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Módulo 7 o papel do gestor “Fica decretado que agora vale a verdade, agora vale a vida, e de mãos dadas, marcharemos todos pela vida verdadeira.” iago de Mello . Estatutos do Homem Convivência na escola:

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Módulo 7

o papel do gestor

“Fica decretado que agora vale a verdade, agora vale a vida,e de mãos dadas,

marcharemos todos pela vida verdadeira.”

Thiago de Mello . Estatutos do Homem

Convivência na escola:

Série Formação - Programa de Formação Continuada de Gestores de Educação Básica - PROGED - ISP - UFBA

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Rede Nacional de Formação e Desenvolvimento da EducaçãoCentro de Pesquisa e Desenvolvimento da EducaçãoÁrea: Gestão e AvaliaçãoPrograma de Formação Continuada de Gestores de Educação Básica (PRoGED)

Coordenador GeralRobert Evan Verhine

Coordenador ExecutivoPaulo Cezar Vilaça de Queiroz

Coordenadora da Ação 01Ana Maria de Carvalho Luz

Coordenadora da Ação 02Patrícia Rosa da Silva

Série Formação Vol. 3Módulo 7: Convivência na escola: o papel do gestorElaboração do texto gerador:Feizi M. MilaniElaboração do módulo:Ana Maria de Carvalho LuzLeitura crítica do módulo: Bela Szaniecki P. SerpaErica BastosGilmara CarvalhoTércio Riosorganizadores:Ana Maria de Carvalho LuzPatrícia Rosa da SilvaFernanda Alamino do AmaralDiagramação e projeto gráfico:Fernanda Alamino do AmaralFoto da capa:Daniel Lobo

Presidente da República do BrasilLuís Inácio Lula da Silva

Ministro da EducaçãoFernando Haddad

Diretora do Departamento de Políticas de Educação Infantil e Ensino FundamentalJeanete Beauchamp

Coordenadora Geral de Políticas de FormaçãoRoberta de Oliveira

Universidade Federal da BahiaReitorNaomar Monteiro de Almeida Filho

Vice-ReitorFrancisco José Gomes Mesquita

Pró-Reitor de ExtensãoEugênio de Ávila Lins

Pró-Reitora de Planejamento e AdministraçãoNádia Andrade de Moura Ribeiro

Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-GraduaçãoAntônio Alberto da Silva Lopes

Pró-Reitor de GraduaçãoMaerbal Bittencourt Marinho

Pró-Reitora de Desenvolvimento de PessoasJoselita Nunes Macedo

Centro de Estudos Interdisciplinares para o Setor Público (ISP)DiretorAntonio Virgílio Bittencourt Bastos

Gestão de Unidades Escolares. -[recurso eletrônico] / ISP /PROGED / UFBA. Programa eletrônico. Salvador : ISP, 2008. 1 CD ROM: il ; 43/4 pol. + encarte: il;1 folha solta dobrada; 42 x 30 cm . (Série Formação; n. 2). Sistema requerido: Windows 98, 2000, XP ou Vista; Adobe Reader 6.0 ou versões compatíveis, com atualização gratuita no próprio CD. E-books. Série Formação; n. 3, foi baseada na Série Seminários Organização: Ana Maria de Carvalho Luz, Patrícia Rosa da Silva e Fernanda Alamino do Amaral. Tamanho do CDs: 5,71Mb

Conteúdo: 1 CD com E-books: 1. E-book 1 - A qualidade social da educação escolar 2. E-book 2 - Organização e gestão da escola: planejamento e avaliação 3. E-book 3 - A construção do projeto político-pedagógico da escola 4. E-book 4 - A avaliação da aprendizagem na escola 5. E-book 5- Gestão de pessoas e do ambiente físico da escola. 6. E-book 6 - Autonomia financeira das escolas. 7. E-book 7 - Convivência na escola: o papel do gestor. 8. E-book 8 - Sobre todas as coisas... I. Título. CDD: 371.3

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Caro Cursista

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A questão da convivência dentro das escolas tornou-se um dos gran-des desafios para gestores e educadores. Em muitos países, incluindo o Brasil, situações de violência, racismo, discriminação e exclusão têm afetado a segurança e o bem-estar dos integrantes da comunidade escolar e desfeito a imagem idealizada da escola como um ambiente neutro e isento desses tipos de conflito.

Este módulo analisa essa situação, sinalizando questões a serem consideradas pela equipe gestora, com vistas à promoção de uma cul-tura de paz no contexto escolar.

São questionadas concepções a respeito dos papéis do gestor, da escola e do educador, bem como sobre a questão da autoridade e do poder, presentes em muitos discursos no meio educacional. Enfatiza-se a importância do ambiente escolar na formação do educando e propõem-se alguns princípios norteadores para o trabalho educativo. Por fim, é delineada uma estratégia pedagógica inovadora – a cons-trução coletiva de um Pacto de Convivência ou Combinado, como compromisso grupal – proposta pelo Professor Feizi M. Milani.

Esse é o tema deste módulo: a convivência na escola. Esperamos que as reflexões propostas consigam indicar caminhos para a compre-ensão e a superação desse problema. Você aceita o desafio proposto no poema acima? Então vamos lá, marchemos de mãos dadas.

Bom trabalho!

