Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO...

20
2020 Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil Parte Geral Organizadores Frederico Amado | Lucas Pavione Coleção Resumos para Concursos 3 5 ª revista atualizada ampliada

Transcript of Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO...

Page 1: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

2020

Júlio César Franceschet

Wagner Inácio Dias

Direito CivilParte Geral

Organizadores Frederico Amado | Lucas Pavione

Coleção

Resumos para

Concursos 3

5ª revista atualizada ampliada

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 3Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 3 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 2: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

ASPECTOS CÍVEIS DA LINDB

\ Leia a lei: ͳ Decreto-Lei 4.657/42 (LINDB), arts. 1º a 6º.

1. GENERALIDADESO Decreto-Lei 4.657/42, denominado até 2010 como Lei de Intro-

dução ao Código Civil, passou, com a reforma da Lei 12.376/10, a ser conhecido como “Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro”.

A mudança, recebida por alguns teóricos como importante, visto ajustar a denominação ao conteúdo, passa, nestes escritos, como um preciosismo de um sistema ainda preso à letra fria da lei.

Contudo, não sendo objetivo da presente obra discutir nomes, mas sim trabalhar conceitos e determinações, aqui serão estudados os ar-tigos primeiro ao sexto, por serem os que se adequam minimamente à temática civil.

Nos demais dispositivos, a LINDB cuida de questões relativas ao Di-reito Internacional Privado, fugindo, assim, aos limites dessa obra.

2. FONTES DO DIREITOFonte do direito, em termos gerais, revela a origem do direito obje-

tivo, ou seja, indica de onde provêm as normas jurídicas. A lei, a jurisprudência e a doutrina são alguns exemplos de fontes

do direito, uma vez que nelas o direito objetivo encontra a sua origem.São diversas as classificações das fontes do direito. Fala-se, assim,

em fontes históricas, materiais, formais e não formais, diretas e indiretas.

No presente estudo, merecem destaque as fontes formais e não formais.

São consideradas formais do direito: a lei, a analogia, o costume e os princípios gerais de direito. Por outro lado, são informais a dou-trina e a jurisprudência.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 15Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 15 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 3: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

16 vol. 3 – DIREITO CIVIL – Parte Geral • Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias

2.1. Lei (em sentido amplo)

No sistema da civil law, como o nosso, a lei é a fonte principal e re-vela, em sentido estrito, um comando geral, aplicado indistintamente a todas as pessoas, emanada de uma autoridade competente. No Brasil, é competente o Poder Legislativo, que tem como função precípua (típica) legislar.

É oportuno dizer que a lei pode ser direcionada a um grupo de pes-soas, unido por características comuns, notadamente questões funcio-nais. É o que ocorre, por exemplo, com o Estatuto do Funcionário Pú-blico ou a Lei Orgânica da Magistratura, que se aplicam, por evidente, a categorias específicas. Ainda que não seja aplicada a TODAS as pessoas, a lei, nos exemplos citados, não deixa de ser genérica e abstrata.

A lei em sentido amplo, geral, abstrata e emanada de uma autorida-de competente, pode ser dispositiva ou cogente.

Cogente é a norma de incidência obrigatória, que não pode ser afastada pela vontade dos interessados. A legítima, disciplinada no art. 1846 do CC, aplicada ao Direito das Sucessões, é exemplo de norma cogente. Com efeito, os ascendentes, os descendentes e o cônjuge (na análise literal da lei) são herdeiros necessários e o autor da herança não pode afastá-los, salvo em situações excepcionais, como, por exemplo, nas hipóteses previstas no art. 1814 do CC.

Dispositiva é a norma que pode ser afastada pelos interessados. Cuida-se da norma que comporta disposição em sentido diverso. Se-gundo o art. 327 do CC, o pagamento deverá ser realizado no domicílio do devedor. Contudo, o mesmo artigo ressalta que as partes podem dis-ciplinar o local do pagamento de forma diversa. Assim, a norma que de-fine o local do pagamento como sendo o domicílio do devedor tem cará-ter dispositivo, já que pode ser afastada pela vontade dos interessados.

2.2. Costumes

Nos países da Common Law, tem especial importância como fonte do direito, já que se trata de sistema não escrito, fundado, com prima-zia, nas relações consuetudinárias e em precedentes jurisprudenciais.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 16Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 16 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 4: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

17ASPECTOS CÍVEIS DA LINDB

No Brasil, o costume é fonte secundária do direito, devendo o ju-rista dele se socorrer ante a omissão da lei, nos termos do art. 4º da LINDB, in verbis:

“Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.

O costume caracteriza-se pelo conjunto de práticas reiteradas na sociedade, derivadas do que os Romanos chamavam de more, uma con-duta generalizada e dotada de força cogente social. Tem como elemen-tos o uso ou prática reiterada de um comportamento e a convicção de sua obrigatoriedade. O costume é, assim, a fonte secundária do Direito, caracterizada pelo conjunto de práticas reiteradas que geram convicção de obrigatoriedade.

Classifica-se, ainda, em relação à lei, como: secundum legem (quan-do encontra apoio na lei), praeter legem (quando supre a lacuna legisla-tiva) e contra legem (quando é contrário à lei. Segundo doutrina domi-nante, não se admite no nosso ordenamento o costume contra legem, já que uma lei só pode ser revogada por outra).

2.3. Analogia

Assim como o costume, a analogia é fonte secundária do direito.

A bem da verdade, a analogia revela-se mais como um método de integração do direito do que propriamente uma fonte.

