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1 Educação, Gestão e Sociedade: revista da Faculdade Eça de Queirós, ISSN 2179-9636, Ano 5, número 17, fevereiro de 2015. www.faceq.edu.br/regs LEITURAS DO TEXTO LITERÁRIO EM CONTEXTO ESCOLAR Cláudia Maria Gazzola (FACEQ/UNIESP) * Cláudio Bazzoni (USP) ** Resumo O objetivo deste artigo é investigar o tratamento didático dado ao texto literário no contexto escolar e refletir sobre alternativas de trabalho para o Ensino Fundamental I e II, com textos da esfera literária. Partindo de uma abordagem sobre texto literário que considera a interação texto-leitor, nas reflexões de Vincent Jouve, de Umberto Eco, de Marisa Lajolo, de Magda Soares e de Rildo Cosson, o artigo mostra a necessidade de mudança no tratamento didático dado aos textos da esfera literária na inevitável escolarização da literatura. Palavraschave: Leitura. Literatura infantil. Literatura juvenil. Estratégias de leitura. Texto literário. Abstract The objective of this paper is to investigate the didactic treatment of the literary text in the school context and reflect on alternative working arrangements for Elementary Education I and II, with the literary sphere texts. Starting from a discussion of literary text that considers the interaction text-reader, the reflections of Vincent Jouve, Umberto Eco, Marisa Lajolo, Magda Soares and Rildo Cosson, the article shows the need for change in the educational treatment of texts the literary sphere in the inevitable schooling literature . Keywords: Reading. Children's literature. Juvenile literature. Reading strategies. Literary text. * Especialista em Docência em Língua Portuguesa pelo Instituto Superior de Educação Vera Cruz. Graduada em Letras e Pedagogia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Nossa Senhora do Patrocínio. ** Doutor em Letras (Língua Espanhola e Literatura Espanhola e Hispano-Americana) pela Universidade de São Paulo. Atualmente, é professor de Língua Portuguesa e Coordenador do Ensino Médio do Curso Supletivo do Colégio Santa Cruz. É consultor de Língua Portuguesa, formador de professores da Rede Municipal de Ensino de São Paulo e autor de livros didáticos.

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LEITURAS DO TEXTO LITERÁRIO EM CONTEXTO

ESCOLAR

Cláudia Maria Gazzola (FACEQ/UNIESP)*

Cláudio Bazzoni (USP)**

Resumo

O objetivo deste artigo é investigar o tratamento didático dado ao texto literário no

contexto escolar e refletir sobre alternativas de trabalho para o Ensino Fundamental I e

II, com textos da esfera literária. Partindo de uma abordagem sobre texto literário que

considera a interação texto-leitor, nas reflexões de Vincent Jouve, de Umberto Eco, de

Marisa Lajolo, de Magda Soares e de Rildo Cosson, o artigo mostra a necessidade de

mudança no tratamento didático dado aos textos da esfera literária na inevitável

escolarização da literatura.

Palavras–chave: Leitura. Literatura infantil. Literatura juvenil. Estratégias de leitura.

Texto literário.

Abstract

The objective of this paper is to investigate the didactic treatment of the literary text in

the school context and reflect on alternative working arrangements for Elementary

Education I and II, with the literary sphere texts. Starting from a discussion of literary

text that considers the interaction text-reader, the reflections of Vincent Jouve, Umberto

Eco, Marisa Lajolo, Magda Soares and Rildo Cosson, the article shows the need for

change in the educational treatment of texts the literary sphere in the inevitable

schooling literature .

Keywords: Reading. Children's literature. Juvenile literature. Reading strategies.

Literary text.

* Especialista em Docência em Língua Portuguesa pelo Instituto Superior de Educação Vera Cruz.

Graduada em Letras e Pedagogia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Nossa Senhora do

Patrocínio. ** Doutor em Letras (Língua Espanhola e Literatura Espanhola e Hispano-Americana) pela Universidade

de São Paulo. Atualmente, é professor de Língua Portuguesa e Coordenador do Ensino Médio do Curso

Supletivo do Colégio Santa Cruz. É consultor de Língua Portuguesa, formador de professores da Rede

Municipal de Ensino de São Paulo e autor de livros didáticos.

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1 Abordagens de leitura

Este artigo tem como objetivo refletir sobre o tratamento didático dado ao texto

literário em contexto escolar. Para desenvolver a investigação, analisaremos os dados

coletados em uma pesquisa desenvolvida junto a professores da Escola Estadual Profª

Esmeralda Becker Freire de Carvalho (Carapicuíba – SP) e apresentaremos abordagens

de leitura que visam tornar mais significativo, para o aluno, o ato de ler gêneros textuais

da esfera literária.

Vincent Jouve (2002, p. 137–138) afirma que “se a leitura literária tem uma

especificidade, é [...] por meio de seus efeitos que se deve tentar apreendê-la”. Jouve

cita Michel Picard (apud JOUVE, 2002, p. 137), que atribui três funções essenciais à

leitura dos textos literários: a “subversão na conformidade”, pois o texto literário “ao

mesmo tempo contesta e supõe uma cultura”; a “eleição do sentido na polissemia”: o

texto literário remete sempre a uma pluralidade de significações; e a “modelização por

uma experiência de realidade fictícia”: modelizar é “propor ao leitor experimentar no

modo imaginário uma cena que ele poderia viver na realidade.” E conclui “[...] a leitura

literária é, desses três modos, uma prática frutuosa da qual o sujeito sai transformado”.

Jouve (2002, p. 66) escreve também sobre “os espaços de certeza” e os

“espaços de incerteza” que se alternam no decorrer da leitura, quando na interação

texto-leitor. Enquanto os “espaços de certeza” são “pontos de ancoragem” da leitura,

passagens explícitas de um texto, os “espaços de incerteza” remetem-se às passagens

obscuras ou ambíguas que solicitam a participação do leitor para serem decifradas.

