Manual Processo Coletivo

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Processo Coletivo João Paulo Lordelo http://www.joaolordelo.com 1 MANUAL PRÁTICO DE PROCESSO COLETIVO DE ACORDO COM O NOVO CPC JOÃO PAULO LORDELO 2ª EDIÇÃO REVISADA 2015

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 MANUAL  PRÁTICO  

DE  PROCESSO  COLETIVO    

DE  ACORDO  COM  O  NOVO  CPC  

 JOÃO  PAULO  LORDELO  

 

 

 

2ª  EDIÇÃO  -­‐  REVISADA  

2015  

 

 

 

 

 

 

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JOÃO  PAULO  LORDELO  Graduado  em  Direito  pela  Universidade  Federal  da  Bahia  (2009),  com  período  sanduíche  na  

Universidade  de  Santiago  de  Compostela  (ES).  Especialista  em  Direito  do  Estado  (2009).  Mestre  em  Direito  Público  pela  Universidade  Federal  da  Bahia  (2013).  Membro  do  Instituto  Baiano  de  Direito  

Processual  Penal  e  da  Academia  Brasileira  de  Direito  Processual  Civil.  Professor  em  diversas  instituições  de  ensino  superior,  pós-­‐graduação  e  cursos  preparatórios  para  carreiras  públicas.  Aprovado  em  concurso  para  Procurador  do  Estado  (PE),  Defensor  Público  Federal  (DPU),  Juiz  de  Direito  (BA)  e  Procurador  da  República  (Ministério  Público  Federal  -­‐  1ª  colocação  no  concurso).    

Ex-­‐Defensor  Público  Federal  (2010-­‐2014),  é  Procurador  da  República  (MPF)  na  Bahia.  

Editor  do  site  http://www.joaolordelo.com.  

 

 

 

 

 

 

 

MANUAL  PRÁTICO  DE  PROCESSO  COLETIVO  

ATUALIZADO  EM  1º  DE  JULHO  DE  2015  

 

 

 

Teoria  geral  do  processo  coletivo  ........................................................................  03  

Ação  civil  pública  .................................................................................................  38  

Ação  popular  .......................................................................................................  59  

Mandado  de  segurança  coletivo  .........................................................................  70  

Mandado  de  injunção  coletivo  ...........................................................................  78  

 

 

 

 

 

 

 

 

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TEORIA  GERAL  DO  PROCESSO  COLETIVO    

Sumário:  1.  Introdução  1.1.  Fundamentos  da  ação  coletiva    1.2.  Conceito  de  processo  coletivo    2.  Fases  metodológicas  do  estudo  do  direito  processual  civil  2.1.  Evolução  do  processo  coletivo  no  Brasil  2.2.  Modelos  de  tutela  jurisdicional  dos  direitos  coletivos  3.  Natureza  dos  direitos  metaindividuais  e  a  tutela  coletiva  4.  Classificação  do  processo  coletivo  5.  Principais  princípios  de  direito  processual  coletivo  comum  5.1.  Princípio  da  indisponibilidade  mitigada  da  ação  coletiva  5.2.  Princípio  da  indisponibilidade  da  execução  coletiva  5.3.  Princípio  do  interesse  jurisdicional  no  conhecimento  do  mérito  5.4.  Princípio  da  prioridade  na  tramitação  5.5.  Princípio  do  máximo  benefício  da  tutela  jurisdicional  coletiva  5.6.  Princípio  do  ativismo  judicial  5.7.   Princípio   da   máxima   amplitude/atipicidade/não-­‐taxatividade   do   processo  coletivo  5.8.  Princípio  da  ampla  divulgação  da  demanda  coletiva  5.9.  Princípio  da  integratividade  do  microssistema  processual  coletivo  5.10.  Princípio  da  adequada  certificação  da  ação  coletiva    5.11.   Princípio   da   adequada   representação   ou   do   controle   judicial   da   legitimação  coletiva  5.12.  Princípio  da  competência  adequada  5.13.  Princípio  da  reparação  integral  do  dano  6.  Objeto  do  processo  coletivo  6.1.  Classificação  de  Barbosa  Moreira  dos  direitos  e  interesses  metaindividuais    6.2.  Observações  importantes  6.3.  Ações  pseudoindividuais    7.  Coisa  julgada  no  processo  coletivo  7.1.  Limites  da  coisa  julgada  7.2.  Questões  sobre  o  regime  jurídico  da  coisa  julgada  coletiva  7.3.  Coisa  julgada  no  mandado  de  segurança  coletivo  7.4.  Relações  jurídicas  continuativas  8.  Relação  entre  demandas  8.1.  Sistemas  de  relação  entre  as  demandas  8.2.  Relações  entre  demandas  no  processo  individual  8.3.  Relações  entre  demandas  no  processo  coletivo  (conexidade  e  litispendência)  8.4.  Critério  para  a  reunião/unificação  de  demandas  coletivas  relacionadas  9.  Competência  nas  ações  coletivas  9.1.  Critério  funcional  9.2.  Critério  material  9.3.  Critério  valorativo  9.4.  Critério  territorial  9.5.  A  inexistência  de  juízo  universal  nas  ações  coletivas  10.  Liquidação  e  cumprimento  de  sentença  10.1.  Direitos  difusos  e  coletivos  10.2.  Direitos  individuais  homogêneos  10.3.  Observações  finais  sobre  liquidação  e  execução  11.  Prescrição  e  decadência  

 1.  Introdução  

1.1.  Fundamentos  da  ação  coletiva  

  Segundo  DIDIER,  as  ações  coletivas  possuem  duas  justificativas:  

a) Fundamento  sociológico  !  Acesso  à  Justiça.  As  ações  coletivas  permitem  a  resolução  de  demandas  pretensões  retidas,  principalmente  de  consumidores,  relativas  a  bens  e  serviços  de  massa.  

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b) Fundamento   político   !   Princípio   da   economia   processual.   Permitem   a   solução   de  diversos  conflitos  por  meio  de  um  só  processo.  

 

1.2.  Conceito  de  processo  coletivo  

  Processo  coletivo  é  aquele  instaurado  por  ou  em  face  de  um  legitimado  autônomo,  em  que  se  postula  um  direito  coletivo  lato  sensu  ou  se  afirma  a  existência  de  uma  situação  jurídica  coletiva  passiva.      

2.  Fases  metodológicas  do  estudo  do  direito  processual  civil  

A  doutrina  distingue  a  evolução  do  direito  processual  civil  em  3  etapas:  

1ª Fase:   sincretismo,   civilismo   ou   privatismo   (do   direito   romano   até   1868)  !   Nesta   fase,   o  direito  processual  não  era  uma  ciência  autônoma,  havendo  uma  confusão  metodológica  entre  direito   material   e   direito   processual,   daí   porque   as   poucas   regras   de   processo   estavam  previstas  nos  códigos  civis.    

2ª Fase:  autonomismo  (1868  até  1950)  !  Quem  iniciou  a  fase  autonomista  foi  VON  BÜLOW.  Ele  percebeu   que   o   processo   seria   uma   relação   jurídica   autônoma,   envolvendo   o   Estado   (que  pode   ser   acionado,   para   que   tome   as  medidas   contra   aquele   que   pretensamente   violou   o  direito).  Assim,   haveria   duas   relações   jurídicas   autônomas:   a  material   e   a   processual.   Foi  nessa   fase   que   o   processo   virou   uma   ciência   autônoma.   Crítica:   o   processo   passou   a   ser  intensamente  estudado  como  objeto  autônomo,  deixando  de  servir  ao  direito  material,  o  que  criou  excessos  formalistas.    

3ª Fase:  instrumentalismo  ou  fase  de  acesso  à  justiça  (1950  em  diante)  !  Com  a  finalidade  de  resgatar   a   proximidade   entre   direito   e   processo,   sem   negar   a   sua   autonomia,   surge   esta  terceira  fase,  que  visa  que  o  processo  seja  um  instrumento  de  acesso  à  justiça.  

Essa   fase   foi   inaugurada  em  1950,  a  partir  de  uma  obra   chamada  de  “Acesso  à   Justiça”,  de  GARTH   (EUA)  e  CAPPELLETTI   (ITA).  Para  tais  autores,  para  garantir  o  acesso  à   justiça  e  tornar  o  sistema  instrumentalista,  os  ordenamentos  jurídicos  teriam  de  observar  3  ondas  renovatórias  de  alterações  legislativa,  para  começar  a  tutelar  as  situações  jurídicas  controvertidas:  

a) Justiça  aos  pobres  !  Neste   sentido,   foi  desenvolvida  a   tutela  do  hipossuficiente,   sendo  criada,  no  Brasil,  a  Defensoria  Pública,  a  Lei  de  Assistência  Judiciária  (de  1950  –  instituiu  a  pobreza  por  presunção),  os  Juizados  Especiais  etc.;  

b) Coletivização   do   processo   !   É   necessário   que   haja   um   tratamento   coletivo   para   o  processo,  pois  somente  assim  haverá  verdadeiramente  acesso  à  justiça.  GARTH  e  CAPPELLETTI  perceberam  a  necessidade  de  serem  tuteladas  pelo  processo  três  situações  até  então  não  protegidas  pelo  sistema:  

• Bens   ou   direitos   de   titularidade   indeterminada   -­‐   Como   não   havia   uma   titularidade  específica   para   bens   como   o   meio   ambiente   e   o   patrimônio   público,   e.g.,   tais   bens  freqüentemente   ficavam   sem   tutela.   Justamente   por   isso,   os   autores   propuseram   a  coletivização  do  processo  neste  ponto.  Foram  criados  os  legitimados  coletivos  (ex:  MP,  defensorias,  órgãos  públicos).  

• Bens   ou   direitos   individuais   cuja   tutela   individual   não   fosse   economicamente  aconselhável   -­‐   Num   segundo   enfoque,   encontram-­‐se   os   casos   em   que   o   direito  veiculado  é  o  tradicional  direito  individual,  mas  cuja  tutela  individual  não  é  exercida,  

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pelos   mais   diversos   motivos,   tais   como:   falta   de   consciência   da   população   sobre   a  existência   e   do   direito   e   seu   mecanismo   de   tutela   (hipossuficiência   cultural);  inviabilidade  econômica  ou  pouca  recompensa  na  tutela  do  direito,  seja  em  razão  dos  custos  psicológicos,  seja  em  razão  dos  custos  financeiros;  falta  de  recursos  para  custear  a  assistência  jurídica  (hipossuficiência  econômica);  configuração  do  processo,  que  exige  demasiado  do  autor,  a  exemplo  da  produção  de  provas  difíceis,   sob  o  ponto  de  vista  técnico  (hipossuficiência  técnica)  etc.  Ex.:  consumidor  descobre  que  a  caixa  de  leite  que  informa   possuir   1l   na   verdade   possui   750ml.   Em   situações   como   esta,   não   é  economicamente  viável  para  o  consumidor  processar  individualmente  a  empresa  para  cobrar  alguns  litros  de  leite,  mas  coletivamente  o  dano  é  considerável.  

• Bens   ou   direitos   cuja   tutela   coletiva   seja   recomendável   por   uma   questão   de  economia  -­‐  Por  fim,  sob  um  terceiro  enfoque  estão  os  casos  em  que  a  tutela  individual  não   é   recomendável,   do   ponto   de   vista   econômico.   Em   tais   situações,   a   tutela   do  direito  não  é  economicamente  inviável,  mas  a  tutela  coletiva  se  releva  recomendável,  em  razão  da  molecularização  dos  conflitos.  Não  há,  aqui,  uma  preocupação  direta  com  o  jurisdicionado,  mas  sim  com  o  sistema,  que  deve  potencializar  a  solução  dos  conflitos.  A  título  exemplificativo,  é  possível  citar  as  causas  envolvendo  expurgos   inflacionários,  bastante  repetidas  em  todo  o  país.  

Observações   importantes:   CAPELLETI   e   GARTH   entenderam   que,   até   então,   o   direito  processual  civil  clássico  era  incapaz  de  tutelar  essas  três  situações,  pois  se  preocupava  com  demandas  individuais,  já  que:    a)  O  critério  de  legitimidade  do  processo  individual,  a  legitimidade  ordinária,  não  é  aplicável  no  processo  coletivo,  eis  que  vinculado  a  uma  perspectiva  liberal  individualista  (cada  um  defende  o  que  é  seu  individualmente);  b)  as  regras  de  coisa  julgada   individual  são  incompatíveis  com  o  processo  coletivo  (art.  472  do  CPC  de  1973;  art.  506  do  NCPC).  No  processo  coletivo,  a  decisão  beneficia  a  todos;  d)   a   criação   do   processo   coletivo   se   fazia   necessária   em   virtude   da   inadequação   do  direito  processual  civil  individual  para  a  proteção  dessas  três  situações  citadas  acima.;  

c) Efetividade  das  normas  processuais  !  A  terceira  onda  renovatória  é  aquela  que  a  gente  vive  atualmente:  a  efetividade  do  processo.  Fala-­‐se  que  hoje  se  busca  um  processo  menos  técnico  e  de  mais  resultados.  

4ª Fase   !   Neoprocessualismo   !   Alguns   autores   destacam   as   fases   seguintes   do  instrumentalismo.   Outros   entendem   que   se   trata   de   um   mesmo   movimento.   Para   os  primeiros  autores,  o  neoprocessualismo  é  uma  nova   fase  de  afirmação  teórica  com  base  na  metodologia  neoconstitucionalista.    

5ª Fase  !  Formalismo-­‐Valorativo  !  A  Universidade  Federal  do  Rio  Grande  do  Sul,  com  grande  repercussão  no  âmbito  jurídico,  afirma  uma  quarta  fase  do  desenvolvimento  do  processo,  que  é  a  do  Formalismo-­‐Valorativo.  É  uma  concepção  teórica  que  pretende  aplicar  as  conquistas  do  neoconstitucionalismo   reforçando   os   aspectos   éticos   do   processo.   A   maior   referência   do  formalismo-­‐valorativo  é  CARLOS  ALBERTO  ALVARO  DE  OLIVEIRA.  

 

2.1.  Evolução  do  processo  coletivo  no  Brasil    

  No   Brasil,   o   desenvolvimento   do   processo   coletivo   foi   bastante   influenciado   pela   doutrina  italiana  e  pela  norte-­‐americana.  

  A   ação   popular   existe   desde   as   ordenações   manuelinas   (mas   de   forma   extremamente  precária).    

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  Apesar  de  já  existir  a  ação  popular  desde  antes  (Lei  4.717/65),  a  doutrina  costuma  vincular  o  SURGIMENTO  do  processo  coletivo  no  Brasil  com  a  Lei  6.938/1981  (Lei  Nacional  da  Política  do  Meio  Ambiente),  que   tinha  um  dispositivo  que  dizia  que  o  MP  protegeria  o  meio  ambiente  por  meio  da  ação  civil  pública.  

  A  CONSOLIDAÇÃO  do  processo  coletivo  só  ocorreu  em  1985,  com  a  Lei  de  Ação  Civil  Pública  (7.347/85).  Essa   lei   resolveu  o  problema  dos  bens  ou  direitos  de   titularidade   indeterminada,  mas  não  o  problema  dos  bens  e  direitos  cuja  tutela  individual  é  inviável  e  os  bens  e  direitos  cuja  tutela  coletiva  é  recomendável.  Esses  últimos  dois  problemas  só  foram  efetivamente  solucionados  com  o  Código  de  Defesa  do  Consumidor,  em  1990.  

  Em  1990  ocorreu  a  POTENCIALIZAÇÃO  do  processo  coletivo,  com  o  surgimento  do  CDC,  que  permitiu  que  o  processo  coletivo  pudesse  tutelar  as  massas  e  atender  aos  bens  e  direitos  cuja  tutela  individual  é  inviável  e  aos  cuja  tutela  coletiva  é  recomendável.  

" Avanços:  a  CF/88,  o  CDC,  o  ECA,  o  Estatuto  do  Idoso,  o  Estatuto  da  Cidade  etc.  trouxeram  diversos  avanços  no  campo  do  processo  coletivo.  

" Retrocessos:  o  Governo,  acanhado  pelos  avanços  da  Lei  7.347/85,  tem  utilizado  Medidas  Provisórias   para   atacar   a   ação   civil   pública,   tentando   restringir   sua   eficácia,   limitar   o  acesso  à  justiça,  frustrar  o  momento  associativo  e  reduzir  o  papel  do  Poder  Judiciário.  Ex:  a  Lei  9.494  é  o  resultado  de  uma  MP,  que  incluiu  o  atual  art.  16  da  LACP.  Este  dispositivo  traz   uma   norma   que   limita   bastante   o   processo   coletivo,   já   que   determina   que   “a  sentença   civil   fará   coisa   julgada   erga   omnes,   nos   limites   da   competência   territorial   do  órgão  prolator,  exceto  se  o  pedido  for   julgado  improcedente  por   insuficiência  de  provas,  hipótese   em   que   qualquer   legitimado   poderá   intentar   outra   ação   com   idêntico  fundamento,  valendo-­‐se  de  nova  prova.”.  

  Quanto   ao   futuro  do  processo   coletivo  brasileiro   é  o   seguinte,   houve  uma   tentativa  de   se  elaborar  o  Código  Brasileiro  de  Processo  Coletivo,  que  partiu  de  três  projetos,  um  deles  oriundo  da  USP   (ADA   PELLEGRINI   GRINOVER),   outro   oriundo   da   UERJ/UNESA   (ALOÍSIO   CASTRO   MENDES)   e   outro   de  ANTONIO  GIDI.  

  Em  2008,  o  Ministério  da   Justiça  nomeou  uma  comissão  de   juristas  para   tanto.  A  comissão  entendeu  que  o  ideal  não  é  fazer  um  novo  código  (que  demorará  muito  para  sair  do  Congresso),  mas  sim  uma  Nova  Lei  de  Ação  Civil  Pública.  Com  efeito,  esta  nova  Lei  é  o  atual  PL  5139/09.  

 

2.2.  Modelos  de  tutela  jurisdicional  dos  direitos  coletivos  

  No  mundo  afora,  destacam-­‐se  dois  modelos  de  tutela  jurisdicional  dos  direitos  coletivos:  

a) Modelo  das  Verbandsklage  (ações  associativas)  !  Tem  origem  ítalo-­‐francesa-­‐alemã  e  é  adotado  pela  Europa-­‐Continental  (salvo  Escandinávia).  É  muito  deficitário.  Características:    

" Especial   legitimação   ativa   das   associações,   com   a   escolha   de   um   “sujeito  supraindividual”  para  tutelar  em  nome  próprio  o  direito  que  passa  ser  considerado  como  próprio.  Ex:  associações  de  consumidores,  associações  ambientais.  

" Fragmentariedade.    

 

b) Modelo  das  Class  Action  !  Tem  origem  norte-­‐americana  e  foi  muito  difundido  no  Brasil.  É  mais  pragmático,  voltado  para  a  proteção  integral  do  direito.  Características:  

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" A   legitimidade   do   indivíduo   ou   de   um   grupo   de   indivíduos,   qual   é   sujeito   ao  controle  jurisdicional  da  “adequada  representação”.  

" Vinculatividade   da   coisa   julgada   para   toda   a   classe,   quer   beneficiando-­‐a,   quer  prejudicando0a,  no  caso  da  improcedência  da  ação.  

" Adequada   notificação   para   aderir   à   iniciativa   aos   indivíduos,   visando   proteger   o  “direito  de  colocar-­‐se  a  salvo  da  coisa  julgada”  (right  to  opt  out).    

" Atribuição   de   amplos   poderes   ao   juiz   (defining   function),   o   que   distingue   esse  modelo  do  modelo  tradicional  de  litígio  (vinculado  predominantemente  a  atividade  das  partes  e  a  uma  radical  neutralidade  judicial).  

  A   tendência   mundial   é   a   universalização   do   modelo   das   class   action,   tanto   nos  ordenamentos   do   common   law   como   do   civil   Law,   a   exemplo   do   Brasil.   A   especial   abertura   do  ordenamento  brasileiro  aos  modelos  norte-­‐americanos  se  deve  à  forte   influência  da  nossa  tradição  constitucional.    

3.  Natureza  dos  direitos  metaindividuais  e  a  tutela  coletiva  

  Como   cediço,   o   direito   pode   ser   dividido   em  dois   grandes   grupos:  direito  público   e   direito  privado.  O  direito  público  regulamenta  as  relações  de  subordinação  entre  Estados  e  entre  Estado  e  indivíduos,   fundadas   na   supremacia   do   interesse   público   (atos   de   império),   enquanto   o   direito  privado  regulamenta  as   relações  entre  os   indivíduos  e  de  coordenação  entre   indivíduos  e  Estado  (atos  de  gestão),  em  que  o  interesse  público  não  se  sobrepõe  ao  interesse  privado.  

  Com   o   passar   dos   anos,   essa   classificação   foi   perdendo   a   sua   força,   por   diversos  motivos,  destacando-­‐se   o   fato   de   que   há   normas   de   direito   privado   que   assumem   natureza   cogente,   de  interesse  geral.    

  A  classificação  entre  direitos  públicos  e  privado  não  é  compatível  com  o  direito  coletivo.  Ele  não  é  privado  porque  envolve  o   interesse   coletivo,  da   sociedade,  e  não  é  público,  porque  envolve  pessoas  privadas.    

Obs1.  Qual  a  diferença  essencial  entre  os  conflitos  individuais  e  a  tutela  coletiva?  

  MAZZILLI  aponta  os  seguintes  fatores  da  tutela  coletiva:  

a) Na  tutela  coletiva  estabelece-­‐se  uma  controvérsia  sobre  interesses  de  grupos,  classes  ou  categoria  de  pessoas  (interesses  difusos,  coletivos  ou  individuais  homogêneos),  enquanto  que  nos  conflitos  individuais,  de  regra,  a  controvérsia  cinge-­‐se  a  interesses  propriamente  individuais;  

b) Na  tutela  coletiva,  é  freqüente  a  conflituosidade  entre  os  grupos  envolvidos;  

c) A  defesa   judicial   coletiva   faz-­‐se  por  meio  de   legitimação  extraordinária,  enquanto  que,  nos  conflitos  individuais,  de  regra,  a  legitimação  é  ordinária.  

Obs.2.  Litisconsórcio  multitudinário  X  tutela  coletiva  

  Segundo  DIDIER,  o  exercício   conjunto  da  ação  por  pessoas  distintas  não  configura  uma  ação  coletiva,  mas   pode   gerar   o   litisconsórcio  multitudinário.   Para   a   definição   da   tutela   coletiva   não   é  significativa  a  estrutura  subjetiva  do  processo  e  sim  a  matéria  litigiosa  nele  discutida.  

  A  ação  coletiva  surge,  assim  em  razão  de  uma  particular  relação  entre  a  matéria  litigiosa  e  a  coletividade  que  necessita  da  tutela  para  solver  o  litígio.  

 

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4.  Classificação  do  processo  coletivo  

4.1  Quanto  ao  sujeito  !  O  processo  coletivo  é  dividido  em  ativo  e  passivo:  

a) Processo   coletivo   ATIVO   -­‐   É   o   processo   coletivo   por   excelência,   em   que   a   coletividade   é  autora,  por  meio  de  um  legitimado  coletivo.  Essas  são  as  mais  comuns.  

b) Processo  coletivo  PASSIVO  -­‐  É  aquele  em  que  a  coletividade  é  ré.  Seria  a  situação  inusitada  de  a  coletividade  ser  demandada  como  ré  numa  ação.  

  Na  doutrina,  existem  duas  posições  diametralmente  opostas  sobre  ação  coletiva  passiva:  

1ª Corrente  (DINAMARCO)   -­‐  Não  existe  ação  coletiva  passiva,  por  ausência  de  previsão   legal.  Na  ação  coletiva  ativa  há  previsão   legal  dos   legitimados,  enquanto  não  há  essa  previsão  para  a  ação  coletiva  passiva.    

2ª Corrente   (MAJORITÁRIA   –   GRINOVER)   -­‐   Existe   ação   coletiva   passiva,   pois   a   prática   tem  demonstrado  que  há  situações  em  que  a  coletividade  deve  ser  acionada  e  a  sua  existência  decorre  do  sistema  (interpretação  sistemática),  dispensando  previsão  expressa:  

a) O  art.   5º,   §2º  da   lei   7.347/85   (LACP)   permite  o   ingresso  do  Poder  Público  e  das  associações  como  litisconsortes  de  “qualquer  das  partes”,  o  que  abrange  a  passiva.  

b) O   art.   83   do   CDC   determina   que   para   a   defesa   dos   direitos   coletivos   são  admissíveis   todas  as  espécies  de  ações   capazes  a  propiciar  a  adequada  e  efetiva  tutela.  

c) Acaso   não   se   admita   a   ação   coletiva   passiva,   não   será   possível   explicar   a   ação  rescisória  proposta  pelo  réu  da  ação  coletiva  originária,  os  embargos  à  execução  coletiva  ou  o  mandado  de  segurança   impetrado  pelo   réu  da  ação  coletiva  contra  ato  judicial.  

Problema   concreto:   dificuldade   existente,   na   ação   coletiva   passiva   em   se   determinar  quem  representa  a  coletividade-­‐ré.  Em  relação  à  coletividade  autora,  a  própria  lei  já  traz  possíveis  representantes  (MP,  defensoria  pública  etc.).    

 

4.2  Quanto  ao  objeto  

a) Processo   coletivo   ESPECIAL   !   É   o   processo   das   ações   de   controle   abstrato   de  constitucionalidade  (ADI,  ADC,  ADPF).    

b) Processo   coletivo   COMUM  !  O  processo   coletivo   comum  é   composto   por   todas   as   ações  para  a  tutela  dos  interesses  e  direitos  metaindividuais  não  relacionados  ao  controle  abstrato  de  constitucionalidade.  São  elas:  

" Ação  popular  –  Tem  previsão  na  lei  4.717/65.  

" Ação  civil  pública  –  Tem  previsão  da  lei  7.347/85.  

" Ação   coletiva   (?)  –  Alguns   autores   (ex:  Mazzilli)   sustentam  que   ação   coletiva   é   algo  diverso  da  ação  civil  pública,  servindo  à  tutela  dos  interesses  individuais  homogêneos.  Para  eles,  a  ação  coletiva  é  a  que  tem  previsão  no  CDC,  enquanto  a  ação  civil  publica  seria  a  prevista  na  lei  7.347/85.  Na  prática,  os  regimes  da  ação  coletiva  e  da  ação  civil  pública  são  idênticos.    

" Ação   de   improbidade   administrativa   (?)  –  O   STJ   e   alguns   autores   sustentam   que   a  improbidade  administrativa  é  uma  espécie  de  ação  civil  pública.  Para  outros  autores,  

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são   ações   distintas,   pois   possuem   legitimidade,   objeto,   regime   de   coisa   julgada   e  outros  institutos  diferentes.  

" MS  coletivo  –  Tem  previsão  na  lei  12.016/09.  

" Mandado   de   injunção   coletivo   (?)   –   Existe   a   discussão   sobre   sua   criação,   mas   ele  ainda  não  foi  formalmente  criado.  

 

5.  Principais  princípios  de  direito  processual  coletivo  comum  

5.1.  Princípio  da  INDISPONIBILIDADE  MITIGADA  DA  AÇÃO  COLETIVA  (art.  5º,  §3º  da  LACP  e  art.  9º  da  Lei  de  Ação  Popular)    

  Basicamente,  este  princípio  estabelece  que  o  objeto  do  processo  coletivo  é  irrenunciável  pelo  autor  coletivo.  A  razão  é  uma  só:  o  bem  que  é  objeto  do  processo  coletivo  não  pertence  ao  autor,  mas  sim  à  coletividade.  

  A  conseqüência  prática  é  que  não  poderá  haver  desistência  imotivada  da  ação  coletiva  e,  se  houver,  não  implicará  extinção  do  processo,  mas  sim  sucessão  processual.  

LACP.   Art.   5º.   §3°   Em   caso   de   desistência   infundada   ou   abandono   da   ação   por   associação   legitimada,   o  Ministério  Público  ou  outro  legitimado  assumirá  a  titularidade  ativa.  

LAP.  Art.  9º  Se  o  autor  desistir  da  ação  ou  der  motivo  à  absolvição  da  instância,  serão  publicados  editais  nos  prazos   e   condições   previstos   no   art.   7º,   inciso   II,   ficando  assegurado   a   qualquer   cidadão,   bem   como   ao  representante   do  Ministério   Público,   dentro   do   prazo   de   90   (noventa)   dias   da   última   publicação   feita,  promover  o  prosseguimento  da  ação.  

 

  Repare  que  este  princípio  é  mitigado:  se  a  desistência  foi  motivada  e  razoável,  o  magistrado  poderá  homologá-­‐la.  Ex.:  falência  da  empresa  ré.    

5.2.  Princípio  da  INDISPONIBILIDADE  DA  EXECUÇÃO  COLETIVA  (art.  16  da  LAP  e  art.  15  da  LACP)  LAP.   Art.   16.   Caso   decorridos   60   (sessenta)   dias   da   publicação   da   sentença   condenatória   de   segunda  instância,   sem   que   o   autor   ou   terceiro   promova   a   respectiva   execução,   o   representante   do  Ministério  Público  a  PROMOVERÁ  nos  30  (trinta)  dias  seguintes,  sob  pena  de  falta  grave.  

LACP.   Art.   15.   Decorridos   sessenta   dias   do   trânsito   em   julgado   da   sentença   condenatória,   sem   que   a  associação  autora   lhe  promova  a   execução,  deverá   fazê-­‐lo  o  Ministério  Público,   facultada   igual   iniciativa  aos  demais  legitimados.  (Redação  dada  pela  Lei  nº  8.078,  de  1990)  

  Este  princípio  objetiva  evitar  a  corrupção  entre  o  condenado  e  o  representante  coletivo.  Para  evitar   a   falta   de   execução,   o   legislador   deixa   claro   que   a  execução  é  obrigatória   para  o  MP.   Se   o  autor   da   ação   coletiva   não   executar   a   sentença   condenatória   no   prazo   de  60   dias   do   transito   em  julgado  e  se  nenhum  mais  executar,  o  Ministério  Público  é  obrigado  a  executá-­‐la  no  prazo  de  30  dias.  

  A  regra  é  que  o  autor  execute  a  sentença  coletiva,  mas,  passados  60  dias,  qualquer  legitimado  continuará  podendo  e  o  MP  deverá  promover  a  execução.  

  Diferentemente   do   primeiro   princípio,   que   é   mitigado,   a   indisponibilidade   da   execução   é  absoluta,  não  admitindo  exceção.    

5.3.  Princípio  do  INTERESSE  JURISDICIONAL  NO  CONHECIMENTO  DO  MÉRITO  

  No  processo  coletivo  deve  haver  uma  maior  flexibilização  das  regras  sobre  a  admissibilidade  da  ação  a  bem  da  análise  do  mérito  do  pedido.    

  Este  princípio  não  tem  previsão   legal  expressa,  decorrendo  do  sistema  processual  coletivo  e  da   circunstância   de   este   atender   ao   interesse   público   primário.   No   processo   coletivo,   por   ele  

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interessar  a  um  grande  número  de  pessoas,  o  Estado  tem  interesse  em  resolver  o  conflito.  Por  conta  disso,   o   magistrado   deve   evitar,   ao   máximo   possível,   a   extinção   do   processo   sem   apreciação   do  mérito.  

  Exemplificando,   se,  no  curso  de  uma  ação  popular,   cuja   legitimidade  é  do  cidadão,  o  autor  tiver   seus  direitos  políticos   suspensos,  o   juiz  não  pode  extinguir  a  ação  por   ilegitimidade  do  autor,  devendo  publicar  editais  para  que  qualquer  cidadão  assuma  esta  legitimidade.  E  se  nenhum  cidadão  se  interessa,  o  Ministério  Público  pode  assumir  esta  titularidade  .  

  Atenção:   com   o   novo   CPC,   tal   princípio   passou   a   ser   previsto   expressamente,   sendo  aplicável  também  a  processo  individual.  

Dispõe   o   art.   4º   do  NCPC:   “Art.   4o   As   partes   têm   o   direito   de   obter   em   prazo   razoável   a  solução   integral  do  mérito,   incluída  a  atividade   satisfativa”.  A  parte   inicial   desse  artigo  é   a  mera  consagração  de  um  princípio  constitucional.  Todavia,  nesse  dispositivo,  duas  novidades:  

i. Princípio  da  primazia  da  decisão  de  mérito  !  Tal  princípio  está  consagrado  no  meio  do   art.   4º   do   NCPC.   Por   ele,   a   solução   de   mérito   prefere   a   solução   que   não   é   de  mérito.  Ou  seja,  a  solução  de  mérito  é  prioritária.  Isso  é  muito  claro  ao  longo  de  todo  o  Código,  a  exemplo  do  que  dispõe  o  art.  139,   IX,  pelo  que  cabe  ao   juiz  determinar  a  correção  dos  defeitos  processuais.  

Art.  139.    O  juiz  dirigirá  o  processo  conforme  as  disposições  deste  Código,  incumbindo-­‐lhe:  

IX   -­‐  determinar  o  suprimento  de  pressupostos  processuais  e  o  saneamento  de  outros  vícios  processuais;  

Da  mesma  forma,  num  eventual  recurso  com  defeito  sanável,  o  relator  de  um  recurso  não  pode  inadmiti-­‐lo  sem  que  antes  intime  o  recorrente,  para  que  emende  o  recurso.  Pelo  NCPC,  o  juiz  não  pode  indeferir  uma  petição  inicial,  sem  antes  determinar  que  a  parte   a   emende.   Além   disso,   a   apelação   contra   qualquer   caso   de   extinção   do  processo   sem   resolução   de   mérito   comporta   retratação.   Há   vários   exemplos   da  primazia  da  decisão  de  mérito.  

Nesse   sentido,   o   art.   1.029,   §3º,     prevê   um   dispositivo   impressionante:   “§   3o   O  Supremo   Tribunal   Federal   ou   o   Superior   Tribunal   de   Justiça   poderá   desconsiderar  vício   formal   de   recurso   tempestivo   ou   determinar   sua   correção,   desde   que   não   o  repute  grave.”.  Cuida-­‐se  de  um  marco  na   concretização  do  princípio  da  primazia  da  decisão  de  mérito,  tendo  sido  reproduzido  na  Lei  n.  13.015,  que  cuida  dos  recursos  de  revista  repetitivos,  no  âmbito  trabalhista.  

ii. Princípio  da  efetividade  do  processo  !  Pelo  art.  4º,  as  partes  têm  direito  à  atividade  satisfativa.   Pela   primeira   vez   na   história,   há   um   dispositivo   normativo   que   consagra  expressamente  o  princípio  da  efetividade.  Isso  é  muito  simbólico.  Antes,  esse  princípio  era  extraído  exclusivamente  do  devido  processo  legal.  

 

5.4.  Princípio  do  MÁXIMO  BENEFÍCIO  DA  TUTELA  JURISDICIONAL  COLETIVA   (arts.  103,  §§3º  e  4º  e  104  do  CDC)  

  Entende-­‐se  que  a   coisa   julgada   coletiva   só  beneficia   os   indivíduos;  NUNCA  os  prejudica.  A  decisão   coletiva   contrária   não   vincula   o   indivíduo,   que   poderá   ajuizar   sua   própria   ação   individual  posteriormente.  

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  Isso  ocorre  porque  o  legitimado  extraordinário  coletivo  não  pede  autorização  dos  titulares  dos  direitos  metaindividuais   antes   de   propor   a   ação   coletiva.   Logo,   se   um   indivíduo   determinado   não  pediu  a  ninguém  para  defender  algo  que  também  é  seu,  não  poderá  a  sentença  prejudicá-­‐los.  

  Fala-­‐se,  assim,  no  transporte  in  utilibus  da  coisa  julgada  coletiva.  Nas  ações  coletivas,  mesmo  que  negado  o  direito,  o  particular  pode  propor  ação  individual.    

Art.  103  do  CDC.  Nas  ações  coletivas  de  que  trata  este  código,  a  sentença  fará  coisa  julgada:  

I  -­‐  erga  omnes,  exceto  se  o  pedido  for  julgado  improcedente  por  insuficiência  de  provas,  hipótese  em  que  qualquer   legitimado  poderá   intentar  outra  ação,   com   idêntico   fundamento  valendo-­‐se  de  nova  prova,  na  hipótese  do  inciso  I  do  parágrafo  único  do  art.  81;  

II  -­‐  ultra  partes,  mas  limitadamente  ao  grupo,  categoria  ou  classe,  salvo  improcedência  por  insuficiência  de  provas,  nos  termos  do  inciso  anterior,  quando  se  tratar  da  hipótese  prevista  no  inciso  II  do  parágrafo  único  do  art.  81;  

III   -­‐   erga   omnes,   apenas   no   caso   de   procedência   do   pedido,   para   beneficiar   todas   as   vítimas   e   seus  sucessores,  na  hipótese  do  inciso  III  do  parágrafo  único  do  art.  81.  

§  1°  Os  efeitos  da  coisa  julgada  previstos  nos  incisos  I  e  II  não  prejudicarão  interesses  e  direitos  individuais  dos  integrantes  da  coletividade,  do  grupo,  categoria  ou  classe.  

§   2°   Na   hipótese   prevista   no   inciso   III,   em   caso   de   improcedência   do   pedido,   os   interessados   que   não  tiverem  intervindo  no  processo  como  litisconsortes  poderão  propor  ação  de  indenização  a  título  individual.  

§  3°  Os  efeitos  da  coisa  julgada  de  que  cuida  o  art.  16,  combinado  com  o  art.  13  da  Lei  n°  7.347,  de  24  de  julho   de   1985,   não   prejudicarão   as   ações   de   indenização   por   danos   pessoalmente   sofridos,   propostas  individualmente  ou  na  forma  prevista  neste  código,  mas,  se  procedente  o  pedido,  beneficiarão  as  vítimas  e  seus  sucessores,  que  poderão  proceder  à  liquidação  e  à  execução,  nos  termos  dos  arts.  96  a  99.  

§  4º  Aplica-­‐se  o  disposto  no  parágrafo  anterior  à  sentença  penal  condenatória.  

Art.   104.   As   ações   coletivas,   previstas   nos   incisos   I   e   II   e   do   parágrafo   único   do   art.   81,   não   induzem  litispendência  para  as  ações   individuais,  mas  os  efeitos  da  coisa   julgada  erga  omnes  ou  ultra  partes  a  que  aludem  os   incisos   II   e   III   do   artigo   anterior   não   beneficiarão   os   autores   das   ações   individuais,   se   não   for  requerida   sua   suspensão   no   prazo   de   trinta   dias,   a   contar   da   ciência   nos   autos   do   ajuizamento   da   ação  coletiva.  

  Há  algumas  exceções  ao  transporte   in  utilibus  da  coisa  julgada  coletiva,  tais  como  a  prevista  no  art.  94  do  CDC  (que  traz  hipótese  em  que  o  indivíduo  é  abarcado  pela  coisa  coletiva:  quando  se  habilita  como  litisconsorte  no  processo).      

5.5.  Princípio  do  ATIVISMO  JUDICIAL  OU  DA  MÁXIMA  EFETIVIDADE  DO  PROCESSO  COLETIVO  

  Pelo   princípio   do   judicial   activism,   o   juiz   pode   flexibilizar   as   regras   processuais   e  procedimentais  a  bem  da  tutela  coletiva.  Trata-­‐se  de  mais  um  princípio  implícito.  Com  efeito,  o  juiz,  no   processo   coletivo,   tem  poderes  mais   acentuados   do   que  o   juiz   de   um  processo   individual.   Isso  decorre  de  algo  que  está  no  direito  norte-­‐americano,  denominado  defining  function,  que  significa  a  “função  de  definidor”  (aumento  dos  poderes  do  magistrado).    

  O  juiz  tem  mais  poderes  na  condução  e  na  solução  do  processo.  Assim,  graças  a  este  princípio,  o  juiz  pode  agir  de  5  formas  (que  não  pode  manejar  no  processo  comum):  

a) Poderes   instrutórios  mais   acentuados  !   O   juiz,   no   processo   coletivo,   deve   suprir   lacunas  probatórias,  através  da  determinação  da  produção  de  provas  de  ofício.  

b) Flexibilização  procedimental  !  Graças  à  defining  function¸  o  magistrado  pode,  no  processo  coletivo,  flexibilizar  as  regras  procedimentais,  através  da:  

a. alteração  da  ordem  dos  atos  processuais  e/ou;  

b. ampliação  de  prazos.  

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Ex.1:  se,  na  sentença,  o  magistrado  percebe  que  não  foi  citado  um  litisconsorte  necessário,  em   regra,   extingue   o   processo   sem   julgamento   do   mérito   (ilegitimidade   de   parte).   No  processo   coletivo,   todavia,   o   magistrado   deverá   fazer   uma   alteração   na   ordem   dos   atos,  determinando  a  citação  da  parte  faltante,  a  quem  será  ofertado  o  contraditório/ampla  defesa,  coma   possibilidade   de   produção   de   provas.   A   idéia   é   evitar   a   extinção   do   processo   sem  julgamento  do  mérito.  

Ex.2:  aumento  do  prazo  para  manifestação  sobre  perícia  ambiental  (que  é  enorme).  

c) Possibilidade  de  alteração  dos  elementos  da  demanda  pós  art.  264  do  CPC  !  No  processo  coletivo,  o  magistrado  pode  permitir  a  alteração  dos  elementos  da  demanda  mesmo  fora  dos  prazos  do  art.  264  do  CPC/73,  agora  previstos  no  art.  329  do  NCPC:  

Art.  329.    O  autor  poderá:  

I  -­‐  até  a  citação,  aditar  ou  alterar  o  pedido  ou  a  causa  de  pedir,  independentemente  de  consentimento  do  réu;  

II  -­‐  até  o  saneamento  do  processo,  aditar  ou  alterar  o  pedido  e  a  causa  de  pedir,  com  consentimento  do  réu,  assegurado  o  contraditório  mediante  a  possibilidade  de  manifestação  deste  no  prazo  mínimo  de  15  (quinze)  dias,  facultado  o  requerimento  de  prova  suplementar.  

Parágrafo  único.    Aplica-­‐se  o  disposto  neste  artigo  à  reconvenção  e  à  respectiva  causa  de  pedir.  

d) Na  SOLUÇÃO:  Possibilidade  de  controle  pelo   Judiciário  das  políticas  públicas  !  O  STF  e  o  STJ   têm   permitido,   em   situações   de   extrema   necessidade,   a   implementação   de   políticas  públicas   definidas   pela   Constituição   mediante   intervenção   do   próprio   Poder   Judiciário,  sempre  que  os  órgãos  estatais  competentes  descumprirem  os  encargos  políticos-­‐jurídicos,  de  modo  a  comprometer,  com  sua  omissão,  a  eficácia  e  integridade  de  direitos  sociais  e  culturais  impregnados  de  estatura  constitucional.    

Argumentos  contrários  ao  controle  das  políticas  públicas  pelo  Poder  Judiciário:  

" O  argumento  de  que  “o  Judiciário,  ao  intervir  nas  políticas  públicas,  viola  a  separação  dos  poderes”  não  é  válido  porque  o  Judiciário  só  pode  intervir  nas  políticas  públicas  para  a  implementação  de  direitos  e  promessas  fundamentais  da  CF.    

