Memórias culinárias

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Estação Memória Memórias Culinárias

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Estação Memória Memórias Culinárias

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A Estação Memória foi criada a partir de projeto de pesquisa

do Prof. Dr. Edmir Perrotti (ECA/USP), implantada em

parceria e coordenada pela Profa. Dra. Ivete Pieruccini

(ECA/USP), desde 1997.

Estação Memória

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Coordenação: Profa. Dra. Ivete Pieruccini

Colaboratório de Infoeducação – Colabori

Escola de Comunicações e Artes – USP

Colaboração: Antonia De Souza Verdini

Bolsistas: Ellen Nascimento, Bruna Trindade Gonçalves e

Lucineia Pereira Ribeiro

Estação Memória

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A Estação Memória é um ambiente educativo, tendo como

objetivo trocas culturais intergeracionais a partir de relatos de

experiência de vida de pessoas idosas. Os depoimentos dos idosos,

coletados por meio de oficinas de memória semanais, são a base

para a criação de produtos informacionais e realização de

encontros presenciais entre velhos, crianças e jovens.

Esta carta tem o intuito de complementar o Álbum Biográfico,

trazendo deliciosas receitas que marcaram a infância dos idosos.

Muitas delas foram passadas de geração a geração herdadas de

imigrantes dos mais diferentes países. Esperamos que vocês

gostem e queiram conhecer mais.

Ficamos no aguardo das cartinhas e do nosso encontro que

acontecerá no 2º. semestre. Por enquanto, boa leitura!

Abraço amigo dos velhos da

Estação Memória

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Almoço de Domingo Alberto Siuffi

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A casa de meus pais, Camillo e Zakia, sempre foi o

ponto de reunião dos familiares, nos domingos e

feriados. O almoço começava ao meio-dia e ficava posto

até às 10 da noite. Todos iam se servindo das guloseimas

típicas árabes. Não se servia bebidas alcoólicas à mesa!

E os doces eram muito apreciados.

Minha mãe e minhas duas irmãs já começavam a

preparar tudo, uns dias antes. Eu era requisitado para

moer as carnes, fazer compras, preparar o forno do

quintal e outras tantas coisas que fossem necessárias. E

com alegria e bom humor.

Minha avó materna, Dona Marrúm, fazia um quibe cru,

que só ela tinha o capricho, mas era eu que executava as

suas ordens. Vou descrever como o quibe era feito: a

carne era o patinho, bem vermelha e saudável. Eu tinha

que moer na máquina manual, com a peça de moer fino,

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por duas vezes, a fim de tirar todos os possíveis nervos

da carne. Fazendo isso, os nervos ficam retidos nas

entranhas da saída do moedor e são removidos.

Operação importante para o paladar!

O trigo fino, pré-cozido e seco, era misturado com a

carne, em proporções iguais. A mistura era feita com as

mãos, que deviam ser resfriadas com água gelada.

Depois disso, tudo era moído na máquina, com um

pouco de cebola, pimentão vermelho, hortelã e, talvez,

algum segredinho, como manda o costume dos

velhinhos.

Parte desse quibe era, então, socado no pilão de pedra

(granito), colocando-se sal a gosto e, pronto! ...Fácil,

não? Depois, era só formatar e enfeitar o prato com

cebola cortada em quatro, salsinha, cebolinha, cheiro

verde. Na hora, era só colocar azeite de oliva.

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Huummm!!!

Recomendo comer um pouco sempre, um grande

remédio para nosso organismo desgastado e anêmico.

Um “reboque-- para os humanos.

Com o restante do quibe fazíamos bolinhos com recheios

típicos, quibe na bandeja ao forno, sopa de iogurte com

bolinhos de quibe, etc.

Mas, isto já é uma outra historia.

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O risoto à milanesa Ângela Elisabeth Bernardin Donelli

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O dia de risoto à milanesa era especial na minha casa.

Era muito valorizado e até hoje é lembrado como um dia

de quase festa. A receita era de família e transmitida

pelos homens. Os preparativos eram bem detalhados.

Sentia-se certa ansiedade entre os adultos porque tudo

tinha que ser bem previsto e os ingredientes bem

escolhidos e bem adquiridos.

Naqueles tempos, o açafrão (zaferano) e os cogumelos

secos (funghi secchi), que são imprescindíveis nessa

receita, eram difíceis de comprar, não havia no mercado

pois eram importados e caros. Muitas vezes, dependia-se

de alguém que tivesse viajado para o exterior ou da

compra contrabandeada no mercado negro. O arroz

arbóreo não existia para a compra, então se acabava

usando arroz comum que não deveria ser lavado, aí

minha mãe interferia e não permitia tal barbaridade. O

arroz era lavado e deixado em uma assadeira para secar

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muito bem, com bastante antecedência.

O caldo para o cozimento do arroz tinha que ser com

galinha, nunca com frango! Isto implicava na ida ao

mercado central ou no de Pinheiros para que a galinha

fosse bem fresquinha e morta na hora, levada para casa e

cozida com água, salsão, cebola, sal e um ou dois tomates,

só para dar cor.

Esse caldo era feito no próprio dia do almoço, na parte da

manhã.

O arroz era frito com manteiga e cebolas cortadas em

rodelas. Punha-se vinho branco-seco, misturado com

açafrão. Também se colocava um pouco de vinho Marsala

para dar gosto, no final.

A preparação do arroz só começava quando tudo estava

separado, pronto e as visitas já tinham chegado. Aí, os

homens da família iam para a cozinha conversando,

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alegres, acompanhados de um bom copo de vinho tinto e

ficavam de 45 minutos a uma hora mexendo o arroz até

ficar pronto. As crianças esperavam com impaciência a

comida demorada!

Assim, passávamos feriados ou domingos entre

familiares e amigos. Era quase uma festa! Este costume

foi conservado até hoje, agora com mais facilidades e

sem grandes exigências. Meus filhos se encarregam de

mexer o arroz e o ambiente nos relembra os dias de

risoto de antigamente.

