Habeas Corpus com Pedido Liminar para o advogado Jadson Luiz dos Santos

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ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL Seção do Estado da Bahia ---------------------------------------------------------------------------------------------------------- Rua Portão da Piedade, nº 16 (Antiga Praça Teixeira de Freitas) - Barris - CEP: 40.070-045 - Salvador - Bahia Tel.: (71) 3329 - 8921 - Fax: (71) 3329 - 8926 Site: www.oab-ba.org.br E-mail: [email protected] EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA. “Advogar é combater, é lutar, é opor-se, é apaixonar- se pela paixão alheia; (...) é na especialidade criminal, obstar, em muitos casos, que juízes e acusadores exerçam seus próprios instintos criminosos na punição dos que delinquiram; é enfim, e mais uma vez, fazer um pouco de bem silenciosamente; é penetrar na alma dos que se confiam a nós, viver suas ânsias e dores, viver suas alegrias.” (Raul Chaves). A Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Bahia, por conduto do Conselheiro Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Fernando Santana Rocha, brasileiro, casado, advogado regularmente inscrito na OAB/BA sob o nº 3.124; do seu Procurador-Geral das Prerrogativas, Gustavo Amorim Araújo, brasileiro, casado, advogado regularmente inscrito na OAB/BA sob o nº 17.050; e do Presidente do Conselho Consultivo de Jovens Advogados da Seccional Bahia, Luiz Gabriel Batista Neves, brasileiro, solteiro, advogado regularmente inscrito na OAB/BA sob o nº 32.879, vêm, com base no art. 5º, inciso LXVIII, da CF/88, e art. 647 e seguintes do Código de Processo Penal, perante este Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, impetrar HABEAS CORPUS COM PEDIDO LIMINAR

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A OAB da Bahia obteve mais uma vitória na defesa das prerrogativas dos advogados, prioridade nesta gestão. Na última quinta-feira (26) o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) concedeu o pedido liminar no Habeas Corpus impetrado pela OAB da Bahia, por meio de sua Procuradoria Seccional de Prerrogativas, em defesa do advogado Jadson Luiz dos Santos. Com a decisão, assinada pela desembargadora Ivete Caldas, está suspensa a ação penal contra o advogado movida pelo então juiz de Direito da Comarca de Lage, Rodrigo Alexandre Rissato, na 1ª Vara Criminal de Amargosa, até o julgamento de mérito do habeas corpus. Jadson Luiz dos Santos foi denunciado por suposta prática de calúnia durante o exercício profissional da advocacia. O caso começou em 2012, quando o advogado Jadson Luiz dos Santos ofereceu “Memoriais Substitutivos” em favor de seu cliente numa ação penal, onde teceu críticas ao então juiz de Direito da Comarca de Lage, Rodrigo Alexandre Rissato, e denunciou a violação de suas prerrogativas funcionais por parte do magistrado. Em razão do teor da peça processual, e por entender que lhe foi imputada, falsamente, a prática de crime de injúria racial, o juiz formalizou uma representação criminal perante o Ministério Público, atribuindo ao advogado a prática de calúnia. No habeas corpus, a OAB da Bahia afirma que o advogado encontra-se sob constrangimento ilegal, pois a conduta em exame constitui mero exercício da profissão de advogado, inexistindo no caso o dolo específico que o tipo penal exige, qual seja, a intenção de caluniar a vítima, imputando-lhe fato definido como crime. Na peça, a OAB entende ainda que ao permitir o prosseguimento da ação penal, o Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal assumiu a posição de autoridade coatora, haja vista ter consentido que continuasse tramitando em desfavor do advogado uma ação penal ajuizada mediante uma inicial que narra uma conduta indiscutivelmente atípica. O habeas corpus é assinado pelo conselheiro federal Fernando Santana, pelo procurador-geral das Prerrogativas, Gustavo Amorim, e pelo presidente do Conselho Consultivo dos Jovens Advogados, Luiz Gabriel Batista Neves.

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE

JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA.

“Advogar é combater, é lutar, é opor-se, é apaixonar-

se pela paixão alheia; (...) é na especialidade

criminal, obstar, em muitos casos, que juízes e

acusadores exerçam seus próprios instintos criminosos

na punição dos que delinquiram; é enfim, e mais uma

vez, fazer um pouco de bem silenciosamente; é

penetrar na alma dos que se confiam a nós, viver suas

ânsias e dores, viver suas alegrias.”

(Raul Chaves).

A Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Bahia, por

conduto do Conselheiro Federal da Ordem dos Advogados do Brasil,

Fernando Santana Rocha, brasileiro, casado, advogado regularmente

inscrito na OAB/BA sob o nº 3.124; do seu Procurador-Geral das

Prerrogativas, Gustavo Amorim Araújo, brasileiro, casado, advogado

regularmente inscrito na OAB/BA sob o nº 17.050; e do Presidente do

Conselho Consultivo de Jovens Advogados da Seccional Bahia, Luiz Gabriel

Batista Neves, brasileiro, solteiro, advogado regularmente inscrito na

OAB/BA sob o nº 32.879, vêm, com base no art. 5º, inciso LXVIII, da

CF/88, e art. 647 e seguintes do Código de Processo Penal, perante este

Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, impetrar

HABEAS CORPUS COM PEDIDO LIMINAR

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em favor de JADSON LUIZ DOS SANTOS, brasileiro, advogado,

inscrito na OAB/BA sob o nº 35.807, residente e domiciliado na Rua Silveira

Martins, nº 1004, CEP 41.150-000, Cabula, Salvador, Bahia, o qual está

sendo submetido a constrangimento ilegal, tendo como AUTORIDADE

COATORA O JUÍZ TITULAR DA VARA CRIME DA COMARCA DE

AMARGOSA (BEL. ALBERTO FERNANDO SALES DE JESUS) NOS

AUTOS DA AÇÃO PENAL TOMABADA SOB O Nº 0000068-

25.2013.805.0148, pelos fatos e fundamentos jurídicos que doravante

passam a expor:

1. DOS FATOS.

Em 2012, o ora Paciente, Jadson Luiz dos Santos, ofereceu

“Memoriais Substitutivos” em favor de seu cliente, Sr. Ademilton Santos

Pereira, no qual teceu severas críticas, bem como alertou para uma possível

violação de suas prerrogativas funcionais pelo, até então, juiz da Comarca

de Laje, Dr. Rodrigo Alexandre Rissato.

