. E isso reconheceu Unamuno quando diz:
“A sede de eternidade é o que se chama amor entre os homens e quem ama
outrem, é porque se eterniza nele. Portanto, o que não é eterno não é real” 50
.
Aqui Unamuno deixa evidenciar que o amor, ele é força movedora, e que por esta
razão possui a capacidade de ser além daquilo que ele é. Não obstante, o autor nos
recorda que o amor só é eternizante, isto é, eterno, na medida mesma que se solidifica, ou
seja, quando se personaliza em outro.
“O amor personaliza tudo o que ama. Só é possível apaixonar-nos por uma
ideia, ou alguém personalizando-a. E quando o amor é tão grande, tão forte, tão
vivo e transbordante que tudo que ama personaliza. E assim descobre o todo, o
universal, a pessoa”51
.
49
ARCANJO DOS SANTOS, Milton. A fome de imortalidade na obra de Miguel de Unamuno. In:
Monografia (Graduação Licenciatura em Filosofia) Faculdade de São Bento - São Paulo: 2009, p.62.
50 UNAMUNO, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo: Martins
Fontes, 1996, p.39.
51 Ibidem, P.134
38
Neste ritmo perceberemos que “Amar não é mais que desejar uma coisa por si
mesma. Pois, amor é desejo” 52
. Sendo assim, todo desejo nos encaminha àquilo que nos
falta53
. Consecutivamente o amor é completude na incompletude. Afinal:
“Não é bom que o homem esteja só. Vou fazer-lhe uma auxiliar que lhe
corresponda (Gn 2, 18)”.
Não muito distante, porém compartilhando da mesma linha de raciocínio nos
afirma Miguel de Unamuno:
“O amor busca com fúria, através do amado, algo que está além deste (...) por
tanto, não é o amor outra coisa que nem ideia, nem volição, são antes de tudo
desejo” 54
.
Unamuno nos demonstra que o desejo está acima da própria vontade do homem.
Seria, pois este um desejo divino, contido no coração de Deus.
“Então o Senhor Deus fez o homem cair em um profundo sono e, enquanto
dormia, tomou-lhe uma de suas costelas e fez crescer carne em seu lugar.
Depois, da costela que tirara do homem, Iahweh Deus modelou uma mulher e
a trouxe ao homem. Então o homem exclamou: Esta sim é osso de meus
ossos e carne de minha carne! (Gn 2, 21-23)”.
Mediante esta magnífica passagem do livro do Gênesis encontramos o primado
da filosofia unamuniana, a figura do homem concreto, vivo. O homem de carne e osso.
Da mesma forma com a que Adão buscou sua metade. É também o amor55
busca
por aquilo que nele está em falta, e não pelo que já possui56
. Que por ele é desejado com
52
ARENDT, Hannnah. O Conceito de Amor em Santo Agostinho. Lisboa, Instituto Piaget; p.17
53 Diferente de Platão, Agostinho. Espinosa entende o Amor já não mais como falta e sim como potência;
no sentido ultimo de vir a ser.
54 UNAMUNO, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo:
Martins Fontes, 1996,p.127
55 Aqui podemos entender o amor como o entendeu Platão. O amor é movimento (dunamis) em direção
ao outro, seria, portanto aqui um amor carnal, sexual o amor primeiro, do desejo, o amor Eros. O que,
temos de obter clareza é que o Amor em Platão percorre um caminho de ascensão, quero dizer que para o
mesmo este amor é “Belo Amor”, onde devo caminhar em direção ao mesmo seguindo passos claros, ou
seja, de um amor que vai do belos corpos ao belo em si, uma ideia que está por sua vez ligado a Ideia do
Bem e da Verdade em Platão. Assim Portanto, a Ascensão dialética é entendida como a escala ascendente
de Eros toda essa ascensão serve para nos mostrar que Eros possui um movimento próprio e inteligente.
39
fúria, que a ele satisfaça por inteiro, pois o amor não é estático, está sempre em direção
ao outro.
Neste sentido mesmo, de busca e movimento, o amor para Unamuno só pode ser
entendido como liberdade concreta. Liberdade que por sua vez já fora dada pelo criador
quando ordena ao homem: “Sede fecundos, multiplicai-vos e enchei a terra (Gn 1,28)”.
Tal máxima nos indica que o homem imagem e semelhança de Deus57
, e por meio
dele fora feito para amar e ser amado. Pois, Deus é Amor58
.
Mas antes de chegarmos neste grau de transcendência do amor. Vejamos que
aquilo que antes era mero desejo individual, torna-se agora carnal, comum. Carnal na
medida em que os “amantes59
não chegam a se amar com entrega de si, com verdadeira
fusão de suas almas” 60
. Somos levados a crer que o amor por sua finalidade última
desemboca na máxima da vida, a saber: a procriação.
“o amor carnal; O amor entre homem e mulher é para perpetuar a linhagem
humana sobre a terra”61
.
Portanto:
“todo ato de geração é um deixar-se de ser total ou parcialmente, um partir-se,
um morrer parcial. Uma vez que viver é dar-se, perpetuar-se, e perpetuar-se é
dar-se é morrer” 62
.
Contudo, o movimento de ascensão dialética é o processo natural qual o Amado sai em direção ao que
ama (isto é, ao Belo em si) Um caminho segundo o Filósofo devem seguir quatro importantes degraus:
1.o plano do corpo, 2. O plano da alma, 3. O plano do conhecimento e da ciência , e 4. O plano das Ideias.
Assim que amar em Platão é constantemente buscar pelo Belo, o Bem que há no outro que em mim falta.
56 COMTE SPONVILLE, André. O amor. Tradução de Eduardo Brandão. – São Paulo: Martins Fontes,
2011.
57 Cf. Gn, 1,27
58 Cf. 1 Jo 4,8
59 Aqui nos recordamos de uma intrigante indagação deixada por Platão em seu diálogo o Banquete 189 c,
que o mesmo diz ser o amado mais importante que o amante.
60 UNAMUNO, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo:
Martins Fontes, 1996, p.129
61 Ibidem, p. 128.
62 UNAMUNO, Op. cit. p.128
40
O que Unamuno nos reitera aqui é que todo ato de amor por mais livre e
despojado que possa vir á ser, é um ato de rompimento. O que não significa gerar um
amor egoísta, e bem um amor que seja capaz de morrer a cada dia um em favor daquele
que se ama. Mas sem perder sua essência. Assim percebemos: “O amor materno, que é
senão compaixão pelo frágil, pelo desvalido, pelo pobre filho inerme que necessita do
leite e do regaço acolhedor de sua mãe” (UNAMUNO, 1996, p.131)
Unamuno quer que vejamos que todo amor é gratuito na medida em que se é
retribuído. Mas ao mesmo tempo é ele renúncia e morte, sofrimento e dor. E nos alerta
Unamuno que aquilo que antes parecia ser harmonioso, um mar de rosas, perfeito, trás a
superfície aquilo que antes estava escondido, no mais íntimo do seu Eu, o grande abismo:
a dor. Afinal: “O amor é irmão, filho e, ao mesmo tempo pai da morte, que é sua irmã,
sua mãe e sua filha (UNAMUNO, 1996, p.129)”.
Deparamo-nos aqui com a crise gerenciada pela falta, pelo desejo que nos leva a
uma incansável busca, e que não nos permite progredir. Em todo caso nos afirma D.
Miguel, que o amor por sua potencialidade de ser, implica no mais individual do homem
isto é, suas escolhas63
, que são por sua vez todas e indubitavelmente pessoais,
característica do próprio homem.
São firmadas nas escolhas e decisões que reconhecemos que o amor-desejo é de
um todo carnal e instintivo, o que nos faz pensar que há nele pura volição, vontade, ou
como diriam os psicanalistas: pura libido.
No entanto, é de fundamental participação para nosso crescimento. E isto faz do
amor peça inerente em função de seu próprio desejo. Contudo, nos lembra Unamuno,
ainda que seja o amor força, pulsividade, é também ele processo doloroso. Um processo
lento do apaixonar-se, que não é outra coisa como já dissemos admirar e contemplar no
outro aquilo que está em falta. Um triturar-se e adaptar-se as novas do outro.
Sendo assim tal como é, em seu sofrimento fecundo, na mescla de dor e alegria, é
o amor um sentimento insaciável e solitário, sempre inquieto com o que ama, sempre
63
A este respeito convido a você caro leitor a ler outro artigo meu intitulado: O amor na perspectiva da
sexualidade e da espiritualidade - In: Revista Pandora do Brasil, Edição 14 – Janeiro de 2010 – “Miguel
de Unamuno”/ Disponível em www.Revistapandoradobrasil.com.br - Ed. Unamuno.
41
carecendo de seu objeto, ele é verdadeira paixão, que enlouquece e dilacera, a que
esfomeia, que tortura, que exalta e aprisiona.
Sob tais argumentações, amar de forma limpa e verdadeira para Unamuno é sair
de nossa redoma de vidro, é quebrar a casca do ovo e ir em direção a nossas próprias
misérias. É termos a coragem de reconhecer no outro o que nós somos de fato. Em outras
palavras, para que eu ame de verdade eu devo me apaixonar, interagir com o outro a tal
ponto de encontrar no mesmo aquilo que me completa.
Pois, sem ser radical apaixonar-se é amar o outro para seu próprio bem, o que não
faria do amor possessivo, egoísta e sim passional e relacional.
No entanto não nos deixemos enganar, não exageremos, não enfeitemos a paixão,
não a confundamos com melancólicos momentos de romances, pois uma dose desregrada
da paixão pode gerar mais dor e mesmo a morte.
O que Unamuno quer que compreendamos é que a paixão é necessária para o
crescimento e avanço para o verdadeiro amor. Não obstante a paixão é efêmera, ilusória.
Afinal amor não é apego, ou um troféu a ser exposto aos amigos. Mas, é o amor um
desprender da carência, da falta e mergulhar na profundidade daquilo que se é amar.
“Pois, só se ama deveras se o coração do amante que se misturou, em almofariz de
angústia e dor ao do coração do amado” 64
.
Sem embargo, o processo de se apaixonar é um tanto quanto melancólico,
doloroso. Uma fase que nos pode levar a compreender e a desvendar tudo àquilo que de
fato é o amor em sua primeira instância, dor e sofrimento. Como resultado, temos a fala
de Sponville quando diz que só ama, de verdade aquele que um dia sofreu.
Em decorrência disto nos dirá Unamuno: “O mistério do amor, é o mistério da
dor” 65
.
Ainda que seja um doloroso processo é o amor transcendência. Tudo porque o
mesmo está sempre visionando o “porvir”, que possa trazer satisfação, preenchimento.
Não querendo aqui, transformar o mais belo dos sentimentos em monstro, esta faceta do
64
UNAMUNO, Miguel de. Uma História de Amor - In: Revista Pandora do Brasil, Edição 14 – janeiro de 2010 – “Miguel de Unamuno”/ Disponível em http:// revistapandoradobrasil.com 65
UNAMUNO, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo:
Martins Fontes, 1996,p.190.
42
amor que nasce pela dor, me faz recordar a D. Miguel quando diz: “O amor é senão, fruto
da dor universal” 66
.
Tal dor é aquela que une os homens em momentos mais difíceis. Isto é um amor
livre que age, que doa, que se esvazia de si para tomar as dores do próximo que está a
sofrer.
Em contra partida a um amor devassador, voraz. Deparamo-nos com um amor que
mesmo na dor é paciente e sabe esperar. E toda essa espera já nos ensina São Paulo:
“O amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria,
não se orgulha.Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente,
não guarda rancor.O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a
verdade.Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”67
Contudo toda essa espera é refletida no cotidiano. Na vida comum, pois “quem
não sofre não ama, não vive”68
.
O que Unamuno quer deixar claro é que sem sofrimento, dor, renúncia não existe
verdadeiro amor. Afinal, já viram rosas sem espinhos? Portanto acredita Unamuno que
sem dor é impossível se falar de amor.
Muitos são aqueles que sofreram por amor, Tristão e Isolda, Romeu e Julieta,
Ricardo e Ludovina, até mesmo o próprio Deus sofreu por amor ao entregar ao mundo
seu filho único - “Deus amou o mundo de tal maneira que entregou seu filho
Unigênito”69
.
Tudo isso é para nos mostra que toda abnegação possui seu lado positivo.
Todavia, para que se possa haver uma evolução da alma, da personalidade e até mesmo
da pessoa se faz necessário um abandono mais amplo e profundo. Um abandono que seja
capaz de ver ao outro sem suas armaduras, vê-lo em sua nudez.
