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Revista SÍNTESE Direito Administrativo ANO IX – Nº 106 – OUTUBRO 2014 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Tribunal Regional Federal da 1ª Região – 610‑2 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – 1999.02.01.057040‑0 Tribunal Regional Federal da 3ª Região – 18/2010 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – 07/0042596‑9 Tribunal Regional Federal da 5ª Região – 10/07 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Mayara Ramos Turra Sobrane CONSELHO EDITORIAL Alexandre de Moraes, Carlos Ari Sundfeld, Fernando Dantas Casillo Gonçalves, Ivan Barbosa Rigolin, Ives Gandra da Silva Martins, Kiyoshi Harada, Maria Garcia, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Misabel de Abreu Machado Derzi, Odete Medauar, Sidney Bittencourt, Toshio Mukai COMITÊ TÉCNICO Elisson Pereira da Costa, Elói Martins Senhoras, Hélio Rios Ferreira, Luís Rodolfo Cruz e Creuz COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Bruno Stefani Morais de Lima, Carlos Athayde Valadares Viegas, Carlos Eduardo Araujo de Assis, Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas, Daniel Ivo Odon, Elisson Pereira da Costa, Elói Martins Senhoras, Jonathan Silva Rocha, Luís Rodolfo Cruz e Creuz, Rômulo de Andrade Moreira ISSN 2179-1651

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Revista SÍNTESE Direito Administrativo

Ano IX – nº 106 – outubro 2014

reposItórIo AutorIzAdo de JurIsprudêncIATribunal Regional Federal da 1ª Região – 610‑2

Tribunal Regional Federal da 2ª Região – 1999.02.01.057040‑0Tribunal Regional Federal da 3ª Região – 18/2010

Tribunal Regional Federal da 4ª Região – 07/0042596‑9Tribunal Regional Federal da 5ª Região – 10/07

dIretor eXecutIvo

Elton José Donato

Gerente edItorIAl e de consultorIA

Eliane Beltramini

coordenAdor edItorIAl

Cristiano Basaglia

edItorA

Mayara Ramos Turra Sobrane

conselho edItorIAl

Alexandre de Moraes, Carlos Ari Sundfeld, Fernando Dantas Casillo Gonçalves, Ivan Barbosa Rigolin, Ives Gandra da Silva Martins, Kiyoshi Harada, Maria Garcia,

Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Misabel de Abreu Machado Derzi, Odete Medauar, Sidney Bittencourt, Toshio Mukai

comItê técnIco

Elisson Pereira da Costa, Elói Martins Senhoras, Hélio Rios Ferreira, Luís Rodolfo Cruz e Creuz

colAborAdores destA edIção

Bruno Stefani Morais de Lima, Carlos Athayde Valadares Viegas, Carlos Eduardo Araujo de Assis, Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas, Daniel Ivo Odon, Elisson Pereira da Costa,

Elói Martins Senhoras, Jonathan Silva Rocha, Luís Rodolfo Cruz e Creuz, Rômulo de Andrade Moreira

ISSN 2179-1651

2006 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação mensal de doutrina, jurisprudência, legislação e outros assuntos de Direito Administrativo.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec‑tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e‑mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Revista Síntese Direito Administrativo – v. 1, n. 1 (jan. 2006) Nota: Continuação da REVISTA IOB de DIREITO ADMINISTRATIVO

São Paulo: IOB, 2006‑.

v. 9, n. 106; 16 x 23 cm

Mensal ISSN 2179‑1651

1. Direito administrativo.

CDU 342.9 CDD 341.3

Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.iobfolhamatic.com.br

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Carta do Editor

Caros leitores, para compor o Assunto Especial desta edição da Re-vista SÍNTESE Direito Administrativo escolhemos o tema “Sanções da Lei de Improbidade Administrativa”.

A Lei nº 8.429/1992, chamada Lei de Improbidade Administrativa, traz algumas sanções, quais sejam: perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, perda da fun-ção pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e a proibição de contratar com o Poder Público.

Analisaremos, nesta edição, tais sanções e alguns aspectos polêmi-cos, dentre eles, se é possível a cumulação destas.

Para compor o Assunto Especial contamos com dois artigos, são eles: “Sanções da Lei de Improbidade Administrativa”, elaborado pelo Doutoran-do e Membro do nosso Comitê Técnico, Elisson Pereira da Costa; e “O Re-gime de Responsabilidade dos Servidores Contido nas Leis nºs 8.429/1992 e 8.666/1993 e o Déficit de Controle Eficaz sobre os Atos de Improbidade Administrativa”, elaborado pelo Mestre em Direito Carlos Athayde Valada-res Viegas e pela Doutoranda Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas.

Também contamos com uma Jurisprudência Comentada, elaborada pelo Procurador de Justiça Rômulo de Andrade Moreira, intitulada “A Perda dos Direitos Políticos, a Prática do Ato de Improbidade Administrativa e a Constituição Federal”. Além de um Acórdão na Íntegra do STJ e do ementá-rio criteriosamente selecionado.

Na Parte Geral publicamos três artigos, destacando o título “Deba-tes Jurídicos sobre a Terceirização no Brasil”, elaborado pelo Pós-Doutor, Membro do nosso Comitê Técnico, Elói Martins Senhoras.

Ainda, na Parte Geral, publicamos oito Acórdãos na Íntegra (TRF 1ª R., TRF 2ª R., 3 do TRF 3ª R., TRF 4ª R., TRF 5ª R. e TJSP) e o ementário com os valores agregados.

Para esta edição, na Seção Especial, contamos com uma Jurispru-dência Comentada elaborada pelo Advogado e Membro do nosso Comitê Técnico Luís Rodolfo Cruz e Creuz, pelo Advogado Jonathan Silva Rocha e pelo Bacharel em Direito Bruno Stefani Morais de Lima, em que analisaram um caso de repasse das diferenças dos valores do ICMS, que estariam sendo indevidamente apropriadas pelo Estado-membro.

Tenham todos uma ótima leitura!

Eliane BeltraminiGerente Editorial e de Consultoria

Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ......................................................................7

Assunto EspecialSançõeS da Lei de improbidade adminiStrativa

doutrinaS

1. Sanções da Lei de Improbidade Administrativa Elisson Pereira da Costa.............................................................................9

2. O Regime de Responsabilidade dos Servidores Contido nas Leis nºs 8.429/1992 e 8.666/1993 e o Déficit de Controle Eficaz sobre os Atos de Improbidade AdministrativaCarlos Athayde Valadares Viegas e Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas .....................................................................................................14

JuriSprudência comentada

1. A Perda dos Direitos Políticos, a Prática do Ato de Improbidade Administrativa e a Constituição FederalRômulo de Andrade Moreira ..................................................................32

JuriSprudência

1. Acórdão na Íntegra (STJ) ..........................................................................38

2. Ementário ................................................................................................46

Parte Geral

doutrinaS

1. Debates Jurídicos sobre a Terceirização no BrasilElói Martins Senhoras ..............................................................................55

2. Habilitação Técnica em Licitações PúblicasCarlos Eduardo Araujo de Assis ...............................................................70

3. O Direito de Reenquadramento Funcional e de Salário de Carreira Isonômico aos Anistiados da Lei nº 8.878/1994: o Equilíbrio Reflexivo de uma Obrigação de Solidariedade e SociedadeDaniel Ivo Odon .....................................................................................88

JuriSprudência

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .................................................110

2. Tribunal Regional Federal da 2ª Região .................................................117

3. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .................................................124

4. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .................................................1435. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .................................................1506. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .................................................1557. Tribunal Regional Federal da 5ª Região .................................................1608. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo ...........................................166

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência de Direito Administrativo .........................173

Seção EspecialJuriSprudência comentada

1. Fundo de Participação dos Municípios. Repartição Constitucional das Receitas Tributárias. Participação dos Municípios no Produto da Arrecadação do ICMS (CF, Artigo 158, IV). PRODEC (Programa de Desenvolvimento da Empresa). Lei Catarinense nº 11.345/2000. Concessão, pelo Estado, de Incentivos Fiscais e Creditícios, com Recursos Oriundos da Arrecadação do ICMS. Pretensão do Município ao Repasse Integral da Parcela de 25%, sem as Retenções Pertinentes aos Financiamentos do PRODEC. Controvérsia em Torno da Definição da Locução Constitucional “Produto da Arrecadação” (CF, Artigo 158, IV). Pretendida Distinção, Que Faz o Estado de Santa Catarina, para Efeito da Repartição Constitucional do ICMS, entre Arrecadação (Conceito Contábil) e Produto da Arrecadação (Conceito Financeiro). Parcela de Receita Tributária (25%) que Pertence, por Direito Próprio, ao Município. Consequente Inconstitucionalidade da Retenção Determinada por Legislação Estadual (RE 572.762/SC, Pleno). Direito do Município ao Repasse Integral. Recurso de Agravo ImprovidoLuís Rodolfo Cruz e Creuz, Jonathan Silva Rocha e Bruno Stefani Morais de Lima .....................................................................................207

Clipping Jurídico ..............................................................................................219

Resenha Legislativa ...........................................................................................242

Bibliografia Complementar ..................................................................................243

Índice Alfabético e Remissivo ...............................................................................244

Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da SÍNTESE.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.a

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

Assunto Especial – Doutrina

Sanções da Lei de Improbidade Administrativa

Sanções da Lei de Improbidade Administrativa

ELISSON PEREIRA DA COSTADoutorando pela USP, Mestre em Direito pela Universidade Católica de Santos, Especialista em Direito pela FGV, Professor de Direito Administrativo do Curso Prepara Saraiva e de Cursos de Graduação e Pós‑Graduação em Direito Administrativo e Ambiental. Autor de diversos livros. Advogado concursado da Petrobras Transporte S/A.

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo analisar a natureza jurídica das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, bem como apresentar um panorama acerca do posicionamento dos Tribunais no que diz respeito à cumulatividade das penas e à obrigatoriedade ou não do ressar‑cimento ao Erário.

PALAVRAS‑CHAVE: Improbidade; sanções; natureza jurídica.

SUMÁRIO: Considerações iniciais; 1 A natureza jurídica das sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa; 2 Cumulatividade e ressarcimento ao Erário; Conclusão; Referências.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A temática do ato de improbidade administrativa foi introduzida no Texto Constitucional no capítulo referente à Administração Pública, mais especificamente no art. 37, § 4º, que determina que os atos de improbidade importarão na perda da função pública, indisponibilidade dos bens do indi-ciado e o ressarcimento ao Erário na forma da lei.

O ato de improbidade administrativa pode ser definido como todo aquele praticado por agente público, contrário às normas da moral, à lei e aos bons costumes, mediante o qual este se enriquece ilicitamente, ob-tém vantagem indevida, para si ou para outrem ou causa dano ao Erário. A improbidade é a má qualidade na gestão da coisa pública e prestação de serviços públicos.

A Lei nº 8.429/1992, que trata dos atos de improbidade, não traz a definição de improbidade, ficando a cargo da doutrina tal tarefa. De for-ma singela, pode-se dizer que improbidade significa má qualidade; logo,

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o agente público que pratica ato de improbidade o faz porque exerce sua função com má qualidade.

Vale dizer que a Lei nº 8.429/1992 não tipificou crimes, porquanto as condutas nela descritas constituem sanções de natureza civil e política. Dessa maneira, no presente artigo far-se-á uma análise sobre a natureza ju-rídica dessas sanções, além de questionamentos relativos à cumulatividade das mesmas e às hipóteses de ressarcimento ao Erário.

1 A NATUREZA JURÍDICA DAS SANÇÕES PREVISTAS NA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

A temática do ato de improbidade administrativa foi introduzida no Texto Constitucional no capítulo referente à Administração Pública, mais especificamente no art. 37, § 4º, ao estabelecer que os atos de improbidade importarão na perda da função pública, indisponibilidade dos bens do indi-ciado e o ressarcimento ao Erário na forma da lei.

Além disso, o art. 5º, inciso LXXIII, prevê como fundamento da ação popular a ofensa à moralidade administrativa. Anota-se, também, que o art. 15 indica a possibilidade de perda ou suspensão dos direitos políticos no caso de improbidade administrativa e o art. 85, V, dispõe que a lesão à probidade administrativa é ato ilícito enquadrado como crime de responsa-bilidade.

Assim, para regulamentar a Constituição Federal, foi promulgada a Lei nº 8.429/1992, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes pú-blicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na Administração Pública direta, indireta ou fundacio-nal, além de outras providências, como será visto adiante.

Como dito anteriormente, a Lei nº 8.429/1992 não tipificou crimes, porquanto as condutas nela descritas constituem sanções de natureza civil e política. Desse modo, independentemente do ato de improbidade come-tido, a lei estabelece as seguintes sanções: perda dos bens ou valores acres-cidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos pagamento de multa civil e a proibição de contratar com o Poder Público.

A questão que se coloca nesse artigo é a seguinte: Qual a natureza jurídica das sanções de improbidade?

A palavra natureza designa tanto o conjunto de seres e coisas existen-tes no universo quanto o princípio criador que deu origem a esse conjunto.

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Natureza, na terminologia jurídica, assinala a essência ou substância de um objeto, de um ato ou até mesmo de um ramo da ciência jurídica.

Assim, encontrar a natureza jurídica de um ramo do Direito ou de um instituto consiste em determinar sua essência para classificá-lo dentro do universo de figuras existentes no Direito.

Nesse diapasão, as sanções referentes à improbidade podem ser classificadas em típicas e atípicas1. As sanções típicas previstas na Lei nº 8.429/1992 têm natureza jurídica de provimentos condenatórios, des-constitutivos e restritivos de direitos. Esquematizando, temos a seguinte si-tuação:

Os provimentos condenatórios são o ressarcimento integral do dano, pagamento de multa civil, perda de bens ou valores ilicitamente acrescidos. A sanção desconstitutiva é a perda da função pública. Já os provimentos restritivos de direito são a proibição de contratar com o Poder Público e de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios e a suspensão dos direitos políticos.

O art. 12, caput, da Lei nº 8.429/1992 possibilita a existência de outras sanções, além das mencionadas anteriormente. São as chamadas sanções atípicas com previsão em legislação específica. Como exemplo, pode-se citar a possibilidade de anulação do contrato administrativo, preco-nizada no art. 59 da Lei nº 8.666/1993. Ademais, a Lei de Ação Civil Pública nº 7.347/1985 também permite a condenação do ímprobo em determinada obrigação de fazer ou de não fazer, como, por exemplo, a paralisação de uma atividade nociva.

1 MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 258.

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O fundamento para a existência de sanções atípicas é a efetividade da tutela do interesse, com vistas ao controle da Administração Pública e tutela do patrimônio público e a moralidade administrativa2.

Portanto, as sanções relativas aos atos de improbidade administrativa classificam-se em típicas e atípicas, sendo que a natureza jurídica dessas sanções pode ser condenatória, desconstitutiva e restritivas de direito.

2 CUMULATIVIDADE E RESSARCIMENTO AO ERÁRIO

Como visto, as penas por improbidade administrativa estão definidas no art. 12 da Lei nº 8.429/1992. De acordo com a jurisprudência do STJ, essas penas não são necessariamente aplicadas de forma cumulativa.

Dessa maneira, cabe ao Magistrado dosar as sanções de acordo com a natureza, gravidade e consequências do ato cometido. É indispensável, sob pena de nulidade, a indicação das razões para a aplicação de cada uma delas, levando em consideração os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade3.

Quanto ao ressarcimento, já está consolidada a tese de que, uma vez caracterizado o prejuízo ao Erário, o ressarcimento é obrigatório e não pode ser considerado propriamente uma sanção, mas consequência imediata e necessária do ato combatido.

Desta forma, o agente condenado por improbidade administrativa com base no art. 10 (dano ao Erário) deve, obrigatoriamente, ressarcir os cofres públicos exatamente na extensão do prejuízo causado e, concomi-tantemente, deve sofrer alguma das sanções previstas no art. 12.

O STJ também já decidiu que, nos casos de improbidade adminis-trativa, existem duas consequências de cunho pecuniário, que são a multa civil e o ressarcimento. A primeira vai cumprir o papel de verdadeiramente sancionar o agente ímprobo, enquanto o segundo vai cumprir a missão de caucionar o rombo consumado em desfavor do Erário4.

CONCLUSÃO

Como visto, a Lei nº 8.429/1992 não tipificou crimes, uma vez que as condutas nela descritas constituem sanções de natureza civil e política.

2 MEDAUAR, Odete. Controle da administração pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 171 e 179-80.

3 REsp 658.389.4 REsp 622.234.

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As sanções previstas na lei são: perda dos bens ou valores acrescidos ilici-tamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil e a proi-bição de contratar com o Poder Público.

Essas sanções são chamadas de sanções típicas, que podem assumir o caráter de provimentos condenatórios, desconstitutivos ou restritivos de direito. As chamadas sanções atípicas são aquelas previstas em legislação específica, como é o caso da Lei nº 8.666/1993, que permite a anulação do contrato administrativo em caso de ilegalidade.

Por fim, é possível que essas sanções sejam cumulativas, embora isso não seja obrigatório. No que diz respeito ao ressarcimento do dano, o STJ tem consolidado o entendimento que, uma vez caracterizado o prejuízo ao Erário, o ressarcimento é obrigatório e não pode ser considerado propria-mente uma sanção, mas consequência imediata e necessária do ato com-batido.

REFERÊNCIAS

MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa. São Paulo: Saraiva, 2011.

MEDAUAR, Odete. Controle da administração pública. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993.

Disponível em: www.stj.jus.br. Acesso em: 18 set. 2014, às 11h50min.

Assunto Especial – Doutrina

Sanções da Lei de Improbidade Administrativa

O Regime de Responsabilidade dos Servidores Contido nas Leis nºs 8�429/1992 e 8�666/1993 e o Déficit de Controle Eficaz sobre os Atos de Improbidade Administrativa

CARLOS ATHAYDE VALADARES VIEGASMestre em Direito pela Universidade FUMEC/BH, Professor de Direitos Humanos e Direito Tributário no Instituto J. Andrade/MG, Servidor Público do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região.

CLÁUDIA MARA DE ALMEIDA RABELO VIEGASDoutoranda em Direito Privado pela PUC‑Minas, Mestre em Direito Privado pela Pontifícia Uni‑versidade Católica do Estado de Minas Gerais, Graduada em Administração de Empresas e em Direito, sendo ambos pela Universidade FUMEC, Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho, Especialista em Educação a Distância pela PUC‑Minas, Especialista em Ciências Criminais pela Universidade Damásio de Jesus, Professora de Direito Civil nas Faculdades Del Rey Uniesp, Tutora em Educação a Distância do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Servidora do TRT da 3ª Região – Assistente do Desembargador Federal Sércio da Silva Peçanha.

Considera-se que a legislação referente ao regime de responsabiliza-ção dos servidores sobre atos de improbidade administrativa, relacionados com procedimentos de licitação, é suficientemente rigorosa e moderna para coibir eventuais ocorrências desta natureza. Entretanto, a cada ano que pas-sa, as estatísticas provam que os casos ofensivos aos valores da probidade e honestidade administrativa vêm se multiplicando e não dão sinais de que estão a retroceder. Há, evidentemente, uma falha na fiscalização dos órgãos de controle, especialmente na esfera municipal, que permite a impunidade dos agentes perpetradores de crimes de improbidade.

O regime jurídico de responsabilização dos servidores públicos con-tido nas Leis nºs 8.429/1992 e 8.666/1993, que trata com rigor os casos de improbidade administrativa e de crimes contra a Administração Pública, no caso contra os procedimentos de licitações, tem sido eficaz para diminuir os ilícitos administrativos? Há um déficit de normatização que permite, ainda,

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a malversação de verbas públicas ou o déficit é de falta de controle por parte dos orgãos de fiscalização?

A partir dessa indagação inicial, destina-se o presente trabalho a veri-ficar o regime jurídico da responsabilidade do servidor público, que vige na Lei nº 8.666/1993 (Lei das Licitações), destacando-se os aspectos relativos às sanções a que podem ser submetidos os mesmos, em caso da ocorrência de atos de improbidade, relativamente às contratações e licitações públicas.

Para tanto, far-se-á um estudo simultâneo com a Lei nº 8.429/1992, a qual servirá de baliza e gizará os limites deste estudo, uma vez que cons-titui, abaixo do Texto Constitucional, o marco jurídico para a prevenção, repressão e sancionamento das condutas dos servidores públicos, que even-tualmente se desviam do caminho e cometem atos de improbidade.

O Regime Jurídico que rege as relações do Estado e dos servidores públicos com a sociedade civil está contido na Constituição Federal. No-tadamente, o que diz respeito à responsabilidade objetiva do Estado e à responsabilização dos servidores contém-se no art. 37, §§ 4º e 6º.

O dispositivo insculpido no § 6º do citado artigo institui o regime de responsabilidade objetiva do Estado em face dos cidadãos, quando agente público ou terceiro investido nessa condição der causa a dano por dolo ou culpa.

Art. 37. A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e efici-ência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

[...]

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestado-ras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Neste mesmo dispositivo, a Constituição determina o dever do Estado de indenizar o dano material ou moral causado em razão de suas atribui-ções, note-se que a responsabilidade direta, imediata, objetiva é do Estado, não do servidor ou do terceiro que mediante dolo ou culpa deu causa ao dano, mas objetivamente do Estado.

Como já foi dito, trata-se do regime jurídico da responsabilização objetiva do Estado. Neste regime não há a necessidade da verificação “do

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fator culpa em relação ao fato danoso. Por isso, ela incide em decorrência de fatos lícitos ou ilícitos, bastando que o interessado comprove a relação causal entre o fato e o dano” (Carvalho Filho, 2008, p. 495).

Este novo entendimento é uma evolução das teorias administrativistas ortodóxicas, que primitivamente reputavam ao Estado uma irresponsabilida-de por seus atos (de seus agentes), ou que, mais recentemente, perqueriam a culpa (civilista e administrativa) do ato danoso.

A responsabilidade do Estado é objetiva, este responde por seus atos e deve ressarcir os prejuízos daí advindos. Esse novo posicionamento dou-trinário e jurídico que visa proteger o cidadão decorre da Teoria do Risco Administrativo, a qual reconhece uma posição de superioridade e de poder do Estado diante da sociedade, o que lhe imputa uma maior responsabili-dade, inclusive a de arcar com o risco do resultado de sua administração.

Estabelecido aí o regime jurídico da responsabilidade do Estado em face dos cidadãos, a Constituição Federal também determina a responsabi-lização do servidor público que, agindo em nome do Estado, ou aproveitan-do-se deste status privilegiado, vier dar causa a dano ao Erário Público, por culpa ou dolo.

Além disto, o já citado § 6º do art. 37 estabelece que deverá ser per-seguido judicialmente o servidor que for responsável pelo dano, sucumbido pelo Estado, pela via de ação regressiva mediante a qual dever-se-á procurar repor ao Erário os eventuais valores pagos aos cidadãos ofendidos pelo ato da administração. Mas não é só, o mesmo dispositivo constitucional, em seu § 4º, determina a penalização civil, administrativa, cumulativamente com a penal, de atos de servidores reputados ímprobos.

§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos di-reitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao Erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Todo servidor público está sujeito a um regime especial de deveres, este, deveras mais rigoroso que para os cidadãos não servidores. Agir com negligência, imperícia, imprudência ou com dolo, em face destes deveres, acarreta uma série de consequências nas esferas jurídicas administrativa, civil e penal. Como ensina Medauar:

Se a conduta inadequada afeta a ordem interna dos serviços e vem caracte-rizada como infração ou ato ilícito administrativo, cogita-se, então, da res-ponsabilidade administrativa, que poderá levar o agente a sofrer sanção ad-ministrativa. Essa responsabilidade é apurada no âmbito da Administração,

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mediante processo administrativo e a possível sanção é aplicada também nessa esfera.

Se o agente, por ação ou omissão, dolosa ou culposa, causou danos à Admi-nistração, deverá repará-lo, sendo responsabilizado civilmente. A apuração da responsabilidade civil poderá ter início e término no âmbito administra-tivo ou ter início nesse âmbito e ser objeto, depois, de ação perante o judi-ciário.

Se a conduta inadequada do agente afeta, de modo imediato, a sociedade e vem caracterizada pelo ordenamento como crime funcional, o servidor será responsabilizado criminalmente, podendo sofrer sanções penais. A respon-sabilidade penal do servidor é apurada mediante processo penal, nos respec-tivos juízos. (Medauar, 2008, p. 298)

Portanto, o servidor público tem o dever de probidade e este princípio necessariamente fundamentará toda a sua vida funcional, que se erguerá sobre os valores da honestidade e moralidade públicas. Deve agir sempre com transparência e impessoalidade e também em conformidade com os princípios republicanos que norteiam a vida comunitária.

Segundo José dos Santos Carvalho Filho, o servidor “não deve co-meter favorecimento nem nepotismo, cabendo-lhe sempre optar pelo que melhor servir à Administração” (Carvalho Filho, 2008, p. 55). Tal dever é regulado, especialmente, pela Lei nº 8.429/1992, a qual dispõe sobre os atos de improbidade administrativa, os quais se caracterizam nas seguintes formas: a) aqueles atos que culminam em enriquecimento ilícito do agente público; b) atos que geram prejuízo ao Erário; e c) atos que atentam contra os princípios da Administração Pública.

Consultada a obra de De Plácido e Silva, atualizada por Nagib Slaibi Filho e Geraldo Alves, Vocabulário Jurídico, tem-se por improbidade:

Improbidade revela a qualidade do homem que não procede por bem, por não ser honesto, que age indignamente, por não ter caráter, que não atua com decência, por ser amoral. Improbidade é a qualidade do ímprobo, E o ímprobo é o mau moralmente, é o incorreto, o transgressor das regras da lei e da moral. (Silva, 2001, p. 416)

Nota-se que o conceito anteriormente apresentado é pleno de signi-ficados valorativos, tais como bem, dignidade, falta de caráter, decência, moral. Todas essas são expressões que demandam o conhecimento de seu significado, a partir de um pré-conceito do próprio intérprete, que, nesse caso, revela muito mais a assunção de valores por parte deste do que efeti-vamente o apontamento objetivo de uma conduta socialmente reprovável.

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Trata-se de um conceito deveras aberto, que permite uma subjetividade po-tencialmente deformadora do Direito, o que é preciso evitar.

Por isso, antes de se analisarem os diversos tipos apresentados pelo legislador na Lei nº 8.429/1992, que indicam os atos considerados ímpro-bos, é necessário tentar conhecer melhor o conceito de improbidade admi-nistrativa, uma vez que a referida lei não definiu a expressão, e muito me-nos apresentou qualquer paradigma referencial, fazendo inscrever, em seu art. 1º, de forma bastante aberta, que a ocorrência de atos de improbidade administrativa será punida na forma daquela mesma lei.

Art. 1º Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, ser-vidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qual-quer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o Erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.

A preocupação em definir e delimitar o conceito de improbidade administrativa se justifica em razão da necessidade de se evitar constran-gimentos e condenações a servidores, com fundamento em interpretações equivocadas, simplistas e subjetivistas, dado o espaço interpretativo deixa-do pelo legislador ao “redigir artigos de caráter excessivamente aberto, im-precisos e impróprios, para através deles cominar as rigorosas e duras penas que prevê” (Copola, 2011, p. 19).

Cabe, portanto, à doutrina especializada, propor os limites à ativida-de interpretativa dos aplicadores da lei, a fim de evitar que atos cometidos sem dolo, ou meras irregularidades formais, sejam transformados em crimes por operadores do direito menos afetos à proporcionalidade e à razoabilida-de e mais afoitos à condenação.

Assim, para que se possa permitir uma verificação do ato administrati-vo e reputá-lo ímprobo, faz-se necessário perquirir os requisitos necessários para a ação por improbidade, quais sejam o dolo e o dano ao Erário, sem a verificação destes elementos não há que se falar em improbidade adminis-trativa.

O ato de improbidade administrativa decorre, obrigatoriamente, de uma conduta dolosa do agente, nunca se pode reputar o ato culposo à cate-goria de ímprobo, pois deve ser demonstrada a intenção, a vontade do resul-tado, o aspecto volitivo destinado a causar dano ao Erário. A lei pune o ad-ministrador desonesto, não o tecnicamente incompetente. Vejamos o REsp

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734984/SP, relatado pelo Ministro José Delgado, julgado em 18.12.2007, 1ª Turma:

RECURSO ESPECIAL – ADMINISTRATIVO – AÇÃO DE IMPROBIDADE AD-MINISTRATIVA – LEI Nº 8.429/1992 – AUSÊNCIA DE DOLO – IMPROCE-DÊNCIA DA AÇÃO.

1. O ato de improbidade, na sua caracterização, como de regra, exige ele-mento subjetivo doloso, à luz da natureza sancionatória da Lei de Impro-bidade Administrativa. 2. A legitimidade do negócio jurídico e a ausência objetiva de formalização contratual, reconhecida pela instância local, con-jura a improbidade. 3. É que “o objetivo da Lei de Improbidade é punir o administrador público desonesto, não o inábil. Ou, em outras palavras, para que se enquadre o agente público na Lei de Improbidade é necessá-rio que haja o dolo, a culpa e o prejuízo ao ente público, caracterizado pela ação ou omissão do administrador público” (MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa. 2. ed. América Jurídica, p. 7 e 8). “A finalidade da lei de improbidade administrativa é punir o ad-ministrador desonesto” (MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil in-terpretada e legislação constitucional. Atlas, 2002. p. 2611). “De fato, a lei alcança o administrador desonesto, não o inábil, despreparado, incompe-tente e desastrado” (REsp 213.994-0/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, DOU de 27.09.1999) (REsp 758.639/PB, Rel. Min. José Delgado, 1ª Turma, DJ 15.05.2006). 4. A Lei nº 8.429/1992 da Ação de Improbidade Administra-tiva, que explicitou o cânone do art. 37, § 4º, da Constituição Federal, teve como escopo impor sanções aos agentes públicos incursos em atos de im-probidade nos casos em que: a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9º); b) que causem prejuízo ao Erário Público (art. 10); c) que atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 5. Recurso especial provido.

Improbidade é ação intencional, voltada para o cometimento do de-lito, expressão inequívoca da vontade de cometer ato de afronta ao orde-namento, caracteríza-se pela má-fé, burla da norma para auferir vantagem ou para prejudicar, deliberadamente, o Erário. Assim vem entendendo o STJ sobre a existência da má-fe para caracterizar o ato ímprobo:

PROCESSUAL CIVIL – ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IM-PROBIDADE ADMINISTRATIVA – ART. 10, CAPUT, DA LEI Nº 8.429/1992 – LICITAÇÃO – PARTICIPAÇÃO INDIRETA DE SERVIDOR VINCULADO À CONTRATANTE – ART. 9º, III E § 3º, DA LEI Nº 8.665/1993 – FALTA SUPRI-DA ANTES DA FASE DE HABILITAÇÃO – SÚMULA Nº 07/STJ – AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO – MÁ-FÉ – ELEMENTO SUBJETIVO – ESSENCIAL À CARACTERIZAÇÃO DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

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1. O caráter sancionador da Lei nº 8.429/1992 é aplicável aos agentes pú-blicos que, por ação ou omissão, violem os deveres de honestidade, impar-cialidade, legalidade, lealdade às instituições e notadamente: (a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9º); (b) causem prejuízo ao Erário Público (art. 10); (c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11) compreendida nesse tópico a lesão à moralidade administrativa. 2. A má--fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal e ímprobo e a ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princí-pios constitucionais da Administração Pública coadjuvado pela má-intenção do administrador. 3. A improbidade administrativa está associada à noção de desonestidade, de má-fé do agente público, do que decorre a conclusão de que somente em hipóteses excepcionais, por força de inequívoca dispo-sição legal, é que se admite a sua configuração por ato culposo (art. 10 da Lei nº 8.429/1992). 4. O elemento subjetivo é essencial à caracterização da improbidade administrativa, sendo certo, ainda, que a tipificação da lesão ao patrimônio público (art. 10, caput, da Lei nº 8.429/1992) exige a prova de sua ocorrência, mercê da impossibilidade de condenação ao ressarcimento ao Erário de dano hipotético ou presumido. (grifo nosso) (Recurso Especial nº 939.118/SP, (2007/0071082-0), Rel. Min. Luiz Fux, 08.02.2011)

É, portanto, ato praticado de maneira voluntária, sem qualquer coer-ção, cujo intuito é o de levar proveito. É o ato conciente do agente público que não se confunde com culpa ou mera irregularidade, como se verifica, ainda, no AgRg-REsp 1139361/MS, levado a julgamento na 1ª Turma do STJ, em 01.11.2013, pelo Ministro Relator Napoleão Nunes Maia:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – CONTRATAÇÃO DE PESSOAL SEM A REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO – ART. 37, IN-CISO II E § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – AUSÊNCIA DE MOTIVOS SUFICIENTES A LEGITIMAR A EXCEÇÃO – DOLO GENÉRICO CONFIGU-RADO.

1. A Constituição Federal, no art. 37, inciso II, impõe às autoridades públicas o dever de realizar concurso público para a contratação de pessoal, preven-do, no § 2º desse mesmo dispositivo, que sua não observância implica na punição da autoridade responsável. 2. Em razão da dinâmica dos fatos, deve--se ponderar que nem todas as hipóteses de contratação de pessoal, sem con-curso público, podem estar autorizadas pela lei. Por exemplo, há casos em que existe a carência de pessoal qualificado, num determinado momento e/ou para uma determinada tarefa. Outros, em que há ocorrência de um evento imprevisto, ou cujos efeitos, por negligência, não foram devidamente dimen-sionados, nos quais se têm necessidade urgente de atuação do Estado. Nesses casos, via de regra, não se pode falar em atuação dolosa da autoridade pú-blica, quando procede à contratação sem realizar concurso público. 3. Não

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se constatando qualquer motivo plausível para a não realização do concurso público, não há espaço para se falar em conduta culposa ou meramente ir-regular na contratação de pessoal, porquanto a autoridade pública atua com a consciência de que o resultado de sua conduta é contrário à lei e à Consti-tuição Federal. Nessa linha, vide: REsp 1005801/PR, Rel. Min. Castro Meira, 1ª Seção, DJe 12.05.2011; AgRg-AREsp 70.899/SP, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, DJe 24.10.2012; REsp 1214605/SP, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, DJe 13.06.2013; REsp 1307085/SP, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma, DJe 10.05.2013; AgRg-AREsp 122.682/MG, Rel. Min. Hum-berto Martins, 2ª Turma, DJe 14.08.2012; AgRg-AREsp 149.558/SP, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, DJe 25.05.2012; AgRg-REsp 1107310/MT, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, DJe 14.03.2012. 4. Agravo regimen-tal provido.

Comprovado o dolo, é ainda necessário combinar este fator com a ocorrência de dano ao Erário, ou seja, o outro elemento que, em combina-ção com o elemento dolo, é essencial para caracterizar o ato administrativo reputado ímprobo. Nesse sentido, vem decidindo reiteradamente o STJ:

ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE DE PREFEITO – CONTRATA-ÇÃO DE PESSOAL SEM CONCURSO PÚBLICO – AUSÊNCIA DE PREJUÍZO.

Não havendo enriquecimento ilícito e nem prejuízo ao Erário municipal, mas inabilidade do administrador, não cabem as punições previstas na Lei nº 8.429/1992. A lei alcança o administrador desonesto, não o inábil. Recurso improvido. (REsp 213994/MG, Min. Garcia Vieira, 1ª Turma, DJ 27.09.1999)

Veja-se que sem dano ao Erário, não havendo prejuízo aos cofres públicos, não há que se falar em ato de improbidade administrativa, é essa, também, a lição de Roberto Gomes Mattos:

A exegese dos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992 exige a prova da prática de ato ilícito doloso, lesivo ao Erário Público. A falta de prejuízo ao Erário além de retirar a virilidade da ação de improbidade, permite que o ato ad-ministrativo que se afigure como inábil ou defeituoso, seja convalidao, em respeito à proeminência do interesse público. [...] A ausência de prejuízo ao patrimônio públicoe aos valores éticos e morais, é suficiente para retirar o ato administrativo ilegal da abrangência da LIA. (Mattos, 2006, p. 12)

Por fim, de maneira a se esclarecer o conceito de ato administrativo ímprobo, sobre o qual se constrói este estudo, verifica-se que ímprobo é o ato praticado pelo servidor ou seu assemelhado, conforme o art. 2º da Lei nº 8.429/1992, que resulta da inteção, manifestada de forma clara e cons-ciente do agente, de causar prejuízo ao Erário Público, com a finalidade de locupletar-se ou simplesmente prejudicar o Tesouro.

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Clarificada a posição assumida neste trebalho sobre o conceito de improbidade, passa-se, agora, à análise do texto legal, a fim de verificar as hipóteses de improbidade administrativa ale descritas. No art. 9º da refe-rida lei são apresentados em rol não taxativo (aliás, em todos os casos há a possibilidade de reconhecer outras modalidades além das elencadas na lei) os atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito do agente praticante, o caput aponta que verifica-se a improbidade administrativa o fato de o servidor receber qualquer vantagem patrimonial indevida, em razão de suas atribuições advindas de cargo, mandato, função ou emprego público, interessa-nos, neste estudo, especialmente, o disposto nos seguintes incisos:

Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando enriqueci-mento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º desta lei, e notadamente:

[...]

II – perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aqui-sição, permuta ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas no art. 1º por preço superior ao valor de mercado;

III – perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aliena-ção, permuta ou locação de bem público ou o fornecimento de serviço por ente estatal por preço inferior ao valor de mercado;

[...]

VI – receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer declaração falsa sobre medição ou avaliação em obras públicas ou qualquer outro serviço, ou sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens fornecidos a qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;

[...]

X – receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indire-tamente, para omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado;

O dispositivo seguinte faz menção aos atos indicativos de conduta ímproba que causam prejuízo ao Erário Público, informando que são todas as ações, sejam elas omissivas, dolosas ou culposas, que desaguam em di-minuição do patrimônio público, desvio, má administração ou dilapidação de bens ou outros pertences do Poder Público. Novamente, em razão do

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escopo deste estudo, nos concentraremos nas ações decritas nos seguintes incisos:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao Erá-rio qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patri-monial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

[...]

III – doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valo-res do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie;

IV – permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta lei, ou ain-da a prestação de serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado;

V – permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado;

[...]

VIII – frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;

IX – ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;

[...]

XI – liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;

XII – permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicita-mente;

[...]

XIV – celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a pres-tação de serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na lei; (Incluído pela Lei nº 11.107, de 2005)

Por fim, ainda na seara da Lei de Improbidade Administrativa, o art. 11 faz menção (em um rol exemplificativo) às ações que atentam contra os princípios da Administração Pública e que violam os deveres de honesti-dade, imparcialidade, legalidade e de lealdade para com a instituição à qual pertence ou se relaciona o agente.

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Resta, ainda, esclarecer a controvérsia sobre quem é o sujeito ativo do ato ímprobo, qual o alcance do art. 2º da Lei nº 8.429/1992 que, de maneira ampla, determina:

Art. 2º Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, no-meação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.

Em primeira verificação, está claro que os servidores públicos, ocu-pantes de cargo, emprego ou função pública, seja qual for a forma de pro-vimento, são submetidos ao regime jurídico estabelecido pela LIA, não res-tando dúvidas quanto a isso.

Controversa é a questão relacionada aos ocupantes de cargos eleti-vos, os chamados agentes políticos, quanto a estes existe uma divergência doutrinária entre os defensores da aplicação da LIA aos mesmos e àqueles outros que defendem a inaplicabilidade desta lei em razão da submissão dos agentes políticos às Leis nºs 1.079/1950 e 7.106/1983, bem como o Decreto-Lei nº 201/1967, que tipificam e penalizam os crimes dos ocupan-tes de cargos eletivos, definidos como crimes de responsabilidade.

Não é objeto deste estudo tratar da sobredita polêmica, contudo, tem--se por posição mais acertada aquela que exclui do alcance da Lei de Im-probidade Administrativa os agentes políticos, com fundamento nas razões apresentadas por Alice Bianchini e Luiz Flávio Gomes, veja-se:

As Leis nºs 1.079/1970 e 7.0106/1983 e o Decreto-Lei nº 201/1967 dão um tratamento especial à matéria, na medida em que trazem um processo muito mais ágil e célere, com vistas à perda do cargo público que o agente exer-cia. Os parâmetros da responsabilidade política são extremamente flexíveis, dinâmicos, dúcteis, erpassando aspectos que transcendem a esfera jurídica, para adentrar o campo emocional, subjetivo, político propriamente dito. Os tipos sancionadores se concretizam em cláusulas gerais e conceitos ou ter-mos juridicamente indeterminados com uma enorme frequência e intensida-de [...]. (Bianchini; Gomes, 2008)

Entretanto, em que pese a posição defendida, a jurisprudência pátria é farta em decisões que autorizam a aplicação da LIA aos agentes políticos, a exemplo do EDcl-REsp 456649/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, 1ª Turma, publicado no DJ de 20.11.2006:

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – ART. 535 DO CPC – ACLARAMENTO DO DECISUM (ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚ-

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BLICA – EX-PREFEITO – CONDUTA OMISSIVA – CARACTERIZAÇÃO DE INFRAÇÃO POLÍTICO ADMINISTRATIVA – DECRETO-LEI Nº 201/1967 – ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LEI Nº 8.429/1992 – COEXIS-TÊNCIA – IMPOSSIBILIDADE – MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRI-DO – VOTO DIVERGENTE DO RELATOR).

1. Os embargos de declaração são cabíveis para o fim de esclarecer o alcan-ce da decisão, quando seus fundamentos, ainda que utilizados obter dictum e sob a ótica subjetiva do relator não retrata o cerne da decisão proferida. 2. In casu, a Turma reconheceu que a conduta do prefeito em recusar-se a responder determinado ofício não representava delito de improbidade, por isso que, extravagante a discussão acerca do concurso aparente de normas entre a ação típica do Decreto-Lei nº 201/1967 e a ação de improbidade, tema, aliás, ainda pendente no eg. Supremo Tribunal Federal. 3. Destarte, o eg. Superior Tribunal de Justiça através da sua jurisprudência predominante, admite a ação de improbidade nos ilícitos perpetrados por Prefeitos, mercê de agentes políticos. 4. Embargos de Declaração acolhidos.

Às considerações acerca da Lei de Improbidade Administrativa jun-tam-se àquelas que se destinam a verificar a responsabilidade do servidor público em face da Lei nº 8.666/1993 – também chamada de Lei de Lici-tações –, a qual incorporou entre seus mecanismos de responsabilização ferramentas inspiradas na sua antecessora, a anteriormente referida Lei nº 8.429/1992.

A Lei nº 8.666/1993 criou o regime jurídico para os contratos e licita-ções públicas e veio unificar os procedimentos para tal em todas as esferas administrativas, seja a municipal, a estadual ou a federal. A norma regula-mentadora alcança também as autarquias, fundações públicas, empresas e sociedades de economia mista, bem como os entes representativos das funções executiva, legislativa e judiciária do Estado.

A referida lei tem como princípios regentes a isonomia, legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade, probidade adminis-trativa, vinculação ao instrumento convocatório, julgamento objetivo, en-tre outros correlatos. Nota-se que houve, por parte do legislador ordinário, uma grande preocuação em reafirmar a lisura do processo de contratação e licitação públicas, especialmente no que diz respeito às condutas de seus agentes durante o processo.

Podem-se destacar entre os princípios elencados três que referem--se diretamente ao comportamento subjetivo do servidor público e, sobre os quais, serão tecidas outras observações, refere-se aqui aos princípios da moralidade, da impessoalidade e da probidade administrativa.

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A moralidade administrativa não se confunde, a priori, com a morali-dade social, aliás, a questão da moral faz referência à discussão de valores, de escolhas que se fazem em relação ao projeto de vida boa de cada um. Em uma sociedade plural como a contemporânea, não se pode afirmar que este ou aquele comportamento é moral ou amoral, a resposta sempre dependerá dos valores em discussão.

Contudo, exatamente pelo fato de convivermos com muitas diferen-ças, há um padrão de comportamento fundado na ética que orienta po-sitivamente as regras de convivência social na sociedade contemporânea, fundadas, estas, sob o direito legitimado pela participação dos seus destina-tários na sua construção.

Entretanto, a moralidade administrativa se reveste de um caráter es-pecialmente jurídico, pois, advém de um conjunto de normas, regras de disciplina e princípios de direito que foram positivados a partir do art. 37, § 4º, da CF/1988. A este dispositivo constitucional se deve a força normativa que inspirou a legislação ordinária de combate à improbidade no serviço público.

A moralidade administrativa tem pertinência com a ética, com a ho-nestidade, com a boa administração, com a lealdade devida às instituiçõs públicas. Nas palavras de Cármen Lúcia Antunes Rocha:

Por isso, nesse final de século, a moralidade administrativa não se restringe à veracidade da obtenção de utilidade para a garantia de um determina-do interesse público tido como meta de ação do agente. Mais que isso, a moralidade administrativa que se pretende ver acatada adentra o reino da finalidade de garantia da realização dos valores expressos na ideia do bem e da honestidade, que se pretendem ver realizados segundo o direito legítimo. (Rocha, 1994, p. 193)

Já o princípio da impessoalidade é traço marcante da Administração Pública pois compõe a dinâmica da igualdade formal (igualdade perante a lei) e material, uma vez que, a partir deste princípio, obrigam-se todos os agentes públicos a prolatar seus atos e suas ações administrativas, des-conhecendo o destinatário do ato enquanto indivíduo, mas apenas reco-nhecendo-o como cidadão, detentor de direitos e deveres. Nas palavras de Gilmar ferreira Mendes:

O princípio da impessoalidade consubstancia a ideia de que a Administração Pública, enquanto estrutura composta de órgãos e de pessoas incumbidos de gerir a coisa pública, tem de desempenhar esse múnus sem levar em conta interesses pessoais, próprios ou de terceiros, a não ser quando o atendimen-to de pretensões parciais constitua concretização do interesse geral. Afinal

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de contas, a otimização da ordem jurídica objetiva não raro se concretiza, precisamente, no respeito e na satisfação de pretensões subjetivas albergadas pelo ordenamento jurídico. O princípio da impessoalidade, por outro lado, convoca o da igualdade, na medida em que este último postulado impõe aos agentes públicos, em geral, e não apenas ao administrador, medir a todos com o mesmo metro. (Mendes, 2008, p. 833)

Por fim, tem-se que o princípio da probidade administrativa seja o mais importante na atuação do servidor público, uma vez que são bastante bem definidas na legislação ordinária aquelas ações que o ferem de morte. Como já foi dito nesse trabalho, igualmente ao princípio da moralidade, que requer uma dose de interpretação devido a vaguesa do termo, a improbida-de também é alvo de divergência interretativa.

O princípio, cuja força é constitucional, declara que não serão tole-radas ações que firam, não só o patrimônio público, mas também, e princi-palmente, o ambiente público, aqui entendido como o conjunto de relações de confiança e de interdependência que se formam entre a Administração Pública e os cidadão, estas relações devem ser protegidas e permanecer imaculadas sob pena de quebra de legitimidade dos atos administrativos.

Neste mesmo sentido, trazemos a lição de Rosaura Moreira Brito Bastos:

Engana-se quem pensa que os objetivos maiores da Lei nº 8.429/1992, ou Lei do Colarinho Branco, sejam a defesa do patrimônio público ou o combate ao enriquecimento ilícito às custas do Erário. Em decorrência disso, muitos agentes ímprobos tentam embasar sua defesa em argumentos de que seus atos não deveriam ser punidos por não terem ocasionado danos ao patrimô-nio coletivo. Alguns juristas até defendem sanções mais brandas aos agentes ímprobos, usando os mesmos argumentos.

Ocorre que o fim maior da referida lei, ou seu verdadeiro objeto, é a tutela da probidade administrativa e não somente do patrimônio público. Essa é a principal diferença desse diploma legal que ora se comenta e os demais diplomas de nosso ordenamento que regulam ou regularam questões ligadas ao enriquecimento ilícito e à dilapidação do patrimônio público. Nesse mis-ter é que se destaca a impotência dos princípios da Administração Pública, pois através deles é que se torna possível medir ou aquilatar a dimensão do dano efetivamente causado à administração Pública, não só o dano econô-mico financeiro, mas o dano, inclusive à sua imagem, à sua credibilidade diante do cidadão. (Bastos, 2010, p. 49)

Apresentados, portanto, os fundamentos constitucionais e principio-lógicos que regem a responsabilização do servidor público, analisar-se-á,

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a partir de agora, a responsabilidade objetivamente colocada no âmbito da Lei de Licitações, com especial ênfase no capítulo destinado a tipificar as condutas criminosas referentes à licitação pública, que se pode verificar entre os dispositivos dos arts. 82 e 89 ao 99.

Antes, porém, vale lembrar a lição de José Afonso da Silva, que mui-to bem relaciona o princípio da licitação com o já referido princípio da moralidade administrativa. O constitucionalista afirma ser a licitação “um procedimento administrativo destinado a provocar propostas e a escolher proponentes de contratos de execução de obras, serviços, compras ou alie-nações do Poder Público” (Silva, 2004, p. 672).

Este princípio da licitação instrumentaliza o princípio da moralisdade administrativa, uma vez que sujeita aquelas às regras e aos procedimen-tos que visam garantir a lisura do procedimento, a competição equilibrada entre os participantes e a transparência para com o tratameto dado à coisa pública. Bem como, e principalmente, cria maneiras de controlar os atos, identificar anormalidades e punir eventuais desvios.

Tudo devidamente fundado no Texto Constitucional, que, em seu art. 37, inciso XXI, determina:

Art. 37. A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiên-cia e, também, ao seguinte:

[...]

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pú-blica que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigên-cias de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cum-primento das obrigações.

É, portanto, sob o valor do controle e da probidade que se erigiu a Lei nº 8.666/1993, que, além de um marco jurídico, tratou-se verdadeiramente de um novo paradigma nas relações entre os fornecedores particulares e os servidores públicos nas suas relações de aquisição de materiais e serviços, anteriomente eivadas de suspeitas de negociatas, comissões, favorecimen-tos, prevaricação e privilégios.

A Lei de Licitações trata da questão da sanção aos seus infratores com um rigor até então apenas visto na Lei de Improbidade Administrativa.

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Inicialmente faz uma referência aos preceitos daquela norma, ou seja, avisa que as aventuais faltas cometidas serão apuradas a partir dos princípios que a fundamentam e lhe dão espírito, não apenas de fatos concretos, ou seja, no mesmo sentido de sua predecessora, pune a mácula, o desprestígio, a ameaça à legitimidade do certame, enfim, a má-fé. É o que se pode conhe-cer na leitura do art. 82:

Art. 82. Os agentes administrativos que praticarem atos em desacordo com os preceitos desta lei ou visando a frustrar os objetivos da licitação sujeitam--se às sanções previstas nesta lei e nos regulamentos próprios, sem prejuízo das responsabilidades civil e criminal que seu ato ensejar.

Também, para dar maior destaque à sua qualidade de norma intole-rante para com o ilícito, avisa que as eventuais sanções a que estão subme-tidas seus transgressores não elidem outras que advêm de outros regulamen-tos, inclusive na esfera criminal.

Considera a lei como crimes passíveis de detenção os seguintes atos: dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei (art. 89); frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expe-diente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do ob-jeto da licitação (art. 90); patrocinar, direta ou indiretamente, interesse pri-vado perante a Administração (art. 91); admitir, possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação contratual, em favor do adjudicatário, durante a execução dos contratos celebrados com o Poder Público, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação ou nos respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem cronológica de sua exigibilidade, observado o disposto no art. 121 desta lei (art. 92); impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório (art. 93); devassar o sigilo de pro-posta apresentada em procedimento licitatório, ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo (art. 94); afastar ou procura afastar licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem de qual-quer tipo (art. 95); fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação ins-taurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente (art. 96); admitir à licitação ou celebrar contrato com empresa ou profissional declarado inidôneo (art. 97); obstar, impedir ou dificultar, injustamente, a inscrição de qualquer interessado nos registros cadastrais ou promover indevidamente a alteração, suspensão ou cancelamento de registro do inscrito (art. 98).

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Como se pode verificar, a Lei nº 8.666/1993 cerca de cuidados e de controles todas as fases do procedimento de licitações e imputa aos agentes públicos uma enorme responsabilidade, pois prevê a punição tanto para os casos de procedimentos mal conduzidos, como para os casos de absoluta má-fé e dolo reputando estas condutas como criminosas.

No entanto, apesar de a legislação aqui já comentada tratar com o rigor necessário os casos de improbidade administrativa e de crimes contra a Administração Pública, especialmente no caso contra os procedimentos de licitações, há ainda um grande caminho a percorrer no Brasil para se po-der considerar os ilícitos administrativos como parte de uma excessão, pois existe um enorme déficit de controle, especialmente na esfera municipal, que permite, ainda, a malversação de verbas públicas.

Instituir órgãos de controle interno, capacitar e dar autonomia aos procuradores municipais, proteger servidores públicos contra ameaças e outros contrangimentos advindos de dirigentes inescrupulosos, tornar mais céleres e dar maior divulgação às ações judiciais contra os corruptos, estas ações, de maneira cominada, podem marcar o ponto de inflexão na curva da corrupção no Brasil.

Entretanto, considera-se que o melhor controle que se pode instituir para enfrentar a malversação da coisa pública é a participação popular na definição e no acompanhamento das políticas públicas.

A institucionalização de mecanismos de consulta democrática, sobre a implementação de ações governamentais, representa a outra dimenção dos sistemas de controle, uma dimensão positiva, pois, quando se determina ao Estado o que fazer, não sobram espaços para a inventividade pseudo--discricionária dos políticos.

Além disso, a participação popular implica, necessariamente, a ado-ção de um modelo de prestação de contas mais transparente e simples. Relatórios com linguagem acessível, que tragam os orçamentos compara-dos com os preços do mercado, eliminando, assim, os subterfúgios técnico--linguísticos, que permitem as interpretações mais variadas, dando azo para desvios ou outras ações condenáveis.

Este é o desafio que está lançado aos operadores do direito e aos servidores públicos: encontrar caminhos e instrumentos para enfrentar a im-probidade administrativa em todas as suas formas de manifestação.

REFERÊNCIAS

BIANCHINI Alice; GOMES, Luiz Flávio. Agentes políticos não estão sujeitos à lei de improbidade administrativa. In: BOLZAN, Frabrício; MARINELA,

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BASTOS, Rosaura Moreira Brito. Improbidade administrativa – Conteúdo jurídico e dimensão constitucional. Belo Horizonte: Forum, 2010.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 19. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

COPOLA, Gina. A improbidade administrativa no direito brasileiro. Belo Horizonte: Forum, 2011.

MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa: comentários à Lei nº 8.429/1992. 3. ed. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2006.

MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 12. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

ROCHA, Carmen Lucia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994.

SILVA, De PLácido e. Vocabulário jurídico. 18. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.

Assunto Especial – Jurisprudência Comentada

Sanções da Lei de Improbidade Administrativa

A Perda dos Direitos Políticos, a Prática do Ato de Improbidade Administrativa e a Constituição Federal

RôMULO DE ANDRADE MOREIRA

Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia, Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador – UNIFACS, na Graduação e na Pós‑Graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público), Pós‑Graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal), Especialista em Processo pela Universidade Salvador – UNIFACS (Curso então coordenado pelo Jurista J. J. Calmon de Passos), Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais, do Instituto Brasileiro de Direito Processual e Membro Fundador do Instituto Baiano de Direito Processual Penal (atualmente exercendo a função de Secretário), Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. Integrante, por quatro vezes, de bancas examinadoras de concurso público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia. Pro‑fessor convidado dos cursos de pós‑graduação dos Cursos JusPodivm (BA), FUFBa e Faculdade Baiana. Autor das obras Curso Temático de Direito Processual Penal e Comentários à Lei Maria da Penha (em coautoria com Issac Guimarães) (2010); A Prisão Processual, a Fiança, a Liberdade Provisória e as demais Me‑didas Cautelares (2011), Juizados Especiais Criminais – O Procedimento Suma‑ríssimo (2013) e A Nova Lei de Organização Criminosa, além de coordenador do livro Leituras Complementares de Direito Processual Penal (2008). Participante em várias obras coletivas. Palestrante em diversos eventos realizados no Brasil.

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O Ministro Ricardo Lewandowski, em decisão monocrática, negou pedido de liminar apresentado na Reclamação nº 18183 contra o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que condenou a ré por ato de im-probidade administrativa e aplicou a sanção de perda dos direitos políticos.

Ao analisar o pedido de liminar, o Ministro Ricardo Lewandowski destacou que:

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O Constituinte originário dispôs expressamente quais seriam as sanções para os agentes que sejam condenados por atos de improbidade administrativa: a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibili-dade dos bens e o ressarcimento ao erário. O art. 12 da Lei nº 8.429/1992, portanto, apenas dá cumprimento comando do legislador originário.

Segundo o acórdão do Tribunal de Justiça e do Distrito Federal e Ter-ritórios, o recebimento de vantagem indevida pela acusada, então parla-mentar, para angariar apoio político ao então candidato Governador, confi-gura ato de improbidade administrativa passível de responsabilização com base nas disposições da Lei nº 8.429/1992.

Desta forma, os Desembargadores do Tribunal de Justiça e do Distrito Federal e Territórios, ao analisarem as apelações contra a sentença, manti-veram as sanções de ressarcimento aos cofres públicos pelos danos que cau-saram; suspensão dos direitos políticos por oito anos; pagamento de multa equivalente a duas vezes o dano causado ao Erário; proibição de contratar com o Poder Público e pagamento de danos morais aos réus.

Consideramos acertadíssima tal decisão. Com efeito, em 1992, foi promulgada a Lei nº 8.429, que passou a dispor sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na Administração Pública direta, indi-reta ou fundacional.

Os arts. 9º, 10 e 11 tipificam os atos de improbidade administrativa que, aliás, não são ilícitos penais (pode até haver – e quase sempre há – uma correspondência entre a infração político-administrativa e a infração penal, mas ambas não se confundem).

A propósito, Maria Sylvia Zanella Di Pietro esclarece que “a nature-za das medidas previstas no dispositivo constitucional está a indicar que a improbidade administrativa, embora possa ter consequência na esfera cri-minal, com a concomitante instauração de processo criminal (se for o caso) e na esfera administrativa (com a perda da função pública e a instauração de processo administrativo concomitante) caracteriza um ilícito de natu-reza civil e política, porque pode implicar a suspensão dos direitos políti-cos, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento dos danos causados ao Erário”1. Aliás, o art. 37, § 4º, da Constituição Federal é expresso no sentido de que “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens

1 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 678.

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e o ressarcimento ao Erário, na forma e gradação previstas em lei, sem pre-juízo da ação penal cabível” (grifo nosso). Observa-se que o próprio Texto Constitucional nitidamente faz a distinção.

Observa-se que o conceito de infração penal (crime e contravenção) é dado pela Lei de Introdução ao Código Penal que define crime como sendo “a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de mul-ta; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente” (art. 1º do Decreto-Lei nº 3.914/1941).

Estas definições, por se encontrarem na Lei de Introdução ao Código Penal, evidentemente regem e são válidas para todo o sistema jurídico-pe-nal brasileiro, ou seja, do ponto de vista do nosso Direito Positivo quando se quer saber o que seja crime ou contravenção, deve-se ler o disposto no art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal. O mestre Hungria já se per-guntava e ele próprio respondia:

Como se pode, então, identificar o crime ou a contravenção, quando se trate de ilícito penal encontradiço em legislação esparsa, isto é, não contemplado no Código Penal (reservado aos crimes) ou na Lei das Contravenções Pe-nais? O critério prático adotado pelo legislador brasileiro é o da distinctio delictorum ex poena (segundo o sistema dos direitos francês e italiano): a re-clusão e a detenção são as penas privativas de liberdade correspondentes ao crime, e a prisão simples a correspondente à contravenção, enquanto a pena de multa não é jamais cominada isoladamente ao crime.2

Por sua vez, Tourinho Filho afirma: “Não cremos, data venia, que o art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal seja uma lex specialis. Trata-se, no nosso entendimento, de regra elucidativa sobre o critério adotado pelo sistema jurídico brasileiro e que tem sido preferido pelas mais avançadas legislações; [...] Veja-se, no particular, Marcelo Jardim Linhares, Contraven-ções penais, Saraiva, v. 3, 1980. p. 781: ‘Assim, quando a infração eleitoral é apenada com multa, estamos em face de uma contravenção’”3. Manoel Carlos da Costa Leite afirma que “no Direito brasileiro, as penas comina-das separam as duas espécies de infração. Pena de reclusão ou detenção: crime. Pena de prisão simples ou de multa ou ambas cumulativamente: contravenção”4.

2 Comentários ao código penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. I, t. II. p. 39.3 Processo penal. 20. ed. São Paulo: Saraiva, v. 4. p. 212-213.4 Manual das contravenções penais. São Paulo: Saraiva, 1962. p. 3.

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Eis outro ensinamento doutrinário: “Como é sabido, o Brasil adotou o sistema dicotômico de distinção das infrações penais, ou seja, dividem-se elas em crimes e contravenções penais. No Direito pátrio o método diferen-ciador das duas categorias de infrações é o normativo e não o ontológico, valendo dizer, não se questiona a essência da infração ou a quantidade da sanção cominada, mas sim a espécie de punição”5. Luiz Flávio Gomes afirma: “Por força do art. 1º da Lei de Introdução ao Código Penal, infração punida tão somente com multa é contravenção penal (não delito)”6.

Vê-se, às escâncaras, que aqueles tipos elencados na Lei de Impro-bidade Administrativa, decididamente, não são infrações penais, mas infra-ções político-administrativas.

Continuando...

O art. 12 da referida lei dispõe que, além das sanções penais, ci-vis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito a outras cominações de natureza político--administrativas (levando-se em consideração, como exige a lei, a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente), a saber:

1) Perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pa-gamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;

2) Ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circuns-tância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

5 FERRARI, Eduardo Reale; SANTOS, Christiano Jorge. As infrações penais previstas na Lei Pelé. Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim, n. 109, dez. 2001.

6 Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim, n. 110, jan. 2002.

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3) Ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pú-blica, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, paga-mento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Pú-blico ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa ju-rídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

Por sua vez, o art. 15 da Constituição veda a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; incapacidade civil ab-soluta; condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos; recusa de cumprir obrigação a todos imposta ou prestação alternati-va, nos termos do art. 5º, VIII, e improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.

Já o art. 37 de nossa Carta7 estabelece que a Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impes-soalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: “Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direi-tos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao Erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.

De mais a mais, como se sabe, foi promulgada a Lei nº 12.403/2011, publicada no Diário Oficial da União do dia 5 de maio de 2011, que alterou substancialmente o Título IX do Livro I do Código de Processo Penal que passou a ter a seguinte epígrafe: “Da Prisão, Das Medidas Cautelares e Da Liberdade Provisória”.

Em uma das medidas cautelares previstas no novo art. 319 está a suspensão do exercício de função pública8, quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais. Evidentemente que esta medida acautelatória deve ser aplicada em casos de crimes praticados con-tra a administração pública. Observar que medida semelhante já tinha sido prevista no art. 56, § 1º, da Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas).

7 Há quem ache inapropriado o uso da palavra Carta para designar a Constituição, pois daria a ideia de uma Constituição imposta e extraparlamentar. Assim, dentro desse enfoque, seriam Constituições os Textos Brasi-leiros de 1891,1934, 1946 e 1988 e Cartas consignariam os diplomas de 1824,1937, 1967 e 1967 com a reforma empreendida pela Emenda Constitucional nº 1/69). Quanta filigrana...

8 Por todos, veja-se o conceito de função pública na obra de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (Direito administra-tivo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 439 e 440).

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E os vencimentos? Cremos não ser possível ser o réu prejudicado, devendo ser mantido o respectivo pagamento.

A propósito, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recur-so Extraordinário nº 482.006-4, tendo como Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, decidiu que:

A redução de vencimentos de servidores públicos processados criminalmente colide com os princípios constitucionais da presunção de inocência (art. 5º, LVII) e da irredutibilidade de vencimentos (art. 37, XV), [...] validando-se ver-dadeira antecipação da pena, sem que esta tenha sido precedida do devido processo legal e antes mesmo de qualquer condenação.

Aliás, para concluir, e por analogia, podemos utilizar do disposto no art. 17-D da Lei nº 9.613/1998 (“Lavagem de Dinheiro”), segundo o qual, “em caso de indiciamento de servidor público, este será afastado, sem pre-juízo de remuneração e demais direitos previstos em lei, até que o juiz com-petente autorize, em decisão fundamentada, o seu retorno”.

Assunto Especial – Acórdão na Íntegra

Sanções da Lei de Improbidade Administrativa

6724

Superior Tribunal de JustiçaRecurso Especial nº 1.228.749 – PR (2010/0217926‑0)Relator: Ministro Og FernandesRecorrente: Ministério Público do Estado do ParanáRecorrido: Plínio Pereira de Araújo JúniorAdvogado: Ivair Granado Barreira

EMENTAADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL – RECURSO ESPECIAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IM-PROBIDADE ADMINISTRATIVA – OMISSÃO – AUSÊNCIA – PERDA DOS DIREITOS POLÍTICOS – CONCURSO DE AGENTES – EXTENSÃO AO VICE-PREFEITO DA SANÇÃO POLÍTICA APLICADA AO PREFEITO – AUSÊNCIA DE PROVEITO PATRIMONIAL E DANO AO ERÁRIO – REVISÃO DAS PENAS – SÚMULA Nº 7/STJ

1. O tratamento da matéria em relação ao recorrido decorre de não se enquadrar na situação particular em que se encontra o Prefeito – so-bre o que tratou o acórdão recorrido, o que não caracteriza omissão a ser sanada na via dos aclaratórios.

2. A jurisprudência desta Corte tem mitigado a imposição da sanção de direitos políticos nas condenações por ato de improbidade, por ser a mais drástica das penalidades estabelecidas no art. 12 da Lei nº 8.429/1992, devendo ser considerada a gravidade do caso, e não a das funções do acusado.

3. Ressaltam as instâncias ordinárias que o principal beneficiário do acordo foi o Prefeito, que teria utilizado o valor do dinheiro para sal-dar dívida com terceiro – a quem foram endossados os cheques em virtude de acordo prévio com o credor originário –, limitando-se o recorrido à intermediação do negócio.

4. Ausente dano à Fazenda Municipal, bem como demonstrada a au-sência de proveito patrimonial obtido pelo agente, verifica-se a ra-zoabilidade no uso dos critérios para graduar a dosimetria da pena

RSDA Nº 106 – Outubro/2014 – ASSUNTO ESPECIAL – ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA ��������������������������������������������������������������������������������������39

na espécie, inviabilizando a revisão da pena ante o óbice da Súmula nº 7/STJ.

5. Recurso especial conhecido em parte, e, nessa extensão, negar-lhe provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa par-te, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques (Presidente), Assusete Magalhães, Humberto Martins e Herman Benjamin votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 03 de abril de 2014 (data do Julgamento).

Ministro Mauro Campbell Marques Presidente

Ministro Og Fernandes Relator

RELATÓRIO

O Sr. Ministro Og Fernandes: Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público do Estado do Paraná, com base na alínea a do per-missivo constitucional, contra acórdão proferido pelo respectivo Tribunal de Justiça nos seguintes termos:

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO RETIDO PREJUDICADO – ADIN JULGADA PELO STF – PERDA DE OBJETO – AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL – CABÍVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE RECEBE A INICIAL – RECURSO NÃO CONHECIDO

Apelação 1: Sanções. Cumulatividade. Princípio da razoabilidade e propor-cionalidade. Suspensão dos direitos políticos. Prefeito que satisfez interesses próprios. Imposição da sanção. Recurso parcialmente provido.

Apelação 2: Alegação de decisão ultra petita rejeitada. Formação de litis-consórcio passivo necessário. Inocorrência. Não demonstração da existência de indícios suficientes da prática de ato de improbidade. Inconstitucionali-dade da Lei nº 8.625/1993 afastada. Atuação do Ministério Público autori-zada pela Constituição Federal. Inconstitucionalidade material e formal da

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lei de improbidade administrativa. Improcedência. Aplicação da Resolução nº 2138, no sentido de que a lei de improbidade administrativa não é aplicá-vel aos agentes políticos detentores de mandato eletivo. Inexistência de efei-to vinculante. Reclamação é medida processual que somente opera efeitos inter partes. Apreciação de provas e livre convencimento do juiz. Recurso não provido.

Recursos adesivos: ausências de preparo.

Deserções. Não conhecimento.

Alega o recorrente a existência de violação do art. 12, parágrafo úni-co, da Lei nº 8.429/1992, e dos arts. 131, 165, 458, 535, II, todos do Código de Processo Civil, respectivamente transcritos:

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas pre-vistas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumu-lativamente, de acordo com a gravidade do fato:

[...]

Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obti-do pelo agente.

Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e cir-cunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes; mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o convencimento.

Art. 165. As sentenças e acórdãos serão proferidos com observância do dis-posto no art. 458; as demais decisões serão fundamentadas, ainda que de modo conciso.

Art. 535. Cabem embargos de declaração quando:

[...]

II – for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou tribunal.

Aponta omissão no acórdão de origem, que teria persistido à opo-sição dos aclaratórios, no tocante à imposição da pena de suspensão dos direitos políticos a um dos acusados.

Argumenta, ainda, sobre a necessidade de aplicar sanção política ao recorrido, por ter sido evidenciada sua participação decisiva, na qualidade de Vice-Prefeito, no ato de improbidade praticado pelo Chefe do Poder Exe-cutivo local, a quem se impôs aludida penalidade.

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Instado a se manifestar, o Ministério Público opinou pelo provimento do recurso (e-STJ, fls. 1.049/1.056).

É o relatório.

VOTO

O Sr. Ministro Og Fernandes (Relator): No caso, verifico não ter ocor-rido ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil, na medida em que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos.

Com efeito, ao justificar a não aplicação da sanção política ao recor-rido, o Tribunal de origem recepciona o fundamento utilizado pelo Juiz de primeiro grau, que afirmou (e-STJ, fl. 867):

Não se apresenta justo e razoável, contudo, qualquer sanção que implique em afastamento do cargo ou a suspensão dos direitos políticos, sanções essas que só se justificam em situações de extrema gravidade, o que não é o caso dos autos, já que não existiu prejuízo ao erário público.

Acrescenta a Corte de origem que a pena de suspensão de direitos po-líticos constitui medida de exceção, só se justificando em hipóteses restritas, o que, no caso, se evidenciaria em relação ao Prefeito, diante da função por ele exercida.

Acentua, ainda, a “excepcional gravidade no ato de improbidade pra-ticado pelo prefeito” (e-STJ, fl. 869).

Pelo que se vê, a matéria relacionada ao pleito de suspensão dos direitos políticos ao recorrido – ponto que se alega ter havido omissão – foi devidamente analisada pelo Tribunal local.

Antes de particularizar a situação do Prefeito, estabelece o acórdão recorrido a regra geral quanto à não aplicação da suspensão dos direitos po-líticos como decorrência imediata de condenação por ato de improbidade.

Desse modo, verifica-se que o tratamento da matéria em relação ao recorrido decorre de não se enquadrar na situação particular em que se encontra o Prefeito, o que, a meu ver, não caracteriza omissão a ser sanada na via dos aclaratórios.

No que se refere ao mérito da condenação, não parece razoável que a sanção política pelo cometimento de ato de improbidade limite-se aos Che-

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fes dos Poderes, como quer parecer crer o acórdão em avilte, ao justificar a aplicação da perda de direitos políticos apenas ao Prefeito.

É verdade que a jurisprudência desta Corte tem mitigado a imposi-ção da sanção de direitos políticos nas condenações por ato de improbida-de, por ser a mais drástica das penalidades estabelecidas no art. 12 da Lei nº 8.429/1992.

De todo modo, o temperamento deve considerar a gravidade do caso, e não a função do acusado. Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – EXAME DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL – IMPOSSIBILIDADE – COMPETÊNCIA DA CORTE EXCELSA – DOSIMETRIA DAS SANÇÕES APLICADAS POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – REEXAME DE FATOS E PROVAS – SÚ-MULA Nº 7/STJ

1. A aplicação das penalidades previstas no art. 12 da Lei nº 8.429/1992 exige que o magistrado considere, no caso concreto, “a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente” (conforme previsão expressa contida no parágrafo único do referido artigo). Assim, é preciso analisar a razoabilidade e a proporcionalidade em relação à gravida-de do ato ímprobo e à cominação das penalidades, as quais podem ocorrer de maneira cumulativa ou não. (Precedente: AgRg-REsp 1242939/SP, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, Julgado em 24.05.2011, DJe 30.05.2011.)

2. A sanção de suspensão dos direitos políticos é a mais drástica das pena-lidades estabelecidas no art. 12 da Lei nº 8.429/1992, devendo ser aplicada tão somente em casos graves. (Precedente: AgRg-AREsp 11.146/RS, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, Julgado em 16.08.2011, DJe 22.08.2011).

3. “A condenação foi devidamente motivada e se encontra dentro dos li-mites do art. 12 da Lei nº 8.429/1992, estando dosada segundo a avaliação razoável do Tribunal de origem. Portanto, não merece reforma em Recurso Especial, ante o óbice da Súmula nº 7/STJ.” (Precedente: REsp 1173845/MG, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, Julgado em 08.06.2010, DJe 27.04.2011) Agravo regimental improvido.

(AgRg-REsp 1223798/PR, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, Julgado em 10.04.2012, DJe 19.04.2012)

ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINIS-TRATIVA – LEI Nº 8.429/1992 – APLICAÇÃO DE PENALIDADES – PRINCÍ-PIO DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE

1. Recurso interposto nos autos da ação de improbidade administrativa mo-vida pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul contra Gilberto

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Lutzky por auferir vantagem patrimonial no exercício de sua atividade como médico anestesista do SUS.

2. O Tribunal a quo manteve a sentença que reconheceu a materialidade da improbidade administrativa e aplicou as sanções de proibição de contratar com o Poder Público, especificamente de prestar serviços pelo SUS, pelo prazo de 3 (três) anos, e multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), cor-rigidos monetariamente pelo IGP-M, a contar da promulgação da sentença, e acrescidos de juros de mora de 12% ao ano a contar do trânsito em julgado desta.

3. Nos termos do art. 12, parágrafo único, da Lei nº 8.429/1992, na fixação das penas o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente, podendo ser aplicadas de modo cumulativo ou não.

4. A sanção de suspensão dos direitos políticos é a mais drástica das pena-lidades estabelecidas no art. 12 da Lei nº 8.429/1992, devendo ser aplicada tão somente em casos graves. Precedentes.

5. Ausência de ofensa aos Princípios da Proporcionalidade e Razoabilidade.

Agravo regimental improvido.

(AgRg-AREsp 11.146/RS, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, Julgado em 16.08.2011, DJe 22.08.2011)

No que se refere aos fatos efetivamente praticados pelos acusados, convém registrar que os atos ímprobos imputados a cada um deles decorre de acordo para pagamento de dívida municipal demandada em ação de cobrança, que seria paga em valor menor na via administrativa.

Ressaltam as instâncias ordinárias que o principal beneficiário do acordo foi o Prefeito, que teria utilizado o valor do dinheiro para saldar dívida com terceiro, a quem foram endossados os cheques em virtude de acordo prévio com o credor originário, limitando-se o Vice-Prefeito (ora recorrido) à intermediação do “negócio” (e-STJ, fl. 580).

Desse modo, ausente dano à Fazenda Municipal, bem como demons-trada a ausência de proveito patrimonial obtido pelo recorrido, verifica-se a razoabilidade no uso dos critérios para graduar a dosimetria da pena, invia-bilizando a revisão das sanções aplicadas ante o óbice da Súmula nº 7/STJ.

No ponto:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – SANÇÕES – DOSIMETRIA – ART. 535 DO CPC – VIOLAÇÃO – AUSÊNCIA

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– INÉPCIA DO RECURSO – SÚMULA Nº 284/STF – REEXAME DE PROVAS – IMPOSSIBILIDADE

1. Não há omissão a ser sanada no acórdão recorrido, já que foi analisa-da individualmente a conduta de cada um dos envolvidos, justificando-se o acréscimo da pena de suspensão dos direitos políticos e a multa imposta na origem com base nas peculiaridades do caso.

