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1 INTRODUÇÃO Portugal, país tradicionalmente identificado como emigrante, vê-se agora no papel de país de acolhimento para inúmeros imigrantes. Nos últimos anos, o nosso país tem-se confrontado com um aumento de falantes bilingues, nomeadamente em contexto escolar, numa faixa etária cada vez mais nova. A imigração que se fez notar com mais intensidade nas décadas de 80 e 90 alterou a realidade escolar portuguesa de tal modo que é impensável, hoje em dia, falar de Língua Portuguesa sem ter em conta o modo como todos os falantes dentro de uma sala de aula se relacionam com ela. Urge definir língua materna (L1) e língua segunda (L2) para, deste modo, tratarmos das diferenças de aquisição de L1 e de L2. Há que repensar e reformular as definições destes dois termos, extremamente importantes, em vários contextos sociopolíticos do início do século XXI. Estes conceitos têm grandes repercussões na formação de professores, na renovação de metodologias e de materiais didácticos. Nesta investigação, abordaremos a sempre presente questão da idade no que diz respeito à aquisição de língua, bem como as questões levantadas pela aquisição sucessiva ou simultânea de duas línguas. Não querendo entrar em questões discriminatórias e chamar ao monolinguismo uma doença, como Skutnabb-Kangas (1988), parto, como Romaine (1989: 7), da ideia de que o bilinguismo é um recurso a cultivar, em vez de um problema a ser ultrapassado: “I start from de premise that bilingualism is a resource to be cultivated rather than a problem to be over come.” Metade do mundo fala mais do que uma língua e as comunidades monolingues não são homogéneas, caracterizando-se por variações regionais, sociais, estilísticas, etc. As comunidades monolingues têm vindo a sofrer alterações devido aos fluxos de turistas, de trabalhadores estrangeiros, de movimentos de povos por razões de guerra ou de serviços humanitários. No entanto, as grandes concentrações de grupos falantes de uma mesma língua, numa determinada área geográfica, aumentam as possibilidades de preservação dessa mesma língua.

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INTRODUÇÃO

Portugal, país tradicionalmente identificado como emigrante, vê-se agora no papel de

país de acolhimento para inúmeros imigrantes.

Nos últimos anos, o nosso país tem-se confrontado com um aumento de falantes

bilingues, nomeadamente em contexto escolar, numa faixa etária cada vez mais nova.

A imigração que se fez notar com mais intensidade nas décadas de 80 e 90 alterou a

realidade escolar portuguesa de tal modo que é impensável, hoje em dia, falar de Língua

Portuguesa sem ter em conta o modo como todos os falantes dentro de uma sala de aula se

relacionam com ela.

Urge definir língua materna (L1) e língua segunda (L2) para, deste modo, tratarmos das

diferenças de aquisição de L1 e de L2. Há que repensar e reformular as definições destes dois

termos, extremamente importantes, em vários contextos sociopolíticos do início do século

XXI. Estes conceitos têm grandes repercussões na formação de professores, na renovação de

metodologias e de materiais didácticos.

Nesta investigação, abordaremos a sempre presente questão da idade no que diz

respeito à aquisição de língua, bem como as questões levantadas pela aquisição sucessiva ou

simultânea de duas línguas.

Não querendo entrar em questões discriminatórias e chamar ao monolinguismo uma

doença, como Skutnabb-Kangas (1988), parto, como Romaine (1989: 7), da ideia de que o

bilinguismo é um recurso a cultivar, em vez de um problema a ser ultrapassado:

“I start from de premise that bilingualism is a resource to be cultivated

rather than a problem to be over come.”

Metade do mundo fala mais do que uma língua e as comunidades monolingues não são

homogéneas, caracterizando-se por variações regionais, sociais, estilísticas, etc.

As comunidades monolingues têm vindo a sofrer alterações devido aos fluxos de

turistas, de trabalhadores estrangeiros, de movimentos de povos por razões de guerra ou de

serviços humanitários. No entanto, as grandes concentrações de grupos falantes de uma

mesma língua, numa determinada área geográfica, aumentam as possibilidades de

preservação dessa mesma língua.

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As comunidades bilingues têm duas características fundamentais: os locutores ou

separam os domínios de experiência (e/ou terminológicos) das duas línguas e criam um

bilinguismo estável ou, em casos mais raros, utilizam ambas as línguas em todos os

domínios, o que se traduz num bilinguismo instável.

Ellen Bialystok, quando, em 1991, editou Language Processing in bilingual children,

referia que 30 anos antes considerava-se o bilinguismo como um distúrbio que podia ser

corrigido com uma instrução impiedosa na língua da maioria, eliminando todos os traços da

língua invasora:

“About thirty years ago, for example, the general wisdom held that

bilingualism was a disorder that could be corrected through ruthless

instruction in a standard majority language, pushing out of the inflicted child

all traces of the invading language.”1

De facto, as pesquisas levadas a cabo, até aos anos 60, associavam o bilinguismo a

deficiências cognitivas e a baixos Q.I.

No entanto, segundo Pinker (1994), os bebés conseguem pensar antes de falar. A

psicologia cognitiva demonstrou que as pessoas pensam não só com palavras, mas também

com imagens/representações. A aquisição de uma língua pressupõe um número considerável

de processos cognitivos.

Nos capítulos seguintes, abordaremos algumas particularidades relativas ao

bilinguismo e à aquisição da língua segunda, no âmbito da diversidade linguística e

integração de i(e)migrantes, no contexto português

Lembramos que, quer na União Europeia, quer em muitos países Africanos, quer

noutros espaços geolinguísticos, existem políticas linguísticas que fomentam e dinamizam o

bilinguismo e/ou multilinguismo importantes na identidade dos povos e das culturas.

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1. AQUISIÇÃO DE LÍNGUA

Aprender uma língua parece ser relativamente fácil, se tivermos em conta que qualquer

criança o faz, em poucos anos e sem necessidade de ter aulas. Aos quatro anos, a maioria das

crianças domina a maior parte das estruturas linguísticas.

O fenómeno da linguagem articulada é característica única dos humanos. É certo que

há outros animais (abelhas, golfinhos) que têm uma linguagem (não articulada),

comunicando entre si através de um conjunto fixo de símbolos; mas nenhum outro animal

parece ter um sistema cujos símbolos, ao serem combinados, possibilitem um número

ilimitado de combinatórias. Os chimpanzés necessitam de ensino intensivo para adquirir

formas que lhes permitam a comunicação básica.

O ser humano, possui mecanismos cognitivos que lhe permitem adquirir uma língua; a

criança “apanha” palavras espontaneamente e forma novas sequências que não ouviu antes.

A competência linguística do indivíduo permite-lhe falar uma determinada língua

possibilitando a comunicação entre os vários locutores de uma comunidade.

No processo de aquisição de uma língua, as crianças não ouvem frases isoladas, mas

em contextos linguísticos e situacionais. Não há registos de crianças que aprenderam a falar

por serem expostas à rádio ou à televisão. De facto, Ervin-Tripp (1973) estudou crianças

filhas de pais surdos, cujo único acesso à língua inglesa era através da rádio e televisão e as

crianças não aprenderam a falar com esta exposição. Uma das razões é que não conhecendo

a língua a priori, não conseguirão formular associações sobre o que as palavras e as

estruturas sintáctico-semânticas significam. Pelo contrário, quando falamos com as crianças

fazemo-lo frequentemente sobre o presente, sobre a realidade com que somos confrontados,

no momento do discurso, e isso ajuda à compreensão do que o locutor quer dizer.

Antes de compreenderem as estruturas sintácticas as crianças conhecem várias

palavras, o que lhes permite fazer associações e “adivinhar” o significado de muitas frases.

As crianças aprendem a língua materna pela exposição à língua, mas não aprendem um

número de frases limitado, não copiam apenas aquilo que ouvem. Deduzem regras que lhes

permitem formular um número infinito de frases, isto é, adquirem uma competência

linguística.

O ambiente e a imitação são fundamentais no processo de aprendizagem de L1. Por

essa razão se explica que uma criança que nasça em Portugal fale português, enquanto uma

criança que cresça na China irá, naturalmente, comunicar em chinês.

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1.1. DEFINIÇÃO DE LÍNGUA MATERNA, LÍNGUA SEGUNDA E LÍNGUA

ESTRANGEIRA

Apesar de sobejamente discutidos e definidos, nunca é demais revisitar os termos

polissémicos e, por vezes ambíguos, de língua materna, língua segunda e língua estrangeira.

Língua materna é, porventura, o termo cuja definição menos problemas causa. Existe

um relativo consenso entre os vários autores que abordam este conceito. Assim, entendemos

por língua materna (L1) a língua na qual a criança estabelece a sua primeira gramática, que

vai desenvolvendo ao longo dos primeiros anos de vida, construindo uma gramática idêntica à

dos adultos da comunidade em que está inserida.

Língua materna é, nas palavras de Clara Tavares (2007: 26):

“Adquirida no contexto familiar, não necessitando de verdadeira

aprendizagem, num primeiro tempo vai ser a língua de escolarização, o

veículo que permite outras aprendizagens escolares, para além de se constituir

ela própria como objecto da comunidade. A língua materna desempenha um

papel simbólico, reforçando a identidade e permitindo estabelecer laços de

pertença a uma determinada comunidade”.

O termo genérico de “Língua não materna” diz respeito a um conceito que abarca todas

as situações relativas a língua segunda e língua estrangeira. Embora na prática seja, por vezes

difícil destrinçar os vários tipos de situações e estabelecer fronteiras claras, podemos

identificar duas grandes subdivisões que dizem respeito aos conceitos de língua segunda e de

língua estrangeira que passamos a definir:

1) língua segunda é um termo polissémico e, frequentemente, utilizado de uma forma

ambígua e com imprecisões: a) a língua segunda é adquirida numa fase posterior à aquisição

da língua materna; o locutor tem, em geral, um domínio oral da língua segunda, e um domino,

por vezes, rudimentar da sua representação escrita; b) língua segunda designa também uma

língua não materna dentro de fronteiras ou de um país, onde é reconhecida como oficial; c)

língua segunda é frequentemente confundida com o termo de segunda língua, isto é, a língua

adquirida, por um processo de aprendizagem, depois da língua materna, em contexto escolar

ou não-escolar.

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2) língua estrangeira é um termo que designa a língua que se aprende em contextos

escolares ou não-escolares e adquire-se depois da língua materna.

A língua materna é, normalmente, aprendida nos primeiros anos de vida; o adulto não

tem memória do esforço dispendido neste processo. O aperfeiçoamento que, posteriormente é

adquirido na escola, não determina o processo de aquisição de língua que decorre natural e

independentemente da escolarização. Assim se explica que muitos analfabetos consigam

comunicar perfeitamente na sua língua.

Exposta a um ambiente, onde a comunicação se processa em determinada língua, a

criança reconhece-a e utiliza-a para um dado objectivo, seja ele a comunicação normal, ou

para solicitar ou indicar algo.

A maioria das pessoas identifica de imediato a sua língua materna relativamente a uma

língua segunda; mas quando questionadas sobre que critérios utilizam para a identificação,

poucos saberão o que responder e as respostas não serão certamente as mesmas.

Tradicionalmente dizemos que a L1 é a língua em que pensamos, sonhamos, contamos ou

praguejamos, mas estes critérios são redutores e insuficientes. No entanto, o domínio de uma

língua (nível: mestria) permite contar ou sonhar noutra língua, num determinado momento da

nossa vida.

O conceito de língua materna remete-nos para a língua falada pela mãe, donde surgiria a

designação de língua materna. Segundo Skutnabb-Kangas, este conceito de mãe pode ser

alargado à pessoa que tem um primeiro contacto linguístico duradouro com a criança o que,

na maioria dos casos, é de facto a mãe ou a pessoa que a substitui. Neste caso a definição de

língua materna designa a língua que a criança aprende em primeiro lugar

No entanto, outros autores definem a língua materna como a língua que melhor

dominamos. Tal definição pode ser ambígua uma vez que numa determinada altura da vida

podemos receber formação numa dada língua que não a L1, adquirindo um nível de mestria,

em determinadas áreas do conhecimento. Nesse contexto educativo, provavelmente,

dominaremos determinados domínios na língua em que recebemos instrução e não na L1.

A sociolinguística tenta definir L1 como a língua que o falante mais utiliza, mas uma

vez mais esta explicação não é precisa pois a nível de trabalho podemos ter que usar com

mais frequência uma língua que não a L1. As minorias, por exemplo, terão poucas hipóteses

para se expressarem na sua língua materna.

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A estas definições podemos ainda acrescentar uma de pendor social e psicológico que

descreve a L1 como a língua com a qual os outros nos identificam ou como a língua com a

qual nos identificamos, remetendo para a língua de socialização.

À excepção do conceito que se rege pela origem, isto é, a língua que a criança aprende

primeiro, a L1 de um indivíduo pode ser diferente à luz destes conceitos em diferentes

momentos da vida.

Para Stern (1983) a diferença entre L2 (ou LS) e LE pode ser feita do seguinte modo: a)

L2 ou LS diz respeito à aquisição e uso de uma língua não-nativa dentro de fronteiras

territoriais em que ela tem uma função reconhecida; b) LE caracteriza-se por uma

aprendizagem e uso da língua em contextos, onde essa língua não tem qualquer estatuto

sócio-político.

Isabel Leiria acrescenta ainda que a LS:

“(…) é frequentemente uma das línguas oficiais. É indispensável para a

participação na vida política e económica do Estado, e é a língua, ou uma das

línguas, da escola. Por ser língua do país, disponibiliza geralmente bastante

input e, por isso, pode ser aprendida sem recurso à escola”.2

A Língua Portuguesa encontra-se nesta situação nos Países de Língua Oficial

Portuguesa (PALOP) e em Timor: não sendo a língua materna para muitos cidadãos, é

adquirida oralmente, numa determinada fase do desenvolvimento do indivíduo. É ainda o

caso de muitos imigrantes dos PALOP em Portugal, para os quais o Português não é a língua

materna.