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Sumário

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Violência e cultura de paz na escola: o que dizem as pesquisas?• Reflita / 6 /

Como se apresenta a convivência na escola?• Analise / 8 /

Como superar o fatalismo, criando uma visão de futuro?• Pense / 10 /

Que conceitos e preconceitos existem a respeito da escola?• Cabe ao gestor resolver (sozinho) os problemas da escola / 10 /• Os pobres são violentos / 11 /• Manda quem pode, obedece quem tem juízo / 12 /• A transmissão de conteúdo é o eixo central do processo educativo em sala de aula / 13 /• Analise / 14 /

Que princípios podem fundamentar novas práticas de gestão?• A relação entre educador e educando / 14 /• Co-responsabilidade pelo processo educativo / 15 /• Valorização do ambiente escolar / 15 /• A ênfase no processo, mais de que nos resultados esperados / 15 /• Reconhecimento e valorização / 16 /• Protagonismo infanto-juvenil / 16 /• Pense / 16 /

Como construir um Pacto de Convivência na escola?• Analise / 19 /

Atividades do módulo 7• Opine / 20 /

Referências bibliográficas

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Violência e cultura de paz na

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Em pelo menos 23 países, a questão da violência nas instituições escolares chegou a ser considerada um “fenômeno de sociedade” (SANTOS, 2001). Apesar das evidentes interações entre a vida esco-lar e o contexto sociocultural de violência, a escola brasileira ainda de-senvolve “uma pedagogia (…) que nega a realidade e que prepara para um mundo que não existe, ou melhor, não prepara para o que exis-te” (COSTA, 1993a). Tal alienação é um dos fatores causais da vul-nerabilidade das escolas públicas de nosso país: 55,6% delas sofrem problemas de roubo, furto, vandalismo e agressão ao patrimônio, no mínimo uma vez ao mês. Em contraste, a segurança é mais efetiva naquelas escolas em que a comunidade se apropria desse espaço pú-blico e há uma maior participação em seu cotidiano. Pesquisadores que coordenaram um mapeamento sobre esse problema concluíram que “onde a participação na vida da escola é maior, onde se efetiva de algum modo à apropriação desse espaço público pela comunidade, a segurança da escola pública é maior. (...) É a carência de exercício da cidadania o que ameaça a escola pública brasileira: a interiorização de que essa escola nos pertence e que por isso temos o dever de protegê-la, de não destruí-la.” (COSTA, 1993a)

Pesquisas demonstram que estudantes que evadem da escola, fal-tam às aulas ou têm uma pobre auto-imagem acadêmica apresentam maiores probabilidades de se engajar em comportamentos de risco para a sua saúde e de violência, enquanto “intervenções que aumen-tam as conquistas acadêmicas dos estudantes e o tempo de escolari-zação podem reduzir a incidência da violência durante a infância e posteriormente” (McALISTER, 1998, p.40). Os resultados de um estudo conduzido no Brasil vão na mesma direção, sugerindo mesmo que “a inserção escolar pode representar um fator significativo de pro-

teção contra o envolvimento com gangues, bem mais relevante do que a inserção no trabalho” (Abramovay, 1999, p.103).

Apesar de as escolas assumirem um discurso de rejeição à violência, Minayo e colaboradores (1999) identificaram três atitudes distintas que adotam, diante de situações de violência: • quando ocorre no âmbito doméstico, as escolas se

escola: o que dizem as pesquisas?

Saiba maisMinayo e colaboradores:

MINAYO, M.C.S.; et alli. Fala, ga-

lera: juventude, violência e cidada-

nia. Rio de Janeiro: Garamond, 1999.

238 p.

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omitem; • quando cometida por aluno(s), reprimem; • quando cometida por professor, minimizam ou acobertam.

Em outras palavras, a escola utiliza três pesos e três medidas para lidar com comportamentos violentos, a depender de quem seja o au-tor da violência. Isso, evidentemente, é injusto e não é ético. É um exemplo, dentre tantos outros, de como a própria instituição pode cometer violências e contribuir para o seu agravamento.

Assis (1999) realizou um estudo em profundidade, que comparava jovens presos por haverem cometido graves atos infracionais (homi-cídio, roubo com homicídio, tráfico de drogas, estupro etc) com seus irmãos ou primos que nunca cometeram qualquer infração, em duas cidades brasileiras. A autora identificou oito variáveis significativa-mente associadas à infração, das quais sete podem ser influenciadas pela escola:

• consumo de drogas;• círculo de amigos ;• tipos de lazer;• auto-estima;• princípios éticos (reconhecimento de limites entre o certo e o errado);• vínculo afetivo em relação à escola (ou aos professores);• violência perpetrada pelos pais.

Das referidas variáveis, a sexta é explicitamente vinculada à escola. Em relação às outras, o papel que a escola desempenha é relevante, podendo constituir-se em fator de risco ou de proteção. Há escolas que contribuem efetivamente para a formação de cidadãos e a pre-venção da violência, enquanto outras, por não assumirem sua mis-são ou não atuarem de forma consistente e continuada, terminam se tornando mais uma peça no quebra-cabeça da exclusão, violência e marginalização.

ReflitaAgora, reflita: na sua opinião quais as principais causas da violência na escola?

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Como se apresenta a

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Defrontados com esse cenário, muitos gestores e professores têm reagido com o tradicional arsenal de ameaças, repressão, punições e expulsões. Mal se dão conta de que o abuso dessas medidas é um dos fatores causais do quadro de desrespeito e antagonismo entre estu-dantes e professores. As posturas autoritárias, as reações arbitrárias e a imposição de regras e proibições mais rígidas terminam por agravar as relações interpessoais, gerando indisciplina e insatisfação em um grau maior ainda.