Umberto Eco (1979, p. 37) também reflete sobre a interação texto-leitor e

mostra que o texto está “entremeado de espaços brancos, de interstícios a serem

preenchidos”, espaços deixados propositadamente por quem os emitiu, porque um texto

“vive da valorização de sentido que o destinatário ali introduziu [...]. Todo texto quer

alguém que o ajude a funcionar”. A cooperação do leitor está na atualização do

conteúdo do texto, preenchendo–lhe os espaços brancos.

Preencher os espaços brancos, ou os espaços de incerteza, faz parte do

processo de interpretação e de construção de sentido na leitura de um texto. Para

compreendermos os mecanismos desse processo, encontramos fundamentos nos textos

de Angela Kleiman (2004, p. 17) que, escrevendo sobre o conhecimento prévio na

leitura, afirma que “[...] é mediante a interação de diversos níveis de conhecimento,

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como o conhecimento linguístico, o textual, o conhecimento de mundo, que o leitor

consegue construir o sentido do texto”.

Sabendo da importância da interação dos diversos níveis de conhecimento para

uma leitura significativa, da interação texto-leitor para atribuição de sentido ao texto e

de uma abordagem voltada para as especificidades do texto literário, é fácil perceber

que, nos materiais didáticos usados por grande parte dos professores, geralmente, a

leitura dos textos literários fica resumida a um conjunto de perguntas/respostas que têm

como objetivo a identificação de informações pontuais, sem a preocupação com a

reflexão crítica sobre o texto, ou seja, com o estabelecimento de relações, com o uso de

conhecimentos prévios – do mundo linguístico e textual –, conhecimentos fundamentais

para a construção de sentido.

Uma análise aprofundada das características dos materiais didáticos aparece no

ensaio Exercícios de Compreensão ou Copiação nos Manuais de Ensino de Língua de

Marcuschi (1996). Nesse ensaio, o autor apresenta um levantamento das atividades

desenvolvidas nos manuais de ensino de Língua Portuguesa (de 1ª a 7ª série) como

exercícios de compreensão, interpretação e entendimento de texto, para verificar se elas

são de fato exercícios de compreensão. Esse levantamento mostra que num total de

1463 perguntas encontradas em sete manuais em uso nas escolas (particulares e

públicas), 60% eram de cópia de alguma parte do texto, 30% eram de caráter pessoal e

apenas 5% exigiam relação com alguma informação textual; poucas perguntas

propunham uma reflexão crítica.

Conforme Marcuschi (1996), mais da metade dos exercícios de compreensão

dos manuais escolares pode ser dividida em: perguntas respondíveis sem a leitura do

texto; perguntas não respondíveis, mesmo lendo o texto; perguntas para as quais

qualquer resposta serve; perguntas que só exigem cópia do texto. Essas constatações

evidenciam que a concepção de leitura desenvolvida na escola está muito distante de

uma concepção interacionista. Os sentidos estão apenas no texto e a leitura é entendida

como mera decodificação, em que o domínio do código é praticamente a única

habilidade básica necessária.

As atividades de leitura na escola, sendo encaminhadas dessa forma, servem

apenas para que o professor confirme se o aluno decodifica o texto e não se ele o

compreende, o interpreta e dialoga com ele. Atividades de cópia não favorecem a

interação texto-leitor, pois não consideram que o texto necessita do leitor para atribuir-

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lhe sentidos – sentidos que se estabelecem por meio de mecanismos de interpretação

que o leitor usa e que devem ser desenvolvidos na escola.

Considerando que o texto literário é plurissignificativo, ou seja, guarda uma

multiplicidade de sentidos, não deveria receber uma abordagem que não considerasse

essa especificidade. A subjetividade da linguagem literária deixa de ser explorada

quando os “exercícios de compreensão” apontados por Marcuschi (1996, p. 64)

multiplicam-se e universalizam-se no espaço escolar. Atividades que apenas recuperam

informações num texto desconsideram o prazer que envolve a leitura e a possibilidade

de vivenciar a pluralidade de sentidos presentes na ficção. Ignoram também a

contribuição que a literatura pode oferecer ao ser humano no seu exercício de

compreender o mundo e a si mesmo. Rildo Cosson, em seu livro Letramento literário

(2009, p.17) afirma:

A experiência literária não só nos permite saber da vida por meio da

experiência. Ou seja, a ficção feita palavra na narrativa e a palavra feita

matéria na poesia são processos formativos tanto da linguagem quanto do

leitor e do escritor. Uma e outra permitem que se diga o que não sabemos

expressar e nos falam de maneira mais precisa o que queremos dizer ao

mundo, assim como nos dizer a nós mesmos. É por possuir essa função maior

de tornar o mundo compreensível transformando sua materialidade em

palavras de cores, odores, sabores e formas intensamente humanas que a

literatura tem e precisa manter um lugar especial nas escolas.

Muitas vezes, o espaço escolar é, para um grande número de crianças,

principalmente aquelas que estudam em escola pública, a única referência com intenção

formadora. As leituras (de livros e de mundo), oferecidas pela escola, serão as

experiências que poderão ajuda-las a inserir-se na sociedade.

Lajolo (1993, p. 59) escreve sobre a inclusão de sugestões de atividades (fichas

de leitura, encartes, suplementos e similares) em livros destinados ao público infantil. A

autora afirma que os professores “delegam a terceiros o planejamento das atividades

que desenvolverão com seus alunos” e analisa que a origem desse problema pode estar

no “despreparo do magistério, achatamento salarial, a precariedade das condições de

trabalho” e conclui que “a leitura proporcionada pela escola de hoje parece sofrer de

uniformização”, as atividades dos encartes que acompanham os livros apresentam uma

única forma de abordagem que nem sempre estão congruentes aos objetivos de leitura

que o professor elege.

Lajolo (1993) reflete também sobre o perfil do professor enquanto leitor. É

consenso que um professor precisa ler muito, que deve gostar de ler e ser um bom leitor,

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porém, baseando–se nos resultados de uma pesquisa da época (feita entre professores do

ensino fundamental I e bibliotecários), a autora descobre que o repertório de leitura do

professor é “desolador”, constituído, a maior parte das vezes, por “best-sellers antigos

como Fernão Capelo Gaivota ou pelo que se poderia chamar de clássicos escolares: A

Moreninha, Escrava Isaura [...]” E frisa a gravidade da situação, lembrando que “a

formação de um leitor exige familiaridade com grande número de textos” (LAJOLO,

1993, p. 18).

