Jornal A Família Católica, 14 edição, julho 2014

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POR QUE ASSISTIR A SANTA MISSA AOS DOMINGOS? ARSENIUS SANTOS E FESTAS DO MÊS: 01– Festa do Preciosíssimo Sangue de Nosso Senhor; 02– Visitação de Nossa Se- nhora; 08– Santa Isabel, Rainha; 14– São Boaventura; 16– Nossa Senhora do Carmo; 18– São Camilo de Lellis; 19– São Vicente de Paulo; 22– Santa Maria Madalena; 25– São Tiago Maior, apósto- lo; 26– Santa Ana; 31– Santo Inácio de Loyola. NESTA EDIÇÃO: Doutrina 1, 2 Tesouro de exemplos 2 Liberalismo 3, 4 Avisos 4 Julho/ 2014 Edição 14 A Família Católica C A P E L A N O S S A S E N H O R A D A S A L E G R I A S Por que essa obrigação? Para isso é neces- sário conhecermos o que é a Santa Missa. E para conhecermos o que é a Santa Missa, de- vemos saber o significado do mistério da morte de Nosso Senhor Jesus Cristo. E para conhecer o mistério da morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, devemos conhecer o mistério da bonda- de de Deus e da maldade do homem. Deus, desde toda a eternidade, existe e não tem necessidade de nenhuma criatura. Mas Deus criou, e criaturas passaram a existir. E entre essas criaturas há uma ordem: há criatu- ras inanimadas, há criaturas que têm vida ape- nas vegetativa, há criaturas que têm vida sensi- tiva e há criaturas corporais que têm uma vida espiritual, intelectual, e há, ainda, outras criaturas que são puros espíritos, que também são intelectuais. Toda a criação tem como objetivo dar glória ao Cria- dor. E as criaturas que não têm inteligência necessaria- mente dão glória ao Criador, mas as criaturas inteligen- tes são livres e elas devem dar glória ao Criador segun- do o modo como é a sua natureza, portanto, livre- mente. E Deus ao criar as criaturas inteligentes, que são os homens e os anjos, Ele quis dar a essas criatu- ras uma felicidade que está acima das exigências natu- rais dessas mesmas criatu- ras. Essa felicidade consiste em participar da própria felicidade do Criador, da própria felicidade que Deus tem em Si mesmo: participar da própria vida de Deus. No entanto, para essa participação, essas criaturas inteli- gentes e, portanto, livres, teriam que merecer esse prêmio, e teriam que merecê-lo perante uma submissão voluntária ao plano de Deus, às ordens de Deus, à vontade de Deus. Entre os anjos houve uma parte que se submeteu a Deus, e outra parte que se revoltou contra Deus. Como os anjos são seres muito perfeitos, quando eles querem algo, eles não voltam atrás. Portanto, a separação de Deus daqueles anjos que rejeitaram o plano de Deus, essa re- jeição é eterna: eles se separaram eternamen- te de Deus. Quanto ao homem, as duas criatu- ras humanas que Deus criou diretamente, ambas rejeitaram o plano de Deus. No entanto, o homem, como é menos perfeito que o anjo, ele tem a possibilidade de se arrepender do erro que faz, tem possibilidade de voltar atrás, de mudar uma resolução em outra resolução. E, diante dessa fraqueza, Deus se compadeceu do homem e resolveu dar-lhe uma outra opor- tunidade. No entanto, o pecado é uma ofensa a Deus e Deus é infinito. Portanto, o pecado, sob um certo aspecto, é de um grau infinito e o homem não tinha nada de infinito para poder saldar a dívida que ele contraiu com o seu pecado. E, então, Deus, que queria dar uma ou- tra oportunidade ao homem, resolveu este problema, insolúvel para o homem, insolúvel... Necessariamente, se dependesse do homem, Adão e Eva e todos os seus descendentes esta- riam irremediavelmente condenados ao inferno, por causa do pecado de Adão; todos herdariam o seu pecado e as conse- qüências do seu pecado, assim como todos her- dariam o Céu se Adão fosse fiel, se Adão se submetesse ao plano divino. Ele não se sub- meteu, resultado: todos os seus descendentes teriam as conseqüências da sua não submissão. No entanto, como dis- se, Deus quis remediar esse problema, e o modo como Ele remediou foi o mais perfeito possível, porque para pagar a dívida do homem era um homem que teria que fazê-lo, e para pagar essa dívida, esse pagamento teria que ser de um valor eterno. Deus resolveu o proble- ma fazendo com que existisse um Homem que pudesse dar uma satisfação de valor eterno, e, para isso, esse Homem precisaria ser, além de homem (verdadeiro homem), teria que ser também verdadeiro Deus, porque só Deus é eterno, só Deus, estando unido a um homem,