Em sede de memoriais, o paciente destacou que foi tolhido das suas

prerrogativas funcionais quando estava patrocinando uma causa na vara do

supracitado magistrado. Consignou que o referido magistrado utilizou

expressões discriminatórias e racistas contra o ora paciente; negou recebê-

lo em seu gabinete, mesmo estando presente no fórum; proibiu o

recebimento da petição em que o paciente fazia requerimento e juntada aos

autos do processo em que patrocinava a causa; recusou-se, ainda, a ouvir

as testemunhas de defesa; e, por fim, disse ao paciente que estava

perdendo seu tempo, uma vez que o magistrado já teria sua convicção

formada, ou seja, não acolheria nenhum tipo de argumento, pois

condenaria o acusado a qualquer pretexto.

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Diante da postura combativa do causídico, o aludido magistrado

formalizou representação criminal no Ministério Público do Estado da Bahia,

apontando ao ora paciente a prática do crime de calúnia, por entender que

o patrono, na aludida peça defensiva, imputou, falsamente, a prática do

crime de injúria racial. Diante disso, o Ministério Público ofereceu denúncia

pela prática do crime tipificado no art. 138 c/c o art. 141, II, ambos do

Código Penal.

O paciente apresentou sua resposta à acusação requerendo sua

absolvição sumária, em razão da atipicidade da conduta, pois, conforme

será exposto doravante, além de não ter imputado fato criminoso ao Juiz,

restou evidente que não houve o dolo específico exigido para o tipo penal

em testilha (o animus caluniandi), mesmo porque sua intenção era, na

condição de advogado, defender os interesses dos seus constituídos, bem

como suas prerrogativas funcionais. Assim, no pior dos cenários, nada mais

fez – na pior das hipóteses - do que criticar a postura da representante da

magistratura (animus criticandi).

Para estadear sua súplica, juntou uma petição inicial de Habeas

Corpus, impetrado pelo Conselho Federal da OAB, em caso extremamente

semelhante ao seu, onde o Superior Tribunal de Justiça promoveu o

trancamento da ação penal, justamente, por atipicidade da conduta, devido

ter ficado evidente que não havia (como aqui não houve) a intenção de

caluniar magistrado ou membro do Ministério Público, apenas exercendo, o

advogado, seu munus profissional, defendendo, com vigor, os interesses de

seus clientes. Além disso, diversos outros julgamentos, inclusive do

Supremo Tribunal Federal, foram adunados à demanda, além de destacados

na resposta à acusação, corroborando o constrangimento ilegal causado

pela deflagração da referida ação penal.

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Todavia, mesmo nesse cenário de tipificação nebulosa, a autoridade

coatora, apontada para fins formais, entendeu em prosseguir com a ação

penal - em todos os seus termos -, designando a audiência para

oferecimento da suspensão condicional do processo para o dia 23 de maio

de 2014. O magistrado, todavia, entendeu que o benefício da suspensão

condicional do processo (art. 89 da Lei 9.099/95) não poderia ser concedido

ao paciente, por ausência de algum dos requisitos legais. Em sendo assim,

o referido juiz designou audiência de instrução para o dia 06 de junho de

2014.

Por tudo quanto o exposto e depois de um trabalho conjunto, a OAB-

BA vem a este conspícuo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia para

impetrar a presente ordem de Habeas Corpus, porque, AO PERMITIR O

PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL, O MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU ASSUMIU

A POSIÇÃO DE AUTORIDADE COATORA, haja vista ter consentido que

continuasse tramitando em desfavor do Paciente uma ação penal AJUIZADA

MEDIANTE UMA INICIAL QUE NARRA UMA CONDUTA INDISCUTIVELMENTE

ATÍPICA. E É NISSO QUE RESIDE O CONSTRANGIMENTO ILEGAL QUE ESTÁ SENDO

INFLIGIDO AO PACIENTE E QUE SE ESPERA VER CESSADO COM A CONCESSÃO DO

PRESENTE MANDAMUS.

2. DA ATIPICIADADE DA CONDUTA.

Do simples folheamento dos autos, nota-se que a decisão de

recebimento da peça de incoação deixou de proceder à absolvição sumária

do paciente, embora ausente a atipicidade da conduta, conforme impõe o

art. 397, III, do Código de Processo Penal.

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A historicidade da tipicidade penal mostra a necessidade de, antes do

prosseguimento da ação penal, percorrer as diversas etapas exigidas para

configuração do tipo. Evidentemente, à medida que se modifica o crime, um

plus de variáveis são inseridas ou excluídas, tudo conforme cada caso

concreto. Em epítome, se pode dizer que é indispensável à combinação da

tipicidade formal e material, a inexistência de causa que exclua tipicidade

(como, p.ex., o erro de tipo), a criação de um risco juridicamente

desaprovado e a realização desse risco; necessita-se de robustez do tipo

objetivo, bem como do tipo subjetivo (o dolo), não se olvidando de todas as

elementares que compõe a tipicidade do crime que se pretende processar

determinado cidadão, especialmente aqueles que são essenciais à

administração da justiça: os advogados.

