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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Fortaleza, CE – 3 a 7/9/2012
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Instrumentos da comunicação pública como auxilio à participação
política dos cidadãos – Análise da consulta pública “Rio+20”1
Fabíola de Paula Liberato
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Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Bauru, SP
Resumo
Os instrumentos de comunicação pública são empregados para melhorar a qualidade de
vida dos cidadãos pela comunicação, pensando em atender as demandas da sociedade. A
partir das informações públicas que devem possuir características especificas para servir
para o aprofundamento da democracia, o cidadão pode entender sobre os problemas e
demandas que necessita e através de diálogos com outros envolvidos, torna-se possível
estabelecer possíveis consensos. As novas tecnologias têm potencial para ser utilizada como
meio de disseminação de informações, auxiliando no aumento da participação democrática
e na ampliação da esfera cívica. As consultas públicas on-line estabelecem-se como formas
de construção compartilhada de políticas públicas. Este trabalho teve como objetivo
analisar os mecanismos utilizados na elaboração da consulta pública, “Rio+20” realizada
pelo Ministério do Meio Ambiente. Os documentos analisados oferecem elementos
necessários para subsidiar decisões refletidas dos cidadãos no que se refere à participação
sobre a consulta pública em questão.
Palavras-chave: comunicação pública; deliberação; informação; consulta pública online;
Introdução
Acredita-se que a disponibilidade de informações plurais deva ocorrer com
frequência em uma sociedade democrática. Desse modo, a comunicação pública tem o
dever de informar, escutar, considerar a relação social com os cidadãos, estabelecer
diálogos, promover o debate público e a prestação de serviços, estabelecendo-se como um
espaço de discussão pública e tomada de decisões.
Os instrumentos de comunicação pública são empregados para melhorar a qualidade
de vida dos cidadãos pela comunicação, pensando em atender as demandas da sociedade.
1 Trabalho apresentado no GP Mídia, Cultura e Tecnologias Digitais na América Latina do XII Encontro dos Grupos de
Pesquisa em Comunicação, evento componente do XXXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.
2 Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação Midiática da Universidade Estadual Paulista e bacharel
em Relações Públicas pela mesma instituição, email: fabiolaliberato@hotmail..
3 A autora agradece a FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) pelo apoio à pesquisa
relacionado a este trabalho.
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No entanto, para que o cidadão possa se posicionar em relação as suas perspectivas é
preciso informação. A informação, quando assimilada, representa uma alteração ou
aquisição de conhecimento de uma pessoa sobre determinado assunto.
A partir das informações públicas obtidas, o cidadão pode desenvolver entendimento
próprio sobre os problemas e demandas que necessita e através de diálogos com outros
envolvidos, torna-se possível estabelecer possíveis consensos. Para que o cidadão tenha
condições de optar por determinadas políticas públicas é preciso que haja informação
adequada.
É preciso considerar a qualidade da informação apresentada, que deve ser clara de
forma que perpasse pelas questões em pauta e informe qualquer cidadão, independente do
conhecimento pré-construído sobre o assunto. Neste caso, as novas tecnologias, como a
internet, têm potencial para ser utilizada como meio de disseminação de informações sob
diversas óticas, auxiliando no aumento da participação democrática e na ampliação da
esfera cívica. A participação das pessoas na tomada de decisões contribui para o
fortalecimento da democracia participativa.
Neste sentido, as consultas públicas on-line são formas de construção compartilhada
de políticas públicas e legislação. A política pública deve ser colocada para consulta pública
para informar e auxiliar à formação política do cidadão. A consulta precisa envolver o
cidadão com ferramentas, pensando que essas irão atingir um grupo maior e não apenas os
que usualmente usariam a internet para participar. A consulta tem que incluir de alguma
maneira os participantes além da configuração on-line.
Considerando o potencial das TICs no auxilio ao engajamento político que, por
meio das consultas públicas podem estimular os cidadãos a participação e a decisão
deliberada, surgem, desse modo, objetivos relevantes para a investigação científica:
verificar a qualidade da comunicação pública digital como meio de informação e identificar
e analisar os mecanismos utilizados na elaboração da consulta pública “Rio+20” realizada
pelo Ministério do Meio Ambiente, necessários para subsidiar decisões dos cidadãos.
