História Oral do CEPED Vivaldo Barbosa - FGV DIREITO...

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1 1 Fundação Getúlio Vargas Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas (FGV Direito Rio) Projeto: História Oral do CEPED Entrevistado: Vivaldo Barbosa Local: Rio de Janeiro/RJ Entrevistadores: Gabriel Lacerda, Tânia Abrão Rangel e Camilla Duarte Transcrição: Joana Medrado Data da transcrição: Término: 26 de agosto de 2010 Conferida por: Raphael Figueiredo Data da Conferência: 18.10.2010 Entrevista: 12.11.2009 T.R. – Rio de janeiro, 12 de novembro de 2009, Projeto História Oral do CEPED, nós vamos entrevistar hoje o dr. Vivaldo Vieira Barbosa, estão presentes: o professor Gabriel Lacerda, Camilla Duarte e Tania Rangel. Boa tarde professor, primeiro agradecer pela disponibilidade de estar

Transcript of História Oral do CEPED Vivaldo Barbosa - FGV DIREITO...

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Fundação Getúlio Vargas

Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getulio Vargas (FGV Direito Rio)

Projeto: História Oral do CEPED

Entrevistado: Vivaldo Barbosa

Local: Rio de Janeiro/RJ

Entrevistadores: Gabriel Lacerda, Tânia Abrão Rangel e Camilla Duarte

Transcrição: Joana Medrado

Data da transcrição: Término: 26 de agosto de 2010

Conferida por: Raphael Figueiredo

Data da Conferência: 18.10.2010

Entrevista: 12.11.2009

T.R. – Rio de janeiro, 12 de novembro de 2009, Projeto História Oral do

CEPED, nós vamos entrevistar hoje o dr. Vivaldo Vieira Barbosa, estão

presentes: o professor Gabriel Lacerda, Camilla Duarte e Tania Rangel.

Boa tarde professor, primeiro agradecer pela disponibilidade de estar

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aqui concedendo para a gente essa entrevista, a gente gostaria que no

primeiro momento o senhor se identificasse, falasse um pouco a seu

respeito, então os dados gerais, o nome completo, idade, formação e

como é que chega até o CEPED.

G.L. – E um breve CV também, não é?

T.R. – É, é.

G.L. – Breve CV que está na internet, mas...

Eu acho que àquela época o método cepediano era total novidade, era

realmente um contraponto com relação à tendência do ensino à época. E

hoje em dia é absolutamente corriqueiro e trivial. Eu encontrei, a minha

vida inteira, desde então, especialmente nos últimos anos, advogados

formados nessa linha que nunca foram alunos do CEPED.

Frequentemente eu perguntava, porque eu os achava tão cepedianos e na

verdade nunca tinham sido alunos do CEPED, de modo que a sensação que

eu tenho é de que a nova forma de raciocínio jurídico felizmente se

disseminou como uma tendência da cultura jurídica também do país hoje

em dia.

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V.B. – Tudo bem. Eu que agradeço a oportunidade de estar aqui com

vocês, voltar aqui à Fundação Getúlio Vargas, a oportunidade de

conversar sobre o CEPED O CEPED realmente foi uma experiência

extraordinária no país, não se repetiu e eu acho que não vai se repetir,

de tão extraordinária que foi, um momento muito especial, espetacular

no estudo do Direito e do processo de ensino. Eu realmente estou muito

feliz por estar aqui conversando e honrado pelo convite de estar com

vocês aqui. Meu nome é Vivaldo Vieira Barbosa, nome completo, 67

anos, nasci em 1942. Eu fiz o curso de Direito na UERJ e, quando eu

terminava o curso de Direito, em 66, eu tive notícia de que no ano

seguinte, em 67, o CEPED estaria fazendo um curso para advogados de

empresa, eu, então, pedi apoio ao professor Caio Tácito, que era diretor

do CEPED e diretor da Faculdade onde estudei.

G.L. – Reitor.

V.B. – Acho que na época eu não sei se ele era reitor não, ou já era

reitor?

G.L. – Foi, foi.

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V.B. – Perfeito, na minha lembrança... eu sei que diretor...

G.L. – Eu não posso falar na entrevista, tirar isso, eu não posso me meter.

V.B. – [riso] Mas é que sua lembrança é boa.

G.L. – Não, mas eu não posso, elas brigam comigo, porque eu interfiro.

[riso]

T.R. – Não, mas isso aí pode.

G.L. – Tem razão, tem razão.

V.B. – É que eu estava na dúvida, não sabia se já era reitor ou diretor,

mas quando ele era o diretor da faculdade, eu fui presidente do

diretório acadêmico, então fiz relação pessoal com ele. O Arnoldo Wald

também era professor lá, a gente não falava UERJ na época, falava

Catete, era a faculdade do Catete, a faculdade de Direito. E o Arnold

Wald era também professor do CEPED, pedi ajuda a ele que queria me

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matricular, então fiz o curso do CEPED em 67, depois de concluir a UERJ,

em 66. Depois do CEPED, eu fui trabalhar como advogado de empresa,

um pouco colocando em prática o aprendizado aqui no CEPED, depois

eu tive oportunidade de...

G.L. – Qual empresa foi?

V.B. – Ecisa engenharia.

G.L. – A Ecisa, tá.

V.B. – Depois, vagou aqui o cargo de secretário executivo do CEPED.

Inicialmente havia sido – vocês já devem ter tudo isso aí levantado –

Venâncio, depois do Venâncio, foi o Magella...

G.L. – Ah, você veio depois do Magella?

V.B. – Vim depois do Magella. Quando o Magella saiu, em conversas aqui,

eu de vez em quando estava aqui frequentando aulas, assistindo aulas

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novamente, o Magella disse que estava saindo e me indagou se eu não

queria assumir as funções dele e eu mais do que depressa aceitei.

T.R. – Isso foi em que ano mais ou menos?

V.B – Isso foi em 70, início de 70.

G.L. – Você foi o último diretor.

V.B. – Fui o último.

G.L. – Agora, engraçado, na minha cabeça eu estava achando que

primeiro veio o Magella, depois veio você.

V.B. – Foi isso.

G.L. – O Magella, você sabe que o Magella... parenteses... eu sei porque eu

liguei para ele, achei o telefone dele e ele estava com um problema de

saúde, eu não sei como é que ele está.

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V.B. – Não, eu não tenho contato com ele, não.

G.L. – Você não tem contato com ele não, não é?

V.B. – Eu não sei se lá na ICOMI, na antiga ICOMI localizam...

G.L. – Não, eu tenho o telefone dele, da casa dele, já localizei, eu quero

saber da saúde dele.

V.B. – Ah, tá, eu não tenho também nenhuma notícia.

G.L. – Se eu já posso entrevistá-lo. Então você sucedeu ao Magella em

70?

V.B. – Início de 70, fui escolhido acho que em janeiro, eu já participei dos

trabalhos do curso de 1970.

T.R. – E que trabalhos eram esses?

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V.B. – Fiquei no CEPED em 70, 71 e em 72, quando saí em julho, pois em

agosto eu já estava nos Estados Unidos para meu mestrado. A função de

Secretário Executivo era essa mesma, não era professor, eu não era

professor. Tinha o corpo de professores, que você já tem o quadro todo

aí, que era o professor Lamy, Leoni, o Gabriel, o Caio Tácito, outros

professores eram da EPGE, da Escola de Pós-Graduação de Economia,

que davam aulas de economia e contabilidade. No primeiro ano foi o

Mario Henrique Simonsen, depois o Roberto Jefferson...

G.L. – Roberto Jefferson não, o Augusto Jeferson. [riso]

V.B. – O Augusto Jeferson, Luis Salomão, um outro que eu me esqueço o

nome, depois ele foi Secrteário Executivo do Ministério da Fazenda

quando o Dornelles foi ministro, agora está me fugindo o nome dele...foi

professor da área de economia representando a EPGE, no curso de pós-

graduação, no curso de advocacia de empresa. Porque como o CEPED

era da UERJ, mas tinha um convenio com a Fundação Getúlio Vargas:

esta provia as instalações e a EPGE provia o CEPED das matérias

econômicas e contábeis, o pessoal vinha da EPGE. E neste ano de 70, e

nos subseqüentes. Creio que o nome dele eera Sebastião Vidal.

G.L. – Mas você já tinha ido para Harvard quando você...

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V.B. – Não.

G.L. – Não? Depois que você foi. Ah!

V.B. – Primeiro, eu vim trabalhar aqui no CEPED... eu, estando aqui, é

que eu fui para Harvard.

G.L. – Ah, ta.

V.B. – A função de Secretário Executivo era dar apoio ao corpo de

professores, todo apoio possível, porque o curso, ele introduziu na

metodologia do ensino jurídico a produção de materiais pelos

professores e a distribuição desses materiais previamente. Então, tinha

toda uma logística executiva de você fazer chegar esse material antes

das aulas para que os alunos lessem o material antes das aulas.

T.R. – Com quanto tempo de antecedência mais ou menos? Uma

semana...

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V.B. – Ah, era geralmente isso. E tinha um certo conforto de que isso

podia ser programado, o curso também já não era o primeiro, 1970, o

curso foi em 67, 68, 69, foi o quarto curso em 1970. Então já tinham

materiais bem consolidados, tinham matérias novas, mas tinha

materiais bem consolidados, de maneira que já era possível a gente

reproduzir os materiais e fazer chegar com essa antecedência, no

mínimo de uma semana nas mãos dos alunos.

