MCADAM, Doug; TARROW, Sidney; TILLY, Charles. Para Mapear o Confronto Politico.

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Lua Nova, São Paulo, 76: 11-48, 2009 PARA MAPEAR O CONFRONTO POLÍTICO* Doug McAdam Sidney Tarrow Charles Tilly * Este texto é nossa contribuição conjunta ao início de um projeto que visa realizar uma síntese teórica e empírica com nossos colegas Ron Aminzade, Elizabeth Perry, Jack Goldstone e Willian Sewell Jr., com o auxílio da Andrew Mellon Foundation, que teve a iniciativa de fazer os Seminars in Studies of Foreign Areas and Cultu- res. O projeto será administrado pelo Center for Advanced Study in the Behavio- ral Sciences. Agradecemos a Jack Goldstone, Jeff Goodwin, Roger Gould, Michael Hechter, Hank Johnston, Bert Klandermas, Hanspeter Kriesi, David Meyer, Jeffrey Wasserstrom, Timothy Wickham-Crowley e Mayer Zald pelas críticas feitas às versões anteriores que nos ajudaram a clarificar o texto. Esses comentários identificaram alguns pontos em relação aos quais qualquer opção que fizéssemos iria desapontar parte de nosso público; porém confirmaram que o estudo do confronto político pre- cisava seriamente de uma síntese do âmbito – senão necessariamente do tipo – que estamos defendendo. Citamos a nós mesmos excessivamente neste texto porque ele coloca muito rapidamente alguns dos argumentos que elaboramos, documentamos e classificamos nas publicações citadas. ‘‘To map contentious politcs’’. Mobilization: An International Journal I(1), 1996, pp. 17-34. Tradução de Ana Maria Sallum. Apesar de Maquiavel e Clausewitz, nem toda política envol- ve confronto. Algumas vezes as pessoas trabalham consen- sualmente, outras vezes reúnem-se para celebrar memórias compartilhadas e frequentemente institucionalizam suas ati- vidades políticas. O confronto político tem início quando, de forma coletiva, as pessoas fazem reivindicações a outras pessoas cujos interesses seriam afetados se elas fossem aten- didas. As reivindicações vão desde súplicas humildes até ata-

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    PARA MAPEAR O CONFRONTO POLTICO*Doug McAdamSidney Tarrow

    Charles Tilly

    * Este texto nossa contribuio conjunta ao incio de um projeto que visa realizar uma sntese terica e emprica com nossos colegas Ron Aminzade, Elizabeth Perry, Jack Goldstone e Willian Sewell Jr., com o auxlio da Andrew Mellon Foundation, que teve a iniciativa de fazer os Seminars in Studies of Foreign Areas and Cultu-res. O projeto ser administrado pelo Center for Advanced Study in the Behavio-ral Sciences. Agradecemos a Jack Goldstone, Jeff Goodwin, Roger Gould, Michael Hechter, Hank Johnston, Bert Klandermas, Hanspeter Kriesi, David Meyer, Jeffrey Wasserstrom, Timothy Wickham-Crowley e Mayer Zald pelas crticas feitas s verses anteriores que nos ajudaram a clarificar o texto. Esses comentrios identificaram alguns pontos em relao aos quais qualquer opo que fizssemos iria desapontar parte de nosso pblico; porm confirmaram que o estudo do confronto poltico pre-cisava seriamente de uma sntese do mbito seno necessariamente do tipo que estamos defendendo. Citamos a ns mesmos excessivamente neste texto porque ele coloca muito rapidamente alguns dos argumentos que elaboramos, documentamos e classificamos nas publicaes citadas. To map contentious politcs. Mobilization: An International Journal I(1), 1996, pp. 17-34. Traduo de Ana Maria Sallum.

    Apesar de Maquiavel e Clausewitz, nem toda poltica envol-ve confronto. Algumas vezes as pessoas trabalham consen-sualmente, outras vezes renem-se para celebrar memrias compartilhadas e frequentemente institucionalizam suas ati-vidades polticas. O confronto poltico tem incio quando, de forma coletiva, as pessoas fazem reivindicaes a outras pessoas cujos interesses seriam afetados se elas fossem aten-didas. As reivindicaes vo desde splicas humildes at ata-

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    ques brutais, passando por peties, reivindicaes atravs de palavras de ordem e manifestos revolucionrios. O con-fronto, portanto, depende da mobilizao, da criao de meios e de capacidades para a interao coletiva. Nos prxi-mos anos, a revista Mobilization certamente dedicar muitas pginas s questes aqui identificadas, no porque falamos sobre elas agora, mas porque muitos estudiosos esto come-ando a consider-las cruciais para o futuro da teoria e da pesquisa. Com esprito de comemorao e, sem dvida, um pouco de confronto tambm saudamos aqui a nova revista, estabelecendo um programa de investigaes sobre confronto poltico.

    Adotamos o termo confronto poltico, em vez da conhecida trade movimentos sociais, revolues e ao coletiva, no apenas por economia de linguagem, mas por-que cada um desses termos est intimamente identificado com uma subrea especfica que apenas uma parte do domnio acadmico que este artigo percorre. Inclumos a interao coletiva no confronto poltico na medida em que: (1) ela envolve confronto, ou seja, faz reivindicaes vin-culadas a outros interesses e (2) pelo menos um grupo da interao (incluindo terceiros) um governo, isto , uma organizao que controla os principais meios de coero concentrados num territrio definido. Movimentos sociais, ciclos de protesto e revolues se encaixam neste mbito de fenmenos. Nosso enfoque mais amplo ajudar a relacion-los entre si, poltica institucional e mudana social hist-rica. Este prlogo prope um esforo sistemtico em favor de uma sntese terica e emprica que abarque as vrias subreas ligadas ao estudo do confronto poltico.

    Sintetizando a teoria e a pesquisa sobre confronto polticoH dois aspectos nas cincias sociais contemporneas que militam contra a sntese acadmica e a acumulao de conhecimento: (1) a natureza do trabalho acadmico, cada

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    vez mais insular e voltado para subreas; e (2) as dificul-dades inerentes e a falta de recompensas profissionais que encorajem esforos para fazer um inventrio terico/emp-rico. Juntos, estes aspectos produzem uma proliferao de conhecimentos especializados que pode acrescentar linhas ao currculo, mas pouco ao conhecimento geral.

    O estudo do confronto poltico, mais do que a maio-ria das reas de pesquisa, sofre deste mal. Os ltimos 25 anos viram uma exploso de trabalhos nesta rea, relativos ao passado ou atualidade. Estes resultaram em literaturas altamente especializadas em, pelo menos, quatro discipli-nas sociologia, histria, cincia poltica e economia com poucas oportunidades para sintetizar a teoria e a pesquisa atravs destas comunidades acadmicas cada vez mais dis-tintas. Nos ltimos anos, os estudos culturais um conjun-to emergente de percepes da antropologia, estudos lite-rrios e histria cultural tambm entraram no debate. O resultado foi um alto grau de fragmentao, de estudiosos falando ao mesmo tempo, de linguagens diferentes sendo usadas em subreas diferentes para descrever fenmenos bem similares.

    Considere-se o estudo da revoluo tal como se desenvol-veu na sociologia histrica norte-americana nas ltimas duas dcadas. As grandes revolues foram usualmente estudadas como fenmenos nicos, o que torna impossvel dizer como elas diferem das no to grandes e das rebelies, tumultos e confrontos de rotina (Goodwin, 1994; Tilly, 1993). Sua rela-o com os movimentos sociais ou com o processo poltico raramente foi abordada (Goldstone, Gurr e Moshiri, 1991). O estudo sistemtico da violncia, iniciada no despertar dos tumultos de gueto nos anos 1960, frequentemente foi visto isoladamente do estudo do protesto pacfico. O mes-mo se deu em relao s organizaes de movimentos: qua-se sempre so estudadas separadamente dos fenmenos de massa que se acredita produzi-los (ver Oliver, 1989). O estu-

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    do de grandes eventos histricos foram frequentemente realizados sem levar em conta os avanos significativos fei-tos pelos socilogos de orientao quantitativa ao estudar histrias de eventos (Olzak, 1989a; Tarrow, 1995). Greves e conflitos industriais produziram sua prpria rea de espe-cialidade, dando pouca ateno interseco entre a revol-ta dos trabalhadores e a luta poltica (ver Goldfield, 1987; Perry, 1993).