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POR QUE ASSISTIR A SANTA MISSA AOS DOMINGOS?

ARSENIUS

SANTOS E

FESTAS DO MÊS:

01– Festa do Preciosíssimo

Sangue de Nosso Senhor;

02– Visitação de Nossa Se-

nhora;

08– Santa Isabel, Rainha;

14– São Boaventura;

16– Nossa Senhora do Carmo;

18– São Camilo de Lellis;

19– São Vicente de Paulo;

22– Santa Maria Madalena;

25– São Tiago Maior, apósto-

lo;

26– Santa Ana;

31– Santo Inácio de Loyola.

N E S T A

E D I Ç Ã O :

Doutrina 1, 2

Tesouro de exemplos 2

Liberalismo 3, 4

Avisos 4

Julho/ 2014 Edição 14

A Família Católica

C A P E L A N O S S A S E N H O R A D A S A L E G R I A S

Por que essa obrigação? Para isso é neces-

sário conhecermos o que é a Santa Missa. E

para conhecermos o que é a Santa Missa, de-

vemos saber o significado do mistério da morte

de Nosso Senhor Jesus Cristo. E para conhecer

o mistério da morte de Nosso Senhor Jesus

Cristo, devemos conhecer o mistério da bonda-

de de Deus e da maldade do homem.

Deus, desde toda a eternidade, existe e não

tem necessidade de nenhuma criatura. Mas

Deus criou, e criaturas passaram a existir. E

entre essas criaturas há uma ordem: há criatu-

ras inanimadas, há criaturas que têm vida ape-

nas vegetativa, há criaturas que têm vida sensi-

tiva e há criaturas corporais que têm uma vida

espiritual, intelectual, e há,

ainda, outras criaturas que

são puros espíritos, que

também são intelectuais.

Toda a criação tem como

objetivo dar glória ao Cria-

dor. E as criaturas que não

têm inteligência necessaria-

mente dão glória ao Criador,

mas as criaturas inteligen-

tes são livres e elas devem

dar glória ao Criador segun-

do o modo como é a sua

natureza, portanto, livre-

mente. E Deus ao criar as

criaturas inteligentes, que

são os homens e os anjos,

Ele quis dar a essas criatu-

ras uma felicidade que está

acima das exigências natu-

rais dessas mesmas criatu-

ras. Essa felicidade consiste

em participar da própria

felicidade do Criador, da

própria felicidade que Deus tem em Si mesmo:

participar da própria vida de Deus. No entanto,

para essa participação, essas criaturas inteli-

gentes e, portanto, livres, teriam que merecer

esse prêmio, e teriam que merecê-lo perante

uma submissão voluntária ao plano de Deus,

às ordens de Deus, à vontade de Deus. Entre

os anjos houve uma parte que se submeteu a

Deus, e outra parte que se revoltou contra

Deus. Como os anjos são seres muito perfeitos,

quando eles querem algo, eles não voltam

atrás. Portanto, a separação de Deus daqueles

anjos que rejeitaram o plano de Deus, essa re-

jeição é eterna: eles se separaram eternamen-

te de Deus. Quanto ao homem, as duas criatu-

ras humanas que Deus criou diretamente,

ambas rejeitaram o plano de Deus. No entanto,

o homem, como é menos perfeito que o anjo,

ele tem a possibilidade de se arrepender do

erro que faz, tem possibilidade de voltar atrás,

de mudar uma resolução em outra resolução.