Isso tudo porque, e sem nenhum truísmo, o processo penal, por si

só, já uma pena ao acusado. Mesmo diante de uma decisão judicial não

transitada em julgado, o processo já é considerado uma carga coercitiva ao

réu. Aliás, assinala Daniel Pastor1, que o processo já tem a sua própria

dimensão punitiva. Ou ainda, como consagrou Carnelutti2, citando Santo

Agostinho, o processo por si mesmo é uma tortura. Desta forma, o

prosseguimento de uma ação penal só deve ser admitido quando forem

satisfeitos todos os requisitos legais, sob pena de ser perpetrada uma grave

injustiça.

No caso em lume, verifica-se que há duas graves questões que

impedem a formação, ainda que precária, do tipo penal. Em primeiro plano,

porque o paciente não imputou fato definido como crime ao magistrado,

como exige o tipo penal de calúnia (art. 138 do Código Penal). Em segunda

1 PASTOR, Daniel R. Tensiones: ¿Derechos Fundamentales o persecución penal sin

limites?. Buenos Aires: Editores del Puerto, 2004, p. 85. 2 CARNELUTTI, Francesco. As misérias do processo penal. São Paulo: CONAM,

1995, p. 45/46.

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ótica, em razão de inexistir a presença de elementar imprescindível para

configuração da tipicidade: o dolo específico, quer se dizer, o animus

caluniandi. Com efeito, é o que cuida os pontos seguintes.

2.1. DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL DO ADVOGADO. NÃO

IMPUTAÇÃO DE FATO DEFINIDO COMO CRIME. ATIPICIDADE DA

CONDUTA DO PACIENTE.

Ab initio, na tipicidade, cumpre tecer algumas observações sobre o

exercício da advocacia, como instrumento essencial à administração da

justiça, bem como serviço público que exerce notória função social.

Diversos são os diplomas que reconhecem a importância e

indisponibilidade da advocacia como profissão que serve tanto à

administração da justiça quanto para manutenção e defesa dos princípios

democráticos, bem como dos demais valores que sustentam e servem de

alicerce para o Estado de Direito. Nesse sentido, assevera a Carta Magna,

em seu art. 133:

Art. 133. O advogado é indispensável à administração da

justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações

no exercício da profissão, nos limites da lei.

Na mesma linha da Constituição, a Lei Federal 8.906/94 (Estatuto da

Advocacia), em seu art. 2º, dispõe que:

Art. 2º O advogado é indispensável à administração da

justiça.

§ 1º No seu ministério privado, o advogado presta serviço

público e exerce função social.

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§ 2º No processo judicial, o advogado contribui, na

postulação de decisão favorável ao seu constituinte, ao

convencimento do julgador, e seus atos constituem

múnus público.

§ 3º No exercício da profissão, o advogado é inviolável por

seus atos e manifestações, nos limites desta lei.

Em sendo assim, denota-se que a atividade do advogado, como

profissional liberal, objetiva não somente lograr êxito no pleito do seu

constituinte, como também se obstina a defender a observância das leis,

impedir os arbítrios e tirania do Estado, assim como prezar pelo respeito a

valores caros do Estado Democrático de Direito. Foram esses os apegos que

moveram o ora paciente a formular, com alguma dose de indignação,

rispidez e ímpeto (que, data venia, o caso exigia), os “memoriais

substitutivos” que lhe custaram o processo-crime em comento, sem,

contudo, assacar contra a honra do magistrado, apenas levantando a

hipótese que houve possíveis irregularidades e expressões discriminatórias,

as quais – segundo sua consciência e conhecimento jurídico -

consubstanciavam violações ao direito, não podendo ser omisso,

principalmente por se tratar de processo crime, cujo bem jurídico em xeque

do seu constituído era a liberdade.

Dessa forma, forçoso demonstrar, de maneira técnica, que o nobre

causídico, ora paciente, galgava trazer esse fato para o processo com o

propósito de obter uma situação jurídica favorável ao seu constituinte, de

modo que fosse exercido algum controle sobre a atuação do juiz de direito,

enquanto membro do Poder Judiciário, porquanto este, conforme o paciente

sustentou em sua peça defensiva, no processo criminal nº 0000466-

06.2012.805.0148, violou sua dignidade pessoal, assim como diversas

prerrogativas funcionais que são caras aos advogados e que também

servem à preservação do direito de ampla defesa, como o direito de falar

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com o juiz, peticionar, ter suas testemunhas de defesa ouvidas em juízo,

entre outras. Não poderia, Excelências, calar-se diante dessa constatação

(objetiva). Como diria Sobral Pinto, um dos patronos da nossa classe, “a

advocacia não é profissão de covardes”.

O paciente se viu no dever de apontar as irregularidades observadas

na condução da ação penal presidida pelo aludido magistrado, até porque o

art. 1º, da Instrução Normativa nº 002/1012 da Corregedoria das Comarcas

do Interior, do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, proíbe atos

manifestadamente ilegais de magistrados do interior que publicavam

portarias, decretos e atos restringindo o acesso de advogados em suas

salas e gabinetes:

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Com efeito, foi obstado, a todo o momento o acompanhamento pleno

dos atos processuais que reputava relevantes para defesa de seu cliente, a

saber: foi negado o acesso ao gabinete do juiz, mesmo estando presente no

fórum; proibiu-se o recebimento da petição em que o paciente fazia

requerimento e juntada aos autos do processo em que patrocinava a causa

(um óbice ao direito de peticionar); recusou-se, ainda, a ouvir as

testemunhas de defesa; e, por fim, o paciente teve que ouvir que estava

perdendo seu tempo, uma vez que o magistrado já teria sua convicção e

não acolheria nenhum tipo de argumento, como se pouca (ou nenhuma)

importância tivesse a “mais bela das profissões jurídicas” (Voltaire).

