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O ESPAÇO JAPONÊS A Casa tradicional Japonesa, uma filosofia de vida, um modo de estar Sandra Antunes Apresentado no âmbito do C.E.S.E. Design Industrial, ESAD, 1998 O ESPAÇO JAPONÊS

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O ESPAÇO JAPONÊS

A Casa tradicional Japonesa, uma filosofia de vida, um modo de estar

Sandra Antunes

Apresentado no âmbito do C.E.S.E. Design Industrial, ESAD, 1998

O ESPAÇO JAPONÊS

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A Casa tradicional Japonesa, uma filosofias de vida, um modo de estar

Resumo

A necessidade de espaço, faz o uso. O povo Japonês desde cedo se deparou com

“pouco espaço” devido ao terreno nem sempre habitável e assolado frequentemente por

catástrofes naturais principalmente terramotos e erupções vulcânicas. Estes factores,

juntamente com o clima submetido ao regime das monções, e às crenças religiosas

culminaram em aspectos determinantes no uso dos materiais e na percepção e

organização do espaço. O que aqui se vai empreender, é um percurso de descoberta das

causas e fenómenos que determinaram as características da casa tradicional Japonesa.

Era uma vez,... um conjunto de 1049 pequenas ilhas no Oceano Pacífico. Se a intenção

fosse contar uma “estória”, mais, ou menos, romantizada, o início mais provável numa

narrativa dessas no Ocidente, poderia ser este. São introduções como esta que povoam o

nosso imaginário infantil aquele que mais mistérios tem. O que aqui se pretende porém, é

a procura do conhecimento. O conhecimento do Outro que fascina o Ocidente há tanto

tempo, conotado com todo o mistério e exotismo que se atribui a tudo o que não se

conhece bem. Espera-se, no entanto, que depois de desvendado um pouco esse mistério, o

fascínio perdure.

Este pequeno país - ilha, símbolo de força de vontade e diligência, foi o único a ser

bombardeado duas vezes por bombas atómicas durante a 2ª Guerra Mundial e que depois

de dolorosa derrota, brota das cinzas, ainda mais forte do que antes, qual Fénix renascida.

É de facto extraordinário como se encontra hoje num lugar cimeiro do mundo capitalista

“dito civilizado”. Um país com poucos recursos minerais, cuja grande maioria da sua

matéria-prima e combustíveis são importados. O seu terreno, constantemente sujeito a

erupções e terramotos, devido à sua configuração de rochas vulcânicas, um terreno

extremamente montanhoso no interior e nem sempre habitável, onde apesar da

abundância de água e de um cultivo agrícola intenso, (onde o terreno o permite), não é

suficiente para alimentar a sua população de aproximadamente 123 milhões de pessoas.

Nestas condições, foram constrangidos a virarem-se para a procura de energias

alternativas e o desenvolvimento de novas tecnologias. Depois do fim da 2ª Guerra Mundial

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a recuperação deveu-se sem dúvida à determinação do governo, agora estável e

democraticamente eleito, em produzir e promover produtos japoneses para o mercado

Ocidental. As grandes industrias Japonesas dos nossos dias são os automóveis, o aço e

bens electrónicos, industrias que o governo protegeu ou subsidiou uma vez ou outra.

No Japão há, e sempre houve, um problema de falta de espaço. De facto, comparado

com outras grandes potências económicas como os E.U.A. ou a Alemanha, a sua área

demográfica é extremamente reduzida, acumulando-se a isto, o interior nem sempre

habitável. Por isso se tornaram “experts” na problemática do espaço através do recurso a

artifícios que levam o Ocidental, a que sempre que pense no Japão Antigo ( hoje as cidades

são muito parecidas com as Ocidentais ), seja remetido para os conceitos de Simplicidade,

Vazio, Minimal e Equilíbrio. Estas noções são também relacionáveis com a coexistência de

duas religiões, a nativa, o Xintoísmo, e o Budismo, que entrou no Japão via China e Coreia

no séc. VI D.C. As duas religiões foram facilmente associadas e hoje em dia, quase todos o