2. Apesar de insurgir-se quanto à ausência de dosimetria na aplicação da pena, o agravante não fundamenta adequadamente a alegada contrariedade ao art. 12, parágrafo único, da Lei nº 8.429/1992, atraindo o óbice da Súmula nº 284/STF.

3. Ainda que assim não fosse, o Tribunal de origem fixou a pena com base em critérios como a extensão do dano e o proveito patrimonial obtido pelo agente, de modo que não pode ser revista em sede de recurso especial, con-forme a Súmula nº 7/STJ.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg-AREsp 403.839/MG, 2ª T., Rel. Min. Og Fernandes, Julgado em 18.02.2014, DJe 11.03.2014)

Ante o exposto, conheço em parte do recurso especial, e, nessa exten-são, nego-lhe provimento.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO SEGUNDA TURMA

Número Registro: 2010/0217926-0 REsp 1.228.749/PR

Números Origem: 4615101 461510106

Pauta: 03.04.2014 Julgado: 03.04.2014

Relator: Exmo. Sr. Ministro Og Fernandes

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. José Flaubert Machado Araújo

Secretária: Belª Valéria Alvim Dusi

AUTUAÇÃORecorrente: Ministério Público do Estado do Paraná

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Recorrido: Plínio Pereira de Araújo Júnior e outros

Advogado: Ivair Granado Barreira

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Atos Administrativos – Improbidade Administrativa – Enriquecimento ilícito

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Segunda Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a).”

Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques (Presidente), Assusete Magalhães, Humberto Martins e Herman Benjamin votaram com o Sr. Mi-nistro Relator.

Assunto Especial – Ementário

Sanções da Lei de Improbidade Administrativa

6725 – Improbidade administrativa – bloqueio de bens e contas bancárias – valor necessá-rio para ressarcimento – limitação

“Processo civil. Agravo de instrumento. Ação civil pública por improbidade administrativa. Bloqueio de bens e contas bancárias. Limitação ao valor necessário para ressarcimento em caso de eventual condenação. Decisão do Superior Tribunal de Justiça. 1. A indisponibilidade de bens e de contas bancárias deve ser limitada tão somente aos valores necessários ao ressar-cimento integral do dano, a teor de precedente do eg. Superior Tribunal de Justiça. 2. Agravo parcialmente provido.” (TJAP – AI 0000380-14.2013.8.03.0000 – (51133) – C.Única – Rel. Des. Gilberto Pinheiro – DJ 28.02.2014)

6726 – Improbidade administrativa – contratação irregular – realização do trabalho – au-sência – remuneração – recebimento – ressarcimento ao Erário – necessidade – sus-pensão dos direitos políticos – desproporcionalidade – ausência

“Administrativo. Improbidade administrativa. Contratação irregular de pessoa para desempe-nhar atividade que, ao final, não foi realizada. Recebimento de remuneração sem a realiza-ção de trabalho. Ato de improbidade caracterizado. Inexistência de violação do art. 535 do CPC. Ausência de litisconsórcio passivo unitário. Necessidade de ressarcimento ao Erário. Suspensão dos direitos políticos por 8 anos. Ausência de desproporcionalidade. 1. Recurso especial no qual se discute se caracteriza ato de improbidade do art. 9º da Lei nº 8.429/1992 a contratação pelo Presidente da Câmara de Vereadores de Atibaia de mulher, mãe de seu filho, para realizar trabalho que, ao final, não foi prestado. Discutem-se, ainda, a aplicação do art. 509 do CPC ao recurso especial, beneficiando-se o réu que não recorreu a tempo, e a proporcionalidade das sanções que lhes foram impostas. 2. Não viola o art. 535 do Códi-go de Processo Civil o acórdão que adota fundamentação suficiente para decidir de modo integral a controvérsia. 3. Ante as peculiaridades do caso e o modo de agir de cada um dos recorrentes, quanto aos atos de improbidade, observa-se que o Tribunal de origem decidiu com acerto ao concluir pela inexistência de litisconsórcio unitário, uma vez que, no caso, os atos de improbidade são distintos e, por conseguinte, as sanções aplicadas derivam de condutas distintas. A respeito, dentre outros: EDcl-REsp 1228306/PB, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma, DJe 04.02.2013. 4. Eventual efeito expansivo subjetivo, em tese, só seria viável caso se concluísse pela improcedência da ação civil de improbidade, não se podendo decidir questões outras, que não sejam comuns a ambos, porquanto as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comunicam. 5. A situação fática descrita pelas instâncias ordinárias não dá margem a dúvidas: a recorrente sabia que sua requisição era irregular e, deliberada-mente, recebeu remuneração, sem prestar o serviço para o qual, em tese, teria sido contra-tada: ou seja, recebeu vantagem patrimonial indevida porque não fez o trabalho para o qual foi requisitada a fazer. 6. A alegação de que o serviço mal prestado não caracteriza ato de improbidade não convence, porquanto os fatos descritos estão a comprovar que a recorrente, dolosamente, aproveitou-se do ato ímprobo praticado pelo então Presidente da Câmara de Vereadores para, em conluio, receber, sem trabalhar. O que se denota da situação descrita é que a recorrente tentou mascarar a ausência de trabalho. 7. Nesse contexto, não há falar que sua condenação na devolução do que recebeu no período de sua requisição não observe o

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princípio da proporcionalidade. 8. Outrossim, não se mostra desproporcional a suspensão dos direitos políticos por 8 anos, porquanto a conduta denota não ter a moralidade necessária àqueles que devem ocupar um cargo eletivo. Assim, a suspensão dos direitos políticos, além de cumprir a finalidade pedagógica da condenação, impede que, eventualmente, venha a ocupar algum cargo eletivo junto à sociedade de Atibaia. 9. Recurso especial improvido.” (STJ – REsp 1.367.969 – (2012/0008160-4) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 19.08.2014)

6727 – Improbidade administrativa – indisponibilidade dos bens – decretação – possibili-dade

“Constitucional, administrativo e processual civil. Agravo de instrumento. Ação de improbi-dade administrativa. Indisponibilidade de bens. Periculum in mora presumido. Art. 7º da Lei nº 8.429/1992. Delimitação da plausibilidade do direito. Fumus boni iuris. Manifestação ex-plícita sobre a plausibilidade da responsabilidade imputada ao réu. Prejuízo demonstrado. I – Descabe a conversão do agravo de instrumento em retido, no presente caso, em que se pretende a reforma da decisão que deferiu o pedido de indisponibilidade dos bens do ora agravante nos autos da ação de improbidade administrativa, suscetível de causar à parte le-são grave e de difícil reparação, a teor do art. 527, II, do CPC. II – O agravo de instrumento impugna decisão que decretou a indisponibilidade dos bens do recorrente, de forma solidá-ria com os demais corréus, nos autos da ação de improbidade administrativa, ajuizada pelo Ministério Público Federal em face do ora agravante e outros, objetivando condená-los nas sanções do art. 12, II, da Lei nº 8.429/1992, pela suposta prática de atos lesivos ao erário, com envolvimento da ‘Máfia dos Sanguessugas’, em decorrência da celebração do Convênio FNS nº 720/2001, entre o Ministério da Saúde e o Município de São João de Meriti/RJ, para a aquisição de unidades móveis de saúde (ambulâncias), além de pretender a condenação dos réus ao ressarcimento integral do dano (devolução de R$ 139.000,00, sendo R$ 112.000,00 ao cofres da União, à conta do Fundo Nacional de Saúde, e R$ 27.000,00 ao Município de São João de Meriti/RJ). III – A medida em tela tem o periculum in mora presumido no art. 7º da Lei nº 8.429/1992, o que é perfeitamente possível, sendo certo que a 1ª e a 2ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça passaram a comungar da orientação de que o periculum in mora estaria implícito no citado comando legal. Precedentes. IV – Portanto, a jurisprudência do Su-perior Tribunal de Justiça tem, de fato, alinhado-se no sentido da desnecessidade de prova de periculum in mora concreto, ou seja, de que o réu estaria dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, exigindo-se apenas a demonstração de fumus boni iuris, consistente em fundados indícios da prática de atos de improbidade. V – No tocante à demonstração de fumus boni iuris, observa-se que, ao deferir a indisponibilidade de todos os bens necessários à reparação do alegado dano ao Erário, no montante de R$ 139.000,00 (cento e trinta e nove mil reais), a MMª Juíza a quo se manifestou explicitamente sobre a plausibilidade da responsa-bilidade imputada ao agravante, como membro permanente da comissão de licitação, eis que o recorrente, juntamente com dois corréus, julgaram as propostas de preços regulares e decla-raram a vencedora do certame (Ata de Licitação da Tomada de Preços nº 48/2002), a despeito das irregularidades constatadas no procedimento licitatório. VI – A decisão agravada decretou ‘a indisponibilidade de todos os bens necessários à reparação do alegado dano ao erário fede-ral, a incidir solidariamente no patrimônio dos réus, cuja proporcionalidade será aferida con-soante a conduta apurada no bojo do Inquérito Civil Público nº 1.30.017.00032/2007-16’. Para a efetivação da medida, determinou: ‘1. A consulta ao Sistema Bacen-Jud, para que sejam bloqueados os ativos nas contas correntes/contas de investimento em nome dos réus, os quais existentes deverão restar indisponíveis até o limite de R$ 139.000,00 (cento e trinta e nove mil

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reais), desde que não comprovada nos autos a sua impenhorabilidade; [...]’. VII – Diante desse quadro, e verificando-se que, com relação ao agravante, a r. decisão impugnada não afronta o art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, e que não se cuida de ação temerária ou infunda-da, mas de procedimento necessário à aferição das supostas irregularidades constatadas pela fiscalização CGU/Denasus na formação e condução do Convênio FNS nº 720/2001, entre a Prefeitura de São João de Meriti/RJ e o Ministério da Saúde, com direcionamento de contrata-ção pública para favorecimento de empresa privada, com prejuízo ao erário, no montante de R$ 139.000,00 (cento e trinta e nove mil reais), nada há a alterar no decisum agravado. VIII – Agra-vo de instrumento conhecido e desprovido.” (TRF 2ª R. – AI 2013.02.01.015446-4 – 7ª T.Esp. – Rel. Des. José Antonio Lisbôa Neiva – DJe 02.07.2014)

Transcrição Editorial SÍNTESELei nº 8.429/1992:

“Art. 7º Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.”

6728 – Improbidade administrativa – prefeito e secretário de finanças – falsificação de documento – multa – elevação – perda dos direitos políticos – aplicação

“Ação civil de improbidade administrativa. Art. 11 da Lei nº 8.429/1992. Prefeito e secretário de finanças. Falsificação de documento. Caracterização do ato de improbidade administrati-va. 1. Concluiu o julgado de primeira instância que os réus teriam praticado atos de impro-bidade administrativa, descritos no art. 11 da Lei nº 8.429/1992, porquanto teriam atentado contra os princípios da Administração Pública e violado os deveres de honestidade, impar-cialidade, legalidade, e lealdade às instituições. 2. Defende o Ministério Público Federal a elevação da multa aplicada e a aplicação da sanção de perda dos direitos políticos de três a cinco anos. 3. Nos termos do art. 12 da Lei nº 8.429/1992, independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato. 4. Não há como negar a gravidade dos fatos imputados aos réus que tinham plena ciência que a aprovação da operação de empréstimo por ante-cipação de receitas orçamentárias dependia de aprovação específica de Lei Municipal e na ausência de lei neste sentido, forjaram documentos, atentando, assim, contra os princípios da administração pública e violando os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições. 5. A Lei de Improbidade Administrativa tem o objetivo de resguardar os princípios da Administração Pública sob o prisma do combate à corrupção, à imoralidade e à desonestidade funcional. 6. Os réus eram ocupantes de cargo político, na condição de prefeito e secretário de finanças. Tinham plena consciência da ilicitude de seus atos e quando desistiram da operação, a mesma já havia sido aprovada pelo Banco Central. 7. Reforma da sentença para além da pena de multa aplicar aos réus a pena de suspensão dos direitos polí-ticos por 03 (três) anos e a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios no prazo de 03 (três) anos. 8. Apelação provida.” (TRF 3ª R. – AC 0000019-44.2005.4.03.6003/MS – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Nery Junior – DJe 15.08.2014)

6729 – Improbidade administrativa – procedimento licitatório – irregularidades – multa – proporcionalidade e razoabilidade – observância

“Improbidade administrativa. Agravo regimental. Irregularidades no procedimento licitatório. Sanção de multa. Matéria fático-probatória. Incidência da Súmula nº 7/STJ. Súmula nº 83/STJ.

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Agravo não provido. 1. O Tribunal de origem consignou ‘o que houve foi a inobservância de regras procedimentais (ausência de renovação do convite em razão de não ter sido atingido o número mínimo de três licitantes pela inabilitação de uma das interessadas) e ausência de justificação técnica para a aquisição do bem nos moldes em que foi descrito no edital. Tendo em conta esses fatos, afigura-se proporcional e razoável o pedido dos apelantes para que seja mantida apenas de multa, fixada 10 subsídios mensais de prefeito para o réu Vicente Solda e em 05 remunerações mensais para os demais réus. A cominação isolada da pena de multa revela-se adequada à gravidade da conduta e ao dano dela decorrente’. 2. Modificar a con-clusão a que chegou a Corte de origem, de modo a acolher a tese do recorrente, demanda reexame do acervo fático-probatório dos autos, o que é inviável em recurso especial, sob pena de violação da Súmula nº 7/STJ. 3. O acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendi-mento deste Tribunal Superior, razão pela qual não merece prosperar a irresignação. Incide, in casu, o princípio estabelecido na Súmula nº 83/STJ. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.401.035 – (2013/0290210-1) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 24.06.2014)

6730 – Improbidade administrativa – Programa Bolsa Família – coordenadora – cartões de beneficiários – retenção – multa – aplicação – direitos políticos – suspensão

“Direito constitucional e administrativo. Ação civil pública de improbidade administrativa. Retenção de cartões de beneficiários do Programa Bolsa Família por coordenadora do pro-grama. Saques efetuados e posterior ressarcimento. Ofensa aos princípios da Administração Pública. 1. apelações desafiadas em face da sentença que julgou procedente o pedido inau-gural, condenando a ré pela prática de ato de improbidade previsto no art. 11, caput, da Lei nº 8.429/1992, com as sanções de pagamento de multa civil no montante de R$ 500,00 (quinhentos reais), suspensão dos direitos políticos, pelo prazo de 3 (três) anos, e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia ma-joritária, por idêntico prazo, nos termos do art. 12, III, da citada lei. 2. A inexistência de rei-teração do apelo interposto antes do julgamento dos embargos de declaração, opostos face à sentença prolatada, não prejudica o conhecimento do recurso, ainda mais quando as razões nele expendidas não foram objeto de apreciação por ocasião dos aclaratórios. 3. Atos ímpro-bos que consistiram em diversas irregularidades na gestão dos recursos do Programa Bolsa Família à época em que a demandada exercia o cargo de coordenadora do citado Programa no Município de Hidrolândia/CE, tendo a mesma retido os cartões magnéticos de diversos beneficiários, com os quais promoveu saques para si dos valores depositados em favor destes. 4. A retenção de cartões de beneficiários do Programa Bolsa Família com saque de valores em favor da coordenadora do citado programa, mesmo com o posterior ressarcimento, configura ato de improbidade previsto no art. 11, caput, da Lei nº 8.429/1992, pois ofende os princípios da moralidade e da legalidade administrativas, restando comprovadas a materialidade e a autoria do ato ilícito. Em relação à dosimetria da pena, não houve impugnação. 5. Quanto a não condenação da ré em honorários advocatícios, deve ser mantida a sentença, tendo em vista que, nas ações de improbidade administrativa, aplica-se subsidiariamente o art. 18 da Lei nº 7.347/1985, que dispõe não caber à condenação em honorários advocatícios do autor das ações civis públicas, salvo comprovada atuação de má-fé. Da mesma forma, considerada a simetria de tratamento das partes, não pode o Ministério Público Federal e a União se be-

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neficiarem da verba honorária, quando vencedores na ação de improbidade administrativa. Apelações conhecidas e improvidas.” (TRF 5ª R. – AC 2008.81.03.003024-4 – (571598/CE) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Geraldo Apoliano – DJe 19.08.2014)

6731 – Improbidade administrativa – sanções – cumulação – juízo de necessidade e pro-porcionalidade – sujeição

“Administrativo. Ação civil pública. Improbidade administrativa. Sanções previstas no art. 12, I, II e III, da Lei nº 8.429/1992. Cumulação sujeita a juízo de necessidade e proporcionalidade. Remessa oficial não conhecida. Apelação desprovida. I – A Lei nº 8.429/1992 não contém norma expressa a respeito do reexame necessário da sentença em ações de improbidade administrativa. O mesmo ocorre com a Lei nº 7.437/1985, pelo que a existência de remessa de ofício da sentença regula-se, na espécie, pelo art. 475, I, do CPC. Precedentes do TRF/1ª Região. II – A aplicação das penalidades previstas no art. 12 da Lei nº 8.429/1992 exige que o Magistrado considere, no caso concreto, a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente, o que torna necessária a análise da razoabilidade e propor-cionalidade em relação à gravidade do ato de improbidade e à cominação das penalidades, as quais podem ser aplicadas cumulativas ou não. III – Correta a sentença ao não aplicar aos réus Aécio Flávio Vieira Andrada e Fanor Alves dos Reis a pena de multa civil, e à ré Miraci Costa Mangabeira a pena de perda do cargo público, eis que as sanções aplicadas são suficientes para ‘alcançar-se a reprimenda à sua ação ilegal, retribuir o dano sofrido, além de desesti-mular o agente ou outrem à prática de condutas ímprobas’ (TRF/1ª Região, AC 0044688-62.2003.4.01.3400/DF, Des. Fed. Carlos Olavo, 3ª Turma, unânime, e-DJF1 de 08.07.2011, p. 96) e devem ser mantidas. IV – Remessa oficial não conhecida e apelação do Ministério Público Federal não provida.” (TRF 1ª R. – Ap-RN 0000597-72.2004.4.01.4200 – Rel. Des. Fed. Cândido Ribeiro – DJe 28.03.2014)

6732 – Improbidade administrativa – sentença – execução provisória – perda função e suspensão de direitos políticos – impedimento

“Agravo de instrumento. Improbidade administrativa. Possibilidade de execução provisória da sentença. Art. 475-O, CPC. Impedimento de execução provisória apenas quanto à per-da de função pública e suspensão de direitos políticos. Art. 20 da Lei nº 8.429/1992. I – O art. 20 da Lei de Improbidade indica que apenas as penas ali previstas não poderão ser ob-jeto de execução provisória. Ora, se em matéria de improbidade a lei condicionou apenas a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos ao trânsito em julgado da sen-tença condenatória, significa dizer que, contrario sensu, as demais penalidades previstas no art. 12 da Lei nº 8.429/1992 são passíveis de execução provisória, nos termos do art. 475-O do CPC. II – Ressalto ainda, que a decisão agravada não faz menção à penhora de salários, bem como os agravantes não lograram êxito em demonstrar qual seria o modo menos gravoso para executá-los e nem que a execução comprometeria sua subsistência e de seus dependen-tes. III – Agravo de instrumento improvido.” (TRF 2ª R. – AI 2014.02.01.004530-8 – 7ª T.Esp. – Rel. Reis Friede – DJe 07.08.2014)

Comentário Editorial SÍNTESEA ementa em epígrafe diz respeito a agravo de instrumento interposto por servidores contra decisão interlocutória proferida nos autos de execução provisória de sentença requerida pelo Ministério Público Federal, que determinou o pagamento de multa civil

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definida nos autos de ação principal, no valor de duas remunerações líquidas por ano, diante da acumulação indevida de cargos.

Os agravantes alegam que possuem apenas seus salários como fonte de renda, logo, são verbas de natureza alimentar e impenhoráveis.

Sustentam, ainda, que há expressa proteção constitucional ao salário, conforme artigo que segue:

“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[...]

X – proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; [...]”

O Relator, ao analisar o agravo, entendeu que o art. 20 da Lei de Improbidade Admi-nistrativa estabelece que apenas a perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos não poderão ser objeto de execução provisória, pois só se efetivam com o trânsito julgado da sentença condenatória.

Diante disso, concluiu que as demais penalidades, entre elas a multa, são passíveis de execução provisória.

Assim, entendeu que não há óbice para execução provisória da pena de multa, e ressal-tou que a decisão agravada não faz menção à penhora de salários.

Por fim, negou provimento ao agravo de instrumento.

Em seu voto, o Relator citou os precedentes a seguir:

“[...] A mesma posição pode ser encontrada na jurisprudência:

ADMINISTRATIVO – PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – AUDITOR FISCAL DA RECEITA – DEMISSÃO/CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA – PROVEITO PRÓPRIO E DE OUTREM EM RAZÃO DO CARGO – AUSÊNCIA DE NULIDADES NO PAD – PROVA ILÍCITA POR DERIVAÇÃO – FONTES AUTÔNOMAS – AUSÊNCIA DE PARCIALIDADE – RETIFICAÇÃO DE SANÇÃO POSSÍVEL – ORDEM DENEGADA – 1. Trata-se de man-dado de segurança impetrado por ex-auditor-fiscal da Receita contra ato emanado pelo Ministro de Estado da Fazenda, que o demitiu após Processo Administrativo Disciplinar, em razão de o impetrante ter deixado de praticar atos de ofício e tê-los cometido em desacordo com seus deveres funcionais, proporcionando vantagem indevida para si e para outrem. 2. Embora a questão não tenha sido debatida pelas partes, foi trazida pelos eminentes pares a impossibilidade de condenar servidor público à demissão em razão de Processo Administrativo Disciplinar por fato subsumível à Lei de Improbidade Admi-nistrativa. Porém, não se aplicou administrativamente a demissão, mas sim a cassação de aposentadoria prevista no art. 127, IV, da Lei nº 8.112/1990. [...] 6. A interpretação sistemática do art. 20 da LIA indica tão somente ser vedada a execução provisória de parcela das sanções previstas no art. 12 do mesmo diploma. Não se estabeleceu aí uma derrogação de todo e qualquer dispositivo presente em outra esfera que estabeleça a condenação de mesmo efeito; tampouco se quis criar lei mais benéfica ao acusado, por meio de diploma que ostensivamente buscava reprimir condutas reprováveis e outorgar eficácia ao comando constitucional previsto no art. 37, § 4º – afinal, é inconcebível que uma lei redigida para coibir com maior rigor a improbidade administrativa no nosso País tenha terminado por enfraquecer sua perquirição. Precedentes do STJ e do STF. (STJ, MS 201100715531, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe data: 24.08.2012)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – SENTENÇA CON-DENATÓRIA – EFEITOS DO RECEBIMENTO DA APELAÇÃO – PEDIDO DE EXTENSÃO DO EFEITO SUSPENSIVO A TODAS AS PENAS – ALEGAÇÕES VEROSSÍMEIS DE QUE UM DOS AGRAVANTES JÁ RESSARCIU AO ERÁRIO – EFEITO SUSPENSIVO DEFERI-DO QUANTO A ESTE AGRAVANTE – POSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA

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CONDENAÇÃO – ART. 475-O, CPC – ART. 20 DA LEI Nº 8.429/1992 – IMPEDIMENTO DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA APENAS QUANTO À PERDA DE FUNÇÃO PÚBLICA E SUSPENSÃO DE DIREITOS POLÍTICOS – 1. Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, contra decisão que deferiu o efeito suspensivo ao receber a apelação apenas quanto à condenação de perda da função pública e suspensão dos direitos políticos, não suspendendo os efeitos da sentença quanto às outras condena-ções. 2. Em relação ao agravante que foi condenado apenas a restituir ao Erário valores indevidamente recebidos por exercício do cargo de direção, foram apresentadas alega-ções e provas que indicam, com alto grau de probabilidade, já ter tal agravante restituído os valores ao Erário por via administrativa, de modo que o dano já teria sido reparado. Concessão de efeito suspensivo à apelação em relação à execução provisória de conde-nação de ressarcimento ao Erário imposta a este agravante. 3. Quanto ao outro agra-vante, condenado em sentença à perda da função pública, proibição de contratar com o Poder Público por 5 anos, suspensão dos direitos políticos por 5 anos e ressarcimento integral do dano ao Erário, não há nos autos deste agravo qualquer prova consistente da verossimilhança de suas alegações. Ao revés, a matéria de fundo deverá ser discutida de modo exauriente em sede de apelação na ação principal, à vista de todo o conjunto probatório formado. 4. Somente em casos de decisão teratológica, com abuso de poder ou em flagrante descompasso com a Constituição, a lei ou com a orientação consolidada de Tribunal Superior ou deste Tribunal justifica-se o provimento de agravo de instru-mento, nos termos da jurisprudência consolidada deste TRF-2. Precedentes: TRF 2, Ag 201302010027041, Desª Fed. Nizete Lobato Carmo, 6ª T.Esp., Decisão: 19.08.2013, e-DJF2R 26.08.2013; TRF-2, Ag 201302010043472, Des. Fed. José Antonio Neiva, 7ª T.Esp., Decisão: 15.05.2013, e-DJF2R 27.05.2013; TRF-2, Ag 201302010033995, Desª Fed. Vera Lúcia Lima, 8ª T.Esp., Decisão: 08.05.2013, e-DJF2R 15.05.2013. 5. O art. 20 da Lei de Improbidade (Lei nº 8.429/1992) indica que apenas as penas ali previstas não poderão ser objeto de execução provisória, a saber, as penas de perda da função pública e suspensão de direitos políticos. As demais penalidades previstas no art. 12 da Lei nº 8.429/1992 são passíveis de execução provisória, nos termos do art. 475-O do CPC. Precedentes: STJ, MS 201100715531, Rel. Min. Herman Benja-min, 1ª Seção, DJe 24.08.2012; TJRS, AI 70046340881, Rel. Jorge Maraschin dos Santos, J. 15.02.2012, 1ª C.Cív., Public. 13.03.2012; TJRS, AI 70044945020, Relª Matilde Chabar Maia, J. 15.12.2011, 3ª C.Cív., Public. 16.01.2012; TJPR, 7703593, Relª Astrid Maranhão de Carvalho Ruthes, J. 13.03.2012, 4ª C.Cív. 6. Agravo a que se dá parcial provimento. (Ag 200902010169555, Agravo de Instrumento nº 182837, Rel. Des. Fed. Marcus Abraham, TRF2, Órgão julgador: 5ª T.Esp., Fonte: e-DJF2R data: 02.10.2013)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – EXECUÇÃO PROVI-SÓRIA – Possuindo natureza civil as penalidades previstas para os atos de improbidade administrativa, mostra-se possível a execução provisória do julgado, exceto quanto às sanções de perda da função pública e de suspensão dos direitos políticos, as quais de-pendem do trânsito em julgado da sentença condenatória para cumprimento, observado o disposto no art. 37, § 4º, da Constituição Federal, e no art. 20 da Lei de Improbidade Administrativa. Assim, sendo a execução provisória restrita a obrigação por quantia certa e a proibição de contratação com o Poder Público e recebimento de benefícios deste, mos-tra-se possível o seu cumprimento em caráter provisório. (TJRS, AI 70046340881/RS, Rel. Jorge Maraschin dos Santos, Data de Julgamento: 15.02.2012, 1ª C.Cív., Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 13.03.2012)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – EXECUÇÃO PROVI-SÓRIA DE SENTENÇA – POSSIBILIDADE – As sanções previstas na Lei nº 8.429/1992 são de natureza civil, como se infere do texto no art. 37, § 4º, da Constituição Fede-ral, e do art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa. De acordo com o art. 20 da

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LIA, somente a execução das sanções de perda da função pública e de suspensão dos direitos políticos dependem do trânsito em julgado da sentença condenatória. Dessa forma, mostra-se possível o cumprimento provisório da sentença que condena os réus ao pagamento de multa. (TJRS, AI 70044945020/RS, Relª Matilde Chabar Maia, Data de Julgamento: 15.12.2011, 3ª C.Cív., Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 16.01.2012) [...]”

6733 – Improbidade administrativa – servidor público – auxílio-transporte – má-fé – confi-guração – sanções – aplicação

“Ação de improbidade administrativa. Servidor público. Percepção indevida de benefício de auxílio-transporte. Má-fé configurada. Sanções. O réu, na condição de técnico administrativo lotado na Fundação Casa de Rui Barbosa, recebeu indenização de transporte, no período de junho de 2004 a junho de 2006, por supostamente residir em Município distinto do Município da sede onde exercia as funções de seu cargo. Por ocasião do recadastramento dos benefi-ciários do auxílio-transporte, no ano de 2006, o réu apresentou comprovante de residência visando a manutenção do pagamento de referido benefício. Ocorre que a auditoria interna da Fundação Casa de Rui Barbosa constatou que a conta telefônica apresentada para com-provar o domicílio do réu no Município de Mangaratiba ‘e, com isso, justificar o pagamen-to de auxílio-transporte’, referia-se à linha telefônica de nº (21) 3381-2608, concernente ao endereço ‘Rua Rio Preto, 20/202, Brás de Pina’, no Município do Rio de Janeiro, consoante informações obtidas junto à Empresa de Telefonia Telemar. Diversos elementos de prova nos autos comprovam a prática do ato ímprobo pelo réu, a exemplo do laudo pericial elaborado pela Polícia Federal (fls. 332/339 dos autos virtuais), do termo de interrogatório (fls. 261/264 dos autos virtuais), realizado no bojo do PAD 01550.000318/2006-21. Inequívoca a má-fé do servidor que apresentou comprovante de residência com informações inverídicas e pros-seguiu recebendo auxílio-transporte como se residisse no Município de Mangaratiba, sem de fato lá residir, aproveitando-se da ineficiência administrativa, consistente na ausência de controle na concessão de benefícios a seus servidores, o que não desculpa, contudo, a impro-bidade. Diante da má-fé configurada e observada a perpetuação do recebimento de benefício indevido por 2 (dois) anos, que cessou unicamente porque descoberta a irregularidade pela administração, entende-se que a sentença recorrida merece reforma, em parte, para que sejam acrescentadas à condenação, além da pena de demissão e do ressarcimento ao Erário: (i) sus-pensão dos direitos políticos pelo prazo de 03 (três) anos; (ii) pagamento de multa civil fixada em 02 (duas) vezes o valor da última remuneração percebida no cargo que ocupava quando demitido; e (iii) proibição de celebrar contratos com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três) anos; Mantendo-se as demais sanções aplicadas na sentença. Apelação do réu improvida e remessa necessária e apela-ções da autora e do MPF providas.” (TRF 2ª R. – APELRE 2010.51.01.017550-0 – (606990) – 7ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Reis Friede – e-DJF2R 30.05.2014)

Destaque Editorial SÍNTESEDo voto do Relator, destacamos:

“[...] Por fim, no que pertine à alegação da autora e do MPF de desproporcionalidade da sanção aplicada pelo MM. Juízo a quo, algumas considerações merecem ser feitas.

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A previsão de sanções pela Lei nº 8.429/1992 é ampla e genérica, exigindo do Ma-gistrado a análise da compatibilidade entre a sanção a ser aplicada e a gravidade e a censurabilidade da infração.

No caso, a sentença confirmou a pena de demissão do servidor, aplicada na Portaria nº 9, de 18 de março de 2009 (fl. 491), e condenou o réu a ressarcir integralmente o dano causado ao Erário.

Diante da má-fé configurada e observada a perpetuação do recebimento de benefício indevido por 2 (dois) anos, que cessou unicamente porque descoberta a irregularidade pela Administração, entende-se que a Sentença recorrida merece reforma, em parte, para que outras penalidades sejam acrescentadas à condenação, além da pena de de-missão e do ressarcimento ao Erário, nos termo já fixados na sentença.

Ante o exposto, nego provimento à apelação do réu e dou provimento à remessa neces-sária e às apelações da autora e do MPF, reformando em parte a sentença, para julgar procedente o pedido e condenar o réu nas penas: (i) suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 03 (três) anos; (ii) pagamento de multa civil fixada em 02 (duas) vezes o valor da última remuneração percebida no cargo que ocupava quando demitido; e (iii) proibição de celebrar contratos com o Poder Público ou receber benefícios ou incen-tivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três) anos; mantendo-se as demais sanções aplicadas na sentença. [...]”

Parte Geral – Doutrina

Debates Jurídicos sobre a Terceirização no Brasil

ELÓI MARTINS SENHORASProfessor da Universidade Federal de Roraima (UFRR), Especialista, Mestre, Doutor e Pós‑Doutor em Ciências Jurídicas. Outros trabalhos do autor podem ser encontrados em www.works.bepress.com/eloi.

RESUMO: O presente artigo discute o processo de terceirização, tomando como referência uma pesquisa jurídica de revisão e de natureza exploratória, cujo objetivo foi desenvolver uma análise da evolução da terceirização na Administração Pública no Brasil, com base em marcos doutrinários e normativos, a fim de demonstrar, a partir de uma lógica dedutiva, que a polêmica produzida por discursos contrários e a favor tem repercussão conflitante, mesmo quando canalizada pela jurispru‑dência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Supremo Tribunal Federal (STF), já que não existe uma legislação específica no País.

PALAVRAS‑CHAVE: Administração Pública; responsabilidade subsidiária; terceirização.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Debates sobre a terceirização na Administração Pública; 2 Periodização contextual da terceirização na Administração Pública; 3 Marcos doutrinários e jurisprudenciais sobre a terceirização na Administração Pública brasileira; Últimas considerações; Referências.

INTRODUÇÃO

A terceirização é um processo administrativo que pode ser com-preendido pela transferência de determinadas atividades-meio – de nature-za periférica, acessória ou marginal em uma organização –, em benefício de um empreendedor autônomo ou outra organização que seja especializada e as tenha como atividade-fim.

O processo de repasse de atividades secundárias a empresas tercei-ras, vulgarmente conhecido pela denominação de terceirização, se refere a um padrão de flexibilização organizacional, pública e privada, que bus-ca aumentar a eficiência por meio de uma concentração ontológica àque-las atividades que compõem o núcleo estratégico de cada organização no contrato, já que determinadas atividades-meio para uma parte representam atividades-fim para outra parte.

A estratégia da terceirização faz parte de um grande movimento de flexibilização e desregulamentação do Direito do Trabalho no contexto de esgotamento do Estado keynesiano, cuja lógica é não apenas abrandar a rígida regulação trabalhista, mas também otimizar ganhos de eficiência com base em uma perspectiva gerencial de aumento de produtividade e de re-dução de custos.

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Embora as estratégias de terceirização tenham sido trazidas ao Brasil por empresas multinacionais, por meio da contratação de empresas de con-servação e limpeza, foi justamente a Administração Pública que primeiro se utilizou de serviços terceirizados em razão do Decreto-Lei nº 200/1967, que trazia uma Reforma Administrativa e propiciava meio de contratação sem a necessidade de se realizar concursos para atividades não essenciais do Estado, mesmo a regulamentação da terceirização tendo surgido apenas com a Lei nº 6.019/1974.

Mas é somente a partir da década de 1990 que a Administração Pú-blica brasileira vai se utilizar de maneira sistemática da terceirização como um conceito basilar funcional para a nova reforma administrativa a fim de se buscar na colaboração com prestadores de serviços especializados, maior economia em recursos humanos e otimização do rendimento do trabalho, momento em que surge uma série de polêmicas sobre o uso deste instituto pelo Poder Público (Souto, 2001).

Tomando como referência estas discussões, o objetivo da pesquisa é avaliar o significado teleológico e as polêmicas derivadas da implementa-ção da estratégia de terceirização na Administração Pública, por meio de uma discussão que foi estruturada em três recortes basilares, os quais se inter-relacionam, findando, como macro-objetivo, desenvolver um balanço sobre os marcos doutrinários e jurisdicionais para o caso brasileiro.

Na primeira seção, “Debates sobre a terceirização na Administração Pública”, são explorados marcos jurídico-conceituais e os principais deba-tes entre especialistas e doutrinadores a fim de mostrar a divisão existente a favor e contra a adoção da terceirização como meio de desverticalização de serviços e atividades operacionalizados pela máquina pública.

Na segunda seção, “Periodização contextual da terceirização na Ad-ministração Pública”, o artigo mostra, a partir de uma análise de longa dura-ção, como a terceirização se difunde em diferentes tempos no sistema inter-nacional até chegar ao Brasil em função de questões estruturais de natureza exógena, relacionadas à difusão do paradigma neoliberal e às mudanças nos padrões de produção e trabalho.

Na terceira seção, “Marcos doutrinários e jurisprudenciais sobre a terceirização na Administração Pública brasileira”, delineamentos sobre li-citude na terceirização na Administração Pública e discussões doutrinárias sobre responsabilidade subsidiária são trazidos ao debate à luz dos prin-cipais marcos jurídicos sobre a terceirização, regulamentada, apenas em 1974, como atividade temporária, até chegar à Súmula nº 331, com devidas revisões, do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

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Por fim, “Últimas considerações” à guisa de conclusão são trazidas como argumentos finais, porém não menos importantes, pois tanto retomam conceitos e debates centrais discutidos ao longo do texto quanto prospec-tam o futuro da terceirização na Administração Pública com base em proje-tos de lei em tramitação no Congresso Nacional.

1 DEBATES SOBRE A TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

No caso da crescente utilização da terceirização pela Administração Pública, verifica-se que ela tem sido alvo de polêmico debate entre especia-listas e doutrinadores que se dividem a favor e contra a adoção desta prática contratual de desverticalização de serviços e atividades operacionalizados pela máquina pública lato sensu.

De um lado, a terceirização como política de eficiência da Adminis-tração Pública representa um esforço de enxugamento do quadro de servi-dores pertencentes à máquina pública com o objetivo de reduzir os gastos estatais àquelas atividades consideradas estratégicas e de monopólio do Es-tado.

Segundo esta perspectiva minimalista sobre o tamanho da máquina pública, existe uma interpretação positiva sobre a parceria entre as iniciati-vas pública e privada como uma opção de flexibilização trabalhista adequa-da às mudanças existentes no mundo do trabalho e às necessidades de um Estado logístico que busca aumentar a eficiência da prestação dos serviços públicos1.

Em uma primeira perspectiva, alguns especialistas argumentam que a previsão legal de utilização de contratos com empresas privadas deve se restringir àquelas atividades-meio, de natureza acessória ou complementar ao núcleo primário-estratégico da máquina pública, cuja execução é apenas colaborativa ao desenvolvimento das políticas públicas.

Em uma segunda perspectiva, outros especialistas defendem que a terceirização não deve se restringir apenas às atividades-meio, pois os atuais marcos jurídicos tomam como referência um critério absoluto de legalidade em um contexto no qual, crescentemente, se torna difícil distinguir ativi-dades-meio de atividades-fim devido ao grau de complexidade das mes-mas e da mutabilidade das competências exigidas no trabalho (Diniz, 1999; Martins, 2003; Pastore, 2006).

1 A defesa da terceirização na Administração Pública embasada em um paradigma liberal busca nesse processo uma forma flexível de desburocratização da máquina estatal que propicie ao Estado se concentrar naquelas atividades essenciais.

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De outro lado, a terceirização como política de privatização da Ad-ministração Pública trata-se de uma leitura existente entre especialistas e doutrinadores que busca mostrar que a transferência de atividades não estra-tégicas ao funcionamento da máquina administrativa e ao desenvolvimento de políticas públicas para o setor privado acaba por convalidar uma lógica de privatização das relações de trabalho, que eventualmente reduz custos, mas não necessariamente aumenta a qualidade ou a eficiência produtiva.

Esta interpretação negativa sobre a terceirização, em especial, na Ad-ministração Pública, está respaldada pela análise fática dos variados casos em que empresas terceirizadas prestam atividades e serviços técnicos espe-cializados, embora com significativa deterioração das condições de traba-lho dos empregados, os quais, muitas vezes, eram, anteriormente, emprega-dos como servidores públicos na execução das mesmas funções (Di Pietro, 2006; Souto Maior, 2006; Pochmann, 2008).

A terceirização na Administração Pública se dinamizou como política de privatização em função de vícios pré-existentes no aparelho estatal, a fim de deter o crescimento desmesurado da máquina administrativa e de se bur-lar os limites de gastos com pessoal estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal, o que repercute em um desvirtuamento na prestação de trabalho, com efeitos negativos em termos de corrupção similares ao desenvolvimen-to de anéis burocráticos por meio da contratação exacerbada de servidores comissionados2.

Destarte, os argumentos contra a terceirização identificam que esta prática tornou-se crescentemente suscetível à corrupção, particularmente na Administração Pública, uma vez que são identificadas fraudes em licita-ções e concursos públicos, bem como estratégias de downsizing por parte de subcontratações que impactam na redução de postos de trabalho, no aumento da carga de trabalho e na perda de direitos para o trabalhador.

Não obstantes as diferentes interpretações a favor e contra, observa-se que tanto no setor privado quanto no setor público a temática dos contratos de terceirização é um tema amplamente debatido no mundo, em especial no Brasil, que não possui legislação específica, uma vez que há uma contra-ditória tendência promovida ela difusão de redes de produção e serviços em diversos países desenvolvidos e emergentes vis-à-vis aos questionamentos de deterioração dos condicionantes legais de trabalho (Cortez, 2004).

2 A evolução da terceirização, acompanhada da contratação hipertrofiada de servidores comissionados, repre-senta uma bula recorrente ao instituto do concurso público no País, descrevendo, nos casos de corrupção, a manutenção de um padrão descentralizado de relações viciadas que são marcadas pela subjetividade e a anéis burocráticos de natureza não meritocrática.

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2 PERIODIZAÇÃO CONTEXTUAL DA TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A função teleológica da terceirização é alcançar maior qualidade, produtividade e redução de custos por meio do desenvolvimento de uma parceria que promova a concentração do contratante naquelas atividades e serviços que compõem seu objetivo final, evitando a dispersão em ativida-des de apoio, as quais passam a ser executadas pelas empresas terceirizadas.

Conforme Sekido (2010), a terceirização tem sido objeto de estudo há décadas, por diferentes correntes e ramos do conhecimento, motivo pelo qual surgiram diferentes maneiras de classificá-la, quanto à forma (inter-na ou externa); ao estágio (inicial, intermediária ou avançada); ao objeto (serviços, materiais, equipamentos, atividades produtivas e tecnológicas), à finalidade (mão de obra, risco, parceria) e ao status (lítica ou ilícita).

[As atividades-meio mais suscetíveis de terceirização no mundo] estão nas áreas de informática, organização e métodos, serviços jurídicos, relações públicas, recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento, adminis-tração de cargos e salários, folha de pagamento, benefícios em geral, restau-rante e alimentação, previdência privada, saúde, seguro de vida e acidentes, transporte coletivo, limpeza e conservação, segurança, gráfica, correio ex-terno, malote, frota de veículos, importação e exportação, auditoria de sis-temas, marketing, pesquisa de mercado, propaganda, projetos, laboratórios diversos e serviços domésticos. (Pastore, 2006, p. 5)

Esta forma de contratação denominada terceirização é uma tendência existente desde a década de 1950, mas que se manifestou, em diferentes países em distintas décadas, com os objetivos convergentes de otimizar de-terminadas atividades-meio, diminuir riscos e custos trabalhistas e previden-ciários, bem como aumentar a taxa de lucratividade.

Inicialmente, denominado como contratação de atividades e serviço de terceiros, o processo de terceirização somente passou a adquirir esta denominação por meio da construção legiferante da terminologia em vários países frente ao contexto de difusão desta tendência administrativa de des-verticalização da produção.

Hoje, as atividades exercidas por prestadores de serviços e autôno-mos têm sido popularmente conhecidas pelo jargão de “atividades tercei-rizadas”, uma vez que a difusão de processos de terceirização engendrada pelo modo de produção enxuta e pelas ondas de políticas neoliberais no mundo impulsionou o surgimento empresas terceirizadas por parte daque-las organizações que buscavam reduzir seus custos e riscos operacionais de atividades que não pertenciam ao núcleo duro dos negócios.

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Em primeiro lugar, a passagem do paradigma tecnocientífico da pro-dução em massa para o paradigma da produção enxuta, contextualizada com a difusão de inovações significativas em logística e em tecnologias de informação e comunicação, acabou por ser funcional para o desenvolvi-mento de terceirizações.

Destarte, muitas atividades que antes eram endogenizadas nas orga-nizações, passaram crescentemente por um movimento de outsorcing, o que refletiu na busca externa por empresas parceiras com a finalidade de diminuir os custos de transação por meio de redes focalizadas na promoção de atividades-meio (Filadelfo, 2011).

Em segundo lugar, a passagem do paradigma keynesiano, marcado por políticas estatais intervencionistas, para um paradigma liberal, de Estado mínimo, impulsionou um boom de privatizações e terceirizações em razão da passagem de atividades enquadradas como não pertencentes ao core business para a iniciativa privada.

Há que se observar que a temática da terceirização por parte da Ad-ministração Pública necessariamente incorre em uma hierarquização axio-lógica sobre o conteúdo e funções das políticas públicas, a qual incorre em um movimento hermenêutico pendular entre minimalismo e maximalismo estatal ao longo do tempo que reflete os ciclos de predominância dos para-digmas liberal e intervencionista.

Internacionalmente, o ritmo da difusão dos processos de terceirização aconteceu assimetricamente no espaço e no tempo por meio de ondas neo-liberais, uma vez que, na década de 1970, se difundiu com o surgimento do neoliberalismo nos Estados Unidos e Inglaterra, mas também no Chile; na década de 1980, no Leste Asiático, na década de 1990, com as reformas na América Latina, e, a partir do final da década de 2000, na Europa.

No Brasil, a simultaneidade da difusão do neoliberalismo político com a entrada no paradigma da produção enxuta, com a abertura comer-cial, impactou em um ajuste econômico penoso que repercutiu em proces-sos de redução do número de empregos com os enxugamentos organizacio-nais (downsizing) que foram, parcialmente, compensados com a tendência de abertura de empregos em empresas terceirizadas.

3 MARCOS DOUTRINÁRIOS E JURISPRUDENCIAIS SOBRE A TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA

Quando se leva em conta a análise jurídica sobre o fenômeno da terceirização, faz-se necessária uma compreensão conceitual que se tornou consagrada na doutrina e na jurisprudência sobre as atividades e as hierar-quizações do empregador, a fim de mostrar a sua legalidade ou ilegalidade, quando contratada sob responsabilidade da Administração Pública.

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De um lado, as atividades organizacionais, quando classificadas como atividades-fim (funções nucleares) e atividades-meio (funções auxi-liares), demonstram as situações possíveis de contratação de autônomos e prestadores de serviços por parte da Administração Pública (Bonfiglioli, 2011).

A atividade-fim é aquela que demonstra qual a finalidade principal do negócio organizacional, podendo ser melhor compreendida quando lidos o contrato social, legislação ou regimento interno da organização, nos quais é possível visualizar o registro do objetivo social.

A atividade-meio, por sua vez, refere-se a toda ação acessória ou mes-mo correlata, que tem natureza não finalística no negócio organizacional, motivo pelo qual tem importância interna, embora seja suscetível de exter-nalização por meio de contratos com prestadores de serviços e autônomos.

De outro lado, as hierarquizações organizacionais revelam os custos de transação entre endogenização e exogenização das atividades, os quais incorrem, necessariamente, em uma escolha compensatória (trade-off) para a existência ou não de relações de pessoalidade e subordinação.

A escolha compensatória pode ser compreendida pelo entendimen-to doutrinário e jurisprudencial que admite que determinada organização contrate outra organização prestadora de serviços caracterizados como ati-vidades-meio, porém sem existir vínculos de pessoalidade e subordinação direta.

Da perspectiva contrária, não ocorrendo terceirização da prestação dos serviços, persiste a funcionalidade dos institutos da pessoalidade – pres-tação de serviço que manifesta desde o contrato intuito personae –, e, da subordinação – dependência jurídica das ordens do empregador.

Tomando como referências as atividades e as hierarquias no proces-so de terceirização, observa-se que determinados conceitos e institutos são limitadores na Administração Pública3 com base no que é lícito ou ilícito, demonstrando, assim, que a terceirização somente é admitida para atender a situações específicas e justificadas em que haja tanto uma natureza não continuada quanto uma necessidade advinda de profissionais do órgão.

Segundo um prisma, é considerada lícita toda aquela terceirização que se caracterize como atividade-meio, ou seja, aquela que venha a cor-

3 Diferentemente das pessoas jurídicas de direito privado, a quem é lícito fazer tudo aquilo que a lei não proíbe, a Administração Pública submete-se ao princípio da legalidade, impondo aos servidores públicos agirem com discricionariedade estrita ao que estiver previsto em lei, motivo pelo qual enfrenta maiores restrições na contratação de serviços terceirizados (Silva, 2008).

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roborar apenas para as atividades finais do serviço público, uma vez que possui uma natureza de suporte ou apoio às atividades principais, gerando a responsabilidade subsidiária do tomador por eventuais créditos do traba-lhador não saldados pelo fornecedor dos serviços.

Segundo outro prisma, é considerado ilícito qualquer tipo de terceiri-zação de atividade-fim na Administração Pública, já que esta se caracteriza por uma ação essencial, possuindo, assim, uma natureza nuclear para a prestação das políticas públicas, o que torna nulo o liame jurídico entre o trabalhador e o fornecedor de seus serviços, gerando vínculo empregatício diretamente entre o trabalhador e o tomador de seus serviços (Hinz, 2005).

Nos processos de terceirização, cabe perguntar, tanto nos casos de licitude quanto de ilicitude, se haverá algum tipo de responsabilidade da Administração Pública4 para com o trabalhador, uma vez que entre ambos não há uma relação contratual direta, mas, antes, apenas uma relação que é intermediada pela organização prestadora dos serviços.

De um lado, interpreta-se que o processo de terceirização de serviços gera entre as partes diretamente envolvidas – tomadora e fornecedora – uma série de direitos e obrigações, como em qualquer relação contratual, embo-ra existam, também, responsabilidades subsidiárias entre a Administração Pública, como tomadora de serviços para com o trabalhador.

Conforme Kich (2010), os tribunais brasileiros adotam, sistematica-mente, a responsabilidade subsidiária às organizações contratantes, como premissa de garantia aos trabalhadores, nos casos de terceirização de servi-ços em que surjam lacunas de prestação nos haveres trabalhistas por parte das empresas prestadoras, motivo pelo qual a Administração Pública e a maior parte das grandes, pequenas e médias empresas se preocupam em verificar nas empresas contratadas se elas cumprem, em primeiro lugar, com os encargos trabalhistas, e, em segundo lugar, com as normas de saúde e segurança no trabalho.

Esta percepção sobre a responsabilidade subsidiária da Administra-ção Pública surge em um recente contexto, marcado por lenta evolução5 dos marcos jurídicos brasileiros sobre o fenômeno da terceirização, o qual,

4 Conforme Silva (2011), embora a Constituição Federal de 1988 traga, no art. 37, § 6º, a responsabilidade civil objetiva do Estado quanto às pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos, a Lei nº 8.666, na contramão, criou um paradoxo na Administração Pública ao promover a liberação deste de toda e qualquer responsabilidade objetiva em face do inadimplemento das verbas traba-lhistas, razão pela qual estas têm sido tradicionalmente trabalhadas pela ótica da responsabilidade subjetiva.

5 A identificação de uma lenta evolução dos marcos jurídicos sobre a terceirização no Brasil parte de uma compreensão histórica de que não existiu uma tendência de linearidade, mas, antes, incorreu em uma série de fricções e descontinuidades ao longo do tempo em relação às perspectivas legiferante e hermenêutica, haja vista que a desconstrução do paradigma cognitivo do intervencionismo nacional-realista pelo emergente paradigma do laissez faire neoliberal no país aconteceu em função da passagem de um regime ditatorial para democrático, na qual há, por conseguinte, uma clara ruptura dos próprios paradigmas econômicos, sociais e jurídicos.

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inicialmente, passa a ser regulamentado, apenas, em 1974, como uma ati-vidade temporária, até se tornar passível de prestação nos serviços públicos na década de 1990, por meio das Leis nºs 8.987 e 9.472, bem como da Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

O instituto da responsabilidade subsidiária da Administração Pública aparece nas revisões textuais de 2000 e 2011 da Súmula nº 331 do TST com a previsão de que os entes públicos integrantes da administração direta e indireta respondem subsidiariamente ao trabalhador quanto às obrigações trabalhistas, desde que tenham participado da relação processual e constem também do título executivo judicial, conforme Lei nº 8.666/1993.

De acordo com Martins (2003), a responsabilidade subsidiária da Ad-ministração Pública, como contratante de empresas terceirizadas, vem a atender à necessidade de segurança das relações de trabalho com relação ao hipossuficiente, em razão de uma questão fática in eligendo, quando decorrente de culpa da empresa contratada, ou in vigilando, quando a pró-pria Administração Pública apresentar um comportamento deficitário de má escolha ou fiscalização de seu parceiro.

QUADRO 1 – PRINCIPAIS MARCOS JURíDICOS SObRE A TERCEIRIzAÇÃO NO bRASIL

1974 Lei nº 6.019Conhecida como lei do trabalho temporário, regulamen-tou o fenômeno da terceirização como atividade tempo-rária.

1983 Lei 7.102Regulamentou o trabalho de vigilância bancária a partir da identificação da terceirização como uma atividade per-manente.

1993 Lei nº 8.666 Regulamentaram a terceirização na Administração Públi-ca por meio do regime de concessão e permissão da pres-tação de serviços públicos.

1995 Lei nº 8.9871997 Lei nº 9.472

1986 Súmula nº 256 do TSTRegulamentou a legalidade e ilegalidade dos contratos de serviços no Brasil. A Súmula nº 256 foi cancelada por ter sido revista e ampliada pela Súmula nº 331.

1993

Súmula nº 331 do TST

Principal marco normativo do instituto da terceirização trabalhista no país, revista em 2000 e em 2011, com reda-ção final em 31.05.2011.

2000

2011

Fonte: Elaboração própria. Baseada nos marcos legais supracitados.

De outro lado, existe uma leitura sobre a natureza do ato jurídico dos contratos de terceirização dos serviços que prevê a inexistência de respon-sabilidade subsidiária da Administração Pública em relação aos trabalhado-res no caso de inadimplência, uma vez que as partes diretamente envolvidas na prestação e na contratação teriam apenas direitos e obrigações entre si.

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Com base nesta doutrina, surgiu a decisão favorável do Supremo Tribunal Federal (STF) à Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 16/2010, que manifesta que os entes públicos não podem ser responsa-bilizados pelos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais decorrentes da terceirização, o que repercutiu na formação de nova jurisprudência sobre o assunto (Sirtheau, 2011).

Em razão da jurisprudência do STF sobre o tema, surgiu uma nova re-dação da Súmula nº 331 do TST no ano de 2011, que manifestou não poder haver generalização dos casos no tocante à responsabilidade subsidiária da Administração Pública, motivo pelo qual se faz necessário investigar com rigor os casos de inadimplência do fornecedor de serviços em que a causa principal seja falha ou falta de fiscalização pelo órgão público contratante.

bOx 1 – SúMULA Nº 331 DO TRIbUNAL SUPERIOR DO TRAbALhO

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – LEGALIDADE

I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo di-retamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados liga-dos à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

(Nova redação em 18.09.2000)

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a respon-sabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).

(Nova redação em 24.05.2011)

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsa-bilidade subsidiária do tomador de serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participa-do da relação processual e conste também do título executivo judicial.

(Itens V e VI, acrescentados em 24.05.2011)

V – Os entes integrantes da administração pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666/1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regular-mente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação.

Fonte: TST (2011).

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Compreende-se que a nova redação da Súmula nº 331 do TST, ao manter a responsabilidade subsidiária da Administração Pública nos pro-cessos de contratação de serviços terceirizados, em condições específicas, acabou por contrariar a decisão do STF no julgamento da ADC 16/2010, favorável à constitucionalidade da Lei nº 8.666/1993, art. 70, § 1º, redigida in verbis:

A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis. (Lei nº 8.666/1993, art. 70, § 1º)

A modificação da Súmula nº 331, ao procurar ajustar a jurisprudência do TST sobre a legalidade dos processos de terceirização na Administração Pública, em resposta à decisão na ADC 16 do STF, claramente desfavorável ao trabalhador, acabou por gerar uma situação de aparente conflito com a instância superior (jurisprudência contra legem), por justamente manter a responsabilidade pública da Administração, o que tenderá a levar a deman-das judiciais em última instância do trabalhador a fim de obter um pronun-ciamento final do STF.

ÚLTIMAS CONSIDERAÇÕES

Com base nestas discussões, a favor e contra a responsabilidade sub-sidiária da Administração Pública, chega-se ao entendimento sintético dos marcos da ADC 16/2010 e da Súmula nº 331/2011 de que o Poder Público lato sensu nem sempre responderá subsidiariamente no caso daquelas ter-ceirizações, lícitas ou ilícitas, em que as empresas prestadoras não venham a quitar os haveres trabalhistas de seus empregados.

A partir destes marcos legais, identifica-se a positividade legal da exi-gência de comprovação fática nos casos problemáticos de terceirização em que se reivindica responsabilidade da Administração Pública, uma vez que a subsidiariedade trabalhista passa a não ser automática quando a empresa contratada – prestadora serviços – vier a não cumprir suas obrigações traba-lhistas com seus empregados.

Não é por acaso que a responsabilidade subsidiária da Administração Pública, por obrigações trabalhistas geradas por inadimplência de empresas terceirizadas, seja o tema com maior número de processos sobrestados no TST, 45% do total existente em 2012, já que se trata do tema com maior

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repercussão por ter relevância geral de natureza multidimensional e que ultrapassa os interesses das partes envolvidas (TST, 2012).

As influências dos ultrarrecentes marcos de jurisprudência superior no TST e no STF relacionados à terceirização na Administração Pública têm tido ampla repercussão sobre os Poderes Executivo e Legislativo, de maneira a se registrar a edição de instruções e acórdãos embasando-se em decisões do Poder Judiciário.

No Poder Executivo, a discricionariedade de contratações terceiriza-das na Administração Pública é disciplinada pelas Instruções Normativas nº 2 e nº 3 do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), as quais objetivam criar tanto freios quanto multiplicadores do processo, con-forme os marcos legais do Judiciário e conveniência para o funcionamento da máquina pública.

De um lado, existem limitações a serviços e atividades consideradas auxiliares, porém necessárias à máquina pública para o desempenho de suas funções quando a interrupção possa comprometer a continuidade das políticas públicas e cuja contratação deva estender-se por mais de um exer-cício financeiro.

De outro lado, a terceirização é recomendada no caso de serviços e atividades de apoio ao funcionamento dos entes públicos relacionados às áreas de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transporte, informáti-ca, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicação e manutenção de prédios, equipamentos e instalações.

No Poder Legislativo, partindo-se da ótica do controle, o Tribunal de Contas da União (TCU) publicou o Acórdão nº 2132/2010, baseando-se nas orientações da Súmula nº 331 do TST, recomendando o fim dos con-tratos de mão de obra terceirizada nas empresas estatais ligadas ao governo federal, por meio de um processo meritocrático de concurso público que promova a substituição de servidores terceirizados em atividades fim por servidores públicos6.

Ademais, observa-se a partir da ótica legiferante promovida por par-lamentares que projetos de lei sobre terceirização foram apresentados tanto na Câmara quanto no Senado, demonstrando, assim, que as propostas do

6 Cerca de 145 empresas públicas da administração indireta, sociedades de economia mista e subsidiárias sob a responsabilidade do MPOG apresentaram em novembro de 2012, segundo determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), os planos de substituição gradual de servidores terceirizados em atividades-fim por concursados até 2016.

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Poder Legislativo são, muitas vezes, conflitantes, o que reflete os diferentes interesses sociais presentes.

De um lado, há a apresentação do Projeto de Lei do Senado nº 422/2012, que institui normas relativas à natureza da contratação, con-trole, transparência, proteção ao trabalhador e vedação à ingerência em atos administrativos das empresas terceirizadas pela Administração Pública Federal, bem como o Projeto de Lei nº 6.662/2010, da mesma casa, que proíbe órgãos públicos de contratar terceirizados para exercer atribuições inerentes ao seu corpo funcional (TST, 2013).

De outro lado, estão os projetos que buscam regulamentar a tercei-rização, de número 4.330/2004, apresentado na Câmara dos Deputados, e número 087/2010, apresentado no Senado Federal, os quais têm em co-mum dois pontos defendidos pela CNI – a responsabilidade subsidiária e a universalização da terceirização, e abrangem, assim, qualquer atividade da empresa contratante e não apenas as atividades-fim.

Conclui-se que, diante da falta de uma lei específica sobre a terceiri-zação, os avanços jurisprudenciais do TST e STJ quanto à responsabilidade subsidiária da Administração Pública nestes contratos repercutem na má-quina pública brasileira, embora ainda persista uma urgente necessidade de se editar uma norma legal específica para regular a terceirização em razão da legalidade ou ilegalidade levar em conta a centralidade da definição de atividade-meio, que é excessivamente subjetiva em um contexto de cres-cente multiplicação, complexidade e interdependência de atividades.

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Parte Geral – Doutrina

Habilitação Técnica em Licitações Públicas

CARLOS EDUARDO ARAUJO DE ASSISGraduado em Ciências Navais pela Escola Naval, Pós‑Graduado em Administração Pública pelo Centro de Instrução Almirante Wandenkolk, Acadêmico do Curso de Graduação da Facul‑dade de Direito da Universidade Federal do Amazonas – UFAM, ManausAM, Brasil.

RESUMO: Este artigo visa a compilar, de acordo com os entendimentos do Tribunal de Contas da União, a melhor interpretação do art. 30 da Lei nº 8.666/1993, o qual trata sobre habilitação técnica em licitações públicas, utilizando‑se do método dedutivo, o que possibilita aos licitantes um melhor preparo para a participação nos certames e o aumento da competitividade nesses processos, ge‑rando economia de meios aos cofres públicos, apontando, ao final do texto, o que pode ou não ser inserido nos editais.

PALAVRAS‑CHAVE: Habilitação; qualificação; técnica; licitações; atestado; acervo.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Conceito de habilitação; 2 Formalidades documentais; 2.1 Autenticação; 2.2 Reconhecimento de firma; 2.3 Numeração de páginas; 2.4 Envelopes; 2.5 Assinatura digital de documentos; 2.6 Documentos emitidos fora do Brasil; 2.7 Matrizes e filiais; 3 Habilitação técni‑ca; 3.1 Amparo constitucional; 3.2 Amparo infralegal; 3.3 Atestados de Capacidade Técnica (ACT) e Certidões de Acervo Técnico (CAT); 3.4 Número e soma de atestados de capacidade técnica; 3.5 Transferência de capacitação técnica entre diferentes pessoas jurídicas; 3.6 Limitações tem‑porais de experiência técnica; 3.7 Declaração de anuência ou de disponibilidade de responsável técnico; 3.8 Pessoal, equipamentos, materiais e instalações; 3.9 Licenças ambientais de operação; 3.10 Habilitação técnica em casos de inexigibilidade de licitação; 3.11 Declaração de compromisso de fornecimento do fabricante; 3.12 Licenças setoriais de operação; 3.13 Certificações de qualidade; 3.14 Visitas técnicas; 3.15 Vinculação de pessoal; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

Tema extremamente importante nas aquisições públicas, a habilita-ção técnica tem se mostrado como a maior causa da inabilitação de lici-tantes. À medida que licitantes são inabilitados, outros subsequentes são convocados para a apresentação da documentação, geralmente com preços maiores que os inabilitados. Com isso, a Administração Pública perde uma grande oportunidade de economizar seus parcos recursos.

Divulgar estudos sobre esse tema tão especial é importante para o nosso País, tendo em vista a possibilidade de alocação dos recursos econo-mizados em outras áreas.

Diversos doutrinadores vêm abordando o problema de maneira muito didática nas suas obras e palestras. O propósito deste trabalho é apresentar

RSDA Nº 106 – Outubro/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������71

sobre os aspectos legais o que se pode ou não fazer constar nos Editais de Licitações Públicas e dar dicas práticas às empresas licitantes para a sua preparação para o certame, de maneira que elas não percam grandes opor-tunidades e que a Administração consiga plenamente atender ao princípio constitucional da eficiência e ao princípio licitatório da economicidade, re-alizando, então, excelentes contratos.

1 CONCEITO DE HABILITAÇÃO

Habilitação significa a apuração e a confirmação, pelos gestores pú-blicos, da capacidade empresarial para a realização de uma determinada tarefa ou fornecimento para a Administração Pública.

Em todos as modalidades licitatórias, ela será verificada em 5 planos diferentes de acordo com o art. 271 da Lei nº 8.666/1993: habilitação jurídi-ca, fiscal e trabalhista, técnica, econômico-financeira e declarações.

A preparação empresarial para a participação em licitação deve levar em conta três importantes considerações:

a) A licitante deve possuir a certeza de que já reúne experiência profissional e capacidade de mobilização administrativa neces-sárias para realizar o objeto;

b) A licitante deve possuir uma documentação que ateste ser capaz de fazer o objeto; e

c) Essa documentação deve, por si só, convencer os avaliadores, seja a Comissão de Licitação ou o Pregoeiro, de que a licitante é capaz de fazer o objeto, sem dar margem a nenhuma dúvida por parte da Administração.

As exigências habilitatórias estão impostas nos art. 27 e 32 da Lei nº 8.666/1993, o Estatuto Geral de Licitações.

2 FORMALIDADES DOCUMENTAIS

Os documentos a serem apresentados deverão estar revestidos com as seguintes formalidades:

1 “Art. 27. Para a habilitação nas licitações exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, documentação relativa a: I – habilitação jurídica; II – qualificação técnica; III – qualificação econômico-financeira; IV – regularidade fiscal e trabalhista; V – cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.”

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2.1 AUTENTICAÇÃO

De acordo com o art. 322 da Lei nº 8.666/1993, existem três maneiras de apresentar documentos válidos:

a) Cópias autenticadas em cartório;

b) Cópias autenticadas anteriormente à sessão pública pelo pregoeiro, mem-bro da Comissão de Licitação ou servidor designado pela Administração; e

c) Apresentar cópias simples, levando os documentos originais para confe-rência no momento da sessão pública ou outro definido no edital.

2.2 RECONhECIMENTO DE fIRMA

A maioria dos editais dispensa a exigência de reconhecimento de fir-ma em cartório dos documentos assinados pelo representante da empresa. Entretanto, geralmente é inserida no edital a exigência de reconhecimento de firma no documento particular que delegue poderes ao colaborador que vai participar da licitação.

2.3 NUMERAÇÃO DE PáGINAS

Geralmente tratado como exigência editalícia, os documentos devem ser apresentados por uma capa que apresente um índice, indicando a nu-meração das páginas. Essas páginas deverão ser numeradas e rubricadas. A numeração pode ser simples ou do tipo 1/34, 2/34, 3/34... até a 34/34, por exemplo.

2.4 ENVELOPES

Nas licitações, a licitante deverá apresentar no mínimo dois enve-lopes. Um de habilitação e outro de proposta de preço. Poderá haver a exigência de um terceiro envelope de credenciamento ou um quarto de proposta técnica. Esses envelopes deverão ser identificados e lacrados. É recomendável a utilização de envelopes de cores diferentes para que não sejam trocados os documentos (documento de habilitação no envelope de proposta de preço ou o contrário), excluindo a licitante do certame. As bor-das dos envelopes poderão ser assinadas antes de lacrá-los com fita de em-pacotamento, o que reduz as chances de fraude. Quanto a isso, poderão

2 “Art. 32. Os documentos necessários à habilitação poderão ser apresentados em original, por qualquer pro-cesso de cópia autenticada por cartório competente ou por servidor da administração ou publicação em órgão da imprensa oficial.”

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também ser utilizados envelopes antifraude, tais como os envelopes usados por bancos para a entrega de cartões ou talões de cheques, envelopes de alma de barbante e diversos outros tipos.

No pregão eletrônico, não há a necessidade de mais de um envelope para a entrega da documentação, exceto se houver a apresentação de amos-tras, o que não é muito comum.

2.5 ASSINATURA DIGITAL DE DOCUMENTOS

A Medida Provisória nº 2.200-23, de 24 de agosto de 2001, possibilita a apresentação de documentos assinados digitalmente. Se a assinatura for gerada pelo Sistema ICP-Brasil, todas as esferas da Administração Pública são obrigadas a aceitá-los, de acordo com o art. 10 da referida MP. Para outros sistemas, faz-se necessário verificar se o órgão público aceita o siste-ma usado pela sua empresa.

Art. 10. Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória.

§ 1ºAs declarações constantes dos documentos em forma eletrônica pro-duzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do art. 131 da Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916 – Código Civil.

§ 2º O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrôni-ca, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento.

A assinatura digital, na prática, nada mais é que um código impresso próximo ao rodapé do documento assinado, que pode ser validado pela Internet de maneira similar a uma certidão fiscal.

2.6 DOCUMENTOS EMITIDOS fORA DO bRASIL

De acordo com o § 4º do art. 324 da Lei nº 8.666/1993, esses docu-mentos devem ser revestidos com duas formalidades:

3 Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/MPV/Antigas_2001/2200-2.htm>. Acesso em: 1º ago. 2014.

4 “§ 4º As empresas estrangeiras que não funcionem no País, tanto quanto possível, atenderão, nas licitações internacionais, às exigências dos parágrafos anteriores mediante documentos equivalentes, autenticados pelos respectivos consulados e traduzidos por tradutor juramentado, devendo ter representação legal no Brasil com poderes expressos para receber citação e responder administrativa ou judicialmente.”

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a) Consularização do documento – o documento é registrado no Consulado ou Embaixada Brasileira do país de origem do docu-mento, recebendo um selo daquele órgão;

b) Tradução juramentada do documento – o documento é traduzi-do por um tradutor juramentado.

Dessa maneira, a licitante deverá apresentar a cópia autenticada des-ses dois documentos.

2.7 MATRIzES E fILIAIS

Se a empresa matriz for participar da licitação, a documentação a ser apresentada é a da matriz. Se for a filial a participar da licitação, os docu-mentos a serem apresentados são os da filial.

3 HABILITAÇÃO TÉCNICA

Entre inúmeras definições, ressaltamos a do Professor Marçal Justen Filho5:

A expressão “qualificação técnica” tem grande amplitude de significado. Em termos sumários, consiste no domínio de conhecimentos e habilidades te-óricas e práticas para a execução do objeto a ser contratado. Isso abrange, inclusive, a situação de regularidade em face de organismos encarregados de regular determinada profissão. Na ordenação procedimental tradicional, essa qualificação técnica deverá ser investigada em fase anterior ao exame das propostas e não pode nem sequer admitir a formulação de propostas por parte de quem não dispuser de condições técnicas de executar a prestação.

Essa definição estabelecida pelo nobre autor nos ensina que a habili-tação técnica será a constatação de que a licitante está preparada tecnica-mente para fazer ou fornecer o que está sendo demandado pela Adminis-tração. Entretanto, o leitor desatento poderá não perceber que ela se refere também ao rito tradicional estabelecido pelo art. 436 da Lei nº 8.666/1993, que foi invertido no caso de licitação na modalidade pregão por ocasião da Lei nº 10.520/2002, de acordo com o inciso XII7 do art. 4º: a famosa inver-

5 Justen Filho, 2014, p. 575. 6 “Art. 43. A licitação será processada e julgada com observância dos seguintes procedimentos: I – abertura dos

envelopes contendo a documentação relativa à habilitação dos concorrentes, e sua apreciação; [...].”7 “XII – encerrada a etapa competitiva e ordenadas as ofertas, o pregoeiro procederá à abertura do invólucro

contendo os documentos de habilitação do licitante que apresentou a melhor proposta, para verificação do atendimento das condições fixadas no edital; [...].”

RSDA Nº 106 – Outubro/2014 – PARTE GERAL – DOUTRINA ������������������������������������������������������������������������������������������������������������������75

são de fases, que possibilitou um enorme avanço nas aquisições públicas no que tange ao tempo.

Assim, a documentação da habilitação no pregão somente poderá ser analisada após a aceitação do objeto. Em tempo, o mesmo poderá ocor-rer nas licitações na modalidade do Regime Diferenciado de Contratação – RDC, estabelecido pela Lei nº 12.462/20118.

3.1 AMPARO CONSTITUCIONAL

A Constituição da República dedicou especial atenção quanto ao modo de atuação da Administração Pública, estabelecendo no caput do art. 37 o importante princípio da legalidade:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiên-cia e, também, ao seguinte:

[...].

Por legalidade, entende o ilustre Professor Hely Lopes Meirelles9:

A legalidade, como princípio de administração (CF, art 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabi-lidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.

O inciso XXI do art. 37 da Constituição da República estabelece limi-tes máximos a serem exigidos em processos licitatórios, como segue trans-crito:

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pú-blica que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigên-cias de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cum-primento das obrigações.

Dessa maneira, o administrador deverá atuar de acordo com o que determina a lei e só poderá incluir nos editais o que é indispensável, o que

8 Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12462.htm>. Acesso em: 1º ago. 2014.

9 Meirelles, 2013, p. 90.

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se torna o máximo a ser exigível da licitante, de forma que não haja limita-ção da competição para que a proposta mais vantajosa seja obtida.

3.2 AMPARO INfRALEGAL

A Lei nº 8.666/1993 define os critérios de habilitação técnica no seu art. 30, que segue transcrito na íntegra:

Art. 30. A documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a:

I – registro ou inscrição na entidade profissional competente;

II – comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licita-ção, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se respon-sabilizará pelos trabalhos;

III – comprovação, fornecida pelo órgão licitante, de que recebeu os docu-mentos, e, quando exigido, de que tomou conhecimento de todas as infor-mações e das condições locais para o cumprimento das obrigações objeto da licitação;

IV – prova de atendimento de requisitos previstos em lei especial, quando for o caso.

§ 1º A comprovação de aptidão referida no inciso II do caput deste artigo, no caso das licitações pertinentes a obras e serviços, será feita por atestados for-necidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente re-gistrados nas entidades profissionais competentes, limitadas as exigências a:

I – capacitação técnico-profissional: comprovação do licitante de possuir em seu quadro permanente, na data prevista para entrega da proposta, profis-sional de nível superior ou outro devidamente reconhecido pela entidade competente, detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, limitadas estas exclusiva-mente às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto da lici-tação, vedadas as exigências de quantidades mínimas ou prazos máximos;

II – (Vetado).

a) (Vetado).

b) (Vetado).

§ 2º As parcelas de maior relevância técnica e de valor significativo, mencio-nadas no parágrafo anterior, serão definidas no instrumento convocatório.

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§ 3º Será sempre admitida a comprovação de aptidão através de certidões ou atestados de obras ou serviços similares de complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior.

§ 4º Nas licitações para fornecimento de bens, a comprovação de aptidão, quando for o caso, será feita através de atestados fornecidos por pessoa jurí-dica de direito público ou privado.

§ 5º É vedada a exigência de comprovação de atividade ou de aptidão com limitações de tempo ou de época ou ainda em locais específicos, ou quais-quer outras não previstas nesta Lei, que inibam a participação na licitação.

§ 6º As exigências mínimas relativas a instalações de canteiros, máquinas, equipamentos e pessoal técnico especializado, considerados essenciais para o cumprimento do objeto da licitação, serão atendidas mediante a apresen-tação de relação explícita e da declaração formal da sua disponibilidade, sob as penas cabíveis, vedada as exigências de propriedade e de localização prévia.

§ 7º (Vetado).

I – (Vetado).

II – (Vetado).

§ 8º No caso de obras, serviços e compras de grande vulto, de alta complexi-dade técnica, poderá a Administração exigir dos licitantes a metodologia de execução, cuja avaliação, para efeito de sua aceitação ou não, antecederá sempre à análise dos preços e será efetuada exclusivamente por critérios objetivos.

§ 9º Entende-se por licitação de alta complexidade técnica aquela que en-volva alta especialização, como fator de extrema relevância para garantir a execução do objeto a ser contratado, ou que possa comprometer a continui-dade da prestação de serviços públicos essenciais.

§ 10. Os profissionais indicados pelo licitante para fins de comprovação da capacitação técnico-profissional de que trata o inciso I do § 1º deste artigo deverão participar da obra ou serviço objeto da licitação, admitindo-se a substituição por profissionais de experiência equivalente ou superior, desde que aprovada pela administração.

§ 11. (Vetado).

§ 12. (Vetado).

Além da limitação constitucional, em perfeita sintonia, o Estatuto Ge-ral das Licitações, Lei nº 8.666/1993, estabelece de forma exaustiva o que poderá ser estabelecido como requisitos, limites máximos, de habilitação técnica.