A língua materna não é apenas adquirida através da oralidade. A escolarização completa

e desenvolve esse processo de aquisição. A aprendizagem de estruturas da língua escrita

contribuem para o enriquecimento e desenvolvimento da língua materna. Para este processo

contribui a leitura e a escrita; mas a organização e coerência de um texto só se ganha/aprende

lendo.

Há dois tipos de conhecimento: o conhecimento implícito ou procedimental (como

saber andar), aquele conhecimento que detemos, mas não sabemos explicar, como o que

temos interiorizado com a nossa língua, e o conhecimento explícito ou metalinguístico, que

2 Leiria, Isabel, Português língua segunda e língua estrangeira: investigação e ensino, p. 1

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nos permite ter competência estratégica para evitar um possível erro e contornar uma situação

como a conjugação de um verbo, se isso se revelar complicado ou ambíguo.

Em relação à língua estrangeira (LE), ela é normalmente aprendida, como já referimos,

em contextos onde por vezes não tem valor socio-político, geralmente em contexto de sala de

aula, por professores nativos ou não-nativos, o que pode acontecer em sítios a larga distância

do lugar onde é falada usualmente.

A língua materna e a língua segunda podem ser facilmente confundidas no caso do

Português nos PALOP. Falamos de língua segunda quando existe nos meios de comunicação,

no contexto escolar, etc. A distinção entre L1 ou L2 prende-se mais com uma questão

política. Na Guiné, o Português é língua materna na cidade, mas tem o estatuto de língua

segunda, nas zonas rurais. O Português é falado por uma minoria, na Guiné, mas está presente

na TV, rádio e no sistema escolar: as aulas são dadas em português. Tal facto põe problemas

no ensino e nas aprendizagens uma vez que há muitas hesitações nas metodologias que

devem ser utilizadas: metodologias de língua materna, de língua segunda ou de língua

estrangeira.

Em Moçambique, o Português é a língua utilizada na escolaridade, quer para as

crianças que a dominam como língua materna quer como L2. No entanto, existem várias

experiências de escolarização bilingue.

Os especialistas moçambicanos têm centrado as atenções na problemática das

aquisições, nomeadamente na óptica da psicologia cognitiva. A questão da problemática das

aquisições associada à psicologia cognitiva coloca toda a atenção na aprendizagem e numa

segunda fase no ensino.

Em relação à Guiné a situação é diferente. Na escola, o Português é L1 e língua

transversal a todas as aprendizagens. Apesar de L1, por vezes tem que ser utilizada uma

metodologia de L2 que permita activar as estratégias de compreensão e de comunicação oral.

O caso da Guiné-Bissau é muito complexo. Num universo multilingue, o Português

tem frequentemente, a par do crioulo, o estatuto de língua de comunicação veicular entre as

muitas línguas existentes. A maior parte dos professores não tem preparação para leccionar

em contexto multilingue. A avaliação é muitas vezes desfasada nesta realidade multilingue.

A metodologia em contexto de L2 ou de LE orientada para a aquisição do léxico tem

que articular situações comunicativas e estruturas gramaticais.

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O léxico deve ser aprendido em contexto, nas suas relações paradigmáticas e

sintagmáticas; o léxico existe integrado em estruturas sintáctico-semânticas que o aluno tem

de compreender e adquirir.

Para as comunidades de imigrantes, quando chegam ao nosso país, o português é uma

língua estrangeira ou uma língua segunda. Por isso, devemos procurar estratégias de LE ou de

L2 em contexto de imersão. Não se trata de uma pessoa que quer aprender uma língua com

uma determinada finalidade, num país estrangeiro; a condição da pessoa residente é diferente.

Em relação às comunidades de portugueses emigradas, em muitos casos, o Português

tem o estatuto de L2, muito em especial, para a segunda geração.

Concluindo, estes conceitos são complexos e têm que ser visto à luz de inúmeras

variáveis, contextualizando diversas situações. Veremos de seguida de que modo se processa

a aquisição/aprendizagem de L1 e L2.

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1.2. DIFERENÇAS NA AQUISIÇÃO DE L1 E L2

O modo como os indivíduos adquirem a L2 tem sido amplamente discutido. Procura-se

resposta à questão: a L2 é adquirida do mesmo modo que a L1? Antes de mais, assumiremos

que ao falar em L1 reportamo-nos à aquisição da língua materna e ao mencionar L2 estamos a

falar de aquisição ou de aprendizagem, geralmente, em contextos não-escolares. Isto, por si

só, já traz diferenças significativas. Assim, a L1 é adquirida em criança, mas a L2 poderá ou

não ser adquirida noutra fase etária.

O factor idade será amplamente discutido mais à frente, mas há diferenças notórias na

aquisição de uma L1 e na aprendizagem de uma L2 que não podemos deixar de referenciar

neste momento. Ao adquirir a língua materna, a criança chegará em poucos anos, e sem

necessidade de uma aprendizagem forçada, à perfeição. Dificilmente ocorrerá o mesmo com

um adulto que aprende uma L2.

A aquisição de uma L1 vai ocorrendo em paralelo com as suas necessidades e

interesses. Para um aprendente de L2, a língua não é uma capacidade essencial para aceder a

todos os aspectos da sua vida, como o é para o caso da língua materna.

Pode ser muito difícil comparar duas pessoas a aprender respectivamente uma L2 ou

L1, já que normalmente se encontram em estádios mentais e sociais bastante distintos, o que

vai necessariamente influenciar a aquisição/aprendizagem de uma língua.

A aquisição de L1 é despoletada automaticamente na fase mais importante do

desenvolvimento cognitivo da criança, enquanto a L2 não acontece naturalmente, a não ser

em casos em que a criança cresce num ambiente bilingue, situação esta que veremos mais à

frente se pode, de facto, ser considerada L2.

A L1 é apreendida inconscientemente, isto é, sem darmos conta das regras complexas

que exige esta aquisição, nem tendo que pensar nelas de modo consciente para poder proferir

enunciados. Já em relação a um aprendente de L2 esta aprendizagem não é adquirida de

forma inconsciente e não são muitos os que, com a aprendizagem contínua, demonstram o

nível de uso inconsciente das regras como o fazem para a L1.

Não há normalmente, por parte das crianças, resistência à aquisição da L1 como por

vezes acontece com quem aprende uma L2.

A aquisição de L1 faz parte do processo biológico da evolução do ser humano e a L2

não é essencial nesse desenvolvimento.

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Volterra & Taeschner (1978) dizem que numa primeira fase a criança tem um sistema

lexical que inclui palavras de ambas as línguas, numa segunda fase a criança distingue dois

léxicos diferentes, mas aplica as mesmas regras sintácticas a ambas as línguas. Numa terceira

fase a criança fala duas línguas distintas em léxico e sintaxe.

Estudos demonstram que um recém-nascido consegue reconhecer os sons de todas as

línguas do mundo. Gradualmente, irá responder àquela que está presente no seu quotidiano.

Mas o que acontece quando o bebé ouve duas línguas em casa ou em programas de

imersão? Patricia Kuhl, co-directora do Institute for Learning and Brain Sciences da

Universidade de Washington, refere que o bebé responde a ambas as línguas mas cada uma

fixa-se numa parte diferente do cérebro. O cérebro do bebé tem dois tipos de circuito, um para

a L1 e outro para a L2. Estudos demonstram que a capacidade de alternar de uma secção do

cérebro para outra permite a certos bebés ter uma melhor performance em determinadas

tarefas.

Crianças que crescem em lares bilingues podem demorar mais tempo a falar que outras

crianças mas quando aprendem as duas línguas parecem ter várias vantagens a nível

intelectual.

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1.3. O PORTUGUÊS COMO LE – PROPOSTAS METODOLÓGICAS

Quando aprendemos uma língua, partimos de uma posição comparativa com a língua

materna. O que interessa é que o aluno pense na língua que está a aprender. A linguagem é

um conjunto de capacidades inatas ao homem que activamos para aprender; a língua é um

sistema de signos que tem como objectivo a comunicação. Quando actualizamos oralmente

ou por escrito essa língua, estamos no domínio da fala ou discurso A linguagem humana é

inata ao homem; por isso, os alunos possuem essa capacidade, mas precisam de a

desenvolver, aperfeiçoando a língua materna e aprendendo uma língua estrangeira.

As línguas naturais são sempre manifestações dessa capacidade da linguagem. A

linguagem humana como linguagem articulada, o uso primário da língua é a oralidade. As

línguas primeiro foram feitas para ser faladas, só depois escritas.

A riqueza de uma língua reside no facto de existir um número finito de estruturas que

permite criar um número infinito de frases.

A sintaxe tem na Língua Portuguesa uma ordem canónica SVO; por vezes inverte-se

um pouco por razões estilísticas; por essa razão, devem ser utilizados, nos níveis de iniciação

do ensino/aprendizagem, textos não literários. Numa primeira fase será importante a língua

sem uma dimensão poética.

Qualquer conteúdo gramatical pode partir ou não de um texto. O ensino da gramática

a alunos estrangeiros é importante para o desenvolvimento cognitivo.

Mas que gramática ensinar? Os conteúdos a ensinar têm que ser sistematizados;

depois é necessário fazer a verificação dessa aprendizagem, através de exercícios de

avaliação.

Alguns objectivos no ensino de PLE passam por desenvolver a competência

linguística e comunicativa (oral e escrita) aos níveis morfo-sintáctico e semântico –

pragmático; executar os conteúdos gramaticais em enunciados orais e escritos; adaptar os

alunos às áreas vocabulares e temáticas do “quotidiano” português, com vista a uma maior

sensibilização da realidade portuguesa e aprofundar os conhecimentos relativos à cultura

portuguesa.

No ensino de PLE há objectivos e metodologias; há uma necessidade por parte dos

alunos de aprenderem a língua rápida e “correctamente”. O conhecimento de uma língua

implica uma determinada visão do mundo. Língua e cultura mantêm uma relação estreita.

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O discurso publicitário pode ser um precioso auxiliar no ensino de uma língua, é um

discurso que permite várias abordagens. A publicidade abre um feixe de possibilidades

didácticas (acompanhada muitas vezes de imagem que é universal). Enquanto discurso misto

o discurso publicitário permite o trabalho com registos verbais e não-verbais (magnéticos e

sonoros), efeitos sonoros (rima, aliteração, ritmo, onomatopeias), figuras de retórica e

processos estilísticos (como a comparação, imagens, metáforas, hipérboles, ironia, etc.).

Permite-nos ainda estudar a estrutura do discurso, frases imperativas, conteúdos morfo-

sintácticos - classes morfológicas nomes, verbos (modos e tempos); adjectivos e vocabulário.

Temos que criar espaço na aprendizagem para a escrita e a leitura. É necessária uma

pedagogia da escrita. Os factores de insucesso da escrita são a massificação do ensino, a

heterogeneidade de culturas, o excesso do número de alunos por turma e de turmas por

professor, a falta de motivação do aluno, a artificialidade do acto da escrita na sala de aula

(falamos na aula sempre e só escrevemos no teste) e falta de treino do acto de escrita.

O desejável é que a aula tenha um espaço de produção de escrita, dividido em várias

etapas: definição/explicitação do tipo de texto e os critérios de escrita, recolha de

ideias/informações, planificação – esquema/rascunho, texto, auto-avaliação

(revisão+reformulação), hetero-avaliação (correcção+anotação rigorosa/código de correcção),

clarificação de competências básicas/competências textuais e reescrita.

Os estudos mais recentes mostram uma directa relação entre os processos cognitivos e

a compreensão da leitura. Na construção da leitura assumem um papel fundamental os

modelos de atenção e memória. Uma pedagogia da leitura procura desenvolver por meio da

leitura capacidades intelectuais, fomentar motivação para a leitura e criar autonomia e

competência do leitor.

Finalmente a avaliação deve ser criteriosa e avaliar as diferentes competências.

É importante o tipo de questões que construímos com vista aos diferentes objectivos

que queremos avaliar, sem nunca esquecer a avaliação do oral e do escrito.

Temos que saber quem é o público e qual é a situação concreta? Onde é que nos

posicionamos? Estamos aqui ou lá? É uma população alfabetizada (já tem mecanismos de

monitorização numa língua) ou não alfabetizada?

Há diferentes culturas pedagógicas. Há países que partilham culturas pedagógicas

muito próximas e outros que estão muito distantes. Um aluno alfabetizado em mandarim é

muito diferente de um aluno alfabetizado em francês.

A União Europeia tem como referência para o ensino/aprendizagem das línguas

estrangeiras o Quadro Europeu de Referência para o Ensino das Línguas.

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A nossa cultura pedagógica tem evoluído mais na horizontalidade dos saberes, vê o

aluno como também tendo algo a acrescentar à aprendizagem, e não o professor como

detentor de todo o saber.

Quando estamos a ensinar PLE precisamos de usar a L1, uma outra língua? Até que

ponto não é necessário ou não faz sentido essa utilização?

James Crawford (1998) fez o levantamento de alguns factos que designou por falácias

no ensino do inglês. Uma delas diz que a melhor forma de aprender uma língua é a imersão

total. Há casos em que há muito pouca opção, por exemplo na questão de colocar dúvidas.

Segundo Crawford, muitos autores afirmam que quanto mais as crianças estiverem expostas,

mais aprendem, mas as investigações dizem que o importante é a qualidade e não a

quantidade dessa exposição. Tudo o que o aluno aprende tem que ser entendido. Não vale a

pena falarmos em português se ele não percebe.