Ex.:   A   Constituição   tem   promessas   como   “creche   para   crianças   até   6   anos   de  idade”.  Se  o  prefeito   tiver  verba  e  preferir   investir  em  um  coreto,  por  meio  da  ação  coletiva  é  possível  obrigar  o  Município  a  construir  a  creche.  Nesse  caso,  não  há   intervenção   do   Judiciário   sobre   o   Executivo   ou   violação   da   separação   dos  Poderes,   pois   visa   implementar   a   Constituição   Federal,   que   obriga   todos   os  Poderes.  

" Outro  argumento  que  utilizam  é  de  que  a  “cláusula  da  reserva  do  possível  só  permite  a    implementação  das  políticas  públicas  se  for  possível”.  Rebatendo,  o  STF  tem  dito  que  a  defesa  com  base  na  reserva  do  possível  não  é  válida  quando  se  trata  de  promessas  constitucionais.    

 

  Atenção:   na   atual   fase   do   processo   civil,   resta   claro   que   tal   princípio   não   é   uma  exclusividade  do  processo  coletivo,  também  se  aplicando  ao  processo  individual.  A  diferença  é  ele  é  mais   intenso  no  processo  coletivo.  Em  realidade,  até  mesmo  no  paradigma  do  CPC  de  1973,  era  possível  sustentar  todas  as  consequências  de  tal  princípio  também  no  processo  individual.  

 

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5.6.  Princípio  da  MÁXIMA  AMPLITUDE/ATIPICIDADE/NÃO-­‐TAXATIVIDADE  DO  PROCESSO  COLETIVO  (art.  83  do  CDC)  

Por  este  princípio,  o  rol  das  ações  coletivas  não  é  taxativo,  já  que  objetiva  ampliar  ao  acesso  à   tutela   coletiva.   Assim,   qualquer   ação   pode   ser   coletivizada,   desde   que   o   objeto   seja   a   tutela   de  interesses  metaindividuais  (pode  ser  utilizada  para  a  proteção  de  direitos  coletivos).  

Com  efeito,  dispõe  o  art.  83  do  CDC:  “para  a  defesa  dos  direitos  e   interesses  protegidos  por  este  código  são  admissíveis  todas  as  espécies  de  ações  capazes  de  propiciar  sua  adequada  e  efetiva  tutela”.  

É  possível,  v.g.,  o  ajuizamento  de  ação  possessória  coletiva;  ação  monitória  coletiva.    

 

5.7.  Princípio  da  AMPLA  DIVULGAÇÃO  DA  DEMANDA  COLETIVA  (art.  94  do  CDC)  

  Segundo  DIDIER,  esse  princípio  pode  ser  dividido  em  dois:  

a) Princípio  da  adequada  notificação  dos  membros  do  grupo  

  Esse  princípio  tem  origem  na  fair  notice,  do  direito  norte-­‐americano.  Com  efeito,  quando  se  ajuiza   uma   ação   coletiva,   ela   interessa   a   uma   gama  determinada  ou   indeterminada  de   pessoas.  O  problema  é  o  seguinte:  como  avisar  a  estas  pessoas  que  há  uma  ação  ajuizada  em  favor  delas?    

  O  art.  94  do  CDC  informa  que  a  demanda  coletiva  deve  ter  ampla  divulgação,  o  que  ocorrerá  através   de   divulgação   pelos   meios   de   comunicação   social,   por   parte   dos   órgãos   de   defesa   do  consumidor,  além  da  publicação  de  edital  no  órgão  oficial.      

Art.  94.  Proposta  a  ação,  será  publicado  edital  no  órgão  oficial,  a  fim  de  que  os  interessados  possam  intervir  no  processo  como  litisconsortes,  sem  prejuízo  de  ampla  divulgação  pelos  meios  de  comunicação  social  por  parte  dos  órgãos  de  defesa  do  consumidor.  

  Essa   ampla   divulgação   serve   para   que   os   indivíduos   que   ficariam   abrigados   pela   coisa  julgada   coletiva  possam   fiscalizar   a   condução  do  processo  bem   como  exercer   seu  direito  de   sair  (right  to  opt  out),  se  assim  desejarem.    

  Com  efeito,  a  nova  LACP  vai  prever  que  essa  divulgação  ocorrerá  através  de  uma  comunicação  direta  entre  o  réu  da  ação  coletiva  (ex:  empresa  de  telefonia)  e  os  beneficiados  (consumidores,  v.g.).      

 

b) Princípio  da  informação  aos  órgãos  competentes  

  Está  previsto  nos  arts.  6º  e  7º  da  LACP,  que  prevê  o  dever   funcional  do   juiz  de   informar  ao  órgão   curador   da   sociedade,   o  Ministério   público,   sobre   fatos   que   constituam  objeto  da   ação   civil  pública.  

Art.   6º   da   lei   7.347/85.   Qualquer   pessoa   poderá   e   o   servidor   público   deverá   provocar   a   iniciativa   do  Ministério   Público,   ministrando-­‐lhe   informações   sobre   fatos   que   constituam   objeto   da   ação   civil   e  indicando-­‐lhe  os  elementos  de  convicção.    

Art.  7º  da  lei  7.347/85.  Se,  no  exercício  de  suas  funções,  os  juízes  e  tribunais  tiverem  conhecimento  de  fatos  que   possam   ensejar   a   propositura   da   ação   civil,   remeterão   peças   ao   Ministério   Público   para   as  providências  cabíveis.  

 

5.8.  Princípio  da  INTEGRATIVIDADE  DO  MICROSSISTEMA  PROCESSUAL  COLETIVO  

  O   princípio   da   integratividade   indica   que   o   sistema   processual   coletivo   adota   a   teoria   do  sistema   do   DIÁLOGO   DAS   FONTES   normativas   ou   “diálogo   sistemático   de   coerência”   (segundo   a  qual,  visando  harmonia  e  integração,  na  aplicação  simultânea  de  duas  leis,  uma  pode  servir  de  base  conceitual  para  outra).  

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  Como  cediço,  não  existe  uma  Lei  central  que  trate  do  processo  coletivo.  Por   isso,  o  sistema  processual  coletivo  brasileiro  é  uma  verdadeira  bagunça,  havendo  contradições,  previsões  repetidas  etc.    

  As  principais  normas  de  direito  coletivo  partem  do  núcleo  básico  formado  pela  LACP  +  CDC.    

  O  CDC  e  a  LACP  são  normas  de  reenvio,  pois  o  CDC,  art.  90,  manda  aplicar,  para  tudo  que  ele  trata,  a  LACP;  e  a  LACP,  em  seu  art.  21,  manda  aplicar  o  CDC  em  tudo  que  ela  trata.    

Art.  90  do  CDC.  Aplicam-­‐se  às  ações  previstas  neste  título  as  normas  do  Código  de  Processo  Civil  e  da  Lei  n°  7.347,  de  24  de  julho  de  1985,  inclusive  no  que  respeita  ao  inquérito  civil,  naquilo  que  não  contrariar  suas  disposições.  

Art.   21  da   LACP.  Aplicam-­‐se   à  defesa  dos  direitos   e   interesses  difusos,   coletivos   e   individuais,   no  que   for  cabível,  os  dispositivos  do  Título  III  da  lei  que  instituiu  o  Código  de  Defesa  do  Consumidor.    

  Sobre  este  núcleo   (CDC  +  LACP),  há  a  comunicação  de  todas  as  normas  paralelas   (LIA,  LAP,  ECA,   MSC,   Estatuto   da   Cidade,   Estatuto   do   Idoso,   Estatuto   do   Deficiente   etc.)   que   formam   o  microssistema  processual  coletivo.    

  A  integratividade  do  microsistema  processual  coletivo  é  aplicado  por  meio  da  interpenetração  recíproca   de   todas   as   leis   que   tratam   de   processo   coletivo.   A   integratividade   se   distingue   da  subsidiariedade,  pois  permite  a  aplicação  das  normas  independentemente  de  existir  a  norma  ou  não  na  lei  específica.  Deve-­‐se  analisar  o  sistema  como  um  todo.  

A   lei   de   improbidade   administrativa,   juntamente   com   a   lei   da   ação   civil   pública,   da   ação   popular,   do  mandado   de   segurança   coletivo,   do   Código   de   Defesa   do   Consumidor   e   do   Estatuto   da   Criança   e   do  Adolescente  e  do   Idoso,   compõem  um  microssistema  de   tutela  dos   interesses   transindividuais  e   sob  esse  enfoque  interdisciplinar,  interpenetram-­‐se  e  subsidiam-­‐se.  –  STJ  –  Resp  510.150/MA,  T1.  Rel.  Min.  Luiz  Fux.  Dj  17/02/2004.  

  ATENÇÃO:   O   CPC   não   faz   parte   do   sistema   integrativo   que   compõe   o   diálogo   das   fontes,  sendo   sua   aplicação   subsidiária.   Ex.:   prazo   de   apelação   (que   não   é   tratada   pelas   leis   do  microssistema).  

NCPC.   Art.   15.     Na   ausência   de   normas   que   regulem   processos   eleitorais,   trabalhistas   ou  administrativos,  as  disposições  deste  Código  lhes  serão  aplicadas  supletiva  e  subsidiariamente.  

  Exemplos  da  integratividade:  

" Segundo  o  STJ,  é  possível  aplicar  a  inversão  do  ônus  da  prova  em  qualquer  ação  coletiva  (seja   ação   civil   pública   ambiental,   de   idoso,  deficiente,  patrimônio  público  etc.)  mesmo  não  havendo  essa  previsão  na  LACP,  pois  o  CDC  prevê  essa  possibilidade  em  seu  art.  6º,  VIII.  

" Aplicação  em  todas  as  ações  coletivas  das  regras  de  reexame  necessário  previstas  na  LAP  (art.   19),   salvo   no   caso   de  Mandado  de   Segurança   Coletivo,   que   tem  disciplina   própria  (nem  a  LACP  nem  o  CDC  prevêem  algo  a   respeito).  Assim,  é  possível  afirmar,  conforme  entende   a   jurisprudência   do   STJ,   que   existe   reexame   necessário   na   ação   coletiva   (se  julgada   improcedente,   pois   o  benefício   é   à   coletividade).  Recentemente   (2014),   o   STJ  afastou   a   aplicação  da   regra  de   reexame  necessário  da   LAP  às   ações  de   improbidade  administrativa.  

Art.  19  da  LAP.  A  sentença  que  concluir  pela  carência  ou  pela  improcedência  da  ação  está  sujeita  ao  duplo  grau  de   jurisdição,  não  produzindo  efeito  senão  depois  de  confirmada  pelo  tribunal;  da  que   julgar  a  ação  procedente  caberá  apelação,  com  efeito  suspensivo.      

§  1º  Das  decisões  interlocutórias  cabe  agravo  de  instrumento.  

§  2º  Das  sentenças  e  decisões  proferidas  contra  o  autor  da  ação  e  suscetíveis  de  recurso,  poderá  recorrer  qualquer  cidadão  e  também  o  Ministério  Público.    

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Obs.:  O  reexame  necessário,  em  ação  coletiva,  não  é  em  prol  do  Poder  Público,  mas  sim  em  benefício  da  coletividade  (diversamente  do  que  ocorre  no  CPC).  Se  o  Poder  Público  perde  a  ação  civil  pública,  não  há  reexame  necessário  em  favor  dele,  mas  apenas  se  a  ação  coletiva  for  julgada  improcedente.  

" Aplicação   em   todas   as   ações   coletivas   do   conceito   dos   direitos   coletivos   lato   sensu  (direitos  difusos,  coletivos  stricto  sensu  e  individuais  homogêneos),  que  estão  previsto  no  art.  82  do  CDC.  

" Aplicação   em   todas   as   ações   coletivos   da   possibilidade   de   execução   por   desconto   em  folha  de  pagamento  (art.  14,  §3º  da  Lei  de  Ação  Popular).  

" Aplicação  em  todas  as  ações  coletivas  da  possibilidade  de  “intervenção  móvel”  da  pessoa  jurídica   nas   demandas   coletivas,   que,   à   juízo   de   seu   representante   legal   e   com   a  finalidade   de   atender   ao   interesse   público,   poderá   optar   por   atuar   ao   lado   do   autor,  contestar  a  ação  como  réu  ou  não  contestar  (arts.  6º,  §3º  da  LAP  e  17,  §3º  da  LIA).    

 

5.9.  Princípio  da  adequada  representação  ou  do  controle  judicial  da  legitimação  coletiva  

  Diferentemente   do   sistema   norte-­‐americano,   em   que   qualquer   pessoa   pode   propor   ação  coletiva,   desde   que   prove   a   adequada   representação   do   grupo,  no   Brasil,  o   legislador   optou   por  estabelecer  um  rol  de  legitimados  no  art.  5º  da  LACP,  os  quais  são  os  únicos  que  podem  demandar  coletivamente  no  Brasil.    

Art.  5º  Têm  legitimidade  para  propor  a  ação  principal  e  a  ação  cautelar:    

I  -­‐  o  Ministério  Público;  

II  -­‐  a  Defensoria  Pública;    

III  -­‐  a  União,  os  Estados,  o  Distrito  Federal  e  os  Municípios;  [Administração  Direta]  

IV  -­‐  a  autarquia,  empresa  pública,  fundação  ou  sociedade  de  economia  mista;  [Administração  Indireta]  

V  -­‐  a  associação  que,  concomitantemente:  

a)  esteja  constituída  há  pelo  menos  1  (um)  ano  nos  termos  da  lei  civil;  

b)   inclua,   entre   suas   finalidades   institucionais,   a   proteção   ao   meio   ambiente,   ao   consumidor,   à   ordem  econômica,  à  livre  concorrência  ou  ao  patrimônio  artístico,  estético,  histórico,  turístico  e  paisagístico.    

  A  grande  dúvida  que  há  no  Brasil  é  se,  sem  prejuízo  do  controle  legislativo  da  representação  (que  define  quais  os  legitimados),  poderia  também  o  juiz,  tanto  quanto  nos  EUA,  fazer  o  controle  judicial,   reconhecendo,   no   caso   concreto,   a   falta   de   representação   adequada   e   legitimidade   do  autor  coletivo  e  considerando-­‐o   incapaz  de  prosseguir  na  demanda.  Ou  seja,  é  possível,  como  no  sistema   norte-­‐americano,   que   o   juiz   faça   uma   verificação   prévia   da   idoneidade/capacidade   do  legitimado  à  ação  coletiva?  

• 1ª  posição  (NELSON  NERY  JR.)  !  Não  é  possível  o  controle  judicial  da  representação  adequada,  salvo  para  as  associações,  pois  há  uma  presunção  ope  legis.  A  própria  LACP  estabelece  alguns  requisitos  para  as  associações  (constituição  há  pelo  menos  1  ano;  pertinência  temática).  

Para  NERY,   o   Estado   federado  do  Rio  Grande  do   Sul,   por   exemplo,   pode   ajuizar   ação   civil  pública  na  defesa  do  meio  ambiente  do  Estado  do  Amazonas,  porque  o  interesse  processual  na  ação  civil  pública  é  aferível  em  razão  da  qualidade  do  direito  tutelado:  difuso,  coletivo  ou  individual  homogêneo.  

• 2ª  posição  (DOUTRINA  MAJORITÁRIA,  STF  E  STJ)  !  É  possível  o  controle   judicial   (ope  iudicis)  da  representação  adequada,  em  complemento  ao  que  o  legislador  já  fez.  Haveria,  portanto,  um  

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controle  duplo.  Para  essa  corrente,  o  controle   judicial   recairia  sobre  o  critério  da   finalidade  institucional  ou  pertinência  temática  do  autor  coletivo  (não  recairia  sobre  os  critérios  norte-­‐americanos).  É  a  corrente  AMPLAMENTE  MAJORITÁRIA  (STF).  

Assim,  o  juiz  poderia  afastar  a  presunção  legal  no  caso  concreto.  

Explicando:  o  MP  tem  sua  finalidade  institucional  prevista  no  art.  127  da  CF/88:  (i)  defesa  da  ordem  jurídica,  (ii)  do  regime  democrático,  (iii)  dos  interesse  sociais  e  (iv)  dos  interesses  individuais  indisponíveis.  

Para   quem   adota   a   primeira   corrente,   o   MP   sempre   terá   legitimidade   para  qualquer   ação   coletiva.   Para  quem  adota   a   2ª   corrente,   o   juiz   poderia  negar   a  ação  ajuizada  pelo  MP,  se  estivesse  fora  de  suas  finalidades  (não  iria  extinguir  a  ação,  mas  chamar  outros  legitimados  para  continuar  a  ação,  por  força  do    

Ex.:   o   Defensor   Público   resolve   entrar   com   ação   civil   pública   para   discutir   a  alíquota  do  bacalhau  norueguês.   Para   a   1ª  posição,   o   juiz   deveria   levar   a   ação  adiante;  para  a  2ª  posição,  o  juiz  deveria  intimar  alguém  para  tocar  o  processo,  já  que   não   tem   nada   a   ver   com   a   finalidade   institucional   da   defensoria   (cuja    finalidade   institucional,   prevista   no   art.   134   da   CF/88   é   a   defesa   do  hipossuficiente).  

 

6.  Objeto  do  processo  coletivo  (art.  81  do  CDC)  

  Segundo   BARBOSA   MOREIRA,   o   objeto   do   processo   coletivo   são   os   interesses   ou   direitos  meta/trans  ou  paraindividuais,  “situados  numa  posição  intermediária  entre  o  interesse  público  e  o  interesse  privado”  (HUGO  NIGRO  MAZZILLI).  

Art.   81.   A   defesa   dos   interesses   e   direitos   dos   consumidores   e   das   vítimas   poderá   ser   exercida   em   juízo  individualmente,  ou  a  título  coletivo.  

Parágrafo  único.  A  defesa  coletiva  será  exercida  quando  se  tratar  de:  

I   -­‐   interesses   ou   direitos   difusos,   assim   entendidos,   para   efeitos   deste   código,   os   transindividuais,   de  natureza  indivisível,  de  que  sejam  titulares  pessoas  indeterminadas  e  ligadas  por  circunstâncias  de  fato;  

II   -­‐   interesses   ou   direitos   coletivos,   assim   entendidos,   para   efeitos   deste   código,   os   transindividuais,   de  natureza  indivisível  de  que  seja  titular  grupo,  categoria  ou  classe  de  pessoas  ligadas  entre  si  ou  com  a  parte  contrária  por  uma  relação  jurídica  base;  

III  -­‐  interesses  ou  direitos  individuais  homogêneos,  assim  entendidos  os  decorrentes  de  origem  comum.    

Obs.1:  Interesses  x  direitos  

  Qual  a  diferença  entre  direitos  e  interesses?  

Interesses   É   gênero.   São  as  pretensões  não   tuteladas   por  norma   jurídica  expressa.  Confere  maior  abrangência  à  tutela.  

Direitos   São  pretensões  tuteladas  pela  norma  jurídica  expressa.  Por  conta  disso,  são  mais  consolidados.  

 

  Essa  distinção,  realizada  pela  doutrina,  é  apenas  acadêmica  (e,  portanto,  inútil),  já  que  o  art.  81  do  CDC  não  faz  qualquer  distinção  entre  as  duas  palavras.    

6.1.  Classificação  de  Barbosa  Moreira  dos  direitos  e  interesses  metaindividuais  

 

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I.  Direitos/interesses  naturalmente  coletivos  

  Segundo  BARBOSA  MOREIRA,  num  primeiro  grupo  dos  interesses/direitos  metaindividuais  estão  os   direitos/interesses   naturalmente   coletivos,   caracterizados   pela   INDIVISIBILIDADE   do   objeto.  Neste  caso,  o  bem  tutelado  não  pode  ser  partilhado  entre  os   titulares   (ou   todo  mundo  ganha  ou  todo  mundo   perde).   Ex.:   meio   ambiente   é   um   bem   naturalmente   coletivo   porque   não   é   possível  despoluir  o  rio  para  uma  única  pessoa;  patrimônio  público.  

  Esses   interesses/direitos   naturalmente   coletivos,   segundo   Barbosa   Moreira,   podem   ser  divididos   em   dois   grupos:   direitos   difusos   e   direitos   coletivos   em   sentido   estrito.   Vejamos   as  diferenças  entre  eles:  

Interesses  e  direitos   DIFUSOS   COLETIVOS  EM  SENTIDO  ESTRITO  

Exemplos   Meio   ambiente;   patrimônio   público;  propaganda  enganosa.  

Nulidade   de   cláusula   de   contrato   de  adesão;   mensalidades   escolares;  questões   envolvendo   direitos  trabalhistas,   sindicatos   e   entidades   de  classe.  

Titularidade  Os   seus   titulares   são   indeterminados   e  INDETERMINÁVEIS   (não   se   sabe   quais  são  os  titulares  e  isso  nunca  será  sabido).  

Os   seus   titulares   são   indeterminados  (tanto   quanto   os   difusos),   mas   são  DETERMINÁVEIS  por  grupo,  categoria.  

Relação  entre  os  titulares  

Não  há  relação  jurídica  entre  os  titulares.  Os   sujeitos   são   ligados   entre   si   por  circunstâncias   de   fato   extremamente  mutáveis.    

Ex.:  morar  na  mesma  cidade,  beber  água  no  mesmo  rio.  

Há  uma   relação   jurídica  base  entre  os  titulares   (entre   si   ou   com   a   parte  contrária).  Os  sujeitos  são  ligados  entre  si  por  circunstâncias  jurídicas.  

Duração  Têm   duração   efêmera   (essa  característica   decorre   da   mutabilidade  das  circunstâncias  de  fato).  

 

Nível  de  Conflituosidad

e  interna  

Alta   conflituosidade   interna:   dentro   do  grupo  que  é  titular  deste  direito  existem  as   mais   diversas  opiniões/posicionamentos.   Justamente  por   isso,   conforme   aponta   Mazzilli,   se  mostram   ineficientes   os   procedimentos  e   a   estrutura   que   normalmente   se  

Há  uma  baixa   conflituosidade   interna,  sendo   eficiente   a   mediação   dos  conflitos.  

 

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prestam  à  mediação  dos  conflitos.  

Nível  de  Abstração  

Alta   abstração:   os   interesses   difusos  existem  muito  mais   no   plano   hipotético  do  que  no  plano  real.  

Os   direitos   são   de   menor   abstração  (são  mais  concretos).  

   

 

 

II.  Direitos/interesses  acidentalmente  coletivos  (individuais  homogêneos)  

  Além  dos  direitos  naturalmente  coletivos,  Barbosa  Moreira  cria  um  segundo  grupo,  composto  pelos  interesses  acidentalmente  coletivos.  O  que  caracteriza  tais  direitos  é  a  DIVISIBILIDADE  de  seu  objeto.    

  Obs.:  A  origem  dessa  proteção  são  as  class  action  for  damages  (ações  de  reparação  de  danos  à  coletiva  do  direito  norte-­‐americano).  

  Assim,  quando  o  interesse  for  acidentalmente  coletivo,  uma  parte  de  seus  titulares  pode  ter  direito  e  outra  parte  não.    

  Na   realidade,   tais   direitos   são   individuais,  pois   cada  pessoa   tem   interesse/direito  próprio   a  uma  tutela  jurídica  una  e  individual.  A  questão  é  que,  em  razão  do  grande  número  de  titulares  desses  interesses,  eles  acabam  sendo  homogeneizados.  A  lei  dá  tratamento  coletivo  para  a  defesa  de  um  interesse  que  é  individual  (daí  o  nome  “direito  individual  homogêneo”).  

a) Exemplos:   um   exemplo   muito   bom   de   direito   individual   homogêneo   é   o   caso   do   recall.  Quando   um   produto   está   com   defeito,  muitos   são   os   consumidores   titulares   do   direito   ao  recall.  Por  conta  do  múltiplo  número  de  titulares,  esse  direito  é  coletivizado.    

Outro   exemplo:   imagine-­‐se   que   determinada   marca   de   leite   apresente,   na   embalagem   do  produto,  que  o  seu  volume  é  de  1  litro,  enquanto  que,  na  realidade,  ele  contém  900  ml.  Neste  caso,   ninguém   acionará   a   empresa   para   cobrar   apenas   alguns  mililitros   de   leite   (isso   seria  antieconômico);  contudo,  um  legitimado  coletivo  pode  defender  todos.  

b) Fundamentos:  São  5  os  fundamentos  que  justificam  a  tutela  coletiva  de  pretensões  que  são  individuais:  

" Molecularização  dos  conflitos  

" Economia  processual;  

" Evitar  decisões  contraditórias;  

" Aumento  do  acesso  à  Justiça:  com  a  tutela  coletiva  dos  direitos  individuais,  amplia-­‐se  o  acesso  à  justiça,  permitindo-­‐se  a  tutela  de  bens  antieconômicos.  

 

c) Características  dos  direitos  individuais  homogêneos  !  Os  titulares  são  indeterminados,  mas  determináveis  (enquanto  os  direitos  coletivos  são  determináveis  por  grupo  logo  no  início  da  ação,  os  direitos  individuais  homogêneos  são  determináveis  na  fase  de  liquidação/execução).  

1ª   fase:   conhecimento   do  ilícito   individual  homogêneo  

2ª   fase:   liquidação   e  execução   do   direito  individual  

3ª   Fase:   liquidação   e   execução  coletiva  

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Não   há   necessidade   de  identificar  os   titulares  nem  a   extensão   de   seu   dano,  sendo   a   sentença   genérica  e   a   coisa   julgada   erga  omnes.    

 

Os   titulares   dos   direitos  individuais   são  identificados   no  momento   da   liquidação  e   execução,   recebendo  suas   respectivas  indenizações,   de   acordo  com   os   danos  suportados  individualmente.  

Passado   o   prazo   de   1   ano,   uma  vez  não  ocorrendo  a  identificação  ou   habilitação   de   titulares   de  direitos   individual   em   número  compatível   com   a   gravidade   da  lesão,  poderá  o  MP  ou  qualquer  co-­‐legitimado   promover   a  liquidação   e   execução   da  indenização,   que   irá   para   o  Fundo   de   Direitos   Difusos   (fluid  recovery).  

 

  A   maioria   dos   problemas   no   estudo   do   processo   coletivo   surge   exatamente   nos   direitos  individuais  homogêneos.  Eles  demandam  uma  análise  mais  profunda.  

Interesses   Grupo   Objeto   Origem  

Difusos   Indeterminável   Indivisível   Situação  de  fato  (APÓS  ou  COM  a  lesão)  

Coletivos   Determinável   Indivisível   Relação  jurídica  (formada  ANTES  da  lesão)  

Individuais  homogêneos   Determinável   Divisível   Origem  comum  

(APÓS  ou  COM  a  lesão)  

 

 

6.2.  Observações  importantes  

  Segundo  NELSON  NERY  JR.,  na  prática,  o  mesmo  fato  pode  dar  ensejo  a  ações  coletivas  para  a  tutela  de  diferentes  interesses,  de  modo  que  o  que  define  se  se  trata  de  direito  difuso,  coletivo  ou  individual  homogêneo  é  o  caso  concreto,  o  direito  afirmado  na  inicial,  o  tipo  de  pretensão  material  e  tutela  jurisdicional  pretendida.  

  Obs.:   a   definição   do   interesse   pelo   pedido.   Segundo   Nery   Jr.,   a   identificação   do   tipo   de  direito   metaindividual   envolvido   depende   da   análise   do   pedido   formulado   na   ação   coletiva.   Isso  porque,   de   fato,   uma  mesma   situação   fática   pode   gerar   diversas   pretensões.   A   título   de   exemplo  (LEAL,  2014,  p.   121),   imagine-­‐se  uma  empresa  que  pratica  publicidade  enganosa  a   respeito  de  um  bem  de  consumo  de  luxo.  Uma  ação  coletiva  que  objetiva  a  cessação  da  publicidade  enganosa  atinge  o  interesse  de  um  grupo  indeterminável  (difuso)  de  pessoas.  Por  outro  lado,  caso  o  pedido  formulado  seja  o  de  indenização  por  danos  sofridos  por  pessoas  que  já  contrataram,  temos  aí  direitos  coletivos  em   sentido   estrito.   Percebam,   com   isso,   que   o   fato   de   um   direito   ser   “difuso”   não   significa   que  pertence   a   todos,   sendo   possível   inclusive   o   controle   da   legitimação   coletiva.   Imagine-­‐se,   por  exemplo,  que  a  publicidade  enganosa  envolva  um  automóvel  que  custe  um  milhão  de  reais.  Nesse  caso,   a   ação   para   cessação   da   publicidade,   embora   envolva   direitos   difusos,   jamais   poderia   ser  patrocinada  pela  Defensoria  Pública,  por  evidente  impertinência  temática.  

  Constitui  erro  comum  supor  que,  em  ação  civil  pública  ou  coletiva,  só  se  possa  discutir,  por  vez,  uma  só  espécie  de   interesse   transindividual.  Não  raro,  nessas  ações  se  discutem   interesses  de  mais  de  uma  espécie.  À  guisa  de  exemplo,  numa  ACP  é  possível  combater  os  aumentos   ilegais  de  mensalidades   escolares   já   aplicados   nos   contratos   dos   alunos   atuais   (direito   coletivo),   buscar   a  

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repetição   do   indébito   (direito   individual   homogêneo)   e,   ainda,   pedir   a   proibição   de   aumentos  futuros  (direito  difuso,  envolvendo  futuros  alunos).  

 

6.3.  Ações  pseudoindividuais    

  Ações   pseudoindividuais   à   São   ações   individuais   cujos   resultados   geram   necessariamente  efeitos  sobre  toda  uma  coletividade  (ex.:  anulação  de  prova  de  concurso);  quando  a  relação  jurídica  substancial   é   incindível.   Nessas   hipóteses,   KAZUO   WATANABE   defende   a   vedação   dos   processos  individuais,   o   que  DIDIER   descarta   por   limitar   o   acesso   à   Justiça.   O   projeto   do   novo   CPC   previa   a  coletivização   das   ações   nesse   caso,   com   a   remessa   dos   autos   ao  MP   (contudo,   tal   dispositivo   foi  vetado).  

   

7.  Coisa  julgada  no  processo  coletivo  

  Esse  tema  é  o  mais  trabalhoso/complicado  no  processo  coletivo.  É  preciso  fazer  um  paralelo  com  o  processo  individual.  

  Relembre:  a  definição  brasileira  de  coisa   julgada  é  de  LIEBMAN:  para  ele,  não  se  trata  de  um  efeito  da  sentença  (os  efeitos  são  declaratórios,  condenatórios  ou  constitutivos,  conforme  doutrina  trinária),  mas  sim  uma  qualidade  dos  efeitos  da  sentença.  [[  

 

7.1.  Limites  da  coisa  julgada  

  O   regime   jurídico  da  coisa   julgada  é  visualizado  a  partir  da  análise  de   três  dados:   (i)   limites  objetivos  –  o  que   se  submete  a  seus  efeitos;   (ii)   limites  subjetivos  –  quem   se  submete  à  ela  e;   (iii)  modo  de  produção  –  como  ela  se  forma.  

  No  âmbito  do  processo  INDIVIDUAL,  o  regime  jurídico  da  coisa  julgada  é  assim  definido:    

" Limites   objetivos  !   A   coisa   julgada   limita-­‐se   a   atingir   o   conteúdo   disposto   na   norma  jurídica  individualizada  do  DISPOSITIVO  da  sentença  (art.  468,  CPC/73;  art.  500,  NCPC).    

Art.   503.    A   decisão   que   julgar   total   ou   parcialmente   o   mérito   tem   força   de   lei   nos   limites   da   questão  principal  expressamente  decidida.  

" Limites  subjetivos  !  A  coisa   julgada  produz  efeitos   INTRA  PARTES.  A  regra  está  no  art.  472  do  CPC  –  art.  506,  NCPC.  

" Modo   de   produção   !   A   coisa   julgada   é   PRO   ET   CONTRA,   se   formando  independentemente  do  resultado  do  processo.      

  Já  no  processo  coletivo,  a  coisa   julgada  encontrará  outros   limites  subjetivos.  A  coisa   julgada  será  erga  omnes  ou  ultra  partes  (pois  atinge  terceiros),  mas  jamais   intra  partes  (não  poderá  jamais  beneficiar  apenas  as  partes  envolvidas).  Ademais,  quanto  ao  modo  de  produção  a  coisa   julgada  só  pode  ser  benéfica:  secundum  eventum  litis  ou  probationis.  Assim,  nem  sempre  haverá  coisa  julgada.  

 

I.  Limites  objetivos  

  Os   limites   objetivos   da   coisa   julgada   são   praticamente   iguais   aos   limites   do   processo  individual.  Ou  seja:  a  coisa  julgada,  em  regra,  abrange  apenas  a  parte  dispositiva  do  julgado.  

 

II.  Limites  subjetivos  e  modo  de  produção  

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  Neste   caso,   a   ideia   do   processo   coletivo   é   exatamente   o   oposto   do   CPC,   visando   abranger  também   quem   não   foi   parte,   mas   sempre   tendo   atenção   para   não   interferir   injustamente   nas  garantias  do  indivíduo  titular  do  direito  subjetivo  (que  poderia  ficar  sujeito  à  “imutabilidade”  de  uma  decisão  da  qual  não  participou)  e  não  gerar  a  exposição  indefinida  do  réu  ao  Judiciário,  nem  violar  a  necessária  estabilidade  jurídica  do  Estado  (que  não  pode  revisar  a  todo  tempo  o  que  já  foi  decidido).  Por  isso,  no  processo  coletivo  não  se  aplicam  os  limites  do  art.  472  do  CPC  (art.  506  do  NCPC).  

  Regem   o   tema   os   arts.   103   e   104   do   CDC,   art.   16   da   LACP   e   art.   18   da   LAP.   No   direito  brasileiro,   à   luz   desses   dispositivos,   o   regime  da   coisa   julgada   nas   ações   coletivas   para   as   pessoas  individuais  é  secundum  eventum  litis.  

  ATENÇÃO:  A  coisa   julgada  que  vamos  estudar  aqui  não  se  aplica  ao  mandado  de  segurança  coletivo  e  à  ação  de  improbidade  administrativa,  que  possuem  tutela  específica  de  coisa  julgada.    

CDC.  Art.  103.  Nas  ações  coletivas  de  que  trata  este  código,  a  sentença  fará  coisa  julgada:  

I   -­‐  erga  omnes,  exceto  se  o  pedido  for   julgado  improcedente  por   insuficiência  de  provas,  hipótese  em   que   qualquer   legitimado   poderá   intentar   outra   ação,   com   idêntico   fundamento   valendo-­‐se   de  nova  prova,  na  hipótese  do  inciso  I  do  parágrafo  único  do  art.  81  [INTERESSES  DIFUSOS];  

II   -­‐   ultra   partes,   mas   limitadamente   ao   grupo,   categoria   ou   classe,   salvo   improcedência   por  insuficiência  de  provas,  nos  termos  do  inciso  anterior,  quando  se  tratar  da  hipótese  prevista  no  inciso  II  do  parágrafo  único  do  art.  81  [INTERESSES  COLETIVOS];  

III  -­‐  erga  omnes,  apenas  no  caso  de  procedência  do  pedido,  para  beneficiar  todas  as  vítimas  e  seus  sucessores,   na   hipótese   do   inciso   III   do   parágrafo   único   do   art.   81   [INTERESSES   INDIVIDUAIS  HOMOGÊNEOS].  

§   1°   Os   efeitos   da   coisa   julgada   previstos   nos   incisos   I   e   II   não   prejudicarão   interesses   e   direitos  individuais  dos  integrantes  da  coletividade,  do  grupo,  categoria  ou  classe.  

§  2°  Na  hipótese  prevista  no  inciso  III  [direitos  individuais  homogêneos],  em  caso  de  improcedência  do   pedido,   os   interessados   que   não   tiverem   intervindo   no   processo   como   litisconsortes   poderão  propor  ação  de  indenização  a  título  individual.  

§  3°  Os  efeitos  da  coisa  julgada  de  que  cuida  o  art.  16,  combinado  com  o  art.  13  da  Lei  n°  7.347,  de  24  de   julho   de   1985,   não   prejudicarão   as   ações   de   indenização   por   danos   pessoalmente   sofridos,  propostas   individualmente   ou   na   forma   prevista   neste   código,   mas,   se   procedente   o   pedido,  beneficiarão   as   vítimas   e   seus   sucessores,   que  poderão  proceder   à   liquidação  e   à   execução,   nos  termos  dos  arts.  96  a  99.  

§  4º  Aplica-­‐se  o  disposto  no  parágrafo  anterior  à  sentença  penal  condenatória.  

Art.  104.  As  ações  coletivas,  previstas  nos  incisos  I  e  II  e  do  parágrafo  único  do  art.  81,  não  induzem  litispendência  para  as  ações  individuais,  mas  os  efeitos  da  coisa  julgada  erga  omnes  ou  ultra  partes  a  que  aludem  os  incisos  II  e  III  do  artigo  anterior  não  beneficiarão  os  autores  das  ações  individuais,  se  não   for   requerida   sua   suspensão   no   prazo   de   trinta   dias,   a   contar   da   ciência   nos   autos   do  ajuizamento  da  ação  coletiva.    

LACP.  Art.  16.  A  sentença  civil  fará  coisa  julgada  erga  omnes,  nos  limites  da  competência  territorial  do  órgão  prolator,  exceto  se  o  pedido  for  julgado  improcedente  por  insuficiência  de  provas,  hipótese  em   que   qualquer   legitimado   poderá   intentar   outra   ação   com   idêntico   fundamento,   valendo-­‐se   de  nova  prova.  (Redação  dada  pela  Lei  nº  9.494,  de  10.9.1997)  

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LAP.   Art.   18.   A   sentença   terá   eficácia   de   coisa   julgada   oponível   "erga   omnes",   exceto   no   caso   de  haver   sido   a   ação   julgada   improcedente   por   deficiência   de   prova;   neste   caso,   qualquer   cidadão  poderá  intentar  outra  ação  com  idêntico  fundamento,  valendo-­‐se  de  nova  prova.    

  O  regime  jurídico  da  coisa  julgada  no  plano  coletivo  depende  do  direito  envolvido:  

i. DIREITOS  DIFUSOS  

a. Sentença  PROCEDENTE  !  Eficácia  erga  omnes  (abrange  toda  a  sociedade);  

b. Sentença   IMPROCEDENTE  !   Eficácia   erga   omnes,   impedindo   nova   ação  coletiva,  salvo  no  caso  de  falta  de  provas  (secundum  eventum  probationis).  Mas  atente:  a  ação  individual  nunca  será  prejudicada.  No  caso  de  falta  de  provas,  é  possível  propor  nova  ação  coletiva.  

ii. DIREITOS  COLETIVOS  

a. Sentença  PROCEDENTE    !  Eficácia  ultra  partes  (abrange  toda  a  classe);  

b. Sentença  IMPROCEDENTE  !  Eficácia  ultra  partes  (abrange  toda  a  classe),  impedindo  nova  ação  coletiva,  salvo  no  caso  de  falta  de  provas  (secundum  eventum   probationis).   Mas   atente:   a   ação   individual   nunca   será  prejudicada.   No   caso   de   falta   de   provas,   é   possível   propor   nova   ação  coletiva.  

iii. DIREITOS  INDIVIDUAIS  HOMOGÊNEOS  

a. Sentença   PROCEDENTE     !   Eficácia   erga   omnes   (abrange   toda   a  sociedade);  

b. Sentença   IMPROCEDENTE  !   Eficácia   erga   omnes,   impedindo   nova   ação  coletiva,  mesmo  no  caso  de  falta  de  provas.  Mas  atente:  a  ação  individual  nunca  será  prejudicada.    

 

  Obs.1:   autores   como   DIDIER   possuem   posicionamento   contrário   (e   mais   coerente,   no   meu  entender)   de   que,   diante   da   integratividade   do   microssistema   coletivo,   também   será   secundum  eventum  probationis   a   coisa   julgada   coletiva   sobre  os   direitos   individuais   homogêneos.  Mas  não  é  isso  que  prevalece.  

  Obs.2:  perceba  que,  no  âmbito  coletivo,  a  coisa   julgada  é,  via  de  regra,  secundum  eventum  probationis,   salvo   em   relação   aos   interesses   individuais   homogêneos.   Assim,   caso   seja   julgado  improcedente   o   pedido   e   tendo   havido   o   trânsito   em   julgado,   com   ampla   instrução,   não   será  possível  uma  nova  ação  coletiva.  Apesar  disso,  será  possível  uma  demanda  individual,  em  razão  da  ideia   do   transporte   in   utilibus.   Justamente   por   isso,   fala-­‐se   que,   do   âmbito   coletivo   para   o  individual,  a  coisa  julgada  coletiva  é  secundum  eventum  litis,  ou  seja,  só  atinge  particulares  se  eles  forem  beneficiados.  

 

7.2.  Questões  sobre  o  regime  jurídico  da  coisa  julgada  coletiva  

I.  Transporte  in  utilibus  da  coisa  julgada  coletiva    

  Em  razão  do  Princípio  da  máxima  eficácia  da  tutela  coletiva,  a  coisa  julgada  coletiva,  em  todos  os   interesses   transindividuais,  nunca  prejudica  as  pretensões   individuais   (nem  mesmo  em  caso  de  improcedência  da  ação  coletiva  por  motivo  outro  que  não  a   falta  de  provas),   só  beneficia.   Logo,  a  

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coisa   julgada   só   será   transportada   ao   particular   se   for   in   utilibus   (ela   somente   beneficia,   não  prejudicando).   Portanto,   mesmo   que   a   improcedente   a   ação   coletiva   em   direitos   individuais  homogêneos  (onde  não  se  distingue  o  fundamento  da  falta  de  provas),  a  coisa  julgada  não  impedirá  o  ajuizamento  de  ação  individual  pelo  particular.    

EXCEÇÃO:  Assistentes  litisconsorciais  

Há  apenas  uma  exceção,  hipótese  em  que  a  coisa  julgada  não  só  beneficia,  mas  também  prejudica  o  partcular.  Ela  ocorre  quando  os  lesados  individuais  intervierem  no  processo  coletivo,  na  qualidade  de   assistentes   litisconsorciais   do   autor.   Esta   hipótese   está   no   art.   94  do  CDC.  De  acordo   com  MAZZILLI,   apesar   de   o   capítulo   apenas   se   referir   aos   individuais   homogêneos,   este  artigo   se   aplica   aos   interesses   coletivos,   individuais   homogêneos   e   até  mesmo   aos   interesses  difusos   (porque,  mesmo   nesta   hipótese,   em   certa  medida,   a   procedência   poderá   ser   usada   in  utilibus,  no  processo  individual).  

Art.  94.  Proposta  a  ação,  será  publicado  edital  no  órgão  oficial,  a  fim  de  que  os  interessados  possam   intervir   no   processo   como   litisconsortes,   sem  prejuízo   de   ampla   divulgação   pelos  meios  de  comunicação  social  por  parte  dos  órgãos  de  defesa  do  consumidor.  

  Aquele  que  se  habilita  como  litisconsorte  numa  ação  coletiva  fica  sujeito  aos  efeitos  da  coisa  julgada,  não  podendo  propor  nova  ação  no  plano  individual.  