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Marçal Justen Filho10 nos ensina sobre a qualificação técnica:

A Lei nº 8.666 disciplinou de modo minucioso a qualificação técnica, visan-do a evitar exigências desnecessárias utilizadas para a restrição indevida à participação em licitação.

A legislação não proíbe as exigências de qualificação técnica, mas reprime exigências desnecessárias ou inadequadas. A Administração Pública não tem liberdade para impor exigências quando a atividade a ser executada não apresentar complexidade nem envolver graus mais elevados de aperfeiçoa-mento.

Por outro lado, as exigências devem estar previstas de modo expresso no ato convocatório. A qualificação técnica a ser exigida é não apenas aquela teóri-ca, mas também a efetiva, concreta, prática. Em vez do exame apenas teórico do exercício da atividade, as exigências se voltam para a efetiva condição prática de desempenhar satisfatoriamente o objeto licitado.

Basicamente, o que se quer verificar é se os profissionais apresenta-dos possuem capacidade de fazer ou fornecer o objeto e se a licitante possui condições de mobilizar-se para a realização desse empreendimento.

A comprovação exigível sobre a experiência dos profissionais é cha-mada de capacitação técnico-profissional.

A comprovação exigível sobre a experiência empresa é chamada de capacitação técnico-operacional, cuja possibilidade de ser cobrada nos cer-tames foi reiterada pela Súmula nº 26311 do Tribunal de Contas da União, em que pese a mesma ter sido revogada no texto legal. É a orientação da-quele Tribunal:

Súmula nº 263 – TCU: Para a comprovação da capacidade técnico-opera-cional das licitantes, e desde que limitada, simultaneamente, às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto a ser contratado, é legal a exigência de comprovação da execução de quantitativos mínimos em obras ou serviços com características semelhantes, devendo essa exigência guardar proporção com a dimensão e a complexidade do objeto a ser executado.

3.3 ATESTADOS DE CAPACIDADE TéCNICA (ACT) E CERTIDõES DE ACERVO TéCNICO (CAT)

Basicamente, serão exigidos ACT ou CAT, que, de acordo com a ju-risprudência atual, deverão comprovar execução de objeto similar, cujas

10 Justen Filho, 2012, p. 461.11 Disponível em: < https://contas.tcu.gov.br/juris/SvlHighLight?key=SUMULA %5C%5C_Sarq_prod%5CUnida-

-des%5CSGS%5CPublico %5CIntranet%5CAcordaosJulgados%5CSumulas%5CSumula-263-de-19-01-2011.doc&texto=2a2533412a&sort=COPIATITULO&ordem= DESC &bases=SUMULA;&highlight=&posicaoDocumento=20&numDocumento=24&totalDocumentos=286>. Acesso em: 1º ago. 2014.

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quantidades a serem comprovadas devem estar relacionadas com as par-celas de maior valor significativo e grau de importância, conforme pude-mos constatar em leitura atenta à súmula apresentada. Além disso, há uma vasta jurisprudência sobre o assunto, entre as quais citamos o Acórdão nº 1898/2011-Plenário12.

Os atestados apresentados na licitação deverão corresponder às ativi-dades que estão sendo demandadas e comprovarão a capacidade técnico--operacional da licitante.

Nos casos de obras ou serviços de engenharia, valem as regras da Resolução nº 1025/200913 do Confea para a elaboração desses documentos. Além disso, podemos citar algumas regras básicas:

a) De acordo com o § 1º do art. 30 da Lei nº 8.666/1993, pode ser emitido por pessoa jurídica de direito público ou privado;

b) Deve ser emitido com o timbrado do emissor;

c) Dados a serem apresentados: identificação do licitante, respon-sável técnico, objeto, quantidades executadas, valor, período de fornecimento, informações contratuais básicas. Recomenda--se também vincular as notas fiscais emitidas no ato da emissão do atestado, o que poderá servir de comprovação fiscal do do-cumento, muito embora o TCU não admita tal exigência, vide Acórdão nº 944/2013-Plenário14; e

d) Assinatura do dirigente/responsável do órgão/empresa, que de-verá ser reconhecida em cartório, caso o emissor seja pessoa jurídica de direito privado.

Poderá ocorrer de a licitante precisar demonstrar estar registrada no Conselho competente para fiscalização, como Conselho Regional de Ad-ministração, de Engenharia, de Contabilidade, de Farmácia, etc., de acordo com o inciso I do art. 30 da Lei nº 8.666/1993. Nesse caso, a empresa deve-rá ter um responsável técnico registrado nesse Conselho, além dela mesmo como pessoa jurídica. Quando ocorrer esse caso, o órgão público poderá solicitar que os atestados estejam registrados nos respectivos Conselhos.

12 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2011& numeroAcordao= 1898&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

13 Disponível em: < http://normativos.confea.org.br/ementas/visualiza.asp?idEmenta=43481>. Acesso em: 1º ago. 2014.

14 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2013 &numeroAcordao= 944&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

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Assim, a licitante deverá ter atenção a três coisas: quitação da anua-lidade do profissional, da empresa e o atestado devidamente registrado no Conselho.

A Administração poderá pedir que os atestados apresentem compro-vação de fornecimento em quantidade razoável em relação ao total do ob-jeto a ser executado.

De acordo com a jurisprudência firmada pelo TCU, dependendo da situação, poderá ser cobrado até 50% do objeto. Por exemplo, em um for-necimento de 100 computadores, uma quantidade razoável a ser compro-vada poderia estar entre 10 e 50 computadores, atitude que busca amparo em várias decisões do TCU, tais como os Acórdãos nºs 31/2013-Plenário15 e 3070/2013-Plenário16. Essa quantidade tida como razoável deve ser defi-nida no edital da licitação. Entretanto, notamos que muitos deles já estão deixando de cobrar o atestado de capacidade técnica nas licitações de ma-teriais, quando se tratam de itens de baixa complexidade.

Em relação à habilitação técnica em licitações de obras ou serviços de engenharia, há uma discussão muito grande, pois o Confea entende que o que se atesta é o serviço do profissional e não a mobilização da empresa para a realização do empreendimento. De acordo com esse posicionamen-to, somente poderia ser cobrada em licitação a capacitação técnico-profis-sional, o que contraria o entendimento do TCU, conforme anteriormente demonstrado.

A capacitação técnico-profissional pode ser cobrada por meio das Certidões de Acervo Técnico ou Anotações de Responsabilidade Técnica, estabelecendo-se quantidades razoáveis em relação aos itens de maior valor significativo e de maior grau de importância em relação à obra / ao serviço de engenharia.

Importante é ressaltar que, dependendo do ramo do objeto da lici-tação, empresas que não são do ramo de obras ou serviços de engenharia também poderão apresentar atestados registrados nos respectivos conselhos de fiscalização e certidões dos profissionais indicados, aos moldes do que foi explicado neste tópico. Como exemplo, em algumas licitações de ser-viços de limpeza e conservação, está sendo solicitada a apresentação de registro e quitação no Conselho Regional de Administração (CRA).

15 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?colegiado= PLENARIO&ano Acordao =2013 &numero Acordao=31&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

16 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2013& colegiado=PLENARIO&numeroAcordao=3070&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

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3.4 NúMERO E SOMA DE ATESTADOS DE CAPACIDADE TéCNICA

De acordo com a jurisprudência firmada pelo TCU, não é possível estabelecer a quantidade mínima ou máxima de atestados a serem apresen-tados por ocasião da habilitação na licitação, em que pese ser possível a soma das quantidades apontadas nos atestados de capacidade técnica para avaliação da capacitação técnico-operacional. Todavia, se tecnicamente for comprovada a necessidade de tal exigência, ela será avaliada pontualmente e deverá ser motivada no processo. Tal posicionamento foi confirmado por ocasião dos Acórdãos nºs 1865/2012-Plenário17 e 1231/2012-Plenário18 do TCU.

3.5 TRANSfERêNCIA DE CAPACITAÇÃO TéCNICA ENTRE DIfERENTES PESSOAS JURíDICAS

A transferência da capacidade técnico-operacional entre pessoas ju-rídicas que passaram por processo de reestruturação empresarial é possível não somente na hipótese de transferência total de patrimônio e acervo téc-nico entre tais pessoas, mas também no caso da transferência parcial desses ativos, como podemos verificar nos Acórdãos nºs 1233/2013-Plenário19 e 2444/2012-Plenário20 do TCU. Em tempo, também é admissível a utilização dos acervos pela empresa incorporadora.

3.6 LIMITAÇõES TEMPORAIS DE ExPERIêNCIA TéCNICA

Não é possível a exigência de número mínimo de profissionais nos quadros permanentes da licitante, pois isso implica para a licitante ter gastos anteriores à realização da licitação, o que limita o caráter competitivo do certame, de acordo com o § 5º do art. 30 da Lei nº 8.666/1993.

Entretanto, a exigência temporal de experiência mínima no mercado do objeto deverá ser razoável e compatível com o prazo de duração do contrato a ser firmado, já que o tempo de atuação é critério relevante para avaliar a solidez do futuro fornecedor e, com isso, assegurar boa execu-ção do objeto e de serviços prestados anteriormente à Administração por número mínimo de meses definido, muito embora haja a limitação previs-

17 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2012& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=1865&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

18 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2012& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=1231&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

19 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2013& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=1233&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

20 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?colegiado= PLENARIO&anoAcordao =2012&numeroAcordao=2444&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

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ta no mesmo dispositivo. Ilustrando o entendimento, citamos os Acórdãos nºs 727/2012-Plenário21 e 2939/2010-Plenário22 do TCU.

3.7 DECLARAÇÃO DE ANUêNCIA OU DE DISPONIbILIDADE DE RESPONSáVEL TéCNICO

Não é possível a exigência de declaração de anuência/disponibili-dade para a participação na licitação firmada de responsável técnico, uma vez que o § 10 do art. 30 da Lei nº 8.666/1993 diz que os profissionais indicados pelo licitante para fins de comprovação da capacitação técni-co-profissional deverão participar da obra ou serviço objeto da licitação, admitindo-se a substituição por profissionais de experiência equivalente ou superior, desde que aprovada pela administração, fato reiterado pelo Acór-dão nº 2934/2011-Plenário23 do TCU.

3.8 PESSOAL, EQUIPAMENTOS, MATERIAIS E INSTALAÇõES

O § 6º do art. 30 da Lei nº 8.666/1993 dever ser compreendido de acordo com a jurisprudência do TCU, que entende não ser possível a co-brança da comprovação da contratação, propriedade ou da posse desses itens no momento da habilitação. A Administração somente poderá cobrar uma declaração de disponibilidades, em que afirma que viabilizará no mo-mento adequado o insumo necessário. Entretanto, poderá ser cobrada a comprovação da posse ou contratação desses itens no momento da assina-tura do contrato, caso o edital assim defina, o que foi reiterado pelo Acórdão nº 5900/2010-2ª Câmara24 do TCU.

3.9 LICENÇAS AMbIENTAIS DE OPERAÇÃO

Com amparo no art. 22525 da CF, poderão ser cobradas no momento da assinatura do contrato, em que pese a previsão do IV do art. 30 da Lei nº 8.666/1993.

21 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2012& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=727&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

22 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2010& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=2939&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

23 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2011& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=2934&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

24 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?colegiado =SEGUNDA +CAMARA&anoAcordao=2010&numeroAcordao=5900&>. Acesso em: 1º ago. 2014

25 “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

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Além disso, devemos nos lembrar de que os problemas relaciona-dos à sustentabilidade ambiental nas contratações deverão ser levados em consideração, o que foi determinado com a entrada em vigor da Lei nº 12349/2010, em especial ao que se refere à determinação da nova reda-ção do art. 3º da Lei nº 8.666/1993, que segue transcrito:

Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucio-nal da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

Além disso, o TCU vem se decidindo reiteradamente e favoravelmen-te no sentido da possibilidade de cobrança de apresentação das licenças ambientais no momento da habilitação, uma vez que esse tipo de documen-to, na prática, pode demorar até 120 dias para a liberação no órgão com-petente, o que pode ser verificado nos Acórdãos nºs 2995/2013-Plenário26 e 1895/2010-Plenário27.

3.10 hAbILITAÇÃO TéCNICA EM CASOS DE INExIGIbILIDADE DE LICITAÇÃO

No caso de impossibilidade de competição, além da apresentação de documentos que comprovem a capacitação técnica e operacional, a si-tuação ou exclusividade deverá ser comprovada mediante declaração do fabricante e reconhecimento pela entidade de classe, o que foi reiterado pelo Acórdão nº 207/2011-Plenário28 do TCU.

3.11 DECLARAÇÃO DE COMPROMISSO DE fORNECIMENTO DO fAbRICANTE

Não é possível a exigência de declaração de compromisso de vincu-lação entre licitante e fabricante, uma vez que o compromisso de forneci-mento assumido é firmado pela licitante, passando a se responsabilizar pela execução do objeto, de acordo com o entendimento firmado pelo TCU por

26 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2013& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=2995&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

27 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2010& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=1895&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

28 Disponível em: < https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2011& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=207&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

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ocasião dos Acórdãos nºs 854/2013-Plenário29 e 1619/2012-Plenário30, por exemplo.

3.12 LICENÇAS SETORIAIS DE OPERAÇÃO

No desempenho de algumas atividades econômicas, as empresas de-vem ser fiscalizadas por alguma Entidade ou Agência Reguladora, como a Antaq, ANTT e Anvisa, por exemplo.

Dessa maneira, para operar, a licitante precisará de licenças ou regis-tros nesses órgãos. Cada licitante atuará no mercado com uma legislação própria.

Existe a possibilidade de cobrança desses documentos no momen-to da habilitação com base na previsão do inciso IV do art. 30 da Lei nº 8.666/1993. Todavia, se for pedida a apresentação somente no momento da assinatura do contrato, a atitude possibilita a ampliação da competitivi-dade do certame, incluindo empresas que estão em processo de obtenção das licenças.

3.13 CERTIfICAÇõES DE QUALIDADE

De acordo com o TCU, certificações de qualidade como ISO, PBQPH, PCMAT, CBPF e Selo ABIC somente poderão ser cobradas em licitações do tipo técnica e preço ou melhor técnica como critério de pontuação téc-nica. Em licitações do tipo menor preço, não poderão ser pedidas, o que podemos depreender da leitura dos Acórdãos nºs 670/2013-Plenário31 e 1305/2013-Plenário32 do TCU.

3.14 VISITAS TéCNICAS

A visita técnica possibilita a licitante ter contato mais aprofundado com o objeto da licitação, de forma a se obter pleno conhecimento sobre o mesmo. É possível ter, nesse momento, contato com o pessoal que vai fis-calizar o contrato. Entretanto, não é mais recomendável a obrigatoriedade imposta pela Administração Pública na realização da visita técnica. Ela deve

29 Disponível em: < https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2013& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=854&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

30 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?colegiado =PLENARIO &anoAcordao =2012&numeroAcordao=1619&>. Acesso em: 1º ago. 2014.

31 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2013& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=670&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

32 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2013& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=1305& >. Acesso em: 2 ago. 2014.

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permitir que a licitante realize ou decline da visita. Caso a licitante realize a visita, receberá nessa ocasião um atestado de visita, assinado por quem a conduziu. Se a licitante declinar, deverá apresentar uma declaração de dispensa de visita técnica, em que ela assumirá todo o ônus decorrente da sua decisão. Em ambos os casos, esses documentos serão utilizados na fase de habilitação.

A realização da visita técnica, via de regra, acontecerá da seguinte forma:

a) O órgão público marca uma data para a visita;

b) A licitante confirma a participação na visita, comparece e recebe um atestado de visita técnica; e

c) A licitante inclui na documentação de habilitação o atestado de visita técnica.

Ocorre que há uma corrente doutrinária dominante que entende que todas as informações necessárias à realização do objeto devem estar con-tidas no projeto básico/termo de referência. Aliado a isso, notamos que o TCU também vem se posicionando nesse sentido. Tendo em vista o apre-sentado, à primeira vista, a visita técnica não cumpriria a sua finalidade.

Não poderá ser disposto no edital que o responsável técnico da em-presa seja o único profissional da licitante a realizar a visita técnica, como por ocasião do Acórdão nº 326/2010-Plenário33 do TCU.

Ao longo dos tempos, essa visita técnica foi mal utilizada por alguns Administradores, tendo sido utilizada de forma a se restringir a competitivi-dade do certame.

Hoje, a Administração não deve exigir que a visita técnica seja re-alizada de forma obrigatória, a não ser que motive de maneira razoável no processo o porquê da necessidade. Entretanto, o edital deverá conter a opção de a licitante poder não realizar a visita, assumindo todo o ônus da sua escolha.

3.15 VINCULAÇÃO DE PESSOAL

Em complemento ao inciso I do § 1º do art. 30 da Lei nº 8.666/1993, entende-se por quadro permanente os profissionais que estão vinculados

33 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2010& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=326&>. Acesso em 2 ago. 2014.

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como sócios da empresa licitante, empregados ou prestadores serviço por meio de contrato, obedecida a legislação civil.

Todavia, já foi verificado no item 4.8 deste artigo que impor que a licitante já disponha, no momento da habilitação, de profissional vincu-lado a ela antes da realização do empreendimento impõe custo anterior à assinatura do contrato. O que verdadeiramente interessa à Administração é que os profissionais indicados estejam à disposição por ocasião do início da execução do contrato. Ademais, de acordo com o § 10 do art. 30 da Lei nº 8.666/1993, o profissional indicado poderá ser substituído, o que reforça o entendimento que a apresentação de profissional adequado é de respon-sabilidade da licitante.

Dessa maneira, a licitante deve ou pode, então, apresentar declaração firmada por profissional detentor de acervo técnico de que o mesmo firma o compromisso de se vincular caso ela seja a vencedora da licitação, o que se mostra adequado ao entendimento do TCU, como comprovado nos Acór-dãos nºs 326/2010-Plenário34, 393/2010-Plenário35 e 1982/2010-Plenário36.

CONCLUSÃO

Com tantas possibilidades, a combinação inadequada ou mal for-mulada dos critérios de qualificação técnica poderá acarretar na fuga de potenciais licitantes ocasionando perda de economicidade nas aquisições públicas.

Os órgãos elaboradores dos projetos básicos, termos de referência e de editais deverão direcionar os seus trabalhos no sentido de se exigir o mínimo possível em relação à qualificação comentada neste trabalho, de modo que o interesse público seja perfeitamente preservado.

As decisões que serão tomadas devem levar em consideração o caso concreto. Assim, o princípio da razoabilidade deverá sempre orientar os atos da Administração, de modo a se alcançar adequadamente um ponto de equilíbrio entre exigências e competitividade.

34 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2010& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=326&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

35 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2010& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=393&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

36 Disponível em: <https://contas.tcu.gov.br/juris/Web/Juris/ConsultarTextual2/Jurisprudencia.faces?anoAcordao =2010& colegiado= PLENARIO&numeroAcordao=1982&>. Acesso em: 2 ago. 2014.

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REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 2 ago. 2014.

______. Lei nº 8.666 de 21 de junho de 1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 3 jun. 2014.

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 16. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. 1277 p.

______. Curso de direito administrativo. 8. ed. rev. ampl. e atual. Belo Horizonte: Forum, 2012. 1314 p.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 39. ed. São Paulo: Malheiros, 2013. 925 p.

Parte Geral – Doutrina

O Direito de Reenquadramento Funcional e de Salário de Carreira Isonômico aos Anistiados da Lei nº 8�878/1994: o Equilíbrio Reflexivo de uma Obrigação de Solidariedade e Sociedade

DANIEL IVO ODONProcurador‑Geral da Conab, Professor de Direito Público e Direitos Humanos, Mestre em Di‑reito Constitucional.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Escorço legislativo da anistia; 2 Conteúdo obrigacional da anistia; 3 A anistia como retorno ao emprego; 4 A justiça que se revela por detrás da anistia; 5 Da pretensão de reen‑quadramento por meio da anistia; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

Durante o governo de Fernando Collor, o Executivo Federal adotou uma concepção minimalista de gestão da máquina administrativa, com o intuito de enxugá-la sob o epíteto de reforma administrativa. No curso des-vairado de sua política de reforma, implementou uma onda avassaladora de exonerações e demissões de servidores públicos e empregados de empresas estatais; todos imotivadamente afastados de suas ocupações funcionais e lançados à própria sorte da maneira mais arbitrária possível.

Somente após o processo de impeachment que tirou Fernando Collor da Presidência da República e alçou, ao seu lugar, Itamar Franco, é que se iniciou o processo de reconstituição dos atos errôneos praticados. Neste pacote, a Lei nº 8.878/1994, em seu art. 1º, concede anistia aos servido-res públicos civis federais, entre os quais os empregados permanentes de empresas públicas e sociedades de economia mista sob controle da União, que, no período compreendido entre 16 de março de 1990 e 30 de setem-bro de 1992, tenham sido exonerados, demitidos, despedidos ou dispensa-dos com violação de dispositivo constitucional, legal, regulamentar ou de cláusula constante de norma coletiva de trabalho, por motivação política devidamente caracterizada ou por interrupção de atividade profissional em decorrência de movimentação grevista.

Muito embora o acerto legislativo tenha ocorrido em 1994, sua real aplicação e eficácia começaram apenas em 2004, uma década depois. Nes-te ínterim, várias empresas públicas e sociedades de economia mistas foram

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extintas e muitos anistiados perderam sua referência patronal. A inércia da Administração Pública em realocar os trabalhadores anistiados a tempo e à hora, além da carência esmiuçada dos direitos atinentes a este grupo indivi-dual homogêneo, contribuiu imensamente para o agravamento da situação trabalhista que até os dias atuais abarrotam o Judiciário.

Malgrado o art. 2º da dita lei assegurar o retorno do anistiado ao ser-viço no cargo ou emprego anteriormente ocupado ou, quando for o caso, naquele resultante da respectiva transformação, a interpretação e aplicação diuturnamente dada pela Administração Pública indireta – mais especifica-mente as empresas públicas e sociedades de economia mistas, arts. 37, XIX, e 173 da Constituição Federal – tem sido a mais restritiva e diminuta possí-vel. Associado à retração no regresso desses trabalhadores, direitos básicos têm sido negados sob o escudo do art. 6º à vedação de efeitos financeiros em caráter retroativo.

Diante desse lastro, o presente trabalho adentra à juridicidade do ins-tituto da anistia vista por outra ótica, a obrigação moral e seus consectários constitucionais e celetistas. Pelos entendimentos jurisprudenciais de melhor retórica para os fins aqui propostos, elaborar-se-á uma fundamentação jurí-dica inclinada à plena realização e afirmação dos direitos dos anistiados que reingressam na Administração Pública por intermédio da Lei nº 8.878/1994, notadamente quanto aos direitos ao correto enquadramento de carreira e ao correspondente salário isonômico.

1 ESCORÇO LEGISLATIVO DA ANISTIA

Para abordar a anistia no mundo jurídico, deve-se inicialmente partir do seu breve retrospecto legislativo. A normatização sobre a anistia se deu por meio do Projeto de Lei nº 4.233/1993, do Deputado Federal Nilson Gibsom, que gerou a Medida Provisória nº 473, de 19.04.1994, posterior-mente convertida em lei sob o nº 8.874/1994. A dita norma encontra sua gênese no Diário do Congresso Nacional, Seção I, de 24.11.1993, páginas 25.410/25.411, que, por meio da Mensagem nº 688/1993, traz o texto inau-gural da lei e sua exposição de motivos, a mens legis.

Tanto na exposição de motivos original como na subsequente – Diá-rio do Congresso Nacional de 28.04.1994, página 1.677 –, mostra-se claro o intuito do legislador em consertar erro de gestão cometido no passado em nome do Estado brasileiro. A lei surge como remédio

aos servidores e empregados punidos com demissão arbitrária ou por moti-vação política, comprovadamente caracterizada, bem como os punidos por haverem participado de movimentos de greve no período compreendido en-

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tre os dias 16 de março de 1990 e 30 de setembro de 1992. (Diário do Con-gresso Nacional de 24.11.1993, p. 25.411)

Acrescenta ainda o legislador que, com guarida na Constituição Fede-ral de 1988 – ADCT, arts. 8º e 9º –, a presente anistia é “ato político formal pelo qual se considera a motivação dos atos cometidos em nome do Estado, apagando-se-lhes os efeitos”. Arremata dizendo que

esse é nosso entendimento com relação a considerável parte dos milhares de casos analisados pela mencionada Comissão Especial: foram prejudicados por uma decisão que suprimiu-lhes cargos e empregos. [...] Por ser inviável qualquer medida reparadora pela via administrativa, resta ao Poder Execu-tivo [...] encaminhar ao Legislativo a proposição objeto do presente projeto de lei.1

É para reparar a arbitrariedade das demissões que se propõe a anistia, como medida saneadora2.

Consoante vaticinado pelo Desembargador Vicente José Malheiros da Fonseca, o dano sofrido pelos empregados anistiados não se vincula direta-mente à reclamada, “mas sim ao Governo Federal que, à época, por ques-tões políticas, procedeu sua demissão de maneira arbitrária, passando por cima da própria Constituição Federal e da legislação infraconstitucional”3. O cenário fático-político no qual se insere a figura do trabalhador anistiado, por conseguinte, faz alusão a um erro histórico da Administração Pública Federal do Brasil. Nesta linha, a edição da Lei nº 8.878/1994 – e seus docu-mentos oficiais auxiliares – surge para honrar a memória dos que sofreram injustiças pelas mãos (ou em nome) da comunidade política, e reconhecer os efeitos em longo prazo da injustiça, com a correspondente reparação dos erros cometidos por aqueles que a infligiram.

2 CONTEÚDO OBRIGACIONAL DA ANISTIA

Como gesto público, a lei de anistia ajuda a cicatrizar as feridas do passado e a criar uma base para a reconciliação moral e política, contribuin-do ainda para o alívio dos efeitos da injustiça nas vítimas e seus familiares. Neste ponto, é incorreto pensarmos que não somos responsáveis pelos erros cometidos por nossos antecessores. O presente evento faz parte da narrati-va histórica da Administração Pública que agrega sim a deliberação moral e interpretação dos atos atualmente praticados. O aspecto teleológico da

1 Vide Diário do Congresso Nacional de 24.11.1993, p. 25.411.2 Vide Diário do Congresso Nacional de 28.04.1994, p. 1.677.3 TRT 8ª R., AP 0066500-33.2007.5.08.0009, DJe de 28.05.2013, p. 38.

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reflexão sobre os anistiados está ligado ao princípio constitucional da mora-lidade pública – art. 37 da CF – e ao processo histórico a que hoje fazemos parte.

Consoante ensina Michael Sandel, o presente caso refere-se a uma obrigação de solidariedade e sociedade, pois trata de responsabilidade es-pecial relativa à comunidade à qual pertencemos. Nossa comunidade pos-sui uma dívida moral com relação a esses empregados injustiçados que, por dever legal, necessita ser reparada4.

Nesta esteira, a Lei nº 8.878/1994 busca ao máximo reestabelecer a relação jurídica do empregado prejudicado, sem com isso gerar efeitos financeiros retroativos – por proibição expressa do art. 6º da Lei e OJT 56 da SBDI-1/TST. Contudo, a vedação do efeito financeiro retroativo tem servi-do de subterfúgio à negativa de muitos direitos trabalhistas básicos, não só de raiz celetista, mas também direitos que invocam a justiça intrínseca da anistia, a justiça de recompor as vidas daqueles atingidos pelo indelével erro histórico do Governo Federal brasileiro.

Assim, em homenagem à interpretação sistemática que torna coeren-te e coeso o ordenamento jurídico, o direito de anistia e seus consectários – oriundo do berço constitucional do ADCT, arts. 8º e 9º – e a vedação do efeito retroativo hão de coadunarem-se com o espírito – ratio essendi – da Lei nº 8.878/1994 para: (i) apagar os efeitos dos atos cometidos em nome do Estado por meio da lei, uma vez que a via administrativa é insuficiente para tal desiderato5; e (ii) reparar a arbitrariedade das demissões como medida saneadora6.

Destarte, o entendimento jurídico que deve prevalecer é aquele que harmoniza o texto da lei com sua finalidade precípua e nuclear. A justiça é a virtude primeira das instituições governamentais. Por esta razão, ao se perscrutar a justiça, o aplicador deve estabelecer um equilíbrio reflexivo, que nos permite modificar a caracterização de uma situação inicial ou refor-mular nossos juízos atuais, pois até os juízos que consideramos pontos fixos provisórios estão sujeitos à reformulação7.

Receber o trabalhador que retorna pela anistia sem curar da obri-gação de solidariedade e sociedade que se esconde por detrás desse ato é fazer desmoronar a justiça tão fortemente defendida pelo legislador origi-

4 SANDEL, Michael. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012. p. 274-294.

5 Diário do Congresso Nacional de 24.11.1993, p. 25.411.6 Diário do Congresso Nacional de 28.04.1994, p. 1.677.7 RAWLS, John. Uma teoria da justiça. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008. p. 4, 24-25.

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nário. No regresso desses trabalhadores, tem-se permitido a assunção de posição funcional tal qual aquela em que foi demitido, como se se houvesse congelado no tempo, posição esta sobejamente inferior a dos cotrabalhado-res contemporâneos, e até dos mais modernos, que não experimentaram o dissabor da despedida arbitrária.

Parece nítido desrespeito à igualdade material dos trabalhadores anis-tiados (art. 5º da CF) e menosprezo da memória da injustiça impingida e postergação de seus longos efeitos corrosivos, além da considerável depre-ciação salarial ilícita (art. 7º, VI, da CF). Todo esse assalto à dignidade do anistiado, por meio de interpretações advindas da própria lei que os consa-grou, a Lei nº 8.878/1994.

3 A ANISTIA COMO RETORNO AO EMPREGO

Diante da obrigação de solidariedade e sociedade e a necessidade impostergável da realização de um equilíbrio reflexivo que homenageie os direitos trabalhistas e a recuperação da dignidade dos anistiados, resta ao Governo Federal como um todo caracterizar seus ingressos como efetivo re-torno. Posicionamento prevalente em alguns TRT e algumas turmas do TST.

Como bem definido por Patrícia Dias Vieira, o retorno é

um instituto de natureza híbrida, já que se socorre de partes dos institutos da readmissão e da reintegração para formar o seu próprio conteúdo. Não se trata de readmissão pura porque esta encontraria vedação no art. 37, inciso II, da Constituição Federal de 1988, que exige submissão a concurso público para o ingresso no serviço público, sendo pacífico que o regresso dos anis-tiados aos seus cargos ou empregos públicos não exige nova aprovação em concurso público, tendo em vista a repristinação dos contratos de trabalho operada pela Lei nº 8.878, de 1994. Também não se trata de reintegração, posto que o art. 6º da aludida lei veda expressamente a concessão de efeitos financeiros retroativos aos seus beneficiários.8

A jurisprudência trabalhista, portanto, faz a distinção clara entre rein-tegração, readmissão e retorno. Na reintegração, o empregado retorna ao serviço como se a relação de emprego jamais houvesse sido descontinuada, enquanto que, na readmissão, o trabalhador é considerado novo admitido, não se considerando o tempo de afastamento como de efetivo serviço. Entre eles e ao mesmo tempo em comunhão com ambos os institutos, temos o

8 VIEIRA, Patrícia Dias. A anistia nas empresas públicas federais. Monografia, Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro, 2013, p. 46-47.

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retorno, comumente chamado pela jurisprudência trabalhista de “terceiro gênero”, vejamos:

[...] READMISSÃO OU REINTEGRAÇÃO – NÃO CARACTERIZAÇÃO – TER-CEIRO GÊNERO – Sobressai daí que o retorno dos trabalhadores aos seus empregos não pode ser tratado como readmissão nem como reintegração. Ambas são danosas e injustas. A readmissão implicaria o enquadramento dos trabalhadores na estaca zero; e a reintegração oneraria a empresa com o pagamento de todos os salários e direitos tanto do período anterior à rescisão como do período do afastamento, o que não é justo também. Nesse diapa-são, nenhum direito foi gerado durante o período em que o contrato perma-neceu adormecido (suspenso). Assim, dando funcionalidade aos termos da Lei de Anistia, reata-se o contrato com todos os aquestos a ele já incorpo-rados pela empresa até a rescisão, porém exime-se a empresa de quaisquer pagamentos retroativos.9

Trata o terceiro gênero, por conseguinte, de repristinação do contra-to de trabalho. Há jurisprudência que entende ser caso de reintegração, e outra boa parte, readmissão, mas é o retorno que melhor se coaduna com a obrigação de solidariedade e sociedade e equilíbrio reflexivo a que se faz alusão. É a figura do retorno que melhor compreende a interpretação siste-mática do ordenamento jurídico pátrio, uma vez que lhe dá comlatação sem com isso vulnerar ou carcomer valores outros orbitantes no mundo jurídico, como a igualdade material, a dignidade do trabalhador injustiçado e a irre-dutibilidade salarial.

4 A JUSTIÇA QUE SE REVELA POR DETRÁS DA ANISTIA

Ao adotar-se a premissa de retorno, balizada aqui pela ideia de re-pristinação do contrato de trabalho, a jurisprudência passa a definir quais direitos trabalhistas são preservados na repristinação do contrato de tra-balho e sua não colisão com a retroatividade financeira (art. 6º da Lei nº 8.878/1994). Neste particular, temos uma trilha desenhada:

ANISTIA – EFEITOS RETROATIVOS – Nos termos da Orientação Jurispru-dencial da SBDI-1 Transitória nº 56, do Colendo TST, é vedada a remunera-ção em caráter retroativo, mas inexiste vedação de contagem de tempo de afastamento para fins de aposentadoria, promoção, férias prêmio, adicionais, anuênios e licenças, bem como a inclusão do anistiado no Plano de Seguri-dade [...].10

9 TRT 22ª R., RO 531200900322008-PI, 00531-2009-003-22-00-8, Rel. Wellington Jim Boavista, 1ª T., DJT/PI, 28.05.2010.

10 TRT 3ª R., 00375-2009-025-03-00-6-RO, Relª Taisa Maria Macena de Lima, 10ª T., J. 13.09.2010.

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Logo, há precedente no sentido de ser perfeitamente aplicável a con-tagem do tempo de serviço para o retorno dos anistiados em sintonia com o art. 6º da Lei nº 8.878/1994 e OJT 56 da SBDI-1/TST. Ora, a jurisprudência mais ventilada, por consequência, seguramente afirma que a contagem de tempo de afastamento para fins de aposentadoria, promoção, anuênios e inclusão do anistiado em plano de seguridade não representa concessão de vantagem financeira com efeito retroativo, coexistindo tal entendimento com a diretriz legal restritiva da lei de anistia, sem com ela colidir.

No mesmo sentido, o Desembargador Jorge Berg de Mendonça, no acórdão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, Recur-so Ordinário nº 01300-2011-020-03-00-5, elucida com a seguinte precisão:

[...] CONTAGEM DO TEMPO DE AFASTAMENTO PARA FINS DIVERSOS – Conforme já assentado no tópico anterior, entende-se que a consequência natural da anistia foi o restabelecimento do contrato de trabalho nos moldes em que suspenso pela dispensa imotivada revista, sendo que esse vínculo com a Administração subsistiu intacto, não sendo devidos apenas os efeitos financeiros naquele interregno de afastamento. A discussão que remanesce, portanto, é sobre a extensão dos efeitos dessa suspensão contratual. Entendo que não assiste razão ao reclamado. Conforme já visto, o que o art. 6º da Lei nº 8.878/1994 veda são os efeitos financeiros retroativos ao período anterior ao retorno. No mesmo sentido, aliás, é também a OJ 56 da SBDI-I Transitória do c. TST: [...]. É evidente a intenção da Lei nº 8.878/1994 de reparar os atos ilegítimos perpetrados pela Administração, com as demissões e exonerações de que aqui se trata, restaurando as situações preexistentes e restituindo os empregos aos empregados atingidos. Parece-nos, portanto, que, conquanto a lei impeça os referidos efeitos financeiros, embasando-se até mesmo na inexistência de prestação de serviços durante o afastamento, o que é de ser feito é pleno retorno ao status quo ante daqueles atingidos. Essa restauração, portanto, implica a contagem do tempo de afastamento para os fins reconhe-cidos na r. sentença (aposentadoria, reposicionamento na carreira, obtenção e percepção do adicional por tempo de serviço e licença prêmio), com o registro em CTPS, sob pena de inconstitucional violação à igualdade de tra-tamento dada a todos os empregados públicos daquele mesmo órgão. A re-composição da remuneração da trabalhadora, a ser feita pela Administração após seu efetivo retorno ao serviço, com as promoções e demais vantagens concedidas aos empregados mantidos em atividade, nada tem a ver com a retroatividade de efeito financeiro vedada pela lei especial em comento, de forma que, assim, não há qualquer ofensa ao princípio da legalidade.11

11 TRT 3ª R., RO 0001300-45.2011.5.03.0020 (RO 01300-2011-020-03-00-5), Rel. Jorge Berg de Mendonça, 6ª T., Publ. 16.04.2012.

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A fundamentação anteriormente colacionada concatena com clareza solar a mens legis da norma (desde o Projeto de Lei nº 4.233/1993 até a edição da Lei nº 8.878/1994), a responsabilidade do governo de reparar os anistiados em memória às injustiças experimentadas (arts. 8º e 9º do ADCT), e a sua obrigação de solidariedade e sociedade por meio do equilíbrio refle-xivo, como norte de justiça a ser perseguido na interpretação e aplicação de qualquer lei brasileira, segundo mandamento do art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, Decreto-Lei nº 4.657/1942. Com sensatez, o eminente Desembargador também identifica como “evidente” – porque de fato o é – a intenção da Lei nº 8.878/1994 de reparar os atos ilegítimos perpetrados pela Administração, com as demissões e exonerações arbitrá-rias, restaurando as situações preexistentes e restituindo os empregos aos empregados atingidos.

Esta é a teleologia da lei; sua razão de ser; seu espírito; sua ratio essendi; e é ela que deve guiar o desempenho administrativo atrelado ao retorno dos anistiados. Neste diapasão, muito além do descumprimento das regras celetistas (nulidade da alteração contratual in mellius, arts. 8º e 468 da CLT) e do desalinhamento da racionalidade teleológica, o enquadra-mento do anistiado que regressa no mesmo ponto da carreira que ocupava quando vítima da arbitrariedade impede a efetiva reparação e saneamento do erro praticado em 1990, criando situação desigual e redutibilidade sa-larial considerável, em desprestígio aos mandamentos constitucionais dos arts. 5º e 7º, VI, da CF.

Vale lembrar, por oportuno, que o Direito brasileiro rege-se pela pre-missa normativa de que, na aplicação da lei, atender-se-á aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum – art. 5º da Lei de Intro-dução às Normas do Direito brasileiro, Decreto-Lei nº 4.657/1942. Como norte hermenêutico, cabe ao intérprete fazer bom uso da interpretação tele-ológica, que busca o genuíno sentido da norma, em sintonia com a interpre-tação sistemática, que insere o entendimento teleológico em um complexo normativo de forma que sua inserção coexista em harmonia com todo o resto. O exercício interpretativo moderno busca o verdadeiro significado sobre o texto normativo, seus vocábulos, frases ou sentenças, seu sentido imanente, para dele extrair sua eficácia transcendental, perquirindo-se o chamado “espírito do sistema”12.

Em suma, trata-se de devolver aos injustiçados pela história o seu sta-tus quo ante, implicando tal restauração na “contagem do tempo de afasta-

12 BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Trad. Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos. 10. ed. Brasília: UnB, 1999. p. 76.

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mento para os fins reconhecidos na r. sentença (aposentadoria, reposiciona-mento na carreira, obtenção e percepção do adicional por tempo de serviço e licença prêmio), com o registro em CTPS”. Ademais, devidamente enal-tecido que o desacatamento dessa restauração mínima configura flagran-te inconstitucionalidade, não só pela “violação à igualdade de tratamento dada a todos os empregados públicos daquele mesmo órgão” (art. 5º da CF), mas também em detrimento dos arts. 8º e 9º do ADCT e art. 7º, VI, da CF, por configurar a negativa de direitos em redutibilidade ilícita do salário do empregado-anistiado. A recomposição da remuneração dos anistiados

após seu efetivo retorno ao serviço, com as promoções e demais vantagens concedidas aos empregados mantidos em atividade, nada tem a ver com a retroatividade de efeito financeiro vedada pela lei especial em comento, de forma que, assim, não há qualquer ofensa ao princípio da legalidade.13

Muitas vezes o legislador emite um comando normativo genérico ao empregador e administrador público que lhe permite gerir a máquina admi-nistrativa conforme seu poder de gestão, dando-lhe campo para o exercício da discricionariedade e liberdade patronal (art. 2º da CLT). Isto não é falha legislativa, pois, conforme, leciona Di Pietro,

[...] o regramento não atinge todos os aspectos da atuação administrativa; a lei deixa certa margem de liberdade de decisão diante do caso concreto, de tal modo que a autoridade poderá optar por uma dentre várias soluções pos-síveis, todas válidas perante o direito. Nesses casos, o poder é discricionário, porque a adoção de uma ou outra solução é feita segundo critérios de opor-tunidade, conveniência, justiça, equidade, próprios da autoridade, porque não definidos pelo legislador.14

Associado ao campo discricionário intencionalmente deixado pelo legislador, acrescentamos entendimento já esposado pelo Ministro Carlos Velloso, do Supremo Tribunal Federal, para quem, no manejo de regras, não se deve privilegiar a interpretação literal do dispositivo, mas sim a teleoló-gica. Perlustrou o escólio de que interpretação literal não é interpretação, mas simples leitura do texto a ser interpretado. “Esta (a interpretação) exige, primeiro que tudo, que se busque a ratio do texto interpretado, a fim de que seja realizada a sua finalidade”15.

13 TRT 3ª R., RO 0001300-45.2011.5.03.0020 (RO 01300-2011-020-03-00-5), Rel. Jorge Berg de Mendonça, 6ª T., Publ. 16.04.2012.

14 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 205.15 Inq. 1769/DF, Informativo nº 375 do STF.

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Com isso, não há como concordar que o entendimento do art. 2º da Lei nº 8.878/1994 (“o retorno ao serviço dar-se-á, exclusivamente, no cargo ou emprego anteriormente ocupado”) traduz-se na recolocação do empre-gado no mesmo ponto da carreira que estava quando demitido. Este méto-do interpretativo é unicamente literal, jamais teleológico, criando sim uma esfera de descompasso com a teleologia da lei (CLT e Lei nº 8.878/1994) e, também, da Constituição Federal (arts. 5º, 7º, VI, 37, e arts. 8º e 9º do ADCT).

Segundo afirmado em linhas anteriores, a teleologia da lei de anistia se instala em sua ratio essendi, que nada mais é do que a razão da norma, o porquê do seu texto16. O escorreito, portanto, é esquadrinhar uma inter-pretação compreensiva do texto, observando sua razão e finalidade, tal qual realizado diligentemente pelo Desembargador Jorge Berg de Mendonça17. Equivocam-se aqueles que pensam ser essa responsabilidade de acomodar com justiça os anistiados pertencentes aos gestores do passado. A respon-sabilidade sobre a reparação moral dos anistiados é de responsabilidade coletiva e histórica, sendo a reconciliação moral e política desse evento dever da presente e futuras gerações; trata-se de autêntica obrigação de so-lidariedade e sociedade18.

O argumento de que a Lei nº 8.878/1994 orienta retornar o anistiado ao mesmo cargo ou emprego anteriormente ocupado lhe franqueia o direito de retornar ao quadro de carreira vigente, não implicando o congelamento de sua posição neste quadro. Pensar assim é tornar inócuo o saneamento da injustiça por via legislativa, tanto preconizado pela mens legis. Outros-sim, não prospera o entendimento literal de que a reposição do anistiado em ponto do quadro de carreira, condigno com a atitude reparatória do Governo Federal, acarretaria retroatividade de efeitos financeiros (art. 6º). O argumento da inexistência de prestação de serviços durante o tempo de afastamento não tem o condão de sobrepujar a ratio essendi da norma.

Segundo majestosa lição de Tércio Ferraz Júnior, no processo norma-tivo há a produção da norma e a sua aplicação. São duas atitudes diferen-tes, porque, ainda que seja importante a relação entre essas duas funções, a primeira surge da técnica legislativa, dentro do processo legislativo (vide escorço narrativo anterior); a segunda etapa é a da aplicação da norma pelo jurista. Este estará diante do dilema ontológico: ser receptor passivo ou,

16 Vide Diário do Congresso Nacional, Seção I, de 24.11.1993, p. 25.410/25.411, e de 28.04.1994, p. 1.677.

17 TRT 3ª R., RO 0001300-45.2011.5.03.0020 (RO 01300-2011-020-03-00-5), 6ª T., Publ. 16.04.2012.18 SANDEL, Michael. Op. cit., p. 261-262.

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então, integrante da elaboração do direito? O art. 5º da Lei de Introdução (Decreto-Lei nº 4.657/1942) não abandona o aplicador da norma, mas o ampara em colaboração na aplicação do direito integrativo, porque se so-correrá dos fins sociais da lei e das exigências do bem comum19.

Desta feita, o reingresso de trabalhadores ao mesmo ponto da carreira que ocupavam quando arbitrariamente demitido, escudando-se no art. 2º da Lei nº 8.878/1994, é agir como passivo receptor da norma, desprestigian-do seu conteúdo de justiça e reparação, fulminando a elaboração do direito de anistia em si. De igual modo, a ilação de que viola o art. 6º (e OJT 56 da SBDI-1/TST) o enquadramento do anistiado ao cenário funcional ideal ao qual teria direito, sob o falso pretexto de com isso dar-lhe vantagem finan-ceira retroativa é, sem dúvidas, equivalentemente errôneo.

O período de afastamento do anistiado deve ser considerado para a concessão de promoção e demais vantagens com efeitos financeiros a partir do efetivo retorno do empregado à atividade, de modo que não se vis-lumbra quaisquer efeitos financeiros de caráter retroativo vedados pela Lei nº 8.878/1994, tampouco violação ao princípio da legalidade. Reforça-se:

LEI Nº 8.878/94 – EFEITOS – ANISTIA CONSISTENTE NA REATIVAÇÃO DOS CONTRATOS DE TRABALHO RESCINDIDOS DURANTE O GOVER-NO COLLOR – O retorno dos empregados deve acontecer respeitando o patrimônio jurídico da época do desligamento, sem prejuízo dos benefícios concedidos à categoria de forma geral e impessoal no período de afasta-mento, em razão do princípio da isonomia, porém, com efeitos financeiros somente a partir do efetivo retorno ao trabalho. É que a anistia conferida pelo Estado não pode servir de perpetuação da injustiça anteriormente cometida, devendo este hiato temporal entre a dispensa e o retorno ser levado em conta para todos os benefícios incorporados pelos demais funcionários, sob pena de violação ao princípio da restituto in integrum.20

A lei de anistia foi editada para corrigir atos ilegítimos praticados pela Administração Pública com demissões e exonerações arbitrárias, devendo, portanto, os vitimados pelo erro do Estado retornarem ao status quo ante. Isto significa o restabelecimento do contrato de trabalho com a garantia de todos os direitos e prerrogativas que o embasavam até sua suspensão por culpa exclusiva da Administração (empregador), razão pela qual o período de afastamento do anistiado deve ser considerado para a verificação da sua

19 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Direito, retórica e comunicação. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 68.20 TRT 3ª R., RO 0001008-69.2011.5.03.0114 (RO 01008-2011-114-03-00-9), Rel. Marcelo Lamego

Pertence, 7ª T., DEJT 26.04.2012.

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situação funcional como se o afastamento nunca houvesse ocorrido21. Este é, a propósito, o desiderato e diretiva da Orientação Normativa nº 04, de 09.07.2008, da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planeja-mento, Orçamento e Gestão, que estabelece os procedimentos da Admi-nistração Pública Federal relativos ao retorno ao serviço dos servidores e empregados beneficiados pela anistia: “Art. 12. O retorno ao serviço não implica em novo contrato de trabalho com o servidor ou empregado, deven-do a unidade de recursos humanos providenciar o devido registro na Car-teira de Trabalho, ou quando for o caso, nos assentamentos funcionais”22.

Este entendimento, por conseguinte, além de diretiva específica no âmbito da Administração Pública Federal, encontra ecorressonância no Texto Constitucional (arts. 5º, 7º, VI, 37, e arts. 8º e 9º do ADCT) e infra-constitucional (art. 471 da CLT). É bem verdade que a maioria das Tur-mas do Tribunal Superior do Trabalho interpretam que a consideração do tempo de serviço para a concessão de benefícios criados pela empresa du-rante o perío do de afastamento dos anistiados transgride o art. 6º da Lei nº 8.878/1994 e a OJT 56, por implicar em efeitos financeiros retroativos. Todavia, o movimento da mudança de valoração já tomou marcha.

Sobre a Orientação Normativa nº 04/2008 da SRH/MP, o Desem-bargador Jorge Berg de Mendonça reitera sua incisiva aplicação em con-sonância com o entendimento vanguardista de que “é inequívoca, pois, a intenção de restabelecimento do contrato de trabalho, o que, obviamente, só pode ser feito com preservação de todos os direitos e prerrogativas que o embasavam, até ser suspenso por culpa exclusiva do réu”23. Ademais, acres-ce ao seu ventilado entendimento o ditame do art. 471 da CLT, que, por sua vez, garante ao empregado, no seu retorno, todas as vantagens que, em sua ausência, tenham sido atribuídas à categoria a que pertencia na empresa.

Compreende responsabilidade da Administração Pública, na qualida-de de empregador, recompor os direitos violados dos anistiados. Como bem elucidou o mencionado desembargador, há de se considerar o período do afastamento para “a verificação do que seria o status funcional da autora no seu encerramento, como se o afastamento não houvesse existido”24. Sem, é claro, ter o empregador a obrigação de pagar os salários referentes ao perí-odo de afastamento, pois este sim seria o efeito financeiro retroativo vedado

21 VIEIRA, Patrícia Dias. Op. cit., p. 51.22 Diário Oficial da União, Seção 1, de 10.07.2008.23 TRT 3ª R., RO 0001300-45.2011.5.03.0020 (RO 01300-2011-020-03-00-5), Rel. Jorge Berg de

Mendonça, 6ª T., Publ. 16.04.2012.24 TRT 3ª R., RO 0001300-45.2011.5.03.0020 (RO 01300-2011-020-03-00-5), Rel. Jorge Berg de

Mendonça, 6ª T., Publ. 16.04.2012.

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pela lei, além de que configuraria o retorno do anistiado em reintegração trabalhista – não é este o intento da lei.

As 2ª e 6ª Turmas do TST, nas quais se mitigou a interpretação dada ao art. 6º da lei, passaram a entender que o empregado anistiado tem seu contrato de trabalho repristinado, o que lhe garante, por isonomia, a con-cessão das vantagens auferidas pela coletividade dos empregados. Ademais, essa nova exegese não contraria o disposto no art. 6º da Lei nº 8.878/1994, tampouco o preceito da OJT 56 da SBDI-1/TST. Confira-se a ementa do acórdão da 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho que julgou o Re-curso de Revista nº 4064-17.2010.5.06.0000, dando ao art. 6º da Lei nº 8.878/1994 interpretação adequada à sua finalidade – sua ratio essendi – que é a reparação de uma injustiça:

ANISTIA – LEI Nº 8.878/1994 – [...] APLICABILIDADE DO ART. 471 DA CLT, SEM CONTRARIEDADE À ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL TRAN-SITÓRIA Nº 56 DA SBDI-1 DO TST – [...]. 2. No caso, o Ministério Públi-co do Trabalho da 10ª Região ingressou com ação civil coletiva em defesa dos interesses e direitos individuais homogêneos e indisponíveis dos em-pregados anistiados da Conab que a ela foram readmitidos por força da Lei nº 8.878/1994, noticiando que eles foram readmitidos ao serviço nos mes-mos cargos e funções que antes ocupavam sem, no entanto, que lhes hou-vessem sido assegurados os cinco níveis de reenquadramento salarial que a reclamada incontroversamente concedeu a todos os seus empregados em atividade no decorrer do período de seu afastamento, sob o rótulo de pro-moções por merecimento, mas de forma linear e com dispensa da avaliação individual de desempenho, postulando a concessão a eles, a partir de suas respectivas datas de retorno ao serviço, das diferenças salariais e suas reper-cussões nas demais verbas trabalhistas decorrentes daquela recomposição salarial. 3. As instâncias ordinárias julgaram improcedente o referido pedido inicial, por o considerarem incompatível com o art. 6º da referida Lei de Anistia e com a Orientação Jurisprudencial Transitória nº 56 da SBDI-1 desta Corte, que dispõem que “os efeitos financeiros da anistia concedida pela Lei nº 8.878/1994 somente serão devidos a partir do efetivo retorno à atividade, vedada a remuneração em caráter retroativo”. Não atentaram, porém, para a circunstância peculiar, claramente registrada no acórdão regional, de que o Ministério Público do Trabalho em nenhum momento pretendeu que os empregados anistiados da Conab recebessem salários e demais vantagens relativos ao período em que estiveram afastados do serviço, e sim, tão so-mente, que fossem eles readmitidos exatamente nos mesmos níveis salariais assegurados, a título de promoções por merecimento, mas de forma linear e sem nenhuma avaliação de desempenho, a todos os seus colegas de traba-lho ocupantes dos mesmos cargos e funções e que continuaram em serviço, sendo postulado o pagamento das consequentes diferenças salariais e suas

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repercussões apenas a partir das datas de seus respectivos retornos ao servi-ço. 4. Anistia significa perdão e esquecimento: por isso mesmo, e como é ab-solutamente consensual na doutrina mais autorizada de Pontes de Miranda, Carlos Maximiliano e Heleno Cláudio Fragoso, a interpretação das leis de anistia não pode ser restritiva, devendo ser, ao contrário, a mais ampla e generosa possível em favor dos anistiados, sob pena de não se lhes dar a devida eficácia, especialmente em face dos motivos que terão ensejado sua edição. 5. A readmissão dos empregados anistiados em cinco níveis salariais abaixo daqueles em que se encontram enquadrados os demais empregados da reclamada que atuam nos mesmos cargos e funções não se afigura justi-ficada, nem razoável, causando inexplicável distorção nos próprios quadros funcionais da empresa pública reclamada. Como se sabe, é exatamente a fal-ta de razoabilidade de uma distinção entre dois sujeitos o que caracteriza a existência de uma situação anti-isonômica ou discriminatória. 6. Por fim, não se pode ignorar que, quando o art. 6º da Lei nº 8.878/1994 estabeleceu que a anistia aos empregados por ela beneficiados só gerará efeitos financeiros a partir do efetivo retorno à atividade e vedou sua remuneração em caráter re-troativo, assegurando-lhes, desse modo, seu direito apenas à sua readmissão ao serviço (e não sua reintegração), não deixou de lhes assegurar a repristi-nação do mesmo contrato de trabalho original que cada um deles mantinha com os entes públicos federais (tanto que é absolutamente pacífico que seu retorno ao serviço não exige sua nova aprovação em concurso público). Se assim é, o período de seu afastamento do serviço (ou seja, o período depois de sua dispensa e antes de seu retorno ao trabalho) deve, necessariamente, ser considerado, do ponto de vista jurídico, um período de genuína suspen-são do único contrato de trabalho mantido pelas partes (em que, como se sabe, não há, por parte do empregado, a obrigação de prestar serviços, mas também, em contrapartida e como regra geral, não há obrigação, por parte do empregador, de lhe pagar salários). Isso, por sua vez, exige que se observe o disposto no art. 471 da CLT, que, na qualidade de regra geral aplicável a todos os casos de suspensão e de interrupção do contrato de trabalho e que foi editada exatamente com a finalidade de dar aplicação prática ao princí-pio da isonomia nessas situações, dispõe que “ao empregado, afastado do emprego, são asseguradas, por ocasião de sua volta, todas as vantagens que, em sua ausência, tenham sido atribuídas à categoria a que pertencia na em-presa [...]”. 7. Na hipótese, portanto, não há nenhuma incompatibilidade da pretensão inicial em tela com a Lei da Anistia e a Orientação Jurisprudencial Transitória nº 56 da SBDI-1 desta Corte, sendo perfeitamente possível, após o conhecimento do recurso de revista por divergência jurisprudencial, conde-nar a reclamada a proceder ao enquadramento funcional e salarial de todos os empregados anistiados que a ela retornaram ao serviço, nos termos da Lei nº 8.878/1994, considerando aqueles cinco níveis de progressão funcional concedidos sob o rótulo de promoção por merecimento, nos termos e para os efeitos do art. 471 da CLT, bem como a pagar-lhes as diferenças salariais em

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razão dessas promoções ocorridas, nos termos em que foram concedidas aos seus demais empregados em atividade e somente a partir da data do efetivo retorno de cada anistiado ao emprego, com reflexos desses valores sobre as demais vantagens trabalhistas decorrentes de lei e de normas coletivas de trabalho, parcelas vencidas e vincendas, tudo como se apurar em liquidação. Recurso de revista conhecido e provido.25

O Ministério Público do Trabalho rapidamente identificou a grosseira violação aos direitos fundamentais dos anistiados quando readmitidos nos mesmos cargos e funções que antes ocupavam sem contar – neste aresto específico – com a progressão e consequente reenquadramento salarial. De imediato, o TST refutou o argumento primeiro de que a concessão dessa van-tagem representaria incompatibilidade com o art. 6º da Lei nº 8.878/1994 e OJT 56 da SBDI-1/TST.

Nesta oportunidade, o TST fortaleceu o caráter reparatório da anistia e sua ratio essendi de corrigir injustiças do passado. A partir dessa com-preensão nuclear, a Corte emite norte interpretativo de vital relevância, “a interpretação da lei de anistia não pode ser restritiva, devendo ser, ao con-trário, a mais ampla e generosa possível em favor dos anistiados, sob pena de não se lhes dar a devida eficácia, especialmente em face dos motivos que terão ensejado sua edição”. Esta, sim, é uma perfeita compreensão da obrigação de solidariedade e sociedade que remanesce diminuta e carente de exploração desde o advento da norma.

Como bem apontado pelo TST, “é exatamente a falta de razoabili-dade de uma distinção entre dois sujeitos o que caracteriza a existência de uma situação anti-isonômica ou discriminatória”. Logo, é visivelmente estranho anistiados ocuparem cargos de carreira inferiores a empregados que lhes foram contemporâneos ou até mesmo mais modernos na Adminis-tração Pública, tudo isso por reflexo de uma recepção passiva e aplicação literal do art. 2º da Lei nº 8.878/1994. Não há dúvida de que reside neste panorama uma “situação anti-isonômica ou discriminatória”, atentatória ao art. 5º da Constituição Federal e seu consectário lógico, o art. 471 da CLT. Esse malsinado quadro encontra-se muito distante do saneamento e repara-ção das injustiças sofridas por estes trabalhadores.

O art. 6º da Lei nº 8.878/1994, a propósito, jamais “deixou de lhes assegurar a repristinação do mesmo contrato de trabalho original que cada um deles mantinha com os entes públicos federais”. Logo, resta apenas uma

25 TST, RR 5064-41.2010.5.10.0000, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, 2ª T., DEJT 02.12.2011, J. 26.10.2011.

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única teleologia a ser aplicada: o período de seu afastamento do serviço (ou seja, o período depois de sua dispensa e antes de seu retorno ao trabalho), deve, necessariamente, ser considerado, do ponto de vista jurídico, um pe-ríodo de genuína suspensão do único contrato de trabalho mantido pelas partes. Isso, por sua vez, exige que se observe o disposto no art. 471 da CLT, que, na qualidade de regra geral aplicável a todos os casos de suspensão e de interrupção do contrato de trabalho, foi editada exatamente com a fina-lidade de dar aplicação prática ao princípio da isonomia.

Na mesma senda, segue a 6ª Turma do TST que, imbuída do mesmo espírito e baseada no mesmo raciocínio e método teleológico, expandiu a aplicação da lei de anistia para a concessão dos níveis salarial de antigui-dade que, diferentemente da promoção por merecimento (art. 461, § 2º, da CLT), “detém requisitos de implementação essencialmente objetivos”, pois depende unicamente do decurso do tempo26. Vejamos o seguinte aresto:

CONCESSÃO AO EMPREGADO ANISTIADO DAS PROMOÇÕES POR AN-TIGUIDADE, CONCEDIDAS, NO PERÍODO EM QUE ESTEVE ALIJADO DO EMPREGO, A TODOS OS EMPREGADOS ATIVOS, COM CARÁTER NÍTIDO DE RECOMPOSIÇÃO SALARIAL, TENDO EFEITOS FINANCEIROS A PARTIR DO SEU RETORNO AO SERVIÇO – INTERPRETAÇÃO DA LEI CONCESSI-VA DA ANISTIA – APLICAÇÃO DO ART. 471 DA CLT E DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA – 1. Trata-se de empregado público beneficiado pela Lei de Anistia Itamar (Lei nº 8.878/1994), a qual se deve dar a interpretação mais ampla possível, em consonância com seu espírito e razão, a fim de lhe em-prestar a devida eficácia – promover o retorno dos anistiados ao serviço, em situação equivalente a de seus colegas contemporâneos que permaneceram na ativa, estendendo-lhes os benefícios que foram concedidos de forma li-near a todos os seus pares, enquanto alijados do emprego, naquilo que não conflitar diretamente com a letra da lei, de forma a evitar situação discrimina-tória e anti-isonômica. 2. A Lei nº 8.878/1994, no art. 2º, assegurou o retorno do empregado anistiado ao serviço no cargo anteriormente ocupado e fixou, no art. 6º, a geração de efeitos financeiros a partir do seu efetivo retorno, vedando a remuneração em caráter retroativo. [...] No entanto, não atentou para o fato de que o autor não busca o pagamento de parcelas referentes ao período de seu afastamento; mas, sim e tão somente, o reconhecimento do direito a um nível funcional, com a finalidade de corrigir o seu reenquadra-mento (recomposição salarial em igualdade com os seus colegas contempo-râneos), e consequentes efeitos financeiros a partir de seu retorno à atividade. [...]. Contudo, a readmissão do autor em 1 (um) nível funcional a menos em relação aos seus colegas contemporâneos (exercendo igual cargo e desempe-nhando hodiernamente a mesma função destes últimos) implica percepção

26 Voto do Ministro Vieira de Mello Filho, do TST, no RR 122-74.2012.5.10.0103.

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remuneratória inferior a de seus pares para o exercício de iguais funções, ca-racterizando, assim, uma situação discriminatória e vulneração do princípio da isonomia (art. 5º, caput, da CF). Daí por que se mostra recomendada a recomposição salarial, por medida de justiça e de razoabilidade que se deve emprestar à situação. 5. Há também aplicação do art. 471 da CLT, com base no que dispõe o art. 6º da Lei nº 8.878/1994, o qual assegurou a repristinação do contrato de trabalho original do autor com a Conab; [...] Nesse diapasão, há de se reconhecer, necessariamente, que houve suspensão do contrato de trabalho e seus efeitos, estes limitados à data do retorno do empregado anistiado, conforme previsão em citados dispositivos. 6. Conclui-se que não há incompatibilidade entre o pedido do autor, o art. 6º da Lei nº 8.878/1994, e a OJT 56 da SBDI-1 do TST, eis que o autor não postula verba retroativa, mas apenas o seu correto reenquadramento, e pagamento dos consectários legais a partir da data do seu efetivo retorno à atividade. Recurso de revista conhecido e provido.27

Diante do fundamentado até agora, depreende-se com facilidade o tratamento discriminatório inconstitucional sofrido pelos anistiados que re-gressam à Administração Pública, habitual e erroneamente enquadrado a menor no quadro de carreira. Como visto, esta medida passiva, literal e reducionista contrapõe-se ao mandamento do art. 5º da CF, arts. 8º e 9º do ADCT e art. 471 da CLT, sem falar na consequente alteração ilícita e preju-dicial do contrato de trabalho (art. 468 da CLT), indissociável da redutibili-dade ilícita do salário do obreiro (art. 7º, VI, da CF).

A interpretação dada pela 2ª e 6ª Turmas do TST à Lei nº 8.878/1994 decorre da compreensão de que o período de afastamento do empregado anistiado deve ser considerado como suspensão do respectivo contrato de trabalho, sendo-lhe aplicável, em observância ao princípio da isonomia, o previsto no art. 471 da CLT (“ao empregado, afastado do emprego, são asseguradas, por ocasião de sua volta, todas as vantagens que, em sua au-sência, tenham sido atribuídas à categoria a que pertencia na empresa”). Assim, revolve-se as lúcidas recomendações exaradas pelo Desembargador Jorge Berg de Mendonça: devolver aos injustiçados pela história o seu status quo ante, implicando tal restauração na contagem do tempo de afastamento para aposentadoria, reposicionamento na carreira, obtenção e percepção do adicional por tempo de serviço e licença-prêmio, com o registro em CTPS.

27 RR 4064-17.2010.5.06.0000, Rel. Min. Augusto César Leite de Carvalho, 6ª T., DEJT 24.02.2012, J. 15.02.2012.

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5 DA PRETENSÃO DE REENQUADRAMENTO POR MEIO DA ANISTIA

Sob a égide do Código Civil, art. 189, a pretensão de se corrigir um direito violado extingue-se pela prescrição. Até para a aplicação do instituto da prescrição sobre a violação de direitos dos anistiados deve o operador do Direito ser cauteloso.

Conforme anteriormente explanado, malgrado o nascedouro do di-reito de anistia datar de 1994, somente nas mais recentes manifestações e posicionamentos dos tribunais tem se empreendido o correto e justo en-tendimento e aplicação da anistia. Faz parte do processo dinâmico-social de mudança de valoração. A sociedade como um todo vai ganhando mais maturidade no processo civilizatório para adoção de determinadas deci-sões que alcançam a coletividade, apurando os sentidos e implementando a justiça.

Passados vinte anos do ímpeto legislativo de se reparar um erro his-tórico do Governo brasileiro, os anistiados vêm ganhando na Justiça do Trabalho o digno direito de reenquadramento condigno com a igualdade material e correlato salário de carreira (arts. 5º e 7º, IV, da CF, e 471 da CLT). Igual movimento vem se replicando dentro do Executivo, como faz prova a Orientação Normativa nº 04/2008 da SRH/MP.

De antemão, portanto, há de se afastar o entendimento nocivo que o lapso temporal poderá incutir naqueles operadores desavisados, no tocan-te ao direito de reenquadramento dos anistiados. Cuida-se da alegação de prescrição, elemento impeditivo ao direito de reenquadramento dos anis-tiados. O primeiro impulso equivocadamente leva o operador do direito a aplicar o disposto na Súmula nº 275, inciso II, do TST, para quem, “em se tratando de pedido de reenquadramento, a prescrição é total, contada da data do enquadramento do empregado”.

O entendimento sumular é escorreito e de plena aplicação cotidiana. Todavia, o operador do direito mais avisado, antes de lançar seu irrefutável veredicto, deve vasculhar os demais dispositivos que coexistem e orbitam no mesmo manancial jurídico, extraindo dessa atividade hermenêutica a interpretação sistemática que melhor atenda à missão terapêutica de eli-minar os conflitos aparentes de normas, tornando o ordenamento jurídico coerente28.

Destarte, ao analisar com maior acuidade o erro de enquadramen-to desses anistiados, verifica-se não estar prescrito o direito ao reenqua-

28 BOBBIO, Norberto. Op. cit.

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dramento cônsono com a justiça narrativa, igualdade material e salário de carreira condigno. Resta caracterizado no ato de enquadramento a menor e inafastável lesão de direito material de caráter sucessivo. O equívoco no reenquadramento funcional dos anistiados no exato ponto da carreira em que estava quando arbitrariamente demitido constitui violação flagrante do contrato de trabalho repristinado, denotando alteração contratual unilateral ilícita – art. 468 da CLT. A reboque, o enquadramento a menor reflete nítida redução salarial, violando igualmente o preceito constitucional da irreduti-bilidade salarial – art. 7º, VI, da CF.

O enquadramento a menor traduz-se em inconteste lesão de trato sucessivo, renovando-se mês a mês. Aqui, a propósito, não se aplica a pres-crição total vicejada na Súmula nº 275, II/TST, mas sim a regra da Súmula nº 294/TST, por adentrar o presente cenário ao direito excepcional lá des-tacado:

PRESCRIÇÃO – ALTERAÇÃO CONTRATUAL – TRABALHADOR URBANO (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003 – Tratando-se de ação que envolva pedido de prestações sucessivas decorrentes de alteração do pactuado, a prescrição é total, exceto quando o direito à parcela esteja tam-bém assegurado por preceito de lei. (Súmula nº 294 do TST)

Ora, o enquadramento a menor configura inequívoca lesão ao con-trato de trabalho do anistiado porque lhe causa prejuízo econômico eviden-te, diminuindo seu salário de carreira em afronta à garantia constitucional da irredutibilidade salarial e princípio da inalterabilidade contratual lesiva (art. 7º, VI, da CF, e art. 468 da CLT), além do tratamento anti-isonômico e discriminatório (art. 5º da CF). Esse enquadramento a menor, em última instância, transgride o próprio retorno a que faz menção o art. 2º da Lei nº 8.878/1994. Neste sentido, conforme pacificado na jurisprudência tra-balhista, a prescrição aplicável é a parcial, pois o direito está garantido por preceito da Constituição Federal (arts. 5º, 7º, VI, da CF, e arts. 8º e 9º do ADCT) e lei (art. 2º da Lei nº 8.878/1994), renovando-se mês a mês29.

A incidência da Súmula nº 275, II/TST, aqui, cede espaço por confi-gurar o presente caso de reenquadramento de retorno de anistiado em fla-grante desigualdade e redutibilidade salarial ilícita (arts. 5º e 7º, VI, da CF, e arts. 468 e 471 da CLT) e por residir o comando do reequadramento em lei e não em regulamento empresarial. Esta distinção é crucial para a vitalidade do direito dos anistiados.

29 TST, Processo RR-199-68.2011.5,02.0062, Rel. Min. Maurício Godinho Delgado, 3ª T., J. 18.12.2013.

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A prescrição total no reenquadramento da Súmula nº 275, II/TST, se dá quando o evento reenquadrante encontra-se no âmbito das normas em-presariais, isto é, em nível infralegal. Ao contrário, se o comando de reen-quadramento parte da lei, a aplicação sumular direta é a 294/TST. Logo, os anistiados têm sim direito ao seu correto reenquadramento, inobstante o largo transcurso de tempo, ficando prescrito apenas o período que extravasa os cinco anos pretéritos à pretensão.

Diante de um ordenamento jurídico complexo e plurinormativo como o brasileiro, essa esquadrinhadura normativa é indeclinável para a busca da coerência entre os dispositivos vigentes. Com isso, aproximam-se os dis-positivos aparentemente conflitantes da compatibilidade recíproca ou da complementariedade entre si, eliminando, por vez, as contrariedades e in-compatibilidades que maculam o sistema. Afinal, as normas que constituem um ordenamento não se isolam, mas se tornam parte de um sistema que forma um bloco sistemático e coerente, razão pela qual as súmulas citadas não conflitam entre si, quanto à regra da prescrição, mas se complementam nos termos retrorrelatados.

Importa, ainda, trazer a lume o apontamento feito por Patrícia Dias Vieira, para quem as decisões do TST guardam compatibilidade com en-tendimento de alguns TRT no sentido de que o período de afastamento dos empregados alcançados pela anistia configura hipótese de suspensão do contrato de trabalho, aplicando-se a regra geral prevista no art. 471 da CLT. No entanto, as decisões da Corte Trabalhista dissentem dos tribunais regio-nais quanto à extensão dos efeitos da suspensão do contrato de trabalho dos anistiados. Enquanto este defende a concessão aos anistiados de quaisquer vantagens, inclusive, as de caráter pessoal (a exemplo das promoções por mérito, adicional por tempo de serviço e licença-prêmio, concedidas aos demais empregados que permaneceram trabalhando no período de afasta-mento dos anistiados), aquele defende apenas a concessão aos anistiados de vantagens concedidas em caráter geral para recomposição salarial. Portan-to, remanesce em construção hermenêutica a discussão acerca da extensão dos efeitos da suspensão do contrato de trabalho ocasionada pela dispensa arbitrária, qual seja, se a aplicação do art. 471 da CLT aos anistiados abran-ge a concessão de vantagem de caráter geral e pessoal ou apenas as de caráter geral30.

30 VIEIRA, Patrícia Dias. A anistia nas empresas públicas federais. Monografia, Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro, 2013, p. 59-60.

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CONCLUSÃO

A Justiça do Trabalho, hoje, fortemente entende que o período de afastamento dos empregados alcançados pela anistia configura hipótese de suspensão do contrato de trabalho, aplicando-se a regra geral prevista no art. 471 da CLT. Todavia, existe ainda caloroso debate a respeito da ex-tensão dos efeitos desta suspensão no contrato de trabalho. Não obstante, seguindo o movimento da jurisprudência mais ventilada, opta-se por seguir o norte interpretativo deixado pelo próprio Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de que se deve dar à anistia a interpretação mais ampla possível, em consonância com seu espírito e razão, a fim de lhe emprestar a devida eficácia.

A evolução jurisprudencial reflete o ininterrupto exercício do equilí-brio reflexivo na acomodação de direitos coletivos e individuais, sobretudo aqueles atrelados à dignidade da pessoa humana. A anistia representa legí-tima obrigação de solidariedade e sociedade na qual a sociedade brasileira como um todo possui um débito com aqueles trabalhadores injustiçados no final do século passado. Cabe à atual geração, tanto quanto cabia à geração do Deputado Federal Nilson Gibsom, promover e incentivar o progresso jurídico na reparação dos erros cometidos pelo governo e recomposição das vidas profissionais dos vitimados.

O caminho recentemente traçado pelos tribunais trabalhistas registra significativa produção de entendimentos vanguardistas de genealogia cons-titucional. A esse respeito, impende destacar que os debates novos acerca de direitos fundamentais possuem caráter irrevogável de transcendência às situações vindouras e pendentes, pois se junge seus argumentos e funda-mentações aos efeitos transcendentes dos motivos determinantes dos jul-gados31.

Decorre, então, da interpretação teleológica e sistemática que melhor busca comportar o instituto da anistia com os demais entes normativos orbi-tantes no ordenamento jurídico brasileiro à inclinação de estender os efeitos da suspensão do contrato de trabalho ocasionada pela dispensa arbitrária aos anistiados, abrangendo com isso a concessão de vantagem de caráter geral e pessoal. Esta opção, induvidosamente, revela ser a diretiva única que corretamente homenageia a obrigação de solidariedade e sociedade da lei de anistia e promove, ao mesmo tempo, um equilíbrio reflexivo entre os primados da Constituição (arts. 5º, 7º, VI, 37; e arts. 8º e 9º do ADCT), leis

31 Segundo escólio primoroso deixado pelo ex-Ministro Maurício Correa, no bojo da Reclamação nº 1.987/DF. No mesmo sentido, Rcl 2986 MC/PE, Min. Rel. Celso de Mello.

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(arts. 8º, 468 e 471 da CLT; arts. 2º e 6º da Lei nº 8.878/1994; art. 2º da Lei nº 9.784/1999; e art. 5º do Decreto-Lei nº 4.657/1942) e jurisprudência.

Os atos administrativos de regresso e convocação dos anistiados sob o manto legal da Lei nº 8.878/1994 precisam acompanhar a valoração das normas. Somente assim a Administração Pública sairá da zona de mera re-ceptora passiva de comandos para efetiva integrante do direito, de forma a colmatar o verdadeiro sentido da lei e exaltar seu conteúdo, virando por vez a página que macula a história progressiva da Administração Pública Federal.

REFERÊNCIAS

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2007.

BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Trad. Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos. 10. ed. Brasília: UnB, 1999.

FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Direito, retórica e comunicação. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997.

PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

RAWLS, John. Uma teoria da justiça. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

SANDEL, Michael. Justiça: o que é fazer a coisa certa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.

VIEIRA, Patrícia Dias. A anistia nas empresas públicas federais. Monografia, Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro, 2013.