E, diante dessa fraqueza, Deus se compadeceu

do homem e resolveu dar-lhe uma outra opor-

tunidade. No entanto, o pecado é uma ofensa

a Deus e Deus é infinito. Portanto, o pecado,

sob um certo aspecto, é de um grau infinito e o

homem não tinha nada de infinito para poder

saldar a dívida que ele contraiu com o seu

pecado. E, então, Deus,

que queria dar uma ou-

tra oportunidade ao

homem, resolveu este

problema, insolúvel para

o homem, insolúvel...

Necessariamente, se

dependesse do homem,

Adão e Eva e todos os

seus descendentes esta-

riam irremediavelmente

condenados ao inferno,

por causa do pecado de

Adão; todos herdariam o

seu pecado e as conse-

qüências do seu pecado,

assim como todos her-

dariam o Céu se Adão

fosse fiel, se Adão se

submetesse ao plano

divino. Ele não se sub-

meteu, resultado: todos

os seus descendentes

teriam as conseqüências

da sua não submissão. No entanto, como dis-

se, Deus quis remediar esse problema, e o

modo como Ele remediou foi o mais perfeito

possível, porque para pagar a dívida do homem

era um homem que teria que fazê-lo, e para

pagar essa dívida, esse pagamento teria que

ser de um valor eterno. Deus resolveu o proble-

ma fazendo com que existisse um Homem que

pudesse dar uma satisfação de valor eterno, e,

para isso, esse Homem precisaria ser, além de

homem (verdadeiro homem), teria que ser

também verdadeiro Deus, porque só Deus é

eterno, só Deus, estando unido a um homem,

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este homem poderia dar uma satisfação

de valor eterno. E essa satisfação, desde

o princípio, desde Abel e Caim, vemos que

era feita através de um rito chamado

sacrifício. Esses ritos antes tinham o seu

valor em relação à sua união com o sacri-

fício que iria, no futuro, ser oferecido pelo

Homem-Deus.

Em que consiste o sacrifício? Consiste

no oferecimento e na imolação de uma

vítima. Oferecimento feito a Deus de uma

vítima; portanto, oferecida a Deus. Imola-

ção que consiste na destruição da vítima,

na morte da vítima. Se é um ser vivo, a

morte; se é um ser inanimado, de um

certo modo, uma destruição da coisa:

para representar o total domínio que

Deus tem sobre todos os seres e a total

submissão que a criatura deve ao seu

Criador. Esse é o significado do sacrifício.

E a vítima deve estar em lugar daquele

que faz o sacrifício. A vítima é como que

um representante daquele que imola. A

vítima como que está no lugar daquele

que imola. Porque, na verdade, quem

deve se oferecer a Deus é o sacrificador,

e a vítima deve estar em seu lugar.

Então, esse Homem-Deus, que é Nosso

Senhor Jesus Cristo, encarnou-Se, nasceu

de Nossa Senhora, Maria Santíssima, a

qual foi preservada dessa herança de

Adão e Eva. Sim, ela não herdou o pecado

original de nossos primeiros pais, porque

Ela foi escolhida para ser Mãe do Reden-

tor, que é o Homem-Deus Nosso Senhor

Jesus Cristo. É a exceção: fora de Nossa

Senhora, todos nós, puros homens, her-

P á g i n a 2 A F a m í l i a C a t ó l i c a

damos o pecado de Adão e Eva e as

conseqüências desse pecado, que, entre

outras coisas, se encontra a condenação

eterna, mas também todos os males

desta vida: todos os males desta vida,

para o homem, são uma conseqüência

do pecado original, que nós herdamos

por via de geração natural. E Nosso Se-

nhor veio remediar isso, com o Seu sa-

crifício, ou seja, com a Sua morte, a qual

se realizou, como sabemos, na cruz.

