Ficha Técnica - APM – Associação de Professores de ... · O Plano de Ação para a Matemática...
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Ficha Técnica
Título
ProfMat2015: Matemática, currículo e desenvolvimento curricular
Julho de 2015
Organizadores
António Borralho, Elsa Barbosa, Isabel Vale, Hélia Jacinto, Jaime Carvalho e Silva e
Joana Latas
Edição
Associação de Professores de Matemática
ISBN
978-972-8768-61-4
ÍNDICE
APRESENTAÇÃO ......................................................................................................... 3
CONFERÊNCIAS COM DISCUSSÃO ....................................................................... 5
AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOCENTE VS. PLANO DA MATEMÁTICA: CONTRIBUTOS
PARA O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOS DOCENTES ............................................ 6
PRÁTICAS TRAICIONAIS RIDEIRINHAS E EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: TRAVESSIAS PARA
ALÉM DA SALA DE AULA ............................................................................................... 32
O ENSINO DA ESTATÍSTICA NAS RECENTES ORIENTAÇÕES CURRICULARES ................... 48
COMUNICAÇÕES COM DEMONSTRAÇÃO ........................................................ 68
A CRIAÇÃO DO MUNDO-HOMENS DE FÉ E DE CIÊNIA: LEIBNIZ, NEWTON E O CÁLCULO
INFINITESIMAL .............................................................................................................. 69
SIMPÓSIOS DE COMUNICAÇÃO ........................................................................... 73
A COMUNICAÇÃO MATEMÁTICA NA AVALIAÇÃO DA RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS ......... 74
FORMAÇÃO CONTINUADA DE DOCENTES DOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL
NO ÂMBITO DAS CIÊNCIAS EXATAS ............................................................................... 90
A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM GEOMETRIA .................................... 98
ALGUNS DADOS QUE ALUNOS E PROFESSORES DEVEM SABER SOBRE RESOLUÇÃO DE
PROBLEMAS ................................................................................................................ 113
O FORMAL DA MATEMÁTICA E O INTUITIVO DA TECNOLOGIA: QUE ARTICULAÇÃO? ... 120
REALIZAÇÃO E REVISÃO DE MINITESTES PARA APROFUNDAR A APRENDIZAGEM DE
ÁLGEBRA LINEAR NO ENSINO SUPERIOR ...................................................................... 131
DOS JOGOS À APRENDIZAGEM .................................................................................... 142
PROFMAT — 2015 3
APRESENTAÇÃO
O Encontro Nacional de Professores de Matemática, anualmente organizado pela APM,
regressa a Évora em 2015.
Aqui tivemos oportunidade de comemorar os dez anos de ProfMat, em 1995, e os vinte
anos em 2005. Aqui esperamos reencontrar-nos, todos, para comemorar os 30 anos de
Encontros.
De Encontro da APM, de encontro connosco próprio, de encontros uns com os outros.
Momento de balanço e de partilha: de práticas, de anseios, de trabalhos, de medos e de
sonhos. E também de vontades por aquilo em que continuamos a acreditar.
Nos últimos 30 anos vivemos momentos altos e momentos baixos.
Momentos de grande exaltação colectiva em que acreditámos que (quase) tudo era
possível. Momentos de forte investimento no nosso crescimento e desenvolvimento
profissionais. Vimos algumas coisas em que acreditávamos verem concretizar-se.
Assistimos a períodos de forte investimento na valorização da nossa condição docente e
vimos as aprendizagens dos nossos alunos tornarem-se mais sólidas porque feitas com
mais sentido e significado. Vimos o País a ter melhores prestações em estudos
internacionais como o PISA ou o TIMMS e a tornar-se frequente alunos portugueses a
serem notícia por resultados alcançados em concursos internacionais nas áreas da
matemática. Enfim a Matemática deixara de ser notícia apenas por más razões. Por isso
sentíamos que haviam valido a pena o nosso empenho e os nossos quereres.
Nos últimos dez anos alguns movimentos de sentidos contraditórios vieram entretanto,
gradualmente a acontecer. A nossa vida enquanto profissionais de educação deixou,
para muitos, de ser perspectivável, a vida nas escolas tornou-se muitas vezes
desmotivadora e com isso algum desinvestimento individual foi-se instalando. O
currículo viu-se amputado de áreas de estudo e de trabalho, algumas disciplinas viram
reduzidas as cargas horárias semanais, tudo isto sem um fio condutor ou uma visão de
conjunto sobre um todo que se quereria coerente. Apesar disso, os aspectos positivos na
matemática foram percepcionados também por muitos. O programa de formação e de
acompanhamento à experimentação e implementação de um novo programa para o
ensino básico é disso exemplo.
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Entretanto, num ápice, sem estudos de avaliação de suporte e sem justificação
sustentável, eis que somos surpreendidos por novos programas para o ensino básico,
primeiro, e para o ensino secundário a seguir. Assentes num formalismo exacerbado em
nome de uma cientificidade de carácter muitas vezes duvidoso, com uma extensão e
com uma rigidez de aplicação que parece ignorar que não pode haver aprendizagem sem
compreensão, real, dos conceitos. E logo num ano em que se assinala o centenário de
José Sebastião e Silva que ousou sonhar, tal como nós, que era possível ensinar
matemática a todos, com intuição, rigor e compreensão.
É pois neste contexto que o ProfMat 2015 vai acontecer. Por isso o tema central do
Encontro ser “A Matemática e o Currículo Escolar”.
Sendo certo que não é possível ensinar tudo a todos e tudo da mesma forma, qual o
papel que a Matemática deve desempenhar na formação dos nossos alunos num
contexto de 18 anos de escolaridade obrigatória? De todos os alunos!
Porque acreditamos que as nossas escolas não podem ser locais de entretinimento nos
intervalos dos treinos para a realização de exames, porque ousamos continuar a sonhar
que é possível desejar aprender e desejar ensinar, convidamos todos, de novo, a mais
uma vez continuarmos a encontrar-nos.
Na nossa APM, para
“Dizer de viva voz
Que não estamos sós…”
Em Évora, cidade branca de todas as encruzilhadas, na primavera de 2015! No XXXI
ProfMat!
Comissão Organizadora ProfMat 2015
Nota da Comissão Científica do ProfMat 2015:
Estes textos têm como um dos principais objetivos revitalizar as atas do encontro
ProfMat. Apesar de inicialmente termos ponderado realizar um processo de revisão
entre pares, optámos por não o fazer. Neste contexto, depois de discutirmos os prós e os
contras, decidimos publicar a totalidade dos textos que nos chegaram, sendo estes,
portanto, da total responsabilidade dos seus autores.
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AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DOCENTE VS. PLANO DA MATEMÁTICA:
CONTRIBUTOS PARA O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DOS
DOCENTES
Luís Martins,
Agrupamento de Escolas de Aljustrel
Resumo
O Plano de Ação para a Matemática constituiu uma das medidas que o Governo
Português implementou no ano de 2006 para procurar melhorar os resultados
académicos dos alunos na disciplina de matemática, no ano seguinte a tutela promulgou
um novo modelo de avaliação do desempenho dos docentes também ele orientado para
a melhoria dos resultados escolares dos alunos portugueses assim como para potenciar o
desenvolvimento profissional dos professores.
Entendemos que estas duas medidas governamentais contemporâneas aportaram
contributos a destacar quer em termos de desenvolvimento profissional dos professores
de matemática quer no ensino e na aprendizagem desta disciplina. Pelo que serve este
documento para evidenciar e comentar estes mesmos contributos de forma clara e
concisa.
Palavras-chave: Desenvolvimento profissional; Plano da matemática; Avaliação do
desempenho docente.
Introdução
Os anos de 2006 e 2007 foram profícuos em ações que objetivaram promover o
desenvolvimento profissional dos docentes. Com efeito, decorria o ano de 2006, mais
precisamente o mês de junho, quando o diagnóstico realizado pelos docentes da
disciplina de matemática relativamente aos resultados dos Exames Nacionais de
Matemática do 9º ano de escolaridade de 2005 impeliu o Ministério da Educação (M.E.)
de então a estabelecer um Plano de Ação para a Matemática cujo principal objetivo era
de melhorar o ensino desta disciplina. Foram assim constituídas ações (M.E., 2006)
enfocadas na melhoria das aprendizagens dos alunos como por exemplo: a definição de
um Programa Matemática: equipas para o sucesso que implicou a elaboração de planos
de escola de combate ao insucesso na disciplina de matemática, ou ainda, o
Reajustamento e às especificações programáticas para a Matemática em todo o Ensino
Básico; a criação de um banco de recursos educativos para a matemática e também na
avaliação dos manuais escolares de Matemática para o Ensino Básico. As seis ações
apresentadas não descoraram os docentes per se tendo em conta que também
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contemplaram a promoção da formação contínua em matemática para professores de
todos os ciclos do Ensino Básico e do Ensino Secundário assim como a necessidade de
estabelecer Novas condições de formação inicial de professores e de acesso à docência.
Decorridos cerca de seis meses, o Ministério da Educação promulgou o Decreto-Lei
nº15/2007 de 19 janeiro que alterou o Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e
dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário e apresentou um novo (primeiro)
modelo de avaliação de desempenho que visou “a melhoria dos resultados escolares dos
alunos e da qualidade das aprendizagens e proporcionar orientações para o
desenvolvimento pessoal e profissional no quadro de um sistema de reconhecimento do
mérito e da excelência.” (Decreto-Lei, nº15/2007 de 19 janeiro). Perante estas
oportunidades de desenvolvimento profissional procuraremos, nesta conferência, dar
uma panorâmica sobre o contributo da Avaliação de Desempenho Docente e do Plano
da Matemática no desenvolvimento profissional dos docentes e no ensino e
aprendizagem da matemática.
Breve conceptualização do desenvolvimento professional docente
Cada docente que termine a sua formação académica de base, ou seja aquando a
conclusão de pelo menos uma licenciatura no ramo educacional, transforma-se num
profissional do ensino que ultrapassou com sucesso os vários crivos que objetivaram
garantir a acumulação de conhecimentos essenciais para o exercício de funções
docentes nos diversos núcleos educativos espargidos por Portugal.
Longe estão os tempos da mestria docente per se, onde os saberes adquiridos aquando a
formação inicial permanecem isolados do mundo e imutáveis no tempo. O docente
contemporâneo confronta-se com um conhecimento que se caracteriza tanto pela sua
volatilidade como pela viralidade da sua propagação. A aquisição de saberes pelos
docentes em pré ou início de carreira não é condição suficiente para rotular estes
profissionais de “seres omniscientes”, mas é condição necessária para classificar cada
um deles como “ser consciente”, como indivíduo que procurará comandar o seu próprio
desenvolvimento (Ponte, 1994) e nunca olvidará a imperiosa necessidade de estar em
constante atualização.
Estarão os professores preparados para responder a todas estas solicitações exigidas por
uma sociedade em pleno século XXI?
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Os docentes são diariamente confrontados com novos desafios, entre os quais o público
com o qual e para o qual exercem funções que, além de significativamente mais
heterogéneo e numeroso, também requer um trabalho de motivação cada vez mais
eficaz e sistemático. O ensino de massas tem vindo a incorporar valências que têm
obrigado a classe docente a assumir novos papéis e a revalidar as competências que
adquiriu ao longo dos anos. Os profissionais do ensino lecionam em ambientes
significativamente mais problemáticos, onde os dilemas sociais complexos crescem
exponencialmente1. Aos professores pede-se que transmitam conhecimentos ao mesmo
tempo que desenvolvem metodologias inovadoras e facilitadores das aprendizagens,
estes são convidados a utilizarem novas2 tecnologias em sala de aula, exige-se um
ensino mais individualizado em turmas cuja dimensão aumenta anualmente.
Estes são alguns dos requisitos impostos e próprios de uma sociedade que sofre dos
efeitos colaterais de uma crise económica à escala mundial, mas que se quer dinâmica e
evolutiva sob pena de desaparecer. As responsabilidades associadas ao corpo docente já
não se cingem apenas à componente letiva, exige-se que os docentes tenham um papel
destacado em funções de gestão burocrática e educativa que requerem uma permanente
atenção a uma legislação em constante atualização. A autonomia das escolas, a
agregação de estabelecimentos em mega agrupamentos, o programa Territórios
Educativos de Intervenção Prioritária são inovações socioeducativas que implicam uma
constante revalidação das competências e saberes dos docentes.
O que acabámos de referir não é uma novidade, os anos sucedem-se e algumas
referências continuam mais atuais do que nunca, com efeito:
[…], a ideia de desenvolvimento profissional, ou seja, a ideia que a
capacitação do professor para o exercício da sua actividade profissional é
1 Entendemos que a utilização deste termo se adequa à conjuntura que o país tem vindo a atravessar e que
se reflete na sociedade civil.
2 Ressalva-se o facto do termo “novas tecnologias” poder parecer um cliché, mas infelizmente para
muitos docentes a utilização regular de ferramentas eletrónicas ainda é uma novidade.
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um processo que envolve múltiplas etapas e que, em última análise, está
sempre incompleto. (Ponte, 1998, p. 2)
Poderemos depreender que o desenvolvimento profissional se define como a ação
continuada de capacitar os docentes para o exercício das suas funções? Ou será mais do
que isso?
[…], as actividades de desenvolvimento profissional consistem em ajudar
os professores a construir novas teorias e novas práticas pedagógicas.
(Marcelo, 2009a, p. 11)
O autor aponta que o desenvolvimento profissional baseia-se no construtivismo segundo
um processo tanto individual como colaborativo que se desenvolve ativamente, a longo
termo e resulta de experiências formais e informais contextualizadas aos locais do
trabalho dos docentes.
[…], as experiências mais eficazes para o desenvolvimento profissional
docente são aquelas que se baseiam na escola e que se relacionam com as
actividades diárias realizadas pelos professores. (Marcelo, 2009a, p. 11)
O caminho do desenvolvimento profissional passa forçosamente pelo amadurecimento
cognitivo do professor que tem que reagir prontamente perante as mudanças que
ocorrem no exercício da docência, quer sejam de teor curricular ou ainda por
reorganização das condições de trabalho. Um sem número de razões podem ser
apontadas para que os docentes sejam quotidianamente colocados à prova, por isso faz
todo o sentido considerar que o desenvolvimento profissional contínuo dos professores
seja uma necessidade (Day, 2007a).
Ainda assim, não se confunda desenvolvimento profissional com formação contínua:
[…], la formación es un elemento importante de desarrollo profesional
pero no el único y, quizá, no el decisivo. (Imbernón, 2009, p.32)
Um equívoco desta natureza significaria que o desenvolvimento profissional só poderia
ocorrer por via da formação em contexto de trabalho/ carreira.
[…]; o conceito “desenvolvimento” tem uma conotação de evolução e
continuidade que, em nosso entender, supera a tradicional justaposição
entre formação inicial e formação contínua dos professores. (Marcelo,
2009a, p.9)
Encontrar forma de definir o conceito de desenvolvimento profissional através de uma
definição que possa ser classificada como consensual não aparenta ser uma tarefa fácil,
no entanto é possível balizar o entendimento em torno deste conceito. Sem menosprezar
uns autores em detrimento de outros, conclui-se rapidamente que todos eles (Heideman,
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1990; Fullan, 1990; Sparks e Loucks-Horsley, 1990; Oldroyd e Hall, 1991; Day, 2001;
Bredeson, 2002; Villegas-Reimers, 2003 e Imbernón, 2009) apresentam nas suas obras
definições que apontam algumas características que permitem aclarar o conceito. Eis
algumas das conclusões a que chegámos.
O desenvolvimento profissional tende a modificar as práticas de ensino, procura incluir
atividades que aperfeiçoem as atitudes dos professores com o objetivo de melhorar os
resultados escolares dos alunos. Tem em conta as necessidades individuais e coletivas
dos docentes ao longo de cada uma das etapas das suas vidas profissionais e leva a que
estes adquiram novos conhecimentos, novas destrezas, novas capacidades que lhes
permitam aperfeiçoar as suas práticas ao mesmo tempo que lhes possibilitam uma
progressão no status profissional.
O Plano de Acção para a Matemática
Em junho de 2006, o XVII Governo Constitucional estabeleceu 50 medidas políticas
para melhorar a escola pública (ME, 2006b). Os estabelecimentos de ensino público
foram incumbidos de refletir e identificar as causas subjacentes ao insucesso verificado
na disciplina de Matemática com particular incidência no Exame Nacional do 9º ano,
realizado no ano letivo 2004/05. Com efeito, nas ilações finais do relatório sobre os
Resultados do Exame de Matemática da 1ª chamada podia ler-se:
Os desempenhos dos examinandos foram, em média, fracos, aliás, na
continuidade dos relativos às Provas de Aferição do 3º ciclo, realizadas
desde 2002. Grande parte dos examinandos baixou um nível no exame,
relativamente à classificação interna. (M.E., 2006c)
As conclusões que repetidamente foram extraídas dos resultados obtidos pelos alunos
pelos mais diversos implicados e interessados no sistema educativo nacional
proporcionaram orientações que o Ministério da Educação (ME) de então apresentou às
escolas sob a forma de um Plano de Ação para a Matemática – PAM (M.E., 2006a).
O ME assumiu a responsabilidade de facultar condições inovadoras para que as escolas
pudessem no âmbito do exercício da sua autonomia desempenhar um papel fundamental
na melhoria dos resultados dos alunos na disciplina de matemática.
Foram estabelecidas várias medidas:
Um novo Programa Matemática para o Ensino Básico;
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A criação de um banco de recursos educativos para a Matemática;
A avaliação dos manuais escolares de Matemática para o Ensino Básico;
A promoção de formação contínua em Matemática para professores de todos
os ciclos do ensino básico e secundário;
desenvolvimento sustentado de projetos de escola que promovessem a
melhoria das aprendizagens em matemática.
Esta última medida, denominada de Plano da Matemática (PM) deu origem a mais de
um milhar de projetos apresentados pelas escolas (M.E., 2008a). O PM foi dirigido aos
alunos do 2.º e 3.º ciclo do Ensino Básico, foi previsto para um período de três anos
letivos, tendo-se iniciado em 2006/07 e terminado em julho de 20093.
Falar-se do Plano da Matemática é o mesmo que falar-se de um conjunto
de projetos concebidos e desenvolvidos por cada escola, em particular,
pelos seus professores de matemática. Estes projetos são pensados a
partir do conhecimento de cada realidade, das particularidades de cada
contexto, do diagnóstico das potencialidades e necessidades dos
professores e alunos de cada uma das comunidades educativas. (Santos,
2008, p. 3)
A elaboração de cada uma das 1100 candidaturas apresentadas envolveu os conselhos
executivos, os conselhos pedagógicos e os professores de matemática que estabeleceram
projetos de escola partindo da análise das condições particulares de cada instituição,
tendo em conta:
um diagnóstico académico (classificações dos alunos na disciplina no ou nos
anos letivos anteriores);
a definição dos objetivos a alcançar (metas concretas para melhorar os
resultados dos alunos);
as estratégias de intervenção (constituição de equipas de docentes para o
acompanhamento dos alunos ao longo de um ciclo de escolaridade, das
3 Os resultados obtidos por esta medida ao nível de Portugal Continental originaram, no final deste
triénio, novo convite às escolas interessadas em apresentar um projeto de candidatura ao Plano da
Matemática II (PM II), com a possibilidade de alargamento às escolas do 1.º ciclo do Ensino Básico por
um período de três anos.
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equipas de docentes em sala de aula e a definição da rentabilização das áreas
curriculares não disciplinares);
os recursos necessários (humanos locais ou não e os materiais disponíveis ou
não);
a identificação dos custos do projeto;
a metodologia de acompanhamento;
avaliação interna do projeto.
Cada uma das escolas que entendeu participar no PAM desenvolveu no seio de um
microssistema educativo ações marcadas pelos princípios de: autonomia; de valorização
profissional (dos seus profissionais que delinearam caminhos para a melhoria das suas
práticas e da aprendizagem dos alunos); da contextualização institucional (seguindo
uma lógica organizacional abrangente e não apenas por área disciplinar e/ou de modo
individualista, tendo em consideração a contextualização social, económica e
profissional onde os docentes atuavam e consequentemente as dificuldades que estes
contextos levantavam); a metodologia de projeto (cumprindo um conjunto articulado e
interdependente de ações); de coresponsabilização (onde a tutela assumiu a obrigação
de criar condições a vários níveis para desenvolver os projetos apresentados). Princípios
entendidos como como adequados para o desenvolvimento profissional dos professores
(Loucks-Horsley et al, 1998).
Ainda assim convenhamos que:
Neste processo de crescimento, marcado por uma evolução contínua
eventualmente pontuada por momentos especiais, o protagonista
principal é o professor, não os cursos ou as oportunidades que lhe são
oferecidas. (Ponte, 2012, p. 6)
Avaliação do desempanho do docente
O que se entende por Avaliação do Desempenho Docente (ADD)?
A avaliação dos professores suscita um alargado conjunto de questões
teóricas e práticas, relacionadas com a sua concretização. É um processo
difícil de conceber e de pôr em prática. (Fernandes, 2008, p. 12)
Nem tudo o que potencialmente pretende ou melhora a nossa condição social,
económica ou profissional é de fácil implementação ou aceitação! Por vezes os fatores
que dificultam a concretização de uma tarefa, de um projeto ou, neste caso, a
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implementação de um modelo de avaliação são em maior número do que os elementos
facilitadores.
A conceção e/ou concretização de um modelo de ADD é uma tarefa morosa e repleta de
contrariedades. No contexto português, entendemos que alguns dos percalços que
ocorreram na implementação do novo modelo de ADD talvez pudessem ter sido
minorados e/ou até evitados através de um enquadramento claro, detalhado e
perfeitamente balizado do processo avaliativo no seu todo. Parte significativa das
preocupações dos envolvidos centraram-se no impacto que a avaliação do desempenho
podia ter tido no quotidiano dos professores e não na influência que esta avaliação devia
de ter tido no sistema educativo per se.
No âmago da ADD está uma sofisticação que nos deixa antever que esta não pode,
evidentemente, reduzir-se apenas a uma ou outra característica. Para Rodrigues e Peralta
(2008) a avaliação do desempenho dos professores está associada a um processo que
engloba atos como: observar, descrever, analisar e interpretar a atividade profissional
dos docentes no intuito de produzir uma tomada de decisão que influencie várias
componentes como a pedagógica, a administrativa e até a salarial.
Parece-nos óbvio que o processo avaliativo dos professores não pode de forma alguma
dissociar-se de toda uma adjetivação que emana da temática da avaliação enquanto
conceito abrangente e aglutinador que se alimenta ferozmente da observação, da
descrição, da análise e da interpretação do objeto avaliativo para poder proferir juízos
que influem nos mais variados contextos.
A função atribuída à avaliação não pode ser dissociada do objecto sobre
o qual ela recai, donde a importância, para o avaliador, de ter uma visão
clara desse objecto. (Simões, 2002, p. 12)
Na sequência desta ressalva, não esqueçamos as palavras de Hadji (1995) que apontou
que o objeto da avaliação docente é:
[...] difícil de estabelecer, porque difícil de definir. (Ibidem, p. 32)
Não há dúvida que definir o que se pretende avaliar é tão ou mais difícil que definir o
que é ser professor. Ainda que qualquer tentativa de referi-lo como: indivíduo de
atributos ímpares, identificável social e profissionalmente, detentor e promotor de
conhecimentos, capacitado e capacitante não seja nem suficiente nem prudente tendo
em conta as conceções daquilo que é ser professor que foram estabelecidas ao longo dos
anos por investigadores/ autores de reconhecido vulto.
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Como es evidente, cada autor establece su concepto y denominación de
profesorado, y aunque hay matices en sus orientaciones, sí que estos
roles, de una forma u otra, van generando una nueva conceptualización
de la formación del profesorado y de su desarrollo profesional, ya sea
individual o en el interior de las instituciones. (Imbernón, 1994, p. 65)
Se a literatura evidencia uma falta de unanimidade na definição do que é ser professor
também não é difícil constatar que a ausência de uma clara perceção do que é o
desempenho também tem contribuído para dificultar a implementação de um modelo de
avaliação. Como tal, uma leitura atenta do seminal trabalho de Simões (2002) permite
constatar que não é de todo judicioso dirimir algumas subtilezas, nomeadamente entre
avaliar a competência do professor, o seu desempenho ou ainda a sua eficácia.
As competências referem-se coisas específicas que os professores sabem,
fazem, ou acreditam, mas não aos efeitos destes atributos nos outros.
(Ibidem, p. 13)
O desempenho do professor diz respeito ao seu comportamento no
trabalho. O desempenho refere-se mais ao que o professor faz do que ao
que pode fazer [...]. O desempenho depende da competência do docente,
do contexto em que o professor trabalha e da sua habilidade para aplicar
as competências em qualquer momento. (Ibidem, p. 14)
A eficácia do professor refere-se ao efeito que o desempenho do
professor tem nos alunos. A eficácia depende não só da competência e do
desempenho, mas também das respostas dos alunos. (Ibidem, p. 14)
A competência implica acção, uma acção física ou uma acção cognitiva,
ou ambas, dependendo da situação em que se manifesta a competência.
(Martins, Candeias e Costa, 2010, p. 23)
Repare-se na proximidade destes três conceitos, as suas similitudes, articulação e
interdependência justificam de alguma forma a dificuldade em distingui-los. A
avaliação do desempenho docente obriga à observação do avaliado no cumprimento das
suas funções, ou seja, no pleno exercício da sua atividade profissional. Para Rodrigues e
Peralta (2008) a associação da avaliação do desempenho docente com a ação, a
descrição, a análise e a interpretação da atividade profissional do docente é
inquestionável.
Assim sendo, estamos em condições de aceitar o seguinte enquadramento relativamente
à ADD:
La evaluación del desempeño profesional del docente es un proceso
sistemático de obtención de datos válidos y fiables, con el objetivo de
comprobar y valorar el efecto educativo que produce en los alumnos el
despliegue de sus capacidades pedagógicas, su emocionalidad,
responsabilidad laboral y la naturaleza de sus relaciones interpersonales
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con alumnos, padres, directivos, colegas y representantes de las
instituciones de la comunidad. (Veloz, 2000, p. 19)
Repare-se nesta definição de avaliação de desempenho docente que baliza o conceito
congregando alguns dos elementos fundamentais à sua conceptualização ao mesmo
tempo que se focaliza nos domínios da competência e eficácia do professor. Para além
de enaltecer a importância da validade e fiabilidade que deve ser aportada à recolha das
informações relativas ao avaliado, este autor enfoca a sua aceção no efeito que as
capacidades (pedagógicas, emocionais) do professor têm sobre os alunos.
A questão da avaliação dos professores aparece de tempos a tempos na
agenda política e social, mas por razões várias fica adormecida no
descontentamento das negociações conseguidas. (Clímaco, 2002,
Prefácio)
O advento da modificação e atualização do Estatuto da Carreira Docente dos
Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário pelo
Decreto-lei nº 15/2007 de 19 de Janeiro e a consequente reforma no modelo de
avaliação do desempenho dos docentes portugueses, catapultou a avaliação dos
professores para o centro das atenções de todos aqueles que sempre se interessaram pelo
campo da educação assim como para o quotidiano dos indivíduos que nunca se
manifestaram relativamente a qualquer assunto relacionado com o sistema educativo
nacional.
Nunca a avaliação dos professores suscitou tanto interesse e foi tão debatida pelos mais
variados agentes da sociedade: docentes, investigadores, opinião pública, opinion
makers, sindicalistas, políticos4.
A génese dos males da educação tinha finalmente sido descoberta:
[…] se aprecia un cierto consenso en la idea de que el fracaso o el éxito
de todo sistema educativo depende fundamentalmente de la calidad del
desempeño de sus docentes. (Veloz, 2000,p. 2)
4De realçar o sentido de oportunidade característico da classe política que transformou a avaliação do
Desempeho docente numaferramenta politico-partidária.
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Consequência da inexistência de um sistema de avaliação de professores credível,
rigoroso e eficaz! Infelizmente o mais importante passou desapercebido:
Um dos desafios que hoje se coloca à avaliação em geral é o de
contribuir para melhorar a vida das pessoas […]. (Ibidem, p. 5)
Com efeito, enquanto parte integrante de um conceito mais amplo, a avaliação do
desempenho docente não pode desagregar-se do tronco educativo do qual deriva. Pelo
que a sua importância é tanto mais evidenciada quanto mais relevantes forem os fins a
que se destina.
A interrogação primordial que emerge na abordagem da problemática da
avaliação dos professores é a seguinte: avaliar para quê? Qual a razão de
ser da avaliação? Que funções e propósitos é que a devem nortear?
(Simões, 2002, p.7)
A avaliação dos professores nem sempre foi associada a melhorias, na realidade esta foi
largamente conotada como um instrumento de controlo, de responsabilização e até
como mecanismo de despedimento. O carácter judicativo e a vertente sumativa da
avaliação dos docentes potenciaram sentimentos de resistência e de distanciamento por
parte dos docentes que se enraizaram e que desabrocharam com vigor aquando as várias
manifestações que ocuparam as avenidas das grandes metrópoles nacionais. Estas
demostrações populares constituíram provas do descontentamento dos docentes perante
as reformas educativas apresentadas pelos últimos governos constitucionais, embora
uma parte da sociedade portuguesa tenha apontado que estas alterações pecavam por
tardias, uma vez que eram necessárias para erradicar os “privilégios” atribuídos à classe
docente. Avaliar para quê? Para dar um passo de gigante na melhoria da qualidade do
ensino em Portugal! Ou talvez não?
Partimos de la idea de que la práctica docente es siempre mejorable y de
que tenemos la obligación de ofrecer a la sociedad el mejor servicio
educativo. (Alcaraz e Canals, 2007, p.161)
Compreenda-se que ceticismo pode associar-se ao medo da inovação ou da mudança,
mas no caso português, a “revolta” dos professores que todos presenciaram, a partir do
ano 2007, na sequência das alterações de um modelo de avaliação datado e há que
assumi-lo abertamente em certa medida largamente ultrapassado, não resultou de uma
simples incompreensão mútua (entenda-se entre os docentes e a tutela). O sucedido
decorreu, sobretudo, das dificuldades que os profissionais do ensino tiveram em
distinguir propósitos avaliativos coerentes, como a clara melhoria do desempenho
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docente, a prestação de contas à sociedade ou ainda a identificação de problemas e suas
possíveis soluções, contrapondo-se-lhes razões puramente economicistas ou políticas.
A avaliação pode assumir várias funções, sendo que as mais importantes,
no domínio do ensino, da formação e da educação, são as funções de
orientação, regulação e certificação. (De Ketele, 2010, p. 14)
Entenda-se que De Ketele (2010) estabelece a “orientação” como precursora da ação,
pois permite estabelecer o rumo que vai ser seguido ao iniciar-se uma aula, um ano
letivo, um curso superior ou até um processo avaliativo, conseguido através de um
plano de aula, uma calendarização anual, uma orientação vocacional ou, já no campo da
avaliação dos professores, por meio da implementação de uma reforma educativa. Por
sua vez a “regulação” tem uma essência fundamentalmente formativa orientada para a
melhoria da ação, através da identificação dos erros, do seu diagnóstico, da definição de
estratégias de remediação e melhoria. Em termos de ADD trata-se de uma avaliação
reguladora e não sancionatória que procura desenvolver as competências profissionais
dos professores através de mecanismos que possibilitam análises contextualizadas e
comparativas dos resultados obtidos na sequência de modificações nas práticas dos
docentes. Finalmente, a “certificação” é considerada como uma função social que
certifica, perante instâncias socialmente reconhecidas, os efeitos/ os resultados obtidos
na sequência da realização das ações dos docentes. No campo particular da avaliação
dos professores equivale, por exemplo, a asseverar o sucesso/ insucesso de um
indivíduo no término de uma formação em serviço, do seu ingresso nos quadros da
carreira docente, da sua promoção ou ainda do acesso à titularidade de um cargo.
Poderíamos ainda acrescentar a estes propósitos a proteção dos docentes competentes e
a exoneração dos incompetentes (Shinkfield e Stufflebeam, 1995) ou ainda a gestão da
carreira, dos recursos humanos e o aperfeiçoamento do sistema educativo promotor da
ADD (Hadji, 1995).
A multiplicidade de propósitos que podem ser associados à avaliação dos professores é
verdadeiramente espantosa ainda assim acreditamos que as aparências possam ser
enganosas. Senão vejamos, se nos debruçarmos, sucintamente, sobre cada uma das
funções apontadas por De Ketele (2010) seremos tentados em reunir a orientação e a
regulação sob a égide da melhoria da ação, numa vertente que o próprio autor
classificou de formativa e não sancionatória como no caso da função regulação e que,
segundo a qual, nos atrevemos a contaminar a orientação. O que não sucede com a
função de certificação manifestamente punitiva e fiscalizadora.
Martins
18 PROFMAT — 2015
Efforts to revise an existing teacher evaluation system or develop a new
one must emerge from a clear statement of purpose. Purpose guides the
development and refinement of evaluation system. Purposes consist of
two general types, formative and summative. (Haefele, 1993, p. 2)
The two principal purpose of teacher evaluation, are (1) quality assurance
and (2) professional development. (Danielson e McGreal, 2000, p. 8)
Teacher evaluation has typically two major purposes. First, it seeks to
improve the teacher own practice by identifying strengths and
weaknesses for further professional development – the improvement
function. Second, it is aimed at ensuring that teachers perform at their
best to enhance student learning – the accountability function. (OCDE,
2009c, p. 7)
1 — A avaliação do desempenho do pessoal docente visa a melhoria da
qualidade do serviço educativo e da aprendizagem dos alunos, bem como
a valorização e o desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes.
(N.º 1 do art.º 3.º do Decreto Regulamentar, n.º 26/ 2012, de 21 de
fevereiro)
Perto de vinte anos separam a primeira referência da última, mas se nos debruçarmos
sobre cada um destes trechos e tentarmos relaciona-los, depressa concluiremos que
todos eles apontam que a avaliação dos professores objetiva fundamentalmente dois
propósitos: a prestação de contas à tutela (avaliação sumativa) e o desenvolvimento
profissional (avaliação formativa).
[...] a história da avaliação de professores podia ser descrita em termos de
tensão entre dois tipos de propósitos, formativos e sumativos. (Simões,
2002, p. 44)
Com efeito a avaliação formativa associa-se ao desenvolvimento profissional e a
melhoria do desempenho e contrapõe-se à avaliação sumativa orientada para: a seleção,
a certificação, a tomada de decisões, a prestação de contas (Peterson, 2000).
Evidenciámos, deliberadamente, o aparente antagonismo que habitualmente se associa a
estes propósitos e que de alguma forma pretende justificar uma incompatibilidade
operativa destes fins no seio de um modelo de avaliação.
A perspectiva formativa da avaliação do desempenho é travada pela sua
dimensão sumativa, pela acentuação dos papéis de inspecção e controlo,
pela definição prévia e a imposição e pelo seu prolongamento numa
lógica de selecção, recompensa ou castigo com impacto na carreira.
(Formosinho e Machado, 2009, p. 297)
Uma primeira análise pode induzir quem nos lê a considerar que os dois propósitos da
ADD que temos vindo a referir não podem coabitar num único modelo de avaliação,
talvez porque fiquemos tentados em:
Martins
PROFMAT — 2015 19
[…] colocar en permanente tensión una perspectiva funcionaria ligada a
resultados de aprendizaje, de carácter punitivo, […], con la idea de una
evaluación basada en la enseñanza, con propósitos formativos y de
desarrollo profesional, sostenida por el Colegio de Profesores. (Assaél e
Pavez, 2008, p. 45)
Ou seja, consideramos que é lícito associar taxativamente a tutela à defensa de uma
postura sancionatória, certificativa, reguladora, sinónima de uma avaliação sumativa:
Legislators and policy-makers tend to value the summative purposes,
those of quality assurance and accountability. (Danielson e McGreal,
2000, p. 8)
Em simultâneo conotamos automaticamente a função formativa da avaliação com os
desejos dos professores em melhorar as suas práticas, o seu desempenho, em suma, a
qualidade da educação. Mas na realidade não são apenas os responsáveis pela pasta da
educação que querem manter os professores competentes nas escolas e se preocupam
com a continuação dos incompetentes no exercício de funções docentes, nem são apenas
os professores que almejam que as melhorias que alcançam tenham mais visibilidade na
sociedade contribuindo para uma identidade da classe docente.
Esta dualidade de posturas, perante propósitos formativos e sumativos que
inerentemente os docentes associam a estruturas educativas hierarquizadas com poderes
diferenciados, não evidencia uma clara aceitação de um modelo de avaliação com dupla
finalidade, como é o caso daquele que se encontra em vigor em Portugal5.
Um modelo de avaliação deve, sempre que possível, contemplar ambos os propósitos,
fomentando a consecução dos objetivos de melhoria dos docentes, assim como a
satisfação das necessidades identificadas na organização escolar ao nível individual ou
coletivo.
It is important to carefully address the tension between evaluation for
improvement and evaluation for career progression and develop their
complementarity within an articulated framework. (OCDE, 2009b, p. 6)
5Cf. N.º 1 do art.º 3.º do Decreto Regulamentar, n.º 26/ 2012, de 21 de fevereiro.
