MOSSA OPINIÃO - memoria.bn.br
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MOSSA OPINIÃO
SHNMíi tfMV
CONCILIAÇÃO
O primeiro fruto
monstruoso do
diálogo de Abi-Ackel
Há
alguns dias o ministro Abi-
Ackel apresentou, após ouvir
as lideranças dos partidos ex-
cluídos do governo, a propôs-
ta do regime para a alteração
da Lei dos Estrangeiros. Dessa forma,
caminha para o desenlace a primeira ro-
dada do diálogo, ou seja, dessa tentativa
mais recente de setores da oposição che-
garem a um acordo e entendimento eom
o regime militar.
Há duas semanas nesta seção, un
artigo mostrava a improeedência do ar-
«taiento fundamental daqueles que têm
defendido a possibilidade e a necessida-
de desse entendimento. A idéia básica da
qual partem os partidários do diálogo
com a ditadura é a de que existem alguns
pontos políticos fundamentais que
podem ser defendidos ao mesmo tempo
pelo governo Figueiredo e a oposição de-
mocrática e popular. Ao contrário, aqui
secontra-argumentava que esses interes-
ses comuns não existem e| que, exata-
mente por causa disso, a proposta de
acordo com o regime só é possível se se
abandona o programa oposicionista. O
diálogo em torno da Lei dos Estrangeiros
apresentado pela ditadura militar eonfir-
ma ou desmente essa análise? Tiremos a
prova.A Lei dos Estrangeiros foi imposta, em
agosto do ano passado, através do fami-
gerado mecanismo do decurso de
prazo; fora apresentada logo apôs o
general Figueiredo ter regressado da
visita que fizera à ditadura müitar ar-
gentina; e não por mera coincidência. O
então líder do governo no Senado, o
senhor Jarbas Passarinho, afirmou alto e
bom som que a Lei dos Estrangeiros vi-
sava impedir que o Brasil se transfor-
masse num refúgio, onde os que se
opõem aos regimes do Cone Sul (Ar-
gentina, Uruguai Chile e Paraguai) pudes-
sem organizar a solidariedade à luta dos
povos daqueles países. Portanto, a Lei dos
Estrangeiros é fruto dc um acordo político
entre a ditadura brasileira e as demais
ditaduras militares do Cone Sul do Con-
tinente. Seu objetivo é cercear, prender e
até deportar os democratas latino-ame-
ricanos que se encontram entre os
120 mil chilenos, os 80 mil argentinos, os
40 mil uruguaios, e os 20 mil paraguaios
que se calcula estarem no Brasil em si-
tuação irregular do ponto de vista jurí-
dico. Ela é uma lei antidemocrática pelo
seu conteúdo e pela forma como foi im-
posta à Nação. A atual proposta de alte-
ração apresentada por Abi-Ackel altera
o caráter dessa lei? De modo nenhum:
da mantém e até aperfeiçoa o caráter
fascista dessa legislação.
O governo propõe, fundamental men-
te, três alterações na Lei dos Eotran-
geiros. Propõe, em primeiro lugar, uma
modificação no artigo que obriga hotéis,
imobiliárias, síndicos de edifícios de
apartamentos etc, a fornecerem intorma-
ções sobre a vida dos hóspedes ou inqui-
linos estrangeiros. Mas a modificação
proposta é uma piada: de acordo com
cia, as informações, isto é, as delações,
só serão obrigatórias quando solicitadas
pelo Ministério da Justiça. Ou seja, con-
tinuam sendo obrigatórias em todos os
casos que interessarem ao regime mili-
tar.
A
segunda alteração proposta si-
mula um recuo, admitindo a
inexpulsabilidade do estran-
geiro casado com brasileiro.
Porém, em primeiro lugar,
fica claro que os padres e bispos pro-
gressistas — celibatários — jamais goza-
rão dessa inexpulsabilidade. Em segun-
do lugar, a inexpulsabilidade só se aplica
a casos em que o casamento tenha sido
celebrado pelo menos há cinco anos. Ou
seja, aplica-se a todo mundo,menos aos
latino-americanos que ingressaram no
país no decorrer dos últimos três ou
quatro anos, para escapar das perse-
guicões políticas que lhes moviam as di-
taduras dos seus países.
Por último, o regime militar apresenta
uma terceira alteração que, embora
também aparente um recuo, é, na reali-
dade, um aperfeiçoamento do caráter
fascista da Lei. Propõe o governo que o
estrangeiro que tenha ingressado no
Brasil até 20 de agosto de 1980 possa
regularizar temporariamente essa situa-
ção através de um registro provisório,
que lhe garantirá o direito ao trabalho.
^^mm* mmwÊF^âTm {**!!%
Já podemos nos ocupar com o próximo passo do programa
espacial: o momentoso tema do estaeioMmeieUP...
MOVIMENTOSlRVlCOS
INTERNACIONAIS£t W*\\it
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O segredo desse súbito democratismo da
ditadura militar encontra-se no advérbio'temporariamente". É que essa altera-
cão não revoga o artigo 132 da Lei do Es-
trangeiros. pelo qual o estrangeiro só
obtém registro permanente para estada
em nosso país se o governo de seu país se
dispuser a contribuir financeiramente
para o seu assentamento no Brasil. Ora,
que ditadura do Cone Sul concordaria
em colaborar, inclusive com a doação de
divisas, para instalar os seus inimigos
políticos em nosso país? Na verdade, a
menos que tenham outras garantias com
isso, os democratas latino-americanos
refugiados no Brasil podem até estar
sendo convidados, através da isca do vis-
to de permanência temporário, a entre-
gar o seu paradeiro para a polícia
política do seu país. E, se os pinochets,
mezas, violas, stroessners negarem-se a
financiar a sua permanência no país,
poderão ser sumariamente deportados
para os cárceres políticos de seus países,
é claro.
Muitos parlamentares, antes de o mi-
nistro Abi-Ackel apresentar a sua pro-
posta de alteração na Lei dos Estran-
geiros, concordavam com a afirmação de
um oposicionista para o qual "o
diálogo
governo-oposição produzirá um a nova Lei
dos Estrangeiros que vai resolver uma
boa parte dos problemas existentes no
setor". Para quem se iludia, o absurdo
da previsão começa a ficar claro. Não é
possível resolver "problemas do setor"
através do entendimento e do acordo
com a ditadura militar porque, tanto
nesse setor como em todos os outros que
interessam à frente oposicionista, os in-
teresses do regime se opõem aos interes-
ses democráticos e populares. O governo
quer aprovar a sua L<ú dos Estrangeiros
para perseguir os democratas latino-
americanos e fortalecer as ditaduras do
Cone Sul. Ã oposição, ao contrário, in-
teressa apoiar a luta desses democratas
até a derrocada completa dos regimes que
os oprimem. Isto por que o avanço da
luta democrática nas nossas fronteiras
fortalece, internamente, a oposição bra-
sileira.
Com
a sua proposta de altera-
ção na Lei dos Estrangeiros,
o governo Figueiredo está sen-
do coerente: deixa claro que
não pretende trair os seus
aliados no Cone Sul. A oposição demo-
crática brasileira também não pode
deixar de ser coerente: deve reprovar em
bloco esta lei fascista remendada e con-
tinuar sendo fiel aos interesses dos de-
mocratas latino-americanos.
METALÚRGICOS
Acordo na
Volks é ruim e
não é a única
saída
A
comissão de Salários do Sin-
dicato dos Metalúrgicos de
Sào Bernardo do Campo,
que reúne os ativistas mais
combativos da categoria, re-
cusou o protocolo de acordo para três
meses de redução na jornada de trabalho
e nos salários dos trabalhadores, firma-
do dia dez passado entre representantes
da Volkswagen e üa Junta Governativa
que substitui Lula e seus companheiros
de diretoria cassados. A própria Junta,
aliás, acabou depois apoiando a campa-
nha de denúncia do protocolo, (veja à pá-
gina 9).
Eles têm razão: os operários mais con-
seqü entes | não podem deixar de colocar
para seus companheiros — especialmen-
te para os que estão amedrontados pela
crise e não vêem outra saída — que o
possível acordo é injusto e não soluciona
seus problemas, mesmo a curto prazo.
Em primeiro lugar, ele exclui os dez mil
demitidos recentemente na região. De-
pois, não garante o emprego dos que o
assinarem sequer nos quatro meses de
estabilidade prometidos pela empresa a-
pós sua vigência — o protocolo admite
demissões nesse período, caso a crise se
agrave. E. por último — e o mais grave:
com ele os trabalhadores estarão dando
um mau exemplo para outras categorias
e, no fundo, assinando um compromisso
de ajudar os responsáveis pelo mo-
delo econômico brasileiro a pagar pe-
Ia brutal crise em que meteram o país ao
promoverem um modelo de desenvolvi-
mento baseado na indústria de bens de
luxo, dependente do capital estrangeiro e
voltado para uma minoria da população.
Quem já sofreu com esse modelo não
deve pagar para remendá-lo. Os trabalha-
dores têm outras saídas: devem mobili-
zar essa massa inédita de desempregados
para exigir que o governo resolva concre-
tamente seus problemas — afinal, o go-
verno não ajudou até o "pobrezinho" do
Maluf despejando milhões de cruzeiros
na Lutfalla quando ela estava em difi-
culdades?
BRASILaam»$ vs'****»-**.*** m tmmuwm
MILITARES
Serpa preso, de novoÉ quase certa a punição do general Serpa,
esta semana: ele vai falar contra o projeto Carajás
Antônio Carlos Queiroz
Sc não ocorrer nenhuma surpre
sa antes, nesta quinta-feira, du
23. o general Antônio Carlos dt
Andrada Serpa comparecerá ac
Clube de Engenharia do Ri(
Janeiro para fazer o seu décimc
pronunciamento público desde
fevereiro de 1979, quando estava
na chefia do Departamento Ge-
ral do Pessoal (DGP) do mini*
tério do Exército. O aconteci-
mento está sendo aguardado
com ansiedade, especialmente
nos gabinetes do Palácio do Pia-
nal to.
A não punição do velho ge-
neral nacionalista pelo ministre
do Exército é que não será uma
surpresa. Embora o próprio An-
drada Serpa esteja confiante
no contrário, são lavas contadas
o seu segundo enquadramento,
em quatro meses, nos dispositi-
vos do Regulamento Disciplinai
do Exército (RDE) e do Estatutc
dos Militares, que proíbem as /VO .seu
manifestações políticas não au-
torizadas. tanto dos militares da ativa
como da reserva. Como se lembra, ele toi
punido com dois dias de prisão domiciliar
no último mês de dezembro, depois de ter
discursado no Instituto de Engenharia de
São Paulo e de ter assinado o manifesto"Em defesa da nação ameaçada", jun-
tamentecom alguns empresários, intelec-
tuais e militares da reserva.
Para justificar suas reiteradas interven-
ções no campo da política, Serpa costuma
repetir a frase de Osório. Marquêsde Her-
vai. segundo a qual "a
farda não abata no
peito do soldado os brios do cidadão .
Fsta máxima sempre o acompanhou, ren-
dendo-lheaimagemde"recalcitrante"noseio do Exército.
Foi com esta disposição que, em 1955, o
então tenente-coronel Antônio Carlos de
Andrada Serpa — bastante considerado
pela sua participação na campanha da I tá
lia. durante a Segunda Guerra Mundial —
Ganhou umabatalhajudicial movida con-
tra ele pelo ministro da Guerra, general
Henrique Lott. Serpa havia desobedecido
uma ordem de Lott e por isso foi enqua-
dradoportrransgressãodisciplinar, preso
e correndo o risco de perder a patente.
Católico, sempre
atacou o consumismo
e a permissividade
Serpa continuaria conspirando até a vi-
tóriadogolpedel°deabrildc 1964. Desde
então, manejando uma vasta cultura his
tórica. princípios doutrinários herdados
da família dos Andradas — ele é descem
dente diretode José Bonifácio, o Patriarca
da Independência - e da ideologia ude-
nista de Minas Gerais, altm de uma anti
comunismo exarcebado e militante, o ge-
neral Andrada Serpa tornou-se um dos
maiores defensores dos ideais da Revo-
lução" de 1964. A propósito é interessante
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sííio Borda do Campo, o general lê e e espionado...
lembrar que, nofinal de 1978, ele declarou
que para se transformar numa potência
até o ano 2000. o Brasil "precisaria de mais
15 anos de regime como este", estando
aindaemvigoroAI-5,instrumentoqueele
sempre defendeu com paixão, e que nesta
época já estava pronto para ser tirado de
cena pelo general Ernesto Geisel. Vieram
as salvaguardas constitucionais, que sa-
tisfiz.eram o general Serpa.
Católico praticante, o general Serpa É
profundamente religioso e moralista, não
perdendo a oportunidade de atacar, por
exemplo, o uso dos meios de comunicação
na divulgação do "consumismo e da per-
missividade". Sua visão política eo papel
social que defende para os militares decor-
trem grande parte de seu arraigado pater-
nalismo. presente até mesmo na lingui-
gem coloquial: Serpa costuma tratar seus
interlocutores de "meu filho". O general
dizia na semana passada em seu sítio de
Barbacena que as elites políticas brasilei-
ras são despreparadas para conduzir o
processo político Idevid > à sua formação"dominantemente bac.iarelescae sem 0
apoio dc partidos organizados") e dai
justifica a intervenção dos militares na ce-
na política como "poder moderador ,
lembrando que o fato foi institucionaliza-
do já na Constituição de 1891.
É contra a
convocação de uma
ConstituinteSerpa evoca a história para também jus-
tificar sua posição contrária ãs eleições di-
retas para a presidência da República, o
voto proporcional, a proliferação de par-
tidos políticos e a convocação de uma
Assembléia Nacional Constituinte. Quan-
toa esta última questão, ele acha que exis-
tem pelo menos duas correntes que a
defendem: os primeiros seriam os "mal
in-
tencionados, que querem a Constituinte
como instrumento para derrubar.o gover-
no", os demais seriam os "ingênuos,
que
acreditam poder resolver as questões poli-ticas. econômicas e sociais, através da lei
escrita". "N,o
Brasil ou em qualquer outro
pais _._ afirma Serpa num discurso pro-
nunciadoemsetembrode 1979—a convo-
cação de Constituinte só poderá resultar
da revolução vitoriosa. Faltará sempre, às
facções derrotadas a força necessária a
condução do processo político; foi assim
em 1824. 1889. 1934. 1946 e 1967".
Um direito que Serpa faz. questão de de-
tender, alegando uma tradição familiar
(por sinal, quebrada pelo seu primo ir-
mão.oex-líderda Arena. José Bonifácio.o
Zézinho) é a liberdade de imprensa, com a
ressalva de que deve estar submetida a
uma lei especifica para evitar o consu-
mismo. a permissividade e defender a cul-
tura nacional contra os enlatados estran-
geiros.
Com caniços de luxo,
dois agentes pescamlambarís e girinos
Como se vê. as posições políticas do ge-
neral Antônio Carlos de Andrada Serpa
sãoextremamente conservadoras e por es-
ta razão sua margem de manobra política
é bem mais limitada do que a dó falecido
general Hugo Abreu. que. defendendo
bandeiras democráticas como a Anistia
Ampla. Geral e Irrestrita e a convocação
da Constituinte, conseguiu impulsionar a
Frente Nacional dc Redemocratização
que apoiou a candidatura oposicionista do
general Euler Bentes Monteiro. De qual
quer maneira, o posicionamento dc Serpa
no plano da economia é que lhe garante
notoriedade a até mesmo certa simpatia
entre as oposições. Afinal, embora nunca
se esqueça dc repetir que sempre eomba-
teu o comunismo materialista e ateu e
defenda bandeiras direitistas no plano
político. Serpa é intransigente ao defender
a soberania nacional.
Desde que foi afastado do DGP. o
general Antônio Carlos de Andrada Serpa
refugiou-se na fazenda Borda do Campo,
no município de AntonioCarlos, cuidando
da fazenda ou estudando, cercado pelos
quase 20 mil volumes (quase todos com-
prados em sebos) de sua biblioteca. Lá
mesmo, como frisa, o general Andrada
Serpa tem oportunidade de ver como c
país é exaurido em suas riquezas: locomo-
tivas movida adiesel subsidiado, puxando
até 20 vagões cada uma. levam o minério
de ferro de Minas Gerais para ser vendido
a preços aviltados no mercado externo.
Ele vai atacar a
entrega de Carajás
aos estrangeiros
A monotonia do campo e do barulho das
locomotivas andou sendo quebrada nos
últimosmesesem AntonioCarlos: primei-
ro, por um helicóptero enviado pelo gene-
ral Coelho Neto. comandante da 4a Dt-
visão do Exército, com sede em Juiz de
Fora. para espionar a fazenda Borda do
Campo, certamente à procura de alguma
emissora de rádio clandestina. Depois, por
dois agentes mal disfarçados de pescado-
res. com sofisticados caniços. lançados ao
córrego da fazenda, onde mal existem
lambaris. mas abundam girinos.
A propósito da espionagem que vem
sofrendo o general Serpa. cabe uma per-
gunta: tais operações estariam sendo de-
flagradas pelo governo para detectar um
possível golpe militar liderado pelo gene-
ral Andrada Serpa? O próprio general, em
conversas com amigos, se defende: embo-
ra seja o último dos generais com pos-
sibilidade de sensibilizar uma facçãodoE-
xército. Serpa considera que um golpe mi-
litar apenas agravaria os problemas que o
país enfrenta, além de possibilitar a ex-
plosão de uma Guerra Civil, que — ele
lembra. — uma facção do Exército dividi-
do. como mostra a história, armaria a po-
pulação. Além disso, os militares golpistas
iamais teriam o apoio popular que ele con-
sidera que o golpe de 1964 teve. pois hoje
— reconhece — as Forças Armadas so-
fiem um processo de grande desgaste.
Pelosim.pelonão.ocertoéqueosobuses
do general Andrada Serpa estão prontos
oara a próxima batalha (verbal) nodiap,
noClub-deFngenhariadoRiodeJaneiro:
no novo discurso Serpa aprofundara suas
critteasà política econômica definida pelo
ministro Delfim Netto. exigirá com mais
veemência do governo "mudanças oe
rumo" e fará novas denúncias da desna
cionalização do País. Serpa abordara a
questão do Projeto Jari. por exemplo. ma>
o principal mote do discurso, como Movi-
mento pôde apurar, será um ataque a
entrega do Projeto Carajás, pelo governo.
ao capital estrangeiro".
MOVIMENTO - 20 a 26/4 81
OPOSIÇÃO E GOVERNO
O velho conto do diálogoO regime já tentou várias vezes antes o
''diálogo"
Roberto Martins
O ministro da Justiça. Abi Ackel, int-
ciou no mês passado uma série de reu-
niões com presidentes dos partidos de
oposição, dando início a um novo "dia-
logo" entre governo e oposição. Desta
feita o objeto dos entendimentos pro-
curados pelo governo é o Estatuto dos Es-
trangeiros. E. a partir daí, novas fases se
seguirão, segundo consta.
A tática do "diálogo"',
que o governo
está empregando agora contra a oposi-
ção. não é nova. Ao longo de 17 anos.
por diversas vezes os governos militares
já a adotaram. E sempre souberam ai-
tornar o "diálogo" com a repressão.
Castello Branco, inicialmente, teve
apenas <>() dias de poderes absolutos —
enquanto vigeu o Al-1. Ele "dialogou
freqüentemente com o que restou dos
antigos partidos que se colocaram na
oposição, dizimados que foram pelas
cassações. E nestes entendimentos per-
mitiu até as candidaturas dos pedessistas
Negrão de Lima e Israel Pinheiro,
pectivamente aos governos da Guanaba-
ra e de Minas Gerais. Mas apostou na
derrota de ambos, e perdeu. Encerrou o
"diálogo" com o Al-2. em 1965. que dis-
solveu os partidos, e reabriu o ciclo de
cassações e de poderes absolutos.
Costa e Silva assu-
miu 0 governo com o
país "constituciona-
li/.ado" no início de
1%7. sem a vigência
de Ato Institucional.
Dizia governar para"todos" os brasilei-
ros e o signo era o
diálogo: e não só
com o MDB e insti-
tuições da sociedade
civil, mas até com o
movimento popular.E assim fe/.
Quando da passeata dos KM) mil. no
Kio dc Janeiro, em 1968, o velho maré-
chal pediu para dialogar eom represen-
tantes dos manifestantes. Uma comissão
foi eleita e dirigiu-se a Brasília.
Entre as reivindicações que a comissão
levava, estava a soltura de dois grupos de
estudantes presos no Rio de Janeiro. Um
grupo de estudantes de arquitetura preso
quando fazia panfletagem na avenida
Brasil e outro que havia sido preso numa
manifestação anterior, entre os quais se
encontrava o líder estudantil Jean Marc.
acusados de incendiarem uma viatura do
Exército. Costa e Silva tentou negociar o
fim das manifestações soltando apenas o
grupo que fazia panfletagem.
Desde o início os es-
tudantes respondiam
ao aoelo de "diálo-
go" lembrando as
prisões, o fechamen-
to de entidades, a Lei
Suplicy em vigor, os
a cor dos MEC-
USAID. Os traba-
lhadores reclama-
vam das intervenções
nos sindicatos, do
fim do direito de gre-ve. Os artistas cia-
mavam contra a cen- \.
sura. Mas enquanto dialogava, e confun-
dia parte da oposição com isso, o governo
Costa e Silva intensificava a repressão
policial às manifestações de rua e prepa-
rava a volta dos poderes absolutos...Di-
zem que o AI-5 começou a ser gestado em
junho, numa reação ao ascenso do movi-
mento popular contra a ditadura. O Ge-
neral Garrastzau Mediei, então chefe do
SNI, confirmou isso mais tarde.
A 13 de dezembro de 1968 acaba qual-
quer perspectiva de "diálogo"...
Durante os últimos meses do governo
Costa e Silva e nos governos da Junta Mili-
tar e do general Garrastazu, não se falou
em diálogo. Afinal, com o Brasil em pleno"milagre econômico", para que
"diálogo"
OU liberdade?...r-.wy*
_______k ¦Nl r________K
f^LáA u mm
Garrastazu
Mediei
IA ",_W
"mCastelloBranco
Ma*Costa
e Silva
Mas o "milagre" vai
chegando ao fim.
Contradições entre
os diversos grupos e
setores dominantes
começam a se mani-
festar e a base social
e política do regime
estreita-se perigosa-mente. A candidatu-
ra Geisel surgiu nes-
te quadro. E antes
mesmo de tomar
posse, o novo general
presidente inicia mais uma fase de "diálo-
go" com a oposição, desde o seu escritório
no Largo da Misericórdia, no Rio de Ja-
neiro. Ouve setores empresariais e políti-
cos do governo e da oposição. Conversa
diretae indiretamente, já assessorado pelo
general Golbery. E o general Geisel dá
início a seu governo sob o signo da"distensão lenta e gradual", mas
"segu-
" Ós conciliadores de toda hora ficam
alvoroçados. De fato Geisel conseguira
ampliar a base política do regime, com
mil promessas de fim das torturas, e da
censura à imprensa, anistia, e fim do
AI-5. É bem verdade que todas as pro-
messas eram veladas, implícitas, mas
bastaram para contentar muita gente.
Em contrapartida a censura a imprensa
se mantinha, assim como a tortura. Em
nenhum outro governo da safra pos-64
loi tão grande o número de desapareci-
dos políticos. Em 1975 Geisel pôs um
basta nas ilusões. Em famoso discurso de
1° de agosto, afirmou que a distensão
era mais social que política, e que não se
cogitava do fim do AI-5, ou anistia...
O governo Geisel será pródigo em "diá-
logo". Terá inclusive
a famosa "missão
__Portela", conduzida <
pelo ministro da Jus-
tiça, o piauiense Pe-
trônio Portella. Um
dos pontos de "diálo-
go" é exatamente a
reforma do judicia-rio. Mas quando a
maioria do Congres-
so se recusa a apro-
vá-la, reivindicando
alguns pontos essen-
ciais, como o resta-
belecimento do habeas corpos. Geisel fe-
cha o Congresso c decreta o não menos fa-
moso "pacote de abril" dc 1977.
A "missão Portela" prossegue. Tenta
desanuviar o clima criado com o "pacote
de abril". Ouve os partidos e, além de-
les, entidades da sociedade civil, como a
OAB. a ABI. a CNBB. Preparam-se as
reformas políticas. Mas as "reformas"
são a estratégia do regime. Velho sonho.
desde os tempos de Castello Branco, de
institucionali/á-lo. Reflete também as
contradições no meio dominante, sendo
necessário encontrar maiores espaços pa-
Ernesto
Geisel
i MMM0 '*^$?âÉj.