Nosso Senhor Jesus Cristo morrendo na

cruz ofereceu a Deus um sacrifício de

valor infinito capaz de salvar todos os

homens. Capaz de salvar: não salvou

realmente todos os homens. Porque

nem todos os homens se salvam: só

aqueles aos quais se aplicam os frutos,

os méritos da morte de Nosso Senhor

Jesus Cristo. Essa aplicação se faz pelos

Sacramentos instituídos por Nosso Se-

nhor Jesus Cristo e pela Santa Missa. A

Santa Missa é o mesmo sacrifício que

Nosso Senhor Jesus Cristo ofereceu na

cruz, porque é a mesma Vítima, é o mes-

mo Sacrificador, só que o oferecimento

é feito de um modo diferente, mas Nos-

so Senhor na Missa Se oferece plena-

mente e de um modo tão agradável ao

Pai quanto quando Ele Se ofereceu

quando morreu na cruz. A diferença está

em que Nosso Senhor na cruz morreu

fisicamente e na Missa Ele morre misti-

camente; na cruz Ele derramou Seu

Sangue e na Missa Ele não derrama o

Seu Sangue. Mas, diante do Pai, de

Deus, é tão agradável a Missa quanto foi

TESOURO DE EXEMPLOS

Pe. Francisco alves

a morte na cruz. E é o mesmo sacrifício,

como disse, porque a Vítima é a mesma e

o Sacrificador também é o mesmo, que é

o próprio Nosso Senhor Jesus Cristo, Deus

e Homem ao mesmo tempo.

Sendo a semana, esse grupo de sete

dias, uma figura da vida do homem sobre

a terra, e sendo o domingo, no Novo Tes-

tamento, o dia especialmente consagrado

a Deus, todo homem, neste dia, deve unir-

se a Nosso Senhor, que Se imola sobre o

altar, fazendo-se uma mesma vítima junto

com Ele, e assim se oferecer a Deus. É o

dever do homem, como criatura e como

pecador. “Adeamus cum fidúcia ad thro-

num gratiae, ut misericordiam consequa-

mur, et gratiam inveniamus in auxilio op-

portuno” (Vamos com confiança ao trono

da graça para conseguirmos a misericór-

dia e [assim] encontremos a graça, para

sermos auxiliados em tempo oportuno).

Hebr. 4, 16.

(Nota da edição: Vale esclarecer que o preceito

é cumprido pela assistência à Santa Missa de

sempre rezada por um sacerdote fiel ao pensa-

mento da Igreja de sempre, que não coloque

em risco no menor ponto a ortodoxia dos fiéis.

O preceito é para honrar a Deus, portanto, a

assistência ao Novus Ordo (A missa nova), além

de não cumpri-lo, ultraja o domingo oferecendo

a Deus uma cerimônia que claramente não

está feita para sua glória. O Novus Ordo é uma

confissão equívoca e protestante.)

ELE ERA DESCENDENTE DE MACACO

A senhora Brossard, anciã rica e piedo-

sa, tinha só um parente, o senhor Aumai-

tre, grande propagandista do darwinismo.

Ao morrer aquela senhora, o senhor darwi-

nista não faltou aos funerais da parenta

rica, cuja fortuna esperava.

No dia seguinte apresentou-se em casa

do tabelião, que leu para ele o testamento

da defunta, redigido da seguinte forma:

“Deixo tudo ao Hospital. Cria ter um paren-

te, Luis Aumaitre, a quem deixar minha

fortuna. Ele me fez saber que descende do

macaco; ora eu sei que nem meus pais,

nem meus avós, nenhum outro membro

de minha família descendem de macacos;

portanto, não podemos ser parentes.”

CASTIGUE-ME

Chegou a uma vila uma professora que

não cria em Deus. E querendo corromper

as alunas, disse-lhes:

- Vamos ao ditado; escrevei! E ditou-lhes

despudoradamente:

- Não existe Deus; os que crêem nele são

uns bobos, aos quais deveriam pôr ore-

lhas de burro.

Ao recolher e corrigir os ditados viu que

uma menina escrevera: Eu creio que

existe Deus.

- Por que escreveste isto, senhorita?

Olha que te castigarei.

- Minha mãe, disse a menina, ensinou-

me que existe Deus, e acrescentou que é

preferível deixar-se matar a ofender a

Deus, nosso criador. Se a senhora quiser

castigar-me, castigue-me; Deus e minha

mãe estarão contentes comigo.