Há casos em que o quadro se deteriora, rompendo-se a linha do respeito entre educandos e educadores. Esses últimos sentem-se insa-tisfeitos, impotentes e amedrontados por ameaças recebidas de alunos ou pelos riscos de ir e vir ao seu local de trabalho. Os pais de alunos, por sua vez, sentem-se preocupados, pois já não reconhecem na esco-la um ambiente seguro para seus filhos.

Diante desse quadro, cabe a cada instituição de ensino questionar-se:

1. A escola desenvolve um programa de prevenção ao abuso de drogas, ou adota uma postura de negação ou repressão? 2. Ela promove a integração entre os educandos, ou não percebe a si mesma como um espaço e agente de socialização? 3. A escola oferece atividades de lazer supervisionadas por educadores?4. Os professores atuam conscientemente para fortalecer a auto-estima de todos os estudantes, ou limitam-se a elogiar apenas os “bem-comportados”? 5. Os valores éticos são trabalhados em sala de aula, ou a priori-dade absoluta é a transmissão de conteúdos? 6. Gestores e professores têm respeito pelos estudantes e genuíno interesse por seu desenvolvimento, ou limitam-se a cumprir suas obrigações formais?7. Há efetiva participação de estudantes e de pais nos processos decisórios da escola? 8. A escola trabalha em parceria com as lideranças e organizações da comunidade, ou se mantém isolada? 9. Os casos de estudantes com indícios de haverem sofrido violência doméstica são denunciados ao Conselho Tutelar, ou a escola se omite?

convivência na escola?

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GlossárioFatalismo:Segundo Abbagnano (1998),

fatalismo é “a atitude de quem se entrega aos acontecimen¬tos, sem procurar alterá-los nem reagir”.

Profecia autorealizável:Juízo de valor prévio a um

acontecimento, emitido em função de uma idéia preconce-bida, e que pode ser incorpo-rado pelos sujeitos envolvidos, determinando, de forma não consciente, modificações no seu comportamento e fazendo com que a idéia preconcebida ou profecia se realize.

Sinergia:Ação simultânea, em comum.

10. A escola atua junto aos pais, buscando prevenir maus-tratos e negligência, ou limita-se a criticá-los por não saberem educar seus filhos?

AnaliseNa sua unidade escolar, diante de situações de conflito ou violência, quais são as medidas adotadas

para resolução dos problemas?

Como superar o fatalismo,

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criando uma visão de futuro?As dificuldades enfrentadas no exercício da profissão de professor

e no processo de gestão escolar têm levado muitos educadores a uma perspectiva fatalista, segundo a qual acreditam que, se as coisas estão assim, é porque sempre foram assim e assim serão para sempre, nada havendo que se possa fazer para melhorar a situação. O fatalismo é um modelo mental no qual se mistu-ram ceticismo, pessimismo e imobilismo. O proble-ma é que, ao adotar essa forma de pensar, sentir e atu-ar em relação a uma determinada questão, as pessoas se acomodam e aguardam passivamente o desenrolar dos fatos. Depois, quando constatam que as coisas pioraram, usam isso como “prova” de que esta-vam corretas. Como todo modelo mental, o fatalismo tem o poder de uma profecia autorealizável.

O fatalismo é, em muitos contextos escolares, o primeiro e principal desafio a ser superado. Qualquer mudança que implique melhoria depende da exis-tência e do cultivo de um estado de espírito caracte-rizado pela motivação, determinação, perseverança e paciência. Quando esse espírito é norteado por uma compreensão clara e precisa da situação que se dese-ja construir, surge a criatividade e o compromisso. Se a visão do futuro desejado é compartilhada por várias pessoas, geram-se a sinergia e a aglutinação de novos apoiadores. Quanto maior a mobilização

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da comunidade escolar com uma visão compartilhada, maiores são as chances de êxito. Entretanto, há casos em que uma única pessoa demonstrou tamanha garra e coragem que foi capaz de desencadear significativas mudanças coletivas, a partir de uma visão pessoal.

A visão que está sendo proposta considera a sala de aula como um ambiente em que há relações de respeito mútuo, confiança e afeto, além de participação, curiosidade e criatividade, bem como de liber-dade disciplinada por limites justos e claros, estabelecidos de comum acordo entre professor e estudantes. Ou seja, almeja-se construir uma convivência saudável, democrática e participativa dentro das escolas, que respeite tanto a autoridade do gestor e dos professores, quanto à dignidade e a autonomia dos estudantes. Hoje é consenso que há necessidade de uma gestão participativa que garanta a democratiza-ção das relações. No discurso, isso é simples e fácil. Concretizar na prática, é desafiador, complexo e profundamente enriquecedor.

A construção desse ambiente é importante não apenas do ponto de vista emocional e psicológico, mas também para que o aprendizado se processe, como ressalta Zabala (1998): “Para aprender é indispensável que haja um clima e um ambiente adequados, constituídos por um marco de relações em que predominem a aceitação, a confiança, o respeito mútuo e a sinceridade” (grifo nosso).