Japoneses são simultaneamente Xintoístas e Budistas. O xintoísmo, constitui-se de um

conjunto de crenças animistas que atribuem aos objectos naturais um espírito próprio,

onde se crê que as almas dos falecidos permanecem entre os vivos, tomando morada nas

cascatas, árvores e pedras. Daí o seu apurado sentido de natureza e para as

manifestações das formas naturais. Assim resulta que a grande maioria dos padrões

usados no Japão tradicional, para tecidos ou outras decorações, eram na sua grande

maioria o desfecho de estilizações elaboradas de interpretações do mundo natural. No

Budismo, acredita-se que a vida não é mais que um sonho, que é parte de um contínuo

ciclo de renascimento e reencarnação. Para se atingir o Nirvana, é necessário viver o mais

próximo possível dos preceitos Budistas assim como, o cumprimento com as

responsabilidades de cada um, o tomar conta dos mais fracos, e colocar o Bem da

Comunidade acima das necessidades e dos desejos individuais. Estes preceitos, tornaram-

se parte integrante do modo de vida japonês, numa filosofia não confrontacional que se

rege pela eliminação dos desejos terrestres, pela abnegação da ambição, luxúria e

ganância através de uma vida simples direccionada para o trabalho honesto, para a

lealdade ao grupo e para a iluminação através da meditação e contemplação. O Zen

Budista, advoga uma vivência por uma economia de meios, falta de ostentação, um código

restrito de frugalidade e rígida aderência a correctos códigos de comportamento. Como

exemplo, no Japão pré - industrial, o código Budista Zen, combinado com as leis do

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Xogunato Tokugawa (governo iniciado no princípio do séc. XVII tendo durado dois séculos e

meio) limitaram através de leis, o desejo de ostentação, fosse na casa ou nos objectos de

uso diário. Em vez de cores vivas e decorações excessivas, na casa, eram criados pontos

focais de contemplação, especialmente para as ocasiões especiais como as festividades.

No Japão, acredita-se numa simbiose entre o Homem e a Natureza, mas a natureza é

aqui entendida como algo que o homem deve trabalhar, e domar. Toda a História dos

jardins japoneses confirmam este facto. O jardim japonês é uma espécie de re-design da

natureza, as formas naturais são escolhidas e depois trabalhadas de forma a transmitirem

um ideal filosófico, num controle do natural em que se pretende confundir o sentido de

escala e perspectiva, num artifício com a finalidade de dar a impressão de “mais espaço”.

A título descritivo, passe-se a citar um exemplo, em que um ocidental no Japão testemunha

o bom funcionamento dos esquemas usados nos jardins japoneses ” ... my neigbhour

proudly presented his newly created western - style garden. He had cleared his japanese -

style garden, levelled the ground and planted a lawn. His desire was more space but

actually he achieved less space. For an appreciable real lawn the area was too small. He

was not aware of the fact that the tradicional gardener who had designed his old - style

garden had arranged all the complex paraphernalia into the existing small area of his

garden in order to increase the actual sensation of space. The size of experiential space is

not so much determined by its physical dimensions, but by our concrete experience of the

quantity and quality of the events contained in it .”(1)

O “natural” no Japão, deve ser entendido, segundo Taichi Sakaiya, no estilo do

“naturalismo tal como é aplicado às obras de Maupassant e Zola “, sendo que estes

autores “ não escreveram sobre o mundo da natureza , mas sim sobre aquilo que se

passava entre os muitos humanos burgueses de Paris ...” é este tipo de “natureza” que os

japoneses mais prezam, porque desde as “.. suas raízes comunais da cultura do arroz, o

povo passou a desprezar e a temer tudo o que perturbasse o fluxo da actividade humana“.

”O que os Japoneses amam realmente é um fac-simile da natureza, domesticada pelas

mãos humanas e apresentada num jardim”(2). Assim, também a noção de selvagem, que

nós ocidentais associamos a natural tem para os Japoneses um significado pejorativo, para

estes uma pessoa que aja naturalmente, que não seja regida pelas boas maneiras e boa

educação, é uma pessoa selvagem. A natureza no Japão não é pensada do mesmo modo

do que se vulgarizou chamar no Ocidente, de “ Bom Selvagem”.