Outra questão é a das oportunidades de uso, isto é, adquirir uma determinada estrutura

e não a poder utilizar é inútil.

Associadas às problemáticas da aquisição de L1 e de L2 e do ensino/aprendizagem de

uma LE, existe uma outra temática muito importante: o bilinguismo e os seus vários graus.

Quando ensino uma língua estrangeira quais são os limites de uma estratégia bilingue? Há

muitos estudos feitos sobre o bilinguismo na educação, mas não há consenso. Se aceitamos

que o ensino bilingue é uma vantagem, temos que saber em que circunstâncias usamos a L1.

Para dar instruções? Ou para explicar e traduzir conteúdos? Ou para explicar situações que

estejam menos claras? Se o que pretendemos é ensinar Português, até onde deve ir o uso de

uma outra língua? Imersão total será de facto desejável, mas não pode ser levada às últimas

consequências. Por vezes, a sala de aula é o único local, onde os alunos têm oportunidade de

falar Português.

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1.4. AQUISIÇÃO SIMULTÂNEA OU SUCESSIVA DE DUAS LÍNGUAS

Quando os bebés adquirem duas línguas, falamos de aquisição simultânea, mas se já

forem crianças, o bilinguismo terá de ser chamado de sucessivo ou sequencial pois já está

enraizada uma L1.

McLaughlin (1978) estabelece um critério de idade que foi adoptado por muitos: a

aquisição de duas línguas antes dos três anos é referida como aquisição simultânea, depois

desta idade é chamada sucessiva. No último caso, de acordo com McLaughlin (1984), a L1 já

está estabelecida. Embora ele também admita que a L1 não está completamente adquirida por

volta dessa idade, diz que nesta altura a criança já a adquiriu consideravelmente e, por isso,

não se coloca a questão de adquirir as duas em simultâneo.

É difícil, por vezes, balizar esta aquisição já que as crianças diferem consideravelmente

no tempo em que adquirem a L1.

Genesee (1989) evita apontar um limite de idade na sua definição de

aquisição/desenvolvimento bilingue.

McLaughlin (1984) viria mais tarde a dizer que a distinção entre aquisição sucessiva de

uma L2 ou aquisição simultânea de duas línguas pode ser difícil de determinar, por ser incerto

também o momento em que podemos afirmar que uma criança “possui” uma língua. Admite

que o limite dos três anos pode ser considerado arbitrário mas mantém-no, para evitar a

decisão de afirmar o momento em que a criança tem a L1 estabelecida.

De Houwer (1990) estabelece um princípio de idade muito rigoroso para distinguir

aquisição simultânea e sucessiva. A expressão “aquisição bilingue de L1” é usada para referir

situações em que a criança é inicialmente exposta a uma língua B, não mais do que uma

semana depois da exposição à língua A, ou quando a exposição a ambas as línguas é regular,

ou seja, a criança é interpelada nas duas línguas quase todos os dias.

O problema na maioria da pesquisa de aquisição de língua em crianças é que esta

envolve essencialmente crianças monolingues. No entanto, mais de metade do mundo fala

mais do que uma língua. Será que as generalizações que retiramos dos monolingues podem

caracterizar exactamente um padrão de aquisição de língua? De que modo uma comunidade

bilingue afecta a aprendizagem de vocabulário em bebés expostos primeiro à língua

minoritária ou a ambas as línguas?

M. Vihman, G. Thierry, J. Lum & T. Keren-Portnoy apresentaram as conclusões de um

estudo sobre aquisição de palavras em lares de bebés bilingues e de minorias linguísticas: a

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aprendizagem implícita (acidental) de prosódia, de fonologia aumenta durante o primeiro ano

de vida, sem uma atenção voluntária ou intenção de aprender; a aprendizagem explícita de

correspondência de forma/significado começa com um, dois anos, quando as crianças

começam a procurar saber o nome das coisas. Por volta dos nove meses há sequências de

segmentos que começam a soar familiares. Com esta idade as crianças reagem com mais

atenção (viram a cabeça por mais tempo, por exemplo) ao ouvir padrões típicos da língua

materna, isto é, padrões frequentemente ouvidos. Para ligar as formas uma criança tem que

reconhecer um segmento sequencial como familiar. Este estudo foi realizado para identificar

o timing da evolução do reconhecimento da forma da palavra, um passo que antecede a

aprendizagem da palavra, isto é, associar a forma ao significado.

Aprender palavras numa comunidade bilingue é subtilmente diferente, dependendo

da(s) língua(s) falada(s) pela criança. Para a língua dominante, o tempo é o mesmo que num

ambiente monolingue; para monolingues expostos vemos uma ligeira demora; para bilingues

uma demora menor.

Ellen Bialystok (1991: 1) refere ainda as dificuldades de estudar o bilinguismo em

crianças, pela diversidade das circunstâncias em que ocorre:

“One factor that has made the problem so difficult to study is the

enormous diversity that accompanies children's bilingualism. Consider, for

example, some of the conditions under which children can become bilingual.

Children can learn both languages simultaneously in the home; the second

language can be learned through submersion in a foreign culture (and here the

relative status of the first and second language becomes critical in

determining outcomes); or the second language can be learned through

immersion or foreign-language classrooms with the majority-language

environment. These differences undermine most attempts to identify precise

conditions for second-language acquisition, the psychological factors that

accompany bilingualism, and the implication of bilingualism for academic

and other achievements.”

A neuropsicologia permitiu que se tratasse o bilingue como um indivíduo com

características próprias, e não somente com um duplo monolingue. Para isto muito

contribuíram os estudos desenvolvidos com bilingues afásicos que, ao contrário dos

monolingues, podiam continuar a utilizar em parte ou na totalidade, umas das línguas que

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falavam. Estes estudos são uma referência quer para a explicação da incapacidade de

produção de uma das línguas, quer para a recuperação da mesma que pode, ou não, ocorrer de

modo diferente na outra língua.

Em suma, a aquisição simultânea ocorre numa fase precoce de aprendizagem das

línguas e favorece um domínio equilibrado, enquanto o bilinguismo tardio, onde uma língua é

aprendida depois de outra, se processa geralmente numa fase mais tardia, originando uma

dominância de um dos sistemas linguísticos. É neste contexto que veremos fenómenos

distintos com o empréstimo, a interferência e a alternância, sobre os quais nos debruçaremos

no ponto 3.2.

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1.5. IDADE NA AQUISIÇÃO DE LÍNGUA

Há ainda muitas questões por responder, em relação à aprendizagem, armazenamento

ou utilização de uma língua materna e de uma língua segunda ou estrangeira, mas algumas

ideias que eram consideradas inquestionáveis têm vindo a ser contestadas, ao longo dos

últimos anos.

É óbvio que tentar compreender de que modo se processa a aquisição da língua e

posteriormente procurar criar uma estratégia de ensino/aprendizagem que maximize as

capacidades dos aprendentes, por si só, não é suficiente. Há todo um conjunto de factores a

que o professor é alheio, que tem que ver concretamente com questões relacionadas com o

aluno, nomeadamente a percepção cognitiva, o ambiente socioeconómico, a alfabetização na

língua materna e, segundo muitos investigadores, a idade.

Procuraremos aqui examinar a discussão em torno do efeito que a idade tem na

aquisição de uma língua: haverá ou não uma idade ideal para aprender uma língua, seja ela a

materna, uma língua segunda ou estrangeira? Quais as vantagens ou desvantagens da idade na

aprendizagem dessa mesma língua? Que áreas do cérebro estão relacionadas com a linguagem

e com a fixação da língua materna e das línguas estrangeiras?

Muitos estudos, realizados nos últimos anos, procuraram confirmar ou refutar a teoria

de que há uma idade ideal para aprender uma língua segunda. A “hipótese de um período

crítico”3 para aprender uma segunda língua, proposta inicialmente por Lennenberg (1967),

pressupunha que a aquisição da língua era uma condição inata determinada por factores

biológicos; balizava este período entre os dois anos e a adolescência sensivelmente, sendo

que após este período as dificuldades na aquisição de uma língua se acentuavam.

A função do cérebro na aquisição de uma língua tem dado origem a inúmeros estudos e

a questão da lateralização tem ocupado parte deles. A lateralização é um processo no qual os

dois hemisférios cerebrais desenvolvem funções específicas, sendo que para Lennenberg, esse

processo estaria terminado durante a puberdade.

A ideia de que o cérebro dos mais jovens é mais maleável que o dos adultos conduziu a

uma outra que refere que os três primeiros anos são essenciais no desenvolvimento de uma

3 Tradução livre da expressão original “critical period hypothesis”

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criança saudável e competente. Esta ideia foi examinada no livro The Myth of the First Three

Years de John Bruer. O autor afirma que há estudos que suportam a existência de um período

crítico, mas que os mesmos estudos também demonstram que o cérebro continua a

desenvolver-se durante a infância e até mesmo durante o resto da vida.

O cérebro começa a formar-se a partir das três semanas após a concepção e aos nove

meses assemelha-se já a um cérebro adulto, ainda que com diferenças significativas,

nomeadamente ao nível do peso. A média do peso do cérebro de um recém-nascido é menos

de 400 gramas e de um adulto é aproximadamente 1, 400 kg. Grande parte do aumento de

peso ocorre nos três primeiros anos, mas só atinge o peso máximo cerca dos vinte anos.

Nem todas as áreas do sistema nervoso se desenvolvem em simultâneo; as que

controlam as funções vitais do corpo, por exemplo, estão essencialmente organizadas à

nascença. A última estrutura a ficar desenvolvida é o córtex cerebral, o centro de funções

mentais como a percepção ou a memória.

A língua é controlada principalmente por áreas do córtex cerebral; duas foram

identificadas como muito importantes: a área de Broca e a área de Wernicke. A área de Broca

está mais ligada à articulação e produção do discurso e deve o seu nome a Paul Broca, um

neurologista e antropologista francês que no século XIX estudou pessoas que tinham perdido

a capacidade de falar, fenómeno conhecido por afasia. Os pacientes tinham lesões que os

impediam de articular os sons correctamente, embora soubessem o que queriam dizer. Carl

Wernicke, um psiquiatra alemão falecido no início do século XX, dá nome à outra área do

córtex cerebral relacionada com a linguagem. Lesões nesta área implicam dificuldades na

compreensão do discurso, na leitura e na escrita, o que permite uma boa articulação das

palavras, mas reflecte normalmente uma má escolha das mesmas. Frequentemente as frases

não fazem sequer sentido.

As crianças parecem aprender uma língua muito mais rapidamente que um adulto;

existe um período crítico ou sensível para a aquisição de uma língua até cerca dos seis, oito

anos. A partir daí torna-se mais difícil aprender uma língua. Esta dificuldade prende-se

essencialmente com a oralidade; é muito mais difícil para um adulto falar sem sotaque do que

para uma criança. Os linguistas afirmam que o sotaque de um aprendente adulto nunca é

perfeito. A questão fonológica é a situação por excelência; quem aprende desde cedo

facilmente ultrapassará aprendentes mais velhos, isto porque os sons de uma dada língua

influenciam a pronúncia nessa mesma língua e quanto mais cedo se efectua essa

aprendizagem, mais nos conseguimos afastar do sotaque que transportamos da L1 quando

falamos uma L2 ou LE.

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No que diz respeito ao vocabulário a questão nem se coloca, parece não haver um

período crítico para a aquisição do mesmo.

O que se passa com o cérebro enquanto crescemos? Porque é que perdemos a

capacidade de falar uma língua perfeitamente à medida que envelhecemos? John Dowling

(2004) tenta responder a isto, explicando que os mais novos são sensíveis a uma grande

variedade de sons, mas que a capacidade de os produzir ou mesmo distinguir se perde a não

ser que os ouçam ou produzam durante os primeiros seis anos. Aos três anos uma criança tem

condições para ser fluente na(s) língua(s) a que foi exposta, mas se não estiver num ambiente

em que se utiliza a língua não desenvolve essas capacidades.

Uma das questões que se coloca na aquisição/aprendizagem de uma L1, L2 ou LE é a

quantidade de variáveis que podemos encontrar nos diferentes aprendentes. Sabemos que há

diferenças em aprendentes de L1, mas estas não se comparam às que encontramos em

aprendentes de L2 ou LE.

O facto da pronúncia e, em muitos casos também a gramática, não revelar a mesma

proficiência num adulto ou numa criança pode ter por base variáveis como a qualidade e

quantidade do input, a prática da língua, a motivação e outras variáveis sociais.

Investigações sugerem que só as crianças expostas a uma L2 ou LE até aos oito anos

vão adquirir um domínio como um nativo da língua, em relação a aspectos como a articulação

e a prosódia na produção de discurso (Fabbro, 2004, citado por Ardila e Ramos).

Os aprendentes diferem na facilidade e na proficiência com que adquirem e utilizam

pormenores gramaticais de uma L2 ou LE. Uns aprendem-na por completo, outros nunca

assimilam na totalidade as estruturas e uso da língua.

As diferenças nas capacidades necessárias à aprendizagem de uma língua (memória

verbal, percepção auditiva, reconhecimento de padrões, etc.) não são as que figuram na

inteligência em geral, embora algumas estejam relacionadas como a generalização e a

associação.

Aprendentes com fraca memória auditiva terão dificuldade em lembrar-se de coisas que

ouvem numa nova língua. Se não se lembram do que ouvem, acharão difícil descobrir as

novas estruturas. Terão dificuldade em distinguir e reproduzir os sons numa nova língua.

