Ficha Técnica - APM – Associação de Professores de ... · O Plano de Ação para a Matemática...

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Ficha Técnica

Título

ProfMat2015: Matemática, currículo e desenvolvimento curricular

Julho de 2015

Organizadores

António Borralho, Elsa Barbosa, Isabel Vale, Hélia Jacinto, Jaime Carvalho e Silva e

Joana Latas

Edição

Associação de Professores de Matemática

ISBN

978-972-8768-61-4

ÍNDICE

APRESENTAÇÃO ......................................................................................................... 3

CONFERÊNCIAS COM DISCUSSÃO ....................................................................... 5

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOCENTE VS. PLANO DA MATEMÁTICA: CONTRIBUTOS

PARA O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOS DOCENTES ............................................ 6

PRÁTICAS TRAICIONAIS RIDEIRINHAS E EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: TRAVESSIAS PARA

ALÉM DA SALA DE AULA ............................................................................................... 32

O ENSINO DA ESTATÍSTICA NAS RECENTES ORIENTAÇÕES CURRICULARES ................... 48

COMUNICAÇÕES COM DEMONSTRAÇÃO ........................................................ 68

A CRIAÇÃO DO MUNDO-HOMENS DE FÉ E DE CIÊNIA: LEIBNIZ, NEWTON E O CÁLCULO

INFINITESIMAL .............................................................................................................. 69

SIMPÓSIOS DE COMUNICAÇÃO ........................................................................... 73

A COMUNICAÇÃO MATEMÁTICA NA AVALIAÇÃO DA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS ......... 74

FORMAÇÃO CONTINUADA DE DOCENTES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

NO ÂMBITO DAS CIÊNCIAS EXATAS ............................................................................... 90

A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM GEOMETRIA .................................... 98

ALGUNS DADOS QUE ALUNOS E PROFESSORES DEVEM SABER SOBRE RESOLUÇÃO DE

PROBLEMAS ................................................................................................................ 113

O FORMAL DA MATEMÁTICA E O INTUITIVO DA TECNOLOGIA: QUE ARTICULAÇÃO? ... 120

REALIZAÇÃO E REVISÃO DE MINITESTES PARA APROFUNDAR A APRENDIZAGEM DE

ÁLGEBRA LINEAR NO ENSINO SUPERIOR ...................................................................... 131

DOS JOGOS À APRENDIZAGEM .................................................................................... 142

PROFMAT — 2015 3

APRESENTAÇÃO

O Encontro Nacional de Professores de Matemática, anualmente organizado pela APM,

regressa a Évora em 2015.

Aqui tivemos oportunidade de comemorar os dez anos de ProfMat, em 1995, e os vinte

anos em 2005. Aqui esperamos reencontrar-nos, todos, para comemorar os 30 anos de

Encontros.

De Encontro da APM, de encontro connosco próprio, de encontros uns com os outros.

Momento de balanço e de partilha: de práticas, de anseios, de trabalhos, de medos e de

sonhos. E também de vontades por aquilo em que continuamos a acreditar.

Nos últimos 30 anos vivemos momentos altos e momentos baixos.

Momentos de grande exaltação colectiva em que acreditámos que (quase) tudo era

possível. Momentos de forte investimento no nosso crescimento e desenvolvimento

profissionais. Vimos algumas coisas em que acreditávamos verem concretizar-se.

Assistimos a períodos de forte investimento na valorização da nossa condição docente e

vimos as aprendizagens dos nossos alunos tornarem-se mais sólidas porque feitas com

mais sentido e significado. Vimos o País a ter melhores prestações em estudos

internacionais como o PISA ou o TIMMS e a tornar-se frequente alunos portugueses a

serem notícia por resultados alcançados em concursos internacionais nas áreas da

matemática. Enfim a Matemática deixara de ser notícia apenas por más razões. Por isso

sentíamos que haviam valido a pena o nosso empenho e os nossos quereres.

Nos últimos dez anos alguns movimentos de sentidos contraditórios vieram entretanto,

gradualmente a acontecer. A nossa vida enquanto profissionais de educação deixou,

para muitos, de ser perspectivável, a vida nas escolas tornou-se muitas vezes

desmotivadora e com isso algum desinvestimento individual foi-se instalando. O

currículo viu-se amputado de áreas de estudo e de trabalho, algumas disciplinas viram

reduzidas as cargas horárias semanais, tudo isto sem um fio condutor ou uma visão de

conjunto sobre um todo que se quereria coerente. Apesar disso, os aspectos positivos na

matemática foram percepcionados também por muitos. O programa de formação e de

acompanhamento à experimentação e implementação de um novo programa para o

ensino básico é disso exemplo.

4 PROFMAT — 2015

Entretanto, num ápice, sem estudos de avaliação de suporte e sem justificação

sustentável, eis que somos surpreendidos por novos programas para o ensino básico,

primeiro, e para o ensino secundário a seguir. Assentes num formalismo exacerbado em

nome de uma cientificidade de carácter muitas vezes duvidoso, com uma extensão e

com uma rigidez de aplicação que parece ignorar que não pode haver aprendizagem sem

compreensão, real, dos conceitos. E logo num ano em que se assinala o centenário de

José Sebastião e Silva que ousou sonhar, tal como nós, que era possível ensinar

matemática a todos, com intuição, rigor e compreensão.

É pois neste contexto que o ProfMat 2015 vai acontecer. Por isso o tema central do

Encontro ser “A Matemática e o Currículo Escolar”.

Sendo certo que não é possível ensinar tudo a todos e tudo da mesma forma, qual o

papel que a Matemática deve desempenhar na formação dos nossos alunos num

contexto de 18 anos de escolaridade obrigatória? De todos os alunos!

Porque acreditamos que as nossas escolas não podem ser locais de entretinimento nos

intervalos dos treinos para a realização de exames, porque ousamos continuar a sonhar

que é possível desejar aprender e desejar ensinar, convidamos todos, de novo, a mais

uma vez continuarmos a encontrar-nos.

Na nossa APM, para

“Dizer de viva voz

Que não estamos sós…”

Em Évora, cidade branca de todas as encruzilhadas, na primavera de 2015! No XXXI

ProfMat!

Comissão Organizadora ProfMat 2015

Nota da Comissão Científica do ProfMat 2015:

Estes textos têm como um dos principais objetivos revitalizar as atas do encontro

ProfMat. Apesar de inicialmente termos ponderado realizar um processo de revisão

entre pares, optámos por não o fazer. Neste contexto, depois de discutirmos os prós e os

contras, decidimos publicar a totalidade dos textos que nos chegaram, sendo estes,

portanto, da total responsabilidade dos seus autores.

5 PROFMAT — 2015

CONFERÊNCIAS COM DISCUSSÃO

PROFMAT — 2015 6

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOCENTE VS. PLANO DA MATEMÁTICA:

CONTRIBUTOS PARA O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOS

DOCENTES

Luís Martins,

Agrupamento de Escolas de Aljustrel

[email protected]

Resumo

O Plano de Ação para a Matemática constituiu uma das medidas que o Governo

Português implementou no ano de 2006 para procurar melhorar os resultados

académicos dos alunos na disciplina de matemática, no ano seguinte a tutela promulgou

um novo modelo de avaliação do desempenho dos docentes também ele orientado para

a melhoria dos resultados escolares dos alunos portugueses assim como para potenciar o

desenvolvimento profissional dos professores.

Entendemos que estas duas medidas governamentais contemporâneas aportaram

contributos a destacar quer em termos de desenvolvimento profissional dos professores

de matemática quer no ensino e na aprendizagem desta disciplina. Pelo que serve este

documento para evidenciar e comentar estes mesmos contributos de forma clara e

concisa.

Palavras-chave: Desenvolvimento profissional; Plano da matemática; Avaliação do

desempenho docente.

Introdução

Os anos de 2006 e 2007 foram profícuos em ações que objetivaram promover o

desenvolvimento profissional dos docentes. Com efeito, decorria o ano de 2006, mais

precisamente o mês de junho, quando o diagnóstico realizado pelos docentes da

disciplina de matemática relativamente aos resultados dos Exames Nacionais de

Matemática do 9º ano de escolaridade de 2005 impeliu o Ministério da Educação (M.E.)

de então a estabelecer um Plano de Ação para a Matemática cujo principal objetivo era

de melhorar o ensino desta disciplina. Foram assim constituídas ações (M.E., 2006)

enfocadas na melhoria das aprendizagens dos alunos como por exemplo: a definição de

um Programa Matemática: equipas para o sucesso que implicou a elaboração de planos

de escola de combate ao insucesso na disciplina de matemática, ou ainda, o

Reajustamento e às especificações programáticas para a Matemática em todo o Ensino

Básico; a criação de um banco de recursos educativos para a matemática e também na

avaliação dos manuais escolares de Matemática para o Ensino Básico. As seis ações

apresentadas não descoraram os docentes per se tendo em conta que também

Martins

PROFMAT — 2015 7

contemplaram a promoção da formação contínua em matemática para professores de

todos os ciclos do Ensino Básico e do Ensino Secundário assim como a necessidade de

estabelecer Novas condições de formação inicial de professores e de acesso à docência.

Decorridos cerca de seis meses, o Ministério da Educação promulgou o Decreto-Lei

nº15/2007 de 19 janeiro que alterou o Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e

dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário e apresentou um novo (primeiro)

modelo de avaliação de desempenho que visou “a melhoria dos resultados escolares dos

alunos e da qualidade das aprendizagens e proporcionar orientações para o

desenvolvimento pessoal e profissional no quadro de um sistema de reconhecimento do

mérito e da excelência.” (Decreto-Lei, nº15/2007 de 19 janeiro). Perante estas

oportunidades de desenvolvimento profissional procuraremos, nesta conferência, dar

uma panorâmica sobre o contributo da Avaliação de Desempenho Docente e do Plano

da Matemática no desenvolvimento profissional dos docentes e no ensino e

aprendizagem da matemática.

Breve conceptualização do desenvolvimento professional docente

Cada docente que termine a sua formação académica de base, ou seja aquando a

conclusão de pelo menos uma licenciatura no ramo educacional, transforma-se num

profissional do ensino que ultrapassou com sucesso os vários crivos que objetivaram

garantir a acumulação de conhecimentos essenciais para o exercício de funções

docentes nos diversos núcleos educativos espargidos por Portugal.

Longe estão os tempos da mestria docente per se, onde os saberes adquiridos aquando a

formação inicial permanecem isolados do mundo e imutáveis no tempo. O docente

contemporâneo confronta-se com um conhecimento que se caracteriza tanto pela sua

volatilidade como pela viralidade da sua propagação. A aquisição de saberes pelos

docentes em pré ou início de carreira não é condição suficiente para rotular estes

profissionais de “seres omniscientes”, mas é condição necessária para classificar cada

um deles como “ser consciente”, como indivíduo que procurará comandar o seu próprio

desenvolvimento (Ponte, 1994) e nunca olvidará a imperiosa necessidade de estar em

constante atualização.

Estarão os professores preparados para responder a todas estas solicitações exigidas por

uma sociedade em pleno século XXI?

Martins

8 PROFMAT — 2015

Os docentes são diariamente confrontados com novos desafios, entre os quais o público

com o qual e para o qual exercem funções que, além de significativamente mais

heterogéneo e numeroso, também requer um trabalho de motivação cada vez mais

eficaz e sistemático. O ensino de massas tem vindo a incorporar valências que têm

obrigado a classe docente a assumir novos papéis e a revalidar as competências que

adquiriu ao longo dos anos. Os profissionais do ensino lecionam em ambientes

significativamente mais problemáticos, onde os dilemas sociais complexos crescem

exponencialmente1. Aos professores pede-se que transmitam conhecimentos ao mesmo

tempo que desenvolvem metodologias inovadoras e facilitadores das aprendizagens,

estes são convidados a utilizarem novas2 tecnologias em sala de aula, exige-se um

ensino mais individualizado em turmas cuja dimensão aumenta anualmente.

Estes são alguns dos requisitos impostos e próprios de uma sociedade que sofre dos

efeitos colaterais de uma crise económica à escala mundial, mas que se quer dinâmica e

evolutiva sob pena de desaparecer. As responsabilidades associadas ao corpo docente já

não se cingem apenas à componente letiva, exige-se que os docentes tenham um papel

destacado em funções de gestão burocrática e educativa que requerem uma permanente

atenção a uma legislação em constante atualização. A autonomia das escolas, a

agregação de estabelecimentos em mega agrupamentos, o programa Territórios

Educativos de Intervenção Prioritária são inovações socioeducativas que implicam uma

constante revalidação das competências e saberes dos docentes.

O que acabámos de referir não é uma novidade, os anos sucedem-se e algumas

referências continuam mais atuais do que nunca, com efeito:

[…], a ideia de desenvolvimento profissional, ou seja, a ideia que a

capacitação do professor para o exercício da sua actividade profissional é

1 Entendemos que a utilização deste termo se adequa à conjuntura que o país tem vindo a atravessar e que

se reflete na sociedade civil.

2 Ressalva-se o facto do termo “novas tecnologias” poder parecer um cliché, mas infelizmente para

muitos docentes a utilização regular de ferramentas eletrónicas ainda é uma novidade.

Martins

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um processo que envolve múltiplas etapas e que, em última análise, está

sempre incompleto. (Ponte, 1998, p. 2)

Poderemos depreender que o desenvolvimento profissional se define como a ação

continuada de capacitar os docentes para o exercício das suas funções? Ou será mais do

que isso?

[…], as actividades de desenvolvimento profissional consistem em ajudar

os professores a construir novas teorias e novas práticas pedagógicas.

(Marcelo, 2009a, p. 11)

O autor aponta que o desenvolvimento profissional baseia-se no construtivismo segundo

um processo tanto individual como colaborativo que se desenvolve ativamente, a longo

termo e resulta de experiências formais e informais contextualizadas aos locais do

trabalho dos docentes.

[…], as experiências mais eficazes para o desenvolvimento profissional

docente são aquelas que se baseiam na escola e que se relacionam com as

actividades diárias realizadas pelos professores. (Marcelo, 2009a, p. 11)

O caminho do desenvolvimento profissional passa forçosamente pelo amadurecimento

cognitivo do professor que tem que reagir prontamente perante as mudanças que

ocorrem no exercício da docência, quer sejam de teor curricular ou ainda por

reorganização das condições de trabalho. Um sem número de razões podem ser

apontadas para que os docentes sejam quotidianamente colocados à prova, por isso faz

todo o sentido considerar que o desenvolvimento profissional contínuo dos professores

seja uma necessidade (Day, 2007a).

Ainda assim, não se confunda desenvolvimento profissional com formação contínua:

[…], la formación es un elemento importante de desarrollo profesional

pero no el único y, quizá, no el decisivo. (Imbernón, 2009, p.32)

Um equívoco desta natureza significaria que o desenvolvimento profissional só poderia

ocorrer por via da formação em contexto de trabalho/ carreira.

[…]; o conceito “desenvolvimento” tem uma conotação de evolução e

continuidade que, em nosso entender, supera a tradicional justaposição

entre formação inicial e formação contínua dos professores. (Marcelo,

2009a, p.9)

Encontrar forma de definir o conceito de desenvolvimento profissional através de uma

definição que possa ser classificada como consensual não aparenta ser uma tarefa fácil,

no entanto é possível balizar o entendimento em torno deste conceito. Sem menosprezar

uns autores em detrimento de outros, conclui-se rapidamente que todos eles (Heideman,

Martins

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1990; Fullan, 1990; Sparks e Loucks-Horsley, 1990; Oldroyd e Hall, 1991; Day, 2001;

Bredeson, 2002; Villegas-Reimers, 2003 e Imbernón, 2009) apresentam nas suas obras

definições que apontam algumas características que permitem aclarar o conceito. Eis

algumas das conclusões a que chegámos.

O desenvolvimento profissional tende a modificar as práticas de ensino, procura incluir

atividades que aperfeiçoem as atitudes dos professores com o objetivo de melhorar os

resultados escolares dos alunos. Tem em conta as necessidades individuais e coletivas

dos docentes ao longo de cada uma das etapas das suas vidas profissionais e leva a que

estes adquiram novos conhecimentos, novas destrezas, novas capacidades que lhes

permitam aperfeiçoar as suas práticas ao mesmo tempo que lhes possibilitam uma

progressão no status profissional.

O Plano de Acção para a Matemática

Em junho de 2006, o XVII Governo Constitucional estabeleceu 50 medidas políticas

para melhorar a escola pública (ME, 2006b). Os estabelecimentos de ensino público

foram incumbidos de refletir e identificar as causas subjacentes ao insucesso verificado

na disciplina de Matemática com particular incidência no Exame Nacional do 9º ano,

realizado no ano letivo 2004/05. Com efeito, nas ilações finais do relatório sobre os

Resultados do Exame de Matemática da 1ª chamada podia ler-se:

Os desempenhos dos examinandos foram, em média, fracos, aliás, na

continuidade dos relativos às Provas de Aferição do 3º ciclo, realizadas

desde 2002. Grande parte dos examinandos baixou um nível no exame,

relativamente à classificação interna. (M.E., 2006c)

As conclusões que repetidamente foram extraídas dos resultados obtidos pelos alunos

pelos mais diversos implicados e interessados no sistema educativo nacional

proporcionaram orientações que o Ministério da Educação (ME) de então apresentou às

escolas sob a forma de um Plano de Ação para a Matemática – PAM (M.E., 2006a).

O ME assumiu a responsabilidade de facultar condições inovadoras para que as escolas

pudessem no âmbito do exercício da sua autonomia desempenhar um papel fundamental

na melhoria dos resultados dos alunos na disciplina de matemática.

Foram estabelecidas várias medidas:

Um novo Programa Matemática para o Ensino Básico;

Martins

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A criação de um banco de recursos educativos para a Matemática;

A avaliação dos manuais escolares de Matemática para o Ensino Básico;

A promoção de formação contínua em Matemática para professores de todos

os ciclos do ensino básico e secundário;

desenvolvimento sustentado de projetos de escola que promovessem a

melhoria das aprendizagens em matemática.

Esta última medida, denominada de Plano da Matemática (PM) deu origem a mais de

um milhar de projetos apresentados pelas escolas (M.E., 2008a). O PM foi dirigido aos

alunos do 2.º e 3.º ciclo do Ensino Básico, foi previsto para um período de três anos

letivos, tendo-se iniciado em 2006/07 e terminado em julho de 20093.

Falar-se do Plano da Matemática é o mesmo que falar-se de um conjunto

de projetos concebidos e desenvolvidos por cada escola, em particular,

pelos seus professores de matemática. Estes projetos são pensados a

partir do conhecimento de cada realidade, das particularidades de cada

contexto, do diagnóstico das potencialidades e necessidades dos

professores e alunos de cada uma das comunidades educativas. (Santos,

2008, p. 3)

A elaboração de cada uma das 1100 candidaturas apresentadas envolveu os conselhos

executivos, os conselhos pedagógicos e os professores de matemática que estabeleceram

projetos de escola partindo da análise das condições particulares de cada instituição,

tendo em conta:

um diagnóstico académico (classificações dos alunos na disciplina no ou nos

anos letivos anteriores);

a definição dos objetivos a alcançar (metas concretas para melhorar os

resultados dos alunos);

as estratégias de intervenção (constituição de equipas de docentes para o

acompanhamento dos alunos ao longo de um ciclo de escolaridade, das

3 Os resultados obtidos por esta medida ao nível de Portugal Continental originaram, no final deste

triénio, novo convite às escolas interessadas em apresentar um projeto de candidatura ao Plano da

Matemática II (PM II), com a possibilidade de alargamento às escolas do 1.º ciclo do Ensino Básico por

um período de três anos.

Martins

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equipas de docentes em sala de aula e a definição da rentabilização das áreas

curriculares não disciplinares);

os recursos necessários (humanos locais ou não e os materiais disponíveis ou

não);

a identificação dos custos do projeto;

a metodologia de acompanhamento;

avaliação interna do projeto.

Cada uma das escolas que entendeu participar no PAM desenvolveu no seio de um

microssistema educativo ações marcadas pelos princípios de: autonomia; de valorização

profissional (dos seus profissionais que delinearam caminhos para a melhoria das suas

práticas e da aprendizagem dos alunos); da contextualização institucional (seguindo

uma lógica organizacional abrangente e não apenas por área disciplinar e/ou de modo

individualista, tendo em consideração a contextualização social, económica e

profissional onde os docentes atuavam e consequentemente as dificuldades que estes

contextos levantavam); a metodologia de projeto (cumprindo um conjunto articulado e

interdependente de ações); de coresponsabilização (onde a tutela assumiu a obrigação

de criar condições a vários níveis para desenvolver os projetos apresentados). Princípios

entendidos como como adequados para o desenvolvimento profissional dos professores

(Loucks-Horsley et al, 1998).

Ainda assim convenhamos que:

Neste processo de crescimento, marcado por uma evolução contínua

eventualmente pontuada por momentos especiais, o protagonista

principal é o professor, não os cursos ou as oportunidades que lhe são

oferecidas. (Ponte, 2012, p. 6)

Avaliação do desempanho do docente

O que se entende por Avaliação do Desempenho Docente (ADD)?

A avaliação dos professores suscita um alargado conjunto de questões

teóricas e práticas, relacionadas com a sua concretização. É um processo

difícil de conceber e de pôr em prática. (Fernandes, 2008, p. 12)

Nem tudo o que potencialmente pretende ou melhora a nossa condição social,

económica ou profissional é de fácil implementação ou aceitação! Por vezes os fatores

que dificultam a concretização de uma tarefa, de um projeto ou, neste caso, a

Martins

PROFMAT — 2015 13

implementação de um modelo de avaliação são em maior número do que os elementos

facilitadores.

A conceção e/ou concretização de um modelo de ADD é uma tarefa morosa e repleta de

contrariedades. No contexto português, entendemos que alguns dos percalços que

ocorreram na implementação do novo modelo de ADD talvez pudessem ter sido

minorados e/ou até evitados através de um enquadramento claro, detalhado e

perfeitamente balizado do processo avaliativo no seu todo. Parte significativa das

preocupações dos envolvidos centraram-se no impacto que a avaliação do desempenho

podia ter tido no quotidiano dos professores e não na influência que esta avaliação devia

de ter tido no sistema educativo per se.

No âmago da ADD está uma sofisticação que nos deixa antever que esta não pode,

evidentemente, reduzir-se apenas a uma ou outra característica. Para Rodrigues e Peralta

(2008) a avaliação do desempenho dos professores está associada a um processo que

engloba atos como: observar, descrever, analisar e interpretar a atividade profissional

dos docentes no intuito de produzir uma tomada de decisão que influencie várias

componentes como a pedagógica, a administrativa e até a salarial.

Parece-nos óbvio que o processo avaliativo dos professores não pode de forma alguma

dissociar-se de toda uma adjetivação que emana da temática da avaliação enquanto

conceito abrangente e aglutinador que se alimenta ferozmente da observação, da

descrição, da análise e da interpretação do objeto avaliativo para poder proferir juízos

que influem nos mais variados contextos.

A função atribuída à avaliação não pode ser dissociada do objecto sobre

o qual ela recai, donde a importância, para o avaliador, de ter uma visão

clara desse objecto. (Simões, 2002, p. 12)

Na sequência desta ressalva, não esqueçamos as palavras de Hadji (1995) que apontou

que o objeto da avaliação docente é:

[...] difícil de estabelecer, porque difícil de definir. (Ibidem, p. 32)

Não há dúvida que definir o que se pretende avaliar é tão ou mais difícil que definir o

que é ser professor. Ainda que qualquer tentativa de referi-lo como: indivíduo de

atributos ímpares, identificável social e profissionalmente, detentor e promotor de

conhecimentos, capacitado e capacitante não seja nem suficiente nem prudente tendo

em conta as conceções daquilo que é ser professor que foram estabelecidas ao longo dos

anos por investigadores/ autores de reconhecido vulto.

Martins

14 PROFMAT — 2015

Como es evidente, cada autor establece su concepto y denominación de

profesorado, y aunque hay matices en sus orientaciones, sí que estos

roles, de una forma u otra, van generando una nueva conceptualización

de la formación del profesorado y de su desarrollo profesional, ya sea

individual o en el interior de las instituciones. (Imbernón, 1994, p. 65)

Se a literatura evidencia uma falta de unanimidade na definição do que é ser professor

também não é difícil constatar que a ausência de uma clara perceção do que é o

desempenho também tem contribuído para dificultar a implementação de um modelo de

avaliação. Como tal, uma leitura atenta do seminal trabalho de Simões (2002) permite

constatar que não é de todo judicioso dirimir algumas subtilezas, nomeadamente entre

avaliar a competência do professor, o seu desempenho ou ainda a sua eficácia.

As competências referem-se coisas específicas que os professores sabem,

fazem, ou acreditam, mas não aos efeitos destes atributos nos outros.

(Ibidem, p. 13)

O desempenho do professor diz respeito ao seu comportamento no

trabalho. O desempenho refere-se mais ao que o professor faz do que ao

que pode fazer [...]. O desempenho depende da competência do docente,

do contexto em que o professor trabalha e da sua habilidade para aplicar

as competências em qualquer momento. (Ibidem, p. 14)

A eficácia do professor refere-se ao efeito que o desempenho do

professor tem nos alunos. A eficácia depende não só da competência e do

desempenho, mas também das respostas dos alunos. (Ibidem, p. 14)

A competência implica acção, uma acção física ou uma acção cognitiva,

ou ambas, dependendo da situação em que se manifesta a competência.

(Martins, Candeias e Costa, 2010, p. 23)

Repare-se na proximidade destes três conceitos, as suas similitudes, articulação e

interdependência justificam de alguma forma a dificuldade em distingui-los. A

avaliação do desempenho docente obriga à observação do avaliado no cumprimento das

suas funções, ou seja, no pleno exercício da sua atividade profissional. Para Rodrigues e

Peralta (2008) a associação da avaliação do desempenho docente com a ação, a

descrição, a análise e a interpretação da atividade profissional do docente é

inquestionável.

Assim sendo, estamos em condições de aceitar o seguinte enquadramento relativamente

à ADD:

La evaluación del desempeño profesional del docente es un proceso

sistemático de obtención de datos válidos y fiables, con el objetivo de

comprobar y valorar el efecto educativo que produce en los alumnos el

despliegue de sus capacidades pedagógicas, su emocionalidad,

responsabilidad laboral y la naturaleza de sus relaciones interpersonales

Martins

PROFMAT — 2015 15

con alumnos, padres, directivos, colegas y representantes de las

instituciones de la comunidad. (Veloz, 2000, p. 19)

Repare-se nesta definição de avaliação de desempenho docente que baliza o conceito

congregando alguns dos elementos fundamentais à sua conceptualização ao mesmo

tempo que se focaliza nos domínios da competência e eficácia do professor. Para além

de enaltecer a importância da validade e fiabilidade que deve ser aportada à recolha das

informações relativas ao avaliado, este autor enfoca a sua aceção no efeito que as

capacidades (pedagógicas, emocionais) do professor têm sobre os alunos.

A questão da avaliação dos professores aparece de tempos a tempos na

agenda política e social, mas por razões várias fica adormecida no

descontentamento das negociações conseguidas. (Clímaco, 2002,

Prefácio)

O advento da modificação e atualização do Estatuto da Carreira Docente dos

Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário pelo

Decreto-lei nº 15/2007 de 19 de Janeiro e a consequente reforma no modelo de

avaliação do desempenho dos docentes portugueses, catapultou a avaliação dos

professores para o centro das atenções de todos aqueles que sempre se interessaram pelo

campo da educação assim como para o quotidiano dos indivíduos que nunca se

manifestaram relativamente a qualquer assunto relacionado com o sistema educativo

nacional.

Nunca a avaliação dos professores suscitou tanto interesse e foi tão debatida pelos mais

variados agentes da sociedade: docentes, investigadores, opinião pública, opinion

makers, sindicalistas, políticos4.

A génese dos males da educação tinha finalmente sido descoberta:

[…] se aprecia un cierto consenso en la idea de que el fracaso o el éxito

de todo sistema educativo depende fundamentalmente de la calidad del

desempeño de sus docentes. (Veloz, 2000,p. 2)

4De realçar o sentido de oportunidade característico da classe política que transformou a avaliação do

Desempeho docente numaferramenta politico-partidária.

Martins

16 PROFMAT — 2015

Consequência da inexistência de um sistema de avaliação de professores credível,

rigoroso e eficaz! Infelizmente o mais importante passou desapercebido:

Um dos desafios que hoje se coloca à avaliação em geral é o de

contribuir para melhorar a vida das pessoas […]. (Ibidem, p. 5)

Com efeito, enquanto parte integrante de um conceito mais amplo, a avaliação do

desempenho docente não pode desagregar-se do tronco educativo do qual deriva. Pelo

que a sua importância é tanto mais evidenciada quanto mais relevantes forem os fins a

que se destina.

A interrogação primordial que emerge na abordagem da problemática da

avaliação dos professores é a seguinte: avaliar para quê? Qual a razão de

ser da avaliação? Que funções e propósitos é que a devem nortear?

(Simões, 2002, p.7)

A avaliação dos professores nem sempre foi associada a melhorias, na realidade esta foi

largamente conotada como um instrumento de controlo, de responsabilização e até

como mecanismo de despedimento. O carácter judicativo e a vertente sumativa da

avaliação dos docentes potenciaram sentimentos de resistência e de distanciamento por

parte dos docentes que se enraizaram e que desabrocharam com vigor aquando as várias

manifestações que ocuparam as avenidas das grandes metrópoles nacionais. Estas

demostrações populares constituíram provas do descontentamento dos docentes perante

as reformas educativas apresentadas pelos últimos governos constitucionais, embora

uma parte da sociedade portuguesa tenha apontado que estas alterações pecavam por

tardias, uma vez que eram necessárias para erradicar os “privilégios” atribuídos à classe

docente. Avaliar para quê? Para dar um passo de gigante na melhoria da qualidade do

ensino em Portugal! Ou talvez não?

Partimos de la idea de que la práctica docente es siempre mejorable y de

que tenemos la obligación de ofrecer a la sociedad el mejor servicio

educativo. (Alcaraz e Canals, 2007, p.161)

Compreenda-se que ceticismo pode associar-se ao medo da inovação ou da mudança,

mas no caso português, a “revolta” dos professores que todos presenciaram, a partir do

ano 2007, na sequência das alterações de um modelo de avaliação datado e há que

assumi-lo abertamente em certa medida largamente ultrapassado, não resultou de uma

simples incompreensão mútua (entenda-se entre os docentes e a tutela). O sucedido

decorreu, sobretudo, das dificuldades que os profissionais do ensino tiveram em

distinguir propósitos avaliativos coerentes, como a clara melhoria do desempenho

Martins

PROFMAT — 2015 17

docente, a prestação de contas à sociedade ou ainda a identificação de problemas e suas

possíveis soluções, contrapondo-se-lhes razões puramente economicistas ou políticas.

A avaliação pode assumir várias funções, sendo que as mais importantes,

no domínio do ensino, da formação e da educação, são as funções de

orientação, regulação e certificação. (De Ketele, 2010, p. 14)

Entenda-se que De Ketele (2010) estabelece a “orientação” como precursora da ação,

pois permite estabelecer o rumo que vai ser seguido ao iniciar-se uma aula, um ano

letivo, um curso superior ou até um processo avaliativo, conseguido através de um

plano de aula, uma calendarização anual, uma orientação vocacional ou, já no campo da

avaliação dos professores, por meio da implementação de uma reforma educativa. Por

sua vez a “regulação” tem uma essência fundamentalmente formativa orientada para a

melhoria da ação, através da identificação dos erros, do seu diagnóstico, da definição de

estratégias de remediação e melhoria. Em termos de ADD trata-se de uma avaliação

reguladora e não sancionatória que procura desenvolver as competências profissionais

dos professores através de mecanismos que possibilitam análises contextualizadas e

comparativas dos resultados obtidos na sequência de modificações nas práticas dos

docentes. Finalmente, a “certificação” é considerada como uma função social que

certifica, perante instâncias socialmente reconhecidas, os efeitos/ os resultados obtidos

na sequência da realização das ações dos docentes. No campo particular da avaliação

dos professores equivale, por exemplo, a asseverar o sucesso/ insucesso de um

indivíduo no término de uma formação em serviço, do seu ingresso nos quadros da

carreira docente, da sua promoção ou ainda do acesso à titularidade de um cargo.

Poderíamos ainda acrescentar a estes propósitos a proteção dos docentes competentes e

a exoneração dos incompetentes (Shinkfield e Stufflebeam, 1995) ou ainda a gestão da

carreira, dos recursos humanos e o aperfeiçoamento do sistema educativo promotor da

ADD (Hadji, 1995).

A multiplicidade de propósitos que podem ser associados à avaliação dos professores é

verdadeiramente espantosa ainda assim acreditamos que as aparências possam ser

enganosas. Senão vejamos, se nos debruçarmos, sucintamente, sobre cada uma das

funções apontadas por De Ketele (2010) seremos tentados em reunir a orientação e a

regulação sob a égide da melhoria da ação, numa vertente que o próprio autor

classificou de formativa e não sancionatória como no caso da função regulação e que,

segundo a qual, nos atrevemos a contaminar a orientação. O que não sucede com a

função de certificação manifestamente punitiva e fiscalizadora.

Martins

18 PROFMAT — 2015

Efforts to revise an existing teacher evaluation system or develop a new

one must emerge from a clear statement of purpose. Purpose guides the

development and refinement of evaluation system. Purposes consist of

two general types, formative and summative. (Haefele, 1993, p. 2)

The two principal purpose of teacher evaluation, are (1) quality assurance

and (2) professional development. (Danielson e McGreal, 2000, p. 8)

Teacher evaluation has typically two major purposes. First, it seeks to

improve the teacher own practice by identifying strengths and

weaknesses for further professional development – the improvement

function. Second, it is aimed at ensuring that teachers perform at their

best to enhance student learning – the accountability function. (OCDE,

2009c, p. 7)

1 — A avaliação do desempenho do pessoal docente visa a melhoria da

qualidade do serviço educativo e da aprendizagem dos alunos, bem como

a valorização e o desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes.

(N.º 1 do art.º 3.º do Decreto Regulamentar, n.º 26/ 2012, de 21 de

fevereiro)

Perto de vinte anos separam a primeira referência da última, mas se nos debruçarmos

sobre cada um destes trechos e tentarmos relaciona-los, depressa concluiremos que

todos eles apontam que a avaliação dos professores objetiva fundamentalmente dois

propósitos: a prestação de contas à tutela (avaliação sumativa) e o desenvolvimento

profissional (avaliação formativa).

[...] a história da avaliação de professores podia ser descrita em termos de

tensão entre dois tipos de propósitos, formativos e sumativos. (Simões,

2002, p. 44)

Com efeito a avaliação formativa associa-se ao desenvolvimento profissional e a

melhoria do desempenho e contrapõe-se à avaliação sumativa orientada para: a seleção,

a certificação, a tomada de decisões, a prestação de contas (Peterson, 2000).

Evidenciámos, deliberadamente, o aparente antagonismo que habitualmente se associa a

estes propósitos e que de alguma forma pretende justificar uma incompatibilidade

operativa destes fins no seio de um modelo de avaliação.

A perspectiva formativa da avaliação do desempenho é travada pela sua

dimensão sumativa, pela acentuação dos papéis de inspecção e controlo,

pela definição prévia e a imposição e pelo seu prolongamento numa

lógica de selecção, recompensa ou castigo com impacto na carreira.

(Formosinho e Machado, 2009, p. 297)

Uma primeira análise pode induzir quem nos lê a considerar que os dois propósitos da

ADD que temos vindo a referir não podem coabitar num único modelo de avaliação,

talvez porque fiquemos tentados em:

Martins

PROFMAT — 2015 19

[…] colocar en permanente tensión una perspectiva funcionaria ligada a

resultados de aprendizaje, de carácter punitivo, […], con la idea de una

evaluación basada en la enseñanza, con propósitos formativos y de

desarrollo profesional, sostenida por el Colegio de Profesores. (Assaél e

Pavez, 2008, p. 45)

Ou seja, consideramos que é lícito associar taxativamente a tutela à defensa de uma

postura sancionatória, certificativa, reguladora, sinónima de uma avaliação sumativa:

Legislators and policy-makers tend to value the summative purposes,

those of quality assurance and accountability. (Danielson e McGreal,

2000, p. 8)

Em simultâneo conotamos automaticamente a função formativa da avaliação com os

desejos dos professores em melhorar as suas práticas, o seu desempenho, em suma, a

qualidade da educação. Mas na realidade não são apenas os responsáveis pela pasta da

educação que querem manter os professores competentes nas escolas e se preocupam

com a continuação dos incompetentes no exercício de funções docentes, nem são apenas

os professores que almejam que as melhorias que alcançam tenham mais visibilidade na

sociedade contribuindo para uma identidade da classe docente.

Esta dualidade de posturas, perante propósitos formativos e sumativos que

inerentemente os docentes associam a estruturas educativas hierarquizadas com poderes

diferenciados, não evidencia uma clara aceitação de um modelo de avaliação com dupla

finalidade, como é o caso daquele que se encontra em vigor em Portugal5.