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O Chuchello de Páscoa Anna M. Amato Nardelli

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No tempo de minha meninice, na minha cidade, Messina

(Sicília-Itália), era costume fazer grandes limpezas nas

casas na semana anterior a Páscoa. O padre da paróquia

mais próxima vinha benzer as casas e as pessoas,

acompanhado de um coroinha. O preparo das casas, o

cuidado com a limpeza e a ordem eram simbólicas,

porque, no fundo, se tratava de um convite para que cada

um fizesse uma "limpeza" no seu interior, na sua alma.

No domingo da Páscoa, na minha casa fazíamos comidas

especiais. Eu me lembro de uma delas, uma sopa bem

substanciosa chamada "Chuchello", feita pela minha

mãe. Já de manhã cedo, ela preparava um caldo cheiroso

de galinha e ervas. Fazia parte da receita, carne moída

misturada com pão amanhecido molhado no leite e

espremido e depois temperado com alho socado, queijo

ralado, salsinha sal e pimenta. Com essa mistura,

fazíamos pequenas bolinhas, pois a essa altura da receita

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eu podia participar da produção. Porém, as minhas bolinhas

tinham um formato diferente, não havia meio que me saíssem

redondas... Experimentava e voltava a experimentar, mas só

ficavam pontudas...!

Quando a mistura acabava, as bolinhas eram colocadas

em pratos rasos e contadas, mais ou menos uma dúzia para

cada pessoa. Depois, ficávamos, eu e minhas irmãs, olhando a

minha mãe bater ovos, ricota, queijo ralado e noz moscada. Só

mais tarde, voltando da missa de Páscoa, quase na hora do

almoço, as bolinhas de carne eram cozidas no caldo. Em

seguida, minha mãe colocava na sopa esse creme de ovos e

ricota. Mais alguns minutos e pronto! Todos à mesa, na

qual não faltavam ovos coloridos e de chocolates.

Lá na Itália, a Páscoa coincide com a entrada da primavera e

era costume antigo reforçar o físico com comidas que levavam

ovos, pois os longos meses anteriores de inverno haviam

debilitado as pessoas.

Até hoje eu sigo esta tradição da sopa de Páscoa.

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O ritual da massa de macarrão Antonia de Souza Verdini

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Toda semana, a movimentação dentro da cozinha

adquiria ares de um ritual. A avó encarnava mais ainda a

italiana de verdade, de Roma, como ela sempre

completava. Era dia de fazer a massa do macarrão.

O avental alvíssimo já cobria as roupas cotidianas e a

mesa era desocupada para receber os vasilhames e

ingredientes a serem usados. As crianças eram alertadas

para não se aproximarem com mãos e roupas sujas e para

não tocarem em nada. Mas, ninguém queria perder a

chance de acompanhar a transformação de simples ovos

com água e farinha em serpentinas de massas tão

saborosas. Tudo era acompanhado com olhares gulosos e

encantamento.

A irmã mais velha que eu, a Janette, já começara a

aprender os desdobramentos do ritual e ajudava com

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competência, sendo até hoje, a guardiã e executora da

receita. Das primeiras mexidas nos ovos, até a mágica

das grandes rodelas de massa cobrindo a mesa de

madeira, nenhum detalhe se perdia.

E a voz da matriarca, até hoje, é possível se fazer ouvir

nos recônditos da memória, quando as toalhas, se

passando por cortinas de um belo espetáculo, cobriam o

produto final da magia: "Ninguém pode colocar os

cotovelos sobre a massa que vai estar secando. Muito

cuidado!”.

Hoje minha irmã passou, por telefone, toda orgulhosa de

colaborar para um artigo a ser lido por gente tão especial

como o pessoal da EM e as crianças do Colégio de SBC,

a receita que aprendeu com minha avó e que transcrevo a

seguir:

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Receita de massa de macarrão, da minha avó materna,

Antonina:

Cinco ovos inteiros batidos com um pouquinho de sal e uma

xícara (de café) de água e farinha de trigo (mais ou menos ½

kg, dependendo do tamanho dos ovos), até a massa ir

desgrudando da mão. Daí, sovar a massa como se fosse massa

de pão, até ficar bem lisa. Depois, deixar descansar por uns

15 minutos e, na sequência, separar metade ou partes, abrindo

a massa com rolo, que pode ser feito de cabo de vassoura.

Um segredo, é deixar a massa bem fininha e espalhar um

pouco de fubá sobre as grandes rodelas. Cobrir a massa com

um pano e depois enrolar, cortar em tirinhas, conforme o

tamanho desejado. A seguir, é só soltar e espalhar as tiras

cortadas sobre a mesa.

Para cozinhar no mesmo dia, é preciso chacoalhar o macarrão

para tirar o excesso de fubá. Para guardar, coloque o

macarrão num recipiente, com o fubá, para não grudar.

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A torta e o doce! Berenice Moreira Prates Bizarro

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Nos almoços de domingo sempre havia uma ou mais de

uma sobremesa.

É disso que mais lembro e sinto saudades!

Havia a Torta de Ricota e o Doce de banana e creme.

Tudo era feito de manhã cedo ou no dia anterior.

Para o creme com doce de banana, não se usava leite

condensado, mas um creme feito no fogo com leite,

gemas, maisena, que tinha que ser bem mexido para não

empelotar. As crianças da família (eu, principalmente)

gostávamos de lamber a colher e o resto que ficava no

fundo da panela.

Depois de frio, o creme era colocado num pirex, coberto

com doce de bananas em fatias feito numa calda de

açúcar. Por cima, ainda, a receita prescrevia claras em

neve (batidas a mão) bem firmes, com açúcar.

Depois esse pirex ia ao forno para dourar as claras. Que

delícia!

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A Torta de Ricota era mais trabalhosa. Minha mãe aprendeu

a fazer com a mãe dela e ensinou a Florinda, que foi quem

nos criou.

A massa era doce, feita com farinha de trigo, maisena, ovos,

açúcar, manteiga e fermento, que chamávamos de pó Royal.