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

6734

Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoApelação Cível nº 0033445‑77.2010.4.01.3400/DFRelatora: Desembargadora Federal Ângela CatãoApelante: Jose Ribamar Sousa Machado FilhoAdvogado: Valerio Alvarenga Monteiro de Castro e outros(as)Apelado: União FederalProcurador: José Roberto Machado Farias

EMENTAAPELAÇÃO CÍVEL – CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO – CUMULA-ÇÃO DE CARGOS PERMITIDA CONSTITUCIONALMENTE – CARGOS CONSIDERADOS, ISOLADA-MENTE, PARA APLICAÇÃO DO TETO REMUNERATÓRIO –PRECEDENTES DO STJ – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – POSSIBILIDADE – REQUISITOS PREENCHIDOS – SENTENÇA REFORMADA (6)

1. A antecipação de tutela é concedida quando, existindo prova ine-quívoca, se convença o Juiz da verossimilhança da alegação e ocorrer fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou ficar caracterizado abuso do direito de defesa ou manifesto propósito pro-telatório do réu (art. 273, I e II, do CPC).

2. Tratando-se de cumulação legítima de cargos, a remuneração do servidor público não se submete ao teto constitucional, devendo os cargos, para este fim, ser considerados isoladamente. (Precedentes: AgRg-RMS 33.100/DF, Relª Min. Eliana Calmon, DJe 15.05.2013 e RMS 38.682/ES, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 05.11.2012).

3. A finalidade do teto constitucional é evitar abusos e salários des-comunais no serviço público. Não se visa impedir que aqueles que de fato cumulam cargos percebam os respectivos vencimentos. Tal raciocínio privaria aquele que efetivamente cumpriu suas funções de sua justa remuneração, ensejando enriquecimento sem causa da Ad-ministração. (RMS 33.100/DF, Relª Min. Eliana Calmon)

4. Apelação parcialmente provida.

ACÓRDÃO

Decide a Turma, por unanimidade, dar parcial provimento à ape-lação.

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Primeira Turma do TRF da 1ª Região, 1º de abril de 2014.

Desembargadora Federal Ângela Catão Relatora

RELATÓRIO

Exma. Sra. Desembargadora Federal Ângela Catão, Relatora:

Trata-se de apelação interposta contra sentença proferida nos presen-tes autos em que se discute a possibilidade de incidência de abate-teto em relação à remuneração pelo exercício de cargos públicos, cuja acumulação é permitida, nos termos da Constituição Federal de 1988.

É o relatório.

VOTO

Exma. Sra. Desembargadora Federal Ângela Catão, Relatora:

Inicialmente, destaco que a pendência de julgamento de Repercussão Geral e/ou Recurso Repetitivo não é óbice para prosseguimento do feito, não havendo que se falar em seu sobrestamento na fase processual em que se encontra.

Com efeito, tal providência não está a cargo do Relator, devendo ser tomada apenas na hipótese de eventual interposição de Recurso Extraordi-nário e/ou Especial, nos termos da legislação processual civil.

No mais, a matéria tratada nos autos já foi objeto de apreciação por parte do Superior Tribunal de Justiça em inúmeras oportunidades, conforme se vê dos seguintes julgados, in verbis:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – QUESTÃO DE ORDEM – MATÉRIA SUBMETIDA AO CRIVO DA PRIMEIRA SEÇÃO DESTE SUPERIOR TRIBUNAL – CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – SERVI-DOR PÚBLICO – CUMULAÇÃO DE CARGOS PERMITIDA CONSTITUCIO-NALMENTE – CARGOS CONSIDERADOS, ISOLADAMENTE, PARA APLI-CAÇÃO DO TETO REMUNERATÓRIO

1. “Tratando-se de cumulação legítima de cargos, a remuneração do servidor público não se submete ao teto constitucional, devendo os cargos, para este fim, ser considerados isoladamente” (Precedentes: AgRg-RMS 33.100/DF, Relª Min. Eliana Calmon, DJe 15.05.2013 e RMS 38.682/ES, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 05.11.2012).

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2. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança provido.

(RMS 33.134/DF, 1ª S., Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Julgado em 26.06.2013, DJe 27.08.2013)

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL – RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO – CUMULAÇÃO DE CARGOS PERMITIDA CONSTITUCIONALMENTE – MÉ-DICO – ART. 17, § 2º, DO ADCT – TETO REMUNERATÓRIO – INAPLICA-BILIDADE

1. Cuida-se, originariamente, de Mandado de Segurança impetrado por Már-cia Silva com objetivo de assegurar o pagamento integral da remuneração a que tem direito, relativamente a cada um dos vínculos que mantém com a Administração (dois cargos de médico exercidos na Secretaria de Estado da Saúde do Espírito Santo).

2. A partir da vigência da Emenda Constitucional nº 41/2003, todos os venci-mentos percebidos por servidores públicos, inclusive os proventos e pensões, estão sujeitos aos limites estatuídos no art. 37, XI, da Constituição.

3. Por outro lado, a EC 41/2003 restabeleceu a vigência do art. 17 do ADCT que, embora em seu o caput afaste a invocação do direito adquirido ao rece-bimento de verbas remuneratórias contrárias à Constituição, os respectivos §§ 1º e 2º trazem exceção ao assegurar expressamente o exercício cumulati-vo de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde.

4. Assim, a acumulação de proventos de servidor aposentado em decorrên-cia do exercício cumulado de dois cargos de médico, legalmente exercidos, nos termos autorizados pela Constituição, não se submete ao teto constitu-cional, devendo os cargos ser considerados isoladamente para esse fim.

5. Recurso Ordinário provido.

(RMS 38.682/ES, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, Julgado em 18.10.2012, DJe 05.11.2012)

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – CONSTI-TUCIONAL E ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO – ACUMULAÇÃO DE PROVENTOS – CARGO TÉCNICO E PROFESSOR – TETO REMUNERATÓRIO – RECURSO PROVIDO – ORDEM CONCEDIDA

A acumulação de proventos de servidor aposentado em decorrência do exer-cício cumulado de dois cargos, de técnico e de professor, não se submete ao teto constitucional, devendo os cargos serem considerados isoladamente para esse fim.

Recurso ordinário provido para conceder a ordem.

(RMS 33.170/DF, 2ª T., Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Rel. p/ Ac. Min. Cesar Asfor Rocha, Julgado em 15.05.2012, DJe 07.08.2012)

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Nesse cenário, é de se ver que a tese defendida pela parte autora en-contra amplo amparo no entendimento firmado pelo próprio SJT.

E efetivamente não poderia ser diferente. Entender de modo diverso seria chancelar a prestação de serviço gratuita, eis que, havendo permis-sivo constitucional para acumulação remunerada de cargos públicos, nas hipóteses descritas na CF/1988, absolutamente incoerente se apresentaria a necessidade de consideração cumulativa das respectivas remunerações para a finalidade de limitação ao teto constitucional.

Por seu teor didático, tomo como razões para decidir os bem lança-dos fundamentos expostos pela Ministra Eliana Calmon quando do julga-mento do RMS 33.100/DF, in verbis:

[...] Não se olvida que, na redação determinada pela Emenda Constitucio-nal nº 41/2003, todos os vencimentos percebidos por servidores públicos limitam-se ao que se convencionou denominar teto constitucional (CF, art. 37, XI). Entretanto, as normas constitucionais devem ser interpretadas em conjunto, garantindo-se a unidade da Constituição.

Vale lembrar que a já mencionada EC 41/2003 restabeleceu a vigência do art. 17 do ADCT, vedando, no caput, a invocação de direito adquirido à percepção de verbas contrárias à Constituição, mas assegurando, em seus parágrafos, o exercício cumulativo de dois cargos de médico. Institui-se, pois, uma regra, mencionando-se, nos parágrafos do artigo, exceções, isto é, hipóteses em que o exercício cumulativo de dois cargos é lícito.

Cotejando a disposição do art. 37, XI, da CF, com a do art. 17, do ADCT, ou-tra não pode ser a interpretação senão no sentido de que o intuito da Consti-tuição da República não era vedar pura e simplesmente qualquer percepção de vencimentos acima do teto. De nada valeria a permissão constitucional para a acumulação de cargos se a própria Constituição privasse o que acu-mula cargos de parte ou mesmo da totalidade da remuneração de um dos cargos.

A finalidade do teto constitucional é evitar abusos e salários descomunais no serviço público. Não se visa impedir que aqueles que de fato cumulam cargos percebam os respectivos vencimentos. Tal raciocínio privaria aquele que efetivamente cumpriu suas funções de sua justa remuneração, ensejando enriquecimento sem causa da Administração.

A regra constitucional em questão deve ser interpretada no sentido de que o teto remuneratório se aplica isoladamente a cada cargo nas hipóteses de acumulação lícita. [...] (grifei)

Assim, “Tratando-se de cumulação legítima de cargos, a remunera-ção do servidor público não se submete ao Teto Constitucional, devendo

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os cargos, para este fim, ser considerados isoladamente”. (Precedentes: AgRg-RMS 33.100/DF, Relª Min. Eliana Calmon, DJe 15.05.2013 e RMS 38.682/ES, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 05.11.2012).

Indevidos os descontos perpetrados, evidentemente cabível sua res-tituição, devendo ser observada a prescrição quinquenal de eventuais par-celas vencidas anteriormente ao qüinqüênio que houver antecedido o ajui-zamento da ação.

A correção monetária deve ser aplicada desde a data em que cada parcela se tornou devida (Súmula nº 19 do TRF 1ª R.).

Os juros de mora são devidos em 0,5% (meio por cento) ao mês, a partir da citação até 30.06.2009.

A partir de 30.06.2009, será aplicado o contido no art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, na redação dada pela Lei nº 11.960/2009.

Explicito que a correção monetária e os juros devem incidir na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal.

A verba honorária é devida em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, em conformidade com o art. 20, § 4º, do CPC, e a jurisprudên-cia desta Corte.

Custas em reembolso.

Antecipação de tutela

Verifico, na espécie, que a prestação tem caráter alimentar, há a pre-sença da prova inequívoca e do perigo de dano irreparável ou de difícil re-paração, razão pela qual estão configurados os pressupostos da antecipação da tutela.

Assim, a antecipação dos efeitos da tutela é medida que se impõe, razão pela qual fica determinado à União Federal, por meio do Ministério da Fazenda, que deixe de proceder a qualquer desconto na remuneração percebida pelo autor a título de abate-teto, nos termos em que analisado neste voto.

Dispositivo

Isso posto, dou parcial provimento à apelação, determinando à parte ré que:

1) considere isoladamente as remunerações a que o autor faz jus em razão do exercício de cargos públicos, cuja cumulação é permitida constitucio-

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nalmente para o cálculo de eventual abate-teto, nos termos da fundamen-tação;

2) suspenda, imediatamente, eventuais descontos ainda realizados a esse tí-tulo, em contrariedade ao ora decidido; e

3) restitua os valores indevidamente descontados, nos termos deste voto.

Em sede de antecipação dos efeitos da tutela, determino a imediata suspensão dos descontos em desacordo com a fundamentação exposta.

Oficie-se ao Ministério da Fazenda para que cumpra a ordem acima no prazo de 30 (trinta) dias, devendo a União Federal proceder à devida comprovação documental nos autos.

É o meu voto.

Desembargadora Federal Ângela Catão Relatora

TRIbUNAL REGIONAL fEDERAL DA 1ª REGIÃO SECRETARIA JUDICIáRIA

7ª Sessão Ordinária do(a) Primeira Turma

Pauta de: 01.04.2014 Julgado em: 01.04.2014

Ap 0033445-77.2010.4.01.3400/DF

Relatora: Exma. Sra. Desembargadora Federal Angela Catão

Revisor: Exmo(a). Sr(a).

Presidente da Sessão: Exmo(a). Sr(a). Desembargador Federal Néviton Guedes

Proc. Reg. da República: Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Luiz Augusto Santos Lima

Secretário(a): Lilio da Silva Ramos

Apte.: Jose Ribamar Sousa Machado Filho

Adv.: Valerio Alvarenga Monteiro de Castro e outros(as)

Apdo.: União Federal

Procur.: Ana Luisa Figueiredo de Carvalho

Nº de Origem: 334457720104013400 Vara: 5ª

Justiça de Origem: Justiça Federal Estado/Com.: DF

SUSTENTAÇÃO ORALSustentação Oral: Dr. Edimar Ramos Gonçalves (Advogado do Apelante: José Ribamar Sousa Machado Filho).

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CERTIDÃO

Certifico que a(o) egrégia(o) Primeira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe, em Sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, à unanimidade, deu parcial provimento à apelação determinando a parte ré que: 1) considere isoladamente as remunerações a que o autor faz jus em razão do exercício de cargos públicos, cuja cumulação é permiti-da constitucionalmente para o cálculo de eventual abate-teto; 2) suspenda, imediatamente, eventuais descontos ainda realizados a esse título, em con-trariedade ao ora decidido; e 3) restitua os valores indevidamente desconta-dos, nos termos deste voto, e em sede de antecipação dos efeitos da tutela, determinou a imediata suspensão dos descontos em desacordo com a fun-damentação exposta. Oficie-se ao Ministério da Fazenda para que cumpra a ordem no prazo de 30 (trinta) dias, devendo a União Federal proceder à devida comprovação documental nos autos, nos termos do voto da Relatora.

Participaram do Julgamento os Exmos. Srs. Desembargador Federal Néviton Guedes e Desembargador Federal Ney Bello.

Brasília, 1º de abril de 2014.

Lilio da Silva Ramos Secretário(a)

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoIV – Apelação Cível nº 2012.51.01.004116‑3Nº CNJ: 0004116‑60.2012.4.02.5101Relator: Desembargador Federal Luiz Paulo da Silva Araujo FilhoApelante: Eduardo Jose da Fonseca e outrosAdvogado: Carlos Alberto Boechat Rangel e outrosApelado: Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTTProcurador: Frank Larrubia ShihOrigem: Vigésima Primeira Vara Federal do Rio de Janeiro (201251010041163)

EMENTAADMINISTRATIVO – SERVIDOR – AUXÍLIO-TRANSPORTE – TRANSPORTE SELETIVO – VEDAÇÃO DE CONCESSÃO – AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DOS BILHETES – AUSÊNCIA DE COMPROVA-ÇÃO DE NÃO ATENDIMENTO POR TRANSPORTE COLETIVO CONVENCIONAL

1. A Medida Provisória nº 1.783/1998, atual MP 2.165-36/2001, instituiu o auxílio-transporte pago em dinheiro pela União aos seus servidores. Contudo, determinou, no art. 1º que, para ter direito ao benefício, o servidor deveria fazer uso de transporte coletivo.

2. Por sua vez, o art. 8º da referida Medida Provisória nº 2.165-36/2001 determina que a concessão do benefício dar-se-á de acor-do com o regulamento. Nesse contexto, a Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, ao estabelecer orientação quanto ao custeio do benefício em questão, condicionou, no art. 5º, § 3º, da Orientação Normativa nº 4/SRH, de abril/2011, o pagamento do auxílio à apresentação dos “bilhetes” de transportes utilizados pelos servidores.

3. Assim, na hipótese em que o serviço de transporte a ser utilizado for seletivo ou especial, a vantagem fica condicionada à apresentação dos respectivos bilhetes utilizados pelos servidores, segundo a legisla-ção pertinente. Portanto, não há qualquer ilegalidade da Administra-ção ao exigir tais comprovantes.

4. Saliente-se que o caráter indenizatório do auxílio-transporte enseja a comprovação de que o transporte seletivo foi realmente foi utiliza-do no deslocamento para o trabalho, providência que os autores se negam a cumprir.

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5. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas: decidem os membros da 7ª Turma Especializada do Tribunal Re-gional Federal da 2ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recur-so, na forma do voto do Relator.

Rio de Janeiro, 20 de agosto de 2014 (data do Julgamento).

Luiz Paulo da Silva Araújo Filho Desembargador Federal

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por Eduardo Jose da Fonseca, Elaine Cristina de Britto Lira, Edna Aparecida Belote, Renata Cristina da Silva Souza, Simone Gonçalves dos Santos e Wanderson Raeyner Machado de Azevedo, contra sentença (fls. 664/673 do processo eletrônico) que, em sede de ação ordinária ajuizada pelos apelantes em face da Agência Na-cional de Transportes Terrestres – ANTT, julgou improcedentes os pedidos que pretendiam: 1) declarar o direito dos autores ao recebimento do auxílio--transporte, independentemente do meio de transporte utilizado no deslo-camento entre a residência e o local de trabalho e da aplicação ou não do bilhete único no trajeto utilizado, desde o momento do corte indevido, em março de 2011; 2) determinar o restabelecimento do pagamento do auxílio--transporte aos autores, considerando os valores pagos até março de 2011, ou os valores apontados pelo Grupo de Trabalho instituído pela Portaria nº 283/2011; 3) condenar a ré ao pagamento dos valores atrasados, acresci-dos de correção monetária e juros de mora.

Asseverou a magistrada de primeiro grau que, de acordo com a legis-lação, a manutenção do benefício pleiteado, na hipótese em que o serviço de transporte a ser utilizado for seletivo ou especial, fica condicionada à apresentação dos respectivos bilhetes utilizados pelos servidores, não ha-vendo, em princípio, qualquer ilegalidade da Administração ao exigir tais comprovantes. Ressaltou que o caráter indenizatório do auxílio-transporte demanda a comprovação de que efetivamente foi utilizado transporte sele-tivo no trajeto para o trabalho.

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Em suas razões (fls. 676/702 do processo eletrônico), os apelantes sustentam que são servidores públicos federais da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), ocupantes do cargo de Técnico em Regu-lação de Serviços de Transportes Terrestres, lotados no Posto de Pesagem Veicular (PPV) de Sapucaia, Unidade Regional do Rio de Janeiro (URRJ). Afirmam que residem em lugares distantes do local de trabalho, e, por isso, efetuam deslocamento cotidiano para exercer suas atividades, arcando com os custos do transporte coletivo utilizado. Alegam que recebiam, até mar-ço de 2011, a parcela indenizatória denominada auxílio-transporte, que foi suspensa em virtude de interpretação errônea da nova Orientação Normati-va nº 03/2011 do MPOG, somada ao disposto no Relatório Circunstanciado nº 1/2011-URRJ, formulado por Grupo de Trabalho instituído através da Portaria nº 432, de 16 de agosto de 2010 da ANTT. Asseveram que, em dezembro de 2011, a Administração resolveu restabelecer o pagamento do auxílio transporte para vários de seus servidores, com exceção daqueles lotados no Posto de Pesagem Veicular de Sapucaia, entre eles os Apelantes, porque apenas os servidores que podem dispor do chamado “bilhete único” foram beneficiados, ou seja, aqueles que conseguem efetuar sua locomo-ção através do transporte da modalidade coletivo. Aduzem que o acesso ao PPV de Sapucaia somente pode ser realizado pelos servidores através do transporte seletivo, modalidade que não está contemplada pelo “bilhete único”. Afirmam que a sentença equivocou-se, ao deixar de analisar, espe-cificamente, a questão posta e seus fundamentos jurídicos, ao entender que não haveria ilegalidade na suspensão do pagamento do auxílio transporte por tempo indeterminado, sugerindo que a causa do não pagamento é a não apresentação de “bilhetes” utilizados no transporte seletivo. Ressaltam que a apresentação de comprovantes de despesas jamais poderia ser uma exigência prévia ao próprio pagamento do auxílio-transporte, ao argumento de que a comprovação dos gastos se dá a posteriori, ou seja, depois dos servidores concretamente receberem a verba e arcarem com os custos de deslocamento residência-trabalho. Asseveram que o benefício tem natureza jurídica indenizatória, não havendo como sustentar a restrição quanto à espécie de transporte utilizado pelo servidor, devendo ser perquirido, tão somente, se haveria a necessidade de transporte, caso em que é devida a verba correspondente, utilizando-se como parâmetro o transporte coletivo público. Defendem que a regulamentação posterior passou a permitir o pa-gamento da verba para ressarcimento de despesas realizadas no transpor-te de modalidade seletiva, tal como o utilizado pelos autores. Asseguram que é absolutamente ilegal deixar de indenizar o servidor apesar do gasto cotidiano com despesas de transporte. Salientam que o auxílio-transporte atualmente tem suas regras nos contornos da Orientação Normativa nº 04,

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de 8 de abril de 2011, da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, ato normativo posterior, portanto, ao corte do benefício dos Apelantes. Destacam que, havendo a realização de despesas de transporte pelo servidor, não há como negar a indenização desse custeio, ou seja, impossível deixar de pagar o auxílio-transporte e que, ainda que eventualmente exista uma rota ou trajeto alternativo, o fato é que os servidores devem receber a indenização em função das despesas efetivamente realizadas.

Em contrarrazões (fls. 705/710 do processo eletrônico), a apelada sustenta que a apelação está em rota de colisão com a jurisprudência do Tribunal, no sentido de que a manutenção do auxílio-transporte, na hipó-tese em que o serviço de transporte a ser utilizado for seletivo ou especial, fica condicionada à apresentação dos respectivos bilhetes utilizados pelos servidores.

É o relatório.

Luiz Paulo da Silva Araújo Filho Desembargador Federal

VOTO

A apelação deve ser desprovida.

A Medida Provisória nº 1.783/1998, atual MP 2.165-36/2001, insti-tuiu o auxílio-transporte pago em dinheiro pela União aos seus servidores. Contudo, determinou, no art. 1º que, para ter direito ao benefício, o servidor deveria fazer uso de transporte coletivo.

“Art. 1º Fica instituído o auxílio-transporte em pecúnia, pago pela União, de natureza jurídica indenizatória, destinado ao custeio parcial das despe-sas realizadas com transporte coletivo municipal, intermunicipal ou interes-tadual pelos militares, servidores e empregados públicos da Administração Federal direta, autárquica e fundacional da União, nos deslocamentos de suas residências para os locais de trabalho e vice-versa, excetuadas aquelas realizadas nos deslocamentos em intervalos para repouso ou alimentação, durante a jornada de trabalho, e aquelas efetuadas com transportes seletivos ou especiais.”

Por sua vez, o art. 8º da referida Medida Provisória nº 2.165-36/2001 determina que a concessão do benefício dar-se-á de acordo com o regula-mento:

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“Art. 8º A concessão do auxílio-transporte dar-se-á conforme o disposto em regulamento, que estabelecerá, ainda, o prazo máximo para a substituição do vale-transporte pelo auxílio-transporte em pecúnia, condicionado seu pa-gamento inicial à apresentação da declaração de que trata o art. 6º.”

Nesse contexto, a Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, ao estabelecer orientação quanto ao custeio do benefício em questão, condicionou, no art. 5º, § 3º, da Orienta-ção Normativa nº 4/SRH, de abril/2011, o pagamento do auxílio à apresen-tação dos “bilhetes” de transportes utilizados pelos servidores:

“Art. 5º É vedado o pagamento de auxílio-transporte nos deslocamentos re-sidência/trabalho/residência, quando utilizado serviço de transporte regular rodoviário seletivo ou especial.

§ 1º Entende-se como transporte regular rodoviário seletivo ou especial, para fins desta Orientação Normativa, os veículos que transportam passageiros exclusivamente sentados, para percursos de médias e longas distâncias, con-forme normas editadas pelas autoridades de transporte competentes.

§ 2º As disposições do caput não se aplicam nos casos em que a locali-dade de residência do servidor não seja atendida por meios convencionais de transporte ou quando o transporte seletivo for comprovadamente menos oneroso para a Administração.

§ 3º O pagamento do auxílio-transporte nas situações previstas no caput fica condicionado à apresentação dos “bilhetes” de transportes utilizados pelos servidores.

§ 4º Compete aos órgãos e entidades apreciar a veracidade dos documentos apresentados pelo servidor ou pelo empregado público para fins de conces-são de auxílio-transporte.”

Assim, na hipótese em que o serviço de transporte a ser utilizado for seletivo ou especial, a vantagem fica condicionada à apresentação dos respectivos bilhetes utilizados pelos servidores, segundo a legislação perti-nente. Portanto, não há qualquer ilegalidade da Administração ao exigir tais comprovantes.

Sobre a matéria, confiram-se os seguintes julgados deste Tribunal:

ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO – AUXÍLIO-TRANSPORTE – EXI-GÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE BILHETES – REPOSIÇÃO AO ERÁRIO – A exigência de comprovação do uso do transporte intermunicipal e interesta-dual, por meio dos bilhetes respectivos, para concessão e manutenção do auxílio-transporte pago a servidor público, nos termos da MP 2.165-36/2001, é legítima e atende aos princípios da legalidade e da moralidade, como for-

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ma de evitar o recebimento indevido da verba indenizatória. Providência há muito exigida de modo uniforme de todos os servidores, e cumprida pela própria parte, em relação a períodos anteriores. Assim, notificado o servidor para que apresentasse os respectivos bilhetes, sem que o fizesse em relação a períodos a partir de 2010, é devida a restituição ao erário dos valores indevi-damente recebidos. Apelação parcialmente provida, apenas para reduzir os honorários sucumbenciais.

(AC 201251020042632, 6ª T.Esp., Rel. Des. Fed. Guilherme Couto de Castro, Data Decisão: 22.01.2014, e-DJF2R – Data: 31.01.2014)

ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDOR PÚBLI-CO – AUXÍLIO-TRANSPORTE – MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.165-36-2001 – DESLOCAMENTO INTERMUNICIPAL – UTILIZAÇÃO DE TRANSPORTE PÚBLICO – ORIENTAÇÃO NORMATIVA Nº 4/2011, DO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO – APRESENTAÇÃO MENSAL DE COMPROVANTES DE PASSAGEM – PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDA-DE, MORALIDADE, EFICIÊNCIA, LEGALIDADE – 1. A Medida Provisória nº 1.783/1998 e reedições, atual MP 2.165-36/2001, institui o auxílio-trans-porte pago em pecúnia pela União, com natureza indenizatória, para custear parcialmente as despesas realizadas com transporte coletivo municipal, in-termunicipal ou interestadual, pelos militares, servidores e empregados pú-blicos da Administração Federal direta, autárquica e fundacional da União, nos deslocamentos de suas residências para os locais de trabalho e vice--versa. 2. A Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, ao estabelecer orientação quanto ao custeio do bene-fício em questão, condicionou, no art. 5º da Orientação Normativa nº 4/SRH de abril de 2011, o pagamento à apresentação dos bilhetes– de transportes utilizados pelos servidores. 3. Não fere o princípio da razoabilidade nem constitui exigência obstativa ao benefício, a comprovação, a posteriori, das despesas com os transportes constante da declaração firmada pelo servidor, nos termos do art. 6º da Medida Provisória nº 2.165-36/2001. 4. A exigência da apresentação do bilhete, ao contrário, favorece a gestão dos recursos da Administração Pública, em prol do princípio da moralidade e da eficiência, não havendo qualquer ilegalidade na conduta, haja vista a prevalência do interesse público sobre o privado. Ademais, busca-se impedir que o benefí-cio em questão seja recebido em valor maior do que os gastos efetivamente tidos com o deslocamento (TRF 5ª R., Ap-Reex 200882010025695, DJe de 16.06.2010) 5. Encontra, também, amparo nos princípios constitucionais da legalidade e da moralidade, previstos no art. 37 da CRFB/1988. Tais prin-cípios norteiam a atividade do administrador e determinam que os gastos públicos sejam limitados ao autorizado por lei, de modo a zelar pelo patri-mônio público. 6. Recurso desprovido.

(AC 201151010137540, 8ª T.Esp., Rel. Des. Fed. Poul Erik Dyrlund, Data Decisão: 11.07.2012, e-DJF2R – Data: 17.07.2012, p. 317/318)

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Além disso, importante ressaltar a afirmação da ANTT, em sede de contestação, sobre os autores desta ação (fl. 483 do processo eletrônico):

“3.1 Os servidores impetrantes da presente ação se negam a apresentar a esta ANTT (Unidade Regional do Rio de Janeiro), os bilhetes de passagem, comprobatórios da efetiva utilização de transporte seletivo e/ou especial de acesso entre suas residências/local de trabalho (PPV de Sapucaia) e residên-cia, se omitindo da prestação de contas legal dos valores percebidos a título de auxílio-transporte, descumprindo, assim, a legislação que rege a matéria, e o direito legal ao referido auxílio, apresentação esta, efetuada pelos demais servidores que utilizam desse meio de transporte para se chegar ao seu local de trabalho.”

Saliente-se que o caráter indenizatório do auxílio-transporte enseja a comprovação de que o transporte seletivo foi realmente foi utilizado no des-locamento para o trabalho, providência que os autores se negam a cumprir.

Por fim, é de se destacar que foram levantadas suspeitas de locu-pletamento ilícito, conforme Relatório Circunstanciado nº 1/2011-URRJ (fls. 301/343 do processo eletrônico), elaborado por Grupo de Trabalho ins-tituído através da Portaria nº 432, de 16 de agosto de 2010 da ANTT.

Diante do exposto, nego provimento ao recurso.

É como voto.

Luiz Paulo da Silva Araújo Filho Desembargador Federal

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 23.07.2014Apelação Cível nº 0007348‑10.2010.4.03.6108/SP2010.61.08.007348‑2/SPRelator: Desembargador Federal Carlos MutaApelante: Alessandra Regina da Silva incapazAdvogado: SP091820 Marizabel Moreno Ghirardello e outroRepresentante: Nidelce Colpani da SilvaAdvogado: SP091820 Marizabel Moreno e outroApelado(a): União FederalAdvogado: SP000019 Tércio Issami TokanoNº Orig.: 00073481020104036108 3ª Vr. Bauru/SP

EMENTADIREITO CONSTITUCIONAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL – INDENIZAÇÃO – EMENDA DA INICIAL – ART. 264, CPC – TUTELA AO DIREITO À SAÚDE – ART. 196, CF – CIRURGIA NO EXTERIOR – DISCENISIA TARDIA – EXISTÊNCIA DE TRATAMENTO NO PAÍS – HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA FMUSP – RECURSO DESPROVIDO

1. Inviável o exame do pedido de indenização, pois o aditamento da inicial, após citação, com ampliação da causa de pedir, não pode-ria ser admitida, conforme art. 264, CPC, sem concordância da ré, a qual, no caso dos autos, manifestou expressa discordância.

2. A jurisprudência encontra-se consolidada no sentido de que cabe ao Estado custear tratamento médico de quem não tenha condições financeiras para arcar com as respectivas despesas, porém através de ações no âmbito do SUS e, no caso de impossibilidade, através de outros sistemas e instituições, inclusive no exterior, mas apenas se imprescindível e adequado o tratamento indicado no exterior e ine-xistente equivalente no país.

3. Caso em que provado nos autos que a cirurgia no exterior não é a única alternativa possível para o tratamento da autora, pois, além da terapia farmacológica, recomendada como tratamento prévio por seu caráter menos invasivo e sujeito a menor risco de complicações graves, a própria intervenção cirúrgica para implante de eletrodos, pleiteada nos autos, constitui procedimento realizado no Brasil, por equipe médica especializada do Hospital das Clínicas da Faculdade

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de Medicina da Universidade de São Paulo – HCFMUS, centro de excelência e referência médica no país.

4. As objeções ao tratamento medicamentoso e cirúrgico no Brasil, levantadas na ação, não procedem para efeito de comprovar que a tutela constitucional da saúde da autora depende, exclusivamente, da cirurgia no exterior, custeada com recursos públicos do Sistema Único de Saúde – SUS.

5. Apelação desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 17 de julho de 2014.

Carlos Muta Desembargador Federal

RELATÓRIO

Trata-se de apelação em ação ajuizada para garantir custeio inte-gral de despesas com a cirurgia de implantação de eletrodos no Hospital de Overland, Ohio, Estados Unidos da América, com custos estimados em R$ 800.000,00, em razão de doença agravada por erro médico do SUS, assim como indenização por danos materiais e morais no valor de R$ 2.000.000,00.

Na apelação, alegou-se que: (1) deve prevalecer não o laudo oficial, mas o do médico que trata a autora há 17 anos, que não recomendou o uso de Tegrabenazina, medicamento sem registro na Anvisa, com comer-cialização não autorizada e cuja entrada configura crime; (2) a cirurgia de implantação de eletrodos não pode ser feita adequadamente no Hospital das Clínicas de São Paulo, pois não existe registro de 100% de êxito, ao contrário do que ocorreria no Hospital de Overland em Cleveland, Ohio, e que no Brasil em 1 a 3% dos procedimentos de ablação ou implante de eletrodos no globo pálido podem ocorrer hemorragia intracerebral com dé-ficits neurológicos; (3) a reprogramação periódica dos parâmetros dos gera-

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dores implantados pode ser feito no Brasil, sem o risco da cirurgia em si; (4) não houve ampliação indevida no pedido de indenização, pois autorizada a emenda da inicial (fl. 95), e a ação discute o erro médico, que causou doença rara denominada patogenia da discinesia tardia, em razão de tra-tamento inadequado do SUS, que usou indevidamente os medicamentos Risperidona e Olanzapina, cujo protocolo clínico e diretrizes terapêuticas foram apenas aprovados recentemente, sendo sabido que o uso crônico de neurolépticos causa superprodução de radicais livres de oxigênio e degene-ração neuronial irreversível que gera discinesia tardia, intenso parksonismo, flutua ção da pressão arterial, rigidez muscular, febre, alteração da cons-ciência, convulsões e quadro que pode conduzir à morte; e (5) os centros cirúrgicos indicados no Brasil são referência mas não necessariamente para o caso da autora, pelo que foi requerida a reforma da sentença.

Com contrarrazões subiram os autos à Corte.

A Procuradoria Regional da República opinou pelo provimento em parte do apelo para assegurar tratamento adequado no Brasil, afastado o pleito de custeio no exterior e o de reparação de danos morais e materiais.

É o relatório.

Carlos Muta Desembargador Federal

VOTO

Senhores Desembargadores, para melhor compreensão da espécie, cabe destacar que a autora ajuizou, primeiramente, medida cautelar, a qual assim foi julgada por esta Turma, em 15.07.2010 (AC 2008.61.08.003442-1):

“DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITO ADMINISTRATIVO – DIREITO PROCESSUAL CIVIL – CAUTELAR PREPARATÓRIA – SENTENÇA DEIXA DE ANALISAR O PLEITO CAUTELAR E EXTINGUE O FEITO SEM RESO-LUÇÃO DO MÉRITO – CAUSA MADURA – ART. 515, § 3º – UNIÃO FE-DERAL – LEGITIMIDADE DE PARTE – DESNECESSIDADE DE INCLUSÃO DOS DEMAIS ENTES FEDERATIVOS – FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MÉDICO INTEGRAL – FAMÍLIA QUE NÃO MAIS DISPÕE DE CONDIÇÕES FINANCEIRAS PARA OFERECER AO DOENTE OS CUIDADOS NECESSÁ-RIOS – DIREITO À SAÚDE – DIREITO À VIDA – DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – ART. 196 E SEGUINTES DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – LEI Nº 8.080/1990 – CUMPRIMENTO IMEDIATO DA DECISÃO INDEPENDEN-TEMENTE DA VIA RECURSAL – PODER GERAL DE CAUTELA – SITUAÇÃO GRAVOSA SOMADA AO DECURSO DE TEMPO – NECESSIDADE DE CI-

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RURGIA NO EXTERIOR – QUESTÃO A SER ANALISADA NA AÇÃO PRIN-CIPAL – PEDIDO PARCIALMENTE PROCEDENTE

1. Em se tratando de processo extinto sem resolução de mérito, o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento, e, não bastasse, de-verão ser objeto de apreciação pela Corte todas as questões suscitadas e dis-cutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro, devendo, assim, prosseguir o feito perante esta Egrégia Turma, com supedâ-neo nas normas inscritas nos §§ 1º e 3º, art. 515, do Código de Processo Civil.

2. Quanto à providência requerida pelo representante do Ministério Público Federal, de que o Estado de São Paulo e o Município de Bauru passem a compor o polo passivo da ação, em que pese a pertinência da questão, cabe registrar que a inclusão de tais entes federativos, no caso, além de tumul-tuar o andamento do processo, tornando mais vagarosa a marcha processual, certo, ainda, que a responsabilidade dos entes federativos que compõe o Sis-tema Único de Saúde – SUS é solidária, podendo, em razão disso, quaisquer deles integrar o polo passivo da demanda em que se pretende o fornecimento de medicamentos ou de tratamento médico.

3. No mérito da causa, trata-se de pessoa maior, incapaz, representada nos autos por sua genitora e curadora, em face de interdição, por ser portadora de esquizofrenia paranóide (F20.0 – CID 10), permanentemente incapacita-da para o trabalho, bem como para gerenciar a própria vida e exercer atos da vida civil, presentemente, incapaz de praticar atos comezinhos, como cuidar sozinha de sua higiene pessoal, sendo certo que os sintomas da doença Dis-cinesia Tardia, de que é portadora, caracterizada por movimentos involuntá-rios, anormais e repetitivos, localizados principalmente na região orofacial, tronco, extremidades inferiores e superiores, podendo acometer o sistema respiratório e comprometer a deglutição, o que poderá, em caso extremo, resultar em sua morte. Assim, tem-se que o quadro de saúde da requerente é de extrema debilidade, sendo certo que se trata de pessoa totalmente de-pendente de cuidados dispensados por mãe e sua irmã, sendo certo que sua família não reúne condições financeiras para assegurar-lhe os cuidados que o seu estado de saúde exige.

4. Com efeito, restou exaustivamente provado, por meio de documentos, laudos técnicos e, até mesmo gravações em vídeo, que a autora necessita de atenção especial para manter a sua vida com o mínimo de dignidade possí-vel, exigências que a sua família não tem como atender.

5. Nesse passo, cabe lembrar que a ordem social erigida pela Constituição Federal de 1988 tem como objetivo o bem-estar de todos, encontrando fun-damento no sumo princípio da dignidade da condição humana, decorrendo daí a preocupação do legislador constituinte originário em dispor que a saú-de é direito de todos e dever do Estado (art. 196).

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6. Anote-se que além de o direito à vida e à saúde encontrarem-se capitula-dos entre os direitos fundamentais do homem, foi editada a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos ser-viços correspondentes.

7. Assim, tais diretrizes ganharam força e operatividade com a vigência do referido diploma legal, assegurando, pois, o acesso igualitário e universal aos serviços de saúde, bem como à integralidade da assistência, dispondo a lei que a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício (art. 2º), sendo ob-jetivo do Sistema Único de Saúde, entre outros, a assistência às pessoas por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com a realização integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas (art. 5º, III), além de prever que está incluída no campo de atuação do SUS a execução de ações de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica (art. 6º, I, d).

8. Ora, se é dever do Estado, garantir, com absoluta prioridade, o direito à vida e à saúde, no caso em tela, não dispondo a família da apelante de meios para fazê-lo, compete à sociedade e ao Estado a viabilização dos recursos para garantir a referida proteção.

9. Frise-se, o comando constitucional assevera que se trata de dever que goza de absoluta prioridade, não podendo a Administração descurar quando instada a oferecer os meios adequados e razoáveis, segundo a necessidade e as circunstâncias de cada caso, certo que, na hipótese, resta exaustiva-mente demonstrada a necessidade de a requerente obter tratamento médico específico, que preserve a sua vida, como internação, medicação adequada e fisioterapia, enquanto necessário, em algum dos hospitais de referência apontados pela apelada, discutindo-se, em ação principal, a possibilidade e real necessidade do tratamento médico no exterior.

10. Ademais, o direito à vida, por si só, já bastaria para dispensar qualquer fundamentação, constituindo pressuposto de todos os demais direitos. As-sim, esse direito fundamental assegurado pela Constituição Federal, deve se sobrepor quando confrontado com qualquer outro. Qualquer empenho des-tinado a salvar uma vida é digno de louvor, não sendo plausível qualquer tentativa de escusa por parte do Estado, seja sob o frágil argumento de alto custo de dispêndio monetário ou a falta de previsão orçamentária para tanto ou, ainda, sob o argumento de ser mero financiador e gestor do SUS e não executor de suas atividades, não podendo propiciar a concessão de trata-mento e medicamento aos necessitados.

11. Outrossim, em face da gravidade da situação posta a deslinde no presen-te caso, bem como do lapso temporal já decorrido, e, levando-se em conta o poder geral de cautela conferido ao magistrado para assegurar a eficácia

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da prestação jurisdicional, a teor do disposto nos arts. 125 e 461, ambos do Código de Processo Civil, a medida cautelar ora concedida deve ser pronta-mente cumprida pela requerida, independentemente da ulterior discussão da questão em eventual via recursal.

12. Em suma, se é dever do Estado, garantir, com absoluta prioridade, o direito à vida e à saúde daqueles que necessitam de sua atuação em face da própria hipossuficiência. No caso em tela, não dispondo a família da apelan-te de meios para fazê-lo, compete à sociedade e ao Estado a viabilização dos recursos para garantir a referida proteção.

13. Assim sendo, impõe-se a reforma da sentença recorrida para julgar par-cialmente procedente o pedido cautelar, condenando a União a fornecer, desde logo, o tratamento médico adequado e necessário à requerente, em um dos hospitais apontados como de referência na doença em questão, de preferência naquele mais próximo da residência da interessada, arcando com todos os custos envolvidos, ou seja, medicamentos, equipamentos mé-dicos, exames laboratoriais, inclusive transporte e hospedagem, se necessá-rio, sendo certo que os demais pedidos deverão ser deduzidos em sede de ação própria. Em face da sucumbência recíproca, cada parte arcará com as despesas que efetuou, inclusive verba honorária de seus respectivos patro-nos, nos termos do art. 21, do Código de Processo Civil.

14. Por sua vez, o Juízo a quo deverá ser comunicado, sendo-lhe remetida cópia desta decisão e das peças principais dos autos, daquelas necessárias para a compreensão do caso, cabendo-lhe determinar as intimações neces-sárias, para cumprimento em dez dias úteis, além de fiscalizar a implementa-ção objetiva das medidas e, após, dar notícia nestes autos.

15. Precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça e da Egrégia Turma.

16. Apelação a que se dá parcial provimento para reformar a sentença recor-rida, e, com base na norma contida no art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil, julgar parcialmente procedente o pedido.”

Garantido tratamento médico em hospital de referência no Brasil, a AGU informou que, para as providências necessárias, o Ministério da Saúde fez contato com a mãe da autora, a qual recusou o tratamento judicialmente deferido, insistindo na cirurgia no exterior (fl. 45).

Foi ajuizada, então, a presente ação objetivando garantir à autora tratamento médico no exterior, além de indenização por danos morais e materiais.

A sentença assim decidiu (fls. 649/53):

“A autora busca a condenação da União ao pagamento de indenização por danos morais e materiais (fls. 19/20) e a realização de ‘cirurgia de implanta-

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ção de eletrodos, no Hospital de Overland’ em Cleveland, Ohio, nos Estados Unidos da América do Norte (fls. 19 e 149).

No que tange ao pleito indenizatório, fundou a causa de pedir no descumpri-mento de medida cautelar e na demora do tratamento (fl. 20).

Assim, com razão a União (fls. 643/644), pois não há como se conhecer da indenização decorrente de erro médico, considerada a discordância diante da ampliação do objeto da demanda de fls. 231/233.

Presentes, nestes termos, os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao exame do mérito.

Inicialmente, observe-se não haver qualquer prova de ter a União descum-prido a decisão proferida na Ação Cautelar de nº 2008.61.08.003442-1.

Não foram juntados aos autos quaisquer documentos que evidenciassem a resistência da União no atendimento da decisão do e. TRF da 3ª Região. O único problema que poderia ser levantado seria o da precariedade da am-bulância utilizada no transporte da demandante, quando do atendimento da decisão (fl. 100); todavia, tal não pode ser equiparado a desobediência de ordem judicial.

Improcede, portanto, o pleito indenizatório.

Em relação ao pedido de custeio da cirurgia no exterior, cabe frisar, por primeiro, que a União jamais recusou a realização da referida intervenção médica, em território brasileiro.

A pretensão resistida consiste, única e exclusivamente, no interesse da autora, por sua representante legal, de realizar a cirurgia no Hospital de Overland, em Cleveland, Ohio, Estados Unidos da América do Norte. Estan-do ao alcance da autora levar a efeito a cirurgia, em hospital apropriado da rede pública nacional, restaria incabível acolher a demanda, no ponto, como preconizado pelo MPF (fls. 600/605), por absoluta ausência do interesse de agir.

Feita esta ressalva, frise-se ser imperativa, para o deslinde do caso, a análise da prova técnica, produzida nos autos.

O perito judicial, Dr. Vitor Tumas, após examinar a demandante, mediante internação no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, concluiu, no que tange ao tratamento indicado (fls. 552, 555 e 556) que:

– a indicação inicial é utilizar a droga tetrabenazina, por via oral, droga cujos efeitos colaterais mais comuns são depressão, sonolência e parkinsonismo;

– em caso de insucesso, restaria indicado o tratamento com implante bilate-ral de estimuladores profundos em globos pálidos;

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– tanto a tetrabenazina quanto a cirurgia poderiam melhorar os movimentos involuntários da autora, sem que se possa afirmar, de antemão, qual seria o mais eficiente;

– a indicação inicial da droga decorre do fato de ser tratamento menos in-vasivo; e

– a cirurgia é realizada no Brasil, sendo o Hospital das Clínicas de São Paulo, sob a responsabilidade do Dr. Manoel Jacobsen Teixeira, o nosocô-mio com maior experiência nesse tipo de intervenção.

No parecer técnico juntado pela autora à fl. 575, afirma-se que: “há risco no uso da tetrabenazina, consistente no desencadeamento de parkinsonismo, sendo, portanto, mais indicado o tratamento cirúrgico;” a opção mais apro-priada é a realização da cirurgia no exterior, pois no Brasil tal intervenção não é comum.

Diante de tal quadro, e com o devido respeito tanto à mãe de Alessandra, Dona Nidelci, quanto à aguerrida irmã, Gisele, não há como se acolher o pedido da autora, por duas razões.

A primeira consiste no fato de não se ter por certo que o tratamento cirúrgico seja, no momento, o mais indicado para melhorar a condição de vida de Alessandra. Como afirmado pelo perito judicial (e reconhecido implicita-mente pelo próprio assistente técnico da parte demandante), a droga tetrabe-nazina pode ser tão eficaz quando o implante de eletrodos, ainda que haja o risco do parkinsonismo.

É de se compreender a resistência da família de Alessandra, no uso de novo medicamento (afinal, a discinesia foi causada pelo uso intensivo de neuro-lépticos). Todavia, o cálculo do risco não pode ser realizado tomando-se por base apenas uma única paciente, mas sim o universo de pessoas que fizeram uso da droga. E, neste sentido, é de se levar em conta a avaliação do perito judicial, tentando-se, por primeiro, a utilização do medicamento, ainda que, como sói acontecer, haja risco em sua administração.

Ainda que assim não fosse, ou mesmo que mal sucedida a administração da tetrabenazina, denote-se que não há necessidade de a cirurgia ser realizada nos Estados Unidos da América do Norte.

O perito judicial afirmou ser plenamente possível a realização da cirurgia no Hospital das Clínicas de São Paulo.

De acordo com o Dr. Erich Talamoni Fonoff, a Divisão de Neurocirurgia Funcional do Departamento de Psiquiatria, do Hospital das Clínicas de São Paulo, sob a coordenação do Dr. Manoel Jacobsen Teixeira, realiza ‘rotinei-ramente procedimentos para implante de eletródios cerebrais profundos bi-laterais assim como procedimentos estereotácticos ablativos indicados para tratar várias anormalidades do movimento (discinesias induzidas por Dopa,

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doença de Parkinson, distonias e discinesias faciais), dor crônica rebelde e procedimentos para controlar anormalidade do comportamento de acordo com protocolos institucionais e do Conselho Regional de Medicina. Mais especificamente, realizamos semanalmente implante de estimuladores ou ablação de regiões do globo pálido interno com fins terapêuticos. Informa-mos que procedimentos desta natureza proporcionam êxito em cerca de 60 a 90% dos doentes dependendo da doença especificada. Cumpre-se informar que em cerca de 1% a 3% dos procedimentos de ablação ou implante de eletródios na região do globo pálido podem ocorrer hemorragias intracere-brais e consequentes déficits neurológicos (hemiparesia, afasia, alteração de consciência) e em casos de implantes de eletródios em cerca de 5 a 7% dos casos pode haver infecção relacionada à prótese implantada (eletródios). É importante informar que procedimentos de implante estimuladores cerebrais requerem acompanhamento regular e periódico para que o efeito benéfico da neuroestimulação seja assegurado; por vezes, este pode estar comprome-tido em situações em que o doente reside em regiões distantes do centro de tratamento ou tem restrições de acesso (voos internacionais), pois são reco-mendáveis reprogramações periódicas dos parâmetros dos geradores implan-tados para a estimulação cerebral profunda e a adoção de eventuais outras medidas terapêuticas’ (fl. 579).

Denota-se que o tratamento cirúrgico é rotineiramente realizado no Hospital das Clínicas do Estado, com índices de risco relativamente reduzidos (1% a 3% em relação a hemorragias intracerebrais e 5 a 7% de risco de infecção).

Ademais, diante da necessidade de acompanhamento regular, não é aconse-lhável que o paciente resida em local distante do centro médico, sob pena, inclusive, de se comprometer o tratamento.

Conclui-se, por tanto, que a autora pode realizar o tratamento cirúrgico em território nacional, onde, inclusive, o posterior acompanhamento médico se dará com maior segurança do que se realizado no exterior.

Posto isso, julgo improcedente o pedido.”

A apelante impugnou a sentença, primeiramente quanto ao pedido de indenização porque não houve ampliação indevida no pedido de in-denização, pois autorizada a emenda da inicial. Todavia, efetivamente, foi determinado que a autora esclarecesse acerca da existência de pedido de tratamento médico (fls. 95-v), e não de indenização propriamente dita, sen-do que a resposta da mesma não veio senão depois da citação da ré (fls. 109 e 113/50).

Na petição, que acompanhou tal manifestação, a autora alegou que, após agravamento do estado de saúde, foi a diversos médicos e hospitais, e numa das ocasiões foi-lhe ministrado o medicamento “piportil”, que qua-

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se a levou a óbito, tendo sido necessária desintoxicação e limpeza, e que foi mantida imóvel em razão das convulsões, aduzindo que somente me-lhorou quando deixou o SUS e passou por tratamento particular, no qual se verificou que o uso de tal remédio foi o causador da discenísia tardia (fls. 137/8), razão do erro médico para efeito de indenização por danos morais e materiais.

Tal exposição fática, contida no tópico “Do direito à indenização de Alessandra” (fls. 137/47), foi reputada ampliação da causa de pedir, consi-derando os termos da inicial (fl. 4), de modo que não admissível o aditamen-to sem prévio consentimento da ré, nos termos do art. 264, CPC (fls. 218-v). Intimada para manifestação, a AGU expressamente discordou da emenda (fls. 231/3), daí porque a sentença dela não conheceu, sem qualquer ilega-lidade.

Resta, portanto, a exame apenas e tão somente o pedido relativo ao custeio, pela ré, das despesas com o tratamento médico no exterior, preci-samente no Hospital de Overland em Cleveland, Ohio.

A jurisprudência encontra-se consolidada no sentido de que cabe ao Estado custear tratamento médico de quem não tenha condições financeiras para arcar com as respectivas despesas, porém através de ações no âmbito do SUS e, no caso de impossibilidade, através de outros sistemas e institui-ções, inclusive no exterior, mas tão somente se imprescindível e adequado o tratamento indicado no exterior e inexistente equivalente em território nacional.

A propósito assim já decidiu esta Corte:

AI 00279710420014030000, Rel. Juiz Convocado Valdeci dos Santos, e--DJF3 19.03.2009: “CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – AGRAVO DE INSTRUMENTO – PEDIDO AO MINISTÉRIO DA SAÚDE – TRATAMEN-TO MÉDICO NO EXTERIOR – ESGOTAMENTO DOS MEIOS NO BRASIL – NÃO CONDIÇÃO DE ARCAR COM AS CUSTAS – INDICAÇÃO POR MÉ-DICO AUTORIDADE NO ASSUNTO – PARECER FAVORÁVEL DA ÁREA TÉCNICA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE – INDEFERIMENTO GENÉRICO POR VEDAÇÃO CONSTANTE NA PORTARIA Nº 763/1994 – NÃO OBSERVADA A CAUTELA DE ANALISAR O CASO CONCRETO – DIREITO À SAÚDE – DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – POSSIBILIDADE – 1. Caso em que a agravada é portadora da ‘Síndrome Miastenia Congênita Gravis’ e vem se submetendo a tratamento desde os seis meses de idade, tendo sido esgotados os recursos médicos no País, recomendado pelo seu médico a continuidade no exterior, sendo certo que o seu convênio não oferece cobertura para tal e a família não dispõe de meios para pagá-lo. 2. Assim sendo, pleiteou ao Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Estado da Saúde do Estado do

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Mato Grosso do Sul, o custeio do tratamento, que foi negado com base na Portaria nº 763/1994, apesar do parecer favorável da Coordenadora da Área Técnica da Saúde do Portador de Deficiência, sugerindo que os exames fos-sem realizados no exterior, no caso, no Mayo Clinic Hospital Miscellaneous, em Rochester, EUA. 3. Correta a decisão que antecipou a tutela jurisdicional, pois, a ordem social erigida pela Constituição Federal de 1988, tem como objetivo o bem-estar de todos, encontrando fundamento no sumo princípio da dignidade humana, decorrendo daí a preocupação do legislador consti-tuinte originário em dispor que a saúde é direito de todos e dever do Estado (art. 196) e, com relação à criança e ao adolescente, ordena, de forma inci-siva, no art. 227, que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, dentre outros, o direito à vida, à saúde. 4. Ora, se é dever da família, da sociedade e do Estado ga-rantir à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida e à saúde, no caso em tela, não dispondo a família da agravada de meios para fazê-lo, compete à sociedade e ao Estado a viabilização dos recursos para garantir a referida proteção. Frise-se, o comando constitucional assevera que se trata de dever que goza de absoluta prioridade, não podendo a Admi-nistração descurar quando instada a oferecer meios adequados e razoáveis, segundo a necessidade e as circunstâncias do caso concreto, certo que, na hipótese, somente após exaurir as possibilidades de tratamento existentes no país, a agravada valeu-se de seu direito de buscar a proteção estatal. 5. Ade-mais, em que pese a Portaria Ministerial nº 763/1994, vedar a concessão de tratamento médico no exterior, em evidente desbordamento da função mera-mente reguladora, cada caso mereceria ser apreciado com prudência e cau-tela, à luz da norma constitucional, não sendo razoável o indeferimento puro e simples, mediante a alegação da existência de portaria que veda expres-samente a autorização para o custeio de atendimento médico fora do país. 6. Deveras, se de um lado, não se pode admitir a generalização da cobertura de atendimento médico no exterior, até em face da existência de centros de excelência médica no país, exauridas as possibilidades da medicina local, deve a família, a sociedade e o Estado, segundo as possibilidades de desem-bolso, em face do caso concreto, assegurar a proteção da saúde, principal-mente da criança e do adolescente, com tratamento no exterior. 7. Outrossim não se vislumbra que o dispêndio com o tratamento médico da agravada traga um gravame irreversível à agravante, acarretando-lhe prejuízo inco-mensurável, até porque não se trata disso, quando o bem jurídico envolvido é a vida. Na verdade, o não deferimento da tutela acarretaria para a agravada perda da consulta com o médico especialista norte-americano, causando-lhe a espera de seis a nove meses, aproximadamente, para se conseguir um novo agendamento, sujeitando-a a um ônus de difícil reparação, tendo em vista que os médicos que a acompanhavam atestaram que visualizavam o agrava-mento rápido e progressivo da doença. 8. Agravo a que se nega provimento, para manter íntegra a decisão agravada, e agravo regimental prejudicado.”

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A questão envolve, portanto, discussão técnica, acerca da eficiência e adequação médica de determinado tratamento e de sua disponibilidade, ou não, no Brasil. Por isso mesmo, foi designada perícia para elucidar a questão, na qual concluiu o perito médico judicial pela adequação de tra-tamento primário à base de medicamento para posterior cirurgia disponível no Brasil, sem a necessidade, comprovação ou justificativa técnica para tra-tamento médico no exterior.

As razões constaram da sentença apelada, cabendo, porém, destacar excertos do que registrou a Procuradoria da República, acerca da pretensão ora deduzida (fls. 601v/5v):

“De início, importa registrar que é incontroverso o fato de a demandante ser interditada (fl. 239) e portadora de enfermidade neurológica grave e pouco comum, associada a outras morbidades, a demandar a imprescindível e a es-sencial garantia do direito constitucional de proteção à saúde. Também não há o que se tergiversar sobre o dever estatal de prestação nesse campo social.

Nesse prisma, a Constituição Federal, no art. 196, ao mesmo tempo em que confere ao indivíduo o direito fundamental à saúde, impõe ao Poder Público o dever de garanti-lo por meio de ‘políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação’.

Deveras, o punctum saliens a ser enfrentado e dirimido no presente caso se refere a seguinte indagação: ainda que haja tratamento médico especiali-zado no Brasil, disponibilizado pelo SUS, seria obrigação da União custear as despesas advindas da realização de cirurgia em instituição de referência indicada pela autora, a qual se encontra sediada no exterior?

Para o enfrentamento do tema relacionado ao que se convencionou denomi-nar de ‘judicialização do direito de proteção à saúde’, releva assentar algu-mas premissas básicas para fins de subsidiar a sua resolução.

Em casos tais, afora o arcabouço normativo pátrio que se deve lançar mão, mostra-se sobremaneira relevante a análise das particularidades fáticas que cercam o caso, decisivas para o equacionamento e a solução da controvér-sia posta em juízo. Isso porque, há inegável relação de tensão entre valores positivados, exigindo a aplicação da técnica de ponderação em concreto.

Assim é que o dever de proteção à saúde, previsto constitucionalmente, abrange a realização, pelo próprio Estado, de políticas sociais e econômicas, o que não engloba o custeio de tratamento médico realizado no exterior, em virtude de opção da curadora da paciente (como pretende a autora), por-quanto existem informações técnicas dando conta da possibilidade de ser o procedimento médico-cirúrgico efetuado em território nacional.

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Destarte, não se pode imprimir ares absoluto ao direito público subjetivo de proteção à saúde, buscando compelir o estado a custear todo e qualquer procedimento necessário para a proteção, promoção e recuperação da saú-de, inobstante o lugar em que ofertado e à revelia da existência de política pública.

Nesse diapasão, o Sistema Único de Saúde – SUS visa à integralidade da as-sistência à saúde, seja individual seja coletiva, devendo atender aos que dela necessitem em qualquer grau de complexidade.

Por outro lado, a Lei nº 8.080/1990, a qual dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funciona-mento dos serviços correspondentes, principia por regular o âmbito espacial de sua aplicação:

Art. 10. Esta lei regula, em todo o território nacional, as ações e serviços de saúde, executados isolada ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas naturais ou jurídicas de direito Público ou pri-vado. (g.n.)

Não pode ser tido como razoável ou proporcional o custeio pelo Estado de determinados tratamentos médicos prestados por instituições estrangei-ras apenas porque são considerados, pela demandante, como os melhores. Diversa seria a solução, se não fosse possível/realizável a cirurgia no país, situação não comprovada nos autos. Nesse sentido, ilustra-se com os seguin-tes precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL EM SUSPENSÃO DE SEGURANÇA – UNIÃO – TRANSPLANTE DE ÓRGÃO NO EXTERIOR – ALEGADA LESÃO À ORDEM ADMINISTRATIVA E À SAÚDE PÚBLICA – EFEITO MULTIPLI-CADOR

1. Cabe à Administração fixar e autorizar os tratamentos e remédios que devem ser fornecidos à população, sempre com vistas a garantir a se-gurança, a eficácia terapêutica e a qualidade necessárias, em território nacional. Questão relativa à matéria de Política Nacional de Saúde. Risco de lesão à ordem pública administrativa configurado.

2. A determinação contra legem que obriga o Estado brasileiro a forne-cer todas as condições para que a agravante/requerida faça cirurgia de elevado custo no exterior, havendo quem a faça no país, tem potencial de lesionar a saúde pública, constituindo-se precedente para um número indefinido de outras situações semelhantes.

3. Regimental não provido.

(AgRg-SS 1.467/DF, ReI. Min. Edson Vidigal, Corte Especial, Julgado em 16.02.2005, DJ 21.03.2005 p. 196 – g.n.)

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APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA.TRATAMENTO EM CUBA – PORTARIA Nº 763/1994 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE – LE-GITIMIDADE RECONHECIDA – AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO – APELAÇÃO IMPROVIDA – 1. Legítima a Portaria nº 763/1994, do Ministério da Saúde, que vedou o financiamento de tratamento mé-dico no exterior pelo SUS. 2. Não há nenhuma ilegalidade na conduta da autoridade coatora ao indeferir o quanto pretendido pela impetrante. 3. Precedentes do STJ e deste Tribunal. 4. Mesmo se assim não fosse, o tratamento da retinose pigmentar em Cuba não tem eficácia comprovada, não é recomendado pela comunidade científica internacional e, além disso, há tratamento em território nacional de custo significativamente menor do que o feito em Cuba. 5. Apelação não provida.

(TRF 3ª R., AMS 200061000491239, Juiz Convocado Rubens Calixto, Ju-diciário em dia – Turma D, DJF3 CJ1 Data: 26.01.2011, p. 267)

O Supremo Tribunal Federal, através do Presidente à época, considerando, dentre outros aspectos, a pletora de ações/medidas judiciais que tinham por escopo o fornecimento das mais variadas prestações de saúde, convocou audiência pública para fomentar o debate desta importante questão.

O Ministro Gilmar Mendes, em obra doutrinária escrita em conjunto com Paulo Gustavo Gonet Branco, a partir dos elementos colhidos na audiência supramencionada, abordando a temática alusiva aos parâmetros para a so-lução judicial de casos concretos que envolvem o direito à saúde, afiançou que:

‘Ao reconhecer que a problemática quanto à interpretação e aplicação desse direito fundamental é extremamente complexa e depende, em sua grande maioria, de juízos de ponderação que levem em consideração todas as circunstâncias dos casos concretos, o Tribunal traçou alguns critérios que podem fornecer balizas mais seguras para o assunto. Tais critérios foram cuidadosamente construídos com base nas diversas ex-periências colhidas na Audiência Pública realizada pela Presidência do Tribunal.

[...]

Ao decidir e fixar critérios, o Tribunal valeu-se da experiência apreendida na Audiência Pública e assim ponderou, esquematicamente:

O primeiro dado a ser considerado é a existência, ou não, de política es-tatal que abranja a prestação de saúde pleiteada pela parte. Isso porque, ao deferir uma prestação de saúde incluída entre as políticas sociais e econômicas formuladas pelo SUS, o Judiciário não está criando política pública, mas apenas determinando o seu cumprimento. Nesses casos, a

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existência de um direito subjetivo público a determinada política pública de saúde parece ser evidente.

[...]

Obrigar a rede pública a financiar toda e qualquer ação e prestação de saúde existente geraria grave lesão à ordem administrativa e levaria ao comprometimento do SUS, de modo a prejudicar ainda mais o atendi-mento médico da parcela da população mais necessitada. Dessa forma, como regra geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente; essa sistemática pressupõe, porém, a necessidade de revisão periódica dos protocolos existentes e de elaboração de novos protocolos.

Essa conclusão não afasta, contudo, a possibilidade, ainda que excep-cional, de o Poder Judiciário, ou de a própria Administração, decidir que medida diferente da custeada pelo SUS deve ser fornecida a determinada pessoa que, por razões específicas do seu organismo, comprove que o tratamento fornecido não é eficaz no seu caso. Assim, em casos excep-cionais, os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas do SUS poderão ser contestados judicialmente?’

Recolhe-se do Laudo Pericial encartado às fls. 468/470, subscrito pelo Professor Doutor Vitor Tumas, profissional com larga experiência na área da neurologia relacionada a movimentos anormais (v. Nota de rodapé na fl. 322), restrito ao ponto nodal para o desate do processado, que em caso de insucesso do tratamento medicamentoso sugerido acima, estaria indicado o tratamento com implante bilateral de estimuladores profundos em globos pálidos. Essa cirurgia é realizada no Brasil, e o Hospital Público no Estado de São Paulo com maior experiência nesse tipo de intervenção é o Hospital das Clínicas de São Paulo, e o cirurgião responsável é o Dr. Manoel Jacobsen Teixeira.

Cumpre destacar que o médico indicado, possui livre-docência em Neurolo-gia pelo Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da Univer-sidade de São Paulo, sendo Professor Titular da Disciplina de Neurocirurgia do Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Neu-rocirurgia, atuando principalmente nos seguintes temas: dor, movimentos anormais, anormalidades do comportamento, epilepsia, espasticidade, neu-ro-oncologia, anormalidades da coluna vertebral, lesões da glândula hipófi-se, neurotraumatologia, radiocirurgia, braquiterapia e cirurgia estereotáctica e funcional.

Em complemento ao laudo acima ofertado, o aludido perito assim se pronun-ciou sobre a questão do tratamento cirúrgico (fls. 570/571):

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‘[...]

4. O tipo de cirurgia e as técnicas cirúrgicas utilizada são semelhantes no Brasil e no exterior. Não há estudo comparativo de eficiência cirúrgica en-tre países diferentes. Há evidências de que Centros que utilizam métodos mais precisos de localização do alvo cirúrgico têm maior sucesso final. Há Centros Brasileiros que usam essas técnicas.

[...]

9. Sem dúvida deve haver Centros no exterior com maior experiência com esse procedimento que no Brasil, especialmente por tratar-se de uma inter-venção de elevadíssimo custo. Entretanto, isso não quer dizer que os Cen-tros Brasileiros sejam incompetentes para realizar essa cirurgia.

10. Tanto no Brasil como no resto do mundo a principal experiência com essa cirurgia é no tratamento da doença de Parkinson e das Distonias Pri-márias. Não há um relato na literatura médica que estime com precisão o sucesso da cirurgia no tratamento de casos de distonia tardia.

Portanto, não há como determinar estatisticamente a probabilidade de su-cesso cirúrgico, nem como estimar a provável eficiência Brasileira em com-paração com a estrangeira [...]’

Em que pese todo o empenho da demandante em ressaltar a qualidade e a eficiência dos tratamentos cirúrgicos do centro de referência da Universida-de de Cleveland, estado de Ohio (EUA), restou satisfatoriamente comprova-do que há, de fato, instituição pública brasileira que realiza o mesmo tipo de cirurgia, não havendo elementos informativos infirmadores da ineficiência científica do centro de referência brasileiro.

Conforme pontuado pelo experto não há dados empíricos que atestam o grau de sucesso da cirurgia pretendida pela autora, nem mesmo se considerando os centros médicos de excelência sediados no exterior, pois há escassez no tratamento de casos de distonia tardia.

De outra banda, a partir de uma rápida leitura do currículo do médico indi-cado para a realização da cirurgia, denota-se a sólida e a específica formação em área da neurologia correlata ao problema enfrentado pela demandante, podendo-se afiançar que se trata de autoridade brasileira nesse campo da medicina.

Conquanto haja centros médicos estrangeiros referências mundiais no as-sunto, contando com prestígio internacional no específico campo do conhe-cimento técnico-científico, não se pode a priori e sem dados concretos que respaldem tal proceder, duvidar das qualidades e possibilidades dos institu-tos brasileiros, mormente do indicado.

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Este Órgão Ministerial, ainda que consternado com a situação pela qual pas-sa a demandante, sensibilizado pelo engajamento e pelo desmedido esfor-ço empreendidos no sentido de obter provimento jurisdicional favorável à pretensão, não poderia, sem ponderar que a União Federal disponibiliza a terapêutica para casos assemelhados, pura e simplesmente aquiescer com o custeamento da cirurgia no exterior.”

As alegações da autora, primeiro em relação à Tegrabenazina como alternativa de tratamento, levantaram a falta de seu registro na Anvisa e o risco de causar parkinsionismo (fl. 575). A falta de registro impede a livre importação e comercialização do produto no país, porém não obs-ta a discussão judicial quanto à necessidade e adequação do medica-mento na tutela do direito à vida e a saúde. Assim já decidiu esta Corte (AC 00084566820104036110, Rel. Des. Fed. Johonsom di Salvo, e-DJF3 14.06.2013). Saliente-se que o medicamento não é experimental, pois pos-sui registro na agência reguladora norte-americana (FDA). Ademais, no caso dos autos, é a própria União quem defende, com base no laudo, o tratamen-to com o uso de tal medicamento, assim a responsabilidade por eventual importação, inclusive no tocante a tal controle, será da apelada junto à Anvisa, conforme necessário.

Na perspectiva médica, o perito esclareceu que o tratamento prévio com uso de medicamento segue orientação pela preferência da abordagem menos invasiva com menor risco de complicações graves, e que a droga, em referência, pode melhorar o quadro de movimentos involuntários, não sen-do incompatível com medicações atualmente em uso pela autora, aduzin-do que efeitos colaterais conhecidos não incluem alterações de elementos do sangue, mas, sim, depressão, sonolência e parkinsionismo, os mesmos que poderiam resultar da cirurgia, o que indicaria menor risco no tratamen-to medicamentoso com potencial de resultado, ainda que a terapia possa eventualmente ser ineficiente no caso específico, o que não dispensaria o prévio esgotamento das tentativas farmacológicas, até porque a própria ci-rurgia pode não alcançar o êxito pretendido (fls. 555 e 570).

Quanto ao pedido de cirurgia no exterior, a autora sustentou que o tratamento no Brasil não é 100% eficiente e que existem riscos, entre 1 e 3% de hemorragia intracerebral com déficits neurológicos, indicando que o seu médico particular registrou preferência pelo tratamento nos Estados Unidos da América, por ser pioneiro em tal cirurgia, com ampla experiência e “com resultados positivos em muitos casos” (fl. 525).

A propósito, o perito judicial assinalou: “Sem dúvida deve haver Centros no exterior com maior experiência com esse procedimento que no

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Brasil, especialmente por tratar-se de uma intervenção de elevadíssimo cus-to. Entretanto, isso não quer dizer que os Centros Brasileiros sejam incom-petentes para realizar essa cirurgia. Tanto no Brasil como no resto do mundo a principal experiência com essa cirurgia é no tratamento da doença de Parkinson e das Distonias Primárias. Não há um relato na literatura médica que estime com precisão o sucesso da cirurgia no tratamento de casos de distonia tardia. Portanto, não há como determinar estatisticamente a pos-sibilidade de sucesso cirúrgico, nem como estimar a provável eficiência brasileira em comparação com a estrangeira.” (fls. 570/1)

Embora os resultados de riscos e êxitos cirúrgicos, no tratamento no Brasil, constem de informações prestadas pelo Departamento de Neurolo-gia da FMUSP (fl. 579), os dados de cirurgias realizadas no exterior foram selecionados através de planilha feita pela autora, citando fonte, mas sem origem atestada e, além do mais, referindo-se a casos individuais, sobretudo do ano de 2004, com o desempenho individual por caso, e não com análise global de casos para extração de estatística média de desempenho, como constou da informação fornecida pela FMUSP.

Assim, não existe base empírica para comprovar ou fornecer, com aplicabilidade ao caso concreto, elemento técnico-científico de compara-ção, tanto que o médico da autora, em declaração escrita, apenas disse que “Acredito que a cirurgia seja a opção mais adequada. E sugiro que seja re-alizada nos Estados Unidos, pois no Brasil não é comum a realização deste tipo de cirurgia sendo necessário um lugar com maior número de casos” (fl. 593).

Cabe destacar, por absolutamente fundamental, que a presente ação tem como objetivo específico compelir a ré a custear todo o tratamento cirúrgico no exterior, incluindo traslado e despesas com acompanhante. Assim, não cabe, aqui, determinar que a autora deva sujeitar-se a este ou aquele tratamento, através seja de medicamento, seja de cirurgia no Brasil, mas apenas decidir, nos limites do que interessa à controvérsia, se existe alternativa ao tratamento cirúrgico no exterior diante da resistência mani-festada pela ré.

Conforme já verificado nos autos, a representante legal não deseja su-jeitar a autora a tratamento farmacológico nem à cirurgia no Brasil, inclusive porque rejeitou tal possibilidade quando a própria União buscou cumprir acórdão da Turma proferido na ação cautelar previamente ajuizada, tanto que foi proposta a presente ação com o objetivo específico apontado.

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Neste particular, como restou suficientemente demonstrado, não é possível, à conta do Poder Público, autorizar o custeio de tratamento cirúr-gico no exterior, quando existentes alternativas de tratamento no país.

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

Carlos Muta Desembargador Federal

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 12.08.2014Apelação Cível nº 0003498‑17.2007.4.03.6119/SP2007.61.19.003498‑8/SPRelator: Desembargador Federal Mairan MaiaApelante: Aerosuporte Ltda.Advogado: MA007775 Farney Douglas Ferreira Ferraz e outroApelado(a): Empresa Brasileira de Infra‑Estrutura Aeroportuária – InfraeroAdvogado: SP149946 Jose Sanches de Faria e outro

EMENTAADMINISTRATIVO – LICITAÇÃO – CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – EFETIVO MÍNI-MO – OBRIGAÇÃO CONSTANTE DO EDITAL – PRINCÍPIOS DA VINCULAÇÃO AO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO E DA MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO – INOBSER-VÂNCIA – INEXECUÇÃO PARCIAL DO CONTRATO – GLOSAS AOS PAGAMENTOS DAS FATURAS – PREVISÃO EDITALÍCIA – LEGITIMIDADE – SENTENÇA MANTIDA

1. A teor do princípio da vinculação ao instrumento convocatório, o edital constitui norma inderrogável do certame, cujos contornos não podem ser infringidos pela Administração Pública e, tampouco, por parte daqueles que afluem à disputa. Ao se credenciar, o licitante anui às exigências contidas no edital, sujeitando-se a todos os seus comandos, inclusive às penalidades e responsabilidades expressa-mente consignadas em seu corpo, ônus que compõem o equilíbrio econômico-financeiro do futuro contrato administrativo.

2. In casu, constava do “Caderno de Especificações Técnicas para Contratação de Serviços de Proteção” previsão de efetivo mínimo para o desempenho dos serviços a serem contratados, elemento que deveria ser observado não apenas quando da formulação da propos-ta, como também durante a execução da avença.

3. A alegação de inexistência de prejuízos no tocante ao bom desem-penho dos serviços contratados não tem o condão de desconstituir as glosas administrativas, as quais dizem respeito ao equilíbrio econômi-co-financeiro da avença.

4. Dentre as despesas gerais consideradas para formação do preço global, encontram-se aquelas relativas aos custos com mão de obra,

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de sorte que a remuneração dos empregados, os gastos com uniforme e demais encargos sociais integraram o custo da proposta ofereci-da no certame, repercutindo na escolha do vencedor. Desconsiderar essa realidade implicaria, em última análise, desprestígio à isonomia e à busca pela máxima competitividade, características inerentes a todo e qualquer procedimento licitatório.

5. O contrato administrativo previa a possibilidade de a Infraero pro-ceder à retenção de valores das Faturas/Notas Fiscais de pagamento em hipóteses como a vertente, em que a execução do contrato ocor-reu sob condições diversas daquelas que propiciaram a contratação, o que equivale à sua inexecução parcial.

6. Apelação a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 31 de julho de 2014.

Mairan Maia Desembargador Federal

RELATÓRIO

Cuida-se de ação de conhecimento, processada sob o rito comum ordinário, ajuizada por Aerosuporte Ltda. em face da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária – Infraero, visando à desconstituição de glosa contratual realizada durante a execução do Contrato nº 0078-SV/2004/0024.

Narra a autora ter firmado com a ré, em 20 de dezembro de 2004, contrato administrativo para a prestação de serviços de controle de acesso e proteção no Aeroporto Internacional de Congonhas/São Paulo/SP.

Informa ter recebido, em 15 de janeiro de 2007, comunicado de que deveria ressarcir aos cofres públicos, mediante glosa nas próximas faturas apresentadas, a quantia de R$ 231.445,80 (duzentos e trinta e um mil, qua-trocentos e quarenta e cinco reais e oitenta centavos), sob o fundamento de

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ter desenvolvido suas atividades com efetivo diverso do previsto no con-trato.

Sustenta ser indevida a glosa, em síntese, porque: i) não havia sido acordada a quantidade mínima de funcionários para a execução dos ser-viços; ii) cuidava-se de contratação sob o regime de empreitada por preço global; iii) inexistia previsão contratual para o procedimento de glosa na hipótese em questão.

Com a inicial, vieram os documentos de fls. 20/121.

Antecipação de tutela indeferida às fls. 207/211.

Regularmente citada, a Infraero apresentou contestação (fls. 226/235).

A autora apresentou réplica às fls. 300/312.

A sentença julgou improcedente o pedido (fls. 317/323). Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa.

