Integração Curricular das TIC no 1º CEB: contributos do computador Magalhães

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INTEGRAÇÃO CURRICULAR DAS TIC NO 1º CEB: CONTRIBUTOS DO COMPUTADOR MAGALHÃES Conceição Coelho Agrupamento de Escolas José Saraiva Conceição Fernandes Agrupamento de Escolas José Saraiva Joana Viana Instituto de Educação, Universidade de Lisboa Pedro Silva Escola Superior de Educação e Ciências Sociais, Instituto Politécnico de Leiria Resumo Apresentam-se os resultados sobre a utilização do computador Magalhães, em contexto de sala de aula, analisando os efeitos escolares da sua utilização e a integração curricular das TIC no 1º ciclo do Ensino Básico. O estudo surge no âmbito de uma investigação, de cariz sociológico, sobre os usos e efeitos, escolares e sociais, do computador Magalhães, num agrupamento de escolas de Leiria. A investigação de natureza longitudinal (2009-2011) apresenta um design metodológico misto, com uma componente extensiva (questionários a alunos, professores e famílias) e outra intensiva (etnografia de uma turma, entrevistas). Na relação com a escola, o computador e a Internet são encarados como instrumentos potenciadores de novas práticas e novas relações pedagógicas onde “a contribuição real dos meios de comunicação digitais para a educação é a flexibilidade que pode permitir a cada indivíduo encontrar trajetos pessoais para aprender” (Papert, 1997). Contudo, diversos estudos apontam para uma visão cautelosa em relação aos efeitos das TIC, revelando que a sua aplicação simples, sem nada modificar as práticas de ensino, tal como sucede frequentemente, não traz mudanças significativas aos sistemas educativos (Eurydice, 2001; Miranda, 2007). Os dados analisados revelam uma adesão significativa ao Magalhães, que sobressai como um computador pessoal para a criança, e uma utilização crescente do computador em situação de aula. A Língua Portuguesa é a área mais trabalhada com o computador Magalhães na sala de aula, seguida pelo Estudo do Meio, e, com bem menor representatividade, a Matemática e as Expressões. A utilização do portátil nas atividades letivas incide principalmente na escrita de textos, nos jogos didáticos e na consulta de enciclopédias. A Internet é utilizada principalmente para pesquisas e, com valores mais reduzidos, jogos e acesso a blogues. Com base no estudo etnográfico destaca-se o contributo do uso do Magalhães para uma maior autonomia e respeito pelos ritmos de aprendizagem dos alunos. O portátil é usado em atividades curriculares disciplinares e não disciplinares, encarado como mais um meio e material de apoio à aprendizagem, como mais um recurso para professor e alunos, a par dos mais “tradicionais”. A professora da turma promove uma integração entre todos os meios à sua disposição. Palavras-chave: computador Magalhães, TIC, integração curricular, 1º CEB

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Joana Viana, Pedro Silva, Conceição Coelho, Conceição Fernandes AFIRSE, 2012

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INTEGRAÇÃO CURRICULAR DAS TIC NO 1º CEB: CONTRIBUTOS DO COMPUTADOR MAGALHÃES

Conceição Coelho

Agrupamento de Escolas José Saraiva

Conceição Fernandes Agrupamento de Escolas José Saraiva

Joana Viana

Instituto de Educação, Universidade de Lisboa

Pedro Silva Escola Superior de Educação e Ciências Sociais, Instituto Politécnico de Leiria

Resumo

Apresentam-se os resultados sobre a utilização do computador Magalhães, em contexto de sala de aula, analisando os efeitos escolares da sua utilização e a integração curricular das TIC no 1º ciclo do Ensino Básico. O estudo surge no âmbito de uma investigação, de cariz sociológico, sobre os usos e efeitos, escolares e sociais, do computador Magalhães, num agrupamento de escolas de Leiria. A investigação de natureza longitudinal (2009-2011) apresenta um design metodológico misto, com uma componente extensiva (questionários a alunos, professores e famílias) e outra intensiva (etnografia de uma turma, entrevistas).