O que Unamuno está tentado deixar claro é que esta nudez é uma ação de
liberdade tomada por esse imponente homem que está dominado pelo terreno da angústia
66
Idem,Ibidem
67 Cf. 1 Cor. 4,4-7
68 UNAMUNO, Op.Cit. p198
69 Cf. Jo 3, 16.
43
e do medo, frutos de seu interior. Em decorrência disto, assente que não há verdadeiro
amor sem sofrimento e dor, sem martírio.
Em conseqüência disso aquele que não sofre é porque não vive e não aceita a dor
como substância da vida70
e raiz da personalidade, pois é sofrendo que se torna pessoa.
Em resumo amor e dor são indelevelmente inseparáveis, e desta união se pode
construir uma nova e límpida forma de amar, a saber: a compaixão (caridade).
Desta maneira, o amor passa a se tornar aqui um ato e não mais falta. Um
encontro mais íntimo e pessoal do homem que se debruça sobre si mesmo, criando
capacidades de fazer daquilo que o movimenta, isto é, o amor superabundar e extravasar,
explodir em direção ao outro.
No entanto, ainda que nos pareça bizarro devemos, com reverência, agradecer
estes nossos momentos de crise e dor, os quais muitas das vezes cravejam o coração do
homem. Assim a frustração, a decepção e a dor, gerenciadas por esse processo nos
ajudam a compreendermos que “Eu sou Eu e não o Outro”71
.
Diferente do amor desejo, carnal. A compaixão permite que aquele que ama
ultrapasse seu egoísmo, e passe a se entregar ao outro com tudo que ele é: liberdade,
vontade, sentido, desejo. E ao percebê-lo descobre que é homem capaz de sentir, amar,
doar e ver aquilo que antes estava oculto os seus olhos e passa a aceitar que ele é um ser
feito o qual Deus criou para amar.
Aqui uma vez mais de forma sutil, reaparece a figura desse homem vivo, de carne
e osso, que antes estava aprisionado e se encontra em liberdade de tal modo que,
abrandado pelo amor este homem perceba e tome ciência de que possui, a capacidade de
sair de seu mundinho e amar o todo e o universal, deixando-se descobrir pelo novo e
desconhecido que é o Outro.
Como já nos dissera Theodor Adorno em um de seus escritos “serás amado
quando puderes mostrar sua fraqueza, sem que o outro se sirva dela para afirmar sua
força”. Em outras palavras Adorno quer que compreendamos que a compaixão é uma
70
Idem, Ibidem 71
MICAI, Barbara Aparecida Brosch. Fé e razão, o conflito: a relação da esperança com a fé e a caridade na filosofia de Miguel de Unamuno. – São Paulo: Editorama, 2009 p.58
44
maneira de amar gratuita, que nos faz viver menos para que o Outro viva mais. Portanto,
é amar sem esperar nada em troca. É doação pura e total. É consentimento de vida.
Aqui nos faz resgatar o que já dissera Simone Weil desta nova forma de amar. O
amor caridade (charitas) é um amor de desprovimento. Um amor universal, ou seja, não
é um amor-amizade (philia) que faz escolhas. Este é um amor que não faz distinção, não
tem preferência. È este fruto da compaixão. Um amor sem limites, sem justificativas tolas
e egoístas. É por fim, a caridade ligada a compaixão uma maneira transcendente do amor
humano.
É este um amor sem preconceito. Que ama sem olhar a quem. Este por sua vez faz
valer o que nos diz Cristo: “Orem por seus amigos e amem seus inimigos” 72
. Tomados
por nossas fraquezas humanas, tais palavras acabam se tornando uma afronta a ponto de
nos questionarmos: Como poderei eu amar meu inimigo? Como amar aquele que me fere
até mesmo me odeia?
Tais palavras de Jesus ainda que duras a nós reles mortais, servem para confirmar
que o homem que se deixa embriagar pelo amor caridade e se guiar pela compaixão
cresce como homem. Tudo porque esse amor transfigura e faz com que todo o individual
e narcísico, torne-se universal e livre.
Não podemos tapar o sol com a peneira. Tamanho é o desafio lançado por Cristo e
se amplia a cada vez mais, na medida em que encarnamos que somos a imagem e
semelhança de Deus, e fomos criados para amar, pois em outra de sua fala Jesus diz: “
Amai vosso próximo como a si mesmo”73
. Para tudo! Como amar meu próximo como a
mim mesmo?
Desafiadora é esta máxima deixada por Jesus. Mas Simone Weil nos ajuda a
entender, pois tal compreensão se da na inversão desta máxima: “ame a si mesmo como
ama a um estranho (próximo)” 74
.
Se minuciosamente analisarmos, perceberemos que a fórmula evangélica “amai ao
próximo como a si mesmo”, nos estaria sendo dito: “ame ao próximo (qualquer pessoa)
72
Cf Mt. 5,44
73 Cf. Mt 22,37
74 COMTE SPONVILLE, André. Pequeno Tratado das Grandes Virtudes. Tradução de Eduardo
Brandão. – São Paulo: Editora Positivo, 2009- p.307
45
da mesma maneira que você se ama, isto é, com todo seu narcisismo, com seu
egocentrismo e amor cego e passional, tudo não passaria de loucura, afinal como posso
amar a outro na mesma medida com que me amo, uma vez que sou único e exclusivo?
Tais indagações, e discussões só servem para que entendamos de uma vez por
todas o que vem a ser esse amor compadecido. E acolher com gratuidade nossas misérias
e fraquezas. Para isso nos auxilia Unamuno ao dizer: “o homem anseia ser amado, ou
ainda anseia ser compadecido” 75
.
Entenda-se que ser compadecido para Unamuno é ser reconhecido e se
reconhecer, acolher e ser acolhido buscando compreender o homem concreto em sua
totalidade, com seus vícios e virtudes.
Ainda acrescenta Unamuno:
“Compadecemo-nos do semelhante a nós, e tanto mais nos
compadecemos quanto mais e melhor sentimos sua semelhança para
conosco”76
Agora não podemos esquecer que esse ideal de amor não é alcançado por todos. E
menos ainda se sabe amar, ou lidar com a dor que o amor causa a um. Tanto é que para
muitos de nossa atualidade, amar pode ser doloso demais a tal ponto, de se criar meios de
se amenizar, ou até mesmo para não amar.
Isso já ocorre segundo a revista época, onde em alguns estados europeus já se
vendem a pílula do desamor. Tudo para afastar daquilo que é essência do amor. A dor é
filtro para o crescimento humano e reconhecimento do outro.
Sem embargo, ainda que a caridade não seja compatível com este amor a si
mesmo, pois ela é fonte do verdadeiro amor que se emana em direção ao próximo, pois se
compreende que é a partir de mim, do meu egoísta amor ,que serei capaz de reconhecer
no outro minhas misérias e distribuir e compartilhar com o outro um estreito laço de
verdadeiro amor. Dirá Unamuno: “A Caridade é, pois, impulso de me libertar, de libertar
todos os meus próximos da dor, de libertar Deus, impulso que abarca a todos nós” 77.
75
UNAMUNO, Op.cit p.130
76 Ibidem, p.135
77 Idem, Ibidem, p.202
46
E mais:
“A Caridade é o transbordar da compaixão, é o impulso que liberta-
nos da dor e do sofrimento. È a verdade e ação do amor [...] é a caridade a mais
viva expressão do amor, e movida por ela, eterniza aquele que ama e
impulsiona-o a amar e a descobrir a Deus nele e no próximo” 78
.
Contudo quando o amor é espontâneo e pessoal, pois o mesmo não pode ser
comandado. O amor em minha liberdade me permite encontrar com a riqueza que há
além fronteira, fora de mim.
Entretanto devemos deixar aqui esclarecido, o amor em sua forma é desejo, júbilo,
mas também caridade, abertura para o desconhecido, que juntas podem formar o homem
concreto.
Sem mais é a caridade por meio da compaixão sua principal veia condutora, que
nos permite sem medo de errar, amar a todos os homens, nos libertando de tudo que nos
aprisiona, nos sufoca. Tornando-nos amados e amantes.
E seria este o único e eficaz amor, desprendido, livre que nos pode levar a uma
profunda e verdadeira aproximação com o Outro interno e externo. Que nos aproxima de
Deus e homem.
Afinal como diria santo Agostinho: “a única forma de amar, é amar sem
medidas”. Portanto amemos e nos deixemos amar. Porém para que amemos de verdade é
necessário que voltemos ao primeiro motor, ao principio do Amor.
2.2 - Amor Consciência: um Deus escondido.
“Quem não conhece o Filho jamais conhecerá o Pai, e o Pai só se
conhece pelo filho; quem não conhecer o Filho do homem, que sofre angústias
de sangue e dilaceramentos do coração, que vive com a alma triste até a morte,
que sofre uma dor que mata e ressuscita, não conhecerá o Pai e nem saberá do
Deus paciente e escondido” 79
.
78
MICAI, Barbara Aparecida Brosch. Fé e razão, o conflito: a relação da esperança com a fé e a
caridade na filosofia de Miguel de Unamuno. – São Paulo: Editorama, 2009 p.81
79 Unamuno, Miguel de. Do sentimento trágico da vida, nos homens e nos povos. São Paulo: Martins
Fontes, 1996, p.196
47
Até aqui temos percebido que o amor é algo individual, no entanto que está em
processo de expansão em direção ao outro, deixando, portanto esse seu lado único e
passando a ser universal, isto é, em direção ao que antes não era enxergado.
Sem embargo nos ficou claro que o amor para Unamuno é um processo lento,
solitário e dolorido. Mas é ele porta de sensibilidade no homem, pois faz com que ele se
compadeça por outrem que não ele mesmo.
Assim a compaixão é responsável por outro processo, que é gerado pelo amor, o
reconhecimento do outro, da pessoa exterior a ele, e este reconhecimento do outro
chamamos de consciência.
Para Unamuno a consciência, ela é o conhecimento participado <<quem não
conhece o filho jamais conhecerá o pai>>, é consentimento, é compaixão80
. Além de
tudo esse reconhecer, trazer o que antes estava escondido, ou seja, a consciência sofre,
compadece. E este processo de sofrimento e compaixão faz com que o escondido se
desvele no amor, pois como ele, a consciência personaliza tudo que ama, é o que
chamamos de Deus. Afinal “Deus é a personalização de tudo, é a consciência eterna e
infinita do Universo” 81
.
Em Unidade a este movimento de dentro para fora que gera a compaixão nos
dirá Charbonneau:
“[...] Uma vez desprendida da massa cósmica da inconsciência... a
consciência floresceria rapidamente e se tornaria um conhecimento superior e
especificamente humano que seria o conhecimento de si [...] e tal movimento
seria passando de uma análise exterior a uma análise interior, nisso o homem
amadureceria e conheceria a si próprio”82
.
Deste modo a consciência em Unamuno é “tida como um tesouro da vida
humana” 83
, pois o mesmo teve, que nele mesmo formular as questões existenciais,
como a vida do homem depois da morte. No entanto sabemos, quando<<o Filho do
80
Ibidem, p.134.
81 Ibidem, Idem
82 CHARBONNEAU, Paul-Eugéne. O homem à procura de Deus. – São Paulo: EPU, 1981- p.436.
83 SILAR, Mario. "Don Miguel y el Dios escondido. La tensión entre cordialidad y racionalidad en el
pensamiento religioso de Unamuno"In: http://www.unav.es – Artículos On-line, 2008, p.41
48
Homem for levantado, atrairá todos para vós (Jo 12,32)>> e mais << se com Cristo
morremos, com ele ressuscitaremos ( Rm 6,8)>>.
O que nos deve ficar claro, é que essa busca incansável por Deus já nos é dado
desde nossa criação, pois ninguém se esquece do seio que veio. Assim, portanto, só
posso falar de Deus, pelo fato mesmo que o já tenha saboreado, sentido a este Deus.
E é pautado nesta certeza de que ao sermos criados por Deus, e que esta busca já
está fundida na alma do homem buscar a Deus, que São Francisco Sales se firma para
escrever sua primordial obra: Tratado do Amor de Deus. A este respeito concorda
Unamuno ao dizer: “Esse conceito de Deus brota do eterno sentimento deste Deus
gravado no homem” 84
.
Circunstancialmente é nesse desejo, vontade de conhecer aquilo que está
implantada a consciência, que antes mesmo de conhecer pela razão, toca e sente aquilo
que é seu objeto de busca.
