Literatura Portuguesa

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ESTUDOS DA LITERATURA PORTUGUESA

LITERATURA PORTUGUESA

ESTUDO DA

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SOMESBSociedade Mantenedora de Educao Superior da Bahia S/C Ltda.da Estudo

Literatura Portuguesa

Presidente Gervsio Meneses de Oliveira Vice-Presidente William Oliveira

Superintendente Administrativo e Financeiro Samuel Soares Superintendente de Ensino, Pesquisa e Extenso Germano Tabacof Superintendente de Desenvolvimento e>> Planejamento Acadmico Pedro Daltro Gusmo da Silva

FTC - EaDFaculdade de Tecnologia e Cincias - Ensino a DistnciaDiretor Geral Reinaldo de Oliveira Borba Diretor Acadmico Roberto Frederico Merhy Diretor de Tecnologia Jean Carlo Nerone Diretor Administrativo e Financeiro Andr Portnoi Gerente Acadmico Ronaldo Costa Gerente de Ensino Jane Freire Gerente de Suporte Tecnolgico Lus Carlos Nogueira Abbehusen Coord. de Softwares e Sistemas Romulo Augusto Merhy Coord. de Telecomunicaes e Hardware Osmane Chaves Coord. de Produo de Material Didtico Joo Jacomel

EQUIPE DE ELABORAO/PRODUO DE MATERIAL DIDTICO:

PRODUO ACADMICA

Gerente de Ensino Jane Freire Coordenao de Curso Jussiara Gonalves Autores (as) Nildete Costa da Mata dos Reis / Celina Abbade Superviso Ana Paula Amorim PRODUO TCNICA

Reviso Final Carlos Magno Brito Almeida Santos Equipe Ana Carolina Alves, Cefas Gomes, Delmara Brito, Diego Maia, Fbio Gonalves, Francisco Frana Jnior, Hermnio Filho, Israel Dantas e Mariucha Ponte Editorao Diego Maia Ilustrao Mariucha Silveira Ponte/Francisco Frana Jnior Imagens Corbis/Image100/Imagemsourcecopyright FTC EaD

Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610 de 19/02/98. proibida a reproduo total ou parcial, por quaisquer meios, sem autorizao prvia, por escrito, da FTC EaD - Faculdade de Tecnologia e Cincias - Ensino a Distncia. www.ftc.br/ead

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Sumrio

AS PRIMEIRAS MANIFESTAES LITERRIAS EM PORTUGAL1 poca Medieval

A Formao de um Estado Independente: Portugal A Novela de Cavalaria

Atividade Complementar

Realismo Simbolismo

Romantismo: 2 e 3 Geraes

Romantismo: Contexto Histrico e 1 Gerao

DO ROMANTISMO AO SIMBOLISMO: PERODO DE GRANDES TRANSFORMAES LITERRIAS

DO ROMANTISMO LITERATURA CONTEMPORNEA

Atividade Complementar

Barroco Arcadismo ou Neoclassicismo

Classicismo

O Teatro Gil Vincente

DO TEATRO PORTUGUS AO ARCADISMO

2 poca Medieval Atividades Complementares

A LITERATURA PORTUGUESA DA IDADE MDIA AO ARCADISMO

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Literatura Portuguesa

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Referncias Bibliogrficas

Glossrio

Atividade Orientada

Jos Saramago: O Nobel da Literatura Atividade Complementar

A Gerao de Presena

Fernando Pessoa e os Heternimos

Modernismo: Contexto Geral e a Gerao Orfeu

O MODERNISMO PORTUGUS E A LITERATURA CONTEMPORNEA

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Apresentao da DisciplinaApresentamos, neste Mdulo, uma viso geral da Literatura Portuguesa. O esprito que norteou nosso trabalho foi o de elaborar um material srio, consistente e agradvel, que servir como ponto de partida para o estudo da Historiografia Literria de Portugal. Quanto apresentao dos assuntos, partimos do conceito de Estilo de poca para estudar cada momento literrio, no contexto em que foi produzido e difundido, visando que vocs, alunos, possam desenvolver, atravs desse aprendizado, um esprito crtico em relao literatura em questo. A opo por esta diviso tem um cunho didtico e funciona como uma sntese. impossvel abarcarmos todo o conhecimento acerca de tudo o que chamamos de Literatura Portuguesa, porm, esperamos que o contedo disponibilizado aqui funcione como o incio de uma longa e apaixonante viagem literria. Longe de ser a nica possibilidade de trabalho, este Mdulo um instrumento que, utilizado como base de estudo, certamente contribuir para promover a reflexo e a autonomia do seu aprendizado. Como o ensino de literatura deve estar sempre intimamente articulado com a leitura e a escrita, sugerimos que vocs, educandos, promovam momentos de leitura dos livros mencionados e elaborem resenhas dos captulos estudados, procurando relacionar o contedo dos textos a outras fontes de pesquisas, como a Internet, filmes, etc. E, se possvel, socializando essa reflexo com alguns de seus colegas atravs de e-mails e chats. O material est organizado em 2 Blocos temticos, subdividido em 4 Temas e estes apresentados em 16 Contedos, nomeados de acordo com os assuntos e objetivos abordados. No Bloco 01, estudaremos desde a origem da Literatura em Lngua Portuguesa ao Arcadismo. No Bloco 02, veremos o perodo que chamamos de Romntico at o que denominamos Tendncias contemporneas. No final de cada Tema acrescentamos questes para fixao dos assuntos estudados. Todas as atividades didtico-pedaggicas deste Mdulo partem da leitura do material impresso e da sua complementao virtual, disponvel na home-page. Esperamos que este material v ao encontro das atuais necessidades do curso e do aprendizado sobre a literatura lusa.

Seja bem-vindo (a)! Roselana Trindade

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da

Literatura Portuguesa

Estudo

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A LITERATURA PORTUGUESA DA IDADE MDIA AO ARCADISMOAS PRIMEIRAS MANIFESTAES LITERRIAS EM PORTUGALA Formatao de um Estado Independente: PortugalNeste primeiro bloco, estudaremos as principais manifestaes da Literatura Portuguesa, desde o Trovadorismo, na Idade Mdia, ao perodo denominado de Arcadismo, tambm conhecido como Neoclssico. Veremos que os primeiros textos literrios portugueses remontam ao sculo XII, ou seja, muitos sculos antes da chegada da frota comandada por Pedro lvares de Cabral ao territrio brasileiro. Veremos, portanto, que a Literatura Brasileira trs, em si, uma herana do perodo que estudaremos a seguir. Contextualizando o Medievo Literrio Portugus O CONDADO PORTUCALENSE A independncia de Portugal foi conseguida de forma gradativa, contra os reinos cristos da Pennsula Ibrica. A tranqilidade conseguida com os casamentos reais1 (Reino de Leo e Reino de Borgonha) foi abalada com a morte do Imperador Afonso VI (final do Sc. XI) e a tnue unidade poltica se desfaz, ocorrendo as lutas entre os reinos cristos. Abdala Junior e Paschoalin2 assinalam que apesar do processo de independncia de Portugal est ligado diferenciao das atividades econmicas da regio e s rivalidades entre os grupos feudais. Foi, entretanto, o povo quem participou ativamente desse processo, atravs de organizaes municipais, os Concelhos populares. Os Concelhos (dentro do sistema feudal) propiciaram a D. Afonso Henriques (reconhecido Rei, pelo papa, em 1179), filho de Tareja, as foras militares necessrias para a independncia. O sistema vigente na Europa, o feudalismo, por predominar grupos sociais fechados, impossibilita a mobilidade de classes. Neste sistema social, competia aos servos trabalhar para, seus senhores; nobreza feudal competia defender a sociedade; e igreja, orar por toda a sociedade. Lembremos que em Portugal dentro dos coutos (propriedade da Igreja) ou da honras (propriedade da nobreza) os senhores eram autoridade absoluta e s prestava obedincia ao rei que detinha os direitos de justia suprema.

Casamentos Reais: URRACA Filha legtima e herdeira do trono casa-se com o conde Raimundo de Borgonha e recebe a regio da Galcia. D. TAREJA Filha ilegtima, casa-se com D. Henrique de Borgonha (primo do conde Raimundo de Borgonha) e recebe a regio denominada de Condado Portucalense, que abrange a rea entre o Minho e o Tejo. Histria Social da Literatura Portuguesa7

Temos, portanto, uma organizao social fechada, que reiterada pelo esprito teocntrico. A Igreja, rica senhora feudal, alm de ensinar os mistrios da f nas freqentes missas e/ou em outras cerimnias religiosas, como as peregrinaes ou romarias, era tambm responsvel pela difuso da educao Estudo da Literatura o centro da instituio pblica se localizava nas catedrais ou nas escolas Portuguesa episcopais, nos conventos e mosteiros. Mediante a esse contexto, as grandes massas adquiriam conhecimentos tericos e prticos transmitidos por via oral. Tradies populares, romances, sermes e provrbios tinham papel importante na formao dos indivduos, fato observado desde o reinado de Sancho I, filho de Afonso Henrique. Nas feiras circulavam a literatura oral, sendo divulgada por meio dos jograis, recitadores, cantores e msicos andarilhos. A poesia e a msica estavam sempre ligadas, o trovador compunha o poema que era cantado pelo jogral, que percorria todo o reino, inclusive as peregrinaes religiosas e as festas palacianas, acompanhado pelo menestrel, msico agregado a uma corte. Essa produo cultural trovadoresca, chamada de literatura cantada e, por isso, conhecida como cantigas, sobrevive at hoje em coletneas renascentistas registradas em colees, Os Cancioneiros. Infelizmente, as partituras das msicas se perderam quase todas, sobrando nos dias de hoje apenas cinco, escritas por Martim Codax. A Literatura De um modo geral pode dizer-se que apesar da Literatura portugue-sa ter expresso literria em todos os gneros, predomina o lirismo em todas as suas formas at na pica, caractersticas aparentemente dominantes no temperamento nacional. A primeira forma das literaturas ocidentais a poesia e oral: e compilada de forma escrita posteriormente, transcritos os poemas de memria. O verso com ritmo e rima mais fcil de memorizar e sobreviveu at ser registrado, o que no aconteceu com as estrias que necessariamente existiram e poderiam ter carter literrio tambm. A histria da poesia moderna ocidental inicia-se com a poesia cavalheiresca da Idade Mdia. Depois de um perodo de trs sculos em que a poesia provinha exclusivamente de monastrios, e tinha a religio como tema, a poesia cavalheiresca, em pleno teocentrismo medieval, tem como objeto o profano, o homem e os seus sentimentos, principalmente o amor. O lirismo provenal irradiou-se por toda a Europa meridional e no se compreenderia Petrarca e Dante sem ela como antecedente. proveniente de Provena, regio ao sul da Frana que tinha muita riqueza devido ao prspero comrcio com a bacia mediterrnea e o norte de frica de Masslia, cidade fundada pelos romanos. Ali dominava a lngua doc, doce e rica, enquanto no norte da Glia se falava a lngua doil, rstica e veemente, que vem a ser usada na prosa. Prosa essa que influenciar tambm as outras literaturas do mundo ocidental com os romances do ciclo Breto (rei Artur) e com as novelas do ciclo carolngio (Carlos Magno e a demanda do Clice Sagrado). Os provenais foram, portanto, os mestres e iniciadores da poesia europia moderna. Como sua influncia aconteceu em Portugal: 1 - Casamento dos trs primeiros reis de Portugal com princesas do sul da Glia, que traziam em seu squito jograis e trovadores. 2 - A primeira dinastia chamada de Borgonha porque foi fundada pelo conde de Borgonha e foi toda ligada Frana.