No recheio ia uma ricota grande, gemas, uma pitada de sal,

essência de baunilha, açúcar, uvas passas, cidra (seca) e noz

moscada ralada.

A assadeira era untada com manteiga e a massa era aberta,

ou melhor, esticada, com as mãos. Daí, punha-se o recheio.

Por cima iam tiras de massa, redondinhas, que eu gostava de

fazer. Enquanto fazia, comia pedaços de massa, crus

mesmo. A torta ia ao forno e, dureza, tínhamos que esperar

esfriar para comer!

Achei o livro de receitas de minha mãe, com sua própria

letra e me deliciei com essas recordações!

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Torta de Abóbora Bernadette Costa

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Oi amigos, sou Bernadette Costa e para vocês me

identificarem, sou aquela que nasceu na América do

Norte.

Quero falar da receita da torta que mamãe trouxe dos

EUA. Eu aprendi a fazer essa torta quando estava no

Brasil, pois cheguei aqui pela primeira vez quando tinha

2 anos de idade. É um tipo de doce de abóbora,

diferente de todos que conheço aqui no Brasil. Por isso

quero passar a receita para vocês. O recheio é feito com

2 quilos de abóbora (de pescoço), 4 ovos, ½ litro de

leite, 2 xícaras (chá) de açúcar. A abóbora devida ser

cozida com pouca água. Depois, é preciso escorrer e

amassar. Até pode ser no amassador de batatas. É

importante tirar toda água que acumular. Nessa massa

bem escorrida, juntar os ovos (batidos levemente), o

leite e o açúcar. Adicionar 1 colher (chá) de noz

moscada nessa mistura.

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A massa para forrar a assadeira deve ser a massa podre

(mas não estragada!). Chama-se massa podre porque

leva bastante gordura e ela fica toda quebradiça... É

necessário uma quantidade suficiente para uma

assadeira de mais ou menos 20 cm por 35 cm. Depois, é

só despejar o recheio de abóbora que deve ter ficado

mais ou menos líquido.

Em seguida, é só assar por 1 hora ou até que o recheio

fique consistente como pudim. Deixar esfriar e... ponto!

Pode se deliciar.

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Canja com Hortelã Elisabeth Gloria Cabral de Oliveira

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Minha família, que era muito pequena, não tinha o

hábito de se reunir para cozinhar. Não me lembro das

pessoas sentadas na cozinha. Minha avó materna

morava com a gente e era ela quem cozinhava. Ela tinha

um temperamento terrível, muito brava e briguenta, por

isso a cozinha era só dela, criança não entrava e

ninguém podia mexer nas panelas.

Mas tenho a lembrança forte da gostosura que era a

canja que ela fazia. E tinha uma regra: quem ficava

doente ganhava a canja fresquinha para sarar logo. Me

lembro que ela pedia para comprar a galinha, que era

comprada no “galinheiro” próximo de casa. A galinha

vinha morta, mas com penas. Ela também pedia para ir

no verdureiro comprar hortelã fresca.

Minha vó dizia que a boa canja era feita no azeite

português, com galinha nova e muita hortelã.

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A canja levava todos os pedaços da galinha e os

pedaços mais cobiçados eram o pescoço e as asinhas,

para ficar chupando os ossinhos.

O dono da canja era quem estava doente, mas todos

também aproveitavam daquela delícia.

Se quem estava doente sarava? Acho que melhorava

muito porque carinho e atenção ajudam bastante.

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Frango com quiabo e angu Elzira Arantes

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A comida lá em casa era a brasileira, tipicamente a paulista

ou caipira – afinal, nosso antepassado imigrante mais

recente viveu há pelo menos trezentos anos! Arroz e feijão

todos os dias, tutu, couve, viradinho etc.

Mamãe era uma cozinheira do trivial, jamais se aventurava,

não seguia receitas e repetia com seu jeito tímido o que

aprendera ao longo da vida. Um de seus caprichos era

esmerar-se no prato para o filho aniversariante, procurando

preparar o que cada um mais gostava. Em 1º de fevereiro,

quando a aniversariante era a caçula (eu) dos cinco filhos, o

almoço da família teria um caprichado prato de Frango com

Quiabo e Angu, meu quitute favorito (até hoje me regalo em

qualquer dia, nem espero o aniversário...).

Naquele tempo, o preparo desse prato não era coisa pra

fracos! A começar pela galinha (ou a chamávamos frango?

Não me lembro), em geral comprada ainda viva na chácara

vizinha. Cabia a papai trucidá-la.

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Com suas grandes e habilidosas mãos de farmacêutico torcia

o pescoço da ave com vigor e a deixava lá pendurada no

espaldar da cadeira por um tempo, cabeça pra baixo pra

escorrer o sangue. Depois, cabia a mamãe ferver a água no

grande tacho e depenar o bicho, chamuscando finalmente as

penugens no calor do fogo. O cheiro não era bom...

[A propósito dessa matança a família guarda uma história

tragicômica. Certo dia a galinha estava lá morta e pendurada

e mamãe foi cumprir sua tarefa. Mas ao mergulhar a pobre

galinha na água fervente ela cacarejou desesperada e pulou

batendo de leve as asas, até cair de vez. Imagine o tamanho

do susto de Dona Mariana – que recontaria essa história pelo

resto de seus dias! A partir daí, papai começou a cortar o

pescoço da galinha com um facão, pra se assegurar do

resultado.

Depenado, trinchado, temperado, o frango ia pra panela e lá

cozinhava por longo tempo até chegar o momento de

acrescentar o quiabo, devidamente picadinho.

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Enquanto isso, o angu (que não é a polenta italiana...) era

preparado na grande panela de ferro, mexendo e mexendo

com a colher de pau até dar o ponto.

Em volta do fogão, as crianças esperavam a hora em que ele

seria despejado na travessa – momento mágico em que

poderíamos comer o delicioso biju formado no fundo da

panela. Minhas irmãs e eu até hoje arregalamos os olhos ao

relembrar essa sensação, mas nenhuma de nós conseguiu

algum dia repetir essa façanha e obter essa casquinha

saborosa. Se alguém souber o segredo, pode me contar...

