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Revista SÍNTESE Direito Administrativo ANO X – Nº 117 – SETEMBRO 2015 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Tribunal Regional Federal da 1ª Região – 610‑2 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – 1999.02.01.057040‑0 Tribunal Regional Federal da 3ª Região – 18/2010 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – 07/0042596‑9 Tribunal Regional Federal da 5ª Região – 10/07 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Mayara Ramos Turra Sobrane CONSELHO EDITORIAL Alexandre de Moraes, Carlos Ari Sundfeld, Fernando Dantas Casillo Gonçalves, Ivan Barbosa Rigolin, Ives Gandra da Silva Martins, Kiyoshi Harada, Maria Garcia, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Misabel de Abreu Machado Derzi, Odete Medauar, Sidney Bittencourt, Toshio Mukai COMITÊ TÉCNICO Elisson Pereira da Costa, Elói Martins Senhoras, Hélio Rios Ferreira, Luís Rodolfo Cruz e Creuz COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Bruno Sá Freire Martins, Ivani Contini Bramante, José Carlos Pacheco de Almeida, Luciano Elias Reis, Luiz Eugenio Scarpino Jr., Maria Garcia, Sebastião Sérgio da Silveira, Thayse Stieven Fleck ISSN 2179-1651

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Revista SÍNTESEDireito Administrativo

Ano X – nº 117 – Setembro 2015

repoSitório AutorizAdo de JuriSprudênciATribunal Regional Federal da 1ª Região – 610‑2

Tribunal Regional Federal da 2ª Região – 1999.02.01.057040‑0Tribunal Regional Federal da 3ª Região – 18/2010

Tribunal Regional Federal da 4ª Região – 07/0042596‑9Tribunal Regional Federal da 5ª Região – 10/07

diretor eXecutivo

Elton José Donato

Gerente editoriAl e de conSultoriA

Eliane Beltramini

coordenAdor editoriAl

Cristiano Basaglia

editorA

Mayara Ramos Turra Sobrane

conSelho editoriAl

Alexandre de Moraes, Carlos Ari Sundfeld, Fernando Dantas Casillo Gonçalves,Ivan Barbosa Rigolin, Ives Gandra da Silva Martins, Kiyoshi Harada, Maria Garcia,

Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Misabel de Abreu Machado Derzi,Odete Medauar, Sidney Bittencourt, Toshio Mukai

comitê técnico

Elisson Pereira da Costa, Elói Martins Senhoras, Hélio Rios Ferreira, Luís Rodolfo Cruz e Creuz

colAborAdoreS deStA edição

Bruno Sá Freire Martins, Ivani Contini Bramante, José Carlos Pacheco de Almeida, Luciano Elias Reis, Luiz Eugenio Scarpino Jr.,

Maria Garcia, Sebastião Sérgio da Silveira, Thayse Stieven Fleck

ISSN 2179-1651

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2006 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação mensal de doutrina, jurisprudência, legislação e outros assuntos de Direito Administrativo.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec‑tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e‑mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Revista Síntese Direito Administrativo – v. 1, nº 1 (jan. 2006) Nota: Continuação da REVISTA IOB de DIREITO ADMINISTRATIVO

São Paulo: IOB, 2006‑.

v. 10, nº 117; 16 x 23 cm

Mensal ISSN 2179‑1651

1. Direito administrativo.

CDU 342.9 CDD 341.3

Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.iobfolhamatic.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

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Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

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Carta do Editor

Nesta edição da Revista SÍNTESE Direito Administrativo abordamos, no Assunto Especial, o tema “Terceirização na Administração Pública”.

Tal questão é polêmica já que a Súmula nº 331 do TST prevê que a Ad-ministração Pública será responsável subsidiariamente em casos de inadimple-mento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, em contrapartida o art. 71, § 1º da Lei nº 8.666/1993 prevê que a inadimplência do contratado com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento.

Em 24.11.2010, na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC 16/DF) ajuizada pelo Distrito Federal, o Plenário do STF entendeu pela constitucionali-dade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993.

Com tal decisão, houve modificação no teor da referida Súmula, res-saltando que a Administração Pública será responsável nas hipóteses em que ficar comprovada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. Referida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

Para compor o Assunto Especial selecionamos quatro artigos, destacando o artigo intitulado “Terceirização, Uma Nova Classe de Trabalhadores? Aspec-tos Constitucionais da Súmula nº 331 do TST”, elaborado pela renomada Pro-fessa, Livre-Docente pela PUC/SP, Maria Garcia, integrante do nosso Conselho Editoral. Além de uma íntegra do TRF 5ª Região e do ementário criteriosamente selecionado.

Na Parte Geral publicamos dois artigos com temas vinculados ao Direito Administrativo, sendo eles: “O Nepotismo na Administração Pública Municipal e a Súmula Vinculante nº 13 do STF”, elaborado pelo Advogado José Carlos Pacheco de Almeida; e “Lei de Acesso à Informação: Transparência Gover-namental a Serviço do Cidadão”, elaborado Mestre e Professor Luiz Eugenio Scarpino Jr. e Doutor e Professor Sebastião Sérgio da Silveira

Ainda, na Parte Geral, publicamos seis Acórdãos na Íntegra (TRF 1ª R., TRF 2ª R., 3 TRF 3ª R. e TRF 4ª R.) e o ementário com os valores agregados.

Por fim, contamos com a Seção Especial “Acontece”, na qual temos o artigo “As Mudanças na Previdência Social Afetam os Servidores dos Estados e Municípios?” elaborado pelo Advogado, Pós-Graduado em Direito Público e Direito Previdenciário.

Tenham todos uma ótima leitura!

Eliane Beltramini

Gerente Editorial e de Consultoria

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Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ......................................................................7

Assunto Especial

Terceirização na adminisTração Pública

douTrinas

1. Terceirização, Uma Nova Classe de Trabalhadores? Aspectos Constitucionais da Súmula nº 331 do TSTMaria Garcia .............................................................................................9

2. A Aparente Derrota da Súmula nº 331/TST e a Responsabilidade do Poder Público na TerceirizaçãoIvani Contini Bramante............................................................................19

3. Terceirização na Administração Pública: Breves Reflexões CríticasLuciano Elias Reis ...................................................................................48

4. A Súmula nº 331 do TST e a Responsabilidade da Administração PúblicaThayse Stieven Fleck ...............................................................................59

JurisPrudência

1. Acórdão na Íntegra (TRF 5ª R.) ................................................................78

2. Ementário ................................................................................................91

Parte Geral

douTrinas

1. O Nepotismo na Administração Pública Municipal e a Súmula Vinculante nº 13 do STFJosé Carlos Pacheco de Almeida ...........................................................100

2. Lei de Acesso à Informação: Transparência Governamental a Serviço do CidadãoLuiz Eugenio Scarpino Jr. e Sebastião Sérgio da Silveira ........................124

JurisPrudência

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .................................................140

2. Tribunal Regional Federal da 2ª Região .................................................148

3. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .................................................161

4. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .................................................176

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5. Tribunal Regional Federal da 3ª Região .................................................182

6. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .................................................188

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência de Direito Administrativo .........................194

Seção EspecialaconTece

1. As Mudanças na Previdência Social Afetam os Servidores dos Estados e Municípios?Bruno Sá Freire Martins .........................................................................224

Clipping Jurídico ..............................................................................................230

Resenha Legislativa ...........................................................................................243

Bibliografia Complementar ..................................................................................244

Índice Alfabético e Remissivo ...............................................................................245

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Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Re-vista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remuneração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da SÍNTESE.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-

co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.a

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

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Assunto Especial – Doutrina

Terceirização na Administração Pública

Terceirização, Uma Nova Classe de Trabalhadores? Aspectos Constitucionais da Súmula nº 331 do TST

MARIA GARCIAProfessora Associada Livre‑Docente da PUC/São Paulo, Professora de Direito Constitucional, Direito Educacional e Biodireito Constitucional, Coordenadora do Programa de Direito Cons‑titucional da Pós‑Graduação da PUCSP, Professora de Biodireito/Bioética do Centro Univer‑sitário Assunção – Unifai, Membro da CoBi, Comissão de Bioética do HCFMUSP, Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo/IASP, Procuradora do Estado de São Paulo (IPESP), Ex‑Assistente Jurídico da Reitoria da USP, Membro‑Fundador e atual Diretora Geral do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional (IBDC), Coordenadora da Revista de Direito Constitucional e Internacional (Editora Revista dos Tribunais), Diretora do Núcleo de Pesquisas do Instituto dos Advogados de São Paulo/IASP (2013/2015), Membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas (Cadeira Enrico T. Liebman), Membro da Comissão Especial da Reforma Política, OAB/SP (2013/2015), Membro da Comissão de Ensino Jurídico, OAB/SP (2013/2015), Asso‑ciada Honorária do Conpedi, Membro do Conselho Deliberativo do Instituto dos Advogados de São Paulo – IASP (triênio 2015‑2017), Membro do Conselho Superior de Direito da Federação do Comércio – Fecomércio.

RESUMO: Cuida‑se da análise da Súmula nº 331 do TSE e da chamada “terceirização” perante os direitos dos trabalhadores.

PALAVRAS‑CHAVE: Terceirização; princípios; direitos constitucionais.

ABSTRACT: On treat about Súmula 331/TST and the named “terceirização”, in front of worker’s rights.

KEYWORDS: “Terceirização”; workers; constitutional; principles rights.

SUMÁRIO: 1 A questão, a partir da ADC 16; 2 Retomando o voto de Ayres Britto; 3 Trabalho e Ter‑ceirização; 4 O princípio da segurança jurídica; 5 Fundamentos da Ordem Econômica e Financeira: o artigo 170 da Constituição; Referências.

1 A queStão, A pArtIr dA AdC 16

Um resumo da questão, no estudo de Ivani C. Bramante1, refere a ação direta de declaração de constitucionalidade do art. 71 da Lei de Licitações (Lei nº 8.666/1993), concluída pela procedência, por maioria de votos, no sentido

1 A aparente derrota da Súmula nº 331/TST e a responsabilidade do Poder Público na terceirização. Revista SínteSe, p. 7 e ss., n. 266/2011.

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de que “o comando geral prevê que o inadimplemento das obrigações trabalhis-tas na terceirização não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento”.

Com efeito, o mencionado dispositivo registra “não transfere”, isto é, o inadimplemento da empresa contratada não tem o condão de transmitir ou “ce-der a outrem”, “transpassar”, “deslocar”, “mudar de lugar para outro”, “transfe-rir” os significados comuns do termo2.

Contudo, não compete à lei ordinária dispor sobre competências ou atri-buições, nem imunidades da Administração Pública, somente a própria Cons-tituição. Correto quanto ao uso do verbo “transferir”, falha o dispositivo em adentrar tais assuntos no seu mérito.

A Constituição, sim, demarca a responsabilidade “pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causaram a terceiros [...]” e aqui, adentra-se toda a problemática da terceirização de serviços e obras e toda a sua amplitude.

José Pastore tem apresentado análises dos mais diversos enfoques sobre terceirização:

A produção moderna é realizada por meio de constelações de empresas e de pessoas nas quais há a mais variada teia de relações de trabalho. Alguns dos protagonistas são empregados fixos da empresa principal; outros, de empresas contratadas (como pessoas jurídicas) para realizar determinados serviços (tercei-rizados). Há ainda os autônomos que trabalham na empresa principal ou nos seus redutos, inclusive em casa.

O que mais importa nessa teia de relações? Seguramente, que todos tenham proteções trabalhistas e previdenciárias plenamente garantidas. Assegurada essa condição, pouco interessa se a atividade é definida como meio ou fim.3

Esclarece Tercio Sampaio Ferraz4:

O que se pode dizer diante das complexas sociedades contemporâneas é que a diferenciação social crescente torna duvidosa a antiga conexão entre a inte-gração de um complexo de ação e a justificação deste complexo por meio do conceito de fim. [...] Na verdade, porém, mesmo quando acentuamos os fins do Estado, não se pode ignorar que a pura racionalidade dos fins como única forma programática fracassa, quando o subsistema político de uma sociedade se dife-rencia e se torna autônomo.

A autonomia da Administração Pública não depende da mera fixação de meios mas da correlata fixação dos fins. Ou seja, sua autonomia não repousa nem nos chamados fins do Estado nem no automatismo dos meios, mas na possibilidade

2 Dicionário Básico da Língua Portuguesa. Folha/Aurélio, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988.3 A real prioridade na terceirização. O estado de S. Paulo, 15.03.2011. p. B2.4 A relação meio/fim na Teoria Geral do Direito Administrativo. RDP, n. 61, p. 27 e ss.

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de uma autoprogramação de suas decisões por intermédio de uma adequada combinação das técnicas finalista e condicional.

“No dia a dia, porém”, prossegue José Pastore5, sabe-se que há contra-tantes que desrespeitam os direitos dos trabalhadores. Isso é grave e intolerável.

Para mudar esse quadro, o País precisa de uma lei que promova o respeito e puna o desrespeito. Isso nada tem a ver com atividade – meio ou fim, mesmo porque, na prática, é impossível diferenciá-las. E, mesmo que torne possível, essa distin-ção não tem o menor interesse para a proteção dos trabalhadores.

Ainda recentemente6, manifesta-se novamente sobre o assunto:

É inacreditável. O Congresso Nacional discute há 17 anos o tema da terceiriza-ção e até hoje não conseguiu regularizar a matéria.

[...] O tema da terceirização foi suficientemente debatido entre nós. O Projeto de Lei nº 4.330, que tramita no Congresso Nacional desde 2004, já passou por inúmeras avaliações. Não é o projeto dos meus sonhos. Mas ele garante as prote-ções de que os trabalhadores necessitam e da segurança jurídica a quem contrata seus serviços.

As proteções ali contidas vão muito além da CLT e a Súmula 331 do TST.

[...] a nova lei afastará os aventureiros que hoje se valem do vazio da legislação para contratar trabalho de modo desumano, precário e indigno.

Monica B. de Bolle7 registra o relatório “The changing nature of jobs”, da OIT (Organização Internacional do Trabalho), “que trata das mudanças ocorri-das no mercado de trabalho na última década, a partir da ótica de 180 países. A conclusão: o mercado de trabalho está em processo de rápida transformação, que deverá se aprofundar nos próximos anos”.

[...] O relatório da OIT não é uma ode à terceirização. Ele expõe os riscos asso-ciados às novas relações de trabalho [...] Para fazer frente aos novos desafios, é preciso reformular as redes de segurança do trabalhador e repensar a regulação do mercado de trabalho.

[...] Entra o PL 4.330. A realidade do mercado de trabalho brasileiro mudou. Portanto a choradeira dos sindicatos é irrelevante, assim como as afirmações simplórias dos empresários. Não há evidência de que a terceirização aumente empregos. O que há, conforme atesta a OIT, são evidências de que as novas re-

5 Loc. cit., 15.03.2011.6 Terceirização – será que agora vai? O estado de S. Paulo, 24.03.2015, p. B2. “Lembro-me bem do Projeto de

Lei nº 4.302, apresentado pelo Poder Executivo em 1998. As discussões foram infindáveis. O projeto passou na Câmara dos Deputados, foi ao Senado, voltou à Câmara e ali morreu. Depois disso, o assunto foi objeto de várias proposituras. Até hoje, nada”.

7 BOLLE, Monica B. de. A confusão da terceirização. Folha de S. Paulo, p. A19, 21.05.2015.

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12 ��������������������������������������������������������������������������������������������������RSDA Nº 117 – Setembro/2015 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

lações de trabalho aumentam a competitividade e a produtividade das empresas – no Brasil, precisamos urgentemente das duas coisas.

2 retomANdo o voto de AyreS BrItto

Conforme anteriormente exposto, durante o julgamento da ADC 16, o Ministro Ayres Britto deixou claro: “Só há três formas constitucionais de contra-tação de pessoal no setor público: por concurso, por nomeação para cargo em comissão e por contratação por tempo determinado, para suprir necessidade temporária”.

A terceirização nos serviços públicos independe da distinção entre ativi-dade/meio e atividade/fim, porquanto a situação até agora verificada do chama-do trabalhador terceirizado atenta contra a Constituição, em vários princípios: igualdade, segurança e moralidade, basicamente.

Não importa, efetivamente, a categoria do serviço prestado (vigilância, limpeza, portaria, telefonia, recepção e outros); trata-se de serviço público na sua avaliação e finalidade.

“Em sentido muito lato”, refere Diogo de Figueiredo Moreira Neto8 que “todas as atividades que o Estado desempenha são serviços públicos e é neste sentido que os administrativistas costumam dizer que seria esta a única (Gaston Jèze) ou a primordial (Léon Duquit) atividade do Estado”.

Contudo, distinguindo certas atividades administrativas, o autor exclui as atividades legiferante e judicante, conceituando serviços públicos como “ativi-dade da Administração que visa a assegurar, de modo permanente, contínuo e geral, a satisfação das necessidades essenciais ou secundárias da coletividade, assim, pois, a lei considerada, e sob as condições impostas unilateralmente pela própria Administração”.

Assim registra Lucia Valle Figueiredo:

Serviço público é toda atividade material fornecida pelo Estado, ou por quem esteja a agir no exercício de função administrativa se houver permissão constitu-cional e legal para isso, com o fim de implementação de deveres consagrados, constitucionalmente relacionados à utilidade pública, que deve ser concretizada sob regime prevalente de Direito Público.9

Referindo que o conceito não é uniforme na doutrina, “que ora nos ofere-ce uma noção orgânica, só considerando como tal o que é prestado por órgãos públicos; ora nos apresenta uma conceituação formal, tendente a identificá--lo por características extrínsecas; ora nos expõe um conceito material visando

8 Curso de direito administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1989, Cap. XVI, p. 366.9 Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 77.

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defini-lo por seu objeto”. Propõe Hely Lopes Meirelles10: “Serviço público é todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade, ou simples conveniências do Estado”.

Qualquer que seja o ângulo pelo qual se examine a questão, conclui-se que, subjacente às atividades estatais, encontram-se serviços de apoio que as integram, permanente e continuamente, como parte do serviço público presta-do pelo ente estatal.

3 trABAlho e terCeIrIzAção

As diretrizes da Administração Pública de um país refletem a sua filosofia domi-nante de sociedade e de governo.

(S. H. Jameson)11

Em estudo comemorativo dos 25 anos da Constituição de República e 70 anos da Consolidação das Leis do trabalho (2013), Cláudio Janotti da Rocha12 ressalta:

As revoluções industriais mudaram a sociedade, retirando o homem do campo e levando-o para a cidade em condições precárias e abaixo de qualquer padrão mínimo. [...] Acabaram dando origem ao porte fático para a relação de emprego, composta pelos elementos fático-jurídicos: trabalho prestado por pessoa física, onerosidade, subordinação, habitualidade e pessoalidade.

Com o denominado Estado Social de Direito, no século XX, os direitos sociais, econômicos e culturais – entre os quais o Direito do Trabalho, distin-guindo-se em direito individual e direito coletivo, conforme Jorge Luíz Souto Maior13:

Desse modo, e por consequência da lógica inserida no direito social, o pressu-posto teórico fundamental do direito do trabalho é o de que sirva como instru-mento da melhoria da condição econômica e social do trabalhador. Toda a racio-nalidade ligada ao direito do trabalho, cientificamente considerada, deve partir desse pressuposto e a ele servir, não para estabelecer verdades incontestáveis e eternas, mas para propor problemas a serem superados.

Destaca o autor as novas diretrizes constitucionais para os direitos traba-lhistas, a partir da Carta Magna de 1988 e, conforme Gabriela Neves Delgado,

10 Direito administrativo brasileiro. Revista dos tribunais, São Paulo, 1977, p. 295 -296.11 “Que é Administração Pública?” Fundação Getúlio Vargas, 1962, Prefácio.12 Uma leitura histórica quanto ao Constitucionalismo dos Direitos Trabalhistas no Brasil e sua importância na

vigente ordem democrática. Revista SínteSe, n. 309, março/2015, p. 82 e ss.13 Idem, p. 91-92.

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“alterando significativamente o conteúdo primário da CLT e sua arquitetura ori-ginal”. “[...] Portanto, a partir da promulgação da Constituição da República de 1988, o direito e o processo do trabalho passaram a ficar submetidos às diretri-zes constitucionais e, assim, tanto as normas legais infraconstitucionais como as convencionais devem respeitar a ordem constitucional”.

Cabe então indagar, em conclusão: os trabalhos terceirizados estariam excluídos da condição constitucional de trabalho no Brasil?

A questão vem do Direito romano: “Quid prodest?” A quem aproveita tal situação de uma “segunda classe” de trabalhadores no Brasil?

4 o prINCípIo dA SegurANçA jurídICA

Dispõe o art. 5º, caput, da Constituição: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estran-geiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igual-dade, à segurança e à propriedade”.

A quem refere esse pronome reflexivo se? Ao Estado, em especial, e a todos nós, enquanto sociedade.

O direito à segurança tem apoio no princípio da segurança jurídica, con-forme Canotilho14:

Partindo da ideia de que o homem necessita certa segurança para conduzir, pla-nificar e conformar autônoma e responsavelmente a sua vida, desde cedo se considerou como elementos constitutivos do Estado de direito os dois princípios seguintes:

– o princípio da segurança jurídica

– o princípio da confiança do cidadão.

[...] os princípios da proteção da confiança e da segurança jurídica podem formu-lar-se assim: o cidadão deve poder confiar em que aos seus actos ou às decisões públicas incidentes sobre seus direitos, posições jurídicas e relações, praticados de acordo com as normas jurídicas vigentes, se ligam os efeitos jurídicos dura-douros, previstos ou calculados com base nessas mesmas normas.

No caso, portanto, todo trabalhador, no território brasileiro, deverá ter a segurança da igualdade de direitos, perante a lei, com os demais trabalhadores. Tertíum non datur.

Em consequência, tende a justificar-se a orientação consubstanciada na Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, porquanto o Estado deve ga-rantir o atendimento aos princípios da igualdade, da segurança e da moralidade

14 CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional. Coimbra: Almedina, 1991. p. 375 e ss.

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administrativa com referência aos trabalhadores “terceirizados” no sentido do que inseja o § 6º do art. 37: os agentes públicos são responsáveis pela fiscaliza-ção das empresas contratadas “para suprir necessidade temporária”, no atendi-mento aos direitos trabalhistas e previdenciários dos empregados destas, “asse-gurado o direito de regresso contra o responsável nas casos de dolo ou culpa”.

O Estado deve garantir, é dizer, o Estado tem responsabilidade pelo cum-primento das leis pelos seus destinatários, no caso, as empresas contratadas. É o que decorre dos princípios-vetores sob análise.

Daí poder-se concluir, nesta parte, que a Súmula nº 331 do TST não apresenta vício de inconstitucionalidade: diante da situação de tantos anos, da chamada “terceirização”, procura garantir direitos aos trabalhadores.

5 FuNdAmeNtoS dA ordem eCoNômICA e FINANCeIrA: o ArtIgo 170 dA CoNStItuIção

Os princípios estabelecidos no art. 170 da Constituição representam va-lores constitucionais balizadores da atividade econômica “fundada na valoriza-ção do trabalho humano e na livre iniciativa”, tendo por finalidade “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”.

Daí as cláusulas trabalhistas e previdenciárias asseguradas a todos os tra-balhadores as quais representam, precisamente, o que Robert Castel15 explica como “a propriedade de transferência”: uma “propriedade” para a segurança, direito estabelecido no art. 5º, caput, da Constituição, como visto.

A propriedade de transferência tem uma “função essencial na sociedade industrial: preservar a classe operária da destituição social”, uma vez que o tra-balhador não conta com outro patrimônio senão a força do seu trabalho físico e/ou intelectual.

E o Estado constitui-se fiador, corresponsável dessas verbas, e diante da gestão das contribuições do contrato securitário que se perfecciona pelo exer-cício da atividade laboral: sobrepondo-lhe “um sistema de prestações públicas que garante a seguridade social”16.

Conforme exposto, o art. 170 reporta-se, expressamente, ao princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado (art. 1º, III), aludindo ao

15 As metamorfoses da questão social. Uma crônica do salário. Petrópoles: Vozes, 1998. p. 396-397, 405.16 “O capitalismo realiza aí uma estranha operação de alquimia. Os poderes da propriedade são conservados.

O direito está ligado ao depósito da cotização, é o que lhe dá seu caráter incondicional, diferentemente do direito ao socorro: como pagou, o cotizador é um detentor de direito no sentido absoluto e não importa o que lhe aconteça – mesmo se não tem ‘necessidade’ de sua prestação, para sobreviver, se é por exemplo, rico proprietário ao mesmo tempo que aposentado. Assim, essa propriedade de transferência não é incompatível com a propriedade clássica. [...] O Estado Social encontra aí uma função específica. É, poder-se-ia dizer, o fiador da propriedade de transferência. Assim, o Estado modela para si um papel novo e completamente original que lhe permite dominar o antagonismo absoluto entre a defesa apaixonada da propriedade ‘burguesa’ e os programas socialistas visando à sua apropriação.” (p. 406-407).

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direito à existência digna – e estabelece à ordem econômica “fundada na valo-rização do trabalho humano” “os ditames da justiça social”.

O art. 193, alusivo à ordem ou organização social, dispõe “como base o primado do trabalho”, objetivando “o bem-estar e a justiça sociais”.

“Justiça Social” refere a Constituição (arts. 170 e 193).

Sobre a Justiça, a Filosofia tem-se ocupado há séculos representando, a demais, o ideal do Direito.

“Ao lado da Justiça Geral, Aristóteles arrola a Justiça Particular”, anota Ricardo Castilho17, ao analisar os diferentes níveis de Justiça.

A Justiça Particular adota critérios distintos daqueles de que se vale a Justiça Ge-ral para a definição do justo e do injusto. Ao passo que estes se caracterizam, na Justiça Geral, como conformação ou não-conformação à lei, na Justiça Particular o que distingue justo e injusto é a igualdade entre dois ou mais sujeitos de uma relação. Levando em consideração que a igualdade pode ser tanto absoluta (arit-mética) quanto proporcional (geométrica), Aristóteles concebe dois subtipos de Justiça Particular, já mencionados: Justiça Corretiva e Justiça Distributiva.

A Justiça Distributiva, explica, “tem como campo de aplicação um tipo de atividade social bem definido. Enquanto a justiça geral ordena a toda a vida social, por meio da lei, a justiça distributiva conforma tão somente o processo de distribuição pública de bons e encargos da comunidade”.

Por influência da doutrina de Tomás de Aquino, a partir da segunda me-tade do século XIX inicia-se o trabalho de “pensadores ligados à Igreja Católica, como forma de empreender uma reanálise do problema da fundamentação e da conformação das relações entre indivíduo, sociedade civil e Estado”. “O res-surgimento do pensamento aristotélico-tomista, neste sentido, teve como razão primordial a necessidade de oferecimento de uma concepção passível de ser contraposta aos postulados do liberalismo político e econômico então vigen-tes”, refere, citando Montoro. “Da mesma maneira”, acrescenta, “serviu como alternativa ao incipiente socialismo marxista, que também fora alvo de críticas por parte desta nova corrente”.

[...] A Justiça Legal tomista que tinha como cerne a Justiça de toda a lei, em decorrência única de seu papel de promovedora do Bem Comum, passa, por forçadas novas conformações igualitárias da sociedade, a ser pensada como es-pécie de Justiça focada nos destinatários da consagração da equânime relevância social: a própria comunidade em seus membros. Em consequência dessa trans-formação, altera-se a denominação de tal modalidade de Justiça, que passa a ser conhecida pela nomenclatura de Justiça Social.

17 Justiça social e distributiva. Desafios para concretizar direitos sociais. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 20-21, 33, 36-37.

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[...] Sintetizando a noção de solidariedade social, ao mesmo tempo que de igual-dade na lei e perante a lei, a Justiça Social tinha também por fundamento garantir a consecução do bem de todas as pessoas, consideradas não em suas indivi-dualidades, mas sim como membros de um todo social harmônico, voltado à cooperação mútua para a realização da felicidade geral. Aí está embutida a firme ideia de dignidade, inerente a toda a humanidade (em substituição à ideia pré--moderna de honra), como único parâmetro de avaliação do homem condizente com a igualdade liberal.18

Nesse contexto encontramos o conceito de Estado, por Dalmo Dallari, como a “ordem jurídica soberana cuja finalidade é o bem comum de um povo, situado em determinado território” – precisamente a completude da Justiça So-cial, sendo bem comum entendido, conforme João XXIII, “o conjunto de todas as condições de vida social que consintam e favoreçam o desenvolvimento integral da personalidade humana”19.

Nas determinações constitucionais do “bem-estar e justiça sociais” (art. 193) e da “existência digna, conforme os ditames da justiça social” (art. 170) a todos asseguradas, estão incluídos os trabalhadores “terceirizados” – eliminando-se de vez tal denominação, claramente conflitante com a Cons-tituição da República, estendida a esses trabalhadores a mesma segurança dos direitos trabalhistas e previdenciários de todos os demais, via lei expressa, via hermenêutica constitucional, dos princípios e regras estabelecidos.

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FERRAZ, Tércio Sampaio. A relação meio/fim na Teoria Geral do Direito Administrativo. Revista de Direito Público, n. 61.

18 “ A identificação da Justiça Social como sucessora da Justiça Legal tomista não é pacífica, havendo autores que querem ver as origens daquele conceito em outras linhas de pensamento. Esta interpretação, todavia, não merece prosperar, segundo Montoro, posto que a Justiça Geral, Justiça Legal e Justiça Social são, todas, desenvolvimento de um conceito único, que guarda um objeto específico, comum a todas elas: a promoção e a manutenção do Bem comum”. (p. 37)

19 elementos de teoria Geral do estado. S. Paulo: Saraiva, 2012. p. 112, 122.

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Assunto Especial – Doutrina

Terceirização na Administração Pública

A Aparente Derrota da Súmula nº 331/TST e a Responsabilidade do Poder Público na Terceirização

IVANI CONTINI BRAMANTEDesembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, Mestre e Doutora pela Ponti‑fícia Universidade Católica de São Paulo, Especialista em Relações Coletivas de Trabalho pela Organização Internacional do Trabalho, Professora de Direito Coletivo do Trabalho e Direito Previdenciário do Curso de Graduação da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, Coordenadora do Curso de Pós‑Graduação em Direito das Relações do Trabalho da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, Ex‑Procuradora do Ministério Público do Trabalho.

SUMÁRIO: Introito; (In)constitucionalidade em abstrato e em concreto; Eficácia erga omnes e efeitos vinculantes na ação direta de constitucionalidade; Limites subjetivos; Limites objetivos e os “fun‑damentos determinantes da decisão” declaratória de constitucionalidade; Efeitos vinculantes dos “fundamentos determinantes da decisão de constitucionalidade” e os vários sentidos da norma; Razões de excepcionalidade não previstas pela própria regra; Transcendência dos motivos determi‑nantes; Texto e contexto: precedentes do STF e estudo de casos; ADC 16 (artigo 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993); A derrota aparente da Súmula nº 331/TST na ADC 16/DF; A cláusula de reserva de Plenário e a Súmula nº 331/TST; (Re)posicionamento do Judiciário Trabalhista; Julgamentos do TST pós‑ADC 16; Conclusão; Referências.

INtroIto

Estes apontamentos versam sobre a aparente derrota da Súmula nº 331/TST diante dos efeitos da declaração de constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 na ADC 16/DF. Ainda, diante dos efeitos dos julgamentos fei-tos nas várias das reclamações constitucionais afastando a aplicação da Súmula nº 331/TST em relação à Administração Pública.

O col. Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária ocorrida em 24.11.2010, na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC 16/DF) ajuiza-da pelo Distrito Federal, em relação a qual ingressaram como amicus curiae a União e diversos outros entes da Federação, entendeu pela constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993.

O entendimento fixado na ADC 16/DF culminou no provimento das inúmeras reclamações constitucionais (entre elas as RCLs 7517 e 8150) contra

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decisões do TST e de Tribunais Regionais do Trabalho, fundadas na Súmula nº 331/TST, objeto da controvérsia, ao espeque de que o verbete nega vigên-cia ao preceito da Lei de Licitações. Deste modo, foi afastada a aplicação do verbete que trata da responsabilidade subsidiária pelos débitos trabalhistas na terceirização em relação à Administração Pública direta e indireta.

Ainda, as RCLs 7901, 7711, 7712 e 7868 foram providas, com cassação de quatro decisões do Tribunal Superior do Trabalho (TST), baseadas na Súmula nº 331 (inciso IV), por conta de outro fundamento: a súmula, indiretamente, reconhece a inconstitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993, sem a observância da cláusula da reserva de Plenário, em ofensa ao art. 97 da CF e à autoridade da Súmula Vinculante nº 10 do STF.

Na problematização do tema, as questões a serem postas são as seguin-tes: houve uma derrota da Súmula nº 331/TST? Doravante, o Judiciário Traba-lhista acha-se incondicionalmente inibido, nos casos concretos postos a seu julgamento, de fixar a responsabilidade subsidiária da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, das suas Autarquias, das fundações, das em-presas públicas e das sociedades de economia mista pelos serviços terceirizados contratados? Há um discreto retorno da teoria da irresponsabilidade estatal dos idos do Estado autoritário? Como deve ser redirecionada a questão no Judiciá-rio Trabalhista à luz das regras e princípios constitucionais diante de um caso concreto?

Por isso, é importante analisar os referidos julgamentos, que se revestem de grande interesse prático, máxime porque a Constituição de 1988 está repleta de enunciados normativos que não podem prescindir dos métodos da tópica e sistemático-teleológico para que possam ser adequadamente interpretados e aplicados.

Convém, assim, analisar a posição atual do STF quanto às diferenças entre a declaração de constitucionalidade in abstrato e in concreto e seus res-pectivos efeitos, para fins de (re)posicionamento do Judiciário Trabalhista diante da aparente derrota da Súmula nº 331/TST.

(IN)CoNStItuCIoNAlIdAde em ABStrAto e em CoNCreto

Todo controle de constitucionalidade é uma atividade comparativa. Compara-se a emenda constitucional ou a norma ou ato normativo infraconsti-tucional com a Constituição. Se houver alguma contradição formal ou material, a norma será inválida. No sistema nacional, a atividade comparativa da con-formidade da norma com a Constituição é feita de duas maneiras: controle de constitucionalidade difuso e concentrado.

No controle difuso, via incidental, in concreto, a (in)constitucionalidade da norma aparece como questão prejudicial ao julgamento do mérito de uma

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causa, exercida por qualquer juiz ou Tribunal, no bojo de qualquer processo ou tipo de ação judicial levada a seu conhecimento. Para chegar à decisão do caso, o juiz resolve primeiro a questão constitucional, que se coloca como um antecedente lógico ao julgamento do mérito.

A comparação entre o ato de hierarquia inferior e a Constituição se dá em concreto, ligada à resolução de uma situação individualizada. Assim, os efeitos da declaração são apenas inter partes e fazem coisa julgada material para o caso concreto.

Entretanto, a missão precípua do Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição, é comparar, no plano abstrato, a lei ordinária federal com a Cons-tituição da República e, na hipótese de contrariedade, declarar a sua inconstitu-cionalidade no controle concentrado.

No controle concentrado, direto, realizado pelo STF, a comparação entre a lei ou ato normativo de hierarquia inferior e a Constituição é o próprio mérito da causa. O julgamento se dá no plano puramente normativo, in abstrato, com a função de banir do mundo jurídico as leis ou atos normativos que contrariem a Constituição. Naturalmente, se a decisão for pela constitucionalidade da lei, a consequência será a manutenção de sua vigência. A declaração é, em tese, abs-trata, mediante um processo objetivo, desvinculado de qualquer caso concreto. Logo, os efeitos são erga omnes, com força de coisa julgada normativa-abstrata.

Destarte, é pertinente assinalar que não existe equivalência necessária entre os conceitos de controle de constitucionalidade. O controle de consti-tucionalidade difuso é sempre in concreto. O controle de constitucionalidade concentrado pode ser in abstrato e in concreto.

Assim, cumpre ressaltar que nem sempre o controle realizado concen-tradamente pelo STF se dá somente em abstrato. Há alguns casos em que o STF exerce a jurisdição constitucional concentrada, direta, com efeitos de coisa jul-gada material no plano concreto, porque recai sobre situações ou casos concre-tos, como o que acontece, por exemplo, na ação direta interventiva (CF, art. 36,) e no mandado de injunção (CF, art. 5º, inciso LXXI, e art. 102, inciso I, alínea q).

No controle concentrado, em tese, in abstrato, a decisão do STF traz as seguintes consequências: na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) há retirada da norma declarada inconstitucional do mundo jurídico; na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) ou Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), há manutenção da vigência e da eficácia da norma, caso seja considerada constitucional.

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eFICÁCIA ergA omNeS e eFeItoS vINCulANteS NA Ação dIretA de CoNStItuCIoNAlIdAde

A Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) em abstrato é desvin-culada de casos concretos; não se destina a resolver lides entre partes determi-nadas, mas, apenas, a manter a integridade da ordem jurídica em benefício de toda a sociedade. Justamente por causa das peculiaridades do controle abstrato de constitucionalidade é que a doutrina elaborou as noções de jurisdição cons-titucional e de processo objetivo.

Nesse diapasão, na ação direta de constitucionalidade julgada proceden-te, é comum a afirmativa de que se forma uma presunção absoluta de consti-tucionalidade da norma. A questão radica em perquirir acerca das diferenças entre eficácia erga omnes e efeitos vinculantes, o que imbrica eficácia subjetiva e objetiva, em cuja análise devem ser considerados, também, os planos concre-to e abstrato da declaração de (in)constitucionalidade.

lImIteS SuBjetIvoS

A eficácia subjetiva da declaração direta de (in)constitucionalidade será, portanto, erga omnes, oponível a todos, e de força vinculante, oponível aos demais órgãos do Judiciário e à Administração Pública, conforme dicção do art. 102, § 2º, da CF:

As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Fe-deral, nas ações direta de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante aos de-mais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública direta e indireta nas esferas federal, estadual e municipal.

De modo que, em princípio, todas as pessoas e todos os órgãos do Estado mencionados ficarão vinculados, não sendo mais possível questionar a validade da norma. Tratando-se de uma decisão pela constitucionalidade da lei, esta se manterá em vigência com uma presunção absoluta em favor de sua validade. Em tese, não poderá mais deixar de ser aplicada por outros órgãos do Judiciário, uma vez que o STF emitiu pronunciamento sobre a questão, e a reabertura da discussão importaria violação do § 2º do art. 102 da Constituição.

Embora parte da doutrina afirme que o art. 102, § 2º, da CF e a Lei nº 9.868/1999, art. 28, conferem tratamento uniforme aos institutos da eficácia erga omnes e do efeito vinculante, o plano pragmático-jurídico revela que são institutos afins, mas distintos, pelo menos no que tange à ação direta de cons-titucionalidade.

Na declaração de constitucionalidade, a eficácia subjetiva erga omnes é contra todos; não se confunde com efeito vinculante, adotado pela EC 3/1993

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e regulada pela Lei nº 9.868/1999, que faz referência “aos demais órgãos do Poder Judiciário”.

Assim, o efeito vinculante não abrange o próprio STF e tampouco o Le-gislativo. O próprio STF entende que a declaração de inconstitucionalidade não impede o legislador de promulgar lei de teor idêntico ao texto censurado1, sob pena de ofensa ao pacto da tripartição dos Poderes (art. 2º da CF).

Isto porque há que se ter mente que, na ação direta de declaração de (in)constitucionalidade, a eficácia erga omnes (contra todos) e os efeitos vinculan-tes possuem limites objetivos, porque in abstrato.

lImIteS oBjetIvoS e oS “FuNdAmeNtoS determINANteS dA deCISão” deClArAtÓrIA de CoNStItuCIoNAlIdAde

Registre-se: na teoria dos efeitos vinculantes da declaração de constitu-cionalidade deve ser levado em conta que a decisão decorre da análise da com-patibilidade da lei em tese, no seu sentido abstrato e geral, plano diferente da lei individualizada e aplicada no plano concreto. De outro turno, analisando o tema sobre o enfoque dos limites objetivos da eficácia erga omnes e dos efeitos vinculantes, verifica-se que estão estritamente conectados com “os fundamen-tos determinantes da decisão” declaratória de constitucionalidade.

Assim, é permitida a reapreciação da matéria pelo STF a qualquer tempo diante do fenômeno da chamada inconstitucionalidade superveniente2. Destar-te, pode haver a reedição de uma demanda direta de (in)constitucionalidade, nas seguintes hipóteses: a) mudança de conteúdo da Constituição, quando o enunciado que serve de parâmetro para a decisão anterior houver sido emen-dado; b) mudança de conteúdo da norma objeto de controle; e c) modificação da orientação jurídica sobre a matéria, quando houver mutação constitucional na via interpretativa.

eFeItoS vINCulANteS doS “FuNdAmeNtoS determINANteS dA deCISão de CoNStItuCIoNAlIdAde” e oS vÁrIoS SeNtIdoS dA NormA

O enunciado normativo, no seu modo final de aplicação, possui vários sentidos. Assim, a interpretação e a aplicação da norma no plano abstrato não se confundem com o plano concreto.

1 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Martires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 1325-1343, passim.

2 Idem, ibidem.

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José Carlos Vasconcellos dos Reis3, com apoio nas lições de Humberto Ávila e Lenio Streck, assevera que:

Ao intérprete, assim, não cabe meramente descrever o significado previamente existente dos dispositivos. Sua atividade é mais profunda: consiste em, efetiva-mente, construir esses significados, uma vez que não é plausível aceitar a ideia de que a aplicação do Direito envolve uma atividade de subsunção de conceitos prontos antes mesmo do processo de aplicação. Por isso é que Lenio Streck, ins-pirado em Gadamer e Heidegger, compreende o processo interpretativo como verdadeiramente produtivo e não reprodutivo.

Nessa trilha, José Joaquim Gomes Canotilho4 demonstra que sem inter-pretar o enunciado normativo não se chega à norma, pois o significado de uma norma não constitui um dado prévio, mas é resultado da tarefa interpretativa.

José Carlos Vasconcellos Reis5 anota que “sem a interpretação não se chega a nada que seja representado ou expresso por meio de um texto”. Assim, exemplifica com a distinção entre a música e a partitura, eis que “a notação musical dá ao intérprete os elementos básicos para que possa realizar a obra de arte sonora que o compositor procurou representar por meio de sinais escritos.”

Considerando que a norma possui vários sentidos, máxime no seu modo de aplicação, agregue-se à discussão, no controle de (in)constitucionalidade abstrato, o tema relativo aos “limites objetivos do efeito vinculante” adstrito aos “fundamentos determinantes da decisão”, bem como a polêmica questão da “transcendência dos fundamentos determinantes” ou “irradiação dos motivos determinantes”.

Em geral, no direito processual, impera a regra de que os fundamentos da decisão não transitam em julgado. Essa regra sofre exceção no controle concen-trado de constitucionalidade. Primeiro, à vista o caráter dúplice da ADC e da ADIn, pois se a ADC for julgada improcedente, significa que a norma é incons-titucional e vice-versa. Ademais, deve ser considerado o princípio da ultrapeti-ção, pois é possível declarar a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo por outros fundamentos, distintos dos deduzidos na peça inicial6.

Gilmar Ferreira Mendes7, ao abordar a coisa julgada no controle da cons-titucionalidade, entende que o efeito vinculante não está adstrito somente à par-

3 REIS, José Carlos Vasconcellos dos. Desafios do neoconstitucionalismo – Aplicação das normas constitucio-nais e a tensão entre a justiça e a segurança. Neoconstitucionalismo. Coord. Regina Quaresma, Maria Lúcia de Paula Oliveira, Farlei Martins Riccio de Oliveira. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 544.

4 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 3. ed. Coimbra: Almedi-na, 1999. p. 126-1128.

5 REIS, José Carlos Vasconcellos dos. Op. cit., p. 544.6 MENDES, Gilmar Ferreira; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Controle concentrado de constitucionalidade.

São Paulo: Saraiva, 2005. p. 425.7 Curso de direito constitucional, p. 1336.

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te dispositiva da decisão, mas se estende também aos chamados “fundamentos determinantes” ou razões de decidir, sob pena de tornar despiciendo o instituto do efeito vinculante e equipará-lo singelamente à coisa julgada8.

Ressalte-se, contudo, que, na ação direta de constitucionalidade, a deci-são do STF é comparativa-interpretativa, em um dado sentido da norma, base-ada no critério da generalidade e no conteúdo literal do enunciado normativo. A coisa julgada é formada no processo objetivo, no plano meramente abstrato, desvinculado de casos concretos e do modo final de aplicação do Direito.

Logo, se o julgado de constitucionalidade apreciou apenas um dos sen-tidos da norma, o STF emitiu a palavra final, no plano abstrato, que deve ser respeitada, mas vinculada aos “motivos determinantes”. Assim, os demais sen-tidos da norma, que surgem em contextos diversos, não estão sob o manto do efeito vinculante.

No plano do modo final de aplicação, a norma possui vários sentidos, assim, os efeitos vinculantes da declaração de constitucionalidade abarcam so-mente os fundamentos determinantes da decisão em dado sentido. Nessa senda, Lenio Streck aponta a chamada “cláusula de reserva de Plenário”, em reforço à defesa da tese da possibilidade de reapreciação da questão da constitucionali-dade pelos demais Tribunais, no controle difuso:

No plano hermenêutico, há uma nítida diferença entre declarar a nulidade de uma lei, isto é, retirá-la do ordenamento, e declarar que essa mesma lei é válida. Os âmbitos são distintos. A expunção da lei impedirá a reconstrução, de qual-quer modo, do texto nulificado. [...] Nada resta da lei no sistema. O mesmo não acontece na decisão que rejeita a inconstitucionalidade. [...] Quando o Tribunal rejeita a inconstitucionalidade, recusa um determinado sentido atribuído na ação pelo autor. É cediço que um texto normativo admite vários sentidos, que surgem em contextos diversos. Afastar esse sentido significa dizer, tão somente, que a lei não é inconstitucional por aquele fundamento. [...] Esse fundamento não pode abarcar, automaticamente, de forma vinculativa, [...] os demais sentidos que esse texto possui, até porque o texto normativo infraconstitucional pode ser confron-tado com outros dispositivos da Constituição.

rAzÕeS de eXCepCIoNAlIdAde Não prevIStAS pelA prÓprIA regrA

Ainda, pensamos que é possível que a inconstitucionalidade se mani-feste, in concreto, no momento do contato da lei com determinadas situações concretas, não cogitadas pela Corte Constitucional quando do controle da

8 O Ministro Gilmar Mendes, na RCL 2.126, para preservar a autoridade da decisão proferida na ADIn 1.662 em decisão monocrática, deferiu a liminar e suspendeu a ordem de sequestro no precatório, sob o fundamento de que o alcance dos efeitos vinculantes da decisão da ADIn não pode estar limitado à sua parte dispositiva, eis que se devem considerar também os fundamentos determinantes, sem os quais a vinculatividade pouca contribuição prestaria à proteção mais abrangente à Constituição.

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constitucionalidade in abstrato. Em determinadas circunstâncias particulares não previstas pela norma, a obrigação imposta pela regra, a princípio tida como absoluta, pode ser superada por “razões não previstas pela própria regra”9.

Baseada nos textos de Humberto Ávila e outros juristas de escol10, alinha-da à ideia da desmistificação da aplicação do modo “tudo ou nada” da regra e admitindo que não é possível separar a interpretação da ponderação, seja na aplicação da regra ou do princípio, é correta a concepção de que há, pelo me-nos, quatro situações de ponderação de regras:

a) ponderação entre duas regras em rota de conflito: a solução se dá pela atribuição de maior peso a uma delas, pela ponderação dos valores de cada uma delas, cujo resultado deve ser uma solução constitucionalmente adequada;

b) ponderação da regra e suas exceções: trata-se da chamada ponde-ração das razões ou razões excepcionais, ou teoria de excepciona-lidade, ou “aptidão para cancelamento (defeasibility) das regras”. A regra comporta exceções, que podem estar previstas ou não na ordem jurídica. Assim:

(i) se a exceção está prevista no ordenamento jurídico, a so-lução se dá pela aplicação de “outras razões calcadas em outras normas, para afastar a regra (overrling); as outras razões, consideras superiores à própria razão para cumprir a regra, são fundamento para o seu não cumprimento”11. A regra pode ter, prima facie, um dado sentido que é supe-rado por razões contrárias calcadas em outras normas.

(ii) se a exceção não está prevista no ordenamento jurídico, solução se dá pelo conteúdo finalístico, pelo sopesamen-to e pela ponderação entre “as razões geradora da norma e as razões substanciais para o seu não cumprimento”12. Assim, envolve a ponderação dos argumentos favoráveis

9 Veja-se o famoso julgado do STF a respeito do revogado art. 224 do Código Penal (atual art. 217-A, criado pela Lei nº 12.015/2009, que instituiu o crime de “estupro de vulnerável”), que prevê o estupro e estabe-lece uma presunção absoluta e incondicional de violência se a vítima é menor de 14 anos. O STF afastou a incidência da norma, porque no caso em que a vítima possua 12 anos de idade, sob o fundamento das circunstâncias particulares não previstas pela norma, quais sejam, conjunção carnal com o consentimento da vítima e aparência física e mental de pessoa mais velha (STF, HC 73.662-9, Rel. Min. Marco Aurélio, DJU 20.09.1996).

10 ÁVILA, Humberto. teoria dos princípios. Da definição a aplicação dos princípios jurídicos. 4. ed. 2. tir. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 44-69; ainda: BARCELLOS, Anna Paula de. Ponderação, racionalidade e ativida-de jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005; REIS, José Carlos Vasconcellos dos. Op. cit., p. 552-553.

11 Humberto Ávila fundamenta que as regras “podem ter suas condições de aplicabilidade preenchidas, e, ainda assim, não ser aplicáveis, pela consideração a razões excepcionais que superem a própria razão que sustenta a aplicação normal da regra”, denominada de “aptidão para cancelamento (defeasibility) das regras” (Op. cit., p. 69).

12 Idem, ibidem.

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e contrários ao estabelecimento de uma exceção, diante das circunstâncias do caso concreto (tópica), com base na finalidade da própria regra ou em outros princípios. Mas, aqui, há maior rigor quanto ao dever de argumentação--fundamentação, ou seja, mister se faz “uma fundamen-tação que supere a importância das razões de autoridade que embasam o cumprimento incondicional da regra”13.

c) ponderação de regras abertas, hipóteses de conceitos jurídicos in-determinados: neste caso, a hipótese normativa é semanticamente aberta, com alto grau de generalidade e formulação imprecisa para aplicação a situações inicialmente não previstas. Assim, “será ne-cessário ao intérprete ponderar de todas as circunstâncias do caso para decidir que o elemento de fato tem prioridade para definir a finalidade normativa”14.

d) ponderação de regras na analogia e contrario sensu: a utilização da forma argumentativa da analogia e contrario sensu é uma atividade de ponderação que leva em consideração as razões e contrarrazões, pois onde há a mesma razão idêntica deve ser a solução.

Do exposto é possível haurir três conclusões. a) aplica-se, também, às regras a técnica da ponderação; b) na tarefa da aplicação da regra, a sua não incidência, fundada na imprecisão legislativa para o caso concreto, resulta em aparente negativa de vigência, mas que não pode ser equiparada com a decla-ração de inconstitucionalidade. Por outras palavras, a negativa de vigência de dada norma, no caso concreto, não conduz, necessariamente, a conclusão de que, direta ou indiretamente, foi reconhecida a sua inconstitucionalidade, pois a técnica da ponderação de regras não admite o resultado incondicional do “tudo ou nada”, a gosto do neopositivismo; e c) o intérprete deve respeitar as possibilidades semânticas do enunciado normativo, qual seja, privilegiar a apli-cação da regra, e só poderá deixar de aplicar uma regra se restar demonstrada, de forma cabal, uma imprevisão legislativa da situação do caso concreto ou se a incidência do enunciado normativo, na hipótese concreta, produz um resultado (uma norma) inconstitucional15.

trANSCeNdêNCIA doS motIvoS determINANteS

Convém expor, brevemente, a teoria da expansão do alcance dos efeitos vinculantes. Registre-se, por oportuno, a polêmica instaurada acerca do viés ex-pansionista da jurisdição constitucional, o fenômeno do ativismo jurisdicional,

13 REIS, José Carlos Vasconcellos dos. Op. cit., p. 553.14 Idem, ibidem.15 BARCELLOS, Anna Paula. Op. cit., p. 220 e ss.

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e o tema relativo ao alcance dos efeitos vinculantes no controle de constitucio-nalidade, denominado “transcendência dos motivos determinantes” ou “efeitos irradiativos dos motivos determinantes da decisão tomada no controle abstrato das normas”.

Trata-se da hipótese de extensão dos efeitos vinculantes, das razões de decidir a outros casos que não guardam a exata identidade com o tema central da decisão proferida na ADIn ou na ADC. Essa tese conturbada foi aplicada nas RCLs 1923/RG, 2.126/SP e 1.987/DF, no sentido de que uma norma declarada inválida significa “uma exegese da norma aplicável segundo a dicção fixada pela Corte, e não o texto em sentido estrito”.

Essa postura foi amplamente resistida por alguns Ministros do próprio STF, na RCL 4219/GO, julgada em 21.09.2006, em que se retomaram os de-bates quanto à aplicabilidade da transcendência dos fundamentos determi-nantes, oportunidade em que quatro Ministros externaram posição negativa à adoção da tese. Isto porque a transcendência dos fundamentos determinantes agride a sensibilidade do julgador, como se este pudesse reconhecer a vincu-latividade de uma decisão editada sob distinta moldura constitucional no tema específico16.

Registre-se a atual reconfiguração do conceito da transcendência dos fundamentos determinantes, haurida do voto do Ministro Gilmar Mendes, que, sob outro enfoque, descarta a aplicação dos efeitos vinculantes a outros casos (leis ou atos normativos semelhantes) que não guardam perfeita identidade com a tese central da ADC ou da ADIn. Em contrapartida, exorta a ideia de que a reclamação constitucional se apresenta como uma oportunidade a mais, um novo instrumento de controle da constitucionalidade, feita diretamente pelo STF, no caso concreto, sem a necessidade da utilização das figuras da ADIn – ADC, ADIO e ADPF. Novos e acesos debates são travados na doutrina acerca da natureza da reclamação constitucional.

16 Na ADIn 1.662, foi arguida a inconstitucionalidade da equiparação entre “não inclusão de verba no orça-mento para pagamento de precatório” com “preterição pela inobservância na ordem de pagamento” e o STF entendeu que o sequestro de verba pública só é possível diante da inobservância da ordem cronológica apon-tada. Várias reclamações constitucionais se seguiram, embora as legislações postas em confronto fossem de diferentes entes da Federação, estaduais e municipais. Na RCL 1923/RG, embora não existisse ato normativo arrimando a decisão, a reclamação foi provida, porque aplicada a transcendência dos efeitos vinculantes. Na RCL 2.126/SP (Ministro Gilmar Mendes) e na RCL 1.987/DF, a questão foi retomada no sentido de que uma norma declarada inválida significa “uma exegese da norma aplicável, segundo a dicção fixada pela Corte, e não o texto em sentido estrito”, com o que discordou o Ministro Sepúlveda Pertence, secundado pelo Ministro Marco Aurélio, pois a ADIn 1.662 cuidava de um instrumento normativo editado por Tribunal Trabalhista anteriormente à RCL 1.987/DF e, ainda, invocava outro fundamento constitucional reconfigurado pela EC 30. Desta feita, restou sinalizado que a transcendência dos motivos determinantes a outros casos concretos que não guardam exata identidade com a tese central do controle concentrado de constitucionalidade agride a sensibilidade do julgador, como se este pudesse reconhecer a vinculatividade a uma decisão editada sob distinta moldura constitucional no tema específico. Comentários dos julgados na obra de Vanice Regina Lirio do Vale (Ativismo jurisdicional e o Supremo tribunal Federal. Curitiba: Juruá, 2009. p. 47-54).

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Assim, levando em conta os vários sentidos da norma, as possibilidades de exceções, as diferença fáticas, as incertezas da Corte em relação aos limites dos efeitos vinculantes e as várias possibilidades das reclamações constitucio-nais, vis-à-vis à transcendência dos fundamentos determinantes, o Ministro Gil-mar Mendes, na RCL 4.987/PE, DJ 13.03.2007, explicitou:

Parece bastante lógica a possibilidade de que, em sede de reclamação, o Tri-bunal analise a constitucionalidade de leis cujo teor já foi objeto de controle concentrado de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal. Como explicitado, não se está a falar, nessa hipótese, de aplicação da teoria da trans-cendência dos motivos determinantes da decisão tomada no controle abstrato de constitucionalidade. Trata-se, isso sim, de um poder ínsito à própria competência do Tribunal de fiscalizar incidentalmente a constitucionalidade das leis e dos atos normativos. Esse poder é realçado quando a Corte se depara com leis de teor idêntico àquelas já submetidas ao seu crivo no âmbito do controle abstrato [...], poder-se-á, por meio da reclamação, impugnar a sua aplicação ou rejeição por parte da Administração ou do Judiciário, requerendo a declaração incidental de sua inconstitucionalidade ou constitucionalidade, conforme o caso.

A declaração de constitucionalidade em abstrato, no controle concen-trado, não impede que, pela via do controle difuso, se declare a inconstitucio-nalidade no caso concreto do mesmo ato normativo, tendo em conta os vários sentidos da norma e as várias possibilidades de exceções ou derrotabilidade, até porque o texto normativo infraconstitucional pode ser confrontado com outros dispositivos da Constituição. O confronto abstrato entre o texto da lei e a Consti-tuição não condiciona, necessariamente, todos e quaisquer casos que envolvam a sua aplicação.

Considerando a importante e singular figura da reclamação constitucio-nal e a tendência moderna do seu papel de novo instrumento de controle da constitucionalidade incidental, no caso concreto, mister se faz traçar uma dis-tinta abordagem ao tema:

a) uma norma declarada constitucional, no controle concentrado, po-der vir a ser considerada inconstitucional em sede de controle difu-so, inclusive na via da reclamação constitucional;

b) uma reclamação constitucional pode vir a ser julgada improcedente porque diverso o fundamento invocado, eis que desvinculados dos fundamentos determinantes exarados no controle abstrato, porque a decisão reclamada vem fundada em determinadas circunstâncias particulares não previstas pela norma declarada constitucional, que, a princípio, tida como absoluta, foi superada uma excepciona-lidade, por razões não previstas pela própria regra;

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c) uma reclamação constitucional pode não ser conhecida, porque a decisão reclamada vem fundada em situação concreta, no conjun-to fático-probatório, cuja via não se presta ao reexame de fatos e provas.

Luiz Roberto Barroso17 enfatiza que as situações concretas, individuali-zadas, determinadas, não podem prescindir da tutela jurisdicional adequada, sempre que necessário. O efetivo exercício do controle difuso de constituciona-lidade deve ser compreendido como um dever de todos os juízes e Tribunais, que não pode ser elidido pela existência de decisão do STF, ainda que em sede de controle concentrado, no sentido da constitucionalidade da lei ou ato estatal aplicável ao caso.

Na mesma esteira, e com mais profundidade, Lenio Streck18, adotando o triângulo dialético de Canotilho, exorta que o controle difuso de constituciona-lidade, em qualquer grau de jurisdição, exercitado pelos juízes deve ser consi-derado cláusula pétrea, como direito-instrumento-garantia, tendo em conta seu papel, por excelência, de servir de instrumento de acesso à justiça por parte do cidadão, pois:

Importa referir, nesse contexto, pela inegável importância que assume o controle difuso de constitucionalidade no plano do acesso à justiça, que qualquer tentati-va de esvaziá-lo e/ou expungi-lo do sistema jurídico brasileiro ferirá, de morte, o núcleo político da Constituição.

De fato, a declaração de constitucionalidade com expansão para além dos fundamentos determinantes da decisão pode levar à ideia absurda de que todos os sentidos da norma e as respectivas exceções estão sob o manto dos efeitos vinculantes na ação direta de constitucionalidade. Assim, restaria sub-traído o acesso ao Judiciário, no caso concreto, a lesão ou ameaça de lesão a direito e, em flagrante coartação da atividade jurisdicional dos demais órgãos do Poder Judiciário, conclusões que não encontram agasalho na própria Cons-tituição Federal.

Procede, pois, a afirmativa de Lenio Streck19 no sentido de que a deci-são que acolhe a inconstitucionalidade faz coisa julgada material, e não pode ser reapreciada em nenhum outro processo. Entretanto, a decisão que acolhe a constitucionalidade tem força de coisa julgada forma; logo, não impede a reapreciação da questão. Nada impede, assim, que um juiz entenda, ao julgar

17 Luís Roberto Barroso expõe, no Post Scriptum, à 5ª edição, de Interpretação e aplicação da constituição, algumas reflexões importantes sobre essa possibilidade cogitada no texto. Veja-se, ainda, especificamente sobre o tema, BARCELLOS, Ana Paula de. Op. cit., p. 229-234.

18 STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica ao direito. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 840.

19 Idem, p. 778.

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um certo caso, que a lei “x” é inconstitucional e, julgando outro caso (presentes outras circunstâncias), decida que a mesma lei “x” é constitucional.

Do exposto, pensamos que é preferível falar em “coisa julgada normati-vo-abstrato” e “coisa julgada in concreto”, bem como em “princípio da adstri-ção dos efeitos vinculantes aos fundamentos determinantes”. Significa dizer, em conclusão, que os efeitos vinculantes da ação declaratória de constitucionalida-de estão adstritos aos fundamentos determinantes da decisão proferida em sede de controle abstrato, em um dado sentido da norma. Ainda, devem ser levadas em conta as razões de excepcionalidade e as circunstâncias particulares não previstas pela própria norma.

O art. 102, § 2º, da CF deve ser interpretado no sentido de que as deci-sões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalida-de produzirão, no plano abstrato, eficácia contra todos e efeito vinculante aos demais órgãos do Poder Judiciário é à Administração Pública direta e indireta nas esferas federal, estadual e municipal.

Essas conclusões podem ser hauridas dos precedentes do próprio STF, nas reclamações constitucionais, o que reforça a tese de que a vinculatividade das decisões no controle de constitucionalidade, em um dado sentido da nor-ma, não descarta outros sentidos, à luz do modo final de aplicação do Direito, no caso concreto.

teXto e CoNteXto: preCedeNteS do StF e eStudo de CASoS

Nesse diapasão, a pesquisa das decisões no campo da jurisdição cons-titucional mostra que o próprio Supremo Tribunal Federal já chancelou que a constitucionalidade in abstrato não afasta, de modo categórico, a inconstitucio-nalidade in concreto, tendo em conta a diferenciação entre texto e contexto e o modo final de aplicação do direito.

A interpretação e a aplicação da Constituição, no caso concreto, não po-dem ser desconectadas das circunstâncias de fato que rodeiam a lide. Sinale-se alguns casos em que o STF considerou que os efeitos da declaração de constitucio-nalidade de lei, no plano abstrato, são relativos e, portanto, não impedem a aná-lise da sua inconstitucionalidade no caso concreto: ADC 4/DF; ADIn 1.232/DF e respectivas RCL 2.303/RS; RCL 4.422/RS; RCL 4.133/RS; RCL 4.366/PE; RCL 4.164/RS; RCL 4.374-6/PE; RCL 3.805/SP20; e, ainda, a RCL 3.034/PB.

20 Comentários sobre a ADIn 1232 e respectivas reclamações constitucionais os julgados mencionados acham, alentadamente, na obra de Fernanda Penteado Balera [O benefício da prestação continuada para pessoas com deficiência no SFT. In: COUTINHO, Diogo R.; VOJVODIC, Adriana M. (Org.). Jurisprudência constitucional: como decide o STF? São Paulo: Malheiros, 2009. p. 500-513].

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a) aDC 4/DF

O exemplo mencionado na doutrina diz respeito à ADC 4/DF, em que o STF concluiu pela constitucionalidade da proibição da antecipação de tute-la contra a Fazenda Pública, estabelecida pela Lei nº 9.494, de 10 de setem-bro de 1997 (STF, ADC 4-MC/DF, Rel. Min. Sydney Sanches, J. 11.02.1998, DJ 21.05.1999).

O instituto da antecipação de tutela é vocacionado a conferir celeridade e efetividade à prestação jurisdicional, antecipando, in limine, antes da deci-são final de mérito, a satisfação concreta do direito do autor. Nesse diapasão, a lei proibiu o instituto da tutela antecipada contra a Fazenda Pública, e o STF declarou constitucional referida proibição, no controle concentrado e abstrato.

Entrementes, em determinado caso concreto, envolvendo direito à saúde, direito fundamental da pessoa humana conectado com o direito à vida, o pró-prio Supremo Tribunal Federal, diante do caso concreto, reconheceu o direito de um cidadão que pleiteou, com fundamento em direitos subjetivos assegura-dos pela Constituição, o fornecimento, pelo Estado, de determinado medica-mento, sem o qual corria o risco de morte. Assim, em sede difusa, qualquer juiz ou Tribunal, mesmo diante da decisão do STF, não está impedido de conceder a antecipação de tutela contra a Fazenda Pública, para que o autor tenha, desde logo, o seu direito satisfeito.

Veja-se que no plano abstrato não existe inconstitucionalidade na veda-ção da tutela antecipada contra o Estado. Mas no caso concreto a situação é diversa, pois seria inconstitucional, justamente, o comportamento de negativa da tutela antecipada em favor do cidadão. Decorre, assim, que o acatamento da letra fria da lei, sem a perquirição das circunstâncias específicas do caso, levaria ao perecimento do direito à vida com consequências e danos irreversíveis.

Nesse mesmo sentido, uma decisão tomada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que serviu de paradigma para outras decisões semelhantes, que teve como Relator o Desembargador Araken de Assis:

É vedado antecipar os efeitos do pedido perante a Fazenda Pública, consoante o art. 1º da Lei nº 9.494/1997, proclamado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal e, portanto, de aplicação obrigatória pelos órgãos judiciários. No en-tanto, a contraposição entre o direito à vida e o direito patrimonial da Fazenda Pública, tutelado naquela forma, se resolve em favor daquele, nos termos do art. 196 da CF/1988, através da aplicação do princípio da proporcionalidade, pois se trata de valor supremo, absoluto e universal. Irrelevância da irreversibilidade da medida. Existência de norma local assegurando semelhante prestação (art. 10 da Lei nº 9.908/1993). Eventual sacrifício da vida, em nome de interesses pecu-niários da Fazenda Pública, conduziria o órgão judiciário a contrariar o direito e praticar aqueles mesmos erros, recordados por Gustav Radbruch, pelos quais os

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juristas alemães foram universalmente condenados. (TJRS, Agravo de Instrumento nº 598.398.600, 4ª C.Cív., Rel. Des. Araken de Assis, de 25.11.1998)21

b) aDIn 1.232/DF

Outro caso paradigma trata-se da ação direta de constitucionalidade do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1991 (Loas – Lei Orgânica da Assistência Social). Para fins do direito ao benefício da assistência social, previsto no art. 203 da CF, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8742/1991 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa à família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.

Considerando que o art. 7º, inciso IV, da CF estabelece que a pessoa necessita de um salário-mínimo para atender as suas necessidades básicas, o Procurador-Geral da República ajuizou a ADIn 1.232/DF. Entretanto, o STF considerou constitucional o § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 (Loas). Os votos vencedores foram dos Ministros Nelson Jobim, Sepúlveda Pertence, Maurício Corrêa, Moreira Alves o Otávio Galotti.

No voto vencido do Ministro Ilmar Galvão, na ocasião, já restou assenta-do que o critério estabelecido em lei, em si, não é inconstitucional, mas poderia ser considerado inconstitucional se entendido como único meio de a pessoa deficiente comprovar a sua incapacidade econômica, sob pena de exclusão de grande parte dos destinatários hipossuficientes do benefício de assistência social. Assim, não haveria problemas em se adotar o critério da renda per capita familiar de até 1/4 do salário-mínimo, desde que propiciado outros meios para comprovação da necessidade econômica. Registre-se, aqui, uma abertura no sentido de que a declaração de constitucionalidade de lei não exclui a análise do caso concreto e suas circunstâncias e provas.

A ADIn 1.232 foi julgada em 27.08.1998, e várias reclamações constitu-cionais se seguiram (RCL 2.303/RS, RCL 4.422/RS, RCL 4.133/RS, RCL 4.366/PE, RCL 4.164/RS, RCL 4.374-6/PE, RCL 3.805/SP), nas quais resta demonstrada a evolução do pensamento dos membros do STF de que os efeitos da declaração de constitucionalidade, in tese, não suprime do Judiciário o poder jurisdicional de analisar o tema, na via difusa, à luz das circunstâncias do caso concreto.

b.1) rCl 2.303/rS

Inicialmente, o STF deixou assentado, na RCL 2.303/RS, voto da Ministra Ellen Gracie, que o critério de 1/4 do salário-mínimo é objetivo e não pode ser conjugado com outros fatores indicativos da miserabilidade do jurisdicionado,

21 Comentários de julgado citado vem na obra de Ana Paula Ávila (Razoabilidade, proteção do direito fundamen-tal à saúde e antecipação de tutela contra a fazenda pública. Ajuris, Porto Alegre, n. 86, p. 361 e ss., 2003).

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não cabendo ao juiz criar outros requisitos para aferição do estado de pobreza. Com o que discordou o Ministro Carlos Brito, no sentido de que a decisão pro-latada no caso concreto não fere a decisão da ADIn 1.232, pois o objetivo da Constituição é a “promoção humana e integração na vida comunitária”. Assim, ainda que a renda ultrapasse o limite legal, no caso concreto é possível, “num dado instante, o idoso ou o deficiente econômico demonstrar que não possui meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida pela respectiva família”.

Verifica-se, ao longo dos anos, que a posição do STF veio, gradativa-mente, se afirmando no sentido de que a declaração de constitucionalidade, in abstrato, quanto ao requisito da renda per capita familiar de até 1/4 do salário--mínimo, para fins de alcance do direito ao benefício da assistência social, não inibe a concessão do benefício no caso concreto, se provado que, embora su-perior a renda per capita, os gastos mensais demonstram que há hipossuficiên-cia econômica do autor. Referidas posições podem ser extraídas das decisões monocráticas ou colegiadas das seguintes Reclamações Constitucionais: RCL 4.422/RS, RCL 4.133/RS, RCL 4.366/PE, RCL 4.164/RS, RCL/MC 4.374-6/PE e RCL 3.805/SP.

b.2) rCl 4.422/rS, rCl 4.133/rS e rCl 4.366/pe

Nas RCLs 4.422/RS, 4.133/RS e 4.366/PE, os Ministros Celso de Mello, Carlos Ayres Brito e Ricardo Lewandowski, sistematicamente, têm negado se-guimento às reclamações ajuizadas pelo INSS sob o fundamento de que a via é inadequada para reexaminar o conjunto fático-probatório em que se funda a decisão reclamada.

b.3) rCl 4.164/rS

Na RCL 4.164/RS, o Ministro Marco Aurélio toma posição clara nos sen-tido de que o critério definido de renda per capita de 1/4 do salário-mínimo é insuficiente para a efetividade do art. 203, V, da CF. Portanto, é possível haurir do julgado que uma norma declarada constitucional pode ser considerada in-constitucional no caso concreto.

b.4) rCl 4.374-6/pe

Na RCL 4.374-6/PE, o Ministro Gilmar Mendes, analisando a liminar re-querida pelo INSS para suspender a decisão de origem que não observou a renda familiar per capita de 1/4 do salário-mínimo, lembrou que o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993 teve a sua constitucionalidade declarada, mas ponderou que a existência de legislação superveniente (Lei nº 10.689/2003, que instituiu o Bolsa Família, e Lei nº 10.210/2001, que instituiu o Programa Nacional de

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Acesso à Alimentação) permite considerar que o próprio legislador reinterpre-tou o art. 203 da CF, no que tange ao conceito de necessitado.

O Ministro Gilmar Mendes reconheceu a insuficiência do critério da ren-da per capita baseada em 1/4 do salário-mínimo, mas assentou que “o correto não seria declarar a inconstitucionalidade do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, mas reconhecer a possibilidade de que esse parâmetro objetivo seja conjugado, no caso concreto, com outros fatores capazes de indicar o estado de miserabili-dade do cidadão”. E, ainda, fundamento que, mais cedo ou mais tarde, o Plená-rio, inevitavelmente, deverá enfrentar o tema diante da reinterpretação que vem sendo dada ao art. 203 da CF, tanto pelo legislador quanto pelo próprio STF. Sinale-se aqui a questão da inconstitucionalidade superveniente de lei antes declarada constitucional, pela mutação constitucional interpretativa.

b.5) rCl 3.805/Sp

Na RCL 3.805/SP, a Ministra Cármen Lúcia cassou a liminar concedi-da, ao fundamento de que a concessão do benefício de assistência social, em situações comprovadas de absoluta incapacidade de meios de subsistência da pessoa. Fundamentou que, ainda que não observado o critério objetivo de 1/4 do salário-mínimo, isso não representa afronta ao entendimento fixado na ADIn 1.232, pois “a constitucionalidade do art. 20 da Lei nº 8.742 não significa in-constitucionalidade dos comportamentos judiciais que, para atender ao prin-cípio constitucional da dignidade humana, tenham de conceder o benefício assistencial diante da constatação da necessidade da pessoa com deficiência”.

Ainda, com todas as letras, a Ministra concluiu que, “no julgamento da ADIn 1.232, o SFT teve por constitucional, em tese, a norma do art. 20 da Lei nº 8.742, mas não afirmou inexistirem situações concretas que impusessem atendimento constitucional e não subsunção àquela norma”.

C) RCL 3.034/Pb

A interpretação do Supremo ao art. 100, § 2º, da CF, de modo uniforme, é no sentido de que só é possível o sequestro de verba pública, para pagamento de precatório, quando houver preterição do direito de precedência do credor. Entretanto, na RCL 3034/PB, em decisão de 21.09.2006, na análise do agravo regimental, o STF considerou também a hipótese de não pagamento de preca-tório alimentício à pessoa idosa.

O Ministro Eros Grau, no agravo regimental na reclamação citada, no voto-vista, afirmou que o fato de o credor, via precatório, estar acometido de doença grave tornava a situação excepcional, pois a norma só vale para as situa ções normais, de sorte que as situações de anormalidades fogem à regra, pois o caso não está contemplado pela norma. O Ministro Eros Grau deixou

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claro, no voto, que há distinção entre a norma abstrata e sua aplicação no caso concreto:

[...] 7. Permito-me, ademais, insistir em que, ao interpretarmos/aplicarmos o di-reito, [...] porque aí não há dois momentos distintos, mas uma só operação [...] ao praticarmos essa única operação, isto é, ao interpretarmos/aplicarmos o direi-to, não exercitamos no mundo das abstrações, porém trabalhamos com a mate-rialidade mais substancial da realidade. Decidimos não sobre teses, teorias ou doutrinas, mas situações do mundo da vida. Não estamos aqui a prestar contas a Montesquieu ou a Kelsen, porém vivificamos o ordenamento, todo ele. Por isso o tomamos na sua totalidade. Não somos meros leitores de seus textos [...] para o que nos bastaria a alfabetização [...] mas Magistrados que produzem normas, tecendo e recompondo o próprio ordenamento.

AdC 16 (ArtIgo 71, § 1º, dA leI Nº 8.666/1993)

Com efeito, o art. 1º da Lei de Licitações nº 8.666/1993 trata da contrata-ção de obras e serviços, incluídos os contratos de prestação de serviços tercei-rizados, e expressamente disciplina sua aplicabilidade à Administração Pública direta e indireta federal, estadual, distrital e municipal, verbis:

Art. 1º Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrati-vos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da Ad-ministração direta, os fundos especiais, as Autarquias as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades contro-ladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

O art. 71, caput e § 1º, da mesma lei, a seu turno, trata da responsabili-dade do Poder Público nas licitações, verbis:

Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.

§ 1º A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regula-rização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis. [...]

A seu turno, a Súmula nº 331/TST, que trata da terceirização, traz a se-guinte diretriz jurisprudencial:

[...]

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IV – o inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da Administração direta, das Autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).

Em março de 2007, o governador do Distrito Federal ajuizou ação direta de declaração de constitucionalidade do art. 71 da Lei nº 8.666/1993. Funda-mentou que o comando legal apontado tem sofrido ampla retaliação por parte de órgãos do Poder Judiciário, em especial o Tribunal Superior do Trabalho, na aplicação da Súmula nº 331. Apontou que a Súmula nº 331/TST nega vigência ao § 1º do art. 71 da Lei nº 8.666/1993, eis que responsabiliza, subsidiariamen-te, a Administração Pública, direta e indireta, pelos débitos trabalhistas na con-tratação de qualquer serviço de terceiro especializado. Ingressaram na ação de constitucionalidade, como amicus curiae (amigos da Corte), a União, a maioria dos Estados e muitos Municípios.

O Relator Ministro Cezar Peluso, diante da complexidade da matéria, en-tendeu necessária uma decisão colegiada e, assim, negou a liminar pretendida. Iniciado o julgamento em setembro de 2008, o Relator votou pelo não conhe-cimento da ação. O Ministro Menezes Direito (falecido) pediu vista dos autos. O Ministro Marco Aurélio votou pelo conhecimento e julgamento do mérito.

Em 24 de outubro de 2010, o julgamento foi retomado. O Presidente do STF e o Relator Ministro Cezar Peluso mantiveram a posição pelo arquivamento da ação, à míngua de controvérsia, na medida em que, no seu entendimento, ao editar o Enunciado nº 331, o TST não declarou a inconstitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993.

Entretanto, a Ministra Cármen Lúcia (sucessora do Ministro Menezes Di-reito) apresentou divergência; votou pelo conhecimento da ação e julgamen-to pelo mérito, tendo em conta a discussão acerca da constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993. Apontou a existência de inúmeros questio-namentos das decisões do Tribunal Superior do Trabalho e demais Tribunais Regionais do Trabalho, bem como considerável número de ações pendentes de julgamento e de reclamações constitucionais (RCLs) junto ao Supremo, todas atacando a Súmula nº 331/TST.

O Ministro Marco Aurélio asseverou que a Súmula nº 331 foi editada com base no art. 2º da CLT, que demarca a figura do empregador, e no art. 37, § 6º, da CF, que responsabiliza as pessoas de direito público por danos causa-dos por seus agentes a terceiros.

O Ministro Ayres Britto lembrou que só há três formas constitucionais de contratação pessoal no setor público: por concurso, por nomeação para cargo

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em comissão e por contratação por tempo determinado, para suprir necessida-de temporária. Assim, embora amplamente praticada, a terceirização não tem previsão constitucional. Portanto, na hipótese de inadimplência das obrigações trabalhistas do contratado, atrai a responsabilidade civil do Poder Público.

O Ministro Dias Toffoli, que atuou na ação como Advogado-Geral da União, deu-se por impedido.

Enfim, por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 (Lei de Licitações). O comando legal prevê que o inadimplemento das obrigações trabalhistas na terceirização não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento.

A questão, doravante, radica em perquirir sobre os efeitos da declaração de constitucionalidade, bem como os efeitos do julgamento das reclamações constitucionais frente à Súmula nº 331/TST, como deve se posicionar o Judi-ciário Trabalhista na análise das ações que envolvem a terceirização no setor público.

A derrotA ApAreNte dA SÚmulA Nº 331/tSt NA AdC 16/dF

Face ao entendimento fixado na ADC 16, o Pleno do STF deu provimento a inúmeras reclamações (RCLs) contra decisões do TST e de Tribunais Regionais do Trabalho fundamentadas na Súmula nº 331/TST, entre elas as RCLs 7517 e 8150.

O Presidente do STF, entretanto, ressalvou que isso “não impedirá o TST de reconhecer a responsabilidade, com base nos fatos de cada causa”, pois o “STF não pode impedir o TST de, à base de outras normas, dependendo das causas, reconhecer a responsabilidade do Poder Público”.

Ressalvou, ademais, que o fundamento utilizado pelo TST é a responsa-bilidade pela omissão culposa da Administração Pública, em relação à fiscali-zação da empresa contratada, quanto à idoneidade e cumprimento ou não dos encargos sociais nos contratos de licitação de prestação de serviços.

Houve um consenso no julgamento no sentido de que o TST não pode-rá generalizar os casos. Portanto, o Judiciário Trabalhista deverá primar pela busca da verdade real, qual seja, investigar, com rigor, se a inadimplência dos direitos trabalhistas pelos contratados, fornecedores de mão de obra, teve como causa principal, direta ou indireta, a inexecução culposa ou a omissão culposa na fiscalização do cumprimento do contrato de licitação, pelo órgão público contratante.

No neoconstitucionalismo, o sentido das normas constitucionais já não pode ser mais designada, a priori, pela simples leitura do seu enunciado abstra-to. Luís Roberto Barroso e Ana Paula de Barcellos asseveram que:

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Em diversas situações, inclusive e notadamente nas hipóteses de colisão de nor-mas e de direitos constitucionais, não será possível colher no sistema, em tese, a solução adequada: ela somente poderá ser formulada à vista dos elementos do caso concreto, que permitam afirmar qual desfecho corresponde à vontade cons-titucional. [...] É preciso saber se o produto da incidência da norma sobre o fato realiza finalisticamente o mandamento constitucional.22

Deste modo, o conteúdo da norma é revelado por ocasião da interação entre o texto normativo e as circunstâncias do caso concreto. Dessarte, “a nor-ma, na sua dicção abstrata, já não desfruta da onipotência de outros tempos. Para muitos, não se pode sequer falar da existência de norma antes que se dê a sua interação com os fatos, tal como pronunciada por um intérprete”23.