    Recentemente, ns e nossos colegas descobrimos um veculo ideal para realizar o tipo de sntese que tem faltado ao estudo do confronto poltico. Ele envolve uma parceria indita e potencialmente criativa entre a Mellon Founda-tion e o Center for Advanced Study in the Behavioral Scien-ces (CASBS). A Fundao incluiu uma srie de trs anos de seminrios no seu programa de estudos internacionais e concedeu fundos para a pesquisa e a sntese da literatura relacionada ao estudo do confronto poltico. De sua parte, o CASBS concordou em ser o responsvel institucional, sediar tais seminrios e desenvolver, no mesmo local, um projeto especial sobre o tema durante o terceiro ano da srie.

    Combinados, estes generosos recursos nos permitiro fazer, nos dois primeiros anos do projeto, uma intensa revi-so do conhecimento recente nas reas de movimentos sociais, revolues comparadas, nacionalismo, democrati-zao, ao coletiva e processos polticos relacionados. O terceiro ano ser dedicado ento redao de projetos com o objetivo de resumir e sintetizar o que tivermos aprendido com nossa pesquisa comparativa sobre o conhecimento aca-dmico relevante e atravs de contatos com colegas e com os que escreveram teses em cada uma dessas reas.

    Mais importante do que o prprio veculo a viso pro-gramtica do projeto e os objetivos intelectuais que guiaro nosso esforo. Sentimos desnimo ao constatar a estrutura fragmentada em subreas que passou a caracterizar o estu-do dos confrontos polticos, passados e atuais. Este senti-

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    mento prejudica os jovens estudiosos, que frequentemente elaboram teses sem ter contato com outros que trabalham em reas relacionadas em outras disciplinas ou sob a influ-ncia de paradigmas concorrentes. Portanto, queremos ava-liar e sintetizar o que foi feito nas literaturas que tenham relao com o confronto poltico. Se conseguirmos favore-cer a padronizao conceitual desta rea como um todo, tanto melhor. Mas visamos principalmente a identificao de analogias causais a descoberta de que processos pol-ticos ostensivamente diferentes tm, de fato, propriedades causais similares. Nossos esforos sero guiados por quatro amplos objetivos acadmicos.

    Primeiro, precisamos mapear o mbito do conhecimen-to contemporneo que seja relevante compreenso do confronto poltico. Em termos prticos, isso significa iden-tificar o conjunto de subreas na histria, na sociologia, na cincia poltica e na economia onde estejam sendo produzi-dos conhecimentos relacionados ao nosso tema.

    Segundo, tendo definido o universo de conhecimento relevante para o nosso projeto, esperamos produzir uma sntese inicial da teoria e pesquisa disponveis nas vrias subreas relacionadas s nossas preocupaes. Neste estgio preliminar do que dever ser um processo contnuo e cola-borativo, no estamos ainda em situao de afirmar nada definitivo. Ao invs, daremos simplesmente, mais adiante neste texto, vrios exemplos ilustrativos dos tipos de linhas sintticas de pesquisa que esperamos explorar nos prximos anos com nossos colegas do projeto e tambm de fora.

    Terceiro, com a sntese em mos, vamos nos voltar para a questo das condies de ocorrncia do confronto pol-tico. Isto , quo efetiva esta sntese considerada como um amplo conjunto de conceitos analticos em vez de uma teoria em si ao explicar a natureza e a dinmica do con-fronto poltico em pocas e lugares diferentes. Suspeitamos que as teorias atuais sobre o confronto poltico se sustentam

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    melhor quando aplicadas aos cenrios que foram estudados mais intensamente por especialistas em movimentos sociais democracias contemporneas dos pases centrais , e no se aplicam to bem a outras eras e regimes. Portanto, refletindo sobre o que pensamos ter aprendido sobre confronto polti-co, queremos ficar atentos s variaes no contexto e aos seus efeitos hipotticos sobre a dinmica da ao coletiva.

    Finalmente, tendo avaliado a extenso do estudo sobre confronto poltico em vrias pocas histricas e distintos con-textos polticos, queremos refletir seriamente sobre como as formas e a dinmica do protesto popular esto mudando no contexto do que alguns chamaram de poca da globaliza-o. No presumimos nada sobre estes processos. De fato, continuamos cticos em relao s verses mais fortes da teo-ria da globalizao, especialmente aquelas que descrevem o estado-nao como fadado a desaparecer a curto prazo. O que nos parece mais plausvel e mais intrigante o crescimen-to do intercmbio poltico transnacional e a possvel ascen-so de um tipo de sistema poltico regional (sendo a Unio Europeia um evidente exemplo atual) em que as naes com-partilham cada vez mais a soberania com instituies trans-nacionais e talvez at subnacionais. A questo interessante e importante : como se apresentar o confronto poltico no contexto de tal estrutura e como afetar uma herana crucial do Estado consolidado o movimento social nacional?

    Isso j demais para nossos objetivos. Vamos analis-los um de cada vez, esboando o que pensamos provisoriamen-te sobre cada um deles e fornecendo exemplos curtos em vez de anlises tericas exaustivas ou apresentaes empri-cas. Trabalharemos desta forma tanto para clarificar nosso prprio pensamento sobre tais assuntos como para solicitar um retorno crtico neste momento inicial de nosso proje-to colaborativo. Comeamos com uma investida preliminar sobre a tarefa fundamental de catalogar as pesquisas sobre confronto poltico.

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    O estudo do confronto polticoO mapeamento do estudo do confronto poltico poderia ser feito de forma abstrata ou epistemolgica. Se tomarmos a ontologia como princpio norteador do mapeamento, por exemplo, poderamos diferenciar o individualismo metodol-gico, que reduz a realidade social a aes automotivadas de atores individuais; o individualismo fenomenolgico, com sua reduo paralela da realidade social conscincia dos ato-res individual ou coletivo; as teorias dos sistemas, em que as coletividades incluindo a grande coletividade chamada sociedade seguem uma lgica autnoma e coercitiva; e modelos relacionais, em que transaes, interaes ou laos sociais so o ponto de partida da anlise. Cada uma dessas vises tem fortes representantes entre os analistas do con-fronto poltico.

    Poderamos tambm usar a epistemologia (da ctica positivista) como nosso ponto de partida; estrutura causal (de campos de variveis em interseo tomada de deci-so racional), tradies analticas (exemplo, marxista ou weberiana), ou at a escala de unidades sociais (de indi-vduos a civilizaes) poderiam ser nossas bases de classi-ficao.

    Entretanto, preferimos apresentar hipteses relativas a conjuntos (clusters) produzidos por entendimento mtuo que evidenciariam se realmente catalogamos todos os estu-dos acadmicos sobre confronto poltico durante as ltimas dcadas; ento identificamos os conceitos, argumentos, mtodos, fontes e citaes em comum resultantes. Preten-demos mapear as literaturas usualmente relacionadas ao nosso conceito central de confronto poltico.

    Um mapa do confronto polticoImaginamos que tal mapa deveria conter quatro conjuntos principais: (1) um vasto e crescente conjunto de histrias polticas agrupadas principalmente por tempo e lugar e

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    ligadas por pouca teorizao explcita1; (2) estudos teori-camente mais autoconscientes sobre mudana social local, regional e/ou de categoria nos quais o confronto poltico constitui apenas parte de uma matriz causal mais ampla; (3) anlises de polticas orientadas para o Estado como tal; e (4) tentativas de selecionar vrias formas de conflito e vio-lncia para serem explicadas em seus prprios termos. Em cada um desses conjuntos, eis alguns nomes para subdivi-ses plausveis:

    1) histrias polticas: monografias locais, regionais e nacionais agrupadas princialmente por tempo, lugar e grupo popu-lacional;

    2) mudana social definida pela geografia ou categoria: trabalho, gnero, grupo domstico e vizinhana; raa, etnicidade e religio; formao de classes, conflito de classe e ao de clas-se; conflito industrial;

    3) polticas orientadas para o Estado: movimentos sociais; redes sociais, grupos de interesse, partidos, eleies e influncia pol-tica; vida pblica e autoridade; identidade poltica, cidadania e nacionalismo; mudanas de regime, incluindo a democratiza-o e a formao do Estado; revoluo, rebelio, resistncia e protesto; guerra, poder militar, imperialismo e relaes inter-nacionais;

    4) conflito e violncia em si: banditismo, crime, policiamento e represso; violncia, poltica e outras; ao coletiva e con-fronto em geral.

    1 Este vasto domnio usualmente pensado como rea exclusiva de historiadores profissionais, mas a historiografia tem se tornado, nos ltimos vinte anos, cada vez mais explicitamente terica e as monografias puramente descritivas, anima-das por uma paixo por movimentos especficos, continuam a ser produzidas na sociologia e na cincia poltica. Importantes e recentes crticas histricas e snte-ses de trabalhos histricos sobre confronto poltico incluem Appleby e Margaret (1994), Berlanstein (1993), Cooper (1994), Hanagan (1994), Ranciere (1992) e Sewell (1992).