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A Simplicidade no Japão é significado de sofisticação, o shubui, que significa,

austeridade no gosto, seja na forma de vestir ou de se comportar, tem o seu exemplo

máximo nos interiores tradicionais japoneses. Na criação de uma estrutura aparentemente

simples, que é no entanto o resultado de séculos de evolução. No “esqueleto” do edifício,

constituída por lintéis e pilares, estes são deixados sem adornos, mas a sua madeira é

cuidadosamente escolhida pela sua cor e o seu grão, de modo a combinarem da melhor

maneira entre si, sendo depois aplainadas e envernizadas. Certas vigas são deixadas

praticamente no seu estado natural como troncos de árvores fazendo assim a ligação com

o jardim, e contrastando com o aspecto rectilinear do todo. A simplicidade na cultura

japonesa, está também associada à utilização dos materiais no seu estado natural, daí o

uso da madeira simples na arquitectura japonesa, assim como também do aproveitamento

das qualidades naturais dos materiais no artesanato. Nas palavras de Taichi Sakiya, “ A

cultura da simplicidade, que faz construções de madeira simples, que reproduz os

movimentos de todos os dias na dança, que compõe poesia sem rima e que encontra

beleza nos templos e estátuas envelhecidos pelo tempo, é uma cultura que procura a

beleza nos próprios materiais. Quando se evitam as alterações nas cores e nas superfícies

a selecção dos materiais torna-se muito importante. Assim dá-se valor ao cedro sem nós e

à seda pura e branca.” (3). Segundo o mesmo autor: ”A minha opinião é que essa

simplicidade é uma característica da totalidade da sociedade japonesa, e não apenas de

alguns sectores como a arquitectura e o artesanato “(4).

A casa tradicional Japonesa é um testemunho vivo da cultura da simplicidade, das

premissas Budistas, tanto como do relacionamento particular dos japoneses com a

natureza, com origem no Xintoísmo. Na crença Budista, a casa era um local temporário de

passagem (crença na reencarnação), o que coincide com a construção flexível, as

estruturas leves mas preparadas para proteger os seus habitantes do calor e do frio

extremo. A flexibilidade da estrutura, foi também pensada de modo a aguentar as

frequentes investidas dos terramotos. Por isso, os vários pilares de madeira se sobrepõem

uns aos outros, unidos na junta por uma cavilha em forma de cunha. A casa é

essencialmente constituída pelo seu “esqueleto” de pilares verticais e lintéis em madeira,

que se elevam de uma plataforma horizontal. Também em madeira é o telhado largo que

providencia sombra no Verão e insolação no Inverno.

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Nos escritos do Português Wenceslau de Moraes (1855 - 1929), Cônsul de Portugal no

Japão, transparece todo um amor por este povo. Aí, casa Japonesa é descrita como se

segue: ”- Feita abstracção do que é movível, transportável, do que se tira, do que se põe,

do que se guarda, a casa japonesa fica pouco mais ou menos reduzida ao simples telhado,

erguido sobre quatro vigas de madeira, telhado amplo, alambazado, em grandes caneluras

formadas pelas telhas negras. O resto não passa de acessórios, de corrediças, de grades,

de delicados xadrezes de pinho cobertos de papel, e tudo isto girando docemente em

ranhuras, desaparecendo a um leve gesto de mão, ora abrindo o recinto aos quatro ventos,

ora fechando-o hermeticamente, dando-lhe a forma de um caixote .” (5). Estes acessórios a

que W. de Moraes se refere, são da maior importância na casa japonesa. São estes que

tornam os limites entre exterior e interior difusos, porque esta casa pode ser “aberta” para

o exterior.

A relação entre espaço interior/exterior é da maior importância, e na casa há de facto

certas barreiras que desenham a linha de separação. Podem-se contar quatro destas

barreiras. As primeiras, são as shoji, portas deslizáveis translúcidas constituídos por uma

grade modular em madeira sobre a qual se esticou e colou papel de arroz (que permite a

difusão suave da luz natural). Correm segundo entalhes no chão e por lintéis no tecto.