\Wa*^5 \_\z
:__-
\__ __x- ** 1':W____m_tP
JoãoFigueiredo
ra acomodar as diversas correntes. As-
sim. as "reformas"
já estão prontas. O"diálogo" visa apenas ganhar respaldo
ao projeto. Tanto é que as reivindicações
da oposição não são aceitas. O AI-5 é
embutido na Constituição e a nova Lei de
Segurança Nacional é aprovada confor-
me o modelo proposto pelo Executivo,
por decurso de prazo.No governo do general Figueiredo, a
mesma equipe basicamente — tendo o
general Golbery como eminência parda e
o ministro Portella na Justiça —, prosse-
gue a institucionalização do regime, ja
agora com o nome de "abertura". As
medidas centrais são a anistia e a refor-
mulação partidária. É bom lembrar que
a esta parte o movimento popular e de-
mocrático já ganha certa força e, inega-
velmente. influi de algum modo na si-
tuação. A anistia sai um pouco menos
restrita e parcial do que o regime pre-
tende. Mas nào atende aos reclamos da
Anistia Ampla, Geral e Irrestrita recla-
mada pela oposição. E quanto à refor-
mulação partidária, sào conhecidas as
suas restrições.
O motivo era de "diálogo" — o Esta-
tuto dos Estrangeiros — foi enviado sor-
rateiramente ao Congresso em meio ao
recesso de julho do ano passado, com
pedido de urgência, depois de ter sido
gestado durante 6 anos no Conselho de
Segurança Nacional. Findou aprovado
por decurso de prazo sem que o governo
aceitasse uma emenda sequer."Bem, aprovem-no assim, depois nós
reformulamos" — dizia o governo então,
já criando o motivo para o "diálogo".
À guisa de conclu-
são, agora importa
menos saber se o go-verno levará ou não
em conta as opiniões ^da oposição sobre o
Estatuto dos Estran-
geiros (já demons-
trou que não preten-de);nem o fato de ter
discriminado o presi-dente do Partido dos
Trabalhadores —
Luís Inácio da Silva— e Ivete Vargas, do
PTB, importa saber qual a tática do regi
me com as suas propostas de "diálogo".
Em primeiro lugar, o regime sempre
alternou o "diálogo" com a repressão;
medidas mais liberalizantes com outras
discricionárias. E apesar de todos os"diálogos" sempre seguiu seu caminho,
com estratégia e tática previamente de-
terminadas, mudando apenas o secunda-
rio, ou quando sofria derrotas.
Em segundo lugar, os momentos de"diálogo" são sempre aqueles em que o
regime enfrenta mais dificuldades. Com
essa tática, o regime tenta desviar a opo-
sição dos problemas centrais.
Finalmente, é o regime que escolhe o
tema e os interlocutores. Neste sentido é
atualíssimo o documento aprovado pela
comissão executiva do PMDB, proposto
pelo ex-governador Miguel Arraes:
Mas porque alguns pontos desse docu-
mento tocam fundo na própria essência
do regime, em torno deles o regime nào
poderá dialogar, restando apenas "dialo-
gar" em torno de pontos secundários. E
em torno dos grandes temas, da essência
do regime, só há que mudar o próprio
regime, ou, como diz o documento: "a
natureza do Estado".
!#83Í
Os abençoadosA catilinária do
senador Jarbas
Passarinho (PDS-PA) contra seto-
res da Igreia,"que estão pre-
gando o õdio",
teve uma pronta«ihJ. 's\k_V~ resposta do Arce
3I- ¦•¦.%/, bispo de São
_m •<£_&_,'3 ' àm~-. Paulo, Dom Pau-
AA í***9*** AmÂm» lo Evaristo Arns
(foto) Ao referir-se ao episódio critica-
do por Passarinho (a recusa de um pa
dre paraense de abençoar a inaugura-
cão de uma agência do Banco da Ama-
zôniaem Tucurui, Pará), Dom Evaristo
Arns fez a seguinte consideração: um
banco não precisa tanto das bênçãos
de Deus, quando tem as benesses de
tantos poderes terrestres e, sobretudo,
quando pessoas da mais alta coloca-
ção já puderam afirmar que os bancos
são em grande parte, os responsáveis
Dela crise atual". Definindo a posição
da Igreja, Dom Evaristo explicou que"isto não significa que um padre deixe
de orar em favor dos bancários, que re-
cebem muitas vezes salários msufi
cientes" E lembrou ao senador Passa-
rinho as palavras do industrial Antônio
Ermírio de* Moraes, segundo as quais"o Brasil se divide entre os banqueiros
e os outros".
Leis iião faltam
O Ministro da Aeronáutica, Délio Jar-
dim de Mattos, defendeu na semana
passada, a elaboração de uma lei anti-
terror, mais rigorosa do que a atual Lei
de Segurança Nacional, como a melhor
fórmula para fazer frente aos atenta
dos terroristas que até agora
continuam impunes. Délio defendeu tal
lei baseado nos exemplos da Alemã
nha e Itália, onde uma legislação espe-
cífica sobre o terror deu ao Estado
maiores poderes Sua proposta, entre-
tanto não conta eom o apoio da maio-
ria dos ministros do STM, para quem a
atual Lei de Segurança Nacional jâ ô
suficiente para fazer frente ao terro-
rismo E para setores da sociedade
civil, como a OAB, tal lei irá reforçar o
autoritarismo, pois com isto o fcstaco
poderá invadir domicílios de cidadãos
em decorrência de uma simples suspei-
ta" Segundo o presidente da OAB. o
próprio Código Penal já permite o arse-
nal jurídico para o combate ao terror
Se é assim, a impunidade ao terrons-
mo de direita existe náo por falta oe
lei mas pela omissão do regime, que
não se tem mostrado interessado em
punir os terroristas, apesar das provas
e evidências que surgiram em vários
casos
O terror volta?Mais do que um novo ato folclórico
das malufiadas, a bombástica declara-
ção do governador de São Paulo, Paulo
Maluf de que sentia saudade dos tem-
pos do ex-presidente Garrastazu Mé-
dici ("quando tínhamos neste país oti-
mismo, progresso e tranqüilidade so-
ciai"), é um claro indicativo da solução
proposta pelos setores da uítradireita
para a solução da crise que vive o regi-
me militar: o retorno à repressão do
período medicista. Pela boca de Maluf,
que fez sua declaração logo após visi-
tar o ex-ditador Mediei, falaram os que
ficaram insatisfeitos com as palavras
de Figueiredo, que antes tinha implici-
tamente se dirigido a tais setores, ao
considerar que "mais vale uma
democracia em dificuldades do que
uma ditadura progressista". Ao confes-
sar o seu amor, nostálgico pelos fascis-
tas do tempo de Mediei, Paulo Maluf
desagradou a gregos e troianos: ir..e-
diatamente, amplos setores da oposi-
ção repudiaram suas palavras, e até
mesmo no Palácio do Planalto ele pro-
vocou desagrado, pois dessa vez Ma-
iuf teria avançado o sinal.
MOVIMENTO - 20 a 26/4/81
Trama oculta
O governo federal pretende exonerar
o prefeito do município fluminense de
Angra dos Reis, comandante Roberto
Carlos do Valle Ferreira, segundo de-
claracões do próprio ministro da Justi-
ça, Ibrahim Abi Ackel. Angra dos Reis
è considerada como área de segurança
nacional e a versão oficiosa para a des-
tituição do prefeito nomeado è de queele está perseguindo
"políticos do PDS
e cometeu vários atos de corrupção".
Por detrás do surto de ombridade ad-
ministrativa do ato do governo federal,
esconde-se entretanto outras inten-
ções menos nobre: a destituição é uma
reivindicação do PDS do Rio de Janei-
ro, mais particularmente do senador
Amaral Peixoto, na sua briga com o
governador do Rio, Chagas Freitas.
Este não è um episódio isolado e ama-
ral Peixoto vai pedir a destituição de
mais dois prefeitos de área de seguran-
ça nacional: o de Caxias.e o de Volta
Redonda. Com tais medidas, o PDS•pretende contrabalançar o peso da má-
quina do governo estadual, atualmente
colocada a serviço do candidato cha-
guista à sucessão governamental: o
deputado Miro Teixeira.
Eleição primáriaO senador Franco Montoro tem uma
proposta para que o PMDB de São
Paulo possa definir quem será o seu
candidato para o governo do Estado: a
realização de uma eleição primária com
os seus 150 mil filiados. Atualmente, o
PMDB paulista tem dois candidatos. O
senador Franco Montoro e o também
senador Orestes Quércia; que na sema-
na passada foi lançado oficialmente
como candidato ao governo do Estado,
com o apoio de oito diretórios munici-
pais Franco Montoro conta, segundo
ele com o apoio de 300 diretórios
municipais e acaba de receber um forte
aliado: o deputado Alberto Goldman
que controla uma parte considerável da
máquina partidária no Estado. Gold-
mar. está redefinindo a sua opinião de
aooio a Quércia e deve somar com
Montoro. Em vista disso, a tendência
é uma composição entre Montoro co-
mo governador e Quércia, como candi-
dato à vice-governadoria.
Sem defesa
O jornal alternativo Repórter teve
duas edições apreendidas somente na
semana passada sendo a segunda sem
determinação do Ministério da Justiça.
Essa foi a 15a apreensão do Repórter e
na penúltima vez a desculpa oficiai toi
que o jornal continha uma reportagem
sobre curras na Baixada Fluminense
considerada um atentado * mo-
ral e aos bons costumes". Segunao os
editores do Repórter, a medida do Mi-
nistério da Justiça è uma clara perse-
guição ao jornal, particularmente "por-
que atravessamos uma fase de expan-
são" Os editores do Repórter critica-
ram ainda a decisão como arbitrária,"pois não nos foi dada nenhuma opor-
umidade de defesa, como estabelece a
própria Lei de Imprensa — que por si
só já é autoritária".
a*****\\\ Wm* '
4Í
W ÉÊk
Malufismo"0
apego aos meto-
dos fascistas pa-*r
" rece ser.o forte do
áf governador de
mJz&idL Sâo Paulo, Paulo
jfir7 ^v Maluf (foto), como
TT Jj£-\ mdica a Sua mais*m*^*J n0va
criação: aformação de uma"Juventude Malu-fista Brasileira".A Juventude Ma-
,-lufista por en-
quanto tem se dedicado a atividades
prosaicas, tais como entregar flores à
mulher do governador, Silvia Maluf, e
apareceu publicamente pela primeiravez no Aeroporto dos Guararapos. em
Recife, quando o governador de Sáo
Paulo esteve nesta cidade, na semana
passada, dando prosseguimento à sua
peregrinação de aliciar bases do PDS
parada sua "candidatura" à presidência
da República
fTãom do Senhor Presidente da Reoública orientação no
do do que a FUNAI so abstenha de qualquer providencia
tendente a estimular a constituição da chamada
Nações Indígenas"
Aproveito a oportunidade para renovar a Vos
ência protestos de alta estima e consideração.
M/f*-?/?'GOLBERY DO COUTO E''SILVA
Ministro Che4e do Gabinete Civil
/
Para Golbery, índio bom é aquele que não tem conhecimento de seus direitos...
INDIOS
A cilada que Golbery
armou para os índiosUm documento
"secreto" contra os direitos
elementares dos índios
A notícia estourou como uma bomba nos
meios indigenistas: o general Golberydo
Couto e Silva, chefe da Casa Civil da Pre-
sidência da Republica, havia orientado a
Funai.com base em estudos do SM. para
oue nao fosse permitida a constituição ju-
rídica da UNI — Uni^o das Nações In-
dígenas. A partir desses documentos con-
lldcnciais. datados de novembro do ano
nassadoe assinados por Golbery e pela As-
sessoria Jurídica do Gabinete Civil (ver
fac-símiles), o deputado Modesto da Sil-
veira (PMDB-RJ) denunciou à nação, em
discurso pronunciado no dia 8 passado na
Câmara Federal, a tramóia do governo
nara manter os povos indígenas no Brasil
desorganizados e fracos, ou seja, sempre
submissos à Funai. O atual presidente
desta fundação, coronel Joio Carlos No-
bre da Veiga, implantou uma política de
terror, demitindo sertanistas e antropo-
logos e contratando oficiais militares para
os altos cargos do órgão e sargentos e cabos
da reserva para os postos nas aldeias.
Na "integração",
o índio vai virar
peão e bóia fria
Os protestos chegaram de tinia parte. O
Cimi-Conselho Indigenista Missionário,
pronunciou-se no dia seguinte, por meio
dc seu vice-presidente. Dom Tomás Bal-
dumo. bispo da diocese de Goiás, e ainda
pelo seu Regional Norte I (que reúne
missionários indigenistas do Estado do
Amazonas e do Território de Roraima).
Outras entidades reforçaram este clamor.
Afinal, havia sido descoberta a razão do
empenho do ministro do Interior. Mário
\ndreazza, e do coronel Nobre da Veiga.
há cerca dc dois meses, em expulsar de
Brasília um grupo de jovens líderes de
várias nações^indigenas. Fstes jovens es-
Antônio Carlos Moura
tudavam na Capital federal e constituíam
os quadros mais escolarizados da UNI.
Naquela ocasião, a Funai tentou disper-
sar. por diversas escolas de seus Estados de
origem, os jovens estudantes indígenas.
Nobre da Veiga desenterrou, inclusive, a
ameaça da "emancipação" compulsória
de índios, particularmente as lideranças
mais incômodas, como o cacique xavante
Mário Junina, o pareci Daniel Matenho
(NR. membro do Conselho Fditorial de
Movimento), e os próprios estudantes em
Brasília, entre os quais se destacava Mano
Marcos Terena. terena, aluno de admi-
nistraçao de empresas, denunciou em
artigo na última página da revista Veja
11.02.81): a emancipação dessas lideran-
ças "seria, inevitavelmente, o primeiro
passo para a perda de nossos direitos e de
nosso principal bem: a terra .
A "emancipação" de algumas lideran-
ças- ou mesmode algumas comunidades
inteiras, como a dos Gaviões da aldeia
Parakatejê. no Sul do Pará. que há quatro
anosdispensaramos •'set\iços"daFunai e
estão comercializando, por conta própria,
a abundante castanha de sua reserva —
aplainaria o caminho para a "integração
rápida e rasteira dos povos indígenas à
chamada "sociedade nacional". Integra-
çãoque. obviamente, nivelaria os índios ao
extrato mais baixo da sociedade brasi-
leira: os peões, osbóias-frias. os favelados.
Os organizadores da UNI têm claro que
nao lhes interessa este tipo de "integra-
çao" - na verdade, uma cruel assimilação
antropofágica. Exatamente por se reco-
nhecerem como "povos" e como
"nações
— e não mais apenas como "grupos ou
..„.ibos-_-<CSSasliderançaslutamporsua
autodeterminação, mie nada tem a ver
eom os espantalhos da "integração e da
••emancipação". Como disse Marcos Ie-
rena no mesmo artigo: "Aceito a integra-
ção'progressh ae harmoniosa'. como reza
o Estatuto do índio. Mas a integração que
eu admito deve basear-se num protundo
respeito pelos aspectos étnicos e carac-
terísticas comunitárias de cada nação.
Deve preservar o índio, náo transtormá-lo
em mais uma figura pitoresca dos anais da
História ou"dos filmes de bangue-bangue
do futuro".
1' Funai trouxe
a gente para expor
como gado dela"
Para a Funai. hoje uma fortaleza de CO-
toneis, falar em "povos indígenas" e
"nações indígenas" é atentar contra a in-
tegridade da pátria brasileira. Para a
eminência parda do órgão, coronel Ivan
Zanoni Hausen. os povos indígenas não
são mais do que "quistos étnicos". Sem
mais conversas. Aliás, no cartaz que
distribuiu este ano. a propósitoda Semana
do Índio, a Funai de Zanoni e Nobre da
Veiga não deixou por menos. O slogan
escolhido foi mesmo a síntese da ideologia
integracionista: "índio e não-índio. todos
brasileiros".A distância queseparacoronéis
dahunai
dos índios que estão sob sua tutela au-
menta a cada dia. Arrebanhados às pres-
sas. em suas aldeias, algumas dezenas de
líderesindígenasforam trazidos a Brasília
nela Funai. para participar .obviamen-
tecomofigurantes.da Semana do Índio o-
ticial. Bem depressa, porém, o caldo en-
tornou. Na abertura de uma exposição de
artesanato indígena. Maluaré. o chete dos
Kara.áda aldeia de Santa Isabel, na Ilha
do Bananal, entregou ao ministro An-
dreazza uma carta assinada por mais
quatro caciques que protestava contra a
forma como foram trazidos a Brasília:"Ficamos surpresos e tristes, pois não era
para discutir os nossos problemas que a
Funaichamou agente. Parece que a Funai
trouxe a gente para a exposição como se
U.ssemos gado dela. e ficamos -aborre-
eidos".
MOVIMENTO - 20 a 26/4/81
6dramático apelo de D. PedroO índio só sobreviverá à avassaladora Civilização Ocidental se organizando; o SNI e contra.
Antônio Carlos Moura
— O branco, quando chegou a este
continente, botou todos os nativos den-
tro do cocho de um nome só: "índios".
Como se cs muitos povos deste conti-
nente náo tivessem nem nome, nem hts-
lória. Ea todos perseguiu por igual, co-
m<. caça. De todos arrancou a terra, os
costumes, a paz. a vida. Vocês que
sobreviveram a lauta perseguição e a
tanta cobiça dos brancos invasores, fa-
çam. agora, dessa palavra "índios"
u-
ma bandeira só: a bandeira de uma
grande pátria. Ameríndia, a América
jos índios l 'nidos, respeitados e livres.
Na noite de sua saída de Roraima, on-
de esteve .1 semana retrasada partici-
pando de um encontro de Pastoral In-
digenistà da diocese local, dom Pedro
Casaldáliga, o bispo de São Félix do A-
raguaia (MT) escreveu a "Carta
de um
amigo a todos os índios do território".
() parágrafo acima faz parte dessa car-
ta. que será divulgada integralmente na
próxima edição do Anna Maimu — Wa-
paradan — o pequeno jornal mimeo-
grafado, preparado pelos agentes de pas-
total Índigenista e dirigido principal-
mente aos índios Makuxi e Wapixana.
as duas grandes nações que somam cer-
ea de 22 mil dos 32 mil índios existentes
em Roraima. (O título bilingüe do jor-
nal quer dizer, nos idiomas Makuxi e
Wapixana. Nossa Voz).
Proibir organização
dos índios eqüivale
a liquidá-los.
Dom Pedro viajou, segunda-feira pas-
sada de Boa Vista, a capital roraimen-
se até Manaus, pela BR-174. a famosa
estrada que cortou as terras dos índios
Waimi i-Atroari. Ao longo do trecho de
cerca de 120 quilômetros que atravessa
a reserva, nenhum veículo pode parar
na pista. I". á entrada e à saida. há um
controle por parte do Exército e da
Funai. Com o bispo dc São Félix. via-
javam também três tuxauas — dois
wapixana e um makuxi — que de
Manaus seguiram para o sul do Ama-
zonas, onde. esta semana, está havendo
uma assembléia de líderes indígenas.
Casaldáliga acabara de ler. no Poran-
tim — jornal Índigenista editado em
Manaus pelo Cimi — o relatório de
uma assembléia cjue reuniu 72 tuxauas
de Roraima, em janeiro último*.
O que eles disseram, o que eles de-
cidiram. me parece de uma grande lu-
cidez e de muita coragem. Sem dúvida,
essas assembléias, esses encontros de
tuxauas podem marcar o futuro da po-
pulação indígena de Roraima.
Em Manaus, a um público reunido na
Biblioteca Municipal para um debate
dentro da programação não oficial da
Semana do Índio, dom Pedro referiu-
se, entre vários temas, aos "Documen-
tos Confidenciais" de Golbery e do
SNI. que tramam contra a L'NI - União
das Nações Indígenas. Falando a Movi-
mento. o bispo dc São Félix comentou
depois:A organização dos povos indígenas
é um direito básico deles, um direito de
sobrevivência. Povos minoritários nu-
mericamente. povos massacrados fren-
te a esse grande povo anônimo que re- 2
presenta a nossa civilização ocidental°
expansionista. capitalista, somente po- gderão sobreviver se organizando. A rea-c
ção violenta do governo e esta organi-fl
zação aqui no Brasil e em outros países.2
(cito, por exemplo, o regime de Strocs- e
sner. que reagiu violentamente às ten-<
tativasde organização dos camponeses
indígenas no Paraguai), deixa claro que
os inimigos destes povos sabem muito
bem o que esta organização significa. O
que me espanta, porém, é que. para
coibir esse esforço legítimo de sobrevi-
vencia, o regime acene com os terrorres
da Segurança Nacional.
Um apelo aos que
lutam em defesa
da causa indígena
Casaldáliga pára, examina o texto dos
documentos do SNI e completa:
— Eu gostaria de lembrar concre-
tamente ao general Golbery. que a in-
compatibilidade dos índios com a poli-
tica Índigenista definida pelo governo,
não nasce de um suposto "apadrinha-
mento de certas pessoas", como seu do-
cumento insinua. Essa incompatibili-
dade brota da própria política indige-
nista do governo, do regime, a serviço
do sistema, que é. a meu modo de ver
— e a América latina toda está aí como
testemunha — essencialmente genoci-
da. A política Índigenista é de integra-
ção desintegradora. de emancipação
marginalizado™, de "brasilidade" de-
sidentilicadora.
•' -âu -i^í*^ ^-«.
mBH 174, Casaldáliga {de óculosh o tuxaua Casemiro (esquerdal,
um representante do Cimi e Terêncio, que falou ao Papa.
Os Tapirapé vão à guerra
"Brasilidade", e também "ordem e
disciplina" foram "qualidades"
que.
poucos dias antes, o presidentíí da Fu-
nai. coronel Nobre da Veiga, disse ha-
ver encontrado, prazerosamente, na
missão salesiana do Alto Rio Negro, no
Amazonas. A mesma missão religiosa
que foi condenada, no final do ano pas-
sado. pelo Tribunal RusselI reunido em
Koterdam, onde depôs, como testemu-
nha de acusação, o índio Tukano Alva-
ro Sampaio, "educado"
pelos salesia-
nos do Rio Negro. Mas Nobre da Veiga
visitou a missão e gostou. Talvez por ser
a única área missionária, no Brasil,
que se opõe abertamente aos trabalhos
do Cimi.
O bispo de São Félix conclui, pedindo
a Movimento que passe um "recado"
a
todos aqueles que apoiam a causa-indi-
gena. para que se unam aos esforços
das lideranças que estão trabalhando
pela consolidação da UNI:
— Eu gostaria de convidar a Ordem
dos Advogados, os antropólogos, os es-
tudantes e todo o povo capaz de se sen-
sibilizar pelos direitos humanos funda-
mentais. Não podemos deixar que o fu-
turo dos povos indígenas fique entregue
ao SNI. á Segurança Nacional, aos "de-
cretos secretos", que. de uma hora para
outra, querem cortar todos os esforços
de sobrevivência desses povos. Somente
com a organização dos povos indígenas
é que se salvará, no Brasil, a "indiani-
dade". que não é apenas a identificação
de uma pessoa, mas de um povo, de
vários «pOVOS.
Tapirapé é um povo indígena dentro
dos limites da área da Prelazia de São
Félix do Araguaia, no norte do Mato
Grosso. São 170 pessoas, reunidas numa
só aldeia, uma gente alegre, que sempre
tentou resolver seus problemas por meios
pacíficos. Premidos pelos fazendeiros e
também pelos violentos Caiapó termina-
ram perdendo suas terras e indo se alojar
nessa região onde hoje estão, chegando a
pensar no "suicídio" da nação, reeusan-
do-se a procriar. por vergonha de con-
tinuar vivendo. Mas tomaram conscien-
cia e agora lutam bravamente por seus
direitos. Eles mesmos relatam, coletiva-
mente, o processo de sua luta atual con-
tra seu principal inimigo, a fazenda Ta-
piraguaia, que é ajudada pelos métodos
de "deixa
estar para ver como é que fi-
ca", aplicados pela FUNAI.
(José Wilson)
Nesse mês de janeiro a lata esteve mo-
vimentada. Chegou a notícia de que a
FUNAI tinha cedido uni pasto dos Tu-
pirapé à fazenda Ta piraguaia. Tirar a
nossa terra é a mesma coisa que tirar a
nossa mãe. porque nós vive nela. Os
Tapirapés flecharam os bois. bicaram
dois dias. fazendo flechas e foram. Fie-
cliaram vários bois e trouxeram alguns
para comer na aldeia. O chefe do posto
da FUNAI. sr. Ivà Baiochi. avisou ao sr.
lem pon i, chefe do Forque dt> Araguaia.
a que estava acontecendo. 0 sr. Iempom
mandou talar qne ele viria conversar.