As reflexões da autora continuam ainda hoje válidas e dialogam com o artigo

“A leitura incerta: a relação de professores (as) de Português com a leitura” de Antonio

Augusto Gomes Batista (1995), no qual o autor analisa as práticas de leitura de

professores que atuam na rede pública. Batista (op. cit.) aponta que a maioria desses

professores constitui a primeira geração de seu grupo familiar a ser submetida a uma

escolarização de longa duração, cujos membros dificilmente passaram da escolaridade

elementar (ensino fundamental) e que no seu processo de formação, os professores são

“leitores escolares e tenderiam a investir, mesmo nas leituras não voltadas para a prática

docente, nas competências e nas disposições escolares, adquiridas escolarmente”

(BATISTA, 1995, p. 46). Sendo assim, segundo Batista, quanto maior a distância entre

as disposições transmitidas pela escola e os conhecimentos pressupostos por um texto

ou uma modalidade de leitura, maior será a possibilidade de esses professores

desenvolverem com dificuldade e insegurança a leitura de textos e impressos, e serem

vistos como “leitores precários”.

Se a maioria dos professores tem um repertório escolar, como então deixar de

reproduzir a “uniformização” dos manuais escolares? As abordagens fundamentadas na

proposta do Letramento Literário de Rildo Cosson (2009) podem inspirar um trabalho

de leitura que rompa com a uniformização citada. Conforme Cosson

Ser leitor de literatura na escola é mais do que fruir um livro de ficção ou se

deliciar com as palavras exatas da poesia. É também posicionar-se diante da

obra literária, identificando e questionando protocolos de leitura, afirmando

ou retificando valores culturais, elaborando e expandindo sentidos. Esse

aprendizado crítico da leitura literária, que não se faz sem o encontro pessoal

com o texto enquanto princípio de toda a experiência estética é o que temos

denominado aqui de letramento literário. (COSSON, 2009, p. 120)

A escola precisa rever as concepções de leitura que geralmente permeiam sua

prática e aventurar-se na aplicação de outras teorias, que no estudo da compreensão,

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atribuem importância tanto para o texto, quanto para o leitor e consideram a leitura

como resultado de uma interação entre eles.

No capítulo “A literatura e o mundo”, Cosson escreve que “na leitura e na

escritura do texto literário encontramos o senso de nós mesmos e da comunidade a que

pertencemos” (2009, p. 17), e completa: “a literatura nos incentiva a desejar e a

expressar o mundo por nós mesmos”, porque por meio dela podemos saber da vida

pelas experiências do outro e vivenciá-las. “No exercício da literatura, podemos ser

outros, [...] viver como os outros, podemos romper os limites do tempo e do espaço de

nossa experiência e, ainda assim, sermos nós mesmos” (COSSON, op. cit., p. 17).

No capítulo “O processo de leitura”, o autor (COSSON, op. cit.) lembra que

as teorias sobre leitura podem ser reunidas em três grandes grupos1: o primeiro grupo

está centrado no texto e a leitura é entendida como um processo de decodificação; o

segundo grupo toma o leitor como centro da leitura que elabora e testa hipóteses

(antecipações) sobre o que está no texto; o terceiro grupo, das chamadas teorias

conciliatórias, considera o leitor tão importante quanto o texto, sendo a leitura o

resultado de uma interação. Esses três modos de compreender a leitura devem ser

pensados como “um processo linear”, ou seja, três etapas que orientarão o trabalho de

letramento literário, colocadas em prática nas sequências sugeridas pelo autor

(sequência básica e sequência expandida): antecipação ou as operações que o leitor faz

antes de penetrar no texto propriamente dito; decifração ou a entrada no texto através

das letras e das palavras e interpretação2 ou as relações estabelecidas pelo leitor quando

processa o texto, e o centro desse processamento são as inferências.

Marcuschi (1996) também coloca como aspectos importantes, numa teoria da

compreensão, a “noção de língua”, a “noção de texto” e a “noção de inferência”,

evidenciando, assim como Kleiman (2004), que compreender um texto é muito mais

que extrair informações, é uma atividade de produção de sentidos, “não é simplesmente

reagir aos textos, mas agir sobre os textos” (MARCUSCHI, 1996, p.74). Essa ação se

dá através dos mecanismos de interpretação que, como já dissemos, devem ser

ensinados pela escola.

1 O autor baseia-se na síntese feita por Vilson J. Leffa, em Perspectivas no estudo da leitura: texto e

interação social (1999). 2 “A interpretação depende do que escreveu o autor, do que leu o leitor e das convenções que regulam a

leitura em uma determinada sociedade” (COSSON, 2009, p. 41). É nessa etapa que o autor enfatiza a

distinção entre o letramento literário, compreendido como prática social, feito na escola e a leitura

literária que se faz, independentemente dela.

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Rildo Cosson (2009, p. 23) propõe o letramento literário “como prática social

e, como tal, responsabilidade da escola”, ou seja, a escola deve incentivar o aluno a

posicionar-se diante da obra, refletindo sobre os valores culturais apresentados,

questionando e ampliando seus sentidos. Por outro lado, Magda B. Soares (1999, p. 43)

afirma que os exercícios que são propostos aos alunos sobre os textos literários não

abordam o que é essencial neles: “a percepção de sua literariedade, dos recursos de

expressão, do uso estético da linguagem”, pois, centram–se nas informações e não no

“modo literário” como os textos as apresentam. Sobre o termo “escolarização” da

literatura, explica:

Não há como evitar que a literatura, qualquer literatura, [...] ao se tornar

‘saber escolar’, se escolarize, e não se pode atribuir, em tese [...] conotação pejorativa a essa escolarização, inevitável e necessária; não se pode criticá-la,

ou negá-la, porque isso significaria negar a própria escola [...]. O que se pode

criticar, o que se deve negar não é a escolarização da literatura, mas a

inadequada, a errônea, a imprópria escolarização da literatura, que se traduz

em sua deturpação, falsificação, distorção, como resultado de uma

pedagogização ou uma didatização mal compreendida que, ao transformar o

literário em escolar, desfigura-o, desvirtua-o, falseia-o. (SOARES, 1999, p.

