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Informativo 877-STF (20/09/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 877-STF Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo pelo fato de não terem sido ainda concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: HC 126457/PA; Rcl 22012/RS. ÍNDICE DIREITO PROCESSUAL PENAL SUSPEIÇÃO Arguição de suspeição de Rodrigo Janot em relação a Michel Temer. COLABORAÇÃO PREMIADA O § 3º do art. 7º da Lei nº 12.850/2013 prevê um limite máximo de duração do sigilo, sendo possível que ele seja retirado antes do recebimento da denúncia. PROGRESSÃO DE REGIME Data da prisão preventiva como marco inicial do tempo para a progressão de regime. DIREITO PROCESSUAL PENAL SUSPEIÇÃO Arguição de suspeição de Rodrigo Janot em relação a Michel Temer É possível a arguição de suspeição de membros do Ministério Público, inclusive do Procurador-Geral da República nos processos que tramitam no âmbito do STF. O STF entendeu que o então Procurador-Geral da República Rodrigo Janot não era suspeito para investigar e denunciar Michel Temer. Entendeu-se que o fato de o PGR dar entrevistas falando sobre o caso, requerer que o inquérito fosse dirigido para determinado Delegado e ainda que um determinado Procurador, em tese, tenha orientado o advogado do réu acerca da colaboração premiada não caracterizam hipóteses de suspeição. STF. Plenário. AS 89/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 13/9/2017 (Info 877). A situação concreta foi a seguinte: Michel Temer ingressou com arguição de suspeição em face do então Procurador-Geral da República Rodrigo Janot. No pedido, a defesa de Temer alegou, dentre outros argumentos, que: • o Ministério Público, no campo processual penal, ocupa posição sui generis, visto que não é parte material no sentido de que não detém interesse unilateral contraposto ao interesse de outrem. Nessa dimensão, exige-se do membro ministerial atuação pautada pela imparcialidade e com objetivo de fiscalização da lei;

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Informativo 877-STF (20/09/2017) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Informativo comentado: Informativo 877-STF

Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo pelo fato de não terem sido ainda concluídos em virtude de pedidos de vista ou de adiamento. Serão comentados assim que chegarem ao fim: HC 126457/PA; Rcl 22012/RS.

ÍNDICE DIREITO PROCESSUAL PENAL

SUSPEIÇÃO Arguição de suspeição de Rodrigo Janot em relação a Michel Temer. COLABORAÇÃO PREMIADA O § 3º do art. 7º da Lei nº 12.850/2013 prevê um limite máximo de duração do sigilo, sendo possível que ele seja

retirado antes do recebimento da denúncia. PROGRESSÃO DE REGIME Data da prisão preventiva como marco inicial do tempo para a progressão de regime.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

SUSPEIÇÃO Arguição de suspeição de Rodrigo Janot em relação a Michel Temer

É possível a arguição de suspeição de membros do Ministério Público, inclusive do Procurador-Geral da República nos processos que tramitam no âmbito do STF.

O STF entendeu que o então Procurador-Geral da República Rodrigo Janot não era suspeito para investigar e denunciar Michel Temer. Entendeu-se que o fato de o PGR dar entrevistas falando sobre o caso, requerer que o inquérito fosse dirigido para determinado Delegado e ainda que um determinado Procurador, em tese, tenha orientado o advogado do réu acerca da colaboração premiada não caracterizam hipóteses de suspeição.

STF. Plenário. AS 89/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 13/9/2017 (Info 877).

A situação concreta foi a seguinte: Michel Temer ingressou com arguição de suspeição em face do então Procurador-Geral da República Rodrigo Janot. No pedido, a defesa de Temer alegou, dentre outros argumentos, que: • o Ministério Público, no campo processual penal, ocupa posição sui generis, visto que não é parte material no sentido de que não detém interesse unilateral contraposto ao interesse de outrem. Nessa dimensão, exige-se do membro ministerial atuação pautada pela imparcialidade e com objetivo de fiscalização da lei;

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• a atuação de Rodrigo Janot contra o réu extrapolou os limites constitucionais e legais inerentes ao cargo, considerando que ele adotou obsessiva conduta persecutória contra Temer, revelando que sua motivação seria de ordem pessoal; • um exemplo de que Janot seria suspeito foi a frase que ele disse a jornalistas ao se referir a Temer: “enquanto houver bambu, lá vai flecha”; • outra circunstância está no fato de que Janot teria interferido no Departamento de Polícia Federal solicitando que determinado Delegado específico conduzisse as investigações contra Temer; • além disso, Janot teria dado inúmeras entrevistas à imprensa e proferido palestras sem demonstrar cautela em narrar os fatos que ainda estavam sendo apurados, o que demonstra a sua absoluta parcialidade. Diante desses argumentos, a defesa afirmou que está provado que Janot nutre um sentimento de evidente inimizade em relação a Temer, devendo ser aplicado, por analogia, o art. 254, I, do CPP:

Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes: I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;

Além disso, a defesa afirmou que o ex-Procurador da República Marcelo Miller teria treinado os executivos da JBS para gravar Temer, com a anuência de Janot, o que configuraria o impedimento do art. 254, IV, do CPP:

Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes: IV - se tiver aconselhado qualquer das partes;

Primeira pergunta: é cabível arguição de suspeição contra membro do Ministério Público? SIM.

É possível a arguição de suspeição de membros do Ministério Público, inclusive do Procurador-Geral da República nos processos que tramitam no âmbito do STF. STF. Plenário. AS 89/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 13/9/2017 (Info 877).

Em um Estado Democrático de Direito, ninguém pode ficar subtraído da jurisdição. O dever de investigar é da instituição, e não de um de seus membros. Assim, sendo reconhecida a suspeição de um determinado membro, a investigação continuaria normalmente, mas agora sendo conduzida por outro integrante do Ministério Público. Vale ressaltar que a própria Lei Orgânica do MPU (LC 75/93) reconhece a possibilidade de serem arguidas situações de impedimento e suspeição dos membros do MP:

Art. 238. Os impedimentos e as suspeições dos membros do Ministério Público são os previstos em lei.

O CPP determina que as mesmas causas de impedimento e suspeição previstas ao juiz devem também ser aplicadas aos membros do Ministério Público:

Art. 258. Os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos processos em que o juiz ou qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que lhes for aplicável, as prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes.

Importante esclarecer que é possível arguir a suspeição do membro do Ministério Público tanto quando ele atua como parte como também como custos legis (LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 1211).

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Deve-se mencionar, por fim, que o simples fato de o membro do MP ter participado da investigação criminal, não faz com que ele seja impedido ou suspeito para oferecer a denúncia e atuar na ação penal. Nesse sentido:

Súmula 234-STJ: A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

Esse é também o entendimento do STF: HC 85011, Relator p/ Acórdão Min. Teori Zavascki, julgado em 26/05/2015. E quanto ao mérito da suspeição, o STF concordou com os argumentos da defesa? O Procurador Rodrigo Janot foi reconhecido como suspeito para conduzir as investigações e a ação penal contra Michel Temer? NÃO.

O STF entendeu que o então Procurador-Geral da República Rodrigo Janot não era suspeito para investigar e denunciar Michel Temer. Entendeu-se que o fato de o PGR dar entrevistas falando sobre o caso, requerer que o inquérito fosse dirigido para determinado Delegado e ainda que um determinado Procurador, em tese, tenha orientado o advogado do réu acerca da colaboração premiada não caracterizam hipóteses de suspeição. STF. Plenário. AS 89/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 13/9/2017 (Info 877).

A emissão de opinião por parte do chefe do Ministério Público da União, por si só, não se qualifica como hipótese de inimizade capital. Para que se caracterize como “inimigo capital”, “é indispensável que o sentimento seja grave, que remeta ao ódio, a um sentimento de rancor ou de vingança. Não basta uma simples antipatia ou malquerença” (LIMA, Renato Brasileiro de. Código de Processo Penal Comentado. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 695). O Procurador-Geral da República, ao manifestar em entrevistas, congressos etc. as ações que o Ministério Público tem realizado na chamada operação “Lava Jato” adota conduta consentânea com a transparência que deve caracterizar o agir republicano. O requerimento do Procurador-Geral para que o inquérito fosse distribuído e ficasse restringido apenas ao Delegado que já estava trabalhando na investigação não significa uma interferência ministerial na Polícia Federal. Além disso, isso não indica inimizade capital entre o PGR e o réu. Por fim, a alegação de que um determinado Procurador (Marcelo Miller) teria orientado o advogado da parte sobre a colaboração premiada não significa suspeição por dois motivos: um, porque essa versão de que houve essa orientação ainda não está sendo apurada, não havendo prova efetiva; dois, porque não há como presumir que o arguido (PGR) tivesse o conhecimento dessa cogitada circunstância. As causas de impedimento e suspeição são sempre pessoais, de forma que não é possível acolher a alegação de que eventual esclarecimento prestado por um Procurador da República contaminaria, automaticamente, a higidez da atuação do Procurador-Geral da República.