T.R. – As matérias basicamente eram quais?

V.B. – Eram Sociedades Anônimas, que se chamavae Grande Empresa, o

Direito da Grande Empresa, acho que o nome era esse, mas basicamente

se estudava sociedades anônimas.

T.R. – E aí, quem dava era o Lamy?

V.B. – O Lamy e o Lobo. O Lobo, o primeiro nome do Lobo, é....?

G.L. – Carlos Augusto da Silveira.

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V.B. – Carlos Augusto da Silveira Lobo.

G.L. – Já está on record.

V.B. – É Carlos Augusto da Silveira Lobo, ele é que ajudava mais o Lamy

a dar essa matéria. E, de vez em quando, um ex-aluno era pinçado para

dar uma matéria específica, desse tema de sociedades anônimas, alguém

que já tinha estudado nos Estados Unidos, alguém que trabalhava, por

exemplo no Banco Central, ou trabalhava em alguma outra grande

empresa era puxado, convidado para dar alguma matéria e até produzia

material, trazia material específico.

T.R. – Você lembra de alguém assim?

V.B. – [silêncio] Eu posso até ter em casa materiais destes ex-alunos...

Rubens, Rubens...

G.L. – Rubens Paulo Torres.

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V.B. – Rubens Paulo Torres, ele veio dar aula. O Bruno, acho que o Bruno

Silveira também.

G.L. – É, o Bruno morreu já. Morreu acho que ano passado, ou esse ano.

V.B. – Eu não sabia não.

G.L. – Sabia não? Ele lutou anos e anos com câncer, eu acompanhei de

perto a coisa toda, eu gostava muito do Bruno.

V.B. – Perdi contato. É, o Bruno deu aulas, porque o Bruno também tinha

ido fazer curso nos Estados Unidos. O Joaquim Falcão deu aulas,

também tinha sido aluno e tinha ido fazer curso nos Estados Unidos, deu

aulas. Tudo era essa matéria chamada Grande Empresa, o Direito da

Grande Empresa, que era sociedades anônimas os problemas de grande

empresa no conjunto. A área Tributária foi o Leoni, Carlos Leoni e o

Gabriel. Direito Público, Direito Administrativo era o Caio Tácito.

T.R. – O Caio, ele dava aula sozinho, ou tinha mais alguém que ajudava?

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V.B. – Ele era mais sozinho, não era uma quantidade grande de aulas, era

uma quantidade menor, porque a temática realmente dele era mais

Direito Público, Direito Administrativo, a temática do CEPED não era

tanto na área pública. Neste ano, eu creio que já não mais deu aula o

Arnoldo Wald. O Arnoldo Wald deu aula anteriormente e até a matéria

que ele concentrava era o BNH, as novas regras jurídicas do sistema

financeiro da habitação, mas eu em 70 e 71. Ele já não deu mais aulas

em 72.

G.L. – O Gustavo Leite deu aula, que você se lembra? Que foi

desembargador?

V.B. – Não estou me lembrando, não.

G.L. – Não se lembra não.

V.B. – Lembro dele, mas não lembro dele estar dando aula não.

T.R. – E aí, depois que o Wald sai dessa matéria sobre o sistema

financeiro da habitação, quem que entra? Ou a matéria...

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V.B. – Eu acho que a matéria caiu. Acho que não tinha maior... não sei se

perdeu o interesse...

T.R. – E aí, entra quem?

V.B. – A coisa parou de ter novidade nessa área, eu creio que a matéria

caiu, não subsistiu não.

G.L. – Agora, Vivaldo, você é o primeiro entrevistado, há uma agenda

aqui que nós vamos cumprir, que é conceitual sobre o Direito e tal, mas

tem uma coisa que até agora você é o primeiro, nós não pegamos

Venâncio de jeito, é a primeira pessoa envolvida com a área

administrativa. Que nem eu, nem Lamy, nem Lobo, ninguém sabia: quem

é que pagava isso, de onde vinha o dinheiro, como é que era a conta,

quanto dinheiro se mexia, como é que funcionava a hierarquia

burocrática, aquela coisa puramente... a concessão de bolsas o controle

da pauta, como é que você fazia.... fale um pouquinho sobre isso,

livremente, sobretudo dinheiro, que até agora não se falou em dinheiro,

o dinheiro caia do céu, eu quero saber... eu não sei quem me pagava a

conta, o cheque chegava, vinha um boy no escritório todo mês com um

chequinho que eu não lembro quem assinava, e que conta era. Fale um

pouco do que você se lembra dessa parte, de suas funções como gestor.

Depois, eu quero seu input como jurista, mas como gestor executivo.

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V.B. – Está bem, está perfeito. O CEPED tinha uma personalidade jurídica

própria, então ele tinha conta bancária, o ato de criação do CEPED da

UERJ, ele era instituição da UERJ, deu a ele personalidade jurídica, e

autonomia administrativa e financeira, que faz ele ter CNPJ, apresentar

declaração de renda no final do ano como pessoa jurídica e ter conta

bancária. O dinheiro do CEPED originalmente veio de um convênio com

a USAID, veio dinheiro também do Ministério do Planejamento, na época

tinha um órgão do Ministério do Planejamento, até quem era diretor

desse órgão era a professora Marli, que era uma ex-diretora da Ebape,

ela era da Fundação Getúlio Vargas, eu lembro que eu estava sempre lá

no Ministério do Planejamento, tendo contato com ela para ver as

questões de dinheiro, depósito em contas, etc e tal. E tinha receita

própria, porque os alunos pagavam mensalidade e as empresas

pagavam pelos alunos. Alguns alunos ganhavam bolsa o critério era

muito subjetivo, não tinha critério objetivo fixado, aí dependia da

pessoa, do currículo.

G.L. – Mas, quando você diz critério, é critério para o quê? Para a

concessão de bolsa? Ou para a admissão no curso?

V.B. – Não, estou mencionando bolsa, a questão financeira. Então, o que

o CEPED recebia de receita do pagamento dos alunos, era uma faixa

confortável para viver financeiramente. Os convênios, com a USAID, por

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exemplo, ajudou muito a prover uma biblioteca, uma biblioteca

razoável. Depois, eu vou contar uma história sobre a biblioteca que é

revelador do funcionamento da universidade brasileira.

T.R. – E essa biblioteca ficava onde, aqui na FGV, ou na UERJ?

V.B. – Ficava aqui. No convênio com a Fundação Getúlio Vargas, que nos

permitia colocar todas as publicações, revistas, livros que o CEPED

tinha, dentro da biblioteca da Fundação, era no terceiro andar da

Fundação, quando a gente ia para lá aí usava a biblioteca da Fundação

no conjunto, e lá dentro estavam nossos livros e revistas. Então, todos os

controles de livros, fichas, etc., era feito pela biblioteca da Fundação

Getúlio Vargas.

T.R. – Entrava no patrimônio daqui?

V.B. – Era do patrimônio do CEPED. Livros e revistas eram do

patrimônio do CEPED. Por convênio, a biblioteca da Fundação geria a

classificação, classificava, colocava as fitinhas, os números da

classificação lá e fazia as fichas dos alunos que podiam pegar, quem não

podia pegar, esse controle todo eles faziam.

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T.R. – Aí, quando o CEPED termina, o que é que acontece com esses

livros, eles vão para UERJ ou eles ficam aqui?

V.B. – Aí acontece o seguinte: Eu fui o último que eu trabalhei no CEPED,

em 70, 71, 72, no meio do ano eu fui fazer o mestrado em Harvard em

72, eu sai no meio do ano, então terminou o ano e não se renovou o

curso daí para frente, o CEPED não fez mais cursos. Quando eu retornei

dos Estados Unidos com mestrado, um ano e meio depois, eu tive

contato com o CEPED, tentamos reanimar o CEPED, mas acabou que não

engrenou. O Lamy fez algumas reuniões, mas não engrenou. Aí o CEPED

já estava funcionando lá na UERJ, ele levou a biblioteca daqui lá para

UERJ e ficou lá com a secretária, funcionários, uma sala, até na casa da

UERJ que era na Marquesa de Santos, ali naquela casa na avenida Pedro

II.

G.L. – Pedro II ou Pedro I? Tanto faz.

V.B. – Bom, enfim, a Marquesa de Santos tinha a ver com Pedro I, mas

acho que a avenida era Pedro II [riso]. Depois, dali foi para o prédio da

UERJ. Meus contatos aí ficaram mais tênues, eu só acompanhava um

pouco, de vez em quando ia lá, mas depois que foi para a UERJ, o CEPED

perdeu contato com as demais pessoas, ficando vinculado apenas à

figura de Caio Tácito. Eu, conversando, tempos depois, com o reitor,

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aliás não era reitor, ele foi reitor depois, o Antônio Celso, ele era diretor

da faculdade.

G.L. – Celso Albuquerque Mello?

V.B. – Não. Antonio Celso. Foi reitor, foi diretor da faculdade. Aí um dia

eu indaguei dele sobre onde estavam os livros do CEPED, as revistas, se

permaneciam na FGV ou se tinham ido para a biblioteca da UERJ. Ele me

relatou: “Não, foram todos colocados na sala lá”. Eu disse: “ué, mas não

usaram na biblioteca da UERJ?”, “não porque...” Aquilo era uma questão

do Caio – e o Caio tinha muito prestígio – era uma questão do Caio então

ninguém mexia lá, a porta estava lá trancada e tal, ninguém mexia lá, era

questão do Caio. O CEPED era questão do Caio. Não era da faculdade de

Direito, da Universidade, era uma questão do Caio.