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3 - As romarias aos santurios famosos como o de Santiago de Compostela. O canto, a poesia e o drama litrgico eram os meios com que o clero fomentava o interesse e a participao do povo. Esses foram evoluindo e expulsos para os adros. Vinham romeiros de Frana com seus cantares caractersticos. Nos santurios, vrios povos confraternizavam culturalmente. 4 - O intercmbio de vrias espcies entre portugueses e provenais: relaes comerciais, vida comum entre os cruzados, as viagens dos cruzados lusitanos, etc. Em toda a cristandade medieval, a Igreja viu-se obrigada primeiro a proibir a prtica de ritos e festas pags que persistiam em cantos e danas erticas de mulheres dentro dos prprios templos. Depois expulsou estas manifestaes que se davam nos adros (manifestao persistente seria, por exemplo, as lavagens dos adros das Igrejas em Salvador. Os costumes e as prticas populares medievais nos adros das igrejas ou por ocasio de feiras de produtos uma fonte de restaurao das energias gastas no sacrifcio e no trabalho durante o resto do ano. No momento da romaria, cessa o penoso trabalho de todos os dias, instaura-se o reino da abundncia, da permissividade, da alegria; h trocas materiais, culturais e afetivas; danas, cortejos triunfais, aproximao entre pessoas, encontros e fuses de grupos e categorias pela conjuntural cessao das proibies, tudo isto se sente ou se pressente na poesia trovadoresca. Desde o fim do sculo XII, com a formao das cortes senhoriais, a produo cultural nobre diversifica-se: surge a poesia lrica e satrica, com as cantigas de amigo, de amor e de escrnio e maldizer. Assiste-se, ento, a uma intensa atividade criativa, constantemente renovada pelos contatos e a competio com as cortes estrangeiras, que os cavaleiros jovens, idealistas, aventureiros e sem fortuna, visitavam freqentemente, trazendo para Portugal as influncias culturalmente preponderantes na Europa da poca: as influncias provenais. Os poetas conseguem dar vivacidade aos diversos estados emocionais da mulher enamorada: a saudade, o cime, o ressentimento, os amuos, as ansiedades, as desconfianas, a reivindicao da liberdade exigida me so expressas de modo muito vivo; as mulheres ora so ingnuas ou sabidas ora compassivas ou calculistas e astutas, sensveis ou indiferentes, ora se entregam ou se negam aproveitando-se dos seus namorados. Os poetas trovadores mostram uma ampla experincia que a sua vida sentimental variada lhes proporcionou. Nas canes de amigo, de origem local, o amor no experincia idlica, platnica, ela realista, fsica.

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Indicao de FilmeTTULO DO FILME: O STIMO SELO (Det Sjunde Inseglet, Sucia, 1957)

DIREO: Ingmar Bergman ELENCO: Max von Sydow, Gunnar Bjomstrand, Bengt Ekerot, Nils Pope, Bibi Anderson, Ing Gill, Maud Hanson, Inga Landgre; 102 min. O sculo XIV assinala o apogeu da crise do sistema feudal, representada pelo trinmio guerra, peste e fome, que juntamente com a morte, compem simbolicamente os quatro cavaleiros do apocalipse no final da Idade Mdia. Nesse contexto de transio do feudalismo para o capitalismo, alm do desenvolvimento do comrcio monetrio, notamos transformaes sociais, com a projeo da burguesia, polticas, culturais e at religiosas com a Reforma Protestante e a Contra Reforma.

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1 poca MedievalA POESIA LRICA GALEGO-PORTUGUESAda

O nascimento da produo literria portuguesa Literatura acontece quase simultaneamente formao da nao Portuguesa lusa. Apesar de seus primeiros representantes serem todos ligados corte, no devemos atribuir primeira fase da Literatura Portuguesa, a da lrica dos trovadores tambm conhecida como poesia lrica galego-portuguesa , um carter nacional. necessrio considerar que as fronteiras polticas e culturais na Pennsula Ibrica, nesse perodo, eram muito flexveis, pois os laos matrimoniais entre os nobres de diferentes cortes eram comuns, fato que favorecia a sua circulao.

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Outro fator de grande importncia para o seu desfronteiramento foi a utilizao de uma lngua nica para as composies. A lngua usada ainda no o portugus, mas o galego-portugus, um romano (lngua de origem latina) falada na costa da Pennsula Ibrica. Apesar desta lngua ser usada somente no Noroeste da Pennsula, sua escolha no foi aleatria. Lembremos que a regio formava uma unidade poltica cultural que abrangia a Galiza e o territrio que se tornaria o reino portugus. Acontece que, mesmo depois do desmembramento, Portugal continuou a manter relaes culturais estreitas com a regio galega, transformando-se em uma regio de importante intercmbio cultural, principalmente com as peregrinaes a Santiago de Compostela. No fcil datar com preciso as primeiras composies do perodo trovadoresco portugus, seja pela escassez dos dados biogrficos de muitos dos poetas, seja pela natureza prpria a essa poesia: a da oralidade. Uma das mais antigas manifestaes literrias galego-portuguesas que se tem notcia a cantiga de maldizer feita por Joo Soares de Paiva Ora faz osto Senhor de Navarra, mas muitos consideram a Cantiga da Ribeirinha tambm chamada de Cantiga da Garvaia como a mais antiga, por ser esta a mais antiga registrada. A Cantiga da Ribeirinha foi composta por Paio Soares de Taveirs, provavelmente no ano de 1189 (ou 1198, h rasuras na datao). Como as datas no so claras e as controvrsias entre os estudiosos desse assunto so constantes e cabveis, conveniou-se datar, portanto, como marco inicial da Lrica Medieval Portuguesa, o ltimo decnio do sculo XII. Ela se estende at o ano de 1418, quando se inicia, em Portugal, o Quinhentismo; e, na Galiza, os chamados Sculos Escuros. A primeira gerao histrica dos trovadores foi caracterizada pelo policentrismo e a extrema mobilidade dos poetas. Depois, uma segunda gerao denominada gerao do meio surge na corte de Fernando III, Afonso X de Leo e Castela e na do rei portugus D. Afonso III. A poesia desta nova fase possua um carter dirigido, ou seja, os interlocutores se apresentavam em forma de desafio, provocando, assim, a resposta de outros trovadores. As cantigas de maldizer foram bastante favorecidas pelo grupo. Embora este perodo seja de grande atividade potica, entra em declnio com a morte de Afonso X e, mesmo ainda existindo trovadores importantes, a corte de D. Dinis que passa a ser o centro dos trovadores, sendo ele prprio um grande poeta, mas faltou em sua corte um movimento potico que envolvesse a todos, como na gerao anterior. Com a10

morte de D. Dinis poderamos pensar no fim do lirismo trovadoresco, no entanto documentos comprovam ter existido, ainda, uma pequena atividade potica patrocinada por seu filho Pedro. As origens da poesia lrica: Uma poesia com influncia Provenal e/ou uma poesia de carter popular? A poesia trovadoresca Provenal surge no sul da Frana em fins do sculo XI, tem o seu apogeu no sculo XII, e declina no sculo XIII, quando a crise dos senhores do sul obriga os trovadores a abandonarem a regio em busca de novos patrocinadores. caracterizada por ser o primeiro lirismo Ocidental em lngua verncula e pelo carter inovador dessa poesia. Mesmo com toda a influncia socio-cultural somada, ela representou uma ruptura com o perodo clssico at ento cultivado e, principalmente, uma nova viso de mundo. Um jeito novo de fazer poesia valorizando o erotismo e apresentando uma outra forma de falar de amor, marcada pelo cdigo de comportamento amoroso chamado finamors mais tarde conhecido como o amor corts. Esse cdigo possivelmente tenha chegado filtrado em Portugal e na Espanha devido religiosidade vigente, pois Provena era considerada a corte da luxria e a poesia considerada demasiadamente ertica. Podemos, ento, dizer que o erotismo provenal foi podado pelo moralismo religioso dos trovadores galego-portugueses?

A relao amorosa cantada pelos trovadores provenais a transferncia do sistema de vassalagem existente na Idade Mdia. Representado por um amor corts no qual um homem da baixa nobreza apaixona-se por uma dama de classe superior que, devido a esta diferena, no ir retribuir a esse amor, passando a existir uma vassalagem amorosa. Mas o amado no quer possuir a amada, e sim gozar desse estado de no-possesso, embora ele sonhe com a retribuio por parte da amada, mesmo porque ela representa a sua ascenso social. Percebemos ser o sentimento amoroso concebido numa tenso constante pelos trovadores desse perodo. E foi esta a poesia difundida por toda a Europa Ocidental, em diferentes propores, a depender da regio. O norte da Itlia e a Catalunha, por estarem mais prximas e possurem costumes parecidos aos da regio Provenal, receberam uma influncia mais direta, enquanto a Pennsula Ibrica teve uma influncia filtrada e menor. Os Cancioneiros As poesias trovadorescas galego-portuguesas so consideradas como Literatura Romnica e no so propriamente portuguesas, pois abrangia a pennsula Ibrica (hoje Portugal e Espanha). Foram, primeiramente, registradas pela oralidade e s depois de algum tempo fixadas por escrito e transmitidas em trs coletneas:

Cancioneiro da Ajuda; copiado provavelmente na corte de D. Monso X. Contm apenas as cantigas de amor dos poetas mais antigos. Cancioneiro da Vaticana; feito na Itlia, inclui cantigas de amor, de amigo e de escrnio e maldizer.11

Cancioneiro da Biblioteca Nacional; o mais completo. Contm a Arte de Trovar, tratado potico que possui instrues para os leitores quanto a arte de compor trovas.da

Literatura melhor compreenso do perodo dos trovadores. Inicialmente, Portuguesa por ser uma poesia destinada oralidade, e esse motivotornava desnecessrio um registro escrito, e tambm pelo no reconhecimento da importncia de conserv-la. Acreditase ter havido uma divulgao escrita dessas cantigas, porm em pequeno nmero. Gneros principais da poesia trovadoresca A poesia trovadoresca apresenta dois gneros principais: a lrico-amorosa e a stira. A poesia lrico-amorosa divide-se em Cantiga de Amor e Cantiga de Amigo e a poesia satrica divide-se em Cantiga de Escrnio e Cantiga de Maldizer. Cantiga de amor O homem canta o seu amor amada, sendo ela uma dama da alta nobreza e ele de classe inferior. De origem provenal, embora tenha perdido um pouco da variao das formas e da riqueza de expresso desta poesia. Isso porque, como j vimos, sofreu algumas modificaes para se adequar a Pennsula Ibrica. Um outro fator que indica diferena dessa cantiga de uma regio para outra que, enquanto na Provenal o amante nutre um desejo de recompensa por parte da amada e ele vive com alegria esse amor platnico; o amante da poesia galego-portuguesa se torna um coitado, vtima de um amor inacessvel que s traz lamento e desiluses e amar um grande pesar que culmina com o desejo da morte. Quanto estrutura e regras formais, podemos dizer que embora a lrica galegoportuguesa no tenha desenvolvido tantos estilos como a Provenal, ela manifesta uma grande preocupao formal. As cantigas eram classificadas em dois tipos: cantigas de refro e cantigas de mestria (sem refro), e os trovadores utilizavam alguns recursos estilsticos para darem acabamento formal as suas cantigas. Cantigas de amigo Diferente das cantigas de amor, o eu-lrico desta feminino. O trovador se expressa pela voz da mulher que tanto pode se dirigir ao amigo, como sua me, irms ou mesmo a algum elemento da natureza. Podemos, ento, dizer que essas cantigas podem ser divididas em dois tipos. O primeiro tipo, que se dirige a um amigo, muito parecido com as de amor, pois elas apresentam o ponto de vista feminino do amor corts se dando s vezes at a substituio do vocbulo amigo por mia senhor. A semelhana era ainda maior quando os trovadores desenvolvem o mesmo tema nos dois gneros. As caractersticas mais marcantes desse tipo de cantiga o paralelismo, que consiste em montar uma composio com base em segmentos repetidos. Sendo este um recurso potico comum na chamada poesia tradicional, de cunho popular. Recurso que se tomou muito importante para os trovadores, e se espalhou por todos os gneros, inclusive as cantigas de amor, onde o paralelismo semntico facilmente encontrado.