Define-se, portanto, como um método de integração do sistema, que visa a aplicação de uma regra a uma situação não disciplinada diretamente na norma.

O juiz, em razão da omissão da lei, deve primeiro socorrer-se da analogia, observando, outrossim:

A inexistência de dispositivo legal (em senti-do amplo) que discipline uma específica situa-ção concreta

Similitude entre a situação apre-sentada e outra já disciplinada pelo ordenamento

Identidade de fun-damentos lógicos e jurídicos como ponto comum às duas situações.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 17Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 17 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 5: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

18 vol. 3 – DIREITO CIVIL – Parte Geral • Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias

2.4. Princípios Gerais de DireitoNo nosso ordenamento, os princípios gerais de direito revelam-se

como verdadeiro método de integração ante a omissão da lei.Segundo ensina CARLOS ROBERTO GONÇALVES, os princípios gerais

de direito são constituídos de regras que se encontram na consciência dos povos e são universalmente aceitas, mesmo não escritas (2006, p. 53).

Segundo adverte o mesmo autor, em sua maioria, os princípios ge-rais de direito estão implícitos no sistema jurídico civil. São exemplos: “ninguém pode valer-se a própria torpeza”, “ninguém pode transferir mais direitos do que titulariza”, “ boa-fé presume-se”, “é vedado o enri-quecimento sem causa”, entre outros.

2.5. JurisprudênciaA jurisprudência, sobretudo na última década, tem se revelado, no

Brasil, importante fonte do direito, embora secundária.MARIA HELENA DINIZ define jurisprudência como “o conjunto de

decisões uniformes e constantes dos tribunais, resultantes da aplicação de normas a casos semelhantes, constituindo uma norma geral aplicável a todas as hipóteses similares ou idênticas” (DINIZ, 2005, p. 295).

A jurisprudência, como fonte do direito, oferece importante con-tribuição à experiência jurídica, pois o Poder Judiciário, ao expressar o sentido e o alcance das normas que aplica, aprimora a ordem jurídica.

Em sentido amplo, jurisprudência é o conjunto de decisões proferidas pelos juízes ou tribunais sobre uma determinada matéria jurídica. Já em sen-tido estrito, consiste apenas no conjunto de decisões uniformes, prolatadas pelos órgãos do Poder Judiciário, sobre uma determinada questão jurídica.

2.6. DoutrinaA doutrina, como fonte secundária do direito, pode ser definida como

o conjunto de obras e pareceres jurídicos de estudiosos da Ciência Jurídica, que contribuem para a formação e modificação do ordenamento jurídico.

A doutrina tem o papel preponderante de aprimorar o direito, nota-damente as normas já existentes, limitando o alcance e extraindo o seu sentido de acordo com o sistema integrado de normas.

Além disso, a doutrina é comumente utilizada como argumento de autoridade, servindo de fundamento para corroborar um posiciona-mento ou uma ideia.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 18Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 18 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 6: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

19ASPECTOS CÍVEIS DA LINDB

3. VIGÊNCIA, OBRIGATORIEDADE E INTERPRETAÇÃO DA LEI

Toda norma necessita estar apta à produção de efeitos no mundo jurídico. A vigência é a aptidão da norma para obrigar ou vincular com-portamentos nela preordenados.

A norma pode iniciar a produção de efeitos de forma imediata ou aguardar prazo, em vacatio legis, para que seus destinatários possam conhecer o seu conteúdo e se adequar às suas determinações.

O CC de 2002, por exemplo, não produziu efeitos a partir da sua publicação. Dada a sua importância e as modificações que acarretou na vida social, teve longa vacatio legis, entrando em vigor um ano após a sua publicação (art. 2044).

Não havendo prazo fixado na norma, a vacatio legis será de 45 dias.

Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quan-do admitida, se inicia três meses depois de oficialmente publicada.

Muito cuidado com duas importantes regras previstas no art. 1º, §§3º e 4º da LINDB:

Se, antes de entrar a lei em vigor, ocorrer nova publicação de seu texto, destina-da a correção, o prazo de 45 dias ou 03 meses (dependendo do caso) começará a correr da nova publicação.

As correções a texto de lei já em vigor consideram-se lei nova.

Ainda em tema de vigência, a lei não é feita, em regra, para durar de forma limitada no tempo. Pelo contrário, ela tende a se manter até que seja revogada por outra lei (princípio da continuidade).

Logo, as leis temporárias são uma exceção no sistema, limitan-do sua duração a um tempo certo (lei com prazo de validade) ou a um evento (como uma guerra, por exemplo).

Surgindo no sistema nova lei que verse sobre todo o assunto, a lei anterior será retirada integralmente do mundo jurídico, dizendo-se ter sido ab-rogada.

Contudo, se a nova lei regular apenas parte da matéria, não atacan-do alguns dispositivos da lei anterior, esta permanecerá em parte no mundo jurídico, dizendo-se ter sido derrogada.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 19Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 19 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 7: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

20 vol. 3 – DIREITO CIVIL – Parte Geral • Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias

Revogação• Uma lei, no nosso ordenamento, só pode ser revoga-

da por outra. Impera, entre nós, o princípio da conti-nuidade. Leis temporárias representam uma exceção

Espécies de revogação

• Expressa ou tácita• Total (ab-rogação) ou parcial (derrogação)

Desta forma, a revogação total é denominada ab-rogação; a revoga-ção parcial, derrogação.