21/22)

Assim, a questão é fazer a escolarização da literatura sem descaracterizar o

texto literário, sem perder de vista a multiplicidade de sentidos que a linguagem

subjetiva do texto literário oferece, confirmando seu poder de humanização.

2 Caminhos didáticos

Para refletir sobre o tratamento dado ao texto literário, no contexto de sala de

aula, propusemos um exercício (que abaixo será descrito) aos professores da escola

estadual Profª Esmeralda Becker Freire de Carvalho (Carapicuíba, São Paulo). Nosso

objetivo era identificar concepções e estratégias de leitura que professores do ensino

fundamental I (polivalentes) e II (área de Língua Portuguesa) dessa escola lançariam

mão, no encaminhamento de um trabalho de leitura de um texto literário, o conto Até

Passarinho Passa, de Bartolomeu Campos de Queirós (2003).

Foi proposto aos professores escolher cinco dentre 20 atividades de leitura que

julgassem essenciais na abordagem do conto. As atividades foram preparadas pelos

autores deste artigo e a escolha do conto de Bartolomeu Campos de Queirós (op. cit.)

foi motivada pela importância que esse autor tem para a literatura brasileira e pela

riqueza da matéria literária de seu texto. As vinte atividades propostas aos professores

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consideravam três categorias: atividades para antes da leitura, atividades para durante a

leitura e atividades para depois da leitura, mas foram apresentadas sem seguir essa

ordem (antes, durante, depois).

Vale esclarecer que essas categorias são sugeridas por Isabel Solé, no livro

Estratégias de Leitura (1998). As estratégias aplicadas antes da leitura permitem a

atualização dos conhecimentos prévios relevantes; as aplicadas durante a leitura

permitem estabelecer inferências, rever e comprovar a própria compreensão; as

estratégias aplicadas depois da leitura permitem recapitular o conteúdo, resumi–lo e

ampliar o conhecimento obtido com a leitura.

Além de os professores escolherem as cinco atividades, teriam de justificar as

escolhas. Dessa forma, obteríamos pistas sobre as concepções de leitura e sobre o que

valorizam na prática da leitura de textos literários. Dos nove professores convidados,

sete aceitaram participar, escolhendo as atividades e justificando as escolhas. Contudo,

para esta investigação, foram consideradas as respostas de seis professores, pois um

deles conhecia o encarte que acompanha o livro, com encaminhamentos de leitura,

preparado pela Editora Moderna, o que poderia influenciar as escolhas. Depois das

atividades, foi reservado um espaço para que pudessem registrar outras que

considerassem importantes. Nosso intuito era oferecer uma possibilidade para que os

professores pudessem propor atividades de autoria.

2.1 As atividades propostas

O conjunto de vinte atividades, apresentado ao grupo de professores

participantes da pesquisa, exibe um grau variado de complexidade e profundidade. As

atividades para antes da leitura (atividades 1, 2, 3, 5, 6, 20) apresentam intenções e

graus de complexidade diferentes. Na atividade nº 1 – Complete: Título do livro/ Autor/

ilustração/ editora –, basta que os alunos copiem as informações da capa do livro, sem

necessidade de que façam uso dos conhecimentos prévios. É uma atividade de

localização de informações explícitas e não necessariamente se relaciona com o

interesse do leitor pela leitura.

Na atividade nº 2 – Antes de ler o texto, ler o resumo da quarta capa e discutir

com os alunos se é possível antecipar o assunto do texto –, o professor precisa fazer a

mediação. Discutir o texto da quarta capa com os alunos pode ser boa estratégia para

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ajuda-los a estabelecer inferências e prepara-los para a leitura do conto. Na edição do

livro de Bartolomeu Campos de Queirós (2003), o texto da quarta capa apresenta ideias

sobre a passagem do tempo, que aproxima e possibilita a amizade, mas que também é

responsável pelo distanciamento nas relações.

A atividade nº 3 – Antes da leitura do conto, ler um poema que fale sobre a

passagem do tempo, a morte, a perda... Discutir esses temas com a turma – também

exige maior preparação do professor. Ele precisa escolher os poemas, lê-los e discuti-los

com os alunos, preparando-os para aproximarem-se das temáticas com que irão se

deparar na leitura. É uma preparação para a compreensão do tema.

A atividade nº 5 – “Até passarinho passa”. Quais são suas hipóteses sobre a

compreensão desse título? – é uma proposta de sensibilização. O título é uma espécie de

etiqueta da obra, dá indícios do que será tratado nela, instiga o leitor, individualiza a

obra. Requer a construção de sentidos e usos dos conhecimentos prévios para

elaboração de hipóteses interpretativas.

A atividade nº 6 – O autor escreveu, antes de começar o conto, o seguinte

texto: “Não conheço, além do imenso tempo, nada que tenha existido para sempre. Até

o silêncio passa.” Ler este trecho ajuda ou modifica suas hipóteses sobre o título? –

requer que o aluno estabeleça relações entre as informações do texto de abertura e o

título do conto. Assim como o título, a epígrafe revela pensamentos que podem ser

considerados “um lema” da obra. A atividade é complexa, pois exige que se recupere o

que o aluno pensou sobre a obra, para que possa estabelecer relações entre ideias

próprias e as do autor.

A atividade nº 20 – Você já refletiu sobre a passagem do tempo, a brevidade

da vida? O que pensa sobre isso? – é um tipo de atividade que solicita resposta pessoal,

independente da leitura do texto (preparação para o tema). Ela, por si só, não garante

que haja interação entre leitor e texto, pois propõe apenas que o leitor escreva sobre

suas próprias experiências do tema que será abordado.