Comoveu-se a professora diante da-

quelas palavras pronunciadas por sua

alunazinha, e mais tarde converteu-se.

MÃES BOAS, FILHOS SANTOS

Vão aqui alguns exemplos mais co-

nhecidos. S. Agostinho, filho de S. Môni-

ca; S. João Crisóstomo, filho de S. Antu-

sa; S. Gregório Magno, filho de S. Silvia;

S. Basílio, S. Gregório Nisseno, S. Pedro

de Sebaste e S. Macrina, filhos de S.

Emélia; S. Bento, filho de S. Nona; S.

Bernardo, filho de S. Aletha, S. Domin-

gos de Gusmão, filho de S. Joana de

Aza; S. Catarina de Suécia, filha de S.

Brígida, etc.

AMABILIDADES ENTRE ESPOSOS

Ao falecer uma rainha da Espanha,

dizia o rei: “Com sua morte causou-me

o primeiro desgosto após vinte e dois

anos de casados”. Oxalá se pudesse

dizer o mesmo de todas as esposas...e

de todos os maridos!

Page 3: Jornal A Família Católica, 14 edição, julho 2014

O mês próximo, a quatro de agosto,

marca o centenário da eleição ao papado

do Cardeal Giuseppe Sarto, isto é, S. Pio

X, patrono de nossa Fraternidade Sacer-

dotal. Desenterrando para um companhei-

ro uma antiga correspondência de Semi-

nário acerca da verdadeira caridade de

Pio X, vejo que em agosto de 1996, embo-

ra eu tenha contado de maneira breve o

episódio de seu cotejo com o Cardeal

Ferrari de Milão, não contei todo o seu

encadeamento. O problema é medular

para nossos tempos. Em honra a S. Pio X,

permitam-me contar-lhes o acontecido

novamente, e ainda mais abreviado, tra-

çando um paralelo secular a partir dos

Estados Unidos no pós-guerra.

Em 1910, passados três anos do apare-

cimento da egrégia carta encíclica anti-

modernista Pascendi de São Pio X, dois

leais monsenhores italianos, os irmãos

Scotton1, publicaram em seu jornal anti-

modernista um artigo proclamando – não

sem razão – o Seminário da Arquidiocese

do Cardeal Ferrari, em Milão, como “um

canteiro de modernismo”, isto é, da estir-

pe daquela mãe de todas as heresias, que

preserva o catolicismo por aparências

enquanto o esvazia na substância, sob o

pretexto e finalidade de adaptar a Igreja

Católica ao mundo moderno.

O Cardeal estava irado. Como se atrevia

um suposto jornal católico minar a honra,

a integridade dos Mestres que lecionavam

no Seminário e seus superiores, incluso

ele mesmo? Quando Pio X replicou atra-

vés de seu nomeado Cardeal, Gaetano De

Lai, entre outras coisas, afirmando que

não havia o menor indício de modernismo

na arquidiocese de Milão, os liberais tira-

ram proveito da controvérsia em vista de

criar uma balbúrdia generalizada na im-

prensa. No início de março, ambos os

lados apelaram a Roma, e Cardeal Ferrari

defendeu a publicação liberal de Milão,

L’Unità, porque intuiu que ela estaria para

ser colocada em contestação.

Ao final do mesmo mês, Pio X escreveu

ele mesmo ao Cardeal, alegando que o

modernismo que provocou essa reação de

repulsa dos irmãos Scotton na arquidioce-

se de Milão se calhar talvez possa não ser

de ordem doutrinal, mas prática. Ou seja,

doutrina sã estaria sendo pregada, ape-

nas não aplicada, uma vez que vários

clérigos de Milão estavam apoiando o

jornal L’Unità, jornal este que deixava

muito a desejar de um ponto de vista ca-

tólico. Todavia, menos de três semanas

após recebido a carta, o Cardeal fervoro-

samente tomou as dores do L’Unità pe-

rante seus seminaristas de Milão, e afir-

mou que sua defesa estava conforme a

vontade do Papa! Quando Pio X soube da

ação do Cardeal, ficou escandalizado e

profundamente desolado: eis que havia um

Cardeal enganando seus futuros padres a

respeito do parecer do Papa, de modo que

estes muito em breve estariam dissemi-

nando idéias liberais ao longo de toda Ar-

quidiocese em nome do Papa! Quando por

sua vez o Cardeal soube da reação do Pa-

pa, ele respondeu se derramando em lágri-

mas, e cá citarei na íntegra a carta de

1996:

“Ele estava de coração partido por ter

ofendido o Papa. Estava arrasado. Estava

tão inconsolável até a morte. Implorou

perdão; nunca quis ter machucado o Papa.

Nunca lhe referiu nenhuma palavra indeco-

rosa, etc., etc... e quanto ao que ele disse

aos seminaristas, nunca desejou que tal

fosse registrado e publicado. Tudo que quis

fazer foi encorajar um aperfeiçoamento do

L’Unità. Não houve em verdade nenhum

escândalo na Arquidiocese. Ele estava

pronto para retificar qualquer coisa que

tivesse dito, e viria a Roma se necessário.

Quando Pio X leu sua carta, rebateu que

em verdade houve, sim, grande escândalo

na Arquidiocese de Milão pois a defesa do

L’Unità por parte do Cardeal foi claríssima,

e perfeitamente entendida. Portanto, dei-

xem o Cardeal corrigir o escândalo, trazen-

do à luz a opinião verdadeira do Santo

Padre a todos os interessados, apenas não

o permitam vir a Roma.

Esta última instrução visava apaziguar a

agitação porquanto a controvérsia silencio-

samente se dissolveria, mas os liberais a

interpretaram como uma recusa do Papa

em ouvir seus cardeais! Desta forma, quan-

do da ocasião da morte de Pio X o Cardeal

Ferrari pisou em Roma para o conclave que

elegeria o sucessor do Papa e, em resposta

às observações de um senador italiano

acerca da gigante veneração e dos senti-

mentos estampados na face das pessoas

em honra ao agora falecido Papa, replicou

rigidamente: ‘Sim, mas ele haverá de pres-

tar contas a Deus pelo modo com o qual

ele abandonava seus bispos em face de

acusações feitas contra eles’! Em verdade,

como Mons. Begnini comentou, Cardeal

Ferrari não compreendeu nada.”

Neste momento, quais são as conse-

qüências que não mencionei em 1996?

Entre Pio X e Cardeal Ferrari temos um

embate entre dois mundos: o primeiro da

realidade católica, do servente piedoso de

Deus; o outro do devaneio liberal, do Deus

que serve ao homem. Pio X preocupa-se

com as questões, o Cardeal com nada mais

que suas inclinações pessoais. Pio X preo-

cupa-se com a correta instrução doutrinária

que pode não estar havendo em Milão; que

o Cardeal deve consertar o escândalo do

conflito de pronunciamentos. Ao contrário,

o Cardeal assume o ataque dos Scotton

como uma questão pessoal que minasse

seus subordinados e os colocassem em

dissensão contra ele; quando o Papa

fica estarrecido com sua defesa do

L’Unità, fica ele permeado de sentimen-

tos pessoais desvairados (“coração

partido”, “humilhado”, “arrasado”),

exibindo sua bravata de boas inten-

ções: quando o Papa não quer vê-lo,

sente-se pessoalmente traído

(“abandonado”) por seu Superior.

Há uma famosa citação do arqui-

romântico poeta inglês, John Keats

(1795-1821): - “Não estou seguro de

nada senão da santidade dos afetos do

coração e da verdade da imagina-

ção” (correspondência a Benjamin Bai-

ley). No momento em que um jovem

poeta de uma época revolucionária

permite seus sentimentos e imaginação

domar-lhe inteiramente, isto é, de certo

modo, sua prerrogativa. Porém, quando

um eminente Príncipe da Igreja Católica

concede que questões concernentes à

doutrina sejam preteridas em sua men-

te pela convicção da santidade das

inclinações de seu próprio coração,

temos um problema! A Revolução está

dominando a Igreja, e a Fé católica

sendo enxotada dela. De fato, a disputa

Pio X-Cardeal Ferrari foi finalmente

levada a cabo em 2001 quando João

Paulo II beatificou o mesmo cardeal!