Foi exatamente isso que o ora paciente sustentou na defesa dos seus

constituintes. Não há razão para a propositura de tal Ação Penal, tendo em

vista que estava em pleno exercício da sua atividade laboral, constando,

como é um direito e dever seu, a forma como estava sendo conduzido o

processo criminal de nº 0000466-06.2012.805.0148. ASSIM, O ORA

PACIENTE, ATRAVÉS DAS SUAS MANIFESTAÇÕES, NÃO REALIZOU A FIGURA TÍPICA

PREVISTA NO ART. 138 DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO.

Entendendo de modo contrário, estar-se-ia obstando o seu exercício

profissional, tendo em vista que todos os advogados não poderiam defender

com o mesmo ímpeto, e autonomia, os direitos dos seus constituintes, bem

como restaria estorvados de denunciar as violações, pelo Estado, das

normas existentes no ordenamento jurídico brasileiro. Se tal óbice fosse

imposto, o advogado, no exercício da sua profissão, estaria a todo o tempo

contido e com receio de sofrer alguma represália pelas suas palavras e atos,

sendo, ainda, o direito penal utilizado como instrumento para a prática

dessa coerção, tal qual a espada de Dâmocles pendendo sobre sua cabeça,

que, diante de qualquer deslize, poderia decepá-lo.

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Nesse sentido, faz-se mister trazer à baila um trecho da defesa

elaborada pelo ora paciente, de modo a desconstituir o alegado pelo

Parquet, o que demonstra a atipicidade da conduta, in verbis:

Em data de 17.08.2012, por volta das 13h45, quando visitou

pela primeira vez a Comarca de Laje, a fim de juntar

procuração para atuar no presente feito, o presente defensor

foi tratado com absoluta deselegância por parte do

presente Magistrado – uma vez que o mesmo queria

fechar o Fórum da Comarca de Laje por volta das 13h55 –

mesmo o defensor justificando que tinha viajado de

Salvador ao município de Laje e alegando urgência por

se tratar de réu preso, pedido indeferido pelo

Magistrado. (...) O juiz praticamente expulsou o presente

advogado do fórum alegando que mesmo tendo um

funcionário de plantão naquele momento – o presente

advogado não podia permanecer em nenhuma dependência

do fórum a partir das 14 horas, utilizando inclusive

expressões discriminatórias e racistas contra o

presente defensor, que não reagiu temendo represália

processual contra seu cliente.

No dia 20.08.2012, o i. Magistrado se negou a receber o

presente advogado em seu gabinete mesmo estando

na Comarca, segundo a serventuária Eliane Santos Bulhões,

o mesmo não podia atender porque estava despachando

processos da Vara Cível. (...)

Omissis

No dia 06.09.2012 novamente o ilustre Magistrado viola as

prerrogativas do presente advogado ao proibir o

recebimento da petição em que o presente DEFENSOR

faz devolução aos autos e faz requerimento da juntada

aos autos 000524-09.2012.805.0148 ao principal 0000466-

06.2012.805.0148 conforme requerido pelo defensor (...).

Omissis

Como se não bastassem todos esses absurdos perpetrados

pelo i. Magistrado em face do presente DEFENSOR, numa

atitude violadora de direitos constitucionalmente

consagrados, sobretudo, da presunção da inocência, do

devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, o

presente Magistrado, depois de ter regularmente intimado as

testemunhas de defesa, NUM GOLPE MORTAL CONTRA A

DEFESA, após ouvir todas as testemunhas de acusação, o i.

Magistrado disse para o presente defensor que não

ouviria nenhuma das testemunhas de defesa (...).

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Em verdade, conforme se pode observar do trecho acima, o paciente,

a todo o momento, destaca os abusos e violação às prerrogativas funcionais

dos advogados perpetradas pelo magistrado em questão, sendo que as

expressões discriminatórias e racistas proferidas por este são apenas

citadas, não tangenciando o cerne da questão que diz respeito, frise-se, às

ilegalidades e desrespeito às prerrogativas advocatícias. Não ofendeu o

Magistrado, mas fez uma crítica ríspida. Há um abismo que separa sua

conduta daquelas que são caluniosas.

Inclusive, em caso de extrema semelhança, o Tribunal de Justiça do

Estado da Bahia - a pouco mais de um mês - concedeu o pedido liminar, em

Habeas Corpus, formulado por outro advogado, também impetrado pela

OAB da Bahia, por conduto da sua Procuradoria-Geral das Prerrogativas,

sobrestando, provisoriamente, a audiência de instrução até o julgamento do

mérito do writ, o qual cumpre transcrever:

(...)