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    Naturalmente tal mapa pareceria mais uma galxia do que um pequeno sistema solar ordenado: em vez de qua-tro planetas bem definidos, cada um com sua geografia coerente, encontraramos nuvens de estrelas com faixas de luz entre elas. Nossa taxonomia afirma apenas uma relao escalar, no interior e entre os conjuntos: que, por exemplo, os estudantes de guerras, do poder militar, do imperialismo e das relaes internacionais compartilham mais conceitos, argumentos, mtodos, fontes e citaes entre si do que os estudantes de revolues, das rebelies, da resistncia e do protesto em relao aos especializados em trabalho, gnero, grupo domstico e vizinhana que venham a assumir o con-fronto poltico como parte de seu objeto.

    Estas distncias e distines, embora sejam uma parte natural da diviso do trabalho acadmico, so prejudiciais ao progresso da teoria social interdisciplinar e geral. Por exemplo, dentro do conjunto dois, sob o ttulo mudana social local e regional, colocamos raa, etnicidade e reli-gio, um assunto que tem atrado cada vez mais estudiosos nos ltimos anos, na medida em que a desagregao dos imprios encorajou grupos minoritrios a se mobilizarem por autonomia e, s vezes, pela destruio fsica de seus vizinhos. Mas at mesmo uma rpida olhada nas categorias do conjunto trs (poltica orientada para o Estado) indi-ca-nos que h pelo menos trs subcategorias relevantes ao estudo da etnicidade do conjunto dois: identidade poltica, cidadania e nacionalismo, mudanas de regime espe-cialmente em relao democratizao e, de forma mais notvel, movimentos sociais. Contudo, quando nos volta-mos para a literatura recente sobre conflito tnico descobri-mos que muito dela no se d conta de sua relao com a teoria dos movimentos sociais.

    Isso significa que o conflito tnico no tem a ver com movimentos sociais? Que a teoria dos movimentos sociais tem pouco a dizer sobre o conflito tnico? Ou (como suspei-

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    tamos) que a especializao acadmica deixou muitos estu-diosos dos conflitos tnicos sem informao sobre os avan-os recentes na teoria dos movimentos sociais2? Por outro lado, os tericos dos movimentos sociais do Ocidente esco-lheram geralmente movimentos mais delimitados, menos volteis para estudar do que os baseados na etnicidade e na religio. A falta de proximidade no desculpa; definies usadas pelos estudiosos dos movimentos sociais incluem claramente o conflito tnico, ainda que poucos tericos de movimentos (se que algum) tenham aplicado suas teorias para analis-los (a raa, nos moldes do movimento america-no pelos direitos civis, a maior exceo). A conexo entre os conjuntos teria um grande potencial tanto para impedir os estudiosos de etnicidade e de movimentos sociais de fala-rem sem dialogar como para construir uma cincia social dos movimentos tnicos teoricamente mais integrada.

    A longo prazo, queremos conformar ideias que per-meiem esses diversos conjuntos e literaturas; a curto pra-zo entretanto, buscamos oportunidades para relacionar duas ou trs literaturas menores de cada vez na esperana de somar mais princpios gerais neste processo. No pode-mos saber antecipadamente todas as linhas de pesquisa que sero adotadas em nosso projeto colaborativo, mas j pro-pusemos alguns tpicos que queremos explorar conjunta-mente. Nas prximas trs sees esboamos trs pares de ligaes no interior dos conjuntos para ilustrar os tipos de sntese que esperamos produzir por meio das muitas litera-turas relacionadas com algum aspecto do confronto polti-co: (1) conectando movimentos sociais, ciclos e revolues; (2) relacionando identidades coletivas e redes sociais; (3) ligando poltica institucional e ao coletiva.

    2 Mesmo Roger Brubaker, um hbil analista do nacionalismo, pesquisa o nacio-nalismo recente na Europa ps-1989 sem tocar em movimento social (ver, por exemplo, Brubaker, 1995).

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    Movimentos sociais, ciclos e revoluesUm movimento social uma interao sustentada entre pessoas poderosas e outras que no tm poder: um desafio contnuo aos detentores de poder em nome da populao cujos interlocutores afirmam estar ela sendo injustamente prejudicada ou ameaada por isso. Precisamente porque o confronto poltico constitui um terreno analtico contnuo com nada mais do que fronteiras fluidas, qualquer defini-o de movimento social provocar objees imediatas de estudiosos de reas adjacentes que se concentram nas suas semelhanas; esta definio especfica exclui as reivindica-es coletivas de poderosos em relao a poderosos, esforos coletivos para se evadir ou se autorrenovar e alguns outros fenmenos prximos que, de fato, compartilham caracte-rsticas importantes com as interaes que esto dentro das fronteiras. Ns nos concentramos nas relaes dominantes-subordinados baseados na hiptese de que o confronto que envolve uma desigualdade substancial entre os protagonis-tas tem caractersticas gerais distintivas que ligam movimen-tos sociais a revolues, rebelies e nacionalismos de base popular (bottom-up).

    As aes pblicas no interior de um movimento com-binam as demandas coletivas dirigidas s autoridades com demonstraes que asseguram que a populao em ques-to e/ou seus representantes mobilizados so merecedores, unificados, numerosos e comprometidos. At certo ponto, o nmero e o comprometimento se intercambiam; demons-traes de disposio de morrer ou matar por uma causa, por exemplo, podem funcionar para uns poucos esta a razo de fases terroristas de ciclos de protesto surgirem usu-almente no fim do ciclo, quando o comprometimento das massas j diminuiu (Della Porta e Tarrow, 1986).

    Nesses termos amplos, os movimentos sociais j existiam pelo menos desde o tempo milnios atrs em que os cultos religiosos dissidentes e rebeldes tribais se ergueram

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    contra igrejas estabelecidas e imprios. Quando surgiram os regimes parlamentares ocidentais no sculo XIX, formou-se um tipo especial de movimento social o movimento social nacional que se generalizou e rapidamente se tornou um padro fixo de lutas polticas nacionais. Comeando na Gr--Bretanha no sculo dezoito e espalhando-se inicialmente para a Amrica do Norte e para o continente europeu e, depois, atravs da imprensa, do trabalho missionrio e do colonialismo, para o Terceiro Mundo, o movimento social nacional chegou a envolver associaes, exibies simbli-cas, publicaes, reunies, passeatas, demonstraes, peti-es, grupos de presso e ameaas de interveno direta na vida poltica formal (Tilly, 1995b; Tarrow, 1994). Isso acon-tece ainda hoje.

    Os participantes de movimentos nacionais fazem rei-vindicaes s autoridades, mas tambm afirmam suas pr-prias identidades ou as das populaes em nome das quais dizem falar como atores dignos, significativos e solidrios. De fato, a efetividade dos movimentos sociais em demons-trar a presena de e formar identidades coletivas para atores sociais negligenciados ajuda a compensar sua notria ineficincia como maneira de promover programas e reivin-dicaes especficas. Afinal, historicamente, matar o coletor de impostos acaba com a coleta de um imposto odiado de forma mais imediata e definitiva do que escrever peties com o mesmo objetivo. A confiana nas estratgias de um movimento social implica confiar que a ao basicamente no-violenta e cumulativa far afinal diferena poltica.

    De fato, tal tipo de ao s faz uma diferena na medida em que ela: a) forja alianas de conscincias ou de interes-ses com membros existentes no sistema poltico; b) repre-senta uma ameaa plausvel de interromper processos pol-ticos rotineiros; c) coloca outra ameaa plausvel ou influ-ncia direta na arena eleitoral; e/ou d) provoca presso de detentores de poder externos sobre as autoridades. Assim,

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    as estratgias dos movimentos sociais prometem mais onde j existem poltica parlamentar, instituies democrticas e competio poltica duradoura.

    Ao contrrio da oposio entre identidade e interes-se, salientada por muitos intrpretes da poltica popular durante os anos 1970 e 1980, os participantes dos movimen-tos sociais nacionais sempre afirmaram algum tipo de sn-tese entre identidade e interesse. Por exemplo, a partir da teoria do valor do trabalho, no auge do sculo dezenove, os trabalhadores organizados sempre afirmaram que sua con-tribuio coletiva produo nacional no apenas justifica-va direitos a um tratamento adequado e pagamento justo por sua produo, mas tambm estabelecia suas identida-des prprias e dignas. Enquanto alguns movimentos por exemplo, o movimento das mulheres e o movimento pelos direitos dos homossexuais fazem um trabalho de enqua-dramento interpretativo (framing) (Snow et al., 1986) para o reconhecimento ou mudana de identidades coletivas, isto no uma inveno dos novos movimentos sociais dos anos 1980; ao contrrio, vemos um trabalho de cria-o de identidade acontecendo entre muitos dos grupos mais orientados por interesses no incio do sculo dezenove (Calhoun, 1994; DAnieri, Ernst e Kier, 1990).