 

II.  Incidência  da  coisa  julgada  coletiva  sobre  quem  já  tem  ação  individual  em  curso    

  De  acordo  com  o  art.  104  do  CDC,  para  o  autor  da  ação   individual   já  proposta  aproveitar  o  transporte  in  utilibus  da  coisa  julgada  coletiva,  deverá  requerer  a  suspensão  da  sua  ação  individual  em  30  dias,  a  contar  da  data  em  que  o  autor  é  avisado,  nos  autos  da  ação  individual,  de  que  há  uma  ação   coletiva   (exercício  da  opção  de   ser   excluído  da  abrangência  da  decisão   coletiva,   chamado  no  sistema  norte-­‐americano  do  class  action  de  right  to  opt  out).  

Art.  104  do  CDC.  As  ações  coletivas,  previstas  nos  incisos  I  [difusos]  e  II  [coletivos]  e  do  parágrafo  único  do  art.  81,  não  induzem  litispendência  para  as  ações  individuais,  mas  os  efeitos  da  coisa  julgada  erga  omnes  ou  ultra  partes  a  que  aludem  os   incisos   II   [coletivos]  e   III   [individuais  homogêneos]  do  artigo  anterior  não  beneficiarão  os  autores  das  ações  individuais,  se  não  for  requerida  sua  suspensão  no  prazo  de  trinta  dias,  a  contar  da  ciência  nos  autos  do  ajuizamento  da  ação  coletiva.  

" Se   eventualmente   o   autor   pedir   a   suspensão   da   sua   ação   individual,   e   a   ação   coletiva   for  julgada  procedente,  ele  será  beneficiado  (mas  não  prejudicado).  Caso  não  peça  a  suspensão  de   sua   ação   individual,   o   autor   não   será   beneficiado   pela   coisa   julgada   coletiva.   Assim,   é  possível   extrair   a   regra   implícita   de   que  a   coisa   julgada   individual   prevalece   sobre   a   coisa  julgada  coletiva.  

" Essa  suspensão  da  ação  individual  é  faculdade  da  parte  ou  o  juiz  pode  determinar  de  ofício?  A  literalidade  do  art.  104  do  CDC  informa  que  a  suspensão  do  processo  é  uma  faculdade  da  parte.  

ATENÇÃO:  Em  out./2009,  o  STJ,  rompendo  a  facultatividade  da  suspensão  da  ação  individual,  entendeu   que,   “ajuizada   ação   coletiva   atinente   à   macrolide   geradora   de   processos  multitudinários  [ações  repetitivas],  suspendem-­‐se  OBRIGATORIAMENTE  as  ações  individuais,  no  aguardo  do  julgamento  da  ação  coletiva,  o  que  não  impede,  entretanto,  o  ajuizamento  da  ação   individual”   -­‐   Resp   1.110.549/RS   (28.10.2009)   –   recurso   especial   repetitivo,   que   tem  natureza  de  precedente  jurisprudencial  vinculante.  

Assim,   o   STJ   atuou   como   legislador,   invocando   a   aplicação   analógica   do   art.   543-­‐C   do  CPC/1973   (art.   1.036   do   NCPC),   que   previa   a   suspensão   dos   recursos   individuais   em   ações  

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multitudinárias   (pois   de   nada   adiantaria   não   autorizar   essa   suspensão   de   ofício   quando   os  recursos  especiais  provenientes  destas  causas  repetitivas  poderiam  ter  seu  curso  sobrestado,  ex  officio,  por  decisão  do  ministro  do  STJ).      

III.  Incidência  da  coisa  julgada  coletiva  sobre  quem  já  tem  coisa  julgada  individual  

  Na  superveniência  de  ação  coletiva  quando   já  há  coisa   julgada   individual,  ou  seja,  se  a  ação  individual   já   foi   julgada   improcedente   (com   trânsito   em   julgado)   e   depois   veio   uma   coletiva  procedente  (difusos,  coletivos  ou  individuais  homogêneos),  o   indivíduo  pode  se  beneficiar  dela?  Há  divergência:  

i. 1ª   corrente   (ADA   PELLEGRINI)  !   O   indivíduo   não   pode   se   beneficiar   com   a   coisa  julgada   coletiva   superveniente,   pois   a   coisa   julgada   individual,   que   é   específica,  prevalece  sobre  a  coisa  individual  coletiva,  que  é  genérica.  

ii. 2ª  corrente  (HUGO  NIGRO  MAZZILLI)  !  O  indivíduo  pode  se  beneficiar,  com  base  em  2   fundamentos:   (i)  preservação  da   igualdade;   (ii)  como  não  houve  opção  para  a  parte   suspender   a   ação   individual,   em   vista   da   inexistência   de   ação   coletiva,   ela  deve  ser  beneficiada.  

  Não   há   jurisprudência   sobre   o   assunto.   Em  provas   de   concursos,   depende  do   concurso:   de  defensoria  pública,  deve-­‐se  seguir  a  corrente  de  Mazzilli;  se  AGU,  PFN,  deve-­‐se  seguir  Ada.  

 

IV.  Extensão  territorial  da  coisa  julgada  coletiva    

  Segundo   o   art.   16   da   LACP   e   2º-­‐A   da   Lei   n.   9.494/97,   uma   vez   proferida   uma   sentença   no  processo  coletivo,  a  sentença  só  vale  no  território  onde  o  juiz  tem  competência.    

Art.   16   da   lei   7.347/85.   A   sentença   civil   fará   coisa   julgada   erga   omnes,   nos   limites   da   competência  territorial   do   órgão   prolator,   exceto   se   o   pedido   for   julgado   improcedente   por   insuficiência   de   provas,  hipótese  em  que  qualquer  legitimado  poderá  intentar  outra  ação  com  idêntico  fundamento,  valendo-­‐se  de  nova  prova.  

Art.   2º-­‐A   da   lei   9.494/97.   A   sentença   civil   prolatada   em   ação   de   caráter   coletivo   proposta   por   entidade  associativa,  na  defesa  dos  interesses  e  direitos  dos  seus  associados,  abrangerá  apenas  os  substituídos  que  tenham,   na   data   da   propositura   da   ação,   domicílio   no   âmbito   da   competência   territorial   do   órgão  prolator.  (Incluído  pela  Medida  provisória  nº  2.180-­‐35,  de  2001)  

Parágrafo   único.     Nas   ações   coletivas   propostas   contra   a   União,   os   Estados,   o   Distrito   Federal,   os  Municípios  e  suas  autarquias  e  fundações,  a  petição  inicial  deverá  obrigatoriamente  estar  instruída  com  a  ata   da   assembléia   da   entidade   associativa   que   a   autorizou,   acompanhada   da   relação   nominal   dos   seus  associados  e  indicação  dos  respectivos  endereços.  (Incluído  pela  Medida  provisória  nº  2.180-­‐35,  de  2001)  

 

  A   doutrina,   de  modo   unânime/uniforme,   estabelece   que   este   art.   16   é   inconstitucional   e  ineficaz.  Ela  critica  esses  dispositivos:  

" CASSIO   SCARPINELA   entende   que   esses   dispositivos   são   formalmente   inconstitucionais,   pois  derivam  de  medidas  provisórias   (posteriormente   convertidas  em   lei)   que  não  atendiam  aos  requisitos  constitucionais  da  urgência  e  relevância.    

" NELSON   NERY   JR.,   MAZZILLI   E   DIDIER   dizem   que   esses   dispositivos   são   materialmente  inconstitucionais   pela   falta   de   razoabilidade,   pois   o   legislador   confundiu   dois   institutos   de  processo  que  não  se  confundem:  coisa  julgada  e  competência.  

  No  STJ,  sempre  houve  julgados  no  sentido  de  que  essa  norma  seria  constitucional.  Essa  era  a  posição   jurisprudencial   (dominante   em   concursos),   no   sentido   da   validade   do   art.   16   da   LACP,  conforme  julgado  abaixo  da  Corte  Especial,  datado  de  2009:  

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  Muita   atenção:   em   dois   recentíssimos   julgados,   datados   de   outubro   de   2011   (REsp  1243887/PR)   e   dezembro   de   2011   (REsp   1247150/PR),   o   STJ,   submetido   ao   rito   dos  recursos  repetitivos  (543-­‐C  do  CPC),  através  da  sua  Corte  Especial,   fixou  entendimento  diverso  daquele  que  era  dominante.  Entendeu  o  STJ,  nos  citados  precedentes,  que  as  sentenças  e  acórdãos  nas  ações  civis  públicas  agora  valerão  para  todo  o  país,  não  tendo  mais  sua  execução   limitada  ao  município  onde  foram  proferidas.  

REsp   124750.   Corte   Especial.   DIREITO   PROCESSUAL.   RECURSO   REPRESENTATIVO   DE  CONTROVÉRSIA   (ART.   543-­‐C,   CPC).   DIREITOS   METAINDIVIDUAIS.   AÇÃO   CIVIL   PÚBLICA.  APADECO  X  BANESTADO.  EXPURGOS  INFLACIONÁRIOS.  EXECUÇÃO/LIQUIDAÇÃO  INDIVIDUAL.  FORO  COMPETENTE.  ALCANCE  OBJETIVO  E  SUBJETIVO  DOS  EFEITOS  DA  SENTENÇA  COLETIVA.  LIMITAÇÃO   TERRITORIAL.   IMPROPRIEDADE.   REVISÃO   JURISPRUDENCIAL.   LIMITAÇÃO   AOS  ASSOCIADOS.  INVIABILIDADE.  OFENSA  À  COISA  JULGADA.  

1.  Para  efeitos  do  art.  543-­‐C  do  CPC:  1.1.  A  liquidação  e  a  execução  individual  de  sentença  genérica   proferida   em   ação   civil   coletiva   pode   ser   ajuizada   no   foro   do   domicílio   do  beneficiário,  porquanto  os  efeitos  e  a  eficácia  da  sentença  não  estão  circunscritos  a  lindes  geográficos,   mas   aos   limites   objetivos   e   subjetivos   do   que   foi   decidido,   levando-­‐se   em  conta,    para  tanto,  sempre  a  extensão  do  dano  e  a  qualidade  dos  interesses  metaindividuais  postos  em  juízo  (arts.  468,  472  e  474,  CPC  e    93  e  103,  CDC).  

1.2.  A  sentença  genérica  proferida  na  ação  civil  coletiva  ajuizada  pela  Apadeco,  que  condenou  o   Banestado   ao   pagamento   dos   chamados   expurgos   inflacionários   sobre   cadernetas   de  poupança,  dispôs  que  seus  efeitos  alcançariam  todos  os  poupadores  da  instituição  financeira  do   Estado   do   Paraná.   Por   isso   descabe   a   alteração   do   seu   alcance   em   sede   de  liquidação/execução  individual,  sob  pena  de  vulneração  da  coisa  julgada.  Assim,  não  se  aplica  ao  caso  a  limitação  contida  no  art.  2º-­‐A,  caput,  da  Lei  n.  9.494/97.  

 

V.  Teoria  da  relativização  da  coisa  julgada  

  Aplica-­‐se  ao  processo  coletivo  a  TEORIA  DA  RELATIVIZAÇÃO  DA  COISA  JULGADA  (além  de  ser  perfeitamente  cabível  ação  rescisória  no  prazo  de  2  anos).  Ela  prega  que,  em  virtude  dos  avanços  tecnológicos,  é  possível  a  rediscussão  de  questões  já  decididas,  à  luz  da  nova  ciência.  Ex.  clássico  é  a  questão  da  investigação  de  paternidade,  com  o  surgimento  do  exame  de  DNA.  No  processo  coletivo,  essa  teoria  se  aplica,  sobretudo,  no  âmbito  do  direito  ambiental   (ex.:  há  alguns  anos,  descobriu-­‐se  que  a  queima  da  palha  da  cana  prejudica  o  solo,  o  que  antes  era  concebido  como  algo  lícito).      

8.  Relação  entre  demandas  

8.1.  Sistemas  de  relação  entre  as  demandas  

  No   sistema   brasileiro,   o   que   define   a   relação   entre   demandas   é   a   TEORIA   DA   TRÍPLICE  IDENTIDADE.  

  Contudo,   no   processo   coletivo,   prevalece   a   italiana   TEORIA   DA   IDENTIDADE   DA   RELAÇÃO  JURÍDICA  MATERIAL.  Para  essa  teoria,  o  que  distingue  as  ações  é  a  relação  jurídica;  direito  material  discutido.  Assim,  se  a  União  e  o  Ministério  Público  ajuízam  duas  ações  coletivas  com  o  mesmo  pedido  e   a  mesma   causa   de   pedir,   há   litispendência,   ainda   que   os   legitimados   sejam   distintos.   A   rigor,   a  parte  autora  é  a  mesma:  a  coletividade.  

  Isso  está  no  art.  337,  §2º  do  NCPC:  “Uma  ação  é  idêntica  a  outra  quando  possui  as  mesmas  partes,  a  mesma  causa  de  pedir  e  o  mesmo  pedido”.    

8.2.  Relações  entre  demandas  no  processo  individual    

  É  possível  que  duas  demandas  possuam  elementos  em  comum.    

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a) Identidade   total   !   Por   ela,   possível   haver   dois   fenômenos:   coisa   julgada   ou  litispendência.   No   processo   individual,   verificando   qualquer   uma   delas,   o   magistrado  determina  a  EXTINÇÃO  do  processo   sem   julgamento  do  mérito   (art.  267,  V  do  CPC;  art.  486,  V,  NCPC).  

b) Identidade  meramente   parcial  !   Se   houver   identidade   de  pedido   ou   causa   de   pedir,  haverá  o  fenômeno  da  conexão   (art.  103  do  CPC;  art.  55  do  NCPC);  se  o  pedido  de  uma  abrange  o  da  outra  e  as  partes  e  causa  de  pedir  são  iguais,  há  o  fenômeno  da  continência  (art.  104  do  CPC;  art.  56  do  NCPC).  Nestes  casos,  no  processo  individual,  sendo  possível,  o  magistrado  determinará  a  REUNIÃO  das  causas  para  julgamento  em  conjunto  (art.  105  do  CPC)  ou  SUSPENSÃO  de  uma  das  causas,  se  não  for  possível  a  reunião.    

CPC/73  Art.  103.  Reputam-­‐se  conexas  duas  ou  mais  ações,  quando  Ihes  for  comum  o  objeto  ou  a  causa  de  pedir.  

Art.   104.   Dá-­‐se   a   continência   entre   duas   ou  mais   ações   sempre   que   há   identidade   quanto   às  partes   e   à  causa  de  pedir,  mas  o  objeto  de  uma,  por  ser  mais  amplo,  abrange  o  das  outras.  

Art.  105.  Havendo  conexão  ou  continência,  o  juiz,  de  ofício  ou  a  requerimento  de  qualquer  das  partes,  pode  ordenar  a  reunião  de  ações  propostas  em  separado,  a  fim  de  que  sejam  decididas  simultaneamente.  

NCPC.  Art.  54.    A  competência  relativa  poderá  modificar-­‐se  pela  conexão  ou  pela  continência,  observado  o  disposto  nesta  Seção.  

Art.  55.    Reputam-­‐se  conexas  2  (duas)  ou  mais  ações  quando  lhes  for  comum  o  pedido  ou  a  causa  de  pedir.  

§  1o  Os  processos  de  ações  conexas  serão  reunidos  para  decisão  conjunta,  salvo  se  um  deles  já  houver  sido  sentenciado.  

  No  processo  coletivo,  os  efeitos/conseqüências  das  relações  entre  demandas  são  diversos.    

8.3.  Relações  entre  demandas  no  processo  coletivo  (conexidade  e  litispendência)  

  No   processo   coletivo,   quem   define   as   consequências   da   identidade   total   ou   parcial   da  demanda   é   o   SISTEMA,   de  modo   que   ele  pode   dar   soluções   distintas   caso   a   caso.   Ou   seja,   nem  sempre   a   identidade   total   gerará   a   extinção  de  uma  das   ações,   nem  a   identidade  parcial   gerará   a  junção  das  ações.  É  possível,  até,  que  a  lei  determine  a  suspensão  de  uma  ação,  a  depender  do  tipo  de  relação  entre  as  demandas.  

  Obs.:   O   regime   jurídico   da   conexão   em   ações   coletivas   é   igual   ao   aplicado   entre   ações  individuais:   o   juiz   pode   conhecê-­‐la   de   ofício   e   a   qualquer   tempo   (pois   a   prevenção   gera  competência  absoluta),  podendo  ser  alegada  por  qualquer  das  partes.      

I.  Ação  coletiva  x  ação  individual  

  A  ação  coletiva  não  induz  litispendência  para  a  ação  individual.  

a) IDENTIDADE  TOTAL  (litispendência)  !  NUNCA  será  possível  a  identidade  total  entre  uma  ação  individual  e  uma  ação  coletiva,  já  que  as  partes  (legitimados  coletivos)  e  o  pedido  (de  tutela   de   um   interesse   difuso   ou   coletivo   ou,   nos   individuais   homogêneos,   de   tutela  genérica)  da  coletiva  são  distintos  das  partes   (indivíduo)  e  dos  pedidos   (pedido  certo)  da  ação   individual.   Em   consequência,   o   art.   104   do   CDC   afirma   que   as   ações   coletivas  não  induzem  litispendência  para  as  ações  individuais.    

Embora   o   dispositivo   não   aluda   às   ações   envolvendo   direitos   individuais   homogêneos,   a  rigor,  nem  mesmo  nestes  casos  haverá  litispendência  entre  ação  coletiva  e  ação  individual.  

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b) IDENTIDADE  PARCIAL  (conexão/continência)  !  É  possível  a  identidade  parcial  entre  uma  ação  individual  e  uma  ação  coletiva  apenas  no  que  diz  respeito  à  CAUSA  DE  PEDIR.  Neste  caso,  haverá  CONEXÃO,  e  não  litispendência.    

Mas   atente:   No   processo   coletivo,   ao   contrário   do   que   ocorre   no   processo   individual,   a  conseqüência  da  identidade  parcial  entre  ação  coletiva  e  ação  individual  não  é  a  reunião  das  causas,  mas  sim  a  SUSPENSÃO  da  ação  individual.  

Essa   suspensão   pode   ser   facultativa   (requerida   pela   parte   –   art.   104,   CDC)   ou  obrigatória  judicial  (nas  ações  individuais  multitudinárias).  

 

  Obs.:  o  exercício  do  right  to  opt  out  (quando,  embora  informado,  o  indivíduo  não  suspende  o  curso  de  sua  ação  individual  -­‐  art.  104  do  CDC)  não  implica  renúncia  da  situação  jurídica  individual.    

II.  Ação  coletiva  x  ação  coletiva    

  A  identidade  entre  as  ações  pode  ser:  

a) IDENTIDADE   TOTAL   (litispendência)   !   É   plenamente   possível   a   identidade   total   de  elementos  entre  duas  ações  coletivas.  Ex.:  uma  ação  popular  para  impedir  a  privatização  de   uma   empresa   pública   numa   vara   em   SP   e   uma   ação   popular   para   discutir   a  mesma  coisa  em  uma  vara  no  RJ.  A  coisa  mais  comum  é  haver  duas  ações  coletivas  idênticas  para  a  proteção  do  meio  ambiente  (uma  do  MPE  e  outra  do  MPF).  

CUIDADO:   Deve-­‐se   lembrar   do   arts.   106   do   CDC   e   16   da   LACP   (coisa   julgada   secundum  eventum   probationis),   pois   pode   ser   de,   em   identidade   total,   a   primeira   ação   coletiva   ser  julgada  improcedente  por  falta  de  provas.  Nesse  caso,  o  MP  pode  repropor  a  ação.  

Qual  é  a  conseqüência  da  litispendência  em  ações  coletivas?  

1ª  Corrente  (WAMBIER,  ANTONIO  GIDI)  !  O  caso  é  de  EXTINÇÃO  da  ação  repetida,  mas  a  parte  da  ação  extinta  poderá  ingressar  como  litisconsorte  na  ação  que  remanesceu.  

2ª   Corrente   (ADA   GRINOVER)  !   O   caso   não   é   de   extinção,   mas   sim   de   REUNIÃO   para  julgamento   conjunto   (mesmo   efeito   da   conexão   e   continência)   ou,   não   sendo   isso  possível,  a  SUSPENSÃO  de  uma  delas.  Essa  posição  é  MAJORITÁRIA  na  doutrina.  

 

[     Observações:    

" Em  ações  coletivas  com  pedido  e  causa  de  pedir  idênticos,  há  litispendência  ainda  que  os  legitimados  das  ações  sejam  diferentes,  aplicando-­‐se,  no  caso,  a  teoria  da  identidade  da  relação  jurídica  e  não  a  teoria  da  identidade  dos  elementos  da  ação.  Assim,  é  suficiente  a  identidade  da  situação  jurídica  substancial  deduzida.  

" É  possível  que  haja,  até,  litispendência  entre  duas  demandas  coletivas  que  tramitem  por  ritos  diversos   (ação  civil  pública  e  ação  popular),   já  que  a  similitude  do  procedimento  é  irrelevante  diante  da  atipicidade  da  tutela  jurisdicional  coletiva  (que  define  que  qualquer  procedimento  pode  servir  à  tutela  de  um  direito  coletivo).  É  o  que  o  STJ  denomina  ação  popular  MULTILEGITIMÁRIA  (STJ,  Resp  401.964/RO  Dj  11/11/2002).    

 

b) IDENTIDADE  PARCIAL   (conexão/continência)  !   Se  pode  haver   identidade   total,   também  é  possível  a   identidade  parcial  entre  as  ações.  A  conseqüência  da  conexão/continência  será  a  REUNIÃO  das  causas  para  julgamento  simultâneo  ou,  se  não  for  possível,  a  SUSPENSÃO.    

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STJ.  Súmula  489:  “Reconhecida  a  continência,  devem  ser  reunidas  na  Justiça  Federal  as  ações  civis  públicas  propostas  nesta  e  na  Justiça  estadual.”  

Observações:  não  há  litispendência  entre  ação  coletiva  que  discuta  direito  difuso  e  outra  que  discuta  direito  individual  homogêneo,  ainda  que  ambas  estejam  fundamentadas  nos  mesmo  fatos  (causa  de  pedir  remota),  mas  sim  CONEXÃO.    

 

8.4.  Critério  para  a  reunião/unificação  de  demandas  coletivas  relacionadas  

  Nessa   hipótese   há   duas   ações   coletivas   litispendentes   ou   conexas/continentes,   em   que   o  efeito  será  a  reunião.  A  reunião  ocorrerá  tomando  por  base  a  PREVENÇÃO.    

  Havia   três   critérios   para   determinar   a   prevenção   Temos   três   dispositivos   que   tratam   dos  critérios  para  reunião  de  demandas:  artigos  106  e  219  do  CPC,  art.  2º  da  LACP  e  art.  5º  da  LAP:  

" Quem  primeiro  deu  um  despacho  positivo   (“cite-­‐se”)  !  Está  no  art.  106  do  CPC/73:   “Art.  106.   Correndo   em   separado   ações   conexas   perante   juízes   que   têm   a  mesma   competência  territorial,  considera-­‐se  prevento  aquele  que  despachou  em  primeiro  lugar.”.  

" Citação  válida  !  Está  no  art.  219  do  CPC/73,  para  casos  de  competência  territorial  distinta.  

" Propositura  !  Está  no  art.  2º  da  LACP  e  no  art.  5º  da  LAP.  Como  essas  normas  não  trazem  a  definição  de  quando  ocorre  a  propositura,  aplica-­‐se  o  art.  263  do  CPC:  distribuição  ou,  se  não  for  o  caso,  despacho  judicial.  

Em   razão  da   integratividade  do  microssistema   coletivo,   o   critério  da  propositura  prevalece,  afastando  os   critérios  do  despacho   inicial   e  da   citação  válida,  do  CPC   (que  é   subsidiário).  A  doutrina  é  majoritária  neste  sentido.    

Atenção:  o  NCPC  adotou  o  regramento  do  processo  coletivo  da  distribuição  em  seu  art.  59:  “O  registro  ou  a  distribuição  da  petição  inicial  torna  prevento  o  juízo”.  

  Obs.1:  Parece  que  o  art.  2º  da  LACP,  caput,  que  prevê  que  a  competência  para  julgamento  da  ação  civil  pública  é  absoluta,  permite  uma  conexão  que  gera  modificação  de  competência  absoluta.    

LACP.  Art.  2º  As  ações  previstas  nesta  Lei  serão  propostas  no  foro  do  local  onde  ocorrer  o  dano,  cujo  juízo  terá  competência  funcional  [territorial  absoluta]  para  processar  e  julgar  a  causa.    

 

   

9.  Competência  nas  ações  coletivas  

  Tudo  explicado  a  seguir  se  aplica,  como  regra  geral,  para  todas  as  ações  coletivas.  

 

9.1.  Critério  funcional  

  A  regra  geral  é  que  a  ação  coletiva  se  inicia  em  primeira  instância,  conforme  a  origem  do  ato  imputado,   independentemente   de   quem   seja   a   autoridade   impugnada:   Presidente   da   República,  Presidente  das  Mesas  do  Senado  e  Câmara,  Juízes,  Prefeitos  etc.  Inclusive  ações  de  improbidade.  

  EXCEÇÕES  constitucionais:  

a) Quando  a  ação  interessar  à  totalidade  dos  juízes  estaduais  e/ou  ficar  configurado,  após  o  julgamento   na   primeira   instância,   o   impedimento   de   mais   da   metade   dos  desembargadores  para  apreciar  o   recurso   voluntário  ou  a   remessa  obrigatória,   ocorre  a  competência  do  STF  (art.  102,  I,  n,  CF).  

b) Quando   a   causa   substantivar   conflito   entre   União   e   Estado-­‐membro   (Pet   3.674/QO,   j.  04/10/2006)  !  Competência  do  STF.  

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  Obs.:   Houve   uma   tentativa   legislativa   de   se   criar   foro   do   prerrogativa   de   função   na  improbidade  administrativa.  Essa  tentativa  se  deu  através  da  Lei  10.628/02,  que  alterou  a  redação  do  art.  84  do  CPP.  O  STF,  contudo,  no  julgamento  da  ADI  2797,  declarou  inconstitucional  essa  lei  (só  a  Constituição  pode  criar  foro  privilegiado).    

9.2.  Critério  material  

a) JUSTIÇA  ELEITORAL   (art.  121,  CF)  !  Em  princípio,   caberá  ação  coletiva  na   Justiça  Eleitoral,  desde  que  a  causa  de  pedir  for  os  assuntos  relacionados  no  art.  121  da  CF.  

b) JUSTIÇA  DO  TRABALHO  (art.  114,  CR)  !  É  perfeitamente  cabível  ação  coletiva  na  Justiça  do  Trabalho.  Basta  ler  a  Súmula  736  do  STF:  “Compete  à  Justiça  do  Trabalho  julgar  as  ações  que  tenham  como  causa  de  pedir  o  descumprimento  de  normas  trabalhistas  relativas  à  segurança,  higiene  e  saúde  dos  trabalhadores.”.  

Exemplo   comum:   ACP   proposta   pelo   MPT,   para   a   defesa   de   interesses   coletivos,   quando  desrespeitados  direitos  sociais.  Outro  ex:  Ações  de  nulidade  de  cláusula  de  contrato  coletivo  ou  convenção  coletiva.    

c) JUSTIÇA  FEDERAL  !  Aqui,  a  competência  adota  predominantemente  o  critério  do  interesse  direto  e  imediato  da  União,  e  não  o  critério  da  natureza  do  bem  disputado.  O  que  define  se  a  ação  coletiva  vai  para  a  federal  ou  fica  na  estadual  é  o  interesse  das  entidades  mencionadas  no  art.  109  da  CRFB/88.    

d) JUSTIÇA  ESTADUAL  !  Merece  atenção  a  redação  da  Súmula  150  do  STJ:  “Compete  à  Justiça  Federal  decidir  sobre  a  existência  de  interesse  jurídico  que  justifique  a  presença,  no  processo,  da   União,   suas   autarquias   ou   empresas   públicas.”.   De   acordo   com   este   enunciado,   não   é  atribuição  do  juiz  estadual  julgar  se  entidade  da  União  tem  ou  não  interesse  na  causa.  

 

9.3.  Critério  valorativo  

  No   âmbito   nacional,   o   critério   valorativo   só   serve   hoje   para   decidir   a   competência   dos  juizados.  Com  efeito,  de  acordo  com  o  art.  3º,  I  da  Lei  10.259/01,  não  cabe  ação  coletiva  nos  juizados  (cíveis  ou  federais).    

9.4.  Critério  territorial  

  Posição  que  prevalece  na  doutrina,  com  larga  vantagem  e  também  no  STJ  -­‐  RESP  1.101.057-­‐MT,  julgado  em  07/04/2011)  !  Qualquer  que  seja  o  interesse  metaindividual  (difusos,  coletivos  ou  individuais  homogêneos),  aplica-­‐se  a  regra  do  art.  93  do  CDC,  que  dispõe  o  seguinte:  

Art.  93.  Ressalvada  a  competência  da  Justiça  Federal,  é  competente  para  a  causa  a  justiça  local:  

I  -­‐  no  foro  do  lugar  onde  ocorreu  ou  deva  ocorrer  o  dano,  quando  de  âmbito  local;  

II  -­‐  no  foro  da  Capital  do  Estado  ou  no  do  Distrito  Federal,  para  os  danos  de  âmbito  nacional  ou  regional,  aplicando-­‐se  as  regras  do  Código  de  Processo  Civil  aos  casos  de  competência  concorrente.  

 

i. Se  o  dano  for  local  !  A  competência  é  do  juízo  do  local  do  dano.  No  passado,  a  Súmula  193/STJ  estabelecia:  “compete  ao  Juiz  Estadual,  nas  Comarcas  que  não  sejam  sede  de  vara  da   Justiça   Federal,   processar   e   julgar   ação   civil   pública,   ainda   que   a   União   figure   no  processo”.   Esse   enunciado   estabelecia   hipótese   de   delegação   de   competência.   Ocorre  que,  em  2000,  o  STJ  cancelou  a  Súmula.    

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ii. Se  o  dano  for  regional  (estadual)  !  O  foro  é  o  da  capital  do  Estado  (para  MAZZILLI  e  ADA  PELLEGRINI   GRINOVER,   a   ação   também   poderia   ser   proposta   no   Distrito   Federal,  alternativamente).  

iii. Se   o   dano   for   nacional  !   Possuem   competência   concorrente   alternativa   os   foro   do  Distrito  Federal  e  da  capital  de  quaisquer  dos  Estados  envolvidos  (STJ).  

 Esse  critério,  embora  pareça  ser  muito  bom,  pode  ser  objeto  de  crítica.  Um  grande  problema  é  que  o  art.  93  do  CDC  não  define  o  que  é  dano  regional  e  o  que  é  dano  nacional.  Ex:  dano  atinge   3   grandes   comarcas   do   Estado   de   São   Paulo   (esse   dano   é   regional   ou   local?);   dano  atinge  os  Estados  de  SC,  PR  e  RS  (é  nacional  ou  regional?).  

 

9.5.  A  inexistência  de  juízo  universal  para  as  ações  individuais  

  Nos   termos  do   art.   2º   da   LACP,   a   propositura  da   ação  prevenirá   a   jurisdição  do   juízo   para  todas  as  ações  posteriormente  intentadas  que  possuam  a  mesma  causa  de  pedir  ou  o  mesmo  objeto.  Essa  regra  alcança  as  ações  conexas  ou  continentes,  bem  como  os  casos  de  litispendência.  Contudo,  ressalte-­‐se  que  este  dispositivo  não  instituiu  um  juízo  universal  para  as  ações  individuais,  como  se  fosse  um  concurso  de  credores.  

  Na  verdade,  os  lesados  individuais  não  se  submetem  necessariamente  ao  juízo  da  ACP  para  as  ações   individuais.   O   dispositivo   referido   apenas   diz   respeito   à   propositura   de   ações   no   plano  coletivo.  

   

10.  Execução,  liquidação  e  cumprimento  de  sentença  

  Liquidação   de   sentença   é   a   atividade   judicial   cognitiva   pela   qual   se   busca   integrar   uma  norma  jurídica  individualizada  estabelecida  em  título  judicial.  

  Salvo   quando   se   tratar   de   sentença   coletiva   relacionada   a   direitos   individuais   homogêneos  (caso   em   que   a   liquidação   deve   ser   buscada   por   cada   um   dos   titulares   individuais,   em   processos  autônomos),  a  liquidação  coletiva  pode  ser  buscada  numa  fase  específica  do  processo  coletivo,  sem  necessidade  de  instauração  de  novo  processo  apenas  com  esse  objetivo.  

  Obs.:  A  decisão  que  encerra  a  fase  de  liquidação  em  primeiro  grau  de  jurisdição  é  SENTENÇA  (em   sentido   estrito),   porque   finaliza   a   fase   cognitiva   do   procedimento   em   primeira   instância,  complementando   a   norma   jurídica   individualizada   estabelecida   na   decisão   liquidanda   (na   primeira  fase   do   conhecimento,   certifica   alguns   elementos   da   obrigação;   na   liquidação   certifica   o  quantum  debeatur).  

CPC/73.  Art.  475-­‐H.  Da  decisão  de  liquidação  caberá  agravo  de  instrumento.  

NCPC.  Art.  1.015.  Parágrafo  único.    Também  caberá  agravo  de  instrumento  contra  decisões   interlocutórias  proferidas  na  fase  de  liquidação  de  sentença  ou  de  cumprimento  de  sentença,  no  processo  de  execução  e  no  processo  de  inventário.  

  Apesar  disse,  o  recurso  previsto  contra  essa  decisão  é  o  de  AGRAVO  DE  INSTRUMENTO,  sem  precisar  analisar  se  há  ou  não  situação  de  urgência,  já  que  é  a  lei  que  expressamente  prevê.    

10.1.  Direitos  difusos  e  coletivos  

  A  sentença  coletiva  que  discute  direitos  difusos  e  coletivos  pode  dar  ensejo  a  2  execuções:    

a) Liquidação/execução   da   PRETENSÃO   COLETIVA   !   Segue   o   padrão   da   liquidação   de  sentença  individual.  

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b) Liquidação/execução  da  PRETENSÃO  INDIVIDUAL  !  Em  razão  do  transporte   in  utilibus.  Segue   o   modelo   da   liquidação   de   sentença   genérica   envolvendo   direitos   individuais  homogêneos.  

 

I.  Liquidação/execução  da  pretensão  coletiva  

  A  efetivação  da  sentença  coletiva  segue  o  sistema  do  CPC.  Assim,  dependerá  da  natureza  do  direito  coletivo  lato  sensu  afirmado.  Ex.:  se  a  execução  é  de  obrigação  de  não  fazer  e  fazer,  segue  as  normas  do  art.  461  do  CPC  (art.  497  do  NCPC).  

" Legitimados  !  A  execução  da  pretensão  coletiva   tem  por   legitimados  aqueles  previstos  no  art.  15  da  LACP.  Assim,  primeiro  deverá  executar  o  autor  (qualquer  legitimado,  a  exemplo  de  uma  associação,  defensoria,  pessoa  jurídica  de  direito  público  etc.).  Se  não  o  fizer  em  60  dias,  em  razão  do  princípio  da  indisponibilidade  da  execução  da  pretensão  coletiva,  deve  fazê-­‐lo  o  MP.    

LACP.   Art.   15.   Decorridos   sessenta   dias   do   trânsito   em   julgado   da   sentença   condenatória,   sem   que   a  associação  autora   lhe  promova  a   execução,  deverá   fazê-­‐lo  o  Ministério  Público,   facultada   igual   iniciativa  aos  demais  legitimados.  (Redação  dada  pela  Lei  nº  8.078,  de  1990)  

Questão:  A  execução  pode   ser  promovida  por  qualquer   legitimado  coletivo,   inclusive  por  aquele  que  não  tenha  sido  autor  da  ação  coletiva  de  conhecimento.  CERTO,  está  no  livro  de  Fredie.  

 

" Destinatário  !  O  sistema  estabelece  (art.  13,  LACP)  que,  havendo  condenação  em  dinheiro,  a   indenização   pelo   dano   deve   ser   revertida   ao   fundo  de   reparação   de   bens   lesados   (a   Lei  9.008/95  regula  o  fundo  federal  gerido  pela  sociedade  civil).  Por  previsão  legal,  esse  dinheiro  deve   ser  usado  exatamente  para   reparar  os  bens   lesados  e  para   campanhas  educativas.  O  problema  é  que  esse  dinheiro,  ao  entrar  para  um  fundo,  se  torna  público,  o  que  compromete  a  sua  flexibilidade  (sua  utilização  exige  lei  orçamentária),  o  que  deve  ser  mudado  com  a  futura  reforma  da  LACP.  

Obs.:  Quando  o  dano  for  ao  patrimônio  público,  esse  dinheiro  não  irá  para  o  fundo,  mas  para  a  pessoa  jurídica  lesada  (ex:  para  a  Prefeitura  de  Salvador).    

LACP.  Art.  13.  Havendo  condenação  em  dinheiro,  a   indenização  pelo  dano  causado  reverterá  a  um   fundo  gerido   por   um   Conselho   Federal   ou   por   Conselhos   Estaduais   de   que   participarão   necessariamente   o  Ministério  Público  e  representantes  da  comunidade,  sendo  seus  recursos  destinados  à  reconstituição  dos  bens  lesados.  

Parágrafo   único.   Enquanto   o   fundo   não   for   regulamentado,   o   dinheiro   ficará   depositado   em  estabelecimento  oficial  de  crédito,  em  conta  com  correção  monetária.  

 

" Competência  !   Pela   regra   geral   do   processo   civil,   o   juiz   da   execução   é   o   juiz   da   ação  (condenação).  Essa  regra  se  aplica  ao  processo  coletivo.    

II.  Modelo  de  liquidação/execução  da  pretensão  individual  

  Nos  termos  do  art.  103,  §3º  do  CDC,  é  possível   fazer  o  chamado  transporte  “in  utilibus”  da  coisa   julgada.   Assim,   o   prejudicado   individual   pode   apresentar   a   sentença   proferida   no   processo  coletivo  perante  o  juízo  cível,  requerendo  apenas  a  liquidação  e  o  pagamento  (não  necessita  mais  de  certificação).  

Art.  103,  §  3°  do  CDC.  Os  efeitos  da  coisa  julgada  de  que  cuida  o  art.  16,  combinado  com  o  art.  13  da  Lei  n°  7.347,  de  24  de  julho  de  1985,  não  prejudicarão  as  ações  de  indenização  por  danos  pessoalmente  sofridos,  propostas   individualmente  ou  na  forma  prevista  neste  código,  mas,  se  procedente  o  pedido,  beneficiarão  as  vítimas  e  seus  sucessores,  que  poderão  proceder  à  liquidação  e  à  execução,  nos  termos  dos  arts.  96  a  99.  

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" Legitimados  !  Vítimas  e  sucessores.  

" Destinatários  do  dinheiro  !  Vítimas  e  sucessores.  O  que  tem  de  particularidade  é  que  esses  destinatários  da  indenização  só  a  receberão  se  houver  uma  prévia  liquidação  da  sentença:      

" Liquidação  de  sentença  !  A  sentença  proferida  no  processo  coletivo  quantificou  o  dano  com  base   na   coletividade,   e   não   naquilo   que   é   devido   aos   prejudicados   individuais.   Logo,   na  execução  da  pretensão  individual,  é  necessária  a  liquidação  prévia.  A  LACP  nada  dispõe  sobre  a   liquidação   da   sentença,   enquanto   o   CDC   só   o   faz   no   tocante   à   defesa   de   interesses  individuais  homogêneos.  Devem,  pois,  ser  aplicadas  à  liquidação  da  sentença,  nas  ações  civis  públicas   ou   coletivas,   as   regras   do   CDC   e,   supletivamente,   as   do   CPC.   Isso   significa   que   a  liquidação  no  processo  coletivo  passa  agora  a  obedecer  às  regras  do  novo  CPC.  

Em  caso  de  procedência  do  pedido,  dispõe  o  art.  95  do  CDC  que  “a  condenação  será  genérica,  fixando   a   responsabilidade   do   réu   pelos   danos   causados.”   Embora   esteja   presente   em  capítulo   relativo   aos   interesses   individuais   homogêneos,   essa   regra   se   aplica   aos   demais  casos.  

Quando  a  determinação  do  valor  depender  apenas  de  cálculo  aritmético,  o  credor  requererá  o  cumprimento  da  sentença,  na  forma  do  art.  475-­‐J  do  CPC  (art.  523  do  NCPC),   instruindo  o  pedido   com   memória   discriminada   e   atualizada   do   cálculo.   Caberá   liquidação   por  arbitramento   quando   determinado   pela   sentença,   convencionado   pelas   partes   ou   exigido  pela  natureza  do  objeto  da   liquidação;.   Por   fim,   será   feita   a   liquidação  por  artigos   quando,  para  determinar  o  valor  da  condenação,  houver  necessidade  de  alegar  e  provar  fato  novo.  

Diferentemente  do  que  ocorre  no  processo  individual,  a  liquidação  no  processo  coletivo  não  é  só  para  apurar  o  quanto  devido  (quantum  debeatur),  mas  também  o  nexo  de  causalidade  e  o  dano   (an   debeatur),   razão   pela   qual   a   doutrina   (DINAMARCO)   considera   que   não   há  verdadeiramente  liquidação,  mas  sim  habilitação  (ou  “liquidação  imprópria”,  como  prefere  a  LACP  para  diferenciá-­‐la  da  liquidação  própria,  que  avalia  apenas  o  quantum  debeatur).    

Obviamente,   apesar   de   ter   que   provar   o   débito,   o   lesado   individual   não   precisa   mais  comprovar  a  ação  culposa  do  condenado  na  ação  coletiva.  

" Competência  !  Na   execução   da   pretensão   individual,   há   foros   concorrentes.  Com   efeito,  poderão  julgar  essa  execução:    

a. O  juízo  da  liquidação  ou  condenação  (art.  98,  §2º,  I  do  CDC)  

b. O  juízo  do  domicílio  do  lesado/sucessores  (art.  101,  I  do  CDC)  Art.  101.  Na  ação  de  responsabilidade  civil  do  fornecedor  de  produtos  e  serviços,  sem  prejuízo  do  disposto  nos  Capítulos  I  e  II  deste  título,  serão  observadas  as  seguintes  normas:  

I  -­‐  a  ação  pode  ser  proposta  no  domicílio  do  autor;  

 

Competência,  segundo  DIDIER  

Fredie  propõe  a  aplicação  concomitante  ao  art.  101,  I  do  CDC,  do  art.  475-­‐P,  p.  ú.,  do  CPC  (atual   parágrafo   único   do   art.   516   do   NCPC),   por   ser   mais   benéfico   e   facilitar   a   efetivação  individual  da   sentença  coletiva   (permite  ao  exeqüente  escolher  o   foro  dentre  3   foros,  devendo  requerer   ao   juízo   de   origem   a   remessa   dos   autos   do   processo   ao   juízo   da   execução).   Assim,  haveria  4  foros  possíveis:  

a) Foro  que  processou  a  causa  originalmente;  

b) Foro  do  domicílio  do  executado;  

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c) Foro  do  bem  que  pode  ser  expropriado  ;  

d) Foro  do  domicílio  do  exequente.  