Estabelece o art. 647 do CPP que: "Dar-se-á habeas corpus sempre

que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou

coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição

disciplinar". Por sua vez, disciplina o art. 648 do mesmo Diploma

Processual Penal, "A coação considerar-se-á ilegal: I - quando não

houver justa causa; II - quando alguém estiver preso por mais tempo

do que determina a lei; III - quando quem ordenar a coação não tiver

competência para fazê-lo; IV - quando houver cessado o motivo que

autorizou a coação; V - quando não for alguém admitido a prestar

fiança, nos casos em que a lei a autoriza; VI - quando o processo for

manifestamente nulo; VII - quando extinta a punibilidade." No caso

presente, da apreciação dos documentos acostados à impetração e

em análise perfunctória das alegações expendidas pela entidade

impetrante, admito presentes os requisitos para a concessão da

liminar pretendida, para determinar a imediata suspensão da

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audiência designada pela autoridade impetrada, para o dia

15/05/14, às 14:30h conforme documento de fl.204 destes autos,

até o desfecho deste writ. (...) (Processo: 0006885-

30.2014.8.05.0000. Habeas Corpus. Distribuição: Segunda Camara

Criminal - Segunda Turma. Relator: OSVALDO DE ALMEIDA

BOMFIM. Data: 13/05/2014)

Pouco tempo depois, cumprindo o rito do Habeas, na análise da

referida ação mandamental, O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA

EMITIU PARECER FAVORÁVEL À CONCESSÃO DA ORDEM (documento em anexo)

com o consequente trancamento do processo crime, justamente por

reconhecer a plausibilidade dos pedidos formulados pela OAB da Bahia. É

esse, exatamente, o caso sob lume.

Não por acaso, a jurisprudência adverte:

“Não obstante a aspereza das palavras tecidas pelo

advogado em petição, não há como se concluir pela

intenção de imputar falsamente qualquer prática de

crime ao Magistrado. Pedido de Habeas Corpus deferido,

para trancar a Ação Penal, por ausência de justa causa” (HC

18.947/SP, rel. Min. EDSON VIDIGAL, DJ 29.4.2002).

Como sói dizer Magalhães Noronha, “não basta, pois, que as palavras

sejam "aptas" a ofender, é mister que sejam proferidas com esse fim"3.

Ademais, é cediço que para configuração do crime de calúnia, o

agente deve imputar fato criminoso determinado, descrever as

circunstâncias mínimas que ocorreram o fato, tecer considerações

3 NORONHA, Magalhães. Direito Penal. Vol. II. nº 350. 14ª ed. São Paulo: Saraiva,

1978, p. 126.

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temporais e do modo de execução do crime. A IMPUTAÇÃO DE CRIME, PARA

CONFIGURAÇÃO DA CALÚNIA, NÃO PODE SE DAR DE FORMA VAGA, APENAS

AFIRMANDO QUE TAL INDIVÍDUO É “LADRÃO” OU “ASSASSINO”, ESSE FATO, AO

REVÉS, CONSTITUIRIA O CRIME DE INJÚRIA, O QUAL É ALBERGADO PELA

IMUNIDADE PROFISSIONAL CONFERIDA AOS ADVOGADOS, PREVISTA, DENTRE

OUTROS DIPLOMAS, NO ART. 142, I, DO CP. Essa é a lição de Cezar Roberto

Bitencourt, a qual se torna imperiosa transcrever:

“A imputação deve referir-se a fato determinado, sendo

insuficiente, por exemplo, afirmar que a vítima furtou.

Indispensável individualizar as circunstâncias

identificadoras do fato, embora não sejam necessários

detalhes minuciosos que, muitas vezes, somente a própria

investigação pode conseguir.” (BITENCOURT, Cezar Roberto.

Tratado de Direito Penal, Vol. II, 9ª Ed. Saraiva: São Paulo.

Pg. 293).

Esses ensinamentos encontram-se, ainda, em sintonia com a posição

do Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Pela pertinência, impõe-se a

transcrição da ementa verbum ad verbum:

TRF-2 - APELAÇÃO CRIMINAL ACR 200751018079810 RJ

2007.51.01.807981-0 (TRF-2)

Data de publicação: 23/08/2010

Ementa: DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME

CONTRA A HONRA DE INTEGRANTES DESTE TRIBUNAL.

ARGUIÇÃO DE SUSPEIÇÃO DE TODOS OS MEMBROS DA

CORTE FUNDADA EM SUPOSTO CORPORATIVISMO.

DESCABIMENTO. CONDUTA PROCESSUAL REPROVÁVEL. RÉU

QUE ADVOGA EM CAUSA PRÓPRIA. INTIMAÇÃO PELA

IMPRENSA OFICIAL PARA O COMPARECIMENTO A ATO DO

PROCESSO. VALIDADE. EMENDATIO LIBELLI.

ENQUADRAMENTO DOS FATOS NA FIGURA TÍPICA DA

INJÚRIA. POSSIBILIDADE EM GRAU DE RECURSO. I – A

suspeição somente pode ser suscitada por meio de exceção e

em face da pessoa da autoridade judiciária, membro do

Ministério Público, servidores ou auxiliares da justiça, jamais

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contra o órgão ao qual pertencem, por absoluta ausência de

previsão legal. II – É válida a intimação do réu para

comparecimento à audiência de oitiva dos ofendidos por meio

da imprensa oficial, se advoga ele nos autos em causa

própria. III - Inexiste óbice à emendatio libelli em grau de

apelação, desde que observado o disposto no art. 617 do

Código de Processo Penal , já que o réu se defende dos fatos

objetivamente descritos na denúncia e não da capitulação

jurídica que lhes é dada pela acusação. IV - Para que o fato

imputado possa constituir calúnia, indispensável,

dentre outros requisitos, que haja a imputação de fato

determinado qualificado como crime, não se prestando

para tal fim meras imputações vagas. V - A imunidade

profissional prevista no artigo 133 da Constituição Federal

não é absoluta, encontra limites na lei e não acoberta as

manifestações excessivas e desnecessárias que extrapolem

os limites da discussão da causa. VI – Recurso parcialmente

provido

No mesmo sentido:

EMENTA

HABEAS CORPUS . PENAL. CALÚNIA, INJÚRIA E DIFAMAÇÃO.

CRIMES QUE TERIAM SIDO PRATICADOS POR ADVOGADO

NA ELABORAÇÃO DAS RAZÕES DE APELAÇÃO. JUIZ DE

DIREITO. SUPOSTA VÍTIMA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA.