Receita eu não sei dar, mas acho que o segredo mesmo está

nos sabores, odores e perfumes preservados na memória. E

estes não têm receita!

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Gefilte fish recheado Esther Stiel

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São muitas as comidas típicas dos judeus. Há grande

variação no modo de seu preparo das mesmas, dependendo

da região de onde proveem.

Para os judeus de origem askenazi, principalmente europeia,

o peixe recheado, chamado Gefilte fish, não pode faltar em

ocasiões especiais e datas religiosas.

A preferida da família do meu marido era essa:

Um peixe de água doce, tipo carpa, traíra ou dourado. Estes

peixes devem pesar por volta de 800 gramas a 1 quilo. Os

peixes maiores não são tão saborosos.

Ao limpar o peixe, não se deve cortá-lo. As tripas são tiradas

através da abertura perto das guelras. Depois de bem limpo,

existem duas maneiras de continuar preparando o peixe: uma

delas, é deixar o peixe como está, recheando a parte oca. A

outra, é tirar a carne com muito cuidado para não furar a

pele. Costumo usar a carpa inteira e misturar outra carpa com

a traíra para fazer o recheio.

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Enquanto tempero o recheio, coloco no fogo uma panela

grande, com bastante água e cebola, na proporção de 1 quilo

de cebola para 1 quilo de peixe e um ramo de cheiro verde

que é retirado no final.

Coloco também o sal e a pimenta e... açúcar.

A carne do peixe deve ser picada, muito bem, com um cutelo

ou moído na máquina antiga de moer carne. As atuais não

servem porque quebram a fibra do peixe. Depois de picada, a

carne do peixe é colocada numa vasilha e se junta um pouco

de pão molhado em água, ovo, sal, pimenta-do-reino moída e

um pouco de açúcar. Esses ingredientes são muito bem

amassados até ficar uma espécie de pasta. Só então se coloca

este recheio dentro da pele do peixe. Em seguida, o peixe vai

para a panela com o caldo de cebola, que já deve estar

fervendo, há um bom tempo. Ali, ele fica cozinhando por 90

minutos, mais ou menos.

Depois de retirado desse caldo, o peixe fica descansando num

prato até esfriar e, então, levado à geladeira.

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O caldo que sobrou é coado e as cebolas cozidas devem

ser bem amassadas. O resultado é uma mistura de

consistência gelatinosa, que também vai à geladeira.

O peixe está pronto, porque é comido gelado. Em cada

prato coloca-se uma fatia do peixe, um pouco da

gelatina e um pouco de raiz forte ralada, misturada ou

não com beterraba.

Conforme a região, o peixe é só salgado, bem

apimentado ou até muito doce.

Um viva à diversidade e aos costumes!

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Receita das carciofi (alcachofras) Giovanni Marino

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Minha família morava em Caserta, perto de Nápoles (Itália),

num apartamento onde havia um vasto terraço que dava para a

rua. Nesse terraço, minha mãe Carolina se deliciava com

conversas com as amigas que transitavam pela rua durante as

manhãs de primavera. As conversas duravam horas a fio, entre

às 9horas e meio-dia, horário em que passavam os vendedores

de frutas e verduras. Minha mãe comprava o necessário para o

dia, sem sair do terraço, só por meio de uma cesta pendente de

uma corda que descia e subia com a fruta e verdura, inclusive

com as alcachofras –carciofi- da época.

Aqui vai por minha conta pessoa um episódio delicioso sobre

os figos brancos que minha mãe comprava todas as manhãs e

que comíamos com o “pão de peito”. Esses figos eram

“divinos”: maduros, encorpados, de tamanho de pera média

com umas fendas do amadurecimento, de onde saiam o melado

da fruta. Não eram lavados porque lá não tinha poluição e as

árvores dos figos eram altas demais. Nem a poeira chegava lá.

Os figos só eram apanhados de madrugada com o frescor da

Page 40: Memórias culinárias

primavera e vendidos de manhã. Relatei tudo isso em

memória de uma época bonita e saudável, em que a

idade era pouca e a natureza era pura e respeitada.

Vamos às carciofi e sua receita: primeiro, é preciso

lavar as alcachofras, antes de colocar de molho em água

com vinagre. Daí, cortamos os talos em pedaços

pequenos e tiramos a parte de fora. Fazemos uma

mistura com os talos de alcachofra, queijo ralado,

bastante alho, salsa e cebola picadas e recheamos as

alcachofras com ela. Colocamos uma panela com água,

azeite e sal para cozinhá-las. Depois elas vão ao forno,

forno, até acabar de cozinhar. Para saber se as

alcachofras estão prontas, a gente puxa uma pétala. Se

vier, é porque está no ponto.

Não sei se deu para entender a receita. Caso contrário,

minha cozinheira explicará melhor...

Page 41: Memórias culinárias

Aquela comida especial Ivone Judith Mussolini de Oliveira

Page 42: Memórias culinárias

Com grande alegria eram aguardados os almoços de domingo,

pois era quando todos da família estavam presentes.

Na véspera, portanto no sábado, a nona preparava as massas,

tagliatelli e o capeletti. O molho feito com lagarto ou músculo

refogado, tomates cozidos e passados pela peneira era levado ao

fogo e apurado durante a manhã toda, no próprio dia.

Muito raramente, talvez poucas vezes ao ano, havia um prato

nada comum: o torttei, uma espécie de pastelzinho recheado.

Para fazer era preciso preparar a massa com farinha de trigo e

ovos. Depois de um tempo, já descansada a massa, era esticada

com rolo de macarrão. Aberta, a massa era cortada com um

facão em tiras de mais ou menos 7 cm. Em seguida, não bem no

meio da tira, mas deixando-se um lado mais estreito, o recheio

era colocado com uma colher, deixando-se um vão entre eles.

Depois, a massa era dobrada por cima, cortando-se um a um

com um carretilha de cozinha.

