Nota Publica Sobre Urgentes Preocupacoes Com a Situacao Do Sistema Prisional Brasileiro Março 2014

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  NOTA DA PASTORAL CARCERÁRIA NACIONAL Urgentes preocupaç ões com a situação do sistema prisional brasileiro A Pastoral Carcerária Nacional, reunida em Brasília, com as coordenações dos estados do Brasil, entre os dias 20 e 23 de março de 2014, vem, pela presente nota, externar à sociedade brasileira as suas urgentes preocupações com a atual situação do sistema  prisional, a exemplo do que se tem enfrentado no estado do Maranhão: 1. Existe uma clara política de encarceramento em massa em todos os estados do  país, da qual deriva o cenário geral da superpopulação carcer ária e de condições degradantes e atentatórias à vida. Estar numa prisão significa descer ao inferno, ser tratado da forma mais desumana possível e, no limite, perder a vida. A  prática violenta e criminosa adotada pelo Estado brasileiro, por meio do encarceramento em massa, sobretudo da população mais pobre, faz do nosso sistema prisional, a pior forma de escravidão dos tempos atuais. 2.  Nas unidades prisi onais de todo país, quase a metade da população encar cerada está presa provisoriamente, por meses, anos, o que constitui uma grave violação do direito à presunção de inocência e de acesso célebre à justiça. De fato, há, por um lado, conhecido déficit de acesso à defesa, e, por outro lado, a consciência do Judiciário e do Ministério Público, que, salvo raríssimas exceções, abdicam do  papel constitucional de fiscaliz ar presídios e de garantir os direitos fundamentais da população carcerária. 3. Também familiares de pessoas presas são duramente apenados, em desprezo ao que dispõe a Constituição da República. A revista vexatória segue como objeta  prática de violação sexual a visitantes de pessoas presas. A cada dia de visita, centenas e milhares de mulheres são submetidas ao que de mais desumano existe ao serem submetidas aos piores constrangimentos: despidas, são obrigadas a se agacharem por várias vezes, abrirem suas partes íntimas, que por vezes até sangra. Quando menstruadas, são impedidas de realizar a visita. Toda essa  barbárie ocorre em nome de uma segurança que não existe, uma vez que os objetos ilícitos estão sempre presentes nas unidades prisionais. 4. Pela própria forma como se organiza e se estrutura o sistema prisional, o mesmo inviabiliza qualquer processo de inclusão da pessoa na sociedade depois do cumprimento da pena. Por esse motivo, não acreditamos nos chamados  programas de ressocializ ação, uma vez que não passam de retórica para angariar recursos ao sistema prisional, sem qualquer tipo de acréscimo nas condições materiais de sobrevivência das pessoas presas.

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Nota Pastoral Carcerária março 2014

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  • NOTA DA PASTORAL CARCERRIA NACIONAL

    Urgentes preocupaes com a situao do sistema prisional brasileiro

    A Pastoral Carcerria Nacional, reunida em Braslia, com as coordenaes dos estados

    do Brasil, entre os dias 20 e 23 de maro de 2014, vem, pela presente nota, externar

    sociedade brasileira as suas urgentes preocupaes com a atual situao do sistema

    prisional, a exemplo do que se tem enfrentado no estado do Maranho:

    1. Existe uma clara poltica de encarceramento em massa em todos os estados do pas, da qual deriva o cenrio geral da superpopulao carcerria e de condies

    degradantes e atentatrias vida. Estar numa priso significa descer ao inferno,

    ser tratado da forma mais desumana possvel e, no limite, perder a vida. A

    prtica violenta e criminosa adotada pelo Estado brasileiro, por meio do

    encarceramento em massa, sobretudo da populao mais pobre, faz do nosso

    sistema prisional, a pior forma de escravido dos tempos atuais.

    2. Nas unidades prisionais de todo pas, quase a metade da populao encarcerada est presa provisoriamente, por meses, anos, o que constitui uma grave violao

    do direito presuno de inocncia e de acesso clebre justia. De fato, h, por

    um lado, conhecido dficit de acesso defesa, e, por outro lado, a conscincia do

    Judicirio e do Ministrio Pblico, que, salvo rarssimas excees, abdicam do

    papel constitucional de fiscalizar presdios e de garantir os direitos fundamentais

    da populao carcerria.

    3. Tambm familiares de pessoas presas so duramente apenados, em desprezo ao que dispe a Constituio da Repblica. A revista vexatria segue como objeta

    prtica de violao sexual a visitantes de pessoas presas. A cada dia de visita,

    centenas e milhares de mulheres so submetidas ao que de mais desumano existe

    ao serem submetidas aos piores constrangimentos: despidas, so obrigadas a se

    agacharem por vrias vezes, abrirem suas partes ntimas, que por vezes at

    sangra. Quando menstruadas, so impedidas de realizar a visita. Toda essa

    barbrie ocorre em nome de uma segurana que no existe, uma vez que os

    objetos ilcitos esto sempre presentes nas unidades prisionais.

    4. Pela prpria forma como se organiza e se estrutura o sistema prisional, o mesmo inviabiliza qualquer processo de incluso da pessoa na sociedade depois do

    cumprimento da pena. Por esse motivo, no acreditamos nos chamados

    programas de ressocializao, uma vez que no passam de retrica para angariar

    recursos ao sistema prisional, sem qualquer tipo de acrscimo nas condies

    materiais de sobrevivncia das pessoas presas.

  • 5. No compactuamos com a construo de mais crceres e com a repetida aposta no sistema penal para a resoluo de problemas sociais. Em verdade, a

    proliferao de prises tem sido elemento determinante no aumento da violncia

    dentro e fora das grades.

    6. Por essas razes, reiteramos nossa reivindicao por uma poltica de desencarceramento massivo e de abertura do crcere sociedade, denunciando o

    papel central do estado nas violaes dos direitos das pessoas presas e nas

    diversas formas de violncia delas decorrentes.

    Braslia, 24 de maro de 2014

    Pastoral Carcerria Nacional