AFERIÇÃO. POSSIBILIDADE. QUEIXA-CRIME LASTREADA

APENAS NA PEÇA PROCESSUAL. DILAÇÃO PROBATÓRIA.

DESNECESSIDADE. FALTA DE JUSTA CAUSA CONFIGURADA.

ATIPICIDADE DAS CONDUTAS DESCRITAS NA PEÇA

ACUSATÓRIA. IMUNIDADE PROFISSIONAL (INJÚRIA E

DIFAMAÇÃO). ART. 7º, § 2º, LEI N. 8.906/1994.

Omissis

2. Hipótese concreta em que os crimes teriam sido praticados

pelo paciente, que é procurador municipal, ao recorrer de

sentença proferida pelo juiz – ora querelante –, que, em

substituição em outro Juízo, acolheu os embargos

declaratórios e atribuiu-lhes efeitos infringentes para

conceder a segurança, modificando o decisum da juíza

titular, que a havia denegado em mandado de segurança no

qual figurava como impetrante a esposa de funcionário do

gabinete do magistrado-querelante.

3. Nos crimes contra a honra, é imprescindível a

demonstração da intenção de ofender ou, no caso da

calúnia, de se imputar a prática de crime.

4. A informação de que a impetrante do mandado de

segurança era esposa de servidor do gabinete do juiz-

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querelante foi trazida pelo paciente no contexto da

defesa elaborada em favor de seu cliente e de modo

objetivo, não se extraindo dela a imputação de prática

de crime pelo magistrado.

5. A configuração do delito de calúnia exige a

imputação expressa de prática de crime, cuja falsidade

é de conhecimento daquele que faz a assertiva.

Omissis

(Documento: 1159966 - Inteiro Teor do Acórdão - Site

certificado - DJe: 06/08/2012; HABEAS CORPUS Nº 213.583

- MG (2011/0165999-7)RELATOR : MINISTRO SEBASTIÃO

REIS JÚNIOR)

Pelo exposto, resta demonstrado que o ora paciente não imputou fato

determinado como crime ao representante, não tendo, portanto, alcançado,

pelo menos, um dos elementos normativos essenciais à realização da figura

típica prevista no art. 138 do Código Penal. Justamente por isso, pugna pelo

trancamento da ação penal, já que o paciente não imputou ao Juiz fato

definido como crime, com todas as miudezas que são exigidas para

configuração dessa modalidade delitiva.

2.2. AUSÊNCIA DE ANIMUS CALUNIANDI. INEXISTÊNCIA DE

DOLO ESPECÍFICO. ELEMENTAR DO TIPO. ATIPICIDADE DA

CONDUTA.

Fosse isso pouco, a atipicidade pela não imputação de fato

determinado, qualificado como crime, percebe-se, outrossim, que o tipo

penal padece, também, por ausência do dolo específico para sua

configuração. Nessa suada, depreende-se que a conduta do ora paciente é

atípica pela ausência de outro elemento estrutural do crime, qual seja: o

animus caluniandi.

Logo, não resta configurado, no presente caso, o elemento subjetivo

geral que compõe a estrutura do crime de calúnia (a intenção de caluniar),

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que é constituído pela vontade consciente de caluniar a vítima, imputando-

lhe prática de fato definido como crime, de que o sabe inocente. É DIZER, O

ESPECIAL FIM DE AGIR - QUE É CAUSAR DANO À HONRA OBJETIVA DE OUTREM –

PRESSUPÕE A INTENÇÃO DE CALUNIAR. NÃO HÁ DE SE FALAR EM CRIME DE

CALÚNIA, DE ANIMUS CALUNIANDI, SE O AGENTE TEM A INTENÇÃO ÚNICA E

EXCLUSIVA DE DEFENDER OS INTERESSES DOS SEUS CONSTITUINTES. Esse é o

ensinamento do Professor Cezar Roberto Bitencourt, a quem novamente se

socorre:

“A calúnia exige, afinal, o especial fim de caluniar, a intenção

de ofender, a vontade de denegrir, o desejo de atingir a

honra do ofendido, que, se não existir, não tipificará o crime.

Inegavelmente, os crimes contra a honra não se

configuram sem o propósito de ofender, que é o

elemento subjetivo especial do injusto. Assim, é

insuficiente que as palavras proferidas sejam idôneas para

ofender; faz-se necessário que sejam proferidas com esse

fim...” (BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito

Penal, Vol. II, 9ª Ed. Saraiva: São Paulo. Pg. 297).

Destarte, infere-se dos ensinamentos, a intenção de caluniar deve

estar presente para configuração do tipo penal, sendo que tal fato não se

observa na peça defensiva do ora paciente. Este queria, tão somente,

defender os interesses e os direitos do seu constituinte, direitos esses que

estavam sendo aviltados diante da condução de um processo criminal sem a

observância do contraditório, da ampla defesa e das prerrogativas

funcionais dos advogados. Assim, o que se busca demonstrar é que, a

despeito da rispidez da defesa, o ora paciente atuou no exercício da

profissão e em defesa dos seu cliente, em hialino animus defendendi ou, no

pior dos cenários, em animus criticandi.

Acrescente-se que tal fato ocorrera no silêncio de um processo penal,

o que corrobora a ausência de dolo específico para prática delitiva. Não se

pode olvidar que todos os elementos normativos do tipo são essenciais para

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que a conduta possa ser considera típica. Faltando-lhe qualquer um dos

seus elementos, a tipicidade cai por terra e cria obstáculos para análise das

demais questões.