  Ademais,   Fredie  e  Hermes  Zaneti   entendem  que  a  possibilidade  de  escolha  do   foro  não  deve   se   restringir   à   execução   individual,   devendo   ser   possível,   também,   no   caso   de   execução  coletiva  promovida  pelos  legitimados  coletivos,  pois  não  há  razão  para  qualquer  diferenciação  de  tratamento.  

   

10.2.  Direitos  individuais  homogêneos  

  A  execução,  nos  direitos  individuais  homogêneos,  segue  3  modelos:  

a) Liquidação/execução  da  pretensão   individual  decorrente  !  Pelas  vítimas  e  sucessores,  já  liquidadas  (art.  97  do  CDC).  

b) Liquidação/execução   da   pretensão   individual   pelo   ente   coletivo  !   Pelos   legitimados  coletivos  em  representação  das  vítimas  já  identificadas  e  já  liquidadas  (art.  98  do  CDC).  

c) Liquidação/execução  da  pretensão  coletiva  residual  (fluid  recovery)  !  Pelos  legitimados  coletivos,  indo  a  indenização  para  o  FDD  (art.  100  do  CDC).  

 

I.  Liquidação/execução  da  pretensão  individual  decorrente  (art.  97  do  CDC)  

Art.  97.  A  liquidação  e  a  execução  de  sentença  poderão  ser  promovidas  pela  vítima  e  seus  sucessores,  assim  como  pelos  legitimados  de  que  trata  o  art.  82.  

  Aplica-­‐se,  aqui,  tudo  aqui  que  foi  dito  no  modelo  da  pretensão  individual  dos  direitos  difusos  e  coletivos   (os   legitimados  são  as  vítimas  e  sucessores,  que  procedem  à  liquidação  imprópria,  tudo  como  já  exposto  acima).  Em  síntese,  deve-­‐se  provar:  

a) O  dano  individual  

b) O  nexo  de  causalidade  

c) O  montante  do  dano  

 

II.  Liquidação/execução  da  pretensão  individual  por  entes  coletivos  (art.  98  do  CDC)  

  O   art.   98   do   CDC   prevê   a   possibilidade   de   o   legitimado   coletivo   promover   a   execução   das  pretensões   individuais   já   liquidadas.   Ex.:   sindicato   promovendo   a   execução   de   verbas   dos  trabalhadores.  

  Atenção:  somente  as  vítimas  que  já  tiverem  indenizações  liquidadas  serão  abrangidas.  

Art.  98  do  CDC.  A  execução  poderá  ser  coletiva,  sendo  promovida  pelos  legitimados  de  que  trata  o  art.  82,  abrangendo  as  vítimas  cujas  indenizações  já  tiveram  sido  fixadas  em  sentença  de  liquidação,  sem  prejuízo  do  ajuizamento  de  outras  execuções.  (Redação  dada  pela  Lei  nº  9.008,  de  21.3.1995)  

§  1°  A  execução  coletiva  far-­‐se-­‐á  com  base  em  certidão  das  sentenças  de  liquidação,  da  qual  deverá  constar  a  ocorrência  ou  não  do  trânsito  em  julgado.  

§  2°  É  competente  para  a  execução  o  juízo:  

I  -­‐  da  liquidação  da  sentença  ou  da  ação  condenatória,  no  caso  de  execução  individual;  

II  -­‐  da  ação  condenatória,  quando  coletiva  a  execução.  

 

 

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" Legitimados  !  São  todos  aqueles  legitimados  coletivos  para  propor  a  ação  civil  pública  (art.  82  do  CDC),   que   agem  agora   como  REPRESENTANTES  processuais,  e  não   como   substitutos  processuais.  

" Destinatários  do  dinheiro  !  São  as  vítimas  e  sucessores  que  já  tiverem  liquidado  a  sentença  coletiva.  Se  não  tiver   liquidação,  não  é  possível  essa  ação  de  execução  coletiva.  Obs.:  Em  se  tratando  de  direito  individual  homogêneo,  não  há  o  fundo  especial  a  que  alude  a  LACP.    

" Competência   !   Como   a   execução   é   coletiva   (apesar   de   a   pretensão   ser   individual),   é  competente  o  juízo  da  condenação.  

  Pergunta-­‐se:  existe  alguma  relação  de  preferência  entre  a  execução  coletiva  ou  individual?  No   informativo   n.   499/2012,   o   STJ   decidiu   que   sim!   Entendeu-­‐se   que,   não   obstante   ser   ampla   a  legitimação   para   impulsionar   a   liquidação   e   a   execução   da   sentença   coletiva,   admitindo-­‐se   que   a  promovam  o  próprio  titular  do  direito  material,  seus  sucessores  ou  um  dos  legitimados  do  art.  82  do  CDC,   o   art.   97   impõe   uma   gradação   de   preferência   que   permite   a   legitimidade   coletiva  subsidiariamente,  uma  vez  que,  nessa  fase,  o  ponto  central  é  o  dano  pessoal  sofrido  pelas  vítimas.    

 

III.  Liquidação/execução  da  pretensão  individual  residual  (fluid  recovery)  

  Conforme   previsto   no   art.   100   do   CDC   para   a   sentença   genérica   que   veicula   direitos  individuais   homogêneos,   passado   o   prazo   de   1   ano   sem   habilitação   de   interessados   (sem   que  requeiram  a  expedição  do  título  no  juízo  coletivo  e  promovam  a  liquidação  em  separado),  poderão  os  legitimados   coletivos   fazer  uma  estimativa   de  quanto   seria   a   indenização  devida   individualmente,  para  cada  um  e  executar.    

  Esse  dinheiro  todo  é  enviado  para  o  fundo  a  que  alude  a  LACP  (já  que  ninguém  apareceu).  Para  MAZZILLI,  essa  regra,  prevista  apenas  para  os  direitos  individuais  homogêneos,  também  deve  ser  aplicada  às  condenações  que  envolvam  direitos  coletivos  em  sentido  estrito.  

Art.   100.   Decorrido   o   prazo   de   um   ano   sem   habilitação   de   interessados   em   número   compatível   com   a  gravidade  do  dano,  poderão  os   legitimados  do  art.   82   promover   a   liquidação  e  execução  da   indenização  devida.  

Parágrafo  único.  O  produto  da  indenização  devida  reverterá  para  o  fundo  criado  pela  Lei  n.°  7.347  [art.  13],  de  24  de  julho  de  1985.  

  Então   veja:   Em   regra,   a   execução,   nos   interesses   individuais   homogêneos,   não   gera   a  destinação  da  eventual  indenização  para  um  fundo  especial.  Isso  somente  ocorre  se  passado  1  ano  sem  habilitação  dos  interessados.    

  Esse  período  de  um  ano  dobra   (passando  a   ser  dois  anos)   se   a  ACP  objetivar   interesses  de  investidores  lesados  no  mercado  de  valores  mobiliários  (Lei  7.913/89).  

  Alguns  autores  sustentam  que,  uma  vez  indenizado  o  fundo,  prescreveriam  as  pretensões  das  vítimas,  de  modo  que,  após  isso,  não  poderia  haver  novas  execuções.  

  Segundo  MAZZILLI,   não   se   habilitando   a   tempo,   só   por   ação   direta   individual   poderão   os  lesados  discutir  seus  prejuízo.    

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Obs.:  Fundo  para  reconstituir  o  bem  lesado  

  Uma   das   mais   peculiares   características   da   tutela   coletiva   de   interesses   transindividuais  consiste,  justamente,  na  dificuldade  de  dar  destino  adequado  ao  produto  de  eventual  condenação.  

  O  legislador  brasileiro  acabou  enfrentando  a  questão  de  maneira  razoável,  ao  criar  um  fundo  fluido,  destinado  à  reparação  dos  interesses  transindividuais  lesados.  Assim,  nas  ações  civis  públicas  ou  coletivas  que  versem  sobre  interesses  indivisíveis  (coletivos  e  difusos),  havendo  condenação  em  dinheiro,  a  indenização  reverterá  para  o  fundo  criado  pelo  art.  13  da  LACP.  

  Esse  fundo  hoje  se  chama  Fundo  de  Defesa  dos  Direitos  Difusos  (Lei  9.008/95),  destinado  à  reparação  do  bem  lesado  ou,  se  isso  não  for  possível,  à  preservação  ou  restauração  de  outros  bens  compatíveis   ou   relacionados   com   a   natureza   da   infração   ou   do   dano   causado.   Ex.:   no   caso   de  destruição  irreparável  de  sítio  ambiental,  pode  ser  cogitada  a  preservação  de  outros  locais  dotados  pela  natureza.  

  Atente:  se  o  produto  da  indenização  se  referir  a  danos  indivisíveis,   irá  para  o  fundo  do  art.  13  da   LACP  e   será  usado  de  maneira  bastante   flexível.   Se,  por  outro   lado,  o  proveito  obtido   for  divisível   (interesses   individuais   homogêneos),   o   dinheiro   será   destinado   diretamente   a   ser  repartido  entre  os  próprios  lesados.  

  Segundo   a   LACP,   deve   haver   um   fundo   federal   e   um   fundo   em   cada   Estado,  para   gerir   os  recursos  oriundos  de  lesões  a  interesses  indivisíveis.    

  O   Fundo   de   Defesa   dos   Direitos   Difusos   será   gerido,   conforme   o   caso,   por   um   conselho  federal   ou   por   conselhos   estaduais,   dos   quais,   segundo   impõe   a   lei,   devem   participar   o   MP   e  representantes  da  coletividade.    

  No  que  diz  respeito  à  sua  finalidade,  o  objetivo  inicial  do  fundo  criado  na  LACP  consistia  em  gerir   recursos   para   a   reconstituição   dos   bens   lesados.   Gradativamente,   por   força   de   alterações  legislativas,  sua  destinação  veio  sendo  ampliada:  hoje,  pode  ser  usado  para  a  recuperação  de  bens,  promoção  de  eventos  educativos   e  científicos,  edição  de  material   informativo   relacionado   com  a  lesão,  bem  como  modernização  administrativa  dos  órgãos  públicos  responsáveis  pela  execução  da  política  relacionada  com  a  defesa  do  interesse  envolvido.  Veja  bem:  

• Lesão  a  interesses  indivisíveis  !  O  produto  irá  para  o  fundo  do  art.  13  da  LACP  e  seu  destino  será  decidido  pelo  respectivo  conselho  gestor,  para  aplicação  flexível,  conforme  mencionado  acima.  

• Lesão  a  interesses  divisíveis  !  O  produto  é  destinado  entre  os  lesados.  

• Lesão  ao  patrimônio  público  em  sentido  estrito  !  O  destinatário  é  a  Fazenda.  

 

10.3.  Observações  finais  sobre  liquidação  e  execução  

" Obs.1  -­‐  Cabe  execução  provisória  no  processo  coletivo,  obedecendo  às  regras  gerais  do  CPC.  Segundo  MAZZILLI,  contudo,  não  caberá  execução  provisória  contra  a  Fazenda  Pública,  sendo  necessário  o  trânsito  em  julgado.  

" Obs.2   -­‐   Se   o   prejuízo   for   ao   patrimônio   público,   o   destinatário   do   valor   devido   é   o   Poder  Público  lesado  (e  não  o  fundo).  

" Obs.3:  Há  ordem  de  preferência  no  pagamento  das  indenizações:  individuais  !  coletivas  !  difusas  (art.  99,  p.  ún.  do  CDC).  Se  houver,  ao  mesmo  tempo,  uma  sentença  condenando  uma  empresa  a  reparar  o  dano  ao  meio-­‐ambiente  e  uma  sentença  a  condenando  a  reparar  o  dano  

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dos   pescadores,   esta   última   terá   preferência   de   pagamento   (abre-­‐se  mão   do   coletivo   para  tutelar  individual,  por  opção  política).    

Art.  99.  Em  caso  de  concurso  de  créditos  decorrentes  de  condenação  prevista  na  Lei  n.°  7.347,  de  24  de  julho   de   1985   e   de   indenizações   pelos   prejuízos   individuais   resultantes   do  mesmo   evento   danoso,  estas  terão  preferência  no  pagamento.  

Parágrafo  único.  Para  efeito  do  disposto  neste  artigo,  a  destinação  da  importância  recolhida  ao  fundo  criado   pela   Lei   n°7.347   de   24   de   julho   de   1985,   ficará   sustada   enquanto   pendentes   de   decisão   de  segundo  grau  as  ações  de   indenização  pelos  danos   individuais,  salvo  na  hipótese  de  o  patrimônio  do  devedor  ser  manifestamente  suficiente  para  responder  pela  integralidade  das  dívidas.  

" Obs.4  -­‐  Custas  e  demais  encargos  da  sucumbência  (art.  18,  LACP)  

  O   art.   18   da   LACP   dispõe   que,   nas   ações   nela   objetivadas,   não   haverá   adiantamento   de  custas,   emolumentos,   honorários   periciais   e   quaisquer   outras   despesas,   nem   condenação   da  associação   autora,   salvo   comprovada   má-­‐fé,   em   honorários   de   advogado,   custas   e   despesas  processuais.  

Art.   18   da   LACP.   Nas   ações   de   que   trata   esta   lei,   não   haverá   adiantamento   de   custas,   emolumentos,  honorários   periciais   e   quaisquer   outras   despesas,   nem   condenação   da   associação   autora,   salvo  comprovada  má-­‐fé,  em  honorários  de  advogado,  custas  e  despesas  processuais.  (Redação  dada  pela  Lei  nº  8.078,  de  1990)  

  O  que  prevalece,  portanto,  é  que  o  autor  nunca  fica  sujeito  aos  ônus  da  sucumbência,  salvo,  no   caso   das   associações,   se   houver   má-­‐fé.   Assim,   se   vencido   for   o   MP,   ele   não   deve   pagar  honorários.  Já  o  réu  fica  naturalmente  sujeito.  

  Mas  cuidado,  pois  há  algumas  decisões  do  STJ  que  entendem  que  a  regra  do  art.  18  da  LACP  é  aplicável   apenas   no   processo   de   conhecimento.   No   processo   executivo   deveria   ser   aplicada   o  regramento  do  CPC.  

  De  acordo  com  a  regra  legal,  tendo  a  associação  autora  agido  de  boa-­‐fé,  o  Estado  suportará  o  ônus  da  sucumbência.  Segundo  entende  o  STJ  (REsp  358828),  essa  regra  não  se  aplica  aos  lesados,  em  suas  ações  individuais,  ainda  que  baseadas  em  título  constituído  no  processo  coletivo.  

  Por  óbvio,  os  réus  serão  obrigados  a  custear  antecipadamente  as  despesas  processuais  a  que  eles  próprios  derem  causa.  Essa  diferença  de  tratamento  é  justificável,  pois  o  legislador  quer  facilitar  a  defesa  dos  interesses  transindividuais  em  juízo.  

  Obs.:  são  devidos  honorários  advocatícios  pela  Fazenda  Pública  nas  execuções  individuais  da  sentença  coletiva,  ainda  que  não  embargadas.  

Súmula  345  do  STJ.  São  devidos  honorários  advocatícios  pela  Fazenda  Pública  nas  execuções  individuais  de  sentença  proferida  em  ações  coletivas,  ainda  que  não  embargadas.    

 

11.  Prescrição  e  decadência  

    A   prescrição   e   decadência   são   institutos   que   visam   a   uma   dupla   função:   a)   assegurar   a  estabilidade  das  relações  sociais  e;  b)  servir  de  sanção  ou  castigo  ao  negligente  titular  do  direito.  

    A   prescrição   ocorre   quando   a   pretensão   é   condenatória   (veiculam   direito   subjetivo   stricto  sensu).   A   decadência,   por   sua   vez,   é   a   perda   do   direito   em   ações   constitutivas   ou   potestativas  (direitos-­‐poder).   As   ações   meramente   declaratórias,   por   sua   vez,   seriam   imprescritíveis   (Agnelo  Amorim).  

    As  ações  coletivas  caracterizam-­‐se  por  veicularem  uma  terceira  espécie  de  direitos  subjetivos  lato  sensu:  os  direitos-­‐deveres,  categoria  na  qual  se   insere  grande  parte  dos  direitos   fundamentais  não  patrimoniais.  As  ações  que  versam  sobre  esses  direitos  são  predominantemente  mandamentais  e  executivas  lato  sensu.  

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I.  As  pretensões  coletivas  prescrevem?    

    A  lei  de  ação  civil  pública  não  prevê  prazo  prescricional  algum,  havendo  3  correntes:  

i. Corrente  (minoritária)  -­‐  ÉDIS  MILARÉ  entende  que  a  ação  civil  pública  é  imprescritível  (está  no  rol  de  ações  perpétuas),  pois  ela  nunca  tem  interesse  patrimonial.    

ii. Corrente   (majoritária   na   doutrina)   -­‐   Entende   que   a   prescrição   da   ação   civil   pública   é  definida  pela  pretensão  de  direito  material  discutida.  Assim,  a   incidência  da  prescrição  dependeria   da   aferição   da   indisponibilidade   dos   interesses   material   judicialmente  deduzidos.  

iii. Corrente   (STJ)   -­‐   Entende   que,   como   não   há   previsão   legal,   a   integratividade   do  microssistema  impõe  a  aplicação  do  prazo  de  5  anos   (da   lei  de  ação  popular).   Julgados:  Resp  911.961/SP.  Na  ação  de  expurgos  inflacionários,  todas  as  ações  anteriores  a  5  anos  estariam  prescritas,  pois  aplicou  o  entendimento  dessa  corrente.  

O   STJ,   contudo,   faz   uma   ressalva,   dizendo   que,   em   duas   situações,   a   ACP   é  imprescritível  quando  discute:  

" PATRIMÔNIO   PÚBLICO,   a   luz   do   art.   37,   §5º   da   Constituição   Federal.   Resp  1.107.833/SP;  

" MEIO  AMBIENTE.  Resp:  1.120.117/AC,  em  que  o  STJ  decidiu  que  o  meio  ambiente  é   o   patrimônio   das   relações   passadas   e   futuras   e,   portanto,   o   direito   ao   meio  ambiente  é  prevalente  sobre  os  outros.  

Atenção:  o   que   prescreve   é   a   via   coletiva,   e   não   o   direito  material.   Portanto,   a   pretensão  individual  não  é  condicionada  ao  prazo  prescricional  da  pretensão  coletiva.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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AÇÃO  CIVIL  PÚBLICA  Sumário:  1.  Origem,  previsão  legal  e  sumular    2.  Objeto  da  ACP    2.1.  Previsão  legal    2.2.  Tutela  preventiva  e  tutela  reparatória    2.4.  Tutela  de  qualquer  outro  interesse  metaindividual  (art.  1º,  inciso  IV)  2.5.  Vedação  de  objeto    3.  Legitimidade    3.1.  Legitimidade  ativa  (art.  5º  da  LACP  e  art.  82  do  CDC)  3.2.  Legitimidade  passiva  3.3.  Atuação  do  MP  como  custos  legis  4.  Competência    4.1.  Critério  funcional  Hierárquico  4.2.  Critério  material  4.3.  Critério  valorativo    4.4.  Critério  territorial  5.  Inquérito  civil  5.1.  Considerações  gerais    5.2.  Fases  do  inquérito  civil  6.  Compromisso  de  ajustamento  de  conduta  (CAC  ou  TAC)  7.  Outras  questões  processuais  sobre  ação  civil  pública  

 

1.  Origem,  previsão  legal  e  sumular  

  Em  1981,  foi  criada  a  Lei  6.938/81  (que  trata  da  Política  Nacional  do  Meio-­‐ambiente).  O  art.  14,  §1º  deste  diploma  dispunha  que,  quando  houvesse  dano  ao  meio  ambiente,  o  MP  poderia  ajuizar  uma  tal  de  “ação  civil  pública”.  Mas  essa  norma  era  incompleta.  

  Assim,  em  origem,  a  ACP  se  voltava  à  proteção  do  meio-­‐ambiente,  tendo  como  legitimado  o  Ministério  Público.    

  Posteriormente,  foi  elaborado  um  projeto  de  lei,  fruto  do  trabalho  de  dois  grupos  de  juristas:  um  grupo  do  MP/SP  (NELSON  NERY,  EDIS  MILARÉ,  entre  outros)  e  outro  grupo  da  USP  (DINAMARCO,  ADA  PELLEGRINI   e   KAZUO  WATANABE).   A   Lei  7.347/85   (atual   LACP)   é   o   resultado   deste   projeto   de   lei,   que  ampliou  o  objeto  da  ação  civil  pública.  

  A  consolidação  da  ação  civil  pública  ocorreu  com  a  Constituição  de  1988  (art.  129,  III).    

  Por   fim,   a   ação   civil   pública   foi   potencializada   pelo   Código   de   Defesa   do   Consumidor,   lei  8.078/90.   Hoje,   a   ACP   tem   previsão   em   diversos   diplomas:   ECA,   estatuto   do   deficiente   (status   de  emenda  constitucional),  estatuto  do  idoso  etc.  

  Nessa   evolução   também  houve   retrocessos   (em  especial   por  meio  de  medidas  provisórias).  Ex.:   O   art.   16   da   lei   7.348/85   que   limitou   os   efeitos   da   decisão   à   circunscrição   territorial   da  competência  do  juiz  foi  inserido  por  meio  de  medida  provisória,  posteriormente  convertida.  

  Em   relação   à   previsão   sumular,   merecem   atenção   aos   seguintes   enunciados   de   súmulas:  643/STF  e  329/STJ:  

Súmula   643   do   STF   -­‐   O   Ministério   Público   tem   legitimidade   para   promover   ação   civil   pública   cujo  fundamento  seja  a  ilegalidade  de  reajuste  de  mensalidades  escolares.  Súmula   329   do   STJ   -­‐   O  Ministério   Público   tem   legitimidade   para   propor   ação   civil   pública   em   defesa   do  patrimônio  público.  

Essa   súmula   justifica-­‐se   porque,   durante   muito   tempo,   tentou-­‐se   afastar   a  legitimidade  do  MP  com  o  fundamento  (leviano)  de  que  quem  deve  defender  o  patrimônio   público   é   o   próprio   ente   lesado   (ex.:  Município)   ou   o   cidadão,   por  meio  de  ação  popular.  

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  A  ação  civil  pública  foi  criada  pela  lei  6.938/81,  regulamentada  pela  lei  7.347/85,  consolidada  pela  Constituição  Federal  e  potencializada  pelo  CDC.  

 

2.  Objeto  da  ACP  

2.1.  Previsão  legal  

  O  objeto  da  ACP   tem  previsão  nos  artigos  1º,   3º  e  11  da   LACP.  Com  efeito,   a  ACP   tem  por  objeto  a  tutela  preventiva   (inibitória  ou  de  remoção  do   ilícito)  ou  ressarcitória   (moral  ou  material)  dos  seguintes  bens  ou  direitos  metaindividuais:  

a) Meio-­‐ambiente  (natural,  artificial,  cultural  e  do  trabalho)  

b) Consumidor  

c) a  bens  e  direitos  de  valor  artístico,  estético,  histórico,  turístico  e  paisagístico;  

d) Ordem  econômica  

e) Ordem  urbanística  

a) Honra  e  dignidade  de  grupos  raciais,  étnicos  ou  religiosos  (novidade  da  Lei  n.  12.966/2014)  !  “Embora  o  Estatuto  da  Igualdade  Racial  já  pudesse  servir  de  fundamento  para  ações  civis  públicas  para  responsabilizar  civilmente  aqueles  que  violem  a  honra  e  a  dignidade  de  grupos  raciais  e  étnicos  [...],  a  Lei  n.  12.966/2014  veio  tornar  incontroversa  a  pretensão  ou  o  direito  subjetivo  coletivo  nesses  casos,  ao  acrescentar  o  inciso  VII  no  art.  1º  da  LACP”  (LEAL,  2014,  p.  161).  

f) Qualquer   outro   interesse   ou   direito   metaindividual   (difusos,   coletivos   ou   individuais  homogêneos)  

Art.  1º    Regem-­‐se  pelas  disposições  desta  Lei,  sem  prejuízo  da  ação  popular,  as  ações  de  responsabilidade  por  danos  morais  e  patrimoniais  causados:              (Redação  dada  pela  Lei  nº  12.529,  de  2011).  l  -­‐  ao  meio-­‐ambiente;  ll  -­‐  ao  consumidor;  IV  -­‐  a  qualquer  outro  interesse  difuso  ou  coletivo.              (Incluído  pela  Lei  nº  8.078  de  1990)  V  -­‐  por  infração  da  ordem  econômica;              (Redação  dada  pela  Lei  nº  12.529,  de  2011).  VI  -­‐  à  ordem  urbanística.            (Incluído  pela  Medida  provisória  nº  2.180-­‐35,  de  2001)  VII  –  à  honra  e  à  dignidade  de  grupos  raciais,  étnicos  ou  religiosos.            (Incluído  pela  Lei  nº  12.966,  de  2014)  Parágrafo   único.     Não   será   cabível   ação   civil   pública   para   veicular   pretensões   que   envolvam   tributos,  contribuições   previdenciárias,   o   Fundo   de   Garantia   do   Tempo   de   Serviço   -­‐   FGTS   ou   outros   fundos   de  natureza   institucional  cujos  beneficiários  podem  ser   individualmente  determinados.   (Incluído  pela  Medida  provisória  nº  2.180-­‐35,  de  2001)  Art.   3º   da   LACP.   A   ação   civil   poderá   ter   por   objeto   a   condenação   em   dinheiro   ou   o   cumprimento   de  obrigação  de  fazer  ou  não  fazer.  Art.  11  da  LACP.  Na  ação  que  tenha  por  objeto  o  cumprimento  de  obrigação  de  fazer  ou  não  fazer,  o   juiz  determinará  o  cumprimento  da  prestação  da  atividade  devida  ou  a  cessação  da  atividade  nociva,  sob  pena  de   execução   específica,   ou   de   cominação   de   multa   diária,   se   esta   for   suficiente   ou   compatível,  independentemente  de  requerimento  do  autor.  

  Obs.1:  Contra  ato  jurisdicional  não  se  admite  ação  civil  pública.  Aquele  tem  meios  próprios  de  impugnação.  

  Obs.2:   A   ACP   não   pode   fazer   às   vezes   de   ADI   (controle   concentrado),   embora   a  inconstitucionalidade   de   determinado   ato   normativo   possa   ser   questão   prejudicial.   Cabe   apenas  como  meio  de  controle  difuso.  

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  Obs.3:  É  perfeitamente  admissível  o  manejo  de  ACP  para  o  fim  de  responsabilizar  alguém  por  danos  morais  causados  a  quaisquer  valores  transindividuais  de  que  cuida  a  lei.  

 

2.2.  Tutela  preventiva  e  tutela  reparatória  

  Para  MARINONI,  as  tutelas  podem  ser  divididas  em  dois  grandes  grupos:  

a) Tutela  PREVENTIVA  !  Opera  antes  da  ocorrência  do  DANO,  buscando  evitá-­‐lo.  MARINONI  divide  essa  tutela  em:  

" Tutela  inibitória  -­‐  É  a  tutela  que  tem  lugar  ANTES  DO  ILÍCITO,  evitando  a  ocorrência  do  dano.  Ex.:  impedir  a  importação  de  medicamento  não  aprovado  pela  ANVISA.    

" Tutela   da   remoção   do   ilícito   -­‐   É   a   tutela   que   tem   lugar   DEPOIS   DE   OCORRIDO   O  ILÍCITO,  MAS  ENQUANTO  AINDA  NÃO  OCORRIDO  O  DANO  (o  ilícito  já  aconteceu,  mas  ainda  não  aconteceu  o  dano).  Ex.:  cessar  a  distribuição  de  medicamento  não  aprovado  pela  ANVISA.  

b) Tutela  RESSARCITÓRIA  !  Ocorre  depois  do  dano,  com  o  objetivo  de  repará-­‐lo.    

Que  dano  é  esse?  Existe  dano  moral  coletivo?  Há  duas  posições:  

" NÃO:   Essa   posição   já   foi   adotada   pela   1ª   Turma   do   STJ   em   alguns   julgados   (Resp  598.281/MG).  O  STJ  entendeu  que  o  dano  moral  é  ofensa  a  direitos  da  personalidade  (honra   ou   dignidade   da   pessoa),   e   a   coletividade   não   possui   personalidade   (é   ente  despersonalizado).  

" SIM  -­‐  Prevalece  na  doutrina  e  na  2ª  Turma  do  STJ  essa  posição,   com  o  argumento  de  que,   embora   a   coletividade   não   possua   personalidade,   ela   tem   consciente   coletivo  (valores  não  patrimoniais  intrínsecos  à  coletividade),  o  qual  pode  sofrer  dano  moral.  

A   2ª   Turma   do   STJ   decidiu   recentemente   que   é   possível   que   a   sentença   condene   o  infrator   ambiental   ao  pagamento  de  quantia   em  dinheiro   a   título   de   compensação  por  dano   moral   coletivo   (REsp   1.328.753-­‐MG,   Rel.   Min.   Herman   Benjamin,   julgado   em  28/5/2013).  

Apesar   de   existirem   precedentes   da   1ª   Turma   em   sentido   contrário   (AgRg   no   REsp  1305977/MG,  julgado  em  09/04/2013),  a  posição  majoritária  (não  pacífica)  é  no  sentido  de  ser  cabível  a  condenação  por  dano  moral  coletivo.    

 

2.3.  Tutela  de  qualquer  outro  interesse  metaindividual  (art.  1º,  inciso  IV)  

  Por  previsão  expressa,  a  ação  civil  pública  pode  proteger  qualquer  interesse  coletivo,  difuso  ou  individual  homogêneo.  Para  o  STJ,  o  inciso  IV  está  em  pleno  vigor  (Resp  706791-­‐PE).  Esse  inciso  é  uma  norma  de  encerramento.  

 

2.4.  Vedação  de  objeto  

  Existe  uma  única  hipótese  de  vedação  ao  cabimento  da  ação  civil  pública,  previsto  no  art.  1º,  p.  ún.  da  LACP,  que  trata  de  impossibilidade  jurídica  do  pedido.  Com  efeito,  por  razões  econômicas  (ordem  de  política  financeira),  não  cabe  ACP  para  veicular  pretensões  que  envolvam:  

a) Tributos;  

b) Contribuições  previdenciárias;  

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c) FGTS;  

d) Outros  fundos  de  natureza  institucional.  

  Embora   haja   muita   discussão   na   doutrina,   é   pacífico   para   o   STF,   que   não   cabe   ação   civil  pública  em  matéria  tributária,  pois  o  art.  1º,  p.  ún.  da  LACP  é  constitucional.  

   

3.  Legitimidade  

3.1.  Legitimidade  ativa  (art.  5º  da  LACP  e  art.  82  do  CDC)  

LACP.  Art.  5º  Têm  legitimidade  para  propor  a  ação  principal  e  a  ação  cautelar:  (Redação  dada  pela  Lei  nº  11.448,  de  2007).  

I  -­‐  o  Ministério  Público;  (Redação  dada  pela  Lei  nº  11.448,  de  2007).  

II  -­‐  a  Defensoria  Pública;  (Redação  dada  pela  Lei  nº  11.448,  de  2007).  

III  -­‐  a  União,  os  Estados,  o  Distrito  Federal  e  os  Municípios;  (Incluído  pela  Lei  nº  11.448,  de  2007).  

IV  -­‐  a  autarquia,  empresa  pública,  fundação  ou  sociedade  de  economia  mista;  (Incluído  pela  Lei  nº  11.448,  de  2007).  

V  -­‐  a  associação  que,  concomitantemente:  (Incluído  pela  Lei  nº  11.448,  de  2007).  

a)  esteja  constituída  há  pelo  menos  1  (um)  ano  nos  termos  da  lei  civil;  (Incluído  pela  Lei  nº  11.448,  de  2007).  

b)   inclua,   entre   as   suas   finalidades   institucionais,   a   proteção   ao  meio   ambiente,   ao   consumidor,   à  ordem   econômica,   à   livre   concorrência,   aos   direitos   de   grupos   raciais,   étnicos   ou   religiosos   ou   ao  patrimônio  artístico,  estético,  histórico,  turístico  e  paisagístico.            (Redação  dada  pela  Lei  nº  12.966,  de  2014)  

§  1º  O  Ministério  Público,  se  não  intervier  no  processo  como  parte,  atuará  obrigatoriamente  como  fiscal  da  lei.  

CDC.  Art.  82.  Para  os  fins  do  art.  81,  parágrafo  único,  são   legitimados  concorrentemente:   (Redação  dada  pela  Lei  nº  9.008,  de  21.3.1995)  

I  -­‐  o  Ministério  Público,  

II  -­‐  a  União,  os  Estados,  os  Municípios  e  o  Distrito  Federal;  

III   -­‐   as   entidades   e   órgãos   da   Administração   Pública,   direta   ou   indireta,   ainda   que   sem  personalidade   jurídica,   especificamente   destinados   à   defesa   dos   interesses   e   direitos   protegidos  por  este  código;  

IV   -­‐   as   associações   legalmente   constituídas   há   pelo  menos   um   ano   e   que   incluam   entre   seus   fins  institucionais  a  defesa  dos  interesses  e  direitos  protegidos  por  este  código,  dispensada  a  autorização  assemblear.  

§  1°  O  requisito  da  pré-­‐constituição  pode  ser  dispensado  pelo  juiz,  nas  ações  previstas  nos  arts.  91  e  seguintes,   quando   haja  manifesto   interesse   social   evidenciado   pela   dimensão   ou   característica   do  dano,  ou  pela  relevância  do  bem  jurídico  a  ser  protegido.  

  Obs.1:   É   uniforme   na   doutrina   que   o   art.   5º   da   LAC   traz   hipótese   de   legitimidade  AUTÔNOMA,  CONCORRENTE  e  DISJUNTIVA.    

" É   autônoma  porque  não  depende  de  participação  ou   autorização  do   titular   do  direito  material.  O  MP  não  precisa  pedir  autorização  aos  consumidores,  v.g.  

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" É  concorrente  porque  há  mais  de  um  legitimado.  

" É  disjuntiva  porque  um  legitimado  não  depende  de  autorização  do  outro  para  ajuizar  a  ação.  Ex.:  a  associação  não  precisa  de  autorização  do  MP  para  ajuizar  ACP.  

  Obs.   2:   Natureza   da   legitimação   !   No   processo   individual   existem   dois   modelos   de  legitimação:   a   regra   é   a   legitimação   ordinária   (art.   6º   do   CPC)   e   a   exceção   é   a   legitimação  extraordinária.   O  MP,   Defensoria,   Administração   Direta   e   Indireta,   associações,   ao   ajuizarem   ação  civil  pública,  exercem  que  tipo  de  legitimação?  Há,  pelo  menos,  3  correntes:  

1ª Corrente  -­‐  As  normas  em  análise  trazem  caso  de  legitimação  extraordinária  (o  legitimado  age   em   nome   próprio,   tutelando   direito   alheio).   Assim   pensa   MAZZILLI.   Durante   muito  tempo,  essa  foi  a  corrente  dominante  no  país.  

2ª Corrente  -­‐  Entende  que  não  é  possível  transportar  os  modelos  de  legitimação  do  processo  individual  ao  coletivo.  Sugere  um  terceiro  modelo  sui  generis  que  só  se  aplica  ao  processo  coletivo:  legitimação  coletiva.    

3ª Corrente  (DOMINANTE,  Nelson  Nery)  -­‐  Para  essa  última  corrente,  é  necessário  fazer  uma  distinção:  

a) Quando  se  tratar  da  tutela  de  direitos  difusos  ou  coletivos,  o  autor  da  ação  age  com  legitimação   AUTÔNOMA   para   a   condução   do   processo   (o   que   não   passa   de   uma  legitimação  coletiva).  É  autônoma  porque  não  decorre  do  direito  material,  mas  sim  da  lei,  que  conferiu  aos  legitimados  a  possibilidade  de  defender  aquele  direito.  

b) Quando   se   tratar   da   tutela   de   interesses   individuais   homogêneos,   a   legitimação   é  EXTRAORDINÁRIA  (a  pessoa  agiria  em  nome  próprio,  na  defesa  do  direito  alheio).  

  Obs.3:  É  plenamente  possível  a   formação,  no  âmbito  do  processo  coletivo,  de   litisconsórcio  entre   os   autores   coletivos   (art.   1º,   §§   2º   e   5º   da   LACP).   Esse   litisconsórcio   é   ativo,   facultativo   e  unitário.  Ex:  ACP  ajuizada  pelos  MP’s  de  São  Paulo  e  Minas  Gerais.  

  Obs.4:  Para  a  análise  individual  de  cada  legitimado,  adotar-­‐se-­‐á  a  posição  de  que  é  possível  o  controle   judicial  da   representação  adequada,   conforme   jurisprudência   (caso   contrário,   falaríamos  genericamente  que  qualquer  legitimado  pode  ajuizar  ACP  sobre  qualquer  matéria).  Se  se  disser  que  a  legitimidade  é  exclusivamente  ope  legis,  o  juiz  não  pode  controlar  a  representação  do  legitimado  (o  legitimado   terá   que   controlar   sua   própria   representação);   se   se   disser   que   a   legitimidade   é   ope  iudicis,  o  juiz  pode  controlar.    

 

I.  Ministério  Público  

  Quando  da  sanção  da   lei  pioneira  –  a  Lei  7.347/85  -­‐,  parte  da  classe   jurídica  não  defendia  a  legitimação  ativa  do  MP  na  investigação  dos  danos  a  interesses  transindividuais,  talvez  por  influência  de  MAURO  CAPPELLETTI.  Parte  dos  doutrinadores  entendiam  que  o  MP  não  tinha  estrutura  para  tanto,  além  de  estar  (estava)  funcionalmente  conexo  ou  subjacente  à  estrutura  do  poder  estatal.  

  A  legitimidade  do  MP  para  ajuizamento  da  Ação  Civil  Pública  está  prevista  no  art.  129  da  CF  e  no  art.  3º  da  LACP.  

Art.  129.  São  funções  institucionais  do  Ministério  Público:  I  -­‐  promover,  privativamente,  a  ação  penal  pública,  na  forma  da  lei;  II   -­‐   zelar   pelo   efetivo   respeito   dos   Poderes   Públicos   e   dos   serviços   de   relevância   pública   aos  direitos  assegurados  nesta  Constituição,  promovendo  as  medidas  necessárias  a  sua  garantia;  

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III   -­‐   promover   o   inquérito   civil   e   a   ação   civil   pública,   para   a   proteção   do   patrimônio   público   e  social,  do  meio  ambiente  e  de  outros  interesses  difusos  e  coletivos;  

  O  MP   só   pode   ajuizar   ação   civil   pública   em   relação   aos   temas   abrigados   em   sua   finalidade  institucional  que,  de  acordo  com  o  art.  127  da  CF,  abriga  os  seguintes:    

" Defesa   da   ordem   jurídica   –   Pode   ser   qualquer   coisa.   Sendo   ope   legis   ou   ope   iudicis   a  legitimidade,  o  MP  ou  o   juiz,  respectivamente,  poderão  entender  que  essa  finalidade  abriga  qualquer  coisa.  

" Defesa  do  regime  democrático  

" Proteção  do  interesse  social  (ex.:  serviços  públicos  e  de  relevância  pública)  –  Interesse  social  pode   ser   individual   ou   coletivo,   e   não   necessariamente   indisponível   (podendo   ser  patrimonial).  Trata-­‐se  de  conceito  é  muito  aberto,  havendo  quem  entenda  que  engloba,  v.g.,  o  valor  da  mensalidade  da  TV  a  cabo  é  interesse  social  e  quem  entenda  que  não.  Por  isso  que  é   tão   importante   saber   se   a   legitimação   é   ope   legis   (será   o   MP   que   decidirá   sobre   sua  representação  adequada)  ou  ope  iudicis.    

" Proteção   do   interesse   individual   indisponível  –  O   interesse   individual   indisponível   envolve,  v.g.,   saúde,  vida,   liberdade  (direitos   individuais   indisponíveis),  dignidade  da  pessoa  humana,  segurança,  patrimônio  público.    

  Nesses   4   temas   o   MP   adequada   representação   para   ajuizar   a   ação   civil   pública   e,   por  conseguinte,  legitimidade.  

  A  doutrina  é  pacífica  no  sentido  de  que  para  a  tutela  dos  direitos  difusos  e  coletivos  strictu  senso,   o  Ministério  Público   SEMPRE   tem   legitimidade,   pois,   como  nesses   casos  o  bem   tutelado  é  indivisível,  entende-­‐se  que  há  interesse  social.  A  briga  em  relação  à  representação  adequada  (se  há  controle  ou  não)  é  adstrita  aos  direitos  individuais  e  homogêneos.    

  Tem  prevalecido  no  STF  e  STJ  que,  em  relação  aos  direitos  individuais  homogêneos,  o  MP  só  tem  legitimidade  se  o  direito  for  indisponível  ou  socialmente  relevante.  Significa  que,  ainda  que  não  esteja  definido  quem  fará  o  controle  da  representação,  deve  haver  controle.  

Pergunta-­‐se:  onde  o  MP  ajuizará  a  ACP  (qual  é  a  Justiça  que  receberá  a  ACP)?  

Há  duas  posições  na  doutrina  a  respeito  do  assunto:  

" 1ª  posição  (doutrina):  o  MP  ajuíza  a  ação  de  modo  livre.  Ou  seja:  o  MP  pode  ajuizar  a  ação  um  na  esfera  de  outro.  Ex.:  o  MP/SP  pode  ajuizar  a  ação  na  justiça  comum  ou  federal  de  Manaus;  o  MPF  pode  propor  ação  na  Justiça  estadual,  bem  como  o  MPT  etc.  

" 2ª   posição:   entende   que   o   MPF   é   equiparado   a   um   ente   federal.   Logo,   se   ele   ingressa   no  processo,  a  competência   será  da   Justiça  Federal.  Há  dois   julgados  do  STJ  neste   sentido,  qual  seja,  sendo  o  mais  antigo  o  REsp  440002-­‐SE.    

Observe-­‐se   que   o   art.   109   da   CRFB/88,   ao   tratar   da   competência   cível,   o   faz   em   razão   da  pessoa.   Para   o   STJ,   o   MPF   estaria   compreendido   na   palavra   “União”.   Assim,   o   mero  ajuizamento   da   ação   pelo   MPF   já   atrai   a   competência   federal,   restando   a   análise   da  legitimidade   ad   causam   (existência   ou   não   de   interesse   federal),   de   acordo   com   cada   caso  concreto.  

 

  Obs.:   em   2015,   foi   cancelado   o   Enunciado   n.   470   da   Súmula   do   STJ,   que   dispunha:   “O  Ministério  Público  não  tem  legitimidade  para  pleitear,  em  ação  civil  pública,  a  indenização  decorrente  do  DPVAT  em  benefício  do  segurado.”  (direitos  individuais  homogêneos).  Tal  cancelamento  ocorreu  

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porque   o   Plenário   do   STF   decidiu   que   o   Ministério   Público   tem   legitimidade   para   defender  contratantes  do  seguro  obrigatório  DPVAT  (RE  631.111/GO,  Rel.  Min.  Teori  Zavascki,  julgado  em  06  e  07/08/2014.  Repercussão  Geral).  