Na relação com a escola, o computador e a Internet são encarados como instrumentos potenciadores de novas práticas e novas relações pedagógicas onde “a contribuição real dos meios de comunicação digitais para a educação é a flexibilidade que pode permitir a cada indivíduo encontrar trajetos pessoais para aprender” (Papert, 1997). Contudo, diversos estudos apontam para uma visão cautelosa em relação aos efeitos das TIC, revelando que a sua aplicação simples, sem nada modificar as práticas de ensino, tal como sucede frequentemente, não traz mudanças significativas aos sistemas educativos (Eurydice, 2001; Miranda, 2007).

Os dados analisados revelam uma adesão significativa ao Magalhães, que sobressai como um computador pessoal para a criança, e uma utilização crescente do computador em situação de aula. A Língua Portuguesa é a área mais trabalhada com o computador Magalhães na sala de aula, seguida pelo Estudo do Meio, e, com bem menor representatividade, a Matemática e as Expressões. A utilização do portátil nas atividades letivas incide principalmente na escrita de textos, nos jogos didáticos e na consulta de enciclopédias. A Internet é utilizada principalmente para pesquisas e, com valores mais reduzidos, jogos e acesso a blogues.

Com base no estudo etnográfico destaca-se o contributo do uso do Magalhães para uma maior autonomia e respeito pelos ritmos de aprendizagem dos alunos. O portátil é usado em atividades curriculares disciplinares e não disciplinares, encarado como mais um meio e material de apoio à aprendizagem, como mais um recurso para professor e alunos, a par dos mais “tradicionais”. A professora da turma promove uma integração entre todos os meios à sua disposição.

Palavras-chave: computador Magalhães, TIC, integração curricular, 1º CEB

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Résumé

On présente les résultats de l’utilisation de l’ordinateur Magalhães en classe, avec l’analyse des conséquences pédagogiques de son utilisation et de l’inclusion des Technologies de l’Information et de la Communication (TIC) dans le programme scolaire du niveau élémentaire. Cette étude est le fruit d’une recherche sociologique sur l’utilisation et effets, scolaires et sociaux, de l’ordinateur Magalhães, dans un groupe d’écoles élémentaires de Leiria, Portugal. L’étude longitudinal (2009-2011) est de méthodologie mixte avec une partie extensive (questionnaires aux élèves, maîtres et la famille des élèves) et une partie intensive (ethnographie d’une classe, interviews).

À l’école, l’ordinateur et l’internet sont vus comme des instruments qui incitent à l’utilisation de nouvelles méthodes et de nouvelles interactions pédagogiques où « la contribution réel des médias digital pour l’éducation est la flexibilité que celle-ci peut permettre a chaque individu de trouver un parcours personnel d’apprentissage » (Papert, 1997). Cependant, plusieurs études demandent d’analyser avec prudence les effets des TIC dans l’apprentissage, car son application simple, sans rien changer aux méthodes d’enseignement déjà utilisées, comme c’est souvent le cas, n’apportent pas d’importants changements aux systèmes éducatifs (Eurydice, 2001; Miranda, 2007).

Les donnés obtenues montrent une forte adhésion à l’ordinateur Magalhães, avec une utilisation croissante de celui-ci pendant les cours et comme ordinateur personel pour les élèves. Au sein des classes, les matières les plus travaillés avec l’ordinateur Magalhães sont la Langue Portugaise, suivi de l’Étude Civique. Pour les Mathématiques et l'Education Artistique l’utilisation de l’ordinateur est moins fréquente. L’ordinateur est principalement utiliser pour l’écriture, la réalisation de jeux pédagogiques et consulter des encyclopédies. En ce qui concerne l’internet, celle-ci est fréquemment utilisé comme moteur de recherche et de façon très peu importante pour accéder à des jeux et blogs.

L’étude ethnographique révèle que l’utilisation de l’ordinateur Magalhães permet l’autonomie des élèves et le respect des différents rythmes d’apprentissages. L’ordinateur est utilisé au cours des activités scolaires et non scolaires, comme un matériel de plus utilisé par la maitresse et les élèves, dans l’apprentissage, au même niveau que d’autres matériaux dit traditionnels. La maitresse incite l’utilisation équilibrée de toutes les ressources disponibles.

Mots clés: ordinateur Magalhães, TIC, cursus, école élémentaire

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Introdução

Na relação com a escola, o computador e a Internet são encarados como instrumentos

potenciadores de novas práticas e novas relações pedagógicas onde “a contribuição

real dos meios de comunicação digitais para a educação é a flexibilidade que pode

permitir a cada indivíduo encontrar trajetos pessoais para aprender” (Papert, 1997).