Esse estudo inicia-se como a revisão teórica que envolve temáticas de comunicação
pública, deliberação, internet e consultas públicas. Em seguida a identificação da consulta
pública analisada é apresentada, então, a análise da consulta pública “Rio+20” desenvolvida
pelo Ministério do Meio Ambiente é oferecida. Considerações finais sintetizam as
contribuições apresentadas.
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Governo eletrônico, comunicação pública e internet
O conceito de Governo eletrônico teve início a partir dos anos 90 na América Latina
trazido pela modernização do Estado com os avanços das Tecnologias da Informação e
Comunicação (TIC) no ambiente público que passa por transformações de gestão,
reconhecendo a importância e necessidade de garantir o direito ao cidadão em obter
informações sobre gestão pública (DUJISIN e VIGÓN, 2004).
Bezerra e Jorge (2010) utilizam a questão da boa governança como indicativo da
democratização entre cidadãos e governo. O acesso a informações claras, que auxiliem a
tomada de decisão de representantes e representados, é um fator que faz com que as
relações entre cidadãos e representados ocorram de forma democrática. Dessa forma,
através da utilização da internet como meio de comunicação e informação, pratica-se a
responsabilidade pública, recurso fundamental para a prática da boa governança.
Para que os cidadãos tenham domínio do contexto envolvido nas decisões a respeito de
determinado tema político, precisam de mais dados, que, de acordo com Bezerra e Jorge
(2010), vão além das informações acessíveis no rádio, televisão e jornal. As tecnologias da
comunicação e informação podem aproximar representados e governo, possibilitando a
divulgação de dados importantes para o fortalecimento da fiscalização das ações políticas
dos representantes.
A atuação do Estado por meio do governo eletrônico se relaciona à prestação de
serviços e à divulgação de informações por meio da internet, modificando a forma de o
governo desempenhar suas funções, o que, exige a informatização de processos para
aumentar a participação dos cidadãos na fiscalização do Estado e tornar mais eficazes as
políticas públicas. O governo eletrônico foi desenvolvido com o objetivo de melhorar os
serviços oferecidos pelo Estado, diminuindo assim os custos, o tempo gasto e aumentando a
accountability, o acesso ao governo e a fiscalização, visando reduzir a corrupção
(PEREIRA, AMARAL E COSTA 2010).
Considerando o contexto comunicacional, é preciso certificar que a transparência “não
será garantida pela simples publicação de dados e de informações na rede, mas por meio de
uma estratégia clara de gestão informacional” (SILVA, 2010, p. 127).
O desenvolvimento da comunicação pública se deu em maior amplitude, após o
período de redemocratização brasileira. Desde então, essa expressão passou a ser
empregada em diferentes contextos e segundo Brandão (2009) tem como característica o
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planejamento e a comunicação estratégica no relacionamento com os diferentes públicos. A
comunicação pública exerce posição de mediadora entre o Estado e a sociedade,
estabelecendo diálogo que promova a melhoria na relação governo/cidadão, estimulando o
conhecimento cívico.
Em instituições públicas, a comunicação pública torna-se responsável por agir de
acordo com o as necessidades e interesses dos cidadãos, referindo-se a disponibilidade de
informações relativas a temas de interesse coletivo.
Duarte (2009) propõe quatro eixos que considera centrais da comunicação pública: 1)
transparência, ao abordar as questões de interesse público; 2) acesso: garantir aos cidadãos
facilidade na obtenção de informações relevantes; 3) interação: criar mecanismos de
aproximação que estimulem a participação cidadã e 4) ouvidoria social: governo precisa
saber a opinião pública, ter conhecimento das demandas para poder corresponder às
exigências dos cidadãos.
A idéia é melhorar a qualidade de vida dos cidadãos pela comunicação, para isso os
instrumentos de comunicação pública são empregados, pensando em atender as demandas
da sociedade. No entanto, para que o cidadão possa se posicionar em relação as suas
perspectivas é preciso informação que se torna uma forma de acesso. A informação, quando
assimilada, representa uma alteração ou aquisição de conhecimento de uma pessoa sobre
determinado assunto.