Chegou no dia 14 de janeiro. Os Tapira-
pe querem falar com ele na Tukàna (ca-
sa dos homens) porque lá e que c lugar
de conversa de homem. Os Tapirapé es-
lavam pintados de jenipapo (pintura dc
tíuerrttl. com flechas e bordunas. O Sr.
I em pon i disse que queria saber o que es-
lava acontecendo e que depois ia falar
oara Brasília talar para Presidente da
FUNAI.
Os Tapirapé respondem: — Estamos
cansados de ser enrolados pela FUNAI.
Nao quer ver nenhum boi no pasto. Nem
hoi. nem ninguém. Estamos fazendo isso
nào é por ruindade, é porque nós precisa
de terra. Nós era 50 e agora nós somos
170. Estamos aumentando e precisa de
terra. A FUNAI promete e não faz.
Mandou Auxiliadora para Ver. Ela an-
dou com nós. viu tudo. Conversou, escre-
veu relatório, mas a FUNAI não liga. A-
gora nós não quer mais falar com empre-
gado da FUNAI. Nós queremos aqui o
Presidente da FUNAI. Não vamos mais
em Brasília. Já abusamos. Nós vamos
voltar lá no pasto. Se ainda tiver gado lá.
nós matar. E se morrer um índio, a pri-
meira pessoa da FUNAI que aparecer
aqui vai morrer também .
O sr. Temponi foi falar para Brasília.
Voltou e disse que o pasto não foi dado
para a fazenda Tapiraguaia. Disse que é
para tapirapé ir conversar com Presi-
dente da FUNAI em Brasília, que ele re-
cebe de braços abertos. Vai mandar um
avião para levar e trazer os índios de vol-
ia. Os Tapirapé dizem que não, que faz 7
mos que estáo indo lá por causa da
erra. que é para Presidente da FUNAI
dr. ver a terra de perto. O sr. Temponi
liz que o Presidente da FUNAI é Presi-
dente e que os Tapirapé devem ir lá fa-
zer o convite para ele vir na aldeia.
Tapirapé acham então que devem ir
iodos da aldeia. O sr. Temponi diz que O
avia» é pequeno, que ê para escolher al-
HUttS e levar também o professor e uma
Irmazinha (as Irmãzinhas de Jesus, como
o professor, são membros da prelazia de
I). Pedro Casaldáliga). Os Tapirapé res-
ntiiuteram:
— Por que é que oeê está falando
que Innàzinha ou rofessor pode ir?
I.ssa hua é dos 'natos.
O índio é queresolvi' .
Ot Tapirapé escolheram 4 represen-
tantes e eles levaram dois gravadores pa-
ra a aldeia ouvir depois da conversa gra-
rada. O Presidente da FUNAI assinou
papel, prometendo que até o dia 30 de
julho a terra será demarcada de acordo
com a vontadedosTapirapé.Os Tapirapé
estãoesperando para verse cumpre.(re\a-
to colhido na aldeia Tapirapé, para o
boletim Alvorada de março de 1981. da
Prelazia de S. Félix do Araguaia).
MOVIMENTO — 20 a 26/4/81
w^ —RORAIMA
Um paraíso quase perdidoEm Roraima, um reduto de índios em liberdade relativa, cercados pelo ódio do branco
Antônio Carlos Moura
Amanheceu
chovendo, sábado.
11 de abril, e o terreno onde aos
fins de semana se realiza a fei-
ra, no bairro São Francisco, es-
tá que é só'lama. Na véspera chegaram
vários caminhões, da Secretaria da Agri-
cultura de Roraima e da Funai. earre-
sando respectivamente, os colonos que
trabalham nas glebas do INCRA e índios
das nações Makuxi e Wapixana, todos
trazendo seus produtos para vender na
pequena feira. Em Boa Vista, a capital
do território de Roraima, ao norte do
Equador, agora é que começa a estação
das chuvas.
As barraquinhas minúsculas dividem
o espaço do terreno enlameado: de um
lado. os índios com seus produtos — mi-
lho, arroz, farinha de mandioca, bana-
na, massa de buriti, galinhas... em ai
gumas barracas, também vassouras, pe-
neiras e outros objetos artesanais. Nas
barracas dos colonos, os mesmos produ-
tos da roça. com um pouco mais de va-
riedade.
Apesar da lama, o movimento não é
pequeno. É nessa feira das sextas e sá-
bados que muitos dos três mil Makuxi e
Wapixana que vivem destribalizados nai
periferia da capital aproveitam para se
encontrar com seus parentes que chegam
das malocas (aldeias). É quando se tro-
cam as notícias, daqui e dali.
Dos 32 mil índios existentes em Rorai-
ma (40% da população total do territó-
rio), quase 22 mil pertencem às duas
grandes nações Makuxi e Wapixana:
mais ou menos 14 mil de uma e oito mil
da outra. Além deles, os Taurepang,
>imbém relativamente "integrados"; os
lngarikó, Maiongong e Wai-Wai, dos
quais há aldeias com algum contato com
a sociedade nacional e outras bastante
isoladas; e os Waimiri-Atroari. "arre-
dios", segundo a classificação oficial,
pois. nos últimos dez anos, mataram os
integrantes de duas equipes (uma dirigi-
da pelo padre Calleri e outra pelo ser-
tanista Gilberto Figueiredo), que foram
atrai-los para facilitar, assim, a abertura
da BR-174, que veio a cortar suas terras.
ligando Manaus a Caracarai. o único
outro município de Roraima: todos esses
grupos terão, talvez, reunidos, pouco
mais de dois mil índios e. com exceção
dos Waimiri-Atroari, que vivem numa
faixa entre Roraima e Amazonas, são
binacionais, istoé, seus povos espalham-
se na fronteira do Brasil (Roraima) com
a Venezuela e a Guiana, de ambos os
lados. Os outros oito mil índios de Ro
raima são os Yomani, cuja grande
maioria ainda está a salvo do contato
com a sociedade nacional.
Apesar de serem, até há pouco tempo,
em número superior ao da população
nâo-india do território, os Makuxi e
Wapixana são os povos mais marcados
pela espoliação da sociedade envolvente.
Suai malocas, cerca de 120, situadas na
região nordeste do território, no muni-
cípio de Boa Vista, são ilhas no meio
das fazendas invasoras. A dominação
dos latifundiários do território (só agora
é que começam a chegar colonos de ou-
tros Estados e, dentro em breve, as gran-
des empresas agropecuárias) é mais pro-
funda: cerceando ao índio o direito a
terra, o fazendeiro do território emprega
os Makuxi e Wapixana como vaqueiros e
peòes. Explorados nos acertos, envene-
nados pela cachaça, golpeados em sua
identidade étnica pelo fazendeiro que os
chama de "caboclos" e à sua língua de
"gíria", os Makuxi e Wapixana so re-
centemente começam a se levantar da
humilhação em que têm vivido, nas ul-
timas décadas, desde que o branco en-
trou no território.
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Cláudia Andujar: uma luta incansável pelos Yanomami
oi te de sexta-feira. 10 de abril.
TWTno "Palácio da Cultura", no
I^W centro de Boa Vista, os quase
JL *4
200 lugares do auditório estão
tomados por estudantes que.
juntamente com alguns missionários.
foram assistir à apresentação de slides
de Cláudia Andujar. a coordenadora
da Comissão pela Criação do Parque
Indígena Yanomani — CCPY. A pre-
miada fotógrafa, que há quase dez anos
dedica sua arte-ofício à causa do povo
Yanomani. foi avisada, pouco antes, de
que haveria "bagunça" no auditório.
durante sua apresentação. O tumulto
seria promovido, possivelmente, por
pessoas ligadas ao coronel Hélio Cam-
pos, ex-governador do território, agora
deputado federal pelo PDS, que, há
pouco tempo, apresentou um projeto
de lei que prevê a retirada dos indíge-
nas situados numa faixa de 150 quilo-
metros ao longo das fronteiras do Bra-
sil. Ou seja. todos os índios de Rorai-
ma, e mais outros 60 mil. em diversos
Estados e territórios.
Sem demonstrar nenhuma preocupa-
ção, Cláudia explica ao público que os
Yanomani são o maior grupo indígena
ainda isolado, em grande parte, do
contato com a sociedade envolvente. O
povo Yanomani conta hoje com cerca
de 18.500 indivíduos: oito mil em Ro-
raima, 2500 no Amazonas e oito mil na
Venezuela. Vivem em malocas que abri
gam entre 30 pessoas, as menores, até
270, as maiores.
Há cerca de 12 anos, várias entidades
estão pleiteando a criação de um Par-
que Indígena Yanomani. Afinal, no
território onde existe a maior propor-
ção de índios de todo o país. nào seria
nenhum favor criar-se um parque para
o povo que mais conserva seu modo
original de vida.
Em junho de 1979, o ministro do In-
terior Mário Andreazza. recebeu a 12a
proposta de criação do Parque Yano-
mani. Foi talvez a mais longa e apai-
xonadamente preparada, e. em sua re-
taguarda. estava a recém-criada
CCPY. que conseguiu mobilizar, desde
então, a maior cadeia nacional e inter-
nacional de solidariedade que um povo
indígena, no Brasil, já recebeu. A pro-
posta da CCPY prevê uma área de
6 446.200 hectares de terras continuas
interligando a quase totalidade das 21
áreas Yanomani reconhecidas ofi-
cialmente. que hoje são como "ilhas"
de um "arquipélago".
Cláudia conclui sua exposição ver-
bal. As luzes do auditório são apagadas
e agora falam as imagens projetadas
na tela branca. Obras-primas de arte
fotográfica, cenas mais que perfeitas do
paraíso perdido, que Cláudia encon-
trou na selva de Roraima e resgatou em
celulóide. No meio do público, risos de
escárnio diante -de cenas singelas do
dia-a-dia dos primitivos Yanomani.
Nada da "bagunça"
prometida. Ape-
nas molecagem, protegida pela eseuri-
dão. Talvez, desrecalque de adolescente
mas certamente, reflexo do sentimento
anti indígena que existe em Boa Vista,
transmitido de pai para filho em cada
lar, disseminando em cada escritório
ou revendido barato em cada casa co-
mercial. espalhado oficialmente em ca-
da escritório ou repartição pública: "o
índio é um estorvo para o progresso do
território; o índio é preguiçoso e não
produz: para que dar terra ao índio?"
Terminam as cenas maravilhosas da
vida preservada dos Yanomani. De re-
pente, na tela branca, o rosto indefini-
vel de um índio jovem, usando um
capacete da Camargo Correia, a emprei-
teira que abriu a estrada genocida. As
imagens seguintes são do inferno: um
menino prostrado na rede, o corpo in-
cendiado pelo sarampo. Adultos e crian
ças esqueléticos, recolhidos na Biafra
que se instalou com as epidemias, após
a abertura da perimetral norte. No au-
ditório. um silêncio comovido. As luzes
se acendem. Cláudia Andujar. o pensa-
mento fixo na redenção do povo Ya-
nomani. esquece as galhofas anônimas
do preconceito, e dá um voto de confian
ça àquele público que bebeu no leite
materno o ódio ao índio: "eu
estou
muito feliz com a presença, aqui. desta
juventude que é o futuro de Roraima".
No dia seguinte, Cláudia não escon-
de sua preocupação com a notícia que
vem recebendo, por telefonemas e re-
cortes de jornais do sul que lhe chegam,
em Boa Vista: o governo federal, pres-
sionado pela opinião pública, vai criar
o Parque Yanomani, mantendo, po-
rém. a estrutura de arquipélago. Se-
riam sete áreas dos Yanomani. separa-
das por reservas florestais e ecológicas.
Nos bolsôes roubados ao crescimento
do povo Yanomani. haveria, ainda, a
presença de forças de segurança e as
trágicas estradas. Já não seria um par-
que indígena, mas um "parque fede-
ral"."Se
se concretizar essa proposta, os
Yanomani não só vão perder terras que
hoje ocupam, mas terão seu crescimen-
to demográfico cerceado. Se se adotar
mesmo o critério de desmembramento
do território Yanomani em "ilhas indíge-
nas", com a presença de tropas federais
nos chamados "corredores" — que. na
verdade, representam mais de 2/3 da
área. estará sendo apressada a desor-
ganização dos grupos e a ruptura do
equilíbrio sócio-cultural das comunida-
des. comprometendo a coesão étnica".
Cláudia acredita na vitória do bom
senso. Com ela. são muitos que os que
acham que. no Dia do índio, se deveria
comemorar o direito do índio a viver,
com dignidade. Neste final de quares-
ma, na Igreja católica, comenta-se que
o tema da Campanha da Fraternidade
(que este ano foi saúde e, em 82. será
educação), poderá ser. em 1983. do in-
dio. Com o sugestivo slogan: "aquele
que deve viver". Que nào seja dema-
siado tarde, para os Yanomani.
Antônio Carlos Moura,
de Roraima
MOVIMENTO — 20 a 26/4/81
IGREJA
Ouando a violência é justaD. José Marta Pires, o D. Pele, explica porque não vê melhorias nas relações Igreja e Estado
Tibério Canuto
Bispo da Diocese de João Pessoa Pa-
raíha. Dom José Pires o Dom Pele.
identifica-se claramente com os setores
progressistas da Igreja e desenvolve um
pmlundn trabalho de bases na sua dio-
,rsr. Entre eles. destaca-se o de Alaga-
,„,„: onde o grau de organização da co-
munidade de posseiros forçou O governo
a tomar uma medida até então medita:
desapropriar a área em favor dos possei-
r"S , um *
Em entrevista ao tomai Movimento,
Dom José Pires fala da relação entre a
Igreja e o Estado, considerando-a inalte*
rada pelo projeto de abertura de Liguei-
redo. posiciona-se sobre a questão da
violência dos oprimidos e analisa a rela-
,ao dos setores eclesiais de base e o
Partido dos Trabalhadores. E mostra-se
pessimista com OS partidos institucionais
existentes, considerando todos eles como
partidos cupulistas. ¦manipulados
por
grupos'. E. para completar, rechaça a
critica segundo a qual a Igreja é ahsten-
cionista e prega 0 purismo em matéria dt
p-olítica.
Movimento — Ao longo dos últimos 17
anos. a.s relações entre a Igreja e o Estado
foram problemáticas, principalmente de-
pois do posicionamento da própria cúpula
trlcsialem defesa dos Direitos Humanos e
de uma aproximação com os movimentos
sociais urbanos e rurais. A política de
abertura "
ensaiada pelo general higuei-
redo teve. entre outros objetivos, diminuir
as áreas de atrito do regime. Agora, o
general Figueiredo teve de repensar a
própria relação entre a Igreja e o Lstado.
Como o senhor avalia a relação Igreja/ts-
tudo no período Figueiredo'.' Há uma
tendência na cúpula da Igreja a um
diálogo com o regime, OU a relação Igre-
ia/Estado continua tão problemática co-
mo antes?
Dom José Pires - A meu ver. o processo
de abertura em nada modificou a relação
entre a Igreja e o Estado e seus proble-
mas têm a sua origem antes mesmo da
chamada abertura. A sua base toi a op-
cão clara e concreta da Igreja pelos po-
bres. vítimas das injustiças que decorrem
do nosso sistema social e político, ial
opção transformou a Igreja numa instan-
eia crítica no sistema econômico, social r
político.
só será revertido na medida em que o
governo se orientar em favor da solução
dos grandes problemas do povo. Se isto
acontecer, não tenho dúvidas de que
regime e Igreja se reencontrarão. Não
mais nos palácios, mas lado a lado com o
povo. Como o atual governo não dá de-
monstrações disso, e como a Igreja não
abre mão da defesa dos oprimidos e dos
Direitos Humanos, creio que as relações
continuarão atrilosas pois não há razões
para a sua alteração.
Movimento — Uma das alterações im-
pi ementadas pelo governo Figueiredo re-
fere-se á política adotada em determi*
nadas áreas rurais, onde o conflito da
terra apresenta uma intensidade muito
urande. como foi o caso de Alagamar. na
Paraíba, onde o regime efetivou a desa-
propriaçao e concretizou uma "reforma
agrária'' a seu modo. Como a igreja ve
Asa nova política do regime e até que
ponto ela dificulta o trabalho dos setores
eclesiais nessa área?
Dom José Pires— Não se pode negar que
o problema número um para o povo e a
nação é a posse da terra, o que pressupõe
uma reforma agrária global e radical,
coisa que o governo não está disposto a
promover. Na medida em que surgem
conflitos em determinadas áreas, estes
têm sido resolvidos contra os posseiros.
iore\ana°
¦¦ crt£3*»1
flUatq»erP**rtld°
r
9
ilPor outro lado. o governo é o baluarte
maior de um sistema profundamente in-
justo, o que provocou o desencontro en-
tre a Igreja e o Estado. Tal desencontro
87
Só quando estes têm um grande grau de
organização é que o governo tem agido,
impondo medidas parciais que não solu-
cionam os problemas. Nesse sentido, po-
demos dizer que a política do governo, ao
não responder globalmente a questão da
terra, será impotente para deter a cami-
nhada dos trabalhadores que padecem
por não ter a posse da terra. Quanto às
soluções parciais, do tipo Alagamar, on-
de a coisa vem como uma "doação
do
governo" e não como uma solução efeti-
va e global, a reação da comunidade
agrícola dependerá do seu grau de cons-
ciência e organização. Aqui em Alaga-
mar. a política do governo não resolveu o
problema e não lhe deu muitos dividen-
dos políticos, uma vez que o longo traba-
lho realizado pela Igreja elevou a cons-
ciência da comunidade e esta percebeu
claramente o caráter paliativo da medi-
da. É de supor, porém. que. em áreas
onde não exista o mesmo grau de orga-
nizaçào de Alagamar. o regime venha a
colher dividendos com suas medidas pa-
liativas.
Movimento — Recentemente. Dom Aloi-
sio Lorscheiter descontentou setores go-
vernamentais ao considerar justos os sa-
quês realizados pelos camponeses atingi-
dos pela seca. Isso trouxe de volta o debate
da posição da Igreja sobre a violência dos
oprimidos. Como o senhor se posiciona
sobre esse tipo de violência e sobre a po-
sição dos cristãos na Nicarágua, que che-
g.iram a pegar em armas, ao lado do povo,
para derrubar um governo despódico e di-
tutorial?
Dom José Pires- Há que se fazer uma
diferença entre a violência e a necessida-
de. 0 que se pode concluir das palavras
de Dom Aloisio é queo direito da neces-
sidade tem prioridade em relação ao
direito da propriedade e foi o que aconte-
eeu no caso dos saques em decorrência
da seca. A necessidade de se alimentar
foi o que levou os flagelados a fazerem
saques, em detrimento do direito da pro-
priedade. Em determinadas circunstân-
cias. isto c justo. Mesmo assim, a Igreja
jondenaria qualquer violência contra as
pessoas, contra os proprietários dos bens
saqueados, o que felizmente não ocorreu.
Somos contra a violência como um pro-
cesso, como um caminho de solução dos
problemas. Agora, em determinados ca-
sos. a única maneira de se opor à violên-
eia é afastando a tonte geradora dessa
própria violência Foi o que aconteceu na
Nicarágua. Lá existia um governo que
era a fonte geradora da violência e o que
os cristãos fizeram foi unir-se ao povo
para afastar essa fonte.sendo coerentes
com o princípio da não-violência, des-
tronando quem estava no poder. E tanto
isso é verdade que o novo governo nica-
ragüense não praticou violências, não
torturou e não fuzilou. Repito: a Igreja c
contra a violência, mas às vezes, a única
solução para pôr fim nesse estado de
coisas é afastando do poder os que a pra-
ticam.
Movimento b-Alguns intelectuais consi-
deram que no Brasil existem dois par-
tidos políticos: as Forças Armadas e a 1-
greja. esta um partido invejável por sua
poderosa estrutura de comunidade de
bases. Na presente reorganização parti-
daria, a proposta do Partido dos Traba-
lhadores atraiu a maioria dessas comu-
nidades de bases fenômeno que estaria
preocupando alguns setores da cúpula
da Igreja. Até que ponto ê válida a
acusação de que a Igreja atua nos moldes
dc um partido político c até que ponto
ria se preocupa com a concorrência do
FL ou de qualquer outro partido inslitu-
cional?
Dom José Pires — E simplificar muito
dizer que a Igreja c um partido político,
ainda que informal. O que há é que ela.
como um todo. apesar de suas diferenças
internas quanto aos enfoques a serem
dados, tem procurado defender a maior
participação do povo não só nos beneti-
cios sociais mas também nas decisões
nacionais. E isto não a caracteriza como
um partido.
Não há a preocupação da cúpula da
Igreja com a identificação das comuni-
dades de base com o Partido dos Traba-
lhadores ou com qualquer outro partido.
A Igreja incentiva os compromissos poli-
ttco-partidários aos seus fiéis. As comu-
nidades eclesiais de base não podem
se comprometer com nenhum partido
porque isto as fecharia para os cristãos
que não pertençam àquele partido. Mas
sto não impede a opção individual dc
cada membro em torno deste ou aquele
partido. No meu modo de entender, até o
presente, todos os partidos institucionais
têm muito pouco a oferecer para um
projeto de uma sociedade justa, íguahta-
ria e livre. Neles ainda predominam in-
teresses de grupos e os grandes proble-
mas do povo não estão merecendo a im-
portância devida. Quero crer quc. no
momento, os movimentos de base deve-
riam dar mais força à política social do
que à política partidária institucional. Só
eom sindicatos livres e movimentos de
base mais fortes é que se pode pensar
em partidos poderosos que se transfor-
mem em veículo das aspirações popula-
res.
*.Todos os
.rt\dost«e
*«' *»*&***.
matei"*11»
'¦Movimento — Determinados setores têm
considerado essa visão que o senhor ex-
pôs como "hasista"
e criticam a Igreja
por ficar, em seu trabalho de base. ao
nível do "vivencial
e comunitário", cain-
do numa espécie de abstenção política
que favorece o regime, pois, por exem-
nio. em eleições passadas, enualgumas
uras em que a Igreja tinha um trabalho
forte, o partido do governo foi 0 mais
votado...
Dom José Pires — Até o momento, não
ivemos outros partidos que não o do
governo. No máximo tivemos partido de
oposição consentida. O problema não
está na Igreja, mas nos partidos; mesmo
osde oposição que sempre foram de cúpu-
a. E mesmo que cheguem ao poder, não
,erá o povo que terá conseguido isso.
Terá sido a elite oposicionista.
Além do mais. a ação político-partida-ria não é o campo da Igreja, embora ela
nào seja indiferente à política. A ela cabe
promover uma verdadeira educação poli-fica, mas não lhe cabe organizar a atua-
ção partidária. Tal missáo cabe à soeie-
dade civil e aos homens de diversos cre-
dos religiosos. Como instituição ela não
pode ultrapassar a sua competência. Por
exemplo, os cristãos podem debater so-
bre a Constituinte, mas esta não é a mis-
sào da Igreja. Ela pode criticar uma
Constituição injusta, mas não pode se
.-tosicionar favorável a tal ou qual pro-
posta de Assembléia Nacional Consti-
tuinte.
MftWíU.-VW--^W* MH*M**
MOVIMENTOS POPULARESf
SALÁRIOS
O acordo indesejadoO acordo proposto pela VW rebai
José (
xa salários c não garante o emprego
arlos Ruy
• O dei ate em torno da redução na jor-
nada de trabalho dos operários, em fun-
ção da crise que a indústria brasileira
atravessa, teve lances decisivos na sema-
na passada em São Bernardo do Campo.
A assinatura, no último dia 10. de um
protocolo de intenções (veja box) entre o
Sindicato dos Metalúrgicos e a direção da
Volkswagen, aprovando a diminuição da
jornada de trabalhe» naquela empresa,
causou grande perplexidade entre as li-
deranças operárias da região. Esse açor-
do só se tornaria efetivo se aprovado em
um plebiscito realizado nos dias 15 e 16,
ocasião em que os 30.859 empregados da
Volkswagen em São Bernardo manifes-
taram-se a respeito.
Já no dia seguinte à assinatura do pro-
tocolo, 43 membros da Comissão de Sa-
lários reuniram-se no sindicato e deram
um "ultimatum" à diretoria: junta-
mente com os membros da Junta Gover-
nativa, ela deveria comparecer aos por-
toes da Volks e aconselhar aos operários
a votar "não". Caso contrário, a pró-
pria Comissão de Salários faria isso sozi-
nha. Segundo Wagner Lino Alves, da Co-
missão de Salários, foi esse "ultimatum"
que fez a diretoria praticamente voltar
atrás e lutar contra a aprovação de um
protocolo que ela própria havia aceitado.