Um modelo de avaliação deve, sempre que possível, contemplar ambos os propósitos,

fomentando a consecução dos objetivos de melhoria dos docentes, assim como a

satisfação das necessidades identificadas na organização escolar ao nível individual ou

coletivo.

It is important to carefully address the tension between evaluation for

improvement and evaluation for career progression and develop their

complementarity within an articulated framework. (OCDE, 2009b, p. 6)

5Cf. N.º 1 do art.º 3.º do Decreto Regulamentar, n.º 26/ 2012, de 21 de fevereiro.

Martins

20 PROFMAT — 2015

Não deve ser privilegiada a competitividade de propósitos, mas antes a sua

compatibilidade e conjugação servindo assim os interesses de todos os envolvidos no

processo avaliativo (Stronge, 1995).

Contributos do PM vs. ADD no desenvolvimento profissional dos docentes, na

aprendizagem e no ensino da matemática

O contributo do PM não pode de todo ser circunscrito à melhoria dos resultados

académicos dos alunos, o PM permitiu que os docentes dos 2º e 3º Ciclos do Ensino

Básico em funções nos mais diversos concelhos no país, se conhecessem melhor,

estabelecessem não somente relações profissionais, de partilha, de práticas e materiais,

ou de reflexões acerca da disciplina de matemática mas também de amizade. Se o ME

estabeleceu (forçou) momentos específicos durante permitindo que os docentes se

reunissem com a orientação de um professor acompanhante cujo papel foi

preponderante, rapidamente se verificou que a colaboração entre os professores não foi

de toda artificial. Muitos foram os professores de matemática que agendaram

variadíssimas reuniões de trabalho para além daquelas que eram “obrigatórias”. O

trabalho em equipa e colaborativo prevaleceu como uma necessidade natural e

espontânea. Se a cultura colaborativa já existia em determinados estabelecimentos de

ensino a mediação entre o ME e os docentes estabelecida através do professor

acompanhante potenciou os comportamentos colaborativos preexistentes. Como é

evidente a partilha foi mais intensa entre os docentes envolvidos no PM quer pela

necessidade conceber, partilhar e planificar conteúdos dos mesmos níveis de ensino

assim como consequentemente pela implementação de estratégias e metodologias de

ensino mais diversificadas proporcionando assim aos discentes variadas formas de

aprender. Em termos de avaliação a grande diversidade e quantidade de instrumentos

avaliativos proporcionaram aos alunos novos modos de confirmar/ infirmar as suas

aprendizagens. O disciplina não curricular de Estudo Acompanhado foi atribuída aos

docentes de matemática, o que permitiu não somente a implementação de um reforço no

treino, na análise exaustiva dos conteúdos, em suma, na aprendizagem da matemática

como promoveu nas escolas uma cultura mais alargada de partilha e envolvimento de

outras disciplinas como as tecnologias de comunicação e informação, disciplinas como

a física e química que também beneficiar dos equipamentos tecnológicos que

apetrecharam os laboratórios de matemática e/ou salas de aula proporcionando aos

Martins

PROFMAT — 2015 21

discentes experiências de aprendizagem diversificadas ou ainda as assessórias realizadas

com os docentes da disciplina de português. Uma clara alusão ao desenvolvimento

profissional no coletivo profissional apontado por Ponte (1998). Se o PM contribuiu

para que os resultados na disciplina de matemática melhorassem substancialmente,

particularmente nos exames nacionais (Carvalho, 2010) este plano também contaminou

positivamente o desenvolvimento profissional dos docentes. Com efeito, esta

contaminação enquadra-se em vários dos modelos de desenvolvimento profissional

apontados por Sparks e Loucks–Horsley (1990). Nomeadamente: o desenvolvimento

profissional autónomo uma vez que os docentes também procuram assimilar por si

mesmos os conhecimentos que entendem necessários para o seu desenvolvimento

profissional ou pessoal; o desenvolvimento profissional baseado na reflexão procurando

uma maior autoconsciência pessoal e profissional.

[…] o processo de reflexão na acção do profissional, encontra-se uma

concepção construtivista da realidade com que ele se defronta. (Schön,

1987, p. 36).

Ou ainda através de um desenvolvimento profissional organizacional visando implicar

um maior número possível de professores promovendo a colaboração no respeito de

uma autonomia própria de cada escola. O desenvolvimento profissional pode

efetivamente adotar diferentes modalidades, não existe apenas um modelo a seguir

pelos estabelecimentos de ensino e pelos docentes. A Organização para a Cooperação e

Desenvolvimento Económico (OCDE) tem desenvolvido estudos onde é possível aferir

várias formas de potenciar o desenvolvimento profissional, nomeadamente através da

frequência de conferências/ seminários; da aquisição de um novo grau académico; do

desenvolvimento de investigações individuais ou colaborativas; da visita a outros

estabelecimentos de ensino; da colaboração numa rede de professores que se dedicam à

temática do desenvolvimento profissional. Cada qual deve procurar crescer

profissionalmente em função das suas necessidades assim como das suas carências,

crenças e culturas (OCDE, 2009a).

Se os PM I e PM II procuraram melhorar os resultados académicos dos alunos na

disciplina de matemática ao mesmo tempo que potenciaram o trabalho colaborativo

entre os docentes e em última análise o desenvolvimento profissional dos mesmos:

Studies have shown that the types of professional development closely

linked to improved student learning are those that provide opportunities

for professional dialogue and critical reflection. (OCDE, 2009a, p. 9)

Martins

22 PROFMAT — 2015

A implementação do “novo” modelo de ADD contemporâneo do PM I aportou também

alguns “benefícios” aos professores uma vez que contribuiu efetivamente para que os

docentes se empenhassem em conhecer os documentos estruturantes das organizações

educativas onde se inseriam.

Um dos objectivos principais de qualquer modelo de avaliação de

desempenho é alinhar os objectivos dos diferentes colaboradores com os

objectivos da organização. (Morais, 2009, p. 13)

Aqueles que poucas ou nenhumas vezes se dignaram refletir e a analisar o seu

desempenho enquanto profissional da educação passaram a conhecer e a preocupar-se

com a importância da concretização de tais objetivos no seio da organização onde

exerciam funções. Morais (2009) ainda apontou que o novo sistema de ADD também

contribuiu para estabelecer prioridades em termos de formação contínua dos docentes

uma vez que permitiu identificar as necessidades destes últimos. O processo de ADD

forneceu respostas a algumas questões dos professores como “qual o objetivo de

frequentar esta ou aquela ação de formação?” assim como aos diretores dos centros de

formação, nomeadamente “qual o plano de formação mais adequado para este ou aquele

conjunto de escolas?”.

Para Fernandes (2008), o contributo da avaliação dos professores não deve ser

confinado às quatro paredes da sala de aula, os seus resultados têm que extravasar o

universo dos docentes para que as organizações, as escolas onde estes exercem a sua

atividade tomem conhecimento daquilo que os docentes conseguem ou não alcançar em

termos de sucesso e progresso dos alunos. Os docentes querem sentir que o seu trabalho

é reconhecido pela comunidade educativa e não apenas pelos seus avaliadores e pares. É

na partilha e na colaboração que pode estar a mais-valia da avaliação dos professores

(entroncando assim no produto dos PM I e PM II), a nova regulamentação promulgada a

partir de 2007 não impede que se desenvolvam tais momentos de cooperação e

repartição de saberes.

[…] tudo depende da forma como as escolas decidirem concretizar o

modelo. (Ibidem, p. 29)

No entanto, a diferenciação da carreira docente em duas categorias, professor e

professor titular veio convelir uma classe cristalizada no paradigma da indiferenciação e

minar de certa forma o trabalho a ser desenvolvido no seio do PM I a decorrer nessa

altura. Esta cisão foi largamente contestada aquando a sua divulgação e

exponencialmente repugnada quando, no ano escolar de 2007/2008, ficaram

Martins

PROFMAT — 2015 23

estabelecidos os requisitos de cariz administrativos para a titularização. Para Afonso

(2007), instalou-se uma divisão na carreira que desprezou as competências de muitos

professores, os seus compromissos, envolvimentos e dedicações, a qualidade dos

desempenhos e dos cargos que foram assumidos anteriormente, as formações

interiorizadas e adaptadas ao quotidiano dos docentes, os trajetos pessoais e os projetos

em construção. Este autor apontou que um dos “paradoxos maiores” se verificou

quando nas atribuições de coordenação e supervisão associadas à categoria de professor

titular não estavam contempladas as funções de coordenação de turma, vulgo direção de

turma que constitui um dos exercícios.

A escolha de um avaliador não pode ser casual e, sobretudo, não pode

depender de critérios político administrativos. (Ruivo, 2009, p. 8).

A evidência da falta de meios/ indivíduos capacitados e cumpridores dos requisitos de

avaliador promoveu uma forma de “lotaria de avaliadores” onde alguns professores

eram avaliados por colegas da mesma área disciplinar enquanto outros foram

submetidos a situações de “avaliações caricatas” onde a componente científica-

pedagógica (principalmente a científica) não podia ser avaliada com pleno anuência dos

intervenientes em detrimento da sua crescente preponderância no processo avaliativo. A

aplicação do sistema de quotas contribuiu ainda mais para que a ADD se transformasse

progressivamente num procedimento técnico implementado em condições “instáveis”

que colocaram o desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes em causa. A

instabilidade vivida pelos professores ficou patente pelas sucessivas alterações do

Decreto Regulamentar tendo-se verificado um afastamento progressivo das exigências

iniciais em 2007 para o que foi implementado no final do primeiro ciclo avaliativo.

Com o primeiro ciclo concluído onde cerca de 93.8% dos docentes foram avaliados6 e

com o segundo ciclo de avaliação (2009/2011) a decorrer foram publicados em 23 de

junho de 2010 os Decreto-Lei n.º 75/2010 e o Decreto Regulamentar n.º 2/2010,

diplomas que aportaram um conjunto de alterações na avaliação dos professores, como

6 Fonte: Relatório sobre a aplicação do 1º ciclo de Avaliação do Desempenho Docente (CCAP, 2010b, p.

14).

Martins

24 PROFMAT — 2015

a reunificação da carreira docente numa única categoria; a introdução de uma “nova7”

figura no processo de avaliação – o relator; as condições associadas à obrigatoriedade

de observação de aulas; as funções de um júri de avaliação ou ainda o contributo da

autoavaliação dos docentes. Não obstante o diluvio de alterações que sucederam estes

diplomas foi apenas em 2012 que foi promulgado o Decreto-Lei n.º 41/2012, de 21 de

fevereiro que constitui a quarta alteração do ECD desde o ano de 2007 e que procurou

dar corpo às pretensões do XIX Governo Constitucional designadamente na:

[…] efectivação de um ambiente de estabilidade e de confiança nas

escolas, à desburocratização dos métodos de trabalho e à avaliação das

práticas e dos processos administrativos aplicados à gestão da Educação.

(Decreto Regulamentar n.º 41/2012, de 21 de fevereiro, preâmbulo)

Entre as várias alterações efetuadas no ECD de destacar evidentemente aquelas que

estabeleceram os fundamentos da reforma do processo de ADD que vigorava desde

2010 e que, segundo a tutela, fomentaram a implementação de um processo de

avaliação em vigor atualmente de cariz mais simples muito embora cumprisse com

níveis idênticos de exigência, rigor e autonomia.

Em suma o novo regime de ADD é um mal necessário, numa investigação que

concluímos em 2013, inferimos junto de mais de mil e duzentos docentes do Alentejo

(16,8% dos quais professores de matemática) que a avaliação do desempenho docente

era necessária, mais 95% dos respondentes concordaram com a sua existência! Este

incontestável resultado garantiu-nos que os profissionais do ensino que inquirimos não

almejavam uma exoneração avaliativa que os libertasse de responsabilidades inerentes

aos seus cargos.

Portugal’s performance in international surveys remains well below the

OECD average. Against this backdrop, the Government’s efforts to

introduce meaningful teacher evaluation are very important and should

be sustained. (OCDE, 2009b, p. 5)

7 A figura de relator não é propriamente uma novidade no processo de ADD uma vez que no Decreto-Lei

n.º 139-A/90 de 28 de abril (n.º 4 do 9.º artigo.º), o relator era o responsável pela elaboração do projeto de

parecer para atribuição da menção qualitativa pela comissão especializada.

Martins

PROFMAT — 2015 25

Neste trabalho confirmamos o que havíamos constatado na literatura (Flores, 2010;

OCDE, 2009c; Peterson, 2000; Simões, 2002; Stronge, 2010), obtivemos evidências que

nos permitiram inferir que os inquiridos entendiam que esta avaliação promovia o seu

desenvolvimento profissional reforçando a ideia que a avaliação dos professores não

deve ser apontada como um constrangimento ou como um fator de limitação à ação

educativa. A ADD poderia constituir uma oportunidade que a ser abraçada por todos no

intuito de promover melhorias no desenvolvimento profissional dos docentes.

O sistema de avaliação cria uma oportunidade de desenvolvimento

profissional que pode contribuir significativamente para melhorar a vida

pedagógica das escolas e a qualidade do serviço que prestam à sociedade

em que se inserem. (Fernandes, 2008, p. 29)

Os participantes no estudo também apontaram a que a legislação em vigor não

desprezava a associação entre a ADD e a melhoria da qualidade da escola uma vez que

podia ocupar um papel preponderante na identificação dos docentes que não

desempenham as suas funções da melhor forma e assim procurar fornecer-lhes o apoio

necessário à sua melhoria.

Os participantes no estudo também não concordaram que a ADD promovesse a

diferenciação dos docentes segundo o mérito, a seleção no acesso à profissão docente e

a prestação de contas à sociedade. Não obstante a importância destas opiniões queremos

realçar que embora o modelo de ADD em vigor apontasse claramente que se

encontrava:

[...] orientado para a melhoria dos resultados escolares e da aprendizagem

dos alunos e para a diminuição do abandono escolar, [...]. (Preâmbulo do

Decreto-Lei n.º 41/ 2012, de 21 de fevereiro)

Os inquiridos discordaram que a ADD promovesse a melhoria das aprendizagens dos

alunos. Repare-se que não é de todo descabido inferir que uma das exigências que se

coloca aos professores prende-se com a obrigação destes desenvolverem as suas funções

em prol do sucesso dos alunos (Simões, 2002). Ora, na presença de um modelo de

avaliação que objetiva tais desígnios, seria expectável que os professores assumissem

uma postura de concordância, entendendo à ADD como promotora da melhoria das

aprendizagens dos alunos. No entanto, tal não sucedeu com os participantes do estudo

que ao manifestarem discordância, conduzem-nos a inferir uma eventual não aceitação

do supradito modelo vigente.

Martins

26 PROFMAT — 2015

Daí advém o risco da avaliação constituir-se irrelevante quer para o desenvolvimento

profissional como para a melhoria das aprendizagens dos alunos (CCAP, 2010b).

Considerações finais

Os contributos dos PM I e PM II foram evidentes, não só facultaram algum

protagonismo positivo à disciplina de matemática que não aquele à que os docentes

desta disciplina estavam habituados como permitiram um aprofundamento didático dos

professores em termos de conhecimento do currículo, do processo instrucional (Ponte e

Oliveira, 2002), dos alunos per se e suas respetivas aprendizagens ou ainda do Novo

Programa do Ensino Básico implementado no decorrer do PM II. Os planos

promoveram uma evidente cultura de reflexão sobre a prática quer seja na ação, sobre a

ação e sobre a reflexão na ação (Schön, 2000), em determinados ambientes educativos a

cooperação e a colaboração dos docentes fomentaram uma cultura de aprendizagem

profissional próxima do conceito de comunidade de aprendizagem definido por Ponte et

al (2009). As práticas de sala de aula alteraram-se desde a implementação de portfólios

passando pela diversificação de tarefas até ao processo avaliativo e sua respetiva

aferição em pequenos e grandes grupos de trabalho in loco ou não.

Como é expectável nem tudo decorreu da melhor forma e alguns constrangimentos

tiveram que ser superados como a falta de tempo dos docentes para poderem trabalhar

em conjunto de uma forma mais sistemática ou ainda a falta de permeabilidade na troca

de saberes entre algumas escolas que integraram os vários grupos de trabalho (Oliveira,

2011). Foi justamente na capacidade de promover uma simbiose colaborativa e

produtiva que os PM I e II se destacaram comparativamente a uma ADD que

inicialmente dicotomizou com ligeireza a classe docente entre avaliadores e avaliados.

Se os planos foram considerados um exemplo de bem-fazer sob a égide da autonomia

das escolas a avaliação dos docentes imposta superiormente foi sinónima de confrontos

entre os professores.

Não há como discordar:

The ultimate goal of all professional development is improved student

achievement. (Mundry & Loucks-Horsley, 1999, p. 3)

Quer os PM I e II ou a ADD provaram querer contribuir não somente para a melhoria

dos resultados académicos dos alunos como para o desenvolvimento profissional dos

Martins

PROFMAT — 2015 27

docentes, ora a resolução dos problemas no campo da educação depende cada vez mais

do trabalho cooperativo, colaborativo em detrimento do carácter individualista de uma

cultura conservadora de escola.

O desenvolvimento profissional atual é um assunto de grupos de

professores, frequentemente trabalhando com especialistas, supervisores,

administradores, orientadores, pais e muitas outras pessoas que estão

ligadas à escola moderna. (Fenstermacher e Berliner, 1985, p. 282)

A hodiernidade desta referência não pode ser colocada em causa é aceitável considerar

que os benefícios que advêm do desenvolvimento profissional não têm apenas

implicações diretas nos docentes e consequentemente nos discentes que tutelam. Todos

os implicados no processo de ensino e aprendizagem, quer sejam os professores, os

alunos ou o pessoal não docente lucram com o desenvolvimento profissional dos

professores, mais acrescentamos que a própria comunidade educativa tem todo o

interesse em desenvolver-se profissionalmente:

El desarrollo profesional de todo el personal educativo de un centro

educativo se define como aquellos procesos que mejoran la situación

laboral, el conocimiento profesional, las habilidades y actitudes de los

trabajadores de un centro educativo. Por lo tanto, en este concepto se

incluiría a los equipos de gestión, al personal no docente y al

profesorado. (Imbernón, 2009, p. 33)

Ainda que possa parecer utópico, atrevemo-nos a referir que os docentes podem até

constituir um motor social de desenvolvimento que contagie não somente o núcleo duro

dos profissionais do ensino mas que extravase na sociedade a necessidade de uma

constante atualização de conhecimentos.

O valor das sociedades atuais está diretamente relacionado com o nível

de formação de seus cidadãos e da capacidade de inovação e

empreendimento que eles possuam. (Marcelo, 2009b, p.110)

Se queremos uma sociedade plural e capaz de enfrentar a concorrência global e as

ameaças económico financeiras temos todo o interesse em que os cidadãos de amanhã

tenham os melhores professores de hoje, para tal novas competências têm que ser

diariamente exigidas aos docentes e aos alunos para que se alcance a produtividade

necessária e imposta pelos acionistas e/ou contribuintes que exigem justificação perante

os investimentos realizados em época de crise económica.

O plano de ação para a matemática abriu o caminho para uma nova forma de enfrentar a

matemática, para demonstrar que os professores (de matemática) foram e continuam

Martins

28 PROFMAT — 2015

capazes de moldar o mundo sem medo de uma ADD imposta por decreto. Perante a

evidência da utilidade desta medida, quando terremos um plano de ação para educação?

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Decreto Regulamentar n.º 2/2010, de 23 de junho

Decreto-Lei n.º 41/2012, de 21 de fevereiro

Decreto Regulamentar n.º 26/ 2012, de 21 de fevereiro

PROFMAT — 2015 32

PRÁTICAS TRAICIONAIS RIDEIRINHAS E EDUCAÇÃO MATEMÁTICA:

TRAVESSIAS PARA ALÉM DA SALA DE AULA

Isabel Cristina Rodrigues de Lucena, Maria Augusta Raposo de Barros Brito

Universidade Federal do Pará

[email protected], [email protected]

Resumo

A dificuldade na compreensão dos conteúdos matemáticos vivida pelos estudantes nas

escolas ribeirinhas, em especial nas séries iniciais, é parte da falta de diálogo dos

conhecimentos desse nível com as situações do cotidiano. Essa percepção foi possível

de ser construída a partir das vivências e discussões que emergiram das pesquisas com

os professores ribeirinhos. Desde 2006 no Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação

Matemática e Cultura Amazônica (Gemaz), e o Projeto Alfabetização Matemática na

Amazônia Ribeirinha – AMAR: condições e proposições, ambos ligados ao Programa

de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática da Universidade Federal do

Pará (PPGECM/IEMCI/UFPA), veêm trabalhando para oportunizar a compreensão da

matemática com sentido e significado, a partir de aspectos culturais dos grupos

amazônicos, compreendendo a matemática religada à história e à cultura das populações

ribeirinhas. Nesta perspectiva, um novo olhar se move em direção ao currículo escolar,

que requer uma organização dos tempos/espaços/valores que deverão ser considerados

necessários para os alunos ribeirinhos, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional - LDBEN (Lei n° 9394/1996). No entanto, permanece ecoando um

distanciamento entre os conhecimentos para o ensino de matemática e os conhecimentos

instaurados cotidianamente pelos alunos ribeirinhos. Assim, essas pesquisas favorecem

reflexões que nos direcionam para atividades potencializadoras de interconexões a partir

da base tradicional amazônica pertencente aos alunos ribeirinhos com novos/outros

conhecimentos da matemática escolar. Neste texto destacamos duas experiências de

professores ribeirinhos que trabalham na perspectiva de aproximação entre os

conhecimentos locais e globais.

Palavras chave: Práticas Tradicionais, Educação Matemática, Escolas Ribeirinhas.

Introdução

As primeiras pistas para se adentrar no universo deste tema centram-se nas pesquisas

encaminhadas pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Matemática e Cultura

Amazônica - GEMAZ e o projeto Alfabetização Matemática na Amazônia Ribeirinha:

Lucena & Brito

PROFMAT — 2015 33

condições e proposições – AMAR1. As vivências e discussões emergidas desta parceria

resultaram em pesquisas envolvendo os professores ribeirinhos os anos iniciais, a partir

do que foi possível inferir que, parte da dificuldade de compreensão dos conteúdos

matemáticos escolares vivida pelos estudantes ribeirinhos, em especial nos anos iniciais,

está relacionada a carência de diálogo entre conhecimentos desse nível escolar com as

situações do cotidiano, vivificados nos saberes da tradição das comunidades

ribeirinhas.

A área chamada ribeirinha, comum ao universo da Amazônia brasileira, possui escolas

que se diferenciam dos centros urbanos. Geralmente são escolas (ou unidades

pedagógicas) com um número pequeno de alunos (total de 20 a 50 alunos em média) e

organizadas em turmas multisseriadas (alunos de 1º ao 3º ano em uma mesma sala de

aula com um único professor, por exemplo) com cerca de 10 a 20 alunos por sala. É

comum que as escolas dessas comunidades ribeirinhas atendam os cinco primeiro anos

de escolaridade, no Brasil denominado Ensino Fundamental I, com alunos na faixa-

etária de 6 a 10 anos.

O projeto AMAR esteve dedicado a investigar realidades de ensino da matemática em

oito escolas dos anos iniciais pertencentes à região insular de Belém (estado do Pará –

Brasil) durante os anos de 2011 a 2015. Para uma certa compreensão do universo

territorial que estamos inseridos, informamos que a extensão territorial do estado do

Pará é 1.248.042,515 Km2, composta por 144 municípios. Somente o município de

Belém, capital do estado do Pará, cerca de possui 1.000Km2 com 1.432.844 habitantes

distribuidos entre sua área continental e suas 39 ilhas (IBGE2, 2014). Embora o espaço

territorial das ilhas corresponda a cerca de 61% da área total de Belém, a maioria da

população habita a parte continental desse município. O modo de vida das ilhas difere

substancialmente daquilo que há na vivência continental, apoximando-se mais dos

aspectos rurais – subsitência no extrativismo, cultivo da terra, baixa concentração de

1 O AMAR é integrante do Programa Observatório da Educação (OBEDUC) – Edital 2010 – financiado

pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal Docente (CAPES) apoiado pelo Ministério da

Educação do Brasil (MEC) e pelo Instituto de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). 2 Dados referente ao relatório de 2014 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Lucena & Brito

34 PROFMAT — 2015

moradores, dentre outros – com dependência de deslocamento, quase que

exclusivamente, do transporte fluvial.

Vejamos um pouco do mapa de Belém:

Figura 1: Mapa de Belém-Pará-Brasil (Fonte: Arquivo projeto AMAR, 2014 )

Desde de 2006 o GEMAZ realiza pesquisas, em nível de mestrado, na ilha do Combu.

Já a partir do projeto AMAR foram envolvidas as seguintes localidades: ilha do Combu,

ilha Grande, ilha de Cotijuba e região da Várzea (Igarapé do Aurá). É em meio a uma

ampla hidrografia, uma paisagem exuberante e cotidianidade diferente do ambiente

urbano da capital continental que deflagramos investigações sobre a educação

matematica que se realiza nas escolas ribeirinhas.

Além das referências construídas a partir do projeto AMAR, trazemos para esse texto

alguns fragmentos da pesquisa de mestrado de Brito (2008), nascedouro das

investigações do GEMAZ nas ilhas de Belém.

A fim de divulgarmos um pouco dessa experiência investigativa, organizamos esse

texto nas seguintes secções: O ensino de matemática e o contexto ribeirinho; Nossas

percepções, Nossa atenção e A aposta. Em Nossas percepções citamos conclusões em

âmbito da formação docente no sentido de anunciar os olhares do campo da pesquisa

científica para as investigação em causa, em nível geral e por meio dos estudos

realizados pelo Gemaz. Em Nossa atenção destacamos a proeminente necessidade de

estritamentos de relações entre o que se pesquisa e o que eminentemente acontece na

Lucena & Brito

PROFMAT — 2015 35

educação básica, tomando como referência as vivências ocorridada durante a inserção

do GEMAZ nas escolas ribeirinhas. Por fim, na A aposta referimo-nos a duas

experiências de professores ribeirinhos, as quais reforçam o argumento de que a

compreensão dos conteúdos matemáticos escolares pelos estudantes ribeirinhos pode ser

beneficiada pelo diálogo entre conhecimentos desse nível escolar e as situações do

cotidiano.

O ensino de matemática e o contexto ribeirinho

Discutir o ensino de matemática tem um desafio constante uma vez que na realidade

estudada o domínio conceitual desta linguagem ainda aponta para os (de)sabores da

compreensão a respeito de seus objetos de aprendizagem. Em contraponto, as práticas

matemáticas estão fortemente presente no cotidiano das crianças em suas ações diárias,

desafiando essas crianças ao enfrentamento de problemas que envolvem estimativas,

medições, cálculo mental, ordenações, classificações, dentre outros.

É na vivência deste contexto que nos propomos a dialogar sobre alguns dos elementos

que pinçamos ao olhar atentamente para este local, a explicitação de ambientes de

aprendizagens em que os saberes da tradição são deflagrados como organizadores do

fazer pedagógico, embora sejam práticas indissincráticas. O nosso interesse além de

mostrar as condições da realidade ali vivida, é também apontar as possibilidades

existentes, mesmo no enfrentamento das adversidades postas.

O currículo da Educação Básica brasileira é orientado (embora atualmente haja

propostas de mudanças) pelo que conhecemos como Parâmetros Curriculares Nacionais

(PCN) - disposto pelo Ministério da Educação desde 1997 - que são diretrizes gerais

com sugestões de blocos de conteúdos a serem trabalhados por ciclos. No caso dos anos

iniciais há dois ciclos: 1º ao 3º ano e 4º e 5º anos. Contudo, as secretarias de educação

estaduais e municipais, podem organizar sugestões de conteúdos frente as suas próprias

realidades e por fim, as próprias escolas também podem organizar seus currículos por

meio dos seus Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) a fim de atender mais

adequadamento os alunos que lhes competem.

Embora haja uma flexibilidade ampla para organizar o currículo de matemática e as

práticas para esse ensino, os currículos procuram estar de acordo com as matrizes de

Lucena & Brito

36 PROFMAT — 2015

referência para as provas externas demandas pelo MEC tais como as chamadas Provas

Brasil e Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA). Então há sempre uma certa

similaridade curricular entre os PPP das escolas, sobretudo no que diz respeito ao que

deve ser ensinado – de matememática - nos anos iniciais de escolarização.

Muitas vezes o ensino de matemática em escolas ribeirinhas toma como referência o

contexto das escolas urbanas. Dos referenciais da psicologia da aprendizagem ou das

neurociências, é possível afirmar que a aprendizagem da criança é facilitada pela

relação que ela estabelece entre conhecimentos novos a serem adquiridos e aqueles já

estabelecidos por suas práticas cotidianas. Portanto, o contexto, as experiências

cotidianas devem ser consideradas para a organização do ensino escolar a fim de

proporcionar qualidade de aprendizagens. Assim, é fundamental reconhecer as práticas

cotidianos do universo ribeirinho para que seja posto em voga as relações pretendidas

com o conhecimento escolar.

A fim de esclarecer um pouco o que denominamos por ribeirinho, trazemos a definição

de Cruz (2008) que refere-se ao ribeirinho não somente aquele que mora às

proximidades dos rios mas, que sobretudo, o que assume o rio para além de um espaço

geográfico, mas, especialmente como um espaço social e simbólico. Segundo Cruz,

O rio como espaço social é o meio e a mediação das tramas e dos dramas sociais que

constituem o modo de vida ribeirinho com seus saberes, fazeres e sociabilidades

cotidianas. Como espaço simbólico ele é matriz do imaginário, produto e produtor dos

sistemas de crenças, lendas, cosmologias e mitos ligados à floresta e ao misterioso

universo das águas que são elementos fundamentais na construção da cultura do

ribeirinho na Amazônia. (2008, p. 59).

Os alunos ribeirinhos, em geral, são nascidos e criados tendo o rio como espaço social e

simbólico. Ao assumirmos o entendimento de que a geração, a organização e a difusão

do conhecimento se estabelecem pelas necessidades sociais que os humanos sentem

para encontrarem explicações e modos de interação com sua realidade (D’Ambrosio,

2007), não há como inferiorizar ou descartar o conhecimento local para o envolvimento

dos alunos em suas aprendizagens.

Portanto, ao lidar com a escolarização, ou melhor, a educação matemática dos alunos,

não basta conhecer dos referenciais curriculares por si. Há de se considerar, também,

qual o contexto de vida que possibilita as aprendizagens dos alunos, suas experiências

Lucena & Brito

PROFMAT — 2015 37

cotidianas e suas formas de lidar com os problemas, por vezes muito distante dos

referenciais urbanos.

Nossas percepções

Ao se pensar em determinado local em que se realiza a investigação é preciso esclarecer

que as percepções são temporalmente posta por quem investiga. Estas percepções são

determinadas por um conjunto de situações muitas vezes exteriores ao fenômeno, mas

também constituem focos para se prosseguir em novos argumentos, por vezes

corroborando com os anteriores, ou refurtando-os. O que genuinamente se quer dizer é

que nossas impressõoes aqui postas também servem de vetor analítico de nossa própria

ação investigativa, por isso nossa confiança em dizer de um local no conforto de nossas

limitações interpretativas.

Compreendemos que os docentes que ali estão – nas escolas ribeirinhas – recebem

formação de um contexto urbano e, nesse sentido, algo já nos provoca: em quais

aspectos as questões norteadoras de estudos a respeito deste contexto podem ser

similares ao outros em relação à docência? O que se tem apontado em âmbitos gerais

aos fazeres pedagógicos desta comunidade?

Em sentido abrangente destacamos alguns autores que têm investigado sobre a

docência. Dentre outros, nos reportamos a Nacarato (2006) e Curi (2004). A primeira

pesquisadora indica que há uma forte ligação entre os valores e crenças em relação a

matemática e a execução da prática pedagógica desta mesma disciplina enquanto que,

Curi, ao estudar o currículo dos graduandos para atuarem nos anos iniciais conclui que a

maioria dos cursos de formação no Brasil dão atenção aos conteúdos gerais do ensino

da matemática em detrimento a uma formação que priorize aspectos metodólogicos

sobre temas a serem abordados neste mesmo nível de ensino.

Em termos mais próximos a nossa atuação destacamos no estado do Pará, o estudo de

Dias (2014) revelando que os docentes ensinam como aprendem, reforçando assim a

necessidade de se (re)pensar a formação, ou seja, de repensarmos as aprendizagens de

formação inicial dos professores para os anos iniciais, pois, conforme já mencionado, há

uma grande tendência das licenciaturas contribuírem com as atuais práticas que se

desenvolvem no interior da escola.

Lucena & Brito

38 PROFMAT — 2015

Em síntese, as experiências formativas são fundamentais para a constituição docente em

termos mais próximos aos contextos em que irão atuar.

Para além de compreender aspectos gerais, o GEMAZ visa olhar atentamente para

espaços específicos, contexto regionalizados, sem se perder na segregação dos espaços,

seja geográfico, social ou imaginativo. Nisso cabe ressaltar a preocupação de estudos

que visam problematizar como o conhecimento, de modo especifico e sob a relevância

do contexto cultural, pode interligar-se aos contexto mais amplos em aula. É nesta

perspectiva que cabe apresentar nossas percepções singulares como sujeito de dialogia

com e no conetxto ribeirinho.

A este respeito Dias e Brito (2012) baseadas em Fleck3 indicam que as pesqusias do

GEMAZ buscam compreender como os saberes do cotidiano, ou da tradição das

comunidades ribeirinhas aproximam-se, distanciam-se ou são negados por práticas

formais do ensino de matemática.

A este respeito destacamos resultados apresentados por: (a) Sousa (2010) que conclui

que há distanciamento entre os saberes cientificos e os da tradição dos

estudantes ribeirinhos, e com isto, afastamento dos alunos ribeirinhos da continuidade

da escolarização; (b) Bicho e Lucena (2014) asseverando que a alfabetização

matemática expressa no contexto ribeirinho ainda se restringe às experiências

matemáticas às orientações didáticas e curriculares de âmbito global, sem levar em

consideração os conhecimentos sugeridas pelas experiências dos estudantes em seu

contexto diário.

Mediante o exposto apresentamos a nossa percepção a respeito da formação docente no

sentido de assentar nossas pretenções de estudo à temática. Com isso destacaremos a

seguir a próxima seção.

3 Ludwink Fleck, médico polonês que em 1935 publicou sua obra Entstehung und

Entwicklungeiner wissenschaftlichen Tatsache (A Gênese e o Desenvolvimento de um Fato Científico).

Lucena & Brito

PROFMAT — 2015 39

Nossa atenção

Ao percebermos que a matemática escolar vivenciada nas escolas ribeirinhas, em sua

maioria, não se organizava tomando como alguma referência as práticas cotidianas dos

alunos que ali estavam, com sentido e significado relacionados ao contexto dos

amazônidas, percebemos que elementos desse tipo de cotidianeidade também era

ausente ou minimizado na formação dos professores amazônidos.

Para pensar o ensino na perspectiva de articulação entre os saberes – tradição escolar e

tradição cultural – a docência deve ser provida de atenção em situações de

aprendizagens que favoreça tal compreensão, há que se pensar um projeto comum entre

formadores e professores da educação básica para que a experiência seja significada por

elos entre este mesmo objeto – a prática – e a compreensão teórica a respeito, pois

segundo Freire:

[...] é refletindo sobre a prática que aprendemos a pensar e a praticar

melhor, contudo, atribui valor à prática na mesma equivalência que à

teoria, pois há a dialeticidade entre a teoria e a prática. [...] é desvelando

o que fazemos desta ou daquela forma, à luz do conhecimento que a

Ciência e a filosofia oferecem hoje que nos corrigimos e nos

aperfeiçoamos. (Freire, 1998, p. 105)

É com a pretenção de aproximar teoria e prática no que se refere a formação docente é

que buscamos estar atentos para o enfrentamento das condições postas ao ensino, por

meio de aprendizagens e de parcerias com os professores atuantes na educação básica.

Se por um lado a formação docente não tem proporcionado aprendizagens suficientes

para o enfrentamento de desafios do ensino no contexto amazônico ribeirinho, por outro

lado, nós, na condição de formadores de professores sentimos carência de

conhecimentos e experiências para com essa situação.

Por meio do AMAR, buscamos adentrar o universo ribeirinho em parceria com os

professores que atuam em escolas das ilhas de Belém–PA a fim de galgar experiências e

produções conjuntas. Dentre as ações propositivas desenvolvemos um curso de

especialização no qual há o que denominamos de aulas práticas, onde nós, professores

da equipe do GEMAZ ministramos aulas nas turmas dos professores ribeirinhos, nos

espaços escolares das ilhas de Belém, assistidos por esses professores. Essas aulas são

planejadas em conjunto com os professores e refletem teorias sobre ensino e

Lucena & Brito

40 PROFMAT — 2015

aprendizagem matematica nos anos iniciais. As aulas, entre outros objetivos, tem

contribuído fortemente para que possamos nos aproximar das aprendizagens da

matemática ocorridas no universo ribeirinho, auxiliando-nos, também, no processo

investigativo sobre o tema.

Importa-nos dizer que, além das aulas práticas, temos recolhidos aprendizagens também

com as experiências que tem sido implementadas por esses professores e que

corroboram com a assertiva da melhoria da aprendizagem matemática pelo diálogo com

os saberes da tradição ribeirinha.