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20 PROFMAT — 2015
Não deve ser privilegiada a competitividade de propósitos, mas antes a sua
compatibilidade e conjugação servindo assim os interesses de todos os envolvidos no
processo avaliativo (Stronge, 1995).
Contributos do PM vs. ADD no desenvolvimento profissional dos docentes, na
aprendizagem e no ensino da matemática
O contributo do PM não pode de todo ser circunscrito à melhoria dos resultados
académicos dos alunos, o PM permitiu que os docentes dos 2º e 3º Ciclos do Ensino
Básico em funções nos mais diversos concelhos no país, se conhecessem melhor,
estabelecessem não somente relações profissionais, de partilha, de práticas e materiais,
ou de reflexões acerca da disciplina de matemática mas também de amizade. Se o ME
estabeleceu (forçou) momentos específicos durante permitindo que os docentes se
reunissem com a orientação de um professor acompanhante cujo papel foi
preponderante, rapidamente se verificou que a colaboração entre os professores não foi
de toda artificial. Muitos foram os professores de matemática que agendaram
variadíssimas reuniões de trabalho para além daquelas que eram “obrigatórias”. O
trabalho em equipa e colaborativo prevaleceu como uma necessidade natural e
espontânea. Se a cultura colaborativa já existia em determinados estabelecimentos de
ensino a mediação entre o ME e os docentes estabelecida através do professor
acompanhante potenciou os comportamentos colaborativos preexistentes. Como é
evidente a partilha foi mais intensa entre os docentes envolvidos no PM quer pela
necessidade conceber, partilhar e planificar conteúdos dos mesmos níveis de ensino
assim como consequentemente pela implementação de estratégias e metodologias de
ensino mais diversificadas proporcionando assim aos discentes variadas formas de
aprender. Em termos de avaliação a grande diversidade e quantidade de instrumentos
avaliativos proporcionaram aos alunos novos modos de confirmar/ infirmar as suas
aprendizagens. O disciplina não curricular de Estudo Acompanhado foi atribuída aos
docentes de matemática, o que permitiu não somente a implementação de um reforço no
treino, na análise exaustiva dos conteúdos, em suma, na aprendizagem da matemática
como promoveu nas escolas uma cultura mais alargada de partilha e envolvimento de
outras disciplinas como as tecnologias de comunicação e informação, disciplinas como
a física e química que também beneficiar dos equipamentos tecnológicos que
apetrecharam os laboratórios de matemática e/ou salas de aula proporcionando aos
Martins
PROFMAT — 2015 21
discentes experiências de aprendizagem diversificadas ou ainda as assessórias realizadas
com os docentes da disciplina de português. Uma clara alusão ao desenvolvimento
profissional no coletivo profissional apontado por Ponte (1998). Se o PM contribuiu
para que os resultados na disciplina de matemática melhorassem substancialmente,
particularmente nos exames nacionais (Carvalho, 2010) este plano também contaminou
positivamente o desenvolvimento profissional dos docentes. Com efeito, esta
contaminação enquadra-se em vários dos modelos de desenvolvimento profissional
apontados por Sparks e Loucks–Horsley (1990). Nomeadamente: o desenvolvimento
profissional autónomo uma vez que os docentes também procuram assimilar por si
mesmos os conhecimentos que entendem necessários para o seu desenvolvimento
profissional ou pessoal; o desenvolvimento profissional baseado na reflexão procurando
uma maior autoconsciência pessoal e profissional.
[…] o processo de reflexão na acção do profissional, encontra-se uma
concepção construtivista da realidade com que ele se defronta. (Schön,
1987, p. 36).
Ou ainda através de um desenvolvimento profissional organizacional visando implicar
um maior número possível de professores promovendo a colaboração no respeito de
uma autonomia própria de cada escola. O desenvolvimento profissional pode
efetivamente adotar diferentes modalidades, não existe apenas um modelo a seguir
pelos estabelecimentos de ensino e pelos docentes. A Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico (OCDE) tem desenvolvido estudos onde é possível aferir
várias formas de potenciar o desenvolvimento profissional, nomeadamente através da
frequência de conferências/ seminários; da aquisição de um novo grau académico; do
desenvolvimento de investigações individuais ou colaborativas; da visita a outros
estabelecimentos de ensino; da colaboração numa rede de professores que se dedicam à
temática do desenvolvimento profissional. Cada qual deve procurar crescer
profissionalmente em função das suas necessidades assim como das suas carências,
crenças e culturas (OCDE, 2009a).
Se os PM I e PM II procuraram melhorar os resultados académicos dos alunos na
disciplina de matemática ao mesmo tempo que potenciaram o trabalho colaborativo
entre os docentes e em última análise o desenvolvimento profissional dos mesmos:
Studies have shown that the types of professional development closely
linked to improved student learning are those that provide opportunities
for professional dialogue and critical reflection. (OCDE, 2009a, p. 9)
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22 PROFMAT — 2015
A implementação do “novo” modelo de ADD contemporâneo do PM I aportou também
alguns “benefícios” aos professores uma vez que contribuiu efetivamente para que os
docentes se empenhassem em conhecer os documentos estruturantes das organizações
educativas onde se inseriam.
Um dos objectivos principais de qualquer modelo de avaliação de
desempenho é alinhar os objectivos dos diferentes colaboradores com os
objectivos da organização. (Morais, 2009, p. 13)
Aqueles que poucas ou nenhumas vezes se dignaram refletir e a analisar o seu
desempenho enquanto profissional da educação passaram a conhecer e a preocupar-se
com a importância da concretização de tais objetivos no seio da organização onde
exerciam funções. Morais (2009) ainda apontou que o novo sistema de ADD também
contribuiu para estabelecer prioridades em termos de formação contínua dos docentes
uma vez que permitiu identificar as necessidades destes últimos. O processo de ADD
forneceu respostas a algumas questões dos professores como “qual o objetivo de
frequentar esta ou aquela ação de formação?” assim como aos diretores dos centros de
formação, nomeadamente “qual o plano de formação mais adequado para este ou aquele
conjunto de escolas?”.
Para Fernandes (2008), o contributo da avaliação dos professores não deve ser
confinado às quatro paredes da sala de aula, os seus resultados têm que extravasar o
universo dos docentes para que as organizações, as escolas onde estes exercem a sua
atividade tomem conhecimento daquilo que os docentes conseguem ou não alcançar em
termos de sucesso e progresso dos alunos. Os docentes querem sentir que o seu trabalho
é reconhecido pela comunidade educativa e não apenas pelos seus avaliadores e pares. É
na partilha e na colaboração que pode estar a mais-valia da avaliação dos professores
(entroncando assim no produto dos PM I e PM II), a nova regulamentação promulgada a
partir de 2007 não impede que se desenvolvam tais momentos de cooperação e
repartição de saberes.
[…] tudo depende da forma como as escolas decidirem concretizar o
modelo. (Ibidem, p. 29)
No entanto, a diferenciação da carreira docente em duas categorias, professor e
professor titular veio convelir uma classe cristalizada no paradigma da indiferenciação e
minar de certa forma o trabalho a ser desenvolvido no seio do PM I a decorrer nessa
altura. Esta cisão foi largamente contestada aquando a sua divulgação e
exponencialmente repugnada quando, no ano escolar de 2007/2008, ficaram
Martins
PROFMAT — 2015 23
estabelecidos os requisitos de cariz administrativos para a titularização. Para Afonso
(2007), instalou-se uma divisão na carreira que desprezou as competências de muitos
professores, os seus compromissos, envolvimentos e dedicações, a qualidade dos
desempenhos e dos cargos que foram assumidos anteriormente, as formações
interiorizadas e adaptadas ao quotidiano dos docentes, os trajetos pessoais e os projetos
em construção. Este autor apontou que um dos “paradoxos maiores” se verificou
quando nas atribuições de coordenação e supervisão associadas à categoria de professor
titular não estavam contempladas as funções de coordenação de turma, vulgo direção de
turma que constitui um dos exercícios.
A escolha de um avaliador não pode ser casual e, sobretudo, não pode
depender de critérios político administrativos. (Ruivo, 2009, p. 8).
A evidência da falta de meios/ indivíduos capacitados e cumpridores dos requisitos de
avaliador promoveu uma forma de “lotaria de avaliadores” onde alguns professores
eram avaliados por colegas da mesma área disciplinar enquanto outros foram
submetidos a situações de “avaliações caricatas” onde a componente científica-
pedagógica (principalmente a científica) não podia ser avaliada com pleno anuência dos
intervenientes em detrimento da sua crescente preponderância no processo avaliativo. A
aplicação do sistema de quotas contribuiu ainda mais para que a ADD se transformasse
progressivamente num procedimento técnico implementado em condições “instáveis”
que colocaram o desenvolvimento pessoal e profissional dos docentes em causa. A
instabilidade vivida pelos professores ficou patente pelas sucessivas alterações do
Decreto Regulamentar tendo-se verificado um afastamento progressivo das exigências
iniciais em 2007 para o que foi implementado no final do primeiro ciclo avaliativo.
Com o primeiro ciclo concluído onde cerca de 93.8% dos docentes foram avaliados6 e
com o segundo ciclo de avaliação (2009/2011) a decorrer foram publicados em 23 de
junho de 2010 os Decreto-Lei n.º 75/2010 e o Decreto Regulamentar n.º 2/2010,
diplomas que aportaram um conjunto de alterações na avaliação dos professores, como
6 Fonte: Relatório sobre a aplicação do 1º ciclo de Avaliação do Desempenho Docente (CCAP, 2010b, p.
14).
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24 PROFMAT — 2015
a reunificação da carreira docente numa única categoria; a introdução de uma “nova7”
figura no processo de avaliação – o relator; as condições associadas à obrigatoriedade
de observação de aulas; as funções de um júri de avaliação ou ainda o contributo da
autoavaliação dos docentes. Não obstante o diluvio de alterações que sucederam estes
diplomas foi apenas em 2012 que foi promulgado o Decreto-Lei n.º 41/2012, de 21 de
fevereiro que constitui a quarta alteração do ECD desde o ano de 2007 e que procurou
dar corpo às pretensões do XIX Governo Constitucional designadamente na:
[…] efectivação de um ambiente de estabilidade e de confiança nas
escolas, à desburocratização dos métodos de trabalho e à avaliação das
práticas e dos processos administrativos aplicados à gestão da Educação.
(Decreto Regulamentar n.º 41/2012, de 21 de fevereiro, preâmbulo)
Entre as várias alterações efetuadas no ECD de destacar evidentemente aquelas que
estabeleceram os fundamentos da reforma do processo de ADD que vigorava desde
2010 e que, segundo a tutela, fomentaram a implementação de um processo de
avaliação em vigor atualmente de cariz mais simples muito embora cumprisse com
níveis idênticos de exigência, rigor e autonomia.
Em suma o novo regime de ADD é um mal necessário, numa investigação que
concluímos em 2013, inferimos junto de mais de mil e duzentos docentes do Alentejo
(16,8% dos quais professores de matemática) que a avaliação do desempenho docente
era necessária, mais 95% dos respondentes concordaram com a sua existência! Este
incontestável resultado garantiu-nos que os profissionais do ensino que inquirimos não
almejavam uma exoneração avaliativa que os libertasse de responsabilidades inerentes
aos seus cargos.
Portugal’s performance in international surveys remains well below the
OECD average. Against this backdrop, the Government’s efforts to
introduce meaningful teacher evaluation are very important and should
be sustained. (OCDE, 2009b, p. 5)
7 A figura de relator não é propriamente uma novidade no processo de ADD uma vez que no Decreto-Lei
n.º 139-A/90 de 28 de abril (n.º 4 do 9.º artigo.º), o relator era o responsável pela elaboração do projeto de
parecer para atribuição da menção qualitativa pela comissão especializada.
Martins
PROFMAT — 2015 25
Neste trabalho confirmamos o que havíamos constatado na literatura (Flores, 2010;
OCDE, 2009c; Peterson, 2000; Simões, 2002; Stronge, 2010), obtivemos evidências que
nos permitiram inferir que os inquiridos entendiam que esta avaliação promovia o seu
desenvolvimento profissional reforçando a ideia que a avaliação dos professores não
deve ser apontada como um constrangimento ou como um fator de limitação à ação
educativa. A ADD poderia constituir uma oportunidade que a ser abraçada por todos no
intuito de promover melhorias no desenvolvimento profissional dos docentes.
O sistema de avaliação cria uma oportunidade de desenvolvimento
profissional que pode contribuir significativamente para melhorar a vida
pedagógica das escolas e a qualidade do serviço que prestam à sociedade
em que se inserem. (Fernandes, 2008, p. 29)
Os participantes no estudo também apontaram a que a legislação em vigor não
desprezava a associação entre a ADD e a melhoria da qualidade da escola uma vez que
podia ocupar um papel preponderante na identificação dos docentes que não
desempenham as suas funções da melhor forma e assim procurar fornecer-lhes o apoio
necessário à sua melhoria.
Os participantes no estudo também não concordaram que a ADD promovesse a
diferenciação dos docentes segundo o mérito, a seleção no acesso à profissão docente e
a prestação de contas à sociedade. Não obstante a importância destas opiniões queremos
realçar que embora o modelo de ADD em vigor apontasse claramente que se
encontrava:
[...] orientado para a melhoria dos resultados escolares e da aprendizagem
dos alunos e para a diminuição do abandono escolar, [...]. (Preâmbulo do
Decreto-Lei n.º 41/ 2012, de 21 de fevereiro)
Os inquiridos discordaram que a ADD promovesse a melhoria das aprendizagens dos
alunos. Repare-se que não é de todo descabido inferir que uma das exigências que se
coloca aos professores prende-se com a obrigação destes desenvolverem as suas funções
em prol do sucesso dos alunos (Simões, 2002). Ora, na presença de um modelo de
avaliação que objetiva tais desígnios, seria expectável que os professores assumissem
uma postura de concordância, entendendo à ADD como promotora da melhoria das
aprendizagens dos alunos. No entanto, tal não sucedeu com os participantes do estudo
que ao manifestarem discordância, conduzem-nos a inferir uma eventual não aceitação
do supradito modelo vigente.
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Daí advém o risco da avaliação constituir-se irrelevante quer para o desenvolvimento
profissional como para a melhoria das aprendizagens dos alunos (CCAP, 2010b).
Considerações finais
Os contributos dos PM I e PM II foram evidentes, não só facultaram algum
protagonismo positivo à disciplina de matemática que não aquele à que os docentes
desta disciplina estavam habituados como permitiram um aprofundamento didático dos
professores em termos de conhecimento do currículo, do processo instrucional (Ponte e
Oliveira, 2002), dos alunos per se e suas respetivas aprendizagens ou ainda do Novo
Programa do Ensino Básico implementado no decorrer do PM II. Os planos
promoveram uma evidente cultura de reflexão sobre a prática quer seja na ação, sobre a
ação e sobre a reflexão na ação (Schön, 2000), em determinados ambientes educativos a
cooperação e a colaboração dos docentes fomentaram uma cultura de aprendizagem
profissional próxima do conceito de comunidade de aprendizagem definido por Ponte et
al (2009). As práticas de sala de aula alteraram-se desde a implementação de portfólios
passando pela diversificação de tarefas até ao processo avaliativo e sua respetiva
aferição em pequenos e grandes grupos de trabalho in loco ou não.
Como é expectável nem tudo decorreu da melhor forma e alguns constrangimentos
tiveram que ser superados como a falta de tempo dos docentes para poderem trabalhar
em conjunto de uma forma mais sistemática ou ainda a falta de permeabilidade na troca
de saberes entre algumas escolas que integraram os vários grupos de trabalho (Oliveira,
2011). Foi justamente na capacidade de promover uma simbiose colaborativa e
produtiva que os PM I e II se destacaram comparativamente a uma ADD que
inicialmente dicotomizou com ligeireza a classe docente entre avaliadores e avaliados.
Se os planos foram considerados um exemplo de bem-fazer sob a égide da autonomia
das escolas a avaliação dos docentes imposta superiormente foi sinónima de confrontos
entre os professores.
Não há como discordar:
The ultimate goal of all professional development is improved student
achievement. (Mundry & Loucks-Horsley, 1999, p. 3)
Quer os PM I e II ou a ADD provaram querer contribuir não somente para a melhoria
dos resultados académicos dos alunos como para o desenvolvimento profissional dos
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PROFMAT — 2015 27
docentes, ora a resolução dos problemas no campo da educação depende cada vez mais
do trabalho cooperativo, colaborativo em detrimento do carácter individualista de uma
cultura conservadora de escola.
O desenvolvimento profissional atual é um assunto de grupos de
professores, frequentemente trabalhando com especialistas, supervisores,
administradores, orientadores, pais e muitas outras pessoas que estão
ligadas à escola moderna. (Fenstermacher e Berliner, 1985, p. 282)
A hodiernidade desta referência não pode ser colocada em causa é aceitável considerar
que os benefícios que advêm do desenvolvimento profissional não têm apenas
implicações diretas nos docentes e consequentemente nos discentes que tutelam. Todos
os implicados no processo de ensino e aprendizagem, quer sejam os professores, os
alunos ou o pessoal não docente lucram com o desenvolvimento profissional dos
professores, mais acrescentamos que a própria comunidade educativa tem todo o
interesse em desenvolver-se profissionalmente:
El desarrollo profesional de todo el personal educativo de un centro
educativo se define como aquellos procesos que mejoran la situación
laboral, el conocimiento profesional, las habilidades y actitudes de los
trabajadores de un centro educativo. Por lo tanto, en este concepto se
incluiría a los equipos de gestión, al personal no docente y al
profesorado. (Imbernón, 2009, p. 33)
Ainda que possa parecer utópico, atrevemo-nos a referir que os docentes podem até
constituir um motor social de desenvolvimento que contagie não somente o núcleo duro
dos profissionais do ensino mas que extravase na sociedade a necessidade de uma
constante atualização de conhecimentos.
O valor das sociedades atuais está diretamente relacionado com o nível
de formação de seus cidadãos e da capacidade de inovação e
empreendimento que eles possuam. (Marcelo, 2009b, p.110)
Se queremos uma sociedade plural e capaz de enfrentar a concorrência global e as
ameaças económico financeiras temos todo o interesse em que os cidadãos de amanhã
tenham os melhores professores de hoje, para tal novas competências têm que ser
diariamente exigidas aos docentes e aos alunos para que se alcance a produtividade
necessária e imposta pelos acionistas e/ou contribuintes que exigem justificação perante
os investimentos realizados em época de crise económica.
O plano de ação para a matemática abriu o caminho para uma nova forma de enfrentar a
matemática, para demonstrar que os professores (de matemática) foram e continuam
Martins
28 PROFMAT — 2015
capazes de moldar o mundo sem medo de uma ADD imposta por decreto. Perante a
evidência da utilidade desta medida, quando terremos um plano de ação para educação?
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Decreto Regulamentar n.º 26/ 2012, de 21 de fevereiro
PROFMAT — 2015 32
PRÁTICAS TRAICIONAIS RIDEIRINHAS E EDUCAÇÃO MATEMÁTICA:
TRAVESSIAS PARA ALÉM DA SALA DE AULA
Isabel Cristina Rodrigues de Lucena, Maria Augusta Raposo de Barros Brito
Universidade Federal do Pará
[email protected], [email protected]
Resumo
A dificuldade na compreensão dos conteúdos matemáticos vivida pelos estudantes nas
escolas ribeirinhas, em especial nas séries iniciais, é parte da falta de diálogo dos
conhecimentos desse nível com as situações do cotidiano. Essa percepção foi possível
de ser construída a partir das vivências e discussões que emergiram das pesquisas com
os professores ribeirinhos. Desde 2006 no Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação
Matemática e Cultura Amazônica (Gemaz), e o Projeto Alfabetização Matemática na
Amazônia Ribeirinha – AMAR: condições e proposições, ambos ligados ao Programa
de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática da Universidade Federal do
Pará (PPGECM/IEMCI/UFPA), veêm trabalhando para oportunizar a compreensão da
matemática com sentido e significado, a partir de aspectos culturais dos grupos
amazônicos, compreendendo a matemática religada à história e à cultura das populações
ribeirinhas. Nesta perspectiva, um novo olhar se move em direção ao currículo escolar,
que requer uma organização dos tempos/espaços/valores que deverão ser considerados
necessários para os alunos ribeirinhos, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional - LDBEN (Lei n° 9394/1996). No entanto, permanece ecoando um
distanciamento entre os conhecimentos para o ensino de matemática e os conhecimentos
instaurados cotidianamente pelos alunos ribeirinhos. Assim, essas pesquisas favorecem
reflexões que nos direcionam para atividades potencializadoras de interconexões a partir
da base tradicional amazônica pertencente aos alunos ribeirinhos com novos/outros
conhecimentos da matemática escolar. Neste texto destacamos duas experiências de
professores ribeirinhos que trabalham na perspectiva de aproximação entre os
conhecimentos locais e globais.
Palavras chave: Práticas Tradicionais, Educação Matemática, Escolas Ribeirinhas.
Introdução
As primeiras pistas para se adentrar no universo deste tema centram-se nas pesquisas
encaminhadas pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Matemática e Cultura
Amazônica - GEMAZ e o projeto Alfabetização Matemática na Amazônia Ribeirinha:
Lucena & Brito
PROFMAT — 2015 33
condições e proposições – AMAR1. As vivências e discussões emergidas desta parceria
resultaram em pesquisas envolvendo os professores ribeirinhos os anos iniciais, a partir
do que foi possível inferir que, parte da dificuldade de compreensão dos conteúdos
matemáticos escolares vivida pelos estudantes ribeirinhos, em especial nos anos iniciais,
está relacionada a carência de diálogo entre conhecimentos desse nível escolar com as
situações do cotidiano, vivificados nos saberes da tradição das comunidades
ribeirinhas.
A área chamada ribeirinha, comum ao universo da Amazônia brasileira, possui escolas
que se diferenciam dos centros urbanos. Geralmente são escolas (ou unidades
pedagógicas) com um número pequeno de alunos (total de 20 a 50 alunos em média) e
organizadas em turmas multisseriadas (alunos de 1º ao 3º ano em uma mesma sala de
aula com um único professor, por exemplo) com cerca de 10 a 20 alunos por sala. É
comum que as escolas dessas comunidades ribeirinhas atendam os cinco primeiro anos
de escolaridade, no Brasil denominado Ensino Fundamental I, com alunos na faixa-
etária de 6 a 10 anos.
O projeto AMAR esteve dedicado a investigar realidades de ensino da matemática em
oito escolas dos anos iniciais pertencentes à região insular de Belém (estado do Pará –
Brasil) durante os anos de 2011 a 2015. Para uma certa compreensão do universo
territorial que estamos inseridos, informamos que a extensão territorial do estado do
Pará é 1.248.042,515 Km2, composta por 144 municípios. Somente o município de
Belém, capital do estado do Pará, cerca de possui 1.000Km2 com 1.432.844 habitantes
distribuidos entre sua área continental e suas 39 ilhas (IBGE2, 2014). Embora o espaço
territorial das ilhas corresponda a cerca de 61% da área total de Belém, a maioria da
população habita a parte continental desse município. O modo de vida das ilhas difere
substancialmente daquilo que há na vivência continental, apoximando-se mais dos
aspectos rurais – subsitência no extrativismo, cultivo da terra, baixa concentração de
1 O AMAR é integrante do Programa Observatório da Educação (OBEDUC) – Edital 2010 – financiado
pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal Docente (CAPES) apoiado pelo Ministério da
Educação do Brasil (MEC) e pelo Instituto de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). 2 Dados referente ao relatório de 2014 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Lucena & Brito
34 PROFMAT — 2015
moradores, dentre outros – com dependência de deslocamento, quase que
exclusivamente, do transporte fluvial.
Vejamos um pouco do mapa de Belém:
Figura 1: Mapa de Belém-Pará-Brasil (Fonte: Arquivo projeto AMAR, 2014 )
Desde de 2006 o GEMAZ realiza pesquisas, em nível de mestrado, na ilha do Combu.
Já a partir do projeto AMAR foram envolvidas as seguintes localidades: ilha do Combu,
ilha Grande, ilha de Cotijuba e região da Várzea (Igarapé do Aurá). É em meio a uma
ampla hidrografia, uma paisagem exuberante e cotidianidade diferente do ambiente
urbano da capital continental que deflagramos investigações sobre a educação
matematica que se realiza nas escolas ribeirinhas.
Além das referências construídas a partir do projeto AMAR, trazemos para esse texto
alguns fragmentos da pesquisa de mestrado de Brito (2008), nascedouro das
investigações do GEMAZ nas ilhas de Belém.
A fim de divulgarmos um pouco dessa experiência investigativa, organizamos esse
texto nas seguintes secções: O ensino de matemática e o contexto ribeirinho; Nossas
percepções, Nossa atenção e A aposta. Em Nossas percepções citamos conclusões em
âmbito da formação docente no sentido de anunciar os olhares do campo da pesquisa
científica para as investigação em causa, em nível geral e por meio dos estudos
realizados pelo Gemaz. Em Nossa atenção destacamos a proeminente necessidade de
estritamentos de relações entre o que se pesquisa e o que eminentemente acontece na
Lucena & Brito
PROFMAT — 2015 35
educação básica, tomando como referência as vivências ocorridada durante a inserção
do GEMAZ nas escolas ribeirinhas. Por fim, na A aposta referimo-nos a duas
experiências de professores ribeirinhos, as quais reforçam o argumento de que a
compreensão dos conteúdos matemáticos escolares pelos estudantes ribeirinhos pode ser
beneficiada pelo diálogo entre conhecimentos desse nível escolar e as situações do
cotidiano.
O ensino de matemática e o contexto ribeirinho
Discutir o ensino de matemática tem um desafio constante uma vez que na realidade
estudada o domínio conceitual desta linguagem ainda aponta para os (de)sabores da
compreensão a respeito de seus objetos de aprendizagem. Em contraponto, as práticas
matemáticas estão fortemente presente no cotidiano das crianças em suas ações diárias,
desafiando essas crianças ao enfrentamento de problemas que envolvem estimativas,
medições, cálculo mental, ordenações, classificações, dentre outros.
É na vivência deste contexto que nos propomos a dialogar sobre alguns dos elementos
que pinçamos ao olhar atentamente para este local, a explicitação de ambientes de
aprendizagens em que os saberes da tradição são deflagrados como organizadores do
fazer pedagógico, embora sejam práticas indissincráticas. O nosso interesse além de
mostrar as condições da realidade ali vivida, é também apontar as possibilidades
existentes, mesmo no enfrentamento das adversidades postas.
O currículo da Educação Básica brasileira é orientado (embora atualmente haja
propostas de mudanças) pelo que conhecemos como Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN) - disposto pelo Ministério da Educação desde 1997 - que são diretrizes gerais
com sugestões de blocos de conteúdos a serem trabalhados por ciclos. No caso dos anos
iniciais há dois ciclos: 1º ao 3º ano e 4º e 5º anos. Contudo, as secretarias de educação
estaduais e municipais, podem organizar sugestões de conteúdos frente as suas próprias
realidades e por fim, as próprias escolas também podem organizar seus currículos por
meio dos seus Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) a fim de atender mais
adequadamento os alunos que lhes competem.
Embora haja uma flexibilidade ampla para organizar o currículo de matemática e as
práticas para esse ensino, os currículos procuram estar de acordo com as matrizes de
Lucena & Brito
36 PROFMAT — 2015
referência para as provas externas demandas pelo MEC tais como as chamadas Provas
Brasil e Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA). Então há sempre uma certa
similaridade curricular entre os PPP das escolas, sobretudo no que diz respeito ao que
deve ser ensinado – de matememática - nos anos iniciais de escolarização.
Muitas vezes o ensino de matemática em escolas ribeirinhas toma como referência o
contexto das escolas urbanas. Dos referenciais da psicologia da aprendizagem ou das
neurociências, é possível afirmar que a aprendizagem da criança é facilitada pela
relação que ela estabelece entre conhecimentos novos a serem adquiridos e aqueles já
estabelecidos por suas práticas cotidianas. Portanto, o contexto, as experiências
cotidianas devem ser consideradas para a organização do ensino escolar a fim de
proporcionar qualidade de aprendizagens. Assim, é fundamental reconhecer as práticas
cotidianos do universo ribeirinho para que seja posto em voga as relações pretendidas
com o conhecimento escolar.
A fim de esclarecer um pouco o que denominamos por ribeirinho, trazemos a definição
de Cruz (2008) que refere-se ao ribeirinho não somente aquele que mora às
proximidades dos rios mas, que sobretudo, o que assume o rio para além de um espaço
geográfico, mas, especialmente como um espaço social e simbólico. Segundo Cruz,
O rio como espaço social é o meio e a mediação das tramas e dos dramas sociais que
constituem o modo de vida ribeirinho com seus saberes, fazeres e sociabilidades
cotidianas. Como espaço simbólico ele é matriz do imaginário, produto e produtor dos
sistemas de crenças, lendas, cosmologias e mitos ligados à floresta e ao misterioso
universo das águas que são elementos fundamentais na construção da cultura do
ribeirinho na Amazônia. (2008, p. 59).
Os alunos ribeirinhos, em geral, são nascidos e criados tendo o rio como espaço social e
simbólico. Ao assumirmos o entendimento de que a geração, a organização e a difusão
do conhecimento se estabelecem pelas necessidades sociais que os humanos sentem
para encontrarem explicações e modos de interação com sua realidade (D’Ambrosio,
2007), não há como inferiorizar ou descartar o conhecimento local para o envolvimento
dos alunos em suas aprendizagens.
Portanto, ao lidar com a escolarização, ou melhor, a educação matemática dos alunos,
não basta conhecer dos referenciais curriculares por si. Há de se considerar, também,
qual o contexto de vida que possibilita as aprendizagens dos alunos, suas experiências
Lucena & Brito
PROFMAT — 2015 37
cotidianas e suas formas de lidar com os problemas, por vezes muito distante dos
referenciais urbanos.
Nossas percepções
Ao se pensar em determinado local em que se realiza a investigação é preciso esclarecer
que as percepções são temporalmente posta por quem investiga. Estas percepções são
determinadas por um conjunto de situações muitas vezes exteriores ao fenômeno, mas
também constituem focos para se prosseguir em novos argumentos, por vezes
corroborando com os anteriores, ou refurtando-os. O que genuinamente se quer dizer é
que nossas impressõoes aqui postas também servem de vetor analítico de nossa própria
ação investigativa, por isso nossa confiança em dizer de um local no conforto de nossas
limitações interpretativas.
Compreendemos que os docentes que ali estão – nas escolas ribeirinhas – recebem
formação de um contexto urbano e, nesse sentido, algo já nos provoca: em quais
aspectos as questões norteadoras de estudos a respeito deste contexto podem ser
similares ao outros em relação à docência? O que se tem apontado em âmbitos gerais
aos fazeres pedagógicos desta comunidade?
Em sentido abrangente destacamos alguns autores que têm investigado sobre a
docência. Dentre outros, nos reportamos a Nacarato (2006) e Curi (2004). A primeira
pesquisadora indica que há uma forte ligação entre os valores e crenças em relação a
matemática e a execução da prática pedagógica desta mesma disciplina enquanto que,
Curi, ao estudar o currículo dos graduandos para atuarem nos anos iniciais conclui que a
maioria dos cursos de formação no Brasil dão atenção aos conteúdos gerais do ensino
da matemática em detrimento a uma formação que priorize aspectos metodólogicos
sobre temas a serem abordados neste mesmo nível de ensino.
Em termos mais próximos a nossa atuação destacamos no estado do Pará, o estudo de
Dias (2014) revelando que os docentes ensinam como aprendem, reforçando assim a
necessidade de se (re)pensar a formação, ou seja, de repensarmos as aprendizagens de
formação inicial dos professores para os anos iniciais, pois, conforme já mencionado, há
uma grande tendência das licenciaturas contribuírem com as atuais práticas que se
desenvolvem no interior da escola.
Lucena & Brito
38 PROFMAT — 2015
Em síntese, as experiências formativas são fundamentais para a constituição docente em
termos mais próximos aos contextos em que irão atuar.
Para além de compreender aspectos gerais, o GEMAZ visa olhar atentamente para
espaços específicos, contexto regionalizados, sem se perder na segregação dos espaços,
seja geográfico, social ou imaginativo. Nisso cabe ressaltar a preocupação de estudos
que visam problematizar como o conhecimento, de modo especifico e sob a relevância
do contexto cultural, pode interligar-se aos contexto mais amplos em aula. É nesta
perspectiva que cabe apresentar nossas percepções singulares como sujeito de dialogia
com e no conetxto ribeirinho.
A este respeito Dias e Brito (2012) baseadas em Fleck3 indicam que as pesqusias do
GEMAZ buscam compreender como os saberes do cotidiano, ou da tradição das
comunidades ribeirinhas aproximam-se, distanciam-se ou são negados por práticas
formais do ensino de matemática.
A este respeito destacamos resultados apresentados por: (a) Sousa (2010) que conclui
que há distanciamento entre os saberes cientificos e os da tradição dos
estudantes ribeirinhos, e com isto, afastamento dos alunos ribeirinhos da continuidade
da escolarização; (b) Bicho e Lucena (2014) asseverando que a alfabetização
matemática expressa no contexto ribeirinho ainda se restringe às experiências
matemáticas às orientações didáticas e curriculares de âmbito global, sem levar em
consideração os conhecimentos sugeridas pelas experiências dos estudantes em seu
contexto diário.
Mediante o exposto apresentamos a nossa percepção a respeito da formação docente no
sentido de assentar nossas pretenções de estudo à temática. Com isso destacaremos a
seguir a próxima seção.
3 Ludwink Fleck, médico polonês que em 1935 publicou sua obra Entstehung und
Entwicklungeiner wissenschaftlichen Tatsache (A Gênese e o Desenvolvimento de um Fato Científico).
Lucena & Brito
PROFMAT — 2015 39
Nossa atenção
Ao percebermos que a matemática escolar vivenciada nas escolas ribeirinhas, em sua
maioria, não se organizava tomando como alguma referência as práticas cotidianas dos
alunos que ali estavam, com sentido e significado relacionados ao contexto dos
amazônidas, percebemos que elementos desse tipo de cotidianeidade também era
ausente ou minimizado na formação dos professores amazônidos.
Para pensar o ensino na perspectiva de articulação entre os saberes – tradição escolar e
tradição cultural – a docência deve ser provida de atenção em situações de
aprendizagens que favoreça tal compreensão, há que se pensar um projeto comum entre
formadores e professores da educação básica para que a experiência seja significada por
elos entre este mesmo objeto – a prática – e a compreensão teórica a respeito, pois
segundo Freire:
[...] é refletindo sobre a prática que aprendemos a pensar e a praticar
melhor, contudo, atribui valor à prática na mesma equivalência que à
teoria, pois há a dialeticidade entre a teoria e a prática. [...] é desvelando
o que fazemos desta ou daquela forma, à luz do conhecimento que a
Ciência e a filosofia oferecem hoje que nos corrigimos e nos
aperfeiçoamos. (Freire, 1998, p. 105)
É com a pretenção de aproximar teoria e prática no que se refere a formação docente é
que buscamos estar atentos para o enfrentamento das condições postas ao ensino, por
meio de aprendizagens e de parcerias com os professores atuantes na educação básica.
Se por um lado a formação docente não tem proporcionado aprendizagens suficientes
para o enfrentamento de desafios do ensino no contexto amazônico ribeirinho, por outro
lado, nós, na condição de formadores de professores sentimos carência de
conhecimentos e experiências para com essa situação.
Por meio do AMAR, buscamos adentrar o universo ribeirinho em parceria com os
professores que atuam em escolas das ilhas de Belém–PA a fim de galgar experiências e
produções conjuntas. Dentre as ações propositivas desenvolvemos um curso de
especialização no qual há o que denominamos de aulas práticas, onde nós, professores
da equipe do GEMAZ ministramos aulas nas turmas dos professores ribeirinhos, nos
espaços escolares das ilhas de Belém, assistidos por esses professores. Essas aulas são
planejadas em conjunto com os professores e refletem teorias sobre ensino e
Lucena & Brito
40 PROFMAT — 2015
aprendizagem matematica nos anos iniciais. As aulas, entre outros objetivos, tem
contribuído fortemente para que possamos nos aproximar das aprendizagens da
matemática ocorridas no universo ribeirinho, auxiliando-nos, também, no processo
investigativo sobre o tema.
Importa-nos dizer que, além das aulas práticas, temos recolhidos aprendizagens também
com as experiências que tem sido implementadas por esses professores e que
corroboram com a assertiva da melhoria da aprendizagem matemática pelo diálogo com
os saberes da tradição ribeirinha.
A seguir anunciamos duas dessas experiências. A primeira remonta a pesquisa de Brito
(2008) e a segunda ao projeto AMAR, recolhida nas práticas formativas do curso de
especialização realizado em 2014.