Contudo, diversos estudos apontam para uma visão cautelosa em relação aos efeitos

das TIC, revelando que a sua aplicação simples, sem nada modificar as práticas de

ensino, tal como sucede frequentemente, não traz mudanças significativas aos

sistemas educativos (Eurydice, 2001; Miranda, 2007).

Para a integração pedagógica das TIC na escola, existem três elementos

fundamentais a ter em consideração: o aluno, o currículo e a tecnologia (Costa, 2007),

assumindo, desde logo, que ao professor caberá um papel decisivo na articulação

entre estes três elementos (Darling-Hammond e Youngs, 2002; Kenski, 2006; Vrasidas

e Glass, 2005a in Costa, 2008; Laurillard, 1993; Ponte, 2000; 2001; Salomon, 2002),

para que sejam diferentes as oportunidades de trabalho com os computadores

oferecidas aos alunos em contexto escolar, envolvendo outras dimensões

consideradas relevantes (os professores e a sua formação), mas sobretudo em

sintonia com o que for decidido sobre o papel para as tecnologias na escola.

A introdução do computador Magalhães no 1º ciclo do ensino básico (CEB) teve início

no ano lectivo 2008/09, no território português, ao abrigo do programa e.escolinha, no

quadro do Plano Tecnológico da Educação, definido pelo XVII Governo Constitucional.

O que parece estar em causa é o uso precoce das TIC, assim como o alargamento da

base sociológica da sua utilização, não só na escola, mas também noutros contextos,

nomeadamente na família.

É sobre a utilização do computador Magalhães, em contexto de sala de aula, que se

centram os dados que aqui se apresentam, analisando-se os efeitos escolares da sua

utilização e a integração curricular das TIC no 1º ciclo do Ensino Básico. Os dados

gerais aqui analisados referem-se à aquisição do computador Magalhães, no

Agrupamento em estudo, à sua utilização em situação de aula, às atividades

realizadas e áreas curriculares trabalhadas. Apresentam-se também resultados

provenientes da análise intensiva do uso e integração curricular das TIC na turma

etnografada – alvo de um acompanhamento em profundidade - concluindo sobre os

contributos do computador Magalhães.

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O Estudo

O estudo e resultados apresentados referem-se a parte de uma investigação mais

abrangente, realizada num Agrupamento de Escolas de Leiria, de cariz sociológico e

natureza longitudinal (Novembro 2009-Dezembro 2011), com um design metodológico

misto, com uma componente extensiva e outra intensiva.

No que respeita à natureza extensiva da pesquisa, foram administrados questionários

aos alunos, professores e famílias de turmas do 1º CEB. Quanto à vertente intensiva

realizou-se a etnografia de uma turma selecionada numa das escolas do

Agrupamento. A sua seleção obedeceu a dois critérios: a) uma turma que estivesse no

1º ano de escolaridade aquando da introdução dos computadores Magalhães na

escola (ano letivo de 2008/2009); b) uma turma que os utilize desde então. Acresce

ainda que na turma selecionada todos os alunos adquiriram o computador Magalhães.

Esta turma foi, assim, acompanhada durante os seus 2º e 3º anos de escolaridade.

A investigação visava responder a um conjunto de questões, entre as quais, identificar

os atores sociais que surgem associados ao computador Magalhães e as suas

representações sociais sobre o mesmo; traçar o perfil sociológico dos adquiridores e

não adquiridores do Magalhães; entender os usos deste, nomeadamente por parte de

quem, em que contextos e quais os seus modos de regulação; compreender os efeitos

escolares e sociais da sua utilização, em particular nos contextos de sala de aula e da

interação escola-família.

A informação obtida foi objeto de um tratamento adequado, nomeadamente estatístico

e por análise de conteúdo.

A amostra: alunos, professores, famílias, turma

Foram inquiridos todos os docentes do 1º ciclo, através de questionário, em quatro

momentos distintos: no final do ano letivo 2008/2009 (32 professores), primeiro ano de

distribuição do computador Magalhães aos alunos do 1º ciclo, no início (31) e no final

do ano letivo 2009/2010 (33) e no final do ano letivo 2010/2011 (32).