 

II.  Defensoria  Pública  

  A   legitimação   da   Defensoria   foi   acrescida   à   Lei   da   Ação   Civil   Pública   por   força   da   Lei  11.448/07.  Na  época,  não  estava  prevista  a  legitimação  coletiva  da  Defensoria  na  Constituição,  o  que  veio  a  ocorrer  posteriormente,  por  força  da  EC  n.  80/2014,  que  modificou  o  art.  134  da  CRFB/88:    

Art.   134.  A  Defensoria   Pública   é   instituição  permanente,   essencial   à   função   jurisdicional   do  Estado,   incumbindo-­‐lhe,   como   expressão   e   instrumento   do   regime   democrático,  fundamentalmente,  a  orientação   jurídica,  a  promoção  dos  direitos  humanos  e  a  defesa,  em  todos  os  graus,  judicial  e  extrajudicial,  dos  direitos  individuais  e  coletivos,  de  forma  integral  e  gratuita,   aos   necessitados,   na   forma   do  inciso   LXXIV   do   art.   5º   desta   Constituição  Federal.            (Redação  dada  pela  Emenda  Constitucional  nº  80,  de  2014)  

   

   Sobre  essa  legitimidade,  existem  duas  grandes  discussões:  

1ª   DISCUSSÃO   (ASPECTO   SUBJETIVO)  !   O   que   significa   a   expressão   “necessitados”?   Na  doutrina,  encontramos  três  posições:  

1ª Corrente  (restritiva  –  MP)  !  Entende  que  a  atuação  da  Defensoria  só  existe  nos  casos  de   hipossuficiência   econômica.   Assim,   somente   nestes   casos   a   Defensoria   poderia  propor  ação  coletiva.   Isso  porque  o  art.  134  da  CF,  que  trata  dessa  instituição,  mesmo  após  a  EC  n.  80,  alude  ao  art.  5º,  LXXIV  da  CRFB/88,  que  prevê  que  “o  Estado  prestará  assistência  jurídica  integral  e  gratuita  aos  que  comprovarem  insuficiência  de  recursos”.  

Art.   134.   A   Defensoria   Pública   é   instituição   permanente,   essencial   à   função   jurisdicional   do  Estado,   incumbindo-­‐lhe,   como   expressão   e   instrumento   do   regime   democrático,  fundamentalmente,  a  orientação  jurídica,  a  promoção  dos  direitos  humanos  e  a  defesa,  em  todos  os  graus,  judicial  e  extrajudicial,  dos  direitos  individuais  e  coletivos,  de  forma  integral  e  gratuita,  aos  necessitados,  na   forma  do  inciso   LXXIV  do  art.   5º  desta  Constituição   Federal.            (Redação  dada  pela  Emenda  Constitucional  nº  80,  de  2014)  

Art.   5º,   LXXIV   -­‐   o   Estado  prestará   assistência   jurídica   integral   e   gratuita   aos  que   comprovarem  insuficiência  de  recursos;  

2ª Corrente  (ampliativa  –  deve  ser  adotada  em  concurso  de  Defensoria)  !  Entende  ADA  PELLEGRINI   GRINOVER   que   a   análise   da   finalidade   institucional   da   Defensoria   Pública  depende   da   análise   da   LC   80/94   que,   em   seu   art.   4º,   prevê   dois   tipos   de   funções   da  Defensoria:  

" Funções  típicas  -­‐  Defesa  dos  necessitados  (hipossuficiência  econômica);  

" Funções   atípicas   -­‐   São   aquelas   relacionadas   com   a   existência   de   hipossuficiência  técnica   ou   organizacional.   Ex.:   indivíduo   não   é   localizado,   sendo-­‐lhe   nomeado  curador   especial   (missão   da   Defensoria).   Neste   caso,   não   se   exige   que   as   pessoas  defendidas  sejam  necessitadas  sob  o  aspecto  econômico.    

Se  levada  ao  extremo,  essa  corrente  permite  a  legitimação  da  Defensoria  Pública  até  mesmo  nas   relações   de   consumo  envolvendo  bens  de   luxo   (ex.:   veículo  BMW),   eis  que,  frente  ao  poder  econômico  da  indústria  de  veículos,  mesmo  um  consumidor  de  um  veículo  de  luxo  é  um  hipossuficiente  sob  o  ponto  de  vista  organizacional.  

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3ª Corrente   (STF   e   julgados   mais   recentes   do   STJ)   !   Seguindo-­‐se   a   regra   geral   do  processo   individual,   a   Defensoria   Pública   pode   ajuizar   ações   coletivas   se,   de   alguma  forma,   puder   beneficiar   pessoas   hipossuficientes   sob   o   aspecto   econômico,  mas   isso  não  significa  que  a  ação  coletiva  deve  beneficiar  apenas  hipossuficientes  econômicos.  Basta  que,  de  alguma  forma,  a  ação  possa  vir  a  beneficiar  pessoas  carentes,  ainda  que  em  conjunto  com  outras  pessoas  -­‐  não  carentes.  Em  síntese  a  atuação  deve  ter  em  vista  as  pessoas  sem  recursos,  mas  não  se  pode  condicionar  a  atuação  da  Defensoria  Pública  à  comprovação  prévia  da  pobreza  do  público-­‐alvo.    

EXPLICANDO  MELHOR  A  TERCEIRA  CORRENTE.  Em  precedentes  mais  recentes,  firmou-­‐se,  no  STJ,  o  entendimento  de  que  a  Defensoria  Pública  somente  pode  ajuizar  ACP  em  defesa  de  interesses  dos  hipossuficientes,  assim  entendidos  os  necessitados  sem  recursos   suficientes  (CF/88,  art.  5º,  LXXIV).  É  o  que  decidiu  a  4ªT  do  STJ  no  REsp  1.192.577-­‐RS,  Rel.  Min.  Luis  Felipe  Salomão,  DJ  15/5/2014.  

Além  disso,  a  EC  n.  80  reiterou  a  necessidade  de  considerar  o  art.  5º,  LXXIV,  da  CF/88.  Nessa  linha,   no   julgamento   da   ADI   3943   (2015),   os   ministros   do   STF   registraram   o   mesmo  entendimento,  no  sentido  de  que  que,  no  plano  individual  ou  coletivo,  é  necessário  atentar  ao  art.  5º,  LXXIV,  da  CRFB/88.  

Em  seu  voto,  que  foi  acolhido  pelos  demais  Ministros,  a  Min.  Cármen  Lúcia  registrou:  “Não  se  está   a   afirmar   a   desnecessidade   de   a   Defensoria   Pública   observar   o   preceito   do   art.   5º,  LXXIV,  da  CF,   reiterado  no  art.   134  —  antes  e  depois  da  EC  80/2014.  No  exercício  de   sua  atribuição  constitucional,  é  necessário  averiguar  a  compatibilidade  dos  interesses  e  direitos  que  a   instituição  protege  com  os  possíveis  beneficiários  de  quaisquer  das  ações  ajuizadas,  mesmo  em  ação  civil  pública”.  

Justamente   por   isso,   como   registrou   o   Min.   Barroso,   a   Defensoria   não   teria   legitimidade  ajuizar  uma  ação  civil  pública  em  benefício  dos  clientes  do  Banco  Itaú  Personnalité.  

 À   luz   do   que   foi   discutido   no   STF,   é   possível   concluir   que   a   Defensoria   Pública   possui  legitimidade  para  ações  coletivas,  mesmo  que  elas  não  beneficiem  apenas  pessoas  pobres.  Contudo,  por   imposição  do  art.  134  da  CRFB/88,  que  alude  ao  art.  5º,  LXXIV,  da  CRFB/88,  a  ação   coletiva   deve   ter   como  possíveis   beneficiários  pessoas   hipossuficientes   sob  o   aspecto  econômico.    

2ª  DISCUSSÃO  (ASPECTO  OBJETIVO)  !  A  segunda  grande  discussão  consiste  em  saber  quais  interesses   ou   direitos   metaindividuais   podem   ser   tutelados   pela   Defensoria   via   ACP.   Há   3  correntes  sobre  o  tema:  

1ª Corrente  !  Entende  que  nenhum  desses  direitos  pode  ser  defendido  pela  Defensoria.  Foi  a  corrente  defendida  pela  CONAMP  (órgão  de  classe  do  MP),  que  ajuizou  no  STF  a  ADI   3943,   sustentando   que   a   Lei   11.448/07   (que   acrescentou   a   legitimidade   da  Defensoria  na  LACP)  é  inconstitucional,  por  violação  dos  artigos  129,  III,  134  e  127  da  CF.  Alegaram  que   a   CF   prevê   a   legitimidade   para   a   proteção   dos   direitos  metaindividuais  somente   do   MP,   e   não   da   Defensoria,   de   modo   que   a   norma   da   LACP   que   prevê  legitimidade  da  Defensoria  é  inconstitucional.  Não  foi  acolhida  pelo  STF  no  julgamento  da  referida  ADI  em  2015.  

2ª Corrente   (TEORI   ALBINO   ZAVASCKI)  !   Entende   que   a   Defensoria   pública   somente   pode  ajuizar   ação   civil   pública   para   a   tutela   dos   interesses   individuais   homogêneos   dos  necessitados.   Isso   porque,   em   tais   direitos,   seus   titulares   são   determináveis   (e  determinados,   quando   da   execução).   Para   ZAVASCKI,   a   atuação   da   Defensoria   só   tem  lugar   quando   há   sujeitos   identificados,   a   fim   de   se   saber   se   existe   ou   não  

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hipossuficiência  econômica.  Só  tem  direito  a  executar  a  sentença  aquele  que  comprove,  na  execução,  que  é  hipossuficiente  (econômico  ou  organizacional).  Ver  seu  voto  vencido  no  REsp  912849/RS.  Também  não  foi  a  corrente  acolhida  pelo  STF  no   julgamento  da  ADI  3943,  em  2015.  

3ª Corrente  (STF)  !  Entende  que  a  Defensoria  Pública  pode  ajuizar  ação  civil  pública  para  a  tutela  de  interesses  difusos,  coletivos  em  sentido  estrito  e  individuais  homogêneos.  

Pode   haver   parcela   de   não   necessitados   na   coletividade   protegida   pela   defensoria  pública?  SIM.  Segundo  o  STF,  não  se  pode  exigir  que  a  ação  coletiva  apenas  beneficie  necessitados.  

É   importante  notar  que,  no  julgamento  da  ADI  3943,  o  que  o  STF  deixou  claro  é  que  a  legitimação   coletiva   da  Defensoria   Pública   é   constitucional.    Ou   seja,   a   previsão,   na  LACP,   é   constitucional.   A   Defensoria   tem   capacidade   de   estar   em   juízo   nas   ações  coletivas,   mas   isso   não   significa   que   a   sua   legitimidade   ad   causam   é   irrestrita.   Em  síntese:  

• O  que   se  decidiu,  no   julgamento  da  ADI  3943,   é  que  a   legitimação  da  Defensoria  Pública  é  constitucional,  mesmo  antes  da  Lei  nº  11.448/2007,  eis  que  o  art.  5º,  da  LACP  e  o  art.  82,  II,  do  CDC  já  previam  que  a  ACP  poderia  ser  proposta  pela  União  e  pelos  Estados  (e  a  Defensoria  Pública  é  órgão  da  União  –  DPU  –  ou  dos  Estados  –  DPE);  

• Os  Ministros  (destaque:  Min.  Rela.  Cármen  Lúcia,  Min.  Teori  Zavascki,  Min.  Barroso  e  Min.  Rosa  Weber),   em  seus  votos,  deixaram  claro  que  o   juízo  poderá  aferir,  no  caso   concreto,   a   adequada   representação.   É   possível   dizer   que   todos   os  legitimados   se   sujeitam   ao   controle   da   legitimação   coletiva,   o   que,   segundo  precedentes   do   STJ   e   do   STF,   se   faz   à   luz   da   pertinência   subjetiva   (no   caso   da  Defensoria,  extraído  do  art.  134  da  CRFB/88);  

• Assim,   ficou   registrado   nos   debates,   quando   do   julgamento   da   ADI   3943,   que   a  legitimação   da   Defensoria  não   é   irrestrita,  devendo   ser   observado   o   preceito   do  art.   5º,   LXXIV,   da   CF,   reiterado   no   art.   134  —   antes   e   depois   da   EC   80/2014.  No  exercício  de  sua  atribuição  constitucional,  é  necessário  averiguar  a  compatibilidade  dos   interesses   e   direitos   que   a   instituição   protege   com   os   possíveis   beneficiários  hipossuficientes.   O   que   não   se   pode   é   impor   à   Defensoria   que   ajuíze   ações   em  benefício   apenas   de   pessoas   pobres   ou   que   os   identifique   na   inicial,   sendo  possível  que  esta  mesma  ação  beneficie  outros  grupos;  

• Não   existe   limitação   abstrata   objetiva,   ou   seja,   a   Defensoria   pode   ajuizar   ações  coletivas  para  a  defesa  de  direitos  difusos,   coletivos  ou   individuais  homogêneos,  mas,   em   qualquer   caso   (mesmo   no   caso   dos   direitos   difusos),   a   legitimação   é  controlável,   como   qualquer   outro   legitimado.   Assim,   a   limitação   é   de   ordem  subjetiva  (possíveis  beneficiários);  

• MUITA  ATENÇÃO:  é  equivocado  dizer  que  os  direitos  difusos  pertencem  a  todas  as  pessoas.   Embora   seus   titulares   sejam   indetermináveis   no   momento   do  ajuizamento   da   ação   e   o   seu   objeto   seja   indivisível,   ainda   assim,   é   possível   o  controle   do   legitimado   coletivo.   Assim,   não   é   correto   dizer   que   a   Defensoria  Pública  pode  ajuizar  ações  coletivas  em  defesa  de  qualquer  interesse  difuso.  Ex.:  a  Defensoria  Pública  não  pode  ajuizar   ação   civil   pública  para   combater  propaganda  enganosa   de   um   veículo   BMW.   Levando-­‐se   em   consideração   que   a   vedação   à  

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propaganda   enganosa   é   classicamente   um   direito   difuso   (eis   que   protege,  sobretudo,   futuros   compradores   desavisados,   integrantes   de   um   grupo  indeterminável)   –   e  que  um  BMW  não   custa  menos  de  R$100.000,00   -­‐,   podemos  concluir  claramente  que  mesmo  em  relação  a  tais  direitos  é  possível  o  controle  da  legitimação  coletiva.  Foi  nessa  linha  o  voto  do  Min.  Barroso  na  ADI  3943.  

• Em   conclusão:   é   constitucional   a   legitimação   da   Defensoria   para   ajuizar   ações  coletivas   em  defesa   de   direitos   difusos,   coletivos   em   sentido   estrito   e   individuais  homogêneos,  desde  que,  de  alguma  forma,  possam  vir  a  ser  beneficiadas  pessoas  hipossuficientes.    

 

IV.  Administração  direta  e  indireta  

  A   Administração   Pública   direta   ou   indireta   podem   propor   ACP,   mesmo   as   sociedades   de  economia  mista   e   as   empresas  públicas   (quanto   às   empresas   estatais,   o   STJ   já   decidiu  que  não   se  exige  a  pré-­‐constituição  por  um  ano,  no  REsp  236499-­‐PB).    

  Pode-­‐se  dizer  que  possuem  legitimidade:  

" Administração   Direta   !   Sua   finalidade   institucional   é   o   BEM   COMUM.   É   a   finalidade  institucional   mais   difícil   de   se   conceituar,   porque   não   tem   previsão   legal.   De   todos   os  legitimados,   esse   grupo   é   o   que   tem   a   finalidade   institucional   mais   ampla.   Para   alguns  autores,   eles   seriam  os   legitimados  universais,  podendo  ajuizar  ação  em  qualquer   tema.  A  análise  adequada  depende  de  cada  caso  concreto.    

Obs.:   alerta   MÁRCIO   MAFRA   que,   onde   houver   possibilidade   de   poder   de   polícia,   não   há  interesse  a  justificar  o  ajuizamento  de  ação  civil  pública  pela  Administração.  

" Administração   Indireta   !   Sua   finalidade   institucional   depende   do   ato   constitutivo   (lei  instituidora  ou  estatuto).  

" Órgãos  com  prerrogativas  próprias  a  defender  (entes  despersonalizados)  !  O  art.  82,  III  do  CDC   dispõe   que   são   legitimados   à   ação   coletiva   “as   entidades   e   órgãos   da   Administração  Pública,  direta  ou  indireta,  ainda  que  sem  personalidade  jurídica,  especificamente  destinados  à   defesa   dos   interesses   e   direitos   protegidos   por   este   código”.   Ex.:  PROCON   (geralmente   é  órgão  do  Município/Estado).  

 

V.  Associação  

  Na   origem,   são   associações   não   só   aquelas   assim   denominadas   em   sentido   estrito,   mas  também  entidades  de  classe,  sindicatos  e  partidos  políticos.    

  E  mais:   segundo   entende   o   STJ,   pode   uma   associação   defender   interesses   transindividuais  que   ultrapassem   os   de   seus   próprios   associados,   ainda   que   estes   interesses   sejam   individuais  homogêneos.  Na   Lei   da   Ação   Civil   Pública,   não   há   previsão   de   que   a   associação   deve   defender  apenas  os  interesses  dos  seus  associados.  

  Diferentemente  dos  demais   legitimados,  a   LACP  condiciona  a   legitimação  da  associação  a  2  requisitos  cumulativos  (art.  5º),  já  que  são  legitimados  que  não  se  sujeitam  a  controle  estatal:  

a) Esteja  constituída  há  pelo  menos  1  ano,  nos  termos  da  lei  civil,  essa  regra  serve  para  dar  uma  maior  credibilidade  à  associação,  evitando-­‐se  o  ajuizamento  de  ações  coletivas  por  associação  ad  hoc.  Mas  atenção:  O  art.  5º,  §4º  da  LACP  prevê  que  o   juiz  pode  dispensar  o  requisito  da  

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pré-­‐constituição   quando   o   bem   jurídico   discutido   for   socialmente   relevante   (repercussão  grande,  em  razão  do  dano  ou  do  bem  jurídico).    

b) Pertinência  temática  !  Que  inclua  entre  suas  finalidades  institucionais  a  proteção  ao  meio  ambiente,   ao   consumidor,   à   ordem   econômica,   à   livre   concorrência   ou   ao   patrimônio,  artístico,  estético,  histórico,  turístico  e  paisagístico.  Para  os  demais  legitimados  esse  requisito  está  implícito.  Este  requisito  da  pertinência  temática  não  pode  ser  dispensado  pelo  juiz.  

Para  MAZZILLI,   o   requisito   da   pertinência   temática   deve   ser   aplicado   a   todos   os   legitimados  (representação  adequada),  com  exceção  do  MP  e  da  Administração  Direta.    

  Obs.:  o  art.  2º-­‐A  da  Lei  9.494/97  limita  profundamente  o  cabimento  da  ação  coletiva  ajuizada  por  associação  para  a  defesa  dos  interesses  de  seus  associados  contra  o  Poder  Público.  Condiciona  o  ajuizamento  de  ACP  por   associações   para   a   proteção  de  direitos   individuais   homogêneos   contra   o  Poder   Público   à   apresentação   de   relação   nominal   dos   associados,   endereços   e   autorização   da  assembleia:    

Art.  2o-­‐A.    A   sentença   civil   prolatada   em   ação   de   caráter   coletivo   proposta   por   entidade  associativa,   na   defesa   dos   interesses   e   direitos   dos   seus   associados,   abrangerá   apenas   os  substituídos  que  tenham,  na  data  da  propositura  da  ação,  domicílio  no  âmbito  da  competência  territorial  do  órgão  prolator.  (Incluído  pela  Medida  provisória  nº  2.180-­‐35,  de  2001)  

Parágrafo  único.    Nas  ações  coletivas  propostas  contra  a  União,  os  Estados,  o  Distrito  Federal,  os  Municípios   e   suas   autarquias   e   fundações,   a   petição   inicial   deverá  obrigatoriamente   estar  instruída   com  a  ata  da  assembléia  da  entidade  associativa  que  a  autorizou,  acompanhada  da  relação   nominal   dos   seus   associados   e   indicação   dos   respectivos   endereços.  (Incluído   pela  Medida  provisória  nº  2.180-­‐35,  de  2001)  

  Seguindo   a   literalidade   da   lei,   o   há   precedente   do   STJ   no   sentido   de   que   o   dispositivo   é  inaplicável  à  hipótese  que  a  associação  defende  outro   interesse  que  não  de  seus  associados   (REsp  805.277/RS).  

  No   Informativo   746,   o   plenário   do   STF   referendou   a   validade   da   norma,   com   um   quê  generalista.  

Ação  coletiva  proposta  pela  associação  em  favor  de  seus  filiados  

A  autorização  estatutária  genérica  conferida  à  associação  não  é  suficiente  para  legitimar  a  sua  atuação  em  juízo  na  defesa  de  direitos  de  seus  filiados.    

Para  cada  ação,  é  indispensável  que  os  filiados  autorizem  de  forma  expressa  e  específica   a   demanda.   Exceção:   no   caso   de   impetração   de   mandado   de  segurança   coletivo,   a   associação   não   precisa   de   autorização   específica   dos  filiados.    

STF.   Plenário.   RE   573232/SC,   rel.   orig.   Min.   Ricardo   Lewandowski,   red.   p/   o  acórdão  Min.  Marco  Aurélio,  julgado  em  14/5/2014.    

  Obs.2:  questão  incomum,  que  já  compareceu  nos  foros,  foi  a  de  saber  se  uma  associação  civil  pode  defender  em  juízo  interesses  de  um  grupo  de  associados,  quando  esses  interesses  contrariem  outro  grupo  de  associados.  No  RMS  15.311,  o  STJ  recusou-­‐lhe  a  possibilidade.  

 

V.  Fundações  privadas  (?)  

  O   art.   5º,   IV,   da   LACP   admitiu   a   legitimação   ativa   da   “fundação”,   ao   lado   das   autarquias,  empresas  públicas,  sociedades  de  economia  mista  etc.  Embora  tenha   incluído  a   fundação  no   inciso  

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que  trata  da  Administração  indireta,  a   lei  não  particularizou,  deixando  de  esclarecer  se  se  referia  à  fundação  pública  ou  privada.  Diante  disso,  temos  2  correntes:  

" 1ª  corrente  (JOSÉ  DOS  SANTOS):  entende  que  a  lei  só  conferiu  legitimidade  ativa  para  fundações  públicas,  na  defesa  de  interesses  transindividuais;  

" 2ª  corrente  (MAZZILLI  E  NERY  -­‐  MAJORITÁRIA):  entende  que,  como  alei  não  distinguiu,  e  como  as  fundações  podem  ter  objeto  compatível  com  a  defesa  de  interesses  metaindividuais,  elas  são  legitimadas  para  propor  ACP,  sejam  elas  públicas  ou  privadas.  

 

3.2.  Legitimidade  passiva  

  A   LACP   é  omissa   a   respeito   da   legitimidade   passiva   nas   ações   coletivas.   Em   razão   disso,   a  doutrina  e  o  STJ  entendem  pela  aplicação  do  regramento  geral  do  CPC.    

   

3.3.  Atuação  do  MP  como  custos  legis  

  O  art.  5º,  §1º  entende  que  sempre  que  o  MP  não   for  parte,  atuará  obrigatoriamente  como  fiscal  da  lei  (custos  legis).  Contudo,  quando  o  MP  for  parte,  não  atuará  como  custos  legis,  pois  será  parcial.      

 

4.  Competência    

4.1.  Critério  Funcional  Hierárquico  

  Sua  principal  função  é  definir  o  foro  por  prerrogativa  de  função.    

  Não  há  prerrogativa  de  foro  na  Ação  Civil  Pública:  o  julgamento  é  sempre  em  1ª  instância.  

Cuidado  com  2  hipóteses  de  ação  originária  do  STF  prevista  na  CF:  art.  102,  I,  “f”  e  “n”.  Art.  102.  Compete  ao  Supremo  Tribunal  Federal,  precipuamente,  a  guarda  da  Constituição,  cabendo-­‐lhe:  

I  -­‐  processar  e  julgar,  originariamente:  

f)  as  causas  e  os  conflitos  entre  a  União  e  os  Estados,  a  União  e  o  Distrito  Federal,  ou  entre  uns  e  outros,  inclusive  as  respectivas  entidades  da  administração  indireta;  

n)  a  ação  em  que  todos  os  membros  da  magistratura  sejam  direta  ou  indiretamente  interessados,  e  aquela  em   que   mais   da   metade   dos   membros   do   tribunal   de   origem   estejam   impedidos   ou   sejam   direta   ou  indiretamente  interessados;  

a) Conflito  federativo    b) Na  ação  de  interesse  de  toda  a  magistratura.  

 

4.2.  Critério  Material    

  Por  meio   do   critério  material,   define-­‐se   qual   o   órgão   judiciário   competente   para   a   ACP   no  Poder  Judiciário  (o  qual  é  uno).  

 

I.  Justiça  Eleitoral  

  O  art.  121  da  Constituição  Federal  define  que  a  Lei   complementar  definirá  a  competência  dos  juízes  eleitorais.  O  Código  Eleitoral  é  uma  lei  ordinária  que,  havendo  sido  recepcionada  como  

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lei   complementar,   define   a   competência   dos   juízes   eleitorais   (recepção   em   caso   de  incompatibilidade  formal  superveniente).  

  O  elemento  da  ação  que  define  a  competência  da  Justiça  Eleitoral  é  a  causa  de  pedir:  

a) Questões   político-­‐partidárias   !   Ex.:   fidelidade   partidária.   Não   pode   envolver  questões  interna  corporis  de  partidos.  

b) Sufrágio  !  É  qualquer  tipo  de  consulta  popular  (plebiscito,  referendo),  e  não  apenas  as  eleições.  

 

II.  Justiça  do  Trabalho  

  A   competência   da   JT   foi   bastante   ampliada   com   a   EC   45/2004.   O   elemento   que   define   a  competência   da   Justiça   do   Trabalho   é   a   causa   de   pedir.   Ex.:   relação   sindical,   meio   ambiente   do  trabalho  (espécie  de  meio  ambiente  artificial)  etc.  

Súmula  736  do  STF.  Compete  à   Justiça  do  Trabalho   julgar  as  ações  que  tenham  como  causa  de  pedir   o   descumprimento   das   normas   trabalhistas   relativas   à   segurança,   higiene   e   saúde   dos  trabalhadores.  

   

III.  Justiça  Comum  

  São   Justiças   comuns   a   federal   e   a   estadual.   Grandes   problemas   surgem   da   briga   de  competência  entre  elas.  Observações  sobre  a  competência  da  Justiça  Federal:  

a) Em   razão   da   pessoa  !   O   art.   109,   I   define   a   competência   da   Justiça   Federal   em   razão   da  presença  da  União,  autarquia   federal  ou  empresa  pública   federal  como  partes   interessadas.  Aplica-­‐se  aqui  o  regramento  geral  do  art.  109.  Merece  destaque,  a   respeito,  o  enunciado  n.  150  da  Súmula  do  STF:  

Súmula   150   do   STJ.   Compete   à   justa   federal   decidir   sobre   existência   de   interesse   jurídico   que  justifique  a  presença,  no  processo,  da  União,  suas  autarquias  ou  empresas  públicas.  

Competência  para  julgamento  das  ACP’s  ajuizadas  pelo  MPF:  

  Existem  na  doutrina  e  jurisprudência  duas  correntes:  

1ª Corrente   (STJ)  !   Entende   que   é   sempre   a   Justiça   Federal   que   julga   a   ACP   ajuizada   pelo  MPF,  porque  o  Ministério  Público  é  um  órgão  da  União.  Essa  posição  foi  adotada  no  Resp  440.002/SE  (Min.  TEORI  ALBINO  ZAWASKI).    

2ª Corrente  !  Entende  que  é  QUALQUER  JUSTIÇA  pode  julgar  ACP  ajuizada  pelo  MPF,  pois  ele  não  se  confunde  com  a  União.  

 

b) Incidente  de  deslocamento  de  competência  !  Está  previsto  no  art.  109,  V,  “a”  da  CF.  Pode  haver  IDC  em  ação  civil  pública.  

c) Causas  relacionadas  ao  direito  indígena  !  Está  previsto  no  art.  109,  XI.  Não  é  o  fato  de  ter  índio  no  processo  que  fixa  a  competência  da  Justiça  Federal,  mas  a  causa  de  pedir  “direito  dos  povos  indígenas”.  

 

4.3.  Critério  Valorativo    

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  Critério   inútil  nas  ACP.  Não  é  possível  ajuizar  ACP  nos   juizados  cíveis,   federais  e  da  Fazenda  Pública,  pois  eles  se  prestam  a  julgar  causas  menos  complexas.  

 

4.4.  Critério  Territorial  

  É   por   meio   dele   que   se   define   qual   a   comarca/subseção   federal   judiciária.   No   processo  coletivo,  esse  critério  é  de  competência  absoluta.  

# Se  o  dano  for  local,  o  ajuizamento  da  ação  civil  pública  é  no  local  do  dano  

# Se  o  dano  for  regional,  o  ajuizamento  da  ACP  será  na  capital  do  Estado.  

# Se   o   dano   for   nacional,   o   ajuizamento   da   ACP   será   no   DF   ou   capital   dos   Estados  envolvidos.  

CDC.  Art.  93.  Ressalvada  a  competência  da  Justiça  Federal,  é  competente  para  a  causa  a   justiça  local:  I  -­‐  no  foro  do  lugar  onde  ocorreu  ou  deva  ocorrer  o  dano,  quando  de  âmbito  local;  II  -­‐  no  foro  da  Capital  do  Estado  ou  no  do  Distrito  Federal,  para  os  danos  de  âmbito  nacional  ou  regional,   aplicando-­‐se   as   regras   do   Código   de   Processo   Civil   aos   casos   de   competência  concorrente.  

 

5.  Inquérito  civil  

5.1.  Considerações  gerais  

I.  Previsão  legal    

  O  inquérito  civil  é  uma  investigação  administrativa  a  cargo  do  MP,  destinada  basicamente  a  colher  elementos  de  convicção  para  eventual  propositura  de  ACP  (ou  medida  substitutiva,  como  uma  recomendação,  uma  denúncia  criminal,  um  declínio  de  atribuição  etc.)  Como  muitas   infrações  civis  investigadas  no  inquérito  civil  são  também  infrações  penais,  o  IC  também  pode  eventualmente  servir  de  base  para  o  oferecimento  de  denúncia  criminal  (HC  n.  84.367-­‐RJ).  

  Tem  previsão  legal  em  dois  dispositivos  da  LACP:  art.  8º,  §1º  e  art.  9º.  Além  disso,  o  art.  129,  III   da   CR/88   também   alude   ao   inquérito   civil,   que   somente   pode   ser   extinto   por   emenda  constitucional.  A  Res  n.  87  do  CSMPF  também  regula  o  tema  e  deve  ser  lida  pelos  candidatos.  

LACP.  Art.   8º   Para   instruir   a   inicial,   o   interessado  poderá   requerer   às   autoridades   competentes   as  certidões  e  informações  que  julgar  necessárias,  a  serem  fornecidas  no  prazo  de  15  (quinze)  dias.  

§  1º  O  Ministério  Público  poderá   instaurar,   sob   sua  presidência,   inquérito   civil,   ou   requisitar,  de  qualquer   organismo   público   ou   particular,   certidões,   informações,   exames   ou   perícias,   no   prazo  que  assinalar,  o  qual  não  poderá  ser  inferior  a  10  (dez)  dias  úteis.  

Art.  9º  Se  o  órgão  do  Ministério  Público,  esgotadas  todas  as  diligências,  se  convencer  da  inexistência  de  fundamento  para  a  propositura  da  ação  civil,  promoverá  o  arquivamento  dos  autos  do  inquérito  civil  ou  das  peças  informativas,  fazendo-­‐o  fundamentadamente.  

§  1º  Os  autos  do   inquérito  civil  ou  das  peças  de  informação  arquivadas  serão  remetidos,  sob  pena  de  se  incorrer  em  falta  grave,  no  prazo  de  3  (três)  dias,  ao  Conselho  Superior  do  Ministério  Público.  

§  2º  Até  que,  em  sessão  do  Conselho  Superior  do  Ministério  Público,  seja  homologada  ou  rejeitada  a  promoção   de   arquivamento,   poderão   as   associações   legitimadas   apresentar   razões   escritas   ou  documentos,  que  serão  juntados  aos  autos  do  inquérito  ou  anexados  às  peças  de  informação.  

§  3º  A  promoção  de  arquivamento  será  submetida  a  exame  e  deliberação  do  Conselho  Superior  do  Ministério  Público,  conforme  dispuser  o  seu  Regimento.  

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§   4º  Deixando  o  Conselho   Superior   de  homologar   a   promoção  de   arquivamento,   designará,   desde  logo,  outro  órgão  do  Ministério  Público  para  o  ajuizamento  da  ação.  

 

II.  Características  

  O  inquérito  civil  tem  as  seguintes  características:  

i. Procedimento   preparatório  !   Significa   que   ele,   via   de   regra,   é   instaurado   antes   do  ajuizamento  de  uma  demanda;  

ii. Procedimento   meramente   administrativo  !   Não   existe   a   presença   do   Judiciário   no  inquérito  civil;  

iii. Não  obrigatoriedade  !  O  membro   do  MP   poderá   ajuizar   ação   coletiva   sem   inquérito  civil,  se  já  tiver  elementos  para  o  ajuizamento  da  ação;  

iv. Publicidade  !   O   inquérito   civil   é   público,   ou   seja,   qualquer   pessoa   pode   conferir   o  procedimento.  Entende-­‐se,  todavia,  que  o  membro  do  MP  pode,  por  analogia  ao  art.  20  do  CPP,  decretar  o  sigilo  do  inquérito,  para  não  se  prejudicar  a  colheita  de  provas;  

v. Procedimento   inquisitorial  !  No   inquérito   civil,   não   há   contraditório,   o   que   somente  ocorre  na  ação  coletiva.  Em  sentido  contrário,  ADA  PELLEGRINI  GRINOVER,   isolada,  entende  que  tanto  no  inquérito  civil  quanto  no  penal  deve  haver  contraditório.  

vi. Privativo  do  MP  !  Somente  o  MP  pode  instaurar  o  inquérito  civil.  A  Defensoria  Pública  não   pode   instaurar   inquérito   civil,   pois   tem   menos   poderes   investigativos,   conforme  quadro  legislativo.  

 

5.2.  Fases  do  inquérito  civil  

I.  Instauração  

  A   instauração   do   inquérito   civil   ocorre   através   de   portaria,   que   deve   indicar  fundamentadamente  o  objeto  da  investigação.    

  A  portaria  pode  ser  baixada  de  3  formas  distintas:  (i)  de  ofício;  (ii)  por  representação;  (iii)  por  requisição  do  Procurador  Geral.  

  A   portaria   deverá   ter   uma   ordem   numérica   e   dizer   o   fato   a   ser   investigado.   Não   pode  investigar  além  desse  fato.  

  Segundo  o  art.  2º  da  Res.  23/07-­‐CNMP,  o  MP  poderá  instaurar  procedimento  preparatório  ao  inquérito  civil,  e  esse  procedimento  deverá  ser  concluído  no  prazo  de  90  dias  (prorrogáveis  por  mais  90,  uma  única  vez,  em  caso  de  motivo  justificável).  

  Observações:  

• Impedimento  e  suspeição  !  Segundo  o  artigo  19  da  Lei  7.347/85,  é  possível  a  aplicação  do  Código   de   Processo   Civil   à   Lei   de   Ação   Civil   Pública,   naquilo   em   que   não   contrarie   suas  disposições.   Assim,   é   perfeitamente   possível   a   aplicação   das   hipóteses   de   impedimento   e  suspeição.  

O  fato  de  o  promotor  ter  presidido  o  inquérito  civil  não  gera  a  suspeição  para  o  ajuizamento  de  ACP.    

• É   possível   a   instauração   de   inquérito   civil   por   representação   apócrifa,   desde   que   haja  cautela,   com   um   mínimo   de   elementos   de   informação   necessários   a   dar   justa   causa   à  

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instauração.  No   âmbito   do  MPF,   é   possível   fazer   representações   anônimas   pela   internet  (Sala  de  Atendimento  ao  Cidadão).  

• Crime   de   denunciação   caluniosa   (art.   339   do   CP)  !   Comete   quem,   de  má-­‐fé,   dá   causa   a  inquérito  civil  contra  alguém,  imputando-­‐lhe  conduta  que  consiste  em  crime.  

Art.   339.   Dar   causa   à   instauração   de   investigação   policial,   de   processo   judicial,   instauração   de  investigação   administrativa,   inquérito   civil   ou   ação   de   improbidade   administrativa   contra  alguém,   imputando-­‐lhe   crime   de   que   o   sabe   inocente:   (Redação   dada   pela   Lei   nº   10.028,   de  2000)  Pena  -­‐  reclusão,  de  dois  a  oito  anos,  e  multa.  §   1º   -­‐   A   pena   é   aumentada   de   sexta   parte,   se   o   agente   se   serve   de   anonimato   ou   de   nome  suposto.  §  2º  -­‐  A  pena  é  diminuída  de  metade,  se  a  imputação  é  de  prática  de  contravenção.  

 

II.  Instrução  

  Neste  tema,  merecem  atenção  as  seguintes  normas:  art.  8º  da  Lei  Orgânica  do  MPU  e  art.  26  da   LOMP   (Lei   Orgânica   do   Ministério   Público),   que   trazem   ao   MP   poderes   instrutórios   gerais  próprios  à  atividade  inquisitiva:  

i. Poder  de  vistoria  e  inspeção.  O  membro  do  MP  tem  poder  de  realizar  vistorias  e  inspeções,  independentemente   de   decisão   judicial,   respeitadas   as   normas   constitucionais   sobre   a  inviolabilidade  do  domicílio  (art.  8º,  V  da  Lei  Orgânica  do  MPU);  

ii. Poder  de  intimação  de  qualquer  pessoa  para  depoimento,  sob  pena  de  condução  coercitiva,  independentemente  de  intervenção  judicial  (art.  26  da  Lei  Orgânica  do  MPU);  

Obs.  1:  Os  investigados  não  precisam  se  auto-­‐incriminar,  mas  as  testemunhas  são  obrigadas  a  falar  a  verdade  (não  podendo  utilizar  do  direito  ao  silêncio),  sob  pena  de  falso  testemunho;    

iii. Poder  de  requisição  de  documentos  e  informações  a  qualquer  entidade  pública  ou  privada,  sob  pena  do  crime  do  art.  10  da  LACP.  

EXCEÇÃO  ao  poder  de   requisição  do  MP:   ressalvam-­‐se  os  documentos  protegidos  por   sigilo  constitucional,   a   exemplo  do   sigilo  de   comunicação  de   correspondências   (e-­‐mail,   dados)   e  telefone,  em  que  se  exige  autorização  constitucional.    

A  grande  discussão  é   sobre  a  possibilidade  de  quebra  direta  do  sigilo  bancário   e   fiscal  pelo  Ministério  Público.  A  grande  maioria  da  doutrina  e   jurisprudência  entende  que,  apesar  de  o  sigilo   bancário   e   fiscal   não   estarem   expressamente   previstos   na   Constituição,   decorrem   do  direito  à  intimidade  e  à  vida  privada,  e  a  lei  do  Ministério  Público  não  pode  excepcionar  esta  regra.  Assim,  a  quebra  do  sigilo  bancário  e  fiscal  só  pode  ser  feita  com  a  autorização  judicial.  É  a  posição  majoritária  (STF,  Rec.  em  MS  8716/GO).  

Mas  há  EXCEÇÃO:  Segundo  a   jurisprudência  do  STF,  o  MP  pode  determinar  a  quebra  do  sigilo  bancário  nos  casos  de  emprego  de  verba  pública,  em  respeito  ao  princípio  da  publicidade  e  porque  não  há  direito  à   intimidade  ou  vida  privada  que  protejam  esse  sigilo.   Cuidado:   Isso  não   se  estende  ao   sigilo  do  Prefeito,   estando  adstrito   às   contas  públicas.    

iv. Poder  de  recomendação  !   Isso  sempre  existiu,  ainda  que  sem  previsão   legal.  Hoje,   já  tem  previsão  no  art.  15  da  Resolução  23  do  CNMP.  Ocorre  quando  o  MP  percebe  que  a  autoridade  pública  não   teve  dolo  na  atuação,  podendo  expedir  orientações   com  eficácia  admonitória  e  

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sem   caráter   vinculativo   a   qualquer   pessoa   investigada,   com   a   finalidade   de   evitar   o  ajuizamento  da  ACP.  

 

II.  Conclusão  

  A   LACP   não   estipula   prazo   para   a   conclusão   do   inquérito   civil,   o   que   é   previsto   nos  regulamentos   locais.   No  MPF,   o   prazo   regulamentar   do   IC   é   de   1   ano,   prorrogável   por   sucessivos  períodos  (Res.  CSMPF  n.  87).  Chegando-­‐se  ao  final  do  inquérito  civil,  o  membro  do  MP  tem  2  opções:  

i. Propor  a  ação  civil  pública  !  A  partir  do  momento  do  ajuizamento,  o  procedimento  deixa  de  ser  extrajudicial,  passando  a  ser  judicializado  (os  autos  do  IC  seguem  como  anexo  à  demanda  coletiva).  

ii. Promover  o  arquivamento   fundamentado  !  Ao  propor  esse  arquivamento,  o  membro  do  MP  encaminha  ao  órgão  superior  do  MP,  no  prazo  de  3  dias,  sob  pena  de  responsabilidade  penal,   trazendo   os   motivos   que   entender   pertinentes.   No   âmbito   do   MPF,   o   controle   de  arquivamento   também   é   feito   por   um   órgão   superior,   denominado   CCR   (Câmara   de  Coordenação  e  Revisão).  Há  seis  CCR  temáticas  no  MPF.  

Esses   órgãos   superiores   designam   uma   sessão   de   julgamento,   que   é  pública.   Na   sessão,   3  providências  podem  ser  tomadas:  

a. Homologação   do   arquivamento:   neste   caso,   homologado   o   arquivamento,   nada  impede  que  qualquer  outro  legitimado,  ou  inclusive  outro  órgão  do  MP,  proponha  ACP  sobre  os  mesmos  fatos  (até  porque  a  legitimação  é  concorrente  e  disjuntiva).    

b. Conversão  do  julgamento  em  diligência:  é  possível  que  se  entenda  que  o  membro  do  MP,   v.g,   não   realizou   uma   perícia   que   era   muito   necessária,   promovendo-­‐se   a  diligência;  

c. Rejeição  da  promoção  de  arquivamento:  se  o  órgão  superior   rejeita  a  promoção  de  arquivamento,   automaticamente   ele   nomeia   outro   promotor/procurador   para   a  propositura   da   ACP.   Preserva-­‐se,   assim,   a   independência   funcional   do  membro   que  decidiu   pelo   arquivamento.   Atente:   designado   outro   promotor   para   ajuizamento   da  ACP,  ele  não  atua  em  nome  próprio,  mas  sim  como  longa  manus  do  Procurador-­‐Geral.  É  dizer:  ainda  que  ache  que  é  um  absurdo,  deverá  ajuizar  a  ACP.  