A aposta
No lugar de apresentarmos algumas de nossas sugestões de diálogos para com a relação
entre saberes tradicionais e saberes matemáticos, algumas delas postas em Lucena e
Mendes (2013), optamos por divulgar expreriências criadas e desenvolvidas por
professores de atuação em escolas ribeirinhas. A primeira delas trata de práticas de
ensino realizadas pela professora Alana em 2006 em turmas de Educação Infantil,
registradas pela pesquisa de Brito (2008). A segunda faz parte da experiência do
professor Humberto, realizada em 2014 em turmas de 4º e 5º ano do Ensino
Fundamental.
Tais experiências, mesmo ocorrendo em momentos diferentes, ambas concentraram
olhar sensível e reflexivo (Holffmann, 2014) em direção à compreensão da matemática
com sentido e significado, a partir de aspectos culturais dos grupos amazônicos, e assim
contribuem como uma espécie de aposta possível para com a realização de atividades
de ensino de matemática sob a religação com a história e a cultura das populações
ribeirinhas.
Lições deixadas pela professora Alana
Açaí - lugar onde Oxóssi faz seu posto!
Lucena & Brito
PROFMAT — 2015 41
A frase em destaque é poetisada por Nilson Chaves, cantor-compositor paraense, em
que exalta a simbologia presente em um dos alimentos mais consumidos do Pará, o
açaí. Com outra estratégia, a professora Alana também expressa a inteireza de ser
amazônida no momento elege o uso da prática cultural, a extração do açaí, na tecitura de
argumentos em favor da divulgação do conhecimento escolar em diálogo com a tradição
e também patrimônio cultural ribeirinho.
Figura 2 - Extração de açaí
Fonte: Brito, 2008
Figura 3 - Rasa de açaí
Fonte: Brito, 2008
Ao tratar do tema “Medidas”, a professora Alana buscava informações sobre o contexto
vivenciado pelos seus alunos. Um conhecimento sempre presente entre eles, mesmo
entre os de menor idade, estava relacionado com a medição da quantidade do fruto
recolhido para a comercialização e, também, para consumo local.
Lucena & Brito
42 PROFMAT — 2015
A rasa4, objeto de confecção e uso comum em algumas comunidades ribeirinhas que
fazem a extração do açaí, é um elemento presente no cotidiano das crianças. Estas
participam das práticas extrativista junto com seus familiares adultos e constróem uma
referência sobre a medição da quantidade de açaí a ser retirada dos açaizeiros para a
venda nas feiras na outra margem do rio. A rasa então torna-se, também, um objeto de
discussão nas aulas de matemática quando é tomado pela professora em situações
didáticas para exploraçã/problematização do sistema de medida de capacidade utilizado
na região. O diálogo com os conhecimentos escolares se estabelece quando a professora
possibilita relações entre a unidade de medida local (rasa) com as unidades
pertencentes ao Sistema Métrico Decimal.
As escolas ribeirinhas são comumente desprovidas de materiais manipuláveis para
apoio às aulas. Mais que uma carência, para a professora Alana essa situação tornou-se
um desafio. Como pode ser visto abaixo a professora adaptou as próprias rasas (em
tamanho menor) como material didático para apoiar as aprendizagens dos alunos sobre a
lógica do funcionamento Sistema de Numeração Decimal, de modo semelhante ao
Cartaz Valor de Lugar (cavalu), material geralmente indicado por livros didáticos ou em
formações docentes para esse tipo de abordagem em sala de aula.
Figura 4 - Rasas pequenas utilizadas como material didático - Fonte: Brito, 2008
Desta maneira, integrava ao processo educativo materiais didáticos confeccionados
pelos próprios estudantes, bem como o diálogo entre a prática escolar e os saberes
tradicionais da comunidade.
4 Artefato confeccionado com palhas de Guarumã, em forma de cesto, comum à região amazônica para o
acondicionamento e medição do fruto açaí.
Lucena & Brito
PROFMAT — 2015 43
A professora Alana buscava agregar os saberes das gerações mais experientes como
meio de materializar a relevância da aprendizagem dos conhecimentos da tradição local.
Em uma de suas aulas pudemos presenciar o encontro da artesã mas antiga do lugar que,
a convite da professora Alana, foi para a sala de aula explicar aos alunos os
procedimentos para a confecção de rasas. Em momento posterior, Alana trabalhou as
posições (paralelas, perpendiculares, concorrentes) entre as talas usadas durante a
confecção das pequenas rasas tomando como ponto de referência da matemática escolar
a geometria plana.
A professora tinha clareza que, na realidade em que vivia, a cultura como acionadora de
mediação entre conhecimentos distintos, era desprezada. Como ela própria afirmava:
(...) pessoas com um vocabulário próprio, riquíssimo, também são
“analfabetas” porque não sabem “falar direito”, errando na concordância
verbal. O desenvolvimento cognitivo que essas crianças alcançam fora da
escola é desprezado e posto em trilhos. Crianças que contam as luas, são
“analfabetas” por não saberem contar os números naturais; crianças que
sabem se vai chover ou não, são reprovadas porque não decoraram as
estações do ano (primavera, outono, inverno, verão), ou porque elas
acontecem” (Excerto da Profa. Alana em Brito, 2008, p.77)
A professora organizava o ensino pensando em atividades como tecer paneiros5 e tupes6,
confeccionar redes de pesca, matapis7 e peconhas8, além de desenhos e construções de
embarcações artesanais (pequeno e médio porte), por exemplo. Nestas atividades os
conteúdos matemáticos podiam ser trabalhados levando em consideração a articulação
entre as imagens locais e o saber escolar.
5 Cesto amazônico, feito de talas de guarumã, jupati e miriti. É confeccionado em traçado hexagonal. A
palavra paneiro é hibrid a, vem do Tupy - PANÁ (cesto) com o sufixo Português – EIRO, que expressa
uso, finalidade e profissão (paná + eiro = Paneiro). Guarda-se nos paneiros roupas, comidas e até animais.
6 Esteira feita de talas de guarumã, na qual se espalham alguns produtos da lavoura para secagem. É
utilizada também como tolda nas embarcações artesanais e como forro e/ou divisórias em casas
ribeirinhas.
7 Armadilha de forma cilíndrica, feita com fibra amazônica, utilizada para capturar camarão.
8 Artefato moldado a partir dos galhos da palmeira do açaí, utilizado para escalar o tronco do açaizeiro a
fim de extrair o cacho do fruto açaí.
Lucena & Brito
44 PROFMAT — 2015
A professora Alana vivia seu tempo e lugar, portanto, uma de suas preocupações era
possibilitar ao aluno compreender-se ribeirinho, tal como afirmava: “Eu quero que esse
aluno quando atravessar o rio consiga fazer a conexão dessa natureza com aritmética,
álgebra e a geometria. Falo isso porque estudei lá [apontou na direção a cidade de
Belém] e não fizeram isso comigo” (Excerto professora Alana em Brito, 2007, p. 83).
Lições do professor Humberto
Foi no desenvolvimento das atividades do projeto AMAR que percebemos alguma
concordância da prática docente da professora Alana com a do professor Humberto.
Eles nunca se conheceram. Alana faleceu em 2007 e Humberto iniciou sua carreira
como docente em Belém, em 2013. Antes de ser professor em Belém, Humberto tinha
sido professor em uma escola tipicamente urbana em outra cidade. Logo quando o
conhecemos por meio do projeto AMAR, em 2013, deparamos com suas inseguranças,
seus medos por atuar em escolas ribeirinhas, pois era sua primeira experiência nesse
tipo de escola.
Figura 5 - Escola ribeirinha onde trabalha o professor Humberto
Fonte: projeto AMAR, 2014.
O professor Humberto foi aluno de escolas ribeirinhas no interior do estado do Pará.
Guarda lembranças desastrosas sobre as aprendizagens que teve na época de aluno,
sobretudo em relação à matemática. As experiências negativas provocaram-lhe um
sentimento de compromisso para com um ensino de matemática diferenciado a partir de
sua própria prática como professor dos ano iniciais. Porém, o medo de fracassar neste
compromisso também fazia parte dos sentimentos deste professor. Segundo ele:
Ao assumir as turmas do CII: 1º e 2º anos [4º e 5º anos de escolarização inicial] na
região das ilhas de Belém, a insegurança que tive em Marabá [cidade de característica
urbana onde teve experiência profissional anterior] voltou a me acompanhar. Pois estava
Lucena & Brito
PROFMAT — 2015 45
diante de um novo desafio, em contato com outras pessoas, com princípios e saberes de
vida diferentes da zona urbana, uma outra cultura a ser conhecida” (Professor
Humberto, arquivos do projeto AMAR, 2014).
Por meio do projeto AMAR pudemos acompanhar as práticas do professor Humberto
em uma escola ribeiirnha, e nos foi possível compreender que o medo paulatinamente
foi vencido pelo respeito aos saberes da tradição e pela ousadia em criar formas de
assunção desses saberes relacionados aos conhecimentos escolares em prol da melhoria
das aprendizagens do alunos. Humberto diz um pouco de suas estratégias para o
enfrentamento dos desafios como professor de uma escola ribeirinha:
Por isso, em minha sala de aula, eu disponibilizo uma variedade de objetos do cotidiano
dos estudantes tais como: barco, casqueta9, paneiro, peconha, matapi, terçado, machado,
caniço, rede de pesca, tarrafa10, vassoura de açaí, rasa, etc. Estes são instrumentos
significativos na vida familiar dos estudantes, são feitos em miniatura por eles, trazidos
para a representação concreta das temáticas estudadas. Isto possibilita aproximação
entre os conhecimentos locais e globais e cria o sentimento de pertencimento nos
sujeitos. Com a miniatura do barco, por exemplo, estudamos os meios de transporte, as
unidades de medidas de tempo, comprimento, velocidade, o ambiente, espaço
geográfico, noções de educação financeira, os tipos de madeira, noções de lateralidade,
adição, subtração, divisão, multiplicação, figuras geométricas, tabelas e gráficos,
produção de textos, história da navegação, etc. (Professor Humberto, arquivos do
projeto AMAR, 2014).
O professor Humberto cita alguns objetos comuns ao cotidiano dos alunos ribeirinhos
como elementos potenciais para o desenvolvimento de aprendizagens múltiplas.
Apresenta possibilidade de articulação entre a exploração das finalidades ou confecção
dos objetos para com o currículo escolar. Compreendemos que essas ideias reforçam o
compromisso com o diálogo entre os saberes da tradição cultural e os conhecimentos
9 Tipo de canoa a remo, de pequeno porte, com capacidade para 3 ou 4 passageiros, comum às famílias
ribeirinhas.
Lucena & Brito
46 PROFMAT — 2015
eminentemente escolares em busca de aprendizagens com sentido e significado para os
alunos ribeirinhos.
Considerações finais
As experiências comentadas reportam à práticas docentes que consideram a relevância
dos saberes tradicionais para com as aprendizagens escolares. De nossas pesquisa,
também foi possível observar a satisfação dos alunos diante das experiências didáticas
realizadas por Alana e Humberto. O envolvimento dos alunos por meio de perguntas e
olhares atentos, a alegria e responsabilidade na desenvoltura das tarefas postas pelos
professores foram algumas características observadas por nós em momentos de
pesquisa, nas próprias salas de aulas desses professores e em períodos/anos distintos.
Porém, é necessário dizer que estas experiências foram excessões dentro do universo
investigado. A maioria das práticas observadas ainda mantem distanciamentos entre o
contexto ribeirinho e a matemática alvo da aprendizagem escolar. Consequentemente
um afastamento do interesse dos alunos para com as aprendizagens desejadas pela
organização curricular, pautadas em estratégias que denotam pouco sentido e
significado para a matemática a ser aprendida pelos alunos em questão.
Compreendemos que parte desse cenário é resultado da ausência de experiências
formativas que considerem como relevantes, para a formação docente, estudos, práticas,
investigações, enfim, atividades formativas que oportunizem a construção de relações
entre o contexto amazônico e as necessidades de aprendizagem dos alunos da Educação
Básica.
Contudo, é possível que as aproximações entre formadores de professores e o ambiente
escolar, via pesquisa e experiências formativas, possam auxiliar na diminuição do fosso
que separa as escolhas formativas e as demandas próprias de alguns contextos
amazônicos.
10
Tipo de rede de pesca usada em lugares de águas rasas.
Lucena & Brito
PROFMAT — 2015 47
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Graduação em Educação Matemática. Rio Claro: EDUNESP.
PROFMAT — 2015 48
O ENSINO DA ESTATÍSTICA NAS RECENTES ORIENTAÇÕES
CURRICULARES1
Ana Henriques, José António Fernandes
Instituto de Educação, Universidade de Lisboa, Universidade do Minho
[email protected] , [email protected]
Resumo
A Estatística tem vindo a adquirir um lugar de destaque nos programas de Matemática,
um pouco por todo o mundo, incluindo Portugal. As orientações curriculares
internacionais salientam a importância de desenvolver uma forte literacia estatística nos
alunos e sugerem o alargamento e aprofundamento do seu ensino, desde os primeiros
anos, recorrendo a abordagens orientadas para a análise de dados e para o
desenvolvimento do raciocínio estatístico. Apesar disso, nos Programas e Metas
Curriculares para o ensino básico (MEC, 2013) e de Matemática A, do ensino
secundário (MEC, 2014), recentemente homologados, salienta-se um ensino factual e
orientado para as técnicas, desvalorizando a literacia e o raciocínio estatístico dos
alunos. Nesta conferência debruçamo-nos sobre as alterações propostas nestes
documentos, com foco na temática da Estatística, em relação aos anteriores programas
de Matemática (ME, 2001, 2007), tendo por referência as perspetivas defendidas nos
documentos orientadores do ensino da Estatística assim como a recente investigação em
Educação Estatística. Começamos por apresentar algumas considerações sobre as
tendências no ensino da Estatística, a nível internacional, e salientamos o retrocesso que
os atuais programas nacionais representam relativamente a essas recomendações.
Iremos focar, em particular, os conteúdos, as indicações metodológicas, incluindo as
tarefas e os recursos, e a avaliação. No final, levantamos um conjunto de questões para
suscitar o debate em torno dos desafios que se colocam, atualmente, ao ensino e à
aprendizagem da Estatística.
Palavras chave: Ensino da Estatística; Orientações curriculares; Programas de
Matemática; Literacia estatística; Raciocínio estatístico.
1 Este trabalho foi realizado com o apoio de fundos nacionais, através da FCT – Fundação para a Ciência
e Tecnologia, no âmbito dos projectos PEst-OE/CED/UI1661/2014 do CIEd-UM e Desenvolver a
literacia estatística: Aprendizagem do aluno e formação do professor (contrato PTDC/CPE-
CED/117933/2010).
Henriques & Fernandes
PROFMAT — 2015 49
Introdução
A Estatística tornou-se uma componente chave do currículo de Matemática de muitos
países, procurando dar resposta aos apelos de uma sociedade que exige cidadãos
estatisticamente letrados, capazes de interpretar e avaliar criticamente os dados com que
se confrontam na sua realidade quotidiana e de os usar na tomada de decisões (Ben-Zvi
& Garfield, 2004; Burril & Biehler, 2011; Gal, 2002).
O desenvolvimento deste nível de literacia estatística requer tempo e não é compatível
com as práticas de sala de aula predominantes em que os alunos aplicam fórmulas e
realizam cálculos morosos e repetitivos sem lhes dar significado. Algumas
investigações, focadas no ensino e aprendizagem da Estatística, têm revelado que estas
práticas conduzem às reconhecidas dificuldades dos alunos em usar as ferramentas
estatísticas, adequadamente, na resolução de problemas, sendo vital a promoção de
situações didáticas que mobilizem os saberes estatísticos e probabilísticos para as
atenuar (Bakker & Derry, 2011; Rouan, 2003). Para isso, é necessário reforçar o papel
da Estatística nos programas do ensino básico e secundário, não só no que respeita ao
conteúdo mas, sobretudo, adotando abordagens curriculares focadas na promoção do
raciocínio estatístico dos alunos, desde os níveis de ensino mais elementares e criando
condições para que as escolas possam apostar na vertente tecnológica, a partir de
políticas educativas com permanência no tempo (Batanero, Burrill & Reading, 2011;
Oliveira & Henriques, 2014).
Os programas escolares, como é o caso dos programas de Matemática para o ensino
básico e secundário (MEC, 2013, 2014), são um importante guia curricular dos
professores, condicionando o que se ensina nas aulas e as aprendizagens dos alunos.
Assim, o caráter acentuadamente prescritivo de algumas dimensões dos atuais
programas coloca algumas questões aos professores e poderá ter um grande impacto
sobre o ensino e a aprendizagem da estatística (Vergnes, 2001). Estas dificuldades
justificam uma análise e discussão sobre as alterações propostas nestes documentos,
com foco na temática da Estatística, tendo como referência os anteriores programas de
Matemática (ME, 2001, 2007), as perspetivas defendidas nos documentos orientadores
do ensino da Estatística, assim como a recente investigação em educação estatística.
Henriques & Fernandes
50 PROFMAT — 2015
Orientações atuais para o ensino e aprendizagem da Estatística
O ensino da Estatística tem sido alvo de mudanças recentes, devido à reconhecida
importância que os processos estatísticos assumem na sociedade e à valorização da
capacidade de a usar no local de trabalho, na vida pessoal e como cidadãos. Defende-se,
atualmente, um papel mais aprofundado e alargado da Estatística na matemática escolar,
perspetivando-se novas abordagens para o seu ensino e aprendizagem, mais holísticas e
orientadas para os processos e para o desenvolvimento do raciocínio estatístico dos
alunos, que vão para além das técnicas de análise de dados (Makar, Bakker & Ben-Zvi,
2011). Estas novas perspetivas requerem mudanças nos conteúdos e nas práticas letivas,
nomeadamente ao nível dos contextos a propor aos alunos, incluindo tarefas, recursos
tecnológicos e avaliação a usar.
Conteúdos
Diversas organizações delinearam o conhecimento necessário aos alunos para se
tornarem estatisticamente literados. Uma análise do NCTM (2007), documento que se
tornou a base de reforma dos currículos de Matemática em muitos países, fornece
argumentos convincentes para a importância da Estatística e explicita que conteúdos
devem integrar os programas escolares, mostrando uma ênfase consistente ao longo dos
vários níveis de ensino na Análise de Dados e na Probabilidade. Em linha com estas
ideias, o documento “Framework for Teaching Statistics within the K-12 Mathematics
Curriculum” (GAISE, 2005) sugere uma abordagem curricular à Estatística que,
enfatizando e revisitando um conjunto de ideias estatísticas ao longo da escolaridade,
promove gradualmente nos alunos a compreensão da Estatística como um processo
investigativo que envolve as seguintes componentes: formular as suas próprias questões
(ou hipóteses) sobre um fenómeno significativo, que podem ser respondidas com dados;
desenhar e utilizar um plano para recolher dados apropriados; selecionar métodos
numéricos e gráficos adequados para analisar os dados: sumariar, formular conjeturas,
tirar conclusões e fazer generalizações; e interpretar os resultados da análise tendo em
conta o âmbito de inferência baseada nos dados e relacionar a interpretação com a
questão original.
Henriques & Fernandes
PROFMAT — 2015 51
Burril e Biehler (2011) examinaram diversas perspetivas sobre o ensino e aprendizagem
da Estatística e identificaram um conjunto de ideias estatísticas centrais que parecem ser
fundamentais para os alunos desenvolverem uma compreensão profunda da Estatística.
Estas ideias servem como objetivos gerais que orientam curricularmente a
aprendizagem dos alunos e devem estar relacionadas com:
(i) dados, entendidos como números com um contexto. O trabalho com dados,
fornecidos aos alunos ou obtidos através de simulações ou recolhidos pelos próprios,
visam a compreensão da sua necessidade para a tomada de decisões e contemplam
aspetos relativos ao tipo e forma de recolha de dados;
(ii) variabilidade e centro, visando reconhecer as fontes dessa variabilidade, por vezes
de acordo com um ‘padrão’ e a compreensão da sua utilidade para, em articulação com
as medidas de tendência central, prever, explicar ou controlar;
(iii) distribuição, incluindo a sua análise visual. Permite compreender o conjunto de
dados como um todo, ao invés de casos isolados, e desenvolver noções de tendência e
dispersão que fundamentam o raciocínio acerca de distribuições;
(iv) representação, gráfica ou de outro tipo e transformações de representações
(transnumeração) de modo a revelar diferentes aspetos dos dados;
(v) associação e relações de modelação entre duas variáveis, para explorar relações
entre variáveis e compreender modelos úteis para explicar ou predizer dados, incluindo
a regressão para modelar associações estatísticas;
(vi) aleatoriedade e modelos de probabilidade para processos de geração de dados,
permitindo compreender resultados aleatórios e modelar relações estruturais hipotéticas
com origem numa teoria, simulações ou grandes quantidades de dados, quantificando a
variabilidade dos dados e a sua estabilidade a longo termo;
(vii) amostragem e inferência, visando a realização de inferências informais, tomando
decisões com base em amostras e na consideração dos fatores que afetam a precisão
dessas inferências e do grau de incerteza que lhe está associado.
Os conteúdos enumerados enfatizam a Estatística como domínio do saber escolar que se
aproxima do trabalho do próprio estatístico, com potencialidades para a promoção de
uma atitude crítica por parte dos alunos e não a restringe a uma visão tecnicista e
teórica, frequentemente veiculada na escola, que explica o facto de professores e alunos
Henriques & Fernandes
52 PROFMAT — 2015
a verem como tema mais fácil de ensinar e aprender comparativamente com outros
temas matemáticos (Fernandes, Sousa, & Ribeiro, 2004; Fernandes, Carvalho, &
Correia, 2011). Na verdade, é fundamental que os alunos situem essas ferramentas
dentro do processo estatístico e em contextos diversos sob investigação e, para isso, é
especialmente importante a prática de análise de dados e de resolução de problemas
reais, suportada pelos múltiplos recursos tecnológicos atualmente disponíveis, ao longo
de toda a escolaridade (Garfield & Ben-Zvi, 2010; Henriques & Oliveira, 2014).
Tarefas
Reconhecendo a importância do ambiente de sala de aula e da abordagem didática
adotada, em associação com a proposta de tarefas desafiadoras para os alunos, Garfield
e Ben-Zvi (2010) defendem a criação de ambientes de aprendizagem SRLE (Statistical
Reasoning Learning Environment) que potenciem uma compreensão profunda e com
significado da Estatística e o raciocínio estatístico dos alunos. Esta abordagem é
baseada em seis princípios que devem orientar a construção de tarefas e o modo como
as aulas são planeadas e conduzidas pelos professores: (i) desenvolver ideias estatísticas
centrais, como as referidas anteriormente, focando a compreensão conceptual; (ii) usar
dados reais e motivadores, preferencialmente recolhidos pelos alunos; (iii) usar a
atividade de sala, em particular as tarefas e o modo de as trabalhar, para apoiar o
desenvolvimento do raciocínio dos alunos; (iv) integrar tecnologia, sobretudo
educacional, para auxiliar a exploração e análise de dados, focando os alunos na
interpretação de resultados e compreensão conceptual; (v) fomentar a argumentação e a
negociação de significados no discurso de sala de aula; e (vi) usar a avaliação para
monitorizar a aprendizagem dos alunos, com foco na compreensão e não em destrezas, e
refletir sobre o processo instrucional.
No que respeita especificamente às tarefas, a perspetiva descrita encontra eco na
comunidade de educação estatística, que vem valorizando o trabalho com dados reais,
relativos aos próprios alunos ou com eles relacionados. Diversos autores reconhecem
que a familiarização com o contexto é da maior relevância para motivar os alunos e
envolvê-los na aprendizagem, além de poder desempenhar um papel clarificador em
muitas fases de um estudo estatístico, sobretudo no que concerne à fase de interpretação
dos resultados (Fernandes, Carvalho, & Ribeiro, 2007; Macgillivray & Pereira-
Henriques & Fernandes
PROFMAT — 2015 53
Mendonza, 2011). De entre os diferentes tipos de tarefas, os projetos de natureza
investigativa, como é o caso das investigações estatísticas, assumem-se como
experiências de aprendizagem com um potencial específico ao constituírem “veículos
ideais para o envolvimento do aluno na aprendizagem de resolução de problemas em
contexto e para sintetizar componentes da aprendizagem” (Macgillivray & Pereira-
Mendonza, 2011, p. 109). Este tipo de tarefa constitui um contexto natural para os
alunos experienciarem o processo de realização de inquirições estatísticas reais através
da escolha de uma problemática, estabelecimento de um plano, recolha e exploração de
dados e formulação de conclusões, percorrendo todo o ciclo investigativo (PPDAC) de
Wild e Pfannkuch (1999).
Uma parte importante do SRLE é o uso de tarefas que promovem a aprendizagem dos
alunos através de colaboração, interação e discussão de problemas interessantes. O
trabalho colaborativo é especialmente adequado na realização dos projetos
investigativos, por permitir um tipo de diálogo onde os alunos respondem às questões
colocadas pelos colegas e aprendem a questionarem-se, bem como a explicar o seu
raciocínio e a defender as suas respostas e argumentos. Deste modo, os alunos
envolvem-se em diálogos/discussões fundamentados que os focam em ideias estatísticas
significativas (Garfield & Ben-Zvi, 2010). Além disso, a aprendizagem colaborativa
fornece oportunidades aos alunos de diferentes capacidades e níveis escolares, podendo
ainda facilitar aos professores a obtenção de informação quando observam e apoiam o
trabalho dos alunos (Macgillivray & Pereira-Mendonza, 2011).
Recursos
De entre os diferentes recursos passíveis de serem utilizados no ensino da Estatística,
iremos referir-nos particularmente às novas tecnologias, incluindo calculadoras,
computadores, internet e software educacional.
Para Jolliffe (2007), a chamada revolução tecnológica está na origem das maiores
alterações no ensino da Estatística. Os avanços na tecnologia e a crescente facilidade de
acesso a dados reais fornecem a alunos e professores novas ferramentas para adotar
abordagens orientadas para os dados, usando contextos ricos e significativos, como os
proporcionados pelas investigações estatísticas (Garfield & Ben-Zvi, 2010). Os
múltiplos recursos tecnológicos hoje disponíveis têm sido incorporados na educação
Henriques & Fernandes
54 PROFMAT — 2015
estatística de modos diversificados, em particular como instrumento de apoio aos alunos
na exploração e análise de dados, na resolução de problemas estatísticos envolvendo
dados reais e na compreensão de conceitos complexos e ideias estatísticas, com o
objetivo de desenvolver o seu raciocínio estatístico (Ben-Zvi & Garfield, 2004).
Segundo Ben-Zvi (2000), são vários os atributos dos computadores que parecem
contribuir para o desenvolvimento do sentido e significados dos alunos, nomeadamente:
a capacidade de operar de forma rápida e precisa; ligar dinamicamente múltiplas
representações; simplificar procedimentos; fornecer feedback e transformar uma
representação como um todo num objeto manipulável. Para este autor, as representações
como um todo, podendo ser editadas, transformadas, combinadas, separadas em partes,
armazenadas e evocadas, “implicam uma reorganização da atividade cognitiva e uma
mudança do foco de atenção para um nível cognitivo superior” (p. 141). Estes atributos
são reconhecidos pelos alunos, levando-os a verem os computadores como meio para
promover a sua aprendizagem (Fernandes, Júnior & Vasconcelos, 2013).
No entanto, estes atributos da tecnologia alteram as assunções acerca do que deve ser
aprendido e implicam que o currículo de Estatística seja reformulado de acordo,
incluindo os materiais de ensino, as práticas de sala de aula e a forma de os alunos
aprenderem. O acesso a recursos tecnológicos não garante, por si só, uma aprendizagem
efetiva, é fundamental o papel ativo do professor no estabelecimento e suporte do
desenvolvimento do raciocínio dos alunos, focando-se tanto nas representações gráficas
construídas, como nas questões a serem exploradas de modo a assegurar que eles
desenvolvem compreensão da necessária articulação entre estes aspetos (Henriques &
Antunes, 2014).
Avaliação
A avaliação é uma parte integrante da aprendizagem e isso significa que o processo de
avaliação precisa de estar alinhado com os objetivos de aprendizagem. Nesse sentido, o
seu foco deslocou-se de ‘testar’ capacidades, procedimentos e cálculos para ‘avaliar’ a
compreensão de ideias chave, literacia e raciocínio estatísticos (Garfield & Franklin,
2011). Estes autores defendem que a avaliação assenta em três pilares: 1) modelo de
como os alunos representam o conhecimento e desenvolvem competências no domínio
do conteúdo (cognição); 2) tarefas ou situações que permitam observar a performance
Henriques & Fernandes
PROFMAT — 2015 55
do aluno (observação); e 3) um método de interpretação para fazer inferências a partir
da performance observada (interpretação). Em articulação com estes pilares, examinam-
se os propósitos e usos da avaliação do aluno nas três categorias seguintes: avaliação da
aprendizagem, relacionada com a avaliação sumativa; avaliação para a aprendizagem,
relacionada com a avaliação formativa; e avaliação como aprendizagem, englobando
métodos sumativos e formativos e que coloca o aluno entre a aprendizagem e a
avaliação.
Aspetos metodológicos
No presente estudo analisam-se as principais alterações verificadas nos novos
programas de Matemática do ensino básico e de Matemática A (MEC, 2013, 2014), do
ensino secundário, em relação aos programas anteriores (ME, 2007, 2001), com especial
incidência no tema de Estatística2.
Tendo em conta a própria organização dos programas objeto de estudo, estabeleceram-
se dois níveis para a sua análise: as alterações estruturais do programa; e as alterações
no tema de Estatística. As alterações estruturais referem-se à globalidade do ensino
básico e de Matemática A do ensino secundário, dizendo respeito aos vários temas
matemáticos, e portanto também ao tema de Estatística, tendo essa análise sido
orientada pelas dimensões: finalidades; objetivos gerais de aprendizagem; temas
matemáticos; capacidades transversais; indicações metodológicas; recursos e avaliação
das aprendizagens.
As alterações no tema Estatística focam-se neste tema matemático dos programas do
ensino básico e de Matemática A do ensino secundário, e essa análise foi orientada
pelas dimensões: gestão do tempo; objetivos gerais; conteúdos; indicações
metodológicas; e recursos.
2 Neste texto incluímos na Estatística o tema Organização e Tratamento de Dados, do ensino básico, e os
temas Estatística, Combinatória e Probabilidades, de Matemática A do ensino secundário.
Henriques & Fernandes
56 PROFMAT — 2015
A avaliação e interpretação das alterações verificadas nos programas de 2013 e 2014,
relativamente aos programas de 2007 e 2001, sobretudo no que se refere ao tema
Estatística, serão orientadas, também, pelas recomendações atuais para o ensino e
aprendizagem da estatística que são preconizadas na literatura.
O ensino da Estatística nos recentes programas escolares de Matemática
Na análise realizada aos programas escolares de Matemática do ensino básico e de
Matemática A do ensino secundário centramo-nos, primeiro, nos aspetos estruturais dos
programas e, seguidamente, nos aspetos específicos do tema Estatística.
Aspetos estruturais dos programas
A nível estrutural, os novos programas de Matemática (MEC, 2013, 2014) apresentam
alterações ao nível das finalidades, dos objetivos gerais de aprendizagem, dos temas
matemáticos; das capacidades transversais, das indicações metodológicas e dos
recursos.
No caso das finalidades, no programa do ensino básico de 2013 salienta-se “A
estruturação do pensamento” e a não referência a “Desenvolver atitudes positivas face à
Matemática e a capacidade de apreciar esta ciência” do programa anterior. Assim, em
termos de diferenças, no atual programa salientam-se os aspetos lógicos da Matemática
e não se explicitam os aspetos afetivos que constavam do programa de 2007.
No programa de Matemática A de 2014, na finalidade “A estruturação do pensamento e
o desenvolvimento do raciocínio abstrato” ampliam-se os aspetos lógicos já afirmados
no ensino básico e, analogamente, não se referem os aspetos afetivos do anterior
programa ─ “Contribuir para uma atitude positiva face à Ciência”, nem de
desenvolvimento pessoal e participação crítica ─ “Promover a realização pessoal
mediante o desenvolvimento de atitudes de autonomia e solidariedade” e “Contribuir
para o desenvolvimento da existência de uma consciência crítica e interventiva em áreas
como o ambiente, a saúde e a economia entre outras, formando para uma cidadania ativa
e participativa”.
Henriques & Fernandes
PROFMAT — 2015 57
No programa de 2007 os objetivos gerais de aprendizagem são formulados para cada
um dos temas matemáticos de cada ciclo do ensino básico, portanto mais centrados
nesses temas, enquanto no programa de 2013 são de natureza transversal e sem
referência aos temas matemáticos, salientando-se o seu carácter genérico e a
abrangência crescente desses objetivos com os ciclos de ensino: 1) identificar/designar
(objetos matemáticos); 2) estender (generalização); 3) reconhecer (validação); 4) saber
(conhecimento); 5) reconhecer, dado… (justificar com casos); 6) provar/demonstrar
(demonstração); e 7) justificar (evocação). De entre estes objetivos, os quatro primeiros
são comuns aos três ciclos de ensino e os três últimos são relativos apenas ao 3.º ciclo.
Além disso, no programa de 2007 também é indicado o propósito principal de ensino de
cada tema matemático em cada nível de ensino.
No programa de Matemática A, de 2001, formulam-se objetivos e competências gerais
segundo as dimensões Valores/Atitudes, Capacidades/Aptidões e Conhecimentos,
enquanto no programa de 2014, à semelhança do ensino básico, são formulados
objetivos transversais a todos os temas: 1) Identificar/Designar/Referir; 2) Reconhecer;
3) Saber; 4) Provar/Demonstrar; e 5) Justificar.
No ensino básico, entre os temas matemáticos (Números e Operações, Geometria e
Medida, Álgebra e Organização e Tratamento de Dados), agora designados “domínios
de conteúdo”, não se salientam grandes diferenças entre os dois programas. O tema
Álgebra não é considerado de forma explícita no 1.º ciclo em ambos os programas e no
programa de 2013 é estabelecido o novo tema matemático Funções, Sequências e
Sucessões (FSS), no 3.º ciclo, e que no programa anterior estava incluído no tema
Álgebra. A este nível, a maior diferença reside no desenvolvimento dos temas
matemáticos, que no programa de 2007 se realiza, fundamentalmente, por ciclo de
ensino básico (os quatro anos de escolaridade do 1.º ciclo são agrupados em dois
subníveis:1.º e 2.º anos; 3.º e 4.º anos), enquanto no programa de 2013 esse
desenvolvimento se concretiza por ano de escolaridade. Também em termos da
informação disponibilizada nos temas se observam diferenças: no programa de 2007
para cada tema matemático são especificados tópicos, objetivos específicos e notas
clarificadoras do conteúdo e da metodologia; já no programa de 2013 apenas são
referidos os conteúdos relativos a cada um dos tópicos considerados e é mencionado, a
título indicativo, o número de tempos (de 45 minutos) que deve ser dedicado a cada
tema matemático. Assim, a gestão do programa de 2007 permite uma maior autonomia
Henriques & Fernandes
58 PROFMAT — 2015
à escola e ao professor ao mesmo tempo que é mais informativo do que o programa de
2013, onde se destacam mais os conteúdos e se assume uma natureza mais prescritiva
destas orientações curriculares.
No programa de Matemática A, de 2001, além dos temas transversais, especificam-se
três temas matemáticos por cada ano de escolaridade deste ciclo de estudos (cada um
dos três temas coincidiria com um período escolar), excetuando o 10.º ano em que se
inclui um “Módulo inicial – Resolução de problemas”, tendo em vista a articulação
entre o ensino básico e o ensino secundário e o desenvolvimento de competências
matemáticas transversais. Já no programa de 2014 salienta-se a inclusão dos novos
temas “Lógica e Teoria dos Conjuntos” (10.º ano) e “Primitivas e Cálculo Integral”
(12.º ano). Além disso, neste programa alguns temas anteriores desdobram-se em
diferentes temas, como acontece com os temas Álgebra (10.º ano) e Cálculo
Combinatório e Probabilidades (12.º ano).
Ao nível do ensino básico, às três capacidades transversais estabelecidas no programa
de 2007 (resolução de problemas, raciocínio matemático e comunicação) são
acrescentadas no programa de 2013 as duas seguintes: “conhecimento de factos e de
procedimentos” e “a matemática como um todo coerente”, perspetivadas como
aquisições integradas a partir dos objetivos gerais de aprendizagem. Nestas novas
capacidades salientam-se os papéis da memória e da lógica, esta última já destacada ao
nível das finalidades.
No programa de Matemática A, de 2001, contemplam-se vários temas transversais:
comunicação matemática; aplicações e modelação matemática; história da Matemática;
lógica e raciocínio matemático; resolução de problemas e atividades investigativas; e
tecnologia e Matemática. Embora no programa de 2014 não exista uma secção
específica correspondente, pode interpretar-se a “aquisição de conhecimentos, factos,
conceitos e procedimentos”, o “desenvolvimento do raciocínio matemático”, a
“resolução de problemas”, a “comunicação (oral e escrita) adequada” e a “visão da
matemática como um todo articulado e coerente” como capacidades transversais.