A seguir anunciamos duas dessas experiências. A primeira remonta a pesquisa de Brito

(2008) e a segunda ao projeto AMAR, recolhida nas práticas formativas do curso de

especialização realizado em 2014.

A aposta

No lugar de apresentarmos algumas de nossas sugestões de diálogos para com a relação

entre saberes tradicionais e saberes matemáticos, algumas delas postas em Lucena e

Mendes (2013), optamos por divulgar expreriências criadas e desenvolvidas por

professores de atuação em escolas ribeirinhas. A primeira delas trata de práticas de

ensino realizadas pela professora Alana em 2006 em turmas de Educação Infantil,

registradas pela pesquisa de Brito (2008). A segunda faz parte da experiência do

professor Humberto, realizada em 2014 em turmas de 4º e 5º ano do Ensino

Fundamental.

Tais experiências, mesmo ocorrendo em momentos diferentes, ambas concentraram

olhar sensível e reflexivo (Holffmann, 2014) em direção à compreensão da matemática

com sentido e significado, a partir de aspectos culturais dos grupos amazônicos, e assim

contribuem como uma espécie de aposta possível para com a realização de atividades

de ensino de matemática sob a religação com a história e a cultura das populações

ribeirinhas.

Lições deixadas pela professora Alana

Açaí - lugar onde Oxóssi faz seu posto!

Lucena & Brito

PROFMAT — 2015 41

A frase em destaque é poetisada por Nilson Chaves, cantor-compositor paraense, em

que exalta a simbologia presente em um dos alimentos mais consumidos do Pará, o

açaí. Com outra estratégia, a professora Alana também expressa a inteireza de ser

amazônida no momento elege o uso da prática cultural, a extração do açaí, na tecitura de

argumentos em favor da divulgação do conhecimento escolar em diálogo com a tradição

e também patrimônio cultural ribeirinho.

Figura 2 - Extração de açaí

Fonte: Brito, 2008

Figura 3 - Rasa de açaí

Fonte: Brito, 2008

Ao tratar do tema “Medidas”, a professora Alana buscava informações sobre o contexto

vivenciado pelos seus alunos. Um conhecimento sempre presente entre eles, mesmo

entre os de menor idade, estava relacionado com a medição da quantidade do fruto

recolhido para a comercialização e, também, para consumo local.

Lucena & Brito

42 PROFMAT — 2015

A rasa4, objeto de confecção e uso comum em algumas comunidades ribeirinhas que

fazem a extração do açaí, é um elemento presente no cotidiano das crianças. Estas

participam das práticas extrativista junto com seus familiares adultos e constróem uma

referência sobre a medição da quantidade de açaí a ser retirada dos açaizeiros para a

venda nas feiras na outra margem do rio. A rasa então torna-se, também, um objeto de

discussão nas aulas de matemática quando é tomado pela professora em situações

didáticas para exploraçã/problematização do sistema de medida de capacidade utilizado

na região. O diálogo com os conhecimentos escolares se estabelece quando a professora

possibilita relações entre a unidade de medida local (rasa) com as unidades

pertencentes ao Sistema Métrico Decimal.

As escolas ribeirinhas são comumente desprovidas de materiais manipuláveis para

apoio às aulas. Mais que uma carência, para a professora Alana essa situação tornou-se

um desafio. Como pode ser visto abaixo a professora adaptou as próprias rasas (em

tamanho menor) como material didático para apoiar as aprendizagens dos alunos sobre a

lógica do funcionamento Sistema de Numeração Decimal, de modo semelhante ao

Cartaz Valor de Lugar (cavalu), material geralmente indicado por livros didáticos ou em

formações docentes para esse tipo de abordagem em sala de aula.

Figura 4 - Rasas pequenas utilizadas como material didático - Fonte: Brito, 2008

Desta maneira, integrava ao processo educativo materiais didáticos confeccionados

pelos próprios estudantes, bem como o diálogo entre a prática escolar e os saberes

tradicionais da comunidade.

4 Artefato confeccionado com palhas de Guarumã, em forma de cesto, comum à região amazônica para o

acondicionamento e medição do fruto açaí.

Lucena & Brito

PROFMAT — 2015 43

A professora Alana buscava agregar os saberes das gerações mais experientes como

meio de materializar a relevância da aprendizagem dos conhecimentos da tradição local.

Em uma de suas aulas pudemos presenciar o encontro da artesã mas antiga do lugar que,

a convite da professora Alana, foi para a sala de aula explicar aos alunos os

procedimentos para a confecção de rasas. Em momento posterior, Alana trabalhou as

posições (paralelas, perpendiculares, concorrentes) entre as talas usadas durante a

confecção das pequenas rasas tomando como ponto de referência da matemática escolar

a geometria plana.

A professora tinha clareza que, na realidade em que vivia, a cultura como acionadora de

mediação entre conhecimentos distintos, era desprezada. Como ela própria afirmava:

(...) pessoas com um vocabulário próprio, riquíssimo, também são

“analfabetas” porque não sabem “falar direito”, errando na concordância

verbal. O desenvolvimento cognitivo que essas crianças alcançam fora da

escola é desprezado e posto em trilhos. Crianças que contam as luas, são

“analfabetas” por não saberem contar os números naturais; crianças que

sabem se vai chover ou não, são reprovadas porque não decoraram as

estações do ano (primavera, outono, inverno, verão), ou porque elas

acontecem” (Excerto da Profa. Alana em Brito, 2008, p.77)

A professora organizava o ensino pensando em atividades como tecer paneiros5 e tupes6,

confeccionar redes de pesca, matapis7 e peconhas8, além de desenhos e construções de

embarcações artesanais (pequeno e médio porte), por exemplo. Nestas atividades os

conteúdos matemáticos podiam ser trabalhados levando em consideração a articulação

entre as imagens locais e o saber escolar.

5 Cesto amazônico, feito de talas de guarumã, jupati e miriti. É confeccionado em traçado hexagonal. A

palavra paneiro é hibrid a, vem do Tupy - PANÁ (cesto) com o sufixo Português – EIRO, que expressa

uso, finalidade e profissão (paná + eiro = Paneiro). Guarda-se nos paneiros roupas, comidas e até animais.

6 Esteira feita de talas de guarumã, na qual se espalham alguns produtos da lavoura para secagem. É

utilizada também como tolda nas embarcações artesanais e como forro e/ou divisórias em casas

ribeirinhas.

7 Armadilha de forma cilíndrica, feita com fibra amazônica, utilizada para capturar camarão.

8 Artefato moldado a partir dos galhos da palmeira do açaí, utilizado para escalar o tronco do açaizeiro a

fim de extrair o cacho do fruto açaí.

Lucena & Brito

44 PROFMAT — 2015

A professora Alana vivia seu tempo e lugar, portanto, uma de suas preocupações era

possibilitar ao aluno compreender-se ribeirinho, tal como afirmava: “Eu quero que esse

aluno quando atravessar o rio consiga fazer a conexão dessa natureza com aritmética,

álgebra e a geometria. Falo isso porque estudei lá [apontou na direção a cidade de

Belém] e não fizeram isso comigo” (Excerto professora Alana em Brito, 2007, p. 83).

Lições do professor Humberto

Foi no desenvolvimento das atividades do projeto AMAR que percebemos alguma

concordância da prática docente da professora Alana com a do professor Humberto.

Eles nunca se conheceram. Alana faleceu em 2007 e Humberto iniciou sua carreira

como docente em Belém, em 2013. Antes de ser professor em Belém, Humberto tinha

sido professor em uma escola tipicamente urbana em outra cidade. Logo quando o

conhecemos por meio do projeto AMAR, em 2013, deparamos com suas inseguranças,

seus medos por atuar em escolas ribeirinhas, pois era sua primeira experiência nesse

tipo de escola.

Figura 5 - Escola ribeirinha onde trabalha o professor Humberto

Fonte: projeto AMAR, 2014.

O professor Humberto foi aluno de escolas ribeirinhas no interior do estado do Pará.

Guarda lembranças desastrosas sobre as aprendizagens que teve na época de aluno,

sobretudo em relação à matemática. As experiências negativas provocaram-lhe um

sentimento de compromisso para com um ensino de matemática diferenciado a partir de

sua própria prática como professor dos ano iniciais. Porém, o medo de fracassar neste

compromisso também fazia parte dos sentimentos deste professor. Segundo ele:

Ao assumir as turmas do CII: 1º e 2º anos [4º e 5º anos de escolarização inicial] na

região das ilhas de Belém, a insegurança que tive em Marabá [cidade de característica

urbana onde teve experiência profissional anterior] voltou a me acompanhar. Pois estava

Lucena & Brito

PROFMAT — 2015 45

diante de um novo desafio, em contato com outras pessoas, com princípios e saberes de

vida diferentes da zona urbana, uma outra cultura a ser conhecida” (Professor

Humberto, arquivos do projeto AMAR, 2014).

Por meio do projeto AMAR pudemos acompanhar as práticas do professor Humberto

em uma escola ribeiirnha, e nos foi possível compreender que o medo paulatinamente

foi vencido pelo respeito aos saberes da tradição e pela ousadia em criar formas de

assunção desses saberes relacionados aos conhecimentos escolares em prol da melhoria

das aprendizagens do alunos. Humberto diz um pouco de suas estratégias para o

enfrentamento dos desafios como professor de uma escola ribeirinha:

Por isso, em minha sala de aula, eu disponibilizo uma variedade de objetos do cotidiano

dos estudantes tais como: barco, casqueta9, paneiro, peconha, matapi, terçado, machado,

caniço, rede de pesca, tarrafa10, vassoura de açaí, rasa, etc. Estes são instrumentos

significativos na vida familiar dos estudantes, são feitos em miniatura por eles, trazidos

para a representação concreta das temáticas estudadas. Isto possibilita aproximação

entre os conhecimentos locais e globais e cria o sentimento de pertencimento nos

sujeitos. Com a miniatura do barco, por exemplo, estudamos os meios de transporte, as

unidades de medidas de tempo, comprimento, velocidade, o ambiente, espaço

geográfico, noções de educação financeira, os tipos de madeira, noções de lateralidade,

adição, subtração, divisão, multiplicação, figuras geométricas, tabelas e gráficos,

produção de textos, história da navegação, etc. (Professor Humberto, arquivos do

projeto AMAR, 2014).

O professor Humberto cita alguns objetos comuns ao cotidiano dos alunos ribeirinhos

como elementos potenciais para o desenvolvimento de aprendizagens múltiplas.

Apresenta possibilidade de articulação entre a exploração das finalidades ou confecção

dos objetos para com o currículo escolar. Compreendemos que essas ideias reforçam o

compromisso com o diálogo entre os saberes da tradição cultural e os conhecimentos

9 Tipo de canoa a remo, de pequeno porte, com capacidade para 3 ou 4 passageiros, comum às famílias

ribeirinhas.

Lucena & Brito

46 PROFMAT — 2015

eminentemente escolares em busca de aprendizagens com sentido e significado para os

alunos ribeirinhos.

Considerações finais

As experiências comentadas reportam à práticas docentes que consideram a relevância

dos saberes tradicionais para com as aprendizagens escolares. De nossas pesquisa,

também foi possível observar a satisfação dos alunos diante das experiências didáticas

realizadas por Alana e Humberto. O envolvimento dos alunos por meio de perguntas e

olhares atentos, a alegria e responsabilidade na desenvoltura das tarefas postas pelos

professores foram algumas características observadas por nós em momentos de

pesquisa, nas próprias salas de aulas desses professores e em períodos/anos distintos.

Porém, é necessário dizer que estas experiências foram excessões dentro do universo

investigado. A maioria das práticas observadas ainda mantem distanciamentos entre o

contexto ribeirinho e a matemática alvo da aprendizagem escolar. Consequentemente

um afastamento do interesse dos alunos para com as aprendizagens desejadas pela

organização curricular, pautadas em estratégias que denotam pouco sentido e

significado para a matemática a ser aprendida pelos alunos em questão.

Compreendemos que parte desse cenário é resultado da ausência de experiências

formativas que considerem como relevantes, para a formação docente, estudos, práticas,

investigações, enfim, atividades formativas que oportunizem a construção de relações

entre o contexto amazônico e as necessidades de aprendizagem dos alunos da Educação

Básica.

Contudo, é possível que as aproximações entre formadores de professores e o ambiente

escolar, via pesquisa e experiências formativas, possam auxiliar na diminuição do fosso

que separa as escolhas formativas e as demandas próprias de alguns contextos

amazônicos.

10

Tipo de rede de pesca usada em lugares de águas rasas.

Lucena & Brito

PROFMAT — 2015 47

Referências bibliográficas

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ribeirinhos. Em EBRAPEM (Ed.), Anais do Encontro de Estudantes de Pós-

Graduação em Educação Matemática. Rio Claro: EDUNESP.

PROFMAT — 2015 48

O ENSINO DA ESTATÍSTICA NAS RECENTES ORIENTAÇÕES

CURRICULARES1

Ana Henriques, José António Fernandes

Instituto de Educação, Universidade de Lisboa, Universidade do Minho

[email protected] , [email protected]

Resumo

A Estatística tem vindo a adquirir um lugar de destaque nos programas de Matemática,

um pouco por todo o mundo, incluindo Portugal. As orientações curriculares

internacionais salientam a importância de desenvolver uma forte literacia estatística nos

alunos e sugerem o alargamento e aprofundamento do seu ensino, desde os primeiros

anos, recorrendo a abordagens orientadas para a análise de dados e para o

desenvolvimento do raciocínio estatístico. Apesar disso, nos Programas e Metas

Curriculares para o ensino básico (MEC, 2013) e de Matemática A, do ensino

secundário (MEC, 2014), recentemente homologados, salienta-se um ensino factual e

orientado para as técnicas, desvalorizando a literacia e o raciocínio estatístico dos

alunos. Nesta conferência debruçamo-nos sobre as alterações propostas nestes

documentos, com foco na temática da Estatística, em relação aos anteriores programas

de Matemática (ME, 2001, 2007), tendo por referência as perspetivas defendidas nos

documentos orientadores do ensino da Estatística assim como a recente investigação em

Educação Estatística. Começamos por apresentar algumas considerações sobre as

tendências no ensino da Estatística, a nível internacional, e salientamos o retrocesso que

os atuais programas nacionais representam relativamente a essas recomendações.

Iremos focar, em particular, os conteúdos, as indicações metodológicas, incluindo as

tarefas e os recursos, e a avaliação. No final, levantamos um conjunto de questões para

suscitar o debate em torno dos desafios que se colocam, atualmente, ao ensino e à

aprendizagem da Estatística.

Palavras chave: Ensino da Estatística; Orientações curriculares; Programas de

Matemática; Literacia estatística; Raciocínio estatístico.

1 Este trabalho foi realizado com o apoio de fundos nacionais, através da FCT – Fundação para a Ciência

e Tecnologia, no âmbito dos projectos PEst-OE/CED/UI1661/2014 do CIEd-UM e Desenvolver a

literacia estatística: Aprendizagem do aluno e formação do professor (contrato PTDC/CPE-

CED/117933/2010).

Henriques & Fernandes

PROFMAT — 2015 49

Introdução

A Estatística tornou-se uma componente chave do currículo de Matemática de muitos

países, procurando dar resposta aos apelos de uma sociedade que exige cidadãos

estatisticamente letrados, capazes de interpretar e avaliar criticamente os dados com que

se confrontam na sua realidade quotidiana e de os usar na tomada de decisões (Ben-Zvi

& Garfield, 2004; Burril & Biehler, 2011; Gal, 2002).

O desenvolvimento deste nível de literacia estatística requer tempo e não é compatível

com as práticas de sala de aula predominantes em que os alunos aplicam fórmulas e

realizam cálculos morosos e repetitivos sem lhes dar significado. Algumas

investigações, focadas no ensino e aprendizagem da Estatística, têm revelado que estas

práticas conduzem às reconhecidas dificuldades dos alunos em usar as ferramentas

estatísticas, adequadamente, na resolução de problemas, sendo vital a promoção de

situações didáticas que mobilizem os saberes estatísticos e probabilísticos para as

atenuar (Bakker & Derry, 2011; Rouan, 2003). Para isso, é necessário reforçar o papel

da Estatística nos programas do ensino básico e secundário, não só no que respeita ao

conteúdo mas, sobretudo, adotando abordagens curriculares focadas na promoção do

raciocínio estatístico dos alunos, desde os níveis de ensino mais elementares e criando

condições para que as escolas possam apostar na vertente tecnológica, a partir de

políticas educativas com permanência no tempo (Batanero, Burrill & Reading, 2011;

Oliveira & Henriques, 2014).

Os programas escolares, como é o caso dos programas de Matemática para o ensino

básico e secundário (MEC, 2013, 2014), são um importante guia curricular dos

professores, condicionando o que se ensina nas aulas e as aprendizagens dos alunos.

Assim, o caráter acentuadamente prescritivo de algumas dimensões dos atuais

programas coloca algumas questões aos professores e poderá ter um grande impacto

sobre o ensino e a aprendizagem da estatística (Vergnes, 2001). Estas dificuldades

justificam uma análise e discussão sobre as alterações propostas nestes documentos,

com foco na temática da Estatística, tendo como referência os anteriores programas de

Matemática (ME, 2001, 2007), as perspetivas defendidas nos documentos orientadores

do ensino da Estatística, assim como a recente investigação em educação estatística.

Henriques & Fernandes

50 PROFMAT — 2015

Orientações atuais para o ensino e aprendizagem da Estatística

O ensino da Estatística tem sido alvo de mudanças recentes, devido à reconhecida

importância que os processos estatísticos assumem na sociedade e à valorização da

capacidade de a usar no local de trabalho, na vida pessoal e como cidadãos. Defende-se,

atualmente, um papel mais aprofundado e alargado da Estatística na matemática escolar,

perspetivando-se novas abordagens para o seu ensino e aprendizagem, mais holísticas e

orientadas para os processos e para o desenvolvimento do raciocínio estatístico dos

alunos, que vão para além das técnicas de análise de dados (Makar, Bakker & Ben-Zvi,

2011). Estas novas perspetivas requerem mudanças nos conteúdos e nas práticas letivas,

nomeadamente ao nível dos contextos a propor aos alunos, incluindo tarefas, recursos

tecnológicos e avaliação a usar.

Conteúdos

Diversas organizações delinearam o conhecimento necessário aos alunos para se

tornarem estatisticamente literados. Uma análise do NCTM (2007), documento que se

tornou a base de reforma dos currículos de Matemática em muitos países, fornece

argumentos convincentes para a importância da Estatística e explicita que conteúdos

devem integrar os programas escolares, mostrando uma ênfase consistente ao longo dos

vários níveis de ensino na Análise de Dados e na Probabilidade. Em linha com estas

ideias, o documento “Framework for Teaching Statistics within the K-12 Mathematics

Curriculum” (GAISE, 2005) sugere uma abordagem curricular à Estatística que,

enfatizando e revisitando um conjunto de ideias estatísticas ao longo da escolaridade,

promove gradualmente nos alunos a compreensão da Estatística como um processo

investigativo que envolve as seguintes componentes: formular as suas próprias questões

(ou hipóteses) sobre um fenómeno significativo, que podem ser respondidas com dados;

desenhar e utilizar um plano para recolher dados apropriados; selecionar métodos

numéricos e gráficos adequados para analisar os dados: sumariar, formular conjeturas,

tirar conclusões e fazer generalizações; e interpretar os resultados da análise tendo em

conta o âmbito de inferência baseada nos dados e relacionar a interpretação com a

questão original.

Henriques & Fernandes

PROFMAT — 2015 51

Burril e Biehler (2011) examinaram diversas perspetivas sobre o ensino e aprendizagem

da Estatística e identificaram um conjunto de ideias estatísticas centrais que parecem ser

fundamentais para os alunos desenvolverem uma compreensão profunda da Estatística.

Estas ideias servem como objetivos gerais que orientam curricularmente a

aprendizagem dos alunos e devem estar relacionadas com:

(i) dados, entendidos como números com um contexto. O trabalho com dados,

fornecidos aos alunos ou obtidos através de simulações ou recolhidos pelos próprios,

visam a compreensão da sua necessidade para a tomada de decisões e contemplam

aspetos relativos ao tipo e forma de recolha de dados;

(ii) variabilidade e centro, visando reconhecer as fontes dessa variabilidade, por vezes

de acordo com um ‘padrão’ e a compreensão da sua utilidade para, em articulação com

as medidas de tendência central, prever, explicar ou controlar;

(iii) distribuição, incluindo a sua análise visual. Permite compreender o conjunto de

dados como um todo, ao invés de casos isolados, e desenvolver noções de tendência e

dispersão que fundamentam o raciocínio acerca de distribuições;

(iv) representação, gráfica ou de outro tipo e transformações de representações

(transnumeração) de modo a revelar diferentes aspetos dos dados;

(v) associação e relações de modelação entre duas variáveis, para explorar relações

entre variáveis e compreender modelos úteis para explicar ou predizer dados, incluindo

a regressão para modelar associações estatísticas;

(vi) aleatoriedade e modelos de probabilidade para processos de geração de dados,

permitindo compreender resultados aleatórios e modelar relações estruturais hipotéticas

com origem numa teoria, simulações ou grandes quantidades de dados, quantificando a

variabilidade dos dados e a sua estabilidade a longo termo;

(vii) amostragem e inferência, visando a realização de inferências informais, tomando

decisões com base em amostras e na consideração dos fatores que afetam a precisão

dessas inferências e do grau de incerteza que lhe está associado.

Os conteúdos enumerados enfatizam a Estatística como domínio do saber escolar que se

aproxima do trabalho do próprio estatístico, com potencialidades para a promoção de

uma atitude crítica por parte dos alunos e não a restringe a uma visão tecnicista e

teórica, frequentemente veiculada na escola, que explica o facto de professores e alunos

Henriques & Fernandes

52 PROFMAT — 2015

a verem como tema mais fácil de ensinar e aprender comparativamente com outros

temas matemáticos (Fernandes, Sousa, & Ribeiro, 2004; Fernandes, Carvalho, &

Correia, 2011). Na verdade, é fundamental que os alunos situem essas ferramentas

dentro do processo estatístico e em contextos diversos sob investigação e, para isso, é

especialmente importante a prática de análise de dados e de resolução de problemas

reais, suportada pelos múltiplos recursos tecnológicos atualmente disponíveis, ao longo

de toda a escolaridade (Garfield & Ben-Zvi, 2010; Henriques & Oliveira, 2014).

Tarefas

Reconhecendo a importância do ambiente de sala de aula e da abordagem didática

adotada, em associação com a proposta de tarefas desafiadoras para os alunos, Garfield

e Ben-Zvi (2010) defendem a criação de ambientes de aprendizagem SRLE (Statistical

Reasoning Learning Environment) que potenciem uma compreensão profunda e com

significado da Estatística e o raciocínio estatístico dos alunos. Esta abordagem é

baseada em seis princípios que devem orientar a construção de tarefas e o modo como

as aulas são planeadas e conduzidas pelos professores: (i) desenvolver ideias estatísticas

centrais, como as referidas anteriormente, focando a compreensão conceptual; (ii) usar

dados reais e motivadores, preferencialmente recolhidos pelos alunos; (iii) usar a

atividade de sala, em particular as tarefas e o modo de as trabalhar, para apoiar o

desenvolvimento do raciocínio dos alunos; (iv) integrar tecnologia, sobretudo

educacional, para auxiliar a exploração e análise de dados, focando os alunos na

interpretação de resultados e compreensão conceptual; (v) fomentar a argumentação e a

negociação de significados no discurso de sala de aula; e (vi) usar a avaliação para

monitorizar a aprendizagem dos alunos, com foco na compreensão e não em destrezas, e

refletir sobre o processo instrucional.

No que respeita especificamente às tarefas, a perspetiva descrita encontra eco na

comunidade de educação estatística, que vem valorizando o trabalho com dados reais,

relativos aos próprios alunos ou com eles relacionados. Diversos autores reconhecem

que a familiarização com o contexto é da maior relevância para motivar os alunos e

envolvê-los na aprendizagem, além de poder desempenhar um papel clarificador em

muitas fases de um estudo estatístico, sobretudo no que concerne à fase de interpretação

dos resultados (Fernandes, Carvalho, & Ribeiro, 2007; Macgillivray & Pereira-

Henriques & Fernandes

PROFMAT — 2015 53

Mendonza, 2011). De entre os diferentes tipos de tarefas, os projetos de natureza

investigativa, como é o caso das investigações estatísticas, assumem-se como

experiências de aprendizagem com um potencial específico ao constituírem “veículos

ideais para o envolvimento do aluno na aprendizagem de resolução de problemas em

contexto e para sintetizar componentes da aprendizagem” (Macgillivray & Pereira-

Mendonza, 2011, p. 109). Este tipo de tarefa constitui um contexto natural para os

alunos experienciarem o processo de realização de inquirições estatísticas reais através

da escolha de uma problemática, estabelecimento de um plano, recolha e exploração de

dados e formulação de conclusões, percorrendo todo o ciclo investigativo (PPDAC) de

Wild e Pfannkuch (1999).

Uma parte importante do SRLE é o uso de tarefas que promovem a aprendizagem dos

alunos através de colaboração, interação e discussão de problemas interessantes. O

trabalho colaborativo é especialmente adequado na realização dos projetos

investigativos, por permitir um tipo de diálogo onde os alunos respondem às questões

colocadas pelos colegas e aprendem a questionarem-se, bem como a explicar o seu

raciocínio e a defender as suas respostas e argumentos. Deste modo, os alunos

envolvem-se em diálogos/discussões fundamentados que os focam em ideias estatísticas

significativas (Garfield & Ben-Zvi, 2010). Além disso, a aprendizagem colaborativa

fornece oportunidades aos alunos de diferentes capacidades e níveis escolares, podendo

ainda facilitar aos professores a obtenção de informação quando observam e apoiam o

trabalho dos alunos (Macgillivray & Pereira-Mendonza, 2011).

Recursos

De entre os diferentes recursos passíveis de serem utilizados no ensino da Estatística,

iremos referir-nos particularmente às novas tecnologias, incluindo calculadoras,

computadores, internet e software educacional.

Para Jolliffe (2007), a chamada revolução tecnológica está na origem das maiores

alterações no ensino da Estatística. Os avanços na tecnologia e a crescente facilidade de

acesso a dados reais fornecem a alunos e professores novas ferramentas para adotar

abordagens orientadas para os dados, usando contextos ricos e significativos, como os

proporcionados pelas investigações estatísticas (Garfield & Ben-Zvi, 2010). Os

múltiplos recursos tecnológicos hoje disponíveis têm sido incorporados na educação

Henriques & Fernandes

54 PROFMAT — 2015

estatística de modos diversificados, em particular como instrumento de apoio aos alunos

na exploração e análise de dados, na resolução de problemas estatísticos envolvendo

dados reais e na compreensão de conceitos complexos e ideias estatísticas, com o

objetivo de desenvolver o seu raciocínio estatístico (Ben-Zvi & Garfield, 2004).

Segundo Ben-Zvi (2000), são vários os atributos dos computadores que parecem

contribuir para o desenvolvimento do sentido e significados dos alunos, nomeadamente:

a capacidade de operar de forma rápida e precisa; ligar dinamicamente múltiplas

representações; simplificar procedimentos; fornecer feedback e transformar uma

representação como um todo num objeto manipulável. Para este autor, as representações

como um todo, podendo ser editadas, transformadas, combinadas, separadas em partes,

armazenadas e evocadas, “implicam uma reorganização da atividade cognitiva e uma

mudança do foco de atenção para um nível cognitivo superior” (p. 141). Estes atributos

são reconhecidos pelos alunos, levando-os a verem os computadores como meio para

promover a sua aprendizagem (Fernandes, Júnior & Vasconcelos, 2013).

No entanto, estes atributos da tecnologia alteram as assunções acerca do que deve ser

aprendido e implicam que o currículo de Estatística seja reformulado de acordo,

incluindo os materiais de ensino, as práticas de sala de aula e a forma de os alunos

aprenderem. O acesso a recursos tecnológicos não garante, por si só, uma aprendizagem

efetiva, é fundamental o papel ativo do professor no estabelecimento e suporte do

desenvolvimento do raciocínio dos alunos, focando-se tanto nas representações gráficas

construídas, como nas questões a serem exploradas de modo a assegurar que eles

desenvolvem compreensão da necessária articulação entre estes aspetos (Henriques &

Antunes, 2014).

Avaliação

A avaliação é uma parte integrante da aprendizagem e isso significa que o processo de

avaliação precisa de estar alinhado com os objetivos de aprendizagem. Nesse sentido, o

seu foco deslocou-se de ‘testar’ capacidades, procedimentos e cálculos para ‘avaliar’ a

compreensão de ideias chave, literacia e raciocínio estatísticos (Garfield & Franklin,

2011). Estes autores defendem que a avaliação assenta em três pilares: 1) modelo de

como os alunos representam o conhecimento e desenvolvem competências no domínio

do conteúdo (cognição); 2) tarefas ou situações que permitam observar a performance

Henriques & Fernandes

PROFMAT — 2015 55

do aluno (observação); e 3) um método de interpretação para fazer inferências a partir

da performance observada (interpretação). Em articulação com estes pilares, examinam-

se os propósitos e usos da avaliação do aluno nas três categorias seguintes: avaliação da

aprendizagem, relacionada com a avaliação sumativa; avaliação para a aprendizagem,

relacionada com a avaliação formativa; e avaliação como aprendizagem, englobando

métodos sumativos e formativos e que coloca o aluno entre a aprendizagem e a

avaliação.

Aspetos metodológicos

No presente estudo analisam-se as principais alterações verificadas nos novos

programas de Matemática do ensino básico e de Matemática A (MEC, 2013, 2014), do

ensino secundário, em relação aos programas anteriores (ME, 2007, 2001), com especial

incidência no tema de Estatística2.

Tendo em conta a própria organização dos programas objeto de estudo, estabeleceram-

se dois níveis para a sua análise: as alterações estruturais do programa; e as alterações

no tema de Estatística. As alterações estruturais referem-se à globalidade do ensino

básico e de Matemática A do ensino secundário, dizendo respeito aos vários temas

matemáticos, e portanto também ao tema de Estatística, tendo essa análise sido

orientada pelas dimensões: finalidades; objetivos gerais de aprendizagem; temas

matemáticos; capacidades transversais; indicações metodológicas; recursos e avaliação

das aprendizagens.

As alterações no tema Estatística focam-se neste tema matemático dos programas do

ensino básico e de Matemática A do ensino secundário, e essa análise foi orientada

pelas dimensões: gestão do tempo; objetivos gerais; conteúdos; indicações

metodológicas; e recursos.

2 Neste texto incluímos na Estatística o tema Organização e Tratamento de Dados, do ensino básico, e os

temas Estatística, Combinatória e Probabilidades, de Matemática A do ensino secundário.

Henriques & Fernandes

56 PROFMAT — 2015

A avaliação e interpretação das alterações verificadas nos programas de 2013 e 2014,

relativamente aos programas de 2007 e 2001, sobretudo no que se refere ao tema

Estatística, serão orientadas, também, pelas recomendações atuais para o ensino e

aprendizagem da estatística que são preconizadas na literatura.

O ensino da Estatística nos recentes programas escolares de Matemática

Na análise realizada aos programas escolares de Matemática do ensino básico e de

Matemática A do ensino secundário centramo-nos, primeiro, nos aspetos estruturais dos

programas e, seguidamente, nos aspetos específicos do tema Estatística.

Aspetos estruturais dos programas

A nível estrutural, os novos programas de Matemática (MEC, 2013, 2014) apresentam

alterações ao nível das finalidades, dos objetivos gerais de aprendizagem, dos temas

matemáticos; das capacidades transversais, das indicações metodológicas e dos

recursos.

No caso das finalidades, no programa do ensino básico de 2013 salienta-se “A

estruturação do pensamento” e a não referência a “Desenvolver atitudes positivas face à

Matemática e a capacidade de apreciar esta ciência” do programa anterior. Assim, em

termos de diferenças, no atual programa salientam-se os aspetos lógicos da Matemática

e não se explicitam os aspetos afetivos que constavam do programa de 2007.

No programa de Matemática A de 2014, na finalidade “A estruturação do pensamento e

o desenvolvimento do raciocínio abstrato” ampliam-se os aspetos lógicos já afirmados

no ensino básico e, analogamente, não se referem os aspetos afetivos do anterior

programa ─ “Contribuir para uma atitude positiva face à Ciência”, nem de

desenvolvimento pessoal e participação crítica ─ “Promover a realização pessoal

mediante o desenvolvimento de atitudes de autonomia e solidariedade” e “Contribuir

para o desenvolvimento da existência de uma consciência crítica e interventiva em áreas

como o ambiente, a saúde e a economia entre outras, formando para uma cidadania ativa

e participativa”.

Henriques & Fernandes

PROFMAT — 2015 57

No programa de 2007 os objetivos gerais de aprendizagem são formulados para cada

um dos temas matemáticos de cada ciclo do ensino básico, portanto mais centrados

nesses temas, enquanto no programa de 2013 são de natureza transversal e sem

referência aos temas matemáticos, salientando-se o seu carácter genérico e a

abrangência crescente desses objetivos com os ciclos de ensino: 1) identificar/designar

(objetos matemáticos); 2) estender (generalização); 3) reconhecer (validação); 4) saber

(conhecimento); 5) reconhecer, dado… (justificar com casos); 6) provar/demonstrar

(demonstração); e 7) justificar (evocação). De entre estes objetivos, os quatro primeiros

são comuns aos três ciclos de ensino e os três últimos são relativos apenas ao 3.º ciclo.

Além disso, no programa de 2007 também é indicado o propósito principal de ensino de

cada tema matemático em cada nível de ensino.

No programa de Matemática A, de 2001, formulam-se objetivos e competências gerais

segundo as dimensões Valores/Atitudes, Capacidades/Aptidões e Conhecimentos,

enquanto no programa de 2014, à semelhança do ensino básico, são formulados

objetivos transversais a todos os temas: 1) Identificar/Designar/Referir; 2) Reconhecer;

3) Saber; 4) Provar/Demonstrar; e 5) Justificar.

No ensino básico, entre os temas matemáticos (Números e Operações, Geometria e

Medida, Álgebra e Organização e Tratamento de Dados), agora designados “domínios

de conteúdo”, não se salientam grandes diferenças entre os dois programas. O tema

Álgebra não é considerado de forma explícita no 1.º ciclo em ambos os programas e no

programa de 2013 é estabelecido o novo tema matemático Funções, Sequências e

Sucessões (FSS), no 3.º ciclo, e que no programa anterior estava incluído no tema

Álgebra. A este nível, a maior diferença reside no desenvolvimento dos temas

matemáticos, que no programa de 2007 se realiza, fundamentalmente, por ciclo de

ensino básico (os quatro anos de escolaridade do 1.º ciclo são agrupados em dois

subníveis:1.º e 2.º anos; 3.º e 4.º anos), enquanto no programa de 2013 esse

desenvolvimento se concretiza por ano de escolaridade. Também em termos da

informação disponibilizada nos temas se observam diferenças: no programa de 2007

para cada tema matemático são especificados tópicos, objetivos específicos e notas

clarificadoras do conteúdo e da metodologia; já no programa de 2013 apenas são

referidos os conteúdos relativos a cada um dos tópicos considerados e é mencionado, a

título indicativo, o número de tempos (de 45 minutos) que deve ser dedicado a cada

tema matemático. Assim, a gestão do programa de 2007 permite uma maior autonomia

Henriques & Fernandes

58 PROFMAT — 2015

à escola e ao professor ao mesmo tempo que é mais informativo do que o programa de

2013, onde se destacam mais os conteúdos e se assume uma natureza mais prescritiva

destas orientações curriculares.

No programa de Matemática A, de 2001, além dos temas transversais, especificam-se

três temas matemáticos por cada ano de escolaridade deste ciclo de estudos (cada um

dos três temas coincidiria com um período escolar), excetuando o 10.º ano em que se

inclui um “Módulo inicial – Resolução de problemas”, tendo em vista a articulação

entre o ensino básico e o ensino secundário e o desenvolvimento de competências

matemáticas transversais. Já no programa de 2014 salienta-se a inclusão dos novos

temas “Lógica e Teoria dos Conjuntos” (10.º ano) e “Primitivas e Cálculo Integral”

(12.º ano). Além disso, neste programa alguns temas anteriores desdobram-se em

diferentes temas, como acontece com os temas Álgebra (10.º ano) e Cálculo

Combinatório e Probabilidades (12.º ano).

Ao nível do ensino básico, às três capacidades transversais estabelecidas no programa

de 2007 (resolução de problemas, raciocínio matemático e comunicação) são

acrescentadas no programa de 2013 as duas seguintes: “conhecimento de factos e de

procedimentos” e “a matemática como um todo coerente”, perspetivadas como

aquisições integradas a partir dos objetivos gerais de aprendizagem. Nestas novas

capacidades salientam-se os papéis da memória e da lógica, esta última já destacada ao

nível das finalidades.