Estudo

Por falta de registros suficientes, no h como ter uma

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Muitos estudiosos, ao se depararem com essas cantigas, se deslumbram no s por seu carter inovador, mas, principalmente, por pensarem estar diante de uma poesia puramente popular. A origem dessa poesia pode ser explicada como sendo uma poesia feminina pr-trovadoresca, o que reforado pelos materiais encontrados. Isso nos leva a crer que inicialmente esse tipo de cantiga tradicional no encontrou lugar entre os nobres, embora eles tenham com certeza apreendido um pouco do gnero. Mas no podemos esquecer que os textos das cantigas que possumos so obras de poetas conhecidos, dentro de uma potica aristocrtica. Cantigas de escrnio e maldizer

Antes de tudo, necessrio estabelecer uma pequena diferena entre esses dois tipos de cantiga. As cantigas de escrnio o trovador usa termos ambguos que dificultam a compreenso imediata dos insultos, enquanto nas de maldizer o poeta usa palavras violentas e diretas. REFLITA

Apesar das diferenas, as cantigas de escrnio e maldizer possuem algo que as unem: ambas falam mal de algum, alm de pertencerem ao gnero satrico, por vezes burlesco e obsceno, e serem muito apreciadas pelos poetas galego-portugueses.

Devido a essas semelhanas, muitos estudiosos preferem uma classificao geral dessas cantigas por perceberem que em muitas poesias esses critrios se misturam. Devido linguagem utilizada e por tratar de temas obscenos, parece ser um gnero totalmente distante dos demais, no entanto, se fizermos uma analise mais minuciosa veremos que elas esto ligadas a comear pelos autores, so os mesmos das de amor e de amigo e, sobretudo, pela capacidade desse gnero em incidir nos demais, parodiando-os.

Um outro tipo de poesia a Mariana, que existiu no sculo XIII, que so cantigas de Santa Maria. Por apresentarem temas e reflexes mais amplas e possurem mais poesias narrativas que de louvor virgem, muitos autores no as consideram quando analisam a poesia galego-portuguesa, todavia no se podem ignorar as pontes que ligam esse gnero aos demais. O primeiro o fato de ela ser escrita em galego-portugus e tambm ser composta como uma unidade de msica e poesia. Sem contar os traos lricos e satricos encontrados em algumas dessas cantigas. Para concluir, preciso ressaltar que, embora as inmeras crticas feitas poesia galego-portuguesa, muitas vezes vista como um ramo da poesia Provenal, incontestvel sua importncia para a formao de uma nova gerao potica, que muito influenciou na poesia procedente. Alm de retratar a sociedade da poca de uma forma inovadora e de vrios ngulos sociais a corte atravs das cantigas de amor, o ambiente mais simples e campestre do povo com as cantigas de amigo e ainda uma crtica cmica de todo o sistema social com as cantigas de escrnio e maldizer.

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A Novela de CavalariaA Demanda do Santo Graalda Estudo

Considerada pelos estudiosos como um dos assuntos mais espinhosos Literatura Portuguesa da literatura medieval, devido a enorme quantidade de textos e as inmeras verses de uma mesma obra, a matria da Bretanha tambm um dos temas fascinantes do medievo, embora no seja nada fcil estudar esse perodo. Muitas vezes necessrio que o especialista recorra a um trabalho arqueolgico e filolgico das obras existentes para esclarecer datas, local de origem, etc. O primeiro n a desatar quanto originalidade da demanda portuguesa. O nico documento existente o cdice 2594 da Biblioteca Nacional de Viena que , na verdade, uma traduo de um outro original, possivelmente francs, cujo paradeiro desconhecido. Um outro impasse ter surgido nesta mesma poca (1400-1438) uma outra verso castelhana do mesmo texto. Isso deu margem a inmeras discusses acerca da prioridade de uma sobre a outra. Mas estudos feitos por Rodrigues Lapa e D. Carolina Michaeles de Vasconcelos demonstrou ser Portugal o responsvel pela traduo e adaptao da obra. Com o objetivo de minimizar os problemas oriundos da diferena de datas entre o original (sculo XIII) e a traduo (sculo XV) e tambm os de diferena cultural e ainda distingui-las das canes de gestas cantigas medievais que celebravam os grandes feitos de heris da poca tradio dividir a fico cavalaresca em trs ciclos: o Carolngio que tem no imperador Carlos Magno e seus pares as figuras centrais; o Clssico que abrange matria da Antiguidade clssica, episdios e heris das literaturas grega e latina; e aquele mais interessante para ns: o Breto ou Arturiano onde encontramos a figura do Rei Artur e seus Cavaleiros na Bretanha, pois este o nico ciclo presente na prosa portuguesa. Um esclarecimento muito importante a fazer quanto distino entre a lenda do Rei Artur e o mito do Graal. Apesar de aparecerem juntos na memria popular no so da mesma poca, sendo o mito bem mais antigo que a lenda. O Rei Artur foi considerado um grande chefe guerreiro das Ilhas Britnicas, que entre os sculos VI e VII ficou clebre em perigosas batalhas contra os inimigos saxes, e teve suas histrias contadas principalmente pelos conteurs bretes (narradores de contos e fbulas folclricas que passavam de pais para filhos). Observemos que este um tema blico por excelncia, enquanto o tema do Graal era essencialmente religioso. Vendo por este ngulo, parece impossvel a juno desses dois temas, no entanto temos textos histricos que traam todo o caminho percorrido desde a primeira descrio dos feitos do Rei Artur, com Nennius, at a unio desses dois temas com Chrtien Troyes na obra Perceval ou le conte du Graal em que o autor vai alm dos episdios amorosos, mergulhando em um universo mstico, embora sem caracteres cristos, , com certeza, a partir da que se d a cristianizao desse material.

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Se razes histricas e textuais explicam os laos entre o Graal e o Rei Artur, as afinidades temticas parecem mais eloqentes. A vida do rei Artur totalmente envolvida pela magia de Merlin e pela proteo das fadas, pois foi ele gerado por meio da magia e mesmo depois de morto foi levado pela fada Morgana ilha de Avalon. E o povo ficou a esperar messianicamente a volta de Artur. Percebemos nitidamente a presena marcante do misticismo no somente na vida do rei como tambm na vida do reino. So pormenores que acrescentaram biografia de Artur aquele halo espiritual responsvel pela mitificao da lenda. A ligao do elemento guerreiro ao mstico na configurao do Imprio adquiriu, na verdade, propores gigantescas. Artur no era somente um chefe poltico, ele tornou-se para o povo tambm um chefe simblico e a ambio de qualquer cavaleiro era tornar-se membro da ordem do Rei Artur, mesmo que para isso fosse preciso renunciar a toda famlia. Quando a ordem arturiana adquire tal magnitude ao situar os homens num plano de valores em que o herosmo guerreiro rivaliza com as qualidades morais, sempre cultivadas por vias que exigem renncias s vezes quase impossveis, com vistas ao prmio no fim da longa caminhada, quando isso ocorre a confluncia na tradio do Graal parece inevitvel: o prprio Graal pode, no fundo, representar o elemento transcendente com que esta cavalaria aspirava a completar-se. Onde o fim justificava os meios, ou seja, a matana que ocorreu na Demanda no era pecaminosa e sim demonstrao de bravura para se alcanar premiao. Tendo em vista a importncia da realidade histrica para toda e qualquer literatura no podemos deixar de ressaltar alguns fatores que contriburam para o surgimento e desenvolvimento da matria ficcional da demanda: A voga do neocetismo; com a conquista normanda, empreendida por Guilherme, abriu para o mundo as portas do folclore cltico-breto, com seus inmeros lutadores ferozes e amantes insaciveis protegidos pelo fantasioso mundo das fadas. O movimento intenso das cruzadas, aproximando o Oriente e o Ocidente; com o objetivo de proteger e recuperar os lugares sagrados e tambm recuperar fiis para a igreja. O surgimento da lrica trovadoresca; sendo o sculo XII considerado o sculo de ouro da literatura da Frana, cuja importncia indiscutvel como fonte de todo o lirismo europeu dos sculos posteriores. A ascenso da cavalaria; que de simples organizao militar comea a se transformar com Carlos Magno (Sculo IX) numa espcie de confraria religiosa, exigindo do ingressante a observncia de uma srie de rituais. Se aliarmos esses fatores ao intenso crescimento das cidades e surgimento das universidades, teremos uma idia do extraordinrio choque de valores que caracterizou os sculos XII e XIII, onde a matana em nome de Cristo e a preservao dos valores da Igreja eram sinnimo de obedincia e valorizao diante de Deus. E, as peregrinaes eram uma forma de obter perdo dos pecados e reinstaurar a paz. Inserida no centro dessas foras antagnicas, a Demanda do Santo Graal tornou-se o retrato definido da Idade Mdia mstica e, ao mesmo tempo, o maior monumento literrio

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que a poca nos legou no campo da fico. Quanto estrutura, podemos dizer terem sido feitas em forma de novelas, o que permitia estruturar os captulos em contos independentes, com significado prprio.da

Um dos pontos mais importante, quando analisamos a Demanda, Literatura percebermos a influncia da Igreja na sociedade da poca. O remorso e a Portuguesa

Estudo

expiao esto sempre presentes na vida dos cavaleiros. Na figura da Besta Ladrador temos uma amostra da punio para aqueles que cometerem o crime do perjrio, considerado pecado mortal. Sendo o juramento uma condio para ingressar na santa busca. Uma outra condio no levar mulher na viagem, sob pena de, tambm, cometer pecado mortal. Pela proibio e a pena imposta, aqueles que desobedecessem no conseguiriam chegar ao Graal , percebemos que a Igreja no via com bons olhos a liberdade amorosa cantada pelos trovadores e embalada pela frtil imaginao dos celtas. Pobre de Lancelot, que embora seja considerado o cavaleiro mais valente da corte arturiana tambm o mais pecador. Como se no bastasse ser o pai bastardo de Galaaz, apaixonou-se pela esposa do rei Artur, cometendo pecado duplo: adultrio e traio, o que vai contra a moral da Igreja e a tica da cavalaria. Apesar de conhecedor da sua enorme culpa e de padecer com o remorso que ela lhe causa, Lancelot no consegue deixar de am-la e s a abandona depois que ela morre. Isso retrata a dualidade vivida por Lancelot, de um lado o amor forte e inabalvel pela rainha; do outro, o respeito, a admirao e a amizade por Artur, que apesar de tudo, ele continuava cultivando. Acontecimentos que o afasta das honrarias as quais os outros cavaleiros participam e, inclusive, da possibilidade de alcanar a conquista do Graal. nesse contexto que surge Galaaz como o cavaleiro eleito, o puro dos puros porque nunca pecou contra a castidade, passando, assim, a simbolizar um novo Cristo, que com a conquista do Graal salvaria o reino do pecado e implantaria a to sonhada paz. Mesmo com todos esses mritos, Galaaz no est livre da tentao, e como Jesus, foi levado ao deserto para ser tentado pelo Diabo, aqui simbolizado pela mulher: durante a noite Galaaz estava deitado quando a filha do rei penetra no seu quarto, porm ela o encontra usando um cinto de castidade e vendo seus planos frustrados, a donzela ameaa matar-se. Ele, desesperado, cede, mas j era tarde e ela havia morrido, mesmo assim ele foi consolado e eximido de culpa por Boorz. Esse episdio prova que nem mesmo Galaaz, o escolhido, pode se descuidar e deixa claro as muitas provaes encontradas pelos cavaleiros. Todavia pensava-se que quanto mais difceis os obstculos, maiores as chances de purificao e mais eminente o perdo de Deus. Vamos reconsiderar os sculos XII e XIII?