A revogação pode, ainda, ser: tácita, quando a nova lei se mostrar, total ou parcialmente, incompatível com a anterior; e expressa, quando a nova lei, expressamente, revoga as anteriores.

A nova lei pode ainda dispor de forma complementar, seja geral ou especialmente. Assim, a lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior. Nestas situações não haverá alteração da lei anterior, passando as duas a coexistir de maneira harmoniosa no sistema.

A norma não pode, no anseio de fazer-se valer, agredir o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, segundo art. 5º da LINDB.

Consideram-se

Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efe-tuou

adquiridos assim os di-reitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha têrmo pré-fixo, ou condição pré-estabeleci-da inalterável, a arbítrio

Chama-se coisa julgada ou caso julgado a de-cisão judicial de que já não caiba recurso

de outrem

De outro lado, deve-se ter especial atenção com a repristinação. Neste caso uma lei A é revogada pela lei B. Quando a lei C revoga a lei B, a lei A voltaria a ter vigência?

De forma tácita, não! Mas, se a lei C dispuser expressamente que a lei A voltar a ter vigência, ocorrerá a repristinação. Desta forma, per-cebe-se que não há, no Brasil, repristinação tácita, mas nada impede a ocorrência de repristinação expressa.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 20Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 20 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 8: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

21ASPECTOS CÍVEIS DA LINDB

Neste sentido é o art. 2º, §3º da LINDB, in verbis: “salvo disposição em con-trário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência”.

O art. 3º da LINDB apresenta elemento chave para o sistema jurídi-co pátrio: a presunção absoluta de conhecimento da lei.

Não se admite que alguém invoque em seu favor a ignorância, de modo a garantir o seu descumprimento.

A lei é de observância obrigatória devido a uma necessidade social, já que todos devem colaborar com a garantia da paz e da estabilidade sociais.

Algumas situações específicas, relativas à presunção de conheci-mento da lei, serão analisadas ao longo dessa obra, como, por exemplo, aquela tratada no art. 139, III, do CC (que trata do erro de direito).

Vale frisar, por fim, que os fins sociais devem orientar a interpreta-ção da lei (art. 5º, LINDB). O intérprete deve atentar aos fins sociais a que se destina a lei, bem como às exigências do bem comum.

4. ALTERAÇÕES ADVINDAS DA LEI 13.655/18

A Lei 13.655/18 objetivou inovar o sistema decisório brasileiro em rela-ção às condutas dos agentes públicos. Logicamente, dado o recorte didático da presente obra, iremos, objetivamente, tratar dos pontos fundamentais ali estampados. Atente, leitor, que as mudanças são legadas a dois momentos di-versos, ainda não sendo possível precisar qual será o adotado: ou cairão em letra morta, sendo argumentos utilizados de pontual, ou se tornarão regra de aplicação, trazendo controversas decisões para o sistema nacional.

A Lei 13.655/18 trouxe uma série de modificações na LINDB, em relação à interpretação a ser realizada na criação e aplicação do direito público brasileiro. Alguns pontos serão aqui destacados:

a) A decisão, seja ela nas esferas judicial, administrativa ou contro-ladora, não poderá se pautar em valores abstratos sem que se leve em consideração os efeitos práticos da decisão;

b) Na invalidação de ato, contrato ou norma administrativa, em qualquer das esferas (administrativa, controladora ou judicial), deve apontar ex-pressamente as consequências jurídicas e administrativas do ato;

c) a regra contida no art. 22, § 2º é de ser destacada, já que estabe-lece que na decisão sobre regularidade de conduta ou validade de ato ou norma, devem ser levados em consideração as circuns-tâncias práticas que impuseram, limitaram ou de qualquer for-ma condicionaram a ação do agente;

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 21Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 21 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 9: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

22 vol. 3 – DIREITO CIVIL – Parte Geral • Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias

d) quando a decisão, em qualquer das esferas, estabelecer nova inter-pretação para regra de conteúdo indeterminado, e isto criar dever ou condicionar direito, deverá ser prevista uma norma de transição;

e) quando da invalidação posterior de ato, contrato ou norma ad-ministrativa, deverá ser levada em consideração a orientação do tempo de efetivação da norma, sendo proibido que se atinjam situações plenamente constituídas.

Veja, também, o Decreto nº 9.830/2019 que regulamenta os arts. 20 ao 30 da LINDB.

5. TÓPICO-SÍNTESE

ASPECTOS CÍVEIS DA LINDB

Fontes do Direito Históricas, materiais, formais e não formais, diretas e indiretas

Fontes formais A lei, a analogia, o costume e os princípios gerais de direito

Fontes não for-mais A doutrina e a jurisprudência

Vigência Aptidão da norma para obrigar ou vincular comportamentos nela preordenados

Vacatio legisPeríodo em que a lei tem a produção de seus efeitos suspensa. Não havendo prazo fixado na norma, a vacatio legis será de 45 dias no território nacional

Princípio da continuidade

A lei se mantém vigente enquanto não for revogada por outra. As leis temporárias são uma exceção no sistema, limitando sua dura-ção a um tempo certo (lei com prazo de validade) ou a um evento (como uma guerra, por exemplo)

Espécies de revo-gação da norma

Tácita ou expressaTotal (ab-rogação) ou parcial (derrogação)

Repristinação É a ressurreição da lei! Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência

Ato jurídico perfeito Já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou

Direito adquirido

Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou al-guém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercí-cio tenha têrmo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem

Coisa julgada Decisão judicial de que já não caiba recurso

Lei 13.655/18 Inovou o sistema brasileiro em relação às decisões dos agentes pú-blicos, dentre outros temas.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 22Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 22 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 10: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

capítulo

1SUJEITOS DE DIREITO

\ Leia a lei: ͳ Arts. 1 a 9º da Lei 10.406/02 – Código Civil

1. INTRODUÇÃOO ser humano sempre foi o principal elemento das Ciências Jurídi-

cas. O Direito sempre se pautou por regulamentar o convívio do homem em sociedade, suas relações sociais.