Quando se conquista um ambiente assim, o professor se sente va-lorizado e respeitado, motivado a dar o melhor de si, e feliz ao cons-tatar o progresso dos estudantes. Em resumo, sente-se realizado como pessoa e profissional. Ele descobre que o tempo e a energia investidos em alcançar esse objetivo valeram a pena, pois a aula flui com mais tranqüilidade, os atritos com e entre estudantes se reduzem, o desper-dício de tempo com questões de indisciplina é minimizado. Ao invés de terminar a aula estressado e frustrado, o professor constata que a classe está aprendendo melhor.

O estudante, por sua vez, sente-se livre e seguro nesse ambien-te. Livre para agir dentro de limites estabelecidos com sua própria participação; seguro, por saber que seus direitos são reconhecidos e respeitados, tanto por seus colegas quanto pelo professor. Liberdade e segurança permitem que as potencialidades do estudante floresçam e contribuem para que ele descubra o prazer de aprender, na medida em que não teme se expressar, cometer erros, fazer perguntas ou to-mar iniciativas. As relações interpessoais, em sala de aula, vão se tor-nando cada vez mais respeitosas, cooperativas e solidárias; os conflitos são resolvidos através do diálogo e da negociação.

Em síntese, o ambiente que almejamos permite que a escola e o educador cumpram a sua missão: a construção do conhecimento e a formação do ser humano em sua integralidade.

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PenseQue traços caracterizam o ambiente educativo que você está inserido?

Que conceitos e preconceitos

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existem a respeito da escola?O primeiro passo a ser dado, por parte de qualquer gestor ou edu-

cador que deseje atuar de forma eficaz e consistente na promoção de uma Cultura de Paz, é rever seus conceitos e preconceitos em relação a essa temática. Afinal, ações e discursos fundamentam-se em cren-ças, valores e justificativas que, usualmente, permanecem ocultos, implícitos. O problema reside no fato de que, na maioria das vezes, o indivíduo não tem consciência dos fundamentos do seu próprio raciocínio e do seu comportamento.

Em se tratando de violência e Cultura de Paz, é im-prescindível questionar os fundamentos, implícitos ou explícitos, de algumas posturas e propostas ainda presentes embora subjacentes nos discursos de alguns profissionais de educação. Por isso, nos próximos pa-rágrafos buscaremos explicitar e analisar quatro pre-missas , através de afirmações que aparecem no dis-curso de educadores.

Cabe ao gestor resolver (sozinho) os problemas da escola É impossível ao gestor, isoladamente, “resolver” a questão da vio-

lência escolar. Os problemas da comunidade escolar precisam ser pensados, discutidos e enfrentados coletivamente. Melhor seria que o gestor se reconhecesse como líder de uma comunidade que inclui alunos, professores, funcionários, dirigentes, famílias dos alunos e os moradores do bairro. Cabe a ele sensibilizar, mobilizar, ouvir, articu-lar, integrar, negociar, visando a construir a unidade dessa coletivida-de através da participação.

A participação pressupõe o reconhecimento do outro como cida-dão e co-responsável pelo bem-estar coletivo, como pessoa capaz de contribuir para melhorias sociais. Uma importante barreira à parti-cipação é a premissa de que os segmentos marginalizados não têm como contribuir para a transformação da sociedade, cuja origem está

GlossárioPremissas:Fato ou princípio que serve

de base para um raciocínio.

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no preconceito de que os “ignorantes” são destituídos de capacidades, na “piedade” de que os “pobrezinhos” já foram submetidos a tantos sofrimentos que agora merecem receber tudo graciosamente. É pre-ciso, portanto, que dirigentes públicos, gestores e professores estejam convencidos de que ninguém é tão “pobre”, “ignorante” ou “inexpe-riente” que não tenha alguma riqueza, conhecimento ou capacidade a oferecer para o aprimoramento da instituição.

A conduta ou o modo como o gestor trata os demais integrantes da comunidade estabelece um padrão que tende a ser reproduzido nas demais relações dentro da escola. Isso significa que não basta que o ges-tor adote um discurso democrático e inclusivo. O seu bom exemplo é essencial para o sucesso de qualquer iniciativa que vise a criar na escola um ambiente de maior respeito e cooperação. Se não for assim, a escola passa a ser percebida apenas como um prédio, um endereço, e não como uma instituição viva que integra a comunidade e com ela interage.

os pobres são violentosA associação mecânica entre pobreza e violência está vinculada a

duas crenças: (a) violência é um fenômeno exclusivo ou característico das classes pobres; (b) pobreza é causa de violência. Tais crenças ali-mentam a falsa expectativa de que adolescentes oriundos de famílias de baixa renda serão mais violentos.

Uma análise mais cuidadosa dessas crenças revela tratar-se de arrai-gados preconceitos ou mitos que as elites brasileiras têm em relação aos excluídos. Peralva (2001) comprova que “os estados e os municí-pios mais pobres [do Brasil] são exatamente aqueles onde há menos violência”. Damacena & Arnaud (2001) denunciam que “a associação entre pobreza e crime, na qual o crime é derivante da pobreza, não representa apenas uma tendência da sociologia, mas continua a fazer parte do enraizado senso comum, tanto de ‘direita’ como de ‘esquer-da’, seja para discriminar, criminalizar e condenar, seja para justificar e absolver, ou, pelo menos, mudar o centro da discussão”

A bem da verdade, é preciso reconhecer que: (a) a violência se faz presente em todas as classes sociais, faixas etárias e grupos étnicos; (b) a pobreza, pos si só, não é causa de violência.