A constatação de que uma norma pode ser constitucional, em tese, in abstrato, mas não exclui a possibilidade de ser inconstitucional in concreto, à vista da situação submetida a exame, é corolário do raciocínio tópico.

Conclui-se, pois, que a declaração de constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 não impede a fixação da responsabilidade da Admi-nistração Pública na terceirização, no caso concreto, à luz das circunstâncias e provas, visando a resguardar os princípios da dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho (art. 1º, III e IV, da CF), sendo plenamente compatível com a decisão do STF na ADC 16.

A ClÁuSulA de reServA de pleNÁrIo e A SÚmulA Nº 331/tSt

Diante do comando do art. 97 da Constituição, temos que: “Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os Tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.

A polêmica acerca da aplicação da Súmula nº 331/TST com relação à Administração Pública teve novo direcionamento, por conta de outro funda-mento (noticia o TST em 13.12.2010). A Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou quatro decisões do Tribunal Superior do Trabalho (TST) baseadas na Súmula nº 331 (inciso IV), que impõe a respon-sabilidade subsidiária da Administração Pública aos contratos de terceirização, com base na cláusula da reserva de Plenário nos recursos (agravos regimentais) das Reclamações Constitucionais dos Estados de Amazonas (RCL 7901/AM), Rondônia (RCLs 7711 e 7712) e Sergipe (RCL 7868).

22 MENDES, Gilmar Ferreira. O começo da história: a nova interpretação constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro. In: BARROSO, Luís Roberto (Org.). A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 333-334.

23 Idem, ibidem.

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Segundo a Súmula Vinculante nº 10, viola a cláusula de reserva de Ple-nário (art. 97 da CF) a decisão de órgão fracionário de Tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.

Anteriormente, a Ministra havia negado seguimento às reclamações, con-tra julgados do TST, ajuizadas sob alegação de descumprimento da Súmula Vinculante nº 10 do Supremo. A Ministra redirecionou a sua decisão, tendo em vista que, em sessão plenária realizada no dia 24 de novembro de 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF), na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 16, declarou constitucional o art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 (Lei das Licitações), que proíbe a transferência de responsabilidades por encargos trabalhistas para os entes públicos.

Entendeu que, ao afastar a aplicação do § 1º do art. 71 da Lei nº 8.666/1993, com base na Súmula nº 331, inciso IV, o Tribunal Superior do Trabalho descumpriu a Súmula Vinculante nº 10 do Supremo Tribunal Federal. A Ministra ressaltou que, ao analisar a ADC 16, o Supremo decidiu que os Mi-nistros poderiam julgar monocraticamente os processos relativos à matéria, “na esteira daqueles precedentes”.

Nota-se que a derrota da Súmula nº 331/TST no caso é de ordem formal, e não material: inobservância da reserva de Plenário. Não se discute aqui o fato de a Súmula nº 331/TST ter sido aprovada pelo Pleno do TST, mas sim o fato de que o item IV, na sua aprovação, não foi precedida de debates acerca da (in)constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993.

Nesse contexto, a melhor interpretação da Súmula Vinculante nº 10 é a de que a negativa de vigência de uma norma, no caso concreto, não conduz, necessariamente, à conclusão de que, direta ou indiretamente, foi reconhecida a sua inconstitucionalidade, no todo ou em parte. A inconstitucionalidade que se equipara à negativa de vigência é aquela em que o juiz deixa de aplicar a norma porque a incidência do enunciado normativo, na hipótese concreta, pro-duz um resultado (uma norma) inconstitucional.

(re)poSICIoNAmeNto do judICIÁrIo trABAlhIStA

Dos debates em torno da aplicação da Súmula nº 331/TST, em relação à Administração Pública, exsurge que houve o deslocamento da questão para o contexto fático-probatório.

Verifica-se, por conseguinte, que a derrota da Súmula nº 331/TST é mais aparente do que real. Isto porque a súmula citada comandava a responsabi-lidade do Poder Público na terceirização, fundada na presunção absoluta da culpa, ou seja, responsabilidade objetiva, bastando tão só o inadimplemento das obrigações trabalhistas.

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Nesse sentido, o excelso Pretório salientou não haver possibilidade de invocar-se o art. 37, § 6º, da Constituição Federal, que trata da responsabilidade objetiva, porque o inadimplemento de verbas trabalhistas se perfaz pela empre-sa prestadora dos serviços terceirizados, contratada administrativamente, e não pela Administração Pública na condição de contratante.

Logo, a Corte Constitucional sinalizou que não é possível aplicar as re-gras da responsabilidade objetiva ou fundada na mera presunção de culpa in vigilando. Desta feita, a questão foi deslocada para o caso concreto, para o contexto fático-probatório, com relevo para o raciocínio tópico, com foco no problema a ser resolvido; o ônus da prova, na análise das provas coligidas dos fatos, do nexo causal, da culpa e do dano e sua extensão (arts. 333 do CPC e 818 do CLT); tudo legitimado pelo ônus da argumentação-fundamentação ade-quada (art. 93, IX, da CF), que desempenha um papel destacado na atualidade, para viabilizar o controle da aplicação racional e razoável da Constituição.

Mister, pois, a prova da ilicitude, da fraude, da inexecução culposa ou da omissão ou imperfeição na fiscalização do contrato de licitação. Assim, a partes e o juiz devem cuidar das provas, da efetiva atuação culposa, subjetiva, do agente público, no sentido de causar, direta ou indiretamente, o indébito tra-balhista para os empregados que lhes tenham prestado serviços intermediados. O juiz decidirá de acordo com o livre convencimento motivado, cujo ônus é expor o raciocínio e as razões de decidir fundamentadamente.

A declaração de constitucionalidade da Lei de Licitações (Lei nº 8.666/1993), art. 71, § 1º, pelo Supremo Tribunal Federal (ADC 16) foi fei-ta in abstrato, desvinculado de qualquer caso concreto, na consideração de um processo de licitação em condições de legalidade e normalidade. Portanto, não constitui salvo conduto ou incondicional ausência de responsabilidade pe-los danos à que deu causa a Administração Publica, por meio de contratação precedida de procedimento licitatório. Se restar provado que a Administração Pública, por seu agente público, de qualquer modo, concorreu com descum-primento da legislação trabalhista, atrai a responsabilidade pelos débitos traba-lhistas.

Por outras palavras, há no caso uma aparente derrota da Súmula nº 33 do TST, pois o seu conteúdo não foi suplantado, mas sim o seu modo de aplicação final. As conclusões aqui externadas não são incompatíveis com a ideia de nova redação para a Súmula nº 331, agora firmada na esteira dos debates travados no STF.

O art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 não trata da hipótese em que o inadimplemento das obrigações trabalhistas decorre, direta ou indireta, da con-duta culposa da Administração Pública. Havendo nexo causal, não obsta o re-conhecimento da responsabilidade do Poder Público, ainda que subsidiária,

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por conta da aplicação de outras normas previstas no ordenamento jurídico. Nesse sentido, o art. 37, XXI, da CF/1988 determina a exigibilidade de o Poder Público observar o procedimento licitatório para celebrar contratos com parti-culares e nos termos da lei geral que regula as licitações. A seu turno, o art. 27 da Lei nº 8.666/1993 comanda... E, ainda, os arts. 58, III, e 67, caput e § 1º, da Lei nº 8.666/1993 comandam a responsabilidade na fiscalização da execução do contrato de licitação. Se o administrador público não cumpre as obrigações constitucionais e legais a seu cargo, no dever de fiscalizar o contrato firmado, seja em sua celebração, seja durante todo o período de execução, qualquer le-são daí oriunda acarreta a sua responsabilização por danos causados a terceiros.

O dever do administrador é fiscalizar, tanto na celebração do contrato como em sua execução, razão porque sua ação ou omissão gera, inexoravel-mente, como consequência, o dever de reparar os danos decorrentes de sua incúria no cumprimento do dever constitucional e legal imposto.

julgAmeNtoS do tSt pÓS-AdC 16Das considerações anteriormente articuladas conclui-se que nada impe-

de o Judiciário Trabalhista de, independente da existência, da validade, da in-validade ou da revogação do item IV da Súmula nº 331/TST, continuar julgando cada caso concreto e apurar e decidir acerca da responsabilidade do Poder Público na terceirização.

As questões que merecem cuidado cingem-se ao conjunto fático-proba-tório, ao ônus da prova, à busca da verdade real e ao dever da fundamentação, tendo em conta a necessidade de controle da racionalidade sistêmica na apli-cação do Direito.

Em pesquisa recente, verificou-se que o TST já concluiu alguns julgados envolvendo terceirização no setor público, após o pronunciamento do STF na ADC 16, conforme ementas abaixo:

AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO – RESPONSABILIDADE SUBSIDI-ÁRIA – ADC 16 – CULPA IN VIGILANDO – OMISSÃO DO ENTE PÚBLICO NA FISCALIZAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO – DESPROVIMENTO – Con-firma-se a decisão que, por meio de despacho monocrático, negou provimento ao agravo de instrumento, por estar a decisão recorrida em consonância com a Súmula nº 331, IV, do col. TST. Nos termos do entendimento manifestado pelo eg. STF, no julgamento da ADC 16, em 24.11.2010, é constitucional o art. 71 da Lei nº 8.666/1993, sendo dever do Judiciário trabalhista apreciar, caso a caso, a conduta do ente público que contrata pela terceirização de atividade-meio. Necessário, assim, verificar se ocorreu a fiscalização do contrato realizado com o prestador de serviços. No caso em exame, o ente público não cumpriu o dever le-gal de vigilância, registrada a omissão culposa do ente público, ante a constatada inadimplência do contratado no pagamento das verbas trabalhistas, em ofensa ao princípio constitucional que protege o trabalho como direito social indisponível,

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a determinar a sua responsabilidade subsidiária, em face da culpa in vigilando. Agravo de instrumento desprovido. (TST, Ag-AIRR 153040-61.2007.5.15.0083, 6ª T., Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, J. 15.12.2010, DJ 28.01.2011)

RECURSO DE REVISTA – ENTE PÚBLICO – RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁ-RIA – ADC 16 – JULGAMENTO PELO STF – CULPA IN VIGILANDO – OCOR-RÊNCIA NA HIPÓTESE DOS AUTOS – ARTS. 58, III, E 67, CAPUT E § 1º, DA LEI Nº 8.666/1993 – INCIDÊNCIA – O STF, ao julgar a ADC 16, considerou o art. 71 da Lei nº 8.666/1993 constitucional, de forma a vedar a responsabilização da Administração Pública pelos encargos trabalhistas devidos pela prestadora dos serviços, nos casos de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do vencedor de certame licitatório. Entretanto, ao examinar a referida ação, firmou o STF o entendimento de que, nos casos em que restar demonstrada a culpa in vigilando do ente público, viável se torna a sua responsabilização pelos encargos devidos ao trabalhador, já que, nesta situação, a Administração Pública responderá pela sua própria incúria. Nessa senda, os arts. 58, III, e 67, caput e § 1º, da Lei nº 8.666/1993 impõem à Administração Pública o ônus de fiscalizar o cumprimento de todas as obrigações assumidas pelo vencedor da licitação (dentre elas, por óbvio, as decorrentes da legislação laboral), razão pela qual à entidade estatal caberá, em juízo, trazer os elementos necessários à formação do convencimento do Magistrado (arts. 333, II, do CPC e 818 da CLT). Na hipótese dos autos, além de fraudulenta a contratação do autor, não houve a fiscalização, por parte do Estado-recorrente, acerca do cumprimento das ditas obrigações, conforme assinalado pelo Tribunal de origem, razão pela qual deve ser mantida a decisão que o responsabilizou subsidiariamente pelos encargos devidos ao au-tor. Recurso de revista não conhecido. (TST, RR 67400-67.2006.5.15.0102, 1ª T., Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, J. 07.12.2010, DJ 17.12.2010)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECURSO DE REVISTA – RECONHECIMENTO DE VÍNCULO DE EMPREGO COM A TOMADORA DE SERVIÇO – ENTIDADE PÚBLICA – IMPOSSIBILIDADE – RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA – CULPA IN VIGILANDO – ISONOMIA SALARIAL – OJ 383, SBDI-1/TST – Na hipótese, o Regional consignou que a reclamante foi contratada por intermédio de empresa terceirizada e passou a laborar como caixa, percebendo, contudo, remuneração inferior aos empregados da CEF que exerciam as mesmas funções. É entendi-mento desta Corte que a contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com ente da Administração Pública, não afastando, contudo, pelo princípio da isonomia, o direito dos empregados terceirizados às mesmas verbas trabalhistas legais e normativas asseguradas àqueles contratados pelo tomador dos serviços, desde que presente a igualdade de funções. Trata-se de aplicação analógica do art. 12, a, da Lei nº 6.019, de 03.01.1974 (OJ 383, SDI-1/TST). Noutro norte, as entidades estatais têm respon-sabilidade subsidiária pelas dívidas previdenciárias e trabalhistas das empresas terceirizantes que contratam, nos casos em que desponta sua culpa in vigilando, quanto ao cumprimento da legislação trabalhista e previdenciária por parte da empresa terceirizante contratada. É, portanto, constitucional o art. 71 da Lei nº 8.666/1993 (ADC 16, julgada pelo STF em 24.11.2010), não implicando, po-

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rém, naturalmente, óbice ao exame da culpa na fiscalização do contrato tercei-rizado. Evidenciada essa culpa nos autos, incide a responsabilidade subjetiva prevista nos arts. 186 e 927, caput, do CCB/2002, observados os respectivos períodos de vigência. Assim, em face dos estritos limites do recurso de revista (art. 896 da CLT), não é viável reexaminar a prova dos autos a respeito da efetiva conduta fiscalizatória do ente estatal (Súmula nº 126/TST). Agravo de instrumen-to desprovido. (TST, AIRR 71240-34.2009.5.13.0006, 6ª T., Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, J. 01.12.2010, DJ 10.12.2010)

CoNCluSãoA conclusão que se extrai do presente estudo é a de que os casos paradig-

máticos supramencionados, por si só, explicam a ressalva feita pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, na ADC 16, no julgamento da constitucionalida-de do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993, no sentido de que tal “não impedirá o TST de reconhecer a responsabilidade, com base nos fatos de cada causa”, pois o “STF não pode impedir o TST de, à base de outras normas, dependendo das causas, reconhecer a responsabilidade do Poder Público”.

Em suma, é possível concluir que, segundo entendimento do STF, na ADC 16/DF:

1. Ao admitir a possibilidade de fixação da responsabilidade da Admi-nistração Pública, à vista do caso concreto e/ou fundado em outras normas, o STF assumiu o papel que lhe cabe, de guardião da Cons-tituição, de fazer valer prevalência dos princípios constitucionais fundantes do Estado Democrático e assegurar caminhos para a efe-tivação dos direitos fundamentais.

2. É totalmente inapropriado impedir o Judiciário Trabalhista de re-apreciar a constitucionalidade ou não do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993, anteriormente declarada válida, à vista de novos ar-gumentos e das circunstâncias fático-probatórias, que só acontecem no contato da norma com a realidade, qual seja, no caso concreto, isto é, no modo final de aplicação do direito

3. É no momento da interpretação, no caso concreto, e à luz das suas circunstâncias reais que o enunciado normativo adquire vida e sig-nificado e passa a determinar condutas, quer estatais, quer dos par-ticulares.

4. A constitucionalidade do art. 71 da Lei nº 8.666/1993 não significa inconstitucionalidade dos “comportamentos judiciais” que, no caso concreto, à luz dos fatos e provas, venham a decidir pela responsa-bilidade da Administração Pública, para atender ao princípio cons-titucional da dignidade humana.

5. Assim, a proteção social do trabalhador, que presta serviços em fa-vor da Administração Pública e acaba por não receber seus créditos

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trabalhistas, não pode conduzir à consideração de responsabilidade objetiva do Poder Público pelo indébito causado por terceiro. Nada obsta, contudo, a perquirir se o agente público agiu com culpa para a ocorrência do inadimplemento dos débitos trabalhistas. Se não for evidenciada, de qualquer modo, ação ou omissão, direta ou indi-reta, na modalidade culposa do agente público em detrimento do contrato administrativo para a prestação de serviços terceirizados, não há como emergir responsabilidade da Administração Pública em relação às obrigações trabalhistas da empresa contratada, à luz do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993. Essa é a linha do entendimen-to pacificado pelo col. Supremo Tribunal Federal.

6. Se a Administração Pública “deu causa” ao inadimplemento das verbas trabalhistas, na terceirização, seja por ato comissivo ou por omissão, conjunto de direitos ligados à manutenção da própria vida humana, é defensável a sindicabilidade judicial da conduta estatal em prol da tutela da dignidade da pessoa humana.

7. Isto porque não é possível olvidar que há normas constitucionais, de larga envergadura, que têm implicações sociais, políticas e eco-nômicas, a exemplo dos princípios fundamentais positivados no art. 1º, tais como a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho e da livre iniciativa; bem como os direitos fundamentais que se afirmam por meio de princípios ligados aos direitos sociais (arts. 6º e 7º), à ordem econômica (art. 170), à Seguridade Social (art. 194), à saúde (art. 196), à assistência social (art. 203) e à cultura (art. 215), entre tantos outros dispositivos constitucionais.

8. O mesmo raciocínio pode ser aplicado a outras situações envolven-do direitos fundamentais, dotados de um núcleo mínimo irredutível, ligados à manutenção do mínimo existencial, consistente no direito às condições mínimas de existência humana digna, e que exigem do Estado prestações positivas e ou que vinculam os particulares nas relações privadas.

9. As questões que merecem cuidado cingem-se ao conjunto fático--probatório, ao ônus da prova, à busca da verdade real e ao dever da fundamentação, tendo em conta a necessidade de controle da racionalidade sistêmica na aplicação do Direito. Assim, é exigida maior investigação, e não apenas a presunção ou mera considera-ção de dever de eleição ou de vigilância em relação à execução do contrato administrativo. Resulta, pois, a exortação do uso tópico, foco na solução do caso concreto, cuidado com as provas, e da questão do convencimento motivado juiz, demonstrado cabalmen-te pela argumentação-fundamentação adequada (art. 93, IX, da CF).

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10. Enfim, houve uma derrota meramente aparente da Súmula nº 331/TST. Não houve um discreto retorno à teoria da irresponsabilidade estatal dos idos do Estado autoritário, interpretação que não se coaduna com o Texto Constitucional, sob pena de desconstrução do Estado Demo-crático de Direito, máxime na vertente da responsabilidade do Estado.

Doravante, o Judiciário Trabalhista deve redirecionar a questão para a análise do caso concreto, com base no conjunto fático-probatório posto a seu julgamento, centrado no nexo causal, culpa e dano, para fixar a corresponsabi-lidade da Administração Pública pelos serviços terceirizados contratados, à luz das regras e princípios, diante de um caso concreto. Trata-se, pois, da atividade de ponderação da regra e suas exceções, ou ponderação das razões ou razões excepcionais, ou teoria de excepcionalidade, ou “aptidão para cancelamento (defeasibility) das regras”.

O art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 trata da regra geral que isenta de responsabilidade a Administração Pública, mas não cuida da hipótese em que esta deu causa ao inadimplemento. A leitura do texto é no sentido de que a inadimplência do contratado, sem o concurso da Administração Pública, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere a respon-sabilidade por seu pagamento.

Logo, a regra comporta exceções previstas na ordem jurídica, pois cum-pre à Administração Pública fiscalizar o procedimento licitatório de terceiri-zação no ato da contratação e na fase de execução, máxime no que tange à regularidade trabalhista e fiscal. Se por sua omissão culposa resultar dano, todo aquele que por ação ou por omissão causar dano comete ato ilícito e deve reparar (art. 37, XXI, da CF; arts. 27, IV, 58, III, e 67, caput e § 1º, da Lei nº 8.666/1993; e art. 186 do CC). Assim, há outras razões, calcadas em outras normas, para afastar a regra geral (overrling) fundada em exceção prevista no próprio ordenamento jurídico. O requisito de apresentação de certidão de re-gularidade trabalhista e fiscal e outros documentos comprobatórios da quitação mensal das verbas trabalhistas, na terceirização, durante a execução do contra-to, previnem lesões e responsabilidades.

Na tarefa do modo final de aplicação da norma, o correto não será de-clarar a inconstitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1991. É inapro-priado, também, falar em negativa de vigência do referido texto legal, tendo em conta a sua inespecificidade ao caso concreto. O correto é apenas reconhecer, pela técnica da ponderação, que há possibilidade de que o art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 seja conjugado, no caso concreto, com outros fatores e normas, que trazem as exceções, tais como as previstas no art. 37, XXI, da CF, arts. 27, IV, 58 III e 67, caput e § 1º, da Lei nº 8.666/1993 e demais regras da responsa-bilidade civil encravadas no Código Civil.

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Assunto Especial – Doutrina

Terceirização na Administração Pública

Terceirização na Administração Pública: Breves Reflexões Críticas1

LUCIANO ELIAS REIS Advogado, Sócio do Escritório Reis, Correa e Lippmann Advogados Associados, Mestre em Direito Econômico pela PUCPR, Especialista em Processo Civil e em Direito Administrativo, ambos pelo Instituto de Direito Romeu Felipe Bacellar, Presidente da Comissão de Gestão Pública e Controle da Administração da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Paraná, Professor de Direito Administrativo da UniCuritiba. Autor de obras jurídicas.

SUMÁRIO: Introito; I – Tratamento normativo da terceirização na Administração Pública Federal; II – Atividades passíveis de terceirização; III – Responsabilidade subsidiária trabalhista da Adminis‑tração Pública; Conclusão; Referências.

INtroIto

A contratação pela Administração Pública de serviços terceirizados é uma prática comum na atualidade, entretanto merece profícuas reflexões sobre o seu uso e as posições adotadas pelas Cortes de Contas e pelo Poder Judiciário, haja vista o distanciamento da teoria e da prática. Este ensaio objetiva um ree-xame crítico de alguns conceitos e comportamentos hodiernamente assentados nos órgãos e entidades públicas, sem qualquer pretensão de esgotamento ou de respostas exatas.

A Constituição da República Federativa de 1988 prescreveu a possibili-dade de contratar serviços de terceiros, desde que respeitados a regra e o prin-cípio do dever de licitar como expresso no inciso XXI do art. 37: “Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública [...]”.

O tema não é uma novidade ou exclusividade da Administração Pública, isto porque a terceirização advém historicamente do setor privado após a Se-gunda Guerra Mundial. Trata-se de um fenômeno ocasionado por critérios eco-nômicos que altera a linha de produção e a iniciativa privada, principalmente para diminuir os custos na formação de preços dos objetos, ainda mais em um

1 Artigo publicado na Revista eletrônica do tribunal Regional do trabalho da 9ª Região (REIS, Luciano Elias. Terceirização na Administração Pública: breves reflexões críticas. Revista eletrônica – tribunal Regional do trabalho do Paraná, v. 4, p. 113-122, 2014).

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mundo globalizado e deveras competitivo. Como explicam Jorge Ulisses Jacoby Fernandes e Diva Belo Lara, a

terceirização teve origem nos Estados Unidos da América após a Segunda Guerra Mundial, quando as indústrias de armamento passaram a buscar parceiros exter-nos para aumentar sua capacidade de produção. Em meados da década de 40, esta técnica foi largamente utilizada pelos países europeus que participaram da Segunda Guerra Mundial, para a produção de armamentos.2

No Brasil, segundo estudos de Osvaldo Nunes Alves, a terceirização em geral começou a surgir em 1929, já que o País estava assolado por uma crise econômica e por esta razão os cafeicultores investiram em indústrias que em-pregavam terceiros para a execução de tarefas secundárias, a fim de economi-zar o valor destinado à mão de obra3. Em outra pesquisa sobre o tema, Amelia Midori Yamane Sekido descreve que a terceirização no Brasil aparece nas déca-das de 1950 e 1960, quando fora adotada pela indústria automobilística4.

No âmbito normativo da Administração Pública, a terceirização tem guarida no Decreto-Lei nº 200/1967, quando expressa que um dos princípios fundamentais é a descentralização, consoante reza o art. 6o. Depois, o art. 10 prescreve que as atividades da Administração serão amplamente descentraliza-das e, em seu § 7º, há a previsão de que,

para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervi-são e controle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da má-quina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização ma-terial de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução.

Conforme Cristiana Fortini e Virginia Kirchmeyer Vieira, “a terceiriza-ção costuma ser definida como processo de gestão empresarial que consiste na transferência para terceiros de serviços que, originalmente, seriam executados dentro da própria empresa”5. Desse modo, é a contratação de um terceiro para a prestação de serviços para uma pessoa, a qual se aproveita e frui do resultado do labor dos funcionários desse terceiro.

2 FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby; LARA, Diva Belo. Terceirização no serviço público. Disponível em: <http://www.jacoby.pro.br/novo/uploads/recursos_humanos/legis/terceirizacao/TSP.pdf.>. Acesso em: 31 out. 2014.

3 ALVES, Osvaldo Nunes. Terceirização de serviços na Administração Pública. Disponível em: <http://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2054228.PDF>. Acesso em: 31 out. 2014.

4 SEKIDO, Amelia Midori Yamane. Terceirização na Administração Pública: a gestão e a fiscalização dos con-tratos. Disponível em: <http://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2055866.PDF>. Acesso em: 31 out. 2014.

5 FORTINI, Cristiana; VIEIRA, Virginia Kirchmeyer. A terceirização pela Administração Pública no direito admi-nistrativo: considerações sobre o Decreto nº 2.271/1997 e a Instrução Normativa nº 2/2008. In: FORTINI, Cristiana. terceirização na Administração. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 25-38, p. 27.

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A terceirização na Administração Pública inicialmente encontra espeque em um contexto econômico e utilitarista, o qual não poderá distanciar-se de ou afrontar o sistema jurídico. Não há dúvidas de que muitos efetuam o cálculo de quanto custa um servidor ou um empregado versus o montante a ser des-pendido para a contratação de uma empresa prestadora do serviço. Logo vem a pergunta: contratar diretamente o trabalhador (seja na condição de servidor público ou empregado público)6 ou contratar uma empresa e tomar o serviço do funcionário desta?

Esta indagação é respondida às vezes no seio dos órgãos e entidades quando do exercício da função administrativa a partir de critérios meramen-te utilitaristas ou por análise puramente financeira sem a observância do seu acolhimento pelo sistema jurídico. Neste diapasão, é impreterível recorrer aos comandos prescritos do sistema jurídico para encontrar a resposta escorreita, a qual determina que jamais poderá ocorrer a terceirização para burlar o também princípio e regra do concurso público para a seleção de uma pessoa apta para prover um cargo público ou um emprego público, após a devida disputa em um concurso público de provas ou de provas e títulos, nos termos insculpidos do inciso II do art. 37 da Constituição. Da mesma forma, a Lei de Responsabilidade Fiscal evita o uso da terceirização como mera substituição de servidores para fins de fuga ao cômputo dos limites de despesas com pessoal, segundo ressoa a partir da norma do § 1º do art. 187.

Valioso complementar que atualmente o tema de terceirização está em relevo nos noticiários em virtude da possível aprovação do Projeto Legislativo nº 4330/2004 em trâmite no Congresso Nacional, o qual será um marco regu-latório de duvidosa contribuição aos direitos trabalhistas, até porque muitas pretensas normas ali prescritas fragilizarão a esfera jurídica dos trabalhadores terceirizados.

Com efeito, percebem-se claramente a relevância e o cuidado no trato do assunto da terceirização na Administração Pública brasileira.

I – trAtAmeNto NormAtIvo dA terCeIrIzAção NA AdmINIStrAção pÚBlICA FederAl

No âmbito da Administração Pública Federal, a terceirização já foi ob-jeto de inúmeros textos normativos para regulamentá-la, e atualmente existe a

6 Diferenciam-se servidor público e empregado público em virtude do regime jurídico aplicável para nortear a sua relação funcional com a Administração Pública. Enquanto o servidor público possui um vínculo estatutário regido por uma lei que é o seu estatuto (como, por exemplo, a Lei nº 8.112/1990), o empregado público firma um contrato de trabalho amparado na CLT. Na Administração Pública, o empregado público é comum nas empresas públicas e sociedades de economia, apesar de ser possível o seu uso nas fundações de direito público de direito privado conquanto haja enormes debates na doutrina acerca da classificação e efetiva na-tureza jurídica das fundações públicas.

7 Sobre o assunto, vide questionamento e julgamento do Supremo Tribunal Federal acerca de constituciona-lidade da aludida previsão: ADIn 2.238-MC, Rel. p/o Ac. Min. Ayres Britto, Julgamento em 09.08.2007, Plenário, DJe de 12.09.2008.

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Instrução Normativa da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão nº 02/2008, que disciplina regras e diretrizes para a contratação de serviços continuados, bem como o Decreto Federal nº 2.271/1997, que dispõe sobre a contratação de serviços em geral, independentemente de serem continuados ou não8.

Historicamente, a Instrução Normativa SLTI/MPOG nº 02/2008 possui os seguintes regulamentos como precedentes: a Instrução Normativa do Ministério do Orçamento e Gestão nº 18/1997 e a Instrução Normativa nº 13, de 30 de outubro de 19969.

Forçoso recordar também que, no âmbito de terceirização de serviços na Administração Pública e cuidados para a realização das licitações e a fiscaliza-ção dos contratos administrativos gerados, o Estado de São Paulo merece des-taque em razão dos Estudos Técnicos de Serviços Terceirizados, denominado de CADTERC. Nos inúmeros cadernos técnicos emitidos pela Administração Pública Estadual de São Paulo, há a divulgação das diretrizes e regras indis-pensáveis a serem fixadas nas licitações e nos contratos terceirizados visando à modernização e padronização na atuação pelos inúmeros agentes públicos competentes atuantes em contratações similares em todo o território estadual.

A previsibilidade dos estudos está alicerçada nos Decretos Estaduais de São Paulo nºs 49.337/2005 e 48.326/2003. A título complementar, atualmente existem dezoito cadernos técnicos disponíveis no site www.cadterc.sp.gov.br. Conquanto seja aplicável à esfera estadual de São Paulo e considerando a boa qualidade das normas lá contidas, recomendam-se o uso e a cópia pelos demais Estados e Municípios.

Não há dúvidas de que os suscitados cadernos também serviram de inspi-ração para a confecção da Instrução Normativa SLTI/MPOG nº 02/2008, que se avolumou de informações e determinações ao comparar com a instrução nor-mativa anterior (IN 18/1997). Atualmente, o citado texto normativo contempla planejamento na fase interna da licitação, regras a serem colocadas nos editais de licitações, diretrizes para a gestão e fiscalização de contratos administrati-vos, ferramentas para evitar riscos e responsabilização do Poder Público, entre outros assuntos.

II – AtIvIdAdeS pASSíveIS de terCeIrIzAção

Como asseverado, a Constituição da República Federativa preceitua a contratação de serviços pela Administração Pública. Regulamentando o inciso XXI do art. 37 da Carta Magna, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos

8 A referida instrução normativa é aplicável aos órgãos e entidades integrantes do Sistema de Serviços Gerais – SISG, que, por sua vez, é regulamentado no Decreto Federal nº 1.094/1994.

9 A Instrução Normativa nº 18/1997 já foi calcada no Decreto Federal nº 2.271/1997.

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(Lei nº 8.666/1993) também dispõe em vários dispositivos. Vide, por exemplo, arts. 1º, caput, 2º, caput, 6º, I, 7º, entre outros diversos.

Qualquer serviço poderá ser descentralizado pelos órgãos e entidades estatais e repassados a um terceiro ou existe uma limitação? Para responder a esta inquirição, é necessário analisar as nebulosas e polissêmicas expressões “atividade-meio” e “atividade-fim”.

A terceirização na Administração Pública somente poderá ocorrer de ser-viços relacionados à atividade-meio. A atividade-fim deverá necessariamente ser desempenhada por um servidor ou um empregado especificamente contra-tado para este mister.

A atividade-meio é importante para a consecução das atribuições e fun-cionamento dos órgãos e entidades da Administração, no entanto não é a ati-vidade precípua ou principal. Enquanto a atividade-meio é considerada instru-mental e ancilar, a atividade-fim está relacionada à essência da existência e aos escopos em si das atribuições determinadas normativamente à Administração Pública.

Neste diapasão, as atividades principais e precípuas dos órgãos e enti-dades da Administração Pública não poderão ser terceirizados, sob pena de configurar flagrante ilegalidade.

O Decreto Federal nº 2.271/1997 prevê em seu art. 1º que, no âmbito da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, poderão ser objeto de execução indireta as atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade.

Os parágrafos do referido artigo estipulam algumas atividades considera-das meio na maioria dos órgãos e entidades e também quando não será legal a terceirização: (i) as atividades de conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática, copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações serão, de preferência, objeto de execução indireta (§ 1º); (ii) não poderão ser objeto de execução in-direta as atividades inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal (§ 2º).

Na mesma esteira, o art. 9º da Instrução Normativa SLTI/MPOG nº 02/2008 estabelece a inviabilidade de terceirizar serviços atinentes ao exer-cício do poder de polícia, de competências relacionadas à missão institucional

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do órgão ou entidade ou de préstimos previstos como deveres de algum cargo existente na estrutura funcional10.

Teoricamente, é mais fácil examinar a atividade-meio e a atividade-fim ao invés de analisar empiricamente nos casos concretos. Dependendo das cir-cunstâncias do suporte fático, poderá ser considerado atividade-fim ou não. A importância dessa diferenciação não se dá unicamente para fins do direito administrativo ou do direito do trabalho, mas também encontra reflexos para o direito tributário, previdenciário, entre outros.

Posto isso, em razão da aproximação existente entre tais atividades para caracterização de uma ilegalidade ou não no seio da Administração Pública, esta deverá tomar as devidas cautelas para a sua atuação, sempre primando pela conduta mais restritiva, a fim de não violar normas constitucionais como é o caso do dever de concurso público.

Sobre o assunto, Flávio Amaral Garcia denuncia a fragilidade para en-contrar o discrímen: “em algumas situações, o limite entre atividade-meio e atividade-fim é muito tênue, não sendo, na maior parte das vezes, solucionado por critérios jurídicos, mas por critérios empresariais inerentes à própria ativida-de”. O autor ainda verbera que

diferenciar as terceirizações lícitas das ilícitas por esse critério de atividade-meio e fim cria um ambiente de absoluta insegurança jurídico para o administrador público, que, diante de situações que se encontram na zona cinzenta, fica sem saber se pode ou não contratar determinado objeto, eis que isso pode ser consi-derado ilegal pela Justiça do Trabalho.11

Na seara da justiça trabalhista, é bastante recorrente a descaracteriza-ção de atividade-meio para atividade-fim com o escopo de evidenciar irregu-laridade na contratação de terceirizados em detrimento do concurso público. Para ilustrar e carrear um exemplo de decisão oriundo da Corte do Trabalho,

10 “Art. 9º É vedada a contratação de atividades que:

I – sejam inerentes às categorias funcionais abrangidas pelo plano de cargos do órgão ou entidade, assim definidas no seu plano de cargos e salários, salvo expressa disposição legal em contrário ou quando se tratar de cargo extinto, total ou parcialmente, no âmbito do quadro geral de pessoal;

II – constituam a missão institucional do órgão ou entidade; e

III – impliquem limitação do exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público, exercício do poder de polícia, ou manifestação da vontade do Estado pela emanação de atos administrativos, tais como:

a) aplicação de multas ou outras sanções administrativas;

b) a concessão de autorizações, licenças, certidões ou declarações;

c) atos de inscrição, registro ou certificação; e

d) atos de decisão ou homologação em processos administrativos.”11 GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e contratos administrativos. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

p. 324.

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colaciona-se o seguinte trecho, em que houve a terceirização dos préstimos de eletricista por uma empresa distribuidora de energia:

Desse modo, a terceirização somente será lícita nos casos de trabalho temporá-rio, serviços de vigilância, conservação e limpeza, e contratação de serviços es-pecializados ligados à atividade-meio do tomador e, ainda assim, se inexistentes os pressupostos inerentes ao contrato de emprego, na forma insculpida no art. 3º da CLT, máxime a pessoalidade e a subordinação jurídica.

No presente caso, porém, ao contrário do alegado pela recorrente, a terceiriza-ção havida entre as empresas não pode ser considerada lícita, na medida em que não se cogita de contratação de serviços especializados ligados à atividade-meio da tomadora de serviços, mas sim de autêntica atividade-fim.

Os serviços de eletricista, terceirizados pela segunda ré e prestados pelo autor, eram essenciais ao seu empreendimento, na sua notória condição de empresa distribuidora de energia.12

No caso supra, fica clarividente que deverá ser analisado o serviço a ser tomado frente à atividade principal desenvolvida pelo empregador, o que per si gerou uma condenação trabalhista nesta situação relatada.

Portanto, conclui-se que existem uma grande preocupação e a inseguran-ça jurídica de saber o que poderá ser terceirizado na Administração Pública, já que inexistem critérios normativos objetivos.

III – reSpoNSABIlIdAde SuBSIdIÁrIA trABAlhIStA dA AdmINIStrAção pÚBlICA

Além do perigo apontado no item anterior, tais contratos também geram uma incomensurável preocupação da Administração Pública em razão do risco de responsabilidade subsidiária trabalhista.

A Lei de Licitações, em seu art. 71, § 1º, preconiza que

a inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.

Todavia, tal dispositivo era constantemente confrontando com o teor da anterior redação da Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que possi-bilitava a responsabilização subsidiária da Administração Pública tomadora de serviço em caso de inadimplemento pelo empregador13.

12 Tribunal Superior do Trabalho, AI-RR 36140-67.2009.5.03.0112, 4ª T., Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen, Data de Julgamento: 12.05.2010, Data de Publicação: DEJT 21.05.2010.

13 “I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

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Frente a este combate entre a Lei de Licitações e a súmula, o dispositivo legal foi questionado no Supremo Tribunal Federal acerca de sua constituciona-lidade. Tal assunto foi julgado pela Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 16, a qual definiu pela constitucionalidade do art. 71, § 1º, e pela sua inter-pretação sistemática com as demais normas da legislação de licitações, mor-mente àquelas que preveem o dever de fiscalização do contrato administrativo por representante devidamente designado pela Administração contratante14.

Com supedâneo nessa decisão do Supremo Tribunal Federal, o Tribunal Superior do Trabalho alterou a Súmula nº 331 a fim de inserir os incisos V e VI, determinando que a responsabilidade subsidiária trabalhista deverá ocorrer caso fique constatada culpa da Administração Pública na fiscalização do cum-primento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora:

V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666/1993, espe-cialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decor-re de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

A partir deste raciocínio e previsão sumular, os órgãos e entidades da Administração Pública deverão realçar ainda mais a devida e correta fiscaliza-ção contratual, pois ela poderá alijar possíveis responsabilizações subsidiárias trabalhistas.

II – A contratação irregular de trabalhador, através de empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da Constituição da República).

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993) (alterado pela Res. 96/2000, DJ 18.09.2000).”

14 “RESPONSABILIDADE CONTRATUAL – Subsidiária. Contrato com a Administração Pública. Inadimplência negocial do outro contraente. Transferência consequente e automática dos seus encargos trabalhistas, fiscais e comerciais, resultantes da execução do contrato, à administração. Impossibilidade jurídica. Consequência proibida pelo art., 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666/1993. Constitucionalidade reconhecida dessa norma. Ação direta de constitucionalidade julgada, nesse sentido, procedente. Voto vencido. É constitucional a norma inscrita no art. 71, § 1º, da Lei federal nº 8.666, de 26 de junho de 1993, com a redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995.”

(STF, ADC 16, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, Julgado em 24.11.2010, DJe-173 Divulg. 08.09.2011, Public. 09.09.2011; Ement., v. 02583-01, p. 00001; RtJ, v. 00219, p. 00011)

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O dever de fiscalizar os contratos administrativos não é uma novidade, isto porque é uma cláusula exorbitante, consoante regra do art. 58, III, da Lei nº 8.666/1993. Depois no próprio teor da lei, há os arts. 67 e seguintes, que enfa-tizam a fiscalização e como deverá portar-se o representante designado para ser fiscal de contrato. Abre-se parêntese para advertir que o tema não foi novidade na legislação, isto porque o texto normativo anterior à Lei nº 8.666/1993, qual seja, o Decreto-Lei nº 2.300/1986, também preconizava o dever de fiscalizar. No âmbito federal das terceirizações, o Decreto Federal nº 2.271/1997 estatui o dever de ser indicado um gestor do contrato para acompanhamento e fisca-lização da execução contratual15. Na mesma toada, os arts. 31 e seguintes da Instrução Normativa SLTI/MPOG nº 02/2008 ressoam sobre o assunto.

Salienta-se que é dever da Administração Pública a demonstração da correta e percuciente fiscalização, comprovando as atitudes e os documentos apreciados durante a execução do contrato com o intuito de afastar a responsa-bilidade subsidiária. O ônus da prova deverá ser da Administração contratante em razão da própria responsabilidade objetiva preconizada no art. 37, § 6º, da Constituição. Caso seja afastada esta regra constitucional por versar sobre danos decorrentes de relação extracontratual, o que não se entende como raciocínio adequado, mas se cogita por eventualidade, deve-se primar pelo ônus à Admi-nistração pela claríssima hipossuficiência do empregado versus o empregador e o tomador do serviço.

Não bastam palavras ou verborragia para repulsar qualquer responsabi-lidade, mas as petições e defesas deverão estar fartamente acompanhadas de documentos colhidos, requisitados e analisados durante a execução contratual. Para tanto, é imprescindível pensar em planejamento e organização preventiva.

O planejamento estampa-se na exigência editalícia e contratual dos do-cumentos fundamentais para perquirir a regularidade ou não das verbas tra-balhistas durante o transcorrer da execução contratual, o que por sinal será sentido quando da elaboração do ato convocatório. O ato-regra que disciplina as condições para a licitação e para a execução contratual já deverá prescrever todos os documentos a serem apresentados pelas empresas, a periodicidade, o formato, quem fiscalizará, entre outras informações básicas. Com esteio nesta prescrição normativa16, incumbirá à rigorosa fiscalização observar todas as exi-gências. A organização reside no fato de arquivar os documentos da fiscaliza-ção e gestão contratual após a extinção do contrato, bem como existirem uma

15 “Art. 6º A administração indicará um gestor do contrato, que será responsável pelo acompanhamento e fisca-lização da sua execução, procedendo ao registro das ocorrências e adotando as providências necessárias ao seu fiel cumprimento, tendo por parâmetro os resultados previstos no contrato.”

16 O edital de licitação prescreve normas a serem cumpridas pela Administração e pelos fornecedores, conforme princípio da vinculação ao instrumento convocatório.

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harmonia e linguagem institucional para que as procuradorias tenham acesso a tais robustas documentações a serem demonstradas em juízo.

Sobre a posição adotada pelos Tribunais Trabalhistas, transcreve-se uma decisão do Tribunal Superior do Trabalho transluzindo o dever de comprovar efetiva fiscalização pela Administração Pública para afastar a responsabilidade subsidiária:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECURSO DE REVISTA – RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA – ENTE PÚBLICO – CARACTERIZAÇÃO DE CULPA IN VIGILANDO – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 331, V, DO TST – LIMITAÇÃO DA CONDE-NAÇÃO – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 331, VI, DO TST – Do quadro fático delineado pelo TRT extrai-se que a condenação decorre da culpa in vigilando dos tomadores dos serviços. Com efeito, consta do v. acórdão recorrido que: os tomadores respondem pela culpa in vigilando e in eligendo, já que foram benefi-ciários do trabalho prestado pela reclamante, posto que os direitos reconhecidos tiveram origem no curso do contrato de trabalho e cabia aos tomadores zelar pela contratação de empresa idônea e cumpridora de suas obrigações, justificando-se a responsabilização subsidiária, já que restou evidente a ausência das cautelas necessárias à execução do contrato de terceirização de modo afeiçoado aos rigo-rosos parâmetros legais de fiscalização retroenunciados. Como visto, o segundo e o terceiro reclamados não produziram qualquer prova de fiscalização quanto ao integral cumprimento das obrigações trabalhistas pela prestadora, deixando de juntar recibos, planilhas, indicação de representante, prova de visitas e controle diário ou mensal, comprovantes de recolhimentos. Desta maneira, devem arcar com o risco inerente à pactuação, responsabilizando-se subsidiariamente pelos direitos do obreiro (fls. 248-249 – grifei). Nesse contexto, inviável a admissibili-dade do recurso de revista, pois a decisão recorrida encontra-se em consonância com o item V da Súmula nº 331/TST. No tocante ao tema “Limitação da Conde-nação”, a v. decisão regional está em consonância com a Súmula nº 331, VI, do TST. Agravo de instrumento conhecido e não provido.

(Tribunal Superior do Trabalho, AI-RR 1784-11.2011.5.02.0013, 4ª T., Rel. Min. Alexandre de Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 15.10.2014, Data de Publicação: DEJT 17.10.2014)

Outrossim, convém ressaltar que o presente tema poderá sofrer modifi-cação na interpretação anteriormente indicada ou ratificação, isto porque está pendente de julgamento perante o Supremo Tribunal Federal a repercussão ge-ral no Recurso Extraordinário nº 760.931. Desse modo, por enquanto, deverá a Administração Pública ser justa e rigorosa na fiscalização das empresas terceiri-zadas e aguardar a posição da Corte Suprema.

CoNCluSão

Diante de todo este cenário brevemente relatado sobre a terceirização na Administração Pública, no âmbito federal, a Instrução Normativa SLTI/MPOG

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nº 02/2008 estabeleceu diretrizes e regras a serem observadas para evitar qual-quer risco de uma possível responsabilização. Várias ferramentas estão imple-mentadas na rotina administrativa, entre elas a conta vinculada para assegurar determinados recursos relacionados aos funcionários a que a empresa faria jus e que depois repassaria aos mesmos, o controle efetivo sobre os funcionários da terceirizada, análise da documentação trabalhista e previdenciária, bem como conferência de férias e verbas rescisórias.

Ante esta realidade, fica uma reflexão crítica: atualmente, a Administra-ção está diante de uma verdadeira terceirização ou de meras empresas interme-diárias (interposição) de trabalho ou, ainda, locação de mão de obra?

A crítica é oportuna porque as empresas terceirizadas contratadas pela Administração Pública simplesmente estão deixando a sua área de recursos hu-manos com os órgãos e entidades contratantes, o que per si tem desencadeado uma sobrecarga de servidores e empregados públicos não qualificados para tais tarefas.

Por derradeiro, uma crítica reflexiva: os servidores e os empregados pú-blicos estão qualificados para efetuar a fiscalização dos serviços terceirizados com todas as suas dificuldades e celeumas desde a parte documental até aos aspectos prático-operacionais?

reFerêNCIASALVES, Osvaldo Nunes. Terceirização de serviços na Administração Pública. Disponível em: <http://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2054228.PDF>. Acesso em: 31 out. 2014.

FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby; LARA, Diva Belo. Terceirização no serviço público. Disponível em: <http://www.jacoby.pro.br/novo/uploads/recursos_humanos/legis/terceirizacao/TSP.pdf.>. Acesso em: 31 out. 2014.

FORTINI, Cristiana; VIEIRA, Virginia Kirchmeyer. A terceirização pela Administração Pública no direito administrativo: considerações sobre o Decreto nº 2.271/1997 e a Instrução Normativa nº 2/2008. In: FORTINI, Cristiana. Terceirização na Administração. Belo Horizonte: Fórum, 2009.

GARCIA, Flávio Amaral. Licitações e contratos administrativos. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

SEKIDO, Amelia Midori Yamane. Terceirização na Administração Pública: a gestão e a fiscalização dos contratos. Disponível em: <http://portal2.tcu.gov.br/portal/pls/portal/docs/2055866.PDF>. Acesso em: 31 out. 2014.

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Assunto Especial – Doutrina

Terceirização na Administração Pública

A Súmula nº 331 do TST e a Responsabilidade da Administração Pública

ThAySE STIEVEN FLECkAdvogada – OAB/SC 28.767, Graduada em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí – Univali (2008), Especialista em Processo Civil pela Universidade Anhanguera/Uniderp. Atualmente é Assessora Jurídica da Federação Catarinense de Municípios – FECAM. Possui experiência na área de Direito, com ênfase em Direito do Trabalho.

RESUMO: O presente Artigo infere acerca da redação dada para a Súmula nº 331 do TST, que trata sobre a terceirização de serviços, à luz da declaração de constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 (Lei de Licitações), com a análise do teor das duas normas. Durante o decorrer do Artigo, foi vista a necessidade de o Poder Legislativo legislar sobre o assunto. Procurou‑se fomentar as discussões a respeito do tema, questionando de que maneira o atual sistema pode prejudicar os direitos globais dos trabalhadores e de que forma o Poder Judiciário poderá intervir para garantir esses direitos, respeitando‑se assim princípios basilares da atual Constituição Federal, como a digni‑dade da pessoa humana e o valor social do trabalho, efetivando‑se não somente o direito processual, mas principalmente o direito material. Além disso, buscou‑se, por meio de estudo de casos sobre o tema, analisar a posição a que chegou o colendo Superior Tribunal do Trabalho, e as decisões de Tribunais inferiores acerca do assunto em tela. PALAVRAS‑CHAVE: Súmula nº 331/TST; terceirização; Administração Pública.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A responsabilização da Administração Pública; 1.1 A Administração Pú‑blica como tomadora de serviços; 1.2 O Direito do Trabalho e a responsabilidade de Administração Pública; 2 A terceirização no Brasil; 2.1 Fenômeno da terceirização no Brasil; 2.2 A terceirização na Administração Pública e a culpa perante a Lei nº 8.666/1993; 3 A nova Súmula nº 331 do TST; 3.1 As alterações causadas pela edição da nova Súmula nº 331 do TST; 3.2 O entendimento do TST nas ações contra a Administração Pública; Conclusão; Referências.

INtrodução

No ano de 2011, o Tribunal Superior do Trabalho – TST alterou a Súmula nº 331, principal norma que trata sobre terceirização no Brasil, passando então a entender que o mero inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do empregador não gera responsabilidade subsidiária automática da Adminis-tração Pública, tomador dos serviços, que poderá ser responsabilizado somente se evidenciada conduta culposa no cumprimento dos deveres previstos na Lei

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nº 8.666/1993 (Lei de Licitações e Contratos), especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora.

A Administração Pública é por muitas vezes demandada judicialmente, o que acaba gerando ajuizamento de milhares de ações, sendo ela uma das maio-res devedoras perante o Poder Judiciário. Antes da alteração da súmula a ser estudada, era comum que a Administração Pública acabasse sendo responsa-bilizada pelas dívidas trabalhistas, sendo que normalmente elas são contraídas pelas empresas prestadoras de serviços. Isso se dava por dois fatores: A falta no nosso ordenamento jurídico de lei versando sobre o assunto, e o total despre-paro da Administração Pública em fiscalizar os seus contratos. A Lei nº 8.666 é de 1993, e está totalmente ultrapassada, precisando ser urgentemente revista.

A terceirização na Administração Pública também é algo a ser repensa-do, pois não é o fato de determinado serviço ser realizado mediante terceiriza-ção que ele será necessariamente mais eficiente. Por muitas vezes acaba sendo mais prejudicial do que satisfatório.

Assim, quando acaba decidindo-se por terceirizar a prestação de alguns serviços, ela deve ser muito bem avaliada, para não correr o risco de fazer uma terceirização ilícita de atividade-fim, cujo conceito será visto no decorrer do Artigo, e também que a conclusão pela execução por meio de terceirização por uma empresa privada seja mesmo a mais vantajosa ao interesse público.

Portanto, neste Artigo irá se discutir a nova redação dada para a súmula, que deve minimizar a responsabilidade da Administração Pública perante o Poder Judiciário, restringindo-se apenas quando provada a sua culpa.

Não se objetiva aqui esgotar o tema, mesmo porque ele é muito amplo e complexo, mas será abordado de maneira sucinta, porém tentaremos ser sensa-tos, lançando algumas reflexões, de forma crítica, para permitir o amplo debate da prática da terceirização na Administração Pública.

1 A reSpoNSABIlIzAção dA AdmINIStrAção pÚBlICA

1.1 a aDmInIstRação PúbLICa Como tomaDoRa De seRvIços

Primeiramente, cabe aqui iniciar com o que se conceitua, doutrinaria-mente, Administração Pública. Maria Sylvia Zanella Di Pietro1 define “como o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas aos quais a lei atribui o exercício da função administrativa do Estado”.

1 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 26. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 58.

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Podemos então considerar que a função administrativa da Administração Pública é aquela realizada pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como aqueles que o Estado autoriza a atuar em seu nome, quando ocorre com os permissionários e concessionários de serviços públicos.

Para que a Administração Pública possa funcionar, ela precisa preencher seu quadro de pessoal.

O Advogado Marcos Fey Probst2, em seu Parecer, explica sobre os regi-mes jurídicos dos agentes públicos com a Administração Pública. Ele explica que servidores públicos estão submetidos a regime jurídico estatutário, estabe-lecido por lei em cada unidade da Federação ocupantes de cargo público. Já empregados públicos são aqueles contratados sob regime da legislação traba-lhista, ocupando empregos públicos.

Portanto, por força do art. 37, II, da CF/19883, sua prioridade é cumprir as formalidades impostas para contratação de pessoal, estando limitada àquilo que a lei determina e não àquilo que a lei não proíbe.

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princí-pios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, tam-bém, ao seguinte:

I – os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;

II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

Uma das formalidades que a Administração Pública precisa cumprir é a obrigação de realização de Processo Licitatório, previsto na Lei nº 8.666/1993, que trata sobre a contratação de obras e serviços, aplicável somente para a Ad-ministração Pública direta, indireta, federal, estadual, distrital e municipal. Para que ela possa terceirizar os seus serviços, é necessário realizar licitação pública para aquisição de serviços, pois não é contratação de pessoal, o que seria por meio de Concurso Público.

2 PROBST, Marcos Fey. Disponível em: <http://www.fecam.org.br/consultoria/consultor_detalhes.php?cod_pa-recer=260>. Acesso em: 10 abr. 2015.

3 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 25 fev. 2015.

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De tal modo é o que leciona o autor Joel de Menezes Niebuhr4:

Entre as formalidades que medeiam o contrato administrativo, notadamente se destaca a obrigatoriedade de licitação pública, que é o procedimento prévio e condicional à sua celebração, por efeito do qual a Administração Pública escolhe a proposta e o proponente com qual irá contratar.

Assim, observa-se que o que não falta são regras para a Administração Pública cumprir. Todas essas formalidades existem para dois fins: a proteção dos cidadãos e da própria Administração Pública.

Este é o entendimento de Gilmar Ferreira Mendes5 sobre o assunto:

Não se olvide, contudo, que as normas constitucionais da Administração Pública, embora apoiadas na ideia de res pubica, não podem agredir os direitos funda-mentais que protegem o cidadão contra posturas estatais que atentem contra o núcleo essencial de outros diretos constitucionalmente previstos.

Fazendo uma ponte entre a terceirização de serviços da Administração Pública para a iniciativa privada com o princípio da eficiência, que é um dos previstos na Constituição Federal e que deve ser observado, é que o referido princípio não traz somente que o cidadão possui o direito à prestação de ser-viços públicos, mas também que esse serviço seja feito de maneira satisfatória, célere e efetiva.

1.2 o DIReIto Do tRabaLho e a ResPonsabILIzação Da aDmInIstRação PúbLICa

A terceirização já é realidade nas áreas Pública e Privada, que visam nela a melhora de sua produtividade.

A contratação de serviços terceirizados deve dar-se pelos meios lícitos. As terceirizações são admitidas somente para as atividades-meio da Administra-ção Pública. No setor privado segue o mesmo critério, e, estando fora disso, a sua terceirização é considerada ilícita.

Flávio Amaral6 disserta de forma muito lúcida a terceirização na ativida-de-meio:

A Jurisprudência administrativa dos Tribunais de Contas, em especial do Egrégio Tribunal de Contas de União, também absorveu esse critério e orienta a Admi-nistração Pública Federal no sentido de somente admitir as terceirizações nos estritos limites de sua atividades-meio.

4 NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitação pública e contrato administrativo. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 112.

5 MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 96.6 GARCIA, Flávio Amaral. A relatividade da distinção atividade-fim e atividade-meio na terceirização aplicada

à Administração Pública.

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O critério encontra-se arraigado não apenas entre os operadores de Direito. Basta constatar que o conceito de terceirização nos dicionários já leva em conta a sua admissibilidade apenas para as atividades-meio.

Segundo o mesmo autor, os critérios atuais estabelecidos já não corres-pondem mais à classificação de atividade-meio e atividade-fim. Atualmente, a Administração Pública acaba por terceirizar diversos serviços que não se en-quadram em nada que possa ser considerado como ilícito e lícito.

Assim, ele7 escreve que

as concessões comuns de serviços públicos, as concessões patrocinadas e admi-nistrativas, os contratos de gestão e os termos de parceria celebrados no âmbito do terceiro setor são exemplos típicos de ajustes nos quais o Estado delega ativi-dades finalísticas, sem que esse critério seja cogitado como impeditivo.

O Professor Calvet8, ao ministrar sua aula, procurou elucidar um pouco mais sobre a matéria, apresentando três posições interpretativas sobre a ilicitude na hora de contratar serviços terceirizados, sob a visão de Maurício Godinho Delgado:

1. Como a terceirização ilícita praticada por entidades estatais não gera vínculo empregatício, ela tampouco tem aptidão para produzir qualquer diferença justra-balhista em benefício do trabalhador ilicitamente terceirizado.

2. A prática ilícita não pode beneficiar aquele que já foi por ela economicamente favorecido, devendo-se conferir validade ao vínculo jurídico com o ente estatal tomador dos serviços, que assume, em consequência, a posição do empregador desde o início da relação socioeconômica verificada.

3. Deve-se garantir a observância da isonomia (art. 5º, caput, e inc. I, e art. 7º, XXXII, da CRFB) no núcleo da relação jurídica trabalhista pactuada. Assim, para afastar os efeitos antijurídicos da terceirização ilícita, suporia assegurar-se ao tra-balhador terceirizado todas as verbas trabalhistas legais e normativas aplicáveis ao empregado estatal direto que cumprisse a mesma função no ente estatal toma-dor de serviços, sem, contudo, retificação de CTPS quanto à entidade emprega-dora formal. Nesta hipótese, o empregador formal responderia em primeiro plano pelas verbas derivadas da isonomia e comunicação remuneratórias, subsidiaria-mente, por tais verbas.

Pelo anteriormente exposto, se for constatada a ilicitude na terceirização, poderá o terceirizado requerer o mesmo salário de empregado da tomadora de serviços, se verificada a igualdade de funções.

7 GARCIA, Flávio Amaral. A relatividade da distinção atividade-fim e atividade-meio na terceirização aplicada à Administração Pública.

8 NTC, Núcleo Trabalhista. Método Calvet: Curso de Direito e Processo do Trabalho. (Aulas 10 e 11: Terceiri-zação no Direito do Trabalho. Terceirização lícita e ilícita. Trabalho Temporário. Entes Estatais e Terceirização. Responsabilidade na Terceirização. Cooperativas de Mão de Obra) 2014.

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Podemos perceber que o próprio Tribunal Superior do Trabalho possui divergências Jurisprudenciais sobre o assunto. Em sua Súmula nº 363 do TST9, afirma que aquele trabalhador que tiver seu contrato de trabalho declarado nulo, por não ter sido aprovado por concurso público, terá direito apenas a receber o pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário-mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS:

CONTRATO NULO – EFEITOS (nova redação) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no respectivo art. 37, II e § 2º, somente lhe conferindo direito ao pagamento da contraprestação pactuada, em relação ao número de horas trabalhadas, respeitado o valor da hora do salário mínimo, e dos valores referentes aos depósitos do FGTS.

Porém, o próprio Tribunal, em sua Orientação Jurisprudencial nº 38310, afirma que existe isonomia salarial, e garante ao terceirizado contratado de for-ma ilícita as mesmas verbas pagas ao servidor público que desempenhe a mes-ma atividade:

383. TERCEIRIZAÇÃO. EMPREGADOS DA EMPRESA PRESTADORA DE SER-VIÇOS E DA TOMADORA. ISONOMIA. ART. 12, A, DA LEI Nº 6.019, DE 03.01.1974

A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com ente da Administração Pública, não afastando, contudo, pelo princípio da isonomia, o direito dos empregados terceirizados às mesmas verbas trabalhistas legais e normativas asseguradas àqueles contratados pelo to-mador dos serviços, desde que presente a igualdade de funções. Aplicação ana-lógica do art. 12, a, da Lei nº 6.019, de 03.01.1974.

Entende a doutrina pela não aplicação da Súmula nº 363 do TST nas si-tuações de terceirização ilícita nos casos da Administração Pública, pois os fun-cionários terceirizados ilicitamente não foram contratados diretamente por ela, e sim por uma empresa interposta. Portanto, não seria o caso de contratação de servidor sem concurso público, mas de contrato de terceirização nulo. Portanto se aplicaria a OJ 383 do TST para assim garantir ao trabalhador terceirizado com pessoalidade e subordinação remuneração equivalente ao servidor público que ocupar a mesma função, caso seja entendido desta maneira.

9 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula de jurisprudência, Enunciado nº 363 (Contrato nulo. Efeitos). DEJT 19, 20 e 21.11.2013. Disponível em: <www.tst.jus.br>. Acesso em: 23 fev. 2015.

10 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula de jurisprudência, Enunciado nº 383 (Terceirização. Isono-mia.). DEJT 03.01.1974. Disponível em: <www.tst.jus.br>. Acesso em: 23 fev. 2015.

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Mas o mesmo não se aplicaria, por exemplo, quando a Administração Pública não celebrar propriamente um contrato de terceirização, e sim cometeu à pessoa jurídica, por meio de convênio, serviço típico da atuação estatal, o que daria continuidade, assim, ao conflito jurisprudencial.

Em recente notícia11 publicada no seu site, o STF informou sobre o ajui-zamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5272, com pedido de medida liminar, pela Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previ-dência Social (ANMP), a fim de se questionar parte dos arts. 1º e 2º da Medida Provisória (MP) nº 664/2014, que modificou normas sobre a contratação de médicos terceirizados e empresas conveniadas para exercerem perícia médica da Previdência Social. A ação ainda está tramitando, e o STF, mais uma vez, terá que se manifestar sobre o tema.

Considerando o que foi visto até aqui, ainda continuamos a nos questio-nar sobre de que critérios a Administração Pública poderia se valer para decidir pela aplicação ou não da terceirização.

2 A terCeIrIzAção No BrASIl

2.1 Fenômeno Da teRCeIRIzação no bRasIL

A CUT12 divulgou dados que apontam a existência, em 2013, de 12,7 milhões de terceirizados no País, o que corresponde a 26,8% do mercado for-mal de trabalho. O número, segundo o estudo, pode ser maior, porque parte considerável desses trabalhadores pode estar na informalidade.

Mas o que seria, afinal, a terceirização para o Direito do Trabalho?

Quem nos apresenta um conceito doutrinário sobre o assunto é Maurício Godinho Delgado13, afirmando que,

para o direito do trabalho, terceirização é o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria corres-pondente. Por tal fenômeno, insere-se o trabalhador no processo produtivo do tomador de serviços sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente.

A terceirização no setor privado surgiu após a Segunda Guerra Mundial, em que as empresas começavam a visar lucros e reduzir custos, aumentando a

11 STF, Supremo Tribunal Federal. Associação questiona normas que permitem a contratação de peritos médicos sem concurso público. Publicado em 27.03.2015. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoti-ciaDetalhe.asp?idConteudo=288350&caixaBusca=N>. Acesso em: 27 mar. 2015

12 CNM, Confederação Nacional de Municípios. Comissão no Senado debaterá projeto de terceirização aprovado pela Câmara. Publicado em 13.04.2015. Disponível em: <http://www.cnm.org.br/noticias/exibe/comissao--no-senado-debatera-projeto-de-terceirizacao-aprovado-pela-camara>. Acesso em: 13 abr. 2015.

13 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 8. ed. São Paulo: LTr, 2009. p. 407.

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produtividade e se preocupando apenas com o seu produto final. No Brasil ela ainda é relativamente nova, vindo com as instalações das primeiras multinacio-nais no País.

Visualizando as vantagens obtidas pelo setor privado, surgiu a terceiriza-ção na Administração Pública a partir da edição do Decreto-Lei nº 200/1967. Ela veio da necessidade da Administração Pública de se reestruturar e adequar o seu tamanho e sua própria função, a fim de que pudesse prestar serviços de melhor qualidade nas áreas essenciais.

O referido Decreto-Lei possui um rol exemplificativo, o que, por sua vez, acaba permitindo que a Administração Pública cada vez mais tenha se utiliza-do de contratação de serviços nas mais diversas áreas, como fornecimento de refeições, limpeza e vigilância, impressão gráfica, transporte, entre outros, sem que se tenha uma fiscalização sobre o mesmo.

Mas a terceirização na Administração Pública não trouxe somente bene-fícios, trouxe também a responsabilidade pelo inadimplemento das empresas pelas verbas trabalhistas.

O autor André Luiz Paes de Almeida14, ao citar as palavras de Dárcio Guimarães, discorre sobre os problemas existentes a respeito da terceirização nos dias atuais em nosso País:

Inegavelmente, a terceirização é hoje um fenômeno amplamente utilizado pelas empresas. Cabe aos juristas a apuração de contratações ilícitas e coibir as frau-des. Seria conveniente a existência de legislação específica sobre a matéria, de forma a acabar com as divergências ainda reinantes. Cabe, ainda, aos sindicatos a fiscalização de contratação efetuada, buscando-se, assim, o respeito aos direi-tos trabalhistas.

Dárcio Guimarães ainda alerta quanto à escolha da empresa prestadora de serviços.

A escolha da empresa locadora, a meu sentir, se caracteriza como problemática. Indubitavelmente sua inidoneidade econômica surge ao ensejo de inúmeras re-clamações trabalhistas contra ambas as empresas e na esteira da jurisprudência aqui dissecada. Por outro lado, ela traz economia, alegando o empresário que, a todas as luzes, merece auferir lucro no escopo de melhorar e expandir sua atividade gerando mais empregos e colocando a preços acessíveis com produto no mercado, onde a disputa se caracteriza pela livre concorrência, lei implacável com os empresários frágeis e desmotivados.

Conclui sua visão sobre o assunto afirmando que cada empregador deve avaliar quais serão as vantagens e desvantagens da terceirização. Ele cita tam-

14 ALMEIDA, André Luiz Paes. Direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: Rideel, 2009. p. 69.

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bém sobre a quarteirização, fruto de criação do nosso País, que significa quan-do a gerência de terceirizados passa a ser de uma quarta empresa. Na sua con-cepção, torna-se algo desvantajoso. Considera o avanço da terceirização algo incontestável e universal, e que nada vai impedir seu crescimento, ainda mais respaldado pela jurisprudência do TST, e que nós, os brasileiros, não podemos deixar de discutir a matéria.

Uma das grandes dificuldades da terceirização no Brasil é a falta de legis-lação para regulamentar a matéria, bem como o desconhecimento por grande parte da população sobre o assunto. Em uma pesquisa acadêmica15 realizada, boa parte dos fiscais dos contratos administrativos relatou que conhecem a le-gislação que trata da contratação de serviços terceirizados pela Administração Pública, mas 40% ainda conhecem muito pouco ou apresentam alguma defi-ciência. Considerando a constatação do item anterior, percebe-se que, mesmo estando na função de fiscal, alguns servidores ainda carecem de conhecimento acerca da legislação.

Complementa o resultado da pesquisa as palavras dos Professores Henrique Correa e Elisson Miessa Santos16:

Não há, na legislação brasileira, regra específica que regulamente a terceirização cujos parâmetros se encontram na Súmula nº 331 do TST. A falta de regulamen-tação específica tem ocasionado insegurança jurídica, gerando decisões confli-tantes no tocante a quais atividades podem ser terceirizadas.

A adequação na legislação brasileira da terceirização é o que permitirá atribuir a verdadeira eficácia social, dando efetividade ao princípio do ser co-letivo obreiro, conceito este dado por Maurício Godinho Delgado17 para carac-terizar as organizações coletivas da classe trabalhadora, às quais se enquadram trabalhadores terceirizados, que também merecem a referida adequação social.

Adaptar o quadro atual dos trabalhadores terceirizados, considerada uma grande parcela de trabalhadores do nosso País, certamente contribuirá como meio de compatibilizar o serviço terceirizado no tocante à utilização deste tipo de serviço para que se possa atender às principais regras e princípios do Direito do Trabalho.

Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 4.330/200418, de au-toria do Deputado Sandro Mabel. Este projeto permite a terceirização em todas

15 SEKIDO, Amélia Midori Yamane. A terceirização na administração pública: a gestão e fiscalização dos con-tratos. Brasília: [s.l.], 2010. p. 55-57.

16 SANTOS, Élisson Miessa; CORREIA, Henrique. Súmulas e Orientações Jurisprudenciais do tSt. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2012. p. 167

17 DELGADO, Maurício Godinho. Op. cit., p. 40918 O projeto está tramitando em regime de urgência, estando em Plenário para recebimento de emendas, e

logo em seguida irá para o Senado. Acredita-se que pouco irá ser alterado, havendo grande possibilidade de

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as atividades empresariais, e está previsto na agenda política de 2015, para vo-tação pelo Plenário da Câmara dos Deputados, existindo grande possibilidade de aprovação.

Prevê o projeto, conforme descrito na sua justificação, que o objeto da contratação deverá ser especificado. Ele amplia de forma considerável as ativi-dades passíveis de terceirização. Prevê também a responsabilidade subsidiária do contratante, e quanto à responsabilidade da Administração Pública, ele re-mete à Lei de Licitações.

Este projeto merece ser muito bem estudado e revisto para não acabar permitindo a precarização da relação de trabalho, pois a ampla terceirização se tornará muito prejudicial.

Enquanto ainda não se tem um estudo aprofundando sobre o projeto, continuamos a estudar como ainda é vista a terceirização com a legislação presente no País.

2.2 a teRCeIRIzação na aDmInIstRação PúbLICa e a CuLPa PeRante a LeI nº 8.666/1993

O governador do Distrito Federal ajuizou, em 2007, uma Ação Direta de Constitucionalidade nº 16, para que o Supremo Tribunal Federal declarasse a constitucionalidade do art. 71 da Lei nº 8.666/199319.

Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.

§ 1º A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regula-rização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.

Afirmou que a redação da Súmula nº 331 do TST estava em desacordo com a redação do art. 71 da Lei de Licitações, e, devido a isso, o referido artigo vinha sofrendo ampla retaliação dos órgãos do Poder Judiciário.

A partir da decisão do STF, concluída em 2011, passou a ser afastada a responsabilidade objetiva da Administração Pública, caindo a sua responsabili-dade para o caso concreto, o evento fático e probatório no conjunto do ônus da prova, dos fatos, do nexo causal, da culpa, do dano e sua extensão. Em resumo,

aprovação do projeto original. Quando se trata de contratação com a Administração Pública, o projeto remete à Lei nº 8.666/1993.

“Art. 12. Nos contratos de prestação de serviços a terceiros em que a contratante for a Administração Pública, a responsabilidade pelos encargos trabalhistas é regulada pelo art. 71 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.”

19 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Disponível em: <www.planalto.gov.br>. Acesso em: 23 fev. 2015.

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deixou a cargo das partes e do Juiz cuidar das provas da efetiva responsabilida-de da Administração Pública.

Em seu artigo, Andrea20 procura expor as possibilidades de condenação da Administração Pública frente à definição do TST:

Restou, então, definido que o TST não poderá generalizar os casos, devendo analisá-los de forma individualizada, um a um, a inadimplência dos direitos tra-balhistas dos prestadores de serviço contratados pelos fornecedores de mão de obra teve como causa principal a inexecução culposa ou a omissão culposa na fiscalização do cumprimento das obrigações no contrato de licitação, pelo órgão da Administração Pública contraente, devendo o conteúdo da norma ser revela-do pela interação entre o texto normativo e as circunstâncias do caso concreto.

Assim, verifica-se que a decisão do Tribunal Superior que declarou a constitu-cionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 não impede a condenação da responsabilidade da Administração Pública na terceirização, no caso concreto, desde que haja circunstâncias e provas suficientes da omissão do ente público em face da fiscalização da empresa contratada, visando resguardar a premissa maior dos princípios da dignidade da pessoa humana e valor social do trabalho estampado no art. 1º, III e IV, da Constituição Federal, sendo plenamente compa-tível com a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADC 16/DF.

Dada a relevância da matéria, cita-se a decisão proferida pelo Minis-tro Ayres Brito21, na Reclamação ajuizada pelo Procurador-Geral do Estado de Goiás:

Pois bem, qual o efeito da decisão desta nossa Corte na ADC 16? Resposta: vedar a automática transferência à Administração Pública das obrigações trabalhistas, fiscais e comerciais do contratado, bem como a responsabilidade por seu paga-mento. Noutras palavras, o que está proibido por lei – lei declarada constitucional por este STF, com eficácia erga omnes e efeito vinculante – é tornar a responsa-bilidade subsidiária do Poder Público uma consequência imediata do inadimple-mento pela empresa, pela empresa contratada, de suas obrigações trabalhistas. O que não impede a Justiça do Trabalho, na específica análise do caso concreto, de reconhecer a responsabilidade subjetiva (por culpa) da Administração.

O caminho que se iniciou pelo Decreto-Lei nº 200/1967 parece que ain-da está longe de ser concluído. Os serviços de terceirização parecem ganhar cada vez mais espaço no setor público, pois ela ainda consegue manter as con-tas públicas estáveis devido ao seu baixo custo. A responsabilidade subsidiária

20 BELMONTE, Alexandre Agra; MUNHOZ, Andréa Rodrigues de Oliveira. Os efeitos da Declaração de Consti-tucionalidade, pelo Supremo Tribunal Federal, do artigo 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 (Lei de Licitações), sobre a Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, a. 11, n. 128, p. 18-24, ago. 2012.

21 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 11698. Rel. Min. Ayres Brito. J. 13.05.2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 10 jan. 2015.

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da Administração Pública, quem sabe, servirá como um último recurso para a prevenção da completa precarização dos trabalhadores terceirizados.

Os Procuradores do Trabalho e Professores Henrique Correa e Elisson Miessa Santos22, ao relatar a decisão, expõem que,

em recente decisão do Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Consti-tucionalidade nº 16, o STF reconheceu a constitucionalidade do art. 71 da Lei de Licitações. Os fundamentos dos defensores da tese de que o Estado não tem responsabilidade trabalhista consiste em: a) o processo licitatório afasta a culpa do Estado; b) a responsabilidade subsidiária representaria um duplo pagamento pelos encargos trabalhistas, uma vez que o Poder Público já havia pago pelos serviços prestados; c) a Administração segue o princípio da legalidade, respeita o art. 71 da Leis de Licitações.

Muito se espera com essa decisão, principalmente na hora de escolher as empresas a serem contratadas. Na premiada reportagem, denominada como “A terceirização que mata”23, foi apurado que dos 133 mortos a serviço da Petrobras de 1998 a 2003, 102 eram funcionários terceirizados. A mesma re-portagem ainda constatou que, no mesmo período, morreram 217 trabalhado-res em acidentes no setor elétrico. Nas siderúrgicas, dos 83 mortos, 50 eram terceirizados. E na telefonia, foram 49 mortos. Foi concluído que, em comum entre os setores, a privatização e o forte corte de pessoal, suprido em seguida pelos terceirizados, foram os principais fatores que chegaram a estes números assombrosos.

Enquanto cobriam a reportagem, as repórteres constataram que a pró-pria Petrobras contingenciava uma verba considerável em seu orçamento para fazer frente a processos trabalhistas de trabalhadores terceirizados. Também se noticiou a comprovação de que os terceirizados, em geral, recebiam pouco treinamento, faltavam-lhes equipamentos de proteção individual nas empresas e os operários eram submetidos a jornadas exaustivas de trabalho.

Com a recente decisão, acredita-se que a Administração Pública vai pas-sar a adotar maiores precauções tanto na escolha da empresa a ser contratada quanto na fiscalização dos contratos firmados, a fim de evitar suas condenações em ações trabalhistas causadas por empresas fraudulentas, bem como que se-jam respeitados os princípios constitucionais que visam assegurar a dignidade da vida humana dos trabalhadores que tiveram seus direitos violados.

22 SANTOS, Élisson Miessa. CORREIA, Henrique. Op. cit., p. 174.23 O GLOBO. Terceirização que mata: Série sobre mortes em acidentes de trabalho ganha Prêmio Esso e Prêmio

Vladimir Herzog em 2003. Publicado em 20.07.2003. Disponível em: <http://memoria.oglobo.globo.com/jornalismo/premiosjornalisticos/terceirizaccedilatildeo-que-mata-9919009>. Acesso em: 18 mar. 2015.

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3 A NovA SÚmulA Nº 331 do tSt

3.1 as aLteRações CausaDas PeLa eDIção Da nova súmuLa nº 331 Do tst

Poucas são as normas existentes sobre terceirização, sendo a principal delas a Súmula nº 331 do TST24. Justamente por estas lacunas, eram inúmeras as decisões judiciais controvertidas proferidas por nossos Tribunais.

Em consequência da decisão do STF, os Ministros do TST precisaram se manifestar sobre o assunto. Foi então publicada a Resolução nº 174/2011, que revisou o entendimento da Súmula, dando nova redação ao item IV e inserindo os itens V e IV, passando a ter a seguinte redação:

Súmula nº 331 do TST

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011

I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua con-duta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e le-gais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

24 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula de jurisprudência, Enunciado nº 331 (Contrato de prestação de serviços. Legalidade). DEJT 27, 30 e 31.05.2011. Disponível em: <www.tst.jus.br>. Acesso em: 23 fev. 2015.

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VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro25 também contribui com o tema, e resume a decisão afirmando que,

em resumo, pela decisão do STF declarando a constitucionalidade do artigo 71, e pelos termos do item V da Súmula nº 331 do TST, a regra é a de que a Adminis-tração Pública não responde subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas, em caso de inadimplemento pelo contratado, a menos que tenha havido omissão ou falha na fiscalização da execução do contrato.

A nova redação acaba por evitar que as decisões judiciais equiparem todo e qualquer contratante de serviços como responsáveis pelos direitos tra-balhistas de empresas terceirizadas. Restou, então, que o TST deve analisar de forma individualizada o caso concreto, primando pela busca da verdade real e investigando com rigor, decidindo com o livre convencimento motivado.

Ainda que ela analise o caso concreto, a Administração Pública pode vir a ser responsabilizada, quando comprovada a sua culpa pelos danos causados aos trabalhadores, por meio de conduta omissiva na fiscalização do contrato, observado o direito de, caso assim entenda, acionar a empresa prestadora de serviços para se ressarcir dos prejuízos arcados.

Não existe uma conduta objetiva estabelecida para classificar o ato fisca-lizatório, inexistindo, outrossim, um rol restrito de providências acautelatórias, passando para a análise do caso concreto.

Após a nova redação, bem como a declaração de constitucionalidade do art. 71 da Lei nº 8.666/1993, os Tribunais Regionais do Trabalho não tiveram outra alternativa e passaram a mudar o seu entendimento, construindo uma nova jurisprudência, como se depreende dos seguintes julgados, oriundos do TRT da 12ª Região (Santa Catarina), in verbis:

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ENTE PÚBLICO – SÚMULA Nº 331, V, DO TST – CULPA IN VIGILANDO – A constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993, declarada na ADC 16, não retira dos entes públicos contratantes o dever de licitar e fiscalizar eficazmente os contratos trabalhistas no que con-cerne ao seu adimplemento e, sempre que for verificada a ausência desse dever fiscalizatório, permanece plenamente possível a imputação da responsabilidade subsidiária ao ente público tomador do serviço terceirizado, ante a configuração da culpa in eligendo ou in vigilando, caracterizada pela ausência de fiscalização das obrigações trabalhistas da prestadora de serviços. Nesse sentido, é o item V da Súmula nº 331 do TST, enunciando que os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, em caso de inadimple-

25 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 361.

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mento das obrigações trabalhistas por parte do empregador (prestador de servi-ços), quando evidenciada a conduta culposa da administração no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666/1993.26

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO TOMADOR DE SERVIÇOS – ENTES IN-TEGRANTES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA – ALCANCE – O reconhecimento da responsabilidade subsidiária dos entes integrantes da administração direta e indireta alcança todas as parcelas decorrentes da con-denação imposta, inclusive aquelas de caráter indenizatório ou punitivo, por encontrar fundamento a responsabilização na culpa, incidindo o princípio da reparação integral do dano, preconizado pelo Código Civil (arts. 944 e 950). Ademais, a redação da Súmula nº 331 do TST não estabelece qualquer tipo de ressalva, ao revés, fixa a responsabilidade por toda e qualquer verba (item VI).27

3.2 o entenDImento Do tst nas ações ContRa a aDmInIstRação PúbLICa

Quanto ao nosso Tribunal, em notícia publicada em seu site28, recente-mente o Município de Içara foi condenado subsidiariamente em ação trabalhis-ta (AIRR 16-42.2011.5.12.0055) porque terceirizou irregularmente atividades próprias do Poder Público. A decisão foi confirmada pelos ministros da 6ª Tur-ma do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Para a responsabilização do município e a consequente condenação, fo-ram consideradas a falta da licitação para a contratação da empresa (culpa in eligendo) e a falta de preocupação em saber se todas as verbas estavam sendo corretamente pagas aos empregados (culpa in vigilando).

No mesmo sentido, nas reclamações submetidas ao exame do STF, tem--se destacado que será admissível a responsabilidade subsidiária.