    Ciclos e repertriosEm vez de ocorrerem separadamente, um de cada vez, os movimentos sociais nacionais frequentemente vm em ciclos de reivindicaes. Logo que os primeiros insurgen-tes do incio ao ciclo, cada vez mais demandantes dispu-tam reconhecimento e resposta. Isto continua at um ponto de intensidade mxima, depois seguido por um declnio na frequncia, no sucesso e na civilidade das reivindicaes e dos demandantes (Koopmans, 1993; Tarrow, 1989 e 1995). Mltiplos reivindicantes incluem representantes legais dos mesmos interesses, defensores dos interesses estabelecidos

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    ameaados por novas reivindicaes, defensores de interes-ses adjacentes e grupos ligados a interesses no relacionados que aproveitam oportunidades de alianas ou de presses sobre as autoridades assediadas. Como resultado, os ativis-tas se empenham muito para criar coalizes e tentar formar identidades coletivas mais amplas em torno delas, disputan-do o controle de organizaes, eliminando agendas rivais, criando expresses de apoio unificado para seus prprios programas e negociando com as autoridades.

    Tal como o confronto coletivo em geral, as aes dos movimentos sociais assumem a forma de repertrios: nme-ros limitados de desempenhos alternativos historicamente estabelecidos ligando reivindicadores a objetos de reivindi-cao (Tilly, 1978 e McAdam, 1983). Grandes desempenhos incluram a criao de associaes ou partidos de interesse especial, reunies pblicas, demonstraes, passeatas, cam-panhas eleitorais, empenho para fazer peties, presso, ocu-pao forada de terras e edificaes, programas de publica-es, formao de instituies de servio pblico e constru-o de barricadas (Traugott, 1995). Atualmente, os ativistas de movimentos sociais podem criar tambm hotlines, apare-cer em programas de televiso e organizar fruns de cor-reio eletrnico frequentemente ultrapassando fronteiras nacionais.

    Os repertrios no so simplesmente uma proprieda-de dos atores do movimento; so uma expresso da intera-o histrica e atual entre eles e seus opositores. Assim, a demonstrao pblica reprimida por ser uma ameaa ordem at 1848 na Gr-Bretanha foi aceita e regulariza-da pela prtica policial nos fins do sculo dezenove. Mais recentemente, as tticas empregadas pelo movimento ame-ricano pelos direitos civis nos anos 1950 e 1960 refletiram a disputa entre a represso e a facilitao, assim como a fora do movimento e suas vises estratgica e ttica. As autorida-des reagem difuso de um novo repertrio com represso,

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    facilitao e, em muitos casos, desenvolvendo estratgias de controle social que transformam uma nova ttica em par-te do repertrio convencional (McCarthy, Britt e Wolfson, 1991; Della Porta, 1995).

    Os repertrios existentes corporificam uma tenso criativa entre inovao e persistncia, refletindo suas lgi-cas instrumental e expressiva muito diferentes. A eficcia instrumental de um repertrio deriva basicamente de sua novidade, de sua habilidade de, temporariamente, pegar desprevenidos oponentes ou autoridades e de criar exem-plos de desordem pblica que so custosos aos interesses estabelecidos. O uso repetido do mesmo repertrio diminui sua eficcia instrumental e, desta forma, encoraja a inova-o ttica. Esta a maior razo para a escalada e a radica-lizao das tticas em muitas campanhas de movimentos, e leva os movimentos a fazerem concesses s suas faces mais radicais, condenando-os a serem descritos com sucesso como extremistas por seus oponentes e pela mdia.

    No entanto, os repertrios tm tambm uma funo expressiva cuja lgica encoraja a persistncia em vez da mudana. A lgica expressiva do repertrio raramente foi reconhecida, mas ajuda a explicar por que os repertrios convencionais persistem apesar das vantagens instrumen-tais da inovao. Especialmente durante os estgios iniciais de um ciclo de protesto, as escolhas tticas feitas por grupos desafiantes expressam sua identificao com os primeiros insurgentes e sinalizam uma definio mais ampla e inclu-siva da luta que surge. Retrospectivamente, os estudiosos podem ver um ciclo especialmente um ciclo de reforma como um conjunto de 6, 7, 8... n movimentos distintos , mas esta viso quase sempre distorce a perspectiva dos parti-cipantes na poca. Eles se consideram apenas uma parte de uma ampla comunidade poltico-cultural que se expande rapidamente lutando a mesma luta em algumas frentes relacionadas. E uma parte significativa do que une e defi-

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    ne esses vrios grupos como uma comunidade coerente sua dependncia persistente das mesmas formas modulares (Tarrow, 1994, cap. 2; Tilly, 1995c).

    Os ciclos de movimentos e os repertrios relacionam-se tambm de outras maneiras. Primeiro, dentro de um mes-mo ciclo, temas, smbolos e inovaes tticas de aes indi-viduais e grupais influenciam uns aos outros, como ocorreu quando os estudantes americanos se apropriaram da ttica de sentar-se passivamente (sit-in) e de outros quadros de ao coletiva usados pelos ativistas pelos direitos civis nos anos 1960 (McAdam, 1988). Segundo, a interao intensa de um ciclo gera oportunidades e incentivos para inova-es que so muito mais raras e mais arriscadas fora destes ciclos. Terceiro, o prprio movimento de um ciclo que vai de uma fase expansiva para uma retrao altera as situaes estratgicas de todos os participantes, mudando com isso a atratividade relativa de formas diferentes de interao, sem mencionar a proeminncia relativa de outros atores como modelos, inimigos, rivais ou aliados. Quarto, as formas de ao associadas a reunies de apoio, a obteno de publici-dade ou a presso de reivindicaes tendem a generalizar-se e tornar-se acrscimos de longo prazo aos repertrios de ao coletiva. Aquelas que so associadas de forma repetida e visvel a fracassos tendem a desaparecer.

    Os movimentos sociais se desenvolvem dentro de limi-tes colocados por estruturas prevalecentes de oportunidade poltica: as organizaes formais de governo e de polticas pblicas; a facilitao e a represso das reivindicaes dos grupos desafiantes por parte das autoridades e a presena de aliados potenciais, rivais ou inimigos afetam, de forma significativa, qualquer padro de confronto do sistema pol-tico. As organizaes de movimentos sociais, por exemplo, comumente criam estruturas paralelas quelas dos deten-tores do poder aos quais dirigem suas demandas; em geral, um Estado altamente centralizado gera organizaes de

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    movimentos mais centralizadas do que um Estado federal fragmentado (Kriesi et al., 1995). Contudo, num prazo mais longo, a ao do movimento social tambm altera as estru-turas de oportunidade, principalmente ao contribuir para mudanas nos modos conhecidos de reivindicar, nas formas de represso e facilitao por parte das autoridades e nas identidades polticas estabelecidas.

    De movimentos a revoluesEssas regularidades nos movimentos sociais sugerem para-lelos surpreendentes com as revolues. Uma revoluo uma alterao rpida, violenta e durvel do controle social sobre um Estado, o que inclui uma fase de soberania aber-tamente contestada. Podemos facilmente distinguir entre situaes revolucionrias (momentos de profunda frag-mentao do poder do Estado) e resultados revolucionrios (transferncia do poder do Estado para novos atores), con-siderando como uma revoluo completamente desenvolvi-da qualquer combinao extensiva dos dois (Tilly, 1993). As formas e temas da revoluo variam significativamente com as estruturas de oportunidade poltica: a) apresentando pretendentes dinsticos onde a dinastia tem normalmente uma sucesso definida de novos governantes e b) assumin-do formas nacionalistas onde o sistema de governo j traba-lha com populaes que demandam identidades nacionais distintas.