COLABORAÇÃO PREMIADA O § 3º do art. 7º da Lei nº 12.850/2013 prevê um limite máximo de duração do sigilo,

sendo possível que ele seja retirado antes do recebimento da denúncia

O sigilo sobre o conteúdo de colaboração premiada deve perdurar, no máximo, até o recebimento da denúncia (art. 7º, § 3º da Lei nº 12.850/2013).

Esse dispositivo não traz uma regra de observância absoluta, mas sim um termo final máximo.

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Para que o sigilo seja mantido até o recebimento da denúncia, deve-se demonstrar a existência de uma necessidade concreta. Não havendo essa necessidade, deve-se garantir a publicidade do acordo.

STF. 1ª Turma. Inq 4435 AgR/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12/9/2017 (Info 877).

CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DA COLABORAÇÃO PREMIADA

- Colaboração premiada é um instituto previsto na legislação por meio do qual... - um investigado ou acusado da prática de infração penal - decide confessar a prática do delito - e, além disso, aceita colaborar com a investigação ou com o processo - fornecendo informações que irão ajudar, - de forma efetiva, - na obtenção de provas contra os demais autores dos delitos e contra a organização criminosa, - na prevenção de novos crimes, - na recuperação do produto ou proveito dos crimes ou - na localização da vítima com integridade física preservada, - recebendo o colaborador, em contrapartida, determinados benefícios penais (ex: redução de sua pena). A colaboração premiada possui natureza jurídica de "meio de obtenção de prova" (art. 3º, I, da Lei nº 12.850/2013). Chamo atenção para esse fato: a colaboração premiada não é um meio de prova propriamente dito. A colaboração premiada não prova nada (ela não é uma prova). A colaboração premiada é um meio, uma técnica, um instrumento para se obter as provas. “Enquanto os meios de prova são aptos a servir, diretamente, ao convencimento do juiz sobre a veracidade ou não de uma afirmação fática (p. ex., o depoimento de uma testemunha, ou o teor de uma escritura pública), os meios de obtenção de provas (p. ex.: uma busca e apreensão) são instrumentos para a colheita de elementos ou fontes de provas, estes sim, aptos a convencer o julgador (p. ex.: um extrato bancário [documento] encontrado em uma busca e apreensão domiciliar). Ou seja, enquanto o meio de prova se presta ao convencimento direto do julgador, os meios de obtenção de provas somente indiretamente, e dependendo do resultado de sua realização, poderão servir à reconstrução da história dos fatos” (BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. Rio de Janeiro. Campus: Elsevier. 2012, p. 270). MOMENTO

A colaboração premiada e a concessão dos benefícios dela decorrentes podem ocorrer em três momentos: 1) Na fase de investigação criminal (inquérito policial ou investigação conduzida pelo MP); 2) Durante o curso do processo penal (ainda que já em instância recursal); 3) Após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. PROCEDIMENTO ATÉ A ASSINATURA DO ACORDO DE COLABORAÇÃO

1) Negociação do acordo O investigado (ou acusado), assistido por advogado, negocia o acordo de colaboração premiada com o Delegado de Polícia ou com o Ministério Público. O juiz não participará, em hipótese alguma, das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração (§ 6º do art. 4º). Caso o magistrado interagisse nas negociações, haveria uma grave violação do sistema acusatório e um seríssimo risco de contaminação da sua imparcialidade, considerando que as informações enunciadas pelo eventual colaborador iriam incutir no julgador preconcepções sobre o próprio delator e seus comparsas.

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Se as negociações não culminassem com um acordo, a opinião do julgador a respeito do investigado/denunciado já estaria construída em seu psicológico, considerando que teria ouvido confissões sobre os fatos criminosos. Ademais, a simples presença do juiz da causa na tentativa de acordo poderia exercer uma indevida coerção velada para que o investigado/acusado aceitasse eventual proposta, o que contraria a natureza do instituto, já que a colaboração deve ser voluntária.