No caso das indicações metodológicas, no programa de 2007 são apresentadas muitas
sugestões em cada tema matemático de cada nível de escolaridade, organizadas segundo
a abordagem, as tarefas e os conceitos específicos. Já no programa de 2013 não são
apresentadas quaisquer sugestões metodológicas, inferindo-me mesmo uma visão
negativa sobre a explicitação de tais sugestões.
Henriques & Fernandes
PROFMAT — 2015 59
A experiência acumulada dos professores e das escolas é um elemento
fundamental no sucesso de qualquer projeto educativo, não se
pretendendo, por isso, espartilhar e diminuir a sua liberdade pedagógica
nem condicionar a sua prática letiva. Pelo contrário, o presente Programa
reconhece e valoriza a autonomia dos professores e das escolas, não
impondo metodologias específicas. (MEC, 2013, p. 28)
No programa de Matemática A, de 2001, considera-se o aluno como agente da sua
própria aprendizagem, propondo-se uma metodologia em que os conceitos são
construídos a partir da experiência de cada um e de situações concretas, a abordagem
dos conceitos sob diferentes pontos de vista e progressivos níveis de rigor e
formalização e maior ligação da Matemática com a vida real, com a tecnologia e com as
questões abordadas noutras disciplinas. Preconiza-se o trabalho de grupo e em pares dos
alunos, cabendo ao professor o papel de dinamizador e regulador do processo de ensino-
aprendizagem. Já no programa de 2014 não são mencionadas metodologias específicas,
referindo-se apenas que deve ter-se em atenção na prática letiva a progressão dos alunos
na aprendizagem matemática, estruturada em patamares de crescente complexidade.
No ensino básico, os recursos são referidos a diferentes níveis do programa de 2007,
salientando-se a referência em cada tema matemático dos diferentes ciclos escolares,
sendo referidos os materiais manipuláveis, os instrumentos de desenho (régua, esquadro
e compasso) e, ao nível das tecnologias, as calculadoras e computadores. No caso das
calculadoras e computadores recomenda-se o seu uso ao longo de todos os ciclos,
afirmando-se que
O seu uso é particularmente importante na resolução de problemas e na
exploração de situações, casos em que os cálculos e os procedimentos de
rotina não constituem objetivo prioritário de aprendizagem, e a atenção
se deve centrar nas condições da situação, nas estratégias de resolução e
na interpretação e avaliação dos resultados. (ME, 2007, pp. 9-10)
No programa de 2013, tal como no caso das metodologias, deixa-se a seleção dos
recursos ao critério da escola e dos professores. Além das calculadoras, em que é
recomendado o seu uso mais restritivo e em níveis escolares mais avançados, não é feita
qualquer referência a outros recursos.
No programa de Matemática A, de 2001, preconiza-se a existência de um Laboratório
de Matemática com materiais e equipamentos diversificados, incluindo calculadoras
gráficas e computadores, que são considerados de uso obrigatório. Tal como no
programa do ensino básico de 2013, também no programa de Matemática A, de 2014,
perspetiva-se um uso mais restritivo das tecnologias, afirmando-se que a sua “utilização
Henriques & Fernandes
60 PROFMAT — 2015
deve, no entanto, ser criteriosa, já que, caso contrário, pode condicionar e comprometer
gravemente a aprendizagem e a avaliação” (p. 28).
Finalmente, no programa do ensino básico, de 2007, preconiza-se uma avaliação das
aprendizagens pautada pelos princípios de congruência com o programa, constituindo
uma parte integrante do processo de ensino e aprendizagem, assentando na diversidade
de formas e instrumentos de avaliação, assumindo um propósito predominantemente
formativo, decorrendo num clima de confiança e sendo transparente para os alunos e
suas famílias. No programa de 2013 remete-se a avaliação para os normativos legais em
vigor, destacando-se as metas curriculares como referencial de avaliação e as funções da
avaliação enquanto regulação e orientação do percurso de aprendizagem.
Também no programa de Matemática A, de 2001, são formulados vários princípios a ter
em conta na avaliação das aprendizagens, como avaliar não só o produto mas também o
processo, avaliar para orientar aprendizagens posteriores, avaliar individualmente e em
grupo e diversificar formas de avaliação dos alunos, recomendando-se ainda que o peso
dos testes não ultrapasse metade do peso do conjunto das diferentes formas de
avaliação. Tal como no ensino básico, também no programa de Matemática A, de 2014,
a avaliação deve ter como referência os normativos legais em vigor, salientando-se o
programa da disciplina e as respetivas metas curriculares.
Alterações no tema Estatística
A nível do tema Estatística destacam-se alterações ao nível da gestão do tempo, dos
objetivos gerais, dos conteúdos, das indicações metodológicas e dos recursos.
No programa do ensino básico, de 2013, sugere-se, a título de indicação, a distribuição
dos tempos escolares pelos vários temas matemáticos em cada ano escolar do 2.º e 3.º
ciclos, o que não acontece no programa de 2007. Embora sem caráter prescritivo, os
tempos sugeridos no programa para cada tema matemático tendem a influenciar a
importância dada ao respetivo tema, seja pelos professores, pelos manuais escolares ou
mesmo pelos alunos. Na Tabela 1, tendo em conta o total dos tempos propostos
conjuntamente no 2.º e 3.º ciclo, apresentam-se as percentagens de tempos em cada
tema matemático do programa no 2.º ciclo, 3.º ciclo e total dos dois ciclos.
Henriques & Fernandes
PROFMAT — 2015 61
Tabela 1 – Tempos totais sugeridos (em %) nos temas matemáticos no 2.º ciclo, 3.º ciclo e total
Temas matemáticos % de tempos totais
2.º ciclo 3.º ciclo Total
Números e Operações (NO) 12 7 19
Geometria e Medida (GM) 18 21 39
Álgebra (ALG) 9 25 34
Organização e Tratamento de Dados (OTD) 4 4 8
Nota: No caso do 3.º ciclo incluíram-se os tempos relativos ao tema Funções, Sequências e
Sucessões (FSS) no tema ALG.
Pela Tabela 1 constata-se que as percentagens de tempos sugeridas para o tema são
iguais no 2.º e 3.º ciclos (4%) e muito inferiores às dos outros temas matemáticos. No
total, menos de metade do que no tema NO, que é o tema matemático imediatamente a
seguir. O tempo sugerido agrava-se ainda mais na medida em que neste tema se incluem
conteúdos de “Gráficos cartesianos” no 5.º ano e, embora sem interferir nas
percentagens da Tabela 1, de “Representação de conjuntos” no 1.º e 2.º ano. Esta
distribuição dos tempos revela uma desvalorização do tema da Estatística não
compatível com a importância que ele tem adquirido nas recentes orientações
curriculares internacionais e no anterior programa de 2007.
Em ambos os programas de Matemática A são sugeridos, a título de indicação, os
tempos para a lecionação de cada tema por ano escolar. Considerando os tempos
previstos ao longo dos três anos escolares, conclui-se que ao tema Estatística
correspondem 18% dos tempos no programa de 2001 e 12% no programa de 2014,
verificando-se, também neste nível de ensino, uma diminuição do tempo dedicado ao
tema.
Tal como foi referido antes para o programa do ensino básico, no programa de 2007 são
referidos objetivos gerais do tema, centrados na Estatística, enquanto no programa de
2013 não são especificados objetivos do tema, enunciando-se objetivos genéricos,
abstratos e comuns aos vários temas matemáticos (antes referidos), portanto sem
referência à Estatística.
Nos programas de Matemática A, tanto de 2001 como de 2014, no tema Estatística não
são formulados objetivos, o mesmo acontecendo nos outros temas matemáticos.
Ao nível do ensino básico, não se destacam diferenças nos conteúdos do tema entre os
dois programas. No caso do programa de 2013, o domínio Probabilidade está todo
concentrado no 9.º ano, o que não acontecia antes. Por outro lado, parece restringir-se o
Henriques & Fernandes
62 PROFMAT — 2015
conceito de frequencista de probabilidade a experiências aleatórias em que se presume a
equiprobabilidade dos casos possíveis, o que contraria a natureza do próprio conceito
frequencista de probabilidade, especificamente ao não clarificar que esta definição de
probabilidade pode aplicar-se a experiências em que os acontecimentos são ou não
equiprováveis (Fernandes, 1999).
O programa de Matemática A, de 2014, inclui o operador somatório e centra-se na
“manipulação de médias e desvios-padrão de amostras, ou percentis” (p. 10), na análise
das propriedades básicas destes conceitos e respetivas interpretações com base em
exemplos concretos, enquanto o programa de 2001 se foca também na articulação das
diferentes medidas de tendência central, de dispersão e quartis. No programa de 2001
inclui-se o estudo gráfico e intuitivo de distribuições bidimensionais, enquanto no
programa de 2014 se inclui também o estudo formal deste conteúdo. Ainda neste último
programa privilegia-se uma abordagem formal da noção de probabilidade, alicerçada na
teoria de conjuntos e focada na definição clássica de probabilidade e, relativamente ao
programa de 2001, não se incluem as definições frequencista e axiomática de
probabilidade nem os modelos de distribuição Binomial e Normal. Observa-se, assim,
uma valorização do formalismo, no programa de 2014, desperdiçando a oportunidade
dos alunos clarificarem, de forma progressiva e adequada, as suas conceções intuitivas
perante os desafios que as situações que o seu dia-a-dia lhes coloca.
Ao nível ensino básico, a questão das indicações metodológicas é diversa, tal como foi
referido antes. No programa de 2013, assume-se, explicitamente, a não especificação de
sugestões metodológicas como forma de promoção da autonomia das escolas e dos
professores. Já no programa de 2007, neste tema, tal como nos restantes temas, são
feitas muitas sugestões metodológicas, seja em termos de abordagem, seja em termos de
tarefas, como se salienta na Tabela 2.
Henriques & Fernandes
PROFMAT — 2015 63
Tabela 2 – Indicações metodológicas no tema ao nível da abordagem e das tarefas no programa
de 2007, segundo os níveis de escolaridade
Nível
escolar
Indicações metodológicas
Abordagem Tarefas
1.º ciclo – Aprendizagem baseada
em atividades do dia-a-dia.
– Situações diversificadas.
– Investigações ou projetos (sobre características
dos alunos e temas do Estudo do Meio).
– Trabalho em grupo.
– Conexões com outras áreas curriculares.
– Realização de experiências aleatórias
envolvendo moedas, extração de bolas de sacos e
dados.
2.º ciclo – Resolução de problemas
identificados pelos alunos.
– Formular questões
relacionadas com outras
disciplinas.
– Investigações ou projetos estatísticos em grupo.
– Realização de experiências aleatórias
envolvendo dois dados, moedas e extração de
bolas de sacos com e sem reposição.
3.º ciclo – Investigações estatísticas
baseadas em situações reais.
– Projetos em grupo (assuntos relacionados com
outras disciplinas, temas da atualidade nacional e
internacional, interesses dos alunos).
– Exploração de gráficos enganadores e amostras
enviesadas.
Da Tabela 2 destaca-se a recomendação da realização de investigações ou projetos
estatísticos em todos os três níveis escolares, desenvolvidos pelos alunos em pequenos
grupos. O destaque dado a este tipo de tarefas decorre ainda dos tópicos elencados neste
tema matemático no 3.º ciclo: planeamento estatístico e tratamento de dados.
Por outro lado, preconiza-se a aprendizagem da estatística com base em atividades
relacionadas com o dia-a-dia, com outras disciplinas e com os interesses dos próprios
alunos, o que enfatiza o significado e a utilidade da estatística. Simultaneamente, a
realização de atividades nestes contextos pode contribuir para o desenvolvimento de um
mais profundo sentido crítico e de cidadania do aluno, referido explicitamente no
programa através da exploração de gráficos enganadores e amostras enviesadas.
No programa de Matemática A, de 2014, conforme foi antes referido, não se incluem
indicações metodológicas, enquanto no programa de 2001 são referidas indicações
metodológicas segundo cada um dos subtemas estabelecidos. Em geral, preconiza-se
uma avaliação crítica de resultados estatísticos e a exploração de atividades
interdisciplinares, realizadas individualmente ou em grupo, e simulações, jogos e
exemplos históricos no caso das Probabilidades.
Em termos de recursos, no programa do ensino básico, de 2007, salienta-se a referência
ao uso de calculadoras e computadores no 2.º e 3.º ciclo, aludindo também à folha de
Henriques & Fernandes
64 PROFMAT — 2015
cálculo e à internet. Além destes recursos tecnológicos, no caso das Probabilidades, é
também recomendado o uso de objetos aleatórios como moedas, dados e sacos de bolas,
bem como tabelas e diagramas de árvore, os quais se revelam particularmente
adequados para descrever o espaço amostral e determinar o número de casos favoráveis
e possíveis tendo em vista a determinação da probabilidade na perspetiva clássica. O
recurso a tabelas e diagramas de árvore para determinar e comparar probabilidades de
acontecimentos compostos também é referido no programa de 2013.
Não são referidos recursos no âmbito deste tema no programa de Matemática A, de
2014, enquanto no programa de 2001 se destaca o uso de calculadoras e computadores e
materiais lúdicos, estes últimos no caso das Probabilidades.
Conclusão
Nas finalidades e capacidades transversais dos programas de 2013 e 2014, relativamente
aos programas anteriores, infere-se uma maior ênfase do papel da memorização na
aprendizagem e uma perspetiva mais formal da Matemática. Também a não referência
às finalidades afetivas, que constavam dos programas anteriores, parece não reconhecer
o seu contributo para a aprendizagem.
A não inclusão de recomendações metodológicas nos programas de 2013 e 2014 pode
ter por consequência a desvalorização de orientações atuais para o ensino da
Matemática, valorizadas nos programas anteriores, sobretudo no ensino básico. No caso
do tema Estatística, destaca-se a ausência de referência aos projetos investigativos e a
tarefas que envolvam dados reais e relativos aos alunos ou relacionados com os seus
interesses, que são unanimemente recomendados pelas orientações curriculares
internacionais (GAISE, 2005; NCTM, 2007) e por investigadores na área da educação
estatística (e.g., Batanero et al., 2011, Fernandes et al., 2007, Henriques & Oliveira,
2014; MacGillivray & Pereira-Mendoza, 2011). O planeamento estatístico e o
consequente desenvolvimento da capacidade de realização de estudos estatísticos que
recorram à análise exploratória de dados, de autonomia e sentido crítico perante a
resolução de problemas ficam, assim, ausentes dos programas.
Por outro lado, à realização de projetos investigativos está geralmente associado o
trabalho de grupo dos alunos, forma de trabalho que também não está prevista nos
Henriques & Fernandes
PROFMAT — 2015 65
programas de 2013 e 2014 e que é vista pelos professores como particularmente
adequada no caso da Estatística (Fernandes et al., 2011).
Comparativamente com os programas anteriores, em geral, nos programas de 2013 e
2014 acentua-se uma abordagem mais procedimental e formal dos temas matemáticos, o
que acontece também no tema Estatística, que é desvalorizada enquanto conteúdo a ser
ensinado. A imprudente valorização dos aspetos teóricos e técnicos em detrimento dos
aspetos de interpretação e de significação reduzem as possibilidades dos alunos
perspetivaram a utilidade da Estatística para o seu dia-a-dia e de desenvolverem a sua
literacia estatística (Batanero et al., 2011).
Tal como no caso das recomendações metodológicas, também no programa de 2013 são
quase inexistentes as referências aos recursos a usar no ensino, advogando-se um uso
mais restritivo da calculadora e do computador e a não referência a software
educacional. Ora, o uso destas tecnologias são amplamente preconizadas no ensino da
Estatística (e.g., Ben-Zvi, 2000; GAISE, 2005; NCTM, 2007; Pratt, Davies, & Connor,
2011).
Em síntese, nos programas de 2013 e 2014 omitem-se importantes recomendações
atuais para o ensino e aprendizagem da estatística que constavam dos programas
anteriores, representando um retrocesso em relação ao que é preconizado pelas várias
instâncias de educação estatística. Simultaneamente ignorar a muita investigação que
ultimamente tem sido desenvolvida no campo da didática da estatística parece contribuir
para a desvalorização desse domínio de conhecimento, podendo também levar à não
aplicação dos seus ensinamentos para uma melhor aprendizagem dos alunos. Neste
contexto levantam-se, pois, as questões: “Que futuro se perspetiva para a educação
estatística?” e “Como se posicionam professores e alunos face às mudanças?”.
Considerando, ainda, o desenvolvimento recente que a nível internacional tem tido o
ensino da Estatística, teremos de concluir pela importância de uma reestruturação
substancial, quer relativa aos domínios do conteúdo, das tarefas e dos recursos, quer às
abordagens pedagógicas a preconizar para estes níveis de ensino, que deveriam
promover um grande envolvimento dos alunos e o desenvolvimento da literacia e
raciocínio estatístico dos alunos. Neste contexto, em que se ignoram importantes
aprendizagens dos alunos, será de questionar: “Que cidadãos pretendemos formar?” e
“Que literacia estatística se perspetiva para esses cidadãos?”.
Henriques & Fernandes
66 PROFMAT — 2015
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PROFMAT — 2015 69
A CRIAÇÃO DO MUNDO-HOMENS DE FÉ E DE CIÊNIA: LEIBNIZ,
NEWTON E O CÁLCULO INFINITESIMAL
Francisca Maria Rosado Silva de Sousa,
Esc. Sec. Gabriel Pereira, Agrupamento de Escolas nº2 de Évora
Resumo
Foi o mundo criado por um supremo arquitecto? Segundo um plano de quem tudo sabe
e tudo pode? É o universo um grande relógio que funciona segundo leis matemáticas e
que uma vez posto em movimento por Deus se mantém eternamente? Cabe ao Homem
apreender pela matemática e pela metafísica a harmonia pré-definida do Universo?
Quase 400 anos após o seu nascimento, maravilham-nos as concepções de mundo e o
trabalho matemático de dois homens de fé e vultos maiores da ciência: LEIBNIZ e
NEWTON. Graças a eles desenvolveu-se o Cálculo Infinitesimal, poderoso instrumento
para tantas descobertas! Podemos assim, em 2015, celebrar o Ano Internacional da Luz
(luz que nos deixa ver para trás no tempo em direcção ao Big Bang cósmico!) e em que
se comemoram, entre outros, os 50 anos da descoberta da radiação cósmica de fundo, a
luz mais antiga do cosmos, os 150 anos dos trabalhos de Maxwell e os 100 anos da
teoria da relatividade geral de Einstein! Mostrar aos alunos aplicações do cálculo
infinitesimal, desde a determinação do melhor ângulo na ramificação dos vasos
sanguíneos até à espiral da concha do nautilus, é mostrar o poder e a glória da
Matemática!
Abordou-se, de forma interativa, o Cálculo, salientando aspectos marcantes da época,
vida e obra dos dois matemáticos referidos; foi objectivo que os participantes
partilhassem e discutissem as diferentes abordagens possíveis ao cálculo infinitesimal e
à história da matemática no ensino secundário.
Palavras chave: Leibniz, Newton, Cálculo infinitesimal
A criação do mundo, homens e fé e de ciência: Leibniz, Newton e o cálculo
infinitesimal
Considerando a relevância do Cálculo Diferencial nos actuais programas de Matemática
e a prevista inclusão do Cálculo Integral, bem como a importância de ambos, enquanto
ferramentas matemáticas, nas várias descobertas que se comemoram neste Ano
Internacional da Luz, propôs-se um percurso, desde a Antiguidade clássica aos nossos
dias, revisitando conceções e trabalhos matemáticos relacionados com o
desenvolvimento do Cálculo Infinitesimal.
À criação da análise infinitesimal está subjacente a discussão do conceito de infinito e
de infinitésimo, da distinção entre infinito real e potencial, bem como a discussão da
dimensão do espaço em que vivemos! Da miríade de Arquimedes e a sua contagem do
Sousa
70 PROFMAT — 2015
número de grãos de areia na Terra, da possível divisão de um intervalo entre dois tic-tac
do relógio em nove biliões de partes, da finitude do universo defendida por Platão e
Aristóteles ao espaço infinito de Parménides e Zenão - bem como de Giordano Bruno,
séculos mais tarde, e que lhe valeu a condenação à morte - passando por Galileu,
Descartes e até aos dias de hoje, onde tudo permanece em aberto, um longo caminho foi
percorrido!
Nesse caminho, encontramos dois homens extraordinários, contemporâneos, e a quem
se atribui em simultâneo a criação do Cálculo Infinitesimal: NEWTON e LEIBNIZ.
São homens de fé e de ciência, espíritos universais, que procuram a sua explicação para
a criação do universo e desenvolvem ferramentas matemáticas para o interpretar, crentes
da efectiva possibilidade de o fazer!
Isaac Newton (Woolsthorpe-by-Colsterworth, 4 de Janeiro de 1642 – Londres, 31 de
Março de 1727), cientista reconhecido sobretudo como físico e matemático, foi também
astrónomo, alquimista, filósofo e teólogo. A sua obra, Philoshophiae Naturalis Principia
Mathematica, é considerada uma das mais influentes em História da Ciência. Publicada
em 1687, descreve a lei da gravitação universal e as três leis de Newton, que
fundamentaram a Mecânica Clássica. Newton acreditava que o tempo era sempre igual
para todos os instantes, reconhecendo os seis mil anos de existência que a Bíblia dá à
Terra. Considerava que a mecânica celeste era governada pela gravitação universal e,
principalmente, por Deus, sobre o qual relata: "A maravilhosa disposição e harmonia do
universo só pode ter tido origem segundo o plano de um Ser que tudo sabe e tudo pode.
Isto fica sendo a minha última e mais elevada descoberta."
Para Newton, o espaço absoluto representava “os sentidos de Deus”. Dessa forma,
Deus estava presente em todas as partes do Universo e agia sobre ele segundo a Sua
vontade; para a Física de Newton, Deus não era hipótese, mas realidade. De acordo com
a sua concepção de mundo e a necessidade de o interpretar, Newton desenvolve
trabalhos em múltiplas áreas, desde as quadraturas e a rectificação de curvas, às fluxões,
ao desenvolvimento de séries infinitas…deixando-nos um legado extraordinário!
Para Gottfried Wilhelm von Leibniz (Leipzig, 1 de Julho 1646- Hanôver, 14 de
Novembro 1716), cientista, matemático, filósofo, Deus é perfeição infinita e criou o
“melhor dos mundos possíveis”, sendo o homem chamado a tomar conhecimento da
“harmonia pré-estabelecida” do Universo e apreendendo-o em dois níveis: matemático,
Sousa
PROFMAT — 2015 71
pela ciência da natureza e metafísico, pela filosofia. Nisto, consiste a verdade e a
máxima felicidade do espírito. O universo foi formado mediante a criação, por Deus, de
infinitas unidades substanciais de energia ou mônadas (AMonadologia, 1714). Essas
unidades estão rigorosamente hierarquizadas e organizadas pelo Supremo Arquitecto do
Universo (Deus).
Para além do legado matemático (notações, passagem do discreto para o contínuo, soma
de séries infinitas, conversão dos indivísiveis de Cavalieri nos infinitésimos, criação do
“triângulo característico”, “coração” do cálculo infinitesimal, etc…) Leibniz, árduo
trabalhador, falante de muitas línguas (aos 10 anos lia em latim e grego), deixou-nos
trabalhos fundamentais em muitas outras áreas, podendo referir-se, a título de exemplo,
a sua obra Codex juris gentium diplomaticus (1693), origem do direito internacional ou,
no campo da metafísica, Discurso de Metafísica (1686). Na área política, defende uma
grande comunidade internacional que garanta a paz e a difusão do cristianismo;
acreditando na unidade de todas as línguas, desenvolveu uma linguagem universal,
baseada num sistema binário, precursora da lógica simbólica e aplicações diretas na
computação!
De referir que não existiu um trabalho partilhado de Newton e Leibniz apesar de
viverem na mesma época, havendo até notícia de alguns atritos; será uma mulher, Maria
Gaetana Agnesi (Milão, 1718-Milão, 1799), linguista, filósofa, matemática e intelectual
de reconhecido valor, para além de ser dotada de uma especial sensibilidade, a unir as
ideias de Newton e Leibniz, trabalhadas na obra Istituzioni Analitichead uso della
Gioventù Italian (1748).
Na génese da análise infinitesimal esteve a manipulação de quantidades associadas a
conceitos geométricos susceptíveis de serem divididas tantas vezes quanto se queira,
vindo a constituir elementos indivisíveis…Fundamentais na análise infinitesimal terão
sido, ao longo da história, os contributos de Eudoxo (matemático grego brilhante, do
século V- IVa.C., inspirador de Dedekind e Weirstrass tantos séculos depois, e
desconhecido da maior parte dos nossos alunos) e de matemáticos como Euler,
Roberval, Barrow, Fourier, Bolzano, Cauchy, Weirstrass, Cantor, Russel e tantos
outros!
Importa salientar aos jovens estudantes que na origem da análise infinitesimal estiveram
problemas hoje para eles correntes, como sejam o cálculo da tangente a uma curva num
Sousa
72 PROFMAT — 2015
ponto, determinação dos máximos e mínimos de uma função, cálculo do comprimento
de uma curva entre dois pontos desta ou cálculo da área delimitada por uma curva.
A abordagem da criação e evolução do cálculo infinitesimal é um excelente pretexto
para trabalhar a história da matemática e reforçar a necessidade de esta estar presente
nas aprendizagens desta disciplina. Só conhecendo a história da matemática será
possível entender a essência da matemática! Ensinar matemática sem história da
matemática será como ouvir ópera com o som baixo!
Referências bibliográficas
Belaval, Y. (2005). Leibniz Initiation à Sa Philosophie, 6ª ed..Paris: Librairie Philosophique
J.Vrin.
Gracián, E. (2011). Uma Descoberta Sem Fim - o Infinito Matemático. Porto: RBA.
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Struik, D. J. (1997). História Concisa das Matemáticas. Lisboa: Gradiva.
PROFMAT — 2015 74
A COMUNICAÇÃO MATEMÁTICA NA AVALIAÇÃO DA
RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS
Maria do Carmo Botelho1, Helena Rocha
2
1Externato São Vicente de Paulo,
2Faculdade de Ciências e Tecnologia – Universidade Nova de Lisboa
[email protected], [email protected],
Resumo
A aprendizagem dos nossos alunos é fortemente influenciada pelas caraterísticas das
tarefas que lhes propomos e a resolução de problemas é frequentemente apontada como
uma das tarefas com mais potencial para promover aprendizagens ricas. Mas aprender
implica ser capaz de desenvolver raciocínios, de comunicar as nossas ideias e de
compreender as dos outros num processo argumentativo e reflexivo. A avaliação das
aprendizagens num contexto de resolução de problemas envolve assim, necessariamente
como parte importante do processo, uma análise da comunicação que se estabelece entre
todos os envolvidos.
Nesta comunicação iremos focar-nos precisamente na comunicação que se estabelece
durante a resolução de problemas, abordando as dificuldades dos alunos e dando
atenção à interpretação que fazem do enunciado, à compreensão que manifestam das
figuras apresentadas, à relação que conseguem estabelecer entre a situação em causa e a
informação disponibilizada através de um gráfico, à forma como conseguem explicitar o
seu raciocínio e à linguagem matemática que utilizam no decurso do processo de
argumentação. Para tal vamos basear-nos num conjunto de problemas propostos a
alunos do 10.º ano de escolaridade no decorrer do estudo de funções.
Palavras chave: comunicação; avaliação; resolução de problemas.
Introdução
A comunicação é uma das capacidades transversais a toda a aprendizagem da
matemática, sendo necessário que sejam propostos aos alunos atividades que promovam
a utilizam da comunicação matemática através de linguagem oral e escrita (Ministério
da Educação, 2001). Uma das atividades consideradas relevantes na matemática é a
resolução de problemas, pois potencia nos alunos o processo de exploração e
desenvolvimento dos conhecimentos adquiridos, bem como a aquisição de novos
conhecimentos, servindo de estímulo ao seu processo de aprendizagem (NCTM, 2007).
Botelho & Rocha
PROFMAT — 2015 75
Com este artigo pretendemos identificar alguns aspectos em que a comunicação
matemática pode trazer informação relevante para a avaliação da resolução de
problemas realizada pelos alunos.
Resolução de problemas
Em Portugal, a resolução de problemas na educação em matemática, evidenciou-se pela
reforma curricular de 1991, tendo como objetivo uma nova conceção para o saber e
pensar matemático, de forma a que os alunos adquiram aprendizagens mais
significativas (Boavida, 1993).
É defendido por Menino e Santos (2004) que o ensino está centrado na resolução e
compreensão de problemas e não apenas na mera aquisição de conceitos. Ainda assim,
Abrantes (1998) e Boavida et al. (2008) consideram que a resolução de problemas é
algo a intensificar no currículo de matemática.
As Normas do NCTM de 1991, referem que para a resolução de problemas de
matemática os alunos deverão possuir as seguintes competências: saber investigar e
compreender os assuntos matemáticos; saber correlacionar conhecimentos matemáticos,
recorrendo a estratégias na aplicação da resolução de problemas de matemática; saber
reconhecer e formular problemas, tanto ligados diretamente como indiretamente à
matemática; saber relacionar os conhecimentos adquiridos para a resolução de situações
problemáticas da vida real.
Segundo Pólya (1995), o processo de resolução de problemas desenvolve-se em quatro
fases: a primeira consiste na compreensão do problema e, para isso, será necessário
verificar qual a incógnita e quais os dados disponíveis; a segunda consiste em encontrar
ou construir uma estratégia, onde por vezes é necessário recorrer ao auxílio de outros
problemas, na perspectiva de alcançar uma nova estratégia para a sua resolução; a
terceira compreende a execução dessa estratégia, visando a aplicação prática da mesma
e a quarta define-se pela retrospetiva, ou seja, proceder à verificação da solução
encontrada.
Botelho & Rocha
76 PROFMAT — 2015
Comunicação matemática
De acordo com Ponte et al. (2007) é através de mensagens orais e escritas que os alunos
conseguem comunicar ideias e apropriarem-se de conceitos matemáticos. No entanto, é
importante que alunos e professores estabeleçam entre si uma linguagem matemática
entendível por todos. Para o autor, as aprendizagens podem ser facilitadas se houver
uma boa comunicação na sala de aula, podendo esta ainda servir de regulador das boas
práticas no processo de ensino-aprendizagem.
Segundo o NCTM (2007), o programa de ensino prevê nos diversos anos de
escolaridade capacitar os alunos para: desenvolver um pensamento matemático
consolidado e organizado apoiado pela comunicação; transmitir informação recorrendo
à comunicação, para expressar o seu pensamento matemático corretamente aos colegas
e professores; saber analisar e refletir numa perspectiva de pensamento crítico,
identificando as estratégias e o pensamento matemático dos outros; e dominar a
linguagem matemática para transmitir noções matemáticas com fidelidade. Ainda para o
NCTM (2007), a comunicação escrita matemática é importante, pois permite que os
alunos reflitam sobre a forma que lhes é mais facilitadora para compreenderem e
interiorizarem os conceitos matemáticos abordados e trabalhados em sala de aula. A
utilização da comunicação matemática em sala de aula permite assim desenvolver
competências tais como saber: escutar, questionar, interpretar e compreender, analisar e
refletir. A frequência da prática da comunicação escrita é um fator importante na
aprendizagem, o mesmo acontecendo com a elaboração e utilização de argumentos
matemáticos na justificação e demonstração dos resultados (idem).
A comunicação matemática (oral ou escrita) é um meio importante para que os
estudantes clarifiquem o seu pensamento, estabeleçam conexões, reflitam na sua
aprendizagem, aumentem o apreço pela necessidade de precisão na linguagem,
conheçam conceitos e terminologia, aprendam a ser críticos (Ministério da Educação,
2007, p.11).
Interpretar enunciados, expressar as suas ideias usando linguagem matemática, explicar
oralmente ou por escrito os procedimentos matemáticos que utilizaram para chegar aos
resultados que apresentam e ainda, argumentar sobre o seu raciocínio ou mesmo
questionar o raciocínio dos outros, são de entre outras, algumas das competências a
desenvolver pelos alunos (Ministério da Educação, 2007).
Botelho & Rocha
PROFMAT — 2015 77
Avaliação em Matemática
A avaliação está ao serviço da aprendizagem com a intenção de contribuir para esta,
assim como para a tomada de decisões sobre o ensino (Santos, 2005). Quando temos a
avaliação direcionada para a aprendizagem de forma adequada, o aluno tem acesso aos
critérios valorizados no processo de avaliação e, consequentemente, terá controlo sobre
o seu percurso na aprendizagem (idem).
A avaliação das aprendizagens em matemática insere-se na compreensão dos
conhecimentos adquiridos em contexto de sala de aula, sabendo-se que o processo de
aprendizagem tem mais sucesso quando os alunos assumem um papel de poder sobre as
suas próprias aprendizagens, em que conseguem vigiar os conhecimentos que são
aprendidos e os que não o são, permitindo assim analisar o seu progresso nas
aprendizagens (NCTM,1999).
A avaliação das aprendizagens pressupõe uma postura de diagnóstico e identificação
das necessidades que os alunos enfrentam no processo de aprendizagem (Tinoco, 2011).
Na avaliação das aprendizagens podemos ter em conta determinados indicadores que as
conseguem identificar. Estes indicadores podem ser breves narrações orais ou escritas e
podem apoiar-se em recursos como o computador ou a calculadora (NCTM, 1999).
Assim, este artigo centra-se na comunicação matemática, procurando analisar a forma
como esta pode disponibilizar elementos relevantes para avaliar a resolução de
problemas.
As tarefas
Apresentamos aqui duas das tarefas propostas a dois alunos do 10.º ano, o Mário e a
Mónica de uma escola da Grande Lisboa. Analisamos a resolução que estes efetuaram,
assim como as razões que fundamentam essas resoluções e que partilharam connosco
em entrevista.
A Tarefa 1 apresenta três questões: na primeira pretende-se que os alunos justifiquem
com cálculos se na situação descrita foi golo; na segunda é solicitado que determinem a
altura máxima atingida pela bola; na terceira pretende-se que o aluno determine a
distância da bola à linha de golo, quando esta atinge a altura máxima. Esta tarefa tem
Botelho & Rocha
78 PROFMAT — 2015
como objetivo avaliar se o aluno consegue efetuar um raciocínio utilizando linguagem
matemática.
Tarefa 3
Num jogo de futebol, vai ser cobrado um livre, a 25 metros da baliza (ver figura 1) A barreira está à distância regulamentar de 9,15 metros da
bola. O plano da trajetória da bola é perpendicular à linha de golo.
A bola pode não passar a barreira ou pode passar por cima
dela. Se passar por cima da barreira, a bola segue na direção da
baliza, fora do alcance do guarda-redes. Admita que só pode acontecer uma das quatro situações
seguintes:
· a bola não passa a barreira;
· a bola sai por cima da barra da baliza;
· a bola bate na barra da baliza;
· a bola entra na baliza. Na barreira , o jogador mais alto tem 1,95 metros de altura.
A barra da baliza está a 2,44 metros do chão. Admita que, depois de rematada, a bola descreve um arco, de tal modo que a sua altura,
relativamente ao solo, medida em metros, é dada por
! ! = 0,32! − 0,01! !
Sendo x a distância, em metros, da projeção da bola no solo ao local onde ela é rematada
(ver figura 2).
Figura 2
Resolve os itens seguintes, utilizando exclusivamente métodos analíticos. Podes utilizar a calculadora, para efetuar cálculos numéricos.
1. É golo? Justifica a tua resposta.
2. Qual é a altura máxima atingida pela bola? 3. A que distância da linha de golo está a bola, quando atinge a altura máxima?
Apresenta o resultado em metros, arredondado às décimas. Itens Matemática A – 10.ºano
Figura 1
A Tarefa 2 solicita aos alunos que elaborem uma breve composição, indicando qual a
opção correta e identificando a razão da rejeição para cada uma das restantes. O
objetivo desta tarefa consiste em verificar se o aluno consegue interpretar a situação
descrita no enunciado e relacioná-la com as três representações gráficas.
Botelho & Rocha
PROFMAT — 2015 79
O Mário
O Mário obteve a classificação de 12 valores na disciplina de matemática A nos 1.º e 2.º
períodos, aparentando ser um aluno constante, nunca tendo reprovado. Nas aulas de
matemática distraía-se facilmente com os colegas. Apesar deste comportamento o aluno
participava nas aulas, demonstrando conhecimento e raciocínio matemático.
Relativamente às aulas de apoio o aluno não as frequentava de forma regular. Contudo,
o Mário referiu a matemática como uma das suas disciplinas preferidas, manifestando
ainda o gosto pelo trabalho individual. Quando questionado sobre a profissão desejada,
o Mário refere gostar de vir a ser Designer de Vídeo Jogos.
A escolha deste aluno deveu-se às suas caraterísticas, enquanto aluno de matemática,
pois evidencia participações pertinentes, raciocínio e facilidade na aquisição das
aprendizagens em contexto de sala de aula.