Na Reclamação ajuizada29, o Ministro Luiz Fuz afirmou sobre a necessi-dade de elementos concretos para demonstrar a omissão culposa da Adminis-tração Pública na fiscalização do contratado quando, embora de forma sucinta, a partir do conjunto probatório presente nos autos da reclamação trabalhista, o órgão jurisdicional “analisou a conduta da ora reclamante e entendeu configu-rada a sua culpa in vigilando”, e quando forem consideradas as peculiaridades fáticas do caso concreto, com espeque em outras normas, regras e princípios do ordenamento jurídico.

26 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. RO 0000129-88.2014.5.12.0055. Rel. Des. José Ernesto Manzi. J. 12.02.2015. Disponível em: <www.trt12.jus.br>. Acesso em: 21 mar. 2015.

27 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. RO 0000908-24.2013.5.12.0008. Relª Des. Lígia M. Teixeira Gouvêa. J. 02.102014. Disponível em: <www.trt12.jus.br>. Acesso em: 21 mar. 2015.

28 TRT, Tribunal Regional do Trabalho. Município de Içara é condenado por terceirização irregular. Publicado em 09.07.2014. Disponível em: <http://www.trt12.jus.br/portal/areas/ascom/extranet/noticias/2014/julho.jsp>. Acesso em: 09.07.2014.

29 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 14579. Rel. Min. Luiz Fux. J. 16.12.2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em: 10 jan. 2015.

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O autor Alexandre Belmonte30 dá a sua interpretação sobre o que seria a responsabilidade admitida para a Administração Pública:

Logo, a Corte Constitucional sinalizou que não é possível aplicar as regras da responsabilidade objetiva ou fundada na mera presunção de culpa in vigilando. Desta feita, a questão foi deslocada para o caso concreto, para o contexto fático--probatório, com relevo para o raciocínio tópico, com foco no problema a ser resolvido; o ônus da prova, na análise das provas coligidas dos fatos, do nexo causal, da culpa e do dano e sua extensão (arts. 333 do CPC e 818 do CLT); tudo legitimado pelo ônus da argumentação-fundamentação adequada (art. 93, IX, da CF), que desempenha um papel destacado na atualidade, para viabilizar o con-trole da aplicação racional e razoável da Constituição.

O fato é que, diante da decisão do STF, incorporada no item V da Súmula nº 331 do STF, a Administração Pública deve tomar algumas cautelas, conforme previsão de Maria Sylvia Zanella Di Pietro31:

A) Colocar nos instrumentos convocatórios e nos contratos cláusula em que fique clara a aplicação da norma do art. 71 da Lei nº 8.666/1993;

B) Inserir nos instrumentos convocatórios de licitação e nos contratos cláusula prevendo a aplicação de penalidade pelo descumprimento da norma do art. 71 da Lei nº 8.666/1993, sem prejuízo da rescisão do contrato com fundamen-to no art. 78, I e II, da mesma lei;

C) Na atividade de fiscalização do cumprimento do contrato, verificar se con-tratada está cumprindo as obrigações trabalhistas, previdenciárias, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato; em caso de inadimplemento, aplicas as penalidades cabíveis;

D) Exigir a atualização, a cada 180 dias, da Certidão Negativa de Débito Traba-lhista (CNDT) referida na Lei nº 12.440, de 07.07.2011.

Verifica-se, então, que a Administração Pública tem o dever de fiscali-zar seus contratos, evitando assim ser responsabilizada de forma indevida por suas más escolhas. Ainda se vale da máxima de que é melhor prevenir do que remediar.

O Professor Joel de Menezes Niebuhr32, em seu livro, é um grande defen-sor de que a Administração Pública deve fiscalizar cada vez mais, considerando esta como a melhor forma de prevenção:

Sobretudo, o trabalho de acompanhamento e de fiscalização produz efeitos pre-ventivos, evitando que a desídia do contratado provoque prejuízos irreversíveis ou de difícil ou onerosa reparação para ele próprio, para a Administração ou para

30 BELMONTE, Alexandre Agra; MUNHOZ, Andréa Rodrigues de Oliveira. Os efeitos da Declaração de Consti-tucionalidade, pelo Supremo Tribunal Federal, do artigo 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993 (Lei de Licitações), sobre a Súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Fórum de Contratação e Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, a. 11, n. 128, p. 18-24, ago. 2012.

31 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit., p. 361.32 NIEBUHR, Joel de Menezes. Op. cit., p. 761.

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terceiros. A fiscalização eficiente antevê defeitos e, por consequência, eventuais prejuízos, minorando transtornos e inconvenientes como rescisões contratuais, aplicação de penalidades mais severas, ações judiciais, etc. Trata-se de medida essencial para a consecução dos interesses públicos no que tange ao gerencia-mento dos contratos administrativos.

Pelo que foi pesquisado, resta-se comprovado que a decisão do STF não superou o conteúdo da Súmula, apenas modificou a sua aplicabilidade ao caso concreto, e a responsabilidade então passou a ter outra análise, ajustando-se à decisão. Resta agora saber como os Tribunais Trabalhistas irão realizar uma efetiva análise do conjunto probatório, para então decidir pela culpa ou não da Administração Pública por sua contratação.

CoNCluSão Analisando todo o exposto, podemos concluir que a Súmula nº 331 do

TST é sem dúvida uma das mais importantes quando o assunto é a terceirização de serviços, e atualmente uma das únicas.

A responsabilidade atribuída à Administração Pública, conforme Súmula anteriormente citada, baseia-se em típica culpa na hora de contratar, nas suas modalidades específicas in eligendo e in vigilando, previstas no art. 927 do Código Civil.

Ela não ocorre apenas da má escolha da prestadora de serviços, senão também da fiscalização do serviço contratado.

Dentro desta lógica, não se permite mais uma negligência do Estado em relação aos trabalhadores que, indiretamente, prestam-lhe serviços. É necessá-rio que a Administração Pública não permaneça inerte na verificação constante do adimplemento das verbas trabalhistas por parte das prestadoras de serviços.

Somente desta forma, fazendo sempre as melhores escolhas e fiscalizan-do, é que a Administração Publica vai conseguir comprovar sua eficiência, e não lhe incorrer em responsabilidade pelo descumprimento das verbas traba-lhistas inadimplidas.

Situações alheias também acabam por dificultar a terceirização, e uma delas é a já citada falta de regulamentação sobre o assunto. A terceirização é uma realidade, e o Poder Legislativo não pode continuar inerte sobre este as-sunto.

A Administração Pública também precisa se instruir sobre o assunto: con-forme visto neste artigo, muitos ainda desconhecem o tema. O conceito de ter-ceirização é muito restrito, e já não atende mais as relações atuais de trabalho ter-ceirizado. Seria este o melhor momento de capacitar melhor a sua estrutura com cursos para funcionários, elaborando materiais que tratam sobre o assunto etc.

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Já não cabe mais à Justiça do Trabalho continuar a fixar os limites da terceirização. A matéria é de suma importância, sendo que, na omissão do Po-der Legislativo, quem está legislando sobre o assunto é o Poder Judiciário, por meio de súmulas e jurisprudências, sendo gritante o desrespeito ao princípio da separação de Poderes.

O que se observa é que, aqui no Brasil, a legislação foi verdadeiramente derrubada pela realidade. O que se tenta, e de maneira míope, é proteger os trabalhadores simplesmente ignorando a terceirização, mas acaba por deixar mais vulneráveis aqueles que trabalham sob essa modalidade de contratação.

É visível que as relações de trabalho na prestação de serviços a terceiros necessita urgentemente de uma intervenção legislativa, no sentido de definir as responsabilidades do tomador e do prestador de serviços e, assim, garantir os direitos dos trabalhadores.

reFerêNCIAS ALMEIDA, André Luiz Paes. Direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: Rideel, 2009.

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Assunto Especial – Acórdão na Íntegra

Terceirização na Administração Pública

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Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoGabinete do Juiz Francisco CavalcantiApelação Cível nº 569010 CE (0008390‑73.2013.4.05.8100)Apte.: Ministério Público FederalApdo.: Antonia Rocivania Araujo LelisApdo.: Kaliane Hingride DantasApdo.: Laurimberg Diniz CavalcanteApdo.: Maria Tereza Barros Arrais MaiaAdv./Proc.: Paulo Andre Lima Aguiar e outroApdo.: UFC – Universidade Federal do CearáRepte.: Procuradoria Regional Federal da 5ª RegiãoApdo.: Suely Beserra de castroAdv./Proc.: Brunilo Jacobe Castro e Silva Filho e outrosOrigem: 4ª Vara Federal do Ceará/CERelator: Juiz Francisco Cavalcanti – Primeira Turma

ementaCoNStItuCIoNAl e AdmINIStrAtIvo – ApelAção – Ação CIvIl pÚBlICA – hoSpItAl pÚBlICo uNIverSItÁrIo – eXeCução, por terCeIrIzAdoS, de AtIvIdAdeS INereNteS ÀS AtrIBuIçÕeS típICAS de CArgoS pÚBlICoS, ApeNAS deSempeNhÁveIS por ServIdoreS pÚBlICoS – IN-CoNStItuCIoNAlIdAde – Art. 37, II e v, dA CF/1988 – proCedêNCIA do pedIdo – provImeN-to do reCurSo

1. Apelação interposta contra sentença de improcedência do pedido de ação civil pública ajuizada com vistas ao afastamento das pessoas físicas rés das funções de gerência/chefia exercitas no âmbito do Hospital Uni-versitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará (HUWC/UFC), tendo em conta a suposta configuração de terceirização ilícita, já que elas seriam empregadas da Sociedade de Assistência à Materni-dade Escola Assis Chateaubriand (Sameac), entidade privada contratada pela autarquia educacional, postas à disposição da unidade hospitalar pública, na qual desempenhariam funções típicas de servidores públi-cos ocupantes de cargo efetivo que exercem função de confiança ou de

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agentes públicos que ocupam cargos em comissão, haja vista seu poder de mando.

2. É preceito constitucional (art. 37, II, da CF/1988) a imposição à Admi-nistração Pública do dever de realização de concurso público para a con-tratação de pessoal, dispondo, outrossim, o Texto Constitucional, acerca dos requisitos para a ocupação de funções de confiança e cargos em comissão. Quando, sob a máscara da terceirização, através da contrata-ção de instituição privada para “apoio complementar”, a Administração Pública admite pessoal ao exercício de atribuições que são inerentes a cargos públicos, e, portanto, deveriam ser desempenhadas por servido-res públicos, está burlando o princípio da obrigatoriedade do concurso público. É cediço que “não devem ser terceirizados serviços relativos às atividades fins da instituição pública contratante, bem como aqueles contemplados nas atribuições dos cargos que compõem sua estrutura or-ganizacional” (Acórdão nº 1.466-22/10-P do TCU).

3. O Superintendente dos Hospitais Públicos/UFC assim se reporta aos profissionais da Sameac, à disposição do HUWC/UFC: “[...] os Hospitais Universitários da UFC (Hospital Walter Cantídio e Maternidade Escola Assis Chateaubriand) possuem grande carência de pessoal e por isso a UFC mantém com a Sociedade de Assistência a Maternidade Escola Assis Chateaubriand (Sameac) um Contrato de Prestação de Serviços ten-do como objeto a prestação de serviços de apoio complementar à ma-nutenção e custeio dos hospitais no que se refere a prestação de serviços assistenciais./[...]/Diante da escassez de concursos públicos nos últimos anos para os HUs, inúmeros profissionais da Sameac [...] assumiram, com presteza e qualidade, funções internas de gerência nestes hospitais e foram capazes de assegurar a boa execução dos serviços, de forma a engrandecer o nome das entidades hospitalares da UFC”. Ou seja, ex-pressamente reconhece: a) que a admissão dos profissionais se deu pela falta de realização de concursos públicos para preenchimento de cargos públicos com as incumbências que passaram a caber aos admitidos, por via terceirizada; b) que esses terceiros, oriundos de instituição privada, estão exercendo “funções internas de gerência”, ou seja, de gestão, de administração, de regência. Ora, quem gere, manda, ainda que em suas ordens se reporte a comandos técnicos superiores. Sublinhe-se, ainda, que a ilação de que os demandados estão exercitando atividades de man-do não foi extraída, simplesmente, da nomenclatura dada às posições por eles ocupadas, mas das afirmações feitas pelas próprias autoridades pú-blicas. O Diretor Administrativo-Financeiro dos Hospitais Públicos/UFC assim descreveu: “[...] A Divisão de Gestão de Pessoas dos Hospitais Uni-versitários da Universidade Federal do Ceará (DGP/HUs), subordinada à Diretoria Administrativa-Financeira dos HUs, tem como função a gestão

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de todos os assuntos relativos à Unidade de Pessoal da UFC e da Sameac, Recursos Humanos [...] Dra. [...] [uma das rés desta demanda] é coorde-nadora da DGP/HUs./As Diretorias dos HUs possuem diversas Divisões que são ocupadas por empregados da Sameac [...] [estão arrolados os nomes dos demais promovidos]./Além das Divisões acima, várias chefias de setores dos HUs são ocupadas por empregados da Sameac [...]”. Esse mesmo Diretor, em ofício complementar, especifica as atribuições: “A Dra [...] [uma das rés desta ação] é coordenadora da Divisão de Gestão de Pessoas dos HUs/UFC, subordinada a Diretoria Administrativa-Finan-ceira dos HUs/UFC, gerenciado os setores abaixo relacionados com suas atividades:/[...]/Unidade de Pessoal da UFC:/[...]/Atividades:/a. Responde por todas as necessidades funcionais dos servidores da UFC, lotados no Hospital Universitário Walter Cantídio, excluindo a elaboração da folha de pagamento dos mesmos;/[...]/d. É responsável pelo controle da frequ-ência, absenteísmo, período aquisitivo e gozo de férias dos servidores de outros órgãos [...]/[...]/Unidade de Pessoal da Sameac:/[...]/a. Gerencia o funcionamento da Sameac/HUWC, considerando:/– Todo o processo re-lativo à admissão ou demissão de trabalhadores;/– Controle dos relatórios de folhas de frequência e alterações;/[...]/Serviço de Desenvolvimento e Recursos Humanos/[...]/SESMT/[...]/Atividades:/a. Periciar, elaborar e atualizar laudos técnicos para atividades insalubres e periculosas [...]./Os funcionários da Sameac em situação similar à [...] [nome de uma das rés] são [...] [os demais demandados] [...]”. Esse registro, meramente exem-plificativo, evidencia se tratar de atividades de gestão, a dizer, de mando, que deveriam estar sendo executadas por servidores públicos. Já o Presi-dente da Sameac, sublinhou: “alguns de seus [dela Sameac] empregados exercem cargos de chefia nos referidos hospitais [...]”. De se ressaltar, outrossim, o caráter limitado do contrato firmado entre o HUWC/UFC e a Sameac, em 2012, tendo por objeto: “a prestação, pela contratada, de serviços de apoio complementar à manutenção e custeio dos hospitais no que se refere à prestação de serviços assistenciais e de ações básicas de saúde à população carente admitida para atendimento no Hospital Uni-versitário Walter Cantídio”. Ainda que se entenda esse contrato, como do tipo “guarda-chuva”, não poderia ele dar ensejo a medidas violadoras das normas constitucionais.

4. Há muito (cerca de 20 anos) a relação entre o HUWC/UFC e a Sameac (que é de nascença, por assim dizer) vem sendo observada pelo TCU, com várias determinações de regularização. Através da Decisão nº 693/1994, do Plenário do TCU, ficou dito que “a UFC, ao transferir à Sameac a administração, ou seja, a gerência dos negócios da Materni-dade-Escola Assis Chateaubriand e do Hospital das Clínicas, trespassou efetivamente, em termos jurídicos, a prestação de serviços públicos de

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sua titularidade [...] acreditamos configurada a inconstitucionalidade da outorga, pela UFC, da prestação de serviços públicos, de assistência à saúde e de educação, a uma sociedade civil (Sameac), mediante a utili-zação de título jurídico impróprio – convênio (cf. fls. 19/22) – e sem pro-cedimento licitatório”, assinalando-se “o prazo de 180 (cento e oitenta) dias para que o responsável indicado no item 3, acima, adote as medidas necessárias à regularização da administração do Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Ceará, trespassada à Sociedade de Assistên-cia à Maternidade Escola ‘Assis Chateaubriand’, entidade privada, sem o devido amparo legal”. Em seguida, na Decisão nº 339/1999-P, o TCU concedeu prorrogação do prazo de regularização. Por meio do Acórdão nº 68/2002-P, o TCU aplicou multa ao administrador público, pelo fato de ele não ter adotado as providências necessárias à regularização im-posta pela Corte de Contas, o que foi mantido, em sede de pedido de reexame, nos termos do Acórdão nº 323/2002-P. Anos depois, o TCU passou a apontar para o fato de que, em muitas instituições públicas, inclusive no HUWC/UFC, estaria ocorrendo a terceirização ilícita, ou seja, a admissão precária de pessoal, por interposta instituição privada (no caso, a Sameac), para o exercício de atribuições de cargo público, tendo ordenado a substituição dos terceirizados por servidores concur-sados, a teor do que se lê no Acórdão nº 1.520/2006-P e no Acórdão nº 2.681/2011-P, esse último prorrogando, até 31.12.2012, o prazo de substituição dos terceirizados (que, no caso do HUWC/UFC, seriam mais de 300) por concursados, de acordo com a seguinte ementa: “MONITO-RAMENTO DO CUMPRIMENTO DAS DELIBERAÇÕES DO ACÓRDÃO Nº 1.520/2006 – PLENÁRIO – SUBSTITUIÇÃO DE TERCEIRIZADOS IR-REGULARES POR SERVIDORES EFETIVOS NO ÂMBITO DE ÓRGÃOS E ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL DIRETA, AU-TÁRQUICA E FUNDACIONAL – PRORROGAÇÃO DE PRAZO PARA A FINALIZAÇÃO DO PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO – ALERTA AOS ÓRGÃOS E ENTIDADES SOBRE A POSSIBILIDADE DE RESPONSABI-LIZAÇÃO POR ATOS OMISSIVOS OU COMISSIVOS DOS GESTORES – CONTINUIDADE DO ACOMPANHAMENTO MEDIANTE FISCALIZA-ÇÕES DIRETAS E INDIRETAS – DETERMINAÇÃO AO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO PARA QUE DÊ CIÊNCIA AOS ÓRGÃOS E ENTIDADES ENVOLVIDOS”.

5. “[...] não se pode permitir a manutenção dessa situação ilegal, na qual os empregados terceirizados ocupam funções próprias de servidores públicos sem terem sido aprovados em concurso público exigido pela Constituição Federal, exercendo ainda poder de mando sobre os servido-res legalmente investidos” (trecho do parecer da PRR5).

6. Pelo provimento da apelação.

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aCÓRDão

Vistos e relatados os presentes autos, Decide a Primeira Turma do Tri-bunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, dar provimento à ape-lação, nos termos do relatório e voto anexos, que passam a integrar o presente julgamento.

Recife, 8 de maio de 2014 (data do Julgamento).

Juiz Francisco Cavalcanti

ReLatÓRIo

O Juiz Francisco Cavalcanti: O Ministério Público Federal (MPF) ajui-zou ação civil pública contra a Universidade Federal do Ceará (UFC), Maria Tereza Barros Arrais Maia, Laurimberg Diniz Cavalcante, Kaliane Hingride Dantas, Suely Beserra de Castro e Antônia Rocivânia Araújo Lélis, objetivando o afastamento das pessoas físicas rés das funções de gerência/chefia exercitas no âmbito do Hospital Universitário Walter Cantídio, tendo em conta a suposta configuração de terceirização ilícita, já que elas seriam empregadas da Socieda-de de Assistência à Maternidade Escola Assis Chateaubriand (Sameac), entidade privada contratada pela autarquia educacional, postas à disposição da unidade hospitalar pública, na qual desempenhariam funções típicas de servidores pú-blicos ocupantes de cargo efetivo que exercem função de confiança ou de agen-tes públicos que ocupam cargos em comissão, haja vista seu poder de mando.

A UFC, em manifestação inicial, sobre o pleito de tutela antecipada, des-tacou a situação diferenciada de Suely Beserra de Castro, tendo em vista que ela teria sido cedida pelo Poder Legislativo do Estado do Ceará à UFC. Quanto aos demais réus, disse que “são empregados da Sameac cedidos para assumir encargos na UFC, como forma de prestar serviços de apoio complementar à ma-nutenção e custeio do hospital” e que as posições por eles ocupadas (Gerente da Divisão de Suprimentos, Gerente de Hotelaria, Gerente da Divisão de Diag-nóstico e Terapia e Gerente da Divisão de Gestão de Pessoas) não integrariam a estrutura organizacional da UFC/HWC.

Antônia Rocivânia Araújo Lélis, Kaliane Hingride Dantas, Laurimberg Diniz Cavalcante e Maria Tereza Barros Arrais Maia, em sua defesa, igualmente ressaltaram que as posições por eles ocupadas não corresponderiam a cargos públicos, inexistindo no organograma da UFC, de modo que “não haveria, por conseguinte, como exigir-se subordinação dos servidores lotados no Hospital Universitário, às supostas ordens por eles atribuídas”. Acrescentaram que as no-menclaturas dessas posições seriam utilizadas apenas para efeito de distribuição das atribuições dos empregados da Sameac a serviço do hospital universitário.

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Consignaram que não teriam poder de mando e que estariam subordinados às ordens dos diretores da instituição pública. Frisaram a inocorrência de violação aos princípios regentes da Administração Pública e ao Decreto nº 2.271/1997. Salientaram que seriam apenas 6, de um universo de 446 empregados da Sa-meac, prestando serviços ao hospital universitário. Invocaram, finalmente, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Suely Beserra de Castro contestou, consignando que “integra o setor de Divisão de Engenharia e Arquitetura do HUWC, departamento este que sequer integra a estrutura organizacional do HUWC [...], ou seja, não existe e nunca existiu concurso público para investidura em função de direção da Divisão de Engenharia e Arquitetura do HUWC, haja vista que se trata de um departamento que não integra a atividade-fim do referido hospital”. Aduziu que não teria po-der de mando e estaria subordinada diretamente à Superintendência do HUWC.

Indeferida a antecipação de tutela (fl. 390), o que ensejou a interposição de agravo de instrumento (AGTR 134129/CE).

Réplica do MPF às fls. 352/359.

A UFC apresentou contestação, reiterando as alegações antes deduzidas e destacando, adicionalmente, que as designações questionadas teriam por ob-jetivo “viabilizar o funcionamento dos Hospitais Universitários, diante da es-cassez de funcionários” e que “somente quando a Ebserh – Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares [...] criada pela Lei nº 12.550, de 15 de dezembro de 2011, assumir os Hospitais Universitários da UFC, é que tal serviço prestado pelos colaboradores em evidência seriam desnecessários”.

Réplica do MPF às fls. 373/376.

O Juízo Federal a quo julgou improcedente o pedido, em sentença de fls. 384/390.

O MPF, então, apelou, dizendo estar devidamente demonstrado o exercí-cio de atribuições de servidor público por pessoal terceirizado. Reiterou, no fun-damental, as teses deduzidas na petição inicial, salientando as decisões exaradas no AGTR 134129/CE e na Ação Civil Pública nº 0020337-08.2005.4.05.8100.

Contrarrazões de apelação às fls. 410/423 e 426/427.

Ouvida, nesta Instância, a PRR5 opinou pelo provimento da apelação, segundo parecer de fls. 436/437.

É o relatório.

Dispensada a revisão. Peço dia para julgamento.

Juiz Francisco Cavalcanti Relator

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ementaCoNStItuCIoNAl e AdmINIStrAtIvo – ApelAção – Ação CIvIl pÚBlICA – hoSpItAl pÚBlICo uNIverSItÁrIo – eXeCução, por terCeIrIzAdoS, de AtIvIdAdeS INereNteS ÀS AtrIBuIçÕeS típICAS de CArgoS pÚBlICoS, ApeNAS deSempeNhÁveIS por ServIdoreS pÚBlICoS – IN-CoNStItuCIoNAlIdAde – Art. 37, II e v, dA CF/1988 – proCedêNCIA do pedIdo – provImeN-to do reCurSo

1. Apelação interposta contra sentença de improcedência do pedido de ação civil pública ajuizada com vistas ao afastamento das pessoas físicas rés das funções de gerência/chefia exercitas no âmbito do Hospital Univer-sitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará (HUWC/UFC), tendo em conta a suposta configuração de terceirização ilícita, já que elas seriam empregadas da Sociedade de Assistência à Maternidade Esco-la Assis Chateaubriand (Sameac), entidade privada contratada pela autar-quia educacional, postas à disposição da unidade hospitalar pública, na qual desempenhariam funções típicas de servidores públicos ocupantes de cargo efetivo que exercem função de confiança ou de agentes públi-cos que ocupam cargos em comissão, haja vista seu poder de mando.

2. É preceito constitucional (art. 37, II, da CF/1988) a imposição à Admi-nistração Pública do dever de realização de concurso público para a con-tratação de pessoal, dispondo, outrossim, o Texto Constitucional, acerca dos requisitos para a ocupação de funções de confiança e cargos em comissão. Quando, sob a máscara da terceirização, através da contrata-ção de instituição privada para “apoio complementar”, a Administração Pública admite pessoal ao exercício de atribuições que são inerentes a cargos públicos, e, portanto, deveriam ser desempenhadas por servido-res públicos, está burlando o princípio da obrigatoriedade do concurso público. É cediço que “não devem ser terceirizados serviços relativos às atividades fins da instituição pública contratante, bem como aqueles contemplados nas atribuições dos cargos que compõem sua estrutura or-ganizacional” (Acórdão nº 1.466-22/2010-P do TCU).

3. O Superintendente dos Hospitais Públicos/UFC assim se reporta aos profissionais da Sameac, à disposição do HUWC/UFC: “[...] os Hospitais Universitários da UFC (Hospital Walter Cantídio e Maternidade Escola Assis Chateaubriand) possuem grande carência de pessoal e por isso a UFC mantém com a Sociedade de Assistência a Maternidade Escola As-sis Chateaubriand (Sameac) um Contrato de Prestação de Serviços tendo como objeto a prestação de serviços de apoio complementar à manu-tenção e custeio dos hospitais no que se refere a prestação de serviços assistenciais./[...]/Diante da escassez de concursos públicos nos últimos anos para os HUs, inúmeros profissionais da Sameac [...] assumiram,

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com presteza e qualidade, funções internas de gerência nestes hospitais e foram capazes de assegurar a boa execução dos serviços, de forma a engrandecer o nome das entidades hospitalares da UFC”. Ou seja, ex-pressamente reconhece: a) que a admissão dos profissionais se deu pela falta de realização de concursos públicos para preenchimento de cargos públicos com as incumbências que passaram a caber aos admitidos, por via terceirizada; b) que esses terceiros, oriundos de instituição privada, estão exercendo “funções internas de gerência”, ou seja, de gestão, de administração, de regência. Ora, quem gere, manda, ainda que em suas ordens se reporte a comandos técnicos superiores. Sublinhe-se, ainda, que a ilação de que os demandados estão exercitando atividades de man-do não foi extraída, simplesmente, da nomenclatura dada às posições por eles ocupadas, mas das afirmações feitas pelas próprias autoridades pú-blicas. O Diretor Administrativo-Financeiro dos Hospitais Públicos/UFC assim descreveu: “[...] A Divisão de Gestão de Pessoas dos Hospitais Uni-versitários da Universidade Federal do Ceará (DGP/HUs), subordinada à Direitoria Administrativa-Financeira dos HUs, tem como função a gestão de todos os assuntos relativos à Unidade de Pessoal da UFC e da Sameac, Recursos Humanos [...] Dra. [...] [uma das rés desta demanda] é coorde-nadora da DGP/HUs./As Diretorias dos HUs possuem diversas Divisões que são ocupadas por empregados da Sameac [...] [estão arrolados os nomes dos demais promovidos]. /Além das Divisões acima, várias chefias de setores dos HUs são ocupadas por empregados da Sameac [...]”. Esse mesmo Diretor, em ofício complementar, especifica as atribuições: “A Dra. [...] [uma das rés desta ação] é coordenadora da Divisão de Gestão de Pessoas dos HUs/UFC, subordinada a Diretoria Administrativa-Finan-ceira dos HUs/UFC, gerenciado os setores abaixo relacionados com suas atividades:/[...]/Unidade de Pessoal da UFC:/[...]/Atividades:/a. Responde por todas as necessidades funcionais dos servidores da UFC, lotados no Hospital Universitário Walter Cantídio, excluindo a elaboração da folha de pagamento dos mesmos;/[...]/d. É responsável pelo controle da frequ-ência, absenteísmo, período aquisitivo e gozo de férias dos servidores de outros órgãos [...]/[...]/Unidade de Pessoal da Sameac:/[...]/a. Gerencia o funcionamento da Sameac/HUWC, considerando:/– Todo o processo re-lativo à admissão ou demissão de trabalhadores;/– Controle dos relatórios de folhas de frequência e alterações;/[...]/Serviço de Desenvolvimento e Recursos Humanos/[...]/SESMT/[...]/Atividades:/a. Periciar, elaborar e atualizar laudos técnicos para atividades insalubres e periculosas [...]./Os funcionários da Sameac em situação similar à [...] [nome de uma das rés] são [...] [os demais demandados] [...]”. Esse registro, meramente exem-plificativo, evidencia se tratar de atividades de gestão, a dizer, de mando, que deveriam estar sendo executadas por servidores públicos. Já o Presi-

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dente da Sameac, sublinhou: “alguns de seus [dela Sameac] empregados exercem cargos de chefia nos referidos hospitais [...]”.

De se ressaltar, outrossim, o caráter limitado do contrato firmado entre o HUWC/UFC e a Sameac, em 2012, tendo por objeto: “a prestação, pela contratada, de serviços de apoio complementar à manutenção e custeio dos hospitais no que se refere à prestação de serviços assistenciais e de ações básicas de saúde à população carente admitida para atendimento no Hospital Universitário Walter Cantídio”. Ainda que se entenda esse contrato, como do tipo “guarda-chuva”, não poderia ele dar ensejo a medidas violadoras das normas constitucionais.

4. Há muito (cerca de 20 anos) a relação entre o HUWC/UFC e a Sa-meac (que é de nascença, por assim dizer) vem sendo observada pelo TCU, com várias determinações de regularização. Através da Decisão nº 693/1994, do Plenário do TCU, ficou dito que “a UFC, ao transferir à Sameac a administração, ou seja, a gerência dos negócios da Materni-dade-Escola Assis Chateaubriand e do Hospital das Clínicas, trespassou efetivamente, em termos jurídicos, a prestação de serviços públicos de sua titularidade [...] acreditamos configurada a inconstitucionalidade da outorga, pela UFC, da prestação de serviços públicos, de assistência à saúde e de educação, a uma sociedade civil (Sameac), mediante a utili-zação de título jurídico impróprio – convênio (cf. fls. 19/22) – e sem pro-cedimento licitatório”, assinalando-se “o prazo de 180 (cento e oitenta) dias para que o responsável indicado no item 3, acima, adote as medidas necessárias à regularização da administração do Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Ceará, trespassada à Sociedade de Assistên-cia à Maternidade Escola ‘Assis Chateaubriand’, entidade privada, sem o devido amparo legal”. Em seguida, na Decisão nº 339/1999-P, o TCU concedeu prorrogação do prazo de regularização. Por meio do Acórdão nº 68/2002-P, o TCU aplicou multa ao administrador público, pelo fato de ele não ter adotado as providências necessárias à regularização im-posta pela Corte de Contas, o que foi mantido, em sede de pedido de reexame, nos termos do Acórdão nº 323/2002-P. Anos depois, o TCU passou a apontar para o fato de que, em muitas instituições públicas, inclusive no HUWC/UFC, estaria ocorrendo a terceirização ilícita, ou seja, a admissão precária de pessoal, por interposta instituição privada (no caso, a Sameac), para o exercício de atribuições de cargo público, tendo ordenado a substituição dos terceirizados por servidores concur-sados, a teor do que se lê no Acórdão nº 1.520/2006-P e no Acórdão nº 2.681/2011-P, esse último prorrogando, até 31.12.2012, o prazo de substituição dos terceirizados (que, no caso do HUWC/UFC, seriam mais de 300) por concursados, de acordo com a seguinte ementa: “MONITO-

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RAMENTO DO CUMPRIMENTO DAS DELIBERAÇÕES DO ACÓRDÃO Nº 1.520/2006 – PLENÁRIO – SUBSTITUIÇÃO DE TERCEIRIZADOS IR-REGULARES POR SERVIDORES EFETIVOS NO ÂMBITO DE ÓRGÃOS E ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL DIRETA, AU-TÁRQUICA E FUNDACIONAL – PRORROGAÇÃO DE PRAZO PARA A FINALIZAÇÃO DO PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO – ALERTA AOS ÓRGÃOS E ENTIDADES SOBRE A POSSIBILIDADE DE RESPONSABI-LIZAÇÃO POR ATOS OMISSIVOS OU COMISSIVOS DOS GESTORES – CONTINUIDADE DO ACOMPANHAMENTO MEDIANTE FISCALIZA-ÇÕES DIRETAS E INDIRETAS – DETERMINAÇÃO AO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO PARA QUE DÊ CIÊNCIA AOS ÓRGÃOS E ENTIDADES ENVOLVIDOS”.

5. “[...] não se pode permitir a manutenção dessa situação ilegal, na qual os empregados terceirizados ocupam funções próprias de servidores públicos sem terem sido aprovados em concurso público exigido pela Constituição Federal, exercendo ainda poder de mando sobre os servido-res legalmente investidos” (trecho do parecer da PRR5).

6. Pelo provimento da apelação.

voto

O Juiz Francisco Cavalcanti: Trata-se de apelação interposta contra sen-tença de improcedência do pedido de ação civil pública ajuizada com vistas ao afastamento das pessoas físicas rés das funções de gerência/chefia exercitas no âmbito do Hospital Universitário Walter Cantídio da Universidade Federal do Ceará (HUWC/UFC), tendo em conta a suposta configuração de terceirização ilícita, já que elas seriam empregadas da Sociedade de Assistência à Materni-dade Escola Assis Chateaubriand (Sameac), entidade privada contratada pela autarquia educacional, postas à disposição da unidade hospitalar pública, na qual desempenhariam funções típicas de servidores públicos ocupantes de car-go efetivo que exercem função de confiança ou de agentes públicos que ocu-pam cargos em comissão, haja vista seu poder de mando.

Direto ao cerne.

É preceito constitucional (art. 37, II, da CF/1988) a imposição à Adminis-tração Pública do dever de realização de concurso público para a contratação de pessoal, dispondo, outrossim, o Texto Constitucional, acerca dos requisitos para a ocupação de funções de confiança e cargos em comissão.

Quando, sob a máscara da terceirização, através da contratação de ins-tituição privada para “apoio complementar”, a Administração Pública admite pessoal ao exercício de atribuições que são inerentes a cargos públicos, e, por-

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tanto, deveriam ser desempenhadas por servidores públicos, está burlando o princípio da obrigatoriedade do concurso público.

É cediço que “não devem ser terceirizados serviços relativos às atividades fins da instituição pública contratante, bem como aqueles contemplados nas atribuições dos cargos que compõem sua estrutura organizacional” (Acórdão nº 1.466-22/10-P do TCU).

A partir de tais premissas, devem ser considerados os aspectos fáticos envolvidos nesta lide.

O Superintendente dos Hospitais Públicos/UFC assim se reporta aos pro-fissionais da Sameac, à disposição do HUWC/UFC: “[...] os Hospitais Univer-sitários da UFC (Hospital Walter Cantídio e Maternidade Escola Assis Chateau-briand) possuem grande carência de pessoal e por isso a UFC mantém com a Sociedade de Assistência a Maternidade Escola Assis Chateaubriand (Sameac) um Contrato de Prestação de Serviços tendo como objeto a prestação de ser-viços de apoio complementar à manutenção e custeio dos hospitais no que se refere a prestação de serviços assistenciais./[...]/Diante da escassez de concur-sos públicos nos últimos anos para os HUs, inúmeros profissionais da Sameac [...] assumiram, com presteza e qualidade, funções internas de gerência nestes hospitais e foram capazes de assegurar a boa execução dos serviços, de forma a engrandecer o nome das entidades hospitalares da UFC”.

Ou seja, expressamente reconhece: a) que a admissão dos profissionais se deu pela falta de realização de concursos públicos para preenchimento de cargos públicos com as incumbências que passaram a caber aos admitidos, por via terceirizada; b) que esses terceiros, oriundos de instituição privada, estão exercendo “funções internas de gerência”, ou seja, de gestão, de administração, de regência. Ora, quem gere, manda, ainda que em suas ordens se reporte a co-mandos técnicos superiores. Sublinhe-se, ainda, que a ilação de que os deman-dados estão exercitando atividades de mando não foi extraída, simplesmente, da nomenclatura dada às posições por eles ocupadas, mas das afirmações feitas pelas próprias autoridades públicas.

O Diretor Administrativo-Financeiro dos Hospitais Públicos/UFC assim descreveu: “[...] A Divisão de Gestão de Pessoas dos Hospitais Universitários da Universidade Federal do Ceará (DGP/HUs), subordinada à Direitoria Admi-nistrativa-Financeira dos HUs, tem como função a gestão de todos os assuntos relativos à Unidade de Pessoal da UFC e da Sameac, Recursos Humanos [...] Dra. [...] [uma das rés desta demanda] é coordenadora da DGP/HUs./As Dire-torias dos HUs possuem diversas Divisões que são ocupadas por empregados da Sameac [...] [estão arrolados os nomes dos demais promovidos]./Além das Divisões acima, várias chefias de setores dos HUs são ocupadas por emprega-dos da Sameac [...]”. Esse mesmo Diretor, em ofício complementar, especifica

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as atribuições: “A Dra [...] [uma das rés desta ação] é coordenadora da Divisão de Gestão de Pessoas dos HUs/UFC, subordinada a Diretoria Administrativa--Financeira dos HUs/UFC, gerenciado os setores abaixo relacionados com suas atividades:/[...]/Unidade de Pessoal da UFC:/[...]/Atividades:/a. Responde por todas as necessidades funcionais dos servidores da UFC, lotados no Hospital Universitário Walter Cantídio, excluindo a elaboração da folha de pagamento dos mesmos;/[...]/d. É responsável pelo controle da frequência, absenteísmo, período aquisitivo e gozo de férias dos servidores de outros órgãos [...]/[...]/Unidade de Pessoal da Sameac:/[...]/a. Gerencia o funcionamento da Same-ac/HUWC, considerando:/– Todo o processo relativo à admissão ou demissão de trabalhadores;/– Controle dos relatórios de folhas de frequência e altera-ções;/[...]/Serviço de Desenvolvimento e Recursos Humanos/[...]/SESMT/[...]/Atividades:/a. Periciar, elaborar e atualizar laudos técnicos para atividades insa-lubres e periculosas [...]./Os funcionários da Sameac em situação similar à [...] [nome de uma das rés] são [...] [os demais demandados] [...]”.

Esse registro, meramente exemplificativo, evidencia se tratar de ativida-des de gestão, a dizer, de mando, que deveriam estar sendo executadas por servidores públicos.

Já o Presidente da Sameac, sublinhou: “alguns de seus [dela Sameac] empregados exercem cargos de chefia nos referidos hospitais [...]”.

De se ressaltar, outrossim, o caráter limitado do contrato firmado en-tre o HUWC/UFC e a Sameac, em 2012, tendo por objeto: “a prestação, pela contratada, de serviços de apoio complementar à manutenção e custeio dos hospitais no que se refere à prestação de serviços assistenciais e de ações bási-cas de saúde à população carente admitida para atendimento no Hospital Uni-versitário Walter Cantídio”. Ainda que se entenda esse contrato, como do tipo “guarda-chuva”, não poderia ele dar ensejo a medidas violadoras das normas constitucionais.

Há muito (cerca de 20 anos) a relação entre o HUWC/UFC e a Sameac (que é de nascença, por assim dizer) vem sendo observada pelo TCU, com vá-rias determinações de regularização.

Através da Decisão nº 693/1994, do Plenário do TCU, ficou dito que “a UFC, ao transferir à Sameac a administração, ou seja, a gerência dos negócios da Maternidade-Escola Assis Chateaubriand e do Hospital das Clínicas, trespas-sou efetivamente, em termos jurídicos, a prestação de serviços públicos de sua titularidade [...] acreditamos configurada a inconstitucionalidade da outorga, pela UFC, da prestação de serviços públicos, de assistência à saúde e de edu-cação, a uma sociedade civil (Sameac), mediante a utilização de título jurídico impróprio – convênio (cf. fls. 19/22) – e sem procedimento licitatório”, assina-lando-se “o prazo de 180 (cento e oitenta) dias para que o responsável indicado

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no item 3, acima, adote as medidas necessárias à regularização da administra-ção do Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Ceará, trespassada à Sociedade de Assistência à Maternidade Escola ‘Assis Chateaubriand’, entidade privada, sem o devido amparo legal”.

Em seguida, na Decisão nº 339/1999-P, o TCU concedeu prorrogação do prazo de regularização.

Por meio do Acórdão nº 68/2002-P, o TCU aplicou multa ao adminis-trador público, pelo fato de ele não ter adotado as providências necessárias à regularização imposta pela Corte de Contas, o que foi mantido, em sede de pedido de reexame, nos termos do Acórdão nº 323/2002-P.

Anos depois, o TCU passou a apontar para o fato de que, em muitas instituições públicas, inclusive no HUWC/UFC, estaria ocorrendo a terceiriza-ção ilícita, ou seja, a admissão precária de pessoal, por interposta instituição privada (no caso, a Sameac), para o exercício de atribuições de cargo público, tendo ordenado a substituição dos terceirizados por servidores concursados, a teor do que se lê no Acórdão nº 1.520/2006-P e no Acórdão nº 2.681/2011-P, esse último prorrogando, até 31.12.2012, o prazo de substituição dos tercei-rizados (que, no caso do HUWC/UFC, seriam mais de 300) por concursados, de acordo com a seguinte ementa: “MONITORAMENTO DO CUMPRIMENTO DAS DELIBERAÇÕES DO ACÓRDÃO Nº 1.520/2006 – PLENÁRIO – SUBS-TITUIÇÃO DE TERCEIRIZADOS IRREGULARES POR SERVIDORES EFETIVOS NO ÂMBITO DE ÓRGÃOS E ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA FEDERAL DIRETA, AUTÁRQUICA E FUNDACIONAL – PRORROGAÇÃO DE PRAZO PARA A FINALIZAÇÃO DO PROCESSO DE SUBSTITUIÇÃO – ALERTA AOS ÓRGÃOS E ENTIDADES SOBRE A POSSIBILIDADE DE RESPONSABILI-ZAÇÃO POR ATOS OMISSIVOS OU COMISSIVOS DOS GESTORES – CONTI-NUIDADE DO ACOMPANHAMENTO MEDIANTE FISCALIZAÇÕES DIRETAS E INDIRETAS – DETERMINAÇÃO AO MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, OR-ÇAMENTO E GESTÃO PARA QUE DÊ CIÊNCIA AOS ÓRGÃOS E ENTIDADES ENVOLVIDOS”.

Penso que “[...] não se pode permitir a manutenção dessa situação ilegal, na qual os empregados terceirizados ocupam funções próprias de servidores públicos sem terem sido aprovados em concurso público exigido pela Constitui-ção Federal, exercendo ainda poder de mando sobre os servidores legalmente investidos” (trecho do parecer da PRR5).

Com essas considerações, dou provimento à apelação.

É como voto.

Juiz Francisco Cavalcanti Relator

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Assunto Especial – Ementário

Terceirização na Administração Pública

7344 – Ação civil pública – contratação de pessoal – atividade essencial – terceirização – impos-sibilidade

“Ação civil pública. Contratação de pessoal na administração pública. Terceirização. Na administra-ção pública a autorização legal à terceirização é limitada exclusivamente às atividades-meio, assim entendidas aquelas atividades não essenciais, periféricas à essência da dinâmica empresarial do toma-dor dos serviços, dentre as quais, às relacionadas à limpeza e à segurança. Caso em que se mantém a sentença que julgou não serem passíveis de descentralização administrativa os serviços executados pelas telefonistas que realizam o agendamento de consultas para o Samu – Serviço de Atendimen-to Médico de Urgência, porquanto exercem atividade que constitui parte essencial do serviço pú-blico prestado de forma permanente. Recurso do município reclamado não provido.” (TRT 4ª R. – RO 0176500-21.2006.5.04.0018 – 1ª T. – Relª Desª Iris Lima de Moraes – DJe 08.09.2014)

7345 – Autarquia – serviços terceirizados – contratação – atividades-fim – ilicitude

“Ação civil pública para obstar contratação de serviços terceirizados para atividade-fim de autarquia estadual. Inmetro. Alegação de nulidade da sentença por ausência de manifestação sobre todos os ar-gumentos da defesa. Desnecessidade. Ilegitimidade ativa do Ministério Público. Afastamento. Ilicitude da terceirização de atividades-fim do ente público. Contratação ilegal. Violação ao art. 37, inciso II, da Constituição Federal e aos princípios que regem a administração pública. Atividades contratadas similares às inerentes às funções dos cargos públicos a serem preenchidos por candidatos aprovados no concurso em vigor. Cláusula de reserva de plenário. Afronta à Súmula Vinculante nº 10 do STF. Inexistência. Multa cominatória fixada em valor razoável e proporcional. Recurso desprovido. Desde que o magistrado tenha encontrado motivos suficientes para julgar procedente o pedido inicial, é desnecessário esgotar a análise de todos os argumentos utilizados pelas partes na defesa de suas teses, tampouco é necessário mencionar todos os dispositivos legais que invocaram para que seja válida a sentença. Os arts. 127, 129, inciso II, ambos da Constituição Federal e a Lei Federal nº 7.347/1985, que disciplina a Ação Civil Pública, conferem legitimidade ao Ministério Público para atuar na defesa de interesses públicos, sociais, difusos e da coletividade e zelar pela observância da ordem constitu-cional. A admissão de pessoal, pela Administração Pública, deve observar o princípio constitucional contido no art. 37, inciso II, da Constituição Federal, o qual prevê a aprovação em concurso públi-co como condição para investidura em cargos ou empregos públicos. Na Administração Pública, atualmente, a terceirização de pessoal só é possível para atividades-meio e não para atividades-fim. É inconstitucional a terceirização de pessoal contratada pelo Poder Público como forma de admitir trabalhadores nos quadros da administração sem o prévio concurso público. É desnecessária a sub-missão ao Órgão Especial do Tribunal de Justiça a que se refere a Súmula Vinculante nº 10 do STF, a decisão que não trata diretamente de reconhecer a inconstitucionalidade da Lei nº 12.545/2011. ‘[...] O objetivo das astreintes não é obrigar o réu a pagar o valor da multa, mas obrigá-lo a cumprir a obri-gação na forma específica. A multa é apenas inibitória. Deve ser alta para que o devedor desista de seu intento de não cumprir a obrigação específica. Vale dizer, o devedor deve sentir ser preferível cumprir a obrigação na forma específica a pagar o alto valor da multa fixada pelo juiz’ (NERY JÚNIOR, Nelson; ANDRADE NERY, Rosa Maria de. Código de Processo Civil Comentado e legislação extravagante).” (TJSC – AC 2013.061922-5 – Rel. Des. Jaime Ramos – DJe 19.05.2015)

7346 – Autarquia – terceirização – tomador de serviços – responsabilidade subsidiária

“Terceirização na administração pública. Autarquia municipal. Responsabilidade subsidiária con-firmada. Nos casos de terceirização, a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços opera-

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-se por ser este o verdadeiro beneficiário final da força de trabalho do empregado contratado pela empresa prestadora dos serviços, que se tornou inadimplente. De acordo com o entendimento jurisprudencial sumular da Corte trabalhista, o pressuposto fático da responsabilização subsidiária da administração Pública é a conduta omissiva e culposa do órgão administrativo ‘no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora’. A questão jurídica suscitada pelo recorrente a respeito da validade do art. 71, da Lei nº 8.666/1993, encontra-se paci-ficada pela decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 16, que motivou o colendo Tribunal Superior do Trabalho a dar nova redação aos itens IV, V e VI da Súmula Nº 331. No caso em apreço, a culpa in vigilando do Instituto Dr. José Frota revela-se nitidamente caracterizada na completa ausência de provas com o fim de demonstrar o cumprimento de seu dever legal de fiscalizar o adimplemento das obrigações, em especial as verbas rescisórias, por parte da empregadora contratada.” (TRT 7ª R. – ROPS 0010628-71.2014.5.07.0023 – Relª Dulcina de Holanda Palhano – DJe 09.07.2015)

7347 – Concurso público – ausência – terceirização ilícita

“Agravo de instrumento. Tutela antecipada. Afastamento da função pública e suspensão dos paga-mentos Deferimento. Admissibilidade Ausência de concurso público. Atividades-fins e ordinárias da Administração Pública. Terceirização ilícita. Inexistência, ao menos sob um exame perfunctório, de ilegalidade, irregularidade, teratologia ou nulidade a recomendar a reforma da decisão recorrida. Recurso desprovido.” (TJSP – AI 2163396-37.2014.8.26.0000 – Guariba – 8ª CDPúb. – Relª Cristina Cotrofe – DJe 26.03.2015)

7348 – Convênio – repasse de incentivo ao esporte – terceirização – não ocorrência

“Agravo de instrumento. Recurso de revista. Pedido de indenização por danos morais. Ausência de comprovação do dano. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que o atraso reiterado no pagamento de salários evidencia dano moral in re ipsa. Do v. acórdão recorrido não se evidencia a repetição no atraso de salários ou das verbas rescisórias. Foi registrado, porém, que o autor não produziu nenhuma prova quanto ao dano alegado. Necessário seria que fosse comprovado ao me-nos algum fato concreto a partir do qual pudesse se presumir o prejuízo, o que não ocorreu no caso dos autos. Não comprovado o dano moral, impossível o deferimento de indenização. Incólumes, portanto, os arts. 186 e 927 do Código Civil Brasileiro. Responsabilidade subsidiária. Administra-ção pública. Convênio. Inaplicabilidade da Súmula nº 331 desta Corte. Atividade de fomento ao esporte. Ausência de caracterização como tomador de serviços. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a celebração de convênio pelos órgãos ou entidades da Administração Pública não os isenta da responsabilização subsidiária pelo descumprimento das obrigações trabalhistas pelos conveniados, em decorrência dos arts. 67 e 116 da Lei nº 8.666/1993, que determinam a obrigação de fiscalizar o cumprimento dos contratos administrativos. Porém, diversamente do que disciplina a Súmula nº 331 deste Tribunal, a hipótese dos autos não trata de serviço público prestado por inter-posta pessoa (terceirização). O Tribunal Regional registrou que a Fundação de Esporte de Londrina apenas realizava repasse de valores para o Instituto Pró-Esporte de Londrina (pessoa jurídica de direito privado) para prestar-lhe serviços de desenvolvimento de atletas de voleibol masculino. Res-saltou, ainda, que ‘não se vislumbra a ocorrência de terceirização, a que alude a Súmula nº 331 do TST, eis que o autor não prestou serviços para o Município mediante interposta pessoa, não haven-do amparo legal para o acolhimento da pretensão recursal.. Dessa forma, não é o caso de aplicação da Súmula nº 331 desta Corte uma vez que atuou o ente público como fomentador da atividade desportiva, não assumindo o risco da atividade privada prestada, não tendo, ainda, sido beneficiário dos serviços prestados. Precedentes. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.” (TST – AIRR 0001397-36.2012.5.09.0863 – Rel. Min. Alexandre de Souza Agra Belmonte – DJe 22.05.2015)

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Comentário Editorial SÍNTESECuida o acórdão em estudo da não configuração da terceirização no repasse de verba pela administração pública para fomentar atividade esportiva.

No caso, restou comprovado que a administração pública somente repassava verba para o incentivo da prática desportiva, não atuando como tomadora de serviço.

Os seguintes dispositivos da Lei nº 8.666/1993 demonstram o entendimento esposado pelo Tribunal:

“Art. 67. A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti--lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição.

§ 1º O representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências rela-cionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados.

§ 2º As decisões e providências que ultrapassarem a competência do representante deverão ser solicitadas a seus superiores em tempo hábil para a adoção das medidas convenientes.

Art. 116. Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.

§ 1º A celebração de convênio, acordo ou ajuste pelos órgãos ou entidades da Administração Pública depende de prévia aprovação do competente plano de trabalho proposto pela organi-zação interessada, o qual deverá conter, no mínimo, as seguintes informações:

I – identificação do objeto a ser executado;

II – metas a serem atingidas;

III – etapas ou fases da execução;

IV – plano de aplicação dos recursos financeiros;

V – cronograma de desembolso;

VI – previsão de início e fim da execução do objeto, bem assim da conclusão das etapas ou fases programadas;

VII – se o ajuste compreender obra ou serviço de engenharia, comprovação de que os recursos próprios para complementar a execução do objeto estão devidamente assegurados, salvo se o custo total do empreendimento recair sobre a entidade ou órgão descentralizador.

§ 2º Assinado o convênio, a entidade ou órgão repassador dará ciência do mesmo à Assem-bleia Legislativa ou à Câmara Municipal respectiva.

§ 3º As parcelas do convênio serão liberadas em estrita conformidade com o plano de aplica-ção aprovado, exceto nos casos a seguir, em que as mesmas ficarão retidas até o saneamento das impropriedades ocorrentes:

I – quando não tiver havido comprovação da boa e regular aplicação da parcela anteriormente recebida, na forma da legislação aplicável, inclusive mediante procedimentos de fiscalização local, realizados periodicamente pela entidade ou órgão descentralizador dos recursos ou pelo órgão competente do sistema de controle interno da Administração Pública;

II – quando verificado desvio de finalidade na aplicação dos recursos, atrasos não justificados no cumprimento das etapas ou fases programadas, práticas atentatórias aos princípios funda-mentais da Administração Pública nas contratações e demais atos praticados na execução do convênio, ou o inadimplemento do executor com relação a outras cláusulas conveniais básicas;

III – quando o executor deixar de adotar as medidas saneadoras apontadas pelo partícipe repassador dos recursos ou por integrantes do respectivo sistema de controle interno.

§ 4º Os saldos de convênio, enquanto não utilizados, serão obrigatoriamente aplicados em cadernetas de poupança de instituição financeira oficial se a previsão de seu uso for igual ou superior a um mês, ou em fundo de aplicação financeira de curto prazo ou operação de merca-do aberto lastreada em títulos da dívida pública, quando a utilização dos mesmos verificar-se em prazos menores que um mês.

§ 5º As receitas financeiras auferidas na forma do parágrafo anterior serão obrigatoriamente computadas a crédito do convênio e aplicadas, exclusivamente, no objeto de sua finalidade, devendo constar de demonstrativo específico que integrará as prestações de contas do ajuste.

§ 6º Quando da conclusão, denúncia, rescisão ou extinção do convênio, acordo ou ajuste, os saldos financeiros remanescentes, inclusive os provenientes das receitas obtidas das aplica-

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ções financeiras realizadas, serão devolvidos à entidade ou órgão repassador dos recursos, no prazo improrrogável de 30 (trinta) dias do evento, sob pena da imediata instauração de toma-da de contas especial do responsável, providenciada pela autoridade competente do órgão ou entidade titular dos recursos.”

Além disso, ante a previsão de lei em nosso ordenamento jurídico, a Súmula nº 331 do TST aborda a temática:

“331 – CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE.” (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação)

I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços es-pecializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a res-ponsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiaria-mente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cum-primento das obrigações da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorren-tes da condenação referentes ao período da prestação laboral.”

Até o momento desta edição, o instituto da terceirização ainda é discutido pelos Senadores.

Na Revista SínteSe trabalhista e Previdenciário, abordamos como assunto especial o tema “A polêmica terceirização”. O Advogado, Dr. Luciano Elias Reis, teceu as seguintes conside-rações:

“A contratação pela Administração Pública de serviços terceirizados é uma prática comum na atualidade, entretanto merece profícuas reflexões sobre o seu uso e as posições adotadas pelas Cortes de Contas e pelo Poder Judiciário, haja vista o distanciamento da teoria e da prática. Este ensaio objetiva um reexame crítico de alguns conceitos e comportamentos hodiernamente assentados nos órgãos e entidades públicas, sem qualquer pretensão de esgotamento ou de respostas exatas.

A Constituição da República Federativa de 1988 prescreveu a possibilidade de contratar servi-ços de terceiros, desde que respeitados a regra e o princípio do dever de licitar como expresso no inciso XXI do art. 37: ‘Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública [...]’.

O tema não é uma novidade ou exclusividade da Administração Pública, isto porque a terceiri-zação advém historicamente do setor privado após a Segunda Guerra Mundial. Trata-se de um fenômeno ocasionado por critérios econômicos que altera a linha de produção e a iniciativa privada, principalmente para diminuir os custos na formação de preços dos objetos, ainda mais em um mundo globalizado e deveras competitivo.

[...]

Como asseverado, a Constituição da República Federativa preceitua a contratação de serviços pela Administração Pública. Regulamentando o inciso XXI do art. 37 da Carta Magna, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 8.666/1993) também dispõe em vários disposi-tivos. Vide, por exemplo, arts. 1º, caput, 2º, caput, 6º, I, 7º, entre outros diversos.

Qualquer serviço poderá ser descentralizado pelos órgãos e entidades estatais e repassados a um terceiro ou existe uma limitação? Para responder a esta inquirição, é necessário analisar as nebulosas e polissêmicas expressões ‘atividade-meio’ e ‘atividade-fim’.

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A terceirização na Administração Pública somente poderá ocorrer de serviços relacionados à atividade-meio. A atividade-fim deverá necessariamente ser desempenhada por um servidor ou um empregado especificamente contratado para este mister.

A atividade-meio é importante para a consecução das atribuições e funcionamento dos órgãos e entidades da Administração, no entanto não é a atividade precípua ou principal. Enquan-to a atividade-meio é considerada instrumental e ancilar, a atividade-fim está relacionada à essência da existência e aos escopos em si das atribuições determinadas normativamente à Administração Pública.

Neste diapasão, as atividades principais e precípuas dos órgãos e entidades da Administração Pública não poderão ser terceirizados, sob pena de configurar flagrante ilegalidade.” (Revista SínteSe trabalhista e Previdenciária, Terceirização na Administração Pública: breves refle-xões críticas, ed. 311, maio 2015, ano XXV, p. 15)

7349 – Improbidade administrativa – convocação de candidatos aprovados em concurso públi-co – pendência – terceirização de serviços – princípios – ofensa

“Apelação cível. Improbidade administrativa. Recurso interposto pelo Ministério Público contra a sentença de improcedência da ação. Reexame necessário conhecido de ofício. Julgamento anteci-pado da lide. Ausência de cerceamento de defesa. Processo instruído com elementos probatórios do inquérito civil. Fatos suficientemente comprovados mérito. Contratação de empresa de tercei-rização de serviços na pendência de convocação de candidatos aprovados em concurso público. Atividades contratadas similares às atividades inerentes aos cargos públicos do concurso vigente. Ilicitude na terceirização de atividades-fim da administração pública. Dever de prover os cargos públicos. Atuação com pessoalidade do presidente da câmara de vereadores de Foz do Iguaçu na indicação de pessoas para serem contratadas pela empresa de terceirização. Presença do elemen-to volitivo (dolo) na conduta irregular. Participação ativa da pessoa jurídica contratada (empresa terceirizada) na prática do ilícito. Configuração de ato de improbidade ofensivo aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade (art. 11, I, LIA). Aplicação das sanções previstas no art. 12, III, da LIA, com razoabilidade e proporcionalidade. Imposição ao ex-presidente da câmara munici-pal das penalidades de suspensão dos direitos políticos por 5 (cinco) anos e multa correspondente a 10 (dez) vezes o valor da última remuneração. Pessoa jurídica que participou do ato ímprobo condenada à proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais por 3 (três) anos. Sentença reformada. Demanda parcialmente procedente. Recurso parcialmente provido. Reexame necessário conhecido de ofício, mas prejudicado.” (TJPR – AC 1127310-8 – 5ª C.Cív. – Rel. Juiz Subst. Rogério Ribas – DJe 21.01.2015)

Transcrição Editorial SÍNTESELei nº 8.429/1992:

“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da admi-nistração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparciali-dade, legalidade e lealdade às instituições, e notadamente:

I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto na regra de competência; [...]”

7350 – Improbidade administrativa – dispensa indevida de licitação – mão de obra – terceiriza-ção ilegal

“Direito processual civil. Apelação cível. Ação de improbidade administrativa. Município de Serri-ta. Termos de parceria. Oscip Cengere. Terceirização ilegal de mão de obra. Dispensa indevida de licitações. Irregularidades que configuram improbidade administrativa. Art.11, Lei nº 8.429/1992. Improvido o apelo. Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença de fls. 390/400 proferida pelo MM. Juiz de direito da vara única da comarca de Serrita/PE que, nos autos da ação civil públi-ca declaratória e condenatória pela prática de ato de Improbidade Administrativa nº 0000546-

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29.2009.8.17.1380, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial e como consequência, decretou a suspensão dos direitos políticos do primeiro e terceiro réus pelo prazo de três anos; condenou o primeiro e terceiro réus ao pagamento de multa civil de dez vezes o valor da remuneração que percebiam em janeiro de 2004, sendo que com relação à segunda requerida a multa civil será de 05 (cinco) vezes o faturamento bruto registrado naquele mês, devidamente atua-lizada e com juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, contados desde aquela data, conforme art. 460 do Código Civil e art. 170, parágrafo único do CTN. Ademais, o magistrado de primeiro grau proibiu os réus de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais e creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três) anos. Em suas razões recursais, o apelante sustenta não ter pra-ticado ato de improbidade administrativa, argumenta que ocorreu apenas a celebração de termo de parceria com a Oscip Cengere para prestação de serviços ao Município de Serrita, ou seja, não havendo frustração à realização de concurso público. Alega que as prestações de contas examina-das perante o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco nos autos dos Processos TC 0550035-7 e 0500709-4 foram julgadas regulares com ressalvas e foram devidamente aprovadas pela Câmara Municipal de Serrita. Afirma, portanto, que a aprovação das prestações de contas objeto da presen-te Ação Civil Pública consignam que as irregularidades averiguadas inicialmente não comprome-tiam a lisura da gestão, por ausência de dano ao erário ou enriquecimento ilícito. Aduz o apelante ainda que não há como lhe imputar má-fé, pois existe legislação prevendo a possibilidade de firma-mento do termo de parceria. Por derradeiro, pugna pelo provimento do recurso para, reformando-se a sentença combatida, julgar improcedente o pedido inicial, em razão da inexistência de prática de ato de improbidade administrativa. A Primeira Câmara do Tribunal de Contas do Estado de Pernam-buco, em sessão ordinária realizada no dia 07.02.2008, para julgamento do Processo TC 0500709-4 (Processo de Auditoria Especial) e TC 055035-7 (Prestação de Contas da Prefeitura Municipal de Serrita), julgou irregulares as contas do ordenador de despesas, ora apelante, referen-te ao exercício financeiro de 2004. Em extenso acórdão (fls. 126/128), o TCE/PE além de julgar irre-gulares as contas do recorrente, recomendou o encaminhamento dos autos do processo ao Ministé-rio Público de Contas e Ministério Público do Estado para a adoção de providências cabíveis, nos termos do art. 114, inciso VII da Lei Estadual nº 12.600/4. Através do Ofício TCMPCO – MP 328/2008, o Procurador-Geral do Ministério Público de Contas encaminhou ao Ministério Pú-blico Estadual os seguintes documentos: a) Relatório da Auditoria relativa ao processo TC 055035-7 (fls. 22/46); b) parecer MPCO 494/06 (fls. 47/77); c) acórdão, relatório e voto referente ao processos TC 0500709-4 e 0555035-7 (fls. 95/130) e d) relatório da auditoria realizada na Prefeitura Munici-pal de Serrita (fls. 131/161). Após o exame minucioso de toda a documentação citada, a Promotoria de Justiça de Serrita constatou que o apelante, ex-prefeito do Município de Serrita, praticou graves irregularidades ao firmar termos de parceria com a Oscip Cengere, no exercício de 2004, para a execução de programas que totalizaram R$ 1.525.970,66 (um milhão, quinhentos e vinte e cinco mil e novecentos e setenta reais e sessenta e seis centavos). Dentre as irregularidades apontadas pela Promotoria de Serrita estão a terceirização ilegal de mão de obra, a inexistência de Lei Municipal específica para a contratação, a contabilização de despesa de pessoal como serviço de terceiros e a dispensa indevida de licitação. A Promotoria de Serrita, então, enquadrou as referidas irregularida-des como atos de improbidade administrativa que causam enriquecimento ilícito, danos ao Erário e violam princípios da administração pública, condutas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992, ensejando a propositura de Ação Civil Pública pela prática de ato de improbidade administrativa. O MM. Juiz a quo, após a apresentação da defesa prévia (fls. 229/253), recebeu a petição inicial, nos termos do art. 17, § 7º da Lei nº 8.429/1992 e indeferiu o pedido de indisponi-bilidade dos bens dos demandados (fls. 265/269). Ao final da instrução processual, que incluiu o oferecimento de contestação (fls. 299/315), decretação de revelia dos demais réus (fl. 378) e réplica (fls. 379/380), o magistrado de primeiro grau proferiu sentença (fls. 390/400), julgando procedentes em parte os pedidos do Ministério Público do Estado de Pernambuco. Na concepção do magistrado,

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o ato de improbidade cometido pelo réu-apelante cinge-se a suposta ilegalidade da contratação da Oscip Cengere, através de nove termos de parceria, todos realizados sem prévio processo licitatório e sem Lei municipal específica para as contratações, além do fato de que a terceirização da mão de obra teve como alvo as atividades-fim da Administração Pública. O juiz de origem enquadrou o aludido ato de improbidade no art. 11 da Lei nº 8.429/1992, não vislumbrando a ocorrência de enriquecimento ilícito por parte dos réus ou prejuízo ao erário, aplicando, portanto, as sanções previstas no art. 12, inciso III da Lei nº 8.429/1992. O apelante insurge-se basicamente contra o reconhecimento das irregularidades apontadas como atos de improbidade administrativa, alegando não ter cometido nenhuma das condutas elencadas nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992. Argumenta ainda que não restou comprovada a sua má-fé e a aprovação das suas contas junto ao TCE/PE inviabiliza a propositura da Ação Civil Pública por atos de improbidade administrativa. Todavia, examinando detidamente os autos, constata-se que as alegações do recorrente não mere-cem prosperar. Conforme mencionado alhures, a Primeira Câmara do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, em sessão ordinária realizada no dia 07.02.2008, para julgamento do processo TC 0500709-4 (Processo de Auditoria Especial) e TC 055035-7 (Prestação de Contas da Prefeitura Mu-nicipal de Serrita), julgou irregulares as contas do ordenador de despesas, ora apelante, referente ao exercício financeiro de 2004. Entretanto, o ora apelante apresentou Pedido de Rescisão nº 1103960-7 ao parecer prévio emitido pelo TCE/PE sobre as contas do Município de Serrita referente ao exer-cício financeiro de 2004. Em sessão realizada no dia 01.02.2012, o Tribunal Pleno do TCE/PE deu provimento ao mencionado pedido, para modificar a Decisão TC 0132/2008, retirando os conside-randos relativos à ausência de comprovação dos pagamentos efetuados e a devolução do valor antes imputado, julgando regulares, com ressalvas, as contas do Ordenador de Despesas, Sr. Carlos Eurico Ferreira Cecílio, relativas ao exercício financeiro de 2004, e emitindo Parecer Prévio pela aprovação, com ressalvas, das contas do Prefeito, relativas ao exercício financeiro de 2004. O ape-lante defende que a mencionada aprovação de suas contas impede o reconhecimento do suposto cometimento de atos de improbidade administrativa, porém, é assente que a aprovação de contas efetuada pelo Tribunal de Contas competente não afasta a ação de improbidade administrativa, em razão da independência das esferas administrativa e civil. No que pertine ao reconhecimento do cometimento de ato de improbidade administrativa, verifica-se que constam nos autos robustas provas acerca da realização, por parte do recorrente, de terceirização ilegal de mão de obra através da celebração de termos de parceria com a Oscip Cengere. Em relatórios elaborados pelas equipes técnicas do TCE/PE foi constatado que o apelante promoveu terceirização nas áreas da saúde, assis-tência social, infra-estrutura e finanças, contratando terceirizados para exercer atividades típicas de funcionário público, previstas na Lei Municipal nº 423/2003. Sobre o assunto, cito o seguinte trecho do relatório de fl. 138 elaborado por servidores do TCE/PE, também mencionado pelo magistrado de primeiro grau, a saber: ‘A terceirização promovida atingiu a área da Saúde, Educação, Assistên-cia Social, Infra-Estrutura, Finanças etc., envolvendo um grande rol de funções. Compulsando as prestações de contas dos recursos repassados à entidade responsável pela execução dos programas supracitados, bem como demais documentos fornecidos durante nossas visitas ao Município (fls. 01/182), verificamos que grande parte das funções a serem desempenhadas pela Entidade par-ceira constam do plano de cargos da Prefeitura, em conformidade com a Lei nº 423/2003 (fls. 193/276). Apesar da não correspondência nominal de algumas funções, verifica-se que são perfeitamente enquadráveis nas atribuições dos cargos previstos na estrutura administrativa. Todo o exposto deixa claro que a Prefeitura promoveu uma ampla contratação sem realizar concurso pú-blico. Em nossa opinião, não ocorreu terceirização de serviço, e sim, contratação de pessoal me-diante interposição de outra pessoa jurídica (podendo, conforme o caso, caracterizar terceirização de mão de obra ou locação de mão de obra)’. De tal arte, restou plenamente caracterizado que os termos de parceria celebrados pelo recorrente com a Oscip Cengere tinham o propósito de burlar a realização de concursos públicos, contratando terceirizados para exercerem atividades-fim da Ad-ministração Pública, violando a disposição do art.37, inciso II da Constituição Federal de 1988. Tal

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conduta viola a um só tempo os princípios da administração pública relativos à legalidade, impes-soalidade e moralidade, caracterizando-se como ato de improbidade administrativa, previsto no art.11 da Lei nº 8.429/1992 O recorrente argumenta ter celebrado os termos de parceria com base na Lei nº 9.790/1999 que dispõe sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, não havendo que se falar em cometimento de ato de improbidade administrativa. Aduz ainda ter anexado aos autos da Prestação de Contas perante o TCE/PE a Lei Municipal nº 438/2004 que regulamentou os Termos de Parceria entre o Município de Serrita com Oscip. Todavia, o termo de parceria em análise é irregu-lar, pois foi realizada a terceirização ilegal de mão de obra, atingindo atividades-fim do ente políti-co, conduta esta, identificada como ato de improbidade administrativa. Cumpre mencionar ainda que o recorrente, conforme relatado pelo TCE/PE (fl. 34), contratou a Oscip Cengere sem observar o procedimento licitatório necessário, em ofensa ao art. 23 do Decreto nº 3.100/1999 que prevê o procedimento a ser adotado pelo Poder Público para a seleção da entidade parceira, in verbis: ‘Art. 23. A escolha da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, para a celebração do Termo de Parceria, deverá ser feita por meio de publicação de edital de concursos de projetos pelo órgão estatal parceiro para obtenção de bens e serviços e para a realização de atividades, eventos, consultoria, cooperação técnica e assessoria. § 1º Deverá ser dada publicidade ao concurso de projetos, especialmente por intermédio da divulgação na primeira página do sítio oficial do órgão estatal responsável pelo Termo de Parceria, bem como no Portal dos Convênios a que se refere o art. 13 do Decreto nº 6.170, de 25 de julho de 2007.’ Neste passo, restou plenamente caracterizado nos autos que o réu-apelante cometeu atos de improbidade administrativa, elencados no art. 11 da Lei nº 8.429/1992, os quais prescindem da comprovação de dano ao Erário ou enriquecimento ilí-cito do agente, subsistindo a necessidade de demonstrar a presença do elemento subjetivo, qual seja, dolo eventual ou genérico. In casu, constata-se que tal elemento subjetivo se faz presente, pois o réu-apelante, não apresentou justificativa plausível para não realizar concursos públicos, tampou-co esclareceu a motivação para celebrar termos de parceria, limitando-se a afirmar que os terceiri-zados contratados exerceram suas funções eficazmente, fato que afasta apenas a ocorrência de en-riquecimento ilícito e prejuízo ao Erário, subsistindo a violação aos princípios da administração pública. Por unanimidade, negou-se provimento ao apelo.” (TJPE – Ap 0000546-29.2009.8.17.1380 – 3ª CDPúb. – Rel. Antenor Cardoso Soares Junior – DJe 19.01.2015)

7351 – Serviço público – terceirização – Administração Pública – falha na fiscalização – respon-sabilidade subsidiária – cabimento

“1. Terceirização na Administração Pública. Responsabilidade subsidiária. Súmula nº 331 do TST. Evidenciada a culpa in eligendo ou in vigilando da Administração Pública, nos termos da Súmula nº 331/V/TST, diante da falha na fiscalização, é cabível a responsabilidade subsidiária pelas verbas decisórias devidas. 2. Limitação da condenação. Multas dos arts. 467 e 477 da CLT. A responsa-bilidade subsidiária abrange todas as parcelas devidas à reclamante, inclusive as multas previstas nos arts. 467 e 477, § 8º, da CLT (Verbete nº 11/2004 do TRT 10ª Região e inciso VI da Súmula nº 331/TST). 3. Juros de mora. Não se cogita a aplicação da política privilegiada de juros nas con-denações contra a Fazenda Pública (Lei nº 9.494/1997, art. 1º-F) quando esta seja condenada em caráter subsidiário, pois nesta condição estará pagando o débito no lugar do empregador, a quem não se estende tal regramento.” (TRT 10ª R. – RO 0000259-77.2013.5.10.0020 – Rel. Juiz Antonio Umberto de Souza Júnior – DJe 10.10.2014)

7352 – Serviço público – terceirização – responsabilidade subsidiária – Administração Pública – tomadora de serviços – conduta culposa

“Agravo de instrumento. Recurso de revista regido pela Lei nº 13.015/2014. Terceirização de ser-viços. Responsabilidade subsidiária da Administração Pública. Conduta culposa. Extensão. Súmula nº 331, V e VI, do TST. Julgamento proferido pelo STF na ADC 16/DF. Efeitos. A parte agravante não

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apresenta argumentos novos capazes de desconstituir a juridicidade da decisão monocrática que denegou seguimento ao recurso de revista, à míngua de demonstração de pressuposto intrínseco previsto no art. 896, a e c, da CLT. Na hipótese, a Corte Regional, valorando fatos e provas, firmou convicção quanto à conduta culposa da entidade da Administração Pública, tomadora dos serviços, pelo efetivo descumprimento das obrigações legais e contratuais previstas na Lei nº 8.666/1993 (arts. 67 e 71), e não apenas pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas a cargo da empresa prestadora de serviços, aplicando a diretriz da Súmula nº 331, V e VI, do TST nos limites fixados pelo STF na ADC 16/DF. Agravo de instrumento a que se nega provimento.” (TST – AIRR 0000209-04.2013.5.12.0050 – Rel. Min. Walmir Oliveira da Costa – DJe 07.08.2015)

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Parte Geral – Doutrina

O Nepotismo na Administração Pública Municipal e a Súmula Vinculante nº 13 do STF

Nepotism in Municipal Public Administration and Stare Decisis STF 13

JOSé CARLOS PAChECO DE ALMEIDAAdvogado e Consultor Público, Graduado em Direito pela FAI – Faculdades Adamantinenses Integradas, Cursando Especialização em Gestão Pública pela UFMS – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

RESUMO: As entidades públicas brasileiras vêm encarando uma fase de moralização administrativa na contratação de seus agentes. Combatendo aquela antiga política de empreguismo de parentes nos órgãos públicos, a Suprema Corte editou a Súmula Vinculante nº 13, que, invocando o princípio da moralidade, estabeleceu restrições para contratações de parentes pelos agentes públicos em geral. O presente trabalho discute os efeitos dessa Súmula no âmbito da Administração Pública Municipal.

PALAVRAS‑CHAVE: Administração municipal; contratação de parentes; cargos comissionados; ne‑potismo; Súmula Vinculante nº 13.

ABSTRACT: The Brazilian public entities are facing a stage of moralizing in the hiring of their agents. Fighting that old policy of excessive employment of relatives in public agencies, the Supreme Court, in the year 2008, edited the stare decisis paragraph 13, that, by invoking the principle of morality, restrictions for signings of relatives by public officials in General. This paper discusses the effects of this Precedent in the context of Municipal Public Administration.

KEYWORDS: Municipal administration; hiring of relatives; commissioned positions; nepotism; Stare decisis nº 13.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Da moralidade nas contratações públicas de pessoal; 1.1 Da Súmula Vin‑culante nº 13; 2 Da necessidade de estar o agente público revestido do poder de nomeação para configuração da vedação de nepotismo; 3 Da inexistência de nepotismo na nomeação de parente, cônjuge ou companheiro para cargos políticos; 4 Da decisão proferida pelo STF nos Autos do Recurso Extraordinário nº 579.951/RN e o chamado “nepotismo cruzado”; 5 Da interpretação sistemática da Súmula Vinculante nº 13, sob a ótica da relação de parentesco prevista no Código Civil; 5.1 Do paren‑tesco por consanguinidade; 5.2 Do parentesco por afinidade; 6 Da competência municipal em fixar outras hipóteses de nepotismo e seus efeitos nos pequenos municípios; Conclusão; Referências.

INtrodução

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o seu art. 37 pas-sou a contemplar alguns dos princípios que regem a Administração Pública em

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todos os seus níveis e poderes. Encontram-se ali previstos os princípios da lega-lidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência, este último acrescido com a Emenda Constitucional nº 19/1998. Essa enumeração, evidentemente, não é exaustiva, pois vários outros princípios, não menos im-portantes, ainda que implícitos, regem as condutas da Administração Pública. Relacioná-los aqui seria um tanto desnecessário, já que o princípio motivador da edição da Súmula Vinculante nº 13, editada pelo Supremo Tribunal Federal, encontra-se, expressamente, elencado no caput do art. 37 da CF/1988: o da moralidade.

Neste trabalho se discutirá o impacto e os efeitos da Súmula Vinculan-te nº 13 do Supremo Tribunal Federal, no âmbito da Administração Pública Municipal. A referida Súmula afeta diretamente os métodos utilizados pelos agentes públicos para contratação de servidores comissionados com relação de parentesco entre si e com a autoridade nomeante. O cerne da discussão está no conceito empregado pela Súmula, no enquadramento das pessoas impedidas de ocupar cargos comissionados ou funções gratificadas nas entidades públi-cas, em razão da sua relação de parentesco, conjugal ou de companheirismo perante os agentes políticos, e o reflexo disso tudo nos pequenos municípios brasileiros.

Debate-se, ainda, o alcance da Súmula face aos preceitos do Código Ci-vil, nas definições das relações de parentesco, bem como a sua aplicabilidade nos casos da relação homoafetiva, do parentesco por afinidade na linha colate-ral e nas hipóteses de dissolução da sociedade conjugal.

Será possível perceber, enfim, que os efeitos da Súmula Vinculante nº 13 vão além daquilo que se pretendeu atingir inicialmente.

1 dA morAlIdAde NAS CoNtrAtAçÕeS pÚBlICAS de peSSoAl

É pela moralidade que os agentes públicos (aí inseridos os agentes polí-ticos) devem dirigir suas condutas de acordo com o bem comum, desprendidas de interesses pessoais, que não refletem, direta ou indiretamente, o bem-estar da coletividade. Entre as várias situações que configuram afronta ao princípio da moralidade encontra-se a iniciativa de o agente público, revestido do poder de nomeação, incorporar aos quadros da entidade pública a que ele pertença, ou a outro órgão da mesma pessoa jurídica, pessoa a ele ligada por relação de casamento, de união estável ou parentesco, consanguíneo ou afim, até o tercei-ro grau, para ocupar cargo em comissão ou de confiança. Tais nomeações eram (e ainda são) comuns em todos os níveis de Governo, nos três Poderes da Repú-blica. Por mais que a pessoa nomeada ou investida na função de confiança ou comissionada seja dotada de conhecimento técnico específico, a sua proximi-dade parental ou conjugal com o agente público a colocaria, de certa forma, em situação de suspeição, mesmo que não esteja ou não venha a ser beneficiada

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indevidamente. Nem se diga com relação àqueles sem conhecimento técnico necessário, que, em determinadas ocasiões, apenas ocupam suas funções para usufruírem das condições oferecidas pela Administração, sem oferecer qualquer eficiência à atividade pública.

Evidentemente, em determinadas situações, o agente político necessita ter ao seu lado pessoas que lhe inspirem confiança, que comunguem do seu próprio objetivo, que defendam as suas ideias ou que possam orientar-lhe na tomada de decisões. Pode ocorrer – e isso é natural – que os servidores efetivos lotados na entidade pública não sejam dotados da confiança necessária que o agente necessite, ou julgue necessitar, para a sua gestão. Para esses casos, a Constituição Federal, em seu art. 37, inc. II, ao estabelecer a regra geral obrigan-do a prévia realização de concurso público na contratação de pessoal, criou a exceção da contratação direta, para os cargos de livre nomeação e exoneração, destinada às funções de chefia, diretoria e assessoramento. Entretanto, aprovei-tando-se dessa permissiva constitucional, alguns agentes políticos passaram a nomear, para esses cargos em comissão, parentes seus e de pessoas próximas, também já lotadas em cargos de livre nomeação na mesma entidade pública. E, o que é pior, nem sempre dotadas de conhecimentos técnicos suficientes para a função.