  Obs.1:   nada   impede   a   reabertura   do   inquérito   civil   pelo   próprio   membro   do   MP   que   o  arquivou.    

  Obs.2:  ocorre   o  arquivamento  parcial   quando  o  MP   resolve  propor   a  ACP   só   em   relação   a  alguns   fatos   ou  alguns  dos  agentes.  Neste   caso  deverá  proceder  ao  arquivamento  em   relação  aos  demais,  já  que  inexiste  arquivamento  implícito  de  inquérito  civil  (nem  no  penal).  

  Obs.3:  uma  outra  opção  é  o  declínio  de  atribuição,  quando  o  membro  do  MP  perceber  que  a  causa  deve  ser  conduzida  por  outro  órgão  (ex.:  MPF  declina  ao  MPE).  No  âmbito  do  MPF,  os  declínios  também  exigem  prévia  homologação  das  CCR  (isso  foi  cobrado  no  28º  Concurso  para  Procurador  da  República).  No  âmbito  do  MPE,  dependerá  de  cada  Estado.  

 

6.  Compromisso  de  ajustamento  de  conduta  (CAC  ou  TAC)  

I.  Previsão  legal  

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  Ocorre  o  compromisso  de  ajustamento  de  conduta  quando  a  pessoa  assume  responsabilidade  pelo  evento  e  se  compromete  a  alterar  sua  conduta.  

  Na  LACP,  o  TAC  está  previsto  apenas  no  seu  art.  5º,  §6º.  Com  efeito,  as  demais  regras  estão  na  Resolução  n.  23  do  CNMP.  

Art.   5º.   §6°   Os   órgãos   públicos   legitimados   poderão   tomar   dos   interessados   compromisso   de  ajustamento   de   sua   conduta   às   exigências   legais,   mediante   cominações,   que   terá   eficácia   de  título  executivo  extrajudicial.  (Incluído  pela  Lei  nª  8.078,  de  11.9.1990)  (Vide  Mensagem  de  veto)    

 

II.  Natureza  jurídica  

" 1ª   corrente   !   Ato   jurídico   em   sentido   estrito,   revelando-­‐se   o   TAC   como   mero  reconhecimento  por   parte  do   compromissário.   Reconhecimento   jurídico   do  pedido.  Isso  porque  o  que  está   sendo  discutido  na  apuração  é  o   interesse  público,  algo  que  não   pertence   ao   órgão   celebrante,   mas   sim   à   coletividade   (logo,   indisponível,  inegociável)  

" 2ª  corrente  !  Negócio  jurídico,  eis  que  se  materializa  na  composição  de  interesses.  

" 3ª  corrente  !Transação,  com  concessões  mútuas.  

A  doutrina  oscila  entre  a  primeira  e  a  segunda  corrente.  

  Segundo  MAZZILLI,   os   legitimados   têm   disponibilidade   sobre   o   conteúdo   processual,   e   não  sobre  o  conteúdo  material.  

  Obs.1:  na  celebração  do  TAC,  dispensam-­‐se  testemunhas  instrumentárias.  

  Obs.2:   firmar   compromisso   de   ajustamento   é   algo   que   ultrapassa   os   limites   de   mera  administração.  Logo,  a  procuração  outorgada  ao  advogado  deve  ter  poderes  especiais.  

  Obs.3:  segundo  Mazzilli,  mesmo  o  Poder  Público  pode  ser  compromitente  em  TAC.  

 

III.  Cabimento  

  Cabe   TAC   tanto   nos   difusos,   coletivos   como   individuais   homogêneos.   Também   pode   ser  manejado  em  relação  a  todas  as  obrigações  (fazer,  não  fazer,  pagar,  dar  quantia).  

  Não  cabimento  !  Não  cabe  TAC  em  ato  de  improbidade  administrativa,  já  que  o  art.  12  da  lei   8.429/92  prevê  diversas   penalidades   para   o   ato   de   improbidade   administrativa   e   não   apenas   a  devolução   do   dinheiro.   O   prefeito   ímprobo   não   pode   concordar   em   devolver   o   dinheiro   e   querer  negociar  a  penalidade  de  suspensão  dos  direitos  políticos  e  perda  da  função  pública,  v.g.    

  Obs.:   essa   questão   tem   sido   objeto   de  muita   polêmica,   já   existindo   TAC   celebrados   pelo  MPF  no  âmbito  da  improbidade  administrativa,  desde  que  ausente  qualquer  tipo  de  renúncias  ou  transação.  

     

IV.  Legitimados  

  De  todos  que  podem  ajuizar  ACP,  somente  as  associações  não  podem  celebrar  TAC,  pois  não  são  órgãos  públicos  (e  o  art.  5º,  §6º  alude  a  órgãos  públicos).  

Legitimação  na  ACP   Legitimação  no  inquérito  civil  

Legitimação  no  TAC  

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Todos  os  legitimados.   Só  o  MP.   Todos,  menos  associações  

 (sociedade  de  economia  mista  e  empresas  públicas  também  não).  

Assim,  podem  ajuizar:  

" MP,    " Defensoria  " Administração  Direta    " Autarquia  e    " Fundações  públicas  

 

  Registre-­‐se  que  qualquer   legitimado  pode   celebrar   TAC,   sem  a  necessidade  de   autorização  dos  demais  (a  legitimação  é  disjuntiva).  Mas  veja:  a  lei  prevê  a  responsabilidade  pela  má-­‐celebração  do  TAC  ou  não  fiscalização  do  seu  cumprimento.    

  Com   efeito,   é   possível   que   se   verifique   a   responsabilidade   do   celebrante   por   improbidade  administrativa,  sem  prejuízo  de  uma  outra  ACP  para  a  reparação  do  dano  (ou  seja:  um  TAC  mal  feito,  além   de   gerar   responsabilidade   do   legitimado   ativo,   não   vincula   ninguém,   pois   o   conteúdo   da  obrigação  não  pode  ser  objeto  de  transação,  mas  apenas  a  forma  de  cumprimento).  

  Mas  veja:  prevalece  que  o  TAC  homologado   judicialmente  só  pode  ser   rescindido   também  judicialmente,  por  ação  anulatória.  

 

V.  Eficácia  

  O  TAC  tem  eficácia  de  título  executivo  extrajudicial,  em  favor  do  grupo  lesado.  Geralmente  o  TAC  prevê  obrigações  de  fazer  ou  não  fazer,  seguindo-­‐se  o  regime  do  art.  632  do  CPC.  Sua  eficácia  ocorre   a   partir   do   instante   em   que   é   tomado   pelo   órgão   público   legitimado,   salvo   se   houver  cláusula  afetando  sua  eficácia.  

  Obs.1:  o  CAC  tomado  extrajudicialmente  não  exige  homologação   judicial.  Contudo,  caso  os  interessados  busquem  essa  homologação  por  qualquer  motivo,  entende  MAZZILLI  que  o  título  deixará  de  ser  extrajudicial  para  transformar-­‐se  em  judicial.  

 

VII.  Celebração  do  TAC  

a) Condição  !É   uma   condição   imprescindível   para   a   celebração   do   TAC   a   fixação   de  multa  cominatória,  em  caso  de  descumprimento   (art.  5º,  §6º  da  LACP).  A  natureza  dessa  multa  é  parecida   com   as   astreintes,   pois   funciona   como   mecanismo   de   coerção,   destinando-­‐se   ao  fundo  fluido;  

b) Celebração  do  TAC  pelo  MP  no  âmbito  do   inquérito  civil  !  Na  maioria  das  vezes,  o  TAC  é  celebrado  no  bojo  de  um  inquérito  civil.  O  problema  é  que,  neste  caso,  automaticamente  o  inquérito   civil   não   precisará   continuar.   Celebrado   o   TAC   pelo  MP   no   bojo   de   um   inquérito  civil,   via   de   regra,   o   inquérito   deve   ser   arquivado.   Como   o   arquivamento   depende   de  homologação  pelo  órgão  superior  do  MP,  entendem  as  Câmaras  do  MPF  que  a  validade  do  TAC  depende  de   homologação  do   arquivamento.   Caso   não   haja   homologação,   o   inquérito  civil  continuará;  

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c) Celebração  do  TAC  no  âmbito  da  ACP  já  ajuizada  pelo  MP  !  A  partir  do  momento  em  que  o  promotor  ajuíza  a  ACP,  o  controle  dela   já  não  é  mais  do  MP,  e  sim  do  Judiciário.  Por   isso,  o  acordo  celebrado  pelo  MP  no  bojo  da  ACP  não  fica  sujeito  a  controle  pelo  órgão  superior  do  MP.  

 

VIII.  Compromisso  preliminar    

  O  chamado  “compromisso  preliminar”  consiste  um  TAC  parcial,  em  que  se  consegue  apenas  parte  do  acordo  (relativamente  a  apenas  parte  dos  legitimados  passivos  ou  parte  das  obrigações).  A  sua  realização  não  impede  a  propositura  da  ACP  contra  outros  investigados,  ou  para  alcançar  outros  pedidos.  O  que   caracteriza   a   sua   existência   é   o   fato  de  haver  prosseguimento  das   apurações  para  ajuizamento  da  ACP.  

 

7.  Outras  questões  processuais  sobre  ação  civil  pública    

i. Liminar   inaudita  altera  pars  !  O  art.  2º  da  Lei  8.734/92  dispõe  que,  no  MS  coletivo  e  na  ACP,  quando   o   réu   for   o   Poder   Público,   é   vedada   a   concessão   de   liminar   em  ACP   inaudita  altera  pars.  Ou  seja:  o  Poder  Público  deve  ser  ouvido,  se  pronunciando  no  prazo  de  72  horas.  

Art.  2º  da  Lei  8.734/92.  No  mandado  de  segurança  coletivo  e  na  ação  civil  pública,  a  liminar  será  concedida,   quando   cabível,   após   a   audiência   do   representante   judicial   da   pessoa   jurídica   de  direito  público,  que  deverá  se  pronunciar  no  prazo  de  setenta  e  duas  horas.  

A   ideia  do  dispositivo  é  que   sempre  que  a  ACP  ou  MS  coletivo   contra  o  poder  público,   o   juiz   não   pode   conceder   a   liminar   sem   antes   ouvir   o   representante  JUDICIAL  (Procuradorias).  

Para   o   STF,   essa   norma   é   constitucional.   Todavia,   em   caráter   excepcional,   nos   casos   de  absoluta   urgência   (quando   houver   risco   ao   próprio   direito   tutelado)   e   mediante  fundamentação  idônea,  é  possível  a  dispensa  da  oitiva  do  Poder  Público.  

Observe-­‐se   que,   por   esta   regra,   será   ouvido   o   representante   judicial   do   Poder   Público,   ou  seja,  um  Procurador  Público  (e  não  o  chefe  do  Executivo).  

ii. Sucumbência  na  ACP  !  Cinco  observações  são  importantes  sobre  este  tema:  

a. Nas  ações  da  LACP,  não  haverá  adiantamento  de  custas.  

b. Se  o  autor  vencido  for  o  MP,  Defensoria  ou  associação,  será  isento  do  pagamento  dos  ônus  de  sucumbência,  salvo  a  associação,  no  caso  de  má-­‐fé.  Essa  regra  está  nos  artigos  17  e  18  da  LACP:    

Art.   17.   Em   caso   de   litigância   de  má-­‐fé,   a   associação   autora   e   os   diretores   responsáveis   pela  propositura  da  ação  serão  solidariamente  condenados  em  honorários  advocatícios  e  ao  décuplo  das   custas,   sem   prejuízo   da   responsabilidade   por   perdas   e   danos.   (Renumerado   do   Parágrafo  Único  com  nova  redação  pela  Lei  nº  8.078,  de  1990)  

Art.   18.   Nas   ações   de   que   trata   esta   lei,   não   haverá   adiantamento   de   custas,   emolumentos,  honorários  periciais  e  quaisquer  outras  despesas,  nem  condenação  da  associação  autora,  salvo  comprovada  má-­‐fé,  em  honorários  de  advogado,  custas  e  despesas  processuais.  (Redação  dada  pela  Lei  nº  8.078,  de  1990)  

c. O  réu  não  tem  esse  benefício.  Ocorre  que  a  Fazenda  Pública  pode  ser  ré.  Se  o  autor  vencido  for  a  Administração  Pública,  o  STJ  se  divide:  

" Para  uma  primeira  corrente,  aplica-­‐se  o  mesmo  regramento  do  MP  etc.  

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" Para  uma  segunda  corrente  (MAZZILLI),  caso  percam,  terão  de  pagar  as  verbas  de   sucumbência,   porque   não   possui   as   mesmas   prerrogativas   do   MP,  Defensoria.  

d. Se  o  MP  for  vencedor,  o  réu  vencido  será  isento  de  honorários,  pois  o  MP  não  recebe  honorários  e  nem  há  fundo  disciplinado  para  isso.    

e. Se  os  demais  legitimados  forem  vencedores,  haverá  sucumbência,  mesmo  se  o  autor  for  a  Defensoria  Pública,  caso  em  que  o  dinheiro  vai  para  um  fundo  instituído.  

iii. Efeito   suspensivo   da   apelação  !  A   regra   do   CPC   é   a   de   que   a   apelação   será   recebida   no  duplo   efeito   ex   lege.   Na   LACP,   o  modelo   é   diferente,   pois   quem   define   que   efeito   terá   a  apelação  é  o  próprio  juiz  da  causa  (art.  14  da  LACP).  

Art.   14.   O   juiz   poderá   conferir   efeito   suspensivo   aos   recursos,   para   evitar   dano   irreparável   à  parte.  ATENÇÃO:  Na  ação  popular  a  apelação  é  recebida  no  duplo  efeito  ex  lege.  

iv. Reexame  necessário  em  sede  de  ACP  !  O  reexame  necessário  está  previsto  no  art.  475  do  CPC,  em  benefício  da  Fazenda  Pública.  Não  há  qualquer  regra  na  LACP  que  trate  do  reexame  necessário.   Em   razão   do   princípio   da   integratividade   do  microssistema   coletivo,   aplica-­‐se   o  art.   19   da   LAP   que   dispõe   que   a   remessa   necessária   é   a   favor   da   coletividade.   O   STJ,   no  julgamento   do   REsp   1108542,   confirmou   este   entendimento.   Assim,   o   exame   necessário  somente   ocorre   quando   a   ação   é   julgada   improcedente   ou   extinta   sem   julgamento   de  mérito.  

LAP.  Art.  19.  A  sentença  que  concluir  pela  carência  ou  pela  improcedência  da  ação  está  sujeita  ao  duplo  grau  de  jurisdição,  não  produzindo  efeito  senão  depois  de  confirmada  pelo  tribunal;  da  que  julgar  a  ação  procedente  caberá  apelação,  com  efeito  suspensivo.    (Redação  dada  pela  Lei  nº  6.014,  de  1973)  §  1º  Das  decisões  interlocutórias  cabe  agravo  de  instrumento.  (Redação  dada  pela  Lei  nº  6.014,  de  1973)  §  2º  Das  sentenças  e  decisões  proferidas  contra  o  autor  da  ação  e  suscetíveis  de  recurso,  poderá  recorrer  qualquer  cidadão  e  também  o  Ministério  Público.   (Redação  dada  pela  Lei  nº  6.014,  de  1973).  

v. Possibilidade  de  ajuizamento  da  ACP  pelo  MP  em   favor  de  único   indivíduo  !  O  MP   tem  legitimidade  para  ajuizar  ação  em  face  de  um  único  indivíduo,  em  caso  de  interesse  individual  indisponível  (STJ).  Em  tal  caso,  não  se  trata  propriamente  de  uma  ação  coletiva.  

vi. Inversão  do  ônus  da  prova  !  O  STJ  entende  que  pode  aplicar  a  inversão  do  ônus  da  prova  em  sede  de  ação  civil  pública.  Essa  previsão  está  no  art.  6º,  VIII  do  CDC,  aplicável  nas  ações  coletivas  em  geral  em  razão  do  princípio  da  integratividade  do  sistema  (Resp  972902/RS).  

vii. Possibilidade  de  convivência  entre  ADI  e  ACP  para  discussão  da  constitucionalidade  de  leis  !   Tanto   o   STF   quanto   o   STJ   entendem   que   é   possível   o   reconhecimento   da  inconstitucionalidade   de   leis   em   ACPs.   Mas   atente:   em   sede   de   ADI,   a   declaração   de  inconstitucionalidade  é  abstrata,  ou  seja,  é  a  causa  de  pedir  e  o  pedido  da  causa.    

   

 

 

 

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AÇÃO  POPULAR  Sumário:  1.  Conceito  de  ação  popular  2.  Previsão  legal  e  sumular  3.  Objeto  da  ação  popular  4.  Cabimento  5.  Legitimidade  5.1.  Legitimidade  ativa    5.2.  Legitimidade  passiva    5.3.  Posição  da  pessoa  jurídica  de  direito  público  ou  privada  lesada  na  LAP    5.4.  A  posição  do  MP  na  Ação  Popular    6.  Outras  questões  processuais    6.1.  Resposta  na  LAP  (art.  7º,  IV  da  LAP)  6.2.  Sentença  da  ação  popular  (art.  7º,  VI)  6.3.  Natureza  da  sentença  que  julga  procedente  a  ação  popular  6.4.  Responsabilização  disciplinar  6.5.  Reexame  necessário  invertido  6.6.  Efeito  suspensivo  da  apelação  (parte  final  do  art.  19)    6.7.  Sucumbência  6.8.  Competência  6.9.  Penhorabilidade  salarial  

 

1.  Conceito  de  ação  popular  

  Segundo  HELY   LOPES   MEIRELLES,   a   ação   popular   é   um   mecanismo   constitucional   de   controle  popular   da   legalidade/constitucionalidade   dos   atos   administrativos.   Cuida-­‐se   de   ação   de   caráter  cívico-­‐administrativo.  

  Cuida-­‐se  de  uma  ação  constitucional  cível,  cuja  legitimidade  é  atribuída  a  qualquer  cidadão,  objetivando   invalidar  atos  ou  contratos  administrativos  que  causem   lesão  ao  patrimônio  público  ou  ainda  à  moralidade  administrativa,  ao  patrimônio  histórico  e  cultural  e  ao  meio  ambiente.  

  Esta  ação  tem  origem  no  direito  romano,  e  está  presente,  no  Brasil,  desde  a  nossa  primeira  Constituição.  Na  realidade,  embora  a  Constituição  de  1824  aludisse  a  uma  ação  popular,  esta  possuía  natureza  penal.  Com  efeito,  a  ação  popular  a  que  nos  referimos  agora  surgiu,  no  Brasil,  através  da  Constituição  de  1934  (que  também  previu  originariamente  o  MS).  

 

2.  Previsão  constitucional,  legal  e  sumular  

  A   ação   popular   já   era   prevista   na   Constituição   imperial   de   1824,   embora   a   doutrina  dominante  destaque  que  ela   foi   introduzida  efetivamente  pela  Constituição   republicana  de  1934  como  um  direito   fundamental  e  as  constituições  seguintes   (1946,  1967)  mantiveram  esse  caráter  (LEAL,  2014,  p.  170).  Suas  raízes  remontam  à  ação  popular  romana.  

  Atualmente,  a  ação  popular  tem  previsão  no  art.  5º,  LXXIII  da  CRFB/88:  Art.  5º,  LXXIII  -­‐  qualquer  cidadão  é  parte  legítima  para  propor  ação  popular  que  vise  a  anular  ato  lesivo   ao   patrimônio   público   ou   de   entidade   de   que   o   Estado   participe,   à   moralidade  administrativa,   ao  meio  ambiente   e   ao  patrimônio  histórico   e   cultural,   ficando  o   autor,   salvo  comprovada  má-­‐fé,  isento  de  custas  judiciais  e  do  ônus  da  sucumbência;  

  Esse   dispositivo   constitucional   é   regulado   pela   Lei   4.717/65,   surpreendentemente  promulgada  no  período  da  ditadura  militar,  ainda  vigente.  Além  deste  diploma,  não  se  pode  esquecer  que   a   ação   popular   é   uma   ação   coletiva,   aplicando-­‐se,   portanto,   naquilo   que   for   possível,   as  disposições  da  LACP  e  do  CDC.  

  Merecem  atenção  duas  súmulas  do  STF:  

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" Sumula  101/STF  “O  mandado  de  segurança  não  substitui  a  ação  popular”  !  Essa  súmula  é  bastante  famosa  e  óbvia,  já  que  a  ação  de  MS  visa  a  proteger  direitos  individuais,  enquanto  a  ação  popular  visa  ao  controle  dos  atos  administrativos.  

" Súmula  365/STF:  “Pessoa  jurídica  não  pode  propor  ação  popular”  !  Essa  súmula,  apesar  de  óbvia,   surgiu   para   resolver   uma   pequena   controvérsia   sobre   a   legitimidade   das   pessoas  jurídicas  para  propor  ação  popular  na  proteção  do  meio  ambiente.  

 

3.  Objeto  da  ação  popular  

  Diferentemente  da  ação  civil  pública,  que  se  presta  para  todos  os  direitos  metaindividuais,  a  ação  popular  só  serve  para  a  defesa  dos  direitos  DIFUSOS.    

  O  objeto  da  ação  popular  tem  previsão  nos  artigos  5º,  LXXIII  da  CF  e  art.  1º,  §§1º  e  2º  da  LAP.  Com  efeito,  a  ação  popular  visa  à  tutela  preventiva  (inibitória  ou  de  remoção  do  ilícito)  e  reparatória  dos  seguintes  bens  e  direitos  difusos  (4):    

i. Patrimônio   público   (envolve   a   Administração   direta,   indireta   e   qualquer   instituição   que  recebe  recurso  público);    

ii. Moralidade  administrativa;  

iii. Meio  ambiente  e;  

iv. Patrimônio  histórico  cultural.    

Veja  que  as  semelhanças  com  a  ação  civil  pública  são  grandes:  LAP.  Art.   1º  Qualquer   cidadão   será  parte   legítima  para  pleitear   a   anulação  ou   a   declaração  de  nulidade   de   atos   lesivos   ao   patrimônio   da   União,   do   Distrito   Federal,   dos   Estados,   dos  Municípios,  de  entidades  autárquicas,  de  sociedades  de  economia  mista  (Constituição,  art.  141,  §  38),   de   sociedades  mútuas   de   seguro  nas   quais   a  União   represente  os   segurados   ausentes,   de  empresas   públicas,   de   serviços   sociais   autônomos,   de   instituições   ou   fundações   para   cuja  criação  ou  custeio  o  tesouro  público  haja  concorrido  ou  concorra  com  mais  de  cinqüenta  por  cento  do  patrimônio  ou  da  receita  ânua,  de  empresas  incorporadas  ao  patrimônio  da  União,  do  Distrito  Federal,  dos  Estados  e  dos  Municípios,  e  de  quaisquer  pessoas   jurídicas  ou  entidades  subvencionadas  pelos  cofres  públicos.  

§  1º  -­‐  Consideram-­‐se  patrimônio  público  para  os  fins  referidos  neste  artigo,  os  bens  e  direitos  de  valor   econômico,   artístico,   estético,   histórico  ou   turístico.   (Redação  dada  pela   Lei   nº   6.513,   de  1977)  

§  2º  Em  se  tratando  de  instituições  ou  fundações,  para  cuja  criação  ou  custeio  o  tesouro  público  concorra  com  menos  de  cinqüenta  por  cento  do  patrimônio  ou  da   receita  ânua,  bem  como  de  pessoas   jurídicas  ou  entidades   subvencionadas,  as   conseqüências  patrimoniais  da   invalidez  dos  atos  lesivos  terão  por  limite  a  repercussão  deles  sobre  a  contribuição  dos  cofres  públicos.  

   

  De  cara,  é  possível  perceber  que  a  ação  popular   tem  um  objeto  bem  menor  que  o  da  ação  civil  pública,  já  que  se  presta  para  a  defesa  dos  direitos  mais  abstratos  dos  direitos  metaindividuais,  que  são  os  direitos  difusos.  Vejamos  algumas  peculiaridades  dos  bens  protegidos:  

a) Registre-­‐se  que  o   conceito  de  patrimônio  público   para   fins  de   ação  popular   é  um  conceito  amplíssimo,   o   que   significa   dizer   que   a   proteção   do   patrimônio   público   ocorre   contra  qualquer   pessoa   jurídica   de   direito   público   ou   contra   entidade   (privada)   que   o   Estado  subvencione,  na  proporção  do  dinheiro  público  aplicado.  Envolve   também  os  bens  de  valor  econômico,  artístico,  estético,  histórico  ou  turístico.  O  que  importa  para  o  patrimônio  público  

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não   é   que   a   pessoa   jurídica   defendida   seja   da   Administração   Pública,   mas   que   ela   receba  dinheiro  público,  em  qualquer  proporção  que  seja.    

b) A  moralidade   administrativa   consiste   em   um   clássico   conceito   indeterminado   (abstrato).  Cuida-­‐se  dos  padrões  éticos  e  de  boa-­‐fé  no  trato  com  a  coisa  pública,  que  variam  conforme  tempo  e   lugar.  Exemplo  clássico  de  violação  à  moralidade  é  trazida  pelo  §1º  do  art.  37  da  CR,   que   veda   a   promoção   pessoal   nos   atos,   programas,   obras,   serviços   e   campanhas   dos  órgãos   públicos.   Em   muitos   casos,   determinado   ato   do   administrador   público   viola   a  moralidade  pública,  mas  não  o  patrimônio.  

c) O  STJ,  no   julgamento  do  REsp  818725/SP,   pacificou  o  entendimento  de  que  o   rol  dos  bens  protegidos   pela   ação   popular   é  TAXATIVO.   Não   se   pode   proteger   via   ação   popular,   v.g.,   o  urbanismo,  direitos  dos  deficientes,  do  idoso,  menores  etc.  

PROCESSUAL   CIVIL.   ADMINISTRATIVO.   AÇÃO   POPULAR.   CONCESSÃO   DE   SERVIÇO.   SUSPENSÃO  DAS  ATIVIDADES  DE  EMPRESA  CONCESSIONÁRIA  DE  SERVIÇO  DE  GESTÃO  DE  ÁREAS  DESTINADAS  A   ESTACIONAMENTO   ROTATIVO.   INOBSERVÂNCIA   DE   DIREITO   CONSUMERISTA.   INÉPCIA   DA  INICIAL.  ILEGITIMIDADE  ATIVA.  AUSÊNCIA  DE  INTERESSE  DE  AGIR.  SÚMULA  211⁄STJ.  

1.   A   Ação   Popular   não   é   servil   à   defesa   dos   consumidores,   porquanto   instrumento  flagrantemente  inadequado  mercê  de  evidente  ilegitimatio  ad  causam  (art.  1º,  da  Lei  4717⁄65  c⁄c  art.   5º,   LXXIII,   da   Constituição   Federal)   do   autor   popular,   o   qual   não   pode   atuar   em   prol   da  coletividade  nessas  hipóteses.  

2.  A  ilegitimidade  do  autor  popular,  in  casu,  coadjuvada  pela  inadequação  da  via  eleita  ab  origine,  porquanto  a  ação  popular  é  instrumento  de  defesa  dos  interesses  da  coletividade,  utilizável  por  qualquer  de  seus  membros,  revela-­‐se  inequívoca,  por  isso  que  não  é  servil  ao  amparo  de  direitos  individuais   próprios,   como   sóem   ser   os   direitos   dos   consumidores,   que,   consoante   cediço,  dispõem   de   meio   processual   adequado   à   sua   defesa,   mediante   a   propositura   de   ação   civil  pública,  com  supedâneo  nos  arts.  81  e  82  do  Código  de  Defesa  do  Consumidor  (Lei  8.078⁄90).  

 

4.  Cabimento  

  Classicamente,  a  ação  popular  é  cabível  contra  atos  ilegais  E  lesivos  mencionados  no  art.  1º  da  LAP.  Veja,  pois,  que  fica  a  ação  popular  condicionada  à  existência  de  um  binômio:  o  ato  deve  ser  ilegal  e  lesivo  ao  patrimônio  público,  meio-­‐ambiente,  patrimônio  histórico  ou  moralidade.  

  Mas  atente:  o  binômio  “legalidade  mais  lesividade”  tem  sido  relativizado  pela  jurisprudência  do  STF  e  do  STJ.  Ela  “relativizou  a  exigência  de  prejuízo  ao  Erário,  especialmente  porque  a  ofensa  ao  art.  4º  da  LAP  é  vista  como  lesão  implícita”.  Justamente  por  isso,  exige-­‐se  apenas  a  demonstração  da   ilegalidade   do   ato   ou   contrato   administrativo   para   a   admissibilidade   da   ação   (LEAL,   2014,   p.  171/172).  Veremos  isso  adiante.  

  A  ação  popular   cabe  contra  atos  administrativos,   independentemente  de   serem  omissivos  ou  comissivos,  pois  servem  para  as  duas.    

  Assim,  no  conceito  de   ilegalidade  estão  abrangidos   todos  os  vícios  do  ato  administrativo.  O  art.   2º   da   LAP   define   quais   são   os   elementos   do   ato   administrativo:   competência;   objeto;   forma;  motivo   e   finalidade.   Assim,   ato   administrativo   ilegal   é   o   que   viola   os   elementos   do   ato  administrativo.  

Ex.:   fazer   contratação   sem   concurso   público   viola   o   elemento   forma;   alienar  imóvel  público  sem  autorização  legislativa  viola  o  elemento  objeto.  

Art.  2º  São  nulos  os  atos  lesivos  ao  patrimônio  das  entidades  mencionadas  no  artigo  anterior,  nos  casos  de:  

a)  incompetência;  

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b)  vício  de  forma;  

c)  ilegalidade  do  objeto;  

d)  inexistência  dos  motivos;  

e)  desvio  de  finalidade.  

Parágrafo  único.  Para  a  conceituação  dos  casos  de  nulidade  observar-­‐se-­‐ão  as  seguintes  normas:  

a)  a  incompetência  fica  caracterizada  quando  o  ato  não  se  incluir  nas  atribuições  legais  do  agente  que  o  praticou;  

b)   o   vício   de   forma   consiste   na   omissão   ou   na   observância   incompleta   ou   irregular   de  formalidades  indispensáveis  à  existência  ou  seriedade  do  ato;  

c)   a   ilegalidade   do   objeto   ocorre   quando   o   resultado   do   ato   importa   em   violação   de   lei,  regulamento  ou  outro  ato  normativo;  

d)   a   inexistência   dos   motivos   se   verifica   quando   a   matéria   de   fato   ou   de   direito,   em   que   se  fundamenta   o   ato,   é   materialmente   inexistente   ou   juridicamente   inadequada   ao   resultado  obtido;  

e)  o  desvio  de  finalidade  se  verifica  quando  o  agente  pratica  o  ato  visando  a  fim  diverso  daquele  previsto,  explícita  ou  implicitamente,  na  regra  de  competência.  

 

  O   rol   de   vícios   do   art.   2º   é   EXEMPLIFICATIVO.   Além   das   legalidades   relacionadas   aos  elementos  dos  atos  administrativos,  existem  outras  hipóteses  de  ilegalidades  tuteladas  pela  LAP:  

Art.  3º  Os  atos  lesivos  ao  patrimônio  das  pessoas  de  direito  público  ou  privado,  ou  das  entidades  mencionadas  no  art.  1º,  cujos  vícios  não  se  compreendam  nas  especificações  do  artigo  anterior,  serão  anuláveis,  segundo  as  prescrições  legais,  enquanto  compatíveis  com  a  natureza  deles.  

  A  Lei  e  a  jurisprudência  são  pacíficos  em  dispor  que  o  ajuizamento  da  ação  popular  depende  da  concomitância  de  ILEGALIDADE  +  LESIVIDADE.    

  Em  vista  disso,  o  art.  4º  da  LAP  prevê  hipóteses  de  presunção  ABSOLUTA  de  lesividade,  tendo  como   exemplo   maior   o   ato   de   contratar   sem   licitação   ou   concurso   público.   Exemplo:   Em   alguns  casos,  são  realizadas  contratações  sem  licitação  ou  concurso,  mas  que  são  extremamente  vantajosas  para   a   Administração   (mais   barato   e   com   mais   qualidade).   Nestas   situações,   o   ato   é   ilegal   e   a  lesividade  é  presumida,  confirmando-­‐se  o  binômio.  

  Obs.:   na   defesa   do  meio   ambiente   e   da  moralidade   administrativa,   não   há   necessidade   de  prova  da  lesividade  ao  Erário,  que  é  implícita.  Cuida-­‐se  de  raciocínio  doutrinário  acolhido  pelo  STF  no  RE  170.768/SP,  DJ  13.08.1999  e  pelo  STJ  no  REsp  552.691,  DJ  30.05.2005.  

Art.   4º   São   também   NULOS   os   seguintes   atos   ou   contratos,   praticados   ou   celebrados   por  quaisquer  das  pessoas  ou  entidades  referidas  no  art.  1º.  

I   -­‐   A   admissão   ao   serviço   público   remunerado,   com   desobediência,   quanto   às   condições   de  habilitação,  das  normas  legais,  regulamentares  ou  constantes  de  instruções  gerais.  

III  -­‐  A  empreitada,  a  tarefa  e  a  concessão  do  serviço  público,  quando:  

a)   o   respectivo   contrato   houver   sido   celebrado   sem   prévia   concorrência   pública   ou  administrativa,  sem  que  essa  condição  seja  estabelecida  em  lei,  regulamento  ou  norma  geral;  

b)  no  edital  de  concorrência   forem   incluídas  cláusulas  ou  condições,  que  comprometam  o  seu  caráter  competitivo;  

c)   a   concorrência   administrativa   for   processada   em   condições   que   impliquem  na   limitação  das  possibilidades  normais  de  competição.  

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IV   -­‐   As   modificações   ou   vantagens,   inclusive   prorrogações   que   forem   admitidas,   em   favor   do  adjudicatário,   durante   a   execução  dos   contratos   de   empreitada,   tarefa   e   concessão  de   serviço  público,  sem  que  estejam  previstas  em  lei  ou  nos  respectivos  instrumentos.,  

V   -­‐  A   compra  e  venda  de  bens  móveis  ou   imóveis,  nos   casos  em  que  não  cabível   concorrência  pública  ou  administrativa,  quando:  

a)  for  realizada  com  desobediência  a  normas  legais,  regulamentares,  ou  constantes  de  instruções  gerais;  

b)  o  preço  de  compra  dos  bens  for  superior  ao  corrente  no  mercado,  na  época  da  operação;  

c)  o  preço  de  venda  dos  bens  for  inferior  ao  corrente  no  mercado,  na  época  da  operação.  [...]  

   

  Observações:  

" Cabe  ação  popular  contra  atos  administrativos  discricionários  e  vinculados.  

" Regra  geral,  NÃO  CABE  ação  popular:  

o contra   ato   de   particular  $   EXCEÇÃO:   Quando   se   tratar   de   meio   ambiente   e  patrimônio  histórico,  cabe  ação  popular  contra  ato  de  particular.  Em  razão  disso,  alguns  doutrinadores  dizem  que  a  ação  popular  para  a  defesa  do  meio  ambiente  e  patrimônio   histórico   seria,   na   verdade,   uma   ação   civil   pública   ajuizável   pelo  cidadão;  

o contra   ato   legislativo   (lei)   $   EXCEÇÃO:   A   jurisprudência   tem   admitido   ação  popular  contra  as  leis  de  efeitos  concretos  (que  por  si  só  já  operacionalizam  o  ato  administrativo).  Ex:  lei  que  concede  anistia  tributária;  

o contra   decisões   jurisdicionais   $   EXCEÇÃO:   o   STJ,   no   julgamento   do   Resp  906400/SP   entendeu   que   é   possível   a   ação   popular   para   anular   acordo  homologado  judicialmente;  

o contra  atos  políticos  $  Ex.:  veto  do  Poder  Executivo  a  projeto  de  lei.  

 

5.  Legitimidade  

5.1.  Legitimidade  ativa  

  O  art.  1º,  §3º  da  LAP  trata  da  legitimidade  ativa  na  ação  popular.  Prevalece  largamente  que  a  legitimidade  ativa  da  ação  popular  é  do  CIDADÃO.    

  Legalmente  falando,  a  cidadania,  no  Brasil,  decorre  do  exercício  e  gozo  dos  direitos  políticos.  Ou  seja:  cidadão  é  o  nacional   (brasileiro  nato  ou  naturalizado)  no  pleno  gozo  dos  direitos  políticos;  que  pode  votar.    

" Como  a  cidadania  começa  aos  16  anos  de  idade,  tem  legitimidade  ativa  para  a  ação  popular  o   maior   de   16   anos   (é   plenamente   possível,   mesmo   sem   assistência,   sendo   necessário  advogado).    

" A   cidadania   deve   ser   provada,   como   requisito   da   inicial,   através   do   título   de   eleitor   ou  documento   que   a   ele   corresponda.   Assim,   segundo   o   STJ,   para   ajuizar   ação   popular,   o  cidadão  deve  ter  TÍTULO  DE  ELEITOR.    

Art.  1º.  §  3º  A  prova  da  cidadania,  para  ingresso  em  juízo,  será  feita  com  o  título  eleitoral,  ou  com  documento  que  a  ele  corresponda.  

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" O   indivíduo   condenado   criminalmente,   enquanto   durarem   os   efeitos   da   condenação,   não  pode  propor  ação  popular.  Também  não  pode  o  estrangeiro,  nem  o  Ministério  Público.  

" O  cidadão  pode  ajuizar  ação  popular  fora  do  seu  domicílio  eleitoral.  

" O  art.   12  da  Constituição   Federal   define  que  os  quase-­‐nacionais   (portugueses)   possuem  os  mesmos   direitos   dos   brasileiros   –   inclusive   podendo   ajuizar   ação   popular   –   desde   que   o  mesmo  direito  seja  assegurado  aos  brasileiros  em  Portugal.  

" O  princípio  do  interesses  jurisdicional  no  conhecimento  do  mérito  da  ação  popular  define  que  se   o   autor   perder   legitimidade   no   curso   do   processo,   outros   legitimados   deverão   ser  intimados  para  assumir  a  legitimidade  ativa.  Caso  ninguém  assuma,  deve  assumir  o  MP.  

" Embora   não   tenha   legitimidade   para   propor   a   ação   popular,   o   Ministério   Público   tem  legitimidade  para  propor  ação  rescisória  e  recorrer.  

  Prevalece  na  doutrina  (HELY  LOPES,  JOSÉ  AFONSO,  STF)  que  a  natureza  da  legitimidade  ativa  para  a  ação  popular  é  LEGITIMAÇÃO  EXTRAORDINÁRIA  (Rcl  424/RJ)  –  o  cidadão  age  em  nome  próprio  em  defesa  do  direito  alheio,  da  coletividade.  

  O  art.   6º,   §5º   da   lei   de   ação  popular   autoriza   habilitação  de   assistente  ou   litisconsorte   por  qualquer  cidadão.  Esse  litisconsórcio  pode  ser  inicial  ou  ulterior;  ativo;  facultativo;  unitário.  

Art.  6º,  §  5º  É  facultado  a  qualquer  cidadão  habilitar-­‐se  como  litisconsorte  ou  assistente  do  autor  da  ação  popular.  

   

5.2.  Legitimidade  passiva  

  A   legitimidade   passiva   na   ação   popular   será   de   todas   as   pessoas   físicas   ou   jurídicas,   de  direito   público   ou   privado,   que,   de   qualquer   forma,   participaram   do   ato,   ou   se   beneficiaram  diretamente  dele.  Entende-­‐se  que  se  trata  de  litisconsórcio  NECESSÁRIO  passivo  e  SIMPLES.  

Art.  6º  A  ação  será  proposta  contra  as  pessoas  públicas  ou  privadas  e  as  entidades  referidas  no  art.   1º,   contra   as   autoridades,   funcionários   ou   administradores   que   houverem   autorizado,  aprovado,   ratificado   ou   praticado   o   ato   impugnado,   ou   que,   por   omissas,   tiverem   dado  oportunidade  à  lesão,  e  contra  os  beneficiários  diretos  do  mesmo.  

  Conforme  dicção  legal,  a  legitimidade  passiva  será:  a)  das  pessoas  jurídicas  de  direito  público  e  pessoas  jurídicas  de  direito  privado  e  das  entidades  referidas  no  art.  1º  da  LACP;  b)  autoridades,  administradores  e  funcionários;  c)  beneficiários  diretos.    

  Observe-­‐se   que   os   beneficiários   indiretos   –   a   exemplo   dos   empregados   da   empresa  beneficiada  –  não  têm  legitimidade  passiva.  Vejamos  alguns  detalhes:  

" Se  a  ação  popular  visar  à  proteção  do  patrimônio  público  ou  moralidade  administrativa,  necessariamente  será  réu  uma  pessoa  jurídica  de  direito  público.    

" Na  proteção  do  meio-­‐ambiente  e  do  patrimônio  histórico-­‐cultural,  por  outro  lado,  pode  não  haver  pessoa  jurídica  de  direito  público  como  ré.  

 

  Detalhe   importante   está   previsto   no   art.   7º,   III   da   LAP,   que   prevê   a   chamada   legitimidade  passiva   ulterior.   Essa   norma   permite   que   se   insira,   no   curso   do   processo,   um   legitimado   passivo  necessário  sem  que  seja  preciso  anular  os  atos  processuais   já  praticados.   Isso  só  existe  para  a  ação  popular,  justificando-­‐se  no  fato  de  que  a  legitimidade  passiva  da  ação  popular  é  muito  grande.  

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  Essa   norma   só   tem   previsão   na   LAP,   mas   é   tão   inteligente   que   deveria   ser   aplicada   para  qualquer  processo.  

Art.  7º,  III  -­‐  Qualquer  pessoa,  beneficiada  ou  responsável  pelo  ato  impugnado,  cuja  existência  ou  identidade   se   torne   conhecida  no   curso  do  processo  e   antes   de   proferida   a   sentença   final   de  primeira   instância,  deverá  ser  citada  para  a   integração  do  contraditório,   sendo-­‐lhe   restituído  o  prazo   para   contestação   e   produção   de   provas,   Salvo,   quanto   a   beneficiário,   se   a   citação   se  houver  feito  na  forma  do  inciso  anterior.  

 

5.3.  Posição  da  pessoa  jurídica  de  direito  público  ou  privada  lesada  na  LAP  

  A   LAP,   na   esteira   do   que   existe   na   Lei   de   Improbidade   Administrativa,   permite   algo  muito  interessante:  a  pessoa   jurídica  de  direito  público  ou  de  direito  privado  demandada,  a  qual  sofreu  o  prejuízo,   poderá   escolher   o   pólo   processual   em   que   atuará,   podendo   ainda   quedar-­‐se   inerte.   Isso  está  no  art.  6º,  §3º  da  LAP  e,  como  veremos  adiante,  se  aplica  também  à  ação  de  improbidade:  

Art.   6º.   3º   A   pessoa   jurídica   de   direito   público   ou   de   direito   privado,   cujo   ato   seja   objeto   de  impugnação,  poderá  abster-­‐se  de  contestar  o  pedido,  ou  poderá  atuar  ao  lado  do  autor,  desde  que   isso   se   afigure   útil   ao   interesse   público,   a   juízo   do   respectivo   representante   legal   ou  dirigente.  

