Introdu o ao Direito Administrativo -...

6
Introdução ao Direito Administrativo Breve contextualização história O direito administrativo está diretamente ligado às funções do Estado. Nesse sentido, devem ser analisadas as funções do Estado, o qual foi elaborado para suprir as necessidades de um povo, sendo fruto de um acordo político entre os cidadãos, com o fito de satisfazer as necessidades comuns da sociedade como um todo. É uma entidade que paira sobre a sociedade. Inicialmente, o Estado estava nas mãos de poucos, que concentravam o poder, proferindo normas públicas, a fim de gerir os indivíduos que, futuramente, será conhecido como o direito público e o direito administrativo. O referido poder é ilimitado. Na Idade Média, o Feudalismo, onde a legislação se tornou local e costumeira, de forma descentralizada, o dono da terra era o responsável pela elaboração e aplicação das leis no domínio de sua propriedade. Dessa forma, os senhores feudais dominaram sua era, impondo o poder por vários séculos. Já na Idade Moderna, surge o período do Absolutismo na Europa. Alguns senhores feudais, mediante guerras e alianças, conseguiram dominar grandes territórios, intitulando-se monarcas absolutos. Não interessava nesse momento um direito que limitasse o poder do rei. O direito administrativo era apenas um conjunto de normas postas por esse rei, que não erra, servindo para gerir os atos de seus subordinados. Aqui ocorre a confusão entre o rei e o Estado. A monarquia se torna absoluta e irresponsável pelos seus atos. Conseguintemente, com o novo Estado Moderno institui-se um exército permanente, a cobrança de tributos centralizados e o desenvolvimento de uma política única. O Estado monopolizou a violência e a coerção para impor sua autoridade, ocorrendo de forma legítima. Em relação aos elementos do Estado: povo, território e soberania. O Estado insere-se em um território limitado, impondo-se sobre um determinado povo, em razão de sua soberania. Para tanto, a fim de viabilizar o exercício do poder do Estado, apresenta-se a burocracia. O burocrata é explicado por três teorias importantes: I. Teoria do Mandato : o burocrata recebeu uma procuração do Estado para que aja em nome dele. Entretanto, como o Estado não tem uma presentação física para proceder tal ato, essa teoria foi abandonada; II. Teoria da Representação : o Estado não pode exprimir a sua própria vontade, necessitando de um indivíduo para poder representá-lo. Essa teoria também foi abandonada pelo direito administrativo. III. Teoria do Órgão : é a teoria em vigor no direito administrativo, que diz que o servidor público é a encarnação do Estado. O servidor recebe a entidade do Estado (“candomblé jurídico”). Devido à necessidade de o Estado se organizar, surge o questionamento do antigo regime, qual seja o Absolutismo, em virtude de seu poder ilimitado. A ideia que prevaleceu no Ocidente foi a de Montesquieu, no sentido de dividir o poder que é uno, de maneira tripartida, ou seja, dentro de um poder, este é subdividido em três partes (legislativo, executivo e judiciário). A tripartição de poder é algo que, historicamente, obteve uma grande aceitação, mas que não é necessário, tendo em vista que várias Constituições adotam quatro poderes. Mas o que é o poder? É algo que não conhece limites, em sua esfera. Por exemplo, o Ministério Público exerce seu poder, em suas atribuições, sem a limitação de outro poder.

Transcript of Introdu o ao Direito Administrativo -...

Introdução ao Direito Administrativo Breve contextualização história O direito administrativo está diretamente ligado às funções do Estado. Nesse sentido, devem ser analisadas as funções do Estado, o qual foi elaborado para suprir as necessidades de um povo, sendo fruto de um acordo político entre os cidadãos, com o fito de satisfazer as necessidades comuns da sociedade como um todo. É uma entidade que paira sobre a sociedade.

Inicialmente, o Estado estava nas mãos de poucos, que concentravam o poder, proferindo normas públicas, a fim de gerir os indivíduos que, futuramente, será conhecido como o direito público e o direito administrativo. O referido poder é ilimitado.

Na Idade Média, o Feudalismo, onde a legislação se tornou local e costumeira, de forma descentralizada, o dono da terra era o responsável pela elaboração e aplicação das leis no domínio de sua propriedade. Dessa forma, os senhores feudais dominaram sua era, impondo o poder por vários séculos.