No sentido de se fazer prevalecer a moralidade nas contratações de pes-soal pela Administração Pública, no que tange, em especial, àquelas vagas sem concurso público, como é o caso dos cargos em comissão e de confiança, o Ple-nário do Supremo Tribunal Federal (STF), utilizando-se da atribuição que lhe foi conferida pelo art. 103-A da Constituição Federal, editou a Súmula Vinculante nº 13, dispondo sobre a vedação do chamado “nepotismo”.

O termo “nepotismo” vem do latim nepos, que significa neto ou descen-dente, e nepotis, sobrinho. O surgimento da expressão se deu em virtude da concessão de privilégios entre o Papa e seus familiares, principalmente durante o período do Renascimento. O Papa e as autoridades da Igreja, em razão de não possuírem filhos, nomeavam seus sobrinhos e outros parentes próximos para exercerem funções eclesiásticas, conforme destaca Garcia (2006). O ter-mo “nepotismo” é usado atualmente para expressar as nomeações realizadas por agentes políticos de seus parentes para ocupar cargos de livre nomeação e exoneração.

No esforço de conceituar o nepotismo na sua essência, Antonio (2009, p. 16) destaca o debate proposto pelo Desembargador Mauro Soares de Freitas, em seu voto proferido nos autos do Processo Crime de Competência Originária nº 1.0000.05.426832-1/000, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, entre a “moral” e “nepotismo”:

Afirma-se ser o nepotismo gritante ofensa a princípios da administração pública, previstos no artigo 37, da Constituição Federal e, portanto, vedado. Afirma-se,

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até mesmo, ser ofensivo à moralidade. Faço duas perguntas indispensáveis: a pri-meira, o que se entende por nepotismo? A segunda, o que se entende por moral?

O termo nepotismo deriva-se da palavra “nepote”, que designava o sobrinho do Papa, por isso entende-se “nepotismo” como sendo a influência que o sobri-nho e outros parentes exerciam na administração eclesiástica. Seria, também, patronato, favoritismo e compadrio. Entretanto, a influência pode ser boa ou má, positiva ou negativa; se boa, nada a recriminar; se má, deve ser extirpada, após indispensável constatação, e é dentro desta ótica que deve ser o termo analisado.

Quanto à “moral”, o que vem a ser esta? Muitos filósofos já procuraram defini--la, mas a definição que melhor se adequa é a de que “moral é a regra da boa conduta, da distinção que fazemos entre o que é bom e o que é ruim para nós e para os outros”.

Utilizando um exemplo milenar daquele que se considerava Mestre, Jesus Cristo, dizia Ele: “façamos aos outros somente o que queremos que eles nos façam”. Esta definição e este ensinamento são universais, não se aplicam apenas no Brasil, e independe do credo religioso, da formação cultural, da posição social ou política do ser humano. Como se observa, nada há de religioso ou político no sentido de obedecer aos dogmas desta ou daquela corrente de pensamento e a moral está neste terreno como valor da alma, que todos entendem, quando a questão é ana-lisar os valores éticos do comportamento.

Um homem moralizado vale mais do que uma multidão de intelectuais, pois isto a questão moral há de ser analisada, caso a caso, pelo comportamento in-dividual de cada pessoa. Foi muito cômodo tachar o Prefeito de “imoral”, pelas nomeações feitas, sem uma análise do comportamento de cada um. Como foi fácil tachar de “imoral” todos os juízes que tinham parentes trabalhando em seus gabinetes, quando imoral seria a nomeação para não trabalhar, sendo até de se perguntar se isto foi apurado. Se o nomeado prestava serviço à administração, se produzia, se honrava o cargo, se, numa linguagem coloquial, “vestia a camisa da instituição”, a questão há de ser vista de uma outra forma, com os olhos da mora-lidade e da ética, na prática de atos sérios, verdadeiros, transparentes, praticados por homens educados moralmente. Educação moral é aquela que se volta para a formação do homem voltado para o bem, seja do seu próprio, seja do próximo, nunca se esquecendo da regra, sugerida pelo Cristo, que é fazer aos outros aquilo que gostaria que os outros lhe fizessem.

Dentro deste diapasão, qual regra constitucional tem mais valor? A do artigo 37 citado ou a do artigo 5º, que dispõe que todos são iguais perante a Lei, sem dis-tinção de qualquer natureza? Aqui, a inconstitucionalidade é muito mais gritante, porque, no Judiciário, o parente de um magistrado tornou-se mais discriminado que um leproso aos tempos de antanho. Terá de mudar de atividade profissional ou de país, porque na rede pública não conseguirá trabalho. Há ou não distin-ção? E distinção injusta, porque há cargos de confiança a serem ocupados, onde as normas da confiança, que envolvem escolha pelos padrões da competência e da confiabilidade, estão dentro das regras que conduzem a moral. (Brasil, 2007, p. 7)

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1.1 Da súmuLa vInCuLante nº 13

A Emenda Constitucional nº 45, de 2004, incluiu no Texto Constitucional o art. 103-A, dispondo sobre a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços de seus membros, depois de reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, após sua efetiva publicação, passa a ter efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e às entidades da Administração Pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual ou municipal. A então súmula vinculante tem por objeto evitar controvérsias que acarretem insegurança jurídica e rele-vante multiplicação de processos sobre questões idênticas. Qualquer ato admi-nistrativo ou decisão judicial que venha contrariar a súmula poderá ser objeto de anulação ou cassação pelo Supremo Tribunal Federal, conforme o caso.

E, agindo dentro de sua competência para editar súmulas vinculantes, o Supremo Tribunal Federal, após ampla discussão, tomando por base as decisões proferidas nos autos da ADIn 1.521, da ADC 12, do MS 23.780, e, finalmen-te, a do RE 579.951, formalizou a Súmula Vinculante nº 13, aprovada pelo Plenário em 7 de novembro de 2008 e publicada no Diário Oficial da Justiça nº 214/2008, em 11 de novembro de 2008.

A Suprema Corte definiu assim os termos da referida Súmula:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia e assessoramen-to, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição. (Brasil, 2008, p. 1)

Sabe-se, de antemão, que a Súmula Vinculante nº 13 foi constituída para acabar, de uma vez por todas, com a prática do “nepotismo”, assim configurada a nomeação de cônjuge, companheiro(a) ou parente em linha, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, para ocupar cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada nos órgãos da Administração Pública, respec-tivamente.

No entanto, a Súmula Vinculante nº 13 é, ainda, alvo de discussão quan-to à sua exata interpretação. A simples análise dos seus termos depara-se com dúvidas importantes, principalmente no que diz respeito a quem se inclui na vedação imposta: se apenas a autoridade nomeante ou todos os ocupantes de cargo de direção, chefia e assessoramento da mesma pessoa jurídica. Ainda, quanto à sua extensão, ao se referir a “parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive [...]”, estariam aí inseridos os mesmos conceitos do Código Civil, no que se refere às regras de parentesco previstos

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na Súmula? Para resposta, necessário se faz aprofundar o estudo. De fato, para a correta aplicação da Súmula Vinculante nº 13, indiscutivelmente, exigir-se-á dedicação do intérprete, que não deve apenas se limitar à sua disposição literá-ria, mas se abastecer dos elementos que motivaram sua edição, incluindo aí os debates entre os Ministros do STF.

2 dA NeCeSSIdAde de eStAr o AgeNte pÚBlICo reveStIdo do poder de NomeAção pArA CoNFIgurAção dA vedAção de NepotISmo

Estabelece a Súmula Vinculante nº 13 vedação à “nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurí-dica investido em cargo de direção, chefe e assessoramento [...]” [grifo nosso]. A proposta oferecida pela Súmula Vinculante nº 13 não é tão simples quanto parece. Exige-se uma análise mais aprofundada da matéria, a fim de se definir a exata extensão dessa vedação. Perfaz-se dúvida se o “nepotismo”, vedado pela Súmula, ocorre apenas com relação à autoridade nomeante ou, também, aos ocupantes de cargo de direção, chefia ou assessoramento (ou cargo político, como o de secretário municipal, por exemplo), ainda que não dotados de pode-res delegados para nomeação.

Tal indagação recaiu, inclusive, nos debates promovidos pelos Ministros do STF para aprovação da Súmula. Este foi o diálogo mantido pelos Minis-tros Gilmar Mendes, Carmen Lúcia, Cezar Peluso, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, durante a 28ª (vigésima oitava) sessão extraordinária do Plená-rio, realizada em 21 de agosto de 2008, ao discutir a definição de autoridade nomeante:

[...]

Excelentíssima Senhora Ministra Cármen Lúcia – Ministro Cezar Peluso, estou perguntando ao eminente Ministro-Relator sobre essa expressão “... ou de servi-dor do mesmo órgão...”. Porque “mesmo órgão”... a administração pública é um conjunto de órgãos. Por exemplo, não se nomeia para este órgão, mas se nomeia para outro órgão onde não há a pessoa e, aí, não é nem uma contratação cruza-da. Aí é apenas a relação hierárquica de chefia, e não é isso. O nepotismo proíbe que se utilize a questão pessoal para nomeações e, aí, não é o órgão.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Cezar Peluso – Ministra, pode-se fazer uma nomeação, por exemplo, em Brasília, de alguém que seja parente; a mesma coisa no Estado do Amazonas, por exemplo.

A Excelentíssima Senhora Ministra Cármen Lúcia – Sim, mas aí é outra entidade, não é órgão.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Cezar Peluso – Sim, Vossa Excelência está propondo substituir “órgão” por que palavra?

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A Excelentíssima Senhora Ministra Cármen Lúcia – Estou apenas questionando exatamente o significado disso aqui. Porque, em uma administração pública, in-clusive direta e indireta, pode-se, se se entender que está vedado na administra-ção direta e para uma outra entidade da indireta, nomear.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Carlos Britto – Parece-me que aqui o Ministro Lewandowski levou em conta a redação do Estatuto do Regime Jurídico Único, Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, ao dizer “... do mesmo órgão investido em cargo de direção...”.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Ricardo Lewandowski – Exatamente. Aliás, essa ideia do Ministro Cezar Peluso veio em boa hora. Porque Sua Excelência sugeriu ontem que nós aqui contemplássemos tanto essas nomeações feitas no mesmo órgão como também, mais tarde, por aqueles que exerçam cargo em comissão, cargo de direção, chefia ou assessoramento. Estamos contemplando todas as situações e, aqui, “órgão” compreendido no sentido amplo da palavra.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente) – A minha ob-servação seria em relação à autoridade nomeante. Porque, hoje, nós temos um regime tal em que pelo menos o Chefe do Poder Executivo...

A Excelentíssima Senhora Ministra Cármen Lúcia – Nomeia tudo.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente) – Como?

A Excelentíssima Senhora Ministra Cármen Lúcia – O Chefe do Poder Executivo nomeia tudo.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente) – Ou não nomeia, praticamente.

A Excelentíssima Senhora Ministra Cármen Lúcia – Ele pode delegar, mas, de toda sorte, aí não se tem essa vinculação e, portanto, estaria excluído disso daqui. Não é a preocupação de Vossa Excelência?

O Excelentíssimo Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente) – Sim, essa é a minha preocupação.

A Excelentíssima Senhora Ministra Cármen Lúcia – É a minha também.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Cezar Peluso – Desculpe-me, mas não percebi o alcance.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente) – É que, hoje, às vezes a lei já autoriza ou há delegação, de modo que o Chefe do Poder Execu-tivo...

O Excelentíssimo Senhor Ministro Marco Aurélio – Mas já apanha essas situações.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente) – Apanha, não é? É apenas para deixar claro. Muitas vezes não é a autoridade. O Chefe do Poder Executivo acaba não realizando ou efetivando a nomeação.

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O Excelentíssimo Senhor Ministro Cezar Peluso – Mas é como delegante. Aí fica compreendido.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Gilmar Mendes (Presidente) – Sim, é apenas para deixar claro.

O Excelentíssimo Senhor Ministro Ricardo Lewandowski – Penso que a redação nunca encontrará todas as hipóteses da realidade fática.

[...]. (Brasil, 2008, p. 22 – grifos nossos)

Pelo que se depara nos debates entre os Ministros do STF, para aprova-ção do texto da Súmula Vinculante nº 13 dá-se a impressão de que a vedação abrangeria tanto a autoridade superior nomeante quanto aqueles servidores ocupantes de cargos de direção, chefia e assessoramento, que possuam, pela legislação local, poderes para nomear pessoas a ocupar cargo em comissão ou de confiança.

Em razão dessa discussão, parte da doutrina passou a defender que a ve-dação de nomeação aplicava-se tão somente à autoridade nomeante ou a quem detivesse poderes de nomeação por ato delegado. Em defesa desse entendi-mento, Júnior (2010, p. 7), em parecer jurídico em relação à Súmula Vinculante nº 13, arguiu, com maestria, afirmando que a vedação não abrangia os servido-res comissionados sem poderes de nomeação, nos seguintes termos:

Como já abordado, o nepotismo se caracteriza pela relação de parentesco entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado. Logo, a relação de parentesco entre pessoas em um mesmo órgão público, por si só, não caracteriza nepotismo, na medida em que deve ser observada a existência de parentesco direto com a autoridade nomeante, que por sua vez deverá obter uma relação de hierarquia e subordinação com o servidor nomeado.

A doutrina especializada de Arnaldo Silva Júnior, ao comentar acerca da Súmula Vinculante nº 13, esclarece que: “Na mesma linha de raciocínio, não há a carac-terização do nepotismo quando ocorre o grau de parentesco entre dois servidores efetivos que ocupavam cargos comissionados na mesma pessoa jurídica, ainda mais, quando um deles não é autoridade nomeante. Tal fato não pode ser sequer mencionado como ato de nepotismo, uma vez que o que a norma constitucional preconiza é justamente essa situação, onde se prioriza a nomeação de servi-dores efetivos para os cargos de confiança ou comissionados da Administração Pública”.

Consoante este entendimento, não há que se falar em nepotismo no ato de no-meação de parente de servidor ocupante de cargo em comissão que não goza de qualquer poder de decisão no ente ao qual pertence, não determinando escolhas administrativas e, consequentemente, não possuindo autonomia para o favoreci-mento de seu parente.

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Outro caso que descaracteriza a prática de nepotismo é a nomeação de parente de servidor comissionado que não seja a autoridade nomeante do ato. Sobre o assunto, eis o precedente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, verbis:

EMENTA: ANULATÓRIA – SERVIDORES DETENTORES DE FUNÇÃO PÚ-BLICA – PARENTES DE MAGISTRADO – EXONERAÇÃO – RESOLUÇÃO Nº 07/CNJ – PORTARIA Nº 1.858/05 – LEGALIDADE – PROCESSO ADMI-NISTRATIVO – DESNECESSIDADE – SERVIDORES OCUPANTES DE CARGO EM COMISSÃO – MARIDO E MULHER/PAI E FILHA – INEXISTÊNCIA DE RE-LAÇÃO DE PARENTESCO COM MAGISTRADO E DE HIERARQUIA ENTRE ELES – EXONERAÇÃO – NULIDADE – PRESIDÊNCIA DO TJMG – PERSONA-LIDADE JUDICIÁRIA – DECADÊNCIA – CERCEAMENTO DE DEFESA – INO-CORRÊNCIA – O servidor designado a título precário para exercer função pública não possui vínculo empregatício com a Administração e, por força de sua própria natureza, tem o provimento submetido à discricionariedade do Poder Público, sendo exonerável à dispensa de prévia instauração de proces-so administrativo. Inexistindo subordinação hierárquica entre cônjuges ou en-tre pai e filha, servidores ocupantes de cargo de provimento em comissão, e nem qualquer vínculo de parentesco dos mesmos com membros do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, não há falar em hipótese considerada como prática de nepotismo, de acordo com a interpretação contida na alínea “I” do Enunciado Administrativo nº 01 c/c o inciso III do art. 2º da Resolu-ção nº 07/2005, ambos do CNJ. (Autos nº 1.0024.06.930803-9/002(1). Rel. Edílson Fernandes. Publ. 06.02.2009)

De acordo com a correta exegese, não há nepotismo entre servidores comissio-nados e efetivos designados para cargo comissionado, quando não há qualquer relação de parentesco com a autoridade nomeante, e ainda, quando não existen-te relação de hierarquia e subordinação entre tais servidores.

Todavia, é crescente o entendimento de que o nepotismo estará confi-gurado, nos termos da Súmula Vinculante nº 13, ainda que o nomeado para cargo em comissão seja parente de servidor, também ocupante de cargo de confiança ou em comissão, sem poderes para nomeação. Antonio (2009, p. 14), ao lecionar acerca da interpretação mais correta da Súmula Vinculante nº 13, induz que:

Analisando-se detidamente a redação da Súmula Vinculante nº 13, infere-se que a conduta considerada como contrária à Constituição é a nomeação, para o exer-cício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública Direta ou Indireta, de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da auto-ridade nomeante ou de servidor público da mesma Pessoa Jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento. (grifo nosso)

A Resolução nº 07/2005, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, que também serviu de fonte inspiradora para a Súmula Vinculante nº 13 do STF,

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ao dispor sobre a vedação do nepotismo no Poder Judiciário, constou no art. 2º, inc. III, que restaria configurada tal prática também nos casos de exer-cício de cargo de provimento em comissão ou de função gratificada, por côn-juge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de qualquer servidor investido em cargo de direção ou assessoramento. Logo, apregoou-se a vedação igualmente no caso de servi-dor nomeado para cargo em comissão com relação de parentesco, cônjuge ou companheiro, de outro servidor também lotado em cargo em comissão (chefia, diretoria e assessoramento), mesmo que esse último não seja a autoridade no-meante, nesses termos:

Art. 2º Constituem práticas de nepotismo, dentre outras:

[...]

III – o exercício de cargo de provimento em comissão ou de função gratificada, no âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo, por cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de qualquer servidor investido em cargo de direção ou de assessoramento. (grifo nosso)

Considerando que essa Resolução foi precedente da Súmula Vinculante nº 13, deve-se analisar que, muito embora seja aplicável no âmbito do Poder Judiciário, serve de parâmetros para as decisões quanto às nomeações de paren-tes, cônjuges ou companheiros de servidores ocupantes de cargos em comissão nas entidades públicas, inclusive, municipais.

Seguindo exatamente esse entendimento, o Tribunal de Contas do Esta-do de São Paulo, nos autos do TC 003032/026/10, em julgamento das contas anuais de 2010 do Prefeito Municipal de Arco-Íris/SP, apreciou denúncia de suposta prática de nepotismo na nomeação da irmã do Secretário Municipal – que não detinha poderes de nomeação – para ocupar cargo em comissão de assessora administrativa:

TC-003032/026/10

Prefeitura Municipal: Arco-Íris

Exercício: 2010

Prefeito: José Luiz da Silva

[...]

10. DENÚNCIAS/REPRESENTAÇÕES/EXPEDIENTES: Expediente TC-237/018/11: anônimo informou a existência de nepotismo direto e cruzado, no âmbito da Municipalidade – O nepotismo direto diz respeito à nomeação de Roserly Ze-quini Quiqueto Abe para o cargo de Assessor Administrativo (Portaria nº 406/05), que é irmã de Edmur Zequini Quiqueto, Secretário Municipal de Saúde no-meado pela Portaria nº 743/2011; o nepotismo cruzado envolveria dois casos:

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Mariângela Quiqueto Campos Montezani, encarregada de setor nomeada pela Portaria 506/07, que é sobrinha do vereador Antonio do Amaral e Noemi Dias de Jesus, nomeada Assessor Administrativo através da Portaria nº 593/2008 que é cunhada do vereador Romão Sidinei Fernandes de Jesus – a auditoria informou que não procede o alegado Nepotismo direto por se tratar de cargo político que é de livre nomeação, não comportando referida restrição, e ainda não se observa infração ao princípio da eficiência. E com relação ao nepotismo cruzado por não se vislumbrar reciprocidade de favores entre a autoridade nomeante (Prefeito Municipal) e citados vereadores, mesmo porque, não foi constatada existência na Câmara Municipal de cargos em comissão no quadro de pessoal.

[...]

É o relatório.

[...]

No capítulo “pessoal”, com relação à existência de nepotismo na nomeação de Roserly Zequini Quiqueto Abe, no cargo de Assessor Administrativo, cuja servi-dora é irmã de Edmur Zequini Quiqueto, Secretário Municipal de Saúde, faz-se necessário a imediata correção da irregularidade, já que a Municipalidade deve observar e cumprir os termos da Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo de a questão ser comunicada ao Ministério Público, in-clusive, com relação às nomeações de duas servidoras em cargos em comissão, quais sejam, Mariângela Quiqueto Campos Montezani, encarregada de setor, que é sobrinha de vereador, e Noemi Dias de Jesus, nomeada Assessor Adminis-trativo, que é cunhada de vereador.

[...]

Oficie-se ao Ministério Público, tendo em conta a existência de nepotismo direto, conforme noticiado no Expediente TC – 237/018/2011. Cópia do referido Expe-diente, bem como do relatório e voto deverão acompanhar o ofício.

Eduardo Bittencourt Carvalho

Conselheiro (São Paulo, 2011, p. 1 – grifo nosso)

Muito embora o Tribunal de Contas de São Paulo tenha seguido a orien-tação da Súmula Vinculante nº 13 ao reconhecer o nepotismo na contratação da irmã do Secretário Municipal, extrapolou os seus limites ao indicar a irregu-laridade com relação às nomeações pelo Executivo Municipal de duas servido-ras em cargos em comissão, por serem sobrinha e cunhada de vereadores. Isto porque, para que essas duas contratações fossem consideradas nepotismo, teria o Legislativo Municipal de Arco-Íris/SP, em ato concomitante, promover nome-ações de parentes, cônjuge ou companheiro, dos agentes políticos do Poder Executivo Municipal, o que não foi o caso. Como será discutido adiante, pode o Executivo Municipal contratar parentes de vereadores para ocupar cargos em comissão, desde que o Legislativo não promova, em retribuição, a contratação,

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também em comissão, de parentes, cônjuges ou companheiros dos agentes po-líticos do Executivo.

A mesma Corte de Contas, nos autos do TC-002756/026/10, relativo às contas anuais do Município de São Roque/SP, apontou como irregulares as no-meações de dois filhos do então Diretor do Departamento de Obras para exer-cerem funções comissionadas, por entender que tal situação contrariava a Sú-mula Vinculante nº 13. Como resultado, o Município promoveu, antes mesmo do julgamento do mérito da questão, a exoneração dos respectivos servidores, evitando punições futuras pelo TCE/SP:

TC-002756/026/10

Prefeitura Municipal: Estância Turística de São Roque

Exercício: 2010.

Prefeito: Efaneu Nolasco Godinho.

[...]

8. Pessoal – Ocupantes de cargos em comissão, no quadro da Prefeitura Muni-cipal, os Srs. Washington Aparecido de Mattos e Willian Roberto de Mattos são filhos do Sr. Roberto de Mattos, Diretor do Departamento de Obras, igualmente em comissão. Não há vínculo de subordinação entre os servidores, mas consta-se “potencial ofensa ao art. 37, caput, da Constituição Federal, consoante à Súmula Vinculante 13 do Supremo Tribunal Federal”.

[...]

A Administração Responsável, regularmente notificada, trouxe aos autos suas jus-tificativas a propósito do teor do relatório de fiscalização.

A argumentação disposta no documento – o qual acompanha documentação complementar – resume-se como segue:

[...]

g) Pessoal – Garante que “foram exonerados dos cargos de provimento em comis-são os Srs. Roberto de Mattos e Washington Aparecido de Mattos [...]”, segundo documentos comprovatórios trazidos ao processo. Com isso, demonstra haver sido solucionada a questão relativa à manutenção de servidores com vínculo de parentesco. E acrescenta que “essa matéria foi examinada pelo Ministério Público que, em face das exonerações acima noticiadas, procedeu ao arquivamento da representação”.

[...]

Com relação à área de Pessoal, do mesmo modo, acabou descaracterizada a questão suscitada no relatório de fiscalização. Com efeito, garante a Adminis-tração – e comprova mediante documentação hábil – que “foram exonerados dos cargos em comissão os Srs. Roberto de Mattos e Washington Aparecido de

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Mattos”. Ademais, afirma que “essa matéria foi examinada pelo Ministério Pú-blico que, face às exonerações acima noticiadas, procedeu ao arquivamento da representação”.

[...]

Determino, à margem do Parecer, a expedição de ofício, dirigido ao órgão de origem, transmitindo-se-lhe recomendações no seguinte teor:

[...]

d) que adote medidas voltadas para a eliminação, na medida do possível, de falhas ou irregularidades porventura pendentes dentre aquelas consignadas no relatório de fiscalização, devendo, doravante, atentar para que semelhantes impropriedades não se repitam, mediante a fiel observância às normas legais e regulamentares inerentes a cada setor ou segmento de atividade onde se verificaram as imperfeições.

Antonio Carlos dos Santos – Substituto de Conselheiro. (São Paulo, 2010, p. 1 – grifo nosso)

Observa-se, assim, que, nas decisões proferidas nos autos dos TCs 003032/206/10 e 002756/026/10, a Corte de Contas Paulista considerou a existência de nepotismo na nomeação de parente de servidor – ocupante de cargo político e de comissão – para exercer a função de direção, chefia e asses-soramento, mesmo não tendo as respectivas autoridades poder de nomeação. Em ambos os casos, as nomeações partiram exclusivamente dos respectivos prefeitos municipais, então únicas autoridades nomeantes. Não existiam, em ambas as situações, relações de parentesco entre os servidores nomeados e os respectivos prefeitos municipais – que eram as autoridades nomeantes –, mas unicamente com o secretário municipal de saúde, no caso de Arco-Íris/SP, e com o diretor do departamento de obras, em São Roque/SP.

O Supremo Tribunal Federal, em julgamento proferido nos autos do Re-curso Extraordinário nº 579.951/RN, entendeu ter ocorrido violação ao princí-pio da moralidade na contratação de irmão do vice-prefeito, para assumir car-go em comissão e de contratação temporária na Prefeitura Municipal de Água Nova, Estado do Rio Grande do Norte. Na fundamentação do Voto, o Ministro Relator Ricardo Lewandowski descreveu o seguinte:

Além da ofensiva à moralidade administrativa, a nomeação de parentes para car-gos e funções que não exigem concurso público, como já se viu acima, fere o princípio da isonomia, porque prevalece o nefasto “QI”, o popular “quem indica” [...]. E no mais das vezes, a nomeação de parentes, dada absoluta inapetência destes para o trabalho e o seu completo despreparo para o exercício das funções que alegadamente exercem, vulnera também o princípio da eficiência, introdu-zido pelo constituinte derivado no caput do art. 37 da Carta Magna, por meio da EC 19/1998, num evidente desvio de finalidade, porquanto permite que o interesse privado, isto é, patrimonial, no sentido sociológico e também vulgar da expressão, prevaleça sobre o interesse coletivo. (Brasil, 2008, p. 5 – grifo nosso)

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Portanto, ainda que a redação da Súmula Vinculante nº 13 não seja de fácil entendimento, analisando os seus precedentes, entendimentos recentes do Tribunal de Contas do Estado, além de parte da doutrina especializada, a veda-ção do nepotismo ocorre não apenas com relação à autoridade nomeante, mas também àqueles servidores comissionados ou agentes políticos não dotados de poder de nomeação. Em nível municipal, por exemplo, ocorreria nepotismo caso o prefeito municipal – autoridade nomeante – promovesse a nomeação de parente, cônjuge ou companheiro de um determinado secretário ou de outro servidor lotado em cargo de comissão, de confiança ou de função gratificada para ocupar a função de direção, chefia ou assessoramento, ainda que não exis-tisse entre eles a relação de subordinação.

Por outro lado, não haverá nepotismo quando a nomeação for para ocu-par cargo político, como o de secretário municipal, por exemplo, independen-temente do grau de parentesco, se cônjuge ou companheiro da autoridade no-meante ou de outro agente político. Da mesma forma, não há que se falar em nepotismo sempre que a nomeação for oriunda de procedimento de seleção de candidatos, como concurso público para cargos efetivos e processo seleti-vo para contratações temporárias, em razão da observância dos princípios da igualdade e da impessoalidade. A vedação é específica para cargos de chefia, direção ou assessoramento.

3 dA INeXIStêNCIA de NepotISmo NA NomeAção de pAreNte, CôNjuge ou CompANheIro pArA CArgoS polítICoS

No âmbito municipal, são considerados políticos aqueles cargos ou fun-ções exercidos pelo prefeito, vice-prefeito, vereadores e secretários municipais. Nesse conceito, reportando-se aos dois casos de nepotismo apreciados pelo Tribunal de Contas de São Paulo (TCs 003032/026/10 e 002756/026/10), é pos-sível observar que os cargos ocupados pelos parentes dos secretários municipais não eram, eminentemente, políticos. Tratava-se de cargos em comissão de se-gundo escalão (direção, chefia ou assessoramento). No caso específico de Arco--Íris/SP, se a irmã do secretário municipal de saúde viesse também a ocupar, por exemplo, cargo de secretária, não restaria configurado o nepotismo vedado pela Súmula Vinculante nº 13 do STF, pois ambos os cargos seriam de natureza política. O mesmo aconteceria se o Diretor do Departamento de Obras, em São Roque/SP, também viesse a ocupar a função de Secretário.

Nesse aspecto, novamente leciona Antonio [2009, p. 12]:

Não obstante, em relação aos cargos de Secretário e Ministros, cumpre asseverar que, embora sejam, via de regra, de provimento em comissão, seus titulares estão excluídos do âmbito de incidência da Súmula Vinculante nº 13 do STF, pois são agentes políticos. Nesse sentido, pronunciou-se o Presidente do STF, Ministro Gilmar Mendes, em entrevista concedida à Rádio Justiça: “Haveria a exceção de

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cargos políticos, nas funções de secretários municipais, de Estado ou ministros do Executivo. Em princípio, o tribunal disse que essa é uma função política que não estaria submetida ao critério”.

E o Ministro Carlos Ayres Britto confirmou, segundo consta nas notícias do STF do dia 21 de agosto de 2008, que “Somente os cargos e funções singelamente administrativos são alcançados pelo artigo 37 da Constituição Federal”.

Finalmente, o Tribunal Pleno do STF, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 579.951-4, que foi precedente para a Súmula Vinculante nº 13, considerou hígida a nomeação de parente de Vereador para exercer atribuições de Secretário Municipal, conforme se depreende do voto do eminente Ministro Carlos Britto:

Então, quando o artigo 37 refere-se a cargo em comissão e função de confiança, está tratando de cargos e funções singelamente administrativas, não de cargos políticos. Portanto, os cargos políticos estariam fora do alcance da decisão que tomamos na ADC 12, porque o próprio Capítulo VII é Da Administração Públi-ca enquanto segmento do Poder Executivo. E sabemos que os cargos políticos, como, por exemplo, os de Secretário Municipal, são de agentes do Poder, fazem parte do Poder Executivo. O cargo não é em comissão, no sentido do artigo 37. Somente os cargos e funções singelamente administrativos – é como penso – são alcançados pela imperiosidade do art. 37, com seus lapidares princípios. Então, essa distinção me parece importante para, no caso, excluir do âmbito da nossa decisão anterior os Secretários Municipais, que correspondem a Secretários de Estado, no âmbito dos Estados, e Ministros de Estado, no âmbito federal.

E, após a publicação da Súmula Vinculante nº 13, o Supremo Tribunal Federal, julgando a Rcl 6.650-MC-AgR/PR, posicionou claramente a respeito da celeuma, conforme consta no voto do eminente Ministro Cézar Peluso, in verbis:

Trata-se, portanto, de questão ligada à interpretação e, evidentemente, ao alcan-ce da súmula.

E digo mais: nesse debate, foi consignada expressamente a posição, que ressaltei, quanto à extensão da conclusão de que o alcance da súmula não atingiria os agentes políticos.

(grifo nosso)

O Tribunal de Contas de São Paulo também já definiu, em algumas opor-tunidades, que não há nepotismo quando a nomeação do parente ocorrer para cargo político, como o de Secretário Municipal, consoante decisões proferidas nos autos dos TCs 000204/026/09 e 000116/026/09.

4 dA deCISão proFerIdA pelo StF NoS AutoS do reCurSo eXtrAordINÁrIo Nº 579.951/rN e o ChAmAdo “NepotISmo CruzAdo”

A Súmula Vinculante nº 13, em sua parte final, estende a vedação do nepotismo ao “[...] ajuste mediante designação recíproca [...]”, também cha-mado de “nepotismo cruzado”. Essa hipótese compreende, por exemplo, a de-

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signação, pelo prefeito municipal, para ocupar cargo em comissão ou função gratificada no Executivo, de pessoa ligada a um determinado vereador por grau de parentesco, casamento ou convivência (união estável), para compensar a nomeação concomitante, pelo Legislativo, de seu parente, cônjuge ou compa-nheira, para também exercer cargo comissionado ou função gratificada. Seria a “troca de favores” entre os agentes políticos dos dois Poderes.

Para configuração de nepotismo cruzado é necessário que haja nome-ações recíprocas entre os Poderes. Se não houver a simples nomeação pelo prefeito, por exemplo, de pessoa ligada ao vereador (parente, cônjuge ou com-panheira), para exercer cargo em comissão ou função gratificada no Executivo, sem a correspondente compensação pelo Legislativo, afastada estará a vedação da Súmula.

Aliás, no Recurso Extraordinário nº 579.951/RN, os Ministros do STF não reconheceram o nepotismo cruzado na nomeação, pelo prefeito, de irmão do vereador, para ocupar cargo em comissão de secretário municipal de Saúde de Água Nova/RN, já que, no caso, não houve, por parte do vereador, a iniciativa de nomear parente do prefeito, para cargo em comissão ou de confiança, no Legislativo Municipal:

Por todo o exposto, pelo meu voto, conheço do recurso extraordinário, dando--lhe parcial provimento, declarando nulo o ato de nomeação de Francisco Souza do Nascimento (irmão do Prefeito). Considero hígida a nomeação do agente polí-tico Elias Raimundo de Souza (irmão de Vereador), em especial, por não ter fica-do evidenciada a prática do nepotismo cruzado, acompanhando, nesse aspecto, o entendimento da douta maioria. (Brasil, 2008, p. 7 – grifo nosso)

5 dA INterpretAção SIStemÁtICA dA SÚmulA vINCulANte Nº 13, SoB A ÓtICA dA relAção de pAreNteSCo prevIStA No CÓdIgo CIvIl

Não se deve analisar a Súmula Vinculante nº 13 sem adentrar às regras de vínculos parentais definidas pelo Código Civil brasileiro.

No que se refere à figura do cônjuge ou companheiro, a abordagem se concentra nos arts. 1.514 e 1.723, do Código Civil. O(a) cônjuge é a pessoa ligada a outra pelo casamento, de acordo com as formalidades legais. O(a) companheiro(a), por sua vez, é a pessoa que convive com a outra sob o regime de união estável, sem a formalidade do casamento, embora preserve os mesmos direitos previstos para o regime parcial de bens. Cumpre salientar que, pela legislação atual, a relação conjugal (art. 1.514 do CC) ou estável (art. 1.723) é reconhecida apenas entre o homem e a mulher.

Logo, tanto o(a) cônjuge quanto o(a) companheiro(a) não podem ser nomeados(as) para ocupar cargo em comissão ou de confiança, ou ainda de

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função gratificada, exceto para cargo político (secretários municipais, por exemplo).

E o que dizer das relações homoafetivas? Embora não reconhecidas pelo Código Civil, são fatores que não devem ser ignorados pela sociedade, de modo que, a exemplo do que ocorre com o cônjuge ou companheiro, a vedação tam-bém deve estender-se a elas, uma vez que o nepotismo, em sua essência, é o favorecimento, direto ou indireto, da pessoa que detém o poder. Se o Supremo Tribunal Federal, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 132, consolidou o entendimento de que a relação homoafetiva conserva os mesmos direitos do casamento ou da união estável, é correto que os efeitos da Súmula Vinculante nº 13 também a abracem.

5.1 Do PaRentesCo PoR ConsanguInIDaDe

De acordo com o art. 1.593 do CC, o parentesco pode ser natural (con-sanguíneo) ou civil (adoção), nesses termos: “Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de Consanguinidade ou outra origem”.

Assim, a relação de parentesco por consanguinidade, conforme a ter-minologia sugere, deriva do próprio sangue, ou por laço civil, como é o caso da adoção, definida por um tronco comum, variando entre os de linha reta (ascendentes e descendentes) e os colaterais ou transversais, que, nesse caso específico, limita-se até ao quarto grau, consoante o disposto nos arts. 1.591 e 1.592 do Código Civil:

Art. 1.591. São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras na relação de ascendentes e descendentes.

Art. 1.592. São parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto grau, as pessoas provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra.

Considerando, pois, que a Súmula Vinculante nº 13 limita a vedação do “nepotismo” até o terceiro grau, da autoridade nomeante ou de servidor comis-sionado, nada obsta, logicamente, a nomeação de seu parente de quarto grau colateral, que é o último grau de parentesco reconhecido pelo Código Civil.

Na linha reta, o parentesco consanguíneo, para efeitos do art. 1.594 do Código Civil, é assim representado:

Bisavós ascend. 3º grau

Avós ascend. 2º grau

pais ascend. 1º grau

Filhos descend. 1º grau

Netos descend. 2º grau

Bisnetos descend. 3º grau

Agente Político

[...] [...]

Figura 1 - Parentesco consanguíneo na linha reta

Fonte: Autor

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Para o Código Civil, o parentesco consanguíneo em linha reta não se limita às gerações. Portanto, na ascendência, começa-se pelos pais e segue-se aos avós, bisavós, trisavós, tetravós etc. Na descendência, inicia-se pelos filhos e segue-se pelos netos, bisnetos, trinetos, tetranetos etc.

Na linha colateral, o parentesco consanguíneo engloba aquelas pessoas ligadas à outra pelo ascendente comum. Nos termos do art. 1.594 do Código Civil, o parentesco colateral limita-se até o quarto grau, assim representado:

pais ascendentes Linha Reta

1º grau

Avós ascendentes Linha Reta

2º grau

Bisavós ascendentes Linha Reta

3º grau

Agente Político

Irmão colateral 2º grau

Sobrinho colateral 3º grau

Sobrinho-neto colateral 4º grau

tio colateral 3º grau

primo

colateral 4º grau

tio-Avô colateral 4º grau

Figura 2 – Parentesco consanguíneo na linha colateral ou transversal

Fonte: Autor

Analisando as figuras 1 e 2, relativas ao parentesco consanguíneo nas li-nhas reta e colateral, surgem algumas dúvidas quanto à abrangência dos efeitos da Súmula Vinculante nº 13.

Considerando que, na linha reta, o parentesco não se limita às gerações, a vedação da Súmula Vinculante nº 13, então, não fica adstrita até ao terceiro grau de parentesco. Abrangeria, assim, todos os graus possíveis de descendên-cia e ascendência (pai, avô, bisavô, trisavô, tetravô, filho, neto, bisneto, trineto, tetraneto etc.) do agente político ou do servidor comissionado.

A limitação até o terceiro grau, para todos os efeitos, ocorreria apenas na linha colateral, em que estão compreendidos: irmãos (2º grau); sobrinhos (3º grau); e tios (3º grau). Não abrangeria, portanto, os primos (4º grau); os tios--avôs (4º grau); e os sobrinhos-netos (4º grau) do agente político ou do servidor comissionado.

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5.2 Do PaRentesCo PoR aFInIDaDe

De acordo com o art. 1.595, o parentesco por afinidade é caracterizado pela ligação da pessoa aos parentes do cônjuge ou companheiro, limitando-se aos seus ascendentes, aos descendentes e aos seus irmãos:

Art. 1.595. Cada cônjuge ou companheiro é aliado aos parentes do outro pelo vínculo da afinidade.

§ 1º O parentesco por afinidade limita-se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro.

§ 2º Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável.

Em linha reta, no parentesco por afinidade, inclui-se o sogro, a sogra e os avós do cônjuge (ascendentes) e filhos e netos do cônjuge (descendentes), assim representado:

Avós do Cônjuge

Asc. 2º grau

Sogro/Sogra Ascendentes

1º grau

enteados Descendentes

1º grau

Agente Político

Filhos dos enteados

Desc. 2º grau

Figura 3 – Parentesco por afinidade na linha reta

Fonte: Autor

Aplicando-se os termos da Súmula Vinculante nº 13, portanto, a auto-ridade não poderá nomear, para ocupar cargo em comissão ou de confiança, na linha reta por afinidade, o sogro, a sogra, os avós do cônjuge, seus enteados (filhos do cônjuge) e filhos dos enteados (netos do cônjuge).

Na linha colateral, o parentesco por afinidade abrange unicamente os cunhados da autoridade (irmãos do cônjuge ou companheiro), conforme prevê o § 1º do art. 1.595 do Código Civil, assim representado:

Agente Político

Cunhados Colateral 2º grau

Sogro/Sogra Ascendentes

1º grau

Figura 4 – Parentesco por afinidade na linha colateral ou transversal

Fonte: Autor

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Verifica-se, portanto, que, de acordo com o legislador civil, na afinidade, o parentesco atinge até o segundo grau, no caso, os cunhados. Com isso, há divergência entre os preceitos da Súmula Vinculante nº 13 com o art. 1.595 do Código Civil. Isto porque a Súmula veda a nomeação de parentes do agente político ou do servidor comissionado, até o terceiro grau, quando, para efeito do Código Civil, na relação de parentesco por afinidade, na linha colateral, tal grau de parentesco inexiste.

Não devem ser incluídos como parentes por afinidade a(o) cônjuge ou companheira(o) do(a) cunhado(a) e a sua descendência (filho, neto, bisneto etc.), já que a legislação civil não possibilita, para fins da definição de paren-tesco, a geração de afinidade pela afinidade. Logo, não incorrerá na vedação da Súmula a nomeação, pelo agente político, por exemplo, do(a) cônjuge de seu(sua) cunhado(a), para ocupar cargo em comissão. Se não há parentesco, não há que se falar na vedação de sua nomeação.

Outra questão a ser debatida é a aplicabilidade do § 2º do art. 1.595 do Código Civil, para efeito da Súmula Vinculante nº 13. Isto porque, de acordo com o referido parágrafo, “na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da união estável”. Pelo dispositivo, a relação de parentesco com o sogro e a sogra não se extingue com sua separação, divórcio ou morte de um dos cônjuges. Nem mesmo quando a pessoa venha a se casar ou conviver com outra pessoa. Indaga-se, portanto, se, mesmo considerando a continuidade do vínculo de afinidade com os ascendentes de sua (seu) ex--esposa(o) ou ex-companheira(a), permaneceria a vedação de suas nomeações nos termos da Súmula Vinculante nº 13.

Evidentemente, para tais casos, deverão ser avaliadas as peculiaridades inerentes à situação, levando-se em conta não apenas a afinidade, prevista na Lei, mas também as condições a que o cargo em comissão ou de confiança exige, e o conhecimento técnico dos nomeados. Do contrário, seria um tanto absurdo que a autoridade, mesmo após 10, 15 ou 20 anos de sua ruptura con-jugal, continuasse impedida de nomear sua sogra ou sogro, mesmo tendo eles pleno conhecimento técnico exigido para o respectivo cargo. Logo, a vedação da Súmula Vinculante nº 13, para os casos semelhantes aqui em debate, deve-rá ser analisada também sob o prisma dos princípios da impessoalidade e da eficiência.

6 dA CompetêNCIA muNICIpAl em FIXAr outrAS hIpÓteSeS de NepotISmo e SeuS eFeItoS NoS pequeNoS muNICípIoS

Embora o Supremo Tribunal Federal tenha decidido, nos autos do Recur-so Extraordinário nº 579.591-4/RN, que a vedação do nepotismo não exige a edição de norma para coibir tal prática, porque decorre do próprio Texto Cons-

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titucional (art. 37, caput), o município, como entidade autônoma, tem compe-tência para estabelecer, por lei, outras hipóteses de vedação do nepotismo, na contratação de servidores públicos para cargos em comissão ou funções gratifi-cadas, não se limitando aos termos da Súmula Vinculante nº 13. Pode, inclusive, ampliar o grau de parentesco – até o 4º grau, que é o máximo previsto no Có-digo Civil –, abrangendo, assim, os primos, os tios-avôs e os sobrinhos-netos da autoridade ou do servidor ocupante de cargo em comissão, de confiança ou de função gratificada. Pode, também, impedir a nomeação de parentes de vereador pelo Executivo, ou vice-versa, ainda que não haja a nomeação recíproca.

Porém, caso a lei local venha estabelecer vedação aquém dos limites es-tabelecidos na Súmula Vinculante nº 13, esta prevalecerá para todos os efeitos, consoante o disposto no art. 103-A da CF/1988.

E, neste contexto, é importante que o legislador municipal, antes de criar regras mais rígidas do que aquela fixada pela Súmula, leve em consideração a sua estrutura populacional. Nos pequenos municípios, principalmente, com relação àqueles localizados no interior do País, são comuns as grandes famí-lias, o que acaba por abranger parcelas significativas da comunidade ligadas por algum grau de parentesco. Na eventualidade de se expandir a vedação da nomeação até o quarto grau, por exemplo, poderá o legislador municipal criar sérias restrições às atividades administrativas. Quanto maior o grau de parentes-co, maior será o número de pessoas incluídas no rol de impedidas de exercerem cargos comissionados ou funções gratificadas.

Esse é um problema que não deve ser desprezado pelo legislador muni-cipal. Muito embora a atitude de limitar as nomeações esteja baseada no receio da prática do nepotismo, poderá dificultar o desenvolvimento das atividades administrativas, por ausência de pessoas com capacidade técnica para assumir alguns cargos em comissão ou funções gratificadas. A remuneração dos servido-res públicos municipais, em geral, principalmente nos pequenos municípios, na maioria das vezes, não atrai profissionais de outras localidades. Ao se deparar com as limitações de parentesco para efeito da legislação local, o município respectivo poderá ficar carente de técnicos, para desempenho de suas ativi-dades.

Os limites constantes da Súmula Vinculante nº 13 podem ser considera-dos razoáveis para se combater o nepotismo prejudicial às entidades públicas brasileiras, corrigidas algumas problemáticas, aqui debatidas.

CoNCluSão

Finalmente, tomando por base o estudo aqui realizado, muito embora não se tenha a intenção de esgotar o assunto acerca do nepotismo, para efeitos da Súmula Vinculante nº 13 do STF, no âmbito municipal, defende-se o seguinte:

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a) haverá nepotismo na nomeação de servidor, para ocupar cargo em comissão ou função gratificada, que possua vínculo de parentesco, consanguíneo ou afim, até o terceiro grau, cônjuge ou companhei-ro com a autoridade nomeante ou com servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia e assessoramento;

b) haverá nepotismo cruzado quando o Poder Executivo nomear pa-rente (até o 3º grau), cônjuge ou companheiro de vereador e, de for-ma recíproca, o Poder Legislativo promover a nomeação de paren-te, cônjuge ou companheiro de agente político do primeiro Poder;

c) não haverá nepotismo nas nomeações para ocupar cargo eminente-mente político, como ocorre, por exemplo, nos casos de secretários municipais, por serem considerados de primeiro escalão, estando fora do alcance da Súmula Vinculante nº 13;

d) não haverá nepotismo cruzado nas nomeações de servidores paren-tes, até o 3º grau, cônjuge ou companheiro das autoridades de outro poder, para ocuparem cargos em comissão, quando não ocorrer designações recíprocas, permitindo, assim, por exemplo, que o pre-feito municipal possa nomear parente, cônjuge ou companheiro de vereador para exercer cargo em comissão ou de confiança, desde que no Poder Legislativo não promova a nomeação recíproca, nas mesmas condições.

e) os efeitos da Súmula Vinculante nº 13 também devem ser estendi-dos às relações homoafetivas, que foram equiparadas ao casamento e à união estável.

f) ainda que não haja poder de nomeação ou de subordinação, os secretários municipais ou demais servidores lotados em cargos em comissão, de confiança ou de função gratificada, não poderão ter nomeados parentes, cônjuges ou companheiros para também ocu-parem essas mesmas funções, com exceção ao de cargo político, conforme disposto na letra “c”; e

g) o município tem a competência para estabelecer, por lei, outras formas de nepotismo, ainda que mais restritivas do que a Súmula Vinculante nº 13 do STF. Neste caso, deverá o legislador municipal levar em consideração o impacto negativo nas atividades adminis-trativas, considerando o conteúdo populacional de sua comuna.

reFerêNCIASANTONIO, Alice Barroso de. O nepotismo sob a ótica da Súmula Vinculante nº 13 do STF: críticas e proposições. Revista Brasileira de Direito Municipal, 2009, a. 10.

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______. Tribunal de Contas do Estado de. Processo TC nº 000116/026/09. Rel. Fulvio Julião Biazzi. Contas Anuais de 2009. Município de Muritinga do Sul, Prefeito Gilson Pimentel, Primeira Câmara, J. 15.03.2011, Publ. 26.03.2011. Disponível em: <http://www2.tce.sp.gov.br/arqs_juri/pdf/119005.pdf>. Acesso em: 4 out. 2014.

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Parte Geral – Doutrina

Lei de Acesso à Informação: Transparência Governamental a Serviço do Cidadão

The Access to Information Act: Government Transparency at the Service of Citizens

LUIZ EUGENIO SCARPINO JR.Mestre em Direitos Coletivos e Cidadania pela UNAERP, Pós‑Graduado em Gerente de Cidade pela FAAP, Gestão Jurídica de Empresas pela UNESP e Direito Eleitoral pela Unisul, Graduan‑do em Administração Pública pela UFSJ, Professor na UNAERP/Graduação e na FAAP/Pós‑‑Graduação, Advogado.

SEBASTIÃO SéRGIO DA SILVEIRAMestre e Doutor pela PUC‑SP, Pós‑Doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Professor e Coordenador do Programa de Mestrado em Direito da UNAERP, Professor Doutor do Departamento de Direito Público da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Uni‑versidade de São Paulo (FDRP‑USP), Promotor de Justiça no Estado de São Paulo.

RESUMO: A Constituição Federal consagra o exercício dos direitos políticos como valor fundamental do indivíduo. Neste contexto, surge a ativa participação cidadã a qual não se restringe apenas ao exercício do sufrágio. O controle social pelo cidadão advém da noção de “accountability” – sendo uma via de mão dupla entre Administração e administrados. Instrumentos jurídicos como a Lei de Acesso à Informação trazem maior transparência aos atos de gestão e de aplicação dos recursos pú‑blicos, facilitando‑se o questionamento de atos públicos, aparentemente revestidos pela legalidade, mas de moral pública duvidosa. Pretende‑se, assim, demonstrar que a noção de cidadania é alimen‑tada pela transparência dos atos públicos – facilitada pela Lei de Acesso à Informação –, ensejando a retroalimentação da garantia da legalidade e da moralidade pública.

PALAVRAS‑CHAVE: Cidadania; Lei de Acesso à Informação; moralidade pública.

ABSTRACT: The Brazilian constitutional system provides the exercise of political rights as a funda‑mental value of the individual. In this context arises the active citizen participation which is not res‑tricted to the exercise of suffrage. Social control by the citizen derives from the notion of accounta‑bility – as a means of interaction between Administration and administered. Legal instruments such as the Access to Information Act bring greater transparency to the management and use of public resources, facilitating the questioning of public acts, apparently clothed in legality, but of dubious public morals. The aim is to demonstrate that the notion of citizenship is powered by the transparency of public acts – facilitated by the Access to Information Act – occasioning the feedback to ensure the legality and public morality.

KEYWORDS: Citizenship; Access to Information Act; public morality.

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SUMÁRIO: Introdução; 1 A cidadania no contexto constitucional na defesa dos atos administrativos; 2 O controle da moralidade administrativa; 3 A Lei de Acesso à Informação e cidadania ativa; Consi‑derações finais; Referências.

INtrodução

Com a Constituição Federal de 1988, surge o Estado Democrático de Direito, e com ele a consagração de princípios e garantias fundamentais, bem como os direitos políticos como valor fundamental do indivíduo.

Neste contexto, com a inserção dos direitos políticos acessíveis a qual-quer indivíduo da sociedade, inicia-se o exercício da cidadania, a qual não se restringe apenas à realização do sufrágio.

A cidadania será um atributo dos cidadãos integrados na sociedade que demanda a participação consciente e responsável, zelando para que seus direi-tos (individuais e coletivos) não sejam violados.

A partir do exercício da cidadania, o indivíduo passa a observar a utiliza-ção dos bens públicos e começa a controlar os atos da Administração Pública. Para o exercício deste controle, a CF estabeleceu que o administrador públi-co deve observar o princípio da moralidade administrativa, que é considerado pressuposto de validade dos atos administrativos.

Com o exercício do controle social pelo cidadão, advém da noção de “accountability”, a qual é uma via de mão dupla entre Administração e admi-nistrados.

Instrumentos jurídicos tais como a Lei de Acesso à Informação têm a finalidade de trazer maior transparência aos atos de gestão e de aplicação dos recursos públicos, facilitando-se o questionamento de atos públicos, aparente-mente revestidos pela legalidade, mas de moral pública duvidosa.

Com isso, pretende-se demonstrar que a noção de cidadania e a busca pelo controle do administrador público são alimentadas pela transparência dos atos públicos, facilitada pela Lei de Acesso à Informação e que enseja a retroa-limentação da garantia da moralidade pública.

1 A CIdAdANIA No CoNteXto CoNStItuCIoNAl NA deFeSA doS AtoS AdmINIStrAtIvoS

A Constituição Brasileira, no seu art. 1º, enumera que o Brasil é um “Es-tado de Democrático de Direito”. E, neste Estado de Direito, o indivíduo tem assegurada pela Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB certa gama de interesses relativos à propriedade, à liberdade, entre outros. Entre seus ordenamentos e princípios se manifesta a vontade de dar ao povo a soberania e a autonomia.

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Desta forma, a constituição consagra os valores fundamentais do indiví-duo, traçados como suas liberdades, direitos políticos, vida, saúde, entre outros, e restou necessária a proteção jurídica para assegurar o convívio em sociedade, pois são direitos oponíveis ao Estado e que visam a inibir a sua atuação.

Neste contexto, surge a cidadania como o instrumento autorizador destes direitos políticos do indivíduo, a qual tem a característica de exercer o direto de sufrágio, e, conforme orientação de Moraes (1999, p. 217), “é a essência do direito político, expressando-se pela capacidade de eleger e ser eleito”, razão pela qual se tornou um grande passo no alcance da soberania e da autonomia da nação.

A cidadania é palavra que deriva de cidade e não indica somente a qua-lidade daquele que habita a cidade, mas mostra a efetividade dessa residência, o direito político que lhe é conferido para que possa participar da vida política de onde reside1. É termo que identifica a qualidade da pessoa que, estando na posse de plena capacidade civil, também se encontra investida no uso e no gozo de seus direitos políticos.

Assim, Dallari (2004, p. 22) explica que:

A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo.

A expressão “cidadania” tem origem na Roma antiga e servia para designar a condição social, política e jurídica de uma pessoa, implicando a possibilidade de plena participação na vida social, inclusive no governo. Entretanto, o status civitas era discriminatório e servia para indicar que a pessoa pertencia a classe superior da sociedade.

Na França, por meados do século XVIII, na Revolução Francesa onde eram com-batidas as injustiças sociais, iniciou-se a utilizar a expressão “cidadão” para indi-car que já não haveria nobres e todas as pessoas poderiam participar plenamente da vida social e influir sobre o governo em condições de igualdade.

Ademais, o conceito de cidadania não se restringe somente à área políti-ca, e, conforme orientação de Silva (2000, p. 348 e 349), “a cidadania está aqui num sentido mais amplo do que o de titular de direitos políticos. Qualifica os participantes da vida do Estado, é atributo das pessoas integradas na sociedade estatal (art. 5º, LXVII)”.

1 Thomas Hobbes entende que a existência da sociedade se define pela vontade, pelo pacto de muitos homens, com a busca da paz, explicada pelo medo: o temor forma e conforma a cidade onde habitam os súditos. Neste contexto, ao explicar o que é ser súdito, Hobbes contrapõe o poder e o direito de comando, o qual consiste em que cada cidadão transfira toda a sua força e poder àquele homem ou conselho, uma vez que ninguém pode transferir seu poder de forma natural; fazer isso nada mais é que abrir mão do seu direito de resistência. E diz--se que todo o cidadão, assim como toda a pessoa civil subordinada, é súdito daquele que detém o comando supremo (Garcia, 2004, p. 126-128).

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Significa também que o funcionamento do Estado estará submetido à vontade popular, em que o conceito de soberania (art. 1º, parágrafo único) se conecta com os direitos políticos (art. 14), como base essencial do regime de-mocrático.

Contudo, entende Garcia (2004, p. 137), para que o indivíduo enquanto membro de uma sociedade política possa exercer sua liberdade como direito fundamental, é necessário que esta liberdade redunde a nível político na cida-dania. Assim, o poder do Estado e cidadania, autoridade e liberdade represen-tam o eterno binômio da dimensão social, jurídica e política do ser humano.

Portanto, a cidadania afigura-se como a identidade política do indivíduo, prevista no inciso II do art. 1º da CF, no título Dos Princípios Fundamentais, como expressão política da liberdade em seu mais amplo significado que alcan-ça a participação no exercício do poder, do governo e da autoridade pública.

Pode-se contextualizar que a cidadania corresponde a um feixe de privi-légios decorrentes da condição da titularidade da coisa pública, pois, ao criar o poder, ao mesmo tempo estabelece seus limites.

Nas palavras de Garcia (2004, p. 148), a plenitude do princípio em maté-ria do direito público assume radical universalidade , quando se trata de matéria constitucional, pois define as liberdades públicas e organiza o poder à vista de sua promoção e proteção mediante organização estatal.

A gama de direitos e garantias da cidadania deverá conter dentro do ordenamento jurídico a possibilidade de o cidadão, titular do poder do Estado, promover a alteração ou a revogação de lei ou deixar de atender à lei ou a qualquer ato que atentem contra a ordem constitucional ou contra os direitos e garantias fundamentais, nos termos do parágrafo único do art. 1º da CF.

Completando este entendimento, corresponde ao status civitas decorren-te dos direitos fundamentais no qual se insere o próprio mandamento do § 2º do art. 5º da CF. Em verdade, o regime dos direitos fundamentais consagrados na CF abrange a possibilidade de direitos fundamentais implícitos, que decorrem do regime e dos princípios adotados pela própria CF.

Assim, a cidadania é um status concedido àqueles que são membros in-tegrais de uma comunidade: todos aqueles que possuem o status são iguais em direitos e obrigações.

Neste diapasão, também deve ser definida como um processo social pelo qual os indivíduos e grupos sociais se ocupam reivindicando, expandindo ou perdendo direitos, se constituindo em um arcabouço de direitos, prerrogativas e deveres que configuram um sistema de reciprocidades determinantes da natu-reza das relações entre os indivíduos entre si e com o Estado. Seu enraizamento na vida coletiva como sentimento, cultura e sistema de referências valorativas

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torna-se medida fundamental do grau de democratização alcançado por uma dada sociedade. Sua configuração política normativa mais ampla se expressa por meio de um conjunto de valores morais e regras jurídicas e sociais que sus-tentam as relações de reciprocidade e de interdependência entre os indivíduos e os diversos grupos sociais na concretude da ação coletiva.

É a qualidade do cidadão de poder exercer o conjunto de direitos e li-berdades políticas, socioeconômicas de seu País, estando sujeito a deveres que lhe são impostos. Relaciona-se, portanto, com a participação consciente e res-ponsável do indivíduo na sociedade, zelando para que seus direitos não sejam violados.

2 o CoNtrole dA morAlIdAde AdmINIStrAtIvA

Os princípios assumem grande importância na atividade de aplicação da norma, uma vez que atuam como verdadeiros mecanismos de interpretação e aplicação destas.

Desta forma, o princípio da moralidade administrativa exige que o admi-nistrador público observe determinados valores, os quais assumem certa pecu-liaridade em razão da natureza de sua atividade.

Nesta esteira, a Administração Pública deve pautar-se pelos princípios constitucionalmente firmados no art. 37 e demais incisos, além dos demais prin-cípios fundamentais.

Tais princípios consubstanciam-se em fundamentos da ação administra-tiva e que, nos dizeres de Meirelles (1999, p. 81 e 82), “são os sustentáculos da atividade pública”. Repeli-los é desvirtuar a gestão da coisa pública e esquecer o que há de mais elementar para a boa guarda e cuidado dos interesses sociais.

Isso ocorre porque o Erário público é constituído de bens pertencentes a todos, e, assim, o lícito é de interesse coletivo, e tudo o que se indispuser contra a alçada de aplicabilidade destes princípios fere a Constituição, transmutando--se em ilícito e ilegal, sendo danosa a toda a população.

Segundo Mendes (2013, p. 822), a moralidade administrativa reconhe-cida como princípio jurídico apenas significa a atribuição a determinado ato formalmente jurídico de uma dimensão ética.

São assertivas as críticas de Grau (2011, p. 284), quando assenta que o princípio da moralidade deve ser encontrado na própria regra, sendo que o caso concreto deva ser fundado na eticidade (ética da legalidade), sob “pena de dissolução do próprio sistema”, resvalando naquilo que Streck denomina de pamprincipiologismo (2014, p. 99).

No entendimento de Mello (2000, p. 89):

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A Administração Pública deve atuar na conformidade de princípios éticos, den-tro da lealdade e da boa-fé, uma vez que não bastará o cumprimento da estrita legalidade, devem-se respeitar também os princípios éticos de razoabilidade e justiça, uma vez que a moralidade constitui pressuposto de validade de todo o ato emanado da Administração Pública.

Ademais, a ideia de moralidade administrativa nasceu vinculada ao con-trole ao desvio de poder, e, diante disso, entende-se que a moralidade admi-nistrativa estabelece pressuposto de validade de todo o ato da Administração Pública, bem solucionado à luz da teoria dos motivos determinantes (Mello, 1981, p. 75).

Para se atender efetivamente à norma, devem os agentes administrativos colimar os seus fins, paralelamente aos princípios éticos nela implícitos. Como Cretela (1999, p. 133) assevera, ao analisar o caso concreto, poderá se observar que a moralidade pode ser encontrada em traços disfarçados pela legalidade, sob o “espírito da lei” ou sob a capa dos “princípios gerais do Direito”.

De fato, a Constituição, quando consagrou o princípio da moralidade administrativa como vetor de atuação da Administração Pública, também con-sagrou a necessidade de proteção à moralidade, bem como a responsabilização de quem fere tal princípio constitucional.

A conduta em desrespeito ao princípio da moralidade enumera Moraes (1999, p. 295) que:

A conduta do administrador público em desrespeito ao princípio da moralidade enquadra-se nos denominados atos de improbidade, previstos pelo art. 37, § 4º, da Constituição Federal, e sancionados com a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao Erário, na forma gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível, permitindo ao Ministério Público a propositura de ação civil pública por ato de improbidade, com base na Lei nº 8.429/1992 para que o Poder Judiciário exerça o controle jurisdicional sobre lesão ou ameaça de lesão ao patrimônio público.

No Estado de Direito, os atos dos administradores públicos auferem seu fundamento de validade na norma, uma vez que tem por finalidade sempre a consecução do bem comum. Em razão disso, é possível se dizer que a legalida-de e a moralidade se integram e se complementam.

A moralidade limita e direciona a atividade administrativa e torna im-perativo que os atos da Administração Pública não contenham os valores que escoam dos direitos fundamentais dos administrados, o que permitirá a valori-zação e o respeito à dignidade da pessoa humana.

Bobbio (2002, p. 10) já exaltava que as forças morais impedem as ins-tituições de degenerar, inclusive ressaltando que “o fundamento de uma boa República, mais até do que as boas leis, é a virtude dos cidadãos”.

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Portanto, além de restringir o arbítrio e preservar a manutenção dos valo-res essenciais a uma sociedade justa e solidária, a moralidade habilita os admi-nistrados ao direito subjetivo de exigir do Estado uma máxima eficiência e que sua atividade esteja direcionada sempre à consecução do bem comum.

3 A leI de ACeSSo À INFormAção e CIdAdANIA AtIvA

A Constituição, como norma explicitadora das promessas da função so-cial do Estado, mesmo que não cumpridas à risca (Streck, 2014, p. 48), desperta constantemente a sua força normativa (Hesse, 1991, p. 27), quando realça o seu substrato nuclear, notadamente no exercício do controle social dos atos públicos, cuja participação do indivíduo é elementar à garantia das liberdades públicas (Tavares, 2013, p. 420).

De fato, a Lei de Acesso à Informação (LAI), Lei nº 12.517, de 18 de novembro de 2011, é novo paradigma em termos de Administração Pública. Traz e efetiva a transparência dos atos públicos mediante o direito do cidadão em acessar quaisquer informações públicas, mesmo àquelas que não sejam de interesse pessoal ao cidadão. A norma constitucional a que se refere o art. 5º, XXXIII, já garantia o direito ao acesso à informação de interesse coletivo, toda-via, não previa a forma pela qual isso seria garantido, gerando a possibilidade de desrespeito ou embaraço ao efetivo atendimento à norma constitucional.

Meirelles (1981, p. 502) destacava antes mesmo da Constituição Brasilei-ra de 1988 a capacidade do cidadão em cuidar da coisa pública:

Podemos agora sustentar, em face dos meios constitucionais postos à disposi-ção dos administrados (ação popular e representação contra ilegalidades), que a fiscalização da conduta dos governantes, que antes era um privilégio das corpo-rações legislativas, na atualidade se estendeu ao próprio cidadão, que hoje em dia tem um direito subjetivo ao governo honesto. A probidade administrativa dos agentes do poder é um direito do povo, daí a razão por que o controle da legali-dade da administração foi ampliado até o mais simples cidadão.

Esta inovação veio a avançar sobre a já sedimentada e acessível possi-bilidade do direito à informação pessoal, e mesmo no que tange ao direito de certidão, que já era garantido expressamente pela CF, no art. 5º, inciso XXXIV, b. Na disposição constitucional, existe direta previsão de que o cidadão tenha pleno direito a solicitar de quaisquer órgãos públicos informações a seu respeito (art. 5º, XXXIV, a) ou mesmo naquelas em que detêm interesse jurídico. Com relação às informações de ordem pessoal, o remédio constitucional assegurado seria o habeas data (art. 5º, LXXII, a). No que tange à informação na qual tenha interesse jurídico, destaca-se, inclusive, a possibilidade de o cidadão fiscalizar a Administração Pública, para propor, se for o caso, a ação popular, mandado de segurança coletivo (se representar algum dos legitimados jurídicos). Nestes

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casos, aquele que pretender informação da Administração Pública deveria tão somente requisitar o seu teor, informando as razões pelas quais faria uso dessa informação ou documento.

Diferentes autores (Moraes, 2002, p. 287; Di Pietro, 2000, p. 76; Meirelles, 1981, p. 501) destacam o direito do cidadão em perquirir a defesa de interesses coletivos mediante a obtenção de documentos públicos, sendo este já um direito garantido constitucionalmente.

Juridicamente, far-se-ia possível antes da LAI ao órgão público recusar o fornecimento de documentos ou certidão feita mediante petição que não conti-vesse qualquer fundamentação ou justificativa para amparar a solicitação. Ha-via uma margem de discricionariedade para denegar ou retardar a solicitação, consoante excerto a seguir trazido de decisão do eg. Tribunal de Justiça de São Paulo (São Paulo, 2011):

Não tendo o legislador pátrio criado o direito apenas às informações pessoais ou particulares do requerente, não compete à Administração Pública impor res-trições que inviabilizem o exercício do direito garantido constitucionalmente, desde que devidamente fundamentada a pretensão.

Não que a Administração Pública tivesse ampla liberdade decisória para negar o acesso à informação ou documentos, dentro de suas prerrogativas dis-cricionárias. No entender de Binenbojm (2008, p. 39), a juridicidade adminis-trativa é passível de controle e avaliação pelo Poder Judiciário, no qual conju-gará os interesses coletivos e fundamentais envolvidos.

Com a LAI, não mais se faz necessário justificar as razões pelas quais se usará o documento. Apenas se solicita, com ou sem fundamentação da pre-tensão. Acessa-se a informação pública, com ou sem interesse direto, para uso científico, jornalístico, pessoal ou até mesmo para promoção de ações de cunho político.

Atualmente, basta a identificação do solicitante e a especificação da informação/documento (art. 10, caput), sendo previsto que não é apenas dis-pensável a justificação, como são “vedadas quaisquer exigências relativas aos motivos determinantes da solicitação de informações de interesse público” (art. 10, § 3º). Foi um excelente avanço.

A LAI traz em seu bojo o direito de cidadão à transparência, à publici-dade – lida aqui em sua acepção ampliada. Tradicionalmente, tem-se que a publicidade dos atos públicos tem seu alcance para validade do ato adminis-trativo (Mello, 2001, p. 331). Aqui, a publicidade quer ser chegada às últimas consequências, coligando a informação pela informação, a compartimentação das ações públicas, dos salários pagos a servidores, como se investe (ou se des-perdiça) o dinheiro público – fruto de sacrifício de todos.

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Mister destacar que a accountability é um mecanismo que conduz à implementação da representação, pois força os “representantes a agirem no melhor interesse público” (Hirano, 2007). Assenta-se que busca-se o controle social e “possibilita que os cidadãos questionem os atos de seus representantes, punindo-os a qualquer tempo e não somente na ocasião das eleições” (Hirano, 2007).

Neste ponto, a accountability atinge sua forma de exteriorização, a sua eficácia, a forma de se chegar ao cidadão, de forma efetiva e direta – caso ele assim o queira –, possibilitando a ele exercer a cidadania, cobrar os atos de seus governantes, pressionar por políticas, questionar gastos injustificados, elogiar as condutas de seus mandatários. Se o poder é do povo, exercido por seus repre-sentantes, nada mais justo para construção sadia de um legítimo espaço demo-crático que o cidadão transcenda as amarradas burocráticas nas quais a Admi-nistração Pública pode legalmente se escamotear. A LAI é sinal dos tempos, da rápida comunicação, da sociedade da informação, em uma fase pós-moderna.

O processo de transparência dos atos públicos sofre um enforcement da pressão social, que redunda em leis como a LAI, a ponto de que, no futuro, não seja necessário buscar as informações mediante requerimentos, solicitação de cópias ou deslocamento à sede física do órgão governamental; elas estarão todas disponíveis nos portais – locais estes que hospedarão de fato o mundo governamental ao alcance de um clique, o e-government, tanto palco de pres-tação de serviços públicos virtuais, bem como de rápida e acessível consulta, e, quiçá, palco de discussões virtuais, audiências públicas, recebimento e proces-samento de sugestões, coleta de melhorias.

Mister citar que, ao lado da Lei de Acesso à Informação ora abordada, tem-se a conhecida alteração na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF, Lei Com-plementar nº 101/2000), a conhecida Lei da Transparência (Lei Complementar nº 131, de 27 de maio de 2009), a qual obriga todos os órgãos públicos, incluin-do prefeituras, a manter um fácil e acessível portal da transparência, com dados básicos para acesso à população.

Menciona-se que dita alteração na LRF deu nova redação ao art. 48, para assegurar a transparência mediante o “incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discus-são dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos” (parágrafo único, inciso I). Do mesmo modo, determinou ao pleno conhecimento e acompanha-mento social, em tempo real, das informações completas quanto à execução or-çamentária e financeira nos sítios oficiais ou outros meios eletrônicos de acesso público (parágrafo único, inciso II, art. 48, da LRF).

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Dita lei chegou ao seu termo para atendimento – de 4 (quatro) anos – (art. 73-B da LRF) nas cidades de menor porte (até cinquenta mil habitantes), as quais remontam a 4.957 em todo o Brasil.

Levantamento feito pela Confederação Nacional dos Municípios apon-tou que das 1.690 cidades consultadas com até 50.000 habitantes, 37% não disponibilizaram as informações exigidas pela legislação (Gama, 2013).

Denotam-se as dificuldades técnicas à implantação da Lei da Transpa-rência tanto a questões culturais (“jeitinho brasileiro”) quanto à falta de prepa-ro técnico das Administrações de menor porte, notadamente pela ausência de profissionais qualificados para realização das não tão complexas adaptações demandas na lei e investimentos de natureza tecnológica.

Vale dizer que o não atendimento da implantação do Portal da Transpa-rência levará às sanções da LRF quanto ao não repasse de recursos federais e estaduais por meio de convênios (art. 73-C).

Ditas dificuldades são indicativos às futuras dificuldades que se terão na correta e efetiva implantação da LAI, visto que demandam adequações não apenas de ordem moral e legal (dar maior publicidade aos atos públicos), mas também de ordem técnica e material (criação de espaços para atendimento ao público, compilação de dados, preparo técnico para rápido e tempestivo aten-dimento aos requerimentos e pedido de informações).

Gregory Michener (2013) faz um paralelo entre a lei da Transparência e a LAI, apontando que a “infraestrutura da transparência” no Brasil carece de melhor organização e coordenação, o que demandaria a reunião das autorida-des fiscalizatórias (Controladorias, Ministérios Públicos, Tribunais de Contas) e as autoridades administrativas em prol de uma “unidade de ação da trans-parência”. Segundo este professor de Administração Pública, a transparência demanda monitoramento e tem custos políticos, apontando que a sociedade civil dever-se-ia fazer fortemente presente para criar um ambiente de pressão às lideranças locais objetivando a concretude dos mecanismos democráticos exteriorizados nestas legislações.

No âmbito do Supremo Tribunal Federal (Brasil, 2013), reconhece-se a experiência do Portal da Transparência:

A criação dos Portais de Transparência dos diversos entes estatais, nos diferen-tes níveis de governo, tem proporcionado a experimentação social da relação cidadão-Estado e o exercício do controle social dos gastos públicos em novas perspectivas.

O efetivo controle social é realizado, primeiramente, pela acessibilidade de informações e transparência dos atos públicos. Despindo-se o véu das travas burocráticas, que, quando concebidas por Weber, objetivavam melhorar as ro-

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tinas e não torná-las com um fim em si mesmo (Pereira, 1996) – a participação social far-se-á amplificada, facilitada, dinamizada e factibilizável.

A LAI traz como diretrizes que a publicidade é preceito de regra geral e sigilo sendo a exceção (art. 3º, I); que as informações de interesse público devem ser divulgadas independentemente de solicitação (art. 3º, II); que a Ad-ministração Pública fomentará o desenvolvimento da cultura de transparência (art. 3º, IV) e se buscará, com tudo isso, o controle social da Administração Pública.

Questões relacionadas à segurança da sociedade ou do Estado (art. 23) podem ser negadas, total ou parcialmente. Todavia, no que concerne à tutela judicial ou administrativa de direitos fundamental, não será negado o acesso (art. 21).

Maximiza-se o direito constitucional de livre acesso às informações que sejam de interesse coletivo (art. 5º, XXXIII). Se é garantido constitucionalmente o direito à informação de interesse coletivo (como o são todos fatos e atos da Administração Pública não revestidas de sigilo) como um direito fundamental (pois este direito se insere no épico art. 5º, dentro do Cap. I, Título II – “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”), logo o art. 21 da LAI materializa o que já o era no espectro constitucional, inviabilizando a negativa estatal no seu forne-cimento.

Portanto, a disciplina normativa da LAI é assente para trazer o amplo controle estatal ao alcance de todos.

Quiçá se admita a negativa a acesso de informações no que tange à apuração de irregularidades a que o titular das informações estiver envolvido, mesmo que se tente impedir sob a alegação de que isto afetaria a vida privada, honra e imagem da pessoa (art. 31, § 4º).

Vale dizer que o valor constitucional do direito à preservação da vida privada, honra e imagem a que se refere o inciso X, do art. 5º, mesmo sendo um direito fundamental, cede seu alcance em face do interesse público para inves-tigar possíveis ilegalidades, prevalecendo aqui, na aparente colisão de valores constitucionais (Alexy, 2012, p. 99), o direito à informação a que se refere o inciso XXXIII, muito bem exteriorizado na LAI.

Tudo isso vem a contribuir para facilitar o verdadeiro exercício da cida-dania.

Até porque o direito de informação, à transparência, fortalece a razão de ser do princípio democrático do Estado brasileiro. Para o Ministro Gilmar Mendes (Brasil, 2013):

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O princípio da publicidade está ligado ao direito de informação dos cidadãos e ao dever de transparência do Estado, em conexão direta com o princípio demo-crático.

O princípio da publicidade pode ser considerado, inicialmente, como apreensí-vel em duas vertentes: (1) na perspectiva do direito à informação (e de acesso à informação), como garantia de participação e controle social dos cidadãos (a par-tir das disposições relacionadas no art. 5º, CF/1988), bem como (2) na perspecti-va da atuação da Administração Pública em sentido amplo (a partir dos princípios determinados no art. 37, caput, e artigos seguintes da CF/1988).

A Constituição Federal de 1988 é exemplar na determinação de participação cidadã e publicidade dos atos estatais. Destacam-se, por exemplo, o direito de petição e de obtenção de certidões, de garantia do habeas data, de realização de audiências públicas e da regra de publicidade de todos os julgamentos do Poder Judiciário (art. 93, IX, CF/1988).

Nesse sentido, a Constituição abriu novas perspectivas para o exercício ampliado do controle social da atuação do Estado, com destacada contribuição da impren-sa livre, de organizações não governamentais e da atuação individualizada de cada cidadão.

Com muita razão o Supremo Tribunal Federal (Brasil, 2013) reconhece a evolução das comunicações como facilitador do exercício da cidadania:

Ao mesmo tempo, os novos processos tecnológicos oportunizaram um aumento gradativo e impressionante da informatização e compartilhamento de informa-ções dos órgãos estatais, que passaram, em grande medida, a serem divulgados na Internet, não só como meio de concretização das determinações constitucio-nais de publicidade, informação e transparência, mas também como propulsão de maior eficiência administrativa no atendimento aos cidadãos e de diminuição dos custos na prestação de serviços.

O controle da moralidade administrativa, do arquétipo comportamental esperado do homem público, coadunado aos valores – e não apenas na fria e estreita compreensão das normas jurídicas –, é tarefa da coletividade e de seus aparatos estatais.

Neste ponto, a ativa cidadania não dispensa rigorosos controles públicos, internos e externos ao próprio órgão governamental. Ao contrário. Tais contro-les devem ser encarados em um processo multidimensional, no qual figurem os stakeholders sociais, inclusive as instituições públicas destinadas a tanto (Tribu-nais de Contas, Controladorias, Ministérios Público, etc.).

A alteração na LRF promovida pela Lei Complementar nº 131, na qual se acrescentou o art. 73-A, destaca a possibilidade e a legitimidade de qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato para denunciar à respectiva Corte de Contas e ao Ministério Público o desatendimento à própria lei.

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Se a Constituição Federal já assegurava ao cidadão, em seu plano in-dividual, fiscalizar, zelar e propor ação popular em nome do interesse coleti-vo, que não seja apenas lesivo ao patrimônio público, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, mas, também, quanto à defesa da moralidade administrativa (art. 5º, LXXIII).

Já na égide da LAI, a Corte Constitucional brasileira entende como cons-titucional a divulgação do salário de servidores públicos em sítio oficial, a con-ferir algum dos argumentos do Ministro Ayres Brito (Brasil, 2012):

Não cabe, no caso, falar de intimidade ou de vida privada, pois os dados objeto da divulgação em causa dizem respeito a agentes públicos enquanto agentes pú-blicos mesmos; ou, na linguagem da própria Constituição, agentes estatais agindo “nessa qualidade” (§ 6º do art. 37). E quanto à segurança física ou corporal dos servidores, seja pessoal, seja familiarmente, claro que ela resultará um tanto ou quanto fragilizada com a divulgação nominalizada dos dados em debate, mas é um tipo de risco pessoal e familiar que se atenua com a proibição de se revelar o endereço residencial, o CPF e a CI de cada servidor. No mais, é o preço que se paga pela opção por uma carreira pública no seio de um Estado republicano.

Prossegue o Ministro Britto (Brasil, 2012), destacando a importância da publicidade e da transparência:

A prevalência do princípio da publicidade administrativa outra coisa não é senão um dos mais altaneiros modos de concretizar a República enquanto forma de go-verno. Se, por um lado, há um necessário modo republicano de administrar o Es-tado brasileiro, de outra parte é a cidadania mesma que tem o direito de ver o seu Estado republicanamente administrado. O “como” se administra a coisa pública a preponderar sobre o “quem” administra – falaria Norberto Bobbio –, e o fato é que esse modo público de gerir a máquina estatal é elemento conceitual da nossa República. O olho e a pálpebra da nossa fisionomia constitucional republicana.

A negativa de prevalência do princípio da publicidade administrativa implicaria, no caso, inadmissível situação de grave lesão à ordem pública.

Por fim, o próprio Supremo Tribunal, destaca o então Presidente Britto, deu exemplo e expôs de forma irrestrita a remuneração dos servidores da Casa e os subsídios dos Ministros (Brasil, 2012):

Por fim, registro que, quando da entrada em vigor da recente Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação Pública), esta nossa Corte decidiu “divulgar, de for-ma ativa e irrestrita, os subsídios dos ministros e a remuneração dos servidores do quadro de pessoal do Supremo Tribunal Federal, assim como os proventos dos ministros aposentados, dos servidores inativos e dos pensionistas”. O que se deu na quarta sessão administrativa, realizada em 22 de maio de 2012, por unanimidade. Decisão que, já em sede jurisdicional, mantive, ao deferir o pedido formulado pela União na SL 623.

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Mister apontar que toda e qualquer inovação legislativa, notadamente que vise a expor e trazer mais transparência da máquina pública, é sim im-portante. Mesmo que tenha sido apontado pelo Professor Rogério Gesta Leal (Conpedi, 2013) que não bastam novas leis – mesmo sendo elas importantes –, o que realmente importa é a amplificação da participação social e sua forma de interferir ativamente no processo democrático.