No que se refere aos alunos e famílias, foram inquiridas metade das turmas, através

de uma amostra estratificada que permitiu a inclusão de turmas de todas as escolas

do Agrupamento. Para a seleção da amostra, outro dos critérios considerado foi

incluir os vários anos letivos, à exceção do 1º ano de escolaridade, por este ser o ano

de distribuição do computador, o que significava a chegada do computador de forma

faseada ao longo do ano, não sendo por isso possível recolher dados sobre a sua

utilização.

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A turma etnografada foi alvo de um acompanhamento sistemático durante dois anos,

no 2º e 3º anos de escolaridade. A turma teve sempre 20 alunos, embora tenham

saído dois e entrado outros dois. No 2º ano a turma era constituída por 12 rapazes e 8

raparigas e no 3º ano 11 rapazes e 9 raparigas. A sala de aula contém 2

computadores de secretária, um deles ligado a um quadro interativo, uma impressora

e uma câmara Web.

Resultados

Apresentam-se os resultados obtidos sobre a utilização do computador Magalhães,

em situação de aula, e os seus contributos para a integração curricular das TIC, no

contexto do Agrupamento de Escolas analisado.

Adesão significativa ao computador Magalhães

Os dados mostram uma adesão significativa ao computador Magalhães, verificando-se

um ligeiro acréscimo de 2010 para 2011, ano em que 93% das famílias inquiridas

declaram possuir o portátil.

Gráfico nº 1 - Aquisição do CM pelas famílias

Fonte: Inquérito aos pais N=210 (IF1) N=157 (IF2)

Utilização do computador nas aulas

A esmagadora maioria dos professores refere que os seus alunos usam o Magalhães

nas aulas, percentagem que foi aumentando, gradualmente, situando-se nos 96,9% no

final do ano letivo 2010/2011.

No entanto, segundo as respostas dadas pelos alunos, a utilização do Magalhães nas

aulas foi diminuindo ao longo do ano letivo 2010/2011, apresentando percentagens de

utilização muito inferiores (65,2% em novembro de 2010 e 54,5% em junho de 2011)

às referidas pelos professores.

88.6  

11.4  

93.0  

7.0  

0  

20  

40  

60  

80  

100  

Sim   Não  

%  

junho  10   maio  11  

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As famílias referem-se à utilização do Magalhães nas aulas pelos seus filhos em

percentagens semelhantes a estes, sublinhando que esse uso é mais esporádico do

que frequente.

Os dados indicam que pais e filhos estão mais próximos na sua apreciação sobre o

uso do Magalhães em contexto de sala de aula do que os professores, incluindo a

tendência de decréscimo de utilização. Significará esta aparente inflação estarmos

perante um efeito do “politicamente correto” por parte dos docentes?

Ainda neste âmbito, segundo os alunos, a utilização do computador Magalhães nas

aulas é superior ao uso de outros computadores (quase o dobro).

Gráfico nº 2 – Uso do Magalhães e de outros computadores nas aulas segundo os alunos

Fonte: Inquérito aos alunos N= 181 (IA1 – computador Magalhães) N= 154 (IA2 – computador

Magalhães); N= 200 (IA1 – outros computadores) N= 174 (IA2 – outros computadores)

Comparando as respostas dadas pelos alunos e pelos professores, a frequência de

utilização do Magalhães nas aulas aumentou, observando-se que o computador é

usado regularmente nas aulas (várias vezes por semana e uma vez por semana).

Segundo a maioria dos professores, quando usam o Magalhães na aula, o tempo

médio de utilização num dia é entre 1 a 3 horas.

Áreas curriculares trabalhadas com o uso do Magalhães

Quando usam o Magalhães com os alunos, os professores referem que as áreas

curriculares que mais trabalham são a Língua Portuguesa e o Estudo do Meio. A

percentagem de professores que diz trabalhar a Matemática e as Expressões, quando

usa o Magalhães com os alunos, aumentou consideravelmente entre o início e o fim

do ano letivo 2010/2011.