Com efeito, estava ele declarando que

as afeições pessoais do Cardeal eram

abençoadas! Um santo católico? Um

santo só no mundo de Keats!

O paralelo secular dos Estados Uni-

dos do pós-guerra reside na contenda

que tomou lugar em Washington D.C.,

no final da década de 40, entre Whitta-

ker Chambers e Alger Hiss. O livro de

Chambers, Wittness2, é um clássico da

história, cultura e literatura norte-

americana, que deveria ser estudada

em toda e cada escola dos EUA, entre-

tanto por se opor ao devaneio moderno,

está escorrendo em direção ao ralo do

esquecimento. Chambers não era cató-

lico, mas possuía real e profunda noção

das entranhas da alma do homem mo-

derno.

Nascido na Filadélfia (PA) em 1901,

criado em um mais ou menos desafor-

tunado lar médio-classista de Long

Island (NY), Chambers detinha uma

inquieta e inquisitiva mente que lhe

rendeu, na condição de estudante uni-

versitário, um tour pelos principais cen-

tros de cultura da Europa em busca da

resposta ao que ele pensava ser uma

aterradora crise da civilização ociden-

tal. Porém, a Europa pós-Segunda Guer-

ra Mundial também não tinha a respos-

ta, razão pela qual ele, nos anos 30, a

exemplo de tantos outros desesperados

O liberalismo é um assassino

Mons. Williamson

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A F a m í l i a C a t ó l i c a E d i ç ã o 1 4

jovens, ingressou nas fileiras do Partido

Comunista. Dentro do núcleo ao qual

ele serviu irrestritamente por vários

anos, conheceu e fez amizade com um

igualmente brilhante e promissor buro-

crata de Washington, cujo nome era

Alger Hiss. Ambos trabalharam juntos

até que o grande Expurgo de Stalin em

1937 e 1938 abrisse os olhos de

Chambers e o fizesse abandonar o

Partido e toda a ideologia comunista.

Permaneceu em total obscuridade até

que os comunistas não mais se arris-

cassem a matá-lo, e por conseguinte

ressurgiu à “superfície” timidamente,

no final dos anos de 1940, como jorna-

lista no Time de Nova York. Enquanto

isso, Alger Hiss prosseguiu na ambição

de trilhar uma prodigiosa carreira no

pós-querra em Washington, chegando

a participar, por exemplo, nos altos

escalões da delegação americana da

Conferência de Yalta e na constituição

da ONU.

Chambers e Hiss se encontraram de

novo em agosto de 1948, na ocasião

em que Chambers saiu de seu anoni-

mato rumo à cintilante publicidade em

Washington a fim de dar testemunho

de que Hiss, estando no Departamento

de Estado Americano, teve papel ímpar

na transmissão de dados confidenciais

do governo aos russos. Hiss negou até

mesmo que tenha visto Chambers algu-

ma vez na vida! Mas ele foi, enfim,

sentenciado por crime de perjúria em

Janeiro de 1950 a cinco anos de cárce-

re privado. Ele morreu há apenas al-

guns anos atrás, ainda a declarar sua

inocência, não restando dúvidas a ele

da santidade das afeições de seu cora-

ção! Chambers morreu em estado de-

plorável em 1961, crente que sua causa

estava fadada ao perecimento.