Aponta-se a feliz coincidência quanto à contemporaneidade (promul-gadas no mesmo dia 18 de novembro de 2011) entre a criação da LAI (Lei nº 12.517) e a criação da Comissão Nacional da Verdade (Lei nº 12.528) quanto a demonstrar a evolução democrática do Estado brasileiro.

Bons ventos sopram quando se observam iniciativas tais como a ins-tituída pela Controladoria-Geral da União ao efetivar o Portal do “Acesso à Informação”2 (Brasil, 2014), no qual é possível buscar informações, via Internet, de quaisquer órgãos públicos federais, sem maiores obstáculos, com resposta via e-mail e acompanhamento da solicitação no próprio portal. Certamente, iniciativas semelhantes deverão ser replicadas pelos demais entes federados, favorecendo a aproximação cidadã e, quem sabe, derrocar uma visão turva na participação política que ruma a uma alienação do povo (Loewenstein, s.d.) sobre os atos públicos.

A maturação democrática brinda ao fato de que, agora, “os mandatários do povo usarão vestes transparentes nas ações governamentais, sujeitos ao con-trole social” (Scarpino, 2012).

Afinal, o exercício ativo da cidadania decorre da prática, como ponto de partida (Habbermas, 1997, p. 121), não podendo ser tomada como um conceito ou ideal, senão em sua verdadeira concretude a partir da participação dos cida-dãos nos atos públicos. Assente-se, assim, o contributo da LAI para o verdadeiro exercício da cidadania.

CoNSIderAçÕeS FINAIS

A Lei de Acesso à Informação (LAI) é sinal dos novos tempos, da rápida comunicação, da sociedade da informação, em uma fase pós-moderna e en-quanto instrumento concretizador da prescrição constitucional no aprimora-mento da transparência dos atos públicos.

A reaproximação cidadão-Estado demanda deste último providências inequívocas no estabelecimento de um accountability, gerando reflexivos inputs e outputs.

2 Confira no sítio: <http://www.acessoainformacao.gov.br/acessoainformacaogov/index.asp>.

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Tais procedimentos favorecem o exercício da cidadania, em uma expres-são ativa, cobrando os atos de seus governantes, pressionando por políticas, questionando gastos injustificados, notadamente no estreito controle e na veri-ficação da prescrição da moralidade administrativa.

Um ferramental aprimorado, tais como os possibilitados em sítios gover-namentais, induz à acessibilidade de informações, tendo como reflexo o efetivo controle social. Tais avanços – que ainda demandam implementação mais efi-cazes nos Municípios e Estados – inegavelmente prestam um papel relevante na consolidação da democrática brasileira.

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoNumeração Única: 0031032‑33.2006.4.01.3400Apelação Cível nº 2006.34.00.031803‑3/DFRelator: Desembargador Federal João Batista MoreiraApelante: Rodoviário União Ltda.Advogado: Andre Puppin Macedo e outros(as)Apelante: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECTAdvogado: Gustavo Esperança Vieira e outros(as)Apelado: os mesmos

ementalICItAção – revogAção – empreSA veNCedorA – preteNSão de ANulAção do Ato – INde-FerImeNto – prejudICIAlIdAde, em rAzão do tempo deCorrIdo – preteNSão SeCuNdÁrIA de INdeNIzAção – reemBolSo dAS deSpeSAS Com A lICItAção – deFerImeNto NA SeNteNçA – reSSArCImeNto de outroS prejuízoS Com ANteCIpAção de provIdêNCIAS em FACe dA eXpeCtAtIvA de CoNtrAtAção – ACrÉSCImo – pArCIAl provImeNto À ApelAção dA AutorA

1. Na sentença, foi julgado “parcialmente procedente o pedido para con-denar a Ré a reembolsar à autora as despesas realizadas com a partici-pação da Concorrência nº 09/2004, as quais deverão ser comprovadas na fase de execução da presente decisão ou em liquidação de sentença, conforme o caso”.

2. A esta altura, não seria faticamente possível atender à pretensão prin-cipal de anular a revogação da Licitação nº 009/2004, sucedida por uma pluralidade de contratos, resultantes de pregões, com o prazo de sessenta meses (já completamente executados, ao que se presume), a fim de que o contrato seja celebrado com a autora-apelante.

3. Prejudicada a anulação da revogação, prejudicada está, em conse-quência, a alegação de desrespeito ao devido processo legal para esse ato. Resta, pois, examinar a consistência do interesse da autora apenas para avaliar a pretensão secundária de indenização.

4. O art. 49 da Lei nº 8.666/1993 estabelece que “a autoridade compe-tente para a aprovação do procedimento somente poderá revogar a lici-tação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal con-duta, devendo anulá-la por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado”.

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5. Esse dispositivo deve ser interpretado, conforme a Constituição, de modo a não impedir a revogação de licitação para, motivadamente, atender, conforme demonstrado no caso, ao princípio da eficiência. Não se vai exigir que determinada licitação seja mantida a qualquer custo, mesmo em face da mudança, no meio do processo, da política adminis-trativa, com o intuito de melhor atender ao interesse público. O que o dispositivo legal busca evitar é o desvio de finalidade ou, mesmo, a mera arbitrariedade do administrador público, caracterizados pela revogação de licitação para atender a interesse privado ou, mesmo sem desvio de finalidade, por motivos desproporcionais à gravidade desse ato.

6. Não é o que ficou demonstrado, ao contrário, restou evidenciado que a revogação aconteceu em período conturbado da administração da ECT, ao ponto de ter-se tornado necessária a substituição dos componentes da direção da empresa e a consequente mudança de sua política adminis-trativa.

7. Lícita a revogação da licitação, deve-se examinar se o ato teria, mesmo assim, gerado obrigação de indenizar, sabido que atos lícitos também podem empenhar a responsabilidade objetiva do Estado.

8. A mudança de orientação, que resultou na revogação da licitação, foi ato de planejamento, que, se não feriu direito subjetivo, pelo menos frustrou uma expectativa legítima da empresa.

9. A autora tem direito ao reembolso das “das despesas realizadas com a participação da Concorrência nº 009/2004”, assim como a indenização por eventuais prejuízos efetivos que tenha tido em razão da antecipação de providências (ex.: investimentos) realizadas em função da classifica-ção (em 1º lugar) na licitação em referência.

10. Parcial provimento à apelação da autora para aditar ao dispositivo da sentença indenização por esses supostos prejuízos (sujeitos a comprova-ção em liquidação). Em consequência, deixa de haver condenação em honorários de advogado.

11. Prejudicada a apelação da ECT.

aCÓRDão

Decide a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da autora e julgar prejudicada a apelação da ECT, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 22 de julho de 2015.

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Desembargador Federal João Batista Moreira

ReLatÓRIo

Na sentença, de fls. 738-752, foi julgado “parcialmente procedente o pedido para condenar a Ré a reembolsar à autora as despesas realizadas com a participação da Concorrência nº 09/2004, as quais deverão ser comprovadas na fase de execução da presente decisão ou em liquidação de sentença, conforme o caso”.

Apela Rodoviário União Ltda. com os seguintes argumentos: a) “a Exce-lentíssima juíza da singela instância entendeu por julgar improcedente o pleito autoral sob os seguintes fundamentos: a) é possível que a administração revo-gue determinado processo licitatório, sem a prévia oitiva do licitante vencedor; b) apesar de não haver superveniência de fatos novos, restou configurado a prevalência do interesse público pelos seguintes motivos: b.1) respeito à morali-dade pública, tendo em vista os recentes escândalos envolvendo a ECT; b.2) au-mento e nova configuração da malha viária objeto da Concorrência nº 09/2004; c) não há falar em direito à indenização, visto que o objeto do certame ainda não havia sido adjudicado à ora requerente”; d) “apesar da decisão final do Tribunal de Contas da União ter sido favorável à ECT, a equipe técnica daquele órgão vislumbrou inúmeras irregularidades na revogação da Concorrência nº 09/2004”; e) foi descumprido o princípio do contraditório, inexistiu interesse público que justificasse a revogação do Certame nº 09/2004 e havia direito subjetivo à contratação, logo, há direito à indenização.

Apela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, argumentando que: a) “a apelada apenas se classificou no certame, sendo que no momento da deliberação pela autoridade competente (art. 43, VI, do Estatuto), decidiu--se revogá-la por razões de interesse público decorrente de fato superveniente (art. 49, da Lei nº 8.666/1993)”; b) “antes da homologação da licitação, não ex-surge aos concorrentes nenhum direito subjetivo capaz de impedir a revogação da abertura do processo licitatório, inspirada por óbvia e declarada conveniên-cia pública, nem tampouco alguma lesão patrimonial de que se lhe irradiasse direito a indenização”; c) “com a revogação da licitação por motivo de mérito, não adveio repercussão alguma na esfera jurídica da apelada (em relação aos seus direitos e interesses privados), que só teria adquirido direito subjetivo com a aceitação definitiva da proposta e adjudicação do objeto da licitação”.

Também apresenta (a ECT) contrarrazões à apelação da autora, que po-dem ser assim resumidas: a) “a apelante apenas se classificou no certame, sendo que no momento da deliberação pela autoridade competente (art. 43, VI, do Es-tatuto), decidiu-se revogá-la, por razões de interesse público”; b) “após realizar um estudo detalhado do certame revogado, aprimorou o objeto em discussão,

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visando atender todas as suas demandas, de forma precisa, eficiente e econô-mica”; c) “no ano de 2006, iniciaram-se novos processos licitatórios” por meio de pregões eletrônicos; d) “o objeto daquela concorrência, [...], não é o mesmo dos certames atuais, pois todas as linhas que ali estavam foram remodeladas, adequadas e remanejadas, visando uma maior eficiência e economia para os Correios”; e) “a situação de um particular não se conformar com a revogação da Concorrência nº 009/2004, ocasionada por razões de interesse público, não pode, em nenhuma hipótese, prejudicar a sociedade brasileira dependente dos serviços prestados pela ré”; f) “a Administração Pública não tem o dever jurí-dico de contratar, pois a escolha insere-se na sua competência discricionária”; g) “não cabe indenização por lucros cessantes e danos emergentes, conforme pleiteia a autora, pois sequer houve homologação ou adjudicação, bem como não há nexo de causalidade entre a revogação e a suposta lesão do patrimônio do particular (que são as despesas para participar daquela licitação)”; h) “essa indenização somente abrangeria as despesas que o vencedor suportou para par-ticipar da licitação ou que tenha sofrido em decorrência dela, não abrangendo lucros emergentes ou cessantes”; i) “não seria razoável exigir que a Administra-ção fosse obrigada a contratar com a autora quando o objeto da licitação, da forma como se encontrava, tornou-se inoportuno e inconveniente ao serviço buscado pela requerida”; j) “a Concorrência nº 009/2004 restou inoportuna para a ECT, uma vez que, após a publicação do Edital, ocorreram mudanças na estrutura operacional da empresa que não foram devidamente contempladas pelo projeto básico inicial do Sitra”; l) o princípio da eficiência “ ‘exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional’”; m) “haveria aplicabilidade do § 3º do art. 49 do Estatuto, somente se o procedimento licitatório tivesse sido concluído”; n) “a autora protocolou re-curso administrativo”, que “não foi provido”; o) “na Concorrência nº 009/2004 era previsto um contrato de 30 meses (com a possibilidade de renovação por mais 30), no novo sistema foi previsto que a duração seria de 60 meses”; p) “não houve prejuízos (danos) ao licitante, pois sequer o objeto do certame lhe foi adjudicado, ou seja, não houve sequer formalização do contrato (adjudicação), com a sua consequente homologação”.

A autora apresentou contrarrazões, aqui reproduzidas em resumo: a) “a revogação do certame trouxe prejuízos a esta empresa, os quais devem ser su-portados por quem os causou”; b) “a revogação da licitação ocorreu por mo-tivo de mérito, segundo a existência de suposto interesse público na referida revogação”; c) “os argumentos tecidos em favor da revogação não representam a verdade acerca dos fatos e, sobretudo, tentam ludibriar esse ilustre Tribunal distorcendo informações e suscitando conflitos inexistentes”; d) “não conceder a reparação material em que incorreu a ora apelada atenta contra o princípio da moralidade, que por sua vez deve permear toda atividade do administrador público, exigindo uma atividade responsável e coerente para a correta identifi-

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cação dos padrões de conduta que individualizam o bom administrador, vincu-lando-o à finalidade pública”.

É o relatório.

Desembargador Federal João Batista Moreira Relator

voto

A esta altura, depois de vários anos, não seria faticamente possível aten-der à pretensão principal de anular a revogação da Licitação nº 009/2004, su-cedida por uma pluralidade de contratos, resultantes de pregões, com o prazo de sessenta meses (já completamente executados, ao que se presume), a fim de que o contrato seja celebrado com a autora-apelante. Prejudicada a anulação da revogação, prejudicada está, em consequência, a alegação de desrespeito ao devido processo legal para esse ato. Resta, pois, examinar a consistência do interesse da autora apenas para avaliar a pretensão secundária de indenização.

O art. 49 da Lei nº 8.666/1993 estabelece que “a autoridade compe-tente para a aprovação do procedimento somente poderá revogar a licitação por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá--la por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito e devidamente fundamentado”.

Esse dispositivo deve ser interpretado, conforme a Constituição, de modo a não impedir a revogação de licitação para, motivadamente, atender, conforme demonstrado no caso, ao princípio da eficiência. Não se vai exigir que determi-nada licitação seja mantida a qualquer custo, mesmo em face da mudança, no meio do processo, da política administrativa, com o intuito de melhor atender ao interesse público. O que o dispositivo legal busca evitar é o desvio de fina-lidade ou, mesmo, a mera arbitrariedade do administrador público, caracteri-zados pela revogação de licitação para atender a interesse privado ou, mesmo sem o desvio de finalidade, por motivos desproporcionais à gravidade do ato.

Não é o que ficou demonstrado, ao contrário, restou evidenciado que a revogação aconteceu em período conturbado da administração da ECT, ao ponto de ter-se tornado necessária a substituição dos componentes da direção da empresa e a consequente mudança de sua política administrativa.

Consoante registrou a ilustre magistrada, na sentença, “o dispositivo su-pracitado não deve ser interpretado de forma literal, mas sim teleológica, ou seja, o julgador, ao aplicar a norma ao caso concreto, deve buscar também sua finalidade e sua adequação aos princípios constitucionais que regem as ações

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da administração pública. Não se pode olvidar que a finalidade do dispositivo legal supracitado é evitar que os responsáveis pela tomada de decisões no âm-bito da administração pública possam, a qualquer tempo e de forma arbitrária, reavaliar a situação fática anterior, que conduziu à realização de um determi-nando procedimento licitatório, para o revogar. Tal finalidade se torna ainda mais evidente ao se verificar que, na maioria das vezes, os critérios para o preenchimento dos cargos de direção e chefia das repartições públicas são po-líticos e, portanto, bastante maleáveis a cada alternância de poder, o que pode gerar instabilidade nas relações jurídicas entabuladas entre a administração e particulares. Ademais, não se pode desconsiderar que, infelizmente, no Brasil, ainda há muitos casos de corrupção, sendo comum que administradores tomem decisões visando a atender a interesses pessoais e não aos da coletividade. Esta realidade, contudo, não pode engessar a administração de forma a se exigir, em toda e qualquer situação, que existam concomitantemente os dois requisitos elencados na norma, quais seja, fato superveniente e interesse público, para que se possa revogar a licitação. Na realidade, o que se deve perquirir é se, embora ausente um dos requisitos, o ato foi praticado com desvio de sua finalidade. Se esse ato objetivou atender ao interesse de toda coletividade ou apenas de deter-minadas pessoas e se os princípios da impessoalidade, eficiência, moralidade foram observados”.

Situação semelhante acontece com a teoria dos motivos determinantes, a qual requer comedimentos. A administração, assim como o juiz, não necessita declinar todos os motivos para sustentar o ato, logo, num segundo momento pode invocar motivos anteriormente não considerados. Não há uma tal espécie de “preclusão consumativa”. O que é inadmissível é o desvio de finalidade ou a simples arbitrariedade, caracterizados pela invocação de novos motivos que só na aparência servem para reforçar a estrutura do ato, evidenciando a pretensão de mantê-lo a qualquer custo.

Lícita, nesses termos, a revogação da licitação, deve-se perguntar se o ato teria, mesmo assim, gerado obrigação de indenizar, sabido que atos lícitos também podem empenhar a responsabilidade objetiva do Estado.

A mudança de orientação, que resultou na revogação da licitação, foi ato de planejamento que, se não feriu direito subjetivo, pelo menos frustrou uma expectativa legítima da empresa.

A responsabilidade por danos decorrentes da confiança em promessas do Estado, manifestadas em planos e programas (no caso, um edital de licitação), é objeto de estudo de Almiro do Couto e Silva, concluindo que, “conquanto possa sempre o Estado alterar seus planos, há situações, contudo, em que a mo-dificação causa tal prejuízo aos particulares e desmente de forma tão acentuada as promessas firmemente feitas pelo Poder Público que importaria grave lesão à justiça material não reconhecer direito à indenização [...] Há situações em que

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o Estado incentiva de forma tão nítida e positiva os indivíduos a um determina-do comportamento, mediante promessas concretas de vantagens e benefícios, que a violação dessas promessas implica infringência ao princípio da boa-fé, cabendo ao Estado indenizar os danos decorrentes da confiança [...] Decisivo para concluir-se se os atos do Estado geram mera expectativa ou se deram causa a direito subjetivo é saber se as promessas foram realmente firmes, precisas e concretas [...] Cuidando-se de aplicação de princípio genérico, como é o da boa-fé, que não comporta incidência imediata, não é possível ultrapassar, como diretriz para sua realização concreta, os limites estabelecidos pelos requisitos ainda muito abstratos de que a responsabilidade do Estado só surge em razão de promessas firmes e feitas de forma clara e precisa pelo Estado [...].

Transportadas essas lições para o caso presente, conclui-se que a autora tem direito ao reembolso das “das despesas realizadas com a participação da Concorrência nº 009/2004”, assim como a indenização por eventuais prejuízos efetivos que tenha tido em razão da antecipação de providências (ex.: inves-timentos) que tenha sido levada a realizar em função da classificação (em 1º lugar) na licitação em referência.

Por isso, dou parcial provimento à apelação da autora para aditar ao dis-positivo da sentença indenização por prejuízos (que vierem a ser comprovados em liquidação) que a empresa tenha suportado em razão da antecipação de providências motivadas pela vitória na Licitação nº 009/2004-ECT.

Em consequência, deixa de haver condenação em honorários de advo-gado.

Prejudicada a apelação da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

É como voto.

Desembargador Federal João Batista Moreira Relator

tRIbunaL RegIonaL FeDeRaL Da 1ª RegIão seCRetaRIa JuDICIÁRIa

26ª Sessão Ordinária do(a) Quinta Turma

Pauta de: 22.07.2015 Julgado em: 22.07.2015

Ap 0031032-33.2006.4.01.3400/DF

Relator: Exmo. Sr. Desembargador Federal João Batista Moreira

Revisor: Exmo(a). Sr(a).

Presidente da Sessão: Exmo(a). Sr(a). Desembargador Federal Néviton Guedes

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Proc. Reg. da República: Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Zilmar Antônio Drumond

Secretário(a): Fábio Adriani Cerneviva

Apte.: Rodoviário União Ltda.

Adv.: Andre Puppin Macedo e outros(as)

Apte.: Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT

Adv.: Gustavo Esperança Vieira e outros(as)

Apdo.: os mesmos

Nº de Origem: 2006.34.00.031803-3 Vara: 6ª

Justiça de Origem: Justiça Federal Estado/Com.: DF

sustentação oRaL CeRtIDão

Certifico que a(o) egrégia(o) Quinta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe, em Sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, à unanimidade, deu parcial provimento à Apelação da Autora e julgou prejudicada a Apelação da ECT, nos termos do voto do Relator.

Participaram do Julgamento os Exmos. Srs. Desembargador Federal Néviton Guedes e Juiz Federal Márcio Barbosa Maia (Conv.). Ausente, por mo-tivo de férias, o Exmo. Sr. Desembargador Federal Souza Prudente.

Brasília, 22 de julho de 2015.

Fábio Adriani Cerneviva Secretário(a)

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoIV – Remessa Ex Officio em Ação Cível nº 593219 2011.51.02.0042202Nº CNJ: 000422083.2011.4.02.5102Relator: Desembargador Federal Marcelo Pereira da SilvaParte Autora: Maria do Amparo Morais PatricioAdvogado: Cristiano Pereira de CastroParte Ré: União FederalRemetente: Juízo da 3ª Vara Federal de Niterói/RJOrigem: Terceira Vara Federal de Niterói (201151020042202)

ementadIreIto AdmINIStrAtIvo – remeSSA NeCeSSÁrIA – ServIdorA pÚBlICA FederAl – peNSão por morte – uNIão eStÁvel homoAFetIvA – AdI 4.277/dF, StF – provA dA uNIão eStÁvel AtÉ A dAtA do ÓBIto

1. Em julgamento histórico recentemente proferido nos autos da ADI 4.277/DF (STF, Rel. Min. Ayres Britto, DJe 198, 14.10.2011), consagrou o Supremo Tribunal Federal o entendimento de que a união homoafeti-va deve ser reconhecida como instituto jurídico, adotando interpretação conforme a Constituição, para excluir “qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segun-do as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva”.

2. Existindo farta prova documental da convivência estável duradoura e pública entre pessoas do mesmo sexo, o direito da companheira homoa-fetiva ao benefício não pode deixar de ser reconhecido, sendo certo que a dependência econômica entre companheiros, assim como ocorre entre cônjuges, é presumida, nos termos da lei previdenciária, razão pela qual desnecessária a sua comprovação para fins de pensionamento. Prece-dentes.

3. Remessa necessária desprovida.

aCÓRDão

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas:

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Acordam os membros da 8ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por maioria, em negar provimento à remessa necessária, na forma do voto do Relator. Vencido o Des. Fed. Guilherme Diefenthaeler que lhe dava provimento.

Rio de Janeiro, 08 de julho de 2015 (data do Julgamento).

Marcelo Pereira da Silva Desembargador Federal

ReLatÓRIo

Trata-se de remessa necessária da sentença proferida pelo MM. Juízo da 3ª Vara Federal de Niterói/RJ (fls. 132/142) que, antecipando os efeitos da tute-la, julgou procedente o pedido para condenar a União a conceder à Autora “o benefício estatutário de pensão vitalícia por morte de Leda Parreiras Gonzalez (matrícula Siape 0639943) a contar de 28.10.2008 (data do óbito da mesma fls. 24 e 90), pagando os atrasados imprescritos com atualização monetária se-gundo os índices contidos no manual de cálculos da Justiça Federal e a contar do vencimento da parcela, e juros de mora de 0,5% ao mês desde a citação válida”. Condenou, ainda, a União em honorários advocatícios fixados em 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação.

Regularmente intimada do teor da sentença, a União peticionou infor-mando que deixaria de recorrer “em razão das robustas provas dos autos (de-claração conjunta de convivência; conta conjunta em banco; e recebimento de pensão do INSS), sob pena de impor à União maior ônus ao recorrer” (fl. 158), informando, ainda, que oficiou ao órgão para cumprimento da tutela deferida em sentença.

Em fls. 165/171, foram juntados documentos comprovando a implanta-ção da pensão, em cumprimento à antecipação da tutela deferida na sentença.

Remetidos os autos a esta egrégia Corte para apreciação da remessa ex officio, foi colhida a manifestação do Ministério Público Federal às fls. 05/08, que opinou pelo desprovimento da remessa, com a manutenção integral da sentença.

É o relatório. Peço dia para julgamento.

Marcelo Pereira da Silva Desembargador Federal

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voto

Vieram os presentes autos remetidos a este Tribunal para julgamento de remessa necessária da sentença de fls. 132/142, da lavra do MM. Juízo da 3ª Vara Federal de Niterói/RJ, que, antecipando os efeitos da tutela, julgou pro-cedente o pedido formulado por Maria do Amparo Morais Patricio na inicial, reconhecendo o seu direito à pensão estatutária instituída por sua companheira, Leda Parreira Gonzales, que era médica aposentada do Ministério da Saúde (fl. 44), a contar da data de seu falecimento, ocorrido em 28.10.2008 (fl. 24).

Verifica-se, assim, que a controvérsia gira em torno da concessão de pen-são estatutária em favor de companheira de ex-servidora fundada em união estável homoafetiva, ou seja, mantida com pessoa do mesmo sexo.

Como se sabe, o Supremo Tribunal Federal, em decisão histórica, proferi-da nos autos da ADI 4.277/DF (Rel. Min. Ayres Britto, DJe 198, de 14.10.2011), consagrou o entendimento de que a união homoafetiva deve ser reconhecida como instituto jurídico “segundo as mesmas regras e com as mesmas conse-quências da união estável heteroafetiva”. Adotando interpretação conforme a Constituição, firmou a Suprema Corte orientação no sentido de que fosse ex-cluído “qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família”.

Confira-se a ementa do referido julgado que, por sua pertinência e rele-vância, a seguir se transcreve, verbis:

“1. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF) – PERDA PARCIAL DE OBJETO – RECEBIMENTO, NA PARTE REMANESCENTE, COMO AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – UNIÃO HOMOAFE-TIVA E SEU RECONHECIMENTO COMO INSTITUTO JURÍDICO – CONVER-GÊNCIA DE OBJETOS ENTRE AÇÕES DE NATUREZA ABSTRATA – JULGA-MENTO CONJUNTO – Encampação dos fundamentos da ADPF 132RJ pela ADI 4.277/DF, com a finalidade de conferir ‘interpretação conforme a Constituição’ ao art. 1.723 do Código Civil. Atendimento das condições da ação.

2. PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO DAS PESSOAS EM RAZÃO DO SEXO, SEJA NO PLANO DA DICOTOMIA HOMEM/MULHER (GÊNERO), SEJA NO PLANO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CADA QUAL DELES – A PROIBIÇÃO DO PRE-CONCEITO COMO CAPÍTULO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL – HOMENAGEM AO PLURALISMO COMO VALOR SOCIOPOLÍTICO-CULTU-RAL – LIBERDADE PARA DISPOR DA PRÓPRIA SEXUALIDADE, INSERIDA NA CATEGORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO INDIVÍDUO, EXPRESSÃO QUE É DA AUTONOMIA DE VONTADE – DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA – CLÁUSULA PÉTREA – O sexo das pessoas, salvo disposição cons-titucional expressa ou implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por colidir frontalmente com o objetivo constitucional

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de ‘promover o bem de todos’. Silêncio normativo da Carta Magna a respeito do concreto uso do sexo dos indivíduos como saque da kelseniana ‘norma geral negativa’, segundo a qual ‘o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido’. Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da ‘dignidade da pessoa humana’: direito a autoestima no mais elevado ponto da consciência do indivíduo. Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autono-mia da vontade das pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e da privacidade constitucionalmente tuteladas. Autonomia da von-tade. Cláusula pétrea.

3. TRATAMENTO CONSTITUCIONAL DA INSTITUIÇÃO DA FAMÍLIA – RE-CONHECIMENTO DE QUE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO EMPRESTA AO SUBSTANTIVO ‘FAMÍLIA’ NENHUM SIGNIFICADO ORTODOXO OU DA PRÓPRIA TÉCNICA JURÍDICA – A FAMÍLIA COMO CATEGORIA SOCIOCUL-TURAL E PRINCÍPIO ESPIRITUAL – DIREITO SUBJETIVO DE CONSTITUIR FA-MÍLIA – INTERPRETAÇÃO NÃO REDUCIONISTA – O caput do art. 226 confere à família, base da sociedade, especial proteção do Estado. Ênfase constitucional à instituição da família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por casais heteroafetivos ou por pares homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão ‘família’, não limita sua formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. Família como instituição privada que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas, mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária relação trico-tômica. Núcleo familiar que é o principal lócus institucional de concreção dos direitos fundamentais que a própria Constituição designa por ‘intimidade e vida privada’ (inciso X do art. 5º). Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homo-afetivos que somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Família como figura central ou continente, de que tudo o mais é conteúdo. Imperiosidade da interpretação não reducionista do conceito de família como instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil. Avanço da Constituição Federal de 1988 no plano dos costumes. Caminhada na direção do pluralismo como categoria sociopolítico-cultural. Competência do Supremo Tribunal Federal para manter, interpretativamente, o Texto Magno na posse do seu fundamental atributo da co-erência, o que passa pela eliminação de preconceito quanto à orientação sexual das pessoas.

4. UNIÃO ESTÁVEL – NORMAÇÃO CONSTITUCIONAL REFERIDA A HOMEM E MULHER, MAS APENAS PARA ESPECIAL PROTEÇÃO DESTA ÚLTIMA – FO-CADO PROPÓSITO CONSTITUCIONAL DE ESTABELECER RELAÇÕES JURÍDI-CAS HORIZONTAIS OU SEM HIERARQUIA ENTRE AS DUAS TIPOLOGIAS DO GÊNERO HUMANO – IDENTIDADE CONSTITUCIONAL DOS CONCEITOS DE ‘ENTIDADE FAMILIAR’ E ‘FAMÍLIA’ – A referência constitucional à dualidade básica homem/mulher, no § 3º do seu art. 226, deve-se ao centrado intuito de

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não se perder a menor oportunidade para favorecer relações jurídicas horizontais ou sem hierarquia no âmbito das sociedades domésticas. Reforço normativo a um mais eficiente combate à renitência patriarcal dos costumes brasileiros. Im-possibilidade de uso da letra da Constituição para ressuscitar o art. 175 da Carta de 1967/1969. Não há como fazer rolar a cabeça do art. 226 no patíbulo do seu § 3º. Dispositivo que, ao utilizar da terminologia ‘entidade familiar’, não preten-deu diferenciá-la da ‘família’. Inexistência de hierarquia ou diferença de quali-dade jurídica entre as duas formas de constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico. Emprego do fraseado ‘entidade familiar’ como sinônimo per-feito de família. A Constituição não interdita a formação de família por pessoas do mesmo sexo. Consagração do juízo de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um legítimo interesse de outrem, ou de toda a sociedade, o que não se dá na hipótese sub judice. Inexistência do direito dos indivíduos heteroafetivos à sua não equiparação jurídica com os indivíduos homoafetivos. Aplicabilidade do § 2º do art. 5º da Constituição Fede-ral, a evidenciar que outro s direitos e garantias, não expressamente listados na Constituição, emergem ‘do regime e dos princípios por ela adotados’, verbis: ‘Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte’.

5. DIVERGÊNCIAS LATERAIS QUANTO À FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO – Anotação de que os Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cezar Peluso convergiram no particular entendimento da impossibilidade de ortodoxo enquadramento da união homoafetiva nas espécies de família constitucionalmen-te estabelecidas. Sem embargo, reconheceram a união entre parceiros do mesmo sexo como uma nova forma de entidade familiar. Matéria aberta à conformação legislativa, sem prejuízo do reconhecimento da imediata auto-aplicabilidade da Constituição.

6. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL EM CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL (TÉCNICA DA ‘INTERPRETAÇÃO CONFOR-ME’) – RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA COMO FAMÍLIA – PROCEDÊNCIA DAS AÇÕES – Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723 do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica de ‘interpretação conforme a Constituição’. Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer sig-nificado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva.” (grifos nossos)

Nessa perspectiva, merece ser dada plena razão à parte autora da de-manda, vencedora do litígio em primeiro grau de jurisdição, quando sustenta a possibilidade de lhe ser judicialmente reconhecida a alegada união estável homoafetiva que, segundo alega, teria mantido por cerca de 08 (oito) anos com Leda Parreira Gonzales, falecida aos 28.10.2008.

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E, sendo assim, impõe-se analisar as provas carreadas aos autos, com vis-tas a determinar a existência ou inexistência de união estável homoafetiva entre a parte autora e a ex-servidora instituidora da pensão estatutária ora postulada.

Com efeito, é sabido que, para o reconhecimento do direito à pensão por morte de companheiro consectário da aplicação do art. 226, § 6º, da Lei Maior, a união estável deve estar cabalmente demonstrada, através de prova inequívoca da relação de convivência, por ocasião do falecimento. Existindo tal demonstração, o direito ao benefício não pode deixar de ser reconhecido, sendo certo que a dependência econômica entre companheiros, assim como ocorre entre cônjuges, é presumida, nos termos da lei previdenciária, razão pela qual desnecessária a sua comprovação para fins de concessão de pensão por morte à companheira ou cônjuge.

A esse respeito, confira-se a reiterada jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça e desta Egrégia Corte, in verbis:

ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO – PENSÃO POR MORTE – COM-PANHEIRO – LEI Nº 8.112/1990 – ART. 217 – DEPENDÊNCIA ECONÔMICA – COMPROVAÇÃO – DESNECESSIDADE – UNIÃO ESTÁVEL – INEXISTÊNCIA À ÉPOCA DO ÓBITO – 1. O art. 246, § 3º, da Constituição Federal, prestigiou a união estável, reconhecendo-a como entidade familiar. 2. Nos termos do art. 217 da Lei nº 8.112/1990, são beneficiários das pensões os companheiros designados que comprovem união estável, nada sendo dado ao intérprete acres-cer o requisito da dependência econômica, que deve ser presumida. 3. “Se a sentença se baseou em dois fundamentos suficientes e apenas um deles foi ataca-do na apelação e no recurso especial, opera-se o trânsito em julgado da decisão pelo outro, irrecorrido” (REsp 39.169/SP, Relator o Ministro Sálvio de Figueiredo, DJU de 23.05.1994). 4. Ademais, o quadro fático delineado pelas instâncias or-dinárias não autoriza a concessão do benefício pleiteado, dado que o ora recor-rente, à época do óbito da servidora, não preenchia a condição de companhei-ro, visto que a união estável já havia se desfeito. 5. Recurso improvido. (REsp 200101554682, Paulo Gallotti, STJ, 6ª T., DJ Data: 13.03.2006, p. 00385, RSTJ v. 00202, p. 00573)

EMBARGOS INFRINGENTES – PENSÃO POR MORTE – SERVIDOR PÚBLICO CIVIL – UNIÃO ESTÁVEL – I – Pretendeu a Parte Autora, ora Embargada, com o ajuizamento da presente demanda, a concessão de pensão decorrente do óbito de sua companheira. II – O MM. Juízo a quo julgou improcedente a pretensão au-toral ao argumento de que o Autor não comprovou sua dependência econômica em relação à falecida servidora. III – Irresignada, a Parte Autora interpôs o recurso de Apelação, o qual, por maioria, foi provido por este E. TRF, garantindo-lhe o direito à pensão pugnada. IV – No que concerne à necessidade de comprovação da existência de dependência econômica do Recorrente em relação à falecida servidora, entende-se que, segundo o art. 217 da Lei nº 8.112/1990, não há pre-visão legal exigindo tal comprovação. Outrossim, a jurisprudência majoritária confirma o entendimento de que se trata de presunção apenas iuris tantum a rela-

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ção de dependência econômica do companheiro em relação à falecida servidora pública. V – In casu, não foi afastada tal presunção de dependência econômi-ca: o Autor aduna aos autos comprovantes de aposentadoria em valor inferior a R$ 900,00 (novecentos reais), sendo certo, frise-se, segundo nossa jurisprudência, que não se pode afastar a dependência econômica o fato de o requerente possuir renda própria. VI – Embargos Infringentes da Parte Ré, o INSS, improvidos.

(TRF 2ª R., EIAC 200051010283922, Des. Fed. Reis Friede, 3ª S.Esp., e-DJF2R, Data: 07.05.2012, p. 21)

ADMINISTRATIVO – APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA – SERVIDORA PÚ-BLICA CIVIL – UNIÃO ESTÁVEL – PENSÃO ESTATUTÁRIA POR MORTE – COM-PANHEIRO – ARTS. 215 C/C 217, I, C, DA LEI Nº 8.112/1990 – PROVAS NOS AUTOS COMPROVANDO A EXISTÊNCIA DE UNIÃO ESTÁVEL COMO ENTI-DADE FAMILIAR – DESIGNAÇÃO EXPRESSA DO COMPANHEIRO COMO BE-NEFICIÁRIO – DESNECESSIDADE – DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA

1. Trata-se de remessa necessária e de apelação contra a r. sentença de procedên-cia, proferida nos presentes autos da ação de rito ordinário, em que se objetiva o reconhecimento de união estável do autor com a servidora falecida, bem como o direito ao recebimento de pensão por morte, desde a data do óbito de sua companheira.

[...]

5. No que concerne à necessidade de comprovação da existência de dependên-cia econômica do Recorrente em relação à falecida servidora, ao que parece, segundo dicção do art. 217 da Lei nº 8.112/1990, não há previsão legal exigindo tal comprovação. Destarte, para fins de percepção de pensão por companheiro, revela-se suficiente a comprovação da união estável, havendo presunção de de-pendência econômica do companheiro. Neste sentido, a jurisprudência majori-tária parece confirmar o entendimento de que se trata de presunção iuris tantum a relação de dependência econômica do companheiro em relação à falecida servidora pública.

6. Precedentes do Egrégio STJ e desta Corte.

7. Apelação e remessa necessária conhecidas e desprovidas.

(TRF 2ª R., Ap-Reex 200551015003962, Des. Fed. Jose Antonio Lisboa Neiva, 7ª T.Esp., e-DJF2R Data: 07.04.2011, p. 246/247) (grifamos)

Na hipótese dos autos, a união estável entre a Autora e a servidora fale-cida restou efetivamente comprovada através do conjunto probatório constante dos autos, valendo, nesse passo, transcrever parte da sentença em apreço, onde o MM. Juízo a quo relacionou as evidências que comprovam a existência de convivência homoafetiva:

“1) cópia do contrato de abertura de conta corrente conjunta (nº 000.114.5193) e de caderneta de poupança conjunta (010.114.5195), sendo ambas co-titulares.

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À fl. 28, anexa cópia da folha de talão de cheques referente à conta corrente conjunta em nome de ambas.

2) cópia da ‘Escritura Pública Declaratória de União Estável de Fato’ outorgada reciprocamente por Leda e pela Autora em 01.10.2008 e às fls. 37/38, a procura-ção outorgada por Leda em 01.10.2008 em favor da Autora

3) certidão do PIS/Pasep/FGTS (fl. 40) indicando a Autora como dependente de Leda.

4) concessão em favor da Autora, pelo Instituto Nacional do Seguro Social, de benefício previdenciário de Pensão por Morte (NB 21 390.439.855), tendo como instituidora Leda Parreiras Gonzalez.”

É de se constatar, ainda, a existência de cartões de crédito do Banco do Brasil e da Unicard/Unibanco, de titularidade de Leda Parreira Gonzales, nos quais a Autora também figurava como dependente da ex-servidora (fls. 29/31), merecendo registro o fato de serem contemporâneas ao óbito as faturas vindas aos autos, correspondentes aos meses de abril e maio de 2008, a demonstrar que a relação homoafetiva perdurou até o final da vida da ex-servidora.

Releva notar que a conta conjunta teve início em 23.09.2002 (fls. 26/27), corroborando os fatos alegados na inicial, no sentido de que Maria do Amparo e Leda conviviam desde 2000, passando a residir “sob o mesmo teto” (fl. 2) a partir de 2002. Corrobora, outrossim, o teor das declarações constantes da “Es-critura Pública Declaratória de União Estável” acostada às fls. 33/36 dos autos.

Consigne-se, ainda, que a própria União/AGU deixou de apresentar re-curso voluntário ressaltando as “robustas provas dos autos(declaração conjunta de convivência; conta conjunta em banco; e recebimento de pensão do INSS)”, aduzindo que a interposição de recurso importaria em ônus para a União (fl. 158).

Deste modo, é de se reconhecer que a existência de união estável ho-moafetiva entre a Autora e a servidora falecida restou suficientemente demons-trada através do conjunto probatório carreado aos autos, cabendo a concessão do benefício de pensão por morte, nos termos do assegurado na sentença, ora apreciada por força da remessa ex officio.

Na esteira desse entendimento, confira-se a jurisprudência desse Eg. Tri-bunal, inclusive da 8ª Turma Especializada, consoante os julgados a seguir, colhidos dentre vários de igual teor, in verbis:

CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – EX-COMBATENTE – PENSÃO POR MORTE – RELACIONAMENTO HOMOAFETIVO – DEPENDÊNCIA ECONÔMI-CA COMPROVADA – POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO – JU-ROS DE MORA – ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/1997 – HONORÁRIOS – REDU-ÇÃO – §§ 3º E 4º DO ART. 20 DO CPC

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1. Trata-se de Remessa Necessária e Apelação Cível interposta pela União. 2. No que tange ao prequestionamento, vale trazer à colação a Ementa do EREsp 165.212/MS, em que foi Relator o Ministro Humberto Gomes de Barros, publi-cado no DJ de 17.10.2001, que espelha o entendimento esposado por aquela Corte de Justiça: “Considera-se explícito o questionamento, quando o tribunal a quo, mesmo sem fazer referência expressa a dispositivos legais, nem declinar os números que os identificam no Ordenamento Jurídico, enfrenta as regras neles contidas.” 3. A jurisprudência de nossos Tribunais reconhece a igualdade de sta-tus jurídico entre uniões heterossexuais e homossexuais, descabendo qualquer discriminação em virtude da opção sexual do indivíduo, sob pena de violação dos arts. 3º, inciso IV e 5º, inciso I, da Constituição Federal. Precedentes: STJ, 6ª T., REsp 395.904/RS, Rel. Min. Quaglia Barbosa, Data: 06.02.2006, p. 365; TRF 1ª R., 2ª T., Agravo de Instrumento nº 200301000006970/MG, Rel. Des. Fed. Tourinho Neto, DJ Data: 29.04.2004; e TRF 2ª R., 3ª T., AC 323.577/RJ, Relª Desª Fed. Tânia Heine, DJU Data: 21.07.2003. 4. No caso vertente, a prova produzida nos autos permite concluir que efetivamente existia união homoafetiva entre o Autor e o Sr. Otto Petiz a qual perdurou por mais de 10 anos. Foram ouvidas como testemunhas os filhos e a nora do Sr. Otto Petiz que foram apresentados ao Apelado pelo falecido militar como seu companheiro. Tanto os depoimentos quanto os documentos apresentados comprovam a constituição de patrimônio comum, bem como a dependência econômica. 5. Quanto aos juros de mora, o Plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu, recentemente, que as dívidas ju-diciais decorrentes de verbas remuneratórias devidas a servidores ou empregados públicos pela União, bem como os pagamentos das pensões delas decorrentes, serão corrigidos em, no máximo, 6% ao ano. A decisão ocorreu no julgamen-to do Recurso Extraordinário nº 453740 em que a Fazenda Nacional contesta acórdão da Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Rio de Janeiro. O Relator, Ministro Gilmar Mendes, entendeu não haver razão para a Turma Recur-sal questionar normas federais. 6. Por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal julgou constitucional a fixação do percentual de juros de mora previstos no art. 1º-F, da Lei nº 9.494/1997, por não caracterizar afronta ao art. 5º, caput, da Constituição Federal. 7. Em relação aos honorários, in casu, considerando o trabalho dispendido, a complexidade da lide e o tempo necessário ao recebimen-to da verba em questão, a verba honorária deve ser arbitrada, com fulcro nos §§ 3º e 4º, do art. 20, da Lei Instrumental Civil, em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. 8. Dado parcial provimento à Apelação e à Remessa Necessá-ria. (TRF 2ª R., 8ª T.E., AC 200551010073664, Rel. Des.Fed. Raldênio Bonifácio Costa, DJU 23.01.2009, p. 126/127)

SERVIDOR – PENSÃO – UNIÃO HOMOAFETIVA – COMPROVAÇÃO

I – O STF firmou precedente reconhecendo a união estável entre pessoas do mesmo sexo ao julgar a ADI 4277/DF e a ADPF 132/RJ, em pronunciamento com eficácia erga omnes e efeito vinculante que apresentou interpretação conforme à Constituição do art. 1.723 do CC, à luz do art. 226, § 6º, da CF. Comprovada a união estável e duradoura com a falecida servidora e sendo presumida a depen-

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dência econômica entre companheiros, é devida a pensão em favor da autora, nos termos do art. 217, I, c, da Lei nº 8.112/1990.

II – No que pertine, por sua vez, à data para início do pagamento da verba plei-teada, considerando que inexiste nos autos comprovação de que a Parte Autora teria ingressado com pedido administrativo para a concessão da pensão em testi-lha, deve-se considerar o dies a quo para pagamento do benefício em liça a data da citação da União Federal.

III – Remessa Necessária parcialmente provida.

(TRF 2ª R., 7ª T.E., REO 20095101010237149, Rel. Des. Fed. Reis Friede, e-DJF2R 13.01.2014)

ADMINISTRATIVO – APELAÇÃO – SERVIDOR PÚBLICO – UNIÃO HOMOAFE-TIVA – PENSÃO POR MORTE – POSSIBILIDADE – DESIGNAÇÃO – DESNECES-SIDADE – COMPROVAÇÃO DA CONVIVÊNCIA

1. No tocante à união homoafetiva, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgarem a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Argui-ção de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceram a união estável para casais do mesmo sexo (Plenário, unânime, julgamento em 05.05.2011), em pronunciamento com eficácia erga omnes e vinculante.

2. Há nos autos suporte probatório suficiente à comprovação da existência da união homoafetiva.

3. Mesmo na união estável (união entre pessoas de sexos diferentes), a falta de designação expressa do companheiro como beneficiário do servidor não impede a concessão de pensão, conforme a jurisprudência tranquila, inclusive desta Cor-te (AC 2005.50.01.0116624, Rel. Des. Fed. Frederico Gueiros, J. 21.09.2009), e nada autorizaria solução diversa para o caso da união homoafetiva.

4. A dependência entre os cônjuges ou companheiros é presumida, nos termos do § 4º do art. 16 da Lei nº 8.112/1990, em sintonia com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal. Sobre o tema, este e. TRF 2ª Região já decidiu que “a de-pendência econômica não constitui requisito autônomo para a caracterização da união estável, sendo inerente à convivência a mútua cooperação para o custeio familiar. A Constituição Federal, em seu art. 226, § 3º, não a exige, não sendo, de qualquer modo, razoável pretender que um dos companheiros dependa intei-ramente do outro para sobreviver e que não tenha renda própria, especialmente à vista da realidade atual, na qual homem e mulher buscam sua independên-cia financeira” (TRF 2ª R., Ap-Reex 2006.5101.0183589, Des. Fed. Guilherme Couto, 6ª T.Esp., 03.11.2009)

5. De qualquer maneira, a dependência econômica restou comprovada nos autos e ressaltada na sentença recorrida.

6. Remessa necessária e apelação conhecidas e desprovidas.

(TRF 2ª R., 7ª T.E., Ap-Reex 201051010207895, Rel. Des. Fed. José Antonio Lisboa Neiva, e-DJF2R 29.11.2012) (grifamos)

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Cumpre observar, por derradeiro, que inexiste óbice à cumulação entre a pensão por morte ora postulada, oriunda dos cofres da União, e o benefício pago pelo Instituto Nacional do Seguro Social (fls. 40 e 42), na medida em que, na condição de médica (fls. 44 e 47), a falecida servidora podia cumular em vida ambos os benefícios, por autorização constitucional.

Por todo o exposto, nego provimento à remessa necessária.

É como voto.

Marcelo Pereira da Silva Desembargador Federal

voto-vIsta

O Exmo. Desembargador Federal Guilherme Diefenthaeler:

Trata-se de ação que visa à concessão de pensão por morte, com fulcro no art. 217, inciso I, alínea c, da Lei nº 8.112/1990.

De acordo com o entendimento já externado oralmente na sessão de julgamento do dia 15.04.2015, ao qual me reporto, consoante notas taquigrá-ficas acostadas às fls. 27/31 dos autos físicos, entendo que, no caso, além do reconhecimento da união estável, é também imprescindível, na atualidade, a comprovação de dependência econômica do companheiro(a) em relação ao segurado(a) para fins de concessão de pensão por morte, cingindo-se a diver-gência neste único aspecto quanto ao Voto exarado pelo Ilustre Relator Desem-bargador Federal Marcelo Pereira (fls. 14/24 autos físicos), uma vez que não há qualquer ressalva a ser feita no tocante à conclusão de configuração da união estável na hipótese dos autos.

A jurisprudência majoritária que tem se posicionado no sentido de que dependência econômica durante a vigência do casamento ou da união es-tável é presumida, fundamenta-se na Lei Previdenciária (art. 16, § 4º, da Lei nº 8.213/1991) inaplicável em caso como o presente, em que se trata de con-cessão de pensão estatutária, com base na Lei nº 8.112/1990.

Ainda que haja o dever de mútua assistência entre cônjuges e compa-nheiros, cabe ao postulante à pensão comprovar satisfatoriamente que não de-tém condições de prover o próprio sustento por seus meios.

Nesse sentido, inclusive, recentemente, a unanimidade, decidiu o Plená-rio deste Tribunal, conforme se pode observar da ementa a seguir colacionada:

“MANDADO DE SEGURANÇA – PENSÃO POR MORTE – UNIÃO ESTÁVEL – DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NÃO CARACTERIZADA – PEDIDO DENEGADO – Trata-se de mandado de segurança impetrado contra ato do Conselho Admi-

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nistrativo deste Tribunal, que indeferiu o pedido de pensão por morte de juiz fe-deral, requerido por defensora pública do estado, na qualidade de companheira, ante a ausência de pressuposto fundamental para a percepção do benefício, qual seja, dependência econômica. O deferimento de pensão por morte ao compa-nheiro em face do óbito do segurado, prevista no art. 217, inciso I, alínea c, da Lei nº 8.112/1990, submete-se a dois requisitos cumulativos imprescindíveis: 1º) convivência em comum, de natureza marital (união estável) e 2º) dependên-cia econômica com relação ao instituidor do benefício. Na hipótese vertente, não obstante a comprovação do vínculo de união estável, não se verifica a depen-dência econômica, visto que a impetrante, como defensora pública do estado do Rio de Janeiro, percebe renda muito similar ao benefício pleiteado, suficientes ao gozo de um estilo de vida acima dos padrões medianos da sociedade, não se justificando, portanto, a concessão da segurança para o adimplemento da pensão por morte de seu companheiro, juiz federal. O mandado de segurança se consti-tui em rito de natureza especial, cujo objetivo é garantir o direito líquido e certo do demandante, por meio de provas pré-constituídas, o que não restou configu-rado na hipótese, o que não impede a requerente de valer-se das vias ordinárias. Segurança denegada.” (Grifei)

(TRF 2ª R., Pleno, MS 200602010125253, Relª Salete Maccalóz, DJe 27.03.2014)

E semelhante entendimento adotou a Sexta Turma Especializada deste Tribunal, quando do julgamento da Apelação Cível nº 2006.51.01.0104227, verbis:

“APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO ADMINISTRATIVO – PENSÃO POR MORTE DE SERVIDOR CIVIL – REGIME ESPECIAL DA PREVIDÊNCIA – COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS DA UNIÃO ESTÁVEL (COMPANHEIRISMO) – DEPENDÊN-CIA ECONÔMICA – INEXISTÊNCIA – CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO – AUTORA BENEFICIÁRIA DE DUAS OUTRAS PENSÕES ANÁLISE DE PROVA – PROVI-MENTO – 1. O tema em debate diz respeito à suposta condição de pensionista em razão da morte de ex-servidor público civil na condição de companheira. 2. O juiz sentenciante considerou que não houve demonstração do alegado di-reito da Apelante, sob o fundamento da ausência de dependência econômica 3. Após o advento da Constituição Federal de 1988, mormente diante da regra expressa contida no art. 226, § 3º, finalmente foi reconhecida oficialmente a família constituída entre companheiros, inclusive para fins de proteção estatal. 4. Há conjunto probatório suficiente no sentido da demonstração de que a Ape-lante mantinha relação de companheirismo com o servidor público civil durante a vida deste. Para fins de reconhecimento do direito à pensão civil em favor de companheira, é essencial a verificação dos pressupostos necessários para a constituição e manutenção da união estável. 5. Há que se considerar que a com-panheira do servidor público civil é dependente econômica presumida, sendo bastante a comprovação do companheirismo (ou ‘união estável’, na terminologia constitucional). Tal questão já foi objeto de apreciação pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos REsp 803.657/PE (Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima) e REsp 383.348/SC (Rel. Min. Paulo Gallotti). Tal conclusão decorre da circunstân-

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cia de, durante o companheirismo, existir dever recíproco de assistência (mate-rial), conforme previsto no art. 1.724, do Código Civil em vigor (e art. 2º, da Lei nº 9.278/1996, em vigor na época do falecimento do servidor civil). 6. No caso concreto, a presunção de dependência econômica é afastada pela circunstância de a autora ser pensionista em dois outros benefícios uma pensão militar e outra pensão previdenciária, o que evidencia a presença de prova cabal no sentido contrário à sua pretensão. 7. Não havia dependência econômica relativamente ao valor da aposentadoria recebida pelo falecido companheiro, não há como ser reconhecido o alegado (mas inexistente) direito à pensão civil. 8. Remessa necessária e recurso da União conhecidos e providos, para o fim de reformar a sentença. Recurso adesivo da autora improvido.” (Grifei)

(TRF 2ª R., 6ª T.Esp., AC 200651010104227, Rel. Des. Fed. Guilherme Calmon Nogueira da Gama, e-DJF2R 21.07.2010, p. 251 – unânime)

Não se pode imputar à União Federal e, portanto, a toda a coletividade o pagamento de benefício após a morte de servidor, com o qual não teria ele sido onerado em vida, sem que haja cabal demonstração da dependência eco-nômica.

Portanto, o direito do beneficiário de receber o pensionamento é indisso-ciável da sua real necessidade (impossibilidade de custear a própria sobrevivên-cia) e na ausência de comprovação da dependência econômica, ônus probató-rio que lhe compete (art. 333, I, do CPC), afigura-se indevido.

E comprovada a dependência econômica, deve ainda ser verificado por quanto tempo o pagamento do benefício é necessário ser alcançado, sendo in-factível a um país a concessão de pensão vitalícia a pessoas jovens e saudáveis, que podem e devem buscar o seu sustento por meios próprios sem onerar a sociedade, pessoas essas que podem até mesmo vir a estabelecer novas relações que lhes assegurem mútua assistência.

Diante do exposto, dou provimento à remessa necessária, para reformar a sentença e julgar improcedente a pretensão autoral, diante da ausência de comprovação da dependência econômica.

É como voto.

Guilherme Diefenthaeler Desembargador Federal

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 10.08.2015Apelação Cível nº 0016904‑70.2004.4.03.6100/SP2004.61.00.016904‑9/SPRelatora: Desembargadora Federal Diva MalerbiApelante: Ministério Público FederalProcurador: SP174154 Suzana Fairbanks Lima de Oliveira e outro(a)Apelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSAdvogado: SP125840 Almir Clovis Moretti e outro(a)

SP000030 Hermes Arrais AlencarApelado(a): Sadayoshi Kanno e outros(as)

Celia Suemi Morikawa Kanno Milton Fernando Kanno Carlos Rodrigo Kanno Eric Rafael Kanno

Advogado: SP054840 Mariangela Pozzi Avellar e outro(a)Nº Orig.: 00169047020044036100 21ª Vr. São Paulo/SP

ementaAdmINIStrAtIvo – proCeSSuAl CIvIl – ApelAçÕeS – Ação CIvIl pÚBlICA – ImproBIdAde AdmINIStrAtIvA – leI Nº 8.429/1992 (lIA) – ImproCedêNCIA NA orIgem – deSCArte de provA empreStAdA dA eSFerA CrImINAl – INAdmISSIBIlIdAde – jurISprudêNCIA pACíFICA do Stj e do trF 3 pelA ACeItAção deSSA modAlIdAde de provA – julgAmeNto ANteCIpAdo dA lIde – AuSêNCIA de ApreCIAção A reSpeIto de provA requerIdA – ImproCedêNCIA FuNdAdA em INSuFICIêNCIA de provAS – deSCABImeNto – CerCeAmeNto do dIreIto de Ação – ANulAção dA SeNteNçA – mANuteNção CAutelAr dA INdISpoNIBIlIdAde de BeNS – reCurSoS provIdoS

Trata-se de apelações interpostas pelo MPF e pelo INSS contra a r. sen-tença que, nesta ação civil pública versando improbidade administrativa, decidiu antecipadamente a lide, descartou prova emprestada da seara criminal consistente em documentação oriunda de quebra de sigilo ban-cário devidamente autorizada em inquérito policial e, por insuficiência probatória, julgou improcedente os pedidos.

Parecer da PGR pelo provimento dos recursos.

Consoante pacífica jurisprudência do STJ e deste TRF 3, respeitados o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, é possível que a prova regularmente produzida no âmbito criminal seja aproveitada na

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ação civil pública promovida com o objetivo de sancionar atos de im-probidade administrativa, uma vez que as ações tidas como criminosas podem, em tese, configurar também atos ímprobos, exigindo responsabi-lização em ambas as esferas, que, por sinal, são independentes (art. 12, caput, da LIA).

Ainda nos termos de harmoniosa jurisprudência da Corte Superior, ao Magistrado, mesmo sendo o destinatário da prova, não é dado decidir antecipadamente a lide sem análise da pertinência das provas requeridas e, posteriormente, julgar improcedente o pedido por insuficiência proba-tória. Cerceamento do direito de ação configurado.

A Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.366.721/BA, sob a sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), consolidou o entendimento de que o decreto de indisponibili-dade de bens em ação civil pública por ato de improbidade administrati-va constitui tutela de evidência e dispensa a comprovação de dilapidação iminente ou efetiva do patrimônio do legitimado passivo, uma vez que o periculum in mora está implícito no art. 7º da Lei nº 8.429/1992 (LIA). Dessa forma, sem que se expresse entendimento a propósito da matéria de fundo, presentes robustos indicativos de prática de atos de improbi-dade administrativa, os quais, em parte, já foram inclusive reconhecidos na esfera administrativa, fica mantida, cautelarmente, a indisponibilidade dos bens conforme decretada pelo MM. Juízo de origem, sem prejuízo de que naquela instância sobrevenha nova apreciação a respeito.

Apelos providos, anulando-se a r. sentença e determinando-se que, com a aceitação da prova emprestada e apreciação desta e das demais pro-vas requeridas pelas partes, segundo o livre convencimento motivado do MM. Juízo a quo, esta ação civil pública tenha regular prosseguimento em primeiro grau de jurisdição.

aCÓRDão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, de-cide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento às apelações, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 30 de julho de 2015.

Diva Malerbi Desembargadora Federal

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ReLatÓRIo

A Senhora Desembargadora Federal Diva Malerbi (Relatora): Trata-se de apelações interpostas em face da r. sentença pela qual, nesta ação civil pública versando improbidade administrativa, julgado improcedente, por ausência de provas, o pedido formulado pelos autores Ministério Público Federal e Insti-tuto Nacional do Seguro Social – INSS contra Sadayoshi Kanno, Célia Suemi Mirikawa Kanno, Milton Fernando Kanno, Carlos Rodrigo Kanno e Eric Rafael Kanno.

Resumidamente, sustentou-se na petição inicial (fls. 02/22) que Sadayoshi Kanno é servidor público federal, ocupante do cargo de auditor fiscal do INSS, cônjuge da corré Célia Suemi Mirikawa Kanno e pai dos demais requeridos, tendo todos apresentado evolução patrimonial incompatível com os respectivos rendimentos, o que seria fruto de atos de improbidade administrativa capitula-dos na Lei nº 8.249/1992 (LIA), culminando em enriquecimento ilícito e atenta-do contra os princípios da Administração.

Assim, requereu-se a condenação dos corréus nas sanções previstas no art. 12, I e II, da LIA, dada a infringência dos arts. 9º, caput e incisos VII e X e 11, caput e incisos I e II, também daquele diploma legal. Cautelarmente, pleiteou-se, ainda, a decretação da indisponibilidade de bens desses requeri-dos, a decretação de segredo de justiça, bem como autorização para juntada de documentos oriundos da quebra de sigilos fiscal e bancário determinados no Juízo criminal.

Com a exordial vieram os documentos anexados às fls. 24/332, incluído o procedimento investigatório preliminar presidido pelo Ministério Público Fe-deral.

Decretado o segredo de justiça (fls. 338/340) e emendada a petição ini-cial (fls. 352/358), o pedido liminar foi deferido, determinando-se a indisponi-bilidade dos bens dos corréus até o limite de R$ 839.003,28.

Notificados, os requeridos, primeiramente, requereram a liberação de parte do bloqueio referente a contas bancárias sede de proventos, salá-rios e benefício previdenciário do pai da corré Célia Suemi Mirikawa Kanno (fls. 440/443).

O MM. Juiz a quo manteve a indisponibilidade assim como ordenada anteriormente (fls. 456).

Noticiou-se a interposição de agravo de instrumento (fls. 461), ao qual dado parcial efeito suspensivo para que, entre o mais, fossem desbloqueados os valores referentes a benefício previdenciário pago em favor do pai de Célia Suemi Mirikawa Kanno e os relativos a salários percebidos por Carlos Rodrigo Kanno (fls. 497/499).

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Manifestaram-se os corréus (fls. 517/546), requerendo, em suma, o inde-ferimento da exordial, dada a inexistência de provas mínimas que amparassem a pretensão dos autores.

Pelo decisum às fls. 561/563, as preliminares foram afastadas e a petição inicial recebida nos termos do art. 17, § 9º, da LIA, determinando-se, também, fosse o INSS intimado para que manifestasse interesse em integrar a lide.

O INSS, então, requereu sua inclusão no polo ativo, o que deferido às fls. 821.

Os corréus foram citados e ofereceram contestações, basicamente, ne-gando que houvera enriquecimento ilícito de sua parte, uma vez que os res-pectivos bens possuem origem lícita e comprovada (fls. 616/628 – Eric Ra-fael Kanno; fls. 640/661 – Carlos Rodrigo Kanno; fls. 663/684 – Célia Suemi Morikawa Kanno; fls. 686/707 – Milton Fernando Kanno e fls. 709/741 – Sadayoshi Kanno).

O Ministério Público Federal requereu expedição de ofício ao Juízo Cri-minal solicitando documentação produzida em Inquérito Policial que apura os mesmos fatos, bem como arrolou testemunha (fls. 857/870).

Em nova manifestação, o Parquet Federal trouxe documentos relativos à quebra de sigilo bancário determinado pelo Juízo da 1ª Vara Criminal de São Paulo, onde tramita o Inquérito Policial instaurado contra o corréu Sadayoshi Kanno, sustentando que a movimentação financeira revelada demonstra incom-patibilidade com a renda apresentada pelos requeridos (fls. 882/888).

Os corréus trouxeram aos autos declarações retificadoras de imposto de renda (fls. 1.449/1.520).

O INSS informou a instauração de comissão de processo administrativo disciplinar destinada a apurar as irregularidades apontadas nesta ação.

Nova manifestação dos corréus (fls. 1.552/1.553), insistindo na impro-cedência desta demanda, o que refutado pelo Ministério Público Federal, que informou, ainda, que Sadayoshi Kanno foi denunciado pela suposta prática dos crimes de concussão e corrupção ativa (fls. 1.578/1.589 e 1.596/1.599).

Outra manifestação dos requeridos (fls. 1.611/1.614), reiterando os argu-mentos já apresentados.

O coautor INSS requereu a sua substituição pela União Federal, tendo em vista as alterações introduzidas pela Lei nº 11.457/2007 (fls. 1.622/1.624). O Ministério Público Federal não concordou com tal substituição processual (fls. 1.626/1.629), que restou indeferida (fls. 1.636).

Sobreveio a r. sentença (fls. 1.637/1.651) pela qual, consoante já adian-tado, julgado improcedente o pedido, por insuficiência de provas, extinguindo-

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-se o feito com resolução do mérito nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil. Da fundamentação, se extrai, em síntese, que o MM. Magistrado de piso, conquanto entendesse que recursos financeiros ingressaram nas contas dos corréus de forma desproporcional em cotejo às respectivas rendas, carac-terizando, em tese, o enriquecimento ilícito, afirmou, por outro lado, serem ilegais as provas que o levaram a tal conclusão, eis que extraídas livremente de autos de Inquérito Policial onde autorizada a quebra do sigilo bancário. Acrescentou, ainda, que a transposição de provas obtidas na instância criminal se deu irregularmente nestes autos, uma vez que não autorizada nem por ele, Juiz Presidente desta ação civil pública e, nem tampouco, pelo Juízo Criminal.

O INSS apelou (fls. 1.667/1.679) argumentando, em síntese, que a pro-va emprestada é admitida tanto pela doutrina como pela jurisprudência pátria, desde que observado o preceito do contraditório, ou seja, as partes envolvidas devem ter participado do contraditório desenvolvido no processo em que pro-duzida a prova que se pretende emprestar, como ocorreu nesta hipótese. Dessa forma, requereu a inversão do julgado.

O Ministério Público Federal também recorreu (fls. 1.685/1.706) alegan-do, em resumo, que não são ilegítimas ou ilícitas as provas oriundas de inqué-rito policial e trasladadas aos presentes autos, uma vez que atendidos os princí-pios do contraditório e da ampla defesa. Asseverou que, apesar de várias vezes ter pleiteado ao MM. Juízo a quo a utilização das provas amealhadas na seara criminal, este não se manifestou a respeito, nada decidindo quando tais pro-vas foram anexadas aos autos, as quais foram recebidas sem qualquer ressalva. Destacou ser patente a incompatibilidade entre os rendimentos dos apelados e as correspondentes movimentações financeiras. Por fim, requereu a “cabal reforma da r. sentença, de modo a se considerar válido todo o conjunto proba-tório acostado aos autos, inclusive a documentação obtida pela quebra de si-gilo bancário obtida nos autos do Inquérito Policial nº 2003.61.81.0006045-2, e convertendo-se o julgamento em diligência, retornando os autos ao MM. Juízo a quo para o correto prosseguimento da instrução processual, quando deverão ser acolhidas as demais provas pleiteadas pelo autor”.

Os recursos foram recebidos nos efeitos devolutivo e suspensivo (fls. 1.733).

Contrarrazões e manifestação dos corréus às fls. 1.735/1.734 e 1.741/1.744, pelas quais, em suma, pugnou-se pela manutenção da r. sentença, bem como requereu-se o afastamento da indisponibilidade de seus bens decre-tada cautelarmente, afastando-se, nesse ponto, o efeito suspensivo conferido às apelações.

O MM. Juízo de origem, pela decisão às fls. 1.750, manteve o recebimen-to dos recursos em ambos os efeitos legais.

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A douta Procuradoria Regional da República da 3ª Região juntou aos autos cópia do Parecer Jurídico PGFN/COJED/Nº 1728/2011 e Portaria nº 457, de 15.09.2011, publicada nos autos do Processo Administrativo Disciplinar nº 16302.000058/2010-79, instaurado pela Corregedoria Regional da Receita Federal do Brasil – 8ª Região/SP, no qual o corréu Sadayoshi Kanno, ora apela-do, foi demitido do serviço público em razão de prática de atos de improbidade administrativa (fls. 1.766/1.816).

Pelo despacho às fls. 1.820, a Exma. Senhora Desembargadora Federal Regina Helena Costa, então Relatora deste processo, concedeu vista às partes para que se manifestassem sobre os documentos anexados.

Os requeridos ofereceram manifestação (fls. 1.823/1.847), noticiando que, contra o aludido ato de demissão, Sadayoshi Kanno interpôs Mandado de Segurança junto ao E. Superior Tribunal de Justiça, o qual, naquele momento, ainda estava pendente de apreciação do pedido liminar pelo Ministro Relator.

A ilustrada Procuradoria Regional da República da 3ª Região apresentou parecer (fls. 1.853/1.858), assim ementado:

“1. Ação civil pública de improbidade administrativa. 2. A doutrina e a jurispru-dência se posicionaram de forma favorável à ‘prova emprestada’, não havendo como suscitar nenhuma nulidade quando respeitado o contraditório e a ampla defesa no âmbito do processo anterior 3. Parecer pelo provimento total das ape-lações interpostas, para anular a sentença e julgar válida a prova constante dos autos, fazendo retornar o feito à instância de origem, com vistas ao regular pros-seguimento da instrução processual.”

É o relatório.

Diva Malerbi Desembargadora Federal

voto

Inicialmente, destaco que a demissão do corréu Sadayoshi Kanno, ora apelado, do cargo de Auditor Fiscal do INSS, ocorrida no curso deste processo, não tem o condão de ocasionar perda superveniente de objeto.

Com efeito, a sanção de perda de função pública não é a única prevista para os casos de improbidade administrativa, os quais, nos termos do art. 12, incisos I, II e II da LIA, englobam, também, perda de bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, suspensão de direi-tos políticos (como decorrência da perda da função pública) e pagamento de multa civil, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato (art. 12, caput).

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Logo, mesmo que uma das penas buscadas nesta ação civil pública ver-sando improbidade administrativa tenha sido alcançada na esfera administrati-va, em relação a Sadayoshi Kanno, ainda assim persiste o interesse dos autores na aplicação das outras sanções. Outrossim, não se pode perder de vista que persiste, integralmente, o interesse processual no tocante aos demais corréus indicados nesta ação.

No que diz respeito ao mérito, a controvérsia, nesta oportunidade, cinge--se em verificar se é possível a utilização de prova emprestada da seara penal em ação civil pública promovida com o intuito de sancionar atos de improbi-dade administrativa.

A prova que se pretende utilizar, na hipótese, consiste em documentos oriundos de quebra de sigilo bancário, judicialmente autorizada no bojo de in-quérito penal instaurado contra o corréu Sadayoshi Kanno, o qual, basicamente, investiga os mesmos fatos ora sob análise.

A propósito, verifico que o MM. Juízo a quo, ao julgar improcedente a demanda com fundamento na insuficiência de provas, assentou o seguinte (fls. 1.650/1.651, in verbis):

“Nos termos da Lei Complementar nº 105/2001, a quebra do sigilo pode ser de-cretada quando necessária para apuração de qualquer ilícito e, conquanto traga rol exemplificativo de crimes onde essa providência se impõe, emprega expres-são genérica, o que permite concluir autorização de uso também na apuração de ilícitos administrativos e cíveis.

Vale dizer, é admissível o uso de informações protegidas pelo sigilo bancário, mediante requerimento da parte interessada e desde que exista expressa autoriza-ção judicial tanto para a quebra, quanto para o compartilhamento desses dados, porque constitui diligência excepcional e extraordinária, uma exceção ao direito à intimidade e à vida privada.

No caso vertente, embora a prova trazida pelo Ministério Público Federal seja lícita, ao entendimento de que ilícita é aquela ‘prova’ que jamais pode ser ad-mitida, pois autorizada a quebra de sigilo pelo juízo criminal, entendo que seu transplante para essa ação é ilegal, isto é, produzida com violação do ordena-mento jurídico.

De fato, não há autorização do juízo criminal, responsável pela ordem de quebra para o compartilhamento das informações e, igualmente, a prova veio a estes autos sem autorização deste juízo, em que pese o requerimento do Ministério Público Federal.

Como se viu, se a demonstração do ato ímprobo depende dos elementos contidos em prova que viola a ordem legal, impõe-se a desconsideração de toda a docu-mentação protegida por sigilo bancário e, por consequência, entendo insuficien-te a prova para caracterização da improbidade administrativa [...]”

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Vê-se que o decisum recorrido, conquanto reconhecesse que a quebra de sigilo bancário foi legalmente procedida no âmbito do inquérito policial, entendeu que o correspondente transplante para esta ação civil pública se dera irregularmente, eis que não precedida de autorização do Juízo Criminal e nem tampouco do consentimento dele, MM. Juiz competente.

Respeitosamente, tem-se que a conclusão afirmada na r. sentença não harmoniza com a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça e deste E. Tribunal Regional Federal de 3ª Região.

Com efeito, respeitados o devido processo legal, a ampla defesa e o con-traditório, é possível que a prova regularmente produzida no âmbito criminal seja aproveitada na ação civil pública ajuizada com o objetivo de sancionar atos de improbidade administrativa, uma vez que as ações tidas como crimino-sas podem, em tese, configurar também atos ímprobos, exigindo responsabili-zação em ambas as esferas, que, por sinal, são independentes (art. 12, caput, da LIA). Confira-se:

“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO RE-CURSO ESPECIAL – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – OMISSÃO – ART. 535, II, DO CPC – NÃO CARACTERIZADA – DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS – USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO STF – TRANSCRIÇÃO NO ACÓRDÃO DE ASPECTOS FÁTICOS NARRADOS NA INICIAL – FASE PREAMBULAR – ART. 17, §§ 7º, 8º E 9º, DA LEI Nº 8.429/1992 – POSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE OMISSÃO E VÍCIO NA FUNDAMENTAÇÃO – PROVA EMPRESTADA – RE-GULARIDADE FUNDADA EM PRESSUPOSTO DE FATO – INVIABILIDADE DE REEXAME – SÚMULA Nº 7/STJ

1. Não cabe ao STJ apreciar a alegada violação de dispositivos constitucionais, ainda que para fins de prequestionamento, sob pena de usurpação da competên-cia do Supremo Tribunal Federal.

2. A análise da controvérsia a partir de transcrição da exordial não caracteriza omissão no acórdão, tampouco vício de motivação, nada impedindo que o Juízo adote, como razão de decidir, os elementos fáticos trazidos pela parte autora.

3. Tal proceder adquire mais relevo na fase de recebimento da inicial nas ações de improbidade (art. 17, §§ 7º, 8º e 9º, da Lei nº 8.429/1992), caracterizada pelo estreitamento do objeto cognoscível.

4. A conclusão do Tribunal de origem pela regularidade da prova emprestada, acentuando que a quebra de sigilo das comunicações telefônicas foi precedida de autorização judicial, impede seu reexame na via especial, por demandar o revolvimento do contexto fático-probatório. Incidência da Súmula nº 7/STJ.

5. Não há falar em nulidade da prova colhida mediante interceptação telefôni-ca, por mera extrapolação do prazo de quinze dias constante do art. 5º da Lei nº 9.296/1996, uma vez que a medida pode ser prorrogada por períodos suces-

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sivos, desde que precedida de autorização judicial devidamente fundamentada. Precedentes.

6. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido da admissibilidade do trans-plante de prova colhida em persecução penal ao processo em que se imputa a prática de ato de improbidade, desde que assegurado o contraditório e a ampla defesa no processo em que utilizada.

7. A exordial em ação de improbidade só pode ser rejeitada, em consonância com o previsto no art. 17, §§ 7º e 8º, da Lei nº 8.429/1992, quando manifesta a improcedência da ação ou a inadequação da via eleita.

8. Assim, rever a conclusão do acórdão recorrido quanto à ocorrência de indícios mínimos atos a deflagrar a ação de improbidade atrai o óbice da Súmula nº 7/STJ, por demandar o reexame dos elementos de prova. Precedentes.

9. Agravo regimental a que se nega provimento.”

(STJ, AgRg-REsp 1299314/DF, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, Julgado em 23.10.2014, DJe 21.11.2014, grifei)

“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPRO-BIDADE ADMINISTRATIVA – POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL – COBRAN-ÇA DE PROPINA – PREQUESTIONAMENTO AUSENTE: SÚMULA Nº 211/STJ – PROVA EMPRESTADA – ESFERA PENAL – POSSIBILIDADE – EXISTÊNCIA DOS FATOS – MODIFICAÇÃO DE PREMISSA INVIÁVEL – SÚMULA Nº 7/STJ – AU-SÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO NÃO CONFIGURADA – PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA – ART. 12 DA LEI Nº 8.429/1992 – PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – SÚMULA Nº 7/STJ

1. É inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida pelo Tribunal de origem, por falta de prequestionamento.

2. A jurisprudência do STJ é firme pela licitude da utilização de prova empresta-da, colhida na esfera penal, nas ações de improbidade administrativa.

[...]

8. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido.”

(STJ, REsp 1297021/PR, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., Julgado em 12.11.2013, DJe 20.11.2013, grifei)

“PROCESSO CIVIL – ADMINISTRATIVO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL – PRERROGATIVA DE FORO – ARESTO COM FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS – AUSÊNCIA DE INTER-POSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO – LIA – APLICABILIDADE – RECE-BIMENTO DA INICIAL – FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE – PROVA EMPRES-TADA – POSSIBILIDADE

1. A ausência de prequestionamento impede o exame da suposta ofensa aos arts. 57, I e XX; 259, IV, da LC 75/1993. Aplicação da Súmula nº 282/STF.

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2. No que concerne aos arts. 18, II, b, e 240, V, a, b e c, da LC 75/1993, o recurso também não ultrapassa as barreiras da admissibilidade, pois a questão acerca da prerrogativa de foro foi apreciada com fundamento na Constituição Federal (art. 105, I, a, da CF). Por outro lado, a ausência de interposição de recurso ex-traordinário, quanto a esse ponto, torna sem utilidade o apelo especial, uma vez que a fundamentação com base na Constituição da República seria suficiente para manter a higidez do acórdão recorrido. Incidência da Súmula nº 126/STJ.

3. As questões apontadas pelo recorrente como omissas foram efetivamente en-frentadas pelo Tribunal a quo, não havendo violação do art. 535 do CPC.

4. A decisão que recebe a inicial da ação de improbidade deve conter funda-mentação, ainda que de maneira concisa. Nessa fase processual, prevalece o princípio do in dubio pro societate, não se exigindo do magistrado uma cognição exauriente. Precedentes.

5. No caso, embora a decisão de Primeiro Grau não esteja minudentemente fun-damentada, houve menção aos termos expostos na inicial, tendo ainda a matéria suscitada na manifestação preliminar sido submetida ao Tribunal por meio de agravo de instrumento. Com efeito, os obstáculos aduzidos pelo recorrente para o processamento do feito – a exemplo do foro por prerrogativa de função, da aplicabilidade da LIA, das provas obtidas por interceptação telefônica – foram rebatidos pelo Tribunal a quo, operando-se o efeito substitutivo sobre a decisão de piso. Nesse contexto, não houve prejuízo para a defesa, devendo prevalecer a instrumentalidade do processo.

6. A Lei nº 1.079/1950 (arts. 40 e 40-A), que não admite interpretação extensiva, faz referência aos crimes de responsabilidade do Procurador-Geral da República e dos membros do Ministério Público da União no exercício de função de chefia nas respectivas unidades regionais e locais, o que significa que os demais mem-bros do Parquet não enquadrados nos citados dispositivos estão exclusivamente submetidos à LIA.

7. Ademais, consoante a jurisprudência do STJ, ressalvada a hipótese dos atos de improbidade cometidos pelo Presidente da República, aos quais se aplica o regime especial previsto no art. 86 da Carta Magna, os agentes políticos sujeitos a crime de responsabilidade não são imunes às sanções por ato de improbidade previstas no art. 37, § 4º, da CF.

8. Em relação às provas obtidas por interceptação telefônica, não há ilegalidade na utilização desses elementos na ação de improbidade, quando resultarem de provas emprestadas de processos criminais. Matéria pacificada no STJ.

9. Recurso especial não provido.”

(STJ, REsp 1190244/RJ, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, Julgado em 05.05.2011, DJe 12.05.2011, grifei)

No âmbito deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, se destacam os seguintes precedentes:

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“AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – LEI Nº 8.429/1992 – PROVA EMPRESTADA – INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO – REDISTRIBUIÇÃO DO PROCEDIMENTO CRIMINAL – POSSIBILIDADE – HONORÁRIOS ADVO-CATÍCIOS – SIMETRIA – NÃO CABIMENTO – PRECEDENTES

As preliminares relativas à ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal, inépcia da inicial, inadequação da via eleita, e indeferimento injustificado de prova, não foram impugnadas, sinalizando a aceitação pela parte dos seus efeitos processuais.

Inexiste vedação na utilização de prova emprestada criminal na seara da ação de improbidade, posto que presentes as mesmas partes e a causa de pedir. As condutas apuradas em investigação criminal que culminaram com a propositura da ação penal deitam raízes não apenas na seara penal como igualmente na seara civil e administrativa, segundo a ordem jurídica.

Apesar de a matéria ser estranha a estes autos, é importante salientar que não há qualquer nulidade na redistribuição do feito criminal de uma para outra Vara cri-minal, eis que quando da criação de novas varas de há muito tem assentado o C. STJ que não se opera qualquer empeço ao Tribunal Regional Federal determinar o redirecionamento para a Vara criada de procedimentos criminais e inquéritos, desde que não tenha sido recebido denúncia. Precedentes.

No mérito, as provas carreadas nos autos não deixam dúvidas sobre a ligação e o oferecimento de vantagem indevida por conta do cargo ocupado pelo réu.

Demais disso, nenhuma impugnação consta nos autos deste feito em relação às condutas imputadas ao apelante. Significa dizer que concordou com os termos em que foram as mesmas abordadas na sentença, pelo que deve ser efetivamen-te mantida com a condenação do apelante por infringência aos arts. 9º, V, c/c art. 11, II, da Lei nº 8.429/1992, eis que agiu o réu com dolo e má-fé, comprova-das pelas provas coligidas nos autos e nos apensos.

Apelação parcialmente provida tão somente para afastar a condenação em hono-rários. Precedentes do STJ e desta Corte.”