A Comissão de
Salários deu um
•'ultimatum"
Assim, Afonso Monteiro da Cruz, presi-
dente da Junta, desmentia que o sindicato
havia aprovado o acordo, acusando "ai-
guns órgãos de imprensa" de torcer os
fatos. "O
que fizemos — disse ele — de-
pois de muita discussão, foi assinalar um
protocolo de intenções onde fomos prati-
camente obrigados a aceitar as imposi-
ções da Volkswagen". De qualquer for-
ma, na segunda feira, Lula e seus com-
panheiros já estavam nas portas da
Volks distribuindo um boletim onde
apresentavam os motivos pelos quais o"sindicato é totalmente contrário à redu-
ção": "D
Porque o trabalhador já passa
fome com o salário inteiro, com o salário
reduzido será pior; 2) Porque a Volks-
wagen, quando teve lucros fabulosos,
nunca quis dividi-los com os trabalhado-
res; 3) Porque enquanto alega retração
nas vendas, aumenta os preços dos car-
ros; 4) Porque, ao mesmo tempo que
alega prejuízos na fabricação de carros,
investe milhões de dólares em caminhões
e tem lucros fabulosos com fazendas e no
mercado financeiro".'O boletim termina
aconselhando os trabalhadores a "pen-
sar antes de votar": "não
é baixando
as calças que vamos segurar nosso em-
prego. Pense bem. Pense e depois vote
conscientemente. O Sindicato respeitara
o resultado".
Para Luiz Inácio da Silva, o Lula. a
Junta Governativa "agiu
de boa fé"
quando assinou o acordo. Perguntado se
a aprovação do acordo pelos operários
não representaria um grande desgaste
para a diretoria cassada, respondeu _di-zendo que
"o sindicato tem que correr o
risco político de perder uma votação,
mas não pode. por uma questão de
princípio, deixar de se manifestar contra
um acordo para redução de salários", E
advertiu os operários: "se
vocês vota-
rem sim, fiquem sabendo que vai ser
muito difíci1 levantar a cabeça outra
vez".
A redução da jornada
representará uma
grande derrota
Como a situação em São Bernardo po-de chegar a esse ponto de confusão? Se-
gundo uma ala da Comissão de Sala-
rios, os erros vem de antes, acentuando-
se quando a Volkswagen, no ano pas-sado. realizou eleições para sua Comis-
são de Representantes. A diretoria eas-
sada não quis participar e recomendou o
voto no "Zé
Ferrador", personagem sim-
bolo da categoria, deixando, segundo as
críticas, "spaço "Herto para uma Comis-
são de Representantes dócil aos interes-
ses da empresa, que foi a grande res-
ponsável pelo abaixo-assinado propondoa redução da jornada e teve ampla liber-
dade para atuar dentro da Volks, intimi-
dando os operários e criando o ambiente
para a aceitação da jornada reduzida.
Isso ameaça inclusive deixar o mo-
vimento operário de São Bernardo sem
saída nessa crise. A aceitação pelos ope-
rários da redução na jornada significará
praticamente o estabelecimento da jor-
nada reduzida em todo o país, ou seja,
uma grande derrota para os trabalhado-
res.
Por outro lado, a vitória do "não"
deixará os trabalhadores desarmados
frente à Volkswagen, e as demissões em
massa continuarão, possivelmente com
mais força. O próprio diretor de Relações
Industriais da Volkswagen, Admon Ga-
nem admite isso: segundo ele. existem na
empresa "5
mil funcionários dispensáveis;
2 mil deles não fazem nada hoje e quatro-
centos estão no ócio".
As criticas ao comportamento da lide-
rança metalúrgica de São Bernardo par-
tem também, indiretamente, de outra
fonte. Espertamente, o presidente do
Sindicato dos Metalúrgicos de São Pau-
lo. Joaquim dos Santos Andrade, que
está em campanha pela sua reeleição,
manifestou-se contra qualquer acordo
que implique redução de salários, e
desde segunda-feira 120 mil exem-
plares do jornal O Metalúrgico, do sin
dicato. estão sendo distribuídos entre os
metalúrgicos de São Paulo. A Federação
dos Metalúrgicos de São Paulo, dirigida
por outro notório pelego. Argeu Egydio
dos Santos, também está contra o açor-
do, e pediu ao ministro Murilo Macedo a
revogação da lei que permite a redução
da jornada de trabalho e a criação de um
salário-desemprego.
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2fz — Ia 3E^ Té^JmWÊrty*
2 '--jihi f ; tss^.jrx^P»^
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L. c\ 'm\\mm itÊamwkMmsmÊÊH*\
m -nr-r. i ¦» ^*\*w* ££jruH
30.H59 julgaram o acordo que reduz a jornada
Um protocolo de más intenções"O
protocolo de intenções" assinado
entre a diretoria do Sindicato dos Me-
talÚTgicos de São Bernardo e a direção
da Volkswagen estabelece que a redu-
ção de cinco dias pur mes na jornada de
trabalhe*, "com
a conseqüente redução
salarial", ocorrerá em maio. junho c
julho, podendo ser prorrogada por
igual período, "mediante expressa co-
municação fundamentada da empresa
ao sindicato". Alguns setores burocrá-
ticos, os empregados na manutenção e
assistência médica, "bem
como os se-
tores envolvidos no esforço de comer-
ciali/.ação e exportação" estão excluí-
dos da redução na jornada.
Os itens do acordo que mais causa-
ram polêmica são aqueles que dizem
respeito às garantias de estabilidade
que a empresa oferece aos empregados— nenhum empregado será demitido
na vigência da redução da jornada e
nos quatro meses seguintes. Entretan-
to, o protocolo ressalva os casos de pe-
dido de demissão e demissão por "mú-
tuo acordo, com a assistência do sin-
dicato dos trabalhadores, ou em virtu-
de de prática de falta grave, devida-
mente comprovada". Diz ainda que "se
algum empregado tiver que ser demiti-
do. por razões inevitáveis em relação à
vontade da empresa e para a realização
das quais esta não concorreu direta-
mente, o sindicato será expressamente
comunicado". Isto é. a empresa não
oferecia nenhuma estabilidade para os
empregados.
A redução na jornada de trabalho
será acompanhada de grande rebaixa-
mento nos salários. O texto do acordo
diz que "as
perdas salariais serão, em
média, de 19% por mês". Este nume-
ro. entretanto, pode ser enganoso, e as
perdas poderão ser maiores. O acordo
salarial deste ano prevê aumentos a
partir de Io de abril de 47,1% do INPC
mais 8% para quem ganha entre 1 e 3
salários mínimos, de 6,1% para as fai-
xas de 3 a 10 mínimos e 3.0%. para
quem ganha mais de 10 mínimos. Ora,
esses números significam, respectiva-
mente, 58,9%, 56.0% e 51.5% acima
do salário do mês de março. Com uma
redução média de 19%, esses números
cairão para 28,7%. 26,0% e 23.0%,
respectivamente, nos meses em que vi-
gorar o acordo. Dessa forma, o reajuste
salarial nesses meses será significativa-
mente inferior ao previsto. Uma tabela
publicada pela Gazeta Mercantil mos-
tra que a perda do poder aquisitivo dos
salários chegará a 48,48% em junho.
Isto é. nesse mês, os trabalhadores re-
ceberão um salário cujo valor real cor-
responderá apenas a 51.02% dos sala-
rios de abril.
Outra coisa que ajudou a aumentar
os ataques ao protocolo é o fato de que,
além de reduzir drasticamente os sala-
rios, a Volkswagen — se conseguir
aprovar a redução da jornada — estará
dando o sinal de partida para que todas
as empresas possam jogar o custo de
suas dificuldades nos ombros dos tra-
balhadores; 23 empresas da capital e
do interior de São Paulo já manifesta-
ram a intenção de adotar a jornada
reduzida, e existem notícias de que
grandes indústrias do ABC estão aguar-
dando apenas o resultado das negocia-
ções na Volkswagen para iniciar um
processo semelhante.
Uma empresa, pelo menos, já redu-
ziu a jornada de trabalho. Trata-se da
Petri do Brasil S A. fabricante de volan
tes para carros, localizada em Jundiaí,
S. Paulo, onde 70% dos 500 emprega-
dos aprovaram um acordo semelhante a
este proposto pela Volkswagen (J-C-R.)
tí
MOVIMENTO - 20 a 26/4/81t*
POLICIA
Os DOI CODIs treinam de inA pretexto de combater a criminalidade torturadores do DOI-CODI reaparecem em cena.
Iara Dalmaso ""'"O trânsito estava completamente en-
garrafado e eram já 10 horas da noite noRio. Em frente ao Palácio do Catete,antigo reduto de Getulio Vargas, cavale-tes fechavam a rua e em cima dos cava-letes as metralhadoras eram apontadaspara os carros que só podiam prós-seguir um a um. Por trás delas, a PolíciaMilitar, cujo comando jura que ali está"para dar maior segurança à popula-
Isso foi em uma segunda-feira, dia 13de abril de 1981, mas dois dias antes noRio Comprido, no Cosme Velho, no Le-blon e em outros bairros a mesma cenase repetia, já passou a ser uma rotina nacidade. A justificativa vem através daimprensa que fala em uma caça desen-freada às quadrilhas de assaltantes debancos: o chamado Comando Vermelho.
Em nome do grupo de presos da Lei deSegurança Nacional, fugitivos da IlhaGrande e outros presídios do Rio, a poli-cia saiu às ruas como no início da décadade 70. Carros são revistados, metralhado-ras sào colocadas em posição de disparosem que se explique o motivo, pessoasdesaparecem e outras ficam incomunicá-veis durante mais de 60 dias, sob tortura,como é o caso de Maria José Ferreira daSilva, viúva do ex-preso Apolinário deSouza, o Nanai, morto em tiroteio com apolícia.
A violência do cerco da Ilha do Gover-nador, quando o assaltante José Jorge
Saldanha foi encurralado por mais de400 homens é um exemplo recente daforma de atuação da Polícia Militar emais: é um ponto de reflexão, não só porsua violência contra os moradores, pelagratuidade da destruição do apartamen-to em que se encontrava o assaltante,mas também porque foram identificadosentre os policiais que agiram na Ilha ho-mens ligados a diversos órgãos de repres-são política que atuaram de forma efeti-va nos anos 70 combatendo os movi-mentos de oposição ao regime.
Ex-presos políticos não hesitaram emreconhecer pelas fotos publicadas nosjornais e nas revistas, policiais do Depar-tamento de Ordem Política e Social quealém de testemunharem contra eles fo-ram em algumas situações intermedia-rios deste órgão com o DOI-CODI.
O fato pode parecer menor se lembrar-mos que o segurança do camarote doGovernador Chagas Freitas no desfiledas escolas de samba, no carnaval, era oUbiraci Santoro, o Touro, que além deter sido acusado de assassinar o operárioAézio na Delegacia da Barra da Tijucaem 1979, declarou em uma entrevista tersido um elemento "da maior importân-cia quando atuava no DOI-CODI".
No entanto, o fato passa a ser damaior gravidade quando lembramos queo DOI-CODI foi um órgão criado em1970 para atuar na chamada "guerra in-terna", quando os militares dividiram o
País em áreas geográficas e cada uma Muniz.. ********£**•"rança e
delas recebeu um Centro de Operações do Corone N Itoi Cerque£ Coman
de Defesa Interna (COD1) que coordena- dante-GeraJ da Policia M»1^ ^b~
va os vários Departamentos de Opera- ligados diretamente a comunidade de
cões Internas (DOI). Subordinados ao segurança que reprimiu os PJWPMDSL^feE&do Maior da área em cos durante longos e sangrentos anos. que
que atuam, os DOI-CODIs e osDPPS asumiram o controle da ação de repressãoaos .presos políticos, respondendo publi-camente pelas prisões.
A violência cometida nestes órgãos foidenunciadaem todo o mundo e a luta pelaelucidação da situação das pessoas mor-tas e desaparecidas nesta época aindahoje prossegue, muito embora o Governoinsista em declarar através de todos osseus representantes que não vai admitir"revanchismo", que estes são crimes deum passado remoto, que a Anistia apagoude nossa história. ..
No entanto, o aparelho repressivo queperseguiu, torturou e matou continuavivo e à disposição do regime. Não setrata de condenar a repressão aos assai-tos mas denunciar as formas e os meiosque estão sendo utilizados pela polícia doRio em nome de uma quadrilha de as
/ ií_l.
hoje são vistos pelas autoridades militares como "um passado distante que nãodeve ser revivido sob pena de se promo-ver o retrocesso do processo democráti-co".
A presença da comunidade de segurança que atuou naqueles anos é hoje umfato inquestionável no Rio, no combateao Comando Vermelho, grupo de presosque têm nos presídios daquela cidadeuma longa, e também sangrenta histó-ria na luta contra a violência nas prisões.
Um grupo que incomoda o sistemapenitenciário, que assusta banqueiros eempresários e que permite a ida da PMàs ruas para invadir conjuntos habita-cionais, manter intensos tiroteios nasruas da cidade e mais uma vez colocarem ação um aparelho repressivo quecontinua intacto e que a qualquer mo-
Rio em nome de uma quadrilha de as- mentQ ser aclonad0i tanto no ter-saltantes que, segundo a própria policia ^^ ^^ tQ n0 terrcno economi-está praticamente desbaratada! Todo Soma.se ainda a este quadro os aten-aparelho repressivo estatal esta nas ruas tadQs terroristas de entidades clandesti-como se cada cidadão fosse um suspeito sàQ esclarecidos.em potencial. Como se vivêssemos nova- .mente um tempo de "guerra interna". Enquanto a policia diz reprimir o cn-
Vale registrar ainda que estes homens me organizado, a população que se guar-estào sob o comando do General Waldir de e a oposição que se cuide.
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[\o cerco ao "Cornar
bandidos ou trein
NAO DEIXE ESTA VOZ SER CAMOVIMENTO PRECISA DE SIM
Uma voz que se levantou emdefesa da Anistia. Saiu à rim, an-tes de qualquer publicação, afir-mando a irnjwrtância de uma As-sembléia Constituinte livre e so-berana. Denunciou os contratosde risco, antex*iu a escalada deuma dívitia externa galofiante ese o/xis à entrega do pãíã aosgrandes grupos estrangeiros.Deu voz ao jhivo pobre dos qua-tro cantos do pais. Trouxe a pú-blico as dissidências militares edivulgou alguns dos maiores es-cândalos de corrupção da Repu-blica. Revelou a extensão dosproblemas da mulher brasileira.Discutiu (ts problemas da nossacultura e publicou textos dosmaiores escritores do pais. limavoz viva liá 6 anos, que a censuranão conseguiu calar, (jue o ter-rorismo não intimidou.
.Mas essa mesma voz jyode mor-rer agora.
E só você, o leitor, é capaz demantê-la forte e vigorosa.
Movimento, por trazer sempreuma informação honesta, popu-lar e democrática, definitivamen-te sem nenhum compromissocom grupos econômicos, nuncapôde beneficiar-se dos créditos eincentivos a que as empresas bra-sileiras têm direito: empréstimosbancários, descontos normais detítulos, parcelamento de dívidas.E jamais pôde contar com a re-ceita certa de todo jornal ourevista: os anúncios.
E além de tudo sofreu umenorme prejuízo nos três anosem que esteve submetido à cen-sura prévia: 17.500.000,00 emjulho de 1977.
Na verdade, a receita de Movi-mento veio sempre de seus leito-re*. Esse dinheiro — e o esforçode seus funcionários e acionistas— é que sustenta Movimento. E
\ 'jffiCr*'.¦'¦','jyffifr*' ^V Ü^^^H^EH^^k' *\mm\ mmmW^rW'^'''
*\m*rí*mt-J::ja-Jm:lf7-"mmmmmmWm*-.'.-i , VTX^ifclLL. V ImVL I J^**mm*T*t~jjf^. ,*f^ 4^0 «ü»*1^ * 7 ¦***$!& ^á^ MmmmmmMÊj ' '*h ^MBc/~**\\W'i lf ^%7*- W* ?*f<e**\WL}S$.. ¦.'.-.
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MOV!MENTO — 20 a 26/4/81 MOV IMF10
EDUCAÇÃO
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/Vo «cercoao "Comando Ven*%elhoffy ca*ça abandidos ou treino doa DOI-CODIs?
Pela segunda vez em pouco mais deum mês de período letivo a PontifíciaUniversidade Católica do Rio de Janeiroestá com as suas aulas paralisadas porum movimento de protesto de professo-res e estudantes. Como ocorreu na greveprecedente, iniciada no primeiro dia dareabertura das aulas, também agora acausa do movimento é a intransigênciado reitor da PUC, padre João Mac Do-well, que se nega a reintegrar os 28 pro-fessores demitidos no período de férias ea promover modificações no estatudo dauniversidade para criar um processo co-legiado de decisões.
A assembléia dos professores que de-cretou a paralisação, por duas semanas,aprovou a decisão de greve por 90% dosvotos, índice que mostra a indignaçãogerada pela atitude do reitor, que fingiuaceitar as reivindicações dos professorese estudantes, para provocar a suspensãoda primeira greve, mas nos bastidorestramou para a manutenção do caráterditatorial do processo de decisões nauniversidade. Em apenas 15 dias. ficouclaro para todos o jogo do reitor: MacDowell admite "democratizar", mas des-de que se mantenha como ditador, atra-vés do exercício do poder de veto.
Na assembléia anterior, realizada nodia 23 de março, os professores chega-ram a acreditar que o reitor, diante daresistência vigorosa às demissões e dapressão para democratizar as decisões naPUC, finalmente aceitara encaminharuma solução para a crise através de ne-gociações. Através de uma comissão es-pecialmente designada para esse fim, o
Conselho Universitário concordou emexaminar uma proposta de modificaçãode estatuto que atribuísse ao corpo do-cente a indicação, por eleição, dos dire-tores de departamento (faculdades) e dosdecanos de centros (que reúnem diferen-tes departamentos). Além disso, seriaatribuída às comissões gerais de cadadepartamento, eleitas pelos professores,a competência para decidir de admissõese demissões em seu quadro docente. Aocriar uma estrutura colegiada de deci-soes, a proposta abriria caminho para areintegração dos professores, num pro-cesso natural, sem ferir o orgulho do rei-tor, que. numa atitude pouco cristã, re-cusa reconhecer que as demissões, maisque um ato de arbítrio, foram simples-mente um erro.
Antes da reunião em que o ConselhoUniversitário examinaria a questão, ncdia 9 passado, Mac Dowell manobrou. Eo que era esperança de professores e es-tudantes se converteu em profunda frus-tração: a proposta inicial foi adulteradapor uma emenda do reitor, que con-cordou com o processo de eleição mas seatribuindo o direito de veto, como umaespécie de Poder Supremo. Pelo textoconcebido com pecado, a rejeição do vetosó se daria por maioria qualificada dedois terços, o que significaria na práticaque todos os vetos praticamente seriammantidos, pois levará tempo para que oConselho Universitário tenha uma com-posição realmente representativa do cor-po docente. Com isso. Mac Dowell dáuma de miguel: na aparência, o poder édemocrático; na realidade, continua im-
perial, autocrático, como até agora.Em sua obstinação de usufruto unipes-
soai do poder, Mac Dowell conta com oapoio da grande imprensa do Rio, quesilencia sobre o movimento dos professo-res, a justeza de suas reivindicações e oempenho do corpo docente, associadoaos estudantes, de melhorar as ativida-des acadêmicas da PUC, ante a tendên-cia de Mac Dowell de transformá-la emmero objeto de pecúnia. um estabeleci-mento mercantil, uma casa de usura,embora a Igreja condene essa cupidezdesde São Tomás de Aquino, há sete sé-culos. Nesse esforço de sustentação daautocracia na PUC destaca-se o Jornaldo Brasil, que deturpa e frauda a in-formação e apresenta a seus leitores edi-toriais mentirosos, feitos de encomenda,
"Nessa batalha — disse a Movimentoum dos professores grevistas — nós pre-cisamos do apoio de instituições cientí-ficas e acadêmicas, associações profis-sionais e outros órgãos da sociedade ci-vil. que devem dirigir mensagens ao rei-tor (Rua Marquês de São Vicente, 225,Rio de Janeiro. RJ), para mostrar que aspessoas de bem querem uma soluça»,digna e justa para a crise da PUC. Assimprofessores e alunos poderão sustentarmelhor esta luta contra o anacronismoque priva professores de seu sustento,desfalca a universidade de pessoal quali-ficado e transforma uma instituição co-mo a PUC do Rio de Janeiro num balcãode negócios, onde o 'cliente' paga caro erecebe um serviço deficiente," (.-«-unirBarbosa, Rio de Janeiro)
ER CALADA.)E SUA AJUDA. OU MORRE.
que ao longo tdos anos pôde man-ter o jornal em razoável equili-brio.
Nos últimos meses tudo come-
çou a mudar. A inflação descon-trolada aumentou 1237c o custodo \mpel. Os custos de impressãocresceram 342% de março de1980 a março de 1981. Alémdisso, os atentados terroristascontra bancas de jornais afãs-taram Movimento de alguns deseus maiA importantes pontos devenda. Cerca de 60cá das bancas
pararam de vender Movimento.(*r
/igora o momento é crucial.Movimento nunca esteve tão
perto da morte.Mas, paradoxalmente, nunca
teve também um apoio tão efetivode jornalistas e colaboradores esua equipe estã plenamente cons-ciente fia* justeza de seu progra-ma polímhco-editorial e seu mo-
delo técnico-jornalistico.Por isso Movimento pede ajuda
a seus leitores. Para que consigaacabar com os prejuízos acumu-lados, mas principalmente paracrescer e tornar ainola mais fortee vigorosa sua voz. Precisamosde 6 milhões de cruzeirrts nos
próximos 60 dias, ou Movimentoserá uma voz calada.
Mande o tanto que você puder:Cr$ 100,00, 200,00, 1.000,00. Vocêíai investir em informação cor-reta e honesta. Sem medo. Semacordos com quem oprime.
Ajude Movimento a crescer.
{*! A venda média nos 20 mesesanteriores aos atentados terroris-tas contra as bancas era de 8.500
jornais. Nas edições seguintescaiu para 5.000 jornais em banca,acumulando em 38 edições — 113mil jornais — um prejuízo realde Cr$ 7.200.000,00.
T¦ »*m *—¦ mm •_¦ ssm -*_•* ¦m —¦¦ —.¦ —— —— «¦—- —— ¦
Esta voz vai ;falar mais alto.
Para isso estou enviando CrS Por
D Cheque nominal para D Vale Postal ? Ordem de pagamento JEdição S/A Editora de para Edição S/A. conta |
fvms. Jornais e revis- * 13007/9 Bradesco,Ag. Vila Clementino, I
São Paulo. |
Edição S/A — Editora de livros Jornais e Revistas. |rua Virgílio de Carvalho Pinto, 625, São Paulo — SP — CEP. 05415 |
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11a 26/4/81 MOVIMENTO - 20 a 26/4/81
Crescer
ou voltar
aser
So, eis
a questãoPequena peça em um ato.
Personagens: o Rei eo Gordo, seu ministro
das Finanças.
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Luiz Nassif
O MINISTRO — Majestade, há quasedois anos o senhor me chamou paraadministrar as finanças do reino. Havia
problemas imensos para serem resolvi-
dos. A inflação era de 40% ao ano. A
dívida externa, de 40 bilhões. Os jurosestavam altíssimos. Havia um processode desaquecimento da economia e um
volume de subsídios que desequilibrava
o Tesouro, causando mais inflação. Dai
eu lhe respondi: Majestade, crescer é
criar problemas. A dinâmica do desen-
volvimento é esta: para cada problema
que você resolve, surgem mais três paraserem resolvidos.
Era necessário dominar a inflação e
equilibrar o balanço de pagamentos —
fxir isso o meu antecessor mantivcra os
juros altos. Com isso, tencionava obri-
gar iv empresas a diminuir seus
estoque: especulativos e suas vendas.
Não tendo pata quem vender, ele acre-
ditava que as empresas seriam obriga-
das a baixar seus preços, derrubando a
inflação.
Com os juros altos, além disso, elas
seriam obrigadas a buscar dinheiro no
exterior, ajudando o reino a adminis-
trar sua dívida externa. Aliás, por cau-
sa da dívida externa, o reino precisavaexportar cada vez mais. Mas como nos-
sos tecidos e especiarias não eram dos
melhores, nem dos mais baratos, as
empresas passaram a receber crédito
subsidiado, para baratear esses produ-
tos e facilitar a sua exportação.
Todo o conjunto fazia lógica, não ê
Majestade?Mas era uma lógica perversa que dt-
minuia os lucros das empresas, dimi-
unia o número de empregos, impedia o
crescimento da economia. Dai, o se-
nhor se recorda, declarei em alto e bom
som: se não quisermos mais crescer, .
melhor que todos voltemos a ser índios.