Já na Idade Moderna, surge o período do Absolutismo na Europa. Alguns senhores feudais, mediante guerras e alianças, conseguiram dominar grandes territórios, intitulando-se monarcas absolutos. Não interessava nesse momento um direito que limitasse o poder do rei. O direito administrativo era apenas um conjunto de normas postas por esse rei, que não erra, servindo para gerir os atos de seus subordinados. Aqui ocorre a confusão entre o rei e o Estado. A monarquia se torna absoluta e irresponsável pelos seus atos.

Conseguintemente, com o novo Estado Moderno institui-se um exército permanente, a cobrança de tributos centralizados e o desenvolvimento de uma política única. O Estado monopolizou a violência e a coerção para impor sua autoridade, ocorrendo de forma legítima.

Em relação aos elementos do Estado: povo, território e soberania. O Estado insere-se em um território limitado, impondo-se sobre um determinado povo, em razão de sua soberania. Para tanto, a fim de viabilizar o exercício do poder do Estado, apresenta-se a burocracia. O burocrata é explicado por três teorias importantes:

I. Teoria do Mandato: o burocrata recebeu uma procuração do Estado para que aja em nome dele. Entretanto, como o Estado não tem uma presentação física para proceder tal ato, essa teoria foi abandonada;

II. Teoria da Representação: o Estado não pode exprimir a sua própria vontade, necessitando de um indivíduo para poder representá-lo. Essa teoria também foi abandonada pelo direito administrativo.

III. Teoria do Órgão: é a teoria em vigor no direito administrativo, que diz que o servidor público é a encarnação do Estado. O servidor recebe a entidade do Estado (“candomblé jurídico”).

Devido à necessidade de o Estado se organizar, surge o questionamento do antigo regime, qual seja o Absolutismo, em virtude de seu poder ilimitado. A ideia que prevaleceu no Ocidente foi a de Montesquieu, no sentido de dividir o poder que é uno, de maneira tripartida, ou seja, dentro de um poder, este é subdividido em três partes (legislativo, executivo e judiciário). A tripartição de poder é algo que, historicamente, obteve uma grande aceitação, mas que não é necessário, tendo em vista que várias Constituições adotam quatro poderes. Mas o que é o poder? É algo que não conhece limites, em sua esfera. Por exemplo, o Ministério Público exerce seu poder, em suas atribuições, sem a limitação de outro poder.

A ideia da Tripartição de poderes é fazer com que um poder limite a atuação do outro, pelo conhecido sistema de freios e contrapesos, onde os poderes interagem entre si, conferindo restrições nas suas próprias atribuições, fazendo com que um poder não se sobressaia ao outro.

Por fim, o Estado foi criado como liberal, não interventor, que pretendia garantir a igualdade de todos perante a lei, o qual restou inexitoso, surgindo o Estado Democrático d Direito.

Funções do Estado:

· Poder Executivo: função executiva; · Poder Legislativo: função legislativa; · Poder Judiciário: função judiciária.

Observa-se que o respectivo poder, predominantemente, exerce sua respectiva função. Não significa que os poderes exercem essas funções de forma absoluta.

As funções podem ser analisadas sob dois prismas:

· Prisma Formal: os atos formalmente administrativos são os produzidos pelo poder que os emanou;

· Prisma Material: apenas pode ser considerado ato materialmente legislativo aquele que contém uma norma geral, abstrata, obrigatória e inovadora no ordenamento jurídico, criando novos direitos e obrigações.

Excepcionalmente, o Poder Executivo produzirá atos formalmente executivos, mas materialmente legislativos, por exemplo, a Medida Provisória (art. 59 da CF/88). Outrossim, segundo a doutrina, o Judiciário também produz leis, quando a Justiça do Trabalho profere Sentenças Normativas a categorias profissionais, tendo caráter geral, obrigatório e inovador.

A função jurisdicional, materialmente falando, é aquele ato que resolve um conflito de forma definitiva, que não pode ser revisto.

O legislativo pode exercer formalmente a função jurisdicional, por exemplo, no momento em que se julga o Presidente da República e os Ministros de Estado nos crimes de responsabilidade (art. 52, I e II da CF/88).

Em algumas situações, existem autores que consideram a decisão do Conselho de Contribuintes um ato materialmente jurisdicional, pois a Administração não pode recorrer ao Judiciário. Entretanto, ressalta-se que é uma questão polêmica.

Em relação ao ato materialmente administrativo, há duas posições;

I. É aquele que aplica a lei de ofício;

II. É aquele considerado de forma residual, ou seja, o que não for ato legislativo ou jurisdicional será ato administrativo.

Observa-se que há quem diga que existe o chamado ato político, reconhecido pelo STF, que considera tal ato como não passível de restrição. Ainda, em relação ao Ministério Público, este se insere no poder executivo e não no judiciário.