65.2  

34.8  

54.5  

45.5  

36.0  

64.0  

32.8  

67.2  

0  

20  

40  

60  

80  

100  

Sim   Não  

%  

Computador  Magalhães  nov  10  

Computador  Magalhães  jun  11  

Outros  computadores  nov  11  

Outros  computadores  jun  11  

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Gráfico nº 3 - Áreas curriculares trabalhadas na utilização do Magalhães segundo os professores

Fonte: Inquérito aos professores N=27 (IP3) N=29 (IP4)

Atividades realizadas com os computadores nas aulas

A esmagadora maioria dos professores refere que as atividades que os alunos

desenvolvem com o Magalhães, na aula, são “escrever textos” (a mais realizada),

“fazer jogos didáticos”, “consultar enciclopédias do computador”, “fazer desenhos” e

“aceder à Internet”. Segundo os alunos, as atividades realizadas maioritariamente com

o computador Magalhães são “escrever textos” e “aceder à Internet”; verificando-se

uma situação de concordância entre professores e alunos.

No final do ano letivo, de acordo com as respostas dadas pelos professores, observa-

se o aumento das atividades “fazer desenhos”, “fazer apresentações em PowerPoint”,

“aceder à Internet” e “escrever textos” com o Magalhães nas aulas, comparativamente

ao início do ano. Enquanto que, segundo os alunos, essas atividades diminuíram, à

exceção de “aceder à Internet” que aumentou tal como a atividade “jogar”.

24.1  

79.3  

62.1  

69.0  

96.6  

14.8  

81.5  

44.4  

55.6  

96.3  

0   20   40   60   80   100  

Outra  

Estudo  do  meio  

Expressões  

MatemáJca  

Língua  portuguesa  

%  

jun  10   jun  11  

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Gráfico nº 4 – Atividades realizadas no Magalhães nas aulas segundo os professores

Fonte: Inquérito aos professores N= 27 (IP3) N=30 (IP4)

Comparando estes dados com os anteriores, da mesma forma que a Língua

Portuguesa é a área curricular que os professores mais referem trabalhar com o

Magalhães, também a atividade “escrever textos” apresenta maior percentagem. Se

estabelecermos o paralelismo entre a área das Expressões e a atividade “fazer

desenhos”, a última apresenta maior percentagem; enquanto que, no caso da

Matemática em articulação com a atividade “fazer cálculos”, a área curricular é referida

em maior percentagem pelos professores.

No entanto, o paralelismo criado não é estanque nem unidirecional, pois cada área

poderá ser trabalhada através de diversas atividades, entre as que foram referidas nas

respostas dadas, nomeadamente, quando 74,1% dos professores indicam que os

alunos fazem jogos didáticos, qualquer uma das áreas poderá ser trabalhada.

66.7  

16.7  

73.3  

60.0  

73.3  

46.7  

16.7  

100  

7.4  

59.3  

14.8  

74.1  

70.4  

59.3  

37.0  

33.3  

92.6  

.0   20.0   40.0   60.0   80.0   100.0  

Outra  

Aceder  à  internet  

 Fazer  jogos  não  didáJcos  

Fazer  jogos  didáJcos  

Consultar  enciclopédias  do  computador  

Fazer  desenhos  

Fazer  apresentações  em  PowerPoint  

Fazer  cálculos  

Escrever  textos  

%  

jun  10   jun  11  

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Gráfico nº 5 – Utilização da Internet na aula pelos alunos segundo os professores

Fonte: Inquérito aos professores N= 27 (IP3) N= 29 (IP4)

De acordo com as respostas dos professores, nos anos letivos 2009/2010 e

2010/2011, a maioria dos alunos usou a Internet na aula para “pesquisar informações”.

Para além desse uso, os alunos recorrem à Internet na aula para “jogar”, para “trocar

mensagens por correio electrónico”, para “aceder a blogs”.

Organização dos alunos para trabalhar com o Magalhães na aula

No ano letivo 2009/2010, a estratégia usada pelos professores para organizarem os

alunos para trabalharem com o computador Magalhães na aula era essencialmente

aos pares ou individualmente. No ano letivo seguinte verifica-se a diminuição da

percentagem de professores que organizam os alunos individualmente, aumentando a

estratégia de os colocar a trabalhar em grupo quando usam o Magalhães, o que pode

ser justificado pelo aumento do número de alunos sem o Magalhães na aula,

especialmente devido às avarias do computador.