Majestade, foi uma frase e tanto, queteve uma tremenda repercussão.
O primeiro passo, então, seria des-
truir a< lógica do meu antecessor. Ele
dizia que só com as vendas caindo as
empresas baixariam seus preços. Ele se
baseava na lei da oferta e da procura. O
que eu fiz? Depus a lei e coloquei em
seu lugar a lei da economia de escala.
Na época eu lhe expliquei como fun-
cionava essa lei. Se o senhor aluga um
galpão por CrS 50 mil por mês, para fa-bricar 5 mil cavalinhos de brinquedo
por mês. será obrigado a colocar CrS
10,00 a mais no preço de cada cava-
linho, só para compensar o aluguel.
Mas se passar a fabricar 50 mil cava li-
nhos. terá que colocar apenas CrS 1,00
a mais no preço de cada cavalinho, porconta do aluguel. Por isso é que eu digo
que a lei da economia de escala é uma
lei antiin fiação.
Dentro dessa nova lógica, eu teria queresolver dois problemas para acabar
com a inflação: eliminar o déficit do
Tesouro e aumentar a produção dasfâ-
bricas. Meu primeiro passo foi progra-mar uma maxidesvalorização dt 30%
na nossa moeda. Graças a isso, nossas
exportações ficaram mais baratas e,
conseqüentemente, mais fáceis de se-
rem vendidas lá fora. Assim, eu puderetirar os subsídios das exportações,
sem afetar nossas vendas.
Mas. como lhe disse. Majestade, você
resolve um problema e logo surgem
outros três. Com a máxi, todos os pro-
dutos que dependiam das importações
subiram de preço. Além disso, haveria
também o encarecimento interno dos
preços dos produtos agrícolas exporta-
dos. Esses produtos são cotados em
moeda estrangeira. Se o dinheiro es-
trangeiro se tornasse mais forte, nossos
agricultores passariam a receber mais
dinheiro nosso por cada partida de
alimento exportada. Obviamente, eles
não iriam querer vender seus produtosno mercado interno por um preço me-
nor.
Contudo, esses problemas eram me-
ras preliminares para um problemc
imensamente mais grave. Num primei-
ro momento aqueles dois setores — o
que utiliza produtos importados e o que
produz alimentos exportados — au-
mentariam seus preços. Num segunde
momento, todos os demais comercian-
tes do reino iriam querer ir atrás. Daí,
ninguém seguraria mais a inflação. Es-
se era o novo problema que eu precisa-
ria solucionar.
Mas eu sou esperto, Majestade. A pri-
meira providência que tomei foi bara
tear os juros, tabelar a correção mone
tária e distribuir dinheiro à vontade.
Pensei, num prato da balança aumento
os custos dos produtos, com a máxi; no
y*
outro, diminuo os custos, barateando
o dinheiro. Além disso, soltando di-
nheiro barato eu poderia uumeniar a
produção e a economia de escala.
Contudo se os efeitos da máxi estou-
rassem antes das outras medidas come-
çarem a surtir efeito, com perdão da
palavra. Majestade, o senhor estaria
frito.
A questão toda consistia em abafar os
efeitos da máxi por alguns meses, o su-
ficiente para que as outras medidas
começassem a surtir efeito e que uma
supersafra, que vinha a caminho, bai-
xasse os preços da alimentação.
Mas como abafar a máxi? Primeiro
eu instituí um imposto sobre as expor-
tações de alimentos. Com o imposto, os
agricultores passariam a receber menos
pelas exportações e se conformariam
em receber menos também pelas ven-
das internas. Depois, coloquei um exèr-
cito de fiscais na rua, ameaçando todo
especulador com cadeia.
O resultado foi um Deus nos acuda!
Os empresários entravam a toda hora
na minha sala e diziam, pôxa, pensa-mos que você fosse um sujeito batuta;
não era você quem dizia que o queimportava era crescer?: agora vem aí,
atentando contra as leis do mercado. E
por aí afora.
Daí eu pensei: eu tinha muito a per-der: meu bom nome, minha fama de
milagroso. E tinha muito pouco a ga-nhar: cá entre nós. Majestade, ninguém
estava acreditando mesmo que com
umas poucas centenas de fiscais eu
conseguiria barrar a especulação.
Então, tentei a grande jogada, aquela
que apenas os grandes jogadores ousam
arriscar: recolhi os fiscais, acabei com
o imposto sobre exportações de alimen
tos e soltei mais dinheiro, para au-
mentor ainda mais a economia de es-
cala.Mas não era o único problema que eu
tinha de enfrentar. Quando eu tabelei a
correção monetária, para baixar os ju-ros. tornou-se menos interessante apli-
car o dinheiro na poupança. A poupan-
ça deixou de render e muita gente
passou a retirar dinheiro de sua pou-
pança para comprar. Foi uma loucura!
O que se anunciava, vendia-se. Estava
tão fácil vender que as lojas passaram a
aumentar cada vez mais os preços das
mercadorias. A inflação disparou. Com
a inflação aumentando, e o dinheiro so-
brando, as empresas passaram a con-
trair mais empréstimos, a fim de com-
prar mais mercadorias e estocar, para
ganhar mais ainda com a inflação. E
isso causava mais inflação. .
Majestade, como o senhor deve ter
percebido, surgiram dois novos proble-mas para resolver. De um lado, impedir
que o crédito continuasse sendo utili-
zado para a formação de estoques espe-
culativos. Do outro, impedir que os
investidores continuassem a tirar di-
nheiro da poupança, para consumir.
Resolvi os dois problemas de uma so
penada. Soltei a correção monetária t
enxuguei o dinheiro que estava sobran-
do. Conseqüência: os juros subiram
como foguete, as pessoas passaram a
poupar novamente, o crédito fácil aca
bou, as vendas despencaram e as em-
presas pararam de estocar mercado-
rias.Havia mais um problema suplemen-
tar. Quando a inflação aumentou, subi-
ram os preços das matérias-primas, dos
componentes utilizados para a fabrica-
ção de manufaturados para exporta-
ção. O aumento eliminou todas as van-
tagens que os exportadores haviam
conseguido com a máxi, e o pais preci-sava exportar.
Mas como resolver este problema?Uma nova mâxi não seria viável, por-
que daí a inflação estouraria de vez. O
que fiz eu? Dos males, o menor. Res-
taurei os subsídios à exportação.
Majestade, crescer é criar problemas.Com esse novo elenco de medidas, solu-
cionei alguns problemas, mas criei ou-
tros. Hoje a inflação ê 4e 120%. A
dívida externa é de 60 bilhões. Os jurosestão altos. Há um processo de desa-
quecimento da economia e uma linha
de subsídios que poderá desequilibrar
novamente o Tesouro, causando mais
inflação.
Outro dia, conversando com um ami-
go, cheguei à seguinte conclusão: dia-
bos, se não quisermos mais crescer, o
melhor a fazer ê voltar a ser índios.
Daí, me ocorreu a seguinte idéia: seu eu
fizer uma maxidesvalorização...
O REI — Guardas!
{pano rápido)
12MOVIMENTO — 20 a 26/4/81
ENTREGUISMO
Tramam novasconcessões
para o JariA direção do Piojeto Jari tem anun-
ciado que o enorme enclave, de pro-
priedade do grupo americano de Daniel
Keith Ludwig. jà teria demitido, desde
setembro do ano passado, em torno de
três mil trabalhadorer.. O anúncio è
apontado como mais uma evidência
das "dificuldades"
por que estaria pas
sando o empreendimento
Em agosto passado, o próprio Daniei
Ludwig escreveu uma carta ao chefe do
Gabinete Civil oo qoverno brasileiro,
general Golbery do Couto e Süva, na
qual reivindicava mais favores e benefi-
cios.
Apesar de ter sido enviada ao general
Golbery, fundador do Serviço Nacional
de Informações (SNI) e especialista em
segredos, a carta tornou-se publica.
Também vieram à tona, meses depois,
as negociações para a venua do parte
das reservas de bauxita de Ludwig, no
Brasil ao grupo Alumimum Cornpany
of America (Alcoa), também america-
no uma das "Seis Irmãs" que contro-
Iam a produção e distribuição de alu-
mínio em todo o mundo.
O ministro Oesar Cais, das Minas e
Energia, jà havia dado sinal verde para
as negociações, mas a questão acabou
esbarrando em dois novos estudos —
um do ministério, outro do Conselho
de Segurança Nacional. 0 primeiro de-
fende que as -eservas devem ser vendi-
das para vários grupos, incluindo a A,-
coa, e o segundo deixa de fora o grupe
americano e prega o repasse das reser-
vas, cujas concessões já caducaram
para a mineração Rio do Norte (MRN),
que explora a bauxita do Trombetas, e
grupos privados nacionais.
Há algumas semanas, a direção do
grupo Ludwig no Brasil foi mais alem
agora ameaça vender o próprio Projete
Jari Quem compraria seria o conheci-
do testa-de-ferro do capital estrangei-
ro Augusto Trajano de Azevedo Antu-
nes, que há muito ja é sócio de Ludwig
em outros negócios no Brasil, asso-
ciado a outros grupos privados nacio-
nais.
Estes fatos montam o quadro "de
grandes dificuldades" por qua estaria
passando o projeto, mer9ulhad°0^"
qundo a revista americana Fortune,
num problema de super invesnmento _
as aplicações de capital no Projetete-
riam corrido muito além das expeçtat-
vas de retorno. O Ministro da Industria
e do Comércio, Camilo Penna. também
acha que o problema esta nesse ponta
embora considere que as demissões de
trabalhadores sejam normais.
O quadro montado de.xa, contudo
tanto o Projeto Jari como o governe
brasileiro, que sempre o favoreceu, em
situação muito cômoda. Estaria mos-
trando, segundo ambos querem fazer
crer que a campanha nacional contra o
projeto ."è injustificada" — um argu-
mento com o qual se tenta mudar £
opinião pública a respeito do assunto.
Do total de recursos investidos.nc
piojeto Jari (cerca de USS 800 mi-
Ihões). a maior parte entrou no Brasil,
em forma de empréstimo externo, com
aval do governo brasileiro. Sò na impor-
tação da fábrica de celulose e da usin.
termoelètrica que a abastece de ener
gia. o Banco Nacional de Desenvolvi-
mento (BNDE) avalizou empresti-
mos externos do Jari de Us$ 310 mi-
Ihões.
Diante das ameaças de Ludwta.0
governo discute 0 que fazer Pelo me-
nos duas reuniões comesse propósito
foram realizada., na semana passada,
no Palácio cio Planalto Não ha decisão
ainda, mas, pelos antecedentes, pooe-
se arriscar o resultado: o governo vai
dizer que não tem interesse em assu
mir o controle do projeto e que os e-
cursos são muito elevados para que
grupos privados nacionais o façam.
Assim, para que o projeto nao«•£
desativado, volta a dar amplos Dane-
fícios ao empreendimento. E tude> yoita
a ser como era, so que, espera o gover-
no. com o aval político de uma tatia
maior da população. ^ ^^
de Brasília.
MÒviiOfe^T-^^tóMT
AGRICULTURA
As sete pragas do ProálcoolO Programa Nacional do Álcool -*-
Proálcool, criado em 1975, tem recebido
numerosas críticas ao longo de sua exis-
téncia. Já se provou, por exemplo, que c
Proálcool, incentivando a monocultura de
cana-de-açúcar rouba terras à agricultura
de alimentos; já se sabe. também, que o
programa favorece a concentração fundia-
ria e acaba motivando a expulsão de pe-
quenos agricultores de suas terras. Ao la-
do disso, traz uma nova ameaça ecológica,
o \inhoto, um subproduto de fabricação
do álcool, altamente poluente. O próprio
ministro Delfim Netto classificou o Proál-
cool de inflacionário. De fato, em 1980.
por exemplo, os financiamentos foram fei-
tos com juros de 25% ao ano, quando a
inflação passou dos 110%. Agora, além
destas críticas, juntam-se ao dossiê do
Proálcool mais duas acusações:de discri-
minaçào política, colocada a partir do
caso da Destilaria Indiana, em Alagoas;
e de favorecimento do capitai estrangei-
ro, no caso do projete Bodoquena, no Ma-
to Grosso do Sul.
Figueiredo vetou
financiamento
pessoalmente
Um grupo empresarial alagoano resol-
veu implantar uma destilaria, no municí-
pio de São Sebastião, para produzir 300
mil litros de álcool por dia. O projeto —
Destilaria Indiana — orçado em cerca dt
CrS 1,4 bilhão, foi aprovado em julho dt
1979 pela Comissão Nacional do Álcool, _
o Banco do Nordeste foi escolhido como
seu agente financeiro. Em dezembro do
ano passado, o Banco do Nordeste inftr-
mou que o financiamento para o projete
havia sidodefinitivamente aprovado. Tudo
estava certo, mas quando ficou pronto o
último documento, o gerente do Banco do
Nordeste,de Maceió tinha uma nova infor-
mação: o financiamento fora vetado por
ordem pessoal do presidente da Repúbh-
ca O motivo: o vice-presidente da Desti-
laria Indiana, dono de 2,5% de suas
ações, é também vice-presidente dc
PMDB e se chama Teotônio Vilela. Mes-
mo que o governo volte atrás e conceda o
financiamento, depois do dia 30 de abril a
Destilaria teria que entrar, de acordo com
a Circular n° 603 do Banco Central, com
30 a 40% do capital necessário (antes o
empresário entrava com apenas 10 ou
20%). Assim, a Destilaria teria que des-
pender quase meio bilhão de cruzeiros,
poupança que pouquíssimos empresários
nacionais têm. Ou seja. o projeto poderá
se-inviabilizar definitivamente.
Para o deputado José Costa (PMÜB-
AL), o caso da Destilaria Indiana mostra
também que o governo procura inviabili-
zar a participação do empresariado nacio-
nal no Proálcool, abrindo uma brecha pa-
ra a entrada do capital estrangeiro. O de-
putado lembrou o contrato que a empresa
Elf Aquitaine (francesa) celebrou com _
Petrobrás para investir no Proálcool e a.
experiências com cana-de-açúcar que gTU-
pos japoneses estão fazendo em Tome
Açu. íio Pará.
Outr.» exemplo da participação estran-
geira no Proálcool: o governo aceitou em
fevereiro a imposição do Banco Mundial
de só conceder empréstimos para financiar
equipamentos do Proálcool se estes fossem
comprados através de concorrência inter-
nacional. Com isto. mesmo dispondo de
tecnologia própria para fabricação do ai-
cool o país será obrigado a aprofundar
sua dependência tecnológica e financeira
Já se sabia que o
Proálcool:
É inflacionário
Rouba terras da agricultura
de alimentos
Favorece a concentraçãofundiária
Leva à expulsão de
pequenos agricultores
É uma ameaça ecológicaAgora, as novidades
Favorece a penetração do
capital estrangeiro
É politicamente
discriminatório
com o exterior. Segundo a revista Econo-
mia e Negócios, o ministro da Indústria e
Comércio, Camilo Penna, tentou impedir
a entrada do consórcio Petrobrás/EU
Aquitaine no Proálcool e quase se viu na
contingência de pedir demissão do cargo.
Figueiredo disse que o assunte era uma
decisão "pessoal
e irreversível".
Porém o exemplo mais claro — e já
consumado — da penetração do capital
estrangeiro no Proálcool é o do projeto
Bodoquena. em implantação no município
de Miranda),MatoGrosso doSul. O proje-
to. aprovado na semana passada pela Co-
missão Executiva Nacional do Álcool, pre-
vê o plantio de 50 mil hectares(500km2)de
cana e uma destilaria que produzirá 1,6
milhão de litros/dia no início da próxima
década. Oitenta por cento do investimento
necessário serão financiados pelo Proál-
cool. A fazenda Bodoquena tem uma ex-
tensão total de 254.463 hectares (2545
km2), área ligeiramente menor que os
municípios de São Paulo e Rio de Janeiro
juntos. Por causa de seu tamanho, o pro-
jeto já foi apelidado de mini-Jari. A Bo-
doquena foi iniciada pelo seu primeiro
proprietário. Laucídio Coelho que. expul-
sando posseiros e índios, alargou-a até as
dimensões atuais. Depois, a propriedade
foi comprada por David Rockefeller e
Walter Moreira Salles. que sempre criaram
gado em pastagens que ocupam até hoje
apenas 50 mil hectares da fazenda. No ano
passado ela íoi vendida aos atuais propric-
tários. que implantarão o proieto álcoolei-
ro mantendo as pastagens e as 100 mil re
ses já existentes.
O vinhoto vai
destruir o pantanaldo Mato Grosso
Os novos proprietários escondem a par-
ticipaçào de capita) estrangeiro no empre-
endimento. Eles apresentam o projeto ai-
cooleiro como sendo de um consórcio na-
cional formado pelo grupo Oi-ietto (maior
produtor de álcool do país), com 34% do
capital, e os grupos Dedini (fabricante de
equipamentos para destilarias), Votoran-
tim(maiorgrupo privado nacional) e Atlan
tica Boavista (ligado ao Bradesco). cada
um com 22%. No entanto, conforme a ata
da assembléia que constituiu oficialmente
a empresa, do capital de CrS 490 milhões,
só CrS 249,9 milhões (51%) pertencem aos
investidores nacionais. O restante é divi-
dido igualmente pelos grupos David
Rockefeller, de Nova York, e The Dia-
mond A. Cattle Cornpany, com sede no
Novo México, EUA.
A aprovação do projeto encontrou no
Mato Grosso do Sul a oposição de grupos
consenacionistas, como o Comitê de Defe-
sa do Pantanal e a Sociedade de Preserva-
ção do Meio Ambiente do Mato Grosso do
Sul, além de associações profissionais, co-
mo as dos agrônomos e engenheiros de
pesca e florestais. A principal preocupa-
ção dessas entidades é com o vinhoto.
Quando em pleno funcionamento, a Bodo-
quena vai produzir 22 milhões de litros
diários desse poluente. Os proprietários do
projeto prometeram utilizar o vinhoto co-
mo adubo nas próprias lavouras de cana-
de-açúcar. sem prejuízo para o Pantanal.
Mas os sul-matogrossenses duvidam di_-
so, porque a quantidade de vinnoto sera
maior que a capacidade de aproveitamen-
to da fazenda.
senhor*'. ^*^<_^JJ*v:ooi.
JütaZ
13
MUNDO
ESTADOS UNIDOS
A colheita da violênciaA violência cega tem raízes profundas nos EUA, pelo mundo, e pode sufocar a democracia.
Paula e Silva
"Quem planta violência colhe violén-
cia" declarou o rev. Daugherty após o
atentado ao pres. Reagan. "Desejo
que o
presidente se recupere, expresso minhas
simpatias à senhora Reagan. e desejo
que nós. americanos, abramos os olhos
para a futilidade dc pensar quc um país
armado e um mundo armado trarão a
paz e a segurança. É ilusório, por parte
dos que detêm o poder de Estado, pen-
sar que podem orientar a violência
apenas para determinadas direções. A
violência se torna virulenta e descontro-
lada e atinge todos. É tempo de pre-
gar justiça e humanidade dentro e
fora das esferas de poder, dentro e fora
do país e de acabar com a ilusão de
que pela força seremos respeitados como
indivíduos ou como nação". O rev.
Daugherty é diretor da Frente Unida
Negra.
Desde a marcha para o Oeste a violen-
cia massacrou os índios para conquistar
territórios. Viajou de costa a costa na
mitologia do cowbov de arma em punho.
Agora a simbologia do cowbov chegou à
Casa Branca de Reagan.
A violência existiu sempre no racismo
assassino que enforcou e queimou negros
no Sul dos EUA. e sobrevive no racismo
dos hate groups entre os quais o Ku
Klux Klan. que está em nova fase de vi-
^ Antes da Segunda Guerra Mundial, a
expansào da violência quase se limitou
aos territórios contíguos dos Estados
Unidos da América, indo no máximo ao
Caribe. Era um estágio óbvio em que a
violência era exercida por tropas que de-
sembarcavam de armas na mão.
O império mundial da
tortura regido pelosEstados Unidos,
A violência tomou nova face após 1944."O
velho mundo colonial fora sacudido
durante a Segunda Guerra Mundial, e o
nacionalismo radical resultante ameaçou
a dominação tradicional e os interesses
econômicos dos negócios do Ocidente.
Para conter esta ameaça, os EUA se
aliaram a elementos da elite e a militares
no Terceiro Mundo, cujas funções têm
sido deter o fluxo de mudanças" diz. o
professor Noam Chomsky.
Começou após 44 um estágio em que os
EUA eram apenas coreógrafos da vio-
I6ncia delegada às mãos de "afilhados, o
Estado Nacional de Segurança neofa-
cista e outras formas de regra autoritária
que se tornaram o modo dominante de
governo no Terceiro Mundo", afirma
Chomsky.Diz o relatório da Anistia Internacio-
nal de 1977 que entre 1975 e 19^6 "mais
de 80 por cento dos apelos urgentes de
ações para vítimas de tortura humana
vieram da América Latina". A Anistia
comparou "o
império expandido da tor-
tura" com "algumas das cxcrescências
piores do fascimo europeu"."Entre b0 e 69" diz Noam Chomski,
"11 governos eleitos constitucionalmente
tinham sido substituídos por militares
que ninguém elegeu. Com isso o poder
dos militares americanos aumentou -
•. mR***stm**. ~. ¦¦¦ - ¦ ¦->< ?"_: —— ¦¦¦¦ ' "' # .
v, xiabmnã, uma tradição tü violência irrBcional contra ob oprimidoa.
devido à sua Intima vinculação com as
classes dominantes, e à sua necessidade
de ajudá-los a consolidar suas posições
minoritárias e aumentar a "segurança"
doméstica junto às populações do Ter-
ceiro Mundo que-não os haviam escolhi-
do".
Algumas estatísticas são suficientes
para mostrar-nos o reino da violência em
que vivemos: 15 mil guatemaltecos fo-
ram vítimas de esquadrões da morte
entre 1970 e 1975, diz Anistia; 5 mil
morreram no mesmo país entre 1978 e
1980J 15 mil salvadorenhos morreram,
sobretudo vítimas da Guarda Nacional e
de esquadrões da morte, entre 1979 e
1980.
Isso não isenta responsabilidades re-
gionais e nacionais, mas afirma Choms-
ki. "os
militares americanos se orgulham
de ter criado uma rede de polícias se-
cretas latino-americanas que percorrem
livremente os territórios uns dos outros
na caça aos dissidentes, e que operam
com um treino comum, o quc os torna
mais eficientes".
O diretor executivo da American Civil
Liberties Union. Ira Glasser, comentou
após a tentativa de assassinato dc Reagan:
Há gente na administração ansiosa para
usar o atentado como justificativa para
um programa amplo de políticas repres-
sivas. baseando-se em fazer a nação te-
merosa de violência gratuita de tal modo
que as liberdades fundamentais -pode-
riam tornar-se vulneráveis. Já se propõe
em Washington liberar a CIA e o FBI
para prisões preventivas, buggings (escu*
ta clandestina), infiltração em grupos
estudantis etc. O clima de medo é pro-
pfcio ao desrespeito aos direitos civis,
porque encoraja os grupos que têm
poder de Estado e ganhar mais poder
em nome da segurança".
O que não existe nestas colocações é a
ligação entre violências fora e dentro dos
EUA. %
O professor Falk. da Universidade de
Princeton enfatiza quão importante é es-
tabelecermos a visão conjuntural."Devemos repensar as soluções atra-
vés de militarização e policiamento. In-
felizmente exportamos a violência com
uma política externa de filosofia militar,
encorajando a defesa de nossos interesses
através de governos autoritários militares
que reprimem domesticamente. Domes-
ticamente nos EUA difundimos a noção
de que força produz vitórias, e bom poli-
ciai garante a segurança. Isso é um erro.
A única maneira de termos paz e segu-
rança é encorajando sociedades harmô-
nicas e justas aqui e fora daqui. Jovens
de níveis econômicos bons, e níveis sofis-
tieados de educação foram os agressores
tle John Leiinon e Ronald Reagan, mos-
trando-nos mais uma ve/ que neste país
cresce a noção errada de que as mu-
danças devem ser implantadas a bala".
O mito do cowboy: dez
vezes mais mortes que
qualquer outro país.Mudará alguma coisa 0 atentado a
Reagan?"O
atentado provavelmente dará ao
Congresso o direito de endurecimento
que precisavam ter para negar-nos mui-
tas liberdades garantidas pela Constitui-
ção*' declarou o diretor áo Comitê Na-
cional para uni Congresso Efetivo, Rus-
sei Hemenway. "Não somente isto, mas
contrariamente ao que se poderia supor,
o atentado não ajudará o controle de ar-
mas. Não, este tipo de ação somente
aumenta o clima de retaliações no país, e
o humor autoritário no Congresso".