Conceito de Direito Administrativo:

1) O critério do “poder público”, baseado na distinção entre atos de império (particular em patamar inferior) e atos de Gestão (administração e particular no mesmo patamar), entendendo-se que o direito administrativo se ocuparia dos atos de império, decorrentes do “poder de comando”, ou seja, apenas no momento em que a administração age de maneira superior ao particular é que se tem direito administrativo, caso contrário, inexistente. Tese superada, mas que se presta a definir as figuras de ato de império e gestão.

2) O critério da noção de “serviço público”, baseado nas atividades desenvolvidas pelo Poder Público (foi abandonado em razão da crise do serviço público). O problema dessa concepção é definir o conceito de serviço público.

3) O critério da “utilidade pública e interesse geral”. Torna-se difícil distinguir direito administrativo dos demais ramos do direito público.

4) O critério da “puissance publique”(algo parecido como Poder Público,em português), que também estaria vinculado à ideia de atos de autoridade, ou seja, o direito administrativo é o ramo do direito que estuda as ações do Estado enquanto sujeito superior, em relação ao particular, conceito semelhante aos analisados anteriormente.

5) O critério do poder público (item4), mas como uma concepção mais ampla no sentido de “gestão pública”, tudo que envolver a gestão do patrimônio público.

Conceito de Direito Administrativo (autores): é o conjunto de normas e princípios que, visando sempre ao interesse público, regem as relações jurídicas entre as pessoas e os órgãos do Estado e entre estes e a coletividade a que devem servir (José dos Santos Carvalho Filho).

• Em sentido objetivo, administração pública é a função administrativa. É analisado o ato administrativo.

• Em sentido subjetivo, Administração Pública é o conjunto de pessoas que exerce atividade administrativa, em qualquer dos Poderes. (maiúsculas e minúsculas segundo Hely Lopes Meirelles).

• Função precípua da administração: atender ao interesse público (para alguns: primário=coletividade; secundário= do Estado enquanto pessoa jurídica).

Para Hely Lopes Meirelles:

Formal: é o conjunto de órgãos instituídos para consecução dos objetivos do Governo.

Material: é o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral.

Operacional: é o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em benefício da coletividade.

Objeto do Direito Administrativo:

Sistema europeu-continental: o direito administrativo tem amplitude muito maior, abrangendo o direito administrativo descritivo, que se preocupa em delimitar o estatuto dos órgãos públicos administrativos do Estado e das coletividades locais, a estrutura dos serviços púbicos e os mecanismos de procedimentos referentes a certas atividades.

Sistema anglo-americano: mais restrito, pois grande parte das relações jurídicas é regida pelo direito comum.

Princípios do Direito Administrativo

O Direito é formado pelas normas jurídicas, as quais são subdividas em:

· Regras: não há uma possibilidade de uma terceira opção: ou ela é cumprida ou não. É um método mecânico, mediante a técnica da subsunção do caso à regra. Não possui grau de abstração, apresentando-se de forma concreta. São susceptíveis de aplicação direta. Tem conteúdo funcional, a fim de resolver de forma efetiva tal problema.

· Princípios: são mandado de otimização, seguindo a lógica de que o ato deve ser realizado na maior medida possível, de forma proporcional ao caso concreto. Está sujeito à adaptação ao caso específico e, mediante critério da resolução de interesses resolvem-se o conflito entre os princípios. Tem grau de abstração elevado. Em razão disso, necessitam de mais medidas concretizadoras. Os princípios são normas de caráter fundamental no ordenamento jurídico, muito embora não havendo hierarquia entre estes e as regras. Está permeada pela ideia de justiça. Os princípios dão origem às regras. Princípios implícitos e explícitos Atualmente, apresenta-se a proliferação de princípios no âmbito administrativo. Embora a CF/88 preveja de forma expressa no caput do art. 37 apenas 5 princípios, quais sejam: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e efetividade (LIMPE), existem outros princípios de forma implícita em nosso ordenamento jurídico. São eles: I. Princípio da Legalidade: é o vetor fundamental do Estado Democrático de Direito. A

Administração Pública somente poderá ser exercida de acordo com a lei, mediante dispositivos complementares à lei, que inova no ordenamento jurídico, criando direitos e obrigações. A Administração Pública é sublegal ou infralegal, ou seja, esta age nos limites da lei. Em função disso, decorrem duas consequências: quando a administração está atuando de acordo com a lei existente; quando a administração expede atos normativos, portarias instruções, resoluções, esses estão somente regulamentando a lei, sem criação de direito novo. Havendo inovação, será considerado ilegal. Para o particular tudo o que não é proibido é permitido, para a Administração somente caberá agir quando e da forma autorizada pela lei. Toda a comunidade submete-se à lei, inclusive, as autoridades, sujeitas à punição e responsabilidade por determinados atos. Entretanto, apresenta-se uma pequena exceção, em relação ao Presidente da República, o qual não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao mandato exercido, somente após o seu término.