Diferentes de nós homens. Deus a Consciência Suprema como costuma chamar
Unamuno, ele não pensa, Ele cria. E se cria não existe é Eterno dirá Kierkegaard; o que
demonstra que Deus antes mesmo de Ser no homem, Ele é.
E é deste Deus que É, que nasce o desejo de buscar aquilo que está fora de nós; a
saber, a consciência.
“Ora, a serpente era mais astuta que todas as alimárias do campo que o
SENHOR Deus tinha feito. E esta disse à mulher: É assim que Deus disse:
Não comereis de toda a árvore do jardim? E disse a mulher à serpente: Do
fruto das árvores do jardim comeremos, Mas do fruto da árvore que está no
meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem nele tocareis para que
não morrais. Então a serpente disse à mulher: Certamente não morrereis.
Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se abrirão os vossos
olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal. E viu a mulher que aquela
árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para
dar entendimento; tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido,
e ele comeu com ela. Então foram abertos os olhos de ambos, e conheceram
que estavam nus; e coseram folhas de figueira, e fizeram para si aventais. E
ouviram a voz do Senhor Deus, que passeava no jardim pela viração do dia; e
esconderam-se Adão e sua mulher da presença do Senhor Deus, entre as
84
UNAMUNO, Op.cit. p.138
49
árvores do jardim. E chamou o Senhor Deus a Adão, e disse-lhe: Onde estás?
E ele disse: Ouvi a tua voz soar no jardim, e temi, porque estava nu, e
escondi-me. E Deus disse: Quem te mostrou que estavas nu? Comeste tu da
árvore de que te ordenei que não comesses?” (Gn 3,1-11)
Aplausívelmente nos é dado a saber que tudo adquirimos de Deus, exceto a
consciência, a qual só nos será dada no ato de comermos do fruto da árvore do
conhecimento, que caímos em nós e percebemos que estávamos nus, e que tínhamos
medo, vergonha daquele que nos criou, pois é aqui que tomamos a consciência de que
nos falta algo, de que temos uma ligação com o criador.
Mas não querendo nos ampliar, nosso foco aqui é demonstrar que este Deus que
é no homem, ele é desvelado, ou melhor, revelado ao homem na consciência, na medida
mesmo que eu me descubra no outro e em suas misérias. Afinal já nos dizia são João:
Deus é Amor! E é esta crença que se torna o centro da existência do homem, pois é
nesse amor dado em Deus e por Deus que nos reconhecemos e conhecemos85
o outro,
isto é aquele, que está fora e ao mesmo tempo imerso em nós.
Uma vez mais colidimos com a questão da incompletude onde já dizia um amigo
em certa discussão: “A incompletude da condição humana é o que faz o ser humano se
abrir para o outro, em busca de um complemento. Assim sendo, é a nossa deficiência
quem nos enriquece. Afinal se bastássemos a nós mesmos, não provaríamos jamais da
riqueza que o outro tem a nos oferecer; os novos sabores que ainda não conhecemos.
Portanto, a vida humana é paradoxal – nossa pobreza, nossa deficiência, ou seja, o fato
de não nos bastarmos a nós mesmos, é motivo, e enfim, nossa maior riqueza”. E
completa Sponville quando diz: “Amar é encontrar a riqueza fora de nós [...], pois, o
amor é pobre86
, e, portanto a única riqueza” 87
.
Expressamente vemos aqui viabilizados a figura de um ser superior que nos é
dado pela experiência no outro, no reconhecer nossas próprias misérias. Assim, pois, é
no ato de compadecer que reconhecemos o “Não-Eu”, isto é, aquele que está fora de
85
Cf. Bento XVI, Carta Encíclica Deus Caritas Est.
86 Platão já nos dizia: “O amor é filho da pobreza e do recurso. In: Coleção os pensadores - Diálogo o
Banquete, §203 b
87 SPONVILLE, André Comte. Pequeno tratado das grandes virtudes. Tradução de Eduardo Brandão –
São Paulo: Editora Martins Fontes, 2009, p.310.
50
mim. E nesse processo o qual conhecemos a necessidade de Amar e sermos amados88
, o
que, no entanto não nos é suficiente para que sejamos felizes.
Deste modo Deus é a causa primária de nossa existência. Pois já nos alertava
Deuteronômio quando diz: “Escuta, ó Israel! O Senhor, nosso Deus, é o único Senhor!
Amará ao Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas
as tuas forças » (Dt 6, 4-5).
Por outro lado ao fazermos uma minuciosa análise perceberemos que o Amor
torna-se uma Ordem: “Amarás, o Senhor teu Deus”, Mas poderá o Amor ser
comandado?
Dirá Sponville: “O amor não pode ser comandado, pois o mesmo comanda,
rege” 89
. Neste sentido concorda Bento XVI quando declara: “o amor só se torna
possível porque não é mera exigência: o amor pode ser « mandado », porque antes nos é
dado” 90
. Neste sentido mesmo o amor é um dom, é graça de Deus, pois Ele sendo tal
quem é: Amor, ele não poderia ser uma ordem e mais bem gratuidade, e isto reconhece
Jung quando relata e afirma que o “amor é como Deus: ambos só se oferecem a seus
serviçais mais corajosos.” 91
Em conformidade a tal pensar nos dirá Muller: “O amor dos homens em direção
a Deus têm sua origem, seu progresso e aperfeiçoamento no amor eterno de Deus em
direção a este homem, pois o amor é fundamento do mundo” 92
, fundamento este que já
estava disposto nos planos de Deus, quando por boca de Jesus exprime: “Amarás ao
Senhor teu Deus, de todo seu coração, de toda sua alma, e com toda as suas forças e
de todo o teu entendimento, e a seu próximo como a ti mesmo(Lc 10,27)”.
88
SPONVILLE, André Comte. O Amor. Tradução de Eduardo Brandão – São Paulo: Editora Martins
Fontes, 2011, p.40.
89 SPONVILLE, op. cit., 2009 – p.308
90 Cf. Deus Caritas Est. – In: www.vatican.va
91 JUNG, Carl Gustav.Sobre o amor.Tradução de Inês Antonia Lohbauer – Aparecida/São Paulo: Ideias
&Letras,2005 p. 24
92 MULLER, Michael.La Alegría en el Amor de Dios. Bamberg, 1933 - In: http://www.opuslibros.org/
51
Em suma o “amor era nele tão abundante que Ele não exigia de nós, tampouco
exigia de nós ser, pois Ele é aquele que é, portanto não exige amor, mas dá que é
todo amor” 93
. Afinal senão há Deus não há amor, dirá Lacan.
Em vista disto nos é atestado que por Deus fomos criados para amar e ser
amados, a sua imagem e semelhança fomos criados. Imagem e semelhança que são
nossa identidade e marco deste Deus que é Amor. E quando usa a palavra semelhança
nos recordará Tomás de Aquino é para deixar mais que evidenciado a precisão do amor
de Deus rumo a este homem, obras de suas mãos.
E consequentemente sendo o homem criação de Deus, é por estado de lógica o
homem ser criação do Amor, que faz com que o homem obedeça a tamanho imperativo
que agite seu coração, e tome um caminho de retorno a Deus. Algo que já nos dizia
Dostoievski: “... se amas já és de Deus”. E tamanho é o amor de Deus em direção ao
homem que o mesmo que é capaz de sentir ciúmes94
.
Neste sentido à medida que vou conhecendo aquele que é e buscando os
caminhos do mesmo, o amor vai se tornando centro de tudo aquilo que constitui a
consciência95
até a criação divina. Como já dizia um teólogo, de Deus só podemos saber
e dizer aquilo que ele não é. Pois Deus é o ser por excelência, por isso não podemos
prová-lo e menos ainda demonstrá-lo. Pois, já nos dizia Jaspers: “Deus existe e isso
basta”.
Mas o homem que é dotado de inteligência, vontades e desejos ele sempre estará
em busca de mais, não para demonstrar e firmar tal existência, mas bem para se
debruçar junto aquilo que realmente dá sentido em sua vida, isto é, voltar as fontes
primeiras, buscar as origens.
Ainda que nos valhamos da consciência como meio para conhecer aquilo que
está “escondido”. Nos é claro que é somente na existência que podemos conhecê-lo,
fixá-lo; afinal “O verbo se fez carne e habitou entre nós96
”.
93
Charbonneau, op.cit., p.462
94 Ibidem- p.461.
95 Idem
96 Cf. Jo 1,14
52
É a partir daqui que o que antes era oculto se faz presente, pois na medida em
que ele tenha revelado seu misterioso nome “Eu sou aquele que é”. Tal nome traz
consigo uma força na qual demonstra o quanto ele está infinitamente acima de tudo, o
quanto podemos dizer ou compreender, pois ele é o Deus Escondido97
.
Parece-nos absurdo, pois, nossa razão não consegue racionalizar a figura deste
que É. Mas o simples fato Dele nos revelar, nos fazer conscientes de seu nome, ele
também deixa evidenciar sua fidelidade, sua aliança e o mais importante o que nos faz
melhor se aproximar dele, seu amor. E nos diz Unamuno:
“O conhecimento de Deus procede do amor a Deus, e é um
conhecimento que pouco ou nada tem de racional. Porque Deus é indefinível.
Querer definir Deus é limitá-lo [...] Deus é, portanto, Amor, Pai do amor, é
Filho do Amor em nós98
”.
Para todos os efeitos Deus em sua natureza é o terno “conhece a ti mesmo”. O
que queremos afirmar é que, Deus não é uma essência a qual se deixa captar por uma
redutiva definição.
Já nos dizia Bento XVI:
“Ninguém jamais viu a Deus tal como Ele é em Si mesmo. E, contudo, Deus
não nos é totalmente invisível, não se deixou ficar pura e simplesmente
inacessível a nós.” 99
Deus, portanto, ele è supremo conhecimento, é essencialmente fonte, motor
primeiro capaz de unificar em sua criação a sua essência. Liberdade Radical100
de
escolhas como nos diria São Paulo. Afinal foi para que já não houvesse mais judeus
nem gregos, nem escravos nem livres, nem homem nem mulher, pois sois agora livres
em Cristo101
.
97
Catecismo da Igreja Católica,§§ 207-208
98 UNAMUNO, op. cit. 1996, pp. 162-163
99 Deus Cáritas Est, §17
100 Cf. Rm 8,21
101 Cf. Gl 3,28
53
Ao fim e a cabo este Deus é o Deus da libertação, do amor. Da mesma maneira
que o amor não impõe, da mesma forma Deus. Neste perfilar de pensamento nos
deparamos uma vez mais com São Paulo quando diz: O amor cresce através do amor. O
amor é “divino”, porque vem de Deus e nos une a Deus, e, através deste processo
unificador, transforma-nos em um Nós, que supera as nossas divisões e nos faz ser um
só, até que, no fim, Deus seja « tudo em todos » (1 Cor 15, 28).
E se tratando ainda desse reconhecer a Deus acrescenta Bento XVI:
“O reconhecimento do Deus vivo é um caminho para o amor, e o sim da
nossa vontade à d'Ele une intelecto, vontade e sentimento no ato globalizante
do amor. Mas isto é um processo que permanece continuamente em caminho:
o amor nunca está « concluído » e completado; transforma-se ao longo da
vida, amadurece e, por isso mesmo, permanece fiel a si próprio.” 102
É dizer, o amor é aquilo que o homem busca desde sua criação. Desde o instante
que fora separados, divididos. A saber, o homem está sempre em busca daquilo que o
complete e dê sentido a sua existência.
O amor é, portanto, o eixo constitutivo, a chave que nos levará ao universo da
consciência, fazendo-nos encontrar com a Suprema Consciência (Deus). Pois já escrevia
Carlos Vogt: “Deus é uma barreira em móvel que, localizada nos últimos limites do
saber humano e acompanhada de uma grande questão X, retrocede sem cessar perante
os progressos da ciência. E eu acrescento: da barreira aqui, tudo se explica sem Deus, da
barreira em diante, nem com Deus, nem sem Deus, por tanto resta Deus.” 103
Com isso nos dirá Unamuno que este Deus cordial, dos sentimentos é o dos
vivos, é a Consciência do Universo. E na medida mesma nos homens criação, do Deus-
Amor, iremos aos poucos reconhecendo em nós e nos outros que este “Deus dos vivos,
teu Deus, nosso Deus, está em mim, está em ti, vive em nós, e nós vivemos, nos
movemos e somos Nele.”104
102
Cf. Deus Cáritas Est.