Estão localizadas na berma interior da varanda. As segundas, são uma inovação de

princípios do séc. XX. São portas deslizáveis em vidro na berma exterior da varanda a uma

distância de aproximadamente um metro em profundidade. Os Amado são portas

deslizáveis em madeira, com fendas para ventilação, têm como função a protecção da

chuva e colocam-se imediatamente à frente das portas de vidro. O Sudare é a persiana de

cana ou bamboo que intercepta a entrada do sol, são suspensas da beira da goteira. Estas

quatro barreiras, não só são ajustáveis por deslize, como podem ser retiradas

integralmente, o que acontece quando o clima se encontra húmido e quente.

Nos jardins usam com frequência o artifício de colocarem plantas de flores grandes

próximas da casa e plantas de folhas pequenas mais afastadas, de modo que da varanda,

o espectador tem uma sensação semelhante à do “ tromp l’oeil”, em que o espaço lhe

parece maior do que realmente é. Quando o espaço não permite a presença de um jardim,

as Bonsai e outras representações em miniatura funcionam como substituto.

O uso do módulo na arquitectura japonesa é de importância fulcral e é uma

característica que ainda hoje se mantém. Com o uso deste esquema, pretende-se poupar

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em trabalho e espaço, conseguindo ao mesmo tempo a racionalização do processo de

produção e providenciando um sistema de vários componentes compatíveis flexíveis e

intercambiáveis. O tapete Tatami, tapete grosso de palha de arroz que pode ir desde o

verde claro a um ligeiro dourado, com os limites bordados a linho ou a brocados de

diferentes cores, transformou-se no módulo tradicional de 1,8x0,9 metros (o espaço

ocupado por um adulto no seu sono) do design arquitectónico de interiores. A disposição

dos Tatami transformou-se num padrão

pré-organizado, em que o tamanho de cada sala podia ser descrito como tendo as

dimensões de três tapetes, quatro tapetes e meio, seis tapetes ou dez tapetes etc. Ainda

hoje este sistema é usado pelas agências imobiliárias na informação descritiva das

propriedades que vendem.

Também no mobiliário usam o módulo, a Yunitto - Kagu (unidade mobiliário) que

consiste em elementos pré-fabricados que podem ser combinados de várias maneiras de

modo a adequarem-se às necessidades dos habitantes da casa, maximizando assim e

também, o uso do espaço interior. Estes pequenos móveis fixos que existem na casa

tradicional, são usados para guardar objectos que não estão a uso, o que lhes proporciona

um aumento do espaço vivêncial.

Os espaços interiores de características minimalistas, de coloração neutra em que as

paredes fixas são estucadas e uniformemente pintadas com cores de tons terra, não são

apenas resultado de uma estética inspirada nos princípios do Budismo, como já vimos,

mas é também resultado da necessidade de maximizar o espaço, o que conseguem,

usando com os outros artifícios que já mencionamos, o da transicionalidade na função dos

espaços. Assim, através de paredes ajustáveis e removíveis, as Fusuma (paredes interiores

constituídas por uma grelha de madeira e cobertas com papel ou tecido) e as Shoji

(paredes que dão para o exterior) consegue--se o alargamento e diluição das funções

atribuíveis a cada espaço e também a abertura da casa para o exterior. Deste modo, a

delimitação do espaço na casa tradicional é fluída, sendo evitada a definição de funções

para cada espaço. O interior desta, segundo Wenceslau de Moraes tem “ o sobrado coberto

de tatamy, as fofas esteiras, e as mesmas corrediças de papel, dividindo o recinto em

vastos salões ou em pequeninas celas, segundo o capricho do momento.“ (6). De facto,

nesta casa, os únicos espaços com funções pré-definidas e estáticas, são a casa de banho

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e a cozinha. Todos os outros espaços estão prontos a ser usados como salas de recepção,

local de trabalho ou quartos, dependendo das necessidades.

Com o sobrado coberto de tatami como descreve W. de Moraes aparece a necessidade

de entrarem em casa descalços, para que as esteiras que cobrem o chão não se

estraguem, o que nós Ocidentais víamos quase como um simples ritual tem também,

afinal, razões de raiz prática.