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A poca de conturbada polaridade; Deus e o Diabo esto como que lado a lado, com apelos igualmente sedutores; a Igreja e a cavalaria encontram na guerra santa e no monge guerreiro uma forma de minimizar suas diferenas e, na literatura, o erotismo trovadoresco e combatido pelas hagiografias sobre a vida de santos e mrtires. Divididos entre a orao e o pecado, o homem medieval v nas cruzadas uma forma de adquirir o perdo divino. Se confrontarmos essa realidade com a realidade dos Cavaleiros da Tvola Redonda e a Demanda perceberemos uma grande afinidade entre ambas, pois as aventuras

existentes na busca do Graal eram formas de peregrinao. Sendo que na Demanda a fantasia e a realidade se misturam, a ponto de no discernimos os limites entre esses dois mundos.

!

Em suma, no sem razo que a Demanda considerada o maior monumento literrio da Idade Mdia, pois alm de ser uma obra coesa e extraordinariamente bem estruturada, ela tambm retoma elementos de crena heterodoxas, no para puni-los ou cerce-los, mas para rev-los e at absorv-los, segundo os dogmas da Igreja.

Indicao de FilmeTTULO DO FILME: EXCALIBUR (Excalibur, inglaterra, 1981) DIREO: John Boorman ELENCO: Nigel Therry (Rei Arthur), Helen Mirren (Morgana),Nicholas Clay (Lancelot), Cherie Lunghi (Guinevere), Paul Geoffrey (Percival), Nicol Williamson (Merlin), Robert Addie (Mordred), Gabriel Byrne (Uther Pendragon); 142 min. Durante muitos sculos, historiadores consideraram Rei Arthur apenas um mito, mas a lenda, acredita-se, baseava-se em um heri real, dividido entre suas ambies pessoais e o dever para com o povo.

2 poca Medieval

As manifestaes literrias da primeira poca medieval caracterizavam-se pelo predomnio da oralidade e, por esta razo, as cantigas trovadorescas tiveram maior destaque. O sculo XV, segunda poca medieval, representa um momento de transio entre a literatura trovadoresca e o Renascimento do sculo XVI, quando a prosa e o teatro ganham o primeiro plano. um dos perodos mais dinmicos da histria portuguesa, pois, nesse sculo, alm de aumentar seus domnios, Portugal mostra para a Europa a fora da coeso moral de um povo solidrio e fiel ao seu rei e uma unidade poltica inviolvel, at ento desconhecida. Inicia-se em 1415, com a tomada de Celta, o perodo dos descobrimentos e das conquistas martimas. Durante mais de cem anos a nao lusa se deteve no propsito mercantilista e a literatura acompanhou esse movimento, dando grande importncia aos trabalhos histricos e didticos: produo de textos de carter documental, cuja finalidade primeira no seria exatamente literria e sim de doutrinao. Portanto, podemos deduzir que as grandes criaes artsticas no encontravam espao, e as canes, at ento comum aos palcios, ficaram restritas s reunies familiares. A prosa doutrinal encontra na famlia de Avis expoentes notveis no sc. XV: O Livro da Montaria de D. Joo I, sobre a arte e os prazeres da caa; A Ensinana de Bem Cavalgar Toda a Sela e Leal Conselheiro, sobre a arte de montar e sobre a tica e a prtica da vida quotidiana, respectivamente, de D. Duarte; e Virtuosa Benfeitoria, adaptao de Sneca sobre os benefcios dos nobres, do Infante D. Pedro.

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da

Literatura Desde os meados do sculo XIV, a escola trovadoresca em Portugal, Portuguesa assim como o exerccio da poesia, da imaginao e da sensibilidade comeoua ser substitudo pela cultura da fora fsica. Afonso IV que inicia ostensivamente o predomnio do corpo sobre o esprito. Eram muitos os exerccios praticados naquela poca, dentre os mais apreciados estavam as caadas, a montaria, sem contar as lutas, os torneios, as justas, etc. Por conta dessa mudana no gosto da sociedade que surgiu uma literatura que refletia as preocupaes dominantes da poca. Um bom exemplo D. Fernando, ele trazia a casa cheia de falces e encarregou seu falcoeiro Pero Menino de elaborar um tratado de mezinas para aplicar s doenas que atacavam os falces. Este livro, entre outros semelhantes, tem reduzido valor literrio; o que no acontece com o Livro da Montaria, de D. Joo I, considerado um valioso documento da literatura desportiva portuguesa. O livro da Ensinana de Bom Cavalgar D. Duarte, ainda prncipe, comeou este livro, levado pelo desejo de ensinar aos seus sditos a teoria de bem cavalgar. uma obra original, no decalcada dos modelos clssicos, onde no abundavam livros destes, um fruto da sua experincia. Todavia esse livro no pode ser considerado apenas um ensinamento sobre equitao, pois ele transcende a esfera profissional e penetra no campo psicolgico, falando sobre o medo no aprendizado da disciplina e recomenda a beleza das atitudes na prtica dos exerccios. a percepo esttica do jogo clssico. O Leal Conselheiro Devemos a primeira edio deste livro aos esforos de dois portugueses, moradores de Paris: o visconde de Santarm e Jos Incio Roquette, o conhecido dicionarista. No tendo unidade de tempo nem de pensamento: um tratado de recopilao enciclopdica, que versa as disciplinas mais variadas. D.Duarte, esprito exatssimo, profundo observador, adquiriu cedo o costume de tomar apontamentos por escrito. No confiava na memria. O livro era dedicado a sua esposa, a rainha, e tinha, como o ttulo indica, um fim educativo, era como que um guia de moral caseira. O estilo de D. Duarte Sem nenhum talento potico, D. Duarte empregava uma linguagem excessivamente culta, prtica pouco aceita no perodo medieval. Muito rigoroso no emprego dos vocbulos, chegava por vezes a discriminar as diferenas de sentido um dos primeiros em Portugal que no crem na existncia de sinnimos. Contudo, isso no deve ser atribudo ao seu instinto literrio, e sim a sua cultura moral e desejo de perfeio. Lia e traduzia o latim no

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O gosto dos desportos

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desejo de se aproximar ao mximo do original e este empenho de tradutor que d ao seu estilo um carter arrevesado e truncado, pois limitava-se a aplicar a sintaxe latina na frase portuguesa. O cronista Ferno Lopes Ao tempo em que D. Duarte compunha os ltimos captulos do Leal Conselheiro, comea Ferno Lopes, arquivista das escrituras desde 1417, a registrar em crnicas as estrias dos antigos reis de Portugal. Sua obra fruto de um imenso trabalho, realizado em quinze anos de busca fadigosa de documentos antigos de toda espcie e em vrias lnguas. Compreendendo todas as crnicas, desde a do conde D. Enrique at de D. Joo I. Inclusive, as crnicas dos reis antigos, que foram atribudas a Rui de Pina um furto literrio denunciado por Damio de Gis com base, sobretudo, nas diferenas estilsticas existentes. Das crnicas que escreveu, s restam trs: a) Crnica de D. Pedro Esta crnica abrange os dez anos de reinado de D. Pedro (1357 a 1367). constituda por um prlogo e quarenta e quatro captulos. Tal como fez para as restantes crnicas, Ferno Lopes apoiou-se em fontes narrativas e diplomticas, como o caso dos documentos dos livros da chancelaria de D. Pedro. Histria e mito tendem a se confundir no imaginrio advindo do episdio que envolve Ins de Castro e seu amante, o futuro rei de Portugal D. Pedro, filho de D. Afonso IV. Os primeiros textos de que se tem notcia a enfocar o drama do Romeu e Julieta portugus (nas palavras de Alexandra MARTINS) so de Ferno LOPES (1380?-1460?), cronista que conduz a historiografia lusitana a novas perspectivas, ao filtrar as lendas dos fatos. b) Crnica de D. Fernando Esta crnica foi, provavelmente, redigida por volta de 1436. constituda por um prlogo e cento e setenta e oito captulos. Comea por relatar as peripcias de pouco depois da morte de D. Pedro, em maro de 1367 e finda tambm pouco depois da morte de D. Fernando. Os ltimos seis captulos so de grande interesse, pois retratam a reao do povo e de uma parte da nobreza, quando D. Leonor Teles se torna regente do Reino, substituindo a sua filha D. Beatriz, rainha de Castela. c) Crnica de D. Joo I (1 e 2 partes) Esta crnica considerada a obra-prima de Ferno Lopes e, segundo algumas opinies, classificada como sendo mais pica do que Os Lusadas e muito mais nacional. Em cronologia a maior das crnicas, visto que abrange acontecimentos ocorridos durante 28 anos. Na concepo de Jos Hermano Saraiva, a primeira parte da Crnica de D. Joo I no uma crnica no sentido rigoroso do termo, mas um livro de histria, na acepo que hoje damos a esta expresso. Trata-se do primeiro livro de Histria que se escreveu em Portugal e, durante muito tempo, o nico. Nesta crnica, Ferno Lopes relata aquele que foi um dos momentos mais conturbados da histria portuguesa: a crise de sucesso de 1383/85.

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O CANCIONEIRO GERAL O fim do perodo de consolidao da lngua (ou de utilizao do portugus arcaico) marcado pela publicao do Cancioneiro Geral de Garcia Estudo da Literatura de Resende, em 1516, perodo no qual o Portugus tornou-se uma lngua Portuguesa madura, com uma tradio literria riqussima, separando-se definitivamente do galego (no sc XV, a lngua na Galiza comeou a ser influenciada pelo Castelhano basicamente o Espanhol moderno). Tempo em que as guerras e a instabilidade da poltica no refrearam a aspirao de uma vida melhor, pelo contrrio, a nobreza compreendeu que s em volta do rei lhe restava viver para se abrigar da penria e da opresso. A aristocracia comeou a freqentar e cultivar as reunies e as maneiras do palcio. Nos tempos de D. Joo II, os seres tiveram grande esplendor, pois o rei prezava a poesia e sentindo que a sociabilidade poderia funcionar como uma obra de propaganda poltica, encontrou nesses encontros uma maneira de ter os fidalgos na mo. A corte, ento, tornou-se o principal centro de produo cultural e literria, graas a esse fortalecimento da casa real. Freqentador da corte, o risonho e inteligente Garcia de Resende, homem da criao de D. Joo II, teve a tima idia de compilar a produo potica do lirismo palaciano, obra que publicou em 1516, sob o nome de Cancioneiro Geral. A moda de colecionar a poesia cortes viera da Espanha, pois l, a vida cortes e galante comeou mais cedo do que em Portugal, graas ao favor de reis como D. Joo II, grande agasalhador de poetas. O que resultou, na segunda metade do sculo XVI, um acusado predomnio da cultura e da lngua castelhanas. No , pois, de se admirar que topemos no Cancioneiro de Resende com numerosas composies em castelhano, e este hispanismo continuar pelo sculo de Quinhentos, favorecido j agora pela hegemonia poltica de Espanha. Mas, acentuar-se, a maior e melhor parte do Cancioneiro est em lngua portuguesa. certo que h na poesia palaciana mais futilidade, j que a prpria ocasionalidade da inspirao d um profundo acento a algumas composies feitas lembremos que foram compostas para serem recitadas e no para serem publicadas em livro. O fato mais insignificante despertava a inspirao potica. E tudo isso se dava num ambiente de liberdade, caracterstico da renascena. A tradio lrica galego-portuguesa Um dos fatos que devemos primeiramente destacar no Cancioneiro a persistncia da antiga tradio lrica, no claro sob o aspecto formal, pois h muito desaparecera o paralelismo da cantiga de amigo, mas pelo que se refere s tendncias permanentes do temperamento saudosista. O amor triste ainda muito presente no Cancioneiro de Resende.