103SILAR, Op.cit
104 UNAMUNO, op. cit. 1996, p.171
54
Em outras palavras diz Arendt pelo desejo que temos de Deus, chegamos a este
que é Deus, da mesma forma é o amor.105
Concorda Charbonneau quando diz que
somos humanos, porque sabemos que Deus é Amor.106
Neste sentido Deus quis se
encarnar na pessoa de Cristo e desta forma se inserir por meio do amor na história deste
homem que é de carne e osso.
Para todos os efeitos somos direcionados a amar, e amar a partir daquele que nos
criou. E tudo porque este Homem já experimentou do amor de Deus, pois nos seria
contraditório falar de amor de Deus, ou até mesmo Dele, sem nunca mesmo haver
experimentado, não em sentido empírico, mas emocional, em espírito.
Experiência que fará com que o homem, com o homem, seja ousado se
abandone, e faça aquilo que deve ser feito, e diga sem esmorecer de que não há nada
mais que o amor de Deus.107
Assim mesmo dirá Francisco Sales Deus mesmo, na pessoa do Homem-Deus, se
uniu a criatura fazendo com que isso determine a posição de Deus mediante ao homem,
conjunto da criação, pois Amando a Deus sobre todas as coisas, nos tornamos em Deus
mais que criaturas, passamos a ser Filhos.
Portanto amar a Deus é também perceber no outro a figura de Deus, é acolher
assim as nossas misérias e suas misérias, pois é, no outro que reconheço a Deus e toda a
sua grandeza, pois tudo o que ele fez é bom. Deus é diferente de nós não é meramente
um ser pensante, um pequeno mortal, mas Ele é aquele que existe, Aquele que é Amor.
Neste sentido o homem torna-se realmente ele mesmo, quando corpo e alma se
encontram em íntima unidade; e aspira a ser somente espírito e quer rejeitar a carne,
pois quando dominado, isto é, envolvido pelo amor o homem sente que é infinito e
imortal, afinal isso nos promete o amor, duração e infinitude, no sentido ultimo de não
105
ARENDT, Hanna. O conceito de amor em Santo Agostinho – Porto Alegre: Instituto Piaget, p. 68
106 CHARBONNEAU, op. cit. p,461.
107 Ibidem,Idem p.474
55
morrer. Afinal é o Amor que nos revela o eterno, e o amor de Deus é que nos faz crer
que venceremos o tempo108
.
Assim que pelo amor a mim mesmo, e ao próximo posso compreender de um
todo aquilo que esta fora de mim. Sem embargo Unamuno sempre pregou um amor
desapegado e livre de todo e qualquer preconceito, mas nos faz pensar que de tudo
dependemos de Deus, pois somente Ele nos pode direcionar para o Amor.
Em contrapartida reafirma Bento XVI que é pelo amor que compreendemos a
totalidade de toda a existência. Pois Deus é para o homem quanto o homem é para
Deus109
, uma vez mesma que o Homem é fruto da ideia de Deus. Por tanto amem,
amem e façam o que desejam, pois amar nos permite pela consciência conhecermos a
Deus.
108
Unamuno, p 196 109
Idem,Ibid p.199
56
2.3 Considerações Finais
Ao logo da evolução humana se percebeu que muitas foram às formas dadas ao
amor, no entanto se tornou intacto a maneira a qual se alcança o verdadeiro amor.
Percorremos ao longo deste caminho, um percurso que nos levou de maneira
sutil a compreender e a desvendarmos como o amor é compreendido em Unamuno.
Amar é sofrer, quem nunca sofreu não pode afirmar que amou verdadeiramente,
e isso defende Unamuno, afinal ainda que pareça algo belo, tão fantasioso, o amor assim
com uma rosa possui também seus espinhos. E para que se possa dizer “Eu te amo”, é
necessário renunciar.
Unamuno nos demonstrou também que o amor é puro desejo. O amor é desejar
aquilo que me falta, no sentido de buscar aquilo que um dia perdi no tempo, aquilo que
me completa. Domado pela falta, somos convocados a nos abrir a novas experiências,
isto é, nos abrir aos que nos cercam buscando compreender no outro aquele que sou por
natureza.
Chegamos aqui à compaixão, esta nos permite sair do narcisismo e refletir no
outro, aquele que está fora de mim. Este seja talvez o amor pregado por Jesus durante
toda sua vida terrena - “Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os
doentes.” (Mt 9,12).
Em consequência disto percebemos que Amor é dom, é gratuidade. A partir
daqui somos levamos a nos perguntar quem é Deus? De onde que nos vem esse amor
como dom?
Parece óbvio, se o amor é dom, só poderia ser nos oferecido por Deus. Mas não
é assim, pois para que afirmemos que Deus é Deus, nos Faz necessário antes de tudo
buscar um caminho inverso, não cartesiano, mas bem unamuniano, ou quiçá freudiano,
pois partimos do filho para que conheçamos a Deus.
Vimos também que em resposta a sua criação e superabundância, Deus nos
permite não só sermos imagem e semelhança vossa como também nos permite Amar e
sermos amados, mesmo que ainda sejamos limitados em nosso corpo e mente.
57
Nesta nova batalha descobrimos que podemos chamar Deus de Deus, porque
algum dia nos foi revelado, - “Deus tanto amou o mundo que nos deu seu único filho”.
A partir daqui percebemos que já não somos meros mortais, mas que somos homens
criados no amor e para o amor, e que, portanto, temos o dever de propagá-lo por toda a
terra.
Aquele que antes somente Era, torna-se também amor. Afinal Deus é Amor. Mas
não um amor egoísta, que se restringe só tão somente só nele mesmo, mas que se abre
ao novo, ao homem que é capaz a ele responder da melhor forma possível.
Desta maneira, nos é permitido viver a loucura de esperar e buscar com ânsia
aquilo que nos completa, pois ainda que sejamos imagem e semelhança do Criador,
somos limitados para reconhecer em nós de maneira comunitária a grandeza de Deus.
Pois assim, toda a história do homem se deixa engendrar pela manifestação consciente
de Deus.
Diante deste movimento, nos é pedido que saiamos de nossos redis e nos
abramos a novas experiências, afinal não fomos criados para vivermos sozinhos,
isolados, pelo contrário fomos criados para experimentarmos ainda que seja necessária a
dor real e vital dose do amor.
Deus é, portanto, o artista que absolutamente poderá ser pensado, mas bem
sentido, na generosidade do outro em se abrir e se deixar amar. Já nos dizia Dostoievski
“em nossos sofrimentos ressuscitaremos para a alegria, na qual o homem não pode viver
nem Deus existir, pois é Ele quem nos dá o grande privilegio” o de amar.
Deus é, portanto o fundamento de nossa existência em sua origem como é
também em seu fim, pois Deus é Amor.
58
Capítulo III
Amor: a pedagogia das relações
Até aqui vimos que o amor é por natureza puro desejo, vontade de ser. Mas é
também dom, graça de Deus. É entrega e abertura ao Outro. A partir dessa certeza e
com mais claridade nos tocará aqui minuciosamente verificar como nós homens do
século XXI lidamos como o amor, e de que maneira este sentimento é sentido por nós.
Para isso faremos um percurso que a meu ver se faz necessário para tal
compreensão, e seria este o caminho: analisar o amor numa relação do Eu - Tu, e de que
forma esse amor se desenvolve como uma pedagogia, isto é, maneira de sentir e
compartilhar com o outro tal sentimento que não é individual, é aberto e circular.
3.1 Amor: o Eu e o Tu
“[...] ter aquilo que se quer ter nem sempre é sinônimo de amor
verdadeiro ou de um sentimento profundo [...] nem objeto, nem
personalidade: amor é ausência na ausência do outro. O amor se faz ao
contrário. É de dentro de si mesmo que o amor floresce e não de fora. O outro
é o sol, mas que deve habitar apenas dentro daquele que ama.” 110
Em direção ao presente pensar está Unamuno quando nos diz “Sou homem e a
nenhum homem eu considero estranho” 111
, pois como nos lembrará Mounier, “só sou
para o outro na medida mesma que o outro é para mim”. O que nos indica que meu
relacionamento com o outro me é dado no instante que me permito pelo outro
conhecido.
Ser pessoa para Unamuno é ser o homem concreto de carne e osso, que carrega
consigo sete virtudes e ao mesmo os sete vícios capitais112
, o que não nos impediria de
continuar a descobrir no outro o que é nosso.
110
Flávio Tonnetti; Arthur Meucci. Amor, existência e morte. – Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2013
– Coleção Miniensaios de Filosofia.
111 UNAMUNO, M. Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Tradução de Eduardo
Brandão. – São Paulo: Martins Fontes, 1996 p. 1
112 CUESTA, Manuel Sánchez. El personalismo unamuniano: la relación Yo-Outro. In revista
Acontecimiento: disponível em http://www.mounier.es/ Acessado em 20/04/15 às 14:40
59
De alguma maneira aqui passamos com mais intimidade a olhar para nós mesmo
para nossas fraquezas, pois se entendermos e verificarmos bem, o Outro é aquilo que
fora retirado de nós, é a outra metade da laranja, a tampa da panela. Pois tal separação
nos explica, o mito que se deu por certa forma pelo medo que os deuses sentiram dos
homens, assim Zeus decide: “vou cortar cada um deles em dois; serão ao mesmo tempo,
mais fracos e mais proveitosos” 113
. Assim, portanto, mediante a tal signo da separação
surge à falta e a carência114
, a partir daqui o homem passa incansavelmente a buscar o
outro na tentativa de voltar a ser um. Uma virtuosa realidade, a qual será possível ao
homem por meio do Amor.
Afinal é o amor o responsável pela unificação dos corações. No entanto, se pode
perder quando entra em um velho conflito, sentimento e razão, pois o homem quando
ama ele sente com o coração e afirma ou nega com a razão, temos aqui o velho dizer de
Pascal “o coração possui razão que até a própria razão desconhece”. E tudo porque o
homem é dotado de amor, um amor que ultrapassa sua razão. É a consciência que nos
faz enxergar no Outro e o Outro com um olhar diferenciado, e pela compaixão que nos
debruçamos sobre aquilo que somos em nossa natureza: Amor.
E tudo isso nos fica claro quando aos nossos ouvidos ressoa:
“Com voz de ressonância
nos níveis do ar
voz de calma e de arrulho
voz de brisa
entre as folhas das árvores
voz de sussurro
no vácuo da espera
voz de confissão e de prece
voz de água
contra as rochas da beira
113
NEUMANN,Patrícia. O mito do andrógeno contado por Aristófanes no banquete: homossexual,
heterossexual e amor. In: Anais da XII Semana de Filosofia e III Semana PET Filosofia – UNICENTRO
– Guarapuava, Paraná nos dias 07 a 11 de Outubro de 2013
114 DROZ, Geneviéve. Aristófanes e o Mito do “Andrógino”. Os Mitos Platônicos. – Brasília: Unb, 1997
pp. 27-91.
60
com voz de grito de liberdade
no exílio da palavra
e com silêncio
de encadeada amante
a quem te ama,”115
Fica aqui exprimido a importância que há tanto para Mounier, quanto para
Buber, grandes figuras do personalismos que essa proximidade do Eu e Tu nos é dada
por intermédio da comunicação, pois somos pessoas criadas para a comunicação, tanto
emocional, quanto social, uma comunicação que aqui para nós é dada por meio da
compaixão, afinal como vimos é nela que contemplamos a beleza, que esta contida no
Outro. Para maior compreensão, vejamos:
“O Tu, vem antes do Eu. Pois a criança ela reconhece antes dela
mesma o Tu, no entanto para que ela possa se descobrir em sua
plenitude se faz necessário mergulhar no mistério que é o Tu.” 116
Consequentemente:
“A relação com o Tu é uma relação direta. Entre o Eu e o Tu não se
interpõe nenhum sistema de ideias, nenhuma espécie de esquema ou
imagem previa [...] entre o Eu e o Tu não se interpõe um fim, nem,
prazer ou prejulgamentos, pois o desejo se transforma em presença,
isto é em pessoa.” 117
É justamente esse jogo relacional que muitas das vezes não compreendemos e
acabamos nos enredando em sistemas aos quais não conseguimos nos encontrar e mais,
é um problema que acaba sendo estendido aos sentimentos, pois só nos reconhecemos
pessoas na medida mesma em que há uma relação com outra pessoa, uma troca de
energia, de prazer, de gostos.