Assim, faz-se necessário determinar quem são os sujeitos habilita-dos a integrar os polos de uma relação jurídica, ou seja, a quem podem ser assegurados direitos e atribuídos deveres.

Para tanto, a legislação civil brasileira estabelece que são sujei-tos de direito e deveres não só as pessoas naturais, mas também as pessoas jurídicas. Vale destacar que de forma supletiva e específica reconhecem-se como sujeitos certos entes despersonificados, como a massa falida, o espólio, o nascituro (para os adeptos da teoria natalista), as sociedades em comum, dentre outros.

\ ATENÇÃOOs animais, apesar de serem protegidos pelo Direito, não são sujeitos de direito. Logo, não podem, em próprio nome, receber herança ou serem beneficiados por doações, como se sujeitos de direito fossem.

Vale destacar que Portugal passou a reconhecer os animais como seres vivos dotados de sensibilidade, continuando submetidos ao di-reito de propriedade, mas viabilizando o estabelecimento de guarda e, provavelmente (já que não há previsão expressa), o dever de prestar alimentos em caso de separação ou divórcio dos seus proprietários.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 23Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 23 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 11: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

24 vol. 3 – DIREITO CIVIL – Parte Geral • Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias

Por ora, o presente capítulo destina-se ao estudo das Pessoas Natu-rais, disciplinadas no Título I do Capítulo I da Parte Geral do CC.

1.1. Teoria geral do Direito Civil

O regramento do Direito Civil ficou a cargo, no Brasil Colônia, das Leis Portuguesas. Dentre estas, foram as Ordenações Phillipinas respon-sáveis pelas disposições privadas até o ano de 1916, sendo que a partir de 1º de janeiro de 1917 passou a viger o Código Civil Brasileiro, obra da genialidade de Clóvis Beviláqua. Antes dele a tentativa de sistematiza-ção da tábua de direitos do universo civil foi incumbida a vários outros gênios, dentre eles o, talvez, maior de todos, Augusto Teixeira de Freitas.

Tábua de principais tentativas de sistematização da legislação civil brasileira.1

Ano Autor Resultado

1855 Augusto Teixeira de Freitas Consolidação das Leis Civis

1859 Augusto Teixeira de Freitas Esboço do Código Civil

1872 Nabuco de Araújo Um conjunto de notas, sem sistema-tização

1889 Comissão Imperial (dentre outros, o Imperador, Lafayette Rodrigues Pe-reira e Afonso Pena)

Nenhum resultado

1899 Clóvis Beviláqua Código Civil de 1916, vigente a partir de 1º de janeiro de 1917

O Código Civil de 1916 (que, como dito, vigeu a partir de 1917), recebeu clara influência das codificações europeias, principalmente do Code Civile Francês, que nasceu quase um século antes (1803). A grande codificação do período, o BGB Alemão, de 1899, também espraiou ares sobre o pensamento de Clóvis, mas com menor influência.

O Código Civil era um código de personagens: o contratante, o pai de família, o testador, o proprietário, dentre outros, figuravam em suas páginas e resplandeciam importância. O sistema orbitava sobre figuras pontuais, esquecendo o quê de importante remanescia sob tamanho entulho: a pessoa. E é esta pessoa que servirá de base para a revisão do

1 Para uma exposição detalhada sobre o histórico da legislação civil brasileira, leia-se GRINBERG, Keila. Código Civil e Cidadania. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002. 86p.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 24Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 24 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 12: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

25Cap. 1 • SUJEITOS DE DIREITO

Código Civil ocorrida em 2002, passando a valer em 11 de janeiro de 2003, ressalvados maiores debates.

O Código Reale, oriundo de projeto de 1975, é inspirado nos precei-tos do culturalismo defendido pelo autor, o que se nota claramente em muitos de seus artigos. Explicando esta, Judith Marins Costa e Gerson Luiz Carlos Branco, em obra dedicada às diretrizes do Novo Código Ci-vil, explicitam que o culturalismo enquanto corrente de pensamento que a aponta a cultura como paradigma central das ciências e da filosofia possui diversas formas de expressão e consequências evidentes na construção do conteúdo das ciências. A consequência do culturalismo de Reale sobre as ciências é uma visão integrante do conhecimento, uma busca constante da relação entre o que é a realidade e o pensamento a respeito da própria realidade. A realidade é reconhecida como o resultado da ação do sujeito sobre o mundo, que ao mesmo tempo é atributiva de significado e que é determinada pela natureza (MARTINS-COSTA & BRANCO, 2002: 38).

É neste meio em que o sujeito, pessoa, se reconstrói, se refaz, in-fluenciando e sendo influenciado, em ciclo especial, passando de uma posição de mero expectador a agente concreto e ponto fundamental do sistema.