G.L. – Que interessante.

V.B. – Muito da realidade, mas, mais estarrecedor do que isso: os livros

estavam lá, de vez em quando alguém abria a porta, ia lá e pegava um

livro. Eu falei: “E as revistas?”, “é, de vez em quando alguém ia lá e

pegava, ia lá e pegava”. “E o que restou?”. “ah, já não restou mais nada”.

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G.L. – Taí, já temos uma resposta, o quê que aconteceu...

T.R. – A biblioteca desapareceu.

G.L. – Foi gradualmente surrupiada.

V.B. – A universidade brasileira não é? É assim essa coisa aí, entende?

Essa coisa incrível. Isso é um reflexo... eu conto esse episódio como um

reflexo da universidade brasileira.

G.L. – É , mas podiam fechar a porta e dar a chave para o Caio. [riso]

V.B. – Fechar ou pegar aqueles livros e colocar dentro da biblioteca!

Para alguém pegar... como nós fizemos aqui porque administrar uma

biblioteca é uma coisa que não é fácil, então o CEPED aqui colocou

dentro da Fundação Getúlio Vargas. Lá não colocaram dentro da

biblioteca da UERJ. Não sobrou um livro ou uma revista.

G.L. – Agora, essas coisas é que a gente está desesperadamente

procurando....

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T.R. – Mas aí assim o dinheiro... só para entender, o dinheiro do USAID

vinha para compra de livro. O que os alunos recebiam pagava os salários

dos professores, e o que vinha do Ministério do Planejamento era o quê?

V.B. – Complementava também a verba. Aí podia usar para pagamento

de professores, despesas funcionais, material...

G.L. – E as bolsas também não é?

V.B. – Bolsas. E compra de livros também. Porque a gente também

comprava livros, comprava e tal, assinava revistas, pagava...

G.L. – É, porque a grande despesa que, presumo eu, uma das maiores

despesas eram as bolsas, não é?

T.R. – A bolsa ela consistia em que? Na "tuition fee"?

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V.B. – A bolsa era dispensa de pagamento da matrícula e mensalidades.

Grande parte dos alunos, 80%, já eram advogados de empresa, então as

empresas pagavam, boa parte, eu...

G.L. – Pagavam não... eu não posso dizer. Eu posso dizer Tania?

T.R. – Pode.

G.L. – Então desliga aí. Eu não posso, porque eu não posso induzir a

testemunha...

V.B. – Não...

G.L. – Mas acontece o seguinte, a minha bolsa, a minha empresa pagou

ao Leoni conseguiu metade do meu salário mas eu recebia... a bolsa

pagou a minha "tuition" em Harvard que foi 36 mil dólares, mais a

passagem para mim e para minha esposa com meu filho para Harvard,

mais uma verba para livros, mais uma verba para mudança e mais um

estipêndio mensal de 500 dólares por mês durante dez meses. Só aí

foram 50 mil dólares que...

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V.B. – Mas eu creio que isso aí não era dessa verba de gestão do CEPED.

Era do convênio da USAID, que a USAID é que dava isso aí, a Fundação

Ford e a USAID, aliás [inaudível]

G.L. – Ah, então pronto. Então você está mencionando duas verbas

diferentes então? Há uma verba para a gestão do CEPED e um

financiamento de bolsas...

V.B. – Isto. Uma... perfeito. Porque havia dois tipos de bolsa aí. Há uma

bolsa que você está se referindo a estudantes do CEPED, ex-alunos do

CEPED, professores que iam fazer curso no exterior.

T.R. – E aí essa bolsa incluia...

V.B. – E havia a bolsa que nós dávamos: os alunos não pagavam a

"tuition" aqui, não pagavam as mensalidades. É por isso que eu te disse

que não era tanto.

T.R. – Mas essa bolsa que ia para fora ela consistia na passagem aéreas,

nas despesas mensais lá de "tuition fee", mais uma bolsa para o aluno...

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V.B. – Para subsistência.

T.R. – Subsistência, que na época era o quê? Uns 500 dólares?

V.B. – Era. Isto aí era dado pela Fundação Ford...

T.R. – Variava... ah era a Fundação Ford que dava.

V.B. – Principalmente, Fundação Ford e USAID. Então era uma coisa que

a gente não tinha gestão ou controle... a gente sabe porque nós fomos

estudantes, mas não era um coisa gerida pelo CEPED não, era gerida em

função do convênio, mas tudo isso era Fundação Ford e USAID que

faziam.

G.L. – Agora, você disse aqui que havia uma conta bancária para uma

entidade com CNPJ e CGC naquela ocasião, e tudo aqui em conta

bancária e eu recebia o cheque do CEPED.

V.B. – Isso.

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G.L. – Agora, o dinheiro, a ajuda do USAID e da Fundação Ford – eu estou

depreendendo do que você se lembra – ela não entrava para essa gestão

do curso...

V.B. – Não entrava para nessa conta.

G.L. – Ela ia para outras coisas.

V.B. – Ela já paga a "tuition" nas universidades, pagava a mensalidade

dos alunos, pagava passagem, enfim, não se incorporava à conta e ao

patrimônio do CEPED, era a bolsa que eles davam aos alunos que o

CEPED indicava...

T.R. – E aí o CEPED costumava indicar quantos alunos por ano? Tinha

uma periodicidade assim, todo ano indicava...

V.B. – Não. Isso era um pouco o aluno que cavava, não é? Ele queria, se

dispunha, se qualificava e ia. Eu mesmo aqui como Secretário Executivo,

eu cavei, consegui da USAID, da Fundação, fui atrás, evidente que o Caio

deu apoio, todo mundo deu apoio, o Lamy. Mas não era uma atividade

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do CEPED, uma função do CEPED. Era um canal que o CEPED tinha e que

naturalmente as coisas fluíam.

T.R. – Quem você lembra que foi assim?

V.B. – Do começo... do curso do começo foi o Gabriel, o Sergio Tostes,

Joaquim Falcão...

G.L. – Isso aí você está falando de 67?

V.B. – 67... é. 67, 68 e depois o Sergio foi em 68 também. 67, 68... o

Bruno, o Rubens Torres que nós já falamos aí e também acho que aquele

que era do Banco Central que se suicidou, saltou da ponte.

G.L. – Paulo Sá.

V.B. – Sá, Paulo Sá, também foi. [silêncio] Em 70 eu creio que não foi

ninguém, 71, não foi ninguém. Porque Bruno foi em 69 e quando o

Bruno retornou em 70 eu estava aqui, como Secretário Executivo. Em 70

não foi... e em 71 também não e eu fui em 72.

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G.L. – Só esqueceu, que eu me lembre, o Jorge, o Jorge Hilário.

V.B. – O Jorge Hilário, Jorge Hilário. Jorge Hilário foi também nesse

período de 68, 69.

G.L. – Agora, você estava falando da biblioteca Vivaldo e que é um dos

temas que mais me desespera, nos desespera, que nós estamos

procurando, é: onde estarão as apostilas e as relações de alunos, porque

a gente quer levantar todos os ex-alunos...

V.B. – É o que eu estou dizendo a você, as apostilas eu acho que eu tenho

todas comigo.

T.R. – Que maravilha!

V.B. – O conjunto que eu ainda guardo em casa, minha mulher: “poxa,

mas você fica guardando coisa do CEPED ainda”...

G.L. – Quer guardar aqui conosco?

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V.B. – Eu creio o seguinte: não sei a que se destina a sua pesquisa, mas se

o destino é coletar, recompor o CEPED eu acho que é um bom destino.

G.L. – É, é isso que nós estamos discutindo ainda mas talvez a idéia é...

seria viável digitalizar as apostilas todas?

T.R. – Com certeza, a gente digitaliza.

V.B. – Pilhas, pilhas.

G.L. – A gente tem equipamento para isso?

T.R. – Tem.

V.B. – São pilhas, é muita coisa.

T.R. – Não, mas dá para a gente digitalizar, não tem problema não.

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V.B. – Porque na época não era computador, era máquina de

datilografar.

G.L. – Ah, mas isso é uma maravilha, Vivaldo, como é que a gente

combina isso aqui?

T.R. – Ah, se quiser a gente pode pedir para alguém ir lá na sua casa,

onde estiver, pegar o material, com todo cuidado.

G.L. – Eu assino um termo me comprometendo a devolver. Se você

quiser doar, pode doar também na minha casa, doar seria...

V.B. - Pois é isso depende aqui do fim, se vocês forem recompor o

CEPED, evidente que aquilo é um bom material de textos.

G.L. – Não, nosso objetivo inicial não é recompor a instituição. É

pesquisar a história e montar um arquivo – isso eu estou definindo aqui

– no CPDOC, na Fundação, para que fique registrada a história dessa

instituição, para os pósteros.

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V.B. – Se nesse arquivo comportar o material é o melhor destino

possível, porque ele ficar só comigo... inclusive minha vida desviou para

outros caminhos, eu não consulto mais aquilo...

G.L. – Ah, se você puder nos doar isso aqui é só fazer um termo de

doação a Fundação Getulio Vargas, a Fundação Getúlio Vargas aceita

calorosamente.

V.B. – Ah, eu faço isso, faço sim, é um bom destino, é um bom destino

porque é um material de alta qualidade, alta qualidade jurídica e alta

qualidade de ensino.