Mais uma espiral de policiamento, re-
pressão, demonstrações de força, milita-
rização, medo, insegurança, poderão
ocorrer nos EUA e no mundo, porque
um jovem detraqué decidiu materializar
suas fantasias de heroísmo numa ação
violenta. Já no segundo dia após o aten-
tado, o Congresso dos EUA cortou os
15 milhões de dólares restarles de ajuda
à Nicarágua (dos 90 n:ohv.., tot-.is que
haviam sido aprovados e anunciou
que enviará 500 Boinas Verdes (green
berets) e um porta-aviões para a Libéria.
Outras ações rígidas poderão ser toma
das para compensar aos olhos do mundo
a imagem de fragilidade física e política
da administração atual, cujo presidente
foi baleado, e cujos membros do gabine-
te, entre os quais sobretudo Haig, Bush e
Weinberger, lutam pelo poder.
Não somente como grupo, o america-
no marchou para a conquista territorial
violenta. Individualmente também o
americano confia sobretudo em si para
defender propriedades e integridade físi-
ca. Nos EUA,55 milhões de revólveres es-
tão em mãos dos civis e, menos de um terço
tem licença de porte-dc-arma.
Os EUA têm 10 vezes mais assassina-
tos do que qualquer outra sociedade in-
dustfializada do mundo. Existem 15 mil
agências, diz. 0 FBI, que tentam comba-
ter o crime.
Norman Hunt, do Sistema Penal do
Estado de Indiana, afirmou "nós
temos o
sistema de sentenciamento mais rigoroso
dos 50 estados americanos, e provável-
mente mais rigoroso que os de qual-
quer país comunista. Nào afrouxamos.
r.t
14
MOVIMENTO - 20 a 26/4/81
Governo olá exemplo ao povousando violência globalmente
Mas isto não reduziu o crime".
Os EUA são um país armado, em que
polícias e ladrões dependem igualmente
do puxar de um gatilho para ver que
sangue será derramado no chão. Para
que? Por que esta mitologia do cowboy
no limiar do século 21?
E de que adianta? Uma pesquisa re-
cente mostrou que 68 por cento dos
americanos temem o futuro econômico, e
41 por cento temem sair e serem assai
tados ou mesmo mortos. Diz a última
pesquisa do Gallup que 85% dos ameri-
canos querem sentenças mais severas.
aumenta 1% e a
criminalidade 8%Não está havendo na grande imprensa
daqui nem a colocação social,nem econô-
mica e nem política do contexto da vio-
lência. Diz a American Civil Liberties
Union que "é
fator histórico que para
cada aumento de um por cento de de-
semprego, há um conseqüente aumento
de 4 por cento de encarceramentos, e
para haver 4 por cento de aumento de
encarceramentos, é provável que 8 por
cento de aumento de crimes tenham ocor-
rido"."O
desemprego, que subiu a 7,3 por
cento em 1980. de 4,9 por cento em
1973, é uma causa importante do au-
mento de crimes nos EUA", diz ACLU.
Em fevereiro de 1981, a revista News-
week registrou que 4,2 milhões de
americanos não tiveram alternativa a
não ser sair dos empregos tempo-inte-
gral, e conformar-se a tempo-parcial.
Calcula também a Newsweek que, resul-
tante dos programas de cortes orçamen-
tários de Reagan. e concentração de ver-
bas no Pentágono, 1,1 milhão de ameri-
canos estava desempregados dentro de
alguns meses, além dos já desemprega-
dos agora.
O mesmo número, 1,1 milhão de tra-
balhadores abandonaram ou abandona-
rão a busca ativa de novo emprego en.
1981, diz o programa Nova de televisão,
relembrando que 750000 trabalhadores
haviam abandonado esta busca em 1980.
Nào há razão para procurar. A tecno-
logia, e a exportação de fábricas inteiras
diminuíram a proporção de oferta de
trabalhos. A "renovação da América
prometida por Reagan aos industriais,
não será tampouco baseada em criação
de linhas-de-produção nem dentro nem
fora do Terceiro Mundo. Fala-se crês-
centemente de fábricas descentralizadas,
em que algumas pessoas monitorarão
computadores, e de granjas eletrônicas,
em que máquinas monitoradas por
poucas m«ãos-de-obra ordenharão as va-
cas.
"Tudo isto gera frustração" diz o ex-
ministro da Justiça Ramsey Clark. Gera
a irracionalidade e a violência, que ter-
mina sendo perpetrada contra família-
res, mulheres, filhos, pais, "que nada
têm a ver com o fato, mas estão ao
alcance da retaliação".
Ainda mais quando isto é agravado pela
violência pregada como filosofia oficial
do governo e dos poderosos. Nossos go-
vernos são os primeiros a difundir a
idéia de que se ganha respeito saindo ar-
mados pelo mundo para subjugar o
adversário. O que isto provoca nas men-
tes dos jovens, dos homens e mulheres
simples, doutrinadas pela sociedade ma-
chista-armada? pergunta Ramsey Ciar-
ke.
Esta pergunta não é respondida pelos
301.800 presos (havia 218.500 em 1974).
não é respondida pela tentativa cega de
Jimmy Carter de prolongar o poder do
xá, não é respondida apoiando uma
junta civil-militar no El Salvador que o
povo não escolheu, não é respondida
pela invenção do tecido Kevlor (da Du
Pont), com o qual foi feito o colete à pro-
va de balas usado por Ronald Reagan na
sua posse em 20 de janeiro de 1981.
Domesticamente nos EUA, as estatís-
ticas do FBI permitem compararmos os
números de assassinatos no Norte, onde
há mais distribuição dc renda, e no Sul,
mais desigual. Se em Nova Iorque houve
1.814 assassinatos em 1980, um cidadão
foi morto por cada 4.102. Em Atlanta,
Geórgia, terra em que 21 crianças negras
foram assassinadas sem haver investiga-
ção policial adequada "por falta de ver-
ba", houve um assassinato por cada
1.831 pessoas em 1979 (as estatísticas do
FBI para Atlanta ainda não foram dis-
tríbuídos à imprensa). Nova Iorque é a
nona cidade em assassinatos. Antes dela
estão Detroit e Saint Louis (Illinois),
ambas cidades industriais onde os ope-
rários foram castigados severamente pela
crise da indústria automobilística, Chi-
cago. outro grande centro de desempre-
go industrial, e outras.
O obscurantismo em alta
Matadores treinados
em quatro grandes
guerras enchem cadeias
Outro fator que parece relevante ao
exame do contexto de violência são as
guerras. Alguns combatentes morrem,
os outros retornam. "Sou um matador
treinado" diz um veterano do Vietnã ao
Projeto de Pesquisa da Era do Vietnã
publicado pelo Centro para Pesquisa
Política Inc., em 24 de março de 1981,
para a "Administração dos Veteranos".
"Alta proporção
— em alguns casos
até 25 por cento — das populações en-
carceradas masculinas é constituída por
vetei anos, sobretudo do Vietnã, homens
que não tinham passado de delmqüen
cia juvenil destrutiva" escreveu no N.Y.
Times de 9 de março de 1981 o advogado
James Lieber".
Diz o Projeto de Pesquisa: "durante
este século os EUA lutaram 4 guerras
maiores — Duas guerras mundiais, o
conflito da Coréia e a Guerra do
Vietnã". A última foi a que deixou mais
cicatrizes psicológicas sérias".
Se tomarmos como ponto de referên-
cia o documentário feito em 1949 pelo
departamento da Defesa e dirigido por
John Huston. Que se Faça a Luz (Let
there Be Light), filme que foi liberado
em 1980, após 30 anos de censura, "30
por cento de todos os ferimentos provo-
cados pela Segunda Guerra Mundial
foram psicológicos"."As vezes eu divagava. O que poderia
acontecer quando eu voltasse pra casa?
Ia perder o controle? Porque sou um
assassino treinado. Quando voltei fui
preso por assalto, e condenado. Você é
uma bomba ambulante quando volta cie
uma guerra. Quando voltei passei muito
tempo no campo, tentei virar caçador
para matar animais, e quase matei uma
pessoa" diz outro veterano de guerra ao
Projeto de Pesquisa.
(Paula e Silva, correspondente nos EUA)
Enquanto mulheres procuram genes•excelentes"
para seus ju tu ros bebes.
>m um banco de esperma da Califór-
nia, diversas indústrias estão recusando
trabalhadores por causa de seus genes.
A criação, no ano passado, do banco de
esperma de ganhadores do prêmio No-
bel e o crescente uso da genética na se-
leção de pessoal são manifestações da
velha teoria de que os genes comandam
o destino.
Com o crescimento do pensamento
de direita em escala mundial, esta
teoria vem ganhando adeptos em algu-
mas áreas científicas e populares. "A
medida que os problemas sociais se
agravam, podemos esperar reações ca-
da vez mais fortes da direita ",
diz John
Vandermeer, um professor de Biologia
da Universidade de Michigan. "Uma
das armas que eles vão utilizar é o de-
terminismo biológico. Se este determi-
nismo se apresenta como herança da
inteligência, explosão demográfica ou
sociobiologia, o propósito é sempre o
mesmo: localizar na Biologia as causas
?. por implicação, as soluções para a
crise do capitalismo"."As
ciências da vida revelam a ne-
cessidade de uma hierarquia entre os
indivíduos em todas as sociedades ani-
mais avançadas, como também nas so-
ciedades humanas", escreveu recente-
mente o editor do Figam revista fran-
cesa de direita. Esta afirmação reflete
os argumentos de muitos anti-semitas
franceses, que usam a sociobiologia
como suposta base científica para seus
preconceitos.
Nos EUA a sociobiologia tem sido
posta em prática pela indústria petro-
química nos últimos 15 </ 20 anos. Em-
presas como a Du Pont e a Dow Che-
mical afirmam que alguns genes aumen-
tam a suscetibilidade a certas doenças
ocupacionais, e que a seleção genética
dos empregados é necessária para sua
proteção.
No entanto, cientistas e líderes sindi-
cais afirmam que os testes não são efe-
tuados para proteger os trabalhadores,
e sim para transferir a culpa pelas
doenças ocupacionais da indústria para
as vítimas. Sustentam ainda que a
seleção genética leva à discriminação
sexual, racial e étnica na oferta de em-
prego. Há exemplos documentados ae
mulheres e negros sendo recusaaos em
empregos devido à "hwersu^etibilida-
de".
Uma investigação feita pelo New
York Times revelou que os negros são
os preferidos para os testes genéticos da
Du Pont. Esta empresa, antes da con-
•ratação, faz um teste sangüíneo de
todos os negros para identificar porta-• dores de células falciformes. apesar do
lato de uma pessoa portadora raramente
apresentar qualquer problema. A célula
hilciforme causa uma doença genética-
mente transmissível(anemia falcijorme)
encontrada principalmente em negros.
Quando uma pessoa possui dois genes
pau a célula talciformelo portador tem so
um), está sujeita a enfermidade crônica
ou á morte.
Por outro lado, em outros grupos
étnicos (por exemplo, brancos de ori-
gem mediterrânea) há outros distúrbios
geneticamente transmitidos que apre-
sentam riscos iguais ou maiores na in-
dústria química, embora a Du Pont
não os submeta ao teste genético. Para
Jonathan King. biólogo do Instituto de
Tecnologia de Massachussets. "a
posi-
ção da Du Pont é racismo científico.
Eles dizem que não sua fanáticos por-
que tudo se baseia na ciência. Mas o
fato é que aquelas pessoas não vão ficar
doentes porque são hipersuscetíveis, e
sim poi que estão sendo envenenadas".
Um exemplo mais notório desse ra-
cismo científico e a declaração feita por
Arthur Jensen em 1969 de que as dite-
renças de Ql (quociente de inteligência)
entre negros e brancos eram devidas a
diferenças genéticas. Em um trabalho
publicado na Harvard Educational Re-
view, Jensen faz as seguintes afirma-
ções: D Çs negros em testes de Ql
obtém em media 15 pontos menos que
os brancos; 2) esta diferença é, em
grande parte, devida a diferenças gene-
ticas; 3) portanto, o Ql é resistente a
mudanças e buscar, por exemplo,
igualdade em educação é puramente
ilusório.
O argumento de Jensen é falso em
vários níveis. Primeiro, o que mede o
Ql? Diversos analistas dessa questão
sustentam que ele mede no máximo ai-
gumar aptidões dentro de um enorme
conjunto de funções intelectuais. Em
muitos casos, o Ql não reflete sequer as
poucas aptidões que deveria refletir,
porque os testes são tenaenciosos do
ponto de vista cultural e de classe,
tanto no conteúdo como na linguagem.
O Ql é, na verdade, uma medida de
como a experiência de uma pessoa se
aproxima à de um indivíduo branco da"classe
média".
Logo após a publicação do trabalho
de Jensen, William Shockley, prêmio
Nobel de Física, redigiu uma proposta
de lei pedindo a esterilização das pes-
soas com Ql menor do que ,100. Sua
idéia era começar pelos segurados da
previdência social, atraindo-os para se-
rem "voluntários" com a oferta de
USS 1.000 para cada ponto de Ql abaixo
dc 100.
O plano de Shockley não era particu-
larmente novo. No ano passado, a
União Americana pelas Liberdades
Civis descobriu programas de esterili-
zação em massa no Estado de Virgínia.
Constatou-se que, em especial durante
a Grande Depressão, centenas de virgi-
nianos pobres foram legalmente esteri-
lizados sem saber. A pesquisa revelou
também que nos anos 50, 8 mil homens
e mulheres foram involuntariamente
esterilizados no Estado.
Os programas de esterilização se ba-
seavam na teoria da eugenia, que de-
sestimula a reprodução das pessoas
onsideradas menos desejáveis. Esta
concepção se liga intimamente com a
ciência racial nazista, o mito da super-
população, a teoria da relação raça-QI
e a sociobiologia.
Ql e eugenia estão associados desde
muito tempo. Em 1912. o Io Congres-
so Internacional de Eugenia, realizado
na Universidade de Londres, anunciou
como uma de suas metas "a
prevenção
da propagação dos incapazes através
da segregação e de esterilização". Os"incapazes" eram os pobres, supostos
inferiores por hereditariedade. Os tes-
tes de Ql foram criados neste mesmo
ano.
As pressões dos eugenistas acabaram
criando leis que oficializaram a esteri-
lizaçâo. Por volta de 1930. 31 estados
americanos decretaram tais leis. e mais
de 60 mil pessoas foram esterilizadas.
Essas leis existem até hoje em quase 30
° Catherine Ylh (The Guardian)
*->
MOVIMENTO — 20 a 26481
15t-t
lê . <ii/j'ftyy
íResistência afegã
A tendência entre a oposição afegã é a
de se organizar para uma luta longa, dei-
xando a improvisação que ate hoje prevale-
ceu por uma estruturação e cooperação
maior entre os vários grupos de resistência.
Esta é a opinião de um especialista em re-
lacões internacionais que passou vários
anos no Afeganistão, citada pelo Jornalista
Patrick Francês no Le Monda (8/4/81).
Segundo este observador ex-oartidário do
primeiro-ministro afegào, Babrak Karmal. o
exército afegão está em fase de difícil reor-
ganização, apôs haver sido"desmantelado" em fins de 79, quando con-
tava com apenas 40 mil homens. Ao contra-
rio das promessas iniciais de Karmal, se-
gundo ele, o governo nâo conseguiu apoio
popular e as contradições do grupo domi-
nante no país se acentuaram.
Prostitutas falamO jornal Macadan é o mais novo órgão da
imprensa francesa Bimensal com uma tira-
gem de 10 mil exemplares, ele será o porta*
voz da Associação de Ação e Defesa das
Mulheres Prostituídas, criada em 1980. O
primeiro número, lançado dia 31 de março
em Paris, marca dez anos de luta das prós-
titutas francesas, que explodiu nos últimos
cinco anos através de manifestações, ocu-
pações de igrejas e mesmo um processo
contra o presidente Giscard d'Estaing, por
proxenetismo.
Sindicato romeno
"Os sindicatos não devem estar subordi-
nados ou sob a tutela do Partido Comu-
nista" Esta foi a definição dada pelo líder
romeno. Nicolau Ceausescu, ao inicio do
Congresso do Conselho Central dos Sindi-
catos de seu país, reunido entre os dias
seis e oito de abril. Para o chefe de Estado,
cumpre aos sindicatos "participar da defe-
sa contra toda agressão imperialista , e
eles poderão daqui para a frente ' opinar
sobre as atividades de direção das empre-
sas e principalmente decidir sobre a desti-
tuicão dos dirigentes que náo cumprem
suas obrigações'. Medidas nes-?e sentido
.serão tomadas em breve, assim como so-
bre a "generalização da semana de 46
horas em todas as empresas e instituições
e da semana de 44 horas durante o atual
planoqüinquenal (81-85). A maioria dos tra-
balhadores ainda tem semana de 48 horas
na Romênia.
Desastre ecológico
be os países ricos nâo mudarem sua poií-
tica ecológica há um risco sério de um de-
sastre mundial. Foi a conclusão dos 24
membros da OCDE reunidos em Paris neste
começo de mês. Seus relatórios mais re-
centes dão um quadro sombrio da situa-
ção- até o fim do século a Terra terá seis
bilhões de habitantes, estará privada de
40% de suas florestas tropicais, de 20%
das terras férteis e ameaçada de pertur-
bações climáticas pelo acúmulo de gás car-
bônico na atmosfera. A divisão de recursos
será ainda mais desigual, os combustíveis
ainda mais raros e os alimentos ainda mais
caros E esses pai: es não podem fugir às
suas responsabilidades: representam 17%
da população, mas seus Produtos Nacio*
nais Brutos somam 60% do total mundial,
fabricam 88% dos veículos do mundo e
80% dos produtos químicos.
Pista de Atlântida
Segundo os pesquisadores do navio
soviético Kurchatov, suas câmaras mostra-
ram "novas evidências'' do que podem ser
as ruínas rio continente perdido de Atlàn-
tida Há cerca de dois anos, os soviéticos
fotografaram um vulcão subterrâneo entre
Portugal o as Ilhas Madeira, descobrindo
formas semelhantes a "paredes e esca-
das" Agora o diretor de pesquisa do Kur-
chatov, Àndrei Monin, disse que os cientis
tas viram misteriosas estruturas nas 460 fo-
toqra-ias tiradas no mesmo local. "Em
ai-
quinas das totós pode-se ver estruturas
retangulares ".
e em uma delas, "lajes
re-
tangulaces que se elevam vindo rio fundo"
Isto para ele "pode
comprovar sua ongem
artificiai' A existência da civilização de
Atlântida. descrita por Platão, náo é levada
a sério pela maioria dos cientistas atual-
mente
POLÔNIA
O Ocidente em busca deuma fórmula para receber
23 bilhões de dólaresÉ quase certo que haverá um
acordo entre o governo polonês e
os governos e bancos ocidentais,
como forma de resolver o grave pro-
blema da dívida externa da Polônia
— impossibilitada este ano de
pagar as prestações e o serviço de
uma soma que já se eleva a US$ 23
bilhões.
A Polônia tem sido, nas ultimas
semanas, a preocupação maior dos
bancos europeus. Seus represen-
tantes não se cansam de procurar
fórmulas para reorganizar esta dlvi-
da, da qual US$ 10,3 bilhões são ga-
rantidos por governos ou organis-
mos de Estado especializados em
exportação internacional (Coface
na França, Eximbank nos EUA,
ECGD na Inglaterra e Hermes na
Alemanha Ocidental). Este último
junto com outros bancos alemães
são os maiores credores da Polo-
nia, com um total de US$ 4,4 bi-
lhões de empréstimos. Oe
seguintes: EUA (3,3 bilhões), França
(2 5 bilhões), Inglaterra (2 bilhões),
Austria(1,7 bilhão) e Itália (1 bilhão).
Itália (1 bilhão).
A situação imediata dos polone-
ses é precária. Sua parcela da dívi-
da este ano é de US$ 6,6 bilhões, e
eles nâo têm condições de pagá-la.
segundo tudo indica. Eles estão pe-
dindo um crédito especial de 1 bi-
Ihão e o adiamento dos
pagamentos relativos ao segundo
trimestre deste ano (mais 1 bilhão)
como forma de evitar atrasos, a que
nunca recorreram, e saldar os com-
promissos mais urgentes (os maio-
res credores este ano sâo os EUA,
com 1,1 bilhão, e a França com 1 bi-
Ihão). Os outros pagamentos deste
ano deverão também ser reescalo-
nados segundo o acordo geral em
estudo. Os poloneses afirmam que
as negociações da parte da divida"garantida"
pelos organismos esta-
tais, estão sendo positivas.
Os eurobanqueiros decidiram
criar comitês nacionais para
estudar a reorganização da dívida
polonesa, nos EUA sob a coordena-
ção do Bank of America e do City-
bank
As negociações até agora têm se
desenrolado sob um clima de satis-
facão geral. O volume da dívida po-
lonesa é tal que todos têm interes-
se numa solução o mais rápido
possível, embora não haja dúvida
de que tudo terá que ser rediscutido
no caso de uma intervenção
armada na Polônia.
Apesar deste clima geral, é duvi-
doso que a melhor saida seja a que
vem se desenhando, com o desdo-
bramento da dívida polonesa em
prazos bastante longos, sob a
cobertura de organismos interna
cionais como o FMI (Fundo Monetá-
rio Internacional). A dúvida se colo-
ca não só devido ao montante da
divida, como por suas conseqüên-
cias inevitáveis sobre a viria interna
do país, condenado a duros sacri-
fícios ainda por longos anos à
frente. Por exemplo: os bancos co-
merciais poderão suportar a carga
que se colocará sobre eles sem pôr
em risco o sistema bancário in-
ternacional? Ao emprestar à Polo-
nia, durante muito tempo eles adia-
ram a crise atuaf. mas ainda
poderão manter o papel que assu-
miram, na verdade substituindo as
organizações especializadas, que
foram incapazes de financiar as
exportações em que têm interesse
os governos credores da Polônia'-
(Le Monde)
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£ tfsJtk . ^w ^^t?*"piS__________fc?^_S^ '^^^K*mm9
Castro: posição consolidada vinte anos após ã invasão
CUBA
Baia dos Porcos: vinte anosVinte e quatro noras depois que aviões tipo
B-26 atacaram, às seis horas da manhã, três
bases militares, o que provocou sete mortos e
uns 60 feridos, milhares de militantes anti-
castristas invadiram Cuba, em três frentes di
ferentes: províncias de Oriente, Pinar dei Rio
e Matanzas. Nesta, ficam a Baía dos Porcos e
a Praia Girón.
Durante a frustrada invasão de Cuba, leva-
ria a efeito há 20 anos (era o dia 17 de abril de
1961, uma segunda-feira), os anticastristas e
mercenários supunham que, tão logo chegas-
sem às praias cubanas, todo o povo, imedia-
tamente, se levantaria contra o regime de Fi-
dei Castro, de armas na mão
No entanto, o que sucedeu foi exatamente
o contrário: decretada a mobilização geral do
povo, a primeira medida efetiva adotada por
Fidel Castro, as forças armadas cubanas, sob
o comando direto do próprio primeiro-minis-
tro. saíram em defesa da pátria ameaçada; de
fato, pouco mais de 48 horas depois da inva-
são, a situação já estava sob controle, com o
aniquilamento das forças invasoras.
Mas ainda antes do bombardeamento das
bases cubanas por aviões supostamente pi-
lotados por cubanos que tinham desertado da
Força Aérea, houve outros atos de sabotagem,
como o incêndio que destruiu, dia 13 de abril,
uma quinta-feira, o Supermercado El Encan-
to, de seis andares, em Havana, com enormes
prejuízos para o Governo e povo cubanos.
Com relação aos bombardeamentos do sá-
bado que antecedeu a invasão, o encarregado
de negócios de Cuba no Rio de Janeiro, Hélio
Armenteros, em entrevista à imprensa, no dia
da invasão, explicava que em Ciu-
dad Libertad não havia qualquer base militar,
mas uma cidade escolar, com umas 20 mil
crianças.
A invasão de Cuba, que segundo Fidel
Castro foi preparada na Guatemala (de onde
partiram os invasores) e organizada com
apoio do Governo americano, foi atribuída ao
Conselho Revolucionário Cubano, presidido
por José Miro Cardona, cujo filho, de igual
nome, foi preso durante a operação de de-
sembarque em Cuba.
O Conselho Revolucionário Cubano, na
véspera da invasão, distribuía comunicado
em New York no qual dizia, dentre outras
coisas, que "um
tremendo exército de pátrio-
tas, agindo na clandestinidade, recebe neste
momento instruções para o golpe final contra
Castro". O jornal mexicano Uni-
versai Gráfico chegou mesmo a anunciar que
o primeiro-ministro Fidel Castro já dispunha
de uma fazenda no México, onde pretendia
asilar-se...