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Mas o amor adquire aspectos novos, torna-se mais natural e mais atrevido. A dama aparece em acordo com a realidade e as relaes afetivas so incrementadas por um toque de ardncia sensual. Havia, pois, um conflito aberto entre as duas concepes do amor: a tradicional, platnica, e aquela que j se respirava na atmosfera clida e sensual da renascena. A corrente satrica Obedecendo ainda a uma corrente da antiga tradio, encontramos no Cancioneiro freqentes exemplos do escrnio de amor; o poeta, despeitado dos rigores da dama, retrataa em cores de fealdade fsica ou moral. Como modelo do poeta cmico, galhofeiro, que no desce ao fundo das coisas e se atm aos aspectos ridculos da vida, o Cancioneiro oferecenos Henrique da Mota que, em certo modo, pode ser considerado um precursor de Gil Vicente, pois que as suas composies, dialogadas, so teatralizveis e constituem verdadeiras farsas. As peas satricas mais notveis em alcance social so as trovas de lvaro de Brito Pestana a Lus Fogaa sobre os ares maus de Lisboa, as de Duarte da Gama s desordens da vida portuguesa e as de Lus da Silveira e Garcia de Resende mudana dos tempos. Dantismo e petrarquismo A influncia dantesca aparece j no perodo galego-castelhano, mas vai-se acentuando cada vez mais, at que, no ltimo quartel do sculo XV, d lugar a uma forma especial de poesia. Essa imitao de Dante de primeira mo deu-se primeiramente em Espanha e depois em a Portugal, por intermdio de Juan de Mena e do Marqus de Santilhana. A influncia indireta de Dante foi igualada, seno at superada pela arte francesa, que era mais clara, superficial e acessvel. Outra influncia italiana e essa mais direta e profunda, porque encontrava correspondncia no nosso temperamento, foi a de Petrarca, que renovara no sculo XIV o lirismo dos velhos trovadores. A atitude petrarquista manifestase nas antteses, nas imprecaes dolorosas e na utilizao artstica da natureza como espelho ou contraposio do estado de alma do poeta. Temos, pois, que a dupla influncia de Dante e de Petrarca despertou, ou melhor, renovou a sensibilidade romntica na poesia portuguesa: porque h uma verdadeira antecipao romntica na poesia do Cancioneiro que se mostra nos contatos entre o poeta e a natureza e ainda em o poeta procurar, numa saudade triste, os lugares em que viveu os seus antigos amores. O esprito clssico J na poesia alegrica evidente um certo estendal de erudio mitolgica, mas se a forma denuncia j uma curiosidade renascentista, o fundo ainda mais romntico-medieval.

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! !22

Esse mesmo esprito clssico provocou algumas tentativas falhadas de poesia pica. O ar andava, j ento, carregado de inspiraes hericas. Simplesmente, ainda no chegara o tempo e o poeta que as havia de condensarem estrofes imortais. Um poeta de ento, Lus Henriques, exercitara Estudo da Literatura o verso maior em assuntos graves. Nem todos, porm, se deixaram ir nessa Portuguesa corrente. E um pequeno grupo de poetas, tocado de esprito horaciano, cultivando o conceito filosfico da mediania dourada, comeou a reagir margem do bulcio do palcio, contra as ambies do tempo. Esse pequeno ncleo aparece representado no Cancioneiro por Diogo de Melo, Nuno Pereira e Joo Roiz de Castelo Branco.

Indicao de FilmeTTULO DO FILME: 1492 - A CONQUISTA DO PARASO (1492: Conquest of Paradise, ESP/FRA/ING, 1992) DIREO: Ridley Scott ELENCO:Grard Depardieu, Sigourney Weaver, Armand Assante, ngela Molina, Fernando Rey, Tcheky Kario, 150 min, Vdeo Arte. A viagem de Cristvo Colombo insere-se no cenrio da expanso ultramarina liderada por Portugal e Espanha entre os sculos XV e XVI. Portanto, para compreender a passagem da Idade Mdia para a Idade Moderna, necessrio inseri-la no quadro das transformaes por que passou a Europa na Baixa Idade Mdia (sculo XII ao XV), durante a transio do feudalismo para o capitalismo comercial.

Complementares

Atividades

1. 2.

O sentimento do eu-lrico ou eu-potico idealiza a mulher, elevando-a a um pedestal. Que versos expressam essa idealizao?

Alm de colocar nas mos de Deus a possibilidade de ser feliz, o poeta atribui a Ele a responsabilidade pela beleza da mulher. Que fragmento da cantiga expressa a segunda idia?

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da

Literatura Portuguesab) A quem ele dirige seus pedidos?

Estudo

3.

O eu-lrico masculino e tem um desejo. a) O que ele pede?

c) Se os pedidos no puderem ser atendidos, qual a soluo entrevista pelo eulrico?

4. 5.

Nesse texto aparecem as caractersticas mais comuns da Cantiga de Amor. Trace um paralelo com o que voc apreendeu sobre a Cantiga de amigo, confrontando as diferenas e semelhanas entre elas.

Alguns compositores se inspiram nesses tipos de cantiga para elaborar suas composies. Nos dias atuais, que exemplos de Cantiga de Amor e de Cantiga de Amigo podemos extrair da msica brasileira.

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DO TEATRO PORTUGUS AO ARCADISMOO Teatro de Gil VincenteDurante a Idade Mdia surge em Portugal o Teatro Vicentino, representao que se caracteriza pelos temas, linguagem e atores populares. A carreira literria de Gil Vicente comea em 1502, quando representa o Auto da Visitao, at o ano de 1536, ano da representao de sua ltima pea Floresta de Enganos. Durante os anos de sua trajetria teatral dedicou-se a escrever e representar teatro para o entretenimento da realeza e da fidalguia, so dezenas de peas de temas variados. Escreveu cerca de 44 peas: 17 bilnges, 16 em portugus e 11 em espanhol. Na corte portuguesa usava-se, tambm, o idioma espanhol em razo da rainha Maria, segunda mulher de D. Manuel I, ser filha dos Reis Catlicos da Espanha. Alm disso, falar espanhol era sinal de distino entre os nobres, pois o povo falava apenas portugus. Didaticamente, pode-se dividir em fazes o teatro vicentino. Temos trs fazes principais: 1502-1514 Sob influncia de Juan del Encina. 1515-1527 Corresponde ao pice da carreira dramtica. 1528-1539 Teatro intelectualizado, sob influncia do classicismo renascentista. Quanto ao tema, pode ser dividido em: Tradicional Peas de carter litrgico, ligados ao teatro de Juan del Encina, aos assuntos buclicos e s novelas de cavalaria. Atualidade Caracteriza-se pela presena de um retrato satrico do modo de viver do seu tempo, e no perdoa nenhuma classe social, seja ela a fidalguia, a burguesia, o clero ou a plebe. um teatro baseado na espontaneidade e com intento de divertir e organizava-se sob a lei do improviso. Supe-se que Gil Vicente redigia um roteiro bsico, apenas para ordenar a encenao em uma seqncia verossmil. Lrico ou cmico, seus textos continham a predominncia da viso medieval e de uma nostalgia de um tempo perdido. O grande mrito do autor o seu talento de poeta, sobretudo de poeta dramtico, em conseqncia disso que o teatro vicentino se tornou um marco dentro da Literatura Portuguesa.

VOC SABIA QUE... A obra literria vicentina possui uma linguagem arcaica, popular, no polida e sem termos eruditos? que, mesmo escrita em linguagem popular, o vocabulrio rico, se adequando aos personagens, valendose ainda do latim eclesistico e do baixo latim usado pelo povo? .25

Suas peas esto classificadas em obras de devoo, comdias, tragicomdias, farsas e obras midas, como monlogos e parfrases de salmos e apresentam a seguinte diviso:da

Os Autos: so composies religiosas, pastoris, nos quais se nota a Literatura influncia do teatro pastoril de Joo de Encima, dramaturgo espanhol. So Portuguesa medieval. As comdias: trazem valores greco-romanos e mitolgicas, contendo relatos romanescos como as novelas de cavalaria.

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peas de temtica devota e moral, alegrica, que refletem os valores do mundo

As farsas: preservam a mesma estrutura dos autos, traando, porm, uma caricatura contra os maus costumes, apresentando uma crtica social contundente, mordaz, carregada de aluses pessoais. De carter pedaggico moral, h uma longa tradio na farsa medieval sobre o tema do adultrio feminino. RESUMINDO... Primeira fase: 1890 a 1198-1434 A criao literria portuguesa, no primeiro perodo medieval (1890 a 1198-1434), corresponde florao trovadoresca e acontece quase simultaneamente formao da nao lusa. Essa produo cultural denominada tambm de cantigas era composta pelos trovadores e cantada pelos jograis que percorria todo o reino em ambientes diversos. A fim de preservar essa literatura, que era transmitida oralmente, fora fixada por escrito em coletneas denominadas cancioneiros. A poesia trovadoresca dividida em dois tipos: lrico-amorosa compreendendo s Cantigas de Amigo, associadas ao canto e dana, impregnadas do realismo da vida campesina, da sensualidade, queixume, euforia, amor popular e amor burgus; e as Cantigas de Amor de origem provenal, marcadas pela vassalagem amorosa, impregnadas pelo idealismo, a coita de amor e idealizao da mulher. O outro tipo a satrica subdivida em escrnio, maldizer, seguir e teno de briga. Os principais trovadores desse perodo foram Paio Soares de Taveirs D. Dinis, Martim Codax, Aires Nunes e Joo Garcia de Guilhade. Alm poesia a poca trovadoresca se caracteriza tambm pelo aparecimento da prosa medieval: novelas de cavalaria, retratando um herosmo de influncia religiosa e feudal, biografias, crnicas e livros de linhagem. Segunda fase: 1434-1527 Perodo conhecido tambm como Humanismo, vai desde a nomeao de Ferno Lopes como cronista-mor da Torre do Tombo, em 1434, at o retorno de Francisco S de Miranda da Itlia, quando introduziu uma nova esttica, o Classicismo, em 1527. Teve como principais caractersticas a divulgao dos mestres da Antiguidade greco-latina, o incentivo s Universidades, a laicizao da cultura e o Culto do Homem. A prosa, no humanismo portugus, consistiu, principalmente, na crnica histrica e teve como principal expoente Ferno Lopes um cronista realista de tcnica literria da narrativa, um criador de perfis psicolgicos que tratou o povo como agente da histria. Destacaram-se, tambm, Gomes Eanes de Zurara e Rui de Pina. Outro tipo de prosa

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inaugurado pelo regime absolutista da dinastia de Avis foi a prosa doutrinria, direcionada para a educao da realeza e da fidalguia, com o sentido de orient-la no convvio social e no adestramento fsico. Alm da prosa tivemos a poesia palaciana recolhidas por Garcia de Resende no Cancioneiro Geral. So poesias j dissociadas de msica, elaboradas para serem lidas e recitadas nas cortes. Surge tambm o Teatro popular de Gil Vicente produo literria caracterizada pela stira sociedade portuguesa e a viso religiosa medieval moralizadora.