No programa de Matemática A, de 2001, contemplam-se vários temas transversais:

comunicação matemática; aplicações e modelação matemática; história da Matemática;

lógica e raciocínio matemático; resolução de problemas e atividades investigativas; e

tecnologia e Matemática. Embora no programa de 2014 não exista uma secção

específica correspondente, pode interpretar-se a “aquisição de conhecimentos, factos,

conceitos e procedimentos”, o “desenvolvimento do raciocínio matemático”, a

“resolução de problemas”, a “comunicação (oral e escrita) adequada” e a “visão da

matemática como um todo articulado e coerente” como capacidades transversais.

No caso das indicações metodológicas, no programa de 2007 são apresentadas muitas

sugestões em cada tema matemático de cada nível de escolaridade, organizadas segundo

a abordagem, as tarefas e os conceitos específicos. Já no programa de 2013 não são

apresentadas quaisquer sugestões metodológicas, inferindo-me mesmo uma visão

negativa sobre a explicitação de tais sugestões.

Henriques & Fernandes

PROFMAT — 2015 59

A experiência acumulada dos professores e das escolas é um elemento

fundamental no sucesso de qualquer projeto educativo, não se

pretendendo, por isso, espartilhar e diminuir a sua liberdade pedagógica

nem condicionar a sua prática letiva. Pelo contrário, o presente Programa

reconhece e valoriza a autonomia dos professores e das escolas, não

impondo metodologias específicas. (MEC, 2013, p. 28)

No programa de Matemática A, de 2001, considera-se o aluno como agente da sua

própria aprendizagem, propondo-se uma metodologia em que os conceitos são

construídos a partir da experiência de cada um e de situações concretas, a abordagem

dos conceitos sob diferentes pontos de vista e progressivos níveis de rigor e

formalização e maior ligação da Matemática com a vida real, com a tecnologia e com as

questões abordadas noutras disciplinas. Preconiza-se o trabalho de grupo e em pares dos

alunos, cabendo ao professor o papel de dinamizador e regulador do processo de ensino-

aprendizagem. Já no programa de 2014 não são mencionadas metodologias específicas,

referindo-se apenas que deve ter-se em atenção na prática letiva a progressão dos alunos

na aprendizagem matemática, estruturada em patamares de crescente complexidade.

No ensino básico, os recursos são referidos a diferentes níveis do programa de 2007,

salientando-se a referência em cada tema matemático dos diferentes ciclos escolares,

sendo referidos os materiais manipuláveis, os instrumentos de desenho (régua, esquadro

e compasso) e, ao nível das tecnologias, as calculadoras e computadores. No caso das

calculadoras e computadores recomenda-se o seu uso ao longo de todos os ciclos,

afirmando-se que

O seu uso é particularmente importante na resolução de problemas e na

exploração de situações, casos em que os cálculos e os procedimentos de

rotina não constituem objetivo prioritário de aprendizagem, e a atenção

se deve centrar nas condições da situação, nas estratégias de resolução e

na interpretação e avaliação dos resultados. (ME, 2007, pp. 9-10)

No programa de 2013, tal como no caso das metodologias, deixa-se a seleção dos

recursos ao critério da escola e dos professores. Além das calculadoras, em que é

recomendado o seu uso mais restritivo e em níveis escolares mais avançados, não é feita

qualquer referência a outros recursos.

No programa de Matemática A, de 2001, preconiza-se a existência de um Laboratório

de Matemática com materiais e equipamentos diversificados, incluindo calculadoras

gráficas e computadores, que são considerados de uso obrigatório. Tal como no

programa do ensino básico de 2013, também no programa de Matemática A, de 2014,

perspetiva-se um uso mais restritivo das tecnologias, afirmando-se que a sua “utilização

Henriques & Fernandes

60 PROFMAT — 2015

deve, no entanto, ser criteriosa, já que, caso contrário, pode condicionar e comprometer

gravemente a aprendizagem e a avaliação” (p. 28).

Finalmente, no programa do ensino básico, de 2007, preconiza-se uma avaliação das

aprendizagens pautada pelos princípios de congruência com o programa, constituindo

uma parte integrante do processo de ensino e aprendizagem, assentando na diversidade

de formas e instrumentos de avaliação, assumindo um propósito predominantemente

formativo, decorrendo num clima de confiança e sendo transparente para os alunos e

suas famílias. No programa de 2013 remete-se a avaliação para os normativos legais em

vigor, destacando-se as metas curriculares como referencial de avaliação e as funções da

avaliação enquanto regulação e orientação do percurso de aprendizagem.

Também no programa de Matemática A, de 2001, são formulados vários princípios a ter

em conta na avaliação das aprendizagens, como avaliar não só o produto mas também o

processo, avaliar para orientar aprendizagens posteriores, avaliar individualmente e em

grupo e diversificar formas de avaliação dos alunos, recomendando-se ainda que o peso

dos testes não ultrapasse metade do peso do conjunto das diferentes formas de

avaliação. Tal como no ensino básico, também no programa de Matemática A, de 2014,

a avaliação deve ter como referência os normativos legais em vigor, salientando-se o

programa da disciplina e as respetivas metas curriculares.

Alterações no tema Estatística

A nível do tema Estatística destacam-se alterações ao nível da gestão do tempo, dos

objetivos gerais, dos conteúdos, das indicações metodológicas e dos recursos.

No programa do ensino básico, de 2013, sugere-se, a título de indicação, a distribuição

dos tempos escolares pelos vários temas matemáticos em cada ano escolar do 2.º e 3.º

ciclos, o que não acontece no programa de 2007. Embora sem caráter prescritivo, os

tempos sugeridos no programa para cada tema matemático tendem a influenciar a

importância dada ao respetivo tema, seja pelos professores, pelos manuais escolares ou

mesmo pelos alunos. Na Tabela 1, tendo em conta o total dos tempos propostos

conjuntamente no 2.º e 3.º ciclo, apresentam-se as percentagens de tempos em cada

tema matemático do programa no 2.º ciclo, 3.º ciclo e total dos dois ciclos.

Henriques & Fernandes

PROFMAT — 2015 61

Tabela 1 – Tempos totais sugeridos (em %) nos temas matemáticos no 2.º ciclo, 3.º ciclo e total

Temas matemáticos % de tempos totais

2.º ciclo 3.º ciclo Total

Números e Operações (NO) 12 7 19

Geometria e Medida (GM) 18 21 39

Álgebra (ALG) 9 25 34

Organização e Tratamento de Dados (OTD) 4 4 8

Nota: No caso do 3.º ciclo incluíram-se os tempos relativos ao tema Funções, Sequências e

Sucessões (FSS) no tema ALG.

Pela Tabela 1 constata-se que as percentagens de tempos sugeridas para o tema são

iguais no 2.º e 3.º ciclos (4%) e muito inferiores às dos outros temas matemáticos. No

total, menos de metade do que no tema NO, que é o tema matemático imediatamente a

seguir. O tempo sugerido agrava-se ainda mais na medida em que neste tema se incluem

conteúdos de “Gráficos cartesianos” no 5.º ano e, embora sem interferir nas

percentagens da Tabela 1, de “Representação de conjuntos” no 1.º e 2.º ano. Esta

distribuição dos tempos revela uma desvalorização do tema da Estatística não

compatível com a importância que ele tem adquirido nas recentes orientações

curriculares internacionais e no anterior programa de 2007.

Em ambos os programas de Matemática A são sugeridos, a título de indicação, os

tempos para a lecionação de cada tema por ano escolar. Considerando os tempos

previstos ao longo dos três anos escolares, conclui-se que ao tema Estatística

correspondem 18% dos tempos no programa de 2001 e 12% no programa de 2014,

verificando-se, também neste nível de ensino, uma diminuição do tempo dedicado ao

tema.

Tal como foi referido antes para o programa do ensino básico, no programa de 2007 são

referidos objetivos gerais do tema, centrados na Estatística, enquanto no programa de

2013 não são especificados objetivos do tema, enunciando-se objetivos genéricos,

abstratos e comuns aos vários temas matemáticos (antes referidos), portanto sem

referência à Estatística.

Nos programas de Matemática A, tanto de 2001 como de 2014, no tema Estatística não

são formulados objetivos, o mesmo acontecendo nos outros temas matemáticos.

Ao nível do ensino básico, não se destacam diferenças nos conteúdos do tema entre os

dois programas. No caso do programa de 2013, o domínio Probabilidade está todo

concentrado no 9.º ano, o que não acontecia antes. Por outro lado, parece restringir-se o

Henriques & Fernandes

62 PROFMAT — 2015

conceito de frequencista de probabilidade a experiências aleatórias em que se presume a

equiprobabilidade dos casos possíveis, o que contraria a natureza do próprio conceito

frequencista de probabilidade, especificamente ao não clarificar que esta definição de

probabilidade pode aplicar-se a experiências em que os acontecimentos são ou não

equiprováveis (Fernandes, 1999).

O programa de Matemática A, de 2014, inclui o operador somatório e centra-se na

“manipulação de médias e desvios-padrão de amostras, ou percentis” (p. 10), na análise

das propriedades básicas destes conceitos e respetivas interpretações com base em

exemplos concretos, enquanto o programa de 2001 se foca também na articulação das

diferentes medidas de tendência central, de dispersão e quartis. No programa de 2001

inclui-se o estudo gráfico e intuitivo de distribuições bidimensionais, enquanto no

programa de 2014 se inclui também o estudo formal deste conteúdo. Ainda neste último

programa privilegia-se uma abordagem formal da noção de probabilidade, alicerçada na

teoria de conjuntos e focada na definição clássica de probabilidade e, relativamente ao

programa de 2001, não se incluem as definições frequencista e axiomática de

probabilidade nem os modelos de distribuição Binomial e Normal. Observa-se, assim,

uma valorização do formalismo, no programa de 2014, desperdiçando a oportunidade

dos alunos clarificarem, de forma progressiva e adequada, as suas conceções intuitivas

perante os desafios que as situações que o seu dia-a-dia lhes coloca.

Ao nível ensino básico, a questão das indicações metodológicas é diversa, tal como foi

referido antes. No programa de 2013, assume-se, explicitamente, a não especificação de

sugestões metodológicas como forma de promoção da autonomia das escolas e dos

professores. Já no programa de 2007, neste tema, tal como nos restantes temas, são

feitas muitas sugestões metodológicas, seja em termos de abordagem, seja em termos de

tarefas, como se salienta na Tabela 2.

Henriques & Fernandes

PROFMAT — 2015 63

Tabela 2 – Indicações metodológicas no tema ao nível da abordagem e das tarefas no programa

de 2007, segundo os níveis de escolaridade

Nível

escolar

Indicações metodológicas

Abordagem Tarefas

1.º ciclo – Aprendizagem baseada

em atividades do dia-a-dia.

– Situações diversificadas.

– Investigações ou projetos (sobre características

dos alunos e temas do Estudo do Meio).

– Trabalho em grupo.

– Conexões com outras áreas curriculares.

– Realização de experiências aleatórias

envolvendo moedas, extração de bolas de sacos e

dados.

2.º ciclo – Resolução de problemas

identificados pelos alunos.

– Formular questões

relacionadas com outras

disciplinas.

– Investigações ou projetos estatísticos em grupo.

– Realização de experiências aleatórias

envolvendo dois dados, moedas e extração de

bolas de sacos com e sem reposição.

3.º ciclo – Investigações estatísticas

baseadas em situações reais.

– Projetos em grupo (assuntos relacionados com

outras disciplinas, temas da atualidade nacional e

internacional, interesses dos alunos).

– Exploração de gráficos enganadores e amostras

enviesadas.

Da Tabela 2 destaca-se a recomendação da realização de investigações ou projetos

estatísticos em todos os três níveis escolares, desenvolvidos pelos alunos em pequenos

grupos. O destaque dado a este tipo de tarefas decorre ainda dos tópicos elencados neste

tema matemático no 3.º ciclo: planeamento estatístico e tratamento de dados.

Por outro lado, preconiza-se a aprendizagem da estatística com base em atividades

relacionadas com o dia-a-dia, com outras disciplinas e com os interesses dos próprios

alunos, o que enfatiza o significado e a utilidade da estatística. Simultaneamente, a

realização de atividades nestes contextos pode contribuir para o desenvolvimento de um

mais profundo sentido crítico e de cidadania do aluno, referido explicitamente no

programa através da exploração de gráficos enganadores e amostras enviesadas.

No programa de Matemática A, de 2014, conforme foi antes referido, não se incluem

indicações metodológicas, enquanto no programa de 2001 são referidas indicações

metodológicas segundo cada um dos subtemas estabelecidos. Em geral, preconiza-se

uma avaliação crítica de resultados estatísticos e a exploração de atividades

interdisciplinares, realizadas individualmente ou em grupo, e simulações, jogos e

exemplos históricos no caso das Probabilidades.

Em termos de recursos, no programa do ensino básico, de 2007, salienta-se a referência

ao uso de calculadoras e computadores no 2.º e 3.º ciclo, aludindo também à folha de

Henriques & Fernandes

64 PROFMAT — 2015

cálculo e à internet. Além destes recursos tecnológicos, no caso das Probabilidades, é

também recomendado o uso de objetos aleatórios como moedas, dados e sacos de bolas,

bem como tabelas e diagramas de árvore, os quais se revelam particularmente

adequados para descrever o espaço amostral e determinar o número de casos favoráveis

e possíveis tendo em vista a determinação da probabilidade na perspetiva clássica. O

recurso a tabelas e diagramas de árvore para determinar e comparar probabilidades de

acontecimentos compostos também é referido no programa de 2013.

Não são referidos recursos no âmbito deste tema no programa de Matemática A, de

2014, enquanto no programa de 2001 se destaca o uso de calculadoras e computadores e

materiais lúdicos, estes últimos no caso das Probabilidades.

Conclusão

Nas finalidades e capacidades transversais dos programas de 2013 e 2014, relativamente

aos programas anteriores, infere-se uma maior ênfase do papel da memorização na

aprendizagem e uma perspetiva mais formal da Matemática. Também a não referência

às finalidades afetivas, que constavam dos programas anteriores, parece não reconhecer

o seu contributo para a aprendizagem.

A não inclusão de recomendações metodológicas nos programas de 2013 e 2014 pode

ter por consequência a desvalorização de orientações atuais para o ensino da

Matemática, valorizadas nos programas anteriores, sobretudo no ensino básico. No caso

do tema Estatística, destaca-se a ausência de referência aos projetos investigativos e a

tarefas que envolvam dados reais e relativos aos alunos ou relacionados com os seus

interesses, que são unanimemente recomendados pelas orientações curriculares

internacionais (GAISE, 2005; NCTM, 2007) e por investigadores na área da educação

estatística (e.g., Batanero et al., 2011, Fernandes et al., 2007, Henriques & Oliveira,

2014; MacGillivray & Pereira-Mendoza, 2011). O planeamento estatístico e o

consequente desenvolvimento da capacidade de realização de estudos estatísticos que

recorram à análise exploratória de dados, de autonomia e sentido crítico perante a

resolução de problemas ficam, assim, ausentes dos programas.

Por outro lado, à realização de projetos investigativos está geralmente associado o

trabalho de grupo dos alunos, forma de trabalho que também não está prevista nos

Henriques & Fernandes

PROFMAT — 2015 65

programas de 2013 e 2014 e que é vista pelos professores como particularmente

adequada no caso da Estatística (Fernandes et al., 2011).

Comparativamente com os programas anteriores, em geral, nos programas de 2013 e

2014 acentua-se uma abordagem mais procedimental e formal dos temas matemáticos, o

que acontece também no tema Estatística, que é desvalorizada enquanto conteúdo a ser

ensinado. A imprudente valorização dos aspetos teóricos e técnicos em detrimento dos

aspetos de interpretação e de significação reduzem as possibilidades dos alunos

perspetivaram a utilidade da Estatística para o seu dia-a-dia e de desenvolverem a sua

literacia estatística (Batanero et al., 2011).

Tal como no caso das recomendações metodológicas, também no programa de 2013 são

quase inexistentes as referências aos recursos a usar no ensino, advogando-se um uso

mais restritivo da calculadora e do computador e a não referência a software

educacional. Ora, o uso destas tecnologias são amplamente preconizadas no ensino da

Estatística (e.g., Ben-Zvi, 2000; GAISE, 2005; NCTM, 2007; Pratt, Davies, & Connor,

2011).

Em síntese, nos programas de 2013 e 2014 omitem-se importantes recomendações

atuais para o ensino e aprendizagem da estatística que constavam dos programas

anteriores, representando um retrocesso em relação ao que é preconizado pelas várias

instâncias de educação estatística. Simultaneamente ignorar a muita investigação que

ultimamente tem sido desenvolvida no campo da didática da estatística parece contribuir

para a desvalorização desse domínio de conhecimento, podendo também levar à não

aplicação dos seus ensinamentos para uma melhor aprendizagem dos alunos. Neste

contexto levantam-se, pois, as questões: “Que futuro se perspetiva para a educação

estatística?” e “Como se posicionam professores e alunos face às mudanças?”.

Considerando, ainda, o desenvolvimento recente que a nível internacional tem tido o

ensino da Estatística, teremos de concluir pela importância de uma reestruturação

substancial, quer relativa aos domínios do conteúdo, das tarefas e dos recursos, quer às

abordagens pedagógicas a preconizar para estes níveis de ensino, que deveriam

promover um grande envolvimento dos alunos e o desenvolvimento da literacia e

raciocínio estatístico dos alunos. Neste contexto, em que se ignoram importantes

aprendizagens dos alunos, será de questionar: “Que cidadãos pretendemos formar?” e

“Que literacia estatística se perspetiva para esses cidadãos?”.

Henriques & Fernandes

66 PROFMAT — 2015

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PROFMAT — 2015 68

COMUNICAÇÕES COM DEMONSTRAÇÃO

PROFMAT — 2015 69

A CRIAÇÃO DO MUNDO-HOMENS DE FÉ E DE CIÊNIA: LEIBNIZ,

NEWTON E O CÁLCULO INFINITESIMAL

Francisca Maria Rosado Silva de Sousa,

Esc. Sec. Gabriel Pereira, Agrupamento de Escolas nº2 de Évora

[email protected]

Resumo

Foi o mundo criado por um supremo arquitecto? Segundo um plano de quem tudo sabe

e tudo pode? É o universo um grande relógio que funciona segundo leis matemáticas e

que uma vez posto em movimento por Deus se mantém eternamente? Cabe ao Homem

apreender pela matemática e pela metafísica a harmonia pré-definida do Universo?

Quase 400 anos após o seu nascimento, maravilham-nos as concepções de mundo e o

trabalho matemático de dois homens de fé e vultos maiores da ciência: LEIBNIZ e

NEWTON. Graças a eles desenvolveu-se o Cálculo Infinitesimal, poderoso instrumento

para tantas descobertas! Podemos assim, em 2015, celebrar o Ano Internacional da Luz

(luz que nos deixa ver para trás no tempo em direcção ao Big Bang cósmico!) e em que

se comemoram, entre outros, os 50 anos da descoberta da radiação cósmica de fundo, a

luz mais antiga do cosmos, os 150 anos dos trabalhos de Maxwell e os 100 anos da

teoria da relatividade geral de Einstein! Mostrar aos alunos aplicações do cálculo

infinitesimal, desde a determinação do melhor ângulo na ramificação dos vasos

sanguíneos até à espiral da concha do nautilus, é mostrar o poder e a glória da

Matemática!

Abordou-se, de forma interativa, o Cálculo, salientando aspectos marcantes da época,

vida e obra dos dois matemáticos referidos; foi objectivo que os participantes

partilhassem e discutissem as diferentes abordagens possíveis ao cálculo infinitesimal e

à história da matemática no ensino secundário.

Palavras chave: Leibniz, Newton, Cálculo infinitesimal

A criação do mundo, homens e fé e de ciência: Leibniz, Newton e o cálculo

infinitesimal

Considerando a relevância do Cálculo Diferencial nos actuais programas de Matemática

e a prevista inclusão do Cálculo Integral, bem como a importância de ambos, enquanto

ferramentas matemáticas, nas várias descobertas que se comemoram neste Ano

Internacional da Luz, propôs-se um percurso, desde a Antiguidade clássica aos nossos

dias, revisitando conceções e trabalhos matemáticos relacionados com o

desenvolvimento do Cálculo Infinitesimal.

À criação da análise infinitesimal está subjacente a discussão do conceito de infinito e

de infinitésimo, da distinção entre infinito real e potencial, bem como a discussão da

dimensão do espaço em que vivemos! Da miríade de Arquimedes e a sua contagem do

Sousa

70 PROFMAT — 2015

número de grãos de areia na Terra, da possível divisão de um intervalo entre dois tic-tac

do relógio em nove biliões de partes, da finitude do universo defendida por Platão e

Aristóteles ao espaço infinito de Parménides e Zenão - bem como de Giordano Bruno,

séculos mais tarde, e que lhe valeu a condenação à morte - passando por Galileu,

Descartes e até aos dias de hoje, onde tudo permanece em aberto, um longo caminho foi

percorrido!

Nesse caminho, encontramos dois homens extraordinários, contemporâneos, e a quem

se atribui em simultâneo a criação do Cálculo Infinitesimal: NEWTON e LEIBNIZ.

São homens de fé e de ciência, espíritos universais, que procuram a sua explicação para

a criação do universo e desenvolvem ferramentas matemáticas para o interpretar, crentes

da efectiva possibilidade de o fazer!

Isaac Newton (Woolsthorpe-by-Colsterworth, 4 de Janeiro de 1642 – Londres, 31 de

Março de 1727), cientista reconhecido sobretudo como físico e matemático, foi também

astrónomo, alquimista, filósofo e teólogo. A sua obra, Philoshophiae Naturalis Principia

Mathematica, é considerada uma das mais influentes em História da Ciência. Publicada

em 1687, descreve a lei da gravitação universal e as três leis de Newton, que

fundamentaram a Mecânica Clássica. Newton acreditava que o tempo era sempre igual

para todos os instantes, reconhecendo os seis mil anos de existência que a Bíblia dá à

Terra. Considerava que a mecânica celeste era governada pela gravitação universal e,

principalmente, por Deus, sobre o qual relata: "A maravilhosa disposição e harmonia do

universo só pode ter tido origem segundo o plano de um Ser que tudo sabe e tudo pode.

Isto fica sendo a minha última e mais elevada descoberta."

Para Newton, o espaço absoluto representava “os sentidos de Deus”. Dessa forma,

Deus estava presente em todas as partes do Universo e agia sobre ele segundo a Sua

vontade; para a Física de Newton, Deus não era hipótese, mas realidade. De acordo com

a sua concepção de mundo e a necessidade de o interpretar, Newton desenvolve

trabalhos em múltiplas áreas, desde as quadraturas e a rectificação de curvas, às fluxões,

ao desenvolvimento de séries infinitas…deixando-nos um legado extraordinário!

Para Gottfried Wilhelm von Leibniz (Leipzig, 1 de Julho 1646- Hanôver, 14 de

Novembro 1716), cientista, matemático, filósofo, Deus é perfeição infinita e criou o

“melhor dos mundos possíveis”, sendo o homem chamado a tomar conhecimento da

“harmonia pré-estabelecida” do Universo e apreendendo-o em dois níveis: matemático,

Sousa

PROFMAT — 2015 71

pela ciência da natureza e metafísico, pela filosofia. Nisto, consiste a verdade e a

máxima felicidade do espírito. O universo foi formado mediante a criação, por Deus, de

infinitas unidades substanciais de energia ou mônadas (AMonadologia, 1714). Essas

unidades estão rigorosamente hierarquizadas e organizadas pelo Supremo Arquitecto do

Universo (Deus).

Para além do legado matemático (notações, passagem do discreto para o contínuo, soma

de séries infinitas, conversão dos indivísiveis de Cavalieri nos infinitésimos, criação do

“triângulo característico”, “coração” do cálculo infinitesimal, etc…) Leibniz, árduo

trabalhador, falante de muitas línguas (aos 10 anos lia em latim e grego), deixou-nos

trabalhos fundamentais em muitas outras áreas, podendo referir-se, a título de exemplo,

a sua obra Codex juris gentium diplomaticus (1693), origem do direito internacional ou,

no campo da metafísica, Discurso de Metafísica (1686). Na área política, defende uma

grande comunidade internacional que garanta a paz e a difusão do cristianismo;

acreditando na unidade de todas as línguas, desenvolveu uma linguagem universal,

baseada num sistema binário, precursora da lógica simbólica e aplicações diretas na

computação!

De referir que não existiu um trabalho partilhado de Newton e Leibniz apesar de

viverem na mesma época, havendo até notícia de alguns atritos; será uma mulher, Maria

Gaetana Agnesi (Milão, 1718-Milão, 1799), linguista, filósofa, matemática e intelectual

de reconhecido valor, para além de ser dotada de uma especial sensibilidade, a unir as

ideias de Newton e Leibniz, trabalhadas na obra Istituzioni Analitichead uso della

Gioventù Italian (1748).

Na génese da análise infinitesimal esteve a manipulação de quantidades associadas a

conceitos geométricos susceptíveis de serem divididas tantas vezes quanto se queira,

vindo a constituir elementos indivisíveis…Fundamentais na análise infinitesimal terão

sido, ao longo da história, os contributos de Eudoxo (matemático grego brilhante, do

século V- IVa.C., inspirador de Dedekind e Weirstrass tantos séculos depois, e

desconhecido da maior parte dos nossos alunos) e de matemáticos como Euler,

Roberval, Barrow, Fourier, Bolzano, Cauchy, Weirstrass, Cantor, Russel e tantos

outros!

Importa salientar aos jovens estudantes que na origem da análise infinitesimal estiveram

problemas hoje para eles correntes, como sejam o cálculo da tangente a uma curva num

Sousa

72 PROFMAT — 2015

ponto, determinação dos máximos e mínimos de uma função, cálculo do comprimento

de uma curva entre dois pontos desta ou cálculo da área delimitada por uma curva.

A abordagem da criação e evolução do cálculo infinitesimal é um excelente pretexto

para trabalhar a história da matemática e reforçar a necessidade de esta estar presente

nas aprendizagens desta disciplina. Só conhecendo a história da matemática será

possível entender a essência da matemática! Ensinar matemática sem história da

matemática será como ouvir ópera com o som baixo!

Referências bibliográficas

Belaval, Y. (2005). Leibniz Initiation à Sa Philosophie, 6ª ed..Paris: Librairie Philosophique

J.Vrin.

Gracián, E. (2011). Uma Descoberta Sem Fim - o Infinito Matemático. Porto: RBA.

Leibniz, G. W. (2003). Escritos Filosóficos, 2ª ed.. Madrid: Machado Libros.

Struik, D. J. (1997). História Concisa das Matemáticas. Lisboa: Gradiva.

PROFMAT — 2015 73

SIMPÓSIOS DE COMUNICAÇÃO

PROFMAT — 2015 74

A COMUNICAÇÃO MATEMÁTICA NA AVALIAÇÃO DA

RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS

Maria do Carmo Botelho1, Helena Rocha

2

1Externato São Vicente de Paulo,

2Faculdade de Ciências e Tecnologia – Universidade Nova de Lisboa

[email protected], [email protected],

Resumo

A aprendizagem dos nossos alunos é fortemente influenciada pelas caraterísticas das

tarefas que lhes propomos e a resolução de problemas é frequentemente apontada como

uma das tarefas com mais potencial para promover aprendizagens ricas. Mas aprender

implica ser capaz de desenvolver raciocínios, de comunicar as nossas ideias e de

compreender as dos outros num processo argumentativo e reflexivo. A avaliação das

aprendizagens num contexto de resolução de problemas envolve assim, necessariamente

como parte importante do processo, uma análise da comunicação que se estabelece entre

todos os envolvidos.

Nesta comunicação iremos focar-nos precisamente na comunicação que se estabelece

durante a resolução de problemas, abordando as dificuldades dos alunos e dando

atenção à interpretação que fazem do enunciado, à compreensão que manifestam das

figuras apresentadas, à relação que conseguem estabelecer entre a situação em causa e a

informação disponibilizada através de um gráfico, à forma como conseguem explicitar o

seu raciocínio e à linguagem matemática que utilizam no decurso do processo de

argumentação. Para tal vamos basear-nos num conjunto de problemas propostos a

alunos do 10.º ano de escolaridade no decorrer do estudo de funções.

Palavras chave: comunicação; avaliação; resolução de problemas.

Introdução

A comunicação é uma das capacidades transversais a toda a aprendizagem da

matemática, sendo necessário que sejam propostos aos alunos atividades que promovam

a utilizam da comunicação matemática através de linguagem oral e escrita (Ministério

da Educação, 2001). Uma das atividades consideradas relevantes na matemática é a

resolução de problemas, pois potencia nos alunos o processo de exploração e

desenvolvimento dos conhecimentos adquiridos, bem como a aquisição de novos

conhecimentos, servindo de estímulo ao seu processo de aprendizagem (NCTM, 2007).

Botelho & Rocha

PROFMAT — 2015 75

Com este artigo pretendemos identificar alguns aspectos em que a comunicação

matemática pode trazer informação relevante para a avaliação da resolução de

problemas realizada pelos alunos.

Resolução de problemas

Em Portugal, a resolução de problemas na educação em matemática, evidenciou-se pela

reforma curricular de 1991, tendo como objetivo uma nova conceção para o saber e

pensar matemático, de forma a que os alunos adquiram aprendizagens mais

significativas (Boavida, 1993).

É defendido por Menino e Santos (2004) que o ensino está centrado na resolução e

compreensão de problemas e não apenas na mera aquisição de conceitos. Ainda assim,

Abrantes (1998) e Boavida et al. (2008) consideram que a resolução de problemas é

algo a intensificar no currículo de matemática.

As Normas do NCTM de 1991, referem que para a resolução de problemas de

matemática os alunos deverão possuir as seguintes competências: saber investigar e

compreender os assuntos matemáticos; saber correlacionar conhecimentos matemáticos,

recorrendo a estratégias na aplicação da resolução de problemas de matemática; saber

reconhecer e formular problemas, tanto ligados diretamente como indiretamente à

matemática; saber relacionar os conhecimentos adquiridos para a resolução de situações

problemáticas da vida real.

Segundo Pólya (1995), o processo de resolução de problemas desenvolve-se em quatro

fases: a primeira consiste na compreensão do problema e, para isso, será necessário

verificar qual a incógnita e quais os dados disponíveis; a segunda consiste em encontrar

ou construir uma estratégia, onde por vezes é necessário recorrer ao auxílio de outros

problemas, na perspectiva de alcançar uma nova estratégia para a sua resolução; a

terceira compreende a execução dessa estratégia, visando a aplicação prática da mesma

e a quarta define-se pela retrospetiva, ou seja, proceder à verificação da solução

encontrada.

Botelho & Rocha

76 PROFMAT — 2015

Comunicação matemática

De acordo com Ponte et al. (2007) é através de mensagens orais e escritas que os alunos

conseguem comunicar ideias e apropriarem-se de conceitos matemáticos. No entanto, é

importante que alunos e professores estabeleçam entre si uma linguagem matemática

entendível por todos. Para o autor, as aprendizagens podem ser facilitadas se houver

uma boa comunicação na sala de aula, podendo esta ainda servir de regulador das boas

práticas no processo de ensino-aprendizagem.

Segundo o NCTM (2007), o programa de ensino prevê nos diversos anos de

escolaridade capacitar os alunos para: desenvolver um pensamento matemático

consolidado e organizado apoiado pela comunicação; transmitir informação recorrendo

à comunicação, para expressar o seu pensamento matemático corretamente aos colegas

e professores; saber analisar e refletir numa perspectiva de pensamento crítico,

identificando as estratégias e o pensamento matemático dos outros; e dominar a

linguagem matemática para transmitir noções matemáticas com fidelidade. Ainda para o

NCTM (2007), a comunicação escrita matemática é importante, pois permite que os

alunos reflitam sobre a forma que lhes é mais facilitadora para compreenderem e

interiorizarem os conceitos matemáticos abordados e trabalhados em sala de aula. A

utilização da comunicação matemática em sala de aula permite assim desenvolver

competências tais como saber: escutar, questionar, interpretar e compreender, analisar e

refletir. A frequência da prática da comunicação escrita é um fator importante na

aprendizagem, o mesmo acontecendo com a elaboração e utilização de argumentos

matemáticos na justificação e demonstração dos resultados (idem).

A comunicação matemática (oral ou escrita) é um meio importante para que os

estudantes clarifiquem o seu pensamento, estabeleçam conexões, reflitam na sua

aprendizagem, aumentem o apreço pela necessidade de precisão na linguagem,

conheçam conceitos e terminologia, aprendam a ser críticos (Ministério da Educação,

2007, p.11).

Interpretar enunciados, expressar as suas ideias usando linguagem matemática, explicar

oralmente ou por escrito os procedimentos matemáticos que utilizaram para chegar aos

resultados que apresentam e ainda, argumentar sobre o seu raciocínio ou mesmo

questionar o raciocínio dos outros, são de entre outras, algumas das competências a

desenvolver pelos alunos (Ministério da Educação, 2007).

Botelho & Rocha

PROFMAT — 2015 77

Avaliação em Matemática

A avaliação está ao serviço da aprendizagem com a intenção de contribuir para esta,

assim como para a tomada de decisões sobre o ensino (Santos, 2005). Quando temos a

avaliação direcionada para a aprendizagem de forma adequada, o aluno tem acesso aos

critérios valorizados no processo de avaliação e, consequentemente, terá controlo sobre

o seu percurso na aprendizagem (idem).

A avaliação das aprendizagens em matemática insere-se na compreensão dos

conhecimentos adquiridos em contexto de sala de aula, sabendo-se que o processo de

aprendizagem tem mais sucesso quando os alunos assumem um papel de poder sobre as

suas próprias aprendizagens, em que conseguem vigiar os conhecimentos que são

aprendidos e os que não o são, permitindo assim analisar o seu progresso nas

aprendizagens (NCTM,1999).

A avaliação das aprendizagens pressupõe uma postura de diagnóstico e identificação

das necessidades que os alunos enfrentam no processo de aprendizagem (Tinoco, 2011).

Na avaliação das aprendizagens podemos ter em conta determinados indicadores que as

conseguem identificar. Estes indicadores podem ser breves narrações orais ou escritas e

podem apoiar-se em recursos como o computador ou a calculadora (NCTM, 1999).

Assim, este artigo centra-se na comunicação matemática, procurando analisar a forma

como esta pode disponibilizar elementos relevantes para avaliar a resolução de

problemas.

As tarefas

Apresentamos aqui duas das tarefas propostas a dois alunos do 10.º ano, o Mário e a

Mónica de uma escola da Grande Lisboa. Analisamos a resolução que estes efetuaram,

assim como as razões que fundamentam essas resoluções e que partilharam connosco

em entrevista.

A Tarefa 1 apresenta três questões: na primeira pretende-se que os alunos justifiquem

com cálculos se na situação descrita foi golo; na segunda é solicitado que determinem a

altura máxima atingida pela bola; na terceira pretende-se que o aluno determine a

distância da bola à linha de golo, quando esta atinge a altura máxima. Esta tarefa tem

Botelho & Rocha

78 PROFMAT — 2015

como objetivo avaliar se o aluno consegue efetuar um raciocínio utilizando linguagem

matemática.

Tarefa 3

Num jogo de futebol, vai ser cobrado um livre, a 25 metros da baliza (ver figura 1) A barreira está à distância regulamentar de 9,15 metros da

bola. O plano da trajetória da bola é perpendicular à linha de golo.

A bola pode não passar a barreira ou pode passar por cima

dela. Se passar por cima da barreira, a bola segue na direção da

baliza, fora do alcance do guarda-redes. Admita que só pode acontecer uma das quatro situações

seguintes:

· a bola não passa a barreira;

· a bola sai por cima da barra da baliza;

· a bola bate na barra da baliza;

· a bola entra na baliza. Na barreira , o jogador mais alto tem 1,95 metros de altura.

A barra da baliza está a 2,44 metros do chão. Admita que, depois de rematada, a bola descreve um arco, de tal modo que a sua altura,

relativamente ao solo, medida em metros, é dada por

! ! = 0,32! − 0,01! !

Sendo x a distância, em metros, da projeção da bola no solo ao local onde ela é rematada

(ver figura 2).

Figura 2

Resolve os itens seguintes, utilizando exclusivamente métodos analíticos. Podes utilizar a calculadora, para efetuar cálculos numéricos.

1. É golo? Justifica a tua resposta.

2. Qual é a altura máxima atingida pela bola? 3. A que distância da linha de golo está a bola, quando atinge a altura máxima?

Apresenta o resultado em metros, arredondado às décimas. Itens Matemática A – 10.ºano

Figura 1

A Tarefa 2 solicita aos alunos que elaborem uma breve composição, indicando qual a

opção correta e identificando a razão da rejeição para cada uma das restantes. O

objetivo desta tarefa consiste em verificar se o aluno consegue interpretar a situação

descrita no enunciado e relacioná-la com as três representações gráficas.

Botelho & Rocha

PROFMAT — 2015 79

O Mário

O Mário obteve a classificação de 12 valores na disciplina de matemática A nos 1.º e 2.º

períodos, aparentando ser um aluno constante, nunca tendo reprovado. Nas aulas de

matemática distraía-se facilmente com os colegas. Apesar deste comportamento o aluno

participava nas aulas, demonstrando conhecimento e raciocínio matemático.

Relativamente às aulas de apoio o aluno não as frequentava de forma regular. Contudo,

o Mário referiu a matemática como uma das suas disciplinas preferidas, manifestando

ainda o gosto pelo trabalho individual. Quando questionado sobre a profissão desejada,

o Mário refere gostar de vir a ser Designer de Vídeo Jogos.