Um dia depois da invasão, havia rnanifes-
tações de apoio a Cuba no México, Guatema-
Ia Colômbia, Bolívia. Panamá, Chile, Peru,
Venezuela, França, Itália, Equador, União So-
viética e Brasil. No Rio de Janeiro, estudan-
tes programaram para terça-feira, dia 18. duas
concentrações de solidariedade a Cuba.Alèm
disso, às oito da noite, houve um ato público,
na União Nacional dos Estudantes, na Praia
do Flamengo.
Na Organização das Nações Unidas, o mi-
nistro das Relações Exteriores de Cuba, Raul
Roa denunciava que um porta-aviões ameri-
cano fora visto navegando ao sul de Cuba,
mandando aviões a jato para apoiar a invasão.
Ao mesmo tempo, Fidel Castro declarava que
os invasores tinham partido da Guatemala, o
que foi contestado pelo Governo guatemal-
teco.
O delegado da União Soviética na ONU,
Valerian Zorin, pedia a cessação imediata das
operações contra Cuba. e acusava o Governo
americano de responsável pela operação. A
acusação foi rechaçada, mas os porta-vozes
americanos manifestaram sua simpatia pelos
anticastristas.
Dia 20 de abril, três dias depois da invasão,
(no mesmo dia, Fidel Castro anunciara que,
na véspera, tinha acabado de aniquilar os In-
vasores), o presidente dos Estados Unidos,
John Kennedy, falando na Sociedade Norte-
Americana de Diretores de Jornais, defen-
dia-se da acusação de ter patrocinado a inva-
são: "Uma
intervenção unilateral norte-ame-
ncana em Cuba seria totalmente contrária às
tradições e obrigações internacionais do Go-
verno de nosso pais, mas è necessário re-
cordar que a moderação estadunidense nao e
'"ji9? Governo brasileiro (o presidente da
República era Jânio Quadros), em nota ofi-
ciai manifestava sua apreensão diante da in-
vasão de Cuba, e reafirmava a decisão de de-
fender os princípios da autodeterminação dos
povos.
Mais ou menos um mês depois da invasão,
tivemos oportunidade de assistir, na Embai-
xada de Cuba, no Rio de Janeiro, a um filme
sobre aquela tentativa de derrubada do Gover-
no de Fidel Castro. As cenas, emocionantes,
mostravam jovens de 15/16 anos. de ambos
os sexos, partindo em direção à praia, a fim
de dar combate ao invasor.
Com essa resistência, evidentemente, não
contavam os anticastristas e mercenários que
se envolveram na aventura de alijar do poder o
primeiro-ministro Fidel Castro, cuja posição,
hoie, está mais do que consolidada. (Adal-
bertu Cavalcanti).
MOVIMfc NTO - 20 a 26/4/81
16
LIVROSMEMÓRIAS
O que é que o Gabeira tem?*^* **• ^^^^^M|M» Trata-se, como o autor anuncia. d<
Com se explica afaçanha de FernandoGabeira, que vendeu
125 mil livros?
Emiliano Gonçalves
fi
uarenta edições, 125.000
exemplares vendidos em
dois anos. Cifras fora do comum no
mercado do livro. É a façanha de Fer
nando Gabeira com O que é isso Compa-
nheiro?, O Crepúsculo do Macho e En
tradas e Bandeiras.
Por que os livros de Gabeira têm tanto
êxito? Ante esta pergunta as respostas
variam muito: desde "é
um gênio" até "é
um desbundado e em país de desbunda-
dos, desbundado é rei". Todas coinci-
dem em que os livros são bem escritos e o
assunto é apaixonante. Muitos argu
mentam também com a força da publi-
cidade.
Mas isto não basta para compreender
o êxito de Gabeira. Este deve ser busca-
do na proposta subjacente do autor que
vai ao encontro de questões sentidas pot
parcelas importantes da sociedade bra-
sileiraque, além de saber ler e ter tempc
para fazê-lo. têm dinheiro para comprai
livros.
A partir da curiosidade inicial que
despertou a chegada do autor ao Brasil
com a entrevista a O Pasquim e a bada-
Íação do retorno — ex-guerrilheiro,
seqüestrador do embaixador yankee,
com tanga de crochet, transa homens e
mulheres em Ipanema — aquelas parce-
Ias da sociedade são atraídas pela irre-
verência desenfreada dos livros de Ga-
beira, face a toda ordem estabelecida (de
direita ou de esquerda) em todos os am-
bitos da vida.
Estes livros vieram ao encontro de um
público situado aparentemente à mar-
gem do "político", estimulando a refle-
xão e discussão fora da "clientela
poli-
tica" da chamada esquerda. Um público
que questiona, muitas vezes de maneira
intuitiva e vivencial, a esquerda marxista
tradicional, armada ou desarmada. Que
nega o regime e igualmente as organi-
/.ações de "esquerda"
que reproduzem
sob outras formas o autoritarismo e mo-
ralismo do mesmo. Parcela da sociedade
alinhada na esquerda pelo seu potencial
contestatório c que não se sente identífi-
cada com a forma dc ver e fazer política
da esquerda tradicional.
mm -£~ 9m^^ ***** mt ^^V-á..,^'.^* *V."''
W*^ \ ,:^J *%> -;;;,«.:,
¦f . <x^. '"Mm
Colaboração, em vez de direção do proletariado...
existência deste público
tem suas raízes num fenômeno social
emergente após mais de uma década de
regime despótico. Trata-se da extenua-
ção da sociedade frente ao despotismo do
regime e ao autoritarismo das relações
sociais gerados pelo capitalismo desen-
volvido no seu seio. Esta extenuação nao
se dá apenas no proletariado. Abrange
também vastas camadas não-proletanas
igualmente oprimidas. O cansaço laten
te, a indignação sufocada, o terror à vio-
lência do cotidiano atravessam toda a
sociedade. O protesto e a indignação se
expressam à margem do constituído le-
galmente, quer se trate de partidos, sin-
dicatos ou qualquer outro tipo de organi-
zação criada de cima para baixo.
São os operários que denunciam o
sindicalismo pelego atrelado ao Estado e
lutam pela autonomia sindical e a inde-
pendência da classe. São as mulheres
que protestam contra a condição de
"objeto para usar, gozar e abusar". Sãc
os negros que se revoltam contra a dis-
eliminação da cor e da cultura. São os
homossexuais que lutam pelo direito de
fazer o amor com quem quiserem. São os
ecologistas perplexos ante a destruição
da vida pelo capital. São setores com rei-
vindicações próprias que abrangem cada
uma delas um aspecto da exploração e
opressão da barbárie capitalista sob um
regime despótico. E se expressam como
movimentos sociais, como forças sociais
que se negam a ser enquadrados em
qualquer forma de organização institu-
cionalizada. ante as quais manifestam
uma desconfiança visceral.
público de Gabeira é fruto
desse fenômeno social. Um público cé-
tico das direitas e das esquerdas. Cama-
das que parte da esquerda, com seu ma-
niqueísmo bipolar - burgueses versus
proletários — não considera nas suas
análises. Parcelas da população que, não
sendo proletárias, têm entretanto, coisas
a dizer sobre o projeto de sociedade que
deve nascer da ação revolucionária. Es-
sas camadas foram preteridas no discur-
so da esquerda oficial, ou vistas como
aliados necessários mas nào-confiáveis. e
com as quais se ajustaria as contas na
hora da "revolução triunfante".
O que é isso Companheiro? é isso
mesmo: uma dessacralizaçào despojada
da esquerda armada.. Desde seu duplo
papel — jornalista e guerrilheiro
— Ga-
beira vai nos introduzindo naquele mun-
do que só conhecíamos por sussurros em
voz baixa ou por lacônicos comunicados
do governo. A técnica usada é a da per-
plexidade. Perplexidade teórica e dc
senso comum ante a monstruosidade em
que vão se transfigurando as organiza-
ções armadas. Contraponto entre a fér-
rea e sólida lógica formal do discurso do
militante construído sobre uma realida-
de imaginária que, contendo alguns ele-
mentos do real. assume as dimensões do
fantástico. Onde o discurso e a ação vão
criando progressivamente uma realidade
paralela que, com sua implacável lógica
interna, transforma a vida em conceito
vazio e o conceito vazio em vida. Organi-
zações que nasciam para a vida política
para dessacralizar verdades tidas come
eternas, por ironia acabam saeralizando
inclusive o que ainda não estava sacra-
lizado.
O grande mérito do autor é que sua
autocrítica, seu longo monólogo, é feito
desde a esquerda. Em nenhum momento
bate no peito como pecador arrependido
que volta aos braços da ordem estabe-
lecida. Continua sendo um subversivo.
Sua crítica à esquerda não é amarga. E
irônica e carinhosa. Não deda ninguém.
Não picha ninguém. Não julga. Argu-
enta.
Por ser aparentemente suave sua cnti-
ca tem efeitos destruidores. Ante nós
desfila, com seus traços peculiares,
toda uma galeria de revolucionários. E
nào podemos deixar de sentir amor e dor
por eles. Como não sentir ternura e ao
mesmo tempo angústia con. Domingui-
nho que. aos quinze anos. recitava as di-
ferenças táticas e estratégicas de todas as
organizações armadas, mas nunca tinha
Aleijado uma moça?
O Crepúsculo do Macho é o périplo do
exílio. O conhecimento de novas realida-
des. O estilo do relato é outro. Utili-
zando a justaposição temporal e espa-
ciai. constrói situações de muita vivaci-
dade. São lembranças do presente. No
começo preocupa-se com o que se preo-
cupa todo banido: preparar-se teórica e
tecnicamente para a volta. Ao mesmo
tempo mantém um monólogo sobre o
beco sem saída ao qual chegam as or-
ganizações armadas.
Trata-se, como o autor anuncia, de
uma viagem. Mas não da viagem do"desbunde"-, das orgias e das transas
com o "bom
capitalismo" como querem
fazer acreditar tanto os críticos de uma
autodenominada esquerda como os apo-
logistas do capital, lrata-se da viagem
da reflexão ante a complexidade da do-
minação capitalista. I a descoberta de
que, junto ao proletariado, existen
outras camadas oprimidas e exploradas.
Que junto aos mecanismos de domina-
ção econômica existem os ideológicos.
Que entre estes últimos a família c a
moral são suportes fundamentais do
capitalismo.
ntradas e Bandeiras constitui
o encontro com o novo Brasil. E a per-
cepção de que. além das lutas dos prole-
tários, existem as lutas das "minorias
oprimidas". Lutas com características
próprias, igualmente contestatórias. que
questionam as raízes da ordem estabele-
cida. Lutas que. se levadas até suas úl-
timas conseqüências, nào podem ser as-
similadas pelo sistema. Lutas autônomas
desses setores que. se incorporadas pelo
proletariado num movimento de enri-
quecimento mútuo, levarão a uma revo-
lução que não se esgota com a tomada do
poder. O autor se engaja nas lutas das"minorias". Já não é o intelectual que
quer levar a consciência ao proletariado.
É o intelectual que assume a luta desde
outro ângulo.
Como ele mesmo diz: "O
movimento
feminista ganhara um novo impulso a
partir de 68, a questão ecológica expio-
dirá com toda a intensidade nos anos 70.
Culturas independentes como a dos ne-
gros exigiam um direito de existência. Os
homossexuais, mantidos sob o signo do
preconceito, começavam a se organizar
em quase toda parte. Os loucos, os ve-
lhos, as crianças, em breve iriam abrir os
olhos para o processo de opressão a que
estavam submetidos. A sorte da nossa
época dependeria do proletariado. Seria
ele capaz de captar estas novas tendên-
cias. ou embarcaria pura e simplesmente
nas águas da repressão silenciosa e dis-
farçada contra milhões de seres huma-
nos?"
Além da dimensão política, os livros
de Gabeira estão permeados por outra
dimensão, a humana. O intento de res-
gatar e expressar os sentimentos, as
emoções, a alegria do sensorial. Aspectos
esses que. em certas camadas, são escon-
didos como debilidades. como algo ver-
gonhoso. E que quando timidamente
transparecem, sâo rapidamente raciona-
lizados.
oltando à pergunta inicial: por
que o êxito do Gabeira? Para a direita,
ti ata-se da volta do filho piodigo que
gosta das amabilidades do sistema. Para
a esquerda dogmática, da decadência de
um desbundado, transformado em "gu-
ru" pelos meios de comunicação. Para
outros, da oportunidade de refletir sobre
os velhos, mas sempre novos, problemas
da esquerda.
17
MOVIMENTO — 20 a 26/4/81
„v. ,\ .-.•.*. /._*.'#«&.
COLEÇÕES
O difícil equilíbrio de
informação e análise
no livro de bolso
PSICOLOGIA
Piaget explicadoA divulgação de um cientista tão importante quanto Freud
.__ roo „..--,_> _c tfinrias de Piaget.
A CRISE DO ESCRAVISMO E A
GRANDE IMIGRAÇÃO, Paula Bei-
guelman. Editora Brasiliense. São
Paulo. 1981. 62 p
AS INDEPENDÊNCIAS NA AMÉRI
CA LATINA, Leon Pommer. Brasi
Hense. 1981.141 d
A LUTA CONTRA A METRÓPOLE.
A u a Y^dda Linhares. Brasiliense,
1981, '15p.
A Editora Brasiliense acaba de
iançar os primeiros títulos da co-
¦cao Tudo à História", cuios te-
nas como indica o próprio nome
, _ coleção, não sequem os ente-
íios tradicionais de trabalhos se-
rneihantea. Estão concentrados
m questões que, mesmo sendo
•o passado, mostram-se atuais e
¦ ilèmicas.
PauU Beiguelman retoma os
>rincipaie argumentos de uas
*,hras da década de 1960. O no-
m-o abolicionismo-imigrantismo
oioca se no centro de seu estu-
<o onvilegiando este ultimo (pro-
-ovido pelos fazendeiros do cha-
rado <»este Novo - com centro
m Ribeirão Preto, interior de bao
•-auio; como elemento decisivo.
Desinteressados da continuidade
no suprimento de escravos, os
\deptos do imigrantismo tentam
pnr a própria instituição do es-
. ravismo para torná-la inviável e
conseguir o apoio oficial aos pro-
íhios de imigração européia. Hara
•• autora, o imigrantismo provo-
<ndo uma crise fundamental
i -entro do escravismo. cria as con-
diçóee objetivas para a emergência,
rio movimento abolicionista, cir-
nunscrevendo, porém, seu tnun-
Io'
Leon Pommer, por sua vez, per-
orre a América Latina indicando
is linhas gerais dos movimentos'¦¦¦- independência. A conjuntura
t.ropicia para tanto se situa na in-
¦sao das metrópoles ibéricas pe•V.
tropas de Napoleão. enfraque-
i .*ndo as ligações entre a Colônia
. a Metrópole. As disputas pelo
,oder que se seguem colocam em
loao diferentes personagens, tm
nuitaa regiões, a iniciativa de re-
..Itas de caráter autonomista in-
, iuí as camadas populares; em
. ..trás o movimento se limita a
méritos oa cúpula da admims-
, ao ou da sociedade colonial
¦i -'«-• ultado final, no entanto, ta-
.ri i ».u a estes últimos, que pas-
,am .i dominar nações formal-
lente independente, que nao
.-.nseguem se libertar dos vin-
uloãccm as grandes potências
da época. Em todo o texto fica
presente a sugestão de que a in-
dependência na América Latina
não representa uma efetiva des-
colonização, embora os novos
países se tornassem libertos das
velhas metrópoles ibéricas.
Maria Yedda Linhares também
critica, por outros motivos, o con-
ceito de descolonização — neste
caso relativo à independência das
colônias européias na Ásia e na
África A descolonização segun-
do a autora, expressaria uma vi-
são eurocentrista desse processo,
entendida a independência como
mera concessão das potências eu-
ropèias.Naverdade. porém foram
as próprias populações coloniza-
das que levaram adiante movi-
mentos que, por fim, obrigaram
as potências européias a conce-
der-lhes a independência A oe-
gunda Guerra Mundial catahza as
forças autonomistas, por relegar
as potências européias a lugar se-
cundário na política mundial e.
ainda, por levar à participação de
algumas populações coloniais no
conflito e à expansão do naciona-
"3Linhares conclui lembrando que
a •descolonização" da Ásia e da
África já se concluiu; mas resta o
problema de construção de suas
sociedades - elas que foram na
sua origem, destruídas pelo con-
tato com o colonizador.
Estes três lançamentos da cole-
ção "Tudo è História" são exem-
plares no sentido de mostrar o
potencial e as dificuldades de
uma coleção baseada nesses pa-
drões (livros de bolso com cerca
de 100 páginas). O livro de Paula
Beiuuelman nem sempre e de tacii
compreensão para o leitor nao fa-
miliarizado com suas obras, Leon
Pommer prefere apresentar infor-
mações minuciosas sobre os mo-
vimentos de cada área colonial,
sacrificando o enquadramento ge-
rai da independência na America
La'ina Apenas Mana Linhares
conseguiu melhor equilíbrio entre
informações e análise, colocando
progressivamente a questão da lu-
ta contra as metrópoles européias
no plano do desenvolvimento do
capitalismo no pós-guerra.
Sem duvida, a grande dificulda-
de consisto em alcançar O equlti-
brio entre a informação histórica t
a análise e a análise em livros de
dimensão restrita. O potencial da
coleção - que pode justificar sua
existência - é de se tomar um
veículo ágil para divulgar novas
teses a respeito de questões poie-
¦micas, sem comprometer o seu
caráter informativo geral.
PIAGET PARA _**M__**____ZLauro de Oliveira Lima, Editora
Summus - Coleção '.Novas
Buscas em Educação", 1980, 284
P*
Jean Piaget è autor de obras
oue só tardiamente obtiveram re-
conhecimento e aceitação, muito
provavelmente porque suas idéias
e descobertas supõem no sistema
acadêmico uma revolução SO
comparável à que Galileu propôs a
sociedade cientifica de seu tem-
P°Ele se dedicou, entre outras
coisas, ao estudo e pesquisa so-
bre a formação de conceitos pela
criança, o desenvolvimento da in-
teliqència e suas fases, campo em
aue positivistas e behavonstas se
negaram a entrar, declarando-o
área inacessível à investigação (a
•caixa preta") e medição.
Piaget, cuja formação provem
mais da área de ciências, (biolo-
qia) que de humanidades aplico^
se ao estudo da ep.stemolog a
genética (teoria do conhecimento
científico baseada na analise do
desenvolvimento da inteligência)
fundamentando seus estudos em
métodos científicos de observa-
ção direta, indo alem das meras
especulações ou atitudes de
"avestruz" até então tradicionais
nesta área, não lhes negando nem
existência nem impossibilidade
de estudo sistemático e cientifi-
CO
Autor de obra extensa, torna-se
acessível aos não iniciados graças
à mediação de um grande nome
da pedagogia brasileira que e Lau-
ro de Oliveira Lima. Em Piaget pa-
ra Principiantes, o autor nao se
limita a expor didaticamente as
teorias do mestre suíço, mas tam-
bém comenta, sugere aplicações
práticas, o que torna a obra mais
valiosa e necessária aos que se
preocupam e se ocupam com a
formação e desenvolvimento do
indivíduo desde seus primeiros
estágios de vida.
Lauro de Oliveira Lima nao se
preocuoou com a organização
como ele mesmo declara - mas
apresenta uma visão sintética e
global das teorias de Piaget. Ao
final, encontram-se ainda dois ar-
tigos de J. Reis, publicados na
Folha de S. Paulo, bastante eluc-
dativos. Aconselha-se ao leitor
que inicie a leitura desta obra pelo
segundo destes artigos ' Piaget
- revolução intelectual talvez
comparável à de Freud"), que re-
sume as teorias de Piaget
O livro se desenvolve a partir
das colocações de Piaget sobre o
comportamento dos seres vivos,
que nega seja inato ou fruto de
condicionamento, mas construído
numa interação entre organismo e
meio, na qual gua.nto mais com-
plexa for a interação, mais inteli-
gente" será o animal.
Em seguida apresenta a meto-
dologia criada por Piaget: o me-
todo clinico por ele aplicado a
conduta humana, suas concep-
ções acerca da moral e o mpjr-
tante papel que o livre arbítrio de-
sempenhaem sua formação; suas
pesquisas em ps.cogenet.cao
problema da "autonom.a da afeti-
vidade e sua relação com o inte-
lectual. além de questões tais co-
comoada imitação, assimilaçaode
modelos, níveis de comportamen-
t0 O autor dá especial destaque às
teorias de Piaget sobre a inten-
qència e seu desenvolvimento e a
didática piagetiana em sua exigen-
-ia de que se dè ao aluno a opor-
tunidade de experimentar Çombi-
nações originais, desenvolvendo
sua inteligência na medida em
que reinventa o mundo.
Silvia Cintra Franco
ECONOMIA
Um grande catálogo sobre moedasu„ -^c có. ¦•r.aso". um dos quais è o de
Flávio Saes
OURO E MOEDA NA HISTÓRIA -
1450/1920, Piene Vilar. Editora Paz
e Terra, 1980.
O pensamento francês não tem
sido pródigo em obras do que
hoie se convencionou chamar ae
ciência econômica. (Essa lacuna e
tanto mais intrigante quando
se lembra que foi um francês o
Dr Quesnay, o fundador da siste-
mática que norteia ate hoje asa-
cramentada disciplina). Em com-
pensação, a história econômica
conheceu importante desenvolvi-
mento naquele pais sendo un-
versalmente conhecidas as contn
buições de Bloch, Labrousse.
Braudel, entre outros. O livro Ou-
ro e Moeda na Historia, 1450-
1920 de Pierre Villar, inscreve-se
também nesse rol e numa conhe-
cida tradição monetária francesa.
Ao que parece foram as tradi-
cionais alianças entre as casas
reais da França e da Espanha que
engendraram o interesse dos fran-
ceses pelos problemas da moeda
e dos metais preciosos. O afluxo
destes para a Espanha, nos se-
culos XVI e XVII. provocou feno-
menos de alta dos preços de to-
dos os gêneros, atraindo as aten-
ções dos estudiosos da época e
também dos séculos seguintes.
O livro de Villar è dedicado em
boa parte ao estuoo do fluxo OO
SS?oPà Espanha, suas consequen-
cias para aqueles países e para os
outros que com ele comercializa-
vam E não se detém a.. Pesquisa
ouai foi o pensamento, na época,
dos países implicados sobre o dl-
nheiro e os efeitos da ai a dos
preços. Não é raro, portanto, en-
contrar ao longo de todo esse
vasto período algumas incursões
do autor pela história do pensa-
mento econômico.
Mas è o metal, como mercado-
ria ou moeda, que ocupa a maior
parte de suaó atenções, desde as
rotas portuguesas e
?s rninas
americanas ate os sistemas de
moeda metálica na índia e Ch na.
Nesse imenso espaço geográfico
e no extenso tempo histórico
abordado, o autor não escapa da
sumarissima descrição de cada
"caso", um dos quais e o de Fer-
não Dias Paes Leme, "o
paulista
mais rico e mais poderoso em es-
cravos".Nos séculos posteriores,
como
não poderia deixar de ser, sua
atenção se dirige aos bancos e as
atividades que desenvolvem nos
vários paises. Dessa forma o cre-
dito faz sua aoançao na historia
monetária de Villar
Qual o balanço de tanto.esfor-
co? Um livro descritivo, útil para
consultas e citações de cunho
erudito. Um grande catalogo, sem
critérios, de tudo o que se refere
aos metais e às moedas O leitor
chegará extenuado ao fim, sem
saber, no entanto, o que eo -
nheiro. O grande segredo do sis-
tema capitalista continuara mde-
cifrável. ___O sentido do dinheiro se des-
cobre nos homens, e nao nas coi-
sas Infelizmente, Villar nao quis
nada com esta história, que e a
história do sistema em que vive-
mos.