II. Princípio da Supremacia do Interesse Público: a atividade pública deve ser realizada com o escopo de atingir o interesse público, o qual se sobrepõe ao interesse privado. Sendo assim, acaba por se desdobrar em duas vertentes:

· A finalidade de caráter geral é sempre satisfazer o interesse público, já a finalidade específica dependerá do objeto a ser alcançado (desapropriação ou licitação, por exemplo);

· Princípio da atuação vinculada: a administração atua sobre o regime jurídico administrativo, ou seja, é o conjunto de prerrogativas e sujeições (vantagens e desvantagens) aplicável à administração pública, com o objetivo de satisfazer o interesse público. A administração tem um regime jurídico próprio que lhe confere o status de superioridade em relação aos seus administrados, com o fito de satisfazer o interesse público. É o responsável pela criação do poder de império, fazendo com que a administração imponha a sua vontade perante o cidadão. Ainda, surge o subprincípio da Indisponibilidade do Interesse Público: a administração não pode dispor do interesse público e, ao mesmo tempo, esta diz o que é interesse público. Em razão desse fato, caso ocorra tal disponibilidade por parte da Administração entra em cena o Judiciário, que constatará se está ocorrendo e referida ilegalidade.

III. Presunção de Legalidade dos Atos Administrativos: os atos administrativos são

presumidos verdadeiros quanto aos fatos que os embasaram e legais em relação ao seu enquadramento com a lei. Presunção relativa (juris tantum). Em razão dessa presunção, os atos administrativos podem ser aplicados imediatamente, cabendo a quem deles discorda a sua impugnação. Por exemplo, se o prefeito expede um decreto de desapropriação de uma casa, esse decreto goza da presunção de que os fatos que o embasaram são legítimos, bem como a presunção de licitude, a qual pode ser perfeitamente afastada com a comprovação no sentido contrário (presunção relativa). Outra consequência prática, bastante importante é a aplicabilidade imediata dos atos administrativos, em virtude das presunções supracitadas, como exemplo, a aplicação imediata de multa por infração de trânsito.

Regras de interpretação do direito administrativo (doutrina tradicional):

1) a desigualdade jurídica entre a Administração e os administrados;

2) a presunção de legitimidade dos atos da Administração;

3) a necessidade de poderes discricionários para a Administração atender ao interesse público.

Para tanto, esses itens devem ser analisados pelo viés do dever-poder que a Administração detém.

Legalidade em crise

• Apesar de parecer um princípio tão óbvio, a legalidade hoje vive uma crise considerável, com movimentos complementares e contraditórios:

• 1) A inviabilidade de se regulamentar, por lei, um mundo tão complexo. As “soft law” – acaba-se delegando ao poder executivo e não mais ao poder legislativo a regulamentação de determinadas situações jurídicas. Por exemplo: Agências Reguladoras – entidades criadas para regulamentar determinados segmentos do mercado, que são de difícil e rápida mutação.

• 2) Caráter técnico de inúmeros aspectos da vida do Estado, submetidos mais a normas técnicas do que à lei.

• 3) Tendência à transferência dos serviços públicos para entes privados, submetidos ao princípio de modo menos intenso.

• A supremacia deve ser vista sob uma ótica democrática, não como uma justificativa para que a administração viole os direitos dos particulares. V. Gustavo Binembojm: A crise dos paradigmas do direito administrativo. A dialética entre a lógica da autoridade e a lógica da liberdade.

Atenção:

VIDE A SÚMULA Nº 636 DO STF: NÃO CABE RECURSO EXTRAORDINÁRIO POR CONTRARIEDADE AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA LEGALIDADE, QUANDO A SUA VERIFICAÇÃO PRESSUPONHA REVER A INTERPRETAÇÃO DADA A NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS PELA DECISÃO RECORRIDA.

Sistema de aplicação da Lei: O Brasil adotou o sistema de jurisdição única (ou sistema inglês), ou seja, o controle administrativo pelo Poder Judiciário, e não o sistema do contencioso administrativo ou jurisdição administrativa (sistema francês).