A escolha deste aluno deveu-se às suas caraterísticas, enquanto aluno de matemática,

pois evidencia participações pertinentes, raciocínio e facilidade na aquisição das

aprendizagens em contexto de sala de aula.

Discussão dos resultados

Pela análise da resolução apresentada pelo Mário (ver figura 3), podemos constatar que

o aluno teve alguma dificuldade na compreensão e interpretação do enunciado da tarefa

1, bem como em estabelecer a relação deste com as figuras apresentadas:

Mário: Isto aqui é a barreira? É os 9.15m?

Botelho & Rocha

80 PROFMAT — 2015

Prof.: Não, o que nos estão a dizer, é que a função nos dá a altura da bola

a x metros depois ter sido lançada. Não tem a ver com a barreira. Isto é o

movimento da bola, a barreira não aparece aqui. (explicação da figura 2)

O aluno considera que a altura assinalada na figura 2, é a barreira de jogadores que é

referida no enunciado. O Mário não consegue integrar na sua resolução todos os

aspectos do problema, pois limita-se a calcular a altura da bola quando esta passa a linha

de golo. Na explicação oral dos cálculos que efetuou afirma não considerar relevante

para a resolução do exercício a existência da barreira:

Mário: Primeiro recolhi os dados do exercício: a distância da bola à

baliza era de 25m, da barreira à bola era 9.15m, mas isto para o primeiro

[exercício] não interessa muito. Na barreira o jogador mais alto, tem

1.95m e da barra ao chão já na linha de golo são 2.44m. A fórmula para

descobrir a trajetória da bola a número de metros é

Depois fui pelo raciocínio que para isto ser verdadeiro, para saber se foi

golo, a trajetória ao fim 25m tem de ser menor do que 2.44m, que é a

altura da baliza. E foi o que aconteceu, substitui o f(x) pelo f(25),

substitui o x da fórmula por 25, e deu 1.75m, e de facto 1.75 é menor que

2.44 o que indica que é golo, segundo uma trajetória perpendicular à

linha de golo.

Prof.: Será que para ser golo, a bola não tem de passar primeiro pela

barreira?

Mário: Ups! É verdade.

Prof.: Então o que temos de fazer?

Mário: Também temos de fazer o f(9.15), e isto vai-nos dizer a que altura

a bola tem de estar para passar a barreira.

Após a intervenção da professora, o Mário acrescenta na sua resolução o cálculo da

altura da bola quando esta passa a barreira e completa o esquema desenhando a barreira.

Botelho & Rocha

PROFMAT — 2015 81

Figura 3 Resolução da questão 1 da tarefa 1 apresentada pelo Mário

O Mário nas suas resoluções escritas apenas apresenta cálculos matemáticos, e por

vezes nem uma resposta ao problema concretiza. Quanto ao rigor na linguagem

matemática, o aluno nem sempre revela preocupação na forma como o utiliza, tal como

se verifica na resolução do exercício 2, em que o aluno escreve em vez de

como seria formalmente correto (ver figura 4).

Figura 4 Resolução apresentada pelo Mário na questão 2 da tarefa 1

É ainda possível concluir que o aluno nem sempre utiliza corretamente a linguagem

matemática oral, pois onde deveria dizer que o gráfico da função é uma parábola, o

Mário afirma que a função é uma parábola. Apesar de o aluno responder corretamente

ao que é solicitado na questão, quando lhe é pedido que relacione o vértice com as

coordenadas e com a parábola em geral, evidencia alguma dificuldade:

Botelho & Rocha

82 PROFMAT — 2015

Mário: Como a função é uma parábola, quando pedem o máximo,

querem o extremo absoluto que é o vértice. Por isso, vou pela fórmula do

vértice, para saber o x do vértice, que é

Prof.: O que é o vértice?

Mário: É o extremo absoluto.

Prof.: Sim, mas é um ponto. Um ponto, tem quantas coordenadas?

Mário: Duas, e estão aqui. Este é o x [referindo-se ao V] e este é o y.

Prof.: Vê o que escreves-te, dá-nos o valor de x e não V. Estás a

dizer que o ponto V só tem uma coordenada.

Mário: Então faço x de V ou V(x)?

Prof.: Deves escrever .

Mário: Já percebi, porque assim o V era uma constante.

Prof.: O vértice só é máximo se a concavidade da parábola estiver

voltada para...

Mário: Ai stora, isso eu não sei muito bem. Se isto for para baixo é para

baixo.

O Mário apresenta a seguinte resolução, na forma escrita, para a tarefa 2:

Figura 5 Resolução apresentada pelo Mário na tarefa 2

Analisando as justificações apresentadas pelo aluno, podemos concluir que o mesmo

teve dificuldade em relacionar a situação descrita no enunciado com os gráficos, como

Botelho & Rocha

PROFMAT — 2015 83

ilustra a argumentação oral efetuada pelo aluno ao ser-lhe pedida uma explicação para a

sua resolução:

O [gráfico] A, não pode ser porque logo na origem tem um erro, porque

elas não podem ter saído do mesmo sítio à mesma hora, elas saíram de

sítios diferentes casa-escola, não saíram casa-casa nem escola-escola. Na

abcissa t elas chegam em horas diferentes, como elas vão a velocidades

constantes, elas não podem chegar a horas diferentes, têm de chegar à

mesma hora. Por isso, a opção A está errada.

A opção B, também não pode ser porque encontramos o mesmo erro na

origem, terem começado no mesmo sítio. Mas é indiferente, agora na

abcissa t o resultado é o mesmo mas a distância é diferente. A distância

neste caso que é f é diferente, a distância da Fernanda não pode ser maior

que a distância da Gabriela, pois ambas vão do sítio A para o sítio B, ou

do sítio B para o sítio A, não pode ser o A+B+1 ou A para B-1 não pode

ser. O 1 é um número que inventei.

A opção C é a correta, porque elas começam de sítios diferentes,

imaginamos que, como isto é a Gabriela, a Gabriela começa da escola,

isto é a escola. Esta é a Fernanda, ela começa de casa. Elas vão a

velocidade constante e encontram-se, como aqui (gráfico) está-nos a

dizer que elas vão à mesma distância, porque daqui aqui é a mesma

distância e daqui aqui é o mesmo tempo, por isso elas têm a mesma

distância, mesmo tempo, velocidades constantes, tanto que se cruzam a

meio do trajeto. (entrevista)

Relativamente à comunicação matemática escrita podemos inferir que o aluno apresenta

constrangimentos quanto à interpretação e compreensão do enunciado dos problemas,

não conseguindo relacionar todos as informações presentes no enunciado. Podemos

ainda concluir que a forma como o aluno expressa as suas ideias ao longo da resolução

dos problemas permite identificar aspetos do conhecimento matemático do aluno que

carecem ainda de aprofundamento.

A Mónica

A Mónica no 1.º período obteve a classificação de 17 e no 2.º período de 18 valores na

disciplina de matemática A e durante o seu percurso escolar nunca reprovou. Nas aulas

de matemática, tende a ser bastante participativa e mostra-se sempre interessada. Esta

demonstra ser uma aluna trabalhadora dentro e fora da aula, sendo assídua nas aulas de

apoio. A Mónica refere a matemática como a disciplina onde sente mais dificuldade,

mostrando por isso alguma insegurança sobre os seus conhecimentos matemáticos nas

Botelho & Rocha

84 PROFMAT — 2015

participações em aula. A aluna pretende prosseguir para o ensino superior, afirmando

desejar vir a ser educadora de infância ou psicóloga.

A escolha da Mónica deveu-se às suas caraterísticas enquanto aluna de matemática, pois

evidencia ser interessada, trabalhadora e com uma boa aquisição das aprendizagens.

Discussão dos resultados

Relativamente à compreensão e interpretação do enunciado da tarefa 1, a Mónica

apresentou dificuldade. Podemos ainda identificar constrangimentos em estabelecer a

relação deste com as figuras apresentadas, tendo necessitado de ajuda para a

interpretação do que era solicitado no enunciado:

Tem muito texto, muitos dados e há dados que pois na resolução nem

acabamos por utilizar, é super confuso. Eu acho que ainda não percebi

bem este exercício, porque acho estúpida esta pergunta: É golo? Justifica

a tua resposta. É um bocado parva. Não sei o que é para fazer. Como é

que mostro que é golo? Pra mim é golo se a bola entrar na baliza, ou seja,

tem de ser menor que a altura da baliza, não tenho de pensar na barreira,

não percebo porque é que tenho de pensar na barreira. Acho este

complicado. Aqui qual é a altura máxima, é fácil; é aquela parte do

vértice, isso é matemática. (entrevista)

A aluna referiu que o excesso de informação no enunciado do problema aumentou o

grau de dificuldade na interpretação do mesmo:

Não gosto muito deste tipo de exercícios, porque não tem contas. É mais

concreto, e este não, é preciso um certo raciocínio, temos de chegar lá,

perceber a lógica e depois já está, mas é parecido com os que fizemos nos

nossos testes. (tarefa 2)

Evidenciou ainda o seu desagrado relativamente à tarefa 2, por não ser necessário

efetuar cálculos para a sua resolução, mas sim relacionar e interpretar os dados do

problema conjuntamente com as representações gráficas do mesmo.

As dificuldades na interpretação do enunciado por parte da aluna, estão patentes na

resolução que apresenta à questão 1 da tarefa 1 (figura 6), onde a aluna não responde ao

pretendido.

Botelho & Rocha

PROFMAT — 2015 85

Figura 6 Resolução apresentada pela Mónica na questão 1 da tarefa 1

Apresenta como resposta um intervalo de valores para x, correspondendo este à

distância em metros da projeção da bola ao local onde é rematada, quando era

espectável que fosse apresentado um valor de y, uma vez que o objectivo é comparar a

altura atingida pela bola na linha de golo com a altura da baliza. É ainda possível

constatar que o intervalo de valores apresentado pela aluna não é a resposta à inequação

de segundo grau. Conclui-se assim que alguns dos conceitos matemáticos envolvidos

careçam ainda de aprofundamento.

A Mónica refere sentir dificuldade na utilização da comunicação matemática escrita

para a explicação do seu raciocínio, pois não sente segurança na resposta, por sentir que

esta nunca se encontra totalmente correta. Por este motivo afirma considerar preferível a

utilização do cálculo para a explicação de um raciocínio. Reforça ainda a dificuldade na

utilização da linguagem matemática no domínio escrito:

Não, faço os cálculos e pronto já expliquei. Só quando às vezes aqueles

que a stora fez os exercícios das hipóteses daquele texto em que temos de

explicar porque é que é aquela hipótese e porque é que não é aquela, até

posso explicar bem, mas tenho a certeza que nunca vou ter a cotação

máxima, há sempre qualquer coisa que vai falhar, por escrito, a

matemática pra mim não é muito bom, complico-me sempre mais. Mas

por cálculos não, acho fácil. Mas a escrita na matemática acho difícil.

(entrevista)

Quanto ao rigor matemático, na resposta apresentada pela aluna à questão 2 da tarefa 1,

podemos inferir a qualidade da mesma (ver figura 7).

Botelho & Rocha

86 PROFMAT — 2015

Figura 7 Resolução apresentada pela Mónica na questão 2 da tarefa 1

No entanto, quando a Mónica é questionada oralmente sobre a sua resolução, constata-

se que a aluna não tem consolidado o conceito de vértice, o que vem mostrar a

relevância da articulação entre diferentes formas de comunicação (escrita e oral) para

uma adequada avaliação do nível de compreensão alcançado pela aluna.

Prof.: Que fórmula é essa?

Mónica: É da parábola...

Prof.: Porque é que vais usar essa fórmula?

Mónica: Não sei, nunca percebi muito bem porque é assim, sabia que era

que é para descobrir sempre o x e depois substituir na fórmula para

descobrir o y.

Prof.: Esse x e y são as coordenadas de que ponto?

Mónica: São as coordenadas da parábola, do ponto máximo, do extremo

Prof.: Numa parábola que nome damos a esse extremo?

Mónica: O vértice. Ah, sim, exato isto é para descobrir o x do vértice.

Mónica: É um máximo ou um mínimo consoante ela está virada para

cima ou para baixo.

Podemos ainda verificar através da comunicação escrita apresentada pela aluna (ver

figura 8), que esta tem dificuldade em relacionar a informação do enunciado com os

gráficos:

Figura 8 Argumentação apresentada pela Mónica na tarefa 2

Através dos registos efetuados pela aluna nos gráficos, observamos que a mesma tenta

interpretar a situação que é descrita no enunciado com as três representações gráficas.

Assim, é possível concluir que a Mónica considera o mesmo ponto do gráfico como

Botelho & Rocha

PROFMAT — 2015 87

sendo simultaneamente instante inicial e final da situação problema apresentada,

evidenciando a fragilidade do seu conhecimento matemático de função e de

representação gráfica.

Figura 9 Anotações feitas pela Mónica nos gráficos da tarefa 2

No que diz respeito, à comunicação matemática escrita verificamos que a aluna

apresenta constrangimentos quanto à interpretação e compreensão do enunciado, bem

como dificuldades quando é confrontada com o que considera ser um excesso de

informação no enunciado. A forma como a aluna expressa as suas ideias ao longo da

resolução dos problemas permitiu-nos identificar aspetos do conhecimento matemático

da aluna que carecem ainda de aprofundamento.

Conclusão

Sendo o objeto da avaliação as aprendizagens é desejável que a avaliação seja um

instrumento de regulação das mesmas de forma a orientar o professor nas suas

estratégias de transferência de conhecimentos (NCTM, 1991).

Os elementos recolhidos junto destes alunos sugerem que estes sentiram dificuldade na

compreensão e interpretação dos enunciados, tendo sido necessário reformulá-los,

recorrendo a outras palavras que não as iniciais, de forma a que os alunos conseguissem

resolver o(s) problema(s). Assim, tal como identificado por Ponte et al. (2007), verifica-

se a importância de estabelecer uma linguagem matemática entre professor e aluno, para

que este se familiarize com a comunicação matemática.

A extensão de informação no enunciado, foi apresentada como causa do aumento da

dificuldade sentida para a resolução das tarefas que lhes foram propostas, bem como a

dificuldade em relacionar o enunciado com as figuras que constavam deste.

Botelho & Rocha

88 PROFMAT — 2015

Relativamente à avaliação das aprendizagens conclui-se que os alunos apresentam, de

uma forma geral, dificuldade na interpretação do enunciado, bem como na compreensão

das figuras presentes no mesmo; dificuldade em relacionar a situação descrita pelo

gráfico; dificuldade na utilização da linguagem matemática durante o processo de

argumentação e dificuldade na elaboração e explicação do seu raciocínio. Constata-se

que as aprendizagens relativas ao estudo da função através do gráfico necessitam de ser

consolidadas. A aplicação destas tarefas permitiu assim identificar o papel da

comunicação matemática em contexto de resolução de problemas, tendo em vista o

processo de avaliação das aprendizagens.

O facto de os alunos não concretizarem com sucesso a primeira etapa da resolução de

problemas apresentada por Pólya (1995), torna-se uma condicionante nas etapas

seguintes, transformando-se num obstáculo para a concretização correta do que é

pretendido.

Parece-nos pois que a análise aqui apresentada permite identificar alguns aspetos do

contributo que a comunicação matemática pode trazer à avaliação das aprendizagens e à

subsequente (re)orientação do processo de ensino. Esperamos, assim que este possa ser

um contributo para estimular a reflexão dos professores em torno desta temática.

Referências bibliográficas

Abrantes, P. (1 88). Um (bom) problema (não) é (só)... Educação e Matemática, 8, 7-10 e 35.

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análise epistemológica e educativa das representações pessoais dos professores.

Dissertação de mestrado. Universidade Nova de Lisboa.

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Editorial do ME.

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Visual Tecnológica – Um Estudo Exploratório. Tese de Mestrado. Braga: Instituto de

Educação da Universidade do Minho.

PROFMAT — 2015 90

FORMAÇÃO CONTINUADA DE DOCENTES DOS ANOS INICIAIS DO

ENSINO FUNDAMENTAL NO ÂMBITO DAS CIÊNCIAS EXATAS

Ieda Maria Giongo, Marli Teresinha Quartieri, Sônia Elisa Marchi Gonzatti, Jane

Herber

Centro Unviersitário UNIVATES

[email protected], [email protected], [email protected],

[email protected]

Resumo

Este relato tem por objetivo explicitar ações e resultados de um curso de formação

continuada para docentes, com a temática “Possibilidades para o Ensino de Ciências

Exatas nos Anos Iniciais, ofertado em 2014 por um grupo de pesquisadoras vinculadas a

uma Instituição de Ensino Superior localizada ao sul do Brasil. Em oito encontros

presenciais, os conteúdos problematizados versaram sobre estimativa, sistemas de

medidas, fenômenos térmicos, elétricos e químicos e, a partir destes, os professores da

Escola Básica participantes deveriam explorar, com suas turmas de alunos, no mínimo,

duas atividades relacionadas a tais conteúdos. Ademais, um relatório contendo

informações sobre avanços, limitações e propostas de continuidade acerca das

atividades escolhidas foi entregue por cada docente no último encontro, além de uma

apresentação oral os demais participantes. Durante as reuniões, as discussões foram

gravadas e posteriormente transcritas, e sua análise, aliada a dos relatórios entregues,

permitiu a emergência dos seguintes resultados: a) a produtividade de se operar, já nos

Anos Iniciais do Ensino Fundamental, com conceitos vinculados à Matemática,

Química e Física; b) os docentes participantes do curso exploraram, com suas turmas,

atividades interdisciplinares, enfocando conteúdos relativos às três disciplinas

mencionadas e c) o curso proporcionou aos participantes aliarem distintas concepções

teóricas a práticas no âmbito das Ciências Exatas.

Palavras-chave: Formação Continuada. Escola Básica. Ensino de Ciências Exatas

Contextualizando

O presente relato evidencia as potencialidades e llimitações da oferta de um curso

de formação continuada dirigida à docentes dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental

com ênfase no ensino de conteúdos vinculados ao âmbito das assim chamadas Ciências

Exatas, aqui compreendidas como Matemática, Química e Física. Como apontado por

Gonzatti et al (2015) usualmente, neste nível de ensino, tais conteúdos –

particularmente os vinculados à Química e Física - são relegados a um plano

secundário, em detrimento daqueles usualmente presentes no currículo escolar. As

autoras (2015, p.1-2) expressam que, neste cenário:

Giongo, Quartieri & Herber

PROFMAT — 2015 91

Os fatores que contribuem para este cenário estão relacionados, por um

lado, à formação de professores, tanto inicial quanto continuada, pois

quando já estão atuando não encontram apoio profissional e

acompanhamento para desenvolver seu trabalho. Por outro lado, há a

cultura do professor polivalente para os anos iniciais, que enfatiza

principalmente o domínio de saberes disciplinares da Matemática e da

Língua Portuguesa; no caso das Ciências, são desenvolvidos temas de

Ciências Biológicas, sobre os quais os docentes geralmente apresentam

maior segurança

Em efeito, em cursos de formação anteriores – focados apenas no campo do ensino de

Matemática - eram recorrentes as falas dos docentes dos anos inicias do ensino

fundamental acerca da impossibilidade de enfocarem, em suas práticas pedagógicas,

conteúdos ligados à Física e Química tendo em vista que, segundo eles, não havia

recebido formação inicial adequada para tal. Tais enunciações estão em consonância

com a pesquisa de Schroeder (2007, p. 4) quando evidencia que “[...] a física ainda está

longe das salas de aula das quatro primeiras séries”. Ainda segundo o autor, dentre os

motivos para tal, um dos mais identificáveis “é a pouca intimidade dos professores

dessas séries com a física, mesmo que ela possua um grande calor em potencial como

instrumento para desenvolver habilidades [..]”. As habilidades de que fala o autor estão

diretamente relacionadas à capacidade de aprender a aprender. Por fim, o mesmo autor

adverte que as atividades propostas não devem requerer que os professores tenham

formação específica em Física, mas que os docentes “adotem práticas mais condizentes

com as necessidades de seus alunos”. Quanto ao ensino de Química nas séries iniciais

do ensino fundamental segundo Silva, Zuliani, Fragoso e Oliveira (s/d, p.2) argumentam

que:

Os conhecimentos básicos de Química nas séries iniciais fundamentam as

bases para o aprendizado dos conceitos que serão trabalhados

futuramente com estes alunos. Os alunos possuem uma curiosidade e

avidez de conhecimentos típica da infância. Não sentem vergonha de

perguntar e se entusiasmam com experimentos e atividades práticas,

diferentemente dos alunos mais velhos e mais resistentes às interferências

dos professores.

Com relação ao ensino de Matemática, embora presente neste nível de ensino, há que se

considerar, por um lado, que os conteúdos ministrados usualmente carecem de outras

possibilidades de ensinar e aprender que não aquelas expressas em manuais ou

parâmetros nacionais. Por outro, poucas são as tentativas de interação desta disciplina

com outras, notadamente às vinculadas ao mesmo campo do conhecimento. Nesse

sentido, propomos um curso de formação continuada que, sobretudo, promovesse

Giongo, Quartieri & Herber

92 PROFMAT — 2015

rupturas nos processos de ensino e aprendizagem dos docentes que, acreditamos, será

estendido aos seus alunos.

Sobre os encontros

O curso se desenvolveu de abril a setembro de 2014 por meio de oito encontros

presenciais e dois a distância com a participação de cerca de 20 docentes dos anos

iniciais do ensino fundamental de escolas públicas e privadas da região do Vale do

Taquari, ao sul do Brasil. Nos encontros presenciais foram problematizadas atividades,

propostas pelos investigadores da Universidade, com as temáticas vinculadas à matéria,

energia e simetria. Para a emergência destas atividades, apoiamo-nos também nas ideias

de Schroeder (2007) para quem os estudantes, desde os primeiros anos de escolaridade,

deveriam ser estimulados a participar de atividades nas quais tivessem oportunidade de

manipular, explorar e interagir “com materiais concretos, ao invés de somente se

dedicar as aulas expositivas e leituras de textos” (Ibidem, p. 3). E completa o mesmo

autor que é preciso problematizar o ensino de ciências, ainda tão em voga nas nossas

escolas, no qual “não se identifica qual a relevância do que se aprende na escola para a

vida fora dela” (Schroeder, p. 3).

Em acordo prévio com os participantes, estes deveriam, por conta dos dois encontros a

distância, explorar, em suas turmas, no mínimo duas atividades desenvolvidas nos

encontros presenciais. Ademais, no último destes, os mesmos apresentaram, oralmente,

os resultados do desenvolvimento das atividades com seus estudantes e também

entregaram um pequeno relatório apontando os avanços e limitações de tal trabalho.

Pensamos na produtividade destas duas ações tendo em vista que entendemos ser

necessário para os docentes de qualquer nível de ensino, por um lado, ter domínio da

comunicação, principalmente com seus pares e, por outro, registar, de modo sistemático,

as possibilidades e limitações de suas práticas pedagógicas. Inicialmente, os docentes

participantes questionaram a metodologia que propomos mas, após a exposição das

duas justificativas, concordaram.

Giongo, Quartieri & Herber

PROFMAT — 2015 93

Alguns resultados

Durante as reuniões, as discussões foram gravadas e posteriormente transcritas, e sua

análise, aliada a dos relatórios entregues, permitiu a emergência dos seguintes

resultados: a) a produtividade de se operar, já nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental,

com conc eitos vinculados à Matemática, Química e Física; b) os docentes participantes

do curso exploraram, com suas turmas, atividades interdisciplinares, enfocando

conteúdos relativos às três disciplinas mencionadas e c) o curso proporcionou aos

participantes aliarem distintas concepções teóricas a práticas no âmbito das Ciências

Exatas.

Em efeito, durante as apresentações orais todos os docentes expuseram as atividades

desenvolvidas com seus estudantes, conforme expresso nas figuras 1 e 2.

Figura 1: Atividade desenvolvida por um dos docentes participantes do curso

Fonte: Professor participante (2014)

Giongo, Quartieri & Herber

94 PROFMAT — 2015

Figura 2: Modelo tridimensional para o sistema Sol-Terra-Lua

Fonte: Das autoras (2014)

Os mesmos docentes ambém evidenciaram, em suas falas e na escrita dos relatórios que,

por um lado, passaram a questionar seus conhecimentos prévios acerca das ciências e,

por outro, desenvolveram atividades bastante significativas para seus alunos.

Evidentemente, também foi possível inferir que estes docentes precisam de apoio para

inserir, em suas práticas ppedagógicas atividades experimentais. Tal ideia converge o

fato de que, nessa perpsectiva, o professor passa da posição de detentor de saberes

estabelecidos para a de orientador dos processos de aprendizagem. Como apontamos

noutra ocasião:

As atividades realizadas, com forte componente investigativo e

questionador, possibilitaram aos participantes questionarem sua prática

docente, destacando a necessidade de um professor com perfil

questionador, que propõe desafios e que passe de uma postura de

transmissor de conteúdos para um orientador do processo de

aprendizagem (Gonzatti, Giongo, Herber e Quartieri, 2015, p. 76).

Esta “nova” postura dos docentes participantes favoreceu seus estudantes na medida em

que estes passaram a questionar a si mesmos e operar com hipóteses durante a

realização dos experimentos. Essa ideia pode ser inferida a partir de alguns comentários

emitidos por um grupo de alunos diante da atividade ligada à densidade tendo como

premissa o fato de que um navio não afunda. Dentre eles, destacamos: “As duas garrafas

não afundaram, nem a grande, nem a pequena”; “Porque a bacia é maior [onde as

garrafas flutuam], tem mais água do que as garrafas, por isso elas não afundam”, “A

garrafa maior boiava mais que a pequena, pois seu tamanho era maior. “A água e as

Giongo, Quartieri & Herber

PROFMAT — 2015 95

britas ficavam mais “espalhadas” dentro. E quando a água foi para um lado, afundou.

Tem que equilibrar para não afundar!”, “No navio é a mesma coisa: tem que equilibrar o

peso, senão afunda! E tem que controlar o peso”.

Noutra passagem, um dos docentes que havia trabalhado com experimentos voltados

para fenômenos térmicos expressou em seu relatório que houve, por parte de seus

estudantes, “curiosidades pelos resultados, envolvimento do grupo na atividade proposta

e demonstraram clareza quando interrogados sobre o que aconteceria com as esferas ao

aquecer o ferro [...] responderam que cairiam porque o ferro iria aquecer”. Por fim

destacou também que presenciou “a alegria dos alunos ao desenvolver as experiências”.

Com a mesma ideia outra docente explicitou que “o prazer que eu vi na cainha deles de

questionarem, de escutarem respostas. Eu achei isso o máximo. Para mim, valeu

demais, valeu mesmo”.

Outra docente, muito envolvida com as atividades desenvolvidas no curso, explicitou

que:

O professor deve estar ciente que muitos conceitos apenas estão

começando a ser trabalhados e muitas vezes a criança lembrará a

sensação que teve ao realizar a atividade, mas não conseguirá

compreender como acontece essa ação. Como professora, tive

dificuldades em explicar conceitos de como acontece a reação química

[nas pilhas] e precisei pesquisar. Há um crescimento do professor na

busca por respostas que ajudem a compreensão do aluno, e o professor

mostra-se como um pesquisador, não sendo o dono da verdade. “Vamos

aprender juntos?” O aprender juntos gera uma grande empolgação e a

participação é muito ativa de todos.

Considerações finais

Ao final deste texto, pretendemos abordar três aspectos. O primeiro deles diz respeito ao

fato de que, embora incipientes, as ações desenvolvidas nos encontros presenciais

acabaram efetivamente por mudar a prática pedagógica dos docentes envolvidos.

Entretanto, estamos cientes da necessidade de prosseguirmos investindo nessas

estratégias em cursos de formação continuada para docentes deste nível a fim de que

estes se sintam seguros quando explorarem atividades desta natureza junto a seus

alunos. É importante destacar também, que essa perspectiva de formação docente visa

superar a ideia de que incialmente se aborda a assim chamada “teoria” para somente

após, partir para a experimentação, ou seja, a “prática”.

Giongo, Quartieri & Herber

96 PROFMAT — 2015

O segundo aspecto evidencia que os estudantes dos professores participantes do curso

passaram a fazer conjecturas, problematizar e questionar – a si mesmos e ao professor –

sobre os resultados dos experimentos. Entendemos que esse primeiro passo pode ser

decisivo para que, por um lado, os discentes tenham acesso à alfabetização científica e,

por outro, sigam seus estudos em carreiras de Licenciatura que demandam

conhecimentos ligados à Física, Química e Matemática. Como bem apontou Chassot

(2003, p. 93):

A alfabetização científica pode ser considerada como uma das dimensões

para potencializar alternativas que privilegiam uma educação mais

comprometida. É recomendável enfatizar que essa deve ser uma

preocupação muito significativa no ensino fundamental, mesmo que se

advogue a necessidade de atenções quase idênticas também para o ensino

médio.

O terceiro item aponta para a continuidade dos estudos tendo em vista que uma das

ações em andamento prevê a realização de tais encontros com os docentes dos a nos

iniciais de uma escola pública da região. A diretora deste educandário e a coordenadora

pedagógica estão participando, junto com as professoras da Universidade, de discussões

sobre os próximos encaminhamentos. Também pretendemos acompanhar as atividades

de duas professoras que realizaram o curso para analisar o impacto, na escola, da oferta

do curso.

Pelo que até aqui narramos, podemos inferir que é possível trabalhar, já nos anos

iniciais do ensino fundamental, conteúdos relativos às assim chamadas Ciências Exatas,

não se restringindo apenas à disciplina Matemática e Língua Portuguesa. Como

apontamos anteriormente (Gonzatti, Giongo, Herber e Quartieri, 2014, p.76).

Em síntese, é possível afirmar que é preciso continuar fomentando e

desenvolvendo novas abordagens teórico-metodológicas para o ensino de

Ciências Exatas, na direção do letramento científico e da aprendizagem

pela pesquisa. Entende-se que esse enfoque provoca os sujeitos a

assumirem nova postura epistemológica frente aos processos de ensino e

aprendizagem, que seja convergente com as teorias de aprendizagem

mais progressistas e com a perspectiva da educação como direito social

de todos os cidadãos e que, como principal resultado, auxiliem a

desenvolver, desde os níveis iniciais da educação escolar, a fluência em

aprender.

Giongo, Quartieri & Herber

PROFMAT — 2015 97

Referências

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Brasileira de Educação, 23. Acedido em março de 2014, em

http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n22/n22a09.

Gonzatti, Sônia Elisa Marchi; Giongo, Ieda Maria; Herber, Jane e Quartieri, Marli Teresinha

(2014). Problematizando o ensino e as aprendizagens em ciências exatas no contexto

de um curso de formação continuada para professores do ensino fundamental. Revista

Signos, ano 35, vol. 2, p.63-78. Acedido em 10 de fevereiro de 2015, de

http://www.univates.br/revistas/index.php/signos/article/view/1193/659.

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Iniciais do Ensino Fundamental. Acedido em 20 de fevereiro em

www.fep.if.usp.br/~profis/arquivos/vienpec/CR2/p729.pdf

PROFMAT — 2015 98

A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM GEOMETRIA

Márcia Jussara Hepp Rehfeldt, Ieda Maria Giongo, Marli Teresinha Quartieri

Centro Unviersitário UNIVATES

[email protected], [email protected], [email protected]

Resumo

Este relato objetiva socializar uma das ações do Programa Observatório da Educação,

desenvolvido no Centro Universitário UNIVATES, que conta com apoio financeiro da

CAPES e do qual participam seis professores de diferentes escolas, três mestrandos, seis

bolsistas de graduação e quatro professoras da Instituição. O objetivo deste Programa é

problematizar e propor estratégias metodológicas com vistas à inovação e reorganização

curricular na disciplina de Matemática, promovendo discussões entre professores de

escolas que possuem considerável distância entre os índices de avaliação externa

relativa ao 5º e 9º anos. Uma das ações consiste em aplicar e avaliar resultados de

provas simuladas. Assim, foram aplicadas 8 questões de múltipla escolha (4 para 5º ano

e 4 para 9º ano) para 318 alunos das escolas parceiras. Além de assinalar a resposta, os

alunos descreveram a estratégia utilizada. Os resultados apontaram lacunas de

aprendizagem na geometria. A partir disso, a equipe do Observatório, selecionou 10

questões envolvendo conteúdos geométricos para explorar com os professores das

escolas, em curso de formação continuada. Participaram desta formação, desenvolvida

nas próprias escolas, cerca de 50 docentes. Inicialmente, os participantes resolveram as

questões descrevendo a estratégia usada. Em seguida, foram discutidas e

problematizadas as resoluções, bem como formas de ministrar os conteúdos

geométricos envolvidos. Percebeu-se que os docentes sanaram suas dúvidas e ficaram

interessados pela geometria. Ademais, solicitaram continuidade dos encontros para o

ano de 2015.

Palavras-chave: Formação Continuada. Programa Observatório da Educação.

Geometria.

Contextualização

O Programa Observatório da Educação financiado pela Coordenação de

Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES e em desenvolvimento no

Centro Universitário UNIVATES, localizado na cidade de Lajeado, Rio Grande do Sul,

Brasil, tem como objetivo central problematizar e propor estratégias metodológicas com

vistas à inovação e reorganização curricular na disciplina de Matemática, promovendo

discussões entre professores das seis diferentes escolas do Vale do Taquari que possuem

considerável distância entre os Índices de Avaliação de Desempenho da Escola Básica

(IDEB), relativo à 5º ano e 9º ano. Conforme informações disponibilizadas no site da

Univates, a região do Vale do Taquari situa-se no centro do Rio Grande do Sul (Estado

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

PROFMAT — 2015 99

que fica ao sul do Brasil), é formada por 36 municípios, que totalizam uma área de

4.821,1 Km² (1,71% do Estado).

O Programa Observatório da Educação conta com a participação de seis escolas, com

IDEB em torno de 6,0 no 5º ano e 4,0 no 9º ano, localizadas nos municípios Roca Sales,

Muçum, Paverama, Estrela, Lajeado e Teutônia, conforme ilustra a Figura 1.

Figura 1 – Mapa do Vale do Taquari e as cidades em que se localizam as escolas contempladas

pelo Programa Observatório da Educação

Fonte: Conselho de Desenvolvimento do Vale do Taquari, 2015

Com relação aos índices do IDEB, em todas as escolas pôde-se observar um

significativo decréscimo nas notas obtidas, além da considerável diferença entre do 5º e

o 9º ano. Esses dados levaram a equipe proponente do estudo a postular necessidade de

pesquisas, estudos e ações nas referidas escolas com o intuito de aumentar os índices ao

longo de quatro anos, haja vista ser este o tempo concedido pela CAPES para

desenvolver o projeto.

Para que se pudesse compreender como este índice é formado, buscou-se em órgãos

governamentais brasileiros a sua definição. Assim, segundo nota técnica disponibilizada

pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (INEP),

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

100 PROFMAT — 2015

O Ideb é um indicador de qualidade educacional que combina

informações de desempenho em exames padronizados (Prova Brasil ou

Saeb) – obtido pelos estudantes ao final das etapas de ensino (4ª/5º ano e

8ª séries/9º ano do ensino fundamental e 3ª série do ensino médio) – com

informações sobre rendimento escolar (aprovação) (BRASIL, s/d, texto

digital).

Em síntese, o índice é obtido multiplicando-se a nota do desempenho

obtido pelos estudantes na prova Brasil num ano específico pelo índice

de aprovação dos alunos da escola até aquele ano. Um exemplo pode

elucidar o caso. Se os alunos do 5º ano atingiram nota 6.0, mas nos anos

iniciais do Ensino Fundamental (até o 5º ano) a escola apresenta um

percentual 90% de aprovação de alunos, o índice é calculado 6.0 x 0.9 =

5.4. Assim, de acordo com o governo brasileiro, há certa garantia de que

não haja um elevado índice de aprovação com ausência de

conhecimentos.

No que tange ao quadro de profissionais envolvidos no Programa Observatório da

Educação, este é integrado por seis professores das escolas públicas acima

mencionadas, três mestrandos de pós-graduação, cujas pesquisas estão vinculadas às

temáticas discutidas (Etnomatemática, Investigação Matemática e Modelagem

Matemática) no Programa, seis bolsistas de Iniciação Científica de diversos cursos de

graduação, além de quatro professoras pesquisadoras (três com formação na área da

Matemática e uma em Pedagogia) que também ministram aulas na graduação e nos

mestrados em Ensino de Ciências Exatas e em Ensino.

A equipe se reúne semanalmente, sendo este o momento em que ações são traçadas e

articuladas, com vistas a alcançar o objetivo central da pesquisa. Entre as ações

destacam-se àquelas que têm como intuito reduzir a distância entre o índice dos Anos

Iniciais e dos Finais do Ensino Fundamental na avaliação do IDEB, como já citado.

Uma delas consiste em elaborar, aplicar, corrigir e avaliar os resultados de provas

simuladas elaboradas a partir de questões do Sistema de Avaliação da Educação Básica

(SAEB) e da Prova Brasil. Entende-se que se os alunos experienciarem e vivenciarem

situações similares, o índice de acertos nas provas finais poderá sofrer um acréscimo.