Em apelação, a autora pugnou a reforma da decisão, reiterando a argumentação expendida na inicial (fls. 326/346).

Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta Corte.

Dispensada a revisão, na forma regimental.

É o relatório.

Mairan Maia Desembargador Federal

VOTO

Cinge-se a controvérsia à legitimidade de glosa administrativa reali-zada sobre o pagamento de faturas apresentadas pela empresa autora, em razão da constatação de divergências entre o efetivo de empregados con-tratados para a execução do serviço e aquele apresentado nas folhas de pagamento de agosto/2005 a outubro/2006.

A sentença não comporta reformas.

Em primeiro lugar, é certo que, ao contrário do sustentado pela recor-rente, constava do “Caderno de Especificações Técnicas para Contratação de Serviços de Proteção”, anexado ao edital de abertura do certame, previ-são de efetivo mínimo para a execução dos serviços a serem contratados. Confira-se (fls. 51/61):

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“7 – QUANTITATIVO DE POSTOS DE TRABALHO

7.1 – Cada licitante deve processar seu custo com base no preço dos serviços para 10 (dez) postos de 24 horas ininterruptas, e 17 (dezessete) postos de 18 horas, todos os dias, inclusive sábados, domingos e feriados, prevendo as necessidades de rendição para intervalos e lanches e refeições de seus fun-cionários, inclusive, mantendo efetivo para compor a escala como reserva técnica, para cobrir eventuais faltas de funcionários nos turnos de trabalho.

Obs.: Ressalto que para cobertura dos postos descritos no item 7.1, o efetivo mínimo a ser considerado é de 136 (Cento e trinta e seis) empregados.”

Nessa esteira, aliás, a própria apelante, no plano de trabalho apresen-tado à Infraero, ressaltou que o efetivo mínimo seria de 136 (cento e trinta e seis) empregados, tal como previsto no item 7.1 supratranscrito (cf. fl. 155).

Ora, a teor do princípio da vinculação ao instrumento convocatório, o edital constitui norma inderrogável do certame, cujos contornos não podem ser infringidos pela Administração Pública e, tampouco, por parte daqueles que afluem à disputa. Em outras palavras, ao se credenciar, o licitante anui às exigências contidas no edital, sujeitando-se a todos os seus comandos, inclusive às penalidades e responsabilidades expressamente consignadas em seu corpo, ônus que compõem o equilíbrio econômico-financeiro do futuro contrato administrativo.

A respeito do tema, oportuna a lição de Marçal Justen Filho, cujas palavras peço vênia para reproduzir:

“Cada parte do contrato administrativo tem o dever de cumprir suas presta-ções na forma, no tempo de no lugar previstos no contrato. Como já apon-tado, aplica-se a regra do dies interpellat pro homine, sendo desnecessário um ato formal para constituição em mora do devedor inadimplente. A ine-xecução contratual acarreta as conseqüências discriminadas na lei, no ato convocatório e no contrato.

O inadimplemento contratual autoriza, conforme o caso, a responsabiliza-ção civil, penal e administrativa dos sujeitos responsáveis.”

(in Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 368)

Vale destacar, no ponto, que o contrato administrativo, em suas cláu-sulas 3.5, 3.5.1, 3.5.2, 3.5.3 e 13.16, previa a possibilidade de a Infraero proceder à retenção de valores das Faturas/Notas Fiscais de pagamento em hipóteses como a vertente, em que a execução do contrato ocorreu sob condições diversas daquelas que propiciaram a contratação, o que equivale à sua inexecução parcial.

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Confira-se, por oportuno, o teor das cláusulas retromencitadas:

“3.5 – A contratante, sem prejuízo de exercer outras prerrogativas contra-tuais, poderá sustar o pagamento de qualquer Nota Fiscal de Prestação de Serviços apresentada pela contratada, no todo ou em parte, nos seguintes casos:

3.5.1 – execução parcial ou defeituosa dos serviços;

3.5.2 – existência de débito da contratada para com a contratante, quer pro-veniente da execução do presente Contrato ou de obrigações ajustadas em outros contratos;

3.5.3 – não cumprimento de obrigação contratual, hipótese em que o paga-mento ficará retido até que a contratada atender à cláusula infringida, salvo o disposto no subitem 3.3.1.1;

[...]

13.16 – Fica autorizada a contratante glosar da Fatura/Nota Fiscal de Presta-ção de Serviços, emitida pela contratada, todos os valores correspondentes a quaisquer serviços não realizados e/ou materiais não utilizados nos serviços contratados.”

Dessa forma, uma vez constatado pela contratante que a prestação dos serviços ocorreu de modo diverso daquele previamente estabelecido, a glosa nos pagamentos era medida que se impunha, não podendo a contra-tada descumprir obrigação em relação à qual aderiu voluntariamente, seja no momento em que se inscreveu no certame, seja quando da assinatura do contrato.

Por outro lado, a alegação de inexistência de prejuízos no tocante ao bom desempenho dos serviços contratados não tem o condão de des-constituir as glosas administrativas, as quais dizem respeito ao equilíbrio econômico-financeiro da avença, definido nas precisas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello como “a relação de igualdade formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo contratante no momento do ajuste e, de outro lado, pela compensação econômica que lhe corresponderá” (in Curso de direito administrativo. 14. ed. Malheiros: 2002, p. 577).

Isso porque, dentre as despesas gerais consideradas para formação do preço global, encontram-se aquelas relativas aos custos com mão de obra, de sorte que a remuneração dos empregados, os gastos com uniforme e de-mais encargos sociais integraram o custo da proposta oferecida no certame, repercutindo na escolha do vencedor.

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Desconsiderar essa realidade implicaria, em última análise, desprestí-gio à isonomia e à busca pela máxima competitividade, características ine-rentes a todo e qualquer procedimento licitatório.

E o edital foi expresso quanto às despesas integrantes da proposta comercial, consoante se colhe de sua cláusula 6.3, alínea e, cujo teor peço vênia para transcrever (fl. 52):

“6.3 – No invólucro da proposta de preços deverá conter todos os elementos a seguir relacionados:

[...]

e) Declaração expressa de que o preço cotado inclui todos os custos diretos e indiretos para perfeita execução dos serviços, inclusive das despesas com materiais e/ou equipamentos, mão-de-obra, seguros em geral, equipamentos auxiliares, ferramentas, encargos da Legislação Social, Trabalhista, Previden-ciária, da Infortunística do trabalho e responsabilidade civil por qualquer dano causado a terceiros ou dispêndios resultantes de impostos, taxas, re-gulamentos e posturas municipais, estaduais e federais, enfim, tudo o que for necessário para a execução total e completa dos serviços, bem como o seu lucro, não cabendo, em qualquer caso, direito regressivo em relação à Infraero;”

Tem-se, por toda argumentação expendida, a legitimidade da glosa realizada pela Infraero, motivo pelo qual a sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos.

No mesmo sentido do aqui decidido, destaco o seguinte julgado desta E. Turma, de minha relatoria:

“ADMINISTRATIVO – AGRAVO RETIDO PREJUDICADO – CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – NÚMERO MÍNIMO DE EMPREGADOS – PRE-VISÃO NO EDITAL E NO CONTRATO ADMINISTRATIVO – DESCUMPRI-MENTO – INEXECUÇÃO PARCIAL DO CONTRATO – LEGALIDADE DA GLOSA ADMINISTRATIVA

1. Prejudicado o agravo retido, porquanto a decisão de indeferimento da liminar, objeto de inconformismo da recorrente, foi substituída por sentença.

2. Ao se credenciar, o licitante anui às exigências contidas no edital, sujei-tando-se a todos os seus comandos, inclusive às penalidades expressamente consignadas em seu corpo. Princípio da vinculação ao instrumento convo-catório.

3. No caso vertente, consoante previsto no item 3.1 do Termo de Referência – anexo IV do Edital do Pregão Eletrônico nº 013/ADGR-4-SBGR/2007, a

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impetrante encontrava-se obrigada a disponibilizar 512 empregados para a execução do serviço contratado.

4. Muito embora a hipótese vertente se refira ao regime de empreitada por preço global, a remuneração dos empregados e demais encargos sociais ine-gavelmente integraram o custo da proposta oferecida no pregão, repercu-tindo na escolha do vencedor. Consequentemente, desconsiderar o número mínimo de funcionários previsto no edital implicaria desprestígio à isonomia e à busca pela máxima competitividade, características inerentes a todo e qualquer procedimento licitatório.

5. Ainda que admitida a execução do contrato com efetivo inferior àquele previsto no edital de abertura da licitação, a aferição da qualidade e do resul-tado dos serviços prestados demandaria dilação probatória, medida incom-patível com a via estreita da ação mandamental.”

(AC 0003285-74.2008.4.03.6119/SP, DE 01.03.2013)

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.

Mairan Maia Desembargador Federal

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 02.09.2014Agravo de Instrumento nº 0007002‑11.2014.4.03.0000/SP2014.03.00.007002‑3/SPRelator: Desembargador Federal Nino ToldoAgravante: Thiago da SilvaAdvogado: SP254765 Franklin Pereira da Silva e outroAgravado(a): União FederalAdvogado: SP000019 Tércio Issami Tokano e outroOrigem: Juízo Federal da 19ª Vara São Paulo Sec. Jud./SPNº Orig.: 00031830220144036100 19ª Vr. São Paulo/SP

EMENTAPROCESSO CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – SERVIDOR MILITAR TEMPORÁRIO – REIN-TEGRAÇÃO

O militar temporário da Aeronáutica, uma vez esgotado o prazo máxi-mo de sua permanência no serviço ativo (oito anos no total de efetivo serviço) será licenciado ex officio, por força da lei (Lei nº 6.880/1980, art. 121, § 3º, a), não havendo necessidade de motivação adicional do ato administrativo de licenciamento.

Não há falar-se que a Portaria nº 467/GC3/2010 do Comando da Aeronáutica asseguraria o limite de oito anos de tempo de serviço exclusivamente na graduação de cabo. A interpretação lógica do dis-posto em seu art. 1º evidencia a necessidade de ser computado todo o período de serviço ativo, inclusive em graduações inferiores.

Não se verifica ilegalidade no ato administrativo de licenciamento do agravante, a contar de 27.02.2013, levando-se em conta que sentou praça em 01.03.2005. Respeitou-se o limite máximo de oito anos de serviço ativo estabelecido na legislação de regência.

Agravo desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da

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3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do pre-sente julgado.

São Paulo, 26 de agosto de 2014.

Nino Toldo Desembargador Federal

RELATÓRIO

O Senhor Desembargador Federal Nino Toldo (Relator): Trata-se de agravo de instrumento interposto por Thiago da Silva em face de decisão proferida pela 19ª Vara Federal de São Paulo/SP, que indeferiu pedido de antecipação de tutela objetivando sua reintegração ao serviço ativo da Aeronáutica, em sua antiga Organização Militar, garantindo todos os direi-tos decorrentes dessa condição.

Alega o agravante, em síntese, que após sucessivas prorrogações vo-luntárias do tempo de serviço militar, obteve, ao concluir o Curso de For-mação de Cabos, nova prorrogação do tempo de serviço, de natureza obri-gatória, por um período de dois anos. No seu entender, isso asseguraria sua permanência no serviço ativo até 02.06.2013.

Entretanto, antes de expirado o termo final da prorrogação, e sem fundamentação específica, a Administração Militar licenciou o recorrente em 27.02.2013.

Pede a concessão do efeito suspensivo ativo, e, ao final, o provimento do agravo.

O efeito suspensivo ativo requerido foi indeferido.

A parte agravada ofereceu contraminuta.

VOTO

Este o teor da fundamentação da decisão que indeferiu o requerimen-to de antecipação da tutela recursal formulado pela agravante:

Assim dispõe o caput do art. 558 do Código de Processo Civil:

Art. 558. O relator poderá, a requerimento do agravante, nos casos de prisão civil, adjudicação, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução

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idônea e em outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamento definitivo da turma ou câmara.

A concessão do efeito suspensivo, como se nota, é medida excepcional (a re-gra continua sendo a de que o recurso de agravo não é dotado de efeito sus-pensivo – CPC, art. 497), a ser concedida em casos nos quais o cumprimento da decisão agravada possa causar lesão grave e de difícil reparação à parte.

Sua concessão demanda o preenchimento dos pressupostos das medidas cautelares em geral: relevância da fundamentação (fumus boni iuris) e perigo de dano irreparável e de difícil reparação (periculum in mora).

O exame das alegações formuladas neste agravo de instrumento, contudo, não demonstra, ao menos inicialmente, a plausibilidade do direito invocado.

De fato, os autos revelam que o agravante foi incorporado às fileiras da Força Aérea Brasileira em 01.03.2005.

Foi promovido a Soldado de Primeira Classe em 13.11.2007.

Já em 2011, foi selecionado para realizar o Curso de Formação de Cabos, lo-grando obter aprovação. Consta, à fl. 66, que em consequência da promoção a esta graduação, o militar ficaria engajado obrigatoriamente por dois anos (art. 25, § 1º, do Decreto nº 3.690/2000), observado o limite máximo de per-manência no serviço ativo de oito anos, conforme estabelecido na Portaria nº 467/GC3/2010.

A contar de 27.02.2013, foi o agravante licenciado, ex officio, do serviço ativo, com fundamento na alínea a do § 3º do art. 121 da Lei nº 6.880/1980.

Assim dispõem os dispositivos normativos acima mencionados:

Lei nº 6.880/1980:

Art. 121. O licenciamento do serviço ativo se efetua:

§ 3º O licenciamento ex officio será feito na forma da legislação que trata do serviço militar e dos regulamentos específicos de cada Força Armada:

a) por conclusão de tempo de serviço ou de estágio;

Portaria nº 467/GC3/2010, do Comando da Aeronáutica:

Art. 1º Fixar, para os militares que venham a ser incluídos no Quadro de Cabos da Aeronáutica (QCB), a partir da entrada em vigor desta Portaria, a prorrogação de tempo de serviço até o limite máximo de oito anos de efetivo serviço.

Parágrafo único. As prorrogações de tempo de serviço serão concedidas por períodos sucessivos de dois anos, exceto a prorrogação que implique

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em ultrapassar o limite previsto no caput deste artigo, quando então de-verão ser concedidas por períodos inferiores.

O que se percebe, portanto, é que o licenciamento ex officio do serviço ativo da Força Aérea dar-se-á em razão da conclusão do tempo de serviço, cujo limite máximo é de oito anos.

Ainda que tenha havido prorrogação obrigatória por dois anos, como coro-lário da promoção à graduação de cabo, ela não pode ultrapassar o limite de dois anos, tal como determina, de forma explícita, o parágrafo único do art. 1º da Portaria nº 467/GC3/2010.

Ao contrário do quanto sustentado pelo agravante em sua petição recursal, não há falar-se que a mencionada Portaria nº 467 asseguraria o limite de oito anos de tempo de serviço exclusivamente na graduação de cabo.

De fato, a interpretação lógica do disposto em seu art. 1º evidencia a ne-cessidade de ser computado todo o período de serviço ativo, inclusive em graduações inferiores. Não fosse assim, restaria sem sentido a parte final do parágrafo único do art. 1º, naquilo em que prevê, caso necessário, a conces-são de prorrogação por período inferior a dois anos, como forma de evitar seja ultrapassado o limite de oito anos de serviço ativo.

Ora, se a contagem dos oito anos somente tivesse início a partir da inclusão do militar no Quadro de Cabos, já na vigência da Portaria nº 467/2010, bas-taria a concessão de quatro prorrogações de dois anos, sem que se pudesse cogitar de desbordo daquele parâmetro máximo.

A previsão do parágrafo único, portanto, pressupõe que o militar, ao ingres-sar no Quadro de Cabos, tenha computado o tempo de serviço anterior a esta graduação, de forma a tornar necessário, em certos casos, que se prorrogue o tempo de engajamento por menos de dois anos, como forma de não ultra-passar o limite máximo de oito.

Importante consignar, por oportuno, que a menção feita no documento à fl. 66, de engajamento obrigatório por dois anos, não gera, à primeira vista, direito adquirido do militar de permanecer em serviço ativo por todo esse tempo, ainda que em prejuízo do período máximo previsto na legislação de regência. Incide, aí, o princípio da legalidade, a balizar a atuação do admi-nistrador público, oportunizando, inclusive, a revisão de seus próprios atos, com o intuito de adequá-los às normas jurídicas aplicáveis.

Percebe-se, por derradeiro, que o militar temporário da Aeronáutica, uma vez esgotado o prazo máximo de sua permanência no serviço ativo (oito anos no total, consideradas todas as graduações por que passou), será licen-ciado ex officio, por força da lei (Lei nº 6.880/1980, art. 121, § 3º, a), não havendo necessidade de motivação adicional do ato administrativo de licen-ciamento. Nesse sentido, julgado do Superior Tribunal de Justiça:

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AÇÃO RESCISÓRIA – VIOLAÇÃO LITERAL A DISPOSITIVO LEGAL – ERRO DE FATO – ART. 485, V E IX, DO CPC – INOCORRÊNCIA

Militar temporário da Aeronáutica. Permanência no serviço ativo pelo prazo fixado na legislação regente. Direito à permanência além do prazo legal não configurado.

Esgotado o prazo de incorporação, não merece reparo o licenciamento do militar do serviço, que se opera ex vi legis, descarecendo de motiva-ção a decisão que o dispensa.

Ação julgada improcedente.

(AR 1.125/RJ, 3ª S., Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Julgado em 25.04.2001, DJ 29.10.2001, p. 180)

Não se verifica, à primeira vista, assim, ilegalidade no ato administrativo de licenciamento do agravante, a contar de 27.02.2013, levando-se em conta que sentou praça em 01.03.2005. Respeitou-se o limite máximo de oito anos de serviço ativo estabelecido na legislação de regência.

Posto isso, indefiro o pedido de antecipação da tutela recursal.

Assim, haja vista que o licenciamento ex officio do serviço ativo da Força Aérea ocorre em razão da conclusão do tempo de serviço, cujo limite máximo é de oito anos de efetivo serviço e, tendo o agravante permanecido no serviço ativo por tal prazo, não se verifica razão para sua reintegração.

Posto isso, nego provimento ao agravo de instrumento.

É o voto.

Nino Toldo Desembargador Federal

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

6739

Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoApelação Cível nº 5034204‑02.2011.404.7000/PRRelator: Cândido Alfredo Silva Leal JuniorApelante: Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANPApelado: C. R. Scalco & Cia. Ltda.Advogado: Danieli Cristina Marcon

Diego Balem

EMENTAADMINISTRATIVO – COMERCIALIZAÇÃO DE GÁS DESCARACTERIZADA – USO DO GÁS PARA CONSUMO PRÓPRIO – MULTA – NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO

A necessidade de armazenamento dos botijões para consumo próprio ficou devidamente demonstrada pela prova testemunhal, devendo ser anulado o auto de infração em debate, que se baseou na comerciali-zação de botijões de gás sem a devida autorização.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 26 de agosto de 2014.

Desembargador Federal Cândido Alfredo Silva Leal Junior Relator

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que julgou procedente o pedido formulado nos autos da ação ordinária por meio da qual a parte autora pretende a anulação da multa que lhe foi aplicada pela ANP por comercializar botijões de gás sem a devida autorização.

Em sede de razões recursais (evento 95), a Agência Nacional de Pe-tróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP sustenta que: (1) a prova tes-

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temunhal revela que os botijões de gás não se destinavam para consumo próprio, mas para a comercialização do produto. Além disso, no estabeleci-mento comercial fiscalizado foram apreendidos 33 (trinta e três) botijões de gás GLP, a maioria cheios (23), o que afasta qualquer possibilidade de serem somente para consumo próprio; (2) considerando a falta de autorização ou credenciamento para a atividade de produto perigoso, somada às demais irregularidades verificadas no estabelecimento pelo fiscal, não há como exi-mir a empresa do pagamento da multa; (3) não pode o Judiciário reavaliar as razões e os motivos apresentados pela Autarquia ANP, a fim de se analisar a conveniência ou não de se manter a multa, ou seja, não cabe ao Judiciário exercer função que compete única e exclusivamente a esta Agência.

Foram apresentadas contrarrazões.

É o relatório.

Inclua-se em pauta.

VOTO

A discussão posta nestes autos diz respeito, em essência, à higidez jurídica da multa aplicada à empresa autora pela ANP em decorrência da lavratura do Auto de Infração nº 110382, capeado pelo Processo Adminis-trativo nº 48621.000047/2005-13.

Mantenho e adoto como razão de decidir a sentença da Juíza Federal Gisele Lemke, que julgou procedente a ação, transcrevendo os seguintes trechos:

A parte autora visa à anulação da multa que lhe foi aplicada pela ANP por comercializar botijões de gás sem a devida autorização.

O autor sustenta na petição inicial que os botijões de gás que foram encon-trados em seu estabelecimento eram destinados ao consumo próprio, pois o estabelecimento se trata de supermercado, no qual há lanchonete e padaria.

Por ocasião da fiscalização da ANP foram apreendidos 23 botijões de gás cheios e 10 vazios (PROCADM2 – evento 29).

Em seu depoimento pessoal (AUDIO MP32 – evento 23 da carta precatória), o representante legal da autora narrou, em síntese, que ao adquirir o esta-belecimento em questão, os botijões de gás lá existentes permaneceram no supermercado. Afirmou que tais botijões são utilizados para consumo pró-prio, pois o estabelecimento conta, além de supermercado, com lanchonete e padaria, havendo necessidade de estoque dos botijões, devido ao alto con-sumo. Esclareceu que promove somente a comercialização de “vale-gás”, ou

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seja, que promove a compra do “vale-gás” de estabelecimento terceirizado, responsável pelo armazenamento e entrega dos botijões, promovendo ape-nas a revenda do ‘vale-gás’ aos seus clientes.

Segundo o depoimento da testemunha Kennedy Miguel Sá (AUDIO MP33 – evento 23 da carta precatória), diante da proibição de comercialização, os botijões de gás foram retirados da frente do estabelecimento e levados para os fundos, não ficando expostos para a venda. A testemunha narrou, em síntese, que depois da proibição (quando revogada a autorização da ANP), o autor iniciou a venda de botijões de gás somente mediante o sistema de “va-le-gás”, sendo que o consumidor adquire o “vale-gás” no estabelecimento do autor, mas o armazenamento e a entrega dos botijões se dá pela empresa da qual a testemunha é proprietária. Disse que o autor também adquire os botijões para consumo próprio do estabelecimento da testemunha. Afirmou que os botijões que se encontravam no estabelecimento do autor eram para consumo próprio, pois há lanchonete e padaria no local, o que consome, em média, 10 a 15 botijões por semana. Esclareceu que há necessidade de o autor manter um estoque no estabelecimento, pois a empresa da testemunha, que faz a entrega dos botijões, fica aproximadamente há 50 km de distância. O número de botijões vendidos pela autora pelo sistema de ‘vale-gás’ era de aproximadamente 200 por mês.

A testemunha João Roberto de Carli (AUDIO MP34 – evento 23 da carta pre-catória), disse que é cliente do supermercado autor e que a comercialização de botijões se dá mediante “vale-gás”. Afirmou que o antigo mercado que existia no local promovia a venda de botijões, os quais ficavam expostos em frente ao mercado, dentro de uma grade. Afirmou, também, que depois da alteração do nome do mercado as grades foram retiradas e não há mais botijões expostos.

Em seu depoimento, a testemunha João Reinaldo Parizzoto (AUDIO MP35 – evento 23 da carta precatória), disse ser cliente do autor, e que a comercia-lização de botijões se dá mediante “vale-gás”. Narrou que a entrega dos boti-jões se dá na residência do cliente ou pode ser retirado no depósito, depósito este que não se trata do supermercado. Afirmou desconhecer como se dava a comercialização de botijões de gás antes da aquisição do supermercado pelo atual proprietário.

Foram tomados os depoimentos, ainda, de Luiz Carlos Brandalize e Juarez Francisco Crestani (AUDIO MP36 e AUDIO MP37 – evento 23 da carta pre-catória, respectivamente), os quais foram ouvidos na qualidade de informan-tes. Em tais depoimentos, os informantes esclareceram que a venda de gás é feita no sistema “vale-gás” e que o consumo de gás da autora é grande, devido à existência de lanchonete e padaria no local, havendo necessidade de troca de botijões frequentemente.

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Em que pese o auto de infração gozar de presunção de legitimidade, o fato é que a prova testemunhal produzida nos autos comprovou que os botijões que se encontravam no estabelecimento do autor, por ocasião da fiscalização, se tratavam de botijões para consumo próprio e não para a comercialização.

A necessidade de armazenamento dos botijões ficou devidamente demons-trada, diante do grande consumo de gás pelo autor (10 a 15 botijões por semana, segundo a testemunha Kennedy), por contar o estabelecimento com lanchonete e padaria, mostrando-se a quantidade de botijões apreendidos por ocasião da fiscalização (23 botijões cheios e 10 botijões vazios) compa-tível com o consumo do autor.

E, diversamente do alegado na contestação, não houve autuação pelo ar-mazenamento dos botijões de gás, mas apenas pela sua comercialização indevida, a qual, como visto, não ocorreu.

Deve ser anulado, portanto, o auto de infração em debate.

Desnecessária a manifestação acerca da prescrição intercorrente, alegada pelo autor na inicial, tendo em vista o juízo de procedência do seu pedido.

Por fim, é o caso de reexame do pedido de antecipação da tutela, tendo em vista o juízo de procedência da ação, com o que está presente o requisito da aparência de bom direito.

Nesse momento processual considero presente também a urgência, pois a parte autora tem necessidade de suspensão da exigibilidade do auto de infra-ção, sendo que o ônus da demora, própria do processo judicial, nessa fase, i.e., após a produção de provas e com decisão favorável em 1ª Instância, deve passar a ser suportado pela parte ré, e não mais pela parte autora.

Diante do exposto,

Julgo procedente o pedido, para o fim de anular a multa aplicada no Auto de Infração nº 908.308.2004.41.110382, objeto dos autos.

Antecipo a tutela, para o fim de suspender a exigibilidade da multa aplicada à autora.

Condeno a ré ao reembolso das custas processuais adiantadas pela autora e ao pagamento dos honorários de sucumbência, os quais, com fulcro no art. 20, §§ 3º e §4º, do CPC, e considerado o valor atribuído à causa e que se tratou de processo bastante trabalhoso, fixo em R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais), valor a ser acrescido de correção monetária e de juros de mora nos termos do disposto na Lei nº 11.960/2009 até a data do efetivo pagamento.

A manutenção da sentença é medida que se impõe, porque, embo-ra pareça que o armazenamento de 23 botijões de gás cheios e 10 vazios pela empresa autora de destine ao comércio, restou comprovado pela prova

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testemunhal que ela os possuía para uso na padaria e lanchonete. Restou esclarecido que o supermercado, para manter o funcionamento da padaria e da lanchonete, consumia, em média, 10 a 15 botijões por semana. Assim, a prova testemunhal (evento 23 da carta precatória, anexada ao evento 79) revelou que o supermercado (empresa autora) tinha botijões para consumo próprio. Portanto, deve ser anulado o auto de infração em debate.

Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso.

Desembargador Federal Cândido Alfredo Silva Leal Junior Relator

ExTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 26.08.2014

Apelação Cível nº 5034204-02.2011.404.7000/PR

Origem: PR 50342040220114047000

Relator: Des. Federal Candido Alfredo Silva Leal Junior

Presidente: Cândido Alfredo Silva Leal Junior

Procurador: Dr. Luiz Carlos Weber

Apelante: Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP

Apelado: C. R. Scalco & Cia. Ltda.

Advogado: Danieli Cristina Marcon Diego Balem

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 26.08.2014, na sequência 1, disponibilizada no DE de 14.08.2014, da qual foi intimado(a) o Ministério Público Federal e as demais Procuradorias Federais.

Certifico que o(a) 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epí-grafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso.

Relator Acórdão: Des. Federal Candido Alfredo Silva Leal Junior

Votante(s): Des. Federal Candido Alfredo Silva Leal Junior Desª Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha Des. Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle

Luiz Felipe Oliveira dos Santos Diretor de Secretaria

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra6740

Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoPoder JudiciárioGabinete do Desembargador Federal Rogério Fialho MoreiraAC 570290‑Al 0002956‑83.2011.4.05.8000Apte.: José Gilvan Ribeiro Almeida FilhoApte.: Paulo César de MedeirosApte.: Marize de Lima Lopes FragosoAdv./Proc.: Sergio Paulo Caldas NewtonApdo.: Ministério Público FederalOrigem: 1ª Vara Federal de AlagoasJuiz Federal André Luís Maia Tobias GranjaRelator: Des. Federal Convocado Bruno Teixeira de Paiva

EMENTAADMINISTRATIVO – IMPROBIDADE – LICITAÇÃO – SOBREPREÇO – PREJUÍZO AO ERÁRIO NÃO COMPROVADA – PESQUISA DE PREÇO ANALISADA ISOLADAMENTE É ELEMENTO INÁBIL À COMPROVAÇÃO DO DANO AO ERÁRIO – PERCENTUAL DE DIFERENÇA ENTRE O VALOR DA PESQUISA E O VALOR CONTRATADO DE VALORES GLOBAIS BAIXOS (20% VINTE POR CENTO) – POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DE PREÇO DE MERCADO – DOLO, MÁ-FÉ E CULPA PUNÍVEL NÃO CONFIGURADA – APELO PROVIDO

Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal con-tra sentença que julgou parcialmente o pedido deduzido em ação de improbidade administrativa, ajuizada pelo Ministério Público Federal contra José Danilo Damaso de Almeida, José Wanderley Neto, Paulo César de Medeiros, José Gilvan Ribeiro de Almeida Filho, Marize de Lima Lopes Fragoso, Edgar Camilo de Moraes Filho, Gilvanete Costa de Alcântara Silva e Luciana Tenório da Silva Sarmento, através da qual busca a condenação dos réus nas penalidades do art. 12, II e III da Lei nº 8.429/1992 por de ato de improbidade causador de dano ao erário (cf. art. 10, V, VIII, XI, XII 2), bem como do art. 37, § 4º da Constituição Federal de 1988.

Sentença julgou procedente o pedido deduzido em ação civil pública, para reconhecer a prática de improbidade administrativa, nos termos do art. 10, incisos I, VIII, XII, da Lei nº 8.429/1992, condenando-os em: a) suspensão dos direito políticos por um período de 05 (cinco) anos; b) proibição de contratar com os poderes públicos federal, es-

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tadual e municipal, pelo período de 05 (cinco) anos; c) restituição de R$ 83.152,10 (oitenta e três mil, cento e cinquenta e dois reais e dez centavos), apropriados indevidamente dos recursos destinados às Tomadas de Preço nº 07/2007 e 11/2007 do Município de Marechal Deodoro/AL, bem como ao pagamento de multa civil no valor de R$ 8.300,00 (oito mil e trezentos reais).

O processo foi julgado extinto, sem resolução de mérito, com relação ao réu José Danilo Dâmaso de Almeida, nos termos do art. 267, IV do CPC, e improcedente com relação aos réus José Wanderley Neto, Edgar Camilo de Morais, Gilvanete Costa de Alcântara e Luciana Tenório da Silva Sarmento.

Em suas razões de apelo, sustentam, em síntese que, além da pres-crição: a) não houve dolo na conduta praticada; b) as irregularidades apontadas não configuraram o extremo de uma improbidade admi-nistrativa; c) não houve beneficiamento a empresas e; d) a condena-ção é baseada unicamente no suposto sobrepreço nas Tomadas de Preço nºs 08 e 11/2007.

Sentença que, diferenciando meras irregularidades de atos ilegais e atos de improbidade administrativa, afastou as variadas irregula-ridades apontadas pelo MPF na licitação, por não enxergar quais-quer condutas desonestas ou de má-fé por parte dos réus. Entretanto, apenas no que tange às Tomadas Preços nº 08/2007 e 11/2007, em que fora homologado valor aproximadamente 20% (vinte por cento) superior àquele apurado na pesquisa prévia de preço de mercado, a sentença condenou os réus Paulo César de Medeiro, José Gilvan Ribeiro de Almeida Filho e Marize de Lima Lopes Fragoso por ato de improbidade administrativa tipificados no art. 10, I, VIII, XII da Lei nº 8.429/1992, pois, segundo o juiz, os mesmos agiram de forma negligente e, portanto, culposa, não tendo o mínimo cuidado no de-sempenho de suas atribuições, deixando que os vícios na condução das licitações surgissem e acarretassem, por consequência, dano ao patrimônio público.

No que se refere a essas Tomadas de preço (nºs 08/2007 e 11/2007), ficou constatado que a empresa JAM Distribuidora Ltda. restou vence-dora, sendo que o valor inicialmente estimado para a licitação era de R$ 175.000,000 (cento e setenta e cinco mil reais) e R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais), respectivamente, com base em pes-quisa de mercado realizada junto a estabelecimentos comerciais de Marechal Deodoro/AL. Entretanto, as propostas vencedoras foram,

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respectivamente, nos valores de R$ 212.336,10 (duzentos e doze mil, trezentos e trinta e seis reais e dez centavos) e R$ 285.816,00 (duzentos e oitenta e cinco mil, oitocentos e dezesseis reais), con-forme fls. 04/07 e 252 do processo licitatório, existindo, segundo a sentença, sobrepreço, respectivamente nos valores de R$ 37.336,10 e R$ 45.816,00, em prejuízo ao erário público.

É certo que a pesquisa de preço é medida legalmente prevista em lei e que possibilita, ao apontar parâmetros e referências, atingir um mais alto de grau de transparência e moralidade nos diversos procedimen-tos para a obtenção de valores de mercadorias e serviços por parte da Administração Pública. Entretanto, a análise, por si só, do percentual diferenciador entre o valor apontado na pesquisa de preço e o va-lor efetivamente contratado, só pode ser decisiva se este percentual for, em termos absolutos, muito elevado. A diferença de cerca de 20 % (vinte por cento) entre o valor apontado na pesquisa de preço e o valor efetivamente contratado, desgarrado de quaisquer outras contingências negativas que apontem o dolo, má-fé ou culpa punível dos responsáveis, como no caso concreto, não perfaz-se como ato de improbidade punível com as sanções previstas na Lei nº 8.429/1992.

Apelos providos para absolver os apelantes também da prática dos atos de improbidade administrativa tipificados no art. 10, I, VIII, XII da Lei nº 8.429/1992.

ACÓRDÃO

Vistos, etc.

Decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à unanimidade, dar provimento às apelações, nos termos do voto do relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 22 de julho de 2014.

Des. Federal Bruno Teixeira de Paiva Relator Convocado

RELATÓRIO

O Exmo. Des. Federal Bruno Teixeira (Convocado):

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Trata-se de apelação interposta pelo Ministério Público Federal con-tra sentença que julgou parcialmente o pedido deduzido em ação de im-probidade administrativa, ajuizada pelo Ministério Público Federal contra José Danilo Damaso de Almeida, José Wanderley Neto, Paulo César de Medeiros, José Gilvan Ribeiro de Almeida Filho, Marize de Lima Lopes Fragoso, Edgar Camilo de Moraes Filho, Gilvanete Costa de Alcântara Silva e Luciana Tenório da Silva Sarmento, através da qual busca a condenação dos réus nas penalidades do art. 12, II e III da Lei nº 8.429/1992 por de ato de improbidade causador de dano ao erário (cf. art. 10, V, VIII, XI, XII2), bem como do art. 37, § 4º da Constituição Federal de 1988.

A sentença julgou procedente o pedido deduzido em ação civil públi-ca, para reconhecer a prática de improbidade administrativa, nos termos do art. 10, incisos I, VIII, XII, da Lei nº 8.429/1992, condenando-os em: a) sus-pensão dos direito políticos por um período de 05 (cinco) anos; b) proibição de contratar com os poderes públicos federal, estadual e municipal, pelo período de 05 (cinco) anos; c) restituição de R$ 83.152,10 (oitenta e três mil, cento e cinquenta e dois reais e dez centavos), apropriados indevidamente dos recursos destinados às Tomadas de Preço nºs 07/2007 e 11/2007 do Município de Marechal Deodoro/AL, bem como ao pagamento de multa civil no valor de R$ 8.300,00 (oito mil e trezentos reais).

O processo foi julgado extinto, sem resolução de mérito, com rela-ção ao réu José Danilo Dâmaso de Almeida, nos termos do art. 267, IV do CPC, e improcedente com relação aos réus José Wanderley Neto, Edgar Camilo de Morais, Gilvanete Costa de Alcântara e Luciana Tenório da Silva Sarmento.

Em suas razões de apelo, sustentam, em síntese que, além da prescri-ção: a) não houve dolo na conduta praticada; b) as irregularidades aponta-das não configuraram o extremo de uma improbidade administrativa; c) não houve beneficiamento a empresas e; d) a condenação é baseada unicamen-te no suposto sobrepreço nas Tomadas de Preço nºs 08 e 11/2007.

Cotrarrazões apresentadas.

O parquet ofertou seu parecer.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Des. Federal Bruno Teixeira (Convocado):

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Entendo como pertinentes as alegações dos réus apelantes no que tange à ausência de prova de prática dos atos de improbidade administrativa tipificados no art. 10, I, VIII, XII da Lei nº 8.429/1992.

A conclusão sentencial de primeiro grau, diferenciando meras irre-gularidades de atos ilegais e atos de improbidade administrativa, afastou as variadas irregularidades apontadas pelo MPF na licitação, por não enxergar quaisquer condutas desonestas ou de má-fé por parte dos réus.

Entretanto, apenas no que tange às Tomadas Preços nºs 08/2007 e 11/2007, em que fora homologado valor aproximadamente 20% (vinte por cento) superior àquele apurado na pesquisa prévia de preço de mercado, a sentença condenou os réus Paulo César de Medeiro, José Gilvan Ribeiro de Almeida Filho e Marize de Lima Lopes Fragoso por ato de improbidade administrativa tipificados no art. 10, I, VIII, XII da Lei nº 8.429/1992, pois, segundo o juiz, os mesmos agiram de forma negligente e, portanto, culposa, não tendo o mínimo cuidado no desempenho de suas atribuições, deixando que os vícios na condução das licitações surgissem e acarretassem, por con-sequência, dano ao patrimônio público.

No que se refere a essas Tomadas de Preço (nºs 08/2007 e 11/2007), ficou constatado que a empresa JAM Distribuidora Ltda. restou vence-dora, sendo que o valor inicialmente estimado para a licitação era de R$ 175.000,000 (cento e setenta e cinco mil reais) e R$ 240.000,00 (duzen-tos e quarenta mil reais), respectivamente, com base em pesquisa de merca-do realizada junto a estabelecimentos comerciais de Marechal Deodoro/AL.

Não obstante, as propostas vencedoras foram, respectivamente, nos valores de R$ 212.336,10 (duzentos e doze mil, trezentos e trinta e seis reais e dez centavos) e R$ 285.816,00 (duzentos e oitenta e cinco mil, oito-centos e dezesseis reais), conforme fls. 04/07 e 252 do processo licitatório, existindo, segundo a sentença, sobrepreço, respectivamente nos valores de R$ 37.336,10 e R$ 45.816,00, em prejuízo ao erário público.

É certo que a pesquisa de preço é medida legalmente prevista em lei e que possibilita, ao apontar parâmetros e referências, atingir um mais alto de grau de transparência e moralidade nos diversos procedimentos para a obtenção de valores de mercadorias e serviços por parte da Administração Pública. Entretanto, a análise, por si só, do percentual diferenciador entre o valor apontado na pesquisa de preço e o valor efetivamente contrata-do, só pode ser decisiva se este percentual for, em termos absolutos, muito elevado.

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A diferença de cerca de 20 % (vinte por cento) entre o valor aponta-do na pesquisa de preço e o valor efetivamente contratado, desgarrado de quaisquer outras contingências negativas que apontem o dolo, má-fé ou cul-pa punível dos responsáveis, como no caso concreto, não perfaz-se como ato de improbidade punível com as sanções previstas na Lei nº 8.429/1992.

Diante do exposto, dou provimento aos apelos dos réus, para absol-vê-los também da prática dos atos de improbidade administrativa tipificados no art. 10, I, VIII, XII da Lei nº 8.429/1992.

É como voto.

Recife, 22 de julho de 2014.

Des. Federal Bruno Teixeira de Paiva Relator convocado

Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal de Justiça do Estado de São PauloApelação nº 9153811‑12.2009.8.26.0000Registro: 2014.0000479998Natureza: Indenização por dano moralComarca: Paraibuna – 1ª Vara CívelApelantes: Guilherme Soares Vitor, Prefeitura Municipal de Paraibuna e Juízo Ex OfficioApelados: Samira Alves Chini e Prefeitura Municipal de ParaibunaVoto nº 501/14

AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS DECORRENTES DE AGRESSÃO FÍSICA CAUSADA POR PACIENTE CONTRA MÉDICA PLANTONISTA – OCORRÊNCIA DE LESÕES QUE INCAPACITARAM A VÍTIMA PARA O TRABALHO POR DUAS SEMANAS – EMBRIAGUEZ CAUSADORA DE INCONS-CIÊNCIA NÃO COMPROVADA – RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO POR EVENTO DANOSO A SERVIDOR NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO E NO INTERIOR DE ESTABELECIMENTO PÚBLICO – CABIMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – DIFERENÇA ENTRE A GRAVIDADE DAS CONDUTAS DOS RÉUS QUE DEVE SER SOPESADA NA APURAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO – APELAÇÃO MUNICIPAL PROVIDA EM PARTE – APELAÇÃO DO RÉU NÃO PROVIDA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 9153811-12.2009.8.26.0000, da Comarca de Paraibuna, em que são apelantes Guilherme Soares Vitor, Prefeitura Municipal de Paraibuna e Juízo Ex Officio, são apelados Samira Alves Chini e Prefeitura Municipal de Parai-buna.

Acordam, em 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Por maioria de votos, deram parcial provimento à apelação da Prefeitura e negaram provimento à ape-lação do correquerido. Vencido em parte o revisor que provia o recurso da Prefeitura e declarará”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores Torres de Carvalho (Presidente) e Teresa Ramos Marques.

São Paulo, 28 de julho de 2014.

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Antonio Celso Aguilar Cortez Relator Assinatura eletrônica

Vistos.

Contra sentença que julgou parcialmente procedente ação de repa-ração de danos morais decorrentes de agressão física por paciente contra médica plantonista de pronto-socorro municipal (fls. 332/342), apelaram os réus.

Guilherme Soares Vitor alegou que na ocasião dos fatos estava sob efeito de bebida alcoólica e não tinha consciência nem controle sobre seus atos; disse que não teve intenção de agredir nem ferir a apelada e que fi-cou agitado após sofrer violenta introdução de uma sonda nasal contra sua vontade; aduziu que a apelada negligenciou durante o procedimento mé-dico e, mesmo consciente do risco, insistiu na colocação da sonda, o que o levou a agir em defesa própria; atribuiu à apelada a culpa pelos eventos, pois esta tentou introduzir a sonda à força e acabou por feri-lo; comentou sobre a prova testemunhal, as diversas espécies e consequências jurídicas da embriaguez e requereu a redução do valor arbitrado como indenização; de outro lado, apelou o Município de Paraibuna arguindo, preliminarmente, ilegitimidade passiva, pois os danos sofridos pela autora foram perpetra-dos por terceiro, com culpa concorrente da vítima; em relação ao mérito, afirmou que jamais deixou de assegurar a incolumidade física de seus ser-vidores, que mantinha vigilância ininterrupta no local e que a autora não comprovou dano moral decorrente de ação ou omissão do Município. A apelada e a Municipalidade apresentaram contrarrazões.

É o relatório.

Não se conhece das contrarrazões oferecidas pelo Município (fls. 375/379), que é réu e apelante na demanda.

Já ficou afastada a objeção preliminar de ilegitimidade passiva, na medida em que a apelada apontou o nexo de causalidade entre a falha do serviço público e as lesões corporais que sofreu a serviço da Municipali-dade.

O Município alega que mantinha vigilante em turno de 24h no pron-to-socorro, mas consta que o segurança presente na oportunidade ausentou--se da sala de atendimento para verificar um barulho em outro setor do prédio, o que contribuiu para a produção do resultado danoso.

Não se exige que o Município coloque um segurança à disposição de cada médico, mas espera-se que o ente estatal assegure o mínimo legal

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de segurança e condições de trabalho para seus servidores, sem o que será chamado a responder por danos e lesões que estes vierem a sofrer durante o expediente.

Em relação ao mérito, a responsabilidade dos réus, cada qual na me-dida de sua ação/omissão, está devidamente caracterizada.

É incontroverso que o agressor desferiu socos e tapas na apelada e causou-lhe as lesões descritas nos autos: hematomas no rosto e na região orbitária, com diminuição da acuidade visual e fratura do escafoide direito. Em virtude das lesões, a autora ficou afastada do serviço por treze dias e incapacitada para suas ocupações habituais (fls. 09/12, 14 e 268).

Não colhe a alegação do apelante de que estava inconsciente e agiu sem discernimento sobre seus atos, ou de que não teve intenção de agredir e ferir a apelada. Com efeito, a prova dos autos revela que o réu chegou ao PS à procura de socorro médico, embriagado, mas acordado, em estado de “grande agitação”, como ele mesmo frisou em suas manifestações.

O exame clínico indicou estado de agressividade evidente, mas não inconsciência geradora de reflexo incondicionado. Se inconsciente estives-se, como ponderou o Juízo, por certo não agiria da forma violenta como o fez. A testemunha ocular Andrea Aparecida Delgado relatou que ao aden-trar o ambulatório, deparou-se com a autora acuada em um canto da sala, defendendo-se com uma bandeja, e o réu a agredi-la violentamente (fl. 244).

Destarte, a conclusão de que o apelante estava consciente e tinha discernimento suficiente para determinar-se por seus atos é de rigor.

De outro lado, não há dúvida de que o Estado (lato sensu) tem o dever de garantir a segurança de todos que são recebidos no interior de seus esta-belecimentos, inclusive a incolumidade dos médicos no local de trabalho. Inexistindo culpa exclusiva da ofendida, a responsabilidade do Estado é objetiva, pela falha do serviço, à vista ainda do disposto no art. 194, pará-grafo único da Lei nº 10.261, de 28.10.1968, verbis: “Considera-se também acidente a agressão sofrida e não provocada pelo funcionário, no exercício de suas funções”.

Pouco importa que não seja possível estabelecer procedimento de segurança em cada repartição pública ou que o dano não possa ser evitado ou impedido, tendo-se em vista a ação repentina e imprevisível de um de-linquente. Não se mostra razoável, assim, fazer o Estado irresponsável, com base no art. 37, § 6º, da CF e demais dispositivos legais mencionados, pela agressão sofrida pela médica-plantonista porque o mesmo art. 37, caput, determina obediência ao princípio da eficiência.

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Assim, a indenização por dano moral é irrecusável. Os sofrimentos físico e psíquico estão demonstrados; a apelada foi agredida em 12.12.2004 e teve que se afastar em licença médica por mais de duas semanas (v. fls. 11/12); experimentou dor física, constrangimento e sofrimento psíqui-co. Está evidente o nexo de causalidade entre a conduta dolosa do agressor, a deficiência da prestação do serviço e as lesões físicas sofridas pela autora.

A responsabilidade dos réus, consequentemente, não pode ser afasta-da, para efeito de mitigação do dano moral decorrente do evento.

A finalidade desse tipo de indenização, na verdade, não é compensar de qualquer modo o sofrimento ou a dor, evidentemente não mensuráveis economicamente. Seu intuito é propiciar a satisfação contida do desagravo, por estimativa pecuniária, não estabelecer vantagem econômica.

A indenização do dano moral deve ser arbitrada tendo como orienta-ção a necessidade de estimular providências positivas e desestimular com-portamentos comissivos ou omissivos potencialmente lesivos, observada a capacidade econômica do responsável e também a necessidade de apre-sentar alguma resposta a quem sofreu ou sofre algum transtorno psicológico em razão da falha do serviço público, sem fazer com que isto se transforme em premiação.

O valor fixado não deve implicar punição ínfima nem exagerada para o ofensor, ou frustração ou enriquecimento exagerado, descabido, para o ofendido, ainda que isto ou aquilo possa ocorrer em alguma medida, como efeito colateral, em situações excepcionais nas quais seja condição necessá-ria à consecução daquelas outras finalidades. Não basta considerar o porte econômico do responsável; importante levar também em conta que a pu-nição não é a única finalidade da indenização por dano moral, que, como dito, deve constituir estímulo à adoção de providências preventivas que evi-tem a repetição das ofensas físicas ou psíquicas evitáveis.

Neste ponto, deve ser dado parcial provimento ao recurso do Muni-cípio, que a sentença condenou a pagar o mesmo montante arbitrado para o agressor. Com o devido respeito à magistrada sentenciante, observa-se que a produção do resultado lesivo deu-se muito mais em razão da grave conduta do réu do que da omissão do Município, pelo que não se justifica a condenação dos réus em valores iguais.

Tem-se, ante tais parâmetros, como razoável que o Município pague à autora a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais) em favor da apelante, valor este que a partir de agora deverá ser corrigido pela tabela prática do Tribunal de Justiça e acrescido de juros de mora pela menor taxa legal, nos termos do art. 406 do Código Civil.

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Ao corréu Guilherme fica mantida a condenação ao pagamento da indenização de R$ 16.400,00 (dezesseis mil e quatrocentos reais), quantia equivalente à fixada pela sentença, nos valores atuais do maior salário míni-mo fixado no Estado de São Paulo pelo Governo Estadual, até mesmo pela falta de recurso da autora neste sentido. Faz-se a conversão neste momento porque é inviável a indexação pelo salário mínimo.

Por fim, arcará o requerido pessoa física, culpado de modo mais gra-ve, com as custas e despesas processuais; ambos os réus pagarão honorários advocatícios à parte contrária, mantidos, à vista do trabalho desenvolvido, em quinze por cento sobre o montante da indenização fixada para cada um, atualizado e acrescido dos juros moratórios até a liquidação pelo paga-mento. Essa verba honorária, incidindo sobre o valor da indenização fixada, mostra-se proporcional e adequada ao trabalho desenvolvido.

Ante o exposto, dá-se parcial provimento à apelação da Prefeitura apenas para reduzir o valor da indenização a ser paga por ela e nega-se provimento à apelação do correquerido, nos termos acima.

Antonio Celso Aguilar Cortez Relator

REVISÃO VOTO VENCIDO EM PARTE

RESPONSABILIDADE CIVIL – Paraibuna. Hospital Municipal. Plantonista agredida por paciente embriagado. Lesões corporais. Danos morais. Inde-nização. Responsabilidade. Município. A responsabilidade por omissão im-plica na indicação da conduta que a administração não teve, hábil a evitar o dano. No caso, não se identifica negligência da administração se a pró-pria vítima (que estava no comando da situação) não viu necessidade de requisitar auxílio do vigia, dos amigos do réu ou mesmo, se fosse o caso, da Polícia Militar e prosseguiu no atendimento médico. Ainda que o município mantivesse guardas municipais armados no pronto socorro, igual teria sido o resultado. Não se trata de responsabilidade objetiva e não há, sequer em tese, culpa da administração pelo evento. Procedência. Desprovimento do recurso de Guilherme e provimento do recurso da Prefeitura para julgar a ação improcedente contra ela.

1. Trata-se de ação de indenização por danos morais interposta por médica contra o Município de Paraibuna e Guilherme Vitor em virtude de agressão física causada pelo segundo durante atendimento no pronto socor-ro municipal. A sentença julgou procedente a ação e fixou os danos morais

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em 20 salários mínimos para cada réu. Os réus recorreram pela reversão do julgado.

Os Des. Aguilar Cortez e Teresa Ramos Marques desproveram o re-curso de Guilherme, mantida a indenização por ele devida em R$ 16.400,00 e proveu em parte o recurso do Município para reduzir o valor da indeni-zação para R$ 10.000,00. Exponho, respeitosamente, a minha divergência.

2. Guilherme Vitor Soares foi trazido ao Pronto Socorro de Paraibuna às 03h00min do dia 12.12.2004 agitado e em acentuada embriaguez; foi levado à sala de atendimento acompanhado por um vigia e um de seus amigos, que o contiveram enquanto a enfermeira Ana Rita puncionava a veia. Ficou mais agitado por ocasião da introdução da sonda nasogástrica e arrancou a sonda duas vezes; o amigo foi chamar ajuda na recepção, o vigia foi atender a um chamado no estacionamento. A enfermeira tentou estan-car um sangramento no nariz com uma gaze e foi afastada por Guilherme com um safanão, por pouco escapando da agressão. A autora Samira Alves Chini, médica de plantão, adentrou a sala, viu a conduta do réu e admo-estou-o; não tocou nele, mas insistiu na introdução da sonda. Sem aviso, o réu agrediu-a com socos causando as lesões descritas nos autos (fratura de punho direito, hematomas periorbitais no olho esquerdo). O processo crimi-nal foi suspenso a pedido do réu, que aceitou a transação penal oferecida.

A responsabilidade civil de Guilherme é escancarada e deve respon-der pela covarde agressão à médica. No entanto, outra é situação do muni-cípio, pelas seguintes razões: (a) o caso não se enquadra no art. 37, § 6º da Constituição Federal, pois o dano não foi causado por seus agentes, mas por Guilherme, nem a terceiros, pois o agente público é o próprio Estado, não um terceiro em relação ao Estado. Não há que falar em responsabilidade objetiva derivada desse dispositivo; (b) a autora fala em responsabilidade por omissão, pois não providenciada pela administração a segurança neces-sária ao atendimento médico. A responsabilidade por omissão é subjetiva por natureza, a exigir a demonstração da culpa administrativa em sua forma impessoal, mas clássica no mais: imprudência, negligência ou imperícia ou, no dizer de Celso Antônio Bandeira de Melo, com outras palavras, que o serviço não funcionou, funcionou mal ou funcionou tarde; (c) a inicial des-creve um acidente do trabalho, que não exclui a indenização a que o em-pregador estiver obrigado quando incorrer em dolo ou culpa (art. 7º, XXVIII da Constituição Federal), aqui entendida a culpa média ou grave.

3. Embriaguez é um evento comum nas unidades de pronto socorro, como se depreende do depoimento da testemunha Ana Rita, sempre contro-lado pela equipe médica. Guilherme chegou à sala de atendimento acom-

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panhado pelo vigia e por um amigo; depois do safanão o amigo foi buscar ajuda e ficaram sozinhos na sala Guilherme, Ana Rita e a autora Samira. Vigias e policiais só comparecem à sala de atendimento médico a pedido; não permanecem ali. Samira era a mais alta autoridade no local e cabia-lhe determinar o necessário à segurança do paciente e da equipe; não deixou a sala, não pediu ajuda mesmo sabendo do safanão (início de violência física) e repreendeu (no que fez bem) Guilherme pela conduta indevida. Samira agiu baseada na experiência com pacientes nesse estado e na suposição da inexistência de perigo, sendo surpreendida pela reação súbita e violenta do rapaz.

A responsabilidade por omissão implica na indicação da conduta que a administração não teve, hábil a evitar o dano. No pronto socorro havia um vigia, enfermeiros e atendentes, outros médicos e os amigos do réu; a força policial está disponível a noite toda, mediante chamado, como veio logo a seguir. Não vejo como caracterizar a negligência da administração se a própria vítima (que estava no comando da situação) não viu necessidade de requisitar auxílio do vigia, dos amigos do réu ou mesmo, se fosse o caso, da Polícia Militar e prosseguiu no atendimento médico. Em outras palavras, ainda que o município mantivesse guardas municipais armados no pronto socorro, igual teria sido o resultado, pois tais servidores não adentrariam a sala de procedimentos médicos sem o chamado da autora. Nada nos au-tos indica que os profissionais que atuam no Pronto Socorro de Paraibuna sejam “vítimas de um sem número de agressões por parte dos pacientes descontrolados, com tamanha facilidade” como diz a juíza, sem dizer quais providências concretas teriam evitado o dano. Não se trata de responsabili-dade objetiva e não há, sequer em tese, culpa da administração pelo evento. Ademais, como anotei acima, o acidente do trabalho só acarreta a respon-sabilização civil da administração em caso de culpa média, grave ou dolo; e nem se longe se verifica qualquer deles.

O voto é pelo desprovimento do recurso de Guilherme e provimento do recurso da Prefeitura para julgar a ação improcedente contra ela, arcan-do a autora com as despesas processuais respectivas e com honorários de advogado de R$ 1.000,00, corrigidos desta data, art. 20, § 4º do CPC.

Torres de Carvalho Revisor, vencido em parte

Parte Geral – Ementário de Jurisprudência6742 – Ato administrativo – benefício indevido – erro da Administração Pública – deca-

dência – configuração

“Ação anulatória de ato administrativo. Erro da Administração Pública. Benefício indevido. Inteligência da Lei Estadual nº 10.177/1998 que estabelece prazo de dez anos para que Ad-ministração possa rever seus próprios atos. Ajuizada a ação após bem mais de dez anos da realização do ato. Decadência configurada. Impossibilidade de rever o ato judicialmente. Sentença que julgou improcedente a ação mantida. Recurso improvido.” (TJSP – Ap 0055160-31.2012.8.26.0053 – 10ª CDPúb. – Rel. Marcelo Semer – DJe 15.08.2014)

6743 – Ato administrativo – Ordem dos Advogados do Brasil – moção de repúdio e desa-gravo – lista de autoridades – elaboração – ilegalidade

“Constitucional. Administrativo. Ação mandamental. Lista de autoridades que receberam mo-ção de repúdio e desagravo. Ato ilegal. Direito líquido e certo que se reconhece. 1. Consoante expresso no art. 44, II, da Lei nº 8.906/1997, a Ordem dos Advogados do Brasil tem por fina-lidade promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil. 2. A Ordem dos Advogados do Brasil não só tem o poder de defender as prerrogativas dos advogados como também tem compe-tência para fiscalizar e punir os profissionais inscritos em seus quadros. 3. Ao elaborar lista de autoridades que receberam desagravo e moção de repúdio a Ordem dos Advogados do Brasil extrapolou de suas atribuições e praticou ato eivado de nulidade, porquanto aplicou, sem o devido processo legal e sem lei que autorizasse, punição a pessoas não integrantes de seus quadros, violando, com isso, o princípio da legalidade. 4. Apelação provida. Sentença reformada.” (TRF 3ª R. – AC 0025854-63.2007.4.03.6100/SP – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Nery Junior – DJe 15.08.2014)

Comentário Editorial SÍNTESEA apelação é oriunda de mandado de segurança impetrado pela Associação dos Magis-trados da Justiça do Trabalho da 2ª Região – AMATRA II, contra decisão o Presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB/SP e Presidente da Seção de São Paulo da OAB, onde almejava a garantia de que todos os associados e aqueles que venham a se associar não vissem seus nomes inscritos no “Cadastro das Autoridades que Receberam Moção de Repúdio e Desagravo”.

O Juízo a quo denegou a ordem, entendendo que não houve qualquer ilegalidade na conduta adotada pela autoridade impetrada.

Inconformada, a impetrante interpôs o recurso em estudo sustentando que a OAB não possui autoridade para alterar as regras previstas em lei e muito menos autoridade para aplicar punições a pessoas que não integram seus quadros.

A 3ª Turma do TRF 3ª Região entendeu que a OAB extrapolou de suas atribuições ao elaborar a lista de autoridades que receberam desagravo e moção de repúdio.

Assim, concluiu que, diante da nulidade do referido ato, já que aplicou punição a pes-soas não integrantes de seus quadros, sem a observância do devido processo legal, a sentença deve ser reformada.

Do voto do Relator, destacamos:

“[...] Pois bem. Consoante expresso no art. 44, II, da Lei nº 8.906/1997, a Ordem dos Advogados do Brasil tem por finalidade promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil.

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Já o art. 7º do mesmo diploma legal elenca os direitos dos advogados, entre os quais a prerrogativa de ser publicamente desagravado, quando ofendido no exercício da profis-são ou em razão dela (XVII).

Por outro lado, os arts. 70 a 74 dispõem sobre o processo disciplinar, nos seguintes termos:

Art. 70. O poder de punir disciplinarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração, salvo se a falta for cometida perante o Conselho Federal.

§ 1º Cabe ao Tribunal de Ética e Disciplina, do Conselho Seccional competente, julgar os processos disciplinares, instruídos pelas Subseções ou por relatores do próprio conselho.

§ 2º A decisão condenatória irrecorrível deve ser imediatamente comunicada ao Conse-lho Seccional onde o representado tenha inscrição principal, para constar dos respecti-vos assentamentos.

§ 3º O Tribunal de Ética e Disciplina do Conselho onde o acusado tenha inscrição princi-pal pode suspendê-lo preventivamente, em caso de repercussão prejudicial à dignidade da advocacia, depois de ouvi-lo em sessão especial para a qual deve ser notificado a comparecer, salvo se não atender à notificação. Neste caso, o processo disciplinar deve ser concluído no prazo máximo de noventa dias.

Art. 71. A jurisdição disciplinar não exclui a comum e, quando o fato constituir crime ou contravenção, deve ser comunicado às autoridades competentes.

Art. 72. O processo disciplinar instaura-se de ofício ou mediante representação de qual-quer autoridade ou pessoa interessada.

§ 1º O Código de Ética e Disciplina estabelece os critérios de admissibilidade da repre-sentação e os procedimentos disciplinares.

§ 2º O processo disciplinar tramita em sigilo, até o seu término, só tendo acesso às suas informações as partes, seus defensores e a autoridade judiciária competente.

Art. 73. Recebida a representação, o Presidente deve designar relator, a quem compete a instrução do processo e o oferecimento de parecer preliminar a ser submetido ao Tribunal de Ética e Disciplina.

§ 1º Ao representado deve ser assegurado amplo direito de defesa, podendo acompa-nhar o processo em todos os termos, pessoalmente ou por intermédio de procurador, oferecendo defesa prévia após ser notificado, razões finais após a instrução e defesa oral perante o Tribunal de Ética e Disciplina, por ocasião do julgamento.

§ 2º Se, após a defesa prévia, o relator se manifestar pelo indeferimento liminar da representação, este deve ser decidido pelo Presidente do Conselho Seccional, para de-terminar seu arquivamento.

§ 3º O prazo para defesa prévia pode ser prorrogado por motivo relevante, a juízo do relator.

§ 4º Se o representado não for encontrado, ou for revel, o Presidente do Conselho ou da Subseção deve designar-lhe defensor dativo;

§ 5º É também permitida a revisão do processo disciplinar, por erro de julgamento ou por condenação baseada em falsa prova.

Art. 74. O Conselho Seccional pode adotar as medidas administrativas e judiciais per-tinentes, objetivando a que o profissional suspenso ou excluído devolva os documentos de identificação.

Como verifica da leitura dos dispositivos acima transcritos, a Ordem dos Advogados do Brasil não só tem o poder de defender as prerrogativas dos advogados como também tem competência para fiscalizar e punir os profissionais inscritos em seus quadros.

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Portanto, ao elaborar lista de autoridades que receberam desagravo e moção de repúdio a Ordem dos Advogados do Brasil extrapolou de suas atribuições e praticou ato eivado de nulidade, porquanto aplicou, sem o devido processo legal e sem lei que autorizasse, punição a pessoas não integrantes de seus quadros, violando com isso, o princípio da legalidade.

Desta feita, presente o direito líquido e certo a amparar a pretensão do impetrante, por-quanto seus associados tem o direito de não verem seus nomes inscritos em cadastro reconhecidamente ilegal.

Assim sendo, a sentença de primeiro grau merece reforma para julgar procedente o pedi-do formulado nos autos e conceder a ordem, nos termos da fundamentação supra. [...]”

6744 – Autarquia – INSS – atendimento – agendamento prévio – necessidade – benefícios previdenciários – requerimentos – limitação – possibilidade

“Mandado de segurança. Administrativo. Necessidade de agendamento prévio para atendi-mento em agências do INSS. Limitação à quantidade de requerimentos de benefícios previ-denciários. Possibilidade. Inexistência de restrição ao pleno exercício da advocacia. Apelação e remessa oficial providas. 1. A previsão de regra interna corporis de repartição pública que li-mita dias da semana e horários de atendimento, bem como número de requerimentos a serem protocolizados, insere-se no âmbito discricionário do Poder Público, para melhor ordenação dos trabalhos com vistas à priorização do interesse público; não representam doloso cerceio do pleno exercício da advocacia, mesmo porque limitações dessa natureza existem até no âmbito do Poder Judiciário, sem que ninguém ‘se lembre’ deles. 2. A regulamentação tem por escopo adequar o horário de funcionamento e atendimento das agências da Previdência Social, garantindo a todos, em igualdade de condições, o acesso a seus serviços, observando--se a impessoalidade a que está adstrita a Administração Pública e numa clara tentativa de levar eficiência ao serviço público, em prestígio aos princípios fundamentais consagrados no art. 37, caput, da Constituição Federal. 3. O que a Lei nº 8.906/1994 assegura ao advogado, em seu art. 6º, é o ‘tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições ade-quadas a seu desempenho’. Sujeitá-lo ao prévio agendamento de atendimento e à limitação quanto ao número de protocolos de que trata a norma interna da repartição pública, não representa afronta ao livre exercício da profissão ou ao seu eficiente desempenho, ao revés, garante observância ao princípio da isonomia no atendimento aos segurados, bem como à igualdade de acesso, à impessoalidade da Administração Pública e à eficiência administrati-va.” (TRF 3ª R. – Ap-RN 0011780-67.2008.4.03.6100/SP – 6ª T. – Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo – DJe 08.08.2014)

Comentário Editorial SÍNTESEA apelação é oriunda de sentença que concedeu a segurança pleiteada pelas impetran-tes, advogadas de segurados da Previdência Social, consistente no direito de protocolar junto às agências da Previdência Social pedidos de benefícios ou certidão de tempo de contribuição independentemente de agendamento prévio ou de limitações acerca da quantidade de requerimentos.

O Juízo a quo entendeu que não é legítima a fixação de restrições, pelo Instituto Nacio-nal do Seguro Social – INSS, ao atendimento específico de advogados em seus postos fiscais.

Em suas razões, o INSS sustenta que a prática tida como ilegal tem como objetivo zelar pela boa e eficiente administração previdenciária, constituindo medida de organização

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interna, de sorte a racionalizar, operacionalizar e viabilizar da melhor forma possível o atendimento ao público.

Ao analisar o recurso, a 6ª Turma do TRF 3ª Região afirmou que a limitação dos reque-rimentos a serem protocolizados insere-se no âmbito da discricionário do Poder Público, visando à melhor ordenação dos trabalhos, objetivando a priorização do interesse públi-co, logo, não são cerceio do pleno exercício da advocacia.

Diante disso, deu provimento à apelação do INSS, reformando a sentença.

Em seu voto, o Relator citou os precedentes a seguir:

“[...] Nesse sentido, destaco aresto emanado do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

‘ADMINISTRATIVO – INSS – HORÁRIO DE ATENDIMENTO – 1. No caso em análise, o atendimento preferencial pleiteado pelos impetrantes fere o princípio da igualdade, previsto no caput do art. 5º da Carta Constitucional, o qual dispõe, in verbis, que ‘todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza’. Sobre o tema, cumpre mencionar também a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello no sentido de que: ‘Lei não pode erigir um critério diferencial um traço tão específico que singularize no presente e definitivamente, de modo absoluto, um sujeito a ser colhido pelo regime peculiar’. Assim, correto o procedimento adotado no âmbito do INSS, o qual entendeu não poder o advogado gozar de benefícios que venham a privilegiar uma única categoria de profissionais, tendo em vista que a Autarquia Previdenciária busca justamente o contrário, isto é, oferecer o serviço de modo igualitário para todos que dele necessitem, independentemente do seu ofício. Desta forma, não é admissível a pretensão dos impe-trantes, ora recorrentes, de obterem atendimento privilegiado em detrimento dos demais segurados que, constituindo ampla maioria, não têm condições econômicas de contratar um advogado para representá-los em seus pleitos administrativos. Desta forma, em que pese a incidência, na espécie, das prerrogativas profissionais concedidas aos advogados, constantes da Lei nº 8.906/1994 – Estatuto da Advocacia –, tenho que a pretensão dos impetrantes em obter atendimento junto às agências do INSS sem o prévio agendamen-to – ‘atendimento por hora marcada’ – contraria o princípio constitucional da isonomia. Ademais disso, deve ser levada em consideração, para a análise da questão, que as pessoas que necessitam do INSS, no mais das vezes, se tratam de pessoas idosas, acidentados, portadoras de alguma deficiência e/ou carecedoras dos mais comezinhos recursos financeiros, inclusive para custear o seu transporte até a agência previden-ciária. Ainda, na linha do que foi apregoado pelo Juízo a quo, a permissão para que os advogados possam ter atendimento privilegiado, sem precisar se submeter ao sistema de agendamento de horário – ‘atendimento por hora marcada’ –, afrontaria, além do princípio constitucional da igualdade, questão de ordem moral e de respeito para com os demais cidadãos que buscam os serviços da Autarquia Previdenciária. 2. Apelação parcialmente provida.’ (AC 200970030000184, 3ª T., Rel. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, J. 24.11.2009, DE 16.12.2009)

Colaciona-se julgado desta Corte:

‘APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA – ADMINISTRATIVO – EXERCÍCIO DA ADVOCACIA – ATENDIMENTO EM AGÊNCIAS DO INSS – LIMITAÇÃO À QUANTIDADE DE REQUERIMENTOS – EXIGÊNCIA DE AGENDAMENTO PRÉVIO COM HORA MARCA-DA – GARANTIAS CONSTITUCIONAIS PRESERVADAS – LEGALIDADE OBSERVADA – 1. O legislador arquitetou em princípio constitucional a indispensabilidade e imunidade do advogado, segundo a dicção do art. 133 da Constituição Federal, que, contudo, em melhor e mais acurada interpretação, leva-nos à conclusão de que tais garantias dirigem-se, exclusivamente, a sua atuação junto à Justiça, não compreendendo ativida-des voltadas ao âmbito administrativo. 2. A Lei nº 8.213/1991, art. 109, e o Decreto nº 3.048/1999, arts. 156 a 159, versam sobre o pagamento de benefício, por meio de procurador do beneficiário, com algumas restrições, que não implica afirmar que

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se tratam de obstáculos opostos ao atendimento do procurador, com esteio na Resolu-ção nº 06/2006-Presidência do INSS. 3. Inexistência nos autos de prova de violação a direito líquido e certo a ser amparado, faltando, assim, fundamentos fáticos e jurí-dicos autorizadores da concessão da segurança pleiteada, sendo certo que eventuais regras de organização do atendimento na autarquia em questão não configuram, em tese, violação a direito, pois é providência que visa ao tratamento igualitário de todos os segurados, representados ou não. 4. Apelação e remessa oficial providas.’ (AMS 0003395-21.2008.4.03.6104/SP, 6ª T., Juiz Conv. Ricardo China, J. 07.04.2011, e-DJF3 13.04.2011) [...].”

6745 – Autorização – validade expirada – retomada do bem – indenização – descabimento

“Administrativo. Autorização de uso. Validade expirada. Retomada do bem pela Administra-ção Pública. Conveniência e discricionariedade. Indenização. Não cabimento. 1. Não é ilegal o ato administrativo que deixa de renovar autorização de uso, que se trata de ato precário, unilateral e discricionário, podendo ser revogado a qualquer tempo. 2. Não cabe indenização em razão do desinteresse da administração em renovar autorização de uso, máxime quando sobre o ato não pesa ato ilícito, cabendo ao autorizado tão-só levantar os investimentos que realizou. 3. Recurso desprovido.” (TJDFT – PADM 20110111627096 – (806363) – Rel. Des. Antoninho Lopes – DJe 14.08.2014)

Destaque Editorial SÍNTESESelecionamos os seguintes julgados no mesmo sentido:

“ADMINISTRATIVO, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – ATO ADMINIS-TRATIVO – AUTORIZAÇÃO DE USO FUNCIONAMENTO DE ATIVIDADE COMERCIAL EM ÁREA PÚBLICA – ATO DISCRICIONÁRIO E PRECÁRIO – SUJEIÇÃO AOS CRITÉ-RIOS DE CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE – INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUI-RIDO À RENOVAÇÃO DO ATO – RESPONSABILIDADE CIVIL DA MUNICIPALIDADE NÃO CONFIGURADA – 1. A autorização administrativa, na modalidade ‘autorização de uso’, consiste em ato administrativo unilateral, discricionário e precário através do qual a Administração Pública faculta ao particular o uso de um determinado bem público. 2. Caracterizando a ‘autorização de uso’ ato precário, afigura-se insuscetível de gerar direito adquirido à exploração de atividade econômica desenvolvida em área pública. Consistindo-se em ato discricionário, sua realização, renovação ou mesmo revogação encontra-se condicionada aos critérios de conveniência e oportunidade a serem aferidos pela Administração Pública. 3. Sendo poder da Administração Pública a não renova-ção da ‘autorização de uso’ por critérios de conveniência e oportunidade, com exceção de situações excepcionais em que maculados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não cabe ao Juiz valorar tais critérios, mas apenas verificar a validade da decisão administrativa. 4. Sendo válida a decisão administrativa, afasta-se a res-ponsabilidade civil do Poder Público.” (TJES, AC 50030037878, Rel. Des. Annibal de Rezende Lima, DJe 14.03.2012, p. 82) (Disponível em: online.sintese.com, sob o nº 143000034089. Acesso em: 18 ago. 2014)

“PROCESSO CIVIL E CIVIL – AUTORIZAÇÃO DE USO – RETOMADA PELA ADMINIS-TRAÇÃO – INTERESSE PÚBLICO – APLICAÇÃO DA REGRAS DE DIREITO ADMINIS-TRATIVO – 1. Em se tratando de autorização de uso, não há qualquer direito subjetivo à obtenção ou a sua continuidade, uma vez que o interesse público se sobrepõe ao particular, de acordo com o princípio da supremacia do interesse público, um dos pilares sobre os quais se sustenta a atividade administrativa. Assim, correta é a decisão mono-crática que determina a desocupação de imóvel, em se tratando de bem de uso especial, pertencente ao Estado do Amapá, isso porque em razão de sua destinação e determi-

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nabilidade subjetiva de uso não pode ser enquadrado com bem público de uso comum ou bem dominial. 2. Nas autorizações de uso são aplicáveis as regras de direito admi-nistrativo, tornando indisponíveis os bens públicos de uso especial, não guardando, em relação às pessoas de direito público a que estão afetas, caráter patrimonial. 3. Apelo não provido.” (TJAP, AC 338107, (12283), Rel. Des. Gilberto Pinheiro, J. 12.02.2008) (Disponível em: online.sintese.com, sob o nº 55006297. Acesso em: 18 ago. 2014)

6746 – Bem público – doação a particular – exigências legais – inobservância – anulação

“Ato administrativo. Doação de bem público a particular. Municipalidade de Sebastianópolis do Sul que realizou a doação de lotes de terra. À Administração Pública é permitida a doa-ção de imóveis às pessoas jurídicas de direito privado, desde que observadas as exigências legais de autorização legislativa, prévia avaliação e licitação na modalidade concorrência (caput do art. 17 da Lei nº 8.666/1993). Inocorrência de certame ou de demonstração de hipótese de dispensada em virtude do interesse público, nos termos do § 4º do art. 17 da Lei nº 8.666/1993. Anulação determinada. Sentença mantida. Recurso improvido.” (TJSP – Ap 0000465-26.2013.8.26.0334 – 2ª CDPúb. – Relª Vera Angrisani – DJe 13.08.2014)

Comentário Editorial SÍNTESEÉ válida a doação de bem público a particular sem prévia licitação? Esse foi o questio-namento da apelação em tela.

Inconformada com a sentença que julgou procedente a ação declaratória de nulidade de ato jurídico ajuizada pela Prefeitura Municipal de Sebastianópolis do Sul, declarando a nulidade da doação, a apelante interpôs recurso.

Em suas razões, sustenta a legalidade da doação e a sua boa-fé.

O ex-prefeito, no término de sua legislatura, em 20.12.2012, doou 55 terrenos da mu-nicipalidade, e a apelante foi contemplada com um desses terrenos.

Na análise recursal, a Relatora entendeu que as doações dos terrenos foram realizadas sem prévia licitação, violando, assim, exigência estabelecida pela Lei nº 8.666/1993, como dispositivo a seguir:

“Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:

I – quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades pa-raestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos:

[...]

f) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis residenciais construídos, destinados ou efetiva-mente utilizados no âmbito de programas habitacionais ou de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública; [...]”