O cotejo entre Chambers e Hiss foi

novamente um cotejo entre dois mun-

dos, entre dois EUA. Assim como Pio X

representou a boa e velha Igreja de sem-

pre enquanto Cardeal Ferrari a iminente

Igreja do Vaticano II, assim o pequeno e

entroncado Chambers representou toda

a pequena população decente dos Esta-

dos Unidos enquanto Hiss, querido do

establishment de Washington e Nova

York, a marcha liberal-comunista rumo à

Nova Ordem Mundial. Quando Chambers

desertou do comunismo, sem a Fé católi-

ca, ele claramente percebe que estava

em direção ao lado derrotado. Sua deci-

são agonizante em testificar contra Hiss

foi um nobre, todavia desesperado gesto

feito na esperança de obter à civilização

não mais que um pequeno prolongamen-

to. Nisto, Chambers logrou êxito se pen-

sarmos no anti-comunismo norte-

americano dos anos 50, no entanto,

obviamente, anti-comunismo sem Fé

católica não usufrui de muito tempo de

vida, então a marcha liberal-comunista

da década de 60 em direção ao Admirá-

vel Novo Mundo3 estava mais irreversível

que nunca.

Abundam visões internas no “Witness”

de Chambers, mas aqui estão duas que

poderiam surgir diretamente das encícli-

cas papais pré-Vaticano II: Comunismo é

um problema religioso, e todos os libe-

rais são comunistas virtuais. Esta é a

razão pela qual, independente da verda-

de ou fatos deste caso, o liberal esta-

blishment Washington-Nova York apela-

ram para um homem à sombra de Hiss,

porque eles sabiam que, caso ele fosse

condenado, também eles mesmos o se-

riam e assim pois sua religião substituta do

liberalismo. Eis o porquê de, até os dias

atuais, persistirão em reafirmar a inocência

de Hiss justamente como João Paulo II

inocentou Cardeal Ferrari.

Caros leitores, o mundo inteiro pode agir

como Alger Hiss, e praticamente todos os

clérigos podem seguir a linha do Cardeal

Ferrari, mas Deus permanece sendo Deus,

e Ele não é nem enganado e nem feito de

bobo. Podemos aparentar estarmos soter-

rados debaixo da avalanche quimérica de

Alger Hiss e do Vaticano II, não obstante,

isto conhecerá um fim, enquanto que Deus

NÃO terá um fim. Paciência. Oração. A Tra-

dição está novamente causando furor em

muitos seios católicos.

Oremos para que o precioso Sangue de

Jesus desça em Julho como um lavabo de

regeneração sobre mais e mais almas.

Atenciosamente, em Cristo,

Richard Williamson

3 de Julho de 2003

1- Os Scotton eram um grupo de três irmãos padres da

diocese de Vicenza que faziam parte do movimento

político e, até certo ponto, laical, cunhado de ultra-

integralismo, o qual intransigentemente se opunha ao

movimento modernista intra e extra eclesiástico, não se

furtando a delatar clérigos e leigos de determinada

influência político-social minimamente suspeitos de

tomar parte da heresia modernista. Para tanto, possuí-

am o aval do próprio Papa Pio X, além de publicações

como a La Riscossa (de posse dos Scotton) e L’Unità

Cattolica, jornal florentino, serem abertamente incenti-

vadas pelo Sumo Pontífice. Com o falecimento deste e

conseqüente subida ao papado pelo então Cardeal

Della Chiesa, as infusões anti-modernistas dos ultra-

integralistas foram suprimidas e dissolvidas completa-

mente. (N. do T.)

2- “Testemunha”, não publicada no Brasil (N. do T.)

3- Alusão à homônima distopia de Aldous Huxley de

1931, Brave New World, profética projeção do futuro

sombrio da humanidade liberal, materialista, niilista,

laica e anti-Deus.

Fonte: williamsonletters.blogspot.com.br

Edição:

Capela Nossa Senhora das Alegrias - Vitória, ES.

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Agradecemos a todos os participantes do sorteio de livros que

lançamos na última edição da “Família Católica” e informamos que os

ganhadores foram o Sr. Marcos Salomão de Paiva Dutra e a Sra. Patrícia

Medeiros Coelho, ambos da Missão Cristo Rei, em Ipatinga. Parabéns aos

ganhadores!

“Ler é alimentar-se. Quem lê livros imorais assimila os pensamentos do autor e

estraga, sem perceber, o entendimento, a imaginação, o coração, a vontade, a

vida toda. (...) Um bom livro converte e leva ao cume da santidade a um Agostinho

de Tagaste, a um Inácio de Loyola.” Sê pura, L. Bianchini