A comunicação mediada por aparelhos tecnológicos tornou o espaço público mais
virtual, criando novas necessidades. Nos anos 90, o investimento em aparatos tecnológicos
modificou a administração pública que iniciou um processo de maior interação do cidadão
com o setor público. Quando novas tecnologias de comunicação e informação amparam a
comunicação pública, cria-se a possibilidade de disponibilizar serviços e informações mais
abrangentes (DUARTE E VERAS, 2006; DUARTE, 2009; SOUSA, 2006; FERREIRA,
2009).
A comunicação pública que se torna possível em função do avanço tecnológico pode
ser vista como algo potencialmente plural e diversificado, capaz de estimular o
desenvolvimento de determinadas qualidades democráticas atualmente valorizadas pela
literatura especializada.
Considerando as arenas comunicativas como espaços onde ocorrem discussões de
interesse público e relacionando as novas tecnologias da comunicação e informação, nesse
caso a internet, pode-se estabelecer certa relação. “Evidentemente, a internet se mostra
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como importante “lugar”, uma “arena conversacional”, na qual o espaço se desdobra e
novas conversações e discussões políticas podem seguir seu curso” (MAIA, R. 2008, p.
283).
Desse modo, a internet permite interação a distância entre os usuários, que podem
estabelecer comunicação estando em diferentes locais, participar dos debates, emitindo
opiniões e se interando das discussões, podendo formar reflexões ponderadas.
O uso da internet a partir dos anos 90 no Brasil despertou perspectivas da utilização
da web na expansão da participação política dos cidadãos. Instituía-se uma ideia de
renovação das formas de comunicação e obtenção de informação, que passa a ser direta,
sem haver necessidade de intermediadores. “Além disso, a informação política em rede está
disponível a um acesso mais rápido, mais barato e mais cômodo do que a informação
política industrial” (GOMES, 2008, p.307).
Gomes (2008) identifica algumas vantagens da internet como instrumento de
participação política: entraves como tempo e espaço são suprimidos; amplo volume de
informações de qualidade que podem ser armazenadas para acesso imediato; conforto de
obter informações e serviços necessários de acordo com a disponibilidade do cidadão;
acesso a informações políticas variadas; internet como ambiente favorável a liberdade de
opinião, onde flui a informação; a interatividade proporcionada pela internet faz com que a
comunicação ocorra como via de mão-dupla, com retorno de ambos envolvidos e chance de
participação de minorias que reforça a abrangência da rede.
A contribuição da internet tona-se evidente, no entanto, não se deve atribuir às novas
tecnologias a responsabilidade de engajar cidadãos na política. A rede eletrônica, nesse
aspecto, surge como um recurso comunicacional a ser utilizado pelos governantes para
melhorar a questão da participação democrática.
Deliberação e informação de diagnóstico
A comunicação depende das interações e mediações entre os sujeitos, que podem ser
instituídas pelas tecnologias da informação e comunicação. Nesse cenário, é preciso edificar
novas maneiras de participação, novos espaços e ações. A teoria deliberativa estima formas
de comunicação como via de mão-dupla entre governantes e cidadãos, a partir da criação de
articulações discursivas que validariam as políticas públicas. A teoria habermasiana
imagina a deliberação pública como um processo ideal no qual se devem aceitar todas as
pretensões dos envolvidos no debate de modo que a compreensão e solução dos conflitos
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demandam uma ação comunicativa. Para Marques (2009), uma definição de deliberação
seria:
(...) um processo social de comunicação através do qual os indivíduos têm a
oportunidade de apresentar seus pontos de vista e suas perspectivas diante dos
outros, interpelando-os e demandando-lhes a validação de seus argumentos após
uma discussão baseada no respeito recíproco (p. 13).
A deliberação exige reconhecer que a solução final atenda o maior número de
interesses possíveis envolvidos em uma negociação. Nesse contexto, além do reconhecido
papel de organizar, articular e divulgar as ideias aos envolvidos no debate, a comunicação
tem a função de aproximar os cidadãos no sentido de ser empática, na medida em que ao
considerar o problema do outro, ocorre uma aproximação entre os cidadãos para que as
demandas sejam consentidas.