G.L. – Então, você pode avisar a sua senhora que a Tania vai ligar para

ela?

V.B. – Não, eu só pediria o seguinte: eu estou concluindo um livro aí que

está me tomando o tempo livre, e eu tenho que realmente separar,

olhar, você entende? Eu tenho que passar um fim de semana fazendo

isso. E eu preciso... só quando eu encerrar.

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G.L. – Nós vamos te cobrar, não há urgência.

V.B. – Perfeito, perfeito. Não dá para marcar não, mas ficamos em

contato.

G.L. – Está gravado aí que você prometeu, tem uma promissória verbal

de que você vai doar isso a Fundação Getúlio Vargas.

V.B. – É, os nomes de alunos pode ser que eu tenha algumas relações em

casa, eu não garanto, o que eu caprichei foi ter o material.

G.L. – Agora nomes de alunos se você pudesse ter...

V.B. – Eu vou ver, eu vou ver. Mas isso aí eu tenho que ver lá no material.

Tem que ver se tenho. Uma pessoa que, não sei se vai guardar alguma

coisa de memória, era Gilceia, que era a secretária.

G.L. – A Gilcéia, é, como é que acha a Gilcéia? Eu me lembro dela.

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V.B. – Pois é, a Gilcéia, ela deve ter muita memória, eu não sei se ela tem

material, papel, mas ela tem muita memória ela tem. Como [inaudível] a

Gilcélia.

G.L. – Você sabe por onde é que ela anda?

V.B. – Pois é...

G.L. – O Venâncio é capaz de saber.

V.B. – Pode ser.

G.L. – Essa aqui já era. Mas então olha aqui, isso aqui foi maravilhoso. Já

temos então uma visão dos assuntos financeiros, você tem mais alguma

dúvida dos assuntos financeiros Tania? Para mim está claro.

T.R. – A única coisa que eu queria saber é essa relação com o Ministério

do Planejamento, se isso era um convênio, se tinha alguma prestação de

contas que a gente tinha que fazer com o Ministerio.

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V.B. – Tinha, tinha, Claro, claro.

T.R. – E o interesse do Ministério era o que? Porque tudo com o governo

é bem burocrático.

V.B. – Não, eram essas verbas mesmo de pesquisa, ensino e pesquisa, o

ensino e pesquisa...

T.R. – Ah, ta, era na área de ensino e de pesquisa mesmo não é? De

pesquisa no ensino jurídico.

V.B. – É, e o Ministério tinha verba para isso. Tinha uma instituição que

inclusive essa instituição recebia verbas internacionais, ela recebia

também recebia dinheiro do USAID, Fundação Ford também. Era um

órgão do Ministério do Planejamento que foram mudando nomes,

nomes, nomes, eu não sei realmente como localizar aquele órgao mais....

mas nos papéis tem a denominação do órgão.

G.L. – Então os arquivos do CEPED, esses, quer dizer, se estiverem em

algum lugar estão na UERJ não é? Os papéis, as provas....

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T.R. – Não, os papeis devem ter perdido tudo.

G.L. – As provas.

V.B. – É, se tiver, estão lá. Duvido que esteja, mas se tiver, está la. Duvido

que esteja, mas se tiver estão lá.

T.R. – Mas se os livros sumiram, imagina isso!

G.L. – Mas uma entidade, uma universidade, um curso daquele gera o

que? Gera biblioteca. Essa o Vivaldo já disse onde é que está. Gera listas

de alunos, chamadas, gera uma material burocrático muito grande que,

a não ser que alguém jogue fora não desaparece. E ninguém rouba

porque ninguém tem interesse.

V.B. – Ninguém tem interesse, isso deve estar lá...

T.R. – É mas assim, na UFRJ pelo menos eles tinham o costume de

depois que o curso acabava, dez anos depois jogava tudo fora. Se

ninguém passava lá para pegar. Porque eles tem muitos papéis, porque

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é curso que não para não é? Tudo bem que a UFRJ não é modelo de

gestão mas a UERJ não deve ser lá muito diferente.

G.L. – As provas, as provas, as listas de chamada...

V.B. – Isso pode ser que tenha. O papelório deve ter, deve ter, deve estar

em algum lugar, deve estar nessa sala até. Na sala que ainda deve existir,

deve estar lá.

G.L. – Eu não sei se existe não mas vamos ver. Agora ainda dessas.... eu

quero depois Tania que você conduza essa parte mais padrão da

entrevista sobre as idéias jurídicas etc., agora a gente tem que explorar

muito Vivaldo porque você é a primeira pessoa ligada a administração

então você sabe coisa que ninguém mais sabe, poucas pessoas sabem.

Outra coisa, Tania, você é o primeiro aluno, ex-aluno do CEPED que está

sendo entrevistado. Duas perguntas sobre isso. Você lembra que nomes

de colegas seus você lembra e se você manteve depois, se houve alguma

espécie de convívio constante de ex-alunos, ou alguma coisa que se

pareça com uma associação de ex-alunos, ou contatos informais,

almoços anuais, alguma coisa assim, você lembra de alguma coisa

assim?

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V.B. – Não.

G.L. – Da sua turma você lembra de quem?

V.B. – Eu acho que não teve esses encontros. Agora, é uma coisa

interessante que diversos ex-alunos se encontram sempre se lembram

do CEPED. “Ah, meu colega do CEPED, nosso tempo no CEPED, sempre

se lembram e se referem ao CEPED, mas não se institucionalizou,

nenhuma associação, nenhum encontro anual que eu tenha notícia

nunca aconteceu isso. Mas a lembrança do CEPED a toda hora a gente...

G.L. – Agora que nomes de ex-colegas seus você lembra, se agente não

achar a lista.

V.B. – O Eduardo Seabra Fagundes, o Manes, que depois foi presidente

do Tribunal de Justiça.

G.L. – Ah o Manes...

V.B. – Humberto Manes.

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G.L. - O Humberto Manes foi presidente do Tribunal de Justiça, eu me

lembro!

V.B. – Isso, Humberto Manes.

G.L. – Ele adora óperas.

V.B. – É. Eduardo Seabra Fagundes, o Humberto Manes, Sergio Tostes,

Sergio Museracchi que já morreu. Mas este já morreu.

G.L. – É, então não pode ser entrevistado.

V.B. – Humberto Manes, Sergio Tostes, o Jorge Hilário, tá, você já tem, o

Jorge Hilário Gouvea Vieira. [silencio]. Tinha o Richeletti, procurador do

Estado.

G.L. – Roberto Richeletti.

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V.B. – Roberto Richeletti. Ah, um que foi professor também, o Maia era

procurador do Estado, Maia esqueci o primeiro nome dele, ele foi

professor, era procurador do estado e era professor. Era junto com o

Arnold Wald, a mesma equipe do Arnold Wald, era Maia. [silêncio]

G.L. – Dar uma pausa aqui. Maia... É, esses aqui, todos... Humberto

Manes, sabe o quê que é feito dele? Ele foi presidente do TJ, adora

óperas. Eu não sei se ele ainda está, você podia perguntar heim?

V.B. – Pergunta você, você também era um fã de ópera.

G.L. – É , um dia encontramos ele na casa do Dornelles, eu não me

lembrava. Ele, o Gustavo Leite, o Gustavo Leite também foi seu colega?

V.B. – Foi, foi.

G.L. – Foi aluno seu também?

V.B. – O Gustavo... eu não estou lembrando a turma do Gustavo Leite, eu

não estou lembrando se foi em 67, 68.

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G.L. – É, o Eduardo Seabra Fagundes foi da...

V.B. - 67.

G.L. – Marcos Raposo, foi seu colega?

V.B. – Marcos Raposo. Marcos Raposo foi da turma... acho que Marcos

Raposo foi colega de 67 ou da turma de 68.

G.L. – A sua turma foi de 67 ou 68?

V.B. – A minha turma 67.

G.L. – A tua foi de 67.

V.B. – É , o Marcos Raposo foi 67.

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G .L. – O outro que foi para o exterior?

V.B. – Marcos Raposo foi para o exterior também.

G.L. – Marcos Raposo também foi para o exterior, anota aí.

V.B. – Aliás eu disse que eu fui o único em 72 ele também foi. Nós fomos

juntos para o exterior, ele foi para Yale, eu fui para Harvard.

G.L. – Marcos Raposo, Álvaro Pessoa também.

T.R. – Espera só um pouquinho, eu vou voltar aqui porque eu pus para

pausar. Então aí o senhor retoma. Diz: “ah lembrei...”.

G.L. – Estava falando dos colegas da turma.

T.R. – É, dos colegas da turma, tem o Marcos... os que estavam faltando

aqui que a gente falou foi o Marcos Raposo e o Gustavo Leite.

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V.B. – Alvaro Pessoa.

T.R. – Alvaro Pessoa também, então espera aí.

V.B. – É, Alvaro Pessoa foi colega e foi para o exterior também.

T.R. – Tá, então vamos gravar.

V.B. – Bem, eu estou me lembrando de Alvaro Pessoa que foi colega de

67 e foi para o exterior eu creio que em 68. O Marcos Raposo que foi

colega em 67 e foi para o exterior junto comigo em 70, foi estudar em

Yale, fez o mestrado em Yale.

G.L. – E Vitor Rogério.

T.R. – Vitor Rogerio?

G.L. – Costa, sócio do Jorge.