Como de facto já vimos, o Japonês prefere uma certa depuração de formas, são um

povo prático com muita atenção ao pormenor. A palavra japonesa Kirei que significa Belo,

ultrapassa o seu correspondente Ocidental, podendo também significar, limpo, apropriado,

bem formado e atenuado. Assim se por um lado existem razões práticas para as coisas

serem como são, há também uma perfeita adequação a premissas religiosas e ao seu

modo de estar na vida. Na descrição de W. de Moraes, no interior da casa japonesa, “ O

japonês não conhece o uso da mobília, cadeiras, mesas, leitos, cómodas não existem; a

um canto, uma jarra com alguma haste florida; pelo chão livros, pequeninos estojos,

pequeninos cofres, bandejas de charão, taças bules, o braseiro para o cachimbo, o

braseiro onde fervilha a água para o chá, nalgum vão escondido à vista guardam-se as

colchas de seda, que em cada noite se estendem aqui e ali, e onde se improvisam leitos

“(7). Nota-se de facto uma certa frugalidade e simplicidade nos interiores japoneses devido

à necessidade de criar “mais espaço” vivêncial. Há por isso, que não o sobrecarregar de

objectos. Como exemplo, temos o Tokonoma parte no interior da casa com a função

específica de ser ponto focal de interesse visual, e centro de contemplação, que consiste

de uma alcova ligeiramente elevada ao nível do chão com uma prateleira onde são

expostos três objectos, o primeiro é geralmente um Kakemono, pergaminho pendurado

para todos verem, pintado à mão e de caligrafia cuidada, o segundo, é geralmente um

pequeno arranjo de flores ou folhagem sazonal, o Ikebana o terceiro, pode ser um suporte

de incenso ou uma peça cerâmica de alta qualidade. O que aqui parece ser simples,

resulta no entanto de uma grande consideração na escolha dos objectos, cuidado nas suas

formas, cores e texturas de modo a que se enquadrem o melhor possível no todo, e de que

as distracções supérfluas sejam eliminadas com o intuito de se conseguir a aparência de

não ostentação. Também as dimensões do Tokonoma estão conforme ao módulo do

Tatami. A maioria dos outros objectos que habitam o interior desta casa, são compactos,

de dimensões reduzidas, os móveis são embutidos, sendo necessário recorrer a métodos

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como a portabilidade, (tanto os Tatami como os shoji ou fusuma são facilmente

transportáveis), sistemas de empilhamento e formas dobráveis. O facto de até

recentemente, não haverem cadeiras nas casas tradicionais deve-se ao facto da falta de

espaço, mas não só, estas depois de introduzidas via China, eram usadas unicamente em

ocasiões formais porque segundo Koji Taki, “ to place chairs on tatami mats on a floor lifted

off the ground makes it seem unnecessary and redundant “(8). Actualmente, nalgumas

casas tradicionais usam-se pequenas cadeiras quase ao nível do chão (cuja principal

função, é a de encosto), à volta de uma mesa igualmente baixa, colocadas no centro da

sala. Mas também estes objectos são fáceis de arrumar, caso se necessite dessa sala para

outra função.

Com a falta de espaço, os interiores das casas japonesas, tornaram-se comunais. O

desejo de solidão é considerado pouco saudável no Japão. Quem procura a solidão no

Japão, é considerado Wagamama (egocêntrico), o que numa sociedade tão orientada para

o grupo como a Japonesa, é visto como uma atitude fortemente anti-----social.

Para o Japonês, as formas geométricas e a rectilinearidade, dois aspectos que são

essenciais na casa tradicional, simbolizam as qualidades masculinas de ordem e

harmonia. A forma circular é mais feminina, mais intuitiva, é também tomada como

símbolo para os ciclos da reencarnação, num processo constante de renovação e

renascimento. Tanto as primeiras como as segundas, conformam-se aos princípios de

origem chinesa do Yin e do Yang. O Yin representa o aspecto sólido, estrutural, masculino,

de formas angulares, assim como o que é trabalhado pelo Homem. O Yang, o

correspondente feminino, representa o mistério, a escuridão, o vazio e o mundo natural. A

estética ideal seria providenciada por um equilíbrio destes dois elementos.