Iniciar um capítulo sobre a teoria geral do Direito Civil pelo con-ceito de Direito é lição comumente vista. Contudo, deve-se ter especial atenção à recomendação do mestre Beviláqua, que da clareza e profun-didade de seus escritos asseverou: “não cabe, certamente, ao direito ci-vil, simples ramo da árvore jurídica, fornecer o conceito geral do direi-to. Somente a filosofia jurídica é que o pode extrair, como síntese final, do conjunto dos fatos, que constituem as disciplinas particulares e a ciência geral do direito” (BEVILÁQUA, 2001: 45).

Cabe a este trabalho tentar, sem a gana de ser perfeito, conceituar o Direito Civil. Este ramo do Direito pode ser compreendido como o que regulamenta a vida privada, não empresarial, em seus amplos aspectos, da concepção à execução da vontade em deixas post mortem.

O Direito Civil acompanha o homem desde seu primeiro momento, caminhando ao longo de sua vida e ainda ao final desta, entregando seus bens aos sucessores, legais ou voluntários.

Observando-se a estrutura do Código Civil este caminho fica cla-ro. Na parte geral tem-se a definição básica do Direito Subjetivo, com a percepção da pessoa, dos bens e das relações jurídicas. Adentrando

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 25Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 25 03/03/2020 10:39:2003/03/2020 10:39:20

Page 13: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

26 vol. 3 – DIREITO CIVIL – Parte Geral • Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias

na parte especial, as obrigações e os contratos, que hoje desde cedo acompanham o homem, formam o livro inicial. O Direito de Empresa, que foi fisicamente jungido ao Código Civil quando da reforma de 2002, estrela o segundo livro, dignificando o dinamismo da atual sociedade. No livro terceiro deixam-se as relações jurídicas e passa-se ao domínio das situações jurídicas de apropriação, ou, nas palavras do mestre Luiz Edson Fachin, chega-se às titularidades. A família, formada hoje cada vez mais tardiamente, estampa o livro quarto. Neste ponto nota-se a clara influência social sobre a estrutura da codificação: quando do Códi-go Beviláqua, virada do século XIX para o século XX, com os casamentos prematuros, em tenra idade, o primeiro livro da parte geral era justa-mente o Direito de Família (e uma família matrimonializada, como se verá mais à frente). Nos tempos atuais as relações jurídicas ganharam celeridade e os projetos familiares são colocados, cada vez mais, em um distante ponto no tempo.

Por fim, chega-se ao livro quinto, em que o legislador dedicou es-pecial atenção ao momento do fim da personalidade e a transmissão causa mortis do patrimônio do finado, o Direito das Sucessões.

1.1.1 A busca pela repersonalização (despersonalização-repersona-lizante) do Direito Civil

Como já observado, o Código Civil de 2002 foi feliz ao buscar novos parâmetros condutores de sua estrutura. Neste caminho, o credor e o contratante deixam de ser entes abstratos para se tornarem se-res concretos, viventes, o ser ético, engajado no social. Um ser que chora, que ri, se emociona. Vivencia cada instante como se o raiar do sol fosse o último; ser que reconhece e sabe que não existe apenas um caminho a ser trilhado, mas uma infinidade de saídas e percalços que lhe acentuam o maior valor, a possibilidade de erro. E isto aproxima o “eu” do “nós”.

Tem-se então um novo direito civil, reconcebido, relido, em que o todo importa e qualifica a parte; em que cada parcela significa muito para a construção da totalidade. Não um direito civil reducionista, em que cada um se perde no todo ou em que o todo deve se curvar à parte. Ágil, altivo, que possibilita a manifestação da pessoa em sua comple-tude, em seu máximo. A pessoa reproduz o quadro total, sem deixar perder sua especificidade, sem se reduzir ou se desqualificar.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 26Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 26 03/03/2020 10:39:2103/03/2020 10:39:21

Page 14: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

27Cap. 1 • SUJEITOS DE DIREITO

É esta figura do próximo que se torna o centro em relação ao qual orbita o Direito Civil. Não um próximo neutral, distante, abstrato, mas aquele que se reflete no “eu”, aquele que também é o “eu”. O próximo, o outro é figura múltipla, vários outros que importam a uma única rela-ção obrigacional, gerando uma rede de obrigações, que validam o “eu”, o “outro”, o “nós”. Assim, saem os personagens, entram as pessoas.

Veja-se que destaque deve ser dado às redes contratuais, um fato comum nos dias de hoje em que se interligam contratos e contratantes entre si, de modo a que cada um passe a influir diretamente sobre os de-mais, mas em uma simbiose estruturada juridicamente, em que cada um precisa necessariamente do outro para alcançar seu objetivo, mesmo que do outro nem mesmo se tenha conhecimento. Exatamente, as redes con-tratuais são um bom exemplo da despersonalização-repersonalizante por que vem passando o Direito Civil. Quando dantes se contratava tinha--se certeza de quem seria o polo contrário, complementar. Na atual con-juntura, não mais se tem plena certeza do que se contrata (haja vista os arts. 413 e 478 CC/02), nem muito menos com quem se contrata (como se nota no contrato com pessoa a declarar, arts. 467 e ss do CC/02).