Discussão dos resultados
Pela análise da resolução apresentada pelo Mário (ver figura 3), podemos constatar que
o aluno teve alguma dificuldade na compreensão e interpretação do enunciado da tarefa
1, bem como em estabelecer a relação deste com as figuras apresentadas:
Mário: Isto aqui é a barreira? É os 9.15m?
Botelho & Rocha
80 PROFMAT — 2015
Prof.: Não, o que nos estão a dizer, é que a função nos dá a altura da bola
a x metros depois ter sido lançada. Não tem a ver com a barreira. Isto é o
movimento da bola, a barreira não aparece aqui. (explicação da figura 2)
O aluno considera que a altura assinalada na figura 2, é a barreira de jogadores que é
referida no enunciado. O Mário não consegue integrar na sua resolução todos os
aspectos do problema, pois limita-se a calcular a altura da bola quando esta passa a linha
de golo. Na explicação oral dos cálculos que efetuou afirma não considerar relevante
para a resolução do exercício a existência da barreira:
Mário: Primeiro recolhi os dados do exercício: a distância da bola à
baliza era de 25m, da barreira à bola era 9.15m, mas isto para o primeiro
[exercício] não interessa muito. Na barreira o jogador mais alto, tem
1.95m e da barra ao chão já na linha de golo são 2.44m. A fórmula para
descobrir a trajetória da bola a número de metros é
Depois fui pelo raciocínio que para isto ser verdadeiro, para saber se foi
golo, a trajetória ao fim 25m tem de ser menor do que 2.44m, que é a
altura da baliza. E foi o que aconteceu, substitui o f(x) pelo f(25),
substitui o x da fórmula por 25, e deu 1.75m, e de facto 1.75 é menor que
2.44 o que indica que é golo, segundo uma trajetória perpendicular à
linha de golo.
Prof.: Será que para ser golo, a bola não tem de passar primeiro pela
barreira?
Mário: Ups! É verdade.
Prof.: Então o que temos de fazer?
Mário: Também temos de fazer o f(9.15), e isto vai-nos dizer a que altura
a bola tem de estar para passar a barreira.
Após a intervenção da professora, o Mário acrescenta na sua resolução o cálculo da
altura da bola quando esta passa a barreira e completa o esquema desenhando a barreira.
Botelho & Rocha
PROFMAT — 2015 81
Figura 3 Resolução da questão 1 da tarefa 1 apresentada pelo Mário
O Mário nas suas resoluções escritas apenas apresenta cálculos matemáticos, e por
vezes nem uma resposta ao problema concretiza. Quanto ao rigor na linguagem
matemática, o aluno nem sempre revela preocupação na forma como o utiliza, tal como
se verifica na resolução do exercício 2, em que o aluno escreve em vez de
como seria formalmente correto (ver figura 4).
Figura 4 Resolução apresentada pelo Mário na questão 2 da tarefa 1
É ainda possível concluir que o aluno nem sempre utiliza corretamente a linguagem
matemática oral, pois onde deveria dizer que o gráfico da função é uma parábola, o
Mário afirma que a função é uma parábola. Apesar de o aluno responder corretamente
ao que é solicitado na questão, quando lhe é pedido que relacione o vértice com as
coordenadas e com a parábola em geral, evidencia alguma dificuldade:
Botelho & Rocha
82 PROFMAT — 2015
Mário: Como a função é uma parábola, quando pedem o máximo,
querem o extremo absoluto que é o vértice. Por isso, vou pela fórmula do
vértice, para saber o x do vértice, que é
Prof.: O que é o vértice?
Mário: É o extremo absoluto.
Prof.: Sim, mas é um ponto. Um ponto, tem quantas coordenadas?
Mário: Duas, e estão aqui. Este é o x [referindo-se ao V] e este é o y.
Prof.: Vê o que escreves-te, dá-nos o valor de x e não V. Estás a
dizer que o ponto V só tem uma coordenada.
Mário: Então faço x de V ou V(x)?
Prof.: Deves escrever .
Mário: Já percebi, porque assim o V era uma constante.
Prof.: O vértice só é máximo se a concavidade da parábola estiver
voltada para...
Mário: Ai stora, isso eu não sei muito bem. Se isto for para baixo é para
baixo.
O Mário apresenta a seguinte resolução, na forma escrita, para a tarefa 2:
Figura 5 Resolução apresentada pelo Mário na tarefa 2
Analisando as justificações apresentadas pelo aluno, podemos concluir que o mesmo
teve dificuldade em relacionar a situação descrita no enunciado com os gráficos, como
Botelho & Rocha
PROFMAT — 2015 83
ilustra a argumentação oral efetuada pelo aluno ao ser-lhe pedida uma explicação para a
sua resolução:
O [gráfico] A, não pode ser porque logo na origem tem um erro, porque
elas não podem ter saído do mesmo sítio à mesma hora, elas saíram de
sítios diferentes casa-escola, não saíram casa-casa nem escola-escola. Na
abcissa t elas chegam em horas diferentes, como elas vão a velocidades
constantes, elas não podem chegar a horas diferentes, têm de chegar à
mesma hora. Por isso, a opção A está errada.
A opção B, também não pode ser porque encontramos o mesmo erro na
origem, terem começado no mesmo sítio. Mas é indiferente, agora na
abcissa t o resultado é o mesmo mas a distância é diferente. A distância
neste caso que é f é diferente, a distância da Fernanda não pode ser maior
que a distância da Gabriela, pois ambas vão do sítio A para o sítio B, ou
do sítio B para o sítio A, não pode ser o A+B+1 ou A para B-1 não pode
ser. O 1 é um número que inventei.
A opção C é a correta, porque elas começam de sítios diferentes,
imaginamos que, como isto é a Gabriela, a Gabriela começa da escola,
isto é a escola. Esta é a Fernanda, ela começa de casa. Elas vão a
velocidade constante e encontram-se, como aqui (gráfico) está-nos a
dizer que elas vão à mesma distância, porque daqui aqui é a mesma
distância e daqui aqui é o mesmo tempo, por isso elas têm a mesma
distância, mesmo tempo, velocidades constantes, tanto que se cruzam a
meio do trajeto. (entrevista)
Relativamente à comunicação matemática escrita podemos inferir que o aluno apresenta
constrangimentos quanto à interpretação e compreensão do enunciado dos problemas,
não conseguindo relacionar todos as informações presentes no enunciado. Podemos
ainda concluir que a forma como o aluno expressa as suas ideias ao longo da resolução
dos problemas permite identificar aspetos do conhecimento matemático do aluno que
carecem ainda de aprofundamento.
A Mónica
A Mónica no 1.º período obteve a classificação de 17 e no 2.º período de 18 valores na
disciplina de matemática A e durante o seu percurso escolar nunca reprovou. Nas aulas
de matemática, tende a ser bastante participativa e mostra-se sempre interessada. Esta
demonstra ser uma aluna trabalhadora dentro e fora da aula, sendo assídua nas aulas de
apoio. A Mónica refere a matemática como a disciplina onde sente mais dificuldade,
mostrando por isso alguma insegurança sobre os seus conhecimentos matemáticos nas
Botelho & Rocha
84 PROFMAT — 2015
participações em aula. A aluna pretende prosseguir para o ensino superior, afirmando
desejar vir a ser educadora de infância ou psicóloga.
A escolha da Mónica deveu-se às suas caraterísticas enquanto aluna de matemática, pois
evidencia ser interessada, trabalhadora e com uma boa aquisição das aprendizagens.
Discussão dos resultados
Relativamente à compreensão e interpretação do enunciado da tarefa 1, a Mónica
apresentou dificuldade. Podemos ainda identificar constrangimentos em estabelecer a
relação deste com as figuras apresentadas, tendo necessitado de ajuda para a
interpretação do que era solicitado no enunciado:
Tem muito texto, muitos dados e há dados que pois na resolução nem
acabamos por utilizar, é super confuso. Eu acho que ainda não percebi
bem este exercício, porque acho estúpida esta pergunta: É golo? Justifica
a tua resposta. É um bocado parva. Não sei o que é para fazer. Como é
que mostro que é golo? Pra mim é golo se a bola entrar na baliza, ou seja,
tem de ser menor que a altura da baliza, não tenho de pensar na barreira,
não percebo porque é que tenho de pensar na barreira. Acho este
complicado. Aqui qual é a altura máxima, é fácil; é aquela parte do
vértice, isso é matemática. (entrevista)
A aluna referiu que o excesso de informação no enunciado do problema aumentou o
grau de dificuldade na interpretação do mesmo:
Não gosto muito deste tipo de exercícios, porque não tem contas. É mais
concreto, e este não, é preciso um certo raciocínio, temos de chegar lá,
perceber a lógica e depois já está, mas é parecido com os que fizemos nos
nossos testes. (tarefa 2)
Evidenciou ainda o seu desagrado relativamente à tarefa 2, por não ser necessário
efetuar cálculos para a sua resolução, mas sim relacionar e interpretar os dados do
problema conjuntamente com as representações gráficas do mesmo.
As dificuldades na interpretação do enunciado por parte da aluna, estão patentes na
resolução que apresenta à questão 1 da tarefa 1 (figura 6), onde a aluna não responde ao
pretendido.
Botelho & Rocha
PROFMAT — 2015 85
Figura 6 Resolução apresentada pela Mónica na questão 1 da tarefa 1
Apresenta como resposta um intervalo de valores para x, correspondendo este à
distância em metros da projeção da bola ao local onde é rematada, quando era
espectável que fosse apresentado um valor de y, uma vez que o objectivo é comparar a
altura atingida pela bola na linha de golo com a altura da baliza. É ainda possível
constatar que o intervalo de valores apresentado pela aluna não é a resposta à inequação
de segundo grau. Conclui-se assim que alguns dos conceitos matemáticos envolvidos
careçam ainda de aprofundamento.
A Mónica refere sentir dificuldade na utilização da comunicação matemática escrita
para a explicação do seu raciocínio, pois não sente segurança na resposta, por sentir que
esta nunca se encontra totalmente correta. Por este motivo afirma considerar preferível a
utilização do cálculo para a explicação de um raciocínio. Reforça ainda a dificuldade na
utilização da linguagem matemática no domínio escrito:
Não, faço os cálculos e pronto já expliquei. Só quando às vezes aqueles
que a stora fez os exercícios das hipóteses daquele texto em que temos de
explicar porque é que é aquela hipótese e porque é que não é aquela, até
posso explicar bem, mas tenho a certeza que nunca vou ter a cotação
máxima, há sempre qualquer coisa que vai falhar, por escrito, a
matemática pra mim não é muito bom, complico-me sempre mais. Mas
por cálculos não, acho fácil. Mas a escrita na matemática acho difícil.
(entrevista)
Quanto ao rigor matemático, na resposta apresentada pela aluna à questão 2 da tarefa 1,
podemos inferir a qualidade da mesma (ver figura 7).
Botelho & Rocha
86 PROFMAT — 2015
Figura 7 Resolução apresentada pela Mónica na questão 2 da tarefa 1
No entanto, quando a Mónica é questionada oralmente sobre a sua resolução, constata-
se que a aluna não tem consolidado o conceito de vértice, o que vem mostrar a
relevância da articulação entre diferentes formas de comunicação (escrita e oral) para
uma adequada avaliação do nível de compreensão alcançado pela aluna.
Prof.: Que fórmula é essa?
Mónica: É da parábola...
Prof.: Porque é que vais usar essa fórmula?
Mónica: Não sei, nunca percebi muito bem porque é assim, sabia que era
que é para descobrir sempre o x e depois substituir na fórmula para
descobrir o y.
Prof.: Esse x e y são as coordenadas de que ponto?
Mónica: São as coordenadas da parábola, do ponto máximo, do extremo
Prof.: Numa parábola que nome damos a esse extremo?
Mónica: O vértice. Ah, sim, exato isto é para descobrir o x do vértice.
Mónica: É um máximo ou um mínimo consoante ela está virada para
cima ou para baixo.
Podemos ainda verificar através da comunicação escrita apresentada pela aluna (ver
figura 8), que esta tem dificuldade em relacionar a informação do enunciado com os
gráficos:
Figura 8 Argumentação apresentada pela Mónica na tarefa 2
Através dos registos efetuados pela aluna nos gráficos, observamos que a mesma tenta
interpretar a situação que é descrita no enunciado com as três representações gráficas.
Assim, é possível concluir que a Mónica considera o mesmo ponto do gráfico como
Botelho & Rocha
PROFMAT — 2015 87
sendo simultaneamente instante inicial e final da situação problema apresentada,
evidenciando a fragilidade do seu conhecimento matemático de função e de
representação gráfica.
Figura 9 Anotações feitas pela Mónica nos gráficos da tarefa 2
No que diz respeito, à comunicação matemática escrita verificamos que a aluna
apresenta constrangimentos quanto à interpretação e compreensão do enunciado, bem
como dificuldades quando é confrontada com o que considera ser um excesso de
informação no enunciado. A forma como a aluna expressa as suas ideias ao longo da
resolução dos problemas permitiu-nos identificar aspetos do conhecimento matemático
da aluna que carecem ainda de aprofundamento.
Conclusão
Sendo o objeto da avaliação as aprendizagens é desejável que a avaliação seja um
instrumento de regulação das mesmas de forma a orientar o professor nas suas
estratégias de transferência de conhecimentos (NCTM, 1991).
Os elementos recolhidos junto destes alunos sugerem que estes sentiram dificuldade na
compreensão e interpretação dos enunciados, tendo sido necessário reformulá-los,
recorrendo a outras palavras que não as iniciais, de forma a que os alunos conseguissem
resolver o(s) problema(s). Assim, tal como identificado por Ponte et al. (2007), verifica-
se a importância de estabelecer uma linguagem matemática entre professor e aluno, para
que este se familiarize com a comunicação matemática.
A extensão de informação no enunciado, foi apresentada como causa do aumento da
dificuldade sentida para a resolução das tarefas que lhes foram propostas, bem como a
dificuldade em relacionar o enunciado com as figuras que constavam deste.
Botelho & Rocha
88 PROFMAT — 2015
Relativamente à avaliação das aprendizagens conclui-se que os alunos apresentam, de
uma forma geral, dificuldade na interpretação do enunciado, bem como na compreensão
das figuras presentes no mesmo; dificuldade em relacionar a situação descrita pelo
gráfico; dificuldade na utilização da linguagem matemática durante o processo de
argumentação e dificuldade na elaboração e explicação do seu raciocínio. Constata-se
que as aprendizagens relativas ao estudo da função através do gráfico necessitam de ser
consolidadas. A aplicação destas tarefas permitiu assim identificar o papel da
comunicação matemática em contexto de resolução de problemas, tendo em vista o
processo de avaliação das aprendizagens.
O facto de os alunos não concretizarem com sucesso a primeira etapa da resolução de
problemas apresentada por Pólya (1995), torna-se uma condicionante nas etapas
seguintes, transformando-se num obstáculo para a concretização correta do que é
pretendido.
Parece-nos pois que a análise aqui apresentada permite identificar alguns aspetos do
contributo que a comunicação matemática pode trazer à avaliação das aprendizagens e à
subsequente (re)orientação do processo de ensino. Esperamos, assim que este possa ser
um contributo para estimular a reflexão dos professores em torno desta temática.
Referências bibliográficas
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Visual Tecnológica – Um Estudo Exploratório. Tese de Mestrado. Braga: Instituto de
Educação da Universidade do Minho.
PROFMAT — 2015 90
FORMAÇÃO CONTINUADA DE DOCENTES DOS ANOS INICIAIS DO
ENSINO FUNDAMENTAL NO ÂMBITO DAS CIÊNCIAS EXATAS
Ieda Maria Giongo, Marli Teresinha Quartieri, Sônia Elisa Marchi Gonzatti, Jane
Herber
Centro Unviersitário UNIVATES
[email protected], [email protected], [email protected],
Resumo
Este relato tem por objetivo explicitar ações e resultados de um curso de formação
continuada para docentes, com a temática “Possibilidades para o Ensino de Ciências
Exatas nos Anos Iniciais, ofertado em 2014 por um grupo de pesquisadoras vinculadas a
uma Instituição de Ensino Superior localizada ao sul do Brasil. Em oito encontros
presenciais, os conteúdos problematizados versaram sobre estimativa, sistemas de
medidas, fenômenos térmicos, elétricos e químicos e, a partir destes, os professores da
Escola Básica participantes deveriam explorar, com suas turmas de alunos, no mínimo,
duas atividades relacionadas a tais conteúdos. Ademais, um relatório contendo
informações sobre avanços, limitações e propostas de continuidade acerca das
atividades escolhidas foi entregue por cada docente no último encontro, além de uma
apresentação oral os demais participantes. Durante as reuniões, as discussões foram
gravadas e posteriormente transcritas, e sua análise, aliada a dos relatórios entregues,
permitiu a emergência dos seguintes resultados: a) a produtividade de se operar, já nos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental, com conceitos vinculados à Matemática,
Química e Física; b) os docentes participantes do curso exploraram, com suas turmas,
atividades interdisciplinares, enfocando conteúdos relativos às três disciplinas
mencionadas e c) o curso proporcionou aos participantes aliarem distintas concepções
teóricas a práticas no âmbito das Ciências Exatas.
Palavras-chave: Formação Continuada. Escola Básica. Ensino de Ciências Exatas
Contextualizando
O presente relato evidencia as potencialidades e llimitações da oferta de um curso
de formação continuada dirigida à docentes dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
com ênfase no ensino de conteúdos vinculados ao âmbito das assim chamadas Ciências
Exatas, aqui compreendidas como Matemática, Química e Física. Como apontado por
Gonzatti et al (2015) usualmente, neste nível de ensino, tais conteúdos –
particularmente os vinculados à Química e Física - são relegados a um plano
secundário, em detrimento daqueles usualmente presentes no currículo escolar. As
autoras (2015, p.1-2) expressam que, neste cenário:
Giongo, Quartieri & Herber
PROFMAT — 2015 91
Os fatores que contribuem para este cenário estão relacionados, por um
lado, à formação de professores, tanto inicial quanto continuada, pois
quando já estão atuando não encontram apoio profissional e
acompanhamento para desenvolver seu trabalho. Por outro lado, há a
cultura do professor polivalente para os anos iniciais, que enfatiza
principalmente o domínio de saberes disciplinares da Matemática e da
Língua Portuguesa; no caso das Ciências, são desenvolvidos temas de
Ciências Biológicas, sobre os quais os docentes geralmente apresentam
maior segurança
Em efeito, em cursos de formação anteriores – focados apenas no campo do ensino de
Matemática - eram recorrentes as falas dos docentes dos anos inicias do ensino
fundamental acerca da impossibilidade de enfocarem, em suas práticas pedagógicas,
conteúdos ligados à Física e Química tendo em vista que, segundo eles, não havia
recebido formação inicial adequada para tal. Tais enunciações estão em consonância
com a pesquisa de Schroeder (2007, p. 4) quando evidencia que “[...] a física ainda está
longe das salas de aula das quatro primeiras séries”. Ainda segundo o autor, dentre os
motivos para tal, um dos mais identificáveis “é a pouca intimidade dos professores
dessas séries com a física, mesmo que ela possua um grande calor em potencial como
instrumento para desenvolver habilidades [..]”. As habilidades de que fala o autor estão
diretamente relacionadas à capacidade de aprender a aprender. Por fim, o mesmo autor
adverte que as atividades propostas não devem requerer que os professores tenham
formação específica em Física, mas que os docentes “adotem práticas mais condizentes
com as necessidades de seus alunos”. Quanto ao ensino de Química nas séries iniciais
do ensino fundamental segundo Silva, Zuliani, Fragoso e Oliveira (s/d, p.2) argumentam
que:
Os conhecimentos básicos de Química nas séries iniciais fundamentam as
bases para o aprendizado dos conceitos que serão trabalhados
futuramente com estes alunos. Os alunos possuem uma curiosidade e
avidez de conhecimentos típica da infância. Não sentem vergonha de
perguntar e se entusiasmam com experimentos e atividades práticas,
diferentemente dos alunos mais velhos e mais resistentes às interferências
dos professores.
Com relação ao ensino de Matemática, embora presente neste nível de ensino, há que se
considerar, por um lado, que os conteúdos ministrados usualmente carecem de outras
possibilidades de ensinar e aprender que não aquelas expressas em manuais ou
parâmetros nacionais. Por outro, poucas são as tentativas de interação desta disciplina
com outras, notadamente às vinculadas ao mesmo campo do conhecimento. Nesse
sentido, propomos um curso de formação continuada que, sobretudo, promovesse
Giongo, Quartieri & Herber
92 PROFMAT — 2015
rupturas nos processos de ensino e aprendizagem dos docentes que, acreditamos, será
estendido aos seus alunos.
Sobre os encontros
O curso se desenvolveu de abril a setembro de 2014 por meio de oito encontros
presenciais e dois a distância com a participação de cerca de 20 docentes dos anos
iniciais do ensino fundamental de escolas públicas e privadas da região do Vale do
Taquari, ao sul do Brasil. Nos encontros presenciais foram problematizadas atividades,
propostas pelos investigadores da Universidade, com as temáticas vinculadas à matéria,
energia e simetria. Para a emergência destas atividades, apoiamo-nos também nas ideias
de Schroeder (2007) para quem os estudantes, desde os primeiros anos de escolaridade,
deveriam ser estimulados a participar de atividades nas quais tivessem oportunidade de
manipular, explorar e interagir “com materiais concretos, ao invés de somente se
dedicar as aulas expositivas e leituras de textos” (Ibidem, p. 3). E completa o mesmo
autor que é preciso problematizar o ensino de ciências, ainda tão em voga nas nossas
escolas, no qual “não se identifica qual a relevância do que se aprende na escola para a
vida fora dela” (Schroeder, p. 3).
Em acordo prévio com os participantes, estes deveriam, por conta dos dois encontros a
distância, explorar, em suas turmas, no mínimo duas atividades desenvolvidas nos
encontros presenciais. Ademais, no último destes, os mesmos apresentaram, oralmente,
os resultados do desenvolvimento das atividades com seus estudantes e também
entregaram um pequeno relatório apontando os avanços e limitações de tal trabalho.
Pensamos na produtividade destas duas ações tendo em vista que entendemos ser
necessário para os docentes de qualquer nível de ensino, por um lado, ter domínio da
comunicação, principalmente com seus pares e, por outro, registar, de modo sistemático,
as possibilidades e limitações de suas práticas pedagógicas. Inicialmente, os docentes
participantes questionaram a metodologia que propomos mas, após a exposição das
duas justificativas, concordaram.
Giongo, Quartieri & Herber
PROFMAT — 2015 93
Alguns resultados
Durante as reuniões, as discussões foram gravadas e posteriormente transcritas, e sua
análise, aliada a dos relatórios entregues, permitiu a emergência dos seguintes
resultados: a) a produtividade de se operar, já nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental,
com conc eitos vinculados à Matemática, Química e Física; b) os docentes participantes
do curso exploraram, com suas turmas, atividades interdisciplinares, enfocando
conteúdos relativos às três disciplinas mencionadas e c) o curso proporcionou aos
participantes aliarem distintas concepções teóricas a práticas no âmbito das Ciências
Exatas.
Em efeito, durante as apresentações orais todos os docentes expuseram as atividades
desenvolvidas com seus estudantes, conforme expresso nas figuras 1 e 2.
Figura 1: Atividade desenvolvida por um dos docentes participantes do curso
Fonte: Professor participante (2014)
Giongo, Quartieri & Herber
94 PROFMAT — 2015
Figura 2: Modelo tridimensional para o sistema Sol-Terra-Lua
Fonte: Das autoras (2014)
Os mesmos docentes ambém evidenciaram, em suas falas e na escrita dos relatórios que,
por um lado, passaram a questionar seus conhecimentos prévios acerca das ciências e,
por outro, desenvolveram atividades bastante significativas para seus alunos.
Evidentemente, também foi possível inferir que estes docentes precisam de apoio para
inserir, em suas práticas ppedagógicas atividades experimentais. Tal ideia converge o
fato de que, nessa perpsectiva, o professor passa da posição de detentor de saberes
estabelecidos para a de orientador dos processos de aprendizagem. Como apontamos
noutra ocasião:
As atividades realizadas, com forte componente investigativo e
questionador, possibilitaram aos participantes questionarem sua prática
docente, destacando a necessidade de um professor com perfil
questionador, que propõe desafios e que passe de uma postura de
transmissor de conteúdos para um orientador do processo de
aprendizagem (Gonzatti, Giongo, Herber e Quartieri, 2015, p. 76).
Esta “nova” postura dos docentes participantes favoreceu seus estudantes na medida em
que estes passaram a questionar a si mesmos e operar com hipóteses durante a
realização dos experimentos. Essa ideia pode ser inferida a partir de alguns comentários
emitidos por um grupo de alunos diante da atividade ligada à densidade tendo como
premissa o fato de que um navio não afunda. Dentre eles, destacamos: “As duas garrafas
não afundaram, nem a grande, nem a pequena”; “Porque a bacia é maior [onde as
garrafas flutuam], tem mais água do que as garrafas, por isso elas não afundam”, “A
garrafa maior boiava mais que a pequena, pois seu tamanho era maior. “A água e as
Giongo, Quartieri & Herber
PROFMAT — 2015 95
britas ficavam mais “espalhadas” dentro. E quando a água foi para um lado, afundou.
Tem que equilibrar para não afundar!”, “No navio é a mesma coisa: tem que equilibrar o
peso, senão afunda! E tem que controlar o peso”.
Noutra passagem, um dos docentes que havia trabalhado com experimentos voltados
para fenômenos térmicos expressou em seu relatório que houve, por parte de seus
estudantes, “curiosidades pelos resultados, envolvimento do grupo na atividade proposta
e demonstraram clareza quando interrogados sobre o que aconteceria com as esferas ao
aquecer o ferro [...] responderam que cairiam porque o ferro iria aquecer”. Por fim
destacou também que presenciou “a alegria dos alunos ao desenvolver as experiências”.
Com a mesma ideia outra docente explicitou que “o prazer que eu vi na cainha deles de
questionarem, de escutarem respostas. Eu achei isso o máximo. Para mim, valeu
demais, valeu mesmo”.
Outra docente, muito envolvida com as atividades desenvolvidas no curso, explicitou
que:
O professor deve estar ciente que muitos conceitos apenas estão
começando a ser trabalhados e muitas vezes a criança lembrará a
sensação que teve ao realizar a atividade, mas não conseguirá
compreender como acontece essa ação. Como professora, tive
dificuldades em explicar conceitos de como acontece a reação química
[nas pilhas] e precisei pesquisar. Há um crescimento do professor na
busca por respostas que ajudem a compreensão do aluno, e o professor
mostra-se como um pesquisador, não sendo o dono da verdade. “Vamos
aprender juntos?” O aprender juntos gera uma grande empolgação e a
participação é muito ativa de todos.
Considerações finais
Ao final deste texto, pretendemos abordar três aspectos. O primeiro deles diz respeito ao
fato de que, embora incipientes, as ações desenvolvidas nos encontros presenciais
acabaram efetivamente por mudar a prática pedagógica dos docentes envolvidos.
Entretanto, estamos cientes da necessidade de prosseguirmos investindo nessas
estratégias em cursos de formação continuada para docentes deste nível a fim de que
estes se sintam seguros quando explorarem atividades desta natureza junto a seus
alunos. É importante destacar também, que essa perspectiva de formação docente visa
superar a ideia de que incialmente se aborda a assim chamada “teoria” para somente
após, partir para a experimentação, ou seja, a “prática”.
Giongo, Quartieri & Herber
96 PROFMAT — 2015
O segundo aspecto evidencia que os estudantes dos professores participantes do curso
passaram a fazer conjecturas, problematizar e questionar – a si mesmos e ao professor –
sobre os resultados dos experimentos. Entendemos que esse primeiro passo pode ser
decisivo para que, por um lado, os discentes tenham acesso à alfabetização científica e,
por outro, sigam seus estudos em carreiras de Licenciatura que demandam
conhecimentos ligados à Física, Química e Matemática. Como bem apontou Chassot
(2003, p. 93):
A alfabetização científica pode ser considerada como uma das dimensões
para potencializar alternativas que privilegiam uma educação mais
comprometida. É recomendável enfatizar que essa deve ser uma
preocupação muito significativa no ensino fundamental, mesmo que se
advogue a necessidade de atenções quase idênticas também para o ensino
médio.
O terceiro item aponta para a continuidade dos estudos tendo em vista que uma das
ações em andamento prevê a realização de tais encontros com os docentes dos a nos
iniciais de uma escola pública da região. A diretora deste educandário e a coordenadora
pedagógica estão participando, junto com as professoras da Universidade, de discussões
sobre os próximos encaminhamentos. Também pretendemos acompanhar as atividades
de duas professoras que realizaram o curso para analisar o impacto, na escola, da oferta
do curso.
Pelo que até aqui narramos, podemos inferir que é possível trabalhar, já nos anos
iniciais do ensino fundamental, conteúdos relativos às assim chamadas Ciências Exatas,
não se restringindo apenas à disciplina Matemática e Língua Portuguesa. Como
apontamos anteriormente (Gonzatti, Giongo, Herber e Quartieri, 2014, p.76).
Em síntese, é possível afirmar que é preciso continuar fomentando e
desenvolvendo novas abordagens teórico-metodológicas para o ensino de
Ciências Exatas, na direção do letramento científico e da aprendizagem
pela pesquisa. Entende-se que esse enfoque provoca os sujeitos a
assumirem nova postura epistemológica frente aos processos de ensino e
aprendizagem, que seja convergente com as teorias de aprendizagem
mais progressistas e com a perspectiva da educação como direito social
de todos os cidadãos e que, como principal resultado, auxiliem a
desenvolver, desde os níveis iniciais da educação escolar, a fluência em
aprender.
Giongo, Quartieri & Herber
PROFMAT — 2015 97
Referências
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www.fep.if.usp.br/~profis/arquivos/vienpec/CR2/p729.pdf
PROFMAT — 2015 98
A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM GEOMETRIA
Márcia Jussara Hepp Rehfeldt, Ieda Maria Giongo, Marli Teresinha Quartieri
Centro Unviersitário UNIVATES
[email protected], [email protected], [email protected]
Resumo
Este relato objetiva socializar uma das ações do Programa Observatório da Educação,
desenvolvido no Centro Universitário UNIVATES, que conta com apoio financeiro da
CAPES e do qual participam seis professores de diferentes escolas, três mestrandos, seis
bolsistas de graduação e quatro professoras da Instituição. O objetivo deste Programa é
problematizar e propor estratégias metodológicas com vistas à inovação e reorganização
curricular na disciplina de Matemática, promovendo discussões entre professores de
escolas que possuem considerável distância entre os índices de avaliação externa
relativa ao 5º e 9º anos. Uma das ações consiste em aplicar e avaliar resultados de
provas simuladas. Assim, foram aplicadas 8 questões de múltipla escolha (4 para 5º ano
e 4 para 9º ano) para 318 alunos das escolas parceiras. Além de assinalar a resposta, os
alunos descreveram a estratégia utilizada. Os resultados apontaram lacunas de
aprendizagem na geometria. A partir disso, a equipe do Observatório, selecionou 10
questões envolvendo conteúdos geométricos para explorar com os professores das
escolas, em curso de formação continuada. Participaram desta formação, desenvolvida
nas próprias escolas, cerca de 50 docentes. Inicialmente, os participantes resolveram as
questões descrevendo a estratégia usada. Em seguida, foram discutidas e
problematizadas as resoluções, bem como formas de ministrar os conteúdos
geométricos envolvidos. Percebeu-se que os docentes sanaram suas dúvidas e ficaram
interessados pela geometria. Ademais, solicitaram continuidade dos encontros para o
ano de 2015.
Palavras-chave: Formação Continuada. Programa Observatório da Educação.
Geometria.
Contextualização
O Programa Observatório da Educação financiado pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES e em desenvolvimento no
Centro Universitário UNIVATES, localizado na cidade de Lajeado, Rio Grande do Sul,
Brasil, tem como objetivo central problematizar e propor estratégias metodológicas com
vistas à inovação e reorganização curricular na disciplina de Matemática, promovendo
discussões entre professores das seis diferentes escolas do Vale do Taquari que possuem
considerável distância entre os Índices de Avaliação de Desempenho da Escola Básica
(IDEB), relativo à 5º ano e 9º ano. Conforme informações disponibilizadas no site da
Univates, a região do Vale do Taquari situa-se no centro do Rio Grande do Sul (Estado
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
PROFMAT — 2015 99
que fica ao sul do Brasil), é formada por 36 municípios, que totalizam uma área de
4.821,1 Km² (1,71% do Estado).
O Programa Observatório da Educação conta com a participação de seis escolas, com
IDEB em torno de 6,0 no 5º ano e 4,0 no 9º ano, localizadas nos municípios Roca Sales,
Muçum, Paverama, Estrela, Lajeado e Teutônia, conforme ilustra a Figura 1.
Figura 1 – Mapa do Vale do Taquari e as cidades em que se localizam as escolas contempladas
pelo Programa Observatório da Educação
Fonte: Conselho de Desenvolvimento do Vale do Taquari, 2015
Com relação aos índices do IDEB, em todas as escolas pôde-se observar um
significativo decréscimo nas notas obtidas, além da considerável diferença entre do 5º e
o 9º ano. Esses dados levaram a equipe proponente do estudo a postular necessidade de
pesquisas, estudos e ações nas referidas escolas com o intuito de aumentar os índices ao
longo de quatro anos, haja vista ser este o tempo concedido pela CAPES para
desenvolver o projeto.
Para que se pudesse compreender como este índice é formado, buscou-se em órgãos
governamentais brasileiros a sua definição. Assim, segundo nota técnica disponibilizada
pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (INEP),
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
100 PROFMAT — 2015
O Ideb é um indicador de qualidade educacional que combina
informações de desempenho em exames padronizados (Prova Brasil ou
Saeb) – obtido pelos estudantes ao final das etapas de ensino (4ª/5º ano e
8ª séries/9º ano do ensino fundamental e 3ª série do ensino médio) – com
informações sobre rendimento escolar (aprovação) (BRASIL, s/d, texto
digital).
Em síntese, o índice é obtido multiplicando-se a nota do desempenho
obtido pelos estudantes na prova Brasil num ano específico pelo índice
de aprovação dos alunos da escola até aquele ano. Um exemplo pode
elucidar o caso. Se os alunos do 5º ano atingiram nota 6.0, mas nos anos
iniciais do Ensino Fundamental (até o 5º ano) a escola apresenta um
percentual 90% de aprovação de alunos, o índice é calculado 6.0 x 0.9 =
5.4. Assim, de acordo com o governo brasileiro, há certa garantia de que
não haja um elevado índice de aprovação com ausência de
conhecimentos.
No que tange ao quadro de profissionais envolvidos no Programa Observatório da
Educação, este é integrado por seis professores das escolas públicas acima
mencionadas, três mestrandos de pós-graduação, cujas pesquisas estão vinculadas às
temáticas discutidas (Etnomatemática, Investigação Matemática e Modelagem
Matemática) no Programa, seis bolsistas de Iniciação Científica de diversos cursos de
graduação, além de quatro professoras pesquisadoras (três com formação na área da
Matemática e uma em Pedagogia) que também ministram aulas na graduação e nos
mestrados em Ensino de Ciências Exatas e em Ensino.
A equipe se reúne semanalmente, sendo este o momento em que ações são traçadas e
articuladas, com vistas a alcançar o objetivo central da pesquisa. Entre as ações
destacam-se àquelas que têm como intuito reduzir a distância entre o índice dos Anos
Iniciais e dos Finais do Ensino Fundamental na avaliação do IDEB, como já citado.
Uma delas consiste em elaborar, aplicar, corrigir e avaliar os resultados de provas
simuladas elaboradas a partir de questões do Sistema de Avaliação da Educação Básica
(SAEB) e da Prova Brasil. Entende-se que se os alunos experienciarem e vivenciarem
situações similares, o índice de acertos nas provas finais poderá sofrer um acréscimo.
Com base neste pressuposto é que foram planejadas ações a seguir descritas.
O planejamento da ação
Para desenvolver a ação acima mencionada, o grupo de professores do Centro
Universitário UNIVATES, conjuntamente com os mestrandos e os bolsistas de
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
PROFMAT — 2015 101
Iniciação Científica buscou em provas de anos anteriores questões que apresentavam
certa recorrência, ou seja, que estavam frequentemente nas referidas avaliações. A partir
deste material, a equipe escolheu oito questões de múltipla escolha que foram
adaptadas, sendo 4 questões direcionadas a alunos do 5º ano e as outras 4 para discentes
do 9º ano.
As duas provas simuladas foram aplicadas a 162 alunos do 5º ano e 156 do 9º ano,
totalizando 318 alunos das escolas parceiras. Além de assinalar a resposta correta,
solicitou-se aos estudantes descreverem o desenvolvimento de cada questão, ilustrando
o raciocínio utilizado. Todas as provas foram corrigidas pelos mestrandos em parceira
com os bolsistas de Iniciação Científica. Os dados oriundos destas provas mostraram
que existem lacunas de aprendizagem, em especial, na geometria.