A atenção ao pormenor é muito importante para o Japonês, segundo Taichi Sakaiya, isto

deve-se em parte a que, “ Quando o povo trabalha constantemente numa sociedade pobre

em recursos, grandes quantidades de trabalho ir-se-ão inevitavelmente derramar sobre os

recursos limitados e a terra escassa. Para resolver este problema, o Japão desenvolveu

uma estética que se preocupa muito com os pormenores. ”...” Ainda hoje, o acabamento

do interior de um fato, o grão de madeira de um prato ou o avesso de uma solda

constituem aspectos importantes no mercado Japonês. Muitos produtos estrangeiros,

deficientes nestes pormenores, não conseguem vender no Japão.”(9). Há até quem seja da

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opinião que grande parte do sucesso dos produtos japoneses nos mercados ocidentais se

deve a esta atenção ao pormenor.

Actualmente, as cidades cosmopolitas, sobrepovoadas e confusas já não deixam grande

espaço à casa tradicional japonesa. De facto, o japonês contemporâneo é fortemente pró-

citadino. Hoje em dia, a maioria da população japonesa vive nas cidades, para onde

partem à procura de uma vida melhor. Citando mais uma vez Taichi Sakaiya, “Nos contos

infantis, um final feliz é, normalmente do género: «Depois eles foram para a cidade». Ir para

as montanhas ou para uma ilha longínqua é reservado para os finais trágicos. As cidades

são, para os japoneses, o local onde as riquezas e as pessoas bonitas se aglomeram.”(10).

Com o excesso populacional provocado por este êxodo em direcção às cidades, a única

solução é construir ao alto. E de facto, os japoneses foram pioneiros numa lei que requer

compensação para os residentes que são colocados na sombra pelos altos edifícios

adjacentes, é o que designam Nisshoken (direito ao sol). As casas japonesas praticamente

não têm aquecimento central e por isso, dependem da luz do sol no Inverno, para ajudar

ao aquecimento das casas. Se na realidade, hoje em dia, as cidades não dão lugar à casa

tradicional devido aos problemas da falta de espaço, o que leva, a que qualquer outro tipo

de construção perca em detrimento das construções em altura, também é verdade que em

qualquer canto do mundo se deseja o contacto com as próprias raízes, o mesmo

acontecendo com os japoneses pró-citadinos. A título de finalização, deixa-se aqui uma

frase da revista GEO, que nos parece representativa do que se acaba de dizer: “ Quand un

japonais a de l’árgent , il fait construire une maison à l’ancienne. Le Tatami, la natte en

paille de riz, est à la fois le symbole du riche qui échappe aux appartements de banlieue et

celui du pauvre qui est resté en marge du grand boom urbain.“(11)

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NOTAS (1) Nitschke, Gunter, From Shinto to Ando - Studies in Architectural Anthropology in

Japan, p. 35 (2) Sakaiya, Taichi, Japão - As duas faces do Gigante, p. 188 (3) op. cit. em (2) (4) op. cit. em (2) (5) Moraes, Wenceslau, Antologia, p. 206 (6) op. cit. em (5) (7) op. cit. em (5) (8) Taki , Koji “in” Product Design in Japan, p. 12 (9) op. cit. em (2), p.226 (10) op. cit. em (2), p.187 (11) Hamon, Hervé, artigo Japon Entretiens p.96

BIBLIOGRAFIA

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• Graves, William, Tokyo a Profile of Success “in” National Geographic, Nov. 1986, VOL.

170, nº 5, Washington D.C.

• Hamon, Hervé, artigo Japon Entretiens “in” Revista GEO, nº 195, Mai 1995

• Martins Janeira, Armando, Japão - Construção de um país Moderno, Editorial

Inquérito Limitada, Lisboa, 1985

• Meyhofer, Dirk, Contemporary Japanese Architects, edição trilingue

espanhol/italiano/português Taschen, Espanha, 1994

• Moraes, Wenceslau, Antologia, Selecção de textos e Introdução de Armando Martins

Janeira, Edições Veja, 1993

• Nitschke, Gunter, From Shinto to Ando - Studies in Architectural Anthropology in

Japan, Academy Editions Ernst & Sohn, 1993

• Sakaiya, Taichi, Japão - As duas faces do Gigante, Difusa Cultural, 1994

• T. Hall, Edward, A Dimensão Oculta, Relógio D’Água, 1986

• Taki, Koji “in” Product Design in Japan, Editora Rikuyo Sha Publishing, inc, Tokyo,

Japan, produced by Koichi Ando