As sociedades contemporâneas são marcadas pelo pluralismo, que não exige que as
ideias sejam compartilhadas por todos, porém, no processo de deliberação pública, é preciso
que todos os envolvidos aceitem o debate. A deliberação mantém o pluralismo, aceita as
diferenças e propõe encontrar soluções que melhor atenda aos interesses, as diferenças que
serão negociadas.
Não é preciso acabar com o pluralismo para que se chegue ao consenso pela via
deliberativa. Não é necessário que o cidadão dissolva sua crença para que prevaleça a de
outra pessoa. No entanto, em algum momento esse interesse ou parte dele será justaposta
pelos consensos, parte será relativizada pelos “consensos por justaposição”. Não se trata de
um consenso absoluto, mas as diferenças convivem por justaposição, para que dessa forma,
seja atendida a maior parte possível das demandas (RAWLS, 2000).
Desta forma, a busca do equilíbrio reflexivo se mostra como alternativa plausível,
para que os interesses sejam refletidos e as demandas ponderadas. Para que isso ocorra, é
preciso “admitir a existência de múltiplos públicos competitivos (ou diversas microesferas
públicas), cada um com suas pretensões de validade, chamando para si o domínio da
compreensão de determinada questão em debate” (ROTHBERG, 2008, p. 156).
A deliberação, realizada nas arenas sociais, pode ocorrer, como salienta Marques
(2009), de três maneiras: a conversação cívica, o debate político mediado pela mídia e a
deliberação formal. Habermas (1997) pontua que a deliberação sofre influências das
conversações cotidianas de cada cidadão, questões particulares são postas no debate público
e cria-se identificação dos envolvidos. Já estando na esfera pública, essas questões podem
ser analisadas como públicas e levadas aos espaços formais de decisão.
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Mas ocorre também das deliberações em instituições administrativas possuírem
diferenças de temporalidade das conversações cívicas, que também podem ficar limitadas
aos bairros ou municípios. O processo deliberativo é caracterizado como uma rede
complexa de debates e práticas de intercompreensão, que ocorre em temporalidades
diversas e traz benefícios para a democracia nas sociedades pluralistas contemporâneas,
independente do contexto que pode ser formal, informal como já mencionado e
mediatizado.
O processo de negociação identificado na deliberação pública pode ocorrer em
espaços formais e informais, em diferentes contextos. Nesse aspecto, a deliberação pode
instigar a participação dos cidadãos nas discussões de interesse comum na elaboração de
políticas públicas, controle sobre a ação dos agentes políticos e exposição dos problemas
reais vividos pelos cidadãos. Porém, para que o debate entre envolvidos se estabeleça de
forma benéfica, é necessário o acesso a informações plurais e consistentes que auxiliam no
entendimento e possível argumentação dos cidadãos.
Nesse processo de formação refletida da opinião dos cidadãos, os ambientes
informais de discussão são importantes, no entanto, o debate não deve ficar limitado em
pequenas arenas de argumentação. Como ponderado por Maia (2008), para que negociações
desenvolvidas em arenas restritas sejam percebidas como políticas, elas precisam de
visibilidade para o reconhecimento em debates mais amplos. Discussões mais abrangentes
podem ser realizadas por intermédio de associações cívicas e movimentos sociais.
A informação deve possuir características especificas para poder servir para o
aprofundamento da democracia. Somente a quantidade de informações não garante a
qualidade (ROTHBERG, 2009). Na prática do jornalismo comercial, não é presente o
conceito de informação política. Para ser utilizada de modo a mediar a democracia, a
política deve ser informada. A disponibilidade de informações e acesso as políticas públicas
podem orientar os cidadãos a formular posicionamentos e atender as demandas sociais.
A informação precisa apresentar-se de forma que contribua para o desenvolvimento
democrático. Rothberg (2009) afirma que um conceito importante no âmbito da qualidade
da informação é a informação de diagnóstico que tende a analisar a política de forma que
abarque antecedentes, necessidades, execução e resultado das políticas implementadas, ou
seja, informe o cidadão de modo que ele consiga avaliar as consequências das políticas.
Neste contexto, a internet torna-se um veiculo diferenciado considerando a liberdade de
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informação e dinamismo não existente no mesmo grau em outros meios de comunicação
comerciais.