Com base neste pressuposto é que foram planejadas ações a seguir descritas.

O planejamento da ação

Para desenvolver a ação acima mencionada, o grupo de professores do Centro

Universitário UNIVATES, conjuntamente com os mestrandos e os bolsistas de

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

PROFMAT — 2015 101

Iniciação Científica buscou em provas de anos anteriores questões que apresentavam

certa recorrência, ou seja, que estavam frequentemente nas referidas avaliações. A partir

deste material, a equipe escolheu oito questões de múltipla escolha que foram

adaptadas, sendo 4 questões direcionadas a alunos do 5º ano e as outras 4 para discentes

do 9º ano.

As duas provas simuladas foram aplicadas a 162 alunos do 5º ano e 156 do 9º ano,

totalizando 318 alunos das escolas parceiras. Além de assinalar a resposta correta,

solicitou-se aos estudantes descreverem o desenvolvimento de cada questão, ilustrando

o raciocínio utilizado. Todas as provas foram corrigidas pelos mestrandos em parceira

com os bolsistas de Iniciação Científica. Os dados oriundos destas provas mostraram

que existem lacunas de aprendizagem, em especial, na geometria.

Após apresentação e discussão dos resultados com os professores das escolas parceiras

nas reuniões semanais, os próprios docentes mencionaram que o tema geometria é

pouco explorado nas escolas, pois muitos livros abordam este assunto nos capítulos

finais. Estudos neste sentido também corroboram tais resultados. Segundo Perez (1995),

Passos (2000) e Ferreira e Correia (2007) apud Kluppel (2012, p. 12) “há um descaso

em relação ao ensino da geometria nas salas de aula, metodologia não apropriada, o não

conhecimento por parte dos professores de alguns conteúdos específicos, conteúdos

deixados para final do ano letivo, entre outros”. Macedo (2013) aponta que a principal

fonte para o ensino da geometria é o livro e que até meados dos anos 90 ela aparecia no

final do livro. Como a maioria dos professores segue o livro didático, mas não o

finaliza, este tema deixa de ser desenvolvido.

A partir de tais constatações, inicialmente discutiu-se com os professores parceiros a

escolha de 10 questões que contemplassem questões semelhantes às que os alunos

erraram na simulação. Após algumas semanas de discussões, os professores das escolas

parceiras entenderam a relevância de tais questões e solicitaram que estas também

fossem problematizadas com seus colegas-professores, nas seis escolas parceiras. A

partir disso, elaborou-se uma agenda e cada escola foi visitada uma ou duas vezes para

discutir as questões. Participaram em cada escola, além do professor indicado por ela,

um professor da Univates ou um dos mestrandos e os demais professores das escolas

parceiras. Em alguns casos, houve um interesse considerável e vários professores,

independente da disciplina que estavam ministrando, acabaram participando dos

encontros. Em outras, colaboraram nas discussões apenas os professores que

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

102 PROFMAT — 2015

lecionavam nos anos iniciais do Ensino Fundamental, além dos docentes graduados em

Matemática. Desta forma, integraram esta formação docente cerca de 50 professores.

De acordo com Chimentão (200 , p. 3), “a formação continuada de professores tem sido

entendida como um processo permanente de aperfeiçoamento dos saberes necessários à

atividade profissional, realizado após a formação inicial, com o objetivo de assegurar

um ensino de melhor qualidade aos educandos”. Para Mileo e Kogut (200 , p. 4 47-

4948),

cabe ao professor manter-se qualificado para que possa atender as

necessidades de seus alunos bem como da sociedade. Uma vez que, o

mercado de trabalho busca o profissional melhor qualificado, flexível e

disposto para enfrentar os desafios a ele proposto, visando uma melhoria

na educação e no ensino. Portanto, apenas a formação inicial não é

suficiente para a garantia da qualificação dos professores na atualidade.

Durante os encontros de formação continuada, a sistemática consistiu na resolução

inicial e individual ou em pequenos grupos das questões propostas. Após, estas eram

resolvidas e discutidas em grande grupo. Por fim, questionaram-se outros aspectos que

poderiam ser desenvolvidos quando uma determinada questão seria desenvolvida em

sala de aula, bem como variações e adaptações destas, haja vista que vários professores

dos anos iniciais estavam participando das discussões.

As questões problematizadas estão descritas a seguir. Cabe mencionar que além de cada

questão, está destacado em que ano a questão poderia ser discutida, a qual descritor ela

se refere, a fonte de onde a questão foi retirada, bem como os demais assuntos que

foram debatidos. Segundo o INEP:

os conteúdos associados às competências e habilidades desejáveis para

cada série e ainda, para cada disciplina, foram subdivididos em partes

menores, cada uma especificando o que os itens das provas devem medir

– estas unidades são denominadas "descritores". Esses, por sua vez,

traduzem uma associação entre os conteúdos curriculares e as operações

mentais desenvolvidas pelos alunos. Os descritores, portanto,

especificam o que cada habilidade implica e são utilizados como base

para a construção dos itens dos testes das diferentes disciplinas

(BRASIL, s/d, texto digital).

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

PROFMAT — 2015 103

As questões desenvolvidas e discutidas com os professores

Questão 1:

Observar a planta de um clube desenhada em uma malha quadriculada e responder à questão.

Juliana fez o seguinte trajeto: saiu da quadra de tênis, passou pela piscina, pelo vestiário feminino e

entrou no ginásio de esportes. Como você poderia descrever esse caminho usando coordenadas?

a) (5,3); (3,5); (1,4); (2,1)

b) (3,5); (5,3); (4,1); (1,2)

c) (5,3); (3,5); (2,3); (2,1)

d) (3,5); (5,3); (1,4); (1,2)

Descritor 9: Interpretar informações apresentadas por meio de coordenadas cartesianas.

Ano: 9º ano

Fonte: adaptado do Projeto Araribá, 2006, p. 245.

Outros assuntos discutidos:

- Como os professores desenvolvem este conteúdo com seus alunos?

- Em que ano poder-se-ia resolver este tipo de atividade?

- O descritor envolvido.

- Exemplos de como trabalhar este conteúdo utilizando jogos como caça ao tesouro no chão, batalha

naval. Estes jogos já são conhecidos dos alunos e professores.

- A importância de diferenciar nomenclaturas como linha e coluna.

- Possibilidades de explorar esta questão de forma diferente, em diversos anos, elevando ou reduzindo

o grau de dificuldade do problema.

Observações e análise:

Nas resoluções individuais, apenas professores de Matemática, em geral, conseguiram resolver esta

questão. Os demais docentes apresentaram algumas dificuldades, pois manifestaram dúvidas acerca das

coordenadas cartesianas, não lembrando qual valor entre parênteses que deveria ser escrito

inicialmente, se era o da linha ou a da coluna. Para alguns professores, esse fato também não parecia

ser relevante, mas após discussões eles compreenderam a posição dos números dentro dos parênteses.

Cabe mencionar que em uma das escolas os alunos estavam desenvolvendo uma questão similar a esta

problematizada quando o professor da Univates chegou ao educandário. Assim, houve também menção

ao trabalho que já estava sendo desenvolvido, vinculando com àquilo que os docentes já estavam

realizando.

As atividades já desenvolvidas pelo professor, bem como os resultados advindos delas podem auxiliá-

lo a refletir sobre sua própria prática. De acordo com Perrenoud e Schilling (2002, p. 53) “aprendemos

a refletir sobre os aspectos importantes da prática, e não situações com exemplos insignificantes”.

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

104 PROFMAT — 2015

Questão 2:

Dobramos uma folha como na figura abaixo, depois recortamos e retiramos a parte branca.

Em seguida, desdobrando a folha, obtemos:

Descritor 4: Identificar relação entre quadriláteros por meio de suas propriedades

Ano: 9º ano

Fonte: http://profwarles.blogspot.com.br/.

Outros assuntos discutidos:

- Esta atividade também foi realizada na prática, dobrando-se o papel. Além disso, a partir de

dobraduras foram construídos quadrados, retângulos e losangos.

- Foram realizadas discussões acerca dos conceitos quadrado, retângulo e losango.

- Foram construídas figuras e polígonos simétricos com eixos de simetria (um, dois, três, quatro, oito)

por meio de dobraduras.

Observações e análise:

A maioria dos professores acertou sem dificuldades esta questão. No entanto, em todas as escolas as

discussões acerca do que é quadrado, retângulo e losango foram exaustivas. Questionados acerca das

definições, a maioria afirmou que uma figura para ser um quadrado basta ter 4 lados iguais. Para ser

um retângulo, segundo os docentes, é necessário que os lados opostos sejam iguais. Poucos professores

mencionaram algo sobre ângulos retos. Por fim, um losango, para estes, era apenas uma figura de 4

lados iguais e ângulos opostos iguais dois a dois.

Questionados se um quadrado também poderia ser um retângulo, a maioria dos professores afirmou

que não. Assim, tornou-se necessária uma longa discussão acerca de cada conceito geométrico. Alguns

professores dos anos iniciais mencionaram que para eles, uma figura geométrica plana só poderia ser

uma coisa, ou um quadrado, ou um retângulo e que foi assim que aprenderam na sua formação inicial.

Esta constatação nos permite inferir que é necessário ao professor também aprender. Segundo Demo

(2005, p. 36) “professor não é quem ensina, mas o eterno aprendiz, aquele que aprende melhor, está à

frente dos outros neste desafio, ou que faz disso sua própria profissão.

Em relação à construção de figuras simétricas, os docentes dos anos iniciais ficaram entusiasmados e

motivados a realizar as atividades com seus alunos. A maioria destes professores não tinha

conhecimento sobre simetria. Entretanto, depois das discussões perceberam a produtividade e a

viabilidade do uso da simetria para os alunos dos anos iniciais.

Questão 3:

Um campo de futebol tem o formato de uma figura com quatro lados, como podemos observar no

esquema representado a seguir. Qual quadrilátero é esse?

a) losango

b) quadrado

c) trapézio

d) retângulo

Descritor 4: Identificar quadriláteros observando as posições relativas entre seus lados (paralelos,

concorrentes, perpendiculares).

Ano: 5º ano

Fonte: Paraná, 2009.

http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/cadernos_pedagogicos/ativ_mat1.pdf

Outros assuntos discutidos:

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

PROFMAT — 2015 105

- Foram discutidos novamente os conceitos de losango, quadrado, trapézio e retângulo.

Observações e análise:

A identificação de qual figura geométrica estava sendo mencionada não gerou dúvidas e todos os

professores acertaram a questão. Como as discussões acerca de quadrados, retângulos e losangos já

havia sido realizadas anteriormente, poucas observações foram realizadas.

Questão 4:

Veja o quadrilátero MNPQ desenhado na malha quadriculada abaixo.

O quadrilátero semelhante ao quadrilátero MNPQ é

Descritor 5: Reconhecer a conservação ou modificação de medidas dos lados, do perímetro, da área em

ampliação e/ou redução de figuras poligonais usando malhas quadriculadas.

Ano: 9º ano

Fonte: Prova Brasil.

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=7998&Itemid=.

Outros assuntos discutidos:

- Proporção;

- Cálculos de área e perímetro com papel quadriculado;

- Importância do uso do papel quadriculado para dar a noção de áreas e perímetros;

- Geoplanos.

Observações e análise:

Esta questão também gerou poucas discussões no sentido da resposta correta, pois todos os professores

acertaram a questão. No entanto, quando se discutiu os cálculos de áreas e perímetros, alguns

questionamentos relevantes surgiram. Um deles esteve relacionado às possibilidades de construção de

figuras com áreas iguais, mas perímetros diferentes. Alguns professores questionaram como seria

possível uma mesma área gerar perímetros diferentes Além disso, ficaram surpresos ao questionamento

de construir uma figura com um determinado perímetro capaz de proporcionar uma área máxima. Após

algumas tentativas, concluíram que uma área composta por quatro lados torna-se máxima se estiver em

formato de quadrado. Neste sentido, foi necessário encorajá-los no sentido de realmente

confeccionarem os quadrados e retângulos usando o material disponibilizado como papel quadriculado,

régua, fios e tesoura. O apoio aos professores neste momento foi fundamental. Segundo Tardif e

Lessard (2012, p. 185), “vários professores dizem ter-se beneficiado, no início da carreira ou na

atribuição de uma nova função, com o suporte de algum colega de experiência, com uma espécie de

mentor informal”.

Ao término desta questão também discutiu-se acerca do uso de geoplanos para calcular áreas e

perímetros. Segundo Thomaz Sobrinho (2011, p. 13),

O geoplano é um artefato que permite ao aluno descrever, reproduzir, montar, identificar, explorar e

reconhecer as diferenças e semelhanças das formas planas, além de propiciar meios de ele deduzir,

analisar, avaliar e propor soluções para questionamentos de cunho geométrico, algébrico, aritmético,

entre outros temas matemáticos.

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

106 PROFMAT — 2015

Questão 5:

Ampliando o triângulo ABC, obtém-se um novo triângulo A’B’C’, em que cada lado é o dobro do seu

correspondente em ABC.

Em figuras ampliadas ou reduzidas, os elementos que conservam a mesma medida são:

a) As áreas

b) Os perímetros

c) Os lados

d) Os ângulos

Descritor 7: Reconhecer que as imagens de uma figura construída por uma transformação homotética

são semelhantes, identificando propriedades e/ou medidas que se modificam ou não se alteram.

Ano: 9º ano

Fonte: Prova Brasil.

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=7998&Itemid=.

Outros assuntos discutidos:

- Ampliação e redução de figuras através da homotetia (ponto de fuga).

- As implicações do dobro do perímetro no cálculo das áreas.

Observações e análise:

Esta questão teve um elevado índice de acertos, haja vista os conceitos de área e perímetro já terem

sido discutidos anteriormente. No entanto, a maioria dos professores apresentou dificuldades em

reproduzir a figura ampliada pelo processo de homotetia. Verificou-se que a maioria dos professores

pouco sabia acerca desta palavra, bem como os processos de reprodução da figura por este método. No

entanto, conseguiram realizar as atividades com o uso de compasso e outros com o uso de réguas.

Também figuras como quadrados tiveram seus perímetros dobrados e para surpresa de alguns

professores, sua área não dobrou, mas quadruplicou. Para se certificar disso, vários professores

repetiram o experimento alterando os valores dos lados dos quadrados.

Questão 6:

Janine desenhou dois triângulos, sendo que o triângulo DEF é uma redução do triângulo ABC.

A medida x do lado DF é igual a

a) 4 cm

b) 6 cm

c) 8 cm

d) 12 cm

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

PROFMAT — 2015 107

Descritor 3: Identificar propriedades de triângulos pela comparação de medidas de lados e ângulos.

Ano: 9º ano

Fonte: Prova Brasil.

http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=7998 &Itemid=.

Outros assuntos discutidos:

- Discussão das condições de existência de um triângulo.

Observações e análise:

Esta questão gerou muita polêmica, poiso primeiro triângulo não existe. A condição de existência de

um triângulo infringida é: “a soma dos dois lados menores precisa ser maior que o maior lado”.

Questionados os professores afirmaram que a resposta certa seria 6 cm, mas ao serem provocados para

construir, na prática, a partir de canudos de refrigerante o triângulo, não o conseguirem construir.

Assim, foram repassados novos valores de lados com o intuito de que eles mesmos descobrissem as

condições de existência e que debatessem sobre isso.

Cabe mencionar que alguns professores, com formação na área da Matemática, também tiveram

dúvidas nesta questão. Para Demo (2005, p. 103), “quem argumenta busca o debate, não sua conclusão,

a mudança de perspectiva, não o fechamento, novos horizontes, não a mesmice”.

Questão 7:

Observar os relógios.

Os destaques nesses relógios estão associados a ângulos de quantos graus?

a) 120º e 210º

b) 20º e 35º

c) 240º e 150º

d) 150º e 200º

Descritor 6: Reconhecer ângulos como mudança de direção ou giros, identificando ângulos retos e não

retos.

Ano: 9º ano.

Fonte: adaptado do Projeto Araribá, 2006, p. 138.

Outros assuntos discutidos:

- Divisão do círculo em 360 graus.

Observações e análise:

A questão foi de fácil entendimento para os professores e somente os que não tinham conhecimento

acerca da quantidade de graus na circunferência é que apresentaram alguma dúvida. A maioria pensou

em 30º para cada 5 minutos; e, posteriormente multiplicou por 4 espaços. Por fim, subtraíram este

valor dos 360º e obtiveram o outro ângulo.

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

108 PROFMAT — 2015

Questão 8:

Três meninas estão olhando para o hospital através da janela dos edifícios em que residem. Andréia

mora no edifício número 1, Bárbara no 2 e Célia no 3.

Observe as vistas que cada uma tem do hospital. Qual das três é a de Andréia?

Descritor 1: Identificar a localização e movimentação de objeto em mapas, croquis e outras

representações gráficas.

Ano: 5º ano.

Fonte: adaptado de Imenes, Jakubovic e Lellis, 1996.

Outros assuntos discutidos:

- Importância de problemas com mais dados do que os usados no problema.

- Possibilidades de trabalhar este tema com o material dourado.

Observações e análise:

Nem todos os professores conseguiram resolver com êxito este problema, alguns confundiram-se

com o desenho em perspectiva. Foi necessário desenvolver na prática, por meio de material dourado,

a situação para que todos compreendessem a questão.

Outro aspecto que foi discutido é a relevância de se problematizar problemas com mais variáveis do

que o necessário. Neste caso, a questão perguntou apenas a visão em perspectiva de Andréia e não

das demais meninas. Segundo Stancanelli (2001) apud Delazeri e Silva (2013, p. 3), problemas com

excesso de informações “valorizam a importância do hábito da leitura e a percepção dos dados

necessários a resolução do problema dispostos dentro dos textos”.

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

PROFMAT — 2015 109

Questão 10:

As figuras planificadas correspondem, respectivamente, a:

a) Uma pirâmide de base triangular e a um prisma de base retangular.

b) Uma pirâmide de base quadrada e a um prisma de base hexagonal.

c) Um prisma de base quadrada e a uma pirâmide de base hexagonal.

d) Um prisma de base triangular e uma pirâmide de base retangular.

Descritor 2: Identificar propriedades comuns e diferenças entre figuras bidimensionais e

tridimensionais, relacionando-as com suas planificações.

Ano: 9º ano.

Fonte: Paraná, 2009.

http://pt.slideshare.net/edileussa/ativ-mat2-descritores-anos-finais

Observações e análise:

Assim como a questão anterior, poucas discussões foram geradas com esta situação. A capacidade de

percepção das figuras planificadas foi de fácil assimilação dos professores. Comentou-se a relevância

de planificar formas geométricas tridimensionais. Discutiu-se que operar com o material concreto é

relevante para o aluno.

Questão 9:

Pintaram-se as seis faces de um prisma quadrangular regular antes de o cortar em cubos iguais, tal

como se observa na figura.

Quantos cubos têm só duas faces pintadas?

a) 3

b) 4

c) 8

d) 12 Ano: 5º ano.

Fonte: Prova Brasil, 2005.

http://www.eidh.eu/exames-13_14/9_ano_matematica/mat_provas/M9_Ex2005_1C.pdf.

Outros assuntos discutidos:

- Exploração do material dourado.

- Atividades de perspectiva e contagem de cubinhos.

Observações e análise:

Esta questão foi de fácil compreensão para os professores. A maioria não utilizou o material dourado

para realizar a contagem. A questão não gerou muito debate. Entretanto, outras possibilidades de

arranjar os cubinhos foram comentadas.

Rehfeldt, Giongo & Quartieri

110 PROFMAT — 2015

Considerações

A formação docente realizada em cada escola foi relevante para os professores, em

especial, para os docentes dos anos iniciais. A partir das práticas realizadas e

experimentadas, eles perceberam que é possível inserir o conteúdo geometria em suas

aulas, inclusive nos primeiros anos do ensino fundamental. Cabe mencionar que a

formação na escola, por meio do deslocamento dos professores e mestrandos da

Univates, e não os professores dirigindo-se até a Instituição foi fundamental, pois foi

possível perceber a realidade em que cada escola está inserida.

As práticas também impulsionaram discussões e reflexões dos professores acerca das

suas aulas. Vários comentários foram realizados tanto pelos professores parceiros como

pelos diretores das escolas e coordenação pedagógica sobre mudanças ocorridas no

cotidiano da sala de aula. Relatos dos professores parceiros ilustram que vários docentes

dos anos iniciais e participantes da formação continuada ainda vêm questionando-os

acerca de alguns conceitos e planejando aulas diversificadas com materiais alternativos.

Durante a formação continuada com os docentes, perceberam-se lacunas em vários

conceitos referentes à geometria como definições de quadrado, retângulo, losango,

trapézio. Em adição, algumas crenças como o dobro do perímetro gera o dobro de área

em figuras como quadrados também tiveram que ser desmistificadas também por meio

de atividades práticas.

No entanto, muitas dúvidas foram sanadas, mas outras permaneceram. O grupo de

docentes, através de suas direções, também solicitou o retorno da equipe em 2015, pois

algumas atividades não foram desenvolvidas exaustivamente. Em algumas escolas, nem

todas as questões foram resolvidas, pois o tempo cedido para tais atividades foi exíguo e

na maioria das escolas ocorreram dois encontros de duas horas aproximadamente. Para

2015, a proposta é de continuidade desta formação continuada.

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20 de fevereiro, 2015, de

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Rehfeldt, Giongo & Quartieri

PROFMAT — 2015 111

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Rehfeldt, Giongo & Quartieri

112 PROFMAT — 2015

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Warles (2015). Acedido em 20 de fevereiro, 2015, de http://profwarles.blogspot.com.br.

PROFMAT — 2015 113

ALGUNS DADOS QUE ALUNOS E PROFESSORES DEVEM SABER SOBRE

RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS

Jorge Cruz

Agrupamento de Escolas nº 1 de Beja - Beja

[email protected]

Resumo

Esta comunicação apresenta, a propósito da resolução de um problema retirado do

estudo PISA, alguns aspetos importantes em resolução de problemas. Escolheu-se um

problema onde os resultados dos alunos portugueses foi bastante baixo e deu-se esse

problema a resolver a um grupo restrito de 3 alunos, os quais obtiveram boa prestação

na tarefa. Procura-se, através da apresentação das características destes alunos

estudados, bem como de aspetos metodológicos presentes na investigação, fornecer

dados relevantes a considerar do ponto de vista didático em resolução de problemas.

Palavras chave: Resolução de problemas; formulação de problemas; avaliação da

resolução de problemas.

Introdução

A justificação da importância de estudos educativos com alunos, baseados em

instrumentos de recolhas de informação constituídos por problemas de matemática,

encontra apoio em abundante literatura disponível. O caminho começado em termos

educativos com o trabalho de Polya (1 57), “How to solve it”, com primeira edição em

1945, introduz o estilo heurístico de resolução de problemas o qual ganha presença nos

currículos à escala global a partir dos desenvolvimentos dados por documentos

emanados pelo NCTM. As normas - Standards - propostas para os vários anos de

escolaridade começam em todos eles por: “A matemática como Resolução de

Problemas” (NCTM, 1 8 , p. 2 , 8 e 163). Principles and Standards, (NCTM, 2000)

apresenta para todos os níveis de ensino (K-12) a resolução de problemas como o

primeiro dos cinco “processos” matemáticos a desenvolver nos alunos.

Törner, Schoenfeld and Reiss (2007), com Problem Solving around the world, uma

compilação de artigos oriundos de várias partes do globo, continuam a concluir sobre a

continuidade da proeminente posição que a resolução de problemas ocupa a nível

mundial aos seja na educação matemática e seja na investigação na área.

O PME, tem dedicado importante relevo ao tema, ampliando-o, como acontece com a

publicação da revista Educational Studies in Matemathics (2013), onde é dado especial

Cruz

114 PROFMAT — 2015

destaque a investigações sob o tema Problem Posing. Vários autores têm salientado que

a formulação de problemas (Problem Posing), em contraste com a resolução de

problemas, tem recebido menor atenção nos programas e na sala de aula (Brown and

Walter, 1983; Kilpatrick, 1987, citados em Cai e Hwang, 2002). Esta é considerada uma

área emergente e, simultaneamente, uma significativa ferramenta para o ensino (Singer,

Ellerton e Cai, 2013).

Schoenfeld (1992) faz uma revisão de literatura e conclui que as tentativas para ensinar

estratégias para resolver problemas não foram bem sucedidas. Schoenfeld (2005) insiste

na mesma ideia.

Cruz (2003) concluiu, através de um estudo com alunos de 12 e de 14 anos, que os mais

velhos não eram melhores na mobilização de recursos, na aplicação de heurísticas e na

verificação/controlo dos seus processos. Por outro lado, os que obtinham melhor

resultado escolar (independentemente da idade) mostravam melhores resultados em

resolução de problemas nas categorias analisadas (Cruz e Carrillo, 2004).

O presente artigo tem como referentes:

- o modelo de competência em resolução de problemas de Schoenfeld (1985; 1992) -

Recursos; Heurísticas; Controlo; Crenças.;

- os resultados de Cruz (2003, 2004) que encontram suporte em linhas de investigação

em resolução de problemas com alunos com bons resultados escolares;

- a conjetura de Kilpatrick (Kilpatrick, 1987, citado por Cai e Hwang, 2003; Goldenberg

e Walter, 2006) sobre a importância da formulação de problemas como ferramenta para

ajudar a resolver problemas e simultaneamente como medida dessa capacidade de os

resolver;

Procedeu-se a um desenho metodológico capaz de identificar/validar estas

características dos alunos, importantes para a resolução de problemas.

Formularam-se então as seguintes perguntas:

Que características possuem os alunos com melhores resultados em resolução de

problemas? Porque são eles melhores? Que contextos educativos podemos proporcionar

para fazer emergir boas características para resolver problemas?

Cruz

PROFMAT — 2015 115

Metodologia

Num grupo de 27 alunos de 14 anos (9º ano), observaram-se os resultados escolares e

aplicou-se o questionário Vila (2001) para deteção de crenças favoráveis (relativas à

matemática e à resolução de problemas). Desse grupo, selecionaram-se 3 alunos,

escolhidos por terem, cumulativamente, bons resultados em matemática e boas crenças

relativamente à matemática e à resolução de problemas.

Aplicaram-se 12 problemas (esta comunicação traz apenas a análise de um deles). Desta

forma, não serão aqui feitas referências a todos os instrumentos utilizados nessa

investigação mais ampla, mas apenas aos pertinentes para compreender a análise do

problema escolhido.

Antes de apresentar aos alunos o problema para resolver, aplicou-se um questionário

Pré-RP e, depois da conclusão da resolução, um questionário Pós-RP. Estes

questionários foram desenhados para obterem informação sobre a compreensão dos

alunos acerca dos problemas e das suas capacidades para os resolverem. Estes

questionários visam favorecer o autoquestionamento ou metacognição, na aceção da

Flavel (1976).

A análise foi feita através do instrumento adaptado de Efklides (2006) para classificar

conhecimento metacognitivo e experiências.

O problema envolvia, além da resolução da questão colocada, a reformulação do

mesmo. Foi pedido aos alunos que criassem outro problema passível de ser resolvido de

forma semelhante. Por outras palavras, pretendia-se um problema com a mesma

estrutura matemática.

Esta análise foi realizada à luz dos instrumentos de Cai e Hwang (2003) – codifica os

problemas em Não extensão, Extensão, Outra - e de Leung (1997) – estrutura do

problema.

O nível de consecução da resolução do problema foi analisado segundo vários

instrumentos, dos quais apenas importa de momento fazer referência a Herr e Johnson

(1994) (modificado) – referente a níveis de consecução das fases de RP, cujos

resultados serão apresentados.

O problema proposto, selecionado entre os itens libertos do PISA, 2003, ao qual foi

acrescentada a alínea c), relativa à sua reformulação, encontra-se no quadro 1.

Cruz

116 PROFMAT — 2015

Quadro 1: Problema para resolver e reformular/Adaptado de Itens Livres PISA 2003.

Análise de resultados

Os alunos portugueses registaram níveis de proficiência bastante baixos na resolução do

problema aquando da aplicação do referido ciclo do PISA. Pretendia-se verificar se os

alunos em estudo registariam melhores resultados e, nessa hipótese, compreender

porque o fizeram. Os resultados do PISA registam 36,6% de codificações máximas para

a questão a) e 4,6% de codificações máximas para a questão b) o que traduz um

resultado bastante baixo.

Os três alunos estudados, aqui designados por Clara, Rafael e Laura, registaram 10

pontos, 9 pontos e 10 pontos, respetivamente, no instrumento (modificado) Herr e

Johnson (1994) que codificava num máximo total de 10 pontos os descritores do

desempenho dos alunos na resolução de problemas. Este instrumento permite ainda

Problema

A figura mostra as pegadas de um homem a andar. O comprimento do passo, P, é a distância

entre a parte de trás de duas pegadas consecutivas.

Para os homens, a fórmula 140P

n estabelece uma relação aproximada entre n e P, em que

n = número de passos por minuto, e

P = comprimento do passo em metros.

a) Se esta fórmula se aplicar ao caminhar do Pedro e ele der 70 passos por minuto, qual é o

comprimento do passo do Pedro?

b) O Bernardo sabe que o comprimento do seu passo é de 0,80 metros. A fórmula aplica-se ao

caminhar do Bernardo. Calcule, em metros por minuto e em quilómetros por hora, a velocidade

a que o Bernardo caminha.

c) Depois de resolver, formule um problema que se resolva do mesmo modo.

Cruz

PROFMAT — 2015 117

verificar, segundo as fases: Compreensão, Escolha da Estratégia, Implementação da

Estratégia, Obtenção da Resposta, Explicação, a prestação dos alunos.

A análise do conteúdo dos questionários pré-RP e pós-RP permitiram verificar aspetos

positivos dos alunos relativamente ao conhecimento que possuem sobre si próprios,

sobre as tarefas, sobre as estratégias a usar, sobre o grau de dificuldade das tarefas

propostas1.

Pedia-se, na alínea c) do problema, a sua reformulação, mantendo a mesma estrutura

“que se resolva do mesmo modo”. Desta análise, referente ao problema em questão,

obtiveram-se os resultados apresentados no quadro 2.

Quadro 2: Classificação dos problemas reformulados pelos alunos.

Aluno Classificação do problema reformulado pelo aluno

Clara Problema de Matemática; Plausível; com dados Suficientes; com Extensão

(Extensão). PMPS-E

Rafael Problema de Matemática; Plausível; com dados Suficientes; com Outra

estrutura. PMPS-O

Laura Problema de Matemática; Plausível; com dados Suficientes; com a mesma

estrutura (Não Extensão). PMPS-NE

Desta análise claramente se observa que os alunos estudados tiveram uma prestação,

enquanto solucionadores de problemas, bastante superior aos seus colegas que

integraram o estudo PISA, conforme esperado. É coerente considerar que os aspetos

relevantes evidenciados por estes três alunos, bem como o contexto que envolveu a

experiência, podem ter sido propiciadores de tais prestações.

1 Esta análise não foi toda ela conseguida a partir do problema aqui apresentado. Lembre-se que se

analisaram 12 problemas de onde os dados aqui avançados são oriundos.

Cruz

118 PROFMAT — 2015

Conclusões

A comunicação baseada no presente artigo, devido à sua curta duração, não permite

apresentar os doze problemas nem tão pouco a análise respetiva. Os dados resultantes da

análise de um só problema não poderiam ser convertidos em conclusões, por escassa

evidência empírica. Assim, as conclusões apresentadas resultam da análise dos 12

problemas apresentados aos alunos. Não obstante, algumas das conclusões

correspondem a dados observados também na análise do problema aqui apresentado.

Verificou-se que os alunos estudados revelaram uma boa capacidade de mobilização de

recursos e de heurísticas e, sobretudo, fizeram-no com um nível de abstração

assinalável.

Estes alunos têm consciência das suas capacidades, conhecimentos e dificuldades e

ainda sobre as tarefas. Evidenciaram ter significativa compreensão da estrutura dos

problemas, uma vez que conseguiram reformular problemas mantendo a estrutura dos

problemas resolvidos na maioria das situações propostas.

Conclui-se sobre a importância do reforço dos aspetos metacognitivos. A aplicação de

questionários do tipo dos usados (Pré-RP e Pós-RP) reforçam o autoquestionamento,

favorecem a metacognição e as decisões sobre conteúdo e estratégias a mobilizar.

Conclui-se ainda sobre a importância de tarefas onde seja pedida a

reformulação/formulação de problemas. Esta atividade força os alunos a compreender a

estrutura matemática dos problemas e a desenvolverem pensamento mais abstrato e de

carácter mais genérico, transponível a situações similares.

O reforço dos aspetos metacognitivos e a proposta de reformulação/formulação de

problemas parecem, assim, ser dois aspetos a incluir com maior frequência nas aulas

com vista a fazer emergir nos alunos melhores capacidades de resolver problemas.

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PROFMAT — 2015 119

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PROFMAT — 2015 120

O FORMAL DA MATEMÁTICA E O INTUITIVO DA TECNOLOGIA: QUE

ARTICULAÇÃO?1

Helena Rocha

Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Nova de Lisboa

[email protected]

Resumo

A tecnologia é cada vez mais indispensável no dia-a-dia, rodeando-nos constantemente.

Para os nossos alunos é uma realidade que conhecem desde sempre e que tendem a

encarar com uma naturalidade descontraída e intuitiva. A facilidade de acesso à

tecnologia e o modo como esta tende a enfatizar o intuitivo e a relegar para segundo

plano o formal e a demonstração matemática são o foco deste artigo. Partindo da análise

de uma proposta de trabalho onde alunos de 10.º ano começam por uma abordagem

intuitiva apoiada na calculadora gráfica e terminam a realizar uma demonstração da

conjectura que formularam, procuro discutir a problemática. As conclusões alcançadas

sugerem que é possível colocar aos alunos situações onde estes se podem aperceber da

vantagem de recorrer tanto a abordagens mais formais como a abordagens mais

intuitivas e isto mesmo quando a tecnologia é uma realidade em sala de aula. Sugere

ainda que a realização de demonstrações pode, entre outros aspectos já identificados na

literatura, dar um contributo importante para a compreensão de aspectos basilares da

Matemática.

Palavras chave: cálculo algébrico, demonstração, tecnologia

Introdução

A tecnologia é cada vez mais indispensável no dia-a-dia, rodeando-nos constantemente.

Para os nossos alunos é uma realidade que conhecem desde sempre e que tendem a

encarar com uma naturalidade descontraída e intuitiva. Movimentam-se livremente

entre conteúdos e aplicações, de dedo colado ao ecrã. Sem receios, experimentam e

testam limites, arriscando avançar por novos mundos. Se o professor lhes proporciona

um meio propício, aventuram-se na exploração do universo matemático,

experimentando, formulando conjecturas e construindo ideias matemáticas. Um

1 Trabalho desenvolvido no âmbito do projecto A noção da demonstração matemática (PTDC/MHC-

FIL/5363/2012) financiado pela FCT/MEC.

Rocha Rocha

PROFMAT — 2015 121

ambiente de aprendizagem ao seu dispor, onde programas de geometria dinâmica

facilmente permitem descobrir relações geométricas e experimentar muitos casos,

deixando-os convictos de mais uma relação matemática; ou onde as calculadoras

gráficas lhes permitem observar com toda a rapidez e conforto o gráfico de imensas

funções e inferir uma qualquer propriedade que estas partilham. Este é um cenário onde

a aprendizagem apela à compreensão das relações envolvidas, mas onde o intuitivo é

um elemento preponderante. E a questão acaba por surgir inevitavelmente. Como

conseguir depois enquadrar nesta abordagem o formalismo da Matemática e a

importância da demonstração? Como conseguir que os nossos alunos sintam que o

cálculo matemático, podendo não ser tão intuitivo e rápido como a tecnologia que eles

bem conhecem, também tem uma importância incontornável?

Neste artigo vou procurar abordar estas questões partindo de uma situação concreta que

envolve em simultâneo as duas abordagens. Trata-se de uma situação que ocorreu com

uma turma do 10.º ano de escolaridade no âmbito do estudo de funções. A tecnologia

envolvida, e que os alunos já estavam habituados a usar livremente, era a calculadora

gráfica.

A professora e a tarefa

Entre as várias tarefas que propôs aos seus alunos ao longo do estudo das funções,

Teresa, a professora da turma, escolheu esta (ver anexo), centrada numa investigação

em torno do eixo da parábola. Trata-se de uma proposta de trabalho onde pretende que

os alunos comecem por explorar uma situação matemática para formular uma

conjectura relativamente à relação existente. Depois é pedido aos alunos que

demonstrem a veracidade da sua conjectura. A tarefa termina com uns desafios que

pretendem levar o trabalho dos alunos um pouco mais além.

Nesta secção apresento sucintamente a forma como decorreu a realização desta tarefa e

os elementos centrais que conduziram às opções assumidas pela professora. Para tal,

baseio-me nos dados provenientes da gravação da aula e das notas de campo que

elaborei, mas também nas duas entrevistas que realizei à professora e que decorreram

antes e depois da aula.

Rocha

122 PROFMAT — 2015

Teresa começa a aula apresentando a tarefa aos alunos e dando algumas indicações

relativamente à forma como esta vai ser realizada. Informa, nomeadamente, que esta vai

ser realizada a pares, destacando bastante este aspecto do trabalho, valorizando a

importância dos contributos que cada aluno pode trazer ao trabalho conjunto.