  A  pessoa  jurídica  poderá,  com  vistas  ao  interesse  público:  

a) Defender  o  ato  combatido  pela  ação  popular;  

b) Mudar  o  pólo,  atuando  ao  lado  do  autor;  

c) Não  fazer  nada  (ficar  inerte).  

Obs.:  essa  previsão  também  existe  para  a  ação  de  improbidade  administrativa.  

 

5.4.  A  posição  do  MP  na  Ação  Popular  

  Dispõe  o  art.  6º,  §4º  da  LAP  que  o  MP  atuará  como  custos  legis  na  ação  popular,  cabendo-­‐lhe  ainda   promover   a   responsabilidade   civil   ou   criminal   das   pessoas   envolvida.   É   vedado   ao  MP,   por  expressa  previsão  legal,  assumir  a  defesa  do  ato  impugnado  ou  dos  seus  autores.  

Art.   6º,   §   4º   O   Ministério   Público   acompanhará   a   ação,   cabendo-­‐lhe   apressar   a   produção   da  prova   e   promover   a   responsabilidade,   civil   ou   criminal,   dos   que   nela   incidirem,   sendo-­‐lhe  vedado,  em  qualquer  hipótese,  assumir  a  defesa  do  ato  impugnado  ou  dos  seus  autores.  

  Além  disso,  o  art.  16  da  LAP,  que  trata  do  princípio  da  indisponibilidade  da  execução  coletiva,  prevê  a  atuação  do  MP  como  legitimado  subsidiário  para  executar  a  sentença  coletiva,  caso  o  autor  da  ação  não  o  faça:  

Art.  16.  Caso  decorridos  60  (sessenta)  dias  da  publicação  da  sentença  condenatória  de  segunda  instância,   sem   que   o   autor   ou   terceiro   promova   a   respectiva   execução.   o   representante   do  Ministério  Público  a  promoverá  nos  30  (trinta)  dias  seguintes,  sob  pena  de  falta  grave.  

  Por  fim,  o  MP  pode  atuar  como  autor  de  ação  popular  (embora  não  possa  ajuizar).  

 

6.  Outras  questões  processuais  

6.1.  Resposta  na  LAP  (art.  7º,  IV  da  LAP)  

  O  prazo  de   contestação,  na  ação  popular,   diverge  brutalmente  da   regra   geral,   sendo  de  20  (vinte)  dias,  prorrogáveis  por  mais  20  (vinte)  dias,  a  requerimento  do  interessado.    

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  ATENÇÃO:  O  STJ  entende  que  não  se  aplica  o  art.  188  e  191  do  CPC/73  (que  prevê  prazo  em  quádruplo  para  a  Fazenda)  para  este  prazo.  No  NCPC,  esse  prazo  passa  a  ser  em  dobro  (art.  183).  

  Mas  atente:  o  entendimento  do  STJ  é  o  de  que  o  art.  188  do  CPC  não  se  aplica  apenas  ao  art.  7º,  IV  da  LAP.  Ou  seja:  para  recorrer  da  sentença,  a  Fazenda  tem  prazo  em  dobro.  

Art.   7º.   IV   -­‐   O   prazo   de   contestação   é   de   20   (vinte)   dias,   prorrogáveis   por   mais   20   (vinte),   a  requerimento  do  interessado,  se  particularmente  difícil  a  produção  de  prova  documental,  e  será  comum   a   todos   os   interessados,   correndo   da   entrega   em   cartório   do  mandado   cumprido,   ou,  quando  for  o  caso,  do  decurso  do  prazo  assinado  em  edital.  

  Prevalece  que  a  ação  popular  não  comporta  reconvenção.    Isso  se  deve  à  posição  do  cidadão,  que,  ao  ajuizar  a  ação,  não  age  na  defesa  de  direito  próprio,  mas  de  toda  a  coletividade.  

 

6.2.  Sentença  da  ação  popular  (art.  7º,  VI)  

  A  sentença  da  ação  popular  tem  previsão  no  art.  7º,  inciso  VI  da  Lei,  que  dispõe:  “a  sentença,  quando  não  prolatada  em  audiência  de   instrução  e   julgamento,  deverá  ser  proferida  dentro  de  15  (quinze)  dias  do  recebimento  dos  autos  pelo  juiz.”.  

  Veja,  pois,  que  a  sentença,  na  ação  popular,  deve  ser  proferida  em  15  dias  (se  não  proferida  em  audiência).   Caso  o   juiz   desrespeite   este  prazo,   o  parágrafo  único  do   art.   7º  prevê  uma   sanção  drástica,  qual  seja,  a  impossibilidade  de  inclusão  na  lista  de  merecimento  para  promoção  durante  2  anos,  além  da  perda,  para  efeito  de  promoção  por  antiguidade,  de  tantos  dias  quanto  forem  os  do  retardamento.  

Art.  7º.  Parágrafo  único.  O  proferimento  da  sentença  além  do  prazo  estabelecido  privará  o  juiz  da  inclusão  em   lista  de  merecimento  para  promoção,  durante  2   (dois)  anos,  e  acarretará  a  perda,  para   efeito   de   promoção   por   antigüidade,   de   tantos   dias   quantos   forem   os   do   retardamento,  salvo  motivo  justo,  declinado  nos  autos  e  comprovado  perante  o  órgão  disciplinar  competente.  

  Trata-­‐se  de  prazo  impróprio,  porque  não  gera  preclusão.  Contudo,  o  p.  ún.  da  ação  popular  estabelece  sanção  para  o  juiz  que  deixa  de  ajuizar  ação  popular:  ele  não  se  promove.  

 

6.3.  Natureza  da  sentença  que  julga  procedente  a  ação  popular  

  Necessariamente,  toda  ação  popular  tem  que  ter  a  natureza  DESCONSTITUTIVA,  mas  poderá  ter  também  natureza  CONDENATÓRIA,  executiva  ou  mandamental.    

Art.  11.  A   sentença  que,   julgando  procedente  a  ação  popular,  decretar  a   invalidade  do  ato  impugnado,  condenará  ao  pagamento  de  perdas  e  danos  os  responsáveis  pela  sua  prática  e  os  beneficiários  dele,  ressalvada  a  ação  regressiva  contra  os  funcionários  causadores  de  dano,  quando  incorrerem  em  culpa.  

  Registre-­‐se  que,  na  ação  popular,  o  juiz  poderá  condenar  ao  pagamento  de  perdas  e  danos  os  responsáveis,  ainda  que  não  exista  pedido  do  autor  para  tal  condenação  (isso  já  foi  cobrado  no  TJBA).  Há,  pois,  evidente  mitigação  do  princípio  da  congruência.  

 

6.4.  Responsabilização  disciplinar  

  O   STJ   entende   que   não   há   a   possibilidade   de   aplicação   de   nenhuma   sanção   política,  administrativa   ou   criminal   na   ação   popular.   O   juiz   não   pode   aplicar   a   pena   da   improbidade  administrativa   na   ação   popular,   v.g.   Ou   seja:   a   responsabilidade   do   agente   será   aferida   em   outro  processo,  conforme  dispõe  o  art.  15  da  LAP:  

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Art.   15.   Se,   no   curso   da   ação,   ficar   provada   a   infringência   da   lei   penal   ou   a   prática   de   falta  disciplinar  a  que  a  lei  comine  a  pena  de  demissão  ou  a  de  rescisão  de  contrato  de  trabalho,  o  juiz,  "ex-­‐officio",  determinará  a   remessa   de   cópia  autenticada  das  peças  necessárias  às  autoridades  ou  aos  administradores  a  quem  competir  aplicar  a  sanção.  

 

6.5.  Reexame  necessário  invertido  

  O  art.  19  da  LAP  dispõe  que  o  reexame  necessário,  na  ação  popular,  não  é  a  favor  do  Poder  Público,  mas   sim   do   interesse   coletivo.   Assim,   fica   sujeita   ao   reexame   a   sentença   que   implicar   na  carência  de  ação  ou  improcedência.  

Art.   19.   A   sentença   que   concluir   pela   carência   ou  pela   improcedência   da   ação   está   sujeita   ao  duplo   grau   de   jurisdição,   não   produzindo   efeito   senão   depois   de   confirmada   pelo   tribunal;  da  que  julgar  a  ação  procedente  caberá  apelação,  com  efeito  suspensivo.    (Redação  dada  pela  Lei  nº  6.014,  de  1973)  

 

6.6.  Efeito  suspensivo  da  apelação  (parte  final  do  art.  19)    

" Na  ação  civil  pública,  como  vimos,  quem  escolhe  se  haverá  ou  não  efeito  suspensivo  na  apelação  é  o  juiz.    

" Na   ação   popular,  por   outro   lado,  o   efeito   suspensivo   é   automático   (como   prevê   a  regra  geral  do  CPC).  Muito  cuidado  com  isso  em  provas  objetivas.  

 

6.7.  Sucumbência  

  A  sucumbência,  na  ação  popular,  tem  previsão  no  art.  5º,  LXXIII  da  CR,  bem  como  nos  arts.  10,  12  13  da  LAP.  Com  efeito,  se  o  autor  popular  for  vencido,  será  isento  do  pagamento  de  sucumbência,  salvo  na  hipótese  de  má-­‐fé  (se  a  má-­‐fé  for  absurda,  a  ponto  de  tornar  a  lide  temerária,  o  autor  será  condenado  ao  décuplo  das  custas).  

  Mas   atente:   se   os   réus   forem   vencidos,   não   haverá   tal   isenção   (eles   pagam   normalmente  todas  as  custas,  despesas  processuais  e  honorários  advocatícios).  

Art.  10.  As  partes  só  pagarão  custas  e  preparo  a  final.  

Art.  12.  A  sentença  incluirá  sempre,  na  condenação  dos  réus,  o  pagamento,  ao  autor,  das  custas  e   demais   despesas,   judiciais   e   extrajudiciais,   diretamente   relacionadas   com   a   ação   e  comprovadas,  bem  como  o  dos  honorários  de  advogado.  

Art.   13.   A   sentença   que,   apreciando   o   fundamento   de   direito   do   pedido,   julgar   a   lide  manifestamente  temerária,  condenará  o  autor  ao  pagamento  do  décuplo  das  custas.  

 

6.8.  Competência  

  A  competência  está  prevista  no  art.  5º  da  LAP  mas,  em  linhas  gerais,  segue  o  regime  da  ACP.  Assim,  não  haverá  foro  privilegiado  na  competência.  

Art.  5º  Conforme  a  origem  do  ato  impugnado,  é  competente  para  conhecer  da  ação,  processá-­‐la  e  julgá-­‐la  o  juiz  que,  de  acordo  com  a  organização  judiciária  de  cada  Estado,  o  for  para  as  causas  que  interessem  à  União,  ao  Distrito  Federal,  ao  Estado  ou  ao  Município.  

§  1º  Para  fins  de  competência,  equiparam-­‐se  atos  da  União,  do  Distrito  Federal,  do  Estado  ou  dos  Municípios  os  atos  das  pessoas  criadas  ou  mantidas  por  essas  pessoas  jurídicas  de  direito  público,  bem  como  os  atos  das  sociedades  de  que  elas  sejam  acionistas  e  os  das  pessoas  ou  entidades  por  elas  subvencionadas  ou  em  relação  às  quais  tenham  interesse  patrimonial.  

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§   2º   Quando   o   pleito   interessar   simultaneamente   à   União   e   a   qualquer   outra   pessoas   ou  entidade,   será   competente   o   juiz   das   causas   da   União,   se   houver;   quando   interessar  simultaneamente   ao   Estado   e   ao  Município,   será   competente   o   juiz   das   causas   do   Estado,   se  houver.  

§   3º   A   propositura   da   ação   prevenirá   a   jurisdição   do   juízo   para   todas   as   ações,   que   forem  posteriormente  intentadas  contra  as  mesmas  partes  e  sob  os  mesmos  fundamentos.  

§  4º  Na  defesa  do  patrimônio  público  caberá  a  suspensão  liminar  do  ato  lesivo  impugnado.  

  A  competência  para  processamento  e  julgamento  será  determinada  conforme  a  origem  do  ato  impugnado.  Assim,  será  competente  o  juiz  que,  de  acordo  com  a  organização  judiciária  de  cada  Estado,  o  for  para  as  causas  que  interessem  à  União,  Distrito  Federal,  Estado  ou  ao  Município.    

  Ressalte-­‐se  que  a  competência  da  ação  popular  não  trabalha  com  provisão  constitucional  que  estabelece  foro  por  prerrogativa  de  função.  Logo,  não  há  competência  originária  do  STF,  com  duas  exceções:  

a) Ação   em   que   todos   os   membros   da   magistratura   sejam   direta   ou   indiretamente  interessados,  e  aquela  em  que  mais  da  metade  dos  membros  do  tribunal  de  origem  estejam  impedidos  ou  sejam  direta  ou  indiretamente  interessados;  

b) Ação  que  envolva  conflito  entre  a  União  e  os  Estados,  a  União  e  o  Distrito  Federal,  ou  entre  uns  e  outros,  inclusive  as  respectivas  entidades  da  administração  indireta;  

 

6.9.  Penhorabilidade  salarial  

  O   art.   14,   §3º   define   uma   exceção   à   impenhorabilidade   salarial,   quando   o   condenado   for  funcionário  público,  pois  o  ressarcimento  do  dano  poderá  ser  feito  por  desconto  em  folha.  

  Se  a  ação  for  julgada  improcedente  de  acordo  com  os  art.  10  e  13  da  LAP  e  5º,  LXXIII  haverá  isenção  de  sucumbência,  salvo  má  fé.  

 

7.  Prescrição  

  Dispõe  o  art.  21  da  LAP  que  “a  ação  prevista  nesta  lei  prescreve  em  5  (cinco)  anos”.  Tem  sido  entendido,   com   tranqüilidade   pela   jurisprudência,   que   a   prescrição   somente   flui   a   partir   da  publicidade  dos  atos  lesivos.  

  Obs.1:  o  que  prescreve  é  a  via  popular,  e  não  o  direito  de  a  pretensão  ser  exercida  por  outra  via.  

  Obs.2:   a   reparação   do   patrimônio   público   e   do  meio-­‐ambiente   são   imprescritíveis.   Logo,  prescrita   a   via   da   ação   popular,   é   possível   que   outro   legitimado   entre   com   ação   civil   pública,   a  qualquer  tempo.  

 

 

 

 

 

 

 

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MANDADO  DE  SEGURANÇA  COLETIVO  SUMÁRIO:  1.  Introdução  2.  Breve  análise  histórica  3.  Disciplina  constitucional  do  MS  3.1  Aspectos  gerais  3.2  Mandado  de  segurança  coletivo  4.  Disciplina  infraconstitucional  4.1  Objeto  4.2  Legitimidade  4.3  Coisa  julgada  e  litispendência  5.  Precedentes  importantes  5.1  Súmulas  do  STF  5.1  Teoria  da  encampação  6.  Procedimento  7.  Atuação  do  MP  como  fiscal  da  lei  

 

Bibliografia  indicada:  LUIZ  GUILHERME  MARINONI  (Procedimentos  especiais)  e  CÁSSIO  SCARPINELA  BUENO.    

1.  Introdução  

  As  únicas  peculiaridades  do  mandado  de  segurança  coletivo,  quando  comparado  ao  mandado  de   segurança   individual,   referem-­‐se   à   legitimidade   ativa   e   ao   objeto.   Estudaremos   essas  peculiaridades,  que  são  o  nosso  foco  nesse  módulo.  

 

2.  Breve  análise  histórica  

i. Antes   de   1934,   não   havia   no   Brasil   previsão   de   cabimento   do   mandado   de   segurança.   A  Constituição  vigente,  a  republicana  de  1891,  não  previa  esta  ação.  Na  época,  entendia-­‐se  que  o   habeas   corpus   servia   para   a   tutela   de   todos   os   direitos,   mesmo   que   não   fosse   de  locomoção.  Ou  seja:  antes  de  1934,  o  HC  substituía  o  MS  (Doutrina  do  habeas  corpus,  de  Ruy  Barbosa).  

ii. Em   1934,   o  mandado   de   segurança   nasce   como   instrumento   tipicamente   brasileiro,   com   a  finalidade   proeminente   de   controlar   os   atos   do   Estado.   Na   época,   a   Constituição   aludia   à  proteção  a  “a  direito  certo  e  incontestado”.  

iii. Em  1937,  Getúlio  Vargas  outorgou  uma  nova  Constituição,   tendo  sido  suprimida  a  previsão  do  mandado  de   segurança.   Apesar  disso,   o  MS   continuou  existindo,  pois,   no  CPC  de  1939,  havia  previsão  expressa  da  ação  no  rol  das  ações  de  procedimento  especial.  

iv. Em  1946,  a  nova  Constituição  reinsere  o  MS  em  nível  constitucional.    

v. A  Constituição  de  1988  traz  2  novidades:  

a. No   art.   5º,   LXIX,   substitui-­‐se   a   expressão   “direito   certo   e   incontestado”   por   “direito  líquido   e   certo”.   Confira-­‐se:   “conceder-­‐se-­‐á   mandado   de   segurança   para   proteger  direito  líquido  e  certo,  não  amparado  por  "habeas-­‐corpus"  ou  "habeas-­‐data",  quando  o  responsável  pela  ilegalidade  ou  abuso  de  poder  for  autoridade  pública  ou  agente  de  pessoa  jurídica  no  exercício  de  atribuições  do  Poder  Público”;  

b. Foi   criado   um   outro   instituto,   que   não   tem   previsão   legal   em   nenhum   lugar   do  mundo:  o  mandado  de  segurança  coletivo  (art.  5º,  LXX).  Confira-­‐se:  

LXX  -­‐  o  mandado  de  segurança  coletivo  pode  ser  impetrado  por:  

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a)  partido  político  com  representação  no  Congresso  Nacional;  

b)  organização  sindical,  entidade  de  classe  ou  associação  legalmente  constituída  e  em  funcionamento  há  pelo  menos  um  ano,  em  defesa  dos   interesses  de  seus  membros  ou  associados;  

vi. Em  2009,  foi  sancionada  a  Lei  12.016/09  (Nova  Lei  do  MS),  cujo  art.  28  prevê  a  sua  vigência  imediata  (sem  vacatio).  A  criação  desta  lei  partiu  de  um  ato  do  AGU,  no  ano  de  1996  (Gilmar  Mendes).  Nesta   época,   foi   criada   uma   comissão,   integrada   por:   ARNOLD  WALD,   CAIO   TÁCITO   e  MENEZES  DIREITO,  que  elaboraram  o  projeto  de  lei.  

Esta  lei  teve  3  propósitos  principais,  todos  alcançados:  

a) Consolidação  da  disciplina  do  MS  em  um  único  diploma.  As  Leis  1.533/52,  4.166/62  e  5.021/66  foi  revogadas,  tendo  sido  incorporadas  em  um  único  diploma;  

b) Compatibilizar   o   tratamento   do   tema   com   a   Constituição   Federal   de   1988   e   com   a  jurisprudência   construída   (especialmente   súmulas).   Muitas   súmulas   do   STJ   e   STF  foram  incorporadas  em  Lei  (ex.:  agora,  por  expressa  previsão  legal,  não  há  condenação  em  honorários  no  MS  –  art.  25  da  Nova  Lei);  

c) Disciplinar  o  MS  originário  e  o  MS  coletivo.  

Opinião  pessoal  de  MARINONI:  essa  nova  lei  não  inovou  em  nada  (deixou  a  desejar),  e  o  pior:  limitaram  absurdamente  o  cabimento  do  mandado  de  segurança  coletivo.  O  único  beneficiado  foi  o  Poder  Público.  

Veja:  a  disciplina  do  mandado  de  segurança  coletivo  o  tornou  ineficaz  (essa  é  a  grande  crítica).  Art.   21.     O   mandado   de   segurança   coletivo   pode   ser   impetrado   por   partido   político   com  representação   no   Congresso   Nacional,   na   defesa   de   seus   interesses   legítimos   relativos   a   seus  integrantes   ou   à   finalidade   partidária,   ou   por   organização   sindical,   entidade   de   classe   ou  associação  legalmente  constituída  e  em  funcionamento  há,  pelo  menos,  1  (um)  ano,  em  defesa  de   direitos   líquidos   e   certos   da   totalidade,   ou   de   parte,   dos   seus  membros   ou   associados,   na  forma  dos   seus  estatutos  e  desde  que  pertinentes  às   suas   finalidades,  dispensada,  para   tanto,  autorização  especial.    Parágrafo  único.    Os  direitos  protegidos  pelo  mandado  de  segurança  coletivo  podem  ser:    I  -­‐  coletivos,  assim  entendidos,  para  efeito  desta  Lei,  os  transindividuais,  de  natureza  indivisível,  de  que  seja  titular  grupo  ou  categoria  de  pessoas   ligadas  entre  si  ou  com  a  parte  contrária  por  uma  relação  jurídica  básica;    II   -­‐   individuais  homogêneos,  assim  entendidos,  para  efeito  desta  Lei,  os  decorrentes  de  origem  comum   e   da   atividade   ou   situação   específica   da   totalidade   ou   de   parte   dos   associados   ou  membros  do  impetrante.    Art.   22.     No  mandado   de   segurança   coletivo,   a   sentença   fará   coisa   julgada   limitadamente   aos  membros  do  grupo  ou  categoria  substituídos  pelo  impetrante.    §  1º  O  mandado  de  segurança  coletivo  não  induz  litispendência  para  as  ações  individuais,  mas  os  efeitos   da   coisa   julgada   não   beneficiarão   o   impetrante   a   título   individual   se   não   requerer   a  desistência   de   seu   mandado   de   segurança   no   prazo   de   30   (trinta)   dias   a   contar   da   ciência  comprovada  da  impetração  da  segurança  coletiva.    §  2º  No  mandado  de  segurança  coletivo,  a  liminar  só  poderá  ser  concedida  após  a  audiência  do  representante  judicial  da  pessoa  jurídica  de  direito  público,  que  deverá  se  pronunciar  no  prazo  de  72  (setenta  e  duas)  horas.  

  O  procedimento  do  MS  coletivo  é  muito  semelhante  ao  procedimento  do  MS  individual.    

 

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3.  Disciplina  constitucional  do  mandado  de  segurança  

3.1  Aspectos  gerais  CRFB/88.  Art.  5.  LXIX   -­‐  conceder-­‐se-­‐á  mandado  de  segurança  para  proteger  direito   líquido  e  certo,   não   amparado   por   "habeas-­‐corpus"   ou   "habeas-­‐data",   quando   o   responsável   pela  ilegalidade   ou   abuso   de   poder   for   autoridade   pública   ou   agente   de   pessoa   jurídica   no  exercício  de  atribuições  do  Poder  Público;  

  Convém  analisar,  de  início,  alguns  conceitos  básicos  ligados  ao  MS:  

i. Direito   líquido   e   certo:  o   sistema   jurídico   brasileiro   adotou   a   teoria   da   substanciação,   que  define  que  a  causa  de  pedir  deve  narrar  os  fatos  e  os  fundamentos  jurídicos.  Peculiaridade:  no   mandado   de   segurança,   o   fato   narrado   tem   que   ser   INCONTROVERSO,   ou   seja,  comprovado  apenas  por  meio  de  prova  pré-­‐constituída,  por  meio  de  documentos.    

O  direito  líquido  e  certo  é  justamente,  o  fato  incontroverso.  Na  verdade,  não  é  o  direito  que  é  líquido  e  certo,  mas  o  fato.  O  direito  pode  ser  controvertido.  Nessa   linha,  a  súmula  625  do  STF  diz  que  “controvérsia  sobre  matéria  de  direito  não   impede  a  concessão  de  mandado  de  segurança”.  

ii. Prova   pré-­‐constituída:   em   sede   de   mandado   de   segurança   não   se   admite   instrução  probatória,  já  que  o  fato  tem  que  ser  incontroverso,  comprovado  por  prova  pré-­‐constituída.  A  existência  de  prova  pré-­‐constituída  é  uma  condição  especial  da  ação  mandamental.  

" Da   mesma   maneira   que   ocorre   na   ação   monitória,   tem   sido   entendido   que   não   é  possível  a  documentalização  da  prova  oral  para  fins  de  impetração  do  MS;  

" Existe   uma   única   hipótese   em   que   é   possível   a   impetração   de   MS   sem   a   prova  documental   (art.   6º,   §§1º   e   2º   da  Nova   Lei   de  MS):   no   caso   em   que   os   documentos  necessários  à  prova  do  alegado  se  achem  em  repartição  ou  estabelecimento  público  ou  em   poder   de   autoridade   que   se   recuse   a   oferecê-­‐lo   por   certidão.   Se   o   documento  estiver   com   terceiro   ou   com   a   autoridade   coatora,   o   magistrado,   preliminarmente,  determinará  a  sua  exibição.  

A   lei  não  estabelece  sanção  se  a  autoridade  coatora/terceiro  não  juntar  o  documento.  Neste  caso,  aplica-­‐se,  por  analogia,  a  medida  de  exibição  de  documentos.  Ou  seja:  se  o  documento  estiver  com  a  autoridade  coatora   (e  esta  se  nega  a  dá-­‐lo),  presumir-­‐se-­‐ão  verdadeiros  os  prazos  alegados;  se  estiver  nas  mãos  de  terceiro  (e  este  se  recusa  a  dá-­‐lo),  o  juiz  ordenará  o  depósito  em  cartório,  sob  pena  de  busca  e  apreensão.  

iii. Não  amparado  por  habeas  corpus  ou  habeas  data  !  O  mandado  de  segurança  é  residual,  somente  cabendo  quando  não  for  possível  habeas  corpus  e  habeas  data:    

" Habeas  corpus  está  previsto  no  CPP,  tutelando  a  liberdade  de  locomoção.    

" Habeas   data   está   previsto   na   lei   9.507/97,   tutelando   a   informação  PRÓPRIA.  Obs:   Cabe  mandado  de  segurança  para  tutelar  informação  alheia.  

iv. Atos   que   podem   ser   atacados:   ato   administrativo,   legislativo,   judicial   e   político/interna  corporis,  praticados  por  autoridade  pública  ou  quem  lhe  faça  as  vezes    !  A  conduta  atacada  pela  via  do  mandado  de  segurança  pode  ser  comissiva  ou  omissiva.  Além  disso,  o  ato  pode  ser  atual  (que  está  ocorrendo)  ou  iminente  (prestes  a  ocorrer).  A  respeito  dos  atos  iminentes  é   que   surge   a   interessante   figura   do   mandado   de   segurança   preventivo,   que   se   presta  exatamente  a  evitar  a  ocorrência  do  ato  (muito  comum  em  matéria  tributária).  O  ato  pode  ser  administrativo,  legislativo,  judicial  e  político/interna  corporis:  

a. Ato  administrativo  

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Regra  geral:  cabe  mandado  de  segurança  contra  ato  administrativo.  

EXCEÇÃO:  Existe  uma  única  hipótese  em  que  não  cabe  mandado  de  segurança  contra  ato  administrativo:  contra  o  qual  caiba  recurso  administrativo  com  efeito  suspensivo  e   sem   caução   (art.   5º,   I   da   lei   de  MS).   A   lógica   é  muito   simples:   nestes   casos,   não  existe   exeqüibilidade   do   ato   ilegal,   exatamente   porque,   com   o   efeito   suspensivo,   é  possível   suspender  os  efeitos  do  ato   (falta  o   interesse  de  agir-­‐necessidade).  A  partir  dessa  exceção,  surgem  algumas  observações  importantes:  

" Se   for   necessário   pagar   para   recorrer   administrativamente,   cabe   MS   (ex:   As  multas  ambientais,  em  geral,  exigem  que  se  pague  a  multa  para  depois  interpor  recurso  administrativo).  

" É   possível   a   desistência   do   recurso   administrativo   com   essas   características,  para  permitir  o  cabimento  do  MS?  SIM.  Desde  que  a  parte  renuncie  o  recurso  administrativo,  poderá  impetrar  o  MS.  

Exceção  da  exceção:  a  Súmula  429  do  STF:  “a  existência  de  recurso  administrativo  com  efeito   suspensivo   não   impede   o   uso   do   mandado   de   segurança   contra   omissão   da  autoridade”.  Veja:  nos  casos  de  ato  omissivo,  o  efeito  suspensivo  não  gera  utilidades,  pois   a   suspensão   do   nada   é   nada,   o   que   torna   o   ato   da   autoridade   exeqüível.  Justamente   por   isso,   ainda   que   exista   recurso   com   efeito   suspensivo,   se   o   ato   for  omissivo,  cabe  MS.  

b. Ato  legislativo  

Regra   geral:   não   cabe   o   ajuizamento   de   MS   contra   ato   legislativo   (lei   em   tese),  conforme  dispõe  a  Súmula  266/STF:  “não  cabe  mandado  de  segurança  contra  lei  em  tese”.  O  motivo  é  muito  simples:  ato  legislativo  é  norma  geral,  não  havendo  prejuízo  específico  para  ninguém.    

EXCEÇÕES:  

" Lei  de  efeito  concreto.  Entende-­‐se  por  lei  de  efeito  concreto  aquela  que,  por  si  só,  causa  prejuízo.  Cuida-­‐se  de  ato  administrativo  “com  roupagem  de  lei”.  Ex:  todas  as  leis  proibitivas  são  de  efeito  concreto  (lei  que  proíbe  o  fumo  em  local  público);   leis   que   fixam   tarifas;   leis   que   decretam   a   expropriação;   leis   que  extinguem  cargos  etc.  

" MS  contra  projeto  de  lei  ou  de  emenda  constitucional  com  vício  no  processo  legislativo.  O  STF  tem  entendido  que  esse  mandando  de  segurança  é  privativo  do  parlamentar  prejudicado,  pois  ele  tem  direito  líquido  e  certo  à  regularidade  do   processo   legislativo.   O   juiz   suspende   o   processo   legislativo   e   não   deixa   o  chefe  do  executivo  promulgar  a  lei.  

c. Ato  judicial    

Regra   geral:   não   cabe   MS   contra   ato   judicial,   ainda   que   a   decisão   proferida   seja  inconstitucional   (a   revisão   de   decisão   inconstitucional   ocorre   pela   via   de   ação  rescisória,  embargos  ou  impugnação).  Isso  está  no  art.  5º,  incisos  I  e  II  da  Nova  Lei  de  MS,  que  nada  mais  fez  do  que  repetir  o  teor  das  Súmulas  267  e  268  do  STF.  

Mandado  de  segurança  não  é  substitutivo  de  recurso,  ação  ou  reclamação.  

EXCEÇÕES:    

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" Decisão  contra  a  qual  não  caiba  recurso  !  Exemplos:  (i)  o  art.  527,  p.  ún.  do  CPC,  que  trata  do  agravo  de  instrumento.  O  relator,  no  julgamento  de  agravo  de  instrumento,  dentre  outras  opções,  poderá:  converter  o  agravo  em  retido;  conceder   efeito   suspensivo   ou   liminar   antecipatória.   Estas   decisões   são  irrecorríveis.   (ii)   No   processo   do   trabalho   prevalece   o   princípio   da  irrecorribilidade  das  decisões   interlocutórias,   cabendo  MS  para,  v.g.,   atacar  a  tutela  antecipatória.  (iii)    

ATENÇÃO:  No  RE  576.847/BA,  o  STF  entendeu  que  nos   juizados  especiais  não  cabe  agravo,  MS  nem  nada,  deixando  tudo  para  ser  recorrido  juntamente  com  a  decisão  final.  

Obs.:  no  NCPC,  o  recurso  de  agravo  de  agravo  passou  a  caber  em  hipóteses  taxativas  (art.  1.015).  A   jurisprudência  ainda  terá  que  se  pronunciar  sobre  o  cabimento  do  MS  em  hipóteses  fora  da  disciplina  legal.  

" Decisão   teratológica:   muita   atenção:   diferentemente   da   hipótese   anterior,  nesta  aqui  é  possível  o  ajuizamento  do  MS  mesmo  após  o  trânsito  em  julgado.  Entende-­‐se   por   decisão   teratológica   a   decisão   “monstruosa”.   Ex:   advogado  apresenta   defesa,   que   o   cartório   junta   em   processo   errado,   tendo   o   juiz  reconhecido  a  revelia  e  proferido  sentença  desfavorável  ao  réu.  

d. Ato  político  e  interna  corporis  

O  ato  político  é  aquele  praticado  em  nome  da  soberania  popular.  Exemplos:  declarar  guerra;  sanção  presidencial;  extradição  etc.  O  ato   interna  corporis,  por  seu  turno,  diz  respeito  a  questões  internas  ao  Poder.  Ex.:  questão  relativas  ao  regimento  interno  do  poder  legislativo,  sanções  parlamentares  etc.    

Regra  geral:  Não  cabe  MS  contra  ato  político  ou  interna  corporis.  

EXCEÇÃO:  é  possível  o  ajuizamento  de  MS  contra  ato  político  ou  interna  corporis,  mas  apenas  em  naquilo  que  transbordarem  os  parâmetros  constitucionais.  

LMS.  Art.  5º  Não  se  concederá  mandado  de  segurança  quando  se  tratar:    

I   -­‐   de   ato   do   qual   caiba   recurso   administrativo   com   efeito   suspensivo,  independentemente  de  caução;    

II  -­‐  de  decisão  judicial  da  qual  caiba  recurso  com  efeito  suspensivo;    

III  -­‐  de  decisão  judicial  transitada  em  julgado.    

Parágrafo  único.    (VETADO)      

 

3.2  Mandado  de  segurança  coletivo  

  A  previsão  constitucional  do  mandado  de  segurança  coletivo   limita-­‐se  a  estabelecer  os  seus  legitimados:  

CRFB/88.  Art.  5.  LXX  -­‐  o  mandado  de  segurança  coletivo  pode  ser  impetrado  por:  

a)  partido  político  com  representação  no  Congresso  Nacional;  

b)   organização   sindical,   entidade   de   classe   ou   associação   legalmente   constituída   e   em  funcionamento   há   pelo   menos   um   ano,   em   defesa   dos   interesses   de   seus   membros   ou  associados  

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  A   pergunta   que   se   faz   é   se   essa   previsão   dos   legitimados   é   exclusiva,   ou   seja,   se   o   rol   é  exaustivo.   Na   doutrina,   MARINONI   defende   que   não.   Para   ele,   não   há   razão   para   a   garantia  fundamental  ser  restringida.  Particularmente,  é  a  posição  que  deve  ser  defendida  no  MPF,  pois  o  MP  não  está  previsto  entre  os  legitimados.  Veremos  isso  com  detalhe.  

  Perceba  que  o  texto  constitucional  não  tratou  de  maneira  específica  de  qualquer  outro  ponto  do  MS  coletivo.  Por  conta  disso,  aplica-­‐se  a  disciplina  do  MS  individual.  

 

4.  Disciplina  infraconstitucional  

  A  disciplina  infraconstitucional  do  MS  coletivo  foi  desenhada,  pela  primeira  vez,  a  partir  da  Lei  12.016/2009.  Era  melhor  ter  mantido  a  omissão,  diante  do  grave  retrocesso  legislativo  que  veremos.  

 

4.1  Objeto  

  O  objeto  do  mandado  de  segurança  individual  são  os  direitos  individuais.    

  De   acordo   com   a   literalidade   da   lei,   o   objeto   do   mandado   de   segurança   coletivo   são   os  direitos  coletivos  e  individuas  homogêneos  (art.  20,  parágrafo  único).  Os  direitos  difusos,  de  acordo  com  a  literalidade  da  lei,  não  são  passíveis  de  impugnação  via  mandado  de  segurança.    

  Na  doutrina,  existem  duas  posições  sobre  o  objeto  do  mandado  de  segurança  coletivo:  

1ª Corrente  (ampliativa  –  doutrina)  !  Entende  que  todos  os  interesses  metaindividuais  podem  ser  tutelados  por  MS  coletivo  (difusos,  coletivos  e  individuais  homogêneos).  Assim  entende  a  doutrina   majoritária   (ADA   PELLEGRINI   GRINOVER,   FREDIE,   MARINONI).   NO   MPF,   é   a   posição   a   ser  defendida.  

2ª Corrente   (restritiva   –   Lei)  !   O   legislador,   ao   tratar   da   questão   no   art.   21,   p.   ún.,   acabou  dando   a   seguinte   resposta:   somente   é   cabível   o   MS   coletivo   quando   os   lesados   forem  determináveis,  ou  seja,  nos  interesses  coletivos  e   individuais  homogêneos.  Ficaram  de  fora,  portanto,  os  interesses  difusos.    

Grave:  graças  à  Lei  12.016/09,  pela  sua  literalidade,  não  cabe  mais  MS  coletivo  para  proteção  de  direitos  difusos.  Essa  posição  deve  ser  sustentada  em  questões  objetivas.  

O   lesado  deverá  utilizar  outras  vias   (ação  popular,  ação  civil  pública  etc.).  Ex.:  não  cabe  MS  coletivo  para  sustar  uma  licença  ambiental  concedida  erroneamente.    

 

4.2.  Legitimidade  ativa  no  mandado  de  segurança  coletivo  

I.  Partido  político  com  representação  no  Congresso  Nacional  

  O  partido  político  é  uma  associação  com  a  finalidade  específica  de  administrar  o  poder,  por  meio   da   democracia   (lei   9.096/95).   O   partido   político   pode   impetrar   MS   coletivo,   mas   sua  legitimidade  está  condicionada  a  que  tenha  representação  no  Congresso  Nacional,  ou  seja,  que  tenha  um  deputado  federal  ou  um  senador  efetivo  –  não  pode  ser  suplente.  Possuindo  essa  representação,  o   partido   poderá   ajuizar   a   ação   em   qualquer   das   suas   esferas   (todos   os   diretórios   municipais,  estaduais   e   o   nacional   podem   propor   a   ação).   Isso   é   importante,   pois   amplia   profundamente   a  legitimidade  no  MS  coletivo.  

  Atenção:  mesmo   que   o   partido   perca   a   representação   no   transcorrer   do   processo,   ainda  assim,  deverá  haver  o  julgamento.  

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  Muito  complicada  é  a  questão  do  objeto  de  defesa  do  mandado  de  segurança  impetrado  por  partido  político.  O  art.  5º,  LXX  da  CF  parece  não  limitar  o  uso  do  MS  coletivo  por  partidos  políticos  à  defesa  de  seus  filiados   -­‐  como  fez  expressamente  para  a  organização  sindical,  entidade  de  classe  e  associação.  

  Seguindo   essa   linha,   o   art.   21   da   Lei   12.016/09   prevê   o   MS   coletivo   para   a   defesa   dos  interesses:  a)  de  seus  integrantes  ou;  b)  relativos  à  sua  finalidade  partidária.  A  CRFB  não  cria  essa  limitação  para  os  partidos,  o  que   faz  autores   como  MARINONI   entenderem  que  essa   limitação   seria  inconstitucional,  ofendendo  a  garantia  constitucional.  

  Assim,   qualquer   interesse   que   esteja   abrangido   pela   sua   finalidade   institucional   pode   ser  tutelado.  

  Segundo   o   STF,   o   partido   político   NÃO   pode   impetrar   MS   coletivo   para   impugnar   uma  alíquota  tributária  em  favor  de  todos  (RH  196184/MA).  

 

II.  Sindicatos,  entidades  de  classe  e  associações  

  Tais  entidades,  diferentemente  dos  partidos  –  que  têm  só  uma  condição  -­‐,  só  podem  impetrar  MS  desde  que  observadas  duas  condições:  

a) Constituição  e  funcionamento  há  pelo  menos  um  ano  !  Esse  requisito  da  constituição  ânua  não  se  aplica  aos  sindicatos  nem  às  entidades  de  classe,  por  uma  questão  de  vírgula  no  art.  5º,   LXX   da   CF.   Essa   é   a   interpretação   do   STF.   Assim,   somente   a   associação   deve   estar  legalmente  constituída  a  pelo  menos  1  ano.  

Obs.1:  Dá  pra  se  aplicar  a  dispensa  da  constituição  há  1  ano  prevista  na  LACP?  Entende-­‐se  que  não,  pois  o  requisito  da  pré-­‐constituição  há  um  ano  consta  da  própria  Constituição.  Não  dá  para  aplicar  as  normas  infraconstitucionais  para  afastar  uma  norma  constitucional.  

b) Defesa  dos  interesses  de  seus  membros  ou  associados  (situação  diversa  da  LACP)  

Obs.  1:  No  RE  181438,  o  STF  entendeu  que  o   interesse  protegido  não  precisa   ser   típico  da  categoria.  Quanto  maior  o  objeto  social/finalidade  institucional,  maior  a  atuação  em  sede  de  MS   coletivo.   Ex.:   no   RE   181438-­‐SP,   entendeu   o   STF   que   um   sindicato   pode   impetrar   MS  coletivo  para   impugnar   tributo  que   incida   sobre  a   renda  dos  associados,   vez  que  a   renda  é  fruto   das   atividades   por   ele   exercidas,   não   sendo   este   um   direito   peculiar   da   cassa   de  trabalhadores  defendida  pelo  mandamus.  

Obs.2:   a   Súmula   629   do   STF   e   o   art.   21   da   lei   12.016/09   dispensam   a   autorização   dos  associados  para  a  impetração  do  MS  coletivo,  isso  porque  a  legitimidade  foi  dada  pela  própria  CF.  A  mesma  coisa  não  se  observa  para  a  ACP  contra  o  Poder  Público.  

Obs.3:  a  Súmula  630  do  STF  e  o  art.  21  da  lei  12.016/09,  por  sua  vez,  prevêem  que  a  entidade  de   classe   tem   legitimação   para   o  MS   coletivo,   ainda   que   a   pretensão   veiculada   interesse  apenas  a  parte  da  categoria.  

 

4.3  Coisa  julgada  e  litispendência  no  MS  coletivo  

  De   acordo   com   o   art.   22   da   Lei   12.016/09,   a   sentença   em  MS   coletivo   fará   coisa   julgada  limitadamente  aos  membros  do  grupo  ou  da  categoria.  Prevê,  por   tanto,  que  essa  sentença  será  ultra  partes.    

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  Isso  é  coerente  com  a  tentativa  nefasta  de  transformar  o  MS  coletivo  como  um  instrumento  a  serviço  de  categorias  determinadas,  afastando-­‐se  a  tutela  dos  interesses  difusos.  

  Justamente   por   isso,   a   doutrina   critica   essa   previsão,   defendendo   que   ela   deve   ser  compreendida  como  erga  omnes,  por  ser  inconstitucional  a  limitação  a  determinada  categoria.    

  Obs.   (LITISPENDÊNCIA):  No  regime  de   todas  as  ações  coletivas,  para  que  o  particular  possa  fazer   o   transporte   in   utilibus   da   coisa   julgada,   deverá   suspender   a   ação   individual,   caso   tenha  ajuizado  a  mesma.  Contudo,  no  novo  regime  do  MS,  o  modelo  da  suspensão  da  ação   individual  do  art.   104  do  CDC   foi   substituído  pelo  modelo  da  desistência.  Ou   seja:  o  particular  deve  desistir   da  ação   individual,  o  que  é  muito  perigoso,  pois  o  prazo  decadencial  para  ajuizamento  do  MS  é  curto  (120  dias).  