ClassicismoO Renascimento e a Lrica Camoniana Considerado o marco inicial da era moderna, o Renascimento o mais importante movimento de renovao cultural ocorrido na Europa durante os sculos XV e XVI. O crescimento gradativo da burguesia comercial e das atividades econmicas entre as cidades europias estimulou a vida urbana e o surgimento de um novo homem cujo reconhecimento de seu valor contribuiu para o enriquecimento do ambiente cultural, resultando na formao de um novo clima intelectual otimista e confiante na fora do ser humano que se torna o centro do universo (antropocentrismo), manifestado pela ruptura com a tradio feudal que era marcadamente religiosa e teocntrica. A viso humanista o primeiro impulso para o surgimento do Classicismo. Esse movimento literrio surge em Portugal, em 1527. E, como resultado da mudana que o homem tinha de si mesmo sendo, portanto, uma continuao do Humanismo so traduzidas e difundidas numerosas obras gregas e latinas, de assunto literrio, filosfico e cientfico, com o objetivo de reviver os ideais da Antigidade Clssica, influenciando assim, as artes, a cultura e a literatura. Essa retomada Antiguidade clssica influi diretamente na linguagem, na forma e nos temas. A linguagem clssico-renascentista a prpria expresso das idias e dos sentimentos do homem do sculo XVI, sendo usada com clareza e objetividade, sbria, simples e precisa. A valorizao da forma est expressa na preferncia pelo soneto, com versos decasslabos distribudos em duas quadras e trs tercetos. Nesses versos usada a chamada medida nova em oposio redondilha medieval, chamada de medida velha. Nos temas, presenciamos o uso da mitologia, do amor platnico, da exaltao das faculdades humanas (o heri nacional), do nacionalismo, do culto beleza e da perfeio. Temos, ento, algumas caractersticas que individualizam o Classicismo: Humanismo Valorizao da antiguidade Conteno lrica Locus Amoenus Carpe Diem Verossimilhana Ausncia de Conflitos

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da

Literatura Portuguesa

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Portugal , ento, um dos pases mais importantes da Europa e se encontra mergulhado no esprito aventureiro das viagens martimas e dos descobrimentos. O esprito renascentista pode ser entendido como oposto ao que orientou o mundo medieval. O antropocentrismo toma o lugar do teocentrismo e o homem passa a valorizar o conhecimento, a filosofia e se volta para a razo. Em Portugal, Lus de Cames o homem-sntese, a expresso do Renascimento. Cames inaugurou, em se tratando de linguagem potica, o Classicismo em terras Lusas. Considerado o poeta mximo da lngua portuguesa, tem sua obra dividida em duas fases, a Lrica e a pica. A pica tem nOs Lusadas a sua mais importante obra classicista. A Lrica representada pelos sonetos, mas tambm contribuiu com canes e redondilhas. E, no gnero Dramtico, escreveu Anfitries, Filodemo e El rei Seleuco. Suas obras se situam entre o Classicismo e o Maneirismo. Plato, Petrarca, Horcio, Virglio entre outros do clssico grego e romano, assim como todo o Renascimento, pulsam na poesia de Cames, mas, dentre todas as influncias recebidas, Plato considerado a principal, pois foi nas passagens da doutrina Platoniana que Cames soube ver uma forma de investigar as relaes da palavra com seu referente, fazendo dele um exmio manipulador das mesmas. [...] Que alma tbua rasa Que com escrita doutrina Celeste tanto imagina. Que voa da prpria casa E sove a ptria divina [...] Os sonetos contm um grande lirismo. A preocupao tcnica impressiona o mais parnasiano dos poetas, a mais comum das rimas de Cames possui os 14 versos em decasslabo, distribudos em 2 quartetos e 2 tercetos, de rima abba-abba-cde-cde. de clara descrio do ambiente, percebendo-se a presena de elementos pagos e catlicos. Os temas giram em torno do amor, abordado principalmente atravs da anttese amor platnico x amor carnal; da busca da perfeio; do desconcerto do mundo; da ptria; de Deus; da figura feminina, na figura idealizada da mulher x beleza fsica; e da viso da natureza. Infelizmente, dizem alguns estudiosos, que alguns sonetos que a ele so atribudos, no so realmente de sua autoria, como por exemplo, um dos mais lidos e apreciados por seu lirismo de beleza universal: Amor fogo que arde sem se ver; ferida que di e no se sente; um contentamento descontente; dor que desatina sem doer; [...]28

VOC SABIA QUE...

Entre os sculos XV e XVI, Portugal um dos pases mais importantes da Europa?

RESUMINDO... O novo estilo de poca que caracteriza o Renascimento denominado de Classicismo e, em Portugal, marcado pela convivncia do feudalismo com o mercantilismo, pelas grandes descobertas e por importantes transformaes culturais. As principais caractersticas do movimento foram a imitao dos clssicos gregos e latinos, o racionalismo, o antropocentrismo e o neoplatonismo. Os autores de destaque foram S de Miranda, introdutor do movimento; Bernardim Ribeiro poeta e novelista; Antnio Ferreira que, alm de poeta, era tambm dramaturgo, e Lus Vaz de Cames escritor mais representativo do Renascimento sendo tambm o prenunciador do Barroco. Alm de poeta Cames era dramaturgo e cabe-lhe no que concerne a linguagem potica a inaugurao do movimento em terras Lusas. Considerado o poeta mximo da lngua portuguesa, tem sua obra dividida em duas fases, a Lrica e a pica. No sculo XVI comparece, tambm, a prosa historiogrfica tendo como principal representante Joo de Barros, cuja concepo de histria caracteriza-se pela preocupao de contribuir com o exemplo moral e superior dos heris para a elevao dos espritos. Outros historiadores desse perodo foram Gaspar Correia, Ferno Lopes de Castanheda, Damio de Gis e outros. A Novela de Cavalaria se nacionaliza com Joo de Barros que traz como heri nessas narrativas os portugueses.

BarrocoDois fatos importantes ocorridos em 1580, quando se inicia o Barroco em Portugal, marcam a vida cultural e poltica do pas, a morte de Cames e a de D. Sebastio na batalha de AlccerQuibir na frica. Com o desaparecimento do rei, o trono portugus passado para Felipe II, da Espanha, sendo Portugal anexado Espanha e permanecendo sob seu domnio durante 60 anos. Desse modo, o Barroco acontece em meio a uma crise de identidade do povo portugus, que sob o julgo espanhol esfora-se em preservar sua cultura e sua lngua, todavia percebe a impossibilidade de ignorar as influncias culturais espanholas. Ao mesmo tempo em que recebe forte influncia da Contra-Reforma, de grande penetrao nos pases ibricos. Segundo Massaud Moiss 1,o movimento Barroco iniciado em Espanha e introduzido em Portugal durante o reinado filipino de instvel contorno por corresponder a uma profunda transformao cultural, cujas razes constituem ainda objeto de polmica. Se tomarmos como base o aspecto literrio, percebemos traos do Barroco j no Renascimento, no chamado Maneirismo. O Barroco, no entender de alguns estudiosos, tornou-se a arte da Contra-Reforma, a qual teria absorvido a esttica barroca fazendo dela uma espcie de estratgia de catequese, mesmo porque nesse perodo o ensino fica quase por completo a cargo dos jesutas. A censura eclesistica, nesse sentido representou um obstculo a qualquer avano no campo cientfico cultural, por conta disso enquanto a Europa vivia um perodo de efervescncia cultural a Pennsula Ibrica permanecia um reduto da cultura medieval.

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MOISES, Massaud. A literatura portuguesa, 3a edio, So Paulo: Cultrix, 1990.

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A esttica barroca procurava sintetizar a viso de mundo medieval de base teocntrica e a ideologia clssica renascentista, pag, terrena e antropocntrica. Era a tentativa de conciliar elementos opostos como o claro e o escuro, a matria e o esprito, a luz e a sombra visando anular pela Estudo da Literatura unificao a dualidade do ser humano, dividido entre os apelos do corpo e os Portuguesa da alma. A arte assume, assim, uma tendncia sensorial ligada ao mundo fsico, ao mundo das percepes dando preferncia s figuras de linguagem, a um vocabulrio rebuscado e aos jogos sonoros. Como vimos, a dicotomia barroca servia como representante das confuses no esprito do homem da poca. Esse embate entre os dois plos radica no problema do conhecimento da realidade, que nessa perspectiva se faria de dois modos. No primeiro modo, o conhecimento se faria pela descrio dos objetos, num estado de verdadeiro delrio cromtico, em que se procurava saber o como das coisas. Conhecer seria descrever. Essa tendncia recebe o nome de Gongorismo, por conta da influncia do poeta espanhol Lus de Gngora e seus adeptos, procuravam cultivar uma linguagem rebuscada, especiosa e rica e, para alcan-la consideravam de bom tom o emprego de neologismos, hiprbatos, trocadilhos, dubiedades e todas as demais figuras de sintaxe que tornam o estilo pesado, tortuoso e alambicado. Expresso em forma de poesia. No segundo modo, o conhecimento se faria pela anlise dos objetos no sentido de lhes conhecer a essncia, ou melhor, saber o que so, conceitu-los, para tanto, utilizamse da inteligncia e da razo sem prejuzo dos sentidos. Corrente denominada de conceptismo, expressa, sobretudo, em prosa, tinha como um dos principais representantes o espanhol Quevedo, do qual deriva o termo Quevedismo. No devemos pensar com isto que tais correntes jamais se cruzaram, mesmo porque comum encontrarmos numa mesma escritura traos tanto do Gongorismo como do Conceptismo. Ambos obedecem a uma concepo pragmtica de arte: o primeiro, enaltecendo as sinestesias, procura criar um clima de brincadeira verbal com o objetivo de entreter; o Gongorismo no raras vezes se prope como espetculo para o gozo dos sentidos, no qual se confundem poesia e prazer ldico. No podemos esquecer que o Barroco comeou nas artes plsticas, sendo essa poca uma das mais importantes para as artes plsticas, embora no o seja para Portugal, onde poucas vezes alcanaram maior nvel, relativamente ao resto da Europa, incluindo a Espanha aonde a arte barroca atingiu graus de primeira grandeza. Para Portugal esta literatura no apresentou o brilho do sculo anterior. Faltou poca uma atmosfera comum, pois os intelectuais eram guiados por clichs ou padres estticos de alambicamento e de forado sentido literrio. Falta poca a conexo entre os homens, apenas aproximados por coincidncia. Alguns representantes do Barroco VOC SABIA QUE... Padre Antnio Vieira tambm estudado na Literatura Brasileira?