As atividades realizadas durante a leitura (números 7, 8, 11, 12, 13, 17 e 18)

são atividades em que quase sempre é indispensável o trabalho de mediação do

professor. A atividade nº 7 – Todas as lembranças do menino se passam num espaço,

qual? Para o menino, o que acontece de mais interessante nesse lugar? – é uma

atividade de localização de informações que estão explícitas no texto. A atividade exige

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apenas a transcrição do texto. Para o professor, a atividade funciona mais para conferir

se o aluno leu ou não o texto.

A atividade nº 8 – Na amizade entre o menino e o passarinho existem atitudes

entre eles que fazem com que se entendam sem palavras. Como isso acontece? –

promove a interação entre texto e leitor, pois exige o reconhecimento das pistas dadas

pelo autor para mostrar o entendimento entre o menino e o pássaro. A questão exige

uma leitura atenta para as expressões que indicam o entendimento entre eles,

promovendo o estabelecimento de inferências.

A atividade nº 11 – O narrador relata situações de sua infância. Isso torna o

texto mais comovente? Por quê? – é um tipo de atividade que solicita resposta pessoal,

porém exige que o leitor interaja com o texto para poder justificar sua opinião. O

professor pode, a partir dessa atividade, discutir com a turma a subjetividade do texto. A

questão permite ao aluno rever a própria compreensão durante a discussão das opiniões.

A atividade nº 12 – “Passei o resto do dia assentado no alpendre frio e limpo,

sem olhos para mais nada. Meu coração estava cheio de vazio.” O que você entendeu

lendo essa expressão? – aborda a pluralidade de sentidos, uma especificidade do texto

literário. Ela exige que o aluno faça uso de seus conhecimentos prévios para explicar

seu entendimento da expressão “cheio de vazio”. Discutir com a turma a variedade de

interpretações para essa expressão é uma boa estratégia para ressaltar a riqueza da

linguagem literária.

A atividade nº 13 – “Meu coração estava cheio de vazio.” Encontre no texto

outras expressões subjetivas como a que foi destacada – também ressalta a

subjetividade da linguagem do texto literário. Mas o aluno tem que rastrear no próprio

texto outras expressões subjetivas como a do exemplo o que, de certa forma, pode

limitar o exercício de compreensão dessa subjetividade. Aqui também a mediação do

professor é importante, pois socializar as respostas é uma estratégia para ampliar o

exercício de compreensão.

A atividade nº 17 – “Quando o dia suspeitava escurecer, inaugurando a

tarde...” O autor poderia ter escrito: “ao entardecer”, mas escolheu uma forma

poética para dizer isto. Essa escolha muda alguma coisa para o leitor? – tem o foco na

matéria literária e promove a interação texto-leitor porque exige que o leitor assuma a

sua contribuição para o funcionamento do texto. A questão faz o leitor perceber a

intencionalidade do autor na escolha das expressões que usa para construir seu texto.

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A atividade nº 18 – Releia os três parágrafos iniciais e retire trechos em que o

autor escreve de forma sutil sobre o tema do conto (a passagem do tempo, a morte)

preparando o leitor para o desenvolvimento do tema – exige que o leitor reconheça as

pistas que o autor coloca no início do texto, antecipando o tema que será desenvolvido

no decorrer do conto. Permite estabelecer inferências. É interessante que o professor

solicite ao aluno que ele recupere essas pistas para confirmá-las durante a leitura do

conto.

As atividades de depois da leitura (números 4, 9, 10, 14, 15, 16 e 19) são

atividades que permitem recapitular o conteúdo, resumi-lo e ampliar os conhecimentos

adquiridos com a leitura. A mediação do professor torna-se menos necessária nesse

momento. A atividade nº 4 – Propor a leitura individual do conto e preparar uma

“roda” para colher as impressões sobre a obra – permite recapitular o conteúdo da

leitura. É importante conhecer as sensações que o texto literário provoca nos alunos.

A atividade nº 9 – Você já teve uma amizade como esta do conto?– requer uma

resposta pessoal, mas exige que o leitor exercite a compreensão do texto lido, pois é

necessário compreender que tipo de amizade existia entre o menino e o pássaro para

compará–la com suas próprias experiências de amizade.

A atividade nº 10 – O menino perdeu o amigo passarinho, você já perdeu algo

ou alguém muito especial? Escreva sobre isto – é um tipo de atividade que solicita uma

resposta pessoal e independente da leitura do texto. Ela não garante que haja interação

entre leitor e texto, pois apenas exige que o leitor escreva sobre suas próprias

experiências sobre o tema do conto.

A atividade nº 14 – Escreva o que você percebeu sobre “o jeito de escrever”

desse autor. O que chamou mais sua atenção? Esse “jeito” facilitou ou dificultou sua

leitura? – tem o foco na matéria literária e na linguagem subjetiva, exige que o aluno

identifique no estilo de escrita do autor sua escolha pela linguagem poética e reflita

sobre a intenção do autor na interação com o leitor.

Desde que seja discutida com a turma, a atividade nº 15 – Dê outro título a

esse conto – é uma atividade de compreensão, pois o título deve dar dicas ao leitor sobre

o assunto do texto. Dar um novo título ao texto exige compreensão do conteúdo do

texto. A atividade nº 16 – Até passarinho passa é um conto autobiográfico. Depois da

leitura do conto fazer leitura de outros textos autobiográficos – exige maior mediação

do professor, pois será necessário pesquisar e escolher outros textos autobiográficos, lê–

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los, analisando os estilos de escrita de seus autores e encaminhar as observações dos

alunos sobre esses estilos, para ampliar os conhecimentos adquiridos com a leitura do

conto.

A atividade nº 19 – Como tudo, a primeira noite sem a presença do amigo

também passou, o dia amanheceu... Como você imagina que foi esse primeiro dia

depois da perda do amigo? Imagine que o conto não terminou e você escreverá a

continuidade, contando como foi esse dia – exige que o aluno tenha compreendido o

tema, tenha percebido as características mais relevantes do estilo de escrita do autor

para dar continuidade ao capítulo final do conto, adequando a forma e o conteúdo nessa

continuidade, tornando-se “parceiro” de escrita do autor.