17.2  

20.7  

31.0  

86.2  

13.8  

7.4  

14.8  

11.1  

33.3  

88.9  

11.1  

0   20   40   60   80   100  

Outra  

Trocar  mensagens  

Aceder  a  blogs  

Jogar  

Pesquisar  informações  

Não  uJlizam  

%  

jun  10   jun  11  

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Gráfico nº 6 – Estratégia usada pelos professores na organização dos alunos para trabalharem com o

Magalhães

Fonte: Inquérito aos professores N= 26 (IP3) N= 30 (IP4)

Contributos do Magalhães para a integração curricular das TIC

Na turma, o tempo médio de utilização dos Magalhães foi de 6h semanais, repartidas

por dois períodos, acrescidos de 45m nas Atividades de Enriquecimento Curricular

(Apoio ao Estudo), orientadas pela professora da turma.

As atividades desenvolveram-se, ora de forma transversal a todas as áreas, ora com

maior incidência disciplinar, dependendo das necessidades ao nível de organização e

avaliação das atividades que periodicamente foram desenvolvidas. Nas Áreas

Curriculares Disciplinares (ACD) a Língua Portuguesa, o Estudo do Meio e a

Expressão Plástica foram as privilegiadas, em detrimento da Matemática. No entanto,

esta área passou também a ser contemplada nas planificações disciplinares, com

recurso aos computadores e elaboraram-se gráficos, tabelas, grelhas; criaram-se

problemas e respetivas soluções, e exploraram-se jogos educativos.

A introdução do uso dos computadores Magalhães implicou a necessidade de se

definirem regras, que foram criadas a dois níveis: escola e turma.

Apesar da estratégia de trabalho se ter mantido (alternância entre o trabalho individual

e de grupo), notou-se que os alunos revelaram grande tendência para irem partilhando

o trabalho com os pares, pelo que esta foi uma das estratégias utilizada com

frequência.

O facto do Magalhães já não ser visto como “brinquedo novo”, mas sim como

instrumento de trabalho - a par dos manuais e outros materiais didáticos – terá

contribuído para uma maior e mais espontânea partilha, o que, de certo modo,

contraria a ideia de que o computador “isola”. Outra razão tem a ver com a

73.3  

86.7  

23.3  

3.8  

34.6  

76.9  

76.9  

0   20   40   60   80   100  

Outra  

Em  grupos  

Aos  pares  

Individualmente  

%  

jun.  10   jun.  11  

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necessidade de agrupar os alunos dada a quantidade de Magalhães que

frequentemente avariam.

As atividades realizadas com recursos aos computadores centraram-se na pesquisa

temática (individual, em grupos ou aos pares), orientada para temas definidos ou de

livre escolha, com recurso à Internet; na escrita individual e coletiva - textos, poemas,

relatórios de atividades, mensagens, cartas e e-mails para os colegas estrangeiros

das escolas parceiras, com correspondente ilustração de desenhos (em Paint e Tux

Paint); na elaboração de apresentações em PowerPoint para tópicos do programa

e/ou para as temáticas dos projetos em curso; na utilização do Photo Story para a

criação de pequenas histórias, do Movie Maker para animações curtas; no

visionamento de vídeos, audição de músicas e captura de imagens fotográficas.

Uma das vantagens que se pode realçar na utilização dos Magalhães na turma é o

facto dos alunos com diferentes níveis de aprendizagem poderem trabalhar cada um

ao seu ritmo, sem se incomodarem uns aos outros, desenvolvendo diversas

aprendizagens de forma orientada, mas autónoma. A procura, seleção e

descodificação de informação, a redação de diferentes tipos de textos, entre outras

atividades, serviu para apoiar, reforçar e consolidar as aprendizagens efetuadas nas

diferentes áreas disciplinares.

Outro facto a realçar prende-se com a constatação de que, desde que os Magalhães

chegaram, todas as crianças da turma, independentemente da sua condição social,

podem na escola e também em casa ter o “seu computador”, privilégio a que

anteriormente só os mais favorecidos tinham direito. Pode-se afirmar que este aspeto

contribuiu para melhorar a sua autoestima e motivação pessoal para as aprendizagens

escolares. O acesso a um instrumento de aprendizagem que a experiência profissional

revela como “poderoso”, quando utilizado de forma adequada, veio contribuir para

uma situação de maior equidade e justiça social.