Rui Granziera
l_Sh é—li f Jf_r__f? m 1 JSSm wál *S *m JlB^.flul__Há_M R,mmtmY'• Js____B_____^K_i__H_? ^___ B» —SS& Sh _* í ^_?5 §?! m-.a*amam,
18
I ASSINATURA BIANUAL
avista CrS 4.200,00
ASSINATURA ANUAL
avista CrS 2.700,00
ouou
, (Qrrt,,nnnn duas parcelas de Cr$ 1.350.001
duas parcelas de CrS 2.100,00 "^^ I
OU , m nt i
-.nn nn três parcelas de CrS 950.00 I
três parcelas de CrS 1.500,00 >
Nome IIdade ¦
Endereço '
Telefone Ciúsét "'!"'"'VcKpV'"'.'.'•. I
Ksliido I
Er_?_& _rsfi«w *¦• *». ¦ .«BE? s»pts:
naiura no exterior: anualai — USS 100; bianual USS 2(X). Paiu anaiura iw *-».*-•.»*.¦ -•— -- ,
_ l)SS ,7(( s>a ass „aiuraAmérica l.auna: anual - Lí-S B5. «¦"_¦'"?l\
p , m 46 s v1for reita na Europa enviar para Coma Posul CCF *'™***™
Vlaschi ou M lorres - Paris - France. Se a assinatura Im |wr.tla
da envia juaío com > cupom cheque no valor da primeira parcela.
mm m ____*¦__¦« mu m MUMMMMMmM _N ** emt** d*v*rão *** ••«Mn p*f* Corto, Aborto*'com nom* • "*dor*ço comptoto*
CARTAS ABERTAS -s-*^^ - --_
IGREJA
Solidariedade ao
pastor demitidoUma surpreendente decisão arbitrária
TRIBUNA LIVRE
Surpresos e dfiscontf-ntes, tomamos
conhecimento da derT.ssão do pastor
Dario Schaeffer pelo Prasbltérlo da Co-
munidade Evangélica de Juiz de Fora.
Já no ano passado, ouando o pastor
esteve para ser demitido nós, estudan-
t«S e professores da Faculdade de Teo-
loflla, escrevemos a comunidade de
Juiz de Fora apelando ao diálogo e à
conciliação. Ficamos esperançosos
quando soubemos que as partes ha-
viam chegado a um acordo de conti-
nuação do trabalho, paia posterior rea-
.aliação.
Muito mais chocados ficamos ern-iiber -ia demissãc arbitrária, sem con-
sulta lenovada à Comunidade e sem
avaliação conjunta com o paste. Nos-
sa carta endereçada à Comunidade de
Juiz de Fora, ao que nos consta, ja-
mais foi comunicada à Comunidade.
Por isso, decidimo-nos agora a aata
carta aberta, com a qual também que-
rernos expressar nossa solidariedade
aos membros da Comum Iade de Juiz
de Fora.
Adicionalmente, noemanto, este ca-
so nos move ainda a fazer as se-
guintes considerações:
1) preocupa-nos a estrutura paro-
quial instituída na IECLB, que possi-
EDUCAÇÃO
Omissõesna pós-
graduaçãoNa Universidade Federal da Paraíba,
o que ouvimos em resposta aos pro-
blemas que estamos vivendo são fra-
áes do tipo*. "A Universidade nao tem
recursos", "É
preciso conter despe-
sas", "Não há bolsas para alunos".
Sabemos que estamos vivendo um
periodo de agravamento da crise eco-
nômica. cujos reflexos são drásticos
no setor educacional. Entretanto, e
preciso que façamos valer, também no
âmbito educacional, os interesses da
Paraíba, os interesses da região.
Hoje os alunos de vários mestrados
não têm bolsas para orosseguir em
seus estudos. E a Reitoria da UFPB
nada fez de concreto ate agora para so-
lucionar o problema.Sem as bolsas fica comprometida a
aistência dos mestrados, não temos
bmo responder aos compromissos as-
sumidos com a cidade e com a região.
Diante das constantes omissões das
autoridades educacionais, devemos
evidenciar tais fatos, bem como, res-
ponsabil.zà-las pelo estrangulamento
dos cursos de Pós-Graduaçao. Esta
carta aberta tem como objetivo central,
além de solicitar uma imediata solução
às questões aqui enunciadas, pedir
apoio, através de pronunciamentos,
dos parlamentares paraibanos e de-
mais autoridades.— pelo pagamento imediato das boi-
sas de estudo dos meses de janeiro,
fevereiro e março, que deveria ter sido
efetuado até o dia 10 de cada mes; que
a Reitoria da UFPB e a Pró-Reitona de
Assuntos para o Interior (PRAI) exijam
a definição do valor das bolsas da
CAPES; pela equiparação das bolsas
dos mestrados ao valor das bolsas da
CAPES; pela garantia e pagamento das
bolsas para os alunos selecionados em
1981 Associação dos Pós-Graduados
__ Campina Grande
bilita a um grupo tutelar uma comuni-
dade;2) sabemos que um dos pontos con-
troversos entre o pasto1" Dario e o Pres-
bitério foi sua participação em ato de
apoio à anistia, para o que podia se
respaldar em documento oficial da
IECLB (Natal de 1978). Por parte da di-
reção da IECLB, não divisamos uma
atitude coerente de apoio concreto a
essa opção, mas apenas um procedi-
mento de cautela que culminou com a
capitulação diante do Presbitèrio
Quais são as prioridades da IFCLB?
3) este caso especifico, que de modo
algum è únLo, nos levanta a séria preo-
cupaçâo pelo modelo de pastorado vi-
gente na IECLB e pelas possibilidades
reais de uma vigência evangélica em
nossas comunidade*.:, a serviço de Cris-
to e do próximo.
Contudo, queremos perseverar na es-
perança que Cristo nos dá. Alegramo-
nos com o fato de que diversas comu-
nidades «"le imediato contataram com o
pastor Dano, para trabalhar em seu
meio e com eles. Isso nos anima.
Assinam 128 estudantes e
professores da Faculdade de Teologia
de São Leopoldo __ RS
ELEIÇÕES SINDICAIS
Nem toda a
oposiçãoestá no PT
Deserções não
ameaçam o PT
Uma resposta aos "cristãos novos" do PMDB.
No Movimento da última semana de
março, n° 300 o repórter Luis
Macklouf Carvalho, ao escrever sobre o
processo eleitoral do Sindicato da
Construção Civil de Belém, falsifica a
verdade sobre como se deu o apoio à.
Chapa 2. da oposição, dizendo que foi•apoiada
por militantes do PT".
A falta de verdade não está na afir-
mação, mas na omissão de informa-
ções. Ao afirmar que "praticamente to-
das as correntes de oposição critica-
vam asperamente Severino", para logo
em seguida dizer que só militantes do
PT apoiaram a Chapa 2, è querer fazer
crer que todas as correntes oposicio-
nistas estão no PT.
E desconhecida para mim a militân-
cia no PT de algumas forças e pessoas
de oposição, tais como* estudantes
daqui identificados com a tendência
Caminhando: pessoas que se orgam-
zam e se identificam com o jornal Tn-
buna da Luta Operária; a maioria dos
membros da Sociedade Paraense de
Defesa dos Direitos Humanos e do jor-
nal Resistência: além de alguns inde-
pendentes. Nenhum destes se enqua-
dra no PT.
Querer omitir as outras forças politi-
cas è, no minimo, desonestidade poli-
tica. È uma forma de censura tão vio-
lenta quanto a da ditadura militar... Ao
não se ter concordância com a posição
x ou y omite-se a sua existência, es-
conde-se a verdade. O que sobra en-
,tão? A mentira.
É imperdoável que um membro do
Conselho de Direção do Movimento
tenha atitude deste tipo.
José Marcos de Lima Araújo
Belém - Pa
Em três Estados do Nordeste, membros das direç<v*.
municipais e regionais, e filiados, deixaram >> PT. ü
primeiro rompimento se deu no Kio Cirande do Norte e
os três membros da (omissão Municipal de Natal, um
da ComissSo Estadual e mais três Filiados publicaram
um documento justificando o rompimento com o PT
O documento começava analisando a crise econômica
porque passa o Brasil, o crescimento da resistência do
povo e a crise c incapacidade da ditadura militar.
Propunha a constituição de uma Frente Democrática e
a organização de uma Central única dos Trabalhado
res — CUT; retomava a tese de que a reformulaçâ..
partidária toi feita para dividir o MDB e fazia autocri-
tica de nâo terem entendido este tato. Como resultado
dessa autocrítica, propunha a luta pela Assembléia
Constituinte, pela organização da Unidade Sindical e.
depois de afirmar a incapacidade do PI para orien-
tar e guiar o povo na luta pela derrocada do regime
militar, anunciava que o verdadeiro partido
da classe
operária nascerá com um programa claro e definido...;
por fim, anunciava a entrada no PMDB.
Em Pernambuco, o processo foi inverso: a Executiva
Regional cxpulvu 0 ex-viee-prefeito de Recife e ex-de-
putado federal, Arthur Lima Cavalcanti, e mais dois
filiados. Fred Navarro e Antônio Melo Martins. A
posiçlo da Executiva Regional foi tomada, segundo
ela, porque os três estavam fazendo aliciamento no PT
para adesões ao PMDB. Os expulsos defendiam as
mesmas propostas do ex-petistas do Rio Grande do
Norte.
Na Paraíba, num primeiro momento, um militante —-
José Francisco de Sou/a - desliga-se do PT na mesma
época e com os mesmos argumentos dos rompimentos
do RN. Mais recentemente, abandonaram O PT da
Paraíba um membro da Direção Nacional, Wanderly
Farias, e mais 59 filiados e integrantes das comissões
municipais, com as mesmas posições.
Todos abandonaram o PT e ingressaram no PMDB
dentro de uma mesma visão e proposta política. Esta-
vam articulados no PT desde O primeiro encontro
nacional, de maio de 1980. quando suas propostas
loram derrotadas em toda a linha, destacando-sea que
defendia a inclusão, na plataforma de luta do PT, ou
mesmo no programa, da palavra de ordem de Cons-
tituinte.
f. preciso entender de uma vez por todas que esta
articulação propõe (propõe porque ainda existem re
manescentes seus dentro do PI') para o Partido uma
tática política e uma estrutura interna de organização
que. se vitoriosas, descaracterizariam o VI e seu papel.
Segundo sua visão, o PT divide a oposição e a principal
meta da abertura toi dividir o MDB. quando a realida-
de e os fatos desses dois últimos anos demonstram que
a abertura e a reformulação partidária tiveram como
objetivo principal desorganizar e desmobilizar o movi-
mento popular, principalmente os trabalhadores e o
sindicalismo autentico.
A principal tarefa que se colocava - para as nascentes
lideranças sindicais, para os parlamentares autênticos
c populares e para a esquerda e setores oposicionistas
- era a de construir nâo só sindicatos, associações e
entidades independentes do Estado, mas. principal-
mente, buscar organizar um partido político legal, de
massas e de luta que buscasse atingir aqueles objetivos.
A concepção política dos setores que abandonaram o
PI nada tem a ver com esses objetivos. Ao proporem a
luta por uma Constituinte; pela organização de uma
Frente Democrática, que seria já o PMDB; pela forma-
ç3o de uma Central Única dos Trabalhadores, como
alternativas à crise econômica e política do regime, na
prática colocam-se a reboque dos objetivos e das
formas de organização e luta da oposição liberal bur-
guesa. Ioda concepção política dessa articulação parte
de uma visto catastrófica, fruto de uma análise nao
objetiva, da crise econômica e uma avaliação ufanista
do nível de luta e organização do movimento popular.
ao pressuporem a viabilidade de, no momento, criar
uma alternativa ao regime militar, ainda dentro dos
limites liberais burgueses.
de lutas que o movimento popular atingir, seu nível de
organização e político. n3o sendo possível
definir hoje
quem é candidato e quem vencerá as eleições. Náo è
porque hoie somos fracos e desorganizados em uma
cidade que vamos compor com outro partido e apoiar-
nos em esquemas de currais eleitorais para detnagegi-
camente pedir votos ao povo. O que importa é uin j
programa político para disputar eleições que relletrto i
a luta e a organização dos trabalhadores.
O que perguntamos aos cristãos-novos do PMDB é
quem dará apoio is campanhas eleitorais para dispu-
tar governos em 82 a seu nc .o par,do, já que, se nâo
tivermos um partido organizado e com bases popuia-
res, dependeremos do apoio de grupos econômicos ou
dos instrumentos controlados pelo regime, como a 1 v
e o rádio.
Mais mistificadora é a acusação que fazem de que o
PT divide o movimento sindical, quando a verdade é
uma só: o que interessa é a unidade dos trabalhadores
pela base, no movimento real de lutas, de organização
sindical e nas fábricas. Militantes do PT. quando têm
apoiado oposições sindicais que disputam eleições con-
tra pelegos. nio est3o dividindo o movimento sindical,
mas apoiando chapas que disputam eleições com dire-
tortas uue mantêm o sindicato afastado da fábrica e
dos trabalhadores.
O PT nâo é contra a Unidade Sindical ou o Conclat,
mas isto nâo significa aceitar a política conciliatória e
cupulista da atual "Unidade Sindical", assim como
defender determinada política nc- Conclat nâo significa
também ser contra ele, mas sim contra outra orienta-
çâo que pretende ser hegemônica.
Fará fechar suas propostas de Constituinte, Unidade
Sindical e prioridade para as eleições de 82. os ex-pe-
tistas definiram o PMDB como a Frente Democrática,
quando todos sabem que naquele partido está apenas
parte das oposições ao regime militar; e que seu caráter
de Frente nâo impede, como nào impediu no passado,
que sua política fosse dirigida por seus setores liberais,
que sempre o conduziram de maneira elitista. Preten-
der transformar o PMDB em Frente Democrática
capaz de derrubar o regime militar é puro desvano,
quando acabamos de assistir uma composição deste
partido, no Congresso Nacional e em diversas assem-
bléias legislativas, com os setores oficiais do PDS — e
nâo com os setores dissidentes ou com as oposições.
como Wanderlv Farias aconselha em sua entrevista à
Folha de S. Paulo (em 19,3/81).
A saída desses elementos do PT nfto implica
nenhum perigo para a construção do Partido, mas deve-
mos nos perguntar como foi possível ter nas direções,
em três Estados, membros que abertamente trabalha-
vam para explodir o partido.
Fm nosso entendimento, estes setores foram eleitos
para direções do PT como resultado de composições
políticas realizadas em nossos encontros do ano passa-
do que nâo levaram em conta as posições políticas e as
propostas que os mesmos faziam. A nâo definição de
uma linha política pelas chapas, e mesmo o desconhe-
cimento por parte dos delegados dos membros das
chapas levaram à sectanzaçlo da luta política nos
encontros, quando deixamos de discutir as posições e
propostas de cada articulação ou conjunto de delega-
dos. para "salvar" o PT dos trotskistas ou da esquer-
da.
A política cupulista e a prática de congressos onde o
que vale sâo as articulações, favorecem as posições de
direita, que nâo dependem das bases ou do movimento
popular e operário.
Ou o PT cresce junto com o movimento operário e
«.pular ou nâo existirá. Daí. a principal tarefa para,
iodos hoje é filiar e registrar o PT. com base nas lutas e
campanhas que levamos nesse último ano. O PT conta
hoje por sua origem e proposta, com amplo apoio
junto aos trabalhadores da cidade e do campo mas sua
viabilidade depende, a médio prazo, da definição de
uma linha política para enfrentar a conjuntura de 1981
c levar o movimento popular a um novo avanço em suas
lutas sócio-econômicas e políticas.
JoséDtreeu
Como resultado dessa visão, só poderia surgir uma
proposta eleitoral e parlamentar oportunista, que só
objetiva a eleição de candidatos do PMDB, jà que estes
teriam condições de vencer em 1982. Sem avaliar que,
como entende o PT, as eleições de 82 vâo refletir o nível
(O aulor é ex diretor da União Estadual tio. Estudan-
te. - SP e militante do PT. O arttoo que pnblfcamo*
nesta edlv«o é constituído de trechos de um aittfo
maior.)
15
MOVIMENTO - 20 a 26/4/81
¦ I
ENTREVISTA
Em defesa dodo exílio''£^s_^S,H»iSEi£sil as liberdades básicas dos exilados dof
Cone Su1 o conh^
cido escritor argentino Júlio Cortazar fala do drama dessa
diáspora e da crueldade das ditaduras.
Jacques Bertoin
Autor de literatura do fantástico, do
ensaio engajado, do conto filosófico, do
romance experimental, o argentino de
66 anos Júlio Cortazar tem minto a
ensinar aos que procuram uma razão
para escrever, diz o jornal francês Le
Monde, de onde foi condensada esta
entrevista. Júlio Cortazar viveu no ext-
lio europeu, onde se converteu numa
espécie de protetor e porta-voz dos
exilados políticos das ditaduras do Cone
Sul. Nessa entrevista, o autor de Jogo
da Amarelinha explica seu engajamen-
tt, político e literário ao lado dos exila-
dos.
Pergunta — Allende dizia que uma
eleição municipal no Panamá podia se
transformar numa disputa entre as
grandes potências. As "opiniões
públi-
cas". nacionais ou internacionais, esta-
riam condenadas a permanecer sem
influência neste contexto? Mais parti-
cularmente. qual poderia ser o papel
dos intelectuais sobre o futuro do Co-
ne Sul da América, quer estejam eles
em seus países ou no exterior?
Júlio Cortazar — Ê preciso inicialmen-
te que tu saliente um fato extrema-
mente positivo: mesmo nos países onde
a situação está pior do que se pode
imaginar, os intelectuais estão ao lado
dos oprimidos e não dos opressores. Ê
claro que sempre existem os indiferen-
tes, as pessoas que se enraízam em
qualquer sistema, mas estes são uma
minoria ncgligenciàvel. È eu certamen-
te não tenho ilusões quanto ao poder
dos intelectuais face às metralhadoras.
A palavra tem o seu peso, mas em re-
lação a força bruta ela infeltemente não
conta! Entretanto é a partir desta cons-
tatação que eu digo que é preciso tra-
balhar e lutar por todos os meios pos-
síveis contra as ditaduras.
Pergunta — Os escritores, os filósofos,
os cientistas fogem em número cada
vez maior das violências que os amea-
çam. Você mesmo cruzou o oceano ha
trinta anos. mas por vontade própria,
pelo amor á Europa e à França. Depois,
as circunstâncias mudaram e você não
poderia voltar a seu país sem sacrificar
sua liberdade, embora a França conti-
nue a recusar-lhe a naturalização que
você pede. Você tem o sentimento de
ter se juntado a este "povo
do exílio
que hoje existe pelo mundo?
iipovo
Júlio Cortazar — A pergunta precisa
ser respondida de diversos ângulos dite-
rentes. Falar de um "povo do exílio
seria dar ao exílio um estatuto que eu
não estou disposto a conceder. Na mi-
nha opinião. 0 exílio é sempre uma
compulsão, uma coisa forçada, um mo-
mento monstruoso da natureza huma-
na e da luta entre os homens, ê o
desenraizamento provocado pela força
rw-uta: a escolha entre ser morto, preso,
aduzido ao silêncio, e continuar a se
e-xpressar, mas em terra alheia. É a
partir daí que os exilados mesmo de-
vem refletir c reagir contra o mecanis-
mo específico do exílio. Se eles se dei-
xarem reduzir ao papel forçosamente
passivo de pessoas expulsas de suas
terras, e que tentam apenas se virar sob
novas condições de vida. estarão contri-
buindo para o triunfo das ditaduras.
Para estas, o exílio é um empreendi-
mento de demolição moral: obriga-se
alguém a partir e se toma por base que
esse alguém não vai resistir, mas se
acomodar em uma nostalgia alegrada
por vagas esperanças. Pense nos exila-
dos espanhóis após a vitória de Franco:
dezenas de anos, de vagas esperanças
de que algum dia Franco cairia, sem
nenhuma autocrítica profunda de seu
comportamento, quando poderiam ter
se mostrado muito mais dinâmicos e
eficientes.E com relação a essa dinâmi-'
ca, a essa eficácia, que eu questiono os
exilados chilenos e argentinos de hoje, e
que eu também questiono a mim mes-
mo. E eu constato que muito poucos
caíram na angústia, no desespero, na
nostalgia. Trabalha-se muito ativamen-
te contra as ditaduras, realiza-se um
encontro depois do outro, e a produção
dos editores, no México, na Venezuela
e na Europa, atesta a vitalidade cultu-
ral deste movimento.
Pergunta — Quais são os objetivos
dessa nova diáspora? A volta de todos a
seus países o mais rápido possível, ou o
triunfo para todos os valores que não
têm fronteira? Você não se sentiria
igualmente próximo dos exilados sovte-
ticos e chilenos?
Júlio Cortazar — Ê verdade que um
exilado se ressente rapidamente da ne-
cessidade moral de reagir contra qual-
quer injustiça, venha ela de onde vier. E
é isso mesmo que cria a noção de dissi-
dência. este protesto contra a sorte re-
servada aos indivíduos pela violação de
seus direitos. Eu ignoro absolutamente
os alinhamentos militantes, as parti-
ções políticas ou geográficas. A única
coisa que eu assinalo, entretanto, é que
os reacionários em geral, e também os
que se costuma qualificar de "liberais",
porque colocam uma aparente tolerân-
cia a serviço de sua boa consciência,
todos estes têm uma tendência de colo-
car todos num mesmo caso.
Ora. se é verdade que, moralmente,
uma pessoa não deve ser perseguida
por um delito de opinião, existe uma
diferença importante para aqueles que
sofrem estes achincalhes: na Polônia,
na Tcheeoslováquia. as pessoas são ex-
pulsas ou dissuadidas a partir. Em El
Salvador, na Argentina, as pessoas são
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Cortazar: lutar por
torturadas, mutiladas ao grau supremo
de desprezo por qualquer sentimento
humano. Eu sou contra as perseguições
seja na URSS, Chile ou Argentina, mas
não tentem me repetir — como fazem
tantos "liberais" —
que é tudo a mes-
ma coisa.
Pergunta — Seu continente, a terra da
qual sc sente nostalgia — não seria
simplesmente a Revolução, terra de so-
nho que você desejaria alcançar?
Júlio Cortazar - Antes é preciso che-
Kar a um acordo sobre o sentido dessa
palavra. As palavras são objetos vivos
cujas conotações mudam segundo as
épocas e as gerações. Eu gostaria por
exemplo que a palavra marxismo to-
masse hoje um sentido moderno e não o
que se atribui ao velho Marx. A orto-
doxia marxista consiste em querer aph-
car esquemas primitivos, ultrapassados
pela evolução histórica. A revolução e
um processo de libertação de um povo,
e por esta razão ela deve veicular todos
os impulsos, todas as maneiras de ser
deste povo. Graças a ela, este deve reen-
contrar sua identidade e não sacrifica-
la.
Pergunta — No caso de revoluções hoje"impensáveis", isso se deveria apenas
ao fato de as relações de força serem
desfavoráveis ou porque não ê mais
/tossível estabelecer um projeto hjtvolu-
cionário?
Júlio Cortazar — O papel de um escri-
tor. de um jornalista é de se mostrar
bastante crítico. O verdadeiro trabalho
dos intelectuais consiste em fornecer a
uma libertação — empreguemos esta
palavra — o máximo de possibilidades
imaginativas e experimentais. Sua con-
tribuição 6 dar á reflexão política os
elementos que. sem isso. ficariam exter-
nos ao debate. Gosto dos políticos que
se mantêm em contato com os intelec-
tuais. "Che" Guevara era um deles. Ele
sabia falar durante horas de poesia e de
música.
os meios contra as ditaduras.**
Os ditadores são cegos e surdos: pior,
eles impedem as populações que domi-
nam de escutar música, de ler livros.
Eu queria insistir sobre este duplo exí-
lio que eles provocam: de um lado,
caçam os intelectuais de seu país, e de
outro, transformam os que restaram —
e não apenas os intelectuais! — em ver-
dadeiros exilados internos. Muitos li-
ivros não entram na Argentina; 30 mi-
lhões de pessoas que não podem ler
sequer um romance de David Vinas, ou
um de meus contos. Não têm o direito
de escutar uma música do Quarteto Ce-
dron. Não se trata de um exílio ainda
mais cruel e que não é sentido como tal?
E isso porque a imprensa oficial e os
serviços de propaganda — realizando
este verdadeiro genocídio cultural —
não permanecem inativos: dopam as
inteligências com a publicidade do"modelo argentino". Apresentam os
exilados como traidores e apátridas.
Como se falou dos diferentes conteú-
dos da palavra 'revolução', se poderia
fazer o mesmo com o termo 'ditadura'.
Este vai da imbecilidade brutal de um
coronel espanhol que entra de revólver
em punho na Câmara dos deputados,
até a lavagem cerebral americana,
quando na tevê se corta 45 vezes um
filme para lhe passar as "mensagens
que se conhece sobre os detergentes, os
chocolates e outros. E que não se pense
que isto é exagero: durante 50 anos, a
política americana neste famoso "quin-
tal" não foi ditada por imperativos de de-
tesa nem por considerações políticas.
Tratava-se muito simplesmente de sa-
tisfazer este verdadeiro ditador da
América Latina, isto é. a United Fruits.
que defendeu seus interesses como hoje
defendem as multinacionais. Atras dos
soldados, dos gangsters. os pinochets.
os somoza, existem forças mais sutis.
Dirão que eu me exprimo em língua-
«em marxista, mas não é necessário ser
marxista para compreender tudo
isso...
(Le Monde)