O recheio era feito com uma abóbora moranga, levada a

cozinhar em um grande caldeirão. Depois de cozida, era tirada a

casca.

Page 43: Memórias culinárias

Em uma panela era feito um refogado com cebola e alho,

juntamente com a abóbora. Cozinhava-se a mistura até secar e

desprender do fundo da panela, para pegar bem o gosto do

tempero. Então, tirava-se a panela do fogo do fogo, polvilhava-

se noz moscada moída e esperava-se esfriar.

Os torttei eram cozidos em água e sal, escorridos e temperados

com manteiga, rodelas de cebolas já cozidas e refogadas e

canela em pó.

Apesar de ser um quitute bem apreciado era raramente

confeccionado, pois a nona sentenciava: torttei comido seguido

provoca stomegazza! Com isso, ela queria dizer que não podia

repetir o prato com frequência porque dava enjôo.

Pelos ingredientes dá até para imaginar...

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Pão com alho Jackeline Hen

Page 45: Memórias culinárias

A lembrança mais marcante que tenho de comida da minha

casa acontecia nas noites de domingo, quando comíamos

pão com alho. Minha mãe era grande adepta de alimentos

saudáveis e alho, apesar do cheiro, faz muito bem para a

saúde.

Como no Rio faz sempre muito calor, meu pai ficava de

camiseta e de shorts. Assim, ele fritava os pães, ou seja,

fatias de pão preto. Ele usava 2 frigideiras. A primeira tinha

manteiga: meu pai colocava o pão e depois de algum tempo

virava para o outro lado. Minha mãe espetava um dente de

alho no garfo e esfregava bem dos dois lados do pão.

Comíamos essas fatias de pão com banana para cortar o

ardor do alho. Éramos só nós três e comíamos na cozinha

mesmo. Era muito gostoso.

Page 46: Memórias culinárias

Anos mais tarde, já casada e com 2 filhas, nas férias

com meus pais, as crianças pediam sempre. “Vovô,

queremos pão com alho”.

Acho que todas nós lembramos com muitas saudades

desses jantares.

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Croquete da vovó e o café nosso de cada dia Lilia Maria Faccio

Page 48: Memórias culinárias

Quando eu era pequena, nada era mais esperado nas festas de

família do que o croquete de carne da vovó. Receita? Não tinha,

quem quisesse aprender, que ajudasse a fazer. Segundo meu

pai, vovó Lilia havia aprendido com sua mãe, a vovó Raquel, e

suas noras, minha mãe e a tia Lourdes, aprenderam a fazer

direitinho.

Festa de aniversário sem croquete não era festa. Meus amigos

quando convidados para comemorar meu aniversário,

invariavelmente perguntavam se o quitute ia ser servido.

Ao longo da minha infância e adolescência fui participando do

preparo até ser capaz de tocar a empreita sozinha com todo o

sabor e requinte que deveria ter. A massa de carne tinha que ser

cremosa e derreter na boca quando se mordia a casquinha

crocante.

Hoje em dia, volta e meia minhas filhas e seus amigos me

pedem para fazê-lo e eu vou para a cozinha com muita alegria,

pois sei que serão saboreados com o mesmo prazer que eu,

meus irmãos e primos tínhamos em nossa infância.

Page 49: Memórias culinárias

Tudo começa com a carne moída sendo refogada com óleo,

cebola, alho, salsinha, um pouco de noz moscada, tomate

picadinho, uma pitada de pimenta do reino, sal e outros

temperos que possam estar à mão.

Assim que a carne estiver toda refogada, coloca-se um pouco de

água até cobrir. Quando estiver fervendo acrescenta-se um ovo

batido, mexendo vigorosamente. A seguir mistura-se uma

colher de sopa bem cheia de farinha de trigo em uma xícara de

leite. Despeja-se a mistura na panela sem deixar de mexer para

não formar grumos. Quando a massa toda estiver desgrudando

do fundo da panela, está pronto. Coloca-se então numa travessa

para esfriar.

Para dar forma aos croquetes é preciso de farinha de rosca e

ovos batidos com um pouco de água e sal. É aí que o trabalho

realmente começa. Cada bolinho é feito com uma colherada da

massa de carne que deve ser passado primeiro na farinha de

rosca, depois nos ovos batidos e de novo na farinha de rosca.

Para finalizar, cada croquete deve ser frito em óleo bem quente.

Page 50: Memórias culinárias

Normalmente esta fritura precisa ser feita numa frigideira alta ou

numa panela, pois o óleo dever tem que ser suficiente para cobrir o

bolinho por inteiro.

Agora sim, é só sentar e se deliciar.

Na casa dos meus avós maternos três horas da tarde era sagrada.

Um pouco antes deste horário minha avó Maria ia para a cozinha.

Pouco depois o perfume do café se espalhava no ar. A mesa ia

sendo posta entre a água borbulhar na panela e o líquido escuro e

fervilhante escorrer pelo velho coador de tecido direto para o bule.

Bolo, pão caseiro, manteiga, biscoitos, xícaras, tudo era

cuidadosamente colocado à mesa esperando a hora de serem

consumidos.

Parecia festa. Vinham os filhos, netos, amigos que iam se sentando

e se servindo. Só não podia ocupar o lugar do vovô. Era uma

tradição, uma delícia, um prazer.

Eu morei com eles durante dois anos e meio quando estudei na

EESC (Escola de Engenharia de São Carlos – USP). Muitas vezes

voltava neste horário para casa só para participar, mesmo que

depois tivesse que caminhar de volta os 20 quarteirões que

separavam aquela mesa farta da Universidade.

Page 51: Memórias culinárias

Ninguém se atrevia a fazer café pela minha avó. Não que ela

não deixasse, mas era muito difícil imitar a delícia de sabor que

ele tinha.

Um dia, logo depois do jantar, meu avô sentenciou:

- Lilia, hoje eu quero tomar um café feito por você.