Em suma, os computadores Magalhães assumiram-se como uma enorme mais-valia

nas diferentes dimensões da vida escolar da turma. Mas é preciso acrescentar que

também foram frequentemente um quebra-cabeças e uma fonte de problemas,

relacionados basicamente com a qualidade do material informático, bloqueios e

avarias muito frequentes, baixa capacidade de armazenamento e reduzida dimensão

da tela de visionamento. Acrescente-se a estes constrangimentos a ausência de uma

rede de apoio técnico aos professores, levando-os a perderem muito do tempo que

devia ser aproveitado para atividades pedagógicas com este tipo de ocorrências que,

por vezes, nem sabem resolver por falta de conhecimentos informáticos. A

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necessidade das escolas terem melhores condições físicas nas salas, quer ao nível do

mobiliário e da luz natural, quer das condições da instalação eléctrica, e a

necessidade de um maior e mais eficaz apoio, da empresa fabricante, na reparação

das avarias constituem outras das condicionantes ao uso dos computadores na sala

de aula.

Os alunos são unânimes em referir como os Magalhães são importantes não só para

brincar, mas também para aprender. À pergunta “para que serve ter um Magalhães?”

respondem que, para além dos jogos com que podem brincar, também podem

aprender muitas outras coisas:

O Magalhães é como um amigo para mim. Ajuda-me a aprender (...). Eu gosto do

Magalhães porque dentro dele existem coisas importantes para mim. Coisas de

aprender, conhecer, jogar e até fotografias. (...) Quando o Magalhães está sem bateria

eu carrego-a logo para depois poder estar com ele outra vez. O Magalhães é como um

chupa-chupa e eu adoro chupar, chupar… [Maria Soledade]

O Magalhães é nosso amigo e ajuda-nos a crescer no mundo do aprender. Eu gosto

muito de usar o Magalhães. [Diogo Silva]

Adorei usá-lo, é giro! Eu fiz vários PowerPoint: do Natal, do Dia das Bruxas, do S.

Martinho, das lendas, do tigre, etc. Também fiz muitos desenhos e textos.

À Internet vou pesquisar e jogar, mas só quando a professora deixa.

Em casa faço aulas da Escola Virtual. O meu pai e o meu irmão também. [Maria

Guarda]

Conclusões

O computador Magalhães configura-se como um autêntico computador pessoal para

as crianças.

A maioria dos pais declarou ter adquirido o Magalhães pelas vantagens que acredita

trazer para os seus filhos. As vantagens reportadas enfatizam o melhor desempenho

no uso das TIC e a aquisição de conhecimentos, em geral. Para além da referência a

outros aspetos menores, não deixa de ser relevante a distinção feita pelos próprios

encarregados de educação entre a aquisição de mais conhecimentos – mesmo

escolares – e o rendimento escolar.

Por outras palavras, a aquisição de mais conhecimentos proporcionada pelo uso do

portátil não se traduz diretamente em maior aproveitamento escolar, o que parece ser

corroborado pelos docentes. Estamos, no entanto, a falar de efeitos no curto prazo. É

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possível que venham a verificar-se ganhos escolares no médio e longo prazo, se o

uso do Magalhães vier a generalizar-se. Pelo menos, é o que sugerem os professores

que falam em “melhorar os resultados escolares dos alunos” e “aumentar as

aprendizagens escolares dos alunos”, assim como os dados da turma selecionada,

nomeadamente quando a professora refere que, sobretudo junto dos alunos mais

carenciados e que não possuíam computador, se nota um aumento da sua autoestima

e uma maior confiança no próprio uso do computador.

Não deixam de ser interessantes, mais uma vez, os dados qualitativos da nossa

pesquisa (turma) que apontam para que o trabalho com o computador, mesmo

pessoal, não deixa de promover a troca e a partilha entre os alunos, rompendo, assim,

com a ideia do eventual isolamento que tenderia a fechar o aluno numa espécie de

casulo. Por outro lado, também esta componente da investigação sublinha que o

computador pessoal permite ao aluno, quando necessário, progredir ao seu próprio

ritmo, o que não seria possível com a existência de apenas alguns PC na sala de aula.

Em síntese, o estudo revela que o computador Magalhães é valorizado por todos os

atores sociais (famílias, professores e alunos). Há indícios de efeitos positivos

escolares, mas também sociais, a prazo, os quais terão, no entanto, de ser

confirmados no futuro.

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