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Padre Antnio Vieira O padre Antnio Vieira grande expresso do Barroco portugus e brasileiro era assistido por grande dinamismo e boa oratria. Pensou muita das questes candentes em seu tempo e procurou agir praticamente para lhes d um rumo compatvel com aquilo que julgava correto numa linha mental e poltica. Para o autor, o ato de pregar tinha como fim ltimo a reafirmao dos dogmas da igreja, da redeno humana e da autoridade absoluta do papa. Tendo sempre objetivos morais, Vieira procura convencer para ensinar, orientar, excitando os fiis no entendimento das mensagens evanglicas que pretende transmitir. Os sermes de Padre Antnio Vieira seguem a estrutura clssica que compreende intrito (ou exrdio), em que o orador declara o plano a utilizar na anlise do tema em pauta; desenvolvimento (ou argumento), em que apresenta o sermo propriamente dito; e a perorao em que finaliza conclamando os ouvintes a seguirem prtica das virtudes propostas. Para Vieira os valores constituintes de um perfeito orador so trs: ensinar, deleitar e mover. Diante disso, pregar agir, falar no apenas falar, e sim pensar e fazer. Escreveu alm de mais de quinhentas cartas, algumas delas em torno de importantes questes da poca, obras de profecia, mas por seus sermes que Vieira mais conhecido. De contorno dilemtico, contraditrio, feito de antteses e oposies, instvel como o prprio ondular das idias no esforo de orientar e persuadir, os sermes vieirianos correspondem preocupao de anular a dicotomia radical existente no ser humano formado que de corpo e alma. A caracterstica comum s produes de Vieira a unio do tema religioso questo poltica, ofensivo, atacava tanto a inquisio portuguesa na perseguio aos judeus, quanto escravido que se imprimia vida do indgena. Barroco, conceptista e no gongrico, o padre Vieira parte sempre de um fato real, observado ou de flagrante presena para, de pronto, persuadir o ouvinte, chamando-o ao dever de pensar e de reagir. Para ele, o sermo no era apenas pensamento e palavra, era necessrio pregar com gesto e voz. Voz forte, na tentativa de tirar o homem do tempo presente e projet-lo para o futuro eterno. Sror Mariana Alcoforado Sror Mariana Alcoforado nasceu em Beja, onde professa cedo no Convento de Nossa Senhora da conceio. Em 1663 conhece Chamilly, oficial francs servindo em Portugal durante as guerras da Restaurao. Enamoram-se. Um dia, porm, o militar regressa Frana impelido por chamado superior, teriam trocado cartas, das quais s ficaram as escritas pela religiosa. Em 1969 publicam-se em Paris, pela primeira vez, as Lettres portugaises traduites em franais. Naquele mesmo ano sai uma nova edio em Colnia e da para frente foram lidas e traduzidas em vrias lnguas, sempre com progressivo interesse. Embora existam muitas dvidas acerca da autoria e da originalidade da mesma inegvel a importncia destas cartas para a literatura portuguesa. Perpassa-as um sopro de paixo incontrolada, insana, superior s inibies e convenes e ao impulso da vontade e da conscincia moral. Paixo e no amor, pois o sentimento expresso contm na raiz um

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avassalador mpeto carnal, explicvel, inclusive, pelo quadro barroco em que o caso amoroso se desenrola. As cartas ganham maior relevo ainda como documento literrio precisamente por no visarem a publicao nem a serem encaradas como pea literria. Estudo

Dispostas da forma como se apresentam, as cartas descrevem uma curva cujo pice marcado pela terceira carta na qual o sofrimento atinge o limite mximo, graas concentrao de efeitos e sensaes, apoiada numa linguagem precisa, concisa, ao mesmo tempo em que suficientemente plstica para apreender o ziguezague da paradoxal confisso. Outros autores barrocos No Barroco portugus, a prosa foi mais explorada. Tivemos alm de Vieira, Padre Manuel Bernardes, cuja produo marcada pela clausura. O autor procura mostrar em seus textos que a relao com Deus possvel pelo culto das virtudes morais. D. Francisco Manuel de Melo produziu uma obra variada e numerosa que compreende poesia, historiografia, teatro polmica, biografia e literatura moralista. Francisco Xavier de Oliveira (o Cavaleiro de Oliveira, como ele assinava) escreveu obras de observao e com propsitos definidos: realizar conquistas amorosas, defender-se dos ataques que lhe eram dirigidos e satirizar os costumes da poca. O teatro foi representado por Antonio Jos da Silva, que transforma a dramaturgia portuguesa. Escreveu suas peas em prosa utilizando-se de aspectos da sociedade de Lisboa para satirizar atravs do riso. A poesia barroca A poesia barroca portuguesa seguiu caminho diferente do da literatura doutrinria e moralista. Era poesia para entreter, valia pelo aspecto ldico, pelo divertimento verbal, expresso no malabarismo das imagens e das correlaes sintticas. Em sntese correspondia mais ao culto da forma, do verso, que do contedo. Apresenta-se em figuras isoladas e em antologias organizadas com o mesmo intuito das compilaes dos cancioneiros medievais. Sobressaem D. Francisco Manuel de Melo e Francisco Rodrigues Lobo, Gabriel Pereira de Castro, Vasco Mouzinho de Quevedo e Antnio de Souza de Macedo.

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Indicao de Filme

TTULO DO FILME: A MISSO (The Mission, ING, 1986) DIREO: Roland Joff ELENCO: Robert de Niro, Jeremy Irons, Lian Neeson, 121 min., Flashstar Ao longo dos sculos XVI e XVII vrias misses catlicas foram criadas pelos jesutas na Amrica do Sul. Surgidas no sculo XIII, com as ordens mendicantes, esse trabalho de evangelizao e catequese, desenvolveuse principalmente nos sculos XV e XVI, no contexto da expanso martima europia. Embora o objetivo fosse a difuso da f e a converso dos nativos, as misses acabaram como mais um instrumento do colonialismo.

RESUMINDO... O incio do Barroco em Portugal marcado por dois fatos importantes que modificam a vida cultural e poltica do pas, a morte de Cames e a de D. Sebastio na batalha de Alccer-Quibir na frica. Este ltimo evento acarreta a incorporao de Portugal ao domnio espanhol, sob o qual permanece durante 60 anos. Desse modo, o Barroco acontece em meio ao fracasso econmico, estagnao cultural, recrudescimento da inquisio, Sebastianismo e patriotismo, alm de uma crise de identidade do povo portugus que se esfora em preservar sua cultura e sua lngua, embora perceba a impossibilidade de ignorar as influncias culturais espanholas. Ao mesmo tempo em que recebe forte influncia da Contra-Reforma. Podemos apontar como principais caractersticas do movimento o dualismo: razo e emoo; o medievalismo e renascimento; o conceptismo e cultismo. O principal representante desse movimento foi Padre Antnio Vieira que se dedicou a uma atividade literria bastante diversificada, compreendendo sermes, cartas e obras profticas. Considerado o maior prosador barroco, pertence tanto literatura portuguesa quanto brasileira, era conceptista e no apenas religioso, mas poltico e proftico. importante salientar ainda a presena de outros escritores desse momento como D. Francisco Manuel de Meio, os historiadores de Alcobaa, Frei Lus de Sousa, Sror Mariana Alcoforado e Antnio Jos da Silva.

Arcadismo ou NeoclassicismoO Arcadismo ou Neoclassicismo o perodo que caracteriza principalmente a segunda metade do sculo XVIII e deu as artes uma nova tonalidade burguesa. Vive-se, agora, o Sculo das Luzes, o Iluminismo burgus. Derivado do esprito crtico do Iluminismo, visa um retorno renovado aos gneros, s formas, s tcnicas e s expresses clssicas, que vingaram em Portugal no sc. XVI. O desenvolvimento das tcnicas de produo acarretou a grande evoluo das cincias naturais, pois se acredita que para expandir a produo fazia-se necessrio conhecer as propriedades da matria. Neste perodo, os filsofos passam a acreditar que a razo a nica fonte de conhecimento da natureza e da vida em sociedade. Portanto, a religio e a Igreja so vistas como instrumentos de ignorncia e tirania. Assim, cientistas e filsofos no aceitam, no plano poltico, o Estado absolutista e suas instituies. So contra a constante interveno do poder real na economia, pois isso limitava o direito da propriedade. O Arcadismo a expresso, na literatura, do momento ideolgico que se impe em meados do sculo XVIII representando a crtica da burguesia culta ao modo de vida da nobreza e do clero. De esprito reformista, pretendeu reformular o ensino os hbitos e o comportamento social em prol dos ideais da burguesia em ascenso. Se no sculo XVII Portugal esteve influenciado pela cultura espanhola, no sculo XVIII a influncia veio da Frana, mas especificamente da burguesia francesa, politicamente forte e responsvel pelo desenvolvimento da economia. Sua fora poltica se manifesta a partir de 1750, nos constantes ataques dos filsofos burgueses aos poderes real e clerical e na denncia da corrupo dos costumes. Podemos perceber que era um tempo de transformaes em toda a Europa, sobretudo na Frana. Mas Portugal, apesar de procurar seguir alguns dos passos dessas transformaes convive ainda com o peso de uma tradio ideolgica fundamentada em dogmas e princpios arraigados na cultura medieval, o que no significa ter o pas se ausentado por completo dessas mudanas. O sculo XVIII representou tambm para os

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portugueses o incio de um processo de modernizao nos setores econmico, poltico, administrativo, educacional e cultural. A partir do reinado de D. Jos (1750-1777), o ministro Marques de da Literatura Pombal, apoiado por diversos intelectuais, em especial Pe. Antnio Verney, Portuguesa promove uma srie de medidas que coloca Portugal num clima de efervescncia cultural. Dentre as mudanas efetuadas, merece destaque a proibio do ensino jesutico e sua substituio por uma educao renovada e mais progressista. Tais posturas originaram um amplo debate sobre a necessidade de renovar a cultura portuguesa.Estudo

Em 1756, funda-se a Arcdia Lusitana por iniciativa de Antnio Dinis da Cruz, Manuel Nicolau Esteves Negro e Teotnio Gomes de Carvalho. Inicia-se, assim, uma nova etapa literria empenhada em expressar o repdio s coisas inteis (inutilia truncat) que adornavam a poesia barroca. Acreditando que esta representou o desequilbrio e a decadncia dos valores clssicos, querem restabelecer a simplicidade da arte renascentista, para tanto, recuam no tempo at Antiguidade greco-latina em busca da mitolgica Arcdia e dos princpios norteadores da nova arte. Caractersticas do movimento: Empenhados em restaurar a literatura clssica e combater a arte barroca, o escritor rcade elegeu alguns princpios orientadores de sua escrita: A arte devia ser regida pelo princpio da verossimilhana, devendo, portanto, ser constituda de imaginao, mas de uma imaginao que no se chocasse com a natureza das coisas, pretendia-se, assim, atrelar a imaginao razo. Pregam a volta aos clssicos antigos (greco-latinos) e quinhentistas principalmente, Cames. Parte-se do pressuposto de que a beleza absoluta foi atingida por estes escritores, nada mais restando aos posteriores do que seguir-lhes as pegadas. Elogio da vida simples, sobretudo da natureza, no culto permanente das virtudes morais, uma vida medocre materialmente, mas rica em realizaes espirituais (aurea mediocritas). Fuga da cidade para o campo (fugere urbem), pois a primeira considerada foco de mal-estar e corrupo, o campo, por sua vez, resguarda o homem mantendo-o natural, sntese de espontaneidade e simplicidade. Desprezo ao luxo, riqueza e ambio, que enfraquecem o homem e elogio da vida serena, plcida pela superao dos desejos carnais. Idealizao amorosa, neoplatonismo, convencionalismo amoroso. O gozo pleno da vida, minuto a minuto, (carpe diem) na contemplao da beleza e da natureza. Racionalismo, a razo deve governar a emoo. Quanto estrutura literria ainda seguem os modelos antigos, defendem, portanto, a separao de gneros e a abolio da rima por consider-la uma contrio para o pensamento e o verso. Reivindicam tambm o emprego de metros simples e ressaltam a importncia da mitologia. Adotam pseudnimos pastoris para que o fingimento potico seja maior e imaginam-se vivendo num mundo habitado por deuses e ninfas, numa Natureza e num tempo fictcios, utpicos. Deve-se salientar que as caractersticas da esttica arcdica dizem respeito exclusivamente poesia, pois embora se cultivasse a prosa, esta no