As variáveis não se referem apenas às capacidades cognitivas. Pesquisas mostram que

aprendentes mais velhos têm algumas vantagens em certos aspectos da L2 ou LE. Os mais

velhos adquirem novas estruturas e formas mais rapida e facilmente porque têm estratégias de

aprendizagem e capacidades cognitivas mais desenvolvidas. Mas as vantagens cognitivas, que

a idade e experiência trazem, não resultam sempre numa melhor aprendizagem para

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aprendentes mais velhos. Necessidades sociais e comunicativas, que se tornam bastante

complexas com a idade, podem interferir no processo.

Aprendentes mais velhos têm que interagir com os falantes da língua alvo (LA). Como

não partilham uma língua em comum esta interacção torna-se complicada. Os aprendentes

não conseguem dizer tudo o que querem ou precisam. É necessário interagir e conversar sem

haver, realmente, uma comunicação efectiva; este tipo de comunicação existe em sala de aula,

onde se tenta reproduzir situações da vida real. Neste contexto, há muito mais oportunidades

para as crianças agirem, do que para os adultos. As crianças comunicam em LE, brincam

juntas sem ocorrerem grandes conversas, mas não há grandes oportunidades para os adultos

agirem deste modo.

Ardila e Ramos (2007) defendem que é possível demarcar três períodos distintos no que

diz respeito à idade em relação à aquisição/aprendizagem de LE:

1) falantes bilingues (ou multilingues) que adquiram as línguas entre um e os oito anos

de idade terão um pronúncia igual aos nativos dessa(s) mesma(s) línguas;

2) falantes bilingues (ou multilingues) que aprendam uma segunda (ou terceira ou mais

línguas) entre os nove e os vinte e um anos irão desenvolver uma boa pronúncia nessa(s)

língua(s);

3) falantes bilingues (ou multilingues) a aprender línguas depois dos vinte e dois anos

vão certamente desenvolver um sotaque acentuado.

A existência de um período crítico para aquisição/aprendizagem de língua foi também

assinalado, como já aqui mencionámos, no que diz respeito à gramática. A título de exemplo,

Johnson e Newport (1989) realizaram uma série de experiências, nas quais indivíduos

bilingues eram testados em tarefas aceitação de gramaticalidade e os resultados demonstraram

um nível mais baixo de precisão nos falantes bilingues, cuja aprendizagem tinha sido

realizada depois dos oito anos de idade.

Apesar das muitas opiniões e das controvérsias em redor da questão da idade ideal

para aprender uma língua estrangeira, a realidade comprova que não há um período em que

uma pessoa esteja mais receptiva para aprender uma língua, como também mostra que não

existe um período em que a capacidade para essa aprendizagem decline. Excepção feita a

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questões de saúde como a perda da visão ou audição por exemplo, que condicionam de facto

a aquisição de uma língua, ou doenças como Alzeihmer, que perturbam a memória, não há

razão para um adulto não ser tão ou mais proficiente do que uma criança.

Catherine Snow, Professora na Harvard Graduate School of Education e investigadora

na área refere numa entrevista concedida a Abigail Bucuvalas, em Outubro de 2002, o que

pensa sobre o período crítico para a aprendizagem de uma L2:

“The evidence clearly demonstrates that there is no critical period for

second-language learning, that there is no biologically determined constraint

on language learning capacity that emerges at a particular age, nor any

maturational process which requires that older language learners function

differently than younger language learners. There are, however, myriad

differences between older and younger learners that play themselves out in

second-language learning just as they do in the learning of a musical

instrument, a sport, or nuclear physics. For some aspects of learning, older

learners have compelling advantages; for others, they have disadvantages.

Those advantages and disadvantages emerge as a result of many variables that

vary with age. These variables include how much one already knows, how

strategic one's learning can be, how embarrassed one is about making errors,

etc., and are not biologically determined.”

Há factores afectivos como a autoconfiança e a motivação que são determinantes para

a aprendizagem de uma língua independentemente da idade do falante. Um aprendente não

pode ter motivação acrescida se não nota aquisições, se fica num nível básico

permanentemente. Os desafios têm que ter um nível certo de dificuldade para continuarem a

ser motivantes; tarefas muito fáceis acabam por ser aborrecidas mas se forem muito difíceis

também podem causar frustração.

Barry McLaughlin (1992) diz que é necessário desmistificar algumas ideias no que diz

respeito ao modo como crianças e adultos aprendem uma língua. A motivação por exemplo

pode ser uma causa para o aparente sucesso das crianças na aquisição de uma língua em

detrimento dos adultos. Uma criança poderá estar mais motivada para aprender a língua, terá

eventualmente mais incentivos para comunicar na escola do que um adulto no trabalho, onde

frequentemente utiliza expressões de rotina ou onde a L1 é por vezes dominada pelos colegas

e amigos.

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Outra questão prende-se com as exigências pedidas a uma criança e a um adulto. O

vocabulário que uma criança necessita para comunicar e as frases de construção simples são

exigências mais básicas do que a complexidade exigida a um falante adulto que tenha a

mesma proficiência na L1 e na LE.

A relação que os aprendentes mantêm com o erro é também fulcral, mas isso não é

uma questão em que possamos fazer a distinção entre crianças e adultos. Um falante que não

tem medo de errar e que aprende com os seus erros, tenha a idade que tiver, será certamente

um falante mais proficiente do que aquele que pouco diz para não errar.

Adolescentes e adultos aprendem em muitos aspectos mais facilmente uma língua do

que as crianças porque já são proficientes numa língua (às vezes em mais do que uma) e já

utilizaram capacidades linguísticas que aceleram o processo de aquisição. A par disso,

possuem vários recursos como capacidades literárias, hábitos de estudo e estratégias

mnemónicas que lhes facilitam o processo de aprendizagem.

A vantagem das crianças que aprendem uma língua estrangeira consiste na aquisição

de uma proficiência mais aproximada à dos nativos do que os adultos; no entanto, pode levá-

las a perder a proficiência da primeira língua, durante o processo. Os adultos pelo contrário,

raramente perdem a proficiência na primeira língua. Aliás, como salienta Catherine Snow

(2002), muitas vezes mantêm as duas línguas num nível elevado com uma taxa de sucesso

muito superior à das crianças.

Torna-se assim difícil, como se demonstrou, chegar a uma conclusão definitiva sobre

o período crítico para aprender uma língua. Na nossa opinião, será mais correcto falar em

diversos períodos sensíveis, como se tem feito mais recentemente. O que é, de facto,

necessário é que o professor não tenha ideias preconcebidas sobre o modo como os

aprendentes adquirem uma língua porque crianças ou adultos nem todos aprendem da mesma

forma e com o mesmo ritmo.

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2. QUESTÕES E ABORDAGENS AO ESTUDO DO BILINGUISMO

2.1. ESTUDOS SOBRE BILINGUISMO

Estudos sobre a aquisição/aprendizagem de uma língua por parte de crianças têm vindo

a ser documentados há mais de um século, mas só com a difusão dos gravadores na década

de 50 é que o discurso espontâneo das crianças começou a ser sistematicamente analisado.

Romaine (1989) classifica as abordagens bilingues em seis tipos:

1) O primeiro tipo, diz respeito ao princípio introduzido por Ronjat, em 1913, que

consiste no binómio “Uma pessoa – uma língua”, isto é, o melhor método para educar uma

criança bilingue com pais com línguas maternas distintas. Esta abordagem foi depois seguida

por Leopold (1939) e muitos outros.

É o caso em que os pais têm línguas maternas diferentes, mas detêm algum

conhecimento da língua do outro. Na comunidade, a língua dominante é a de um dos

progenitores e a estratégia utilizada, como o próprio nome sugere, é cada um fala com a

criança na sua L1. Alguns estudos que englobam este tipo podem ser aprofundados em

Ronjat (1913), Leopold (1939-49), Taeschner (1983) ou De Houwer (1990).

Apesar de haver estudos anteriores e outros que se seguiram, o diário que Werner

Leopold escreveu, em quatro volumes, sobre a aquisição de inglês e alemão da sua filha

Hildegard continua a ser dos mais completos registos de aquisição de duas línguas por parte

de uma criança.

De notar que o próprio Leopold era bilingue. De origem alemã, era professor desta

língua nos Estados Unidos da América.

A regra era simples: o pai falava-lhe em alemão e a mãe em inglês. Todo o restante

ambiente que envolvia Hildegard tinha por base o inglês. Toda a informação foi reunida em

quatro volumes que continham respectivamente o desenvolvimento lexical, a aquisição

fonológica, a formação de palavras e estruturação de frases e, por fim, no último volume

Leopold reúne as suas notas e observações.

Este estudo peca por seguir uma metodologia do estudo de caso, onde só há um

observador e este é pai da criança estudada. Esta será uma questão sempre presente, já que,

na maioria dos casos estudados de crianças bilingues, o observador é um dos progenitores.

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Frequentemente um linguista que decide estudar a evolução da aprendizagem do seu filho,

com todas as variantes afectivas que não é possível eliminar.

De Houwer (1990) lembra ainda outra desvantagem, o facto de não haver registo do

comportamento de Hildegard quando Leopold não estava presente.

Leopold afirma que Hildegard não separava as duas línguas em termos de vocabulário,

durante os dois primeiros anos muitas palavras coexistiam em ambas as línguas até que, por

fim, o inglês acabou por prevalecer.

Taeschner salienta a importância da aquisição de sinónimos por parte da criança

bilingue, pois o facto de ter dois campos pragmáticos e semânticos obriga-as a fazer

generalizações e a perceber que estão a usar duas línguas e que os nomes das coisas são

arbitrários. Mais tarde a criança organizará o seu sistema linguístico de modo a ir ao

encontro da pessoa com quem fala.

Refere ainda que é complicado comparar a aquisição lexical de uma criança bilingue

com uma monolingue pois a capacidade de produzir novas palavras no primeiro caso é

dividida por duas línguas.

Doyle et al. (1978) estudaram 22 crianças bilingues e 22 monolingues e, apesar das

últimas terem um léxico maior do que as bilingues, estas tinham uma fluência verbal maior,

medida pelas histórias que contavam e pelo número de conceitos que estas apresentavam.

Com três anos Hildegard tratava as duas línguas com dois sistemas linguísticos

distintos, ao passo que o filho de Ronjat, segundo este, fê-lo antes dos dois anos.

Por volta dos 15 anos, o filho de Ronjat era fluente nas duas línguas, enquanto o

alemão de Hildegard se tornara a língua mais fraca.

2) “Língua não dominante em casa” / “uma língua – um ambiente” – os pais têm

línguas maternas diferentes mas uma delas é a língua dominante da comunidade. Os pais

optam por falar a língua não dominante em casa, enquanto as crianças são expostas à língua

dominante no exterior, nomeadamente na escola.

Fantini (1985) é autor de um estudo deste tipo, em que a mãe fala espanhol e o pai

inglês e estão inseridos numa comunidade onde o inglês domina. Em casa ambos falavam

espanhol como Mário, o filho. Os pais demonstravam já uma receptividade muito grande às

línguas, além da sua L1, falavam também inglês, francês, italiano e português e isso veio a

reflectir-se no filho. Quando ouvia alguém falar uma nova língua tentava imitar a pronúncia.

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Com 8 anos tentou aprender o alfabeto grego e aproveitava para tentar aprender novas

palavras sempre que alguém que falasse uma nova língua cruzava o seu caminho.

Mário foi exposto à língua inglesa com 2.64 anos e ao espanhol com 1.4 por essa razão,

as primeiras palavras em inglês eram ditas com pronúncia espanhola. Apesar de não produzir

alguns sons em inglês, conseguia perceber a diferença. Essa situação foi diminuindo, mas só

foi extinta com 5 anos.

3) “Língua não dominante em casa sem suporte da comunidade” – neste caso os pais

têm a mesma L1, que não é a língua dominante da sociedade e decidem falar com a criança

na sua língua. Exemplos disso são os estudos de Oksaar (1977) que envolve pais estónios

numa comunidade dominada pelo sueco.

Oksaar leva-nos à confirmar uma conclusão anterior proposta por Geissler (1938) que

refere que as crianças podem aprender até quatro línguas sem se confundir. Oksaar estudou a

aquisição de alemão pelo seu filho com a idade de 3.11 quando ele veio para a Alemanha,

vindo da Suécia, onde tinha sido educado em sueco e estónio. A sua pronúncia nestas

últimas línguas era de um falante de L1 e o mesmo aconteceu com a aprendizagem de

alemão. Contudo, teve algumas dificuldades a nível da sintaxe e da morfologia,

nomeadamente usar palavras em alemão tendo por base o sueco e utilizar a terminação

estónia para verbos em sueco.

4) “Duas línguas não dominantes em casa sem suporte da comunidade” – os pais não

partilham a L1 e a língua dominante da comunidade não é nenhuma delas. Os progenitores

dirigem-se à criança, cada um na sua língua. Elwert (1959) e Hoffman (1985) estudaram esta

variável.

Elwert fala na primeira pessoa, foi criado em Itália e exposto a três línguas desde

muito cedo. Filho de mãe inglesa e pai alemão, os pais dirigiam-se a ele em inglês embora

falassem alemão entre si. Os amigos da mãe falavam-lhe em inglês, os do pai em italiano e

na escola falava italiano.

É interessante pois é o único estudo que conhecemos, em que é o próprio objecto de

estudo que retira as conclusões. Contudo, tem por base a memória e não nos fornece dados

tão precisos como os demais.

4 Idade em anos e depois meses.

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Elwert refere que não tem bem noção de quando é que tomou consciência de que

falava mais do que uma língua mas recorda-se de aos 3 ou 4 anos achar que inglês era a

língua da intimidade e que o italiano era uma língua usada pelas e para as crianças.

Quando tinha 9 anos e se mudou para a Alemanha era o pior da classe em alemão.

Gradualmente, essa situação foi-se alterando até falar como os restantes alunos, aparte de um

sotaque da Alemanha do Norte, que não era igual ao da região onde vivia.