Por fim, negou provimento ao recurso, mantendo a sentença.

Em seu voto, a Relatora assim se manifestou:

“[...] Entretanto, no caso em questão, restou evidenciado que o Município não justificou de maneira fundamentada o relevante interesse público na doação dos terrenos confor-me se vislumbra da simples leitura da Legislação Municipal posta em realce. Também não trouxe o Município qualquer fundamento ou razão que justifique os motivos que levaram o ente público a decidir pela dispensa da licitação no caso em apreço.

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De acordo com os ensinamentos de Marçal Justen Filho, ‘[...] será dispensável a lici-tação para doação de bens públicos quando o destinatário for órgão ou entidade da Administração Pública, de qualquer esfera de governo. Se a doação tiver por destinatário um particular, será obrigatória a licitação’ (Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 11. ed. São Paulo: Dialética, 2005. p. 176).

Mesmo nos casos de doação de imóvel residencial construído, a Administração Pública não está autorizada a escolher de maneira arbitrária os beneficiários das transferências, sob pena de violação dos princípios da moralidade e da impessoalidade devendo, nesse caso, estabelecer critérios de seleção por sorteio.

Portanto, ao deixar de proceder da forma estabelecida em lei, as doações realizadas pela Prefeitura de Sebastianópolis do Sul encontram-se eivadas de nulidade devendo, por isso, serem anuladas.

Neste sentido já se entendeu este Tribunal de Justiça, a saber:

‘AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO – DOAÇÃO DE TERRENO PÚBLICO EFETUADA PELO MUNICÍPIO DE SEBASTIANÓPOLIS DO SUL PARA ATENDER AO PROGRAMA FEDERAL ‘MINHA CASA, MINHA VIDA’ DESPROVIDA DE REGULAR PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO QUE ASSEGURASSE AOS DEMAIS MUNÍCIPES PREVIAMENTE CADASTRADOS E INTERESSADOS NA AQUISIÇÃO DE MORADIA PRÓPRIA TRATAMENTO ISONÔMICO AUSENTE, ADEMAIS E ALTERNATIVAMENTE, DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS DA FORMULAÇÃO DE PEDIDO ESPECÍFICO DE DOAÇÃO, PELO RÉU, BEM COMO DE TODOS OS ATOS QUE, EM TESE, CULMINA-RIAM NO ACOLHIMENTO DO PEDIDO PELO CHEFE DO PODER EXECUTIVO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO – NÃO DESINCUMBÊNCIA, PELO RÉU, DO ÔNUS PROCESSUAL INSCULPIDO NO ART. 333, II, CPC, NA QUALIDADE DE PARTE INTE-RESSADA NA COMPROVAÇÃO DA LEGALIDADE E LEGITIMIDADE DA DOAÇÃO – SEN-TENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO DO RÉU DESPROVIDO.’ (Apelação nº 0000403-83.2013.8.26.0334, 21 de maio de 2014, Des. Ferraz de Arruda)

‘APELAÇÃO – AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO – ALIENAÇÃO DE BEM PÚBLICO IMÓVEL – DOAÇÃO – Pretensão inicial da Municipalidade voltada à anulação de ato administrativo praticado pelo anterior Edil. Doação pura de imóveis pertencentes ao acervo público, sem que fossem respeitados os critérios legais. Ausência de motiva-ção apta a evidenciar o interesse público inerente ao negócio jurídico. A mera edição de decreto, ato normativo secundário, não tem o condão de mitigar a necessária ob-servância aos princípios a que está submetida toda a Administração Pública por força constitucional (art. 37, caput, da CF/1988 e art. 3º da Lei Federal nº 8.666/1993). Ilegalidade do ato de alienação afronta aos princípios da impessoalidade e moralidade. Inteligência do art. 17, caput, cc. inciso I, f, da Lei Federal nº 8.666/1993 sentença de procedência da ação anulatória mantida. Recurso não provido.’ (Apelação nº 0000433-21.2013.8.26.0334, 19 de maio de 2014, Des. Paulo Barcellos Gatti). [...]”

6747 – Bem público – usucapião – sociedade de economia mista – pedido – impossibilida-de jurídica

“Civil. Administrativo. Constitucional. Apelação. Usucapião. Bem público registrado em nome de sociedade de economia mista prestadora de serviço público. Impossibilidade ju-rídica do pedido. Extinção do processo sem julgamento de mérito. Decisão mantida. Lote registrado em nome da Companhia de Desenvolvimento do Estado do Tocantins, sociedade de economia mista prestadora de serviço público, é insuscetível de usucapião, ante expressa vedação constante na Constituição Federal e no Código Civil, revelando-se correta a sentença

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de extinção do processo, sem resolução do mérito, por impossibilidade jurídica do pedi-do.” (TJTO – Ap 0004018-52.2014.827.0000 – Rel. Juiz Subst. Gilson Coelho Valadares – DJe 29.08.2014)

6748 – Concessão – trecho oeste do rodoanel – crise financeira – equilíbrio econômico--financeiro – Fazenda – condenação – inadmissibilidade

“Contrato administrativo. Concessão para exploração do trecho oeste do rodoanel Mário Covas. Pretensão de condenação da Fazenda do Estado à recomposição do equilíbrio eco-nômico-financeiro do ajuste em virtude da queda da TIR dos acionistas decorrente da crise financeira de setembro/2008. Inadmissibilidade. Necessidade de adoção da TIR do proje-to como parâmetro para a fixação da equação econômico-financeira. Ação improcedente. Sentença confirmada.” (TJSP – Ap 0048584-90.2010.8.26.0053 – 4ª CDPúb. – Rel. Ricardo Feitosa – DJe 13.08.2014)

Comentário Editorial SÍNTESEA apelação foi interposta pela Concessionária do Rodoanel Oeste S.A. contra sentença que julgou improcedente o seu pedido inicial que consistia na condenação da Agência Reguladora de Serviços Delegados de Transporte do Estado de São Paulo (ARTESP) à recomposição econômico-financeira do contrato de concessão, levando em consideração as projeções financeiras que embutem os custos de financiamento.

Em suas razões, a autora, ora apelante, sustenta que estando obrigada, nos termos do contrato de concessão, a contratar financiamento a longo prazo, em virtude da crise financeira mundial de setembro de 2008 se deparou com uma situação muito mais onerosa e condições de crédito muito mais gravosas do que as consideradas nas proje-ções financeiras constantes da proposta. Tal situação implicou na quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.

A 4ª Câmara de Direito Público do TJSP, ao analisar o recurso, entendeu que é despro-positada a alegação de que o contrato de concessão firmado entre as partes tenha con-siderado a Taxa Interna de Retorno (TIR) dos acionistas como parâmetro para a fixação da equação econômico-financeira.

Por fim, negou provimento à apelação.

Do voto do Relator, destacamos:

“[...] O disposto no item 23.1, inciso III do pacto (‘23.1 As partes terão direito à re-composição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, quando este for afetado, observada a legislação vigente, especialmente nos seguintes casos: III – Ocorrência de eventos excepcionais, causadores de significativas modificações nos mercados finan-ceiro e cambial, que impliquem alterações substanciais, para mais ou para menos, nos pressupostos adotados na elaboração das projeções financeiras, desde que esses even-tos não sejam passíveis de serem cobertos por mecanismos efetivamente disponíveis no mercado nacional ou internacional (hedge), a custos razoáveis’) não autoriza absoluta-mente tal conclusão, ainda mais que na lição sempre precisa de Hely Lopes Meirelles, ‘na interpretação do contrato administrativo é preciso ter sempre em vista que as normas que o regem são as do Direito Público, suplementadas pelos princípios da teoria geral dos contratos e do Direito Privado, e não o contrário, como, lamentavelmente, ainda se pratica entre nós (art. 54). Não se nega a aplicação das regras de hermenêutica comum à interpretação dos contratos administrativos, mas nessa operação não se pode olvidar que o objeto da contratação é, sempre e sempre, o atendimento do interesse público. Diante dessa realidade, a busca da intenção das partes há de partir da premissa de que a finalidade precípua do ajuste é a satisfação de necessidades coletivas. Daí porque já

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decidimos que nos contratos administrativos celebrados em prol da coletividade não se pode interpretar suas cláusulas contra essa mesma coletividade, para só se atender aos direitos individuais do particular contratado’ (Direito administrativo brasileiro. 34. ed. Malheiros, p. 221).

E à luz da posição adotada, sem qualquer utilidade dilação probatória tendente a apurar os efeitos da crise financeira de 2008 sobre as projeções financeiras com financiamento.

Em tais condições, rejeitada a preliminar, nega-se provimento ao recurso.”

6749 – Concurso público – Fundação Casa – candidato – fase de investigação social – des-classificação

“Concurso público. Fundação Casa. Candidato desclassificado na fase de investigação social. Contratação temporária anterior, pela própria Fundação Casa, por cinco meses, tendo o can-didato apresentado onze faltas injustificadas no mesmo mês. Análise dos antecedentes sociais do candidato realizada dentro de limites razoáveis, em campo atinente ao mérito adminis-trativo. Não caracterizada violação ao devido processo administrativo porque não se trata de punição pelas faltas. Demanda improcedente. Recurso não provido.” (TJSP – Ap 4021919-72.2013.8.26.0114 – 12ª CDPúb. – Rel. Edson Ferreira – DJe 25.08.2014)

6750 – Concurso público – psicólogo – carga horária semanal – decreto municipal – alte-ração

“Administrativo e processual civil. Concurso público. Servidor municipal. Psicólogo. Carga horária semanal prevista no edital alterada, a posteriori, por decreto municipal. Inexistência de ofensa ao art. 535, II, do CPC. Edital. Lei que rege o certame. Interpretação de cláusulas editalícias. Súmula nº 5/STJ. Limite de horas semanais. Análise de decretos municipais. Direito local. Súmula nº 280/STF, aplicável por analogia. 1. No mérito, a controvérsia cinge-se à car-ga horária a ser cumprida por psicólogos, servidores públicos do Município do Rio de Janeiro, uma vez que, por novo decreto municipal que modificou o edital do concurso de admissão, a municipalidade alterou o decreto anterior, de modo a aumentar a carga horária de 32 horas e 30 minutos para 40 horas semanais. 2. Não cabe falar em ofensa ao art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido se pronuncia de modo inequívoco e suficiente sobre a questão posta nos autos. 3. Nos termos da jurisprudência desta Corte, o edital é a lei que rege o concurso público, vinculando a relação jurídica havida entre a Administração e os candidatos, desde que não subverta a ordem jurídica vigente. 4. Insuscetível de revisão o entendimento a quo amparado em cláusulas de edital de concurso público, haja vista a incidência da Súmula nº 5/STJ. 5. Normas de direito local não podem ser analisadas por esta Corte, ante o óbice da Súmula nº 280/STF, aplicável por analogia. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1.454.645 – (2014/0101641-7) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 15.08.2014)

6751 – Contrato administrativo – município e advogados – assinatura por extenso em todas as folhas – desnecessidade

“Direito administrativo. Agravo de instrumento. Contrato firmado entre município e advoga-dos. Desnecessidade de assinatura por extenso em todas as folhas do instrumento. Existência de rubricas e assinatura na ultima folha que satisfaz o requisito de autenticidade. Agravo provido. 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu os pedidos da agravante de liquidação do titulo executivo judicial, de aplicação de multa de 10% para a hipótese de resistência, de fixação da verba honorária sucumbencial no percentual de 20%, deixando ainda de apreciar o pedido de retenção da verba honorária contratual. 2. Não se

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exige a assinatura por extenso em todas as páginas do contrato firmado, bastando para a vali-dade do instrumento contratual, a aposição da assinatura em sua ultima página e a existência de rubricas nas demais. 3. Agravo de instrumento provido para reconhecer a validade do instrumento contratual e determinar que o juiz de primeiro grau proceda à analise do pedido de retenção dos honorários.” (TRF 5ª R. – AGTR 0004633-87.2014.4.05.0000 – (138166/PE) – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Rogério Fialho Moreira – DJe 14.08.2014)

6752 – Convênio – Município – inadimplência – novos contratos – celebração – impossibi-lidade – gestão anterior – responsabilidade – restrição – suspensão

“Mandado de segurança. Inadimplência. Município. Impossibilidade de celebração de novos convênios com o Estado. Responsabilidade da gestão anterior. Adoção das providências ca-bíveis pelo atual gestor. Suspensão da restrição. Segurança concedida. Precedentes do TJMA e do STJ. 1. Comprovando-se que a inadimplência foi deixada por gestão municipal anterior e que a atual gestão adotou as providências necessárias para regularizar a situação, deve ser excluído o nome do Município do cadastro de inadimplentes. Precedentes do TJMA e do STJ. 2. Segurança concedida.” (TJMA – Proc. 0003495-14.2014.8.10.0000 – (151463/2014) – Relª Angela Maria Moraes Salazar – DJe 21.08.2014)

6753 – Desapropriação – rodovia – duplicação da rodovia – indenização – convênio – DNER e DER/MG – solidariedade – indenização

“Administrativo. Desapropriação indireta. Duplicação da rodovia Fernão Dias. DNER. DER/MG. Convênio. Legitimidade passiva. Solidariedade. Faixa de domínio. Indenização. Ju-ros compensatórios. Juros moratórios. Correção monetária. Honorários advocatícios. 1. Com a extinção do DNER e simultânea criação do DNIT, por meio da Lei nº 10.233/2001, a União tornou-se parte legítima nos processos em curso, ajuizados até 05.06.2001, como sucessora da autarquia extinta em todos os seus direitos e obrigações, e o DNIT nas ações ajuizadas des-de a data da publicação da lei que o criou. 2. Celebrando o DNER convênio com o DER/MG para a duplicação de estrada federal, e ocupando este área de terra para tal finalidade, devem os dois responder pela indenização, cuja causa foi o ato ilícito praticado pelo Departamento Estadual. Precedente do TRF 1ª Região. 3. A prova pericial demonstrou que a obra de dupli-cação da rodovia Fernão Dias – BR-381 absorveu parte do imóvel da parte autora, tornando certo o dever de indenizar por desapropriação indireta, em respeito ao direito de propriedade. 4. Incensurável a sentença a quo que teve como base para apurar o quantum indenizatório a perícia oficial produzida nos autos, equidistante dos interesses das partes e elaborada de acordo com os critérios técnicos e regramentos legais a respeito da matéria, tendo como referência valores obtidos mediante pesquisa mercadológica, relativa a outros imóveis com características semelhantes às do imóvel expropriado. 5. Na desapropriação indireta os juros compensatórios são devidos a partir da ocupação do imóvel à taxa de 6% (seis por cento) ao ano, no período compreendido entre 11.06.1997, quando foi editada a Medida Provisória nº 1.577/1997, até 13.09.2001, quando foi publicada a decisão liminar do STF na ADIn 2.332/DF, suspendendo a eficácia da expressão ‘de até seis por cento ao ano’, do caput do art. 15-A do Decreto-Lei nº 3.365/1941, introduzida pela referida MP. Nos demais perío-dos, a taxa dos juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano, como prevê a Sú-mula nº 618/STF (REsp 1.111.829/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe de 25.05.2009). 6. Juros moratórios no percentual de 6% (seis por cento) ao ano, a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito. Art. 15-B do Decreto-Lei nº 3.365/1942, acrescentado pela Medida Provisória nº 1.577/1997, hoje Medida Provisó-

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ria nº 2.183-56/2001. 7. Correção monetária devida desde a data do laudo de avaliação do perito. 8. Honorários advocatícios arbitrados em 5% (cinco por cento) sobre o valor to-tal da condenação. 9. Apelações da União e do DER/MG não providas.” (TRF 1ª R. – AC 2006.38.08.001342-4/MG – Rel. Des. Fed. Ney Bello – DJe 22.08.2014)

6754 – Ensino – contrato de financiamento estudantil – FIES – estudante – idoneidade ca-dastral – desnecessidade

“Administrativo. Contrato de financiamento estudantil. FIES. Idoneidade cadastral do estu-dante. Desnecessidade. Obrigatoriedade apenas em relação ao fiador. Alteração legislativa. Sentença reformada em parte. I – Nos termos do art. 475, I, do Código de Processo Civil, está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público. Possuindo a Caixa Econômica Federal natureza jurídica de empresa pública federal, não há razão para submeter a sentença ao duplo grau de jurisdição obrigatório, sendo o não conhecimento da remessa oficial medida que se impõe. II – A Lei nº 12.801/2013 conferiu nova redação ao inciso VII do art. 5º da Lei nº 10.260/2001 e afastou a necessidade de comprovação de idoneidade cadastral do estu-dante para fins de assinatura de contrato de financiamento com recursos do FIES, mantendo-a apenas em relação ao(s) fiador(es), devendo ser mitigada essa exigência ainda que em relação aos processos anteriores à sua vigência, na medida em que o contrato de financiamento pode ser garantido por fiador idôneo. III – Constando da parte dispositiva da sentença recorrida determinação no sentido de se afastar in totum a exigência de comprovação de idoneidade cadastral para fins de assinatura de contrato de financiamento com recursos do FIES, sem dife-renciar se referente ao estudante ou ao fiador, deve ser acolhido em parte o recurso interposto pela CEF a fim de que tal conclusão se refira apenas ao estudante beneficiário do respectivo contrato. IV – Remessa oficial de que não se conhece e recurso de apelação a que se dá par-cial provimento (item III).” (TRF 1ª R. – Ap-RN 0042754-63.2012.4.01.3300/BA – Relª Juíza Fed. Hind Ghassan Kayath – DJe 18.08.2014)

6755 – Ensino – estudante – curso superior – concurso – nomeação – antecipação de con-clusão – possibilidade

“Administrativo. Ensino superior. Mandado de segurança. Antecipação de conclusão de curso superior. Nomeação em concurso público. ‘Extraordinário aproveitamento’. Art. 47, § 2º, da Lei nº 9.394/1998. I – Há previsão legal no sentido de que os alunos que tenham extraordiná-rio aproveitamento nos estudos, demonstrada por meio de provas a serem aplicadas por ban-ca examinadora especial, podem ter abreviada a duração de seus cursos, conforme prevê o art. 47, § 2º, da Lei nº 9.394/1996. II – O fato de a impetrante ter obtido êxito em concurso pú-blico antes mesmo do regular término do Curso de Psicologia, demonstra que possui um de-sempenho escolar que não se pode deixar de qualificar como admirável, sobremaneira nos dias de hoje, em que a disputa pelo emprego público, em especial nas carreiras jurídicas, é bastan-te acirrada. III – O instituto do ‘extraordinário aproveitamento’, previsto na Lei nº 9.394/1996, art. 47, § 2º e no art. 115 do Regimento Geral da UFU não deve receber interpretação restriti-va, e sim ser aplicado de acordo à situação de cada aluno (REOMS 2008.38.03.001097-1/MG, 5ª T., Relª Desª Fed. Selene Maria de Almeida, e-DJF1 de 28.01.2011, p. 137). III – Remessa oficial a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – RN 0004287-54.2013.4.01.3502/GO – Rel. Des. Fed. Kassio Nunes Marques – DJe 08.08.2014)

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Comentário Editorial SÍNTESEDiscutiu-se na ementa em epígrafe se candidato aprovado em concurso público pode ter a antecipação de conclusão de curso superior para que assim possa ser nomeado.

Cuida-se de reexame necessário interposto contra sentença que ratificou a liminar con-cedendo a segurança para determinar que a autoridade impetrada submeta a impe-trante ao exame de proficiência por excepcional desempenho, e, caso aprovada, seja expedido o certificado de conclusão do curso de Psicologia na Faculdade Ahanguera de Anápolis/GO.

A impetrante relatou que estaria concluindo o 10º período do curso de Psicologia na Faculdade Ahanguera de Anápolis/GO e alcançou aproveitamento extraordinário nos es-tudos, sendo aprovada em 2º lugar no concurso público para Prefeitura Municipal de Abadiânia/GO. Assim, almejou a antecipação de conclusão de seu curso com fulcro no art. 47, § 2º, da Lei nº 9.394/1996, in verbis, já que a mesma lhe foi negada por não atender os requisitos do regulamento da instituição de ensino.

“Art. 47. Na educação superior, o ano letivo regular, independente do ano civil, tem, no mínimo, duzentos dias de trabalho acadêmico efetivo, excluído o tempo reservado aos exames finais, quando houver.

[...]

§ 2º Os alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos, demonstrado por meio de provas e outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca examinadora especial, poderão ter abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino.

[...].”

O Relator, ao analisar reexame em questão, ressaltou o mencionado dispositivo legal, que prevê a abreviada duração do curso daqueles alunos que possuem extraordinário aproveitamento nos estudos.

Por fim, afirmou que, como a impetrante obteve êxito em concurso público antes mesmo do regular término do curso de Psicologia, isso demonstra que ela possui um desempe-nho escolar que não se pode deixar de qualificar como admirável.

Assim, negou provimento ao reexame, mantendo a sentença.

Transcrevemos os precedentes citados no voto do Relator:

“[...] Saliento que o entendimento adotado na sentença se encontra amparado também pela jurisprudência desta Corte, como é de ver nos seguintes julgados:

‘ADMINISTRATIVO – ENSINO SUPERIOR – ANTECIPAÇÃO DE CONCLUSÃO DE CURSO SUPERIOR – NOMEAÇÃO E POSSE EM CARGO PRIVATIVO DE BACHAREL EM DIREI-TO – ‘EXTRAORDINÁRIO APROVEITAMENTO’ – ART. 47, § 2º, DA LEI Nº 9.394/1998 – I – Nos termos do disposto no § 2º do art. 47 da Lei nº 9.394/1998, ‘os alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos, demonstrado por meio de provas e outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca examinadora espe-cial, poderão ter abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino’. II – Hipótese dos autos em que a conclusão antecipada do curso se justifica em razão da aprovação do impetrante em concurso privativo de bacharel em Direito, no caso, Delegado de Polícia Civil do Estado do Piauí, de modo que devida a manutenção da sentença proferida em primeiro grau de jurisdição. III – Remessa oficial a que se nega provimento.’ (REO-MS 0007330-62.2010.4.01.4000/PI, 6ª T., Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian, e-DJF1 de 06.07.2012, p. 242)

‘ENSINO SUPERIOR – ‘EXTRAORDINÁRIO APROVEITAMENTO’ – EXPEDIÇÃO ANTECI-PADA DO CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DO CURSO – 1. O instituto do ‘extraordinário aproveitamento’, previsto na Lei nº 9.394/1996, art. 47, § 2º, e no art. 115 do Regi-mento Geral da UFU, não deve receber interpretação restritiva, e sim ser aplicado de acordo a situação de cada aluno. 2. Demonstrado que o aluno, embora não apresente

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um dos requisitos exigidos, teve aproveitamento acima do comum, além de ter sido aprovado em concurso de nível superior para o cargo de Engenheiro Mecânico, faz jus à concessão do ‘extraordinário aproveitamento’ e consequente expedição antecipada de certificado. 3. Remessa oficial improvida.’ (REO-MS 2008.38.03.001097-1/MG, 5ª T., Relª Desª Fed. Selene Maria de Almeida, e-DJF1 de 28.01.2011, p. 137) [...].”

6756 – Improbidade administrativa – contratação irregular – remuneração – recebimento – trabalho – realização – ausência

“Administrativo. Improbidade administrativa. Contratação irregular de pessoa para desempe-nhar atividade que, ao final, não foi realizada. Recebimento de remuneração sem a realiza-ção de trabalho. Ato de improbidade caracterizado. Inexistência de violação do art. 535 do CPC. Ausência de litisconsórcio passivo unitário. Necessidade de ressarcimento ao Erário. Suspensão dos direitos políticos por 8 anos. Ausência de desproporcionalidade. 1. Recurso especial no qual se discute se caracteriza ato de improbidade do art. 9º da Lei nº 8.429/1992 a contratação pelo Presidente da Câmara de Vereadores de Atibaia de mulher, mãe de seu filho, para realizar trabalho que, ao final, não foi prestado. Discutem-se, ainda, a aplicação do art. 509 do CPC ao recurso especial, beneficiando-se o réu que não recorreu a tempo, e a proporcionalidade das sanções que lhes foram impostas. 2. Não viola o art. 535 do Códi-go de Processo Civil o acórdão que adota fundamentação suficiente para decidir de modo integral a controvérsia. 3. Ante as peculiaridades do caso e o modo de agir de cada um dos recorrentes, quanto aos atos de improbidade, observa-se que o Tribunal de origem decidiu com acerto ao concluir pela inexistência de litisconsórcio unitário, uma vez que, no caso, os atos de improbidade são distintos e, por conseguinte, as sanções aplicadas derivam de condutas distintas. A respeito, dentre outros: EDcl-REsp 1228306/PB, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma, DJe 04.02.2013. 4. Eventual efeito expansivo subjetivo, em tese, só seria viável caso se concluísse pela improcedência da ação civil de improbidade, não se podendo decidir questões outras, que não sejam comuns a ambos, porquanto as circunstâncias e as condições de caráter pessoal não se comunicam. 5. A situação fática descrita pelas instâncias ordinárias não dá margem a dúvidas: a recorrente sabia que sua requisição era irregular e, deliberada-mente, recebeu remuneração, sem prestar o serviço para o qual, em tese, teria sido contra-tada: ou seja, recebeu vantagem patrimonial indevida porque não fez o trabalho para o qual foi requisitada a fazer. 6. A alegação de que o serviço mal prestado não caracteriza ato de improbidade não convence, porquanto os fatos descritos estão a comprovar que a recorrente, dolosamente, aproveitou-se do ato ímprobo praticado pelo então Presidente da Câmara de Vereadores para, em conluio, receber, sem trabalhar. O que se denota da situação descrita é que a recorrente tentou mascarar a ausência de trabalho. 7. Nesse contexto, não há falar que sua condenação na devolução do que recebeu no período de sua requisição não observe o princípio da proporcionalidade. 8. Outrossim, não se mostra desproporcional a suspensão dos direitos políticos por 8 anos, porquanto a conduta denota não ter a moralidade necessária àqueles que devem ocupar um cargo eletivo. Assim, a suspensão dos direitos políticos, além de cumprir a finalidade pedagógica da condenação, impede que, eventualmente, venha a ocupar algum cargo eletivo junto à sociedade de Atibaia. 9. Recurso especial improvido.” (STJ – REsp 1.367.969 – (2012/0008160-4) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 19.08.2014)

6757 – Improbidade administrativa – imóveis públicos – utilização – consentimento – pré-via licitação – ausência

“Improbidade administrativa. Consentimento de utilização de imóveis públicos por terceiros sem prévia licitação. Não recolhimento de valores públicos ao fundo do exército. Improbi-

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dade. 1. Não há que se falar em nulidade da sentença em razão de ter sido prolatada antes do cumprimento da carta precatória expedida para a oitiva da testemunha, vez que, do seu depoimento, juntado aos autos em momento posterior à sentença, não se extrai qualquer novo elemento probatório. Aplicação do princípio do pas de nullité sans grief. 2. O consentimento de utilização dos imóveis jurisdicionados ao Exército por terceiros para fins de exploração comercial deve ocorrer através de arrendamento, mediante prévia licitação, e não através da permissão de uso, destinada tão somente ao consentimento da prática de eventos de curta du-ração. Inteligência dos art. 22 da Lei nº 9.636/1998 e arts. 9º, 17, 30 e 31 da IR 50-13. 3. Em que pese não ter sido o demandado o subscritor das permissões de uso e suas prorrogações, até mesmo porque sequer tinha atribuição para tanto, ele foi o responsável pelas tratativas e por assessorar o Comandante na elaboração dos termos, apesar de ter conhecimento da ne-cessidade da prévia licitação para pactuação do arrendamento. Todavia, quanto a tal prática, não se afigura a improbidade administrativa, vez que não restou demonstrada a intenção desleal de lesar os cofres públicos ou de obter vantagem indevida. Do mesmo modo, apesar de inexistir regramento que permita o recebimento dos valores devidos à Administração Pú-blica diretamente pelo servidor púbico, em espécie, esta prática também não era estranha à 9ª Brigada de Infantaria Motorizada. 4. Por sua vez, o não recolhimento dos valores pagos pelos permissionários, oportuna e espontaneamente, ao Fundo do Exército caracteriza ato de improbidade administrativa previsto no art. 10 da Lei nº 8.429/1992. Não se tratou de um mero esquecimento, decorrente da desatenção do réu, uma vez que o não recolhimento se referiu a todo o período de vigência das permissões, por quase um ano, até o início das investigações pelo Ministério Público, o que denota, no mínimo, a culpa gravíssima, equi-parável ao dolo, e não mera inabilidade ou gestão meramente irregular. Por certo, não é crível que alguém receba pagamento, todos os meses, de dois permissionários, e os guarde no (mesmo) armário, se esquecendo, no entanto, de efetuar a obrigação de recolhimento aos cofres públicos. 5. Considerando que a conduta ímproba é grave e advém da pactuação de irregulares permissões de uso, gerando dano ao patrimônio público e destoando da finalida-de pública exercida pelo servidor, impõe-se a condenação do réu ao ressarcimento integral do dano, compensando-se os valores já depositados, e, pela prática de ato de improbidade administrativa, nas penas de perda da função pública, pagamento de multa civil, fixada em 2 (duas) vezes o valor do dano causado ao Erário e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos. 6. Com ressalva do meu entendimento, sigo o posicionamento do Tribunal Superior de Justiça no sentido de afastar a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em favor do Ministério Público. 7. Apelação e remessa necessária parcialmente providas.” (TRF 2ª R. – Ap-RN 2009.51.01.028676-8 – (586025) – 7ª T.Esp. – Rel. Des. Luiz Paulo da Silva Araújo Filho – DJe 29.08.2014)

6758 – Improbidade administrativa – indisponibilidade de bens – conta corrente – blo-queio – verba alimentar – liberação

“Agravo de instrumento. Ação de improbidade administrativa. Indisponibilidade de bens. In-dividualização da conduta. Bloqueio de contas do recorrente. Liberação dos subsídios e dos proventos de aposentadoria. Verba alimentar recurso conhecido e parcialmente provido. O art. 7º da Lei nº 8.429/1992 possibilita a decretação da indisponibilidade de bens do acusado de improbidade administrativa, visando assegurar o integral ressarcimento do dano causado ao Erário, sendo que tal medida não é mera consequência do ajuizamento da ação de im-

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probidade, devendo, portanto, preencher os requisitos estabelecidos em lei. Assim, para que o patrimônio pessoal do acusado torne-se indisponível, necessário que sejam apontados os atos ilícitos praticados por este que deram razão a decretação da medida. Na hipótese dos autos, apesar das alegações do agravante, no sentido de que o juízo não individualizou a sua conduta e nem fundamentou sua decisão, não vislumbro isso nos autos. Isso porque, da aná-lise da decisão verifica-se que se encontra bem fundamentada e, ainda que de forma sucinta, individualizou a conduta do agravante. A medida de indisponibilidade de bens era necessária a garantir o interesse público, uma vez que conforme se constata nos autos, o suposto dano ao Erário causado pelo agravante chegaria ao importe de R$ 3.985.589,53. Destarte, não bloquear tais valores, poderia gerar dano ainda maior ao Poder Público, uma vez que refe-rida quantia poderá não ser mais encontrada, quando do deslinde da ação. O bloqueio de valores financeiros na ação de improbidade deve ressalvar as importâncias devidas a título de subsídios e proventos de aposentadorias do agravante, que por determinação legal são abso-lutamente impenhoráveis (CPC, art. 649, IX). Recurso conhecido e parcialmente provido para determinar o desbloqueio das contas, as quais o agravante recebe seus subsídios e proventos, limitando-se à quantia salarial.” (TJPA – AI 20143000050-9 – (136579) – Belém – 4ª C.Cív.Isol. – Rel. Jose Maria Teixeira do Rosario – DJe 07.08.2014)

Comentário Editorial SÍNTESEO agravo de instrumento em epígrafe foi interposto contra decisão de primeiro grau que, nos autos de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, deferiu pedido de tutela antecipada em desfavor do agravante, ordenando a indisponibilidade de seus bens.

De acordo com o agravante, a inicial narra supostamente quatro irregularidades, quais sejam: pagamento e prestação de contas do suprimento de fundos; concessão de diárias aos servidores; violação do teto remuneratório pelos procuradores e outros agentes pú-blicos ativos e inativos; contratação de estagiário; e que referidos fatos foram imputados em virtude de relatórios produzidos unilateralmente pelo órgão interno do Tribunal de Contas do Estado.

Relata que o juízo não individualizou a sua conduta nem justificou os motivos de sua convicção, assim, afirma que a decisão deve ser anulada.

Ao analisar o agravo, o Relator afirmou que houve sim a individualização da conduta do agravante. Mas o bloqueio de contas encontra limitações, e nesse aspecto tem razão o agravante, pois as importâncias devidas a título de subsídios e proventos de aposenta-dorias são absolutamente impenhoráveis, conforme preceitua o art. 649, IV, do CPC:

“Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:

[...]

IV – os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposenta-doria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3º deste artigo;

[...].”

Por fim, deu parcial provimento ao agravo, para determinar o desbloqueio das contas--salários do agravante apenas no que concerne aos valores objeto dos seus proventos de aposentadoria e subsídios.

Colacionamos as ementas a seguir no mesmo sentido:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO – IMPROBI-DADE ADMINISTRATIVA – INDISPONIBILIDADE DE BENS – REMUNERAÇÃO – VERBA

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ALIMENTAR – No caso, é imputada aos agravantes a prática de atos de improbidade administrativa previstos nos arts. 9º, caput, 10 e 11, todos da Lei nº 8.429/1992, em síntese, consistentes na utilização de desapropriação e do instituto do desmembramen-to, para beneficiar indevidamente os réus. A prática de ato de improbidade administra-tiva que causar lesão ao Erário ou ensejar enriquecimento ilícito enseja a medida de indisponibilidade de bens dos indiciados. Inteligência do art. 7º da Lei nº 8.429/1992. Para o decreto de indisponibilidade de bens, faz-se necessária a demonstração do fumus boni iuris, ou seja, dos indícios dos atos de improbidade; e do periculum in mora, que emerge da gravidade dos fatos e do montante do prejuízo causado ao Erário. Preceden-tes do STJ e desta Corte. Presentes os elementos necessários para manter a decisão de indisponibilidade de bens. As quantias relativas à remuneração dos agravantes não devem ser alcançadas pelo decreto de indisponibilidade de bens, por se tratar de verba de natureza alimentar. Inteligência do art. 649, IV, do CPC. Agravo desprovido.” (TJRS, AI 70057650889, 3ª C.Cív., Rel. Des. Leonel Pires Ohlweiler, J. 27.03.2014) (Dis-ponível em: online.sintese.com, sob o nº 158000261995. Acesso em: 15 ago. 2014)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBI-DADE ADMINISTRATIVA – FORTE INDÍCIO DE CONDUTA ÍMPROBA PRATICADA PELO RECORRENTE – INDISPONIBILIDADE DOS BENS DECRETADA – BLOQUEIO DE VER-BA ALIMENTAR – IMPOSSIBILIDADE – PRECEDENTES DO STJ – INDISPONIBILIDADE PARCIALMENTE AFASTADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO – I – No caso em tela, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública contra o demandado, ora agravante, sob o fundamento da prática de atos de improbidade, consubstanciados em prejuízo ao Erário Municipal, comprovados através da investigação levada a efeito pela Polícia Federal, no curso das ‘Operações Caetés e Mascoth’. II – Por seu turno, o Magistrado a quo decretou a indisponibilidade de bens do demandado, ora agravante, com base na probabilidade dos fatos que lhe foram imputados serem verossímeis, quais sejam: ‘O superfaturamento de preços na aquisição de merenda escolar, o recebimento de ‘comissões’ para direcionar os contratos administrativos a empresas previamente combinadas, a ausência de prévia cotação dos preços dos bens a serem adquiridos, contratação com empresa não vencedora de procedimento licitatório, desvio de recur-sos do PNEA em benefício do Prefeito J. G. R. S. E de desvio de parcela da merenda escolar’ (fls. 11-12). III – Sem descuidar do fato de que há forte indício de conduta ímproba praticada pelo recorrente, a qual respalda a indisponibilidade decretada pelo juízo de primeiro grau, à luz da iterativa jurisprudência do col. Superior Tribunal de Justiça, tenho que o bloqueio de conta-salário desenha, com acentuada amplitude, malferimento ao princípio da razoabilidade (AgRg-REsp 1307137/BA, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, Julgado em 25.09.2012, DJe 28.09.2012 e AgRg-AREsp 197.901/DF, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, Julgado em 28.08.2012, DJe 06.09.2012). IV – A par disso, parece-me destituída de amparo legal a permissão de constrição sobre valores recebidos pelo demandado, ora agra-vante, em conta bancária destinada ao pagamento de folha salarial, como sói ocorrer, visto que ostenta nítido caráter alimentar. Precedente desta Corte Regional: Processo: 00041292320104050000, AG 105441/PB, Des. Fed. Manoel Erhardt, Primeira Tur-ma, Julgamento: 25.08.2011, Publicação: DJe 09.09.2011, p. 187. V – Ademais, não há como se afastar da conclusão de que a indisponibilidade decretada pelo juízo de primeiro grau equivale a uma penhora incidente sobre os vencimentos da parte agrava-da. Haveria, por via oblíqua, burla ao disposto no art. 649, IV, do CPC. VI – Agravo de instrumento parcialmente provido para restringir a indisponibilidade de bens, decretada pelo juízo de primeiro grau, a fim de que, única e exclusivamente, não alcance o importe depositado em conta bancária que esteja associado ao pagamento salarial.” (TRF 5ª R., AGTR 0013756-80.2012.4.05.0000, (129258/AL), 4ª T., Rel. Des. Fed. Edilson Pereira Nobre Júnior, DJe 07.03.2013, p. 351) (Disponível em: online.sintese.com, sob o nº 111000170107. Acesso em: 15 ago. 2014)

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6759 – Improbidade administrativa – prefeito – contratação de motorista – concurso – au-sência – pagamento – recursos próprios – dano indireto – configuração

“Improbidade administrativa. Município de Leme. Contratação de motorista sem concurso público salário pago com recursos próprios do Prefeito. Dano indireto ao Erário decorrente de reconhecimento do vínculo empregatício com o Município e consequente condenação a pagamento de verbas trabalhistas. Apadrinhamento e confusão das esferas pública e privada que geraram dano ao Erário. Configuração de ato ímprobo art. 10, I, da LIA. Sentença de pro-cedência. Recurso não provido.” (TJSP – Ap 0006635-04.2009.8.26.0318 – 6ª CDPúb. – Rel. Reinaldo Miluzzi – DJe 07.08.2014)

Comentário Editorial SÍNTESEÉ possível a contratação de motorista sem concurso público mesmo que o salário deste seja pago com recursos próprios do prefeito? Tal fato enseja a condenação do prefeito por improbidade administrativa? Esses foram os questionamentos da apelação em tela.

O Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou ação de responsabilidade por ato de improbidade administrativa contra o ex-prefeito do Município de Leme, almejando a condenação deste às penas do art. 12, II, ou, subsidiariamente, inciso III da Lei nº 8.429/1992.

Segundo o órgão ministerial, a improbidade administrativa foi perpetrada quando o en-tão prefeito concretizou a contratação de motorista sem concurso público para prestar serviços junto à APAE, causando dano ao Erário, já que foi imposta condenação no valor de R$ 3.654,63 ao Município pela Justiça do Trabalho em reclamação trabalhista, em que foi reconhecido o vínculo empregatício entre o motorista e o Município.

A sentença julgou procedente a ação, condenando o réu ao ressarcimento integral do dano, à perda da função pública que estiver exercendo ao tempo do trânsito em julga-do; à suspensão dos direitos políticos por cinco anos; ao pagamento de multa civil no valor de duas vezes do dano; à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos.

Inconformado com a decisão, o ex-prefeito interpôs o recurso em estudo alegando que não houve contratação temporária ou qualquer outra espécie de contratação pelo ente público e que inexiste dano ao Erário, já que não já registros de pagamentos originários do Município.

Finalmente, ressaltou que as penas foram aplicadas desproporcionalmente, além destas não serem necessariamente cumulativas, sendo cabível ao Magistrado a dosimetria das penas em consonância com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

A 6ª Câmara de Direito Público do TJSP negou provimento ao recurso, acolhendo os argumentos que o Ministério Público utilizou ao ajuizar a demanda.

Do voto do Relator destacamos:

“[...] Pelos testemunhos prestados durante a instrução processual a fls. 441/44, bem assim o documento de fls. 67, ficou claro que o então Prefeito de Leme contratou, sem concurso público, motorista para prestar serviços à APAE em nome do Município. E em-bora os salários fossem pagos com recursos próprios dele, Prefeito, houve dano indireto ao Erário em razão de condenação imposta pela Justiça do Trabalho em reclamação tra-balhista, em que foi reconhecido o vínculo empregatício entre o motorista e o Município.

Com efeito, o réu, em razão de seu ato de apadrinhamento e de confusão das esferas pú-blica e privada, acabou por causar dano ao Erário Municipal, configurando-se, pois, ato

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de improbidade administrativa, nos termos do art. 10, inciso I, da Lei nº 8.429/1992, como bem assentado na r. sentença recorrida.

Como anotou a Procuradoria-Geral de Justiça, ‘[o réu] assumiu o risco de resultado, sem a cautela de rigor. Prejudicou o Erário público, pela via indireta, e, portanto, o interesse público. [...] Teve seu mandato cassado pela Câmara Municipal (fls. 175/176) e vem respondendo a vários processos por improbidade administrativa decorrentes de ilegali-dade em contratações administrativas e de pessoal, por vezes com suspeita de licitações dirigidas (fls. 263/411). O interesse público é indisponível e como tal a autotutela da Administração deveria ter sido preservada no presente caso, como em todos os demais atos administrativos praticados. Deveria seu representante direto, o Prefeito, ter zelado ‘pela legalidade de seus atos e condutas e pela adequação dos mesmos ao interesse público’ (Odete Medauar, Direito administrativo moderno. 17. ed. São Paulo: RT, 2013. p. 148).’

As penalidades impostas ao apelante foram bem dosadas e estão de conformidade com a gravidade do ato. [...].”

6760 – Licitação – edital – violação – não comprovação – direito líquido e certo – ausência

“Mandado de segurança. Anulação de procedimento licitatório. Alegação de violação ao edi-tal. Não demonstrada. Ausência de direito líquido e certo. Discricionariedade administrativa. Segurança denegada. I – In casu, o impetrante pretende a declaração de nulidade do processo licitatório do qual foi eliminado, sob o argumento de que o edital do leilão, apresenta como objeto licitado quantidade muito superior ao que realmente utiliza de fato. II – Contudo em que pese as alegações do impetrante, após analisar detidamente os autos, não vislumbrei a presença a ofensa do direito líquido e certo alegado, uma vez que o processo licitatório ora questionado, seguiu todas as regras contidas no edital do certame, que inclusive, foi impug-nado pelo impetrante, por duas vezes por fatos diverso do alegado no presente mandamus. III – Por outro lado destaca-se, que a delimitação do objeto licitado é discricionariedade administrativa, visto que cabe a administração estabelecer os critérios para forma a conseguir a proposta mais vantajosa, estando a análise do judiciário adstrita apenas, ao aspecto da le-galidade do certame licitatório. IV – Registra-se ainda, que o fato da ora impetrante ter sido a prestadora do objeto licitado nos últimos anos, ocasião em que seu contrato possuiu uma quantidade menor do que a prevista no edital da licitação questionada, não significa dizer que a administração está vinculada a mesma quantidade, tendo em vista, que a necessidade ad-ministrativa varia com o passar dos anos. V – Segurança denegada.” (TJMA – Proc. 0019769-84.2013.8.10.0001 – (151451/2014) – Rel. Raimundo José Barros de Sousa – DJe 21.08.2014)

6761 – Mandado de segurança – Estatuto do Desarmamento – oficial de justiça avaliador – porte de arma – autorização – possibilidade

“Administrativo. Mandado de segurança. Estatuto do Desarmamento. Autorização para o por-te de arma de fogo a oficial de justiça avaliador. Possibilidade. I – A regra do Estatuto do Desarmamento é pela proibição do porte de arma de fogo em todo o território nacional, ex-cepcionando, pois, os casos legalmente previstos e as hipóteses elencadas em seu art. 6º, bem como as autorizações revestidas de precariedade insertas no poder discricionário da Polícia Federal a ser exercido nos limites conferidos no ordenamento jurídico. II – O exercício efetivo do cargo de Oficial de Justiça Avaliador agrega a seu ocupante a qualidade de executor de ordens judiciais, considerada atividade profissional de risco nos termos do inciso I do § 1º do art. 10 da Lei nº 10.826/2003, conforme estipulado pelo art. 18, § 2º, I, da Instrução Normativa nº 23/2005-DG, do Departamento de Polícia Federal, que estabeleceu os procedimentos para

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o cumprimento do Estatuto do Desarmamento, regulamentado pelo Decreto nº 5.123/2004, razão pela qual deve ser observado o estrito cumprimento do ordenamento jurídico e con-cedida a segurança a fim de superar o requisito normativo e determinar à autoridade policial que verifique a presença das demais exigências legais para o deferimento do porte de arma de fogo. III – Apelação da União e remessa oficial a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – Ap-RN 0063946-77.2011.4.01.3400 – Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian – DJe 01.09.2014)

Transcrição Editorial SÍNTESELei nº 10.826/2003:

“Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm.

§ 1º A autorização prevista neste artigo poderá ser concedida com eficácia temporária e territorial limitada, nos termos de atos regulamentares, e dependerá de o requerente:

I – demonstrar a sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física; [...]”

6762 – Militar – licença – transtornos esquizoafetivos – incapacidade definitiva – auxílio--invalidez e reparação por dano – descabimento

“Administrativo. Militar. Anulação do ato de licenciamento. Reforma. Transtornos esquizoa-fetivos. Eclosão durante a prestação do serviço castrense. Incapacidade definitiva para toda e qualquer atividade laborativa. Auxílio-invalidez e reparação por dano indevidos. Sucumbên-cia recíproca. 1. A jurisprudência, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, já firmou enten-dimento segundo o qual para a reforma ex officio do militar acometido de moléstia mental é suficiente que a doença tenha se manifestado durante a prestação do serviço militar, sendo desnecessária a comprovação da relação causal entre a eclosão desta enfermidade e o serviço militar (REsp 550.615/RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma, Julgado em 14.11.2006, DJ 04.12.2006, p. 357). 2. Demonstrada de forma cabal e incontroversa a incapacidade total e definitiva para toda e qualquer atividade laborativa, advinda de moléstia eclodida durante a prestação do serviço castrense, o militar deve ser reformado com soldo correspondente ao grau hierárquico que possuía na ativa (Lei nº 6.880/1980, art. 108, VI, c/c art. 111, II), servindo para tanto a perícia realizada e os documentos acostados aos autos. 3. Face à especialidade da legislação castrense, não se observa, in casu, a responsabilidade objetiva da Administração, pelo que não é devida a reparação por dano moral. 4. O auxílio-invalidez é devido ao militar que necessitar de internação especializada, militar ou não, ou assistência, ou cuidados perma-nentes de enfermagem, devidamente constatados por Junta Militar de Saúde, e ao militar que, por prescrição médica, também homologada por Junta Militar de Saúde, receber tratamento na própria residência, necessitando assistência ou cuidados permanentes de enfermagem. 5. Remessa necessária e apelação da União Federal parcialmente providas. Apelação da parte autora desprovida.” (TRF 2ª R. – AC 2005.51.01.008092-9 – (524839) – 8ª T.Esp. – Rel. Des. Marcelo Pereira da Silva – DJe 13.08.2014)

Destaque Editorial SÍNTESEDo voto do Relator, destacamos:

“[...] No caso, conforme se depreende do laudo pericial, o autor não necessita de inter-nação especializada ou assistência permanente de enfermagem, não fazendo jus, desta forma, ao pretendido auxílio-invalidez.

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Em caso semelhante, assim decidiu esta Corte, in verbis:

‘ADMINISTRATIVO – MILITAR – REFORMA – ALIENAÇÃO MENTAL – AUXÍLIO-INVA-LIDEZ – I – Ajuizou a parte autora a presente demanda objetivando, em síntese, a con-cessão de reforma militar com proventos da graduação superior, além de percepção de verba a título de auxílio-invalidez. II – Assevera, para tanto, que ingressou na Aeronáu-tica, gozando de boa saúde. Pretende demonstrar que, ainda quando do serviço ativo, já apresentava sinais da alienação mental que hoje o acomete. III – Compulsando os autos, verifica-se, que já se providenciou a interdição do autor (Certidão de Curatela de fls. 227) face à existência de deficiência mental incapacitante. Ademais, consta no lau-do pericial que o autor é portador de alienação mental e está incapacitado para o exercí-cio de qualquer atividade laborativa. IV – No que pertine ao auxílio-invalidez, consoante se depreende do laudo pericial, o autor não necessita de internação especializada ou assistência permanente de enfermagem, não fazendo jus, desta forma, à pretendida ver-ba. V – Remessa necessária e apelação da União Federal parcialmente providas.’ (TRF2, AC 2003.51.10.001078-6, 7ª T.Esp., Rel. Des. Fed. Reis Friede, DJ 07.12.2010)

Quanto ao pedido de indenização por dano moral, pleiteada pelo autor ao argumento de que a Administração teria praticado ato ilegal quando do seu desligamento, não merece prosperar face à especialidade da legislação castrense, não se observando a responsabi-lidade objetiva da Administração.

Logo, o que se extrai dos autos é que o autor é incapaz de prover sua subsistência, ou seja, de que se encontra incapacitado de forma total e permanente para qualquer trabalho, em decorrência de doença eclodida durante a prestação do serviço militar, fazendo jus a reforma, com o soldo correspondente ao grau que possuía na ativa (Lei nº 6.880/1980, art. 108, VI, c/c art. 111, II), não fazendo jus ao auxílio-invalidez, nem a reparação por dano moral. [...]”

6763 – Militar – pensão – valores recebidos liminarmente – decisão – revogação – ressar-cimento ao Erário – necessidade

“Agravo interno. Agravo de instrumento. Administrativo. Pensão militar. Valores recebidos liminarmente. Revogação da decisão. Ressarcimento ao Erário devido. I – Segundo dispõe o Código de Processo Civil (art. 273, § 3º), a efetivação da tutela antecipada observará, no que couber, as normas relativas à execução provisória. II – Assim, sobrevindo revogação ou modificação do título que deu causa à execução provisória já efetivada, a situação fática an-terior há de ser recomposta nos mesmos autos, desde logo e de modo integral pelo exequente. III – No caso em apreço, a ora agravada foi habilitada liminarmente ao recebimento de pensão na condição de filha de ex-combatente, tendo sido revogada definitivamente a antecipação de tutela, acarretando o recebimento indevido do montante de R$ 458.804,13 (quatrocentos e cinquenta e oito mil, oitocentos e quatro reais e treze centavos), atualizado até fevereiro de 2012. IV – Como já exposto linhas atrás, não há negar a possibilidade de obter, nos pró-prios autos, a reparação dos danos causados em razão da efetivação da tutela antecipada. V – Agravo interno improvido.” (TRF 2ª R. – AI 2014.02.01.004374-9 – 7ª T.Esp. – Rel. Reis Friede – DJe 19.08.2014)

Destaque Editorial SÍNTESEEm seu voto, o Relator citou os seguintes precedentes:

“[...] Nesse sentido, trago à Colação os seguintes arestos:

PENSÃO MILITAR – CUMPRIMENTO PROVISÓRIO DE SENTENÇA, DEPOIS REFOR-MADA – RESTITUIÇÃO DE VALORES AO ERÁRIO – POSSIBILIDADE – O regime de cumprimento de decisão judicial ainda sujeita à reforma (portanto, provisória) é sub-

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metido à regra categórica: quem executa providência liminar responderá pelos prejuízos que causar à parte adversa, em caso de reforma. Isso está previsto no art. 475-O do CPC, I, bem como nos arts. 811 e 273, § 3º, também do CPC. Assim, se a sentença judicial que beneficiava a parte foi reformada, e a parte recebeu valores a maior, é devida a restituição ao erário. O caráter alimentar da verba e a alegação de ter sido recebida de boa-fé não afastam o dever de restituir. Existe norma clara, direta e ine-quívoca, presente em textos de vários países, e não cabe ao Judiciário substituir-se ao legislador, e sim determinar o cumprimento da norma. Remessa e apelação providas. (AC 200151040011278, Apelação Cível nº 600985, Rel. Des. Fed. Guilherme Couto, Sigla do órgão TRF2, Órgão julgador 6ª Turma Especializada Fonte, e-DJF2R, Data: 02.10.2013)

ADMINISTRATIVO – VALORES RECEBIDOS LIMINARMENTE – REVOGAÇÃO DA DE-CISÃO – RESSARCIMENTO AO ERÁRIO DEVIDO – 1. A apelante pretende reaver os valores pagos por força de decisão que, ao antecipar os efeitos da tutela, determinou o fornecimento de recursos para custear tratamento de saúde do réu em Cuba, vez que a medida liminar foi posteriormente revogada pela sentença que denegou a ordem, já transitada em julgado. 2. Não obstante a alegada boa-fé do réu, certo é que sua aferi-ção, in casu, é desnecessária, uma vez que a hipótese em tela diz respeito a verdadeiro enriquecimento sem causa (art. 884 do CC), sendo aplicável, portanto, o art. 885 do Código Civil, no sentido de que ‘a restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir’. E essa é justamente a hipótese dos autos, uma vez que a Administração foi compelida a fornecer os recursos recebidos pelo réu exclusivamente por força de decisão judicial, posteriormente reformada. 3. Além disso, como o deferimento da antecipação de tutela rege-se pelas normas que disciplinam a execução provisória, sua revogação implica o restabelecimento do status quo anterior, por produzir efeitos ex tunc (art. 475-O, I, do CPC). Logo, ao dispor dos valores que lhe foram antecipados precariamente, o réu deve restituí-los à União, corrigidos monetariamente até a citação, a partir de quando passa a incidir apenas a Taxa Selic (art. 406 do Código Civil c/c art. 219 do CPC), sendo desca-bidos os índices apontados pela União. 4. Remessa necessária, considerada realizada, e apelação parcialmente providas. (Ap-Reex 200451120003767, Apelação/Reexame Necessário nº 456008, Rel. Des. Fed. Luiz Paulo da Silva Araujo Filho, Sigla do órgão TRF2, Órgão julgador 7ª Turma Especializada, Fonte e-DJF2R, Data: 29.05.2013) [...]”

6764 – Militar – pensão especial – ex-combatente – legislação – data do óbito – condição econômica – perquirição – desnecessidade

“Administrativo. Pensão especial. Ex-combatente. Óbito do ex-combatente. Reversão do be-nefício. Filha. Legislação que rege a matéria. Data do óbito. Perquirição a respeito da con-dição econômica. Desnecessidade. O direito à pensão de ex-combatente é regido pela lei vigente à data do seu óbito, nos termos das Leis nºs 4.242/1963 e 3.765/1960 e de que o regime misto de reversão aplica-se na hipótese de o ex-combatente falecer entre 05.10.1988 (Constituição de 1988) e 04.07.1990 (Lei nº 8.059/1990), quando se regulamentou o art. 53 do ADCT/1988. Descabida a perquirição acerca da dependência econômica das autoras em relação a seu falecido pai, uma vez que a legislação de regência não previa esse requisito. Inaplicável à espécie a Lei nº 8.059/1990, que veio regulamentar o art. 53 do ADCT/1988, por ser posterior à data do óbito do instituidor. Da mesma sorte, por idêntica fundamentação, os proventos referentes à pensão deverão ser correspondentes ao soldo de Segundo-Sargento, ao invés do soldo de Segundo-Tenente, haja vista que a atual norma (Lei nº 8.059/1990)

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não pode alcançar uma situação jurídica já consumada na vigência de lei anterior (Lei nº 4.242/1963).” (TRF 4ª R. – AC 2008.72.00.010861-8/SC – 4ª T. – Rel. Des. Fed. Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle – DJe 25.08.2014)

6765 – Processo administrativo – demissão – advogado – ausência – prejuízo manifesto – nulidade

“Apelação cível. Direito administrativo. Ação ordinária com pedido de reintegração no cargo de técnico da receita estadual. PAD. Demissão. Nulidade do processo administrativo disci-plinar. Ausência de advogado. Prejuízo manifesto. Inobservância dos princípios da isonomia material e da ampla defesa. Não aplicação das circunstâncias atenuantes. Direito subjetivo do réu. Aplicação da pena em concreto deve se dar dentro das balizas da legalidade, não sendo um ato meramente discricionário. Recurso conhecido e provido contra o parecer ministerial.” (TJMA – Proc. 0007553-96.2010.8.10.0001 – (151670/2014) – Relª Nelma Celeste Souza Silva Sarney Costa – DJe 25.08.2014)

Destaque Editorial SÍNTESEDo voto da Relatora, destacamos:

“[...] Em que pese a Súmula Vinculante nº 05 do Supremo Tribunal Federal afirmar em seu teor que ‘a falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição’; entendo que a análise do respeito aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório devem ser feitas caso a caso, sob pena de, em caso contrário, contrariar princípios constitucionais basilares.

Assim, quando for demonstrado efetivo prejuízo por ausência de defesa técnica, entendo que o processo será fulminado por uma nulidade. Como no caso sub análise, eis que a defesa do ora apelante foi feita inicialmente por uma servidora nomeada defensora ad hoc, sem que a mesma demonstrasse no bojo de todo o procedimento, conhecimentos técnicos para tanto.

Ademais, posteriormente, o ora recorrente foi representado por advogado de seu sindi-cato, que apenas apresentou a defesa final no bojo do PAD.

Como já assentado pacificamente na jurisprudência pátria, embora não seja indispen-sável a atuação de advogado no processo administrativo disciplinar, não se exclui a necessidade da defesa efetiva, sob pena de afrontar os princípios supracitados.

Vejamos a jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça, inclusive posterior à edição da Súmula Vinculante nº 05 do Supremo Tribunal Federal:

MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDOR PÚBLICO – PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – DEMISSÃO – ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA – INOCOR-RÊNCIA – REVELIA – NOMEAÇÃO DE DEFENSOR DATIVO – PROCESSO ADMINIS-TRATIVO DISCIPLINAR FORMALMENTE REGULAR – APLICAÇÃO DA SANÇÃO DE-MISSÓRIA À SERVIDORA PÚBLICA COM MAIS DE 30 ANOS DE SERVIÇO, SOB O FUNDAMENTO DE ABANDONO DE CARGO – ART. 132, II, DA LEI Nº 8.112/1990 – INOBSERVÂNCIA DA REGRA DE OURO DA PROPORCIONALIDADE – ANTECEDENTES FUNCIONAIS FAVORÁVEIS – ART. 128 DA LEI Nº 8.112/1990 – ORDEM CONCEDIDA EM CONFORMIDADE COM O PARECER MINISTERIAL – 1. Com a edição da Súmula Vinculante nº 5, do col. STF, não há mais que se falar em indispensabilidade, no proce-dimento administrativo disciplinar, de que a defesa do indiciado seja necessariamente realizada por advogado, ou que, na ausência deste, a administração esteja obrigada a nomear-lhe defensor dativo. 2. Embora não seja indispensável a atuação de advogado no PAD, uma vez que a própria lei prevê a manifestação pessoal do servidor, à toda evidência, não se exclui a necessidade de efetiva defesa, como decorrência, inclusive,

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do princípio do devido processo legal; a ausência de defensor constituído no decorrer da instrução do processo administrativo disciplinar não importa, necessariamente, em sua nulidade, desde que tenha sido oportunizada e efetivamente exercida a defesa do indiciado, ainda que pessoalmente. 3. In casu, porém, a impetrante foi citada por edital para acompanhar o procedimento, tendo sua procuradora, não advogada, comparecido espontaneamente à comissão, oportunidade em que foi inquirida sobre os fatos alegados sem, contudo, apresentar justificativa para as faltas. Em face de revelia da servidora, foi regularmente designado defensor dativo para exercer sua defesa, tendo este oportu-namente apresentado defesa escrita. 4. O procedimento sumário, previsto pelo art. 133 da Lei nº 8.112/1990 para a apuração de abandono de cargo, prevê que a comissão processante será composta por 2 servidores estáveis, afastando, assim, a aplicação do art. 149 da Lei nº 8.112/1990 (que impõe que a comissão processante será composta por 3 servidores estáveis). 5. Embora as sanções administrativas disciplinares apli-cáveis ao servidor público sejam legalmente fixadas em razão da própria infração – e não entre um mínimo e máximo de pena, como ocorre na seara criminal – não está a administração isenta da demonstração da proporcionalidade da medida (adequação entre a infração e a sanção), eis que deverá observar os parâmetros do art. 128 da Lei nº 8.112/1990 (natureza e gravidade da infração, danos dela decorrentes e suportados pelo Serviço Público, circunstâncias agravantes e atenuantes e ainda os antecedentes funcionais). 6. Assim, incide em ilegalidade o ato demissório do servidor público que ostenta mais de 30 anos ininterruptos de serviço sem qualquer punição administrativa, dando-se à sua ausência ao trabalho por 42 dias (de 23.07.2007 a 03.09.2007) o va-lor de abandono de cargo, punível com a demissão (art. 132, II, da Lei nº 8.112/1990); as sanções disciplinares não se aplicam de forma discricionária ou automática, senão vinculadas às normas e sobretudo aos princípios que regem e norteiam a atividade punitiva no âmbito do direito administrativo disciplinar ou sancionador. 7. No exercício da atividade punitiva a administração pratica atos materialmente jurisdicionais, por isso que se submete à observância obrigatória de todas as garantias subjetivas consagradas no processo penal contemporâneo, onde não encontram abrigo as posturas autoritárias, arbitrárias ou desvinculadas dos valores da cultura. 8. Ordem concedida para reinte-grar a servidora no cargo de Agente Administrativo do Quadro de Pessoal do Ministério da Saúde/GO, com o ressarcimento de todos os seus direitos, inclusive vencimentos e cômputo do tempo de serviço, desde a data da edição do ato demissório (Portaria nº 776/GM, de 24.04.2008, publicada no DOU 79, de 25.04.2008), sem prejuízo da aplicação de outra sanção administrativa, observado o devido processo legal. (STJ, MS 13791/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 25.04.2011, 3ª Seção) [...]”

6766 – Processo administrativo – pena de inidoneidade para licitar e contratar com o Po-der Público – alegações finais – inexistência – anulação – possibilidade

“Administrativo. Aplicação da pena de inidoneidade para licitar e contratar com o Poder Pú-blico. Na forma do art. 44 da Lei nº 9.784, de 1999, encerrada a instrução, o interessado terá o direito de manifestar-se no prazo máximo de dez dias, salvo se outro prazo for legalmente fixado. Espécie em que a pena de inidoneidade para licitar e contratar com o Poder Público foi aplicada sem que a empresa apenada tivesse a oportunidade de articular as alegações finais. Ordem concedida, anulando-se a decisão, facultado à autoridade impetrada retomar o curso do processo com a intimação da impetrante para a apresentação das alegações finais. Prejudicado o agravo regimental.” (STJ – MS 20.703 – (2013/0419973-5) – 1ª S. – Rel. Min. Ari Pargendler – DJe 21.08.2014)

Transcrição Editorial SÍNTESELei nº 9.784/1999:

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“Art. 44. Encerrada a instrução, o interessado terá o direito de manifestar-se no prazo máximo de dez dias, salvo se outro prazo for legalmente fixado.”

6767 – Registro profissional – OAB – eleição – advogado inadimplente – votação – partici-pação – possibilidade

“Administrativo. OAB. Eleição. Advogado inadimplente com as anuidades corporativas. Par-ticipação na votação. Possibilidade. 1. Conforme o disposto no art. 63, § 2º, do Estatuto da Advocacia – Lei nº 8.906/1994 –, apenas o candidato tem o dever de comprovar a sua situação regular junto à OAB, não se estendendo tal obrigação ao advogado eleitor. 2. Prece-dentes desta Corte. 3. Remessa oficial a que se nega provimento.” (TRF 3ª R. – RN 0011836-70.2012.4.03.6000/MS – 4ª T. – Relª Desª Fed. Marli Ferreira – DJe 25.08.2014)

Destaque Editorial SÍNTESEEm seu voto, a Relatora citou os seguintes precedentes:

“[...] Nesse exato sentido, aliás, vem decidindo esta eg. Corte, de forma iterativa, con-forme arestos que ora colho, verbis:

‘ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – ELEIÇÃO NA ORDEM DOS ADVO-GADOS DO BRASIL ANO 2012 – ADVOGADO INADIMPLENTE – DIREITO DE VOTAR – 1. Conforme se infere da leitura da Lei nº 8.906/1994, o requisito essencial para o exercício do voto, pelo advogado, consiste em estar inscrito na OAB (art. 63, caput e § 1º), situação por conta da qual torna-se obrigatório o comparecimento ao pleito. A obrigação de prova de regularidade de situação existe apenas em relação ao advogado candidato (art. 63, § 2º). 2. Constitui infração disciplinar deixar de pagar as contribui-ções, multas e preços de serviços devidos a OAB, depois de regularmente notificado a fazê-lo, nos termos do art. 34, XXIII, da Lei nº 8.906/1994, sendo o advogado infrator punido com suspensão até que satisfaça integralmente a dívida atualizada monetaria-mente, a teor do disposto o art. 37, § 2º, do Estatuto da Advocacia. 3. Assim, enquanto não se intimar regularmente o advogado inadimplente para o pagamento da dívida e não findar o processo disciplinar, regulado pelo art. 68 da Lei nº 8.906/1994, que impôs a pena de suspensão do exercício profissional, a retirar do advogado os direitos inerentes ao grau, é vedado impedir sua participação, como eleitor, das eleições de que trata o art. 63 da referida legislação. 4. Ademais, a participação como eleitora do pleito ocor-rido em 2012, por força de liminar em mandado de segurança consubstancia situação consolidada pelo transcurso do tempo e que deve ser mantida em prol da segurança ju-rídica.’ (REOMS 344.212, 6ª Turma, Rel. Juiz Conv. Herbert de Bruyn, J. 26.09.2013, e-DJF3 Judicial 1 data: 04.10.2013)

‘DIREITO ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – DESERÇÃO DE APELA-ÇÃO – ELEIÇÃO DE CARGOS DIRETIVOS NA OAB – ADVOGADO INADIMPLENTE COM ANUIDADES – DIREITO DE VOTAR – EXIGÊNCIA DE COMPROVANTE DE QUITAÇÃO – ILEGALIDADE – As entidades fiscalizadoras do exercício profissional não estão isentas de custas (art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/1996 – Regimento de Custas da Justiça Federal). Apelação não conhecida. A imposição da necessidade de o advogado demonstrar a situação regular para, então, poder votar, mostra-se em descompasso com a Lei nº 8.906/1994, criando um ônus não previsto em lei, em nítida violação ao art. 5º, inciso II, da CF/1988. O art. 63 do Estatuto da OAB estipula como condições para o advogado votar, apenas o fato de estar devidamente inscrito. O § 1º do art. 63 de-lega ao Regulamento Geral apenas matérias atinentes à forma, critérios e procedimentos a serem realizados nas eleições. Não há como se extrair interpretação que fundamente a imposição de requisitos que limitem os direitos dos advogados. Remessa oficial a

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que se nega provimento.’ (AMS 268.399, 3ª Turma, Rel. Des. Fed. Márcio Moraes, J. 18.02.2010, e-DJF3 Judicial 1 data: 09.03.2010, p. 67)

‘ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – ELEIÇÃO NA ORDEM DOS ADVO-GADOS DO BRASIL ANO 1997 – ADVOGADO INADIMPLENTE – DIREITO DE VOTAR – 1. Conforme se infere da leitura da Lei nº 8.906/1994, o requisito essencial para o advogado votar consiste em estar inscrito na OAB (art. 63, caput e § 1º), sendo, por for-ça disso, obrigatório o comparecimento ao pleito. A obrigação de prova de regularidade de situação existe apenas em relação ao advogado candidato (art. 63, § 2º). 2. Constitui infração disciplinar deixar de pagar as contribuições, multas e preços de serviços devi-dos a OAB, depois de regularmente notificado a fazê-lo, nos termos do art. 34, XXIII, da Lei nº 8.906/1994, sendo o advogado infrator punido com suspensão até que satisfaça integralmente a dívida atualizada monetariamente, a teor do disposto o art. 37, § 2º, do Estatuto da Advocacia. 3. Assim, enquanto não se intimar regularmente o advogado inadimplente da dívida e da necessidade de seu pagamento, e não estiver findo o pro-cesso disciplinar, regulado pelo art. 68 da Lei nº 8.906/1994, no qual se tenha imposto pena de suspensão do exercício profissional, a retirar do advogado os direitos inerentes ao grau, não se pode impedir sua participação, como eleitor, das eleições de que trata o art. 63 da referida legislação. 4. Demais disso, a participação como eleitora do pleito ocorrido em 1997, por força de liminar em mandado de segurança consubstancia situa-ção consolidada pelo transcurso do tempo e que deve ser mantida em prol da segurança jurídica.’ (AMS 187.959, 6ª Turma, Rel. Juiz Convocado em Auxílio Miguel Di Pierro, J. 15.01.2009, DJF3 data: 02.02.2009, p. 1399)

E esta eg. Turma julgadora, verbis:

‘DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – OAB – ELEIÇÃO – ADVOGADO INADIMPLENTE COM AS ANUIDADES CORPORATIVAS – PARTICIPAÇÃO NA VOTAÇÃO – POSSIBILIDADE – 1. Não há prova de que o advogado tenha sido notificado para efe-tuar o pagamento (art. 34 da Lei Federal nº 8.906/1994), nem mesmo que, constatada a inadimplência, o Tribunal de Ética e Disciplina (art. 70, caput e § 1º, da Lei Federal nº 8.906/1994) tenha cuidado de instaurar o devido processo legal disciplinar, com o necessário respeito às garantias constitucionais. 2. A inobservância do devido processo legal não pode ser suprida com a edição de resolução impositiva da apresentação de cer-tidão de quitação ou da exigência do pagamento da integralidade ou de parte do débito, no ato de exercício do sufrágio. 3. ‘O candidato deve comprovar situação regular junto à OAB’ (art. 63, § 2º, da LF nº 8.906/1994), não o eleitor. 4. Apelação e remessa oficial desprovidas.’ (AMS 287.076, 4ª Turma, Rel. Juiz Conv. Paulo Sarno, J. 03.11.2011, e-DJF3 Judicial 1 data: 17.11.2011) [...]”

6768 – Responsabilidade civil do Estado – casa do menor – menores abrigados – arremesso de objetos em casa vizinha – indenização devida

“Direito de vizinhança. Caraguatatuba. Casa do menor. Acesso dos menores abrigados ao telhado da casa da autora; arremesso de objetos; ameaças e palavras de baixo calão dirigidas à autora e seu filho. Construção de alambrado. Dano moral e material. Indenização. CC, arts. 1.277 e 1.278. 1. Responsabilidade. A prova dos autos demonstra que o Município, ciente das perturbações sofridas pela autora e advertido pelo Tribunal, não tomou qualquer providência para instalar alambrado e aumentar a altura do muro, de modo a impedir o acesso dos menores à residência da autora. Medida simples tomada depois de oito anos do início das atividades no abrigo e depois de mais de 2 anos da propositura da ação. Omissão do Município configurada. Inteligência dos arts. 1.277 e 1.278 do CC. 2. Dano material. Não há nos autos prova suficiente do dano material. Pedido rejeitado. 3. Dano moral. Têm-se como notórios os transtornos e constrangimentos a que submetida a autora e sua família devido ao

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constante acesso dos menores ao telhado e muro de sua residência, dirigindo-lhes ameaça e palavras de baixo calão, a qualquer hora do dia e da noite. Fotos, declarações dos responsá-veis pelo abrigo e as declarações do oficial de justiça confirmam as perturbações e a falta de segurança a que se sujeitou a autora. Indenização devida. 4. Indenização. A indenização do dano moral assume dupla função de compensar o sofrimento e advertir o causador do dano, sem que haja enriquecimento ilícito da parte indenizada. No caso, o valor de R$ 10.000,00 atende a finalidade do instituto e se amolda ao que a Câmara tem fixado para casos seme-lhantes. Sentença de procedência parcial. Recurso da autora acolhido em parte.” (TJSP – Ap 0008239-91.2009.8.26.0126 – 10ª CDPúb. – Rel. Torres de Carvalho – DJe 15.08.2014)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente em parte a ação e tornou definitiva a liminar, condenando o Município de Caraguatatuba a colocar alam-brado para cercar e proteger a casa da autora de objetos arremessados por menores residentes na casa do menor, vizinha da casa da autora.

Conforme consta nos autos, desde julho de 2003, funciona, ao lado da casa da autora, o Abrigo Provisório para Crianças e Adolescentes (antiga Casa do Menor), mantido pelo Município e administrado por meio de convênio pela Associação de Amparo e Proteção à Criança e Adolescente – SOAPROC.

Segundo declarações da autora, os menores sobem no telhado de sua residência, da-nificando-o, além de arremessarem objetos sobre ele, fazerem gestos obscenos e lhe dirigirem palavras de baixo calão, causando-lhe prejuízos de ordem moral e material, o que gerou o presente pedido de indenização.

A sentença apenas condenou o Município a colocar alambrado no local, o que gerou o inconformismo da autora e a interposição da apelação, enfatizando que houve compro-vação dos danos materiais e morais.

O Tribunal, ao analisar a apelação, entendeu que não houve comprovação do dano ma-terial, já que não houve prova de que a autora, ora apelante, consertou as telhas e nem dos valores despendidos para tal conserto.

Diante disso, deu parcial provimento ao recurso, determinando o pagamento de indeni-zação por danos morais, no valor de R$ 10.000,00.

Do voto do Relator, destacamos:

“[...] 6. Dano material. A despeito de o oficial de justiça ter constatado telhas quebradas ao cumprir mandado de constatação na residência da autora (fls. 228, v. 2), não há prova do conserto das telhas nem dos valores despendidos. O orçamento de fls. 27 não comprova que o material tenha sido adquirido e empregado na residência.

A ausência de prova leva ao não acolhimento do pedido de indenização por dano ma-terial.

7. Dano moral. Têm-se como notórios os transtornos e constrangimentos a que subme-tida a autora e sua família devido ao constante acesso dos menores ao telhado e muro de sua residência, dirigindo-lhes ameaça e palavras de baixo calão, a qualquer hora do dia e da noite, inclusive de madrugada como comprova o Boletim de Ocorrências nº 3747/11 (fls. 10 do apenso). As fotos de fls. 17/26, declarações dos responsáveis pelo abrigo a fls. 73 e 101 e as declarações do oficial de justiça a fls. 208, v. 2 confir-mam as perturbações e a falta de segurança a que se sujeitou a autora. A indenização é devida.

Indenização. A indenização do dano moral assume dupla função de compensar o so-frimento e advertir o causador do dano, sem que haja enriquecimento ilícito da parte

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indenizada. No caso, a autora se qualificou como ‘do lar’, está isenta da declaração do imposto de renda e é beneficiária da justiça gratuita. O Município, a partir da citação, demorou pouco mais de dois anos para instalar o alambrado e erguer o muro de acesso à residência da autora. A inércia da Administração não provocou dano grave ou gravíssi-mo. Por isso, o valor de R$ 10.000,00 atende a finalidade do instituto e se amolda ao que a Câmara tem fixado para casos semelhantes.

O voto é pelo parcial provimento do recurso para determinar que o Município pague à autora o valor de R$ 10.000,00 a título de danos morais, corrigidos desta data pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação. Diante da sucumbência mínima da autora, o Município arca integralmente com ônus fixados pela sentença.”