115
IBÁÑEZ, Guillermo Juan. Poemas de Amor. In: Revista Pandora do Brasil, Edição Nº 39 - Fevereiro
de 2012 - "Poetas Poesia II"/ Disponível em http://revistapandorabrasil.com/ Acessado em 18/04/2015 ás
15:45
116 DÍAZ. Carlos. Introducción al piensamiento de Martin Buber. Instituto Emmanuel Mounier.
Disponível em www.Mounier.es
117 Ibidem.Idem
61
No entanto, o erro mais cometido é o esquecimento. Esquecemos que os
sentimentos são estados anímicos e que, portanto, devem ser compreendido como tal
em sua particularidade, pois em cada pessoa reaciona de maneira diferente.
Assim, portanto, o amor é responsabilidade. É compatibilidade. É um mundo no
qual somos submergidos a uma sensação de prazer, de vontades e desejos, um
envolvimento mágico que nos Leva a perguntar: porque amamos? Porque somos
amados?
Talvez, tal pergunta nos direcione aquilo que antes havíamos denotado, amamos
porque nos falta, e só numa relação com o Outro é que me descubro, pois o “amor é
uma alegria acompanhada por uma ideia ou causa exterior118
”, e como senão bastasse o
amor é conhecer o Outro, criar um grau de intimidade experiência a qual nenhum outro
sentimento nos permitirá.119
Compreendendo isso nos dirá Buber: “Só posso amar o ideal e não posso
conceber o ideal em nenhuma outra forma senão amando-o” 120
. E em concordância diz
Unamuno: Só amo o outro personalizando-o.
Como isso, percebemos que o Tu é o marco da existência humana desde sua
criação, - “Depois das costelas que tirara do homem, o Senhor Deus modelou uma
mulher” (Gn 2, 22). O amor por sua vez também é força, é dinâmica que está sempre
em direção do outro: “E o amor? Ah! Amor, esse, não havia de vir, chega sem querer,
pois quando se ama- o amor dele necessita” 121
, sempre aparece.
É também sem dúvidas o amor que se agarra, se prende, ao mais íntimo de
nossas almas de maneira mais profunda de nossa própria inteligência, pois o amor,
seduz, nos alucina e nos completa. O amor por sua vez serve da inteligência para que
possa ir mais no fundo e longínquo conhecimento da pessoa amada.
118
SPONVILLE, Andre Comte. Amor. Tradução de Eduardo Brandão. – São Paulo: Martins Fontes,
2011 p.78.
119 Ibidem,Idem p.88
120 DÍAS, Carlos. Introducción al pensamiento de Martin Bubber. – Clasicos Basicos del
Pensamiento; Disponível em www.mounier.es.
121 Unamuno, Miguel de. Uma História de amor. In: Revista Pandora do Brasil, Edição Nº 14 – Janeiro
de 2010 - "Miguel de Unamuno"/ Disponível em http://revistapandorabrasil.com/ Acessado em
28/04/2015 às 14:29
62
Como diria May, o amor sempre chama um amor, é ele sempre um grito por
outro amor122
.
Aqui se faz claro e evidente o que já nos dizia Marcel “a pessoa se realiza mais
que em atos pelo qual tende a se encarnar( em uma obra, em uma ação, em um conjunto
de uma vida) mas se realiza como pessoa na encarnação particular(...) pois, é no ser
pessoa que se participa da inesgotável plenitude de onde brota a pessoa”.123
Em contra partida o amor em sentido mais amplo e concreto, só se faz
verdadeiro se for amor de um ser, para outro ser124
, isto é se houver uma relação entre
um Eu e um Tu, o que nos deixa claro que o amor ele transcende a oposição do si
mesmo e do outro na medida mesmo que reconhece o outro.
O que nos leva a pensar que o amado, isto é, o outro passa a ser percebido, pois,
passa o amante a chamá-lo pelo nome, fazendo com o que antes era desejo, passe a ser
compartilhamento, isto é, já não é um amor egoísta e sim um amor complementar,
deixando de ser busca e passando a ser plenitude.
Tudo nos leva a declarar:
“El ser a quien amo no es de ninguna manera um tercero para mi...El
a cada vez más en el circulo con relación al cual-exteriormente al cual –se
dan los terceros que son los otros. Expresaria esto diciendo que no comunico
efectivamente conmigo mismo, sino el medida en que comunico com el
outro, es decir, en que el outro se convierte en Tú para mi”.125
E mais amado e amante tornam-se um, não havendo mais diferença entre ambos:
“Amo tanto más aunténticamente cuanto menos amo por mi, es
decir, por lo que puedo esperar del outro, y más por él mismo (...) la
respuesta residiria más bien em la comunidad cada vez más invisible en el
seno en el cual Yo y el Outro nos fundimos más perfectamente”. 126
122
MAY, ROLLO. Eros e repreensão: o amor e a vontade. Tradução de Áurea Brito Weissenberg. -
Petrópolis, vozes, 1973.
123 PERÉZ, José Seco. Introducción al Pensamiento de Gabriel Marcel. Instituto Emannuel Mounier –
Coleção Clasicos Basicos del Personalismo; p29. –Disponível em www.mounier.es – acessado em
28/04/2015 ás 15:00.
124 Ibidem, p.36
125 Ibidem, p.38
126 PÉREZ, op.cit. p.38-39
63
O que devemos compreender que, é no outro e com o outro que me fortaleço,
que construo aquilo que em mim estava em falta. É contemplar o que nos recorda
Agostinho: “o amor torna fácil o que é difícil e leve o que é pesado, pois dois amores
construíram duas cidades, o Amor a si mesmo até o desprezo de Deus, o amor de Deus
até o desprezo de si mesmo”.127
Assim, portanto, o amar o outro é a ele dar créditos, é considerá-lo em sua
totalidade e não pelo que ele haverá de ser, pois o mistério do amor se concretiza no
intimo conhecimento do outro.
Nisso vemos com clareza, quando vemos narrado o amor que Jonatas sente por
David.
“Aconteceu que, terminando ele de falar com Saul, a alma de
Jônatas se ligou com a alma de Davi; e Jônatas começou a amá-lo como a si
mesmo. E Jônatas fez um pacto com David; porque Jônatas o amava como à
si mesmo. E Jônatas se despojou da capa que trazia sobre si, e a deu a Davi,
como também as suas vestes, até a sua espada, e o seu arco, e o seu cinto”.128
Notoriamente fica evidenciado que o ser humano, como já se sabe, é um ser de
relação e isso implica dizer que possui a capacidade de estabelecer vínculo com o seu
próximo e, a partir disso, ressalta-se uma categoria considerada primordial para Buber,
isto é, o “entre”, “lugar em que se torna possível a aceitação e a confirmação ontológica
dos dois pólos envolvidos no evento da relação” (ZUBEN in BUBER, 1979, p.XLVIII).
Ou seja:
“Compreenderíamos o homem se o compreendêssemos como um ser
cuja dialógica estar-dois- em –recíproca presença que se realiza e reconhece
cada vez no encontro do um com o Outro”. 129
Afinal:
“O ser humano vai muito mais além da simpatia... e o cara a cara
recíproco do dialógico”. 130
127
GONZÁLES OSA, Paulino Sahelices. O amor, fio condutor. In: Cadernos de espiritualidade
agostiniana, vol 2, - FABRA (Federação Agostiniana Brasileira), Petrópolis, RJ. 2011
128 Cf. 1 Sm 18, 1. 3-4
129 DÍAS, Carlos. Introducción al pensamiento de Martin Bubber. – Clasicos Basicos del
Pensamiento; p.24 - Disponível em www.mounier.es – Acessado em 28/04/2015 às 16:00.
130 Ibidem,Idem
64
Sem embargo, nos fica atestado que o Outro sem sombra de dúvidas é de
extrema importância para nós, pois é no outro e com o outro que nos fazemos pessoas e
nos reconhecemos como seres amados, e criados para amar.
Neste mesmo sentido de Buber, se encontra Unamuno pois a relação do homem
com o Outro é uma busca não daquele que está fora, mas é um recorrido uma forte
busca de si mesmo131
. Consequentemente forte e egoísta, o Eu se converte num amplo
Nós. O que significa que o Eu sai de si e vai em direção do outro, o que é para
Unamuno o grande ato da Compaixão.
Neste sentido a compaixão deixa de ser plural e passa a ser singular, sendo capaz
de transformar o Outro em irmão132
, fazendo com o Eu individual e narcísico se abra a
uma conectividade com o Outro, com aquele que é seu próximo.
Sem embargo, entramos aqui ao que muito pouco se é dito em Unamuno que é,
pois, a questão da alteridade, que não passa desta relação que há entre o Outro e Eu,
dada por meio da simpatia dolorosa culminada pela caridade e compaixão.
“O amor e a dor se geram mutuamente, o amor caridade e a
compaixão, e o amor que não é caritativo não é tal amor. O amor é por fim
desespero resignado”.133
Em outras palavras amar é simplesmente dar-se. Pois neste jogo Tu e Eu amar ao
próximo sem resignação é amá-lo na mesma medida com a que nos amamos.
Amar ao outro significa a ele dizer: “Tu não morreras”, o que da margem a
entender que amo algo, ao qual me permite selar o abismo, ao qual chamamos de morte,
pois contrario dela o “amor quer sempre o que é eterno”.
Isso já clamava D. Miguel: “Dá-me mais um instante de vida”!134
, tudo nos leva
a pensar que todos morrerão; O porquê de tudo? Simples cada um de nós está morrendo
a cada passo, uma vez mesmo que a morte se torna um forte mistério enigmático para
131
DÍAZ-PETERSON, R., Unamuno: el personaje en la busca de sí mismo,Playor, Madrid, 1975.
132 CUESTA, Manuel Sánchez. El personalismo unamuniano: la relación Yo-Outro. In revista
Acontecimiento: disponível em http://www.mounier.es/
133 UNAMUNO, M. Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Tradução de Eduardo
Brandão. – São Paulo: Martins Fontes, 1996, p.198
134 ARCANJO DOS SANTOS, Milton. A fome de imortalidade na obra de Miguel de Unamuno.
In:Monografia (Graduação Licenciatura em Filosofia) Faculdade de São Bento, São Paulo 2009, p.31
65
nós meros humano. Pois, acrescenta Unamuno; “o pensamento que tenho de morrer e o
enigma do que haverá depois é o próprio latejar de minha consciência” 135
. Assim por
tanto, tornaria o amor, ou até mesmo o ato de amar um morrer lentamente.
No entanto a grande batalha travada por Unamuno e justamente essa, não morrer
e sim viver, e viver sempre pela eternidade. E isso não é egoísmo, e sim amor em
Unamuno, um amor pela vida, pelo próximo e por si mesmo.
E acrescentamos:
“O amor é aquilo pelo que os mortais embora nunca sendo iguais,
tendem a conservar e a participar, a imortalidade [...] afinal o amor é a
própria vida, vida que amam e buscam a imortalidade”.136
Contrário a este pensamento ainda Sponville em sua obra “ O Amor” afirma que
o fato de dizer ao outro que o amamos, isto é, o velho jargão “Te amo”, é demonstrar ao
outro que ele é efêmero ao que realmente sinto, pois ao pronunciar ao outro Te amo137
, é
o mesmo que dizer: caso você me abandone não sofrerei, pois creio, tenho a certeza que
ao final da fila há outro há minha espera. Tudo porque nós ainda não aprendemos amar
de uma maneira desnudada, livre, sempre queremos algo em troca, ainda que seja um
“Eu também te amo”.
Ora, se o simples fato de afirmar com palavras ao outro meus sentimentos da
margem a tal pensar, significa que somos muitos mais que uma dependência do outro,
somos puros devir, somos amor em nossa natureza.
Tudo nos faz recordar que o homem não se aproxima do mundo tão somente
pela experiência, mas “o experimentador não participa do mundo: a experiência se
realiza ‘nele’ e não entre ele e o mundo”.138
Destarte sendo o homem um ser de relação. Portanto estabelece vínculos. Ao
que nos implica afirmar que o mesmo possui a grande capacidade de estabelecer um
135
ARCANJO, Op. Cit. p. 32
136 COMTE-SPONVILLE, André. Pequeno tratado das grandes virtudes, Tradução de Eduardo
Brandão. - 2ª edição – São Paulo, Martins Fontes, 2009 – p.255
137 COMTE-SPONVILLE, André. O Amor, Tradução de Eduardo Brandão – São Paulo, Martins Fontes,
2011 – pp. 76-77
138 ZUBEN, Newton Aquiles Von. Martin Buber: Cumplicidade e Diálogo. Bauru: EDUSC, 2003.
66
vínculo com aquele que está próximo dele. E mais, em relação com o fato a cima o que
estabelece este vínculo é o lugar no qual está inserido139
este homem, fazendo com que
seja possível a aceitação e confirmação dos eventos envolvidos, a saber, o homem e o
homem, em outras palavras o Outro.