    As situaes revolucionrias se parecem com casos extremos de ciclos de movimentos sociais: quando aumenta a diviso no interior de um sistema poltico, todos os direi-tos e identidades passam a ser contestados, a possibilidade de permanecer neutro desaparece e a vulnerabilidade do Estado torna-se mais visvel para todos os envolvidos. Assim como a mobilizao bem-sucedida de um dos contendores do movimento social estimula as reivindicaes tanto entre os rivais como entre os aliados, os revolucionrios que rei-

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    vindicam o poder do Estado incitam mobilizaes ofensi-vas ou defensivas de grupos anteriormente inativos. Alm disso, a tomada de fato de parte do poder do Estado por um grupo altera imediatamente as perspectivas de atores retardatrios que precisam escolher entre aliana, ataque, autodefesa, fuga e desmobilizao. Consequentemente, as rivalidades, coalizes, reivindicaes e aes defensivas aumentam rapidamente. Os estudiosos do confronto, devi-do sua propenso de ver movimentos sociais e revolues como gneros separados, cada um deles com suas prprias leis imutveis, ainda no comearam a explorar esses para-lelos e interseces entre os movimentos, ciclos de protesto e revolues (ver Goldstone, 1994).

    Identidades coletivas e redes sociaisOutro segmento de nosso mapa inicial ilustrar o problema de conexes que no foram realizadas e a urgncia de reu-nir duas perspectivas diferentes sobre o confronto poltico, identidades coletivas e redes sociais. O papel da formao da identidade coletiva nos movimentos sociais, enfatizado pelas abordagens construtivista e cultural, tornou-se recen-temente um aspecto importante na teorizao sobre o con-fronto poltico3. Esta nfase logo foi ultrapassada, dado o carter distintivo da vida moderna identificado por inme-ros analistas sociais (ver, por exemplo, Berger e Luckmann, 1967, p. 64). Na sociedade pr-moderna, afirmam esses dois autores, a vida social era estritamente circunscrita devido evidente falta de mobilidade geogrfica e social. O efei-to prtico destas restries era criar uma forte equivalncia

    3 Os trabalhos de Alberto Melucci (1988 e 1989) so fontes de muitas pesquisas re-centes. Para uma excelente compilao de trabalhos sobre identidade poltica, ver Calhoun et al. (1994). De fato, esta teorizao volta at a explicao de Pizzorno e tem mais razes estruturalistas do que os defensores da recente abordagem cultural reconhecem sobre a vitalidade e espontaneidade da revolta dos traba-lhadores italianos nos anos 1960. Ver Pizzorno (1978) e o trabalho inspirado por ele em Crouch e Pizzorno (1978).

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    estrutural entre o indivduo e o grupo. De fato, na maior parte dos lugares e pocas, o indivduo vivia toda sua vida numa nica tribo ou em grupo isolado similar. Moderna-mente, sem dvida estremecemos s de pensar numa vida como essa. Os limites empricos desta vida seriam para ns um antema. Contudo, apesar de todas as bvias carncias associadas a tal existncia, no se veria entre elas uma falta de sentido e de identidade.

    Tudo isso, afirmam Berger e Luckmann, comeou a mudar com a rpida ruptura da forte equivalncia estrutural entre o indivduo e o coletivo que caracterizava a sociedade pr-moderna. Alimentada por trs tendncias a expanso do capitalismo industrial, a urbanizao e o surgimento do moderno Estado-nao esta transformao comeou no incio da Europa moderna e se acelerou nos sculos dezoito e dezenove. Os analistas j tinham notado h muito tempo o significado e o momento em que ocorreram estas tendn-cias e o papel que desempenharam na transformao da vida poltica e econmica. Entretanto, o que no se notou to frequentemente foi o que se pode denominar mudanas ontolgicas ocasionadas por elas. De modo bem simples, a modernidade, o conjunto de tendncias que libera-ram o indivduo do isolamento da sociedade pr-moderna, alterou fundamentalmente a estrutura ontolgica e a din-mica da vida social. Significado e identidade passaram a ser menos caractersticos de algum mundo da vida estvel e mais uma realizao social colaborativa.

    O que isso tem a ver com confronto poltico? A trans-formao da vida, de pr-moderna a moderna, tornou a poltica popular uma das fontes principais da construo de sentido e de identidade na vida social. Consideramos que isso uma lio duradoura de The making of the English working class, de E. P. Thompson (1964). Com isso, Thomp-son liberou a anlise de classe de sua priso produtivista, mas deixou de lado modos no classistas de formao da

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    identidade coletiva e a relao especfica entre a ao cole-tiva e a identidade coletiva.

    Mas que aes criam novas identidades? Como estudio-sos de movimentos sociais, ao coletiva e revolues ainda temos de criar uma verdadeira microbase relacional para explicar a formao de identidades coletivas novas e trans-formadas. Alguns estudiosos analisaram a interao face a face de pequenos grupos para identificar este processo, que Melucci (1988) chama de negociao de identidades cole-tivas. Mas esta microperspectiva isola o grupo face a face do movimento maior do qual parte e de suas relaes com outros significativos: antagonistas, aliados e agentes cultu-rais mais amplos que restringem e incentivam a ao cole-tiva (Snow e Benford, 1992; Snow et al., 1986). No decorrer de nosso projeto esperamos fazer da formao relacional de identidades coletivas um dos principais objetivos da sntese conceptual. Duas abordagens atuais nos do alguns indcios.

    Escolha racional e anlise de redesOs que propem a perspectiva da escolha racional esto cor-retos em salientar a importncia do estudo do ativismo indi-vidual. Enganam-se, a nosso ver, na sua concepo extrema-mente estreita e geralmente materialista de incentivos e no seu retrato do indivduo quase sempre anmico. Tem-se a imagem de um outsider isolado decidindo se vai ou no ade-rir a uma certa ao coletiva oferecida por algum tipo de empreendedor. O que falta a esta viso o grau de insero e investimento ontolgico dos indivduos em vrios tipos de estruturas e prticas sociais.

    A falha das primeiras teorias de escolha racional em reconhecer e investigar esta insero da ao coletiva dis-torceu o processo de recrutamento e agregao e deixou os estudiosos insensveis a toda uma classe de incentivos que parecem ser decisivos na maioria dos casos. Tericos mais recentes reconheceram que h diferentes problemas e solu-

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    es relativas ao coletiva. O dilema do rebelde, salien-ta Mark Irving Lichbach, tem uma variedade de solues diferentes (Lichbach, 1995, p. xii). Lichbach aproxima um pouco mais a teoria da escolha racional da insero social que vemos nos processos de mobilizao. Entre as solues que ele vislumbra para o dilema do rebelde esto os mer-cados, as comunidades, os contratos e as hierarquias.

    Por seu lado, os analistas de rede do confronto poltico salientaram a insero social e organizaram evidncias impres-sionantes do seu papel na mediao do recrutamento e agre-gao para o ativismo (Gould, 1991 e 1993; McAdam, 1986). Mas em geral calaram-se sobre a dinmica sociolgica bsica que d origem aos achados relatados... na maioria dos casos, no se oferece nenhuma teoria para explicar os efeitos obser-vados (McAdam e Dieter, 1993, p. 641). Fica-se com uma ima-gem inquietante do indivduo como um autmato estrutural, forado a agir pela fora desta ou daquela insero social.

    Os analistas de rede dos movimentos sociais nunca explicaro completamente os efeitos marcantes que seus modelos prognosticam sem abordar explicitamente a ques-to dos incentivos, motivaes e identidades coletivas.

    Podem-se fazer progressos com essas linhas. Nossa caracterizao inicial de pessoas inseridas e ontologicamen-te comprometidas em vrios tipos de estruturas e prticas sociais sugere a direo que pretendemos tomar. Supe-se que a maioria das pessoas participe da ao coletiva que est baseada nas comunidades das quais derivam os signifi-cados e identidades importantes para sua vida e bem-estar. Ao oferecer esta proposio no supomos nenhum clculo consciente da parte do indivduo. Mesmo sem avaliar cons-cientemente custos e benefcios, as pessoas agem para con-firmar ou salvaguardar as fontes centrais de significado e identidade em suas vidas, especialmente quando h mode-los disponveis na forma de repertrios e reivindicaes inseridas na histria do grupo.

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    So comuns os exemplos na literatura histrica recen-te sobre o confronto poltico: na Amrica do Norte, seria difcil explicar a rpida mobilizao e difuso do movimen-to pelos direitos civis sem reconhecer que se tornou firme-mente inserido em duas instituies as igrejas negras e as faculdades centrais para a vida e identidade dos sulistas negros (McAdam, 1982, pp. 12-31). Na Frana, os achados de Roger Gould (1991, 1993 e 1995) sobre a grande partici-pao da vizinhana na Comuna de Paris podem ser inter-pretados da mesma maneira. Aproveitando-se das fontes estruturais de sentido e identidade na vida das pessoas, os lderes da insurreio que produziu a Comuna conseguiram assegurar apoio para sua causa.