A colaboração é um meio de obtenção de prova cuja iniciativa não se submete à reserva de jurisdição (não exige autorização judicial), diferentemente do que ocorre nas interceptações telefônicas ou na quebra de sigilo bancário ou fiscal. Nesse sentido, as tratativas e a celebração da avença são mantidas exclusivamente entre o Ministério Público e o pretenso colaborador. O Poder Judiciário é convocado ao final dos atos negociais apenas para aferir os requisitos legais de existência e validade, com a indispensável homologação. STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

2) Formalização do acordo e envio à Justiça Caso as negociações tenham êxito, as declarações do colaborador serão registradas (em meio escrito ou audiovisual) e será elaborado um termo de acordo de colaboração premiada, a ser assinado por todas as partes e, então, remetido ao juiz para homologação. 3) Requisitos formais do acordo Segundo o art. 6º, o termo de acordo da colaboração premiada deverá ser feito por escrito e conter os seguintes requisitos formais: I - o relato da colaboração e seus possíveis resultados; II - as condições da proposta do Ministério Público ou do delegado de polícia; III - a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor; IV - as assinaturas do representante do Ministério Público ou do delegado de polícia, do colaborador e de seu defensor; V - a especificação das medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando necessário. Na proposta encaminhada ao Judiciário já deverá ser especificado o benefício que deverá ser concedido ao colaborador (ex: redução de 2/3 da pena). Deve-se esclarecer, contudo, que o magistrado não está vinculado aos termos da proposta, podendo adequá-la ao caso concreto (§ 8º do art. 4º). 4) O pedido de homologação do acordo é autuado como processo sigiloso O pedido de homologação do acordo será sigilosamente distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e o seu objeto (art. 7º). As informações pormenorizadas da colaboração serão dirigidas diretamente ao juiz a que recair a distribuição, que decidirá no prazo de 48 horas. Obs: se já houver um juízo que estiver funcionando no caso (ex: tiver deferido interceptação telefônica, recebido a ação penal etc.), este será o competente para apreciar o acordo, sendo distribuído a ele por prevenção. O acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao Delegado de Polícia, como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências em andamento. O acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia (§ 3º do art. 7º).

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5) Análise da homologação pelo juiz As negociações do acordo de colaboração premiada ocorrem em âmbito extrajudicial, sendo vedada, como vimos, a participação do magistrado. Repetindo: o magistrado não participa da negociação do acordo. Ocorre que, após celebrado, o pacto somente terá eficácia processual se for homologado pelo juiz. Na análise da homologação do acordo, o juiz deverá examinar os seguintes aspectos: a) Regularidade: se os aspectos formais e procedimentais foram atendidos; b) Legalidade: se a pactuação celebrada ofende algum dispositivo legal; c) Voluntariedade: se o investigado/acusado não foi coagido a assinar o acordo.

Art. 4º (...) § 8º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais, ou adequá-la ao caso concreto.

"A homologação não representa juízo de valor sobre as declarações eventualmente já prestadas pelo colaborador à autoridade judicial ou ao Ministério Público." (Min. Dias Toffoli, no HC 127483/PR). Isso significa que, quando o juiz homologa o acordo de colaboração premiada, não está necessariamente concordando ou afirmando que as declarações prestadas pelo colaborador são verdadeiras. Tais declarações ainda serão objeto de apuração.

A decisão do magistrado que homologa o acordo de colaboração premiada não julga o mérito da pretensão acusatória, mas apenas resolve uma questão incidente. Por isso, esta decisão tem natureza meramente homologatória, limitando-se ao pronunciamento sobre a regularidade, legalidade e voluntariedade do acordo (art. 4º, § 7º, da Lei nº 12.850/2013). O juiz, ao homologar o acordo de colaboração, não emite juízo de valor a respeito das declarações eventualmente prestadas pelo colaborador à autoridade policial ou ao Ministério Público, nem confere o signo da idoneidade a seus depoimentos posteriores. A análise se as declarações do colaborador são verdadeiras ou se elas se confirmaram com as provas produzidas será feita apenas no momento do julgamento do processo, ou seja, na sentença (ou acórdão), conforme previsto no § 11 do art. 4º da Lei. STF. Plenário. Pet 7074/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21, 22, 28 e 29/6/2017 (Info 870).

SIGILO LEVANTADO ANTES DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA

O § 3º do art. 7º da Lei nº 12.850/2013 prevê o seguinte:

Art. 7º (...) § 3º O acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia, observado o disposto no art. 5º.

É possível que esse sigilo seja retirado antes do recebimento da denúncia? SIM. O § 3º do art. 7º da Lei nº 12.850/2013 prevê um limite máximo de duração do sigilo, sendo possível que ele seja levantado (retirado) antes do recebimento da denúncia. Esse dispositivo não traz uma regra de observância absoluta, mas sim um termo final máximo. Para que o sigilo seja mantido até o recebimento da denúncia, deve-se demonstrar a existência de uma necessidade concreta. Não havendo essa necessidade, deve-se garantir a publicidade do acordo. Assim, nada impede que o sigilo do acordo seja afastado em momento anterior ao recebimento da denúncia, possibilitando conhecer aquele que subscreveu o acordo, bem assim o conteúdo do que declarado.