Em adulto Elwert diz que é difícil dizer qual das línguas falava melhor sem especificar

um determinado momento da sua vida mas difícil é também dizer qual é a sua L1. Até

naquelas funções que utilizamos para fazer essa distinção, como contar, sonhar ou praguejar,

mesmo aí depende da situação, se estiver com alemães fá-lo-á em alemão.

5) “Pais não nativos” – apesar de partilharem a mesma L1 e de esta ser a língua

dominante, um dos pais fala sempre com a criança numa língua que não é a sua L1. Saunders

(1982) e Döpke (1992) debruçaram-se sobre este tipo de ensino bilingue.

Saunders foi relativamente bem sucedido ao educar de modo bilingue os dois filhos e

uma filha, na Austrália, apesar do facto de Saunders não ter o alemão com L1 e de não terem

contacto com monolingues alemães e pouco com bilingues com alemão como L1. Numa fase

mais avançada, a família passou algum tempo na Alemanha.

Até aos 2 anos, as crianças tinham apenas uma base lexical que consistia em palavras

de ambas as línguas. Saunders refere que o seu filho Frank, com a idade de 1.4, reagia do

mesmo modo ao vocábulo cavalo na sua versão em inglês ou alemão mas até aos 2.0 apenas

utilizava a versão alemã Pferd, independentemente da pessoa com quem estivesse a falar.

Nesta fase, a criança relaciona as línguas com um único sistema linguístico.

Saunders considera então uma segunda fase, na qual a criança vai construindo frases

com palavras de ambas as línguas mas vai, gradualmente, tomando consciência das

diferenças entre elas, consoante o contexto e as pessoas. Um facto curioso é as crianças

repetirem na outra língua um pedido não concedido pelos pais.

Numa última fase, as crianças distinguem os dois sistemas linguísticos e sabem quando

usar uma ou outra língua. Esta fase depende de inúmeros factores, quer individuais (a

personalidade, vontade e aptidão da criança), quer da envolvência que os rodeia como a

maior ou menor exposição à língua e ainda da atitude dos pais. No caso dos filhos de

Saunders, um dirigia-se ao pai quase exclusivamente em alemão com a idade de 3.9,

enquanto com o outro isso aconteceu bem mais cedo, com três anos de idade.

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Uma conclusão muito interessante que é possível retirar deste estudo é que devemos

tratar pessoas bilingues com a especificidade que o termo acarreta, e não como a soma de

dois monolingues. Analisando a competência vocabular dos filhos, Saunders provou que o

vocabulário total de um bilingue pode exceder o de um monolingue. Com a idade de 5.5

Frank sabia 144 palavras em 200 para o alemão e 135 em 200 para o inglês, e Thomas 155

na primeira língua e 145 na outra. Cruzadas ambas as línguas, Frank conseguia reconhecer

163 palavras e Thomas 169, em pelo menos uma das línguas.

Os erros mais comuns dos rapazes eram em termos de caso e género. No que diz

respeito à pronúncia, não se distinguiam dos nativos nas duas línguas e os erros que faziam

em inglês eram os de generalizações de regras, típicos de todas as crianças.

6) “Línguas misturadas” – os pais são bilingues, alguns sectores da comunidade podem

também ser bilingues e os pais alternam as línguas.

Tabouret-Keller (1962) abordou este tipo de aprendizagem; neste estudo o pai era

bilingue de francês e alemão e a mãe falava alemão e tinha aprendido francês. Ambos

misturavam as duas línguas, quando falavam com a criança, o que provocou uma

consciência tardia de que falava duas línguas.

Concluindo, facilmente encontramos semelhanças entre estes tipos; as diferenças são

essencialmente na abordagem ao dirigirem-se à criança.

Há muitas maneiras de tornar uma criança bilingue. Muitos investigadores apontam

como preferenciais as abordagens referidas nos dois primeiros tipos, mas não há indicadores

que comprovem que as outras abordagens conduzirão a mais interferências ou a um pior

domínio da(s) língua(s).

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2.2 – CRIAR UMA CRIANÇA BILINGUE

As crianças já nascem preparadas para falar mais do que uma língua. Raros são os

casos em que há, de facto, limitações que impedem a aquisição de mais do que uma língua.

O papel dos pais neste tipo de educação deve privilegiar a comunicação e transformar

a aquisição das línguas numa experiência agradável e não, como frequentemente acontece,

procurarem sistematicamente a gramaticalidade, a precisão no vocabulário ou que as

crianças evitem interferências de uma língua na(s) outra(s).

O bilinguismo deve estar associado a algo positivo e vantajoso e não a ansiedades e

pressões. A criança deve ser encorajada a aprender línguas, como uma tarefa simples e

deleitosa. No que diz respeito às crianças, trata-se mais propriamente de uma aquisição do

que aprendizagem. A naturalidade de “aprender” uma língua é igual à de aprender a correr

ou a saltar.

Entre 1920 e 1960, foram realizados testes de modo a tentar perceber se o facto de ser

bilingue influía, de algum modo, sobre a inteligência das crianças bilingues. Como já

referimos, os estudos da altura revelavam que as crianças bilingues tinham Q.I. mais baixos,

mas estes testes não eram totalmente isentos. Como veremos mais adiante, raros são os casos

em que um bilingue é igualmente proficiente em ambas as línguas. Elas são frequentemente

usadas em contextos diferentes, com pessoas distintas e daí ser falacioso comparar ambas

nos mesmos usos. Os testes de Q. I. mais conhecidos eram realizados na língua mais fraca

dos bilingues, normalmente em inglês, língua materna dos monolingues em questão; o facto

da maioria dos bilingues ser proveniente de famílias rurais e dos monolingues pertencerem à

classe média urbana, é suficiente para ter influência nos resultados obtidos.

De facto, actualmente os testes realizados ao Q.I. apresentam o indivíduo bilingue com

uma ligeira superioridade em relação aos monolingues.

Os benefícios de uma educação bilingue são, actualmente, inquestionáveis. As crianças

desenvolvem com proficiência duas línguas, o que lhes permite uma opção maior no que diz

respeito à comunicação com diferentes culturas ou pessoas oriundas de outros locais; este tipo

educação permite ainda um maior conhecimento e consequente entendimento de outras

culturas, o que possivelmente conduzirá a um adulto mais tolerante e informado. Outra

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vantagem que as pesquisas têm confirmado é que as crianças habituadas a comunicar em mais

do que uma língua têm benefícios em tarefas cognitivas, nomeadamente ao nível do

pensamento criativo, são mais flexíveis e criativas.

Skutnabb-Kangas (1981:152) dá algumas sugestões para criar uma criança bilingue:

“Talk to the child as much as possible and as early as possible… Try to

organize for the child as many varied linguistic situations as possible in both

languages… Play linguistic games with the child… Try to arrange for the

child to get mother tongue instruction in both languages… Try to show the

child in practical situations, not only by discussions, how splendid it is, how

useful and rewarding, to be able to participate as a native in two different

cultures. Try to give the child a chance to be proud of her bilingualism and

her cultural competence”.

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2.3. DEFINIÇÕES E GRAUS DE BILINGUISMO

Definir bilinguismo é, por si só, uma tarefa difícil. Como afirma Baker (2001, 2):

“Since a bicycle has two wheels and binoculars are for two eyes, it would seem that

bilingualism is simply about two languages”. Mas a definição é bem mais complicada.

Bloomfield (1933) definiu bilinguismo como o domínio nativo de duas línguas,5 mas

nem todos os especialistas não concordam com esta definição. Haugen (1953) tem uma visão

quase oposta a Bloomfield. Para ele, basta que o falante de uma língua consiga produzir

frases, ainda que limitadas, noutra língua.

Estas definições, já com alguns anos, enfrentam alguns problemas, nomeadamente a de

Bloomfield, em que é exigido um controlo como um monolingue para cada uma das línguas.

Também a questão do “domínio nativo” e como pode ser medido e definido tem vindo a ser

questionada por inúmeros investigadores.

Já a definição de Weinreich (1968) também não parece muito precisa, pois embora

considere que o bilingue é aquele que usa alternadamente duas línguas6, não estipula um

nível de proficiência nas mesmas.

Todas estas definições são um pouco extremas, por um lado, Weinreich e Haugen que

alargam tanto o âmbito da definição que permitem que praticamente todas as pessoas possam

ser consideradas bilingues, por outro Bloomfield que cinge tanto o conceito que diminuiria

bastante o número de bilingues que consideramos actualmente.

Mackey (1967) considera que temos que ter em conta quatro factores na definição de

bilinguismo: o grau, a função, a alternância e a interferência. O grau remete para a

proficiência, para o conhecimento que um falante tem das línguas e a função incide na

utilização que dá às mesmas. Alternância, como o próprio nome indica, reflecte-se na

extensão com que o falante bilingue alterna entre as línguas e interferência repercute-se na

influência que uma língua exerce sobre a outra, isto é, de que modo é que o indivíduo

consegue ou não separar as línguas.

Todos estes factores são facilmente verificáveis, à excepção da proficiência. Em

relação à proficiência, pode ser “medida” recorrendo à fluência que o indivíduo tem nas duas

5 “native-like control of two languages” 6 “alternately using two languages”

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línguas e no equilíbrio entre elas, isto é, na comparação da proficiência que podemos

estabelecer entre as duas mas esta classificação não é fácil de fazer. Qual será o grau

necessário de fluência para considerarmos uma pessoa como bilingue? Será que este

equilíbrio entre as línguas é um factor essencial para considerar um falante bilingue? O

indivíduo terá que dominar ambas as línguas ao nível de um monolingue nativo ou qual é o

nível de fluência necessário para ser considerado bilingue? Todas estas questões implicam

uma resposta subjectiva. Dificilmente um bilingue terá as mesmas experiências nas duas

línguas para ter o tão desejado equilíbrio.

O que a investigação desde os anos 50/60 tem feito é concentrar-se em aspectos da

língua que são mais facilmente analisáveis como o vocabulário ou a morfologia.

Outros factores que referimos anteriormente como a idade, memória ou a motivação

vão também influenciar a aptidão do bilingue.

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3. LÍNGUA

3.1. MANUTENÇÃO OU TROCA

Quando um indivíduo falante de uma língua se instala num país que tem outra língua de

origem uma destas consequências pode ocorrer: ou o indivíduo consegue manter a sua própria

língua, mesmo tendo outra mais forte em termos da região, onde está inserido mesmo em

termos sociais, ou há uma troca, uma alternância da sua língua pela língua da comunidade

maioritária onde está inserido pela necessidade de comunicação e socialização.

Muitas línguas estão a desaparecer devido à difusão de línguas maiores7 como o inglês

ou o chinês. Grosjean acredita que são onze as línguas mais faladas, distribuídas por 70% da

população mundial.

A mudança entre línguas pode implicar bilinguismo, mas bilinguismo não significa que

uma das línguas tem que desaparecer ou morrer. Há diversos factores externos identificados

em estudos sobre a manutenção, desaparecimento e alternância entre línguas como a classe

social, a religião, os laços com o país natal, a semelhança entre as línguas, as políticas de

educação de língua e de educação para as minorias.

O objectivo por detrás da aprendizagem da língua é também motivo de maior ou menor

sucesso nessa aprendizagem. Um indivíduo que quer aprender uma língua por questões de

integração, isto é, que pretende não só aprender a língua mas também apreender a cultura, tem

mais probabilidades de ser bem sucedido do que aquele que pretende aprender a língua

motivado apenas pela utilidade da mesma.

Outro factor a ter em conta é a atitude da maioria em relação à minoria. As opiniões

divergem no que diz respeito à integração de falantes de línguas minoritárias em comunidades

com uma língua maioritária diferente. Mesmo dentro do próprio grupo há culturas que se

distinguem na maneira como interagir com a restante comunidade.

Uma coisa parece certa, quando grupos grandes falantes de uma mesma língua se fixam

em determinada área geográfica, dentro de estruturas montadas, onde o grupo fala a sua

língua de origem, têm hipóteses maiores de manter a sua língua.

7 Quando nos referimos a línguas maiores ou maioritárias, por oposição a línguas menores ou minoritárias, não

pretendemos dizer que há línguas melhores que outras. Falamos sim no sentido quantitativo, isto é, reportamo-

nos à quantidade de número de falantes dessa mesma língua.

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O isolamento é um factor que pode funcionar tanto como aliado da extinção ou da

manutenção de uma língua, ou seja, se a comunidade falante de uma língua minoritária não

tiver contacto com os membros da língua dominante isso irá, certamente, favorecer a

manutenção da língua minoritária, mas se essa comunidade não tiver fortes laços com a sua

pátria a assimilação da língua maioritária vai ser favorecida. Acontece por vezes no caso de

refugiados que rejeitam a língua de origem.

Há diferentes razões para a escolha de uma ou outra língua num contexto multilingue,

mas será que há realmente uma escolha no caso de um falante de uma língua minoritária

inserido numa comunidade onde, por exemplo, o inglês é a língua maioritária?

Na grande diversidade de língua existentes dentro da União Europeia, por exemplo, é

tentador permitir que o inglês assuma o papel de língua oficial dentro das instituições

europeias. Veremos mais à frente de que modo esta situação pode ser contornada.

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3.2. EMPRÉSTIMO, INTERFERÊNCIA, ALTERNÂNCIA

É à luz dos conceitos de aquisição sucessiva ou simultânea da língua, já abordados em

1.3, que devemos tentar compreender as definições de empréstimo, interferência e

alternância.

Sabemos hoje que, ao contrário do que era afirmado até à década de 60, o contacto entre

ambas as línguas faladas por um bilingue não é necessariamente um sinal negativo ou prova

de um deficit na competência. Aliás, a alternância de códigos de um bilingue é hoje avaliada

como elevada competência em ambas as línguas.