A informação de diagnóstico é aquela em que os dados são capazes de dar suporte
para que os cidadãos possam chegar aos efeitos das políticas públicas, tenham informações
para poder entender, ponderar e fazer escolhas, atingindo, o que Kuklinski et al (2001)
designam como equilíbrio de “compensações” entre os resultados das políticas. O planejador
de políticas vai pensar nos prós e contras, nas consequências da implantação de
determinada política. É a ideia de que tudo tem vantagens e desvantagens, por isso é
pertinente avaliar as políticas públicas.
Para participar de forma igualitária, todos devem ter acesso a informação pública
que precisa ser suficiente para os cidadãos chegarem aos efeitos de compensação dessas
políticas. Faz-se necessário que o acesso aos dados ofereça a chance dos representados
discutirem, formular razões que possam ser compreendidas por todos e ponderar as políticas
públicas para se chegar a uma acepção coletiva de seus interesses, desse modo, a qualidade
da informação é imprescindível para que se chegar aos efeitos de compensação de políticas.
Neste contexto, as consultas públicas, quando bem empregadas, auxiliam no
processo de ponderação dos efeitos positivos e negativos, verificando se a implantação de
tal política será compensatória, no entanto, para exercer essa habilidade, é preciso ter
informação de diagnóstico. Desse modo, se acredita que as novas tecnologias podem
auxiliar no desenvolvimento de formas de acesso a informação de diagnóstico de qualidade
como subsídios adequados as decisões políticas, assim, tem-se a internet como um meio de
comunicação favorável a formação de diagnósticos. (ROTHBERG 2009; 2010).
Consultas públicas
A participação dos cidadãos pode acontecer por meio de mecanismos alternativos
como as consultas públicas. Considerando a realidade da democracia no Brasil, esses
instrumentos de participação apresentam relevante importância como novos espaços
públicos disponíveis aos cidadãos que podem determinar as soluções viáveis para os
problemas detectados nas comunidades.
As mediações nos mecanismos de participação online como fóruns e consultas
públicas passam pelo processo de negociação de interesses, visando encontrar soluções
justas e equitativas. A condução da discussão, segundo Rothberg (2008) e Dalhberg (2001),
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deve prosseguir de modo que os interessados estabeleçam uma relação empática, baseada
no respeito e cooperação no tratamento de suas divergências, que assegure a pluralidade e a
liberdade de expressão articulando os argumentos de forma deliberativa.
O sucesso dos debates depende do desempenho dos moderadores, que precisam
conduzir a discussão de forma integrada, com informações relevantes apresentadas com
clareza e organização de ideias, para que todos os envolvidos tenham condições de
participar. Portanto, é necessário que haja regras gerais para mediação, como reforça
Rothberg (2008), esses preceitos precisam ser esclarecidos antecipadamente, evitando
conflitos com os participantes.
As contribuições dos cidadãos nas consultas públicas precisam ser orientadas para
que os argumentos expostos tragam efetivamente contribuições e o espaço seja utilizado
para o desenvolvimento democrático e não simplesmente para que os participantes
demonstrem seu descontentamento em relação a determinado assunto político utilizando
palavras de baixo calão ou assuntos fora do contexto da consulta em questão. No sentido de
evitar esse tipo de situação, é necessário que seja feito o preenchimento de um cadastro com
informações pessoais, na qual o sigilo dos dados n deve ser garantido.
Nem todas as consultas públicas abrangem temas genéricos, de baixa
complexidade. Nesse caso, a democracia digital, através da comunicação pública deve
garantir instrumentos para que o cidadão possa se informar sobre o assunto em pauta. Uma
alternativa para consultas sobre temas complexos como aborto, maioridade penal e pena de
morte, como evidencia Rothberg (2008) seria especificar a quem essas consultas são
dirigidas e evidenciar ser necessário possuir habilidades específicas delimitadas por áreas,
como consultas endereçadas a área da saúde, por exemplo, que levaria os envolvidos ao
contato com documentos divulgados para poder deliberar sobre o assunto.
Como forma de reduzir a apatia política, a democracia digital pode ser impulsionada
com a utilização das novas tecnologias para desenvolverem sistemas de consulta pública
eficientes, que envolvam questões pertinentes e possuam informações necessárias e
específicas para cada público, objetivando a formação e participação política do cidadão.