    Alm disso (e aqui nos voltamos para o potencial de construo de identidade do confronto poltico), os dois con-juntos de eventos acima descritos mudaram as identidades de forma duradoura. Quando o movimento americano pelos direitos civis declinou no fim dos anos 1960, ele fun-damentalmente mudou o significado de ser afro-america-no. De modo semelhante, embora a Comuna de Paris tenha sido implacavelmente destruda, ela deixou atrs de si um significado novo e mais coletivista do termo republicano, gerando uma insero mais profunda dessas ideias nas clas-ses mais baixas de Paris. E quando os bolcheviques de Lenin adotaram o nome Comunistas, a herana da Comuna tor-nou-se internacional.

    Esses exemplos contradizem a imagem tradicional da escolha racional de indivduos isolados optando pela ao coletiva ou abandonando-a, e ajudam a explicar por que o alardeado problema do carona (free-rider) pode no ser to problemtico no final das contas. A maior parte dos movimentos no surge porque os outsiders so induzidos a se juntar luta; ao invs, eles so agregados a partir da soli-dariedade e dos compromissos ontolgicos das estruturas primrias de mobilizao do movimento que esto, por sua

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    vez, ligadas s comunidades de identidade comunicadas por meio de redes sociais.

    Movimentos sociais e poltica institucionalNossa insistncia anterior nas continuidades entre os movi-mentos, ciclos e revolues e, na ltima seo, sobre a inser-o da ao coletiva nas comunidades e redes sociais ressal-ta uma afirmao mais bsica: a de que no h nenhuma descontinuidade fundamental entre os movimentos sociais e a poltica institucional. No apenas rejeitamos o argu-mento de que a atividade do movimento social irracional; afirmamos que tal atividade uma escolha estratgica entre outras feitas pelos atores quando a resposta mais apropria-da aos seus recursos, oportunidades e restries. A ativida-de do movimento social escolhida como uma alternativa determinada pela situao a uma variedade de outras formas de comportamento, que vo desde aes coletivas no estruturadas, organizaes de grupos de interesse at ativismo no interior de partidos polticos e instituies.

    Embora no seja controversa em si, esta afirmao con-duz a vrias outras:

    Primeiro, de que no h atores ou grupos inerente-mente orientados para movimentos sociais, mas apenas situ-aes, capacidades e restries que fazem surgir atividades de movimento social.

    Segundo, medida que essas situaes, capacidades e restries se desenvolvem, os mesmos grupos que agem nas ruas e montam barricadas podem ser encontrados em grupos de presso, escritrios de jornais e em partidos polticos.

    Terceiro, esses vrios tipos de atividades podem ser combinados no repertrio dos mesmos grupos e podem at ser empregados simultaneamente.

    Quarto, os movimentos podem cooperar com os parti-dos e grupos de interesse, competir com eles por apoio ou tentar ocupar o mesmo espao poltico.

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    Para acrescentar detalhes empricos nossa perspecti-va, considere um fenmeno como o movimento anti-imi-grao, a Frente Nacional Francesa (French National Front). Certamente, ela um partido poltico que disputa eleies, apresenta propostas polticas e busca obter cargos pblicos. Mas reflete tambm a presena difusa de milhes de france-ses que no se sentem representados e cuja identidade em formao como um movimento anti-imigrao muito evi-dente, tanto devido aos frequentes ataques fsicos a imigran-tes como pelo apoio crescente, registrado em pesquisas, a polticas anti-imigratrias. Se conceituarmos os movimentos apenas como formas alternativas e mutuamente exclusivas de partidos, seramos forados a escolher uma identidade para a Frente Nacional que ignorasse sua dupla face de par-tido e movimento e tambm a focalizar apenas um nvel de atividade e ignorar outros que no combinassem com nos-sa opo.

    Note as implicaes para os pesquisadores: os estudos que focalizam apenas movimentos, ignorando seu lugar na luta poltica como um todo, tornam difcil captar as suas mudanas relativas a apoios, tticas e objetivos porque so profundamente afetados por seus recursos, oportunidades e restries assim como por outros atores na luta poltica (Kriesi et al., 1995).

    Pode-se objetar que alguns movimentos no so instru-mentalmente orientados, como partidos e grupos de inte-resse, mas so expressivos e visam a elaborao de objetivos internos, como a formao de identidades coletivas (Cohen, 1985; Melucci, 1988). Respondemos, em primeiro lugar, que os partidos e grupos de interesse tambm tm como tarefa fundamental o enquadramento interpretativo (framing) de identidades coletivas; segundo, que as atividades expressivas dos movimentos envolvem a manifestao tanto da identi-dade como do interesse; e que, diante de estados ativos e influentes, at os movimentos autorreferidos encontram o

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    poder do Estado em alguns pontos e ajustam suas estrat-gias em resposta a isto. As identidades precisam ser reco-nhecidas para serem validadas e os estados e seus anexos so as agncias mais simbolicamente poderosas para tal reconhecimento (Calhoun, 1994, p. 21).

    Se pensssemos que os movimentos sociais so simples agregados de identidades e interesses, estaramos incli-nados a estud-los por meio de seus documentos, de suas declaraes pblicas e de sua negociao interna de identi-dades coletivas. Mas os movimentos tambm combinam as reivindicaes coletivas s autoridades com demonstraes de que a populao merecedora, unificada, numerosa e comprometida. E isso dirige nossa ateno para as aes pblicas as performances que os movimentos apresentam, tanto para marcar suas demandas s autoridades como para criar e manter seus adeptos. Em outras palavras, nossa con-cepo de movimentos dirige o foco metodolgico para o estudo sistemtico e historicamente estruturado da ao coletiva de confronto4.

    O uso de fontes pblicas disponveis sobre reivindica-es e ao coletiva permite tratar das relaes complexas e variveis entre movimentos sociais e poltica institucional das seguintes maneiras: primeiro, pode revelar os tipos de atores sociais que tendem a interagir de forma contencio-sa com estados, elites e outros atores; segundo, pode mos-trar se e como esses atores combinam formas contenciosas de ao coletiva com comportamentos mais convencionais dentro e no entorno das instituies; terceiro, pode indicar mudanas de recursos, oportunidades e restries associadas s alternncias entre formas mais ou menos contenciosas de ao coletiva; quarto, pode indicar relaes entre as aes desses atores e as de outros durante os mesmos perodos de

    4 Ver McAdam (1982), Olzak (1989a), Tarrow (1989) e Tilly (1995b) sobre discus-ses metodolgicas representativas.

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    tempo para averiguar a hiptese acima de que ciclos de pro-testo produzem quadros interpretativos de ao coletiva e uma acelerao da inovao da ao coletiva atravs de um amplo espectro de grupos sociais; quinto, pode revelar as mudanas nos padres de ao coletiva que produzem situ-aes revolucionrias e interaes entre pessoas poderosas e desafiantes que convertem essas situaes em resultados revolucionrios.

    Algumas questes esto na agenda de pesquisa relativa s relaes entre movimentos sociais e instituies polticas: Os movimentos sociais esto se assemelhando aos grupos de interesse pblico? O protesto pblico tornou-se to difundi-do no mundo ocidental que sua aceitao geral rouba sua qualidade disruptiva e, portanto, sua capacidade de estimu-lar respostas? Os processos de globalizao criaram uma aldeia global de movimentos sociais possibilitando que as teorias criadas no Ocidente possam ser aplicadas a pases no ocidentais e nos quais os movimentos sociais transna-cionais se formam e escapam s fronteiras do Estado nacio-nal? Essas questes nos levam a dois enigmas finais.

    Dois enigmas finaisPode ter ocorrido ao leitor (ocorreu aos autores h algum tempo!) que muito do que se pensou ao escrever este texto baseou-se at agora nas experincias das democracias parla-mentares ocidentais na era do movimento social nacional. Isso significa que os conceitos aqui usados dizem respeito ape-nas s democracias industriais avanadas do Ocidente? Ou apenas que no foram sistematicamente especificados e ope-racionalizados para tratar outros perodos ou tipos de regime ou ainda movimentos que transcendem o Estado nacional? Infelizmente, tal a fragmentao do campo do confronto poltico que ainda no estamos em condies de propor nem mesmo respostas provisrias a esta indagao, mas gostara-mos de colocar essas questes de forma mais completa.

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    Condies de ocorrncia do confronto polticoSeguindo intuies razoveis sobre as condies que desen-cadeiam diferentes tipos de confronto poltico, os estudiosos de coups dtat concentraram sua ateno em pases em que as organizaes militares gozam de considervel autonomia poltica; os que estudam revolues o fizeram em relao s regies agrrias em vias de se tornar industrializadas e capitalistas; estudiosos de movimentos sociais focalizaram as democracias parlamentares ocidentais; e assim por diante, atravs de uma variedade de conexes entre temas e casos. Alm de tudo, a disponibilidade de evidncias e a localiza-o dos estudiosos introduziram um forte vis nos trabalhos existentes sobre confronto poltico na Europa Ocidental e na Amrica do Norte contemporneas.