(TRF 3ª R., 4ª T., AC 0001340-18.2009.4.03.6119, Relª Desª Fed. Marli Ferreira, Julgado em 25.09.2014, e-DJF3 Judicial 1 Data: 09.10.2014)

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ATOS DE IMPROBI-DADE ADMINISTRATIVA – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA – APELOS DAS PARTES E DA UNIÃO – PRELIMINARES AFASTADAS – PROVA CABAL E CONTUNDENTE DAS PRÁTICAS ÍMPROBAS RECONHECIDAS NA SENTENÇA, QUE ABSOLVEU APENAS UM DOS CORRÉUS – ENRIQUECIMENTO ILÍCITO E EVIDENTE ATENTADO CONTRA OS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE ADMI-NISTRATIVA – REFORMA PARCIAL DAS PENALIDADES, SOMENTE NO TO-CANTE À MULTA CIVIL IMPOSTA A TRÊS CORRÉUS – INDISPONIBILIDADE DE BENS DOS CONDENADOS QUE SE MANTÉM, ATÉ A LIQUIDAÇÃO FINAL DAS PENALIDADES PATRIMONIAIS

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1. Recursos do autor (Ministério Público Federal), da União (interveniente) e das defesas dos corréus condenados, contra a sentença proferida em ação civil públi-ca de responsabilização por atos de improbidade administrativa.

2. É incontestável a legitimidade do Ministério Público Federal para a defesa do patrimônio público, sendo a Ação Civil Pública a via adequada para a recompo-sição do dano, no caso de improbidade administrativa – arts. 129, III, da Consti-tuição Federal e 16 e 17 da Lei nº 8.429/1992.

3. Não há vício de inconstitucionalidade formal na Lei nº 8.429/1992 (ADI 2182, Relator(a): Min. Marco Aurélio, Relator(a) p/Acórdão: Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, Julgado em 12.05.2010, DJe-168 Divulg. 09.09.2010, Public. 10.09.2010, Ement. v. 02414-01, p. 00129 RTJ, v. 00218, p. 00060).

4. A petição inicial é, in casu, perfeitamente apta: traz a descrição dos fatos tidos por ímprobos, devidamente relacionados às sanções legais, além de estar instruída com vasta documentação indiciária, como manda o art. 17, § 6º, da Lei nº 8.429/1992. É o que basta para delimitar a ação de improbidade administrativa e propiciar o exercício do contraditório e da ampla defesa, o que, aliás, foi feito à exaustão pelos requeridos.

5. A suspensão condicional do processo criminal determinada em favor de Alberto França de Mello – o que não equivale a uma sentença absolutória – não constitui impeditivo para a propositura da presente demanda, ante a independên-cia das esferas civil, penal e administrativa. A influência da jurisdição penal na órbita da jurisdição não-criminal decorre apenas nos casos exaustivos do art. 65 do CPP. Precedentes do STJ.

6. “Embora a determinação judicial de interceptação telefônica somente caiba no âmbito de inquérito ou instrução criminal (Lei nº 9.296/1996), isso não impede que, a partir da sua realização, haja pertinente utilização como prova emprestada em Ações de Improbidade que envolvem os mesmos fatos, assegurado o direito à ampla defesa e ao contraditório” (STJ, REsp 1122177/MT, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., Julgado em 03.08.2010, DJe 27.04.2011). É do Pleno do STF o entendimento de que “[...] Dados obtidos em interceptação de comunicações telefônicas, judicialmente autorizadas para produção de prova em investigação criminal ou em instrução processual penal, bem como documentos colhidos na mesma investigação, podem ser usados em procedimento administrativo discipli-nar, contra a mesma ou as mesmas pessoas em relação às quais foram colhidos, ou contra outros servidores cujos supostos ilícitos teriam despontado à colheita dessas provas” (Pet. 3683 QO, Relator(a): Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, Jul-gado em 13.08.2008, DJe 035 Divulg. 19.02.2009, Public. 20.02.2009, Ement. v. 02349-05 PP-01012 RMDPPP v. 5, nº 28, 2009, p. 102-104).

7. Sucede que em sede de Ação Civil Pública por Atos de Improbidade exa-minam-se condutas que têm a qualificação de ilícitos administrativos, mas que também podem ser infrações penais. Assim, se toda a matéria se insere no âmbito do direito sancionador – possibilidade de aplicação de penas – não existe razão

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fundamental para impedir que elementos de prova apurados com base em auto-rização judicial sejam compartilhados.

[...]

(TRF 3ª R., 6ª T., AC 0011558-07.2005.4.03.6100, Rel. Des. Fed. Johonsom Di Salvo, Julgado em 21.11.2013, e-DJF3 judicial 1 Data: 29.11.2013)

Logo, verifica-se que o MM. Juiz a quo impôs óbice insubsistente para a utilização da prova emprestada nestes autos – necessidade de autorização dele e do Juízo Criminal –, sendo certo que nem sequer cogitou-se de cerceamento de defesa ou desrespeito ao contraditório ou à ampla defesa.

Salienta-se que, desde a petição inicial, passando por outros requeri-mentos efetivados ao longo da instrução, o Parquet requereu ao MM. Juízo de origem que apreciasse a possível anexação da prova emprestada do inquérito policial, o que não ocorreu. Tal prova acabou juntada aos autos e considerada inidônea pela r. sentença.

Ademais, por outra razão se mostra necessária a desconstituição do decisum recorrido.

É que o Ministério Público Federal, em momento processual adequado, requereu o depoimento da testemunha Pedro Américo, representante da pessoa jurídica FOX Indústria e Comércio de Cosméticos Ltda., que supostamente teria ligação com os eventuais atos ímprobos cometidos pelos corréus. Esse pedido, porém, não foi apreciado nem por decisão interlocutória e nem sequer pela r. sentença, que, aliás, julgou antecipadamente a lide, interrompendo a marcha processual sem fundamentar o porquê da prescindibilidade da produção de outras provas.

Logo, nesse ponto, verifica-se cerceamento do direito de ação dos auto-res, eis que ao Magistrado, mesmo sendo o destinatário da prova, não é dado decidir antecipadamente a lide sem análise da pertinência das provas requeri-das e, posteriormente, julgar improcedente o pedido por insuficiência probató-ria. Nesse sentido, mais uma vez a pacífica jurisprudência da Corte Superior:

“AGRAVO REGIMENTAL – RECURSO ESPECIAL – PRODUÇÃO DE PROVAS – INDEFERIMENTO – CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO

1. No presente caso restou caracterizado o cerceamento de defesa pela ausência da produção da prova oral e documental, uma vez que o juiz a quo conclui que não era caso de dilação probatória, julgando a ação improcedente, concluindo pela impossibilidade de produção de outras provas em sentido contrário.

2. Esta Corte já firmou posicionamento no sentido de que configura o cerceamen-to de defesa a decisão que, a um só tempo, deixa de reconhecer alegação por falta de prova e julga antecipadamente a lide.

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3. Agravo regimental não provido.”

(STJ, AgRg-REsp 1354814/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 04.06.2013, DJe 10.06.2013, grifei)

“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – SERVIDORA OCUPANTE DO CARGO DE TÉCNICO CONTÁBIL – ALEGAÇÃO DE DESVIO PARA A FUNÇÃO DE TÉCNICO DO TESOURO NACIONAL – JULGAMEN-TO ANTECIPADO DA LIDE – INDEFERIMENTO DE PROVA TESTEMUNHAL – ACÓRDÃO QUE NÃO DEIXA EVIDENTE A DESNECESSIDADE DA INSTRU-ÇÃO PROBATÓRIA – DESVIO DE FUNÇÃO NÃO RECONHECIDO PELO TRI-BUNAL DE ORIGEM COM FUNDAMENTO NA INSUFICIÊNCIA DA PROVA DOCUMENTAL – CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO – RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO PARA DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À PRIMEIRA INSTÂNCIA COM O FIM DE PRODUZIR A PROVA RE-QUERIDA – AGRAVO REGIMENTAL DA UNIÃO DESPROVIDO

1. Vige no âmbito judicial o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, em que pode o magistrado, ao analisar o conjunto probatório dos autos, entender não haver necessidade de produção de prova testemunhal para o julgamento da lide e inde-ferir o pedido sem que incorra em cerceamento de defesa.

2. No caso dos autos, contudo, o Tribunal de origem não deixou evidente a desnecessidade de produção da prova testemunhal requerida, haja vista as afir-mações contraditórias contidas no julgado.

3. A decisão da Corte a quo de que a documentação acostada aos autos é insu-ficiente para comprovar o desvio de função contraria a jurisprudência do STJ de que, ao indeferir o pedido de produção de provas, não se pode julgar o pedido improcedente com base na ausência de provas, sob pena de cerceamento de defesa.

4. Agravo Regimental da União desprovido.

(AgRg-AgRg-AREsp 35.795/CE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª T., Jul-gado em 16.06.2014, DJe 04.08.2014)

Quanto ao mérito discutido neste feito, com razão os apelantes e a douta Procuradoria Regional da República, pois não se mostra possível seu julgamen-to diretamente nesta Corte Regional, nos termos do art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil (“Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento”), sob pena de supressão de instância, uma vez que, além de não ter havido ex-tinção sem resolução do mérito, a causa não versa unicamente sobre questão de direito, mas sim exige do julgador a análise de extensa matéria fática. Nessa

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esteira: AgRg-RMS 45.512/SP, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., Julgado em 04.09.2014, DJe 15.09.2014.

Portanto, impõe-se o provimento dos apelos, para que, anulada a r. sen-tença, tenha esta ação civil pública regular seguimento em primeira instância, com a aceitação da prova emprestada e análise a respeito das demais provas requeridas pelas partes.

Derradeiramente, é certo que a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.366.721/BA, sob a sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), consolidou o entendimento de que o decreto de indisponibilidade de bens em ação civil pública por ato de improbidade administrativa constitui tutela de evidência e dispensa a comprovação de dila-pidação iminente ou efetiva do patrimônio do legitimado passivo, uma vez que o periculum in mora está implícito no art. 7º da Lei nº 8.429/1992 (LIA).

Dessa forma, sem que se expresse entendimento a propósito da matéria de fundo, presentes robustos indicativos de prática de atos de improbidade ad-ministrativa, os quais, em parte, já foram inclusive reconhecidos na esfera admi-nistrativa, fica mantida, cautelarmente, a indisponibilidade dos bens conforme decretada pelo MM. Juízo de origem, sem prejuízo de que naquela instância sobrevenha nova apreciação a respeito.

Ante o exposto, voto por dar provimento às apelações, anulando a r. sentença e determinando que, com a aceitação da prova emprestada e apre-ciação desta e das demais provas requeridas pelas partes, segundo o livre con-vencimento motivado do MM. Juízo a quo, esta ação civil pública tenha regular prosseguimento em primeiro grau de jurisdição.

É como voto.

Diva Malerbi Desembargadora Federal

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra7356

Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 31.07.2015Mandado de Segurança nº 0018235‑05.2014.4.03.0000/SP2014.03.00.018235‑4/SPRelatora: Desembargadora Federal Marli FerreiraImpetrante: Luis Marcio Olinto PessoaAdvogado: SP018789 José de Mello JunqueiraImpetrado(a): Juízo Federal da 2ª Vara de Bauru Sec. Jud./SPInteressado(a): União Federal (Fazenda Nacional)Advogado: SP000020 Simone Aparecida Vencigueri AzeredoInteressado(a): Coml. Mobifiltros Ltda. e outros

João Luis Delcorso Neubern Maria de Fatima Pachioni Neubern

Nº Orig.: 13041831619974036108 2ª Vr. Bauru/SP

ementaAdmINIStrAtIvo – mANdAdo de SegurANçA – CANCelAmeNto de CArtA de ArremAtAção jÁ regIStrAdA em CArtÓrIo – emolumeNtoS – devolução – ImpoSSIBIlIdAde

A teor do disposto no art. 36, caput da Constituição Federal, as funções registrais e notariais são desempenhadas, obrigatoriamente, em caráter privado, mediante delegação do Poder Público, sendo previsto no art. 2º que os emolumentos serão fixados por Lei Federal.

O valor dos emolumentos relativos aos atos praticados pelos respecti-vos serviços notariais e de registro foram estabelecido pela Lei Federal nº 10.169/2000, que estabelece:

Nos termos da Lei Federal nº 10.169/2000, os Estados e o Distrito Fede-ral fixarão o valor dos emolumentos relativos aos atos praticados pelos respectivos serviços notariais e de registro, sendo que no Estado de São Paulo, os emolumentos foram fixados pela Lei nº 11.331/2002.

Dos documentos colacionados os autos, resta incontroverso que o regis-tro da Carta de Arrematação fora efetuado, em obediência aos ditames legais e autorizado por determinação judicial, sendo os emolumentos devidos para a formalização jurídica de registro e transmissão do bem ao arrematante, ex vi do art. 14 da Lei nº 6.015/1973.

As despesas que dizem com o registro imobiliário não devem ser restitu-ídas, vez que os serviços, tanto de transferência do bem, como registrais,

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foram devidamente prestados, sendo certo que o Oficial do Registro de Imóveis não concorreu para o cancelamento da Carta de Arrematação, decorrente que foi de determinação judicial.

Segurança concedida.

aCÓRDão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, de-cide a Egrégia Segunda Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conceder a segurança, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 21 de julho de 2015.

Silvio Gemaque Juiz Federal Convocado

ReLatÓRIo

Luis Márcio Olinto Pessoa, Oficial de Registro de Imóveis, impetra o pre-sente Mandado de Segurança contra ato praticado pelo r. Juízo da 2ª Vara Fe-deral de Bauru/SP, que determinou ao impetrante o reembolso e a devolução das custas e emolumentos pagos quando do registro da carta de arrematação do imóvel de matrícula de nº 6.314, em razão do cancelamento da arrematação levada a efeito nos autos da Execução Fiscal nº 1304183-16.1997.403.6108.

Aduz não ser possível a restituição dos aludidos valores porquanto o ato fora praticado de forma legal e em cumprimento a uma ordem judicial (arrema-tação), sem qualquer erronia registral ou excesso em sua cobrança, e repassadas as verbas aos órgãos competentes e destinados os emolumentos ao custeio da Serventia, observada rigorosamente a tabela de custas.

Às fls. 48/49 foi concedida a liminar para determinar a imediata sus-pensão da ordem judicial de devolução das custas e emolumentos pagos pelo registro de arrematação junto à matrícula de nº 6314, até julgamento final deste mandamus.

As informações foram prestadas à fls. 51/54.

Parecer do Ministério Público Federal às fls. 57/59, opinando pela con-cessão da segurança.

É o relatório.

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voto

Ressalte-se, preliminarmente, que a questão de fundo aqui se refere a ato de juiz que determinou a devolução de preço público, regularmente recolhido, e não em relação ao registro público propriamente dito, aplicando-se o art. 10, § 2º, VI, do Regimento Interno do Tribunal.

Como relatado, trata-se se Mandado de Segurança impetrado por Oficial de Registro de Imóveis contra ato praticado pelo r. Juízo da 2ª Vara Federal de Bauru/SP, que lhe determinou o reembolso e a devolução das custas e emolu-mentos pagos quando do registro de arrematação junto à matrícula de nº 6.314, em razão do cancelamento desse ato levada a efeito nos autos da Execução Fiscal nº 1304183-16.1997.403.6108.

Narra o impetrante que, por carta de arrematação, dada e passada em 18.11.2013, assinada pelo MM. Juiz da 2ª Vara Federal de Bauru/SP, expedida nos autos de Execução Fiscal movida pela Fazenda Nacional contra Comercial Mobifiltros Ltda. e outros, Processo nº 1304183-16.1997.403.6108, foi regis-trado, em 04.12.2013, o auto de arrematação do imóvel objeto da matrícula nº 6314 (R.16), em benefício do arrematante e adquirente Jonas de Souza Rios, pelo valor de R$ 42.000,00 (quarenta e dois mil reais);

Que pelos atos de registro e averbações, o arrematante pagou as custas devidas ao Estado, Ipesp, Fundo de Registro Civil e Tribunal de Justiça e emolu-mentos, num total de R$ 1.167,97, observada a Tabela prevista na Lei Estadual nº 11.331/2002; e que, posteriormente, em 24.04.2014, foi protocolado e pre-notado na Serventia Registral ofício-mandado, expedido por aquele mesmo juí-zo, determinando o cancelamento do registro da arrematação do mesmo imóvel objeto da Matrícula nº 6314, com a ordem de restituição integral da quantia recebida, em razão da anulação da hasta pública.

Relata ainda o impetrante que dirigiu ofício àquele Juízo justificando a impossibilidade do cumprimento da ordem de devolução, tendo recebido con-tudo a determinação para que cumprisse a decisão no prazo de 48 horas, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais) e caracterização de crime de desobediência.

Desde logo ressalte-se que, a teor do disposto no art. 236, caput da Cons-tituição Federal, as funções registrais e notariais são desempenhadas, obrigato-riamente, em caráter privado, mediante delegação do Poder Público.

Nesse contexto, infere-se que as serventias extrajudiciais se compõem de um feixe de competências públicas, nada obstante exercidas em regime de delegação a pessoa privada.

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Além da fixação do regime jurídico, a Constituição Federal prevê no § 2º do art. 236 que: “Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolu-mentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro”.

Em cumprimento dessa norma foi editada a Lei Federal nº 10.169/2000, que estabelece:

“Art. 1º Os Estados e o Distrito Federal fixarão o valor dos emolumentos relativos aos atos praticados pelos respectivos serviços notariais e de registro, observadas as normas desta Lei.

Parágrafo único. O valor fixado para os emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à adequada e suficiente remuneração dos serviços prestados.”

No Estado de São Paulo, os emolumentos foram fixados pela Lei nº 11.331/2002 em sua “Tabela II – Dos Ofícios de Registro de Imóveis”.

Outrossim, o crédito decorrente desses emolumentos deve ser su-portado pelo interessado na prática do ato, como decorre do art. 2º da Lei n° 11.331/2002, verbis:

“Art. 2º São contribuintes dos emolumentos as pessoas físicas ou jurídicas que se utilizarem dos serviços ou da prática dos atos notariais e de registro.”

Há de se atentar, ainda, à Lei nº 8.935/1994, cujo art. 1º, estabelece que os serviços notariais e de registro “são os de organização técnica e administrati-va destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos”.

Por outro lado, à luz do art. 236 da CF e de sua regulamentação pela Lei nº 8.935/1994, a jurisprudência tem assentado a legalidade da ampla fiscali-zação e controle das atividades cartoriais pelo Poder Judiciário, assim como a natureza pública dessas atividades, nada obstante serem exercidas em caráter privado, por delegação do Poder Público.

Cumpre lembrar que, nos termos do art. 30, incisos VIII e IX da Lei nº 8.935/1994 ao impetrante incumbe zelar pela correta e exata cobrança dos serviços e emolumentos do registro, bem como fiscalizar o recolhimento dos impostos incidentes sobre os atos que devem praticar.

À vista, portanto, de todo esse arcabouço legal, tenho que assiste razão ao impetrante.

No caso concreto, Josias de Sousa Rios arrematou em hasta pública re-alizada por ordem do juízo impetrado, o imóvel matriculado sob o nº 6.314, no 2º Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de Bauru/SP, tendo recebido a respectiva carta de arrematação, registrada em 04.12.2013 (fl.45).

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Contudo, posteriormente, o arrematante comunicou à autoridade impe-trada que referido imóvel já havia sido alienado em hasta promovida por outro Juízo, razão pela qual solicitou o reconhecimento da nulidade da arrematação procedida, bem como a restituição do valor do bem e da comissão de leiloei-ro, pleito este deferido e atendido, à exceção do reembolso dos emolumentos pagos ao Oficial de Registro de Imóveis, cuja recusa motivou a presente impe-tração.

Dos documentos colacionados, resta incontroverso que o registro da Car-ta de Arrematação fora efetuado, em obediência aos ditames legais e autorizado por determinação judicial, sendo os emolumentos devidos para a formalização jurídica de registro e transmissão do bem ao arrematante, ex vi do art. 14 da Lei nº 6.015/1973, que dispõe sobre os registros públicos, litteris:

“Art. 14. Pelos atos que praticarem, em decorrência desta Lei, os Oficiais do Registro terão direito, a título de remuneração, aos emolumentos fixados nos Regimentos de Custas do Distrito Federal, dos Estados e dos Territórios, os quais serão pagos, pelo interessado que os requerer, no ato de requerimento ou no da apresentação do título. (Redação dada pela Lei nº 6.216, de 1974)

Parágrafo único. O valor correspondente às custas de escrituras, certidões, bus-cas, averbações, registros de qualquer natureza, emolumentos e despesas legais constará, obrigatoriamente, do próprio documento, independentemente da expe-dição do recibo, quando solicitado.”

Assim, as despesas que dizem com o registro imobiliário não devem ser restituídas, vez que os serviços, tanto de transferência do bem, como registrais, foram devidamente prestados.

De outra banda, como bem destacou o impetrante, os emolumentos são fracionados entre outras instituições, incluído aí o Poder Judiciário Estadual, além de constituir o respectivo restante dos emolumentos, a remuneração do impetrante.

Veja-se, a propósito, que o impetrante não concorreu para o cancela-mento da arrematação, sobretudo pelo fato de que na matrícula do imóvel cons-ta a averbação de outras penhoras incidentes no imóvel objeto da impetração, sendo certo que a existência de averbações ou registros referentes a penhoras anteriores não impede o registro da carta de arrematação, por tratar-se de aqui-sição originária.

Nesse sentido, como bem asseverou o d. representante do Ministério Pú-blico Federal o impetrante “não deu causa ao registro equivocado, sendo de responsabilidade do juízo ter homologação hasta pública e consequente ata de arrematação referente a imóvel viciado! Nesse diapasão, não há culpa e nem dolo por parte do oficial de registro, o que por si só já basta para que este não seja coagido a devolver os valores recebidos, que, inclusive, são revertidos em

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37,5% (trinta e sete vírgula cinco por cento) ao Tribunal de Justiça, Fazenda Pública, Ipesp e Fundo de Custeio do Registro Civil das Pessoas Naturais”.

Ante o exposto, voto no sentido de conceder a segurança.

É como voto.

Silvio Gemaque Juiz Federal Convocado

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 04.08.2015Apelação Cível nº 0020479‑76.2010.4.03.6100/SP2010.61.00.020479‑7/SP Relatora: Desembargadora Federal Alda BastoApelante: JK Coml. e Serviços Ltda.Advogado: SP181560 Rebeca Andrade de Macedo e outroApelado(a): Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECTAdvogado: SP185929 Marcelo do Carmo Barbosa e outroNº Orig.: 00204797620104036100 24ª Vr. São Paulo/SP

ementaAdmINIStrAtIvo – Ação ordINÁrIA – CoNtrAto de FrANquIA – empreSA BrASIleIrA de CorreIoS e telÉgrAFoS (eCt) – leI Nº 11.688/2008 – deCreto Nº 6.639/2008 – eXtINção ImedIAtA doS CoNtrAtoS No prAzo eStIpulAdo por deCreto regulAmeNtAdor – ImpoS-SIBIlIdAde

I – A Lei nº 11.668/2008 dispõe em seu art. 7º que os contratos de fran-quia postal, desde que em vigor em novembro de 2007, continuarão em vigência até a conclusão dos contratos nos termos da nova legislação. Estabelece ainda, no mesmo artigo, prazo para que a ECT conclua as contratações em conformidade com aquele diploma legal.

II – O decreto regulamentar deve manter relação de conformidade com a lei, concedendo-lhe aplicabilidade no caso concreto, sem inovar no mundo jurídico.

III – O Decreto nº 6.639/2008 inovou ao estabelecer prazo para a extin-ção dos contratos de franquias realizados nos termos da norma anterior, atrelando-o a data de conclusão dos novos contratos. Com efeito, a Lei nº 11.668/2008, no tocante à vigência dos contratos anteriores, apenas dispõe que tais contratos persistem até a assinatura dos novos, restando silente concernente à suposição de não serem cumpridos os prazos nela estabelecidos.

IV – A edição da Lei nº 12.400/2011 afeta apenas o prazo para finaliza-ção dos contratos novos, sem dispor novamente a respeito da vigência dos contratos antigos no caso de inexistir nova empresa para prestar o serviço postal.

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V – A extinção do contrato de franquia com a empresa ora apelante acar-retaria graves prejuízos à sociedade, eis que não há novo contrato a ser concluído, pondo em risco a continuidade de prestação de serviço pú-blico, não se vislumbrando nenhum prejuízo a ECT, pois o advento de novo contrato de franquia revogará o contrato objeto da presente lide, nos termos da Lei nº 11.668/2008.

VI – Apelação provida.

aCÓRDão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, de-cide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 16 de julho de 2015.

Alda Basto Desembargadora Federal

ReLatÓRIo

Trata-se de ação ordinária ajuizada com escopo de manter a vigência de contrato de franquia postal entre a autora e a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT até que haja novo contrato de agência franqueada precedido de licitação. Valorada a ação em R$ 10.000,00.

Assevera a autoria que o encerramento do contrato de franquia antes da realização de licitação para contratar novas empresas acarretaria graves prejuízos à prestação de serviços postais. Sustenta a ilegalidade do Decreto nº 6.639/2008, que determinou a imediata extinção dos contratos, trazendo inovações não previstas pela Lei nº 11.668/2008.

Processado o feito, sobreveio sentença de extinção do feito sem resolu-ção do mérito por carência de interesse processual, tendo em vista o advento da Lei nº 12.400/2011, que trouxe nova redação para Lei nº 11.668/2008 em relação ao prazo de extinção do contrato.

Inconformada, a autoria interpôs recurso de apelação, sustentando não ter se esvaído o objeto principal do feito, isto é, a possibilidade de eventual encerramento de contrato de franquia sem a finalização do processo licitatório e a contratação de nova empresa.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.

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O feito foi distribuído inicialmente à relatoria do E. Des. Fed. Antônio Cedenho, que determinou a redistribuição dos autos em razão da competência da Segunda Seção para apreciar as causas relacionadas aos contratos de fran-quia postal celebrados entre a ECT e pessoas jurídicas de direito privado.

Conclusos os autos a minha relatoria, a apelante requereu a concessão de antecipação dos efeitos da tutela recursal, pleito indeferido ante a ausência de pedido no bojo da apelação.

É o relatório.

Dispensada a revisão nos termos regimentais.

votoA Lei nº 11.668/2008 dispõe em seu art. 7º que os contratos de franquia

postal, desde que em vigor em novembro de 2007, continuarão em vigência até a conclusão dos contratos nos termos da nova legislação. Estabelece ainda, no mesmo artigo, prazo para que a ECT conclua as contratações em conformidade com aquele diploma legal. Transcrevo tais dispositivos a seguir:

“Art. 7º Até que entrem em vigor os contratos de franquia postal celebrados de acordo com o estabelecido nesta Lei, continuarão com eficácia aqueles firmados com as Agências de Correios Franqueadas que estiverem em vigor em 27 de novembro de 2007.

Parágrafo único. A ECT deverá concluir as contratações a que se refere este artigo até 30 de setembro de 2012. (Redação dada pela Lei nº 12.400, de 2011)

Art. 7º-A. As novas Agências de Correios Franqueadas – ACF terão prazo de 12 (doze) meses para fazer as adequações e padronizações definidas pelas normas técnicas e manuais da ECT. (Incluído pela Lei nº 12.400, de 2011)”

Observe-se que não há qualquer disposição em relação à vigência dos contratos na hipótese de não restarem devidamente concluídas as novas con-tratações no biênio estipulado. Sobreveio o Decreto nº 6.639/2008 para regula-mentar a referida lei, estabelecendo, in verbis:

“Art. 9º Omissis.

§ 2º Após o prazo fixado no parágrafo único do art. 7º da Lei nº 11.668, de 2008, serão considerados extintos, de pleno direito, todos os contratos firmados sem prévio procedimento licitatório pela ECT com as Agências de Correios Fran-queadas.”

A determinação do indigitado decreto, entretanto, extrapola os princí-pios constitucionais da Administração Pública, notadamente o da legalidade, expresso no art. 37, da Constituição Federal de 1988. Neste passo, o decreto regulamentar está subordinado à lei, sendo-lhe defeso criar normas no mundo

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jurídico, seu escopo cinge-se a estabelecer pormenores de ordem técnica com intuito de viabilizar o cumprimento da lei a qual se vincula.

Outrossim, o decreto regulamentar deve manter relação de conformida-de com a lei, concedendo-lhe aplicabilidade no caso concreto, sem inovar no mundo jurídico.

Neste sentido é a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, con-forme aresto que colaciono a seguir:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – FRANQUIAS POSTAIS – FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚMULA Nº 211/STJ – NECESSIDADE DE LICITAÇÃO – ENCERRAMENTO DOS CON-TRATOS EM CURSO – TERMO FINAL DOS CONTRATOS SEM LICITAÇÃO – DECRETO Nº 6.639/2008 – ILEGALIDADE – AFRONTA À LEI Nº 11.668/2008 –1. Na origem, o recorrente foi condenado a se abster de extinguir os contratos de franquia postal, na medida em que fora reconhecido aos recorridos o direito de continuar em atividade até que vigorem os novos contratos – devidamente licitados – de agências franqueadas de correios. 2. A questão inerente à falta de interesse processual das agências franqueadas não foi prequestionada. Incidência do óbice da Súmula nº 211 desta Corte. 3. O Decreto nº 6.639/2008, no § 2º do art. 9º, exorbita do poder regulamentar, porquanto dá alcance maior que o da norma regulamentada ao determinar a extinção dos contratos vigentes após o prazo legal. 4. O art. 7º da Lei nº 11.668/2008 – norma tida por violada – de-termina expressamente uma obrigação para a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos e tutela, implicitamente, o princípio da continuidade dos serviços pú-blicos. A obrigação legal da ECT é de efetuar as licitações para todos os novos contratos de franquia até setembro de 2012. A tutela do princípio da continuida-de dos serviços públicos, por outro lado, é efetivada mediante a garantia de ma-nutenção dos contratos de franquia sem licitação até que novos contratos sejam firmados. 5. Não há falar em perpetuação dos contratos sem licitação, mas ape-nas sejam respeitados até que vigorem os novos contratos de franquia licitados. Nesse caso, não perdurariam os antigos contratos, visto que estes estão condicio-nados à ausência de novos contratos licitados. Recurso especial conhecido em parte e improvido. (STJ, REsp 201301475438, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., DJe de: 19.02.2015)

No caso dos autos, o Decreto nº 6.639/2008 inovou ao estabelecer pra-zo para a extinção dos contratos de franquias realizados nos termos da norma anterior, atrelando-o a data de conclusão dos novos contratos. Com efeito, a Lei nº 11.668/2008, no tocante à vigência dos contratos anteriores, apenas dispõe que tais contratos persistem até a assinatura dos novos, restando silente concer-nente à suposição de não serem cumpridos os prazos nela estabelecidos.

Saliente-se que a edição da Lei nº 12.400/2011 afeta apenas o prazo para finalização dos contratos novos, sem dispor novamente a respeito da vigência dos contratos antigos no caso de inexistir nova empresa para prestar o serviço postal.

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O compulsar dos autos revela que a extinção do contrato de franquia com a empresa ora apelante acarretaria graves prejuízos à sociedade, eis que não há novo contrato a ser concluído, pondo em risco a continuidade de pres-tação de serviço público.

Ademais, nenhum prejuízo se vislumbra para a ECT, pois o advento de novo contrato de franquia revogará o contrato objeto da presente lide, nos ter-mos da Lei nº 11.668/2008.

A título ilustrativo, trago outros julgados desta E. Corte:DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – EMPRESA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS (ECT) – CONTRATO DE FRANQUIA POSTAL – LEI Nº 11.668/2008 – DECRETO Nº 6.639/2008 – DECRETO REGULAMENTAR – PRAZO PARA A EXTINÇÃO DOS CONTRATOS DE FRANQUIA – INOVAÇÃO DO ORDENA-MENTO JURÍDICO – PRINCÍPIO DA ESTRITA LEGALIDADE E DA CONTINUI-DADE DO SERVIÇO PÚBLICO – VIOLAÇÃO – 1. A Lei nº 11.668/2008, com a redação conferida pela Lei nº 12.400, de 2011, dispõe em seu art. 7º que os contratos de franquia postal, desde que em vigor em novembro de 2007, conti-nuarão em vigência até a conclusão dos contratos nos termos da nova legislação. 2. Contudo, em 07 de novembro de 2008, foi publicado o Decreto nº 6.639/2008, que estabeleceu no seu art. 9º que a ECT terá o prazo máximo de vinte e quatro meses, a contar da data da publicação deste Decreto, para concluir todas as contratações previstas no art. 7º da Lei nº 11.668, de 2008, bem como que, após o prazo fixado no parágrafo único do art. 7º da Lei nº 11.668, de 2008, serão considerados extintos, de pleno direito, todos os contratos firmados sem prévio procedimento licitatório pela ECT com as Agências de Correios Franqueadas. 3. Como é sabido, o decreto regulamentar tem por função manter relação de conformidade com a lei, possibilitando-lhe aplicabilidade ao caso concreto, mas sem inovar o ordenamento jurídico. 4. Contudo, o Decreto nº 6.639/2008 trouxe inovação ao mundo jurídico ao estabelecer prazo para a extinção dos contratos de franquia realizados nos termos da norma anterior, em claro confronto com o disposto no art. 7º, da Lei nº 11.668/2008, que não prevê, em momento algum, que a extinção dos contratos de franquia seja feita antes da constituição dos novos contratos precedidos de licitação. 5. Assim sendo, clara está a afronta ao princípio da estrita legalidade que rege os atos da Administração Pública, segun-do o qual o administrador público somente pode fazer aquilo que a lei determina. 6. A ECT foi concebida para a prestação do serviço postal, de natureza pública e essencial, nos termos do art. 21, X, da Constituição da República, de modo que o fechamento das agências de correios franqueadas que estavam em vigor em 30 de setembro de 2012, nos moldes do estabelecido no Decreto nº 6.639/2008, antes da contratação, por meio de procedimento licitatório, das novas agências, ocasionará, inegavelmente, a interrupção de serviço público de suma importân-cia para a população local, com a consequente violação do princípio da conti-nuidade do serviço público, corolário da ideia de serviço adequado. 7. Portanto, da análise conjunta dos dispositivos em questão e com fundamento nos prin-cípios supratranscritos, depreende-se que os contratos atualmente em vigência devem permanecer nessa condição até o início das operações das agências que

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serão contratadas após a realização de certame licitatório. 8. Apelação improvi-da. (TRF 3ª R., AC 00158647220124036100, Relª Desª Fed. Consuelo Yoshida, 6ª T., e-DJF3 Judicial 1 de 30.08.2013)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE CONHECIMENTO – AGÊN-CIA FRANQUEADA DOS CORREIOS – EXTINÇÃO DOS CONTRATOS – LEI Nº 11.668/2008 – IMPOSSIBILIDADE – CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLI-CO – 1. Diferentemente de estabelecer o término dos contratos em 30 de setem-bro de 2012, a Lei apenas estipula a obrigatoriedade da conclusão do processo licitatório e consequente celebração dos contratos (entre a ECT e as novas fran-queadas) até essa data. Não há comando que permita inferir restrição à norma ex-pressa no caput do art. 7º, da Lei que aponta o momento a partir do qual cessam os efeitos jurídicos emanados dos contratos antigos, operantes em 27.11.2007: a entrada em vigor dos contratos oriundos da assinalada licitação. 2. Do dispositivo legal, somente duas normas são irradiadas: uma, que determina a conclusão do processo licitatório até 30.09.2012, embora sem prever sanção específica para a ECT; outra, que estatui que, até que entrem em vigor os novos contratos, mantêm--se vigentes os anteriores, nos termos assinalados. Nada há capaz de levar à com-preensão do término de vigência dos contratos na data em questão, anteriormente ao término do certame. 3. O Decreto nº 6.639/2008 excede seu poder regulamen-tar, ferindo o princípio da legalidade, ao extrapolar os limites impostos pela Lei nº 11.668/2008, que determina a manutenção dos contratos firmados com as Agências de Correios Franqueadas em vigor em 27.11.2007. Agride, ainda, o princípio da razoabilidade, ao apenar as agências franqueadas pela omissão ou letargia da licitante (ECT), bem como o da continuidade do serviço público. 4. Ex-tintos os contratos de franquia vigentes em 27.11.2007 anteriormente ao término do processo licitatório, haverá patente violação ao interesse público, norteador dos atos administrativos, à vista da possibilidade de ocorrência de graves prejuí-zos à sociedade consistentes no risco de descontinuidade do serviço público e no injustificado dispêndio de recursos públicos para a contratação de agências temporárias, para operarem até o início da operação das vencedoras da licitação, enquanto, para a adequação da conduta da ECT aos ditames constitucionais, basta a empresa levar a cabo, com a máxima presteza, a licitação. 5. Não há nos autos alteração substancial capaz de influir na decisão proferida quando do exame do pedido de efeito suspensivo. (TRF 3ª R., AI 00259402520124030000, Rel. Des. Fed. Mairan Maia, 6ª T., e-DJF3 Judicial 1 de 31.10.2014)

Dessa forma, de rigor a reforma integral da r. sentença para autorizar a vigência do contrato de franquia entre a autoria e a ECT até a realização de licitação para formalização de novo contrato para prestação de serviços postais.

Ante o exposto, dou provimento à apelação.

É o voto.

Alda Basto Desembargadora Federal

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Parte Geral – Jurisprudência – Acórdão na Íntegra

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Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoApelação Cível nº 5032243‑12.2014.4.04.7100/RSRelator: Cândido Alfredo Silva Leal JuniorApelante: Heloisa de Lima FloresAdvogado: Fernanda Ramalho ChiaradiaApelado: Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Ufrgs

ementaAdmINIStrAtIvo – ServIdor pÚBlICo – CoNtAgem de tempo de ServIço – tempo de Ser-vIço preStAdo pArA A AdmINIStrAção pÚBlICA INdIretA – empreSA pÚBlICA – Art. 103, INCISo v, dA leI Nº 8.112/1990 – Art. 173, § 1º, INCISo II, dA CoNStItuIção FederAl

O tempo de serviço prestado junto à Administração Pública Federal Indi-reta somente pode ser computado para fins de aposentadoria e disponi-bilidade, nos termos do art. 103, inciso V, da Lei nº 8.112/1990, uma vez que tais empresas se sujeitam ao regime próprio das empresas privadas, inclusive, com relação a direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhis-tas e tributárias, a teor do art. 173, § 1º, inciso II, da Constituição Federal.

aCÓRDão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, de-cide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por una-nimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 04 de agosto de 2015.

Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia Relator

ReLatÓRIo

Trata-se de apelação em ação ordinária proposta por Heloisa de Lima Flores contra a Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Ufrgs, objetivan-do provimento jurisdicional que condene a ré a averbar, para todos os efeitos legais, como tempo de serviço público federal, o tempo de serviço prestado em empresa pública federal, bem como a pagar as diferenças remuneratórias daí

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decorrentes, inclusive com revisão de enquadramento, revisão da data de apo-sentadoria, abono de permanência e licença-prêmio.

A autora disse ser servidora pública federal aposentada, tendo ingressado na Ufrgs em março de 1992. Antes do ingresso na ré, foi empregada na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT, empresa pública federal vinculada ao Ministério das Comunicações, no período compreendido entre dezembro de 1973 e março de 1987, perfazendo um total de 13 anos, 03 meses e 04 dias (4.839 dias), que foram averbados na Ufrgs. Todavia, referiu que a ré não procedeu à averbação desse tempo de serviço conforme previsto no art. 100 da Lei nº 8.112/1990, ou seja, como tempo de serviço público federal para todos os efeitos. Alegou que as empresas públicas, embora sejam pessoas jurídicas de direito privado, integram a Administração Pública Federal Indireta, pelo que o tempo de serviço nelas prestado deve ser computado como no serviço público federal, para todos os fins, nos termos do art. 100 da Lei nº 8.112/1990.

A sentença proferida tem dispositivo com o seguinte teor:

Ante o exposto, rejeito as preliminares e, no mérito, julgo improcedente a presen-te ação ordinária, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC.

Condeno a autora ao pagamento das custas judiciais e de honorários advoca-tícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa. A exigibilidade das verbas resta suspensa em virtude da AJG concedida.

A parte autora apela, demonstrando sua inconformidade com a sentença proferida e renovando o postulado na inicial. Pretende o reconhecimento do período trabalhado na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT como tempo de serviço público federal para todos os efeitos legais, inclusive, para fins de revisão do seu enquadramento no PCCTAE.

Com contrarrazões.

É o relatório.

voto

A discussão posta nestes autos diz respeito, em essência, a pedido de provimento jurisdicional que condene a Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Ufrgs a averbar, para todos os efeitos legais, como tempo de serviço público federal, o tempo de serviço prestado em empresa pública federal, bem como a pagar as diferenças remuneratórias daí decorrentes, inclusive com revi-são de enquadramento, revisão da data de aposentadoria, abono de permanên-cia e licença-prêmio.

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mÉrIto

Acerca da questão posta sob análise nos autos, mantenho e adoto como razão de decidir a sentença do Juiz Federal Substituto Bruno Brum Ribas, que julgou improcedente o pedido nos seguintes termos, grifei:

“[...]

A jurisprudência majoritária atual não acolhe o pleito da autora, conforme evi-denciam os seguintes precedentes:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL – CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM EMPRESA PÚBLICA E SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA PARA FINS DE ANUÊNIO – IMPOSSIBI-LIDADE

1. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, submetendo-se as empresas públicas e as sociedades de economia mista ao regime próprio das empresas privadas, o tempo de serviço prestado somente pode ser computado na forma prevista no art. 103, V, da Lei nº 8.112/1990, isto é, conta-se apenas para efeitos de aposentadoria e disponibilidade. Precedentes: REsp 1.220.104/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe 10.3.2011; AgRg-REsp 1.082.085/RJ, Rel. Min. Nilson Naves, 6ª T., DJe 18.12.2009; e REsp 960.200/RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., DJe 18.05.2009.

2. No caso concreto, tratando-se de servidor público federal que prestou serviços aos Correios e à Dataprev, empresas públicas federais, e ao Banco do Brasil, sociedade de economia mista, mostra-se incabível o cômputo do período traba-lhado para fins de percepção de anuênio.

3. Agravo Regimental não provido.

(STJ; Processo AgRg-AREsp 145522/DF; Agravo Regimental no Agravo em Recur-so Especial nº 2012/0029954-6; Rel. Min. Herman Benjamin (1132); Órgão Julga-dor T2 – Segunda Turma; Data do Julgamento 22.05.2012; Data da Publicação/Fonte DJe 15.06.2012) – grifei

SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL – CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO – EN-TES PARAESTATAIS – ANUÊNIO – IMPOSSIBILIDADE – RECURSO ESPECIAL – SÚMULA Nº 83/STJ – AGRAVO REGIMENTAL – IMPROVIMENTO

I – O acórdão recorrido se encontra em consonância com o entendimento desta Corte sobre a questão, no sentido de que o tempo de serviço prestado por ser-vidor público federal em empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 103, V, da Lei nº 8.112/1990, conta-se apenas para efeitos de aposentadoria e disponibilidade, a não ser que haja previsão legal expressa que autorize o cômputo também para outros fins. Precedentes: REsp 1.220.104/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 10.03.2011; REsp 960.200/RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe de 18.05.2009 e AgRg-REsp 1.067.895/RJ, Rel. Min. Felix Fischer, DJe de 16.02.2009. Incidência da Súmula nº 83/STJ.

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II – Agravo regimental improvido.

(STJ; Processo AgRg-AREsp 95301/DF; Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 2011/0290532-4; Rel. Min. Francisco Falcão (1116); Órgão Julgador T1 – Primeira Turma; Data do Julgamento 17.05.2012; Data da Publicação/Fonte DJe 25.05.2012) – grifei

ADMINISTRATIVO – SERVIDOR PÚBLICO – CONTAGEM DE TEMPO DE SER-VIÇO PRESTADO PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA SOB O RE-GIME CELETISTA COMO SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL – IMPOSSIBILIDADE – HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA – 1. O tempo de serviço prestado junto à Administração Pública Federal Indireta somente pode ser computado para fins de aposentadoria e disponibilidade, nos termos do art. 103, V, da Lei nº 8.112/1990, vez que tais empresas sujeitam-se a regime próprio das empresas privadas, inclu-sive com relação a direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributá-rias, a teor do art. 173, § 1º, II, da CF. Precedentes. 2. Quanto à fixação da verba honorária, é pacífico o entendimento da 2ª Seção deste Tribunal, no sentido que dita verba deve ser fixada em 10% sobre o valor da causa ou da condenação, sendo que a regra em referência somente não é aplicável no caso em que resultar valor exorbitante ou ínfimo, o que não é o caso dos autos. 3. Não há necessi-dade de o julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamenta sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal justifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13.09.1999). (TRF 4ª R., AC 5003626-81.2010.404.7100, 3ª T., Rel. p/ Ac. Sérgio Renato Tejada Garcia, juntado aos autos em 18.07.2014) – grifei

ADMINISTRATIVO – TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO PERANTE SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA E EMPRESA PÚBLICA – CONTAGEM PARA TODOS OS FINS NO ÂMBITO DO SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL – 1. Submetendo-se as empresas públicas e as sociedades de economia mista ao regime próprio das empresas privadas, o tempo prestado somente pode ser computado na forma pre-vista no art. 103, inc. V, da Lei nº 8.112/1990, isto é, conta-se apenas para efeitos de aposentadoria e disponibilidade. 2. A Lei nº 8.112/1990 adota (arts. 2º e 3º) um conceito restrito da categoria ‘servidor público’, por ela regida. Essa categoria inclui apenas os ocupantes de cargos públicos – que são criados por lei –, o que não ocorre com as sociedades de economia mista, as quais são criadas por lei, mas cujos cargos não o são. Portanto, quando a Lei nº 8.112/1990 estabelece, em seu art. 100, que ‘é contado para todos os efeitos o tempo de serviço público federal, inclusive o prestado às Forças Armadas’, deve-se entender, na linha do conceito estrito de servidor público, por ela adotado, que isso só se aplica ao servidor público em sentido estrito. Em face disso, o tempo de serviço prestado sob a égide do regime da Consolidação das Leis do trabalho, a uma sociedade de economia mista ou empresa pública, só pode ser contado, no âmbito do serviço público federal, para fins de aposentadoria e disponibilidade (art. 103, inciso

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V, da Lei nº 8.112/1990). 3. Apelação e remessa oficial parcialmente providas. (TRF 4ª R., Ap-Reex 5033642-81.2011.404.7100, 3ª T., Rel. p/ Ac. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, juntado aos autos em 02.08.2012) – grifei

Assim, não é possível computar o tempo de serviço trabalhado em empresa pú-blica federal para todos os fins, mas apenas para fins de aposentadoria e disponi-bilidade, na forma do art. 103, V, da Lei nº 8.112/1990. Sendo os demais pedidos decorrentes do acolhimento da alegação principal, inclusive o relativo ao enqua-dramento no PCCTAE, impõe-se a improcedência da ação.

Ante o exposto, rejeito as preliminares e, no mérito, julgo improcedente a presen-te ação ordinária, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC.

Condeno a autora ao pagamento das custas judiciais e de honorários advoca-tícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa. A exigibilidade das verbas resta suspensa em virtude da AJG concedida.”

Na questão de fundo, não verificando motivos que justifiquem a altera-ção do posicionamento adotado, a manutenção da sentença é medida que se impõe.

CoNCluSão

Portanto, não verificando motivos que justifiquem a alteração do posicio-namento adotado, mantenho, em sua integralidade, a sentença de improcedên-cia do pedido, visto que não é possível computar o tempo de serviço trabalhado em empresa pública federal para todos os fins, mas apenas para fins de aposen-tadoria e disponibilidade, na forma do art. 103, inciso V, da Lei nº 8.112/1990.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.

Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia

eXtRato De ata Da sessão De 04.08.2015Apelação Cível nº 5032243-12.2014.4.04.7100/RS

Origem: RS 50322431220144047100

Relator: Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia

Presidente: Vivian Josete Pantaleão Caminha

Procurador: Dr. Marcus Vinicius Aguiar Macedo

Apelante: Heloisa de Lima Flores

Advogado: Fernanda Ramalho Chiaradia

Apelado: Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Ufrgs

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Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 04.08.2015, na sequência 638, disponibilizada no DE de 24.07.2015, da qual foi intimado(a) o Ministério Público Federal, a Defensoria Pública e as demais Procuradorias Federais.

Certifico que o(a) 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígra-fe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação.

Relator Acórdão: Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia

Votante(s): Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia Desª Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha Des. Federal Luís Alberto D’ Azevedo Aurvalle

Luiz Felipe Oliveira dos Santos Diretor de Secretaria

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Parte Geral – Ementário de Jurisprudência7359 – Anistia – perseguição política – pretensão indenizatória – dilação probatória – ne ces-

sidade

“Administrativo e processual civil. Ditadura militar. Perseguição política. Dissolução de vínculos empregatícios. Prisão. Tortura. Danos morais e patrimoniais. Pretensão indenizatória. Dilação pro-batória. Necessidade. Cerceamento de defesa. Nulidade da sentença. 1. A Anistia política, instituída no art. 8º do ADCT, gerou direitos aos atingidos pelos atos de exceção, praticados durante o regime militar da década de 60, tendo a Lei nº 10.559/2002 disposto sobre a reparação econômica no seu art. 3º. 2. Hipótese em que, apesar de a matéria tratada nos autos demandar dilação probatória, sen-do insuficientes as provas documentais acostadas, o juízo a quo, ignorando o protesto do autor pela produção de provas complementares, como a oitiva de testemunhas e o depoimento pessoal do pro-movente, julgou antecipadamente a lide e indeferiu o pleito contido na exordial, fundamentando-se na insuficiência das provas coligidas nos autos. 3. Uma vez caracterizado o cerceamento do direito do autor à produção de provas, não há que ser o mesmo prejudicado em razão da não comprovação da sua condição de perseguido, custodiado e torturado, durante todo o período correspondente à Ditadura Militar no Brasil, impondo-se, in casu, a nulidade do julgado monocrático, com o conse-quente retorno dos autos ao juízo de origem para que seja sanado o vício apontado. 4. Acolhida a prefacial de nulidade por cerceamento de defesa, resta prejudicado o exame do mérito da de-manda. 5. Sentença anulada. Apelação provida.” (TRF 5ª R. – AC 0002239-53.2011.4.05.8200 – (580724/PB) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Paulo Machado Cordeiro – DJe 14.08.2015)

7360 – Bem público – mera detenção – benfeitorias – indenização indevida

“Apelação cível. Ação reintegração de posse. Área de domínio público. Posse de bem público ocu-pado por particular sem permissão. Mera detenção. Benfeitorias. Indenização indevida. Juros e cor-reção monetária. Pedidos prejudicados. Recurso provido. Em face do princípio da indisponibilidade do bem público, torna-se incogitável qualquer tese de posse do réu que possa inviabilizar a gestão da coisa pública, além do que a ocupação irregular do bem público não configura posse, mas mera detenção, pois a lei impede os efeitos possessórios em favor do ocupante ilícito, nos termos do art. 1.198, do Código Civil. Não há respaldo à pretensão indenizatória quanto às benfeitorias edifi-cadas ou o direito de retenção, vez que, em se tratando de construção em área pública, devem ser observadas as normas típicas do Direito Administrativo. A simples detenção precária não confere direito ao recebimento de indenização por benfeitorias.” (TJMT – Ap 72036/2014 – Relª Vandymara G. R. P. Zanolo – DJe 20.08.2015)

7361 – Concurso público – agente de polícia – vida pregressa e investigação social – sindicância – prática de ato infracional análogo ao crime de homicídio doloso – não recomendação

“Apelação. Mandado de segurança. Constitucional e administrativo. Concurso público. Cargo de agente de polícia da PCDF. Sindicância de vida pregressa e investigação social. Natureza peculiar da carreira policial. Prática de ato infracional análogo ao crime de homicídio doloso. Não recomen-dação. Ato legal. 1. O candidato que presta concurso público deve se submeter às condições edita-lícias que regem o certame. 2. Se o edital do concurso público para o provimento de vagas no cargo de agente de polícia da PCDF prevê a possibilidade de o candidato ser eliminado do certame por ter dado causa ou participado ‘de fato desabonador de sua conduta, incompatibilizando-o com o cargo de agente de polícia da carreira de polícia civil do Distrito Federal’, deve-se partir da presun-ção de que o candidato era sabedor de tal possibilidade, bem como de que a aceitou. 3. A carreira policial tem natureza ‘peculiar’, adjetivo, aliás, utilizado na própria ementa da lei, que ‘dispõe sobre o regime jurídico peculiar dos funcionários policiais civis da União e do Distrito Federal’. A própria adjetivação legal, bem como os requisitos específicos para ingresso na polícia civil, autorizam a conclusão no sentido de que, aqui, a análise da vida pregressa do candidato é requisito editalício que se reveste de especial significado, na medida em que existe uma moral da instituição, pública e

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apreensível a partir das regras internas da administração peculiar da carreira policial, que deve ser preservada. 4. A não recomendação de candidato ao cargo de agente de polícia que praticou ato infracional análogo ao crime de homicídio doloso não pode ser tida como ilegal, assim como está devidamente autorizada, não só por lei, mas também pelo princípio da moralidade constitucional, cabendo destacar, ainda, que o ato de não recomendação, em si, se contém dentro dos limites da proporcionalidade e da razoabilidade, princípios que, igualmente, têm assento na constituição da república. 5. Recurso de apelação não provido.” (TJDFT – Ap 20140110646445 – (882980) – 4ª T.Cív. – Rel. Des. Arnoldo Camanho de Assis – DJe 05.08.2015)

7362 – Concurso público – candidato excedente – contratação temporária – constitucionali-dade

“Constitucional. Administrativo. Apelação cível. Ação ordinária. Concurso público. Candidato excedente. Contratação temporária. Constitucionalidade. Preterição inocorrência. Inexistência de cargo público. Função pública e cargo público. Não sinônimos. Provimento. I – Não logrando a apelante êxito em classificar-se dentro do número de vagas (apesar de excedente), não faz jus à nomeação, uma vez que os aprovados em vagas remanescentes, i.e., além daquelas previstas para o cargo, possuem, apenas, mera expectativa de direito, diferentemente dos que obtiveram aprova-ção no limite do número de vagas definido no edital do concurso – que terão direito subjetivo à nomeação. Precedentes do STJ. II – Não é a simples contratação temporária de terceiros no prazo de validade do certame que gera direito subjetivo ao candidato aprovado à nomeação. Impõe-se a comprovação de tais contratações, não obstante existirem cargos de provimento efetivo a serem providos. Ademais, se a administração preencheu as vagas destinadas aos cargos de provimento efetivo de acordo com a ordem classificatória do concurso público vigente e, além disso, contratou terceiros de forma temporária, para o exercício de função pública, presume-se que há excepcional interesse público a demandar essa conduta, razão por que não se pode entender tenha atuado de forma ilegal ou mediante abuso de poder. III – Nas hipóteses de contratação temporária, o agente público exerce atribuições públicas como mero prestador de serviço, sem que para tanto precise ocupar um local na estrutura da administração pública (leia-se: cargo público). IV – Ape-lação provida.” (TJMA – AC 059936/2014 – (169332/2015) – Rel. Des. Cleones Carvalho Cunha – DJe 19.08.2015)

7363 – Concurso público – cargo público – acumulação – residência médica – possibilidade

“Administrativo. Concurso público. Acumulação de cargo público. Residência médica. Possibilida-de. 1. A residência médica é modalidade de ensino de pós-graduação, destinada a médicos, sob a forma de curso de especialização, de acordo com o art. 1º da Lei nº 6.932/1981 e não se caracte-riza como relação empregatícia. 2. Havendo compatibilidade de horário é possível a acumulação de dois cargos privativos na área de saúde, segundo o inc. XVI do art. 37 da Constituição Federal. 3. Recurso desprovido.” (TJDFT – PADM 20140110032262 – (886800) – 5ª T.Cív. – Relª Desª Maria de Lourdes Abreu – DJe 14.08.2015)

Destaque Editorial SÍNTESEDo voto da Relatora, destacamos:

“[...] Entendo que não há vedação prevista que impeça a autora de receber sua remuneração perante o órgão militar, uma vez que a residência médica não está classificada como relação empregatícia e, mesmo se fosse seria plenamente possível a acumulação de dois cargos pri-vativos na área de saúde, no âmbito das esferas civil e militar, desde que houvesse compati-bilidade de horário.

Ademais, as atividades da autora na residência médica foram encerradas em 30.12.2011, ou seja, na mesma data em que ingressou na corporação militar.

Confira-se aresto desta Corte de Justiça, nesse sentido, in verbis:

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APELAÇÃO – ACUMULAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS DE NATUREZA MILITAR E CIVIL – COR-PO DE BOMBEIROS MILITAR DO DISTRITO FEDERAL E SECRETARIA DE ESTADO DE SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL – I – O autor ocupa o cargo de militar do CBMDF, na área de saúde, e tomou posse no cargo de Auxiliar de Enfermagem na Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal. II – O art. 142, § 3º, inc. II, da CF/1988 deve ser interpretado em consonância com o art. 37, inc. XVI, alínea c, da CF/1988, a fim de assegurar ao profissional de saúde, ainda que militar, a possibilidade de exercício, cumulativo, de dois cargos ou empregos, um deles na Administração Pública direta ou indireta, sem implicar a sua transferência para a reserva. Des-se modo, poderá usufruir da garantia constitucional assegurada aos médicos militares no § 1º do art. 17 do ADCT. III – Apelação desprovida. (Acórdão nº 825293, 20120110070143APC, Relª Vera Andrighi, Revisor: Esdras Neves, 6ª T.Cív., Data de Julgamento: 08.10.2014, Publi-cado no DJe 21.10.2014, p. 160) [...]”

7364 – Concurso público – policial militar – exame médico – anomalia – não obsta exercício da atividade – admissão – possibilidade

“Constitucional e administrativo. Concurso público. Admissão. Policial militar. Distrito Fede-ral. Exame médico. Espinha bífida de S1. Não obsta exercício. Apto à atividade policial militar. 1. Constatado por meio de exames médicos que a anomalia constante do edital não obsta ao exercí-cio da atividade de policial militar, mostra-se excessiva e desarrazoada a decisão da administração em excluí-lo do certame para o qual havia sido regularmente aprovado. 2. Recurso conhecido e desprovido.” (TJDFT – Proc. 20140110049522 – (887817) – 5ª T.Cív. – Relª Desª Maria de Lourdes Abreu – DJe 20.08.2015)

7365 – Convênio – recursos federais – transferência voluntária – suspensão – prestação de con-tas – irregularidades – devido processo legal – exigência

“Constitucional e administrativo. Município. Convênio. Suspensão de transferência voluntária de recursos federais. Irregularidades na prestação de contas do ex-gestor. Adoção de medidas para sanar as irregularidades. Devido processo legal. Exigência. Jurisprudência do STF. Suspensão da res-trição do município junto ao cadastro Siafi. Possibilidade. Sentença reformada. 1. A municipalidade não pode sofrer as consequências negativas da suspensão de transferências de recursos federais e da vedação de celebração de novos convênios, em razão do registro de sua inadimplência nos cadas-tros mantidos pelo Governo Federal, em decorrência de irregularidades perpetradas pelo ex-gestor, se a administração atual comprova haver tomado as providências ao seu alcance para regularizar a situação. Tal posicionamento decorre das disposições da Instrução Normativa STN nº 1/1997. 2. Tendo a gestão atual do Município comprovado que estão sendo tomadas providências atinentes à instauração da devida Tomada de Contas Especial e que adotou medidas judiciais para respon-sabilização do ex-prefeito, com vistas à reparação dos danos causados pela má-administração dos recursos oriundos de convênio, não existe inércia na tomada de providências relacionadas à situa-ção de inadimplência que culminou na inscrição do Município-autor perante o Cauc. Regularidade. Siafi. 3. Cabe destacar que, conforme disposto na Lei nº 8.443/1992 – Lei Orgânica do TCU – e na Instrução Normativa STN nº 01/1997, art. 38, a instauração da Tomada de Contas Especial não é da competência do Município, não podendo, por isso mesmo, o ente municipal sofrer as conse-quências de eventual retardo das providências que não são de seu encargo. 4. Se não há resistência do atual gestor na prestação de contas a que está obrigado por lei, não pode o município – e, por consequência, a comunidade local – ser afetada com a suspensão das transferências financeiras federais e com o impedimento à celebração de novos convênios. 5. O STF decidiu que a inscrição de entidades políticas nos cadastros de inadimplentes se sujeita ao devido processo legal (Questão de Ordem em Ação Civil Originária nº 1.048-6/RS; AC 2156 REF-MC). 6. Além disso, o § 3º do art. 25 da Lei de Responsabilidade Fiscal, e o art. 26 da Lei nº 10.522/2002, admitem a suspensão da restrição quando se tratar de transferências de verbas destinadas à execução das ações relativas à

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educação, saúde e assistência social, bem como ações em faixa de fronteira. 7. Remessa oficial e a apelação a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – Ap-RN 0067858-14.2013.4.01.3400 – Rel. Des. Fed. Néviton Guedes – DJe 04.08.2015)

7366 – Desapropriação indireta – implantação de rodovia estadual – proprietários após o desa-possamento – ilegitimidade ativa

“Desapropriação indireta. Implantação de rodovia estadual. SCT-283. Deinfra. Ilegitimidade ativa dos autores. Proprietários que adquiriram o imóvel após o desapossamento. Precedentes. Extinção do feito sem resolução de mérito. Art. 267 do Código de Processo Civil. Proibição do enriquecimen-to ilícito. Recurso desprovido. Esta 3ª Câmara de Direito Público tem entendimento firmado no sen-tido de que, adquirido o imóvel pelo autor após o apossamento administrativo, falta-lhe a necessária legitimidade para ajuizar a ação de desapropriação indireta (Apelação Cível nº 2013.069004-3, de Ipumirim, Rel. Des. Stanley da Silva Braga).” (TJSC – AC 2014.082278-4 – Rel. Des. Pedro Manoel Abreu – DJe 06.08.2015)

Comentário Editorial SÍNTESEA apelação em tela é oriunda de ação de indenização por apossamento administrativo – de-sapropriação indireta ajuizada contra o Departamento Estadual de Infraestrutura – Deinfra.

Os autores almejavam o pagamento de indenização diante da ocupação, pelo Deinfra, de parte da sua propriedade, destinada à implantação da Rodovia Estadual SCT-283. Sobreveio sentença reconhecendo a ilegitimidade dos autores, já que a aquisição da propriedade ocorreu após a ocupação do imóvel pelo ente público.

Inconformado, interpuseram apelação alegando que quando da aquisição do imóvel inexistiu qualquer negociação entre os particulares quanto à área expropriada e que todos os direitos e obrigações relacionados à propriedade lhes foram transmitidos. Salientaram que como ad-quirentes do imóvel se sub-rogam em todos os direitos do antigo proprietário, inclusive o seu direito à indenização.

Na análise recursal, a 3ª Câmara de Direito Público do TJSC entendeu que, como ficou evi-dente que os apelantes adquiriram o imóvel desapossado após a realização da obra da rodovia que o atravessa, inexiste legitimidade para figurar no polo ativo da demanda, pois somente o antigo proprietário sofreu com o ato ilícito da Administração, cabendo-lhe a este a faculdade de exercer sua pretensão.

Em seu voto, o Relator assim se manifestou:

“[...] Sabe-se que a legitimidade das partes é uma das condições da ação, verificando-se que, em verdade, os autores da presente demanda não possuem legitimidade para figurar no polo ativo da demanda. Nesse sentido, em processo originário da comarca de Ipumirim decidiu esta Câmara de Direito Público:

APELAÇÃO CÍVEL, AGRAVO RETIDO E REEXAME NECESSÁRIO – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – ILEGITIMIDADE ATIVA – MATÉRIA DE ORDEM PÚ-BLICA CONHECIMENTO DE OFÍCIO – EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE SEU MÉRITO – ART. 267, § 3º, DO CPC – AQUISIÇÃO POSTERIOR AO DESAPOSSAMENTO – NA-TUREZA JURÍDICA DA AÇÃO – IRRELEVÂNCIA – PROIBIÇÃO DO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO – REMESSA OFICIAL CONHECIDA – RECURSOS VOLUNTÁRIOS NÃO CONHECIDOS, POR-QUANTO PREJUDICADOS – ‘[...] Na remota hipótese de os autores terem pago efetivamente o valor integral do imóvel, ou seja, sem cogitar a perda de parte do terreno à Administração, o que seria extraordinário, é razoável exigir que aquele que assumiu onerosidade alheia consiga demonstrar a sub-rogação do respectivo direito ao ressarcimento, nem que seja por contrato particular ou prova testemunhal, o que não ocorre nos autos, sequer em início de prova, sendo oportuna a lição de Nicola Framarino dei Malatesta, segundo o qual “se o ordinário se presume, o extraordinário se prova” (A lógica das provas em matéria criminal, LZN, 2003, p. 132). Ainda que se leve em conta a natureza jurídica da ação de desapropriação indireta, cuja doutrina e a jurisprudência não vacilam em afirmar, com razão, ser de direito real, tal fato não garante, por si só, a indenização dos atuais proprietários do bem expropriado. Caso se extraia dos autos que os proprietários não sofreram mal algum com a expropriação indevida

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da Administração, independentemente da natureza jurídica da actio, a pretensão indenizatória encontra óbice no princípio jurídico segundo o qual é vedado o enriquecimento ilícito, visto que somente que sofreu o dano tem o direito de ser reparado, consoante interpretação do art. 927 do Código Civil’ (TJSC, Apelação Cível nº 2014.007509-3, de Coronel Freitas, Rel. Des. Carlos Adilson Silva, J. 01.04.2014). (TJSC, Apelação Cível nº 2013.069004-3, de Ipumirim, Rel. Des. Tanley da Silva Braga, J. 03.06.2014)

Do referido voto extrai-se:

Esta 3ª Câmara de Direito Público tem entendimento firmado no sentido de que, adquirido o imóvel, pelo autor, após o apossamento administrativo, falta-lhe a necessária legitimidade para ajuizar a ação de desapropriação indireta, conforme os arestos a seguir transcritos:

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – EXPRO-PRIAÇÃO DO IMÓVEL – OBRA DE CONSTRUÇÃO E PAVIMENTAÇÃO DA RODOVIA SC-480 (TRECHO SÃO LOURENÇO DO OESTE – GALVÃO) – AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMÓVEL EM MOMENTO POSTERIOR AO DESAPOSSAMENTO – AUSÊNCIA DE PREJUÍZO COMPRO-VADO A SER INDENIZADO – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO CO-NHECIDO E DESPROVIDO – ‘É inadmissível a propositura de ação indenizatória na hipótese em que a aquisição do imóvel objeto da demanda tiver ocorrido após a edição dos atos nor-mativos que lhe impuseram as limitações supostamente indenizáveis [...]’ (EREsp 209297/SP, Min. Luiz Fux). (Apelação Cível nº 2013.009868-9, de São Lourenço do Oeste, Rel. Des. Carlos Adilson Silva, J. 25.03.2014)

Mais:

PROCESSUAL E ADMINISTRATIVO – DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – AQUISIÇÃO DA PRO-PRIEDADE POSTERIORMENTE À IMPLEMENTAÇÃO DA RODOVIA – SUB-ROGAÇÃO QUE NÃO OCORRE DE FORMA AUTOMÁTICA – INDENIZAÇÃO INDEVIDA – 1. A indenização prevista no art. 5º, XXIV, da Constituição Federal, só é devida ao proprietário que à épo-ca do esbulho foi afetado em sua esfera jurídica pela construção de rodovia estadual ou ao adquirente que expressamente tenha se sub-rogado nos direitos daquele. 2. Para sustentar o pedido indenizatório incumbe ao adquirente e atual proprietário demonstrar, por meio da declaração do proprietário anterior, que este não recebeu a respectiva indenização à época do esbulho e expressamente cedeu àquele o direito de recebê-la. A não ser assim, o adquirente estaria se locupletando de valores que deveriam ser destinados ao antigo proprietário com a finalidade de cobrir os prejuízos que teve com a afetação de seu imóvel. (TJSC, Apelação Cível nº 2013.068119-2, de Modelo, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, J. 10.12.2013).[...]”

7367 – Direito eleitoral – suspensão de direitos públicos – certidão de quitação eleitoral – expe-dição de passaporte – possibilidade

“Administrativo. Mandado de segurança. Expedição de passaporte. Suspensão de direitos políti-cos. Certidão de quitação eleitoral. 1. Em que pese a regulação da matéria, os Tribunais vêm mi-tigando o alcance dos efeitos da suspensão dos direitos políticos, limitando-os, neste viés, apenas ao exercício do direito do sufrágio, não alcançando, assim, a plenitude do exercício de locomoção previsto no art. 5º da Constituição Federal. 2. A certidão expedida pelo Cartório Eleitoral atestan-do a suspensão dos direitos políticos do impetrante em virtude de condenação criminal transitada em julgado é prova suficiente da inexistência de qualquer obrigação eleitoral pendente. 3. Pre- cedentes: TRF 1ª R., REOMS 2009.41.00.007222-1/RO, Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian, 6ª T., J. 22.09.2014, 03.10.2014 e-DJF1; TRF 5ª R., REOMS 531.172/SE, Rel. Des. Fed. José Maria Lucena, 1ª T., J. 16.05.2013, DJe 22.05.2013; TRF 4ª R., AC-Reex 2009.71.07.000195-5/RS, Relª Desª Fed. Maria Lúcia Luz Leiria, 3ª T., J. 25.08.2009, DE 11.09.2009, e TRF 3ª R., AC--Reex 2010.61.08.0032571/SP, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos, decisão de 06.05.2015, DE 13.05.2015; AC-Reex 2010.61.00.020546-7/SP, Rel. Des. Fed. Johonsom di Salvo, decisão de 14.05.2015, DE 19.05.2015, e REOMS 2012.61.24.000921-9/SP, Rel. Des. Fed. Carlos Muta,

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decisão de 19.12.2014, DE 09.01.2015. 4. Apelação, agravo retido e remessa oficial a que se nega provimento.” (TRF 3ª R. – Ap-RN 0013997-10.2013.4.03.6100/SP – 4ª T. – Relª Desª Fed. Marli Ferreira – DJe 03.08.2015)

Comentário Editorial SÍNTESEÉ admissível a emissão de passaporte para os condenados criminalmente a suspensão dos direitos políticos? Essa foi a celeuma da apelação em epígrafe.Cuida-se de mandado de segurança impetrado com o intuito de obter provimento jurisdicional determinando, assim, que a autoridade impetrada proceda com a imediata emissão de pas-saporte no nome do impetrante, mediante certidão eleitoral com restrição, esta referente ao cumprimento de suspensão dos direitos políticos.O juízo a quo julgou procedente o pedido, concedendo a segurança.Diante disso, a União Federal apelou sustentando a legalidade do procedimento administrativo adotado face à legislação de regência, pois a expedição do passaporte está atrelada à certi-dão de quitação de débitos eleitorais, a qual o apelado não pode obter, já que está com seus direitos políticos suspensos.A 4ª Turma do TRF 3ª Região afirmou que os tribunais vêm mitigando o alcance da suspensão dos direitos políticos, limitando-os apenas ao exercício do sufrágio, assim, não abrange a ple-nitude do exercício de locomoção previsto no art. 5º da Nossa Carta Magna.Por fim, negou provimento ao recurso, mantendo a sentença na íntegra.Em seu voto, a Relatora citou os seguintes precedentes:“[...] Nesse exato diapasão, remansosa jurisprudência deste E. Tribunal e demais c. Cortes Regionais Federais, verbis:‘ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – EMISSÃO DE PASSAPORTE – SUS-PENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS EM RAZÃO DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA – ART. 7º, § 1º, V, DO CÓDIGO ELEITORAL – I – A teor do art. 7º do Código Eleitoral, o eleitor que deixar de votar e não se justificar perante o juiz eleitoral até 30 (trinta) dias após a realiza-ção da eleição, incorrerá na multa de 3 (três) a 10 (dez) por cento sobre o salário-mínimo da região, imposta pelo juiz eleitoral e cobrada na forma prevista no art. 367. Sem a prova de que votou na última eleição, pagou a respectiva multa ou de que se justificou devidamente, não poderá o eleitor, nos termos do inciso V do § 1º do citado dispositivo legal, obter passaporte ou carteira de identidade. II – Na hipótese em que a pendência que obstaculariza a emissão de passaporte cinge-se ao descumprimento da obrigação eleitoral em razão da suspensão dos direitos políticos decorrente de sentença penal condenatória, deve ser afastada a censura do art. 7º, § 1º, inciso V, do Código Eleitoral que impede a emissão de passaporte, porque “Afigura-se ilegítimo exigir do cidadão cujos direitos políticos foram suspensos, em razão de sentença penal condenatória, que comprove o cumprimento das obrigações eleitorais durante o período de suspensão”.” (TRF 1ª R., REOMS 5654-70.2010.4.01.4100/RO, Rel. Des. Fed. Souza Prudente, 5ª T., 15.06.2012). III – Remessa oficial a que se nega provimento.’ (TRF 1ª R., REOMS 2009.41.00.007222-1/RO, Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian, 6ª T., J. 22.09.2014, 03.10.2014 e-DJF1)‘CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – IMPEDIMENTO DE OBTENÇÃO DE PASSAPOR-TE – COMPROVANTE DE QUITAÇÃO ELEITORAL – CIDADÃO QUE TEVE SEUS DIREITOS POLÍTICOS SUSPENSOS POR FORÇA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO – ADOÇÃO DA TÉCNICA DA MOTIVAÇÃO REFERENCIADA (PeR ReLAtIOneM) – AUSÊNCIA DE NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – ENTENDIMENTO DO STF – 1. Cuida-se de remessa obrigatória de sentença que concedeu a segurança para determinar que a Certidão de Quitação Eleitoral apresentada pelo impetrante seja aceita pelo impetrado para fins de expedição do passaporte pretendido. 2. A mais alta Corte de Justiça do país já fir-mou entendimento no sentido de que a motivação referenciada (per relationem) não constitui negativa de prestação jurisdicional, tendo-se por cumprida a exigência constitucional da fun-damentação das decisões judiciais. Adota-se, portanto, os termos da sentença como razões de decidir. 3. [...] “A necessidade de comprovação de quitação com a esfera eleitoral, para fins de expedição de passaporte, resta perfeita ante a apresentação de certidão eleitoral que declara que o interessado não pôde votar ou ser votado na eleição anterior, por força de decisão judicial que suspendeu seus direitos políticos, fl. 42. Ou seja: Não se pode exigir do cidadão que teve os direitos políticos suspensos que comprove o cumprimento de obrigação eleitoral no período

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da suspensão, eis que inexistente qualquer obrigação a ser quitada e atestada pela Justiça Eleitoral, afastando-se a exigência contida no art. 7º, § 1º, inciso V, da Lei nº 4.737/1965 e no art. 20, inciso III, do Decreto nº 5.978/2006”. 4. [...] “Por fim, observa-se que o próprio impetrado reconhece o equívoco cometido pelo órgão, no tocante ao objeto em pauta, regis-trando já terem sido determinadas as providências para evitar que equívocos como este se repitam, como ainda indica estar já procurando resolver a celeuma especificamente relativa ao presente caso, fl. 84”. Remessa obrigatória improvida.’ (TRF 5ª R., REOMS 531.172/SE, Rel. Des. Fed. José Maria Lucena, 1ª T., J. 16.05.2013, DJe 22.05.2013)

‘MANDADO DE SEGURANÇA – EXPEDIÇÃO DE PASSAPORTE – SUSPENSÃO DE DIREITOS POLÍTICOS – CERTIDÃO DE QUITAÇÃO ELEITORAL – A certidão expedida pelo Cartório Elei-toral atestando a suspensão dos direitos políticos do impetrante em virtude de condenação cri-minal transitada em julgado é prova suficiente da inexistência de qualquer obrigação eleitoral pendente. Uma vez apresentada à autoridade administrativa, constitui documento hábil para autorizar a confecção de passaporte.’ (TRF 4ª R., Ap-Reex 2009.71.07.000195-5/RS, Relª Desª Fed. Maria Lúcia Luz Leiria, 3ª T., J. 25.08.2009, DE 10.09.2009) [...]”

7368 – Ensino – Enem – aluno habilitado – inscrição – pagamento – erro do sistema bancário – participação – possibilidade

“Administrativo. Ensino superior. Exame Nacional de Ensino Médio – Enem. Inscrição de aluno habilitado. Equívoco no pagamento da inscrição. Princípio da razoabilidade. Participação asse-gurada. Sentença mantida. 1. Não se mostra razoável impedir a estudante de participar do exame Enem/2013, por eventual erro do sistema bancário quando do pagamento do boleto, considerando, sobretudo, que sua participação no certame não acarretará prejuízos à Administração Pública. 2. No caso, foi concedida liminar, em 24.10.2013, garantindo à impetrante a participação no Enem/2013, não sendo aconselhável a desconstituição da situação fática, mormente quando incapaz de gerar prejuízo à ordem jurídica e à Administração Pública. 3. Realizadas as provas do Exame Nacional do Ensino Médio 2013 – Enem/2013, por força de medida liminar, confirmada por sentença, milita em favor da impetrante a teoria do fato consumado, preservada, assim, a realidade fática exaurida, mantida, por conseguinte, a segurança concedida, sob pena de prejuízo ímpar e, portanto, despro-porcional, à Requerente. Precedentes desta Corte. 4. Remessa oficial a que se nega provimento.” (TRF 1ª R. – RN 0062318-82.2013.4.01.3400 – Rel. Des. Fed. Néviton Guedes – DJe 04.08.2015)

Destaque Editorial SÍNTESEEm seu voto, o Relator citou os seguintes precedentes:

“[...] Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO – ENSINO – MANDADO DE SEGURANÇA – INSCRIÇÃO ENEM/2010 – EQUÍVOCO NO PAGAMENTO DA INSCRIÇÃO – PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE – POS-SIBILIDADE DE PARTICIPAÇÃO NO CERTAME – I – Embora as regras do edital vinculem a Administração Pública e os candidatos, no caso em questão, verifica-se que o impetrante seria prejudicado por um erro da instituição bancária ao efetuar o pagamento da inscrição. Ademais, a participação da aluna no Enem/2010 não acarretará prejuízos à Administração Pública. Portanto, em atenção ao princípio da razoabilidade, deve a autoridade impetrada permitir que a impetrante participe do certame. II – Remessa oficial a que se nega provimento. (REOMS 0049538-18.2010.4.01.3400/DF, Rel. Des. Fed. Kassio Nunes Marques, 6ª T., 15.09.2014 e-DJF1, p. 428)

ADMINISTRATIVO – INSCRIÇÃO NO ENEM-2011 – POSSIBILIDADE – TEORIA DO FATO CONSUMADO – APLICAÇÃO – I – Realizadas as provas do Exame Nacional do Ensino Médio 2011 (Enem/2011), por força de medida liminar, confirmada por sentença, milita em favor da Impetrante a teoria do fato consumado, preservada, assim, a realidade fática exaurida, mantida, por conseguinte, a segurança concedida, sob pena de prejuízo ímpar e, portanto, desproporcional, à Requerente. Precedentes dos TRF 2ª R. e TRF 5ª R. II – Remessa oficial a que se nega provimento. (REO 0012765-95.2011.4.01.3801/DF, Rel. Des. Fed. Jirair Aram Meguerian, 6ª T., 05.06.2014 e-DJF1, p. 848) [...]”