Após apresentação e discussão dos resultados com os professores das escolas parceiras
nas reuniões semanais, os próprios docentes mencionaram que o tema geometria é
pouco explorado nas escolas, pois muitos livros abordam este assunto nos capítulos
finais. Estudos neste sentido também corroboram tais resultados. Segundo Perez (1995),
Passos (2000) e Ferreira e Correia (2007) apud Kluppel (2012, p. 12) “há um descaso
em relação ao ensino da geometria nas salas de aula, metodologia não apropriada, o não
conhecimento por parte dos professores de alguns conteúdos específicos, conteúdos
deixados para final do ano letivo, entre outros”. Macedo (2013) aponta que a principal
fonte para o ensino da geometria é o livro e que até meados dos anos 90 ela aparecia no
final do livro. Como a maioria dos professores segue o livro didático, mas não o
finaliza, este tema deixa de ser desenvolvido.
A partir de tais constatações, inicialmente discutiu-se com os professores parceiros a
escolha de 10 questões que contemplassem questões semelhantes às que os alunos
erraram na simulação. Após algumas semanas de discussões, os professores das escolas
parceiras entenderam a relevância de tais questões e solicitaram que estas também
fossem problematizadas com seus colegas-professores, nas seis escolas parceiras. A
partir disso, elaborou-se uma agenda e cada escola foi visitada uma ou duas vezes para
discutir as questões. Participaram em cada escola, além do professor indicado por ela,
um professor da Univates ou um dos mestrandos e os demais professores das escolas
parceiras. Em alguns casos, houve um interesse considerável e vários professores,
independente da disciplina que estavam ministrando, acabaram participando dos
encontros. Em outras, colaboraram nas discussões apenas os professores que
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
102 PROFMAT — 2015
lecionavam nos anos iniciais do Ensino Fundamental, além dos docentes graduados em
Matemática. Desta forma, integraram esta formação docente cerca de 50 professores.
De acordo com Chimentão (200 , p. 3), “a formação continuada de professores tem sido
entendida como um processo permanente de aperfeiçoamento dos saberes necessários à
atividade profissional, realizado após a formação inicial, com o objetivo de assegurar
um ensino de melhor qualidade aos educandos”. Para Mileo e Kogut (200 , p. 4 47-
4948),
cabe ao professor manter-se qualificado para que possa atender as
necessidades de seus alunos bem como da sociedade. Uma vez que, o
mercado de trabalho busca o profissional melhor qualificado, flexível e
disposto para enfrentar os desafios a ele proposto, visando uma melhoria
na educação e no ensino. Portanto, apenas a formação inicial não é
suficiente para a garantia da qualificação dos professores na atualidade.
Durante os encontros de formação continuada, a sistemática consistiu na resolução
inicial e individual ou em pequenos grupos das questões propostas. Após, estas eram
resolvidas e discutidas em grande grupo. Por fim, questionaram-se outros aspectos que
poderiam ser desenvolvidos quando uma determinada questão seria desenvolvida em
sala de aula, bem como variações e adaptações destas, haja vista que vários professores
dos anos iniciais estavam participando das discussões.
As questões problematizadas estão descritas a seguir. Cabe mencionar que além de cada
questão, está destacado em que ano a questão poderia ser discutida, a qual descritor ela
se refere, a fonte de onde a questão foi retirada, bem como os demais assuntos que
foram debatidos. Segundo o INEP:
os conteúdos associados às competências e habilidades desejáveis para
cada série e ainda, para cada disciplina, foram subdivididos em partes
menores, cada uma especificando o que os itens das provas devem medir
– estas unidades são denominadas "descritores". Esses, por sua vez,
traduzem uma associação entre os conteúdos curriculares e as operações
mentais desenvolvidas pelos alunos. Os descritores, portanto,
especificam o que cada habilidade implica e são utilizados como base
para a construção dos itens dos testes das diferentes disciplinas
(BRASIL, s/d, texto digital).
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
PROFMAT — 2015 103
As questões desenvolvidas e discutidas com os professores
Questão 1:
Observar a planta de um clube desenhada em uma malha quadriculada e responder à questão.
Juliana fez o seguinte trajeto: saiu da quadra de tênis, passou pela piscina, pelo vestiário feminino e
entrou no ginásio de esportes. Como você poderia descrever esse caminho usando coordenadas?
a) (5,3); (3,5); (1,4); (2,1)
b) (3,5); (5,3); (4,1); (1,2)
c) (5,3); (3,5); (2,3); (2,1)
d) (3,5); (5,3); (1,4); (1,2)
Descritor 9: Interpretar informações apresentadas por meio de coordenadas cartesianas.
Ano: 9º ano
Fonte: adaptado do Projeto Araribá, 2006, p. 245.
Outros assuntos discutidos:
- Como os professores desenvolvem este conteúdo com seus alunos?
- Em que ano poder-se-ia resolver este tipo de atividade?
- O descritor envolvido.
- Exemplos de como trabalhar este conteúdo utilizando jogos como caça ao tesouro no chão, batalha
naval. Estes jogos já são conhecidos dos alunos e professores.
- A importância de diferenciar nomenclaturas como linha e coluna.
- Possibilidades de explorar esta questão de forma diferente, em diversos anos, elevando ou reduzindo
o grau de dificuldade do problema.
Observações e análise:
Nas resoluções individuais, apenas professores de Matemática, em geral, conseguiram resolver esta
questão. Os demais docentes apresentaram algumas dificuldades, pois manifestaram dúvidas acerca das
coordenadas cartesianas, não lembrando qual valor entre parênteses que deveria ser escrito
inicialmente, se era o da linha ou a da coluna. Para alguns professores, esse fato também não parecia
ser relevante, mas após discussões eles compreenderam a posição dos números dentro dos parênteses.
Cabe mencionar que em uma das escolas os alunos estavam desenvolvendo uma questão similar a esta
problematizada quando o professor da Univates chegou ao educandário. Assim, houve também menção
ao trabalho que já estava sendo desenvolvido, vinculando com àquilo que os docentes já estavam
realizando.
As atividades já desenvolvidas pelo professor, bem como os resultados advindos delas podem auxiliá-
lo a refletir sobre sua própria prática. De acordo com Perrenoud e Schilling (2002, p. 53) “aprendemos
a refletir sobre os aspectos importantes da prática, e não situações com exemplos insignificantes”.
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
104 PROFMAT — 2015
Questão 2:
Dobramos uma folha como na figura abaixo, depois recortamos e retiramos a parte branca.
Em seguida, desdobrando a folha, obtemos:
Descritor 4: Identificar relação entre quadriláteros por meio de suas propriedades
Ano: 9º ano
Fonte: http://profwarles.blogspot.com.br/.
Outros assuntos discutidos:
- Esta atividade também foi realizada na prática, dobrando-se o papel. Além disso, a partir de
dobraduras foram construídos quadrados, retângulos e losangos.
- Foram realizadas discussões acerca dos conceitos quadrado, retângulo e losango.
- Foram construídas figuras e polígonos simétricos com eixos de simetria (um, dois, três, quatro, oito)
por meio de dobraduras.
Observações e análise:
A maioria dos professores acertou sem dificuldades esta questão. No entanto, em todas as escolas as
discussões acerca do que é quadrado, retângulo e losango foram exaustivas. Questionados acerca das
definições, a maioria afirmou que uma figura para ser um quadrado basta ter 4 lados iguais. Para ser
um retângulo, segundo os docentes, é necessário que os lados opostos sejam iguais. Poucos professores
mencionaram algo sobre ângulos retos. Por fim, um losango, para estes, era apenas uma figura de 4
lados iguais e ângulos opostos iguais dois a dois.
Questionados se um quadrado também poderia ser um retângulo, a maioria dos professores afirmou
que não. Assim, tornou-se necessária uma longa discussão acerca de cada conceito geométrico. Alguns
professores dos anos iniciais mencionaram que para eles, uma figura geométrica plana só poderia ser
uma coisa, ou um quadrado, ou um retângulo e que foi assim que aprenderam na sua formação inicial.
Esta constatação nos permite inferir que é necessário ao professor também aprender. Segundo Demo
(2005, p. 36) “professor não é quem ensina, mas o eterno aprendiz, aquele que aprende melhor, está à
frente dos outros neste desafio, ou que faz disso sua própria profissão.
Em relação à construção de figuras simétricas, os docentes dos anos iniciais ficaram entusiasmados e
motivados a realizar as atividades com seus alunos. A maioria destes professores não tinha
conhecimento sobre simetria. Entretanto, depois das discussões perceberam a produtividade e a
viabilidade do uso da simetria para os alunos dos anos iniciais.
Questão 3:
Um campo de futebol tem o formato de uma figura com quatro lados, como podemos observar no
esquema representado a seguir. Qual quadrilátero é esse?
a) losango
b) quadrado
c) trapézio
d) retângulo
Descritor 4: Identificar quadriláteros observando as posições relativas entre seus lados (paralelos,
concorrentes, perpendiculares).
Ano: 5º ano
Fonte: Paraná, 2009.
http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/cadernos_pedagogicos/ativ_mat1.pdf
Outros assuntos discutidos:
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
PROFMAT — 2015 105
- Foram discutidos novamente os conceitos de losango, quadrado, trapézio e retângulo.
Observações e análise:
A identificação de qual figura geométrica estava sendo mencionada não gerou dúvidas e todos os
professores acertaram a questão. Como as discussões acerca de quadrados, retângulos e losangos já
havia sido realizadas anteriormente, poucas observações foram realizadas.
Questão 4:
Veja o quadrilátero MNPQ desenhado na malha quadriculada abaixo.
O quadrilátero semelhante ao quadrilátero MNPQ é
Descritor 5: Reconhecer a conservação ou modificação de medidas dos lados, do perímetro, da área em
ampliação e/ou redução de figuras poligonais usando malhas quadriculadas.
Ano: 9º ano
Fonte: Prova Brasil.
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=7998&Itemid=.
Outros assuntos discutidos:
- Proporção;
- Cálculos de área e perímetro com papel quadriculado;
- Importância do uso do papel quadriculado para dar a noção de áreas e perímetros;
- Geoplanos.
Observações e análise:
Esta questão também gerou poucas discussões no sentido da resposta correta, pois todos os professores
acertaram a questão. No entanto, quando se discutiu os cálculos de áreas e perímetros, alguns
questionamentos relevantes surgiram. Um deles esteve relacionado às possibilidades de construção de
figuras com áreas iguais, mas perímetros diferentes. Alguns professores questionaram como seria
possível uma mesma área gerar perímetros diferentes Além disso, ficaram surpresos ao questionamento
de construir uma figura com um determinado perímetro capaz de proporcionar uma área máxima. Após
algumas tentativas, concluíram que uma área composta por quatro lados torna-se máxima se estiver em
formato de quadrado. Neste sentido, foi necessário encorajá-los no sentido de realmente
confeccionarem os quadrados e retângulos usando o material disponibilizado como papel quadriculado,
régua, fios e tesoura. O apoio aos professores neste momento foi fundamental. Segundo Tardif e
Lessard (2012, p. 185), “vários professores dizem ter-se beneficiado, no início da carreira ou na
atribuição de uma nova função, com o suporte de algum colega de experiência, com uma espécie de
mentor informal”.
Ao término desta questão também discutiu-se acerca do uso de geoplanos para calcular áreas e
perímetros. Segundo Thomaz Sobrinho (2011, p. 13),
O geoplano é um artefato que permite ao aluno descrever, reproduzir, montar, identificar, explorar e
reconhecer as diferenças e semelhanças das formas planas, além de propiciar meios de ele deduzir,
analisar, avaliar e propor soluções para questionamentos de cunho geométrico, algébrico, aritmético,
entre outros temas matemáticos.
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
106 PROFMAT — 2015
Questão 5:
Ampliando o triângulo ABC, obtém-se um novo triângulo A’B’C’, em que cada lado é o dobro do seu
correspondente em ABC.
Em figuras ampliadas ou reduzidas, os elementos que conservam a mesma medida são:
a) As áreas
b) Os perímetros
c) Os lados
d) Os ângulos
Descritor 7: Reconhecer que as imagens de uma figura construída por uma transformação homotética
são semelhantes, identificando propriedades e/ou medidas que se modificam ou não se alteram.
Ano: 9º ano
Fonte: Prova Brasil.
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=7998&Itemid=.
Outros assuntos discutidos:
- Ampliação e redução de figuras através da homotetia (ponto de fuga).
- As implicações do dobro do perímetro no cálculo das áreas.
Observações e análise:
Esta questão teve um elevado índice de acertos, haja vista os conceitos de área e perímetro já terem
sido discutidos anteriormente. No entanto, a maioria dos professores apresentou dificuldades em
reproduzir a figura ampliada pelo processo de homotetia. Verificou-se que a maioria dos professores
pouco sabia acerca desta palavra, bem como os processos de reprodução da figura por este método. No
entanto, conseguiram realizar as atividades com o uso de compasso e outros com o uso de réguas.
Também figuras como quadrados tiveram seus perímetros dobrados e para surpresa de alguns
professores, sua área não dobrou, mas quadruplicou. Para se certificar disso, vários professores
repetiram o experimento alterando os valores dos lados dos quadrados.
Questão 6:
Janine desenhou dois triângulos, sendo que o triângulo DEF é uma redução do triângulo ABC.
A medida x do lado DF é igual a
a) 4 cm
b) 6 cm
c) 8 cm
d) 12 cm
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
PROFMAT — 2015 107
Descritor 3: Identificar propriedades de triângulos pela comparação de medidas de lados e ângulos.
Ano: 9º ano
Fonte: Prova Brasil.
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=7998 &Itemid=.
Outros assuntos discutidos:
- Discussão das condições de existência de um triângulo.
Observações e análise:
Esta questão gerou muita polêmica, poiso primeiro triângulo não existe. A condição de existência de
um triângulo infringida é: “a soma dos dois lados menores precisa ser maior que o maior lado”.
Questionados os professores afirmaram que a resposta certa seria 6 cm, mas ao serem provocados para
construir, na prática, a partir de canudos de refrigerante o triângulo, não o conseguirem construir.
Assim, foram repassados novos valores de lados com o intuito de que eles mesmos descobrissem as
condições de existência e que debatessem sobre isso.
Cabe mencionar que alguns professores, com formação na área da Matemática, também tiveram
dúvidas nesta questão. Para Demo (2005, p. 103), “quem argumenta busca o debate, não sua conclusão,
a mudança de perspectiva, não o fechamento, novos horizontes, não a mesmice”.
Questão 7:
Observar os relógios.
Os destaques nesses relógios estão associados a ângulos de quantos graus?
a) 120º e 210º
b) 20º e 35º
c) 240º e 150º
d) 150º e 200º
Descritor 6: Reconhecer ângulos como mudança de direção ou giros, identificando ângulos retos e não
retos.
Ano: 9º ano.
Fonte: adaptado do Projeto Araribá, 2006, p. 138.
Outros assuntos discutidos:
- Divisão do círculo em 360 graus.
Observações e análise:
A questão foi de fácil entendimento para os professores e somente os que não tinham conhecimento
acerca da quantidade de graus na circunferência é que apresentaram alguma dúvida. A maioria pensou
em 30º para cada 5 minutos; e, posteriormente multiplicou por 4 espaços. Por fim, subtraíram este
valor dos 360º e obtiveram o outro ângulo.
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
108 PROFMAT — 2015
Questão 8:
Três meninas estão olhando para o hospital através da janela dos edifícios em que residem. Andréia
mora no edifício número 1, Bárbara no 2 e Célia no 3.
Observe as vistas que cada uma tem do hospital. Qual das três é a de Andréia?
Descritor 1: Identificar a localização e movimentação de objeto em mapas, croquis e outras
representações gráficas.
Ano: 5º ano.
Fonte: adaptado de Imenes, Jakubovic e Lellis, 1996.
Outros assuntos discutidos:
- Importância de problemas com mais dados do que os usados no problema.
- Possibilidades de trabalhar este tema com o material dourado.
Observações e análise:
Nem todos os professores conseguiram resolver com êxito este problema, alguns confundiram-se
com o desenho em perspectiva. Foi necessário desenvolver na prática, por meio de material dourado,
a situação para que todos compreendessem a questão.
Outro aspecto que foi discutido é a relevância de se problematizar problemas com mais variáveis do
que o necessário. Neste caso, a questão perguntou apenas a visão em perspectiva de Andréia e não
das demais meninas. Segundo Stancanelli (2001) apud Delazeri e Silva (2013, p. 3), problemas com
excesso de informações “valorizam a importância do hábito da leitura e a percepção dos dados
necessários a resolução do problema dispostos dentro dos textos”.
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
PROFMAT — 2015 109
Questão 10:
As figuras planificadas correspondem, respectivamente, a:
a) Uma pirâmide de base triangular e a um prisma de base retangular.
b) Uma pirâmide de base quadrada e a um prisma de base hexagonal.
c) Um prisma de base quadrada e a uma pirâmide de base hexagonal.
d) Um prisma de base triangular e uma pirâmide de base retangular.
Descritor 2: Identificar propriedades comuns e diferenças entre figuras bidimensionais e
tridimensionais, relacionando-as com suas planificações.
Ano: 9º ano.
Fonte: Paraná, 2009.
http://pt.slideshare.net/edileussa/ativ-mat2-descritores-anos-finais
Observações e análise:
Assim como a questão anterior, poucas discussões foram geradas com esta situação. A capacidade de
percepção das figuras planificadas foi de fácil assimilação dos professores. Comentou-se a relevância
de planificar formas geométricas tridimensionais. Discutiu-se que operar com o material concreto é
relevante para o aluno.
Questão 9:
Pintaram-se as seis faces de um prisma quadrangular regular antes de o cortar em cubos iguais, tal
como se observa na figura.
Quantos cubos têm só duas faces pintadas?
a) 3
b) 4
c) 8
d) 12 Ano: 5º ano.
Fonte: Prova Brasil, 2005.
http://www.eidh.eu/exames-13_14/9_ano_matematica/mat_provas/M9_Ex2005_1C.pdf.
Outros assuntos discutidos:
- Exploração do material dourado.
- Atividades de perspectiva e contagem de cubinhos.
Observações e análise:
Esta questão foi de fácil compreensão para os professores. A maioria não utilizou o material dourado
para realizar a contagem. A questão não gerou muito debate. Entretanto, outras possibilidades de
arranjar os cubinhos foram comentadas.
Rehfeldt, Giongo & Quartieri
110 PROFMAT — 2015
Considerações
A formação docente realizada em cada escola foi relevante para os professores, em
especial, para os docentes dos anos iniciais. A partir das práticas realizadas e
experimentadas, eles perceberam que é possível inserir o conteúdo geometria em suas
aulas, inclusive nos primeiros anos do ensino fundamental. Cabe mencionar que a
formação na escola, por meio do deslocamento dos professores e mestrandos da
Univates, e não os professores dirigindo-se até a Instituição foi fundamental, pois foi
possível perceber a realidade em que cada escola está inserida.
As práticas também impulsionaram discussões e reflexões dos professores acerca das
suas aulas. Vários comentários foram realizados tanto pelos professores parceiros como
pelos diretores das escolas e coordenação pedagógica sobre mudanças ocorridas no
cotidiano da sala de aula. Relatos dos professores parceiros ilustram que vários docentes
dos anos iniciais e participantes da formação continuada ainda vêm questionando-os
acerca de alguns conceitos e planejando aulas diversificadas com materiais alternativos.
Durante a formação continuada com os docentes, perceberam-se lacunas em vários
conceitos referentes à geometria como definições de quadrado, retângulo, losango,
trapézio. Em adição, algumas crenças como o dobro do perímetro gera o dobro de área
em figuras como quadrados também tiveram que ser desmistificadas também por meio
de atividades práticas.
No entanto, muitas dúvidas foram sanadas, mas outras permaneceram. O grupo de
docentes, através de suas direções, também solicitou o retorno da equipe em 2015, pois
algumas atividades não foram desenvolvidas exaustivamente. Em algumas escolas, nem
todas as questões foram resolvidas, pois o tempo cedido para tais atividades foi exíguo e
na maioria das escolas ocorreram dois encontros de duas horas aproximadamente. Para
2015, a proposta é de continuidade desta formação continuada.
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Rehfeldt, Giongo & Quartieri
PROFMAT — 2015 111
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20 de fevereiro, 2015, de http://portal.inep.gov.br/web/saeb/o-que-cai-nas-provas.
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20 de fevereiro, 2015, de
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Delazeri, Giovani Rosa; Silva, Leandro Millis da. (2013). Vivenciando a resolução de
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Ulbra – Canoas, Rio Grande do Sul. Acedido em 20 de fevereiro, 2015, de
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aprendizagem de geometria no 8º ano do Ensino Fundamental. 65 f. Dissertação
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Mileo, Thaisa Rodbard; Kogut, Maria Cristina (2009). A importância da formação continuada
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Rehfeldt, Giongo & Quartieri
112 PROFMAT — 2015
Tardif, Maurice; Lessard, Claude. (2012). O trabalho docente: elementos para uma teoria da
docência como profissão de interações humanas. 7. ed. Petrópolis: Vozes.
Thomaz Sobrinho, César José. (2011). Geoplano no ensino da geometria: cálculo de áreas.
Trabalho de Conclusão de Curso. Anápolis, GO, 2011. Acedido em 20 de fevereiro,
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http://www.unucet.ueg.br/biblioteca/arquivos/monografias/CESAR_JOSE_THOMAZ
_SOBRINHO.pdf.
Warles (2015). Acedido em 20 de fevereiro, 2015, de http://profwarles.blogspot.com.br.
PROFMAT — 2015 113
ALGUNS DADOS QUE ALUNOS E PROFESSORES DEVEM SABER SOBRE
RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS
Jorge Cruz
Agrupamento de Escolas nº 1 de Beja - Beja
Resumo
Esta comunicação apresenta, a propósito da resolução de um problema retirado do
estudo PISA, alguns aspetos importantes em resolução de problemas. Escolheu-se um
problema onde os resultados dos alunos portugueses foi bastante baixo e deu-se esse
problema a resolver a um grupo restrito de 3 alunos, os quais obtiveram boa prestação
na tarefa. Procura-se, através da apresentação das características destes alunos
estudados, bem como de aspetos metodológicos presentes na investigação, fornecer
dados relevantes a considerar do ponto de vista didático em resolução de problemas.
Palavras chave: Resolução de problemas; formulação de problemas; avaliação da
resolução de problemas.
Introdução
A justificação da importância de estudos educativos com alunos, baseados em
instrumentos de recolhas de informação constituídos por problemas de matemática,
encontra apoio em abundante literatura disponível. O caminho começado em termos
educativos com o trabalho de Polya (1 57), “How to solve it”, com primeira edição em
1945, introduz o estilo heurístico de resolução de problemas o qual ganha presença nos
currículos à escala global a partir dos desenvolvimentos dados por documentos
emanados pelo NCTM. As normas - Standards - propostas para os vários anos de
escolaridade começam em todos eles por: “A matemática como Resolução de
Problemas” (NCTM, 1 8 , p. 2 , 8 e 163). Principles and Standards, (NCTM, 2000)
apresenta para todos os níveis de ensino (K-12) a resolução de problemas como o
primeiro dos cinco “processos” matemáticos a desenvolver nos alunos.
Törner, Schoenfeld and Reiss (2007), com Problem Solving around the world, uma
compilação de artigos oriundos de várias partes do globo, continuam a concluir sobre a
continuidade da proeminente posição que a resolução de problemas ocupa a nível
mundial aos seja na educação matemática e seja na investigação na área.
O PME, tem dedicado importante relevo ao tema, ampliando-o, como acontece com a
publicação da revista Educational Studies in Matemathics (2013), onde é dado especial
Cruz
114 PROFMAT — 2015
destaque a investigações sob o tema Problem Posing. Vários autores têm salientado que
a formulação de problemas (Problem Posing), em contraste com a resolução de
problemas, tem recebido menor atenção nos programas e na sala de aula (Brown and
Walter, 1983; Kilpatrick, 1987, citados em Cai e Hwang, 2002). Esta é considerada uma
área emergente e, simultaneamente, uma significativa ferramenta para o ensino (Singer,
Ellerton e Cai, 2013).
Schoenfeld (1992) faz uma revisão de literatura e conclui que as tentativas para ensinar
estratégias para resolver problemas não foram bem sucedidas. Schoenfeld (2005) insiste
na mesma ideia.
Cruz (2003) concluiu, através de um estudo com alunos de 12 e de 14 anos, que os mais
velhos não eram melhores na mobilização de recursos, na aplicação de heurísticas e na
verificação/controlo dos seus processos. Por outro lado, os que obtinham melhor
resultado escolar (independentemente da idade) mostravam melhores resultados em
resolução de problemas nas categorias analisadas (Cruz e Carrillo, 2004).
O presente artigo tem como referentes:
- o modelo de competência em resolução de problemas de Schoenfeld (1985; 1992) -
Recursos; Heurísticas; Controlo; Crenças.;
- os resultados de Cruz (2003, 2004) que encontram suporte em linhas de investigação
em resolução de problemas com alunos com bons resultados escolares;
- a conjetura de Kilpatrick (Kilpatrick, 1987, citado por Cai e Hwang, 2003; Goldenberg
e Walter, 2006) sobre a importância da formulação de problemas como ferramenta para
ajudar a resolver problemas e simultaneamente como medida dessa capacidade de os
resolver;
Procedeu-se a um desenho metodológico capaz de identificar/validar estas
características dos alunos, importantes para a resolução de problemas.
Formularam-se então as seguintes perguntas:
Que características possuem os alunos com melhores resultados em resolução de
problemas? Porque são eles melhores? Que contextos educativos podemos proporcionar
para fazer emergir boas características para resolver problemas?
Cruz
PROFMAT — 2015 115
Metodologia
Num grupo de 27 alunos de 14 anos (9º ano), observaram-se os resultados escolares e
aplicou-se o questionário Vila (2001) para deteção de crenças favoráveis (relativas à
matemática e à resolução de problemas). Desse grupo, selecionaram-se 3 alunos,
escolhidos por terem, cumulativamente, bons resultados em matemática e boas crenças
relativamente à matemática e à resolução de problemas.
Aplicaram-se 12 problemas (esta comunicação traz apenas a análise de um deles). Desta
forma, não serão aqui feitas referências a todos os instrumentos utilizados nessa
investigação mais ampla, mas apenas aos pertinentes para compreender a análise do
problema escolhido.
Antes de apresentar aos alunos o problema para resolver, aplicou-se um questionário
Pré-RP e, depois da conclusão da resolução, um questionário Pós-RP. Estes
questionários foram desenhados para obterem informação sobre a compreensão dos
alunos acerca dos problemas e das suas capacidades para os resolverem. Estes
questionários visam favorecer o autoquestionamento ou metacognição, na aceção da
Flavel (1976).
A análise foi feita através do instrumento adaptado de Efklides (2006) para classificar
conhecimento metacognitivo e experiências.
O problema envolvia, além da resolução da questão colocada, a reformulação do
mesmo. Foi pedido aos alunos que criassem outro problema passível de ser resolvido de
forma semelhante. Por outras palavras, pretendia-se um problema com a mesma
estrutura matemática.
Esta análise foi realizada à luz dos instrumentos de Cai e Hwang (2003) – codifica os
problemas em Não extensão, Extensão, Outra - e de Leung (1997) – estrutura do
problema.
O nível de consecução da resolução do problema foi analisado segundo vários
instrumentos, dos quais apenas importa de momento fazer referência a Herr e Johnson
(1994) (modificado) – referente a níveis de consecução das fases de RP, cujos
resultados serão apresentados.
O problema proposto, selecionado entre os itens libertos do PISA, 2003, ao qual foi
acrescentada a alínea c), relativa à sua reformulação, encontra-se no quadro 1.
Cruz
116 PROFMAT — 2015
Quadro 1: Problema para resolver e reformular/Adaptado de Itens Livres PISA 2003.
Análise de resultados
Os alunos portugueses registaram níveis de proficiência bastante baixos na resolução do
problema aquando da aplicação do referido ciclo do PISA. Pretendia-se verificar se os
alunos em estudo registariam melhores resultados e, nessa hipótese, compreender
porque o fizeram. Os resultados do PISA registam 36,6% de codificações máximas para
a questão a) e 4,6% de codificações máximas para a questão b) o que traduz um
resultado bastante baixo.
Os três alunos estudados, aqui designados por Clara, Rafael e Laura, registaram 10
pontos, 9 pontos e 10 pontos, respetivamente, no instrumento (modificado) Herr e
Johnson (1994) que codificava num máximo total de 10 pontos os descritores do
desempenho dos alunos na resolução de problemas. Este instrumento permite ainda
Problema
A figura mostra as pegadas de um homem a andar. O comprimento do passo, P, é a distância
entre a parte de trás de duas pegadas consecutivas.
Para os homens, a fórmula 140P
n estabelece uma relação aproximada entre n e P, em que
n = número de passos por minuto, e
P = comprimento do passo em metros.
a) Se esta fórmula se aplicar ao caminhar do Pedro e ele der 70 passos por minuto, qual é o
comprimento do passo do Pedro?
b) O Bernardo sabe que o comprimento do seu passo é de 0,80 metros. A fórmula aplica-se ao
caminhar do Bernardo. Calcule, em metros por minuto e em quilómetros por hora, a velocidade
a que o Bernardo caminha.
c) Depois de resolver, formule um problema que se resolva do mesmo modo.
Cruz
PROFMAT — 2015 117
verificar, segundo as fases: Compreensão, Escolha da Estratégia, Implementação da
Estratégia, Obtenção da Resposta, Explicação, a prestação dos alunos.
A análise do conteúdo dos questionários pré-RP e pós-RP permitiram verificar aspetos
positivos dos alunos relativamente ao conhecimento que possuem sobre si próprios,
sobre as tarefas, sobre as estratégias a usar, sobre o grau de dificuldade das tarefas
propostas1.
Pedia-se, na alínea c) do problema, a sua reformulação, mantendo a mesma estrutura
“que se resolva do mesmo modo”. Desta análise, referente ao problema em questão,
obtiveram-se os resultados apresentados no quadro 2.
Quadro 2: Classificação dos problemas reformulados pelos alunos.
Aluno Classificação do problema reformulado pelo aluno
Clara Problema de Matemática; Plausível; com dados Suficientes; com Extensão
(Extensão). PMPS-E
Rafael Problema de Matemática; Plausível; com dados Suficientes; com Outra
estrutura. PMPS-O
Laura Problema de Matemática; Plausível; com dados Suficientes; com a mesma
estrutura (Não Extensão). PMPS-NE
Desta análise claramente se observa que os alunos estudados tiveram uma prestação,
enquanto solucionadores de problemas, bastante superior aos seus colegas que
integraram o estudo PISA, conforme esperado. É coerente considerar que os aspetos
relevantes evidenciados por estes três alunos, bem como o contexto que envolveu a
experiência, podem ter sido propiciadores de tais prestações.
1 Esta análise não foi toda ela conseguida a partir do problema aqui apresentado. Lembre-se que se
analisaram 12 problemas de onde os dados aqui avançados são oriundos.
Cruz
118 PROFMAT — 2015
Conclusões
A comunicação baseada no presente artigo, devido à sua curta duração, não permite
apresentar os doze problemas nem tão pouco a análise respetiva. Os dados resultantes da
análise de um só problema não poderiam ser convertidos em conclusões, por escassa
evidência empírica. Assim, as conclusões apresentadas resultam da análise dos 12
problemas apresentados aos alunos. Não obstante, algumas das conclusões
correspondem a dados observados também na análise do problema aqui apresentado.
Verificou-se que os alunos estudados revelaram uma boa capacidade de mobilização de
recursos e de heurísticas e, sobretudo, fizeram-no com um nível de abstração
assinalável.
Estes alunos têm consciência das suas capacidades, conhecimentos e dificuldades e
ainda sobre as tarefas. Evidenciaram ter significativa compreensão da estrutura dos
problemas, uma vez que conseguiram reformular problemas mantendo a estrutura dos
problemas resolvidos na maioria das situações propostas.
Conclui-se sobre a importância do reforço dos aspetos metacognitivos. A aplicação de
questionários do tipo dos usados (Pré-RP e Pós-RP) reforçam o autoquestionamento,
favorecem a metacognição e as decisões sobre conteúdo e estratégias a mobilizar.
Conclui-se ainda sobre a importância de tarefas onde seja pedida a
reformulação/formulação de problemas. Esta atividade força os alunos a compreender a
estrutura matemática dos problemas e a desenvolverem pensamento mais abstrato e de
carácter mais genérico, transponível a situações similares.
O reforço dos aspetos metacognitivos e a proposta de reformulação/formulação de
problemas parecem, assim, ser dois aspetos a incluir com maior frequência nas aulas
com vista a fazer emergir nos alunos melhores capacidades de resolver problemas.
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Cruz
PROFMAT — 2015 119
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PROFMAT — 2015 120
O FORMAL DA MATEMÁTICA E O INTUITIVO DA TECNOLOGIA: QUE
ARTICULAÇÃO?1
Helena Rocha
Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Nova de Lisboa
Resumo
A tecnologia é cada vez mais indispensável no dia-a-dia, rodeando-nos constantemente.
Para os nossos alunos é uma realidade que conhecem desde sempre e que tendem a
encarar com uma naturalidade descontraída e intuitiva. A facilidade de acesso à
tecnologia e o modo como esta tende a enfatizar o intuitivo e a relegar para segundo
plano o formal e a demonstração matemática são o foco deste artigo. Partindo da análise
de uma proposta de trabalho onde alunos de 10.º ano começam por uma abordagem
intuitiva apoiada na calculadora gráfica e terminam a realizar uma demonstração da
conjectura que formularam, procuro discutir a problemática. As conclusões alcançadas
sugerem que é possível colocar aos alunos situações onde estes se podem aperceber da
vantagem de recorrer tanto a abordagens mais formais como a abordagens mais
intuitivas e isto mesmo quando a tecnologia é uma realidade em sala de aula. Sugere
ainda que a realização de demonstrações pode, entre outros aspectos já identificados na
literatura, dar um contributo importante para a compreensão de aspectos basilares da
Matemática.
Palavras chave: cálculo algébrico, demonstração, tecnologia
Introdução
A tecnologia é cada vez mais indispensável no dia-a-dia, rodeando-nos constantemente.
Para os nossos alunos é uma realidade que conhecem desde sempre e que tendem a
encarar com uma naturalidade descontraída e intuitiva. Movimentam-se livremente
entre conteúdos e aplicações, de dedo colado ao ecrã. Sem receios, experimentam e
testam limites, arriscando avançar por novos mundos. Se o professor lhes proporciona
um meio propício, aventuram-se na exploração do universo matemático,
experimentando, formulando conjecturas e construindo ideias matemáticas. Um
1 Trabalho desenvolvido no âmbito do projecto A noção da demonstração matemática (PTDC/MHC-
FIL/5363/2012) financiado pela FCT/MEC.
Rocha Rocha
PROFMAT — 2015 121
ambiente de aprendizagem ao seu dispor, onde programas de geometria dinâmica
facilmente permitem descobrir relações geométricas e experimentar muitos casos,
deixando-os convictos de mais uma relação matemática; ou onde as calculadoras
gráficas lhes permitem observar com toda a rapidez e conforto o gráfico de imensas
funções e inferir uma qualquer propriedade que estas partilham. Este é um cenário onde
a aprendizagem apela à compreensão das relações envolvidas, mas onde o intuitivo é
um elemento preponderante. E a questão acaba por surgir inevitavelmente. Como
conseguir depois enquadrar nesta abordagem o formalismo da Matemática e a
importância da demonstração? Como conseguir que os nossos alunos sintam que o
cálculo matemático, podendo não ser tão intuitivo e rápido como a tecnologia que eles
bem conhecem, também tem uma importância incontornável?
Neste artigo vou procurar abordar estas questões partindo de uma situação concreta que
envolve em simultâneo as duas abordagens. Trata-se de uma situação que ocorreu com
uma turma do 10.º ano de escolaridade no âmbito do estudo de funções. A tecnologia
envolvida, e que os alunos já estavam habituados a usar livremente, era a calculadora
gráfica.
A professora e a tarefa
Entre as várias tarefas que propôs aos seus alunos ao longo do estudo das funções,
Teresa, a professora da turma, escolheu esta (ver anexo), centrada numa investigação
em torno do eixo da parábola. Trata-se de uma proposta de trabalho onde pretende que
os alunos comecem por explorar uma situação matemática para formular uma
conjectura relativamente à relação existente. Depois é pedido aos alunos que
demonstrem a veracidade da sua conjectura. A tarefa termina com uns desafios que
pretendem levar o trabalho dos alunos um pouco mais além.
Nesta secção apresento sucintamente a forma como decorreu a realização desta tarefa e
os elementos centrais que conduziram às opções assumidas pela professora. Para tal,
baseio-me nos dados provenientes da gravação da aula e das notas de campo que
elaborei, mas também nas duas entrevistas que realizei à professora e que decorreram
antes e depois da aula.
Rocha
122 PROFMAT — 2015
Teresa começa a aula apresentando a tarefa aos alunos e dando algumas indicações
relativamente à forma como esta vai ser realizada. Informa, nomeadamente, que esta vai
ser realizada a pares, destacando bastante este aspecto do trabalho, valorizando a
importância dos contributos que cada aluno pode trazer ao trabalho conjunto.