As disparidades econômicas, a exclusão social e a falta de perspec-tivas são expressões de violência estrutural, bem como fatores causais da violência interpessoal. McAlister (1998) confirma: “embora a po-breza não seja uma causa direta de crime, intervenções que reduzem a pobreza podem reduzir os conflitos e aumentar a esperança de forma que podem reduzir a violência nas cidades americanas”.

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Manda quem pode, obedece quem tem juízoEsse chavão é repetido com freqüência dentro das escolas brasi-

leiras, e revela uma visão de mundo centrada no poder – um man-da, e aos demais resta obedecer. Fundamenta-se no autoritarismo e faz uma ameaça velada a quem “ousar” desobedecer. Quem acredita nessa frase desconhece a diferença entre poder e autoridade. Gesto-res e professores têm autoridade, mas o poder reside no alunado, da mesma forma que os governantes recebem do povo a autoridade para administrar o país e garantir os direitos de todos os cidadãos.

AUTORIDADE é o direito outorgado a alguém para conduzir a realização de uma tarefa. Esse direito implica deveres: respeitar o grupo, agir com justiça e ética, cuidar do bem-estar coletivo e prestar contas. A autoridade do gestor escolar lhe é outorgada pela Secretaria de Educação, pelos professores e funcionários, pelos pais, pelos estu-dantes e, em última instância, pela sociedade, cabendo-lhe conduzir o processo educativo que compete à escola.

PODER é a capacidade de agir, de realizar, de transformar idéias e planos em ações concretas. O poder está nas massas da humanidade e de cada instituição, não em seus dirigentes. Uma evidência disso são os inúmeros programas que os governantes lançam e tentam im-plementar, mas não saem do papel, porque aqueles que têm o poder efetivo não se sentem comprometidos.

Vejamos a diferença entre chefe e líder. O chefe acha que todos de-vem obedecê-lo de forma automática, sem contestação. Não se preo-cupa em estabelecer vínculos com seus comandados, não dialoga nem ouve as opiniões alheias, não explica suas decisões. A comunidade es-colar se sente frustrada e insatisfeita, mas não encontra abertura para expressar isso. A conseqüência é que a equipe cumprirá apenas com suas obrigações, sem se envolver verdadeiramente. Então, o chefe pas-sa a cobrar, reclamar, criticar, ameaçar, exigir mais e punir. A insatisfa-ção das pessoas aumenta, e os resultados pioram. Já o líder reconhece que depende inteiramente da comunidade escolar para o sucesso da tarefa que lhe foi outorgada. Ele sabe que o ser humano só age com sincera motivação quando se sente respeitado, valorizado e envolvido. Por isso, sua prioridade não é dar ordens, mas encontrar meios para estabelecer uma boa relação com a comunidade e com cada um de seus integrantes. Tem consciência de que, para conquistar a confiança, terá de demonstrar vera-cidade, honestidade, eqüidade e diálogo. As decisões são, em geral, tomadas com a participação do grupo, considerando as opiniões e sentimentos das pessoas.

O AUTORITARISMO é o abuso da autoridade, com o objetivo de dominar o outro. É uma deturpação

GlossárioEqüidade:Disposição de reconhecer i-

gualmente o direito de cada um.

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da autoridade, pois o poder decisório é centralizado em uma pessoa, e sua vontade é imposta sobre o grupo. A excessiva centralização dá

margem a arbitrariedades e, como o autoritário não sabe escutar, a ausên¬cia de diálogo favorece a ocor-rência de injus¬tiças e abusos Perrenoud (2000).

A transmissão de conteúdo é o eixo central do processo educativo em sala de aula

Muitos professores estão obcecados em transmitir os conteúdos curriculares, e acham que trabalhar os valores humanos, a ética e a cidadania é perda de tempo. Entretanto, quando essas questões não são trabalhadas, os conteúdos tornam-se informações vazias, dissociadas, sem sentido. Quando uma coisa não faz sentido, o ser humano não consegue apren-der. Nas escolas em que todos os esforços são con-centrados na transmissão de conteúdos conceituais, cada professor se ocupa apenas com a “sua” discipli-na e esquece que o educando é um ser integral, que precisa se desenvolver por inteiro para se tornar, verdadeiramente, humano.

Os professores que acreditam nessa premissa rejeitam qualquer proposta de um trabalho edu-cativo diferenciado (abrir espaço para que os alu-

nos troquem opiniões, desenvolver projetos transversais, realizar atividades extra-muros, ou adotar metodologias mais criativas), por imaginarem que estarão “perdendo tempo” ao abandonar o púlpito de onde pretendem inundar os cérebros de seus alunos com infor-mações.

Para que o ensino se torne significativo e envolvente, é urgente que o sistema educacional e cada educador reconheçam o ser huma-no em sua multidimensionalidade, abrangendo o físico, o mental, o emocional e o espiritual. Só assim o ensino passará a ter significado e sentido. A obsessão “conteudista” impede a escola de transformar-se, bem como de contribuir para qualquer processo de transformação pessoal ou social.

Numa escola em que cada um cuida apenas da “sua parte” e nin-guém se dedica a promover o processo global de formação, instala-se uma cultura de violência simbólica. Por essa razão, mesmo tendo percorrido toda a trajetória escolar, muitas pessoas carregam intactas crenças e atitudes racistas ou machistas, práticas antiéticas, posturas de intolerância. Até quando insistiremos na tolice de que a capacita-ção técnica para inserir o jovem no mercado de trabalho é o objetivo maior da escola? Quando é que os alunos receberão uma capacitação moral e emocional que os insira na vida?