Acrescenta que no final da aula recolherá os registos efectuados por um elemento de

cada par, que levará para ver em casa.

Após este momento inicial, dá atenção ao funcionamento da calculadora, dando

algumas indicações sobre o seu funcionamento, que considera que os alunos vão

necessitar no decorrer da tarefa. Conclui este momento inicial referindo as expectativas

que tem para a aula e fazendo alguns comentários mais concretos relativamente a cada

uma das questões da tarefa. Refere assim as questões que considera fáceis, as que

entende poderem ser consideradas mais difíceis e o ponto até onde pretende que todos

façam:

Prof- O objectivo de cada par é fazer tudo até ao ponto 6. Até ao ponto 5

eu acho que é fácil. Devem fazer bem, o mais depressa que conseguirem.

O 6 já não será tão fácil, (…) nesta ficha no ponto 6 pretende-se que se

prove. Eu penso que a prova não é muito difícil e portanto tenho alguma

esperança que muitos consigam fazer a demonstração. O “indo mais

longe”, que vem nos pontos 7 e 8, também tenho esperança que dois ou

três pares ainda consigam fazer. O ponto 7 e o 8 se algum conseguir é

óptimo porque eu não tenho esperança que façam, que tenham tempo

aqui na aula, mas tenho esperança que depois façam em casa. Portanto, o

objectivo é todos fazerem até ao 6, incluindo a demonstração, alguns

fazerem o 7 e quem sabe… (aula)

Termina este primeiro momento de abordagem à tarefa em grande grupo, focando a

demonstração e a respectiva importância em Matemática:

Prof- O 6 (…) é uma demonstração e eu gostava de falar um bocadinho

sobre isto. (…) Em Matemática nós muitas vezes experimentamos. Já

fizemos isso aqui com as funções. Estudámos famílias de funções e

depois, das duas uma, ou o professor dá alguma informação a dizer isso é

mesmo verdade em todos os casos e vocês acreditam, também consultam

o livro etc., e às vezes provamos. Fazemos aquilo que os matemáticos

fazem sempre. Em Matemática a prova, a demonstração, é a essência da

disciplina, portanto não podemos esquecê-la. (aula)

A partir deste momento, toda a aula decorre centrada no trabalho dos alunos, com a

professora a circular entre os grupos e a corresponder às suas solicitações.

Quando os alunos começam a formular as primeiras conjecturas, a professora apercebe-

se do reduzido número de exemplos que estes estão a ter em conta para as formular e

Rocha Rocha

PROFMAT — 2015 123

sente necessidade de lhes chamar a atenção para isso. No entanto, os alunos não

parecem muito sensíveis aos comentários que faz e só a dúvida que Teresa coloca sobre

a veracidade da conjectura que formularam parece ser suficiente para que estes decidam

analisar mais alguns casos:

Prof- Estão a formular uma conjectura apenas com base em dois

exemplos?

Aluno- Oh stora, mas nós já vimos.

Prof- E então o que é que repararam?

Aluno- Que corresponde à multiplicação, só que tem que ser menos este

vezes este. (…) Tem que ser menos, depois abre parênteses, -5 vezes 3.

Prof- Ok, óptimo. É a vossa conjectura.

Aluno- (…) Mas assim dá -15. Está mal. Por isso é que eles dizem a

seguir se os pontos estiverem do mesmo lado do eixo. Não é stora?

Prof- Não sei. (…) Só experimentaram com dois exemplos, estão a tirar

as conclusões apenas com dois… podem fazer mais, se estão com

dúvidas. Depois confirmam se isso que estão a fazer está certo ou não.

Aluno- É quantos pares, stora?

Prof- Numa investigação não há limite. Fazem alguns, quando

conseguirem tirar a conclusão… dois é bem pouco para fazer. Acho eu,

não é? (aula)

Contudo este não é um comportamento generalizado na turma. Alguns pares de alunos

parecem assumir que, pelo contrário, quantos mais exemplos analisarem melhor. Ainda

assim, parecem sentir algum desconforto por não lhes ser indicada uma quantidade, pelo

que procuram alguma orientação junto da professora:

Aluna- Eram quantos [exemplos] stora?

Prof- É os que quiserem.

Aluna- Os que quisermos. Quantos mais melhor… (aula)

Mas em alguns casos, independentemente do número de exemplos considerado, a

conjectura parece ser formulada de uma forma algo irreflectida, levando Teresa a

questionar os alunos de modo a que estes sintam a necessidade de ponderar melhor a

conclusão a que chegaram:

Aluno- Já concluí uma coisa. A ordenada na origem é sempre o x1x2 e

depois o declive do segmento é a diferença entre um e outro.

Prof- x1x2? Então quando é que é 3(-5)?

Aluno- Não.

Prof- Diz lá, quanto é que é?

Rocha

124 PROFMAT — 2015

Aluno- -15.

Prof- Dá -15 e ali está?

Aluno- 15.

Prof- 3(-4)?

Aluno- Dá -12. Então… pronto, é o inverso.

Prof- O inverso?

Aluno- Sim.

Prof- É o inverso?

Aluno- Sim. É o módulo?... Pode ser menos. A ordenada na origem é

menos ou…

Prof- Então vamos lá… mas escrevam as conclusões. (aula)

Tal como previsto por Teresa, o trabalho nesta aula terminou com a demonstração, pois

nenhum par de alunos conseguiu ir para além desta etapa no tempo disponível. Esta foi

uma fase do trabalho em que surgiram dificuldades, algo que aliás a professora já

antecipava, e onde optou por ir apoiando individualmente os pares de alunos à medida

que os problemas surgiam:

Prof- A prova, mesmo no caso mais simples, ainda não é simples para

estes miúdos do 10.º ano. Tenho que ir dando umas dicas no lugar e tal e

há-de haver uns que fazem e há-de haver outros que demoram muito

tempo. (pré-aula)

Associada à concretização da demonstração surgiram, contudo, outras questões. A

primeira delas incidiu sobre o significado atribuído pelos alunos ao termo conjectura,

com vários alunos a questionarem o seu significado, mesmo depois de já terem

elaborado a sua conjectura:

Aluna 1- Oh stora o que é fazer a conjectura?

Prof- A conjectura é exactamente isso. É o que eu penso que será

verdade. Depois a seguir tenho que provar. Penso que é verdade. Com a

Geometria fizemos isso. Com isto que temos é verdade (refere-se aos

exemplos considerados pelas alunas) e isso permite-me conjecturar,

permite-me pensar que será sempre assim. Só quando demonstrar é que

tenho a certeza se é mesmo sempre assim ou não.

(…)

Prof- O que é a conjectura? O que é que vocês querem conjecturar?

Aluna 2- Oh stora pois, o que é que é suposto dizermos com conjectura?

(aula)

Mas entender o significado do termo demonstração revelou-se ainda mais complexo.

Com efeito, vários alunos mantiveram-se focados nos exemplos concretos que

Rocha Rocha

PROFMAT — 2015 125

analisaram, parecendo bastante convictos relativamente à forma como estes lhes

permitiam garantir a veracidade do que afirmavam:

Aluna- E aqui no 6, se nós já mostrámos aqui os cálculos (aponta os

exemplos registados mais acima)… Posso dizer que isto prova a validade

da nossa conjectura.

Prof- Prova?

Aluna- Não? (aula 2)

Aquilo que muitos alunos fizeram foi executar analiticamente os cálculos para o declive

e a ordenada na origem dos casos que tinham considerado graficamente, parecendo

pensar que fazendo esses cálculos analiticamente, em vez de utilizar os valores dados

pela calculadora, lhes permitia alcançar um outro nível de segurança, que lhes garantia a

veracidade da sua conjectura e consequentemente corresponderia a uma demonstração:

Aluna- Não estamos a perceber a 6.

Prof- A 6 é a demonstração.

Aluna- Fazemos as contas? Metemos assim as contas.

Prof- Claro. Mas puseram para estes três casos. Agora uma demonstração

(interrompem)

Aluna- Ah! Temos que fazer mais!

Prof- Uma demonstração, é assim, só está demonstrado se eu tiver

demonstrado para quantos casos?

Aluna- Para muitos.

Prof- Quantos? Quantos?

Aluna- Infinitos.

Prof- Infinitos. (interrompe para ralhar com a turma e depois dá uma

ajuda às alunas indicando a forma genérica dos pontos)

Aluna- É complicado, stora.

Prof- É complicado… mas a gente não desiste do complicado assim à

primeira vista. (…) A demonstração tem que ser analítica que aí na

calculadora não podem… Podem experimentar muitos, mas não podem

experimentar infinitos. (aula)

Teresa entende no entanto que esta é uma abordagem que de algum modo seria de

esperar dos alunos, uma vez que vem na sequência do que têm vindo a fazer nas aulas.

Como ela própria explica na conversa que tivemos depois da aula:

Prof- Eu vi não sei quantos, agora vou ver as fichas, mas pronto, houve

alguns que na demonstração o que é que eles fizeram? Foram fazer

analiticamente, tratar analiticamente os exemplos. (…) Eh pá, e isto

corresponde no fundo àquilo que nós temos feito noutras situações. Não

Rocha

126 PROFMAT — 2015

lhe chamamos demonstração, evidentemente, mas corresponde a um

trabalho que eles têm feito. Eu tenho tido a preocupação de trabalharmos

na calculadora e trabalharmos analiticamente e portanto eu acho que eles

fizeram uma transposição dessas situações que temos feito, aqui para

isto. (pós-aula)

Depois de tentar levar os alunos a perceberem que para que fique provado é necessário

que todos os casos sejam considerados e não apenas alguns, Teresa opta por ir ajudando

os alunos a considerar pontos genéricos que lhes permitam efectivamente demonstrar o

pretendido:

Prof- Portanto no 6 o que eu estou a perguntar é assim: para estes pontos

isto é verdade, então agora seguindo este raciocínio, se o ponto não for

este… Tu tens dois pontos, então e se for um ponto 1, por exemplo, de

coordenadas (x1, y1) e um ponto 2 de coordenadas (x2, y2). Agora este

y1 e este y2 não são quaisquer. Porquê? Estes pontos também pertencem

à parábola. E portanto qual é, quanto é que vale o y1? Quanto é que vale

o y2? (ajuda o aluno a chegar à resposta) Então este ponto é (x1, x12) e

este (x2, x22). (…) Será que agora consegues demonstrar? Ora

demonstrar, tu tens que ir usar o que tu sabes. Tu sabes calcular o declive

de uma recta a partir dos pontos, certo? Então vamos tentar fazer.

Aluno- Mas aqui, nós aqui em cima já tínhamos mostrado isso.

Prof- Mostraram, mas isso é só para essa. Se tu mostrares para este caso,

se fizeres exactamente o mesmo raciocínio, só que os cálculos são um

bocadinho mais complexos, tens que fazer com calma, o mesmo

raciocínio mas para um ponto que é qualquer, não mostraste para um,

mostraste para quantos pontos?

Aluno- Para infinitos. (…)

Prof- Então se tu conseguires fazer exactamente o mesmo raciocínio mas

para este caso… (aula)

A noção de que para se demonstrar é necessário considerar todos os casos possíveis e

não apenas alguns é algo que entende necessitar de ir sendo trabalhado ao longo do

tempo e a que deseja dar uma atenção cuidada na aula em que pretende proporcionar

aos alunos um momento de discussão e reflexão em torno do trabalho realizado nesta

tarefa:

Prof- Eu já esperava que eles tivessem dificuldades na demonstração.

(…) Pronto, a ideia é exactamente ir fazendo esta discussão com eles…

que depois eu, como lhes dei até 4ª feira, portanto provavelmente vai ser

na aula de 4ª feira, devolvo as fichas e ao devolver depois fazemos um

bocadinho a discussão outra vez da diferença entre experimentar num,

dois, três casos. (…) E vou discutir com eles principalmente esta questão:

o que é que significa demonstrar. O facto de terem que incluir os

exemplos que já fizeram, mas terem que provar para todos os casos e,

neste caso, eram infinitos. (pós-aula)

Rocha Rocha

PROFMAT — 2015 127

Neste sentido, expressa mesmo a sua intenção de não encerrar a questão já. Discutindo

com os alunos a demonstração no caso mais simples e deixando os desafios em aberto,

para serem apresentados mais tarde à turma por algum dos alunos que entretanto o

consiga resolver e numa altura em que o cálculo necessário à demonstração esteja a ser

alvo de atenção nas aulas:

Prof- Vou fazer a demonstração neste caso, só para o f(x)=x2, e depois

estas do “indo mais longe” ainda vou continuar a deixá-las como

desafios. Quando eles conseguirem podem-me entregar. (…) Isto exige

algum cálculo que eles ainda nunca trabalharam porque no básico não se

trabalha o cálculo até este nível. À medida que formos agora estudando

os polinómios… É também para os sensibilizar que o cálculo é preciso,

em vez de ser só depois nos polinómios o cálculo pelo cálculo. Portanto,

mais à frente, daqui a uns tempos, depois de alguns fazerem, até vou

pedir a um para fazer a apresentação à turma, logo se vê, quando

estivermos a trabalhar o cálculo nos polinómios. (pós-aula)

A articulação entre o gráfico e o analítico é outro aspecto a que Teresa afirma dar

atenção e que aborda nos desafios que deixa aos alunos no final desta tarefa e que

pretende explorar noutra aula. Com efeito, estas últimas questões vêm precisamente

colocar o foco sobre a opção entre a abordagem gráfica e a abordagem analítica. A

professora considera que os alunos têm geralmente uma preferência pelo gráfico em

detrimento do analítico, achando que este último é apenas cálculo sem grande utilidade.

Neste caso, contudo, o analítico vem oferecer a abordagem mais simples e rápida à

questão, embora não necessariamente fácil. Algo que Teresa considera muito importante

abordar com os alunos e que entende que os desafios finais desta tarefa vêem mostrar

aos alunos de uma forma muito evidente:

Inv- No “ir mais longe” a parábola passa a ser outra. Achas que é fácil

experimentando com a calculadora descobrir a relação?

Prof- Não, acho que não.

Inv- É que eu não consegui. Eu encontrei-a, mas encontrei-a

analiticamente. Também é verdade que me fartei e que resolvi que fazia

analiticamente.

Prof- Exactamente. Mas a intenção também é um bocadinho essa. É para

perceberem que há coisas em que não é preciso irem ao cálculo, mas há

outras em que o cálculo tem alguma utilidade. E este cálculo ainda é

difícil para eles, não é? Mas eu prefiro ir trabalhando assim o cálculo,

que é para eles perceberem que tem alguma vantagem fazer algum

cálculo… (pré-aula)

Rocha

128 PROFMAT — 2015

Discussão dos resultados no âmbito da literatura existente

Para Mejía-Ramos (2005), a procura por uma mais profunda compreensão é o que

verdadeiramente move os matemáticos e também o que os leva a rejeitar as “alegadas”

demonstrações realizadas por via computacional. Por seu turno Boavida (2001) refere-

se ao papel da demonstração como um meio e não um fim, englobando

simultaneamente a validação e a compreensão. Mas existem outros papéis que também

são atribuídos à demonstração. A autora refere-se ainda à demonstração como um

processo de descoberta. Segundo esta, existem numerosos exemplos, na história da

Matemática, de novos resultados que foram descobertos ou inventados por processos

puramente dedutivos; de facto, é completamente improvável que alguns resultados

(como, por exemplo, as geometrias não euclidianas) pudessem alguma vez ter sido

encontrados por mera intuição. Aborda também o papel da demonstração como

processo de sistematização, considerando que esta revela as subjacentes relações lógicas

entre afirmações de um modo que a intuição pura não seriam capazes de realizar. Por

seu turno Davis e Hersh (1983) encaram a demonstração como um desafio intelectual,

considerando que esta cumpre uma função gratificante e de realização própria. A

demonstração é portanto um campo de teste para a energia intelectual e engenho

matemático.

DeVilliers (2012) considera que, tradicionalmente, a justificação ou o convencimento

sobre a validade de uma conjectura são encaradas como a principal função da

demonstração, sendo que Knuth (2002) considera que este é mesmo o único papel que a

maioria dos professores lhe reconhece. Nas últimas décadas esta visão estreita do papel

da demonstração tem vindo a ser criticado por autores como Reid (2011), que entende

que esta tem assumido igualmente outros papéis importantes para os matemáticos e que

pode também assumir um papel de grande valor didáctico em sala de aula.

A perspectiva assumida pela professora cuja prática profissional se esboça neste artigo

parece ser, contudo, um pouco diferente daquelas que dominam a literatura. Estando

naturalmente presente um papel de validação da conjectura previamente formulada, a

demonstração parece ser encarada por esta professora pelo papel que esta assume ao

nível da compreensão da natureza da Matemática.

Rocha Rocha

PROFMAT — 2015 129

A dificuldade em conseguir que os alunos compreendam a necessidade e a importância

da demonstração em Matemática é, segundo deVilliers (1999), bem conhecida de todos

os professores do ensino secundário. Esta dificuldade acentua-se quando a tecnologia

está envolvida pois, segundo Hsieh et al. (2012), o carácter dinâmico usualmente

oferecido por esta permite a realização de trabalho de natureza experimental, que

potencia a descoberta de propriedades e a formulação de conjecturas. Os alunos passam

a poder com toda a facilidade experimentar e analisar vários casos, reflectindo em torno

de importantes ideias matemáticas e, consequentemente, alcançando um maior nível de

compreensão (Goos & Bennison, 2008). Adquirem assim a possibilidade de formular as

suas próprias perguntas e de prosseguir formulando hipóteses e testando-as, procurando

enquadrar os resultados na teoria que estão a tentar formular (Grant & Searl, 1996).

A forma como a análise de diversos casos se torna possível, acaba por originar nos

alunos um sentimento de confiança relativamente à veracidade das conclusões que

estabelecem com o apoio da tecnologia, que frequentemente é potenciada pela forma

como os alunos se habituaram a ver a Matemática validada de forma externa, seja pelo

professor, pelo manual ou até pelos pais (Tall et al., 2012). A necessidade de demonstrar

a conjectura formulada pode assim não ser sentida. Mas se inferir uma conclusão a

partir da reflexão em torno de alguns casos particulares é uma actividade importante,

esta é sem dúvida distinta da demonstração (Cabassut et al., 2012). Enfatizar junto dos

alunos a necessidade e a importância da demonstração é assim algo importante.

A tecnologia e, concretamente, a calculadora gráfica são amplamente utilizadas pela

professora participante neste estudo. Os alunos são confrontados com tarefas em que

lhes é pedido que explorem relações e formulem conjecturas e, por vezes, são também

confrontados com momentos em que lhes é pedida uma demonstração.

A preocupação relativamente ao uso da tecnologia e à convicção da professora de que

os alunos acabam por ter uma preferência pelas abordagens gráficas em detrimento das

analíticas, conduz também a uma cuidada selecção de tarefas. É assim possível

identificar uma reflexão por parte da professora que deliberadamente opta por colocar

aos alunos um desafio onde a abordagem gráfica acaba por não ser a mais eficiente.

Consegue assim confrontar os alunos com situações onde o cálculo e um trabalho

matemático mais formal surgem não só como úteis, mas também como a abordagem

mais eficiente.

Rocha

130 PROFMAT — 2015

Conclusão

Este estudo sugere que é possível colocar aos alunos situações onde estes se possam

aperceber da vantagem de recorrer tanto a abordagens mais formais como a abordagens

mais intuitivas e isto mesmo quando a tecnologia é uma realidade em sala de aula.

Sugere ainda que a realização de demonstrações pode, entre outros aspectos já

identificados na literatura, dar um contributo importante para a compreensão de

aspectos basilares da Matemática.

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PROFMAT — 2015 131

REALIZAÇÃO E REVISÃO DE MINITESTES PARA APROFUNDAR A

APRENDIZAGEM DE ÁLGEBRA LINEAR NO ENSINO SUPERIOR

Paula Maria Barros, José António Fernandes, Cláudia Mendes Araújo

ESTiG – Instituto Politécnico de Bragança,

CIEd – Universidade do Minho, Centro de Matemática – Universidade do Minho

[email protected], [email protected], [email protected]

Resumo

A álgebra linear constitui uma fonte de dificuldades para muitos alunos do ensino

superior, como corroboram estudos realizados a nível nacional e internacional. Face a

esta realidade, é importante que se investiguem e implementem metodologias de ensino

que conduzam a alterações significativas na aprendizagem dos alunos. Enquanto

resposta a esta preocupação realizou-se uma experiência de ensino com uma turma de

alunos de engenharia do ensino superior politécnico que frequentavam a unidade

curricular Álgebra Linear e Geometria Analítica, com o intuito de averiguar o impacto

de um ensino centrado na exploração dos erros e dificuldades sobre a aprendizagem dos

alunos em álgebra linear. No âmbito da experiência de ensino, perspetivando a

avaliação como uma componente não dissociada do processo educativo, implementou-

se uma metodologia de avaliação, que contribuísse igualmente para a superação de erros

e dificuldades. Esta metodologia de avaliação assumiu a forma de realização (numa

primeira fase) e revisão (numa segunda fase) de minitestes. Na segunda fase, o aluno,

para além de ser confrontado com as respostas antes dadas, também tinha acesso aos

comentários efetuados pela professora, de modo a proporcionar-lhe uma nova

oportunidade para voltar a refletir sobre a correção e adequação dos processos usados

para responder às questões colocadas, criando-se, assim, um novo momento de

aprendizagem.

Nesta comunicação pretende-se descrever a experiência de avaliação realizada e retratar

as opiniões dos alunos sobre o processo.

Palavras-chave: Ensino superior, avaliação, dificuldades, álgebra linear.

Introdução

A álgebra linear está subjacente a quase todos os domínios da matemática e até mesmo

de outras áreas, como as ciências da computação, a engenharia e a física. No entanto,

apesar desta relevância, “o ensino da álgebra a um nível universitário é quase

universalmente considerado como uma experiência frustrante para professores e

estudantes” (Hillel, 2000, p.1 1), sendo uma fonte de dificuldades para muitos alunos

do ensino superior como corroboram investigações a nível nacional (Barros, Fernandes

e Araújo, 2012; Barros, Araújo e Fernandes, 2013) e internacional (Celestino, 2000;

Coimbra, 2008; Dorier, 2000). Face a este cenário, é natural que os professores

Barros, Fernandes & Araújo

132 PROFMAT — 2015

envolvidos no ensino da álgebra linear sintam a preocupação de perceber as razões do

fracasso de muitos estudantes e de como melhorar o seu desempenho, pois, como

referem Ramos et al. (2013), “para além do professor do ensino superior dever

continuar a preocupar-se com o domínio científico dos conteúdos a trabalhar com os

seus estudantes, também deve passar a dar atenção ao que se passa ao nível do ambiente

de aprendizagem relativo às unidades curriculares que ministra” (p. 117).

Neste contexto, inserido num estudo mais alargado, realizou-se uma experiência de

ensino com alunos do ensino superior em que um dos objetivos era averiguar qual o

impacto de um ensino centrado na exploração dos erros e dificuldades na aprendizagem

dos estudantes em álgebra linear. Como “a avaliação não constitui uma componente

isolada e dissociada de todo o processo educativo, mas acima de tudo ela é uma parte

inseparável de um complexo sistema onde o fim último do ato educativo é a

aprendizagem” (Santos, 2008, p. 12), procurou-se que alguns dos métodos de avaliação

implementados visassem a superação de erros e dificuldades, assumindo assim uma

vertente formativa. Para tal, considerou-se a resolução de minitestes pelos alunos em

duas fases: na primeira fase os alunos resolviam os minitestes e na segunda fase reviam

os minitestes a partir do confronto com as respostas antes dadas e dos comentários

efetuados pela professora. Pretendia-se, assim, nesta segunda fase, proporcionar aos

alunos uma oportunidade para refletir sobre a correção e adequação dos processos

usados para responder às questões colocadas, criando-se deste modo um novo momento

de aprendizagem. Desta forma, de acordo com Abrantes e Leal (2005), encaravam-se as

tarefas de avaliação como fonte de aprendizagem.

Os participantes na experiência e o contexto do estudo

A experiência de ensino foi realizada numa turma de 28 alunos, do curso de Engenharia

Química e Biológica do ensino superior politécnico, que frequentavam a unidade

curricular Álgebra Linear e Geometria Analítica. As aulas desta unidade curricular são

lecionadas no 1º ano, 1º semestre, em dois tempos semanais, cada um com a duração de

duas horas, e compreendem os temas: Números complexos; Matrizes e determinantes;

Sistemas de equações lineares; Geometria analítica; Espaços vetoriais, Aplicações

lineares e Valores e vetores próprios. Porém, destes temas, na experiência de ensino

Barros, Fernandes & Araújo

PROFMAT — 2015 133

realizada apenas foram objeto de estudo os temas Matrizes e determinantes e Sistemas

de equações lineares.

Os 28 alunos eram maioritariamente do sexo feminino (78,6%) e tinham idades

compreendidas entre os 18 e os 25 anos, 27 eram estudantes ordinários e apenas um

trabalhador-estudante. Todos tinham entrado no ensino superior através de concursos

especiais, sendo titulares de um diploma de especialização tecnológica (CET de nível

5). Mais de metade da turma (64,3%) não estava a frequentar a unidade curricular pela

primeira vez, tendo os restantes alunos (35,7%) ingressado no ensino superior no ano

letivo em que se realizou a experiência de ensino.

Para fazer a avaliação da experiência de ensino, do ponto de vista dos estudantes,

recorreu-se a um questionário, que avaliava também outros aspetos da experiência para

além dos referidos neste texto, e realizaram-se entrevistas a cada um dos alunos

(designados no texto por Ai, com 1i 28) para aprofundar e esclarecer algumas das

opiniões dadas. O questionário foi aplicado na última aula do 1º semestre e as

entrevistas foram realizadas no 2º semestre, em horário previamente acordado com os

alunos, após estes já conhecerem a classificação final que tinham obtido à unidade

curricular.

O processo de revisão dos minitestes

Os dois minitestes foram realizados no fim de cada um dos temas, em data previamente

combinada com os alunos. As perguntas eram de resposta fechada e os alunos podiam

usar como apoio o software Microsoft Mathematics, assim como um formulário,

previamente fornecido.

A revisão dos minitestes foi igualmente realizada em ambiente de sala de aula, numa

aula extra, também em horário previamente acordado com os alunos. Antes da revisão

dos minitestes os alunos tiveram acesso ao enunciado e no próprio dia da revisão foi-

lhes fornecida a resolução que tinham feito antes, com notas da professora que

indicavam se a questão estava correta ou não. Caso houvesse erros na resposta,

assinalou-se o passo onde havia incorreções e convidava-se o aluno a identificar o erro e

a procurar corrigi-lo. Disponibilizada esta informação, pretendia-se também que os

alunos respondessem a essas notas da professora.

Barros, Fernandes & Araújo

134 PROFMAT — 2015

Exemplificando, numa questão em que se pretendia que os alunos indicassem,

justificando, se a afirmação “Se A for uma matriz singular, o sistema de equações

lineares bAx é possível e indeterminado” era verdadeira ou falsa, o aluno A13 na

primeira fase (realização do miniteste) respondeu que a afirmação era verdadeira,

indicando um exemplo que a verificava (Figura 1).

Figura 1: Resposta do aluno A13 na primeira fase.

Verifica-se que o aluno A13 não teve presente que poderia haver exemplos de sistemas

para os quais a afirmação não fosse válida. Assim, face à resposta, a professora colocou

as seguintes questões: “Será o exemplo mais adequado para justificar? Um exemplo

prova que a afirmação é verdadeira? O que é que acontece em outras situações?”.

Na segunda fase, o aluno A13 tenta justificar porque é que a sua resposta não é

adequada e reformula-a apresentando como exemplo um sistema que não verifica a

afirmação, concluindo assim que ela é falsa (Figura 2).

Figura 2: Resposta do aluno A13 na segunda fase.

Barros, Fernandes & Araújo

PROFMAT — 2015 135

Numa outra questão, em que dadas as matrizes A e B se pretendia resolver a equação

BXAA 1 , sabendo que X é uma matriz de ordem adequada, na primeira fase, o

aluno A14 responde sem ter em atenção a não comutatividade da operação de

multiplicação de matrizes (Figura 3).

Figura 3: Resposta do aluno A14 na primeira fase.

Aquando da revisão, face às questões colocadas pela professora: “Porque é que este

raciocínio não é válido? O que é que está incorreto?”, o aluno A14 foca-se na não

comutatividade da multiplicação de matrizes e resolve novamente a equação, agora de

forma correta.

Figura 4: Resposta do aluno A14 na segunda fase.

A classificação final de cada miniteste resultou da soma das classificações obtidas nas

duas fases do processo. Aquando da revisão, os alunos tiveram acesso à classificação

obtida na primeira fase (realização do miniteste), atribuída tendo em conta os critérios

Barros, Fernandes & Araújo

136 PROFMAT — 2015

definidos. A avaliação quantitativa da segunda parte do processo (revisão dos

minitestes) seguia as seguintes regras: nas questões em que cometeram erros os alunos

podiam obter até metade da pontuação perdida se corrigissem os erros e respondessem

às notas registadas pela professora, quando tal se justificasse; por cada questão que os

alunos não tinham respondido poderiam recuperar um quarto da pontuação da pergunta

se a resolvessem corretamente. Neste último caso pretendia-se motivar os alunos que

não tinham tido um desempenho favorável a resolver igualmente as questões. Na

revisão os alunos podiam consultar todo o material que quisessem, assim como trocar

impressões com os colegas.

Opinião dos alunos sobre o processo de revisão

Tendo em atenção a opinião dos estudantes sobre a revisão dos minitestes (Tabela 1),

constata-se que este processo trouxe vantagens para a sua aprendizagem. Em geral,

quase todos os alunos concordam ou concordam totalmente com as seis afirmações

consideradas para a avaliação do processo de revisão dos minitestes.

Tabela 1 Opinião dos estudantes sobre a revisão dos minitestes

% de estudantes

DT D C CT NR

O confronto com os meus próprios erros contribuiu para

que tomasse consciência das minhas dificuldades. 3,6 64,3 28,5 3,6

Saber que podia recuperar uma parte da pontuação perdida

foi um incentivo para que estudasse um pouco mais. 50,0 46,4 3,6

Explicar qual a causa dos meus erros contribuiu para que

tomasse consciência de quais os procedimentos/

propriedades que não são válidos. 10,7 60,7 25,0 3,6

Este processo tornou-me mais autónomo na resolução das

tarefas. 7,1 75,0 14,3 3,6

Este processo estimulou-me a refletir sobre o meu

raciocínio. 3,6 75,0 17,8 3,6

As questões/sugestões da professora ajudaram-me a refletir

sobre o trabalho realizado. 3,6 67,8 25,0 3,6

DT Discordo totalmente; D Discordo; C Concordo; CT Concordo totalmente; NR Não

responde.

Tendo em conta a percentagem de alunos que concordam ou concordam totalmente com

as afirmações, contata-se que para todos eles (96,4%) recuperar uma parte da pontuação

perdida foi um incentivo para que estudassem um pouco mais. Seguidamente

Barros, Fernandes & Araújo

PROFMAT — 2015 137

reconheceram o contributo do confronto com os erros para a tomada de consciência das

dificuldades (92,8%), que o processo de revisão os estimulou a refletirem sobre o

raciocínio (92,8%) e que as questões/sugestões da professora os ajudaram a refletir

sobre o trabalho realizado (92,8%). Por último, numa percentagem um pouco inferior,

constata-se que o processo de revisão os tornou mais autónomos na resolução das

tarefas (89,3%) e que explicar a causa dos erros contribuiu para a tomada de consciência

dos procedimentos/propriedades não válidos (85,7%).

Nas entrevistas os alunos dão igualmente ênfase às vantagens da revisão dos minitestes,

focando a recuperação da pontuação, a motivação para o estudo e a apropriação dos

procedimentos corretos de resolução: “O que é bom é que uma pessoa chega lá, tem

errado aqui e vai corrigir, não é. E se calhar, ao resolver novamente, já tem outra noção

e já não faz o mesmo erro se aparecer outro igual” (A27); Uma pessoa fazia o exame e

se calhar nem corria assim tão bem. Mas ia para casa, fazia os exercícios ou depois

acabava por os resolver lá na aula. Fazia um esforço para resolver bem, para ter mais

aqueles pontinhos extra. É uma motivação” (A12); “Eu gostava mesmo quando a

professora entregava os minitestes, ‘Vamos resolver’. Eu aí expunha mais as minhas

dúvidas, percebia onde errava e tinha mais disposição para voltar atrás para estudar e

para fazer, puxa mais por mim na resolução das reformulações” (A2); “Vantajoso é.

Para além de nos poder melhorar a nota, também vemos onde é que erramos e pronto

arranjamos outro método, outra forma de resolução” (A1).

Tendo em atenção os dois minitestes que se reportam aos temas em análise, nas

entrevistas apenas 10 alunos afirmaram tê-los resolvido em casa antes da respetiva

revisão, alguns deles em conjunto com outros colegas da turma. Desta forma, 11 alunos

não os resolveram e 6 resolveram apenas o segundo.

Quando questionados sobre a razão do seu procedimento, os que resolveram

argumentam: “Costumávamos [em conjunto com mais dois colegas] resolver um dia

antes de fazer a reformulação. Nós gostávamos porque era sempre a questão de ir buscar

mais uns pontos e tornávamos a ver as coisas. De certa forma ficava mais consolidado

do que aquilo que teria ficado nos minitestes” (A6); “Resolvi. Quando chegava lá à

correção sempre tinha a noção de como é que tinha de resolver a seguir” (A27); “Uma

pessoa levava a resolução na folha de rascunho. Chegava a casa, até era capaz de

resolver e pensava: ‘Porque é que eu errei isto aqui? Era tão fácil e errei.’ E dava para

ver o que uma pessoa tinha errado. Podia melhorar” (A ).

Barros, Fernandes & Araújo

138 PROFMAT — 2015

A maior parte dos alunos que não resolveu em casa manifesta alguma autoconfiança na

correção das suas respostas aquando da realização do miniteste: “Para ser sincero eu nos

primeiros até pensava que teria melhor nota do que realmente tive. E depois

aconteceu… ‘Olha se eu soubesse tinha revisto. Tinha feito em casa.’ Só que em casa o

erro possivelmente seria o mesmo” (A1 ); “Se tivesse resolvido em casa chegava à

reformulação e conseguia subir a minha nota. Neste caso isso não aconteceu. Mas

muitas vezes ia para lá com a ideia de que aquilo ia estar certo. Eu pensava que ia ter

boa nota. E lá está, também me permitiu ver o meu erro” (A26); “Pensei que ia chegar

lá e do género: ‘Já sei onde é que errei, vou resolver’, mas depois acabava por me

deparar ainda com mais erros. E acho que fiz mal em não ter pegado e não ter resolvido.

Até que tinha a vantagem de ter os testes lá no virtual. Foi um bocado, se calhar, de

desleixo da minha parte” (A1).

Há porém também alunos que alegam falta de tempo, desmotivação, falta de reflexão

sobre o assunto ou pouca vontade de trabalhar: “Eu não fiz. Não resolvi. Passou de

parte, falta de tempo deve ser” (A4); “Lá está a desmotivação também vem. É errado,

uma pessoa não deve desmotivar assim, mas depois não sei… deixei-me ir um bocado

abaixo e já estava. Se calhar, se fosse hoje já pensava de maneira diferente (…) já viria

aqui [gabinete] mais vezes tirar dúvidas” (A24); “Não resolvi e não me lembro porque é

que não resolvi. Tempo tivemos. Acho que nem sequer raciocinamos, na altura nem

pensamos que poderia ser importante” (A22); “Agora vou-me dar ao trabalho. Chego lá

e faço lá isto. (…) Chego lá e vejo o que está bem e o que está mal. Logo vejo por um

colega, ou assim” (A17).

Os alunos que resolveram apenas o segundo miniteste, embora tenham mudado um

pouco de atitude na segunda revisão, também alegam não terem refletido sobre a

situação, terem falta de tempo ou desconhecerem os procedimentos: “O primeiro não

resolvi nada [em casa]. Se calhar nem nós nos lembrámos de poder já levar as coisas

feitas. E o segundo já resolvi. Já tinha visto” (A10); “No primeiro não, que eu não sabia

que se podia levar. Mas depois sim. Era dois estudos, e eu fiz o teste, tive dúvidas aqui,

agora chegava a casa vou fazer a correção, já tirava as dúvidas. Porque quando estou a

estudar pela primeira vez não sei o que é que vai sair, não é? E depois via as minhas

dúvidas e já as clarificava” (A5).

A maioria dos alunos concorda com a forma como se desenrolou o processo de revisão

dos minitestes. Pensam que se a revisão fosse efetuada em casa não seria tão profícua,

Barros, Fernandes & Araújo

PROFMAT — 2015 139

por não haver garantias que fossem eles a resolver, porque não se organizariam para

fazer a revisão atempadamente ou porque poderiam ter mais dificuldades, como se pode

constatar pelos comentários apresentados: “Foi melhor. Se levássemos para casa se

calhar não íamos fazer por nós, juntávamo-nos todos e há sempre alguém que faz mais

do que nós” (A2); “Depois uma pessoa em casa iria dizer: ‘Faço hoje, faço amanhã,

faço passado’ e no dia não temos nada feito. E se for na aula, quem quiser ir já tem a

noção de que tem que ir e não vai sair de lá sem fazer ou tentar fazer. Eu falo por mim,

porque sou daquelas pessoas que vou deixando, vou deixando e depois…” (A10); “Se

tínhamos alguma dúvida podíamos perguntar à professora ou comentar com os colegas.