Acrescenta que no final da aula recolherá os registos efectuados por um elemento de
cada par, que levará para ver em casa.
Após este momento inicial, dá atenção ao funcionamento da calculadora, dando
algumas indicações sobre o seu funcionamento, que considera que os alunos vão
necessitar no decorrer da tarefa. Conclui este momento inicial referindo as expectativas
que tem para a aula e fazendo alguns comentários mais concretos relativamente a cada
uma das questões da tarefa. Refere assim as questões que considera fáceis, as que
entende poderem ser consideradas mais difíceis e o ponto até onde pretende que todos
façam:
Prof- O objectivo de cada par é fazer tudo até ao ponto 6. Até ao ponto 5
eu acho que é fácil. Devem fazer bem, o mais depressa que conseguirem.
O 6 já não será tão fácil, (…) nesta ficha no ponto 6 pretende-se que se
prove. Eu penso que a prova não é muito difícil e portanto tenho alguma
esperança que muitos consigam fazer a demonstração. O “indo mais
longe”, que vem nos pontos 7 e 8, também tenho esperança que dois ou
três pares ainda consigam fazer. O ponto 7 e o 8 se algum conseguir é
óptimo porque eu não tenho esperança que façam, que tenham tempo
aqui na aula, mas tenho esperança que depois façam em casa. Portanto, o
objectivo é todos fazerem até ao 6, incluindo a demonstração, alguns
fazerem o 7 e quem sabe… (aula)
Termina este primeiro momento de abordagem à tarefa em grande grupo, focando a
demonstração e a respectiva importância em Matemática:
Prof- O 6 (…) é uma demonstração e eu gostava de falar um bocadinho
sobre isto. (…) Em Matemática nós muitas vezes experimentamos. Já
fizemos isso aqui com as funções. Estudámos famílias de funções e
depois, das duas uma, ou o professor dá alguma informação a dizer isso é
mesmo verdade em todos os casos e vocês acreditam, também consultam
o livro etc., e às vezes provamos. Fazemos aquilo que os matemáticos
fazem sempre. Em Matemática a prova, a demonstração, é a essência da
disciplina, portanto não podemos esquecê-la. (aula)
A partir deste momento, toda a aula decorre centrada no trabalho dos alunos, com a
professora a circular entre os grupos e a corresponder às suas solicitações.
Quando os alunos começam a formular as primeiras conjecturas, a professora apercebe-
se do reduzido número de exemplos que estes estão a ter em conta para as formular e
Rocha Rocha
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sente necessidade de lhes chamar a atenção para isso. No entanto, os alunos não
parecem muito sensíveis aos comentários que faz e só a dúvida que Teresa coloca sobre
a veracidade da conjectura que formularam parece ser suficiente para que estes decidam
analisar mais alguns casos:
Prof- Estão a formular uma conjectura apenas com base em dois
exemplos?
Aluno- Oh stora, mas nós já vimos.
Prof- E então o que é que repararam?
Aluno- Que corresponde à multiplicação, só que tem que ser menos este
vezes este. (…) Tem que ser menos, depois abre parênteses, -5 vezes 3.
Prof- Ok, óptimo. É a vossa conjectura.
Aluno- (…) Mas assim dá -15. Está mal. Por isso é que eles dizem a
seguir se os pontos estiverem do mesmo lado do eixo. Não é stora?
Prof- Não sei. (…) Só experimentaram com dois exemplos, estão a tirar
as conclusões apenas com dois… podem fazer mais, se estão com
dúvidas. Depois confirmam se isso que estão a fazer está certo ou não.
Aluno- É quantos pares, stora?
Prof- Numa investigação não há limite. Fazem alguns, quando
conseguirem tirar a conclusão… dois é bem pouco para fazer. Acho eu,
não é? (aula)
Contudo este não é um comportamento generalizado na turma. Alguns pares de alunos
parecem assumir que, pelo contrário, quantos mais exemplos analisarem melhor. Ainda
assim, parecem sentir algum desconforto por não lhes ser indicada uma quantidade, pelo
que procuram alguma orientação junto da professora:
Aluna- Eram quantos [exemplos] stora?
Prof- É os que quiserem.
Aluna- Os que quisermos. Quantos mais melhor… (aula)
Mas em alguns casos, independentemente do número de exemplos considerado, a
conjectura parece ser formulada de uma forma algo irreflectida, levando Teresa a
questionar os alunos de modo a que estes sintam a necessidade de ponderar melhor a
conclusão a que chegaram:
Aluno- Já concluí uma coisa. A ordenada na origem é sempre o x1x2 e
depois o declive do segmento é a diferença entre um e outro.
Prof- x1x2? Então quando é que é 3(-5)?
Aluno- Não.
Prof- Diz lá, quanto é que é?
Rocha
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Aluno- -15.
Prof- Dá -15 e ali está?
Aluno- 15.
Prof- 3(-4)?
Aluno- Dá -12. Então… pronto, é o inverso.
Prof- O inverso?
Aluno- Sim.
Prof- É o inverso?
Aluno- Sim. É o módulo?... Pode ser menos. A ordenada na origem é
menos ou…
Prof- Então vamos lá… mas escrevam as conclusões. (aula)
Tal como previsto por Teresa, o trabalho nesta aula terminou com a demonstração, pois
nenhum par de alunos conseguiu ir para além desta etapa no tempo disponível. Esta foi
uma fase do trabalho em que surgiram dificuldades, algo que aliás a professora já
antecipava, e onde optou por ir apoiando individualmente os pares de alunos à medida
que os problemas surgiam:
Prof- A prova, mesmo no caso mais simples, ainda não é simples para
estes miúdos do 10.º ano. Tenho que ir dando umas dicas no lugar e tal e
há-de haver uns que fazem e há-de haver outros que demoram muito
tempo. (pré-aula)
Associada à concretização da demonstração surgiram, contudo, outras questões. A
primeira delas incidiu sobre o significado atribuído pelos alunos ao termo conjectura,
com vários alunos a questionarem o seu significado, mesmo depois de já terem
elaborado a sua conjectura:
Aluna 1- Oh stora o que é fazer a conjectura?
Prof- A conjectura é exactamente isso. É o que eu penso que será
verdade. Depois a seguir tenho que provar. Penso que é verdade. Com a
Geometria fizemos isso. Com isto que temos é verdade (refere-se aos
exemplos considerados pelas alunas) e isso permite-me conjecturar,
permite-me pensar que será sempre assim. Só quando demonstrar é que
tenho a certeza se é mesmo sempre assim ou não.
(…)
Prof- O que é a conjectura? O que é que vocês querem conjecturar?
Aluna 2- Oh stora pois, o que é que é suposto dizermos com conjectura?
(aula)
Mas entender o significado do termo demonstração revelou-se ainda mais complexo.
Com efeito, vários alunos mantiveram-se focados nos exemplos concretos que
Rocha Rocha
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analisaram, parecendo bastante convictos relativamente à forma como estes lhes
permitiam garantir a veracidade do que afirmavam:
Aluna- E aqui no 6, se nós já mostrámos aqui os cálculos (aponta os
exemplos registados mais acima)… Posso dizer que isto prova a validade
da nossa conjectura.
Prof- Prova?
Aluna- Não? (aula 2)
Aquilo que muitos alunos fizeram foi executar analiticamente os cálculos para o declive
e a ordenada na origem dos casos que tinham considerado graficamente, parecendo
pensar que fazendo esses cálculos analiticamente, em vez de utilizar os valores dados
pela calculadora, lhes permitia alcançar um outro nível de segurança, que lhes garantia a
veracidade da sua conjectura e consequentemente corresponderia a uma demonstração:
Aluna- Não estamos a perceber a 6.
Prof- A 6 é a demonstração.
Aluna- Fazemos as contas? Metemos assim as contas.
Prof- Claro. Mas puseram para estes três casos. Agora uma demonstração
(interrompem)
Aluna- Ah! Temos que fazer mais!
Prof- Uma demonstração, é assim, só está demonstrado se eu tiver
demonstrado para quantos casos?
Aluna- Para muitos.
Prof- Quantos? Quantos?
Aluna- Infinitos.
Prof- Infinitos. (interrompe para ralhar com a turma e depois dá uma
ajuda às alunas indicando a forma genérica dos pontos)
Aluna- É complicado, stora.
Prof- É complicado… mas a gente não desiste do complicado assim à
primeira vista. (…) A demonstração tem que ser analítica que aí na
calculadora não podem… Podem experimentar muitos, mas não podem
experimentar infinitos. (aula)
Teresa entende no entanto que esta é uma abordagem que de algum modo seria de
esperar dos alunos, uma vez que vem na sequência do que têm vindo a fazer nas aulas.
Como ela própria explica na conversa que tivemos depois da aula:
Prof- Eu vi não sei quantos, agora vou ver as fichas, mas pronto, houve
alguns que na demonstração o que é que eles fizeram? Foram fazer
analiticamente, tratar analiticamente os exemplos. (…) Eh pá, e isto
corresponde no fundo àquilo que nós temos feito noutras situações. Não
Rocha
126 PROFMAT — 2015
lhe chamamos demonstração, evidentemente, mas corresponde a um
trabalho que eles têm feito. Eu tenho tido a preocupação de trabalharmos
na calculadora e trabalharmos analiticamente e portanto eu acho que eles
fizeram uma transposição dessas situações que temos feito, aqui para
isto. (pós-aula)
Depois de tentar levar os alunos a perceberem que para que fique provado é necessário
que todos os casos sejam considerados e não apenas alguns, Teresa opta por ir ajudando
os alunos a considerar pontos genéricos que lhes permitam efectivamente demonstrar o
pretendido:
Prof- Portanto no 6 o que eu estou a perguntar é assim: para estes pontos
isto é verdade, então agora seguindo este raciocínio, se o ponto não for
este… Tu tens dois pontos, então e se for um ponto 1, por exemplo, de
coordenadas (x1, y1) e um ponto 2 de coordenadas (x2, y2). Agora este
y1 e este y2 não são quaisquer. Porquê? Estes pontos também pertencem
à parábola. E portanto qual é, quanto é que vale o y1? Quanto é que vale
o y2? (ajuda o aluno a chegar à resposta) Então este ponto é (x1, x12) e
este (x2, x22). (…) Será que agora consegues demonstrar? Ora
demonstrar, tu tens que ir usar o que tu sabes. Tu sabes calcular o declive
de uma recta a partir dos pontos, certo? Então vamos tentar fazer.
Aluno- Mas aqui, nós aqui em cima já tínhamos mostrado isso.
Prof- Mostraram, mas isso é só para essa. Se tu mostrares para este caso,
se fizeres exactamente o mesmo raciocínio, só que os cálculos são um
bocadinho mais complexos, tens que fazer com calma, o mesmo
raciocínio mas para um ponto que é qualquer, não mostraste para um,
mostraste para quantos pontos?
Aluno- Para infinitos. (…)
Prof- Então se tu conseguires fazer exactamente o mesmo raciocínio mas
para este caso… (aula)
A noção de que para se demonstrar é necessário considerar todos os casos possíveis e
não apenas alguns é algo que entende necessitar de ir sendo trabalhado ao longo do
tempo e a que deseja dar uma atenção cuidada na aula em que pretende proporcionar
aos alunos um momento de discussão e reflexão em torno do trabalho realizado nesta
tarefa:
Prof- Eu já esperava que eles tivessem dificuldades na demonstração.
(…) Pronto, a ideia é exactamente ir fazendo esta discussão com eles…
que depois eu, como lhes dei até 4ª feira, portanto provavelmente vai ser
na aula de 4ª feira, devolvo as fichas e ao devolver depois fazemos um
bocadinho a discussão outra vez da diferença entre experimentar num,
dois, três casos. (…) E vou discutir com eles principalmente esta questão:
o que é que significa demonstrar. O facto de terem que incluir os
exemplos que já fizeram, mas terem que provar para todos os casos e,
neste caso, eram infinitos. (pós-aula)
Rocha Rocha
PROFMAT — 2015 127
Neste sentido, expressa mesmo a sua intenção de não encerrar a questão já. Discutindo
com os alunos a demonstração no caso mais simples e deixando os desafios em aberto,
para serem apresentados mais tarde à turma por algum dos alunos que entretanto o
consiga resolver e numa altura em que o cálculo necessário à demonstração esteja a ser
alvo de atenção nas aulas:
Prof- Vou fazer a demonstração neste caso, só para o f(x)=x2, e depois
estas do “indo mais longe” ainda vou continuar a deixá-las como
desafios. Quando eles conseguirem podem-me entregar. (…) Isto exige
algum cálculo que eles ainda nunca trabalharam porque no básico não se
trabalha o cálculo até este nível. À medida que formos agora estudando
os polinómios… É também para os sensibilizar que o cálculo é preciso,
em vez de ser só depois nos polinómios o cálculo pelo cálculo. Portanto,
mais à frente, daqui a uns tempos, depois de alguns fazerem, até vou
pedir a um para fazer a apresentação à turma, logo se vê, quando
estivermos a trabalhar o cálculo nos polinómios. (pós-aula)
A articulação entre o gráfico e o analítico é outro aspecto a que Teresa afirma dar
atenção e que aborda nos desafios que deixa aos alunos no final desta tarefa e que
pretende explorar noutra aula. Com efeito, estas últimas questões vêm precisamente
colocar o foco sobre a opção entre a abordagem gráfica e a abordagem analítica. A
professora considera que os alunos têm geralmente uma preferência pelo gráfico em
detrimento do analítico, achando que este último é apenas cálculo sem grande utilidade.
Neste caso, contudo, o analítico vem oferecer a abordagem mais simples e rápida à
questão, embora não necessariamente fácil. Algo que Teresa considera muito importante
abordar com os alunos e que entende que os desafios finais desta tarefa vêem mostrar
aos alunos de uma forma muito evidente:
Inv- No “ir mais longe” a parábola passa a ser outra. Achas que é fácil
experimentando com a calculadora descobrir a relação?
Prof- Não, acho que não.
Inv- É que eu não consegui. Eu encontrei-a, mas encontrei-a
analiticamente. Também é verdade que me fartei e que resolvi que fazia
analiticamente.
Prof- Exactamente. Mas a intenção também é um bocadinho essa. É para
perceberem que há coisas em que não é preciso irem ao cálculo, mas há
outras em que o cálculo tem alguma utilidade. E este cálculo ainda é
difícil para eles, não é? Mas eu prefiro ir trabalhando assim o cálculo,
que é para eles perceberem que tem alguma vantagem fazer algum
cálculo… (pré-aula)
Rocha
128 PROFMAT — 2015
Discussão dos resultados no âmbito da literatura existente
Para Mejía-Ramos (2005), a procura por uma mais profunda compreensão é o que
verdadeiramente move os matemáticos e também o que os leva a rejeitar as “alegadas”
demonstrações realizadas por via computacional. Por seu turno Boavida (2001) refere-
se ao papel da demonstração como um meio e não um fim, englobando
simultaneamente a validação e a compreensão. Mas existem outros papéis que também
são atribuídos à demonstração. A autora refere-se ainda à demonstração como um
processo de descoberta. Segundo esta, existem numerosos exemplos, na história da
Matemática, de novos resultados que foram descobertos ou inventados por processos
puramente dedutivos; de facto, é completamente improvável que alguns resultados
(como, por exemplo, as geometrias não euclidianas) pudessem alguma vez ter sido
encontrados por mera intuição. Aborda também o papel da demonstração como
processo de sistematização, considerando que esta revela as subjacentes relações lógicas
entre afirmações de um modo que a intuição pura não seriam capazes de realizar. Por
seu turno Davis e Hersh (1983) encaram a demonstração como um desafio intelectual,
considerando que esta cumpre uma função gratificante e de realização própria. A
demonstração é portanto um campo de teste para a energia intelectual e engenho
matemático.
DeVilliers (2012) considera que, tradicionalmente, a justificação ou o convencimento
sobre a validade de uma conjectura são encaradas como a principal função da
demonstração, sendo que Knuth (2002) considera que este é mesmo o único papel que a
maioria dos professores lhe reconhece. Nas últimas décadas esta visão estreita do papel
da demonstração tem vindo a ser criticado por autores como Reid (2011), que entende
que esta tem assumido igualmente outros papéis importantes para os matemáticos e que
pode também assumir um papel de grande valor didáctico em sala de aula.
A perspectiva assumida pela professora cuja prática profissional se esboça neste artigo
parece ser, contudo, um pouco diferente daquelas que dominam a literatura. Estando
naturalmente presente um papel de validação da conjectura previamente formulada, a
demonstração parece ser encarada por esta professora pelo papel que esta assume ao
nível da compreensão da natureza da Matemática.
Rocha Rocha
PROFMAT — 2015 129
A dificuldade em conseguir que os alunos compreendam a necessidade e a importância
da demonstração em Matemática é, segundo deVilliers (1999), bem conhecida de todos
os professores do ensino secundário. Esta dificuldade acentua-se quando a tecnologia
está envolvida pois, segundo Hsieh et al. (2012), o carácter dinâmico usualmente
oferecido por esta permite a realização de trabalho de natureza experimental, que
potencia a descoberta de propriedades e a formulação de conjecturas. Os alunos passam
a poder com toda a facilidade experimentar e analisar vários casos, reflectindo em torno
de importantes ideias matemáticas e, consequentemente, alcançando um maior nível de
compreensão (Goos & Bennison, 2008). Adquirem assim a possibilidade de formular as
suas próprias perguntas e de prosseguir formulando hipóteses e testando-as, procurando
enquadrar os resultados na teoria que estão a tentar formular (Grant & Searl, 1996).
A forma como a análise de diversos casos se torna possível, acaba por originar nos
alunos um sentimento de confiança relativamente à veracidade das conclusões que
estabelecem com o apoio da tecnologia, que frequentemente é potenciada pela forma
como os alunos se habituaram a ver a Matemática validada de forma externa, seja pelo
professor, pelo manual ou até pelos pais (Tall et al., 2012). A necessidade de demonstrar
a conjectura formulada pode assim não ser sentida. Mas se inferir uma conclusão a
partir da reflexão em torno de alguns casos particulares é uma actividade importante,
esta é sem dúvida distinta da demonstração (Cabassut et al., 2012). Enfatizar junto dos
alunos a necessidade e a importância da demonstração é assim algo importante.
A tecnologia e, concretamente, a calculadora gráfica são amplamente utilizadas pela
professora participante neste estudo. Os alunos são confrontados com tarefas em que
lhes é pedido que explorem relações e formulem conjecturas e, por vezes, são também
confrontados com momentos em que lhes é pedida uma demonstração.
A preocupação relativamente ao uso da tecnologia e à convicção da professora de que
os alunos acabam por ter uma preferência pelas abordagens gráficas em detrimento das
analíticas, conduz também a uma cuidada selecção de tarefas. É assim possível
identificar uma reflexão por parte da professora que deliberadamente opta por colocar
aos alunos um desafio onde a abordagem gráfica acaba por não ser a mais eficiente.
Consegue assim confrontar os alunos com situações onde o cálculo e um trabalho
matemático mais formal surgem não só como úteis, mas também como a abordagem
mais eficiente.
Rocha
130 PROFMAT — 2015
Conclusão
Este estudo sugere que é possível colocar aos alunos situações onde estes se possam
aperceber da vantagem de recorrer tanto a abordagens mais formais como a abordagens
mais intuitivas e isto mesmo quando a tecnologia é uma realidade em sala de aula.
Sugere ainda que a realização de demonstrações pode, entre outros aspectos já
identificados na literatura, dar um contributo importante para a compreensão de
aspectos basilares da Matemática.
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PROFMAT — 2015 131
REALIZAÇÃO E REVISÃO DE MINITESTES PARA APROFUNDAR A
APRENDIZAGEM DE ÁLGEBRA LINEAR NO ENSINO SUPERIOR
Paula Maria Barros, José António Fernandes, Cláudia Mendes Araújo
ESTiG – Instituto Politécnico de Bragança,
CIEd – Universidade do Minho, Centro de Matemática – Universidade do Minho
[email protected], [email protected], [email protected]
Resumo
A álgebra linear constitui uma fonte de dificuldades para muitos alunos do ensino
superior, como corroboram estudos realizados a nível nacional e internacional. Face a
esta realidade, é importante que se investiguem e implementem metodologias de ensino
que conduzam a alterações significativas na aprendizagem dos alunos. Enquanto
resposta a esta preocupação realizou-se uma experiência de ensino com uma turma de
alunos de engenharia do ensino superior politécnico que frequentavam a unidade
curricular Álgebra Linear e Geometria Analítica, com o intuito de averiguar o impacto
de um ensino centrado na exploração dos erros e dificuldades sobre a aprendizagem dos
alunos em álgebra linear. No âmbito da experiência de ensino, perspetivando a
avaliação como uma componente não dissociada do processo educativo, implementou-
se uma metodologia de avaliação, que contribuísse igualmente para a superação de erros
e dificuldades. Esta metodologia de avaliação assumiu a forma de realização (numa
primeira fase) e revisão (numa segunda fase) de minitestes. Na segunda fase, o aluno,
para além de ser confrontado com as respostas antes dadas, também tinha acesso aos
comentários efetuados pela professora, de modo a proporcionar-lhe uma nova
oportunidade para voltar a refletir sobre a correção e adequação dos processos usados
para responder às questões colocadas, criando-se, assim, um novo momento de
aprendizagem.
Nesta comunicação pretende-se descrever a experiência de avaliação realizada e retratar
as opiniões dos alunos sobre o processo.
Palavras-chave: Ensino superior, avaliação, dificuldades, álgebra linear.
Introdução
A álgebra linear está subjacente a quase todos os domínios da matemática e até mesmo
de outras áreas, como as ciências da computação, a engenharia e a física. No entanto,
apesar desta relevância, “o ensino da álgebra a um nível universitário é quase
universalmente considerado como uma experiência frustrante para professores e
estudantes” (Hillel, 2000, p.1 1), sendo uma fonte de dificuldades para muitos alunos
do ensino superior como corroboram investigações a nível nacional (Barros, Fernandes
e Araújo, 2012; Barros, Araújo e Fernandes, 2013) e internacional (Celestino, 2000;
Coimbra, 2008; Dorier, 2000). Face a este cenário, é natural que os professores
Barros, Fernandes & Araújo
132 PROFMAT — 2015
envolvidos no ensino da álgebra linear sintam a preocupação de perceber as razões do
fracasso de muitos estudantes e de como melhorar o seu desempenho, pois, como
referem Ramos et al. (2013), “para além do professor do ensino superior dever
continuar a preocupar-se com o domínio científico dos conteúdos a trabalhar com os
seus estudantes, também deve passar a dar atenção ao que se passa ao nível do ambiente
de aprendizagem relativo às unidades curriculares que ministra” (p. 117).
Neste contexto, inserido num estudo mais alargado, realizou-se uma experiência de
ensino com alunos do ensino superior em que um dos objetivos era averiguar qual o
impacto de um ensino centrado na exploração dos erros e dificuldades na aprendizagem
dos estudantes em álgebra linear. Como “a avaliação não constitui uma componente
isolada e dissociada de todo o processo educativo, mas acima de tudo ela é uma parte
inseparável de um complexo sistema onde o fim último do ato educativo é a
aprendizagem” (Santos, 2008, p. 12), procurou-se que alguns dos métodos de avaliação
implementados visassem a superação de erros e dificuldades, assumindo assim uma
vertente formativa. Para tal, considerou-se a resolução de minitestes pelos alunos em
duas fases: na primeira fase os alunos resolviam os minitestes e na segunda fase reviam
os minitestes a partir do confronto com as respostas antes dadas e dos comentários
efetuados pela professora. Pretendia-se, assim, nesta segunda fase, proporcionar aos
alunos uma oportunidade para refletir sobre a correção e adequação dos processos
usados para responder às questões colocadas, criando-se deste modo um novo momento
de aprendizagem. Desta forma, de acordo com Abrantes e Leal (2005), encaravam-se as
tarefas de avaliação como fonte de aprendizagem.
Os participantes na experiência e o contexto do estudo
A experiência de ensino foi realizada numa turma de 28 alunos, do curso de Engenharia
Química e Biológica do ensino superior politécnico, que frequentavam a unidade
curricular Álgebra Linear e Geometria Analítica. As aulas desta unidade curricular são
lecionadas no 1º ano, 1º semestre, em dois tempos semanais, cada um com a duração de
duas horas, e compreendem os temas: Números complexos; Matrizes e determinantes;
Sistemas de equações lineares; Geometria analítica; Espaços vetoriais, Aplicações
lineares e Valores e vetores próprios. Porém, destes temas, na experiência de ensino
Barros, Fernandes & Araújo
PROFMAT — 2015 133
realizada apenas foram objeto de estudo os temas Matrizes e determinantes e Sistemas
de equações lineares.
Os 28 alunos eram maioritariamente do sexo feminino (78,6%) e tinham idades
compreendidas entre os 18 e os 25 anos, 27 eram estudantes ordinários e apenas um
trabalhador-estudante. Todos tinham entrado no ensino superior através de concursos
especiais, sendo titulares de um diploma de especialização tecnológica (CET de nível
5). Mais de metade da turma (64,3%) não estava a frequentar a unidade curricular pela
primeira vez, tendo os restantes alunos (35,7%) ingressado no ensino superior no ano
letivo em que se realizou a experiência de ensino.
Para fazer a avaliação da experiência de ensino, do ponto de vista dos estudantes,
recorreu-se a um questionário, que avaliava também outros aspetos da experiência para
além dos referidos neste texto, e realizaram-se entrevistas a cada um dos alunos
(designados no texto por Ai, com 1i 28) para aprofundar e esclarecer algumas das
opiniões dadas. O questionário foi aplicado na última aula do 1º semestre e as
entrevistas foram realizadas no 2º semestre, em horário previamente acordado com os
alunos, após estes já conhecerem a classificação final que tinham obtido à unidade
curricular.
O processo de revisão dos minitestes
Os dois minitestes foram realizados no fim de cada um dos temas, em data previamente
combinada com os alunos. As perguntas eram de resposta fechada e os alunos podiam
usar como apoio o software Microsoft Mathematics, assim como um formulário,
previamente fornecido.
A revisão dos minitestes foi igualmente realizada em ambiente de sala de aula, numa
aula extra, também em horário previamente acordado com os alunos. Antes da revisão
dos minitestes os alunos tiveram acesso ao enunciado e no próprio dia da revisão foi-
lhes fornecida a resolução que tinham feito antes, com notas da professora que
indicavam se a questão estava correta ou não. Caso houvesse erros na resposta,
assinalou-se o passo onde havia incorreções e convidava-se o aluno a identificar o erro e
a procurar corrigi-lo. Disponibilizada esta informação, pretendia-se também que os
alunos respondessem a essas notas da professora.
Barros, Fernandes & Araújo
134 PROFMAT — 2015
Exemplificando, numa questão em que se pretendia que os alunos indicassem,
justificando, se a afirmação “Se A for uma matriz singular, o sistema de equações
lineares bAx é possível e indeterminado” era verdadeira ou falsa, o aluno A13 na
primeira fase (realização do miniteste) respondeu que a afirmação era verdadeira,
indicando um exemplo que a verificava (Figura 1).
Figura 1: Resposta do aluno A13 na primeira fase.
Verifica-se que o aluno A13 não teve presente que poderia haver exemplos de sistemas
para os quais a afirmação não fosse válida. Assim, face à resposta, a professora colocou
as seguintes questões: “Será o exemplo mais adequado para justificar? Um exemplo
prova que a afirmação é verdadeira? O que é que acontece em outras situações?”.
Na segunda fase, o aluno A13 tenta justificar porque é que a sua resposta não é
adequada e reformula-a apresentando como exemplo um sistema que não verifica a
afirmação, concluindo assim que ela é falsa (Figura 2).
Figura 2: Resposta do aluno A13 na segunda fase.
Barros, Fernandes & Araújo
PROFMAT — 2015 135
Numa outra questão, em que dadas as matrizes A e B se pretendia resolver a equação
BXAA 1 , sabendo que X é uma matriz de ordem adequada, na primeira fase, o
aluno A14 responde sem ter em atenção a não comutatividade da operação de
multiplicação de matrizes (Figura 3).
Figura 3: Resposta do aluno A14 na primeira fase.
Aquando da revisão, face às questões colocadas pela professora: “Porque é que este
raciocínio não é válido? O que é que está incorreto?”, o aluno A14 foca-se na não
comutatividade da multiplicação de matrizes e resolve novamente a equação, agora de
forma correta.
Figura 4: Resposta do aluno A14 na segunda fase.
A classificação final de cada miniteste resultou da soma das classificações obtidas nas
duas fases do processo. Aquando da revisão, os alunos tiveram acesso à classificação
obtida na primeira fase (realização do miniteste), atribuída tendo em conta os critérios
Barros, Fernandes & Araújo
136 PROFMAT — 2015
definidos. A avaliação quantitativa da segunda parte do processo (revisão dos
minitestes) seguia as seguintes regras: nas questões em que cometeram erros os alunos
podiam obter até metade da pontuação perdida se corrigissem os erros e respondessem
às notas registadas pela professora, quando tal se justificasse; por cada questão que os
alunos não tinham respondido poderiam recuperar um quarto da pontuação da pergunta
se a resolvessem corretamente. Neste último caso pretendia-se motivar os alunos que
não tinham tido um desempenho favorável a resolver igualmente as questões. Na
revisão os alunos podiam consultar todo o material que quisessem, assim como trocar
impressões com os colegas.
Opinião dos alunos sobre o processo de revisão
Tendo em atenção a opinião dos estudantes sobre a revisão dos minitestes (Tabela 1),
constata-se que este processo trouxe vantagens para a sua aprendizagem. Em geral,
quase todos os alunos concordam ou concordam totalmente com as seis afirmações
consideradas para a avaliação do processo de revisão dos minitestes.
Tabela 1 Opinião dos estudantes sobre a revisão dos minitestes
% de estudantes
DT D C CT NR
O confronto com os meus próprios erros contribuiu para
que tomasse consciência das minhas dificuldades. 3,6 64,3 28,5 3,6
Saber que podia recuperar uma parte da pontuação perdida
foi um incentivo para que estudasse um pouco mais. 50,0 46,4 3,6
Explicar qual a causa dos meus erros contribuiu para que
tomasse consciência de quais os procedimentos/
propriedades que não são válidos. 10,7 60,7 25,0 3,6
Este processo tornou-me mais autónomo na resolução das
tarefas. 7,1 75,0 14,3 3,6
Este processo estimulou-me a refletir sobre o meu
raciocínio. 3,6 75,0 17,8 3,6
As questões/sugestões da professora ajudaram-me a refletir
sobre o trabalho realizado. 3,6 67,8 25,0 3,6
DT Discordo totalmente; D Discordo; C Concordo; CT Concordo totalmente; NR Não
responde.
Tendo em conta a percentagem de alunos que concordam ou concordam totalmente com
as afirmações, contata-se que para todos eles (96,4%) recuperar uma parte da pontuação
perdida foi um incentivo para que estudassem um pouco mais. Seguidamente
Barros, Fernandes & Araújo
PROFMAT — 2015 137
reconheceram o contributo do confronto com os erros para a tomada de consciência das
dificuldades (92,8%), que o processo de revisão os estimulou a refletirem sobre o
raciocínio (92,8%) e que as questões/sugestões da professora os ajudaram a refletir
sobre o trabalho realizado (92,8%). Por último, numa percentagem um pouco inferior,
constata-se que o processo de revisão os tornou mais autónomos na resolução das
tarefas (89,3%) e que explicar a causa dos erros contribuiu para a tomada de consciência
dos procedimentos/propriedades não válidos (85,7%).
Nas entrevistas os alunos dão igualmente ênfase às vantagens da revisão dos minitestes,
focando a recuperação da pontuação, a motivação para o estudo e a apropriação dos
procedimentos corretos de resolução: “O que é bom é que uma pessoa chega lá, tem
errado aqui e vai corrigir, não é. E se calhar, ao resolver novamente, já tem outra noção
e já não faz o mesmo erro se aparecer outro igual” (A27); Uma pessoa fazia o exame e
se calhar nem corria assim tão bem. Mas ia para casa, fazia os exercícios ou depois
acabava por os resolver lá na aula. Fazia um esforço para resolver bem, para ter mais
aqueles pontinhos extra. É uma motivação” (A12); “Eu gostava mesmo quando a
professora entregava os minitestes, ‘Vamos resolver’. Eu aí expunha mais as minhas
dúvidas, percebia onde errava e tinha mais disposição para voltar atrás para estudar e
para fazer, puxa mais por mim na resolução das reformulações” (A2); “Vantajoso é.
Para além de nos poder melhorar a nota, também vemos onde é que erramos e pronto
arranjamos outro método, outra forma de resolução” (A1).
Tendo em atenção os dois minitestes que se reportam aos temas em análise, nas
entrevistas apenas 10 alunos afirmaram tê-los resolvido em casa antes da respetiva
revisão, alguns deles em conjunto com outros colegas da turma. Desta forma, 11 alunos
não os resolveram e 6 resolveram apenas o segundo.
Quando questionados sobre a razão do seu procedimento, os que resolveram
argumentam: “Costumávamos [em conjunto com mais dois colegas] resolver um dia
antes de fazer a reformulação. Nós gostávamos porque era sempre a questão de ir buscar
mais uns pontos e tornávamos a ver as coisas. De certa forma ficava mais consolidado
do que aquilo que teria ficado nos minitestes” (A6); “Resolvi. Quando chegava lá à
correção sempre tinha a noção de como é que tinha de resolver a seguir” (A27); “Uma
pessoa levava a resolução na folha de rascunho. Chegava a casa, até era capaz de
resolver e pensava: ‘Porque é que eu errei isto aqui? Era tão fácil e errei.’ E dava para
ver o que uma pessoa tinha errado. Podia melhorar” (A ).
Barros, Fernandes & Araújo
138 PROFMAT — 2015
A maior parte dos alunos que não resolveu em casa manifesta alguma autoconfiança na
correção das suas respostas aquando da realização do miniteste: “Para ser sincero eu nos
primeiros até pensava que teria melhor nota do que realmente tive. E depois
aconteceu… ‘Olha se eu soubesse tinha revisto. Tinha feito em casa.’ Só que em casa o
erro possivelmente seria o mesmo” (A1 ); “Se tivesse resolvido em casa chegava à
reformulação e conseguia subir a minha nota. Neste caso isso não aconteceu. Mas
muitas vezes ia para lá com a ideia de que aquilo ia estar certo. Eu pensava que ia ter
boa nota. E lá está, também me permitiu ver o meu erro” (A26); “Pensei que ia chegar
lá e do género: ‘Já sei onde é que errei, vou resolver’, mas depois acabava por me
deparar ainda com mais erros. E acho que fiz mal em não ter pegado e não ter resolvido.
Até que tinha a vantagem de ter os testes lá no virtual. Foi um bocado, se calhar, de
desleixo da minha parte” (A1).
Há porém também alunos que alegam falta de tempo, desmotivação, falta de reflexão
sobre o assunto ou pouca vontade de trabalhar: “Eu não fiz. Não resolvi. Passou de
parte, falta de tempo deve ser” (A4); “Lá está a desmotivação também vem. É errado,
uma pessoa não deve desmotivar assim, mas depois não sei… deixei-me ir um bocado
abaixo e já estava. Se calhar, se fosse hoje já pensava de maneira diferente (…) já viria
aqui [gabinete] mais vezes tirar dúvidas” (A24); “Não resolvi e não me lembro porque é
que não resolvi. Tempo tivemos. Acho que nem sequer raciocinamos, na altura nem
pensamos que poderia ser importante” (A22); “Agora vou-me dar ao trabalho. Chego lá
e faço lá isto. (…) Chego lá e vejo o que está bem e o que está mal. Logo vejo por um
colega, ou assim” (A17).
Os alunos que resolveram apenas o segundo miniteste, embora tenham mudado um
pouco de atitude na segunda revisão, também alegam não terem refletido sobre a
situação, terem falta de tempo ou desconhecerem os procedimentos: “O primeiro não
resolvi nada [em casa]. Se calhar nem nós nos lembrámos de poder já levar as coisas
feitas. E o segundo já resolvi. Já tinha visto” (A10); “No primeiro não, que eu não sabia
que se podia levar. Mas depois sim. Era dois estudos, e eu fiz o teste, tive dúvidas aqui,
agora chegava a casa vou fazer a correção, já tirava as dúvidas. Porque quando estou a
estudar pela primeira vez não sei o que é que vai sair, não é? E depois via as minhas
dúvidas e já as clarificava” (A5).