Saiba mais

Perrenoud (2000):Ao abordar esta questão, afirma

que os abusos que vêm logo à mente

chamam-se brutalidade ou pedofi-

lia. Sem desconsiderar tais fenôme-

nos, menos raros do que se poderia

crer, é importante não esquecer os

“pequenos abusos de poder”, os

“pequenos deslizes”. Palavras ofen-

sivas, ingerência indevida no traba-

lho pessoal, perguntas indiscretas,

julgamento global sobre uma pes-

soa ou sua família, prognóstico de

reprovação, punições coletivas são

violências menores. Não é assim

tão grave, talvez se diga, em compa-

ração com os sádicos e os doentes

que dependem da máquina judici-

ária. No entanto, as violências coti-

dianas no exercício banal do ofício

deveriam preocupar-nos. (p.151-2)

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Que princípios podem

AnaliseDas quatro premissas acima citadas, existe alguma que se identifique com as posturas adotadas na

escola onde você trabalha?

fundamentar novas práticas de gestão?

Agora, que já analisamos algumas premissas ocultas ou subjacentes aos discursos sobre a educação, precisamos definir princípios ou dire-trizes que podem nortear o trabalho do gestor como educador.

A relação entre educador e educando O segredo da educação, como processo capaz de transformar o ser

humano, reside no vínculo que se estabelece entre educador e edu-cando. Quando essa relação é fundamentada no afeto, no respeito, no diálogo, em limites e na confiança, torna-se fonte de crescimento e realização para ambas as partes. O impacto que o educador exerce na vida dos estudantes pode ser profundo e duradouro. Prova disso é que qualquer adulto se recorda facilmente dos professores e gestores que marcaram a sua experiência estudantil – quer de forma positiva, quer negativa.

A colocação de limites é uma das tarefas primordiais de todo edu-cador. Não se trata de estabelecer uma lista de proibições e negações, mas a de garantir o bem-estar e a segurança de todos. Os limites pre-cisam ser claros, objetivos, lógicos, justos e coerentes. Precisam tam-bém ser negociados com a comunidade e compreendidos por todos.

Ao reconhecer o seu dever de respeitar os educandos e demais inte-grantes da comunidade escolar, o gestor está se dando conta dos limi-tes que ele próprio não pode transgredir – a dignidade e a auto-estima das pessoas têm que ser preservadas. Serrão e Baleeiro (1999) explicam que respeitar alguém significa respeitar sua individualidade, suas for-mas de expressão e imagem, suas origens, suas escolhas, suas opiniões, seus limites e seus sentimentos. Respeitar não implica em concordar com o outro ou elogiar qualquer tipo de conduta. Significa não ter o direito de desqualificar, menosprezar, ridicularizar, oprimir ou impor.

Para se construir o diálogo, é preciso aprender a ser um ouvinte

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ativo. Professores e gestores foram treinados e se habituaram a falar e, por isso, a maioria não escuta com a necessária proficiência. Escutar ativamente é muito mais do que simplesmente permitir que o outro fale; é concentrar a sua atenção em tudo aquilo que o outro expressa – em suas palavras, olhar, expressões faciais, tom de voz, gestos, postura corporal, respiração, nas entrelinhas e nos silêncios – com o sincero desejo de compreendê-lo.

Co-responsabilidade pelo processo educativoTodos os envolvidos no trabalho educativo precisam ser reconhe-

cidos e reconhecerem-se a si próprios como co-responsáveis pelo processo e pelos resultados. Isso certamente inclui os educandos. Co-responsabilidade significa que gestor, professor e estudante são responsáveis pela construção do conhecimento. Cada qual tem o seu papel, suas atribuições, direitos e deveres, mas o êxito do processo educativo depende de todos e da qualidade das interações entre eles. Naturalmente, o bom exemplo, o reforço positivo e a perseverança devem partir de gestores e educadores. O estudante, gradualmente, compreenderá que, quando não cumpre com a sua parte, está se pre-judicando, muito mais que prejudicando o professor.

Valorização do ambiente escolarO ambiente escolar é uma das condições críticas para que a cons-

trução do conhecimento e a formação do caráter se efetivem. Se o clima em sala de aula é tenso, marcado por críticas, reclamações ou sermões (por parte do professor), ou por discriminações, competi-ção ou gozações (entre os es¬tudantes), o desgaste emocional afeta o aprendizado e o desempenho acadêmico dos educandos. Além disso, que tipo de pessoas estaremos formando nesse tipo de ambiente?

A ênfase no processo, mais de que nos resultados esperadosProcesso implica em algo gradual, que evolui passo a passo, etapa

por etapa, dia após dia. Há processos relativamente rápidos e outros bem demorados, mas, em Educação, não se pode esperar por resulta-dos imediatos ou transformações instantâneas. A paciência e perseve-rança são qualidades presentes em todo educador bem-sucedido, pois o habilitam a conduzir a sucessão de passos simples, avanços sutis e pequenas mudanças que, ao final, se manifestam em uma grande conquista. As tentativas e os erros não são percebidos como fracassos, mas como parte natural e inevitável do aprendizado.

O processo participativo de tomada de decisões é mais demorado que a tradicional centralização e imposição, mas os resultados são mais sólidos e duradouros, pois resultam da contribuição de todos.