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V.B. – Vitor Rogerio Costa.

G.L. – Aí eu posso induzir, não é? Ficar o registro.

T.R. – Pode, pode.

V.B. – Claro.

T.R. – O Vitor Rogerio Costa.

V.B. – Aí você me lembrou que tinha um outro Vitor que foi aluno

quando eu era Secretário Executivo, era procurador, Vitor Soveral

Junqueira Alves

G.L. – Esse eu não me lembro não.

V.B. – Esse foi de 70, da turma de 70.

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T.R. – Junqueira Alves?

V.B. – Junqueira Alves. A Procuradora atual Geral do Estado, a Lucia Lea

Guimarães foi em 70, o Machado Cerqueira, o marido dela foi também

aluno em 70.

G.L. – Esse Cerqueira é de constitucionalista? Deputado?

V.B. –Deputado, foi deputado. Ele foi aluno em 70.

G.L. – Marcelo Cerqueira foi aluno também? Eu não sabia.

V.B. – É, foi aluno em 70. A Lucia Lea foi aluna em 70. A Zelia que foi da

Petrobrás, que está na Petrobrás atualmente, era da Interbras. Zelia

Porto, foi aluna em 70. Foi aluna em 70 ou 71, eu estou na dúvida aí, 70

ou 71.

G.L. –Qualquer nome que te ocorra, Vivaldo, por favor, porque uma

parte substancial que nós estamos... você como eu te disse é o primeiro

ex-aluno que está sendo entrevistado. Você tem duas primazias aqui,

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primeiro ex-aluno e primeiro que trabalhou na administração do

CEPED, então nesse ponto você é único. Qualquer nome de colega que

você se lembre, qualquer coisa assim...

V.B. – Vou me lembrar, voltar e... quando eu procurar nos papéis, nas

apostilas, eu devo ter muita anotação. Quem tem material sobre o

CEPED também é o Lamy, heim? Lamy tinha na casa dele material.

G.L. – Ele deu um bocado de coisa para a gente.

T.R. – É, mas ele deu do IEDE, do CEPED ele não conseguiu achar.

V.B. –Ah, é?

G.L. – É, mas vamos cobrar material também do...

T.R. – Ele não sabe onde pode ter guardado, que alguém guardou para

ele...

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V.B. – Olha, quem me disse que depois que o Caio morreu o filho dele,

Antônio Carlos me disse que manuseou uns papéis do CEPED.

G.L. – Você sabe aonde é que eu acho o Antônio Carlos? Eu trabalhei com

ele, aonde?

V.B. – No escritório do Sergio Tostes.

G.L. – Sergio Tostes, exatamente. Antônio Carlos Vasconcelos.

V.B. – Antônio Carlos Vasconcellos. O telefone dele é 3806-8812.

G.L. – Ainda está no Sergio Tostes, não é?

V.B. – É.

G.L. – É, eu sou muito amigo dele, trabalhei com ele na Brascan e

trabalhei com ele também... eu acho que ele é mais um que é mais um

que a gente tem que botar na nossa lista, para nossa pasta. Então olha

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aqui, vamos combinar de ex-alunos é o seguinte: qualquer nome que

você se lembre de colega seu ou de ex-aluno, você dá um toque e gente

anota aqui.

V.b. – Claro.

G.L. – Uma próxima etapa nossa é selecionar e começar a entrar em

contato com ex-alunos. Agora podemos voltar à parte conceitual não é?

Porque o Vivaldo reúne vários papéis não é? Professor, ex-aluno,

bolsista, Secretário Executivo, quer dizer, pega aí pelo....

T.R. – Tá, aqui: qual ou quais ao ser ver foram as idéias básicas do

programa em termos de metodologia do ensino, conceito de Direito e

papel do advogado na sociedade?

V.B. – É muito amplo, porque realmente o CEPED foi um manancial de

idéias a respeito de tudo isso aí. O CEPED, seu primeiro propósito era a

reforma do ensino jurídico, novos métodos de ensino para se construir

uma nova faculdade de Direito no Brasil, em consequencia forjar aí um

novo advogado. O Brasil estava ali em uma certa mudança ideológica

naquele período, não é? O Brasil vinha da Revolução de 30 com todo

Direito brasileiro muito forjado em função disso – da Revolução de 30 –

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com o golpe militar de 64 aconteceram algumas mudanças e eu encaro...

nesse período eu não estava engajado nisso, eu não sou um founding

father, como disse o Gabriel, mas eu, enfim, analiso – mais análise, não é

informação para vocês não, mais análise – de que realmente um grupo

de pessoas se reuniram aí junto com esses americanos, o David Trubeck,

o Henry Steiner também não é? E o pessoal da USAID, da Fundação Ford,

se reuniram e decidiram forjar um novo método de ensino, chamado

método socrático, em que se dizia muito: professor não seria um

expositor. O Gabriel uma vez, como professor, usou uma imagem

dizendo: “olha, eu vou ser esse dedo aqui que vai juntar os dedos, que

vamos, juntos, pensar e eu vou ser esse dedo aqui que vai juntar os

outros dedos com vocês, o que distingue o ser humano dos animais...”

G.l. – Esse dedo é o polegar.

V.B. – Exatamente eu nunca esqueço dessa imagem que ele colocou. E se

dizia muito: olha o professor de Direito não pode ser um expositor, um

discursador, à semelhança da tradicional Faculdade de Direito

brasileira. Ele tem que dialogar com o aluno. Então por isso o aluno

recebia o material e se dizia que esse era o método na Universidade de

Harvard, na universidade americana, que era o método socrático. Em

que o aluno já sabia alguma coisa e o professor, junto com o aluno

procurava abrir caminhos de raciocínio jurídico, se buscava uma nova

forma de se pensar o Direito, um novo raciocínio jurídico se exigia aí. E o

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método visava buscar esse raciocínio jurídico, praticar esse raciocínio

jurídico de maneira a instrumentar o advogado para lidar com uma

outra realidade para a qual o Brasil estaria caminhando. E essa

realidade era a modernização capitalista que estava acontecendo

naquele período, com aquele viés não é? Aquele tipo de modernização

capitalista. O curso era um curso de especialização em advocacia de

empresa, era o nome do curso, curso de aperfeiçoamento em advocacia

de empresa, esse era o nome do curso. As matérias do curso já eram um

pouco diferentes das matérias curriculares da Faculdade de Direito,

porque incluía contabilidade, economia, macro-economia, basicamente.

Enfim, se buscou estimular pessoas a dar aulas em faculdades para

disseminar o método, disseminar o padrão de ensino. E a partir daí

tentar construir uma faculdade de Direito diferente. Isso o CEPED não

conseguiu fazer, tentou-se na PUC, na UERJ, esta nunca respondeu bem a

isso. Nenhuma faculdade no Rio, no Brasil seguiu a metodologia CEPED.

Nenhuma, pelo menos naquele período. Então não se conseguiu

construir essa nova faculdade. Mas a concepção que estava por tras era

mais ou menos essa aí. Bom você tinha mais algumas coisas específicas

aí, você poderia repetir?

T.R. – É, sobre o conceito de Direito que aí entra nisso que você falou de

estar preparando para uma modernização.

V.B. – Sem dúvida.

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G.L. – Você não é um dos founding fathers, mas você é uma das pessoas

que teve muito contato, tem uma cadeira muito boa para analisar

porque você viveu como aluno e junto com a equipe e na sua própria

carreira política depois. Porque aí você tem que registrar no início da

biografia a carreira política. Então, você tem todo direito de analisar e

colocar... pode ser um pensamento reconstruído, que eu digo, como você

percebeu a idéia original.

V.B. – É, tá certo, essa percepção eu realmente posso externar, mas aí é

percepção e análise, não é mesmo um conjunto de informações. Então o

Direito realmente era uma coisa a ser repensada, no sentido dele ser um

instrumento que dinamizasse a empresa, ajudasse aos negócios,

dinamizasse os negócios, que o advogado conhecesse um pouco a

natureza dos negócios para poder trabalhar os contratos

correspondentes, conhecesse o funcionamento da empresa para poder

trabalhar a assessoria à empresa, nos seus negócios, na sua estrutura,

na sua relação com os acionistas, com o capital, com busca de capital,

com investidores etc, etc. Eram campos que as faculdades pouco

exploravam até então, o CEPED é que abriu esse campo como ensino,

como estudo, abriu esse campo para o advogado.

T.R. – Entendi. E aí nisso muda um pouco esse papel do advogado na

sociedade?

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V.B. – Sem dúvida, sem dúvida. Esse tipo de advogado exerceria um

papel diferente. Evidente que havia na época, no Brasil, o drama do

problema de presos políticos, de prisões, de torturas, ditadura política.

O CEPED não tocava nessa questão. Não tocava nas questões políticas

que estavam em debate no momento. O CEPED fugiu de toda essa coisa,

que as faculdades de Direito refletiam. As faculdades de Direito, quando

focalizavam Direito do Trabalho, quando eu estudei, o professor fazia

uma análise compreensiva das relações de trabalho no Brasil, as

implicações sociais. As faculdades refletiam o ambiente político,

refletiam o debate político... o CEPED fugiu disso, fugiu de qualquer

contágio político, interessava era mesmo a função empresarial.

T.R. – O business não é?