A diferença entre interferência e alternância é facilmente explicável: a primeira

demonstra uma incapacidade em separar as duas línguas, motivada por uma aquisição

incompleta de uma L2, que se reflecte numa competência gramatical confusa, já que muitas

vezes ocorre o empréstimo de palavras da L2, que são utilizadas de acordo com as regras da

outra língua. Na alternância isso não se verifica. O bilingue distingue claramente dois

sistemas linguísticos e conscientemente consegue utilizar as regras de cada uma das línguas

que domina. É nesse sentido que actualmente se assume a elevada performance de um

bilingue ao alternar as duas línguas. Poplack (1980: 601) afirma:

“Alternation between two languages requires a high level of bilingual

competence. Code-switching involves enough knowledge of two (or more)

grammatical systems to allow the speaker to draw from each system only

those rules which the other shares, when alternating one with another”.

Muitas vezes a alternância é utilizada com um pendor humorístico, outras de modo a

obter uma simplificação do enunciado e outras ainda porque o falante bilingue encontra

lacunas numa das línguas e vale-se da outra que lhe oferece um espectro mais alargado de

escolhas.

Quando o falante bilingue está a comunicar escolhe uma das línguas para o fazer, mas

pode a qualquer altura recorrer à outra para uma palavra ou frase. É um conceito em que as

línguas se encontram justapostas, ao contrário da interferência, em que as línguas se

encontram interligadas. É frequente na interferência utilizar uma palavra de uma das línguas e

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adaptá-la morfologica ou fonologicamente à outra ou pegar numa palavra e estender o seu

sentido à outra língua.

Estes conceitos de empréstimo, interferência e alternância têm que ser vistos, segundo

Romaine, à luz do indivíduo, mas também da comunidade. A interferência é o resultado do

uso de mais do que uma língua por parte de um bilingue no dia-a-dia mas; ainda segundo

Romaine, com o tempo os efeitos da interferência na comunidade podem levar a novas regras

que são distintas das observadas em comunidades monolingues quando utilizam essa língua.

Mackey distingue interferência como fenómeno individual e casual, de empréstimo,

visto como colectivo e sistemático.

Um dos pontos onde pode haver maior interferência é ao nível da pronúncia. O bilingue

identifica um fonema de uma língua mas ao reproduzi-lo serve-se das regras fonéticas da

outra. Existem vários estudos com o objectivo de clarificar qual a língua dominante: alguns

vocábulos com correspondência gráfica igual em ambas as línguas, são inseridos em listas, de

modo a observar qual o sistema fonético de que o falante se serve na leitura.

Haugen (1956) estudou e classificou diferentes tipos de empréstimo que ilustrou com

exemplos. Refere que pode ou não haver assimilação e explica que palavras como pizza ou

czar já foram de tal modo assimiladas, que a maioria dos falantes nem se apercebe da sua raiz

estrangeira. Distingue um outro tipo de empréstimo loanblend, um empréstimo híbrido ou

combinado, para os casos em que uma parte da palavra é emprestada e a restante pertence à

outra língua.

Clyne (1967) registou inúmeros exemplos deste tipo de empréstimo e exemplifica com

o vocábulo Gumbaum frequente nos registos do alemão falado por imigrantes na Austrália.

Não há, na língua alemã, um equivalente para a palavra inglesa Gumtree (em português

árvore da borracha) e por isso os alemães imigrantes na Austrália criam uma palavra com

uma parte emprestada do inglês Gum e outra retirada do alemão baum (árvore). Este tipo de

empréstimo é frequente no bilinguismo de imigrantes que ao deslocarem-se para um novo

ambiente vão encontrar coisas específicas e vão utilizar palavras da língua onde estão.

Outro tipo de empréstimo que Haugen (1953) descreve é o loanshift, também chamado

de extensão (semântica) e que consiste em utilizar uma palavra da língua base e estender o

seu significado de modo a que corresponda a uma palavra na outra língua. O exemplo que

fornece diz respeito aos imigrantes que falam português nos Estados Unidos da América e

que utilizam a palavra grosseria (comentário desagradável) como grocerystore (mercearia).

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Poder-se-ia pensar que este tipo de empréstimo só acontece quando as palavras são

foneticamente semelhantes, nas duas línguas. Mas Grosjean clarifica essa situação servindo-

se de um exemplo extraído da mesma comunidade imigrante: a utilização da palavra frio (em

inglês cold) para se referirem a uma constipação, por analogia à palavra inglesa cold (também

com o significado de constipação).

É frequente também a utilização de expressões e, mais uma vez, servindo-se da mesma

comunidade Grosjean exemplifica com a expressão correr para mayor (to run for mayor) em

que o verbo to run (que tanto pode ter o significado de correr como de concorrer, candidatar-

se) é utilizado de forma errada, criando um enunciado inaceitável para um monolingue.

A distinção entre alternância e empréstimo ou interferência pode ser vista através da

competência em determinada língua ou através da gramaticalidade.

O empréstimo pode ocorrer no discurso dos falantes que têm apenas uma competência

monolingue, enquanto os fenómenos de alternância e interferência implicam já um grau de

competências nas duas línguas. Se as definições entre alternância e interferência não

apresentam problemas quando contrapostas com a definição de empréstimo, fazer a distinção

entre as duas implica um olhar mais atento. Diremos que a alternância implica intercalar a

gramática não provocando uma violação da gramática de nenhuma das línguas, e a

interferência já provoca essa violação em uma ou ambas as línguas.

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4. UM OU DOIS SISTEMAS LINGUÍSTICOS: PRODUÇÃO E

PROCESSAMENTO DO DISCURSO BILINGUE

O que está implicado no bilinguismo? Um ou dois sistemas linguísticos?

Será que o bilingue tem dois sistemas linguísticos distintos, um para cada língua ou tem

um só sistema, mas diferente do sistema de um monolingue?

As distinções entre os códigos podem ser vistas à luz da linguística e aí a grande

questão é se o bilingue tem um sistema com regras para cada língua ou se tem dois sistemas

distintos. Se analisarmos estas questões a um nível neuropsicológico e neurolinguístico,

teremos que considerar o modo como o cérebro está organizado, em comparação com o do

monolingue e se os cérebros dos bilingues diferem entre eles. A psicologia da aprendizagem e

a sociologia debruçam-se mais sobre os métodos de aprendizagem e contexto em que ocorre o

bilinguismo.

Qualquer que seja o modo como as línguas estão representadas no cérebro bilingue, as

provas dadas pela influência entre os dois sistemas linguísticos na perda ou aquisição de

língua sugerem que o conhecimento da L1, da L2 e da LE não está separado por fronteiras

rígidas, e que o conhecimento num sistema pode mesmo afectar o conhecimento no outro. Na

prática, o conhecimento só se demonstra através da performance, portanto só é possível

constatar estas evidências quando falamos.

Estudos em neuropsicologia e neuroimagiologia evidenciam representações cerebrais

do léxico na L1 e na L2 similares tanto em bilingues tardios como precoces.

Uma questão que se coloca é em que momento é que a criança bilingue reconhece e

distingue as duas línguas. De acordo com Leopold (1954) ou Volterra e Taeschner (1978), as

crianças só distinguem as duas línguas a partir dos três anos. Pesquisas mais recentes, levadas

a cabo por De Houwer (1990); Genesee (1989) ou Genesee, Nicoladis e Paradis (1995)

defendem um reconhecimento desta diferenciação um pouco mais cedo e mesmo algumas

análises mais recentes de dados antigos apontam nesse sentido, como é o caso de Paradis, que

chama a atenção para a distinção fonológica na recolha de dados efectuada por Leopold.

Um dos argumentos para esta distinção tem que ver com a utilização de palavras de

cada uma das línguas, numa fase muito precoce do desenvolvimento linguístico, por altura em

que só dizem uma palavra de cada vez. Estas conclusões derivam de estudos de discriminação

da língua por parte de crianças monolingues.

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Há ainda uma questão relevante que se prende com o facto de mesmo numa exposição

simultânea a duas línguas, desde o nascimento, poder haver uma língua dominante.

Para compreender a produção do discurso temos que analisar os métodos utilizados no

estudo da produção linguística. Estes podem vistos à luz de três grandes áreas: observação;

experimentação e neuroimagiologia. A pesquisa psicolinguística dos anos 50 utilizava quase

exclusivamente as técnicas de observação do discurso, enquanto que o método por via da

experimentação começou a ser utilizado duas décadas mais tarde. No final dos anos 80 as

técnicas de neuroimagiologia começaram a ser adoptadas na pesquisa sobre produção do

discurso.

Os métodos de observação envolvem o discurso espontâneo e o erro. Dizem respeito ao

tipo de frase, à prosódia, à formação de palavras e estruturas sintácticas. Investigam as

pausas, os silêncios, as auto-correcções, a frequência e o tipo de erros.

A segunda área traduz-se no estudo das interferências e serve-se com frequência de

stroop tasks (estímulos que induzem ao erro). A título de exemplo, diremos que este tipo de

tarefas muitas vezes utiliza testes com cores escritas noutras cores que não as suas, isto é, azul

escrito a amarelo, verde escrito azul e por aí em diante), há ainda listas de vocabulário onde

estão presentes palavras ambíguas, que podem ser lidas à luz de mais do que uma língua, e

que serviriam para identificar a língua dominante. Este último sistema pode servir línguas

relativamente próximas, mas será difícil fazê-lo com línguas como o chinês e o inglês, por

exemplo.

Há estudos que tentam suportar a hipótese do sistema único ou dos dois sistemas. É

difícil fazer uma análise de um de outro sem termos em conta os estudos já feitos, os dados e

as conclusões retiradas. Comum a todos os estudos está o conceito de alternância. Esta

definição é por si só uma dificuldade, pois cada estudo tem uma definição mais ou menos

abrangente da mesma. A maior parte dos estudos envolvem a alternância lexical e sintáctica.

Menos atenção é dada à alternância fonológica. Vogel (1975) estudou a aquisição fonológica

de uma criança bilingue de língua romena e inglesa e defende a hipótese de um sistema único

mas Ingram (1981) vai contra esta hipótese no seu estudo de uma criança bilingue da mesma

idade, demonstrando separação no desenvolvimento fonológico.

Bergman (1976) e Lindholm e Padilla (1978a,b) dão argumentos convincentes para o

output alternado das crianças ser visto com base no seu input linguístico. A necessidade de

examinar o input era uma crítica dirigida aos defensores do sistema único.

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Lanza (1997) sugere que talvez a questão da hipótese de um ou dois sistemas não seja a

mais correcta a colocar para tentar perceber esta alternância em crianças bilingues. Talvez a

grande questão seja questionarmo-nos sobre quais os factores que estimulam essa alternância.

Ao nível das representações, apesar de a criança ter dois sistemas linguísticos pode ter

que aprender ainda a diferenciá-los em termos de uso de língua, de acordo com parâmetros

sócio-linguísticos, como o interveniente ou o assunto.

Grosjean (1985,1992) critica a concepção de bilingue que se traduz no que ele chama

de “visão monolingue de bilinguismo”8. De acordo com Grosjean (1985:473), uma

consequência natural deste ponto de vista é que partindo do princípio que os bilingues são (ou

devem ser) dois monolingues numa só pessoa, o contacto entre as duas línguas deve ser raro.

Os dois sistemas linguísticos devem ser autónomos e assim permanecer sempre. A haver

contacto é acidental e produto de interferência:

“Because bilinguals are (or should be) two separate monolinguals

in one person, covert or overt contact between their two languages should

be rare. The two language systems should be autonomous and should

remain so at all times. If there is contact, it is accidental and is simply the

result of language interference”.

Esta questão dos dois sistemas nas crianças bilingues também é partilhada pelos

defensores da hipótese de um só sistema, mas consideram esta alternância parte integrante do

desenvolvimento, a ser ultrapassada com vista ao “verdadeiro bilinguismo”. Grosjean propõe

a “visão total ou bilingue do bilinguismo”,9 que defende o bilingue como um todo, que não é

facilmente decomposto em duas partes isoladas: o bilingue “is an integrated whole which

cannot easily be decomposed into two separate parts”.

Para Grosjean, os bilingues adoptam a língua do interlocutor e reduzem a activação da

outra língua mas dificilmente desactivam por completo a língua que não está a ser utilizada.

Refere ainda que os bilingues têm duas redes linguísticas (compostas por fonemas, sílabas,

palavras) que são independentes mas que ao mesmo tempo estão interligadas. São

independentes naqueles bilingues que ora falam uma língua, ora falam outra mas estão

interligadas naqueles bilingues que transferem de uma língua quando estão a usar a outra em

contexto monolingue, ou quando há alternância em conversas entre bilingues. Isto vai ao

8 No original “the monolingual (or fractional) view of bilingualism” 9 No original “the bilingual (or wholistic) view of bilingualism”

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encontro do que é defendido por Paradis que propõe que as duas línguas estão armazenadas de

modo idêntico num sistema alargado, mas como normalmente aparecem em contextos

separados, formam ligações distintas e, consequentemente, um subsistema dentro desse

sistema maior. Os bilingues possuem ainda conjuntos de ligações neurais, um para cada língua

que pode ser activado ou desactivado independentemente, mas têm também um conjunto mais

alargado do qual podem retirar elementos de cada língua, em qualquer momento.

O bilingue é uma pessoa com características singulares e deve ser estudado como tal e

não procurar sempre a comparação com o monolingue. Não é possível colocar os dois no

mesmo ponto, o bilingue utiliza duas línguas (separadamente ou juntas) para objectivos

diferentes, em diferentes domínios, com diferentes pessoas. Este é, em linhas gerais, o

princípio da complementaridade que François Grosjean diz ser necessário ter em consideração

cada vez que procuramos analisar um bilingue.