É, por meio desta atitude, que o ser de relação desvenda os segredos da natureza
sob a sua ação e o seu protagonismo; porém torna-se um mal através do momento em
que o homem converge os seus valores, unicamente, a este modo de existência o qual
favorece a indisponibilidade e a irresponsabilidade para com o outro, com o mundo e
com Deus.
É-nos esclarecido que para que eu possa distinguir de fato aquilo que sou, do que
não sou é necessário aceitar a existência do Outro, como diria Aristóteles “o homem é
por natureza social”. Sendo assim, “para que eu possa ter consciência de mim mesmo,
preciso diferenciar-me do outro. Só quando existe essa diferenciação que pode haver
relacionamento” 140
, e, por conseguinte verdadeiro Amor, pois “uma pessoa só alguma
coisa em relação a outro indivíduo”.141
E finalmente nos é esclarecido que o Amor só é gerado por uma estrita e
confidencial relação entre o Eu e o Tu, o nosso fim é envolver-nos, entregar-nos ao
Outro, tornando-nos um com ele, pois dirá Buber:
“O amor é uma força cósmica. Aquele que habita e contempla no amor, os
homens se desligam do seu emaranhado confuso próprio das coisas; bons e
maus, sábios e tolos, belos e feios, uns após outros, tornam-se para ele atuais,
tornam-se TU, isto é, seres desprendidos, livres, únicos, ele os encontra cada
um face-a-face. [...] O Amor é responsabilidade de um EU para com um TU:
nisto consiste a igualdade daqueles que amam, igualdade que não pode
consistir em um sentimento qualquer, igualdade que vai do menor, ao maior
do mais feliz e seguro, daquele cuja vida está encerrada na vida de um ser
amado, até aquele crucificado durante sua vida na cruz do mundo por ter
podido e ousado algo inacreditável: amar os homens”142
E completa Unamuno:
139
Aqui nos remetemos Vygotsky quando em seus estudos retrata as maneiras de aprendizagens, pois o
homem afirma, ele; só reconhece o outro no momento em que sai de sua zona de conforto e passa a zona
de proximidade.
140 JUNG, Carl Gustav. Sobre o Amor, - Tradução de Inês Antonia Lohbauer; - Aparecida, São Paulo:
Ideias & Letras, 2005.
141 Ibid, idem, p. 87.
142 ZUBEN, Newton Aquiles Von. Martin Buber: Cumplicidade e Diálogo. Bauru: EDUSC, 2003 –
p.17
67
“O amor é o rumor das águas profundas que se funde ao ruído das folhas
secas e vem numa altura em que a terra ressequida se escancara – e, à
superfície dela irrompem, como um manancial, as águas adormecidas isso é o
amor, [...] amor encarnado e humanizado, que exige que a ele pertençamos,
inteiramente – e só a ele”. 143
E por fim;
“O amor supõe que Eu ame alguém (Outro), e que este alguém seja amado
com o mesmo amor. Desta forma nos deparamos com esta tríplice realidade:
o que ama (Eu), o que é amado (Outro) e o próprio amor (Deus). O que é
portanto o amor, senão uma certa vida que enlaça dois seres, ou tenta enlaçar,
a saber, o que ama e o que é amado”? 144
Assim é o amor pura relação, comunicação entre mim e o outro. È uma busca
incansável por uma completude que se perdeu no tempo. Sem embargo o amor é força,
movimento o qual me impulsiona na barreira da vida buscar o outro, me fazendo
abandonar o narcísico e egoísta, e me abrindo para um amor que é cumplicidade é
compartilhamento.
Ao fim e a cabo na medida em que a pessoa se relaciona com seu próximo e
descobre nela seu amor, a ponto de poder dizer como Deus disse a Jesus “Este é meu
bem amado e nele eu me comprazo”, seremos pessoas mais felizes e realizadas – “A
partir do momento em que o amor se faz feliz, se satisfaz, se realiza, já não mais deseja,
mas ama.” 145
O que realmente temos que entender é que o amor ele só se concretiza, se realiza
quando há uma resposta comprometida do outro, e com isso, ter presente que o Amor é
um presente e constante relacionamento entre Eu-Tu.
Neste sentido quando se há uma doação mútua, uma afinada aceitação entre
ambos, o Tu nos dá uma abertura, a eternidade. O que nos da margem a um novo e
eterno Tu. Pois, é mediante a relação entre os homens que nascem uma profunda relação
Deus-Homem.
143
UNAMUNO, Miguel de. Uma História de amor. In: Revista Pandora do Brasil, Edição Nº 14 –
Janeiro de 2010 - "Miguel de Unamuno"/ Disponível em http://revistapandorabrasil.com/
144 GONZÁLES OSA, Paulino Sahelices. O amor, fio condutor. In: Cadernos de espiritualidade
agostiniana, vol 2, - FABRA (Federação Agostiniana Brasileira), Petrópolis, RJ. 2011
145 UNAMUNO, M. Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Tradução de Eduardo
Brandão. – São Paulo: Martins Fontes, 1996, p 196
68
Ao final nascemos e fomos criados por Deus e em Deus. Assim sobre tudo ao
falar do Outro em nossa relação, estamos englobando uma íntima relação com Deus que
nos permite amar e sermos amados.
3.2 O Tu eterno e absoluto.
“O Deus sentido, a divindade sentida como pessoa e consciência única fora
de nós, embora envolvendo-nos e submetendo-nos, converteu-se na idéia de
Deus [...], portanto dizer que Deus existe, sem dizer o que Deus é e como é,
equivale a não dizer nada”.146
Unamuno sempre fora muito religioso, pois adotara esta virtude de sua amada
vó. No entanto, com o passar dos anos o jovem Miguel deixa de certa maneira sua fé
adormecer, o que produz mais tarde uma imensa crise. Mas a personalidade e ideia de
Deus sempre pulsaram em seu interior.
É em virtude a esta inquietude que Unamuno começa a investigar a esse Deus e
sua influência na vida dos Homens. Vimos que por natureza os homens são seres de
relações com o outro, com o Universo e mesmo com Deus (o grande Tu).
Não obstante ainda que nos relacionemos com as demais pessoas, sempre
estamos com uma mera sensação de vazio, como se tal relação não se bastasse por si
mesmo. O que nos levaria a buscar um novo Outro, aquele que pudera ser eterno e me
eternizasse nele.
Por essa razão que Unamuno mergulha no mistério do Tu eterno. O que talvez
viesse a ser seu trampolim para a questão da imortalidade. Do querer ser eterno, pois
existirá sempre em nós o desejo daquele que É.
Sem dúvidas que as relações humanas imprimem o desejo de uma participação
total com o ser do outro e com o Tu eterno (Outro). Com tudo nossa tarefa é fazer
possível o diálogo do homem com Deus, de recuperar a relação entre os homens, o
mundo e Deus, pois, segundo ele, é isso que interessa ao homem e lhe é significativo e
profundo a sua relação com o Tu eterno.
Neste sentido já nos alertava Martin Buber:
146
Ibidem, pp. 154-155
69
“La vida humana toca con el absoluto gracias a su carácter
dialógico,pues, a despecho de su sigularidad, nunca el hombre, aunque se
sumerja em próprio fondo, puede encontrar um ser que descanse del todo em
si mismo, de este modo, Le haria rozar com el Absoluto; el hombre no puede
hacerse enteremente hombre mediante su relación consigo mismo, sino
gracias a su relación con Otro mismo”.147
Ora, o que Buber quer resgatar é que por sermos pessoas sociáveis
necessitamos de total relacionamento. No entanto Unamuno parece inverter esse quadro
quando nos diz que não chegamos ao Tu por meio da razão, mas sim pelo meio do
amor. Afinal de contas o Deus é um mistério.
Por outro lado, o Deus unamuniano não passa de uma mera projeção humana,
sinalizada pelo profundo desejo que se há no homem que existia um ser supremo, o que
me permitiria concebê-lo com um ser Absoluto e realmente eterno. Talvez por isso fosse
à divindade de Deus substituída por uma necessidade.
Declara Unamuno:
“É na necessidade de Deus parece sua vontade livre, isto é sua
personalidade consciente. Pois o Deus que ansiamos, o Deus que salvará
nossa alma do nada, o Deus imortalizador, tem que ser um Deus
arbitrário”.148
Embora nos pareça apresentado a uma figura de um Deus ideal, isto é, criado
pela ideia e necessidade do homem; o Deus de Unamuno é por sua vez um Deus Vivo e
presente que está sempre próximo dos seus, o mesmo Deus dos cristãos – Um deus que
pensa, age e cria, ou seja, é Um Deus Ativo149
.
O homem que busca a Deus e com ele deseja manter uma relação se inclina bom
e terno caminho – “Eu sou o caminho a verdade e a vida” 150
. Afinal, os homens ao
buscar encontram a Deus e nele se abandonam, apostam. Pois, seguramente quem
encontra seu Tu, a outra metade da laranja, implica neste Tu ser de um todo inteiro, pois
se há encontrado com aquele que não pode ser buscado.
147
DÍAS, Carlos. Introducción al pensamiento de Martin Bubber. – Clasicos Basicos del Pensamiento;
p.27 - Disponível em www.mounier.es – Acessado em 07/05/2015 às 15:00
148 UNAMUNO, M. Do sentimento trágico da vida nos homens e nos povos. Tradução de Eduardo
Brandão. – São Paulo: Martins Fontes, 1996, p 158
149 Ibidem, Idem, p.158
150 Cf Jo 14,6
70
Com isso nos recorda Unamuno, só nos conhecemos conhecendo ao Outro151
.
Não obstante o homem, para se relacionar com o divino, necessita, então, em primeiro
lugar manter a relação com o próximo, pois é este evento que garante o cultivo e o
constante desejo de uma relação perfeita, em que “o meu tu engloba o meu si - mesmo,
sem, no entanto, ser o si - mesmo; o meu reconhecimento limitado se expande na
possibilidade ilimitada de ser reconhecido” 152
, pois a sua imagem e semelhança o
homem fora feito, portanto nada mais justo esta incontrolável vontade de se aproximar e
manter contato com este que é eterno.
Tudo ocorre nos diz Dias, porque existe uma simetria153
entre o Eu e o Tu eterno
absoluto, e todo esse jogo simétrico ocorrer porque entre o Eu e o Tu há um
reconhecimento mútuo.
Agora não nos esqueçamos que cada e particular Tu, abre uma perspectiva ao
que diz respeito ao Tu eterno, ou seja, a cada Tu singular e particular a palavra primeira
se dirige ao Tu eterno.
É por essas e outras razões que devemos nos cuidar para que Outro enquanto
pessoa não seja tratada como um megafone amplificador, mas que seja cúmplice na
busca daquilo que o Outro é para nós.
Sem embargo, todo nosso acesso a esse Outro eterno nos é dado pelo amor,
antes a mim mesmo e ao meu próximo. Pois, somente assim é que o Tu (Deus) pode
chegar a uma realidade real e sentida.
Portanto, o caminho não é amar-nos a nós mesmo, tornando-nos prisioneiros
narcísicos e individualistas, mas amá-lo. Ao fim e a cabo “Deus é Amor, Pai do Amor e
filho Amor em nós” (UNAMUNO,1996 p.162).
Deste modo “todo conhecimento de Deus procede do amor a Deus, e é
conhecimento que pouco ou nada tem de racional. Tudo porque Deus nada tem de
indefinível” (UNAMUNO, 1996 p.162).
151
UNAMUNO, Miguel de. Abel Sánchez una historia de pasión. Versão digitalizada disponível em
http://www.gutenberg.org/ acessado em 07/05/2015 Acessado às 15:45
152 LORENZ, Fernando. A NOÇÃO DE PESSOA EM EMMANUEL MOUNIER. In: Monografia
apresentada à Universidade Católica Dom Bosco – Campo Grande Minas Gerais, 2008.