Se se estiver em casa sozinha não se tem certezas, nem é a mesma coisa” (A15); “Em

casa, se calhar, íamos pousar aquilo e nunca mais ligar. E aqui nas aulas, às vezes, até

chamávamos um bocadinho a professora. Oh professora não estou a perceber isto. E

você lá explicava. Acho que isso já é uma ajuda bastante grande” (A16).

Quanto às questões/sugestões que a professora usava, aquando da primeira correção dos

minitestes, com o intuito de ajudar na identificação dos erros e na procura da resposta

correta, há alunos que confessam que mesmo assim se limitaram a resolver novamente

as questões: “Eu liguei [às notas] só que algumas frases deixavam ali muito em aberto.

E eu sinceramente já não conseguia. Faltava ali qualquer coisa que me fizesse, faltava

um clique. E eram várias, e eu vá sinceramente. Como é isto afinal? Está errado agora

porquê?” (A1 ); “Eu limitei-me mais a resolver. Às vezes ia lá ver o que é que a

professora punha lá, porque também gosto de saber, mas não tentei” (A24).

Assim, é perfeitamente natural que estes alunos discordem que explicar qual a causa dos

seus erros tivesse contribuído para que tomassem consciência de quais os

procedimentos/propriedades que não são válidos. Porém, para muitos alunos essas

questões/sugestões foram uma mais-valia para detetarem os erros e os corrigirem:

“Ajudou porque às vezes a pessoa vê que está ali mal mas não consegue, logo de

imediato, descobrir e avançar dali para a frente. Então com essas notas era mais fácil, já

sabíamos o que procurar em concreto” (A8); “Aquelas dicazinhas que punha, sim. Dava

não só para resolver o exercício mas mesmo a nível de nós sabermos onde estava o erro.

Porque senão íamos olhar para aquilo e se calhar para nós até estava bem, não é. E

mesmo chegar a casa e ir fazer o teste de novo era uma maneira também de estudar um

bocado” (A16).

Barros, Fernandes & Araújo

140 PROFMAT — 2015

Considerações finais

Analisando as opiniões dos estudantes, pode-se afirmar que o balanço final da

experiência foi positivo na medida em que permitiu que os alunos tomassem

consciência das suas dificuldades e dos seus erros e provocou alguma revisão sobre os

conceitos e procedimentos envolvidos nas questões, nem que fosse pelo confronto das

resoluções com os outros colegas. De notar, por exemplo, que uma das alunas, que

confessa ter ido à revisão com o intuito de copiar por um colega, assegura que o

confronto das resoluções acabou por gerar alguma discussão e por consequência uma

aprendizagem de que não estava à espera: “Às vezes falávamos, discutíamos aquilo que

ele pensava que eu tinha mal. E eu dizia-lhe: ‘Porque é que fizeste isto assim?’ ‘Então,

tens de fazer isto e isto.’ (…) Discutíamos mais do que no trabalho em grupo. Por

exemplo, nós tínhamos lá uma matriz que o A20 tinha tudo bem, mas fez de outra

maneira e eu enganei-me lá num passo (…). Não ia copiar o exercício. E eu disse-lhe

‘não consigo ver onde é que está o meu erro’. E ele disse: ‘enganaste-te, tens de subtrair

aqui nesta linha’. E eu: ‘Ah! Pois é.’ E depois resolvi tudo direitinho" (A17).

O facto da maior parte dos alunos preferirem realizar a revisão no contexto de sala de

aula pode ser interpretado como alguma falta de organização em termos de hábitos de

estudo, aspeto que também parece ser corroborado por muitos ao não terem realizado

em casa a correção dos minitestes antes da revisão. Neste caso, o excesso de confiança

nas resoluções efetuadas e o não ser habitual realizar avaliações deste tipo também

parece ter tido a sua contribuição.

Um dos aspetos que pode constituir uma desvantagem do processo de revisão dos

minitestes é o facto de se gastar mais tempo na avaliação, implicando também uma

maior quantidade de trabalho para o professor, aspetos que também são referenciados

por Menino e Santos (2004) e Cherepinsky (2011) ao descreverem experiências com

características similares. No entanto, como afirma Cherepinsky, “é um investimento de

tempo que vale a pena para o professor e para o estudante” (p. 300).

Barros, Fernandes & Araújo

PROFMAT — 2015 141

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PROFMAT — 2015 142

DOS JOGOS À APRENDIZAGEM

Carolina Moreira, Sílvia Lopes, Helena Rocha

Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Nova de Lisboa

[email protected], [email protected], [email protected]

Resumo

Neste texto apresentamos os jogos no ensino da matemática como uma forma de

aprendizagem de conteúdos e não apenas como um recurso que cada professor pode

usar nas suas aulas para tornar a aula diferente. Analisamos dois jogos desenvolvidos

por nós e que utilizámos com alunos dos 7.º e 10.º anos de escolaridade, procurando não

só apresentar os jogos, mas também aspetos da sua implementação em sala de aula,

ponderando o contributo que trouxeram à aprendizagem dos alunos.

Aprender matemática depende de um grande número de variáveis, o que torna o ensino

um processo complexo, pois é necessário que se desenvolva o raciocínio lógico, além de

estimular o desenvolvimento das mais variadas capacidades transversais, tais como o

pensamento autónomo, a criatividade, o sentido de estratégia e a capacidade de resolver

problemas.

Duas das dificuldades frequentemente encontradas pelos professores passam pela falta

de motivação para a aprendizagem e pelo desinteresse pela Matemática. A solução para

estes problemas pode passar pela utilização de jogos para complementar o estudo, mas

também para a aquisição de novos conteúdos. No entanto, apenas a implementação dos

jogos não basta. O papel do professor é de extrema importância e a planificação e

orientação da aula são fundamentais para que se alcancem os objetivos pretendidos.

Palavras chave: jogos, discussão matemática, aprendizagem

Jogo, brincadeira, atividade lúdica, …? Do que falamos afinal?

Para tentar identificar quais as vantagens de inserir jogos no ensino da matemática,

tentámos encontrar uma definição da palavra jogo, embora existam muitas definições.

Para Aristóteles (385-322 a.C.), o jogo é antagónico ao trabalho, pois além de preparar o

jovem para a vida adulta, funciona como uma fonte de “descanso do espírito”, como

recreação. Já Platão (427-347 a.C.), apregoava o valor e a importância de se aprender a

brincar, sendo necessário estimular tal prática que, para ele, repercute na formação da

personalidade e, por isso, deveria ser supervisionada pelos adultos como garantia de

conservação das leis e das virtudes.

Atualmente, pensamos que a ideia do jogo ser apenas um divertimento está ultrapassada

visto que, por exemplo, uma das definições que encontrámos (Infopédia, 2015) sugere

que um jogo é:

Moreira, Lopes & Rocha

PROFMAT — 2015 143

Atividade lúdica ou competitiva em que há regras estabelecidas e em que

os praticantes se opõem, pretendendo cada um ganhar ou conseguir

melhor resultado que o outro.

No entanto, em 1996 Huizinga já tinha traçado algumas características que também

definem a atividade “jogo”:

o jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de

determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente

consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si

mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma

consciência de ser diferente da vida quotidiana.

Inclusive, o autor refere que embora um jogo se possa entender como uma atividade

lúdica, é essencial a existência de regras para que se possa realizar em harmonia, tendo

de ser provido de alguma seriedade.

Através das características dos jogos mencionados pelo autor podemos evidenciar várias

competências transversais presentes nos currículos da matemática.

Quando se fala em jogos, a visão global que a maioria das pessoas tem, é: lazer,

dinheiro, competição individual ou em grupo, etc.. Todas estas opiniões levam a que se

pense que a ideia de jogo é a de ser algo bom, divertido e agradável.

Jogo e Matemática… Qual a relação?

Qual a importância do jogo no processo ensino-aprendizagem da matemática?

Onde acaba o jogo e começa a matemática séria? Uma pergunta difícil

que admite muitas respostas. Para muitos que a veem de fora, a

matemática, é extremamente aborrecida, não tem nada a ver com o jogo.

Ao contrário, para a maioria dos matemáticos, a matemática nunca deixa

completamente de ser um jogo, embora, para além disso, possa ser

muitas outras coisas. (Guzmán, 1990, p. 39)

Vários investigadores na área da Educação Matemática, seguidamente mencionados,

têm ampliado os estudos sobre as vantagens do jogo no processo de ensino-

aprendizagem da Matemática e defendem a importância deste recurso metodológico na

sala de aula.

Moreira, Lopes & Rocha

144 PROFMAT — 2015

Grando (2004) afirma que o jogo pode ser utilizado como um instrumento facilitador na

aprendizagem de estruturas matemáticas, muitas vezes de difícil assimilação. Neste

sentido, a expressão facilitar a aprendizagem está associada à necessidade de tornar

atraente o ato de aprender. A autora faz referência também a Gardner (1961), para quem

os jogos matemáticos, assim como as “matemáticas recreativas”, são matemáticas

carregadas do fator lúdico. Para ela, o uso de jogos na sala de aula é um suporte

metodológico adequado a todos os níveis de ensino, desde que os objetivos destes sejam

claros, representem uma atividade desafiadora e estejam adequados ao nível de

aprendizagem dos alunos.

Para Borin (2004), os jogos podem funcionar como facilitadores no desenvolvimento da

linguagem, criatividade e raciocínio dedutivo, elementos enfatizados na escolha de uma

jogada e na argumentação necessária durante a troca de informações no jogo.

Segundo Winter e Ziegler (1983), há uma relação muito próxima entre o jogo e a

Matemática. Conforme é mostrado no esquema seguinte, é possível estabelecer uma

correspondência entre as duas (ver figura 1).

Jogo Pensamento matemático

Regras do jogo Regras de construção, regras de lógica,

operações;

Situações iniciais Axiomas, definições, o que é dado;

Jogadas Construções, deduções;

Jogadores Meios, expressões, conclusões;

Estratégias do jogo Utilização eficaz das regras, redução a

fórmulas conhecidas, processos;

Resultados Novos teoremas e novos conhecimentos.

Figura 1: Correspondência entre jogo e o pensamento matemático

(retirado de Winter & Ziegler, 1983)

Os jogos e a matemática dividem os mesmos aspetos em relação à sua função

educacional. Se por um lado, a matemática dota os alunos de um conjunto de

ferramentas que potenciam e enriquecem as suas estruturas mentais e os preparam para

explorar e analisar a realidade, por outro lado, os jogos permitem o desenvolvimento de

técnicas intelectuais, enriquecem o pensamento lógico e o raciocínio. Dada a atividade

Moreira, Lopes & Rocha

PROFMAT — 2015 145

mental que estimulam, são um ponto de partida para ensinar a Matemática e podem

servir de base para uma posterior formalização do pensamento matemático.

O ponto de chegada do ensino não consiste apenas em fechar na mente humana uma

combinação de informações que se considera necessária para o progresso do seu

desenvolvimento na sociedade. Segundo Kishimoto (1996), um dos contributos que o

jogo propicia aos alunos e que é fundamental para a sua evolução é o facto de fazer com

que cada aluno não tenha medo de errar, pois o erro é considerado um degrau necessário

para se chegar a uma resposta correta. A ideia fulcral é ajudá-lo a desenvolver a mente e

as potencialidades intelectuais que possuem.

Vantagens e Desvantagens

Grando (2004) defende que antes dos jogos serem postos em prática em sala de aula, o

professor deverá ter consciência que estes podem ocasionar vantagens e/ou

desvantagens no processo de ensino aprendizagem, dependendo da forma como forem

abordados e dos alunos em causa. Grando (2001) aponta uma série de vantagens e

desvantagens para a introdução de jogos no contexto de ensino-aprendizagem.

Dentro das vantagens as que pensamos ser mais significativas são: o (re)significado de

conceitos já aprendidos de uma forma motivadora para o aluno; desenvolvimento de

estratégias na resolução de problemas, a tomada de decisões, a consciencialização e

avaliação das mesmas; significação para conceitos aparentemente incompreensíveis;

participação ativa do aluno na construção do seu próprio conhecimento;

desenvolvimento da criatividade, do senso crítico, da participação, da competição

saudável, da observação, das várias formas de uso da linguagem e do resgate do prazer

em aprender; identificação e diagnóstico por parte do professor de algumas dificuldades

dos alunos.

As desvantagens apontadas por Grando (2001) são: quando os jogos são mal utilizados,

existe o perigo de dar ao jogo um caráter puramente aleatório, tornando-se um

“apêndice” em sala de aula (os alunos jogam motivados apenas pelo jogo, sem saber o

motivo pelo qual jogam); o tempo gasto com as atividades de jogo na sala de aula é

Moreira, Lopes & Rocha

146 PROFMAT — 2015

maior e, se o professor não estiver preparado, pode existir um sacrifício de outros

conteúdos pela falta de tempo; as falsas conceções de que se devem ensinar todos os

conceitos através do jogo; a perda do momento lúdico do jogo pela interferência

permanente do professor, destruindo a essência do mesmo; a imposição do professor,

exigindo que o aluno jogue, mesmo que ele não queira, destruindo a voluntariedade

pertencente à natureza do jogo; a dificuldade de acesso e disponibilidade de material

para a prática dos jogos.

Dentro das desvantagens apresentadas anteriormente podemos prever que estas podem

ser neutralizadas se o professor tiver alguns cuidados a realizar a planificação para as

aulas onde implementa os jogos. A realização da planificação nestas aulas é essencial,

pois fará com que o professor antecipadamente tome decisões essenciais para que as

aulas cumpram todos os objetivos propostos e decorram em harmonia. Estas decisões

passam, por exemplo, por formar os grupos segundo os objetivos da aula. É importante

frisar que a utilização de um jogo deve ser um auxílio em sala de aula, ou seja, a

utilização dele sem ter um objetivo não favorecerá nunca o processo de aprendizagem

dos alunos. Além disso, a autora cita uma desvantagem relacionada com o tempo, pois

na sua conceção nas aulas com jogos o tempo gasto é maior e, portanto o professor deve

ficar atento a este fator para que não seja preciso sacrificar outros conteúdos. Para este

último problema, Borin (2004) dá a sugestão de durante a aplicação do jogo, ser

recomendado que, quando forem jogados jogos de tabuleiro estes sejam oferecidos aos

alunos para que possam jogar anteriormente noutros locais; porém, na sala de aula é

importante que sejam discutidas as descobertas feitas, para orientar e sistematizar as

hipóteses formuladas e as estratégias. Esta última sugestão, apesar de aplicável, poderá

não ser viável devido à falta de recursos normalmente existente (outra desvantagem

apontada).

Borin (2004) completa a lista de desvantagens com um problema que a nosso ver é um

problema que todos os professores enfrentam atualmente, seja em aula com aplicação de

jogos ou não: o ruído. Segundo a autora, é inevitável, pois somente através de

discussões é possível chegar-se a resultados convincentes. É importante que o professor

pense no ruído de uma forma construtiva, porque sem ele não há motivação para o jogo

Moreira, Lopes & Rocha

PROFMAT — 2015 147

e até porque se os alunos tiverem hábitos de trabalho em grupo, esse mesmo ruído é

substancialmente menor.

4. Etapas do Jogo

O jogo tem as suas vantagens no ensino da matemática, como referido na secção

anterior, desde que o professor tenha objetivos claros do que pretende atingir com a

tarefa proposta. Para isso deve tê-lo jogado anteriormente e realizado a sua respetiva

planificação para que conheça muito bem o jogo selecionado/criado, o que permitirá

realizar intervenções pedagógicas adequadas no momento da aplicação em sala de aula.

Segundo Grando (2004), as intervenções pedagógicas com jogos nas aulas de

matemática incluem sete momentos distintos:

1.º momento: Familiarização dos alunos com o material do jogo.

É o momento em que os alunos entram em contacto com o material do jogo,

construindo-o ou experimentando-o mediante simulações de possíveis jogadas. É

comum o estabelecimento de analogias com os jogos já conhecidos por eles.

2.º momento: Reconhecimento das regras

No segundo momento os alunos devem reconhecer as regras do jogo e este processo

pode ocorrer mediante a explicação do professor, a leitura pelos alunos ou pela

identificação a partir de várias jogadas entre o professor e alguns alunos, que

aprenderam anteriormente o jogo. Estas simulações de jogadas entre o professor e os

alunos são ótimas para a compreensão dos demais, pois percebem as regularidades nas

jogadas e identificam as regras.

3º momento: O “jogo pelo jogo” – jogar para garantir regras

Nesta fase deverá acontecer um momento de jogo espontâneo e de exploração de noções

matemáticas contidas no mesmo. Também nesta fase deve ser possibilitado aos alunos

jogarem de forma a assimilarem as regras, é fundamental a compreensão e cumprimento

das regras do jogo.

4.º momento: Intervenção pedagógica verbal

Moreira, Lopes & Rocha

148 PROFMAT — 2015

Este é o momento das intervenções verbais do professor e tem como caraterísticas o

levantamento de questões e observações realizados por ele, a fim de provocar nos

alunos a análise das próprias jogadas. Neste momento é importante analisar os

procedimentos que os alunos utilizam na resolução de problemas, para garantir que haja

a relação deste processo com a conceitualização/formalização matemática.

5.º momento: Registo do jogo

O registo do jogo pode ocorrer dependendo da sua natureza e dos objetivos que tem

com o registo. O registo dos pontos ou dos procedimentos realizados ou dos cálculos

utilizados pode ser considerado uma forma de sistematização e formalização por meio

de uma linguagem própria: linguagem matemática. Através do registo o professor

conhece melhor os seus alunos. Assim, é fundamental que o professor estabeleça

estratégias de intervenções em que haja necessidade do registo escrito do jogo.

Através do registo podem ser analisadas as jogadas “erradas” e construções de

estratégias. Metodizar um raciocínio por escrito contribui para a melhor compreensão

do aluno em relação às suas próprias formas de raciocínio e também para o

aperfeiçoamento da forma como o explica.

6.º momento: Intervenção escrita

Neste momento o professor e/ou os alunos elaboram situações-problema sobre o jogo

para que os próprios alunos resolvam. A resolução dos problemas de jogo propicia uma

análise mais específica sobre o mesmo, na qual os problemas abordam diferentes

aspetos que podem não ter ocorrido durante as partidas. Neste momento os limites e

possibilidades são assinalados pelo professor e este direciona os alunos para os

conceitos matemáticos trabalhados no jogo. O registo do jogo também se faz presente

nesse momento.

7.º momento: Jogar com competência

Como último momento, o jogar com competência, é o retorno à situação real do jogo. É

importante que o aluno retorne à ação para que execute estratégias definidas e

analisadas durante a resolução de problemas. O processo de análise do jogo e as

Moreira, Lopes & Rocha

PROFMAT — 2015 149

intervenções obtidas nos momentos anteriores farão sentido no contexto do próprio

jogo.

Os sete momentos propostos pela autora possibilitam a estruturação de um trabalho com

jogos nas aulas de Matemática. Porém, é necessário que o professor realize boas

intervenções pedagógicas durante o jogo para garantir a aprendizagem dos conceitos

matemáticos por parte dos alunos.

Dois exemplos de jogos aplicados no ensino da matemática

O objetivo dos jogos que aqui apresentamos é a introdução de novos conceitos, de

forma a proporcionar aos alunos a aprendizagem dessas novas noções através da prática

dos mesmos.

O Dominó das Semelhanças foi realizado com alunos do 7.º ano e o jogo Funções a

Feijões com alunos do 10.º ano.

Depois de experimentados os jogos foi pedido aos alunos que respondessem a um breve

questionário com as suas opiniões sobre a matemática e o jogo que experimentaram.

Os nomes apresentados nesta secção são fictícios.

Dominó das Semelhanças: descrição da aplicação do jogo

Este jogo é constituído por duas etapas. Na primeira etapa cada grupo de quatro alunos

em cooperação tenta chegar a conclusões acerca do conceito de triângulos semelhantes.

É distribuída uma folha com vários conjuntos de triângulos semelhantes baralhados,

sem quaisquer medidas. O objetivo é que os alunos os agrupem efetuando as medições

que acharem pertinentes utilizando a régua e/ou o transferidor. Com a realização desta

etapa, pretende-se que os alunos cheguem à conclusão que dois triângulos são

semelhantes se tiverem os lados proporcionais ou os ângulos iguais. Sendo este jogo

introdutório aos critérios de semelhança de triângulos, é essencial a realização de uma

primeira etapa, tal como a apresentada, onde os alunos possam discutir e tirar

conclusões sobre estes conteúdos.

Moreira, Lopes & Rocha

150 PROFMAT — 2015

Na segunda etapa, os grupos põem em prática um jogo muito semelhante ao dominó.

Dentro de cada grupo todos os elementos são adversários, apesar de deverem em

conjunto discutir e conjecturar sobre os critérios de semelhança dos triângulos em jogo.

O objetivo é cada aluno obter o máximo de pontos, jogando até acabar as peças do jogo

ou não existirem mais jogadas possíveis. Para isso, deverão unir em cada jogada as

extremidades das peças que tenham dois triângulos semelhantes, tal como no dominó

original se une as extremidades das peças com o mesmo valor. Com a realização deste

jogo pretende-se que os alunos consigam identificar, definir e consolidar cada critério

de semelhança de triângulos.

De seguida apresentamos alguns momentos da realização da segunda etapa do jogo do

dominó por um grupo de quatro alunos (A-Ana, B-Bernardo, C-Carolina, D-Diogo).

Começou-se por explicar as regras do jogo. Os alunos entenderam rapidamente a

dinâmica do jogo, apesar de irem surgindo algumas questões. O facto de na atualidade

jogos como o dominó não pertencerem ao leque de jogos praticados por jovens poderá

ser uma dificuldade no que diz respeito a encontrarem rapidamente semelhanças com o

jogo original.

D: É preciso decorar as peças?

Professora: Não é preciso decorar, podes pôr as peças na tua mão como

se fossem cartas e veres sempre que quiseres.

D: Então e agora é suposto fazer o quê?

Professora: Um de vocês tem de jogar uma peça com dois triângulos

equiláteros. Quem a tiver, é o primeiro a jogar.

A: Uma qualquer?

Professora: Só existe uma peça nessas condições.

D: Ah! É mesmo parecido ao dominó!

Aqui pudemos constatar uma das caraterísticas da primeira fase que qualquer jogo deve

ter, visto que o Diogo conseguiu identificar as analogias com o dominó tradicional.

B: Posso jogar noutra direção?

Professora: Sim, desde que juntes duas peças com extremidades com triângulos semelhantes.

Moreira, Lopes & Rocha

PROFMAT — 2015 151

Figura 2 – Aluno a segurar as peças

Com o avançar do jogo começaram a surgir as primeiras questões acerca da definição

dos diferentes critérios de semelhança. Os alunos tendencialmente remeteram dúvidas à

professora, embora esta nunca lhes tenha respondido concretamente às questões. Uma

das estratégias adotadas foi, então, a de comparar as jogadas dos colegas e perceber

quais os critérios que usavam.

C: Posso juntar um triângulo equilátero através dos ângulos com um

através dos lados?

Professora: Será que podes?

C: Sim… Ambos são equiláteros! Os seus lados são proporcionais… são

semelhantes!

(…)

B: Posso jogar um que não seja equilátero?

Professora: Podes desde que seja semelhante à extremidade de uma das

peças.

B: Há aqui muitos que não são equiláteros…

Professora: A teu ver dois triângulos equiláteros são semelhantes… Que

outros casos achas que existem para que dois triângulos sejam

semelhantes?

B: Não sei… A A há pouco juntou duas peças em que os triângulos não

eram equiláteros…

A: Quais? Ah… sim, mas tinham ambas um ângulo reto e dois lados

proporcionais!

B: Ah já sei então! Esta aqui então também dá aqui!

Professora: Qual é o critério?

B: Um ângulo igual e dois lados juntos a esse ângulo proporcionais?

Moreira, Lopes & Rocha

152 PROFMAT — 2015

A, C: Sim!

O jogo premeia os alunos que encontrem erros nas jogadas dos colegas, o que fomenta o

sentido crítico e permite que os alunos aprendam com os seus erros.

A: Acho que não tenho nenhuma peça que possa jogar.

Professora: Então podes pedir ajuda aos teus colegas e caso consigam

encontrar uma peça que possa ser jogada ganhas um ponto.

A A pôs as cartas na mesa.

D: Estes ângulos são iguais mas não sei se assim os triângulos são

semelhantes, os lados não têm a mesma medida...

A: Vou jogar esta então, mas não tenho a certeza.

Professora: O que é vocês acham?

C: Eu acho que são, os dois lados que estão junto ao ângulo são

proporcionais… A razão é 2,5!

Professora: Todos concordam?

A: Sim!

Professora: E a peça só poderia ser posta nesse lugar?

Os alunos começaram a discutir e chegaram à conclusão que haveria mais três hipóteses

para jogar a peça.

C: A jogada do D não está correta!

D: Está sim!

C: Então, mas olha, uma peça tem um triângulo com um ângulo reto e a

outra tem um triângulo equilátero.

B: O C tem razão!

D: Pois tem, como vi dois lados proporcionais fiquei confuso.

Figura 3 – Jogada errada efetuada pelo Diogo

(…)

Moreira, Lopes & Rocha

PROFMAT — 2015 153

C: Posso juntar um triângulo equilátero através dos ângulos com um

através dos lados?

Professora: Será que podes?

C: Sim… Ambos são equiláteros! Os seus lados são proporcionais… são

semelhantes!

A C pôs uma peça e seguidamente retirou-a.

C: Calma! Não vou deixar ninguém ganhar um ponto! Se eu passar

ninguém ganha um ponto?

Professora: Não.

C: Então passo!

Dominó das Semelhanças - Conclusões da aplicação do jogo e inquérito

Na aplicação dos inquéritos, apenas um aluno diz não gostar de matemática e todos

revelam gostar de trabalhar em grupo, referindo como principal razão a troca de ideias e

construção de raciocínio.

A maioria aponta como principal dificuldade na utilização dos materiais do jogo o facto

de as peças serem demasiado pequenas e de papel. Quanto às dificuldades sentidas

durante a prática do jogo, a maioria refere sentir dificuldades em verificar se os lados

dos triângulos são proporcionais por envolver cálculo mental.

No que diz respeito ao contributo dos jogos para aprendizagem matemática, as opiniões

convergiram no mesmo sentido:

“Com os jogos nós interessamo-nos mais, porque além da matemática ser divertida,

assim torna-se ainda mais”; “Estimulam a criatividade”; “É mais fácil aprender”.

Na questão “Gostarias de trabalhar mais vezes com jogos nas aulas de matemática?”,

todos os alunos responderam afirmativamente, dando como justificação o facto de

quebrar a rotina, os motivar e por ser uma forma fácil de aprenderem os conceitos.

A aplicação deste jogo sugere que este poderá dar um contributo positivo tanto ao nível

de aprendizagem na introdução do conceito de triângulos semelhantes, como na revisão

de conceitos e noções de geometria e álgebra. Os alunos superaram as dificuldades

encontradas ao longo do jogo e foi possível observar um crescendo da dinâmica

Moreira, Lopes & Rocha

154 PROFMAT — 2015

estabelecida ao longo do mesmo. Foi evidente que no fim do jogo os alunos apenas se

preocupavam com a sua estratégia para conseguir a melhor jogada, visto já terem

interiorizado os conceitos abordados.

Enigma, Funções e Feijões: descrição da aplicação do jogo

O jogo é constituído por duas partes e é composto por um baralho com dez cartas mãe e

trinta cartas filhas, numeradas de 1 a 40. Nas cartas mãe, os alunos têm o gráfico de uma

função e a sua expressão analítica. O conjunto das cartas filhas é dividido em três

subconjuntos – dez cartas com as concavidades, dez cartas com as monotonias e dez

cartas com os extremos. Cada grupo de dez cartas tem uma cor para facilitar a distinção.

Na primeira parte cada grupo de quatro alunos, em cooperação, tenta chegar a

conclusões acerca das caraterísticas das funções lineares e quadráticas, usando as cartas

do jogo e juntando-as em grupos de quatro, isto é, juntando cada carta mãe (com o

gráfico) às três respetivas cartas filhas (concavidade, monotonia e extremos).

Na segunda parte, são distribuídas as cartas e os feijões sendo que cada aluno tem em

mãos uma carta mãe, duas cartas filha e dez feijões. Nesta parte os alunos de cada grupo

jogam individualmente, discutindo e descobrindo as caraterísticas de cada função. O

objetivo do jogo é juntar o máximo de feijões. Para isso os alunos deverão tentar fazer a

combinação com o maior número de cartas possível para garantir a vitória nessa ronda.

Caso dois ou mais alunos façam uma combinação com o mesmo número de cartas,

considera-se o vencedor o que jogar a carta com o maior valor.

Depois de distribuídas as cartas pelos jogadores, são colocadas cinco cartas na mesa

(independentemente de ser carta mãe ou carta filha). Concluída esta fase, consoante as

cartas que têm em mãos, os alunos podem optar por não entrar na ronda, tendo de doar

um feijão; se quiserem que a sua jogada conte, podem apostar entre dois e cinco feijões.

Cada jogador deve igualar ou superar a aposta do jogador anterior pelo que se o

primeiro jogador apostar cinco feijões, qualquer outro jogador que queira entrar na

ronda terá de apostar, também, cinco feijões.

Moreira, Lopes & Rocha

PROFMAT — 2015 155

São válidas todas as combinações que juntem entre duas e quatro cartas, todas de cores

diferentes.

O jogo acaba quando um dos jogadores for o detentor de todos os feijões.

Este jogo foi implementado com alunos do 10.º ano: (I-Inês, J-João, L-Luísa, M-

Matias), apresentando-se de seguida alguns aspetos relativos à parte do jogo de cartas

concretizada por um grupo de quatro.

Começou-se por explicar as regras do jogo e fazer algumas simulações de jogadas.

Este jogo tem bastantes regras, o que exigiu alguma concentração por parte dos alunos,

no início, para que conseguissem compreender e definir as suas estratégias.

Figura 4 – Uma jogada – o fim da ronda

Início do Jogo

A I retirou a carta menor e por isso ficou responsável por distribuir o jogo durante as

jogadas. O primeiro a jogar foi o J e as dúvidas que apresentou não se relacionaram com

os conteúdos, mas sim com as regras.

J: Posso fazer duas combinações ao mesmo tempo?

Professora: Não, apenas uma.

J: Mas por estratégia, é melhor a combinação que tenha a carta mais alta?

Professora: Porquê?

J: Para ter mais hipóteses de ser o primeiro a jogar na próxima jogada.

Moreira, Lopes & Rocha

156 PROFMAT — 2015

I: Mas deves escolher a combinação com mais cartas possível, para

ganhares a rodada, se não, não te vale de nada teres uma carta alta… ter a

carta alta é só para o caso de empatares o jogo…

J: Ah sim, tens razão! Mas as duas combinações que eu tenho, têm ambas

duas cartas.

I: Pois… Assim é melhor escolher o par que tem a carta mais alta.

A L e a M revelaram algumas dificuldades inicialmente na compreensão de alguns

conteúdos. Embora, com as suas jogadas e a correção por parte dos colegas, tenham

acabado por entender a caraterização de cada função.

Ao mostrar a sua combinação, a L foi corrigida:

I: Mas na tua combinação, a função não tem extremos, porque juntas esta

carta?

L: Tem extremos sim!

I: Isto é uma função linear! Como pode ter extremos?

L: Ah pois, extremos…

J: Não tem nem máximos nem mínimos!

L: Ah… pois não!

(…)

L: O que é uma função constante?

I: Hum… é aquelas funções que são uma reta horizontal.

L: Então tem concavidades?

J: Se é uma reta…

L: Ah pois, esqueçam!

O J no final do jogo fez um pleno, tendo conseguido reunir quatro cartas.

I: As probabilidades de isto acontecer são mínimas!

Professora: Concordam todos?

L: Sim, está certo… Ganhaste todos os feijões!

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PROFMAT — 2015 157

Figura 5 – Pleno realizado pelo João

Enigma, Funções e Feijões - Conclusões da aplicação do jogo e inquérito

Na aplicação dos inquéritos, a totalidade dos alunos diz gostar de matemática e todos

revelam gostar de trabalhar em grupo, referindo como principais razões a troca de

ideias, a ajuda entre os elementos do grupo, a interação e a construção de raciocínio.

Os alunos não sentiram dificuldades na manipulação do material do jogo. Quanto às

dificuldades sentidas durante a prática do jogo, as respostas foram bastante divergentes:

“ver que cartas ficavam melhor com quais”; “conjugar as cartas”; “perceber as regras do

jogo”; “não senti dificuldades”.

No que diz respeito ao contributo dos jogos para a aprendizagem matemática, as

respostas apontam para uma maior motivação e facilidade de aprendizagem.

Na questão “Gostarias de trabalhar mais vezes com jogos nas aulas de matemática?”,

todos os alunos responderam afirmativamente. A resposta dada por um dos alunos foi a

seguinte: “Sim, pois é sempre bom ter vários tipos de aula”

O que nos confirma que o jogo não deve ser uma constante em sala de aula, mas

também não deve ser posto de parte, visto dar acesso a uma aprendizagem motivada e a

uma nova forma de aprender.

Moreira, Lopes & Rocha

158 PROFMAT — 2015

À semelhança do outro jogo apresentado, a aplicação deste também veio trazer

conclusões bastante positivas. Os alunos revelaram grande entusiasmo por alcançar o

objetivo que neste caso era a obtenção do maior número de feijões e para isso tiveram

que analisar todas as possíveis combinações de cartas, ou seja, analisar todas as funções

e suas caraterísticas. Inicialmente, os alunos apresentaram algumas dificuldades nos

conceitos de extremos, principalmente na diferença entre máximo e maximizante, e

entre mínimo e minimizante, mas com o decorrer do jogo foram ultrapassando esses

detalhes.

Conclusão

Os jogos apresentados foram concebidos por nós, tendo a experiência que aqui

descrevemos visado avaliar as vantagens da aplicação dos jogos como um recurso

pedagógico nas aulas de matemática, para além de perceber qual a sua real importância

para a aprendizagem por parte dos alunos.

Um dos fatores que muitas vezes interfere com os resultados obtidos pelos alunos a

matemática é a sua fraca motivação. Através da utilização destes jogos em aula,

verificámos que os alunos se mostraram muito mais interessados e curiosos. O facto de

se tratar de um jogo, independentemente do conteúdo do mesmo, faz com que os alunos

queiram participar e principalmente estabelecer estratégias a fim de concretizar o seu

objetivo: ganhar. Mas para isso terão que dominar em pleno os conteúdos, o que lhes dá

um maior incentivo para os aprender e consolidar.

Outra das vantagens que é importante ressalvar é o desenvolvimento de raciocínios em

grupo. Os alunos perceberam que mais que saber as regras do jogo, saber os conteúdos

seria um fator fulcral para vencerem o jogo e a única forma de o fazer seria discutir com

os colegas até alcançarem conclusões. Assim, em grupo debateram ao pormenor cada

situação de jogo e corrigiram as pequenas dificuldades que foram encontrando.

Estes jogos têm uma grande dinâmica, pois encontrar erros nas jogadas dos

colegas/opositores faz com que ganhem vantagem em relação a eles. Não basta apenas

os alunos formularem as estratégias do seu próprio jogo, terão também que tomar

Moreira, Lopes & Rocha

PROFMAT — 2015 159

atenção às jogadas dos colegas para que consigam perceber se essas jogadas fazem

sentido. Isto também faz com que cada jogador sinta uma responsabilidade acrescida

pelas suas próprias jogadas, visto que caso a jogada não esteja correta, os seus

opositores poderão passar à frente.

Cada um dos jogos proporciona aos alunos total liberdade nas suas jogadas, um aspecto

fundamental para que desenvolvam a imaginação e a criatividade. Assim, é possível

estimular a individualidade de cada um, mantendo a coesão e articulação entre todos,

pois a grande finalidade é sempre a discussão das conclusões retiradas a partir desta

nova experiência.

Referências bibliográficas

Borin, J. (2004). Jogos e resolução de problemas: uma estratégia para as aulas de matemática

(5ªedição). São Paulo: IME-USP.

Gardner, M. (1961) Divertimentos Matemáticos. Rio de Janeiro: Ibrasa.

Grando, R. C. (2001). O jogo na educação: aspectos didático-metodológicos do jogo na

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Guzmán, M. (1990). Aventuras Matemáticas. Lisboa: Gradiva.

Huizinga, J. (1999). Homo Ludens. São Paulo: Perspectiva.

Kishimoto, T. M. (1996). Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez.

GRANDO, R. C. (2004). O jogo e a matemática no contexto da sala de aula. São Paulo: Paulus.

Winter H., Ziegler T. (1983). Introduccion al juego de los conjuntos. Madrid: Interduc-

Schoedel.