Malgrado pareça nítida a situação de constrangimento a que está

submetido o ora paciente, tendo em vista a atipicidade da conduta e a

exclusiva intenção de defender seus constituintes, no exercício do seu

mister, é comum que essa circunstância seja submetida à análise do Poder

Judiciário, que, acertadamente, vem decidindo, quando já não é feito nas

instâncias ordinárias, pelo trancamento da ação penal, consoante decisão

da Corte da Cidadania, abaixo destacada in litteris:

STJ - AÇÃO PENAL APn 564 MT 2008/0245452-5 (STJ)

Data de publicação: 03/06/2011

Ementa: PENAL. PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL PÚBLICA

CONDICIONADA ÀREPRESENTAÇÃO. CRIMES CONTRA A

HONRA. CALÚNIA. PEÇA DE DEFESA.ANIMUS DEFENDENDI.

REPRESENTAÇÃO CONTRA A VÍTIMA. ANIMUS

NARRANDI.ADVOGADO. EXERCÍCIO DA PROFISSÃO.

AUSÊNCIA DO ANIMUS CALUNIANDI.ATIPICIDADE DA

CONDUTA. INJÚRIA. PRESCRIÇÃO. EXTINÇÃO

DAPUNIBILIDADE. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. 1. Os crimes

contra a honra exigem, além do dolo genérico, o elemento

subjetivo especial do tipo consubstanciado no propósito de

ofender a honra da vítima. 2. A calúnia exige a presença

concomitante da imputação de fato determinado qualificado

como crime; da falsidade da imputação; e do elemento

subjetivo, que é o animus caluniandi. 3. O propósito de

esclarecimento e de defesa das acusações

anteriormente sofridas configura o animus defendendi

e exclui a calúnia. 4. A representação dirigida contra a

vítima com o propósito de informar possíveis

irregularidades, sem a intenção de ofender, caracteriza

o animus narrandi e afasta o tipo subjetivo nos crimes

contra a honra. 5. A advocacia constitui um múnus público

e goza de imunidade -excluída em caso de evidente abuso -

pois o advogado, no exercício do seu mister, necessita ter

ampla liberdade para analisar todos os ângulos da questão

em litígio e emitir juízos de valor na defesa do seu cliente. A

IMPUTAÇÃO A ALGUÉM DE FATO DEFINIDO COMO

CRIME NÃO CONFIGURA A CALÚNIA SE AUSENTE A

INTENÇÃO DE OFENDER E O ATO FOR MOTIVADO

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APENAS PELA DEFESA DO SEU CONSTITUINTE. 6. O

lapso prescricional da suposta injúria praticada antes da Lei

n. 12.234/2010 é de dois anos.7. Rejeição da denúncia

quanto ao crime de calúnia; declaração de extinção da

punibilidade quanto à injúria, ante a prescrição da pretensão

punitiva.

Encontrado em: : 00006 CRIME CONTRA HONRA - CALÚNIA -

EXPRESSÕES OFENSIVAS EM PEÇA PROCESSUAL - ANIMUS

DEFENDENDI

Na mesma linha:

STJ - HABEAS CORPUS HC 113000 RS 2008/0174551-8

Data de publicação: 15/06/2009

Ementa: HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A HONRA.

CALÚNIA PROFERIDA POR ADVOGADA CONTRA SERVIDOR

PÚBLICO NO CURSO DE PROCESSO PREVIDENCIÁRIO.

TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. DESNECESSIDADE DE

PROFUNDA ANÁLISE DA PROVA PARA SE CONSTATAR A

INEXISTÊNCIA DE DOLO DA AGENTE. ANIMUS NARRANDI

E/OU DEFENDENDI EVIDENCIADO. ATIPICIDADE DO ATO

IMPUTADO À PACIENTE. FALTA DE JUSTA CAUSA À

PERSECUÇÃO PENAL. ORDEM CONCEDIDA. 1. O trancamento

de ação penal, em sede de habeas corpus, somente deve ser

acolhido se restar, de forma indubitável, a ocorrência de

circunstância extintiva da punibilidade, de ausência de

indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito e

ainda de atipicidade da conduta. 2. Se os fatos que deram

azo ao processo-crime estão impregnados de animus

narrandi e/ou defendendi e apresentam-se em total

consonância com o relatado pelos clientes da paciente,

tanto nas declarações que prestaram, quanto nos

depoimentos de suas testemunhas perante a

autoridade judicial, resta evidenciada a ausência de

dolo por parte da advogada, que simplesmente agiu no

exercício regular de seu direito, que era defender seus

constituintes. 3. Não pode ser imputado o delito de calúnia

à paciente que apenas cumpriu o seu dever de ofício, ao

indicar atos que, se falsos, decorreram de depoimentos

prestados por terceiros, pois a advocacia constitui um

múnus público e faz parte da administração da justiça,

não devendo seus representantes passar pela

vexatória situação de envolvimento indevido em

processos criminais, em forçada colocação de autoria de

crime contra a honra, decorrente de depoimentos de

testemunhas e clientes. 4. Ordem concedida para trancar a

ação penal

De igual modo, o Supremo Tribunal Federal assim se posiciona:

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“CRIME CONTRA A HONRA – Calúnia – Descaracterização –

Afirmação por advogado de que determinado juiz agiu com

parcialidade – Imputação que não caracteriza a prática de

prevaricação, pois imprescindível que na denúncia por este

delito conste onde se encontra o dolo específico ou o especial

fim de agir do tipo.