V.B. – É. Era a questão dos negócios, da empresa, como a empresa

deveria se modernizar, como se modernizar a empresa brasileira e

como a empresa multinacional estrangeira teria no Brasil uma

assessoria, um instrumental de trabalho, gente preparada para

assessorar essa empresa que estava no Brasil também, estava vindo, já

estava aqui. Era muito nessa perspectiva.

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G.L. – Isso seria do curso CEPED enquanto curso, o CEPED enquanto

movimento ou enquanto ângulos? Se é que você entende, isso é uma

pergunta.

V.B. – É, o CEPED era um movimento, era um movimento. Não era

apenas um curso. O curso era um instrumento desse movimento, era a

materialização desse movimento. Como você colocou também, era um

movimento. O CEPED era um movimento realmente nesse caminho que

eu pelo menos... é a minha compreensão. E até analisando também um

pouco à distância. Na época até dentro a gente não percebia tanto não é?

T.R. – Não tinha tanta consciência.

V.B. - Além dessa questão da preparação do advogado de empresa, esse

novo patamar de modernização capitalista, é preciso dizer que o

conjunto de pessoas que conceberam o CEPED eram também

humanistas. Eram humanistas, eram pessoas que detinham uma visão

superior sobre o país, sobre a sociedade, tinham compreensão disto.

Pessoas como... bastava citar aí o Lamy e o Caio Tácito, eram pessoas de

visão realmente humanista, superiores, eram reformistas,

modernizadores, eles queriam modernizar, reformar. Para eles, o

CEPED não era apenas instrumento de organização empresarial. Essa

era a temática e esse era o foco, mas eles eram figuras de compreensão

muito superiores. Trabalhavam essa questão no sentido de entender

que o Brasil tinha que se modernizar. E tinham a visão que, o

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profissional do Direito, o advogado, tinha que se instrumentar da

melhor maneira possível para o país acompanhar o passo da

humanidade que, segundo eles, o Brasil estava ficando para trás, então

era preciso acompanhar. Numa compreensão profissional e humanista,

uma visão superior.

T.R. – E até que ponto essas idéias básicas do CEPED elas chegavam a

representar a novidade no meio jurídico brasileiro?

V.B. – Ah, era completa novidade. O meio jurídico naturalmente não

debatia, não refletia, essas questões. Essas questões eram refletidas

aqui.

T.R. – Eu posso dizer que foi talvez a primeira vez que você tem um

curso jurídico pensando, comprometido com o futuro do país, assim? Ou

que se predispunha a ter esse compromisso?

V.B. – É, enfim, com essa compreensão de futuro. Porque outros cursos,

ao longo do tempo, sempre se preocuparam em formar para o futuro,

mas com aquela compreensão de futuro que cada época tinha, sua

compreensão própria, não é? Então esse tipo de compreensão e essa

mudança que o país estava fazendo na época o CEPED refletiu, o CEPED

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foi vanguardista. O que debatia no CEPED não era o que debatia no

Instituto dos advogados, ou na Ordem dos Advogados. Certamente em

muitos escritórios que tinham essa dinâmica, esse tipo de trabalho isso

se refletia, coisas que se debatia aqui, conversas entre advogados em

grandes escritórios eram semelhantes, reflexões eram certamente

semelhantes às reflexões aqui. Mas no geral, como instituição de

pensamento e de ensino o CEPED foi vanguardista.

T.R. – E teve no CEPED alguma influência com a cultura jurídica

americana? Da cultura jurídica americana?

V.B. – Sem dúvida, sem dúvida, sem dúvida. Refletia na biblioteca que a

gente tinha, revistas americanas, revistas americana e europeias. Eram

revistas americanas, francesas, inglesas. Tinha alguma coisa da

Alemanha, italianas também tinham revistas, livros, mas era

essencialmente americana. Os participantes da seleção, os únicos

estrangeiros eram americanos. As bolsas, porque a USAID e a Fundação

Ford eram instituições americanas que encaminhavam para

Universidades americanas. Então o vínculo...

T.R. – Não teve nenhuma bolsa dada por uma universidade europeia?

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V.B. – Não. Nós tivemos aqui alguns alunos que antes de vir para o

CEPED fizeram algum curso no exterior. Eu lembro que um aluno de

1970 ele tinha feito o curso na Universidade de Heilderberg, na

Alemanha. Um outro tinha feito curso em uma universidade italiana,

também em 1970, 71. Um outro tinha feito o curso em Londres. Não

estou me lembrando dos nomes deles mas as figuras eu localizei. Então

era realmente muito vinculado para o tipo de Direito, o raciocínio

jurídico americano, método de ensino americano, prática jurídica

americana, porque era centrada na questão da empresa e a concepção

empresarial do século XX, da segunda metade do século XX é muito de

fundo americano, não é? Organização empresarial, regime jurídico da

empresa, relação de negócio são muito de fundo americano, da segunda

metade do século XX para cá...

G.L. – Eu acho que você está dando uma visão muito importante para

nós que é exatamente uma análise não narrativa mas de análise do

substrato ideológico do CEPED e na sua correlação com o Direito e com

o universo político que o circunda. Então vou tomar uma frase sua e vou

poder, vou pedir para você, fazer uma distinção elaborando um pouco

mais e com toda a liberdade porque a história reflete também uma

história raciocinada e analisar a influencia. Você falou o CEPED como

preparando advogados para a modernidade capitalista. A modernidade

está necessariamente ligada ao capitalismo? Preparar para a

modernidade como o CEPED preparava era necessariamente uma

modernidade capitalista ou era apenas a modernidade que pode ser

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percebida sem adjetivos? O que é que você acha? O quê que você viveu

dali?

V.B. – Eu acho que ali, Gabriel, não há dúvida de que o país com o

regime militar ele, enfim, barrou qualquer outra alternativa para o país

a não ser a modernidade capitalista, não é? Ele abriu portas para isso,

fechou as outras portas e abriu portas realmente para isso. E o CEPED se

encaixa nisso aí, porque o golpe, o regime militar veio em 64, não é?

Quando em 67 já se está dando aulas um curso como esse – esse curso

foi elaborado em 66, 65 – realmente para poder reunir gente, preparar a

coisa para funcionar em março de 67 então não foi muito distante do

novo ambiente militar. Foi muita conexão aqui com a EPGE – Escola de

Pós-Graduação de Economia, com o Mario Henrique Simonsen, muita

conexão, o Mario nos ajudou muito na formulação. O Mario deu poucas

aulas para a gente, mas eu creio que na formulação do CEPED acho que

ele participou muito ativamente, eu creio que sim. Então, eu acho que a

linha da modernidade era a modernidade capitalista que se tinha em

mente ali, eu acho que não contemplava outra alternativa não.

T.R. – Aqui, de que forma idéias e prática já existentes à época em

determinados nichos de atores do Direito, como por exemplo o jurídico

da Light, ou o escritório do Bulhões Pedreira, iniciaram as atividade do

CEPED? Na sua visão, como aluno da primeira turma, você acha que o

CEPED foi uma continuação, ou que tinha uma relação muito forte com

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os escritórios da Light e do Bulhões Pedreira ou isso não aparecia, não

tinha nada a ver?

V.B. – Tinha porque os fundadores do CEPED, as principais estrelas do

CEPED, as grandes figuras que eram o Lamy e o Caio eram da Light.

Então eles...

T.R. – E eles traziam a experiência que eles viviam lá na Light para a sala

de aula?

V.B. – É, enfim, eles eram também, ao mesmo tempo eles eram grandes

consultores, eram consultados sobre as questões do Direito, eles eram

muito além, a figura deles era muito maior do que a Light, o Lamy e o

Caio eram muito maiores que o departamento jurídico da Light, eles

eram transcendentes, muito maiores, eram figuras realmente

extraordinárias, não é? No conceito deles, no trabalho, na produção

intelectual, na compreensão, no raciocínio, na bolação das coisas, enfim,

eles eram, apesar de que o jurídico da Light era um grande jurídico, era

a maior do Rio em termos de qualidade, em quantidade de gente, acho

que era a maior do Rio, mas eles eram transcendentes ao jurídico de lá.

Mas refletiu bem. O Bulhões Pedreira eu acho que nunca teve uma

relação direta com o CEPED, nem como professor nem antes, apesar de

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que as obras dele, na matéria de Imposto e Renda, eram material

didático nosso aqui.

G.L. – Isso aqui, desculpe, é que eu não posso dizer. Isso aqui é idéia, dá

um artigo sério de capa, que é todo esse "Legal Imperialism" uma

contribuição preciosa e vem com essa besteira, mas o Bulhões não teve

nada a ver com o CEPED a não ser convidar o Venâncio para trabalhar

com ele depois.

V.B. – Vai formular... Pode dar sequência?

T.R. – Pode.

V.B. – Não, é evidente que eu não quero transparecer isso de jeito algum,

porque eu faço uma distinção muito forte, muito grande, por isso é que

eu disse aquilo: o Lamy e o Caio eram muito maiores do que jurídico da

Light, do que a Light, eram muito maiores do que o ambiente que eles

viviam lá, profissional deles, pareceres, consultorias deles, estudos,

porque eles eram humanistas, eles se preocupavam com a formação do

brasileiro advogado, eles queriam ver um advogado diferente, mais

modernizado, mais competente, mais capaz, com capacidade de

raciocínio, ele queria o aperfeiçoamento humano do povo brasileiro, do

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profissional advogado, isso era ideal deles, eles tinham essa visão

humanista. Agora, a conjuntura em que as coisas aconteceram foram

essas aí, não é? Hoje, se acontecesse hoje, seria realmente de acordo

com a conjuntura atual, a conjuntura daquele período era essa. Você

lembra que endureceu em 68, em 68 eu não estava aqui ainda mas de

vez em quando estava aqui, em 69, eu frequentei algumas aulas, a gente

sabia: Sobral Pinto estava sendo preso, Heleno Fragoso estava sendo

preso, a gente estava aqui, aqui, trabalhando o Direito e as coisas

acontecendo aí fora...