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A comunidade se sente dona do que foi construído e, se for continu-amente encorajada, se sentirá responsável pelo cumprimento de seu próprio consenso.

Reconhecimento e valorização Reconhecimento e valorização são o principal combustível de qual-

quer mudança de comportamento. Quando o educador se concentra nos avanços dos estudantes – por menores e temporários que sejam – eles se sentem encorajados a continuar tentando. Compreender o que é um “processo educativo” se traduz em saber que não haverá mudan-ças instantâneas, e abrir mão da obsessão pelo resultado final almeja-do. Ressaltar os erros não gera acertos, da mesma forma que denunciar a escuridão não resulta em iluminação. A atenção do gestor precisa estar voltada aos acertos e às mudanças positivas, em cada passo.

Protagonismo infanto-juvenilCrianças e adolescentes precisam ser valorizados pelo que são hoje,

não pelo que se tornarão no futuro. Precisam ser res-peitados em suas necessidades e nas características es-pecíficas de seu desenvolvimento. Ao mesmo tempo, podem e devem ser desafiados a amadurecer, a apri-morar suas capacidades, a galgar novos degraus de compreensão, participação e responsabilidade. Pro-mover o protagonismo infanto-juvenil significa criar oportunidades e espaços para que crianças e adoles-centes se reconheçam e sejam reconhecidos como su-jeitos, cidadãos e autores da sua própria história, além de personagens importantes da sociedade.

Saiba maisProtagonismo infanto-ju-

venil:Sobre esse tema, ler Antonio

Carlos Gomes da Costa (2003).

PenseOs princípios listados no texto estão presentes nas práticas de gestão desenvolvidas em sua escola?

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Como construir um Pacto de

>>>

Convivência na escola?Dentre as estratégias pedagógicas inovadoras e bem-sucedidas

adotadas por gestores escolares, encontra-se o Pacto de Convivên-cia, também chamado de Combinado . Essa estratégia, desenvolvida pelo Prof. Feizi M. Milani, têm demons-trado excelentes resultados nas escolas e salas de aula, nos mais variados e desafiadores contextos. Trata-se da construção coletiva, por parte de estudantes e profes-sores, de um pacto, no qual sejam explicitados e acor-dados os direitos e deveres de ambos e as normas de convivência na escola.

Quatro etapas envolvem a construção do Pacto de Convivência:

• A primeira é a SENSIBILIZAÇÃO. Sensibilizar equivale a arar a terra. É preciso arar, para tornar a terra receptiva e, só então, semear. Para planejar essa etapa, o educador pode perguntar-se: “O que eu preciso fazer para despertar o interesse da turma? Que estratégias uti-lizarei para que os educandos, sinceramente, se sintam mobilizados e envolvidos com essa temática?” No caso do Combinado, a sensibilização deve trabalhar a neces-sidade de princípios e normas para o convívio social, as-sim como a interdependência entre direitos e deveres.

• A segunda etapa da construção do Pacto de Con-vivência é a REFLEXÃO CONTEXTUALIZADA. Depois de sensibilizar os estudantes para a questão do convívio, da necessidade de normas, direitos e deveres claramente definidos, o educador conduz a discussão

para o contexto da escola. O objetivo é que os educandos compre-endam a importância do ambiente em sala de aula para o sucesso da construção do conhecimento e o desenvolvimento integral do ser humano. Em geral, os estudantes não percebem que existe uma asso-ciação direta entre o ambiente de sala de aula e a qualidade do ensino, o sucesso escolar e a formação do caráter. Essas relações precisam ser explicitadas, para que eles sintam o desejo de assumir o compromisso de construir uma sala de aula segura, inclusiva, participativa e praze-rosa para todos.

Glossário

Pacto de Convivência:Extrapolaria as possibilidades

do presente módulo fazer uma

apresentação aprofundada dessa

estratégia. Ela pode ser encon-

trada no livro “Tá combinado!

Construindo um pacto de

convivência na escola”, de

Feizi Milani, no qual o autor sis-

tematizou o processo de constru-

ção de Combinados na forma de

uma tecnologia educacional.

Combinado:Além disso, pode-se fazer

Combinados específicos para ati-

vidades especiais, que requerem

a definição de regras claras e o

compromisso de todos em res-

peitar as regras – por exemplo,

quando da realização de ativida-

des externas à escola, gincanas,

feira de ciências, comemorações,

festivais etc.

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• A etapa seguinte é a CONSTRUÇÃO DO COMBINADO, propriamente dita, quando serão definidos, pelo coletivo de cada sala de aula, os princípios que comporão o seu Pacto de Convivência. O formato sugerido para o Combinado é o de uma tabela com quatro espaços: direitos e deveres, tanto de estudantes quanto de professores. Inicialmente, cada estudante reflete e escreve os direitos e deveres que sugere para o Pacto. Em seguida, a turma é dividida em subgrupos, nos quais as sugestões individuais serão analisadas e se elabora uma proposta. As propostas dos subgrupos são apresentadas à classe como um todo, avaliando-se cada tópico, seu significado e implicações, bus-cando um consenso. Quando já se houver chegado ao resultado final, o professor solicita a aprovação da turma para o Combinado.