Entrei com pânico. Tentei argumentar que na casa da minha

mãe eu saberia fazer, pois a medida da água estava marcada na

panela de ferver a água. Mas ele não aceitou o argumento. Eu

não sabia se chorava ou se fugia. Minha tia Letícia, irmã mais

velha da minha mãe, me salvou daquela situação. Ela me

ensinou o que hoje chamo de "receita universal de um bom

café". É assim: para cada copo americano de água coloque uma

colher de sopa bem cheia de pó. E assim foi feito.

Meu avô pareceu surpreso quando experimentou. Recebi até um

elogio:

- Você já pode casar.

Até hoje uso a receita quando precisa fazer café em algum

lugar.

Page 52: Memórias culinárias

Simples, fácil, prático e não tem erro.

Entrei em pânico. Tentei argumentar que na casa da minha mãe

eu saberia fazer, pois a medida da água estava marcada na

panela de ferver a água. Mas ele não aceitou o argumento. Eu

não sabia se chorava ou se fugia. Minha tia Letícia, irmã mais

velha da minha mãe, me salvou daquela situação. Ela me

ensinou o que hoje chamo de "receita universal de um bom

café". É assim: para cada copo americano de água coloque uma

colher de sopa bem cheia de pó. E assim foi feito.

Meu avô pareceu surpreso quando experimentou. Recebi até

um elogio:

- Você já pode casar.

Até hoje uso a receita quando precisa fazer café em algum

lugar: simples, fácil, prático e não tem erro...

Page 53: Memórias culinárias

As Rabanadas da Vovó Maria Manoel Pereira do Vale Junior

Page 54: Memórias culinárias

Minha avó Maria do Carmo Vale Pereira era portuguesa da

Serra da Estrela e vivia na Zona Rural de Tabapuã, município

localizado na região noroeste do Estado de São Paulo, a 440

quilômetros da capital, na linha da Estrada de Ferro

Araraquarense cujos trilhos nasciam na cidade de Araraquara e

nesta época morriam em São José do Rio Preto.

A vó Maria, na década de 1940, costumava fazer os pães da

casa, às sextas-feiras. Eram enormes pães de semolina que

seriam consumidos durante uma semana. Em épocas especiais,

como o Natal, ela duplicava a quota.

Os alvíssimos pães eram assados no forno a lenha que ficava

fora da casa, ao lado do coberto onde estavam os tanques de

lavar roupa e um grande pilão. Os pães que não seriam

consumidos durante a semana, eram envoltos em panos brancos

feitos com antigos sacos de farinha e postos em uma larga

prancha, no alto da despensa.

Na véspera do Natal, os pães amanhecidos, como a vovó falava,

eram cortados em generosas fatias.

Page 55: Memórias culinárias

Em tigelas, batia ovos de galinha caipira: primeiro as claras e

depois as gemas, bem vermelhinhas. As fatias eram ali deixadas

por um tempo, até absorverem os ovos batidos e depois

colocadas em grandes formas, levadas ao forno do fogão a

lenha na cozinha. O velho fogão além de cozinhar os alimentos,

também fornecia água quentíssima para a torneira da cozinha e

chuveiro da casa, graças à serpentina em seu interior.

Assada a rabanada, conforme minha avó dizia que eram feitas

em seu querido Portugal, recebia uma cobertura de mel colhido

no pomar da casa. O preferido era o mel de abelha jataí que era

retirado de velhos trancos de árvore. Finalmente, as rabanadas

eram polvilhadas com canela em pó.

No almoço de Natal, a vovó Maria reunia na casa da fazenda os

seus dez filhos, os cincos mais velhos já casados e os primeiros

vinte e sete netos. Majestosa salada abria o almoço, seguido do

tradicional arroz de forno, feijão preto incrementado com

linguiça e pertences de porco. Não faltava o peru, o frango

caipira, o pernil de cabrito, o carneiro recheado, a carne de

caçarola, o coelho e ainda um saboroso prato de bacalhoada.

Page 56: Memórias culinárias

Para os adultos, isso tudo regado com garrafão de vinho

português Ferreirinha. Para os “miúdos”, como nossa avó

se referia às crianças da família, tinha a “vilhaça” do vinho

português rosé Faísca, temperado com água e açúcar.

Após o almoço, compartilhávamos a esperada sobremesa: as

deliciosas rabanadas da vó Maria.

Page 57: Memórias culinárias

Pão De Torresmo Da Vovó Jacinta Maria Ângela Furtado

Page 58: Memórias culinárias

Tudo começou lá na roça, na cidade de Santa Rosa de Viterbo,

onde vovó Jacinta e seus seis filhos moravam. Em 1935, vovó

conversou com a família e resolveram trocar o sítio por uma casa

com terreno grande, em São Simão. Eram seis lotes, um para cada

família: tio Armindo e tias Cecília, Aparecida, Maria, Jandira e

minha mãe Geraldina. Assim, construíram suas casas sem muros e

com árvores frutíferas. Passou o tempo e os filhos foram

nascendo. Eu, Maria Ângela, pertenço a estas gerações (1940 -

1960). Éramos 22 netas e 22 netos. Crescemos brincando nos

quintais e subindo nas árvores pra apanhar aquela fruta bonita e

gostosa. Às vezes caíamos, brigávamos, coisa de criança.

Na casa de vovó Jacinta, em certos dias da semana, se fazia um pão

de torresmo muito especial. A receita tinha que dobrar e redobrar.

Estávamos em fase de crescimento, gulosos. Era só olhos e boca e

desejo daqueles pães.

O pão era assado no forno de barro grande e redondo que meu tio

Armindo construiu. Era preciso colocar lenha dentro até esquentar

bem.

A tia Cecília governava. Regrava. Dava um pedaço bom pra cada

um, de tamanho igual a todas as crianças.

Page 59: Memórias culinárias

Assim, degustávamos aquele delicioso pedaço de pão com

leite da cabra que meu pai criava. Aí, a tia Cecília dizia que

ninguém pedisse mais. Ela decretava que todos estavam

satisfeitos e guardava o pão -bem guardado-, num

armário alto, fechado, impossível. Era aquilo, uma coisa de

respeito. Não era pra ser comido sem mais nem

menos. Teria que sobrar pra comer nas horas certas.