153 DIAS, José Francisco de Assis. Direitos Humanos: fundamentação onto-teológica dos diretos
humanos. - Maringá, Pr: Unicorpore, 2005 p.387
71
E por tanto nos amar “Deus em sua infinita bondade e infinita sabedoria, quis
revelar-se a si mesmo seu mistério e sua vontade e [...] Deus, invisível,, se revela por
causa do seu muito amor”.154
Afinal, dizia Mounier:
“La relación del yo con el tú es el amor, por el que mi persona se descentra
de alguna manera y vive en el otro aunque poseyéndose e y poseyendo su
amor. El amor es la unidad de La comunidad como la vocación es la unidad
de las personas”.155
3.3 Pessoa: Realidade ou Ficcção?
Frente a tudo nos resta tão só uma única questão: “Que é o homem Senhor para
vós? Exclama o salmista, para dele assim vos lembrardes e o tratardes com tanto
carinho? Pouco abaixo de Deus o fizestes, coroando-o de glória e esplendor” (Sl 8, 5-6)
Essa é uma pergunta que fundamentaliza toda a filosofia de Unamuno, e a ela o
mesmo responde “Todo homem, toda mulher é um ser que está em busca de si
mesma”.156
Unamuno define, portanto como pessoa, o homem. Aquele que é de
carne e osso. Sendo assim a pessoa unamuniana é aquela que desempenha um papel
tragicômica da história, é, pois, o personagem que o homem representa em sua vida real.
Não obstante a ideia de pessoa, no pensar unamuniano, explica Moelleda se
refere ao conteúdo espiritual do indivíduo. No entanto em Unamuno é estritamente
difícil fazer a separação do homem real, do homem personagem. Para tal confirmação
temos Augusto Pérez, que é, pois, segundo estudiosos um retrato, uma personagem da
vida interior (sentimental/intelectual) de Miguel de Unamuno.
É neste cenário que encontramos dúvidas, dificuldades em distinguir o homem
real de carne e osso, da vida interior de um personagem que se torna tão real quanto seu
criador.
154
Cf. CONCÍLIO VATICANO II, Constituição Dogmática sobre a revelação, n° 2
155RUIZ, Antonio. Emannuel Mounier. In: Instituto Emannuel Mounier – Coleção Clasicos Basicos del
Personalismo; n° 3 p39. –Disponível em www.mounier.es – acessado em 08/05/2015 ás 15:50.
156 CUESTA, Manuel Sánchez. El personalismo unamuniano: la relación Yo-Outro. In revista
Acontecimiento: disponível em http://www.mounier.es/
72
Para que compreendamos melhor, vejamos o que nos diz Unamuno:
“- [...] é preciso confundir o sono com o despertar, a ficção com a realidade, o
verdadeiro com o falso, confundir tudo numa única névoa... a criança ri na
tragédia e o velho chora na comédia.
- É a comedia, Augusto, a comédia que representamos perante nós mesmos,
no que se chama foro íntimo, no tablado da consciência, nos fazendo ao
mesmo tempo cômicos e espectadores. E na cena da dor representamos a dor,
e nos parece um contra-senso que então tenhamos vontade de ri.
- Então, o que é real, o verdadeiro, o sentido?
- E quem disse que a comédia não é real, verdadeira e sentida?
- Ora, tudo é uma coisa, é a mesma coisa. É preciso confundir, meu caro
Augusto, confundir. Aquele que não confunde, confunde-se.
- [...] Ora, você já esta se sentindo como um personagem de drama ou de
novela, homem! Devemos nos concentrar em ser personagens de nívolas!”157
É justamente este jogo de real e irreal que faz de Augusto Pérez um personagem
estático, e inseparável, fazendo com que ele possua as mesmas características de seu
criador D. Miguel – “Volto 158
a insinuar a ideia de que o senhor quem não existe fora
de mim e dos personagens que acredita ter inventado”.
Assim que ao evoluir neste contexto de unicidade, seu Augusto tão certo de sua
existência, pouco a pouco toma para si as crises existenciais de Unamuno159
.
Por outro lado, perceberemos que esta pessoa que cria Unamuno também
vontade160
. Vontade de ser, existir, se movimentar. Pois, onde há vontade há
manifestação de uma personalidade.
Frente a isso declara Unamuno:
“Eu sou o centro do meu Universo, o centro do universo, e em minhas
angústias supremas grito como Michelet: Meu eu, estão arrebatando meu eu!
De que serve ao homem ganhar ao mundo todo, se perde sua alma? (Mt 16,
26)”.161
157
UNAMUNO, Miguel de. Névoa. Tradução de José Antonio Ceschin. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1989 p 160-162
158 UNAMUNO, Op. Cit. p.168
159 A este respeito peço aos caros leitores que leiam do capitulo XXXI da Novela a Névoa de Miguel de
Unamuno.
160 MARTÍN, Jaime Vilarroig. El concepto de persona en “Del sentimiento trágico de la vida” de
Miguel de Unamuno, p. 286 In: http://dialnet.unirioja.es Acessado em 11/05/2015 às 15:00
161 UNAMUNO, 1996 P.44
73
Neste percurso, fica firmado que para Unamuno “cada homem vale mais que
uma humanidade inteira e que, portanto, não sacrificar cada um a todos, afirma
Gutierrez, a não ser que todos se sacrifiquem por um”.162
O que nos faz recordar que a existência da pessoa em Unamuno se dá na
comunidade, é comunhão163
, e deste modo a cada relacionamento a pessoa acaba por si
tornando-se sujeito, pois como dirá Unamuno onde há subjetividade há também
personalidade164
.
Neste sentido mesmo que Unamuno está sempre utilizando o jogo de vocábulos,
pois, tudo indica que aquele que de fato possui personalidade é capaz de “personificar”.
Portanto, o ato de Personalizar tudo é dado à pessoa, que assim como “Deus o amor
personaliza tudo que ama, e por outro lado Deus é a personalização do Todo é a
Consciência infinita”.165
È justamente neste ponto que o real e o fictício se misturam, afinal “todo real é
racional, e todo racional é real”.166
Tamanha é a mistura entre real e personagem que
tudo se confunde se perde no tempo.
Portanto o que antes era tão só uma personagem ganha vida; dando a ela espaço
e personalidade. O Eu vivo é, pois a pessoa, designando em Unamuno o abstrato e o
real. Tamanha é a selagem que chegamos a nos perguntar se realmente estamos vivos?
Neste caso vemos a Augusto, indagar:
“– Augusto terminou em meio a uma calma terrível [...] queria acabar
consigo mesmo [...] mas antes de levar a cabo sua intenção, como o náufrago
que se agarra s uma pequena tábua, ocorreu-lhe conversar comigo, autor
deste relato.
[...] – Em seguida começou a me contar de sua vida e suas infelicidades.
Interrompi-o dizendo que não precisava contar-me tudo aquilo das suas
vicissitudes da sua vida eu sabia tanto quanto ele. E demonstrei, citando os
mais íntimos pormenores e até aqueles que ele acreditava serem os mais
secretos.
162
GUTIERREZ, Jorge Luis. A “fome de imortalidade” no pensamento de Miguel de Unamuno.
Artigo em pdf disponível em www.mackenzie.br - acessado em 09/05/2015 ás 14:40.
163 MARTÍN, op. Cit. p.288.
164 Ibidem, p287.
165 UNAMUNO, 1996 p. 134
166 PELENCIA, Oscar González. El tema de la personalidad en la obra narrativa de Miguel de
Unamuno.Un estado de la cuestión. In: Boletín de la Real Academia de Buenas Letras de
Barcelona,2002 vol. 48 – Disponível em http://www.raco.cat/ ; Acessado em 11/05/2015 ás 14:20
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[...] – Não se mexa! – Ordenei.
_É que você não pode se suicidar, mesmo que o pretenda.
_ Como?
_ Para se matar é necessário que esteja vivo!
_É claro?
_ E você não está vivo!
_ Como? Não estou vivo? Por acaso morri?
_ Não homem, não! – respondi – Antes disse que você não estava acordado
nem dormindo, e agora digo que não está nem morto nem vivo
- A verdade, querido Augusto – é que você não pode se matar porque não
está vivo, e não está vivo e muito menos morto, porque não existe.
_ Você só existe como uma ficção. Você pobre Augusto, nada mais é que
produto de minha fantasia e das fantasias dos meus leitores que lerem o relato
de suas fingidas venturas e desventuras que eu escrevi. Você nada mais é que
um personagem de novela, ou de nívola... ”167
Assim que drama e personagem, novela e homem168
, todos se tornam um;
dificultando-nos a identificação de quem é autor (pessoa) e quem é personagem. E que
por fim o personagem não passa de tão só parte de uma leitura.
Deste modo que o autor possui a força, a capacidade de criar seus personagens.
É também o amor capaz de criar vínculos com as pessoas, ou até mesmo de destruir
com tudo que a mesma conquistou.
Tão evidente que o papel do autor permite que o leitor saiba que Unamuno é real
e que existe seja aparte ou envolvido bem adentro de sua novela. Sua existência é um
tema de muitas de suas novelas. E tamanho é o envolvimento de Unamuno nas novelas
que acaba não fazendo distinção daquilo que é Unamuno, seus afetos, seus medos. Do
que venha a ser o personagem, que é capaz de sentir e vivenciar as dores e amores do
próprio autor, possuindo assim suas mesmas características e assumindo sua
personalidade.
O que Unamuno nos tenta deixar claro, é que tudo em nós faz parte do Outro, até
mesmo nossa maneira simples e singela de amar. Basta que nos deixemos mergulhar em
nosso mundo.
Por outro lado, nos alerta que não é possível colocar todas as culpas e forças no
personagem, pois o mesmo é reflexo daquilo que sou. Portanto, na medida em que eu
me aproximo de mim mesmo, serei capaz de me abrir e me aproximar de outrem que se
167
NÉVOA, op. Cit. p.167-168
168 UNAMUNO, 1989 p.162
75
assemelha ou aproxima de mim. Podendo assim amá-lo, senti-lo, pois este é a
verdadeira pessoa; aquela que se realiza de um todo no amor e para o Amor.
3.4 Um caminho, um encontro: a pedagogia.
“Filosofar consiste en llevar a cabo una hermenéutica de la vida y los afectos,
tematizar las inquietudes más profundas del ser humano y ponerlas de
manifiesto, expresarlas para que cada individuo pueda identificarse con ellas
y entienda que son algo compartido con todos los demás. Cada ser humano
emprende una búsqueda para «encontrarse a sí mismo y para encontrar, con
él, a todos los seres humanos que a su vera sufren y gozan» (Ferrater Mora,
1985, 36).”
Assim como o ato de filosofar, é o amor. Pois é ele, uma hermenêutica, uma
elucubração da vida. È por meio da pedagogia do amor que Unamuno encontra uma
válvula de escape, um meio pelo qual os homens pudessem não só se encontrar consigo
mesmo, com o universo, mas também com todos que estão a seu redor buscando em
particular manter um vinculo de proximidade.
Para isso que ao longo de sua caminhada e com tais preocupações que Unamuno
em 1902 escreve sua segunda novela Amor e pedagogia. Uma estupenda novela a qual
perceberemos com clareza que o amor triunfará, pois para Unamuno é o amor o meio
mais seguro e amplo para se alcançar a felicidade ainda que custe muito.
Deste modo, a psicologia a ser usada nesta novela, afirma Julia Barella é que a
“vida é superior ao homem e suas políticas e que o amor como sentimento dos
sentimentos é superior a lógica” 169
, Neste sentido somos sempre indagados pela
questão: O que é o amor do qual fala tanto os poetas? Para isso nos diz Unamuno “a
poesia é a virtude, o amor, a piedade, o afeto, o amor à pátria, o infortúnio, é você, é
seu amor”... (UNAMUNO, 2011 p. 108). São eles os poetas que possuem a capacidade
de transmitir com emoção e verdade o mais puro e verdadeiro sentimento do homem.
Ao mesmo tempo declama o Poeta:
O amo é uma planta e das mais preciosas virtudes,
Pesado parecia, quando só nos céus existia.
Até que na terra se derramou.
169
BARELLA, Julia.Miguel de Unamuno: Amor y Pedagogia. Alianza editorial: Madri, 2000
76
Como espírito leve como pena,
Desde que carne e sangue se revestiu.
Ligeiro e penetrante como ponta de agulha. 170
A esta altura, tamanha é a preocupação de Unamuno com a educação e com o
homem em suas relações, que parte de seu pensamento da maturidade, está imbuído de
reflexões que nos permitem adentrar na intimidade do homem.
Sem embargo a “existência não nos pertence, mas sim a vida. Do mesmo modo,
o amor não pertence a mim, mas ao homem” ( TONETTI, 2013 p. 28). O que nos
revela Unamuno neste trajeto é que não vivemos sozinhos. A figura do outro é de
extrema importância, pois só existimos sob o olhar daquele que nos amam.
Em outras palavras, o amor como pedagogia de encontro e esmero é expressão
em seu sentido de força, e luta contra a morte, contra o nada. O amor é o caminho que
nos faz perceber que para existir é necessário amar, e para amar é indispensável morrer.