• A quarta etapa é a SUSTENTABILIDADE. Esta, juntamente com a primeira, são as etapas mais críticas do processo de construção do Combinado. O simples fato de se pactuar direitos e deveres não promove qualquer mudança. É preciso que esse Pacto seja internali-zado por todos integrantes da comunidade escolar, que cada um se sinta “dono” e “responsável” pelo sucesso desse esforço coletivo. Se o Pacto permanecer afixado num canto esquecido da sala de aula, ou só for relembrado nos momentos de reclamação e cobrança por parte do professor, o resultado será um fracasso.

A sustentabilidade do processo depende do compromisso de todos professores e do gestor em garantir ao Pacto de Convivência uma centralidade nos processos pedagógicos e de gestão da escola. É ne-cessário manter o Combinado em local visível e de destaque na sala de aula, com a assinatura de todos. Cada estudante deve ter o Pacto de Convivência copiado ou colado em seu caderno. Seus pais devem ser informados do teor do Combinado e comprometerem-se, por es-crito, em apoiar a concretização do mesmo. É preciso aproveitar todas as oportunidades possíveis para aprofundar a compreensão dos estu-dantes a respeito de cada direito e dever. O educador deve ressaltar, de forma permanente, cada pequeno avanço feito na direção certa, enfatizando os progressos e o aprendizado, e transformando os erros e transgressões às normas em oportunidades de reflexão e aprendizado coletivo. É imprescindível compreender e aceitar que o Combinado é um processo e, como tal, não traz resultados instantâneos, nem faz milagres. Só assim aceitaremos as contradições entre o que foi combi-nado e o comportamento cotidiano dos alunos, como partes naturais do processo. Auto-avaliações individuais e coletivas devem ser reali-zadas a cada semana, de modo que os estudantes reconheçam os seus próprios crescimentos e os aspectos a melhorar.

Há várias possíveis formas de se construir um Pacto de Convi-vência na escola. Cada professor saberá escolher as estratégias e ati-

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vidades mais adequadas à sua realidade. O essencial é que o processo seja envolvente, participativo, provocador de reflexão e discussão, que os estudantes sintam, o tempo todo, que o Pacto é deles, que é o resultado do esforço, da criatividade e da negociação deles. Assim, gradualmente assumirão a responsabilidade pelo cumprimento das normas acertadas. Como ensina Paulo Freire, “a autonomia, enquan-to amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser. Não ocorre em data marcada. É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em experiências respeitosas da liberda-de”. (Freire, 2000, p.121)

O Pacto de Convivência possui a potencialidade de ser uma dessas “experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade”, que contribui para o processo de amadurecimento psicológico, moral e social dos educandos, bem como a criação de escolas que se consti-

tuem em espaços de prática da cidadania e de convi-vência saudável.

Os resultados alcançados pelo Pacto de Convivên-cia, em termos de prevenção da violência e promoção da cidadania, são considerados ótimos, pelas escolas e professores que já o implementam. Eles descobri-ram que é possível criar um ambiente de respeito, participação, responsabilidade e cidadania em sala de aula. Obviamente, isso não ocorreu num passe de mágica, mas gradualmente, num processo que de-

mandou negociação e reflexão coletivas, resultando numa nova forma de estudantes e professores perceberem a si mesmos e a sua relação.

Saiba maisRecomendamos a leitura do livro

de Feizi Milani Cultura de paz: Es-

tratégias, mapas e bússolas, cuja pri-

meira edição já se esgotou, mas en-

contra-se disponível, para download

gratuito, no site www.inpaz.org.br

AnaliseVocê acha possível a construção de um Pacto de Convivência ou Combinado na Unidade Escolar

que trabalha?

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Atividade do Módulo 7Esperamos que a discussão sobre a convivência na

escola tenha propiciado a você momentos de reflexão sobre os desafios de se construir uma cultura de paz, fator que influencia a tão desejada qualidade social da educação escolar.

Escreva um texto sobre as relações que se desenvol-vem entre os diversos atores da comunidade escolar (alunos, professores, corpo técnico-administrativo, funcionários) onde você atua a partir de questões de classe, raça, gênero, sexualidade e deficiência.

Bom trabalho!

Referências bibliográficas

>>>

OpineDesde o começo deste curso, estamos acompanhando o seu percurso ao longo dos módulos, e

isso tem nos ajudado a descobrir lacunas, falhas no material e contribuído pra sentido de torná-lo melhor e mais útil na sua formação. Por isso, mais uma vez solicitamos a sua contribuição no sentido de nos encaminhar seus comentários sobre uma das características desse material: a INTERATIVI-DADE. Por isso, escreva-nos com suas opiniões sobre:

• diálogos com o Instrutor;• diálogos entre os cursistas;• questões postas ao longo dos módulos (clareza, grau de dificuldade, propriedade, etc.).

Entregue seu texto ao tutor.

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. Trad. Alfredo Bosi. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes. 1998. ABRAMOVAY, M. et al. Gangues, galeras, chegados e rappers: juventude, violência e cidadania nas cidades da periferia de Brasília. Garamond. Brasília. 1999. 200p.ABRAMOVAY, M. e RUA, M. G. Violências nas escolas. UNESCO / Ministério da Saúde / Secretaria de Estado dos Direitos Humanos / CNPq / Instituto Ayr-ton Senna / UNAIDS / Banco Mundial / USAID / Fundação Ford / CONSED / UNDIME. Brasília. 2002. 400p.ABRAMOVAY, M. et al. Escolas inovadoras: experiências bem-sucedidas em es-

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