6769 – Responsabilidade civil do Estado – CEF – conta vinculada ao FGTS – saque fraudu-lento – indenização por dano material – descabimento

“Civil e administrativo. Saque fraudulento em conta vinculada ao FGTS. Ressarcimento ao titular pela instituição financeira depositária. Conduta lesiva da empresa empregadora. Au-sência de comprovação. Responsabilidade da Caixa Econômica Federal pela guarda e segu-rança dos depósitos do FGTS. Indenização por dano material. Descabimento. I – Na condição de agente operador do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, compete à Caixa Econômica Federal a centralização de todos os recolhimentos, a manutenção e o controle das contas vinculadas em nome dos trabalhadores, velando pela guarda e segurança dos de-pósitos do FGTS que lhe são confiados. II – Na hipótese em comento, a realização de saques fraudulentos em contas vinculadas ao FGTS, mediante a apresentação de documentos supos-tamente falsificados (já devidamente ressarcidos os respectivos titulares), sem que a referida instituição financeira adotasse as medidas de cautela devidas, com vistas na verificação da autenticidade da documentação apresentada para essa finalidade, não autoriza a transferên-cia dessa responsabilidade para a empresa empregadora dos funcionários lesados, à míngua de qualquer comprovação de sua participação no evento danoso. Precedente. III – Apelação provida. Sentença reformada, em parte, com inversão dos ônus da sucumbência.” (TRF 1ª R. – AC 0012985-35.2011.4.01.3400/DF – Rel. Des. Fed. Souza Prudente – DJe 27.08.2014)

6770 – Responsabilidade civil do Estado – hospital geral – diagnóstico equivocado – aten-dimento – demora – morte por infarto – dano moral e material – existência

“Civil. Responsabilidade civil objetiva do Estado. Erro médico. Morte por infarto agudo do miocárdio. Hospital Geral de Bonsucesso. Diagnóstico equivocado, sem respaldo de exames físicos. Demora no atendimento adequado. Dano, ação e nexo de causalidade comprova-dos. Prescrição afastada. Indenização por dano material e moral mantidas. Juros e correção monetária mantidos. Honorários advocatícios afastados. 1. A hipótese é de ação ordinária que objetiva a condenação da União por danos materiais e morais sofridos pela autora, em decorrência de suposto erro médico cometido no primeiro atendimento do Sr. Fernando Basílio Claro da Fonseca, seu marido, no Hospital Geral de Bonsucesso, que resultou na morte do mesmo por infarto agudo do miocárdio. A sentença julgou procedente em parte o pedido para fixar pensão mensal indenizatória de um salário-mínimo por 17 anos; o reembolso das despesas com funeral; a indenização por danos morais fixados em 200 salários-mínimos. Condenou a ré em honorários que fixou em 10% sobre o valor da indenização. A ré sustenta a inexistência de prova de que houve erro no procedimento, o que afasta a obrigação de in-denizar; a prescrição; a impossibilidade de ser condenada em honorários. Subsidiariamente, a redução da indenização. 2. Afasta-se a prescrição quinquenal. A parte autora perseguiu

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diligentemente os seus direitos, sendo certo que a citação ocorreu tardiamente por questões alheias à sua vontade, razão pela qual o prazo não pode ser computado em seu prejuízo. O eg. Superior Tribunal de Justiça tem entendimento já sumulado (Súmula nº 106) no sentido de que ‘proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência’. 3. A Constituição Federal de 1988 consagrou a teoria do risco administrativo, respondendo o Estado, objetivamente, pelos danos que causar a terceiros, desde que estabe-lecido o nexo de causalidade entre o ato da Administração e o prejuízo. 4. A Suprema Corte tem estabelecido os seguintes requisitos, para a configuração da responsabilidade objetiva do Estado, a saber: a) o dano; b) a ação administrativa; c) e o respectivo nexo causal; escla-recendo que a mesma pode ser excluída, total, ou parcialmente, por culpa da vítima (STF, RE 178806, DJ 30.06.1995), bem como pelo caso fortuito, ou força maior (STF, RE 109615, DJ 02.08.1996), ou por fato de terceiros ou da natureza (STJ, REsp 44500, DJ 09.09.2002). 5. Há que se vislumbrar um nexo etiológico entre a conduta e o dano experimentado (STF, RE 172025, DJ 19.12.1996), sem o qual, não obstante a presença dos demais requisitos, inviabi-liza-se o reconhecimento do direito à indenização (STJ, REsp 44500, DJ 09.09.2002). 6. Sobre nexo causal em matéria de responsabilidade civil, vigora no direito brasileiro, o princípio da causalidade adequada, também denominado princípio do dano direto e imediato, na forma do que dispõe o art. 403 do Código Civil, segundo o qual ninguém pode ser responsabilizado por aquilo a que não tiver dado causa (art. 927 do CC/2002) e, somente se considera causa o evento que produziu direta e concretamente o resultado danoso. 7. A ação/omissão da ré, no caso em que se discute erro médico, tem que ser comprovadamente negligente, imprudente ou praticada com imperícia, pois a responsabilidade médica se traduz em empregar a melhor técnica e os conhecimentos disponíveis no instante do procedimento. Em outras palavras, é obrigação de meio e não de fim, impondo-se a prova da conduta dos agentes em descon-formidade com a boa prática médica e o nexo de causalidade entre esta conduta e a lesão sofrida. 8. Da prova pericial e dos prontuários médicos, verifica-se que o atendimento do Sr. Fernando no Hospital Geral de Bonsucesso foi deficiente, eis que, pelo quadro de mal estar inespecífico, com dores e dormência nos membros superiores, era exigível a investigação de existência de fatores fisiológicos, antes de se concluir por problema de origem psíquica. Descumpriu a ré ônus que lhe competia: o de comprovar que adotou as técnicas médicas ade-quadas e disponíveis durante o atendimento do falecido marido da autora. 9. Presente está o dano, a omissão administrativa por negligência, eis que o hospital tinha condições de realizar um exame de sangue para a contagem de enzimas cardíacas ou um eletro cardiograma, antes de encaminhar o paciente para uma unidade psiquiátrica, o que efetivamente retardou as providências necessárias, somente conseguidas com a internação no Hospital Souza Aguiar, duas horas depois. 10. Em sede de responsabilidade civil, o dano material não se presume. O falecido estava desempregado, mas tinha esposa, três filhos, e sustentava a família realizando serviços gerais. A jurisprudência é uníssona no sentido de reconhecer que, na hipótese de não comprovação de vínculo empregatício, presume-se a percepção de um salário-mínimo para o sustento da família, com fundamento no art. 7º, IV, da Constituição Federal. Prece-dentes: REsp 1262938/RJ, Rel. Min. Castro Meira, 2ª Turma, DJe 30.08.2011; REsp 876.448/RJ, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª Turma, DJe 21.09.2010. 11. Deve ser mantido o valor fixado a título de indenização por danos morais, eis que levou em consideração as circunstâncias do caso concreto, a gravidade da lesão – incapacidade total e definitiva para qualquer ativida-de laborativa –, as características pessoais da vítima e da ré. Não há como não se ter como razoável e proporcional o valor de 200 salários-mínimos, equivalente à época da sentença a

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R$ 102.000,00 fixado na sentença, valor suficiente para minimizar o sofrimento da autora, sem que se caracterize o seu enriquecimento sem causa, e apto a cumprir o seu caráter pedagógico. 12. Correção monetária e juros de mora mantidos tal como fixados na sentença. 13. Hono-rários advocatícios afastados, eis que a parte autora está sendo patrocinada pela Defensoria Pública da União, órgão que integra a estrutura da Administração Pública Federal, confun-dindo-se na mesma pessoa as qualidades de credor e devedor, ocorrendo o instituto da con-fusão (art. 381 do Código Civil). Súmula nº 461 do STJ. 14. Remessa necessária e apelação cível parcialmente providas, tão somente para afastar a condenação em honorários advoca-tícios.” (TRF 2ª R. – Ap-RN 2003.51.01.009060-4 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Marcus Abraham – DJe 19.08.2014)

Remissão Editorial SÍNTESEVide RSDA nº 95, nov. 2013, ementa nº 6138, no mesmo sentido.

6771 – Responsabilidade civil do Estado – prisão durante o regime militar – filhos menores na época – dano moral – impossibilidade – prescrição quinquenal – ocorrência

“Direito civil e administrativo. Responsabilidade civil da União. Apelação. Prisão durante o regime militar. Filhos menores na época. Dano moral. Impossibilidade. Prescrição. 1. A sen-tença pronunciou a prescrição quinquenal da pretensão indenizatória dos autores por danos morais, por terem sido privados da convivência com o pai, preso durante o regime militar com base na Lei de Segurança Nacional, fundada em que o prazo prescricional deve ser compu-tado a partir da Lei nº 10.559/2002, e a ação foi proposta somente em 2011. 2. Com a prisão do pai, condenado a várias penas, incluindo prisão perpétua, por crimes não especificados pelas certidões expedidas na época, de dezembro de 1971 a pelo menos até dezembro de 1978, os dois autores, nascidos em 1966 e 1971, ficaram privados da presença paterna. 3. A Lei nº 10.559/2002, que instituiu o Regime do Anistiado Político, regula no art. 13 a trans-missão do direito à reparação econômica aos dependentes, e não se aplica aos filhos que vindicam direito próprio, decorrente do dano moral por eles diretamente experimentado em razão da ausência do pai, preso durante os primeiros anos de suas vidas. 4. Ajuizada a ação em 2011, a pretensão foi de todo modo atingida pela prescrição quinquenal (art. 1º do De-creto nº 20.910/1932), que se aplica às ações relativas à reparação de danos oriundos de per-seguição política durante o período da ditadura militar, a contar a partir da vigência o art. 8º do ADCT, em 05.10.1988, quando ambos os autores já contavam mais de 16 anos e não havia impedimento ao fluxo do prazo, nos termos da lei civil. 5. Apelação desprovida.” (TRF 2ª R. – AC 2011.51.01.012532-9 – 6ª T.Esp. – Relª Desª Nizete Antônia Lobato Rodrigues Carmo – DJe 19.08.2014)

Transcrição Editorial SÍNTESEDecreto nº 20.910/1932:

“Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.”

6772 – Responsabilidade civil do Estado – veículo – apreensão indevida – liberação – de-mora – indenização devida

“Administrativo. Responsabilidade civil. Apreensão indevida de veículo. Poder de polícia. Desconhecimento da legislação. Demora na liberação do bem. Dano moral. Arbitramento.

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1. Para a caracterização da responsabilidade objetiva do agente público ensejadora da indeni-zação por danos materiais e morais, é essencial a ocorrência de três fatores: o dano, a ação do agente e o nexo causal. 2. A indenização por danos morais tem por finalidade compensar os prejuízos ao interesse extrapatrimonial sofridos pelo ofendido, que não são, por sua natureza, ressarcíveis e não se confundem com os danos patrimoniais, estes sim, suscetíveis de recom-posição ou, se impossível, de indenização pecuniária. 3. Com efeito, o autor sofreu danos morais em razão da apreensão do veículo, visto que houve demora injustificada na liberação do bem, que se encontrava em situação de regularidade. 4. Relata o departamento de polícia federal que se tratava de caso raro e de difícil conhecimento, sendo necessário recorrer-se ao Detran para esclarecimento da matéria, e que até mesmo o funcionário supracitado do Detran desconhecia a legislação correspondente (fls. 435). 5. Não pode o administrado ser penaliza-do pelo desconhecimento do agente acerca da legislação aplicável no caso concreto, sendo este caso em que o poder de polícia é extrapolado. 6. Destarte, configurados o dano e o nexo de causalidade pelo ato de apreensão indevida de veículo de forma injustificada e por tempo excessivo, necessária a indenização por danos morais em montante que respeite o binômio de mitigação do sofrimento pelo dano moral, penalizando o ofensor, sem que se configure o enriquecimento ilícito da parte. 7. Nesse aspecto, entendo correta a condenação arbitrada em R$ 10.000,00 reais (dez mil reais), visto que não se demonstra irrisória e nem exagerada. 8. Apelação improvida.” (TRF 3ª R. – AC 0000818-67.2008.4.03.6105/SP – 6ª T. – Relª Desª Fed. Consuelo Yoshida – DJe 22.08.2014)

Destaque Editorial SÍNTESESelecionamos os seguintes julgados no mesmo sentido:

“RESPONSABILIDADE CIVIL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – APREENSÃO INDEVIDA DE CNH E VEÍCULO – FALSIFICAÇÃO DO DOCUMENTO AFASTADA – LEGITIMIDADE PASSIVA DO DETRAN – O Detran é parte legítima para figurar no polo passivo da presente demanda, sendo responsável pelos registros atinentes à CNH. Responsabilidade objetiva da ré pelos atos danosos causados por seus agentes. Art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Caso em que o autor, parado em uma blitz, foi autuado em decorrência de irregularidade em sua CNH. A autuação por infração de trânsito, com a retenção da CNH e o recolhimento do veículo, além de instauração de inquérito policial, tudo a partir da omissão do órgão de trânsito demandado, configuram danos morais. Ausente sistema tarifado, a fixação do montante indenizatório ao dano extrapatrimonial está adstrita ao prudente arbítrio do juiz. Valor fixado na sentença [R$ 6.200,00 – seis mil de duzentos reais] mantido. Even-to danoso como marco inicial à contagem dos juros moratórios – Súmula nº 54 do STJ. Negaram provimento ao apelo. Unânime.” (TJRS, AC 70056132368, 10ª C.Cív., Rel. Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana, J. 24.04.2014) (Disponível em: online.sintese.com, sob o nº 158000275685. Acesso em: 25 ago. 2014)

“RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – APREENSÃO INDEVIDA DO VEÍCULO – PARCELAS EM DIA – LESÃO MORAL PASSÍVEL DE INDENIZAÇÃO – DANO MORAL CONFIGURADO – REDUÇÃO DO VALOR FIXADO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS DE ACORDO COM OS PARÂMETROS DO CPC – JUROS DE MORA – NO REFORMATIO IN PEJUS – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO – 1. Configura-se dever do banco indenizar o recorrido que teve seu veículo apreendido indevidamente em seu local de trabalho. 2. O valor arbitrado deve ser reduzido para R$ 10.000,00 (dez mil reais), observando-se os critérios de moderação e razoabili-dade e guardando dimensão com o dano experimentado pela vítima. 3. Não há falar em redução dos honorários advocatícios fixados na sentença em 20% sobre o valor da condenação, pois está condizente com o trabalho desenvolvido pelo causídico, bem como está de acordo com os parâmetros determinados pelo Código de Processo Civil.

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4. Em caso de relação contratual, os juros de mora fluem a partir da citação. Contudo, mantenho os juros conforme posto na sentença – a partir da condenação –, em obedi-ência ao princípio no reformatio in pejus.” (TJMT, Ap 28603/2013, Relª Desª Clarice Claudino da Silva, DJe 21.10.2013, p. 21) (Disponível em: online.sintese.com, sob o nº 148000100771. Acesso em: 25 ago. 2014)

6773 – Servidão administrativa – depósito insuficiente – imissão provisória na posse – im-possibilidade

“Agravo de instrumento. Servidão administrativa. Imissão provisória. Depósito de valor vil, insuficiente para garantir a entrada da expropriante no imóvel rural. 1. A servidão de passa-gem administrativa é imposição de ônus reais sobre propriedade particular, visando utilidade pública, in casu, a implantação da Linha de Transmissão de Energia Elétrica Mascarenhas – Linhares. Em hipóteses tais, o particular tolera restrições ao exercício dos poderes ineren-tes à propriedade, recebendo, por isso, indenização proporcional à redução do ius fruendi. 2. A imissão provisória na posse de imóvel é providência viável sob o aspecto normativo, desde que preenchidas as seguintes condições: (i) declaração de urgência, emitida no próprio decreto expropriatório ou no curso da ação judicial, e (ii) depósito prévio, nos moldes do Decreto-Lei nº 3.365/1941. O depósito, por seu turno, pode ser fundado em valores apura-dos unilateral e precariamente pela expropriante, desde que essa avaliação tenha suficiente coerência, clareza e correspondência com o preço efetivo do imóvel. 3. Na hipótese dos autos, a laudo de avaliação feito pela expropriante ostenta flagrantes inconsistências, apon-tando, como valor final da faixa serviente, quantia vil. Se prevalecesse a cotação imobiliária feita pela concessionária de energia elétrica, o metro quadrado do imóvel valeria a irrisória quantia de R$ 1,24 (um real e vinte e quatro centavos), precificação que não se coaduna com os registros descritivos feitos pela própria empresa. 4. São verossímeis as alegações do casal expropriado, no sentido de que o diminuto depósito feito pela expropriante não corresponde, sequer minimamente, aos prejuízos decorrentes da servidão (que importará na erradicação de cultura cafeeira produtiva), restando, pois, imprestável para garantir a imissão provisória na posse do imóvel. 5. Recurso conhecido e provido, para revogar a ordem de imissão provisória na posse do imóvel rural objeto da contenda.” (TJES – AI 0005041-19.2014.8.08.0014 – Relª Desª Eliana Junqueira Munhos Ferreira – DJe 25.08.2014)

6774 – Servidor público – auxiliar de atividade de limpeza – desvio de função – motorista – diferenças salariais devidas

“Constitucional. Administrativo. Servidor público. Auxiliar de atividade de limpeza pública. Gari. Desvio de função. Motorista. Diferenças salariais devidas. Natureza indenizatória. 1. De- monstrado o desvio de função de atividade de limpeza urbana – gari – para a de motorista, surge o dever da Administração Pública de pagar as diferenças da remuneração do servidor e com os devidos consectários legais. 2. Consoante a Súmula nº 373 do Superior Tribunal de Justiça, uma vez reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes. 3. Não se trata de equiparação de vencimentos, que requer autorização legisla-tiva, ou de aumento de vencimentos pelo Poder Judiciário, vedados pelo art. 37, XIII, da CF e pela Súmula nº 399 do STF, mas de indenização ao servidor que, desviado de função pela Administração Pública, passa a prestar serviços melhor remunerados. 4. Apelo não provido.” (TJDFT – Proc. 20120110740536 – (813843) – Rel. Des. Flavio Rostirola – DJe 27.08.2014)

6775 – Servidor público – auxílio-alimentação – servidores administrativos – equiparação – cabimento

“Servidor público municipal. Equiparação de auxílio-alimentação com os servidores adminis-trativos. Cabimento. A distinção operada pelo requerido entre servidores operacionais e ad-ministrativos para efeito de concessão de vale-refeição não está prevista em lei. Portanto, não

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subsiste qualquer justificativa que legitime a diferenciação de tratamento. Inviável, no entanto, o pagamento retroativo, sob pena de enriquecimento indevido do apelante, vez que já recebe-ra alimentação em refeitório, de modo a se evitar a percepção cumulada e dúplice do auxílio -alimentação. Sentença de improcedência reformada. Apelo provido parcialmente.” (TJSP – Ap 0015262-26.2013.8.26.0554 – 3ª CDPúb. – Rel. Ronaldo Andrade – DJe 27.08.2014)

6776 – Servidor público – faltas não justificadas – feriado estadual – descontos remunera-tórios

“Administrativo. Servidor. Faltas não justificadas. Feriado estadual. Descontos remunerató-rios. Lei nº 9.093/1995. 1. Hipótese na qual os autores, servidores públicos civis federais, lotados no Instituto Militar de Engenharia – IME, pleiteiam a anulação do ato administrativo que determinou o desconto de verbas e vantagens em seus vencimentos, em virtude de não terem comparecido ao trabalho no dia 20.11.2006. 2. A referida data não é considerada fe-riado nacional, e sim estadual, não podendo ser enquadrada em nenhuma das hipóteses pre-vistas na Lei Federal nº 9.093/1995. 3. O servidor perde a remuneração relativa aos dias em que faltar ao serviço, sem motivo justificado, nos termos do art. 44, I, da Lei nº 8.112/1990. 4. Assim, não há ilegalidade no ato administrativo que determinou o desconto nos vencimen-tos dos servidores públicos federais civis que faltaram ao trabalho no referido dia, eis que o IME funcionou regularmente, e o calendário escolar foi previamente divulgado. 5. Recurso desprovido. Sentença mantida.” (TRF 2ª R. – AC 2009.51.01.025854-2 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Marcus Abraham – DJe 01.09.2014)

6777 – Servidor público – lei complementar estadual – reajustes – lei de responsabilidade fiscal – violação – inexistência

“Administrativo. Servidor público estadual. Reajustes da Lei Complementar Estadual nº 432/2010. Lei de Responsabilidade Fiscal. Inexistência de violação. 1. Os limites previstos nas normas da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), mormente os relacionados às despesas com pessoal de ente público, não são aptos a justificar o descumprimento dos direitos sub-jetivos dos servidores. Precedentes. 2. As restrições sobre as despesas com pessoal, previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal, também não incidem quando decorrerem de decisões judiciais, nos termos do art. 19, § 1º, IV, da LC 101/2000. Precedentes. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.433.550 – (2014/0022991-0) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 19.08.2014)

Transcrição Editorial SÍNTESELei Complementar nº 101/2000:

“Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

[...]

§ 1º Na verificação do atendimento dos limites definidos neste artigo, não serão com-putadas as despesas:

[...]

IV – decorrentes de decisão judicial e da competência de período anterior ao da apura-ção a que se refere o § 2º do art. 18;

[...]”

RSDA Nº 106 – Outubro/2014 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA ����������������������������������������������������������������������������205

6778 – Servidor público – pensão por morte – redução – possibilidade

“Administrativo. Constitucional. Pensão por morte de servidor. Redução. Possibilidade. Ine-xistência do direito à paridade. Óbito ocorrido após a EC 41/2003 e após a vigência da MP 167/2004, posteriormente convertida na Lei nº 10.887/2004. beneficiário da Justiça gratuita. condenação em honorários. cabimento. 1. A hipótese dos autos versa sobre a redução de pensão por morte instituída por ex-servidor federal, que foi concedida observando a parida-de com os servidores ativos, não obstante o óbito do instituidor do benefício tenha se dado após a vigência da EC 41/2003. 2. A Emenda Constitucional nº 41/2003 alterou o art. 40 da Constituição Federal/1988, prevendo uma nova forma de revisão às pensões, que, a partir de então, seriam revistas pelos mesmos índices de reajuste dos inativos deferido aos benefícios do regime geral. 3. A inovação trazida pela EC 41/2003 não foi autoaplicável, dependendo de critérios a serem estabelecidos em lei e que foram estipulados na MP 167, de 19.02.2004, posteriormente convertida na Lei nº 10.887/2004. 4. A aposentadoria com paridade apenas gerará pensão com paridade se essa for a previsão normativa na data do óbito, uma vez que, segundo jurisprudência consolidada, o benefício da pensão por morte rege-se pela lei vigente à época do óbito. Inteligência da Súmula nº 340 do STJ. 5. A Emenda Constitucional nº 41/2003 suprimiu do Texto Constitucional a garantia da paridade entre as remunerações dos servidores inativos e daqueles em atividade, assegurando a manutenção dessa paridade apenas àqueles que estivessem na fruição de aposentadoria ou pensão na data de sua pu-blicação, nos termos do disposto no seu art. 7º. 6. Na hipótese, o fato gerador do direito à percepção da pensão pela autora ocorreu em 30.04.2004, data do falecimento do seu marido, época em que se encontrava vigente a EC 41/2003 e a MP 167/2004, editada em 19.02.2004 e convertida na Lei nº 10.887/2004, razão pela qual a autora não faz jus à paridade pleiteada. Precedentes desta Corte. 7. É devida a paridade às pensões conferidas com base em óbitos ocorridos até 19.02.2004, data anterior a da publicação da MP 167/2004, que se deu em 20.02.2004, uma vez que a partir daí não há mais que se falar em direito à paridade. Ressalte--se que a eficácia jurídica da medida provisória retroage, na hipótese de sua conversão em lei, à data de sua publicação. 8. Inexiste ilegalidade na conduta da Administração que, ao constatar que o benefício da pensão foi concedido observando-se indevidamente a parida-de, procede à sua revisão com o propósito exclusivo de adequá-lo à legislação vigente na data do óbito. 9. A concessão do benefício da gratuidade de justiça não obsta a condenação da parte beneficiada em honorários advocatícios, uma vez que tal benefício apenas suspen-de a sua exigibilidade. Inteligência do art. 12 da Lei nº 1.060/1950. Precedentes do STJ. 10. Apelação da autora desprovida. Apelação da União provida, para condenar a parte autora em honorários advocatícios, fixados em dez por cento sobre o valor da causa.” (TRF 2ª R. – AC 2012.51.01.002140-1 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Marcus Abraham – DJe 19.08.2014)

6779 – Servidor público – verbas salariais em atraso – Município – pagamento – responsa-bilidade

“Apelação cível. Administrativo. Ação de cobrança. Servidor público municipal. Verbas salariais em atraso. Preliminar de ausência de interesse de agir e impossibilidade jurídica do pedido. Rejeitadas. Mérito: não pagamento de verbas. Fato negativo. Ônus da prova de quem afirma o fato positivo. Diferença salarial, gratificações natalinas e adicional de 1/3 de férias. Responsabilidade do Município pelo pagamento da remuneração em atraso e não da antiga gestão política administrativa. Lei de Responsabilidade Fiscal. Obrigação legal da administração pública em quitar seus débitos para com seus servidores sob pena de enrique-

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cimento ilícito, vedado pelo ordenamento pátrio. Recurso conhecido e improvido. À unanimi-dade.” (TJAL – Ap 0700043-45.2013.8.02.0021 – Relª Desª Elisabeth Carvalho Nascimento – DJe 18.08.2014)

6780 – Transporte – coletivo de passageiros – veículo de aluguel – Município recém-criado – regulamentação – ausência – documentação – concessão

“Recurso de apelação. Constitucional. administrativo. Município de Araçoiaba. Transporte coletivo de passageiros. Veículo de aluguel. Documento de porte obrigatório. Não renovado. Exigência de contrato de permissão ou concessão de serviço público. Município recém-cria-do. Ausência de regulamentação própria. Recurso conhecido e desprovido por unanimidade. 1. Recurso de apelação interposto pelo Detran/PE em face de sentença que, nos autos do man-dado de segurança impetrado em desfavor do Diretor Geral do Departamento de Trânsito de Pernambuco, concedeu a segurança no sentido de condenar o réu a proceder o registro, emitir o CRV e as respectivas placas de aluguel do veículo do tipo Sprinter de placas KIW 7514. 2. O recorrido foi impedido de obter documento definitivo que reconheça o seu veículo como ‘carro de aluguel’. O apelado possuía documento provisório de porte obrigatório, válido em todo o território nacional pelo prazo de 30 dias. Entretanto, ao procurar novamente o ór-gão com o intuito de obter documento definitivo, viu-se impedido pela lavratura da Circular nº 009/2001, de data 25 de junho de 2001. 3. Buscando atender a necessidade dos que ali habitam, o Município concedeu Alvará de Licença (fls. 12) para o transporte de passageiros do centro de Araçoiaba até o Engenho Canaã, regulamentando uma situação já existente e conso-lidada. 4. O Município de Araçoiaba, além de ter sido criado em momento recente à época da propositura da demanda, não possuía legislação específica própria capaz de regular a conces-são e permissão do transporte coletivo em seu território. 5. Não subsiste razão para que não conceda a documentação definitiva para regularizar a atividade até que o Município tenha regulamentação própria que discipline a permissão e concessão do transporte coletivo. 6. Re-curso a que se nega provimento. Decisão unânime.” (TJPE – Ap 0023083-63.2001.8.17.0001 – 1ª CDPúb. – Rel. Des. Erik de Sousa Dantas Simões – DJe 18.08.2014)

6781 – Transporte escolar rural – programa estadual – repasse de recursos – suspensão – prestação de contas – ausência

“Constitucional e administrativo. Programa Estadual de Transporte Escolar Rural – PETERN. Suspensão de repasse dos recursos. Ausência de prestação de contas exercício do ano de 2012. Omissão praticada pela gestão anterior. Exigibilidade afastada. Verba destinada ao custeio da educação. Art. 25, § 3º, da Lei de Responsabilidade Fiscal. Precedentes jurisprudenciais. Pre-sença do direito líquido e certo. Concessão da segurança.” (TJRN – MS 2014.000898-2 – Rel. Des. Glauber Rêgo – DJe 01.09.2014)

Seção Especial – Jurisprudência Comentada

Fundo de Participação dos Municípios� Repartição Constitucional das Receitas Tributárias� Participação dos Municípios no Produto da Arrecadação do ICMS (CF, Artigo 158, IV)� PRODEC (Programa de Desenvolvimento da Empresa)� Lei Catarinense nº 11�345/2000� Concessão, pelo Estado, de Incentivos Fiscais e Creditícios, com Recursos Oriundos da Arrecadação do ICMS� Pretensão do Município ao Repasse Integral da Parcela de 25%, sem as Retenções Pertinentes aos Financiamentos do PRODEC� Controvérsia em Torno da Definição da Locução Constitucional “Produto da Arrecadação” (CF, Artigo 158, IV)� Pretendida Distinção, Que Faz o Estado de Santa Catarina, para Efeito da Repartição Constitucional do ICMS, entre Arrecadação (Conceito Contábil) e Produto da Arrecadação (Conceito Financeiro)� Parcela de Receita Tributária (25%) que Pertence, por Direito Próprio, ao Município� Consequente Inconstitucionalidade da Retenção Determinada por Legislação Estadual (RE 572�762/SC, Pleno)� Direito do Município ao Repasse Integral� Recurso de Agravo Improvido

LUÍS RODOLFO CRUZ E CREUZAdvogado e Consultor em São Paulo, Sócio de Creuz e Villarreal Advogados Associados, Ba‑charel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC‑SP, Pós‑Graduado em Direito Societário, no Curso LLM – Master of Laws, do INSPER, Mestre em Relações Internacionais pelo Programa Santiago Dantas, do Convênio das Universidades UNESP/UNI‑CAMP/PUC‑SP, Mestre em Direito da Integração da América Latina pelo PROLAM – Programa de Pós‑Graduação em Integração da América Latina da Universidade de São Paulo – USP. Autor da monografia Commercial and Economic Law – Brasil, da International Encyclope‑dia of Laws, editada por Dr. Jules Stuyck (Holanda: Kluwer Law International, 2010). Autor do livro Acordo de Quotistas – Análise do Instituto do Acordo de Acionistas Previsto na Lei nº 6.404/1976 e Sua Aplicabilidade nas Sociedades Limitadas à Luz do Novo Código Civil Brasileiro, com Contribuições da Teoria dos Jogos (São Paulo: IOB‑Thomson, 2007). Coautor do livro Organizações internacionais e questões da atualidade, organizado por Jahyr‑Philippe Bichara (Natal/RN: EDUFRN, 2011), sendo autor do capítulo Organizações Internacionais e a Integração Econômica: Revisões de Uma Teoria Geral (p. 67 à 101). Autor dos livros Commer‑cial and Economic Law in Brazil (Holanda: Wolters Kluwer – Law & Business, 2012) e Defesa da Concorrência no Mercosul – Sob uma Perspectiva das Relações Internacionais e do Direito (São Paulo: Almedina, 2013).

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JONATHAN SILVA ROCHAAdvogado em São Paulo, Bacharel em Direito em São Paulo pelas Faculdades Metropolitanas Unidas de São Paulo – FMU/SP.

BRUNO STEFANI MORAIS DE LIMABacharel em Direito em São Paulo pela Universidade São Judas Tadeu – USJT.

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O fim do Direito é a paz, o meio de atingi-lo, a luta. Enquanto o Direito tiver de contar com as agressões partidas dos arraiais da injustiça – e isso acontecerá enquanto o mundo for mundo – não poderá prescindir da luta. A vida do Direito é a luta – uma luta dos povos, dos governos, das classes sociais, dos indivíduos.1

EMENTAFUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS. REPARTIÇÃO CONSTITUCIONAL DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS. PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS NO PRODUTO DA ARRECADAÇÃO DO ICMS (CF, ARTIGO 158, IV). PRODEC (PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO DA EMPRESA). LEI CA-TARINENSE Nº 11.345/2000. CONCESSÃO, PELO ESTADO, DE INCENTIVOS FISCAIS E CREDI-TÍCIOS, COM RECURSOS ORIUNDOS DA ARRECADAÇÃO DO ICMS. PRETENSÃO DO MUNICÍPIO AO REPASSE INTEGRAL DA PARCELA DE 25%, SEM AS RETENÇÕES PERTINENTES AOS FINAN-CIAMENTOS DO PRODEC. CONTROVÉRSIA EM TORNO DA DEFINIÇÃO DA LOCUÇÃO CONSTITU-CIONAL “PRODUTO DA ARRECADAÇÃO” (CF, ARTIGO 158, IV). PRETENDIDA DISTINÇÃO, QUE FAZ O ESTADO DE SANTA CATARINA, PARA EFEITO DA REPARTIÇÃO CONSTITUCIONAL DO ICMS, ENTRE ARRECADAÇÃO (CONCEITO CONTÁBIL) E PRODUTO DA ARRECADAÇÃO (CONCEITO FI-NANCEIRO). PARCELA DE RECEITA TRIBUTÁRIA (25%) QUE PERTENCE, POR DIREITO PRÓ-PRIO, AO MUNICÍPIO. CONSEQUENTE INCONSTITUCIONALIDADE DA RETENÇÃO DETERMINADA POR LEGISLAÇÃO ESTADUAL (RE 572.762/SC, PLENO). DIREITO DO MUNICÍPIO AO REPASSE INTEGRAL. RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.

COMENTáRIO

A questão em comento remete ao acórdão do Supremo Tribunal Fe-deral – envolvendo julgamento de agravo regimental interposto contra de-

1 IHERING, Rudolf von. A luta pelo direito. Tradução e apresentação de Richard Paul Neto. Rio de Janeiro: Rio Sociedade Cultura Ltda., 2004. p. 19.

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cisão que conheceu e negou provimento a recurso extraordinário interpos-to pela agravante para manter a decisão com precedentes no Plenário do Supremo Tribunal Federal (Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 459.486/SC), da 2ª Turma, que, em apertada síntese, refere-se à ação proposta pelo Município de Fraiburgo contra o Estado de Santa Catarina, processo oriundo do Tribunal de Justiça Estadual, objetivando o repasse das diferenças dos valores do ICMS – Imposto sobre Circulação de Mer-cadorias e Serviços, que estariam sendo indevidamente apropriadas pelo Estado-membro em razão de Programa de Desenvolvimento da Empresa Ca-tarinense – PRODEC, por força de Lei Estadual nº 11.345/2000, com afronta direta e objetiva ao art. 158, IV, da Constituição Federal.

A decisão agravada manteve decisão anterior que havia conhecido do recurso extraordinário, mas negou-lhe provimento em razão da matéria levantada estar pacificada pela Corte, na medida em que é inconstitucio-nal a retenção das verbas devidas ao Município por previsão expressa do art. 158, V, da Constituição Federal. O acórdão, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Rela-tor.

Ainda no caso, após a agravante opor recurso de embargos de decla-ração sob o argumento de omissão e contradição ao presente aresto, com a finalidade de solicitar nova revisão da ação, sendo, ao final, rejeitados por unanimidade.

APONTAMENTOS INTRODUTÓRIOS

Apontamos, inicialmente, um conceito destacado na própria emen-ta do acórdão ora em comento. Trata-se do significado da repartição das receitas oriundas do “ICMS”, que é o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação.

Tema importante a ser abordado refere-se à delimitação de qual ente da administração direta será competente para tratar de tal imposto, trata-se de um imposto de competência dos Estados e do Distrito Federal, contudo, em se tratando da cobrança de tal imposto é imperioso destacarmos que caberá esta ao Estado em que se constate a hipótese de incidência2.

Uma vez delimitada a competência, essencial se torna destacarmos em quais operações e serviços haverá a incidência deste imposto, previstas

2 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 24. ed. Rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 344.

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estas informações no art. 2º da Lei Complementar nº 87/1996, bem como no art. 3º desta mesma lei complementar, há as hipóteses de quando não caberá a incidência do “ICMS”3.

O acórdão nos remete, em se tratando do “ICMS”, à correta reparti-ção deste, com a estrita legalidade e conformidade no momento do repasse cabível pelo Estado ao Município, conforme as palavras descritas do ilustre presidente e Relator Ministro Celso de Mello:

Em uma palavra, as parcelas da receita tributária em questão não poderão ser reduzidas pelos Estados-membros (que sequer têm qualquer poder de disposição sobre elas), não lhes cabendo manipular o repasse de tais par-celas devidas aos Municípios (CF, art. 158, IV), ainda que sob o pretexto (claramente inconstitucional) de que, em decorrência de um programa de desenvolvimento estadual (PRODEC), tenha sido concedido, às empresas contribuintes, como modalidade de benefício fiscal, a postergação do reco-lhimento do próprio ICMS.4

3 Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996: “Art. 2º O imposto incide sobre: I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e esta-belecimentos similares; II – prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores; III – prestações onerosas de serviços de comunicação, por qual-quer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a amplia-ção de comunicação de qualquer natureza; IV – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios; V – fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual. § 1º O imposto incide também: I – sobre a entrada de mercadoria ou bem importados do exterior, por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade; II – sobre o serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior; III – sobre a entrada, no território do Estado destinatário, de petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e de energia elétrica, quando não destinados à comercialização ou à industrialização, decorrentes de operações interestaduais, cabendo o imposto ao Estado onde estiver localizado o adquirente. § 2º A caracterização do fato gerador independe da natureza jurídica da operação que o constitua. Art. 3º O imposto não incide sobre: I – operações com livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão; II – operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semi-elaborados, ou serviços; III – ope-rações interestaduais relativas a energia elétrica e petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, quando destinados à industrialização ou à comercialização; IV – operações com ouro, quando definido em lei como ativo financeiro ou instrumento cambial; V – operações relativas a mercadorias que tenham sido ou que se destinem a ser utilizadas na prestação, pelo próprio autor da saída, de serviço de qualquer natureza definido em lei complementar como sujeito ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, ressalvadas as hipóteses previstas na mesma lei complementar; VI – operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de propriedade de estabelecimento industrial, comercial ou de outra espécie; VII – operações decorrentes de alienação fiduciária em garantia, inclusive a operação efetuada pelo credor em decorrência do inadimplemento do devedor; VIII – operações de arrendamento mercantil, não com-preendida a venda do bem arrendado ao arrendatário; IX – operações de qualquer natureza de que decorra a transferência de bens móveis salvados de sinistro para companhias seguradoras. Parágrafo único. Equipara-se às operações de que trata o inciso II a saída de mercadoria realizada com o fim específico de exportação para o exterior, destinada a: I – empresa comercial exportadora, inclusive tradings ou outro estabelecimento da mesma empresa; II – armazém alfandegado ou entreposto aduaneiro” (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp87.htm>).

4 Supremo Tribunal Federal, Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 459.486-2 (AgRg-RE 459.486-2/SC), Brasília, Presidente e Relator Celso de Mello, Julgamento da 2ª Turma, de 11 de novembro de 2008.

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Segundo disposto no art. 158, IV, da Constituição Federal5, deve ser destinado aos Municípios um percentual de 25% do produto da arrecada-ção do referido imposto (ICMS), na forma como consta no parágrafo único do mesmo artigo6.

Desta forma, conforme exposto anteriormente, o art. 158, inciso IV, da Constituição Federal reforça a necessidade e relevância em haver a distri-buição do imposto ora em comento, havendo, desta forma, a impossibilida-de de quaisquer reduções em face da integral arrecadação do “ICMS”, pois eventuais modificações no repasse de tais valores poderiam causar diversos prejuízos inabaláveis para a estrutura organizacional dos Municípios.

No Brasil, a Constituição Federal, por meio do art. 187, determina que a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, e outorgou aos Estados, Distrito Federal e Municípios poderes administrativos, financeiros e políticos para o exercício de governo e admi-nistração próprios, segundo orientações individuais, sempre considerando que a autonomia é limitada pela Constituição da República.

O princípio da autonomia do Município nos traz a ideia referente à essencialidade em haver a repartição correta não somente do imposto ora em análise, mas de todos. Contudo, abordaremos aqui única e exclusiva-mente baseando-se no “ICMS”.

5 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: “Art. 158. Pertencem aos Municípios: [...] IV – vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação” (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>).

6 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: “Art. 158. [...] Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes cri-térios: I – três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios; II – até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal” (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>).

7 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: “Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição. § 1º Brasília é a Capital Federal. § 2º Os Territórios Federais inte-gram a União, e sua criação, transformação em Estado ou reintegração ao Estado de origem serão reguladas em lei complementar. § 3º Os Estados podem incorporar-se entre si, subdividir-se ou desmembrar-se para se anexarem a outros, ou formarem novos Estados ou Territórios Federais, mediante aprovação da população di-retamente interessada, através de plebiscito, e do Congresso Nacional, por lei complementar. § 4º A criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios, far-se-ão por lei estadual, dentro do período deter-minado por Lei Complementar Federal, e dependerão de consulta prévia, mediante plebiscito, às populações dos Municípios envolvidos, após divulgação dos Estudos de Viabilidade Municipal, apresentados e publicados na forma da lei” (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>).

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REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS

A repartição das receitas tributárias decorre diretamente de imposi-ção da Constituição Federal e é vinculada à autonomia dos entes públicos, consubstanciando-se, por assim dizer, na participação dos entes menores na receita arrecadada pelos entes maiores.

Esta repartição pode ser classificada como repartição direta ou repar-tição indireta. É repartição direta quando o ente público que é beneficiário da repartição da receita tributária recebe a mesma diretamente, sem inter-mediação de outro ente e sem que esta receita tributária previamente faça parte de qualquer fundo constitucional. Já a repartição indireta é aquela que ocorre quando a receita tributária a ser repartida é primeiramente destinada e integra um fundo de participação, cujas receitas serão posteriormente di-vididas entre os beneficiários, nos termos constitucionalmente fixados.

A Carta Magna preceitua que na hipótese de ser criado o tributo, pela pessoa política competente, o produto de sua arrecadação será total ou parcialmente destinado a outro ente político. Na lição de Roque Antonio Carraza:

A repartição das receitas tributárias não é uma tema tributário. É tema finan-ceiro, pois, ao Direito Financeiro, que tem por objeto da chamada atividade financeira do Estado. Esta compreende a obtenção de recursos públicos, sua guarda, gestão e dispêndio. Deve ser desenvolvida com base na Constituição e na lei (especialmente na lei orçamentária). A obtenção de recursos públicos pode dar-se por via contratual ou por via coativa. Por via coativa, através da tributação ou da imputação de multas (penalidades pecuniárias).8

Nesse sentido, a Constituição Federal estabelece que a regra de re-partição das receitas tributárias dar-se-á da seguinte forma: a União Federal fica com o produto da arrecadação e seus tributos, no caso, impostos, taxas e contribuição de melhoria, aplicando-se também aos Estados, Municípios e ao Distrito Federal.

Vale indicar, ainda, que a União transfere aos Estados, Distrito Fede-ral e Municípios, além dos competentes fundos de participação, determina-dos produtos de arrecadação de impostos para aplicação em determinados programas, ou segundo determinadas regras9.

8 CARRAZA, Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 434.

9 Segundo informação do Ministério da Fazenda, “além das receitas transferidas pela União aos Estados, Distri-to Federal e Municípios através dos fundos de participação, a União transfere ainda para as referidas esferas de governo: 3% do produto de arrecadação dos impostos sobre produtos industrializados, para aplicação em programas de financiamento ao gestor produtivo das regiões norte, nordeste e centro-oeste, através de

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PARTILHA DE RECEITAS AOS MUNICÍPIOS

O texto constitucional determina que os Estados da Federação devem partilhar parte de suas receitas tributárias com os Municípios localizados em seus territórios.

O art. 158, IV, da Constituição Federal10 reza sobre a obrigatoriedade dos Estados entregarem aos Municípios localizados em seu território, 25% (vinte e cinco por cento) do produto da arrecadação do imposto sobre ope-rações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transportes interestadual ou intermunicipal e de comunicação.

Com efeito, o referido acórdão estatui que a repartição de receitas tri-butárias qualifica-se como um instrumento necessário e essencial à preser-vação da integridade da autonomia dos Municípios, sendo compreendida em sua dimensão e projeção financeiras.

Ressaltamos que tal entendimento já foi pacificado pela Suprema Corte, ainda sob a égide da Constituição Federal anterior, por meio da Sú-mula nº 578 – não revogada até hoje, e aprovada em Sessão Plenária de 15.12.1976, que fixava que os Estados não podem, a título de ressarcimento de despesas, reduzir parcela do produto do ICMS atribuída aos Municípios11.

Sob o manto da atual e vigente Carta Magna, igualmente, existem diversos julgados neste mesmo sentido. Citamos outros dois julgamentos, o primeiro da lavra do Ministro Ricardo Lewandowski e o segundo do Mi-nistro Celso de Mello, inclusive, que envolvem reclamações de outros Mu-nicípios do Estado de Santa Catarina, praticamente envolvendo a mesma temática e fundamentação, a saber:

Constitucional. ICMS. Repartição de rendas tributárias. PRODEC. Programa de Incentivo Fiscal de Santa Catarina. Retenção, pelo Estado, de parte da parcela pertencente aos Municípios. Inconstitucionalidade. RE desprovido. A parcela do imposto estadual sobre operações relativas à circulação de mer-

suas instituições financeiras de caráter regional; 10% do produto de arrecadação do imposto sobre produtos industrializados, aos Estados o Distrito Federal, proporcionalmente ao valor das respectivas exportações de produtos industrializados; 50% do imposto territorial rural aos Municípios onde a arrecadação for efetuada; 30% do imposto sobre operações financeiras – ouro, aos Estados e 70% aos Municípios produtores de ouro; 2/3% da distribuição do salário educação destinam-se ao estado onde a arrecadação for efetuada” (Disponível em: <http://www.fazenda.gov.br/glossario/idglossarioR29/?searchterm=imposto>).

10 Constituição Federal, 5 de outubro de 1988: “Art. 158. Pertencem aos Municípios: [...] IV – vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação” (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>).

11 Supremo Tribunal Federal, STF: “SÚMULA Nº 578 – NÃO PODEM OS ESTADOS, A TÍTULO DE RESSARCI-MENTO DE DESPESAS, REDUZIR A PARCELA DE 20% DO PRODUTO DA ARRECADAÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS, ATRIBUÍDA AOS MUNICÍPIOS PELO ART. 23, § 8º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL” (Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula>).

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cadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e inter-municipal e de comunicação, a que se refere o art. 158, IV, da Carta Magna pertence de pleno direito aos Municípios. O repasse da quota constitucional-mente devida aos Municípios não pode sujeitar-se à condição prevista em programa de benefício fiscal de âmbito estadual. Limitação que configura indevida interferência do Estado no sistema constitucional de repartição de receitas tributárias.12

Fundo de participação dos Municípios. Repartição constitucional das recei-tas tributárias. Participação dos Municípios no produto da arrecadação do ICMS (CF, art. 158, IV). PRODEC (Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense). Lei Catarinense nº 11.345/2000. Concessão, pelo Estado, de incentivos fiscais e creditícios, com recursos oriundos da arrecadação do ICMS. Pretensão do Município ao repasse integral da parcela de 25%, sem as retenções pertinentes aos financiamentos do PRODEC. Controvérsia em torno da definição da locução constitucional “produto da arrecadação” (CF, art. 158, IV). Pretendida distinção, que faz o Estado de Santa Catarina, para efeito da repartição constitucional do ICMS, entre arrecadação (conceito contábil) e produto da arrecadação (conceito financeiro). Pressupostos ne-cessários à concessão do provimento cautelar (RTJ 174/437-438). Cumulati-va ocorrência, no caso, dos requisitos concernentes à plausibilidade jurídica e ao periculum in mora. Recurso extraordinário admitido. Outorga de eficá-cia suspensiva. Decisão referendada pela turma.13

No mesmo sentido deste julgamento podem ser citados os seguin-tes: AI 645.282-ED, Relª Min. Cármen Lúcia, Julgamento em 01.02.2011, 1ª Turma, DJe de 18.02.2011; RE 531.566-AgRg, Rel. Min. Joaquim Barbo-sa, Julgamento em 09.06.2009, 2ª Turma, DJe de 01.07.2009; RE 477.854, Relª Min. Ellen Gracie, Julgamento em 28.04.2009, 2ª Turma, DJe de 22.05.2009; RE 459.486-AgRg, Rel. Min. Celso de Mello, Julgamento em 11.11.2008, 2ª Turma, DJe de 06.02.2009; AC 1.669-MC, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Julgamento em 20.11.2007, 1ª Turma, DJ de 07.12.2007.

Como indicamos anteriormente, existem diversos julgados neste mes-mo sentido, que ora transcrevemos suas ementas:

Financeiro. ICMS. Partilha e repasse do produto arrecadado. Art. 158, IV, parágrafo único, II, da CF de 1988. Legislação estadual. Exclusão completa de Município. Inconstitucionalidade. Com base no disposto no art. 3º, III, da Constituição, lei estadual disciplinadora do plano de alocação do produto

12 Supremo Tribunal Federal, STF, RE 572.762, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Julgamento em 18.06.2008, Plenário, DJe de 05.09.2008, com repercussão geral.

13 Supremo Tribunal Federal, STF, AC 1.689-QO, Rel. Min. Celso de Mello, Julgamento em 07.08.2007, 2ª Turma, DJ de 24.08.2007.

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gerado com a arrecadação do ICMS, nos termos do art. 157, IV, parágrafo único, II, da Constituição, pode tomar dados pertinentes à situação social e econômica regional como critério de cálculo. Contudo, não pode a legisla-ção estadual, sob o pretexto de resolver as desigualdades sociais e regionais, alijar por completo um Município da participação em tais recursos. Não obs-tante a existência, no próprio texto legal, de critérios objetivos para o cálculo da cota para repasse do produto arrecadado com a cobrança do imposto, a Lei nº 2.664/1996 atribui ao Município do Rio de Janeiro valores nulos. São inconstitucionais as disposições que excluem por completo e abruptamen-te o Município do Rio de Janeiro da partilha do produto arrecadado com o ICMS, constantes nos Anexos I e III da Lei do Estado do Rio de Janeiro nº 2.664/1996, por violação do art. 158, IV, paragrafo único, I e II, ponde-rados em relação ao art. 3º, todos da Constituição. Recurso extraordinário. Alcance da decisão. Recurso extraordinário conhecido e provido, para que o Estado do Rio de Janeiro recalcule os coeficientes de participação dos muni-cípios no produto da arrecadação do ICMS (parcela de ¼ de 25%, art. 158, IV, parágrafo único, II, da Constituição), atribuindo ao Município do Rio de Janeiro a cota que lhe é devida nos termos dos critérios já definidos pela Lei nº 2.664/1996 e desde o início da vigência de referida lei. Uma vez que o recálculo do quadro de partilha poderá implicar diminuição da cota de par-ticipação dos demais municípios do Estado do Rio de Janeiro, com eventual compensação dos valores recebidos com os valores relativos aos exercícios futuros, a execução do julgado não poderá comprometer o sustentáculo fi-nanceiro razoável e proporcional dos municípios. Logo, a lei que irá norma-tizar o recálculo e a transferência ao recorrente dos créditos pertinentes aos períodos passados deverá prever, ainda, compensação e parcelamento em condições tais que não impliquem aniquilamento das parcelas futuras devi-das aos demais Municípios.14

Repartição do ICMS. Art. 158, IV e 161, I, da CF/1988. Reserva de lei com-plementar. Usina hidrelétrica. Reservatório. Áreas alagadas. 1. Hidrelétrica cujo reservatório de água se estende por diversos Municípios. Ato do Secre-tário de Fazenda que dividiu a receita do ICMS devida aos Municípios pelo ‘valor adicionado’ apurado de modo proporcional às áreas comprometidas dos Municípios alagados. 2. Inconstitucionalidade formal do ato normativo estadual que disciplina o “valor adicionado”. Matéria reservada à lei com-plementar federal. Precedentes. 3. Estender a definição de apuração do adi-cional de valor, de modo a beneficiar os municípios em que se situam os reservatórios de água representa a modificação dos critérios de repartição das receitas previstos no art. 158 da Constituição.15

14 Supremo Tribunal Federal, STF, RE 401.953, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Julgamento em 16.05.2007, Plenário, DJ de 21.09.2007.

15 Supremo Tribunal Federal, STF, RE 253.906, Relª Min. Ellen Gracie, Julgamento em 23.09.2004, Plenário, DJ de 18.02.2005.

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Deferimento da suspensão cautelar do § 3º do art. 4º da Lei nº 11.475/2000 (“Os títulos recebidos referentes às parcelas pertencentes aos Municípios, previstas no inciso IV do art. 158 da CF, serão convertidos em moeda, cor-rente nacional, e repassados a esses, pela Secretaria da Fazenda, no dia do resgate dos certificados”), pois, a norma deixa ao estado a possibilidade de somente repassar aos Municípios os 25% do ICMS só quando do vencimento final do título, que eventualmente pode ter sido negociado.16

PRINCÍPIO DA AUTONOMIA MUNICIPAL

Nos termos do art. 29 da Constituição Federal17, os Municípios são regidos por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal, na Constituição do respectivo Estado.

O princípio da autonomia municipal é tão forte e importante que sua concretização e o respeito ao mesmo levou o Jurista Roque Antonio Carrazza a declarar que “os Municípios só conseguirão exercitar plena-mente suas competências tributárias, quando for conhecido e respeitado o princípio da autonomia municipal”18. Esta pontuação de Carrazza está historicamente situada em momento anterior à promulgação da atual e vi-gente Constituição Federal, que atendeu aos reclamos e anseios políticos de resgate da maior autonomia local, ou seja, a autonomia Municipal.

Inclusive, tal fato é destacado por Hely Lopes Meirelles:

Em face dessas atribuições, já não se pode sustentar, como sustentavam al-guns publicistas, ser o Município uma entidade meramente administrativa. Diante de atribuições tão eminentemente políticas e de um largo poder de autogoverno, a sua posição atual, no seio da Federação, é de entidade políti-co-administrativa de terceiro grau, como bem salientavam os comentadores da Constituição.19

16 Supremo Tribunal Federal, STF, ADIn 2.405-MC, Rel. Min. Ayres Britto, Julgamento em 06.11.2002, Plená-rio, DJ de 17.02.2006.

17 Constituição Federal, 5 de outubro de 1988: “Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos: [...]” (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>).

18 CARRAZZA, Roque Antonio. Autonomia municipal e tributação. Justitia, São Paulo, 45 (122): 41-51. Jul./set. 1983, p. 41.

19 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 43.

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É imperioso lembrar que é em função dos tributos que o Município institui e arrecada que o ente municipal passa a ter recursos financeiros necessários à prestação de serviços públicos e à realização de obras de in-teresse da população. E neste sentido, princípio da autonomia municipal é elemento central.

Segundo Joaquim Castro Aguiar, “a autonomia municipal é a facul-dade que o Município tem, assegurada pela Constituição da República, de auto-organizar-se politicamente, através de lei própria, de autogovernar-se, de legislar, originária ou supletivamente, sobre assuntos de interesse local e de auto-administrar-se, gerindo seus próprios negócios e dispondo livre-mente sobre eles, respeitando o sistema constitucional das competências e as restrições que a mesma Constituição lhe impõe”20. Ou seja, a autonomia dada ao Município significa que o mesmo tem capacidade para editar nor-mas jurídicas, prerrogativa para elaborar o seu próprio direito, segundo suas peculiaridades.

Inclusive, segundo o ilustre Relator, o Ministro Celso de Mello:

O art. 29 da Constituição representa, na realidade, o substrato consubstan-ciador, o núcleo expressivo de outorga dessa autonomia institucional às en-tidades municipais. A Constituição da República, em seu art. 29, dispõe que o Município reger-se-á por lei orgânica própria, que se qualifica como verda-deiro estatuto constitucional das pessoas municipais.21

Por fim, vale indicar que por ser a autonomia municipal é um prin-cípio fundamental insculpido em nosso sistema constitucional, ele é de observância e respeito obrigatório tanto pela União quanto pelos Estados Federados e a infração e desrespeito à essa autonomia pode dar ensejo à intervenção federal, conforme se depreende do texto do art. 34, VII, c, da Constituição22.

CONCLUSÕES

De forma pontual, podemos apontar os seguintes elementos conclusi-vos extraídos da análise que fizemos do acórdão em comento, a saber:

20 AGUIAR, Joaquim Castro. Competência e autonomia dos municípios na nova constituição. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 41.

21 Supremo Tribunal Federal, Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 459.486-2 (AgRg-RE 459.486-2/SC), Brasília, Presidente e Relator Celso de Mello, Julgamento da 2ª Turma, de 11 de novembro de 2008.

22 Constituição Federal, 5 de outubro de 1988: “Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Fede-ral, exceto para: [...] VII – assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: [...] c) autonomia municipal; [...]” (Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>).

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a) A decisão do acórdão em comento seguiu e está lastreada no melhor entendimento de nossos tribunais acerca do tema de re-partição de receitas tributárias;

b) O respeito ao princípio da autonomia municipal é vital para o exercício da autonomia administrativa, política e financeira dos Municípios, sendo a mesma limitada pela Constituição da Repú-blica;

c) Neste sentido, a parcela do ICMS, a que se refere o art. 158, IV, da Constituição Federal, pertence de pleno direito aos Municí-pios e não pode ser objeto de restrições, retenções e/ou limita-ções, salvo previsto em texto constitucional;

d) Mesmo que estipulada por Lei Estadual, não pode uma condi-ção prevista em programa de benefício fiscal de âmbito estadual interferir ou restringir o repasse da quota constitucionalmente devida aos Municípios, sendo que qualquer limitação configura indevida interferência do Estado no sistema constitucional de re-partição de receitas tributárias.

Clipping Jurídico

Estado terá de indenizar filhos de detento morto em penitenciária

O Estado de Goiás terá de indenizar, em R$ 50 mil, os dois filhos de Wendel José da Silva. Ele era detento da Penitenciária Odenir Guimarães, em Aparecida de Goiânia, e foi assassinado por outros presos. A quantia será igualmente repartida entre os dois filhos. Um deles, que é menor, também receberá pensão mensal no valor de dois ter-ços do salário-mínimo até completar 25 anos de idade. A decisão monocrática foi do Desembargador Geraldo Gonçalves da Costa que negou apelação cível interposta pelo Estado e manteve sentença proferida pelo juízo da Vara da Fazenda Pública Estadual da comarca de Aparecida de Goiânia. Consta dos autos que, no dia 26 de outubro de 2010, Wendel foi agredido por outros detentos da penitenciária e morreu, decorrente de traumatismo crânio encefálico. Segundo os filhos, ele trabalhava na prisão para ajudar no sustento de seu filho menor. Eles alegaram que houve omissão Estatal ao não evitar que Wendel fosse morto por ação de outros presos e, por isso, eles têm direito a indenizações por danos morais e materiais. O Estado argumentou que não foi compro-vada a dependência econômica entre Wendel e seus filhos, portanto não pode ser con-denado ao pagamento de indenização por danos materiais. Entendeu, também, que os valores fixados a título de danos morais foram exorbitantes e ofensivos aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. O desembargador julgou que, no caso, res-taram comprovados a lesão, o dano e o nexo de causalidade, portanto o Estado tem o dever de indenizar os filhos. Ele esclareceu que, de acordo com a Constituição Federal (CF), o Estado responde pelos prejuízos que seus agentes causarem a terceiros, desde que demonstrado o nexo causal entre o fato lesivo e o dano, independentemente de dolo ou culpa. Ele destacou que, ainda de acordo com a CF, o Estado tem o dever de assegurar aos detentos o direito fundamental à integridade física e moral, sendo a vigilância intrínseca à atividade prestada pelos agentes carcerários. O Magistrado entendeu que o filho que é menor tem direito à pensão mensal por danos materiais, já que foi comprovada sua dependência econômica a Wendel. Não comprovado existir a destituição do poder familiar ou outro ato que rompesse tal dependência, deve ser mantida a sentença guerreada, afirmou ele. Quanto ao valor da indenização por danos morais, Geraldo Gonçalves concordou com a quantia estabelecida em primeiro grau. De acordo com ele, a perda de um ente querido pela omissão do Poder Público ofende diretamente o estado emocional e psíquico dos autores, razão pela qual entendo que o valor fixado não ultrapassa os limites da razoabilidade e proporcionalidade, tendo em vista que tal dano jamais poderá ser reparado em termos pecuniários. (201192084233). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás)

Alterações curriculares só devem ser aplicadas aos alunos que se matricularem após as mudanças

A 6ª Turma do TRF da 1ª Região confirmou sentença da 2ª Vara Federal da Seção Judi-ciária de Uberlândia (MG) que determinou à Universidade Presidente Antônio Carlos (Unipac) que efetue a matrícula de uma aluna no 9º período do curso de Medicina, independentemente da obrigação de cursar as disciplinas faltantes da grade horária. A decisão, unânime, seguiu o voto do Relator, Desembargador Federal Kassio Nunes Marques. A estudante impetrou mandado de segurança na Justiça Federal requerendo a concessão de sua matrícula ao argumento de que a Unipac negou o pedido com fun-

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damento na Portaria nº 23/2012 da IES, de 17.05.2012, que alterou os pré-requisitos de ingresso no 9º período, estabelecendo que o aluno deveria obter êxito em todas as disciplinas até o 8º período. Afirma a requerente que, ao concluir o 8º período, foi reprovada em uma matéria, motivo pelo qual não conseguiu realizar sua matrícula. Entretanto, pondera que a referida norma não estava em vigor quando iniciou o curso. As razões da impetrante foram aceitas pelo juízo de primeiro grau, que determinou à Universidade que efetuasse a matrícula da estudante. O processo chegou ao TRF1 por meio de remessa oficial. Trata-se de um instituto previsto no Código de Processo Civil (art. 475) que exige que o juiz singular mande o processo para o tribunal de segunda instância, havendo ou não apelação das partes, sempre que a sentença for contrária a algum ente público. A sentença só produzirá efeitos depois de confirmada pelo tribu-nal. Ao analisar o caso, o relator esclareceu que a Unipac alterou a grade horária do curso de Medicina referente a pré-requisito de disciplinas. No entanto, a alteração dos pré-requisitos ocorreu após o ingresso da aluna na Universidade, “não sendo razoá-vel que seja impedida de se matricular no 9º ano em razão de mudanças nas regras inicialmente instituídas”. Ainda de acordo com o magistrado, não há óbice para que as universidades promovam alterações unilaterais nas grades curriculares dos cursos por elas ofertados; contudo, tais modificações devem ser adaptadas aos estudantes, sob pena de causar prejuízos àqueles que já cursaram as disciplinas nos períodos anteriores. “Assim, as alterações curriculares só devem ser aplicadas aos alunos que ingressarem na universidade após a respectiva mudança”, afirmou. Nº do Processo nº 0001028-21.2013.4.01.3803. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Fe-deral da 1ª Região)

Grávida não pode ser demitida mesmo em contrato temporário

A trabalhadora gestante tem o direito à estabilidade provisória até o fim de sua licença maternidade, isto é, cinco meses após o parto. A medida vale mesmo para servidoras contratadas em regime temporário, cujo contrato que terminaria durante a gravidez não pode ser interrompido. O entendimento é da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), que votou, à unanimidade, contra a prefeitura de Taquaral de Goiás em processo ajuizado por uma funcionária. O relator do processo foi o juiz substituto em segundo grau José Carlos de Oliveira. A decisão já havia sido tomada monocraticamente, mas o município recorreu, alegando que o contrato com a mulher era de apenas um ano e terminaria em janeiro de 2013 – no 6º mês de gestação e, portanto, ela não teria sido demitida. Contudo, o relator manteve a determinação a favor da servidora: mesmo que ela não possa continuar a trabalhar no atual posto, deve ser remanejada ou, ao menos, receber a remuneração referente aos demais meses. É imperativo reconhecer-lhe o direito ao recebimento da indenização decorrente de sua estabilidade provisória. • Ementa: Agravo interno na apelação cível em mandado de segurança. Licença-maternidade. Contrato temporário de trabalho. Art. 7º, XVIII, da Constituição Federal. Art. 10, II, b, do ADCT. Argumentos insuficientes para alterar a decisão agravada. 1. A empregada gestante, independentemente do regime jurídico de trabalho, tem direito à licença maternidade, nos termos do art. 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal e do art. 10, inciso II, b, do ADCT. Precedentes do Supremo Tri-bunal Federal e deste Tribunal de Justiça. 2. Considerando que o agravo interno não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar a conclusão proposta, a decisão

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monocrática atacada deve ser mantida por seus próprios fundamentos. Agravo interno desprovido. (Agravo Interno na Apelação Cível nº 201390728153). (Conteúdo extraí-do do site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás)

Município de Goiânia terá de incluir netas sob guarda da avó no plano de pre-vidência dela

Em decisão monocrática, o Desembargador Olavo Junqueira de Andrade manteve sentença da 1ª Vara da Fazenda Pública Municipal e Registros Públicos da comarca de Goiânia, que determinou à Prefeitura da capital que faça a inclusão das netas de Sílvia Fonseca Giani no plano previdenciário do Instituto de Previdência dos Servi-dores Municipais de Goiânia (IPSM), do qual ela faz parte. O município de Goiânia interpôs apelação cível para reformar a sentença, alegando que o Regime de Previ-dência dos Servidores Municipais de Goiânia – Lei Municipal nº 8.095/2002, art. 50, incisos I e II – não contempla no rol de dependentes menores sob guarda. O relator do processo reconheceu a apelação, mas negou provimento. Segundo o magistrado, apesar da lei municipal não incluir o menor sob guarda na lista de dependentes do segurado, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no § 3º do art. 33, confere à criança e ou adolescente a condição de dependente para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários. Desta feita, à luz da Constituição Federal e do ECA, que estabelecem direitos previdenciários aos menores sob guarda, não há que se falar em não outorgar os direitos assistenciais às netas, em detrimento do que pre-vê a Lei Municipal do Regime Previdenciário dos Servidores Municipais de Goiânia, enfatizou. • Guarda: O magistrado explicou que a pessoa que detêm a guarda possui deveres e direitos que devem ser exercidos com o objetivo de proteger a criança ou o adolescente, assim como prover suas necessidades de desenvolvimento. No caso em questão, a guarda foi atribuída por decisão judicial, fazendo com que Sílvia assumisse o compromisso de prestar a devida assistência moral, material e educacional às netas. Uma vez estando as netas sob a guarda da avó, que proverá a educação, o sustento e total assistência moral, não há como negar o caráter maternal da relação estabelecida, ressaltou. (Processo de nº 2011191856178). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás)

Decisão decreta indisponibilidade de bens de ex-empregado público por im-probidade

O Desembargador Federal Carlos Muta, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), deu provimento a agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) para decretar a indisponibilidade de bens móveis (veículos) e imóveis e aplicações financeiras de ex-empregado público acusado de praticar improbidade administrativa, em montante suficiente para assegurar a satisfação da multa prevista no art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa. O recurso foi interposto contra o indeferimento de liminar em ação civil pública em trâmite na 11ª Vara Federal de São Paulo. A decisão do desembargador, publicada em agosto no Diário Eletrônico, atende aos arts. 12, da Lei nº 7.347/1985 (disciplina a ação civil pública), e 7º, da Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa). Para o magistrado, a medida de indisponibilidade de bens nos casos de imputação de conduta ímproba ao erário é necessária e baseada em jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ). “O pres-

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suposto de dano irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora) encontra-se implícito no art. 7º da Lei nº 8.429/1992, sem que seja necessária comprovação de dilapidação efetiva ou iminente de patrimônio”, afirmou. A ação civil pública foi ajui-zada em face de ex-empregado do Serviço de Processamento de Dados (Serpro) que, no exercício do cargo de auxiliar, cedido à Receita Federal do Brasil (RFB), na agência Franco da Rocha, na Grande de São Paulo, prestou informações incorretas e tentou obter vantagens pessoais e financeiras de três contribuintes. Os processos administra-tivos e disciplinar instaurados resultaram na demissão por justa causa do funcionário. O MPF requereu, então, liminar para o bloqueio de bens do réu, suficientes para asse-gurar a satisfação da multa civil, estimada em R$ 252.669.000, correspondente a cem vezes o valor da remuneração percebida pelo funcionário. O objetivo era assegurar o resultado útil da ação civil pública, resguardando-se do risco de que o réu eventual-mente venha a dilapidar o seu patrimônio”. • Fundamento: O Desembargador Carlos Muta destacou que a petição inicial da ação civil pública descreve suficientemente os fatos que caracterizariam o ato ímprobo praticado pelo ex-empregado público (art. 11, caput e inciso I da Lei nº 8.429/1992). “Foi instruída a ação com cópias dos processos administrativos instaurados no âmbito da RFB (onde prestava serviços) e da Serpro (órgão ao qual era vinculado). Processados com respeito ao devido processo legal, em procedimento contraditório, culminando em decisão em que se aplicou penalidade de demissão por justa causa ao réu.” O magistrado afirmou, também, que consta no processo cópia de relatório do inquérito policial para apuração de eventual ilícito na esfera criminal (art. 317 do Código Penal, corrupção passiva). Isso demonstraria admis-sibilidade jurídica da pretensão liminar de bloqueio de bens para assegurar a satisfação de eventual sentença condenatória do réu em multa civil (art. 12, inciso III, da Lei nº 8.429/1992). Por fim, o magistrado ressaltou que a pretensão do agravado de afas-tar incidência de decreto de indisponibilização sobre recursos imprescindíveis, bem como a suficiência de bloqueio de apenas um imóvel de sua propriedade, deveria ser postulada perante o juízo de primeiro grau, demonstrando, eventualmente, a natureza dos respectivos recursos e o efetivo valor do bem, sob pena de ofensa ao duplo grau de jurisdição. Agravo de Instrumento nº 0012595-21.2014.4.03.0000/SP. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 3ª Região)

Ex-servidora precária receberá indenização por ter sido dispensada durante licença-maternidade

A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu por unanimidade que uma ex--servidora contratada a título precário (sem estabilidade) pelo estado de Minas Gerais receberá indenização correspondente às vantagens financeiras do cargo, da data de impetração do mandado de segurança até o quinto mês após o parto, por ter sido dis-pensada do emprego durante a sua licença maternidade. O Relator do caso, Ministro Rogerio Schietti Cruz, destacou que a jurisprudência do STJ estabelece que é legítima a exoneração ad nutum, ou seja, por livre vontade da administração, do servidor de-signado para o exercício da função pública de forma precária. Contudo, o ministro ressaltou que também está consolidado no STJ o entendimento de que “as servidoras públicas, incluídas as contratadas a título precário, independentemente do regime ju-rídico de trabalho, possuem direito à licença maternidade e à estabilidade provisória, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, sendo-lhes assegurado

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o direito à indenização correspondente às vantagens financeiras pelo período consti-tucional da estabilidade”. • Caso concreto: A autora do mandado de segurança era servidora pública, por designação a título precário, desde 2005, para o cargo de oficial de apoio judicial C. Ela foi dispensada em junho de 2006, em virtude do cumprimento do cronograma de dispensa dos servidores, determinado pelo presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Ela entrou com mandado de segurança contra ato do juiz de direito diretor do foro da comarca de Uberaba (MG), com o objetivo de anular a dispensa, que se encontrava em licença maternidade. Queria a sua reintegração ao cargo ocupado, com efeitos financeiros a partir da dispensa. Alternativamente, reque-reu o pagamento de indenização correspondente aos vencimentos desde a dispensa até cinco meses após o parto. O STJ garantiu apenas o pagamento da indenização. • Período da indenização: O Ministro Schietti Cruz apontou precedentes do próprio STJ que decidiram que as servidoras públicas civis contratadas a título precário, em-bora não tenham direito à permanência no cargo em comissão, em virtude da regra contida no art. 35, inciso I, da Lei nº 8.112/1990, fazem jus ao recebimento de indeni-zação durante o período compreendido entre o início da gestação e o quinto mês após o parto. Porém, o relator afirmou que o mandado de segurança não alcança efeitos patrimoniais pretéritos, nos termos das Súmulas nºs 269 e 271, ambas do Supremo Tribunal Federal. Assim, a segurança foi parcialmente concedida para que a ex-ser-vidora receba indenização correspondente às vantagens financeiras do cargo da data de impetração do mandado de segurança até o quinto mês após o parto. RMS 26107. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Procedimento administrativo não pode restringir a acumulação legal de dois cargos públicos

A possibilidade de acumulação de cargos públicos fica condicionada à compatibilida-de de horários, nos termos do art. 37 da Constituição Federal. Com esse fundamento, a 2ª Turma do TRF da 1ª Região manteve sentença de primeira instância que garantiu a um enfermeiro do Hospital das Forças Armadas (HFA), com jornada de 24 horas se-manais, o direito de tomar posse no cargo de Técnico em Saúde – Auxiliar de Enferma-gem, com jornada de 40 horas semanais. Consta dos autos que ato do diretor do HFA havia impedido o enfermeiro de tomar posse no citado cargo ao fundamento de que “a soma das jornadas de trabalho dos cargos que o impetrante pretende acumular ul-trapassa 60 horas semanais”. Por essa razão, o profissional da área de saúde impetrou mandado de segurança requerendo o direito de tomar posse no outro cargo público. Em primeira instância, o pedido foi julgado procedente, razão pela qual a União ape-lou ao TRF1 sustentando, entre outros argumentos, que “a Constituição Federal não alude expressamente à duração máxima de jornada de trabalho, contudo, mostra-se razoável e proporcional que se vislumbre do atual sistema de normas de proteção ao trabalho, o limite de 60 horas semanais como divisor de águas para a possibilidade de acumulação de cargos públicos”. As razões do ente público não foram aceitas pelo Colegiado. “Procedimento administrativo em que se busca restringir a cumulação de cargos públicos, limitando a jornada de trabalho a 60 horas semanais, não se mostra legítimo”, afirmou o Relator, Juiz Federal convocado Cleberson Rocha, em seu voto. “No caso dos autos pretende-se a acumulação de dois cargos de saúde, um com jorna-da de 40 horas semanais, sem dedicação exclusiva, e outro anteriormente ocupado de

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24 horas semanais, pelo que demonstra haver compatibilidade de horários”, comple-tou. O Juiz Federal Cleberson Rocha também rechaçou o argumento da União de que a jornada de trabalho superior a 60 horas semanais comprometeria o desempenho do servidor. O magistrado observou que uma “eventual inaptidão ou deficiência” só deve ser constatada no efetivo exercício das atribuições, não podendo ser apenas presumi-da. O voto do relator foi acompanhado pelos outros dois integrantes da 2ª Turma do Tribunal. Nº do Processo: 0027248-43.2009.4.01.3400. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Políticos são condenados por vender lote público

O ex-Prefeito de Barra do Garças, Wanderlei Farias, e o Vereador João Carlos Souza Abreu, continuam condenados a restituir o erário em R$ 201.110,00 mil referentes ao terreno público que foi vendido por eles. A decisão foi tomada por unanimidade, na última terça-feira (9 de setembro), durante sessão ordinária da 3ª Câmara Cível do TJMT, formada pelas Desembargadoras Maria Erotides Kneip Baranjak (presidente), Maria Aparecida Ribeiro (relatora) e pela juíza Vandymara Zanolo. Durante o julga-mento, a relatora do processo ressaltou que o terreno alvo do processo havia sido doa-do por Farias, prefeito à época, para que fosse construído um buffet infantil na cidade. A construção do local foi solicitada pelo Vereador João Abreu, também animador de festas, com a finalidade de promover sociabilidade e diversão para a população local. No local, deveria ter cama elástica, piscina de bolinhas e outros brinquedos. Entretan-to, em 2008, o terreno foi dividido em seis partes, as quais foram vendidas para que fossem construídas casas particulares. Os terrenos foram registrados em cartório em 2010. Toda a transação foi feita pelo Vereador João Abreu com o consentimento do ex-Prefeito Wanderlei Farias, que inclusive autorizou o desmembramento parcial do terreno, recebeu os impostos dos lotes desmembrados e autorizou o recebimento do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI). Em sua defesa, Farias afirmou que não tinha conhecimento do ocorrido e agiu de boa fé. Já Abreu afirmou que precisou vender o terreno por estar passando por dificuldades financeiras por conta de um aci-dente automobilístico. Verifico que os fatos e as práticas danosas das ações restaram comprovados no processo. O terreno foi utilizado para fim diverso e a sociedade ficou sem o local de diversão. [...] Quanto ao Wanderlei Farias, este agiu negligentemente ao permitir que o bem fosse alienado e aprovar em um segundo mandato que fosse recebido o ITBI. [...] Em relação ao João Abreu, ninguém pode valer de sua própria torpeza, ressaltou a desembargadora. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso)

Receita Federal pode quebrar sigilo bancário sem necessidade de autorização judicial

A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) decidiu, em julgamento realizado na última semana, que o Fisco tem direito a quebrar o sigilo bancário sem prévia autorização judicial. A decisão em recurso ajuizado pela Fazenda Nacional restabeleceu um lançamento que havia sido desconstituído pela Justiça Estadual de Balneário Camboriú (SC). Conforme o Relator do processo, Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona, a decisão da turma, baseada em legislação vigente, ainda não está pacificada na jurisprudência e sua constitucionalidade segue em julgamento