2.2 Resultados da pesquisa

2.2.1 Atividades escolhidas pelos professores (Fundamental I e II)

De modo geral, as escolhas contemplaram as três categorias (antes, durante e

depois da leitura). Somente um professor de ensino fundamental II não escolheu

atividades para antes da leitura.

Atividades escolhidas

Antes da leitura

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Durante a leitura

Depois da leitura

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Escolhas de cada professor (quantidade por categoria):

Número de

atividades para

antes da leitura

Número de

atividades para

durante a leitura

Número de

atividades para

depois da leitura

Professor 1 2 2 1

Professor 2 1 1 3

Professor 3 _ 1 4

Professor 4 1 2 2

Professor 5 2 1 2

Professor 6 1 2 2

O quadro mostra claramente que há uma tendência na escolha das questões da

categoria depois da leitura. Essa é a forma mais comum para o trabalho de leitura

presente nos manuais de ensino de Língua Portuguesa, na escola. As atividades mais

escolhidas pelos professores foram as de número 10 (O menino perdeu o amigo

passarinho, você já perdeu algo ou alguém muito especial? Escreva sobre isto.) e 13

(“Meu coração estava cheio de vazio”. Encontre no texto outras expressões subjetivas

como a que foi destacada).

A atividade 10 independe da leitura do texto para ser respondida. Além de

prescindir da leitura, também não contempla os objetivos das estratégias para depois da

leitura: recapitulação, resumo e ampliação do conteúdo. A atividade 13 é uma atividade

para durante a leitura e trabalha com a linguagem subjetiva, mas podemos dizer que não

provoca o diálogo com o texto, pois faz o aluno apenas rastrear expressões similares

presentes no conto.

Os três professores de ensino fundamental I escolheram uma ou duas

atividades para antes da leitura, estratégias que permitem a atualização dos

conhecimentos prévios relevantes. Já dos três professores de ensino fundamental II, um

deles não escolheu nenhuma atividade para antes da leitura e os outros dois escolheram,

para esse momento, uma atividade (nº 1), que requer apenas a cópia das informações da

capa e não trabalha com a ativação do conhecimento prévio.

Sobre a importância da ativação do conhecimento prévio, Kleiman (2004, p.13)

afirma: “É mediante a interação de diversos níveis de conhecimento, como o

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conhecimento linguístico, o textual, o conhecimento de mundo, que o leitor consegue

construir o sentido do texto.” Portanto, sem o uso das estratégias que atualizam esses

conhecimentos adquiridos pelo leitor no decorrer da vida, a compreensão da leitura

pode não acontecer.

O fato de os professores do ensino fundamental II escolherem menos

atividades para antes da leitura, pode ser explicado por considerarem que os alunos de

fundamental II não necessitam da mesma preparação para a leitura que os alunos

menores. Contudo, é possível afirmar que quanto maior for a expectativa criada para ler

um texto, maior será a possibilidade de promover a interação.

Chama atenção o fato de os professores não escolherem atividades que

trabalhem com a compreensão e com a interação texto-leitor, como as atividades nº 12

(“Passei o resto do dia assentado no alpendre frio e limpo, sem olhos para mais nada.

Meu coração estava cheio de vazio.” O que você entendeu lendo essa expressão?), nº

14 (Escreva o que você percebeu sobre “o jeito de escrever” desse autor. O que

chamou mais a sua atenção? Esse “jeito” facilitou ou dificultou sua leitura?) e nº 17

(“Quando o dia suspeitava escurecer, inaugurando a tarde...” O autor poderia ter

escrito: “ao entardecer”, mas escolheu uma forma poética de dizer isto. Essa escolha

muda alguma coisa para o leitor?).

A maioria dos professores escolheu uma atividade que independe da leitura

realizada pelo aluno. Nota-se que a preferência por atividades como a de número 10

pode nos dar um indício de que há dificuldades, por parte dos professores, de ensinarem

os alunos a interagir com o texto, durante ou após a leitura. Ao que parece, bastam

respostas subjetivas, mesmo as que não revelam a interação entre texto e leitor, para que

se comprove que o texto foi lido/compreendido/interpretado.

A escolha da atividade 13 (“Meu coração estava cheio de vazio”. Encontre no

texto outras expressões subjetivas como a que foi destacada), por 4 dos 6 professores,

pode evidenciar que atividades de reconhecimento, no texto, de características

específicas da esfera literária (no caso, o reconhecimento da linguagem figurada) são

atividades que predominam mais do que outras que possam garantir efetivamente a

busca pela interação do leitor com o texto. Outras atividades favoreceriam a

colaboração do leitor para completar o sentido do texto, como as já citadas atividades

(12 e 17). Pensar na diversidade de sentidos que a expressão “cheio de vazio” pode

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gerar, solicitar a reflexão sobre a forma escolhida pelo autor, inferindo sua intenção

seriam propostas que, como afirma Eco (1979), são necessárias para o texto funcionar.

Os professores que escolheram a atividade nº 10 (O menino perdeu o amigo

passarinho, você já perdeu algo ou alguém muito especial? Escreva sobre isso)

apresentaram as seguintes justificativas:

Prof. 2: “Trabalhar a afetividade, um momento para o professor conhecer o perfil do

aluno, a clientela”.

Prof. 3: “Também escolheria esta atividade porque é similar a anterior, isto é, o leitor se

identifica com o que está lendo”.

Na questão anterior, o mesmo professor justificou, escrevendo: “Acredito que elaborar

uma atividade que faça o leitor se identificar com um personagem ou reviver uma

situação passada, após a leitura do conto (texto literário) é uma maneira de tornar esse

ato de ler um prazer”.

Prof. 5: “Em determinadas situações é importante que os alunos demonstrem confiança

e condições de poder expressar sensações, sentimentos e necessidades. Relatar com

mais segurança suas experiências e acontecimentos do cotidiano”.

Prof. 6: “A afetividade e a valorização da vida são elementos presentes no conto.

Desenvolver atividades neste sentido com o aluno é resgatar os valores que estão se

perdendo com banalizações afetivas, morais... e da família”.