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obedecia s regras rigorosas do arcadismo. Sendo um movimento de oposio aos exageros do Barroco, buscava-se, ainda, a clareza absoluta, o equilbrio e a simplicidade formal e de contedo. Representantes do movimento Manuel Maria Barbosa du Bocage Bocage o pastor Elmano Sadino da Nova Arcdia, poeta que foi consagrado pela imaginao popular como autor de piadas e anedotas picantes. Mas, alm desse anedotrio acrescido pelo gosto popular, Bocage possui vasta obra potica, legada pela tradio literria, em duas vertentes principais, a satrica e a lrica. A veia satrica de Bocage diferencia-se dos poetas anteriores por no ser impessoal, nem genrica, nem zombeteira, mas extremamente contundente, grosseira, feita de sarcasmo e ditada por um amor-prprio ferido, incapaz de perdoar. Inmeros aspectos sociais da poca no escapam sua crtica mordaz, critica o poder, percebendo a estreita unio existente entre os dogmas da Igreja e o poder absolutista dos reis. Escritores, frades, mulheres esquivas, senhores todo-poderosos, nada escapa crtica ou maledicncia de Bocage. Mas, a poesia lrica de Bocage, popularmente menos conhecida, a mais comentada pela critica literria que a considera sua produo superior. Nessas poesias revela-se a orientao do academicismo do sculo XVIII como a presena do pseudnimo pastoril, da mitologia clssica, a nsia do locus amenus, ilustrando o fugere urbem, a produo de sonetos. Todavia, por sua originalidade e pessoalismo, particulariza, sobretudo nos sonetos, sua poesia, retratando nela o seu drama potico indissocivel do seu drama pessoal; a sua obra, mais do que qualquer outra, permeada de experincias pessoais, marca-lhe a vida com suas grandezas, misrias, esperanas e desajustes. Sentimentos desmedidos transformam-se em matria potica na qual perpassa a natural indisciplina do poeta, fonte de uma permanente irritabilidade e orgulho desmedido e pressente-se a sua inconstncia amorosa exacerbada por um temperamento impulsivo e inclinado a um cime delirante. Escreveu em todos os gneros literrios em voga no seu tempo - idlios, odes, canes, epstolas, epigramas, fbulas - em todas elas, demonstrando a mesma qualidade de estilo, perfeito na adequao e no apuro do vocabulrio, na fluncia da dico e na seduo meldica, mas nos sonetos surgem composies de tipos completamente diferentes: erticos, morais e devotos, hericos joviais, libertinos e satricos e ainda filosficos. Apesar de ser fortemente influenciado pelo estilo dominante em sua poca comum encontrar na poesia de Bocage, principalmente nos poemas escritos depois de sua priso, uma luta constante entre a razo iluminista e a emoo. Nessa luta dolorosa e angustiante a emoo sobrepuja a razo, nas suas composies combina elementos neoclssicos com o gosto pelo pr-romantismo como a solido, o sofrimento, o amor-cime, a morte. Essas transgresses fazem de Bocage um poeta de transio entre o Neoclassicismo e o Romantismo, sua poesia anuncia os primeiros valores do Romantismo em Portugal, sendo o poeta, portanto, considerado por vrios estudiosos como um poeta pr-romntico.

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Outros autores Alm de Bocage, outros autores participaram do movimento rcade, como Antnio Dinis da Cruz e Silva, Padre Antnio Correia Garo, Domingos Estudo da Literatura dos Reis Quita pertencentes Arcdia Lusitana; Domingos Caldas Barbosa Portuguesa e padre Jos Agostinho de Macedo que faziam parte da Nova Arcdia. Alguns poetas, porm, renegaram a Arcdia ou fundaram grupos para combat-la, como Filinto Elsio pseudnimo do padre Francisco Manuel do Nascimento, que pretendia renovar a linguagem literria, pr-romntico pelo tom confessional de alguns poemas, exerceu influncia em muitos escritores do romantismo, inclusive Garrett e poetas brasileiros. Um outro escritor que no participou de nenhuma academia foi Nicolau Tolentino de Almeida, grande representante da crtica aos costumes sua obra constituda de stiras e de homenagens aos poderosos dos quais dependia, o curioso que essas stiras criticavam exatamente os poetas que viviam da mendicncia de favores. RESUMINDO... O Arcadismo ou Neoclassicismo caracteriza a segunda metade do sculo XVIII e deu s artes uma nova tonalidade burguesa. Vive-se, agora, o Iluminismo burgus e visa-se um retorno renovado aos gneros, s formas, s tcnicas e expresso clssicas. De esprito reformista, pretendeu reformular o ensino os hbitos e o comportamento social em prol dos ideais da burguesia em ascenso no pas. Mas, embora Portugal tenha procurado seguir alguns dos passos das transformaes em voga, convive, ainda, com o peso de uma tradio ideolgica fundamentada em dogmas e princpios da cultura medieval. Apesar disso, esse sculo representou para os portugueses o incio de um processo de modernizao nos setores econmico, poltico (Despotismo Esclarecido), administrativo, educacional e cultural. Surgimento das Academias de Cincias e as Academias Literrias. O Arcadismo a expresso, na literatura, desse momento ideolgico representando a crtica da burguesia culta ao modo de vida da nobreza e do clero e teve como caractersticas o racionalismo, o princpio da verossimilhana, a imitao dos clssicos, o ideal de vida pastoril (locus amenus) e a oposio ao Barroco: inutilia truncat. Principais autores: Nicolau Tolentino de Almeida - poeta satrico; Manuel Maria Barbosa du Bocage - poeta satrico e lrico considerado rcade e pr-romntico e Filinto Elsio que renovou linguagem literria em Portugal.

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ComplementaresO amor e a razoPinta-se o amor sempre menino, porque ainda que passe dos sete anos [...] nunca chega idade de uso da razo. Usar de razo e amar so duas coisas que no se juntam. A alma de um menino que vem a ser? Uma vontade com afetos e um entendimento sem uso. Tal o amor vulgar. Tudo conquista o amor, quando conquista uma alma; porm o primeiro rendido o entendimento. Ningum teve a vontade febricitante, que no tivesse o entendimento frentico. O amor deixar de variar, se for firme, mas no deixar de tresvariar, se amor. Nunca o fogo abrasou a vontade, que o fumo no cegasse o entendimento. Nunca houve enfermidade no corao, que no houvesse fraqueza no juzo.

Atividades

1.

(Pe. Antnio Vieira, Sermo do Mandato, In Sermes)

O jogo de oposio de idias tpico do Barroco. Justifique essa afirmativa com base no texto acima.

2.

A razo e o amor sempre foram discutidos pelos poetas e escritores. Veja um soneto de Cames com o mesmo tema do texto anterior e, a partir do que foi estudado, identifique as caractersticas prprias do estilo de poca:

Sempre a Razo vencida foi de Amor, mas, porque assim o pedia o corao, quis Amor ser vencido da Razo. Ora que caso pode haver maior! Novo modo de morte, e nova dor! Estranheza de grande admirao, que perde suas foras a afeio, por que no perca a pena o seu rigor. Pois nunca houve fraqueza no querer, mas antes muito mais se esfora assim um contrrio com outro por vencer. Mas a Razo, que a luta vence, enfim, no creio que razo, mas h de ser inclinao que eu tenho contra mim. Lus de Cames, In rimas37

Ao analisar o texto, possvel dizer que ele revela traos em comum com os cantares trovadorescos. Nesse caso, faa o que se pede:da

3.

Literatura Portuguesa

Estudo

Abandonada por voc Apaixonada por voc Eu vejo o vento te levar Mas tenho estrelas pra sonhar E ainda te espero todo o dia (In Faf: Pssaro sonhador.)

a) A que tipo de composio medieval relaciona-se o texto?

b) Justifique sua resposta.

Texto para as questes 4 e 5 Oh! Maldito o primeiro que, no mundo, Nas ondas vela ps em seco lenho! Digno da eterna pena do Profundo, Se justa a justa Lei que sigo e tenho! Nunca juzo algum, alto e profundo, Nem ctara sonora ou vivo engenho, Te d por isso fama nem memria, Mas contigo se acabe o nome e a glria. (Cames, Os Lusadas)

4.

Considerando este trecho da fala do velho do Restelo no contexto da obra a que pertence, explique os dois primeiros versos, esclarecendo o motivo da maldio que, neles, lanada.

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5.

Nos quatro ltimos versos, est implicada uma determinada concepo da funo da arte. Identifique essa concepo, explicando-a brevemente.

DO ROMANTISMO LITERATURA CONTEMPORNEADO ROMANTISMO AO SIMBOLISMO: PERODO DE GRANDES TRANSFORMAES LITERRIASRomantismo: Contexto Histrico e 1 GeraoO Romantismo corresponde no s a uma revoluo literria, mas designa, tambm, uma tendncia geral de vida e de arte. Com esse movimento, abre-se um ciclo de cultura novo, correspondente diminuio do poder das oligarquias reinantes em prol das monarquias constitucionais ou das repblicas federadas, e ao aparecimento do Liberalismo em poltica, moral, arte etc. O comportamento romntico caracteriza-se por uma atitude emotiva e subjetiva diante do mundo no qual o sujeito est imerso. O romntico idealiza um universo melhor, defendendo a idia da expresso do eulrico, no qual prevalece o tom melanclico e nostlgico. Enfim, o ideal romntico tenta colocar o universo presenciado de forma subjetiva. Nesse sentido, a expresso do sentimento no precisa obedecer a nenhuma regra, antes adorada pelos clssicos. O movimento romntico recusa a cosmoviso racionalista e a esttica neoclssica a ela ligada. Contexto Histrico O Romantismo proveniente de dois acontecimentos marcantes na segunda metade do sculo XVIII na histria europia: a Revoluo Francesa e a Revoluo Industrial, responsveis pela abolio das monarquias aristocratas e pela introduo da burguesia que, ento, dominava a vida poltica, econmica e social da poca.39

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Literatura Portuguesa

Estudo

Em Portugal, inicia-se, com as mudanas econmicas ocorridas no Brasil a partir de 1807 provenientes da chegada da corte de D. Joo VI, uma nova fase moderna da vida econmica e social. Ainda com a famlia real fora de casa arrebenta em 1820, no Porto, uma revoluo em defesa da implantao do liberalismo no pas a qual com o auxlio de Lisboa e do resto do pas saiu vitoriosa. O rei D. Joo VI, que havia se refugiado no Brasil, ento regressa. Todavia os problemas em Portugal no terminam a, a luta pelo trono portugus continua com veemncia gerando conturbao e desordem interna na nao. De um lado, D. Joo VI, representante do liberalismo; de outro, D. Miguel, seu irmo absolutista. Depois da morte de D. Joo VI os absolutistas apoderam-se do poder e iniciam uma perseguio aos liberais, levando muitos deles a exilar-se em Inglaterra e Frana. Diante de tantas turbulncias, o processo de instaurao do movimento romntico no pas foi lento e incerto. Enquanto o realismo tomava forma no horizonte parisiense, o romantismo portugus procurava ainda afirmar-se. Alguns autores chegam a assegurar que esta afirmao s houve como uma cultura de importao, pela via indireta dos exlios a que se sujeitaram Almeida Garrett e Alexandre Herculano. Almeida Garrett acaba por exilarse na Inglaterra, onde entra em contato