As pessoas grandes da casa usavam e abusavam de pretensos

direitos de educação. Quando as crianças abusavam,

palmatórias e chineladas não faltavam. Ou éramos postos

sentados no canto, de castigo.

O passado foi duro, mas deixou o seu legado: saber viver. É

a grande sabedoria, assim estou aprendendo.

A receita, não me lembro.

Page 60: Memórias culinárias

Comidas de nossa lembrança Maria Apparecida Lopes

Page 61: Memórias culinárias

Na minha lembrança, eu tenho muito claro os pratos bem

elaborados pela vovó Assuncion, mãe de meu pai. Muito ativa,

boa disposição, tempero famosíssimo, ótima dona de casa.

Na cozinha, havia um fogão a gás, mas do lado de fora, num

coberto, tinha um forno a lenha que era usado para assar pão. O

cheirinho de pão assando, tenho ainda na memória...

Nas festas de fim de ano e também em datas de aniversários,

eram feitas algumas “EMPANADAS”, uma espécie de torta

salgada muito apreciadas por todos. Esta receita passou para os

filhos e noras e chegou aos netos. Até hoje continuamos

também, em datas festivas, a nos deliciarmos com o prato típico

da Espanha.

A receita da minha avó era assim:

Para a massa:

½ k de farinha de trigo 1 copo de leite morno

1 xícara de café de azeite 50gr de fermento fleishman

(3tabletes)

1 ovo inteiro

Page 62: Memórias culinárias

O preparo era assim: primeiro, ela dissolvia o fermento no leite

morno. Depois, juntava todos os ingredientes e amassava a

mistura até soltar das mãos. Às vezes era necessário juntar mais

farinha para dar o ponto.

Em seguida, ela deixava a massa descansar por uma hora ou até

que dobrasse de volume. Sempre coberta com um pano.

Enquanto isso, o recheio ia sendo preparado com 6 batatas

médias cruas, cortadas em fatias, 3 ou 4 cebolas médias também

em rodelas, umas 100 gramas de bacon picado, 2 gomos de

linguiça calabresa e 2 paios, cortados em fatias. Tudo era

misturado em uma bacia e temperado com sal a gosto, azeite e

coloráu espanhóis, alecrim, orégano, manjerona, salsa e

cebolinha verde picada, pimenta dedo de moça.

Quando estava no ponto, ela abria a massa com o rolo na

espessura de um dedo. Depois, forrava uma assadeira retangular

com a metade da massa, deixada com uma rebarba bem grande,

que passava da altura da assadeira, para que o farto recheio

ficasse bem acomodado, não saindo fora dela.

Page 63: Memórias culinárias

Em seguida, o recheio, depois de muito bem misturado, era

colocado sobre a massa aberta.

A outra metade de massa reservada ia, então, por cima da

mistura. Com as mãos, as laterais da massa iam sendo

juntadas, formando um cordão. Quando sobrava massa eram

feitos desenhos - e eu sempre faço - com as iniciais de

nomes, talvez do aniversariante ou a data da comemoração,

para enfeitar a empanada.

Depois de pronta, a empanada ainda ficava descansando por

meia hora. Só então era pincelada com gema e azeite, para

depois ser levada ao forno a 220º, por mais ou menos, 40

minutos.

Page 64: Memórias culinárias
Page 65: Memórias culinárias

Bolinhos de Batatas Recheados Maria de Lurdes Lazzarin Ferreira

Page 66: Memórias culinárias

Minha mãe, só Maria, era simples em tudo, assim como

o seu nome sugere.

Fazia apenas o trivial, mas tudo ficava delicioso. Não

sou eu apenas que digo. Meus primos recordam -

saudosos - "o arroz da tia Maria", que ninguém fazia

igual.

Não acostumada a contato físico, se esquivava dos

carinhos que tentava fazer nela. E acredito que era no

cozinhar que demonstrava o seu afeto. Só pode ser esse

mesmo o tempero. O prato campeão, na minha

opinião, eram os bolinhos de batatas recheados com

carne moída.Nunca comi iguais, e olha que tenho

procurado muito por eles.E tentei também fazer, com a

receita que a minha mãe me deu, sem as medidas, pois

ela só fazia "a olho".

Page 67: Memórias culinárias

Os dela sempre ficavam no ponto, moreninhos e secos

por fora e com o recheio bem molhadinho e muito bem

temperado.

Aos 70 anos de idade, aproximadamente, depois de ter

enviuvado e os filhos tomado seus rumos, deixou de

cozinhar.

Ela sabia da minha paixão por eles, então, mesmo na

época em que estava em greve com a cozinha, ia lá

apenas para prepará-los para mim, quando eu a visitava.

Ela viveu até os 93 anos, lúcida. Aqui vai a receita:

Cozinhe algumas batatas, passe no espremedor,

acrescente ovos e farinha. Se ficar muito mole, junte

mais farinha, até dar o ponto de fazer bolas na palma da

mão, achatá-las e recheá-las com a carne refogada. Para

esse refogado, que será o recheio, acrescente tomate,

salsinha e pedaços de azeitonas.

Page 68: Memórias culinárias

Doce de banana (da mamãe Dona Amália!) Maria José Leite de Souza

Page 69: Memórias culinárias

Eu gostaria muito de passar a todos vocês a receita muito fácil,

de um “doce de banana” que minha mãe sempre fazia. Eu e

minhas irmãs adorávamos este doce quando éramos crianças.

Não sei de onde veio a receita, mas era muito bom! Minha mãe

colocava o doce num pirex, em cima da geladeira e nós,

brincando e correndo pelo quintal, passávamos pela cozinha

com uma boa colher na mão! E assim... ia acabando o delicioso

doce!

O doce era feito assim:

- 1 dúzia de bananas nanicas maduras, bem macias

- açúcar a gosto

- canela em pó - a gosto (só depois de pronto)

Depois de descascar as bananas, minha mãe as colocava

inteiras, numa frigideira, uma ao lado da outra.