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7369 – Ensino – programa “Ciência sem Fronteiras” – comunicação visual design – direito à pré--seleção – existência

“Direito administrativo. Apelação cível. Ensino superior. Programa ‘Ciência sem Fronteiras’. Curso superior. Comunicação visual design. Direito à pré-seleção. Existência. 1. A sentença negou à auto-ra-apelante, estudante de Comunicação Visual Design, prosseguir nas etapas seguintes da Chamada Pública nº 170/2013 do Programa Ciência sem Fronteiras, Graduação Sanduíche no Reino Unido, e assegurar vaga em universidade britânica, ou, não sendo possível, em próximo edital, fundada em que seu curso superior não está contemplado no tema Indústria Criativa, previsto no subitem 2.1, p, do edital. 2. Sabe-se que o edital do concurso vincula a Administração Pública e os participantes do certame. No caso, o subitem 2.1, p, disponibiliza bolsas de estudo aos alunos de curso superior inserido no tema Indústria Criativa, área de atuação prioritária do programa federal, em obediência ao art. 1º da Portaria Interministerial nº 1, de 09.01.2013. 3. A seleção dos candidatos vem sendo realizada com base, somente, na nomenclatura do curso, desconsiderando os temas prioritários de atuação do programa federal, e, iniciado pelo epíteto ‘comunicação’, restou o Curso Comunicação Visual Design enquadrado na área de Ciências Humanas. 4. Descabe ao Judiciário analisar os crité-rios adotados pelos apelados na avaliação e seleção de candidatos ao programa educacional, salvo quando o exercício dessa prerrogativa violar os princípios da moralidade e da legalidade. Este é o caso. 5. Ofende os princípios da vinculação ao instrumento convocatório e da legalidade a seleção de candidatos com base apenas na nomenclatura do curso, a despeito de portaria interministerial e regra editalícia, que elegem, expressamente, para o deferimento de bolsas de estudo, o critério de inserir-se o curso superior em temas de atuação prioritária do programa federal. 6. Na hipótese, a grade curricular do curso evidencia rol de disciplinas abarcadas pelo tema Indústria Criativa, tendo a UFRJ assinalado aos apelados haver mal-entendido tocante ao nome da graduação, pois o Curso Comunicação Visual Design insere-se na área Design Gráfico, distinguindo-se dos cursos de Comunicação. De mais a mais, outro aluno, em situação idêntica, teve a candidatura deferida, recebendo tratamento diverso, mácula ao princípio da isonomia. 7. É assustador constatar a confis-são da Capes de que elimina ou aproveita candidatos unicamente com base na nomenclatura do curso, por absoluta falta de recursos humanos e materiais para apreciar adequadamente todos os pedidos que lhe são dirigidos. Entre amadorismo e superficialidade, trata-se da admissão, pela auto-ridade administrativa, de que não está cumprindo a contento seu mister, pondo em risco concreto e direto o fiel cumprimento dos ditames legais e regulamentares aplicáveis ao caso e, por consequ-ência, dando ensejo ao controle jurisdicional de todos os casos em que a omissão administrativa tenha gerado lesão concreta a direito (TRF 2ª R, 7ª T.Esp., AI 2015.00.00.003310-3, Rel. Des. Fed. José Antônio Lisbôa Neiva, Public. em 25.05.2015; TRF 2ª R., 5ª T.Esp., Ag 2015.00.00.000269-6, Rel. Des. Fed. Aluísio Gonçalves de Castro Mendes, Public. em 13.05.2015; TRF 2ª R., 7ª T.Esp., Ag 2015.00.00.000032-8, Rel. Juiz Fed. Conv. José Arthur Diniz Borges, Public. em 10.02.2015). 8. Não há nulidade, contudo, na eliminação do apelante da Chamada Pública nº 170/2013, pois, conforme subitem 11.1, o cronograma veda convocações após junho de 2014. Nada obstante, para situação análoga de superação do prazo em virtude de recurso administrativo, os alunos vêm sendo inseridos em chamada subsequente. Logo, de rigor a nomeação do apelante em vaga futura, disponibilizada por edital vindouro. [TRF 2ª R., 7ª T.Esp., AC 2013.51.01.024406-6, Rel. Des. Fed. Reis Friede, Public. em 19.01.2015]. 9. Provido o pedido de destinação de vaga em próximo edital, restaram prejudicados, à evidência, os pedidos subsidiários de indenização por danos morais e materiais. Os danos materiais não se verificam, pois o valor reputado perdido pelo não recebimento da bolsa a tempo e modo será oportunamente pago, mediante a respectiva contrapartida. E os da-nos morais também não se fazem presentes, pois toda a controvérsia a respeito da elegibilidade da autora para o programa longe fica de vulnerar direitos da personalidade ou aspectos essenciais de sua subsistência. 10. Apelação parcialmente provida.” (TRF 2ª R. – AC 0121632-33.2014.4.02.5101 – 6ª T.Esp. – Rel. Juiz Fed. Conv. Antônio Henrique Correa da Silva – DJe 04.08.2015)

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7370 – Ensino – Prouni – estudante bolsista – transferência externa – possibilidade

“Constitucional. Administrativo. Mandado de segurança. Ensino superior. Programa Universidade para Todos – Prouni. Estudante bolsista. Transferência externa. Possibilidade. Sentença confirmada. I – O Programa Universidade para Todos – Prouni destina-se à concessão de bolsas de estudo, para estudantes de cursos de graduação e sequenciais, em instituições privadas de ensino supe-rior, excluídos aqueles portadores de diploma de curso superior (Lei nº 11.096/2005, art. 1º, § 1º). II – Nos termos do art. 49 da Lei nº 9.394/1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, ‘as instituições de educação superior aceitarão a transferência de alunos regulares, para cursos afins, na hipótese de existência de vagas, e mediante processo seletivo’. III – Na espécie dos autos, não há, nas normas que tratam da matéria, qualquer vedação quanto à possibilidade do aluno, beneficiário do Prouni, transferir o seu curso superior para Instituição de Ensino diversa, a caracterizar, na espécie, a abusividade e ilegalidade da restrição imposta, posto que há que se ter em mente que o benefício instituído pelo Programa Universidade para Todos tem por destinatário central o estudante, para a viabilização de sua formação em nível superior. IV – Remessa oficial desprovida. Sentença confirmada.” (TRF 1ª R. – RN 0002263-16.2014.4.01.3600 – Rel. Des. Fed. Souza Prudente – DJe 13.07.2015)

Comentário Editorial SÍNTESECuida-se de Reexame Necessário oriundo de sentença que concedeu a segurança pleitea-da pela impetrante, a qual consistia na transferência de bolsa de estudos do Programa de Universidade para Todos – Prouni, do curso superior de Secretariado Executivo Bilíngue na Universidade Integradas de Cuiabá – FIC, da qual a impetrante era beneficiária, para o curso de Direito na Universidade de Cuiabá – Unic, em virtude da extinção daquele curso superior.

O juízo a quo entendeu que a impetrante atendeu os requisitos legais definidos na Lei nº 11.096/2005, que instituiu o Prouni, logo, na hipótese de desvinculação do curso, o estu-dante tem direito de ser transferido, com prioridade, para curso superior idêntico ou equivalen-te, ofertado por outra Instituição de Ensino Superior participante do Programa.

Na análise do reexame, a 5ª Turma do TRF 1ª Região entendeu que não há normas que vedem a transferência da impetrante, já que o benefício instituído pelo Prouni tem por destinatário o estudante.

O Relator, em seu voto, citou os seguintes precedentes:

“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL – MANDADO DE SEGURANÇA – ENSINO SUPE-RIOR – PROGRAMA UNIVERSIDADE PARA TODOS (PROUNI) – ESTUDANTE BOLSISTA – TRANSFERÊNCIA – POSSIBILIDADE – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ DESCARACTERIZADA – I – O Programa Universidade para Todos – Prouni destina-se à concessão de bolsas de estudo, para estudantes de cursos de graduação e sequenciais, em instituições privadas de ensino superior, excluídos aqueles portadores de diploma de curso superior (Lei nº 11.096/2005, art. 1º, § 1º). II – Nos termos do art. 49 da Lei nº 9.394/1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, ‘as instituições de educação superior aceitarão a transferência de alunos regulares, para cursos afins, na hipótese de existência de vagas, e mediante processo seletivo’. III – Na espécie dos autos, não há na referida lei qualquer vedação quanto à possibilidade do aluno transferir o seu curso superior para Instituição de Ensino diversa, a caracterizar, na espécie, a abusividade e ilegalidade da restrição imposta em norma infralegal, em manifesta violação ao princípio da hierarquia das leis, confrontando, ainda, com a garantia fundamental insculpida em nossa Carta Magna, na determinação de que ‘ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei’ (CF, art. 5º, II). III – Não se verifica na hi-pótese litigância de má-fé da apelante, pois inexistentes quaisquer dos itens previstos no art. 17 do CPC. IV – Apelação provida, para conceder a segurança impetrada.” (AMS 0000982-10.2009.4.01.3500/GO, Rel. Des. Fed. Souza Prudente, 5ª T., e-DJF1 de 01.06.2012, p. 124)

“MANDADO DE SEGURANÇA – ADMINISTRATIVO – ENSINO SUPERIOR – ESTUDANTE IN-SERIDO NO PROUNI – TRANSFERÊNCIA EXTERNA PARA INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPE-RIOR DIVERSA – EMISSÃO DO TERMO DE LIBERAÇÃO DE TRANSFERÊNCIA PELA INSTI-TUIÇÃO DE ORIGEM – SENTENÇA REFORMADA – 1. O Programa Universidade para Todos

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– Prouni destina-se à concessão de bolsas de estudo, para estudantes de cursos de graduação e sequenciais, em instituições privadas de ensino superior, excluídos aqueles portadores de diploma de curso superior (Lei nº 11.096/2005). 2. O art. 49 da Lei nº 9.394/1996 – que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional – dispõe que ‘as instituições de educa-ção superior aceitarão a transferência de alunos regulares, para cursos afins, na hipótese de existência de vagas, e mediante processo seletivo’. 3. O Ministério da Educação, no exercício do seu poder regulamentar, por meio da Portaria MEC nº 3.121/2005, facultou ao estudante transferir sua bolsa para outra instituição, observada a proporção entre alunos pagantes e bol-sistas, condicionando-a à anuência das instituições de ensino de origem e de destino. 4. Não há impedimento legal para que a estudante obtenha a pleiteada transferência, afigurando-se abusivas e ilegais as restrições impostas pela IES, em decorrência da recusa arbitrária e sem fundamento, por manifesta violação à garantia constitucional de observância ao princípio da legalidade. 5. Apelação a que se dá provimento para conceder a segurança pretendida para assegurar à Impetrante a transferência da bolsa de estudos do Prouni para o Centro Universi-tário de Belo Horizonte – UNIBH.” (AMS 0031025-29.2011.4.01.3800/MG, Rel. Des. Fed. Néviton Guedes, 5ª T., e-DJF1 p. 321 de 18.12.2014)

7371 – Ensino – registro de diploma – processo de reconhecimento de curso – tramitação – dano moral – inexistência

“Apelação e remessa necessária. Direito administrativo. Registro de diploma do curso de arquitetu-ra e urbanismo. Finac. Processo de reconhecimento de curso em tramitação junto ao MEC. Dano moral. Improvimento. 1. Trata-se de apelação e remessa necessária oriunda da sentença proferida nos autos da ação ordinária, objetivando a expedição e registro de diploma de aluno graduado no Curso de Arquitetura e Urbanismo da Finac bem como o recebimento de reparação por danos morais. 2. A Lei nº 12.378 exige para o exercício da referida profissão diploma de graduação em arquitetura e urbanismo, obtido em instituição de ensino superior oficialmente reconhecida pelo poder público e que se encontre inscrito no Conselho de Arquitetura e Urbanismo do seu Estado ou do Distrito Federal. Referida Lei foi regulamentada pelo Dec. 5.773/2006, que estabelece que a educação de nível superior depende de autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público. 3. Ocorre que, na hipótese dos autos, os autores lograram concluir o curso de Arquitetura e Urbanis-mo pela Faculdade Nacional – Finac, instituição de ensino superior credenciada pelo Ministério de Educação que, através da Portaria nº 562, de 22 de março de 2001, autorizou ‘o funcionamento do curso de Arquitetura e Urbanismo, bacharelado, a ser ministrado pela Faculdade Nacional, mantida pelo Colégio Nacional Ltda., ambos com sede em Vitória, no Estado do Espírito Santo’. Assim, a demora pela expedição/registro do diploma fere frontalmente o direito dos autores de obterem o diploma por já ter concluído o curso e todas as obrigações acadêmicas. 4. Não se verifica qualquer ilegalidade na exigência imposta pela Ufes ao condicionar o registro dos diplomas dos estudantes do curso de Arquitetura e Urbanismo da Finac ao seu respectivo reconhecimento pelo MEC. No entanto, não se mostra razoável que os alunos, cumpridores de suas obrigações acadêmicas, sejam prejudicados, diante da inércia da faculdade em tomar as medidas necessárias ao pronto reco-nhecimento da instituição perante o MEC. 5. Por outro lado, o dano moral representa um reflexo social de um ultraje que abala a imagem ou a honra do ofendido, ou seja, a obrigação de reparação do dano moral decorre da ofensa à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem, em razão de conduta antijurídica. Partindo de tais premissas, é de se perceber que inexiste prova nos autos de que, em virtude da ausência do registro do diploma os autores ficaram concretamente impedidos de trabalhar, fazer pós-graduação e participar de concursos públicos. 6. Apelação e remessa necessária conhecidas e improvidas.” (TRF 2ª R. – AC 0005678-50.2011.4.02.5001 – 6ª T.Esp. – Rel. Juiz Fed. Conv. Alexandre Libonati de Abreu – DJe 05.08.2015)

Comentário Editorial SÍNTESECuida-se de apelação cível oriunda de sentença proferida nos autos de ação ajuizada por al-guns estudantes contra a União Federal e Universidade Federal do Espírito Santo – Ufes, onde

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almejavam a expedição e o registro de seus diplomas de graduação bem como o recebimento de reparação por danos morais.

Na inicial, os autores alegaram que concluíram o curso de Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade – Finac de Vitória/ES e, apesar de receberem o certificado de conclusão do curso, não obtiveram o registro de seus diplomas junto à Ufes. Enfatizaram que diante da omissão e ineficiência do MEC que se abstém por quase dois anos da prática do ato administrativo do reconhecimento do curso, não conseguem obter o registro dos diplomas.

Por fim, ressaltaram que estão impedidos de trabalhar, fazer pós-graduação e participar de concursos públicos, acarretando-lhes prejuízos de ordem moral.

Sobreveio sentença que julgou procedente os pedidos em relação à Ufes, afirmando que os autores têm direito ao registro de seus diplomas, independentemente da decisão do procedi-mento de reconhecimento do curso de arquitetura da Finac junto ao MEC. Quanto ao pedido de indenização por danos morais em relação à União Federal, julgou improcedente.

Irresignados com a decisão proferida, os autores interpuseram apelação sustentando que pos-suem direito ao recebimento de reparação por danos morais, já que o MEC não desempenhou bem seu dever de fiscalização, permitindo que a Finac funcionasse normalmente e fizesse de vítimas todos os seus alunos do curso de arquitetura e urbanismo.

A 6ª Turma Especializada do TRF 2ª Região entendeu que a sentença deve ser mantida, já que decidiu a lide com absoluta propriedade. Assim, negou provimento ao recurso.

Do voto do Relator, destacamos:

“[...] 12. Com efeito, não se verifica qualquer ilegalidade na exigência imposta pela Ufes ao condicionar o registro dos diplomas dos estudantes do curso de Arquitetura e Urbanismo da Finac ao seu respectivo reconhecimento pelo MEC. No entanto, não se mostra razoável que os alunos, cumpridores de suas obrigações acadêmicas, sejam prejudicados, diante da inércia da faculdade em tomar as medidas necessárias ao pronto reconhecimento da instituição pe-rante o MEC. Entendimento contrário importaria em admitir que as aulas de referido curso só poderiam ter seu início após o reconhecimento pelo órgão competente, o que pode demandar tempo, inviabilizando o funcionamento da própria instituição de ensino.

13. Considerando a boa-fé das autoras que já concluíram todos os créditos e inclusive já cola-ram grau, obstar o exercício de sua profissão configura violação ao princípio do Livre Exercício da Profissão consagrado no art. 5º, XIII da CF.

14. Frise-se que não se pode negar que o ato de autorização concedido pelo MEC criou legí-tima expectativa nos estudantes de que o curso seria, ao fim, reconhecido pelas autoridades públicas. Eventuais irregularidades apuradas durante a fase de reconhecimento não devem prejudicar os alunos que se inscreveram de boa-fé em cursos já autorizados, devendo a insti-tuição de ensino superior apenas impedir a inscrição de novos estudantes. É o que se infere do art. 44, IV do Decreto:

‘Art. 44. O Secretário, nos processos de autorização, reconhecimento e renovação de reconhe-cimento de cursos superiores de tecnologia, poderá, em cumprimento das normas gerais da educação nacional:

I – deferir o pedido, com base no catálogo de denominações de cursos publicado pela Secre-taria de Educação Profissional e Tecnológica;

II – deferir o pedido, determinando a inclusão da denominação do curso no catálogo;

III – deferir o pedido, mantido o caráter experimental do curso;

IV – deferir o pedido exclusivamente para fins de registro de diploma, vedada a admissão de novos alunos; ou

V – indeferir o pedido, motivadamente.’

15. Assim, examinando-se a questão à luz dos princípios da segurança jurídica e da confiança, deve-se autorizar a emissão e a averbação do certificado das autoras que, confiando na legiti-midade do ato administrativo de autorização, investiram seu tempo e dinheiro com a finalidade de obter um certificado de graduação em ensino superior. A negativa da Administração, na hipótese concreta, fere o princípio da razoabilidade, tendo em vista que o único prejudicado, nesse caso, é o próprio aluno. E também vai de encontro ao princípio da proporcionalidade, eis que impõe sanção superior àquela verdadeiramente necessária à consecução do interesse público, além de negar aos autores o seu direito fundamental de exercer livremente a sua profissão, consagrado no art. 5º, XIII da Constituição da República de 1988.

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16. Por outro lado, a reparação por dano moral exige a descrição de um dano específico e concreto, capaz de assegurar a reparação pela dor moral suportada por fato constrangedor, o que não se verificou nos presentes autos. [...]”

7372 – Ensino – Sistema de Seleção Unificada (Sisu) – cadastramento – convocação – Internet – publicação – princípio da publicidade – violação – ausência

“Administrativo. Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Convocação para cadastramento. Publicação. Internet. Ausência de violação ao princípio da publicidade. I – Trata-se de apelação interposta con-tra sentença que julgou improcedente o pedido em sede de ação ordinária, objetivando que seja a UFCG compelida a efetivar a matrícula da demandante no curso de Letras-Língua Francesa. II – A apelante pugnou pela reforma da sentença, alegando, em síntese, que, embora tenha sido aprovada através do Sisu/2013, não conseguiu efetuar o cadastramento para efetivação de sua matrícula, por não ter acesso às informações acerca dos prazos de comparecimento, eis que a publicação foi efetivada, exclusivamente, pela internet, e por morar em um sítio na zona rural do município de Areia/PB e ser de uma família de baixa renda, não tem acesso à Internet, nem em sua residência nem na zona rural do município, restando violado o princípio da publicidade. III – A alegação de afronta ao princípio da publicidade, em virtude da utilização exclusiva da internet como meio de divulgação das informações relativas ao Sisu/2013, não tem razoabilidade, especialmente quando comparada, por exemplo, à divulgação por meio de Imprensa Oficial (Diário Oficial), forma tradi-cional de divulgação dos atos administrativos. IV – Ainda a respeito da alegação de ter sido violado o princípio da publicidade, uma vez que a apelante reside na zona rural e que a divulgação de sua convocação para cadastramento no curso em que fora classificada se deu, exclusivamente via Internet, torna-se importante se ressaltar que o Edital nº 001/2013, divulgado em jan/2013, já tinha datas previstas para a divulgação da convocação para o cadastramento nos dias 14 e 15.05.2013. V – De outra parte, verifica-se que a divulgação da convocação da apelante para o cadastramento no curso de Letras Língua Francesa, ocorreu nas datas previstas no Edital nº 001/2013, publicado em 17.01.2013, podendo, ainda, a apelante ser representada por procurador legalmente constituí-do, nos termos do art. 23 da Resolução nº 14/2012 da Câmara Superior de Ensino da UFCG, regente do processo seletivo em discussão. VI – Como é do conhecimento de todos, as disposições constan-tes do edital regente do concurso, sem impugnação dos participantes a respeito, passa a ser lei entre as partes, vinculando tanto a Administração Pública como o particular, devendo ser observadas todas as regras no momento da participação do certame, ou seja, ao se submeter ao processo seleti-vo, a parte apelante vinculou-se ao estabelecido no edital, e como já dito, é lei entre as partes, não competindo ao Poder Judiciário apreciar e julgar o mérito dos atos administrativos, salvo em caso de flagrante ilegalidade. VII – Apelação improvida. [07].” (TRF 5ª R. – AC 0001287-03.2013.4.05.8201 – (567942/PB) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Conv. Ivan Lira de Carvalho – DJe 06.08.2015)

7373 – Improbidade administrativa – indisponibilidade de bens – contas bancárias – bloqueio – inviabilidade

“Agravo de instrumento. Ação de improbidade administrativa. Deferimento de indisponibilidade de bens e bloqueio de valores depositados em contas bancárias do agravante. Inviabilidade do bloqueio das contas bancárias, porquanto valores depositados por terceiros em tal conta-corrente atinge valores recebidos a título de salário destinadas ao sustento do agravante e de sua família. Verba alimentar. Art. 649, IV, do CPC. Agravo parcialmente provido. 1. A hipótese dos autos trata de inviabilidade do bloqueio das contas bancárias e ativos financeiros do agravante, eis que as quantias recebidas por liberdade de terceiro depositadas em conta-corrente e ativos financeiros atingem valores a título de salário, destinados ao sustento do agravante e de sua família. 2. A ver-ba alimentar é absolutamente impenhorável e contém princípio de ordem pública, cabendo ao magistrado resguardar o comando do art. 649 do CPC, razão pela qual há vício no decisum que

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determinou o bloqueio das contas bancárias e ativos financeiros do agravante. 3. Agravo conhecido e parcialmente provido.” (TJAP – AI 0000511-18.2015.8.03.0000 – C.Única – Rel. Juiz Conv. Mário Mazurek – DJe 03.08.2015)

7374 – Improbidade administrativa – indisponibilidade de bens – substituição por precatório – impossibilidade

“Agravo regimental em apelação cível. Ação de improbidade administrativa. Indisponibilidade dos bens móveis e imóveis. Medida cautelar devida. Impossibilidade da substituição por precatório. Art. 655 do CPC. Recurso provido. A Carta Maior em seu art. 37, § 4º junto com a Lei nº 8.429/1992, além de prever sanções de caráter civil ao agente processado pela prática de impro-bidade administrativa, elencou algumas medidas cautelares, objetivando assegurar o ressarcimento do Erário público pelo agente ímprobo, como, p. exemplo, a indisponibilidade de bens. Quanto à possibilidade de substituição da indisponibilidade dos bens recaia sobre o precatório e não sobre bens imóveis e móveis, a princípio, esclareço que a orientação da Corte Superior é no sentido de que a penhora (ou eventual substituição de bens penhorados) deve ser efetuada conforme a ordem legal, prevista no art. 655 do Caderno Processual. Não obstante o agravado Élio José alegue que o precatório é um bem penhorável equivalente ao dinheiro, o Superior Tribunal de Justiça enquadra--o na hipótese do inciso XI do art. 655 do Código de Processo Civil, sendo considerado direito de crédito, consoante REsp 881.014/RS, isto é, constitui última opção para dar em garantia, segundo o rol previsto no art. alhures.” (TJMS – AgRg 0604235-34.2012.8.12.0000/50000 – 1ª C.Cív. – Rel. Des. Marcelo Câmara Rasslan – DJe 19.08.2015)

7375 – Improbidade administrativa – pedido de natureza condenatória – prescrição – ressarci-mento ao Erário – imprescritibilidade

“Apelação cível. Processual civil. Improbidade administrativa. Pretensão prescrita em relação ao pedido de natureza condenatória. Possibilidade de prosseguimento da demanda quanto ao pleito de ressarcimento por supostos danos causados ao Erário. Imprescritibilidade. Desnecessidade de ação autônoma. Recurso provido. 1. Não está em discussão nestes autos a incidência da prescrição sobre a pretensão do Município de Jupi no tocante à responsabilização do ex-Prefeito demanda-do (ora apelado) pela prática de atos de improbidade administrativa (o próprio Ministério Público apelante concorda com isso), ressalvado, porém, o pedido de ressarcimento ao Erário. 2. Na es-pécie, controverte-se apenas se a demanda relacionada à recomposição do Erário tem condições de prosseguir neste mesmo processo ou se, por outro lado, seria necessária a propositura de outra ação com esse objeto específico. 3. O STJ, para além de ter pacificado o entendimento de que é imprescritível a pretensão de ressarcimento de danos ao Erário, vem reafirmando o posicionamento de que, ‘Decretada a prescrição apenas em relação às sanções, admite-se o prosseguimento da ação de improbidade quanto ao pedido de reparação de danos’ (AgRg-REsp 1.218.202/MG). 4. Apelo provido. 5. Decisão unânime.” (TJPE – Ap 0000268-32.2010.8.17.0850 – 2ª CDPúb. – Rel. Des. Francisco José dos Anjos Bandeira de Mello – DJe 18.08.2015)

Destaque Editorial SÍNTESESelecionamos os julgados no mesmo sentido:

“APELAÇÃO – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – CONVÊNIO ENTRE MUNICÍ-PIO E UNIÃO – REPASSE DE VERBAS PARA REALIZAÇÃO DE OBRAS DE CANALIZAÇÃO – DESCUMPRIMENTO DO CONVÊNIO – RELATÓRIO QUE ATESTOU EQUIVOCADAMENTE A CONCLUSÃO DAS OBRAS – LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO – PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO – IMPRESCRITIBILIDADE – POSSIBILIDADE DE PRESCRIÇÃO DE OUTRAS PRETENSÕES ESTATAIS – INTELIGÊNCIA DO ART. 23 DA LEI Nº 8.429/1992 – NÃO CONFIGURAÇÃO DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – 1. Trata-se de ape-lação interposta por Marco Aurélio Lemgruber contra a sentença do que julgou procedente o pedido formulado pela União Federal para condenar o apelante pela prática de ato de improbi-

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dade administrativa nos termos do art. 10 da Lei nº 8.429/1992. 2. A ação civil pública por ato de improbidade administrativa não justifica, em regra, o litisconsórcio passivo necessário entre o agente público e o ente a que ele se subordinava, ou entre o agente público e tercei-ros beneficiados pelo ato de improbidade. Precedentes: STJ, AgRg-REsp 1.411.897/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., J. 24.04.2014, DJe 02.05.2014; STJ, AgRg-REsp 1.461.489/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., J. 18.12.2014, DJe 19.12.2014. Diversa seria a hipótese caso se estivesse diante de particular figurando como único réu – desacompanhado de agente ou ente público –, o que justificaria, aí sim, a formação de li-tisconsórcio passivo necessário para fins de regular prosseguimento do feito, nos termos do art. 47, parágrafo único, do CPC. 3. A pretensão de ressarcimento do prejuízo causado ao Erário é imprescritível, com fundamento no art. 37, § 5º, da Constituição Federal. Precedentes: STJ, AgRg-REsp 1.484.699/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., J. 18.12.2014, DJe 19.12.2014; STJ, AgRg-REsp 1.427.640/SP, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª T., J. 18.06.2014, DJe 27.06.2014. 4. A pretensão estatal originada de ato ilícito praticado por agente público se sujeita aos prazos prescricionais que a lei vier a prever, enquanto a pretensão de ressarcimento – e somente esta – é imprescritível. 5. Interpretação teleológica dos incisos do art. 23 da Lei nº 8.429/1992. O inciso I se destina a agentes cujo vínculo com a admi-nistração pública tenha caráter temporário, enquanto o inciso II rege, precipuamente, agentes com vínculo de caráter permanente/estável. 6. A situação do apelante se amolda com mais exatidão ao inciso I do art. 23 da Lei nº 8.429/1992. Incide, outrossim, prazo prescricional de 5 (cinco) anos, tendo como termo inicial o término do exercício da função. Em consequência, a pretensão estatal não está prescrita, seja pela imprescritibilidade da pretensão de ressarci-mento ao erário, seja pela incidência da disciplina prevista no art. 23, I, da Lei nº 8.429/1992 para as demais pretensões. 7. Não se caracteriza ato de improbidade administrativa nos ter-mos do art. 10 da Lei nº 8.429/1992 sem a prova de prejuízo concreto ao Erário. Não basta a alegação de prejuízo potencial. In casu, a conduta culposa do apelante não impediu que o TCU instaurasse Tomada de Contas Especial e viesse a obter o ressarcimento devido ao Erário. 8. O art. 11 da Lei nº 8.429/1992, que trata de atos de improbidade administrativa por aten-tado aos princípios da Administração Pública, somente admite a responsabilização por dolo, e não por culpa, conforme doutrina e jurisprudência majoritárias. Precedente: STJ, AgRg-REsp 1260963/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., J. 08.05.2012, DJe 14.05.2012. 9. A conduta imputada ao apelante na sentença impugnada se deu a título de culpa, o que poderia, em tese, justificar a caracterização de improbidade administrativa nos termos do art. 10 da Lei nº 8.429/1992. Ocorre que o TCU não reconheceu prejuízo ao Erário em decorrência da conduta culposa do apelante, mas apenas sobre condutas que lhe eram estranhas, valendo destacar que mesmo para essas os responsáveis vieram a obter quitação plena do débito. 10. Mesmo que se cogitasse de improbidade administrativa por violação aos princípios da administração pública nos termos do art. 11 da mencionada lei, seria imprescindível a prova de dolo do agente público, o que não se depreende de qualquer elemento de prova no presente caso. 11. Recurso de apelação provido.” (TRF 2ª R. – AC 2008.51.01.000052-2 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Marcus Abraham – DJe 12.08.2015 – p. 314) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 108000313146. Acesso em: 19 ago. 2015)“CONVÊNIO – DESVIO DE VERBA PÚBLICA – RESSARCIMENTO AO ERÁRIO – IMPRES-CRITIBILIDADE – ‘Direito constitucional. Administrativo. Processual civil. Ministério Público Federal. Ação civil pública. Improbidade administrativa. Desvio de verba pública federal. Convênio. Penas (art. 12, inciso II, da Lei nº 8.429/1992). Prescrição. Ressarcimento ao Erário. Imprescritibilidade. Execução de acórdão do TCU. Quitação integral do débito. Esva-ziamento da discussão travada nos recursos. Embargos de declaração. Omissão inexistente. 1. São manifestamente improcedentes os presentes embargos de declaração, pois não se verifica qualquer omissão ou contradição no julgamento impugnado, mas mera contrariedade da embargante com a solução dada pela Turma que, à luz da legislação aplicável, consignou expressamente que “Quanto ao ressarcimento, porém, a União noticiou o pagamento do valor desviado, devidamente atualizado, objeto da execução do Acórdão TCU nº 432/2002 (Pro-cesso nº 0005288-02.2012.403.6106), inclusive acostando aos autos as Guias de Recolhi-mentos da União – GRUs, nas quantias de R$ 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil reais) e R$ 219.948,44 (duzentos e dezenove mil, novecentos e quarenta e oito reais e quarenta e quatro centavos), além das consultas ao sistema Conra – Consulta Registro de Arrecadação (fls. 2966/73), corroborando a informação, daí porque requereu a extinção do feito. Com efei-to, uma vez que demonstrado que o valor objeto do Convênio nº 077/1995 foi integralmente

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restituído ao Tesouro Nacional, consoante informação da União e documentação anexa, o pedido de ressarcimento ao erário, embora feito no âmbito da execução do TCU na verdade não acarreta a perda superveniente do objeto, mas esvaziamento da discussão travada nos recursos, já que estes apelos visam a obstar um adimplemento que já fora efetivado em seara distinta”. 2. Não houve qualquer omissão ou contradição no julgamento impugnado, revelan-do, na realidade, a articulação de verdadeira imputação de erro no julgamento, e contrariedade da embargante com a solução dada pela Turma, o que, por certo e evidente, não é compatível com a via dos embargos de declaração. 3. Para corrigir suposto error in judicando, o remédio cabível não é, por evidente, o dos embargos de declaração, cuja impropriedade é manifes-ta, de forma que a sua utilização para mero reexame do feito, motivado por inconformismo com a interpretação e solução adotadas, revela-se imprópria à configuração de vício sanável na via eleita. 4. Embargos de declaração rejeitados.’” (TRF 3ª R. – EDcl-Ap-RN 0000522-95.2002.4.03.6124/SP – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Carlos Muta – DJe 27.01.2015) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 251300002441. Acesso em: 19 ago. 2015)

7376 – Improbidade administrativa – Procurador Regional da República – perda do cargo – prerrogativa de função – inexistência

“Processual civil e administrativo. Ação de improbidade administrativa. Procurador Regional da República. Perda do cargo. Foro por prerrogativa de função. Inexistência. 1. Cuida-se, na origem, de Ação de Improbidade Administrativa proposta pelo Ministério Público Federal contra o ora re-corrente pela prática de ato ímprobo. 2. O Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que o foro por prerrogativa de função não se estende ao processamento das Ações de Improbidade Administrativa. 3. Agravo Regimental não provido.” (STJ – AgRg-AgRg-REsp 1.389.490 – (2013/0185360-9) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 05.08.2015)

Destaque Editorial SÍNTESESelecionamos o seguinte julgado no mesmo sentido:

“IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – AGRAVO DE INSTRUMENTO – PRERROGATIVA DE FORO – INEXISTÊNCIA – SÚMULA Nº 83/STJ – RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO – 1. Cuida-se, na origem, de Ação de Improbidade Administrativa proposta pelo Ministério Pú-blico estadual contra o ora recorrente pela prática de ato ímprobo. 2. Esta Corte Especial pacificou entendimento no sentido de que o foro por prerrogativa de função não se estende ao processamento das Ações de Improbidade Administrativa. 3. Dessume-se que o acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento do STJ, razão pela qual não merece prosperar a irresignação. Incide, in casu, o princípio estabelecido na Súmula nº 83/STJ. 4. Recurso Especial não provido.” (STJ – REsp 1.453.870 – (2011/0239712-6) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 10.08.2015 – p. 2413) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 101000543671. Acesso em: 10 ago. 2015)

7377 – Licitação – empresa vencedora – vícios meramente formais – inabilitação – ato abusivo

“Apelação cível. Administrativo. Mandado de segurança. Licitação. Inabilitação de empresa ven-cedora. Vícios meramente formais. Segurança concedida. Sentença mantida. Unanimidade. I – No caso em exame, a empresa Maducare Alimentação Comércio e Serviços Ltda., impetrou o presente mandamus contra ato do Secretário de Estado de Desenvolvimento Social e Presidente da Comissão Central de Licitação – CCL do Estado do Maranhão, aduzindo que participou no Pregão nº 027/2011 – POE/MA, que visava a contratação de empresa especializada no fornecimento de alimentação/refeições para o funcionamento de restaurante popular do governo do Estado do Maranhão e após as formalidades legais foi escolhida vencedora, ofertando a melhor proposta. II – Compulsando de-tidamente os autos, constatei que restou devidamente comprovado que o ato que desabilitou a ora apelada do certame, foi abusivo, uma vez que esta preencheu de forma satisfatória todos os itens previstos no edital do certame. Ademais, os vícios levantados no recurso administrativo da empresa Serv Food Alimentos Ltda., foram devidamente sanados e esclarecidos, não tendo o condão de

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tirar a licitante do certame, como bem consignado pela magistrada de base. III – Apelo conhecido e improvido.” (TJMA – Proc. 0062403-66.2011.8.10.0001 – (169363/2015) – Rel. Raimundo José Barros de Sousa – DJe 20.08.2015)

7378 – Licitação – pré-qualificação – consórcio – habilitação

“Administrativo. Apelação cível. Procedimento licitatório. Pré-qualificação. Habilitação de consór-cio. Somatório de quantitativos. Capacidade técnica. Honorários advocatícios. Valor. Majoração. 1. É nulo o ato administrativo de não habilitar consórcio em procedimento de licitação, contrarian-do o disposto na Lei nº 8.666/1993, art. 33, inciso III, que admite o somatório dos quantitativos de cada consorciado para efeito de qualificação técnica. 2. Fixada a verba honorária em valor que representa clara ofensa à remuneração condigna dos trabalhos desenvolvidos pelo advogado no processo, merece guarida a insatisfação correspondente à majoração do quantum respectivo. 3. Recurso da ré desprovido e provido o do autor.” (TJDFT – PADM 20140110869478 – (888193) – 2ª T.Cív. – Rel. Des. Mario-Zam Belmiro – DJe 20.08.2015)

7379 – Militar – ex-combatente – pensão por morte – união estável – convivência pública – pro-vas – ausência

“Administrativo. Pensão por morte. Ex-combatente. Companheira. União estável. Ausência de pro-vas cabais da convivência pública, contínua e duradoura com o objetivo de constituir família. Cerceamento de defesa. Nulidade. I – Pelo inciso II, item ‘a’ do § 2º do art. 1º da supracitada Lei nº 5.315/1967, considera-se que a certidão expedida pelo Ministério do Exército, na qual consta que o ex-militar serviu no Arquipélago de Fernando de Noronha, além de indicar que o mesmo par-ticipou efetivamente de operações bélicas, comprova o direito a pensão especial de ex-combatente. II – No entanto, não tendo sido comprovada a vida em comum entre a autora e o falecido, nem tampouco sido oportunizada à requerente a produção das provas solicitadas, deve ser anulada a sentença, face ao cerceamento de defesa caracterizado, para determinar que o Magistrado de Pri-meiro Grau promova a regular intimação da parte autora, a fim de viabilizar a comprovação de sua condição de companheira do ex-combatente, para fins de percepção da pensão requerida, na forma da legislação vigente, por todo e qualquer meio de prova e não apenas testemunhal. III – Agravo retido da União não conhecido (art. 523, §1º do CPC). Apelação da parte autora provida, para re-conhecer a condição de ex-combatente e, de ofício, declarar a nulidade da sentença de recorrida, determinando a remessa dos autos à Vara de Origem, para que outra seja proferida, após as provi-dência acima mencionadas.” (TRF 2ª R. – AC 2007.51.01.017995-5 – (485022) – 8ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Marcelo Pereira da Silva – DJe 19.08.2015)

7380 – Poder de polícia – ANTT – veículos locados pelo Ministério Público – pedágio – isenção

“Administrativo. Mandado de segurança. Isenção de tarifa de pedágio. Veículos locados pelo Minis-tério Público Estadual do Rio de Janeiro. ANTT. Concessionária ponte Rio-Niterói S/A. Companhia de Concessão Rodoviária Juiz de Fora (Concer). Interpretação restritiva do conceito de veículos oficiais. Decadência. Não ocorrência. CNT. Locação. Carros oficiais afetados ao serviço público. 1. O objeto do presente mandado de segurança é o alegado direito líquido e certo à isenção de pedágio de veículos próprios ou locados pelo Ministério Público Estadual, em razão de sua equi-paração a veículos oficiais nas rodovias administradas pelas concessionárias impetradas. A causa de pedir consubstancia na equiparação dos veículos locados aos de propriedade do Ministério Público Estadual, em razão da relevância quanto à utilização, em prol do serviço público, e não da titularidade do bem. 2. Decadência não caracterizada. Transcurso de lapso temporal inferior a 120 dias entre a ciência do teor do Ofício de nº 070716/PR-01, de 16.07.2007, do Parecer da Companhia de Concessão Rodoviária Juiz de Fora-Rio constante do Ofício AJU-CA-031/2007, de 11.06.2007 (fls. 17/24) e do Parecer/ANTT/PRG/CCJ nº 0378-3.4.1.4/2007, de 09.07.2007 até o

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ajuizamento da ação. 3. O art. 120 do Código Nacional de Trânsito trata em seu § 1º apenas do registro dos veículos oficiais de propriedade da administração direta, da União, dos Estados, do Dis-trito Federal e dos Municípios. Não se infere, a partir de sua leitura, que a classificação dos veículos oficiais seja apenas aqueles de propriedade dos entes citados. Já o art. 8º do Decreto nº 94.002, de 4 de fevereiro de 1987, assegura aos veículos oficiais e aos do Corpo Diplomático a isenção do pagamento de pedágio, desde que exibam o título de isenção. Não menciona tratar-se os veículos oficiais exclusivamente aqueles de propriedade do ente público. 4. O fundamento da isenção no pagamento das tarifas de pedágio pelos carros oficiais não é simplesmente o fato de pertencerem a órgãos da Administração Pública, mas sim de estarem afetados ao serviço público. 5. O art. 3º da Resolução nº 3.916/2012/ANTT trata especificamente dos veículos contratados de prestadores de serviço para os quais a fruição da isenção fica sujeita a prévio cadastro, mediante apresentação de cópia autenticada do Certificado de Licenciamento de Veículo e cópia autenticada do contrato de locação (incisos I e II). 6. Agravo Retido e apelações conhecidos e improvidos. Sentença confir-mada.” (TRF 2ª R. – AMS 2007.51.01.024737-7 – 5ª T.Esp. – Relª Juíza Fed. Conv. Geraldine Pinto Vital de Castro – DJe 16.07.2015)

Comentário Editorial SÍNTESEA apelação em tela foi interposta pela Unimed Vale do Rio Doce Cooperativa de Trabalho Médico, contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, quais sejam, invalidação da multa pecuniária que lhe foi cominada, diante da aplicação de reajustes de percentuais superiores ao índice do IGP-M e o cancelamento do auto de infração ou, alter-nativamente, a minoração da penalidade.

De acordo com a decisão a quo, a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS tem a in-cumbência de regular e fiscalizar o mercado relativo aos planos de saúde, conforme preceitua o art. 1º da Lei nº 9.961/2000, como órgão de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantem a assistência suplementar à saúde; que a autora, ora apelante, ao aplicar os reajustes no contrato de um segurado específico adotou percentuais superiores ao IGP-M, violando expressamente o disposto no item 12.2 do contrato, pactuado antes do advento da Lei nº 9.656/1998.

Nas razões recursais, a apelante sustenta que inexiste ilegalidade nos reajustes aplicados, e, ainda, que a majoração da multa inicialmente aplicada, após a interposição do recurso admi-nistrativo, incorreria em reformatio in pejus, o que seria vedado pelo ordenamento jurídico.

A 5ª Turma Especializada do TRF 2ª Região, ao analisar o recurso, manteve a sentença na íntegra, negando provimento à apelação.

Do voto do Relator, destacamos:

“[...] Mesmo os contratos de seguro-saúde, celebrados anteriormente ao advento da Lei nº 9.656/1998, deverão reverenciar as regras consumeristas, porquanto estas são normas de ordem pública, de caráter imperativo. É o que se infere do § 2º do art. 3º do CDC, ao dispor que ‘serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista’.

Em se tratando de relação de consumo, extrai-se do art. 6º, inciso V, e do art. 51, incisos IV e X, que é defeso ao prestador de serviços estabelecer obrigações consideradas iníquas, abusi-vas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou que sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade, sendo vedado também o reajuste dos preços de maneira unilateral, o que deverá ser reverenciado pelas operadoras de plano de saúde, independente da data da celebração do contrato.

No presente caso, restou acordado entre as partes, no item 12.2 da Cláusula XII do contrato, que:

‘As mensalidades e inscrições fixadas em cruzeiros serão reajustadas na mesma proporção da variação do coeficiente do IGP-M divulgado pela Fundação Getúlio Vargas, ou, na falta deste, outro índice de correção aceito pelos contratantes.’

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Nesse sentido, se o percentual superou o índice acordado, afrontando o pacta sunt servanda, está correta a atuação da agência reguladora, intervindo no reajuste celebrado.

Mutatis mutandis, o seguinte precedente jurisprudencial:

‘PLANO DE SAÚDE – CONTRATO CELEBRADO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.656/1998 – REAJUSTE UNILATERAL E ABUSIVO DAS MENSALIDADES – NULIDADE (ART. 51, X, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR) – Conquanto o Supremo Tribunal Federal tenha concedido liminar suspendendo a aplicação dos arts. 35 e 35-E da Lei nº 9.656/1998 aos contratos de seguro de saúde anteriores à sua vigência, deixando a ANS de regular os reajustes das mensalidades dos referidos contratos, o ordenamento constitucional, cujos princípios se encontram estabelecidos nas normas da Lei nº 8.078/1990, assegura os direitos do consumi-dor, sendo nula a cláusula contratual que autoriza aumento unilateral e abusivo de mensalida-de do Plano de Saúde, por violar os princípios da boa-fé e da confiança, consoante estabelece o art. 51, X, do Código de Defesa do Consumidor. Recurso improvido.’ (TJRJ, 12ª C.Cív., Des. José Antonio Geraldo, AC 2005.001.20583, DO de 15.09.2005, p. 52/54) [...]”

7381 – Poder de polícia – interdição de estabelecimento – abuso de poder – ausência

“Constitucional e administrativo. Mandado de segurança. Ato administrativo. Interdição de esta-belecimento. Poder de polícia. Ilegalidade ou abuso de poder. Ofensa a direito líquido e certo. Inexistência. 1. O mandado de segurança se destina à correção de ato ou omissão de autoridade, desde que ilegal e ofensivo a direito individual, líquido e certo do impetrante (art. 5º, LXIX, CF). 2. Estabelecimento interditado por falta de auto de conclusão e licença de funcionamento. Ausência de ilegalidade ou abuso de poder. Inexistência de ofensa a direito líquido e certo. Segurança con-cedida. Inadmissibilidade. Sentença reformada. Reexame necessário acolhido e recurso provido.” (TJSP – Ap 1001391-86.2015.8.26.0053 – 9ª CDPúb. – Rel. Décio Notarangeli – DJe 10.08.2015)

7382 – Pregão eletrônico – serviços diários de transporte – capacidade técnico-operacional – comprovação

“Administrativo. Mandado de segurança. Apelação. Casa da Moeda do Brasil – CMB. Pregão ele-trônico. Licitação para contratação de serviços diários de transporte. Vinculação ao instrumento convocatório. Empresa vencedora. Comprovação de capacidade técnico-operacional. Ausência de ato abusivo por parte da autoridade coatora. Ausência de direito líquido e certo a ser amparado por meio do mandamus. 1. Sentença que julgou improcedente o pedido e denegou a segurança pleiteada, que objetivava a desclassificação da empresa vencedora do certame em licitação para contratação de serviços diários de transporte, prosseguindo-se o certame para os demais classifi-cados. 2. Pelos documentos acostados aos autos verifica-se que a empresa vencedora do certame, detém todos os certificados de capacidade técnico-operacional, passados por pessoas jurídicas de direito público e privado; além de estarem acompanhados de Registros de Comprovação de Aptidão emitidos pelo Conselho Regional de Administração do Rio de Janeiro. 3. A decisão administrativa que aceitou os três atestados, os quais foram devidamente certificados pelo Conselho Regional de Administração do Rio de Janeiro, cujas certidões estão revestidas de fé pública, na forma do art. 30 da Lei nº 8.666/1993, como meio de comprovação da capacidade técnica da empresa vencedora, está dentro das atribuições da Administração Pública, não havendo, portanto, ato abu-sivo por parte da indigitada Autoridade Coatora. 4. Tendo em vista que os atos administrativos em geral gozam de presunção de legitimidade e veracidade, somente podendo ser desconstitu-ídos mediante prova inequívoca da inexistência dos fatos apontados, o que não ocorreu na hi-pótese dos autos, não há direito líquido e certo a ser amparado por meio da presente segurança. 5. Precedentes: STJ, MS 17.361/DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 1ª S., Julgado em 27.06.2012, DJe 01.08.2012; TRF 2ª R., AMS 200551010064160/RJ, Rel. Des. Fed. Luiz Paulo da Silva Araujo Fi-lho, 5ª T.Esp., e-DJF2R 22.07.2011; TRF 2ª R., AMS 200751010105285/RJ, Rel. Des. Fed. Raldênio Bonifacio Costa, 8ª T.Esp., e-DJF2R: 03.12.2010. 6. Apelação desprovida.” (TRF 2ª R. – AC 0002911-25.2014.4.02.5101 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Marcus Abraham – DJe 12.08.2015)

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7383 – Processo administrativo – Conselho da polícia do Paraná – sanção disciplinar – membro do Ministério Público – nulidade

“Mandado de segurança. Processo administrativo disciplinar. Deliberação do Conselho da Polícia Civil do Paraná. Acolhimento pelo Governador do Estado. Sanção disciplinar de demissão. Parti-cipação de membro do Ministério Público no Conselho da Polícia Civil. Nulidade. 1. A Primeira Seção deste Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que a participa-ção de integrante do Ministério Público em Conselho da Polícia Civil torna nulo o procedimento administrativo instaurado para processar servidor público estadual por prática de ato infracional. Precedentes. 2. Recurso ordinário provido, para reconhecer a nulidade do processo administrativo disciplinar, a partir da designação ou intervenção de promotores de justiça para atuar no caso pe-rante o Conselho da Polícia Civil. 3. Recurso ordinário conhecido e provido.” (STJ – RMS 24.143 – (2007/0107404-4) – 6ª T. – Rel. Min. Nefi Cordeiro – DJe 07.08.2015)

Comentário Editorial SÍNTESEO Recurso Ordinário em tela foi interposto pelo recorrente diante do acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná, assim ementado:

“EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA – PROCESSO ADMINISTRATIVO – PENA DE DEMIS-SÃO – FALTA GRAVE – ARTS. 213, INCISO XLI E 230, INCISO IV, DO ESTATUTO DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DO PARANÁ – RESPEITO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, AMPLA DEFESA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL – ALEGADA INCONSTITUCIONALIDADE DE DI-VERSOS DISPOSITIVOS DA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL Nº 14/1982 – NÃO CONFIGU-RAÇÃO – EXCESSO DE PRAZO – INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO PARA A DEFESA – SEGURAN-ÇA DENEGADA – DECISÃO POR MAIORIA DE VOTOS. – Tendo sido observados no processo administrativo disciplinar os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, é lícita a imposição da pena demissória ao servidor pela prática de faltas graves previstas nos arts. 213, inciso XLI e 230, inciso IV, do Estatuto da Polícia Civil do Estado do Paraná. Ao Poder Judiciário é lícito analisar a existência de justa causa para a imposição da penalidade, mas não o que remanesce de discricionário da autoridade administrativa, ou seja, o livre con-vencimento desta na valoração das provas produzidas no procedimento (e-STJ fls. 390/430)”

O recorrente impugna a participação de membro do Ministério Público no Conselho Estadual de Polícia Civil.

Sustenta afronta ao enunciado na Resolução nº 03/2005 do Conselho Nacional do Ministério Público, que trata sobre a proibição de acúmulo de funções por integrante do Ministério Públi-co dos Estados. Ressalta que tanto a Lei Orgânica do Ministério Público Federal quanto a Lei Orgânica do Ministério Público Estadual proíbem o controle disciplinar da atividade de polícia judiciária, já que inexiste subordinação hierárquica entre a polícia civil e o Ministério Público, sendo permitido apenas o controle externo dos atos de persecução penal.

Ao analisar o recurso, a 6ª Turma do STJ adotou o entendimento pacificado pela Primeira Se-ção, qual seja, a participação de membro do Ministério Público em Conselho da Polícia Civil, formado para processar servidor público estadual por ato infracional disciplinar, torna nulo o procedimento administrativo.

Assim, deu provimento ao recurso, reconhecendo a nulidade do processo administrativo dis-ciplinar.

Colacionamos os seguintes precedentes mencionados no voto do Relator:

“RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL – PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – NULIDADE – PARTICIPAÇÃO DE MEMBRO DO MINISTÉ-RIO PÚBLICO NO CONSELHO DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO DO PARANÁ – VEDAÇÃO – 1. A Primeira Seção desta Corte Superior, na sentada do dia 11 de setembro de 2013, durante o julgamento do Recurso em Mandado de Segurança n° 32.304/RS, na relatoria do e. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, firmou a compreensão de que a participação de membro do Mi-nistério Público em Conselho da Polícia Civil, formado para processar servidor público estadual por ato infracional disciplinar, torna nulo o procedimento administrativo. 2. Agravo regimental

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não provido. (AgRg-RMS 37.820/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 18.02.2014, DJe 27.02.2014)

ADMINISTRATIVO – RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA – PARTICIPAÇÃO DE MEM-BRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO SUL NO CONSELHO DA POLÍCIA CIVIL DO ESTADO – VEDAÇÃO – ARTS. 128, § 5º, II, D E 129 DA CARTA MAGNA – NÃO RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 DO ART. 123 DA LEI ESTADUAL Nº 7.366/1980 – ART. 5º, § 2º DA LC 75/1993 E ART. 44, IV E PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI Nº 8.625/1993 – RECURSO PROVIDO – 1. Ao membro do Ministério Público é vedado exer-cer, ainda que em disponibilidade, qualquer outra função pública, exceto uma do Magistério (art. 128, § 5º, II, d da Carta Magna); essa vedação se estriba na necessidade de preservar a liberdade funcional dos Membros do MP e assegurar-lhes a indispensável independência e autonomia, em face das superiores atribuições que o art. 127 da Constituição confere à Instituição Ministerial. 2. O art. 123 da Lei Estadual Gaúcha nº 7.366/1980, que prevê a participação de membros do Ministério Público do Rio Grande do Sul no Conselho Superior da Polícia do Estado, não foi recepcionado pela Carta Magna de 1988, que deve ser inter-pretada em sua inteireza positiva, de modo a privilegiar a unidade lógica do sistema jurídico constitucional com a aplicação conjunta e harmônica de todos os seus dispositivos, e não de forma isolada e fracionada. 3. A vedação constitucional de o membro do Ministério Público exercer outras funções estranhas ou externas à Instituição se projeta naturalmente na legis-lação infraconstitucional, a saber, na LC 75/1993 e na Lei nº 8.625/1993, que reproduzem os magnos dispositivos da Constituição Federal. 4. Precedentes: STF, AI 768.852/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 19.08.2011 e STJ, RMS 15.156/RS, Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 09.12.2008. 5. Recurso provido para conceder a segurança, para anular o processo administrativo disciplinar processado e julgado pelo Conselho Superior de Polícia do Rio Grande do Sul, que teve em sua composição a presença de membro do MP e que culminou na demissão do recorrente, determinando sua imediata reintegração ao cargo, sem prejuízo da instauração de outro PAD, com observância das normas legais de composição do órgão processante. (RMS 32.304/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª S., Julgado em 11.09.2013, DJe 21.10.2013)”

7384 – Processo administrativo – demissão – prova emprestada do processo criminal – possibi-lidade

“Mandado de segurança. Ato de demissão. Processo administrativo disciplinar. Prova emprestada do processo criminal. Recebimento de vantagem indevida, em razão da função pública. Omissão em praticar ato de ofício. Conduta funcional proibitiva ao servidor público. Contraditório. Princípio pas de nullité sans grief. Ordem denegada. 1. Não procedem as alegações de nulidade por excesso de prazo para conclusão do PAD e pelo fato de o Ato de Demissão não mencionar os fatos que o motivaram, mas tão somente os dispositivos legais pertinentes, desde que o contraditório tenha sido exercido em sua plenitude e a parte não tenha logrado provar o seu prejuízo, ao quê se aplica o princípio pas de nullité sans grief. 2. Vigora no direito pátrio a separação das instâncias civil, administrativa e penal. Salvo a decisão absolutória penal que decida pela inexistência do fato ou pela negativa de autoria, não há condicionamento de uma instância pelas demais, o que não ocorre na lide. A suspensão do processo é questão facultada ao julgador, prevista a fim de evitar decisões conflitantes em instâncias ou juízos distintos. Não obstante, a despeito de um mesmo fato ser objeto de dois processos em instâncias diversas, e, a exemplo do caso concreto, ser concluído antes na esfera administrativa que na criminal, o que importa e do que não se pode prescindir é que seja garantido o contraditório. Portanto, não havendo prejuízo, uma vez exercido plenamente ou opor-tunizado o contraditório, aplica-se uma vez mais o princípio pas de nullité sans grief. 3. Extraídas as cópias do processo criminal, ingressaram no PAD sob a natureza documental, e como tal devem ser analisadas. Consolidou-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido da admissibi-lidade, observado o devido contraditório, de prova emprestada proveniente de ação penal.” (TJPE – MS 0005128-31.2015.8.17.0000 – C.Esp. – Rel. Des. José Fernandes – DJe 20.08.2015)

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7385 – Responsabilidade civil do Estado – atropelamento de ciclista por ônibus – teoria do risco administrativo – aplicação – dano moral – cabimento

“Constitucional, administrativo e processo civil. Apelação em ação de indenização por danos mo-rais e materiais. Atropelamento de ciclista por ônibus. Aplicação da teoria do risco administrativo. Responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público. CF, art. 37, § 6º. Ausência de perícia no local do acidente. Depoimentos testemunhais contraditórios. Configuração de culpa concorrente, diante dos depoimentos. Dano moral devido. Precedentes dos tribunais pátrios e do Superior Tribunal de Justiça. I – Com efeito, faz-se imperioso registrar que a Constituição Federal, em seu art. 37, § 6º, adotou a teoria do risco administrativo, a qual atribui responsabilidade objetiva para as pessoas jurídicas de direito público, bem como às pessoas jurídi-cas de direito privado, prestadoras de serviço público, quando o dano experimentado por terceiro decorre de conduta de seus agentes no exercício da atividade administrativa. Como se percebe, na responsabilidade objetiva não é necessário que o lesado demonstre a culpa da Pessoa Jurídica de Direito Público ou da Pessoa Jurídica de Direito Privado prestadora de serviço público, sendo necessário, tão somente, a demonstração dos três requisitos susomencionados. É a aplicação da chamada teoria do risco administrativo, que preceitua ser de natureza objetiva a responsabilidade civil do Estado, sendo desnecessária a comprovação de culpa. II – Em relação à ocorrência do fato, resta comprovado nos autos que o esposo da autora foi vítima de acidente de trânsito, conforme boletim de ocorrência (fl. 22), laudo cadavérico (fl. 24) e depoimentos testemunhais. No que tange ao dano, também resta claro nestes autos que houve o dano, uma vez que ocorreu o falecimento do esposo da autora, conforme documentos acima especificados. O nexo causal, por sua vez, pode ser definido como o liame entre a conduta culposa ou o risco criado e o dano suportado por outrem. Conforme a jurisprudência e doutrina, o nexo causal pode ser excluído no caso de verificada a cul-pa exclusiva da vítima, culpa exclusiva de terceiro ou caso fortuito e força maior. III – No caso dos autos, verifica-se que não foi realizada perícia no local do acidente e que as testemunhas arroladas pela autora confirmam a ocorrência do acidente e falecimento da vítima, atribuindo a culpa ao mo-torista do ônibus, e que as testemunhas da empresa promovida contrariam o alegado na inicial, ale-gando que a culpa foi exclusiva da vítima. Ademais, o boletim de ocorrência de fl. 22, juntado pela autora inicialmente, apenas relata o fato ocorrido, mas não indica culpa de nenhuma das partes. IV – No presente caso, fazia-se necessária a realização de perícia no local do sinistro para melhor averiguação do caso, sendo, inclusive, de interesse da promovida a realização desta, eis que, sendo a responsabilidade da empresa de ônibus objetiva, caberia a esta comprovar as possíveis excluden-tes do nexo causal. Como é cediço, tratando-se de responsabilidade objetiva, caberia à promovida defender-se provando a inexistência do fato administrativo, a inexistência de dano ou a ausência do nexo causal entre o fato e o dano. V – Na situação em tela, não resta comprovado a culpa exclusiva da vítima, uma vez que, embora uma testemunha alegue que esta foi imprudente, em contrapartida outra testemunha também afirma ter sido o motorista do ônibus imprudente, uma vez que fez sinal para parar, mas não o fez. De fato, a realização da perícia teria sido essencial para dirimir alguns pontos controvertidos no presente caso, no entanto, diante de sua ausência, devem ser considerados os fatos aqui demonstrados, quais sejam, o fato, o dano e o nexo causal entre os dois. Não há que se falar, pois, em exclusão do nexo causal, uma vez que não resta devidamente demonstrado a culpa exclusiva da vítima. Na verdade, entendo razoável falar, no caso em tela, em culpa concorrente das partes, tendo em vista a divergência dos depoimentos, mas esta como se sabe não é suficien-te para afastar o dever da promovida de indenizar a esposa da vítima, mas apenas reduz o valor arbitrado pelos danos causados. VI – Com efeito, cumpre destacar que a verba indenizatória deve representar para a vítima ou familiares uma satisfação, capaz de amenizar ou suavizar o mal sofrido. Outrossim, deve significar para o ofensor um efeito pedagógico, no sentido de inibir reiteração de fatos similares no futuro. É dizer, a aferição do quantum indenizatório por danos morais deve advir, necessariamente, das circunstâncias específicas de cada caso, levando-se em conta as condições do ofensor e do ofendido, a extensão do dano tanto no mundo interior quanto no exterior da vítima e

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o modo como a ofensa foi irrogada, entre outros fatores. Ademais, a referida indenização possui um forte caráter preventivo, funcionando como instrumento de advertência ao lesante. Nessa esteira, em conformidade com os critérios supramencionados, com a jurisprudência do STJ, bem como com a culpa concorrente concluída por meio da análise dos depoimentos testemunhais, a compensação por danos deve ser fixada no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais). O aludido valor mostra--se razoável para situação em tela. VII – Apelação conhecida e parcialmente provida.” (TJCE – Ap 0768603-45.2000.8.06.0001 – Rel. Inacio de Alencar Cortez Neto – DJe 03.08.2015)

7386 – Responsabilidade civil do Estado – proventos de aposentados e pensionistas – descontos indevidos – INSS – condenação solidária

“Administrativo e processual civil. Descontos indevidos em proventos de aposentados e pensionis-tas. Condenação solidária. INSS. Danos morais majorados. Termo inicial. Juros de mora. 1. Diante da conduta ilícita da instituição financeira será devida a restituição dos valores indevidamente descontados no benefício previdenciário do autor bem como o pagamento a título de danos morais. 2. O valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) se afigura razoável para o caso concreto, tendo em vista não caracterizar enriquecimento sem causa por parte do segurado, bem como assegurar o caráter pedagógico na medida. 3. O recurso adesivo é recurso acessório, tendo sua existência condicio-nada à do recurso principal. Assim, a sua abrangência se limita apenas aos pedidos condenatórios em face do réu que apelou. Como o INSS já foi condenado a arcar com pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) a título de danos morais, a condenação do Banco Pine, neste ponto, deve ser majorada para R$ 6.000,00 (seis mil reais), se afigurando razoável para o caso concreto, já que não caracteriza enriquecimento sem causa por parte do segurado, bem como assegura o caráter peda-gógico na medida. 4. Recurso da parte autora parcialmente provido.” (TRF 4ª R. – AC 0002146-50.2014.4.04.9999/SC – 3ª T. – Relª Desª Fed. Marga Inge Barth Tessler – DJe 15.07.2015)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de apelação interposta contra sentença proferida nos autos de ação declaratória de inexistência de débito que reconheceu descontos indevidos no benefício previdenciário da autora, inclusive com a declaração de nulidade dos empréstimos contratados e a condenação dos réus, Banco Pine e INSS, ao pagamento de indenização por danos materiais e morais.

Em suas razões, o Banco Pine afirma que a autora celebrou contrato de empréstimo e, assim, se beneficiou com os valores emprestados. Sustenta que inexistem danos morais na espécie.

Na análise recursal, a 3ª Turma do TRF 4ª Região entendeu que é fato incontroverso a existên-cia de descontos no benefício da parte autora, ora apelada. E que não há prova da existência de contrato de mútuo entre a instituição financeira e a apelada.

Por fim, negou provimento à apelação.

Colacionamos os seguintes precedentes do voto da Relatora:

“ADMINISTRATIVO – DANO MORAL – DESCONTOS INDEVIDOS EM PROVENTOS DE APO-SENTADORIA – CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – QUAntUM INDENIZATÓRIO – 1. O INSS não agiu com o dever de cuidado diante da documentação que recebeu de Sul Financeira S/A, de modo que, presentes todos os pressupostos da responsabilidade civil objeti-va, responde pelos prejuízos suportados pela autora. [...]” (AC 2006.71.01.002419-6, 3ª T., Relª Exma. Desª Fed. Maria Lúcia Luz Leiria, DE 17.03.2010)

“ADMINISTRATIVO – CIVIL – CONTRATUAL – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – DANOS MATERIAIS E MORAIS – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – SEGURADO DO INSS – CDC – RESPONSABI-LIDADE OBJETIVA – BANCOS – INSS – QUANTIFICAÇÃO – HONORÁRIOS – 1. O Código de Defesa do consumidor é aplicável às instituições financeiras, nos termos da Súmula nº 297 do STJ. 2. As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros – como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebi-mento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos –, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno (REsp 1199782/PR, julgado pelo rito dos recursos repetitivos). 3. A responsabilidade civil do Estado pressupõe a coexistência de três requisitos essenciais à sua configuração, quais sejam:

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a) a comprovação, pelo demandante, da ocorrência do fato ou evento danoso, bem como de sua vinculação com o serviço público prestado ou incorretamente prestado; b) a prova do dano por ele sofrido; e c) a demonstração do nexo de causalidade entre o fato danoso e o dano sofrido. 4. Se a instituição bancária, ao dar seguimento a contrato de empréstimo consignado fraudulento, apossou-se indevidamente de parcelas descontadas do benefício previdenciário da autora, deve ressarcir, incidindo a correção monetária e os juros moratórios desde os descontos indevidos, pois estes definem a data do efetivo prejuízo (Súmula nº 43 do STJ). 5. Para que se caracterize a ocorrência de dano moral, deve a parte autora demonstrar a existência de nexo causal entre os prejuízos sofridos e a prática pela ré de ato ou omissão voluntária – de caráter imputável – na produção do evento danoso. 6. Na quantificação do dano moral devem ser sopesadas as circunstâncias e peculiaridades do caso, as condições econômicas das partes, a menor ou maior compreensão do ilícito, a repercussão do fato e a eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso. A indenização deve ser arbitrada em valor que se revele suficiente a desestimular a prática reiterada da prestação de serviço defeituosa e ain-da evitar o enriquecimento sem causa da parte que sofre o dano. 7. Honorários advocatícios fi-xados em 10% sobre o valor da condenação.” (TRF 4ª R., AC 5048227-07.2012.404.7100, 4ª T., Rel. Luis Alberto D’Azevedo Aurvalle, Julgamento em 18.12.2013)

7387 – Servidão administrativa – passagem de eletroduto – constituição por escritura pública – reexame – impossibilidade

“Administrativo. Servidão de passagem de eletroduto. Constituição por escritura pública. Ale-gação de vício de consentimento afastada pela Corte local. Reexame. Impossibilidade. Súmula nº 7/STJ. Servidão efetuada sobre área superior à pactuada. Complementação devida. Preceden-tes. 1. A alteração das conclusões adotadas pela Corte de origem, quanto à existência de vício de consentimento a ensejar a nulidade do negócio jurídico, tal como colocada a questão nas razões recursais, demandaria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice previsto na Súmula nº 7/STJ. 2. De outro lado, consignado pela instância de origem que as restrições ocasionadas pela instalação de eletrodutos abrangerem área superior à de servidão de passagem constante na escritura pública, deve haver o complemento do valor indenizatório. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 949.507 – (2007/0104490-3) – 1ª T. – Rel. Min. Sérgio Kukina – DJe 19.08.2015)

7388 – Servidor público – bolsa de estudos – residência – período não trabalho – ressarcimento

“Apelação cível. Administrativo. Ressarcimento. Bolsa de estudos. Residência. Período não tra-balhado. 1. A recorrente não demonstrou que efetivamente cumpriu a carga horária necessária para fazer jus ao pagamento questionado. 2. Não pode alegar boa-fé quem afirma ter trabalhado 1/3 do mês e recebe a remuneração correspondente ao mês inteiro de trabalho. 3. Se não houve prestação laboral, não há caráter alimentar na verba. 4. Recurso de apelação desprovido.” (TJDFT – AC 20130110806843 – (887960) – 2ª T.Cív. – Rel. Des. J. J. Costa Carvalho – DJe 19.08.2015)

7389 – Servidor público – contrato temporário – art. 19-A da Lei nº 8.036/1990 – FGTS – inapli-cabilidade

“Apelação civil. Direito administrativo. Servidor temporário. Relação de caráter jurídico-adminis-trativo. Regras de direito público. Art. 19-A da Lei nº 8.036/1990. FGTS. Inaplicabilidade. Pre-cedente TJPA. 1. Conforme deliberado por esta E. 5ª Câmara Cível Isolada, não se aplica a regra estabelecida no art. 19-A da Lei nº 8.036/1990 aos servidores temporários que mantém vínculo jurídico administrativo com o Estado, sendo inaplicáveis as teses firmadas no RE 596.478/RR e RE 705.140/RS, julgados sob o rito da repercussão geral, bem como no REsp 1.110.848/RN, apre-ciado sob a sistemática dos recursos repetitivos. 2. Recurso conhecido e improvido à unanimidade.” (TJPA – Ap 00274884020098140301 – (149380) – 5ª C.Cív.Isol. – Rel. Luiz Gonzaga da Costa Neto – DJe 10.08.2015)

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Transcrição IOBLei nº 8.036/1990:

“Art. 19-A. É devido o depósito do FGTS na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no art. 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário.”

7390 – Servidor público – demissão – ampla defesa e contraditório – inobservância

“Agravo regimental em apelação cível. Reintegração de cargo. Demissão de servidor público con-cursado. Inobservância dos princípios da ampla defesa e contraditório. Ausência de fundamentos novos capazes de reformar a decisão agravada. Decisão mantida. I – A ausência de processo admi-nistrativo ou a inobservância dos princípios da ampla defesa e do contraditório tornam nulo o ato de demissão do servidor. II – A ausência de fundamentos novos aptos a infirmar a motivação que embasa a decisão agravada enseja o não provimento ao agravo regimental interposto. IV – Agravo improvido.” (TJMA – AgRg 036661/2014 – (169236/2015) – Relª Desª Maria das Graças de Castro Duarte Mendes – DJe 18.08.2015)

7391 – Servidor público – depressão grave – enfermidade – art. 186, I, § 1º, da Lei nº 8.112/1990 – aposentadoria – proventos proporcionais – concessão

“Recurso administrativo. Depressão grave. Enfermidade que não se enquadra no rol taxativo do art. 186, I, § 1º, da Lei nº 8.112/1990. Aposentadoria por invalidez permanente, com proventos proporcionais. Recurso desprovido. 1. Conforme assentou o Supremo Tribunal Federal, o rol de enfermidades que ensejam a aposentadoria por invalidez permanente, com proventos integrais, previsto no art. 186, inciso I, § 1º, da Lei nº 8.112/1990, é taxativo (RE 656860/MT, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe 17.09.2014). 2. Estando esta Corte, em questões médicas, vinculada ao laudo da Junta Médica Oficial deste Regional, o qual consignou expressamente que a enfermidade da qual padece a servidora não se enquadra nas hipóteses daquele rol taxativo, correta a decisão que concedeu aposentadoria por invalidez permanente com proventos proporcionais. 3. Recurso a que se nega provimento.” (TREAM – Proc. 2217-11.2014.6.04.0000 – (587/2015) – Rel. Juiz Marco Antonio Pinto da Costa – DJe 13.08.2015)

Transcrição Editorial SÍNTESELei nº 8.112/1990:

“Art. 186. O servidor será aposentado:

I – por invalidez permanente, sendo os proventos integrais quando decorrentes de acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, especificada em lei, e proporcionais nos demais casos;

[...]

§ 1º Consideram-se doenças graves, contagiosas ou incuráveis, a que se refere o inciso I deste artigo, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira posterior ao ingresso no serviço público, hanseníase, cardiopatia grave, doença de Parkinson, paralisia irreversível e incapacitante, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estados avançados do mal de Paget (osteíte deformante), Síndrome de Imunodeficiência Adquirida – Aids, e outras que a lei indicar, com base na medicina especializada. [...]”

7392 – Servidor público – juiz do trabalho – remoção a pedido – ajuda de custo – interesse público – existência

“Administrativo. Juiz do trabalho substituto. Remoção a pedido. Ajuda de custo. Interesse público. Existência. Art. 65 da Loman. Precedentes do STJ. 1. A orientação do STJ se consolidou no sentido de que o magistrado faz jus à ajuda de custo prevista no art. 65, I, da Loman, seja na remoção ex

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officio, seja na levada a efeito a pedido do interessado, uma vez que em ambas está presente o inte-resse público. 2. Agravo Regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.507.507 – (2015/0003018-0) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 12.08.2015)

Transcrição Editorial SÍNTESELei complementar nº 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional – Loman):“Art. 65. Além dos vencimentos, poderão ser outorgadas aos magistrados, nos termos da lei, as seguintes vantagens:I – ajuda de custo, para despesas de transporte e mudança; [...]”