O professor 3 (Prof. 3) foi o único que viu na atividade a possibilidade de o

leitor olhar a experiência do outro para olhar a própria. O professor 6 (Prof. 6) buscou

interpretar as emoções que o conto desperta; porém, restringe seu olhar quando

estabelece como objetivo o uso da literatura com função moralizadora. A justificativa

do professor 5 não vai além do relato de experiência pessoal. O professor 2 (Prof. 2)

proporia a atividade para “conhecer o perfil do aluno, a clientela”. Mas há outras

atividades que poderiam revelar com mais eficácia o “perfil” da turma.

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Em relação à atividade nº 13 (“Meu coração estava cheio de vazio.” Encontre

no texto outras expressões como a que foi destacada), as justificativas que apareceram

foram as seguintes:

Prof. 2: “Questão importante para se trabalhar a linguagem poética, brincadeira com

palavras, sentido figurado...”

Prof. 4: “Propor atividades com essas expressões e outras para enriquecer o vocabulário

e entender a linguagem poética”.

Prof. 5: “Para identificar uma interpretação para um determinado texto, estabelecendo

relações entre o que está lendo com sua própria situação do cotidiano (perda, solidão...)

estabelecer a relação entre diferentes informações veiculadas pelo texto”.

Prof. 6: “Fazer uso da linguagem conotativa. Ouvir as interpretações dadas pelos alunos

e expandir seu vocabulário conotativo. Empregar a conotação em outras situações.

Valorizar o subjetivo”.

Os professores percebem a importância de trabalhar com a linguagem

subjetiva, mas parece que não têm muito claro o caminho para fazer isso. Localizar

expressões no texto não garante criar novas possibilidades de interpretação. Na

justificativa não dizem o que é possível fazer depois da localização dessas expressões

subjetivas, falam em emprega-las, valorizá-las... mas como? Os professores não

explicitaram por que do rastreamento das expressões figuradas.

Das atividades que não foram escolhidas por nenhum dos professores, algumas

têm um potencial que pode contribuir como exercícios de compreensão e de abordagens

mais amplas: por exemplo, a atividade 5 (“Até passarinho passa”. Quais são suas

hipóteses sobre a compreensão desse título) é da categoria das atividades para antes da

leitura, e se as respostas forem discutidas com a turma, pode favorecer a compreensão.

A atividade 11 (O narrador relata situações de sua infância. Isso torna o texto

mais comovente? Por quê?) pode render uma boa reflexão sobre o contexto da

narrativa, as intenções do autor, as escolhas que ele faz. As atividades 6 (o autor

escreveu, antes de começar o conto, o seguinte texto: “Não conheço, além do imenso

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tempo, nada que tenha existido para sempre. Até o silêncio passa.” Ler este trecho

ajuda ou modifica suas hipóteses sobre o título?) e 18 (Releia os três parágrafos

iniciais e retire trechos em que o autor escreve de forma sutil sobre o tema do conto

[...] preparando o leitor para o desenvolvimento do tema) são estratégias para que o

professor possa conduzir o olhar do leitor para as pistas que o autor dá, a fim de que ele

possa se preparar para a leitura colaborativa, para que o leitor elabore suas hipóteses,

alimente sua curiosidade e leia com prazer.

A atividade 19 ([...] como você imagina que foi esse primeiro dia depois da

perda do amigo? Imagine que o conto não terminou e você escreverá a continuidade,

contando como foi esse dia) é uma atividade interpretativa e que pode oportunizar a

prática das observações e reflexões que a leitura despertou, bem como o trabalho com

os aspectos linguísticos, estilísticos e as especificidades do texto literário. O leitor

assume o papel do autor.

Observando as atividades preteridas por esse grupo de professores, atividades

cujo ponto central é a interação entre texto e leitor, obtemos indícios do que valorizam

no trabalho de leitura. A não escolha parece indicar que o professor opta por uma

prática próxima à sua própria experiência de leitor que, como já afirmamos, geralmente,

reduz-se ao repertório escolar.

A reprodução da qual se fala está presente também no momento em que o

professor é convidado a pensar em outras atividades que criaria, usando sua autonomia:

dos seis questionários aplicados, apenas três responderam a esse convite e as três

propostas refletem encaminhamentos semelhantes aos encontrados no material didático

oferecidos às escolas.

1– Pesquisar sobre o autor e sua obra. Justificativa: conhecer melhor o autor, estilo e

forma de escrever. Distinguir o autor pela obra.

Embora o professor tenha o objetivo de conhecer o estilo de escrita do autor,

não esclarece como fazer isso.

2– Colher questões levantadas pelos alunos e construir outros poemas. Não justificou a

atividade.

Colher as questões levantadas pelos alunos é similar à atividade 4. A

construção de outros poemas (atividade típica de produção de texto, nos livros

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didáticos) é uma proposta muito aberta, o professor não esclarece se considerará o conto

como ponto de partida ou porque propor a escrita de um poema.

3– Dramatizar o conto. Justificativa: dirigir novas discussões a partir do foco dado pelos

alunos na dramatização do conto.

Nesta sugestão, apesar de o professor pretender abrir possibilidades para novas

discussões, a dramatização, uma situação didática também muito frequente no contexto

escolar, frequentemente é uma atividade de mera memorização que pode não se

relacionar com a compreensão da leitura.

Considerações finais

A leitura dos textos literários deve ir além da localização das informações

explícitas e de respostas que independem da leitura do texto. A leitura deve ser

trabalhada com objetivos específicos para o texto literário: estudar o que é “textual”

(análise do gênero, dos recursos de expressão etc.) e do que é “literário” (interpretação

das analogias, comparações, metáforas, identificação de recursos estilísticos, poéticos),

como afirma Soares (1999). Porém, para o professor repensar sua prática, são

necessários um maior conhecimento teórico e uma formação fundamentada na reflexão

crítica que incentive o rompimento com a “uniformização” das aulas de leitura. É muito

importante que os professores busquem situações didáticas que ajudem a aproximar o

aluno dos textos literários, de textos que são obras de arte.