Permite-se aqui um parêntese para que reste explicado o porquê de se falar em despersonalização-repersonalizante. Quando se alinham estruturalmente direitos e deveres, sem que se questionem “de quem” ou “para quem” pode-se promover uma maior interação daqueles que de outro modo não contratariam. Com a despersonalização o que se leva em consideração são as características da parte, não do sujeito por trás dela. A parte contratual pode absorver todas as necessidades do sujeito que lhe completa, e ainda, de modo flexível, adequar-se às pos-sibilidades contratuais para a otimização da relação. Por outro lado, a pessoa, com suas características e detalhes é sempre fundamental, mas não a pessoa egoísta, personagem, esculpida nos séculos XVIII e XIX. Não! Agora é a hora da repersonalização, da recompreensão de que a pessoa, com seus limites e capacidades, com seus amores e dissabo-res, contrata, se relaciona, se obriga, casa, se enamora de outrem.

E amar, respeitar, cuidar, proteger são, dentre muitos, valores que se conjugam no plural, no outro. Não se ama, sem que se necessite de outrem, não se respeita, se não o for a foco do terceiro. Viver não é o suficiente para ensinar ao indivíduo todos os valores possíveis, faz-se mister conviver, compreender, confiar, partir de alguém para chegar a si mesmo.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 27Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 27 03/03/2020 10:39:2103/03/2020 10:39:21

Page 15: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

28 vol. 3 – DIREITO CIVIL – Parte Geral • Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias

Esta tábua de valores permite que se adeque o Direito Civil, a le-tra da lei ao mundo, às relações plúrimas que a cada momento se dão no universo social. A relação estabelecida pelo Direito e pelos valores do conviver não é de fácil percepção, por sua gama complexa e o risco de se estabelecerem limites fluidos em excesso. Este risco pode refle-tir em simples falha técnica ou mesmo desembocar em um perigoso e instável plexo de soluções injustas. Mas o fundamental, o necessário, é que aquela pessoa que foi legada ao esquecimento, que não tinha suas características reconhecidas pelo sistema, ganhou novos ares, passou a importar, de maneira especial e única, ao sistema Civil, não mais se valendo este de preceitos reducionistas, como a conhecida figura do ho-mem-médio, mas sim buscando reconhecer que, no caso concreto, está diante da lei alguém humano e em sua plenitude, digno.

1.1.2. As diretrizes fundamentais do Código Civil

Como mencionado acima, a influência de Miguel Reale em muito do que hoje é o Código Civil deixou claro que o homem, pessoa, se in-veste de direitos e deveres e, como tal, passa a ser um protagonista do sistema. Neste sentido, o Código Civil passa a contar com três grandes princípios ou diretrizes, que norteiam sua leitura e aplicação: a sociali-dade, a eticidade e a operabilidade.

Com a socialidade, o Código e seus regramentos rompem os limites do inter partes. Agora, parafraseando a feliz construção de Tereza Negrei-ros, as relações vão além das relações. A sociedade importa e passa a se im-portar com cada relação privada, aguardando que todas atendam à função social que delas se espera. Função social que pode ser entendida como o atendimento às perspectivas econômico-sociais de um direito, evitando-se relações dissimuladas ou meramente especulativas (com a função social, que alcança todo e qualquer direito subjetivo – do que se afirma que todo direito subjetivo está socialmente funcionalizado – os conhecidos contra-tos de gavetas – acordos escusos, feitos para não valer, como meras garan-tias pontuais – perdem sua licitude, passando a estar, graças ao art. 187 do Código Civil, compreendidos pelo conceito de abuso de direito).

De outro lado, se apresenta a eticidade, que tem como grande re-presentante a boa-fé objetiva. Esta cláusula geral estabelece regra de conduta que determina entre as pessoas a necessidade de um especial cuidado com o outro em suas relações. Não há espaço para a mentira, para a enganação, é tempo de verdade, informação, esclarecimento. A

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 28Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 28 03/03/2020 10:39:2103/03/2020 10:39:21

Page 16: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

29Cap. 1 • SUJEITOS DE DIREITO

boa-fé objetiva limita o exercício dos direitos (art. 187 do CC), serve de parâmetro de interpretação (art. 113 do CC) e ainda imprime condutas sobre as partes contratantes (art. 422 do CC). Deve-se perceber que ela não se confunde com a boa-fé subjetiva. Em conhecida lição, a boa-fé subjetiva é exculpante, está atrelada à consciência do sujeito, que age acreditando estar correto. É a boa-fé dos direitos reais (como o possui-dor de boa-fé), do matrimônio (que possibilita o casamento putativo), dentre muitos outros casos. A eticidade abre as portas do Código para os conceitos abertos, as cláusulas gerais e os mais variados princípios, deixando a cargo do prudente arbítrio do magistrado a construção, in concreto, da solução necessária.

Por fim, a operabilidade, que denota a preocupação com os assun-tos comuns, com o homem comum, com a aplicabilidade prática e real (mais um traço do culturalismo de Reale), estabelece que expressões em desuso, institutos em desuso ou que afrontam as demais perspec-tivas do Código (como a enfiteuse) devem ser retirados. Ainda, a cons-trução do ordenamento civil deveria partir de instrumentos úteis para a vida cotidiana, a aplicabilidade e o direcionamento tomam a dianteira e passam a regrar o trabalho do legislador e do hermeneuta. Buscou-se, assim, um Código Civil prático, aplicável, concreto.

Razão há naqueles que compreendem que dentre tais princípios, este último tenha sido o que menor êxito logrou. Ainda permeiam o Có-digo institutos de pouca aplicabilidade (como a anticrese, mesmo que remodelada) ou de difícil compreensão, como os parágrafos 4º e 5º do art. 1.228, que ainda encontram grande discussão em doutrina para com-preensão de sua natureza jurídica. Do mesmo modo o tratamento dado à união estável é de um todo anacrônico, como será detidamente observa-do na parte deste trabalho reservada às famílias e ao direito sucessório.