O processo de consulta pública teria o objetivo de formar, amadurecer decisões,
informar o cidadão sobre determinado assunto político. Nesse sentido, como ressalta
Coleman (2002), o fato de o cidadão ter acesso e observar as discussões em torno das
consultas públicas, mesmo que não esboce opinião, demonstra participação política, novas
informações são absorvidas, auxiliando a formação política desse cidadão.
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O retorno da participação cidadã no processo de consulta pública é decisório, à
medida que os cidadãos não percebem as políticas como consequências de escolhas e de
compensações entre os efeitos possíveis, estes se relacionam de maneira superficial e dessa
forma, sem a participação dos indivíduos, os agentes políticos fazem escolhas sozinhos,
muitas vezes representando interesses próprios. As trocas sociais entre os envolvidos em
comunidades, a participação e o compartilhamento de opiniões, valores e confiabilidade
entre os indivíduos traz oportunidades de aprimoramento dos grupos perante as instituições
democráticas.
Análise das ferramentas utilizadas na Consulta Pública Rio+20
A consulta pública sobre a Rio+20 ficou disponível no site
http://hotsite.mma.gov.br/rio20/consulta-publica-4/ e contou com um texto de apresentação
acerca da Conferência do Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), realizada pela
Organização das Nações Unidas (ONU) em junho de 2012, na cidade do Rio de Janeiro.
No contexto da Rio+20, cada país participante deveria apresentar contribuições
sobre o assunto em pauta até 1º de novembro de 2011 para que, a partir dessas
contribuições, o documento inicial fosse elaborado. Dessa maneira, o Ministério do Meio
Ambiente, com a justificativa de garantir um processo inclusivo na elaboração das
propostas do Brasil, abriu a referida Consulta Pública com o objetivo de fortalecer as
posições defendidas pelo país na Rio+20.
As contribuições dos cidadãos puderam ser feitas através de um questionário com
11 perguntas que poderiam ser respondidos pela sociedade civil ou em nome de
organizações. Estabeleceu-se um padrão de formatação das respostas que deveriam ser
enviadas ao e-mail destinado no texto de apresentação sobre a consulta até o dia 25 de
novembro de 2011. A Consulta Pública sobre a Rio+20 esteve aberta para contribuições
entre os dias 5 e 30 de setembro de 2011.
No hotsite da consulta4, estava disponível para visualização um texto de apoio para a
Consulta Pública que abordou os principais aspectos da Conferência Rio+20, o texto de
inicia com datas e programação do evento. Nesse texto, diretrizes gerais sobre a
4 Link de acesso as informações sobre o texto de apoio à Consulta Pública Rio+20
http://hotsite.mma.gov.br/rio20/consulta-publica-4/texto-de-apoio-para-a-consulta-publica/. Acesso em
6/06/2012 às 14h52min.
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Conferência foram expostas para conhecimento dos participantes da consulta. Explicações
gerais sobre os temas abordados durante o evento também foram oferecidas.
As informações disponíveis no texto de apoio foram capazes de apresentar o tema
em questão para que os cidadãos participantes da consulta pudessem ter respaldo para
participar e contribuir de forma efetiva. No entanto, foram disponibilizadas informações
superficiais em relação ao questionário proposto.
As perguntas envolveram dados mais aprofundados, sobre, por exemplo,
Conferências do Desenvolvimento Sustentável passadas, o que requer conhecimento prévio
dos envolvidos. Embora no hotsite do evento informações aprofundadas pudessem ser
encontradas, é preciso considerar os dados existentes nos textos de apoio para a
participação na consulta.
Nessa questão a disponibilização de outros textos de apoio, que sintetizassem os
principais avanços ocorridos em conferências anteriores seria positiva para que todos os
cidadãos, independente da formação ou área de atuação profissional pudessem tomar
conhecimento do assunto abordado de forma mais completa e assim, ter condições de
responder as perguntas do questionário de forma eficaz.