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Depois que forem realizadas as diligências cautelares, em regra, não subsiste mais razão para o sigilo, mesmo que ainda não tenha sido recebida a denúncia. Não há direito subjetivo do colaborador a que se mantenha, indefinidamente, a restrição de acesso ao conteúdo do acordo. Isso porque no âmbito da administração pública a regra é a publicidade e o sigilo é exceção, conforme estabelece o art. 5º, LX, da CF/88:

Art. 5º (...) LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;

Em suma:

O sigilo sobre o conteúdo de colaboração premiada deve perdurar, no máximo, até o recebimento da denúncia (art. 7º, § 3º da Lei nº 12.850/2013). Esse dispositivo não traz uma regra de observância absoluta, mas sim um termo final máximo. Para que o sigilo seja mantido até o recebimento da denúncia, deve-se demonstrar a existência de uma necessidade concreta. Não havendo essa necessidade, deve-se garantir a publicidade do acordo. STF. 1ª Turma. Inq 4435 AgR/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12/9/2017 (Info 877).

PROGRESSÃO DE REGIME Data da prisão preventiva como marco inicial do tempo para a progressão de regime

Importante!!!

Se o condenado estava preso preventivamente, a data da prisão preventiva deve ser considerada como termo inicial para fins de obtenção de progressão de regime e demais benefícios da execução penal, desde que não ocorra condenação posterior por outro crime apta a configurar falta grave.

STF. 1ª Turma. RHC 142463/MG, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12/9/2017 (Info 877).

Imagine a seguinte situação hipotética: João praticou um crime e foi preso preventivamente em 10/10/2010. Em 11/11/2011, ele foi condenado pelo juiz a uma pena de 12 anos de reclusão. Em 12/12/2012, o Tribunal de Justiça manteve a sentença. A defesa interpôs recursos especial e extraordinário contra o acórdão do TJ. Em 15/12/2012, antes que o Resp e o RE tivessem sido julgados, a defesa do réu pediu a progressão do regime fechado para o semiaberto alegando que ele já cumpriu 1/6 da pena e que apresenta bom comportamento. Segundo a defesa, esse 1/6 da pena (equivalente a 2 anos) deve ser contado desde a data em que ele foi preso preventivamente (10/10/2010). Logo, ele teria cumprido o requisito objetivo em 10/10/2012. O Ministério Público manifestou-se contrariamente ao pedido, afirmando que esse 1/6 da pena deve ser contado da data da sentença condenatória. A questão chegou até o STF. O que foi decidido? Qual será o termo inicial para a obtenção do benefício da progressão: a data em que o réu foi preso preventivamente (tese da defesa) ou o dia da publicação da sentença condenatória (tese do MP)? A data em que o réu foi preso preventivamente (tese da defesa).

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Se o condenado estava preso preventivamente, a data da prisão preventiva deve ser considerada como termo inicial para fins de obtenção de progressão de regime e demais benefícios da execução penal, desde que não ocorra condenação posterior por outro crime apta a configurar falta grave. STF. 1ª Turma. RHC 142463/MG, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 12/9/2017 (Info 877).

Assim, em caso de crime único, o marco para progressão de regime é contado da prisão cautelar (e não da publicação da sentença condenatória). O próprio STF possui uma súmula que, indiretamente, prevê a possibilidade de se computar o tempo da custódia provisória para fins de progressão de regime.

Súmula 716-STF: Admite-se a progressão de regime de cumprimento de pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.

O preso provisório deve fazer jus aos mesmos direitos que o preso definitivo, salvo se o benefício for incompatível com o texto expresso da lei. Não há qualquer mandamento legal impedindo o cômputo do período em que o sentenciado ficou preso cautelarmente para fins de progressão do regime fechado para o semiaberto.

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) É possível a arguição de suspeição de membros do Ministério Público, inclusive do Procurador-Geral da

República nos processos que tramitam no âmbito do STF. ( ) 2) O sigilo sobre o conteúdo de colaboração premiada somente poderá ser retirado com o recebimento da

denúncia. ( ) 3) Se o condenado estava preso preventivamente, a data da prisão preventiva deve ser considerada como

termo inicial para fins de obtenção de progressão de regime e demais benefícios da execução penal, desde que não ocorra condenação posterior por outro crime apta a configurar falta grave. ( )

Gabarito

1. C 2. E 3. C