Ementa da Redação: NÃO CARACTERIZA IMPUTAÇÃO DA

PRÁTICA DE PREVARICAÇÃO, APTA A CONFIGURAR

CALÚNIA, A AFIRMAÇÃO POR ADVOGADO DE QUE

DETERMINADO JUIZ AGIU COM PARCIALIDADE, pois é

impossível saber se ao Magistrado se atribuiu retardamento,

omissão ou comissão de ato de ofício, modalidade diversas

de realização do crime, cuja identificação, em cada caso, é

exigível, uma vez que é imprescindível que na denúncia por

prevaricação conste onde exatamente se encontra o dolo

específico, ou o especial fim de agir que a figura do tipo

exige, ou seja, a que tipo de sentimento pessoal teria cedido

o suposto agente do delito funcional cogitado” (STF, Rel. Min.

SEPÚLVEDA PERTENCE, RT 766/551).

No corpo do supracitado aresto, destaca-se:

“... é da jurisprudência reiterada do Tribunal SER

IMPRESCINDÍVEL À APTIDÃO DE QUEM DENUNCIA

POR PREVARICAÇÃO QUE NELA SE DECLINE

CONCRETAMENTE ONDE SE ENCONTRARIA O DOLO

ESPECÍFICO ou especial fim de agir que a figura reclama,

ou seja, a que INTERESSE OU SENTIMENTO PESSOAL

TERIA CEDIDO O SUPOSTO AGENTE DO DELITO

FUNCIONAL COGITADO...”(RT 766/551).

Pontofinalizando-se, anela-se, caso não prospere o argumento

anterior, o trancamento da ação penal pela ausência de dolo específico na

conduta do paciente (ou seja, animus caluniandi) e a sua completa e

consequente atipicidade, porquanto resta comprovado que o paciente atuou

exclusivamente na defesa de seu constituinte, imbuído do animus

defendendi, ou, em remota hipótese, do animus criticandi, insuficientes

para preencher as exigências da tipicidade - em matéria penal – do caso em

apreço.

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3. DA NECESSIDADE DE CONCESSÃO DA LIMINAR.

A JURISPRUDÊNCIA DAS CORTES SUPERIORES TEM SIDO RECORRENTES

NO SENTIDO DA CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR EM HABEAS CORPUS, sempre

que se afiguram presentes os requisitos legais. Assim, aliás, se deu no HC

nº 98.631-5 BA (STF. Rel. Dr. Min. Carlos Britto, j. em 02/06/2009), HC Nº

213.583 - MG (STJ. Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. em 26/06/2012),

além de inúmeros outros.

No caso dos autos, INDISPENSÁVEL A CONCESSÃO DE LIMINAR, EM

PRIMEIRO PLANO, DETERMINANDO O SOBRESTAMENTO PROVISÓRIO DO FEITO,

ao menos, ATÉ QUE SE JULGUE DEFINITIVAMENTE O MÉRITO DA PRESENTE

IMPETRAÇÃO. Isto porque, aguardar toda uma cognição exauriente e, por

conseguinte, a tutela definitiva, é imputar um ônus insuportável ao

paciente, já que a referida tutela poderá vir a destempo para garantir o

exercício do direito alegado, pois diversos atos processuais,

desnecessariamente, podem ser praticados no curso da supracitada ação

penal.

Imperioso destacar – como já suscitado alhures – que o Tribunal de

Justiça do Estado da Bahia, em caso de extrema semelhança, concedeu o

pedido liminar formulado por outro paciente, em Habeas Corpus também

impetrado pela OAB da Bahia, sobrestando, provisoriamente, a audiência de

instrução até o julgamento do mérito do writ. (vide: Processo: 0006885-

30.2014.8.05.0000. Habeas Corpus. Relator: OSVALDO DE ALMEIDA

BOMFIM).

De outro lado, os vários documentos que seguem acostados e a

descrição do vício que acomete o feito, bem como a hialina atipicidade da

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conduta, já indicam a verossimilhança das alegações lançadas em favor do

Paciente – fumus boni iuris.

O periculum in mora resta configurado, porquanto diversos atos

processuais, durante o curso do julgamento deste Habeas Corpus, podem

ser determinados em prejuízo ao paciente (inclusive uma sentença penal

condenatória, uma vez que os documentos pré-constituídos em anexo

demonstram que a instrução já foi concluída), que se vê processado,

conforme exaustivamente já abordado, por um fato completamente atípico.

De outro modo, caso o entendimento desta corte seja pela não concessão

da ordem, na apreciação do mérito, nenhum prejuízo será causado e a ação

penal retomará o seu curso.

Por todo o exposto e ante a presença dos seus pressupostos

autorizadores, requerem os Impetrantes que seja concedida a medida

liminar suplicada, determinado a suspensão da mencionada ação penal

(processo de n° 0000068-25.2013.805.0148, em curso na Comarca de

Amargosa - Bahia), determinando o sobrestamento do feito até o

julgamento final desta ação constitucional.

4. DOS PEDIDOS.

Tabuladas tais considerações, requer os Impetrantes que seja

concedida a medida liminar, com a provisória suspensão da ação penal, até

o julgamento definitivo do writ e, no mérito, que seja determinado o

TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL (TOMBADA SOB O Nº 0000068-

25.2013.805.0148, EM TRÂMITE NA COMARCA DE AMARGOSA – BAHIA)

com a concessão da ordem, em razão da nítida atipicidade da conduta do

paciente.

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TERMOS EM QUE,

PEDEM DEFERIMENTO.

Salvador, Bahia, 11 de Junho de 2014.

FERNANDO SANTANA ROCHA

Advogado e Conselheiro Federal da OAB

GUSTAVO AMORIM ARAÚJO

Advogado e Procurador-Geral das Prerrogativas da OAB-BA

LUIZ GABRIEL BATISTA NEVES

Advogado e Presidente do Conselho Consultivo dos Jovens Advogados da

OAB-BA