7393 – Servidor público – membros do Ministério Público – auxílio-moradia – ato regulamentar administrativo – restrições – direito líquido e certo – violação

“Constitucional. Administrativo. Mandado de segurança. Membros do Ministério Público Estadual. Auxílio-moradia. Restrições impostas por ato regulamentar administrativo. Violação a direito líqui-do e certo. Configuração. I – Configurativo de violação a direito líquido e certo de membros do Ministério Público Estadual a criação por ato regulamentar administrativo de restrições à percepção de auxílio-moradia não previstas em lei. Ordem concedida para suspender em definitivo os efeitos do inciso V do art. 3º do Ato Regulamentar nº 19/2014-GPJ, oriundo da Procuradoria-Geral de Jus-tiça deste Estado.” (TJMA – MS 59731-2014 – (169357/2015) – Rel. Des. Antonio Fernando Bayma Araujo – DJe 20.08.2015)

7394 – Servidor público – pensão – pagamento de atrasados – disponibilidade orçamentária – danos morais – indenização devida

“Administrativo. Servidor. Pensão. Reconhecimento administrativo. Pagamento de atrasados. Dispo-nibilidade orçamentária. Impossibilidade. Indenização por danos morais. Comprovação. Litigância de má-fé. Inocorrência. Honorários advocatícios. Sucumbência da Fazenda Pública. Arbitramen-to equitativo. Juros moratórios. Correção monetária. 1. Incontroverso o recebimento de vantagem ou direito reconhecido administrativamente, não se justifica a demora do adimplemento da obri-gação pela Administração, ao fundamento da necessidade de disponibilidade orçamentária ou pendências administrativas (STJ, AROMS 30359, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, J. 04.10.2012; AROMS 30451, Relª Maria Thereza de Assis Moura, J. 19.06.2012; STJ, REsp 551961, Rel. Min. Paulo Gallotti, J. 27.03.2007). 2. Tratando-se de causa em que foi vencida a Fazenda Pública e inexistindo motivo a ensejar conclusão diversa, os honorários advocatícios devem ser fixados em R$ 2.000,00 (dois mil reais), à vista do disposto no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil e dos padrões usualmente aceitos pela jurisprudência (STJ, AgRg-AI 1.297.055, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, J. 10.08.2010; ED-AR 3.754, Rel. Min. Benedito Gonçalves, J. 27.05.2009; TRF 3ª R., AC 0008814-50.2003.4.03.6119, Relª Desª Fed. Ramza Tartuce, J. 21.05.2012; AC 0021762-42.2007.4.03.6100, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, J. 23.04.2012). 3. Tendo em vista a re-percussão geral reconhecida no AI 842063, bem como o julgamento, nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil, do REsp 1.205.946, reformulo parcialmente meu entendimento acerca da incidência dos juros moratórios nas condenações impostas à Fazenda Pública para pagamento de verbas remuneratórias a servidores e empregados públicos, que deverão incidir da seguinte forma: a) até a vigência da Medida Provisória nº 2.180-35, de 24.08.2001, que acrescentou o art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, percentual de 12% a.a.; b) de 27.08.2001, data da vigência da Medi-da Provisória nº 2.180-35/2001, a 29.06.2009, data da Lei nº 11.960/2009, percentual de 6% a.a.; c) a partir de 30.06.2009, data da vigência da Lei nº 11.960/2009, a remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (STF, AI 842063, Rel. Min. Cezar Peluso, J. 16.06.2011; STJ, REsp 1.205.946, Rel. Min. Benedito Gonçalves, J. 19.10.2011, TRF 3ª R., 1ª S., AR 97.03.026538-3, Rel. Des. Fed. Antonio Cedenho, J. 16.08.2012). A correção monetária deve incidir desde a data em que devida as parcelas, conforme os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos

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para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal. 4. A autora faz jus ao pagamento da correção monetária a partir de julho de 2003, sobre o valor reconhecido admi-nistrativamente (R$ 16.813,83), até a data do efetivo pagamento que ocorreu na folha de setembro de 2006 e setembro de 2007 – de acordo com os extratos do Siape – com aplicação de juros a partir da citação (29.01.2004), tudo a ser apurado em fase de execução do julgado. E, em que pese a alegação de perturbação psíquica e de ansiedade que a demora do adimplemento da obrigação teriam infligido ao autor, que faleceu sem ter recebido o valor a que tinha direito, é certo que em demanda visando a indenização por dano moral, a relação entre o evento danoso e o prejuízo sofrido deve exsurgir de modo claro, dado que não basta a mera alegação do sofrimento físico e moral, à míngua de comprovação segura do nexo de causalidade. Tampouco se pode extrair das manifestações do INSS o descumprimento do dever da parte em proceder com lealdade e boa-fé, a ensejar a aplicação da multa por litigância de má-fé. 5. Apelação da autora parcialmente provida, para determinar a incidência da correção monetária e juros, nos termos indicados.” (TRF 3ª R. – AC 0001230-32.2003.4.03.6118/SP – 5ª T. – Rel. Des. Fed. André Nekatschalow – DJe 19.08.2015)

7395 – Servidor público – pensão por morte – viúva e filho inválido – rateio – possibilidade

“Administrativo. Pensão por morte de servidor. Rateio entre viúva e filho inválido. Possibilidade. I – Cuida-se de ação ordinária em que a autora, beneficiária de 50% de pensão por morte de servidor, pretende excluir seu filho do recebimento do percentual restante, sob o argumento de que o mesmo não é inválido. II – Examinando os autos, observa-se que a sentença não merece reforma, pois o filho da autora, antes de ter deferido seu benefício, apresentou vários documentos (fls. 356/378), e foi examinado por uma junta médica, conforme se verifica à fl. 380, que reco-nheceu a sua alienação mental. III – Ressalte-se, também, que às fls. 443/444 consta sentença de interdição processada perante a justiça estadual, além de parecer do Ministério Público do Estado, declarando a incapacidade do filho da autora. IV – Saliente-se, ainda, que esta Turma vem aceitan-do a prova emprestada, trazida da ação de interdição, a fim de comprovar a incapacidade da parte. V – Apelação improvida.” (TRF 5ª R. – AC 0015849-79.2011.4.05.8300 – (563466/PE) – 2ª T. – Rel. Des. Fed. Conv. Ivan Lira de Carvalho – DJe 12.08.2015)

Destaque Editorial SÍNTESESelecionamos o seguinte julgado no mesmo sentido:

“SERVIDOR PÚBLICO – PENSÃO POR MORTE – CONFLITO ENTRE AS BENEFICIÁRIAS – FILHA E VIÚVA – RATEIO – ‘Administrativo. Pensão temporária. Conflito entre as beneficiá-rias. Filha do instituidor portadora de esquizofrenia. Invalidez anterior ao óbito. Comprovação. Rateio entre a filha e a viúva. Montepio Civil da União. Designação expressa. Beneficiário. Desnecessidade. Verba honorária. Majoração. Descabimento. De acordo com o disposto no inciso VI do art. 93 da CRFB, com a redação dada pela EC 20/1998, na aposentadoria de Magistrados e no pagamento de pensão a seus dependentes, as regras a serem observadas são as do art. 40 da CRFB, que disciplinam o Regime Geral de Previdência dos Servidores Públicos detentores de cargos efetivos. Nos termos do art. 217, II, a, da Lei nº 8.112/1990, é beneficiário da pensão temporária o filho, ou enteado, até 21 (vinte e um) anos de idade ou, se inválidos, enquanto durar a invalidez. Não obstante a interdição da ré ter sido decretada poste-riormente ao óbito do instituidor, é cediço que a sentença que a decreta tem natureza jurídica predominantemente declaratória. O fator genético é indiscutível na série de fatos que provocam uma evolução do processo esquizofrênico. A determinação do início da referida enfermidade é algo complexo no âmbito da ciência médica, porquanto relacionado diretamente à interação de uma predisposição genética a fatores do meio, desencadeadores estes da manifestação dos sintomas próprios da doença. Existência de amplo aporte documental nos autos ates-tando problemas de ordem psíquica da ré, desde o início da década de 1990, em momento bastante anterior ao falecimento do instituidor (2007). Desnecessidade de comprovação de dependência econômica, por inexistência de previsão legal da referida exigência nos termos do art. 217, II, a, da Lei nº 8.112/1990. Precedentes. Desnecessidade de designação expressa para percepção de pensão do Montepio Civil da União, por ausência de previsão condicio-

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nante, nos termos da lei, nesse sentido. Verba honorária fixada em sentença mantida, com fundamento no § 4º do art. 20 do CPC. Apelações a que se negam provimento.’ (TRF 2ª R. – AC 2012.51.01.048573-9 – 5ª T.Esp. – Rel. Des. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes – DJe 11.04.2014) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 251600006480. Acesso em: 14 ago. 2015)

7396 – Servidor público – policial civil – promoção – pedido de aposentadoria – exigência cons-titucional – inaplicabilidade

“Administrativo. Agravo regimental no recurso em mandado de segurança. Servidor público. Poli-cial civil. Promoção do cargo de escrivão de 4ª classe para o cargo de comissário de polícia. Pedido de aposentadoria. Inaplicabilidade da exigência constitucional de 5 anos consecutivos para fins de aposentadoria aos cargos alcançados por meio de promoção por antiguidade ou merecimento. Entendimento do supremo tribunal federal. I – O Supremo Tribunal Federal já se manifestou, em momentos distintos, acerca de matéria análoga à presente, assentando que a promoção por acesso de servidor constitui forma de provimento derivado e não representa ascensão a cargo diferente daquele em que já estava efetivado (AI 768.895, Relª Min. Cármen Lúcia). Precedentes. II – Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-Rec.-MS 28.614 – (2009/0005629-9) – 6ª T. – Rel. Min. Nefi Cordeiro – DJe 20.08.2015)

7397 – Servidor público – processo administrativo disciplinar – falta de defesa técnica – ofensa à Constituição – inexistência

“Constitucional e administrativo. Mandado de segurança. Servidor público. Processo administrativo disciplinar. Falta de defesa técnica. Inexistência de ofensa à Constituição. Decisão da autoridade administrativa em consonância com o relatório fornecido pela comissão processante, devidamente fundamentado. Motivação suficiente. Ilícitos relacionados às avaliações do certame. Nulidade da nomeação. Inaplicabilidade das penalidades previstas na Lei nº 8.112/1990, tendo em vista que os supostos vícios ocorreram antes do efetivo exercício do cargo. Fraudes não comprovadas devi-damente. Ato anulatório baseado em mera probabilidade construída a partir de laudo estatístico. Impossibilidade. 1. A ausência de advogado constituído ou defensor dativo não acarreta a nulidade do processo administrativo, desde que seja dada ao investigado a oportunidade do pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, hipótese dos autos. Aliás, a questão foi definitivamente solu-cionada pela Suprema Corte, por meio da edição da Súmula Vinculante nº 5: ‘A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição’. 2. Está consolidado na jurisprudência desta Corte entendimento no sentido de que, estando a autoridade julgadora de acordo com o relatório final, e se este se encontra suficientemente fundamentado, não há qualquer vício no ato demissório por falta de motivação. 3. Na espécie, tendo a autoridade con-cluído que houve fraude relacionada às provas (avaliações) do certame, a penalidade, obviamente, só poderia ser a de nulidade da nomeação. Não se aplicam, ao caso, as penalidades previstas na Lei nº 8.112/1990. 4. Não obstante a inexistência das irregularidades até aqui mencionadas, saliente--se que as supostas fraudes, objeto de apuração no Processo Administrativo Disciplinar instaurado contra o impetrante (nº 9473/2005), que culminou com a anulação de sua nomeação, não restaram devidamente demonstradas, tanto que o Ministério Público Federal não ofereceu denúncia contra o ora recorrente. 5. Tal contexto conduz à análise da legalidade, ou não, do ato anulatório da no-meação com base, exclusivamente, em probabilidade, delimitada a partir de registros estatísticos. 6. Nesse diapasão, sedimentou-se nesta Corte Superior entendimento no sentido de que a aplicação da sanção disciplinar deve estar amparada em elementos probatórios contundentes, mormente em se tratando de ato de anulação de nomeação. Não se presta para tal finalidade mera probabilidade construída a partir de laudo estatístico. 7. Agravo regimental provido para, reformando o decisum recorrido, conceder a segurança e determinar a reintegração do recorrente no cargo de Analista Judiciário, especialidade Execução de Mandados. Retroação dos efeitos funcionais à data do ato

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de demissão do serviço público, com efeitos financeiros a partir da impetração (Súmulas nº 269 e 271 do STF) (MS 12.955/DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 3ª S., Julgado em 13.05.2015, DJe 19.05.2015).” (STJ – AgRg-Rec.-MS 26.011 – (2008/0000165-4) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 03.08.2015)

Destaque Editorial SÍNTESEColacionamos os julgados abaixo no mesmo sentido:

“DIREITO ADMINISTRATIVO – AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO – SERVIDOR PÚBLICO – SINDICÂNCIA – PROCEDIMENTO QUE ANTECEDE A INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – PRESCINDIBILIDADE DE CONTRADITÓ-RIO E AMPLA DEFESA – PRECEDENTES – APLICAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE Nº 5 – 1. O Supremo Tribunal Federal já assentou ser dispensada a observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa no decorrer da sindicância, procedimento que antecede a instauração do processo administrativo disciplinar. Precedentes. 2. ‘A falta de defesa técni-ca por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição’ (Súmula Vinculante nº 5). 3. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF – AgRg-RE 715.790 – Distrito Federal – 1ª T. – Rel. Min. Roberto Barroso – J. 23.06.2015) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 100000092465. Acesso em: 10 ago. 2015)

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – SERVIDOR PÚBLICO – MILITAR – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – NÃO OCORRÊNCIA – JUSTIÇA MILITAR – JULGAMENTO COLEGIADO – COMPOSIÇÃO – PROCESSO ADMINIS-TRATIVO DISCIPLINAR – ADVOGADO – AUSÊNCIA – SÚMULA VINCULANTE Nº 5 – PRE-CEDENTES – 1. A jurisdição foi prestada pelo Tribunal de origem mediante decisão suficien-temente motivada (AI 791.292-QO-RG, Relator o Ministro Gilmar Mendes). 2. O art. 125, § 5º, da Constituição Federal contém exigência de que as demandas que tenham por objeto ato disciplinar cometido por militar sejam julgadas em primeiro grau por juiz de direito, não fazendo, entretanto, nenhuma menção acerca dos julgamentos colegiados de tais demandas. 3. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que não ofende a Constituição Federal a ausência de defesa técnica em processo administrativo disciplinar. Incidência da Súmula Vinculante nº 5. 4. Agravo regimental não provido.” (STF – AgRg-RE-Ag 755.412 – São Paulo – 1ª T. – Rel. Min. Dias Toffoli – J. 07.10.2014) (Disponível em online.sintese.com, sob o nº 100000082528. Acesso em: 10 ago. 2015)

7398 – Servidor público – professor estadual – licença remunerada – aprimoramento profissio-nal – indeferimento – irrazoabilidade

“Mandado de segurança. Professor estadual. Licença remunerada para aprimoramento profissional. Poder discricionário da administração pública. Teoria dos motivos determinantes. Direito líquido e certo configurado. I – Nos termos da Lei Estadual nº 13.909/2001, a concessão de licença para o aperfeiçoamento profissional dos servidores da área da educação do Estado de Goiás, depende, além do preenchimento dos requisitos elencados em seu art. 116, da análise discricionária da Ad-ministração Pública. II – Com base na teoria dos motivos determinantes, uma vez editado o ato dis-cricionário e explicitados os motivos que o embasaram, fica o administrador vinculado aos mesmos, podendo o interessado provocar o controle jurisdicional, em busca da constatação da coerência entre o ato administrativo e os motivos apresentados para justificá-lo. III – No caso, o pedido de licença para aprimoramento profissional apresentado pela impetrante, para participação do curso de mestrado, indeferido pela autoridade impetrada, ao argumento de carência de professores efe-tivos na rede estadual, agravado pela suspensão de concursos públicos, não se mostra de razoável motivação, quando se constata que a solicitante comprovou todos os requisitos legais necessários ao deferimento da licença pretendida. IV – Mostrando-se, pois, insubsistente a negativa apresenta-da pela Administração Pública para o indeferimento da licença solicitada, e satisfeitos os demais

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requisitos previstos na legislação estadual correlata, resta configurada ofensa a direito líquido e certo a ser sanada mediante a concessão da segurança vindicada. Segurança concedida.” (TJGO – MS 201591280214 – 1ª C.Cív. – Rel. Roberto Horacio de Rezende – DJe 09.07.2015)

Comentário Editorial SÍNTESEO Mandado de Segurança em epígrafe foi impetrado por uma professora estadual contra su-posto ato ilegal atribuído ao Secretário de Educação Cultura e Esporte do Estado de Goiás, que indeferiu pedido de licença para aperfeiçoamento profissional prevista na Lei Estadual nº 13.909/2001, em virtude da carência de professores na rede estadual de ensino.A impetrante relata que protocolou pedido de licença remunerada para aprimoramen-to profissional em razão do curso de Mestrado em Letras – Literatura e Crítica Literária da PUC/GO para o qual foi aprovada. Ocorre que, a Administração indeferiu a pretensão, diante da significativa carência de professor efetivo na rede estadual de ensino, agravada pela sus-pensão de concursos públicos.Destaca a necessidade da concessão de licença remunerada, pois além da carga horária, a impetrante precisa arcar com a mensalidade do curso.A 1ª Câmara Cível do TJGO, ao analisar o presente mandamus, entendeu que a negativa apre-sentada pela Administração Pública para o indeferimento do pedido formulado é insubsistente, já que o maior beneficiário é a própria sociedade, que contará com um serviço de educação mais qualificado. Logo, concedeu a segurança pleiteada.Em seu voto, o Relator assim se manifestou:“[...] Não obstante o motivo indicado para a não concessão da licença, qual seja, a carência de professores efetivos na rede estadual, verifica-se que a impetrante colacionou prova de que, dentre as três unidades escolares em que leciona, não há licenças simultâneas em número su-perior à sexta parte do pessoal em exercício, de modo que há um único afastamento dentre os 40 (quarenta) professores do Colégio de Aplicação do IEG, enquanto nas outras duas escolas em que leciona não possuem professores afastados (fls. 35/37).Assim, não causando prejuízo à educação dos alunos matriculados naquelas Unidades de Ensino, o afastamento da impetrante para o aperfeiçoamento de sua profissão, e restando satisfeitos todos os requisitos necessários ao deferimento da licença pretendida, como consta do próprio despacho de fl. 32, configura-se como ilegal a negativa apresentada pela autoridade impetrada, de forma a ensejar a concessão da segurança pretendida.Registro que, em casos semelhantes, esse Tribunal de Justiça assim tem decidido:MANDADO DE SEGURANÇA – PROFESSOR DA REDE ESTADUAL DE ENSINO PÚBLICO – LICENÇA PARA APRIMORAMENTO PROFISSIONAL (MESTRADO) – REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS – DIREITO LÍQUIDO E CERTO – SEGURANÇA CONCEDIDA – A jurisprudência desta Corte Estadual é firme no sentido de reconhecer a configuração de ofensa a direito líqui-do e certo, a ser reparada pela via mandamental, o indeferimento de licença para aprimora-mento profissional, sob a justificativa, reputada precária e insubsistente, de carência de profes-sor efetivo na rede estadual de ensino, uma vez reconhecido pela própria autoridade impetrada que a requerente atende às exigências previstas no art. 116, da Lei nº 13.909/2001, bem assim aos critérios da Portaria nº 0823/2011, GABS/Sedeuc, que regulamenta a concessão da licença vindicada. Segurança concedida, em definitivo. (TJGO, Mandado de Segurança nº 407214-63.2014.8.09.0000, Rel. Des. Amaral Wilson de Oliveira, 2ª C.Cív., Julgado em 17.03.2015, DJe 1755 de 26.03.2015)MANDADO DE SEGURANÇA – LICENÇA PARA APERFEIÇOAMENTO PROFISSIONAL – ATO DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – MOTIVO – DIREITO LÍQUIDO E CERTO – 1. Ser discricionário não é ser arbitrário. O ato discricionário deve estar adstrito ao motivo e finalidade que o justifica. Uma vez motivado, deve o administrador ficar vinculado ao motivo, sob pena do controle jurisdicional. 2. A alegação de carência de professores na rede estadual de ensino, consequência da má administração pública, não é motivo plausível para o inde-ferimento da licença do servidor, quando este preenche todos os requisitos previstos em lei, mormente, porque, é dever do administrador investir na formação de seus servidores, quali-ficando-os, para o serviço público eficiente, princípio fundamental da Administração Pública, previsto expressamente na Constituição Federal. Segurança concedida. (TJGO, Mandado de Segurança nº 315017-89.2014.8.09.0000, Rel. Des. Orloff Neves Rocha, 1ª C.Cív., Julgado em 13.01.2015, DJe 1712 de 22.01.2015)

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MANDADO DE SEGURANÇA – LICENÇA PARA APRIMORAMENTO PROFISSIONAL DE PRO-FESSOR – CONCESSÃO – ATO DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO – TEORIA DOS MO-TIVOS DETERMINANTES – JUSTIFICATIVA PRECÁRIA REFUTADA – DIREITO LÍQUIDO E CERTO CONFIGURADO – I – Nos termos da Lei Estadual nº 13.909/2001, a concessão de licença para o aperfeiçoamento profissional dos servidores da área da educação do Estado de Goiás, depende, além do preenchimento dos requisitos elencados em seu art. 116, da análise discricionária da Administração Pública. II – Com base na teoria dos motivos determinantes, uma vez editado o ato discricionário e explicitados os motivos que o embasaram, fica o admi-nistrador vinculado aos mesmos, podendo o interessado provocar o controle jurisdicional, em busca da constatação da coerência entre o ato administrativo e os motivos apresentados para justificá-lo. III – No caso, o pedido de licença para aprimoramento profissional apresentado pela impetrante professora, para conclusão do curso de mestrado no exterior, indeferido pela autoridade impetrada ao argumento de carência de professor efetivo na rede estadual, agra-vado pela suspensão de concursos públicos, não se mostra de razoável motivação, quando se constata que a solicitante comprovou todos os requisitos legais necessários ao deferimento da licença pretendida. IV – Mostrando-se, pois, insubsistente a negativa apresentada pela Administração Pública para o indeferimento da licença solicitada e satisfeitos os demais re-quisitos previstos na legislação estadual correlata, resta configurada ofensa a direito líquido e certo a ser sanada mediante a concessão da segurança vindicada. Ademais, na espécie, a maior beneficiário é a própria sociedade, que contará, em futuro próximo, com um serviço de educação mais qualificado. Segurança concedida. (TJGO, Mandado de Segurança nº 297813-32.2014.8.09.0000, Rel. Des. Luiz Eduardo de Sousa, 1ª C.Cív., Julgado em 16.12.2014, DJe 1727 de 12.02.2015) [...]”

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Seção Especial – Acontece

As Mudanças na Previdência Social Afetam os Servidores dos Estados e Municípios?

BRUNO Sá FREIRE MARTINSServidor Público Efetivo do Estado de Mato Grosso, Advogado, Pós‑Graduado em Direito Públi‑co e em Direito Previdenciário, Professor da LacConcursos e de Pós‑Graduação na Universidade Federal de Mato Grosso no ICAP – Instituto de Capacitação, e Pós‑Graduação (Mato Grosso) no Instituto Infoc – Instituto Nacional de Formação Continuada (São Paulo), no Complexo Educacional Damásio de Jesus – Curso de Regime Próprio de Previdência Social (São Paulo), Fundador do site Previdência do Servidor (www.previdenciadoservidor.com.br), Presidente da Comissão de Regime Próprio de Previdência Social do Instituto dos Advogados Previdenciários – Conselho Federal (IAPE), Membro do Comitê Técnico da Revista SínteSe Administração de Pessoal e Previdência do Agente Público, publicação do Grupo IOB, escreve todas as terças‑‑feiras para a Coluna Previdência do Servidor no Jornal Jurid Digital (ISSN 1980‑4288) . Autor dos livros: Direito Constitucional Previdenciário do Servidor Público, A Pensão por Morte e Re‑gime Próprio – Impactos da MP 664/2014 Aspectos teóricos e Práticos, e Manual Prático das Aposentadorias do Servidor Público e de diversos artigos nas áreas de Direito Previdenciário e Direito Administrativo.

No final de 2014, o Governo Federal editou as Medidas Provisórias nºs 664 e 665, que promoveram profundas modificações nas regras que regu-lam a concessão de benefícios para os segurados do INSS; mais especificamen-te, a primeira MP alterou diversos aspectos relacionados à pensão por morte dos servidores federais.

Decorrido o lapso temporal constitucionalmente estabelecido para a vi-gência das medidas provisórias, ambas foram convertidas em lei, com altera-ções, recebendo os nºs 13.135/2015 e 13.134/2015, respectivamente.

É bem verdade que o Congresso Nacional promoveu modificações no texto que amenizaram os impactos iniciais, mas não alteraram seu escopo de reduzir e retirar direitos que até então estavam garantidos tanto aos segurados do Regime Geral quanto aos integrantes do serviço público federal.

Durante essa discussão, levantou-se a possibilidade de acabar com o fator previdenciário, instituto afeto ao INSS, muito combatido e questionado, dando ensejo à edição da Medida Provisória nº 676/2015, que introduziu nova regra de aposentadoria no Regime Geral.

Essa série de modificações promovidas em apenas um semestre trouxe grande confusão e receio quanto à possibilidade de sua aplicação aos Regi-mes Próprios de Previdência Social dos servidores estaduais e municipais, bem como para os militares, possibilidade esta a ser analisada na sequência.

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Antes, contudo, é importante lembrar que o sistema previdenciário brasi-leiro conta hoje com dois regimes tidos como básicos, consistentes no Regime Geral, que abarca segurados da iniciativa privada e algumas pessoas que atuam junto à Administração Pública, e, no Regime Próprio destinado aos servidores efetivos, estabilizados, vitaliciados e militares.

Não sendo sua instituição obrigatória para os Estados e Municípios, hipó-tese em que os servidores, anteriormente citados, terão seus benefícios regula-dos pelas normas do Regime Geral, ou seja, caso o ente federado tenha optado por não instituir previdência específica para seus agentes públicos, todos serão filiados ao INSS.

Superada a questão relacionada à organização do sistema previdenciá-rio, necessário se faz analisar os aspectos que induzem à confusão e ao temor dos servidores que possuem Regime Próprio quanto à aplicação das novas re-gras do INSS à concessão de benefícios em seu favor.

O primeiro reside no teor da Constituição Federal que estabelece:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é as-segurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

[...]

§ 12 Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores pú-blicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.

O referido parágrafo constitucional autoriza a aplicação do princípio da subsidiariedade no âmbito dos Regimes Próprios, consistente no permissivo para que as omissões legais existentes na Previdência do Servidor sejam sanadas pela aplicação das normas do INSS.

Fica clara, portanto, a invocação da regra maior somente nos casos de omissão, ou seja, é preciso que não exista regulação acerca dos institutos, o que não é o caso, já que tanto o benefício de pensão quanto o auxílio-doença, principais objetos de mudança no Regime Geral, possuem normas regedoras instituídas individualmente pelos Regimes Próprios.

Além disso, as aposentadorias dos servidores, cujos entes instituíram pre-vidência própria, e a metodologia de cálculo das pensões de seus dependentes, tem regras constitucionalmente estabelecidas, afastando, dessa forma, qualquer possibilidade de aplicação das atinentes ao INSS.

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Portanto, não há que se falar em omissão.

Ocorre que esse não é o principal fundamento para a dúvida; em verda-de, a interrogação decorre do disposto na Lei nº 9.717/1998, que prevê:

Art. 5º Os regimes próprios de previdência social dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos militares dos Esta-dos e do Distrito Federal não poderão conceder benefícios distintos dos previstos no Regime Geral de Previdência Social, de que trata a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, salvo disposição em contrário da Constituição Federal.

Inicialmente, é preciso destacar que o referido artigo reveste-se de fla-grante inconstitucionalidade, frente às regras norteadoras da competência concorrente para legislar sobre Previdência Social e a autonomia dos entes fe-derados, pois o art. 24 da Constituição Federal, ao disciplinar as regras de com-petência para regulação de determinados temas, fixou que compete à União editar as normas de cunho geral, enquanto os Estados e o Distrito Federal devem editar as chamadas normas locais.

Então, a Constituição brasileira adotou a competência concorrente não cumulativa ou vertical, de forma que a competência da União está adstrita ao estabelecimento de normas gerais, devendo os Estados e o Distrito Federal es-pecificá-las, por meio de suas respectivas leis1.

Obviamente que entre as limitações impostas ao exercício do direito de editar normas gerais, outorgado pela Carta Maior à União, encontram-se limites na chamada autonomia dos entes federados, prevista no art. 18 da Magna Carta.

A autonomia decorre da forma federativa adotada pelo Texto Magno para a Nação brasileira, em que os Estados e os Municípios têm legitimidade e liber-dade para se autoadministrarem e gerir de acordo com os interesses da socieda-de local, limitando-se apenas à observância das Normas Constitucionais.

Daí afirmar-se que, na competência concorrente não cumulativa, a le-gislação estadual deve obedecer à legislação federal, respeitando-lhe os prin-cípios gerais. Porém, se a União extrapolar os limites que lhe foram impostos, de estabelecer regras gerais e uniformes para o País, ao editar norma objeto de competência concorrente, o diploma resultante estará, ao menos parcialmente, eivado de inconstitucionalidade, por adentrar o âmbito legislativo dos Estados--membros2.

Os benefícios previdenciários dos servidores públicos, por se tratarem de tema afeto ao seu regime jurídico, constituem-se em matéria umbilicalmente

1 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 27. ed. Atlas, p. 325.2 MACHADO, Costa. Constituição Federal interpretada artigo por artigo, parágrafo por parágrafo. 3. ed.

Manole, p 186.

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ligada à autorização constitucional concedida aos entes federados para se auto-gerirem e administrar, por se constituir em assunto eminentemente de interesse da sociedade e do serviço público locais.

Portanto, fica evidente a inconstitucionalidade do disposto no art. 5º da Lei nº 9.717/1998, não podendo ele servir de fundamento para a obrigatorieda-de de aplicação das novas normas reguladoras do INSS no âmbito da Previdên-cia dos Servidores Públicos de Estados e Municípios.

Mas, como não houve ainda a declaração de inconstitucionalidade ex-pressa do disposto no referido artigo, por parte do Supremo Tribunal Federal, ele continua sendo aplicado e invocado diariamente no âmbito dos Regimes Próprios.

Essa aplicação é feita sob a forma de interpretações variadas e equivo-cadas de seu teor, entre as quais merece destaque, para efeitos do assunto ora debatido, a de que seu texto levaria à obrigatoriedade de observância literal das normas contidas na Lei nº 8.213/1991 (Plano de Benefícios do INSS) em sede de Previdência do Servidor, bem como a de que, ante a obrigação dessa obser-vância literal, os róis de dependentes dos segurados dos dois regimes básicos deveriam ser idênticos, já que, nesse caso, a edição da norma de caráter geral teria promovido a revogação tácita das Leis dos Regimes Próprios Estaduais e Municipais que se encontravam em conflito com as regras previstas na Lei nº 8.213/1991, supramencionada.

A revogação tácita consiste na retirada da validade de uma lei, em razão da edição de novo texto, incompatível com aquele que se encontrava vigente até então.

Tanto que o Tribunal de Contas da União assim se manifesta:

[...]

20. Expressamente aprovada pelo Congresso Nacional, já é plena a identifica-ção dos regimes quanto às categorias de beneficiários, razão pela qual a pensão civil a pessoa designada deixou de ser devida desde o advento do art. 5º da Lei nº 9.717/1998, que derrogou, do Regime Próprio de Previdência Social dos Ser-vidores Públicos da União, as categorias de pensão civil estatutária, destinadas a pessoa designada, maior de 60 anos ou portadora de deficiência, a filho emanci-pado e não inválido, a irmão emancipado e não inválido, a menor sob guarda e à pessoa designada, até 21 anos, previstas no art. 217, inciso I, alínea e, e inciso II, alíneas a, b, c e d, do art. 217 da Lei nº 8.112/1990, respectivamente.

[...].3

3 Acórdão nº 375/2015-TCU-1ª Câmara.

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No que é seguido por diversos órgãos de controle externo do País e por um sem-número de Regimes Próprios estaduais e municipais.

E também pela doutrina, senão vejamos:

A Lei nº 9.717/1998 dispõe em seu art. 5º que os regimes próprios de previdência não poderão conceder benefícios distintos dos previstos no RGPS, disciplinado na Lei nº 8.213/1991.

Tratando-se de norma geral, colocou-se, desde então, para os entes federativos a necessidade de adaptar a legislação pertinente, especialmente no tocante ao rol de beneficiários das pensões.

Em decorrência, as normas previdenciárias locais que continham relação de be-neficiários em desconformidade com a legislação federal perderam seu funda-mento de validade, tais como as que concediam pensão aos filhos maiores de 21 anos universitários, às filhas solteiras, aos netos e contribuintes facultativos.4

Em que pesem os fundamentos utilizados para essa conclusão, quer nos parecer que não coadunam com o verdadeiro escopo do disposto no art. 5º, independentemente da discussão acerca de sua inconstitucionalidade ou não.

Pois o texto é cristalino ao limitar o rol de benefícios e não os requisitos e/ou a sua forma de cálculo, ou seja, o intento da norma foi o de impedir que os entes federados criassem benefícios, tidos como previdenciários, diversos dos existentes, ou melhor, concedidos aos segurados do INSS.

Então, impôs-se aos Regimes Próprios dos Entes Federados apenas a li-mitação quanto à concessão dos benefícios de aposentadoria, auxílio-doença e salários-maternidade e família em favor de seus segurados e pensão por morte e auxílio-reclusão aos dependentes dos mesmos.

Salientando-se que, por intermédio da Orientação Normativa nº 02/2009, o Ministério da Previdência exclui a possibilidade de concessão de auxílio-aci-dente aos servidores públicos segurados da previdência própria, não havendo, portanto, qualquer menção que pudesse autorizar a interpretação de que tam-bém se deveria aplicar literalmente os requisitos e critérios previstos no Regime Geral, para a concessão de seus benefícios, em sede de Regime Próprio.

Daí o Supremo Tribunal Federal ter se posicionado no sentido de que:

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA – TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO – MENOR SOB GUARDA DE SERVIDOR PÚBLICO – FALECIMENTO – PEN-SÃO TEMPORÁRIA – ART. 217, INCISO II, ALÍNEA B, DA LEI Nº 8.112/1990 – NEGATIVA DE REGISTRO – LEI Nº 9.717/1998, ART. 5º – PRETENSO EFEITO

4 BRIGUET, Magadar Rosália Costa; HOVARTH JÚNIOR, Miguel; VICTORINO, Maria Cristina Lopes. Previdên-cia Social – Aspectos práticos e doutrinários dos regimes jurídicos próprios. Atlas, p. 212.

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DERROGATÓRIO NOS REGIMES PRÓPRIOS DE PREVIDÊNCIA SOCIAL – INO-CORRÊNCIA – MANDADO DE SEGURANÇA CONCEDIDO.5

Portanto, não se pode admitir a aplicação do disposto nas modificações ocorridas no Regime Geral para os servidores públicos dos Estados e Municípios com fundamento no disposto no art. 40, § 12, da Constituição Federal ou no caput do art. 5º da Lei nº 9.717/1998 sob qualquer argumento, conclusão tam-bém obtida pelo Ministério da Previdência Social, senão vejamos:

[...]

a) as alterações promovidas pela Medida Provisória nº 664, de 2014, na Lei nº 8.112, de 1990, e na Lei nº 8.213, de 1991, que serão apreciadas pelo Con-gresso Nacional, não se aplicam automaticamente aos servidores amparados em RPPS;

b) somente por lei local as previsões da Medida Provisória nº 664, de 2014, podem ser estendidas aos servidores dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, respeitadas as normas constitucionais e gerais específicas dos ser-vidores;

[...].6

Inaplicabilidade que também contempla os militares, em função do que estabelece o art. 42, § 2º, da Constituição Federal, que concedeu autonomia plena aos entes federados para regular as pensões por morte de seus depen-dentes sem a imposição de que as regras estabelecidas para a concessão do benefício em favor dos dependentes dos servidores civis fossem adotadas em sede de pensão militar, argumentos que não podem ser invocados em favor dos servidores federais, uma vez que a Lei nº 13.135/2015 alterou especificamente as regras de pensão por morte contidas na Lei nº 8.112/1990, tema a ser abor-dado em um próximo texto.

5 MS 31770, 2ª T., Relª Min. Cármen Lúcia, Julgado em 04.11.2014, Processo Eletrônico DJe-228, Divulg. 19.11.2014, Public. 20.11.2014.

6 Nota Explicativa nº 04/2015/CGNAL/DRPSP/SPPS/MPS.

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Clipping Jurídico

Vítima de erro médico deve receber R$ 20 mil de indenização

A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) determinou que o Município de Aquiraz, na Região Metropolitana de Fortaleza, deve pagar R$ 20 mil de indeniza-ção para servidor que teve os movimentos da mão direita comprometidos após ter o membro engessado. Para o Relator do caso, Desembargador Paulo Francisco Banhos Ponte, ficou devidamente caracterizada que a “sequela no quarto dedo da mão direita do autor [servidor] deveu-se a uma má prestação no serviço médico quando do seu atendimento para diagnóstico do machucado”. De acordo com os autos, o servidor machucou a mão durante jogo de basquete. No dia seguinte, ele foi a um hospital municipal, onde foi constatado que um dos dedos estava quebrado. Na ocasião, o médico que realizou o atendimento mandou engessar dois dedos da mão e prescreveu analgésico. Depois de 21 dias, o paciente removeu o gesso e percebeu que o dedo ma-chucado estava torto e arroxeado. Ele se dirigiu a outro hospital. Lá, foi constatado que o membro havia calcificado de forma errada e precisaria de cirurgia para recuperar os movimentos da mão. Por essa razão, o servidor ajuizou ação requerendo indenização por danos materiais e estéticos. Alegou que sofreu redução na capacidade laboral, pois trabalhava com digitação de documentos. Na contestação, o ente público alegou ausência de responsabilidade, pois o problema teria sido originado em decorrência da conduta da vítima. Sustentou também que não foi comprovado o dano sofrido. Em agosto de 2012, a Juíza Mônica Lima Chaves, da 1ª Vara de Aquiraz, condenou o município ao pagamento de R$ 30 mil de reparação material e R$ 30 mil a títulos de danos estéticos. “Está bem caracterizada a conduta negligente do médico contratado pelo município, a contribuir, decisivamente, para o agravamento do estado de saúde do paciente, especialmente porque a sua conduta desencadeou o comprometimento da função motora do dedo do autor”, destacou a magistrada. Requerendo a reforma da decisão, o município ingressou com apelação (nº 0000677-47.2004.8.06.0034) no TJCE. Manteve os mesmos argumentos apresentadas anteriormente. Durante sessão, a 1ª Câmara Cível fixou em R$ 20 mil a indenização por danos estéticos e materiais. Segundo o Desembargador Paulo Ponte, as sequelas decorrentes do procedimento médico “não mostraram-se aptas a afastar em definitivo ou por período prolongado o autor do trabalho, e mais, as sequelas motoras verificadas não são de grande monta a ponto de fundamentar” a quantia fixada na sentença de 1º grau. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Ceará)

Estado é condenado a indenizar homem por tortura

Por atos de tortura, o Juiz Aldary Nunes Junior, da Vara da Fazenda Pública Estadual, Registros Públicos e Meio Ambiente de Vila Velha, Comarca da Capital, condenou o Estado do Espírito Santo a indenizar E. O. J. em R$ 20 mil. A indenização é referente ao dano moral sofrido pela vítima, e o valor deve ser acrescido de juros e corrigido mo-netariamente desde a data da publicação da sentença (5 de agosto). O homem que re-ceberá a indenização é um dos 56 detentos que teriam sofrido tortura na Penitenciária Estadual de Vila Velha III (PEVV III), no Complexo do Xuri, em janeiro de 2013. Apesar da multa coletiva no valor de R$ 200 mil imposta ao Estado, em junho último, em favor do Fundo Penitenciário Estadual (Funpen), no entender do magistrado, a possibilidade do ingresso de ações individuais não está afastada. Na primeira ação interposta contra

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o Estado, consta nos autos que os agentes da Diretoria de Segurança Penitenciária (DSP) teriam invadido as galerias D e E, lançando bombas de gás e disparando tiros de borracha em direção aos internos. A ação teria ocorrido sob a justificativa de que os presos teriam chutado o chapão, cela em que toda a área de grades é fechada por chapa de aço, com apenas uma pequena abertura. Os agentes teriam levado os deten-tos para o banho de sol, utilizando gás de pimenta e lacrimogêneo, alocando-os na parte do pátio sem proteção contra o sol, sentados e vestidos apenas com bermudas do uniforme, o que teria provocado queimaduras nos internos. Também segundo os autos, enquanto permanecia no chão, o grupo teria sido agredido com tapas e chutes, sofrendo ainda torturas de ordem psicológica, como, por exemplo, ameaças. A defesa do Estado alegou, neste processo, inexistência de conduta ilícita de agentes públicos estaduais e pediu, assim, a impugnação dos fatos. Já o Juiz Aldary Nunes Junior enten-deu que, por todo o exposto, se deve reconhecer que restaram demonstrados, a partir da instrução probatória, os requisitos que justificam a condenação do Estado. A inde-nização por dano moral não é um preço pelo padecimento da vítima, mas sim uma compensação parcial pela dor injusta que lhe foi provocada, como forma de minorar seu sofrimento, detalhou o juiz na sentença. Processo nº 0001923-35.2015.8.08.0035. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Espírito Santo)

Tribunal confirma obrigação de Estado custear tratamento a paciente com neoplasia maligna

A 4ª Câmara de Direito Público do TJ manteve sentença da Comarca do Vale do Itajaí que condenou o Estado a fornecer medicamentos a paciente diagnosticada com ne-oplasia maligna. Ela necessita de medicação com custo mensal de R$ 9 mil e provou incapacidade financeira para custear o tratamento mediante comprovante de renda e documentos que demonstram o alto custo da medicação. Os medicamentos não estão na lista dos fornecidos pela Secretaria de Saúde do Estado – o ente público sugeriu sua substituição por similares. Nos autos, ficou claro que a paciente tem recebido acom-panhamento médico de um especialista. Este, inclusive, advertiu sobre a impossibili-dade de substituição do remédio, pois o indicado por ele possibilita melhor tolerância, com menor incidência de hipertensão e fadiga. O Relator da matéria, Desembargador Ricardo Roesler, ressaltou que o direito à saúde e à vida deve ser assegurado pelos entes federativos, e, portanto, o Estado precisa oferecer o medicamento adequado para preservar a vida da paciente. Destarte, sendo a saúde e a vida um bem maior, deve o Poder Público, comprovada a necessidade do enfermo, fornecer o medicamento independentemente de previsão orçamentária, bem como de estar o remédio relacio-nado na lista daqueles padronizados pelo Ministério da Saúde ou pelo Estado de Santa Catarina, concluiu Roesler. A decisão foi unânime (Apelação Cível nº 2015.035820-6). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina)

Tribunal anula punição disciplinar aplicada a militar por afronta ao princípio da ampla defesa

O Tribunal Regional Federal (TRF3) julgou procedente ação ajuizada por um militar para que fosse anulada punição disciplinar imposta pelo Exército. Em primeiro grau,

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o pedido foi julgado improcedente, tendo o juiz entendido que a punição sofrida pelo autor da ação decorria dos princípios da hierarquia e da disciplina e que não havia ví-cios no ato do Exército. O militar recorreu ao TRF3 alegando que a punição seria ilegal e inconstitucional, pois teria sido aplicada sem a observância das garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Ao analisar o recurso, o Tribunal observa que a punição, consistente em detenção pelo período de dois dias, decorreu de sindicância em que o interessado figurava como testemunha e não como sindica-do. O autor, 2º Tenente, teria orientado um cabo a procurar autoridades policiais e a registrar ocorrência por ameaça feita por um civil nas dependências do 9º Batalhão de Suprimentos, sendo que essa responsabilidade caberia ao Subcomandante do Bata-lhão, configurando esta conduta uma transgressão disciplinar considerada média. No curso da sindicância instalada para apurar a responsabilidade do civil que praticara a ameaça, embora o autor da ação tenha sido ouvido como testemunha, terminou punido sem ser sequer sindicado. Para o Desembargador Federal Hélio Nogueira, Re-lator do caso, a finalidade do procedimento instaurado foi nitidamente desviada. “Ao vislumbrar a ocorrência de transgressão disciplinar por outro que não o sindicado ini-cialmente apontado, deveria ter sido outorgada ao apelante a chance de se defender, o que não aconteceu”, explicou o relator, que concluiu que houve ofensa ao princípio da ampla defesa, o que gera a anulação do ato administrativo disciplinar. Nº do Pro-cesso: 0002360-86.2004.4.03.6000. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 3ª Região)

União terá de se manifestar sobre ação que questiona compra de helicópteros pelo GDF com verba federal

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou decisão da Justiça do Distrito Federal e de-terminou que a Corte local intime a União, a fim de que manifeste eventual interesse em ingressar na ação em que o Ministério Público contesta a compra de helicópteros pelo Governo do Distrito Federal (GDF). A decisão é da Segunda Turma. A aquisição pelo DF de helicópteros de salvamento, destinados ao Departamento de Trânsito e ao Corpo de Bombeiros Militar, foi feita por licitação na modalidade pregão. O MP contestou a compra em ação civil pública. Como os equipamentos já foram entregues à administração, o MP pede que sejam devolvidos e que os valores sejam restituídos pela empresa aos cofres públicos. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) manteve sentença que declarou a nulidade da contratação. No entanto, deixou de intimar a União para ingressar na ação porque considerou que ela não teria interesse processual, sob o argumento de que a verba utilizada na compra, apesar de ter sido fruto de convênio entre a Secretaria Nacional de Segurança Pública, do Ministério da Justiça, e o GDF, foi incorporada ao Erário distrital. Ao analisar recursos apresen-tados pelo GDF e pela Helibras, que vendeu os helicópteros, o Relator, Ministro Og Fernandes, afirmou que o interesse da União não poderia ter sido afastado de plano. “Ainda que a verba pública tenha sido incorporada ao patrimônio do Distrito Federal, é necessária a avaliação do interesse federal na lide, considerando-se a amplitude do convênio administrativo firmado, a sua execução, a finalidade e a destinação atribuída

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aos valores despendidos pela União”, ressaltou o magistrado. Caso a União manifeste interesse em ingressar na ação, os autos deverão ser remetidos à Justiça Federal. REsp 1375679. (Conteúdo extraído do site do Superior Tribunal de Justiça)

1ª Turma: regras de concurso público já iniciado não podem ser alteradas

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu não ser possível a al-teração das regras de pontuação de títulos por pós-graduação de concurso público já iniciado por ofensa ao princípio da segurança jurídica. A questão foi analisada durante o julgamento dos Mandados de Segurança (MS) nºs 32941 e 33076, impetrados contra ato do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que, ao anular decisão administrativa do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES), manteve contagem, sem restri-ção de quantidade, de títulos de pós-graduação em concurso para cartórios do Esta-do. Consta dos autos que o concurso para preenchimento de serventias extrajudiciais estava previsto no Edital nº 01/2013, porém, posteriormente, o TJ publicou o Edital nº 12/2014 com o intuito de adequar as regras do certame às novas diretrizes estabe-lecidas pelo CNJ. Este último edital foi anulado por meio da decisão administrativa do CNJ questionada nos mandados de segurança. De acordo com os processos, a Resolução nº 81/2009 – editada pelo CNJ a fim de normatizar os processos seletivos para outorga de delegações de serventias extrajudiciais – foi alterada pela Resolução nº 187/2014, que previu novas regras quanto à atribuição de pontos aos títulos de can-didatos. Entre elas, determinou limite à cumulação dos títulos de pós-graduação para fins de avaliação dos candidatos. Segundo os autores dos mandados de segurança, o sistema original de pontuação dos títulos referentes à pós-graduação fere o sistema classificatório do concurso, devendo ser aplicada a resolução do CNJ no concurso já iniciado. O Relator, Ministro Marco Aurélio, indeferiu os pedidos. Para ele, deve ser mantido o ato do CNJ no sentido de que “não se aplica nova regra para limitar a cumu-lação dos títulos de pós-graduação, na etapa de concurso público denominada prova de títulos”. A maioria dos ministros acompanhou o voto do relator, considerando não ser possível alterar as regras de um edital de concurso com o certame em andamento, como expressa o ato normativo do CNJ. Ficou vencido o Ministro Luiz Fux ao entender possível aplicar a regra de limitação de títulos em certame já iniciado. No MS 32941, o relator declarou o prejuízo do agravo interposto contra decisão interlocutória proferida por ele. (Conteúdo extraído do site do Supremo Tribunal Federal)

Ação questiona lei da Paraíba que permite uso de depósitos judiciais pelo go-verno

A Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionali-dade (ADIn) nº 5365 no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar a Lei Com-plementar nº 131/2015, do Estado da Paraíba, que prevê transferência de depósitos judiciais para conta específica do Poder Executivo, para pagamento de precatórios de qualquer natureza e para outras finalidades. A lei estadual destina 60% dos valores relativos a depósitos judiciais da Justiça do Estado da Paraíba a conta do Poder Executi-vo, para o pagamento de precatórios e outras despesas previstas em lei. Ainda segundo

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a norma, os 40% restantes, não transferidos, devem constituir fundo de reserva para garantir a restituição ou pagamentos referentes aos depósitos, conforme decisão pro-ferida no processo judicial ou administrativo de referência. Para o procurador-geral, a norma “destina os depósitos judiciais para despesas ordinárias do estado, e não aos titulares de direitos sobre esses créditos”, e é integralmente incompatível com a Cons-tituição Federal de 1988, por violar diversos artigos e princípios constitucionais. Entre eles, o art. 5º (caput), por ofensa ao direito de propriedade, o art. 22 (inciso I), por invasão da competência legislativa privativa da União para legislar sobre Direito Civil e Processo Civil, e o art. 148 (incisos I, II e parágrafo único), por instituir empréstimo compulsório. A norma afronta, ainda, no entender da PGR, o art. 168, por desobede-cer à sistemática constitucional de transferências do Poder Executivo ao Judiciário, o art. 170 (inciso II), por ofensa ao direito de propriedade dos titulares de depósitos, e o art. 192, por desconsideração à competência da União para disciplinar o funcio-namento do sistema financeiro nacional mediante lei complementar. A ação pede a suspensão cautelar da norma e, no mérito, a declaração de inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 131/2015, do Estado da Paraíba. O Relator da ADIn é o Ministro Gilmar Mendes. Processo relacionado: ADIn 5365. (Conteúdo extraído do site do Su-premo Tribunal Federal)

Detran deve liberar emplacamento de veículo indevidamente apreendido

O Juiz Valdir Flávio Lobo Maia, da Comarca de Patu, determinou que o Detran/RN efetue a suspensão da cobrança da quantia de R$ 1.258,00 e expeça as guias neces-sárias ao emplacamento do veículo de um cidadão que possivelmente teve seu bem clonado por falsários, no ano de 2015, livres de encargos. O magistrado entendeu que o proprietário do veículo não deu causa à situação de apreensão do bem no depósito do órgão de trânsito, o que não impede este de cobrar o valor anteriormente referido caso obtenha êxito ao final da ação judicial, já que não ocorre nenhum perigo de ir-reversibilidade na medida. Na ação, o autor alegou que possui uma motocicleta, cujo registro está em seu nome, e que, ao tentar imprimir as guias para pagar o emplaca-mento do ano de 2015, foi surpreendido com uma cobrança de R$ 1.258,00, quantia esta que afirma ser indevida, pois decorreria de custos referentes a diárias de apre-ensão e reboque do veículo. Assinalou ainda que, temendo se tratar de clonagem de veículo, o que poderia lhe causar mal-estar ainda pior, resolveu registrar um Boletim de Ocorrência junto à Delegacia de Polícia da Cidade de Patu e, logo em seguida, pro-curou o Detran/RN, a fim de submeter seu veículo à vistoria daquele órgão, tendo sido atestada a regularidade dos caracteres veiculares. A despeito disso, o autor informou que foi destinado pelos funcionários do órgão de trânsito ao depósito das motocicletas apreendidas, a fim de que, ele próprio, e não os servidores, localizasse a motocicleta supostamente clonada, isto entre centenas ou quem sabe milhares de veículos reu-nidos no depósito. Tendo saído do órgão sem solucionar a situação de seu veículo, o autor alegou que atualmente não tem utilizado seu veículo, pois, diante do que se passou, não foi possível regularizar a situação do emplacamento 2015, vendo, assim, seu direito de propriedade prejudicado em razão da prática de ato administrativo ile-

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galmente praticado pelo Detran/RN e seus agentes. Quando analisou os fatos alegados e documentos anexados ao processo, o magistrado verificou que as alegações do au-tor, no sentido de que tal cobrança tem impedido a regularização do veículo no ano de 2015, têm fundamento, vez que a quantia que se lhe cobra a título de diárias no depósito e reboque do veículo soma valor que ultrapassa mil reais. Segundo o juiz, isto se constitui em algo bastante superior ao que normalmente se dispende para colocar em dia um veiculo como o do autor em condições normais, o que de fato apresenta verossimilhança fundada em prova inequívoca, que corresponde à vistoria veicular realizada em sua motocicleta, atestando a normalidade de seus caracteres (Processo nº 0100285-60.2015.8.20.0125). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Rio Grande do Norte)

Servidor público não precisa devolver valores recebidos de forma indevida ou pagos a maior

Não é cabível a efetivação de desconto em folha de pagamento para fim de reposição ao Erário quando se tratar de verba remuneratória por ele percebida de boa-fé, mesmo que seja indevida ou tenha sido paga a maior por erro da Administração. Com essa fundamentação, a 1ª Turma do TRF da 1ª Região confirmou sentença de primeiro grau que, nos autos de mandado de segurança impetrado por um servidor público federal, determinou à União que não efetivasse quaisquer descontos na sua folha de paga-mento, a título de ressarcimento ao Erário, de valores que lhe teriam sido pagos inde-vidamente. Em suas alegações recursais, a União sustentou que a Lei nº 8.112/1990 autoriza expressamente o desconto de valores recebidos indevidamente por servidor público e que o recebimento indevido da Gratificação de Desempenho da Atividade Jurídica “é hipótese que autoriza a dúvida sobre a boa-fé dos servidores”. Afirmou que, ao realizar os descontos do servidor, “apenas cumpriu estritamente o que consta em lei, objetivando a reposição ao Erário para sanar o locupletamento ilícito”. Ao analisar o caso, o Relator, Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, citou jurispru-dência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de que “a interpretação errônea da Administração que resulte em pagamento indevido ao servidor acaba por criar-lhe uma falsa expectativa de que os valores por ele recebidos são legais e definitivos, daí não ser devido qualquer ressarcimento”. O magistrado também destacou que o Supre-mo Tribunal Federal (STF), ao julgar o Mandado de Segurança nº 256.641/DF, enten-deu ser insuscetível de devolução a percepção de vantagem indevidamente paga pela Administração ao servidor quando houver: “Presença de boa-fé do servidor; ausência, por parte do servidor, de influência ou interferência para a concessão da vantagem im-pugnada; existência de dúvida plausível sobre a interpretação, validade ou incidência, no momento da edição do ato que autorizou o pagamento da vantagem impugnada; interpretação razoável, embora errônea, da lei pela Administração”. Nesses termos, a Turma negou provimento à apelação. Nº do Processo: 39410-70.2009.4.01.3400. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

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Determinado pagamento integral de salário de professora aposentada

O Juiz de Direito Ivan Fernando de Medeiros Chaves, da 2ª Vara Cível do Foro de São Leopoldo, concedeu liminar em ação movida por professora aposentada contra o Es-tado do RS. A autora ingressou na justiça pedindo que o Estado pague, integralmente, os proventos de professora estadual aposentada. O pedido é relativo ao mês de julho de 2015 e subsequentes (incluindo 13º salário), impedindo-se futuros novos parcela-mentos. Em sua decisão, o magistrado assinalou ser notório que o Governo do Estado do Rio Grande do Sul parcelou os salários dos servidores do Poder Executivo, ativos e inativos. Na medida emergencial do governo, foram depositados apenas R$ 2.150,00, prometendo o pagamento do restante da remuneração em duas parcelas, em datas diversas no mês. O juiz considerou descabida a medida, como se fossem os servidores os responsáveis pela crise, penalizando-os com o parcelamento dos salários. Paralelo a isso, ainda destacou que, mesmo com a drástica medida adotada, o governo ainda assim noticiou a nomeação de mais de 50 cargos em comissão pelo Executivo, em verdadeira afronta ao quadro de servidores concursados. Ressaltou que é um direito dos servidores receber remuneração de forma integral, regular e contínua garantida na Constitucional Estadual que regula a matéria (art. 35) e ordenou que o parcelamento do salário, por malferir a Lei Magna Estadual, deve cessar imediatamente. “Defiro os pedidos liminares, para os fins de determinar a imediata cessação dos parcelamentos dos salários da autora, depositando o saldo remanescente do mês de julho/2015 na conta bancária vinculada à sua matrícula junto ao Estado, no prazo de 72 horas”. Caso haja descumprimento da decisão, o juiz determinou multa diária de R$ 1 mil. Ainda salientou que, por se tratar de verba alimentar, poderá haver sequestro liminar dos respectivos valores. Processo nº 033/1.15.0009867-1 (Comarca de São Leopoldo). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Rio Grande do Sul)

Reconhecida a competência de guardas municipais para aplicar multas de trânsito

Por seis votos a cinco, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que as guardas municipais têm competência para fiscalizar o trânsito, lavrar auto de infração de trânsito e impor multas. Seguindo divergência aberta pelo Ministro Luís Roberto Barroso, o Tribunal entendeu que o poder de polícia de trânsito pode ser exercido pelo Município, por delegação, pois o Código Brasileiro de Trânsito (CTB) estabeleceu que esta competência é comum aos órgãos federados. O recurso tem repercussão geral, e a decisão servirá de base para a resolução de pelo menos 24 processos sobrestados em outras instâncias. No caso concreto, foi negado provimento ao Recurso Extraordinário (RE) nº 658570, interposto pelo Ministério Público de Minas Gerais contra acórdão do Tribunal de Justiça Estadual (TJMG), e reconhecida a constitucionalidade de normas do Município de Belo Horizonte – Lei Municipal nº 9.319/2007, que instituiu o Estatuto da Guarda Municipal, e o Decreto nº 12.615/2007, que o regulamenta – que conferem à guarda municipal competência para fiscalizar o trânsito. O julgamento começou em maio, mas empate em quatro votos para cada corrente, a votação foi suspensa para aguardar os votos dos ministros ausentes. A discussão foi retomada esta tarde com os

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votos dos Ministros Edson Fachin e Gilmar Mendes, que acompanharam a divergência, e da Ministra Cármen Lúcia, acompanhando o relator. Na sessão anterior, os Ministros Marco Aurélio (Relator), Teori Zavascki, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski votaram pelo provimento parcial do recurso, no sentido de limitar a competência da guarda municipal. O Ministro Luís Roberto Barroso abriu a divergência e foi seguido pelos Ministros Luiz Fux, Dias Toffoli e Celso de Mello, fixando o entendimento de que a decisão do TJMG deve ser mantida, votando, portanto, pelo desprovimento do RE. Processo relacionado: RE 658570. (Conteúdo extraído do site do Supremo Tribunal Federal)

5ª Câmara Cível condena ex-prefeito e ex-secretários de Uruburetama

A 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) condenou, nesta quarta--feira (05/08), o ex-prefeito e seis ex-secretários do Município de Uruburetama (a 127km de Fortaleza) ao pagamento de multa e suspensão de direitos políticos. Tam-bém determinou o ressarcimento ao Erário dos valores que foram desviados dos cofres públicos. Os acusados foram condenados pela prática de improbidade ad-ministrativa durante o exercício de 2012. São eles: José Giuvan Pires Nunes (Ex--Prefeito); Francisco Carlos Alves de Lima (Ex-Secretário de Planejamento, Adminis-tração e Finanças); José Carlos Ferreira de Sousa (Ex-Secretário de Obras, Transporte e Serviços Públicos); João de Castro Chagas Neto (Ex-Secretário de Saúde); Isabel Rodrigues Batista Nunes (Ex-Secretária de Educação e Desporto); e Rita Rodrigues Batista (Ex-Secretária do Trabalho e Assistência Social). O processo teve a relatoria do Desembargador Teodoro Silva Santos. Segundo o magistrado, ficou verificado que o estudo realizado pela Comissão de Investigação do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) comprovou as irregularidades, “concluindo-se pela existência de superfaturamento”. Conforme denúncia do Ministério Público Estadual (MP/CE), o TCM constatou fraude em licitações, excesso de gastos com pessoal, contratação de servidores sem concurso público, entre outros. Em virtude das irregularidades, foi ocasionado atraso no pagamento de credores. Ao julgar o caso, o Juiz Antônio Cristiano de Carvalho Magalhães, titular da Comarca de Uruburetama, condenou os acusados ao ressarcimento do prejuízo sofrido pelo ente público, no valor aproxi-mado de R$ 22,5 milhões. Além disso, eles também deverão pagar multa correspon-dente a duas vezes o valor dos prejuízos. Os gestores ainda tiveram os direitos polí-ticos suspensos. Requerendo a reforma da decisão, o ex-prefeito e os ex-secretários apelaram (nº 0005218-98.2012.8.06.0178) no TJCE. Em defesa, alegaram a nulidade do relatório da Comissão de Inspeção Especial do TCM, por violação ao devido processo legal e à ampla defesa. Ao analisar o caso, a 5ª Câmara Cível determinou a condenação, reduzindo a multa civil na razão de um terço do valor do prejuízo sofrido. Segundo o relator, “a multa civil fixada pelo Juiz a quo mostrou-se excessiva, pois, repiso, não observou os vetores legais, desgarrando-se, inclusive, do princípio da proporcionalidade, motivo pelo qual reduzo a multa civil na razão de 1/3 (um terço) do valor sofrido pelo município conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça”. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Ceará)

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2ª Câmara Especial concede o direito a policial de não ser transferido

Em sessão de julgamento realizada nessa terça-feira, dia 4, os membros da 2ª Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia reformaram a sentença de pri-meiro grau e concederam o direito a um policial militar (PM), transferidos ex officio para o Município de Cerejeiras, de permanecer na unidade da Polícia Ambiental do Município de Pimenteiras do Oeste. A transferência revelou possível perseguição ao militar; além disso, o subcomandante da Polícia Militar de Rondônia não justificou a motivação nem observou os critérios para transferência, como a antiguidade do praça em relação a outros mais modernos. A decisão colegiada foi por unanimidade, nos termos do voto do Relator, Desembargador Renato Martins Mimessi. De acordo com o voto do relator, uma das motivações da transferência do policial de Pimenteiras para Cerejeiras seria uma transgressão do militar por não ter zelo no preenchimento na documentação da corporação – o policial colocava o carimbo nos documentos de cabeça para baixo e rasurava-os. A segunda motivação seria a instauração de um in-quérito policial militar, por ter ingerido bebida alcoólica em serviço, todas amparadas em uma portaria que trata da movimentação de praças (soldado a subtenente) e oficiais da PMRO (aspirante a coronel). Para o relator, os fatos ocorridos na vida funcional do policial não têm nenhuma relação com a portaria que regulamenta a remoção de policial militar rondoniense. Quanto à primeira transgressão, relativa a carimbos e rasuras em documentos oficiais, o PM foi punido com dois dias de detenção; já com relação à acusação de bebida alcoólica em serviço, não houve prova nos autos de conclusão de investigação, apenas de que a investigação não teve prosseguimento. Ainda de acordo com o voto do relator, conforme o parecer ministerial, as informações constantes nos autos revelam a possibilidade de que o policial esteja, efetivamente, sofrendo perseguições, uma vez que os fatos descritos nos documentos juntados em defesa do Comando da PMRO não guardam nenhuma relação com a sua portaria de movimentação. No caso, o ato é nulo por falta de observância do estatuto da categoria, além disso, embora seja facultada à administração, por interesse e necessidade, trans-ferir seus servidores, tal faculdade não isenta o administrador em observar e obedecer aos princípios da legalidade, da motivação e da impessoalidade. A decisão colegiada foi sobre um recurso de apelação cível em mandado de segurança. Participaram do julgamento os Desembargadores Renato Martins Mimessi, Roosevelt Queiroz e Walter Waltenberg Júnior. Apelação Cível nº 0019288-88.2013.8.22.0001. (Conteúdo extraí-do do site do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia)

Tribunal autoriza universidade a limitar salários de professores

A 6ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo determinou o cor-te dos salários de professores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) que estejam acima do teto remuneratório estadual. Com isso, a instituição voltará a limitar os vencimentos em R$ 21,6 mil, tendo como base o subsídio recebido pelo governa-dor. A universidade limitou os pagamentos em abril de 2014, para cumprir decisão do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Poucos meses depois, a associação que representa os docentes conseguiu liminar que suspendeu a medida. Na ocasião, a entidade argu-

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mentou que a redução dos pagamentos desrespeita a isonomia entre os servidores. Em fevereiro deste ano, o Judiciário autorizou os cortes, mas ambas as partes recorreram. O Relator do recurso, Desembargador Sidney Romano dos Reis, determinou que sejam mantidos apenas os pagamentos de verbas decorrentes da prestação de serviço extra-ordinário. “No que diz respeito à isonomia entre docentes das redes estadual e federal, não viceja o argumento, ausente qualquer amparo legal para a pretensão. Tampouco merece guarida a pretensão da Unicamp de que sejam excluídos os pagamentos de plantões, sobreaviso e outras verbas decorrentes da prestação de serviço extraordinário e que superem o valor do teto remuneratório”, disse. Ainda de acordo com o magis-trado, a decisão afeta toda a categoria profissional representada pela entidade. “Cabe observar expressamente que a coisa julgada em ação coletiva não se restringe somente àqueles que são filiados ao sindicato ou associação, mas afetam a toda categoria pro-fissional representada por ele”, disse. Os Magistrados Reinaldo Miluzzi e Maria Olívia Pinto Esteves Alves também participaram do julgamento e acompanharam o voto do relator, negando provimento aos recursos. Apelação nº 1016686-14.2014.8.26.0114. Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo)

Juiz determina bloqueio de verba para tratamento de criança com diabetes

O Juiz Airton Pinheiro, da 2ª Vara da Fazenda Pública de Natal, determinou o imediato bloqueio da quantia de R$ 6.440,40 das contas do Estado do Rio Grande do Norte para que seja viabilizado o tratamento de uma criança que é portadora de Diabetes Mellitus tipo 1. O bloqueio foi determinado porque a mãe do menino, que o represen-ta judicialmente, informou o franco descumprimento da obrigação de fazer imposta ao Estado, razão pela qual pediu pelo bloqueio de verbas públicas e pela execução de uma multa que foi fixada em caso de descumprimento. Pela liminar deferida à criança, esta receberia: insulina lantus autopen 24h; insulina novorapid flex pen; agulha bd ultra fin; tiras accu-chek; e lanceta softclix, para uso mensal por tempo ainda indeter-minado. No entanto, até o momento, o Estado não cumpriu o que foi determinado pela justiça. Após efetuado o bloqueio, o magistrado determinou a expedição de alvará, em favor do autor, a ser retirado pela sua representante legal, para levantamento do montante, mediante recibo. Em seguida, ela deverá prestar contas dos medicamentos e insumos adquiridos com os valores que lhe foram conferidos (Processo nº 0036842-32.2009.8.20.0001). (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Rio Grande do Norte)

Prefeito de Maricá é multado por improbidade administrativa

A 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) multou, por improbidade administrativa, o Prefeito de Maricá, Washington Quaquá. Ele é acu-sado de utilizar a Revista Maricá, feita com dinheiro público, para realizar autopromo-ção. O valor a ser pago é de 50 vezes a última remuneração do prefeito, além do res-sarcimento do dinheiro gasto com a impressão dos 50 mil exemplares da publicação. Na decisão, o Desembargador Relator Cesar Cury escreveu que “é evidente o dolo, ainda que genérico, na autopromoção do prefeito em diversas passagens da Revista

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Maricá”, ressaltando que “foram utilizados artifícios para enaltecer sua imagem e seu nome”. Processo: 0004225-82.2011.8.19.0031. (Conteúdo extraído do site do Tribu-nal de Justiça do Estado de Rio de Janeiro)

Aprovação para cadastro reserva em concurso público não gera direito à no-meação

O cadastro reserva em concursos públicos gera mera expectativa de direito, não dando aos candidatos direito à indenização por danos morais ou materiais em caso de não haver nomeação. Esse foi o entendimento da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) ao negar recurso de um morador de Santo Ângelo (RS) aprovado em concurso para Carteiro da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT. O candi-dato ajuizou ação na Justiça Federal requerendo que a ECT fosse obrigada a nomeá-lo e a pagar-lhe indenização por danos morais e materiais. Ele alegou que a empresa teria realizado concurso público apenas com fins arrecadatórios, tendo em vista que contratou terceirizados enquanto o certame era válido. Além disso, os Correios publi-caram novo edital de concurso para preenchimento de 12 vagas assim que expirada a validade deste, no qual o candidato fora aprovado em 7º lugar. A ECT alegou que não teve necessidade de contratar nenhum carteiro no período de validade do concurso, uma vez que este foi realizado apenas para a formação de cadastro reserva. A empre-sa argumentou que a contratação de terceirizados ocorreu durante curto espaço de tempo para suprir demanda excepcional. O pedido do autor foi negado pela 1ª Vara Federal de Santo Ângelo, e ele recorreu ao Tribunal. Segundo a Relatora do processo, Desembargadora Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha, “a contratação temporária de terceirizados não obriga a nomeação de candidato aprovado em concurso público, uma vez que não revela a urgência no preenchimento das vagas previstas no edital”. Conforme Vivian, “o cadastro de reserva é mera expectativa de vagas que possam sur-gir durante o período de sua validade, desde que haja interesse da administração em supri-las”. Nº do Processo: 5006121-49.2011.4.04.7105. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 4ª Região)

Médicos da Região Sul não precisam mais fazer curso de primeiros socorros para renovar CNH

Os médicos dos Estados do PR, SC e RS estão dispensados de participar do curso de primeiros socorros exigido pelo Conselho Nacional de Trânsito (CNT) para renovação da carteira de motorista. A decisão é do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que, na última semana, atendeu a um recurso do Sindicato dos Médicos do Estado do Paraná (Simepar) e reformou sentença de primeira instância que havia negado a anulação da exigência. A ação civil pública tramitava desde 2006 e questionava a Resolução nº 168/2004 do CNT. A 4ª Turma entendeu que submeter esses profissio-nais a tal curso é uma violação ao princípio da razoabilidade, já que eles estudam durante vários anos como salvar vidas. O juízo de primeiro grau havia considerado inadmissível criar uma divisão para atender exclusivamente à classe médica, enquanto outros profissionais da área, como enfermeiros e técnicos de enfermagem, também

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possuem conhecimentos sobre a matéria. Como alegação para manter a obrigatorie-dade, a Advocacia-Geral da União argumentou que o curso de primeiros socorros, nos moldes da resolução, não faz parte da grade curricular das faculdades de medicina, portanto, não se pode presumir que estes profissionais tenham todos os conhecimentos abordados nas aulas. Já o TRF4 entendeu que o curso não é necessário para os médi-cos. Conforme o Desembargador Federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle, Relator do processo, “é notório que os médicos possuem conhecimento diferenciado em relação aos demais cidadãos, no que se refere à saúde humana, portanto, plenamente cabível o afastamento da imposição de frequência ao curso de primeiros socorros”. Nº do Processo: 50187256620114047000. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 4ª Região)

Poder Judiciário não possui competência para alterar valor de auxílio-alimen-tação

Não cabe ao Poder Judiciário alterar os parâmetros fixados pela Administração para definição do valor do auxílio-alimentação, pois assim decidindo estaria atuando como legislador positivo, em violação ao princípio da separação dos poderes. Com essa fundamentação, a 1ª Turma do TRF da 1ª Região reformou sentença de primeiro grau que determinou a majoração do auxílio-alimentação de uma servidora do Instituto Na-cional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em parâmetros equivalentes àqueles percebidos pelos servidores do Tribunal de Contas da União (TCU). Em suas alegações recursais, o Incra sustentou a ilegalidade da equiparação dos valores recebidos a título de auxílio-alimentação, argumento este aceito pelo Colegiado. “Nos termos da Súmula Vinculante nº 37, não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, au-mentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia, princípio que se aplica a toda e qualquer outra vantagem percebida pelo servidor”, disse o Re-lator, Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, em seu voto. O magistrado também destacou que a Lei nº 8.460/1992, que dispõe sobre os critérios de concessão do auxílio-alimentação, determinou que a competência para fixar e majorar parcelas é adstrita ao Poder Executivo, “sendo impróprio ao Poder Judiciário modificar parâme-tros fixados pela Administração”. Ainda segundo o relator, o Decreto nº 3.887/2001 estabelece que, em se tratando se servidor do Poder Executivo, a competência para fixar o valor mensal do auxílio-alimentação é do Ministério do Planejamento, Orça-mento e Gestão (MPOG), observadas as diferenças de custo por unidade da federação, sendo tais despesas custeadas pelos recursos do órgão ou da entidade a que o servidor pertença. Nesses termos, a Turma deu provimento à apelação da autarquia. Nº do Pro-cesso: 0055840-56.2012.4.01.3800. (Conteúdo extraído do site do Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

Aluno indenizado em R$ 15 mil após constrangimento

Um aluno que foi submetido a uma revista íntima após o cartão de passagem de uma professora de artes supostamente sumir da sala de aula será indenizado em R$ 15 mil como reparação por danos morais. Na sentença proferida pelo Juiz da Fazenda

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Pública Estadual da Serra, Carlos Alexandre Gutmann, ainda fica determinado que o valor da condenação será corrigido monetariamente e acrescido de juros. De acordo com o Processo de nº 0022348-15.2013.8.08.0048, em outubro de 2010, enquanto dava aula em uma escola estadual da região, uma professora da disciplina de artes percebeu que seu cartão de passagem havia sumido. A professora teria perguntado a todos os alunos se alguém tinha visto o cartão, recebendo resposta negativa da sala toda. Não tendo conseguido a informação por parte dos alunos, a docente resolveu chamar o coordenador da instituição, sendo que o mesmo revistou todos os pertences de B. J. P. e dos demais alunos. Não tendo encontrado o cartão em meio ao material dos alunos, o coordenador juntou-se a outra coordenadora e resolveram fazer uma revista íntima nos estudantes, encaminhando-os, de três em três, para o banheiro para que os mesmos tirassem a roupa. O juiz entendeu que de fato o autor foi submetido a constrangimento reprovável, sem nada que justifique a atitude dos coordenadores da escola. O magistrado ainda ressaltou alguns pontos graves da atitude do coordenador, dizendo que, não satisfeitos com a situação vexatória vivida pelo estudante em sala de aula, os coordenadores encaminharam o autor ao banheiro determinando que ele retirasse toda a sua roupa, causando desconforto e constrangimento perante terceiras pessoas, finalizou o juiz. (Conteúdo extraído do site do Tribunal de Justiça do Estado de Espírito Santo)

Fechamento da Edição: 26�08�2015

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Resenha Legislativa

leIS

LeI nº 13.154, De 30.07.2015 Altera a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro, a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e a Lei nº 13.001, de 20 de junho de 2014; e dá outras providências.

LeI nº 13.153, De 30.07.2015 Institui a Política Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca e seus instrumentos; prevê a criação da Comissão Nacional de Combate à Desertificação; e dá outras providências.

LeI nº 13.150, De 27.07.2015Cria cargos efetivos e funções comissionadas nos quadros de pessoal dos Tribu-nais Regionais Eleitorais, destinados às Zonas Eleitorais, e transforma funções de Chefe de Cartório.

medIdA provISÓrIA

meDIDa PRovIsÓRIa nº 688, De 18.08.2015Dispõe sobre a repactuação do risco hidrológico de geração de energia elétrica, institui a bonificação pela outorga e altera a Lei nº 10.848, de 15 de março de 2004, que dispõe sobre a comercialização de energia elétrica, a Lei nº 12.783, 11 de janeiro de 2013, que dispõe sobre as concessões de energia elétrica, e a Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, que institui o Conselho Nacional de Política Energética.

deCretoS

DeCReto nº 8.509, De 25.08.2015 Discrimina ações do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC a serem executadas por meio de transferência obrigatória.

DeCReto nº 8.504, De 18.08.2015 Revoga o Decreto nº 8, de 17 de janeiro de 1980, que aprova a Diretriz para o Estabelecimento de Estrutura Militar.

DeCReto nº 8.498, De 10.08.2015 Altera o Decreto nº 7.790, de 15 de agosto de 2012, que dispõe sobre financia-mento do Fundo de Financiamento Estudantil – FIES.

Fechamento da Edição: 26�08�2015

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Bibliografia Complementar

Recomendamos como sugestão de leitura complementar aos assuntos abordados nesta edição os seguintes conteúdos:

ArtIgoS doutrINÁrIoS

• Direitos Fundamentais e Responsabilidade da Administração Públi-ca na Terceirização de Serviços. Inconstitucionalidade do § 1º do Artigo 71 da Lei nº 8.666/1993

Ilse Marcelina Bernardi Lora Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

• Responsabilidade da Administração Pública na Terceirização de Serviços

Elói Martins Senhoras Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

• O Acesso à Informação Prevista em Lei É Geral e Irrestrito? Não Ives Gandra da Silva Martins Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

• Transparência na Administração Pública Elói Martins Senhoras e Ariane Raquel Almeida de Souza Cruz Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

• O Nepotismo Cruzado e a Súmula Vinculante nº 13, do Egrégio Supremo Tribunal Federal. A Improbidade Administrativa. Jurispru-dência sobre o Tema

Gina Copola Juris SÍNTESE ONLINE e SÍNTESENET, disponíveis em: online.sintese.com

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Índice Alfabético e Remissivo

índice por Assunto especial

DOUTRINA

Assunto

Terceirização na adminisTração Pública

• A Aparente Derrota da Súmula nº 331/TST e a Responsabilidade do Poder Público na Terceiri-zação (Ivani Contini Bramante) ............................19

• A Súmula nº 331 do TST e a Responsabilidade da Administração Pública (Thayse Stieven Fleck) ............................................................................59

• Terceirização na Administração Pública: Bre-ves Reflexões Críticas (Luciano Elias Reis) ...........48

• Terceirização, Uma Nova Classe de Trabalhado-res? Aspectos Constitucionais da Súmula nº 331do TST (Maria Garcia) ............................................9

Autor

ivani conTini bramanTe

• A Aparente Derrota da Súmula nº 331/TST e a Responsabilidade do Poder Público na Terceiri-zação ...................................................................19

luciano elias reis

• Terceirização na Administração Pública: Bre-ves Reflexões Críticas .........................................48

maria Garcia

• Terceirização, Uma Nova Classe de Trabalhado-res? Aspectos Constitucionais da Súmula nº 331do TST ...................................................................9

Thayse sTieven Fleck

• A Súmula nº 331 do TST e a Responsabilidadeda Administração Pública ....................................59

ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Assunto

Terceirização na adminisTração Pública

• Constitucional e administrativo – Apelação – Ação civil pública – Hospital Público Univer-sitário – Execução, por terceirizados, de ativi-dades inerentes às atribuições típicas de cargos públicos, apenas desempenháveis por servido-res públicos – Inconstitucionalidade – Art. 37, II e V, da CF/1988 – Procedência do pedido –Provimento do recurso (TRF 5ª R.) .............7343, 78

EMENTÁRIO

Assunto

Terceirização na adminisTração Pública

• Ação civil pública – contratação de pessoal – atividade essencial – terceirização – impossibi-lidade ........................................................7344, 91

• Autarquia – serviços terceirizados – contratação – atividades-fim – ilicitude .........................7345, 91

• Autarquia – terceirização – tomador de servi-ços – responsabilidade subsidiária .............7346, 91

• Concurso público – ausência – terceirização ilí-cita ............................................................7347, 92

• Convênio – repasse de incentivo ao esporte – terceirização – não ocorrência ...................7348, 92

• Improbidade administrativa – convocação de candidatos aprovados em concurso público – pendência – terceirização de serviços – princí-pios – ofensa ..............................................7349, 95

• Improbidade administrativa – dispensa indevi-da de licitação – mão de obra – terceirização ilegal .........................................................7350, 95

• Serviço público – terceirização – Administração Pública – falha na fiscalização – responsabili-dade subsidiária – cabimento ....................7351, 98

• Serviço público – terceirização – responsabili-dade subsidiária – Administração Pública – to-madora de serviços – conduta culposa ......7352, 98

índice geral

DOUTRINAS

Assunto

lei de acesso à inFormação

• Lei de Acesso à Informação: Transparência Go-vernamental a Serviço do Cidadão (Luiz EugenioScarpino Jr. e Sebastião Sérgio da Silveira) ........124

nePoTismo

• O Nepotismo na Administração Pública Muni-cipal e a Súmula Vinculante nº 13 do STF (José Carlos Pacheco de Almeida) ..............................100

Autor

José carlos Pacheco de almeida

• O Nepotismo na Administração Pública Muni-cipal e a Súmula Vinculante nº 13 do STF .........100

luiz euGenio scarPino Jr. e sebasTião sérGio da silveira

• Lei de Acesso à Informação: Transparência Go-vernamental a Serviço do Cidadão ....................124

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sebasTião sérGio da silveira e luiz euGenio scarPino Jr.

• Lei de Acesso à Informação: Transparência Go-vernamental a Serviço do Cidadão ....................124

ACÓRDÃO NA ÍNTEGRA

Assunto

aTo adminisTraTivo

• Administrativo – Mandado de segurança – Can-celamento de carta de arrematação já regis- trada em cartório – Emolumentos – Devolução– Impossibilidade (TRF 3ª R.) ...................7356, 176

conTraTo adminisTraTivo

• Administrativo – Ação ordinária – Contrato de franquia – Empresa Brasileira de Correios e Te-légrafos (ECT) – Lei nº 11.688/2008 – Decreto nº 6.639/2008 – Extinção imediata dos contratos no prazo estipulado por decreto regulamen-tador – Impossibilidade (TRF 3ª R.) ..........7357, 182

imProbidade adminisTraTiva

• Administrativo – Processual civil – Apelações – Ação civil pública – Improbidade administrati-va – Lei nº 8.429/1992 (LIA) – Improcedência na origem – Descarte de prova emprestada da esfera criminal – Inadmissibilidade – Jurispru-dência pacífica do STJ e do TRF 3 pela aceita-ção dessa modalidade de prova – Julgamento antecipado da lide – Ausência de apreciação a respeito de prova requerida – Improcedên-cia fundada em insuficiência de provas – Des-cabimento – Cerceamento do direito de ação – Anulação da sentença – Manutenção cau-telar da indisponibilidade de bens – Recur-sos providos (TRF 3ª R.) ...........................7355, 161

liciTação

• Licitação – Revogação – Empresa vencedo-ra – Pretensão de anulação do ato – Indeferi-mento – Prejudicialidade, em razão do tempo decorrido – Pretensão secundária de indeniza-ção – Reembolso das despesas com a licitação – Deferimento na sentença – Ressarcimento de outros prejuízos com antecipação de pro-vidências em face da expectativa de contrata-ção – Acréscimo – Parcial provimento à apela-ção da autora (TRF 1ª R.) .........................7353, 140

servidor Público

• Administrativo – Servidor público – Conta-gem de tempo de serviço – Tempo de serviço prestado para a administração pública indire-ta – Empresa pública – Art. 103, inciso V, da Lei nº 8.112/1990 – Art. 173, § 1º, inciso II, daConstituição Federal (TRF 4ª R.) ...............7358, 188

• Direito administrativo – Remessa necessária – Servidora pública federal – Pensão por morte

– União estável homoafetiva – ADI 4.277/DF, STF – Prova da união estável até a data do óbito (TRF 2ª R.) ...............................................7354, 148

EMENTÁRIO

Assunto

anisTia

• Anistia – perseguição política – pretensão in-denizatória – dilação probatória – necessidade ................................................................7359, 194

bem Público

• Bem público – mera detenção – benfeitorias – indenização indevida ..............................7360, 194

concurso Público

• Concurso público – agente de polícia – vida pregressa e investigação social – sindicância – prática de ato infracional análogo ao crime dehomicídio doloso – não recomendação ...7361, 194

• Concurso público – candidato excedente – contratação temporária – constitucionalidade ................................................................7362, 195

• Concurso público – cargo público – acumula-ção – residência médica – possibilidade ..7363, 195

• Concurso público – policial militar – exame médico – anomalia – não obsta exercício da ati-vidade – admissão – possibilidade ...........7364, 196

convênio

• Convênio – recursos federais – transferência voluntária – suspensão – prestação de contas – irregularidades – devido processo legal – exi-gência ......................................................7365, 196

desaProPriação

• Desapropriação indireta – implantação de rodo-via estadual – proprietários após o desapossa-mento – ilegitimidade ativa ......................7366, 197

direiTo eleiToral

• Direito eleitoral – suspensão de direitos pú-blicos – certidão de quitação eleitoral – expe-dição de passaporte – possibilidade .........7367, 198

ensino

• Ensino – Enem – aluno habilitado – inscrição – pagamento – erro do sistema bancário – parti-cipação – possibilidade ...........................7368, 200

• Ensino – programa “Ciência sem Fronteiras” – comunicação visual design – direito à pré--seleção – existência ................................7369, 201

• Ensino – Prouni – estudante bolsista – transfe-rência externa – possibilidade ..................7370, 202

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RSDA Nº 117 – Setembro/2015 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ��������������������������������������������������������������������������������������������������247 • Ensino – registro de diploma – processo de reco-

nhecimento de curso – tramitação – dano mo-ral – inexistência ......................................7371, 203

• Ensino – Sistema de Seleção Unificada (Sisu) – cadastramento – convocação – Internet – publi-cação – princípio da publicidade – violação – ausência ..................................................7372, 205

imProbidade adminisTraTiva

• Improbidade administrativa – indisponibili-dade de bens – contas bancárias – bloqueio – inviabilidade ............................................7373, 205

• Improbidade administrativa – indisponibilida-de de bens – substituição por precatório – im-possibilidade ...........................................7374, 206

• Improbidade administrativa – pedido de natu-reza condenatória – prescrição – ressarcimentoao Erário – imprescritibilidade .................7375, 206

• Improbidade administrativa – Procurador Re-gional da República – perda do cargo – prerro-gativa de função – inexistência ................7376, 208

liciTação

• Licitação – empresa vencedora – vícios me-ramente formais – inabilitação – ato abusivo ................................................................7377, 208

• Licitação – pré-qualificação – consórcio – ha-bilitação ..................................................7378, 209

miliTar

• Militar – ex-combatente – pensão por morte – união estável – convivência pública – pro-vas – ausência .........................................7379, 209

Poder de Polícia

• Poder de polícia – ANTT – veículos locados pelo Ministério Público – pedágio – isenção ................................................................7380, 209

• Poder de polícia – interdição de estabelecimen-to – abuso de poder – ausência ................7381, 211

PreGão eleTrônico

• Pregão eletrônico – serviços diários de trans-porte – capacidade técnico-operacional – com-provação .................................................7382, 211

Processo adminisTraTivo

• Processo administrativo – Conselho da polícia do Paraná – sanção disciplinar – membro do Ministério Público – nulidade ..................7383, 212

• Processo administrativo – demissão – prova em-prestada do processo criminal – possibilidade ................................................................7384, 213

resPonsabilidade civil do esTado

• Responsabilidade civil do Estado – atropela-mento de ciclista por ônibus – teoria do risco

administrativo – aplicação – dano moral – cabi-mento ......................................................7385, 214

• Responsabilidade civil do Estado – proventos de aposentados e pensionistas – descontos in-devidos – INSS – condenação solidária....7386, 215

servidão adminisTraTiva

• Servidão administrativa – passagem de eletro-duto – constituição por escritura pública – ree-xame – impossibilidade ...........................7387, 216

servidor Público

• Servidor público – bolsa de estudos – residên-cia – período não trabalho – ressarcimento ................................................................7388, 216

• Servidor público – contrato temporário – art. 19-A da Lei nº 8.036/1990 – FGTS – inapli-cabilidade ................................................7389, 216

• Servidor público – demissão – ampla defesa e contraditório – inobservância .................7390, 217

• Servidor público – depressão grave – enfermi-dade – art. 186, I, § 1º, da Lei nº 8.112/1990 – aposentadoria – proventos proporcionais – con-cessão ......................................................7391, 217

• Servidor público – juiz do trabalho – remo-ção a pedido – ajuda de custo – interesse público – existência .................................7392, 217

• Servidor público – membros do Ministério Pú-blico – auxílio-moradia – ato regulamentar ad-ministrativo – restrições – direito líquido e certo– violação ................................................7393, 218

• Servidor público – pensão – pagamento de atrasados – disponibilidade orçamentária – da-nos morais – indenização devida .............7394, 218

• Servidor público – pensão por morte – viúva e filho inválido – rateio – possibilidade ......7395, 219

• Servidor público – policial civil – promoção – pedido de aposentadoria – exigência constitu-cional – inaplicabilidade .........................7396, 220

• Servidor público – processo administrativo disciplinar – falta de defesa técnica – ofensa à Constituição – inexistência ......................7397, 220

• Servidor público – professor estadual – licença remunerada – aprimoramento profissional – in-deferimento – irrazoabilidade ..................7398, 221

Seção especial

ACONTECE

Assunto

servidor Público

• As Mudanças na Previdência Social Afetam os Servidores dos Estados e Municípios? (BrunoSá Freire Martins) ...............................................224

Page 248: ISSN 2179-1651 Revista SÍNTESE - bdr.sintese.com 117_miolo.pdf · Alexandre de Moraes, Carlos Ari Sundfeld, ... Pós-Graduado em Direito Público e ... Um resumo da questão, no

248 ���������������������������������������������������������������������������������������������������RSDA Nº 117 – Setembro/2015 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

Autor

bruno sá Freire marTins

• As Mudanças na Previdência Social Afetam osServidores dos Estados e Municípios? ................224

CLIPPING JURÍDICO

• 1ª Turma: regras de concurso público já inicia-do não podem ser alteradas ...............................233

• 2ª Câmara Especial concede o direito a policial de não ser transferido ........................................238

• 5ª Câmara Cível condena Ex-Prefeito e Ex-Secre-tários de Uruburetama .......................................237

• Ação questiona lei da Paraíba que permite usode depósitos judiciais pelo governo ...................233

• Aluno indenizado em R$ 15 mil após constran-gimento .............................................................241

• Aprovação para cadastro reserva em concursopúblico não gera direito à nomeação.................240

• Determinado pagamento integral de salário de professora aposentada .......................................236

• Detran deve liberar emplacamento de veículo indevidamente apreendido ................................234

• Estado é condenado a indenizar homem por tor-tura ....................................................................230

• Juiz determina bloqueio de verba para tratamen-to de criança com diabetes ................................239

• Médicos da Região Sul não precisam mais fa-zer curso de primeiros socorros para renovarCNH ..................................................................240

• Poder Judiciário não possui competência paraalterar valor de auxílio-alimentação ...................241

• Prefeito de Maricá é multado por improbidadeadministrativa ....................................................239

• Reconhecida a competência de guardas muni-cipais para aplicar multas de trânsito .................236

• Servidor público não precisa devolver valores recebidos de forma indevida ou pagos a maior ..235

• Tribunal anula punição disciplinar aplicada a mi-litar por afronta ao princípio da ampla defesa ...... 231

• Tribunal autoriza universidade a limitar saláriosde professores ....................................................238

• Tribunal confirma obrigação de Estado custear tratamento a paciente com neoplasia maligna ...231

• União terá de se manifestar sobre ação que ques-tiona compra de helicópteros pelo GDF comverba federal ......................................................232

• Vítima de erro médico deve receber R$ 20 mil de indenização ..................................................230

RESENHA LEGISLATIVA

leis

• Lei nº 13.154, de 30.07.2015 ............................243

• Lei nº 13.153, de 30.07.2015 ............................243

• Lei nº 13.150, de 27.07.2015 ............................243

medida Provisória

• Medida Provisória nº 688, de 18.08.2015 .........243

decreTos

• Decreto nº 8.509, de 25.08.2015 ......................243

• Decreto nº 8.504, de 18.08.2015 ......................243

• Decreto nº 8.498, de 10.08.2015 ......................243