    Essas ligaes entre localizao e temas podem ser ape-nas acidentes que se relacionam a lugares onde os recursos esto concentrados ou os problemas de pesquisa so obser-vados, mas em princpio, fenmenos como revolues ou movimentos sociais podem variar de forma to significati-va em sua realizao em diferentes tempos e lugares que nenhuma regularidade emprica mereceria extrapolao. Duas questes tornam problemticas estas condies de ocorrncia: (1) em que medida as regularidades no con-fronto poltico variam no tempo e no espao e (2) em que medida a ateno desproporcional da literatura Europa ocidental e Amrica do Norte produz generalizaes enga-nadoras sobre vrias formas de confronto? Os especialistas na Somlia, Bsnia, China ou Afeganisto, por exemplo, devem avaliar que generalizaes de trabalhos anteriores podem ser transpostas com segurana para suas prprias regies. Quais as concluses que dependem tanto das cultu-ras, histrias e reformas polticas peculiares das democracias capitalistas contemporneas que no seriam vlidas fora de suas zonas de origem?

    Esta pergunta nos leva a trs respostas.

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    Primeiro, no conhecemos as condies de ocorrncia que deram base s generalizaes mais correntes sobre o con-fronto poltico, e s podemos descobri-las por meio de uma comparao deliberada e cuidadosa no tempo e no espao. (Mas certamente no as descobriremos assumindo a priori que os pases no ocidentais so inerentemente e sempre diferentes do Ocidente, resolvendo com uma proclamao culturalista a questo das condies de ocorrncia.) Pode-ramos supor que modelos de movimentos sociais e de con-flitos de classe, baseados na experincia europeia ocidental e suas extenses, falhariam se aplicados fora do mbito dos estados relativamente centralizados, burocratizados e par-lamentarizados, mas s podemos descobrir isso testando-os comparativamente em relao a modelos que tenham surgi-do da experincia no ocidental (Boudreau, 1995).

    Segundo, anlises causais slidas do confronto poltico oferecem a possibilidade de se descobrir princpios no de uniformidade, mas de variao que uma das razes de fazermos trabalho comparativo (Tilly, 1984b). Se, por exem-plo, descobrirmos que tanto os fatores desencadeadores como as formas de guerra dependem da organizao pre-dominante do poder militar em cada Estado e das relaes entre as classes dominantes de Estados potencialmente beli-gerantes, este achado nos desafiaria a estipular quo dife-rentes teriam de ser as organizaes militares predominan-tes e as relaes internacionais de classe das que observa-mos para que afetassem os desencadeadores e as formas da guerra. Achados relativos ao impacto da estrutura varivel de oportunidades polticas sobre o carter dos movimentos sociais convidam extrapolao e testagem fora das demo-cracias parlamentares nas quais geralmente esto fundados (Brockett, 1991). Em suma, os contrafactuais que inevita-velmente utilizamos ao explorar fenmenos cuja variao observamos sugerem, sem sombra de dvida, explicaes cujo mbito poderiam facilmente ultrapassar os limites de

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    nossas observaes correntes. Mais uma vez, podemos ape-nas tentar.

    Terceiro, tanto as condies de ocorrncia quanto nos-so conhecimento atual sobre elas variam seguramente para tipos diferentes de fenmeno. Grupos de interesse, partidos, eleies e venda de influncia poltica quase certamente ope-ram de forma diferente no Camboja ou no Zaire do que o fazem no Canad ou no Reino Unido. Por esta razo, expor-tar para algum outro lugar concluses baseadas na experin-cia anglo-canadense implica duplo risco. Mas, quando se trata de identidade poltica, cidadania e nacionalismo, ao menos possvel que esses fenmenos dependam suficientemente de condies mundiais para permitir uma generalizao cautelo-sa pelos continentes, ou por pocas histricas. E isso conduz ao nosso enigma final a globalizao dos movimentos.

    O mundo em processo de globalizao e movimentos transnacionais?Muito do nosso conhecimento sobre confronto poltico vem no s do Ocidente industrializado como tambm se refere aos ltimos duzentos anos o auge do que chamamos movi-mento social nacional. Reconhecemos (e escrevemos sobre isso) as diferenas entre este conjunto de fenmenos e o que o precedeu na histria ocidental (Tilly, 1983, 1984a, 1995b; Tarrow, 1994), mas apenas comeamos a considerar, com outros especialistas, as implicaes para o confronto poltico do que est sendo chamado de globalizao da poltica.

    Este no o lugar para detalhar as vrias verses e pro-priedades da tese da globalizao. As suas formas fortes5 fazem cinco afirmaes:

    5 As verses mais fortes da teoria so apresentadas pelo cientista poltico James Ro-senau (1900), que v uma nova fase de crescimento da turbulncia global desde o fim da Segunda Guerra Mundial, e tambm pelas comunicaes do especialista Michael ONeill (1993), para quem uma nova era de poder transnacional das pes-soas foi promovida pela televiso global, fax e mdia eletrnica privada.

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    Primeiro, as tendncias econmicas dominantes no final do sculo vinte caminharam para uma interdependn-cia econmica internacional.

    Segundo, o crescimento econmico dos anos 1970 e 1980 aproximaram os cidados do norte e do oeste daque-les do leste e do sul, tornando os ltimos mais conscientes de sua desigualdade.

    Terceiro, a interdependncia econmica global e a rela-tiva pobreza internacional contriburam para estimular movi-mentos massivos da populao do sul e oeste para o norte e leste. Como os imigrantes no perdem mais o contato com seus pases de origem e no podem ter esperanas de obter cidadania, permanecem estrangeiros para sempre.

    Quarto, as comunicaes globais podem estreitar os laos entre o centro e a periferia do sistema mundial. As tecnologias de comunicao descentralizadas e privadas, como os computadores conectados em rede, aceleraram o crescimento das comunicaes interdependentes globais.

    Quinto, essas mudanas estruturais possuem um con-comitante cultural: o de que vivemos num universo cultu-ralmente mais unificado, em que os jovens se vestem da mesma forma, andam nos mesmos skates, jogam os mesmos jogos de computador e ouvem o mesmo rock.

    Essas mudanas resultam na verso mais forte da tese do movimento social transnacional que tem as seguintes caractersticas gerais:

    Primeiro, as estruturas nacionais de oportunidade poltica que costumavam estruturar apenas a ao cole-tiva e reprimi-la podem estar diminuindo. O Estado nacional, incubador e centro de movimentos sociais no passado, pode no ser mais o nico a restringir ou esti-mular movimentos. Isso especialmente verdadeiro nos lugares em que os sistemas polticos nacionais concorda-ram em compartilhar a soberania como na Comunidade Europeia com instituies transnacionais (e, s vezes,

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    subnacionais) polticas e econmicas emergentes (Marks e McAdam, 1996).

    O segundo efeito suposto o declnio da capacidade dos governos de exercer controle sobre o sistema poltico nacional.

    A crescente fluidez do capital, do trabalho, das mercadorias, do dinheiro e das prticas culturais enfraquece a capacidade de qualquer Estado particular de controlar os acontecimentos dentro de suas fronteiras (Tilly, 1995a, p. 1).

    Terceiro, a capacidade de apresentar novas formas de ao coletiva tambm deve estar provavelmente crescendo. Onde a comunicao eletrnica se torna um meio para pro-pagar informaes de movimentos, h uma maior capacida-de de as pessoas em todo o mundo ganharem mais poder com pouco risco o que pode ser denominado de navega-o livre na internet (Tarrow, 1995).

    Formas de ao coletiva transnacionais pacficas e virtual-mente institucionalizadas acompanharam esta mudana: do movimento estudantil dos anos 1960 (McAdam e Dieter, 1993) s campanhas pacficas que se espalharam pela Europa e Amrica do Norte nos anos 1980 (Rochon, 1988), ao movimen-to ambiental global, que liga os partidos verdes e movimentos que ultrapassam fronteiras nacionais (Dalton, 1994), at as associaes no-governamentais que oferecem recursos para proteger os direitos e dar publicidade s injustias contra os povos nativos da Austrlia Amrica Latina (Brysk, 1993; Yashar, no prelo). Esses grupos transnacionais so cada vez mais relevantes para a poltica externa e para a poltica inter-nacional (Keck e Sikkink, 1994; Pagnuco e Smith, 1993).