  O   objetivo   da   alteração   foi   inviabilizar   a   discussão   individual   da   questão   em   um   novo  mandado  de  segurança,  uma  vez  que  após  o   julgamento  da  ação  coletiva  (improcedente),   já  terá  passado  o  prazo  decadencial  para  repropositura  do  MS.  

  Justamente  por  isso,  para  Marinoni,  a  previsão  é  inconstitucional.  

 

5.  Precedentes  importantes  

5.1  Súmulas  do  STF  

Obs.:  desde  a  promulgação  da  CF/88,  quando  nasceu  o  mandado  de  segurança  coletivo,  o  STF  somente  editou  as  súmulas  629  e  630  sobre  o  tema:  

Súmula   629   do   STF   -­‐   A   impetração   de   mandado   de   segurança   coletivo   por  entidade  de  classe  em  favor  dos  associados  independe  da  autorização  destes.  

Súmula  630  do  STF   -­‐  A  entidade  de  classe  tem  legitimação  para  o  mandado  de  segurança  ainda  quando  a  pretensão  veiculada  interesse  apenas  a  uma  parte  da  respectiva  categoria.  

 

5.2  Teoria  da  encampação    

A   doutrina   passou   a   entender   que,   em   algumas   circunstâncias,   ainda   que   fosse   indicada  como   coatora   a   autoridade   errada,   poderia   ser   julgado   o  MS   impetrado   erroneamente   contra   a  autoridade  superior  à  que  seria  a  correta  coatora,  se  ela  defender  o  ato.  A  teoria  da  encampação  consiste  na  defesa  do  ato  atacado  pela  autoridade  equivocadamente  indicada  como  coatora,  caso  em  que  restaria  suprida  a  errônea  indicação,  com  possibilidade  de  julgamento  do  MS.  

Para   esta   teoria,   o   ingresso   da   autoridade   coatora   correta   ou   da   pessoa   jurídica   a   que   ela  pertença   no   feito   supriria   o   vício   (de   indicação   equivocada),   conseqüentemente   permitindo   o  julgamento  do  MS.    

No  RMS  10.484/DF,  o  STJ  previu  4  condições  para  que  seja  possível  a  aplicação  da  teoria:  

i. O  encampante  deve  ser  superior  hierárquico  do  encampado;  

ii. A  encampação  não  pode  gerar  modificação  da  competência  absoluta   para   julgamento  do  MS.  Ex.:  quem  julga  MS  de  Presidente  da  República  é  o  STF  e  quem  julga  o  MS  contra  ato  dos  Ministros  de  Estado  é  o  STJ.  

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iii. As  informações  prestadas  para  autoridade  encampante  devem  ter  esclarecido  o  mérito  da  questão,  não  se  limitando  a,  exclusivamente,  indicar  a  ilegitimidade.  (manifestação  a  respeito  do  mérito  nas  informações  prestadas).  

iv. Deve  ser  razoável  a  dúvida  quanto  à  real  autoridade  coatora.    

 

6.  Procedimento  

  Quanto  ao  procedimento  do  MS  coletivo,  a  LMS  não  tratou  do  assunto.  Assim  sendo,  aplica-­‐se  o  regime  procedimental  do  mandado  de  segurança  individual.    

  Há  apenas  uma  regra  específica,  que  estabelece  o  dever  de  ouvir  o  representante  judicial  da  pessoa   jurídica  de  direito  público  no  prazo  de  72  horas,  antes  de  decidir   sobre  a  medida   liminar  (art.  22,  §2º).  

  Essa  previsão,  contudo,  deve  ser  vista  com  temperamento,  podendo  ser  mitigada  de  acordo  com  o  caso  concreto.  

 

7.  Atuação  do  MP  como  fiscal  da  lei  (art.  12  da  LMS)  Art.   12.     Findo  o  prazo  a  que   se   refere  o   inciso   I   do   caput  do  art.   7o  desta   Lei,   o   juiz  ouvirá  o  representante   do  Ministério   Público,   que   opinará,   dentro   do   prazo   improrrogável   de   10   (dez)  dias.    

A  questão  que  se  põe  é  saber  se  a  intervenção  do  MP  é  obrigatória  na  ação  de  mandado  de  segurança.  Com  efeito,  temos  2  correntes:  

1ª Corrente  (MP)  !  O  MP  somente  atua  no  MS,  se  presentes  as  hipóteses  do  art.  82  do  CPC.  Se   o   objeto   for,   v.g.,   matéria   tributária,   não   há   intervenção   do   órgão   ministerial.   De  qualquer  forma,  o  MP  deve  ser  sempre  intimado,  para  que  verifique  se  possui  interesse.  

2ª Corrente   (MP/MG)  !  O  MP   tem  que   se  manifestar   em   todos  as  ações  de  mandado  de  segurança,  sob  pena  de  nulidade.  

É  pacífico  o  entendimento  de  que  o  que  gera  nulidade  do  processo  é  a  falta  de  oportunidade  de  manifestação  para  o  MP,  e  não  a  própria  manifestação.  Assim,  em  sentença,  deve-­‐se  oportunizar  a  manifestação  do  MP.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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MANDADO  DE  INJUNÇÃO  E  MANDADO  DE  INJUNÇÃO  COLETIVO  Sumário:  1.  Instrumentos  de  controle  das  omissões  constitucionais  1.1.  Ação  direta  de  inconstitucionalidade  por  omissão  1.2.  Mandado  de  injunção  

 

1.  Instrumentos  de  controle  das  omissões  constitucionais  

  A  Constituição  é  uma  norma  jurídica  e,  por   isso,  possui  uma  força  normativa  própria.  Desta  forma,  ela  manda/obriga/determina,  segundo  lições  de  Hesse  (1957).  

  Trata-­‐se   de   uma   norma   jurídica   superimperativa,   possuindo   imperatividade   reforçada,   em  decorrência  do  princípio  da  supremacia  da  Constituição.  

  As  nossas  constituições  pretéritas  não  eram  aplicadas,  em  razão  da   inação,   falta  de  ação  do  legislador   constituído.   Algumas   normas   constitucionais   precisam   de   regulamentação,   devida   pelo  legislador,  que  descumpria  frequentemente  os  comandos  constitucionais.  

  A  síndrome  de  inefetividade  é  justamente  a  desobediência  da  Constituição,  em  razão  da  falta  de   regulamentação.   Trata-­‐se   de   patologia   constitucional   ao   lado   do   fenômeno   da  constitucionalização  simbólica,  que  reclama  a  identificação  de  mecanismos  para  sua  concretização  e,  nisso,   o   Poder   Judiciário   tem   assumido   a   importante   missão   de   implementar   a   efetividade   das  normas  constitucionais,  o  que  tem  feito  por  meio  das  técnicas  de  mandado  de  injunção  e  ação  direta  de  inconstitucionalidade  por  omissão.  

  Obs.1:   todas   as   normas   constitucionais   possuem   eficácia   jurídica.   Apesar   disso,   apenas  parte   delas   possui   eficácia   social.   Entende-­‐se   por   eficácia   jurídica   a   qualidade   da   norma  constitucional  que  está  apta  a  produzir  efeitos  nas  relações  concretas.  Por  outro  lado,  a  eficácia  social  consiste  na  potencialidade  da  norma  vigente  para  ser  aplicada  em  determinadas  matérias.    

  A   doutrina   mais   moderna   do   direito   constitucional   entende   que   todas   as   normas  constitucionais  devem  possuir  eficácia  social,  além  da  eficácia  jurídica.  A  síndrome  de  inefetividade  pode  ser  resolvida  através  de  dois  remédios  constitucionais  distintos:  

• Ação  direta  de  inconstitucionalidade  por  omissão;  

• Mandado  de  injunção.    

1.1.  Ação  direta  de  inconstitucionalidade  por  omissão  

  Trata-­‐se   de   inovação   da   CF/88,   inspirada   na   Constituição   portuguesa.   O   que   se   busca   é  combater  uma  “doença”  chamada  “síndrome  da  inefetividade  das  normas  constitucionais”.  

  Em  outras  palavras,  a  ADO  é  ação  de  controle  concentrado  que  busca  tornar  efetiva  norma  constitucional  destituída  de  efetividade,  ou  seja,  somente  é  aplicáveis  para  as  normas  constitucionais  de  eficácia  limitada.  

  A   ação   direta   de   inconstitucionalidade   por   omissão   está   prevista   no   art.   103,   §2º   da   CF,  regulamentado  pela  lei  9.886  (da  ADI  e  ADC).  

Art.  103,  §  2º  -­‐  Declarada  a   inconstitucionalidade  por  omissão  de  medida  para  tornar   efetiva   norma   constitucional,   será   dada   ciência   ao   Poder   competente  

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para   a   adoção   das   providências   necessárias   e,   em   se   tratando   de   órgão  administrativo,  para  fazê-­‐lo  em  trinta  dias.  

  A  finalidade  da  ADO  é  tornar  efetiva  a  norma  constitucional.  Significa  uma  preocupação  com  a  ordem  constitucional  objetiva  em  assegurar  a  supremacia  da  Constituição.  

  Trata-­‐se  de  uma  ação  de  controle  abstrato  de  constitucionalidade.  Sendo  assim,  a  pretensão  será  deduzida  em  juízo  através  de  um  processo  constitucional  objetivo.  

   

I.  Espécies  de  omissão  

  A  omissão  poderá  ser  total  ou  parcial:  

a) Total  !  Quando  não  houver  o  cumprimento  do  dever  constitucional  de  legislar.  Ex.:  art.  37,  VII,  que  prevê  o  direito  de  greve  para  os  servidores  públicos.  

b) Parcial  !  Quando  houver   lei   integrativa   infraconstitucional,  porém  de  forma  insuficiente.  A  inconstitucionalidade  por  omissão  parcial  se  divide  em:  

" Parcial   propriamente   dita  !   A   lei   integrativa   existe,  mas   regula   de   forma   deficiente   o  texto.  Ex.:  art.  7º,  IV,  que  estabelece  o  direito  ao  salário  mínimo.  

" Parcial   relativa  !   Nesse   caso,   a   lei   existe   e   outorga   determinado   benefício   a   certa  categoria,  mas  deixa  de  concedê-­‐lo  a  outra,  que  deveria  ter  sido  contemplada.  Prevalece  o   conteúdo   da   Súmula   339/STF:   “Não   cabe   ao   Poder   Judiciário,   que   não   tem   função  legislativa,  aumentar  vencimentos  de  servidores  públicos  sob  fundamento  de  isonomia.”.  

 

II.  Objeto  

  A  omissão   impugnada  é  de  qualquer  um  dos  poderes:   Legislativo,  Executivo  ou   Judiciário  em  relação  às  normas  que  devam  criar  (não  cabe  contra  desídia  do  juiz  que  não  julga  processo).    

  “São  impugnáveis,  no  controle  abstrato  da  omissão,  a  inércia  legislativa  em  editar  quaisquer  dos   atos   normativos   primários   suscetíveis   de   impugnação   em  ação  direta   de   inconstitucionalidade  [...]  O  objeto  aqui,  porém,  é  mais  amplo:  também  caberá  a  fiscalização  da  omissão  inconstitucional  em  se  tratando  de  atos  normativos  secundários,  como  regulamentos  ou  instruções,  de  competência  do   Executivo,   e   até   mesmo,   eventualmente,   de   atos   próprios   dos   órgãos   judiciários”.   (BARROSO,  2010)  

• Perda   de   objeto:   segundo   entendimento   clássico   do   STF,   pendente   julgamento   de  ADI   por  omissão,  se  a  norma  que  não  tinha  sido  regulamentada  é  revogada,  a  ADI  por  omissão  deverá  ser  extinta  por  perda  do  objeto.  Veremos,  adiante,  que  o  STF  mitigou  isso  em  julgamento  de  mandado  de  injunção.  

O   STF   também  entendia   que   haveria   perda   de   objeto   na   hipótese   de  encaminhamento   de  projeto   de   lei   sobre   a   matéria   ao   Congresso   Nacional   (ADI   130-­‐2/DF).   Contudo,   esse  entendimento   foi   repensado   no   julgamento   da   ADO   3.682:   o   Supremo   entende   não   se  justificar   a   demora   na   apreciação   de   projetos   já   propostos,   passível   de   caracterizar   uma  desautorizada   “conduta   manifestamente   negligente   ou   desidiosa   das   Casas   Legislativas”,  colocando  em  risco  a  ordem  constitucional.    

• Fungibilidade:   Segundo   decisão   do   STF,   no   MI   395-­‐QO,   não   há   fungibilidade   da   ADI   por  omissão  com  o  Mandado  de  Injunção,  tendo  em  vista  a  diversidade  de  pedidos.  

 

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III.  Competência  

  O  órgão  competente  para  apreciar  a  representação  de  inconstitucionalidade  por  omissão  é  o  STF,  de  forma  originária  (art.  103,  §2º,  CF),  porque  todo  controle  concentrado  de  constitucionalidade  só  pode  ser  feito  pelo  Tribunal  Constitucional.  

  Obs.:  No  âmbito  Estadual  também  será  possível  haver  ADO.  Nesse  caso,  a  competência  será  do  TJ.  

 

IV.  Legitimidade    

1ª Legitimidade  Ativa  !  São  legitimados  os  mesmos  da  ADI  genérica  (previstos  no  art.  103  da  CF),  com  as  peculiaridades   já  apontadas  em  relação  à  pertinência   temática.  Há,  aqui,  um  típico  processo  constitucional  objetivo.  

2ª Legitimidade  Passiva  !  Responderá  pela  ADO  a  autoridade  ou  órgão  responsável  pela  medida  para  tornar  efetiva  a  norma  constitucional.    

 

V.  Procedimento  

  Este   procedimento   é   praticamente   o  mesmo   da   ADI   por   ação.   Encontra-­‐se   previsto   na   Lei  9.868/99:  

1ª Antes  da   lei  12.063/2009,  que  alterou  a   lei  9.868/99,  o  STF  entendia  que  o  AGU  não  precisava  ser  citado,   já  que  não  existe  ato  impugnado  para  ele  defender.  Modificando  esse   posicionamento,   a   lei   passou   a   estabelecer   que   o   relator   poderá   solicitar   a  manifestação  do  AGU,  cujo  encaminhamento  deverá  ser  feito  no  prazo  de  15  dias.  

2ª A  Lei  determina  que  o  PGR  seja  ouvido  em  toda  ação  direta  de  inconstitucionalidade  por  omissão,  no  prazo  de  15  dias,  depois  de  prestadas  as  informações.    

3ª Não  existe  prazo  para  o  seu  ajuizamento  (para  a  ADI  também  não  há  prazo).  

 

VI.  Parâmetro  

  Somente   as   normas   constitucionais   de   eficácia   limitada   (não   auto-­‐aplicáveis)   podem   ser  parâmetro  de  controle.  Esse  é  o  posicionamento  majoritário.    

 

VII.  Medida  cautelar  

  A   lei   12.063/2009,   que   modificou   a   lei   9.868/99,   alterou   bastante   a   medida   cautelar   e   a  decisão  de  mérito.  

  A  jurisprudência  do  STF,  antes  da  alteração  feita  em  2009,  era  pacífica  no  sentido  de  que  não  cabia  medida  cautelar  em  ADO  total  (quando  não  existisse  nenhum  ato).  O  argumento  do  STF  era  de  que,  sendo  o  efeito  da  decisão  de  mérito  apenas  dar  ciência  ao  poder  competente  de  sua  omissão  (o  STF  não  supre  a  omissão,  apenas  comunicando  a  omissão),  não  haveria  sentido  em  dar  uma  medida  cautelar,  pois  ela  apenas  daria  ciência  antecipada,  sem  resolver  o  problema  da  pessoa.  A  lei  de  2009  alterou  a  lei  9.868/99  para  admitir  a  medida  cautelar:  

Art.  12-­‐F.    Em  caso  de  excepcional  urgência  e  relevância  da  matéria,  o  Tribunal,  por  decisão  da  maioria  absoluta  de  seus  membros,  observado  o  disposto  no  art.  22,   poderá   conceder   MEDIDA   CAUTELAR,   após   a   audiência   dos   órgãos   ou  

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autoridades   responsáveis   pela   omissão   inconstitucional,   que   deverão  pronunciar-­‐se  no  prazo  de  5  (cinco)  dias.  (Incluído  pela  Lei  nº  12.063,  de  2009).  

 

  O  §  1º  do  art.  12-­‐F  trata  dos  efeitos  da  medida  cautelar  em  ADO.  

§  1o    A  medida  cautelar  poderá  consistir  na  suspensão  da  aplicação  da  lei  ou  do  ato   normativo   questionado,   no   caso   de   omissão   parcial,   bem   como   na  suspensão  de  processos  judiciais  ou  de  procedimentos  administrativos,  ou  ainda  em  outra  providência  a  ser  fixada  pelo  Tribunal.  (Incluído  pela  Lei  nº  12.063,  de  2009).  

  No  caso  da  inconstitucionalidade  por  omissão  parcial,  será  possível  conceder  uma  cautelar  para  suspender  o  ato  (a  depender  do  caso).  O  STF  já  admitia  a  medida  cautelar  em  caso  de  omissão  parcial.   A   novidade   foi   a   concessão   de   medida   cautelar   por   omissão   total,   hipótese   em   que   os  efeitos  poderão  ser:  suspensão  dos  processo  judiciais  ou  de  procedimentos  administrativos,  ou  ainda  “outra  providência  a  ser  fixada  pelo  Tribunal”.  

§  2o    O  relator,   julgando  indispensável,  ouvirá  o  Procurador-­‐Geral  da  República,  no  prazo  de  3  (três)  dias.  (Incluído  pela  Lei  nº  12.063,  de  2009).  

§  3o    No   julgamento  do  pedido  de  medida  cautelar,   será   facultada   sustentação  oral   aos   representantes   judiciais   do   requerente   e   das   autoridades   ou   órgãos  responsáveis  pela  omissão  inconstitucional,  na  forma  estabelecida  no  Regimento  do  Tribunal.  (Incluído  pela  Lei  nº  12.063,  de  2009).  

 

VIII.  Efeitos  da  decisão  de  mérito  

  Declarada  a  inconstitucionalidade,  surge  a  dúvida  quanto  à  possibilidade  do  STF  elaborar  a  lei,  para  suprir  a  omissão.  Em  respeito  à  tripartição  dos  Poderes,  não  é  permitido  ao  Judiciário   legislar  (salvo  hipóteses  constitucionalmente  previstas,  como  no  caso  de  Regimentos  Internos).  

  A   sentença   proferida   em   sede   de   ADI   por   omissão,   contudo,   tem   caráter   mandamental,  constituindo  em  mora  o  poder  competente  que  deveria  elaborar  a  lei  e  não  o  fez.    

  O  art.   103,  §2º,  da  CRFB/88  estabelece  efeitos  diversos  para  o  poder   competente  e  para  o  órgão  administrativo:  

" Poder   competente   !   Será   dada   ciência   ao   poder   competente,   não   tendo   sido   fixado  qualquer  prazo  para  a  elaboração  da  lei.  

Art.  12-­‐H.    Declarada  a  inconstitucionalidade  por  omissão,  com  observância  do  disposto  no   art.   22,   será   dada   ciência   ao   Poder   competente   para   a   adoção   das   providências  necessárias.  (Incluído  pela  Lei  nº  12.063,  de  2009).  

Obs.1:  Na  ADO  3682  (omissão  de  lei  complementar  federal  prevista  no  art.  18,  §4º  da  CF  para  criação   de   municípios),   sob   relatoria   do   Min.   Gilmar   Mendes,   diante   da   negligência   dos  parlamentares,   foi   dado   ao   Congresso   Nacional   prazo   de   18   meses   para   adotar   as  providências   legislativas   necessárias   ao   cumprimento   do   dever   constitucional   imposto1.  Embora   a   ementa   não   indique   o   caráter   coercitivo   da   decisão,   entende   Pedro   Lenza   que   a  leitura  do  acórdão  completo  dá  a  idéia  de  que,  em  razão  do  caráter  mandamental  da  decisão,  

1   Aos  Municípios   foi   dado  o   prazo   de   24  meses   para   que   tivessem,   pelo  menos,   6  meses   a  mais   que  o   Congresso,   já   que   somente  podem  criar  a  lei  depois  da  criação  da  lei  complementar  federal.  

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o   Congresso   Nacional   terá   de   legislar   dentro   do   período   de   18  meses.   Inclusive,   em   ofício  encaminhado   ao   Presidente   do   Congresso,   o   Presidente   do   STF   deixou   claro   que   findo   24  meses  sem  solucionar  a  questão  dos  municípios,  eles  seriam  extintos.  

" Órgão   administrativo   !   Deverá   editar   a   norma   no   prazo   de   30   dias,   sob   pena   de  responsabilidade.  Tendo  em  vista  a  existência  de  situações  complexas,  em  que  esse  prazo  não  é   suficiente,   a   lei   9.868/99   permite   que,   excepcionalmente,   o   STF   estabeleça   prazo  diferenciado  para  o  órgão  administrativo  cumprir  a  decisão:    

Art.   12-­‐H,   §   1o     Em   caso   de   omissão   imputável   a   órgão   administrativo,   as  providências   deverão   ser   adotadas   no   prazo   de   30   (trinta)   dias,   ou   em   prazo  razoável   a   ser   estipulado   excepcionalmente   pelo   Tribunal,   tendo   em   vista   as  circunstâncias  específicas  do  caso  e  o  interesse  público  envolvido.  (Incluído  pela  Lei  nº  12.063,  de  2009).  

   

1.2.  Mandado  de  injunção  

  A  Constituição  (art.  5º  LXXI)  estabelece  que  se  concederá  mandado  de  injunção  sempre  que  a  falta  de  norma  regulamentadora  torne  inviável  o  exercício  dos  direitos  e  liberdades  constitucionais  e  das  prerrogativas  inerentes  à  NACIONALIDADE,  à  SOBERANIA  e  à  CIDADANIA.  

  Seus   dois   requisitos   são:   a)   norma   constitucional   de   EFICÁCIA   LIMITADA   prescrevendo  direitos,  liberdades  constitucionais  e  prerrogativas  inerentes  à  nacionalidade,  soberania  e  cidadania;  b)  falta  de  norma  reguladora,   tornando  inviável  o  exercício  dos  direitos,   liberdades  e  prerrogativas  mencionados.  

  Também   surge   para   “curar”   a   síndrome   da   inefetividade   das   normas   constitucionais,   vale  dizer,  normas  constitucionais  que,  de   imediato,  no  momento  em  que  a  Constituição  é  promulgada,  não   têm   o   condão   de   produzir   todos   os   seus   defeitos,   precisando   de   uma   lei   integrativa  infraconstitucional.  

  Como  sua  finalidade  é  assegurar  o  exercício  de  direitos  subjetivos,  o  mandado  de  injunção  é  instrumento   de   controle   concreto   ou   incidental   de   constitucionalidade   da   omissão.   Assim,   será   a  pretensão  deduzida  em  juízo  por  meio  de  um  processo  constitucional  subjetivo.  

 

I.  Legitimidade  ativa    

  A  legitimidade  vai  depender  do  tipo  de  mandado  de  injunção:  

" Mandado   de   injunção   individual  !   É   legítima   qualquer   pessoa   cujo   direito   constitucional  subjetivo  seja  inviabilizado  pela  ausência  de  norma  regulamentadora.  

Obs.:  O  STF,  superando  entendimento  anterior,  decidiu  que  pessoa  jurídica  de  direito  público  pode   impetrar   MI,   inclusive   porque   são   titulares   de   direitos   fundamentais   (MI   725/SC,   j.  10/05/2007).  

" Mandado  de   injunção   coletivo  !  Como  não  existe   lei   regulamentadora  do  MI,   o   STF,   por  analogia,  aplica  os  legitimados  do  mandado  de  segurança  coletivo  (art.  5º,  LXX  da  CF):  

Art.  5º,  LXX  -­‐  o  mandado  de  segurança  coletivo  pode  ser  impetrado  por:  

a)  partido  político  com  representação  no  Congresso  Nacional;  

b)   organização   sindical,   entidade   de   classe   ou   associação   legalmente  constituída   e   em   funcionamento   há   pelo   menos   um   ano,   em   defesa   dos  

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interesses  de  seus  membros  ou  associados.  

 

Mandado  de  Injunção  coletivo   ADO

Partido   político   com   representação   no  Congresso  Nacional  (igual  à  ADO)  

Partido   político   com   representação   no   Congresso  Nacional  (igual  ao  MI)

Qualquer   organização   sindical   pode  (confederações,   federações   ou   sindicatos)  impetrar   MI,   mas   devem   ter   pelo   menos   1  ano.  

Apenas  a  confederação  sindical  pode  ajuizar  ações  de  controle  abstrato  (ADO).  Não  precisam  ter  1  ano.

Podem  impetrar  MI  as  entidades  de  classe  de  qualquer  esfera,  mas  devem  ser  pelo  menos  1  ano.  

Apenas   as   entidades   de   classe   de   âmbito   nacional  podem  ajuizar   ação   (presente   em   ao  menos   1/3   dos  Estados  da  Federação).  Não  precisam  ter  1  ano.

 

II.  Legitimidade  passiva  

  É   a   mesma   legitimidade   da   ADO.   Assim,   responderá   pelo  Mandado   de   Injunção   a   pessoa  estatal  responsável  por  regulamentar  a  norma,  e  nunca  o  particular.    

  Se   o   MI   tem   por   finalidade   assegurar   direitos   subjetivos   no   caso   concreto,   significa   que  alguém   (que   não   a   autoridade   responsável   pelo   ato)   terá   que   suportar   os   efeitos   do   exercício   do  direito  subjetivo  pleiteado  por  meio  dessa  ação.  

 

III.  Competência  (arts.  102,  105,  121  e  125,  CF)  

  Como  não  se   trata  de  controle  de  constitucionalidade  concentrado,   fundado  na  supremacia  da  Constituição,  o  Mandado  de  Injunção  não  é  da  competência  exclusiva  do  STF.  

  Mas  o  MI  não  é  um  instrumento  de  controle  difuso  como  os  demais.  Para  processar  e  julgar  o  Mandado  de   Injunção,  o  órgão   tem  que   ter  essa   competência  prevista  na  Constituição  Federal,  na  Constituição   Estadual   (pode   atribuir   ao   TJ   ou   ao   juiz   estadual,   a   depender   da   autoridade   que   se  omitiu)  ou  em  lei  federal.  Só  que  até  hoje  não  há  lei  federal  regulamentando  o  MI  ou  atribuição  de  competência  a  algum  órgão  jurisdicional.  

  Tendo  em  vista  que  não  há  regulamentação   legal  específica  para  o  MI,  visando  permitir  sua  utilização,  o  STF  indica  a  aplicação,  por  analogia,  da  legislação  referente  ao  Mandado  de  Segurança.  

  A  CF  atribui  competência  ao:    

" STF   (art.   101,   I,   “q”)   –   Julga   o   mandado   de   injunção,   quando   a   elaboração   da   norma  regulamentadora  for  atribuição  do:  

• Presidente  da  República  

• Congresso  Nacional  

• Câmara  dos  Deputados/Senado  Federal  

• Mesas  de  uma  dessas  casas  

• TCU  

• Tribunais  superiores  

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• Próprio  STF  

Compete   ao   STF,   ainda,   processar   e   julgar,   em   recurso   ordinário,   o   mandado   de   injunção  decidido  em  única   instância  pelos  Tribunais  Superiores,  se  denegatória  a  decisão  (art.  102,   II,  “a”).  

" STJ   (art.   105,   I,   “h”)   –   Compete   ao   STJ   processar   e   julgar,   originariamente,   o   mandado   de  injunção,  quando  a  elaboração  da  norma  regulamentadora   for  atribuição  de  órgão,  entidade  ou  autoridade  federal,  da  administração  direta  ou  indireta,  excetuados  competência  do  STF  e  dos  órgãos  da  Justiça  Militar,  da  Justiça  Eleitoral,  Justiça  do  Trabalho  e  da  Justiça  Federal.    

" TSE  (art.  121,  §4º,  V)  –  Competência  para  julgar  em  grau  de  recurso  o  MI  denegado  pelo  TRE.  

Art.   121,   §   4º   da   CF   -­‐   Das   decisões   dos   Tribunais   Regionais   Eleitorais   somente  caberá  recurso  quando:  

V   -­‐   denegarem   "habeas-­‐corpus",   mandado   de   segurança,   "habeas-­‐data"   ou  mandado  de  injunção.  

" Estados   (art.   125,   §1º)   –   Os   Estados   organização   sua   Justiça,   observados   os   princípios  estabelecidos  na  CF,  sendo  a  competência  dos  tribunais  definida  na  Constituição  do  Estado.  

Tipo  de  controle  

O  Mandado  de  Injunção  é  hipótese  de  controle  difuso  limitado,  porque  a  competência  para  exercê-­‐lo  é  limitado  pela  CF.  

 

IV.  Parâmetro  

  Assim   como   no   caso   da   ADO,   somente   as   normas   constitucionais   de   eficácia   limitada   (não  auto-­‐aplicáveis)   podem   ser   parâmetro   de   controle,   já   que   o   controle   visa   suprir   omissões  constitucionais.    

  Segundo  a  doutrina  majoritária,  a  CF  restringe  ainda  mais  o  parâmetro  do  MI,  definindo  que  somente  quando  houver  violação  de  direitos  fundamentais  consubstanciados  em  normas  de  eficácia  limitada  será  possível  a  impetração  de  mandado  de  injunção.  

  Mas  a  interpretação  do  STF  é  muito  mais  ampla  que  a  interpretação  realizada  pela  doutrina,  já  que   ele   vem   aceitando   a   impetração   de  mandado   de   injunção   em   casos   que   não   violam   direitos  fundamentais  (a  exemplo  do  caso  do  MI  dos  juros  de  12%).    

  Para  o  STF,  qualquer  direito  constitucional  violado,  se  estiver  em  norma  de  eficácia  limitada,  pode  fundamentar  MI.  

 

V.  Medida  cautelar  

  Como   o   STF   dava   ao  MI   as  mesmas   conseqüências   da   ADO,   também   não   permitia   liminar.  Ocorre   que,   atualmente,   é   possível   cautelar   em   ADO.   Sendo   assim,   questionou-­‐se   sobre   a  possibilidade  medida  cautela.  

  Os  pronunciamentos  do  Supremo  são  reiterados  sobre  a   impossibilidade  de  se   implementar  liminar  em  mandado  de  injunção  (STF  MI  283  e  STF  MI  542).    

   

VI.  Procedimento  e  efeitos  da  decisão  de  mérito  

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  Aplica-­‐se,  analogicamente,  o  rito  do  mandado  de  segurança  (parágrafo  único  do  art.  24  da  Lei  8.038/90).  Como  não  há  norma  específica  definindo  quais  serão  os  efeitos  da  decisão  de  mérito  em  mandado  de  injunção,  existem  quatro  correntes  que  tratam  disso:  

" Corrente   não   concretista  !   o   Tribunal   não   supre   a   omissão   do   legislador   ou   do   órgão  administrativo.   O   Tribunal   não   concretiza   a   norma.   O   efeito   da   decisão   é   apenas   de   dar  ciência   ao   Poder   competente   de   sua   omissão.   Por   muito   tempo,   essa   corrente   foi   a  dominante   no   STF   (MI   107-­‐DF).   Esse   posicionamento   sofreu  muitas   críticas,   na  medida   em  que  o  MI  ficaria  esvaziado  já  que,  tendo  a  mesma  abrangência  da  ADO,  o  MI  não  realizaria  sua  finalidade   de   viabilizar   o   exercício   de   direitos   fundamentais,   na   persistência   da   inércia  legislativa.  

" CORRENTE   CONCRETISTA   GERAL   !   As   correntes   concretistas   têm,   em   comum,   o  entendimento   de   que   o   Tribunal   pode   concretizar   a   norma   que   vai   assegurar   o   direito,  suprindo   a   omissão   do   órgão   responsável.   Pode   ser   criticada   porque   o   STF   atua   como  legislador  positivo.  Essa  corrente  é  concretista  geral  porque  a  norma  criada  pelo  Tribunal  tem  efeito  erga  omnes,  valendo  para  todas  as  pessoas  que  se  encontrem  naquela  situação.    

No  julgamento  dos  MIs  670,  708  e  712,  foi  adotada  a  corrente  concretista  geral,  declarando  o  STF,  por  unanimidade,  a  omissão  legislativa  e,  por  maioria,  determinando  a  aplicação,  no  que  couber,  da  lei  de  greve  vigente  no  setor  privado  aos  servidores  públicos.  

" CORRENTE  CONCRETISTA  INDIVIDUAL  !  O  efeito  concretista  é  inter  partes.  O  STF  concretiza  a  norma  apenas  para  as  partes  envolvidas  na  impetração.    

No   MI   721,   o   STF   aderiu   a   essa   corrente,   estabelecendo   os   critérios   para   a   contagem   de  tempo  especial  apenas  para  os  servidores  que  impetraram  o  MI  (até  porque  para  cada  tipo  de  atividade  deve  haver  uma  contagem  de  tempo  especial  diferente).  

" CORRENTE  CONCRETISTA  INTERMEDIÁRIA  !  O  STF  primeiro  dá  ciência,  fixando  prazo  para  que  a  omissão  seja  suprida,  prevendo  que  se  a  omissão  não  for  suprida  no  caso  fixado,  deverá  ser   aplicada   uma   norma   concreta   criada   pelo   próprio   Tribunal.   Segundo   João   Paulo,   essa  corrente  seria  individual,  pois  os  efeitos  seriam  inter  partes.  Essa  corrente  já  foi  adotada  no  MI  232.  

  Não   é   possível   afirmar   qual   a   corrente   preferida   pelo   STF,   que   seria   definida   pelas  peculiaridades   de   cada   caso.   No   caso   da   lei   de   greve   o   STF   aplicou   a   corrente   concretista   geral  porque   já  havia  normas  gerais  a   respeito  da  questão   (ele  basicamente  determinou  a  aplicação  por  analogia  da  lei  já  existente  para  os  trabalhadores  privados).  O  mesmo  não  seria  possível  no  caso  da  contagem  de  tempo  especial  (pois  não  havia  parâmetros  legislativos  nos  quais  se  basear  o  STF).  

  Pergunta-­‐se:  a  superveniência  de  lei  regulamentadora  faz  o  Mandado  de  Injunção  perder  o  objeto?  O  Plenário  do  STF,  em  fevereiro  de  2013,  disse  que  NÃO:  

  PLENÁRIO  -­‐  MANDADO  DE  INJUNÇÃO  E  AVISO  PRÉVIO  -­‐  2  

  Devem  ser  aplicados  os  critérios  estabelecidos  pela  Lei  12.506/2011  —  que  normatizou  o  aviso   prévio   proporcional   ao   tempo   de   serviço   —   a   mandados   de   injunção,   apreciados  conjuntamente,   em   que   alegada   omissão   legislativa   dos   Presidentes   da   República   e   do   Congresso  Nacional,   ante   a   ausência   de   regulamentação   do   art.   7º,   XXI,   da   CF   (“Art.   7º   São   direitos   dos  trabalhadores  urbanos  e  rurais,  além  de  outros  que  visem  à  melhoria  de  sua  condição  social:  ...  XXI  -­‐  aviso  prévio  proporcional  ao  tempo  de  serviço,  sendo  no  mínimo  de  trinta  dias,  nos  termos  da  lei”).  A  superveniência  da   lei  não  prejudicaria  a  continuidade  de  julgamento  dos  presentes  mandados  de  injunção.   A   partir   da   valoração   feita   pelo   legislador   infraconstitucional,   seria   possível   adotar-­‐se,  para  expungir  a  omissão,  não  a  norma  regulamentadora  posteriormente  editada,  mas  parâmetros  

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idênticos  aos  da  referida  lei,  a  fim  de  solucionar  os  casos  em  apreço.  Nesse  tocante,  o  Min.  Marco  Aurélio  salientou  a  impossibilidade  de  incidência  retroativa  dessa  norma.  MI  943/DF,  rel.  Min.  Gilmar  Mendes,  6.2.2013.  (MI-­‐943).  MI  1010/DF,  rel.  Min.  Gilmar  Mendes,  6.2.2013.  (MI-­‐1010).  MI  1074/DF,  rel.  Min.  Gilmar  Mendes,  6.2.2013.  (MI-­‐1074).  MI  1090/DF,  rel.  Min.  Gilmar  Mendes,  6.2.2013.  (MI-­‐1090)  

Em   síntese:   o   fato   de   ter   surgido   lei   regulamentadora   não   faz   o  mandado   de   injunção   perder   o  objeto,  pois  a  nova  lei  não  pode  retroagir!  Assim,  devem  ser  aplicados  aos  mandados  de  injunção  em  curso  os  mesmos  parâmetros  da  nova  lei!  

 

VII.  Quadro  sinóptico  de  diferenças:  ADO  x  MI:  

  A   finalidade   da   ADO   é   assegurar   a   força   normativa   da   Constituição,   proteger   a   ordem  constitucional  objetiva.  Trata-­‐se,  pois,  de  controle  abstrato,  em  tese.  

  O  mandado  de  injunção,  por  outro  lado,  é  instrumento  de  controle  concreto.  Mais  diferenças  podem  ser  traçadas:  

ADO   Mandado  de  Injunção

Quanto  à  finalidade  

Controle  abstrato  

 

Controle  concreto

Quanto  à  pretensão  

Processo  constitucional  objetivo  

 

Processo  constitucional  subjetivo

Quanto  à  competência  

É  do  STF,  havendo  controle  concentrado.  

Não  é  qualquer  órgão  do  judiciário  que  pode  julgar  o  MI.    

Segundo  a  CF,  somente  o  STF,  STJ,  TSE  e  TRE   (arts.  102,  I,  “q”;  105,  I,  “h”;  art.  121,  §4º,  V).  Por  óbvio,  os  Estados-­‐membros  podem  criar  o  MI  em  seu  âmbito.  

Para   a   doutrina,   há,   aqui,   um   controle   difuso  limitado.

Parâmetro  

Segundo   José   Afonso   da   Silva,   apenas   normas   constitucionais   de   eficácia   limitada   (ou   não   auto-­‐aplicáveis).  

Segundo   a  maioria   da   doutrina,   somente   normas   que   consagram  direitos   fundamentais   podem   ser  parâmetro  em  mandado  de  injunção.  O  STF,  todavia,  faz  uma  interpretação  ampla  deste  parâmetro,  não  restringindo  apenas  aos  direitos  fundamentais.

Legitimidade  ativa  

A   legitimidade   ativa   é   aquela   prevista   no   art.  103  da  CF:  

Qualquer   pessoa   física   ou   jurídica   pode   ajuizar  mandado  de  injunção  (art.  5º,  inc.  LXXI).    

O  MP   também   é   legitimado,   quando   se   tratar   de  direitos   difusos,   coletivos   ou   individuais  

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I  -­‐  o  Presidente  da  República;  

II  -­‐  a  Mesa  do  Senado  Federal;  

III  -­‐  a  Mesa  da  Câmara  dos  Deputados;  

IV   -­‐   a   Mesa   de   Assembléia   Legislativa   ou   da  Câmara   Legislativa   do   Distrito   Federal;  [pertinência  temática]  

V   -­‐   o   Governador   de   Estado   ou   do   Distrito  Federal;  [pt]  

VI  -­‐  o  Procurador-­‐Geral  da  República;  

VII   -­‐   o   Conselho   Federal   da   Ordem   dos  Advogados  do  Brasil;  

VIII   -­‐   partido   político   com   representação   no  Congresso  Nacional;  

IX  -­‐  confederação  sindical  ou  entidade  de  classe  de  âmbito  nacional.  [pt]  

indisponíveis,  em  face  do  que  dispõe  o  art.  129,  II  e  III.  

Para   a   doutrina   majoritária,   órgãos   públicos   não  podem   impetrar   mandado   de   injunção.   Dirley   da  Cunha  discorda,  já  que  órgãos  podem  impetrar  MS.  

Há,   ainda,   o   mandado   de   injunção   coletivo,  segundo  entendimento  do  STF.  Os   legitimados,  por  analogia,   são   os   mesmos   do   MS   coletivo   (art.   5º,  LXX).

Legitimidade  passiva  

Segundo  o  STF,  recai,  exclusivamente,  no  órgão  ou  entidade  encarregados  da  elaboração  da  norma  regulamentadora.  Mais  ninguém  (nem  mesmo  aquele  que  irá  suportar  a  decisão,  no  caso  do  MI).  

Se  o  projeto  de  lei  for  de  iniciativa  exclusiva  ou  privativa,  a  legitimidade  passiva  do  MI  e  ADIO  será  do  responsável  pelo  projeto.  

Atenção  às  provas  de   concurso:  não  pode  a  autoridade  que  deveria   ter  elaborado  a  norma  ajuizar  essas  ações,  ainda  que  a  legitimidade  seja  concorrente.

Decisão  de  mérito  

Segundo  previsão  do  art.  103,  §2º2,  CF,  o  efeito  da   ADIO   é   apenas   o   de   dar   ciência   ao   Poder  competente   para   adoção   das   medidas  necessárias   e,   em   se   tratando   de   autoridade  administrativa,  para  fazê-­‐lo  em  30  dias  (caráter  mandamental).  

Na  ADI  3682,  o  STF  fixou  um  prazo  de  18  meses  para   que   a   omissão   fosse   suprida.   Esse   prazo,  todavia,   consistiu   em   mero   “parâmetro  temporal   razoável”,   não   se   fixando   qualquer  sanção  pela  inércia  (não  é  peremptório).  

Os  efeitos  dependem  da  corrente  adotada:  

a)  Não  concretista  

b)  Concretista  

b.1  Concretista  geral  

b.2  Concretista  individual  

b.3  Concretista  intermediária

Liminar  

O   STF   vinha   admitindo   concessão   de   medida  cautelar  só  para  o  caso  de  omissão  parcial.  Com  a  lei  12.063/09,  alterando  a  Lei  9.868,  passou  a  

 

Como   o   STF   adotava   a   corrente   não   concretista,  sempre  aderia  ao  entendimento  defendido  na  AIO:    não  cabimento  de  medida  liminar.  

2  Art.  103.  §2º  -­‐  Declarada  a  inconstitucionalidade  por  omissão  de  medida  para  tornar  efetiva  norma  constitucional,  será  dada  ciência  ao  Poder  competente  para  a  adoção  das  providências  necessárias  e,  em  se  tratando  de  órgão  administrativo,  para  fazê-­‐lo  em  trinta  dias.  

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ser   admitida   a   medida   cautelar   tanto   para   a  omissão  parcial  como  para  a  total.  

O   curioso   é   que,   apesar   de   passar   a   admitir,   em  algumas   decisões,   a   corrente   concretista,   ainda  assim   o   STF   não   admite   liminar   em   mandado   de  injunção.  

Mesmo   com   a   Lei   12.063/2009,   o   Tribunal  continuou  não  admitindo  a  medida  liminar.