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no Supremo Tribunal Federal (STF). Nesse caso, segundo o magistrado, enquanto não houver o exame definitivo acerca da quebra de sigilo bancário por todos os ministros do STF, a ação da Receita Federal goza da presunção de constitucionalidade, não subsistindo motivo para declarar nulo o lançamento. Segundo Pamplona, a Lei Com-plementar nº 105/2001 permite a quebra do sigilo bancário por parte das autoridades fiscais desde que autorizada por delegado da Receita Federal, após instauração de pro-cesso administrativo ou procedimento fiscal, sendo ressaltado na lei o dever de sigilo. “A rigor, há apenas a transferência da obrigação de sigilo, que passa da instituição ban-cária à autoridade fiscal”, observou Pamplona. Para o desembargador, a necessidade de ajuizar uma ação judicial postulando essa quebra sempre que houver a necessidade de acesso à vida financeira das empresas por parte da fiscalização tributária seria uma medida descabida. “O adequado, a meu sentir, é permitir-se, como autorizam a Lei nº 9.311/96 e a Lei Complementar nº 105/2001, que a autoridade fiscal, através de procedimento administrativo próprio, proceda à quebra do sigilo”, escreveu. Ele frisou que, caso o contribuinte se sinta prejudicado, poderá então buscar a Justiça. “É de se presumir a legitimidade da ação das autoridades constituídas, devendo o contrário ser provado”, concluiu. Nº do Processo: 0001375-96.2014.404.0000. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 4ª Região)

Estado deverá matricular alunos em escola próxima à residência

Por maioria, os desembargadores da 4ª Seção Cível concederam a ordem do mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado por D. N. de A. L. e M. E. de A. L., representados pela mãe, contra ato praticado pela Secretária de Educação de MS ao não disponibilizar vaga na 2ª série para D. N. de A. L. e na 5ª série para M. E. de A. L., ambas no ensino fundamental, em tempo integral, na escola estadual próxima da resi-dência dos autores. Os impetrantes sustentam que em 2013 cursaram, respectivamen-te, 1ª e 4ª séries em escola municipal, porém, como a mãe trabalha o dia inteiro, há necessidade de cursarem a 2ª e a 5ª séries em escola de tempo integral. Afirmam que a escola mais próxima e que oferece o ensino em tempo integral encontra-se a cerca de 2,5km de sua residência. Argumentam que o direito líquido e certo de frequentar a escola mais próxima de sua residência é garantido pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. A impetrada alega que os pais têm por obrigação ficar atentos aos períodos amplamente divulgados para realização da pré-matrícula em escola pública, consistindo nisso obrigação da família. O relator do processo, Desembargador Júlio Roberto Siqueira Cardoso, explica que está previsto na Constituição Federal, no Estatu-to da Criança e do Adolescente e na Lei de Diretrizes e Base da Educação que o Estado tem a obrigação de garantir o acesso do aluno aos mais elevados níveis de ensino de acordo com a capacidade de cada um, não podendo o ente estatal furtar-se à obriga-ção imposta pela simples alegação de falta de efetivação da pré-matrícula no período disponibilizado, sob pena de violação da própria dignidade da pessoa humana. Além disso, o relator explica que se mostra absolutamente injustificável impedir o ingresso ou matrícula dos impetrantes na referida escola estadual em virtude de ausência de vaga, principalmente porque não restou comprovado pelo impetrado que as turmas da 2ª e 5ª séries estejam com excesso de alunos ou que exista lista de espera para efetivar suas matrículas nestas séries. Ante o exposto, contra o parecer da Procuradoria-Geral

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de Justiça, voto por se conceder a segurança, tornando definitiva a liminar inicialmente concedida. Processo nº 1403726-02.2014.8.12.0000. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul)

Ex-secretário de Saboeiro tem direitos políticos suspensos e deve pagar multa de R$ 60 mil

O ex-secretário de Saúde do Município de Saboeiro (a 462km de Fortaleza), Francis-co Dácio Santos Cavalcante, foi condenado a pagar multa de R$ 60 mil por praticar atos de improbidade administrativa. Também deverá ressarcir os cofres públicos no valor total do prejuízo causado ao erário, que será apurado na fase de liquidação de sentença. Além disso, teve os direitos políticos suspensos por sete anos e está proibido de contratar com o poder público, de receber benefícios ou incentivos fiscais ou cre-ditícios por cinco anos. A decisão é do juiz Daniel Carvalho Carneiro, integrante do Grupo de Auxílio do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) para agilizar o julgamento de ações de improbidade e de crimes contra a Administração Pública (Meta 4 do Conse-lho Nacional de Justiça). Segundo os autos (nº 2755-80.2011.8.06.0159), o Ministé-rio Público do Ceará (MP/CE) ajuizou ação contra o ex-gestor, com base no acórdão do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). De acordo com o documento, houve ausência de processos licitatórios na aquisição de materiais de limpeza e gêneros ali-mentícios (R$ 29.100,00), material odontológico (R$ 10.200,00) e locação de veículos (R$ 70.458,23), durante o exercício financeiro de 2005. Os bens e serviços contratados sem licitação totalizaram R$ 109.758,23. Na contestação, Francisco Dácio disse que não causou dano ao erário nem praticou ato de improbidade. Ao julgar o processo, o magistrado comprovou as irregularidades e condenou o ex-secretário. “Não existem dúvidas da necessidade de sua responsabilização pela prática de atos de improbidade administrativa que causaram prejuízo ao erário, porquanto a malversação do dinheiro municipal revelou-se irrefutável pela não realização de licitação considerada legal-mente obrigatória, na medida em que concorreu para o malbaratamento dos recursos, sem a verificação da proposta mais vantajosa ao erário.” (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará)

Títulos podres da dívida pública não podem ser usados para abater impostos

A 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) determinou a extinção de um processo em que se discutia a validade de títulos da dívida pública datados do início do século passado. O motivo foi a ilegitimidade passiva da União (representada pela Fazenda Nacional) para figurar como parte no processo, vez que os títulos foram emitidos pelo Estado de Pernambuco. A ação foi ajuizada por uma indústria de co-nexões hidráulicas que pretendia usar os títulos antigos – emitidos entre 1902 e 1941 – para abater impostos. Em primeira instância, a 8ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal (SJDF) julgou improcedente o pedido em razão da prescrição e da ausência de liquidez dos papéis. Isso significa que, por serem muito velhos, os títulos não teriam validade alguma – os chamados “títulos podres” – e, portanto, não poderiam ser usa-dos no abatimento de tributos. Insatisfeita, a empresa recorreu ao TRF1 contestando a ocorrência de prescrição, sob o argumento de que a “imprescritibilidade das apóli-ces ficou estabelecida por meio das próprias leis e decretos que regulamentaram sua emissão e resgate”. Já a União, pediu que fosse declarada sua ilegitimidade passiva no

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processo. Ao analisar o caso, a relatora na 8ª Turma do Tribunal deu razão ao ente pú-blico. No voto, a Desembargadora Federal Maria do Carmo Cardoso sequer analisou o mérito da ação. A magistrada observou que o Estado de Pernambuco, emissor dos pa-péis, não tem vínculo direto com a União e, por isso, a ação não deveria ter sido ajui-zada contra a Fazenda Nacional, e sim contra o próprio estado. “É este ente que detém a qualidade de agir juridicamente”, frisou. Para reforçar seu entendimento, a relatora citou decisões anteriores do TRF1, todas reconhecendo que a União não deve ser parte nesse tipo de ação. O voto foi acompanhado pelos outros dois magistrados que integram a 8ª Turma do TRF1. • História: Os títulos antigos da dívida pública foram emitidos, em papel, ao longo de mais de 50 anos, a partir de 1889. O Governo Federal, estados e municípios venderam as apólices interessados em arrecadar recursos para bancar, essencialmente, o financiamento de grandes obras públicas e investimentos em infraestrutura. Há inúmeras ações na Justiça Federal em que se discute a validade desses papéis. Nº do Processo: 0010576-28.2007.4.01.3400. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Tribunal afasta limite máximo de horas para acumulação de cargos públicos

A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) afastou, por unanimida-de, a limitação de 60 horas semanais de trabalho imposta pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) a candidata aprovada em concurso público para o cargo de auxiliar de enfermagem, como condição para acumulação de cargos e, consequente-mente, para a posse. A carga horária na Unifesp é de 40 horas semanais e a candidata pretende acumular este cargo com outro de auxiliar de enfermagem no Hospital Muni-cipal Regional do Tatuapé, em São Paulo, que tem carga horária de 30 horas semanais, em regime de plantão, no período das 19 às 7 horas. Ela informou, ainda, que essa limitação de horas não constou do edital do concurso, tendo somente tomado ciência desse óbice por conta da posse. Em grau de apelação, a Desembargadora Federal Marli Ferreira, Relatora do acórdão, afirmou que a Constituição Federal, em seu art. 37, inciso XVI, e a Lei nº 8.112/1990, em seu art. 118, § 2º, condicionam a acu-mulação de cargos à compatibilidade de horários, não havendo qualquer previsão que limite a carga horária máxima desempenhada, diária ou semanal, “vedando, na realidade, a superposição de horários”. Ela ressaltou, ainda, que a jurisprudência das cortes superiores já se firmaram no sentido de afastar o Parecer AGU GQ nº 145/1998, quanto à limitação da carga horária máxima, nos casos em que há acumulação de cargos, na medida em que o referido ato não possui força normativa para regular a ma-téria. Com isso, a desembargadora afastou a limitação imposta pela Unifesp à posse da impetrante, porém, a candidata deve comprovar, ainda, a compatibilidade de horários, indispensável à acumulação de cargos. Nº do Processo: 0003959-51.2004.4.03.6100. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 3ª Região)

Portador de hanseníase submetido a isolamento até 1986 tem direito à pensão vitalícia

Portador de hanseníase que comprovar ter sido submetido a isolamento e internação compulsória para tratamento da doença em hospital colônia, até 31 de dezembro de 1986, tem direito ao recebimento de pensão vitalícia. Esse foi o entendimento adotado pela 1ª Turma do TRF da 1ª Região para manter sentença de primeira instância que de-

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terminou à União a implantação do benefício a um cidadão que preencheu os requi-sitos estabelecidos pela Lei nº 11.520, de 2007. Na apelação, a União sustenta que o agravado deixou de cumprir as exigências da Lei nº 10.520/2007, pois não apresentou prova no sentido de que foi submetido a isolamento e internações compulsórios em hospital colônia em virtude do acometimento da hanseníase. “O próprio agravado afir-ma que apenas ficou internado um mês e cinco dias, o que demonstra a inexistência de internação e isolamento compulsórios, mas tão somente de tratamento ambulatorial”, argumenta. Ao analisar o caso, o Colegiado entendeu que a sentença proferida pela 3ª Vara da Seção Judiciária do Maranhão não merece reforma. Isso porque está compro-vado nos autos, mediante prova documental, que o agravado foi internado no Hospital Aquiles Lisboa no período de 31.07.1985 a 18.09.1985 para tratamento da hansenía-se. “O agravado preencheu, portanto, o requisito legal de segregação compulsória em hospital colônia até 31 de dezembro de 1986”, diz a decisão. Nesse contexto, preen-chidos os requisitos legais, mister a manutenção da pensão especial, mensal, vitalícia e intransferível instituída pela Lei nº 11.520/2007, na forma determinada pela decisão a quo”, finalizou o Colegiado. A decisão, unânime, seguiu o voto da desembargadora federal Ângela Catão. Nº do Processo: 0023498-09.2013.4.01.0000. (Conteúdo extraí-do do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

PM que adquiriu transtorno afetivo bipolar será indenizado pelo Estado

A Juíza Francimar Dias Araújo da Silva condenou o Estado do Rio Grande do Norte a pagar uma indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil, mais juros e correção monetária, a um Policial Militar em razão deste ter adquirido transtorno afetivo bipo-lar em razão do exercício da função que exercia, tornando-o incapaz definitivamente para o serviço ativo, conforme fartamente constatado pela própria Administração. Na ação, o autor informou que é servidor público estadual vinculado aos quadros da Polícia Militar do Rio Grande do Norte, na qualidade de soldado desde o ano de 2004. Alegou que há mais de seis anos vem se submetendo a intensos tratamen-tos psiquiátricos que, inicialmente, emanaram da síndrome do pânico, mas que no decorrer do tempo constatou-se a presença de várias outras mazelas do gênero, as quais se desencadearam durante o serviço ativo militar e pela maciça utilização de remédios e afins. Argumentou que desde então encontra-se em efetivo tratamento da enfermidade psíquica, que se manifesta como depressão e ansiedade exacerbada, conforme laudo médico expedido pela Junta Policial Militar de Saúde, de 6 de junho de 2011, que atesta que seu estado clínico compatível com o CID – F31 (transtorno afetivo bipolar). Ele disse que já havia sido dispensado pela Junta Militar Policial de Saúde das atividades de educação física, instrução e serviço ostensivo, noturno e de guarda, sendo, ainda, proibido de portar arma de fogo e de participar do regime de escala de serviço, bem como, licenciado em várias oportunidades para tratamento de saúde, assegurando ao praça unicamente o dever de trabalho administrativo perante a corporação militar. Mesmo após tal enfermidade e as limitações médicas impostas pela corporação militar, exerceu sua função administrativa perante o Presídio Estadu-al de Parnamirim, localidade de alta periculosidade, dado ao contato contínuo com vários infratores e marginais que se encontram recolhidos em tal estabelecimento prisional. • Inadequação: Em que pese o fato de estar designado para trabalho me-ramente administrativo, encontrava-se com o mesmo nivelamento psíquico incom-

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patível com as atribuições militares, ainda mais estando lotado em Presídio Estadual onde estão abrigados diversos delinquentes, refletindo uma inadequação total frente ao seu tratamento psíquico. Em 12 de março de 2008 foi pedida ao Diretor de Saúde da PM a inspeção e reforma do autor, pela Junta Médica de Saúde da Polícia Militar, e diante de sua inércia, ingressou com medida judicial pleiteando tal direito, o qual foi reconhecido em decisão colegiada na Apelação Cível nº 2010.007591-2. O pleito de reforma da praça foi novamente apreciado administrativamente pela Junta Médica da PM/RN no mês de junho de 2011, cujo parecer médico atestou expressamente a incapacidade definitiva para exercer as atividades de Policial Militar, não podendo prover meios para sua subsistência, devido à patologia catalogada no CID F31 (trans-torno afetivo bipolar) a contar de 6 de junho de 2011. A Ata de Inspeção de Saúde exarada na Sessão nº 063.1/2011 comprovou a necessidade de reforma da praça, bem como a sua isenção de imposto de renda; a magistrada considerou a responsabi-lidade objetiva do Estado no caso, assim como o fato de que o Estado não conseguiu comprovar a ausência de culpa de sua parte. Ela constou nos autos a vasta ratificação médica, inclusive pela própria Administração, descrevendo a enfermidade que aco-mete o autor e sua relação de causa e efeito com o trabalho que exercia, sendo, pois, necessária sua reforma por se tratar de incapacidade definitiva para o serviço ativo da Polícia Militar. Processo nº 0802138-52.2012.8.20.0001. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte)

Paciente que ingeriu soda cáustica tem de receber remédios do Poder Público

A 6ª Câmera Cível do Tribunal de Estado de Goiás manteve liminar que mandou a Secretaria da Saúde do Estado de Goiás fornecer toda medicação necessária a um paciente que ingeriu soda cáustica, ocasionando-lhe lesão esofágica. Ele necessita, mensalmente, de 90 frascos de Nutrison Energy (500ml); 45 litros de Isosource (1,5cal); 45 litros de Trophic (1,5cal); 30 frascos descartáveis para dieta; 10 frascos descartáveis para água; e 30 equipos grartacional. Entendendo que a saúde é um direito constitu-cional do cidadão brasileiro, o Relator do processo, Desembargador Geová Sardinha de Moraes, ressaltou que a omissão do Poder Público em prestar medicação adequada a pessoa enferma e carente constitui ofensa ao direito líquido e certo do paciente. Em substituição processual, o Ministério Público alegou que o paciente sofre de quadro grave de depressão e, em razão disso, ingeriu soda cáustica. Ressaltou que ele não tem condições financeiras para arcar com as despesas do tratamento e que a demora no fornecimento dos remédios acarretará prejuízos irreversíveis à sua saúde. Ao se ma-nifestar, a Secretaria de Saúde do Estado de Goiás alegou ausência de direito líquido e certo, ponderando que as provas constantes dos autos se mostram suficientes para demonstrar a grave enfermidade que acomete o paciente. • Ementa: A ementa recebeu a seguinte redação: Ementa: Mandado de segurança. Fornecimento de medicamento. Prova pré-constituída. Legitimidade passiva ad causam do estado. Responsabilidade comum dos governantes. Direito à saúde. 1. Comprovada a doença, a necessidade do medicamento e a omissão do Poder Público Estadual em atender os reclamos do cidadão, mostra-se inegável a presença da prova pré-constituída do seu direito líquido e certo. 2. Consoante remansosa jurisprudência dos tribunais pátrios, a União, os Es-tados, o Distrito Federal e os Municípios são partes legítimas para figurar no polo pas-sivo das ações mandamentais visando à proteção da saúde do cidadão, podendo ser

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proposta em face de quaisquer deles. 3. É dever das respectivas autoridades públicas assegurar a todos, indistintamente, o direito à saúde. Segurança concedida. Mandado de Segurança nº 175421-90.2014.8.09.0000. (201491754214). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás)

Turma confirma dever do Estado de indenizar por omissão no cuidado de via pública

A 3ª Turma Recursal do TJDFT confirmou decisão do 1º Juizado da Fazenda Pública que condenou o Distrito Federal a pagar indenização por danos materiais, em virtude de sinistro decorrente da má conservação de via pública. A decisão foi unânime. O autor afirma que foi surpreendido com a existência de buraco em via pública, fato que causou avarias em seu veículo, razão pela qual pleiteia indenização por danos mate-riais. A Lei Orgânica do Distrito Federal estabelece, em seu art. 337, que compete ao Poder Público planejar, construir, operar e conservar em condições adequadas de uso e segurança o sistema viário público do Distrito Federal. A questão, explica o juiz, diz respeito à responsabilidade objetiva do Estado resultante da omissão. Nessa hipótese, para que o Estado seja responsabilizado, devem estar presentes o dano, a ausência do serviço por culpa da Administração, bem como o nexo de causalidade. O exame dos autos demonstra que estão comprovadas por meio de fotografias as avarias sofridas pelo veículo conduzido pelo demandante, diz o julgador. De documento juntado aos autos também se extrai que o defeito na pista de rolamento, consistente na presença de expressivo buraco no asfalto, revela que a conservação da via pública não estava sendo adequadamente realizada. Diante disso, o magistrado conclui que o réu tem o dever de, em se tratando de via pública, zelar pela segurança do trânsito e pela preven-ção de acidentes, incumbindo-lhe o dever de manutenção e sinalização, advertindo os motoristas dos perigos e dos obstáculos que se apresentam, como eventuais buracos, desníveis ou defeitos na pista. Nesse sentido, sua omissão culposa consiste, justamen-te, em não conservar em condições adequadas de uso e segurança o seu sistema viário. O dano material foi comprovado pelo documento trazido aos autos [...], que especifica o reparo do automóvel, sendo o valor cobrado a esse título compatível com as carac-terísticas do acidente e do dano, acrescentou o magistrado, que julgou procedente o pedido do autor para condenar o Distrito Federal ao pagamento, a título de dano ma-terial, da quantia de R$ 2.172,66 corrigida monetariamente a contar do desembolso e acrescida de juros de mora. Processo nº 2013.01.1.166869-3. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado do Distrito Federal)

Filhos de policial morto em acidente vão receber pensão e indenização

O Juiz Eduardo Cardoso Gerhardt, de Firminópolis, condenou o motorista Hermann Costa Flávio, acusado de provocar um acidente que causou a morte do policial mili-tar Valde Ley Rosa. Por causa da imprudência ao volante, Hermann terá de pagar de indenização por danos morais no valor de R$ 90 mil – dividido, igualmente, entre os dois filhos e a esposa da vítima –, e, ainda, pensão mensal às duas crianças, no valor de 2/3 do salário-mínimo até que completem 25 anos. Para o magistrado, ficou claro

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que o motorista foi o causador da colisão que vitimou o policial, tanto que Hermann foi também condenado criminalmente pelo ocorrido. A conduta imprudente do réu foi que deu causa à morte da vítima. Nesses termos, entendo ser cabível o pedido de indenização por danos morais. A morte prematura do marido e pai dos autores, aos 35 anos, representa uma severa agressão à dignidade pessoal de cada uma de-las, causando-lhes, presumidamente, enorme sofrimento. Consta dos autos que Valde Ley estava em serviço quando morreu. Ele realizava um patrulhamento no Setor Oes-te, em Goiânia, quando trafegava pela Rua João de Abreu e, de repente, o carro de Hermann cruzou a pista, sem respeitar a preferencial. O policial sofreu politrauma-tismo e morreu no hospital cinco dias após a colisão. O Estado de Goiás foi também acionado na justiça pela família de Valde Ley. Contudo, o juiz entendeu que o ente público não deve responder pelo acidente, mesmo sendo empregador do policial. Nota-se que o fato gerador principal e determinante do evento se deu pela imprudên-cia de Hermann. O Estado em nada colaborou com o resultado, não houve omissão ou qualquer ato comissivo por parte deste, que pudesse dar causa ao acidente. (Processo nº 200302813670). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás)

DNIT é responsável por acidentes decorrentes de falta de manutenção em ro-dovias

A 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu que, em caso de acidente de trânsito em rodovias por falta de manutenção do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), cabe indenização à vítima. Após grave aciden-te em uma rodovia brasileira, o pai das autoras da ação faleceu e elas ajuizaram pedi-do de indenização por danos morais e materiais. Foi comprovado por perícia e por de-poimento de policial rodoviário que o local do acidente era mal sinalizado e cheio de buracos, o que concorreu para o acontecimento do acidente. A sentença estabeleceu o valor de 250 salários-mínimos, que, diante das circunstâncias do caso, mostrou-se razoável para reparar o dano sofrido. O Relator do processo no TRF1, Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro, destacou, no voto, que, embora a condenação por dano moral não deva ser fixada em valor excessivo, gerando enriquecimento sem causa, não pode ser arbitrada em valor irrisório, incapaz de propiciar reparação do dano sofrido e de inibir o causador do dano a voltar a incorrer no mesmo erro. Também estabeleceu pensão correspondente à metade da remuneração do falecido à época, a ser dividida entre suas filhas. O magistrado não considerou justa a alegação do DNIT de que o fale-cido estava trafegando em velocidade superior à da via quando ocorreu o fato. “A ne-gligência do DNIT está satisfatoriamente demonstrada nos autos, não sendo suficiente para imputar ao condutor do veículo a culpa exclusiva pelo evento danoso [...]. Essa argumentação não é suficiente para elidir a atribuição legal conferida ao recorrente pelo art. 82, inciso IV, da Lei nº 10.233/2001.” Deste modo, o magistrado negou pro-vimento à apelação do DNIT. O voto foi acompanhado pelos outros dois magistrados que integram a 6ª Turma do Tribunal. Nº do Processo: 0001276-14.2009.4.01.3807. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Estado deve fornecer cadeira de rodas para paciente com distrofia muscular

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O Estado de Alagoas deve fornecer cadeira de rodas motorizada e cadeira de rodas para banho a uma paciente que sofre de distrofia muscular. A decisão é do Desem-bargador Domingos de Araújo Lima Neto, do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL). De acordo com os autos, a paciente foi diagnosticada com uma doença progressiva e degenerativa que causa fraqueza muscular na região pélvica e escapular, necessitando fazer uso das cadeiras, conforme relatório médico. Ela ingressou na Justiça requerendo a concessão dos equipamentos por parte do Estado. O Juízo de 1º Grau, no entanto, não concedeu a liminar, alegando que a paciente não demonstrou o motivo que ense-jaria a urgência do pedido. Objetivando reverter a decisão, interpôs agravo de instru-mento no TJAL. Sustentou que a ausência dos equipamentos poderá comprometer o tratamento, fazendo com que ela venha a sofrer atrofia permanente dos músculos que ainda funcionam. Ao analisar o caso, o Desembargador Domingos Neto concedeu a liminar, reformando a decisão de 1º Grau. Concluo que a agravante tem necessidade das cadeiras de roda, as quais, embora não tragam a restituição total da sua saúde, proporcionarão o abrandamento dos efeitos da doença, afirmou. O desembargador ressaltou que as cadeiras devem ser autorizadas conforme requerido pelo médico que acompanha o tratamento, inclusive com a utilização dos materiais por ele especifica-dos. A decisão foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico desta segunda-feira (1º/9). Matéria referente ao Processo nº 0800894-40.2014.8.02.0900. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas)

Indeferimento de estágio a aluno por débito de uma disciplina fere o princípio da razoabilidade

A 6ª Turma do TRF da 1ª Região decidiu que o ato de instituição de ensino superior (IES) que indefere o requerimento de estágio a aluno regularmente matriculado, por estar em débito de uma disciplina do 3º período, fere o princípio da razoabilidade. A argumentação da IES é que o estudante não atenderia aos requisitos exigidos pela instituição para realização de estágio curricular não obrigatório, devido ao débito existente. O ato, segundo o Relator do processo no Tribunal, Desembargador Federal Daniel Paes Ribeiro, demonstrou ser incorreto porque ficou provado nos autos que o aluno, com a anuência da entidade, já havia participado do programa de estágio em período anterior. No voto, o relator acatou como razões de decidir parte do que foi exposto pela sentença. “Está claro, portanto, que o estágio curricular se consubstancia em importante etapa da formação acadêmica, devendo ser incentivado pela instituição de ensino”, citou o magistrado. “Mais ainda, a instituição de ensino está obrigada a celebrar o termo de compromisso de estágio, salvo nas hipóteses de descumprimento dos requisitos legais pelo estudante ou pela parte concedente, devidamente evidencia-do, não devendo, contudo, a instituição pública de ensino olvidar que os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade também devem ser atendidos pela Administra-ção Pública”, concluiu. O magistrado finalizou o voto afirmando que o aluno já teria realizado o estágio – por força de liminar confirmada em sentença, de primeira instân-cia – no período de 06.02.2012 a 31.12.2012. Dessa forma, “impõe-se a aplicação da teoria do fato consumado, haja vista que o decurso do tempo consolidou uma situação fática, cuja desconstituição não se mostra viável”. A Turma acompanhou o voto do relator de forma unânime. Nº do Processo: 0006163-57.2012.4.01.3800. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

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Confirmada decisão para manter integridade de hospital universitário da USP

O Desembargador Fermino Magnani Filho, da 5ª Câmara de Direito Público do Tri-bunal de Justiça de São Paulo, negou seguimento a recurso interposto por entidade de classe trabalhista contra liminar de interdito proibitório deferida em favor da Univer-sidade de São Paulo. O interdito proibitório está expresso no art. 932 do Código de Processo Civil e visa a repelir algum tipo de ameaça à posse de determinado possuidor. No caso em questão, a USP obteve a decisão a fim de proteger a integridade do prédio do Hospital Universitário, no campus do Butantã, e a continuidade do atendimento efetuado no local, ameaçado por piquetes sindicais. O magistrado explicou que o agravo interposto é improcedente, nos termos do art. 557 do CPC, e ressaltou que o direito à livre manifestação não se resume à interpretação literal dos dispositivos da Constituição Federal relativos a ele. “Não são esses direitos civis que estão em causa, antes, os riscos objetivos ao patrimônio físico da universidade e à comunidade (pobre) dependente dos seus serviços hospitalares. Riscos que podem ser antevistos e evita-dos sem afronta a nenhuma prorrogativa constitucional”, afirmou em voto. “Reuniões poderão ocorrer na região, inclusive defronte ao dito hospital – porque garantidas em texto constitucional –, mas desde que não haja depredação ou piquete apto a interrom-per o seu funcionamento. O cadeado no portão é indesculpável. As portas do sindi-cato continuam abertas, aceitando inscrições de quem quer que a ele deseje filiar-se.” Agravo de Instrumento nº 2142299-78.2014.8.26.0000. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo)

Estado deve custear cirurgia em joelho de paciente

O Juiz Cícero Martins de Macedo Filho, da 4ª Vara da Fazenda Pública de Natal, determinou ao Estado do Rio Grande do Norte custear os materiais necessários para realização do procedimento médico solicitado por um paciente para uma cirurgia de joelho. Ele manteve medida liminar anteriormente deferida, pela confirmação do bom direito e pela conservação do perigo da demora. Na ação judicial, o paciente alegou que necessita do custeio de implantes (materiais) necessários para a realização da cirurgia de revisão de artroplastia do joelho esquerdo, por ser portador de gonartrose severa (CID M17.0 e M96.8), conforme prescrição do profissional de saúde que o acompanha. Entretanto, como trata-se procedimento de custo elevado e que não são fornecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), porque são importados, o autor alega que não tem condições de adquiri-los sem comprometer o seu próprio sustento e de sua família, e por isso, buscou o Judiciário. • Garantia à saúde: Para o magistrado, de acordo com o texto constitucional, a proteção à saúde constitui matéria solidária entre a União, Estado e Município, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e ao acesso universal às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação, podendo o cidadão acionar qualquer um dos entes para o cumprimento de tal obrigação. Ele explicou que essas ações e serviços públicos de saúde devem ser desenvolvidos de forma integrada, embora descentrali-zada, através de um sistema único (art. 198) do qual fazem parte a União, os Estados e os Municípios. “Os Tribunais há muito já pacificaram entendimento no sentido de que a responsabilidade entre os entes federativos é solidária, podendo o cidadão di-rigir a demanda ao ente que melhor lhe aprouver, haja vista que se trata de obriga-

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ção constitucional, conforme dispõe o art. 23, II, da Constituição Federal”, ressaltou. Segundo o juiz, o relatório médico juntado aos autos, representa prova suficiente do estado de saúde da parte autora e da indicação do procedimento designado. Processo nº 0801024-78.2012.8.20.0001. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte)

Proposta aumenta prazo para estudante formado começar a pagar o Fies

A Câmara dos Deputados analisa o Projeto de Lei nº 7.068/2014, do Deputado Nilson Leitão (PSDB-MT), que aumenta o prazo de carência do Fundo de Financia-mento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) para 36 meses. Atualmente, segundo a Lei nº 10.260/2001, o período para o estudante começar a pagar o financiamento é de 18 meses após o término da graduação. O prazo previsto na proposta será contado a partir do mês seguinte ao da conclusão do curso, mantido o pagamento dos juros pre-vistos. De acordo com Leitão, o recém-formado necessita de prazo para se firmar no mercado de trabalho. “É comum que o ingresso no mercado de trabalho coincida com várias outras mudanças na vida do jovem profissional. Todo este movimento, pessoal e profissional, envolve gastos.” O parlamentar acredita que, após três anos de forma-do, o profissional terá mais condições de arcar com o pagamento de seu débito com o governo. O Fies concede financiamento a estudantes regularmente matriculados em faculdades privadas, com avaliação positiva do Ministério da Educação. O saldo é parcelado em até três vezes o tempo do curso, acrescido de um ano. • Tramitação: O projeto, que tramita em caráter conclusivo, será analisado pelas comissões de Educa-ção; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. (Conteúdo extraído do site da Câmara dos Deputados Federais)

Ocorrendo desapropriação indireta, a União é obrigada a indenizar o proprie-tário

A 3ª Turma do TRF da 1ª Região decidiu que na hipótese de desapropriação indireta – quando o Estado realiza obras que inviabilizam a utilização da propriedade pelo dono – a União deve realizar o pagamento de indenização como se houvesse ocorrido processo formal de desapropriação. O fato aconteceu em Vitória da Conquista/BA, quando, para a construção do anel viário da Rodovia BR-116/BA, a União invadiu vários terrenos, dentre os imóveis o de uma proprietária que é a parte autora neste caso. O perito do juízo afirmou taxativamente em seu relatório que todo o terreno foi utilizado na construção da rodovia, não restando nada da propriedade. A União, em seu recurso, alegou que a autora já havia recebido indenização pela perda do terre-no, apesar de o ente público não conseguir provar o pagamento dessa indenização. Em seu voto, o Relator, Desembargador Federal Olindo Menezes, declarou que: “O laudo oficial, calcado em levantamento planimétrico por GPS e elaborado em estreita observância das normas técnicas estabelecidas na ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas avaliou criteriosamente o imóvel, valendo-se, inclusive, do método comparativo direto (Cf. Item ‘Conclusão’ – fl. 97). Cuida-se de trabalho elaborado por perito da confiança do juízo, equidistante dos interesses imediatos das partes. Ainda que o Laudo Administrativo (fl. 66) deixe entrever uma ‘intenção’, por parte da União, de indenizar a área desapropriada, a verdade é que nada foi pago à autora, a título de indenização pela perda do domínio e da posse de seu imóvel”. Assim, o magistrado

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confirmou integralmente a sentença, negando provimento à apelação da União. A Turma, à unanimidade, acompanhou o voto do relator. Nº do Processo: 0003084-94.2012.4.01.3307. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Candidato prestes a ser nomeado em cargo público tem direito ao adiantamen-to da colação de grau

É possível a antecipação da colação de grau nos casos em que a parte impetrante, em vias de ser nomeada em cargo público, comprove ter concluído curso de nível superior para, dessa forma, não prejudicar sua vida profissional. A 6ª Turma do TRF da 1ª Região adotou esse entendimento para manter sentença da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Amapá, que determinou à Universidade Vale do Acaraú que procedesse à colação de grau e à entrega do diploma do curso de Pedagogia à impetrante da ação. Na inicial, a requerente alega que concluiu o curso de Pedagogia na citada instituição de ensino e que, tendo sido nomeada para o cargo de pedagoga e especialista em edu-cação, necessitaria do diploma para poder tomar posse. Entretanto, a Universidade se negou a permitir a outorga de grau em seu favor. Por essa razão, a estudante impetrou mandado de segurança. O pedido foi concedido pelo Juízo de primeiro grau. O pro-cesso chegou ao TRF1 por meio de remessa oficial. Trata-se de um instituto previsto no Código de Processo Civil (art. 475) que exige que o juiz singular mande o processo para o tribunal de segunda instância, havendo ou não apelação das partes, sempre que a sentença for contrária a algum ente público. A sentença só produzirá efeitos depois de confirmada pelo tribunal. Ao analisar a demanda, o Colegiado ressaltou que o entendimento adotado em primeira instância encontra respaldo na jurisprudência do próprio TRF1 no sentido de que “concluídas com êxito todas as disciplinas da gra-duação e estando a impetrante em vias de ser nomeada para cargo público de nível superior, após aprovação em certame público, faz jus à concessão da segurança para antecipação do procedimento administrativo de lançamento de notas, assegurado, por conseguinte, o adiantamento da colação de grau e a expedição do diploma”. A deci-são unânime seguiu o voto do Relator, Desembargador Federal Kassio Nunes Marques. Nº do Processo: 0001702-71.2013.4.01.3100. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Estado tem de pagar servidora comissionada demitida quando estava grávida

A 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) negou provimento a agravo regimental em apelação cível interposta pelo Estado de Goiás contra sentença do juízo da Vara das Fazendas Públicas e 2ª Cível de Posse, que concedeu a Tatia-ne Ataíde Gugel o direito de receber remuneração no período em que foi demitida quando estava grávida. A decisão, unânime, relatada pelo Desembargador Francisco Vildon José Valente, garantiu à funcionária as remunerações equivalentes ao valor que receberia se estivesse exercendo o cargo em comissão do qual foi exonerada, desde a data da dispensa, em 30 setembro de 2008, até o período de 120 dias depois do parto, ocorrido em 20 de novembro 2008, bem como seus reflexos sobre férias e 13º salário. Tatiane Gugel defendeu na ação reclamatória trabalhista que foi exonerada quando já estava grávida, argumentando possuir estabilidade diante do seu estado gravídico. Irresignado, o Estado de Goiás sustentou que o Estatuto dos Servidores Públicos de

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Goiás não prevê a concessão de estabilidade provisória a funcionárias comissiona-das gestantes. • Ementa: A ementa recebeu a seguinte redação: Agravo regimental na apelação cível. Ação reclamatória trabalhista. Exoneração de servidora pública co-missionada. Período gestacional. Extensão da estabilidade provisória. Remuneração devida. Imprevisão da matéria discutida no Estatuto dos Servidores Públicos de Goiás. Inovação recursal. Correção monetária. Alteração de ofício. Matéria de ordem públi-ca. Rediscussão da matéria. 1. A estabilidade provisória decorrente da maternidade é estendida às servidores públicas comissionadas, nos termos do § 3º do art. 39 da Constituição Federal e do art. 10, inciso II, letra b, do Ato das Disposições Consti-tucionais Transitórias. Tendo sido exonerada ainda gestante, faz jus a servidora em receber os vencimentos relativos ao período de gravidez, até o término de sua licença maternidade. 2. Não cabe à parte alegar, em sede de Agravo Regimental, matéria não abordada na Apelação Cível, sob pena de inovação recursal. 3. A incidência de correção monetária constitui matéria de ordem pública, de forma que a aplicação, alteração de cálculo, ou modificação do termo inicial, ou índice de aplicação procedi-das, de ofício, não configura reformatio in pejus, nem dependem de pedido das partes. 4. É medida imperativa o desprovimento do agravo regimental que não traz, em suas razões, qualquer argumento novo que justifique a modificação da decisão recorrida. Agravo regimental conhecido e desprovido. Agravo Regimental na Apelação Cível nº 440417-81.2009.8.09.0132. (200994404174). (Conteúdo extraído do site do Tribu-nal de Justiça do Estado de Goiás)

Município terá de fornecer suplemento alimentar a bebê portador de refluxo

Em decisão monocrática, o Desembargador Leobino Valente Chaves manteve decisão proferida pelo juízo da Vara das Fazendas Públicas e 2ª Cível da comarca de Itaberaí determinando que a Secretaria de Saúde do município forneça nove latas por mês do suplemento alimentar Neocate à bebê portadora de refluxo gastroesofágico. Ao julgar a remessa obrigatória do mandado de segurança, o desembargador concordou com a decisão em primeiro grau, destacando que, de acordo com a Constituição Federal, a saúde é um direito de todos e o Estado deve garanti-la aos cidadãos por meio de políti-cas sociais e econômicas. O magistrado esclareceu que o fornecimento do suplemento não é facultativo e sim dever do Município, principalmente porque, segundo ele, o direito em questão – à vida, com dignidade – sobrepõe-se a qualquer outro. Leobino Valente constatou que os documentos presentes nos autos comprovam a doença da criança, além da necessidade da terapia nutricional, o que para ele, demonstra o di-reito líquido e certo do bebê. (201392980704). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás)

Universidade é obrigada a conceder diploma à aluna inadimplente

A PUC-Goiás foi condenada a fornecer o diploma de uma aluna que finalizou o cur-so de medicina, mas estava com parcelas em atraso. A decisão é da 1ª Câmara Cí-vel do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), que seguiu, à unanimidade, o voto do Relator, o Desembargador Orloff Neves da Rocha. Conforme dispõe a Lei nº 9.870/1999, art. 6º, são proibidas a suspensão de provas, a retenção de documento e quaisquer outras sanções pedagógicas por motivo de inadimplência. O magistrado observou que a instituição de ensino deve, então, efetuar a cobrança das mensalida-

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des atrasadas pela via judicial e não penalizar o aluno que se encontra matriculado. A universidade havia alegado que a aluna não havia renovado a matrícula e, por causa disso, havia sido desligada do quadro discente. Contudo, o magistrado constatou que tal afirmativa não deveria proceder, já que, mesmo sem a matrícula oficializada, a jovem frequentou todas as aulas, realizou provas e, ainda, foi aprovada no trabalho de conclusão de curso, tendo, inclusive, participado de cerimônia de colação de grau. • Ementa: Agravo regimental em embargos declaratórios na apelação cível. Ação de-claratória. Tese aduzida já decidida. Ausente fato novo. 1. Convém lembrar que a tese aduzida já foi decidida quando do julgamento da apelação (fls. 332/352) e dos embargos Declaratórios (fls. 370/378), no sentido de que a agravada frequentou as aulas, cursou todas as matérias dos períodos exigidos, realizou as provas e concluiu o curso, inclusive, lhe foi oportunizada a apresentação do Trabalho de Conclusão do Curso – TCC, frente à banca examinadora e sua orientadora, recebendo aprovação e produção textual. 2. Restando evidenciado que as razões arguidas por ocasião do agra-vo regimental não caberia fato novo que possa modificar o entendimento do julgador de segundo grau, deve a decisão recorrida ser mantida. Regimental conhecido e des-provido. (Apelação Cível nº 201392552745). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás)

Certidão de tempo sem descrição de atividade exercida por dentista não vale para pontuação em concurso

O Desembargador Federal Carlos Muta, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), negou seguimento a recurso de uma candidata que queria que fossem atri-buídos pontos de experiência profissional como dentista no município de Itaporã/MS no concurso da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), com lotação no Hospital Universitário de Dourados/MS, ligada à Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). Na decisão, publicada em julho, o magistrado afirmou que a can-didata, embora provida no cargo de dentista no órgão municipal, apenas exerceu ativi-dade administrativa. Havia a necessidade de descrição do serviço prestado que serviria para permitir devida valoração de experiência profissional frente às atividades ineren-tes ao emprego disputado e às necessidades da administração. A descrição das ativi-dades pelo candidato era imprescindível, uma vez que o edital do concurso prescrevia que os profissionais contratados pela EBSERH deveriam, necessariamente, no exercí-cio de suas atribuições, difundir os conhecimentos da sua área de formação, de forma a integrar as atividades de assistência, ensino e pesquisa junto às equipes multidisci-plinares dos hospitais universitários e das demais unidades operacionais da empresa. No recurso, a profissional relatou que concorreu à única vaga de cirurgiã dentista do concurso publicado em 16.12.2013, classificando-se em quarto lugar. Acrescentou que não lhe foram atribuídos pontos pelos oito anos de trabalho no município de Ita-porã/MS, conforme declaração tempo de serviço municipal. Alegou ainda ser despro-positada a exigência de descrição de atividades odontológicas no documento. Alter-nativamente, requereu que a UFGD se abstivesse de convocar o candidato aprovado em primeiro lugar no concurso público para o cargo de cirurgião-dentista. Segundo o magistrado federal, a decisão agravada foi devidamente motivada e, conforme consta dos autos, a agravada (UFGD) não atribuiu pontuação à agravante (dentista) porque não constou da declaração do serviço público municipal no cargo de odontólogo a

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descrição das atividades, em desobediência ao item 9.11 c e 9.13 do edital. “De fato, a decisão administrativa tem amparo no edital, que exige a discriminação do serviço realizado para a verificação da experiência profissional efetiva, não bastando a mera descrição da nomenclatura do cargo, logo a declaração apresentada pela agravante realmente não cumpre a regra do edital do concurso”, afirmou o desembargador. Ano negar a reforma da decisão da 2ª Vara Federal de Dourados/MS, o relator do processo no TRF3 ressaltou que não sujeitar a agravante à exigência do edital, aceitando docu-mento que manifestamente não cumpre requisito substancial previsto, geraria violação ao princípio da isonomia. “Criaria favorecimento indevido, prejudicando, além da administração, todos os demais candidatos e, sobretudo, os que foram aprovados em melhor colocação do que a recorrente”, finalizou. Agravo de Instrumento nº 0015831-78.2014.4.03.0000/MS. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 3ª Região)

Contratação sem concurso é nula e só gera direito a salários e FGTS

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em julgamento de Recurso Extraordinário (RE 705140) com repercussão geral reconhecida, firmou a tese de que as contrata-ções sem concurso pela administração pública não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos a não ser o direito à percepção dos salários do período trabalhado e ao levan-tamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Por unanimidade, o Plenário negou provimento ao recurso, interposto contra decisão no mesmo sentido do Tribunal Superior do Trabalho (TST). O presidente eleito do STF, Ministro Ricardo Lewandowski, destacou que o julgamento afeta pelo menos 432 ca-sos sobre a mesma matéria sobrestados no TST e nas instâncias inferiores. Na decisão questionada no RE 705140, o TST restringiu as verbas devidas a uma ex-empregada da Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem) do Rio Grande do Sul, contratada sem concurso, ao pagamento do equivalente ao depósito do FGTS, sem a multa de 40% anteriormente reconhecida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. A decisão seguiu a jurisprudência do TST, contida na Súmula nº 363 daquela Corte. Ao recorrer ao STF, a trabalhadora alegava que tal entendimento violava o art. 37, § 2º, da Constituição Federal. Segundo ela, a supressão dos efeitos trabalhistas nas contratações sem concurso não pode ser imposta com base nesse dispositivo, “que nada dispõe a respeito”. Sustentava, ainda, que o § 6º do mesmo artigo impõe à Ad-ministração Pública a responsabilidade pelo ilícito a que deu causa, ao promover a contratação ilegítima, e, por isso, pleiteava o direito à integralidade das verbas resci-sórias devidas aos empregados contratados pelo regime da CLT. • Relator: O Ministro Teori Zavascki, Relator do recurso, observou que o art. 37, § 2º, da Constituição, “é uma referência normativa que não pode ser ignorada” na avaliação dos efeitos das relações estabelecidas entre a Administração Pública e os prestadores de serviço con-tratados ilegitimamente. “Nas múltiplas ocasiões em se manifestou sobre o tema, o STF assentou que a Constituição reprova severamente os recrutamentos feitos à margem do concurso”, afirmou. O ministro explicou que o dispositivo constitucional atribui às contratações sem concurso “uma espécie de nulidade jurídica qualificada”, cuja consequência é não só o desfazimento imediato da relação, mas também a punição da autoridade responsável. “Daí afirmar-se que o dispositivo impõe a ascendência do concurso no cenário do direito público brasileiro, cuja prevalência é garantida mes-

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mo diante de interesses de valor social considerável, como aqueles protegidos pelas verbas rescisórias nos contratos por tempo indeterminado, considerado inexigíveis em face da nulidade do pacto celebrado contra a Constituição”, assinalou. O único efeito jurídico válido, nessas circunstâncias, é o direito aos salários correspondentes aos ser-viços efetivamente prestados e a possibilidade de recebimento dos valores depositados na conta vinculada do trabalhador no FGTS. Este último, inclusive, só passou a ser admitido após a introdução, em 2001, do art. 19-A na Lei nº 8.036/1990, que regula-menta o FGTS, contendo previsão expressa nesse sentido. “Ainda que o levantamento do FGTS esteja previsto em lei específica, a censura que o ordenamento constitucional levanta contra a contratação sem concurso é tão ostensiva que essa norma [art. 19-A da Lei nº 8.306] chegou a ter sua inconstitucionalidade reconhecida por cinco dos 11 ministros do STF no julgamento do RE 596478”, lembrou o Ministro Teori. Ele citou ainda diversos precedentes das Turmas do STF no sentido de negar o direito a outras verbas rescisórias típicas do contrato de trabalho, ainda que a título de indenização. “Na verdade, o alegado prejuízo do trabalhador contratado sem concurso não cons-titui dano juridicamente indenizável”, afirmou. “Embora decorrente de ato imputável à administração, se trata de contratação manifestamente contrária à expressa e clara norma constitucional, cuja força normativa alcança também a parte contratada, e cujo sentido e alcance não poderia ser por ela ignorada”. Segundo o ministro, o reconheci-mento do direito a salários afasta, ainda, a alegação de enriquecimento ilícito por parte da Administração. Processos relacionados: RE 705140. (Conteúdo extraído do site do Supremo Tribunal Federal)

Estudante com bronquite terá direito a transporte escolar na porta de casa

A 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), à unanimidade, confirmou sentença determinando que a Secretaria Municipal de Educação do Municí-pio de Vila Propício forneça transporte escolar para estudante que mora em zona rural. O menino sofre com bronquite asmática e, para se deslocar até a rodovia que dava acesso ao ônibus escolar, ficava exposto ao frio da manhã, o que piorava sua condi-ção. O Relator do processo foi o Desembargador Alan Sebastião de Sena Conceição. A família da criança buscava a concessão da segurança para que fosse oferecido o transporte no turno vespertino. A liminar foi concedida em favor da família, porém, após visita do prefeito de Vila Propício, o garoto passou a estudar no período matutino e seu transporte passou a ser realizado por um veículo da prefeitura que o buscava em sua casa. Em segundo grau, a segurança foi concedida para que a Secretaria Municipal de Educação da cidade continuasse a fornecer o transporte no período matutino. O de-sembargador destacou que é dever dos entes da federação prestar serviços gratuitos de transporte escolar a alunos que residem na zona rural. Ele afirmou que é obrigação do município desenvolver programas que possibilitem o atendimento das necessidades do educando para que esteja em condições reais de frequentar e acompanhar as aulas. O magistrado apontou que, após a determinação judicial, o transporte continuou a ser fornecido no período matutino, só que agora o veículo buscava o estudante na porta de sua casa, eliminando, assim, sua exposição ao frio da madrugada. Dessa forma, ele decidiu pela manutenção da sentença, para que o transporte seja fornecido no período matutino, de forma periódica, e pelo período necessário. A ementa recebeu a seguinte redação: Duplo grau de jurisdição. Mandado de segurança. Transporte escolar. Área

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rural. Direito à educação. A educação, sobretudo a básica, é direito de todos e dever do Estado e, para fins de efetivação dessa garantia constitucional, deve ser assegurado pelo Município aos alunos da zona rural transporte escolar gratuito, a ser prestado de forma adequada, atendendo-se às necessidades dos alunos. Remessa obrigatória conhecida e desprovida. (201290792968). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás)

Projeto regulamenta participação da União em lucros do petróleo no regime de partilha

A Câmara dos Deputados analisa projeto (PL 7017/13) que fixa percentuais mínimos para a participação governamental no excedente de óleo produzido nos campos petro-líferos explorados sob o regime de partilha. Segundo a proposta, do Deputado Andre Moura (PSC-SE), o excedente em óleo recebido pela União não pode ser inferior a 40% para campos com produção média diária inferior a 15 mil metros cúbicos de óleo; 50% para campos com média diária entre 15 mil e 30 mil metros cúbicos; e 60% para produção maior que 30 mil. Atualmente, a parcela de óleo excedente do governo é de-finida em leilão, sendo o direito de exploração outorgado à empresa que oferecer uma alíquota maior. • Partilha x concessão: A Lei nº 12.351/2010, que institui o regime de partilha, define o excedente em óleo como a parte do lucro do campo petrolífero a que a União tem direito, já que, neste regime, as empresas partilham com o governo o óleo excedente. Já no regime de concessão, a empresa concessionária é obrigada a pagar várias participações governamentais, entre elas a participação especial, uma alíquota sobre o lucro obtido com a exploração em campos de alta produtividade, definida por decreto presidencial. De acordo com o Deputado Andre Moura, a participação especial nas áreas sob o antigo regime de concessão é maior que o excedente em óleo nas áreas sob o regime de partilha. Segundo o parlamentar, o objetivo do projeto é garantir uma maior participação do governo nas receitas das áreas exploradas sob o novo regime, “e trazer maior arrecadação para a União e mais benefícios econômicos e sociais”. • Tramitação: O projeto, que tramita em caráter conclusivo, será analisado pelas comissões de Minas e Energia; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. (Con-teúdo extraído do site da Câmara dos Deputados Federais)

União federal terá que pagar indenização por dano moral a idoso humilhado em hospital público

Decisão da 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) obriga a União a pagar indenização por dano moral a idoso por maus-tratos e grosserias praticadas por agentes do Estado no Hospital da Base Aérea de Campo Grande (MS). O acordão foi disponibilizado no Diário Eletrônico da Justiça Federal da 3ª Região no dia 14 de agos-to. No caso, o idoso afirmou que sofreu grave constrangimento durante inspeção de saúde realizada entre 08.02.2011 e 23.03.2011 no Hospital da Base Aérea de Campo Grande/MS, quando foi tratado com descaso por um sargento e com estupidez por um capitão, que utilizou palavras grosseiras e gestos indelicados. Em primeiro grau, o juiz havia julgado improcedente o pedido. No voto condutor do acordão, o Desembarga-dor Federal Johonsom Di Salvo destacou que não há justificativa para o mau tratamen-to pessoal a quem, mesmo sendo militar, procura serviço de saúde mantido pelo poder público. “Ninguém é obrigado a suportar, como ocorreu, atos de estupidez – como

RSDA Nº 106 – Outubro/2014 – CLIPPING JURÍDICO ��������������������������������������������������������������������������������������������������������������������������241

aqueles perpetrados pelo capitão, que utilizou palavras grosseiras e gestos indelicados contra o autor – já que dos agentes do Estado só se pode esperar comportamento lhano e atencioso. A natural rispidez do meio castrense não é tolerável quando ocorre em recinto hospitalar”, afirmou. Para o magistrado, ficou caracterizado dano moral, que deve ser ressarcido pela União com o pagamento de R$ 10 mil reais, com juros de mora desde o evento (Súmula nº 54/STJ) e correção monetária a partir desta data na forma da Resolução nº 134/CJF. De acordo com a decisão, a União deve ser também condenada a pagar honorários advocatícios de 10% do valor corrigido da condena-ção, na forma do art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil. No TRF3, a ação recebeu o número 0007022-49.2011.4.03.6000/MS. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 3ª Região)

Evolução patrimonial não explicada configura ato de improbidade

A evolução patrimonial e financeira desproporcional ao patrimônio ou à renda do agente público é, por si, ato de improbidade administrativa. Para a 3ª Seção do Su-perior Tribunal de Justiça (STJ), essa situação justifica a cassação de aposentadoria de um auditor fiscal da Receita Federal que apresentou declarações de bens falsas, demonstrando falta de transparência. A Relatora do mandado de segurança é a Desem-bargadora convocada Marilza Maynard. O colegiado levou em conta que não foi com-provada a licitude da evolução patrimonial e financeira e que o servidor apresentou declarações de bens falsas referentes aos anos sob exame no processo. O servidor foi auditor fiscal da Receita Federal por mais de 22 anos. Ele sustentava que a movimenta-ção financeira incompatível com a renda e o patrimônio declarados seria, no máximo, um ilícito tributário, mas para que houvesse reflexo administrativo-disciplinar seria ne-cessária a demonstração da prática de ilícito administrativo tipificado como tal pela Lei nº 8.112/1990. Disse que não se demonstrou sua intenção dolosa de descumprir nor-mas fundamentais da boa administração. Dolo genérico Em seu voto, Marilza Maynard observou que, no caso de atos que atentam contra os princípios da administração pública (art. 11 da Lei nº 8.429/1992), o dolo se configura pela manifesta vontade do servidor de realizar conduta contrária ao dever de legalidade. Ela esclareceu que nesses casos a configuração do ato de improbidade depende da presença de dolo ge-nérico, ou seja, dispensa a demonstração de ocorrência de dano para a administração pública ou de enriquecimento ilícito do agente. Marilza Maynard explicou que a con-duta do servidor tida por ímproba não precisa estar necessária e diretamente vinculada ao exercício do cargo público. Ela entende que mesmo quando o ato se der fora das atividades funcionais, se ele evidenciar incompatibilidade com o exercício do cargo, será passível de punição por improbidade. Por unanimidade, os ministros da Seção não consideraram a pena desproporcional. A Desembargadora Marilza Maynard tam-bém afirmou que a administração não tem discricionariedade para aplicar pena menos gravosa quando se vê diante de situações em que a conduta do servidor se enquadra nas hipóteses de demissão ou de cassação de aposentadoria. MS 12660. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

Fechamento da Edição: 30�09�2014

Resenha Legislativa

LEIS

LEI Nº 13.026, DE 03.09.2014Altera as Leis nºs 10.410, de 11 de janeiro de 2002, que cria e disciplina a Carreira de Especialista em Meio Ambiente, e 11.357, de 19 de outubro de 2006, na parte em que dispõe sobre o Plano Especial de Cargos do Ministério do Meio Ambiente e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente – Ibama; cria o Quadro em Extinção de Combate às Endemias; e autoriza a transformação dos empregos criados pelo art. 15 da Lei nº 11.350, de 5 de outubro de 2006, no cargo de Agente de Combate às Endemias.

LEI Nº 13.025, DE 03.09.2014Altera o art. 1º da Lei nº 10.714, de 13 de agosto de 2003, que autoriza o Poder Executivo a disponibilizar, em âmbito nacional, número telefônico destinado a atender denúncias de violência contra a mulher.

LEI Nº 13.024, DE 26.08.2014Institui a gratificação por exercício cumulativo de ofícios dos membros do Ministério Público da União e dá outras providências.

Fechamento da Edição: 30�09�2014

Bibliografia Complementar

Recomendamos como sugestão de leitura complementar aos assuntos abordados nesta edição os seguintes conteúdos:

ARTIGOS DOUTRINÁRIOS

• Licitação para Consultoria e a Demonstração de Capacidade Téc-nica: O Problema das Equipes Compartilhadas

Carlos Ari Sundfeld Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

• Habilitação Preliminar nas Licitações Reinaldo Moreira Bruno Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

• Ressarcimento por Dano ao Erário e Prescrição Cícero Martins de Macedo Filho Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

Índice Alfabético e Remissivo

Índice por Assunto Especial

DOUTRINA

Assunto

SançõeS da Lei de improbidade adminiStrativa

• O Regime de Responsabilidade dos Servidores Contido nas Leis nºs 8.429/1992 e 8.666/1993 e o Déficit de Controle Eficaz sobre os Atos de Improbidade Administrativa (Carlos Athayde Valadares Viegas e Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas) .....................................................14

• Sanções da Lei de Improbidade Administrativa (Elisson Pereira da Costa) .......................................9

Autor

carLoS athayde vaLadareS viegaS e cLáudia mara de aLmeida rabeLo viegaS

• O Regime de Responsabilidade dos Servidores Contido nas Leis nºs 8.429/1992 e 8.666/1993 e o Déficit de Controle Eficaz sobre os Atos de Improbidade Administrativa .................................14

cLáudia mara de aLmeida rabeLo viegaS e carLoS athayde vaLadareS viegaS

• O Regime de Responsabilidade dos Servidores Contido nas Leis nºs 8.429/1992 e 8.666/1993 e o Déficit de Controle Eficaz sobre os Atos de Improbidade Administrativa .................................14

eLiSSon pereira da coSta

• Sanções da Lei de Improbidade Administrativa ......9

JURISPRUDÊNCIA COMENTADA

Assunto

SançõeS da Lei de improbidade adminiStrativa

• A Perda dos Direitos Políticos, a Prática do Ato de Improbidade Administrativa e a Consti-tuição Federal (Rômulo de Andrade Moreira) ......32

Autor

rômuLo de andrade moreira

• A Perda dos Direitos Políticos, a Prática do Ato de Improbidade Administrativa e a Constituição Federal ................................................................32

ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Assunto

SançõeS da Lei de improbidade adminiStrativa

• Administrativo e processo civil – Recurso es-pecial – Ação civil pública – improbidade ad-ministrativa – Omissão – Ausência – Perda dos

direitos políticos – Concurso de agentes – Exten-são ao vice-prefeito da sanção política aplicada ao prefeito – Ausência de proveito patrimonial e dano ao erário – Revisão das penas – Súmula nº 7/STJ (STJ) ..............................................6724, 38

EMENTÁRIO

Assunto

SançõeS da Lei de improbidade adminiStrativa

• Improbidade administrativa – bloqueio de bens e contas bancárias – valor necessário para res-sarcimento – limitação ...............................6725, 46

• Improbidade administrativa – contratação irre-gular – realização do trabalho – ausência – re-muneração – recebimento – ressarcimento ao Erário – necessidade – suspensão dos direitos políticos – desproporcionalidade – ausência ..................................................................6726, 46

• Improbidade administrativa – indisponibili-dade dos bens – decretação – possibilidade ..................................................................6727, 47

• Improbidade administrativa – prefeito e secretá-rio de finanças – falsificação de documento – multa – elevação – perda dos direitos políticos– aplicação ................................................6728, 48

• Improbidade administrativa – procedimento licitatório – irregularidades – multa – propor-cionalidade e razoabilidade – observância ..................................................................6729, 48

• Improbidade administrativa – Programa Bolsa Família – coordenadora – cartões de beneficiá-rios – retenção – multa – aplicação – direitos polí-ticos – suspensão .......................................6730, 49

• Improbidade administrativa – sanções – cumu-lação – juízo de necessidade e proporcio-nalidade – sujeição ....................................6731, 50

• Improbidade administrativa – sentença – execu-ção provisória – perda função e suspensão de di-reitos políticos – impedimento ...................6732, 50

• Improbidade administrativa – servidor público – auxílio-transporte – má-fé – configuração – san-ções – aplicação ........................................6733, 53

Índice Geral

DOUTRINA

Assunto

aniStia

• O Direito de Reenquadramento Funcional e de Salário de Carreira Isonômico aos Anistiados da Lei nº 8.878/1994: o Equilíbrio Reflexivo de uma Obrigação de Solidariedade e Sociedade(Daniel Ivo Odon) ................................................88

RSDA Nº 106 – Outubro/2014 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ����������������������������������������������������������������������������������������������������245 Licitação

• Habilitação Técnica em Licitações Públicas(Carlos Eduardo Araujo de Assis) .........................70

terceirização

• Debates Jurídicos sobre a Terceirização no Bra-sil (Elói Martins Senhoras) ....................................55

Autor

carLoS eduardo arauJo de aSSiS

• Habilitação Técnica em Licitações Públicas ........70

danieL ivo odon

• O Direito de Reenquadramento Funcional e de Salário de Carreira Isonômico aos Anistiados da Lei nº 8.878/1994: o Equilíbrio Reflexivo de uma Obrigação de Solidariedade e Sociedade ............................................................................88

eLói martinS SenhoraS

• Debates Jurídicos sobre a Terceirização no Brasil ............................................................................55

ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Assunto

agência reguLadora

• Administrativo – Comercialização de gás des-caracterizada – Uso do gás para consumo pró-prio – Multa – Nulidade do auto de infração(TRF 4ª R.) ...............................................6739, 155

improbidade adminiStrativa

• Administrativo – Improbidade – Licitação – So-brepreço – Prejuízo ao erário não comprovada – Pesquisa de preço analisada isoladamente é elemento inábil à comprovação do dano ao erá-rio – Percentual de diferença entre o valor da pesquisa e o valor contratado de valores globais baixos (20% vinte por cento) – Possibilidade de alteração de preço de mercado – Dolo, má--fé e culpa punível não configurada – Apeloprovido (TRF 5ª R.) ..................................6740, 160

Licitação

• Administrativo – Licitação – Contrato de presta-ção de serviços – Efetivo mínimo – Obrigação constante do edital – Princípios da vinculação ao instrumento convocatório e da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro – Inob-servância – Inexecução parcial do contrato – Glosas aos pagamentos das faturas – Previsão editalícia – Legitimidade – sentença mantida(TRF 3ª R.) ...............................................6737, 143

miLitar

• Processo civil – Agravo de instrumento – Servi-dor militar temporário – Reintegração (TRF 3ª R.) ................................................................6738, 150

reSponSabiLidade civiL do eStado

• Ação de reparação de danos morais decorrentes de agressão física causada por paciente contra médica plantonista – Ocorrência de lesões que incapacitaram a vítima para o trabalho por duas semanas – Embriaguez causadora de incons-ciência não comprovada – Responsabilidade do município por evento danoso a servidor no exercício da função e no interior de estabele-cimento público – Cabimento de indenização por dano moral – Diferença entre a gravidade das condutas dos réus que deve ser sopesada na apuração do quantum indenizatório – Apela-ção municipal provida em parte – Apelação do réu não provida. (TJSP) ............................6741, 166

reSponSabiLidade púbLica

• Direito constitucional e direito processual civil – Indenização – Emenda da inicial – Art. 264, CPC – Tutela ao direito à saúde – Art. 196, CF – Cirurgia no exterior – Discenisia tardia – Existência de tratamento no país – Hospital das clínicas da FMUSP – Recurso desprovido(TRF 3ª R.) ...............................................6736, 124

Servidor púbLico

• Administrativo – Servidor – Auxílio-transporte – Transporte seletivo – Vedação de concessão – Ausência de apresentação dos bilhetes – Au-sência de comprovação de não atendimento por transporte coletivo convencional (TRF 2ª R.) ................................................................6735, 117

• Apelação cível – Constitucional e administrativo – Servidor público – Cumulação de cargos per-mitida constitucionalmente – Cargos considera-dos, isoladamente, para aplicação do teto remu-neratório – Precedentes do STJ – antecipação de tutela – possibilidade – Requisitos preenchidos – Sentença reformada (TRF 1ª R.) .............6734, 110

EMENTÁRIO

Assunto

ato adminiStrativo

• Ato administrativo – benefício indevido – erro da Administração Pública – decadência – configu-ração .......................................................6742, 173

• Ato administrativo – Ordem dos Advogados do Brasil – moção de repúdio e desagravo – lis-ta de autoridades – elaboração – ilegalidade ................................................................6743, 173

autarquia

• Autarquia – INSS – atendimento – agendamento prévio – necessidade – benefícios previdenciá-rios – requerimentos – limitação – possibilidade ................................................................6744, 175

246 ����������������������������������������������������������������������������������������������������� RSDA Nº 106 – Outubro/2014 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

autorização

• Autorização – validade expirada – retomada dobem – indenização – descabimento .........6745, 177

bem púbLico

• Bem público – doação a particular – exigênciaslegais – inobservância – anulação ............6746, 178

• Bem público – usucapião – sociedade de eco-nomia mista – pedido – impossibilidade jurídica ................................................................6747, 179

conceSSão

• Concessão – trecho oeste do rodoanel – crise financeira – equilíbrio econômico-financeiro – Fazenda – condenação – inadmissibilidade ................................................................6748, 180

concurSo púbLico

• Concurso público – Fundação Casa – candidato – fase de investigação social – desclassificação ................................................................6749, 181

• Concurso público – psicólogo – carga horá-ria semanal – decreto municipal – alteração ................................................................6750, 181

contrato adminiStrativo

• Contrato administrativo – município e advoga-dos – assinatura por extenso em todas as folhas – desnecessidade .....................................6751, 181

convênio

• Convênio – Município – inadimplência – no-vos contratos – celebração – impossibilidade – gestão anterior – responsabilidade – restrição– suspensão .............................................6752, 182

deSapropriação

• Desapropriação – rodovia – duplicação da rodo-via – indenização – convênio – DNER e DER/MG – solidariedade – indenização .................6753, 182

enSino

• Ensino – contrato de financiamento estudan-til – FIES – estudante – idoneidade cadastral – desnecessidade ........................................6754, 183

• Ensino – estudante – curso superior – concur-so – nomeação – antecipação de conclusão – possibilidade ...........................................6755, 183

improbidade adminiStrativa

• Improbidade administrativa – contratação irre-gular – remuneração – recebimento – trabalho – realização – ausência ............................6756, 185

• Improbidade administrativa – imóveis públicos – utilização – consentimento – prévia licitação– ausência ...............................................6757, 185

• Improbidade administrativa – indisponibilida-de de bens – conta corrente – bloqueio – verbaalimentar – liberação ...............................6758, 186

• Improbidade administrativa – prefeito – contra-tação de motorista – concurso – ausência – pa-gamento – recursos próprios – dano indireto – configuração ............................................6759, 189

Licitação

• Licitação – edital – violação – não comprovação– direito líquido e certo – ausência ..........6760, 190

mandado de Segurança

• Mandado de segurança – Estatuto do Desarma-mento – oficial de justiça avaliador – porte dearma – autorização – possibilidade ..........6761, 190

miLitar

• Militar – licença – transtornos esquizoafetivos – incapacidade definitiva – auxílio-invalidez ereparação por dano – descabimento ........6762, 191

• Militar – pensão – valores recebidos liminar-mente – decisão – revogação – ressarcimento aoErário – necessidade ................................6763, 192

• Militar – pensão especial – ex-combatente – le-gislação – data do óbito – condição econômica – perquirição – desnecessidade ...............6764, 193

proceSSo adminiStrativo

• Processo administrativo – demissão – advoga-do – ausência – prejuízo manifesto – nulidade ................................................................6765, 194

• Processo administrativo – pena de inidoneida-de para licitar e contratar com o Poder Públi-co – alegações finais – inexistência – anulação – possibilidade .........................................6766, 195

regiStro profiSSionaL

• Registro profissional – OAB – eleição – advo-gado inadimplente – votação – participação – possibilidade ...........................................6767, 196

reSponSabiLidade civiL do eStado

• Responsabilidade civil do Estado – casa do menor – menores abrigados – arremesso de objetos em casa vizinha – indenização devida ................................................................6768, 197

• Responsabilidade civil do Estado – CEF – conta vinculada ao FGTS – saque fraudulento – in-denização por dano material – descabimento ................................................................6769, 199

• Responsabilidade civil do Estado – hospital geral – diagnóstico equivocado – atendimento – de-mora – morte por infarto – dano moral e material– existência ..............................................6770, 199

• Responsabilidade civil do Estado – prisão du-rante o regime militar – filhos menores na épo-ca – dano moral – impossibilidade – prescrição quinquenal – ocorrência ..........................6771, 201

• Responsabilidade civil do Estado – veícu-lo – apreensão indevida – liberação – demora – indenização devida ...............................6772, 201

RSDA Nº 106 – Outubro/2014 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ����������������������������������������������������������������������������������������������������247 Servidão adminiStrativa

• Servidão administrativa – depósito insuficiente – imissão provisória na posse – impossibilidade ................................................................6773, 203

Servidor púbLico

• Servidor público – auxiliar de atividade de limpeza – desvio de função – motorista – dife-renças salariais devidas ............................6774, 203

• Servidor público – auxílio-alimentação – ser-vidores administrativos – equiparação – cabi-mento ......................................................6775, 203

• Servidor público – faltas não justificadas – feria-do estadual – descontos remuneratórios ..6776, 204

• Servidor público – lei complementar estadual – reajustes – lei de responsabilidade fiscal – viola- ção – inexistência ....................................6777, 204

• Servidor público – pensão por morte – redução– possibilidade .........................................6778, 205

• Servidor público – verbas salariais em atraso – Município – pagamento – responsabilidade ................................................................6779, 205

tranSporte

• Transporte – coletivo de passageiros – veículo de aluguel – Município recém-criado – regula-mentação – ausência – documentação – con-cessão ......................................................6780, 206

• Transporte escolar rural – programa estadual – repasse de recursos – suspensão – prestação decontas – ausência ....................................6781, 206

Seção EspecialJURISPRUDÊNCIA COMENTADA

Assunto

repaSSe de verbaS

• Fundo de participação dos municípios. Repar-tição constitucional das receitas tributárias. Participação dos municípios no produto da ar-recadação do ICMS (CF, art. 158, IV). PRODEC (Programa de Desenvolvimento da Empresa). Lei Catarinense nº 11.345/2000. Concessão, pelo estado, de incentivos fiscais e creditícios, com recursos oriundos da arrecadação do ICMS. Pretensão do município ao repasse integral da parcela de 25%, sem as retenções pertinentes aos financiamentos do Prodec. Controvérsia em torno da definição da locução constitucional “produto da arrecadação” (CF, Artigo 158, IV). Pretendida distinção, que faz o Estado de Santa Catarina, para efeito da repartição constitucional do ICMS, entre arrecadação (conceito contábil) e produto da arrecadação (conceito financeiro). Parcela de receita tributária (25%) que pertence,

por direito próprio, ao município. Consequente inconstitucionalidade da retenção determinada por legislação estadual (RE 572.762/SC, Ple-no). Direito do município ao repasse integral. Recurso de agravo improvido (Luís Rodolfo Cruz e Creuz, Jonathan Silva Rocha e Bruno Stefani Morais de Lima) ...........................6782, 208

Autor

LuíS rodoLfo cruz e creuz, Jonathan SiLva rocha e bruno Stefani moraiS de Lima

• Fundo de participação dos municípios. Repar-tição constitucional das receitas tributárias. Participação dos municípios no produto da ar-recadação do ICMS (CF, art. 158, IV). PRODEC (Programa de Desenvolvimento da Empresa). Lei Catarinense nº 11.345/2000. Concessão, pelo Estado, de incentivos fiscais e creditícios, com recursos oriundos da arrecadação do ICMS. Pretensão do município ao repasse integral da parcela de 25%, sem as retenções pertinentes aos financiamentos do PRODEC. Controvérsia em torno da definição da locução constitucional “produto da arrecadação” (CF, Artigo 158, IV). Pretendida distinção, que faz o Estado de Santa Catarina, para efeito da repartição constitucional do ICMS, entre arrecadação (conceito contábil) e produto da arrecadação (conceito financeiro). Parcela de receita tributária (25%) que pertence, por direito próprio, ao município. Consequente inconstitucionalidade da retenção determinada por legislação estadual (RE 572.762/SC, Ple-no). Direito do município ao repasse integral.Recurso de agravo improvido ..................6782, 208

CLIPPING JURÍDICO

• Alterações curriculares só devem ser aplicadas aos alunos que se matricularem após as mu-danças ...............................................................219

• Candidato prestes a ser nomeado em cargo pú-blico tem direito ao adiantamento da colação de grau ..............................................................235

• Certidão de tempo sem descrição de atividade exercida por dentista não vale para pontuação em concurso ......................................................237

• Confirmada decisão para manter integridade de hospital universitário da USP .............................233

• Contratação sem concurso é nula e só gera direito a salários e FGTS ...............................................238

• Decisão decreta indisponibilidade de bens deex-empregado público por improbidade ...........221

• DNIT é responsável por acidentes decorrentes de falta de manutenção em rodovias ......................231

• Estado deve custear cirurgia em joelho de pa-ciente ................................................................233

• Estado deve fornecer cadeira de rodas para pa-ciente com distrofia muscular ............................232

248 ����������������������������������������������������������������������������������������������������� RSDA Nº 106 – Outubro/2014 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

• Estado deverá matricular alunos em escola próxima à residência .........................................225

• Estado tem de pagar servidora comissionada de-mitida quando estava grávida ............................235

• Estado terá de indenizar filhos de detento morto em penitenciária ................................................219

• Estudante com bronquite terá direito a transpor-te escolar na porta de casa .................................239

• Evolução patrimonial não explicada configuraato de improbidade ...........................................241

• Ex-secretário de Saboeiro tem direitos políticossuspensos e deve pagar multa de R$ 60 mil .......226

• Ex-servidora precária receberá indenização por ter sido dispensada durante licença-mater-nidade ...............................................................222

• Filhos de policial morto em acidente vão receber pensão e indenização ........................................230

• Grávida não pode ser demitida mesmo em con-trato temporário .................................................220

• Indeferimento de estágio a aluno por débito de uma disciplina fere o princípio da razoabilidade ..........................................................................232

• Município de Goiânia terá de incluir netas sobguarda da avó no plano de previdência dela .....221

• Município terá de fornecer suplemento alimen-tar a bebê portador de refluxo ............................236

• Ocorrendo desapropriação indireta, a União éobrigada a indenizar o proprietário ....................234

• Paciente que ingeriu soda cáustica tem de rece-ber remédios do Poder Público ..........................229

• PM que adquiriu transtorno afetivo bipolar será indenizado pelo Estado ......................................228

• Políticos são condenados por vender lote público ..........................................................................224

• Portador de hanseníase submetido a isolamen-to até 1986 tem direito à pensão vitalícia .........227

• Procedimento administrativo não pode restrin-gir a acumulação legal de dois cargos públicos ..........................................................................223

• Projeto regulamenta participação da União emlucros do petróleo no regime de partilha ...........240

• Proposta aumenta prazo para estudante forma-do começar a pagar o Fies .................................234

• Receita Federal pode quebrar sigilo bancáriosem necessidade de autorização judicial ...........224

• Títulos podres da dívida pública não podem ser usados para abater impostos ..............................226

• Tribunal afasta limite máximo de horas para acumulação de cargos públicos .........................227

• Turma confirma dever do Estado de indeni-zar por omissão no cuidado de via pública........230

• União federal terá que pagar indenização por dano moral a idoso humilhado em hospital pú-blico ..................................................................240

• Universidade é obrigada a conceder diploma àaluna inadimplente ............................................236

RESENHA LEGISLATIVA

LeiS

• Lei nº 13.026, de 03.09.2014 ............................242

• Lei nº 13.025, de 03.09.2014 ............................242

• Lei nº 13.024, de 26.08.2014 ............................242