Sem muitos rodeios, o amor é o caminho pedagógico que leva o homem a
desfrutar e conhecer aquele que sou no mais íntimo de mim. Pois, para Unamuno todo
aprendizado nasce de uma amarra entre a vida e os sentimentos. A essas alturas nos
deparamos com o pensamento de Gaona que diz:
“Puede uno tener un gran talento […] y ser un estúpido del sentimiento y
hasta um imbécil moral» (Unamuno, 2005, 115). No basta con acumular
conocimientos, sino que el pensamiento debe ocuparse primordialmente de la
vida en su especificidad y tomar en consideración todas las dimensiones
afectivas que han sido olvidadas por los discursos científicos y filosóficos
tradicionales. «La razón es enemiga de la vida» (Marías, 1968, 14) porque
«la inteligencia, al intentar pensar la vida, la mata y sólo conoce su cadáver
inerte» (Marías, 1968, 15)”.171
Assim, portanto, fica declarado que todo conhecimento sem fundamentos sólidos
não possuem valor. Da mesma maneira o amor, quando não está apoiado em si mesmo e
no outro não há possibilidades de sobrevivência. A este respeito concordava Mazzini ao
dizer:
170
LEWIS, C.S. Alegoria do Amor: um estudo da tradição medieval. Tradução de Gabriele
Greggersen – São Paulo: È realizações editora, 2012
171 María Ángeles Goicoechea Gaona ; Olaya Fernández Guerrero. Filosofía Y Educación Afectiva En
Amor Y Pedagogía, De Unamuno. In: Revista Inter-Universitária, Vol. 26 n° 1. Disponível em
http://revistas.usal.es/ acessado em 11/05/2015 às 14h00min.
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“Embaixo de meu coração encontro cinza e um lar apagado. O vulcão
completou seu incêndio e dele só restam o calor e a lava que se agitam na
superfície, e quando tudo estiver gelado e as coisas tenham se cumprido não
restará nada – uma lembrança dos meios que deveriam ter sido utilizados
para a felicidade e que ficaram perdidos na inércia dos desejos titânicos
rechaçados desde o intimo, sem que nem ao menos pudessem se derramar
para fora, que minaram a alma de esperanças, de ansiedades, de votos sem
frutos... e depois sem nada”. 172
Em tempos modernos como o nosso, tudo tem perdido seu sentido, pois já não
mais valorizamos o que somos e sentimos e, mais bem aquilo que possuímos. Mas
Unamuno nos mostra que amar está acima de qualquer outra coisa, é como afirma
Brosch “quem ama tem olhos para o outro, importa-se, interessa-se, percebe sua
existência, tem a capacidade de sentir o que está oculto, se condói com que está além
do seu próprio eu”.173
e mais, é a partir do amar e ser amado que “o homem que sentir é
ver no outro suas limitações, suas forças e ao mesmo tempo um ato de conhecimento
próprio”174
.
Assim que:
“El amor precede al conocimiento,y éste mata aquél» (Unamuno, 2001, 39).
El amor se aleja de la razón y se acerca a la vida en toda su intensidad y
dramatismo, pues «lo que perpetúan los amantes sobre La tierra es la carne
del dolor, es el dolor, es la muerte» (Unamuno, 2005, 275). El amor más
intenso es el que surge de compartir el dolor, se llega a amar verdaderamente
a otra persona cuando se pone en juego esa empatía que permite ver al otro
como alguien que es semejante a mí, que sufre igual que yo”.175
E acrescenta Unamuno:
“[...] el amor abre el camino hacia un nuevo modo de conocimiento del
mundo que ya no se basa en la pedagogía sino en los afectos: «Para amarlo
todo, para compadecerlo todo, humano y extrahumano, viviente y no
172
UNAMUNO, Miguel de. Como escrever um romance. –Tradução de Antonio Fernando Borges. São
Paulo: É Realizações editora, 2011 p.86
173 MICAI, Barbara Aparecida Brosch. Fé e razão, o conflito: a relação da esperança com a fé e a
caridade na filosofia de Miguel de Unamuno. São Paulo: Editorama, 2009 p.58
174Ibidem, Idem
175 María Ángeles Goicoechea Gaona ; Olaya Fernández Guerrero. Filosofía Y Educación Afectiva En
Amor Y Pedagogía, De Unamuno. In: Revista Inter-Universitária, Vol. 26 n° 1. Disponível em
http://revistas.usal.es/ acessado em 11/05/2015 às 14h00min.
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viviente, es menester que sientas tododentro de ti mismo, que lo personalices
todo.” 176
Fica-nos, pois, evidenciado que o amor é o único caminho para um
autoconhecimento. No entanto é necessário que o homem mergulhe naquilo que há de
mais íntimo, e valioso que é o vosso coração, e se abra para novos mundos, para um
mundo do amor e do encontro. Ao fim, quem ama personifica aquilo que ama e busca
no outro sua razão de viver.
176
Ibidem
79
3.5 Considerações Finais
“Só o amor conhece o caminho da verdade, da felicidade, da
beleza... Deus. A eles só se chega pelo amor”.177
Assim como em Santo Agostinho; vimos também, muito bem estampado na
filosofia concreta de Miguel de Unamuno que o amor como virtude e força é o caminho
que leva aos homens ao conhecimento de si mesmo em relação ao outro.
Para isso, se faz necessário um ardo caminho. Caminho este que muitas vezes
está repleto de espinho, mas já afirmara Unamuno só se pode amar sofrendo. Sem
embargo, a relação entre eu e o Tu se faz precisa na medida mesma que me relaciono e
coloco no outro aquilo que sou. Não se trata de projeção, mas de contemplação, de
completude naquilo que o outro pode me oferecer.
Consequentemente essa relação entre mim e Tu quando tratada de maneira
correta, perpassa todos os obstáculos, me levando assim a um amor transcendente a um
Tu que é capaz de se eternizar no tempo. É justamente este tu que me permitirá lutar e
com o último fôlego da vida exclamar: “Não quero Morrer!” quero viver, me eternizar
no tempo. Ser imortal.
O amor para Unamuno se torna, portanto, o meio mais viável e humano para a
integração do homem. Deste homem de carne e osso.
Não obstante o amor é fio de ligação para uma profunda e duradoura relação
entre o Eu, o Outro, a natureza e Deus. È, pois, o amor a força motora de unicidade e
comunhão entre os povos. O que faz enfim do amor o mais trágico na vida dos homens
é sua vontade de ser.
A saber; o amor possui o fundante missão de equilibrar o sentimento e a razão.
Pois só ele, o amor, pode evocar e fazer visíveis a força que se faz marcada em nossa
alma.
O que Unamuno aqui nos mostrou que todos nós, independente da raça ou credo,
não podemos viver sozinhos. Somos seres sociáveis e que precisamos do outro. Mas, no
entanto essa ligação só nos é dada pelo mais puro e brando sentimento.
177
GONZÁLES OSA, Paulino Sahelices. O amor, fio condutor. In: Cadernos de espiritualidade
agostiniana, vol 2, - FABRA (Federação Agostiniana Brasileira), Petrópolis, RJ. 2011 p. 11
80
Talvez seja justamente, devido essa capacidade de ser que o amor carrega, como
marca, que faça dele o que há de mais trágico na vida dos homens.
Como fio condutor, o amor tem o dever de ligar e unir o terreno com o divino.
Para isso o caminho percorrido que o torna pedagógico e caritativo, e aberto para
aqueles que necessitam de um pouco mais de amor.
Domado por sua fome de imortalidade, Unamuno se agarra no homem e em suas
virtudes. Pois quando amamos somos capazes de afugentar de nós todo o mal. E é pelo
amor que o homem personaliza tudo que ama.
Ao nosso tempo, banalizado, o amor é a única ferramenta de acalmar os
corações e fazer com que os homens se redescubram como pessoas, e abandonem a
caricatura de ser apenas um personagem e se tornem protagonistas de suas próprias
vidas e vontades, nem que para isso deva morrer.
O Amor Unamuniano é amor puro, desnudo livre, assim como diz o poeta
Gutiérrez:
Nua...
somente vestida
com a eternidade.
[...] nua existência.
E teu corpo nu
Se expandiu por minha carne
Como um cândido rio
de felicidade de nua
Nua
sem fronteiras
Nua
Eras bela nua
Airosa nua
Formosa nua
Verdadeiramente nua
Eu te amo nua.178
Amar é, portanto, caros leitores, se perder nas estradas mais longínquas do
conhecimento humano. É se perder na beleza nua do Outro. É olhar com os olhos livres
e limpos. Compreendendo o outro em sua totalidade, em sua natureza.
178
Para ler o poema completo acessar http://revistapandorabrasil.com/pagina literaria
81
CONCLUSÃO
Longe de esgotar o tema do amor, nossa missão aqui fora demonstrar como o
amor é compreendido por Unamuno. Contudo mergulhamos em um mundo que
perpassa a nossa realidade. Unamuno nos mostrou que o amor é como uma música que
nos leva a uma viagem muitas vezes sem volta. No entanto a cada viagem descobrimos
que ama é se redescobrir a cada instante é se fortalecer no caminho que nos é dado
gratuitamente.
Afinal, frutos da criação divina que total e puro amor. Somos também nós
convocado a amar sem medidas, a nos lançar no mar da vida acreditando que tudo se é
possível quando se ama.
Unamuno também nos ensina que o amor não é tão só um sentimento, mas sim
uma abertura, um se despojar do narcísico que há dentro de cada um de nós e mergulhar
na bela que há no outro, pois a medida que eu amar a mim mesmo como a um estranho,
saberei como me abrir e amar aquele que de fato é meu próximo.
Portanto, toda a filosofia unamuniana está embasada no homem. O que significa,
na vida ainda que o mesmo a detestasse, pois viver desembocaria em morrer. E seu
esforço estava todo voltado pelo não querer morrer.
Sem embargo, envolvido por um apaixonado pela vida, e pela beleza que nela
contém. Pois fomos criados por Deus para amar e sermos amados.
Contudo Unamuno nos dirá que o verdadeiro amor consiste na admiração, na
contemplação da pessoa amada, deste modo antes de amar deve se passar pelo
sofrimento, mas também um sofrimento que o leve a pensar e a amar a si mesmo, pois o
amor, dentre os muitos sentimentos, é um dos poucos que não envelhece, e está sempre
em movimento, e mais: é o sentimento que almeja o longe, e traz consigo o eterno.
Em detrimento disso, em geral o amor implica e abarca em si múltiplas escolhas,
as quais indubitavelmente são individuais, refletidas no outro, que nos permite olhar o
outro como nosso bem, e ponte para que nos reconheçamos em nosso mais profundo Eu.
Para esse novo mar de abertura rumo ao outro se faz mais que urgente olhar para
dentro de nós mesmos e nos perguntar: Eu me amo?
82
Se formos capazes de com firmeza atestar isso, poderemos dizer que somos aptos
para amar. Afinal amar é atirar as cegas, e se lançar no abismo e esperar pela queda.
Amar é entrega, é doação.
Também nos mostrou Unamuno que o amor é transcendente a tudo aquilo que
para nós se parece sem sentido. O amor assim, como as rosas carregam seus espinhos.
Espinhos os quais vão sendo abandonados pelas estradas na medida em que com ele vou
tornando-me um.
Em meio a tantas dores e medos, Unamuno trás algo de inovador a sua filosofia, a
figura do homem que é capaz de decidir pela própria razão aquilo que é de melhor para
si. Ensina-nos que sim é possível o homem concreto ser de carne e osso e ao mesmo
tempo fruto de sua ficção, de seus sonhos, afinal sonhar também é amar.
Agora nos resta a nós amigos leitores, traçar nosso próprio caminho. Nenhum
filósofo esgotará ou sanará as nossas dores existências, mas podem eles nos ajudar a
compreender o mistério da vida, indicando-nos meios para que superemos os nossos
medos.
Consequentemente para Unamuno o amor é aquele que engloba o universo,
aquele que busca uma felicidade além do mundo sensível, um sentimento capaz de
ultrapassar as barreiras humanas. Sendo o amor o sentimento mais trágico de nossas
vidas, pois o homem busca na totalidade amar e ser amado, onde o mesmo se submete a
imensuradas torturas para que se alcance tal sentimento. E assim termino dizendo que o
amor é o que há de mais radical neste planeta, pois, o mesmo é capaz de gerar desde
uma perpétua e dócil felicidade, a uma destruição total. Pois o preço do Amor é amar
sem medidas.
83
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