Page 70: Memórias culinárias

Com muito cuidado, ela tomava conta para as bananas irem

amolecendo, mexendo de leve com a colher, como se

estivesse só empurrando de lado, uma a uma.

Víamos rapidamente se formar uma “caldinha” meio grossa,

junto delas. Logo o doce ficava pronto para ser colocado no

pirex. Cada banana ia sendo posta lado a lado. Depois, era só

jogar canela e... ai que gostoso!

Page 71: Memórias culinárias

Mariano Giffoni

Frango com polenta

Page 72: Memórias culinárias

Saudade é o que sinto hoje nos meus 94 anos de

idade. Saudade de meus pais, irmãs, avós e demais

parentes e até do frango com polenta que minha mãe fazia

aos domingos em reuniões familiares e do qual

gostávamos muito.

Minha mãe era italiana do norte da cidade de Rovigo

e o frango com polenta é um prato tradicional na região.

Meu pai era do sul da Itália e quando minha noiva

passou a morar em nossa casa, ela tomou conta da cozinha

e o “menu” mudou passando a ter mais massas!

Na cidade de São Bernardo do Campo, na Avenida

Maria de Marchi, existe diversos restaurantes que servem

esse prato.

Vejam só: tenho saudade até do frango com polenta!

Mariano Giffoni

Page 73: Memórias culinárias

Ingredientes

• 2 colheres de (sopa) de óleo

• 1/2 kg de frango cortado em pedaços

• 1 cebola pequena picada

• 2 cubos de galinha

• 1 xícara (chá) de água fervente

• 4 tomates picados sem pele e sementes

• 1 xícara (chá) de flocos de milho pré-cozido

• 2 xícaras (chá) de água fria

• 1 colher (sopa) de margarina

Modo de Preparo

• Em uma panela, aqueça 2 colheres (sopa) de óleo e

doure o frango junte a cebola e refogue por 1 minuto

Page 74: Memórias culinárias

• Acrescente dois cubos de galinha dissolvidos em uma

xícara de água fervente e cozinhe por 15 minutos ou até

que fique macio

• Junte os tomates e cozinhe por mais dez minutos ou até

que desmanchem

• Acrescente a salsinha picada

• Reserve

• Em outra panela, coloque 1 xícara (chá) de flocos de

milho e 2 xícaras (chá) de água fervente

• Mexa até engrossar

• Junte uma colher (sopa) de margarina extra cremosa e

misture

• Espalhe a polenta em uma travessa e cubra com o frango

reservado

• Sirva em seguida

Page 75: Memórias culinárias

Comidas de infância Marilene Gonçalves Barbiellini

Page 76: Memórias culinárias

Não tenho muitas lembranças das comidas da minha infância,

talvez pelo fato de eu ter sido uma criança chata para comer.

Era magricela, não gostava de nada e na hora das refeições,

para o desespero da minha mãe, ficava enrolando.

Também não me lembro das comidas feitas pelos meus avós.

Só sei de algumas coisas que minha mãe fazia, mas acho que

não foram receitas herdadas da família, não.

Uma coisa boa ficou dessa época: não era propriamente a

comida, mas os petiscos. Um deles era um pão-doce que minha

mãe fazia nos fins de semana, sempre no sábado à tarde. Eu

ficava na cozinha com ela, vendo como sovava massa, fazia os

pães e punha uma bolinha da massa num copo com água.

Quando a bolinha subia, era hora de ir pro forno.

O cheirinho do pão assando inundava a casa toda. Era uma

delícia. A gente devorava aquela gostosura ainda quente. O

bom é que saiam uns pães grandes, que duravam o fim de

semana inteiro.

Page 77: Memórias culinárias

Infelizmente, não ficou a receita desses pães. Tento fazê-los,

mas não são mais os pães da minha infância.

Outra coisa gostosa também eram as balas de café. Eu

participava da enrolação das balas, que ficavam divinas.

Naquele tempo, minha mãe não sabia do problema de cáries

causadas por balas puxa-puxa e não se preocupava com isso. E

a gente - eu e meu irmão - se “entupia”.

Numa panela, ela colocava o açúcar, café forte, leite, mel,

manteiga, um pouco de farinha e um ovo. Misturava tudo muito

bem e deixava cozinhar em fogo baixo, mexendo sempre.

Cozinhava por uns trinta minutos, mais ou menos. Depois,

vinha a prova: o “ponto-de-bala”. Ela colocava um pouco da

mistura num copo com água fria. Se ficasse durinha, podia tirar

a panela do fogo.

Então, ela untava com manteiga o tampo da mesa que era de

mármore e despejava a massa. Muito quente, pelando! Esperava

esfriar um pouco, enrolava a massa em cordões e cortava em

pedacinhos. Eu ajudava a embrulhar balas com papel celofane.

Tudo de bom… Que saudade!

Page 78: Memórias culinárias

Almoço Judaico Sylvia Lerner

Page 79: Memórias culinárias

Minha família, de origem judaica, se encontrava às sextas-

feiras para o Shabat. Nós nos reuníamos em torno da mesa e

todos falavam juntos e riam de qualquer coisa que era falada.

Éramos muito felizes, mesmo com tão pouco nós nos

divertíamos.

Minha avó Helena sempre servia um caldo de carne e junto

com esse caldo ela fazia um tipo de pastel. Era uma receita

russa. Além disso, era servido um tanto de cenoura cortada

em cubinhos, ela era refogada com um pouco de açúcar, este

também trazido de Riga, local de onde eles vieram. Algumas

outras delícias – os sabores – ficaram desses jantares por

toda a minha vida.

Esses momentos também seguiram acontecendo na casa de

meus pais que já tinham mais possibilidade financeira.

Sempre nos reuníamos em torno da mesa e, como sempre,

todos falavam de uma só vez. Era uma noite abençoada.

Garanto que aqueles que tiveram a oportunidade de estar

presentes não poderiam se esquecer dessa reunião.

Page 80: Memórias culinárias

Bom apetite!

Boas lembranças!