O mesmo autor reconhece que os bilingues têm vindo a ser descritos e avaliados

segundo critérios standard utilizados para os monolingues, o que não se traduz num estudo

apurado pois os monolingues só utilizam uma língua para todos os domínios e os bilingues

usam duas ou mais. Muitas vezes as línguas faladas pelos bilingues são avaliadas em

separado, quando na realidade ambas são utilizadas em simultâneo frequentemente.

Esta classificação de bilingue equilibrado tem causado algum incómodo nos bilingues

ao longo do tempo, que muitas vezes não consideram deter uma proficiência igual em ambas

as línguas e acabam por não se considerar bilingues. Ora uma proficiência igual em duas ou

mais línguas é extremamente raro. As necessidades e usos das duas línguas são diferentes, e

como tal, poucas vezes o bilingue é igualmente fluente nas duas línguas.

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5. POLÍTICAS LINGUÍSTICAS. A DIVERSIDADE NA INTEGRAÇÃO DOS

I(E)MIGRANTES

As políticas educativas no que diz respeito às línguas são determinantes para o futuro

dessas mesmas línguas.

Partiremos da situação em que se encontra o multiculturalismo e a diversidade

linguística na Europa, para depois nos circunscrevermos a Portugal.

Marques (2003, 65) questiona:

“(…) como promover o plurilinguismo e o pluriculturalismo10

preservando a identidade de cada um? Como o fazer ante a presença crescente

do Inglês como língua de comunicação internacional? Como definir uma

política linguística que, tendo em conta, tanto tradições, quanto uma

diversidade e uma multiplicidade linguística e cultural que não se podem

questionar, não esqueça, nem as raízes históricas do problema, nem uma

unidade e uma diversidade, ambas a manter, nem tão pouco o que chamaria

uma tendência que aponta para a convergência de sistemas linguísticos

(países nórdicos, línguas latinas,…) e para a aposta de transparência dos

mesmos, logo, na intercompreensão”.

Numa União Europeia onde as línguas oficiais já ultrapassam as duas dezenas é

necessário que todos vivam em harmonia, definindo uma unidade europeia que partilha

valores universais comuns e respeitando a singularidade, nomeadamente linguística, nacional.

O Presidente da União Europeia, Durão Barroso e o Comissário para o Multilinguismo,

Leonard Orban, decidiram juntar um grupo de intelectuais para estudar de que o modo o

multilinguismo poderia promover o diálogo intercultural e para a compreensão mútua dos

cidadãos na União Europeia. O resultado desse trabalho surge agora, no Ano Europeu do

Diálogo Intercultural, com algumas sugestões interessantes.

Um dos conceitos que consideramos interessantes e motivadores neste relatório é o de

Língua Pessoal Adoptiva (LPA). Esta LPA seria uma língua à escolha aprendida por todos os

europeus, diferente da L1 e da sua língua de comunicação internacional, que funcionaria

10 Negrito proposto pela autora no original

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idealmente não como LE, mas como uma segunda língua materna. Esta aprendizagem seria

intensa, integrada no percurso escolar e profissional e acompanhada por uma familiarização, a

todos os níveis, com os países onde ela é falada.

No contexto actual, falar inglês já não representa uma enorme mais-valia, já não é

suficiente pois é uma língua que quase todos dominam. É necessário outro tipo de distinção

entre, por exemplo, candidatos a um emprego e, nesse sentido, a aprendizagem de uma LPA

traria enormes benefícios. Certo que alguns escolheriam na mesma o inglês, mas se a oferta

fosse ampla, as vantagens seriam gigantescas. E não falamos só a nível europeu, essas

vantagens notar-se-iam também nas relações da Europa com o mundo, pois certamente alguns

cidadãos escolheriam como LPA línguas não presentes na União Europeia, nomeadamente

asiáticas.

A imigração é um factor tanto de enriquecimento como de tensão. Gerir a diversidade

linguística e cultural que a envolve é um processo complexo. É fundamental evitar políticas

segregacionistas que não contemplem a interacção entre a língua e cultura do país de

acolhimento e do país do emigrante e banir acções que visem a assimilação total da cultura e

língua do país de acolhimento em detrimento das do imigrante. Nesse sentido também o

conceito de LPA vem trazer um contributo. Se pensarmos que um imigrante escolhe como

sua LPA a língua do país, onde irá estabelecer-se, certamente facilitará o processo de

integração e aumentará a sua participação na vida da nova comunidade.

Haver ainda a possibilidade para os imigrantes e seus filhos de acederem à sua língua e

cultura de origem ajudaria a preservar o seu património linguístico e cultural. Não se pense

que tudo estaria do lado dos imigrantes, seria importante também incentivar os cidadãos dos

países de acolhimento a aprender as línguas e cultura dos países que acolhem. Pensamos que

estas medidas proporcionariam um melhor entendimento entre os povos e ajudaria a prevenir

eventuais conflitos que já nos habituámos a assistir.

Outra sugestão presente no relatório, que muito nos agrada, é a da constituição de um

organismo bilateral e bilingue, seja ele instituto, fundação ou simplesmente um grupo activo

de cidadãos, que trabalhe com um par de países e desenvolva o conhecimento entre as suas

línguas e culturas, promovendo os contactos entre instituições escolares, escritores,

personalidades, assegurando o ensino da sua língua no outro país e que houvesse um

verdadeiro incentivo à escolha dessa língua durante o percurso escolar, ao nível de estágios e

de emprego.

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Nesta altura coloca-se a questão do orçamento para pôr um projecto desta natureza em

prática mas, havendo vontade, nem é necessário um investimento inicial tão avultado assim.

Se por exemplo houver uma intenção de inserir num programa escolar uma língua alternativa

e inesperada, o seu ensino poderia ser feito através de um intercâmbio entre professores dos

dois países. Os custos com a formação de professores e com a logística também poderiam ser

superados através do ensino em rede a vários alunos em pontos geográficos distintos.

É claro que inicialmente a escolha da LPA seria feita pelos pais e a criança até poderia

mais tarde a vir a contestá-la mas os benefícios da aprendizagem de uma língua em tenra

idade permaneceriam. É também sugestão deste grupo de intelectuais que a escolha da LPA

seja possível em qualquer altura da vida nomeadamente na reforma, revitalizando o tempo

livre de milhões de europeus.

É conclusão deste relatório e nossa firme convicção também que “uma gestão sábia e

imaginativa da diversidade linguística pode efectivamente favorecer a integração europeia e

promover o espírito de cidadania e o sentimento de pertença à União”.

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5.1 - O QUE JÁ FOI FEITO EM PORTUGAL

Marques (2003, 70) distingue três situações em território nacional, decorrentes de

fenómenos migratórios:

“A daqueles alunos que falam uma variante do Português diferente

da Continental europeia, mas para quem o Português pode até ser uma LS;

recorde-se que nem sempre atingem um nível aceitável na língua de origem,

mesmo se muito ligados a ela (funções identitária, simbólica ou

sentimental);

A daqueles portugueses migrantes em situação de retorno, com

repertórios verbais extremamente heterogéneos, mesmo se dentro de um

“falar bilingue”;

A de estrangeiros, por vezes principiantes absolutos, que se

encontram a frequentar uma escola primária portuguesa.” 11

Num estudo levado a cabo pelo Departamento da Educação Básica (DEB) em 2003,

denominado Caracterização nacional dos alunos com língua portuguesa como língua não

materna, o DEB fez o levantamento dos alunos que no ano lectivo de 2001/2002 tinham

como língua materna outra que não o português e concluiu que em Portugal, existiam 17535

alunos a cumprir a escolaridade mínima obrigatória que tinham línguas maternas que não o

Português. Entre estes alunos foi ainda possível identificar 230 línguas diferentes para 140

minorias identificadas.

Os gráficos apresentados de seguida demonstram as alterações da origem da população

escolar do ensino básico entre os anos lectivos de 2001/2002 e 1999/2000. Os PALOP e os

alunos de etnia cigana continuam a ocupar os lugares cimeiros entre os alunos do ensino

básico público, a grande diferença é a subida da população russa, ucraniana e chinesa.

11 Não reduziria estes principiantes às escolas primárias. Há estrangeiros que chegam já com alguma

escolaridade concluída nos países de origem.

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Nesse sentido, e tendo em conta a diversidade de línguas existentes na altura (e que

supomos se mantenha praticamente inalterada), em contexto escolar o documento

mencionado refere que é necessário:

“equacionar o ensino da língua portuguesa (LP) como língua segunda (L2).

Esta deve considerar a língua materna (LM) do aluno, ao mesmo tempo que

incide no desenvolvimento das competências de comunicação na língua alvo,

na cultura alvo e em padrões diversificados de interacção professor-aluno.”12

Fonte DEB, Caracterização nacional dos alunos com língua portuguesa como língua não

materna

O Documento Orientador - Português Língua Não Materna no Currículo Nacional,

datado de Julho de 2005, que visa a integração de alunos que não têm o português como

língua materna revela, no ponto em que descreve a evolução da imigração, que:

12 Caracterização nacional dos alunos com língua portuguesa como língua não materna, p. 7

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“O último relatório da Rede Eurydice – UE (Setembro de 2004) sobre a

população imigrante estudantil em 30 países da Europa revela que existem

noventa mil estudantes de outras nacionalidades a frequentar o sistema de

ensino português. O maior número de alunos concentra-se no 1º ciclo do

ensino básico, à volta de 36 730 alunos, seguido do 3º ciclo, com 19 065

alunos.

De acordo com os números do INE, 47,8% da imigração é de

proveniência africana, dos quais 14 081 alunos são originários de Angola.

Os números do ensino recorrente não são tão elevados. Frequentam: o

1º ciclo do ensino recorrente 2 839 alunos; o 2º ciclo, 1 503 alunos; o 3º ciclo,

4 232 alunos.

O 1º ciclo do ensino recorrente é o nível de ensino mais procurado pelos

alunos romenos, enquanto que os níveis seguintes são frequentados,

sobretudo, por alunos angolanos e cabo-verdianos.

Na globalidade, existem, nas escolas públicas portuguesas, alunos de

120 nacionalidades, conforme apuramento dos dados do questionário aplicado

no ano lectivo 2004-2005.”13

Se o problema já existia desde a vaga de imigração dos PALOP, em que se supunha que

estes imigrantes oriundos de países de língua oficial portuguesa falassem português e durante

muito tempo se negligenciou o facto da sua cultura e língua não ser a portuguesa, o que fazer

em relação às novas línguas que ouvimos diariamente na rua, nos transportes públicos, nas

escolas?

A Lei de Bases do Sistema Educativo Português ( Lei n.º 46/86 de 14 de Outubro)

consagra o seguinte:

alínea d), Artigo 3º

"Assegurar o direito à diferença, mercê do respeito pelas personalidades e pelos

projectos individuais da existência, bem como da consideração e valorização dos diferentes

saberes e culturas";

alínea f), Artigo 7º

"Fomentar a consciência nacional aberta à realidade concreta numa perspectiva de

humanismo universalista, de solidariedade e de cooperação internacional";

13 Documento Orientador - Português Língua Não Materna no Currículo Nacional, p. 6

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alínea o)

"Criar condições de promoção do sucesso escolar e educativo a todos os alunos".

O Decreto-Lei n.º6/ME/2001, de 18 de Janeiro, no seu artigo 8º vem consignar o ensino

do português como língua segunda: "As escolas devem proporcionar actividades curriculares

específicas para a aprendizagem da língua portuguesa como segunda língua aos alunos cuja

língua materna não é o português."

Na realidade é muitas vezes difícil integrar estes alunos quando, por muita vontade que

haja, os professores não têm uma formação em português como L2 e em educação

multicultural e quando os materiais escasseiam.

Dulce Pereira afirmava já em 1998:

“(...) para melhorar o ensino das minorias linguísticas, podemos, (...)

introduzir novas culturas na aula, aplicar métodos de português como língua

segunda (o que não deixa de ser ensinar português), ou promover aulas

suplementares de reforço da língua portuguesa (o que não interfere na

dinâmica da aula tradicional). (...) é imperioso instituir o ensino bilingue em

Portugal.”14

Portugal foi um dos quinze países que, a partir de 1998, aderiram ao projecto Políticas

Linguísticas para uma Europa Multilingue e Multicultural, do qual saíram dois instrumentos

de valor incontornável na discussão sobre o ensino das línguas: o Quadro Europeu Comum de

Referência para as Línguas (QECR) e o Portfolio Europeu de Línguas (PEL), mas apesar de

se ter comprometido a seguir as recomendações destes instrumentos, o certo é que não há

mudanças profundas no ensino das línguas.

A discussão sobre multilinguismo e multiculturalismo tem sido desenvolvida mais na

esfera académica, não há uma discussão efectiva e abrangente do tema na sociedade em geral.

Um estudo mais recente sob a coordenação de figuras incontornáveis na discussão do

português como língua não materna como Maria Helena Mira Mateus, Glória Fisher e Dulce

14 Pereira, Dulce (1998), “Desenvolvimento linguístico das minorias de origem crioula e formação de

professores”, in PROJECTOS, MODELOS, IMPULSOS, DEB, p. 120

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Pereira, denominado Diversidade Linguística na Escola Portuguesa (2005, 2006) actualiza os

dados, embora se reporte só à área metropolitana de Lisboa.

Num primeiro CD, o objectivo foi caracterizar a sociedade linguística presente em

Portugal: “Conhecer foi a palavra-chave que motivou este projecto de investigação”. Foram

analisadas quatrocentas e dez escolas, as que responderam ao desafio de preencher os

questionários enviados pelos autores, e consequentemente foram analisadas quatro línguas

que se encontraram em número mais significativo, nomeadamente caboverdiano, guzerate,

mandarim e ucraniano.