A maioria dos alunos concorda com a forma como se desenrolou o processo de revisão
dos minitestes. Pensam que se a revisão fosse efetuada em casa não seria tão profícua,
Barros, Fernandes & Araújo
PROFMAT — 2015 139
por não haver garantias que fossem eles a resolver, porque não se organizariam para
fazer a revisão atempadamente ou porque poderiam ter mais dificuldades, como se pode
constatar pelos comentários apresentados: “Foi melhor. Se levássemos para casa se
calhar não íamos fazer por nós, juntávamo-nos todos e há sempre alguém que faz mais
do que nós” (A2); “Depois uma pessoa em casa iria dizer: ‘Faço hoje, faço amanhã,
faço passado’ e no dia não temos nada feito. E se for na aula, quem quiser ir já tem a
noção de que tem que ir e não vai sair de lá sem fazer ou tentar fazer. Eu falo por mim,
porque sou daquelas pessoas que vou deixando, vou deixando e depois…” (A10); “Se
tínhamos alguma dúvida podíamos perguntar à professora ou comentar com os colegas.
Se se estiver em casa sozinha não se tem certezas, nem é a mesma coisa” (A15); “Em
casa, se calhar, íamos pousar aquilo e nunca mais ligar. E aqui nas aulas, às vezes, até
chamávamos um bocadinho a professora. Oh professora não estou a perceber isto. E
você lá explicava. Acho que isso já é uma ajuda bastante grande” (A16).
Quanto às questões/sugestões que a professora usava, aquando da primeira correção dos
minitestes, com o intuito de ajudar na identificação dos erros e na procura da resposta
correta, há alunos que confessam que mesmo assim se limitaram a resolver novamente
as questões: “Eu liguei [às notas] só que algumas frases deixavam ali muito em aberto.
E eu sinceramente já não conseguia. Faltava ali qualquer coisa que me fizesse, faltava
um clique. E eram várias, e eu vá sinceramente. Como é isto afinal? Está errado agora
porquê?” (A1 ); “Eu limitei-me mais a resolver. Às vezes ia lá ver o que é que a
professora punha lá, porque também gosto de saber, mas não tentei” (A24).
Assim, é perfeitamente natural que estes alunos discordem que explicar qual a causa dos
seus erros tivesse contribuído para que tomassem consciência de quais os
procedimentos/propriedades que não são válidos. Porém, para muitos alunos essas
questões/sugestões foram uma mais-valia para detetarem os erros e os corrigirem:
“Ajudou porque às vezes a pessoa vê que está ali mal mas não consegue, logo de
imediato, descobrir e avançar dali para a frente. Então com essas notas era mais fácil, já
sabíamos o que procurar em concreto” (A8); “Aquelas dicazinhas que punha, sim. Dava
não só para resolver o exercício mas mesmo a nível de nós sabermos onde estava o erro.
Porque senão íamos olhar para aquilo e se calhar para nós até estava bem, não é. E
mesmo chegar a casa e ir fazer o teste de novo era uma maneira também de estudar um
bocado” (A16).
Barros, Fernandes & Araújo
140 PROFMAT — 2015
Considerações finais
Analisando as opiniões dos estudantes, pode-se afirmar que o balanço final da
experiência foi positivo na medida em que permitiu que os alunos tomassem
consciência das suas dificuldades e dos seus erros e provocou alguma revisão sobre os
conceitos e procedimentos envolvidos nas questões, nem que fosse pelo confronto das
resoluções com os outros colegas. De notar, por exemplo, que uma das alunas, que
confessa ter ido à revisão com o intuito de copiar por um colega, assegura que o
confronto das resoluções acabou por gerar alguma discussão e por consequência uma
aprendizagem de que não estava à espera: “Às vezes falávamos, discutíamos aquilo que
ele pensava que eu tinha mal. E eu dizia-lhe: ‘Porque é que fizeste isto assim?’ ‘Então,
tens de fazer isto e isto.’ (…) Discutíamos mais do que no trabalho em grupo. Por
exemplo, nós tínhamos lá uma matriz que o A20 tinha tudo bem, mas fez de outra
maneira e eu enganei-me lá num passo (…). Não ia copiar o exercício. E eu disse-lhe
‘não consigo ver onde é que está o meu erro’. E ele disse: ‘enganaste-te, tens de subtrair
aqui nesta linha’. E eu: ‘Ah! Pois é.’ E depois resolvi tudo direitinho" (A17).
O facto da maior parte dos alunos preferirem realizar a revisão no contexto de sala de
aula pode ser interpretado como alguma falta de organização em termos de hábitos de
estudo, aspeto que também parece ser corroborado por muitos ao não terem realizado
em casa a correção dos minitestes antes da revisão. Neste caso, o excesso de confiança
nas resoluções efetuadas e o não ser habitual realizar avaliações deste tipo também
parece ter tido a sua contribuição.
Um dos aspetos que pode constituir uma desvantagem do processo de revisão dos
minitestes é o facto de se gastar mais tempo na avaliação, implicando também uma
maior quantidade de trabalho para o professor, aspetos que também são referenciados
por Menino e Santos (2004) e Cherepinsky (2011) ao descreverem experiências com
características similares. No entanto, como afirma Cherepinsky, “é um investimento de
tempo que vale a pena para o professor e para o estudante” (p. 300).
Barros, Fernandes & Araújo
PROFMAT — 2015 141
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PROFMAT — 2015 142
DOS JOGOS À APRENDIZAGEM
Carolina Moreira, Sílvia Lopes, Helena Rocha
Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Nova de Lisboa
[email protected], [email protected], [email protected]
Resumo
Neste texto apresentamos os jogos no ensino da matemática como uma forma de
aprendizagem de conteúdos e não apenas como um recurso que cada professor pode
usar nas suas aulas para tornar a aula diferente. Analisamos dois jogos desenvolvidos
por nós e que utilizámos com alunos dos 7.º e 10.º anos de escolaridade, procurando não
só apresentar os jogos, mas também aspetos da sua implementação em sala de aula,
ponderando o contributo que trouxeram à aprendizagem dos alunos.
Aprender matemática depende de um grande número de variáveis, o que torna o ensino
um processo complexo, pois é necessário que se desenvolva o raciocínio lógico, além de
estimular o desenvolvimento das mais variadas capacidades transversais, tais como o
pensamento autónomo, a criatividade, o sentido de estratégia e a capacidade de resolver
problemas.
Duas das dificuldades frequentemente encontradas pelos professores passam pela falta
de motivação para a aprendizagem e pelo desinteresse pela Matemática. A solução para
estes problemas pode passar pela utilização de jogos para complementar o estudo, mas
também para a aquisição de novos conteúdos. No entanto, apenas a implementação dos
jogos não basta. O papel do professor é de extrema importância e a planificação e
orientação da aula são fundamentais para que se alcancem os objetivos pretendidos.
Palavras chave: jogos, discussão matemática, aprendizagem
Jogo, brincadeira, atividade lúdica, …? Do que falamos afinal?
Para tentar identificar quais as vantagens de inserir jogos no ensino da matemática,
tentámos encontrar uma definição da palavra jogo, embora existam muitas definições.
Para Aristóteles (385-322 a.C.), o jogo é antagónico ao trabalho, pois além de preparar o
jovem para a vida adulta, funciona como uma fonte de “descanso do espírito”, como
recreação. Já Platão (427-347 a.C.), apregoava o valor e a importância de se aprender a
brincar, sendo necessário estimular tal prática que, para ele, repercute na formação da
personalidade e, por isso, deveria ser supervisionada pelos adultos como garantia de
conservação das leis e das virtudes.
Atualmente, pensamos que a ideia do jogo ser apenas um divertimento está ultrapassada
visto que, por exemplo, uma das definições que encontrámos (Infopédia, 2015) sugere
que um jogo é:
Moreira, Lopes & Rocha
PROFMAT — 2015 143
Atividade lúdica ou competitiva em que há regras estabelecidas e em que
os praticantes se opõem, pretendendo cada um ganhar ou conseguir
melhor resultado que o outro.
No entanto, em 1996 Huizinga já tinha traçado algumas características que também
definem a atividade “jogo”:
o jogo é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de
determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente
consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si
mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma
consciência de ser diferente da vida quotidiana.
Inclusive, o autor refere que embora um jogo se possa entender como uma atividade
lúdica, é essencial a existência de regras para que se possa realizar em harmonia, tendo
de ser provido de alguma seriedade.
Através das características dos jogos mencionados pelo autor podemos evidenciar várias
competências transversais presentes nos currículos da matemática.
Quando se fala em jogos, a visão global que a maioria das pessoas tem, é: lazer,
dinheiro, competição individual ou em grupo, etc.. Todas estas opiniões levam a que se
pense que a ideia de jogo é a de ser algo bom, divertido e agradável.
Jogo e Matemática… Qual a relação?
Qual a importância do jogo no processo ensino-aprendizagem da matemática?
Onde acaba o jogo e começa a matemática séria? Uma pergunta difícil
que admite muitas respostas. Para muitos que a veem de fora, a
matemática, é extremamente aborrecida, não tem nada a ver com o jogo.
Ao contrário, para a maioria dos matemáticos, a matemática nunca deixa
completamente de ser um jogo, embora, para além disso, possa ser
muitas outras coisas. (Guzmán, 1990, p. 39)
Vários investigadores na área da Educação Matemática, seguidamente mencionados,
têm ampliado os estudos sobre as vantagens do jogo no processo de ensino-
aprendizagem da Matemática e defendem a importância deste recurso metodológico na
sala de aula.
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Grando (2004) afirma que o jogo pode ser utilizado como um instrumento facilitador na
aprendizagem de estruturas matemáticas, muitas vezes de difícil assimilação. Neste
sentido, a expressão facilitar a aprendizagem está associada à necessidade de tornar
atraente o ato de aprender. A autora faz referência também a Gardner (1961), para quem
os jogos matemáticos, assim como as “matemáticas recreativas”, são matemáticas
carregadas do fator lúdico. Para ela, o uso de jogos na sala de aula é um suporte
metodológico adequado a todos os níveis de ensino, desde que os objetivos destes sejam
claros, representem uma atividade desafiadora e estejam adequados ao nível de
aprendizagem dos alunos.
Para Borin (2004), os jogos podem funcionar como facilitadores no desenvolvimento da
linguagem, criatividade e raciocínio dedutivo, elementos enfatizados na escolha de uma
jogada e na argumentação necessária durante a troca de informações no jogo.
Segundo Winter e Ziegler (1983), há uma relação muito próxima entre o jogo e a
Matemática. Conforme é mostrado no esquema seguinte, é possível estabelecer uma
correspondência entre as duas (ver figura 1).
Jogo Pensamento matemático
Regras do jogo Regras de construção, regras de lógica,
operações;
Situações iniciais Axiomas, definições, o que é dado;
Jogadas Construções, deduções;
Jogadores Meios, expressões, conclusões;
Estratégias do jogo Utilização eficaz das regras, redução a
fórmulas conhecidas, processos;
Resultados Novos teoremas e novos conhecimentos.
Figura 1: Correspondência entre jogo e o pensamento matemático
(retirado de Winter & Ziegler, 1983)
Os jogos e a matemática dividem os mesmos aspetos em relação à sua função
educacional. Se por um lado, a matemática dota os alunos de um conjunto de
ferramentas que potenciam e enriquecem as suas estruturas mentais e os preparam para
explorar e analisar a realidade, por outro lado, os jogos permitem o desenvolvimento de
técnicas intelectuais, enriquecem o pensamento lógico e o raciocínio. Dada a atividade
Moreira, Lopes & Rocha
PROFMAT — 2015 145
mental que estimulam, são um ponto de partida para ensinar a Matemática e podem
servir de base para uma posterior formalização do pensamento matemático.
O ponto de chegada do ensino não consiste apenas em fechar na mente humana uma
combinação de informações que se considera necessária para o progresso do seu
desenvolvimento na sociedade. Segundo Kishimoto (1996), um dos contributos que o
jogo propicia aos alunos e que é fundamental para a sua evolução é o facto de fazer com
que cada aluno não tenha medo de errar, pois o erro é considerado um degrau necessário
para se chegar a uma resposta correta. A ideia fulcral é ajudá-lo a desenvolver a mente e
as potencialidades intelectuais que possuem.
Vantagens e Desvantagens
Grando (2004) defende que antes dos jogos serem postos em prática em sala de aula, o
professor deverá ter consciência que estes podem ocasionar vantagens e/ou
desvantagens no processo de ensino aprendizagem, dependendo da forma como forem
abordados e dos alunos em causa. Grando (2001) aponta uma série de vantagens e
desvantagens para a introdução de jogos no contexto de ensino-aprendizagem.
Dentro das vantagens as que pensamos ser mais significativas são: o (re)significado de
conceitos já aprendidos de uma forma motivadora para o aluno; desenvolvimento de
estratégias na resolução de problemas, a tomada de decisões, a consciencialização e
avaliação das mesmas; significação para conceitos aparentemente incompreensíveis;
participação ativa do aluno na construção do seu próprio conhecimento;
desenvolvimento da criatividade, do senso crítico, da participação, da competição
saudável, da observação, das várias formas de uso da linguagem e do resgate do prazer
em aprender; identificação e diagnóstico por parte do professor de algumas dificuldades
dos alunos.
As desvantagens apontadas por Grando (2001) são: quando os jogos são mal utilizados,
existe o perigo de dar ao jogo um caráter puramente aleatório, tornando-se um
“apêndice” em sala de aula (os alunos jogam motivados apenas pelo jogo, sem saber o
motivo pelo qual jogam); o tempo gasto com as atividades de jogo na sala de aula é
Moreira, Lopes & Rocha
146 PROFMAT — 2015
maior e, se o professor não estiver preparado, pode existir um sacrifício de outros
conteúdos pela falta de tempo; as falsas conceções de que se devem ensinar todos os
conceitos através do jogo; a perda do momento lúdico do jogo pela interferência
permanente do professor, destruindo a essência do mesmo; a imposição do professor,
exigindo que o aluno jogue, mesmo que ele não queira, destruindo a voluntariedade
pertencente à natureza do jogo; a dificuldade de acesso e disponibilidade de material
para a prática dos jogos.
Dentro das desvantagens apresentadas anteriormente podemos prever que estas podem
ser neutralizadas se o professor tiver alguns cuidados a realizar a planificação para as
aulas onde implementa os jogos. A realização da planificação nestas aulas é essencial,
pois fará com que o professor antecipadamente tome decisões essenciais para que as
aulas cumpram todos os objetivos propostos e decorram em harmonia. Estas decisões
passam, por exemplo, por formar os grupos segundo os objetivos da aula. É importante
frisar que a utilização de um jogo deve ser um auxílio em sala de aula, ou seja, a
utilização dele sem ter um objetivo não favorecerá nunca o processo de aprendizagem
dos alunos. Além disso, a autora cita uma desvantagem relacionada com o tempo, pois
na sua conceção nas aulas com jogos o tempo gasto é maior e, portanto o professor deve
ficar atento a este fator para que não seja preciso sacrificar outros conteúdos. Para este
último problema, Borin (2004) dá a sugestão de durante a aplicação do jogo, ser
recomendado que, quando forem jogados jogos de tabuleiro estes sejam oferecidos aos
alunos para que possam jogar anteriormente noutros locais; porém, na sala de aula é
importante que sejam discutidas as descobertas feitas, para orientar e sistematizar as
hipóteses formuladas e as estratégias. Esta última sugestão, apesar de aplicável, poderá
não ser viável devido à falta de recursos normalmente existente (outra desvantagem
apontada).
Borin (2004) completa a lista de desvantagens com um problema que a nosso ver é um
problema que todos os professores enfrentam atualmente, seja em aula com aplicação de
jogos ou não: o ruído. Segundo a autora, é inevitável, pois somente através de
discussões é possível chegar-se a resultados convincentes. É importante que o professor
pense no ruído de uma forma construtiva, porque sem ele não há motivação para o jogo
Moreira, Lopes & Rocha
PROFMAT — 2015 147
e até porque se os alunos tiverem hábitos de trabalho em grupo, esse mesmo ruído é
substancialmente menor.
4. Etapas do Jogo
O jogo tem as suas vantagens no ensino da matemática, como referido na secção
anterior, desde que o professor tenha objetivos claros do que pretende atingir com a
tarefa proposta. Para isso deve tê-lo jogado anteriormente e realizado a sua respetiva
planificação para que conheça muito bem o jogo selecionado/criado, o que permitirá
realizar intervenções pedagógicas adequadas no momento da aplicação em sala de aula.
Segundo Grando (2004), as intervenções pedagógicas com jogos nas aulas de
matemática incluem sete momentos distintos:
1.º momento: Familiarização dos alunos com o material do jogo.
É o momento em que os alunos entram em contacto com o material do jogo,
construindo-o ou experimentando-o mediante simulações de possíveis jogadas. É
comum o estabelecimento de analogias com os jogos já conhecidos por eles.
2.º momento: Reconhecimento das regras
No segundo momento os alunos devem reconhecer as regras do jogo e este processo
pode ocorrer mediante a explicação do professor, a leitura pelos alunos ou pela
identificação a partir de várias jogadas entre o professor e alguns alunos, que
aprenderam anteriormente o jogo. Estas simulações de jogadas entre o professor e os
alunos são ótimas para a compreensão dos demais, pois percebem as regularidades nas
jogadas e identificam as regras.
3º momento: O “jogo pelo jogo” – jogar para garantir regras
Nesta fase deverá acontecer um momento de jogo espontâneo e de exploração de noções
matemáticas contidas no mesmo. Também nesta fase deve ser possibilitado aos alunos
jogarem de forma a assimilarem as regras, é fundamental a compreensão e cumprimento
das regras do jogo.
4.º momento: Intervenção pedagógica verbal
Moreira, Lopes & Rocha
148 PROFMAT — 2015
Este é o momento das intervenções verbais do professor e tem como caraterísticas o
levantamento de questões e observações realizados por ele, a fim de provocar nos
alunos a análise das próprias jogadas. Neste momento é importante analisar os
procedimentos que os alunos utilizam na resolução de problemas, para garantir que haja
a relação deste processo com a conceitualização/formalização matemática.
5.º momento: Registo do jogo
O registo do jogo pode ocorrer dependendo da sua natureza e dos objetivos que tem
com o registo. O registo dos pontos ou dos procedimentos realizados ou dos cálculos
utilizados pode ser considerado uma forma de sistematização e formalização por meio
de uma linguagem própria: linguagem matemática. Através do registo o professor
conhece melhor os seus alunos. Assim, é fundamental que o professor estabeleça
estratégias de intervenções em que haja necessidade do registo escrito do jogo.
Através do registo podem ser analisadas as jogadas “erradas” e construções de
estratégias. Metodizar um raciocínio por escrito contribui para a melhor compreensão
do aluno em relação às suas próprias formas de raciocínio e também para o
aperfeiçoamento da forma como o explica.
6.º momento: Intervenção escrita
Neste momento o professor e/ou os alunos elaboram situações-problema sobre o jogo
para que os próprios alunos resolvam. A resolução dos problemas de jogo propicia uma
análise mais específica sobre o mesmo, na qual os problemas abordam diferentes
aspetos que podem não ter ocorrido durante as partidas. Neste momento os limites e
possibilidades são assinalados pelo professor e este direciona os alunos para os
conceitos matemáticos trabalhados no jogo. O registo do jogo também se faz presente
nesse momento.
7.º momento: Jogar com competência
Como último momento, o jogar com competência, é o retorno à situação real do jogo. É
importante que o aluno retorne à ação para que execute estratégias definidas e
analisadas durante a resolução de problemas. O processo de análise do jogo e as
Moreira, Lopes & Rocha
PROFMAT — 2015 149
intervenções obtidas nos momentos anteriores farão sentido no contexto do próprio
jogo.
Os sete momentos propostos pela autora possibilitam a estruturação de um trabalho com
jogos nas aulas de Matemática. Porém, é necessário que o professor realize boas
intervenções pedagógicas durante o jogo para garantir a aprendizagem dos conceitos
matemáticos por parte dos alunos.
Dois exemplos de jogos aplicados no ensino da matemática
O objetivo dos jogos que aqui apresentamos é a introdução de novos conceitos, de
forma a proporcionar aos alunos a aprendizagem dessas novas noções através da prática
dos mesmos.
O Dominó das Semelhanças foi realizado com alunos do 7.º ano e o jogo Funções a
Feijões com alunos do 10.º ano.
Depois de experimentados os jogos foi pedido aos alunos que respondessem a um breve
questionário com as suas opiniões sobre a matemática e o jogo que experimentaram.
Os nomes apresentados nesta secção são fictícios.
Dominó das Semelhanças: descrição da aplicação do jogo
Este jogo é constituído por duas etapas. Na primeira etapa cada grupo de quatro alunos
em cooperação tenta chegar a conclusões acerca do conceito de triângulos semelhantes.
É distribuída uma folha com vários conjuntos de triângulos semelhantes baralhados,
sem quaisquer medidas. O objetivo é que os alunos os agrupem efetuando as medições
que acharem pertinentes utilizando a régua e/ou o transferidor. Com a realização desta
etapa, pretende-se que os alunos cheguem à conclusão que dois triângulos são
semelhantes se tiverem os lados proporcionais ou os ângulos iguais. Sendo este jogo
introdutório aos critérios de semelhança de triângulos, é essencial a realização de uma
primeira etapa, tal como a apresentada, onde os alunos possam discutir e tirar
conclusões sobre estes conteúdos.
Moreira, Lopes & Rocha
150 PROFMAT — 2015
Na segunda etapa, os grupos põem em prática um jogo muito semelhante ao dominó.
Dentro de cada grupo todos os elementos são adversários, apesar de deverem em
conjunto discutir e conjecturar sobre os critérios de semelhança dos triângulos em jogo.
O objetivo é cada aluno obter o máximo de pontos, jogando até acabar as peças do jogo
ou não existirem mais jogadas possíveis. Para isso, deverão unir em cada jogada as
extremidades das peças que tenham dois triângulos semelhantes, tal como no dominó
original se une as extremidades das peças com o mesmo valor. Com a realização deste
jogo pretende-se que os alunos consigam identificar, definir e consolidar cada critério
de semelhança de triângulos.
De seguida apresentamos alguns momentos da realização da segunda etapa do jogo do
dominó por um grupo de quatro alunos (A-Ana, B-Bernardo, C-Carolina, D-Diogo).
Começou-se por explicar as regras do jogo. Os alunos entenderam rapidamente a
dinâmica do jogo, apesar de irem surgindo algumas questões. O facto de na atualidade
jogos como o dominó não pertencerem ao leque de jogos praticados por jovens poderá
ser uma dificuldade no que diz respeito a encontrarem rapidamente semelhanças com o
jogo original.
D: É preciso decorar as peças?
Professora: Não é preciso decorar, podes pôr as peças na tua mão como
se fossem cartas e veres sempre que quiseres.
D: Então e agora é suposto fazer o quê?
Professora: Um de vocês tem de jogar uma peça com dois triângulos
equiláteros. Quem a tiver, é o primeiro a jogar.
A: Uma qualquer?
Professora: Só existe uma peça nessas condições.
D: Ah! É mesmo parecido ao dominó!
Aqui pudemos constatar uma das caraterísticas da primeira fase que qualquer jogo deve
ter, visto que o Diogo conseguiu identificar as analogias com o dominó tradicional.
B: Posso jogar noutra direção?
Professora: Sim, desde que juntes duas peças com extremidades com triângulos semelhantes.
Moreira, Lopes & Rocha
PROFMAT — 2015 151
Figura 2 – Aluno a segurar as peças
Com o avançar do jogo começaram a surgir as primeiras questões acerca da definição
dos diferentes critérios de semelhança. Os alunos tendencialmente remeteram dúvidas à
professora, embora esta nunca lhes tenha respondido concretamente às questões. Uma
das estratégias adotadas foi, então, a de comparar as jogadas dos colegas e perceber
quais os critérios que usavam.
C: Posso juntar um triângulo equilátero através dos ângulos com um
através dos lados?
Professora: Será que podes?
C: Sim… Ambos são equiláteros! Os seus lados são proporcionais… são
semelhantes!
(…)
B: Posso jogar um que não seja equilátero?
Professora: Podes desde que seja semelhante à extremidade de uma das
peças.
B: Há aqui muitos que não são equiláteros…
Professora: A teu ver dois triângulos equiláteros são semelhantes… Que
outros casos achas que existem para que dois triângulos sejam
semelhantes?
B: Não sei… A A há pouco juntou duas peças em que os triângulos não
eram equiláteros…
A: Quais? Ah… sim, mas tinham ambas um ângulo reto e dois lados
proporcionais!
B: Ah já sei então! Esta aqui então também dá aqui!
Professora: Qual é o critério?
B: Um ângulo igual e dois lados juntos a esse ângulo proporcionais?
Moreira, Lopes & Rocha
152 PROFMAT — 2015
A, C: Sim!
O jogo premeia os alunos que encontrem erros nas jogadas dos colegas, o que fomenta o
sentido crítico e permite que os alunos aprendam com os seus erros.
A: Acho que não tenho nenhuma peça que possa jogar.
Professora: Então podes pedir ajuda aos teus colegas e caso consigam
encontrar uma peça que possa ser jogada ganhas um ponto.
A A pôs as cartas na mesa.
D: Estes ângulos são iguais mas não sei se assim os triângulos são
semelhantes, os lados não têm a mesma medida...
A: Vou jogar esta então, mas não tenho a certeza.
Professora: O que é vocês acham?
C: Eu acho que são, os dois lados que estão junto ao ângulo são
proporcionais… A razão é 2,5!
Professora: Todos concordam?
A: Sim!
Professora: E a peça só poderia ser posta nesse lugar?
Os alunos começaram a discutir e chegaram à conclusão que haveria mais três hipóteses
para jogar a peça.
C: A jogada do D não está correta!
D: Está sim!
C: Então, mas olha, uma peça tem um triângulo com um ângulo reto e a
outra tem um triângulo equilátero.
B: O C tem razão!
D: Pois tem, como vi dois lados proporcionais fiquei confuso.
Figura 3 – Jogada errada efetuada pelo Diogo
(…)
Moreira, Lopes & Rocha
PROFMAT — 2015 153
C: Posso juntar um triângulo equilátero através dos ângulos com um
através dos lados?
Professora: Será que podes?
C: Sim… Ambos são equiláteros! Os seus lados são proporcionais… são
semelhantes!
A C pôs uma peça e seguidamente retirou-a.
C: Calma! Não vou deixar ninguém ganhar um ponto! Se eu passar
ninguém ganha um ponto?
Professora: Não.
C: Então passo!
Dominó das Semelhanças - Conclusões da aplicação do jogo e inquérito
Na aplicação dos inquéritos, apenas um aluno diz não gostar de matemática e todos
revelam gostar de trabalhar em grupo, referindo como principal razão a troca de ideias e
construção de raciocínio.
A maioria aponta como principal dificuldade na utilização dos materiais do jogo o facto
de as peças serem demasiado pequenas e de papel. Quanto às dificuldades sentidas
durante a prática do jogo, a maioria refere sentir dificuldades em verificar se os lados
dos triângulos são proporcionais por envolver cálculo mental.
No que diz respeito ao contributo dos jogos para aprendizagem matemática, as opiniões
convergiram no mesmo sentido:
“Com os jogos nós interessamo-nos mais, porque além da matemática ser divertida,
assim torna-se ainda mais”; “Estimulam a criatividade”; “É mais fácil aprender”.
Na questão “Gostarias de trabalhar mais vezes com jogos nas aulas de matemática?”,
todos os alunos responderam afirmativamente, dando como justificação o facto de
quebrar a rotina, os motivar e por ser uma forma fácil de aprenderem os conceitos.
A aplicação deste jogo sugere que este poderá dar um contributo positivo tanto ao nível
de aprendizagem na introdução do conceito de triângulos semelhantes, como na revisão
de conceitos e noções de geometria e álgebra. Os alunos superaram as dificuldades
encontradas ao longo do jogo e foi possível observar um crescendo da dinâmica
Moreira, Lopes & Rocha
154 PROFMAT — 2015
estabelecida ao longo do mesmo. Foi evidente que no fim do jogo os alunos apenas se
preocupavam com a sua estratégia para conseguir a melhor jogada, visto já terem
interiorizado os conceitos abordados.
Enigma, Funções e Feijões: descrição da aplicação do jogo
O jogo é constituído por duas partes e é composto por um baralho com dez cartas mãe e
trinta cartas filhas, numeradas de 1 a 40. Nas cartas mãe, os alunos têm o gráfico de uma
função e a sua expressão analítica. O conjunto das cartas filhas é dividido em três
subconjuntos – dez cartas com as concavidades, dez cartas com as monotonias e dez
cartas com os extremos. Cada grupo de dez cartas tem uma cor para facilitar a distinção.
Na primeira parte cada grupo de quatro alunos, em cooperação, tenta chegar a
conclusões acerca das caraterísticas das funções lineares e quadráticas, usando as cartas
do jogo e juntando-as em grupos de quatro, isto é, juntando cada carta mãe (com o
gráfico) às três respetivas cartas filhas (concavidade, monotonia e extremos).
Na segunda parte, são distribuídas as cartas e os feijões sendo que cada aluno tem em
mãos uma carta mãe, duas cartas filha e dez feijões. Nesta parte os alunos de cada grupo
jogam individualmente, discutindo e descobrindo as caraterísticas de cada função. O
objetivo do jogo é juntar o máximo de feijões. Para isso os alunos deverão tentar fazer a
combinação com o maior número de cartas possível para garantir a vitória nessa ronda.
Caso dois ou mais alunos façam uma combinação com o mesmo número de cartas,
considera-se o vencedor o que jogar a carta com o maior valor.
Depois de distribuídas as cartas pelos jogadores, são colocadas cinco cartas na mesa
(independentemente de ser carta mãe ou carta filha). Concluída esta fase, consoante as
cartas que têm em mãos, os alunos podem optar por não entrar na ronda, tendo de doar
um feijão; se quiserem que a sua jogada conte, podem apostar entre dois e cinco feijões.
Cada jogador deve igualar ou superar a aposta do jogador anterior pelo que se o
primeiro jogador apostar cinco feijões, qualquer outro jogador que queira entrar na
ronda terá de apostar, também, cinco feijões.
Moreira, Lopes & Rocha
PROFMAT — 2015 155
São válidas todas as combinações que juntem entre duas e quatro cartas, todas de cores
diferentes.
O jogo acaba quando um dos jogadores for o detentor de todos os feijões.
Este jogo foi implementado com alunos do 10.º ano: (I-Inês, J-João, L-Luísa, M-
Matias), apresentando-se de seguida alguns aspetos relativos à parte do jogo de cartas
concretizada por um grupo de quatro.
Começou-se por explicar as regras do jogo e fazer algumas simulações de jogadas.
Este jogo tem bastantes regras, o que exigiu alguma concentração por parte dos alunos,
no início, para que conseguissem compreender e definir as suas estratégias.
Figura 4 – Uma jogada – o fim da ronda
Início do Jogo
A I retirou a carta menor e por isso ficou responsável por distribuir o jogo durante as
jogadas. O primeiro a jogar foi o J e as dúvidas que apresentou não se relacionaram com
os conteúdos, mas sim com as regras.
J: Posso fazer duas combinações ao mesmo tempo?
Professora: Não, apenas uma.
J: Mas por estratégia, é melhor a combinação que tenha a carta mais alta?
Professora: Porquê?
J: Para ter mais hipóteses de ser o primeiro a jogar na próxima jogada.
Moreira, Lopes & Rocha
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I: Mas deves escolher a combinação com mais cartas possível, para
ganhares a rodada, se não, não te vale de nada teres uma carta alta… ter a
carta alta é só para o caso de empatares o jogo…
J: Ah sim, tens razão! Mas as duas combinações que eu tenho, têm ambas
duas cartas.
I: Pois… Assim é melhor escolher o par que tem a carta mais alta.
A L e a M revelaram algumas dificuldades inicialmente na compreensão de alguns
conteúdos. Embora, com as suas jogadas e a correção por parte dos colegas, tenham
acabado por entender a caraterização de cada função.
Ao mostrar a sua combinação, a L foi corrigida:
I: Mas na tua combinação, a função não tem extremos, porque juntas esta
carta?
L: Tem extremos sim!
I: Isto é uma função linear! Como pode ter extremos?
L: Ah pois, extremos…
J: Não tem nem máximos nem mínimos!
L: Ah… pois não!
(…)
L: O que é uma função constante?
I: Hum… é aquelas funções que são uma reta horizontal.
L: Então tem concavidades?
J: Se é uma reta…
L: Ah pois, esqueçam!
O J no final do jogo fez um pleno, tendo conseguido reunir quatro cartas.
I: As probabilidades de isto acontecer são mínimas!
Professora: Concordam todos?
L: Sim, está certo… Ganhaste todos os feijões!
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Figura 5 – Pleno realizado pelo João
Enigma, Funções e Feijões - Conclusões da aplicação do jogo e inquérito
Na aplicação dos inquéritos, a totalidade dos alunos diz gostar de matemática e todos
revelam gostar de trabalhar em grupo, referindo como principais razões a troca de
ideias, a ajuda entre os elementos do grupo, a interação e a construção de raciocínio.
Os alunos não sentiram dificuldades na manipulação do material do jogo. Quanto às
dificuldades sentidas durante a prática do jogo, as respostas foram bastante divergentes:
“ver que cartas ficavam melhor com quais”; “conjugar as cartas”; “perceber as regras do
jogo”; “não senti dificuldades”.
No que diz respeito ao contributo dos jogos para a aprendizagem matemática, as
respostas apontam para uma maior motivação e facilidade de aprendizagem.
Na questão “Gostarias de trabalhar mais vezes com jogos nas aulas de matemática?”,
todos os alunos responderam afirmativamente. A resposta dada por um dos alunos foi a
seguinte: “Sim, pois é sempre bom ter vários tipos de aula”
O que nos confirma que o jogo não deve ser uma constante em sala de aula, mas
também não deve ser posto de parte, visto dar acesso a uma aprendizagem motivada e a
uma nova forma de aprender.
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À semelhança do outro jogo apresentado, a aplicação deste também veio trazer
conclusões bastante positivas. Os alunos revelaram grande entusiasmo por alcançar o
objetivo que neste caso era a obtenção do maior número de feijões e para isso tiveram
que analisar todas as possíveis combinações de cartas, ou seja, analisar todas as funções
e suas caraterísticas. Inicialmente, os alunos apresentaram algumas dificuldades nos
conceitos de extremos, principalmente na diferença entre máximo e maximizante, e
entre mínimo e minimizante, mas com o decorrer do jogo foram ultrapassando esses
detalhes.
Conclusão
Os jogos apresentados foram concebidos por nós, tendo a experiência que aqui
descrevemos visado avaliar as vantagens da aplicação dos jogos como um recurso
pedagógico nas aulas de matemática, para além de perceber qual a sua real importância
para a aprendizagem por parte dos alunos.
Um dos fatores que muitas vezes interfere com os resultados obtidos pelos alunos a
matemática é a sua fraca motivação. Através da utilização destes jogos em aula,
verificámos que os alunos se mostraram muito mais interessados e curiosos. O facto de
se tratar de um jogo, independentemente do conteúdo do mesmo, faz com que os alunos
queiram participar e principalmente estabelecer estratégias a fim de concretizar o seu
objetivo: ganhar. Mas para isso terão que dominar em pleno os conteúdos, o que lhes dá
um maior incentivo para os aprender e consolidar.
Outra das vantagens que é importante ressalvar é o desenvolvimento de raciocínios em
grupo. Os alunos perceberam que mais que saber as regras do jogo, saber os conteúdos
seria um fator fulcral para vencerem o jogo e a única forma de o fazer seria discutir com
os colegas até alcançarem conclusões. Assim, em grupo debateram ao pormenor cada
situação de jogo e corrigiram as pequenas dificuldades que foram encontrando.
Estes jogos têm uma grande dinâmica, pois encontrar erros nas jogadas dos
colegas/opositores faz com que ganhem vantagem em relação a eles. Não basta apenas
os alunos formularem as estratégias do seu próprio jogo, terão também que tomar
Moreira, Lopes & Rocha
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atenção às jogadas dos colegas para que consigam perceber se essas jogadas fazem
sentido. Isto também faz com que cada jogador sinta uma responsabilidade acrescida
pelas suas próprias jogadas, visto que caso a jogada não esteja correta, os seus
opositores poderão passar à frente.
Cada um dos jogos proporciona aos alunos total liberdade nas suas jogadas, um aspecto
fundamental para que desenvolvam a imaginação e a criatividade. Assim, é possível
estimular a individualidade de cada um, mantendo a coesão e articulação entre todos,
pois a grande finalidade é sempre a discussão das conclusões retiradas a partir desta
nova experiência.
Referências bibliográficas
Borin, J. (2004). Jogos e resolução de problemas: uma estratégia para as aulas de matemática
(5ªedição). São Paulo: IME-USP.
Gardner, M. (1961) Divertimentos Matemáticos. Rio de Janeiro: Ibrasa.
Grando, R. C. (2001). O jogo na educação: aspectos didático-metodológicos do jogo na
educação matemática. Unicamp.
Guzmán, M. (1990). Aventuras Matemáticas. Lisboa: Gradiva.
Huizinga, J. (1999). Homo Ludens. São Paulo: Perspectiva.
Kishimoto, T. M. (1996). Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez.
GRANDO, R. C. (2004). O jogo e a matemática no contexto da sala de aula. São Paulo: Paulus.
Winter H., Ziegler T. (1983). Introduccion al juego de los conjuntos. Madrid: Interduc-
Schoedel.