Fichamento Bourdieu - Casa Kabyle Ou o Mundo Ao Avesso
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UniversidadeFederaldeMinasGerais
FaculdadedeFilosofiaeCinciasHumanas
CinciasSociais
TpicosemAntropologia:Antropologiadaarte,memriaepaisagem
JooVitorFerrariRabelo
Maro2015
BeloHorizonteMG
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UniversidadeFederaldeMinasGerais
CinciasSociaisFAFICH
Disciplina:TpicosemAntropologia:Antropologiadaarte,memriaepaisagem.
Professor:LeonardoFgoli
Aluno:JooVitorFerrariRabelo
Marode2015
Obrafichada:
ACasaouoMundosAvessas,dePierreBourdieu.
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ACASAOUOMUNDOSAVESSAS
Atravs da anlise da arquitetura e organizao da casa kabila, bem como sua posio
no espao geogrfico, possvel sentirse disposto a restringir a explicao das oposies
presentes em suas particularidades (como a parade lateral kanun e o estbulo, a primeira
representando o alto e a ltima o baixo a parede do tear como luz e a parede da porta
como trevas) apenas parte tcnica, desconsiderando toda implicao simblica inerente.
Na verdade, esse seria um exemplo em que a necessidade simblica estaria articulada com a
necessidade tcnica sendo que, tais indicadores de oposio seriam no s responsveis por
criar as prprias oposies mas tambm de receber delas seu sentido. Com efeito, o autor
precisaque
Poderamos ficar tentados a dar uma explicao estritamente tcnica a essas oposies, j que
a parede do tear, frente porta, e voltada para o leste, a mais iluminada e que o estbulo fica
situado abaixo (a casa sendo freqentemente construda perpendicularmente s curvas de
nvel, para facilitar o escoamento das guas servidas), se uma srie de indicadores no
sugerissem que essas oposies so o centro de feixes de oposies paralelas, que nada devem
aosimperativostcnicosesnecessidadesfuncionais.(BOURDIEU,p.91)
Ainda mais, vale ressaltar que as significaes simblicas dos aspectos da organizao
e arquitetura da casa kabila no se relacionam diretamente com a forma como os espaos so
utilizados: tais significaes, por estarem dispostas de modo a construir relaes de oposio,
implicam em relaes de relaes, em um sentido caracterstico do mtodo estrutural
lvistraussiano. Um exemplo que corrobora com essa tese a da ofensa presente em oferecer
o jirau para um hspede dormir, uma vez que tal estrutura, feita de madeira, sustentada pelo
estbulo como o cadver o pelos que o carregam (BOURDIEU, p. 93), ou seja, a relao
deoposiodojirauamesmaqueadaparededotmulo(trevas)comaparededotear(luz).
interessante destacar, tambm, o significado por trs do encaixe entre a viga mestra
e o pilar da casa kabila, que representaria, respectivamente, a unio matrimonial entre o
homem, dono da casa, e a esposa, simbolizada na rvore bifurcada que serviria de repouso
para a viga, o homem. Tal relao se torna explcita na vinculao de termos masculinos e
femininos s estruturas correspondentes, assim como pelos rituais executados no momento de
nascimento de um menino, quando fazse votos para que ele se torne a viga mestra da casa.
Contudo, embora o homem seja considerado o dono da casa, percebese outra posio quando
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a vida exterior casa est relacionada ao homem e a vida no interior da casa mulher.
Quando um homem passa muito tempo dentro de casa e no se coloca vista dos outros,
ridicularizado e chamado de homem de casa, em oposio ao trabalho da mulher, que
exclusivamente empregado nos cuidados da casa e de tudo que se entende como atividades
biolgicas (comer, dormir, procriar, etc.) segundo o ditado, que se refere ao que se espera da
mulher: A mulher s tem duas moradas: a casa e a tumba. Apesar disso, no possvel
inferir que a oposio entre vida pblica e privada exterior e interior corresponde de
forma inequvoca oposio entre masculino e feminino, afinal possvel dividir a prpria
vidaprivadaaindanessesltimostermos.
A soleira de vital importncia para o entendimento das implicaes simblicas da
casa kabila. O local pode ser interpretado como eixo de rotao entre as paredes internas,
cujos sentidos respectivos so inversos e simtricos aos das paredes adjacentes do lado
externo.Oautorvaimaisalm,
No compreenderamos inteiramente o peso e o valor simblico atribudos soleira no
sistema se no percebssemos que ela deve sua funo de fronteira mgica ao fato de ser o
lugar de uma inverso lgica e que, sendo o lugar de passagem e de encontro obrigatrio entre
os dois espaos, definidos em relao aos movimentos do corpo e a trajetos socialmente
qualificadoselalogicamenteolugarondeomundoseinverte.(BOURDIEU,p.109).
Assim, o espao interno acaba por ser definido pelo espao externo, ou seja, o espao
do homem. Em outras palavras, o espao feminino subordinado e definido pelo masculino,
ainda que o papel da mulher dentro da casa seja de suma importncia para a subsistncia do
grupo o movimento exercido pelo homem em direo ao ambiente exterior, afastandose da
moradia e a firmandose socialmente como homem , tambm, uma forma de recusa
categrica da natureza, origem inevitvel do movimento para distanciarse dela
(BOURDIEU, p. 112). Com efeito, para essa sociedade berbere, o homem a lmpada de
fora,amulheralmpadadedentro.