Para abordar o conto de Bartolomeu Campos de Queirós (op. cit.) e outros

contos ou textos literários é necessário trabalhar com a ideia de letramento literário na

escola, com o objetivo de adotar estratégias para serem usadas nas aulas de leitura dos

textos literários. Lançando mão do que Rildo Cosson (2009) chama de “sequência

básica” no livro Letramento literário, seria possível conseguir um envolvimento maior

na leitura. As etapas dessa sequência básica são: motivação, introdução, leitura e

interpretação.

A motivação é uma atividade de preparação dos alunos para entrarem no

universo do livro a ser lido. No caso de Até passarinho passa, essa aproximação com o

texto pode ser feita por meio da leitura de poemas que falem da passagem do tempo,

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sobre a morte, sobre as perdas. O professor poderia selecionar poemas sobre o tema e

distribuí–los para pequenos grupos lerem e comentarem entre os pares. Depois, numa

“roda” de leitura, abrir para discussão: o que pensaram ao ler o poema? Os poemas têm

semelhanças? O que fez com que pensassem de uma forma e não de outra? Enfim,

deixar que a multiplicidade de sentidos apareça. É fundamental aproximar os alunos do

tema do conto. Seria possível também escolher outro conto que servisse para essa

aproximação.

A etapa da introdução é a apresentação do autor e da obra aos alunos. Aqui

pode–se fazer a apresentação falando do livro ou do autor, lendo o prefácio, as orelhas e

outros peritextos. Seria interessante, também, despertar a curiosidade do aluno para a

leitura. Por exemplo: apresentar o título e abrir para a discussão das ideias que suscita,

chamar a atenção para a palavra “passa”, presente na palavra “passarinho”, perguntar

sobre os sentidos que a palavra “passa” pode ter, chamar atenção para “até” – será que

modifica alguma coisa estar escrito assim no título? No caso deste conto, pode ser muito

interessante, depois da discussão sobre o título do livro, o professor fazer a leitura do

texto que antecede o início do conto: “Não conheço, além do imenso tempo, nada que

tenha existido para sempre. Até o silêncio passa”, e perguntar se este texto modifica

suas ideias anteriores, por quais motivos.

A leitura de uma obra no contexto escolar precisa de um acompanhamento,

porque tem um objetivo, mas esse acompanhamento não deve ser confundido com

vigilância. O professor não deve “vigiar” o aluno para ver se ele está lendo, mas

acompanhar o processo de leitura. Durante o período de leitura (da introdução até o

prazo para a finalização da leitura) o professor pode propor intervalos de leitura. Esses

momentos são o acompanhamento do processo de leitura. O conto Até Passarinho

Passa não é longo. O intervalo para esse conto pode ser assim combinado: estabelecer

uma data para que todos leiam até a página 23 (aqui já se descreveu a amizade entre o

menino e o passarinho) e o professor traz para a classe a leitura do livro A Árvore

Generosa de Shel Silverstein (2006, tradução de Fernando Sabino) que conta a amizade

entre um menino e uma árvore; os dois se amavam, mas de forma diferente. O texto é

curto, mas também recheado de recursos poéticos. Depois da leitura, o professor poderia

propor a comparação entre os dois contos, buscando diferenças e semelhanças

estilísticas, analisando os recursos expressivos dos dois textos e também discutindo

sobre as duas formas de amizade e suas semelhanças e/ou diferenças.

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Pode também fazer a leitura conjunta de um capítulo ou trecho do próprio livro

que está sendo lido, para estudar os recursos expressivos que o professor deseja

ressaltar. O propósito, nesse momento, é verificar a compreensão da leitura, chamar a

atenção dos alunos para a multiplicidade de sentidos da linguagem literária e reconhecer

as pistas deixadas pelo autor para que o leitor possa atribuir sentido ao texto.

Para o último passo da sequência básica, a interpretação, Rildo Cosson (2009,

p. 54) propõe que ela ocorra em dois momentos: um interior e outro exterior. O

momento interior é o que ele chama de “encontro do leitor com a obra”. Esse encontro é

de caráter individual, é a leitura de cada um. O momento externo é “a materialização da

interpretação” como ato de construção de sentido.

As atividades de interpretação devem ter como princípio a externalização da

leitura, ou seja, um registro. A resenha é uma prática bastante adotada; porém, o

professor deve buscar outras estratégias para o exercício da escrita dentro do gênero.

Um exemplo é solicitar a escrita de um capítulo a mais à obra, conforme propunha uma

das atividades da pesquisa que realizamos.

Essas são apenas sugestões de trabalho para incentivar a reflexão necessária

para o exercício de um tratamento didático que considere a riqueza da linguagem

plurissignificativa dos textos literários. A busca é sempre no sentido de tornar a leitura

dos textos literários um “processo de formação de um leitor capaz de dialogar no tempo

e no espaço com sua cultura, identificando, adaptando ou construindo um lugar para si

mesmo” (COSSON, 2009, p.120), um aprendizado crítico da leitura literária.

Considerando as análises feitas pelos autores deste artigo, pode-se dizer que

muitos professores ainda aplicam atividades que exigem apenas cópia de trechos do

texto, sem nenhuma exigência de reflexão ou estabelecimento de relação com outros

conhecimentos, e também propõem questões cujas respostas independem da leitura do

texto. Em outras palavras, muitos professores abordam os textos literários, mas não

exploram a multiplicidade de sentidos da linguagem literária.

Como já foi dito, segundo o estudo de Batista (1995), o professor, geralmente,

reproduz na sala de aula sua experiência como leitor. Conforme Soares (1999, p. 21):

“[...] não há como evitar que a literatura, qualquer literatura [...] ao se tornar ‘saber

escolar’, se escolarize [...]”. Porém, distingue a escolarização adequada – aquela que

conduz às práticas de leitura literária – da inadequada, que distorce a literatura.

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Diante de tais reflexões, confirmamos a necessidade de continuar buscando

descobrir caminhos adequados para a “inevitável escolarização da literatura” (SOARES,

1999, p. 20) e, dessa forma, o texto literário receba, no contexto escolar, uma

abordagem que respeite suas especificidades e que explore a riqueza da multiplicidade

de sentidos que carrega.

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