Não se pode, contudo, negar que o Código significou um avanço nas vetustas regras concebidas por Beviláqua (que ao seu tempo tentou ser atual). O que se aguarda é que a flexibilidade dada à codificação possa resultar em um duradouro e rico tempo de aplicação.

1.1.3. Constitucionalização do Direito Civil Brasileiro

O sistema civil ocidental deu seus primeiros passos quando do al-vorecer do pensamento romano. Este Direito Civil (Ius Civile), que se referia a tudo quanto tocava ao cidadão (civis) pautava-se na proteção

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 29Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 29 03/03/2020 10:39:2103/03/2020 10:39:21

Page 17: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

30 vol. 3 – DIREITO CIVIL – Parte Geral • Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias

do universo privado de forma estanque, fechado, vedado, sobrepondo a vontade à dignidade; o pagamento das dívidas à vida; o poder do pai aos direitos dos filhos.

Um sistema tradicionalista, fechado em si mesmo, calcado na es-tabilidade das relações, mesmo que esta estabilidade se sobrepujasse à justiça. A construção jurídica romana, principalmente o Corpus Iuris Civilis do Imperador Justiniano irá adormecer com a queda do império no Ocidente no séc. V. O corpus estava assim estruturado.

Este direito, adormecido, despertará, na Europa da Alta Idade Mé-dia, renascerá com variadas nuances, principalmente impregnado de um direito natural teológico, obra da Igreja Católica em seu império di-vino. Com a formatação da idade moderna e as luzes do século XVII o direito como um todo, e sua base à época – o Direito Civil -, passará a uma estrutura jusracionalista (um pensamento racional e sistemático do Direito), detectável nas grandes codificações do início do século XIX, o Code Civile da França (1804) e o Código Civil Austríaco (1811).

Contudo será o século XIX o responsável pela reconstrução deste pensamento, dando ao Direito a metafísica Kantiana, com sua estrutura moral forte. Este pensamento desencadeará um positivismo jurídico, notado nas construções do final do século XIX, como o Código Civil Ale-mão, o BGB, de 1900.

Este sistema, com evoluções e reparos, vigeu, no Brasil, até o século XX, seja através das Ordenações Phillipinas, seja no Código Beviláqua, que retratava um pensamento ainda fincado no século XIX.

Era necessário inspirar um novo pensamento, mesmo que não hou-vesse mudança na letra da lei. Era, assim, necessária uma (re)visão, uma nova visão do sistema civil, em que se pudesse revalorizar todo o esquema em favor da pessoa (repersonalização).

Na busca por um sistema mais justo e, como dito, focado na pes-soa, era necessário encontrar um novo ponto de apoio, já que o Código

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 30Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 30 03/03/2020 10:39:2103/03/2020 10:39:21

Page 18: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

31Cap. 1 • SUJEITOS DE DIREITO

Civil não bastava e não supria as reais necessidades sociais. Eis que se concebe a noção de “constitucionalização” do Direito e, consequente-mente, do Direito Civil. Através desta visão hermenêutica, a Constitui-ção se apresenta como uma lente, um filtro, pelo qual devem passar os direitos, as regras, os princípios, enfim, todo o sistema, antes que sejam aplicados ao caso concreto.

Apoiado nisto, o Código Reale, que foi publicado em 10 de janeiro de 2002, passa a contar com três vetores: a socialidade, a operabilidade e a eticidade.

Com a socialidade passa a estar clara a funcionalização social de todos os direitos subjetivos. Se na Constituição Federal encontramos a função social da propriedade e da empresa, o Código Civil passa a estar, ao menos na mente dos seus principais redatores, integralmente fun-cionalizado. Todo direito subjetivo deve ter função social.

Ao lado desta confissão de fé social, o Código Civil elege a eticidade, o respeito, a informação, o cuidado, como elementos fundamentais das relações jurídicas. Neste momento entra em cena a boa-fé objetiva, de-terminando aos contratantes, aos obrigados, zelar um pelo outro, pres-tando as informações necessárias, não agindo de forma dolosa, tendo atenção e cuidado, guardando sigilo se necessário, enfim, sendo respei-toso para o outro.

Se a socialidade e a eticidade estão atreladas ao conteúdo dos direi-tos, a operabilidade envolve o funcionamento do Código. Pretendeu-se extirpar contradições e normas desnecessárias ou de pouca aplicabili-dade prática. Cada disposição, conforme pretendido, deve apresentar um sentido lógico e uma realizabilidade.

É a partir destes vetores que a compreensão constitucional do uni-verso civil se apresenta de forma mais clara. Isso dá ao Código uma for-te maleabilidade, além de possibilitar a manutenção de sua atualidade.

Não se apresentam como princípios, posto não serem mandados de otimização, mas sim estruturas permeáveis que permitem o ingresso de um conjunto de valores de alcance constitucional na seara civil. Ao invés de imporem ao sistema mudança, eles viabilizam que este mesmo sistema tenha possibilidade de absorver as mudanças de interpretação ou as inclinações sociais para se manter atual. Atualidade não resume a ser um Código de modas, mas sim possibilitar que as mudanças sociais possam fazer parte de forma mais célere da estrutura civil, visto que

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 31Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 31 03/03/2020 10:39:2103/03/2020 10:39:21

Page 19: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

32 vol. 3 – DIREITO CIVIL – Parte Geral • Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias

muitas são as reivindicações de gênero, condição financeira, proteção a hipossuficientes que surgem na sociedade e necessitam refletir tam-bém no hermeneuta civil.