G.L. – O Werneck Viana eu fui contratar ele na PUC para um projeto de

pesquisa no Ministério de Planejamento que o Joaquim fez, quando

estava entrevistado, pronto para contratar veio ordem: “não pode

contratar”. Ordem da Reitoria, e a Reitoria ia fazer o quê? Você

contratava o cara?

V.B. – Claro, claro.

G.L. – Não podia.

V.B. – Realmente, o CEPED não era, jamais foi, eu conceituaria, um

instrumento do regime militar. Ele era dentro daquele contexto em que

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o regime militar abriu portas para a modernização capitalista de acordo

com a orientação. Aí o CEPED dentro daquele ambiente caminhou, não

é? Caminhou com sua trilha própria dentro desse ambiente. Eu não

tenho dúvida não. E realmente as figuras, as figuras humanas, ao

contrário, tinham uma distância dos governantes muito grande, não é?

Tinha uma distância muito grande dos governantes, não frequentavam

gabinetes palacianos, nem eles frequentavam aqui, isso aqui eu não

tenho dúvida. Eram situações inteiramente diferenciadas, porque era o

regime militar, mas o Brasil não era só o regime militar, o Brasil era

sufocado pelo regime militar, mas o Brasil tinha coisas, potencialidade,

um ambiente humano próprio, tanta coisa aconteceu, não é? O Brasil foi

campeão do mundo em 70, tricampeão, tanta coisa aconteceu que não

tinha nada a ver com os militares, então o CEPED não tinha a ver com os

militares.

T.R. – E o CEPED tinha uma idéia, um objetivo? Você, como secretário

executivo, percebeu nas reuniões de que um dos objetivos do CEPED era

formar uma elite pensante?

V.B. – Era sim, era sim.

T.R. – E como que se pesava em concretizar isso?

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V.B. – Isso era com a reforma do ensino jurídico no país. Buscava-se

daqui disseminar métodos jurídicos de ensino e de raciocínio jurídico

país afora, daqui saírem professores para povoar as diversas faculdades,

daqui sair a concepção de organização de faculdades de Direito. Não se

realizou isso, isso realmente não se realizou, porque boa parte dos

alunos inclusive ficaram mais restritos ao ambiente profissional. Poucos

realmente foram para as faculdades, poucas faculdades se abriram a

essas possibilidades, a que abriu mais acho que foi a PUC, não é? A PUC

acho que abriu mais a possibilidade de gente daqui ir pra lá. Mas, a

faculdade mesmo, a faculdade da PUC, não chegou a ser esse

instrumento, mas a concepção era essa sim, de que o mundo jurídico

sofreria uma grande guinada, uma grande mudança e não há dúvida que

o produtor dessa mudança seria o CEPED: suas pessoas, pelos materiais,

pela biblioteca, pelo debate, pelo ensino, pelo método, pelo raciocínio

jurídico e tal, se fazia, era tudo envolvendo o CEPED, essa pretensão

teve, mas foi a menos frutífera.

T.R. – Aqui, como foi o desenrolar das atividades do CEPED, quem

participou, quem fazia o quê, eu acho que a gente já passou, não é? O

senhor mencionou a Gilceia, que foi a secretária, que com certeza.

G.L. – Gilceia ou Gilcelia?

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V.B. – Gilceia, com “g”. Ela realmente é uma pessoa útil porque ela estava

desde o começo ao fim, ela ficou o tempo todo do CEPED secretariando.

T.R. – E ela era ligada à Fundação, à UERJ?

V.B. – Não, ela era funcionária do CEPED.

T.R. – Ah, do CEPED.

V.B. – O CEPED tinha carteira, ela assinava carteira dos seus

funcionários, recolhia INSS, descontava imposto de renda na fonte, era

um pessoa jurídica mesmo, tinha personalidade jurídica, então assinava

carteira, dava as férias, etc, aquela coisa toda.

T.R. – Tem mais alguém que talvez seria interessante?

V.B. – Eu acho que a Gilceia. Evidente que a figura central aí é o

Venâncio, que foi o primeiro, que ajudou na fundação, na organização,

no apoio administrativo.

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T.R. – E na época você conheceu algum texto que falava sobre o CEPED

ou sobre essa experiência de ensino que estava se desenvolvendo

naquele momento?

V.B. – Circulava textos sim. Circulava textos. Agora, onde localizar... acho

que o Trubek escreveu sobre isso.

G.L. – Tem, ou seja, a gente está localizando um vasto material

americano,agora aqui no Brasil tem um artigo do Lamy, um artigo do

Venâncio, agora você chegou a produzir alguma coisa relacionada a

isso?

V.B. – Não, não. Porque tem artigos, acima de tudo muitas aulas sobre o

tema. Muitas referências. O Henry Steiner também.

G.L. – É, o Steiner está na lista dos nossos entrevistados. Agora você

mesmo não produziu nada?

V.B. – Não, não.

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G.L. – E uma outra pergunta, Vivaldo, aqui, tem até uma novidade de

Tania também lá no nosso roteiro, nosso primeiro ex-aluno: você fez

carreira política também, não é? Você é deputado hoje.

V.B. – Não, estou sem mandato, perdi a eleição, mas sou político.

G.L. – É político, mas você foi deputado por quanto tempo?

V.B. – Só para recuperar um pouco a carreira. Como estudante, fui

presidente do diretório, então já estava convivendo o ambiente. Aqui, no

CEPED, eu dei um passo a mais na compreensão do Brasil, das coisas, da

economia, minha vivência aqui me alargou, me ajudou a compreender a

economia, a situação do Brasil. Quando eu fiz mestrado e doutorado no

exterior – que eu fiz mestrado e depois doutorado – eu aprofundei

estudos...

G.L. – Fez direto? Um logo depois do outro?

V.B. – É, eu fiz o mestrado em 72, 73. Depois voltei para o Brasil em 74 e

em 78, 80, fiz doutorado.

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T.R. – Aonde? Lá em Harvard também?

V.B. – Lá em Harvard também. Eu aí, quando eu voltei, enfim, o CEPED já

estava morrendo, não renasceu e nem eu mergulhei no renascimento do

CEPED, porque também quando eu fiz o mestrado e o doutorado eu

relamente já parti para uma ação política e não mais técnica de ensino e

de profissional advogado. Minha cabeça já saiu para...

T.R. – Seu mestrado lá foi em que?

V.B. – No mestrado eu fiz um trabalho sobre teoria brasileira do habeas

corpus. Um fenômeno que aconteceu no início da República Brasileira.

Porque o Brasil não tinha mandado de segurança, então as pessoas

usavam o habeas corpus para outras proteções que não apenas a ordem

penal. Depois eu fiz o meu trabalho de doutorado, que é um trabalho

mais denso...

T.R. – Mas os cursos que você frequentou... porque em geral, o pessoal

que a gente entrevista que chegou a fazer o curso lá em Harvard faz

mais esse mestrado voltado um pouco para essa área empresarial, ou

para área de tax.

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G.L. – O mestrado lá em Harvard não tem área. Você vai lá e faz o seu...

T.R. – Sim, sim, você pode fazer lá uma série de matérias.

G.L. – De uma série de matérias você faz o seu menu.

T.R. – Você lembra as matérias que você fez?

V.B. – Eu lembro. Eu não fiz nessa área empresarial não, realmente meu

mestrado foi um pouco diferenciado, eu já estava com a cabeça tentando

me preparar para a ação política e então eu quis estudar mais História,

História do Direito americano, eu fiz curso na área de História do Direito

americano, fiz cursos de teoria, Legal Process, e Direito na Sociedade

Moderna, com o Mangabeira. O Mangabeira, quando eu fui para lá, foi o

segundo ano que ele deu aulas, então eu fiz os cursos dele que eram

mais de filosofia e teoria jurídica. Quando eu fiz o doutorado, eu voltei a

fazer os cursos com ele. E eu fiz a tese de doutorado sobre Direito e

Estado autoritário no Brasil de 30 a 45. eu estudei a Revolução de 30 e

esse período político, a chamada era Vargas. Então eu me preparei mais

para essa linha aí. Quando eu estava lá no doutorado, eu encontrei

Leonel Brizola, que estava exilado, ele esteve lá em Harvard, foi nos

visitar, a mim e ao Mangabeira, fui visitá-lo em Nova York, fizemos

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contato e eu voltei no início de 81, começando a trabalhar com ele, ele já

estava no Brasil quando eu voltei, enfim, trabalhando com Brizola e

Saturnino Braga, já mesmo em atividade política. Aí eu fui coordenador

de campanha do Brizola em 82, coordenei os grupos de estudos de

programa de campanha, eu fui ser Secretário de Justiça do governo dele,

depois eu fui candidato a Deputado Constituinte, fui deputado duas

vezes, na Constituinte de 87 a 90, depois de 90 a 94. Perdi a eleição em

94, recuperei o mandato em 98-2002, depois perdi em 2002 e 2006,

perdi duas eleições seguidas, mas continuo um animal político ainda, a

maior parte da vida é dedicada a questões de ação política.