Os grandes objectivos deste projecto são: mudar a atitude de professores, legisladores e

alunos face à diversidade linguística, criar instrumentos que permitam conhecer melhor essa

diversidade e analisar o modo como as outras línguas e culturas interferem ou não na

aprendizagem e utilização do Português, valorizando sempre a diversidade.

O segundo CD traz exercícios, materiais e listas de vocabulário para as línguas

referidas, valorizando sempre as línguas maternas e as vantagens do bilinguismo e do

plurilinguismo.

A União Europeia definiu como prioridade a aprendizagem de línguas estrangeiras no

pré-escolar e no 1º ciclo do ensino básico e nesse sentido Portugal cumpriu o seu papel, o

ensino do inglês no primeiro ciclo do ensino básico é hoje uma realidade na esmagadora

maioria das escolas portuguesas.

Na Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité

Económico e Social e ao Comité das Regiões, em 2003, pode ler-se que é objectivo que os

cidadãos dominem a língua materna mais duas outras línguas. A aprendizagem no ensino

secundário deve privilegiar uma capacidade de comunicação efectiva e as escolas secundárias

são incentivadas a acolher professores de outras comunidades linguísticas.

A nível universitário recomenda-se a aprendizagem de uma língua estrangeira,

independentemente da natureza da licenciatura.

Idealmente deveria estar à disposição dos alunos uma gama abrangente de línguas

estrangeiras, tanto as com maior número de falantes como as línguas das minorias e dos

imigrantes.

Nesta comunicação pede-se ainda a criação de comunidades favoráveis às línguas,

aproveitando o potencial de cidadãos bilingues, estudantes Erasmus ou residentes temporários

e das novas tecnologias, aconselhando o recurso à Internet e ao DVD por exemplo.

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O Documento Orientador já mencionado, propõe medidas de acolhimento e

escolarização que deverão ser postas em prática em todos as escolas onde se verifique a

presença de alunos com o Português como língua não materna, com vista a favorecer a sua

socialização. Estas medidas consistem na criação de uma equipa multilingue e

multidisciplinar organizará o processo de cada aluno, onde constará a sua L1 e outras línguas

que conheça. A realização de um teste diagnóstico, cuja avaliação é reconhecida através de

um Sistema de Avaliação e Certificação de Português Língua Estrangeira (SACPLE),

estabelecerá o nível de proficiência em Português. As medidas de escolarização pressupõem o

seguimento de metodologias específicas de ensino de Português como língua não materna.

Estas orientações devem ser seguidas pelos professores de todas as disciplinas, dada a

presença constante do Português em todas elas.

Prevê-se depois a criação de grupos consoante a proficiência, que serão divididos em

três níveis, de acordo com o QECR.

A avaliação, parte integrante do processo de aprendizagem e atestadora da aquisição das

competências, deve constar do já mencionado teste diagnóstico que servirá para adaptar o

projecto curricular da turma ao aluno e de testes intermédios que vão registando a sua

evolução.

Marques (1989) diz que o ensino:

“(…) envolve aceitar/admitir15 que toda a educação é um processo de

transformação que afecta quem aprende e que tem outros impactos que não

explicitamente definidos por quem ensina. Assim o como se ensina

determinará se a comunicação é «a afirmação ou negação do Eu, se ela é a

aquisição de novos poderes ou antes a submissão a novas limitações»”.16

O professor deve ajudar o aluno não só a conseguir produzir frases gramaticalmente

correctas mas também auxiliá-lo a saber interagir com outros falantes e em que circunstâncias.

Isto leva-nos ao ponto seguinte do Documento Orientador, onde se define o perfil do

professor de Português língua não materna. Será alguém habilitado para leccionar português

mas terá necessariamente características específicas, nomeadamente interesse por comunicar

com estes alunos, deverá ser capaz de partir dos saberes e interesses que estes alunos trazem,

15 Sublinhados da autora no original 16 Modern Languages, Conselho de Europa, Estrasburgo, 1981, citado e traduzido por Marques (1989, p.34)

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uma atitude aberta e tolerante, e ser capaz de promover a comparação entre diferentes culturas

e hábitos.

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5.2. O QUADRO EUROPEU COMUM DE REFERÊNCIA

O tratado que institui a União Europeia, no capítulo 3 dedicado à educação, formação e

juventude refere no seu artigo 149, ponto 2 que: “ A acção da Comunidade tem por objectivo

desenvolver a dimensão europeia na educação, nomeadamente através da aprendizagem e

divulgação das línguas dos Estados – Membros (...)”.17

Neste sentido surge o Quadro Europeu Comum de Referência para as línguas (QECR),

documento concebido pelo Conselho da Europa, com vista a criar uma base comum na

Europa para as línguas vivas, no que diz respeito à aprendizagem, elaboração de programas,

manuais e exames. O QECR tem indicadores dos níveis de proficiência e competências,

levanta questões mas não pretende impor uma metodologia. Dos seus objectivos gerais

destacam-se a promoção da mobilidade dentro da Europa, melhorar a compreensão entre os

povos e travar ou evitar preconceitos entre falantes de línguas diferentes.

Partindo de “enunciados claros e realistas dos objectivos reais da aprendizagem”, o

QECR reconhece que “toda a aprendizagem que decorre num determinado período de tempo

necessita de estar organizada em unidades que tenham em conta a progressão e assegurem

uma continuidade.”18

O QECR faz uma normalização de procedimentos, nomeadamente ao nível da

avaliação. Revela-se de extrema utilidade para a definição de competências. Situa-se quase

sempre do lado do aprendente, baseando-se nas suas “necessidades, motivações,

características e recursos”19, o que é um passo decisivo para fazer a mudança de algumas

práticas e fornece pistas no que diz respeito à organização e avaliação do trabalho. Dá bons

indicadores das aprendizagens orientadas por finalidades. Os quadros iniciais são de extrema

utilidade e contemplam as diferentes áreas de actuação propostas: ouvir, falar, escrever e ler.

Os contextos em que a comunicação ocorre também são relevantes e o QECR não deixa

de o realçar, distinguindo entre domínio privado, público, profissional e educativo, sem

esquecer que estes podem muitas vezes fundir-se ou cruzar-se.

O QECR representa um novo conceito na aprendizagem/ensino e requer por parte de

quem ensina uma visão mais analítica e observadora. É extenso e complexo e exige tempo

para poder pôr em prática os seus conteúdos. Talvez uma versão mais abreviada fizesse com

que a sua utilização fosse mais alargada.

17 Jornal Oficial da União Europeia de 29/12/2006 18 Conselho da Europa, Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas – Aprendizagem, ensino,

avaliação, p. 39 19 Ibidem, p. 21

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O Portfolio tem como suporte teórico o QECR. É um instrumento prático que está

dividido em três partes: o passaporte linguístico que regista as competências nas línguas

aprendidas e as experiências interculturais, a biografia linguística orienta o aprendente na

aprendizagem e auto-avaliação, e o dossier, onde constam certificados e diplomas das línguas

aprendidas.

Os níveis de competência estão de acordo com o QECR. O Portfolio visa promover o

plurilinguismo, “facilitar a mobilidade na Europa, reforçar e preservar a diversidade

linguística; incentivar a autonomia na aprendizagem; encorajar a aprendizagem de línguas ao

longo da vida.”20 Para o aprendente ajuda-o na aprendizagem autónoma e a apresentar o seu

processo. Para o empregador traz informações claras sobre as competências de quem procura

emprego e para os educadores é demonstra o percurso curricular do aprendente a nível

nacional e internacional.

O Portfolio foi criado com o intuito de motivar a aprendizagem de línguas ao longo da

vida, facilitar a mobilidade na Europa e promover o respeito e compreensão mútua entre os

povos. A situação linguística inclui também as competências na língua de origem, o que me

parece extremamente interessante nomeadamente no que diz respeito às minorias linguísticas

que vêem o seu estatuto reconhecido.

Existe também um Quadro de Referência para o Ensino do Português no Estrangeiro

(QuaREPE) que serve a rede oficial e particular de cursos não universitários na Europa, em

França, Espanha, Andorra, Alemanha, Reino Unido, Suíça, mas também os E.U.A. e África

do Sul. Encontra-se presentemente e até Agosto do corrente ano em fase de experimentação.

O QuaREPE está estruturado em etapas, através de um currículo aberto e flexível que

contempla as aprendizagens consideradas essenciais em níveis de competência.

A análise feita no terreno através de uma pesquisa documental, de resultados das acções

de formação, de caracterização do público, de análise do inquérito permitiu chegar a quatro

grandes conclusões sobre o ensino do português no estrangeiro:

- há uma grande heterogeneidade;

- para a maioria do público, o Português circunscreve-se aos modelos educativos

e à família (ao domínio do privado);

- há diferentes graus de proficiência da língua (da materna à não materna);

- há falta ou inadequação de espaços e materiais (manuais).

20 http://www.dgidc.min-edu.pt/plnmaterna/portfolio.pdf

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O ensino de Língua e cultura Portuguesa no estrangeiro pode revelar-se no apoio

curricular a emigrantes recentes, a falantes de outras línguas, na experiência bilingue como

acontece em Berlim e Hamburgo, ou ainda no ensino de português fora do horário escolar. Há

ainda a possibilidade dos emigrantes estarem integrados no sistema educativo dos países de

acolhimento e terem as mesmas disciplinas que os outros alunos, mas ministradas em língua

portuguesa.

Um dos objectivos que procura alcançar é a competência plurilingue e pluricultural,

definida como:

“a capacidade para utilizar as línguas para comunicar na interacção

cultural, na qual o indivíduo, na sua qualidade de actor social, possui

proficiência em várias línguas, em diferentes níveis, bem como experiência

em várias culturas. Considera-se que não se trata da sobreposição ou da

justaposição de competências distintas, mas sim de uma competência

complexa ou até compósita à qual o utilizador pode recorrer”.21

O documento Currículo Nacional do Ensino Básico - Competências Essenciais

inspirou-se neste conceito e procura uma “sensibilização à diversidade linguística e

cultural”22 com o objectivo da “construção de uma competência plurilingue e pluricultural”23.

Esta concepção implica uma complementaridade das aprendizagens, que funcionam em

interacção, ao contrário do que é usual na aprendizagem de línguas, em que as competências

são tratadas de modo compartimentado. Sugere-se ainda que se utilize para o estudo das

línguas, não só material impresso mas também material audiovisual e multimédia.

21Conselho da Europa, Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas – Aprendizagem, ensino,

avaliação, p. 231 22 Currículo Nacional do Ensino Básico - Competências Essenciais, pag.45 23 Currículo Nacional do Ensino Básico - Competências Essenciais, pag.53

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6. CONCLUSÕES

O interesse no estudo dos movimentos migratórios internacionais tem variado ao longo

do tempo. Consoante o momento da História, considera-se que as migrações podem ser

benéficas ou prejudiciais ao desenvolvimento. De qualquer modo, é sempre necessário

trabalhar as relações entre os países de origem e o país de acolhimento envolvidos no

processo.

Portugal encontra-se inserido numa Europa cada vez mais aberta a novas culturas, a

novas línguas. A maior parte das pessoas fala mais do que uma língua. O monolinguismo é a

realidade menos frequente.

Portugal vê-se cada vez mais no papel de país de acolhimento. Com a descolonização

muitos africanos escolheram Portugal e sobretudo a periferia de cidades como Lisboa e

Setúbal e aí se fixaram, muitas vezes em condições precárias, conquistando empregos

indiferenciados.

A partir de meados dos anos 90, Portugal assistiu a um novo tipo de imigrantes,

primeiro da comunidade brasileira e posteriormente dos países de Leste. Estes últimos muito

diferentes dos outros, por não terem qualquer laço com o país de acolhimento, terem uma

língua diferente e possuírem muitas vezes um nível cultural elevado.

Em poucas décadas, o panorama nacional sofreu profundas alterações e, se na teoria há

muito caminho já percorrido no ensino da língua, em estratégias educativas, nas directivas

comunitárias, na prática há ainda muito por fazer.

A família imigrante está numa situação ideal para aprender uma língua porque está num

ambiente em que está fortemente exposta à mesma. A língua pode ser ouvida e aprendida na

escola, trabalho, na vizinhança. A família sabe que à partida, a não ser em casos em que as

comunidades se agrupam e organizam num determinado espaço e se fecham à comunidade do

país de acolhimento, tem que aprender a língua se que ser aceite socialmente, quer seja na

escola, quer seja no trabalho.

Se pensarmos que o mito da Torre de Babel já via a diversidade linguística como um

castigo imposto ao Homem, percebemos que o caminho para a defesa do multilinguismo não

tem sido tarefa fácil.

Passámos da ideia de que o bilingue tinha uma prestação mais fraca em testes de

aptidão verbal, por exemplo, na não muito distante década de 60, para o encararmos agora

como um indivíduo com características próprias que domina duas línguas. Só na década de 70

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é que se começou a entender o bilinguismo como fenómeno importante e não como um

entrave educativo.

Não havendo, ainda, uma solução perfeita para a gestão da diversidade cultural que

contemple a defesa do indivíduo e da sua língua e cultura de origem e que, por outro lado o

integre nos valores do país de acolhimento de uma forma tolerante e aberta ao diálogo

intercultural, parece-nos que a alternativa mais aceitável é o multiculturalismo.

Concluímos com uma citação de Colin Baker em A Parents' and Teachers' Guide to

Bilingualism (2000: 4) sobre o papel de um monolingue e de um bilingue:

“Those who speak one language simbolize that essential difference

between animals and people. Those who speak two languages symbolize the

essential humanity of building bridges between peoples of different color,

creed, culture and language”.

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