Neste novo sistema, constitucionalizado, a pessoa passa a ocupar o ponto central. Não uma pessoa qualificada como antes ocorria (o con-tratante, o testador, o proprietário, o pai de família etc.). A pessoa, nua, simples, diretamente considerada se torna o agente fundamental do sistema e, ao mesmo tempo, passa a ser o fim único da estrutura. Res-guardar sua dignidade humana, ou melhor, a sua igual dignidade huma-na se torna um imperativo jurídico.

Ao lado dela, segue a solidariedade, criando influências no universo civil através da função social e da boa-fé, cláusulas gerais que introdu-zem a noção de que não se está sozinho, não se constrói um direito sem a presença e o respeito ao outro.

Esta compreensão não rompe a clássica diferenciação entre direito público e direito privado, que pode ser compreendido como “o conjun-to de preceitos reguladores das relações dos indivíduos entre si” e o Direito Público como “o destinado a disciplinar os interesses gerais”, conceitos estes de raiz romanísticas e apresentados por Washington de Barros Monteiro (MONTEIRO, 2003: 9-10).

2. A PERSONALIDADEO conceito de personalidade está intrinsicamente ligado ao de ca-

pacidade de direito, pois é com a atribuição de personalidade que o ser humano passa a ser sujeito de direitos.

Como não há direito sem um titular e o titular de um direito deve ser necessariamente uma pessoa, conceitua-se personalidade como “o atributo necessário para ser sujeito de direitos.” (GAGLIANO; PAMPLO-NA FILHO, 2006, p. 80)

Portando, com a personalidade (atribuída pela lei aos nascidos vivos) surge concomitantemente a capacidade de direito, elevando o indivíduo à condição de sujeito de direito.

A personalidade não pode ser medida. Ou ela está presente ou não está. O mesmo não ocorre com a capacidade, que pode ser fragmentada conforme as condições pessoais de quem a detém.

Cumpre observar que não só as pessoas naturais têm personalidade, mas também as pessoas jurídicas. Segundo Caio Mário da Silva Pereira (2005, p. 213-214), “o direito reconhece igualmente personalidade a en-

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 32Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 32 03/03/2020 10:39:2103/03/2020 10:39:21

Page 20: Júlio César Franceschet Wagner Inácio Dias Direito Civil · 2020-03-11 · 16 vol. 3 DIREITO CIVIL Parte Geral Júlio César Franceschet e Wagner Inácio Dias 2.1. Lei (em sentido

33Cap. 1 • SUJEITOS DE DIREITO

tes morais, [...] aos quais é atribuída com autonomia e independência re-lativamente às pessoas físicas de seus componentes ou dirigentes”.

\ ATENÇÃOPara FABIO ULHOA COELHO, algumas entidades, embora desprovidas de personalidade jurí-dica, também são consideradas sujeito de direitos de fato, como é exemplo o espólio, a mas-sa falida, o condomínio edilício, etc. Tratam-se dos entes despersonalizados, que são criados pelo direito e constituídos para facilitar a consecução de um determinado fim que ostentam autorização legal para praticar determinados atos inerentes a este fim. Respeitosamente, discordamos desse posicionamento por ser a personalidade um conceito técnico-jurídico, desenvolvido, no caso em análise, pela Ciência do Direito, sendo certo que cabe à lei definir quais entidades, diversas do homem, terão personalidade jurídica própria. Assim, embora o condomínio edilício, a massa falida e o espólio pratiquem atos jurídicos em sentido amplo, não nos parece correto dizer que eles são, tecnicamente, sujeitos de direitos por lhes faltar, expressamente, a aptidão genérica para adquirem direitos e obrigações (ULHOA COELHO, 2006, p. 153-154). Ao nosso sentir e em que pese a atuação cada vez mais frequente dessas entidades, sobretudo do condomínio edilício, esses entes são despersonalizados.

2.1. Início e fim da Personalidade

O art. 2º do CC estabelece que “a personalidade civil da pessoa co-meça do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concep-ção, os direitos do nascituro”.

Destarte, para o direito brasileiro o nascimento com vida é a única condição imposta para que se atribua personalidade à pes-soa natural. Em outras palavras, surgindo para o mundo como pessoa viva, terá personalidade.

Segundo CAIO MÁRIO, “ocorre o nascimento quando o feto é sepa-rado do ventre materno, seja naturalmente, seja com auxílio de recur-sos obstétricos” (PEREIRA, 2005, p.219, grifo do autor).

O marco utilizado para afirmar o nascimento com vida é a respira-ção. Se ao nascer os pulmões encherem-se de ar ao menos uma vez, é possível afirmar com propriedade que houve vida e, portando, iniciou--se a personalidade.

A demonstração desse fato poderá ser realizada por todos os meios, inclusive pela perícia médico-legal denominada Docimasia Hidrostá-tica de Galeno.

Mesmo o recém-nascido que, em razão de malformação, apresente aberrações ou que nasça vivo e logo em seguida venha a óbito, terá ad-quirido personalidade jurídica.

Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 33Resumos p Conc v3-Franceschet-Dias-Dir Civil PGeral-5ed.indb 33 03/03/2020 10:39:2103/03/2020 10:39:21