G.L. – E como é que você vê se é que teve, a influência alguma positiva,

negativa, neutra ou de que forma, dessa carreira de político ligado a um

governador, a um político que era um líder de esquerda destacado, em

que essa experiência como secretário executivo, aluno, bolsista do

CEPED, como é que ela foi trabalhada? Você simplesmente a repudiou

ou a elaborou?

V.B. – Não, ao contrário, eu não repudiei de forma alguma, eu acho que

foi um instante importante nesse caminho, um instante muito

importante. Eu não vejo incompatibilidades entre a minha carreira

política que foi em um ambiente político diferente do ambiente do

CEPED, mas o CEPED como instrumento de raciocínio, de reflexão, de

pesquisa, de estudo abre fronteiras na cabeça das pessoas, abre

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fronteiras. É evidente que os alunos do CEPED que fizeram o CEPED,

que leram o material, que debateram as coisas aqui não eram produtos

do material do CEPED. Porque aquilo bate nas pessoas, larga um

raciocínio e abre a cabeça, aquilo abre um mundo pela frente aí, não é?

Só dar um exemplo para vocês: meu filho, ele foi querer jogar basquete,

então ele concluiu o curso secundário dele lá nos Estados Unidos, e aí foi

para a faculdade, fez faculdade lá. No período dele, ele ficou mais lá do

que aqui, um convívio intenso, mas o estudo que ele fez na universidade

americana abriu a cabeça dele para um caminho político inteiramente

diferente da realidade americana, não é uma reprodução, não é? O

estudo, a reflexão tem essa questão. Desde que a pesquisa seja séria,

profunda e desde que figuras que ajudam a compor isso aí sejam de

visão ampla, humanistas como eu classifiquei aí o Caio e o Lamy, as

figuras centrais, e os outros também, as figuras centrais, enfim, você

abre um raciocínio enorme para vir coisas daí. O meu caminho, a minha

intuição política anterior ao CEPED já era mesmo mais à esquerda,

desde que eu era estudante. E no CEPED nunca me senti

incompatibilizado, ao contrário, trabalhava assiduamente, cumpria as

tarefas aqui sentindo que eu estava me aprofundando no conhecimento.

Aprofundar o conhecimento não leva a cabeça da linha política para

nenhum caminho específico, não é? O conhecimento leva as pessoas a

fazer as suas opções políticas, então o que o CEPED propiciou aqui foi

conhecimento, foi técnica de reflexão, de ensino, de conhecimento

jurídico, de compreensão de papel do Direito na sociedade moderna,

naquela modernização capitalista. Evidente que muitos poderão tirar

outras conclusões, eu tirei as minhas, que me acumularam. E hoje eu

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digo a você essa foi uma parte, eu sou produto disso aí, produto da vida

toda, não é, a minha passagem pelo CEPED ajudou a acumular o

pensamento político que eu tenho hoje. Também me ajudou a

encaminhar a questão do ensino, eu também no período que eu estava

no CEPED eu fui professor, na Cândido Mendes, fui professor na PUC um

período. Tão logo eu perdi o mandato,

G.L. – De quê Vivaldo?

V.B. - Eu cheguei na Cândido Mendes a suprir lá um professor de Direito

Comercial, aqui na Ebape eu fui professor aqui na Ebape de Direito

Tributário junto com o Dornelles, nos dividimos aqui. Lá na PUC eu fui

dar aula de Direito Econômico no curso de mestrado que começou lá, de

Direito Econômico. Então o CEPED me puxou muito para a área do

ensino jurídico. Tão logo eu perdi as eleições, eu perdi o mandato, eu

voltei a dar aula. Eu entrei na Unirio, sou professor da Unirio até hoje.

Vou sair daqui e vou para dar aula lá. [riso]. Eu sou professor e...

T.R. – Então você continua ainda fazendo prática do...

V.B. – Isto, isto.

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G.L. – Eu acho que esse depoimento aqui...

T.R. – E as suas aulas na Unirio também você se baseia em caso, em

leitura prévia?

V.B. – Sem dúvida, sem dúvida, preparo material para distribuir

previamente aos alunos. Só que na Unirio eu dei aulas de muita coisa, fui

preenchendo buraco, mas eu cheguei aonde eu queria que é história do

pensamento político. Então eu organizei dois seminários e eu dou esses

seminários há uns seis anos.

G.L. – Na faculdade de Direito?

V.B. – Na faculdade de Direito. Porque agora tem esses seminários

optativos, não é, que os alunos escolhem, então eu organizei dois

seminários. Um é Teoria do Contrato Social, Liberalismo e Direito, outro

seminário é Direito e Democracia no século XX. Então com esses dois

seminários eu estudo pensamento político e jurídico do Iluminismo para

cá. Eu fui fazendo como os professores americanos e como cepediano:

tendo que preparar material para os alunos, eu fui escrevendo notas de

aula, fui escrevendo, fui preparando, cada semestre vai melhorando,

casa semestre vai melhorando... deu um livro! Então eu estou...

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G.L. – Como é que chama? É esse que você está completando agora não

é?

V.B. – É esse que eu estou completando agora, é O Pensamento Político

do Iluminismo aos nossos dias, que eu termino com Mangabeira, eu

estudo o pensamento político do Mangabeira - é o penúltimo capítulo do

livro.

G.L. – Ah, esse último capítulo vai ter 280 páginas [risos]. Eu acho

Vivaldo, e Tania, o depoimento do Vivaldo, primeiro ex-aluno, do

primeiro envolvido com administração, do primeiro bolsista e do

primeiro sujeito que já começa a analisar e não a contar, é diferente

quem conta de quem analisa e a nossa pesquisa está se conduzindo

exatamente para reproduzir a história e numa etapa subsequente

analisá-la, essa entrevista no meu ver marca um ponto de transição no

nosso trabalho, é a primeira vez que você já começa realmente... é uma

pessoa que fez parte e que não fez de uma certa forma, você não montou

a instituição, mas trabalhou com ela muito cedo, comprou o produto que

ela vendia e teve uma carreira totalmente política, já começa a analisar...

eu acho que talvez seja interessante uma das primeiras a taquigrafar

seja a do Vivaldo, porque foi realmente muito enriquecedor aqui para o

nosso projeto. Eu acho que eu não tenho mais nenhuma pergunta a

fazer, você tem alguma coisa da nossa lista aí?

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T.R. – Aqui a última pergunta é se você conhece alguma outra

experiência posterior que possa ser considerada como tendo sido

marcadamente influenciada pelo CEPED?

G.L. – Acabou de descrever uma não é? A sua própia, na Unirio, não

deixa de levar essa influência [risos].

V.B. – Sem dúvida. Eu acho que nesse ponto realmente, o CEPED, no

estudo, no sentido de um desencadeador de coisas, ele foi meio

frustrante porque institucionalmente ele não perdurou. Se ele tivesse

perdurado institucionalmente daria frutos mais visíveis. Nesse ponto

realmente ele falhou, nesse ponto ele falhou. Ele voltou para a UERJ, a

UERJ não era local de ressonância disso aí, saiu daqui da Fundação,

então nesse ponto ele falhou. Eu tenho dificuldade de lembrar alguma

experiência concreta que reflita... acho que talvez a faculdade aqui que

você e o Joaquim estão trabalhando deve ter muito a ver com isso, deve

ter certamente, você e o Joaquim estando aqui, tem a ver com o CEPED,

não há dúvida. Lá na Unirio, Lá na Unirio, por exemplo, onde dou aulas,

eu sou o único cepediano mas, enfim, o debate sobre questões de

ensino jurídico, do papel do Direito na sociedade atual é muito reflexo

do CEPED. A PUC foi acho que mais próximo de pessoas do CEPED que

se deslocaram para lá, mas uma experiência assim cepediana mesmo

acho que nesse ponto se frustrou porque ele não teve uma continuidade

institucional, uma pena.

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G.L. – É eu acho que está tudo aí.

T.R. – Então muito obrigada professor.

G.L. – Tem que tirar fotografia.

V.B. – Às ordens.

[FINAL DO ARQUIVO 1]

T.R. – Continuando a entrevista com o professor Vivaldo Barbosa.

V.B. – É só porque o Gabriel acabou de mencionar uma questão aqui de

que ele como aluno da PUC sentiu-se agredido por um método de ensino

que quiseram incutir na cabeça dele verdades que as pessoas já tinham

na cabeça delas. O CEPED realmente nunca foi isso. O CEPED ajudava,

procurava raciocinar e os materiais didáticos eram abrangentes, eram

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amplos. Eu lembro, em aulas, você mencionou o Lamy agora, a questão

de Marx. O Lamy realmente dizia, comentava o manifesto comunista de

Marx, dentro da perspectiva: “olha, o que o Marx fez, a análise que ele

fez do capitalismo é um elogio ao capitalismo como ele estava

florescendo, desenvolvendo naquele momento. A gente tem que

compreender o manifesto comunista nessa perspectiva aí”. Então o

CEPED como filosofia, como método de raciocínio era universal. Não era

a coisa tacanha dirigida para uma perspectiva, era universal. É evidente

que tinha o seu foco, não é? Mas ele era um método universal e como tal

realmente ele permitia as pessoas optarem por “n” caminhos que cada

uma foi optando. Era só isso.

T.R. – Obrigada

[FINAL DO DEPOIMENTO]