Algumas perguntas apresentadas no questionário eram específicas e favorecia
respostas de profissionais com conhecimento aprofundado na área ambiental. No entanto, a
ideia exposta sobre a Consulta Pública Rio+20 era saber a opinião para a construção do
documento brasileiro. Dessa maneira, a ampla abordagem e disponibilização de diferentes
textos com visões sobre a sustentabilidade, economia verde e meio ambiente poderia
contribuir para que a participação ocorresse de forma consciente com as demandas reais.
Para responder o questionário era preciso antes se identificar, então após o
encerramento da consulta elaborou-se um Relatório Final sobre a Consulta Pública Rio+20
que também encontra-se disponível no hotsite da conferência. O documento final traz
informações sobre o número de participantes (139) e a divisão dos setores envolvidos: 103
participantes da sociedade civil, 16 empresas, 9 de comunidades acadêmicas e 11
participantes de governos locais. O relatório traz também a distribuição geográfica dos
participantes.
O relatório atentou-se em agrupar as principais respostas das 11 questões,
desenvolvendo a compilação das respostas recolhidas e sintetizando os pontos principais
elaborados por cada grupo participante (sociedade civil, comunidade acadêmica, setor
empresarial e governos locais).
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Ao final, o relatório apresenta a conclusão ressaltando que o processo de consulta
pública atingiu as expectativas do Ministério do Meio Ambiente pela qualidade e
quantidade de respostas recebidas. O texto destacou a participação civil como meio de
melhorar o processo decisório de maneira democrática na agenda da sustentabilidade
nacional e internacional.
A ferramenta de visualização dos comentários dos participantes durante o período da
consulta não foi utilizado na consulta sobre a Estratégia de Transportes. Os comentários dos
participantes foram disponibilizados quando acabou o prazo para participação na Consulta
Pública Rio+20 e os resultados foram apresentados. Esses comentários poderiam servir de
base para que novas ponderações fossem feitas.
Outro recurso interessante seria utilizar um mecanismo tecnológico que deixasse
disponível todos os comentários feitos durante o período da consulta, para que os outros
participantes pudessem ter acesso antes deles participarem. Outra ferramenta é o
mecanismo de votar nos comentários e estabelecer um ranking dos mais e menos votados,
estimula a participação. Dessa forma, amplia a oportunidade de se informar e conhecer as
ideias dos outros participantes.
Considerações Finais
A comunicação pública amparada pelas redes digitais passa a ser um canal de duas
vias, no qual ocorrem interações em curto intervalo de tempo. A velocidade e interatividade
proporcionada pela internet são fatores que facilitam a participação do cidadão em assuntos
políticos.
As informações disponíveis devem conter subsídios que suportem as decisões dos
cidadãos, que sejam suficientes para que haja entendimento do assunto em pauta, para que
as escolhas sejam ponderadas. No caso da Consulta Pública Rio+20, as informações
contidas nos documentos disponíveis para consulta poderiam ser mais bem detalhadas para
orientar as sugestões dos participantes, no entanto os subsídios eram coerentes com a
estratégia elaborada.
Ao permitir que os participantes sejam expostos a perspectivas diferentes das suas, o
cidadão pode se informar e ponderar se sua demanda é coerente, justa ou se anula as
pretensões de outros envolvidos na consulta. Neste sentido, o acesso a dados plurais e
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seguros oferece a oportunidade dos envolvidos ponderarem as políticas públicas para que as
escolhas atendam o maior número de demandas possível.
A utilização das novas tecnologias da informação e comunicação amplia os espaços
de participação democrática. A internet pode auxiliar na disponibilização de dados mais
abrangentes e estimular os cidadãos a participarem do processo político.
A tecnologia comporta que a participação ocorra fora dos mesmos limites de tempo,
cada um participa quando puder. Os documentos informativos disponibilizado na consulta
analisada possibilitaram que os participantes levantassem aspectos que talvez não fossem
considerados.
Diferentes instrumentos de participação, como as consultas públicas online
configuram-se como novos espaços de debate disponíveis para que os cidadãos opinem por
recursos e sugiram melhorias de acordo com suas realidades, conforme os problemas que
afetam os locais onde vivem que passam pelo processo de negociação de interesses, de
consensos almejando soluções equitativas. Dessa forma, deve-se esperar da tecnologia a
utilização de ferramentas que tornem o debate mais justo e qualitativo.
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