    No entanto, a rpida difuso da informao, a imigra-o e at a militncia podem no ser suficientes para produ-zir movimentos globais. A histria e a teoria do movimento social sugerem alguma cautela. As razes histricas para tal

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    cuidado com a verso forte da tese transnacional podem ser resumidas em dois pontos: em primeiro lugar, a integrao da economia mundial no exatamente nova6. E, em segun-do, a expanso do capitalismo, as comunicaes e as ondas de imigrao resultantes difundiram os movimentos de forma muito similar e com objetivos semelhantes por todo o mun-do. Basta pensar nas razes europeia-orientais do movimento dos trabalhadores em vesturio criado nas oficinas opressivas (sweatshops) no Lower East Side de Manhattan nos anos 1890; ou nos movimentos socialista e anarquista que foram criados por imigrantes italianos no Chile e na Argentina.

    Isso nos leva aos achados da teoria do movimento social. Se aprendemos alguma coisa nos ltimos 25 anos de pesquisa sobre movimentos sociais que eles no dependem apenas do interesse ou da oportunidade, mas se formam atravs de redes sociais nativas nas sociedades domsticas. Afirmamos anteriormente que as pessoas aderem ao coletiva muito mais devido s redes de pessoas ligadas umas as outras por um lao interpessoal especfico do que organizao formal ou incentivos individuais. Os que defendem a tese forte da globalizao tero de mostrar que as redes transnacionais (e inevitavelmente distantes) de ativistas tm os mesmos efeitos que as redes face a face e as identidades coletivas resultantes que tinham sido as bases do movimento social nacional.

    Nem todos os movimentos prospectivos tm recursos para reagir s foras transnacionais com ativismo proporcio-nal. Vejamos, p.ex., o movimento trabalhista: no fosse por mais nada, pelo simples fato de o capital ter maior mobili-dade que o trabalho, os movimentos dos trabalhadores tm sido incapazes de reagir efetivamente interdependncia econmica global que reestruturou o trabalho em todo o mundo (Tilly, 1995a). At na Europa, onde a Unio Euro-

    6 s dar uma olhada em Age of Empire, de Hobsbawm, para concordar com ele que, no centenrio das revolues francesa e americana, o mundo tinha se torna-do genuinamente global (1987, p. 13).

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    peia parecia encorajar a cooperao transnacional, o traba-lho organizado no conseguiu combinar a taxa de cresci-mento dos negcios multinacionais com a cooperao atra-vs das fronteiras nacionais (Marks e McAdam, 1996)7.

    por isso que a verso mais fraca do movimento social transnacional pode ser mais plausvel do que a forte: ela no afirma que as instituies transnacionais emergentes ou uma expanso da capacidade de comunicao criaro automatica-mente movimentos transnacionais, mas que fornecero novas oportunidades e maiores recursos que podem transformar as redes sociais nativas em movimentos sociais nacionais. De fato, os exemplos mais relevantes no dizem respeito a movi-mentos globais com captulos nacionais, mas ao intercmbio poltico entre atores aliados cujo contato foi facilitado pela integrao econmica global e pela comunicao. Em suma, no sabemos se, no final, a globalizao tornar anacrnicos os movimentos sociais nacionais. Se o fizer, suspeitamos que a poltica institucionalizada, a interao poltica contnua e as redes sociais nativas continuaro a estruturar a dinmica do confronto poltico.

    ConclusoEsses so nossos pensamentos preliminares sobre os quatro tpicos que delineamos no incio deste texto e que ocupa-ro nossa ateno nos prximos anos. Eles deixam questes urgentes em aberto. A guerra civil, o genocdio e o conflito entre Estados pertencem ao mesmo universo terico que os movimentos sociais e as revolues? A evaso, a fuga e o que James Scott chama de formas dirias de resistncia obe-

    7 Alm disso, depender das organizaes de movimentos de pases industriais avan-ados no o melhor caminho para os ativistas dos pases do Terceiro Mundo or-ganizarem movimentos nativos. De um lado, porque seus laos com ambientalistas internacionais so frequentemente frgeis ou intermitentes (MacDonald, s.d.). De outro, porque as relaes entre dois atores quase sempre favorecem os que tm per-cia e acesso ao poder em detrimento dos que vm para ajudar. Quando os primeiros se vo, seus aliados locais podem se dispersar ou ficar mais vulnerveis represso.

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    decem s mesmas leis que o confronto coletivo manifesto? Quanto e como o confronto coletivo altera as identidades por intermdio das quais as pessoas lidam com suas rela-es sociais no dia a dia? Trabalhos recentes tornaram tais questes mais urgentes do que nunca, mas as evitamos na esperana de identificar problemas com os quais o conheci-mento atual possa lidar mais facilmente.

    Ento, como convm topografia atual do terreno inte-lectual que buscamos atravessar, nossos pensamentos so necessariamente fragmentados, parciais e, esperamos, pro-vocativos. Quisemos compartilh-los esperando estimular um dilogo contnuo, tanto com nossos colegas do projeto como, de forma mais difusa, com todos que buscam uma compre-enso mais profunda da dinmica do confronto poltico.

    Solicitamos seus comentrios e esperamos um inter-cmbio prolongado e produtivo. Que comece a conversa!

    Doug McAdam Professor of Sociology na University of ArizonaSidney Tarrow Professor of Government na Cornell UniversityCharles Tillyera University Distinguished Professor na New School for Social Research (falecido em 2008)

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    Resumos / Abstracts

    PArA mAPeAr o CoNFroNTo PoLTICo

    Doug McADAM, SiDney TARRow e chARleS Tilly Diferentes formas de confronto poltico, como movimentos sociais, revolues, mobilizaes tnicas e ciclos de protesto compartilham algumas propriedades causais, mas tais simi-laridades foram obscurecidas pela fragmentao disciplinar. Trabalhos recentes e esta nova revista Mobilization ofere-cem oportunidades para comparao e sntese. Uma rede de pesquisadores vem realizando uma ampla pesquisa sobre confronto poltico e espera produzir um mapa inteligvel do campo, uma sntese das pesquisas recentes, uma especi-ficao das condies de ocorrncia dos fenmenos para a validao das teorias disponveis e uma investigao sobre as mudanas nas caractersticas do confronto em todo o mundo. Discusses sobre 1) movimentos sociais, ciclos e revolu-es; 2) identidades coletivas e redes sociais; 3) movimentos sociais e poltica institucional e 4) globalizao e confronto transacional ilustram a promessa e os perigos do empreendimentoPalavras-chave: Confronto poltico; Movimento social; Ao cole-tiva; Rede social; Movimento transnacional.

    tO MaP cONtENtIOUs POLItIcsDifferent forms of contentious politics such as social movements, revolutions, ethnic mobilizations, and cycles of protest share a number of causal properties, but disciplinary fragmentation has obscured their similarities. Recent works and this new journal Mobilization provide opportunities for comparison and synthesis. A network of researchers is undertaking a broad survey of contentious politics in hopes of producing an intelligible map of the field, a synthesis of recent inquiries, a specification of scope conditions for the validity of available theories, and an exploration of worldwide changes in the character of contention. Discussions of

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    Resumos / Abstracts

    1) social movements, cycles and revolutions; 2) collective identities and social networks; 3) social movements and institutional politics; and 4) globalization and transnational contention illustrate the promise and perils of the enterprise.

    Keywords: Political contention; Social movement; Collective action; Social network; Transnational movement.

    As TeorIAs Dos moVImeNTos soCIAIs: um BALANo Do DeBATe

    AngelA AlonSoEste artigo apresenta as trs principais teorias de explica-o dos movimentos sociais, constitudas nos anos 1970; a Teoria de Mobilizao de Recursos, a Teoria do Processo Poltico e a Teoria dos Novos Movimentos Sociais. Em segui-da, mapeiam-se as reformulaes de que essas teorias foram objeto, seja em reao s crticas recebidas, seja para fazer face s mudanas empricas das ltimas dcadas, que acen-tuaram as dimenses cultural e transnacional do ativismo.Palavras-chave: Teorias dos movimentos sociais; Mobilizaes coletivas; Ativismo transnacional; Cultura e ao poltica.

    thE thEOrIEs Of sOcIaL MOvEMENts: a rEvIEw Of thE dEbatEThis article presents the main theories on social movements raised in the 70s: the Resource Mobilization Theory, the Political Process Theory and the Theory of the New Social Movements. Then, the article discusses how those theories had to reshape themselves to face the criticisms they received as well as the empirical transformations the activism went through during the last decades, which stressed its cultural and transnational dimensions.

    Keywords: Social movements theories; Collective mobilizations; Trans national activism; Culture and political action.

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